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MONO TONIA
TÍTULO
Monotonia AUTORA
Alice
REVISÃO, DESIGN E DIAGRAMAÇÃO
Beatriz Batista [2016]
MONO TONIA
“Talvez quando nos encontramos querendo tudo, é porque estamos perigosamente perto de não querer nada.”
- Sylvia Plath
CRÔNICAS DE ALICE
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dia 1 Posso fechar os olhos e imaginar um lugar que posso chamar de meu. Uma sala com um teto e piso de madeira, uma luz fraca no centro do chão, formando minha sombra na parede clara. Há pessoas dançando no ar e música baixa que me faz querer dançar junto a eles. Nesse lugar não há julgamentos, não há ressentimentos e posso ser como bem entender, se ao menos eu pudesse ter alguém comigo, alguém para rir junto e dançar eternamente. Olho para o lado e vejo uma criança, uma menininha vestida como uma boneca, vestido azul com uma saia rodada. Em uma fração de segundos, os dançarinos desaparecem e pequenas setas fluorescentes no chão me guiam até a garota que corre em direção a um longo corredor. A sigo depressa, até que caio num buraco colorido que me leva até um lugar que eu conheço bem. Uma floresta bastante iluminada. Caminho sem cautela, chegando ao lugar de onde eu havia partido, repleto de rostos conhecidos. Eu passo pelas pessoas, que sorriem e acenam, toda a conversação fazem meus ouvidos formigarem. Tenho vontade de correr de volta para o lugar que eu estava, mas meus pés mal se movem. Uma senhora de cabelos brancos e roupas simples para à minha frente e diz com uma voz baixa: “É aqui que você deve ficar, é um completo. Lá é apenas seu não se pode compartilhar. O País das Maravilhas é sua fuga, não pode fugir sempre”.
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dia 2 Vê-lo partir, me faz desistir. Vê-lo falhar, me faz desacreditar. Sonhar acordada é meu maior dom. Mas não sei se consigo suportar toda essa dor. Vê-lo morrer aos poucos, desaparecer em minhas mãos, me faz esquecer. Esquecer de minha promessa, de minhas escolhas, de meus princípios, jogar todas as lembranças de um precipício. Me faz incendiar os desejos que antes haviam em minha alma, hoje é apenas pó sendo levado pelo forte vento dentro de um labirinto. Recortes em preto e branco, flutuando, sorrindo, gritando a plenos pulmões, contando as cores da minha aquarela que antes era tão colorida e hoje consegue ser tão apagada.
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dia 3 Não sou boa companhia, para ninguém. Corro perigo estando acompanhada de mim mesma. Pulsação acelerada, vendo vultos que passam por mim numa velocidade inexplicável. Perturbada por memórias que eu tenho que esquecer, mas que sempre voltam à tona, me despertando, como se me jogassem um balde de água fria. Lembranças que me tiram de meu perfeito juízo. Eu deveria estar numa redoma para me sentir segura, me sentir salva e com a sanidade no lugar. O isolamento me atrai, ele me puxa, sempre sorri quando bato em sua porta lhe pedindo por abrigo. Estou viajando em meus pensamentos, me refugiando em meus sonhos românticos e sorrisos bobos. Sem começo, nem fim, estou numa gangorra de sentimentos, vozes gritando em meus ouvidos que eu estou fazendo errado, que eu não conseguirei continuar minha caminhada. Eu tenho medo, vergonha, raiva de tudo que sai de meu controle, tudo que me frustra. Quando mais nova, a escuridão me assustava, eu fugia dela de todas as formas, hoje ela parece estar em mim, queira eu ou não.
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dia 4 Conversar com você após três anos de silêncio, me fez sentir algo estranho, uma felicidade. Após três anos sem nem ao menos saber a verdadeira razão do tal silêncio, eu começo a pensar o quão estúpida eu fui. Quanta besteira eu fiz, falei, achando que estava certa. É como todos dizem: “só aprende com os próprios erros” e os erros a gente comete com o tempo. E quantos erros eu devo ter cometido e ainda não percebi? Quantas bobagens eu falei, fiz e hoje estou pagando o preço? Uma das maiores idiotices, talvez, tenha sido não dar o valor que você merecia, o único que quis me conhecer por inteira. Talvez eu tenha feito com você o mesmo que faço com todos, não te deixei entrar com medo de me magoar.
dia 5 Pare. Respire fundo. Reflita. Reveja seus conceitos, seu comportamento. Veja se você está satisfeito consigo mesmo. Se suas atitudes são corretas, se elas não contradizem as palavras que saem da sua boca. Não tente se tornar alguém que você não é, não tente se espelhar em alguém só porque ele é mais famosinho ou tem mais amigos.
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A grama do vizinho nem sempre é mais verde. Seja você, mas veja o que pode melhorar. Não olhe para trás, esqueça os erros do passado, mas veja qual caminho você está seguindo. Ainda dá tempo de mudar de direção. Mesmo após erros e tropeços, se mantenha de pé e siga em frente. Nunca conseguiremos chegar à perfeição, mas podemos tentar com nossas atitudes e pensamentos. Valorize as pessoas que merecem. Batalhe pelo que quer. Corra atrás de seus sonhos, mesmo que eles pareçam impossíveis, um dia você conseguirá tudo o que deseja mesmo que todos digam o contrário, confie em si mesmo, aprenda a se amar, por você, será mais fácil para os outros te aceitarem, que se dane! O que importa é ser feliz. A cada dia o sol vai raiar e aí teremos um novo começo. Se conheça mais. Sorria mais. Se divirta mais. Sonhe, viaje, caminhe. Observe os pequenos detalhes, é lá onde encontramos as coisas mais bonitas. É um pouco hipócrita dizer isso, nem sempre reparamos nas pequenas coisas, nem sempre damos valor a quem merece. Sempre pendemos para o errado, para o ruim, é mais fácil. Não insistir no erro, é o que digo. Mude, faça o que achar melhor para você. Com os erros é que aprendemos a acertar.
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dia 6 Ainda não sei o meu destino, tenho medo de fazer as escolhas achando que são certas. Tenho medo do incerto, de não alcançar meus objetivos, não realizar meus sonhos – coisa que mais prezo na vida. Meus sonhos são a razão pela qual eu vivo, é o que me mantém de pé, que não me faz desistir. Sem meus sonhos eu seria inválida. Sonhos que me fazem viajar para longe, bem longe daqui. Voo de primeira classe diretamente para um mundo meu, somente meu. E assim eu vivo, dando passos infinitos, sem saber para onde vou, sem saber o que está por vir, sem saber se vou ter tudo o que sempre quis. Torcendo para que tudo dê certo.
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dia 7 Sobrevivi a mais um dia, mas sinto como se a cada dia meu peito se aperta mais e mais. A cada dia que sobrevivo, eu vou morrendo aos poucos, perdendo a minha alma, sendo levada pelo vento para um corredor longo e escuro. A cada dia eu vou perdendo minha esperança e minha consciência. Perdendo minha identidade, mesmo sabendo que ainda sou eu mesma. Ando preferindo os estranhos aos conhecidos. Os suporto com um sorriso e nunca mais os vejo novamente. Os conhecidos querem manter contato e vínculos, sempre tentam te convencer de algo em uma conversa casual. Eu estou farta disso, farta daquilo, de tudo! Eu queria poder me afastar de tudo isso, esquecer minha vida por alguns dias, dar um tempo, fugir. Colocar minha vontade e meus gostos acima de tudo e de todos, ser egoísta até não querer mais. Fazer o que eu quiser sem ter que pensar nas consequências. Parar de me conter.
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dia 8 Eu te olho, você me olha, ambos sorrimos e já sabemos o que o outro está pensando. Eu te quero e você me quer, não há nada no mundo que nos impeça de ficarmos juntos. Eu te descrevo em longas frases em papéis extensos, você me desenha em sua mente com meus trejeitos e desejos. Eu te fotografo para sempre só com o olhar, você me repara e mexe nos cabelos devagar, observando cada detalhe meu. Crio declarações que nunca exponho, guardo todas para mim, são unicamente minhas, invento brincadeiras para te fazer sorrir, brincadeiras tão estúpidas que até eu me pergunto como consigo ser tão... eu. Minha melhor amiga fica me olhando desconfiada, ela já sabe que a culpa daquele sorriso de orelha a orelha é sua. Você fala para o seu melhor amigo que sou uma maluca sem noção, mas a garota mais divertida que já conheceu. Eu vou dormir pensando em você e você aparece na minha porta no dia seguinte logo cedo. Meu gênio forte não supera tua teimosia, e a gente fica nessa, discutimos, mas no fim do dia estamos de bem e planejando a semana para que os horários coincidam. Quando a gente se encontra, você passa a mão na nuca por nervosismo, eu sinto meu rosto esquentar, como se a gravidade nos puxasse, mesmo quando tentamos fugir, o seu caminho cruza o meu, eu não resisto a você e você não resiste a mim. Eu não esqueço o teu sorriso e você não esquece meus olhos.
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dia 9 De frente para o espelho, não vejo quem realmente sou, na realidade, nem sei mais quem sou. Olhos cansados, tristes, profundas olheiras demonstram que eu estou indo de mal a pior, fundo do poço e sequer sei a razão. Algo que me puxa para baixo, um nó na garganta que não se desfaz nunca, uma vontade de gritar para que todos se afastem. Estou me tornando uma solitária “feliz”, consciente, que admite que gosta de ficar só mais do que qualquer coisa no mundo. Não sinto que isso está me fazendo bem, estou me afundando mais e mais, tenho medo de que nunca mais levante, nunca mais me recupere, não sei se devo permitir ficar triste ou ficar alegre para que a depressão não me contamine por completa. Mantenho minha cabeça erguida para os outros, detesto mostrar vulnerabilidade, por dentro posso estar quebrada, uma completa bagunça, mas nunca irei dar o braço a torcer, muitas vezes para esconder tal sentimento, sou arrogante até com quem não merece. É minha fuga. Mantenho-me presa a esse mundo sujo, hipócrita e insuportável, tenho vontade de me desligar dele todos os dias da minha vida. Tenho vontade de me desligar de mim mesma, tenho plena ciência de que eu sou complicada e impossível com todos os meus pensamentos, iras e tristezas repentinas que me fazem perder a cabeça. Quero quebrar esse espelho e parar de me olhar, parar de me destruir. Quero me consertar, parar de ser tão inconstante, viver um dia de cada vez, sem me preocupar com o futuro. Quero ficar feliz por uma semana inteira, é tudo o que eu peço e se for para ficar triste, que ninguém me veja assim. Não sou a mesma que costumava ser, mas também não sei se daqui a alguns anos terei mudado ou se continuarei a mesma louca nervosa e paranoica, a cada dia me vejo tornando alguém que eu sempre sonhei ser, mas as malditas recaídas são montanhas enormes em meu caminho, que parecem estar se estendendo.
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Não sei se devo atravessá-las e me machucar ou escalá-las e sair ilesa, sem nenhum arranhão. Não posso mover montanhas, mas acredito que posso mudar as estratégias de sobrevivência.
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dia 10 Quando pequenos sequer entendemos a dimensão do amor de uma mãe, apesar de brigarem conosco e nos colocarem de castigo, tudo tem um propósito no fim. Nunca reclamei de minha mãe, algumas vezes o problema era comigo. Me sentia inferior por não ter ou fazer o que as outras faziam. Hoje eu posso agradecer a ela, por ter me privado de certas coisas, vejo que tudo que ela fez e faz é para o meu bem, mesmo que eu não concorde. Acho até estranho, eu sou tão jovem, nunca tive filhos, nem irmão caçula para ter que cuidar quando nenhum adulto estava por perto, mas entendo o tamanho do amor como igual. Sei que posso ter me tornado algo que ela não concorda, fazer e falar coisas que ela desaprove totalmente. Tenho todas as chances do mundo para decepcioná-la, me sinto mal só de pensar que isso pode acontecer, mas eu preciso crescer, descobrir o mundo à minha maneira, cair algumas vezes, sofrer um pouco mais. Ela sempre estará de braços abertos para me amparar e mentir, dizendo que está tudo bem. Sou cheia de defeitos, cometo erros, vivo falando bobagens, falo demais, sou louca demais e mesmo assim, para ela eu sou perfeita e ainda me defende com unhas e dentes. Meu sonho sempre foi me parecer com ela, fisicamente e até nos trejeitos, cada dia que passa, me deparo de frente para um espelho e me orgulho; o sonho da menininha finalmente se realizou. Só espero que eu crie meus filhos da mesma forma que ela me criou, os colocando acima de tudo e de todos. A farei se sentir orgulhosa e ter certeza de que a filha maluquinha, nada seria sem ela.
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dia 11 Venho me frustrando comigo mesma, me decepcionando com pessoas que eu certamente pensei que poderia contar para sempre. Meus ossos e órgãos doem, sinto a esperança sendo tirada de mim. Não quero, nem posso perder o foco. Devo perder horas, até mesmo dias tentando me descobrir, me procuro e não me acho. Uma outra ‘eu’ está presa, gritando por socorro enquanto os outros passam por ela sem nem notar. Não sei o que fazer para libertá-la, enquanto ela me corrói por dentro, me confunde e mal sei se ela é uma criança perdida ou uma mulher querendo aparecer.
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dia 12 Eu quero alguém para mim, alguém que cuide de mim, que me faça sorrir, me faça esquecer meus traumas, minhas tristezas, que me faça ver a vida de outra forma. Preciso de uma força maior, de uma luz mais forte que me ilumine na escuridão, alguém corajoso que me tire dos destroços, alguém que não me destrua. Preciso de alguém que não tenha medo de se aproximar, alguém que me enfrente. Estou esperando esse alguém há tanto tempo. Talvez seja hora de esquecer o plano A. Ninguém vai conseguir me consertar, ninguém vai conseguir me tirar do buraco, ninguém vai me amar como eu desejo. Sempre vou me decepcionar e me machucar mais ainda. Eu devo me curar, eu devo me amar por mim, esquecer os outros, esquecer quem me machuca, me despreza. Não vou apostar todas as minhas fichas em alguém que não existe, é perda de tempo. Devo parar de me aborrecer com pouco e parar de esperar tanto de quem não tem o que me oferecer. Ver o lado positivo da vida, sem a ajuda de ninguém.
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dia 13 Quando a noite vem e com ela o frio, o medo e algum sentimento que eu não consigo identificar. Quando o misto de tristeza, mágoa, uma dor no peito que pareceu estar sempre lá, incapaz de se curar, de cicatrizar, retorna. Tornados imaginários estão acontecendo e eu estou bem no meio deles, é provável que esteja acontecendo porque eu estou deixando. Uma maré de lembranças ruins me atinge todos os dias, tento desviar delas, mas é impossível quando o tornado me empurra para o mar e as ondas me puxam para o desentendimento. Meu sangue é como lava, queima minhas veias, transborda. Agora o mar me empurra para fora, me expulsa e logo não sei mais o que fazer. Da minha boca saem palavras que minha mente desconhece, minha mente não se pronuncia por completo. Ela prossegue seguindo o protocolo. Só quero correr para longe, não quero lidar com o que eu aparento ser ou com a opinião dos outros, quero viver o que há de ser meu. Eu quero ser feliz e deixar todas as dúvidas, paranoias para trás, eu só vou conseguir ser satisfeita quando eu esquecer tudo, quando eu ultrapassar tudo isso e por mais difícil que pareça, estou em busca do primeiro passo, de como se começa.
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dia 14 Eu quero me apaixonar, quero ter alguém como minha fonte de inspiração, esquecer que um dia fui magoada - ou que sempre sou magoada. Quero que alguém seja o motivo de meus pensamentos vinte e quatro horas por dia, escrever textos e mais textos para esse alguém, cada linha, cada palavra, cada vírgula seja para ele. Que eu seja dele e ele seja meu como ninguém foi antes, que seja infinito mesmo que por um curto período de tempo, que seja abundante, como uma noite de ano novo, que rapidamente passa, mas muito se acontece, muito se espera, muito se acredita. Que esse alguém não me abandone, que me faça chorar de tanto rir, que me proporcione momentos que seria impossível de se ter sozinha, me mostrando que ficar só de nada vale. Que ele faça mudar esses meus pensamentos mórbidos e solitários de gente que se isola demais. Me faça acreditar mais nas coisas, me faça esquecer o meu pessimismo insistente. Não me deixe correr, não me deixe fugir, me mantenha presa o máximo que puder, presa e livre para amar o quanto quiser.
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dia 15 Agora entendo o porquê de todos dizerem que todo mundo deve viver um grande amor. É como se duas pessoas se tornassem uma só, elas se unem e se completam, tem uma a outra. É difícil de contar tudo para familiares, amigos e demais. Mas tendo essa outra pessoa se pode contar seus segredos, seus sentimentos mais profundos e íntimos, mesmo tendo companhia de outros, não é a mesma coisa. Quando se encontra aquela pessoa, começa a jornada a dois. A pior parte é encontrar esse amor. Porque é ruim caminhar sem segurar a mão de alguém. Porque é ruim viver só e não saber o que fazer para inverter isso. Porque você anda na contramão, esbarrando em todos e tropeçando nos próprios pés. Porque se quer correr para os braços de alguém e não se tem, quer ser cuidada e amar, mas não sabe quem.
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dia 16 Sortudos os que encontram o amor, os que não são só. Sortudos os que seguram o amor, o aceitam, não os perdem e ele o vive. Pois um dia eu já quis, meu bem, te dar meu amor, te falar palavras bonitas, te beijar e cuidar de você. Mas você fugiu de mim e nunca mais voltou, nem vai voltar e por mais incrível que pareça, eu não tenho saudade, não tenho saudade desse amor. E eu não sou garota de sofrer por amor, meu bem, mas eu sofro. Eu tenho solidão. Sou rodeada por ela. Eu sou a solidão. Minha alma é banhada por sorrisos apáticos e vontades mínimas. Por verões frios e invernos longos. Por momentos, milhares, confusos e solitários.
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dia 17 Todos os meus anseios, medos, angústias e demônios continuam a me perseguir, mesmo depois de um longo e doloroso ano, eles continuam aqui, me puxando para baixo, me atormentando, rindo de mim quando eu sou levada pelo momento. Continuo tentando me afastar de tudo que é ruim, que me faz mal, ainda assim, sou afetada e sofro como se estivessem arrancando meu coração. Sou perseguida em meu sono. Minha sanidade vai se esvaindo aos poucos, eu a puxo com toda a força que tenho e ela continua indo embora, acenando para mim com um sorriso debochado. Eu nem me importo mais de afundar e ficar de vez no fundo do poço, é o lugar onde pertenço. É o lugar para onde sempre voltarei, mesmo escapando por uma brecha aqui ou ali, sempre vou regressar. Meus pés cansados de tanto caminhar em busca do topo, sangram e me fazem desistir, com os pés cansados e mente lotada, eu desisto. Jogo tudo para o ar, desabo e assim vou levando. É o meu despertar.
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dia 20 Me surpreendi quando já estava tudo caminhando corretamente e do nada saiu dos trilhos e se transformou num trem desgovernado, sem destino, sem parada. Tudo está estragado, um verdadeiro lixo. Começo a sentir que estou sendo destruída aos poucos, por vários lados. Mas então penso em você e tudo entra nos eixos novamente. Desculpa se eu demorei tanto. Eu não fazia ideia do que poderia acontecer caso eu desse uma chance. Eu que sempre fugia de você e depois me arrependia. Se eu soubesse que tudo terminaria assim, ou melhor, começaria... Ah, eu faria tudo de novo.
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dia 21 Eu costumava ter uma teoria sobre relacionamentos; Um mais um, sempre dava zero. Matemática simples. Eu não só acreditava, como era confirmado diante de meus olhos e isso me fechou, me deixou sem vida, com planos práticos e racionais. Fiquei interditada por um bom tempo. Então eu o encontrei quando não quis, como diria Los Hermanos, e era a prova que eu precisava. Era você, todo esse tempo. A prova de que eu sou uma pessoa melhor do que eu pensei, de que eu posso recriar meus sonhos, de que eu posso acreditar na vida, que um mais um, nem sempre é zero. Nos meus dias mais chatos, eu penso como está sendo o seu. Você que roubou meus risos, minhas noites de sono, em partes minha sanidade e bom senso. Te amo em olhares, sorrisos e até mesmo em minhas dúvidas. Não imagino mais minha vida sem nossos fins de semanas divertidos, geralmente na praia. Se ser sortuda significa conseguir encontrar tudo o que sempre quis em apenas uma pessoa... Sim, eu sou bastante sortuda.
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dia 67 As semanas passaram e nada mudou, nada aconteceu, nada. Acordo pela manhã, meus pés tocam o chão frio e minha mente é massacrada. A tv desligada. O sofá parece tão grande sem você sentado ao meu lado. Ultimamente todos os casais felizes que vejo me faz lembrar nós dois. Não se lembra de como éramos felizes? Porque você tinha que fazer essa bagunça? Aquela era a última coisa que precisava acontecer comigo. Tenho que te esquecer. Por mim, e pela minha sanidade mental. Devo mesmo estar sentindo a sua falta, afinal de contas, foi o meu primeiro relacionamento sério. Afinal de contas, acabei me apaixonando por você. Enquanto ainda o tinha ao meu lado me permiti sentir coisas que nunca tinha sentido por outra pessoa. Desenterrei meu coração no momento errado, aparentemente. Podíamos ter deixado tudo em ordem e não ter nos aprofundado em algo que acabaria nos sufocando. Eu busco em livros, músicas e sonhos, um refúgio, tentando matar o tempo, para não morrer de tédio. O ritmo desacelerou e estou sem conseguir acompanhá-lo. Minha vida continua sendo a mesma. Eu ainda respiro. Meu coração ainda bate. Não sei se o vazio que estou sentindo é você que está faltando. Não sei o que fazer, todos desapareceram justo agora. Você desapareceu.
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dia 69 Após dias de constância e correria, finalmente pude parar e refletir que não é nada disso que quero, eu nunca quis. Como se pode ficar angustiada e insatisfeita tão rápido? Talvez eu esteja me sentindo fraca, depois de semanas de recuperação. Como se pode ficar pior depois de se recuperar? Por mais que insista em fazer o que é certo, é em vão, sempre existirão oportunidades mais fáceis que sinto que elas não são as certas, porém sou pressionada a fazer o que mais desprezei na vida e ser o que eu não quero. Me tornar o que mais detesto. Eles estão me empurrando e eu não quero ceder. Me sinto encarcerada e rodeada por mentiras das quais eu não consigo me libertar, enquanto vão me sufocando aos poucos. Porque sempre que eu estou cicatrizando você vem, toca a minha ferida e me deixa pior do que eu estava antes? Eu não estou mais forte que ontem, nem mais fraca que amanhã. Você tenta me deixar forte, mas o efeito é o contrário. Não me orgulho dos sentimentos que tenho quando estou perto de você, me sinto o mesmo monstro que você. Eu costumava te olhar com olhos inocentes de baixo para cima, acreditando no que me diziam para acreditar. Hoje não posso mais. Você me forçou a te odiar, eu nunca quis isso. Como pôde? Eu não te reconheço mais.
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dia 80 Caminhei por todos os quartos vazios, mas sentia alguém bem atrás de mim. Andei por todas as ruas à sua procura, entrei em labirintos, os mais sombrios, não te encontrei. Fugi por todos os caminhos que eu achei, me encontrei com suas mãos em meu rosto, olhando em meus olhos. Sem entender, continuo sem entender, esse teu jeito estranho. E me confundo com minha indiferença, me faz pensar em todas as maneiras e manias que eu gostaria de entender. Entre meus devaneios alcóolicos não senti nada. Não senti e me perguntei por quê. O teto branco nunca me pareceu tão interessante quanto agora, a minha cama sempre foi assim, vazia. Os ares que inspiro e me inspiram não são tão leves quanto costumavam ser.
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dia 85 Mais um ano está chegando ao fim e eu tenho observado tantas perdas repentinas, não só minhas. Será isso parte do crescimento ou do real sentido da vida? As pessoas vão desaparecendo da sua vida e o ponteiro do relógio começa a correr e tentamos correr contra, apesar de sabermos que de nada adianta. Tudo simplesmente se vai e quando me pego, estou pensando nas minhas perdas. Parei no tempo e as minhas conquistas não fazem mais diferença diante dos lutos, não existe espelho e não consigo olhar para dentro de mim. As paredes negras parecem se fechar e bloquear meu caminho. Sabendo que o sol vai aparecer de qualquer forma e de que eles não voltarão mais. Eles ficaram para trás, mas as lembranças continuam e vão me acompanhar. O monstro continua sendo alimentado, mesmo que por trás das grades, o caos permanece.
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dia 90 O dia estava diferente, cor de rosa com algumas nuvens alaranjadas colorindo o céu, o sol se pondo para dar vez à escuridão. Os barulhos na rua não existiam mais, janelas e portões de casas estavam fechados. Eu era a única na rua. A única livre. Andei por alguns quarteirões e ninguém havia aparecido. Pude ver, um pouco distante, alguém com olhos e cabelos que eu conhecia bem. Tudo ficou escuro. Anoiteceu antes que eu tivesse notado. 4 meses. 18 semanas. 121 dias. Por todo esse tempo você tem sido meu tormento, tenho pesadelos até de olhos abertos. Continuei olhando para ele que permanecia imóvel, apenas seu peito subia e descia conforme sua respiração. Em passos curtos e lentos se aproximou para sussurrar algumas palavras em meu ouvido, ele dizia: “Não sairei da sua mente. Você me quer lá”, repetiu as mesmas palavras sem parar, sem alterar o tom de voz. Meus sentidos passaram a se chocar dentro de mim, lutavam um contra o outro, enquanto minha batalha estava bem à frente. Uma espécie de adaga surgiu em minha mão e sem pensar duas vezes, acertei-lhe o peito, direto no coração, sua boca foi calada, ele caiu de joelhos e eu observei enquanto sua roupa começou a mudar de cinza para vermelho. “Não mais”, foram as minhas palavras antes que minha visão ficasse turva e enfim, escura.
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dia 98 Ser ou estar? Acordei num nublado domingo com o cabelo e dedos da mão cheirando a cigarro, com palavras da noite anterior em minha mente e completamente sóbria. Há algum tempo eu continuo sóbria e isso tem me deixado melhor, mas minha transparência me confunde e atropela todos os meus conceitos. Em meio a tanta gente, meu corpo descansava em minha cama, em meio a tanta gente, meu fantasma passeava entre eles, por entre as ruas escuras da cidade. Sou ou apenas estou? Tenho minhas convicções que se fundem e se chocam umas com as outras. Mesmo acobertando tantas emoções, de boca fechada, sou invisível. Quando abro a boca tenho medo de me perder em minha própria atmosfera e tenho a ingenuidade de achar que os outros entenderão, então eu explico e explico, até sentir que ficarei sufocada por tantos argumentos e reflexões feitas ao longo dos anos. Eu estou lá, mas meus olhos estão observando toda aquela fumaça e vozes que se encontram. Eu não sou de lá, mas talvez devesse ser. Todas as coisas que eu falei e me arrependi, continuo me arrependendo e querendo voltar no tempo para não as repetir. Vi as nuvens cinza se unirem, a água cair aos poucos e eu corri entre os corredores banhados pelo domingo.
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dia 102 Todos já estavam dormindo, a luz do meu quarto ainda estava acesa. Induzida pela cafeína, fiquei em busca de respostas e a lista de minhas decepções só aumentou. O silêncio foi mais alto. Mais café. Passeando tantos anos, tão só e triste. Minha mente barulhenta fez sons de protesto e ordenou: “Não escreva mais sobre isso, deixe passar, deixe ir.” Minha alma gritou pela dispensa de palavras num pedaço de papel. No fim de um dia curto, depois de tantos dias demorados, e eu pensando o de sempre, sem crescer, sem sair do lugar. Alienada. Imobilizada. Ficando embriagada de melancolia, as ruas têm sido cruéis. Olhos marejados escondidos por trás de íris azuis, ninguém notou. Nem eu mesma. Cercada por paredes azuis, como o céu, como o mar, como meus olhos que estavam fechados para tudo, agora estão tão abertos, querem regressar ao ponto de antes. Cada mínimo detalhe, eles acompanham. Minha sombra não está comigo e eu tenho que achar meu caminho sozinha. Cada vez mais meu ser desperta, cada vez menor. Nada é diferente. As madrugadas, as pessoas e as ruas são as mesmas. Justo eu. Logo eu, fui ser tão diferente.
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dia 105 As luzes laranjas se alternavam de segundo em segundo, o mix de sombras que se formavam no teto era intenso. Um show de fogos de artifícios entre quatro paredes. Os acordes leves do violão soavam ao fundo, as palavras precisavam ser cantadas, proferidas. Que graça teria cantálas sozinha? A iluminação era restrita, tudo o que havia era luz artificial, como pessoas, de carne e osso, sem cérebro. Caminhantes sem rumo. E eu estava caminhando com eles, estava sendo levada pelo mar de pessoas. Elas eram como as ondas, se chocavam contra os outros e os sugavam, os levando consigo para o desconhecido. Esqueçamos tudo o que vimos e ouvimos, tudo o que pensamos e desejamos, haverá um massacre, um extermínio existencial. As palavras ainda precisavam ser cantadas. O silêncio se apoderou daquele lugar de corações pulsantes e almas vazias, mas de mentes gritantes. Uma pena a vida não ser como nos livros.
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não há
nenhuma
porta, nenhum nenhum
cadeado, ferrolho, que
você
pode
colocar sobre a
da minha
LIBERDADE
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mente
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dia 107 Era algo novo e bom. Dificilmente essas duas características se encaixam quando o assunto sou eu. Não parecia real. Os números do telão à minha frente passavam devagar e eu via tudo se mover no mesmo ritmo. Todos eram os mesmos, menos eu. Diante de tudo aquilo, o meu eu, não pareceu se importar com a origem ou com definições exatas sobre si, só queria que aquele momento não fosse quebrado. Não fosse queimado e coisas fossem engolidas pelo fogo. Naquele momento, eu parecia estar numa valsa, meus pés estavam no controle, mas eu queria seguir a música como se aquela noite fosse eterna. E está sendo. Ninguém estava lá. Apenas nós, amigos. A minha percepção dos mínimos detalhes, a visão além do alcance, é para que eu sinta a vida, que eu a desfrute e depois capte a sua essência e, claro, escreva sobre o bem ou o mal. Poderiam cortar-me a língua fora, nada mudaria, eu não deixaria de pensar o que penso, não pararia de escrever, todas as palavras que derramo sobre o papel é o que eu sou, como posso ser. Por aí à fora, eu posso ter uma máscara e usar a mesma roupa que todos usam, mas o meu interior... É a minha arte.
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dia 108 O paraíso está bem distante. A morte bem próxima. Meus olhos encontraram os olhos daquele animal de pelo branco, eles eram um misto de inocência e felicidade por me ver. Aqueles olhos me acompanham há nove anos e eu sei que é genuíno. Ninguém nunca me olhou assim. Ele entendia minha dor, talvez até a compartilhávamos. “Ele não é o que você imagina, assim como os outros”. No meio da multidão essas palavras ecoavam por todo o lugar. Ele era a minha casa, eu olhava para ele e via que todo o resto estava errado. Olhei para ele e então para o relógio de pulso. Eu estava atrasada. O animal me acompanhou naquela longa noite, pude ouvir o seu lamento quando os primeiros raios de sol apareceram, ele sabia que tinha de ir embora. Se eu pudesse escolher?! Não ficaria mais um dia presa aqui e pediria para ser levada com ele. Para o céu ou inferno!
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dia 122 Jurei a mim mesma não mais falar de amor, ou do que julgo ser amor. Aquela sensação de obsessão e entusiasmo está voltando com toda força e eu não quero estar enganada dessa vez. Porque eu te assustaria com o meu passado? Meus anseios, receios e segredos. Os segredos, por enquanto são apenas meus. Eu poderia te dizer por onde andei e te mostrar minhas marcas. Poderia te mostrar o monstro que cresceu dentro de mim e agora está adormecido dentro de sua jaula, que está vivo apenas pelas migalhas de esperança que lhe ofereci, era tudo o que eu tinha. Para mim e para ele. Borboletas no estômago, fazia muito tempo que eu não as sentia, noites em claro sem nenhuma razão aparente. Uma árvore seca, no meio de outras, pode florescer, não pode? Eu poderia mentir e dizer que não terei vontade de correr a qualquer momento. Mas eu quero que quando essa vontade me vier à mente, seus braços me envolvam num abraço sufocante que faça meu coração despertar de uma só vez. Que a cor do luto, não seja a minha cor oficial novamente. Pude ver, pela fresta da porta, alguém parecido com você passar, o acompanhei com os olhos, meu peito pareceu se encher de alegria e minhas mãos começaram a tremer de nervosismo. Oh não! Acho que estou me apaixonando... De novo.
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dia 145 Noite dessas senti sua falta, mas não uma falta superficial que só é você estar perto, passa. Não. Sinto sua falta constantemente, quando estou na sala e você no quarto, quando estou na cama e você na cadeira. Mesmo ao meu lado, eu sinto sua falta. Te quero o mais perto de mim possível. Noite dessas lembrei de quando veio dormir na minha casa pela primeira vez e foi o primeiro cara ao deitar na minha cama, o primeiro a me abraçar durante a noite e o primeiro que ocupou o vazio da minha cama que só parece aumentar a cada dia em que não está nela. Eu aqui sozinha e você sozinho. Nós poderíamos estar sozinhos juntos, mas temos todo o fim de semana para isso. Tenho o fim de semana inteiro para me apaixonar mais por você, para me irritar com você e te pedir desculpa por alguma grosseria que eu fiz. Tenho o resto do mês inteiro para esperar pelo próximo décimo sétimo dia para sorrir quando te ver ao meu lado.
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dia 148 Trago na mala vazia pesadas cartas amassadas e rasgadas de um passado que foi ontem, carrego uma solidão de vinte anos e um nó na garganta de amores passados. Trago na bagagem a falta de luz, e a falta de sono que faz meus olhos temerem a claridade. Essa nova fase é como um prato de comida para quem passou meses de estômago vazio e o excesso de comida o deixa satisfeito, porém com mal-estar. Trago coisas que só meus olhos podem ver e minha boca não pode pronunciar. Um amor que não se mede, mas que machuca. Meus pés podem acompanhar os teus, meu caminhar deixará rastros para que possa segui-los. Terão momentos em que precisarei soltar tua mão para andarmos lado a lado, em outros, terei que sentir tua falta para poder te abraçar como se fosse meu último dia. Talvez porque mesmo chorando, quando você sorri, as lágrimas cessam. Talvez porque quando meus olhos encontram os teus, o restante parece tão pequeno, a dor parece distante e a queda é amortecida. Mesmo magoada, o que sinto por você é maior. Você não pode tirar vantagem desse sentimento por estar exposto, você não pode fazer o que os outros fizeram e apenas esperar meu perdão. As cicatrizes que tenho de ontem são o que fazem ser o que sou hoje. Te entrego minha alma, mente e corpo, mesmo trazendo uma bagagem tão pesada, se você for meu.
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dia 153 Eu preciso escrever isso. Preciso escrever antes que fique louca com tantos ressentimentos guardados. Você continua repetindo que não existe mais “você” e “eu”, e sim, “nós”, mas posso acrescentar que nunca me senti tão “apenas eu”. Logo quando achei que dessa vez ia dá certo, quando achei que essa seria minha última tentativa bem-sucedida, você quebrou o feitiço que lançou em mim, justo quando eu havia caído de joelhos aos seus pés e estava disposta a mudar e lutar, você continuou a me decepcionar. Enquanto eu fingia que tudo estava bem, em gestos eu me escondia e sufocava minhas lágrimas. Enquanto ambos fingíamos estar tudo bem, meu coração acabou sendo estraçalhado, mais uma vez. E o meu perdão parecia tão distante, que eu sofria mais por não o achar para te dar. Sofria mais ainda por não saber o que fazer com a agonia de estar de mãos atadas, mais e mais por ter que ficar calada quando tudo o que queria era gritar e despejar todas as minhas dores, que por você passam despercebidas, que me sinto traída, humilhada, desprezada e subestimada. Mas tudo o que continuo a fazer e me torturar, sozinha num quarto, fingindo ser inatingível quando não ouço de você o que eu queria, quando não sinto vir de você, o que deveria. Se não posso ser o que quer, quem mais eu poderia ser? Talvez tudo o que eu precise é de uma repaginada, uma noite com amigos. Qualquer coisa para te manter longe da minha mente por apenas uma noite, para que eu consiga pegar no sono sem ter que passar inquietas horas na cama.
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Eu não posso correr para os seus braços se você desejar abraçar outro alguém. Não posso te dizer que te imagino no meu futuro, porque eu estaria mentindo, o futuro é apenas um rabisco negro de mim mesma, mas também estaria mentindo de dizer que imagino minha vida sem você agora. Não sei se estou pronta para te deixar... Estou a ponto de desistir, mas se eu o fizesse, você lutaria por mim? Porque eu esperei você ligar. E esperei você vir. E continuo a esperar.
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dia 156 Gostei de você desde a primeira vez que te vi. Nossos reflexos no espelho e o modo que nossos lábios se completam, como consegui me sentir com quinze anos novamente com você, por você. De uns dias para cá, comecei a gostar ainda mais dos seus olhos e como eles me olham, gostei ainda mais de você quando me fez chorar de tanto rir. Gosto de quando reconhece as minhas qualidades. Não esperava gostar tanto de alguém depois de tanto tempo, mas não há mais como negar. É cedo dizer que somos um para o outro, que estarmos com quaisquer outras pessoas seria perda de tempo, mas quando chegar a hora, é bom que estejamos prontos. Talvez tenhamos pulado etapas, diferentemente de outros relacionamentos, inclusive os nossos anteriores, atropelamos um pouco os passos, tropeçamos. Mas eu não tenho dúvidas. Não espero ter dúvidas. Como qualquer casal, temos nossas diferenças, mas talvez a nossa diferença seja a escolha de ficarmos juntos, eu escolhi você, estamos de acordo com isso?!
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dia 164 Sendo uma fênix e sempre renascer, te amando, como ama um poeta, poderia eu te dar meu amor incondicional? Posso eu aprender os passos da tua dança e conseguir te seguir? Minha solidão é acompanhada pelos teus feitiços e segredos. Dói em mim, dizer que você tem que partir, me machuca descobrir que nada era o que eu imaginava. Eu tenho que te dar adeus, se eu quiser seguir em frente. Irei sofrer ao te ver atravessar a rua, irei chorar ao ver que não vai olhar para mim por cima do ombro. E é por imaginar tanto sofrimento que eu não queria ter que me despedir e seguir em frente. É por não estar plantada em meu próprio lugar que eu não consigo deixar isso ir, não consigo parar de pensar. Sabendo que eu não tenho mais nada, além disso, estou tentando ao máximo me pegar e me garantir nisso, mas sei que quando acabar, voltarei para o estágio um.
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dia 192 O ponteiro do relógio parece girar cada dia mais rápido, meu coração parece bater mais rápido a cada dia, meus dedos ansiaram e meus pensamentos foram de encontro com as palavras. Há dias venho guardando versos, qualquer que fosse a ideia eu as colocava no papel, mas hoje, todas elas pareciam como as outras, não tinham nada de diferente. Exceto estas: Partes dentro de mim foram se rompendo, farpas passam de raspão contra minha pele. Se alguém quiser entrar na minha vida, que esteja pronto para ser e não ter. Só entregarei tudo o que sou para quem me trouxer paz, para me dar algo mais, além de tempo perdido e desgaste emocional. Tem que querer, que ser, que ver algo mais além do seu mundo, tem que querer o meu também, para torná-lo nosso. Naquele tempo, eu preferi ter opção de estar sozinha ou acompanhada por quem não me queria por perto de verdade. Os dias silenciosos me esperavam há semanas e agora voltaram com todo sabor de champanhe e nostalgia. Com aquele sentimento saudosista de que tudo está acontecendo da mesma forma, e no final das contas, é a melhor pedida. Então vai um ou dois copos?
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dia 196 Lembro como eu me considerava uma pessoa corajosa, determinada e sonhadora. Ultimamente fui engolida por algo maior, o medo, o medo de ficar cercada por pessoas que saibam meus pensamentos mais profundos, o medo de ser feliz, de nada acontecer como planejei. Deixei de sonhar com o meu futuro depois de tudo, deixei de almejar tudo o que parecia ser certo e bom para mim, com medo de que não fosse tão fácil ou tão bom assim. Me sinto tão exausta por todo início de ano ter o mesmo pedido: não me deixe só. Ainda cansada de não saber o que quero ser e não saber onde pertenço, tão vulnerável em todos os lugares que frequento, tão presa em minha própria mente. Todos os que um dia foram meus amigos, me traíram, de uma forma tão sorrateira que eles ainda devem acreditar que eu não percebi, todas as decepções, uma por uma, me deixou mais afastada do que o esperado, pouco a pouco fui vendo a vida como algo inútil se você não está disposto a ser superficial e inconstante. Penso a cada dia que não há sentido em viver num meio onde ser verdadeiro e leal não é de grande importância, onde se ter caráter é motivo para ser excluído dos meios sociais. Em um canto qualquer da cama como se alguém estivesse ocupando a outra metade, entendi que estava querendo sentir pena de mim mesma porque ninguém sentia. Eu não estava inteiramente triste, por isso não consegui chorar e não estava completamente infeliz por estar sozinha.
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Por um momento, senti uma angústia tão profunda que tomou conta de toda parte do meu corpo, senti a dor de todos os abandonos durante toda a minha vida, senti a dor de pensar em todas as interrogações que nunca foram respondidas. Fui substituída por tantas futilidades que cheguei a acreditar que merecia. Os elogios pareceram ser jogados ao vento e eu deixei de ser quem sou, me perdi em minha própria tristeza e hoje não sinto a necessidade de conversar com as pessoas sobre a minha vida, por achá-la medíocre, não vejo razão em ter alguém comigo vinte e quatro horas por dia quando só tenho vontade de questionar, repetidamente, os relacionamentos fracassados que tive, aqueles poucos minutos que permanecem na minha memória e a aflição agonizante das horas seguintes parecem não querer ir embora, não consigo recordar quando tudo começou a dar errado, mas ao relembrar, eu então consegui chorar.
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dia 200 Continuo negando que acredito naquela história clichê em que o príncipe salva a donzela. Por mais que negue, eu quero acreditar nisso, preciso acreditar que não ficarei sozinha pelo resto da vida, preciso acreditar que ainda tenho bastante tempo pela frente, até quando olhar para os lados e ver que pessoas da minha idade estão um, dois passos à frente. Encarei aquele dia dizendo para mim mesma que estava bem, esperei desesperadamente pela noite, até que sentei no chão, encostei-me na cama e, mesmo com o quarto todo escuro, eu fiquei olhando para a fresta de luz que atravessava por debaixo da porta. Como se estivesse esperando ansiosamente por sombras ou sons de passos, imaginando que, ao abrir a porta, alguém poderia fazer tudo ir embora, que poderia afastar todos os monstros, me sacudir pelos ombros e dizer que não estou sozinha. Perdi o jeito de amar incondicionalmente quando notei que estava me humilhando por amores que jamais teria retorno, por pessoas que nunca estariam ali por mim, quando percebi que minha perspectiva não havia mudado, quando o meu negativismo era, na verdade, a vida real, sem sorte ou azar. Mas se alguém perguntar, diga que estou bem, eu sempre estou bem.
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dia 208 Fechei os olhos para enganar a minha mente, para obrigá-la a esquecer todas as ações, erros e escolhas. Fechei os olhos para não te ver e tentar esquecer. Não funcionou, claro. Ainda pude sentir como foi tê-lo em meus abraços, como era engraçado a nossa diferença de altura. Ainda pude lembrar de como me olhou no primeiro dia e no último. O beijo de adeus que eu interpretei como um sinal de boas vindas, então eu retribui com um de “até logo” e você me acompanhou. Aquele foi o meu melhor beijo e sempre que te vejo, eu desejo que você me olhe e lembre dele. Nada estava bem até você aparecer e tudo ficar na média. Eu não queria namorar você, nem não esperava que você quisesse, nem mesmo esperava que sentisse hoje o que eu não senti quando nos falamos diretamente pela primeira vez. Não sabia que ia te ver no meio da aula e iria presenciar meu coração murchar. Nem imaginei que ia sonhar com você mais de duas vezes por dia, de olhos fechados ou não, muito menos que a sua letra fosse igual ao do meu tio preferido. Queria considerar esta, uma história absurda do meu consciente, a de que você se arrependeu, de que se tivesse escolha estaria comigo, que nada pôde fazer. Queria ter certeza de que, mais uma vez, não fui um caso até outra tomar um lugar que sequer cogitou em ser meu. O dia foi ensolarado e não dei importância para a presença do sol, ao abrir os olhos foi como se o dia ficasse negro e um raio me atingisse, ter que encará-lo todos os dias me deixa inquieta, com todos os pensamentos borbulhando.
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dia 210 Preciso respirar. Preciso me afogar. Preciso descansar. Bom seria poder descansar no teu colo, sentir teus dedos passeando pelos meus cabelos. Quem sabe um dia a gente possa ser como Tiago e Isabelle, Marcelo e Mallu. Talvez um dia eu aprenda a amar sem sofrer, sorrir de verdade. Não sou mais a garota que eu costumava ser, pela primeira vez não quero saber para onde estou indo É isso que chamam de “viver o momento”? Não estou caindo, garanto. Sinto falta dela algumas vezes, de como era ter uma melhor amiga, é esquisito saber que todo esse tempo tenho ficado bem sem conversar e me confessar com alguém da minha idade. É triste saber que estou melhor em unidade.
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dia 211 Lá estava ela. Daquela vez resolveu me aparecer na cor amarela, cortada ao meio, do lado oposto ao qual costumávamos nos encontrar. A lua. Apesar de uma áurea tenebrosa pairar ao seu redor, ela estava inspirada, era pura poesia de uma maneira melancólica. Não muito distante, avistei uma teia de aranha completa, daquelas que só se vê em desenhos animados, se alastrava do varal até a barra de ferro. Consegui ver através da teia, a lua. A luz da lua deixou a teia mais evidente e me perguntei: “É isso?” Por mais que eu enxergue beleza nas pequenas criações da vida, algo parece estar errado, está faltando algo.
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dia 216 Uma velha amiga decidiu voltar e se aconchegar ao meu lado, não falou nada, só ficou aqui me fazendo companhia. Soltei um suspiro de quem está com o peito apertado e palavras não são o bastante para expor o que está guardado. Sons não são o bastante e perfumes são reconfortantes por um tempo. A cada dia que passa eu reconheço que foi tudo um erro, eu fui meio boba e meio esperta, mas foi o meu melhor erro. Me passou pela cabeça, certa vez, que eu deveria entrar no mar como nunca mais havia feito, esperar o sol se por e simplesmente colocar os pés na areia. Eu estaria naquela imensidão azul, sem você, por conta própria, estaria sozinha dentre ventos frios e maresia. As vezes lembro da quantidade infinita de perguntas que mantive guardadas Você ainda lembra de mim? Diga que lembra o meu nome. Quando tudo, que parecia perfeito, começou a dar errado? Os anos passam e o teu amor adolescente por mim não me sai da memória.
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dia 220 Sem aviso prévio, tudo o que eu queria esquecer veio até mim noite passada e não me deixou escapar até que eu colocasse para fora o que estava me devastando, me desesperando. De imediato, eu não entendi a razão daquela dor, pela primeira vez o machucado não era uma ferida semiaberta, era recente demais, não tinha nada a ver com o passado, pela primeira vez o meu peito foi cortado quando me ocorreu como a vida seria sem você. O corte ficou ainda mais profundo e eu, mais uma vez, resolvi me expressar em palavras como a sua presença é importante para mim. Temos nossos defeitos, você e eu, temos nossas mínimas diferenças, mas uma das coisas mais importantes que temos é a confiança mútua. Por amor, eu pude comprovar como é difícil encontrar uma melhor amiga como você, pude descobrir que você é a única. Mesmo sabendo que um dia terei que me despedir e ir para o mundo, você nunca ficará em segundo plano, quando o oxigênio não é o suficiente para me manter viva, o teu apoio e compreensão é o meu aconchego. Sua dor é a minha dor, sua tristeza é a minha tristeza e as minhas conquistas são nossas. Sem você eu não existiria e, apesar das minhas súbitas mudanças de humor, o meu amor é o mesmo.
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dia 231 Em meio a ideias e teorias trazidas após a meia noite, após algumas páginas lidas de um livro qualquer notei que, ao me tornar realista e pé no chão demais, eu havia perdido a facilidade de sonhar, sequer sabia como fazer, caso precisasse fazer novamente. Há tempos que as palavras não fazem mais o mesmo sentido quando as ponho no papel, meu coração não está quebrado, muito menos cego e menos ainda pertence a outro alguém, agora eu sou inteira e completamente minha, desde sentimentos, pensamentos e ações. Ao ler isto muitas pessoas que conheço diriam que sou louca ou que me tornei egoísta. É possível que eles estejam certos, apesar de nunca ter me sentido tão bem em minha própria pele quanto agora, estou naquela fase que todos chamam de “aceitação”, tenho dispensado pessoas por falta de paciência, interesse. Neste momento, sentada num cantinho do meu quarto escuro sinto verdadeiramente a liberdade, aos 21 anos vou para onde quero sem me preocupar se outra pessoa vai se chatear com as minhas atitudes, por muitas vezes felizes ou grosseiras demais. Sou livre para cortar o cabelo ou não, para sair, não ter que ir para lugares desagradáveis para ter conversas que fazem o ponteiro do relógio andar mais devagar, ouvir adjetivos que não ajudam em nada na minha autoestima e autoconhecimento, sou livre para ser ou não. Por muito tempo eu não soube que era desesperada, como tantas outras mulheres, para ser aceita, para ser amada ou para o alguém de outro alguém. Qualquer pessoa era digna de uma chance, quando essa mesma pessoa não reparava que eu também precisava de uma chance, eu também precisava ser vista e eu não precisava gritar para isso, não preciso fazer escândalo para ter atenção.
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Irei cometer centenas de erros a mais, mas sei que com cada um, mesmo com as consequências que virão irão me fazer levantar como os outros fizeram. Não quero dar início a algo que mais parece uma lista de prós e contras do que um relacionamento. Talvez a tentativa casual sem definição e não intencional possa ser a melhor, aí quem sabe, eu reaprenda a sonhar.
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dia 245 Enterrei todos os meus sentimentos por ele no fundo do armário e esperei por semanas até que eles fossem embora, ou fingi esperar que eles fossem embora, fiquei quieta na minha. Tentei conversar com outras pessoas, não quis incomodá-lo, até que não aguentei e fui até ele, senti falta de alguém conhecido. Tentei me segurar, tentei não ser inconveniente demais e parecer que estou insistindo em algo impossível, mas cheguei ao meu limite, preciso desatar as palavras entaladas. Não sei como é a rotina dele, não sei quando é dia ou noite, se está saindo com alguém, gostando de verdade de alguém, só sei o que eu sinto e não sei mais como lidar com o que está acontecendo. Sim, concordei em sermos amigos, mas percebo que ele anda tão distante que não sei se é razoável esperar três meses por um “não”. A nossa história é bem complicada, boa parte, por minha causa. Vai parecer loucura, vai parecer desesperado que agora eu tente consertar todas as burradas que cometi, mas, agora, eu realmente estou gostando dele. Fico me perguntando como ele está se sentindo, querendo saber as novidades, quando converso com algum outro cara, que possamos ter algo mais, logo me lembro que nenhum conhece a minha história como ele conhece, que nenhum se importa comigo como ele se importa, ou se importava, que depois de tudo, sempre foi o mesmo comigo, até quando passei por várias merdas em que eu não era a mesma. Meus olhos estão bem abertos para o passado, tudo aquilo que não vi, estou vendo agora e talvez seja tarde demais, mas preciso que ele me diga caso seja, quero a verdade, quero saber o que ele pensa de mim, se devo esquecer toda essa história, do contrário... Eu te espero.
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dia 250 Mais uma vez, venho desabafar sobre o quanto sinto que estou estagnada, pés fincados ao chão e as raízes podres do passado que persistem em me prender o corpo. Observei casais, amigos meus e estranhos, caminharem de mãos dadas para longe de mim, e, aquela cena pareceu estar tão longe da minha realidade que vivo meus dias através dos olhos de outras pessoas. Vivo num contínuo “stand by”, quando menos espero aquelas pessoas e desejos voltam à mente, como se o tempo não tivesse passado. Adulta, como hoje sou, não posso mais sentir tanto as pancadas da vida como antes, e tanto que não sinto, nem sinto mais os outros que tanto implicam com minha antipatia pelos problemas e dores alheias. Sem ter mais medo de ser quem sou, eu quero dar um basta à solidão que tenta, arduamente, penetrar minha alma ano após ano. Por mais que tente, aquilo que foi tão almejado, milimetricamente planejado simplesmente não era para ser. De nada adianta ficar perdendo tempo tentando montar um quebra cabeça e pensando “e se”, porque o tempo de algumas histórias acontecerem já passou e a única decisão decente que se deve tomar é passar por cima e seguir em frente, fazer outros planos, conhecer outras pessoas e dar a si mesmo uma nova chance.
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O fim é sinônimo de recomeço
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quele minúsculo apartamento parecia gigantesco. Estava tão vazio quanto antes dele ter colocado os pés ali. Ficar deitada naquela cama, debaixo daqueles lençóis me fazia querê-lo novamente. Toda aquela situação estava despertando em mim um lado masoquista que eu desconhecia, eu estava me martirizando, lembrando de todos momentos. Eu precisava de forças para superar aquilo. Como eu podia arranjar outro amor, se eu continuava sofrendo por um antigo? Em quem eu poderia me segurar se não havia ninguém ali? As peças do quebra cabeça estavam soltas por aí, perdidas no espaço. Vulnerabilidade. Distração. Traição. Eu estava mesmo assim, pensamentos sendo atormentados por um passado não tão distante. Traída por meus próprios sentimentos e por ele, ele me traiu. Me apunhalou pelas costas enquanto se fazia de “meu aliado”. Por alguns segundos eu encarei meu reflexo no espelho e não me reconheci. Certo dia, quando eu já estava me recuperando, meu celular tocou. O outro lado da linha estava mudo. Enquanto eu, repetidamente, dizia “alô”. Era ele. Só soube depois que desliguei e fui checar o número. Por que ele ligou? E só agora? Meu coração bateu forte parecendo que ia saltar do peito. O meu foco mudou. O raciocínio ficou lento, assim como tudo ao meu redor. Meu mundo era cinza, minha realidade era preto no branco, ele me trouxe cor e desejei que nunca o tivesse feito. Sem isso, eu conseguiria lidar com as coisas de um jeito diferente. Ele havia provocado um buraco negro ainda maior em meu peito. Como ele terminou, como ele me enganou. Agora eu acreditava que os próximos vão fazer o que ele fez. Não só ele, como tantos outros fizeram, mas ele fez da pior forma. Eu não consegui fazê-lo, nem nenhum outro, se apaixonar por mim. Já estava chegando ao nível ridículo de me fazer de vítima.
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Qual era o problema de me permitir ser dramática e chorona uma vez na vida? Ele não ia voltar, eu tinha certeza. Nem queria que voltasse. Mas porque eu não conseguia esquecer? Por que ele não podia ser meu? Ele fingiu ser meu. Ele me salvou e eu não pedi por isso. Não quis nada disso. O fim de semana estava apenas começando e eu estava sem planos. Olhei para minha gata Amy que também me olhou e respondeu com um “miau”. - Te entendo. – respondi para ela. Lá estava eu, falando com uma gata. A solidão não me fazia bem, assim como a embriaguez. Mas já que nada está tão ruim que não possa ficar pior... O melhor a se fazer era comprar uma garrafa de rum! Peguei as chaves e saí do apartamento, caminhei pelo corredor e entrei no elevador. Minutos depois, logo entrei no carro e dei partida, indo em direção ao primeiro supermercado que aparecesse. Como um atalho, entrei num beco escuro que estava repleto de pessoas sujas, algumas deitadas no chão, outras andavam cambaleando devido ao excesso de álcool. Não pude evitar que meus olhos ficassem marejados. Eu estava como eles. Sem rumo. Pedindo ao universo por algo especial. Me senti desprotegida como nunca antes. Nova York que nunca dorme, esta noite não parecia ser boa companhia. Parei no sinal vermelho e olhei para o relógio de pulso, os ponteiros marcavam uma e meia da manhã. Encostei a cabeça no banco e fechei os olhos por um instante. Comecei a pensar no que eu estava fazendo da minha vida. O que era minha vida? O que ou quem eu era? Ouvi buzinas ensurdecedoras atrás de mim, o que me fez abrir os olhos e continuar meu caminho. Senti a claridade entrar pelas frestas da persiana e abri os olhos com dificuldade encarando o teto branco, eu havia
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adormecido no sofá e ficaria com uma terrível dor na coluna pelo resto do dia. Amy havia se deitado em minha barriga, ainda dormia profundamente. Em movimentos lentos a peguei e a coloquei no canto do sofá, ficando de pé e me alongando em seguida. Minha cabeça ainda estava com aquela sensação entorpecida por causa do rum. Prendi o cabelo num coque frouxo e fui até meu quarto, lembrei-me de todo o meu monólogo da noite anterior e resolvi fazer algo a respeito. Jon havia sido bom por um tempo, eu ainda ia amá-lo por mais outro tempo, mas se ele não me amava mais, porque ficar me torturando? Eu estava me tornando minha própria inimiga. Abri a porta do closet e havia ali uma camiseta xadrez dele, uma caixa cheia de fotos e cartas, que eu havia jurado para mim mesma que me livraria daquilo, havia chegado a hora. Peguei a camiseta, a caixa e em passos apressados fui de encontro à cozinha. Peguei um isqueiro e a garrafa de álcool, despejei todas as coisas dentro do lixo e incendiei. Eu queria queimar a presença dele dentro daquele lugar, queimar meu passado, nós dois. Por mais confusa que eu estivesse, por mais qualquer coisa que eu estivesse sentindo, eu não podia deixa-lo atrapalhar a minha vida. Por mais que eu quisesse me trancar dentro de meu quarto e esperar toda aquela história passar, eu sabia que fugir não era a melhor escolha. Observei as chamas tomarem conta daqueles pedaços de Jon e se transformarem em pó. Talvez nosso relacionamento tivesse sido assim, incendiou o meu mundo e logo se transformou em nada mais nada menos que lixo. Pelo resto do domingo eu procurei me ocupar em cozinhar para mim mesma e ler algum livro que não tivesse nada de romance, com algum personagem santo e adorável que o nome começasse com a letra J. E acordei no dia seguinte com o mesmo mau humor de Amy, estava na hora de ir trabalhar e como havia me atrasado um
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pouco, resolvi tomar café a caminho do escritório. Vesti meu casaco vermelho e prendi os cabelos num rabo de cavalo. O vento estava mais leve naquela manhã, numa temperatura agradável. Desci as escadas da estação, em poucos minutos o aglomerado de pessoas que estavam ali se apressaram para pegar um lugar no metrô. Entrei no metrô que estava vazio em relação aos outros dias, procurei por algum assento desocupado e não encontrei, tive que me contentar com a barra de ferro para me segurar. Olhei para cima e respirei fundo. Estava torcendo para que aquele dia fosse o recomeço de tudo. Era uma nova semana, outra segunda-feira. Olhei para o lado e avistei um rapaz de profundos olhos verdes que sorriu para mim e em uma resposta automática eu sorri de volta. Abri a porta do apartamento e notei que Amy não estava deitada no sofá, como ela costumava ficar, supus que ela fugira... De novo. Respirei fundo, dei os mesmos passos de volta e fechei a porta. Ela poderia estar no beco ao lado do prédio. Rapidamente saí do elevador e fui até o hall, encontrei Amy nos braços de Alex. Assim que me viu, ele abriu aquele largo sorriso de sempre, se pôs de pé e se aproximou. - Essa sua gata gosta muito de fugir, já descobri porque se dão tão bem. – Ele disse divertido, lutei contra meus instintos de responder de forma grosseira e peguei a gata, a encaixando em meus braços. - Bom te ver também, Alex. - Só estou brincando contigo. - Tá, tá. – Relaxei os ombros e lhe dei um beijo na bochecha. – Só o que você está merecendo. Segui em direção ao elevador, sendo seguida por ele. - Ei, eu te liguei no sábado, mas só caía na secretária eletrônica. - Hum, trabalhei até tarde num artigo, estava bastante
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inspirada. Ele assentiu com a cabeça e entrou no elevador junto comigo, enquanto eu fazia carinho na cabeça de Amy. - Eu vim para te fazer um convite, na verdade. “Convite”, aquelas letras já faziam meu sinal de alerta disparar, vindo da boca dele então, me faziam querer sair correndo. Alex e eu só havíamos conversado abertamente sobre relacionamentos pouco tempo atrás e, ele me parecia bem determinado em me conquistar, o que, por um lado, me assustava. Era como se ele me pressionasse apenas por estar perto e aquele sentimento era angustiante. - Convite? – Me pronunciei depois de minutos em silêncio dentro do elevador, enquanto caminhava até o sofá da sala. - Sim. Quero que você vá passar o Natal comigo e minha família, em Connecticut. Eu sabia! - Não acha que está cedo? - Sinceramente? Não. Nos conhecemos por acaso num metrô e daí? Já estamos de rala e rola faz mais de quatro meses, você passar o natal comigo não é nada de mais. - Mas eu vou conhecer sua família. - Também não vejo problema. Olhei em sua direção e levantei as sobrancelhas em surpresa, ele me parecia bem seguro e parecia não medir a consequência das coisas. Tudo bem que, realmente, não tinha nada de mais conhecer os pais dele, porque afinal, amigos fazem isso o tempo inteiro, apesar de que o que tinha entre nós era algo diferente e eu só temia o que podia vir a partir desse “feriado em família”. - E então? – Alex continuou me olhando, esperando uma resposta e antes que eu pudesse piscar, assenti com a cabeça meio devagar: - Tá, eu topo. - Maravilha! – sorriu novamente. A noite havia chegado rápido, logo depois de jantarmos uma boa pizza, fomos para o quarto.
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Já era mais de duas da manhã e eu estava com insônia. “Do que tem medo, Norah?” Minha mente continuava a me perguntar isso enquanto eu observava Alex dormir profundamente ao meu lado, alguns fios negros caiam sobre seu rosto, ele conseguia ser incrivelmente bonito e parecia clichê demais achá-lo mais bonito que os outros que deitaram naquela cama. Era tudo demais, tudo maravilhoso e confuso demais pra ser verdade, aquela não era a minha vida, não parecia ser. Eu não sabia se tinha medo de toda aquela perfeição desaparecer da noite para o dia ou de nunca me sentir boa o suficiente para ele. Ele poderia ter qualquer mulher no mundo, isso era fato. Naquele estado emocional que eu me encontrava, sabia que precisava me sentir segura, me sentir forte, mas como? No dia seguinte, pela manhã, liguei para minha mãe que não atendeu o celular, mas lhe deixei um recado na secretária eletrônica avisando que ia passar o natal na casa de Alex. Ela já sabia o suficiente sobre ele para imaginar que estávamos meio que deixando esse termo de “apenas amigos” de lado. Também sabia que eu estava cismada o bastante para querer ouvir um bom conselho de mãe, que seria: Tenha paciência e espere. Mesmo não a tendo por perto, iria tentar seguir essa linha de pensamento. Já era dia 24, pela manhã Alex veio me buscar logo cedo para que pudéssemos ir ao supermercado antes de pegarmos estrada com destino a Connecticut. Minhas coisas couberam em uma mochila de tamanho médio, o que o admirou. Ora, eu só iria passar duas noites, não precisaria de muita coisa. Enquanto empurrava o carrinho de compras no supermercado, cantarolava ao som de Have Yourself a Merry Little Christimas, definitivamente eu era obcecada pelo natal, todo aquele clima adorável e infantil me fazia bem, sem falar da neve.
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Olhei para a seção de bebidas e lá estava Alex com uma expressão confusa no rosto, enquanto olhava para as garrafas de vinho, aproximei dele com o carrinho e continuei observando em silêncio, até que ele me olhou por cima do ombro e sua confusão se transformou num sorriso. - Pode me ajudar? - Hum, essa garrafa. – Disse-lhe e apontei para uma garrafa de vinho tinto que ele segurava na mão esquerda. Sorriu novamente e colocou a mesma no carrinho. - Você não acha que é muita coisa para uma ceia de natal na casa dos seus pais? Aposto que eles já compraram muita coisa. - Não conhece minha família mesmo. – riu e beijou meu rosto. – Tenho cinco irmãos, minha querida. Comida não sobra por lá. Depois temos que sair daqui e comprar presentes. - Ok, você quem sabe. Vamos chegar lá meio tarde, eu acho. - Só não podemos chegar de mãos vazias! – Ele riu. – Não vai comprar presente pra sua família? - Ah, é, já comprei na verdade, pretendo passar a virada do ano com eles. Notei que os olhos dele ganharam um brilho de esperança e engoli em seco, sorrindo fraco, não sei se deu pra disfarçar bem, Alex estava com intenções mais sérias do que eu imaginei e pensei que era aquilo que eu queria também, até perceber que estava surtando por dentro. Depois de horas batendo perna à procura dos presentes, estávamos entrando no condomínio em que a família dele morava, era bem bonito e calmo, enfeites de natal por todos os lados, as crianças correndo e brincando sobre a superfície branca que cobria a grama, era o clima familiar mais impecável que eu tinha presenciado. Sorri de lado por me sentir tão confortável num lugar e olhei para Alex que já estava estacionando o carro em frente a uma casa azul simples. Da calçada até a entrada tinha um caminho de pedra, um sedan preto estacionado na garagem.
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Tudo parecia calmo, até que saímos do carro e alguém abriu a porta da casa falando alto. Um senhor de cabelos grisalhos, calvo e barrigudo sorriu ao nos ver e foi se aproximando para nos cumprimentar. - Vocês demoraram, Alex! – Ele disse com uma voz alegre e firme. - Demos uma parada para comprar as coisas, pai. - Oh, tudo bem. – O sr. Foster abanou a mão no ar e olhou para mim. – E você, mocinha? Norah, não é? - Exatamente. Muito prazer. – Estendi a mão, mas ele me puxou para um abraço apertado que quase me deixou sem ar. Ouvi a risada abafada de Alex ao meu lado, até que o pai dele me soltou. - Vamos, entrem, devemos apresentar a Norah a sua mãe. Olhamos um para o outro, ele com uma expressão despreocupada e eu, surpresa. A ceia ainda estava na metade e eu já tinha me divertido demais com os Foster, principalmente o irmão mais novo de Alex que era uma comédia.Todos também pareciam estar gostando de mim, até agora ninguém havia me olhado de cima a baixo com cara de desdém. Limpei minha boca com o guardanapo e repousei minhas mãos no colo, Alex, que estava ao meu lado, colocou sua mão em cima da minha. Olhei para ele e sorri sem jeito, puxando a mão devagar, coloquei uma mecha de meu cabelo atrás da orelha. Percebi que ele não entendeu minha atitude e aproximou o rosto de meu ouvido, perguntando em voz baixa o que estava acontecendo. - Eu vou ao banheiro. – Respondi no mesmo tom de voz e levantei, chamando a atenção de todos, sorri para eles e saí da sala de jantar, subindo as escadas, indo em direção ao banheiro. Segundos depois que eu fechei a porta, pude vê-la abrir novamente. - Eu não posso ficar com você, Alex. – Disse olhando em
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seus olhos, mesmo que pelo reflexo do espelho. - E você vem me dizer isso na véspera de Natal? E porque não pode? – Ele fechou a porta, aproximando de mim. - Eu não estou pronta pra entrar de cabeça num relacionamento. – Passei a mão em meu pescoço onde o nó se formava, de novo. - Você fala como se o seu último relacionamento tivesse sido muito duradouro. - Mas foi intenso. - Durou o que? Três, quatro meses? - Não se trata disso! – Minha voz subiu um pouco o tom e percebi que ele começava a ficar irritado, passou as mãos pelos cabelos e respirou fundo antes que eu pudesse continuar, – eu nunca havia me apaixonado. - Aos 21 anos e você só se apaixonou agora? – O semblante de Alex estava um misto de dúvida e diversão. Dei de ombros em resposta e ele pareceu se conformar com a súbita mudança de comportamento. - Por isso não quer se envolver comigo? - Eu não posso passar por isso de novo, não agora, e eu sei o que vou passar por estar apaixonada por você, prefiro cortar o mal pela raiz. - Como pode ter tanta certeza? – Ele franziu o cenho. - Por que quer tanto que eu mude de ideia, huh? - Prefere que eu te deixe sair sem questionar? - Você não entende, ser rejeitada de novo, eu não suportaria. - Droga, Norah, estou me cansando de ser sua consciência! Você está sendo infantil, todo mundo é rejeitado, todo mundo é traído, é a vida. E eu não estou te pedindo em casamento, eu só quero ficar com você, mas se você escolher ir embora sugiro que faça isso logo, não vou te segurar e nem te forçar a fazer nada que não queira. Está em suas mãos agora a decisão. De início eu achei que ele iria usar algum argumento fajuto e clichê, como todos fazem, mas ele pronunciou com firmeza todas as palavras, ele estava me dando um xeque mate.
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Estávamos ambos nervosos, a ponto de explodir, não era a hora para discutirmos aquele assunto, não era hora, nem lugar. Inspirei o ar calmamente e olhei para ele, tentando recuperar meu bom senso. - Acho melhor deixarmos esse assunto para amanhã. - Santo Deus! – Alex grunhiu e então saiu apressado do banheiro. Minha cabeça estava mais confusa que dias atrás antes dele me arrastar para aquele lugar, eu precisava de ar, eu não suportava aquela pressão e cobrança. Aquele Natal estava muito estranho, eu havia aceitado a proposta por achar que conseguiria lidar com tudo aquilo, mas eu precisava me curar primeiro, eu não poderia deixar que alguém se machucasse por minha causa, seria injusto. Eu nunca fora orgulhosa demais para pedir que alguém voltasse e talvez o problema fosse esse, eu não me amava o suficiente, eu não me colocava acima de ninguém. Naquela noite, mesmo estando com raiva de mim, Alex dormiu ao meu lado. Eu sabia que ele já estava perdendo a paciência comigo, sabia que tinha que tomar uma decisão o mais depressa possível. Eu tinha duas opções: Libertá-lo antes que fosse tarde ou ficar com ele acima de qualquer medo que eu estivesse sentindo. A questão era: Eu estava pronta para deixa-lo? Estava pronta para tê-lo? Me virei na cama, ficando de frente para ele, que dormia de barriga para cima e o abracei, inalando o seu perfume. Senti as pontas de seus dedos passeando pelas minhas costas e ele pigarreou, ainda de olhos fechados, antes de falar: - Não conseguiu dormir? - Não, essas insônias estão me enlouquecendo. Ele me puxou mais para perto e deu um beijo em meus cabelos. - Você se preocupa demais, quase estragou minha véspera de Natal. – Disse num tom divertido e eu me forcei a rir para que não ficasse me sentindo tão culpada.
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- Você me bagunça, Alex. - De uma forma boa? - Mais ou menos, eu fico meio desequilibrada com você por perto, mas é um desequilíbrio interessante, no fundo, eu acabo gostando. Olhei para o seu rosto e ele abriu os olhos, me encarando. - Não entendi. - Eu não sei se estou pronta pra você. Ele revirou os olhos e sabia que eu ia começar com meu monólogo. - Só responde o que eu te perguntei quando for certeza, ok? Basta dizer sim ou não. Já falamos tudo o que tínhamos para falar, só falta sua decisão final. – Disse, me interrompendo. - Esse é o problema, eu posso não ter certeza nunca, porque eu fico confusa com relação ao que sinto por você, eu quero me arriscar sem me machucar, eu quero ficar com você sem ter medo de ser deixada. Minha voz saiu meio abafada por estar com o rosto encostado em seu peito. Alex se endireitou na cama e encostou as costas na cabeceira, segurou meu rosto com as duas mãos. - Veja bem, preste atenção no que eu vou falar porque sou sete anos mais velho que você. – Ele mesmo riu de seu início de discurso, – Nunca vamos saber se não vamos nos machucar, você tem esse medo todo aí de ser deixada, mas quem sabe se não é você quem vai me deixar? Não vamos ter as respostas do futuro, se estamos no presente. Eu só quero saber uma coisa. Você confia em mim? Seus olhos verdes continuavam a prender a atenção dos meus, aquilo tudo soou da maneira mais sincera que eu pude imaginar. Sem hesitar, encostei meus lábios nos seus e pude senti-lo sorrir com a resposta.
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