E book abre a pestana com um poema por semana 2015 2016 vf

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ÍNDICE

INTRODUÇÃO ..................................................................................................................................................................... 5 POEMAS LIDOS NO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE MACEDO DE CAVALEIROS …………………………………………… 6 PRÉ-ESCOLAR E 1.º CICLO (1.º E 2.º ANOS) .................................................................................................................... 7 1.º CICLO (3.º E 4.º ANOS), EB1 DE CHACIM E MORAIS .............................................................................................33 2.º CICLO ..........................................................................................................................................................................57 3º CICLO………………………………………………………………………………………………………………….86 ENSINO SECUNDÁRIO……………………………………………………………………………………………………………………………….. 115 CONCLUSÃO …………………………………………………………………………………………………………………………………………..... 144


INTRODUÇÃO

Ao longo do ano letivo de 2015/2016, semanalmente, deu-se continuidade à atividade “Abre a pestana com um poema por semana”, integrada no projeto

aLeR+, em que toda a

comunidade escolar está integrada. Com ela pretendeu-se fomentar o gosto pela leitura, dar a conhecer poetas nacionais e, esporadicamente, estrangeiros, bem como facilitar o contacto dos alunos com a expressão lírica e motivá-los para a sua interpretação e procura de outros poemas do autor. Aos alunos pediu-se que acolhessem o poema com os cinco sentidos apurados, que sentissem a melodia daquele modo literário e que atentassem na combinação harmoniosa e inopinada das palavras. A poesia embala-nos com a sua musicalidade, dela ressaltando a cadência melódica que das duas artes deflui. A leitura do poema constituía, a priori, o cerne da atividade, contudo, os docentes que assim o desejassem podiam dela partir para o desenvolvimento de outras atividades, como jogos de associação de ideias, construção de campos lexicais ou semânticos, exercícios de expressão artística, como a ilustração, expressão de pontos de vista sobre o tema ou assunto apresentados na composição poética. Ao longo de quase quatro anos, a atividade tem permitido aos alunos ouvir ler expressivamente poemas de autores de língua portuguesa como: Arlindo Miranda, Isabel Lamas, Sidónio Muralha, Violeta Figueiredo, Fernando Cardoso, Regina Gouveia, Luísa Ducla Soares, Albano Martins, Alexandre Parafita, Ana Cristina Correia, Armindo Reis, Marques Portugal, Ana Pinto, Matilde Rosa Araújo, Alice Vieira, Luís Infante, Alexandre O’Neill, António Gedeão, Teresa Muge, Anthero Monteiro; António Ramos Rosa, Irene Gil, Luísa Lamela, Isabel Mendonça, Lourdes Custódio, Maria Alberta Menéres, Carlos Drummond de Andrade, Eugénio de Andrade, Fernando Pessoa, Florbela Espanca, José Jorge Letria, José Régio, Manuel Alegre, Maria do Rosário Pedreira, Miguel Torga, Sophia de Mello Breyner Andresen, Maria Isabel Anjo, Manuel António Pina, António Mota, Miguel Torga, Rosa Lobato Faria, José Saramago, David MourãoFerreira, Amândio Vilares, André Hönk, Sebastião da Gama, José Trigo, Manuel da Fonseca, José Francisco Lopes, Angelino Pereira, José Carlos Ary dos Santos, Mia Couto, João de Deus, Manuel da Fonseca, Mário de Sá-Carneiro, António Manuel Cabral, Vitorino Nemésio, Virgínia do Carmo, alargando, deste modo, os seus conhecimentos, no tocante a poetas portugueses e à sua produção literária. Estas leituras têm servido os mais diversos fins: a criação de ilustrações, a exploração de temáticas relacionadas, ponto de partida para outros assuntos, material para desenvolvimento de aulas.


POEMAS LIDOS NO AGRUPAMENTO DE ESCOLAS DE MACEDO DE CAVALEIROS


PRร -ESCOLAR E 1.ยบ CICLO (1.ยบ E 2.ยบ ANOS)


A PRIMAVERA A Primavera chegou e do alto bradou: - Ervinhas do prado, são horas! É dia!… E nos campos brotaram rebentos…flores, papoilas garridas, de fantásticas cores…

E o grilo fadista, que gosta da farra, Não se fez esperar. Puxou da guitarra, chamou a cigarra e vai de cantar…

E a andorinha alegre, elegante e formosa, de novo, voltou… e o seu ninho forrou, com fios de lã; com muito carinho, com grande afã!... E tudo acordou Naquela manhã…

Miranda, Arlindo (2004). A Primavera, in Novo Retintim, Língua Portuguesa, 3ºano Ensino Básico de C. Figueiredo Lopes. Porto: Porto Editora, p. 87.


CHEGOU UM BEBÉ

Estou muito contente Sabem por que é? A minha mamã Teve hoje um bebé Porque sou crescida Já posso ajudar Mudo-lhe as fraldinhas Ajudo-a a lavar Meto-lhe a chupeta Trato-o muito bem Mas para dar maminha Tem de ser a mãe Pego nele ao colo Faço uma festinha É bom ter irmão Já não estou sozinha!

Lamas, Isabel (2004). Chegou um Bebé, in Língua Portuguesa, 2º ano de António Monteiro. Porto: Porto Editora, p.44.


PATO MARRECO Certa manhã foi engolido pelo pato marreco o meu boneco que dizia papá…mamã…

Que arrelia! Era tão pequenino o meu boneco que foi engolido pelo meu pato marreco…

E no dia seguinte, de manhã, o mafarrico pato marreco mal abria o bico dizia: Papá…Mamã… porque tinha no bucho o meu boneco.

Muralha, Sidónio (2006). Pato Marreco, in As leituras do João-4º ano de João Monteiro Miguel Paiva. Vila Nova de Gaia: Edições Gailivro, p.118.


O QUE FAZ A MINHOCA

Sem esforço e sem guerra, minhoca de anéis suaves faz na terra o que no céu fazem as aves: abre espirais incompletas para todo o sempre secretas.

Figueiredo, Violeta (2014). Fala bicho. Porto: Porto Editora, p. 8.


O PALHAÇO O faz-tudo tudo faz Muitos gestos e caretas. Ele no circo é um ás, Toca ferrinhos e trombetas.

Pinta a boca e o nariz, Pinta os olhos a correr. Faz-nos crer que é feliz, Faz-se parvo sem o ser.

Faz loucuras, brincadeiras, Veste roupa extravagante, Usa largas cabeleiras E sapatos de gigante.

Faz piruetas no ar, Cambalhotas com laracha, Que fazem até pensar Se o palhaço é de borracha

Fernando Cardoso

Cardoso, Fernando (2004). António Monteiro, in Língua Portuguesa 2ºano. Porto: Porto Editora, p. 38.


PINTAINHO O meu pintainho, amarelo, tão fofinho, parece mesmo um novelinho. Pu-lo sobre a minha mão e ele debicou-me um dedo. Fome, sede, frio ou medo? Ou será que era um carinho? Diz-me lá, ó pintainho. Vou pôr-te junto da mãe Pois é lá que tu estás bem. Saíste do seu ovinho…

Gouveia, Regina (2014). Ciência para meninos em poemas pequeninos. Lisboa: Porto Editora, p.25.


AMIGO Mal nos conhecemos Inaugurámos a palavra «amigo»

«Amigo» é um sorriso De boca em boca, Um olhar bem limpo, Uma casa, mesmo modesta, que oferece, Um coração pronto a pulsar Na nossa mão! ………………………………… «Amigo» é o contrário de inimigo!

Amigo é o erro corrigido, Não o erro perseguido, explorado, É a verdade partilhada, praticada. «Amigo» é a solidão derrotada!

«Amigo» é uma grande tarefa, Um trabalho sem fim, Um espaço útil, um tempo fértil, «amigo» vai ser, é já uma grande festa!

O’Neil, Alexandre (s.d.). Poesia Portuguesa para crianças Antologia. Sintra: Girassol, Abrunheira,p.162.


A LUA…

A Lua, nas suas voltas, Namorica com o gato; Pisca o olho ao vitelinho, Atira beijos ao rato.

E o Rei-Sol ciumento, Ao entrar na minha rua; Pergunta sempre baixinho: -Já passou a dona Lua?

Miranda, Arlindo (2000). A Lua, in Novo Retintim-Língua Portuguesa 3ºano de C. Figueiredo Lopes. Porto: Porto Editora, p. 43.


O TEMPO Pelas areias da praia O tempo fui procurar. Mas onde moras, ó tempo, Que não te consigo achar?

Pelos verdes da floresta O tempo fui procurar. Mas onde moras, ó tempo, Que não te consigo achar?

Pelas pedrinhas da rua O tempo fui procurar. Mas onde moras, ó tempo, Que não te consigo achar?

Tiquetaque, o coração É um relógio a bater. O tempo que não achei Já me fez envelhecer.

Soares, L. Ducla (2008). A Cavalo no Tempo. Porto: Civilização Editora,p.32.


CHOVE CHUVA

Chove chuva chuva chove. Chove chuva chove cá. Já choveu uma chuvada numa chávena de chá.

Mota, António (2004). Chove Chuva, in As Leituras do João, 2ºano de João Monteiro e Miguel Paiva. Vila Nova de Gaia: Gailivro, p. 75.


LIVRO Livro um amigo para falar comigo um navio para viajar um jardim para brincar uma escola para levar debaixo do braço.

Livro um abraço para além do tempo e do espaço.

Soares, L. Ducla (2005). Poemas da Mentira e da Verdade. Lisboa: Livros Horizonte, p.33.


ARCO-ÍRIS

Era uma vez um dia de abril, um dia de chuva, com o sol a espreitar e no céu, a brilhar, um arco de cores.

Uma era Vermelha, outra Alaranjada, uma era Amarela, uma outra Verde, uma era Azulada, outra era Anil, uma Violeta, cor arroxeada…

Que arco tão lindo brilhava no céu! O nome arco-íris não sei quem lho deu.

Gouveia, Regina (2014. Ciência para meninos em poemas pequeninos. Lisboa: Porto Editora, p.32.


A ABELHA

Uma abelha enganou-se e julgou que era doce uma flor vermelha feita de papel.

E depois, afinal, - mas que coisa feia!em vez de ter mel saiu um jornal da sua colmeia.

Muralha, Sidรณnio (2014). O rouxinol e a sua namorada. Porto: Porto Editora, p.22.


OUTONO O Verão deixa, como herança, ao Outono um leque de folhas secas.

Pelos corredores Do Outono passam As folhas, nuas.

Martins, Albano (s.d). Poesia Portuguesa para crianças Antologia. Sintra: Girassol Edições, p.137.


O DUENDE Estava doente O duende: Já não se ria com a gente!

«Como se sente, Senhor duende?»

«Tenho um dente Doendo, doendo, doendo!...»

«Doendo, doendo, doendo, Senhor duende?»

«Doendo, doendo – que raio! – doendo!»

Oh! Pobre duende, Que já não ri com a gente!...

Oxalá não fique demente Por causa dum dente!

Parafita, Alexandre (2007). Histórias a rimar para ler e brincar. Alfragide: Texto Editores, p.23.


INVERNO O Inverno bateu à porta Trouxe com ele chuva e frio As nuvens também vieram A água subiu no rio.

Os meninos brincam em casa Já vestem roupas de lã Calçam galochas e luvas Quando saem de manhã.

A mãe arranja o casaco O gorro e a camisola. Mesmo com o tempo frio Também é giro ir á escola.

Ana Cristina Correia

Correia, A. Cristina (s.d.). Inverno, in Língua Portuguesa-2º ano de Monteiro, António (2004). Porto: Livraria Arnaldo, p.49.


O GALO E A GALINHA

Logo que a noite comece a galinha adormece e o galo fica acordado, ao lado da galinha, ao lado. E depois, devagarinho, Dorme sempre um bocadinho. Mas cedo o galo desperta E dรก um alerta ao mundo E tudo, tudo estremece, Mas a galinha sรณ esquece E dorme um sono profundo.

Entre este dormir e acordar, Entre o que vem e o que vinha, Sempre existe o verbo amar Entre o galo e a galinha.

Muralha, Sidรณnio (2014). O rouxinol e a sua namorada. Porto: Porto Editora, p. 15.


AMIGO, AMIGÃO!

No nosso coração Há um balão. Um amigo sopra, sopra E ele depressa fica cheio!

É aquele para quem nós corremos Quando guardamos alguma alegria. E essa alegria cresce ainda mais…

O amigo é aquele que vê quando Nós estamos tristes, Caídos no chão e ele, como se fosse Um balão cheio de gás Nos puxa e nos faz elevar pelo ar!

Reis, Armindo (2006). Amigo, Amigão!, in As leituras do João de João Monteiro Miguel Paiva. Vila Nova de Gaia: Gailivro, p.104.


PAI

Preciso dos teus carinhos E amparo, dia a dia, De mim mereces beijinhos, Muito amor e alegria. É tão bom ver-te sorrir Para esqueceres o cansaço! Abraçar-te muito e subir, À noitinha, a teu regaço.

Portugal, Marques (2006). Pai, in As Leituras do João 4º ano de João Monteiro e Miguel Paiva. Vila Nova de Gaia: Edições Gailivro,p.98.


PRIMAVERA Com duas folhas de figueira faço um par de sapatinhos, dobro a folha sobre o pé e prendo-a com uns pauzinhos.

Ponho um lenço na cabeça, visto um vestido qualquer, ponho uns brincos de cereja, um colar de malmequer, uma pulseira de giesta, e já estou pronto para a festa.

Gouveia, Regina (2014). Ciência para meninos em poemas pequeninos. Lisboa: Porto Editora, p. 20.


COELHA

Eu sou a coelha E tenho um marido Que se chama coelho, - sempre foi assimE gosta de mim, De mim, De mim.

Galgรกmos os dois Todos os caminhos, -sรณ que eu nรฃo entendo, No meu modo de ver, Porque ele quer ter Mais coelhinhos, mais coelhinhos, Mais coelhinhos.

Muralha, Sidรณnio (2014). O rouxinol e a sua namorada. Porto: Porto Editora, p.12.


ANDORINHA

Eu sou a andorinha Que está sempre à espera Que chegue a barquinha Da primavera.

Amigos, tenho e vou ter, E também tenho a certeza Que vão defender A Natureza.

A natureza querida é preciso defendê-la. Ela é toda a nossa vida, - andorinha, mulher, estrela.

Muralha, Sidónio (2014). O rouxinol e a sua namorada. Porto: Porto Editora, p.21.


O GATO

Um gato entrou na escola devagarinho e roubou a sacola de um aluno. Fez do aluno gato-sapato, É um gato gatinho Gatuno.

Muralha, SidĂłnio (2014). O rouxinol e a sua namorada. Porto: Porto Editora, p.17.


JOANINHA VOA, VOA… A joaninha que voa, que voa, foi para Lisboa. Chegou e ficou muito atrapalhada. Estava habituada a muita calmaria e ali na cidade tal não existia.

Quis voltar à serra, lá na sua terra, mas antes quis ver a praia e o mar. Ficou fascinada e já não sabia o que preferia, se voltar à terra no alto da serra, coberta de neve em plena invernia, ou ali ficar à beira do mar, para ver as ondas a ir e voltar.

Gouveia, Regina (2014). Ciência para meninos em poemas pequeninos. Lisboa: Porto Editora, p. 23.


O VERÃO CHEIRA BEM

O Verão cheira bem A trevo e a feno Se vamos ao campo Num dia sereno. Se vamos à praia Cheira a mar e a sal. E às vezes também Há cheiro a pinhal. Ouvem-se as cigarras Vêem-se as papoilas Tão lindas, vermelhas. Apanho uma rã Saltou-me da mão. Tanta coisa que há Para ver no Verão.

Mendonça, Isabel (2004). O Verão cheira bem, in As Leituras do João 2ºano de João Monteiro e Miguel Paiva. Vila Nova de Gaia: Gailivro, p. 131.


1.º CICLO – EBSMC (3.º E 4.º ANOS), EB1 DE CHACIM E MORAIS


POEMA ÀS MASSAS Amassa a massa o padeiro, vende massa o merceeiro, usa massa o vidraceiro e também o cozinheiro. Na Avenida do Rossio passam massas populares, as canções que as massas cantam vão voando pelos ares. Ó ladrão, senhor ladrão, responda, mas não se zangue, a mania de roubar está-lhe na massa do sangue? Perdi todo o meu dinheiro, fui pedir massa emprestada, mas a massa que me deram, vejam – foi massa folhada! Uma massa, outra massa… com tanta pressa amassada, digam lá se este poema não é mesmo uma maçada!

Soares, L. Ducla (2005). Poemas da Mentira e da Verdade. Lisboa: Livros Horizonte, p. 18.


OS LIVROS Apetece chamar-lhes irmãos, tê-los ao colo, afagá-los com as mãos, abri-los de par em par, ver o Pinóquio a rir e o D. Quixote a sonhar, e a Alice do outro lado do espelho a inventar um mundo de assombros que dá gosto visitar. Apetece chamar-lhes irmãos e deixar brilhar os olhos nas páginas das suas mãos.

Letria, José Jorge (1997). Pela casa fora. Lisboa: Livros Horizonte, p.9.


FOLHAS DE OUTONO

Tantas folhas, tantas! De tanto feitio! De tanto tamanho! Umas amarelas Outras encarnadas Ou em tom castanho! Umas têm recortes… Há outras que não… Com cola e pincel Colo-as num papel Façam como eu, E vocês verão Que bonita fica Esta coleção!

Pinto, Ana (2004) Ana . Folhas de Outono, in Eu e o Bambi, Língua Portuguesa 2º ano de Maria Aurélia Carneiro. Porto: Porto Editora, p.27.


LOAS À CHUVA E AO VENTO Chuva, porque cais? Vento, aonde vais? Pingue … Pingue … Pingue … Vu … Vu … Vu … Chuva, porque cais? Vento, aonde vais? Pingue … Pingue … Pingue … Vu … Vu … Vu … Ó vento que vais, Vai devagarinho. Ó chuva que cais, Mas cai de mansinho. Pingue … Pingue … Vu … Vu … Muito de mansinho Em meu coração. Já não tenho lenha, Nem tenho carvão … Pingue … Pingue … Vu … Vu … Que canto tão frio, Que canto tão terno, O canto da água, O canto de Inverno … Pingue … Que triste lamento, Embora tão terno, O canto do vento, O canto de Inverno … Vu … E os pássaros cantam E as nuvens levantam! Araújo, M. Rosa (2010). O livro da Tila. Alfragide: Editorial Caminho, p. 30/31.


O LIVRO Quem vê capas não vê corações, que os livros, lá por dentro, guardam as suas razões, as letras bem arrumadas, os sonhos, as ilusões, as histórias que passaram por muitas gerações, e também as memórias, os versos e as orações, os ecos que ficaram da cadência dos sermões e as lendas e os mitos que animaram os serões. Não é que eu seja vaidoso, mas quando falo de mim sinto que sou um mundo e uma espécie de jardim onde o prazer da leitura nunca gosta de ter fim.

Letria, José Jorge (2008). A Fala das Coisas. Porto: Ambar, p.13.


A ESCOVA DE DENTES Escova aqui, limpa acolá minha escovinha apressada com a pasta bem espalhada a saber a framboesa. Limpa incisivos, caninos, molares, dentes de leite, e não há outra escovinha que assim tão bem se ajeite. Faz lembrar o meu cabelo ou o penacho do Tim-Tim. E verdade verdadinha eu nunca vi escova assim.

Letria, José Jorge (1997). Pela casa fora. Lisboa: Livros Horizonte, p.16.


CANTIGA DA MÃE Olha as horas! Sai da cama! Não demores a acordar! Lava os dentes muito bem. - Mas...ó mãe!... Não inventes mais desculpas p'ra atrasar! Passa o pente na cabeça! Bebe o leite mais depressa! E não te esqueças também... - Mas...ó mãe!... ...de levar a papelada assinada que a professora mandou. Vai lá buscar a mochila e vê se, por esta vez, estão prontos os TPC! E fecha bem... - Mas...ó mãe!... ...a torneira da banheira! Olha o pingo... - Mas ó mãe!... Mas ó mãe!... Hoje é domingo! Alice Vieira Acedido em 06/10/2015. https://www.facebook.com/BibliotecaEscolarDAntonioFerreiraGomes/posts


A BORRACHA

Deram-me como função, como razão de existir esta sina apagadora, que permite, sem demora, apagar e corrigir. Que bom havia de ser se o mundo fosse assim. A cada erro humano a borracha punha um fim, sendo precisa e certeira como um golpe de espadachim; se tal fosse possível, se as coisas fossem assim, talvez se apagasse da Terra a negra palavra guerra, pondo-se no seu lugar as rosas brancas de um jardim.

Letria, José Jorge (2008). A Fala das Coisas. Porto: Ambar, p.27.


A PAZ É uma pomba que voa É um casal de namorados São os pardais de Lisboa que fazem ninho nos telhados E é o riacho de mansinho que saltita nas pedras morenas e toda a calma do caminho com árvores altas e serenas A paz é o livro que ensina.

Muralha, Sidónio (1994). A Paz, in No Jardim da Comunicação Língua Portuguesa 4º ano de Maria Teresa Cabral Freire. Porto: Porto Editora, p.8.


A PRESSA DO TEMPO Guardei o tempo num saco feito de linho e cetim para ele, que é apressado, passar sem pressa por mim. Pendurei-o num ponteiro de um relógio de parede onde morava um cuco que estava cheio de sede. E disse-me o tempo assim: “Não é por me prenderes que corres mais do que eu, aquele que há-de ganhar-me ainda não nasceu”.

Infante, Luís (2004). Poemas pequeninos para meninas e meninos. Vila Nova de Gaia: Gailivro, p. 58.


VITAMINAS Foram dizer à maçã que a laranja e a tangerina diziam que ela e a pera já não tinham vitaminas. A maçã ouvindo aquilo foi queixar-se ao ananás ficaram muito zangados por elas serem tão más. A ameixa e a uva muito amigas do melão foram chamar o morango p’ra resolver a questão. O morango disse logo: para comparar tais saladas a banana e a cereja já estão mais habituadas. Arranjaram tal sarilho e tal salada de fruta que a toranja deu um berro: - Acabem com essa luta! Para quê tanto barulho? Para quê tal confusão? Vitaminas temos todos. Acabou-se a discussão.

Muge, Teresa (2006). Vitaminas, in Língua Portuguesa 4ºano de António Monteiro. Coimbra: Livraria Arnado, p.20.


O ESQUILO E O COELHO O esquilo diz ao coelho a quem faz muitas partidas: - Você já se viu ao espelho? Mas que orelhas tão compridas!

Amanhã, vindo da escola, eu trago-lhe uma cartola.

- Meu caro, muito obrigado, responde o outro, eu não digo, pois sou coelho educado, o que penso do amigo... Mas se dissesse, diria: "Um rabo assim enrolado é francamente mania!"

Eu vou gastar dez tostões para lhe dar uns calções.

Pôs-se o coelho a pular, riu o esquilo às gargalhadas e lá foram passear como dois bons camaradas.

Muralha, Sidónio (1992). O Esquilo e o Coelho, in Ali Baba Língua Portuguesa, 2º ano de Conceição Pinto e Orízia Alhinho. Porto: Areal Editores, p. 62.


A ANA QUER

A Ana quer nunca ter saído da barriga da mãe. Cá fora está-se bem, mas na barriga também era divertido.

O coração ali à mão, os pulmões ali ao pé, ver como a mãe é do lado que não se vê.

O que a Ana mais quer ser quando for grande e crescer é ser outra vez pequena: não ter nada que fazer senão ser pequena e crescer e de vez em quando nascer e voltar a desnascer.

Pina, Manuel António (2012). O Pássaro da Cabeça. Porto: Assírio& Alvim, p.9.


A UMA ÁRVORE AMIGA

De muito pequenina te conheço. Lembras-te de brincarmos ao crescer? Tu me ganhavas sempre, que mais baixa fiquei eu sempre sendo, de assim ser.

De muito amedrontada te conheço. Lembras-te das geadas e dos frios? Eu te ganhava sempre que fugindo em casa aconchegava os arrepios.

De muito pequenina te conheço. E se algum dia me esquecer de ti, é de mim que me esqueço.

Maria Alberta Menéres

Acedido em 24/02/2016 de http.//becreruyandrade.blogspot.pt/2011/03/uma-arvore-amiga.html


CANTIGA DOS REIS

Santos reis, santos coroados Vinde ver quem vos coroou Foi a Virgem, mãe sagrada, Quando por aqui passou.

O caminho era torto Uma estrela vos guiou Em cima de uma cabana Essa estrela se pousou.

A cabana era pequena Não cabiam todos três; Adoraram Deus - Menino Cada um por sua vez.

Cantiga popular de Barcelos

Acedido em 04/01/2016 de http://quintadocesario.blogspot.pt/2010/11/cantiga-dos-reis.html


CASTANHAS ASSADAS Castanha assada E agua pé Para a merenda Ai que bom que é. Castanha assada Quentinha na mão Quente na boca Quente no coração. Castanhas assadas Quentes a estalar Venham, meus senhores Quem mas quer comprar? Castanhas assadas Gostosas e quentinhas Comprem meus senhores Estas castanhinhas. Castanhas assadas Que boas que são Eu até comia Castanhas no Verão. A aparência engana E eu creio nisso Quem adivinhava O que escondia o ouriço.

Lamela, Luísa (2006). Castanhas Assadas, in Crescer 4, Língua Portuguesa de Ana Maria Rodrigues. Lisboa: Editora Educação Nacional, p.38.


O RIO Saindo da rocha dura, Escondida na vertente, Cantei – fio de água pura E fui nascente. P’ra cumprir seu destino Outros mais se me juntaram E a nascente, pequenina, Em ribeiro transformaram. Mais tarde, em mim desaguaram Os meus irmãos afluentes Que engrossando nas enchentes, As margens fertilizaram. E assim unidos, lá vamos Neste eterno caminhar… Já não sou fio de nascente Nem ribeiro ou afluente. Sou rio E sigo, calmo e contente, O meu caminho para o mar.

Gil, Irene (2006). O Rio, in Língua Portuguesa 4º ano de António Monteiro. Coimbra: Livraria Arnado, p.54.


A CAMINHADA Nessa mata ninguém mata a pata que vive ali, com duas patas de pata, pata acolá, pata aqui.

Pata que gosta de matas visita as matas vizinhas, com as suas duas patas seguidas de dez patinhas.

E cada patinha tem, como a pata lá da mata, duas patinhas também que são patinhas de pata.

Sidónio Muralha

Acedido em 04-04-216 de http://www.estudioraposa.com/index.php/17/01/2012/sidonio-muralha-boa noite/


ROSA A rosa! Benvinda seja! Há quem diga que é vaidosa, altaneira e orgulhosa, mas eu acho que é inveja. Porque a rosa é deslumbrante, muito altiva e elegante. Tem espinhos, é bem verdade - não há bela sem senão… Mas é tão fresca e formosa, que receber uma rosa faz-nos bem ao coração!

Faria, R. Lobato (2002). ABC das flores e dos frutos. Porto: Edições Asa, p.34.


CÃO Quem não gosta de um cãozinho dum cachorro, dum béu-béu? Eu quero um pequenino mas um que seja só meu!

Tenho que dar-lhe comida e levá-lo a passear que um cão não é brinquedo que só serve para brincar…

Se eu for muito responsável e o tratar muito bem tenho um amigo adorável mais fiel do que ninguém.

Faria, Rosa Lobato (2002). ABC dos bichos. Porto: Asa Editores, p.6.


MALMEQUER Eu gosto do malmequer que é tão simples e tão belo com as pétalas branquinhas e o olhinho amarelo. Ele deixa-se desfolhar quando lhe queres perguntar, sobre uma certa pessoa, uma perguntinha à toa a que ele há-de responder: - Mal-me-quer? Bem-me-quer? Mal-me-quer? Bem-me-quer? - Quer!

Faria, Rosa Lobato (2002). ABC das flores e dos frutos. Porto: Edições Asa, p.24.


A ROUPA Sei que devo andar na moda e que a moda, por natureza, é o que mais passa de moda, mas que hei-de eu fazer? Sou curta ou comprida conforme o gosto comanda, umas vezes colorida, outras vezes preta e branca como a pelagem de um panda. Posso viver num armário à espera da estação certa, ou no fundo de uma arca, dependendo o seu valor de ser ou não ser de marca. Mas a marca, meus amigos, para dizer a verdade, nem sempre quer dizer que eu tenha mais qualidade.

Letria, José Jorge (2008). A Fala das Coisas. Porto: Ambar, p.34.


DIA MUNDIAL DO AMBIENTE Vamos amar animais e as plantas que temos neste belo planeta que é a Terra onde vivemos. De mãos dadas, os meninos dos países todos, vão ensinar os mais crescidos a termos um mundo são. Não poluirmos a água e o ar que respiramos proteger a Natureza e assim, todos ganhamos. Porque, vejam bem, só há um planeta para viver uma Terra para amar… Vamos todos ajudar?

Custódio, Lourdes (2006). Dia Mundial do Ambiente, in Crescer 4, Língua Portuguesa de Ana Maria Rodrigues e Maria Felícia Cruz. Porto: Editora Educação Nacional, p. 150.


2ยบ CICLO


CANTIGA DA MÃE Olha as horas! Sai da cama! Não demores a acordar! Lava os dentes muito bem. - Mas...ó mãe!... Não inventes mais desculpas p'ra atrasar! Passa o pente na cabeça! Bebe o leite mais depressa! E não te esqueças também... - Mas...ó mãe!... ...de levar a papelada assinada que a professora mandou. Vai lá buscar a mochila e vê se, por esta vez, estão prontos os TPC! E fecha bem... - Mas...ó mãe!... ...a torneira da banheira! Olha o pingo... - Mas ó mãe!... Mas ó mãe!... Hoje é domingo! Alice Vieira Acedido em 06/10/2015. https://www.facebook.com/BibliotecaEscolarDAntonioFerreiraGomes/posts/25142779167 1454


O INDECISO

Eu cá quero ser tudo futebolista e arquiteto ator de cinema mudo é preciso é que dê certo. No fundo o que eu quero é ser grande e bem depressa porque isto de crescer não pode ser só conversa. Quero ser grande em altura sem ter projeto nenhum e quem sabe se hei de ser piloto de Fórmula Um? Também quero ser marinheiro, alpinista e domador herói de banda desenhada pirata e aviador. Quero ser de tudo um pouco pois tenho imaginação para acreditar que acordo com o mundo na palma da mão. No fundo, quando eu for grande sem que isso seja um insulto o que eu acho que vou ser afinal é mesmo adulto.

Letria, José Jorge (2011). O que eu quero ser, in Caminhos de Leitura, Língua Portuguesa de 5ºano de Hungria Miguel Gomes. Lisboa: Didática Editora, p.64.


OS LIVROS Os Livros Apetece-me chamar-lhes irmãos tê-los ao colo., afagá-los com as mãos, abri-los de par em par, ver o Pinóquio a rir o D. Quixote a sonhar, e a Alice do outro lado do espelho a inventar um mundo de assombros que dá gosto visitar. Apetece chamar-lhes irmãos e deixar brilhar nos olhos nas páginas das suas mãos.

Letria, José Jorge (2011). Os Livros, in Caminhos de Leitura, Língua Portuguesa de 5ºano de Hungria Miguel Gomes. Lisboa: Didática Editora, p.135.


ENCONTRO Marquei encontro com o sol esta manhã. Em vez do sol veio a nuvem com seus pezinhos de lã. Pôs-se a chorar à janela para eu a deixar, de lágrimas fez um rio que vai na rua a passar. Marquei encontro com o sol esta manhã. Em vez do sol veio o vento e pôs tudo em movimento. Varreu as folhas do chão, varreu a nuvem do ar. Entrou-me pela janela um raio de sol a brilhar. Marquei encontro com o sol esta manhã. Não vou faltar ao encontro. Até amanhã.

Soares, L. Ducla (2011). Encontro, in Caminhos de Leitura, Português de 5º ano de Hungria Gomes. Lisboa: Didática Editora, p. 54.


DECLARAÇÃO DOS DIREITOS DA CRIANÇA Tenho direito a ter um nome e uma nação. Tenho direito a não ter fome e a ter pão. Tenho direito à liberdade. Tenho direito à igualdade. Tenho direito à educação. Tenho direito a ter amor e compreensão, seja qual for a minha raça, a minha cor ou religião. Tenho direito a tratamento. Tenho direito a alojamento. Tenho direito à distração. Tenho direito à amizade e à proteção da negligência, crueldade ou exploração Tenho direito à segurança. Tenho direito a ser criança. Cumpra-se esta declaração!

Anthero Monteiro

Acedido em 9/11/2015. http://pracadapoesia.blogspot.pt/2008/11/decalatao-dos-direitos-da-criana.html


O INVERNO

Velho, velho, velho. Chegou o Inverno. Vem de sobretudo, vem de cachecol, o chão onde passa parece um lençol. Esqueceu as luvas perto do fogão: quando as procurou, roubara-as um cão. Com medo do frio, encosta-se a nós: dai-lhe café quente senão perde a voz. Velho, velho, velho. Chegou o Inverno.

Eugénio de Andrade acedido em 12/10/2015. http://poemasdebibe.blogspot.pt/2013/08/o-inverno-eugenio-de-andrade.html


DIA DE NATAL

Hoje é dia de Natal Mas o menino Jesus Nem sequer tem uma cama, Dorme na palha onde o pus. Recebi cinco brinquedos Mais um casaco comprido. Pobre menino Jesus, Faz anos e está despido. Comi bacalhau e bolos, Peru, pinhões e pudim. Só ele não comeu nada Do que me deram a mim. Os reis de longe trazem Tesouros, incenso e mirra. Se me dessem tais presentes, Eu cá fazia uma birra. Às escondidas de todos Vou pegar-lhe pela mão E sentá-lo no meu colo Para ver televisão.

Soares, L. Ducla (s.d). Dia de Natal, in Língua Portuguesa de 5º Ano de Ana Isabel Serpa. Porto: Areal Editores, p. 82.


TANGERINA Tangerina, tangerina, Não é laranja ou limão. É mais doce a tangerina Que do ramo cai ao chão.

Tangerina, tangerina, Quem assim a pintaria? Foi a mão da Natureza Com o pincel da alegria.

Tangerina, tangerina, Quantos gomos ela tem? Um para mim, outro para ti, Muitos para quem lá vem.

Soares, L. Ducla (2008). O Planeta Azul. Porto: Livraria Civilização Editora, p.34.


RODA-VIVA EM QUATRO DIAS No reino das serpentinas havia sete meninas muito lindas, muito finas, levezinhas como fadas, que reinavam quatro dias por ano, muito animadas. No país dos papelinhos eram sete rapazinhos alegres e redondinhos que entravam na reinação e nos mesmos quatro dias andavam em roda-viva pelo ar e pelo chão. Na cidade das caraças,…… caras de todas as raças, carantonhas e caretas ou risonhas ou medonhas ou rubicundas ou pretas faziam grandes folias nesses mesmos quatro dias. No estado dos estalinhos, na terra das cegarregas, na capital das bisnagas, no domínio das gaitinhas, esses dias inteirinhos que não tinham horas vagas eram gastos igualmente em brincadeira contente. Maria Isabel Soares

Acedido em 13/01/2016. https://bibliobeiriz.wordpress.com/2013/02/12/a-mascara-maria-candida-mendonca/


FOLHAS Hoje sou um rei e sabem porquê? Vinha da escola e encontrei um tapete gigante para eu caminhar um tapete de folhas para eu pisar e que estava ali para me aclamar.

Amanhã o vento levará as folhas para novas paragens e eu deixarei de ser rei com cortesãos e pajens. Foi um curto reinado. Amanhã serei um rei destronado Que é a única maneira de um rei não fazer asneiras…

Maria Cândida Mendonça

Acedido em 13/01/2016. https://bibliobeiriz.wordpress.com/2013/02/12/a-mascara-maria-candida-mendonca/


O QUE UMA CRIANÇA SOFRE Larguei o canário no meu aquário para ele nadar. Em vez de ficar contente comigo, à noite, o meu pai pôs-me de castigo. Deitei o peixinho no meio do ninho para descansar. Em vez de ficar contente comigo, à noite, o meu pai pôs-me de castigo. Enterrei dinheiro dentro do canteiro para o semear. Em vez de ficar contente comigo, à noite, o meu pai pôs-me de castigo. Eu dei ao bebé só um pontapé para ele voar. Em vez de ficar contente comigo, à noite, o meu pai pôs-me de castigo.

Soares, Luísa Ducla (2015). Poemas de Mentira e de Verdade. Lisboa: Livros Horizonte, p. 12.


A ERVA DANINHA Sou uma erva daninha. Nem princesa, nem rainha. Não tenho eira nem beira. Nem ninguém que me queira. Comigo ninguém se importa. Todos me querem ver morta. Sei que sou amaldiçoada. porque não sirvo pra nada. Mas a culpa não é minha, de ser uma erva daninha. Inventaram o herbicida, pra me complicar a vida. Mas isto não fica assim. Vamos ver quem ri por fim. Nem princesa nem rainha. Sou uma erva daninha.

Jorge Sousa Braga

Acedido em 20/01/2016. http://versonapoesia.blogspot.pt/p/jorge-sousa-braga.html


UMA ÁRVORE, UM AMIGO Uma árvore, um amigo que devemos bem tratar, um amigo de verdade tão fiel como a amizade que podemos cultivar. Sabes que uma árvore é um pouco de beleza que protege a Natureza e purifica o nosso ar. Dá-nos a madeira e tanta coisa, que fascina. A cortiça ou a resina mais a fruta no pomar. Oh! Vamos fazer uma floresta. Vem plantar, amigo, uma festa tão rica e modesta. Vamos semear. Sabes que uma árvore é um bem de toda a gente não estragues o ambiente não lhe sujes o lugar. Vamos, vamos, vamos defender a nossa vida que uma árvore esquecida pode às vezes ajudar. Sim, vamos fazer uma floresta. Vem, plantar, amigo, uma festa tão rica e modesta. Vamos semear. Carlos Paião Acedido em 24/02/2016 em http://carlos-paiao.blogspot.pt/2010/03/dia-mundial-da-arvore.html


LIVRO

Livro um amigo para falar comigo um navio para viajar um jardim para brincar uma escola para levar debaixo do braço. Livro um abraço para além do tempo e do espaço.

Soares, Luísa Ducla (2015). Poemas de Mentira e de Verdade. Lisboa: Livros Horizonte, p. 33.


OS DOIS IRMÃOS Eu conheço dois meninos que em tudo são diferentes. Se um diz: “Dói-me o nariz!” o outro diz: “Ai, meus dentes!”

Se um quer brincar em casa, o outro foge para o monte; e se este a casa regressa, já o outro foi para a fonte.

É difícil conviver com tanta contradição. Quando um diz: “Oh, que calor! ”, “Que frio!” - diz o irmão.

Mas quando a noitinha chega com suas doces passadas, pedem à mãe que lhes conte histórias de Bruxas e Fadas.

E quando o sono esvoaça por sobre o dia acabado, dizem “Boa noite, mãe!” e adormecem lado a lado. Maria Alberta Menéres

Acedido em 4/4/2016. http://quadrogiz.blogspot.pt/2012/07/os-dois-irmaos-de-maria-alberta-meneres.html


O DIA DA LIBERDADE 25 de Abril

Este dia é um canteiro com flores todo o ano e veleiros lá ao largo navegando a todo o pano. E assim se lembra outro dia febril que em tempos mudou a história numa madrugada de Abril, quando os meninos de hoje ainda não tinham nascido e a nossa liberdade era um fruto prometido, tantas vezes proibido, que tinha o sabor secreto da esperança e do afeto e dos amigos todos juntos debaixo do mesmo teto.

José Jorge Letria

Acedido em 4/4/2016. http://bibliobeiriz.wordpress.com/category/25-de-abril/25-poemas-e-cancoes-parao-25-de-abril/


A NOSSA TERRA Que lindos peixes de prata Nadam no azul do mar… Não deixemos que os venenos Nas águas os vão matar.

Que lindas areias de ouro Nesta praia à minha beira. Não deixemos que haja gente Que faça delas uma lixeira.

Que lindos pinheiros bravos Do verde, verde pinhal Não deixemos que algum fogo Os queime para nosso mal.

Que linda cidade branca Com ruas para passear… Não deixemos tantos carros Impedir-nos de passar.

Que linda Terra rodando Por entre o Sol e a Lua… Ela é a nossa casa, A vossa, a minha e a tua!

Soares, Luísa (2008). O Planeta Azul. Porto: Civilização Editora, p.25.


A ESCOLA DOS BICHINHOS

Quando a escola dos meninos Fecha nas férias de Verão Abre a escola dos bichinhos Onde aprendem a lição: Aprende o grilo e a cigarra A cantar ao desafio Aprendem os peixinhos novos A nadar além no rio Os coelhos aprendem A franzir bem o focinho Aprendem os passarinhos A voar longe do ninho Os esquilos e os ursos Estão a aprender a trepar O vitelo e o cabrito Aprender logo a marrar. Cada qual se aperfeiçoa Que aprender é coisa boa. Maria Soares

Acedido em 22/04/2016. http://poesia-portguesanofeminino.webnode.pt/products/viagen/


O DIA DA CRIANÇA É um dia em que cabem todos os dias do ano e as coisas mais bonitas que não podem causar dano: os sonhos e os brinquedos, as festas, as guloseimas, a sombra de alguns medos, a casmurrice das teimas e também, com fartura, o afeto e o carinho com que se faz a ternura, para mostrar ao mundo que a guerra é uma loucura e que o gosto de ser menino é o nosso eterno destino.

José Jorge Letria

Acedido em 22/04/2016. https://bibliobeiriz.wordpress.com/category/autor/jose-jorge-letria/


DIA DE PORTUGAL Hoje é dia do nosso Portugal, e das nossas gentes espalhadas, que tornam este país mundial, por terras ainda não conquistadas.

É dia do grande poeta Camões que a nossa bela história cantou, em versos com muitas emoções, os feitos deste povo, alto elevou.

É dia ter orgulho na nossa pátria e de aprender a amá-la também. É dia de comemorar com alegria tudo o que de bom este país tem.

É o grande dia dez de Junho, um importante feriado nacional, deste povo que pelo seu punho, elevou a bandeira de Portugal.

José Couto

Acedido em 22/04/2016. http://poemas-sentidos.blogspot.pt/2012/06/dia-de-portugal.html


O OUTONO

O Outono é uma árvore com folhas amarelas e vermelhas e castanhas a cair. O Outono é o tempo de ir pela primeira vez à escola. É o tempo dos passarinhos fazerem muito barulho à tardinha ao irem dormir nas árvores que ficam sem folhas. É o tempo das folhas das árvores caírem nas ruas e nos parques e nas matas fazendo tapetes fofos que apetece pisar. O Outono é o tempo das vindimas na aldeia. É o tempo em que as castanhas caem dos ouriços que picam.

É o tempo dos magustos no dia de São Martinho. O Outono é o tempo em que o Sol parece morno. É o tempo dos coelhos e das perdizes andarem aflitos nos montes por causa dos caçadores.

O Outono é o tempo dos crisântemos. É o tempo dos míscaros que as meninas e meninos da aldeia vão apanhar aos pinhais depois da chuva. O Outono é o tempo a envelhecer!

Maria Anjo

Acedido em 12/10/2015. http://infantedomfernando.blogspot.pt/2013/10/o-outono-e-o-tempoenvelhecer.html


HÁ FESTA NA ESCOLA Caem as castanhas

Que lindas que são

Lá no castanheiro

Ao lume estalar

Corro a apanhá-las

Vamos lá meninos

Não gasto dinheiro.

Vamos lá provar.

Castanhas quentinhas

Castanhas quentinhas

Que boas que são

Que boas que são

Cuidado meninos

Cuidado meninos

Não queimem a mão.

Não queimem a mão.

Olha o S. Martinho

Há festa na escola

De Sol a espreitar

Vamos lá cantar

Uma fogueirinha

Assar as castanhas

Toca a festejar.

E depois brincar.

Castanhas quentinhas

Castanhas quentinhas

Que boas que são

Que boas que são

Cuidado meninos

Cuidado meninos

Não queimem a mão.

Não queimem a mão.

Acedido em 12/10/2015. http://www.ensinobasico.com/blogue


LENGALENGA DO VENTO

Andava o senhor vento Um dia passeando Encontrou a formiga: - Senhor vento, que força! Lá caí de barriga!

Andava o senhor vento A rir pelo pinhal Quando ouviu a galinha: - Senhor vento, que força! Uma pinha na pinha!

Andava o senhor vento Pé ante pé na vinha quando avistou um cão: - Senhor vento, que força! Fui de focinho ao chão!

Andava o senhor vento a brincar pela rua Quando viu uma cereja: - Senhor vento, que força! Não me empurre, que aleija!

Andava o senhor vento Bailando no Olival Quando viu um lagarto: - Senhor vento, que força! Já nem por aqui escapo...

Então o senhor vento foi para o alto do monte e encontrou um moinho: - Senhor vento, que bom! Eu estava tão sozinho!

Andava o senhor vento Correndo no jardim Quando ouviu uma flor: - Senhor vento, que força! Tenha pena de mim.

Menéres, M. Alberta (2011). Lengalenga do Vento in Caminhos de Leitura, Português de 5º ano de Hungria Gomes. Lisboa: Didática Editora p. 44.


O BERLINDE Era uma vez uma pomba Sem um ninho, sem um pombal, Era branca como a Lua E os seus olhos de cristal.

Não era branco nem negro Assim na neve o menino, Seu chorar era triste, Tornava-o mais pequenino.

Era uma vez uma pomba Que não sabia chorar: O seu choro trrru… trrru… Era um modo de cantar.

E a pomba logo o viu Com seus olhos de cristal: Logo desceu para o monte – Era aquele o seu pombal.

Era uma vez uma pomba Que noite e dia voava: Fosse noite, fosse dia, Nunca a pomba descansava. Era uma vez uma pomba Que nos céus, longe, voava, Seu coração um berlinde Grande segredo guardava. Era uma pomba tão estranha Que voava noite e dia: Quanto mais alto voava Mais da terra ela se via. Era uma vez uma pomba Com penas de seda real: Era uma pomba do Mundo Com seus olhos de cristal. Seu coração um berlinde De vidros de sete cores, Que do sol tinha o brilhar, Um espelhinho de mil flores.

Poisou nas mãos do menino Com seu corpo, seu calor: Mãos por debaixo da neve, Ninguém lhes sabia a cor. Dorme, dorme, meu menino… Branco ou negro tanto faz: Meu coração é um berlinde, Tem o segredo da Paz. E o menino já ria, Podia dormir sem medo, Sonhava com o berlinde, Coração feito brinquedo. Há quem diga que uma estrela Fugiu do céu a correr, Atravessou todo o mundo Para o segredo dizer. Escutaram-na os meninos, Têm um berlinde na mão: Seja noite de Natal, Seja noite de S. João.

Um dia longe nos céus, Viu um menino a chorar Sentadinho sobre um monte, Numa noite de nevar.

Araújo, Matilde Rosa (1988). Mistérios. Lisboa: Livros Horizonte, p.33.


AQUÁRIO

Vivia no mar largo

Tão longe

e era feliz feliz.

tão vasto o mundo… o seu mundo! Tão largo, alto e profundo!...

Sabia os sítios seguros onde os maiores e mais duros não podiam atacar não o podiam caçar não o podiam comer. E continuava a viver.

Que alegria de nadar! Mas um dia aconteceu que um fenómeno se deu: foi pescado foi levado

Quando nadar o cansava uma alga procurava e dormia um bocadinho e a onda que o embalava era amiga do peixinho.

para fora do seu mar para longe do seu lar transportado bem fechado numa prisão de cristal.

A onda amiga ondulava enquanto o acalentava aquecia

E se não lhe fizeram mal se o não comeram com sal está muito descontente

arrefecia e para longe o levava.

nessa prisão transparente à vista de toda a gente.

Alice Gomes

Acedido em 4/1/2016 de http://espaco-horizontes.blogspot.pt/2007/05/aqurio-alice-gomes.html


VIAGEM

Três meninos

O comboio diz

Viajavam de comboio

Vem aí o papão... vem aí o papão...

Pela primeira vez...

Vem aí o papão... Assustou o João.

Foram para a janela Ver as árvores passar

Que será que o comboio diz?

E ouvir o comboio falar.

Perguntou ao revisor o Luís.

Que será que o comboio diz?

O comboio não fala. É mudo.

Quis saber o Luís

Respondeu o revisor muito trombudo

Que gostava de saber tudo.

E ficou sem saber nada. O Luís que gostava de saber tudo.

Eu acho que o comboio diz Era uma vez…era uma vez… Era uma vez Respondeu a Inês.

Maria Isabel Soares

Acedido em 5/1/2016 de http://poesia-portguesa-no-feminino.webnode.pt/products/viagen/


ALICE, ALICE

Alice, Alice Ela me disse por onde hei de ir Por toda a estrada iluminada que eu descobrir

Alice, Alice diz que é tolice tudo saber Cada momento é vivo e tento mais aprender

Que eu não me apoquente se de repente a luz faltar Andar no escuro não é tão duro se se cantar!

Por isso Alice sempre me disse para eu brincar

Mas ai, Alice, Alice Se alguém me visse assim a ir… Tropeço e caio Só daqui saio se souber rir… Se eu não caísse talvez não visse o chão brilhar… Vou aprendendo que o que vou vendo pode mudar…

Fazer de conta não é ser tonta é experimentar - Alice, Alice… É criancice tanto arriscar!... Não pode ser!... Vais-te perder!... Vives no ar!... E Alice riu E o Céu se abriu para ela entrar

Maria Luísa Barreto

Acedido em 4/4/2016 de http://criandoanjosefadas.blogspot.pt/


A MÃE

A mãe

A mãe

é uma árvore

sabe para onde vão

e eu uma flor.

todos os autocarros, descobre as histórias que contam

A mãe

as letras dos livros.

tem olhos altos como estrelas. Os seus cabelos brilham

A mãe

como o sol.

tem na barriga um ninho. É lá que guarda

A mãe

o meu irmãozinho.

faz coisas mágicas: transforma farinha e ovos

A mãe

em bolos,

podia ser só minha.

linhas em camisolas,

Mas tenho que a emprestar

trabalho em dinheiro.

a tanta gente...

A mãe

A mãe

tem mais força que o vento:

à noite descasca batatas.

carrega sacos e sacos do supermercado e ainda me carrega a mim.

Eu desenho caras nelas e a cara mais linda é da minha mãe.

A mãe conhece o bem e o mal. Diz que é bom partir pinhões e partir copos é mal. Eu acho tudo igual.

Soares, Luísa Ducla (2015). Poemas da Mentira e da Verdade. Lisboa: Livros Horizonte, p.27.


3ยบ CICLO


OBRA DO TEMPO!

Criança produzida Neste inferno de guerra De forma desnutrida Na amaldiçoada terra! Gerada em ventre de grito Na dor que sofre de medo Amor de fruto maldito No parir sem aconchego Criança do ventre da violência No cordão umbilical Do ódio que a sustenta Criança no desamor desta raça Que semeia a desgraça No momento que atormenta! Criança, fruto de televisão N’amostra do exuberante De vida de ilusão! Criança sem ser criança Sem tempo pr’a brincar Que vive o faz de conta Sem conta para dar! Pereira, Angelino. Obra do tempo. In Fonte, Barroso da - Poetas de sempre (Antologia) (2000). Guimarães: Editora Cidade Berço, p. 50.


ARMA SECRETA

Tenho uma arma secreta ao serviço das nações. Não tem carga nem espoleta mas dispara em linha recta mais longe que os foguetões.

Não é Júpiter, nem Thor, nem Snark ou outros que tais. É coisa muito melhor que todo o vasto teor dos Cabos Canaverais.

A potência destinada às rotações da turbina não vem da nafta queimada, nem é de água oxigenada nem de ergóis de furalina.

Erecta, na torre erguida, em alerta permanente, espera o sinal da partida. Podia chamar-se VIDA. Chama-se AMOR, simplesmente.

Gedeão, António (2001). Obra Poética. Lisboa: Edições João Sá da Costa, Lda., p. 96.


UMA NÉVOA DE OUTONO O AR RARO VELA

Uma névoa de Outono o ar raro vela, Cores de meia-cor pairam no céu. O que indistintamente se revela, Árvores, casas, montes, nada é meu.

Sim, vejo-o, e pela vista sou seu dono. Sim, sinto-o eu pelo coração, o como. Mas entre mim e ver há um grande sono. De sentir é só a janela a que eu assomo.

Amanhã, se estiver um dia igual, Mas se for outro, porque é amanhã, Terei outra verdade, universal, E será como esta [...]

Pessoa, Fernando (1990). Poesias Inéditas (1930-1935). Lisboa: Ática 1955, p. 104.


AMIGO Mal nos conhecemos Inaugurámos a palavra amigo! Amigo é um sorriso De boca em boca, Um olhar bem limpo, Uma casa, mesmo modesta, que se oferece. Um coração pronto a pulsar Na nossa mão! Amigo (recordam-se, vocês aí, Escrupulosos detritos?) Amigo é o contrário de inimigo! Amigo é o erro corrigido, Não o erro perseguido, explorado. É a verdade partilhada, praticada. Amigo é a solidão derrotada! Amigo é uma grande tarefa, Um trabalho sem fim, Um espaço útil, um tempo fértil, Amigo vai ser, é já uma grande festa!

O’Neill, Alexandre (2002). Poesias Completas (3.ª ed.). Lisboa: Assírio & Alvim, p. 79.


KYRIE Em nome dos que choram, Dos que sofrem, Dos que acendem na noite o facho da revolta E que de noite morrem, Com a esperança nos olhos e arames em volta. Em nome dos que sonham com palavras De amor e paz que nunca foram ditas, Em nome dos que rezam em silêncio E falam em silêncio E estendem em silêncio as duas mãos aflitas. Em nome dos que pedem em segredo A esmola que os humilha e os destrói E devoram as lágrimas e o medo Quando a fome lhes dói. Em nome dos que dormem ao relento Numa cama de chuva com lençóis de vento O sono da miséria, terrível e profundo. Em nome dos teus filhos que esqueceste, Filho de Deus que nunca mais nasceste, Volta outra vez ao mundo! Santos, José Carlos Ary dos (1994). Obra poética (6ª ed.). Lisboa: Editorial “Avante”, p. 101.


LENTAMENTE

Lentamente vêm os dias de ser feliz Lentamente os teus olhos Lentamente o perdão… Vem a ternura dos sorrisos A doçura dos beijos Lentamente as lembranças Lentamente o silêncio… Vem a paz das minhas escolhas A serenidade do caminho Lentamente o amor, Lentamente a saudade… Carmo, Virgínia do (2004). Tempos cruzados. Coimbra: Pé de Página, p. 61.


A ESTRADA Os homens, esquecidos do que não se esquece, passam distraídos como se nada acontecesse. Dos grupos de esquina escapam-se risadas. São sonhos pintados de purpurina. Histórias obscenas de fadas. Nas palavras que entretêm nem um suspiro transparece. E vão, e vêm, como se nada acontecesse. Dedos que em assombros se enclavinham, poisam, esquecidos, nos ombros que os adivinham. Os lábios secos, amarelecidos por ventos de rancor, esquecidos, enunciam teoremas de amor. Pomo da estrada que amadurece. Como se nada acontecesse.

Gedeão, António (2006). Poemas escolhidos (10ª ed.). Lisboa: João Sá da Costa, p. 19-20.


CIRCO

Poeta não é gente, é bicho coiso Que da jaula ou gaiola vadiou E anda pelo mundo às cambalhotas, Recordadas do circo que inventou.

Estende no chão a capa que o destapa, Faz do peito tambor, e rufa, salta, Ë urso bailarino, mono sábio, Ave torta de bico e pernalta

Ao fim toca a charanga do poema, Caixa, fagote, notas arranhadas, E porque bicho é, bicho lá fica, A cantar às estrelas apagadas.

Saramago, José (2014). Os poemas possíveis (8ª ed.). Porto: Porto Editora, p. 47.


ABDICAÇÃO

Toma-me, ó noite eterna, nos teus braços E chama-me teu filho. Eu sou um rei que voluntariamente abandonei O meu trono de sonhos e cansaços.

Minha espada, pesada a braços lassos, Em mão viris e calmas entreguei; E meu cetro e coroa — eu os deixei Na antecâmara, feitos em pedaços

Minha cota de malha, tão inútil, Minhas esporas de um tinir tão fútil, Deixei-as pela fria escadaria.

Despi a realeza, corpo e alma, E regressei à noite antiga e calma Como a paisagem ao morrer do dia.

Pessoa, Fernando (2014). Poesias: Ortónimo. Porto: Porto Editora, p. 17.


NATAL

Na tal habitação volto a falar-te Na tal que já eu-próprio não conheço Na tal que mais que tálamo era berço Na tal em que de noite nunca é tarde

Na tal de que por fim ninguém se evade Na tal que sei bem que não regresso Na tal que cordão umbilical cabe num verso Na tal sem universo que a iguale

Na tal habitação te vou falando Na tal como quem joga às escondidas Na tal a ver se tu me dizes qual

Na tal de que eu herdei só este canto Na tal que para sempre está perdida Na tal em que o natal era Natal

Mourão-Ferreira, David (1997). Obra poética (3.ª ed.). Lisboa: Editorial Presença, p. 231.


TRÊS REIS MAGOS DO ORIENTE Três reis magos do Oriente a sós Com presentes viemos nós Entre montes, campos, fontes De linda estrela após. Linda estrela de fulgente luz, O teu brilho nos conduz. Luz celeste, rumo oeste Guia-nos ao rei Jesus. Rei, nascido em distante lar, Ouro trago para Te dar Rei supremo, dom eterno, Vem sobre nós reinar Ofertar-te incenso me apraz Pois incenso a Deus só se traz, Que comprova a prece nova Na adoração veraz. Eis a mirra de agreste odor Que na vida exprime o fervor Singeleza, luz, beleza, Exuberante amor. Rei gloris, bendito Deus Sacrifício aos pecados meus. Aleluia, aleluia! Soa na terra e céus.

Hönke, André, consultado em 04 de janeiro de 2016 em: https://www.youtube.com/watch?v=KDzNzR2T0b4


QUANDO AS CRIANÇAS BRINCAM

Quando as crianças brincam E eu as oiço brincar, Qualquer coisa em minha alma Começa a se alegrar. E toda aquela infância Que não tive me vem, Numa onda de alegria Que não foi de ninguém. Se quem fui é enigma, E quem serei visão, Quem sou ao menos sinta Isto no coração.

Pessoa, Fernando (2014). Poesias: Ortónimo. Porto: Porto Editora, p. 95.


MOCIDADE Vai-se embora, cedo passa a mocidade! E antes dela, vai-se embora a inocência. Depois disto, só nos resta a saudade… E esta, às vezes, é de inclemência. Desde a adolescência à maior idade - vida alegre – dias vêm, dias vão! Mas essa flor bela, na realidade, Vai-se sem lhe podermos deitar a mão. Fugitiva – subtil e risonha ela passa Como uma primavera ávida e com graça Que, deleitosa, nos eleva a uma mansão!... O tempo foge, os dias correm – não se ignora – E ela, insensível, desprendida, vai-se embora Deixando-nos mil… e mais uma recordação.

Vilares, Amândio (2004). Explosão Sentimental. Terras de Bouro: CALIDUM, p. 84.


RETRATO DO POETA QUANDO JOVEM

Há na memória um rio onde navegam Os barcos da infância, em arcadas De ramos inquietos que despregam Sobre as águas as folhas recurvadas

Há um bater de remos compassado No silêncio da lisa madrugada, Onde brandas se afastam para o lado Com o rumor da seda amarrotada.

Há um nascer do sol no sítio exato, À hora que mais conta duma vida, Um acordar dos olhos e do tato, Um ansiar de sede inextinguida.

Há um retrato de água e de quebranto Que do fundo rompeu desta memória, E tudo quanto é rio abre no canto Que conta do retrato a velha história.

Saramago, José (2014). Os Poemas Possíveis. Porto: Porto Editora, p. 57.


CIDADE

Cidade, rumor e vaivém sem paz das ruas, Ó vida suja, hostil, inutilmente gasta, Saber que existe o mar e as praias nuas, Montanhas sem nome e planícies mais vastas Que o mais vasto desejo, E eu estou em ti fechada e apenas vejo Os muros e as paredes, e não vejo Nem o crescer do mar, nem o mudar das luas.

Saber que tomas em ti a minha vida E que arrastas pela sombra das paredes A minha alma que fora prometida Às ondas brancas e às florestas verdes.

Andresen, Sophia de Mello Breyner (2011). Obra poética (2.ªed.). Alfragide: Editorial Caminho, p. 26.


UM CAMINHO

Amena ilusão, que um fogo escaldante enfrentas; melíflua paixão que uma vida confusa alentas, nos teus olhos, possuo duas estrelas preciosas que me facultam, generosas, no mundo dos vendavais, um caminho florido onde os dois não somos mais que vítimas do Cupido. Um caminho dispensado de horror, de rochas, de espinhos,… - de traição! Um caminho onde o amor, a bailar, a cantar, edificou a união onde, só em amor, se sabe amar.

Trigo, José (1983-1984). Estímulo para Amar. Bragança: Escola Tipográfica, p. 68.


BUCÓLICA A vida é feita de nadas: De grandes serras paradas À espera de movimento; De searas onduladas Pelo vento;

De casas de moradia Caídas e com sinais De ninhos que outrora havia Nos beirais;

De poeira; De sombra de uma figueira; De ver esta maravilha: Meu Pai a erguer uma videira Como uma mãe que faz a trança à filha.

Andrade, Eugénio (2002). Bucólica, in Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa (7.ª ed.). Porto: Campo das Letras, p. 432.


A FLOR DO SONHO

A Flor do Sonho, alvíssima, divina, Miraculosamente abriu em mim, Como se uma magnólia de cetim Fosse florir num muro todo em ruína.

Pende em meu seio a haste branda e fina E não posso entender como é que, enfim, Essa tão rara flor abriu assim! ... Milagre ... fantasia ... ou, talvez, sina ...

Ó Flor que em mim nasceste sem abrolhos, Que tem que sejam tristes os meus olhos Se eles são tristes pelo amor de ti?! ...

Desde que em mim nasceste em noite calma, Voou ao longe a asa da minh’alma E nunca, nunca mais eu me entendi ...

Espanca, Florbela (1997). Sonetos. Venda Nova: Bertand, p. 50.


LEMBRANÇA Fui Essa que nas ruas esmolou E fui a que habitou Paços Reais; No mármore de curvas ogivais Fui Essa que as mãos pálidas poisou...

Tanto poeta em versos me cantou! Fiei o linho à porta dos casais... Fui descobrir a Índia e nunca mais Voltei! fui essa nau que não voltou...

Tenho o perfil moreno, lusitano, E os olhos verdes, cor do verde Oceano, Sereia que nasceu de navegantes...

Tudo em cinzentas brumas se dilui... Ah! quem me dera ser «Essas» que eu fui, «As» que me lembro de ter sido... dantes!...

Espanca, Florbela (1997). Sonetos. Venda Nova: Bertand, p. 128.


DEPOIS DO BRANCO Quem sabe o que na página se esconde e se dentro do branco está um muro e se depois do muro não há onde e se depois do branco é tudo escuro?

Quem sabe o que pode acontecer quando ao verso já escrito outro se junta e tudo está no verso por escrever e o que se escreve é só uma pergunta?

Quem sabe o que se vê e não se vê se por dentro do branco apenas cabe esse nome que nunca ninguém lê e o verso que se sabe e não se sabe?

Alegre, Manuel (2012). Nada está escrito. Lisboa: Dom Quixote, p. 27.


POESIA

A Poesia não fora ali chamada. Naquele chão, de rosas nem saudade. Nem um perfume vago memorando-as… Tudo, naquele sítio, repelia, pelo seu ar hostil, que magoava, o olhar sincero e lúcido dos Astros. Quem não disse à Poesia que não era chamada àquele sítio? Não requerida, veio. O chão continuou a não ter rosas… Os Astros não deixaram de alhear-se… Mas quem te nota, ó ausência de Estrelas e de rosas? - Não requerida, a Poesia veio.

Gama, Sebastião da (2007). Cabo da Boa Esperança. Mem Martins (Sintra): Edições Arrábida, p. 79.


A VIDA

É vão o amor, o ódio, ou o desdém; Inútil o desejo e o sentimento … Lançar um grande amor aos pés de alguém O mesmo é que lançar flores ao vento!

Todos somos no mundo «Pedro Sem», Uma alegria é feita dum tormento, Um riso é sempre o eco dum lamento, Sabe-se lá um beijo de onde vem!

A mais nobre ilusão morre … desfaz-se … Uma saudade morta em nós renasce Que no mesmo momento é já perdida …

Amar-te a vida inteira eu não podia. A gente esquece sempre o bem de um dia. Que queres, meu Amor, se é isto a vida! ...

Espanca, Florbela (1997). Sonetos. Venda Nova: Bertand, p. 100.


A ESFINGE

Pois o meu coração que transbordasse, já que de puro Amor transbordaria. Antes isso que a vaga expressão fria, o silêncio cruel da sua face. O vento mais violento nela passe: não vergará sua figura esguia. As brancas mãos de estátua refugia num segredo que a Noite lhe contasse. E no entanto eu sei quanto me quer. P`ra lá da pedra muda dos seus lábios adivinho a palavra merecida. Só não sei se ela é anjo se é mulher. Não sei se ela é a Morte se é a Vida. Seja lá o que for: mas que me fale!

Gama, Sebastião da (2007). Cabo da Boa Esperança. Mem Martins (Sintra): Edições Arrábida, p. 92.


O REGRESSO

Como quem, vindo de países distantes fora de si, chega finalmente aonde sempre esteve e encontra tudo no seu lugar, o passado no passado, o presente no presente, assim chega o viajante à tardia idade em que se confundem ele e o caminho.

Entra então pela primeira vez na sua casa e deita-se pela primeira vez na sua cama. Para trás ficaram portos, ilhas, lembranças, cidades, estações do ano. E come agora por fim um pão inteiro sem o sabor de palavras estrangeiras na boca.

Pina, Manuel António (2011). Como se desenha uma casa. Lisboa: Assírio & Alvim, p. 13.


POEMA DA MENINA TONTA A menina tonta passa metade do dia a namorar quem passa pela rua, que a outra metade fica pra namorar-se no espelho. A menina tonta tem olhos de retrós preto, cabelos de linha de bordar, e a boca é um pedaço de qualquer tecido vermelho. A menina tonta tem vestidos de seda e sapatos de seda, é toda fria, fria como a seda: as olheiras postiças de crepe amarrotado, as mãos viúvas entre flores emurchecidas, caídas da janela, desfolham pétalas de papel… No passeio em frente estão os namorados com os olhos cansados de esperar com os braços cansados de acenar com a boca cansada de pedir… A menina tonta tem coração sem corda, a boca sem desejos, os olhos sem luz ... E os namorados cansados de namorar… Eles não sabem que a menina tonta tem a cabeça [cheia de farelos.

Fonseca, Manuel da (2014). Obra Poética. (10ª ed.). Alfragide: Editorial Caminho, pp. 95 e 96.


HÁ DE HAVER UM DIA

Há de haver um dia em que eu faça tudo bem nem que dê a volta ao dia para tudo lhe parecer bem. Há de um dia em que os outros os que me apontam o dedo por acharem que não faço nada bem façam eles próprios como convém tudo bem! Há de haver um dia em que todos descobriremos que ninguém faz tudo bem e até nada bem! E há de haver outro dia para os que olhando com desdém o que os outros olharam também que afinal não somos o que queremos nem o que parecemos apenas o que fazemos pouco importa se mal ou bem!

Lopes, Francisco José (2014). Percursos. [Valongo]: Lema d`Origem, p. 34.


COISAS DA VIDA

Há pessoas que ganham a vida tirando a vida às coisas e há outras que fazem das coisas o sentido da própria vida.

Há pessoas que vivem a vida passando pelas coisas e há outras que dão sentido às coisas que fazem a vida.

Lopes, Francisco José (2014). Percursos. [Valongo]: Lema d`Origem, p. 49.


ANTES QUE SEJA TARDE Amigo, tu que choras uma angústia qualquer e falas de coisas mansas como o luar e paradas como as águas de um lago adormecido, acorda! Deixa de vez as margens do regato solitário onde te miras como se fosses a tua namorada. Abandona o jardim sem flores desse país inventado onde tu és o único habitante. Deixa os desejos sem rumo de barco ao deus-dará e esse ar de renúncia às coisas do mundo. Acorda, amigo, liberta-te dessa paz podre de milagre que existe apenas na tua imaginação. Abre os olhos e olha, abre os braços e luta! Amigo, antes da morte vir nasce de vez para a vida. Fonseca, Manuel da (2014). Obra Poética (10.ª ed.). Alfragide: Editorial Caminho, p. 169.


ENSINO SECUNDÁRIO


OBRA DO TEMPO! Criança produzida Neste inferno de guerra De forma desnutrida Na amaldiçoada terra! Gerada em ventre de grito Na dor que sofre de medo Amor de fruto maldito No parir sem aconchego Criança do ventre da violência No cordão umbilical Do ódio que a sustenta Criança no desamor desta raça Que semeia a desgraça No momento que atormenta! Criança, fruto de televisão N’amostra do exuberante De vida de ilusão! Criança sem ser criança Sem tempo pr’a brincar Que vive o faz de conta Sem conta para dar!

Pereira, Angelino (2000). “Obra do tempo”. In Poetas de sempre (Antologia), Barroso da Fonte. Guimarães: Editora Cidade Berço, p. 50.


SER POETA

Ser Poeta é ser mais alto, é ser maior Do que os homens! Morder como quem beija! É ser mendigo e dar como quem seja Rei do Reino de Aquém e de Além Dor!

É ter de mil desejos o esplendor E não saber sequer que se deseja! É ter cá dentro um astro que flameja, É ter garras e asas de condor!

É ter fome, é ter sede de Infinito! Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim... É condensar o mundo num só grito!

E é amar-te, assim, perdidamente... É seres alma, e sangue, e vida em mim E dizê-lo cantando a toda gente!

Espanca, Florbela (1997). Sonetos (28.ª ed.). Venda Nova: Bertrand Editora, p.134.


RUÍNAS Se é sempre Outono o rir das primaveras, Castelos, um a um, deixa-os cair... Que a vida é um constante derruir De palácios do Reino das Quimeras!

E deixa sobre as ruínas crescer heras. Deixa-as beijar as pedras e florir! Que a vida é um contínuo destruir De palácios do Reino das Quimeras!

Deixa tombar meus rútilos castelos! Tenho ainda mais sonhos para erguê-los Mais altos do que as águias pelo ar!

Sonhos que tombam! Derrocada louca! São como os beijos duma linda boca! Sonhos!... Deixa-os tombar... Deixa-os tombar...

Espanca, Florbela (1997). Sonetos (28.ª ed.). Venda Nova: Bertrand Editora, p.96.


OUTONAL

Caem as folhas mortas sobre o lago! Na penumbra outonal, não sei quem tece As rendas do silêncio... Olha, anoitece! - Brumas longínquas do País Vago...

Veludos a ondear... Mistério mago... Encantamento... A hora que não esquece, A luz que a pouco e pouco desfalece, Que lança em mim a bênção dum afago...

Outono dos crepúsculos doirados, De púrpuras, damascos e brocados! - Vestes a Terra inteira de esplendor!

Outono das tardinhas silenciosas, Das magníficas noites voluptuosas Em que soluço a delirar de amor...

Espanca, Florbela (1997). Sonetos (28.ª ed.). Venda Nova: Bertrand Editora, p. 133.


KYRIE Em nome dos que choram, Dos que sofrem, Dos que acendem na noite o facho da revolta E que de noite morrem, Com a esperança nos olhos e arames em volta. Em nome dos que sonham com palavras De amor e paz que nunca foram ditas, Em nome dos que rezam em silêncio E falam em silêncio E estendem em silêncio as duas mãos aflitas. Em nome dos que pedem em segredo A esmola que os humilha e os destrói E devoram as lágrimas e o medo Quando a fome lhes dói. Em nome dos que dormem ao relento Numa cama de chuva com lençóis de vento O sono da miséria, terrível e profundo. Em nome dos teus filhos que esqueceste, Filho de Deus que nunca mais nasceste, Volta outra vez ao mundo! Santos, José Carlos Ary dos (1994). Obra poética (6ª ed.). Lisboa: Editorial “Avante”, p. 101.


MEMÓRIA

Se os dias fogem de mim e não se importam Então eu quero que todas as coisas existam Muito para além do tempo Em que se demoram; Quero que esperem Para que eu ponha nos olhos Dos que me cercam Por momentos O começo de uma eternidade E logo depois Que desça sobre o chão das partidas O simples desejo de ficar Para que se ouça No escuro da noite começada Que afinal Todos os momentos podem voltar…

Carmo, Virgínia do (2004). Tempos cruzados. Coimbra: Pé de Página, p. 42.


TUDO É FOI Fecho os olhos por instantes. Abro os olhos novamente. Neste abrir e fechar de olhos já todo o mundo é diferente. Já outro ar me rodeia; outros lábios o respiram; outros aléns se tingiram de outro Sol que os incendeia. Outras árvores se floriram; outro vento as despenteia; outras ondas invadiram outros recantos de areia. Momento, tempo esgotado, fluidez sem transparência. Presença, espectro da ausência, cadáver desenterrado. Combustão perene e fria. Corpo que a arder arrefece. Incandescência sombria. Tudo é foi. Nada acontece. Gedeão, António (2006). Poemas escolhidos (10ª ed.). Lisboa: João Sá da Costa, p. 16-17.


«ERGO UMA ROSA E TUDO SE ILUMINA…»

Ergo uma rosa, e tudo se ilumina Como a lua não faz nem o sol pode: Cobra de luz ardente e enroscada Ou vento de cabelos que sacode. Ergo uma rosa, e grito a quantas aves O céu pontuam de ninhos e de cantos, Bato no chão a ordem que decide A união dos demos e dos santos. Ergo uma rosa, um corpo e um destino Contra o frio da noite que se atreve, E da seiva da rosa e do meu sangue Construo perenidade em vida breve. Ergo uma rosa, e deixo, e abandono Quanto me dói de mágoas e assombros. Ergo uma rosa, sim, e ouço a vida Neste cantar das aves nos meus ombros.

Saramago, José (2014). Os poemas possíveis 88.ª ed.). Porto: Porto Editora, p. 176.


O MENINO DE SUA MÃE No plano abandonado Que a morna brisa aquece, De balas trespassado — Duas, de lado a lado —, Jaz morto e arrefece. Raia-lhe a farda o sangue. De braços estendidos, Alvo, louro, exangue, Fita com olhar langue E cego os céus perdidos. Tão jovem! que jovem era! (Agora que idade tem?) Filho único, a mãe lhe dera Um nome e o mantivera: «O menino da sua mãe». Caiu-lhe da algibeira A cigarreira breve. Dera-lha a mãe. Está inteira E boa a cigarreira. Ele é que já não serve. De outra algibeira, alada Ponta a roçar o solo, A brancura embainhada De um lenço... Deu-lho a criada Velha que o trouxe ao colo. Lá longe, em casa, há a prece: «Que volte cedo, e bem!» (Malhas que o império tece!) Jaz morto, e apodrece, O menino da sua mãe. Pessoa, Fernando (2014). Poesias: Ortónimo. Porto: Porto Editora, p.48.


VOTO DE NATAL

Acenda-se de novo o Presépio no Mundo! Acenda-se Jesus nos olhos dos meninos! Como quem na corrida entrega o testemunho, passo agora o Natal para as mãos dos meus filhos.

E a corrida que siga, o facho não se apague! Eu aperto no peito uma rosa de cinza. Dai-me o brando calor da vossa ingenuidade, para sentir no peito a rosa reflorida!

Filhos, as vossas mãos! E a solidão estremece, como a casca do ovo ao latejar-lhe vida... Mas a noite infinita enfrenta a vida breve: dentro de mim não sei qual é que se eterniza.

Extinga-se o rumor, dissipem-se os fantasmas! O calor destas mãos nos meus dedos tão frios? Acende-se de novo o Presépio nas almas. Acende-se Jesus nos olhos dos meus filhos.

Mourão-Ferreira, David (1997). Obra poética (3.ª ed.). Lisboa: Editorial Presença, p. 222.


TRÊS REIS MAGOS DO ORIENTE Três reis magos do Oriente a sós Com presentes viemos nós Entre montes, campos, fontes De linda estrela após. Linda estrela de fulgente luz, O teu brilho nos conduz. Luz celeste, rumo oeste Guia-nos ao rei Jesus. Rei, nascido em distante lar, Ouro trago para Te dar Rei supremo, dom eterno, Vem sobre nós reinar Ofertar-te incenso me apraz Pois incenso a Deus só se traz, Que comprova a prece nova Na adoração veraz. Eis a mirra de agreste odor Que na vida exprime o fervor Singeleza, luz, beleza, Exuberante amor. Rei gloris, bendito Deus Sacrifício aos pecados meus. Aleluia, aleluia! Soa na terra e céus.

Hönke, André, consultado em 04 de janeiro de 2016 em: https://www.youtube.com/watch?v=KDzNzR2T0b4


RECEITA

Tome-se um poeta não cansado, Uma nuvem de sonho e uma flor, Três gotas de tristeza, um tom dourado, Uma veia sangrando de pavor. Quando a massa já ferve e se retorce Deita-se a luz dum corpo de mulher, Duma pitada de morte se reforce, Que um amor de poeta assim requer.

Saramago, José (2014). Os Poemas Possíveis. Porto: Porto Editora, p. 117.


METÁFORA

Alma, a quem o vento assim levou Voando em paraquedas pelos ares Ou rasgando a terra, sulcando mares, À procura de quem só mais tarde encontrou. Alma! Para quem já não sei quem sou… Talvez um santo que dos altares A cinja em meigos olhares… Alma! Que o destino p’ra mim guardou. E porque assim se me ofereceu Num sorriso que era todo seu, Mui pertinho – junto a ela há de ter-me. E hei de dizer-lhe segredos imaculados, Confessar-lhe, baixinho, os meus pecados, porque só ela soube compreender-me!

Vilares, Amândio (2004). Explosão Sentimental. Terras de Bouro: CALIDUM, p. 106.


EM TODOS OS JARDINS

Em todos os jardins hei-de florir, Em todos beberei a lua cheia, Quando enfim no meu fim eu possuir Todas as praias onde o mar ondeia.

Um dia serei eu o mar e a areia, A tudo quanto existe me hei-de unir, E o meu sangue arrasta em cada veia Esse abraço que um dia se há-de abrir.

Então receberei no meu desejo Todo o fogo que habita na floresta Conhecido por mim como num beijo.

Então serei o ritmo das paisagens, A secreta abundância dessa festa Que eu via prometida nas imagens.

Andresen, Sophia de Mello Breyner (2011). Obra poética (2.ª ed.). Alfragide: Editorial Caminho, p. 56.


PRIMEIRO DOMINGO

A tarde estava errada, não era dali, era de outro domingo, quando ainda não tinhas acontecido, e apenas eras uma memória parada sonhando (no meu sonho) comigo.

E eu, como um estranho, passava no jardim fora de mim como alguém de quem alguém se lembrava vagamente (talvez tu), num tempo alheio e impresente.

Tudo estava no seu lugar (o teu lugar), excepto a tua existência, que te aguardava ainda, no limiar de uma súbita ausência, principalmente de sentido.

Pina, Manuel (2012). Todas as Palavras - Poesia Reunida. Porto: Porto Editora, p. 243.


OUTRA Se fosses luz serias a mais bela De quantas há no mundo: - a luz do dia! - Bendito seja o teu sorriso Que desata a inspiração Da minha fantasia! Se fosses flor serias o perfume Concentrado e divino que perturba O sentir de quem nasce para amar! - Se desejo o teu corpo é porque tenho Dentro de mim A sede e a vibração de te beijar! Se fosses água – música da terra Serias água pura e sempre calma! - Mas de tudo que possas ser na vida, Só quero, meu amor, que sejas alma!

Andrade, Eugénio (2002). Antologia Pessoal da Poesia Portuguesa (7.ª ed.). Porto: Campo das Letras, p. 395.


DE JOELHOS «Bendita seja a Mãe que te gerou.» Bendito o leite que te fez crescer. Bendito o berço aonde te embalou A tua ama, pra te adormecer!

Bendita essa canção que acalentou Da tua vida o doce alvorecer ... Bendita seja a Lua, que inundou De luz, a Terra, só para te ver ...

Benditos sejam todos que te amarem, As que em volta de ti ajoelharem Numa grande paixão fervente e louca!

E se mais que eu, um dia, te quiser Alguém, bendita seja essa Mulher, Bendito seja o beijo dessa boca!!

Espanca, Florbela (1997). Sonetos. Venda Nova: Bertrand, p. 58.


VENTO NO ROSTO

À hora em que as tardes descem, noite aspergindo nos ares, as coisas familiares noutras formas acontecem. As arestas emudecem. Abrem-se flores nos olhares. Em perspectivas lunares lixo e pedras resplandecem. Silêncios, perfis de lagos, escorrem cortinas de afagos, malhas tecidas de engodos. Apetece acreditar, ter esperanças, confiar, amar a tudo e a todos.

Gedeão, António (2001). Obra poética. Porto: Livraria Figueirinhas, p. 40.


LEMBRANÇA Fui Essa que nas ruas esmolou E fui a que habitou Paços Reais; No mármore de curvas ogivais Fui Essa que as mãos pálidas poisou...

Tanto poeta em versos me cantou! Fiei o linho à porta dos casais... Fui descobrir a Índia e nunca mais Voltei! fui essa nau que não voltou...

Tenho o perfil moreno, lusitano, E os olhos verdes, cor do verde Oceano, Sereia que nasceu de navegantes...

Tudo em cinzentas brumas se dilui... Ah! quem me dera ser «Essas» que eu fui, «As» que me lembro de ter sido... dantes!...

Espanca, Florbela (1997). Sonetos. Venda Nova: Bertand, p. 128.


NÓS

Nós fomos noite e noite até ser dia nós fomos noite e a noite fomos nós fomos a noite e os corpos e esses nós com que a noite se atava e desfazia

Fomos a noite e o que sobrava dela e o que sobrava dela foram luas que circulam à volta de uma estrela ora nas minhas mãos ora nas tuas.

Alegre, Manuel (2012). Nada está escrito. Lisboa: Dom Quixote, p. 39.


ANJO INCOLOR Abri o livro na altura em que o Anjo me sorria e em vez de mel prometia amor, descanso e ternura. Falava como que a sós. E as palavras flutuavam. Eram pombas que poisavam no fio da sua voz. Escutei-o de olhos no chão como se fosse o culpado, como se o mundo enredado estivesse na minha mão. Abri o peito e mostrei-lhe a areia, a pedra britada, os planos da grande estrada onde o Anjo se ajoelhe. Ele fitou-me, de frente, De olhos frios como brasas. E abrindo e fechando as asas rasgou o céu, lentamente. Sobre a folha imaculada por longo tempo nevou. Sentei-me à beira da estrada mas o Anjo não voltou. Gedeão, António (2001). Obra Poética. Porto: Livraria Figueirinhas, p. 23.


POEMA DAS COISAS BELAS

As coisas belas, as que deixam cicatrizes na memória dos homens, por que motivo serão belas? E belas, para quê?

Põe-se o Sol porque o seu movimento é relativo. Derrama cores porque os meus olhos vêem. Mas por que será belo o pôr do sol? E belo, para quê?

Se acaso as coisas não são coisas em si mesmas, Mas só são coisas quando coisas percebidas, por que direi das coisas que são belas? E belas, para quê?

Se acaso as coisas forem coisas em si mesmas Sem precisarem de ser coisas percebidas, Para quem serão belas essas coisas? E belas, para quê?

Gedeão, António (2001). Obra Poética. Porto: Livraria Figueirinhas, p. 159.


POEMA DA VOLTA PELO BAIRRO As palavras saíam-lhe da boca altas e frondosas como as árvores, e o vento que soprava levava as palavras consigo e deixava-as cair nas terras férteis onde se multiplicavam e cresciam. Eram essas palavras sonorosas, pesadas e sumarentas como as laranjas escolhidas, e nelas se comparavam as virtudes às flores, e o vício à lepra, e a vida inteira ao caudaloso rio que flui, estreito e efémero, tropeçando nas pedras e nos limos. Recolhi-me no quarto com as palavras fervendo nos ouvidos, e aí me entretive a pesá-las, uma a uma, numa balançazinha que lá tenho. Pesei-as, e arrumei-as nas prateleiras. Aqui, a boca; além, as árvores frondosas. Deste lado, a virtude; do outro, as flores. Aqui, o vício; mais além, a lepra. Aqui, o rio efémero; além, a vida. E como a noite estivesse realmente agradável saí, e fui dar uma volta pelo bairro. Gedeão, António (2001). Obra Poética. Porto: Livraria Figueirinhas, p. 173.


SOB ESCOMBROS Um tempo houve em que, de tão próximo, quase podias ouvir o silêncio do mundo pulsando onde também tu eras mundo, coisa pulsante. Extinguiu-se esse canto não na morte mas na vida excluída da clarividência da infância e de tudo o que pulsa, fins e começos, e corrompida pela estridência e pela heterogeneidade. Agora respondes por nomes supostos, habitante de países hábeis e reais, e precisas de ajuda para as coisas mais simples, o pensamento, o sofrimento, a solidão. A música, só voltarás a escutá-la numa noite lívida, uma noite mais vulnerável do que todas (o presente desvanecendo-se, o passado cada vez mais lento) um pouco antes de adormeceres sob escombros. Pina, Manuel António (2011). Como se desenha uma casa. Lisboa: Assírio & Alvim, p. 24 e 25.


MORTE E TRANSFIGURAÇÃO Cinzas, vergões, renúncias, cicatrizes, Laceram-nos a esperança, mas dão outra. Essa em que a dor nos faz criar raízes, Árvore e fruto duma seiva nova.

Dos abismos da ira levantamos As vozes, os protestos e as trombetas. Só nos ouvimos quando nos calamos E em vez de arautos nos tornamos poetas.

Cantores das coisas que nos doem, magos Da nossa angústia, frémito das águas Onde nos debruçamos, onde nós,

Narcisos do que é grande e impossível, Nos transformamos por amor da voz Enquanto a imagem nos parece inútil.

Santos, José Carlos Ary dos (1994). Obra Poética. Lisboa: Edições Avante, p. 47.


DIZEM NOS LIVROS Dizem nos livros que as palavras se aprendem e que aprendendo a ligar os sinais fazemos delas as ideias. Mas não. Elas existem por si dispersas a esvoaçar como gaivotas à beira mar. Entram em nós fazem ninho e criação e quando acordamos somos apenas a lembrança das palavras que partiram.

Lopes, Francisco José (2014). Percursos. [Valongo]: Lema d`Origem, p. 29


SE FOSSE POSSÍVEL

Se fosse possível cantava estas palavras oferecia-lhes a melhor melodia em notas douradas com semibreves e colcheias, muitas claves e outros sinais dessa simbologia que não percebo. Admito até que o solfejo caísse bem nesta pauta em linhas desenhadas que musicando o espaço que não domino acabam por ser um valioso instrumento graças a essa campainha do tempo impiedoso que a cada sopro descuidado nos recorda com confrangedor desdém ter expirado o prazo do crédito que a vida contém.

Lopes, Francisco José (2014). Percursos. [Valongo]: Lema d`Origem, p. 38.


ANTES QUE SEJA TARDE Amigo, tu que choras uma angústia qualquer e falas de coisas mansas como o luar e paradas como as águas de um lago adormecido, acorda! Deixa de vez as margens do regato solitário onde te miras como se fosses a tua namorada. Abandona o jardim sem flores desse país inventado onde tu és o único habitante. Deixa os desejos sem rumo de barco ao deus-dará e esse ar de renúncia às coisas do mundo. Acorda, amigo, liberta-te dessa paz podre de milagre que existe apenas na tua imaginação. Abre os olhos e olha, abre os braços e luta! Amigo, antes da morte vir nasce de vez para a vida. Fonseca, Manuel da (2014). Obra Poética (10.ª ed.). Alfragide: Editorial Caminho, p. 169.


CONCLUSÃO

Mercê da colaboração e empenho de toda a comunidade escolar, designadamente da equipa das bibliotecas escolares, dos alunos, dos assistentes operacionais e da Direção, foi possível levar a bom porto a atividade “Abre a pestana com um poema por semana…”, enquadrada no projeto

aLeR+ do Agrupamento de Escolas de Macedo de Cavaleiros,

iniciada em dezembro de 2012. “O caminho faz-se caminhando”, como afirmou Fernando Pessoa, e foi fazendo jus a este verso que a semente desabrochou, proporcionando aos alunos o contacto profícuo com a poesia, que lhes merece tantas vezes animosidade. Com agrado conhecemos distintos aproveitamentos desta atividade que, em primeira instância, visava tão-somente a aproximação entre alunos e um mundo encantado e íntimo – o da poesia… Com o mesmo contentamento ouvimos os alunos perguntar pelo dia e pelo docente a quem caberia ler o poema da semana. Da gratidão para com os docentes, que souberam receber esta iniciativa e que a fizeram crescer, abraçando a dádiva da maneira que entenderam ser melhor, serão testemunhas estas breves palavras. A semente foi plantada em 2012, brotou, abriu em flor e deu belos frutos nos quatro anos que se seguiram, precisa apenas de continuar a ser tratada com estima e carinho para se manter vigorosa e voltar a frutificar…


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