Introdução (Tom Lisboa)
Foi quando li “As Cidades Invisíveis”, de Italo Calvino, que pela primeira vez ouvi falar em Maurília, a cidade onde o viajante é convidado a visitá-la “ao mesmo tempo em que observa uns velhos cartões-postais ilustrados que mostram como esta havia sido”. Na visão do autor, Maurília é uma metrópole, talvez como Londres, São Paulo ou Paris, onde viadutos tomaram o lugar dos coretos e o provincianismo cedeu espaço ao encanto da prosperidade. Por possuírem postais, essas cidades têm em comum a possibilidade de serem sonhadas, porque, assim como no livro, cada remetente se transforma em um inventivo narrador como o viajante Marco Polo, e cada destinatário, um curioso e atento ouvinte como o imperador Kublai Khan1. “Novas Maurílias” é uma experiência em que eu me propus a confeccionar os primeiros cartões-postais para cidades (quase) invisíveis. Com população entre 1.400 e 2.500 habitantes e fundados entre as décadas de 1960 e 1990, Iguatu, Esperança Nova, Nova Aliança do Ivaí, Guaporema, Mirador, Santa Inês, São Manoel do Paraná, Miraselva, Jardim Olinda e Santo Antônio do Paraíso são considerados os dez menores municípios do Paraná. O cartão-postal, neste caso, foi utilizado tanto para que cada uma dessas localidades possa, no futuro, se recordar “com saudades daquilo que foi” quanto para povoar o imaginário de outros centros urbanos com histórias ilustradas provenientes desses cantos remotos de nosso país. A pandemia do covid-19 adiou constantemente as viagens, mas elas terminaram acontecendo entre agosto e novembro de 2020, quando o número de casos começou a se alternar entre “estável” e “em decréscimo” na região. Com escolas fechadas e muitos indivíduos isolados em suas residências, as cidades pareciam desertas. A presença humana, no entanto, era sentida nos jardins bem cuidados, no soar do sino da igreja e nas ruas sempre limpas. Minhas visitas normalmente começavam na residência de um dos pioneiros, pessoas que desbravaram aquelas terras vermelhas e viram o asfalto chegar junto com algumas moradas de alvenaria. O bate-papo quase sempre continuava na casa de outra pessoa que “conhecia melhor aquela história”. Assim, colhendo fragmentos dispersos em vários endereços, fui acessando um pouco da memória coletiva de cada lugar. 1 No livro “Cidades Invisíveis”, Marco Polo é contratado pelo Imperador Kublai Khan para visitar as terras mais longínquas de seu reino e, ao retornar, descrever o que viu. 8