Casa | Identidade e Memória I - TCC1 - Betânia Batista da Costa

Page 1


CENTRO UNIVERSITÁRIO DO LESTE DE MINAS GERAIS ARQUITETURA E URBANISMO

CASA: IDENTIDADE E MEMÓRIA

BETÂNIA BATISTA DA COSTA CORONEL FABRICIANO, DEZEMBRO 2014.


BETÂNIA BATISTA DA COSTA

-CASA: IDENTIDADE E MEMÓRIA-

Trabalho de Conclusão de Curso (TCC), apresentado ao Curso de Arquitetura e Urbanismo do Centro Universitário do Leste de Minas Gerais, como requisito parcial para obtenção do título de Arquiteto e Urbanista, Orientada pela Prof.ª Amanda Beraldo Machado.

CORONEL FABRICIANO, DEZEMBRO 2014.


Este trabalho é dedicado às duas pessoas que contribuíram de forma singular na minha formação acadêmica e pessoal, bases de minha existência, do meu caráter, alicerces e bálsamos da minha vida. Dedico à minha mãe que não mediu esforços para me ajudar, mas o fez com prazer e amor, quando me mostrei cansada me fez ver a minha capacidade, e à minha avó materna que Deus não permitiu estar aqui para vivenciar o final desta jornada, mas me impulsionou ao seu início de maneira que jamais pude retribuir, por quem terei eterno amor, orgulho e gratidão.


AGRADECIMENTOS

Agradeço à Deus por ter me permitido e capacitado para vivenciar esta experiência, aos professores que compartilharam seus conhecimentos com dedicação, em especial a professora Amanda Machado, que me orientou com muita sabedoria e nobreza no desenvolvimento deste trabalho, aos companheiros de sala de aula que me ajudaram nos momentos de dificuldade e aos moradores do Primeiro Conjunto Habitacional Popular de Ipatinga, que me receberam com muita atenção em suas casas, contribuindo para o enriquecimento deste trabalho.


RESUMO Esta pesquisa foi desenvolvida para melhor entendimento da relação entre o usuário e o seu ambiente de moradia, quando esta residência não foi pensada para um indivíduo específico. Para isso foi necessário entender o surgimento da casa e sua evolução ao longo dos anos até os dias atuais, estudar conceitos aplicados a casa como extensão corporal e mental, fonte de memória e os seus significados simbólicos. Todos os conceitos aplicados a casa foram contextualizados com obras de referências como, a Casa Bordeaux de Rem Koolhaas, Casa Schroeder de Gerrit Rietveld, Edifício Centraal Beheer de Herman Hertzberger, Casa Muller de Adolf Loos e a Segunda Residência do Arquiteto de Vilanova Artigas. A pesquisa ainda exemplifica os conceitos de casas aplicadas em residências físicas.

Palavras Chaves: Casa. Identidade. Pertencimento. Memória. Lugar. Significados.


LISTA DE FIGURAS Figura 01| Pintura do período Paleolítico. .......................................................................................................................................... 15 Figura 02| Homens reunidos em volta da fogueira numa caverna. .................................................................................................... 16 Figura 03| Homem organizado em comunidades. .............................................................................................................................. 17 Figura 04| Vila de trabalhadores egípcios. ......................................................................................................................................... 18 Figura 05| Vila de nobres egípcios. .................................................................................................................................................... 19 Figura 06| Mobiliários dos nobres egípcios. ....................................................................................................................................... 20 Figura 07| Casa Grega. ...................................................................................................................................................................... 21 Figura 08| Cadeira Grega, Klismos. ................................................................................................................................................... 22 Figura 09| Átrio Romano. ................................................................................................................................................................... 22 Figura 10| Móveis Romano. ............................................................................................................................................................... 23 Figura 11| François Boucher, Ruhendes Mädchen,1752. .................................................................................................................. 28 Figura 12| Quarteirão em Spangen de Nuchiel Brinkman, Roterdã, 1919. ........................................................................................ 30 Figura 13| Protótipo Dominó, Le Corbusier, 1914. ............................................................................................................................. 31 Figura 14| Aplicação do Protótipo Dominó, Le Corbusier, 1915. ........................................................................................................ 31 Figura 15| Casa Curzio Malaparte, Adalberto Libera, 1938................................................................................................................ 32 Figura 16| Interior Casa Curzio Malaparte, Adalberto Libera, 1938. .................................................................................................. 33 Figura 17| Apartamento Lipschutz/Jones, Lupo e Rowen, 1988. ....................................................................................................... 35 Figura 18| Casa Bordeaux, Rem Koolhaas, 1998. ............................................................................................................................. 38 Figura 19| Interior Casa Bordeaux, Rem Koolhaas, 1998. ................................................................................................................. 39 Figura 20 | Azul, Vermelho, Amarelo, Piet Mondrian, 1935. ............................................................................................................... 42


Figura 21| Casa Schroeder, Gerrit Rietveld, 1924. ............................................................................................................................. 43 Figura 22| Centraal Beheer, Herman Hertzberger, 1972. ................................................................................................................... 45 Figura 23| Casa Muller, Adolf Loos, 1930. ......................................................................................................................................... 46 Figura 24| Interior Casa Muller, Adolf Loos, 1930 .............................................................................................................................. 47 Figura 25| A Montanha Encantada, Maria José Dupré, 1945 ............................................................................................................. 50 Figura 26| Segunda Residência do Arquiteto, Vilanova Artigas, 1949. .............................................................................................. 51 Figura 27| Viaduto Aricanduva, Carla Caffé, 2000. ............................................................................................................................ 52 Figura 28| Seminário Semana Integrada 2/2014 ................................................................................................................................ 55 Figura 29| Mutirão Primeiro conjunto habitacional Popular – 1991. ................................................................................................... 58 Figura 30| Planta da Unidade Habitacional – 1991. ........................................................................................................................... 59 Figura 31| Implantação Geral do Primeiro Conjunto Habitacional Popular de Ipatinga. ............................................................... Anexo Figura 32| Conjunto Habitacional Popular – 1992. ............................................................................................................................. 60 Figura 33| Conjunto Habitacional Popular – 2014. ............................................................................................................................. 60 Figura 34| Localização das Famílias Visitadas. .................................................................................................................................. 62 Figura 35| Casa Família Souza. ......................................................................................................................................................... 63 Figura 36| Sala Casa Família Souza. ................................................................................................................................................. 63 Figura 37| Cozinha Casa Família Souza. ........................................................................................................................................... 64 Figura 38| Quarto da Dona Ana Maria de Souza. .............................................................................................................................. 65 Figura 39| Dona Ana Maria de Souza. ............................................................................................................................................... 65 Figura 40| Casa da Família Silva Nascimento. ................................................................................................................................... 66 Figura 41| Sala da Casa da Família Silva Nascimento....................................................................................................................... 67


Figura 42| Sra. Celina com o filho Edeine e os netos. ........................................................................................................................ 67 Figura 43| Casa da Família Pereira Silva. .......................................................................................................................................... 68 Figura 44| Sala da Casa da Família Pereira Silva. ............................................................................................................................. 68 Figura 45| Fotos da Família Pereira Silva. ......................................................................................................................................... 69 Figura 46| Família Pereira Silva com o Sobrinho. .............................................................................................................................. 70 Figura 47| Casa da Família Oliveira. .................................................................................................................................................. 70 Figura 48| Mural 70 anos do Sr. João Fernandes. ............................................................................................................................. 71 Figura 49| Coleção de Garrafas do Sr. João Fernandes. ................................................................................................................... 72 Figura 50| Família Oliveira. ................................................................................................................................................................ 72 Figura 51| Casa da Família Carvalho Silva. ....................................................................................................................................... 73 Figura 52| Desenhos do Filho Maria do Carmo Carvalho Silva. ......................................................................................................... 74 Figura 53| Diagrama de Análise nas Residências - Proposta TCC2 .................................................................................................. 79 Figura 54| Etapas do Projeto - Proposta TCC2 .................................................................................................................................. 81


LISTA DE TABELAS Tabela 01| Cronograma do Projeto - Proposta TCC2..........................................................................................................................81


SUMÁRIO 1.0 INTRODUÇÃO ............................................................................................................................................................................. 12 2.0 DESENVOLVIMENTO.................................................................................................................................................................. 15 2.1 A Casa e o Seu Desenvolvimento Histórico .............................................................................................................................. 15 2.2 A Casa Como Extensão Corporal ............................................................................................................................................. 37 2.3 A Casa Como Extensão Mental ................................................................................................................................................ 40 2.4 A Casa Como Fonte de Memória .............................................................................................................................................. 49 2.5 A Casa Imaterial........................................................................................................................................................................ 54 3.0 ANÁLISE EM RESIDÊNCIAS FÍSICAS ........................................................................................................................................ 58 3.1 O Conjunto Habitacional ........................................................................................................................................................... 58 3.1 Análise das Famílias Visitadas.................................................................................................................................................. 61 3.3 Resultado da Análise das Famílias Visitadas ........................................................................................................................... 76 4.0 PROPOSTA TCC2 ....................................................................................................................................................................... 78 5.0 CONCLUSÃO............................................................................................................................................................................... 83 6.0 REFERÊNCIAS ............................................................................................................................................................................ 85 7.0 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ............................................................................................................................................. 85 ANEXO - Figura 31| Implantação Geral Do Primeiro Conjunto Habitacional Popular de Ipatinga.......................................................87


12 desejado para a população brasileira. A idealização da 1.0 INTRODUÇÃO

moradia tornou o ramo da construção civil em uma oportunidade altamente lucrativa, devido ao seu grande

A casa é para o homem o marco de sua presença no mundo,

público de mercado.

uma extensão de sua própria existência em um lugar de desenvolvimento de raízes e reconhecimento de si mesmo, o

Para reprodução em massa dessas habitações, o método

abriga em vários estágios de sua vida e resguarda

mais utilizado é padronização dessas unidades de moradia,

lembranças, sentimentos, emoções e significados.

ou seja, a produção em série de um mesmo modelo.

Entretanto pensando no contexto da realização da casa

Esse tipo de solução se fortaleceu nas primeiras décadas do

própria ou da posse do direito de moradia, nos dias atuais nos

século

deparamos com uma grande especulação imobiliária, onde a

habitacionais do presente momento histórico. Solução esta

paisagem urbana se transforma quase que num piscar de

que se consolidou pelos seus vários benefícios do ponto de

olhos. O fator aqui abordado para estas transformações da

vista do mercado imobiliário, como garantia de agilidade,

imagem do espaço urbano é o habitacional. Onde vemos

rapidez e economia.

surgir em um curto espaço de tempo, conjuntos e edifícios residenciais, tanto os que são desenvolvidos por programas do governo, como os que acontecem por empreendedores do mercado imobiliário. Segundo o portal Estado De Minas (2014) o sonho da casa própria é uma realidade no país, representando o bem mais

XX,

como forma

de solução para problemas

No entanto a pesquisa foca no ponto de pós-apropriação dessas unidades habitacionais indo além das questões de realização da casa própria. Investigando a relação entre usuário e casa, quando esta residência não foi pensada para um morador específico.


13 Considerando

que

cada

indivíduo

é

único

possui

Para o teórico norueguês Noberg-Shulz citado por Nesbitt

necessidades específicas, surgem questionamentos sobre a

(2006, pag.459) “pertencer a um lugar quer dizer ter uma

interação destes moradores com estes espaços: como

base de apoio existencial em um sentido cotidiano concreto”.

acontece a relação desse usuário em ambientes que não

Noberg Shulz ainda explica a fenomenologia como o

foram pensados especificamente para ele? Como se dá essa

desenvolvimento de significados a um determinado lugar,

apropriação de espaços vazios, que a princípio não exprimem

onde este deixa de ser um espaço comum tornando-se um

nenhuma relação como o seu usuário? Como essa relação

lugar

vai se desenvolvendo com o passar do tempo? Será que

emoções e significados.

todos os usuários conseguem desenvolver

e

identidade,

sentimentos e significados?

específico,

dotado

de

lembranças,

sentimentos,

A partir do pensamento desses teóricos pode-se perceber que o pertencimento está relacionado à identidade e como a

Como forma de estudo para um melhor entendimento dessas

casa é uma extensão dos reflexos corporais e psicológicos do

questões algumas teorias ajudam a fundamentar a pesquisa,

morador. Já a fenomenologia é o desenvolvimento da relação

tais

entre o indivíduo e lugar mediante ao surgimento de valores

como

“o

sentimento

de

pertencimento”

e

a

“fenomenologia”.

simbólicos.

Segundo a mestra em Filosofia Amaral (2014), o sentimento

Entendendo a casa muito além que um simples espaço

de

de

habitacional, a pesquisa tem por objetivo específico estudar: a

pertencer a um determinado lugar e que este lugar pertence

casa e o seu desenvolvimento histórico, a casa como

ao indivíduo, e que esta sensação estimula e valoriza a

extensão corporal e mental, a casa como fonte de memórias e

intervenção neste lugar.

os

pertencimento

acontece

mediante

a

sensação

seus

significados

simbólicos.

Os

conceitos

serão

contextualizados com obras de referências e ainda com


14 visitas em residências para observação sistemática e

Considerando a importância do papel do arquiteto em projetar

realização de entrevistas com moradores.

espaços que propiciem e instiguem o desenvolvimento de

As visitas em residências têm por objetivo permitir um aprofundamento no estudo da relação do usuário com seu ambiente de moradia e qual significado que esta representa para o indivíduo que a habita, procurando entender sentimentos e sensações (ou a inexistência) quando esta residência não foi pensada especificamente para este usuário. O tema da pesquisa surgiu a partir da minha própria vivência e moradia a vinte e dois anos no Primeiro Conjunto Habitacional da Cidade de Ipatinga, localizado no bairro Bethânia. A vivência neste conjunto habitacional foi despertando, ao longo dos anos, a inquietação de entender como inúmeras pessoas e famílias com personalidades, hábitos, usos e costumes diferentes se relacionam com um mesmo espaço.

pertencimento por parte do usuário, e que pensar espaços onde

o

usuário

conhecimento

e

se

identifique,

interação

com

exige quem

do

arquiteto

habitará

estes

ambientes. Pois a relação entre corpo, mente e espaço estão totalmente associadas no contexto da identidade e memória. No entanto, nos deparamos com situações nas quais não existiu esta aproximação ente o usuário e o arquiteto, e é deste tipo de situação que a pesquisa se apropriará, para responder a estes questionamentos.


15 2.0 DESENVOLVIMENTO

Quando estes recursos se esgotavam em determinado local,

2.1 A Casa e o Seu Desenvolvimento Histórico

migravam em busca de outro, no tempo de permanência em um determinado espaço os homens procuravam abrigos

Para melhor entendimento da casa, é indispensável entender

temporários como grutas, cavernas e grandes fendas. Estes

como ela surgiu e como se deu sua evolução ao longo dos

abrigos temporários desempenhavam a função de proteção

anos, desde a pré-história até a contemporaneidade,

contra animais e ações da natureza. No entanto é possível

enfatizando a relação do homem com seu ambiente de

perceber as intervenções humanas nestes espaços, onde por

moradia.

meio de desenho representava-se a vida cotidiana. (Fig. 01).

Segundo Moraes (1993) o primeiro e mais longo período da

Figura 01| Pintura do período Paleolítico.

pré-história, é o Paleolítico ou Idade da Pedra Lascada, devido ao desenvolvimento das primeiras ferramentas como, machados

e

lanças.

A

vida

humana

era

totalmente

dependente da natureza, pois sua sobrevivência se baseava na caça de animais, pesca, colheita de frutos, folhas e raízes. Tais atividades tornavam o homem um nômade, uma vez que ele era obrigado a percorrer longas distâncias em busca de seus alimentos. Portanto, o homem não controlava e transformava a natureza em favor de sua subsistência, ele era parte integrante da natureza. (MORAES, 1993, p.6 e 7).

Fonte: http://historiadaarte2009.blogspot.com.br/


16 Estas manifestações podem ser interpretadas como artísticas

Figura 02| Homens reunidos em volta da fogueira numa caverna.

de identificação e concretização de um lugar habitado, ou seja, um ambiente que passou pela experimentação do corpo humano. Ainda no paleolítico ocorreu a experiência humana com um elemento de grande importância para o início da vida familiar, o fogo. Segundo Fracalossi (2014) o fogo marcou as primeiras

reuniões

humanas,

onde

após

as

longas

caminhadas, reflexo do nomadismo ou em busca de comida, os homens se acomodavam para o descanso ao redor da fogueira. Dando início ao agrupamento humano, o princípio da instituição do desenvolvimento social, o lar.

Fonte: http://tempodoshomens.blogspot.com.br/

O domínio da produção do fogo permitiu ao homem conforto,

Esse conceito e importância dada ao fogo são reforçados

pois conseguira aquecimento em dias frios, a iluminação

Miguel (2003), que ressalta a importância do fogo para a

durante a noite, proteção contra insetos e animais, além da

vivência cotidiana e as relações familiares, comparando-o ao

possibilidade do cozimento de alimentos, “compartilhar os

processo da vida humana:

alimentos no fogo doméstico era sinal de pertencer à comunidade”. (FRACALOSSI, 2014). (Fig. 02).

O fogo que reúne ao seu redor todos os integrantes de um laço familiar, sendo, de um modo figurativo, um manto que aquece e une a todos num mesmo instante. A identificação


17 do fogo está presente nas cabanas rústicas como o elemento mais semelhante à vida. O fogo cresce, move-se, aquece, destrói e é quente, uma das qualidades fundamentais associada à vida humana. Quando o fogo se extingue, suas cinzas tornam-se frias, do mesmo modo que esfria o corpo de um ser quando morre. (MIGUEL, 2003).

formavam às margens de rios facilitando a subsistência e os serviços como a irrigação (Fig. 03). Figura 03| Homem organizado em comunidades.

Para Moraes (1993) o último período da pré-história, o

Neolítico ou Idade da Pedra Polida, foi outro período marcado por grandes transformações fundamentais para a vida cotidiana familiar tais como desenvolvimento da agricultura e domesticação

de

animais.

Estas

conquistas

foram

determinantes para que o homem deixasse de ser nômade para ser sedentário, pois estas condições o deixava menos dependente da natureza.

Fonte: http://anaraquelvaz.blogspot.com.br/

Outro fator importante foi a divisão de tarefas de acordo com

O homem passa a produzir sua própria moradia com os

o sexo, onde o homem era responsável pela caça e as

materiais que a natureza oferece como, barro, galhos,

mulheres pelos afazeres domésticos como, organizar, tecer,

troncos, cipós e folhas, desenvolvendo o início da vida familiar

cozinhar e cuidar dos filhos.

Com estas transformações

em uma habitação. Essas novas condições propiciaram o

surgiram as primeiras comunidades, consequentemente a

aumento da população, desenvolvimento da cultura, práticas

propriedade privada e posse de terra. Estas aldeias se

religiosas, comércio e classificação social.


18 Um local importante para o desenvolvimento dessas primeiras

Figura 04| Vila de trabalhadores egípcios.

comunidades que levaram as grandes civilizações foram às margens dos rios Tigre e Eufrates, pois a terra fértil era fator determinante que os nômades se instalassem nessa região. As margens do rio Nilo surge um grande império, o Egípcio, denominado “um oásis em meio ao deserto”. (COTRIM,1999 p. 29). Na civilização egípcia as classes sociais eram um reflexo nas moradias, tanto em materiais, como em tamanho e conforto. No entanto, apresentavam o mesmo padrão. Devemos ter presente, contudo, que essas casas eram baseadas nos edifícios reais e religiosos que estabeleceram o padrão da arquitetura geral e das artes decorativas. (MANCHIP, 1966 p.59).

Segundo Millard (1975) as casas dos mais pobres eram pequenas com apenas um ambiente, o material utilizado na construção era o junco, madeira e o barro, não possuíam muito conforto, mas protegiam contra o frio e as tempestades de areia. Mesmo na classe trabalhadora era possível notar um tamanho variado das residências, reflexo do posto de trabalho de cada habitante da vila. (Fig. 04).

Fonte: http://i.ytimg.com/vi/yxT8G_xzK-8/0.jpg

As residências dos trabalhadores com melhor posto de trabalho ainda que modestas apresentavam divisão de ambientes, que poderiam ser denominados como sala de estar, quartos, um pátio central onde cozinhavam e também serviam de depósitos. Algumas possuíam terraços. Na sala de estar sempre havia um altar como culto aos deuses protetores. O terraço um ambiente aberto, agradável e com mais conforto, era um local de lazer e serviços. “Era nele que


19 o dono da casa, a sua família e os convidados se recostavam

Figura 05| Vila de nobres egípcios.

sobre mantas e almofadas para conversar, descansar e tomar suas refeições.” (MANCHIP, 1966 p.67). As residências dos mais ricos eram feitas de tijolos de barro seco e se dispunham de maior conforto doméstico. (Fig. 05 e 06). Nas cidades, o espaço era pequeno. Por isso, as casas eram altas, estreitas e muito juntas. Algumas tinham três ou quatro andares. Mas no campo, onde havia muito espaço, os egípcios ricos construíram casas de campo grandes e bonitas, com jardins frondosos. Erguiam altos muros em volta delas para que as pessoas não pudessem ver o interior [...] Eram belamente decoradas e mobiliadas. As pessoas ricas possuíam camas, mesas, cadeiras, bancos e armários de madeira, de todos os formatos e tamanhos. Os assentos das cadeiras e dos bancos eram frequentemente feitos de couro ou de palhinha. A mobília de luxo era feita de madeiras, tais como ébano e cedro. (MILLARD 1975, p. 22)

Fonte: http://www.decorarconarte.com/


20 Figura 06| Mobiliários dos nobres egípcios.

cores e feitios. Se não fossem as palmeiras, o jardim teria a aparência de um bem cuidado jardim, numa tarde de julho, no sul da Inglaterra. (MANCHIP, 1966 p.65).

Manchip (1966) associa a volumetria da casa de um nobre egípcio com grandes nomes da arquitetura moderna.

As residências dos nobres e os palácios eram dotados de

A casa em si, além de ser de linha quadrada, possuiria o aspecto “funcional” de um edifício moderno. Em deferências para as condições locais, contudo, não teria janelas, apenas uma série de grades colocadas bem alto nas paredes. O fato de se tratar de uma vasta moradia de um só andar, com uma ligeiramente mais elevada seção que servia de jardim-cobertura, dar-nos-ia a impressão de que o projeto era de autoria de um dos mais famosos arquitetos moderno, como Mies Van de Rohe, Gropius ou Maxwell Fry. (MANCHIP, 1966 p.65).

mais ambientes, públicos e privados para recepção, sala de

A arte em pinturas e desenhos decoravam as paredes,

administração, área de banho e necessidades fisiológicas,

representando o modo de vida, cultura e a religiosidade dos

além de lagos, fontes compondo os belos jardins.

egípcios. No antigo Egito é possível ver uma introdução ao

Fonte: http://www.decorarconarte.com/

No meio do jardim, veríamos os contornos da casa através de uma pérgola com trepadeiras. À nossa direita, um pequeno lago coberto por flores aquáticas e, à nossa esquerda, canteiros de flores de todas as

conforto, privacidade e divisão de ambientes de acordo com suas atividades, afinal “o bem estar doméstico é uma necessidade humana fundamental, que está profundamente


21 enraizada em nós e precisa ser satisfeita”. (RYBCZYNSKI,

Figura 07| Casa Grega.

2002 p.223).

Na civilização grega a moradia era relativamente pequena, no entanto as relações culturais deste período influenciaram fortemente a forma de habitação. Segundo Janson (2001), a casa grega não era grande e voltava-se para um pátio central, para onde todos os ambientes se abriam, o material utilizado na construção eram pedras, madeiras ou tijolos. Havia casas maiores e estas se dispunham de mais ambientes setorizados como cozinha, sala de jantar e sala de banho. (Fig. 07). Já Lessa (2004) cita espaços específicos para homens e mulheres, o androceu e o gineceu. O primeiro é um ambiente destinado aos homens para celebração e visita, este cômodo possuía uma abertura direto para a rua, o segundo era um espaço totalmente feminino, somente os homens com grau de parentesco poderiam adentrar neste ambiente.

Fonte: http://www.decorarconarte.com/

A casa era simples e com poucos móveis como, camas e mesas, mas os gregos representaram sua importância no desenvolvimento de mobiliário, como o aperfeiçoamento da cadeira originalmente criada pelos egípcios. (Fig. 08). “Os egípcios faraônicos haviam usado cadeiras, e os gregos antigos a refinaram-nas até atingir uma perfeição elegante e confortável no século V a.C.” (RYBCZYNSKI, 2002 p.39).


22 Figura 08| Cadeira Grega, Klismos.

Figura 09| Átrio Romano.

Fonte: http://thearcheology.wordpress.com/page/2/ Fonte:http://www.arquiteturaclassica.com.br/ Em Roma as casas não se dispunham de luxo, denominada

ainda abrigo por, Bonecque E Mornet (1977), pé direito baixo, cômodos pequenos, com pisos de pedra, de argila ou pedaços cerâmicos. No entanto, o átrio passa a ser um espaço

mais

destacado

no

ambiente

doméstico,

principalmente no inverno, pois deixava passar os raios solares. (Fig. 09).

A casa romana, de fato, até a segunda guerra púnica, compreende essencialmente a peça assim coberta, o átrio, para o qual dão os quartos, que são pequenos caiados, e sem móveis. [...] O átrio é ao mesmo tempo cozinha, santuário, quarto de dormir, sala de refeições, sala de recepção... (BONECQUE E MORNET, 1977, p. 146)

No século II, a casa romana se tornara mais espaçosa, mais confortável e evoluindo também sua decoração. Neste período as colunas e as paredes passaram a ser revestidas


23 com mármores, mosaicos recobriam o pavimento térreo,

As pessoas mais pobres moravam em apartamentos

madeira preciosa para o forro, pinturas e tapeçarias de alto

alugados, em casas com até cinco andares, construídas

custo integravam a decoração. Mas a simplicidade do

exatamente para esta finalidade.

mobiliário persistia, os leitos, assentos, mesas e armários ainda eram feitos com madeira comum. Mas ainda faltavam móveis para algumas funções, como escrever. Ainda que escassas, haviam as mobílias de alto luxo, feitas de madeira nobre, bronze e até prata. FIG. (10). A iluminação, para os mais ricos, ganhou um toque de requinte, com lâmpadas e grande candelabros. Figura 10| Móveis Romano.

Com a queda do Império Romano, aumento das invasões dos bárbaros germânicos e o fortalecimento da igreja, deu-se início à Idade Média, entre séculos V e XV. Neste período as constantes invasões gerou muita insegurança para o povo europeu que procuraram formas de se defenderem, o que gerou um processo de ruralização das cidades europeias. Houve uma considerável migração das cidades para o campo. Construíam-se vilas fortificadas e castelo cercados por estacas e muralhas. Cada um se defendia como podia. Os mais fracos procuraram ajuda de nobres e poderosos. Camponeses, buscando a proteção dos senhores de terra, foram submetidos à servidão. (COTRIM, 1999 p.101).

Esta nova situação da organização das cidades mudou drasticamente o cotidiano das pessoas que refletiu de forma determinante nas moradias medievais. Segundo Rybczynski Fonte:http://thearcheology.files.wordpress.com/

(2002) a moradia dos mais pobres eram precárias, não


24 Isto ocorria em parte porque, na falta de restaurantes, bares e hotéis, elas serviam como locais de encontros públicos para as pessoas se entreterem e fazerem negócios, e também porque as “famílias” que nelas moravam eram grandes. Além de família direta, incluíam empregados, criados, aprendizes, amigos e afilhados – “famílias” de até 25 pessoas não eram pouco frequentes. (RYBCZYNSKI, 2002 p.41).

possuíam água e nem saneamento, a mobília e os objetos pessoais eram praticamente escassos, as residências eram minúsculas de tal forma que chegavam a comprometer a vida familiar e era composta por apenas um cômodo. As cosequências destas privações, segundo alguns historiadores, é que conceitos como “lar” ou “família” não existiam para estas almas sofridas. Falar de conforto nestas circunstâncias é um absurdo; tratava-se de mera sobrevivência. (RYBCZYNSKI, 2002 p.37).

A moradia típica de um burguês do século XIV era um ambiente múltiplo, utilizados para morar e trabalhar. Como reflexo do adensamento das cidades, as casas eram longas e estreitas e possuíam dois andares. A área frontal era destinada ao espaço de trabalho, o espaço de morar era composto por apenas um cômodo, onde todas as atividades da vida doméstica eram realizadas, serviços, lazer e descanso. A mobília tinha multifuncionalidade, móveis de estocar alimentos serviam de assentos, as camas e mesas eram desmontáveis. A casa era um espaço sem privacidade e superlotada. A privacidade e intimidade eram desconhecidas.

A casa era um era um reflexo do meio que estava inserida, das pessoas e da cidade. Segundo Rybczynski (2002) não se deve interpretar que neste período não se havia prazer no morar, até porque o tipo de conforto existente sempre fora oculto. “O que realmente faltava aos nossos ancestrais era a noção objetiva e consciente do conforto.” (RYBCZYNSKI, 2002 p.44). O que importava era mundo exterior e o seu lugar nele. A vida era uma questão pública, e assim como as pessoas não tinham uma forte consciência de si, elas também não tinham um quarto próprio. É a mente medieval, e não a falta de cadeiras confortáveis ou de aquecimento central, o que explica a austeridade das casas medievais. Não é que


25 o conforto fosse desconhecido, como Walter Scott colocou, mas ele não era necessário. (RYBCZYNSKI, 2002 p.48).

um maior senso de intimidade, que identificava a casa exclusivamente com a vida familiar. (RYBCZYNSKI, 2002 p.51).

Na Idade Moderna ocorreram mudanças no ambiente de

O mobiliário ganha lugar especial nas residências, deixando

moradia ainda que lentas. No século XVII, as casas

de ser um simples equipamento para se tornarem peças

parisienses ganharam mais espaço e solidez, divisão de

valiosas e a atração central do cômodo, ficaram mais

ambientes, a pedra substituiu a madeira, e agora possuíam

elaborados, com novas modelagens e estofamento se

quatro ou cinco andares e eram construídas em torno de um

tornando mais usual.

jardim interno. Os primeiros andares abrigavam o comércio, estábulo e os quartos dos familiares, uma sala principal era utilizada como recepção de visitantes, alimentação e lazer. A cozinha por apresentar um cheiro desagradável tinha um ambiente específico. Normalmente abrigavam mais de uma família, pois a casas se dispunham de ambientes que poderiam ser alugados. As pessoas já não trabalhavam e moravam no mesmo lugar. A divisão de ambientes torna mais claro um desejo por mais privacidade e intimidade, tornando o ambiente mais propício à vida familiar. A consequência desta separação foi que – com relação ao mundo exterior. A casa estava se tornando um lugar mais privado. Junto com essa privatização da casa surgiu

As pessoas com nível social mais elevado moravam em residências maiores e individuais, possuía mobília luxuosa, uma mesma família morava em uma casa com até cinco pavimentos, composta por até doze aposentos. A construção era feita em torno de grandes pátios. A fachada era simples e não causava nenhuma imponência, já o seu interior era suntuoso. A decoração era belíssima, apresentava pinturas, painéis e espelhos. É evidente que se priorizavam as aparências, ao invés da privacidade, todos, desde os empregados até o visitantes, passavam por cada um dos cômodos até chegar o seguinte. (RYBCZYNSKI, 2002 p.53).


26 Contudo a sensação de conforto e aconchego ainda não

aconteceram, o desenvolvimento da intimidade e privacidade,

predominavam esses ambientes. O mobiliário apesar de belo,

necessidades básicas para o desenvolvimento de uma vida

não inspiravam o uso e pareciam abandonados nos grandes

familiar com maior comodidade.

aposentos.

Neste Apesar dos aposentos serem decorados com diferentes temas clássicos – o amor, as Musas, Hércules – eles não tinham a atmosfera doméstica que é decorrente da atividade humana. (RYBCZYNSKI, 2002 p.55).

mesmo

período,

na

Holanda,

a

moradia

se

desenvolveu de forma única e como reflexo dessa sociedade. De acordo com Rybczynski (2002), a burguesia holandesa era dotada

de

muita

simplicidade

e

discrição

em

vários

parâmetros e esta simplicidade ficou explícita na arquitetura das residências. As casas eram pequenas, abrigavam não

Segundo Rybczynski (2002), o que faltava a esses espaços era o senso de intimidade que se caracteriza por um espaço ou por uma decoração.

banheiros, pois as noções de higiene ainda eram precárias neste período, por isso não achavam necessário ter um cômodo específico para esta finalidade, ou para outra qualquer, embora existisse a divisão de ambientes os parisienses não os associavam às atividades específicas. A alimentação, por exemplo, poderia ser realizada em qualquer da

casa.

No

permitia que todos tivessem sua própria residência ainda que pequena.

No entanto, estas residências ainda não apresentavam

cômodo

mais do que quatro ou cinco pessoas, a prosperidade local

entanto, evoluções importantes

A casa de família surgiu por meio da importância que esta sociedade direcionava a esta entidade, não havia babás, as mães eram responsáveis por criar os filhos. A presença da mulher

como

administradora

doméstica,

mudou

completamente o conceito de moradia até o momento, principalmente no que diz respeito ao seu interior doméstico. Visto que agora a esposa cuidava da casa e não os criados.


27 Os holandeses demonstravam um grande apreço a família, a casa e ao jardim, espaço muito utilizado em consequência do clima ameno. O sentimento dos holandeses por suas casas era de tal forma que eles possuíam maquetes perfeitas, que o autor denomina como lembranças em miniaturas.

A limpeza do interior holandês não era meramente uma faceta da personalidade nacional, mas uma prova de algo muito mais importante. Quando se pedia que os visitantes tirassem os sapatos ou calçassem chinelos, isto não era feito imediatamente ao entrar na casa – o andar de baixo ainda era considerado uma parte pública da rua – mas quando se ia para o andar de cima. Era ali que se encerrava a esfera pública e começava o lar. Este limite era um conceito novo e a ordem e a limpeza da casa não eram prova nem de meticulosidade nem de uma limpeza especial, mas de um desejo da casa como um lugar separado, especial. (RYBCZYNSKI, 2002 p.77).

Os holandeses adoravam suas casas. [...] A palavra “home” (lar) reuniu os significado de casa e família, de moradia e abrigo, de prosperidade e afeição. “Home” significava a casa, mas também tudo que estivesse dentro dela, assim como as pessoas e a sensação de satisfação e contentamento que emanava de tudo isso. Podia se sair de casa, mas sempre se retornava ao lar. (RYBCZYNSKI, 2002 p.73).

O controle feminino na casa holandesa permitiu que esta se

O mobiliário era para ser admirado, mas igualmente utilizado.

desenvolvesse de uma forma singular, pois a moradia agora

Os cômodos não deveriam ser abarrotados pela mobília, pois

pode ser vista também de forma emotiva e não apenas como

a sensação do ambiente deveria prevalecer. A tradição

um lugar para realização das atividades doméstica, a casa

holandesa era de estampar as paredes com, pinturas,

ganha vida, deixa de ser abrigo e passar ser lar.

espelhos e mapas. A sensação era de intimidade e tranquilidade. A casa era rigorosamente asseada, o alpendre e calçada, os vasilhames igualmente esfregados e areados, mas isso não deve se interpretado como um mero capricho.

A domesticidade é um conjunto de emoções sentidas, e não um único atributo. Ela está relacionada à família, à intimidade, à devoção ao lar, assim como uma sensação de casa incorporadora – e não somente abrigo –


28 destes sentimentos. (RYBCZYNSKI, 2002 p.85).

Figura 11| François Boucher, Ruhendes Mädchen,1752.

No século XVIII, o novo conceito de moradia desenvolvido pelos holandeses já havia se popularizado por toda a Europa, onde a casa passa ser um espaço íntimo e pessoal, de convívio em família, passando por mudanças físicas e emocionais, desta forma começa surgir os primeiros passos para o desenvolvimento do conforto. O mobiliário poderia ser admirado e utilizado, mas com um diferencial existia-se o prazer em fazê-lo. Este agora era desenvolvido para o corpo, a formalidade já não era mais uma obrigação, poderia se sentar e apoiar os pés em cima de um banco. Sentar não era mais uma atividade ritualística e funcional, mas se tornou uma maneira de estar à vontade. As pessoas sentavam-se juntas para ouvir música, para conversar, para jogar cartas. Um novo conceito de lazer ficou explicito pelo modo de sentar... (RYBCZYNSKI, 2002 p.94).

Fonte:http://thearcheology.files.wordpress.com/ A diversidade da mobília na frança tornava claro as mudanças

da nova maneira de morar, criados e patrões em ambientes separados, o banheiro se torna especial, o banho já poderia

confeccionado

ser considerado uma atividade prazerosa, os cômodos

especificamente para um determinado cliente e sexo. (Fig.11).

estavam menores e ganharam funções específicas, o que

O

mobiliário

também

poderia

ser

proporcionou mais organização e intimidade ao lar.


29 A decoração doméstica se desenvolveu de tal forma, que deu

Desta forma pode-se perceber uma busca pela identidade

início ao primeiro estilo de interiores, o rococó, acabamento

pessoal de cada indivíduo, e esta ocorre por meio do que

dourado em formas orgânicas como conchas, flores e curvas.

pode ser visto na decoração, a escolha dos objetos, a

Esta evolução impulsionou o desenvolvimento do conforto

maneira com que os organizam, as cores que se usa, a

residencial, marcado por forte influência feminina.

atmosfera do ambiente que se cria, proporcionando a reflexão

As transformações no ambiente doméstico continuam no

da personalidade do indivíduo no ambiente.

século XIX. A casa se torna um lugar muito mais pessoal,

Percebe-se de forma clara que a moradia sempre foi

com menos formalidade, um ambiente onde possa se estar à

influenciada pelo período sociocultural em que o esteve

vontade, os filhos passam mais tempo em casa e possuem

inserida. O final do século XIX e início do século XX foram

seus próprios dormitórios, separados por sexo, ou seja, além

períodos de plena consolidação da era industrial, importantes

de espaço familiar também é um espaço individual. Enquanto

evoluções são desencadeadas na vida cotidiana doméstica

as crianças usam os quartos para se divertirem, as mulheres

como, a eletricidade, equipamentos elétricos que facilitam as

o usam para costurar, escrever e conversar com as amigas.

atividades domésticas, que aquecem e ventilam o ambiente.

O desejo por um quarto só para si não era uma mera questão de privacidade pessoal. Ele demonstrava uma crescente consciência da individualidade – uma crescente vida pessoal interior – e a necessidade de se expressar a individualidade fisicamente. (RYBCZYNSKI, 2002 p.120).

Essa mecanização da residência se torna possível a partir dos desenvolvimentos mecânicos gerados pela indústria. As cidades da Europa Ocidental enfrentam um grande problema neste período, a habitação social, que se iniciou com a migração da população para os grandes centros urbanos em busca de emprego nas indústrias. Segundo Gossel E Leuthauser (2001) neste período da cidade


30 industrial e em meados da Primeira Guerra Mundial os problemas habitacionais se agravaram drasticamente devido

Figura 12| Quarteirão em Spangen de Nuchiel Brinkman, Roterdã, 1919.

a quase estagnação do desenvolvimento urbano e da construção. No entanto, neste mesmo período houve uma migração maciça das famílias para os grandes centros industriais em busca de trabalho e melhores condições de vida, o que propiciou um aumento significativo do preço da terra e estas famílias se viam obrigadas a residirem em condições quase que sub-humanas. Nas tristes casas de arrendamento do período anterior ao conflito armado, e nos bairros cotidianos mais antigos – já com gente a mais -, cujas as condições de higiene eram catastróficas, ainda se vieram amontoar mais pessoas. (GOSSEL E LEUTHAUSER, 2001 p. 153).

Em um momento de grande problemática habitacional e diante das profundas transformações no mundo, como

Fonte: http://revistavisual.ucpel.tche.br/ O que irá propiciar inúmeras argumentações e pesquisas

sobre o homem e a moradia, e como este se relaciona com seu ambiente residencial.

solução social de moradia, ganha força a construção dos

Em 1914 o arquiteto franco-suíço, Le Corbusier, desenvolve o

grandes blocos residenciais, fundamentada em habitações

protótipo de uma estrutura, Casa Dominó, que consiste em

multifamiliares, que proporciona aos usuários a integração de

plantas livres sobre pilares, que permite a verticalização e

uma unidade particular organizada em comunidade. (Fig.12).

vedação dos mais variados tipos. (Fig.13).


31 Figura 13| Protótipo Dominó, Le Corbusier, 1914.

Figura 14| Aplicação do Protótipo Dominó, Le Corbusier, 1915.

Fonte: http://www.studyblue.com/study-tools

Fonte: http://www.studyblue.com/study-tools As paredes e as divisões internas não eram mais que um enchimento leve, podendo ser feito sem mão de obra especializada, de taipa, de tijolos ou perpianhos de enchimentos. (LE CORBUSIER, 1999 p.160)

O problema da casa é um problema de época. O equilíbrio das sociedades hoje depende dele. A arquitetura tem como primeiro dever, em uma época de renovação, operar a revisão dos valores, a revisão dos elementos constitutivos da casa. A série está baseada sobre a análise e a experimentação.

Inspirados pelas produções em série da indústria de

A grande indústria deve se ocupar da construção e estabelecer em série os elementos da casa.

automóvel, Le Corbusier propõe a produção em série de

É preciso criar o estado de espírito da série.

moradias, como solução para a problemática social de

O estado de espírito de construir casas em série.

habitação. (Fig. 14).


32 O estado de espírito de residir em casas em série.

Figura 15| Casa Curzio Malaparte, Adalberto Libera, 1938.

O estado de espírito de conceber casas em série. (LE CORBUSIER, 1999 p.159)

A solução para os problemas de habitação social apresentada por Le Corbusier se consolidou a partir do início do século XX até os dias atuais. Apesar dos problemas habitacionais vividos na primeira metade do século XX, um fator de extrema importância para o desenvolvimento da arquitetura residencial é que o arquiteto já se tornara um profissional liberal, desta forma o homem

Fonte: http://www.40forever.com.br/casa-malaparte/

passa ter a possibilidade de uma residência pensada

A Casa Malaparte explora de várias maneiras a essência e

especificamente para seu corpo, personalidade, necessidades

encantos da ilha, se projetando de várias formas a propiciar a

e que tenha relação com lugar em que está inserida. Como

vivência do usuário no espaço e lugar, “ao tratar da

podemos observar na casa projetada pelo arquiteto Adalberto

experiência corporal do homem e do espaço existencial”.

Libera para o escritor Curzio Malaparte em Punta Massulo.

(MONTANER, 2001 p.37). (Fig. 16).

(Fig. 15).


33 Figura 16| Interior Casa Curzio Malaparte, Adalberto Libera, 1938.

trabalho. As famílias ficam menores, as pessoas se casam mais tarde, os casamentos são menos duradouros, as mulheres têm menos filhos e ocupam efetivamente o mercado de trabalho. As transformações na unidade familiar compõem um fenômeno que se observa nas culturas ocidentais, consequência da definitiva incorporação da mulher no mercado de trabalho, gerando novos modelos de casais, sem ou com poucos filhos (relações menos duradouras) menor compromisso temporal (relações instáveis) pessoas que vivem só ou em pequenas coletividades (caso dos estudantes e trabalhadores temporários)[...]. (REVISTA AU, 2002 p.64).

Fonte: http://www.40forever.com.br/casa-malaparte/

A nova era capitalista tecnológica, possibilita inúmeros novos

Segundo a Revista AU (2002) a partir da segunda metade do

campos de trabalhos, e em especial que esses novos

século XX até os dias atuais, vivemos a era contemporânea e

profissionais possam trabalhar em casa, o que confere à

tecnológica, a sociedade experimenta um novo modo de

moradia um espaço de múltiplas funções.

viver, permitido por meios das profundas mudanças na vida cotidiana, social e cultural. Onde pode-se observar nos novos modelos de estruturas familiares, novas formas de se relacionar afetivamente e socialmente, novas formas de

A habitação está passando por profundas transformações decorrentes dos modos de vida experimentados pela contemporaneidade. Novas formas de tecnologia, trabalho, sociabilidade e relações


34 conjugais são decorrentes de uma nova forma do homem se posicionar diante da experiência do tempo. Portanto em termos de programa, a habitação volta, em certa medida a adquirir qualidades que lhes foram pertinentes no período medieval. (REVISTA AU, 2002 p.64).

Diante dessas mudanças surgem novas formas de morar, espaços que devem ser pertinentes aos novos estilos de vida dos usuários.

Se o usuário mora só, ou usa a residência

como um espaço temporário, como no caso de trabalhadores e estudantes, pode-se observar a quitinete, espaço único, com vários ambientes que comportam as necessidades básicas do usuário e facilita os afazeres domésticos. Se a família é composta por um casal sem filhos e deseja um pouco mais de privacidade, a Revista Famecos (2001) cita como solução o “loft”, pois esse tipo de moradia permite uma melhor definição entre espaço público e privado. Diante desta nova situação o modelo do “loft” parece, segundo Riley, predestinado a ser o mais apropriado, oferecendo flexibilidade e abertura, em expressivo contraste com os espaços estruturados típicos das casas da

família tradicional. 2001 p. 35).

(REVISTA

FAMECOS

Como exemplo de residência e local de trabalho e principalmente de introdução da tecnologia nas novas formas de morar, a Revista Famecos (2001) cita o apartamento Lipschutz/Jones em Manhattan, projetado para dois usuários que, ao estarem no ambiente doméstico, não podem se desconectarem de suas atividades profissionais. Desta forma a sala é um escritório central de negociação que pode ser visualizado de todos os ambientes da casa, outras telas são posicionadas em pontos estratégicos na residência, no banheiro, ao lado da cada cama de forma que em todas as atividades dos usuários eles possam estar conectados com o mundo comercial financeiro. (Fig. 17). Ainda nessa residência, há seis outras telas espalhadas pelos diversos espaços da casa, disseminando continuamente informações em tempo real, tanto junto ao espelho do banheiro, de forma a poder ser consultada enquanto o morador faz sua barba, quanto próximo a cama, de modo poder ser visível ao acordar, pois se trata de um regime de


35 trabalho contínuo, ininterrupto, na verdade interminável.

Esta residência é um exemplo do final dos anos 80, pensar

Nesse último exemplo, evidencia-se de maneira clara, nas palavras de Terence Riley, “uma estrutura permeável apta a receber e a transmitir imagens, sons, textos e informações em geral”. (REVISTA FAMECOS 2001 p. 36).

certa forma ser um indivíduo escravizado pela tecnologia, no

em habitar desta forma, poderia ser uma exclusividade e, de

entanto pouco mais de 20 anos depois esta é uma realidade nos espaços residenciais. Hoje as casas são dotadas de vários televisores e diversos tipos processadores que conectam o homem ao mundo, ao trabalho, as pessoas,

Figura 17| Apartamento Lipschutz/Jones, Lupo e Rowen, 1988.

atividades que antes o levava a sair de casa, hoje pode ser desenvolvida dentro dos lares de igual forma, ou melhor. Para Brandão (2008) o espaço doméstico vem sendo modificado pela contemporaneidade e as suas transformações mais evidentes, são as novas atividades provenientes dos novos equipamentos,

que

combinados

configuram-se

novos

espaços doméstico.

Fonte: http://www-cgi.cnn.com/

Assim posso estar em qualquer lugar do mundo e acessar minha conta bancária, fazer pagamentos, conversões de moedas etc., sem que meu banco tenha deixado de existir num lugar preciso, como posso abrir minha conta postal, que há pouco tempo era apenas uma caixinha de metal no muro da minha casa, não estou presente em outro lugar, mas posso desfrutar de qualidades que antes só


36 seriam possíveis estando lá. (BRANDÃO, 2008 p.95).

Ao longo deste capítulo, foi possível entender a casa desde o seu surgimento na pré-história até os dias atuais e que, ao longo dos anos, o espaço doméstico foi se adaptando as necessidades do seu usuário, para que a identidade e o conforto fossem desenvolvidos. Desde o abrigo em cavernas ao espaço influenciado pelo desenvolvimento tecnológico, de forma a perceber que o homem e o morar sempre foram reflexos do período sociocultural em que estavam inseridos. A partir do desenvolvimento da relação do usuário com a moradia, a casa se transforma em um envoltório de produção de sentimentos e significados, ou seja ela passa a compreender uma dimensão simbólica, muito além de um espaço físico. A casa funciona para o homem como lugar de enraizamento e identificação com o lugar, onde o homem vive passado e presente, ponto estável a partir do qual enfrenta o mundo. Ao habitar a casa e, mais intensamente, ao habitar o quarto, o homem evoca memórias do passado, reminiscências, sentimentos, emoções. (LOPES, 2012).

O desenvolvimento desses significados simbólicos da casa, a torna uma extensão do corpo e da alma, que configura a moradia outros conceitos, os imateriais.


37 2.2 A Casa Como Extensão Corporal

“Minha casa é minha pele, parede que me separa do exterior. Como a casa, o corpo tem dentro e fora: pele, carne e

Após o entendimento da casa e seu desenvolvimento

entranhas”.

histórico, se faz necessário os estudos de alguns conceitos

Segundo Mautner (2012) os objetos que usamos para as

aplicados a casa para um melhor entendimento de sua

atividades rotineiras são extensões do nosso corpo, conceito

complexidade.

introduzido por Marshall McLuhan na segunda metade do

A casa é composta por muitos elementos, o palpável, o

século XX, “O martelo é o prolongamento do nosso punho, o

funcional, os reflexos e hábitos pessoais. A vivência destes

binóculo é nosso olho grande etc. Se os instrumentos são

elementos a partir da profunda relação entre casa e usuário,

extensões do corpo, a casa onde moramos também é”.

confere a esta significados simbólicos.

(MAUTNER 2012).

A casa é uma extensão do corpo humano, pois recebe

Uma obra onde casa se torna uma extensão do corpo do

diretamente os reflexos de seus usuários, em hábitos e

usuário até em sua estruturação é na Casa Bordeaux, 1998,

comportamentos se tornando um prolongamento corporal. A

projetada pelo arquiteto Rem Koolhaas. (Fig. 18). Nela pode-

função de proteção contra intempéries da natureza e

se observar um estudo minucioso do cliente para desenvolver

agressões do mundo, também se compara à finalidade da

uma residência que possa refletir as necessidades físicas e,

pele.

sobretudo psicológicas do usuário.

Assim como o corpo humano a casa possui necessidades de cuidados específicos, desta forma a casa recebe uma comparação direta ao corpo como afirma Mautner (2012)


38 Figura 18| Casa Bordeaux, Rem Koolhaas, 1998.

A vida íntima familiar acontece no nível mais baixo, no intermediário fica a sala de estar, o espaço mais usado da casa, com ampla relação com um lugar através do seu plano aberto, no volume superior estão os dormitórios da família, que apresenta singularidade em suas aberturas em diferentes alturas, para as variadas alturas dos usuários. Os três planos por si só estabelecem a relação entre espaços públicos e privados. Para permitir a locomoção do usuário em toda a residência, os três volumes foram vazados para a circulação vertical de um elevador sem vedações laterais,

Fonte: http://www.archdaily.com/

uma sala composta por estante e livros, fornecendo-lhe um livre acesso em todos os planos, que funciona como a

A casa foi desenvolvida para um casal com filhos, cujo marido após um acidente de carro passou a se locomover em uma

extensão do corpo do usuário, dinamizando os espaços domésticos durante sua utilização. (Fig. 19).

cadeira de rodas. Ao invés de uma residência simples, o cliente solicitou a Koolhaas uma moradia complexa, pois esta seria seu novo mundo. A residência foi proposta com uma volumetria simples, no entanto com uma espacialidade complexa e dinâmica, composta por três volumes sobrepostos com funcionalidades distintas.

Maison Bourdeaux é uma inovação magistral de espaço que superou a expectativa dos desejos dos clientes. Maison Bordeaux permanece como uma residência privada, que não permitem visitantes públicos; no entanto, independentemente de sua reclusão, ele ainda é um marco arquitetônico inovador


39 que é verdadeiramente “uma máquina para viver”. (ARCHDAILY, 2014)

cada usuário cuidar do seu funcionamento e até escoltá-la de vez em quando”. (MAUTNER 2012).

Figura 19| Interior Casa Bordeaux, Rem Koolhaas, 1998. Se nos alienamos do nosso corpo, deixandoo à mercê só de especialistas, a chance de percebermos tardiamente uma disfunção aumenta. O contato com o corpo facilita a compreensão de avisos -e não só de pedidos de socorro. (MAUTNER 2012).

Bachelard (1989) em seu livro, A poética do Espaço, traz várias interpretações de casas feitas por outros autores em seus contos. Uma dessas casas apresentadas pelo autor é La Redousse, presente na obra, Malicroix, de Henri Bosco onde este expressa a humildade e bravura da casa ao enfrentar Fonte: http://www.archdaily.com/

A casa é comparada ao organismo humano em seu cuidado diário, funcionamento e reflexo, da mesma forma quando existe uma alteração o corpo reage por meio da dor e da variação da temperatura, assim é a casa. Da mesma maneira que corpo precisa de sua higiene diária, a casa também. As atividades rotineiras de organização e limpeza permitem estar atento às possíveis transformações e anomalias, “cabe a

uma tempestade. A casa lutava bravamente. A princípio ela se queixava, as piores rajadas a atacaram de todos os lados ao mesmo tempo, com ódio nítido e tais urros de raiva que, durante alguns momentos eu temi de medo. Mas ela resistiu. Quando começou a tempestade, ventos mal-humorados dedicaram-se a atacar o telhado. Tentaram arrancá-lo, partir-lhe os rins, fazê-lo em pedaços, aspirá-lo. Mas ela curvou o dorso e agarrou-se ao velho


40 vigamento. Então outros ventos vieram e, arremessando-se rente ao solo, arremeteram contra as muralhas. Tudo se vergou sob o choque impetuoso; mas a casa, flexível, tendo-se curvado, resistiu à fera. Sem dúvida ela prendia ao solo da ilha por raízes inquebrantáveis, e por isso suas finas paredes de pau-a-pique e madeira tinham uma força sobrenatural. Por mais que atacassem as janelas e as portas, pronunciassem ameaças colossais ou trombeteassem na chaminé, o ser agora humano em que eu abrigava meu corpo nada cedeu à tempestade. A casa apertou-se contra mim, como uma loba, e por momento senti seu cheiro descer maternalmente até o meu coração. Naquele momento ela foi realmente minha mãe. “Eu só tinha a ela para me proteger e amparar. Estávamos sozinhos”. (BACHELARD, 1989 p. 61).

O autor confere a casa um corpo e organismo, que dotado energias físicas de um corpo humano, ganha vida. Ela faz parte de um lugar vivo e também vive. Transforma-se em um corpo de força e bravura. Além de corpo e vida, a casa ganha alma. Ao mesmo que ela desempenha sua função da forma mais literal e primitiva, ela a faz da forma mais sublime, com

ternura e bravura. A casa deixa de ser refúgio para se tornar um reduto com sentimentos. Sendo assim, entende-se que a casa deve ser tratada de forma mais complexa e sensível, indo além de combinação de cores, formas, volumes e materiais. Deve ser entendida como um lugar de reconhecimento do corpo em seus hábitos e costumes, como forma de aproximação da relação entre casa e morador. O

estreitamento

dessa

relação

permitirá

ao

usuário

interpretar a casa como uma extensão de seus reflexos corporais, consequentemente possibilitando um entendimento de maneira mais clara da casa como um organismo vivo que reage diretamente ao comportamento dos usuários.


41 2.3 A Casa Como Extensão Mental Esses conceitos podem ser reforçados por Bachelard (1989) onde ele afirma que “a casa é um estado de alma”, em seu Além de extensão do corpo, a casa também é um reflexo da personalidade de quem a habita, segundo Jaeger (2001) na filosofia ocidental o corpo é quem abriga a psique, a alma, sendo esta a essência do homem, que influencia diretamente o comportamento humano, aflorando-se em hábitos e costumes.

livro, A Poética do Espaço, ele relata a análise da psicóloga Francoise Minkowska, à partir da observação de desenhos de casas feito por crianças da mesma idade, “Pedir uma criança para desenhar uma casa é pedir-lhe para revelar o sonho mais profundo que ela deseja abrigar a sua felicidade”. (BACHELARD 1989, p.84). Em análise foram observados dois

a

grupos de crianças, um grupo de crianças felizes e outro

experiência com sua moradia visto em seus hábitos, usos e

grupo de crianças infelizes, maltratadas pelas brutalidades

costumes vividos no interior da casa. Desta forma pode-se

sofridas durante a Segunda Guerra Mundial.

O

comportamento

do

indivíduo

deixa

transparecer

perceber que a casa é um reflexo da essência do usuário. É necessário ultrapassar aquela totalidade homogênea do espaço para descobrir que o comportamento humano se traduz em usos e hábitos. Cada indivíduo possui um comportamento particular que estará refletido no seu lugar de moradia, na forma como organiza os ambientes, nos objetos presentes, etc. A casa passa a ser espelho da personalidade dos moradores e assim estes se reconhecem nela. (BARROS, 2012, p.02)

Se for feliz, saberá encontrar a casa fechada e protegida, a casa sólida e profundamente enraizada. Ela é desenhada em suas formas, mas quase sempre um traço designa uma força íntima. Em certos desenhos, diz a Sra. Balif, “é evidente que faz calor no interior, que há fogo, um fogo tão vivo que vemos saindo pela chaminé”. Quando a casa é feliz, há telhado. Se a criança é infeliz, a casa traz a marca da angústia do desenhista. [...] A criança que


42 viveu escondida num armário, atenta ao menor ruído, muito tempo depois das horas malditas desenhas casas estreitas, frias e fechadas. [...] “Essa rigidez e essa imobilidade são encontradas, tanto na fumaça quanto nas cortinas das janelas. As árvores em derredor são retas, parecem estar vigiando-a”. (BACHELARD 1989, p.84 e 85).

viúva e mãe de três filhos, mulher independente, de forte personalidade, muito influenciada pelos movimentos artístico da época, mais precisamente o De Stijl. O De Stijl foi um marco da arte moderna, fundado em 1917, pelo artista holandês Piet Mondrian. O estilo se configurava em uma arte abstrata e geométrica, com cores primárias,

Os desenhos das crianças por mais ingênuos e espontâneos

azul, amarelo e vermelho, aos tons de cinza, preto e

que possam ser, trazem as marcas que existem na alma,

branco. (Fig. 20).

sejam de alegria ou tristeza. Mesmo tratando do aspecto exterior da

casa,

os desenhos

relatam

intimidade

Figura 20 | Azul, Vermelho, Amarelo, Piet Mondrian, 1935.

e

reconhecimento por meio da maçaneta na porta, que é interpretada da seguinte forma “uma maçaneta, entramos nela, moramos nela”. Não é simplesmente uma casaconstrução; “é uma casa habitada”. (BACHELARD 1989, p. 85). Esse signo marca a capacidade de reconhecimento do corpo nos desenhos das crianças felizes, esquecido no desenho das crianças tristes. Uma casa onde se pode visualizar a personalidade de quem a habita de forma marcante é na residência projetada pelo arquiteto e design Gerrit Rietveld para a Sr. Schroeder. Uma

Fonte: http://prilazaroarquitetura.files.wordpress.com/


43 A cliente apresentou seu programa de necessidades ao

Figura 21| Casa Schroeder, Gerrit Rietveld, 1924.

arquiteto: uma casa sem muros, flexibilidade de layout dos dormitórios, abastecimento de água em todos os cômodos e que estes tivessem uma abertura para voltada para o exterior. O projeto da residência foi concebido com participação ativa da cliente, que recebeu seu nome, Casa Schroeder 1924. (Fig. 21). A casa apresenta os princípios artísticos do movimento de forma muito expressiva tanto na área externa como interna. Onde a casa parece imprimir a tela de Mondrian. Rietveld usa cores primárias do movimento para distinguir espaços e funções, tanto nos ambientes físicos como também no mobiliário feito para os usuários, solicitado pela cliente. No segundo pavimento ficam os dormitórios com painéis reversíveis, que durante o dia configuram amplo espaço aberto, para que as crianças tenham liberdade ao brincar durante o dia, sob o cuidadoso olhar materno, à noite os painéis podem ser fechados proporcionando privacidade em quartos individuais, espaço considerado o “coração da casa”.

Fonte: http://www.archdaily.com.br/


44 possa ser apropriado e anexado por todos como um lugar que realmente lhes pertença. [...] Cada componente espacial será usado mais intensamente (o que valoriza o espaço), ao mesmo tempo em que se espera que os usuários demonstrem suas intenções. (HERTZBERGER 1996, p.47).

Nesta residência pode-se observar de forma explícita essência do que se acreditava o usuário. Quando ocorre o reconhecimento do indivíduo em seu espaço de moradia, a casa adquire uma dimensão simbólica, o que resulta em um sentimento de pertencimento do usuário com sua residência. Desta forma o usuário sente que faz parte da casa e casa

Essas contribuições e oportunidades para que o usuário

parte do indivíduo. A sensação de pertencimento significa que precisamos nos sentir como pertencentes a tal lugar e ao mesmo tempo sentir que esse tal lugar nos pertence, e que assim acreditamos que podemos interferir e, mais do que tudo, que vale a pena interferir na rotina e nos rumos desse tal lugar. (DICIONÁRIO DOS DIREITOS HUMANOS, 2014).

Segundo Hertzberger (1996), o sentimento de pertencimento pode ser desenvolvido por meio da facilitação e incentivo da intervenção dos usuários nos ambientes. O arquiteto pode contribuir para criar um ambiente que ofereça muito mais oportunidades para que as pessoas deixem suas marcas e identificações pessoais, que

expresse sua identidade, podem se vistas no Edifício de Escritório Centraal Beheer, 1972 (Fig. 22).O arquiteto tornou mais humano “as ilhas de escritórios” onde foi explícito aos usuários a liberdade e responsabilidade individual de ordenamento e acabamento. A participação efetiva dos funcionários desencadearam efeitos surpreendentes na personalização individual dos escritórios.


45 Figura 22| Centraal Beheer, Herman Hertzberger, 1972.

Cada funcionário procurou se identificar à sua maneira, com cores, vasos de plantas, objetos com valores afetivos. Ainda que se tratasse de um escritório, um ambiente de trabalho, os usuários tem a necessidade de se sentirem identificados, criando uma relação prazerosa com o ambiente, que por sua vez os convidou à caracterização individual. Os usuários foram influenciados através de oportunidades oferecidas pela própria forma do espaço e acessórios básicos. A influencia dos usuários pode ser estimulada, pelo menos nos lugares certos, i.e. onde se pode esperar o envolvimento necessário, e como isto depende do grau de acesso, das demarcações territoriais, da organização da manutenção e da divisão de responsabilidades, é essencial que o projetista esteja plenamente consciente desse fatores nas suas gradações adequadas. Nos casos em que a estrutura organizacional impede os usuários de exercerem qualquer influência pessoal em seu ambiente, ou quando a natureza de determinado espaço é tão pública que ninguém se sente inclinado a exercerem influencia nele, não há motivo que o arquiteto tente fazer uma contribuição nesse sentido. (HERTZBERGER 1996, p.25).

Fonte: http://www.archined.nl/typo3temp/pics/fdac05ab92.jpg


46 Sendo assim percebe-se que intervenção do usuário é

Figura 23| Casa Muller, Adolf Loos, 1930.

empregada de maneira primordial, para o enriquecimento e aprofundamento da relação entre usuário e o espaço.

Outro arquiteto que defendeu a liberdade de atuação dos usuários como forma de identificação e desenvolvimento de sentimentos para uma real experiência com a casa de foi Adolf Loos.

Este tratou a arquitetura residencial de maneira minuciosa, como forma de propiciar o máximo de identidade aos moradores, apresentando muitos discursos e conceitos no desenvolvimento dos espaços domésticos, estudando de forma detalhada os usuários, costumes e hábitos, para criar

Fonte: http://www.fototuristika.cz/

e

Feita para um casal burguês europeus nos anos 30, nesta

personalidade dos clientes, sempre defendendo e propiciando

residência Loos cria uma organização de sobreposição de

experiências corporais, conforto, segurança, intimidade e

planos, trabalhando os cômodos com níveis diferentes e pés

dimensão psicológica, como podemos observar na Casa

direitos variados, como estímulo de sensações corporais e

Muller, 1930. (Fig. 23).

privacidade e para garantir ainda mais o senso de intimidade

ambientes

que

respondessem

as

necessidades

cria ambientes distintos à mulher.


47 A sala localizada centralmente, lugar íntimo e seguro, faz fronteira com o acesso para o mais íntimo ainda, os dormitórios acima, enquanto apresenta janela interior com visão para a circulação interna. É a mulher como esposa e mãe que garante a privacidade da casa, mantendo sua respeitabilidade, essencial como defesa contra a incursão ou a curiosidade como se fosse ela própria as paredes da casa. (ARAÚJO, 2008 p.152).

Figura 24| Interior Casa Muller, Adolf Loos, 1930

Para firmar a intimidade e identidade presente em seu discurso, Loos defendia a não intromissão do arquiteto na decoração estilística da casa, uma vez que os objetos passam a ter significados simbólicos para os usuários, facilitando o desenvolvimento do espaço doméstico ideal. Fonte: http://www.fototuristika.cz/

(Fig. 24). A ligação comum deve unir os móveis dispostos em um cômodo é o fato de que seu morador os selecionou afirma ele. E sobre sua própria casa diz Loos: ”Cada peça do mobiliário, cada coisa, cada objeto tinha uma história para contar, uma história da nossa família”. (Loos, 1982:24). (ARAÚJO, 2008 p.152)

Para Brandão (2005), os objetos que compõem um ambiente permite ao usuário se encontrar, se identificar, se orientar e se firmar. A conexão entre esses objetos, que caracterizam o ambiente e o espaço, de acordo com o indivíduo pode assegurar o seu bem-estar ou falta dele. Por isso a habitabilidade e o bem-estar vão além vão além da constituição da forma que


48 abriga o hábito cotidiano, a habitudine, e requerem o decoro, os objetos que me confirmam, que me assentam em mim mesmo, os objetos próprios ao lugar e a mim e que dão-me um pouco de certeza da história que sou. O decoro não é decoração e o ornamento não é ornamentação, mas os instrumentos visíveis que fazem com que me encontre, que esteja num lugar este alguém que sou eu, com desejos e possibilidades de serem realizadas. Quando acontece este eu estou, este eu sou e este posso ser eu, minhas circunstâncias e minhas possibilidades o bem estar vem e me põe em repouso ou em movimento. Quando, ao contrário, eu vejo o indecoroso à minha volta, este não-eu que me contradiz e me faz sentir alienado e não estando em um lugar, vem a insatisfação, o mal estar e o estar mal em mim e comigo mesmo. (BRANDÃO² 2005).

Desta forma, percebe-se que a casa é um reflexo da personalidade do seu usuário, e esta tem a capacidade de fazer com o indivíduo se sinta parte desta deste lugar, por meio de suas impressões ainda que subjetivas, que podem ser exprimidas em cada particularidade apresentada pelo usuário,

seus

costumes,

hábitos,

sentimentos

e

personalidade.

Um

mundo

que

pode

passar

pela

incompreensão dos olhares supérfluos, mas afinal a casa deve se significativa para o seu usuário, pois é este que ela representa, expressa e o envolve em toda sua dimensão.


49 2.4 A Casa Como Fonte de Memória

específicos.” Trazendo a noção romana de genius loci, o espírito do lugar, o estabelecimento de uma relação sagrada

Para entender melhor a relação entre corpo, mente e espaço

para a realização do habitar, que é estar em harmonia com

é necessário fazer a distinção entre espaço e lugar, termos

um lugar seguro.

estes que conduzem experiências comuns. Para Montaner (2001, p. 31) os conceitos de espaço e lugar são distintos e de forma clara, “O primeiro tem uma condição ideal, teórica, genérica e indefinida, e o segundo possui um caráter concreto, empírico, existencial, articulado e definido até os detalhes”, e também traz uma diferenciação precisa destes conceitos, onde o espaço se torna lugar a partir da experiência do corpo humano. Desta forma é possível perceber que o espaço está ligado à construção palpável, a uma casa vazia e sem habitantes, a partir do momento em que esta se torna habitada, tem-se uma casa que passou a ser lugar. O espaço recebeu a

Uma das mais importantes “matérias primas” da análise fenomenologia é a memória da primeira infância. Estamos habituados a pensar que a lembrança de infância são produtos da consciência ingênua e da capacidade de memorização imprecisa da criança, algo muito interessante, mas de tão pouco valor nos nossos sonhos. Mas essas duas ideias preconcebidas são erradas. Sem dúvida, o fato de que certas lembranças remotas conservam para toda a vida a sua identificabilidade pessoal e vigor emocional é uma prova convincente da importância e da autenticidade dessas experiências, assim como os sonhos e devaneios diurnos revelam os conteúdos mais espontâneos e verdadeiros da nossa mente. (PALLASMAA, 1986, p.485)

essência do lugar. Para Tuan (1983) “O espaço transforma-se em lugar à NESBITT (2006, p.443) cita o teórico Noberg - Schulz que

medida que adquire definição e significação”.

explica a fenomenologia na arquitetura “como a capacidade

relação entre tempo e lugar de três formas: a partir dos laços

de dar significado ao ambiente, mediante a criação de lugares

afetivos criados com um determinado lugar em função tempo

Ele faz a


50 de vivência, o lugar é destinado como um lugar de repouso e

diversas moradas da nossa vida se interpenetram e guardam

descanso, procriação e segurança, e por último o lugar cria

tesouros dos dias antigos. (BACHELARD, 1989 p.25).

raízes pertencente ao passado, podendo ser revividos através das lembranças e memória.

As casas podem permanecer em nossas lembranças através de objetos, fatos, atividades, sentimentos e outros diversos

A casa é o lugar do homem no mundo, a primeira membrana

elementos. A casa da minha infância me vem à memória, por

do seu universo, nela se retém muitas de suas histórias e

vários elementos, mas um dos mais significativos é o livro de

lembranças, em cada ambiente e objeto. Cada um desses

Maria José Dupré, A Montanha Encantada, 1945. (Fig. 25).

elementos tem a capacidade de o transportar através do tempo por meio das lembranças e sentimentos. “... a casa é uma

das

maiores

(forças)

de

integração

para

Figura 25| A Montanha Encantada, Maria José Dupré, 1945

os

pensamentos, as lembranças e os sonhos do homem”. (BACHELARD, 1989 p.26).

As lembranças da casa estão guardadas na memória e no inconsciente, ao deixar se aventurar por elas, os sonhos são valorizados e acompanha-nos durante toda a vida e, sempre voltamo-nos a elas nos nossos devaneios. Ao revivê-las nos sentimos confortados pelas lembranças que ainda vivem em nós. Assim a casa vive não somente no dia-a-dia, no curso de uma história, na narrativa de nossa história. Pelos sonhos as

Fonte: Aquivo Pessoal


51 Não é necessário ler a obra, apenas contemplá-la, para ser transportada à varanda de telhado cerâmico que não exercia

Figura 26| Segunda Residência do Arquiteto, Vilanova Artigas, 1949.

limites para com quintal onde reinava a nossa amoreira que além de sustentar o nosso balanço e nos agraciava com suas deliciosas frutas. O cenário se completava pela minha presença e a de meus irmãos sentados à volta da minha mãe, para ouvirmos a nossa história preferida, que ela contava com alma, todos os personagens ganhavam vida, e nós nos sentíamos no cenário da história. Apesar do passar dos anos a lembrança é mais viva do que nunca, me retorna a um momento de encanto e ternura, as lembranças também me ocorrem ao passar pelo bairro, mesmo que a casa não exista

Fonte: http://www.archdaily.com.br/

mais. As lembranças só se tornam possíveis porque um dia a

A casa é concebida um lugar com significados, cheios de

casa foi um lugar existencial com definições e significados.

histórias e lembranças, por meio da existência de sua primeira casa no mesmo sítio.

O professor e arquiteto brasileiro, Vilanova Artigas trabalha a casa como fonte de memória ao projetar sua segunda

A casa em sua própria volumetria deixa claro as áreas pública

residência, em 1949, uma obra de grandes conceitos e

e privada, uma vez que esta foi projetada para ser um

discussões na arquitetura paulista e modernista brasileira, a

ambiente de moradia e trabalho. O forte conceito de público e

Segunda Residência do Arquiteto, 1949. (Fig. 26).

privado em evidência na residência deixa transparecer a personalidade do usuário, um arquiteto professor, a área


52 pública da casa tem maior dimensão que a área privada, um

Caffé (2000) demonstra a cidade do ponto de vista de um

usuário com um grande relacionamento social, onde os

espectador, além de exercitar a memória do observador de

convidados se encontravam na casa para uma série de

seus desenhos, a artista revela uma paisagem em constante

discussões, como arquitetura e política.

transformação, desconsiderada por um olhar corriqueiro de

A casa era bastante frequentada pelos alunos de Artigas e ficou marcada na memória de todos eles, mas principalmente

um observador comum. (Fig. 27). Figura 27| Viaduto Aricanduva, Carla Caffé, 2000.

para os simpatizantes da política comunista, pois em pleno período militarista, a casa era o lugar de encontros políticos dos esquerdistas, que constantemente era alvo dos militares. A casa desempenhava inúmeras funções como, moradia, trabalho, social e política. As lembranças da casa eram importantes para os moradores, como também para todos que a frequentavam. A arquiteta e artista plástica, Carla Caffé, também instiga o olhar sobre a memória, com seus desenhos da cidade de São Paulo, ao capturar imagens cotidianas de vários pontos da cidade que passam despercebidas pelos seus habitantes. Os desenhos podem ser visualizados em seus livros, AV. Paulista e São Paulo na Linha. Fonte: https://c2.staticflickr.com/6/5078/5878338_8175c3d770.jpg


53 Assim pode-se perceber que cada casa conta sua história e a história de seus usuários. A casa é palco das diferentes manifestações humanas em toda sua diversidade social, cultural e econômica. Quão maior a relação entre morador e ambiente de moradia, mais a casa é composta sentimentos e significados e cabe a cada usuário entender a dimensão simbólica que esta adquire durante sua vivência.


54 2.5 A Casa Imaterial

Ao aprofundar a relação entre casa e usuário, a partir do reconhecimento de corpo e mente nestes lugares esta vai adquirindo

novos

conceitos

e

valores

para

os

seus

moradores. A casa se torna o ponto de partida e retorno do mundo, a casa se torna o mundo e o universo para o usuário, que é interpretado e vivido à maneira do seu morador. Para Brandão (2005), a casa se torna um lugar ideal a partir do desenvolvimento do bem-estar quando se conforma um meio através do qual o usuário se conquista, se identifica, se vê abrigado em seus costumes, seus hábitos e se encontra em sua moradia depois de um dia de trabalho, depois percorrer a cidade e girar o mundo. Como pode ser visto em um dos contos de MACHADO DE ASSIS. A casa estava perto; à medida que ia vendo as outras casas e chácaras próximas, Mariana sentia-se restituída de si mesma. Chegou finalmente; entrou no jardim, respirou. Era aquele o seu mundo; menos um vaso, que o jardineiro trocara de lugar: - João bota esse vaso onde estava antes, disse ela. - Tudo estava em ordem, a sala de entrada, a

de visitas, a de jantar, os seus quartos, tudo. Mariana sentou-se primeiro, em diferentes lugares, olhando bem para todas as coisas, tão quietas e ordenadas. Depois de uma manhã inteira de perturbação e variedade, a monotonia trazia-lhe um grande bem, e nunca lhe pareceu tão deliciosa. (MACHADO DE ASSIS, 1884).

No entanto, para se chegar a esse paradigma existem muitos caminhos a serem percorridos. Para Chaves (2012) esta é uma busca que deve ser questionada e procurada pelo morador, incansavelmente mesmo que dure a vida toda. Para chegares a uma casa, tens de caminhar. Tens de procurá-la. Uma casa não existe. Uma casa não vem ter contigo, à tua procura. Nenhuma casa te espera, a menos que aceites que aquilo que te espera possa ser uma casa. Tens de procurá-la, tens de construí-la, mesmo que pareça já estar construída. Nenhuma casa vem ter contigo. Para chegares a uma casa tens de caminhar, tens de procurá-la. Podes conseguir encontrá-la, no tempo da tua vida. Ou não. (CHAVES, 2012).

Esta busca pela casa ideal foi discutida no Seminário da Semana Integrada. (Fig. 28). Onde foram exibidos episódios do programa Morar, do canal GNT. O programa exibe


55 documentários que relatam moradores em determinadas

vivências com a moradia. No seminário foi exibido dois

cidades, em busca da casa ideal, alguns encontraram e

episódios do programa, Morar na Serra Gaúcha e Morar no

outros ainda estão à procura.

Caminho dos Diamantes.

Figura 28| Seminário Semana Integrada 2/2014

A primeira casa do episódio exibido, Morar na Serra Gaúcha, relata uma casa que abriga várias gerações de uma família, um ato de preservar uma tradição que os moradores exibem com orgulho, pois veem a casa como um bem imaterial da família. A casa é repleta de lembranças e histórias que fazem com que os moradores atuais estreitem os laços familiares com seus antepassados. Uma moradora ficou sozinha em sua casa, devido aos seus familiares acharem que esta era “amaldiçoada”, a moradora permaneceu na residência por se identificar com a casa e o lugar, e encontrou no paisagismo e pintura um meio de alegrar o ambiente de sua vivência.

Fonte: Arquivo do Autor

Esta busca dos moradores ocorre das mais variadas formas assim como as soluções encontradas por eles. Os moradores abrem as portas de suas casas e falam de suas relações e

Ao falecer a senhora de quem cuidava, a “cuidadora” de idosos, permaneceu na residência, para manter viva a casa e a memória de sua dona.


56 Uma esposa construiu uma casa ao lado da residência do

a cidade natal, onde mantém a casa que guarda os primeiros

marido onde moraram juntos por anos, por sentir falta de

passos da família.

identidade com a residência. Na nova moradia ela desfruta de uma ampla relação com a casa. O marido permaneceu em sua morada onde nascera, onde morou com a esposa por anos e onde pretende morrer. Embora morando em casas separadas, os vizinhos, mantém sua vida familiar.

A procura pela casa ideal é a busca do desenvolvimento do sentimento de pertencimento, do estabelecimento de uma relação harmoniosa com a casa que excede sua dimensão volumétrica palpável. Algo comum aos moradores são os sentimentos e importância que apresentam em relação ao

As gerações de uma família construíram suas casas no

convívio familiar, às raízes e as memórias, como citado por

mesmo sítio, para não se distanciarem de suas raízes,

Lopes (2012), “a casa funciona para o homem como lugar de

convívio familiar e por sentirem que fazem parte do lugar.

enraizamento e identificação com o lugar, onde o homem vive

Cada residência compõe as impressões da família, garantindo

passado e presente...”. Os usuários descrevem a casa como

identidade, intimidade e ampla vivência com parentes.

um conjunto de elementos e sentimentos que constituem um

O episódio Morar no Caminho dos Diamantes apresenta

lar.

dos

O lar é uma condição complexa que integra memórias, imagens, passado e presente, sendo um complexo de ritos pessoais e rotinas quotidianas que constitui o reflexo de seus habitantes, aí incluídos seus sonhos, esperanças e dramas. (MIGUEL, 2003).

integrantes da família, a casa agora se movimenta e reside

Miguel (2003) e Fracalossi (2014) ao falarem sobre o lar,

em cidades diferentes, mas quando a saudade aperta voltam

sempre trazem como elemento de analógico o fogo, diante de

casas de vivências de igual particularidade ao primeiro, se sobressaindo a família que não satisfeita com a imobilidade da casa, passaram a residirem em um ônibus, que o caracterizaram

de

acordo

com

a

personalidade

suas significativas propriedades para o desenvolvimento


57 Uma casa é uma gargalhada, ou as vozes e o sorriso dos amigos.Procuramos uma casa que exista em todo o lado, sem tectos nem paredes. Nem alicerces. Nem portas fechadas. Uma casa é um abraço: o maravilhoso aroma da pessoa amada, a sua acolhedora temperatura, a comovente suavidade e doçura dos seus contornos, a sua pele, a sua voz, o seu olhar que nos envolve. O seu sorriso, que sempre reconheceremos. A sua mão no interior da nossa mão quando passeamos os dois. Esta é a casa mais eterna e a mais precária, a única que esperará sempre por nós. (CHAVES, 2012).

humano e a religiosidade, mas, sobretudo para a criação da base das instituições sociais, o lar. Desde os primeiros tempos, o lar se converteu em lugar de culto; ideias religiosas antiguíssimas e persistentes estavam associadas a ele. Era um símbolo moral: congregava aos homens em famílias, tribos e nações, e contribuía ao desenvolvimento das instituições sociais ao menos tanto como a necessidade ou a pobreza. O altar doméstico foi o primeiro objeto singularizado por meio da ornamentação; ao longo de todos os períodos da sociedade humana, formou o foco sagrado em torno ao qual cristalizaram, como um todo, os outros elementos dispersos. (FRACALOSSI, 2014).

A casa é um conjunto de sentimentos, elementos, pessoas, vivências e significados, o lugar de princípio da existência

O lar configura uma instituição sagrada no interior da casa, o

humana, lugar de cada indivíduo no universo, um ponto de

fogo se torna alma da casa, despertando a união e

partida onde se prepara para mundo e se encontra ao

propiciando o conforto e, esta por sua vez protege o fogo, que

retornar.

reúne a família e constitui o lar. Desenvolvendo um ciclo harmônico o para a vivência do sentimento do significado

Os conceitos de casa estudados permitem a entender como um lugar de reconhecimento corporal e psicológico, um lugar

simbólico da casa.

de transição humana com a capacidade de resguardar Uma casa é o riso e as vozes das crianças que a habitam. Uma casa é onde o sorriso antigo dos nossos Pais permanece sempre à nossa espera, de cada vez que chegamos.

momentos e histórias, sobretudo a casa é capaz de despertar e adquirir significados específicos para seus usuários.


58 3.0 ANÁLISE EM RESIDÊNCIAS FÍSICAS

emprego participavam com a mão de obra não remunerada

3.1 O Conjunto Habitacional

nos finais de semanas e feriados. (Fig. 29). Figura 29| Mutirão Primeiro conjunto habitacional Popular – 1991.

Para o embasamento prático da pesquisa, serão analisadas residências que não foram projetadas para moradores específicos, procurando identificar nessas moradias os conceitos de casas estudados no desenvolvimento da pesquisa. O local de análise será o Primeiro Conjunto Habitacional Popular da cidade de Ipatinga. Segundo a dissertação de mestrado de Conti (1999), o projeto do conjunto habitacional se iniciou em 1989 e teve sua total implantação em 1992, o conjunto foi realizado por meio da política habitacional, Mutirão em Autogestão, o projeto foi gerenciado e financiado pela Prefeitura Municipal de Ipatinga com assessoria da Associação Habitacional de Ipatinga.

Fonte: Associação Habitacional de Ipatinga

Segundo Conti (1999), por falta de tempo, as famílias beneficiadas não participaram das discussões do projeto da unidade

habitacional,

impossibilitando

as

modificações

desejadas. O projeto consistia em unidade habitacional

O projeto do mutirão era baseado na integração entre

geminadas com área de 39 m² com sala, quarto, cozinha,

gestores

banheiro e área de serviço, em alvenaria estrutural e telhado

e

desempregados

futuros

moradores

foram

contratados,

os os

beneficiários que

possuíam

cerâmico.

O

projeto

previa

a

projeção

de

escada

possibilitando a construção de um segundo andar. (Fig. 30).


59 Figura 30| Planta da Unidade Habitacional – 1991.

Segundo a revista Mutirão Em Autogestão (1993) foram beneficiadas 117 famílias de baixa renda ou que residiam em situações de risco como às margens do Ribeirão Ipanema. Em fevereiro 1992 as moradias começaram serem entregue as famílias. (Fig. 31 – Anexo). Ao mudar com a minha família para este residencial, ainda criança, pude vivenciar as dificuldades sociais encontradas pelos novos residentes, como a falta de abastecimento de água, energia e pavimentação das ruas. Embora as famílias estivessem aliviadas por terem um espaço seguro para morar, o lugar era triste e vazio, reflexo da monotonia das formas e cores repetitivas. Como todas as unidades não foram apropriadas ao mesmo tempo, as casas sem vestígio algum da presença de uma família, tornavam o lugar menos confortante. Ainda com os problemas de infraestrutura do local, todas as unidades foram apropriadas, a presença das famílias nas residências fizeram com que em pouco tempo e com pequenas transformações

Fonte: Associação Habitacional de Ipatinga

as residências marcassem a presença humana, como a


60 criação de jardins na frente da casa e objetos no quintal. (Fig.

Ao longo dos anos estas residências passaram por muitas

32).

modificações que ocorreram pelos mais variados fatores,

Figura 31| Conjunto Habitacional Popular – 1992.

adaptação da residência às necessidades e características específicas de seus moradores como hábitos, costumes, comportamentos

e

a

busca

por

identificação

e

reconhecimento. As intervenções realizadas nas residências desencadearam grandes transformações na imagem da paisagem urbana. (Fig. 33). Figura 32| Conjunto Habitacional Popular – 2014.

Fonte: Associação Habitacional de Ipatinga

Fonte: Arquivo do Autor


61 3.1 Análise das Famílias Visitadas

A entrevista foi concebida por meio de uma conversa informal e descontraída, como método de assegurar tranquilidade e

Para entender o desenvolvimento da relação dos moradores

espontaneidade aos entrevistados, visto que o importante era

com estas residências, foram entrevistadas cinco das cento e

entender a relação do usuário, as suas interpretação,

dezessetes famílias dos residentes iniciais do conjunto

emoções e inquietações, demonstradas pelo próprio morador.

habitacional. A entrevista aconteceu por meio de uma visita às casas que permitiu um entendimento do panorama geral da residência. (Fig. 34).

A entrevista e a análise sistemática tiveram por objetivo a observação e entendimento em análise física dos conceitos estudados no desenvolvimento da pesquisa e as hipóteses

As casas analisadas foram escolhidas de forma aleatória e de

levantadas na introdução, tais como, procurar entender os

acordo com o desejo e disponibilidade de participação de

primeiros sentimentos e sensações na apropriação da

cada morador.

moradia, como o usuário buscou imprimir identidade em sua

As visitas às famílias não foram agendadas, ao passar pelas residências abordei os moradores, me identifiquei como estudante e moradora do bairro, apresentei a proposta da pesquisa e os convidei a participação. Apenas um dos seis moradores abordados, rejeitou a participação.

residência, a relação que foi desenvolvida com o passar dos anos, que lembranças a casa proporciona e que significado esta tem hoje para o seu morador.


62 Figura 33| Localização das Famílias Visitadas.

 Conjunto Habitacional  Casa da Família Souza  Casa da Família Silva Nascimento  Casa da Família Pereira Silva  Casa da Família Oliveira  Casa da Família Carvalho Silva

Fonte: Arquivo do Autor


63

 A Casa da Família Souza

Dona Ana fazia parte da comissão organizadora do mutirão e pode escolher a primeira casa, como era certo que a casa já

Antes de começar a construção do conjunto habitacional foi

seria sua ela pediu que o piso escada fosse preto, pois era

feito uma casa piloto, com um quarto a mais que todas as

um sonho antigo. (Fig. 36).

outras casas, o que levou os moradores a optarem pela residência. No período de posse da casa a família Souza era

Figura 35| Sala Casa Família Souza.

composta por seis moradores, hoje tem apenas dois, Ana Maria de Souza, 63 anos e o neto Filipe Souza Almeida, 21 anos (não participou da entrevista). (Fig. 35). Figura 34| Casa Família Souza.

Fonte: Arquivo do Autor

A moradora conta que não sentiu dificuldades na apropriação da residência, devido aos problemas que enfrentava em suas moradias anteriores. A família já havia passado em várias residências alugadas e se apossar de uma moradia própria Fonte: Arquivo do Autor

era um marco na vida dos moradores, “Eu não enxergava


64 problema na casa ser pequena, pois morávamos de aluguel e

Figura 36| Cozinha Casa Família Souza.

as outras casas também eram pequenas, era muito difícil porque as pessoas não queriam alugar casas para famílias com muitos filhos, vir morar aqui, em uma casa nossa foi uma coisa de outro mundo.” (Informação Verbal)1. A primeira necessidade de intervenção da casa foi uma observação do marido, uma cozinha maior, “eu não fazia muita questão, mas ele achava que uma família grande precisava de uma cozinha grande” 1. Dona Ana, demonstra muito afeto e zelo pela casa, “a casa é

Fonte: Arquivo do Autor

como a gente se não cuidar, acaba” 1, mostra com carinho os

A cozinha da casa conta muitas histórias, uma entre elas

objetos da casa, que mantém aparência conservada, mesmo

torna a casa especial para os outros moradores do bairro.

com o passar dos anos. Durante a apresentação dos objetos

Como pagamento de uma promessa todos os anos a família

ela demonstra grande emotividade, no entanto um especial,

promove uma comemoração no mês de outubro para as

um jogo de vasilhas sobre o armário da cozinha, que passou

crianças do bairro. Os quitutes são preparados na mesma

de mãe para filha, que faz questão de manter sempre muito

cozinha a mais de vintes anos, o evento também acontece na

bem areados. (Fig. 37).

casa que fica aberta a todas as crianças. A casa faz parte da história das pessoas, muitas crianças que frequentavam a casa, hoje levam seus filhos, “para mim é um prazer fazer a

1

Informações cedidas pela moradora, Ana Maria de Souza, em visita à sua residência no dia 18 de outubro de 2014.

alegria das crianças em minha casa” 1.


65 Para a moradora a maior lembrança que a casa lhe

desde uma apropriação com a família completa, a perda do

proporciona é a do esposo ainda com vida, a esperando no

marido, a preparação dos filhos para o mundo e saída de

portão da casa. Ela conta que se identifica com a casa, em

cada um para viver sua própria vida e anos depois a chegada

especial com o quarto, “no verão não faz calor e no inverno o

de um neto para fazer companhia. Ao término da visita a

frio é na medida” 1. (Fig. 38).

moradora relembra as casas passadas e complementa “a

Figura 37| Quarto da Dona Ana Maria de Souza.

melhor casa que já morei depois de casada” 1. (Fig. 39). Figura 38| Dona Ana Maria de Souza.

Fonte: Arquivo do Autor

Para ela, hoje a casa está um patamar ideal que não carece de mudanças, mas não descarta necessidades futuras. A casa marca uma fase de transição na vida da moradora,

Fonte: Arquivo do Autor


66

 A Casa da Família Silva Nascimento

A matriarca da família a Sra. Celina relatou a vivencia na casa desde a apropriação até os dias atuais. Ela conta que os

A família reside no residencial desde sua implantação, a

primeiros dias na nova residência foram de grandes

princípio a casa abrigava os seis integrantes da família, hoje

dificuldades, pois a casa estava pendente de acabamentos

apenas dois moradores: a Sra. Celina da Silva Nascimento,

como revestimentos e vidros nas janelas e portas, além dos

65 anos e o filho, Silvanir Silva Nascimento, 37 anos (não

constantes aparecimentos de escorpiões que amedrontava as

estava presente durante a visita). (Fig. 40).

crianças, mas estes problemas eram pequenos diante da

Figura 39| Casa da Família Silva Nascimento.

felicidade da realização da casa própria, “era melhor está aqui, era pequeno apenas três cômodos, mas era meu”. (Informação Verbal)2. A disposição dos cômodos da casa não atendia a família, apenas um quarto para seis pessoas, “a casa não cabia as camas das crianças”2, o que desencadeou as primeiras intervenções na residência, a construção de novos quartos. A casa passou por várias modificações para se adaptar as necessidades da família, “melhorou, mas não gosto do banheiro, não é convidativo e nem prazeroso”2, o único

Fonte: Arquivo do Autor

ambiente que não sofreu alterações. Outros problemas

2

Informações cedidas pela moradora, Celina da Silva Nascimento, em visita à sua residência no dia 2014.


67 também não foram solucionados “meu marido não suportava

Na sala da família está exposto objeto mais importante e

o quarto, não dormia lá, é quente e abafado, em seus últimos

valioso da casa, o quadro com pintura do casal “está comigo

dias de vida mudou-se de vez para a sala” 2.

há muitos anos, deixo ele aqui para que todos que entrem na

A Sra. Celina conta que a sala resguarda algumas das mais importantes lembranças da casa, os últimos momentos do marido com vida “ele só dormia aqui por causa da ventilação, ele morreu aqui e pediu para ser velado aqui, e eu realizei o seu pedido. Não vejo isso como um problema, mas como uma parte da minha história, gosto da minha sala, da cor, dos meus quadros e das minhas flores” 2. (Fig. 41).

casa possam ver, é minha maior recordação do meu marido, não vendo por dinheiro nenhum” 2. A moradora conta que à algum tempo colocou a casa a venda, ao iniciar a transação não pode prosseguir “senti que ia perder parte de mim, pra mim é primeiro Deus e depois a minha casa, é o lugar de encontro da minha família” 2. (Fig. 42). Figura 41| Sra. Celina com o filho Edeine e os netos.

Figura 40| Sala da Casa da Família Silva Nascimento.

Fonte: Arquivo do Autor

Fonte: Arquivo do Autor


68

 A Casa da Família Pereira Silva

Ao se casar Edeine morou por três anos na casa do sogro com a esposa Juliana, o que dificultava a vida familiar do

O filho da Sra. Celina, ao se casar construiu sua moradia no

casal, “não tínhamos privacidade e a casa não era nossa este

segundo pavimento da residência da mãe. Ele repetiu o

espaço aqui, foi uma concretização para nossa família”

padrão do pavimento inferior. A família é composta por quatro

(Informação Verbal)3.

membros, Edeine Mendes da Silva, 38 anos, Juliana Pereira Venâncio, 31 anos, Victor Hugo Pereira da Silva, 7 anos e

A esposa Juliana conta que se identifica com a casa e com

Verônica Pereira da Silva, 13 anos (não participou da

lugar, embora sinta que ainda não tenha chegado ao seu

entrevista). (Fig. 43).

parâmetro ideal, “a modificação que eu mais desejo é a construção do quarto das crianças, as camas ficam aqui na

Figura 42| Casa da Família Pereira Silva.

sala e aqui não é espaço para dormir” 3. (Fig. 44). Figura 43| Sala da Casa da Família Pereira Silva.

Fonte: Arquivo do Autor Fonte: Arquivo do Autor

3

Informações cedidas pela moradora, Juliana Pereira Venâncio, em visita à sua residência no dia 2014.


69 O marido de Juliana, Sr. Edeine além de se incomodar com o

Victor nasceu já havíamos mudado, foi o momento mais

quarto das crianças na sala, também relata o banheiro como

importante vivido em nossa própria casa” 4.

um espaço que incomoda “gostaria que ele fosse mais reservado, está voltado para quase todos os cômodos da casa”, (Informação Verbal)4.

Para Juliana o que torna mais agradável é convívio com a família, “coloco foto das crianças por todos os cantos, isso me agrada, quando não estão aqui continuo olhando para eles” 3.

Para o casal o ambiente que mais gostam é o quarto, “gosto

Para ela os objetos mais importantes da casa são as fotos da

de dormir, por isso é o lugar na casa que mais gosto” 4 . Para

família, os recadinhos e desenhos feitos pelos filhos. (Fig. 45).

o filho mais novo o ambiente mais agradável da casa é a cozinha, “gosto de comer e lá é lugar de fazer a comida e de

Figura 44| Fotos da Família Pereira Silva.

comer”, (Informação Verbal) 5 . A criança relata também o espaço que menos gosta “não gosto da sala, porque a minha cama fica aqui, mas não é meu quarto, todas as pessoas da casa ficam aqui, fazem tudo aqui, quero um espaço só meu” 5. Para o casal o momento mais importante vivido na casa foi o nascimento do filho como relatou o pai “quando a Verônica nasceu morávamos na casa do pai da Juliana, mas quando o

4

Informações cedidas pelo morador, Edeine Mendes da Silva, em visita à sua residência no dia 2014. 5 Informações cedidas pelo morador, Victor Hugo Pereira da Silva, em visita à sua residência no dia 2014.

Fonte: Arquivo do Autor


70 Segundo a mãe o que torna a casa especial é a capacidade

 A Casa da Família Oliveira

de propiciar o convívio doméstico da família, de unir a todos e proteger o lar, “a casa permite estarmos todos juntos, permite

A casa a família Oliveira no momento de apropriação da casa

o acontecimento da nossa família” 3. (Fig. 46).

era composta por onze pessoas, o casal e mais nove filhos. Hoje a residência abriga cinco habitantes, o Sr. João

Figura 45| Família Pereira Silva com o Sobrinho.

Fernandes de Oliveira, 75 anos e sua esposa a Sra. Maria aparecida Oliveira, duas filhas e um neto (não participaram da entrevista). (Fig. 47). Figura 46| Casa da Família Oliveira.

Fonte: Arquivo do Autor

Fonte: Arquivo do Autor


71 O Sr. João Fernandes conta que apesar da casa não compor

gosta na casa, a varanda, “passo mais tempo aqui, perto das

confortavelmente todos os seus integrantes, a felicidade de

minhas plantas, mas o mais importante, aqui é onde eu reúno

habitar uma residência própria era maior que qualquer

os meus filhos e netos” 6. E mostra com orgulho o mural na

deficiência encontrada. Para ele a casa tem um valor muito

parede, que a família preparou no seu aniversário de 70 anos.

especial por ter construído a própria residência “eu comecei a

(Fig. 48).

construir um sentimento com esta casa, quando ainda a

Figura 47| Mural 70 anos do Sr. João Fernandes.

estava construindo, cada tijolo colocado era parte deste sentimento

que

estava

sendo

composto”.

(Informação

Verbal)6. A filha mais velha do Sr. João Fernandes, mora ao lado da casa do pai, ele conta que todas as noites parte das crianças dormiam na casa da filha. No entanto as primeiras intervenções foram uma varanda e uma cozinha e depois as quartos na parte superior da casa, “durante a noite as crianças dormiam na casa ao lado, mas durante o dia a casa não nos comportava” 6.

Fonte: Arquivo do Autor

A esposa Sra. Maria aparecida relata que o menos gosta na Hoje o morador acha que a casa é grande demais para a quantidade de moradores, e apresenta o ambiente que mais 6

Informações cedidas pelo morador, João Fernandes de Oliveira, em visita à sua residência no dia 2014.

casa é o quarto por ser muito pequeno e impossibilitar a modificação do layout. Entretanto apresenta a residência com


72 muita satisfação e mostra o primeiro utensílio que ganhou do

A religiosidade da família Oliveira pode ser notada em um

pai ao se mudar para nova casa.

ambiente muito especial para todos os moradores da

O Sr. João Fernandes é um colecionador de admiradores, começou

a

guardar

todas

as

lembranças

que

fora

presenteados e hoje possui duas coleções, uma de cédulas e outra de garrafas, todas as peças são presentes que ele guarda com muito carinhos. As garrafas ficam em lugar de

residência. O pai criou um jardim onde depositou sua religiosidade, o lugar foi batizado pelos filhos como Santuário de São Sebastião, “gosto de jardins em geral, mas esse aqui expressa a minha fé e a da minha família” 6. (Fig. 50). Figura 49| Família Oliveira.

destaque na estante da sala, cada uma tem uma história para contar, “todos que chegam querem saber as histórias das garrafas, que eu conto com muito prazer”6. (Fig. 49). Figura 48| Coleção de Garrafas do Sr. João Fernandes.

Fonte: Arquivo do Autor

Fonte: Arquivo do Autor


73

 A Casa da Família Carvalho Silva

A moradora guia a visita e relata que mesmo diante da satisfação da casa própria, os primeiros meses na casa

A apropriação da casa aconteceu pela primeira família da

tiveram suas dificuldades, ela lembra os primeiros problemas

moradora, Maria do Carmo Carvalho Silva, 49 anos, que era

também evidenciados pela Sr. Celina, como a falta de

composta por cinco integrantes. Hoje a casa abriga a sua

revestimento, vidros na portas e janelas, deficiência no

segunda família que é composta por ela, o marido Emerson

abastecimento de água e energia.

Oliveira Medeiros, 33 anos e o filho Luís Otávio Soares Assis Ferreira de 3 anos. (Fig. 51).

Para a moradora o fato da casa não comportar as necessidades da família era um problema, que chegava a

Figura 50| Casa da Família Carvalho Silva.

dificultar o convívio familiar, “é complicado falar de intimidade e privacidade, quando se tem um quarto para cinco pessoas”. (Informação Verbal)7. Para que as eventuais insatisfações fossem relevadas a morada procurava colocar a sua personalidade na residência, tanto com os seus objetos que já possuía, tanto por outros elementos que ela achava necessário para transformar os ambientes em lugares mais agradáveis, “comecei com as minhas flores e plantas, pois elas têm uma capacidade de alegrar o ambiente, hoje não as tenho mais e morro de

Fonte: Arquivo do Autor 7

Informações cedidas pela moradora, Maria do Carmo Carvalho Silva, em visita à sua residência no dia 2014.


74 saudade” 7, o jardim foi desfeito para criar o espaço de uma

residência. Logo após a mudança o filho fora internado em

garagem.

um hospital devido à descoberta de uma leucemia, “foram

A primeira intervenção na volumetria da residência foi a construção de varandas tanto na parte frontal um local para as crianças brincarem como na posterior como meio de resolver o problema de insolação “era impossível permanecer na cozinha ou no quarto na parte de tarde” 7.

poucos dias aqui, mas ainda me lembro dele brincando pela casa, mas a lembrança mais forte é quando dava o remédio, ele fugia, colocava uma cadeira no muro e gritava a vizinha para colocar açúcar no remédio, isso acontecia inúmeras vezes e é incrível como um muro de tijolos é capaz de resguardar tamanha lembrança”7. As lembranças mais

Segundo a moradora o quarto é um problema até hoje, é um

importantes da casa giram em torno do filho assim como os

espaço para comportar a cama e o armário, mas não para

guardados mais preciosos, a mãe trouxe os brinquedos e os

dormir, “durante o dia ele fica armado como um quarto

desenhos feitos pelo filho. (Fig. 52).

normal, à noite trago tudo para sala, é impossível dormir neste quarto, é muito abafado e quente”7 . A moradora

Figura 51| Desenhos do Filho Maria do Carmo Carvalho Silva.

mantém as expectativas de um dia poder se apropriar do quarto, “um dia ele vai ficar maior e arejado, aí conseguirei dormir lá e passarei chamá-lo de meu quarto, mas até o momento ele é só um quarto” 7. A moradora se mostrou muito emocionada ao perguntar sobre as lembranças que a casa lhe proporcionar, ela relatou de forma muito emotiva os poucos dias de um dos seus filhos na Fonte: Arquivo do Autor


75 Para mãe esse guardados são a sua fortuna, “não vendo por dinheiro nenhum do mundo”7. Ela ainda ressalta que o significado da casa está vinculado às pessoas que a compõe, e são estas que constituem os significados da casa, “a minha casa é a minha família” 7.


76 3.3 Resultado da Análise das Famílias Visitadas

As soluções adotadas pelos moradores foram a criação de ambientes que solucionassem de forma mais objetiva essas

A análise nas residências permitiu observar que embora,

deficiências, como quartos para os filhos, varandas para

todos os moradores compartilhassem do sentimento de posse

resolver o problema de insolação e desejo de ter um ambiente

da casa própria, cada família se relacionou à sua maneira

coberto que propiciasse uma melhor interação com o exterior

com a casa. Alguns demonstraram uma total realização com a

e cozinhas maiores.

conquista desde sua apropriação mesmo que intervenções fossem

necessárias,

outros

ainda

vivem

os

mesmos

desconfortos iniciais e idealizam soluções para uma total satisfação com a casa. Os moradores relataram o passo a passo das primeiras deficiências apresentadas na casa e suas soluções. Os primeiros meses de apropriação foram marcados pela sujeição do homem à residência, onde os usuários foram obrigados a se adaptarem ou conviverem com as deficiências até o começo das intervenções. As modificações foram desencadeadas por dois principais fatores, a incoerência da espacialidade da casa às necessidades da família, seguida pelo desconforto ambiental.

Além das intervenções espaciais, cada família foi se adaptando a sua residência da forma que melhor lhe expressasse, com objetos de família, ou que representasse um valor sentimental ao usuário, de forma que pudessem se reconhecer na moradia. Apenas dois entrevistados, Dona Ana Maria de Souza e o Sr. João Fernandes apresentam hoje uma total identificação com a casa, os outros apontaram inquietações e desejos de modificação. O ambiente onde os moradores menos se identificaram é o quarto, devido ao seu desconforto térmico e pequena dimensão. Sendo assim pode-se perceber que o conceito da casa como extensão corporal é deficiente em algumas residências.


77 As maiores lembranças que marcam as residências são

objetos que passaram de pai para filho, fotos, mural

desencadeadas pelo nascimento ou morte de pessoas, onde

comemorativo, desenho dos filhos.

a casa marca um lugar de transição do ser humano, que pode também ser observado no número de moradores que as casas possuíam no momento da apropriação e na numeração atual. A casa faz parte do ciclo de vidas pessoas. A modificação no tamanho das famílias é um fato recorrente, onde as casas sofreram intervenções para comportar uma demanda que hoje não existe mais. As casas se tornaram grandes para os seus habitantes. Embora alguns moradores apresentem algumas inquietações, e desejos de modificações para uma total satisfação com a residência, todos relataram um relacionamento harmonioso com a casa e atribuem a ela profundos significados simbólicos, voltados às pessoas, ao lar, ao convívio e reencontro familiar. Estas atribuições ficam evidentes tanto pelas próprias definições dos moradores, tanto ao apresentarem os objetos mais importantes da casa, todos foram associados à família,

As interpretações de casa apresentadas pelos próprios moradores

demonstram

a

composição

da

casa

em

sentimentos da família que a habita. Um lugar de emoções, significados e valores simbólicos.


78 4.0 PROPOSTA TCC2

O projeto traz ainda uma resposta a estas residências após vinte e dois anos de apropriação do Primeiro Conjunto

A partir dos estudos realizados, foi possível entender de

Habitacional Popular da cidade de Ipatinga, onde todas as

forma mais profunda o complexo universo da relação entre

casas partiram de um mesmo projeto e ao longo dos anos

usuário e a casa, a pesquisa permitiu também entender essa

foram

relação em análises físicas, a partir da interpretação e relatos

moradores.

adquirindo

características

especificas

de

seus

dos próprios moradores. As análises serão realizadas em vários perfis de famílias, Sendo assim a proposta para o TCC2 é o desenvolvimento de

relatando as experiências na apropriação dessas residências,

análises físicas nas residências do Primeiro Conjunto

estudando as intervenções, bem como suas causas e

Habitacional Popular de Ipatinga de forma mais minuciosa e

resultados exemplificadas em representação de volumes,

em uma maior proporção. O objetivo do projeto é a

plantas e cortes. O projeto também deve compor a

investigação de como usuário e casa estão sujeitos um ao

demonstração da vivência, as lembranças que a casa

outro, por meio das deficiências, potencialidades e evoluções

proporciona, como os usuários se relacionam com essas

dessas

residências no momento atual, e o significado que estas

residências.

Buscando

entender

como

estas

intervenções desencadearam transformações na paisagem

representam para o seu moradores. (Fig. 53).

urbana, no cotidiano, nos hábitos e comportamento das pessoas, investigando suas causas e resultados. O projeto também analisa os conceitos de casas estudados na pesquisa, aplicados a estas residências.

A implantação original do conjunto habitacional é composta por cento e dezessete residências, como base para pesquisa serão estudadas dez por cento destas moradias, um total de doze residências.


79 Figura 52| Diagrama de AnĂĄlise nas ResidĂŞncias - Proposta TCC2

Fonte: Arquivo do Autor


80 O trabalho a ser desenvolvido será feito sob um olhar

O documentário em vídeo será composto por depoimentos

arquitetônico,

dos moradores demonstrando a relação com a residência

buscando

contribuir

para

um

melhor

entendimento do usuário como sujeito transformador da

após

arquitetura

complementação de um vídeo do primeiro dia de mutirão do

residencial,

desenvolvimento

de

diante

de

sua

sentimentos

e

busca

pelo

significados,

exemplificando a transformação de espaços em lugares. As análises realizadas no projeto busca adquirir um olhar mais sensível para produção arquitetônica. Tendo em vista que ao se projetar uma casa, mais do que simplesmente

vinte

conjunto Habitação

e

dois

habitacional, Da

anos

cedido

Prefeitura

de

apropriação,

pelo

Municipal

como

Departamento De

Ipatinga.

De O

documentário escrito deve apresentar uma contextualização do conjunto habitacional, as análises e estudos realizados nas residências e uma análise do resultado do projeto.

projetar, está lidando-se com os sentimentos, emoções,

Como o desenvolvimento do projeto conta com a participação

anseios, hábitos, usos e costumes das pessoas e que estes

ativa dos moradores, ao término será promovido um encontro,

devem ser determinantes na concepção do projeto de uma

como

casa, como busca do desenvolvimento natural de identidade,

documentários, concebidos a partir da contribuição de cada

pertencimento, experiências sensíveis e de significados para

família. Para o desenvolvimento do trabalho a pesquisa será

o usuário.

composta por sete etapas. (Fig. 54).

As análises e estudos realizados deverão resultar na

A primeira etapa será uma visita aos moradores do conjunto

composição de um documentário em duas versões, uma em

habitacional para a apresentação do projeto e catalogação

vídeo e outra escrita. Os documentários receberão o mesmo

das doze residências a serem analisadas.

nome desta pesquisa: Casa: Identidade e Memória 2.

forma

de

agradecimento

e

apresentação

dos


81 A segunda etapa será realizada por meio da primeira visita

Figura 53| Etapas do Projeto - Proposta TCC2

às famílias catalogadas para realização entrevistas e observação sistemática de hábitos, usos e vivências e, busca dos conceitos estudados. A terceira etapa é a documentação dos dados levantados na segunda etapa. A quarta etapa é a realização da segunda visita às residências para análises das intervenções, levantamento métrico e fotográfico. A quinta etapa é a documentação dos dados levantados na quarta etapa. As visitas serão realizadas em etapas distintas para facilitar uma análise mais meticulosa e o desenvolvimento uma aproximação com os moradores, visto que a segunda visita adentra mais na intimidade das famílias. A sexta etapa é a análise dos resultados da pesquisa, bem como sua documentação e a finalização do material gráfico a

Fonte: Arquivo do Autor

ser produzido.

Para maior praticidade do desenvolvimento das etapas as

A última etapa é o encontro com as famílias para agradecimentos

e

postagem do projeto.

apresentação

dos

documentários

e

residências serão analisadas em grupo de três. Como pode ser visto no cronograma a seguir. (Tab. 01).


82 Tabela 01| Cronograma do Projeto - Proposta TCC2 CRONOGRAMA PROJETO TCC2 SEMANA 01

Casas 01 a 03

ATIVIDADES Visita aos moradores para apresentação do projeto e catalogação das 12 residências a serem analisadas.

SEMANA 02

Visita às famílias para entrevistas/observação sistemática de hábitos, usos e vivências e busca dos conceitos estudados.

SEMANA 03

Documentação da análise semana 02.

SEMANA 04

Retorno às família para análises das intervenções, levantamento métrico e fotográfico.

SEMANA 05

Documentação do levantamento semana 04.

Casas 04 a 06

PERÍODO

SEMANA 06

Visita às famílias para entrevistas/observação sistemática de hábitos, usos e vivências e busca dos conceitos estudados.

SEMANA 07

Documentação da análise semana 06.

SEMANA 08

Retorno às família para análises das intervenções, levantamento métrico e fotográfico.

SEMANA 09

Documentação do levantamento semana 08. BANCA INTERMEDIÁRIA TCC2

Casas 07 a 09

Visita às famílias para entrevistas/observação sistemática de hábitos, usos e vivências e busca dos conceitos estudados.

SEMANA 12

Documentação da análise semana 10.

SEMANA 13

Retorno às família para análises das intervenções, levantamento métrico e fotográfico.

SEMANA 14

Documentação do levantamento semana 12.

SEMANA 15

Visita às famílias para entrevistas/observação sistemática de hábitos, usos e vivências e busca dos conceitos estudados.

SEMANA 16

Documentação da análise semana 14.

SEMANA 17

Retorno às família para análises das intervenções, levantamento métrico e fotográfico.

SEMANA 18

Documentação do levantamento semana 16.

SEMANA 19

Análise e Finalização da produção do material dos documentários.

SEMANA 20

Encontro com as famílias para agradecimentos e apresentação dos documentários.

SEMANA 21

Postagem dos documentários.

Finalização

SEMANA 11

Casas 10 a 12

SEMANA 10

SEMANA 22

Fonte: Arquivo do Autor

BANCA FINAL


83 simbólicos, tem a capacidade de fisicamente marcar a 5.0 CONCLUSÃO

transição do homem no mundo.

Os estudos e análises realizados no desenvolvimento desta pesquisa possibilitaram o entendimento do surgimento da casa e o seu desenvolvimento desde a pré-história aos dias atuais. Permitiu entender a evolução da casa, por meio do

A casa é composta por muitos conceitos, entretanto os estudos

realizados

enfatizaram

os

seus

significados

simbólicos. Esta colocação pode ser concluída à partir da análise física onde os moradores narraram a relação com a residência, desde a apropriação ao período atual, ao

desenvolvimento das pessoas, da família e da sociedade.

introduzir o assunto do significado da casa, todos os O conceito do lar como a base da casa foi introduzido desde a

moradores o associaram ao lar, à reunião familiar.

pré-história onde o homem ainda não produzia sua própria moradia,

entretanto

nesse

período

iniciou-se

o

desenvolvimento da mais importante instituição que uma casa é capaz de abrigar, o lar. Apesar das transformações históricas vivenciadas, a casa permaneceu como base para a vivência da família.

A análise em residências físicas permitiu visualizar e demonstrar, a relação de usuário com a casa, a partir da vivência e relatos dos próprios moradores. De forma a adquirir um novo olhar sobre residências populares, onde os conceitos de casas relatados pelos próprios moradores se assemelham aos conceitos dos teóricos estudados.

A casa além de refletir o seu usuário em hábitos, comportamentos, sentimentos e personalidade também é contextualizada pela relação cultural com o lugar e momento histórico. Pois esta, além de todos os seus significados

As intervenções realizadas nas residências analisadas demonstraram a busca pela casa ideal, pela identidade e pertencimento, por meio da transformação de residências padronizadas em lugares únicos e específicos para seus


84 moradores, capazes de exprimirem sentimentos, emoções e significados. Sendo assim conclui que a casa marca a passagem do ser humano na terra e resguarda parte de suas memórias, ela se transforma em um universo, mediante a habitação humana, espaços comuns são transformados em lugares únicos e cheios de significados a partir da vivência e intervenção do usuário. Por isso o projeto a ser realizado no TCC2 aprofunda na investigação da relação entre casa e morador, como forma de contribuição ao desenvolvimento de um olhar mais sensível e profundo à produção arquitetônica residencial.


85

6.0 REFERÊNCIAS BENEVOLO, Leonardo. História da Cidade. São Paulo: Perspectiva, 1999 GALFETI, Gustau Gili. Minha casa, meu paraíso. Barcelona, Editorial Gustavo Gili, 1999. MONTANER, Josep Maria: As formas do século XX. Barcelona, Editorial Gustavo Gili, 2002 MONTANER, Josep Maria. Depois do Movimento Moderno: arquitetura da segunda metade do Séc. XX. Barcelona, Gustavo Gili, 2001. VERISSíMO, Francisco Salvador; BITTAR, William Seba Mallmann. 500 anos da casa no Brasil. As transformações da arquitetura e da utilização do espaço de moradia. 2ª edição, Rio de Janeiro, Ediouro, 1999.

7.0 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AMARAL, Ana Lúcia. Dicionário De Direitos Humanos: Pertencimento. Disponível em: < http://escola.mpu.mp.br/dicionario/tiki-index.php> Acesso em: 17 de agosto de 2014. ASSIS, Machado . Volume de contos. Rio de Janeiro : Garnier, 1884. ARCHDAILY.COM. Clássicos do anúncio: Maison Bordeaux / OMA. Disponível em: <http://www.archdaily.com/104724/ad-classics-maisonbordeaux-oma/ Acesso em: 20 de setembro de 2014. BORNECQUE, Henri e MORNET, Daniel. Roma e os Romanos. São Paulo, Edusp, 1977. BRANDÃO, Ludmila de Lima. A casa subjetiva: matérias, afectos e espaços domésticos. São Paulo: Perspectiva, 2008.


86 BRANDÃO, Carlos Antonio Leite. Habitabilidade e Bem Estar. Minas Gerais: UFMG, 2005. BACHELARD, Gaston (1989). A poética do espaço. 7ed. São Paulo: Martins Fontes, 2005. CAFFÉ, Carla e BEILGUEMAN,Giselle. São Paulo na Linha. São Paulo, Editora DBA – Dorea Books And Art, 2000. CONTI, Alfio. A experiência da autogestão em Ipatinga: uma busca pelo conceito. 1999. 215 fl. Dissertação (mestrado em arquitetura e urbanismo) — Universidade Federal de Minas Gerais, Belo Horizonte, 1999. CHAFES, Rui. Um Quarto Cheio De Neve. Disponível em: < http://1112.projetoescolas.serralves.pt/fotos/editor2/textoruichafes.pdf> Acesso em: 26 de setembro de 2014. COTRIM, Gilberto. História Global, Brasil e Geral. São Paulo: Saraiva, 1999. EM.COM.BR. Pesquisa aponta os principais sonhos de consumo dos brasileiros. Disponível em: < http://www.em.com.br/> Acesso em: 17 de agosto de 2014. FRACALOSSI, Igor. Os elementos básicos da arquitetura / Gottfried Semper. Disponível em: <http://www.archdaily.com.br/174291/oselementos-basicos-da-arquitetura-gottfried-semper> Acesso em: 26 de setembro de 2014. GOSSEL, Peter e LEUTHAUSER, Gabriele. Arquitetura no século XX. Colônia: Taschen. 2001. JAEGER, Werner Wilhelm . Paidéia: a formação do homem grego. Trad. Artur M. Parreira. 4ª Ed. – São Paulo: Martins Fontes, 2001. JANSON, H. W. História geral da arte: o mundo antigo e a idade média. São Paulo: Martins fontes, 2001. HERTZBERGER, Herman. Lições de arquitetura. São Paulo: Martins Fontes, 1996. LOPES, Luísa. O Quarto: Domesticidades construídas. Fundação de Serralves, Porto, Portugal, Fev. 2012. Disponível em: <http://1112.projetoescolas.serralves.pt/fotos/editor2/textoluisalopes.pdf> Acesso em: 26 de setembro de 2014.


87 LE CORBUSIER. Por uma arquitetura. São Paulo: Perspectiva,1994. LESSA, Fábio Souza. O feminino em Atenas. Rio de Janeiro: Mauad, 2004. MANCHIP, Jon White. O Egito Antigo. Rio de Janeiro: Zahar, 1966. MAUTNER,

V.

Extensões

dos

nossos

corpos.

Folha

de

S.

Paulo,

São

Paulo,

Nov.

2011.

Disponível

em:

<http://www1.folha.uol.com.br/colunas/annaveronica/1180456-extensoes-dos-nossos-corpos.shtml > Acesso em: 26 de setembro de 2014. MIGUEL, Jorge Marão Carnielo. Casa e lar: a essência da arquitetura. Disponível em: < http://www.vitruvius.com.br/revistas/read/arquitextos/ 03.029/746> 10 de outubro de 2014. MILLARD, Anne. The Egyptians (Peoples of the past). London: MacDonald & Company, 1975. MONTANER, Josep Maria: A modernidade superada arquitetura, arte e pensamento do século XX. Barcelona, Editorial Gustavo Gili, 2001. MORAES, José Geraldo V. Caminhos das Civilizações : Da Pré-História aos Dias Atuais. São Paulo: Atual, 1993. NESBITT, Kate (Org.). Uma nova agenda para a arquitetura. Antologia teórica (1965-1995). Coleção Face Norte, volume 10. São Paulo, Cosac Naify, 2006. RYBCZYNSKI, Witold. Casa: pequena história de uma idéia. 3.ed. Rio de Janeiro: Record, 2002.


Turn static files into dynamic content formats.

Create a flipbook
Issuu converts static files into: digital portfolios, online yearbooks, online catalogs, digital photo albums and more. Sign up and create your flipbook.