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Aline Guarato

Portfolio

Aline está se formando em Artes Plásticas na USP e apresenta aqui na OLD seu trabalho fotográfico feito somente com seu celular, pelas ruas de São Paulo. É um trabalho delicado, diário e com um resultado final impressionante. Como você chegou a este processo fotográfico, envolvendo celular e póstratamento?

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a fotografia, me interessava pela pintura –apesar de ter me inscrito no bacharelado em Multimídia e intermídia, cumpri toda a grade curricular dos estudantes de pintura. Fiz as primeiras disciplinas de fotografia e não me interessei; tinha uma câmera boa e tal, mas nenhum tesão; e só voltei a fazer as outras disciplinas de foto três anos depois

As fotografias com o celular apareceram meio por acaso; quando entrei nas artesplásticas não pensava que trabalharia com

- por causa do celular. Junto com a pintura, fazia uns vídeos, e usava o celular por ser, além do que tinha a mão, um instrumento leve, prático, que não chamava atenção na rua – meu lugar preferido de trabalho – e por causa da baixa resolução que

‘destruía’ o vídeo, distorções, cores erradas, eu adorava isso. E como o usava muito e estava sempre no bolso, o celular acabou se tornando ao mesmo tempo, minha câmera e meu ‘caderno de anotação’, quando me dei conta de que não desenhava mais as coisas e sim as fotografava, senti necessidade de organizá-las e a edição e o tratamento dessas imagens que começavam a se acumular no meu computador acabaram me mostrando que alguns registros iam além de anotações pessoais e passavam a configurar um outro modo de pensar as coisas à minha volta.

Você está sempre fotografando com o celular?

Atualmente ando me dedicando a experimentar a fotografia analógica, a mesma que não havia me causado nenhuma grande emoção quando entrei na universidade.

Ironias à parte, ainda carrego o celular, mas já tem uns meses que não faço nada com ele a não ser anotações. Usei o celular durante dois anos seguidos – 2009 e 2010 –, e por enquanto quero aprender outras coisas, acho importante procurar entender o que você trabalha, qual o caminho que as ferramentas e materiais tiveram que trilhar até o presente, acho que dá uma certa liberdade o conhecimento técnico. Infelizmente o meu celular é muito limitado em certos aspectos, não tem zoom, por exemplo e eu ando fascinada por teleobjetivas, por isso anda meio encostado; se bem que tem uma coisa que o fotografar com o celular me ensinou foi que a ‘limitação’ está mais ligada com o que você faz do seu instrumento (ofício, material, enfim) e não dele propriamente dito.

Algumas de suas fotografias chegam a parecer pinturas pelo processo que você utiliza. Você gosta desta dúvida de suporte dentro da sua produção?

Não só gosto desta dúvida, como a procuro. Geralmente eu ‘pioro’ o defeito que o arquivo me trouxe, separo cada um deles e os trato de maneira diferente. Sinto necessidade de trabalhá-los assim, caso contrário, estaria ignorando a linguagem fotográfica: sem prestar atenção ao que me apresenta a imagem gerada pelas minhas câmeras, estaria apenas fazendo registros, ou imagens pouco comunicáveis.

Suas imagens são um registro do seus caminhos pela cidade. O cotidiano, para você, é o mais importante dentro da fotografia?

Dentro da minha fotografia, posso dizer que sim, pois a experiência do cotidiano me permite falar de tempo, de repetição e de mistério. As fotografias são sempre dos mesmos lugares, não saio de casa especificamente para fotografar – e não fotografo apenas na rua –, mas sempre saio/estou com uma câmera; a fotografia faz parte do meu cotidiano, é muito próxima da minha vida, do tempo que gasto pra chegar aos lugares, dos ônibus que pego, da ida ao supermercado. Costumo encontrar pessoas que fotografei - e elas não fazem idéia. Acho incrível como às três horas da tarde tem alguém na calçada fumando o terceiro cigarro com uma expressão quase inexistente ou alguém que olha da janela do ônibus como se esperasse alguma coisa, alguma salvação. As fotos são ao mesmo tempo registros da cidade e de mim. E não raro, acabo usando as fotos não só pra questionar sobre a cidade em que vivo, mas também sobre o que sou. Construo uma cidade com meus próprios fragmentos, algumas fotografias poderiam ser chamadas de auto-retrato, e às vezes é São Paulo, outras vezes, só uma cidade sem nome.

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