CORPO-MULHER-CIDADE: Uma perspectiva feminina sobre o caminhar da mulher

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CORPO-MULHER-CIDADE: UMA PERSPECTIVA FEMININA SOBRE O CAMINHAR DA MULHER NO BAIRRO FAROLÂNDIA, ARACAJU/SE


UNIVERSIDADE TIRADENTES ARQUITETURA E URBANISMO

BEATRIZ DE SOUSA OLIVEIRA

CORPO-MULHER-CIDADE: Uma perspectiva feminina sobre o caminhar da mulher no bairro Farolândia, Aracaju/SE

ARACAJU 2022


BEATRIZ DE SOUSA OLIVEIRA

CORPO-MULHER-CIDADE: Uma perspectiva feminina sobre o caminhar da mulher no bairro Farolândia, Aracaju/SE

Trabalho Final de Graduação apresentado a Universidade Tiradentes como um dos prérequisitos para a obtenção do grau de bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

Orientador (a): Profª. Ma. Rosany Albuquerque Matos

ARACAJU 2022


BEATRIZ DE SOUSA OLIVEIRA

CORPO-MULHER-CIDADE: Uma perspectiva feminina sobre o caminhar da mulher no bairro Farolândia, Aracaju/SE

Trabalho Final de Graduação apresentado a Universidade Tiradentes como um dos prérequisitos para a obtenção do grau de bacharel em Arquitetura e Urbanismo.

APROVADA EM:

/

/ 2022 BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________ Profª. Ma. Rosany Albuquerque Matos ___________________________________________________ Profª. Dra. Pedrianne Barbosa de Souza Dantas __________________________________________________ Profª. Ma. Dora Neuza Leal Diniz ARACAJU 2022


À todas as mulheres que vieram antes de mim e às que ainda virão. À todas que, apesar de todas as lutas, nutrem esse grande útero-casa chamado cidade.


AGRADECIMENTOS Esse trabalho não seria possível sem o apoio de muitas pessoas, de forma direta e indireta, e a elas eu agradeço imensamente: À minha mãe, meu pai e meu irmão, que sempre estiveram comigo nesta jornada e em todas as outras jornadas da vida. Por todo o apoio, amor e compreensão durante todos esses anos longe de casa em busca do meu sonho. Vocês sabem o quanto eu os amo incondicionalmente. À Lai, minha irmã de alma, por todo suporte, acolhimento e sabedoria compartilhada. Por ser essa pessoa insubstituível, por estar presente em qualquer circunstância, pela amizade acima de tudo. À Henrique, meu parceiro de vida. Pelo companheirismo, carinho, apoio e compreensão. À minha querida-amiga-professora Pedrianne Dantas, que esteve comigo desde o início da graduação. Obrigada por me fazer vislumbrar uma cidade pulsante e de direito para todes, por ter me ajudado a abrir tantas portas e virado a chavinha sobre como é importante olhar a cidade sob a perspectiva de gênero, por todo o incentivo, pelos puxões de orelha também e pelo abraço acolhedor. À Rosany, minha orientadora, pelo sorriso sincero, compreensão e sabedoria compartilhada durante esse caminhar. Às professoras Simone e Lygia, por me inspirarem tanto, vocês são sensacionais. À Vitória, minha dupla durante a graduação, obrigada por tudo durante essa trajetória louca. Saiba que virar todas as noites nos momentos de aperreio, sem você, não seria tão leve como foi, mesmo que durante as videochamadas durante a pandemia. À todos os meus colegas do NUPPE e do CasaURB, vocês são incríveis. Foi com vocês que entendi o é a verdadeira Universidade, sendo ela algo além da sala de aula, e que nós a vivenciamos, sobretudo, lutando. À cada um que, de alguma forma, fez parte dessa trajetória, que colaboraram para que esse trabalho tenha nascido e significou na construção de quem eu sou hoje. A Tay, Diene, Dienefer, Vic, Lara, Ju e Rai por me acompanharem no começo da jornada em 2020, na intervenção com os cartazes. À todas as pessoas queridas que


tiraram um tempo pra responder formulário para que eu pudesse colher as informações necessárias para o trabalho. À Isa e Let, por ouvir minhas lamúrias sobre o desenrolar deste trabalho e por me dar apoio, em nossas idas e vindas ao estágio no Projetar.SE. Aos amigos da graduação, Evelyn, Levi, Chico, Amanda, Gabi, Amanda, Thalis, Bruce, e aos que não citei aqui, mas que não deixaram de ser importantes durante essa caminhada. Que sigamos sempre nossos caminhos com muita força e vontade de transformar a realidade das nossas cidades.


“Me levanto sobre o sacrifício De um milhão de mulheres Que vieram antes E penso O que é que eu faço Para tornar essa montanha mais alta Para que as mulheres Que vieram depois de mim Possam ver além”. Legado Rupi Kaur


RESUMO As avenidas, as ruas, os becos e ruelas, as praças, os muros, o escuro, o deserto, o assédio, a violência, a insegurança – a cidade formada por sensações e elementos espaciais são desafio diário para a mulher. O presente trabalho final de graduação buscou analisar e investigar as questões do urbano a partir das sensações no caminhar das mulheres no bairro Farolândia, na cidade de Aracaju/SE. Neste sentido, foram realizados diversos estudos com a criação de mapas, gráficos e formulários, gerando uma estatística sobre como as mulheres se sentem ao utilizar as ruas e avenidas inseridas no perímetro da Farolândia. Através deste material, produzido a partir da perspectiva da autora e de outras mulheres, foi possível observar as sensações que permeiam no urbano quando se trata da mulher, despertando através deste estudo, possíveis olhares avaliativos quanto as problemáticas no atual modelo de se idealizar, projetar e construir cidades, expondo a necessidade da inclusão da mulher como figura ativa no perímetro urbano. Palavras-chaves: Mulher; Caminhar; Sensações.


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LISTA DE FIGURAS Figura 1 - Resultado da pesquisa para a campanha “Chega de Fiu Fiu” ................. 12 Figura 2 - Resultado da pesquisa “Percepções sobre segurança das mulheres nos deslocamentos pela cidade (1) ................................................................................. 13 Figura 3 -Resultado da pesquisa “Percepções sobre segurança das mulheres nos deslocamentos pela cidade (2) ................................................................................. 13 Figura 4 - Formas de assédio sofridas em público por mulheres brasileiras ............ 13 Figura 5 - Ilustração sobre o feminismo .................................................................... 19 Figura 6 - Mapa do Brasil, Sergipe, Aracaju e Bairro Farolândia .............................. 21 Figura 7 - Antigo farol em meio a paisagem natural ................................................. 22 Figura 8 - Farol inserido na rotatória em tempos atuais............................................ 22 Figura 9 - Av. Josino José de Almeida em meados de 1982 .................................... 23 Figura 10 - Rua Cinco ............................................................................................... 26 Figura 11 - Travessa K .............................................................................................. 26 Figura 12 - Rua cercada por terrenos murados. ....................................................... 27 Figura 13 - Rua deserta, com calçadas estreitas e terreno baldio. ........................... 27 Figura 14 - Av. Dr. José Tomaz D’Avilla Nabuco (Canal 5) ...................................... 28 Figura 15 - Av. Josino José de Almeida (Canal 4) .................................................... 29 Figura 16 - Av. Caçula Barreto (Canal 3) .................................................................. 29 Figura 17 - Rua adjacente com pouca vitalidade humana ........................................ 30 Figura 18 - Rua adjacente com a presença de terreno baldio .................................. 30 Figura 19 - Enunciado do Formulário Google Forms ................................................ 38 Figura 20 - Rua Carlos Pereira de Melo.................................................................... 41 Figura 21 - Rua Franca ............................................................................................. 42 Figura 22 - Rua Edson de Cunha Lima ..................................................................... 43 Figura 23 - Rua Fernando Maia ................................................................................ 44 Figura 24 - Rua Professora Ofenísia Freire .............................................................. 45 Figura 25 - Av. Maria Pastora ................................................................................... 46 Figura 26 - Rua A Um ............................................................................................... 47 Figura 27 - Rua A ...................................................................................................... 48 Figura 28 - Av. Josino José de Almeida .................................................................... 49 Figura 29 - Rua B. ..................................................................................................... 50 Figura 30 - Intervenção Cala a Boca já morreu! ....................................................... 54


Figura 31 – Ilustrações de lambes “Meu voto será feminista”................................... 55 Figura 32 - Cartazes utilizados na intervenção ......................................................... 57 Figura 33 - Autora e voluntárias da intervenção. ...................................................... 58 Figura 34 - Autora e voluntária colando cartazes em muro. ..................................... 59 Figura 35 - Voluntárias realizando colagem em ponto de táxi da cidade.................. 59 Figura 36 – Autora e voluntária aplicando cartaz em poste ...................................... 60 Figura 37 - Mulher demonstra interesse pelo cartaz. ................................................ 60 Figura 38 - Cartaz Intervenção: Medo....................................................................... 62 Figura 39 - Cartaz Intervenção: Assédio ................................................................... 62 Figura 40 - Intervenção: Finalização Manual de Cartazes ........................................ 63 Figura 41 - Colagem de Cartaz em ponto de ônibus ................................................ 65 Figura 42 - Cartazes inseridos na Av. Murilo Dantas ................................................ 66 Figura 43 - Cartazes inseridos na Av. José Tomaz D’Ávila Nabuco ......................... 66 Figura 44 - Cartazes inseridos na Av. Josino José de Almeida ................................ 67 Figura 45 - Cartaz inserido na Av. Caçula Barreto.................................................... 67


LISTA DE MAPAS Mapa 1 - Mapa de uso e ocupação do bairro Farolândia.......................................... 24 Mapa 2 - Mapa Base - Problemáticas ....................................................................... 25 Mapa 3 - Caminhografia – Perímetro e Limites......................................................... 32 Mapa 4 - Caminhografia - Caminhos ........................................................................ 33 Mapa 5 - Sensações e Percepções Pessoais – Caminho 1 ..................................... 34 Mapa 6 - Sensações e Percepções Pessoais – Caminho 2 ..................................... 35 Mapa 7 - Sensações e Percepções Pessoais – Caminho 3 ..................................... 36 Mapa 8 - Mapa Base – Pontos Fotografados............................................................ 37 Mapa 9 - Mapa Base – Mapeamento dos Cartazes .................................................. 64


LISTA DE GRÁFICOS Gráfico 1 - Mapa de Sensações - Identidade de Gênero .......................................... 39 Gráfico 2 - Mapa de Sensações - Idade.................................................................... 39 Gráfico 3 - Mapa de Sensações - Raça .................................................................... 40 Gráfico 4 - Imagem 1 - Mulheres ............................................................................... 41 Gráfico 5 - Imagem 1 - Homens ................................................................................ 41 Gráfico 6 - Imagem 2: Mulheres ................................................................................ 42 Gráfico 7 - Imagem 2 - Homens ................................................................................ 42 Gráfico 8 - Imagem 3 - Mulheres ............................................................................... 43 Gráfico 9 - Imagem 3 - Homens ................................................................................ 43 Gráfico 10 - imagem 4: Mulheres .............................................................................. 44 Gráfico 11 - Imagem 4: Homens ............................................................................... 44 Gráfico 12 - Imagem 5: Mulheres .............................................................................. 45 Gráfico 13 - Imagem 5 - Homens .............................................................................. 45 Gráfico 14 - Imagem 6: Mulheres .............................................................................. 46 Gráfico 15 - Imagem 6: Homens ............................................................................... 46 Gráfico 16 - Imagem 7 - Mulheres............................................................................. 47 Gráfico 17 - Imagem 7 - Homens .............................................................................. 47 Gráfico 18 - Imagem 8 - Mulher ................................................................................ 48 Gráfico 19 - Imagem 8 - Homens .............................................................................. 48 Gráfico 20 - Imagem 9 - Mulheres............................................................................. 49 Gráfico 21 - Imagem 9 - Homens .............................................................................. 49 Gráfico 22 - Imagem 10 - Mulheres........................................................................... 50 Gráfico 23 - Imagem 10 - Homens ............................................................................ 50 Gráfico 24 - Sensações – Gênero Não Binário ......................................................... 51 Gráfico 25 - Principais Sensações - Mulheres .......................................................... 52 Gráfico 26 - Principais Sensações - Homens............................................................ 52 Gráfico 27 – Como é dada a locomoção das mulheres ............................................ 64


SUMÁRIO 1.

INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 6

2.

MULHER, FEMINISMO E O ESPAÇO PÚBLICO ............................................. 10 2.1 MEDO, CAMINHABILIDADE E PLANEJAMENTO URBANO ....................... 15 2.2 A CIDADE FEMINISTA COMO FERRAMENTA DE TRANSFORMAÇÃO .... 18

3. ARACAJU E O BAIRRO FAROLÂNDIA: ENTENDENDO SUA CRONOLOGIA 21 3.1 ESTUDO DO BAIRRO: UTILIDADES, SENSAÇÕES E PROBLEMÁTICAS 24 3.2 CAMINHOGRAFIA SOBRE O BAIRRO ......................................................... 31 3.3 MAPA DE SENSAÇÕES COLABORATIVO .................................................. 37 4. INTERVINDO NO ESPAÇO PÚBLICO ................................................................ 53 4.1 ANSEIO INICIAL: O CAMINHAR DAS MULHERES NA CIDADE ................. 56 4.2 INTERVENÇÃO URBANA NA FAROLÂNDIA ............................................... 61 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ................................................................................... 69 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ......................................................................... 70


1. INTRODUÇÃO O uso e o pertencimento da cidade reproduzem desigualdades socioespaciais, amplificadas no cotidiano da mulher. Este Trabalho Final de Graduação buscou refletir sobre como o corpo feminino, inserido em uma sociedade patriarcal e capitalista, tentar ocupar os espaços públicos, experimentando o medo e a falta de segurança na cidade. As cidades constantemente representam estruturalmente as desigualdades de gênero, raça e classe, identificados em diversos pontos, a exemplo de seu planejamento urbano e construção, que majoritariamente são efetuados por concepções masculinas, constatando que diferentes grupos sociais se beneficiam de forma desigual dos espaços públicos. Desta forma, todos os indivíduos que não se sentem inseridos ao modelo hegemônico, passam a ser objetos de exclusão urbanística, como as mulheres, a população LGBTQIAP+1, a população negra e a população pobre (FELIX; SITO, 2021). O corpo humano é uma individualidade de cada ser, sendo ele aquilo que se apresenta, que fala de si e que se representa na história de forma única na cidade. Posto isso, é relevante falar da nítida influência da sociedade patriarcal e capitalista sobre o corpo feminino, com a capacidade de moldá-lo a partir do poder sobre estes corpos que usam a cidade, modificando rotas e a forma de se vestir, para que, de alguma maneira, determinada segurança seja ofertada em relação ao corpo - não individual - destas mulheres que se movimentam nas ruas da cidade. "Essa característica consiste na estreita interação entre as pressões globalizantes e o modo como as identidades locais são negociadas, modeladas e remodeladas" (BAUMAN, 2021, p. 28). Ao tratar de suas experiências urbanas como mulher, a escritora Leslie Kern em seu livro “Cidade Feminista: A luta pelo espaço em um mundo desenhado por homens”, coloca que: Como mulher, minhas experiências urbanas cotidianas estão profundamente ligadas ao gênero. Minha identidade de gênero molda como eu me movo pela cidade, como vivo meu cotidiano e as opções que estão disponíveis para mim. Meu gênero é mais do que meu corpo, mas meu corpo é lugar de minha

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Sigla que abrange pessoas que são Lésbicas, Gays, Bissexuais, Transexuais, Transgêneros, Travestis, Queer, Intersexo, Assexual, Pansexual e demais orientações sexuais e identidades de gênero, como pessoas não-binárias, que fluem entre as infinitas possibilidades de gênero sem seguir um padrão.


experiência, onde minha identidade, história e os espaços em que vivi se encontram, interagem e se escrevem na minha carne (KERN, 2021, p.16).

Entretanto, deve-se ressaltar também, que há uma diferença na vivência da cidade não só sobre a perspectiva de gênero em geral, mas também a partir de uma análise racializada dos corpos de mulheres. Corpos de mulheres negras experienciam uma maior objetificação e hipersexualização do corpo, e isso é desenhado no caminhar pela cidade. Assim como também há problemáticas a se tratar sobre corpos trans, onde a intolerância, a rejeição, a aversão e a discriminação são dadas por conta da identidade de gênero assumida. Posto isso, todos os corpos que se identificam com o gênero feminino, estão em uma busca incessante pela conquista do seu lugar na cidade. Neste contexto, este TFG tem como objetivo abordar discussões sobre como mulheres e homens usufruem dos espaços urbanos de forma distinta, onde problemas como a mobilidade, acessibilidade e segurança pública atingem o público feminino de modo mais intenso, trazendo reflexões sobre como um planejamento urbano voltado a segurança da mulher é de extrema importância para a existência de cidades que pensam em todes2, assim como uma cidade feminista. O urbanismo feminista vem despontando como uma alternativa para se pensar a cidade e seus equipamentos coletivos de uma outra forma, onde o principal desafio é questionar um urbanismo neutro, no qual teoricamente, os espaços públicos oferecem as mesmas condições de uso para homens e mulheres. Segundo Kern (2021) para uma cidade ser considerada feminista, ela deve quebrar barreiras físicas e sociais, desta forma, todos os corpos são bem acolhidos e acomodados. A criação de uma cidade feminista, demanda formas criativas de utilização, a exemplo das mulheres, que sempre usam uma as outras como apoio em situações desconfortáveis. O objetivo é encontrar maneiras de construir esse apoio na própria estrutura do mundo urbano, para a propagação de uma cidade feminista e com direitos iguais. Pensando nisso, este trabalho tem a intenção de tentar compreender como essas opressões se acumulam e impactam a vida das mulheres, e assim começar a vislumbrar caminhos possíveis para que essas tenham de fato direito à cidade.

2 O uso da linguagem neutra existe para se referir a pessoas que não se identificam com o padrão binário de gênero representado pela oposição masculino e feminino.


A partir de um estudo inicial durante uma disciplina Teoria e Critica da Arquitetura e da Cidade VI (2020.1), ministrada na graduação pela Profª Pedrianne Dantas, onde foi desenvolvida uma intervenção que abordava o tema “O Caminhar das mulheres nas cidades” (aprofundado no item 4.2 Anseio inicial: O despertar), foi vista através daquela experiência, que apesar de ser um tema extremamente importante, há a necessidade de aprendizado sobre as vivências pessoais femininas na cidade, junto ao estudo sobre o direito da mulher. Desta maneira, com a intenção de pensar em uma urbanidade relacionada às questões que implicam o gênero feminino, que vivem, caminham, usam e moram na cidade e a fim de facilitar a compreensão destes conceitos na prática, adota-se a cidade de Aracaju, especificamente o bairro Farolândia – por ser ele o bairro de vivência e moradia da autora -, como base norteadora para analisar e mapear as sensações femininas durante suas andanças, revelando assim os principais locais de hostilidade. Com o intuito de colher informações e mapear o bairro, foi realizado um estudo fotográfico e entrevistas online, que resultou em um quantitativo de dados sobre como essas mulheres se sentem ao utilizar as ruas e avenidas da Farolândia. Após a realização das entrevistas e análise dos resultados, foi feita uma intervenção urbanística, como forma de conscientizar sobre como propor uma cidade habitável numa tangente a equidade de gênero. A vivência do corpo feminino na cidade é, muito comumente, vivenciada com base no medo e incômodo, o que acaba por confirmar a divergência entre os gêneros com relação ao aproveitamento do espaço urbano. Quanto a estrutura desde TFG, além desta introdução, conta-se mais 3 seções. Na seção 2, é apresentado um estudo teórico sobre como o corpo feminino utiliza os espaços públicos. Já na seção 3, deu-se uma atenção maior ao bairro, suas utilidades, sensações e problemas, assim como um estudo pessoal, através de vivencias nas suas ruas e documentação do mesmo através da escrita e do desenho, como também a criação de mapa de sensações a partir da perspectiva de colaboradores em formulário de pesquisa através do Google Forms. Na seção 4, há o destaque para intervenções urbanísticas, desenvolvidas com propósito de transmitir mensagens a fim de questionar e transformar a vida cotidiana nos espaços públicos, além de dar enfoque em intervenção urbanística proposta pela autora durante a graduação e outra


desenvolvida durante este trabalho, mostrando a sua importância para a movimentação e sensibilização da população. Por fim, que este trabalho contribua de alguma forma, por meio dos resultados obtidos, fazendo com que, no futuro, existam cidades com o acesso universal a espaços públicos que sejam seguros e inclusivos, principalmente para as mulheres, assim como para as crianças, idosos e pessoas com deficiência.


2. MULHER, FEMINISMO e o ESPAÇO PÚBLICO De maneira geral, estar na cidade pode significar enfrentar muitos medos: medo do espaço público, de infringir regras, de apropriar-se do espaço, medo de ultrapassar barreiras muitas vezes inexistentes e medo dos outros cidadãos, quase sempre percebidos como inimigos potenciais. Como mulher, podemos acrescer também outros temores: medo de ser oprimida, medo de ser assediada, medo de ser perturbada e medo de ser violentada. E caminhar, sem resguardo ou companhia, é estar nesse local de sensibilidade, e talvez vulnerabilidade, que nos obriga a perceber tudo o que nos cerca. É caminhar sempre à espreita de um acontecimento (SANTOS et al, 2019). A sensação de exposição e de ser observada de forma pejorativa é certeira, gerando incômodo. Ser mulher na cidade é criar uma película protetora diante da situação ao caminhar em espaços públicos para que se possa ter uma experiência, de certa forma, menos exaustiva. Na visão de Kern (2021), “a capacidade de estar sozinha é um marcador igualmente importante de uma cidade bem sucedida.” De acordo com a escritora Simone de Beauvoir (1967, p. 12) Para compreender as vivências do feminino na cidade, é necessário debater sobre os papéis que as mulheres exercem na sociedade, as relações de gênero e a construção do papel da mulher ao longo da história. A construção social e cultural do que é feminino e masculino é imposta como um padrão natural. Esses padrões são construídos, reforçados ou desconstruídos pela forma como se organizam as sociedades ao longo da história e estabelecidos desde o nascimento das meninas.

Tal afirmação nos leva a compreensão de que a cidade nunca foi vivenciada pelas mulheres da mesma forma que os homens. Ainda apoiada no pensamento de Simone de Beauvoir (1970, p. 10): “a mulher determina-se e diferencia-se em relação ao homem, e não este em relação a ela; a que diz que a fêmea é o inessencial perante o essencial; também o homem é o sujeito, o Absoluto, ela é o Outro”. Visto no corpo social, a mulher sempre foi o outro. É ela quem se responsabiliza por todas as atividades de cuidar, principalmente no espaço doméstico, reforçando a divisão arcaica de gênero. E para usufruir da cidade, há condutas que são estabelecidas desde muito cedo e que se devem ser seguidas. “Encurralando-as no espaço privado e reproduzindo o tratamento dado neste espaço nos espaços públicos, proprietários de seus corpos” (GONZAGA, 2011, p. 25).


Este corpo, relacionado a ser dominado, mediante as condutas patriarcais que vinculam a imagem feminina como propriedade, ocorrendo a privatização do mesmo, como cita Beauvoir (2016, p. 114) “o homem quando se torna proprietário do solo é que reivindica também a propriedade da mulher. (...) quer que o trabalho familiar que se utiliza em proveito de seu espaço seja totalmente seu e, para isso, é preciso que os trabalhadores lhe pertençam: a mulher e os filhos”. Assim como definiram, desenharam, construíram e se fizeram senhores dos espaços públicos da cidade, os homens praticamente monopolizaram esses mundos no reino da produção literária, ainda que, inúmeras vezes, para atacar com violência a vida urbana. Mas dizer e mostrar isso não é fazer acusação alguma as mulheres. É, antes, acusar a cidade pensada e construída pelos homens, que, ao longo dos séculos, confinaram as mulheres ao chamado espaço doméstico, limitando autoritária e drasticamente a sua vivência das realidades urbanas. (RISÉRIO, 2015, p. 38)

É importante ressaltar, através das palavras de Abreu (2021) que essas relações se dão através de construções histórias sociais que projetaram este cenário nas cidades, compostas por relações econômicas, construídas paralelamente por uma sociedade patriarcal que visa uma soberania entre os sexos. Desta forma, existindo a figura masculina como propagador da dominação sobre o corpo da mulher e que delibera quais espaços esse corpo acessa e ocupa. Pensamento este com um quê falocêntrico, caracterizado por colocar o homem acima de tudo e de todos, defendendo a superioridade masculina em relação à mulher. Entendendo a relação do gênero com os espaços, é visto que esta é dada através da apropriação do homem nos espaços públicos, sendo eles aqueles que se encontram em estado de permanência por um período maior de tempo nestes espaços. Foi então quando as divisões espaciais do publico e do privado foram cada vez mais claramente associadas as esferas consideradas “naturais” de cada um dos sexos, construídas sobre a base da ideia de superioridade, da dominação masculina e da responsabilidade feminina para a esfera doméstica. (MOLLEROKIN, 2000 apud MONNET, 2013, P. 221)

Risério (2015) traz a observação de que em nosso vocabulário, casa e cidade, são excepcionalmente palavras femininas. Coisas fêmeas. Substantivos que se fazem preceder por um artigo que firma a determinação clara do gênero a que pertencem. Fato este que está enraizado até mesmo na língua portuguesa-brasileira, mostrando que até na gramática, o patriarcado se instalou desde então. O autor ainda complementa, “o que me interessa, aqui, é assinalar o gênero feminino de casa e


cidade. Pelo simples fato de que, entre nós, fazer casa e fazer cidade nunca foram coisas de mulher”. Visto que, ao vivenciar esta cidade, - que se trata de um local não preparado e pensado para as mulheres, sendo ele na maioria das vezes hostil -, há algo intrínseco em ser mulher e se caminhar na cidade, onde perpassar por vários empecilhos ao caminhar se transforma em algo frequente. O primeiro empecilho a ser citado aqui é o assédio que comumente vivenciado durante estes percursos, por conta disso, a mulher está condicionada a pensar de forma natural em como se proteger, maneiras de proteção são tomadas antes mesmo de sair – locais que pode ir, horários para chegar e como devem se vestir, qual melhor trajeto a ser seguido, acompanhadas do medo de estar ali, pelo simples fato de ser mulher. Como bem sintetiza a ONG Think Olga (2013), em sua campanha intitulada de “Chega de Fiu Fiu”, que teve objetivo em denunciar o assédio – palavra essa que era não-dita ou não compreendida com a frequência e contexto de hoje-, apontou que 81% das mulheres brasileiras já deixaram de sair na rua por medo de assédio. A desigualdade entre os gêneros se expressa em todos os âmbitos e espaços, sejam eles comerciais, residenciais, institucionais, privados ou públicos. Os próximos dados nos mostram e exemplificam de forma clara como essa desigualdade é dada no meio urbano. Como salienta Taciana Gouveia, que pontua que: Falar das desigualdades não é apenas tratar do problema do ponto de vista do acesso desigual aos espaços e processos das cidades é, acima de tudo, reconhecer que as desigualdades entre mulheres e homens não atravessam a produção e reprodução das cidades, mas são, por princípio, elementos constituintes das mesmas. Esta é uma distinção importante, na medida em que se atuamos apenas no plano das desigualdades de enquanto acesso estaremos trabalhando os impactos da estrutura na vida das mulheres - o que é importante, mas não o suficiente - que ao assumirmos as desigualdades de gênero como estruturadoras e dinamizadoras das cidades estaremos enfrentando a questão do poder e consequentemente dos privilégios que os homens têm com a conservação desta estrutura (GOUVEIA, 2005, p. 1). Figura 1 - Resultado da pesquisa para a campanha “Chega de Fiu Fiu”

Disponível em: https://paranaportal.uol.com.br/geral/996-das-mulheres-ja-foram-assediadas/, 2017.


Figura 2 - Resultado da pesquisa “Percepções sobre segurança das mulheres nos deslocamentos pela cidade (1)

Disponível em: https://artebrasileiros.com.br/brasil/o-medo-de-andar-nas-ruas/, 2018. Figura 3 - Resultado da pesquisa “Percepções sobre segurança das mulheres nos deslocamentos pela cidade (2)

Disponível em: https://agenciapatriciagalvao.org.br/violencia/81-das-mulheres-ja-sofreram-violenciaem-seus-deslocamentos/, 2021. Figura 4 - Formas de assédio sofridas em público por mulheres brasileiras

Disponível em: https://actionaid.org.br/noticia/brasil-lidera-assedio-de-mulheres-em-espaco-publico/, 2016.


Uma pesquisa da Organização Internacional ACTIONAID (2016), durante a campanha Cidades Seguras para as Mulheres, mostra que o Brasil lidera o assédio de mulheres em espaço público, trazendo dados que 86% das mulheres brasileiras ouvidas durante a pesquisa já sofreram assédio em público. Além de que 70% das mulheres têm medo de assédio ao caminhar nas ruas brasileiras, assédios esses que são sofridos de diversas maneiras, como foi ilustrado na Figura 4. Sendo assim, é crescente a segregação dos espaços urbanísticos, onde existe a posse visual de espaços públicos predominantemente masculinos, como praças, bares e construções, havendo o medo como indivíduo comum durante o ir e vir das mulheres nas cidades, justamente por vivermos em cidades sobretudo pensadas por e para homens, brancos da classe média alta, onde são privilegiados. A arquiteta e urbanista Cândida Zigoni declara que: É possível afirmar que a mulher se encontra dentro de um espectro observador, mas também de sujeito que sofre as consequências das decisões do poder público na construção de cidade, esse, majoritariamente composto por homens. Portanto, a posição desse espectro sugere a percepção das mulheres como uma ferramenta de análise urbana (ZIGONI, 2017, p. 12).

Lima (2020), acredita que na medida em que se dá ao homem o posto de superioridade, automaticamente é imposto um caráter passivo e afetivo, e para que essa dominação dos homens sob as mulheres seja arruinada, é necessária a alteração da relação da posição cultural dos homens. a Arquiteta e Urbanista Terezinha de Oliveira Gonzaga (2011) reforça está ideia, ao afirmar que: Para ocorrer mudanças, é necessário que as mulheres cheguem em todos esses espaços, já que são as mais prejudicadas em relação ao espaço público e político. Onde a visão machista/patriarcal forma os componentes da sociedade que compõem os partidos que direcionam as políticas públicas. Ao ressignificar esses lugares e paradigma, as alterações intraurbanas, podem ser mais alcançadas nas questões da mulher. (GONZAGA, 2011)

Segundo Melo (2017), “a mulher é cidadã plena do ponto de vista legal e formal, porém, sob a perspectiva da sua condição na sociedade, pode-se dizer que ela ainda é uma cidadã de “segunda classe”. O direito de ir e vir é dado, mas, na vivência do urbano, não ocorre de maneira fluida e afetiva”, dito isso, Peccini (2016) fortifica que, “a insegurança no espaço público é um tema que toca a todas as pessoas que vivem a cidade, mas é extremamente importante considerar que há perigos e medos vividos exclusivamente ou mais intensamente pelas mulheres.”


Marconi (2020) aborda o fato de que, ao contrário das classes econômicas, as classes sexuais originam-se diretamente de uma realidade biológica em que as mulheres e os homens são criados de formas essencialmente distintas. Assim, no decorrer da história, as figuras femininas são dispostas em função de seus detalhes biológicos, em que seu meio social reforça uma visão de vulnerabilidade em função dessa condição – período menstrual, menopausa, partos e amamentação – e cria uma relação de dependência para com os homens, quer seja irmão, pai, marido, amante ou governo (MELO, 2017). A maioria das mulheres ainda é coagida a um papel tradicional de gênero que reforça o ciclo de medo. Esse aspecto cria assim, um subsistema em que a dominação masculina é mantida e perpetuada (VALENTINE, 1989). Desta maneira, há de ser observado, que o feminino e masculino ocupam ações diferentes dentro do espaço urbano, sendo designada uma relação de superioridade do masculino com o feminino, sendo transformada assim esta, uma das marcas feitas pelo o patriarcado na sociedade. No entanto, é necessário ressignificar os espaços urbanos para que estes sejam pensados para todos os gêneros, mostrando a importância e necessidade em ser pensada políticas públicas para que os direitos sejam iguais. E esta ressignificação só pode ser dada através do uso cotidiano do ambiente coletivo, sendo esta uma forma de resistência feminina contrapor aos fatos iniciais do patriarcado, para que desta maneira, seja formulado um olhar da cidade através do olhar feminino.

2.1 MEDO, CAMINHABILIDADE E PLANEJAMENTO URBANO Os planos de urbanização das cidades, muito comumente, não reconhecem, os indícios que demonstram como pode ser chocante a diferenciação de impacto urbano entre gêneros, não havendo uma inclusão em medidas urbanísticas para a uso da cidade de forma mais fluida, onde se dá a continuidade em gerar medo ao se caminhar nas cidades. Conforme Josep Maria Montaner e Zaida Muxí: Há uma tendência de ver o planejamento urbano como neutro em termos de gênero, pressupondo que ambos os sexos são afetados igualmente. Na realidade, essa neutralidade implica em uma perspectiva masculina e corresponde aos papéis de gênero da sociedade patriarcal (MONTANER E MUXÍ, 2019).


Situações desconfortáveis vividas diariamente pelas mulheres, reproduzindo o medo e desconforto, as impedem que sejam feitos os seus trajetos de forma livre e intuitiva, havendo sempre uma limitação da sua experimentação da vida urbana. Este fato diz respeito sobre o quanto é importante ser pensado em um planejamento mais humano, incluindo a figura feminina como o centro, voltado e pensado na segurança dela. Não se trata de uma questão de segurança genérica, que em tese atingiria mulheres e homens igualmente. Muito menos de um tema afeito à esfera policial. Tem a ver com um estigma cultura, o pressuposto importo a todas nós de que uma de nós sozinha, em um espaço público, está ali para ser assediada sexualmente, o que nos impede o acesso a um direito básico: o de circular e ocupar livremente a cidade, na hora e como se quiser (ROLNIK, 2018).

Para que mudanças possam surgir, é preciso pensar em artefatos que incluam uma boa caminhabilidade na cidade. Kern (2021) nos traz exemplos para que isso aconteça, como melhorar a iluminação pública, limpar paisagens obstruídas e criar rotas de tráfego bem por meio de habitações e empreendimentos cívicos. A autora destaca ainda que o uso generalizado de câmeras de segurança foi adotado como uma medida destinada para reduzir o crime, mas ressalta que embora seja uma medida com o propósito de seguridade, a sua capacidade em reduzir o medo é algo a ser questionado. A segurança e a percepção da cidade são muito diferentes para as mulheres e para os homens, de maneira que é importante que se conheçam suas experiências ao planejar espaços públicos. Usos, limites, transparência, visibilidade e iluminação são variáveis que devem ser levadas em conta de acordo com a experiência das mulheres (KERN, 2021).

A desigualdade de gênero atinge, de forma certeira, os espaços e como as mulheres se deslocam pelas cidades por causa do medo de vivenciar a violência, seja ela sexual, física ou psicológica. O medo também é contornado por diferenças de idade, raça, classe, sexualidade, identidade de gênero e habilidade. Assim, embora as feministas certamente tenham feito campanha por mudanças no ambiente construído, elas nunca perderam de vista o fato de que a falta de segurança das mulheres existe dentro de uma rede entrelaçada de dominação que facilita o controle social das mulheres e de outros grupos menos poderosos na cidade. Nessas condições, o medo nunca pode simplesmente ser “eliminado” (KERN, 2021).

Como caracteriza Felix e Sito (2021), as mulheres podem ser usadas como termômetro para segurança e outras prioridades de planejamento. Se perguntar: uma mulher se sentiria segura andando aqui a noite? E obter resposta positiva, provavelmente significa que a maioria das pessoas se sentiria confortável usando aquele espaço. Pois, assim como cita Kern (2021), é muito difícil superestimar o efeito


do medo diário, pois mesmo quando o medo não está ativamente presente, o fardo de um conjunto de precauções rotinizadas está sempre lá, embora estejam tão incorporadas que mal há a percepção de que é feito. As mulheres, diariamente, desafiam constantemente seus medos e agem de maneira corajosa, empoderada e libertadora ao utilizar as cidades. Calió (1997), explica o desafio sobre mesmo a mulher sendo uma reprodução de força na cidade, trabalho e família, utilizar a transitar no território urbano não significa que elas ocupam de fato a cidade, “misturada na multidão, a mulher vive uma falsa impressão de igualdade de uso e de mobilidade urbana.” (1997, p.5). De acordo com Felix e Sito (2021), a falta de diversidade é um prato cheio para segregação espacial e exclusão social. Uma cidade justa, democrática e inclusiva pressupõe pensar o projeto de desenvolvimento a partir de um outro olhar, de outras premissas que impulsionem uma alteração substancial na sua forma de organização e na forma como se estruturam as políticas públicas, visando contemplar as maiorias e minorias excluídas do direito à cidade. O direito à cidade é um direito humano e coletivo, é muito mais do que a liberdade individual em ter acesso aos recursos urbanos, sendo ele um direito de mudar a nós mesmos, mudando a cidade. É um compromisso ético e político de defesa de um bem comum para a comunidade é essencial a uma vida plena e digna. De acordo com Gomes (2020), nos últimos anos houve uma larga concepção da importância do direito à cidade, e por vezes, esse debate ignora que a cidade é um espaço diversificado: onde dentro de uma mesma malha urbana há de se desenvolver diferentes tipos de territórios, com mais ou menos acessos a direitos. A arquiteta e urbanista Joice Berth, interliga a efetivação do direito à cidade à participação social: Cidade é o espaço público, onde você se locomove, mora, estuda, trabalha e cria raízes. As pessoas têm dificuldade de entender: como assim, direito à cidade, a cidade não é pública? É, mas não em sua totalidade (BERTH, 2018). Sendo assim, o planejamento das cidades deve perpassar por vários fatores, incluindo a vida das mulheres que utilizam a cidade. Reconhecendo que existem dificuldades diferentes e papéis diferentes nas cidades, as diferenças humanas deveriam ser tomadas como contribuição para uma sociedade justa, trazendo a perspectiva de cada um para que dessa forma contribuísse para um desenvolvimento social justo para todos. Desta forma, deve-se estabelecer a equidade e justiça social,


com a criação de condições necessárias para que o direito à cidade seja abordado de forma correta. 2.2 A CIDADE FEMINISTA COMO FERRAMENTA DE TRANSFORMAÇÃO Inicialmente, é necessário voltar um pouco no tempo e estudar a história para que se compreenda e preencha a lacuna da falta de informação sobre o que é o feminismo e como esse movimento tem um papel essencial para a sociedade desde muito tempo como atualmente. Durante a década de 1970, os estudos sobre feminismo e sobre o direito da mulher ganharam visibilidade, sendo vinculado a movimentos sociais. Foi nesse período que o movimento feminista apareceu de fato como uma experiência histórica, marcado por mulheres as quais lutavam pelos seus direitos, enunciando de forma genérica e abstratamente a emancipação feminina. (SARTI, 2004). Assim, conforme afirma Cynthia Sarti (2004), o feminismo, desde o começo do movimento, foi pautado por lutas e guerrilhas políticas, sociais, culturais e históricas. Por isso, declarar-se feminista é um ato político, pois traz para o debate a luta contra uma ideologia misógina. Ser feminista é se opor a violência sistemática que apaga e não reconhece as mulheres nos espaços. Feminismo é o movimento político que contribui de maneira fundamental para a identificação de valores patriarcais, bem como para a compreensão das desigualdades entre homens e mulheres e para a luta social (FARIA; PIMENTA; SILVA, 2017, p.3)

Através da luta do movimento, há o vislumbre em se vivenciar cidades com valores feministas, onde é necessário acontecer muitas mudanças na forma como a humanidade vive a cidade. É preciso, de certa forma, estabelecer uma reeducação da população, a fim de criar mudanças no uso da cidade. Gomes (2019, p. 30) cita que “o conceito de gênero é dado como um reflexo da sociedade para que se possa moldar os comportamentos, as relações humanas e o espaço, demonstrando que a compreensão binária do feminino e do masculino é uma construção social que pode e deve vir a ser desconstruída.”. Assim como a cidade, nós mesmas/mos somos resultados de construções sociais que estão sempre relacionadas: se produzimos cidades que proporcionam vivências desiguais para homens e mulheres, é porque fomos socialmente construídos para naturalizar estas diferenças e hierarquias e, portanto, naturalizamos também a própria construção dessas cidades, pautadas pela lógica patriarcal (PECCINI, 2016, p.52)


Desta maneira, vale ressaltar que a questão feminista não será somente abordada por estar normalmente ligada as críticas e tabus, como ilustrado na figura 5, mas também salientando que “este carrega como uma de suas pautas centrais a critica a dualidade entre o publico e o privado” (LYRA, 2018, p. 27), ou seja, o julgamento recorrente sobre a aceitação das mulheres no universo doméstico à sua exclusão no universo da esfera pública. Figura 5 - Ilustração sobre o feminismo

Fonte: Helô D’Angelo, 2020.

Ao observar que uma cidade segura para uma mulher, é uma cidade segura para todes, é possível perceber que há uma diferenciação na experimentação da urbe entre a figura feminina e masculina, havendo uma certa desigualdade que assume como um reflexo da natureza diferenciada dos dois sexos. Havendo a necessidade de mudança nesse comportamento patriarcal, Kern (2021, p. 107) analisa que “em uma cidade feminista segura, as mulheres não precisam ser corajosas apenas para sair de casa. [...] Nesta cidade, toda a extensão do que as mulheres têm para oferecer ao mundo pode ser percebida.” Uma cidade feminista deve ser aquela onde as barreiras – físicas e sociaissão desmanteladas, onde todos os corpos são bem vindo e acomodados. Uma cidade feminista deve ser centrada no cuidado, não porque as mulheres devam continuar sendo as principais responsáveis pelo trabalho de cuidado, mais porque a cidade tem o potencial de espalhar o trabalho de cuidado de maneira mais uniforme. Uma cidade feminista deve olhar para as ferramentas criativas que as mulheres sempre usam para apoiar umas as outras, e encontrar maneiras de construir esse apoio na própria estrutura do mundo urbano. (KERN, 2021, p. 42)


O fato das cidades estarem estagnadas e condicionadas a serem reproduzidas a partir de um olhar patriarcal e misógino está ligado a veracidade de que politicas públicas e políticas de superação do machismo e da misoginia não são criadas, onde é possível perceber que, “parte da população ainda reproduz um discurso que questiona o ’direito’ da mulher em, por exemplo, andar desacompanhada a noite pela cidade e culpabiliza as vitimas de estupro associando os ataques ao comprimento de suas roupas” (HARKOT, 2015). Não é possível construir uma cidade feminista e inclusiva sem entender e levar em conta as diferentes opressões de gênero que estas vivenciam. Ao mesmo tempo, é preciso que haja a constatação de que a construção de um espaço público com igualdade de gênero é apenas plenamente possível com iniciativas públicas e políticas de superação do machismo e da misoginia que as oprimem, uma vez que constantemente defendem que o seu lugar é no espaço privado e não no espaço público (SITO; FELIX, 2021).

Ser feminista e vivenciar uma cidade patriarcal é um ato de resistência e força diária. Para Gomes (2019, p. 31) o feminismo nos fala sobre equidade de direito, onde é algo muito além de gênero, possuindo autonomia e a ação como foco. A realização de cidades feministas deve considerar elementos para a construção de uma urbe acessível, como a exclusão dos espaços de poder, a violência de gênero, a divisão sexual do trabalho e as diversas atribuições de cuidados com filhos, casa e familiares. Assim como o pensamento de Jacobs (2011) que defende que o principal atributo de um distrito urbano próspero é aquele em que as pessoas se sintam seguras e protegidas na rua em meio a tantos desconhecidos, este trabalho também leva em consideração este pensamento como forma da criação de cidades mais justas para todes.


3. ARACAJU e o BAIRRO FAROLÂNDIA: ENTENDENDO SUA CRONOLOGIA Esta seção inicialmente abordará o crescimento histórico do bairro na malha urbana da cidade. Em um segundo momento, será apresentado um olhar sobre o espaço público do bairro em relação à mulher, propondo-se a entender suas potencialidades e atrelado a isso, perceber como ele é utilizado pelo público feminino. Posteriormente, um estudo fotográfico do bairro mostrando seus usos, instrutura pública e problemáticas servirá de base para a construção de um mapeamento colaborativo de sensações destes espaços fotografados. Com o intuito de notabilizar as questões de gênero que foram citadas nas seções anteriores, foi adotado como espaço para realização deste trabalho a análise de um bairro da capital sergipana como área de estudo pontual, sendo este escolhido por este bairro fazer parte do cotidiano da autora, como local de moradia e estudo, o bairro Farolândia (Figura 6). Figura 6 - Mapa do Brasil, Sergipe, Aracaju e Bairro Farolândia

Fonte: Elaborado pela Autora, sem escala (2022).

A cidade de Aracaju possui uma população de 571.149 mil habitantes, sendo composta por 42 bairros. O bairro da Farolândia está situado na Zona Sul aracajuana. Como um dos bairros mais populosos da cidade, possui 28.257 habitantes, destes, 54.71% são mulheres e 45.29% homens (CENSO, 2010). Situado na região sul da cidade, foi nomeado "Farolândia" devido a um antigo farol, que em meio a dunas de areia e vegetação natural (Figura 7), servia como orientação marítima a embarcações que chegavam à foz do Rio Sergipe durante a noite. Considerado o mais antigo farol da capital, teve grande destaque durante a Segunda Guerra Mundial, foi considerado como Patrimônio Histórico Estadual de


Sergipe através do “Decreto n º 15.295, de 21 de abril de 1995” (ROSA, 2015). Atualmente, ele se encontra inserido no contexto urbano em uma rotatória, próximo a edificações residenciais, de serviços e ao comércio local (Figura 8). Figura 7 - Antigo farol em meio a paisagem natural

Fonte: Aracajusaudade.blogspot.com, 2015. Figura 8 - Farol inserido na rotatória em tempos atuais

Fonte: Acervo da Autora, 2022.

O desenvolvimento do bairro foi impulsionado a partir do ano de 1982, com a inauguração do conjunto Augusto Franco, com 4510 unidades de habitação e edifícios


com até 4 pavimentos (Figura 9), com o propósito de beneficiar milhares de sergipanos que sofriam com problemas de moradia, saneamento básico, saúde e educação. Figura 9 - Av. Josino José de Almeida em meados de 1982

Fonte: Aracajusaudade.blogspot.com, 2012.

Um ponto a ser citado é a sua heterogeneidade quanto ao gabarito das edificações existentes. É possível identificar, edifícios com mais de 10 andares, como também casas térreas, conjuntos habitacionais e uma diversidade de comércios locais, criando uma ideia de que naquele mesmo bairro pode haver “mini-bairros”. De acordo com Muxí (2012) o bairro compõe uma unidade espacial perceptível em que se constituam relações de interação, troca e convivência em função de atividades habituais, cotidianas e socialmente organizadas. Neste sentido, apesar de suas diferenças em questões urbanas, o bairro guarda o potencial de uma vida em comunidade ativa, havendo uma diversidade de usos durante todo o seu perímetro, gerando uma grande movimentação na sua espacialidade geral. Um dos fatores para tal movimentação se dá por conta do campus da Universidade Tiradentes, implementada em 1994. Com isso mais infraestrutura chegou para o local e começou um processo de valorização da terra e de construção de edifícios para atender os estudantes que viam do interior para morar nas proximidades da academia (CARVALHO, 2013).


A partir deste impulso, com a chegada da Universidade no local, transformações aconteceram no bairro, trazendo uma multiplicidade maior de usos no bairro, como variações de comércios afim de simplificar a vivencia de quem o utiliza diariamente. 3.1 ESTUDO DO BAIRRO: UTILIDADES, SENSAÇÕES E PROBLEMÁTICAS Delimitado entre os bairros Inácio Barbosa (Norte), Aeroporto (Sul), São Conrado (Oeste), Atalaia (Sudeste) e abraçado pelo rio Poxim e vegetação típica de manguezal em grande parte da sua área de extensão, abarcando diversos usos durante todo o seu perímetro (Mapa 1), o bairro Farolândia tem uma igualdade espacial quanto a sua distribuição no uso habitacional, prevalecendo os seus conjuntos de residências térreas. Mapa 1 - Mapa de uso e ocupação do bairro Farolândia.

Fonte: Desenvolvido pela Autora com Mapbox e Canva, 2022.


Apesar de possuir caráter predominantemente residencial, o bairro possui uma quantidade expressiva de usos comerciais e serviços, possibilitando essa evolução expansiva por conta do seu crescimento e desenvolvimento populacional. Embora seja considerado um bairro de classe média, há uma problemática quanto a sua infraestrutura pública em pontos específicos em seu perímetro, que foram mapeados neste, pontuados no Mapa 2, permitindo ser evidenciado certa distinção entre um local e outro, havendo uma pluralidade na existência de ruas estreitas, com pouca iluminação pública, sem arborização e com terrenos murados ao longo da sua extensão, como também é vivenciada na paisagem locais com ruas largas e asfaltadas, com calçadas regulares, arborizadas e iluminadas, como pode ser vista na Figura 10 e 11. Mapa 2 - Mapa Base - Problemáticas

Fonte: Desenvolvido pela Autora com Mapbox e Canva, 2022.


Figura 10 - Rua Cinco

Fonte: Google Maps, 2019. Figura 11 - Travessa K

Fonte: Google Maps, 2019.

Além disso, na sua paisagem urbana existe condições precárias na sua caminhabilidade, por conta da existência de áreas compostas por vazios urbanos, ruas desertas, calçadas estreitas, fachadas cegas e segregação do interno x externo, com pouca atividade urbana e conforto (Figura 12 e 13). Os vazios urbanos são fenômenos contemporâneos consolidados a partir de espaços residuais, remanescentes urbanos ou áreas ociosas (...) seu tratamento integrado no planejamento da cidade pode resultar em melhorias nas condições ambientais da paisagem urbana (CARVALHO, 2016, p. 24)


Figura 12 - Rua cercada por terrenos murados.

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Figura 13 - Rua deserta, com calçadas estreitas e terreno baldio.

Fonte: Acervo da Autora, 2022.


Também é possível perceber as disparidades dos espaços como a ocupação dos principais Avenidas (Av. Dr. José Tomaz D’Avilla Nabuco, Av. Josino José de Almeida e Av. Caçula Barreto) e suas ruas adjacentes, onde é visível a diferença da sua infraestrutura e movimentação urbana. Jane Jacobs3, traz uma reflexão pessoal em seu livro Morte e Vida das Grandes Cidades, sobre como nos locais em que as ruas possuem estabelecimentos comerciais, vivacidade, usos e atrativos suficientes para cultivar essa continuidade de vida, seu povo norte-americano se mostra muito capazes de autogerir as vias públicas. Por possuir maior dinâmica devido a concentração de comércios, serviços e residências nas áreas, além da utilização dos canais centrais das avenidas como área de uso para caminhadas e pedaladas, assim como também para a vivência no espaço por conta do sombreamento das árvores, possuindo um certo conforto térmico no local (Figuras 14, 15 e 16). Figura 14 - Av. Dr. José Tomaz D’Avilla Nabuco (Canal 5)

Fonte: Acervo da Autora, 2022.

3

Nascida nos Estados Unidos, foi escritora e ativista política no Canadá, foi considerada a urbanista mais influente do mundo pela revista Planetizen, ativismo em defesa da participação das pessoas no espaço urbano.


Figura 15 - Av. Josino José de Almeida (Canal 4)

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Figura 16 - Av. Caçula Barreto (Canal 3)

Fonte: Acervo da Autora, 2022.

Nas ruas localizadas de imediato nas avenidas citadas acima, há pouca existência de movimentação urbana, que se dá pela falta de movimentação humana nos espaços, como pode ser visto nas figuras 17 e 18.


Figura 17 - Rua adjacente com pouca vitalidade humana

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Figura 18 - Rua adjacente com a presença de terreno baldio

Fonte: Acervo da Autora, 2022.

Assim como cita Jacobs (2019), não resta dúvidas que faltam as nossas cidades ruas preparadas para a vida urbana. Em vez dela, temos extensas áreas afligidas pela Grande Praga da Monotonia. São exatamente nestas ruas que se encontram a presença de terrenos baldios, criando zonas de perigos – proporcionando ocorrência de violências sexuais – e edificações com fachadas cegas, causando barreiras visuais no espaço público.


3.2 CAMINHOGRAFIA SOBRE O BAIRRO Como corpo que se desloca por este bairro, tomei como atitude importante documentar o meu caminhar nas ruas da Farolândia. Foi a partir da minha experiência como caminhante, que se despertou a necessidade de estudar e pesquisar sobre a caminhar da mulher nas ruas do bairro. Minha relação com o bairro decorre do fato, de nele estar inserido o Campus da Universidade que eu estudo, ou seja, foram cinco anos refazendo caminhos. Além disso, resido no bairro há mais de três anos, inicialmente em um prédio isolado de 3 andares, em uma área totalmente cercada por residências térreas, em uma das ruas no entorno do Canal 3 e atualmente em um condomínio fechado de classe média alta, situado às margens do antigo farol, indicando que minha experiência com o bairro é notável pelo privilégio. Desta maneira, sei que o meu local de mulher branca, cis, heteronormativa e privilegiada é muito diferente do de diversas mulheres na cidade, no entanto, mesmo portando dessa diferença, ainda assim, é importante ser estudado o caminhar delas. Ao sair às ruas para fazer um mapeamento de sensações e percepções pessoais sobre a caminhografia do bairro, foi levada com consideração alguns fatores citados pelo urbanista e escritor Kevin Lynch, onde cita em seu livro “The Image Of City”, algumas diretrizes sobre como é dada a percepção da cidade e seus elementos. Neste sentido, o estudo utilizou duas formas de percepção, caminhos e limites. A princípio, foi delimitado um perímetro com raio de aproximadamente 900m, que possibilitasse caminhar a partir do ponto de saída (Farol), criando-se limites entre as três avenidas que cortam o bairro de forma transversal e horizontal, sendo elas: Av. Murilo Dantas, Av. Dr. José Tomaz D’Avilla Nabuco, Av. Josino José de Almeida, Av. Caçula Barreto assim como ilustrado no Mapa 3. A escolha do perímetro foi definida pelo desejo de englobar as principais avenidas do bairro: as avenidas dos canais 3, 4 e 5, como também algumas das suas ruas adjacentes, que fazem de fato, ligação entre os limites (canais/avenidas).


Mapa 3 - Caminhografia – Perímetro e Limites

Fonte: Acervo da Autora, 2022.

Nesta vivência, pude confirmar e reforçar a necessidade feminina de pensar em formas de se sentir segura no espaço, como qual roupa utilizar, horário para circular, onde andar etc., a partir desse pensamento de proteção, enraizados em todas, foi que percebi a importância em fazer este estudo particular. Assim, como tantas mulheres, também tomei o cuidado de sair de casa de forma segura, apenas com a roupa do corpo - sendo ela calça jeans folgada e camiseta, por pensar que assim não chamaria tanta atenção -, levando comigo apenas um caderno e caneta para que pudesse desenhar, escrever e documentar estas caminhadas. Estas vivências, foram realizadas, em dias e horários diferentes, percorrendose três caminhos, ilustrados no Mapa 4. Busquei realizar os trajetos da maneira mais livre possível, não me apegando aos detalhes menores.


Mapa 4 - Caminhografia - Caminhos

Fonte: Acervo da Autora, 2022.

Desta maneira, foquei, a princípio, apenas nas sensações pessoais, podendo ser físicas, emocionais, espaciais, visuais, auditivas, olfativas e etc. Porém, foi visto que durante o caminho, diante da observação do espaço público e de percepções pessoais, houve a necessidade de fazer mudanças nesse processo. Tomando como ponto de partida o farol, o primeiro caminho (Mapa 4) realizado foi entre a extensão da Av. Murilo Dantas e a Av. Dr. José Tomaz D’Avilla Nabuco, avenidas estas que compartilham o mesmo caminho e direção entre elas durante todo o canal 5. Esta experiência trouxe algumas percepções e sensações, que influenciaram o percurso: (1) a maneira que o corpo se transforma, tomando um aspecto de fortaleza ao se caminhar, mantendo-se em modo alerta o tempo inteiro; (2) andar livremente por entre as avenidas despertou algumas sensações (físicas, emocionais, olfativas e auditivas) durante todo o percurso; (3) optei, por questões


intuitivas, não permear algumas ruas que estavam no meu entorno, justamente por não me sentir segura ali. Enquanto esta experiência era idealizada, a perspectiva era em ser extremamente pessoal, porém, foi durante o primeiro percurso (Mapa 5) que esta idealização foi descartada a partir do momento em que uma mulher não identificada, que estava de passagem pelo bairro, se dirigiu a mim para perguntar se era seguro ficar sentada no banco do canal 5 para descansar um pouco da sua caminhada, visto que não era moradora e só estava de passagem. A partir deste fato, vi que era sim importante inserir a perspectiva de outras mulheres durante o meu caminhar. Mapa 5 - Sensações e Percepções Pessoais – Caminho 1

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.

Outras perspectivas foram coletadas para o enriquecimento da visão do caminho 1, onde três anônimas não identificadas, desta vez moradoras do bairro, deram seus depoimentos sobre como se sentiam ao utilizar o bairro, sendo eles: (1) “Me sinto segura, mas evito andar a noite sozinha e prefiro andar pelos canais”; (2) “Me sinto segura o tempo todo, é um bairro bom pra se morar”; (3) “Só me sinto segura de dia, a noite nem pensar”. Havia um número considerável de mulheres naquele espaço, estando elas acompanhadas por outras mulheres, com homens, crianças, cachorros ou sozinhas,


até mesmo aquelas com passo apressado, conduzido com cuidado por caminhos selecionados. Além disso, foram pontuadas por mim algumas sensações, como: calor, solidão, mal cheiro, tristeza, medo, confusão e tranquilidade. Como também o assédio verbal sofrido uma vez durante a caminhada. Para começar a permear o caminho 2 (Mapa 6) foi necessário coragem. Sendo este o caminho com o maior número de assédio sofrido durante as caminhadas, mesmo percorrendo uma distância relativamente curta. As ruas possuíam uma grande quantidade de oficinais e de uma praça pouco movimentada, logo, as sensações documentadas durante o caminhar entre as ruas foram: temor, incômodo, medo, solidão e apreensão. Mapa 6 - Sensações e Percepções Pessoais – Caminho 2

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.

Visto que não houve presença de nenhuma figura feminina ao caminhar nas ruas adjacentes da avenida, somente foi possível ter interações ao chegar na Av. Josino José de Almeida – que possui um grande numero de comércios e serviços -, onde três moradoras trouxeram as suas percepções sobre o bairro, sendo elas: (1) “Não saio tanto a pé, geralmente ando de carro, pois tenho medo”; (2) “Não tenho muito medo, acho que o bairro relativamente seguro, só nos domingos que fica sem


movimento e dá medo”; (3) “De dia é tranquilo, a noite nem pensar”. Vale complementar que as sensações e percepções vivenciadas durante o caminho foram de tranquilidade, sombra, arborização abundante e barulho de automóveis. Uma percepção sobre o caminho 3 (Mapa 7) foi de que naquela área em especifico do bairro há uma diferenciação na disposição das tipologias construtivas, sendo esta a avenida que provem de mais residências térreas, visto que nas outras há um grande maciço de comércios, serviços e prédios residências. Mapa 7 - Sensações e Percepções Pessoais – Caminho 3

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.

Com base nesta percepção, foi visto que o uso das ruas e avenida daquele trecho se dá de forma um pouco diferente das demais, podendo ser observado crianças brincando nas calçadas, como também pessoas sentadas na porta de suas residências, causando um certo tipo de tranquilidade. Algumas das outras percepções e sensações foram: arborização, tranquilidade, solidão, calor, assédio e medo. Foi visto, a grosso modo, diante as interações com outras mulheres que o fato da falta de iluminação pública, a ausência de pessoas durante momentos do dia e semana se tornam a indicação principal de insegurança.


Uma vez que os canais são os espaços com o maior número de mulheres fazendo atividade física, visto que estes são os únicos locais públicos para a realização com tal objetivo, foi observado que o uso das praças é dado predominantemente pelo o público masculino 3.3 MAPA DE SENSAÇÕES COLABORATIVO Quais sensações o bairro Farolândia desperta em você? Esta foi a pergunta chave para a elaboração desta seção, que teve o objetivo de coletar dados quantitativos, a fim de apresentar estatísticas. Com este intuito, foi utilizada a plataforma Google Forms para elaboração de um formulário denominado de "Sensações Urbanas", com a finalidade de coletar diferentes tipos de sensações físicas, emocionais, espaciais e etc., durante a observação das 10 imagens - de diferentes locais da Farolândia, como foi ilustrado no Mapa 8 - que se encontrava no formulário. Mapa 8 - Mapa Base – Pontos Fotografados

Fonte: Desenvolvido pela Autora com Mapbox e Canva (2022).


O questionário tinha a intenção de desenvolver o senso observatório das 10 imagens que se encontravam ali, obtendo depoimentos que exprimissem a experiência do local. O resultado da pesquisa deu origem ao Mapa das Sensações Urbanas. A abordagem promoveu a avaliação do caminhar de uma forma mais holística, possuindo um descritivo das sensações a partir dos 10 pontos inseridos através de fotografias inseridas no formulário, tratando de forma científica e estatística como é vista a caminhabilidade do bairro. Figura 19 - Enunciado do Formulário Google Forms

Fonte: Acervo da Autora, 2022.

Com base das respostas coletadas após 12 dias em que o formulário ficou disponível, foi feito o levantamento para a elaboração de gráficos nuvem, utilizando as palavras citadas. Os gráficos foram divididos por gênero, com a intenção de fazer um agrupamento das respostas entre mulheres, homens e não binários, afim de mostrar os resultados obtidos a partir de cada localidade representada com as fotografias.


Gráfico 1 - Mapa de Sensações - Identidade de Gênero

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Gráfico 2 - Mapa de Sensações - Idade

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.


Gráfico 3 - Mapa de Sensações - Raça

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.

O formulário dava continuidade com o preenchimento das sensações que cada imagem, transmitia individualmente, faria o participante sentir. Para isso, a seguinte pergunta foi feita: "Qual a sensação esta imagem desperta em você?”, existindo um espaço em branco, permitido a escrita livre, sem influência, apenas com uma margem de uma a cinco sensações para cada imagem. Portanto, a seguir, são demonstrados os resultados das 10 imagens acompanhadas dos seus respectivos gráficos nuvem, divididos entre os gêneros. Nos gráficos foram utilizadas todas as sensações apresentadas no formulário. É importante salientar que o funcionando do gráfico nuvem se dar de forma que cada palavra tem seu tamanho regido pela relevância, onde aquelas que mais se repetiram ficarão maiores e as que menos se repetiram serão menores.


Figura 20 - Rua Carlos Pereira de Melo

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Gráfico 4 - Imagem 1 - Mulheres

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Gráfico 5 - Imagem 1 - Homens

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.


Figura 21 - Rua Franca

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Gráfico 6 - Imagem 2: Mulheres

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Gráfico 7 - Imagem 2 - Homens

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.


Figura 22 - Rua Edson de Cunha Lima

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Gráfico 8 - Imagem 3 - Mulheres

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Gráfico 9 - Imagem 3 - Homens

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.


Figura 23 - Rua Fernando Maia

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Gráfico 10 - imagem 4: Mulheres

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Gráfico 11 - Imagem 4: Homens

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.


Figura 24 - Rua Professora Ofenísia Freire

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Gráfico 12 - Imagem 5: Mulheres

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Gráfico 13 - Imagem 5 - Homens

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.


Figura 25 - Av. Maria Pastora

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Gráfico 14 - Imagem 6: Mulheres

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Gráfico 15 - Imagem 6: Homens

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.


Figura 26 - Rua A Um

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Gráfico 16 - Imagem 7 - Mulheres

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Gráfico 17 - Imagem 7 - Homens

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.


Figura 27 - Rua A

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Gráfico 18 - Imagem 8 - Mulher

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Gráfico 19 - Imagem 8 - Homens

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.


Figura 28 - Av. Josino José de Almeida

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Gráfico 20 - Imagem 9 - Mulheres

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Gráfico 21 - Imagem 9 - Homens


Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Figura 29 - Rua B.

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Gráfico 22 - Imagem 10 - Mulheres

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022. Gráfico 23 - Imagem 10 - Homens

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.


Não foi possível realizar gráficos nuvem através das respostas do gênero não binário, pois, somente uma pessoa relacionada a esse gênero teve participação durante a pesquisa, visto que seria necessário um volume expressivo de respostas para gerar um quantitativo. No entanto, foi criado um gráfico pizza, este ilustrado no gráfico 24, com sensações que mais se repetiram em relação a este gênero em específico. Gráfico 24 - Sensações – Gênero Não Binário

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.

Logo após verificar as respostas de cada gênero em todas as imagens apresentadas, viu-se a necessidade de fazer um levantamento sobre as principais sensações sentidas a partir dos marcadores de gênero. Dentre as mulheres, as sensações que mais se destacaram, na devida ordem de grandeza, foram: Medo (42,1%); Insegurança (26,3%); Assédio (15,8%); Ansiedade (5,3%); Desespero (5,3%); Tranquilidade (5,3%). Dentre os homens, as sensações que mais se destacaram, na devida ordem de grandeza, foram: Tranquilidade (28,6%); Paz (21,4%); Calor (21,1%); Assalto (14,3%); Insegurança (7,1%); Medo (7,1%).


Gráfico 25 - Principais Sensações - Mulheres

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.

Gráfico 26 - Principais Sensações - Homens

Fonte: Elaborado pela Autora, 2022.

Após a comparação dos resultados, foi possível observar uma alternância nas sensações entre os dois gêneros, visto que o medo ocupa o primeiro lugar no gráfico das mulheres e último lugar no gráfico dos homens, assim como a tranquilidade ocupa o primeiro lugar no gráfico masculino e último lugar no gráfico feminino, mostrando que as distinções se sobressaem e caracterizam-se de forma mais significativa quando comparadas entre os gêneros.


4. INTERVINDO NO ESPAÇO PÚBLICO Desenvolvidas com propósito de transmitir mensagens a fim de questionar e transformar a vida cotidiana nos espaços públicos, intervenções urbanas são realizadas de diferentes maneiras, sendo elas macro ou micro, como grandes instalações artísticas ou até mesmo adesivos distribuídos em locais distintos na cidade. Sendo assim, ao semear questões que provocam discussões em toda a população, é vista a possibilidade de dialogo entre pesquisador e participantes, dada de forma diretamente ou indiretamente, sendo capaz de mostrar também que intervenções urbanas fazem parte da construção de espaços da cidade. Ou seja, a história está em ações presentes, passadas e para futuros assuntos a serem estudados. As intervenções citadas aqui, expõem ideias sobre como é necessário pensar em políticas públicas que visam o direito à mulher na cidade, tornando este assunto vibrante no sentido de que as cidades não são pensadas para o publico feminino. Apresenta-se aqui algumas destas intervenções, que serviram, de alguma maneira, como inspiração para a realização das intervenções realizadas pela autora e compartilhadas nas sessões seguintes. •

Cala a boca já morreu! Segundo publicação no Jornal da USP (2021) o trabalho teve início em 2019,

quando Ana Teixeira, a partir da pergunta “O que você não quer mais calar?”, recolheu depoimentos de 101 mulheres em quatro locais: o Centro Universitário Maria Antonia da USP, a Ocupação 9 de Julho, a Casa das Rosas, na Avenida Paulista, e em Colônia, na Alemanha, a convite da Universidade de Colônia. “Eu não vou me calar.” “Por que minha liberdade te incomoda?” “Quem manda na minha vida sou eu.” “Eu quero ser protagonista da minha história.” “Meu corpo não é público.” Ecoadas pelas vozes das 101 mulheres, frases como essas poderiam ser escutadas nas proximidades da Biblioteca Mário de Andrade, na Rua Consolação, em São Paulo. A frase-título do projeto estampou a fachada da biblioteca (Figura 30), além de possuir também, no jardim, 16 caixas de som funcionando todos os dias, durante 8 horas seguidas.


Figura 30 - Intervenção Cala a Boca já morreu!

Fonte: Ana Teixeira, 2021.

Na época, a artista visual estava se aprofundando em temáticas ligadas ao feminismo, questão que sempre esteve presente em sua vida, através de leituras teóricas. Logo, decidiu que faria um trabalho com mulheres. Ana cita que “a frase ‘cala a boca já morreu, quem manda na minha boca sou eu’ é muito comum no interior, na minha geração. Eu sempre gostei dela e pensava em fazer um trabalho com a frase um dia”, diz Ana. O ditado popular combinou com a ideia da artista. “Pensei que essa era uma frase própria para as mulheres.” Ana conta que, por vezes, as conversas se transformaram em rodas de discussão entre várias mulheres, que se identificavam com as respostas umas das outras. “A maioria das queixas era em relação ao patriarcado, ao machismo, aos homens. São pouquíssimas as frases que não falam sobre isso”, afirma Ana. “Inclusive em Colônia, onde eu achava que isso não iria acontecer, por pensar que talvez fosse diferente na Europa. Mas as questões do assédio no espaço público e do corpo feminino foram muito semelhantes.” Segundo a artista, seu trabalho sempre foi marcado pelo ativismo, buscando fornecer uma forma de escuta no espaço público. Para ela, dar voz às frases trouxe força à leitura. Ana, que já fez trabalhos anteriores com instalações sonoras, diz gostar muito do recurso. Por isso, diante do espaço físico limitado que tinha disponível para a intervenção na biblioteca, chegou à ideia de caixas de som em pedestais. “Ficou como um exército de novo, o mesmo batalhão de mulheres que desenhei no Maria Antonia e no MAB. Elas estão em pé, olhando para a rua, e ressoam as 101 vozes. Ficou potente”, observa a artista.


Meu voto será feminista Intervenção realizada pelo Feminicidade, um coletivo feminista, que busca

ocupar o espaço público com histórias de mulheres e seus olhares, valorizando e dando visibilidade às mesmas. Segundo o site do coletivo, seu objetivo é “desnaturalizar violências contra a mulher e estimular o fortalecimento feminino por meio da identificação e empatia com narrativas femininas”. O Feminicidade trabalha com diversas ações, em diferentes frentes, sendo as principais: Intervenções urbanas; Ações virtuais; Trocas de histórias e eventos e Advocacy. “Meu voto será feminista”, é um projeto-ação com foco no impulsionamento de mulheres feministas na politica institucional, que através da intervenção de lambes distribuídos em âmbito nacional, dá visibilidade as candidatas, convocando aliadas e investindo, de forma permanente, numa cultura para o voto feminista. Figura 31 – Ilustrações de lambes “Meu voto será feminista”

Fonte: https://feminicidade.com/campanhas/, 2020.


Este movimento foi idealizado por ser uma maneira de estabelecer relação, seja ela afetiva, religiosa ou politica. Sendo ele uma dedicação de um tempo, ou de algo valioso, a alguma coisa que acreditamos ou desejamos profundamente. Um voto de confiança só é dado a alguém com quem desejamos construir uma relação importante. Um voto de amor é dado a alguém com quem desejamos construir uma relação de entrega e afeto. No processo eleitoral, o voto é um manifesto oficial que declara uma preferencia, um desejo, uma definição por representação. Sendo ele, um direito a ser conquistado, e por isso, ele deve ser defendido. Com o desejo de serem reconhecidas e se sentirem representadas em todas as esferas de poder, é preciso o incentivo para que mais mulheres feministas estejam apoiadas, seguras, para o desafio de uma candidatura. Querer escolher e definir tudo sobre o que toca e é urgente, pautando a vida das mulheres, o direito sobre seus corpos como fundamento de luta, priorizando o enfrentamento radical do racismo, a exploração e as violências físicas, simbólicas e históricas. É o querer em ver mulheres elaborando e executando politicas publicas. Desta maneira, o coletivo desenvolveu diversas artes em forma de lambes para que pudesse realizar, de forma online, a distribuição em âmbito nacional para a colagem dos mesmos em diversas localidades do país (Figura 31). 4.1 ANSEIO INICIAL: O CAMINHAR DAS MULHERES NA CIDADE Foi a partir da experiência vivenciada na disciplina Teoria e Critica da Arquitetura e da Cidade VI (2020.1), ministrada na graduação pela Profª Pedrianne Dantas, na qual desenvolvi uma intervenção urbana intitulada “O Caminhar da Mulher na Cidade”, que me ocorreu a vontade de fazer aquilo crescer de forma mais branda, florescendo então a ânsia para a idealização deste TFG. Com o intuito de levar dados sobre a experiência das mulheres nas ruas da cidade, durante o primeiro ano da pandemia da COVID-19, em meados de novembro de 2020, esta intervenção foi realizada na cidade natal da autora, Cruz das Almas, no interior da Bahia, situada no Recôncavo Baiano. A intervenção foi feita através de cartazes colados em pontos chaves, afim de espalhar frases de efeito e dados de uma campanha Cidades Seguras para as Mulheres, feita pela ActionAid no Brasil, em 2014, mostrando que o Brasil lidera a taxa


de assédio de mulheres em espaços públicos, listando alguns destes assédios sofridos pelas mulheres e seus respectivos porcentuais de acontecimentos. Figura 32 - Cartazes utilizados na intervenção

Fonte: Elaborado pela autora, 2020.

Desta forma, a fim de levar informação, estes cartazes foram inseridos próximos a locais específicos com o maior nível de assédio na cidade, como bares, oficinas, praças, construções, ponto de táxi, entre outros. A ação foi realizada pela a autora e mais seis voluntárias, o intuito era de que fosse necessária a presença de mais mulheres durante a colagem dos cartazes pela cidade, a fim de criar um coletivo feminino durante o ato, que aconteceu no dia 05 de novembro de 2020, durante o turno da tarde.


Figura 33 - Autora e voluntárias da intervenção.

Fonte: Acervo da autora, 2020.

Os locais de escolha para fixação dos cartazes foram pré-definidos antes da realização da colagem, em uma reunião para esclarecimentos de como seria feito o ato, onde deveria ser aplicados os cartazes e para a identificação coletiva sobre as informações contidas nos mesmos, que houve de forma foi imediata por todas as voluntárias. Os materiais foram colados em muros, postes, fachadas abandonadas, ponto de táxi e em estabelecimentos que permitiram a colagem dos mesmos em suas fachadas, como padaria, oficinas, bares, loterias e bancos. No decorrer da execução, foi vivenciado diversas formas de assédio, buzinas de carros e motos, conduzidos por homens que diminuía a velocidade para tal, assim como assobios, “fiu fiu” e agressões verbais em um local específico durante o trajeto.


Figura 34 - Autora e voluntária colando cartazes em muro.

Fonte: Acervo da autora, 2020. Figura 35 - Voluntárias realizando colagem em ponto de táxi da cidade.

Fonte: Acervo da autora, 2020.


Figura 36 – Autora e voluntária aplicando cartaz em poste

Fonte: Acervo da autora, 2020. Figura 37 - Mulher demonstra interesse pelo cartaz.

Fonte: Acervo da autora, 2020.


Por se tratar de um grupo de mulheres fazendo algo juntas, chamou a atenção de várias pessoas que observavam e perguntavam do que se tratava, desta forma, quando era explicado o motivo da movimentação, houve muitas palavras de afirmação entre as pessoas sobre a intervenção, como pode ser visto na Figura 18, uma mulher que se aproxima do cartaz e compartilha o sentimento ao ver o objeto exposto na parede “eu me identifiquei com o cartaz na hora em que vi escrito o nome ‘mulher’, ótima iniciativa, parabéns!”. O desenvolvimento deste trabalho trouxe uma visão enriquecedora sobre como pode ser envolvente, proveitoso e significativo o criar intervenções na cidade, pois é possível ver a interação de pessoas ao se identificam com a arte espalhada por dentre os espaços público, criando uma afinidade para com tal. Mostrando, nesta intervenção, em como há uma importância no olhar a cidade sob a perspectiva de gênero. 4.2 INTERVENÇÃO URBANA NA FAROLÂNDIA Seguindo a mesma lógica da intervenção apresentada no item 4.1, foi utilizado o método de uso de cartazes inseridos no espaço público, mais precisamente no bairro Farolândia, objeto de estudo. A estratégia foi escolhida por alguns motivos: (1) pela intenção de utilizar a arte no ambiente urbano à ser apresentado neste Trabalho Final de Graduação, (2) ter vivenciado uma experiencia positiva quando foi realizada a intervenção apresentada anteriormente, (3) querer desenvolver um diálogo através da arte desta vez, dedicada exclusivamente ao público feminino. No entanto, ao contar com as interações físicas de pessoas com a arte, foi aguardada uma resposta positiva quanto ao que foi desenvolvido para os cartazes distribuídos no espaço público. Para isso, foram desenvolvidos pela autora duas tipologias destinados somente as mulheres – dado que a figura feminina seja o elemento principal para que este trabalho tenha sido, de fato, pensado, planejado e desenvolvido. Desta maneira, visto que a palavra ASSÉDIO e MEDO foram umas das que mais se repetiram durante a pesquisa de sensações (seção 3.3), foram utilizadas essas palavras chaves para a criação dos cartazes.


Figura 38 - Cartaz Intervenção: Medo

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Figura 39 - Cartaz Intervenção: Assédio

Fonte: Acervo da Autora, 2022.


Para a confecção destes, foi desenvolvida, pela a autora, o design dos cartazes de forma digital e concluído de forma manual, utilizando envelopes feitos manualmente e pequenos símbolos da figura feminina em papel adesivo, que foram distribuídos dez unidades em cada painel, facilitando a colagem durante o dia a dia de quem avistar os cartazes. Sendo esta uma forma rápida e descomplicada ao coletar respostas. Figura 40 - Intervenção: Finalização Manual de Cartazes

Fonte: Acervo da Autora, 2022.

Durante as caminhadas pessoais e pesquisa feita sobre como é dada a locomoção dos participantes, foi entendido que os lugares de maior permanência destas mulheres no bairro são ainda os pontos de ônibus, estes situados nas avenidas principais do estudo (Av. Murilo Dantas, Av. José Tomaz D’Ávila Nabuco, Av. Josino José de Almeida e Av. Caçula Barreto), por ser o tipo de locomoção mais utilizadas pelas mulheres que participaram da pesquisa, como foi ilustrado no gráfico 27. Com isso, foram escolhidos alguns pontos de ônibus para distribuição e colagem dos cartazes.


Gráfico 27 – Como é dada a locomoção das mulheres

Fonte: Elaborado pela autora, 2022.

Para melhor configurar a espacialidade dos cartazes no bairro, foi realizado um mapa ilustrativo (mapa 9), para indicar a situação de cada um. Mapa 9 - Mapa Base – Mapeamento dos Cartazes

Fonte: Acervo da Autora, 2022.


Figura 41 - Colagem de Cartaz em ponto de ônibus

Fonte: Acervo da Autora, 2022.

Ao realizar a colagem em alguns destes, houve a presença de mulheres no local, gerando uma certa curiosidade sobre o que estava sendo transmitido a partir da arte exposta, onde gerou interações e trocas entre aurora e mulheres anônimas. Interações estas que foram em ser solícitas a ajudar no momento de colagem, como também em conversar sobre o tema e externar como se sentiam. Desta forma, de maneira instantânea, os adesivos começaram a ser colados nos cartazes, mostrando uma resposta positiva quanto a intervenção. Algumas das falas destas mulheres, que compartilharam seus sentimentos de forma transparente, foram apropriadas para aqui serem citadas: "Quem não sente medo, né minha filha?"; "Hoje em dia todas nós sentimos medo, né?". Mostrando mais uma vez, como já foi visto após coleta de dados na seção 3.3, como a grande maioria das mulheres se sentem ao caminhar no bairro, com medo e insegura. No entanto, após um dia de intervenção, foi visto que os cartazes receberam muitas interações, mostrando mais uma vez uma resposta positiva a intervenção.


Figura 42 - Cartazes inseridos na Av. Murilo Dantas

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Figura 43 - Cartazes inseridos na Av. José Tomaz D’Ávila Nabuco

Fonte: Acervo da Autora, 2022.


Figura 44 - Cartazes inseridos na Av. Josino José de Almeida

Fonte: Acervo da Autora, 2022. Figura 45 - Cartaz inserido na Av. Caçula Barreto

Fonte: Acervo da Autora, 2022.


Em resumo, independentemente do ato de vandalismo – atitude dada provavelmente por incômodo do que se tratava as mensagens -, sobre os envelopes existentes nos cartazes na Figura 44 terem sidos arrancados, foi visto um resultado positivo sobre intervenção, pois foi possível observar que, apesar do pouco tempo de permanência nos espaços, ocorreu de se apurar um grande numero de interações, visto que os envelopes contavam com 10 unidades cada do símbolo feminino, como também teve a obtenção de dar visibilidade à violência contra a mulher, gerando participação nos espaços públicos sobre o assunto.


5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Chegamos ao fim desde presente trabalho e compreendemos que, apesar de reflexões sobre os corpos, espaço e gênero discutidas aqui, ser mulher e viver a cidade não é tarefa fácil, visto que há questões que permeiam a vida urbana feminina, que influenciam no caminhar, no pensar, na vestimenta e na forma de agir. Ao realizar análises sobre o caminhar destas mulheres no bairro, foi possível descobrir as suas sensações ao executar tal movimento, trazendo resultados de que uma vez que estes caminhos são feitos, eles são vivenciado principalmente através do medo e insegurança, afirmando a pesquisa inicial apresentada neste Trabalho Final de Graduação, mostrando que, apesar da existência de muitas questões culturais inseridas na sociedade atual, iniciativas de projeto e gestão publica ofertaria melhorias na vida das mulheres na cidade. A partir da pesquisa sobre as sensações foi possível concluir que as vivencias femininas são dadas de forma discrepante das vivencias masculinas durante o caminhar na cidade, mostrando como o gênero influencia de forma direta a forma de permear nas cidades. Vale salientar que, através dos estudos feitos a partir deste trabalho, foi vista a necessidade de uma abordagem mais abrangente quanto ao tema, levando em conta ao numero de mulheres que se consideravam brancas durante a pesquisa, mostrando carência no desenvolvimento de estudos voltados com o olhar para outras raças. Sendo assim, é necessário pensar em um planejamento urbano que atenda as minorias -mulheres, crianças, idosos, deficientes físicos-, se tornaria uma experiencia prazerosa para todos aqueles que utilizam a cidade e que a utilizam para realizar atividades cotidianas de lazer no meio urbano.


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