Exedra

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CORPO EDITORIAL Diretora Maria de Fátima Fernandes das Neves Editor do número temático Pedro Balaus Custódio Conselho Científico Maria do Amparo Carvas Monteiro - Artes e Humanidades Pedro Balaus Custódio - Educação/Formação Maria Cláudia Perdigão Andrade - Comunicação e Ciências Empresariais

FICHA TÉCNICA Revisores deste número Isabel Sofia Calvário Correia, Leonor Crespo Ramos Riscado, Lola Geraldes Xavier, Natália Albino Pires, Pedro Balaus Custódio, Rosa Maria Nazaré Oliveira Produção Escola Superior de Educação do Instituto Politécnico de Coimbra Execução gráfica - José Pacheco (NDSIM) ISSN 1646-9526 | ISBN 978-9898486-01-1 | D.L. 324363/11 Copyright A reprodução de artigos, gráficos ou fotografias da Revista EXEDRA só é permitida com autorização escrita da Diretora.

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Editorial

As Raízes Greco-latinas da Língua Portuguesa e

31 Escrever: Processo e emoção nos

a sua importância no ensino do Português Gabriela Barroso de Almeira & Ana Miguel de Paiva

alunos do ensino básico

Luís Filipe Barbeiro

47 57 67 Brincando às/com as conjunções

Entre Línguas se(des)constrói o texto: interfe-

Maria Alice Simões Cardoso

rências linguísticas da Língua Gestual Portu-

Fonológica e Diversidade Textual

guesa no Português

Isabel Sofia Calvário Correia & Rita Maria

Isabel Sofia Calvário Correia

75 A história e as histórias do género em português: percursos diacrónicos, sincrónicos e pedagógicos josé António Costa & Celda Morgado Choupina

Aqui há Som: Consciência

Ribeiro Gonzalez

e c i d in

87 109 121 Experiências significativas de leitura no 2º CEB - Representatividade e qualidade dos textos literários

A tradução e interpretação de pro-

A Flor vai pescar num Bote: uma dualidade

vérbios e expressões idiomáticas em

pictórica

língua gestual - equivalentes

Anabela de Oliveira Figueiredo

linguísticos e culturais

Pedro Balaus Custódio

Maria José Duarte Freire

129 139 151 Possibilidades e pontos de resistência Influencia de las creencias de las docentes en el na recepção do Plano Nacional de Lei-

processo de alfabetización inicial

tura - Para uma análise de práticas de

Maria do Céu Ferreira Gomes

leitura Maria José Gamboa

04

A Educação Bilingue de Alunos Surdos.Da Legislação às Práticas

Maria do Céu Ferreira Gomes


179 Era uma vez… o verbo: abordagem do verbo

161 189 no 1º ano Gestuar e Ouvir: Divergências e Con-

vergências entre CODA licenciados

Maria João Loureiro

em Tradução e Interpretação em Línguagem Gestual Portuguesa e os não-CODA licenciados em Língua Gestual Portuguesa

Luísa Gonçalves

Building bridges between texts: From Intertextuality to intertextual reading

197 Sensibilização ao género e ao número gramaticais no Pré-escolar

and learning. Theoretical challenges and classroom resources Tzina Kalogirou & Vasso Economopoulou

Anabela Marques Esgalhado Fonseca Machado

211 219 229 Gente de papel e tinta: A construção Literacia Familiar e Desenvolvimento de Comde personagens numa oficina de Escrita Criativa

petências de Literacia Lourdes Mata

João de Mancelos

Ler no ecrã: contributo para uma reflexão sobre estratégias de ensino da leitura na aula de Português Dulce Helena M. R. Melão & João Paulo R. Balula

259 271 243 Conhecimento lexical e consciência

Ensinar português/LE na Universitat de Barce-

O trabalho com a escrita na escola:

lona Ensinar português/LE em Portuga

modos de (des)envolvimento e pro-

Rosa Oliveira & Ignacio Vázquez

postas de didactização nos 1.ºs ciclos de ensino

morfológica em alunos chineses de

Luísa Álvares Pereira & Luciana Graça

PLE: reconhecimento, interpretação e

285 295

utilização de elementos prefixais do português Susana Margarida Nunes

O avental das estórias. Um projeto do agrupamento de escolas de Buarcos Isabel Oliveira & Mª Albertina Pereira

05

Aprender a Arte de Escrever no 1º CEB

- o contributo do PNEP Cristina Pinto


309 321 341 Inferindo o conhecimento linguístico

Os Manuais Escolares do 3.º ano no Ensino

“Bom Português” – para tudo apren-

de crianças do 1º CEB a partir das suas

da Compreensão de Leitura

der… e aprender a usar, em todas as

produções textuais

Maria Helena Santos Ramos

disciplinas Branca Luísa dos Santos Rodrigues

Natália Albino Pires

363 373 379 Transversalidade da língua portuguesa: representações, instrumentos, prá-

Aspeto verbal na LGP Neuza Santana

“Olhos que ouvem... Mãos que falam. Aprendizagem da Língua Gestual Portuguesa por parte de Alunos

ticas e formação

Ouvintes”

Cristina Manuela Sá

Gabriela Cristina Ribeiro Silva

387 401 413 SignWriting: um sistema de escrita

Crescer bilingue: As crianças ouvintes filhas

“Sonhar, mas um sonho possível”: a

das línguas gestuais. Aplicação à Lín-

de pais surdos

realidade em torno de um projeto de

gua Gestual Portuguesa

Joana Rita da Silva Conde e Sousa

Rafaela Cota da Silva

leitura Keila Vieira de Sousa

421 433 447 Programas de Português do Ensino

NPP - Desenvolver a competência de escrita

Secundário em Portugal e no Brasil:

Graça Trindade & Madalena Relvão

orientações teóricas

Aprender a compreender. Da teoria à

prática pedagógica Fernanda Leopoldina Viana, Iolanda Ribeiro, Sandra Cristina Santos & Irene Cadime

Souza, Marinete Luzia Francisca & Messias, Carla

467 Ensinar Gramática pela Abordagem Ativa de Descoberta Lola Geraldes Xavier

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Editorial

É com grande satisfação que a Exedra publica mais um número integralmente consagrado ao

ensino do Português. No trilho da anterior edição de 2009, o título agora disponibilizado constitui uma nova etapa na apresentação periódica de investigações e de boas práticas neste âmbito.

A aprendizagem de uma língua não é uma tarefa conclusa, nem tão-pouco um domínio que

não esteja sujeito a constantes estímulos e renovações. Ensinar e aprender constituirão sempre tarefas que colocam a todos desafios permanentes. Assim, a divulgação destas coletâneas de estudos decorre da necessidade de partilha de saberes, de experiências e, sobretudo, de reflexões sobre linhas investigativas no ensino do Português.

O presente volume integra, pois, diferentes e variadas abordagens teórico-práticas, algumas

delas apresentadas no decurso do II Encontro Internacional de Ensino do Português, em fevereiro de 2011, bem como outros estudos produzidos no decurso de projetos de mestrado e de doutoramento, desenvolvidos na ESEC e em distintas instituições de ensino superior. Prova-se, mais uma vez, a vitalidade de diversas dinâmicas formativas que estão a ser continuamente alimentadas por pesquisas académicas. Outras delas são, também, o resultado de boas práticas levadas a cabo nos territórios educativos.

Muitos desses estudos recentes têm-nos alertado, por exemplo, para as dificuldades em domí-

nios específicos, como é o caso, entre outros, da compreensão da leitura, dando-nos razões para nos mantermos atentos a estes obstáculos no quotidiano letivo. O mesmo se passa com o ensino explícito da língua, que deve ser recolocado como um dos centros vitais e nucleares da aprendizagem do Português. O conhecimento gramatical facilita e promove competências nos domínios da oralidade, da leitura e da escrita e, portanto, constitui uma força motriz capaz de propulsionar o ensino da língua.

A pertinência desta temática traduz-se no relevo conferido a algumas abordagens sobre as-

petos nucleares do ensino da gramática e fazem sobressair a extrema importância deste domínio no conhecimento da língua e na mestria do Português, sobretudo à luz das novas orientações prescritas no Programa de Português recém-chegado ao ensino básico. 07


Mas há ainda uma outra área crucial que diz respeito à leitura, ao valor da literatura e à inse-

parabilidade do seu ensino, a par com o da língua materna. O ensino da literatura, através de textos significativos da nossa tradição e identidade cultural devem vir à tona das nossas práticas, em todos os graus de escolaridade, sem exceção.

Assim, e em clara sintonia com esta orientação, poderemos também partilhar algumas refle-

xões que incidem sobre o papel e o alcance do ensino da literatura, comprovando a imprescindibilidade do texto literário e o modo eficaz como ele cumpre os desígnios de fruição estética e o papel na formação cultural e linguística dos jovens leitores. A valorização da literatura nas práticas letivas, mediante o aproveitamento do texto literário deve, pois, constituir uma prioridade. Estas tipologias textuais constituem os mais autênticos e promissores materiais de leitura para quem aprende uma língua.

Certos aspetos que orbitam o encantamento que a literatura suscita ou que decorrem do Plano

Nacional de Leitura estão também vertidos em alguns estudos que aqui se encontram incluídos. Neles se perspetivam os desafios decorrentes da implementação nacional deste programa, e os modos como ele dinamiza e renova os modos de ler, na escola e fora dela. As TIC são hoje, também, uma realidade omnipresente. O ensino das línguas não se pode alhear deste novo estatuto das tecnologias da comunicação, sendo imperioso que a elas se alie, de modo produtivo e eficaz, num registo de complementaridade e de cooperação.

Como se poderá verificar, também os textos aqui incluídos, pela sua diversidade e ecletismo,

constituem um fórum de ideias e de projetos que estão em desenvolvimento no campo de ação do Ensino do Português. Assim sendo, este número da Exedra cumpre um dos objetivos da sua missão, que é consabidamente, ser um espaço de diálogo e de partilha de conhecimentos.

Alguns destes artigos veiculam pontos de vista investigativos provenientes de diversos graus

de ensino, desde o Básico ao Superior, e procedem, também, de vários países como a Espanha, a Grécia ou o Brasil. Este olhar múltiplo enfatiza a importância do Português como língua de crescente interesse 08

(...) olhar múltiplo

tância do Portuguê

crescente interess

plano geop


e destaque no plano geopolítico e, ainda, realça a permanente procura de soluções didáticas e as formas como elas se podem materializar em contextos e cenários geográficos diversos, muito para além

o enfatiza a impor-

ês como língua de

se e destaque no

político (...)

das nossas fronteiras nacionais.

De igual modo, há outros estudos que comentam o ensino e a promoção da leitura em dife-

rentes ciclos de escolaridade, realçando a sua importância enquanto atividade fundante. Alguns dos textos revelam-nos contributos novos e originais sobre essa competência e inauguram caminhos inéditos sobre o seu entendimento e aplicação em contexto didático. O mesmo se verifica com a escrita, outro dos subdomínios aqui representado, comprovando-se a sua centralidade por entre as práticas de ensino. Presentemente, a didática da escrita é um lugar de permanente revisitação e um objeto de trabalho que exige constantes experimentações, de modo a apurar soluções metodológicas atrativas, envolventes e eficazes para alunos de todas as idades

As TIC são hoje, também, uma realidade omnipresente. O ensino das línguas não se pode alhe-

ar deste novo estatuto das tecnologias da comunicação, sendo imperioso que a elas se alie, de modo produtivo e eficaz, num registo de complementaridade e de cooperação.

Como se poderá verificar, também os textos aqui incluídos, pela sua diversidade e ecletismo,

constituem um fórum de ideias e de projetos que estão em desenvolvimento no campo de ação do Ensino do Português. Assim sendo, este número da Exedra cumpre um dos objetivos da sua missão, que é consabidamente, ser um espaço de diálogo e de partilha de conhecimentos.

Alguns destes artigos veiculam pontos de vista investigativos provenientes de diversos graus

de ensino, desde o Básico ao Superior, e procedem, também, de vários países como a Espanha, a Grécia ou o Brasil. Este olhar múltiplo enfatiza a importância do Português como língua de crescente interesse e destaque no plano geopolítico e, ainda, realça a permanente procura de soluções didáticas e as formas como elas se podem materializar em contextos e cenários geográficos diversos, muito para além das nossas fronteiras nacionais. 09


Mas há ainda uma outra área crucial que diz respeito à leitura, ao valor da literatura e à inse-

parabilidade do seu ensino, a par com o da língua materna. O ensino da literatura, através de textos significativos da nossa tradição e identidade cultural devem vir à tona das nossas práticas, em todos os graus de escolaridade, sem exceção.

Assim, e em clara sintonia com esta orientação, poderemos também partilhar algumas refle-

xões que incidem sobre o papel e o alcance do ensino da literatura, comprovando a imprescindibilidade do texto literário e o modo eficaz como ele cumpre os desígnios de fruição estética e o papel na formação cultural e linguística dos jovens leitores. A valorização da literatura nas práticas letivas, mediante o aproveitamento do texto literário deve, pois, constituir uma prioridade. Estas tipologias textuais constituem os mais autênticos e promissores materiais de leitura para quem aprende uma língua.

Certos aspetos que orbitam o encantamento que a literatura suscita ou que decorrem do Plano

Nacional de Leitura estão também vertidos em alguns estudos que aqui se encontram incluídos. Neles se perspetivam os desafios decorrentes da implementação nacional deste programa, e os modos como ele dinamiza e renova os modos de ler, na escola e fora dela. De igual modo, há outros estudos que comentam o ensino e a promoção da leitura em diferentes ciclos de escolaridade, realçando a sua importância enquanto atividade fundante. Alguns dos textos revelam-nos contributos novos e originais sobre essa competência e inauguram caminhos inéditos sobre o seu entendimento e aplicação em contexto didático. O mesmo se verifica com a escrita, outro dos subdomínios aqui representado, comprovando-se a sua centralidade por entre as práticas de ensino. Presentemente, a didática da escrita é um lugar de permanente revisitação e um objeto de trabalho que exige constantes experimentações, de modo a apurar soluções metodológicas atrativas, envolventes e eficazes para alunos de todas as idades.

O labor sobre as competências de oralidade e o seu papel na sala de aula é outro dos temas

que se constitui como objeto de reflexão teórica. A estes estudos não escapam, ainda, as naturais e 10


necessárias reflexões que versam a transversalidade do Português. Com efeito, esta preocupação suprassegmental com o domínio do Português deve marcar qualquer trabalho nesta área. As representações, os instrumentos, as práticas e a formação neste âmbito, são decisivos para compreender a centralidade na aprendizagem do Português, em todos os níveis de escolaridade. Por entre estes textos podemos deparar-nos, ainda, com algumas análises que tocam a literacia de adultos e projetos em torno da escolarização tardia de competências. Para além destes, é imperioso sublinhar de novo que este volume abrange um arco de interesses e de temas de largo espetro dentro do domínio do Português, quer como língua materna, quer como língua estrangeira. Assim, e por entre este elenco de estudos, podemos encontrar alguns que se debruçam sobre esta área de inquestionável relevo e atualidade: o ensino do Português língua não materna (PLNM) e, ainda, abordagens de caráter analítico e comparativo, de realidades programáticas e curriculares muito distintas.

O mesmo sucede com diferentes estudos que incidem sobre o ensino do Português como Língua

Segunda a surdos. Com efeito, este volume inclui um conjunto de reflexões de grande utilidade para todos aqueles que trabalham diretamente com o ensino da língua gestual. Assim, são abordadas questões essenciais da didática do PLNM adaptado ao público de alunos surdos, trabalho inédito a nível nacional, reflexões linguísticas e comparatistas em torno das duas línguas, o português e Língua Gestual Portuguesa (LGP) que motivarão, certamente o desbravar destas áreas, e se constituem como instrumentos de trabalho basilares na sala de aula das Escolas de Referência para o Ensino Bilingue de Alunos Surdos (EREBAS).

De facto, para se conseguir ensinar esta população, respeitando as diretrizes do Decreto-Lei nº

3/2008 de 7 de janeiro, temos de compreender esta minoria linguística. Também aqui são apresentadas reflexões sobre a identidade surda, o biculturalismo e o papel fulcral do intérprete. A LGP também pode ter uma vertente escrita, importantíssima para o estudo do PLNM, e que é aqui divulgada num estudo também inédito no nosso país. Olhando as crianças falantes de Português, é necessário contribuir para a formação em valores cívicos, culturais e linguísticos. Assim, aqui se vertem algumas propostas de materiais didáticos para o ensino da LGP. 11


Deste modo, e pela primeira vez na Escola Superior de Educação de Coimbra e, cremos, no

ensino superior português, a LGP encontra um espaço de reflexão e de debate ao lado da língua com que todos os dias contacta, o Português.

A encerrar esta breve nota introdutória, é obrigatório que deixemos algumas palavras expli-

cativas sobre o excessivo atraso a que esta edição se viu sujeita. A somar à proverbial, e cada vez mais aguda carência de estruturas de apoio, sobrevieram naturais alternâncias nos órgãos de direção desta revista. Adicionalmente, e fruto de diversos fatores, o NDSIM – Núcleo de Desenvolvimento de Sistemas Interativos e Multimédia, gabinete responsável pela parte técnica e compositiva desta edição, viu-se dramaticamente reduzido e, em simultâneo, obrigado a copiosas tarefas.

A este conjunto de obstáculos logísticos e técnicos, vieram juntar-se algumas demoras exces-

sivas por parte de vários autores que, com justificação, nos fizeram chegar os seus textos fora dos prazos estabelecidos. Outros houve ainda que, infelizmente, não reuniram condições para nos remeter atempadamente os seus artigos. Sendo essas as causas próximas, queremos penitenciar-nos por este prolongado compasso de espera editorial junto do público em geral, e dos autores em particular, apresentando a todos as nossas mais sinceras desculpas.

Esperamos, pois, que os textos que agora são dados à estampa possam constituir mais uma

etapa significativa na divulgação de estudos e de práticas, e que sejam, pelo seu interesse e novidade, capazes de contribuir para o enobrecimento do ensino da língua que nos é comum e que define uma parte tão substancial da nossa identidade.

O coordenador de edição

Pedro Balaus Custódio

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Ensinar Portugues LE na Universitat de Barcelona Ensinar Portugues LE em Portugal Rosa Oliveira & Ignacio Vรกzquez

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resumo

O ensino de qualquer língua estrangeira acarreta problemas que se revelam divergentes dependendo do par de línguas

confrontadas. No caso do português, deparamo-nos com questões muito subtis quando em diálogo com o espanhol, língua tão próxima e, simultânea e paradoxalmente, tão estranha. Tencionamos com este artigo dar notícia de alguns pontos de fricção no ensino do português a hispano falantes. Apontamos para a necessidade de uma gramática comparativa que vise o uso real dos dois idiomas. Palavras chave: português, espanhol, LE, gramática, atitude pedagógica

abstract

Teaching a foreign language presents several problems depending on the relationship between L1 and L2. If we consider

Portuguese and Spanish, two apparently very similar languages, we will discover that they are not so similar after all. The purpose of this article is to investigate and clarify some points of conflict in Portuguese language when taught to Spanish speakers. We require the need of a comparative grammar in the every day use of the language. Keywords: Portuguese, Spanish, L1/L2, grammar, pedagogical point of view

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O título desta comunicação advém da nossa experiência como professores de Português na Universitat de Barcelona

(onde coincidimos de 1996 a 1998) e das nossas reflexões posteriores e longas conversas desses anos a esta parte, continuando um de nós na referida universidade e regressada a outra à ESEC onde, entre outras docências, tem sido responsável por ensino do português a portugueses (LM), a estrangeiros (estudantes Erasmus - português LE) e, mais recentemente, a docentes que têm nas suas turmas alunos imigrantes e, portanto, se deparam com questões levantadas pelo ensino do português L2.

Será, no entanto, o português LE de que hoje trataremos, ainda que esta nossa reflexão possa remeter para as outras

possibilidades que acabamos de nomear.

Importa, desde já, esclarecer que, entre as várias caraterísticas e vicissitudes do ensino do português no estrangeiro

ocorre um facto que funciona simultaneamente como adjuvante e oponente numa ambivalência linguística e simbólica que, a ser aqui analisada, “daria pano para mangas”. Na verdade, frequentemente, no ensino superior no estrangeiro, o estudo do português está associado ao do espanhol – e vice-versa. Em muitos lugares da Europa e da América, apenas existe um departamento de Estudos Hispânicos em que as duas línguas e culturas peninsulares estão agregadas e os alunos, na sua maioria, estudam as duas, uma quase que por arrastamento da outra. No caso de Espanha, obviamente, a associação não é esta, mas antes a naturalíssima entre o português e o galego, como no caso da Universitat de Barcelona.

Atualmente em Barcelona, a designação genérica, após o plano de Bolonha, é aquela que vigora em Portugal há

já tempos, a de “Línguas e Literaturas Modernas”, onde se inserem o espanhol e o português entre outras línguas vivas. Ou seja, uma situação em tudo semelhante ao que se passa em Portugal.

Tendo pois como ponto de partida a nossa experiência comum como docentes na Universitat de Barcelona, gostaríamos

de propor uma breve reflexão acerca de alguns aspetos problemáticos com que os estudantes espanhóis (alguns com o catalão como língua materna) se deparam no processo de aprendizagem do português. Julgamos que a nossa contribuição pode ser proveitosa devido ao interesse crescente em Portugal pela língua espanhola, funcionando assim alguns dos temas que aqui serão tratados como contra-imagem reflexa de questões que ao ensino do espanhol se colocarão em Portugal e, mais genericamente, como hipóteses de abordagem de metodologias, estratégias, e até “truques” de bom senso no ensino do português como LE e como L2.

Entre muitos dos aspetos passíveis de análise, esta comunicação centrar-se-á em dois que

consideramos fundamentais:

1. A utilidade de uma gramática comparativa (português-espanhol).

2. A utilidade de um estudo coordenado das variantes portuguesa e brasileira: qual a atitude pedagógica, metodológica

ou normativa a ter. 15


Quanto ao primeiro destes dois destaques, podemos, desde já, assinalar um facto por todos nós bem conhecido: existe

a ideia generalizada e precipitada de uma grande semelhança entre o espanhol e o português construída, sobretudo, a partir da fácil constatação da partilha de um largo espetro de léxico. De um lado e do outro da fronteira, com mais ou menos boa vontade e inspiração, todos se acham capazes de falar Portunhol e, pelo menos quando se leem textos utilitários ou técnicos, a intercompreensão é alta. Mas, ao iniciarem o estudo sistematizado da língua portuguesa, os alunos espanhóis percebem rapidamente que o caminho será longo e complicado. Obviamente o mesmo se poderá dizer para situação paralela deste lado da fronteira. Aquilo que parecia ser uma navegação à vista, em breve mostra os seus escolhos. É o caso da especificação semântica do português que acarreta um assinalável esforço ao falante espanhol. Ao aprendermos inglês, por exemplo, aprendemos um outro universo linguístico. Tudo é desconhecido, (enfim, na verdade grande parte, se abstrairmos do muito léxico comum latino e grego) – tanto a palavra de raiz germânica,como a semântica a ela associada. Diversamente, quando estudamos uma língua próxima, como é o caso do português e do espanhol, deparamo-nos inicialmente com o facto de não precisarmos de aprender muito léxico novo ou, pelo menos, muito diferente do de raiz já conhecida para criarmos as primeiras frases, mas, quando percebemos que as mesmas palavras têm sentidos, usos ou especificações totalmente divergentes em cada uma das línguas, começam os verdadeiros problemas. E um emaranhado deles

. Não estamos a pensar apenas nos famosos falsos amigos, pois, quanto a estes, qualquer pessoa que contacte com estas

duas línguas irmãs, até os acha divertidos: La cena ha sido exquisita. / O jantar foi delicioso. Tiene un comportamiento raro. / Tem um comportamento esquisito. Tiene el pelo largo. / Tem o cabelo comprido.

El largo trayecto. / O longo percurso. La calle es ancha y larga. / A rua é larga e comprida.

Es una película espantosa. / É um filme terrível. Es una película maravillosa. / É um filme espantoso.

Ese niño es travieso. / Ese menino é traquina. Un nido de golondrinas. / Um ninho de andorinhas.

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Referimo-nos sobretudo a diferenças mais complexas como, por exemplo, o facto de uma e única

palavra espanhola com dez significados precisar de dez vocábulos diferentes em português para cada um desses dez significados (achar-creer / pegar-coger)!:

Um espanhol...

Um portugês...

cree en Dios,

crê em Deus,

cree todo lo que le dicen,

acredita em tudo o que lhe disserem,

cree que la crisis va para largo,

julga que a crise ainda vai durar,

cree que llegará tarde;

acha que chegará atrasado;

coge un libro,

pega num livro,

coge el autobús,

apanha o autocarro,

coge cerezas del árbor,

colhe crejas da árvore,

coge al vecino por las solapas y

agarra o vizinho pela lapela e

se coge a la rama de una higuera.

segura-se ao ramo de uma figueira.

Ou seja, se há uma grande sobreposição das duas línguas num nível imediato e, diríamos, superficial, sobretudo nos

domínios lexical, semântico, mas também morfológico, há, no entanto, nas suas estruturas profundas, diferenças bem notórias e perigosamente travestidas de parecença na sua superfície.

Se a este e outros problemas de natureza gramatical acrescentarmos a hipótese de o aluno ter um professor português e

depois um brasileiro (ou ao contrário), então o problema amplifica-se consideravelmente. Imaginem o que é receber “as mesmas explicações”, a mesma norma legível numa gramática que é um clássico de coautoria entre um brasileiro e um português (Celso Cunha e Lindley Cintra) e depois ver práticas tão diferentes relativas a aspetos fundamentais. É o caso extremo da colocação dos pronomes pessoais cuja norma é única para os dois lados do Atlântico, mas realizada pela maioria esmagadora dos falantes de cada um dos países de forma totalmente diferente:

Chamo-me António ~ Me chamo Antônio

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1. a utilidade de uma gramática comparativa

Sabemos que existem no mercado gramáticas e tratados gramaticais descritivo-comparativos do português e do espa-

nhol. A comparação das duas línguas é centrada na norma de cada uma delas, enquanto o uso quotidiano e real é comentado apenas esporadicamente. Há pois uma maior preocupação e importância normativa e uma menor projeção comunicativa. É nossa opinião que, para o ensino de línguas estrangeiras, se deveria também escrever tratados que apresentassem dificuldades com grau de frequência relevante partindo da experiência de ensino. Estamos conscientes de que essa experiência difere consoante o país e, nalguns casos, consoante a região/autonomia/cantão onde se ensina o português e ainda conforme a/s língua/s aí em vigor. Para nós, portugueses, esta questão está muito arredada da nossa débil consciência de variação linguística, pelo facto de sermos um país tão profunda e empedernidamente monolingue. Já em Espanha o bi e plurilinguismo é uma realidade e controversa. Pois, como diria Leporello no Don Giovanni “Ma in Ispagna son già mille e tre...”

Queremos pôr em foco apenas quatro aspetos importantes que exemplificam a necessidade

de tal gramática comparativa: 1.1. fonética;

1.4.

1.2.

1.3.

colocação dos pronomes

verbos no passado (comi ≠ te-

átonos;

nho comido);

formas de tratamento.

1.1. Fonética

Centrando-nos agora na nossa experiência na Catalunha, rapidamente se pôde constatar que a fonética portuguesa está

mais próxima da sua congénere catalã. Portanto, seria de esperar que esses alunos da UB tivessem menos problemas quando falam português do que os que teria um castelhano ou um andaluz. Vejam-se estes exemplos: português catalão espanhol porteiro [pur’tɐiru] porter [pur’te] portero [por’tero] carro [‘ka{u] carro [‘karu] carro [‘karo] casa [‘kazɐ] casa [‘kazə] casa [‘kasa] genético [ʒ ’nɛtiku] genètic [ʒə’nɛtik] genético [xe’netiko] baixar [bai’ʃar] baixar [bə’ʃa] bajar [ba’xar] porta [‘pɔrtɐ] porta [‘pɔrtə] puerta [‘pwerta] pedra [‘pɛðrɐ] pedra [‘pɛðrə] piedra [‘pjeðra]

fila

[‘fi´ʎɐ]

filla

[‘fi’ʎə] 18

hija

[‘ixa]


No entanto, verificámos que, nestes casos, os falantes catalães se baseiam na regra espanhola e não na catalã. Talvez

este fenómeno se deva ao facto de conceberem o português como uma língua mais próxima do castelhano em todos os aspetos. Paremos um instante para analisar esta generalização precipitada do “em todos os aspetos”. Na verdade, em todos os aspetos é, afinal, apenas o léxico. E imediatamente nos interrogamos sobre o porquê dessa convicção e desse alastrar de semelhança (de falsa semelhança) a partir de uma só face da língua, quando têm ao dispor nos seus thesaurus e prática de bilingues uma outra semelhança fonética muito mais próxima do que aquela que estão a usar. Por outras palavras: por que razão saem da estrada principal para fazer um desvio mais complicado que, ademais, os leva ao destino errado?

O que se passa, parece-nos, é que estes estudantes aprendem o português mais pela escrita e leitura do que pela oralida-

de, como seria natural e desejável. Na verdade, as oportunidades que têm de ouvir falar português são muito poucas (como aliás acontece em todos os países estrangeiros onde o português não é língua oficial). E como a semelhança com o léxico espanhol é alta, rapidamente leem português por aproximação com esta língua escrita e não por via do português oral com o qual contactam esporadicamente, ouvindo-o quase sempre apenas e só nas aulas. Ou seja, na sua aprendizagem do português, oralidade e escrita são quase simultâneas, dominando até, antinaturalmente, a escrita sobre a oralidade e, portanto, dando prioridade, na fala, ao espanhol sobre o catalão. Mas, ainda aqui há um equívoco mais profundo: é que, na verdade, a similitude entre português e espanhol no que respeita ao léxico é aparente, como já dissemos. De facto, essa paridade é muito mais ortográfica do que lexical como já mostrámos atrás nos exemplos dos falsos amigos e no reiterado lapso de correspondência entre vocábulos e suas acepções e significados nas duas línguas (português/espanhol).

Compreende-se, pois, que apesar dos nossos esforços para dissipar os desacertos acabados de descrever, mesmo na

Catalunha, prevaleça, na predisposição dos estudantes ao aprender português, a ideia muito divulgada da semelhança entre espanhol e português que só é válida para o campo lexical e ainda assim com muitas reservas. Veja-se a filiação seguinte: catalão portugues espanhol Quero comer Falo português Estou em Coimbra Buscar o pai Apesar de tudo

Quiero comer Hablo portugués Estoy en Coimbra Buscar al padre Apesar de todo

Vull menjar Jo parlo portuguès Sòc a Coimbra Cercar el pare Malgrat tot

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frances Je veux manger Je parle portugais Je suis à Coïmbre Chercher le père Malgré tout


Como se observa, o catalão está mais próximo no léxico do francês enquanto o espanhol o está do português. Para os

alunos, os textos portugueses aparecem associados ao espanhol e mentalmente teriam de proceder a duas operações quase simultâneas: primeiro, dissociar a grafia portuguesa da espanhola e logo a seguir re-aprender a pronunciar essas palavras com a fonética catalã, ironicamente a deles. O que verificámos é que os alunos, falantes de catalão, demoram bastante tempo a interiorizar esta sequência de operações.

Este curioso fenómeno é apenas uma manifestação da falsa proximidade português/espanhol, quando, em muitos casos

seria mais lógico e mais económico do ponto de vista linguístico aparentar português e catalão, e parece-nos prender-se com as políticas linguísticas seguidas e frequentemente impostas até épocas recentes. Com efeito, até aos anos oitenta, os falantes de catalão, galego e basco eram alfabetizados exclusivamente em espanhol, embora falassem quotidianamente as suas línguas em domínios privados. E, como sabemos, a abstração linguística necessária para aprender outro idioma costuma dar-se a partir da língua de alfabetização. Pelo que não admira que, para além da falsa similitude ortográfica português/espanhol, os alunos tendam a recuperar mentalmente a língua de alfabetização ao aprender uma nova, ainda para mais parecida.

No caso da Catalunha, os estudantes de português que já acederam ao ensino em catalão, depois dos anos 80, apresen-

tam uma tipologia diferente. No entanto, apesar de foneticamente poderem aproximar mais facilmente o catalão do português, as interferências lexicais permanecem por via do espanhol, com os erros inerentes.

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1.2. A colocacão dos pronomes átonos

Outro item conflituoso que tem a ver com a própria “discórdia” portuguesa é a colocação dos

pronomes. Claro que, com exceção dos galegos, os alunos têm de aprender uma estrutura nova diferente daquela da sua língua, como acontece em qualquer LE. Mas há ainda uma questão que antecede esta: trata-se da origem europeia ou sul-americana do professor, que, fora de Portugal, tanto pode ser português como brasileiro. O docente ensina as mesmas regras sintáticas, emborahaja grande divergência entre norma e realização em Portugal e no Brasil. Isto é, em Portugal, quer a oralidade quer a escrita estão mais próximas da norma do que no Brasil, onde, como sabemos, é raríssimo ouvirmos ou lermos frases como “Eu vejo-o”; “Ela diz-mo” e por aí adiante… Esta costuma ser uma etapa confusa para os alunos não nativos. Daí a necessidade de darmos uma coerência ao ensino deste aspeto gramatical.

De facto, a aprendizagem das formas enclíticas (o/lo/no-lhe-se-nos-vos) não provoca normal-

mente grandes problemas. É a colocação dessas formas na frase que o aluno deve interiorizar. Quando já conseguiu aprendê-las com frases afirmativas simples, a tendência posterior é empregar por analogia o mesmo procedimento em qualquer oração. A nossa experiência diz-nos que é a partir desse momento que o professor deve lutar contra a hipercorreção.

Frases como as seguintes servem-nos de exemplo:

Chamo-me Luís; vai-te embora; disse-me uma coisa, etc.

Ao transformar estas frases na forma negativa o pronome muda de lugar e aparece o primeiro

conflito, que neste caso se resolve com facilidade:

*Não chamo-me Luís > Não me chamo Luís, etc.

Quanto à colocação de enclíticos com verbos simples, numa oração subordinada a questão não

é tão fácil. Se esta for afirmativa, no aluno evidencia-se a tendência geral, ou seja, a primeira regra que aprende - pospor o pronome ao verbo. No entanto, no caso da subordinação, o processo torna-se complexo e o pronome fica posposto à conjunção e anteposto ao verbo. Há alunos que depois de vários anos de aprendizagem do português e com um nível linguístico muito bom, ainda se enganam. Não é de éestranhar, visto que no Brasil frases acomo esta serem comuns (e nos últimos tempos, em Portugal): “... nesse plano insere-se questão da necessidade de uma regulação social... ” “... é nesse plano que insere-se a questão da necessidade de uma regulação social...” 21


a

Como poderemos resolver esta dificuldade? Os métodos tradicionais não ajudam, pois limitam-se a

c

fornecer-nos regras infindáveis, difíceis de memorizar e, sobretudo, não funcionais. Em Barcelona, a nós usamos uma metáfora: os pronomes átonos são chamados assim, porque carecem de tonicidade própria, são satélites que precisam de se ligar a um planeta, sendo este, em cada frase, a palavra mais

c

importante, a que introduz a informação primordial (do ponto de vista da história da língua a lei é

b

clara: a palavra essencial enfatiza a informação e unem-se a ela as outras, dependentes):

Oracões simples

a

Chama- se António

Não se chama João

Chamas-te Amália?

Como te chamas?

Levanta-se às dez

Todos os dias se levanta às dez

Deixa-me só!

Não me deixes só!

a

c

c

c

b a

c

a

Oracões compostas Ela disse que se ia embora

Perguntou quando se ia embora

Fomos para casa porque nos aborrecíamos

Embora lhe explicasse, não perceberia

Se me ligasse, eu atendia

Come tão pouco que se cansa facilmente b

c

a

c

b

a

a

a

c a

c

b

b

a

a a

c

b

c

c

b

a

b

a 22


1.3. Os verbos no passado (comi ≠ tenho comido)

No que diz respeito à conjugação verbal, de entre os vários usos dos tempos verbais nas duas línguas, queremos apenas

destacar as duas formas do pretérito perfeito e a sua equivalência em espanhol.

O português forma estes tempos com o auxiliar TER (deixando HAVER para um uso escrito e/ou culto) e o espanhol com

HABER. Mas há uma diferença substancial nos seus empregos. Enquanto a língua espanhola diferencia o pretérito indefinido e o pretérito perfecto segundo o princípio de aproximação ou afastamento do passado em relação ao falante, o português efetua uma distinção entre o pretérito perfeito simples e o composto segundo uma significação aspetual reiterativa.

espanhol Ayer hice sopa de pescado

Esta mañana he hecho sopa de pescado

Ontem fiz sopa de peixe

Hoje de manhã fiz sopa de peixe

Últimamente he hecho sopa de pescado

Llevo hecha sopa de pescado

portugues

Ya he hecho sopa de pescado

Tenho feito sopa de peixe

Estes são tempos de uso problemático para os nossos alunos espanhóis, que traduzem um pretérito perfecto pelo homó-

nimo composto português. Por exemplo:

Esta mañana he ido al mercado > *Esta manhã tenho ido ao mercado.

Esta manhã fui ao mercado.

A partir de exemplos deste teor, vamos explicando de forma contrastiva o funcionamento diverso das duas línguas perante

uma forma verbal que apresenta a mesma estrutura morfológica mas que tem uma semântica muito diferente.

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1.4. As formas de tratamento

Quando os alunos começam a falar português, deparam-se com três formas diferentes para se dirigirem a um interlocutor:

tu, você e o senhor. Quer o espanhol, quer o catalão só possuem duas formas de tratamento tú/usted e tu/vostè.

2ª pessoa

2ª pessoa

SUJEITO INFORMAL TU

SUJEITO INTERMÉDIO VOCÊ (verbo na terceira pessoa do singular)

SUJEITO FORMAL

[VÓS] / VOCÊS (verbo na terceira pessoa do plural

VOCÊS (verbo na terceira pessoa do plural)

OS SENHORES/ AS SENHORAS

O SENHOR/ A SENHORA

Explicar quando se usa tu e o senhor é fácil, mas você já é mais complicado. E vejam ainda a dificuldade aumentada quan-

do o você é dito por um português ou por um brasileiro.

É sempre difícil encontrar uma correspondência em espanhol e catalão. Só o contexto permite aproximarmo-nos de uma

boa tradução: que pode ir do tú, usted, compadre (dialetal, como para nós no falar alentejano) a um muito raro vuestra merced.

A conclusão que se tira destas breves reflexões, que nos levaram a afirmar a necessidade de uma gramática comparativa

entre o português e o espanhol, é que, sendo duas línguas tão próximas, surge o paradoxo de vermos que a complexidade de as aprender radica precisamente nessa aparente proximidade. No respeitante ao léxico, por exemplo, os alunos estão constantemente a fazer um exercício mental de ampliação ou estreitamento de sentido/acepções ou mesmo de vocabulário, por vezes, a partir de formas escritas iguais ou muito erroneamente parecidas na língua em aprendizagem e na já conhecida. Um verdadeiro brainstorm linguístico-comparativo…

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2.a utilidade de um estudo coordenado das variantes portuguesa e brasileira

No caso da Facultat de Filologia da Universitat de Barcelona, os alunos de português têm professores de

três nacionalidades (brasileira, portuguesa e espanhola) lecionando em duas variantes possíveis: a europeia e a americana. Este facto, acarreta, obviamente, complicadas questões de aprendizagem. Na realidade, verifica-se que os alunos, quando aprendem a língua portuguesa no seu nível mais básico, com um professor de uma variante e tendo os níveis seguintes com um docente de uma outra, acabam por não dominar nenhuma e misturam as duas, sem de tal terem consciência.

A mesma complexidade de escolha e gestão das variantes a lecionar pode vir a colocar-se, se não aconte-

ce já pontualmente, em Portugal, com professores de espanhol europeu ou americano.

A questão que nós colocamos é a seguinte: que atitude tomar, enquanto docentes de variante europeia,

quando, por exemplo, nos apercebemos de que um estudante aprende muito mais facilmente, devido ao decalque da sua L1, a estrutura “estar + gerúndio”, (“estou fazendo”) típica do português padrão do Brasil (e regional em Portugal)? Considerar o uso desta estrutura um erro está fora de questão, mesmo sabendo que se trata, muitas vezes, de um caso de transferência (em espanhol é “estoy haciendo”). Os estudantes não utilizam a referida expressão por optarem por uma variante específica, mas sim por um decalque, na maioria das vezes inconsciente.

Como consequência das questões aqui afloradas, foram-se desenhando três opções:

- a primeira: informar repetidamente acerca das duas possibilidades oferecidas por cada um dos padrões

das duas variantes, aceitando ambas;

- a segunda: criar um programa que ofereça, num dos níveis, se possível num dos mais avançados, um

estudo comparativo acerca das diferenças existentes entre as duas variantes;

- a terceira possibilidade e a escolhida pela área de português da Facultat de Filologia da UB: criar uma

disciplina específica, no último ano do curso de “Línguas e Literaturas Modernas”, na qual se aprofundasse, num estudo comparativo do padrão das duas variantes e num estudo interno do português usado em cada país, ou seja, de algum modo, contrapor a norma de ambos os países às respetivas variações dialetais. Vejam-se estes casos que exemplificam o conteúdo e estruturação dessa cadeira:

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-referido à fonética,

Principais diferencas no vocalismo e consonantismo entre Portugal e Brasil PORTUGAL Vocalismo tónico oral BRASIL

[ɔ] > o, ó [o] > o, ô -ante [m] e [n] -ante [m] e [n] António [ã’tɔniw] Antônio [ã’toniw] referidos à morfologia, Os Interrogativos Portugal Brasil Cadê? (= que é de...?) A palavra cadê tornou-se, na linguagem popular do Brasil, num equivalente de onde interrogativo, p.e. Cadê meu lenço? = Onde está o meu lenço?

O Advérbio

Portugal

Brasil

Mais comuns cá, lá

Mais comuns aqui, ali

Em baixo

Embaixo

Mesmo com o sentido de absolutamente é mais comum em Uso especial de não: veio não, sei não. Portugal do que no Brasil.

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3. Conclusões

Concluímos resumindo o anteriormente exposto: o ensino de português a espanhóis apresenta aspetos específicos que

derivam da proximidade e da aparente transparência entre as duas línguas.

No caso da UB, esses aspetos adquirem uma nova dimensão, visto que se trata de ensinar duas variantes do português a

alunos que têm como língua materna o espanhol ou o catalão e, nalguns casos, o galego. Outro fator particulariza ainda mais esta aprendizagem: a maioria destes alunos são bilingues em espanhol/catalão, alguns em espanhol/galego e outros, ainda, trilingues em espanhol/catalão/galego.

Por tudo o que foi exposto, é evidente que o facto de os alunos terem professores das duas variantes, sem que estas sejam

comparadas, acaba por gerar mistura, o que, consoante o uso que os discentes façam do português no futuro, lhes pode causar não poucos problemas profissionais, seja em matéria de docência, tradução, interpretação.

Do ponto de vista teórico, a solução da UB parece-nos adequada, sobretudo se tivermos em mente que há apenas três

níveis de língua. Usar um deles para comparar o padrão de Portugal com o do Brasil significaria condensar ainda mais aquilo que já é difícil de ensinar em apenas três quadrimestres.

Concluímos pois que esta atitude de aceitação geral das duas variantes, apesar de implicar um assinalável trabalho suple-

mentar quer para docentes quer para alunos, reverte a favor dos sabores diferentes que a língua portuguesa pode adquirir pelo mundo fora.

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