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Reflexões

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Amigos”?

Amigos”?

João Carlos Teixeira . Escola Secundária da Sé, Lamego

Li, há tempos, no livro “As histórias que me ensinaram a viver” de Jorge Bucay, a história de um elefante que, desde o seu nascimento, viveu num circo, acorrentado a uma estaca presa no chão. Se de início se esforçava para se libertar, em pouco tempo se resignou à sorte de ficar preso, resultado das tentativas frustradas. Após ler esta história, questionei-me sobre a forma como o elefante, podendo ser livre, assumiu que seria incapaz de se libertar das correntes que o prendem e aceitou viver para o resto da sua vida preso ao frágil poste, quando comparado com a sua força. A verdade é que é impossível ouvir uma história como esta – aparentemente sobre elefantes – e não nos questionarmos: então e nós? Não estaremos também presos às nossas convenções diárias, às nossas rotinas limitadas, por acharmos que não temos capacidade para uma vida melhor que a nossa? Não estaremos velhos demais, demasiado conformados com o mundo que nos rodeia e, por isso, não questionamos aquilo que deve ser questionado, tal como a criança que foi ao circo teve a capacidade de fazer? E nós, homens, seres racionais, inteligentes, pensadores… Somos assim tão incomparáveis com o elefante, ou será que temos bem mais em comum com ele do que aquilo que somos capazes de reparar? A verdade é que também nós não temos a plena noção que somos os guias da nossa vida, e que a nossa vontade tem mais força do que aquilo que jamais imaginámos ser capazes de fazer. Quando somos crianças curiosas para com o mundo onde vivemos, e dizemos constantemente “porquê?”, “porquê?”, “porquê?”, e fundamentalmente sonhamos e nos imaginamos em futuros que ninguém acredita que possamos vir a ter, estamos ao fim ao cabo a tentar libertar-nos das correntes que nos prendem ao poste daquilo que pensamos ser o “destino pré-definido”. E depois? Crescemos, tornamo-nos fortes o suficiente para nos desamarrarmos, e já não o desejamos fazer. Não será irónico? Todos os grandes sonhos que nos guiavam em criança e que nos davam a capacidade para seguirmos o nosso próprio caminho (e não me refiro ao caminho que achamos que devemos seguir, mas sim ao caminho que realmente queremos seguir) desaparecem. E é realmente triste passar uma vida a receber aplausos e ovações por aquilo de bom que fazemos, como o elefante nas suas atuações de circo, aplausos esses que nos dão a ideia que estamos no lugar certo, e que aparentemente nos fazem esquecer dos outros possíveis caminhos que poderíamos seguir, porque estamos “muito bem assim”. Os sonhos são adiados, o caminho que poderíamos seguir com toda a nossa garra e paixão é adiado, e adiado, até que é tarde demais para voltar a colocá-lo na nossa lista de objectivos. E ficamos, por isso, conformados, felizes mas tristes, acompanhados mas sós. A nossa incapacidade de fugir à rotina prende-nos ao lo-

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cal do costume. A incapacidade de negar aquilo que os outros guardam para nós, a incapacidade de correr em direcção aos abismos sem medo de cair, a incapacidade de pegar numa linda rosa sem medo de nos picarmos nos espinhos, a incapacidade de auto-afirmação. Todos estes pequenos gestos limitam as nossas escolhas, bloqueiam as possibilidades que poderiam derivar da nossa vida. A sociedade, estripadora de sonhos, cria-nos à sua imagem e semelhança, e portanto crescemos incapazes de a questionar, achando nós que todos os que não têm medo de fugir às suas rotinas são loucos. E agora eu digo: serão eles os loucos, que apesar de por vezes não o conseguirem, procuram a felicidade a todo o custo? Ou seremos nós os loucos, que optamos pelo caminho mais fácil, onde não é necessário ter o trabalho de imaginar uma vida “livre” nem o trabalho para nos “desamarrarmos das correntes” que nos prendem? Quem é mais louco, pergunto eu: o “louco” que sabe que esta é a única vida que tem e por isso não tem medo de pisar o risco, ou o “normal” que tem medo de escrever fora da linha, que vive preso à opressão, que vive calado com medo de errar? Após toda esta reflexão, resta-me dizer: se queres viver, vive! Mas não adies a vida para amanhã, porque esse dia pode não chegar. Se queres seguir o teu caminho, segue-o, mas não o abandones por ser o caminho mais difícil de percorrer. Não tenhas medo de negar aquilo que os outros esperam de ti, de usar os teus próprios passos para alcançares as metas que desejares. Só assim poderás viver sem arrependimentos, sabendo que és feliz e que não vives frustrado por nunca teres tentado. Tenta! Vive! Não negues a felicidade!

“Não sei para onde vou Sei que não vou por aí” José Régio

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