FACULDADE INDEPENDENTE DO NORDESTE CURSO DE DIREITO
PAULO ALVES FERRAZ
COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E LEI MARIA DA PENHA: UMA PROPOSTA DE AMPLIAÇÃO DAS AÇÕES DESENVOLVIDAS PELA DELEGACIA ESPECIAL DE ASSISTÊNCIA À MULHER (DEAM), SITUADA NO MUNICÍPIO DE VITÓRIA DA CONQUISTA – BA.
VITÓRIA DA CONQUISTA/BA 2014
PAULO ALVES FERRAZ
COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E LEI MARIA DA PENHA: UMA PROPOSTA DE AMPLIAÇÃO DAS AÇÕES DESENVOLVIDAS PELA DELEGACIA ESPECIAL DE ASSISTÊNCIA À MULHER (DEAM), SITUADA NO MUNICÍPIO DE VITÓRIA DA CONQUISTA – BA.
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel em Direito da Faculdade Independente do Nordeste de Vitória da Conquista/BA. Orientadora: Prof. Luciano Tourinho.
VITÓRIA DA CONQUISTA/BA 2014
FOLHA DE APROVAÇÃO
PAULO ALVES FERRAZ
COMBATE À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E LEI MARIA DA PENHA: UMA PROPOSTA DE AMPLIAÇÃO DAS AÇÕES DESENVOLVIDAS PELA DELEGACIA ESPECIAL DE ASSISTÊNCIA À MULHER (DEAM), SITUADA NO MUNICÍPIO DE VITÓRIA DA CONQUISTA – BA.
Trabalho de Conclusão de Curso de Direito apresentado a Faculdade Independente do Nordeste – FAINOR, como requisito parcial para obtenção do título de Bacharel.
Aprovado em ___/___/___
BANCA EXAMINADORA ______________________________________________________ Prof. Luciano Tourinho Orientador ______________________________________________________ 2° Membro ______________________________________________________ 3° Membro
RESUMO O problema da violência contra a mulher é grave e carece de estudos capazes de apontar novos caminhos para sua solução. Nesse contexto, o presente artigo discute o papel das DEAMs, tomando como recorte empírico a unidade instalada no município de Vitória da Conquista – BA. O objetivo é sugerir novas formas de combate à violência doméstica por meio da atuação da referida delegacia visando à melhoria das políticas de combate à violência contra o sexo feminino. Como objetivos específicos, destacam-se: Analisar a Lei Maria da Penha, com ênfase na violência doméstica; Abordar a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, Destacar as políticas públicas de combate à violência doméstica. No que se refere aos procedimentos metodológicos, esse estudo em relação aos objetivos trata-se de uma pesquisa descritiva e exploratória, baseado em um levantamento bibliográfico sobre o tema tratado. Em suma, acredita-se que melhor seria reestruturas as DEAMs aproveitando uma estrutura já existente, para adaptar à realidade a necessidade de encontrar soluções mais eficazes para a diminuição e erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher. Sendo assim, buscar medidas não-penais através do diálogo e, principalmente, em conjunto com profissionais da área de saúde mental e da sociologia, promovendo uma educação cultural diferente da patriarcal, parece ser o meio mais harmonizado Palavras-chaves: DEAMs. Mulher. Violência Doméstica.
ABSTRACT The problem of violence against women is serious and needs studies able to identify new approaches to its solution. In this context, this article discusses the role of DEAMs, taking as empirical cut the unit installed in Vit贸ria da Conquista - BA. The goal is to suggest new ways to combat domestic violence through action of said precinct aimed at improving policies to combat violence against women. The specific objectives are: Analyze the Maria da Penha Law, with an emphasis on domestic violence; Address the creation of Special Courts for Domestic and Family Violence against Women, Highlight public policies to combat domestic violence. As regards the methodological procedures, this study in relation to the objectives it is a descriptive and exploratory research, based on a literature on the subject covered. In short, we believe that the best would reestruturas DEAMs leveraging an existing structure to adapt to the reality of the need to find more effective solutions for the reduction and eradication of domestic violence against women. Therefore, seek noncriminal measures through dialogue and especially in conjunction with professionals in mental health and sociology, promoting a different cultural education of patriarchal, seems to be more harmonized through. Keywords: DEAMs. Woman. Domestic Violence.
SUMÁRIO ARTIGO .................................................................................................................... 06
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1 INTRODUÇÃO
A violência doméstica diz respeito a qualquer tipo de ação ou conduta praticada por uma pessoa contra outra que convive na mesma casa que ela; que cause dor, sofrimento físico, sexual ou psicológico. Geralmente, tal tipo de violência parte dos homens e tem como principal vítima as mulheres (ARAÚJO, 2007). Embora agressões a pessoas do sexo feminino remontem as sociedades mais antigas, somente nas últimas décadas, atos desse tipo começaram a ser discutidos abertamente ganhando visibilidade nos espaços públicos, na mídia e em organismos governamentais e não-governamentais (CAVALCANTI, 2007). Como forma de inibir e punir tal prática, foram criadas no Brasil algumas iniciativas de combate a práticas dessa natureza. Dentre elas, as Delegacias Especializadas de Atendimento às Mulheres (DEAMs), que têm por objetivos: investigar, apurar e tipificar os crimes cometidos contra o sexo feminino; combater a violência contra a mulher; resgatar seus direitos e reestruturar as famílias por meio de mudanças de comportamento. Sem dúvida, tal órgão representa um avanço; contudo, o mesmo tem se demonstrado incompleto em sua estruturação em diversos aspectos. Um deles diz respeito ao fato de não possuir um quadro técnico especializado para o atendimento a mulher em situação de violência (BIELLA, 2005). Dentro desse contexto, o presente trabalho discute o papel das DEAMs, tomando como recorte empírico a unidade instalada no município de Vitória da Conquista – BA. O objetivo é sugerir novas formas de combate à violência doméstica por meio da atuação da referida delegacia visando à melhoria das políticas de combate à violência contra o sexo feminino. Como objetivos específicos, destacam-se: Analisar a Lei Maria da Penha, com ênfase na violência doméstica; Abordar a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, Destacar as políticas públicas de combate à violência doméstica. Nesse interim, o problema da violência contra a mulher é grave e carece de estudos capazes de apontar novos caminhos para sua solução. Neste sentido, a justificativa para a realização deste trabalho é o desejo de colaborar para a melhoria
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e expansão das ações de combate à violência contra pessoas do sexo feminino. Como estudos dessa natureza vêm sendo constantemente realizados com a finalidade de aperfeiçoar o conhecimento já produzido acerca do assunto, o trabalho se reveste de importância na medida em que pretende, além de também contribuir para tal fim, sugerir que novas ações de combate à violência doméstica sejam implementadas pela Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher (DEAM), instalada no município de Vitória da Conquista. E para reforçar a importância deste estudo, cabe fazer algumas considerações acerca do tema aqui tratado. No que se refere aos procedimentos metodológicos, esse estudo em relação aos objetivos trata-se de uma pesquisa descritiva e exploratória. A pesquisa descritiva segundo Gil (2002, P. 36) “tem como objetivo primordial a descrição das características
de
determinada
população
ou
fenômeno
ou,
então,
o
estabelecimento de relações entre as variáveis”. A pesquisa exploratória visa proporcionar um maior conhecimento para o pesquisador acerca do assunto, a fim de que o mesmo tenha condições de formular problemas mais precisos e de criar hipóteses que possam ser pesquisadas por estudos posteriores (GIL, 2002).
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2 REPRESSÃO À VIOLÊNCIA DOMÉSTICA
2.1 Lei Maria da Penha
A Lei nº 11.340, de 07 de agosto de 2006, ficou conhecida como Lei “Maria da Penha” em homenagem à vítima de violência doméstica Maria da Penha Maia Fernandes. Após sofrer com a violência praticada pelo seu marido, em 1983 foi vítima de tentativa de homicídio engendrada por este, simulando um assalto, que resultou em paraplegia irreversível. Depois deste acontecimento, seu esposo ainda tentou eletrocutá-la, não logrando êxito sua conduta criminosa (HERMANN, 2007). O Ministério Público propôs ação penal contra o agressor de Maria da Penha em setembro de 1984 e o mesmo foi a Júri Popular em maio de 1991, sendo condenado a 10 anos de prisão. Recorrendo da decisão de primeira instância, o Tribunal de Justiça do Ceará submeteu o réu a novo julgamento, sendo condenado a 10 anos e 6 meses de prisão. Este interpôs recurso novamente (HERMANN, 2007).
Em 1997, diante da morosidade da Justiça brasileira, Maria da Penha juntamente com o Centro pela Justiça e o Direito Internacional – CEJIL e o Comitê Latino-Americano de Defesa dos Direitos da Mulher (Cladem) formalizaram uma denúncia contra o Brasil à Comissão Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (SABADELL, 2005, p. 149).
Assim, em 22 de setembro de 2006, entrou em vigor a Lei nº 11.340, que ficou conhecida como “Lei Maria da Penha”. O referido diploma confere tratamento penal mais rigoroso às infrações penais praticadas contra a mulher, nos âmbitos doméstico e familiar, na tentativa de criar mecanismos para coibir e prevenir esse tipo de violência. Desde então, o assunto em voga tem gerado calorosos debates em todas as áreas da sociedade, dividindo os operadores do Direito no que concerne aos seus benefícios e/ou prejuízos ocasionados em decorrência da lei supracitada (HERMANN, 2007).
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Dias (2007, p. 348) aduz que a Lei nº 11.340/06, conhecida como “Lei Maria da Penha”, “È fruto do movimento de mulheres e de compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro, objetivando prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar”. Como o Brasil quedou-se inerte e não respondeu às informações solicitadas pela Comissão, foi condenado internacionalmente em 2001 a pagar uma indenização no valor de 20 mil dólares em favor da vítima. Ademais, o Estado brasileiro foi responsabilizado por sua negligência, recebendo recomendações para que tomasse medidas de combate a este tipo de violência, e que tornasse mais célere o procedimento judicial, para que a resposta jurisdicional do problema ocorresse de maneira mais eficaz (PIOSEVAN, 2006). O Estado brasileiro havia ratificado, em 1994, a Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação contra as Mulheres (de 1979) que tem como objetivos a busca da igualdade de gênero, promovendo os direitos da mulher, e reprimir quaisquer discriminações contra esta. Tal convenção foi o primeiro instrumento internacional invocado como fundamento da Lei “Maria da Penha” (DIAS, 2007). O segundo instrumento internacional trazido à baila foi a Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência Doméstica – conhecida popularmente como Convenção de Belém do Pará. Esta fora ratificada pelo Brasil em 27 de novembro de 1995 e em seu art. 1º diz ser a violência contra a mulher “qualquer ação ou conduta baseada, no gênero, que cause morte, dano ou sofrimento físico, sexual ou psicológico à mulher, tanto no âmbito público como no privado” (DIAS, 2007). A Convenção de Belém do Pará, em seu art. 7º, estabelece como dever dos Estados-partes a adoção, por todos os meios apropriados e sem demora, de políticas de prevenção, repressão e erradicação da violência contra a mulher, no âmbito jurídico e administrativo, ampliando o acesso da vítima à Justiça e os mecanismos de proteção e assistência (LIMA, 2007). Embora o Brasil tenha ratificado tratados internacionais que discorrem sobre a violência contra a mulher como uma violação aos direitos humanos e prevêem um tratamento diferenciado para este tipo de agressão, segundo Cavalcanti (2007) não
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havia editado, até então, uma lei que criminalize com maior rigor violências de gênero oriundas do âmbito doméstico e familiar. Destarte, cumprindo compromissos assumidos internacionalmente e por força do movimento de mulheres e da condenação supracitada que sofreu, o Brasil editou a Lei nº 11.340/06. Esta, com seu caráter protetivo direcionado exclusivamente à mulher, é instrumento jurídico legal em harmonia com a previsão internacional. 2.2 Violência Doméstica
O preâmbulo da Lei em tela e o seu art. 1º demonstram expressamente o objetivo a que ela se propõe, qual seja, “coibir e prevenir a violência doméstica e familiar contra a mulher”. A violência doméstica diz respeito a qualquer tipo de ação ou conduta praticada por uma pessoa contra outra que convive na mesma casa que ela, que cause dor, sofrimento físico, sexual ou psicológico. Tal ato configura-se como crime e envolve lesão corporal ou espancamento, ameaça, tentativa de homicídio e homicídio (ARAÚJO, 2007). É preciso lembrar que o drama da violência contra a mulher remonta as sociedades mais antigas. Contudo, por um longo tempo, essa prática foi encarada como algo comum em função do papel de inferioridade e submissão atribuído ao sexo feminino. Sabe-se que por muito tempo, a mulher foi tratada como um objeto e considerada um ser com pouco ou nenhum direito, o que resultou em inúmeras práticas de violência contra ela. A esse respeito, Biella (2005, p. 20) afirma que:
A violência contra a mulher, nos diferentes contextos históricos, sociais e culturais teve pouca visibilidade pública, ficando confinada aos espaços domésticos, justamente pelas relações de dominação-subordinação entre homens e mulheres. [...] O agressor, dado ao seu papel de “provedor da família” é beneficiado pela tolerância da cultura machista, enquanto a mulher, produto e vítima desta mesma cultura, por muito tempo se recolheu na intimidade do lar e nas sombras da cultura que a subordinou ao espaço doméstico, sem o protagonismo da sua própria história.
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Somente nas últimas décadas, a violência contra pessoas do sexo feminino começou a ser discutida passando a ganhar visibilidade nos espaços públicos, na mídia e em organismos governamentais e não-governamentais. Contudo, apesar das campanhas e ações implementadas com a finalidade de inibir as agressões e incentivar as denúncias, muitas vítimas se omitem por temerem que a impunidade aos agressores venha agravar ainda mais a situação (PIOSEVAN, 2006). As causas que levam os homens a agredirem as mulheres, são na maioria das vezes de origem multifatorial. Dentre estes, temos os fatores de ordem individual, de relacionamento, dentre outros. Temos também os fatores culturais, que se referem aos aspectos sociais entre si (CAVALCANTI, 2007). Pesquisas realizadas por autores diversos acreditam que o álcool é considerando um fator desencadeador da prática da violência, uma vez que esse tipo de droga coíbe a consciência da pessoa. Nesse caso específico, do agressor (ARAÚJO, 2007). Outro fator também relacionado com a violência, citado pelo autor acima é “O distúrbio da personalidade, ou seja, existe uma grande probabilidade de que homens que agridem suas esposas sejam emocionalmente dependentes”. (ARAÚJO, 2007, p. 32). Em suma, dados estatísticos realizados nos últimos anos nos mostram, que as principais causas da violência sexual no Brasil são álcool em primeiro lugar (96%), seguido pela toxicodependência (94%), desemprego (79%), pobreza / exclusão social (73%) e o fato do histórico familiar dos agressores que sofreram violência (73%) (OMS, 2008). Conseqüentemente, o aumento dessa violência possui um padrão de lesividade com grau muitas vezes irreparável, implicando em danos tanto para a saúde física quanto para a saúde mental da mulher (PIOSEVAN, 2006).
Os danos físicos para a saúde física da mulher são lesões de natureza grave ou leve, cicatrizes deformantes, mutilações, doenças crônicas, doenças sexualmente transmissíveis, ferimentos, escoriações, hematomas, fraturas recorrentes, problemas ginecológicos, infecções, gravidez indesejada, abortamento, etc. Já as conseqüências para a saúde mental se apresentam como: estresse pós-traumático caracterizado pela
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destruição da auto-estima, apatia, depressão, etc (SÁ, 2005, p. 38).
Neste sentido, pode-se inferir que a violência contra a mulher, além de provocar sofrimento físico, tende a causar diversos distúrbios de natureza psicológica não só nela, mas também em outros membros da família. Filhos que presenciam atos desse tipo dentro de casa estão fortemente sujeitos a apresentar vários problemas, como timidez, medo, ansiedade, pesadelos, agressividade, dificuldade de concentração e aprendizado na escola, tristeza contínua, dentre outros. Assim, as consequências da violência ultrapassam a sua vítima direta configurando-se como um problema que atinge a família como um todo (RODRIGUES, 2008). Souza (2001) identifica três tipos mais frequentes de violência praticadas contra a mulher. São elas: a) agressão física, a que apresenta maior grau de agressividade e que mais põe em risco a vida da vítima. Envolve desde um “simples” empurrão a atos mais violentos que levam à morte. b) agressão psicológica ou emocional, que ataca diretamente a estrutura psicológica da mulher por meio de ameaças ou palavras ofensivas que a fazem se sentir inferior e incapaz. São exemplos as injúrias e repetidas acusações de infidelidade sem motivos ou provas. c) agressão sexual, que consiste no ato de obrigar a vítima a praticar qualquer tipo de ato sexual contra a sua vontade, além de envolver também atitudes como conversas obscenas; por escrito; objetos pornográficos, entre outros.
Neste sentido, pode-se inferir que a violência contra a mulher, além de provocar sofrimento físico, tende a causar diversos distúrbios de natureza psicológica não só nela, mas também em outros membros da família. Filhos que presenciam atos desse tipo dentro de casa estão fortemente sujeitos a apresentar vários problemas, como timidez, medo, ansiedade, pesadelos, agressividade, dificuldade de concentração e aprendizado na escola, tristeza contínua, dentre
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outros. Assim, as consequências da violência ultrapassam a sua vítima direta configurando-se como um problema que atinge a família como um todo (PIOSEVAN, 2006). A Lei Maria da Penha foi promulgada com o objetivo de coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. A violência da qual trata a Lei Maria da Penha não precisa ser necessariamente praticada dentro do lar, podendo ocorrer em diversos locais. No entanto, neste caso, faz-se necessário que a vítima e o agressor possuam um vínculo familiar sanguíneo e/ou afinidade, independente da coabitação (ARAÚJO, 2007). Assim, conforme a legislação vigente no que diz respeito às formas de violência contra a mulher, a Lei Maria da Penha, no seu art. 7º, exemplifica, como destacadas abaixo:
Art. 7º São formas de violência doméstica e familiar contra a mulher, entre outras: I - a violência física, entendida como qualquer conduta que ofenda sua integridade ou saúde corporal; II - a violência psicológica, entendida como qualquer conduta que lhe cause dano emocional e diminuição da autoestima ou que lhe prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento ou que vise degradar ou controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, ridicularização, exploração e limitação do direito de ir e vir ou qualquer outro meio que lhe cause prejuízo à saúde psicológica e à autodeterminação; III - a violência sexual, entendida como qualquer conduta que a constranja a presenciar, a manter ou a participar de relação sexual não desejada, mediante intimidação, ameaça, coação ou uso da força; que a induza a comercializar ou a utilizar, de qualquer modo, a sua sexualidade, que a impeça de usar qualquer método contraceptivo ou que a force ao matrimônio, à gravidez, ao aborto ou à prostituição, mediante coação, chantagem, suborno ou manipulação; ou que limite ou anule o exercício de seus direitos sexuais e reprodutivos; IV - a violência patrimonial, entendida como qualquer conduta que configure retenção, subtração, destruição parcial
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ou total de seus objetos, instrumentos de trabalho, documentos pessoais, bens, valores e direitos ou recursos econômicos, incluindo os destinados a satisfazer suas necessidades; V - a violência moral, entendida como qualquer conduta que configure calúnia, difamação ou injúria.
2.3 Políticas públicas de combate à violência contra a mulher
No Brasil, o aumento dos casos de violência contra a mulher levou à criação de algumas iniciativas de combate e punição a práticas dessa natureza.
Destas, citamos a pioneira: a criação do SOS Mulher, em 10 de outubro de 1980, em São Paulo, considerado como o primeiro grupo de combate à violência contra a mulher. Em 1985, foi criado o Conselho Nacional dos Direitos da Mulher, um órgão consultivo, com o objetivo de promover políticas sociais para as mulheres, no sentido de eliminar qualquer tipo de discriminação e garantir condições de igualdade para o exercício da cidadania A partir daí, surgiram as Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher (DEAM’s). A primeira destas foi inaugurada em São Paulo, 1985. Em 1990, já eram mais de duzentas em todo o país (BIELLA, 2005, p.22). Assim, o Brasil conta atualmente com algumas políticas públicas de combate à violência contra a mulher e de atendimento às vítimas de agressões desse tipo. As principais são as Delegacias Especializadas de Atendimentos à Mulher (DEAM’s) e a Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, Casas Abrigo e Centros de Atendimento (ou de Referência) (BIELLA, 2005). Contudo, tais políticas carecem de ações mais efetivas no sentido de diminuir o nível de marginalização das mulheres, incentivando-as a saírem da situação de subalternidade e de passividade. Por isso, os projetos orientados para enfraquecer a prática de violência contra a mulher precisam ser melhorados para que alcancem maiores resultados (CAVALCANTI, 2007).
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As DEAM´s, por exemplo, têm por objetivos: investigar, apurar e tipificar os crimes cometidos contra o sexo feminino; combater a violência contra a mulher; resgatar seus direitos e reestruturar as famílias por meio de mudanças de comportamento. Sem dúvida, tal órgão representa um avanço no combate à violência a pessoas do sexo feminino. Contudo, o mesmo tem se demonstrado incompleto em sua estruturação em diversos aspectos. Um deles diz respeito ao fato de não possuir um quadro técnico especializado para o atendimento a mulher em situação de violência (ARAÚJO, 2007). Como ressalta Biella (2005, p. 58), “a implantação das Delegacias teve seu impacto positivo na visibilização da violência contra a mulher, sendo uma porta de entrada para as mulheres fazerem suas queixas, mas ainda possui limites”. Por fim, é preciso mencionar que, no dia 7 de agosto de 2006, o Presidente Lula sancionou a Lei nº 11.340/06, batizada de “Lei Maria da Penha”. A referida Lei abrange medidas preventivas, assistenciais, punitivas, educativas e de proteção à mulher e aos filhos. Além de considerar a violência física e sexual, engloba ainda a violência psicológica, que ocorre por meio de ameaças e humilhações (DIAS, 2007). Dentre as medidas de proteção às mulheres, a Lei Maria da Penha determina, por exemplo, a saída obrigatória do agressor de casa, a proteção dos filhos e o direito de a mulher se afastar do trabalho por seis meses, sem risco de perder o emprego, sempre que isso for necessário para preservar sua integridade física e psíquica (CAVALCANTI, 2007). Diante do exposto, nota-se que houve, nas últimas décadas, um avanço relevante nas políticas de combate à violência contra a mulher no Brasil. Contudo, ainda há muito que ser feito, visto que as iniciativas até aqui implementadas não vêm inibindo as agressões como deveriam. Prova disso é que diariamente são divulgados na mídia diversos casos de violência doméstica e de impunidade aos agressores, o que demonstra que é preciso reforçar e aperfeiçoar as políticas e ações voltadas ao combate à esses tipo de agressão (RODRIGUES, 2008). Assim, como mencionado anteriormente, este trabalho se reveste de importância na medida em que pretende contribuir com a melhoria das ações de combate à violência contra a mulher.
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2.3.1 Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher – JVDFM
Com o objetivo de tratar com mais rigor os crimes praticados contra a mulher, no âmbito doméstico e familiar, e de tornar mais céleres os julgamentos dos processos relativos a este tipo de violência, acreditando, assim, que se chegará a uma diminuição significativa deste problema social, a Lei nº 11.340/06 determinou a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar contra a mulher – JVDFM. Tal criação está prevista no art. 14 do referido diploma legal, vinculando-os à Justiça Ordinária e atribuindo-lhes competência mista – cível e criminal – para o processo, julgamento e execução das causas decorrentes da prática de violência doméstica e familiar contra a mulher (GRINOVER, 2006). A Lei Maria da Penha prevê a criação dos JVDFMs, mas não impõe sua instalação nem define prazo para seu funcionamento. O legislador facultou essa criação em respeito à autonomia das Unidades Federadas, cabendo aos Tribunais de Justiça a implantação destes (DIAS, 2007). Enquanto tais juizados não forem criados ou instalados, a Lei em comento delegou às Varas Criminais competência transitória para atuar nas causas a eles pertinentes. Entretanto, a competência dos juizados especializados e das varas criminais se diferencia. Enquanto nestas a competência é tão-somente para o processo e julgamento das ações envolvendo violência doméstica e familiar contra a mulher, naqueles a competência é para o processo, julgamento e execução das mesmas causas (RODRIGUES, 2008). Nos Juizados de Violência Doméstica e Familiar, todos os procedimentos acontecem lá, seja a execução de medida protetiva de urgência bem como as ações criminais e cíveis promovidas pela vítima ou pelo Ministério Público, onde cabe o processo, julgamento e execução das ações decorrentes de violência doméstica (RODRIGUES, 2008). Os requerimentos de medidas protetivas de urgência como os inquéritos são encaminhados para as varas criminais. No entanto, depois de analisada pelo juiz criminal o pedido de medida protetiva, só permanece nas Varas Criminais aquela que tem natureza criminal, quanto às providências cíveis, após cumpridas as
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determinações que obrigam o agressor, deverão ser redistribuídas para a Vara de Família (CAVALCANTI, 2007). No que concerne à competência ratione personae, esta se verifica de acordo à condição da pessoa da vítima (mulher como sujeito passivo), bem como a existência de vínculo afetivo desta com o ofensor no âmbito doméstico e familiar. Assim, no âmbito de incidência da Lei “Maria da Penha”, não importa o local do fato, como está previsto no Código de Processo Penal (FILHO, 2007). A “Lei Maria da Penha” determina a aplicação subsidiária das normas dos Códigos de Processo Penal e Processo Civil, do Estatuto da Criança e do Adolescente e Estatuto do Idoso. Importante ressaltar, também, que a lei de violência doméstica delega à vítima a eleição do foro, sendo competente para os processos cíveis o Juizado do seu domicílio ou de sua residência; do lugar do fato em que se baseou a demanda ou do domicílio do agressor (art. 15) (DIAS, 2007). Uma mudança significativa que a Lei “Maria da Penha” trouxe e que tem gerado calorosas discussões foi a alteração de competência, excluindo a aplicação da Lei 9.099/95, subtraindo desta forma a competência dos Juizados Especiais Criminais, nos crimes de violência doméstica e familiar praticados contra a mulher (GRINOVER, 2006). No entanto, enquanto não são criados e instalados os JVDFMs, a competência é das Varas Criminais para processo e julgamento (sem processo executório) das ações que antes eram encaminhadas aos Juizados Especiais Criminais (DIAS, 2007). Destarte, não são mais considerados crimes de menor potencial ofensivo aqueles praticados contra a mulher e que são caracterizados como de violência doméstica e familiar. Logo, não é mais permitida aplicação dos institutos despenalizadores da Lei 9.099/95 (FORTE, 2008). Ao que parece, a Lei nº 11.340/06 dá a entender que era a aplicação dos JECrims a causa do aumento da violência doméstica e que a sensação de impunidade, gerada pela cominação de pena pecuniária, estimula a prática reiterada das violências sofridas pela mulher (GRINOVER, 2006).
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2.4 Proposta de ações para a DEAM de Vitória da Conquista/BA
A Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (DEAM), do município de Vitória da Conquista, foi criada no ano de 2002. De acordo com informações de agentes, a referida delegacia não consegue atender satisfatoriamente as excessivas carências das necessidades locais, sobretudo, por não dispor de corpo técnico especializado. A falta de profissionais na área de Assistência Social e Psicológica, por exemplo, dificulta a melhoria do atendimento às vítimas que procuram pelo órgão (BIELLA, 2005). Nota-se que muitas mulheres que sofrem agressão por parte de seus maridos encontram-se em situação de dependência financeira, psicológica e afetiva em relação ao mesmo. E é exatamente por isso que muitas se calam e não denunciam os maus tratos que sofrem dentro de casa. Neste sentido, a Delegacia da Mulher poderia desenvolver trabalhos, como palestras, por exemplo, incentivando a inserção dessas mulheres em escolas, faculdades e cursos técnicos para que as mesmas possam ingressar no mercado de trabalho. Além disso, automaticamente, estaria se trabalhando com a autoestima das vítimas (RODRIGUES, 2008). Outra iniciativa a ser empreendida pela DEAM de Vitória da Conquista seria a própria divulgação da existência e do endereço do órgão, visto que, muitas mulheres, vítimas de agressão, procuram as delegacias convencionais para prestar queixa, e somente depois que já estão lá são orientadas a procurar a delegacia da mulher (FORTE, 2008). De acordo com especialistas e estudiosos da área, nas delegacias especiais para as mulheres, o quadro de funcionários é formado, em sua maioria, apenas por policiais. Assim, são raras as delegacias que contam com trabalho de algum técnico, e nenhuma possui Assistente Social (CAVALCANTI, 2007). Tendo em conta tratar-se de um tipo de atendimento delicado, torna-se necessária a existência de um corpo técnico especializado na DEAM de Vitória da Conquista, bem como a presença de uma Assistente Social e de uma Psicóloga. É importante que esses profissionais sejam do sexo feminino para que a mulher fique mais à vontade e não se sinta tímida ou constrangida ao procurar por tal serviço de proteção. Como destaca Biella (2005, p. 58):
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As DEAM’s, como política pública voltada ao atendimento das mulheres em situação de violência, deveriam ter em seus quadros uma equipe multidisciplinar: além dos delegados(as), policiais, servidores técnico-administrativos, seria necessária a presença de assistentes sociais e psicólogos capacitados e sensibilizados para as questões de gênero, direitos humanos e cidadania. O atendimento inicial à mulher em situação de violência é decisivo no estímulo em continuar o processo da denúncia e, por conseguinte, seu processo de empoderamento. Conforme Forte (2008), todos os funcionários das DEAMs devem, dentre outras ações, estimular a denúncia, prestar orientação e informação sobre os direitos das vítimas, encaminhá-las à assistência jurídica e ao uso dos recursos da comunidade e propor alternativas de segurança durante a crise de violência. Além disso, a autora destaca que é preciso discutir com os casais sobre uma nova visão da mulher na sociedade, baseada na autonomia, na justiça e na igualdade entre os sexos. Com base em Biella (2005), sugere-se que a DEAM de Vitória da Conquista desenvolva os seguintes trabalhos: promover palestras para grupos de vítimas, familiares e amigos das vítimas por categorias de violência; capacitar atores sociais para atuarem como multiplicadores de ações educativas voltadas para a prevenção da violência; participar de movimentos e lutas contra a impunidade e a violência, e em defesa da vida e dos Direitos Humanos; estabelecer parcerias com instituições do setor público e privado para o desenvolvimento de atividades voltadas para a prevenção da violência;
Assim, nota-se que, para melhorar os serviços prestados pela Delegacia de Mulheres, é preciso todo um processo de reestruturação da referida delegacia, que pode ser feito por meio de parcerias com outras instituições, como escolas e universidades, de forma a desenvolver um trabalho em rede, o que resultaria em uma maior visibilidade e eficácia.
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3 CONSIDERAÇÕES FINAIS
Como pode ser visto ao longo do estudo, a Lei nº 11.340/06, conhecida como “Lei Maria da Penha”, é fruto do movimento de mulheres e de compromissos internacionais assumidos pelo Estado brasileiro, objetivando prevenir, punir e erradicar a violência contra a mulher no âmbito doméstico e familiar. Ela prevê normas que receberam críticas negativas quanto à sua constitucionalidade e à sua eficácia, a citar como exemplo o art. 41. Desse modo, consoante ao que foi apresentado na proposta desse artigo, a Delegacia Especial de Atendimento à Mulher (DEAM), implantada no município de Vitória da Conquista não consegue atender satisfatoriamente as excessivas carências das necessidades locais, sobretudo, por não dispor de corpo técnico especializado. Em suma, acredita-se que melhor seria reestruturas as DEAMs aproveitando uma estrutura já existente, para adaptar à realidade a necessidade de encontrar soluções mais eficazes para a diminuição e erradicação da violência doméstica e familiar contra a mulher. Sendo assim, buscar medidas não-penais através do diálogo e, principalmente, em conjunto com profissionais da área de saúde mental e da sociologia, promovendo uma educação cultural diferente da patriarcal, parece ser o meio mais harmonizado.
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4 REFERÊNCIAS
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