O medo do insucesso

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O medo do insucesso

A vida não é só feita de sucessos. Então por que não nos ensinam, desde logo, a lidar com esta amarga instância humana? Sim, acredito mesmo que, trazendo à discussão esta problemática, refletindo acerca dela, poder-se-ia começar a percorrer um caminho mais verdadeiro. Chamo a “verdade” para esta reflexão, pois parece-me que anda de passo desacertado com aquilo a que estamos habituados a apreciar entre os humanos: a aparência do sucesso. Subscrevo essa clarividente definição de Yourcenar - “a Verdade, essa linha ascendente” – que é afirmação que gosto de pensar em simultâneo com uma outra, - “é difícil viver na verdade”. Será que é esta não assunção da verdadeira realidade - o insucesso existe - que é impeditiva de assumirmos que, mesmo falhando, estamos num percurso, de que o erro é etapa, que nos é próprio, que é humano e que nos permite essa ascensão tão desejada? E começo por falar da família, essa primeira célula onde tudo começa: todo o progenitor gosta que o seu filho tenha sucesso, e porque transmitir o amor que se sente, por vezes, pode ser extremamente complicado, então aí está o pai ou a mãe numa eterna afirmação: “Tens que ter boas notas, tens que ser bom jogador, tens que ser bom menino, tens que ser boa menina”, esquecendo muitas vezes o entendimento e a compreensão que estes pequenos solicitam. Na escola, outro fator importante da socialização: aqui a azáfama gira sobretudo em torno da preocupação cega de se atingir competências, deve dominar isto, deve dominar aquilo, e são inexistentes (há que cumprir um programa) os “espaços de aula” para a discussão de ideias, que combateriam em tantos casos o medo de errar, impulsionando à participação e discussão.


No meio profissional, a corrida é desenfreada para se atingir um topo. E, aqui, porque não fomos habituados a lidar com o insucesso, as amarguras agudizam-se e, na aparência, dirigimo-nos para o verosímil. Acredito que devêssemos assumir espaços de integração dos insucessos. Se toleramos que em determinadas situações, normalmente privadas, por tentativa e erro, podemos chegar à compreensão e resolução de determinadas tarefas, por que não trazer a público de uma vez por todas esta prática, assumindo-a mesmo como um hábito integrador da complexidade humana, para em conjunto e em prol do bem comum embarcarmos nessa “linha ascendente”? E não será da nossa responsabilidade o facto de fazermos com que a vida tenha sentido, para nós e para os outros, como co-extensão desse mesmo sentido que desejamos para nós, sem nos enredarmos em permanentes lamúrias e desgostos? Porque não a encararmos como substância verdadeiramente, que precisa de ser moldada, esculpida, desconstruída e reconstruída por nós com a presença indefetível do tempo. E sobre esse anátema que o tempo é, sugiro uma reflexão sobre o que Séneca nos diz na sua 1ª carta a Lucílio: “ (...) uma parte do tempo é-nos tomada, outra parte vai-se sem darmos por isso, outra deixamo-la escapar. (...) É um erro imaginar que a morte está à nossa frente: grande parte dela já pertence ao passado (...).” Ora, se adiarmos permanentemente certos compromissos, só nos restará saborear o que nos parece agradável. As palavras sábias deste romano não soam a estranho, até compreendemos o registo e tem sentido. Não obstante, esvanece-se, pois é difícil serenar, contemplar e integrar verdadeiramente a mensagem. Estamos tão ocupados em cumprir um fado, essa busca incessante do sucesso, que nos esquecemos de sentir, pensar e agir por respeito ao que verdadeiramente desejamos. Susana Ferreira (Professora do Grupo Disciplinar de Filosofia)

Biblioteca Escola Secundária Dr. Jorge Augusto Correia, Tavira Junho 2014


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