FS Revista Fotosite [n. 16]

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editorial ilustrado

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FOTOGRAFIA NO ESQUEMA

O que vai acontecer por aqui depois que o "Comandante" morrer? pergunto a um fotógrafo cubano (não vou citar o nome) enquanto tomamos um café num bar de Havana. À resposta vem rápidae fria, enquanto olho seu portfólio. "Não sei e nem tenho muito tempo pra pensar nisso minhas preocupações são mais terrenas: o que comer, como viver de fotografia em um país que não tem fotografia publicitária nem editorial, arrumar dinheiro, enfim... tocar a vida. E tocar a vida com fotografia em Cuba é viver de esquema. Esquema para conseguir equipamento, malabarismo para ampliar uma foto só há um laboratório razoável, e caro, na cidade de Havana sorte de encontrar um livro que traga alguma luz sobre o que se produz lá fora, oportunidade para tentar vender suas obras a algum estrangeiro, criatividade para fugir do estigma da geração épica de Kordas e Salas enfim, esquema. Cuba éa ilha da fotografia intuitiva, da internet proibida, do deslumbre pelo celular. Cuba é a ilha das duas moedas, é o lugar onde as crianças parecem os seres humanos mais felizes e onde os artistas parecem ter tempo de sobra para criar, pois, na impossibilidade de ganhar dinheiro com fotografia publicitária, editorial ou seja lá o que for, ganha-se tempo para investir com afinco no autoral e fazer disso a tábua de salvação. Fico imaginando como seria a fotografia brasileira se tivéssemos uma única maneira de ganhar dinheiro com ela: trabalhos autorais. Nada de agências de publicidade, nada de orçamentos, apenas arte. Vender sua arte para comer, vestir-se, namorar, quem sabe comprar um carro caindo aos pedaços e achar o máximo. De certa maneira isso me serviu de lição, já que voltei de lá com a incrível sensação de que eu preciso mudar o meu esquema.

PISCO DEL GAISO

Del Gai

www.sony.com.br/alpha

sumário

lugar na categoria "Ensaio de Esporte" do 50º Press Photo. A série de 12 imagens, inédita na mídi brasileira, mostra frequentadores de uma academia de Nilson Garrido. Apesar do contentamento pessoal, premiação comprova, para Kehl, a crise pela qual fotojornalismo nacional transita. "Ganhei um prêmio internacional sem nunca ter publicado o Fiel To) meu país. Não há mais espaço para esse tipo de ensaio no mercado editorial brasileiro. Nosso fotojornalismo é pautado por uma formulinha que não valoriza! história contada através da foto", diz. Integrante da: equipe da Cia de Foto, Kehl se sente um privilegiado por poder conciliar projetos pessoais e comerciais.

ÉEN & Eam

FOTO DA CAPA: Sin Titulo , da série "White Things (2002), de autoria do fotógrafo cubano René Pena. Veja mais na matéria "Filhos da Revolução" (página 8)

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SIXPIX Marceio Cândido de Meto Rena e (1 E RS id [E Ss UA See eo Tete DE ra ulçad A RR SEITA POÀ AR O Es fimo Dei GsdE cena sm Rodrigues ericaOfotosite.com.br Repórter Flávia Lelis flavialelisOfotosite.com.br Assistente Mário Ito Revisão dis Fa neta E E] le A Leu Dacorso, Eder Chiodetto, Juliane Bezerra, Luiz Maximiano, Marcio Scavone, Maria Joaquina, SESI UOL eoJunior, Ena ALCA RE PAL gi penera DEE PPT adrianaQsixpix.com.br Executiva oa LA CRETA E fa E Es CÃO AA pesada PA Sonha E) norte, DEL A ICAO IE AR RETA se, Pe Eid RE Do pá aa cano a EUR ETR TT E RS PTE A Re ed] PRI TO eu) TC oc ni ST po SRS aa eo Eskenazi Indústria Gráfica Os artigos assinados não refletem necessariamente a opinião da

O QUE ERRAMOS NA EDIÇÃO ANTERIOR

Diferentemente do publicado na página 56, o nome correto da exposição de German Lorca, inaugurada em dezembro na Pinacoteca do Estado de São Paulo, é Fotografia como Memória . Na página 59, as imagens 4 e 5 referem-se à fotografia À Procura de Emprego e as imagens 6e 7 referem-se à

fotografia Malandragem , de German Lorca.

Cia

aa porn Apesar das dificuldades em PLEN do] PT o IS TA socialista: Rede lei E La fo fotografia cubana contemporânea apresenta bons expoentes, revigora-se'e segue adelante...

or muito tempo a fotografia cubana ficou conhecida apenas pelo mítico retrato de Che Guevara feito por Alberto Korda (1928-2001) em 5 de março de 1960. Considerada a fotografia mais reproduzida no mundo, o olhar decidido sob a boina com uma estrela segue estampando camisetas, pôsteres e os sonhos daqueles que ainda acreditam num modelo de vida em sociedade no qual a justiça e a igualdade sejam as premissas.

Desde que Fidel, Che e seus seguidores desceram da Sierra Maestra para assumir o poder da ilha em 1959, a fotografia documental cubana firmou-se mais fortemente por conta do interesse do mundo em um regime socialista às barbas dos EUA, o que elevou rapidamente Fidel e Che ao status de celebridades da esquerda mundial.

Passados quase 50 anos, porém, uma nova geração de fotógrafos parece menos preocupada com questões ligadas ao regime e à política, e mais atenta à exploração da linguagem fotográfica em suas diversas possibilidades narrativas.

A tremenda dificuldade em se adquirir equipamentos, filmes, papel fotográfico, químicos e computadores, e a exi cia de apenas um laboratório em Havana apto a realizar cópias de alta qualidade não são necessariamente barreiras que paralisem a produção cubana.

Fotografando com o filme que há, e ampliando no papel que, por acaso, algum estrangeiro trouxe para ilha, os artistas encontram na dificuldade, por vezes, uma ferramenta criativa, como é o caso de Alfredo Ramos, que utiliza sobras de papel e pontas de filmes na sua criação.

Outro fator que tem feito a fotografia local alçar vôos são a aparente união e a troca de informações dos fotógrafos reunidos em torno da Fototeca, instituição que pertence ao Conselho Nacional de Artes Plásticas, do Ministério da Cultura.

Fotomontagens, ampliações em suportes alternativos e man pulações em computador convivem com o preto-e-branco clássico na pesquisa de temas que narram a cultura, a identidade, a relação entre espaço construído e natureza, a sensualidade e a memória. Questões que p tuam a fotografia contemporânea em qualquer lugar do mundo, mas que, em Cuba, recebem a contribuição da generosa luz caribenha.

René Peha

Cras da «Mega ne. dd

RENÉ PENA

A produção desse fotógrafo que nasceu em 1957, em Havana, e viveu por quase dois anos nos Estados Unidos aponta para as raízes africanas do povo cubano. Calcado no retrato em preto-e-branco, possui extensa obra elaborada em estúdio na qual grande parte das vezes ele se auto-retrata, como nestes dois exemplos. À sensualidade e o ser humano entendido como um duplo feminino-masculino surgem como a linha de força de seu trabalho, que por vezes remete às obras do norte-americano Robert Mapplethorpe e do brasileiro Mario Cravo Neto

Um piquenique ao lado de um caminhão do exé to, um teatro de arena destruído. Alejandro, que nasceu em 1974 em Havana, retornou aos lugares que frequentava na infância para registrar a situaçãc ali anos depo - Uma i fáei rote indi ão pelo atual estado das coisas transformou-se fotografia que podia pegar o atalho fácil do protesto e da indignação ! atra, E ae Use numa fotografia sorrateira, que denuncia sem esbravejar. O aparente piquenique idílico (na abertura desta matéria) acomoda em sua paisagem um deslocado caminhão do exército. O teatro de arena (nesta página), sem público, sem a e O NR Rae SAO cena, transforma-se numa insólita instalação. Teatro do absurdo? [ww w.alejandroglez.com]

NEÉSTOR

Parte da produção de Néstor está voltada para o diálogo possível da fotografia com outras mídias, como os símbolos e logotipos que circulam nos computadores e a fotografia de vídeos de conteúdo pornográfico. Versátil, Martí também possui uma bela série sobre o fumo, na qual fotografa os desenhos erráticos da fumaça de charutos sob efeito do vento

Marti

Federico Reiners

NELSON E LIUDMILA

Ela nasceu em Moscou, em 1969, e vive em Cuba desde 1977. Ele nasceu em Berlim, no mesmo ano que ela, e vive em Cuba desde 1972. Um casal que assina as obras em conjunto e que faz da investigação dos espaços urbanos um dos principais eixos de seus trabalhos, como na divertida e irônica sequência Absolut Revolution em que fotografam o monumento da praça da Revolução e, por meio de fotomontagens, o transportam para cenários inesperados. Em outra interessante série (acima), chamada "Todos los Caminos Conducen al Mar" (1996), eles extirpam os prédios dos quarteirões da avenida da praia, em Havana, deixando apenas as esquinas e suas ruas

FEDERICO REINERS

A obra "Micro Mundo", na qual Freddy, 40, se utiliza de uma lente super angular para transformar cenários de Havana em universos insólitos, pode ser entendida como uma metáfora da impossibilidade de muitos cubanos deixarem a ilha por conta própria. "Às vezes não sei se o que estou fazendo já foi feito, não tenho referências, é tudo intuitivo", diz o fotógrafo, que trabalha com uma câmera de 2 MP

Oscilando entre uma produção mais experimental e intelectualizada representada pela série em que trabalha diferentes construções fotográficas, compondo com pedras , e outra de caráter mais documental, na qual revela aspectos ritualísticos da cultura cubana, como a briga de galos, José M artí, 54, faz do uso adequado do preto-ebranco e da luz seus melhores trunfos

MABEL LLEVAT

Fotógrafa de 32 anos, autora dos textos que acompanham as exposições e publicações de vários fotógrafos locais, Mabel possui uma obra eminentemente feminina, seja nos auto-retratos da série "La Favorita", na qual ela se fotografa em locais com escombros, seja nas suas divertidas fotomontagens feitas com tesoura e cola, onde a junção de tempos e espaços distintos cria uma atmosfera kitsch e inesperada [www.casa.cult.cu]

LISSETTE SOLÓRZANO

Pesquisadora de técnicas históricas de impressão, Lissette se pauta sobretudo pela fotografia de arquitetura, que, por meio da técnica empregada, ela vai aos poucos transfigurando. Cada prédio, cada parede recebem um tratamento diferenciado de cores e texturas. À artista finda por criar espaços ficcionais, como quem busca a melhor forma de representar o seu lugar no mundo [www.lissettesolorzano.com]

PEDRO ABASCAL

Nasceu em Havana em 1960. Fotógrafo veterano que segue fielmente a escola francesa do flagrante de rua, do momento decisivo e da busca do surreal que se esconde na vida cotidiana. Sua extensa obra revela muito da cultura habanera, dos costumes e das relações sociais. Anda pelas ruas de olho atento, esperando que o acaso lhe presenteie com uma boa fotografia. Seu portfólio está repleto delas

ALFREDO RAMOS

Refugo de químicos, de filmes, de papel fotográfico, e seus efeitos sobre superfícies inesperadas, como azulejos e a bancada de trabalho, compõem uma obra nada convencional. Sobras e restos lhe interessam para criar formas e cores que não pagam tributo ao realismo da fotografia, mas que investigam o insondável universo do inesperado, no qual a intervenção do artista nem sempre consegue determinar o final da obra, como na série "Estudo para Vestígios". Nasceu em 1964, em Havana

Livro

Fidel Castro -Cuba Biografia a Duas Vozes =Guia Visuals Ignacio Ramonet Publifolha Er:

z LivroInside Cubaa Julio Cesar-P Hernandez é Gianni Basso

Uma Nova História Richard Gott
GALIRIA

Exposições nas Galerias Fnac

Sérgio Sá Leitão

Manuel da Costa

No último semestre, Vicente de Mello lançou quatro exposições e um livro que compila 15 anos de sua produção em preto-e-branco. Depois de acompanhar o fotógrafo em temporada por São Paulo, quando inaugurou a mostra moiré.galácticabestiário REVISTA FS publica seus dois trabalhos em cor, o work in progress Vermelhos Telúricos e o inédito O Cinematógrafo

POR ÉRICA RODRIGUES

No alto, "A palavra fora da pedra no ar". Acima, "Todo mar choveu em um dia . Da série "O Cinematógrafo"

"Florianópolis - Santa Catarina - Brasil".

Da série "Vermelhos Telúricos"

"Centre Pompidou - Paris - França".

Da série "Vermelhos Telúricos"

ila Madalena, São Paulo. Entre os muitos desenhos delineados com mínimas continhas de subtração, O ateliê do artista Paulo Climachauska guarda uma grande fotografia vermelha. Dá uma certa nostalgia mesmo para as gerações pós-80, que talvez não saibam o que é um carrossel de slide olhar para aquela foto de Vicente de Mello[www.vicentedemello.com], uma reprodução [,24m x 1,24m de um monumento turístico que todos temos plasmados em algum ponto da memória. Diante dela, é como se parássemos de girar os ektachromes, em suas moldurinhas de bordas arredondadas, para contemplar a própria lembrança, simbolizada pela catedral grande e imutável de Brasília. O souvenir, igual àquele que o pai do fotógrafo comprava e projetava junto com os slides que ele mesmo fazia durante as viagens, estava agora ali, acelerado na cor, alterado em seu tempo e espaço. Era 25 de janeiro, e o almoço no ateliê de Paulo Climachauska celebrava o lançamento da exposição do amigo Vicente de Mello na Pinacoteca do Estado de São Paulo. Aos 39 anos, o fotógrafo está num momento profissional bastante favorável. No último semestre, expôs no Oi Futuro [www.oifuturo.org.br] e na Galeria Artur Fidalgo [www.arturfidalgo.com.br], no Rio de Janeiro, e suas séries "Moiré", "Galáctica" e "Bestiário" podem ser vistas simultaneamente em São Paulo e em Paris, na Maison Européene de la Photographie [www-.mep fr.org]. Tudo acompanhado do lançamento do livro Áspera Imagem, que compila 15 anos de sua produção em preto-e-branco Paulistano radicado no Rio desde criança, Vicente é sujeito de muitos amigos parece ter aquela capacidade inata de atrair pessoas ao redor de suas idéias. Especialmente para celebrar a exposição, vieram do Rio o colecionador Gilberto Chateaubriand, o curador Alberto Saraiva e o produtor cultural Mauro Saraiva. Também estavam presentes os curadores Katia Canton, Ivo Mesquita e Rejane Cintrão, o artista Renato Dib e o colecionador Guilherme Leite Ribeiro, que puderam partilhar da comida feita por Iraklis, misto de cientista e cozinheiro, que, ao final do almoço, distribuiu seu cartão de visita: "Iraklis, o Grego. Coma como Rei e paga como plebeu [sic]. Cozinha típica grega. Uma idéia inteligente e de bom gosto".

A foto na parede do ateliê integra a série "Vermelhos Telúricos", exposta no Centro Cultural Banco do Brasil, no Rio, em 2001. As imagens, pastiches postais do Grande Canal de Veneza, na Itália, das geleiras de San Raphael, no Chile, do Centre Pompidou, na França, ou da praia em Florianópolis, foram feitas em preto-e-branco com uma Rolleiflex, impressas em magenta e emolduradas de maneira semelhante a um slide. "Telúrico é tudo o que transforma o que está estagnado. Diz respeito às transformações da Terra, como erosões, enchentes, vendavais que mudam »

Geleira de San Raphael - Chile . Da série "Vermelhos Telúricos

"Grand Canal - Veneza - Itália . Da série "Vermelhos Telúricos

"Catedral - Brasília - Brasil". Da série "Vermelhos Telúricos

o estado natural das coisas", explica o artista, como que querendo explicar a si próprio.

Isso porque quem observava Vicente na Pinacoteca distribuindo autógrafos em exemplares de seu livro para o pessoal de fora do Rio, ele costuma colocar junto às palavras a imagem do Cristo Redentor, feita com carimbo de almofadinha de tinta azul não poderia imaginar que aquela figura falante e agitada é, na verdade, um sujeito absurdamente introspectivo. Mas bastava caminhar com atenção entre suas imagens para sacar que sua fotografia resulta de experiências muito solitárias. A parca presença do elemento humano pode ser a primeira pista, embora os vestígios de situações íntimas estejam ali, levados ao limite da compreensão visual, quase abstratos. É um diário íntimo? "É um diário, mas velado, como disse [o crítico] Alexandre Melo. Porque o que aconteceu, de fato, ninguém O íntimo não está nas fotos."

Eu, a Rollei e os filmes no bolso À câmera é seu bloco de anotações. Mas, diferentemente do fotógrafo que se volta para a realidade de maneira objetiva e sai à caça de imagens que justifiquem uma idéia preliminar, Vicente fotografa situações de maneira aleatória e constante, criando um banco de reminiscências. "Saio eu, minha Rollei e vários filmes no bolso para dar um rolê. Aí, as imagens vão aparecendo." Só depois, sobre a mesa do estúdio, na edição, as imagens vão revelando diferentes vocações. »

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"Atlântico". Da série "O Cinematógrafo
A sombra aberta dos lírios". Da série "O Cinematógrafo"

Como um antifotógrafo, ele subverte o estabelecido como fotografável . O lance não está no tato, mas na sobra, no pequeno, no ínfimo, no resquício. Fotografar passa a ser uma experiência residual e transformadora "Eu não tenho essa fissura do fotógrafo que quer clicar tudo, a c riançada correndo na praça, o passarinho na árvore. Não que eu negue isso, mas não me interessam as imagens cansadas Eu quero o que está por baixo do aparente.

Se fotografias podem ser afáveis e reconfortantes, em Vicen te elas são incômodas, ou, como observou Alberto Saraiva no texto que deu título ao livro do fotógrafo, são "áspera imagem um exercício de "re-velar-trans-formar" Eu, os coroas e a Kátia Garelli "Na verdade, sempre fui muito solitário." As palavras confirmam as imagens. Filho temporão de uma família de quatro irmãos, aos sete anos ele foi morar na praia de Itacoatiara, em Niterói, depois que o pai se aposentou e os irmãos maiores saíram de casa. "Eramos eu, Os coroas, os cachorros e a motocicleta chamada Kátia Garelli." Como não era de surfe, ia à praia e ficava olhando tudo à sua volta. Depois, voltava para casa com a motinha. "Essa solidão não me traumatizou, mas criou uma situação muito particular. Eu imprimo isso nas imagens que faço." Aos 10, ele pegava o ônibus sozinho parair escola, em percursos que duravam uma hora. "Era um filme que eu assistia pela janela na ida, e outro na volta , já dando as pistas de um hábito que também se tornaria extremamente presente em seu trabalho: a imagem cinematográfica. "AsPara menino sistia a todos os filmes da Sessão da Tarde na década de 80, "era a coisa mais sensacional do mundo Tinha umas coisas inacreditáveis, Fred Astaire, umas fábulas maravilhosas não era que nem hoje"

A televisão pequenininha com bombril na antena era uma janela libertária, e as imagens dos filmes se tornariam o filtro pelo qual passariam todas as cenas que ele

Tecido roxo de estante marcha". Da série "O Cinematógrafo"

receberia do mundo e que, mais tarde, influenciariam o processo de construção das imagens que ele devolveria para o mundo

Subtraída a ponte é finita a vista Vila Leopoldina, São Paulo erma, feriado prolongado. No dia seguinte a exposição, Vicente fala do seu trabalho inédito "O Cinematógrafo", experiência radicalizada desse seu cinema de fotografias

"Sabe aquelas imagens estáticas que aparecem no meio do filme como se fossem vírgulas entre uma ação e outra? Todo filme tem isso. É um gap entre o que aconteceu e o que vai acontecer. Isso sempre me intrigou."

A série "O Cinematógrafo" que faz sua primeira exibição nestas páginas reúne sua produção em cor captada desde 2001 e agora editada em trípticos, numa referência ao cinema Polyvision do diretor francês Abel Gance, aplicado no clássico Napoléon, de 1925. Gance filmava a mesma cena com três câmeras, e as imagens eram projetadas em três telas separadas e simultancamente. Muito criticado à época, só mais tarde o mundo entendeu seu legado, e sua obra transformou-se em marco do cinema. "Assisti ao filme quando tinha 15 anos. Para mim, Abel Gance continua extremamente contemporâneo."

Assim como no cinema, os títulos das obras são de vital importância para Vicente de Mello. Em "O Cinematógrafo", as imagens ganham palavras que se interpõem, numa espécie de haicai, ao criarem múltiplas conexões entre si, como em "subtraída a ponte é finita a vista

Ações captadas em tempos diversos tornam-se simultâneas, e a tensão da imagem única reordena-se em pequenas narrativas oníricas, intensamente cerebrais Vicente de Mello cristaliza cinema em fotografia. E

Dacorso

Foto: Dani

Abaixo, o autor Vicente Mello: fotografar passa a ser uma experiência residual e transformadora

snapshots

Vitaminados

Três brasileiros são selecionados pela editora inglesa Phaidon para compor obra de referência sobre produção fotográfica contemporanea mundial

Trabalhos dos brasileiros Mauro Restiffe, Rochelle Costi e Rosângela Rennó estão no livro Vitamin Ph New Perspectives in Photography, um extrato da produção fotográfica contemporânea lançado pela editora inglesa Phaidon, que reúne 500 imagens de 121 artistas avalizados por 79 curadores críticos. De Rosângela, foram publicadas imagens da série "Vermelha", o projeto de projeção sobre fumaça "Experiência de Cinema e um díptico da série "Corpo da Alma", feito com foto de João Castilho, mostrando o pai e a mãe do mineiro Jean, morto pela polícia londrina. A artista foi indicada pelo crítico Rodrigo Alonso. Rochelle, recomendada pela curadora Katerina Gregos, teve publicadas fotos das séries "Quarto São Paulo" (1998), "Pratos Típicos" (1997) e "Arquitetura Informal" (2003). E de Mauro Restiffe, indicado por Adriano Pedrosa, foram incluídas as fotos

Carpete e Pirâmide , do seu trabalho sobre a arquitetura de Istambul, e uma da série Empossamento , tirada na posse do presidente Lula, em janeiro de 2002.

Confusão... na Anvisa?! Vitamin Ph ganhou as páginas de O Globo, em janeiro último, quando o exemplar enviado pela Phaidon a Rosângela! Rennó foi parar na Anvisa Agência Nacional de Vigilância Sanitária = por um equívoco da Receita Federal, que achou tratar-se de um produto farmacêutico. "É muito mico, né? Até o pessoal da Phaidon se divertiu muito com o imbróglio! Soube que deram garga hadas", comenta Rosângela. O livro é o terceiro de uma série da editora sobre novas perspectivas nas artes visuais. Já foram lançados volumes sobre pintura e desenho. Vitamin Ph pode ser encomendado no site da Phaidon [www.phaidon.com].

1- Uma das casas cegas captadas por Rochelle Costi para a série Arquitetura Informal

2 - Um estranho recorte da arquitetura de Istambul na foto Pirâmide , de Mauro Restiffe

3 - Foto da série Vermelha , de Rosângela Rennó

4 - Capa do livro Vitamin Ph

ROGÉRIO GHOMES

O paranaense Rogério Ghomes iniciou a carreira defotógrafo na década de 80 e atualmente é representado pelas galerias Virgílio, em São Paulo, e Ybakatu, em Curitiba. Suas obras estão nos acervos do Museu de Arte Moderna de São Paulo e do Museu de Arte Contemporânea do Paraná, e na coleção Joaquim Paiva. Graduado em Desenho Industrial, com mestrado em Design e especialização em Fotografia, hoje divide seu tempo entre trabalhos pessoais, aulas de Fotografia e Sintaxe Visual na Universidade Metropolitana, de Londrina, e a direção do estúdio Espaço Paralelo, em Curitiba. Rogério escolheu o livro ET Eu Tu para comentar:

Dentre as relações mais relevantes do repertório imagético, deparamo-nos com o duelo, ou comunhão, entre imagem-palavraimagem. Dessa ambigúidade percebemos e/ou construímos um grande repertório num mundo coletivo (e particular) carregado de significantes e significados. Essa relação é tão simples e direta como o uso da relação mesa-cadeira em diversas funções do cotidiano. O livro ET Eu Tu, projeto dos artistas Arnaldo Antunes e Márcia Xavier, propõe uma forma híbrida que constrói e possibilita uma visão particular para o leitor, ao mergulhar nas lâminas desse possível glossário do imaginário contemporâneo. O projeto foi desenvolvido entre 2000 e 2003, e tem como ponto de partida as imagens de Márcia, enviadas ao Arnaldo via correio eletrônico. O processo de elaboração para a construção verbal respeitava esse sentido de mão dupla. O texto retornava leitura visual de Márcia Xavier rebatendo ecos aos signos verbais, para então, juntos, os artistas fecharem a relação de cada imagem com otexto proposto. Importante considerar essa ação para a construção de uma linguagem híbrida. Essas articulações entre as linguagens verbal e visual foram consolidadas nas soluções do artista plástico Carlito Carvalhosa, num excelente projeto gráfico de sedução sensória premiado como 1º lugar do Prêmio Jabuti de 2004, na categoria projeto/produção editorial. Como diz Arnaldo, o livro ET Eu Tunão é nem poema, nem imagem, mas diálogos parceiros de dois códigos.

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Elegantíssimos cartões ornados!

Livro traça panorama da fotografia paulistana no século 19 a partir de anúncios publicados em jornais

"Dá de presente aos seus clientes 6 photographias. Novo formato Elena, em elegantissimos cartões ornados, só 4$500 e por poucos dias." O anúncio publicado no jornal A Platéa em 22 de outubro de 1900 anunciava a novidade oferecida pelo fotógrafo Vincenzo Pastore, italiano radicado em São Paulo que se tornou conhecido na cidade por seus retratos "mimosos . Essa e outras preciosidades foram garimpadas pelos historiadores Ricardo Mendes e Paulo Cezar Alves Goulart para o livro Noticiário Geral da Photographia Paulistana 1889-1900 (co-edição Centro Cultural São Paulo e Imprensa Oficial do Estado de São Paulo, 340 págs. R$ 75). A obra traça um panorama da fotografia no século 19 sob um ângulo inusitado: o dos fotógrafos e comerciantes de fotos que anunciavam seus negócios em jornais e revistas paulistanos. "O livro mostra como esses profissionais pensavam a fotografia, como elaboravam esses objetos e como introduziam novos usos e novas estratégias de marketing para alavancar seus negócios", diz Ricardo Mendes.

Entre as preciosidades garimpadas pela dupla de pesquisadores, está o mimoso retrato colorizado do casal Adelina Leopardi e José De Mauro, de 1900, feito por Vincenzo Pastore

Arnaldo Antunes Marcia Xavier

Amado ou odiado?

Livro resgata a obra do polêmico fotógrafo francês Jean Manzon, que revolucionou a linguagem fotojornalística no Brasil nas décadas de 40 e 50

ária sempre estiveram sob a mira do fotógrafo a O Cruzeiro de que a Imagem seria capaz de 1948, instituiria rev

a no jornalismo brasileiro, e estabelecer dignidader tas ou encenação dos fatos -, foi trato Vivo da Grande Aventura (Aprazível R$ 150). "Si os e ideólogos ligados ao governo que circulavam na as fotos deram concretude visual a diversos como o valor do trabalho acompanhado de uma crítica à malandragem, industrialização e a exploração tureza

Helouise Costa, vice-diretora do MAC de São Paulo do fotógrafo

Helouise evoca também a formação de Manzon como um dos elementos principais de sua obra. "Ele se formou fotojornalista em Paris antes da 2º Guerra, quando atuou em revistas como a Vu e a Match. Essa experiência moldou o

seu olhar a partir de dois pressupostos: as in fotográficas européias e um tipo de fotojornalismo desenv Match que apostava na foto encenada, chamativa, de forte apelo para o público em geral", Para a curadora independente Nadja Peregrino, "a narrativa visual argumenta era muito importante para ele. Antes de Manzon, as rev por aqui tinham na elemento ilustrativo. Ele conseguiu levar O Cruzeiroa números de imagem um ssimos", diz vendagem im, até o final dos anos 90 o trabalho de Jean Manzon ficou relegado o em relação cenadas. "Acho queele tinha consciência do que fazia", diz Helouise. "Quando o entrevistei, ele enfatizou a ques ica como algo muito importante em sua obra. Acredito que haja fotógrafos que escolhem esse caminho, como, por exemplo, o Walter Firmo", completa Nadja. Independentemente do status de amado ou odiado, para a curadora ainda é pc naCertos padrõe: no fotojornalismo atual. visuais, como fotos em perspectiva muito usadas por ele, ainda permanecem , finaliza.

O livro traz textos de Ana Cecília Martins, Franci os Teixeira, Leonel Kaz o da Aprazível atar o fotojornalismo e Nigge Loddi, e é a segunda publica brasileiro. Em 2005, a editora publicou a obra de José Medeiros.

[Flávia Lelis]

Jean Manzon
Acima, Cândido Portinari, primeiro personagem das reportagens de Manzon, em O Cruzeiro. Ao lado, "brotinhos" fazem um contraponto entre o moderno o antiquado. Na página seguinte, o heroísmo dos operários na Usina da Light no Rio, da década de 40

ja Guimarães

Em 2004, a fotografia do polêmico curta-metragem Felicidade, que trazia dois atores nus filosofando sobre o que éser feliz, deu a Claudia Guimarães o primeiro lugar no 11º Vitória Cine Vídeo. Em 2000, ela venceu o 4º Festival de Cinema de Curitiba, na categoria Vídeo de Ficção, com Cinira e a Mochila, filme que dirigiu e roteirizou. Graduada pela Escola de Música e Belas Artes do Paraná, com especialização em Cinema pela Escola Internacional de Cinema de Cuba, Claudia transita entre as artes visuais e O cinema, dividindo-se entre a pintura e a fotografia. Ela escolheu o filme Un Long Dimanche de Fiançailles (Eterno Amor), do francês Jean-Pierre Jeunet, com fotografia de Bruno Delbonnel, para comentar:

o 5 ê

Emerson Schmidlin.

FILM JEAN- PIERRE JEUNET uy LONG DIMANCHE DE FIANCAILLES

BANDE ORIGINALE COMPOSÉE PAR ANGELO BADALAMENTI

O filme como um mosaico espaço onde se articulam elementos impregnados de expressão: linhas, luz é cores constroem texturas nos cenários e paisagens, capazes de provocar sensações poéticas. Eterno Amor é um relato, verdadeira comunicação de sentimentos de amor e honra. O clima dramático proposto pelo roteiro transpõe-se em imagens, enquadramentos, alternativas de planos e movimentos de câmera que resultam em concisão da linguagem narrativa. Duas tonalidades: cores frias retratam as trincheiras de guerra, enquanto as quentes, o universo pacífico. A cor-chave é sempre o marrom, que amarra o todo com inúmeras gotas de outras cores, resultando em um "impressionismo cinemático Cabe a seguinte questão: qual a relação entre um pintor e um diretor de fotografia?! Segundo o cineasta Eduardo Geada, o primeiro observa, ao pintar, uma distância natural entre a realidade dadae ele próprio; o segundo penetra, em profundidade, a própria trama dada. As imagens que um e outro obtêm diferem extraordinariamente. A do pintor é global, a do cineasta fragmenta-se em grande número de partes, cada uma delas obedecendo às suas leis próprias. Para o homem de hoje, a imagem do real fornecida pelo cinemaéinfinitamente mais significativa, porque atinge esse aspecto das coisas que escapa a qualquer aparelhagem, e essa é a exigência legítima de qualquer obra de arte. Ela só o consegue precisamente por usar aparelhos para penetrar, do modo mais intensivo possível, no próprio coração desse real. A verdadeira imagem fundamenta-se sempre numa ligação orgânica entre idéia e forma.

Bastidores da Tijuca

A convite da agência Sambaphoto [www.samba photo.com], os fotógrafos Pablo di Giulio, André Arruda, Christian Gaul, Rafael Jacinto e João Kehl participaram do Projeto Tijuca, uma cobertura do pré-Carnaval 2007 na escola carioca Unidos da Tijuca [www.unidosdatijuca.com.br]. À iniciativa de reunir esses autores para que produzissem um saio livre em torno do tema foi motivada pelo samba-enredo da escola, que neste ano defendeu na Sapucaí a importância e o papel da fotografia na história mundial. O desfile contou com imagens da faminta Etiópia, de Sebastião Salgado, e dos carvoeiros de Marcos Prado, entre outros. O resultado do Projeto Tijuca poderá ser visto no mês de abril, em uma exposição no MIS, em São Paulo, queterá direção de arte de Rodolfo Rezende e curadoria dos conselheiros do museu. A mostra tem o apoio da Kodak. [FL]

Nas fotos, os passos do integrante da Velha Guarda da Tijuca

André Arruda

Intercâmbio

André Vieira ganha bolsa de 12 mil para desenvolver trabalho na Alemanha

O fotógrafo carioca André Vieira [wwwandrevieiracom] conquistou uma vaga no Changing Faces Exchange Programme, um intercâmbio entre fotógrafos profissiona atrocinado pela Comunidade Européia e coordenado pelo International Photography Res Network [wwwtheiprn.org], no Reino Unido. Em abril, André pa sen, na Alemanha, onde desenvolverá um ensaio sobre o tema! arcn te para a cidade de Estrabalho", Ele pretende se centrar nas transformações sofridas pelas indústrias centenárias alemãs, buscando, por meio do retrato, mostrar a nova cara desse setor, ameaçado pelo crescimento da produção industrial chinesa e indiana. "Quero fazer algo na mesma linha do ensaio que apresentei para o comitê de seleção, uma série de retratos realizada na Amazônia, numa região em que grileiros e fazendeiros conflitam coma floresta", explica André, que terá 12 mil disponíveis para executar o trabalho.

O fotógrafo foi escolhido por curadores do Museu Folkwang, na Alemanha, após ser indicado por um comitê brasileiro formado por João Luiz Vieira e Paulo Duque Estrada, da Universidade Federal Fluminense, Patrícia Gouvêa, do Ateliê da Imagem, Maria Arlete Gonçalves, do Oi Futuro, e pelas curadoras independentes Nadja Peregrino e Ângela Magalhães

A mesma equipe do Museu Folkwang selecionou o fotógrafo eslovaco Andrej Balco [mwwandrejbalco.com), fundador do coletivo Slovak Documentary Photography, que vem para o Brasil com a intenção de documentar o trabalho doméstico nas principais metrópoles do país. Ao final da residência, que dura dois meses, as fotografias de todos os bolsistas integrarão um livro e uma exposição que deverá circular por todos os países participantes do programa, como Holanda, África do Sul, Eslováquia, Rússia, Finlândia, Espanha, Inglaterra, Alemanhae o próprio Brasil. [Flávia Lelis]

e ed es E Acima, uma da: Edo

André Vieira

MARCELO COELHO

O brasileiro Marcelo Coelho, 43, conquistou uma colocação na última edição do 200 Best Ad Photographers Worldwide, seleção da renomada editora austríaca Lúrzer's Archive distribuída a 20 mil artbuyers e designers de 35 países. Uma das características de seu trabalho é levar para o ambiente publicitário uma fotografia mais humanizada, com iluminação natural e sem retoques. A seguir, ele conta os bastidores de um de seus principais trabalhos.

Cliente The Braille Institute

Agência de Design McNulty & Associates

Câmera Canon EOS 5D

Lentes Canon 28-7Omm

Iluminação Natural

Locação Residências na Califórnia, EUA

Exposição 2.8; 1/250s

Diretor de Criação Eugene Bustillos

Redator Richard Huvard

Diretor de Arte Rene Neri

Conceito Não se trata de uma campanha, mas de um relatório anual cujo conceito era "Enxergando através... A idéia era mostrar atividades que trazem os deficientes visuais para um novo universo de possibilidades, por meio da sensibilidade extradesenvolvida pelos outros sentidos. Porém, durante as sessões de fotografia, uma situação incrível levou o pessoal da criação a mudar o conceito para "Eu posso.. .

Dificuldade O layout sugerido pela agência mostrava a foto de uma criança num parque com uma expressão de felicidade absoluta, o rosto

virado para o alto e ninguém ao redor. Expliquei para o diretor de criação que seria praticamente impossível conseguir aquele nível de emoção e espontaneidade de uma criança de cinco anos que se tornara praticamente cega num período de três anos. Mesmo assim, o cliente optou por produzir a foto num parque, com duas assistentes sociais que iriam "brincar" com a criança. Aceitei o desafio, mas, após quatro horas de tentativas frustradas, eles finalmente me perguntaram o que eu sugeria. Decidi retirar toda a equipe de produção do local, deixar a câmera temporariamente de lado e trazer o irmão mais velho do menino, para que eles, no seu próprio ritmo, interagissem com o ambiente.

Elaboração Percebi que Florentino, o menino cego, tentava reproduzir quase tudo o que seu irmão mais velho fazia. Sugeri que seu irmão fosse ao balanço. Florentino nunca tinha experimentado o balanço, por causa de sua deficiência visual, mas, ao ouvir as gargalhadas do irmão, pediu que este o empurrasse cada vez mais para cima. Ao ficar de frente parao alto, ele berrou de repente com todas as forças: "Eu posso ver o céu!" Fiquei em estado de transe por um segundo, quando então vi sua mãe e outras pessoas com a mão na boca, numa expressão de espanto. Peguei a câmera correndo e bati a foto quando ele ainda dava gargalhadas. Esta é foto da capa [do relatório], e no ano seguinte o Braille Institute me procurou para fazer um trabalho todo focado nesse conceito.

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COMO ESCOLHO

UM FOTOGRAFO

CARLOS

RODRIGUES

Jornal Zero Hora

Ele iniciou a carreira no fotojornalismo no final dos anos 60, na Cia. Jornalística Caldas Júnior, editora dos jornais Folha da Manhã e Folha da Tarde, que deram origem ao atual Correio do Povo. Entre 1988 e 1993, atuou na sucursal do jornal O Estado de S. Paulo e na Agência Estado de Porto Alegre. Na carreira, Rodrigues acumula participação no VII Salão Internacional de Fotografia Esportiva, em Barcelona, e menção honrosa do Prêmio Nikon, em 1980. Aos 62 anos, é subeditor do departamento fotográfico do jornal Zero Hora, onde está desde 1995.

O que você busca em um portfólio?

Numa apresentação de portfólio, o fotógrafo deve colocar um material que demonstre suas características, seu estilo pessoal, sua criatividade. Algo que possa me surpreender, acrescentado de uma boa técnica. Você prefere que tipo de formato de apresentação do trabalho?

Aprecio duas formas de exibição: na tradicional pasta, com uma seleção dos trabalhos, ou através de CDs, o que é mais fácil e agiliza a minha leitura, além de dar uma ampla visão da qualidade do

trabalho apresentado.

O que não deve ser colocado em um portfólio?

O fotógrafo deve escolher aquilo que ele considere ter melhor qualidade, sem exageros e sem fotografias muito semelhantes. E, antes de me mostrar seu portfólio, é necessário realizar uma boa!

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Como os fotógrafos podem entrar em contato com você?

Por meio do telefone (51) 3218-4759 ou por e-mail: carlos.rodrigues(Ozerohora.com.br.

Nova categoria

Maior prêmio em dinheiro destinado à fotografia no país prestigia documentarismo com R$ 100 mil

Criado há quatro anos, o Prêmio Conrado Wessel [www.fcw.com.br] surge em 2007 com uma nova proposta. A partir desta edição, fotojornalistas e documentaristas poderão concorrer na categoria "Ensaio Fotográfico", que destinará R$ 80 mil e R$ 20 mil líquidos ao primeiro e segundo colocados. O Prêmio de Fotografia Publicitária será mantido; porém, agora, não há mais o terceiro lugar. A nova categoria surge depois do imbróglio envolvendo as mudanças no regulamento do Prêmio de Fotografia Publicitária, em virtude da manifestação de um artista gráfico que requereu co-autoria da foto vencedora da edição 2004 (confira histórico no box). Segundo o curador Rubens Fernandes Junior, propositor da nova categoria e integrante da comissão organizadora do prêmio, a intenção é ampliar a premiação em busca da diversidade. "Como o Wessel atuou como fotógrafo publicitário, num primeiro momento optamos pela premiação da fotografia publicitária. Hoje entendemos que podemos ampliar a qualidade e a quantidade dos fotógrafos participantes, abrindo o prêmio para dois campos: a publicidade e o ensaio", diz. Questionado sobre as constantes críticas com relação à manutenção de um prêmio para fotografias cada vez mais regidas por recursos tecnológicos e por montagens onde pouco se vê a participação do fotógrafo, o curador alega que a manipulação faz parte da fotografia, e que não é contrário à sua utilização. "A fotografia continuamente é questionada quanto à sua veracidade. A história da fotografia publicitária sempre esteve associada à imagem compartilhada por fotógrafo, ilustrador e retocador. Nós não temos nenhum problema com imagens caracterizadas pela montagem ou pela intervenção. Segundo José Moscogliatto Caricatti diretor financeiro da Fundação Conrado Wessel e coordenador do prêmio, o plano é que, a cada qjiinquênio, a fundação realize uma reunião para observar como estão as premiações. "Mais para a frente, quem sabe não mude mais alguma coisa? , diz. [Flávia Lelis]

Cronologia do Prêmio

Agosto de 2002 -Écriado o maior prêmio em dinheiro para a fotografia no país (R$ 140 mil divididos entre os três vencedores). O prêmio leva o nome do cientista Conrado Wessel, que, na década de 20, fundou uma fábrica de papel fotográfico em São Paulo e também atuou como fotógrafo publicitário. Por testamento, criou a Fundação Conrado Wessel, com a finalidade de incentivar a arte, a ciência e a cultura. Klaus Mitteldorf vence a primeira edição.

Maio de 2005 - Imagem "Irado", do fotógrafo Ricardo Cunha, é anunciada vencedora da edição 2004. Fotosite publica, com exclusividade, artigo com declaração do manipulador digital Leonardo Candian, que se considera co-autor da imagem. A reportagem abre uma discussão sobre autoria.

Novembro de 2005 - Organização do Prêmio FCW muda o regulamento. A partir de então, o fotógrafo deve responder por, no mínimo, dois terços da criação da imagem, devidamente comprováveis. A Abrafoto Associação Brasileira de Fotografia Publicitária - contesta a decisão. A organização do prêmio responde que tem autonomia para decidir sobre o próprio regulamento, e que o júri está capacitado para selecionar, entre os fotógrafos inscritos, quem correspondeu melhor, criativamente, à proposta do prêmio.

Dezembro de 2006 - Prêmio Conrado Wessel cria a categoria "Ensaio Fotográfico", com o tema "O Meio Ambiente Brasileiro". A categoria "Fotografia Publicitária" é mantida, mas em ambos os casos não há terceiro lugar. O resultado será anunciado no dia 15 de março. Os 50 melhores trabalhos de "Fotografia Publicitária" e os cinco primeiros em "Ensaio Fotográfico" integrarão livro comemorativo do prêmio e uma exposição, ainda sem data definida.

Spencer Platt, o grande vencedor do World Press Photo 2006

NÃO SOU DAQUI,

MARINHEIRO |

perfil

fa Na Turquia, ele é holandês. Na Holanda, turco. Dividido entre dois mundos stantes e buscando. * desvencilhar-s: possível estigma q inusitada mistura "turcoholandês possa carimbar de modo permanente em seu trabalho, o jovem fotojornalista Ahmet Polat aportou em São Paulo, em busca de outras histórias que possam lhe ajudar a compreender a sua própria.

"Sou uma combinação de histórias diferentes, filho do meu tempo" contra

HH u ando em São Paulo como uma galinha sem ER Essa expressão holandesa para quem está perdido foram as primeiras palavras que ouvi de Ahmet Polat: "Eu não entendo nada nesta cidade Haviam decorrido duas semanas da chegada do fotógrafo na capital paulista, em outubro do ano passado, e as frustrações de um gringo perdido sobressaltaram "Por que uma simples ligação de celular custa uma fortuna aqui?!

O "fotógrafo turco-holandês", como ele havia se apresentado no primeiro e-mail que me enviou, despertou minha curiosidade. Ele chegou a mim, correspondente holandesa em São Paulo desde 2000, por meio do cônsul holandês. Na verdade, Ahmet dominava o mapa de São Paulo e já havia rodado bastante pela cidade, de ônibus, de táxi e a pé, construindo uma teia de contatos. De perdido, mesmo, não tinha nada Decidimos começar uma parceria. Realizamos uma matéria sobre a luta dos índios tupiniquins e guaranis contra a fabricante de celulose Aracruz, no Espírito

O mundo fashion é uma das tônicas do trabalho de Ahmet Polat. Acima e abaixo, bastidores do desfile da Casa de Criadores, em outubro de 2006, no Hotel Renaissance de São Paulo

Santo. Em seguida, fizemos reportagens sobre o culto à beleza no Brasil, entrando em salões de cabeleireiros nas favelas do Campo Limpo e no bairro dos Jardins, em São Paulo. Subimos o Morro da Mangueira, no Rio de Janeiro, e agora desceremos as águas do rio Amazonas. Interesses que o animam e fascinam, e que temos em comum.

No nosso primeiro encontro, mostrou-me o seu livro Gurbetçi. Kayapinar, sobre um vilarejo de imigrantes na Turquia, com retratos de turcos na cidade de Dordrecht, na Holanda, e no local de origem deles, Kayapinar. Retratos em preto-e-branco, estranhos, captados em momentos silenciosos. À história da migração, sem obviedade, mas presente

Presente como na vida do próprio Ahmet. Cresceu na Holanda, numa cidade do interior, definido pelos colegas como turco mesmo sem falar turco e criado somente pela mãe holandesa. O pai, turco, era ausente Mas o nome bastava para estigmatizá-lo como turco, o que tem uma conotação negativa na Holanda. "No dicionário holandês, você acha a expressão 'turco sujo!. Sujo por causa do trabalho pesado que nenhum holandês queria fazer, e que era deixado para os imigrantes", diz Ahmet

Começou a buscar suas raízes em viagens para a Turquia a partir de 1998, e aprofundou-se no tema da identidade na Academia de Arte St. Joost, em Breda, em 2000. Em 2005, mudou-se em definitivo para Istambul, e foi encarado pela primeira vez na vida como um holandês. Ganhou a Câmera de Prata, um prêmio holandês, por sua fotografia documentária, e, no ano passado, o Young Photographer Award do ICP International Center of Photography, em Nova York, por suas fotografias de imigrantes nas periferias de cidades como Haia e Istambul, e pelos retratos de moradores de rua de Tilburg, Holanda. Suas reportagens depois do terremoto de 1999 na Turquia, acontecimento em que se envolveu de forma pessoal e comprometida, chamaram a atenção. Também na Holanda. Recentemente, foi escolhido pelo consulado holandês em Istambul para acompanhar a rainha Beatriz, em viagem oficial à Turquia. "Como uma ponte entre dois países", orgulha-se e ri. O fotógrafo, de 29 anos, gosta da sensação de ser valorizado, apesar de ainda ser muito mais reconhecido na Turquia que na Holanda. Mas o perigo de ficar preso ao estigma do "turco-holandês" é real. Por isso veio a São Paulo, para tentar trabalhar fora desse contexto. Buscar novos desafios. E mostrar que é um bom fotógrafo. Admirador da fotografia clássica de Henri CartierBresson, Ahmet gosta de citar as palavras do mestre francês que abriram sua mente: "Não é sobre fotografia, é sobre a vida". Outra referência para ele é Sebastião Salgado. Ainda na academia, ganhou um livrinho do brasileiro. Já o contactou, e agora aguarda ansioso pelo primeiro encontro com Salgado. "Polat tem um instinto natural para captar a simetria visual, e trata seus temas ao mesmo tempo com dignidade e um toque de humor", sentenciou o júri do ICP. >

Acima: vista de favela no Campo Limpo, onde Ahmet morou durante dez dias para acompanhar estudantes de moda do projeto Officio Moda. Abaixo: Lucíola de Jesus, 106 anos, moradora da favela da Mangueira, no Rio de Janeiro, acompanhada do bisneto. Matéria para o jornal holandês Throw sobre os preparativos da comunidade para o Carnaval

Enquanto isso, o fotógrafo percorre a cidade de São Paulo atrás de trabalho, sem medo de nada. De uma foto para uma revista de ioga à Rolling Stone e à Vogue revistas para as quais trabalha na Turquia e na Holanda , a mesma dedicação. Ficou dez dias morando numa favela do bairro do Campo Limpo, acompanhando a turma de um projeto social que concorria a bolsas de estudo na área da moda. Seguiu os alunos até a São Paulo Fashion Week, querendo juntar dois mundos nas suas imagens: o fashion e o popular. Aliás, esses contrapontos sociais tornaramse a tônica de seu trabalho depois que conheceu Shelley, sua namorada, maquiadora de famosos como Naomi Campbell. Ela, linda negra anglo-canadense, apresentou o mundo da riqueza e do poder que Polat nunca quis encarar. "Sempre achei mais fácil ficar perto dos pobres, não somente porque me sinto mais à vontade, mas, no fundo, no fundo, também para não ser confrontado com o 'fracasso! de não ter todo esse dinheiro. Mas superei isso: agora sei curtir também uma roupa bonita", diz o fotógrafo, que já documentou a high society de Istambul.

Em São Paulo, o jeito de Ahmet chamou a atenção de Beto, cabeleireiro dos clientes endinheirados do salão Ash Hair Estetic, no Jardim Europa. Para brindar a presença espontânea do fotógrafo no pequeno palácio, Beto abriu todas as garrafas de champagne do salão. Adorou esse rapaz franco que sabe seduzir as pessoas para que acompanhem suas idéias e imagens. No cais de Santarém, Ahmet fotografou um par de amantes num barco, debaixo de um guarda-chuva, após conquistar a confiança do casal: "Vi a cena, me aproximei, foi tudo natural". Um momento atraente, bonito. "A foto é bidimensional, apenas formas; mas o significado que ela pode ter, essas outras camadas que podem ser construídas, são uma espécie de teatro da vida real. Nunca quero deixar de me deixar surpreender, descobrir novos significados."

Ahmet voltará em breve para Istambul, depois de quatro meses no Brasil. Valeu? "Foi diferente do que imaginava. Foi difícil. Quis muito entrar nesta cultura, trabalhar com o mercado local. Tive várias respostas positivas ao meu trabalho, mas o meu entusiasmo nem sempre foi correspondido com a mesma vontade de começar uma parceria, trocar experiências. Talvez por causa da língua, não sei. Mas também é verdade que, na Turquia, trabalhei sete ou oito anos para conseguir meu espaço. Sou muito perfeccionista. Tenho dificuldade para relaxar, preciso de amigos que de vez em quando falem: 'Está indo bem, Ahmet, pode respirar . Não sou um hindu em cima de uma montanha. Sou uma combinação de histórias de lugares diferentes, filho do meu tempo.

Esse filho tem uma boa perspectiva na volta para a Turquia: abre dia 28 de maio uma exposição solo no Istambul Modern, o museu de arte moderna de Istambul. Será a primeira individual de um fotógrafo no local, e deve enfocar, por meio de imagens feitas em diferentes lugares, a relação de Ahmet com seu pai 7

Acima: estudantes de moda de projeto desenvolvido em favela no Campo Limpo, na expectativa do resultado de concurso que oferecia bolsas de estudo do Instituto Europeu de Design. Abaixo: jovens índios tupiniquins brincam com celular na aldeia Pau-Brasil, no Espírito Santo

fotojornalismo

reportagem

ÚLTIPLO DE

Pela primeira vez em suas páginas, FS publica uma reportagem pautada, fotografada e escrita por um fotógrafo

brasileiro Luiz Maximiano, 28, conquistou o CanonPrijs 2006, prêmio destinado a jovens fotojornalistas que vivem e trabalham na Holanda. Com reportagens críticas e sensíveis feitas em São Paulo, no Leste Euror em Zimbábue ou Cabul, Maximiano vem trabalhando para conquistar seu espaço num mercado cada vez mais acirrado e em mutação. Crises na indústria da mídia, redações sempre mais enxutas, espaços ainda menores para publicação de trabalhos de fôlego. Em tempos de discussão sobre os novos paradigmas da profissão que exaltou os ânimos dos repórteres fotográficos brasileiros no início de fevereiro por conta de uma exposição promovida pela Arfoc em São Paulo e que, inclusive, será tema um dos encontros da Semana Epson/Fnac Fotosite da Fotografia, em abril , a REVISTA FS publica uma das reportagens de Maximiano sobre as novas fronteiras da Europa, que mostra a existência de uma intensa produção jovem procurando um lugar ao sol. "Quando mostro meu portfólio para revistas brasileiras ouço sempre 'que bonito!" E só. Raramente alguém nota a reportagem ou sua falta." Para apontar as diferenças entre o Brasil e a Europa nesse quesito, o fotógrafo cita um exemplo da Dinamarca, onde o jornal Politiken e a escola de fotojornalismo da cidade de Arhus desenvolvem um projeto juntos e estão criando uma nova geração de excelentes fotojornalistas documentaristas. "Agora, é essa comparação descabida? Num primeiro momento, sim. Afinal, o orçamento de lá deve ser muito maior do que o de um jornal no Brasil. Mas o que fica como lição são diferentes elementos da indústria trabalhando juntos para formar uma nova geração, ou simplesmente amadurecer a geração atual. Disso eu sinto falta no Brasil. Senão, ocorre de alguns malucos como eu, tentar atravessar um oceano a nado."

Por dentro das fronteiras À idéia inicial de Maximiano era fazer uma reportagem sobre a comunidade Roma em Sliven, capital cigana da Bulgária. Mas o contato inicial não foi muito amigável. "Está cada vez mais difícil fotografar, pois as pessoas estão desconfiadas e paranóicas. Os Roma em Sliven achavam que eu ia ficar milionário com as fotos tiradas ali, e me perturbavam muito", diz o fotógrafo, que para conquistara confiança dos moradores, passou a ir sem a câmera, com um tradutor local, só para conversar. "As ezes aparecia gente nas sacadas gritando 'no photo, no photo!, 'money, money...". O fotógrafo teve mais sorte na Romênia. "Passei alguns dias indo à vila de Boiu e a outras vilinhas adjacentes, e sempre abriam a porta para mim. Também com um tradutor, eu explicava o que queria fazer, e eles concordavam." Depois das primeiras visitas Maximiano já ia sem o tradutor, mas, em alguns casos chegava a ficar duas horas sentado na sala, tomando chá sem trocar uma palavra. "É constrangedor, mas precisav cansá-los até que eles se esquecessem de mim e eu conseguisse o resultado que queria.

As imagens feitas em Bucareste e Sófia foram mais um exercício de paciência e observação. "Para a foto da me nina olhando para o lado na calçada, a avenida vazia atrás dela, eu esperei uns 10 minutos até que tudo se encaixasse enquanto tentava permanecer ali sem ser notado. Não tive interação com ninguém. Fiz a foto e desapareci. Confira agora, o resultado da matéria. [Érica Rodrigues]

Entrada de metrô no centro de Sófia, Bulgária

VA 1

fotos e texto Luiz Maximiano

A pequena vila de Boiu, na Transilvânia, fica a apenas 15 minutos de carro de Sighisoara, famoso destino turístico que atrai todos os anos milhares de visitantes, encantados com sua arquitetura medieval e ansiosos para conhecer o lugar de nascimento do Conde Drácula. Já Boiu não atrai ninguém. Pelo contrário, espanta. Qualquer taxista aqui se recusa a completar a viagem, e, alegando falta de segurança, deixa o passageiro na primeira rua que marca a entrada da vila, como se ela fosse uma cidade fantasma, maldita. Mas Boiu é apenas um lugar pobre, na zona rural, e predominantemente habitada por ciganos, ou melhor, pelos Roma. difícil descobrir se a

razão de tanto receio realmente se justifica, ou se é apenas mais um preconceito contra os Roma. No final das contas, não importa. E apenas outro episódio sobre os enormes desafios sociais que assombram a Romênia nos seus primeiros dias como novo país europeu Não que já não fosse afinal, desde o tempo do Império Romano, a Romênia ocupa uma posição importante no Velho Mundo. Mas a herança deixada pela era comunista, no século passado, cunhou como infame o termo "Leste Europeu", que passou a designar essa outra metade do continente como uma "meia-Europa", uma versão pirata da original, o irmão bastardo com sua pobreza, atraso

tecnológico, longo registro de abusos contra os direitos humanos e outras incivilidades em geral, que fariam qualquer um perder o apetite em Bruxelas. Agora, a Romênia e sua vizinha, a Bulgária, fazem parte do clube dos ricos. Da rica Europa. Pela primeira vez, dois países com expressivo número dos Roma, a minoria mais negligenciada da Europa, fazem parte da União Européia. Os dois países mais pobres, com enormes abismos entre as classes sociais, já aceitos pelo bloco. Um desafio ainda maior que a assimilação da Polônia, em maio de 2004. Os romenos e búlgaros sabem disso. Sabem da forma como eram tratados do outro lado do muro invisível que ainda separa essas duas Europas. São céticos, e, apesar de comemorações aqui e ali, e dos anúncios publicitários na TV prometendo uma nova era, não crêem que suas vidas vão mudar. Nesses dois países, onde a fé e a religião cristã-ortodoxa são essenciais para a formação da identidade nacional, ninguém acredita em milagres. Andar pelas ruas de Bucareste, capital da Romênia, é experimentar esse momento histórico que os dois países estão passando, um misto de emoções

Do otimismo velado e da esperança de quem sinceramente crê que essa é a hora, ao pessimismo exacerbado daqueles que julgam já ter vivido e visto de tudoe já não se surpreendem com nada. Algo como o Brasil em 89. Mesmo garoto na época, lembro-me dos que realmente acreditavam "Agora o Brasil vai!" nos primeiros dias após a eleição de Collor; ou na Paulista em 2002, quando Lula ganhou pela primeira vez e foi recebido por milhares de pessoas que o tratavam como o Messias

Nicolae Ceausescu [chefe de Estado romeno de 1967 a 1989] ecutado há dezessete anos, no dia de Natal de 1989, mas foi e seu fantasma ainda ronda a cidade. Nos buracos de bala de fuzil, ainda nas paredes de edifícios da região central, próximos à Praça da Universidade, onde, na noite de 22 de dezembro de 1989 centenas de pessoas a maioria estudantes que pediam a cabeça do ex-ditador foram reprimidos à Kalashnikov. Cruzes, flores placas de bronze e pichações marcam a cidade, na tentativa de imprimir para sempre no coração da próxima geração o alto preço pago naquele dezembro sangrento. Dezessete anos depois e >

Garoto Roma em sua casa. Boiu, Romênia
Clara, 23, em sua casa. Sighisoara, Romênia

a Romênia daqueles estudantes ainda é uma incert Como na ria, a corrupção e a criminalidade são endêmicas, estão por toda a parte. O Estado, pesado e lento, ainda funciona, em boa medida, como funcionava nos tempos da burocracia comunista, e a maioria dessa nova geração de cidadãos europeus acredita que serão uma espécie de cidadãos de segunda classe, sem os mesmos priv ilégios dos outros E não deixa de ser verdade. Mesmo oficialmente chamados de cidadãos da União Européia, o acordo de livre-circulação pelo mercado de trabalho do bloco ainda não vigora completamente. Os paísesmembros mais ricos ainda podem restringir o acesso de romenos e ros a suas cidades, tentando coibir uma migração em massa daqueles países. Mas, mesmo assim, muita gente decide partir. Em Sófia, capital da Bulgária, migrantes fazem fila na estação rodoviária para tentar a sorte em outro país; se possível na outra Europa. Todos os anos, milhares deixam a terra natal, e os que ficam evitam

ter filhos, por causa da difícil situação econômica. Com uma taxa de crescimento demográfico cada vez mais em declínio, a Bulgária rapidamente, nas para continuar a existir. É a empreitada de envelhece e põe seu futuro em risco. Dos sete milhões de habitantes um bloco que deve convencer o resto do mundo de que tem fôlego atuais se mantido esse ritmo de crescimento negativo, o país terá e músculos para assumir um papel cada mais importante no cinco milhões em 2050, segundo uma projeção da Population Refe- | cenário político internacional rence Bureau, uma ONG norte-americana. No país, há 144 vilas com população de O habitantes e outras 337 vilas com, no máximo, 10 habitantes. É o desafio de um país que precisa crescer e enriquecer

Centro de Sófia, Bulgária
Funeral em igreja ortodoxa de Sófia, Bulgária

REUNIU ENI

A US é a agência de notícias do Grupo Folha. Comercializa fotos, textos, colunas e ilustrações a partir do conteúdo editorial do jornal Folha de S.Paulo. O site contém um Banco de Imagens on-line com um acervo de mais de 250 mil imagens digitalizadas. Imagens que foram notícia e também que retratam a realidade brasileira. Para contratar o serviço da Folhapress ligue 011 3224-3123 ou acesse www.folhapress.com.br

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A boa imagem da notícia

rosa de luca

CARMELA GROSS

A Carmela quis a foto na rua, porque tem tudo a ver como trabalho dela, que faz interferências no próprio corpo da cidade. No princípio fiquei meio apreensiva; afinal, as chances de imprevistos aumentariam. Pegamos o trem da Marginal Pinheiros e paramos nesta estação. À [produtora] Tata Marchetti distraía o funcionário do trem que vinha nos abordar [é necessário ter autorização para fazer fotos nas estações], enquanto, muito rapidamente, saquei a câmera e fiz esta foto dela"

RETRATODO ARTISTA QUANDO

Livro Contemporânea Arte Artistas faz um pequeno inventário das artes visuais no país por meio da fotografia intuitiva de Rosa de Luca

POR ÉRICA RODRIGUES FOTOS ROSA DE LUCA

ntuição. Essa é a palavra que talvez melhor traduza o espírito do livro Contemporânea Arte Artistas (Editora Alles Trade, 270 págs., R$ 90).

Tudo começou há dois anos, quando a fotógrafa Rosa de Luca teve o insight de fazer um livro só com imagens de artistas contemporâneos. Primeiro, retratou os amigos Iran do Espírito Santo, Claudia Marchetti, Edgard de Souza e Caetano de Almeida. Depois, os próprios artistas fotografados foram indicando os personagens seguintes, e assim, numa corrente de bons contatos, felizes coincidências e gratas surpresas, surgiu a obra, lançada no dia 28 de fevereiro na Galeria Millan Antonio, em São Paulo. Rosa confessa que não se ateve a grandes pesquisas biográficas dos artistas. Ela partia da boa conversa "Sou italiana, então já viu, falo muito" para conquistar a confiança dos retratados. O resultado são fotos intuitivas, que apreendem, de maneira espontânea, a essência estética e a atmosfera de cada um dos 60 artistas que constam do livro.

"O retrato é resultado de uma boa conversa. E o bom resultado depende de técnica e espontaneidade", explica a fotógrafa, que estudou no Liceo Artistico di Salerno, na Itália. E, já que para ela o papo é fundamental, durante as sessões Rosa levou a produtora Tata Marchetti, que ajudava a manter o arco da conversa quando ela tinha de se concentrar em algum detalhe técnico. Algumas vezes, a fotógrafa carregava consigo também o sobrinho Gianluca, que acabou entrando para o livro com o neto da artista Amélia »

ARTHUR OMAR

As provas dos retratos que havia feito do Arthur Omar segurando suas próprias fotos estavam no chão do meu escritório. Olhei para aquilo, as fotos sobrepostas num bloquinho, e resolvi fazer esta construção, preservando a casualidade"

Toledo. O acaso do encontro conspirou a favor de uma imagem que sintetiza a atmosfera lúdica do trabalho de Amélia e suas bolas-bolhas de plástico cheias de espuma, em que o espectador literalmente integra a obra. Outro acaso saboroso é a presença instintiva dos gatos, que aparecem nas fotos de Lenora de Barros, Leda Catunda, Regina Silveira, Sandra Tucci. "Uma série de coincidências contribuiu decisivamente para o resultado do trabalho", analisa a fotógrafa. Num livro em que a espontaneidade é a tônica, todas as fotos foram feitas com luz natural. A câmera convencional também dava um gostinho de imprevisto: "Voltava para casa sem saber se o resultado tinha ficado como imaginávamos . Cada imagem revelada a impulsionava a levar adiante o projeto. "Você tem que batalhar pelo retrato, claro. Mas o fator sorte também conta muito. Como disse certa vez Jorge Amado, você pode ter uma ótima idéia e executar um bom trabalho. Mas, se não tiver sorte, nada acontece."

Patrocínio Mas, se as fotos saíram tão espontaneamente, o mesmo não se pode dizer do patrocínio. Mesmo com o projeto aprovado pelas leis federais de incentivo fiscal, Rosa teve que batalhar duro pelas verbas para publicação da obra. "Tentei primeiro as empresas que possuíam alguma ligação direta com as artes, mas não obtive retorno , diz ela. Contemporânea Arte Artistas é o primeiro livro da editora Alles Trade, que conseguiu viabilizar a publicação com patrocínio da BioLab, indústria farmacêutica. O livro é também o primeiro de uma série sobre arte brasileira que Rosa pretende desenvolver ao longo dos próximos anos. "Penso em retratar personalidades do design e da arquitetura, mas também 'garimpar' bons artistas que muitas vezes permanecem ocultos por falta de oportunidade", adianta Rosa, que aprendeu a manusear o programa de paginação QuarkXPress e cuidou sozinha da arte do livro. "Quando fotografava, já tinha em mente como queria que ficasse na página. Entreguei o livro pronto para a editora." a

CILDO MEIRELES

"Eu já havia feito algum

eai ão ido. Ele me convidou para as fotos do Cildo, mas achava que a imagem ainda não tinha acontecido. Ele o para Ro aa conhecer o andar de cima do ateliê. Estávamos subindo a escada, quando virei de repente e bati. Gosto muito desta 3! SEs d

ALBANO AFONSO

"O Albano ainda não havia pintado na minha lista. Fui fazer a foto da Sandra Cinto, que divide ateliê com ele. Como ele estava lá, pedi pra fazer seu retrato também. Ele trabalha com essa questão da luz, são obras diáfanas que tentam captar o imponderável. E esta foto é um reflexo dele mesmo, literalmente"

MIGUEL RIO BRANCO

Ep esitei muito imei - em fazer o primeiro contato com Miguel, porque todos falavam que ele tinha o gênio difícil, que seria impossível.im Mas, para minha grata surpresa, o encontro foi incrível. Esta imagem é resultado de duas que fiz em segiência. Numa, ele está m ais sério; na outra, sorri. Essa dualidade tem muito a ver com ele e com sua obra, traduz bem o clima do seu ateliê. Gostei muito do resultado"

REGINA SILVEIRA

"Detalhe curioso: boa parte dos artistas tem gato! E, com os bichanos circulando livremente pelos lugares, acabaram aparecendo nas cenas. Nesta imagem, a gatinha da Regina Silveira surgiu de repente enquanto eu fotografava um de seus trabalhos, que tem umas patinhas impressas"

coluna

rubens fernandes junior

FESTFOTO, UM EVENTO QUE ILUMINOU PORTO ALEGRE

Es auspiciosa a realização de mais um evento de fotografia no país. Neste 2007, a cidade de Porto Alegre saiu na frente, e logo na segunda semana de janeiro reuniu, para refletir sobre a fotografia, um time estrelado por fotógrafos, pesquisadores, curadores e críticos. Idealizado por Carlos Carvalho, fotógrafo carioca que vive há mais de cinco anos no Sul, o evento contou com a participação de vários colaboradores e algumas empresas, cujo envolvimento, ainda que pequeno neste momento, foi fundamental para a concretização da primeira edição.

Para evitar repetir as fórmulas já consagradas e até desgastadas de outros festivais de fotografia, o Festfoto Festival de Fotografia de Porto Alegre optou por um formato enxuto e diferenciado, bem mais dinâmico, atrativo e menos custoso. Foram dezenas de encontros com fotógrafos nacionais e internacionais, workshops, algumas mesas-redondas, conferências, projeções de vídeos e audiovisuais.

Nos Encontros com o Autor, destacamos Martine Frank, fotógrafa da agência Magnum e presidente da Fundação Henri Cartier-Bresson, cuja projeção, somada aos trabalhos dos fotógrafos gaúchos Luiz Carlos Felizardo, Leopoldo Plentz, Luiz Eduardo Achutti e Fernanda Chemale, ofereceu um amplo panorama das possibilidades de expressão fotográfica. As diferentes experiências visuais projetadas e as ricas discussões com o público, que participou ativamente das diversas sessões programadas, evidenciaram não só a carência de trocas mais efetivas de informação como também a necessidade da realização de acontecimentos dessa natureza.

Outro sucesso de público foi a sessão multimídia, em vários horários, da Agência Magnum, denominada Magnum in Motion, que retoma as edições fotográficas audiovisuais dos anos 70 cada imagem vinha acrescida de pequenos comentários dos próprios fotógrafos. Esse novo formato (veja www.magnum

photos.com), encontrado para viabilizar comercialmente alguns dos trabalhos e divulgar a produção da lendária agência, apropria-se dos recursos digitais e da multimídia para propagar uma produção documental destinada não mais necessariamente à mídia impressa.

As projeções livres e de fotógrafos selecionados e convidados pela organização do Festfoto, realizadas na Usina do Gasômetro, no Santander Cultural e no Studio Clio, em horários diversos, também reuniram o melhor da fotografia contemporânea brasileira. Outro destaque foi o Seminário Coleções públicas: um olhar autoral no tempo , que trouxe, além da Biblioteca Nacional do Rio de Janeiro, as diversas instituições públicas do Estado do Rio Grande do Sul, para discutir qualitativamente as diferentes políticas de manutenção e preservação dos seus acervos.

O evento abre uma nova perspectiva de discutir, divulgar e valorizar a fotografia brasileira, em seus diferentes níveis de produção, circulação e preservação da

imagem. Sem as dificuldades e os altos custos de montagem das exposições, o Festfoto optou por compartilhar informações através do suporte eletrônico, hoje facilitado por distintas soluções midiáticas. Além disso, a iniciativa ajuda a fortalecer os laços locais e regionais, tornando pública a qualidade da produção visual de fotógrafos brasileiros e estrangeiros. Uma inovadora e ótima oportunidade para refletir sobre os novos caminhos da fotografia E

FE

IRINA

Veja imagens do evento em www.fotosite.com.br/fs16

RUBENS

thales trigo

os últimos vinte anos, o PIB brasileiro cresceu a uma ridícula média de 2,5% ao ano. No mundo como um todo, essa taxa evoluiu em torno de 4% nos últimos quatro anos, enquanto a China assombra a todos com crescimento anual próximo dos 10%. Naturalmentea China não é uma boa comparação pelo menos no que diz respeito à grande maioria de sua população, que vive e trabalha em condições muito difíceis, para se dizer o mínimo.

Mas o que me interessa analisar é o que vem acontecendo como fotógrafo brasileiro nesse panorama. Sob essa análise, a falta de crescimento econômico implica a redução do mercado de trabalho e, em conseqiência, uma séria crise de mercado e a redução no preço dos trabalhos fotográficos. Presume-se que existam no Brasil aproximadamente 1.500 estúdios fotográficos e 100 mil fotógrafos, dos quais 30 mil vivem exclusivamente da fotografia. Entenda-se aqui fotografia no sentido mais amplo, em todas as suas modalidades.

E por que o crescimento do mercado é fundamental? Em duas palavras: investimentos ilimitados.

Em 1996, quando a fotografia digital aportou no mercado brasileiro, inicialmente de forma muito tímida e incipiente, as câmeras profissionais tinham resolução de 4 MP e custavam pequenas fortunas. Foram, em grande medida, desprezadas. Muitos fotógrafos achavam que "esse tipo de coisa" era para um futuro distante. É claro que a avaliação foi errada, hoje, o mercado é praticamente 100 % digital.

Muitas são as questões que chegaram com o mundo digital mas, essencialmente, o aprendizado desse novo sistema é muito mais complexo, e há a necessidade de investimentos frequentes.

O CRESCIMENTO, ATECNOLOGIA E O FOTÓGRAFO

Durante décadas, fotógrafos faziam investimentos em equipamentos "para toda a vida". Uma boa câmera e uma boa objetiva eram usadas ao longo de toda a trajetória profissional e ainda mais, os filhos ou a viúva herdavam um "bem".

Apesar de recente, a chegada dos sistemas digitais alterou esse panorama. A evolução tecnológica e a corrida por maiores resoluções têm obrigado fotógrafo, muitas vezes com dificuldades, a investimentos constantes. É praticamente impossível encontrar um fotógrafo profissional que não tenha feito pelo menos uma troca de equipamento nos últimos anos. "Para onde vamos?" é a pergunta mais frequente. Quando se analisam outros segmentos de mercado que foram dominados pela tecnologia, uma resposta emerge. À telefonia celular, computadores pessoais e palmtops são os exemplos mais próximos. Praticamente não existem limites para o desenvolvimento tecnológico; as câmeras digitais devem continuar sua evolução, mesmo que o número de pixels do sensor não cresça no mesmo ritmo das mudanças observadas nos últimos anos. Modelos mais rápidos, melhores objetivas, visores maiores, conectividade com computadores e telefones celulares já são parte do presente.

Além disso, o fotógrafo tem ainda um outro desafio a tecnologia é sempre facilitadora, isto é, pode ser usada por uma pessoa com pouca experiência. Isso significa que o mercado brasileiro tem recebido nos últimos anos milhares de novos fotógrafos, e o nome é esse mesmo: fotógrafos.

Quem usa uma câmera é fotógrafo!

Bancos de imagens internacionais ou brasileiros, CDs com fotografias livres de direitos autorais e o cliente-fotógrafo tornam o problema ainda maior.

Mercado sem crescimento, necessidade crescente de investimentos e concorrência abundante esse é o cenário.

O que fazer depende de cada um. Na minha opinião, apenas o conhecimento pode preservar a profissão.

A fotografia não é mais um processo isolado; é, cada vez mais, parte de um conjunto em que o resultado final depende de diversas outras áreas do conhecimento. Da computação, da ilustração digital, do marketing, da percepção do mercado e esperamos também da sensibilidade e do olhar do fotógrafo. E

THALES TRIGO é fotógrafo profissional e diretor da Fullframe, escola de fotografia

EU QUERIA SER FOT: ÓGRAFO ga INDEPENDENTE

unca é tarde para uma resolução de Ano Novo. Eu já parei de fumar, jogo pouco e me casei. Minhas opções, portanto, já não podem ser as mais comuns. Também não precisa ser algo como fazer um livro, porque isso seria a resolução da década. Na verdade, eu queria ser fotógrafo independente. Aliás, essa resolução eu havia pinçado há algum tempo e, embora fosse possível, tinha um alto custo. Em um sentido amplo, aliás, eu não sei o que quer dizer ser fotógrafo independente. Mas vou supor que seja estar organizado juridicamente, optando pelos sistemas de tributação "Simples" ou "Super Simples", o que for menos complicado. Ter uma empresa com um nome legal e identidade visual, uma marca. Ter um site, um cartão e agendar visitas para ampliar a carteira de clientes. Parece que, até aqui, nada me faria diferir da maior parte dos meus colegas. O trabalho viria inicialmente em conta-gotas, porque bons contratos aparecem com o tempo. Mas muitos fotógrafos parecem gostar mesmo do envolvimento com redações, que oferecem trabalhos picados, até o dia em que se questiona valor de uma diária, de um transporte etc. Então, começa a aumentar o intervalo entre uma gota e outra.

Mas todo fotógrafo tem um fundo de garantia que pode ajudar e render: o arquivo. À coisa complica um pouco porque isso precisa ser gerenciado. O fotógrafo americano Evan Nisselson também resolveu essa questão criando um banco de dados na internet. Em 2003 fundou a Digital Rail Road [http:/Avww. digitalrailroad.net], que é algo como um template de banco de imagens.

Por uma tarifa mensal ou anual, o profissional pode armazenar, gerenciar e comercializar seus arquivos digitais

através desse site, que já no upload cria automaticamente até cinco tamanhos diferentes de arquivo, aceitando imagens em alta resolução (por padrão do software, 3.000 x 1.800 pixels, mas pode ser maior). Você tem o resumo das vendas e solicitações de seus clientes e pode transferir automaticamente por FTP além de outras facilidades. Um dos assinantes do serviço de Nisselson, para ficar no mais conhecido, é a prestigiada Agência VII.

Atenção para novas mídias. Não se pode pensar em jornalismo sem ter um olho pelo menos na internet, mesmo que não se saiba como isso vai ser feito. Na edição em que publicou a previsão de Philip Meyer para a morte dojornalismo impresso nos Estados Unidos (2.043), a revista The Economist citou a mais bemsucedida experiência jornalística na web, que são os audio slide shows.

Trata-se de uma narrativa para reportagens com fotos em sequência e som. Nos Estados Unidos, essa prática é bastante difundida, e alguns exemplos podem ser vistos no Interactive Narratives [www interactivenarratives org]. Melhor ainda se você quiser ter a experiência de produzir um. O fotógrafo Joe Weiss, procurando uma solução para problemas com a edição de audio slides shows, criou o Sound Slide [www.soundslides.com], que tem uma versão demo à disposição. Há outros, como o iView e o iMovie, mas aí você mesmo testa.

Vamos desconsiderar o que haja de pessoal nessa resolução de Ano Novo e observar a remodelagem que acontece no nosso mercado de trabalho há algum tempo, para o bem e para o mal. Por exemplo: a terceirização nos grandes jornais e o surgimento de novas revistas. É possível que o tempo de um ano não seja uma referência apropriada, mas com paciência e a colaboração do acaso, quem sabe, pode ser o início de um caminho que vai ser construído, um projeto de longo, longo prazo. Talvez seja quase como ter um filho. E

Tudo me parece acessível. No aspecto metódico, sim. Mas a condição de independente não é a troca de contra-cheque pelo talonário de notas. Tem o emocional, a composição de situações que parecem nos oferecer somente conforto, mas que significam também segurança, apoio e, por que não? afeto. Isso sim é um alto custo. Sem falar no imponderável, para ser dramático: qualquer problema, ligue para você mesmo.

scavone

raquém apertou a minha mão e disse: Faz tempo, Ass dois namoramos rapidamente no MASP em volta de um texto seu sobre o Zen e a Fotografia, mas não nos encontramos mais . Muito comuns os encontros e os desencontros dos fotógrafos. Na verdade, eles acontecem por conta do diálogo silencioso entre suas imagens. O encontro planejado cede ao fortuito. Um livro, uma página de revista, uma frase ou uma fotografia na parede saciam a sede da companhia de nossos pares, e os dias se sucedem, os meses, os anos, e cada um de nós continua ocupado atrás de suas onças na escuridão das matas que nós mesmos escolhemos. Mas não desta vez. Na sua visita ao meu estúdio eu iria ouvir outras histórias. Seu primeiro encontro com o Belo na Arte, uma epifania que aconteceu numa madrugada remota em Santos depois de assistir a uma sessão maldita de cinema, quando as imagens fulminantes de Kaneto Shindô em A

ARAQUÉM ALCÂNTARA MARCIO SCAVONE

Ilha Nua encontraram seu caminho para dentro do mais recôndito ser do jovem Araquém, o filho de marinheiro, prometido poeta, mas ainda amarrado à pedra do cais. Começou assim, me disse ele, sua aventura fotográfica. A pose da puta no ponto de ônibus, o calçamento molhado e disforme da zona portuária, o céu cinzento do Atlântico e os cargueiros exibindo no casco nomes de terras distantes que alimentavam sua insônia em bares que se chamavam Scandinavian ou The Fugitive. Depois, câmera em punho, a subida da Mata Atlântica, metáfora da busca interior, do espírito que anima todas as coisas. Lembreime das palavras do mestre zen-budista D. T. Suzuki que pareciam explicar a atitude do fotógrafo de natureza, e que, no caso do meu amigo aqui na minha frente, devem estar impressas no inconsciente como imagem latente em filme: A idéia é observar as cóisas como elas são e deixar a realidade fluir.

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