Leituras natal

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LEIO PRA TI Ações de animação da leitura na cidade de Silves pelos Voluntários de Leitura da Biblioteca Municipal [3 a 16 dezembro’12] O que a palavra Natal quis dizer é o que continua a querer dizer: a celebração dum nascimento. A celebração porque um nascimento é uma afirmação de vida, uma afirmação de continuidade de vida. O nascimento duma criança deveria ser sempre ocasião para alegria, júbilo, confiança. Mas a palavra Natal-nascimento, que durante gerações simbolizou o renascer da esperança da salvação, hoje tem cada vez mais uma contrapartida excessivamente dramática, pois hoje, quantas são as crianças cujo nascimento é símbolo de esperança e quantas são aquelas cujo nascimento é símbolo de miséria, decadência, abandono? Para que nascem as crianças hoje? Quem as faz nascer? Porque as fazem nascer? Para quê as fazem nascer? Para que mundo? Para que destino? Para que esperança? Para que lutas? Para que sofrimentos? A misericórdia divina precisa do apoio dos homens. Sejamos instrutivos para os que fazem nascer as crianças sem saberem porquê e impiedosos para os que as fazem nascer para o desespero e para o terror. Se o culto do Natal é o culto da criança salvadora da espécie, da sociedade e do destino dos homens, então que se cuide da criança cuidando do mundo para onde ela é trazida, para o mundo onde ela terá de viver, para que ela possa ser a continuada afirmação da vida e da esperança. Não se pode celebrar o símbolo e descurar o seu fundamento.

Lisboa, 1971 | Ana Hatherly

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[seleção textual e musical] Paulo Pires | Programador cultural e mediador de leitura da BMS


ANTOLOGIA LITERÁRIA E MUSICAL

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PÁSSAROS PROIBIDOS (Eduardo Galeano) Nos tempos da ditadura militar, os presos políticos uruguaios não podiam falar sem licença, assobiar, sorrir, cantar, caminhar rapidamente ou cumprimentar outro preso. Nem sequer podiam desenhar ou receber desenhos de mulheres grávidas, casais, borboletas, estrelas ou pássaros. Didaskó Pérez, professor, torturado e preso por ter ideias subversivas relativamente ao regime, recebe num domingo a visita da sua filha Milay, de cinco anos. A filha traz-lhe um desenho de pássaros. Os censores rasgam o desenho à entrada da cadeia. No domingo seguinte, Milay traz para o pai um desenho de árvores. As árvores não estão proibidas e o desenho passa. Didaskó elogia a obra e pergunta à filha o que são os pequenos círculos coloridos que aparecem nas copas das árvores, aquelas bolinhas muito pequenas e brilhantes entre a ramagem: – São laranjas? Que frutas são? A menina o faz calar: – Shhhhhhhh. E em tom de segredo explica-lhe: – Não vês que são olhos? São os olhos dos pássaros que eu trouxe escondidos para ti.

♣ [NA HORA DE PÔR A MESA, ÉRAMOS CINCO] (José Luís Peixoto) na hora de pôr a mesa, éramos cinco: o meu pai, a minha mãe, as minhas irmãs e eu. depois, a minha irmã mais velha casou-se. depois, a minha irmã mais nova casou-se. depois, o meu pai morreu. hoje, na hora de pôr a mesa, somos cinco, menos a minha irmã mais velha que está na casa dela, menos a minha irmã mais nova que está na casa dela, menos o meu pai, menos a minha mãe viúva, cada um deles é um lugar vazio nesta mesa onde como sozinho. mas irão estar sempre aqui. na hora de pôr a mesa, seremos sempre cinco. enquanto um de nós estiver vivo, seremos sempre cinco.

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CONVIDA-ME SÓ PARA JANTAR (Ana Goês) E não queiras depois fazer amor. Convida-me só para jantar num restaurante sossegado numa mesa de canto e fala devagar e fala devagar eu quero comer uma sopa quente não quero comer mariscos os mariscos atravancam-me o prato e estou cansada para os afastar fala assim devagar devagar não é preciso dizeres que sou bonita mas não me fales de economia e de política fala assim devagar devagar deita-me o vinho devagar quando o meu copo estiver vazio. Estou convalescente sou convalescente não é preciso que o percebas mas por favor não faças força em mim. Fala, estás-me a dar de jantar estás-me a pôr recostada à almofada estás-me a fazer sorrir ao longe fala assim devagar devagar devagar

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♣ [NÃO POSSO ADIAR O AMOR PARA OUTRO SÉCULO] (António Ramos Rosa) Não posso adiar o amor para outro século não posso ainda que o grito sufoque na garganta ainda que o ódio estale e crepite e arda sob montanhas cinzentas e montanhas cinzentas


Não posso adiar este abraço que é uma arma de dois gumes amor e ódio Não posso adiar ainda que a noite pese séculos sobre as costas e a aurora indecisa demore não posso adiar para outro século a minha vida nem o meu amor nem o meu grito de libertação Não posso adiar o coração

♣ DIA DE NATAL (António Gedeão) Hoje é dia de era bom. É dia de passar a mão pelo rosto das crianças, de falar e de ouvir com mavioso tom, de abraçar toda a gente e de oferecer lembranças. É dia de pensar nos outros— coitadinhos— nos que padecem, de lhes darmos coragem para poderem continuar a aceitar a sua miséria, de perdoar aos nossos inimigos, mesmo aos que não merecem, de meditar sobre a nossa existência, tão efémera e tão séria. Comove tanta fraternidade universal. É só abrir o rádio e logo um coro de anjos, como se de anjos fosse, numa toada doce, de violas e banjos, entoa gravemente um hino ao Criador. E mal se extinguem os clamores plangentes, a voz do locutor anuncia o melhor dos detergentes. De novo a melopeia inunda a Terra e o Céu e as vozes crescem num fervor patético. (Vossa Excelência verificou a hora exacta em que o Menino Jesus nasceu? Não seja estúpido! Compre imediatamente um relógio de pulso antimagnético.) Torna-se difícil caminhar nas preciosas ruas. Toda a gente se acotovela, se multiplica em gestos, esfuziante.

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Todos participam nas alegrias dos outros como se fossem suas e fazem adeuses enluvados aos bons amigos que passam mais distante. Nas lojas, na luxúria das montras e dos escaparates, com subtis requintes de bom gosto e de engenhosa dinâmica, cintilam, sob o intenso fluxo de milhares de quilovates, as belas coisas inúteis de plástico, de metal, de vidro e de cerâmica. Os olhos acorrem, num alvoroço liquefeito, ao chamamento voluptuoso dos brilhos e das cores. É como se tudo aquilo nos dissesse directamente respeito, como se o Céu olhasse para nós e nos cobrisse de bênçãos e favores. A Oratória de Bach embruxa a atmosfera do arruamento. Adivinha-se uma roupagem diáfana a desembrulhar-se no ar. E a gente, mesmo sem querer, entra no estabelecimento e compra — louvado seja o Senhor! — o que nunca tinha pensado comprado. Mas a maior felicidade é a da gente pequena. Naquela véspera santa a sua comoção é tanta, tanta, tanta, que nem dorme serena. Cada menino abre um olhinho na noite incerta para ver se a aurora já está desperta. De manhãzinha, salta da cama, corre à cozinha mesmo em pijama. Ah!!!!!!!!!! Na branda macieza da matutina luz aguarda-o a surpresa do Menino Jesus. Jesus o doce Jesus, o mesmo que nasceu na manjedoura, veio pôr no sapatinho do Pedrinho

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uma metralhadora. Que alegria reinou naquela casa em todo o santo dia! O Pedrinho, estrategicamente escondido atrás das portas, fuzilava tudo com devastadoras rajadas e obrigava as criadas a caírem no chão como se fossem mortas: Tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá-tá. Já está! E fazia-as erguer para de novo matá-las. E até mesmo a mamã e o sisudo papá fingiam que caíam crivados de balas. Dia de Confraternização Universal, Dia de Amor, de Paz, de Felicidade, de Sonhos e Venturas. É dia de Natal. Paz na Terra aos Homens de Boa Vontade. Glória a Deus nas Alturas.

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TODOS OS HOMENS SÃO MARICAS QUANDO ESTÃO COM GRIPE (PASODOBLE) (António Lobo Antunes) Pachos na testa terço na mão uma botija chá de limão

ai Lurdes Lurdes que foi aquilo não é a chuva no meu postigo

zaragatoas vinho com mel três aspirinas creme na pele

ai Lurdes Lurdes fica comigo não é o vento a cirandar nem são as vozes que vêm do mar

grito de medo chamo a mulher ai Lurdes Lurdes que vou morrer

não é o pingo de uma torneira


põe-me a santinha à cabeceira compõe-me a colcha fala ao prior pousa o Jesus no cobertor chama o doutor passa a chamada

mede-me a febre olha-me a goela cala os miúdos fecha a janela não quero canja nem a salada ai Lurdes Lurdes não vales nada

ai Lurdes Lurdes nem dás por nada

se tu sonhasses como me sinto já vejo a morte nunca te minto

faz-me tisanas e pão de ló

já vejo o inferno chamas diabos anjos estranhos cornos e rabos

não te levantes que fico só aqui sozinho a apodrecer

vejo os demónios nas suas danças tigres sem listras bodes de tranças choros de coruja risos de grilo

ai Lurdes Lurdes que vou morrer.

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♣ URGENTEMENTE (Eugénio de Andrade) É urgente o amor. É urgente um barco no mar. É urgente destruir certas palavras, ódio, solidão e crueldade, alguns lamentos, muitas espadas. É urgente inventar alegria, multiplicar os beijos, as searas, é urgente descobrir rosas e rios e manhãs claras.


Cai o silêncio nos ombros e a luz impura, até doer. É urgente o amor, é urgente permanecer.

♣ A TERRA DO NUNCA (Nuno Júdice) Se eu fosse para a terra do nunca, teria tudo o que quisesse numa cama de nada: os sonhos que ninguém teve quando o sol se punha de manhã; a rapariga que cantava num canteiro de flores vivas; a água que sabia a vinho na boca de todos os bêbedos. Iria de bicicleta sem ter de pedalar, numa estrada de nuvens.

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E quando chegasse ao céu, pisaria as estrelas caídas num chão de nebulosas. A terra do nunca é onde nunca chegaria se eu fosse para a terra do nunca. E é por isso que a apanho do chão, e a meto em sacos de terra do nunca. Um dia, quando alguém me pedir a terra do nunca, despejarei todos os sacos à sua porta. E a rapariga que cantava sairá da terra com um canteiro de flores vivas. E os bêbedos encherão os copos com a água que sabia a vinho. Na terra do nunca, com o sol a pôr-se quando nasce o dia.


SÃO JOSÉ – O FILOFAX (Rui Zink) 1 de Março Hoje comprei um martelo de duas pontas e uma esposa. Não sei nada para que servem as duas pontas, mas é alemão. 11 de Março Há muitos judeus na rua. A Maria demorou-se imenso tempo no mercado. Voltou ofegante e contou uma história complicadíssima de incidentes entre as varinas e os romanos. O preço da madeira está a subir. Onde é que isto vai parar? 20 de Março Tudo voltou à normalidade. Maria foi buscar água, mas depois em vez de água trouxe um líquido preto, que suja tudo e que ela diz que é inflamável, que parece que os sumérios estão cheios dele, que ainda vai valer uma fortuna… Às vezes pergunto-me se não terá um parafuso a menos. O que faz sentido… Ai, os parafusos ainda não foram inventados. 1 de Abril A Maria contou-me uma coisa que não percebo nada. Mete um pombo, um anjo, um tal de Gabriel, uma tal de Isabel, um tal de Espírito Santo... Não percebi. Só sei é que vou ser pai. 2 de Abril Toda a gente da aldeia me felicita. Nunca pensei que gostassem tanto de mim. Cada vez que entro num café todo o mundo se atira ao chão de riso. Que gente boa! 3 de Abril Maria foi passar uns dias com Isabel. Parece que a ela lhe aconteceu uma coisa parecida. Zacarias está mudo. Eu também – mas é com o preço da madeira. O que me vale é que vendo as cruzes muito caras. 13 de Maio A Maria faz anos hoje. Enviei-lhe um postal de parabéns por correio azul. Pode parecer estranho, mas sinto falta das histórias dela. Ainda não me convenci que vou ser pai. 28 de Maio A Maria voltou. Está mais gordinha. Voltou de novo aquela história do pombo e do anjo. Continuo a não perceber nada. 16 de Junho Já percebi. Parece que afinal nem eu sou pai nem ela está grávida. A notícia abalou-me tanto que fiquei a martelar até tarde.

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27 de Junho Afinal não tinha percebido. O que se passa é que ela está grávida mas continua virgem. Eu sou o pai, mas não sou o pai biológico. Agora cada vez que vou ao café perguntam-me se quero um whisky biológico ou legal. São uns brincalhões, estes nazarenos. É o humor judeu! 8 de Agosto Não resisti e levei a minha Maria de férias ao Mar Morto. Tivemos sorte, não havia muitos engarrafamentos. Há umas mulas novas tão boas… Um dia ainda perco a cabeça e compro uma mula nova só para mim. 21 de Agosto A Maria e eu estivemos a fazer planos para o futuro do nosso filho. A Maria quer que seja um Messias. Eu preferia que fosse carpinteiro. Acabámos a discutir. 11 de Setembro Fizemos as pazes. Rimos da estupidez da nossa discussão. Pois se, na volta, ainda nos sai uma filha… 28 de Setembro Se for uma filha, a Maria quer que seja qualquer coisa menos virgem como ela. Eu preferia que fosse carpinteira. Acabámos a discutir. 5 de Outubro Fizemos as pazes e perdi a cabeça e comprei-lhe uma Black & Decker. No mercado correm rumores de um novo pogrom, com crucificados e tudo. Vinha mesmo a calhar, e assim já podia contratar um aprendiz. 19 de Outubro As minhas preces foram atendidas. Contratei um aprendiz, e não tenho mãos a medir. Passamos os dois de manhã à noite a dar marteladas na oficina. Maria não se importa. 25 de Outubro Maria está contente com a perspectiva do nascimento da criança. Tenho de falar com esse tal de Gabriel Espírito Santo para ver se chegamos a acordo. Quero que Maria tenha muitos filhos. Espero que ele faça um preço razoável. 11 de Novembro O meu aprendiz é o máximo. Eu aos 15 anos não tinha nem metade da escola dele. Só não gosto quando se põe a falar mal da Maria. Eu não acho que ela seja “uma grande mentirosa”. Tem muita imaginação, é tudo. Demos marteladas até tarde. 23 de Novembro Hoje fizemos cinco cruzes. 24 de Novembro Hoje fizemos nove cruzes.

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25 de Novembro Hoje batemos o recorde: vinte cruzes. Abençoada Black & Decker. 1 de Dezembro Despedi o meu aprendiz. Tinha de ser, a Maria ameaçou fazer escândalo. Nem o argumento de que assim não ia chegar para as encomendas a comoveu. 20 de Dezembro Não sei se é por causa do Natal, ou do fim do ano, ou das férias escolares, mas as estradas estão um horror. É mais fácil um camelo passar pelo buraco de uma agulha que encontrar lugar para estacionar! E a neve que não para de cair…Por pouco não íamos de encontro a um pinheiro. 24 de Dezembro O Meridien, o Hilton e o Sheraton estão cheios. Ainda bem, assim poupamos uns sestércios. Eu sei que é um bocado semítico da minha parte, mas é mais forte que eu. Felizmente a Maria gosta de animais, porque vamos a ter que passar a noite numa manjedoura. 25 de Dezembro Nasceu a criança, mesmo no feriado, tem graça. Espero que os funcionários da repartição não tenham feito ponte, senão vamos ter de ficar até Janeiro. 31 De Dezembro Sacanas! E não é que fizeram mesmo ponte? Estes belenenses só crucificados… O que me consola ainda é a criança. Com a auréola que tem à volta da cabeça, vamos poupar imenso em electricidade. Que importa que não seja minha?

♣ POEMA DE NATAL (Miguel Torga) Leio o teu nome Na página da noite: Menino Deus... E fico a meditar No milagre dobrado De ser Deus e menino. Em Deus não acredito. Mas de ti como posso duvidar? Todos os dias nascem Meninos pobres em currais de gado.

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Crianças que são ânsias alargadas De horizontes pequenos. Humanas alvoradas... A divindade é o menos.

♣ RECOMEÇA (Miguel Torga) Recomeça.... Se puderes Sem angústia E sem pressa. E os passos que deres, Nesse caminho duro Do futuro Dá-os em liberdade. Enquanto não alcances Não descanses. De nenhum fruto queiras só metade.

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E, nunca saciado, Vai colhendo ilusões sucessivas no pomar. Sempre a sonhar e vendo O logro da aventura. És homem, não te esqueças! Só é tua a loucura Onde, com lucidez, te reconheças…

♣ A CRUEL HISTÓRIA DO NATAL NA CAPOEIRA (Manuel António Pina) No dia 1 de Dezembro o Peru começa A andar com tremuras tonturas dores de cabeça Paga as dívidas vende a mobília E no dia 23 reúne a Família Os filhos os amigos toda a gente


Despedindo-se deles pateticamente É a Última Ceia do Peru coitado Antes de ir de camioneta para o mercado Onde será embebedado morto e devorado A Perua fica com os peruzinhos ao seu cuidado Acarinha-os e educa-os todo o ano Fala-lhes do pai e do seu destino desumano Chora sobre eles as lágrimas de dor Que no Natal dão aos perus aquele excelente sabor. Enquanto duram Janeiro e Fevereiro Anda tudo inconformado no galinheiro Lamentando a má sorte do companheiro Mas memória de galinha é desmemoriada E em Março já ninguém se lembra de nada Mesmo a Perua já não sabe porque chora Chora por ser costume por lhe parecer bem E porque já chorava também a mãe E a mãe da mãe também E porque as lágrimas lhe saem pelos olhos fora Como à mãe e à mãe da mãe outrora – E volta tudo ao mesmo até ao Natal que vem Ao cocoró ao piu piu ao glu glu – Que ao menos quem o comeu e lhe soube bem Se lembre com saudades do Peru!

♣ [POEMA VIII DE “O GUARDADOR DE REBANHOS”] (Alberto Caeiro – heterónimo de Fernando Pessoa) Num meio-dia de fim de primavera Tive um sonho como uma fotografia. Vi Jesus Cristo descer à terra. Veio pela encosta de um monte Tornado outra vez menino, A correr e a rolar-se pela erva E a arrancar flores para as deitar fora E a rir de modo a ouvir-se de longe. Tinha fugido do céu. Era nosso demais para fingir De segunda pessoa da Trindade.

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No céu era tudo falso, tudo em desacordo Com flores e árvores e pedras. No céu tinha que estar sempre sério E de vez em quando de se tornar outra vez homem E subir para a cruz, e estar sempre a morrer Com uma coroa toda à roda de espinhos E os pés espetados por um prego com cabeça, E até com um trapo à roda da cintura Como os pretos nas ilustrações. Nem sequer o deixavam ter pai e mãe Como as outras crianças. O seu pai era duas pessoas – Um velho chamado José, que era carpinteiro, E que não era pai dele; E o outro pai era uma pomba estúpida, A única pomba feia do mundo Porque não era do mundo nem era pomba. E a sua mãe não tinha amado antes de o ter. Não era mulher: era uma mala Em que ele tinha vindo do céu. E queriam que ele, que só nascera da mãe, E nunca tivera pai para amar com respeito, Pregasse a bondade e a justiça! Um dia que Deus estava a dormir E o Espírito Santo andava a voar, Ele foi à caixa dos milagres e roubou três. Com o primeiro fez que ninguém soubesse que ele tinha fugido. Com o segundo criou-se eternamente humano e menino. Com o terceiro criou um Cristo eternamente na cruz E deixou-o pregado na cruz que há no céu E serve de modelo às outras. Depois fugiu para o sol E desceu pelo primeiro raio que apanhou. Hoje vive na minha aldeia comigo. É uma criança bonita de riso e natural. Limpa o nariz ao braço direito, Chapinha nas poças de água, Colhe as flores e gosta delas e esquece-as. Atira pedras aos burros, Rouba a fruta dos pomares E foge a chorar e a gritar dos cães.

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E, porque sabe que elas não gostam E que toda a gente acha graça, Corre atrás das raparigas Que vão em ranchos pelas estradas Com as bilhas às cabeças E levanta-lhes as saias. A mim ensinou-me tudo. Ensinou-me a olhar para as coisas. Aponta-me todas as coisas que há nas flores. Mostra-me como as pedras são engraçadas Quando a gente as tem na mão E olha devagar para elas. Diz-me muito mal de Deus. Diz que ele é um velho estúpido e doente, Sempre a escarrar no chão E a dizer indecências. A Virgem Maria leva as tardes da eternidade a fazer meia. E o Espírito Santo coça-se com o bico E empoleira-se nas cadeiras e suja-as. Tudo no céu é estúpido como a Igreja Católica. Diz-me que Deus não percebe nada Das coisas que criou – “Se é que ele as criou, do que duvido” —. “Ele diz, por exemplo, que os seres cantam a sua glória, Mas os seres não cantam nada. Se cantassem seriam cantores. Os seres existem e mais nada, E por isso se chamam seres.” E depois, cansados de dizer mal de Deus, O Menino Jesus adormece nos meus braços E eu levo-o ao colo para casa. …………………………………………………………………………………………………………………………………….

Ele mora comigo na minha casa a meio do outeiro. Ele é a Eterna Criança, o deus que faltava. Ele é o humano que é natural, Ele é o divino que sorri e que brinca. E por isso é que eu sei com toda a certeza Que ele é o Menino Jesus verdadeiro. E a criança tão humana que é divina

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É esta minha quotidiana vida de poeta, E é porque ele anda sempre comigo que eu sou poeta sempre. E que o meu mínimo olhar Me enche de sensação, E o mais pequeno som, seja do que for, Parece falar comigo. A Criança Nova que habita onde vivo Dá-me uma mão a mim E a outra a tudo que existe E assim vamos os três pelo caminho que houver, Saltando e cantando e rindo E gozando o nosso segredo comum Que é o de saber por toda a parte Que não há mistério no mundo E que tudo vale a pena. A Criança Eterna acompanha-me sempre. A direcção do meu olhar é o seu dedo apontando. O meu ouvido atento alegremente a todos os sons São as cócegas que ele me faz, brincando, nas orelhas. Damo-nos tão bem um com o outro Na companhia de tudo Que nunca pensamos um no outro, Mas vivemos juntos e dois Com um acordo íntimo Como a mão direita e a esquerda. Ao anoitecer brincamos as cinco pedrinhas No degrau da porta de casa, Graves como convém a um deus e a um poeta, E como se cada pedra Fosse todo um universo E fosse por isso um grande perigo para ela Deixá-la cair no chão. Depois eu conto-lhe histórias das coisas só dos homens E ele sorri, porque tudo é incrível. Ri dos reis e dos que não são reis, E tem pena de ouvir falar das guerras, E dos comércios, e dos navios Que ficam fumo no ar dos altos mares. Porque ele sabe que tudo isso falta àquela verdade Que uma flor tem ao florescer

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E que anda com a luz do sol A variar os montes e os vales E a fazer doer aos olhos os muros caiados. Depois ele adormece e eu deito-o. Levo-o ao colo para dentro de casa E deito-o, despindo-o lentamente E como seguindo um ritual muito limpo E todo materno até ele estar nu. Ele dorme dentro da minha alma E às vezes acorda de noite E brinca com os meus sonhos. Vira uns de pernas para o ar, Põe uns em cima dos outros E bate as palmas sozinho Sorrindo para o meu sono. …………………………………………………………………………………………………………………………………….

Quando eu morrer, filhinho, Seja eu a criança, o mais pequeno. Pega-me tu ao colo E leva-me para dentro da tua casa. Despe o meu ser cansado e humano E deita-me na tua cama. E conta-me histórias, caso eu acorde, Para eu tornar a adormecer. E dá-me sonhos teus para eu brincar Até que nasça qualquer dia Que tu sabes qual é.

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Esta é a história do meu Menino Jesus. Por que razão que se perceba Não há de ser ela mais verdadeira Que tudo quanto os filósofos pensam E tudo quanto as religiões ensinam?


CARTA A MEUS FILHOS SOBRE OS FUZILAMENTOS DE GOYA (Jorge de Sena) Não sei, meus filhos, que mundo será o vosso. É possível, porque tudo é possível, que ele seja aquele que eu desejo para vós. Um simples mundo, onde tudo tenha apenas a dificuldade que advém de nada haver que não seja simples e natural. Um mundo em que tudo seja permitido, conforme o vosso gosto, o vosso anseio, o vosso prazer, o vosso respeito pelos outros, o respeito dos outros por vós. E é possível que não seja isto, nem seja sequer isto o que vos interesse para viver. Tudo é possível, ainda quando lutemos, como devemos lutar, por quanto nos pareça a liberdade e a justiça, ou mais que qualquer delas uma fiel dedicação à honra de estar vivo. Um dia sabereis que mais que a humanidade não tem conta o número dos que pensaram assim, amaram o seu semelhante no que ele tinha de único, de insólito, de livre, de diferente, e foram sacrificados, torturados, espancados, e entregues hipocritamente â secular justiça, para que os liquidasse “com suma piedade e sem efusão de sangue”. Por serem fiéis a um deus, a um pensamento, a uma pátria, uma esperança, ou muito apenas à fome irrespondível que lhes roía as entranhas, foram estripados, esfolados, queimados, gaseados, e os seus corpos amontoados tão anonimamente quanto haviam vivido, ou suas cinzas dispersas para que delas não restasse memória. Às vezes, por serem de uma raça, outras por serem de uma classe, expiaram todos os erros que não tinham cometido ou não tinham consciência de haver cometido. Mas também aconteceu e acontece que não foram mortos. Houve sempre infinitas maneiras de prevalecer, aniquilando mansamente, delicadamente, por ínvios caminhos quais se diz que são ínvios os de Deus. Estes fuzilamentos, este heroísmo, este horror, foi uma coisa, entre mil, acontecida em Espanha há mais de um século e que por violenta e injusta

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ofendeu o coração de um pintor chamado Goya, que tinha um coração muito grande, cheio de fúria e de amor. Mas isto nada é, meus filhos. Apenas um episódio, um episódio breve, nesta cadeia de que sois um elo (ou não sereis) de ferro e de suor e sangue e algum sémen a caminho do mundo que vos sonho. Acreditai que nenhum mundo, que nada nem ninguém vale mais que uma vida ou a alegria de tê-la. É isto o que mais importa – essa alegria. Acreditai que a dignidade em que hão-de falar-vos tanto não é senão essa alegria que vem de estar-se vivo e sabendo que nenhuma vez alguém está menos vivo ou sofre ou morre para que um só de vós resista um pouco mais à morte que é de todos e virá. Que tudo isto sabereis serenamente, sem culpas a ninguém, sem terror, sem ambição, e sobretudo sem desapego ou indiferença, ardentemente espero. Tanto sangue, tanta dor, tanta angústia, um dia – mesmo que o tédio de um mundo feliz vos persiga – não hão-de ser em vão. Confesso que multas vezes, pensando no horror de tantos séculos de opressão e crueldade, hesito por momentos e uma amargura me submerge inconsolável. Serão ou não em vão? Mas, mesmo que o não sejam, quem ressuscita esses milhões, quem restitui não só a vida, mas tudo o que lhes foi tirado?

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Nenhum Juízo Final, meus filhos, pode dar-lhes aquele instante que não viveram, aquele objecto que não fruíram, aquele gesto de amor, que fariam “amanhã”. E, por isso, o mesmo mundo que criemos nos cumpre tê-lo com cuidado, como coisa que não é nossa, que nos é cedida para a guardarmos respeitosamente em memória do sangue que nos corre nas veias, da nossa carne que foi outra, do amor que outros não amaram porque lho roubaram. Lisboa, 25 de Junho de 1959


[AMIGAS E AMIGOS:] (José Fanha) Amigas e amigos: O que eu gostava mesmo era de ser o Pai Natal. O verdadeiro. O autêntico. O que desce pelas chaminés e leva uma prenda a cada menino. E, já agora, a cada adulto. Sei que já não há chaminés por onde possa escorregar um Pai Natal que se preze. Teria de aprender outros truques para entrar na casa de cada um. Mas havia de levar prendas daquelas que não são compradas à pressa. Nem precisam de muitos laços e fitas. Prendas com prendas dentro. Das que ficam muito tempo a fazer ninho no coração das pessoas. Levava sorrisos. Sobretudo sorrisos. Não daqueles que se acendem a medo, de espinhela dobrada, “com licença, faz favor”. Mas sorrisos fortes como os dos homens que são capazes de olhar de frente a vida e dar a volta aos tropeços do destino. Levava palavras. Palavras escritas devagarinho e com todas as letras. Palavras fraternas e limpas como as pedrinhas que se apanha à beira mar. Cada uma escolhida de propósito para cada pessoa. Levava livros também. Daqueles que nos oferecem muitas horas de viagens verdadeiras, de alegria, de espanto, de maravilha, de medo, de ternura. Daqueles que nos fazem conhecer outras pessoas, com outros desejos, outras dores e outros sonhos. Livros que nos ajudam a saber que cada um de nós não é o centro do mundo e nos permitem a festa de estender pontes daqui para ali, do nosso peito para o longe do universo. Talvez não consiga levar-vos tudo isto pessoalmente. Mas segue um abraço dado com toda a força e o desejo de muita luz neste Natal.

♣ ROMANCE INGÉNUO DE DUAS LINHAS PARALELAS (José Fanha) Duas linhas paralelas muito paralelamente iam passando entre estrelas fazendo o que estava escrito: caminhando eternamente de infinito a infinito. Seguiam-se passo a passo exactas e sempre a par

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pois só num ponto do espaço que ninguém sabe onde é se podiam encontrar falar e tomar café. Mas farta de andar sozinha uma delas certo dia voltou-se para a outra linha sorriu-lhe e disse-lhe assim: “Deixa lá a geometria e anda aqui para o pé de mim…!” Diz-lhe a outra: “Nem pensar! Mas que falta de respeito! Se quisermos lá chegar temos de ir devagarinho andando sempre a direito cada qual no seu caminho!” Não se dando por achada fica na sua a primeira e sorrindo amalandrada pela calada, sem um grito deita a mãozinha matreira puxa para si o infinito.

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E com ele ali à frente as duas a murmurar olharam-se docemente e sem fazerem perguntas puseram-se a namorar seguiram as duas juntas. Assim nestas poucas linhas fica uma história banal com linhas e entrelinhas e uma moral convergente: o infinito afinal fica aqui ao pé da gente!


[REIS MAGOS] (autor anónimo) O que se teria passado se, em vez de três Reis Magos, tivessem sido três Rainhas Magas? - Teriam perguntado como chegar ao local e teriam chegado a horas. - Teriam ajudado no parto e deixado o estábulo a brilhar. - Teriam ainda preparado uma panela de comida e teriam trazido ofertas mais práticas. Mas quais seriam os seus comentários ao partirem? - “Viste as sandálias que a Maria usava com aquela túnica?!” - “O Menino não se parece nada com o José…” - “Virgem?! Pois está bem! Já a conheço desde o Liceu.” - “Como é possível que tenha todos estes animais imundos a viver dentro de casa?!” - “Disseram-me que o José está desempregado…” - “Queres apostar em como não te devolvem a panela?”

♣ A AVENTURA DO NATAL (Miguel Esteves Cardoso) Quem nasceu não foi logo menino. Foi bebé. No caso do Menino foi Bebé Jesus. O Gugu-dadá Jesus. Um embrulho gordinho com mãozinhas que apetecia enfiar numa panela e comer. Se calhar tinha bochechas trincadeiras e tudo. Por é que as pessoas se esquecem do Jesus que nasceu no dia de Natal? Fazem-no logo Menino quase em idade de Liceu, a discutir com os filósofos do templo. Mas Cristo não começou assim. Começou com fraldas e birras. Comeu banana esmigalhada com pêras. O Bledine da Palestina. Berrou e bolsou. Caiu do berço. Entornou os Cornflakes e as Milupas multifrutas com figos da altura. Causou preocupações. Provocou as mais enormes alegrias. Arrotou. Foi um amor. E ambas as coisas nas alturas menos indicadas. O facto de ter um nome pesado (Jesus Cristo soa um bocadinho pretencioso aos ouvidos modernos) não nos deve influenciar. Podia chamar-se Zé Manel. Isto é, Zé Manel Dodó. Cristucho. Fufurrinho. Coisa linda da sua Mãe. Gosto muito de bebés. O Natal devia ser a festa deles. Não ser humano (ou animal) que não tenha a sua graça em bebé. Já vi fotografias de Rasputine e Hitler quando eram embrulhos cor-de-rosa com pezitos de fora e apeteceu-me, em ambos os casos, no que diz respeito às bochechas deles, plantar-lhes uma boa beijoca. Confesso. A mão de Babuschka Estaline, caso a Mamã Estaline tivesse tido acesso a boas malhas, deve ter sido igualzinha à do bebé do anúncio da Benetton. No calor do momento, por puro impulso, mesmo sabendo que ele se havia de tornar num terrível ditador responsável pela chacina de milhões de camponeses inocentes, perfilhá-lo-ia. Podia-me arrepender depois, mas perfilhá-lo-ia. Antes de ser Josef havia de ser Zezinho. Anda cá ao Pai. O que é um milhão de camponeses ao pé de ti?

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As pessoas não percebem os bebés. (Os bebés também não percebem as pessoas, mas é bem feito.) Os bebés têm um valor próprio. Não sabem andar, não falam, não lêem, mas, há-de reparar-se, ó cambada de maduros e inteligentes, que ocupam as 24 horas do dia à mesma. Sobretudo, dormem e, quando já não é fisicamente possível dormir mais, exigem. O bebé é um snob sem complexos. Tem o egoísmo encantador de quem quer ver satisfeitos todos os seus desejos imediatamente, mesmo quando estes são indefiníveis. O bebé é um conde, seja ele filho de merceeiro ou de marquês. Se sente uma vaga apetência de um je-ne-sais-quoi qualquer, não hesita. Grita. Se de repente lhe surge, no meio do sono, a imagem de um puré de cenoura com uma roca do Roger Rabbit a boiar no meio da tigela, não hesita. Grita. Grita sempre. Está habituado. Quer lá saber! O bebé, por definição, queixa-se. E tem razão. Faz parte dos estatutos. Quem se queixa não se compraz. Uma pessoa, à medida que vai abandonando a bebezice, vai pactuando, vai fazendo compromissos, vai-se habituando à miséria, vai baixando as expectativas e acaba por tornar-se aceitadora, compreensiva e chata. Adulta. A pizza que se pediu sem anchovas veio coberta de anchovas? Não faz mal… o cozinheiro está cansado, o empregado anda com muito trabalho, o Mercado Único está à porta… enfim. Os pós-bebés, diga-se em abono da verdade, abandalham facilmente. Um bebé não perde tempo a inventar desculpas para os outros. Ele é duro. Simples. Cabrão. Não se compadece. Os adultos, aflitos, batem as pestanas à volta dos bebés, cismando o que terá o pobre petiz: “Por que rosna o moço?” Enfim, Benurons e soros e termómetros a trouxe-mouxe. Em vão. Coitados. Ignorantes. Valha-nos Deus. O petiz não dá abébias. Se não obtém rapidamente uma satisfação completa, chora. Funga. Rebenta. Exige uma satisfação. Não se pense que os bebés estão sempre a queixar-se. Não estão. Quando um bebé não se está a queixar, apraz-se. A imagem de um bebé satisfeito é inesquecível. Os crescidos, nos raros momentos em que se satisfazem, fazem uma grande fita. Os bebés arrepimpam-se. Este verbo não existe, mas é o que eles fazem. Aprazem-se. Arregalam-se. Por amor de Deus: arrechoncham-se. Não há nada como um bebé sonolento no pleno usufruto do seu conforto. Os bebés são exemplos. Arrepimpam-se como vice-reis da Índia e na disposição do pernil, no abrir e fechar da nariga e no modo como os dedos fufurram a fronha da almofada traduz-se a mais magnífica indiferença do mundo perante a vida. Quando chegam aos dois anos já estão um bocado estragados. Um bocado quarentões, admita-se. Têm consciência dos problemas. Têm dúvidas. Não sabem se. Não sabem como. Têm vergonha de. Têm pruridos com. Enfim. Dúvidas. Um bebé não tem dúvidas. É um primário. Comunica somente o essencial. É beckettiano. Têm uma dignidade intocável. Entre as coisas mais queridas dos bebés está aquela expressão trombuda, um bocadinho perplexa e desgostada perante a aproximação dum desconhecido, que diz: Mas, afinal, o que é que este gajo quer? E de facto… Os bebés são malcriados, preguiçosos e egoístas, e safam-se. É evidente. Não é justo, mas é evidente. Safam-se porque são lindos de morrer. Quando forem crescidos vão ter de escrever sonetos, passar exames, comprar flores, escolher vinhos, esforçar-se. Por enquanto não. Ninguém precisa de nós como um bebé. O amor é uma coisa pequena comparada com a verdadeira necessidade. É fácil amar quem precisa muito de nós. É fácil amar quem sente absolutamente a nossa falta.

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Não se julgue, porém, que o bebé “retribui” o amor. É demasiado jovem para amar. É um tontaço. Aquilo que ele fornece, fundamentalmente, é a necessidade. É a concessão do título “Pessoa Mais Importante do Mundo”. Subtítulo: “Misturador de biberons; Fofador de almofadas; Vestidor de fraldas secas”. Pois é: uma grande dependência parece-se muito com uma grande paixão. Um bebé é uma coisa absoluta. É bebé é uma coisa absoluta. É o amor em pessoa. É o amor em carne e osso. É o amor em pessoa. A minha maneira de celebrar o Natal é reles, mas deve ter um sentido. O Natal é o dia dos bebés. É o dia da vida deles. Imagino facilmente Jesus Bebé. Não me interessa perder tempo a pensar como e porquê. Todos os bebés vêm por um acaso. Todos os bebés aparecem sem a mínima explicação. Crescem dentro da gente com ideias malucas que não dão jeito. E depois tornam-se na nossa vida. Há qualquer coisa nos bebés, independente de onde vieram e independente de onde irão, que comove imenso. Os bebés não são como nós. Se calhar são os nobres selvagens de Rousseau. Posso não perceber porquê, nem saber explicar, mas sei que os bebés não são como nós. Não há nada a fazer. As coisas acontecem. Os dias nascem. No fundo, é óbvio. Os bebés são como Deus.

♣ NOITE DE PAZ (Nuno Markl)

26 O Pai Natal entrou em mais uma chaminé. Era incrível como, apesar de todos estes anos de trabalho e da nítida sensação de que estava a engordar de ano para ano – o que era manifestamente impossível, porque, pela ordem lógica das coisas, isso significaria que estaria, por esta altura, com a dimensão do planeta Júpiter –, o artista anteriormente conhecido como São Nicolau continuava a descer pelas chaminés com a destreza de um jovem esbelto e esguio. Era o trabalho do costume. Nada de novo. Excepto um pormenor, nesta sala em que acabara de cair: ao pé da árvore estava uma criança a tirar presentes de dentro de um saco e a arrumá-los debaixo do pinheiro. – Eu não acredito – disse o Pai Natal. – Desculpa, essa devia ser a minha deixa – replica o miúdo. – Ninguém com bom senso acredita. Em ti, é claro. O Pai Natal reconheceu imediatamente o pirralho: – Menino Jesus, o que fazes aqui? – O que faço aqui? – perguntou-se o Menino, com um ar trocista. – Deixa-me cá pensar o que faço aqui… talvez… o meu trabalho? – O teu trabalho? – disse o Pai Natal, atirando-se pesadamente para o sofá mais próximo. – Essa é boa. Desde quando? – Desculpa lá, velhadas. Esta festa é por causa de quem? Quem é que faz anos hoje? – Tudo bem – disse o Pai Natal –, os meus parabéns. Mas sejamos sinceros: não vejo o que é que uma coisa tem a ver a outra. Pergunta aos miúdos na rua quem é que lhes traz os presentes e vais ter uma dura surpresa, pequenitates.


– Os miúdos, hoje em dia, identificam-se com alguém como eles, barbas – disse o Menino Jesus, começando a andar, com o ar mais ameaçador que conseguia, em torno do sofá onde o Pai Natal se sentara. – Hoje em dia, se eles vêem um velho balofo atrás deles já não se sentam ao seu colo: fazem queixa aos pais e os pais fazem queixa à polícia. Reforma-te, homem. Deixa o trabalho para os mais novos e capazes. – Novos? – disse o Pai Natal. – Desculpa lá, mas de acordo com a última contagem tu tens 2010 anos. – Nunca tive muito jeitinho para a Matemática – disse o Menino. – O que eu sei é que tu és um velho gordo e eu sou um menino. O Pai Natal fez uma pausa. Estava claramente a fazer contas de cabeça. O Menino Jesus aproveitou o momento para colocar mais uns presentes debaixo da árvore. Finalmente, o Pai Natal falou: – Agora a sério: isto não faz o mínimo sentido, ó Jesus. – O quê: – resmungou o Menino Jesus. – Tu fazes hoje 2010 anos. Nasceste no ano zero. Eu nasci no ano três. Eu sou mais novo que tu. – Meu, a idade é uma questão de espírito. – Que raio de cremes é que tu usas? – disse o Pai Natal. – Cremes? Eu não preciso de cremes. Eu transformei água em vinho, lembras-te? E fiz aquela coisa com as carcaças. O que é que tu és capaz de fazer? – Bom, contrariando todas as regras da Física, eu consigo distribuir presentes no mundo inteiro em tempo recorde. E montado num trenó voador puxado por renas. – Sempre achei isso um bocado rebuscado – disse o Menino Jesus. – Trenós voadores puxados por renas? De onde é que te veio essa ideia? – Não sei. Acho que foi qualquer coisa que tomei em novo. Sabes como é que é, naquela de experimentar coisas novas. A conversa chegou, neste ponto, a um silêncio desconfortável. Secretamente, tanto o Pai Natal como o Menino Jesus estavam, pela primeira vez em muito tempo, a questionar a bizarria dos seus métodos. Depois de dois mil e tal anos de rotina, as duas criaturas do Natal paravam, finalmente, para pensar. Foi, por isso, com um misto de alívio e susto que ouviram uma terceira voz na sala, acompanhada por um aplauso solitário, seco e irónico. – Vocês são formidáveis – disse um homem em roupão, entrando na sala a bater palmas. – Quem é você? – disseram o Pai Natal e o Menino Jesus em coro. – Quem sou eu? Sou o único tipo que realmente existe nesta história toda do Natal! – disse o homem. – E, sinceramente, estou farto. Farto de gastar o meu dinheiro em prendas, para que depois um velho que anda num trenó voador e um Peter Pan de 2010 fiquem com a glória toda. Eu sou o pai do miúdo que vive nesta casa. O Pai Natal e o Menino Jesus engoliram em seco. – Quem é que se levanta todos os dias às seis da manhã para ir para o trabalho, para ter dinheiro para poder comprar estas coisas todas? São vocês? O Pai Natal e o Menino Jesus baixaram as cabeças, em silêncio. – Eu acho-vos uma piada! – continuou o homem da casa. – O velho só trabalha nesta altura do ano – rico emprego; o puto é uma divindade! O Filho de Deus! Nada como ter paizinhos bem colocados, é ou não é?

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O Pai Natal e o Menino Jesus continuaram em silêncio, cabisbaixos. Nenhum deles – nem o homem da casa – se apercebeu que acabara de chegar mais uma pessoa. Era uma criança. Um miúdo de seis anos estava parado, em pijama, à porta da sala, olhando para aquelas três figuras, alinhadas como os suspeitos nas esquadras. O homem da casa, o Pai Natal e o Menino Jesus olharam para o miúdo em silêncio. Os olhares não falavam; gritavam. Mais precisamente, gritavam: “Em mim! Em mim! Acredita em mim!”. O miúdo avançou na direcção dos três. Passou por eles e foi direitinho a um embrulho que se destacava dos restantes, debaixo da árvore. A criança rasgou o embrulho e pegou na caixa que lá estava dentro. Os olhos brilharam: – Uau! O Action-Man! – Agarrado à caixa, o miúdo saiu, a correr, da sala. O homem da casa, o Pai Natal e o Menino Jesus tiveram todos a nítida sensação de que, dentro da caixa, através da janela de plástico transparente, o estupor do Action-Man lhes piscou o olho. Foi o homem da casa quem quebrou o silêncio: – Alguém quer tomar alguma coisa?

♣ O EVANGELHO SEGUNDO JESUS CRISTO [excerto adaptado para leitura encenada] (José Saramago) [Maria está sentada e Jesus a ouvi-la]

28 Jesus – Desde quando começou meu pai a ter o sonho? Maria – Há muitos anos. Jesus – Quantos? Maria – Desde que nasceste, todas as noites o sonhou. Sim, creio que todas as noites. Nos últimos anos já não me fazia acordar. Uma pessoa acostuma-se… Jesus – Nasci em Belém da Judeia… Maria – Assim é. Jesus – Que foi que aconteceu no meu nascimento para que meu pai sonhasse que me ia matar? Maria – Não foi no teu nascimento. Jesus – Mas tu disseste… Maria – O sonho apareceu umas semanas depois. Jesus – O que se passou nessa altura? Maria – Herodes mandou matar os meninos de Belém com menos de três anos. Jesus – Porquê? Maria – Não sei. Jesus – O pai sabia? Maria – Não. Jesus – Mas a mim não me mataram. Maria – Vivíamos numa cova fora da aldeia. Jesus – Queres dizer que os soldados não me mataram porque não chegaram a ver-me? Maria – Sim…


Jesus – Meu pai era soldado? Maria – Nunca foi soldado. Jesus – Que fazia então? Maria – Trabalhava nas obras do Templo. Jesus – Não compreendo. Maria – Estou a responder às tuas perguntas. Jesus – Se os soldados não chegaram a ver-me, se vivíamos fora da aldeia, se o pai não era soldado, se não tinha responsabilidade, se nem sequer sabia por que motivo mandou Herodes matar os meninos… Maria – Sim. Teu pai não soube por que motivo Herodes mandou matar os meninos. Jesus – Então…? [Maria, sentada, vira as costas a Jesus] Maria – Então nada. Se não tens mais perguntas a fazer-me, eu não tenho mais respostas a dar-te. Jesus – Ocultas-me qualquer coisa… Maria – Ou és tu que não és capaz de ver. Jesus – O pai sabia que os meninos iam ser mortos. [Jesus levanta-se abruptamente e começa a andar de um lado para o outro de forma agitada e nervosa] Jesus – Como soube ele? Maria – Estava a trabalhar nas obras do Templo, em Jerusalém, quando ouviu uns soldados que falavam do que iam fazer. Jesus – E depois? Maria – Veio a correr para te salvar. Jesus – E depois? Maria – Mais nada. Os soldados fizeram o que lhes tinham mandado e foram-se embora. Jesus – E depois? Maria – Depois voltámos para Nazaré. E o sonho começou… A primeira vez foi na cova. [Jesus leva as mãos ao céu e grita] Jesus – O meu pai matou os meninos de Belém. [Maria ergue-se de repente, aproxima-se de Jesus, agarra-o e diz] Maria – Que loucura estás dizendo?! Mataram-nos os soldados de Herodes. Jesus – Não mulher! Matou-os meu pai. Matou-os José, filho de Heli, que, sabendo que os meninos iam ser mortos, não avisou os pais deles. [Maria vira as costas a Jesus e fica imóvel. Jesus cai prostrado e grita olhando para o céu] Jesus – Os inocentes, os inocentes… Jesus – Pai, meu Pai, porque me abandonaste?...

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IMAGINE (letra e música de John Lennon) Imagine there´s no heaven It’s easy if you try No hell below us Above us only sky Imagine all the people Living for today You may say i’m a dreamer But I’m not the only one I hope some day you’ll join us And the world will be as one Imagine there’s no countries It isn’t hard to do Nothing to kill or die for And no religion too Imagine all the people Living life in peace

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You may say i’m a dreamer But i’m not the only one I hope some day you’ll join us And the world will be as one Imagine no possessions I wonder if you can No need for greed or hunger A brotherhood of man Imagine all the people Sharing all the world You may say i’m a dreamer But i’m not the only one I hope some day you’ll join us And the world will be as one

♫♪


IMAGINEM [tradução]

Imaginem que não há paraíso É fácil se tentarem Imaginem que não há inferno debaixo de nós E acima de nós apenas o céu Imaginem toda a gente vivendo para o presente Imaginem que não há países Não é difícil fazê-lo Imaginem que não há nenhum motivo para matar ou morrer E nenhuma religião também Imaginem todas as pessoas vivendo a vida em paz Imaginem não haver posses Interrogo-me se conseguirão Um mundo sem necessidade de ganância ou raiva Uma fraternidade entre os homens 31 Imaginem toda a gente partilhando o mundo todo Podem dizer que sou um sonhador Mas eu não sou o único Espero que um dia se juntem a nós E o mundo será um só

♫♪ FAZER O QUE AINDA NÃO FOI FEITO (letra e música de Pedro Abrunhosa)

Sei que me vês Quando os teus olhos me ignoram Quando por dentro eu sei que choram Sabes de mim Eu sou aquele que se esconde


Sabe de ti sem saber onde Vamos fazer o que ainda não foi feito Trago-te em mim Mesmo que chova no verão Queres dizer sim, mas dizes não Vamos fazer o que ainda não foi feito E eu sou mais do que te invento Tu és um mundo com mundos por dentro E temos tanto p’ra contar Vem nesta noite Fomos tão longe a vida toda Somos um beijo que demora Porque amanhã é sempre tarde demais E eu sei que dói Sei como foi andares tão só por essa rua As vozes que te chamam e tu na tua Esse teu corpo é o teu porto, é o teu jeito Vamos fazer o que ainda não foi feito Sabes quem sou, para onde vou A vida é curva, não uma linha As portas que se fecham e eu na minha A tua sombra é o lugar onde me deito Vamos fazer o que ainda não foi feito E eu sou mais do que te invento Tu és um mundo com mundos por dentro E temos tanto p’ra contar Vem nesta noite Fomos tão longe a vida toda Somos um beijo que demora Porque amanhã é sempre tarde demais Tens uma estrada Tenho uma mão cheia de nada

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Somos um todo imperfeito Tu és inteira e eu desfeito Vamos fazer o que ainda não foi feito E eu sou mais do que te invento Tu és um mundo com mundos por dentro E temos tanto p’ra contar Vem nesta noite Fomos tão longe a vida toda Somos um beijo que demora Porque amanhã é sempre tarde demais Porque amanhã é sempre tarde demais Porque amanhã é sempre tarde demais Porque amanhã é sempre tarde demais Porque amanhã é sempre tarde demais

♫♪ MENINO DEUS (letra e música de Caetano Veloso)

Menino Deus, um corpo azul-dourado Um porto alegre é bem mais que um seguro Na rota das nossas viagens no escuro Menino Deus, quando tua luz se acenda A minha voz comporá tua lenda E por um momento haverá mais futuro do que jamais houve Mas ouve a nossa harmonia A electricidade ligada no dia Em que brilharias por sobre a cidade Menino Deus, quando a flor do teu sexo Abrir as pétalas para o universo E então, por um lapso, se encontrar no anexo Ligando os breus, dando sentido aos mundos

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E aos corações sentimentos profundos de terna alegria no dia Do menino Deus Do menino Deus Do menino Deus No dia do menino Deus

♫♪ NATAL DOS SIMPLES (letra tradicional e música de José Afonso) Vamos cantar as janeiras Vamos cantar as janeiras Por esses quintais adentro vamos Às raparigas solteiras Vamos cantar orvalhadas Vamos cantar orvalhadas Por esses quintais adentro vamos Às raparigas casadas

34 Vira o vento e muda a sorte Vira o vento e muda a sorte Por aqueles olivais perdidos Foi-se embora o vento norte Muita neve cai na serra Muita neve cai na serra Só se lembra dos caminhos velhos Quem tem saudades da terra Quem tem a candeia acesa Quem tem a candeia acesa Rabanadas pão e vinho novo Matava a fome à pobreza Já nos cansa esta lonjura Já nos cansa esta lonjura Só se lembra dos caminhos velhos Quem anda à noite à ventura

♫♪


PEDRA FILOSOFAL (letra de António Gedeão e música de Manuel Freire)

Eles não sabem que o sonho é uma constante da vida tão concreta e definida como outra coisa qualquer, como esta pedra cinzenta em que me sento e descanso, como este ribeiro manso em serenos sobressaltos, como estes pinheiros altos que em verde e oiro se agitam, como estas aves que gritam em bebedeiras de azul.

pára-raios, locomotiva, barco de proa festiva, alto-forno, geradora, cisão do átomo, radar, ultra-som, televisão, desembarque em foguetão na superfície lunar. Eles não sabem, nem sonham, que o sonho comanda a vida, que sempre que um homem sonha o mundo pula e avança como bola colorida entre as mãos de uma criança.

Eles não sabem que o sonho é vinho, é espuma, é fermento, bichinho álacre e sedento, de focinho pontiagudo, que fossa através de tudo num perpétuo movimento.

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Eles não sabem que o sonho é tela, é cor, é pincel, base, fuste, capitel, arco em ogiva, vitral, pináculo de catedral, contraponto, sinfonia, máscara grega, magia, que é retorta de alquimista, mapa do mundo distante, rosa-dos-ventos, Infante, caravela quinhentista, que é cabo da Boa Esperança, ouro, canela, marfim, florete de espadachim, bastidor, passo de dança, Colombina e Arlequim, passarola voadora,

♫♪


CARTA AO PAI NATAL (letra e música de Boss AC) Olá Pai Natal É a primeira vez que escrevo para ti Venho de Lisboa e o pessoal chama-me AC Desculpa o atrevimento mas tenho alguns pedidos Espero que não fiquem nalguma prateleira esquecidos Como nunca te pedi nada Peço tudo duma vez e fica a conversa despachada Talvez aches os pedidos meio extravagantes Queria que pusesses juízo na cabeça destes governantes Tira-lhes as armas e a vontade da guerra É que se não acabamos a pedir-te uma nova Terra Ao sem-abrigo indigente dá-lhe uma vida decente E arranja-lhe trabalho em vez de mais uma sopa quente E ao pobre coitado, e ao desempregado Arranja-lhe um emprego em que ele não se sinta explorado E ao soldado, manda-o de volta para junto da mulher Acredita que é isso que ele quer Vai ver África de perto, não vejas pelos jornais Dá de comer às crianças, ergue escolas e hospitais Cura as doenças e distribui vacinas Dá carrinhos aos meninos e bonecas às meninas E dá-lhes paz e alegria Ao idoso sozinho em casa arranja-lhe boa companhia Já sei que só ofereces aos meninos bem comportados Mas alguns portam-se mal e dás condomínios fechados Jactos privados, carros topo de gama importados Grandes ordenados, apagas pecados a culpados Desculpa o pouco entusiasmo, não me leves a mal Não percebo como é que isto se tornou um feriado comercial Parece que é desculpa para um ano de costas voltadas E a única coisa que interessa é se as prendas tão compradas

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E quando passa o Natal, dás à sola? Há quem diga que tu não existes, quem te inventou foi a Coca-Cola Não te preocupes que eu não digo a ninguém Se és Pai Natal, é porque és pai de alguém Para mim Natal é a qualquer hora, basta querer Gosto de dar e não preciso de pretextos para oferecer E já agora para acabar, sem querer abusar Dá-nos Paz e Amor e nem é preciso embrulhar Muita Felicidade, saúde acima de tudo Se puderes dá-nos boas notas com pouco estudo Desculpa o incómodo e continua com as tuas prendas Feliz Natal para ti e já agora baixa as rendas

♫♪ A GENTE VAI CONTINUAR (letra e música de Jorge Palma)

37 Tira a mão do queixo não penses mais nisso O que lá vai já deu o que tinha a dar Quem ganhou ganhou e usou-se disso Quem perdeu há-de ter mais cartas p’ra dar E enquanto alguns fazem figura Outros sucumbem á batota Chega a onde tu quiseres Mas goza bem a tua rota Enquanto houver estrada p’ra andar A gente vai continuar Enquanto houver estrada p’ra andar Enquanto houver ventos e mar A gente não vai parar Enquanto houver ventos e mar Todos nós pagamos por tudo o que usamos O sistema é antigo e não poupa ninguém Somos todos escravos do que precisamos Reduz as necessidades se queres passar bem


Que a dependência é uma besta Que dá cabo do desejo E a liberdade é uma maluca Que sabe quanto vale um beijo Enquanto houver estrada p’ra andar A gente vai continuar Enquanto houver estrada p’ra andar Enquanto houver ventos e mar A gente não vai parar Enquanto houver ventos e mar

♫♪ LAST CHRISTMAS (HAPPY CHRISTMAS) (letra e música dos Wham) Last Christmas i gave you my heart, But the very next day, You gave it away, (you gave it away) This year, to save me from tears, I’ll give it to someone special, (special) Once bitten and twice shy, I keep my distance but you still catch my eye, Tell me baby, do you recognize me, Well, it’s been a year, it doesn't surprise me. Happy Christmas, I wrapped it up and sent it, With a note saying “I love you”, I meant it, Now i know what a fool i’ve been, But if you kiss me now, I’ll know you’ve fool me again. Last Christmas i gave you my heart, But the very next day, You gave it away (you gave it away), This year to save me from tears, I’ll give it to someone special (special). Oh, Oh Baby.

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A crowded room, friends with tired eyes, I’m hiding from you and your soul of ice, My God i thought you were, Someone to rely on, Me, i guess i was a shoulder to cry on. A face on a lover with a fire in his heart, A man undercover but you tore me apart, Oooh Ooh, Now i’ve found a real love, You’ll never fool me again. Last Christmas I gave you my heart, But the very next day, You gave it away (you gave it away), This year to save me from tears, I’ll give it to someone special (special). Face on a lover with a fire in his heart, A man undercover but you tore him apart. Maybe next year…

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I’ll give it to someone, I’ll give it to someone special.

♫♪

E que seja “Natal, e não Dezembro”...


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