Fundação Bienal de São Paulo
Edemar Cid Ferreira Presidente/ Chairman
Pedro Paulo de Se na Madureira Vice-presidente/Vice-president
Jens Olesen Diretor internacional! /nternationa/ director
Direto res/ Directors
Fábio Penteado Ivo Rosset Ricardo Ohtake Secretário de Estado da Cultura/ State Secretary of Cu/ture
Rodolfo Konder Secretário Municipal da Cultura/ Municipa/ Secretary of Cu/ture
Sérgio Telles Chefe do Deptº Cultural do Itamaraty/Officer of /tamaraty's Cultural Department
Wladimir Murtinho Representante do Ministério da Cultura/ Cu/ture Ministery Representative
Altino João de Barros Diretor-adjunto/Assistant director
Francisco Matarazzo Sobrinho (1898/1977) Presidente perpétuo/PerpetuaI president
Conselho de administraçãolBoard of directors
Celso Neves Presidentel Chairman
Oscar P. Landmann Vice-presidente/ Vice-president Membros vitalícios/ Lifetime members
Conselho de honralHonorary council
Alex Periscinoto Jorge Eduardo Stockler Jorge Wilheim Luiz Oiederichsen Villares Luiz Fernando Rodrigues Alves Oscar P. Landmann Roberto Muylaert
Armando Costa de Abreu Sodré Benedito José Soares de Mello Pati César Giorgi Francisco Luiz de Almeida Salles Giannandrea Matarazzo João de Scantimburgo Oscar P. Landmann Oswaldo Arthur Bratke Oswaldo Silva Otto Heller Roberto Maluf Roberto Pinto de Souza Sábato Antonio Magaldi Sebastião de Almeida Prado Sampaio Wladimir Murtinho
Membros/ Members
Adolpho Leirner Alex Periscinoto Álvaro Augusto Vidigal Angelo Andrea Matarazzo Antonio Henrique da Cunha Bueno Áureo Bonilha Caio de Alcântara Machado Carlos Bratke Carlos Eduardo Moreira Ferreira Celso Neves Diná Lopes Coelho Edemar Cid Ferreira Edgardo Pires Ferreira Eduardo de Moraes Dantas Ernst Gunter Lipkau Fernando Roberto Moreira Salles Fernão Carlos Botelho Bracher Gilberto Chateaubriand Hélene Matarazzo Henrique de Macedo Netto Jens Olesen Jorge da Cunha Lima
Jorge Wilheim José Ermírio de Moraes Filho Julio R. M. Landmann Lúcio Gomes Machado Luiz Antonio Seráphico de Assis Carvalho Manoel Ferraz Whitaker Salles Maria do Carmo Abreu Sodré Maria Rodrigues Alves Mário Pimenta Camargo Mendel Aronis Miguel Alves Pereira Oswaldo Corrêa Gonçalves Pedro Aranha Corrêa do Lago Pedro Franco Piva Pedro Paulo de Se na Madureira Pietro Maria Bardi Roberto Duailibi Romeu J. S. Mindlin Rubens José Mattos Cunha Lima Rubens Ricupero lhomas Farkas Wolfgang Sauer
12 Outubro a 11 Dezembro 1994
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American Express Antarctica Banco do Brasil Banespa - Banco do Estado de São Paulo Banco Real Bolsa de Mercadorias & Futuros
Bolsa de Valores do Estado de São Paulo Caixa Econômica Federal Citibank Coca-Cola e Spal General Electric do Brasil Gerdau
Gillette IBM ING Bank I Seagram IOCHPE Kolynos McCann-Erickson
Philip Morris Price Waterhouse Rosset Semp Toshiba Suzano Tintas Ypiranga Votorantim
Patrocinadores das Salas Especiais e da 22ª Bienal Internacional de São Paulo Sponsors of the Special Rooms and 22ª Bienal Internacional de São Paulo
Ministério da Educação e do Desporto Ministério das Relaçõe.s Exteriores Secretaria de Estado da Cultura Prefeitura Municipal de São Paulo Secretaria Municipal de Cultura
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AGRADECIMENTOS ACKNOWLEDGMENTS
Akzo Nobel Alitalia Arquitetura da Luz AZP Banco do Brasil Banco Santos Centro Cultural São Paulo Charter - Union Insurance Brokers CNAP Cobercirco Codesp Coldclima Coord. Ger. do Sistema de Controle Aduaneiro Corpo de Bombeiros de São Paulo 2M Elevadores Villares ENGEVE ENSIC ESTRU-TEC Eucatex Evguêniia Petrova, Museu Russo de São Petersburgo Galerie Tokoro, Tóquio Geraldo Pougy, Fundação Cultural de Curitiba GYPSALUM - auto portante Guarda Metropolitana Municipal Hanart T Z Gallery Hunter Douglas do Brasil Infraero ING Bank - Internationale Nederlanden Bank Inspetoria da Alfândega/AISP Inspetoria da Alfândega/Porto de Santos Inspetoria da Receita Federal Instituto Goethe IRFFllnternacional Istituto Italiano di Cultura Jardine Insurance Brokers Int. JBA Kodak Brasileira
Kulturkontar, Viena Lufthansa Cargo/SP Masterpiece International MEC/FNDE Metalúrgica Garra Metropolitan Transports Min. dos Transp.!Transp. Aquav. de Santos Minas Goiás Transportes Museu da Imagem e do Som Museu de Arte Contemporânea/USP Newpower Group, Hon9 Kong Otávio Donasci PAMEBO Pincéis Tigre Polaroid Polícia Militar de São Paulo Rental Rádio Rijksakademie, Amsterdam Rio Sul Companhia de Aviação RHOR Robert Bosch Rosset Rudi Fuchs, Stedelijk Museum de Amsterdam Seco de Est. da Cult. de Minas Gerais Shangai Ta"g Department Store Soco Amigos da Cult. de Minas Gerais Springer Carrier Teatro Municipal de São Paulo Telesp The New China Hong Kong Group Tintas Ypiranga Transportes Fink Varig Vera Cruz Serviços Vidraria Santa Marina Vladimir Gusev, Museu Russo de São Petersburgo Wim Beeren, Stedelijk Museum de Amsterdam
Edemar Cid Ferreira Presidente/President
Pedro Paulo de Sena Madureira Vice-presidente/Vice-president
Jens Olesen Diretor internacional/lnternational difector
Altino JoĂŁo de Barros Diretor-adj unto/Assistant director
Nelson Aguilar Curador-geral/Chief curator
Correspondentes internacionais! Overseas correspondents: Bart de Baere Museum van Hedendaagse Kunst (Gont, Bélgica) Catherine Millet Art Press (Paris, França) Henri Maldiney Université de Lyon (Lyon, França) Jan Hoet Musée d'Art Contemporain (Gand, Bélgica) Jorge Glusberg CAVC (Buenos Aires, Argentina) José Sommer Ribeiro Fundação Calouste Gulbenkian (Lisboa, Portugal) Llilian Llanes Centro Wilfredo Lam (Havana, Cuba) Pieter Th. Tjabbes Stedelijk Museum (Schiedam, Holanda) Zelmir Koscevic Muzej Suvremene Umjetnosti (Croácia)
Assistentes da curadoria! Assistants to curator's office: Anna Carboncini Masini Cristina Ricupero Regina Teixeira de Barros
Gerência internacional! International management Gerente/Manager: Suzanna Sassoun Carlos Verna Claudia Sachs Cristiane Pedro Piza Janete Alves de Souza Kyra Carbonell Lucy Amélia dos Santos Marcella Bokel Marina Ancona Lopez Soligo Marize Nóbrega Martins Renata Motta Ricardo Gottlieb
Gerência de eventos! Events management .Gerente/Manager: Romão Veriano da Silva Pereira
Ana Auge Carlos Loureiro César Augusto Fedato Eliana Aparecida Fazzio Julio Cesar da Silva Marcos de Oliveira Costa Maria Clara Perino
Arquitetura!Architectur Arquiteto-chefe/Architect in chier.· Ronald Cavaliere Tereza Mas Santa Creu Inês Lucchesi de Carvalho
Gerência administrativo-financeira! Adm. -finan. management Gerente/Manager: Aloysio Teixeira.da Costa Edmilson Elias do Carmo Itamar Alves da Silva Kátia Marli Silveira Mário Rodrigues da Silva Maurício Marques Neto Shirley Dias Rizzardi
Entreposto alfandegário! Customs warebouse: Raquel da Silveira Toledo Alexandre Nakabayashi Moriya Luzia Delgado Orivaldo Dias Junior Suzete Aparecida Dias de Oliveira
Montagem das Salas Especiais! Special Rooms assembling Expomus: Maria Ignez Mantovani Franco Sônia Guarita do Amaral Ana Lúcia Pinheiro de Miguel Francis Melvin Lee Izadora Bertussi Márcia Arcuri Sílvia Bahia Monteiro
Assessoria de captação! Resources assistant: Ruthi Dabbah Samuel Swartz
Manutenção e montagem! Maintenance and assembling Chefe/Department head: Guimar Morelo Hildimar Gonçalves Francisco Lucindo Gazola Paulo de Tarso Gracia Severino B. da Silva Acácio de Moraes Amadeu Bezerra de Melo Antonio Gomes da Costa Antônio Milton Araújo Carlos Henrique Gazola Carmen Gibrin dos Santos Clodomir Cordeiro Costa Damião Belo Pereira Dilson Moreira Freitas Dorgival Cordeiro Costa Dulce Ricardo de Souza Ednaldo Moreira de Freitas Eduardo Roberto de Jesus Eliane Moreira Bortolotti Elias Lima da Silva Elisabeth Almeida M. Emerson Áureo Horst Francisca Alves da Silva
Geraldo Barbosa da Silva Givanete Alves dos Santos Hamilton Ferreira Lima Isaías de Jesus Siqueira Ivaldo Firmino César Jacó Pereira Jair Furtado Teixeira Jair Miranda João Batista das Dores João de Macedo Silva Jonas Moreira de Macedo José Aparecido da Silva José Carlos de Andrade José Cordeiro da Silva José Espedito Pereira José Fábio da Silva José Leite Borges José Leite da Silva José Pereira Costa José Tavares da Silva Josefa Gomes da Silva Lindomar Freitas Lúcia Rossi Lucivaldo Pereira da Silva Marcelo de Souza Crispim Marcelo Pereira Leite Marcílio Borges da Silva Maria da Glória Araújo Maria José dos Santos Nivaldo da Costa Paulo Rogério S. Amorim Reginaldo Silva Rogaciano Alves Bezerra Romilda Jose Bispo Tabajara de S. Macieira
Monitoria!Monitor team Chefe/Department chier.Carlos EduardoUchôa Fagundes Jr.
Nazareth Pacheco e Silva Maria do Carmo Alferes Adriana Cavallaro Alcyone de Godoy Alessander R. R. Borba Álvaro Eduardo Vaz da Silva Ana Maria Correia de Novaes Ana Paula de Camargo Lima Andrea E. Cabrini Antônio Vinicio Frezza Berenice F. Calandriello Carla Zaccagnini Carlo Romani Carlos Augusto L. Arouca Claudia Fernanda Sperb Claudia R. Souza Senna Cristina Bava Daniel Ferreira Lima Daniella Elgul Samad Eduardo Comodo Valarelli Eliana Baroni Fábio Lima Freire Fernando de Paula Simões Gilberto Mariotti Filho Herta Franco José Pedro Martins Silva Kênia Marangão Leandro Henrique Siena
Lúcia Ferraz Nogueira Luciana Mourão Arslan Luiz Augusto Citrângulo Assis Maria de Lourdes Colombo Maria Inês Fernandes Pitta Marisa Amaral Camargo Naira Ciotti Nilo Mattos de Almeida Patrícia A. C. Franco Priscila Rossinetti Rufinoni Regina Kutka Renato Camasmie Dib Ricardo Cukierman Richard Calhabeu Rita L. B. Bredariolli Rubens Zaccharias Jr Saleti S. Barreto de Abreu Sílvia Maria do Espírito Santo Sônia Maria Magalhães e Silva Tahia Michele Renda Macluf Tally Traksbetrygier Teresa Viana Terezinha A. Gouveia
Secretaria!Secretarial support: Liliane Legnini Augusto Maria Rita Cássia Marinho Fukumaru Emília Moreira Gunther Nakabayashi Campelo Luiz Carlos Estevaninn
Arquivo histórico! Hystorical archive Diretor-adjunto/Assistant director: Edgardo Pires Ferreira Luiz Marques Sílvia Martha Castelo Branco Bezerra Andréa Gomes Leite Andréa Lima Alves Dalton Delfine Maziero Liliana Mendes de Oliveira Sandra Rodrigues Pandeló
Simpósio!Symposium: Agnaldo Farias
Edição dos catálogos! Catalogues edition Editora/ Publisher: Célia Valente Eliana Rocha Clare Charity Cláudia Maria de Oliveira Débora Czeresnia Ederzil Andreatta Amaral Camargo Elisa Barros de Aquino Fernando Chaves Flávia Nagelschmidt Rodrigues Francisco José Mendonça Couto Joana Tuttoilmondo Laís Tapajós
Lúcia Haddad Luiz Roberto Mendes Gonçalves Márcia Veirano Maria da Graça Mendonça Couto Maria da Penha Vilela de Carvalho Maria de Fátima de Freitas Godinho Maria de Fátima Mendonça Couto Maria Elizabeth Buarque de Almeida Maria Luiza de Freitas Godinho Mariza Romero Martha Conceição Gambini Mineo Takatama NCristina Martorana Olga Cafalcchio OIiara de Cássia Fortunato Roger Trimer Rui Moreira de Oliveira Shizuka Kuchiki Sônia Violeta Buarque de Faria Vera Caputo Possebon Wagner Homem Vara Nagelschmidt
Consultor gráfico/ Graphic consultant: Ricardo Ohtake Projeto gráfico/ Graphic design: Lígia Pedra Monica Pasinato Renan M. Figueiredo Ed. eletr. & fotolitos/ Desk publ. & photolithos: Unida Impressão/Printing house: Pancrom
PATRONOS/PATRONS
o Estado de S. Paulo
Julio de Mesquita Neto Luiz Fernando Ferreira Levy Octávio Frias de Oliveira Roberto Civita Roberto Marinho
Gazeta Mercantil Folha de S. Paulo Editora Abril
Fundação Roberto Marinho
A Fundação Bienal de São Paulo agradece a seus patronos a colaboração recebida no sentido de inovar e ampliar os meios e os métodos de implantação e utilização do marketing cultural. A parceria estabelecida entre a Fundação Bienal de São Paulo e as empresas de comunicação dirigidas pelos patronos da 22ª Bienal Internacional de São Paulo não só garantiu parte substancial da efetiva concretização desse evento, como também descortina novas perspectivas extensíveis à totalidade das atividades culturais em nosso país.
The Fundação Bienal de São Paulo wishes to thank its patrons for contributing toward innovating and expanding both the means and the methods for implementing and making use of our cultural marketing. This partnership, established between the Fundação Bienal de São Paulo and communication companies directed by the patrons of the 22ª Bienal Internacional de São Paulo, not only substantiated the base required to make this event possible, but also enables new prospects to be revealed, embracing ali the cultural activities of our country
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SUMARIO TABlE OF CONTENTS
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18 A22ª BIENAL INTERNACIONAL DE SAO PAULO: HONRAR ERENOVAR ATRADIÇAO THE 22ª BIENAL INTERNACIONAL DE SAO PAULO: N
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HONORING AND RENEWING TRADITlON
Edemar Cid Ferreira 22 AARTE FORA DOS LIMITES ART BEYOND THE LIMITS
Nelson Aguilar
,
38 HELIO OITICICA 52 LYGIA CLARK 73 MIRA SCHENDEL
90 DENG LlN 98 ARTISTAS CONVIDADOS DA CHINA/GUEST ARTlSTS FROM CHINA
100 li SHAN 101 VU VOUHAN 102 WANG GUANGVI 103 ARTISTAS CONVIDADOS DE HONG KONGIGUEST ARTlSTS FROM HONG KONG
105 FANG lIJUN 106 lIU WEI 107 ZHANG XIAOGANG
108 126 142 158
DIEGO RIVERA , JESUS SOTO JOAN MITCHELL JOHN CHAMBERLAIN 184 JORGE MOLDER , 196 JOSE BEDIA
214 224 242 281
JULlAN SCHNABEL LUCIO FONTANA , MALEVITCH MARCEL BROODTHAERS 290 MONDRIAN
306 PER KIRKEBV 325 RICHARD LONG 338 .ROBERT RAUSCHENBERG 356 RUFINO TAMAVO 382 TAL-COAT , 418 TORRES-GARCIA
440 444 451 463
FABRIZIO PLESSI GARV HILL JUDITH BARRV PAUL GARRIN
466 PLANTAS P[ANS . 474 REGULAMENTO REGU[ATlONS
HONRAR E RENOVAR A TRADIÇAO
A 22ª BIENAL INTERNACIONAL DE SÃO PAULO
Nossa 22ª Bienal abre suas portas, não dois, mas três anos após a 21ª mostra. Não se trata de descuido mas de uma homenagem especial à Bienal de Veneza, sua mais famosa predecessora, que em 1995 completará o centenário e tem um lugar especialmente reservado no mundo das artes. Tal prorrogação do biênio anunciavase sem dúvida auspiciosa, pois permitia levar a bom termo o projeto de um evento extraordinário, à altura dos mais espetaculares de nossa história. Assim que começamos a organizar esta Bienal, a questão da ruptura com o suporte na arte contemporânea mostrou ser a mais pertinente hoje. Toda a riqueza das manifestações que invadem a cena artística encontrou repentinamente o denominador comum: a expansão da tela ou da massa escultural, paixão da atualidade. Instalações, performances, experiência.s com novos materiais, tudo está resumido na vontade de sair dos territórios predeterminados pela tradição. Mesmo quando os reinventores da pintura trabalham telas, já não celebram a disciplina cubista ou a irreverência expressionista, mas dão conta do ilimitado, da ausência de fronteiras que caracterizam o panorama de nossa civilização nos dias de hoje. Foi assim que a curadoria promulgou a escolha de artistas contemporâneos capazes de iluminar essa trilha: os brasileiros Hélio Oiticica, Lygia Clark e Mira Schendel, os americanos Joan Mitchell, Julian Schnabel e Robert Rauschenberg, ao lado dos instaladores de vídeo Gary Hill, Judith Barry e Paul Garrin, e do italiano Fabrizio Plessi, o venezuelano Jesús Soto, o cubano José Bedia, o francês Pierre Tal-Coat, o belga Marcel Broodthaers, o dinamarquês Per Kirkeby, o grupo de artistas chineses onde se destaca Deng Lin. Mas não foi só. Era importante que se criasse também um espaço museológico afim de abrigar a câmara dos ancestrais da arte contemporânea. Só assim o público brasileiro poderia sentir concretamente a importância do elo entre os precursores e os renovadores e teria a ocasião rara de constatar que arte não é moda, mas intuição do instante único que só os verdadeiros criadores sabem captar. Conseguimos. Criamos condições para trazer a exposição de Kazímir Malévitch, graças à cooperação do Museu Russo de São Petersburgo e do Stedelijk Museum de Amsterdam. A obra do artista que recapitulou magistralmente as mutações estilísticas do século - impressionismo, simbolismo, fauvismo, futurismo, cubismo, abstração absoluta - e voltou à figuração seguramente constitui a mostra de arte mais importante ocorrida n~ Brasil, desde a de Picasso, na 2ª Bienal, em 1953. Guernica e outras cinqüenta telas do mestre, que abrangem desde as conquistas do
cubismo analítico até o realismo que fustigava a guerra fria, deslumbraram os visitantes. Agora, ao lado de Malévitch vamos também mostrar o ateliê novaiorquino de Mondrian, verdadeiro testamento estético, para revelar como acontece o salto da pintura à vida através dos objetos feitos pelo mestre holandês e que povoaram sua última residência. Malévitch e Mondrian levarão os visitantes a entender melhor Hélio Oiticica, Lygia Clark, Jesús Soto. O enraizamento latinoamericano da Bienal é reafirmado através de Salas Especiais consagradas aos mexicanos Diego Rivera e Rufino Tamayo, ao uruguaio Joaquín Torres-García e ao ítalo-argentino Lucio Fontana. Mas uma Bienal não é apenas uma coleção de grandes nomes da história da arte. É necessário ainda tornar a arte acessível a um número grande de pessoas, das mais diversas extrações e regiões do país. Por isso produzimos mecanismos institucionais para incentivar e mesmo garantir a visita de um enorme contingente de alunos de escolas de nível médio. Encomendamos um multimídia que deixará, sobre diversos suportes eletrônicos, um registro interativo do monumental acervo aqui reunido. E, sobretudo, estamos lançando as bases do que será a Bienal do futuro, a ser concebida como um verdadeiro museu andarilho. A exemplo do que já está sendo feito com a Bienal Brasil Século XX, pretendemos viajar pelo Brasil (e, a médio prazo, pelo exterior) com segmentos significativos da exposição, de modo a propiciar a um público não familiarizado com a arte de seu tempo uma experiência estética cujas implicações serão decisivas para a plena compreensão do sentido da noção de humanidade. Cabe, ainda, sublinhar que tamanho esforço não se traduziria em tarefa cumprida se dela não participassem, intensa e eficazmente, com rara dedicação, em prejuízo até de suas atividades privadas, os companheiros de diretoria. Referimo-nos ao editor Pedro Paulo de Sena Madureira, nosso vice-presidente, e aos publicitários Jens Olesen e Altino João de Barros. Realizada a travessia, é com sincero orgulho que damos aos visitantes e aos I e i t o r e s p r e s e n t e s e f u tu r o s d e s t e c a1-á I o g o as b o a s - v i n das à 22 ª B i e n a I Internacional de São Paulo. Edemar Cid Ferreira Presidente Fundação Bienal de São Paulo
THE 22ª BIENAL INTERNACIONAL DE SÃO PAULO
HONOR/NG AND RENEW/NG TRAD/T/ON Our 22 nd Biennial will open its doors, not two, but three years after the 21 st show It is not negligence, but a special tribute paid to the Biennial of Venice, its most famous predecessor, which will be celebrating its 100 th Aniversary in 1995 and has owned for itself a very special place in the world of arts. Such a biennium postponement was undoubtedly an auspicious announcement, since it enabled the successfull completion of an extraordinary event which stands on the same leveI with the most prominent shows of our history As the arrangements for this Biennial started, the disruption of support in contemporary art proved to be the most relevant issue today Ali wealth of the manifestations invading the artistic scenario has suddenly encountered a common denominator: expansion of painting or sculptural mass, todays passion. Installations, performances, experiments with new materiaIs, everything is summarized in the desire to escape from territories predetermined by tradition. Even when painting new inventors work on canvases, they no longer celebrate the cubist discipline or the expressionist irreverence, they tackle instead the unlimited, the absence of boundaries, characteristic the present portrait of our civilization. Therefore, the curators office selected those contemporary artists capable of shedding light on this path: Hélio Oiticica, Lygia Clark, and Mira Schendel from Brazil,· Joan Mitchell, Ju/ian Schnabel, and Robert Rauschenberg from the United States; Jesús Soto (Venezuela), José Bedia (Cuba), Pierre Tal-Coat (France), Marcel Broodthaers (Belgium), Per Kirkeby (Denmark), and the group of Chinese artists, highlighted by Deng Lin. There is also, Gary Hill, Judith Barry, Paul Garrin (U.s.), and Fabrizio Plessi (ltaly), who are involved with video installations. But that is not the whole story It was very important to create a climatized area set up according to museological conditions required to accomodate the group of contemporary art ancestors. This was the onlyway through which the Brazilian public would really perceive the importance of the link between precursors and renewers and would have the rare opportunity to ascertain that art does not mean fashion, but intuition of the unique instant only grasped by real creators. We 've made it. We have made possible that Kazimir Malevich to bring his exhibition, due thanks also to the cooperation by the Russian Museum of Saint Petersburg and Stedelijk Museum of Amsterdam. The artists work that has magnificently reviewed' stylistic mutations of the century - impressionism, symbolism, fauvism, futurism, cubism, absolute abstraction - and returned to figuration, can certainly be considered the most important art exhibition held in Brazil, since Picasso at the 2ª Bienal in 1953. Guernica
and fifty other paintings, including works from the analitical cubism triumph up to the realism that ironized the cold war, astonished visitors. Now, next to Malevich, we will also exhibit Mondrian s New York studio, a real aesthetic legacy, with the intent of disclosing the way painting steps into lite through objects which were made by the Dutch master and which populated his last residence. Malevich and Mondrian will enable the visitors to better understand Hélio Oiticica, Lygia Clark, and Jesús Soto. The Latin-American roots of the 8iennial are reasserted by Special Rooms dedicated to Diego Rivera and Rufino Tamayo, both from Mexico,· Joaquín Torres-García, from Uruguay, and Italian-Argentinean Lucia Fontana. However, a 8iennial is not only a collection of renowned artists in the history of art. Its role is to make art available to a large number of people, from various walks of lite and regions of the country. This is the reason why we have produced institutional mechanisms to encourage and even urge a great number of students to visit the show. We have arranged for a multimedia that will prepare, on various electronic supports, an interactive record of this monumental collection gathered here. Above alI, we are introducing the foundations for the future 8iennial, to be conceived as a real traveling museum. Like the Bienal Brasil Século XX we intend to traveI throughout Brazil (and, very soon, throughout the world) with meaningful segments of the exhibition, to offer a public not familiarized with present-date art an aesthetic experience whose implications will be conclusive to fully understanding the meaning of humanity concept. Yet, it is important to mention that even this great effort would not guarantee that tasks would be completed if it were not for the intense and efficient participation, great dedication and renoucement of personal activities, of senior co~workers, editor Pedro Paulo de Sena Madureira,- our Vice-President, and Jens Olesen and Altino João de Barros, professionals of advertisement. As we approach the end of the road, we proudly welcome both visitors and present as well as future readers of this c-atalogue to the 22ª Bienal Internacional de São Paulo. Edemar Cid Ferreira Chairman Fundação Bienal de São Paulo
AARTE fORA
ART BEYOND
DOS UM TES
THE UMITS
Nel)ON AGUI~~ CU~ADO~ -Ge~Al DA LLº ~leNAlINle~NACIONAl De )AO ~AUlO
NflSON AGUI~~
A 22ª Bienal Internacional de São Paulo, que se realiza de 12 de outubro a 11 de dezembro de 1994 e reúne 70 países, além do Brasil, está baseada na questão do suporte, fio condutor que atravessa e determina a arte contemporânea desde os anos 50. Quase 200 artistas estrangeiros apresentarão seus trabalhos, inclusive em vídeo; 26 brasileiros e uma série de eventos paralelos à Bienal propriamente dita se encarregarão de traçar um pouco dessa história que, como objetivo maior, pretende transformar o espectador em participante ativo do trabalho artístico.
The 22ª Bienal Internacional de São Paulo will take place between october 12 and December 11, 1994, and will count on the participation of 70 countries, besides Brazil. This year's Bienal focuses on the issue of support, which represents the bridge uniting and defining contemporary art from the 195()s to the present day.Almost 200 foreign artists will be displaying their works, including videos. The 26 Brazilians participating in the BISP and series of side events to the Bienal itself will provide a bit of the history designed primarily to tum the spectator into an active participant in the artistic work.
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De 50 para cá, os artistas têm se recusado a agir dentro de uma reserva, de um território predeterminado chamado tela ou massa escultural. Entram em cena as instalações, as performances, as peças, que não se contentam com a mera contemplação, mas querem também ser sentidas, ouvidas, manipuladas, embora os anos 80 mostrem a retradução em suporte bidimensional de toda a expansão anterior. A tensão entre a diástole do suporte e a sístole subseqüente é a questão artística do final do século XX, a tal ponto que marca exposições como Os Mágicos da Terra (Centro Georges Pompidou, Paris, 1989), Deslocamentos (MOMA, Nova Vork, 1991), a última Documenta (Kassel, 1992). Graças à ruptura com o suporte, porém, a bidimensionalidade, hoje em dia, não é mais a mesma. A atitude de romper com espaços limitados determinou uma distinção entre arte contemporânea e arte moderna. A arte moderna procurou colocar o mundo dentro da área bidimensional, do pano esticado e pregado no quadrilátero de madeira. Foi conquista árdua passar do espaço ilusório, renascentista, canonizado pelo academismo, à autoconfissão de que "um quadro, antes de ser um cavalo de batalha, uma mulher nua, ou uma história qualquer, é essencialmente uma superfície plana recoberta de cores reunidas numa certa ordem" (como disse o pintor Maurice Denis na revista francesa Art et Critique, em 1890, em sentença lapidar a respeito do assunto). O escândalo criado em torno de Le déjeuner sur /'herbe, de Manet, em 1863, marco do modernismo para grande parte de críticos e historiadores de arte, foi provocado mais pela ausência da camada preparatória com que todos os praticantes de belas-artes cobriam o quadro, da maneira como Manet exibia o grão da tela, do que pela personagem nua circundada por cavalheiros vestidos. A conquista
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GfNf~A[ CU~AíO~ Of íHf LLº ~leNAlINle~NACIONAl De )AO ~AUlO
From the 1950s onwards, artists showed increasing reluctance to limit themselves to the sanctioned orthodoxy of traditional mediums, that predetermined territory called canvas or sculptural mass. Emerging from this ennui came installations, performances, pieces which were not content to merely contemplate,' they wanted to be felt, heard and manipulated. Notwithstanding, the 1980s evidenced a trend to redefine two-dimensional support in a different light from that of the earlier expansionist period. The tension between the diastole of support and subsequent systole is the artistic point at issue marking the late 20th century, to the extent that it served as theme to such exhibits as Magicians of the Earth (Georges Pompidou Center, Paris, 1989), Displacements (MoMA, New York, 1991), and the last Documenta (Kassel, 1992). owing to the break with support, however, twodimensionality is no longer what it used to be. This attitude of breaking with limited spaces created a watershed between contemporary art and modem art. Modem art envisioned placing the world within a two-dimensional plane consisting of a stretched cloth nailed to a quadrilateral frame of wood. It was a trying battle to break from the illusory, Renaissance-dictated realm canonized by academicians, and to confess to oneself that "rather than a battle horse, a nude woman, or a story of sorts, a painting is essentially a flat surface covered with colors combined in a set order" (a statement by painter Maurice Denis from the magazine Art et Critique, August 1980, pg. 23-30, in an incisive remark on modem art). The scandal arising from Manet's Le déjeuner sur I'herbe in 1863, considered bya great many art crdics and historians to be a milestone of Modemism, " was caused more because Manet, in exposing the grain of the canvas, deviated from the standard practice of the Beaux-Arts school of artists who applied layers of undercoats onto raw canvas, than because of the figure of a nude surrounded by dressed gentlemen. The victory of being able to choose one's specific medium echoes in Mallarmé's statement concluding the interview: "Deep down, the world was made to eventually become a beautiful book. " or, as Joyce says: "The whole world in a nutshell. " Cubism,
da especificidade do medium encontra eco na frase com que o poeta francês Mallarmé conclui uma entrevista: "No fundo, o mundo está feito para acabar num belo livro". Ou como disse certa vez James Joyce: "0 mundo inteiro numa casca de noz". O cubismo edificou o estilo moderno, por excelência, porque adequou o volume ao plano e transformou montanhas em páginas. A arte contemporânea, por sua vez, quebra o plano pintado e invade territórios inimagináveis na arte de quarenta anos atrás. Um mesmo sentido varre o universo artístico, produzindo happenings, instalações, arte corporal, arte da paisagem, fenômeno que não é privilégio dos países desenvolvidos. A intuição dos limites do suporte tradicional encontra formulação arrojada já em 1962, em textos do brasileiro Hélio Oiticica. Outros dois artistas questionariam logo o suporte: as também brasileiras Lygia Clark e Mira Schendel. As combine paintings de Robert Rauschenberg; os ambientes de Lucio Fontana; a formulação da ausência em Marcel Broodthaers; as pedras de Richard Long; as instalações de vídeo de Gary HiII; os penetráveis do venezuelano Jesús Rafael Soto ou as construções de Per Kirkeby também ilustram essa mesma busca ao longo dos anos. Por isso também estão presentes nesta Bienal em espaços próprios - as 25 Salas Especiais. O questionamento da tela passa pela contestação da estrutura museológica complexa que propicia uma relação contemplativa entre o visitante e a obra de arte, característica de um elenco restrito de países. A ruptura com o suporte tradicional como traço definidor da contemporaneidade abrange a arte emergente da América Latina, da Europa oriental, da África e da Ásia. Um novo tipo de contato é procurado e solicitado ao espectador. A saída do muro, do volume central e do suporte tradicional dos recintos protegidos do museu exprime uma necessidade tão vital que diz algo sobre o motivo da "transgressão". Quando o ornamento atinge o apogeu no neolítico, na arte bárbara das grandes invasões, na arte bizantina, na arte oceânica, isso significa a afirmação de algo novo a respeito do suporte, tanto assim que o historiador de arte F. A. van Scheltema cunhou a lei fundamental do ornamento desta maneira: "Uma forma artística só tem significação ornamental se enuncia algo do objeto no qual aparece, se subscreve à forma do suporte e, assim procedendo, elucida esta ou sublinha o acento". Isso permitiu ao historiador afirmar que não existe animal fabuloso nas fivelas bárbaras, mas animal "fiveloso". Ao colocar em xeque o dispositivo sobre o qual a arte vinha se articulando, o artista contemporâneo revela a nova maneira de se relacionar com o mundo, que pede porosidade, abandono de defesas e, conseqüentemente, ampliações de horizontes. Quando a arte sofre uma mutação desta espécie, a própria premissa antropológica sobre a qual está assentada se expande. Perguntou-se à arte brasileira quem primeiro sentiu necessidade de mudar a maneira de fazer arte. A questão não visa buscar uma identidade, pelo contrário, responde à procura da alteridade. Entre os brasileiros, três artistas promoveram o desafio: Hélio Oiticica (19371980), Lygia Clark (1920-1988) e Mira Schendel (1919-1988). Lygia e Hélio se negavam a participar do circuito artístico. Ambos vinham fazendo uma carreira fulminante na arte nacional. O abandono dos chassis foi paulatino. No caso de Hélio, os relevos espaciais (1959) eram shaped canvas em andamento, que chegariam às roupas, aos "penetráveis", transformando o espectador em participante e exigindo do público uma atitude cada vez mais dionisíaca. Lygia,
in its endeavor to make volume fit into a plane, or to tum mountains into pages, substantiates modem style par excellence. Contemporaryart, in tum, has broken the barrier of the painted plane to invade territories unimaginable to art forty years ago. The same feeling sweeps through the artistic universe producing happenings, installations, corporal art, landscape art, etc., a phenomenon which is not a privilege of the artistic circuit of developed countries alone. The perception of tradition support limits was daringly put into words as early as February 6, 1962, in a text written by Hélio Oitieica. Two other Brazilian artists question this support: Lygia Clark and Mira Schendel. The combine paintings by Robert Rauschenberg, the environments created by Lueio Fontana, Marcel Broodthaers' form and expression of absence, the rocks of Richard Long, the vide o installations of Gary Hill, the penetrables of the Venezuelan Jesús Rafael Soto, the buildings by Per Kirkeby, and so many others, also illustrate this selfsame search, over the years, to define support. This is the main reason for their being at this Bienal, each commanding his own space -the 25 Special Rooms. The questioning of canvases is part of a process which includes querying the complex museological structure, and in so doing promotes a contemplative relation between visitor and work of art, a feature which onlya handful of countries can boast of Breaking with traditional support, a trait defining contemporaneity, has spread out to take in the emerging art of Latin America, Eastem Europe, Africa and Asia. A new type of contact is sought and demanded of the spectator. . Escaping through the hole in the wall, from the central mass and from traditional support, from the protected enclosures of the museum, expresses a need so vital that it addresses the motive for this "transgression. " When the omament reaches its apogee in Neolithic times, in the barbaric art of the great invasions, in Byzantine art, in Oceanic art, this bears out the novelty of the support, so much so that art historian FA. van Scheltema coined the fundamental law of an omament in the following words.~ "An artistic form only has ornamental meaning if it expresses something about the object in which it appears, if it endorses the form of the support, and as such elucidates it or underscores the accent. " This assertion led the historian to infer that what appears on barbaric fibulae is not a fabulous animal, but rather, a fibular animal. By placing in check the mechanism being used to articulate art, the contemporary artist could expose the new way of relating with the world, which urges porosity, shedding of defenses and, consequently, broadening of horizons. When art undergoes a mutation of this sort, the very anthropological premise on which it lies expands. A question was put to Brazilian art as to who first felt a need to change the way of making art. The question does not seek to find an identity. Much to the contrary. It responds to the search for alterity (or othemess). Among Brazilian artists, three took on the challenge: Hélio Oitieica (7937-1980), Lygia Clark (1920-1988) and Mira Schendel (1919-1988). Lygia and Hélio refused to take part in the artistic circuito Both had made a brilliant career for themselves in national art. The wooden framework was abandoned gradually. In Hélio's case, the spatial reliefs (7959) were shaped canvases taking shape to become clothes and penetrables, tuming the spectator into a partieipant and demanding of the public a increasingly more Dionysian attitude. Lygia, whose contribution to the neoconcrete movement
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cuja contribuição ao movimento neoconcreto foi decisiva, através dos Casulos (1958) e dos Bichos (1960), elaborou objetos relacionais, totalmente consagrados à interatividade. Mira Schendel partiu de um horizonte cultural que teve Paul Klee como ponto de partida. (A última fase do artista suíço foi marcada pelo emprego da juta, do tecido com tramas e urdiduras escancaradas, numa espécie de contrapartida artística para a patologia dérmica que abreviaria sua vida). Por sua vez, Mira prosseguiu com a pulverização do suporte, trabalhando com papéis vaporosos, inventando transparências. A série Droguinhas (1966), para pinçar um exemplo ao acaso na sua vasta obra, lidou com a idéia da linha como um evento tridimensional, criando uma constelação de nós. A partir desses parâmetros, foi formada a representação brasileira para esta Bienal.
SALAS ESPECIAIS Os faróis brasileiros A 22ª Bienal Internacional de São Paulo mostra o trabalho de três artistas brasileiros: Hélio Oiticica (1937-1980), Lygia Clark (1920-1988) e Mira Schendel (1919-1988), que estão expostos em três das 25 Salas Especiais desta mostra, que contará ainda com Deng Lin e seus companheiros, Jesús Soto, Joan Mitchell, John Chamberlain, Jorge Molder, José Bedia, Julian Schnabel, Lucio Fontana, Marcel Broodthaers, Per Kirkeby, Richard Long, Robert Rauschenberg, TalCoat, Diego Rivera, Malévitch, Piet Mondrian, Rufino Tamayo e Torres-García, além dos quatro artistas que apresentarão seus trabalhos em vídeo.
HÉLIO OITICICA: OS OUTROS SENTIDOS Da obra plástica e teórica de Oiticica nasceu o tema da mostra. Ao afirmar, em 1961, que já não tinha dúvidas de que a era do fim do quadro estava definitivamente inaugurada, Oiticica apontou para um outro momento da arte. "O problema", dizia ele, "é da integração do espaço e do tempo na gênese da obra, e essa integração já condena o quadro ao desaparecimento e o traz ao espaço tridimensional, ou melhor, transforma-o no não-objeto". O próprio título da antologia que reúne seus textos - Aspiro ao grande labirinto, escritos entre 1954 e 1969 - revela uma visão dionisíaca da arte, em que a pura visualização é substituída pela participação do espectadoJ. Em seus Penetráveis, o público entra na obra, ouve sons, sente aromas, tem sensações táteis. O monopólio do olho é colocado em xeque. Oiticica trabalhou em todas as direções capazes de ser captadas pelo espectador. O pavimento da obra é fonte de sensação e, quando o público se descalça e entra no labirinto plástico proposto pelo artista, deixa uma parte importante de si mesmo do lado de fora para sentir com os pés a tatilidade da areia, do pedregulho. Em outros trabalhos, existe a presença da música, como nas Cosmococas, povoadas de sons de Jimmi Hendrix ou da voz de Vma Sumac, invocação incaica que, ao mesmo tempo, remete ao som de pássaros. O penetrável funde-se com o ambiente, faz parte dele, como definiu o próprio Oiticica: "No penetrável, o fato de o espaço ser livre, aberto, pois a obra se dá nele, implica uma visão e posição diferentes do que seja a obra. Um escultor, por exemplo, tende a isolar sua obra num
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was decisive, in Casulos (7958) and Bichos (7960), creates relational objects totally committed to interactivity Mira Schendel evolved from a cultural horizon which had Paul Klee as a starting point. The last phase of this Swiss artist was marked by her use of jute, and fabric of wide open weave, in a sort of artistic counterpart to the skin disease which eventually shortened her lite. She, in turn, proceeded by destroying the support, working with vaporous types of paper, inventing transparencies. The series named Droguinhas (7966), to single out a random example from her vast repertoire of works, addresses the idea of a line as a three-dimensional event, creating a constellation of knots. The Brazilian representation in this Bienal is built around this new framework.
SPEC/AL EXH/B/TS Brazi/ /eads the way The 22ª Bienal Internacional de São Paulo shows works of art by three Brazilian artists - Hélio Oiticica (7937-7980), Lygia Clark (7920-7988), and Mira Schendel (7979-7988) - on view in three of the twenty-five rooms for Special Exhibits. Also included are Deng Lin and his companions Jesús Soto, Joan Mitchell, John Chamberlain, Jorge Molder, José Bedia, Julian Schnabel, Lucio Fontana, Marcel Broodthaersm, Per Kirkeby, Richard Long, Robert Rauschenberg, Tal-Coat, Diego Rivera, Malevich, Piet Mondrian, Rufino Tamayo, and Torres-García and, in addition, four artists who will present their work on video.
HÉLIO OITlCICA: THE OTHER SENSES The theme of the exhibition originated from the modeling and theoretical work of Oiticica. When he stated, in 7967, that he no longer had any doubt that the era heralding an end to pictures was definitely here to stay, Oiticica was pointing to another feature in art. "The problem ", he would say, "is one of in tegration of space and time in the genesis of a work of art. Through this integration, pictures are already doomed to disappear. Integration brings them into the realms of the tridimensional, or better, transforms them into non-objects". The very title itself of the anthology, a collection of his texts Aspiro ao grande labirinto, written between 7954 and 7969 -shows a dionysian vision of art, where pure visualization is substituted by participation of the spectator In his Penetrables, the public moves into the piece of art, hears sounds, is aware of scents, and experiences tactile sensations. The monopoly of the eyes is put in check. Oiticica worked in every direction that might be captured by a spectator. The foundations of his work lie in a source of sensation and, when a visitor takes off his shoes and walks into the plastic maze produced by the artist, he leaves an important part of himself outside to feel the tactility of sand, of gravei, with his feet. In other works of art, there is music, such as in the Cosmococas, peopled by sounds of Jimmi Hendrix or by the voice of Yma Sumac, an Inca invocation that, at the same time, is reminiscent of the sound of birds. The penetrable merges with the atmosphere, is part of it, as defined by Oiticica himse/f" "In the realms of that which is penetrable, the fact that space is free, open, for the work takes place in it, implies a vision and a position different from what the work might be. A sculptor, for example, tends to isolate his work on a pedestal, not for reasons that are quite simply practical, but for the very sense itself of space in his work of art. Hence the need to isolate it. In the realms of the penetrable, environmental space penetrates and involves it at one and the same time". In one of these pieces namedTropicália (7967), after travelling through the labyrinth, the viewer
pedestal, não por razões simplesmente práticas mas pelo próprio sentido de espaço de sua obra. Aí a necessidade de isolá-Ia. No penetrável, o espaço ambiental o penetra e envolve a um só tempo". Num desses trabalhos, chamado Tropicália (1967), depois de percorrer o labirinto, o espectador chega a um televisor ligado em um feéric~ programa de auditório, síntese do comportamento nacional. E como se, dentro da aldeia global, Oiticica nos apresentasse o Brasil e a carnavalização de todas as condutas. Tropicália é, por excelência, uma convocação para a intermodalidade do sentir, essa passagem do olhar para o tato e daí para o olfato, para se chegar à audição e, finalmente, à televisão, sinergia de todos os sentidos. Nesta Bienal, o público poderá também ver os Parangolés (1967), obras feitas para serem vestidas e dançadas. O espectador se desmembra em participante, quando está dentro dela, e ao mesmo tempo em obra, a partir dos movimentos corporais que produz e que acionam o projeto. O corte produzido por Hélio Oiticica a partir da criação dos Parangolés causou um impacto tão grande que mesmo Lygia Clark, sua grande companheira de caminho, comentou: "O que está acontecendo? Isso é coisa de costureiro e não de artista". Logo em seguida, no entanto, ela percebeu. Passou a utilizar a lição do mais jovem, quando realizou suas máscaras sensoriais.
comes to a television set showing a dazzling show biz program, the very synthesis of national behavior. It is as if, within the global village, Oiticica were to present Brazil and the carnival-like attitude of ali behaviors. Tropicália is, par excellence, a call to the íntermodalíty of feeling - this passage from eye to touch and hence, to sense of smell, to reach the sense of hearing and, finally, to television, the synergy of ali senses. In this Bienal, visítors will also be able to see the Parangolés (1967), works of art made to be dressed and danced about. The viewer is dismembered into a participant when he is in it, and is, at the same time, inside the work of art, as from the body movements that he produces and that activate the project. The cut produced by Hélio Oiticíca as from the advent of the Parangolés wrought an impact so great that even Lygia Clark, his great companion along the way, commented: "What is happening? This has to do with a seamstress, not an artist". Soon after, however, she realized. She began to use the lesson of the younger artist when she produced her sensory masks. Oiticica 's críticísm to tradítíonal support was absolute and ínvolving. His Penetráveis will act as the didactic side of the concept on which this Bienal is based. Moving into the labyrinths, listening, and feeling, the viewer will once more have a chance, wíth a single gesture, to see thousands of years of the history of art.
LYGIA CLARK'S INFALLlBLE COHERENCE A crítica de Oiticica ao suporte tradicional foi absoluta e envolvente. Seus Penetráveis funcionarão como o lado didático do conceito sobre o qual se assenta esta Bienal. Entrando nos labirintos, ouvindo, sentindo, o espectador terá condições de rever, com um único gesto, milhares de anos de história da arte.
A COERÊNCIA INFALíVEL DE LYGIA CLARK Dezessete anos mais velha que Oiticica, Lygia Clark percorreu um caminho semelhante. E é justamente esse percurso, marcado por uma coerência infalível, que vamos apresentar na Bienal. Em sua fase concretista, Lygia começa a se preocupar com as linhas. Passa a trabalhar com grandes planos, com quadrados justapostos, mas o que interessa neles é a linha de passagem de um para outro. Em uma obra circular negra, que ela chamou de Ovo (1958), há uma espécie de moldura branca que se interrompe, mostrando que algo como uma fecundação está acontecendo dentro daquele espaço. A partir daí, ela rompe com o concretismo e começa a sair do plano, como se, grávido, ele precisasse expandir seus limites. Nos Casulos, também de 1958, há dois planos com uma pequena distância um do outro, como uma pintura que estivesse se descolando da camada original, insatisfeita de permanecer ali. Embora tanto Hélio Oiticica como Lygia Clark tenham realizado uma fecundação do espaço, os caminhos de cada um foram inteiramente distintos. Lygia fez essa passagem através de esculturas moduladas, espécies de dobradiças que possibilitam dobrar os planos e formar algo lúdico, que ela chamou de Bichos (1960). São planos de alumínio que podem ser abertos e fechados em várias posições. Vêm em seguida os Trepantes (1964), projetos realizados com o anel de Moebius, onde direito e avesso se intercambiam a ponto de se tornarem contínuos. Caminhando vai no mesmo sentido, e sobre esta obra Lygia disse, em 1964: .. Caminhando é o nome que dei à minha
Seventeen years older than Oiticica, Lygia Clark travelled a similar path. And it is precísely this path, marked by infallible coherence that we will present in this Bienal. In her concretism phase, Lygia began to show concern for line. She began to work on large planes, with overlapping squares, but what is of interest in these is the line of passage from one to the other. In a black circular work of art, that she named Ovo (1958), there is a kind of whíte frame that is interrupted to show that something resembling fecundation is taking place inside that space. As from then, she broke wíth concretism and began to emerge from the plane, as if, being pregnant, ít had to expand íts limits. In Casulos, also from 1958, there are two planes a short distance one from the other, like a painting coming unstuck from an original layer, dissatisfied wíth remaining there. Although both Hélio Oíticica and Lygia Clark carried out fecundation in space, the paths of each were entirely distinct. Lygia travelled this path by means of modulated sculpture, types of hinges that allow us to fold the planes and to form something pertaining to a game, that she named Bichos (1960). These are aluminum planes that may be opened or closed in various positions. Next are the Trepantes (1964), projects carried out wíth Moebius' ring, where right side and wrong side out interchange to the extent that they become continuous. Caminhando moves on in the same direction and, in 1964, Lygia said about this work of art: "Caminhando" is the name that I gave to my last proposition. From now on, I attribute absolute importance to the immanent act carried out by the participant. Caminhando carries with ít ali the possibilíties that are associated to action in ítself It allows the choice, the unpredictable, the transformation of virtuality into concrete enterprise".
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última proposição. Daqui em diante, atribuo uma importância absoluta ao ato imanente realizado pelo participante. Caminhando leva todas as possibilidades que se ligam à ação em si mesma. Permite a escolha, o imprevisível, a transformação de uma virtualidade em empreendimento concreto". Em seguida, convocando a participação do espectador, ela convida: "Faça você mesmo um Caminhando. Pegue uma dessas tiras de papel que envolvem um livro, corte-a na larg .. ra e cole-a de maneira a obter o anel de Moebius. Em seguida, tome uma tesoura, crave uma ponta na superfície e corte continuadamente no sentido do comprimento. Preste atenção para não recair no corte já feito, o que separaria a ., fita em dois pedaços. Quando você tiver dado a volta na fita de Moebius, escolha entre cortar à direita ou cortar à esquerda do corte já feito".
Then, calling on the participation of the viewer, she invites him to "Produce a Caminhando yourself Take one of these strips of paper wrapped round a book, cut it the right width and glue it in such a wayas to obtain a Moebius ring. Then take a pair of scissors, push one point into the surface and cut continuously lengthwise. Take care not to incide on the cut that is already made and that would divide the ribbon into two pieces. When you have worked your wayaround the Moebius tape, choose between cutting to the right ar cutting to the left of the cut that has already been made".
Suas Máscaras sensoriais (1967), da mesma forma, exigem a participação do público. Feitas para serem colocadas no rosto do participante, as máscaras têm conchas que ficam na altura do ouvido, grãos que proporcionam uma experiência tátil e que ao mesmo tempo exalam aromas e espelhos redondos, levemente afastados da vista, para que a pessoa possa olhar a si mesma ou aos outros.
Like Hélio Oiticica, Lygia Clark believed that the public should benefit from a work of art, and that it is necessary to do away with passivity on the part of the viewer. An exacerbation of this concept proved a setback to commercializing her work. Bichos were Lygia Clark's last works of art to be commercialized. In the same way, when Oiticica went on to produce Penetráveis, it became impossible to seI/ his work in gal/eries ar to exhibit it in museums. To both artists, museums eventual/y became a kind of prison for works of art and the gal/eries became places where artists in this modality could not show their projects. This reinvidicating criticai aspect made them very demanding in relation to the artistic milieu and to art. This was no longer producing a painting - something that could be sold. They were more interested in divulging than in sel/ing their work, in an antielite position that was to lead them to fit themselves into the international circuit to continue their work. Hélio settled in England and in the United States, and Lygia went to live in France. In Paris, appointed teacher of arts at the Sorbonne and inspired by movements in May 7968, she made her lessons real performances. Her interaction with the public became so intense, that it became a therapeutic relationship. When she returned to Brazil in 7976, she opened a clinic where her plays became directed relational objects, directed at therapy. By means of these, the patient was treated as if he were an artist without works of art, lacking in expression. At this stage, Lygia's work became a clinic.
Como Hélio Oiticica, Lygia Clark acreditava que o público deve desfrutar da obra, que é necessário acabar com a passividade do espectador. A exacerbação desse conceito colocou em xeque o problema da comercialização de suas obras. Os Bichos foram as últimas obras comercializadas de Lygia Clark. Da mesma forma, quando Oiticica parte para realizar os Penetráveis, a venda de seus . trabalhos em galerias ou sua exposição em museus torna-se impossível. Para os dois artistas, os museus acabaram se transformando numa espécie de prisão de obras e as galerias, lugares onde artistas dessa modalidade não podem mostrar seus projetos. Esse lado reivindicador, crítico tornou-os muito exigentes em relação ao meio artístico e à arte. Não se tratava mais de fazer pintura, algo que pode ser vendido. Estavam mais interessados na divulgação do que na venda de seus trabalhos, numa postura antielitista que os levaria a se inserir no circuito internacional para continuar seus trabalhos. Hélio se estabeleceu na Inglaterra e nos Estados Unidos, e Lygia foi morar na França. Em Paris, nomeada professora de artes na Sorbonne e inspirada pelos movimentos de maio de 1968, fez de suas aulas verdadeiras performances. Sua interação com o público se tornou tão intensa que se transformou em relação terapêutica. Quando voltou ao Brasil, em 1976, abriu uma clínica, onde suas peças se tornaram objetos relacionais dirigidos à terapia. Através deles, o paciente era tratado como se fosse um artista sem obras, a quem faltasse a expressão. Nesse momento, o trabalho de Lygia se transformava em clínica.
HerMáscaras sensoriais (1967), in the same way, demand the participation of the public. Designed to be placed over the participant's face, the masks have shel/s on a levei with the ear, grains that afford a tactile experience and, that at the same time, give off aromas, and round mirrors that are slightly away from the eyes so that a person may look at himself ar at others.
MIRA SCHENDEL'S OBJETOS GRÁFICOS Although she worked in São Paulo and did not belong to the concretism group in which Hélio Oiticica and Lygia Clark were outstanding, Mira Schendel played a role similar to the other two artists as regards questioning the support framework. Mira sought the rarefaction of pictorial elements, rendered them more pure, and díd not keep exclusively to canvas, alternating flat surface support with tridimensional works of art. In her Objetos gráficos (7967-7973) that wil/ be shown at this Bienal exhibition, transparency is important - the fact that the work of art is traversed by light. The support becomes diaphonous, gossamer.
OS OBJETOS GRÁFICOS DE MIRA SCHENDEL Embora trabalhando em São Paulo, sem se vincular ao grupo concretista do qual se destacaram Hélio Oiticica e Lygia Clark, Mira Schendel desempenhou um papel semelhante ao dos outros dois artistas em relação ao questionamento do suporte. Mira buscou a rarefação de elementos picturais, tornou-os mais puros e não se ateve apenas à tela, alternando o suporte plano com obras
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In another series entitled Droguinhas (1966), she worked with paper and began to crumple the paper until it was reduced to lines, to knots, as from
tridimensionais. Em seus Objetos gráficos (1967-1973), que serão mostrados nesta Bienal, o que importa é a transparência, o fato de a obra ser atravessada pela luz. O suporte se transforma em algo diáfano. Em outra série chamada Droguinhas (1966), ela trabalhou com papel e começou a amassá-lo até ele se transformar em linhas, em nós, a partir dos quais foi se criando um novelo. A linha se tornou ativa dentro do espaço, virava uma espécie de barbante que se entrelaçava, como se tivesse saído do suporte plano do papel e permanecesse no espaço. Outro caso absolutamente inédito é a série chamada Sarrafos (1987), em que Mira partiu de um plano branco e de uma linha que se expande até virar sarrafo. A partir de um ponto, não sabemos mais discernir qual é o suporte: se a linha preta formada pela madeira ou o branco. Essa impossibilidade de distinguir qual é o fundo constituiu um engendramento de espaço tão forte quanto o que ocorria nos Casulos de Lygia Clark. No começo foi a linha sobre o papel, sobre a parede. Aos poucos, ela se tornava autônoma, saía do papel, virava uma presença que ao mesmo tempo suportava o suporte. Dentro da obra de Mira não existiu, portanto, uma linguagem meramente contemplativa, embora ela fosse uma grande desenhista e pintora. Para mostrar suas obras na Bienal, treinamos uma equipe de monitores que vai interagir com o público. O anseio da Bienal é fazer desses três artistas brasileiros as bússolas capazes de iniciar o público na trajetória da arte contemporânea, ajudando-o a navegar por conta própria, com instrumentos de aferição tão precisos que cada um dos visitantes se torne um crítico de arte à sua maneira. Através de Oiticica, Lygia e Mira, se chegará aos outros artistas para verificar como eles se soltaram do suporte tradicional para atingir o inédito que caracteriza . a arte contemporânea.
Os contemporâneos AS TAPEÇARIAS DE DENG LlN Deng Lin partiu dos tradicionais desenhos chineses de flores de ameixeira e atingiu o gestualismo da action painting. Filha do dirigente Deng Xiaoping, sua carreira sofreu variações que refletem a política da China. Os partidários da história social da arte são capazes de dizer como a revolução cultural ou os massacres da Praça Tiananmen repercutem em seu percurso. Esta Bienal apresenta as tapeçarias em seda da ilustre artista, ao lado das obras de Li Shan, Vu Vouhan, Wang Guangyi, da China, e de Fang Lijun, Liu Wei e Zhang Xiaogang, de Honk Kong, desejando que a autonomia do processo artístico se torne realidade na República Popular da China.
which a skein was formed. The thread became active within the space and became a type of string interwoven as if it had left the flat surface support of . the paper and as if it remained in space. Another case that was absolutely unique was the series entitled Sarrafos (1987), where Mira started as from a white plane and from a line that expands until it becomes a slat. As from a given point, we can no longer discem what the support is: whether it is the black line formed by the wood ar the white line. This impossibility to distinguish what the background might be, was an engendering of space so strong as that in Lygia Clarks Casulos. At first it was line on paper, on the wall. Litt/~ by little it became autonomous, left the paper, became a presence that, at the same time, offered support to the support. In Miras work, therefore, there was no merely contempla tive language, although she was a great designer and painter. To show her work in the Bienal, we trained a team of monitors to interact with the public, The prime objective at Bienal is to make of these three Brazilian artists compasses able to initiate the public in the trajectory through contemporary art, enabling it to navigate on its own, with metering instruments so precise that each visitar will becomean art critic each in his own way. Through Oiticica, Lygia and Mira, visitors will reach other artists to observe how they broke loose from traditional support to attain the unique features that characterize contemporary art.
Contemporary Artists DENG LlN'S TAPESTRIES Deng Lin took the traditional chinese design of peach blossom as a departure point and attained the gestural of action painting. Daughter of leader Deng Xiaoping, her career underwent changes that reflect Chinas policies. Those who pake the side of social history of art are able to describe how the cultural revolution ar the Tiananmen Square massacres leave repercussions in their wake. The Bienal shows silk tapestries by the famous artist together with work by Li Shan, Yu Youhan, Wang Guangyi, from China, and Fang Lijun, Liu Wei, and Zhang Xiaogang from Hong Kong, in the hope that the autonomy of the artistic process will become a reality in the Popular Republic of China. JESÚS SOTO'S PENETRABLES Included among the great kinetic artists, Venezuelan Soto conducted his research in Paris, marked by his country to such an extent that he founded the Jesús Soto Museum in Ciudad Bolivia in the midst of the Amazon jungle, on the banks of the Orenoco river, 500 km south of Caracas. His work is therefore from these depths, from a peripheral place within conventional artistic memory.
OS PENETRÁVEIS DE JESÚS SOTO Incluído entre os grandes artistas cinéticos, o venezuelano Soto fez suas pesquisas em Paris, marcado por seu país de tal forma que fundou o Museu Jesús Soto na Ciudad Bolivia, em plena selva amazônica, às margens do rio Orenoco, 500 km ao sul de Caracas. Sua obra vem, portanto, dessas profundezas, de um lugar periférico dentro da memória artística convencional.
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Nesta Bienal, vamos mostrar alguns penetráveis de Soto, estruturas que o espectador atravessa e dentro das quais sente obstáculos flexíveis, deslocáveis. Um dos penetráveis é feito por cinqüenta quilômetros de fios de ny/on, que compõem uma espécie de chuva plástica. À medida que o espectador entra nele, tem a sensação de ser abraçado por esses milhares de fios de plástico que chovem do forro. O envolvimento proporcionado pela obra de Soto vai criar uma homologia com os penetráveis de Oiticica, embora o trabalho de Hélio proponha um percurso e o do artista venezuelano se dirija ao conhecimento de uma experiência sensorial. Há também um outro penetrável, desta vez sonoro - Soto é guitarrista e durante um tempo viveu de música -, feito com tubos de alumínio de sete diferentes espessuras que vibram como notas musicais. Quando percorrido pelo visitante, o penetrável emite um som produzido pelos tubos de alumínio que, ao bater uns contra os outros, parece um carrilhão.
In this Bienal, we will show some of Soto's penetrables, structures that the viewer traverses and within which he feels flexible, movable obstacles. One of the penetrables is made out of fifty kilômeters of nylon yam that make up a kind of plastic rain. As the viewer moves on into the work of art, he experiences the sensation of being enveloped by these thousands of plastic threads that rain down from the ceiling. The involvement afforded by Soto's work will generate a homology with Oiticica's penetrables, although Hélio's work suggests a path travelled, whereas that of the Venezuelan artist is directed towards knowledge of a sensorial experience. There is also another penetrable, this time with sound - Soto is a guitar player and for some time lived from music - made out of aluminum tubes of seven different thicknesses that vibrate as musical notes. When traversed by a visitor, the penetrable produces a sound as a result of the aluminum tubes striking one against the other, like a carillon or chimes.
JOAN MITCHELL: PAINTlNG MOVEMENT
JOAN MITCHELL: A PINTURA DO MOVIMENTO Falecida há dois anos, Joan Mitchell fez uma obra que se insere no expressionismo abstrato, mas revela grande singularidade. Seus trabalhos apresentam traços orientais, são obras extremamente caligráficas, e nesse sentido diferem da pintura gestual, que se inscreve muito mais como uma coreografia aérea do braço. A caligrafia é assinatura e como tal exige um embate com a tela, enquanto a action painting - tanto no ato de derramar a tinta como no gesto de chicotear a tela com o pincel - mostra alguma coisa feita à distância do quadro. Esse embate com a tela realizado por Joan Mitchell se traduz numa espécie de plantação pictural que a aproxima de Monet. Em seus quadros, existe ao mesmo tempo uma proximidade e uma independência em relação à natureza, fortemente introjetada dentro da arte. Impressio,nante também em sua obra é o flagrante, a captação do instante. E possível imaginar que depois de pintar com a tela deitada, em seguida ela a levanta ainda molhada e, sobre ela, derrama as sobras de til!ta em cascatas que participam ativamente das caligrafias. E como se o instante florescesse, originando um novo produto, construído pelas tintas que caminham no sentido da queda, como estalactites do quadro. Trata-se de uma espécie de celebração da natureza em glória e isso se liga de alguma maneira à motricidade. A arte de Joan Mitchell nunca está parada, e esse movimento nasce da própria pintura e não do gesto da artista. Curiosamente, ela foi patinadora.
Joan Mitchell died two years ago. Her work is included in abstract expressionism, but with peculiarities ali its own. Her works of art are on orientallines and are extremely calligraphic, and in this sense, they differ from gestural painting, more important as air choreography of the armo Calligraphy is a signature and, as such, it demands a dialog with the screen, whereas action painting - both in the act of spilling the paint as in the gesture of striking the canvas with the paintbrush - shows something produced at a distance from the painting. This dialog with the canvas by Joan Mitchell translates into a kind of pictura/ planting that brings her close to Monet. In her paintings, there is both proximity and independence in relation to nature, strongly introjected within art. The flagrant aspect, capturing an instant, is also impressive in her work. It is possible to imagine that, having painted with the canvas Iying flat, she then raises the canvas as yet wet and on it spills the leftover paint in cascades that are an active part of the calligraphy It is as if the instant were to flourish giving rise to a new product built up by the paints that move downwards, like stalactites of the painting. This is a kind of celebration of nature in gloryand this is in some way associated to motility Joan Mitchell's art is never stopped and this movement arises from the very painting itself and not from the artist's gesture. Curiouslyenough, she was a skater. The expansive property of white, whether as paint, or as void can also be noted. Mitchell's painting throbs, takes leave of the pictural surface, of the supporting framework, like a palpitating heart.
JOHN CHAMBERLAIN: CONTEMPORARY BAROQUE SCULPTURE
É de se notar ainda o poder expansivo do branco, seja como tinta ou como vazio. O quadro de Mitchell pulsa, sai da superfície pictural, do suporte, como um coração palpitando. JOHN CHAMBERLAIN: A ESCULTURA BARROCA CONTEMPORÂNEA O americano John Chamberlain, nascido em 1927, faz da sucata sua matéria-prima e começou a desenvolver suas esculturas no momento em que a cena americana estava tomada pelo expressionismo abstrato, pelas obras extremamente gestuais da action painting. Em suas peças, ele usa o amassado como se fossem pinceladas, 28
u. S. artist John Chamberlain was bom in 1927. He made of scrap metal raw material and began to develop his sculpture as from the time the U.S. scene was dominated by abstract expressionism, by the extremely gestural works of art of action painting. In his paintings, he uses crumpled elements as though they were the strokes of a brush, transforming metal structures into jets of paint, like the dripping of abstract expressionists. Brightly colored or of a very luminous white, these structures show enormous vitality
transformando as estruturas metálicas em jatos de tinta, como o dripping dos expressionistas abstratos. Extremamente coloridas ou apresentando um branco muito luminoso, essas estruturas revelam enorme vitalidade. Ao utilizar, no entanto, elementos da vida urbana, como a sucata ou a lataria de automóveis, Chamberlain liga-se também à pop-art. Seu trabalho muda o destino da mercadoria industrial, transformando-a em arte e realiza com grande contundência o sonho dos artistas pop de utilizar informações do cotidiano, do lixo com que a indústria publicitária entope o consumidor, convertendo-o em antídoto. Sua obra desenvolve ainda um lado barroco muito apurado e, se entendermos o barroco como uma riqueza de dobras, Chamberlain aproxima-se de certos escultores do Renascimento, como Oonatello e Bernini.
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AGENTE SECRETO" JORGE MOLDER
Nas fotos de Jorge Molder, existe a herança de uma plástica inconformista. Filósofo, avizinha-se até certo ponto de Atget, que fotografava espaços desertos, vazios de pessoas mas onde pulsava uma intensa vida própria. Para Walter Benjamin, as fotografias de Atget são como o teatro do crime no sentido de que elas registram a maneira como a polícia registra o local do sinistro. Molder atua de forma parecida. Em sua obra O agente secreto, as fotos parecem antecipar um crime, como se cada objeto estivesse à espera de um acontecimento que mudará sua trajetória. O agente secreto protagonizado pelo próprio Molder - está atrás de alguma coisa que não sabemos o que é, mas cuja intensidade nos transforma em participantes, divididos entre o que veio antes e o depois. No cenário de Molder, todos os objetos são passíveis de serem convertidos em provas de um delito que ainda não foi julgado.
By using elements of urban lite, however, such as scrap or bodywork on automobiles, Chamberlain was also associated to pop-art. His work changed the fate of industrial merchandise by changing it into art and in a cutting way; he made real the dream of pop artists, namely to utilize information from dayto-day lite, from the garbage with which the publicity media chokes the consumer, converting it into an an tido te. His work also develops a more refined baroque aspect and, it we can see the baroque as a wealth of folds, Chamberlain is close to certa in Renaissance sculptors such as Donatello and Bernini. "SECRET AGENTil JORGE MOLDER In the photographs of Jorge Molder, there is a heritage of nonconformist fine arts. As a philosopher, he is to a certa in extent, close to Atget who photographed desert spaces empty of people, but with a pulsating lite of their own. To Walter Benjamin, Atget's photographs are like crime drama, in the sense that they record the manner in which the police make a record of the scene of the crime. Molder acts in a similar way. In his work Oagente secreto, the photographs seem to anticipate a crime, as it each object were in wait of an event that would change its course. The secret agent - played by Molder himself - is after something, we do not know what, but whose intensity makes us participants, divided between what came before and what came later. In Molder's scenario, ali of the objects can be converted into proof of a crime that was not yet judged. This artistic object as it lives a pause, like a defendant waiting to-be convicted or absorbed, and is precisely what Molder infers in his photographs. Theyare objects that seek the gaze of the spectator to pass or to fail in their existence, already expelled from paradise, in the precarious condition of one awaiting the verdict. JOSÉ BEDIA: POETRY DF THE ARCHETYPES
Esse objeto artístico que vive uma pausa, como um réu à espera de ser condenado ou absolvido, é exatamente o que Molder apura em suas fotos. São objetos que procuram o olhar do espectador para serem aprovados ou reprovados em sua existência, já expulsos do paraíso, precários na condição de quem aguarda o veredicto.
JOSÉ BEDIA: A POESIA DOS AROUÉTIPOS A presença de Bedia nesta Bienal corrige um dado que pertence apenas ao terreno político. Teremos, desta vez, além da representação oficial de Cuba, a diáspora artística da ilha, personificada em Bedia, que vive em Miami. Ao mesmo tempo que essa dupla representação testemunha a força da arte cubana, ressalta também a presença de obras ligadas à herança negra e indígena das Antilhas e do continente americano e que não se confinam a um só país. Bedia tenta captar os mitos em constante migração que fazem parte do imaginário de uma cultura inédita e extremamente mestiçada. Sua obra se assemelha a uma tatuagem, algo que sai da tela e quer viver no corpo de alguém, como uma espécie de grande sinal, de totem, de símbolo secreto e reunificador.
The presence of Bedia in this Bienal corrects data that belong only to the political terra in. This time, besides the official representation in Cuba, we will have the artistic Diaspora of the island, personitied in Bedla who lives in Miami. At the same time that this double representation is witness to the strength of Cuban art, it also emphasizes the presence of work associated to the black and Indian heritage of the Antilles and of the American continent and that are not limited to only one country. Bedla endeavors to capture the myths in constant migration that are part of the imaginary of a unique and extremely crossbred culture. His work is similar to a tattoo - something that leaves the canvas and would like to live on somebody's body; as a kind of large sign, a totem, a secret and reunitying symbol. Although the mythical American Patrimony is lived out fully in his paintings, his figures are reminiscent at the same time of Sumerian or Assyrian characters. Theyare, in fact, available to any telluric force, from any invocation on earth. They translate the simplicity of an African drum, of tribal, ritualobjects.
Apesar do patrimônio mítico americano ser vivenciado de maneira plena em seus quadros, suas figuras lembram ao mesmo tempo personagens sumérias, assírias. Elas estão, na verdade, à disposição
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de qualquer força telúrica, d,e qualquer invocação da terra. Traduzem a simplicidade de um tambor africano, de objetos tribais, rituais. No entanto, não é possível dizer diante de suas telas: "Esta figura quer dizer exatamente isso",porque embora sejam entidades parecem estar aguardando uma disponibilidade religiosa para serem adoradas. Não há um lugar exato para elas. Também não se pode afirmar que as telas de Bedia sejam meramente figurativas. Ofundo é f~ito às vezes de estrelas, a lua está sempre presente, existem dísticos que atravessam a tela, mas sua pintura possui a força tanto da abstração quanto da figuração, do inesgotável manancial dos arquétipos. OS MATERIAIS INUSITADOS DE JULlAN SCHNABEL Julian Schnabel é um dos grandes pintores da contemporaneidade, capaz de converter qualquer coisa em obra de arte. Nesse sentido, tem algo de Picasso, que transformava um guidão de bicicleta em cabeça de touro. Schnabel se utiliza de materiais heteróclitos. A cerâmica aparece como elemento pictural dentro da tela, como fragmentos de louça que fazem parte da pintura, num processo semelhante ao da brasileira Adriana Varejão. Ele trabalha também com letras, e elas assumem ritmos dentro da tela, transformam-se em elementos plásticos. A expressão I don't care (Eu não me importo), por exemplo, contida em um de seus quadros, revela formas: o fechamento do o, a coluna do i, o laço do c, que integram a obra e influem decisivamente no que as circunda. Esse tipo de diversificação plástica só é bem sucedida para quem domina o campo de tensões plásticas que uma tela pode suscitar. Schnabel tem, ao mesmo tempo, um sentido religioso da obra. Ela acontece como retábulo, feita para abrigar a presença do sagrado. Por vezes existe uma repartição à maneira de um políptico; o espaço pode se desdobrar em várias folhas, como se fossem biombos verticais ou horizontais. Os acidentes compreendidos no suporte são também elementos picturais em sua arte. Por vezes, a tela tem um desenho especial para conter o que ele está comunicando. Esse culto ao material existe também em suas esculturas. Há uma submissão, uma humildade do artista em relação ao material que o aproxima da arte povera. LUCIO FONTANA: A VIDA FORA DA MOLDURA A história da explosão do suporte tradicional tem uma dívida muito grande em relação ao ítalo-argentino Lucio Fontana (1899-1968). Em 1951, ele apresentou na 3ª Trienal de Milão uma estrutura em neon que estamos mostrando nesta Bienal. É uma espécie de auréola, uma linha luminosa solta no espaço, algo que saiu da tela e bóia no teto, suspenso, como um planeta pintor capaz de desenhar sua órbita. A caligrafia espacial do neon enfatiza a importância dos intervalos. Ao problematizar o suporte, como fez Lucio Fontana, o artista questiona o dogma de a pintura ter que estar circunscrita a um quadrado de pano esticado e nos diz que a vida não pode ser como sempre foi, que não podemos encará-Ia dentro de uma moldura fixa, como um hábito.
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It is not possible, however, to say, from his canvases that: "This figure means precisely this", because although theyare entities, they se em to be awaiting . religious availability in order to be adored. There is no exact place for them. Neither can it be affirmed that Bedla 's canvases are merely figura tive. The background is sometimes made up of stars, the moon is invariably present, there are distichous forces that traverse the screen, but his painting possesses the strength both of abstraction and of figuration, of the inexhaustible source of archetypes.
THE UNUSUAL MATERlALS DF JULlAN SCHNABEL Julian Schnabel is one of the great contemporary painters, able to convert anything into a work ofart. In this sense, he is somewhat like Picasso who transformed bicycle handlebars into the head of a steer. Schnabel uses heteroclite materiais. Ceramics appears as a pictorial element within the painting with fragments of china that are part of the painting, in a process similar to that of Brazilian Adriana Varejão. He also works with letters and they assume rhythms within the painting, and become modeling . elements. The expression "I don't care", for example, contained in one of hi§:' paintings, reveals shapes: the closing 0, the column on the i, the loop on the: c, that make up his work and have a decisive influence on what surrounds them. This type of plastic diversitication is only successful for those who master the tensions that a canvas can arouse. At the same time, Schnabel has a religious sense to his work. It manitests itself as an altarpiece made to shield the presence of the sacred. At times there is a partition in the manner of a polyptych; the space can unfo/d into severalleaves, as though they were vertical or horizontal screens. The aceidents included in the framework are also pictorial elements in his art. At times, the canvas has a special design to contain what it is conveying. This cult to the material also exists in his sculptures. There is submission, humility on the part of the artist in relation to the material that brings him close to the arte povera. LUCIO FONTANA: LlFE OUTSIDE THE FRAME The history of a breakaway from traditional support is much indebted to Italian-Argentinian artist Lucio Fontana (1899-1968). In 1951, at the 3rd Trienal in Milan, he presented a structure in neon that we are showing at this Bienal. It is a kind of halo, a luminous line loose in space, something that broke loose from the canvas and floats on the ceiling, suspended, like a painter planet able to draw its own orbit. The spaeial calligraphy of neon emphasizes the importance of the intervals. When he questions the supporting framework, as did Lueio Fontana, an artist questions the dogma wherebya painting must be circumscribed to a square of cloth stretched out and te//s us that lite can not be as it always was, that we can not view it as a fixed frame, as a habit.
Em seguida, Fontana passa a pintar quadros monocromáticos, nos quais faz incisões com o cutter e, cortando a superfície da tela, novamente nos mostra que nada é imutável. Em torno dos cortes linhas que se despediram da tela -, cria-se imediatamente um campo tensional muito forte. Às vezes ele faz também furos no quadro, e essas presenças táteis se transformam em céus estrelados ao alcance dos olhos. Diante delas, o olhar desfalece porque nada há para ver, é preciso observar outro código além do visual, uma espécie de nova linguagem em braille. Os furos são outra maneira de plantar a escultura dentro da tela, já que Fontana era também um grande escultor, capaz de se comunicar em idiomas diversos, como a cerâmica e a pedra.
Fontana then begins to paint monochromatic pictures in which he makes incisions with a cutter and, in cutting the surface of the canvas, shows us once more that nothing is immutable. Around the cuts - lines that bid farewell to the canvas - there is immediately a very strong fie/d of tension. At times, he also pierces holes into the painting and these tactile features become starry skies visible to the eyes. Before these, the gaze falters because there is nothing to see: it is necessary to observe another code besides the visual, a sort of new language in Braille. The holes pierced are another way of planting the sculpture inside the canvas, since Fontana was also a great sculptor, able to communicate in several languages such as ceramics and stone. THE DISLDDGING DF SIGNIFICANCE IN MARCEL BRDDDTHAERS
O DESLOCAMENTO DE SIGNIFICADOS DE MARCEL BROODTHAERS Marcel Broodthaers (1924-1976) foi um artista que fundiu poesia e pintura. Profundamente engastado na arte belga, sua obra nos reenvia imediatamente a Magritte. Seu famoso quadro que apresenta um cachimbo com a inscrição "Ceci n'est pas une pipe" (Isto não é um cachimbo) abre um projeto de negação da referência estabelecida que Broodthaers persegue em sua obra. Ele é, no entanto, muito mais material do que Magritte e é exatamente essa, característica que o torna imprescindível para a arte contemporânea. Uma das obras mais instigantes de Broodthaers é a reconstituição de seu ateliê, em escala natural, que chamou La salle blanche, presente nesta Bienal. O conjunto provoca estranheza: no lugar de elementos reais, há palavras, como se todo o ateliê tivesse se transformado numa página de livro. Espaciais, as palavras adquirem certo grau de arbitrariedade, ocupam um lugar, fluem dentro do espaço como um poema de Mallarmé, paginadas segundo seu significado e sonoridade. Feitas em escrita cursiva, levemente tombadas à direita, elas apontam em direção a uma rapidez de apreensão e agem no sentido contrário ao da ilusão criada pela pintura. Um quadro dá a sensação de que alguma coisa está ocorrendo. Broodthaers inverte essa lógica, colocando a obra como parte da realidade, como se um livro estivesse acontecendo dentro da sala. Essa operação de desabituação está presente em seus outros trabalhos, como quando ele trabalha com palmeiras, elementos que servem para dividir espaços nos museus, separar pintores clássicos de modernos, isolar tendências diferentes. Inocentes, elas constituem verdadeiras fronteiras armadas entre países, protegendo obras de contaminação indevida. Broodthaers altera essa disposição e usa as palmeiras simplesmente, sozinhas, separando nada de nada, atestando a impossibilidade de se insistir nessas divisões arbitrárias.
Marcel Broodthaers (1924-1976) was an artist that blended poetry and painting. Deeply inlaid in Belgian art, his work reminds us immediately of Magritte. His famous painting that shows a pipe bearing the inscription "Ceci n'est pas un pipe" (This is not a pipe) opens a project of negation of established reference that Broodthaers pursues in his work. He is, however, much more material than Magritte, and it is precisely this characteristic that makes him indispensable to contemporary art. Dne of Broodthaers most intriguing works is the reconstitution of his studio on a natural scale that he calledLa salle blanche, on view in this Bienal. The association produces strangeness: in place of real elements, there are words, as it ali of the studio were transformed into the page of a book. Spacial, words acquire a certa in degree of arbitrariness: they occupy a place, flow within space like a poem by Mallarmé, composed according to their significance and sonority. Produced in cursive writing, slightly slanting to the right, they point towards a quick grasp and act in the sense contrary to that of illusion brought about by painting. A painting conveys the feeling that something is taking place. Broodthaers inverts this logic placing this work of art as part of reality, as it a book were taking place in this very room. This operation of becoming unaccustomed to something is present in his other works, as when he works with palms, elements that serve to divide space in museums, to separa te c/assical from modem painters, or to isolate ditferent trends. Innocent as theyare, theyare real armed frontiers between countries offering protection to works from undue contamination. Broodthaers alters this disposition and uses palms simply, alone, separating nothing from nothing, bearing witness to the impossibility of insisting in these arbitrary divisions. In this Bienal, we are also presented with his inscription plates. These are signboards where the signs change in sense and read precisely the opposite to what they seem to indica te. There is a signboard, for example, with the words "Musée - Enfants non admits" (Museum - Children not allowed), when it is dogs that are not allowed in museums. This dislodging of significance builds a project of decontextualization of day-to-day lite. At the same time, it
Nesta Bienal estamos apresentado também suas placas de inscrição. São tabuletas de sinalização, em que os signos mudam de sentido e dizem exatamente o contrário do que parecem indicar. Há uma placa, por exemplo, onde está escrito "Musée - Enfants non admits" (Museu - Proibida a entrada de crianças), quando são os cachorros que não podem entrar nos museus. Esse deslocamento de significados constrói um projeto de descontextualização do cotidiano. Ao mesmo tempo, existe um jogo de ironias no fato de essas placas se
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assemelharem a páginas de uma cartilha. São tabuletas para o ensino da leitura, mas a confirmação do que se lê é imediatamente contestada, criando um curto-circuito de sentido.
is ironic that these signboards are similar to the pages of a primer. These signboards teach reading, but the confirmation of what is being read is immediately contested, starting a short-circuit in sense.
PER KIRKEBY, O OLHAR PARA O SOLO
PER KIRKEBY, GAZING DOWNWARD TO THE GROUND
Na tela do dinamarquês Kirkeby está presente uma idéia de extensão. Geólogo de formação, coloca em seus quadros a na!ureza em atividade, como algo que se engendra, prestes a produzir. E um olhar para o solo, para uma série de extratos que esse solo recobre, como se a pintura fosse um terreno recoberto de camadas e o espectador tivesse um olhar tão penetrante que pudesse distinguir o que está oculto sob essas camadas. No fundo do terreno, então, ele reconhece forças em conflito, materiais que não poderiam estar juntos e que se encontram em erupção.
Danish artist Kirkeby's painting presents an idea of extension. Geologist by formation, he inc!udes nature in activity into his paintings as something that engenders, soon to produce. It is a do wnward gazing to the ground for a series of extracts that this soil covers as if the painting were a terrain covered in layers and as if the viewer would have a gaze so penetrating that he might distinguish that which was hidden under these layers. At the bottom of the terra in, then, he recognizes forces in conflict, materiais that could not be together and that are in eruption.
Não são quadros que se contentem em ser vistos num só relance. Pode-se dizer isso de muitas obras, mas o que distingue Kirkeby é que o olhar precisa germinar junto com o trabalho. Não existe uma imagem imediatamente dada, mas uma seqüência de notas soltas cuja música terá que ser composta pelo espectador. Kirkeby se considera acima de tudo um pintor, mas é capaz de se expressar de maneira brilhante também na escultura, trabalhando materiais diversos como o bronze ou criando estruturas com tijolos. Mas a escultura para ele é uma espécie de estação de cura para recomeçar a pintar, um trabalho de pausa nessa guerra que é a pintura. Originário do movimento Fluxus - de viés radical, dadaísta, para quem a arte enquanto tal era uma excrescência - Kirkeby se desligou do grupo, mas conservou dessa militância uma grande disciplina e a determinação de buscar a arte em lugares improváveis e distantes, formulando quadros muitas vezes difíceis de serem compreendidos, mas com alto grau de surpresa e imprevisibilidade.
O ANDARILHO RICHARD LONG A obra do inglês Richard Long surge nos anos 60. Ele é um andarilho, um homem que percorre o mundo e faz interferências em campos, desertos, planaltos, deixando o marco da passagem humana pela natureza e fotografando em seguida essas incisões. Sua experiência lembra os menires dos povos do neolítico. Nos círculos de pedra deixados por essas civilizações, o menir está sempre colocado de maneira precisa em relação ao entorno. A pedra desvenda o que existe à sua volta, é um foco de energia imantador. Em torno dela, todo o espaço se articula e se torna cúmplice. É impossível não associar Richard Long a essa presença dos menires, sobretudo ao parque de Stonehenge, na Inglaterra, um dos mais impressionantes sítios arqueológicos do mundo. Ouando Long faz numa galeria um círculo de pedras é como se o mundo fosse devolvido à galeria. Todo o percurso que andou, as centenas de milhas que percorreu, são imediatamente devolvidos ao espectador. Essa experiência que não cabe no espaço de um olhar, a obra que, na verdade, se torna muito mais do que aquilo que está sendo mostrado, constitui a essência da arte conceitual, da qual
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These are not pictures to be seen at a glance. This can be said of many works, but what distinguishes Kirkeby is that the gaze must germina te together with the work. There is no single image that is immediately nothing, but rather a sequence of loose notes the music of which will have to be composed by the spectator. Kirkeby regards himself above ali as a painter, but is capable of expressing himself in a brilliant fashion also in sculpture, working several materiais such as bronze or building structures in brick. Sculpture for him, however, is a kind of cure resort to recommence painting, a pause from work in this war which is painting. The founder of the Fluxus movement - radically biased, dadaist, to whom art as such was an outgrowth - Kirkeby broke away from the group but of this militancy, he preserved great discipline and the determination to seek art in improbable and distant places, but with a high incidence of surprise and unpredictabiIity.
RICHARD LONG THE WAYFARER The work of Englishman Richard Long was first in evidence in the sixties. He is a wayfarer, a man who travels the world and produces interferences in fields, deserts, plateaux, leaving a mark of human passage through nature and then photographing these incisions. His experience suggests the menhirs of the Neolithic peoples. On the circ!es of stone left by these civilizations, the menhir is always positioned in a precise manner in relation to its surroundings. The stone reveals what there is around him; it is a focus of magnetizing energy. Around it, ali of space articulates itself and is an accomplice. It is impossible not to associa te Richard Long to this presence of the menhirs, above ali at Stonehenge in England, one of the most impressive archeological sites in the world. When Long builds a circ!e of stone in a gallery, it is as if the world were returned to the gallery. Ali of the course travelled, the hundreds of miles that he covered are immediately returned to the viewer. This experience that does not fit in the space of a look, a work of art that in truth becomes much more
Long é um dos inspiradores. Em seus trabalhos, ele revela o descondicionamento total da paisagem como espaço domesticado dentro da tela.
than that being shown. is the essence of conceptual art of which Long is one of the originators. In his work, he shows the total deconditioning of the landscape as domesticated space within the painting.
Na Bienal, ele está realizando uma obra feita de meandros. Para isso, , veio antes conhecer o espaço da mostra a fim de escolher com precisão o local onde instalou seu trabalho. Com certeza, a obra de Long está criando uma espécie de ressonância, uma revelação do prédio construído por Niemeyer.
In the Bienal, he is producing a work of art consisting of meanders. For this purpose, he arrived beforehand to become familiar with the space of the sample in arder to select the precise site where he installed his work of art. Long's work is surely giving rise to a kind of ressonance, a revelation of the building constructed by Niemeyer.
ROBERT RAUSCHENBERG: O PAPA DA CONTRACORRENTE
ROBERT RAUSCHENBERG: THE POPE DF THE COUNTERCURRENT
Nos anos 50, Robert Rauschenberg percebe a insuficiência da estética pós-cubista e se nega a fazer parte da estrada real da pintura, que converteu a disciplina de Cézanne e de Picasso numa espécie de sistema infalível.
In the fifties, Robert Rauschenberg perceived the insufficiency of post-cubist aesthetics and refused to be part of the royal road to painting that transformed Cézanne and Picasso's discipline into a kind of infallible system.
Seu gesto de negação foi colocar um elemento na frente do quadro, relacionando-o com a tela, o que chamou de combine painting. O objeto, na verdade, era uma extensão do quadro, como se tivesse derramado lágrimas para fora de suas dimensões. A partir dessa ousadia, vão nascer as instalações dos anos 60 e a pintura contemporânea. Desde então, Rauschenberg se posiciona contra a corrente. Emprega em seus quadros elementos que nunca tiveram dignidade para freqüentar a pintura, como uma garrafa de Coca-Cola ou caixas de papelão. Suas colagens reúnem objetos de maneira aparentemente anárquica, tudo o que é desclassificado, pouco notado. Mistura paisagens, caras, anúncios de publicidade, imagens do mundo industrial que estão mais perto do lixo que da sala de visitas e realiza a resenha do que não foi visto, eliminando de maneira completa a narrativa tradicional. Antes de Rauschenberg, não podíamos olhar nossas costas, nosso lado invisível. Ele nos devolveu essa parte que desconhecíamos. Há artistas que são malditos por excelência. Mas Rauschenberg, que têm obras vendidas por 1 milhão de dólares, opta pela antifetichização da arte como estado natural. Com sua obra, ele mostra que não existe arte sem a semente do inconformismo. Se não for inquietante - e essa condição vem antes do fato de ser política - a arte não existe. Na obra Eco-Echo V, que vai ser apresentada na Bienal, ele utiliza um sonar, instrumento de sondagem submarina, que, ao captar a aproximação do público, começa a movimentar as pás do objeto. Essa profunda ironia, esse combate a hábitos consolidados estabelece um estreito contato entre Rauschenberg e os trabalhos de Hélio Oiticica, Lygia Clark e Mira Schendel, reunidos pela primeira vez numa mesma mostra.
AS PAISAGENS ABSTRATAS DE TAL-COAT
His gesture of negation was to place an element in front of the painting, relating it to the canvas - what he described as combined painting. The object, in truth, was an extension of the painting, as if it had spilt tears beyond its dimensions. This piece of daring was to produce the installations of the sixties and contemporary painting. As from then, Rauschenberg took a stand against the stream. In his paintings, he employed elements that were never dignified eÍ70ugh to appear in painting such as a bottle of Coca-Cola ar cardboard boxes. His collages include collections of objects in an apparently chaotic fashion - ali that is declassified, little noticed. He mixes landscapes, faces, advertisements, images from an industrial world that are closer to garbage than to the living roam, and he carries out the description of what was not seen, completely doing away with traditional narra tive. Before Rauschenberg, we could not look at our backs, our invisible side. He retumed to us this part that we did not know There are artists that are accursed through excellence. Rauschenberg, however, who has had paintings sold for I million dollars, opts for defetishizing art as a natural state. In his work, he demonstrates that there is no art without the seed of nonconformism. If it is not disquieting - and this condition comes before the fact that it is political - art does not exist. In his work Eco-Echo V, that will be shown at the Bienal, he uses sanar, an instrument for underwater exploration that senses that the public is drawing close and begins to cause the blades of the object to move. This deep irony, this struggle against consolidated habit establishes close contact between Rauschenberg and the works of art by Hélio Oiticica and Mira Schendel, shown together in one same exhibition for the first time.
THE ABSTRACT PAINTlNGS DF TAL -COAT Tal-Coat died in 1985 and in his native land, France, he is regarded as a modem painter, far from contemporary art. From the seventies on, however, he began to translate the questioning of existing support in a precise manner, and marked the will of the artist in leaving the restricted space of the canvas and seeking out the viewer wherever he might be. Contrary to Nicolas de
Falecido em 1985, Tal-Coat é considerado em sua terra natal, a França, um pintor moderno, distante da arte contemporânea. De 70 em diante, no entanto, passou a traduzir de forma exata o questionamento do suporte e marca a vontade do artista de sair do espaço restrito da tela e procurar o espectador onde ele estiver.
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Ao contrário de Nicolas de Stael, Tal-Coat não se utiliza da linha do horizonte em seus quadros. Um artista que usa esse recurso consegue imediatamente um cabide onde é possível pendurar todas as coisas: mesas, cadeiras, montanhas. Mas quando a linha do horizonte se desfaz, a arte começa a existir, porque a certeza estabelecida de quem está vendo a obra acaba naquele momento. Na pintura de Tal-Coat, há apenas um foco de energia, um enorm~ poder de concentração, como se o infinito estivesse dentro da tela. E um homem do espaço da paisagem, da travessia, que remete aos artistas chineses da era Song. Colocar as telas de Tal-Coat ao lado de Richard Long dará ao espectador a oportunidade de experimentar o novo. Nos quadros de Tal-Coat, o dilema figuração-abstração não existe. Embora abstratas, suas obras são paisagens, onde o espaço torna-se convexo, motivado pela presença da cor. Há algo que pulsa, que vem para a frente do quadro, e nesses elementos reconhecemos a neblina, o campo, a terra. Apesar da grande importância de seu trabalho, Tal-Coat não foi suficientemente reconhecido até sua morte, aos oitenta anos. A exibição de sua obra no Brasil pela primeira vez equivale a uma justiça poética. A 22ª Bienal Internacional de São Paulo celebra o encontro dos países em terras americanas e nela estão descartados o regionalismo ou o multiculturalismo, os disfarces geopolíticos. Os artistas de hoje abandonaram os preceitos do museu imaginário em busca da realidade estética. Os curadores de todos os países foram convidados a tornar possível a revelação da insuspeita polifonia de nossa época.
OS TRABALHOS EM VíDEO Judith Barry desvenda articulações novas entre fenômenos históricos, tornando-os contemporâneos pelo impacto da descoberta e pela linguagem artística. The work of lhe foresttece ilações sobre o Art Nouveau e o colonialismo belga, utilizando como suporte das projeções de vídeo um ambiente ornamental de época criado por um dos artífices do estilo floral, Paul Hankar. As belas vinhetas que imortalizaram o movimento artístico são iluminadas por imagens que testemunham a violência da presença européia no continente africano. Fabrizio Plessi, a cada nova instalação de vídeo, descortina um emprego inédito para as emissões. Em Roma 111, a solidez do travertino se contrapõe à fluidez das imagens, construindo uma praça tátil no interior do pavilhão da Bienal. A obra esposa finalmente a arquitetura, potencializando o espaço. Tanto num palácio veneziano quanto no edifício moderno de Niemeyer, Plessi explora as linhas de força do monumento, conduzindo-o a um desenlace surpreendente. Gary HiII, por sua vez, lida com o vídeo não como um produto pronto, como o fazem Barry e Plessi, mas como se o medium não estivesse tecnologicamente concluído e precisasse do impulso de um inventor. HiII é uma mistura de Thomas Edison com o antropólogo Gregory Bateson. A lâmpada imagética tem a limpidez conceitual da noção do duplo vínculo (double bind). Em Crux, HiII emprega os pontos cardeais da cruz e a instabilidade do crucificado para propor uma sensação de motricidade vertiginosa. Paul Garrin usa a interatividade 34
Stael, Tal-Coat did not resort to the horizon in his paintings. An artist that uses this resource immediately finds a coathanger for himself where it is possible to hang everything: tables, chairs, mountains. When the Une of the Horizon comes apart, however, art begins to exist, beca use the certainty established by those viewing the work of art comes to an end at that momento In Tal-Coat's painting, there is only one focus of energy, an enormous power of concentration, as íf the infinite were inside the painting. He is a man of the space of landscaping, of crossings, that related to the Chinese artists of the Song era. To place Tal-Coat's paintings next to Richard Long, will give the viewer the opportunity to try something new In Tal-Coat's paintings, the figuration-abstraction dilemma does not existo Although abstract, these works of art are landscapes where space becomes convex, motivated by the presence of colar. There is something that pulses, that comes out to the front of the painting, and in these elements we can recognize mist, fields, the earth. Inspite of the great importance of his work, Tal-Coat was not sufficiently recognized until his death at the age of eighty. The exhibition of his work in Brazil for the first time is equivalent to poetic justi~e. The 22ª Bienal Internacional de São Paulo commemorates a meeting of countries on American soil, and regionalism and multiculturalism, geopolitical disguises are ali of them discarded. Artists today have abandoned the precepts of an imaginary museum in search of aesthetic appeal. Curators from ali of the countries were invited to render possible a revealing of the unsuspected polyphony of our times.
WDRKS DF ART DN VIDED Judith Barry reveals new articulations between historical phenomena, rendering these contemporary through the impact of discovery and of artistic language. The work of the forest runs through Art Nouveau and Belgian colonialism, using as support for the vide o, projections on ornamental environment of the time produced by one of the artífices of the floral style, Paul Hanker. The beautíful vignettes that immortalized the artistic movement were illuminated by images that élre witness to the violence of the European presence on the continent of Africa. With each new installation on vide o, Fabrizio Plessi shows an unprecedented use for broadcasting. In Roma 111, the solidity of the travertino is a contrast to the fluid images, building a tactile plaza in the Bienal pavillion. The work of art finally combines with architecture potentializing space. Both in a Venetian palace and in a modem building by Niemeyer, Plessi explores the lines of force of the monument, leading it to surprising results. Gary Hill, in tum, deals with vide o not as a ready product as do Barryand Plessi, but rather as íf the medium were not technically concluded and required the impulse of the inventor. Hill is a combination of Thomas Edison and anthropologist Gregory Bateson. The imagetic lamp has the conceptual limpidity of the notion of double bind. In Crux, Hill employs the cardinal points of the cross and the instability of the crucífied to propose a sensation of vertiginous motility. Paul Garrin uses interactivity in White devil, supplying not a rebel shade, but a cathodic tail for every spectator that barks and growls during its course.
em White devil, fornecendo não uma sombra rebelde, mas uma cauda catódica a cada espectador que ladra e rosna durante seu percurso.
Barry and Plessi used the video as final product, and Hill an~ Garrin, a.s a . . medium that could be transformed thanks to their technologlcal contnbutlOns.
Barrye Plessi usam o vídeo como produto final, e HiII e Garry, como meio passível de ser transformado graças a suas contribuições tecnológicas.
A CULTURAL HERITAGE: MUSEUM SPACE
CÂMARA DOS ANCESTRAIS: O ESPAÇO MUSEOLÓGICO Ao lado das salas especiais, o espectador terá a oportunidade de visitar um espaço museológico dentro da mostra, que funcionar~ como uma espécie de câmara dos ancestrais da arte contemporanea. Ela tem a missão de convocar os grandes mestres da arte do século XX para que se tenha um parâmetro do que significou a história da explosão do suporte. Os artistas ali expostos serão com.o avós da arte contemporânea, a ascendência ilustre desse questionamento. DIEGO RIVERA: A ARTE À DISPOSiÇÃO DO PÚBLICO Por que um artista como Rivera (1886-1957), nascido no México, participa de uma exposição em que a temática diz respeito à . , explosão do suporte tradicional? Diego Rivera, mais do que mnguem, tentou dilatar ou colocar em questão o quadro de cavalete ao recorrer ao mural e posicionar sua obra fora do quadro, à disposição do público. Mesmo quando se refere à tela, o artista tem a preocupação de criar uma arte muralista, como se o quadro fos~e uma espécie de prova para passar para as grandes paredes. Alem disso, a obra de Rivera compatibiliza-se também com a de outros artistas presentes nesta mostra, como Bedia, por exemplo, cuja pintura tenta celebrar as forças da terra e a comunhão entre os homens. A Bienal tem um caráter de laboratório, e Rivera suscita questões de importância crucial, como as que indagam sobre as relações entre política e arte. De que maneira ele se libera da ~olítica e c~m~ça a ser artista? Rivera se opôs veementemente a artistas que nao tmham uma vocação social, a ponto de isso significar uma espécie de censura na arte mexicana ao advento de obras que não possuíam caráter épico. Ao mesmo tempo, para onde aponta essa celebração da pátria contida em seus trabalhos? Rivera é ainda hoje uma questão, talvez a mais difícil de ser respondida, porque é necessário encontrar o ângulo correto de apreciação de sua obra como arte e não como política. Diante de seu fascinante trabalho, o espectador está diante de um enigma e, para decifrá-lo, é preciso remover a camada ideológica que recobriu sua pintura para se chegar à obra de arte.
In the rooms adjoining Special Exhibits, visitors will have the opportunity to view the museum space within the exhibition devoted to the forerunners of contemporaryart. The purpose is to bring together the great m~st~~s of twentieth century art to establish parameters in terms of the slgntflcanc~ of the background leading to the impact on the support framework. The arttsts whose work is exhibited are, as it were, the forebears of contemporary art and a noble ascendance to this questioning. DIEGO RIVERA: MAKING ART AVAILABLE TO THE PUBLlC Why is an artist such as Rivera (7886-1957), bom in Mexico, par~ of an exhibition where the theme concems a breakaway from conventlOnal support? More than anyone else, Diego Rivera endeavore? .to ~xpa~d and to question easel painting by resorting to muraIs an~ by pos/~lOntng hls work beyond a picture, making art available to the publlc. Eve.n tn re.te~ence to painting, Rivera's concem was to produce mural art, as tf a patnt/~g w~re a kind of proof to be transferred over to great walls. Furthermore, RlVera s ~ork is compátible also with that of other artists at the exhibition such as Bedla, for example, whose painting celebrates the forces of the earth and harmony between men. The Bienal exhibition is, by nature, a laboratory, and Rivera raises issues of crucial importance such as those that inquire about the relationship between politics and art. In what way does free himsel! from.politics a~d becofl}e an artist? Rivera was vehemently opposed to artlsts wlth no socIal vocatlOn to the extent that this meant a kind of censorship in Mexican art to works of art that were not epic in character. At the same time, where does this celebration of a motherland contained in his work point to? Rivera is even todaya riddle,possibly the most difficult to answer because it is neces.s~ry to find the correct angle of appreciation of his work as art and not as polltlcs. With his fascinating work, a viewer is face to face with an enigma and, to decipher it, he must necessarily remove the ideologicallayer that envelops his painting to reach the work of art itself. THE TALENT DF MA LEVICH Space pioneered by Kazimir Malevich (7878-1935) who may perhaps prove to be the greatest artist manifest in the second half of the centu(y playtng a role similar to that of Picasso in the first fifty years of the twentieth century.
A GENIALIDADE DE MALÉVITCH O espaço aberto por Kazimir Malévitch (1878-1935), talvez o grande artista revelado na segunda metade do século, lembra o de Picasso na 11 Bienal Internacional de São Paulo, que cobria sua obra realizada nos primeiros cinqüenta anos do século XX.
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Malévitch criou a parte mais importante de sua obra sem nunca ter saído da Rússia, onde nasceu. Apesar disso, tinha uma profunda compreensão do significado da arte moderna, do que estava acontecendo em Paris. Através dos grandes colecionadores russos como Tchúchkin, que possuía a maior coleção particular de arte moderna do mundo -, QS jovens artistas tomavam conhecimento das últimas descobertas da arte européia. Assim, Malévitch atravessa todas as etapas da arte conhecida até sua época. Seus primeiros trabalhos revelam uma forte influência impressionista. Mais tarde, passa pela arte simbolista, evolui para um estilo fauvista que muito deve a Matisse, percorre a orientação futurista, se encaminha para uma pintura cubista e atinge a abstração absoluta, que chama de suprematismo. No manifesto em que estabelece as linhas mestras desse movimento, declara: "Eu me converti em zero de formas". Foi o primeiro artista a atingir esse resultado, em 1915, antes de Mondrian. Em todos esses estilos, alcançou uma enorme perfeição, mas não se ateve a nenhum deles, revelando uma maneira de pintar extremamente original. Adquiriu uma intensa plenitude em seu trabalho, despindo-se de todos os artifícios da pintura, sem buscar nenhum referencial a não ser as formas geométricas que nascem de uma maneira impecável em suas telas. Quando atinge essa estatura, ele passa a escrever, afirmando que troca o pincel esgarçado pela pena afiada. Transforma-se, então, num dos maiores teóricos das artes plásticas e em dedicado professor, capaz de orientar alunos sem reduzi-los a escravos de seu estilo. Sua teoria do não-objeto - formulada em 1915 e com influência marcante nas formulações neoconcretistas do poeta brasileiro Ferreira Gullar, anos depois - inspira ao mesmo tempo Hélio Oiticica e LVgia Clark. Embora o abandono do plano aconteça dentro do quadro, em Malévitch a tela não tem mais horizonte, nada que a determine. Tudo acontece dentro de um suporte aberto, em que não existe o constrangimento da moldura. Nos anos 20, por força de injunções políticas, o artista deixa de lado a abstração absoluta e volta à figuração. Poderemos, desta vez, ver também as telas desse retorno à figuração. Vai caber a cada um julgar se elas significaram uma regressão ou um progresso na obra de Malévitch. Esse é um dos grandes enigmas que só um estudo atento ou uma intuição bastante apurada serão capazes de definir.
o ATELIÊ DE MONDRIAN Este ano celebra-se o cinqüentenário da morte de Mondrian. Escolhemos essa oportunidade para mostrar o último ateliê que o artista ocupou em Nova Vork antes de morrer em conseqüência de uma pneumonia. Todos os objetos do ambiente de trabalho de Mondrian foram construídos por ele. São móveis feitos com caixas de frutas recolhidas nas ruas e nas quais ele colocava algumas ripas horizontais à maneira de prateleiras, que depois pintava. Além dos objetos, fazia uma série de cartões coloridos, que pregava na parede, elementos da pesquisa que desenvolvia no momento. Nessa época, suas linhas ortogonais, antes negras, começavam a ficar policrômicas: azuis, amarelas, vermelhas, resultando finalmente em seu último quadro, o Victoria boogie woogie, uma referência ao jazz.
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Malevich produced the most important part of his work never having left Russia where he was bom. Inspíte of this, he had a deep understanding of the significance of modem art, and of what was taking place in Paris. By means of the great Russian collectors such as Tchúchkin who owned the greatest priva te collection of modem art in the world - the young artists leamed of the latest discoveries in European art. Thus, Malevich moved on through ali of the stages of art known up to his time. His first works of art showed a strong impressionistic influence. Later, from symbolic art, he evolved to a fauvist style that owes much to Matisse, through a futuristic leaning and on towards cubist painting to attain absolute abstraction, that he referred to as suprematism. In the manifesto in which he established the guidelines of this movement, he declared: "1 became zero in form". He was the first artist to reach this result in 1915, before Mondrian. In ali of these styles, he attained enormous perfection, but did not hold to any style in particular, with a manner of painting that was extremely original. He reached intense plenitude in alI of his work, stripping away ali of the artifices of painting, wíthout going in search of any referential other than geometric forms that arise impeccable in his paintings. When he reached this status, he began to write, insisting that he was changing a wom paintbrush for a sharp pen. He then became one of the greatest theoreticians in fine arts and a devoted professor able to offer guidance to his students without enslaving them to his sty/e. His theory of non-object, formulated in 1915, wíth a marked influence years later on neoconcretist formulations of Brazilian poet Ferreira Gullar, he inspired Hélio Oiticica and Lygia Clark. Although the horizontal plane was abandoned in painting, in Malevich, painting had no more horizon, nothing that would determine it. AlI took place within an open support in which there was no longer the embarrassment of a frame. In the twenties, beca use of polítical injunctions, the artist set aside absolute abstraction and retumed to figura tive art. We can, this time also, see the paintings from this retum to figura tive art. It will be up to each one to judge whether they meant a retum to figura tive art. It was up to each to judge if these paintings meant a regressing or progress in the work of Malevich. This is one of the great enigmas that only an attentive study or very sharp intuítion would be able to define.
MONDRlAN'S STUDIO This year marks the fiftieth anniversary of the death of Piet Mondrian. We took the opportunity to show the last studio occupied by the artist in New York before his death as a result of pneumonia. AlI of the objects in Mondrian's working environment were produced by him. Fumiture made out of crates for fruit col/ected in the streets and to which he added horizontal slats as shelves that he then painted. Besides the objects, he produced a series of colored cards that he nailed to the wall, as components for the research that he was working on at the time. At this stage, his ortogonal !ines formerly black began to tum polychromic: blue, , yellow, red, and finally resulted in his last painting, the Victoria boogie woogie, a reference to jazz.
ofantástico no ateliê de Mondrian é que tanto os móveis como os cartões são uma espécie de conseqüên,cia de sua obra, uma extensão do trabalho criado nas telas. E como se a pintura tivesse saído do quadro para se transformar no próprio ambiente. Seu ateliê era, portanto, uma grande obra de arte, a concretização mais acabada da expansão do suporte.
The fantastic feature of Mondrian's studio was that both the furniture and the cards are a kind of outcome of his work, an extension to the work produced in the paintings. /t is as if the painting had left the picture to become part of the environment itself His studio was, therefore, a great work of art, and the mostcomplete concrete evidence of the expanding of support. RUFINO TAMAYO: A MURAL PORTRAYED ON CANVAS
RUFINO TAMAVO: O MURAL DENTRO DA TELA Rufino Tamayo, a/so bom in Mexico in 1899, may pro vide an answer to the enigma of Rivera. He retranslates on an easel what took place with the Mexican muralists. He was, in a sense, a rival to Rivera, but he was not indifferent to ali that was being presented in the art that preceded him. First, he was swept into the figura tive flux and the wide spaces of murais, but he readdressed these issues to painting, with monumental figures that seem to elude the frame. Use of c%rs also signa/s this exit from support. In Tamayo's work, they are a force so vital that his characters seem like masks.
Rufino Tamayo, também nascido no México, em 1899, talvez seja uma resposta para o enigma de Rivera. Ele retraduz para o cavalete o que aconteceu com os muralistas mexicanos. Era num certo sentido um adversário de Rivera, mas não ficou imune a tudo o que estava sendo apresentado na arte que o antecedeu. Primeiro, entrou no fluxo figurativo e no espaço extenso do mural, mas retraduziu essas questões para o quadro, apresentando figuras monumentais que parecem escapar da moldura. O uso das cores também sinaliza essa saída do suporte. Na obra de Tamayo elas apresentam uma força tão vital que seus personagens parecem máscaras.
Tamayo's work is included in the Bienal exhibition as an attempt to produce an experimental history of art.
O trabalho de Tamayo comparece nesta Bienal como uma tentativa de se criar uma história experimental da arte.
SIGNS IN TORRES-GARCíA
A PRESENÇA DOS SIGNOS EM TORRES-GARCíA A presença do uruguaio Joaquín Torres-García (1874-1949) é, em primeiro lugar, uma reparação ao desastre acontecido no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, quando um incêndio devastou uma grande exposição de suas obras. Significa também uma homenagem ao primeiro grande artista abstrato latino-americano. Ao mesmo tempo que freqüentou Mondrian - em Torres-García a mesma disciplina ortogonal apresenta-se muito pronunciada em seus trabalhos -, habita o plano com uma série de signos, de elementos ideogramáticos, criando uma figuração dentro da abstração. Mesmo quando apresenta retratos, mostra uma compreensão muito apurada de arte abstrata e obedece a uma rígida disciplina, dada pela regra de ouro da antiga Grécia, com o objetivo de encontrar a harmonia. Como Mondrian, Torres-García se permite sair da tela e passar para um outro âmbito, continuar dentro da escultura ou fazer painéis, como o Monumento Cósmico do Parque Rodo de Montevidéu, realizado em 1938, em que estão presentes signos de civilizações pré-colombianas. Seu trabalho pode continuar em todas as direções, é algo que passa, que se prolonga e para o qual o suporte pictural significa apenas um acidente. Pelo poder de incorporação de mundo, o epíteto contemporâneo que acompanha a arte se desvanece. A arte contemporânea torna-se pura e simplesmente arte. Assim como o impressionismo absorveu lições da arte japonesa, o expressionismo, da arte das crianças, dos doentes mentais e dos povos primitivos, e o cubismo, da arte. africana, no momento atual não somente os artistas cosmopolitas dialogam com a distância, mas o longínquo encontra a própria voz. Chegam à cena artística internacional as mulheres, com o espectro de sensorial idades em busca de forma, as nacionalidades reemergentes antes submissas a potências centralizadoras, aptidões de xamãs que abolem os intermediários. Os centros artísticos atulham as latas de lixo da história. Doravante, charmar-se-á centro o lugar onde o longínquo estiver sintonizado com o próximo.
The presence here of Uruguayan artist Joaquín Torres-García (1874-1949) is, in first place, reparation in answer to the catastrophe in the Museu de Arte Moderna in Rio de Janeiro when fire brought devastation to a great exhibition of his works. It also stands as a tribute to the first great LatinAmerican abstract artist. Torres-Garcia was influenced by Mondrian - the same ortogonal discipline is prominent in his work and, at the same time, he peopled the plane surface with a series of signs, of ideogrammatic elements, resulting in figuration within abstraction. Even when he produced portraits, he showed c/ear understanding of abstract art, with strict discipline, seeking harmony in the golden rufe of ancient Greece. Like Mondrian, Torres-García allowed himself to leave the canvas and move to another ambience, to continue within sculpture ar to produce panels, such as the Cosmic Monument in the Rodo Park in Montevideo produced in 1938 with evidence of pre-Columbian civilization. His work can proceed in ali directions - something that passes, that prolongs itself, and for which pictoria/ support is merely accidental. Through the power of incorporation of a world, the contemporary epithet that accompanies art fades away Contemporary art becomes art pure and simple. Just as impressionism absorbed lessons from Japanese art and expressionism from children's art, from mental patients, and from primitive peoples, and just as cubism did so from African art, at the present moment not only do the cosmopolitan artists dialog with distance, but the far-off finds its own voice. Women, with a spectrum of the sensorial in search of form arrive on the international artistic scene together with the reemerging nationa/ities formerly submissive to centralizing powers, aptitudes of shamans that do away with intermediaries. Artistic centers cram the garbage cans of history Henceforth, center will be the name for the place where distant is attuned to close.
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CU~DO~ lUCIANO fIGUcl~cDO CU~DO~ A~~I~lcNlcfClI~c ~cD~O~O
CU~Aro~ WClANO flGUf/~fDO Ajj/)JANr CU~ArO~ ffUff ffD~OjO
No texto do catálogo que acompanha a exposição retrospectiva da obra de Hélio Oiticica apresentada nas instituições Witte De With, Rotterdam, Galerie Nationale du Jeu de Paume, Paris, Fundació Antoni Tàpies, Barcelona, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, e Walker Art Center, Minneapolis, entre 1992 e 1994, os organizadores da mostra assinam um texto do qual gostaríamos aqui de citar um fragmento:
In the catalogue of the retrospective exhibition of the artworks by Hélio Oiticica shown at the institutions Witte De With, Rotterdam, Galerie Nationale du Jeu de Paume, Paris, Fundació Antoni Tàpies, Barcelona, Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa, and Walter Art Center, Minneapolis, from 1992 to 1994; the following text is an excerpt of the article written by the organizers of the exhibition:
"As realizações de Hélio Oiticica estão fortemente ligadas à realidade sócio-cultural do Brasil. Apesar de possuir raízes locais, sua arte é universal. Simultaneamente, embora a arte de Oiticica tenha origem num movimento internacional como o neoconcretismo, ela não pode ser associada à idéia de arte internacional própria do Ocidente. Segundo a nossa perspectiva a obra de Oiticica é extremamente relevante na medida em que transgride as concepções estereotipadas e eurocêntricas da cultura latino-americana, ao contrário de reforçar a nossa visão do 'outro'." Estamos diante de uma afirmação recente que é parte da opinião crítica que a obra de Hélio Oiticica desfruta internacionalmente, e que nos faz constatar uma nova qualidade reflexiva e fora da nossa esfera local. Isso me faz lembrar que ao longo de sua trajetória (1955-80) a obra de Hélio Oiticica, sempre polêmica, apesar de sua forte presença no Brasil t~ve pouco colóquio com a crítica de arte brasileira e mesmo com a crítica de arte internacional. Exceto nos anos do Grupo Frente (1955-56) e em seguida, quando o artista participa do Movimento Neoconcreto (1959-60), no qual sabemos foram importantes as conceituações e teorias de Mário Pedrosa e Ferreira Gullar sobre a originalíssima produção artística que ali surgia, não existe de fato um acompanhamento de sua obra por parte da crítica especializada brasileira.
"Hélio Oiticica's achievements are strongly linked to the social and cultural Brazilian reality. Although presenting local roots, it is universal. On the other hand, although his artworks origina te from an international movement - NeoConcretism - it cannot be labelled as typical of the international art produced in the Western hemisphere. According to our approach, the work dane by Oiticica is extremely relevant as it overrules the stereotyped and eurocentric conventions of Latin-American culture as oposed to emphasizing its foreign condition, its 'otherness'. /I
We have just read a recent statement which reflects the opinion of the international appraisal of Hélio Oiticica's work which unveils a new reflexive quality that reaches beyondour local boundaries. This reminds me that during his trajectory (1955-1980) the artworks of Hélio Oiticica - which were always daring - did not establish a dialogue neither with the Brazilian critic nor with the international, although he always had a significant standing in the Brazilian scene. Besides, the years in which he participated in the Grupo Frente (1955-1956) and when he joins the NeoConcrete movement (1955-1960), period when the theories of Mário Pedrosa and Ferreira Gullar stiongly influenced the extraordinary artistic production in its ear/y phase, his work was not closely followed by the Brazilian critico
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Nildo da Mangueira veste ParangolĂŠ Capa 7, 1964 Foto Andreas Valentin Acervo Projeto HO, Rio de Janeiro
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Um dos últimos textos que Mário Pedrosa escreve sobre Hélio data de 1965 e intitula-se "Arte ambiental, arte pós-moderna, Hélio Oiticica". Ali ele observa a prospecção da experiência neoconcreta no artista das "estruturas-cor" em Bilaterais, relevos espaciais que foram se fundindo em Núcleo e Penetrável e que faziam surgir agora, através dos Bólides (1963) e de Parangolé (1964), uma nova condição para a arte e o fim daquilo que se chamou de "arte moderna". Para Mário Pedrosa inaugurava-se ali um outro ciclo, "que não é mais puramente artístico, mas cultural, radicalmente diferente do anterior". O Bólide Vidro 5(1965) "Homenagem a Mondrian" é, segundo Mário Pedrosa, "uma garrafa de forma caprichosa, como uma licoreira, cheia de um líquido verde translúcido; saem pela boca do gargalo, como flores artificiais, telas luxuriantes, porosas, amarelas, verdes, de um preciosismo absurdo". Podemos assim dizer que o Bólide Vidro 5"Homenagem a Mondrian" é um proto-Parangolé, e que as telas e tecidos luxuriantes prenunciavam ali, e já em regozijo, o fim de uma antiga idéia da arte, literalmente conduzida à celebração de uma dança de transformação cultural. Como bem viu Mário Pedrosa, aqueles momentos de passagem e de inauguração artística eram demonstrativos do novo processo cultural: as novas ordens nucleizadas e prósperas fornecedoras de outras novas ordens foram fenomenalmente o combustível e a combustão daquele momento especial da arte brasileira. Assim se deu. Assim seguiu Hélio Oiticica dentro da arte e na vida, inseparáveis que são, dando as costas ao mundo institucional da arte, aos mercados, à crítica, às "raízes" ou a qualquer tipo de contexto que não abrigasse o seu "mundo-abrigo". Parangolés transmutaram-se e em seu próprio vértice, volatizaram-se para novas danças. Penetráveis desmembraram-se, fundiram-se até não mais sequer possibilitarem categorias para as artes chamadas plásticas.
One of the last texts written by Mário Pedrasa on Hélio s work is fram 1965 and is entitled "Arte ambiental, arte pós-moderna, Hélio Oiticica" (Ambiental art, post-modern art); in it Pedrasa observes the onset of the Neo-Concrete experience in the works "estruturas-cor" (structures-color) and Bilaterais (BilateraIs) spacial reliefs which merged, paving the way to Núcleo (Nucleous) and Penetrável (Penetrable) and which created with Bólides (Meteors - 1963) and Parangolé (1964) a new realm for art and the end of what had been dubbed "modem art". In Mário Pedrasas opinion a new cyele was being launched "which is not only artistic, but cultural and radically different fram what came before ir". The Bólide Vidro 5 (1965) "Homenagem a Mondrian" is, according to Pedrasa, "a bottle with capricious shape, as a liquor container full of a green translucid liquid; fram the bottleneck - as artificial flowers - colorful sCreens with a poraus texture emerge; theyare yellow, green, and of an absurd painstaking craft". Thus, we can say that Bólide Vidra 5 "Homenagem a Mondrian" is a pratoParangolé and that the sCreens and flamboyant fabrics were already celebrating the end of an old idea about art which is literally carried out by means of a joyful dance in hommage to the new cultural phase.
A partir de 1964 e já com a criação de Bólide e Parangolé, a crítica de arte brasileira noticia amplamente mas reflete pouco sobre o que Hélio Oiticica desenvolve com seu trabalho e sua curiosidade. A reflexão mais substancial sobre as obras do artista é realizada pelo próprio Oiticica, que progressivamente afirma novas realizações e escreve concomitantemente conceituações oriundas da própria geração de novas obras.
Fram 1964 onwards, afterBólide andParangolé were braught to life, the Brazilian critic comments seldom analysed the new paths paved by Hélio Oiticica. Curiously, the most significa tive thought about the artists work are carried out by Hélio Oiticica himself who created ceaselessly and at the same time wrote conceptual texts derived fram his own new praposals.
Daí por diante, a maioria dos textos escritos sobre as obras de Hélio Oiticica são quando muito arremedos das próprias elaborações conceituais do artista ou manifestações refratárias e ideologicamente inconsistentes. A prosa e a conversação artística deslocam-se com Hélio Oiticica para o convivium de outro habitat: a interdisciplinaridade de outras artes e poéticas. A crítica de arte de então, e podemos dizer que até mesmo a crítica recente, cai em emudecimento conceitual e de fato não mais produz novas reflexões sobre novas obras d.e arte. Muito tempo depois surgem da poesia e do cinema, e não da crítica de arte, nos textos de Haroldo de Campos, Décio Pignatari, Waly Salomão, Antonio Cícero e Julio Bressane, as novíssimas considerações sobre o significado artístico de Hélio Oiticica. Por ocasião desta 22ª Bienal Internacional de São Paulo, e talvez pela óbvia celebridade que hoje usufrui, a obra de Hélio Oiticica oferece novo convite à dança com o penetrável Tenda-Luz e com Parangolé. E como disse bem o poeta Décio Pignatari no seu texto "Hélio Oiticica e a arte do agora": "Hélio não queria saber da arte, mas a arte nunca vai deixar de querer saber dele". 42
Luciano Figueiredo
As Mário Pedrasa accurately observed, these moments of transformation and of artistic innovation were an evidence of the new cultural pracess: the new dictates, core and generaus suppliers of other new dictates, were both the fuel and the radiation of that important moment of Brazilian art. Thus was Hélio Oiticicas journey both in art and life - which, in his case, are indivisible. Rejecting the official world of art, the critic, the "raots" or any other context which did not accept his "world-shelter". The Parangolés underwent a transformation which unleashed fram their own vortex and became more volatile so as to undertake new dances. The penetrables disintegrated and merged until they could not be labelled as categories of the so called fine arts.
Fram this period onwards, most of the artieles written about his work are either inspired on Oiticicas own conceptual thoughts or disclose a refusal to accept his artwork or are ideologically inconsistent. The artistic narrative and dialogue attain a new sphere with Hélio Oiticica,' they share a new habitat, which ineludes inter-disciplinarity with other art languages and poetics. The critic of art undertaken at the time - and we can extend this opinion to current critic - is mutewhere concept is concerned and does not prapose new reflexions about new forms of art. After a long time brand new considerations about the artistic meaning of Hélio Oiticicas work emerge fram poetry and cinema, but not from the art critics, and were written by artists such as Haraldo de Campos, Décio . Pignatari, Waly Salomão, Antonio Cícera and Julio Bressane. When the 22a Bienal Internacional de São Paulo takes place his artwork - renews its invitation to dance with the penetrable Tenda luz and with Parangolé. As the poet Décio Pignatari accurately mentioned in his text "Hélio Oiticica e a arte do agora ": "Hélio didn't pay his respects to art, nevertheless art will always pay respects to him". Luciano Figueiredo ~
I
16 DE FEVEREIRO DE 1961
FEBRUARY 16,1967
Já não tenho dúvidas de que a era do fim do quadro está definitivamente inaugurada. Para mim a dialética que envolve o problema da pintura avançou, juntamente com as experiências (as obras), no sentido de transformar a pintura-quadro em outra coisa (para mim o não-objeto), que já não é mais possível aceitar o desenvolvimento "dentro do quadro", o quadro já se saturou. Long,e de ser a "morte da pintura", é a sua salvação, pois a morte mesmo seria a continuação do quadro como tal, e como "suporte" da "pintura". Como estátudo tão claro agora: que a pintura teria que sair para o espaço, ser completa, não em superfície, em aparência, mas na sua integridade profunda. Creio que só partindo desses elementos novos poder-se-á levar adiante o que começaram os grandes construtores do começo de século (Kandinsky, Malévitch, Tátlin, Mondrian, etc.), construtores do fim da figura e do quadro, e do começo de algo novo, não por serem "geométricos", mas porque atingem com maior objetividade o problema da não-objetividade. Não excluo a importância de Matisse, Picasso, Klee, Pollock, Wols, etc., mas pertencem a outro tipo de expressão, também da época, mas paralelo aos construtores, e também prenunciam o fim do quadro. ~ara mim a pintura de Pollock já se realiza virtualmente no espaço. E preciso, pois, a conscientização do problema e o lançamento concreto e firme das bases desse desenvolvimento da pintura, ainda que não refeita da destruição da figura. Na verdade a desintegração do quadro ainda é a continuação da desintegração da figura, à procura de uma arte não-naturalista, não-objetiva. Há um ano e dois meses, praticamente, achei palavras de Mondrian que profetizavam a missão do artista não-objetivo. Dizia ele que o artista não-objetivo, que quisesse uma arte verdadeiramente nãonaturalista, deveria levar seu intento até as últimas conseqüências; dizia também que a solução não seria o mural nem a arte aplicada, mas algo expressivo, que seria como "a beleza da vida", algo que não podia definir, pois ainda não existia. Foi um profeta genial. O artista, nestes dias, que desejar uma arte não-naturalista, nãoobjetiva, de grande abstração, ver-se-á às voltas com o problema do quadro e sentirá, conscientemente ou não, a necessidade da sua destruição ou da sua transformação, o que no fundo é a mesma coisa, por dois caminhos diferentes. A fragmentação do espaço pictórico do quadro é evidente em pintores como Wols (o próprio termo "informal" o indica), Dubuffet ("texturologias", ou seja, a fragmentação infinita até que o espaço pictórico se transforme num espaço infinito ao pequeno, é o microilimitado) ou como em Pollock (o quadro aí virtualmente "explode", transforma-se no "campo de ação" do movimento gráfico). Na tendência oposta se dá o mesmo, mais lentamente, porém mais objetivamente, desde o prenúncio de Mondrian sobre o "fim do quadro", até as experiências de Lygia Clark da integração da moldura no quadro, partindo daí todas as conseqüências desse desenvolvimento do quadro para o espaço. Num sentido intermediário está Fontana e os seus quadros cortados em sulcos, sulcos de espaço, com os. quais vejo afinidades com os sulcos de minhas maquetas e não-objetos pendurados. O problema está posto, e portanto sinto a necessidade de começar a construir, firmemente, definitivamente, o desenvolvimento básico desse novo tipo de expressão, que por ser novo está incerto, e ainda flutua na indetermina~ão, mas que mais cedo ou mais tarde terá de se consolidar. E uma necessidade cósmica, está na mente coletiva, cabe ao artista torná-Ia clara e palpável. Creio que nenhum artista que queira algo novo, autêntico, nessa época, não aspire a tal coisa. Só será possível a posição do artista, posição genética, fenomenologicamente, numa expressão que se realize no espaço e no tempo: a idéia se desfia, mantendo um diálogo paralelo entre a realização e a expressão. No quadro esse diálogo se dá pela ação, pois pode assim o artista abstrair mais facilmente o limite do quadro, mas quando este limite já não existe, a ação já está implícita na gênese, e será portanto mais lícito que esta se cristalize em algo
I no longer have any doubts that the era of the end of the picture has been definitely inaugurated For me, the dialectics which surraunds the prablem of painting evolved, together with the experiences (the works), in the direction of the transformation of the painting-picture into something else (for me the non-object), It is no longer possible to accept development "inside the picture" the picture already became saturated Far fram being the "death of painting", this is its salvation, since true death would be the continuation of the picture as such, as the "support" for ''painting'', How clear it ali is now: painting had to launch itself in to space, be complete, not in surface, in appearance, but in its prafound integrity. I believe that only by starting fram these new elements can one carry forward which was undertakew by the great constructivists of the beginning of the century (Kandinsky, Malevich, Tatlin, Mondrian, etc,), constructors of the end of the figure and of the picture, of the beginning of something new, which they achieved not only by being "geometric", but by striking with greater objectivity at the prablem of non-objectivity. I do not deny the importance of Martisse, Picasso, Klee, Pollock, Wols, etc" but they belong to another type of expression, simultaneous with and parallel to the constructivits: they also herald the end of the picture, For me the painting of Pollock already takes place virtually in space, Thus, what is needed is awareness of the prablem, the firm and concrete launching of the development of painting, fram this basis, even it it has barely recovered fram the destruction of the figure, In truth, the disintegration of the picture is still a continuation of the disintegration of the figure, in search of a non-naturalistic, non-objective art. Practicallya year and two months ago I found some words of Mondrian speculating praphetically on the task of the non-objective artist. He said that the nonobjective artist who wished for a truly non-naturalistic art should follow thraugh his intentions to the ultima te consequences; he said, toa, that the solution would be neither the mural nor applied art, but something expressive, which would be like the "beauty of lite':' something he could not define, beca use it did not yet exist. He was a praphet of genius. In our time, the artist who aspires to a non-naturalistic, non-objective art, great abstraction, will find himself involved with the prablem of the picture and will feel, consciously ar not, the need for its destruction ar its transformation - which deep-down is the same thing - by two ditferent rautes. The fragmentation of the picture's pictorial space is evident in painters such as Wols (the term "informal" itself indicates it), ar Dubuffet ("texturalogies" ar rather, endless fragmentation as pictorial space transforms itself infinitely towards the minute, the micra-unlimited) ar Pol/ock (there the picture virtually "explodes" - transforms itself in to the "acting field" of graphic movement). In the other tendency the same thing occurs, more slowly but more objectively, fram Mondrian's prediction of the "end of the picture" to the experiments of Lygia Clark, and her integration of the frame into the picture: ali the consequences of this development of the picture into space begin at this point. In an intermediate position lies Fontana and his pictures cut into slits, graoves of space, in which I see affinities to the graoves im my "maquettes" and hanging "non-objects". The prablem is posed. I feel therefore the need to start constructing, firmly, definitively, the basic development of this new type of expression, uncertain beca use of being new, still floating in indeterminacy, butwhich sooner ar later must consolida te itself It is a cosmic necessity, it is in the collective mind; it is up to the artist to make it clear and palpable. I believe that any artist who desires something new and authentic, in this period, aspires to such a thing. The position of the artist only is possible in an expression which realizes itself in space and in time: the idea unravels, maintaining a paral/el dialogue between realization and expression. In the picture, this dialogue occurs thraugh action, beca use in this way the artist can more easily abstract the limit of the picture; but when this limit no longer exists, the action is already implicit in the genesis; and therefore it will be more apprapriate for it to crystallize itself in to something constructed. Evidently, this solution is on an equal footing with architecture, beca use it "inaugurates its space" (Gullar), 43
Tropicália, em "Whitechape/ experience" Whitechapel Gallery, Londres, 1969 Foto Héli o Oiticica Acervo Projeto HO, Ri o de Janeiro
construído. Evidentemente esta solução está em pé de igualdade com a arquitetura, pois "funda o seu espaço" (Gullar). A arquitetura é o sentimento sublime de todas as épocas, é a visão de um estilo, é a síntese de todas as aspirações individuais e a sua justificação mais alta. O problema da pintura se resolve na destruição do quadro, ou da sua incorporação no espaço e no tempo. A pintura caracteriza-se, como elemento principal, pela cor; esta, pois, passa a desenvolverse como o problema da estrutura, no espaço e no tempo, não mais dando ficção ao plano do quadro; ficção de espaço e ficção de tempo. A pintura nunca se aproximou tanto da vida, do "sentimento da vida". O tamanho da tela não significa que seja mais "vital" a obra, mas sim a sua gênese. O problema não é superficial (ampliação do quadro para murais), mas da integração do espaço e do tempo na gênese da obra, e essa integração já condena o quadro ao desaparecimento e o traz ao espaço tridimensional, ou melhor, transforma-o no não-objeto.
Architecture is the sublime sentiment of ali eras, it is the vision of a style, it is the synthesis of ali the individual aspirations and their highest jus titica tion. The problem of painting is resolved by the destruction of the picture, or by its incorporation into space and time. Painting is characterized by colour as its principal element; colour, then, begins to evolve with the problem of structure, in space and in time, no longer imparting fiction to the picture plane: fictioi7 of space and fiction of time. Never has painting so approached lite, "the feeling of lite". It is not the size of a work which determines it it is more "vital", but its genesis. The problem is not superficial (amplification of the picture to murais), but one of integrating space and time into the genesis of the work. This integration already condemns the picture to disappearance and brings it into three-dimensional space, or, better, transforms it into a "non-object".
Hélio Oiticica
APRlL 27, 7967
21 DE ABRIL DE 1961 Hoje está para mim mais claro do que nunca que não é a aparência exterior o que dá a característica da obra de arte e sim o seu significado, que surge do diálogo entre o artista e a matéria com que se expressa. Daí o erro e vulgaridade da distinção "informal" e "formal". Na obra de arte tudo é informal e formal, não sendo a aparência "geométrica" ou a aparência "sem contornos ou de manchas" que determinam o formal e o informal. O problema é bem 44
Hélio Oiticica
Today it is c1earer to me than ever that it is not the externai appearance which generates the charateristic of the work of art but, rather, its meaning, which arises from the dialogue between the artist and the materia with which he expresses himself Hence the mistake and vulgarity of the distinction between "informal" and "formal". In the work of art, everything is informal and formal; it is not a "geometric " appearance or a "contourless or stained" appearance which determines the formal and the informal. The problem is much deeper and lies beyond this appearance. Who could say for example, that Mondrian and Wols are far apart, when theyare so connected in the expression of inner greatness and concept of lite? Mondrian
mais profundo e está acima desta aparência. Quem diria que Mondrian, por exemplo, não está próximo a Wols, tão próximo na expressão de grandeza interior e de concepção de vida. Mondrian funda um espaço ilimitado, uma dimensão infinita, dentro da "geometrização" que lhe atribuem, fazendo o mesmo Wols na sua "não-geometrização". Ambos criam o "fazer-se" do seu espaço, dando-lhe absoluta transcendência, dimensão infinita. Quão longe estão as obras de Wols das "manchas" da maioria dos seus seguidores, assim como as de Mondrian nada têm a ver com os "geométricos" que vieram logo após a sua grande démarche. E, por incrível que pareça, Mondrian está tão próximo de Wols. Pensando nos dois, penso em Lao-Tsé. São ambos pintores de espaço, têm a faculdade de dar ao espaço dimensão infinita e colocam a pintura numa posição ética e vital de profundíssima significação. Nesse sentido são ambos os mais significativos precursores do desaparecimento da pintura como veio até agora sendo entendida. Mondrian num pólo, Wols no outro. Não se preocupam com a aparência mas com significados. Não tratam de destruir a superfície e sim dão significações que transformam essa superfície de dentro para fora. Mondrian chega ao ponto extremo da representação no quadro pela verticalização e horizontalização dos seus meios. Daí, só para trás, ou para a superação do quadro como meio de expressão, por estar o mesmo esgotado. Mas Wols, no outro pólo, chega à mesma conclusão pela não-fixação num núcleo de representação espacial e temporal dentro da tela. Ambos são pintores do espaço sem tempo, do espaço no seu fazer-se primordial, na sua imobilidade móvel. Não será este o limite mesmo da pintura de representação? É.
inaugurated an unlimited space, an infinite dimension, in the "geometrization" which is attributed to him, Wols doing likewise with his "non-geometrization". 80th create the "becoming" of their space, giving it absolute transcendence, infinite dimensiono How far are the works of Wols from the "stains" of the majority of his followers, just as those of Mondrian have nothing to do with the "geometricians" who appeared soon after his great stride. Incredible as it may seem, Mondrian lies so close to Wols. Thinking about both makes me think of Lao- Tse. 80th are painters of space, possessing the ability to give space an infinite dimension, and placing painting in an ethic and vital position of extremely deep significance. In this sense, both are the most significant forerunners of the disappearance of painting as it has been understood until now Mondrian at one pole, Wols at the other. Theyare not preoccupied with appearance, but with meaning. They do not set out to destroy the surface, but instead give meanings which transform this surface from the inside out. Mondrian reaches the extremity of pictoriaI representation through the verticalization and horizontalization of his means. At this point, it is only possible to go, either backwards, or forwards towards surpassing the picture as a means of expression, since it has become exhausted. 8ut Wols, at the other pole, comes to the same conclusion by non-fixation to a nucleus of spatial and temporal representation inside the canvas. 80th are painters of space without time, of space in its primeval becoming, in its mobile immobility Is this not the very limit itself of representational painting? It is. Hélio Oiticica
Hélio Oiticica
Éden, em "Whitechape/ experience" Whitechapel Gallery, Londres, 1969 Foto Hélio Oiticica Acervo Projeto HO, Rio de Janeiro
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6 DE FEVEREIRO DE 1962 SUPORTE O problema do suporte é complexo e na verdade ambíguo, ora existente na ordem dos desenvolvimentos, ora oculto, ora inquietante e por vezes inexistente. Numa arte de figuração há mais passividade em relação ao problema, ao passo que em épocas de mutação como as que foram a da pintura mural para o quadro e agora do quadro para o espaço, vem à tona o problema do espaço-suporte da expressão, não só o suporte físico (mural, tela etc.) mas essencialmente o suporte expressão, elemento intrínseco entre o espaço e a estrutura. Quem figura, figura algo sobre algo, sendo que a expressão linear e caligráfica geralmente necessita de um suporte passivo, e pouco o supera ou o transforma na sua estrutura. Uma arte baseada nas transformações estruturais está sempre em oposição ao estado passivo do suporte, sendo que o conflito chega ao ponto de 'não permitir a sua evolução sem que seja resolvido. Na verdade quem figura sobre algo, melhor figura através de algo. Há o intermediário entre o sentido de espaço e estrutura e o espectador que recebe a idéia. Evidentemente o criador necessita dos meios com que se expressa, mas os meios devem ser diretos, ou melhor, terão que o ser, quanto mais estrutural e abstrata for a expressão. No século XX a arte caminha como nunca para uma expressão abstrata e direta, afastando-se do naturalismo e da figuração, principalmente no que se refere ao lado mais estrutural da arte abstrata. Vem então o problema do suporte com o ímpeto decisivo, e trata-se logo de resolvê-lo. Daí vem um dos mais fortes argumentos para o descrédito da expressão pictórica, que entra em fase de mutação, não só por corresponder à necessidade da evolução de determinados caminhos e expressões já iniciadas como por ser uma fatalidade de nossa época a sua consecução. Essa necessidade de nossa época da transformação e absorção do suporte não nasce só de comparações analíticas nem da dialética da evolução pictórica, mas de uma aspiração interior irresistível. Isso antes de nada.
FEBRUARY 6, 1962 SUPPORT The prablem of the support is complex and, in reality, ambiguous, some times overt in the stages of de velopment, some times hidden, some times disquieting and, at times, non-existent. In figura tive art, there is more passivity in relation to the prablem, while, in times of transition, such as that fram mural painting to the easel picture, and now fram the picture to space, the prablem of the space-support of expression emerges, not only the physical support (mural, canvas, etc.), but essentially the expression support, intrinsic element between space and structure. Whoever represents, represents something upon something else - with linear calligraphic expression generally needing a passive support - and hardly surpasses ar transforms the support itself in its structure. An art based upon structural transformations alwaY$ opposes the passive rale of the support, and the conflict reaches a point where there can be no evolution unless it is resolved. In reality, whoever represents upon something, will better represent "thraugh" something. There is the intermediary between the sense of space and structure, and the spectator who receives the idea. Evidently, the creator needs the means with which to express himself, but the means should be direct, ar better, will have to be so, to the extent that the expression is structural and abstract. In the twentieth century, art moves, as never before, towards abstract and direct expression, away fram naturalism and figurativeness, principally in reference to the more structural side of abstract art. The support prablem then emerges with decisive impetus, and attempts are soon ma de to resolve it. Fram this pracess comes one of the strangest arguments discrediting pictorial expression, wich enters a time of change, not only beca use it corresponds to the evolutionary necessities of certain already-initiated ways and expressions, but beca use its attainment is the destiny ofour times. This need of our times - to transform and absorb the support - is not only bom of analytical comparisons, ar of the dialectics of pictorial evolution, but of a irresistible internaI aspiration. This, before ali ,else. Hélio Oiticica
Hélio Oiticica JUNE3,1962 3 DE JUNHO DE 1962 No "penetrável" o fato do espaço ser livre, aberto, pois que a obra se dá nele, implica uma visão e posição diferentes do que seja a "obra". Um escultor, p.ex., tende a isolar sua obra num socle, não por razões simplesmente práticas, mas pelo próprio sentido de espaço de sua obra; há aí a necessidade de isolá-Ia. No "penetrável", o espaço ambiental o penetra e envolve num só tempo. Mas, fora daí, onde situar o "penetrável"? Talvez nasça daí a necessidade de criar o que
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In the ''penetrable'', the fact that space is free and open - since the work occurs in it - implies a different vision and position regarding what constitutes a work. A sculptor, for instante, tends to isola te his work on a ''pedesta/'', not just for practical reasons, but beca use of his work's very sense of space: there is the need to isola te it. In the penetrable, the surraunding space simultaneously penetrates and envelops it. But, aside fram this, where does one place the penetrable? Maybe the need to create what I
chamo de "projetos". Não que sejam socles dos penetráveis (que idéia mais superficial seria), mas que "guardem" essas obras, criem como que prelúdios à sua compreensão. Que sentido teria atirar um "penetrável" num lugar qualquer, mesmo numa praça pública, sem procurar qualquer espécie de integração e preparação para contrapor ao seu sentido unitário? Essa necessidade é profunda e importante, não só pela origem da própria idéia como para evitar que a mesma se perca em gratuidades de colocação, local etc. Que adiantaria possuir a obra "unidade" se essa unidade fosse largada à mercê de um local onde não só não coubesse como idéia, assim como não houvesse a possibilidade de sua plena vivência e compreensão?
call "projects" is bom from this questiono Not that theya(e "pedestal" for the penetrables (what a superficial idea that would be), but they "guard" these works, creating, as it were, preludes to their understanding. What point would there be in showing a penetrable anywhere, even a public space, without seeking some kind of integration and preparation of the spectator's encounters with its unitary sense? This need is profound and important, not only because of the origin of the idea itself, but in arder to prevent it from losing itself in gratuities of placement, site, etc. What good would it do for the work to possess "unity" if this unity is left to the mercy of a place where it would not fit as an idea, and where the possibility of its fulllife-experience and comprehension would not exist? Hélio Oiticica
Hélio Oiticica
Para o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro realizar a coordenação das Salas Especiais de Lygia Clark e Hélio Oiticica, a convite da Fundação Bienal de São Paulo, foi uma grande experiência. Ambos os artistas, que tiveram toda a sua produção ligada ao MAMRJ, são um marco significativo da produção artística brasileira deste século, alcançando hoje um merecido destaque internacional.
o MAM-RJ desenvolve há cinco anos o Projeto LygiaClark com o apoio do CNPQ. Nele estão reunidos os arquivos da artista e a maior parte dos objetos relacionais e sensoriais por ela produzidos. Esse amplo material que inclui fotos, documentos e artigos sobre Lygia tem sido catalogado e estudado ao longo desses anos, estando à disposição do público. Partindo do movimento neoconcreto, Lygia e Hélio ultrapassaram os limites da geometria e se comprometeram com a experimentação. Enquanto Oiticica mergulhou na alma coletiva para extrair o corpo individual, Clark pesquisou a alma individual para revelar o corpo coletivo. Nesta 22ª Bienal, foro de discussão da ruptura do suporte da obra de arte, Lygia Clark e Hélio Oiticica se inserem como representantes maiores da criatividade e contundência da arte brasileira. Marcus de Lontra Costa Coordenador-geral do MAM-RJ Denise Mattar Coordenadora de Artes Plásticas do MAM-RJ
For the Museum of Modem Art of Rio de Janeiro it was a great experience to coordinate the Special Rooms of Lygia Clark and Hélio Oiticica, upon invitation by the Bienal of São Paulo Foundation. Both artists, whose production was entirely linked to the MAM-RJ, are a significant landmark of this century's Brazilian artistic production, attaining well deserved intemational recognition. The Lygia Clark Project has been developed by MAM-RJ for five years, with the support of CNPQ. It gathers the artist's archivesand most of the relational and sensorial objects produced by her. This comprehensive material which includes photos, documents and articles about Lygia has been catalogued and studied through the years and is available to public view. Starting at the neo-concrete movement, Lygia and Helio went beyond the boundaries of geometry and commited themselves to experimentation. While Oiticica went deeply into the collective soul in arder to extract the individual body, Clark researched the individual soul to reveal the collective body. In this 22a Bienal, discussion forum on the rupture of the support to the work of art, Lygia Clark and Hélio Oiticica stand as the most significant representants of the creativity and aggressiveness of the Brazilian art. Marcus de Lontra Costa General coordinator of MAM-RJ Denise Mattar Fine Arts coordinator of MAM-RJ
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Penetrável Invenção da luz, 1978-80 Galerie Nationale du Jeu de Paume. Paris, 1992 Foto P.Y. Brest
Grande núcleo, "Manifestação ambiental", 1960-68 Galerie Nationale du Jeu de Paume, Paris, 1992 Foto P.Y. Brest
Ninhos, em "/nformation" Museum of Modern Art, Nova York, 1970 Foto Hélio Oiticica Acervo Projeto HO, Rio de Janeiro
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1937 Nasce no Rio de Janeiro. 1954 Estuda pintura com Ivan Serpa, no Museu de Arte Moderna desta cidade. Integra o Grupo Frente. 1956-57 Participa da Exposição Nacional de Arte Concreta, realizada no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, em 1956, e no de São Paulo, em 1957. 1957-58 Cria os chamados Metaesquemas, desenhos onde manipula formas simples, visando ao mesmo tempo estimular o olhar e a mente. 1959-60 Renega os produtos da ortodoxia concretista, ligandose ao movimento neoconcreto. Rompe com a estrutura bidimensional do quadro e liberta a cor da tela, visando espacializá-Ia. Característicos desta fase são as Monocromias, formas quadradas recortadas e coladas sobre suporte retangular branco; os Bilaterais, objetos coloridos suspensos no ar; os Núcleos e os Relevos espaciais, placas tridimensionais suspensas por fios que podiam ser manipuladas pelo espectador, e os primeiros Penetráveis, instalações em forma de labirinto onde cores se sucediam segundo um ritmo cromático previsto. 1960 Participa da coletiva Konkrete Kunst, em Zurique. 1961 Expõe no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro a maquete do Projeto Cães de Caça espécie de. jardim japonês entremeado de penetráveis, evidenciando seu interesse progressivo em pesquisar novos esquemas de participação do
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espectador na obra de arte. 1963 Cria os Bólides, pequenas peças em vidro contendo pigmentos puros que podiam· ser manipulados. 1964 Desloca sua obra no sentido da criação de ambientes participacionais, então denominados Manifestações ambientais. 1965 Apresenta Parangolé, primeira manifestação ambiental coletiva, envolvendo capas, barracas, estandartes e passistas da Mangueira na mostra Opinião 65, realizada no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro. 1966 Apresenta a manifestação ambiental Sala de sinuca, na mostra Opinião 66, realizada no MAM do Rio de Janeiro. 1967 Apresenta a manifestação ambiental Tropicália, espécie de labirinto feito de penetráveis monitorados por um olho televisivo, na mostra Nova Objetividade Brasileira, realizada no MAM do Rio de Janeiro. 1968 Realiza no Aterro do Flamengo a manifestação ambiental coletiva Apocalipopótese. 1969 Realiza importante individual na Whitechapel Gallery, em Londres. 1970-78 Como bolsista da Fundação Guggenheim, fixa-se em Nova Vork. Participa da retrospectiva Information, realizada no Museu de Arte Moderna de Nova Vork. 1978 Retorna ao Brasil. 1978-1980 Desenvolve maquetes de labirintos que deveriam integrar o projeto de Rui Ohtake
para o Parque Ecológico do Tietê, em São Paulo. 1980 Morre no Rio de Janeiro. 1986 Galeria São Paulo realiza importante retrospectiva póstuma. 1992-94 Primeira retrospectiva internacional da obra do artista, que percorre cidades como Roterdam, Paris, Barcelona, Lisboa e Minneapolis. Participou da 4ª, 5ª, 7ª, 8ª e 14ª Bienais Internacionais de São Paulo, como artista convidado. 1994 Bienal Brasil Século XX. 1937 Bom in Rio de Janeiro. 1954 Studies painting with Ivan Serpa, at the Modem Art Museum in this city. Joins Grupo Frente (Front Group). 1956-57 Exhibits at the National Exhibition of Concrete Art, held at the Museum of Modem Art, Rio de Janeiro, in 1956, and at the MAM, Museum of Modem Art, São Paulo, in 1957. 1957-58 Creates the so-called Meta-schemes, drawings where he manipulates simple forms, aiming at stimulating both the ~ye and the mind. 1959-60 Denies the products of the concretist ortodoxy, joining the neoconcrete movement. He breaks the bidimensional structure of the painting and frees the colar of the screen, with the purpose of specializing it. Some characteristics of this phase are the Monocromias, which are square forms cut-up and colated on a white rectangular stand' the Bilaterais (Bilaterais), colored objects suspended in the air; the Núcleos (Nucleous) and the Relevos espaciais (Spacial reliefs), tridimensional boards suspended by
wires which could be handled by the spectator; and the first· Penetráveis (Penetrables), instalations shaped as a maze, where the colors would follow according to a preset cromatic rythm. 1960 Takes part in the group exhibition Konkrete Kunst, in Zurich. 1961 Displays his maquette of the Projeto Cães de Caça (Tracker Dogs Project), a kind of Japanese garden intermingled by penetrables, enhancing his growing interest in researching and experimenting new spectator participation schemes in the work of art. 1963 Creates the Bólides (Meteors), small glass pieces containing pure pigments which could be handled. 1964 Directs his work towards the creation of participational environments, called Manifestações ambientais (Environmental manifestations). 1965 Presents Parangolé, first group environmental manifestation, involving capes, tents, banners and dancers of the samba school "Mangueira" at the exhibit Opinião 65, held at the Museum of Modem Art of Rio de Janeiro. 1966 Piesents the environmental manifestation Sala de sinuca (Snooker roam) at the exhibit Opinião (j6, held at the MAM in Rio de Janeiro. 1967 Presents the environmental manifestation Tropicália, a kind of maze made of penetrables monitored by a tv camera at the exhibit Nova Objetividade Brasileira, held at the MAM in Rio de Janeiro. 1968 Presents the group environmental manifestation Apocalipopótese in Aterro do
Flamengo, Rio de Janeiro. 1969 Important solo exhibition at Whitechapel Gallery, in London. 1970-78 Settles in New York, with a scholarship from the Guggenheim Foundation. Participates in the retrospective Information, held at the Museum of Modem Art in this city. 1978 Retums to Brazil. 1978-1980 Designs maze maquettes which should be part of Rui Ohtake's project for the Ecological Park of Tietê, in São Paulo. 1980 Dies in Rio de Janeiro. 1986 Galeria São Paulo displays important posthumous retrospective exhibition. 1992-94 First intemational retrospective exhibition of the artist's work, which is presented in cities such as Rotterdam, Paris, Barcelona, Lisbon and Minneapolis. Participated in the 4th, 5th, 7th, 8th and 14th Bienais Internacionais de São Paulo as a guest artist. 1994 Bienal Brasil Século XX (Brasil Twentieth Century Biennial). Obras apresentadas/Works in the exhibition Rijanviera, 1979 Coleção Projeto HO, Rio de Janeiro Branco, 1971 Coleção Projeto HO, Rio de Janeiro Parangolé,1964-79 Coleção Projeto HO, Rio de Janeiro Tenda, 1964 Coleção Projeto HO, Rio de Janeiro
Romero veste Parangolé Capa 25, 1973 Foto Hélio Oiticica Acervo Projeto HO, Rio de Janeiro
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CU~DO~ lUClANO f1GUcl~cDO CU~DO~ A~~I~lcNlc fHI~c ~cD~O~O
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LYGIA CLARK: o DENTRO ÉO FORA
LYGIA CLARK: THE INSIDE IS THE OUTSIDE
Uma exposição retrospectiva da obra de Lygia Clark ainda não aconteceu entre nós. O público brasileiro e principalmente este das novas gerações só conhece de fato aspectos isolados ou fragmentados de uma artista considerada de seminal importância para a arte moderna. Toda a sua produção de arte e também daquilo que preferiu não chamar de arte exige que adotemos os conceitos próprios e específicos deste trabalho que desafia ainda hoje os critérios museológicos e normativos de exposições. É inútil querer aplicar-lhe noções estereotipadas ou extemporâneas, pois sua natureza prova ser incompatível ao contato superficial e que não seja o de adesão. Como para qualquer artista de excepcional valor, a obra de Lygia Clark pede que seja apresentada, vista e experimentada tal como a artista a realizou. Possui complexidade ímpar e integra a linhagem dos desbravadores de novos caminhos para a arte.
A retrospective exhibition of Lygia Clark's artworks stilll did not take place in Brazil. The Brazilian audience and the younger generation has only known isolated or fragmented aspects of the output of an artist who is considered essential for modem art. Ali her art production as well as that which she preferred not to consider as art require that we use only accurate and specific concepts to analyse it; today her work still challenges museum's and ideologic exhibition criteria. It is useless to approach Clark's work with stereotyped ideas as their nature has proved to be resistant to superficial contact as well as to spectators who are not open to them. As ali artists of exceptional standing, her work has to be shown, viewed and experimented as it was created. It has an inequalled complexity and belongs to the sphere of masters who pave new paths to art.
Nosso convívio com a obra de Lygia Clark nos ensina que, se não nos aproximarmos dela com despojamento e receptivos à ~ua problemática, não poderemos dizer que nosso contato foi pleno ou que sabemos qualquer coisa a seu respeito. Se o olhar é formalista, a experiência se limitará ao campo formal. Se esteticista, as limitações estetlcistas prevalecerão, mas a obra propriamente dita não se revelará para nós. Em 1986, por ocasião do 9º Salão Nacional de Artes Plásticas, realizamos uma exposição bastante didática do trabalho de Lygia que enfatizava uma de suas questões centrais que é a da "participação do espectador na obra de arte". Usamos como narrativa-guia o Livro-obra (1965-1984) através de versão ampliada em pranchas e textos sobre mesas especiais onde o público podia ver, mexer, vivenciar e construir proposições até então restritas aos poucos exemplares da limitadíssima edição.
Our experience with Lygia Clark's artwork has taught us that if we do not approach it in an open manner and in a receptive stand as regards her motifs we will not be able to say that we have had a deep contact with it nor that we know anything about it. If the gaze is a formalone the experience will be limited to the formal sphere. If it is directed to aesthetics the aesthetical limitations will prevail but the work will not be revealed to uso In 1986, when the 9º Salão Nacional de Artes Plásticas was held we organized a didactic exhibition of Lygia Clark's works. That emphasized one of her core issues, wich is "the spectator's participation in the artwork. "We have used as leading source Livro-obra (1965-1984) (Work-book) through the enlarged version in boards and texts on special tables where the audience was able to see, to touch, to experience and to construct propositions so far restricted to the few copies of the limited edition. In Livro-obra, Lygia Clark designs a special didactics, making use of a very simple styled text in order to demonstra te, by small inserted figures, thé periods of her work, since the linha orgânica phase (organic line) up to the propositions with "sensorialobjects".
No Livro-obra, Lygia Clark elabora uma didática especial, usando um texto de linguagem bastante simples para demonstraar com pequenas figuras encartadas as passagens de sua obra, desde a fase que chamou de linha orgânica até as proposições com os "objetos sensoriais" .
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Na inauguração daquele evento, deu-se em pleno espaço da exposição um curioso embate conceitual que confirma amplamente um aspecto até hoje muito polêmico de suas obras intituladas Bichos (1960), esculturas articuladas por dobradiças e oferecidas à manipulação do espectador. Os colecionadores proprietários de alguns Bichos emprestados à exposição manifestaram temor quanto à manipulação das obras pelo público, causando portanto um impedimento momentâneo à realização da mostra. A própria artista, ali presente, determinou que as pessoas continuassem manuseando os objetos, declarando que os tinha feito para serem manipulados livremente. O "não-objeto" Bicho provocava de novo, 22 anos depois de sua primeira apresentação no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro, outra humorada controvérsia como a que foi tão bem ilustrada pelo caricaturista Fortuna na edição do suplemento dominical do Jornal do Brasil em 3 de dezembrC? de 1960, na qual ele ironizava as normas museológicas que dizem "E proibido tocar nos objetos" com "É favor tocar nos não-objetos" da 2ª Exposição Neoconcreta. Tivesse Lygia podido ampliar o papel democrático do Bicho ao multiplicá-lo em "grande quantidade e vender em camelôs nas ruas", talvez não corresse mais o risco de sofrer ameaças redutoras de seus potenciais enquanto peça única, e talvez eles não estivessem agora ironicamente condenados ao destino comum das obras de arte. Muitas variações e formatos foram criados por Lygia e incorporados a coleções de arte. Não somente dos Bichos, mas também de Superfície modulada, Planos em superfície modulada, Espaço modulado e Unidade. Ao contrário da pintura e da escultura tradicionais, essas obras não mais perpetuam o gesto irrepetível do artista. Existe ainda hoje uma grave desinformação sobre este aspecto de seu trabalho, e devemos atentar para o fato de que a serialização de quadros deste período é parte do conceito da obra. Constitui ainda grande desafio para nós exibir os trabalho~ de Lygia em museus e espaços institucionais. Em 1964, em Stuttgart, por ocasião de uma exposição individual organizada e montada por Max Bense, Lygia, ao ver a exposição montada, fez uso de tesoura e soltou todos os Bichos que haviam sido pendurados por fios de náilon no. teto da galeria. Em 1968, em entrevista a Vera Pedrosa~ ela declara: "Hoje meu trabalho só tem pensamento. As luvas, por exemplo, para o espectador vestir. Elas são compradas; o objeto que você tem de apanhar, também. O que eu proponho aqui é que você vista a luva e tateie o objeto; e depois que a retire e pegue de novo o objeto com sua mão. Você deverá tentar descobrir o sentido do gesto. Assim, faço proposições. No fundo o objeto não é o mais importante. O pensamento, o sentido que se empresta ao objeto, ao ato, é o que interessa: O que vai de nós para o objeto". Em 1976 declara a O Globo: "Depois que rompi com a pintura e a escultura tive alguns anos difíceis. Eu já estava com uma linguagem esboçada, que era o corpo, mas não tinha medium, não tinha como continuar. Eu era chamada por galerias para mostrar meu trabalho. Recebia convites da Inglaterra, dos Estados Unidos e da Holanda. Mas caía sempre na manifestação inócua, no happening, e voltava completamente desgratificada, não havia retorno para mim do material. Eu sabia que havia alguma coisa errada, sabia que era a comunicação, mas não sabia como comunicar. Isto durante quatro anos".
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When this event was inaugurated, a heated conceptual discussion took place on the polemic aspect of her series entitled Bichos (Beasts), from 1960; they are articulated sculptures which have to be manipulated by the audience. The owners of some of these works which were included in the exhibition became afraid that the manipulation could damage the artworks. This caused the exhibition to be temporarily interrupted. The artist, however, determined that the spectator's participation was to continue as this was her purpose when she created them. The "non-object" called Bicho was still as challenging as when it was exhibited for the first time, 22 years before at the Museu de Arte Moderna of Rio de Janeiro. Then, a different controversy was illustrated with good humour by the cartoonist Fortuna in a Sunday issue of the Jornal do Brasil (December, 3rd, 1960) in which museum's rules and regulations were focused with irony; "it is forbidden to touch the exhibits" was replaced with "it is forbidden not to touch the non-exhibits" in a reference to the 2nd Neo-Concrete Exhibition. If Lygia had been able to enlarge the democratic role of the Bichos "reproducing them in huge quantities so that they could be sold by street vendors" she would perhaps not face the risk of having them undergo the menace of having their potential reduced for being unique pieces, and, as such, subjected to the ironic destiny of ali artworks. Lygia manufactured many such objects with different shapes which today take part in many art collections. She also designed, besides the Bichos (Beasts), Superfície modulada (Moduled surface), Planos em superfície modulada (Moduled surface planes), Espaço modulado (Moduled space) and Unidade (Unity). As opposed to traditional painting and sculpture, these works do not perpetuatethe unique imprint of the artist. This is an aspect of her work which still is misinterpreted and it is important to emphasize that the series she created during this period are part of the concept of the work. It is still a great challenge to exhibit Lygia's works in museums and galleries. In 1964 when an exihibition of her works was held in Stuttgart, organized by Max Bense, Lygia used scissors to cut the nylon wires that attached her Bichos to the ceiling. In 1968 when she was interviewed by Vera Pedroso she stated: "Today my work is created in my mind. Take the gloves, for instance, theyare to be worn by the spectator. Theyare bought as well as the other objects. What I propose is that vou wear the glove and manipula te the object while wearing it next vou manipula te the object without wearing the glove. You will try to find out the purpose of the gesture. Therefore, I make propositions. In the end it is not the object which is important. It is the thought that this object provokes which is important. What interest us is that which goes from us to the object. " In 1976 she states to the newspaperO Globo: "A fter I broke away from painting and sculpture I had to face some difficult years. I already had a structured language but it did not have a body, a medium; I did not have a means to communicate. Galleries invited me to exhibit my work. I received invitations from England, United States and Holland. But it was always an innocuous experience, directed towards happenings, and I used to come back unmotivated. I had no feedback. I knew something was wrong and I also knew that the problem was related to communication but I did not know how to communicate. This situation lasted for four years".
Nostalgia do corpo, 1965-1988 Corpo coletivo, 1986 Foto SĂŠrgio Zalis
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Prosseguindo com suas experiências e proposições coletivas em Paris, e mesmo depois que passa a se declarar não-artista, ela ainda tenta sem grande entusiasmo fazer exposições em galerias comerciais, mas os resultados provam-se incipientes. A partir dos Objetos re/acionais, e dentro de seu contexto terapêutico, seu trabalho, sendo inclassificável, impede adequações ou interpretações descontextualizantes. Previsivelmente, o mundo das artes vai sempre querer "reintegrá-Ia" aos seus domínios, porém cabe a nós pelo menos mostrar' sua obra em termos de: de onde veio, o que é e para onde foi. Gostaríamos de apresentar aqui dois fragmentos da extensa correspondência que ela manteve ao longo de anos de amizade com Hélio Oiticica: De H~lio Oiticic,a para Lygié}, C/ark em 11 de ju/ho...de,1974: ..... CRITICO OU E DA POSIÇAO DE ARTISTA OU NAO E: como já dizia o NIETZSCHE há 100 anos: como pode uma COISA MAIOR ser reduzida a UMA MENOR: da descoberta/invenção do artista às mesquinharias idiossincráticas do espectador que não existe mais: quem vive o que você propõe e dá, ou vive ou não vive mas nunca fica na posição de "assistir"como de fora!: voyeurs da arte ... pior que a pior das inutilidades, eu e a PRIMA nada temos comisso!: pertencemos a outra raça: VOCÊ ÉOUTRA RAÇA! Resposta de Lygia C/ark a Hé/io Oiticica em 6 de novembro de 1974: ..... quanto ao papel do crítico, estou com você: ou a criatividade tem pensamento e diz tudo, ou nada é. Por isso é que o crítico só pode se expressar ainda através da cultura morta onde há o objeto arte, mas agora é impossíveL:' Certamente nada disso se aplicaria a um Mário Pedrosa, que em seu texto 66A significação de Lygia Clark", escreveu: "essas esculturas são' como uma árvore mágica, que dá esculturas como uma jaqueira dá jacas". Não receio dizer que devemos vencer os coágulos conceituais. Com a palavra, o artista e terapeuta Lula Wanderley. . Luciano Figueiredo Rio de Janeiro, 6'de setembro de 1994.
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As her work developed including the group exhibitions in Paris she declared herself a non-artist but sti// participated, without enthusiasm, in comercial exhibitions. The results, however, were considered uninteresting by the artist. As it is impossible to be labe//ed, her work should not be subject to extraneous interpretations, especia//y after Objetos relacionais (Relational objects) and her therapeutic work was developed. The art world tried to reintegrate her to its realms but it is up to us to, at least, show her work within its own context: where it came from, what it is and where it went to. From the extensive correspondence she maintained with Hélio Oiticica I wish to highlight two excerpts: From Hélio Oiticica to Lygia Clark in July, 11th, 1974: "The critic either agrees with the artist's proposal or not, as Nietzche already stated a hundred years ago. How can a major thing be reduced to a sma//er thing? From the discovery/invention carried out by the artist to the minor idiosyncrasies of the spectator which does not exist anymore: who experiences that which you propose and impart; you either live or do not live but you never put yourself in the position of someone who is an outsider!: voyeurs of art. .. it is worse than useless. 80th, I and my Cousin do not have anything in common with them! We belong to a different species of human beings:
Answer from Lygia Clark to Hélio Oiticica in November, 6th, 1974: "regarding the role of the critic I agree with you: either creativity is supported by thought and says everything or it is nothing. That is the reason why the critic can onlyexpress himself by means of a late culture in which artworks sti// exist. However, this is impossible today." i
These commentaries do not apply to a critic like Mário Pedrosa who wrote in his text ':4 significação de Lygia Clark" ( Lygia Clark' s meaning): "these sculptures are like magic treeswhich produce sculpture as a tree produces fruit". Iam not afraid to say that we have to overcome the conceptual blood clots. The artist and psychotherapist Lula Wanderley takes the floor. Luciano Figueiredo Rio de Janeiro, September 6th, 1994
EM BUSCA DO ESPAÇO IMAGINÁRIO INTERIOR DO CORPO
IN SEARCH DF BDDY'S IMAGINARY INNER SPACE
Em nossa vida cotidiana costumamos dizer que um determinado objeto é uma "verdadeira obra de arte", mas quando nos pedem para definir o que é arte, quando temos que conceituar, tudo se torna muito difícil. Nunca sabemos se a arte é uma coisa, um gesto ou uma característica qualquer, e quando conseguimos sentir a ilusão de uma certeza, encontramos pela frente um artista sempre pronto a nos confundir. Entretanto, quase não temos dúvida em afirmar que toda arte é uma forma de comunicação com o outro, por ser uma expressão que existe numa espécie de plano imaginário. Dito em outras palavras: toda arte necessita, para existir, de um suporte que chamamos de "o objeto de arte", feito para a leitura do outro e tendo qualidades predominantemente físicas ou conceituais. -
In our daily lite we easily tend to say that a certa in object is a "real work of art" but when asked to define art, judge ar classify any piece of work, it becomes very difficult. We do not know if art is a thing, a gesture ar any characteristic and even when we have the iIIusion of knowing we meet an artist whose work puzzles uso We may, however, affirm that art is a form of communication, an expression of an imaginary idea. Summing up we may say: to exist and communicate with the observer art needs a support, the "art object" with its physical and conceptual characteristics.
Mas o que aconteceria se tivéssemos uma linguagem artística que não fosse essa expressão em um determinado plano, que eliminasse o suporte, ou seja, se não existisse o "objeto de arte"? Em primeiro lugar, encontraríamos uma linguagem em que não teríamos um espectador, esse alguém contemplativo seria agora ativo participante da criação. Mas isso não quer dizer que haveria um objeto incompleto, dotado de uma atemporalidade dinâmica que exigisse que o espectador tentasse continuamente completá-lo, porque não existiria o objeto. Suprimido o processo de comunicação e estabelecido um contato direto, corpo a corpo, o objeto seria dissolvido e incorporado ao participante. Não existiria, portanto, nem o espectador nem o objeto, mas a relação que se estabeleceria entre os dois, pondo fim, dessa maneira, ao mito do artista.
What would happen if we had an artistic language other than this expression in a determined plane eliminating the support, thus the art object? First of ali, we would find a language where the observer would be active in the creation process and not contemplative as today. But this does not mean that we - would have an incomplete object whose timelessness dynamics requires the constant effort of the observer to complete it, because there would not be any object at ali. Eliminating the communication process and establishing a direct body-to-body contact, the object would be dissolved and incorporated by the participant. This would be the end of the myth of the artist. In a few words, this is Lygia Clark's path in search of the body. Art is an organic language which ends up as she says, "revealing us to ourselves". This search began with the creation ofBichos (Beasts), articulated structures composed of hinged triangles, squares and circles, that when manipulated by the participant establish a kind of fusion between him/her and the object. Caminhando (Walking) (1964) was her next creation where,
Em outras palavras, este é o percurso desenvolvido por Lygia Clark em busca do corpo. Arte, dentro de uma linguagem orgânica que acaba, como ela própria diz, "por nos revelar a nós mesmos". O início deste original percurso se deu com a criação dos Bichos (1960), esculturas articuladas, formadas de triângulos, quadrados e círculos unidos por dobradiças que, manipuladas, estabelecem uma espécie de fusão entre participante e objeto. Em seguida, fazendo uso de apenas uma tesoura e uma fita de Moebius, propõe Caminhando (1964), em que o objeto "some" e passa a ser
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Nostalgia do corpo, 1965-1988 Objetos rei acionais/ relational objects
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incorporado ao gesto de quem o faz. Mais tarde, com a descoberta de Pedra e ar (1964), surge o que ela chamou de Nostalgia do corpo. O objeto, agora, abre passagem por entre o corpo e toca direto na subjetividade e fantasia daquele que antes era o espectador. Um percurso em busca do corpo, por certo, mas aqui não é o corpo em si que interessa, e sim a Fantasmática do corpo, onde o corpo e a fantasia se "fundem", através de uma memória afetiva que o corpo guarda de nossas relações com o mundo. Isso me leva a supor que as propostas de Lygia Clark não negam o objeto de arte para colocar o corpo em seu lugar, o que restauraria o mito do artista. Nelas, os opostos arte e não-arte se justapõem, não criam conflito, encontramse na totalidade da linguagem por ela desenvolvida. Sua proposta Estruturação do self, construída no final da década de 70, cria o "objeto relacional", que se diferencia do "objeto sensorial" de propostas anteriores (embora alguns objetos sensoriais tenham sido incorporados aos objetos relacionais) por ser uma espécie de síntese de todo o seu percurso, onde a linguagem que veio se sedimentando ao longo da evolução de seus trabalhos ganha força e clareza. Coube a mim o interesse de desenvolver as potencialidades dessa proposta em direção a um trabalho psicoterápico com pessoas que tinham experiências diagnosticadas como psicóticas.
with the help of a pair of scissors and Mobius tape, the object "disappears" and is incorporated by the gesture of the person who handles it. Later, after creating Pedra e ar (Rock and air) (1964), appears what she called Nostalgia do corpo (Body nostalgia). The object now goes thraugh the body of the former spectator and touches directly hislher subjectiveness and fantasy. It is a search for the body, however it is not the body that matters, but the Fantasmática do corpo, i.e., its soul where fantasy and substance merge thraugh an affective memory of one's relationship with the world which the body has kept. This leads me to suppose that Lygia Clark's praposal does not deny the art object to replace it with the body,' which would restare the myth of the artist. In it, the antagonism of art and non-art is juxtaposed and do not conflict. They meet in the wholeness of the language she developed. Her praposal to Estruturação do self (Self structuring) intraduced in the late 70's creates the "relational object" that is different fram the "sensorial object" fram previous praposals (although some sensorial objects have been incorporated to relational objects) beca use theyare a· kind of synthesis of the whole path. Hence, language that was sedimenting during the course of her works gains force and clearness. It was up to me to develop the potentiality of this praposal towards a psycotherapic work with individuaIs who had experiences diagnosed as psychotic.
O óbjeto relaciona I Esses objetos podem ser descritos como pequenos sacos de 30 x 30 cm repletos de areia, de sementes finas ou de bolinhas de isopor, além de outros sacos - de mesmo tamanho - de água ou de ar, pedras pequenas e redondas envolvidas pela rede dos saquinhos de embalar verduras, assim como uma rede que envolve em uma das extremidades uma pedra e na outra extremidade um saco de ar, etc. Os objetos relacionais propostos por Lygia Clark para o relacionamento com o participante, ao contrário dos objetos que vemos agora na arte contemporânea, são sem dúvida alguma de uma simplicidade formal surpreendente. São sempre uma película por onde corre uma matéria pura como o ar, água, leves bolinhas de iSf8Jor, areia, etc. A sensorial idade que eles contêm na textura, nos diferentes pesos e temperaturas, na forma com que a matéria corre em seu interior, etc. é a especificidade de cada um, é o que difere um do outro. Experimentados em conjunto, guardam uma certa analogia com o ambiente primário que envolve o corpo. Digo primário porque tal analogia não se refere aos aspectos formais desse am~iente, mas às qualidades plurissensoriais gravadas no e pelo corpo. E do fluxo entre o cheio e o vazio, movimento da ausência e da presença, dentro e fora, leve e pesado, quente e frio, que os objetos ganham unidade nessa relação corpo/espaço/objeto/ambiente. Mas todo esse jogo de sensorial idade produzida, de dificílima descrição, acaba por formar uma linguagem, uma espécie de linguagem do corpo. Portanto, o objeto relaciona I é um objeto para o corpo. A relação que o objeto relacional estabelece com o corpo não é feita pela significação da forma (imagem visual do objeto), mas pela imagem sensorial do objeto: algo vivido pelo corpo que não é uma delineação sensorial da forma ou uma qualidade de superfície, mas algo que dissolve a noção de superfície e faz com que o objeto seja vivido em "um dentro imaginário do corpo", onde ele encontra significação. Quebra-se aí a fronteira entre corpo e objeto. 60
The relational object These objects can be described as small bags of 30 x 30 cm full of sand ar fine seeds ar small balls of styrafoam, other bags of the same size containing water ar air, stones, vegetables, a net involving a stone in one extremityand a bag of air in the other, etc. The relational objects which Lygia Clark praposes to relate with observers, contrary to the objects we now see in contemporary art are of a surprising formal simplicity. They are always a sort of membrane carrying pure materiaIs such as water, air, small styrafoam balls, sand, etc. The sensoriality in their texture, in their different weights and temperatures, the way substance runs in its interior, etc. is the specificity of each one of them. It is what makes one differ fram the other. Experimented in graups they resemble the primary enviranment that in volves the body. I say, primary beca use this analogy does not refer to formal aspects of this enviranment, but to the plurissensorial qualities engraved on and about the body. And in this full and empty flux, the absencelpresence movement, theinside and outside, light and heavy, hot and cold is where objects attain oneness in this relation bodylspacelobjectlenviranment. But ali this praduced sensoriality is extremely difficult to describe and ends up forming a language. Body and its speaker begin to exist in a specific relationship, turning it into a kind of body language, where the relational object is an object for the body. The relationship the relational object establishes with the body is not made by what form means (visual image of the object) but by the sensorial image of the object: something the body experiments that is not a sensorial outlining of form ar quality of the surface, but something that dissolves the notion of surface and makes the object live in an "imaginary inside of the body" where it finds its meaning. Here, the boundaries between bodyand object are braken.
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Nostalgia do corpo, 1965-1988 Mรกscara abismo
Nostalgia do corpo, 1965-1988 Foto Hubert Josse
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"Sem especificidade em si, o objeto relacional, como o seu próprio nome indica, se define na relação estabelecida com a fantasia do sujeito que o vivencia, perdendo a condição de simples objeto para, impregnado, ser vivido como parte do sujeito" (Lygia Clark). Temos então a quebra da fronteira entre corpo e fantasia.
"Without definition as such, the relational object as the name indicates is defined in the relationship established with fantasy of the subject that experiences it, losing the condition of simple object to, impregnated, live as part of the individual" (Lygia Clark). We then have the rupture of the boundaries between body and fantasy.
Dessa maneira, o objeto relacional pode ser considerado um objeto que anula a si próprio. Todas as potencialidades que lhe conferem uma independência de quem o propõe são como que virtuais. Ele existe em quem o experimenta, no aqui e agora de uma relação concreta. Dissolve não só a fronteira entre o corpo objeto e a fantasia, como também deixa de existir a fronteira entre tempo e espaço, entre o dentro e o fora, etc. Temos então uma vivência de totalidade.
This way, the relational object can then be considered an object that annuls itself Ali the potentialities that free it from those whose propose are as it they were virtual. They exist in those experimenting it, in the here and now of a concrete relationship. It dissolves the frontier among body, object and fantasy and the frontier between time and space, inside and outside, etc. also ceases to exist. We then have a total experience of lite.
A relação dialética entre o todo e a parte, que caracteriza essa vivência de totalidade em algumas pessoas diagnosticadas como psicóticas, é desfeita, partida e vivenciada como metáfora da morte. E daí que vêm meu interesse e minhas experiências com os objetos relacionais. Construídos em algum lugar entre o dentro e o fora, eles trazem a vivência de uma unidade que se totaliza como uma experiência de vida.
ocorpo A plurissensualidade do objeto relacional acaba fragmentando a nossa percepção do corpo, como se o objeto se dirigisse ao corpo para dilacerá-lo. Mas é preciso que o corpo se dilacere, e que essa dilaceração seja vivida como um vazio, para que o objeto seja incorporado. E como aqui o dentro é o fora, essa incorporação é sentida como um religamento como o mundo, uma nova experiência cósmica, construindo uma membrana em um arremate final. Ampliase o contato afetivo com a realidade. Na verdade, o que se parte (dilacera) é o suporte da própria subjetividade humana, condição para que se dê definitivamente a eliminação do suporte da arte. Porém, a quebra desse suporte é também uma investigação a respeito do real e do imaginário, do metafórico e do físico na arte. Antes, partindo do quadro, Lygia Clark fez com que o metafórico da arte escapasse para o espaço real circundante. Mais tarde, esse espaço ganha uma plurissensualidade particular cujo toque no corpo alcança a fantasmática inerente a ele em suas relações com a memória e o simbolismo, fazendo irromper o psicológico, as fantasias primordiais. A arte agora tem hora e dia marcados para acontecer, no espaço de um consultório psicoterápico.
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The dialetic relationship between whole and part, is characterized by this total experience of lite; in some persons who have been diagnosed as psychotic, it is undone, divided and experienced as a metaphor to death. Here my interest and experiences with relational objects origina te. Having built a place between the inside and outside, they bring a total experience of lite. The body The plurisensuality of the relational object ends up fragmenting our perception of body as if the object went towards the body to lacerate it. However the body must lacerate, -and this laceration must be lived as void, for the object to be incorporated and because here inside is outside, this incorporation is felt as a reconnection to the world, a new cosmic experience, constructing a membrane in a final conclusion. The affective contact with reality is enlarged. In fact, what is broken (Iacerates) is the own support of human subjectivity, a condition to definitively eliminate support in art. However, breaking this support is an investigation on reality and imaginary, metaphoric and physical in art. Previously, starting from the canvas, Lygia Clark makes an art metaphor escape to real surrounding space. Later, this space gains particular plurisensuality whose touch on body reaches the phantasmal inherent to it in its relationships to memory and symbolism , making the psychologic and primordial fantasies burst forth. Art now has a set day and hour tohappen, in the space of a psychotherapic consulting roam.
Creio que tudo isso se relaciona com o fato de as pessoas emergirem de suas experiências com os objetos relacionais com um contato afetivo com a realidade mais amplo; ele é um novo deslocamento para o real circundante. E assim como o objeto é dissolvido no corpo, a arte está inserida novamente na vida.
I believe that ali this is related to the fact that individuais emerge from their experiences with the relational object with an affective contact with their broader reality, a new shift from the surrounding reality. Hence, beca use the object is dissolved in the body, art is again inserted in life.
Structuring the seft
A estruturação do self
É como chamamos a sistemática da utilização do objeto relacional na proposta psicoterapêutica. Um setting onde as potencialidades dos objetos tornam-se mais claras dentro do dinamismo psíquico. Ritual belo, principalmente na relação entre o silêncio e o gesto. A pessoa deita-se em um grande objeto, um colchão feito de plástico transparente e recheado de bolinhas de isopor. A superfície desse colchão não oferece resistência e tende a abrir espaços em seu interior, facilitando a acomodação perfeita do corpo. Cubro seus olhos, assim como também coloco em seus ouvidos conchas do mar, para proporcionar uma sensação de interioridade. Massageio suavemente sua cabeça. Junto suas articulações com doçura, mas com firmeza, o que leva muitas pessoas a vivenciar uma sensação de unidade. Toco o corpo da pessoa com os objetos relacionais, em uma espécie de massagem, para depois deixar os objetos sobre o corpo, envolvendo-o. Essa etapa em que os objetos permanecem estáticos sobre o corpo é a mais longa (cerca de 40 minutos). É quando o objeto relacional torna-se mais forte em sua linguagem, sem a presença do toque do mediador terapeuta, que apenas espera. Durante essa espera, coloco em suas mãos uma pedrinha redonda envolta por uma rede. Esta pedra é o que chamamos de "prova da realidade". Sendo ela totalmente diferente dos demais objetos, pois é compacta, possuindo contornos definidos, etc., o gesto de segurála vai se contrapor a todo o processo, ao mesmo tempo que a ele vai pertencer. Depois, retinj·vagarosa e suavemente os objetos de cima do corpo. Também massageio o corpo com outro grande objeto, uma espécie de cobertor feito de pano levíssimo recheado de bolinhas de isopor. Forneço à pessoa um objeto de ar (saco plástico cheio de ar) para que ela, já sentada e de olhos abertos, toque seu próprio corpo, em um gesto de transição antes de voltar à atitude de verbalização. Converso então com o cliente a respeito do que foi vivenciado durante toda a experiência. Encerro a sessão, que é renovada periodicamente dentro de um processo.
This is how we call the systematic of utilizing a relatiónal object in psychotherapy. A "setting" where the potentialities of the object become clearer within the psychic dynamism. A beautiful ritual, mainly in its relationship between silence and gesture. The person lies down on a large object, a matress made of transparent plastic and filled with small balls of styrofoam. The surface of this matress does not offer any resistence and has a tendency to open empty spaces in its interior, enabling a perfect accomodation of the body. I cover his eyes and place shells on his ear lobes to provide a sensation of interiority. I gently massage his head. I hold his joints gently but firmly, which makes my client experience a sensation of oneness. I touch the person's body with the relational object in a sort of massage, and then Ileave the objects over hislher body, involving it. This part in which the objects remains static on the body is the longest one (approximately 40 minutes). It is when the relational object becomes more powerful in its language without the mediating therapist's presence. The therapist just waits. During this wait, I place in his hands a small round stone involved by a net. This stone is what we call "proof of reality". It is totally different from other objects, because it is compact, has defined shapes, etc. The gesture of holding it opposes the whole process and at the same time belongs to it. After this, I slowly and gently take away the objects from hislher body. I also massage hislher body with another large object, a sort of blanket made of an extremely light material filled with small styrofoam balls. I give the person an object containing air (plastic bag full of air) so that helshe, who is already sitting and with hislher eyes open, will touch hislher own body, in a gesture of transition resuming an attitude of verbalization. I talk to the client about what was experienced. I close the session to periodically refresh it as part of a processo Lula Wanderley
Lula Wanderley
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Pedra e ar, 1966
Objeto sensorial/sensorial object
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Caminhando -1964
Caminhando - 1964
Caminhando é o nome que dei a minha última proposição. A partir daí, atribuo uma importância absoluta ao ato iminente realizado pelo participante. O Caminhando tem todas as possibilidades ligadas à ação em si: ele permite a escolha, o imprevisível, a transformação de uma virtualidade em um empreendimento concreto.
Caminhando (Trailings) is the name I gave my latest proposition. Henceforth, I will give an absolute importance to the immanently inscribed act that the participant willbring about. The Caminhando supplies ali the possibilites attached to action itself it allows for choice, for the unpredictable, for the transformation of a virtuality into a concrete undertaking. Make yourself a Caminhando: Vou take the band of paper wrapped around a book, vou cut it open, Vou twist it, and vou glue it back together so as to pro dure a Mobius strip.
Faça você mesmo o Caminhando com a faixa branca de papel que envolve o livro, corte-a na largura, torça-a e cole-a de maneira a obter uma fita de Moebius. Tome então uma tesoura, enfie uma ponta na superfície e corte continuamente no sentido do comprimento. Tenha cuidado para não cair na parte já cortada - o que separaria a fita em dois pedaços. Quando você tiver dado a volta na fita de Moebius, escolha entre cortar à direita ou à esquerda o corte já feito. Essa noção de escolha é decisiva e nela reside o único sentido dessa experiência. A obra é seu ato. À medida em que se corta a fita, ela se afina e se desdobra em entrelaçamentos. No fim, o caminho é tão estreito que não pode mais ser aberto. É o fim do atalho.
Then take a pair of scissors, stick one point into the surface and cut continuoslyalong the length of the strip. Take care not to converge with the pre-existing cut, what will cause the band to separa te into two pieces. When Vou have gane the circuit of the strip, it's up to Vou whether to cut to the left ar the right of the cut you've already made. This idea of choice is capital. The special meaning of this experience is in the act of doing it. The work is your act alone. To the extent that Vou cut the strip, it refines and redoubles itself into interlacings. At the end the path is so narrow that Vou can't open it further. It's the end of the trail.
(Se eu utilizo uma fita de Moebius para essa experiência é porque ela quebra os nossos hábitos espaciais: direita-esquerda, anverso e reverso, etc. Ela nos faz viver a experiência de um tempo sem limite e de um espaço contínuo.)
(lf I use a Mobius strip for this experiment, it's beca use it breaks with our spatial habits: right/left; from/back, etc. It forces us to experience a limitless time and a continuous space.)
Cada Caminhando é uma realidade imanente que se revela em sua totalidade durante o témpo da expressão do espectador-autor.
Each Caminhando is an immanent reality that reveals itself in its totality during the expressive time of the spectator-author.
Inicialmente, o Caminhando é apenas uma potencialidade. Você e ele formarão uma realidade única, total, existencial. Nenhuma separação entre sujeito-objeto. É um corpo-a-corpo, uma fusão. As diversas respostas surgirão de sua escolha.
At the outset, the Caminhando is onlya potentiality. You are going to form, Vou and it, a unique, total, existential reality. No more separation between subject and object. It's an embrace, a fusion. The responses, diverse as they are, will be bom of your choices.
À relação' dualista entre o homem e o Bicho, que caracterizava as
To the dualistic relation of man and Beast that characterized my earlier experiments, there now succeeds a new type of fusion. The work, being the act of making the work, Vou and it become wholly indissociable.
experiências precedentes, sucede um novo tipo de fusão. Em sendo a obra o ato de fazer a própria obra, você e ela tornam-se totalmente indissociáveis. Existe apenas um tipo de duração: o ato. O ato é o que produz o Caminhando. Nada existe antes e nada depois. Sempre que inicio uma nova fase de meu trabalho, sinto todos os sintomas da gravidez. E logo que a gestação começa, sofro verdadeiras perturbações físicas como a vertigem, por exemplo, até o momento em que consigo afirmar meu novo espaço-tempo no mundo. Isso acontece na medida em que chego ao ponto de identificar, reconhecer essa nova expressão de minha obra no meu dia-a-dia. O Caminhando, por exemplo, só passou a ter sentido para mim quando, atravessando o campo de trem, senti cada fragmento da paisagem como uma totalidade no tempo, uma totalidade sendo, se fazendo sob meus olhos, na iminência de movimento. Era o momento, a coisa decisiva. Outra vez, contemplando a fumaça do meu cigarro, senti como se o tempo fizesse incessantemente seu próprio caminho se aniquilando e se refazendo em um ritmo contínuo ... Já experimentei isso no amor, nos meus gestos. E cada vez que a expressão "caminhando" surge na conversa, nasce em mim um verdadeiro espaço e me integro no mundo. Sinto-me salva.
There is a single type of duration: the act. The act is what produces the Caminhando. There is nothing before, nothing after. Each time I attack a new phase of my work, I feel ali the symptoms of pregnancy. Dnce gestation begins, I have actual physical symptoms, dizziness for example, unti! the moment I manage to bring my new space-time into the world. That occurs to the extent that I arrive at identitying, at recognizing this new expressiveness of my work in my every day lite. The Caminhando, for example, only took on meaning for me once, crossing the countryside by train, I experienced each fragment of the landscape as a temporal totality, a totality in the process of forming, of producing itself before my eyes, in the immanence of the moment. The moment, that was the decisive thing. Dr another time, while watching the smoke from my cigarrete: it was as though time itself were ceaselessly forginig its path, annihilating itself, remaking itself, continuosly. .. 1already experienced that in lave, in my gestures. An each time the expression "trailing" wells ip in conversation, it gives rise to an actua! space and integrates me into the world. I feel saved. I a!so find that my architectural attemps, bom at the same time as the
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Caminhando, 1964 Foto Beta FelĂcio
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Penso também que minhas tentativas arquiteturais, nascidas ao mesmo tempo que o Caminhando, queriam ser uma ligação com o mundo coletivo. Tratava-se de criar um espaço-tempo novo, concreto - não apenas de mim, mas também para os outros. Fazendo essas arquiteturas, senti um grande cansaço, como se tivesse trabalhado toda uma vida. Um cansaço provocado pela absorção de uma nova experiência. Daí, algumas vezes, essa nostalgia de ser uma pedra úmida, um ser-pedra à sombra de uma árvore, à margem do tempo.
Caminhando, wanted to be a link with the collective world. At issue was the creation of a new, concrete, space-time - not only for myself, but for others. In making them, these architectures, I felt a great fatigue, as though I had worked at it for a whole lite. Fatigue due to the absorption of a new experience. From which, sometimes, this nostalgia to be a damp stone, a stone-being, in the shade of a tree, outside time.
Bichos - 1960 Bichos -1960
Éesse o nome que dei às minhas obras desse período, pois seu caráter é fundamentalmente orgânico. Além disso, a dobradiça que une os planos me faz pensar em uma espinha dorsal. A disposição das placas de metal determina as posições do Bicho, que à primeira vista parecem ilimitadas. Duando me perguntam quantos movimentos o Bicho pode fazer, respondo: "Eu não sei, você não sabe, mas ele sabe .. :'
The arrangement of the metal plates determines the position of the Bicho (Beast), which at first glance seems limitless. When I am asked how many movements the Bicho can execute, I reply: "1 have no idea, nor do you, but the beast knows ... "
o Bicho não tem avesso.
The Bichos have no reverse side.
Cada Bicho é uma entidade orgânica que se revela totalmente dentro de seu tempo interior de expressão. Ele tem afinidade com o caramujo e a concha. Éum organismo vivo, uma obra essencialmente atuante. Entre você e ele se estabelece uma interação total, existencial. Na relação que se estabelece entre você e o Bicho não há passividade, nem sua nem dele.
Each Bicho is an organic entity that only reveals itself totally within its internaI expressive time. It has affinities with the conch and the shellfish.
Acontece uma espécie de corpo-a-corpo entre duas entidades vivas. Acontece na realidade um diálogo em que o Bicho tem respostas próprias e muito bem definidas aos estímulos do espectador. Essa relação entre o homem e o Bicho, anteriormente metafórica, torna-se real.
o Bicho tem um círculo próprio de movimentos que reage aos estímulos do sujeito. Ele não se compõe de formas independentes e estáticas que possam ser manipuladas à vontade e indefinidamente, como num jogo. Ao contrário: suas partes se relacionam funcionalmente, como as de um verdadeiro organismo, e o movimento dessas partes é interdependente.
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This is the name I gave my works of this period, due to their fundamentally organic character. And also, the hinge connecting the planes made me think of a dorsal spine.
Nessa relação entre você e o Bicho há dois tipos de movimento. O primeiro, feito por você, é puramente exterior. O segundo, do Bicho, é produzido pela dinâmica de sua própria expressividade. O primeiro movimento (que você faz) nada tem a ver com o Bicho, pois não pertence a ele. Em compensação, a conjugação de seu gesto com a resposta imediata do Bicho cria uma nova relação e isso é possível graças aos movimentos que ele sabe fazer: é a vida própria do Bicho.
It's a living organism, an essentially active work. A total, existential integration is established between it and you. A passive attitude is impossible between you and the Bicho, either on its part or on yours. What occurs is a kind of embrace between two living entities. It's in fact a dialogue through which the Bicho reacts - thanks to its own specitic circuit of movements - to the spectator's stimulus. This relation between the work and the spectator until now a virtual one becomes effective. The Bicho is not composed of independent forms whose development one could pursue indefinitely at one's own will, as in a game. To the contrary: its parts work together harmoniously as in a real organismo When the parts are in movement an interdependence is stablished between them. In these relations between the Bicho and yourself, there are two types of movement. The first, purelyexternal, is what you do. The second, the Bicho 's own, is produced by the dynamic of its own expressiveness. The first movement (what you do) has nothing to do with the Bicho because it doesn't belong to it. But, on the other hand, the conjuction of your gesture with the immediate response by the Bicho creates a new relatioship, and that is possible only as a function of the movement that the Bicho knows how to execute itself this is the lite proper to the Bicho.
Bicho "Ponta", 1960 Coleção particular, RJ Foto Fausto Fleury
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A morte do plano -1960
Death of the plane - 1960
oplano é um conceito criado pelo homem com um objetivo prático: satisfazer sua necessidade de equilíbrio. O quadrado, criação abstrata, é um produto do plano. Marcando arbitrariamente limites no espaço, o plano dá ao homem uma idéia inteiramente falsa e racional de sua própria realidade. Daí os conceitos opostos como o alto e o baixo, o direito e o avesso, que contribuem para destruir no homem o sentimento da totalidade. Étambém essa a razão pela qual o homem projetou sua parte transcendente e lhe deu o nome de Deus. Assim ele colocou o problema de sua existência - inventando o espelho de sua própria espiritualidade.
The plane is a concept created by humanity to serve practical ends: that of satisfying its need for balance. The square, an abstract creation, is a product of the plane. The plane arbitrarily marks off the limits of a space, giving humanityan entirely false and rational idea of its own reality. From this are derived the opposing concepts of high and low, front and back - exactly what contributes to the destruction in humankind of the feeling of wholeness. It's also the reason why people have projected their transcendent part outward and given it the name of God. In this way the problem of their own existence is raised - in inventing the mirror of their own spirituality.
O quadrado adquiria uma significação mágica quando o artista o considerava como portador de uma visão total do universo. Mas o plano está morto. A concepção filosófica que o homem projetava sobre ele não mais o satisfaz, assim como a idéia de um Deus exterior ao homem. Ao tomar consciência de que se tratava de uma poética de si mesmo projetada para o exterior, ele compreendeu ao mesmo tempo a necessidade de reintegrar essa poética como parte indivisível de sua própria pessoa. Foi também essa introdução que fez explodir o retângulo do quadro. Esse retângulo em pedaços, nós o engolimos, nós o absorvemos. Anteriormente, quando o artista se situava diante do retângulo, projetava-se sobre ele e nessa projeção carregava de transcendência a superfície. Demolir o plano como suporte da expressão 'é tomar consciência da unidade como um todo vivo e orgânico. Nós somos um todo e agora chegou o momento de reunir todos os fragmentos do caleidoscópio em que a idéia do homem foi quebrada, reduzida a pedaços. Mergulhamos na totalidade do cosmos; fazemos parte desse cosmos, vulneráveis por todos os lados: o alto e o baixo, o direito e o esquerdo, enfim, o bem e o mal: todos conceitos que se transformam. O homem contemporâneo escapa às leis da gravitação espiritual. Ele aprende a flutuar na realidade cósmica como em sua própria realidade interior. Ele se sente tomado pela vertigem. As muletas que o amparavam caem longe de seus braços. Ele se sente como uma criança que deve aprender a equilibrar-se para sobreviver. É a primeira experiência que começa.
The square took on a magical meaning when the artist understood it as carrying a total vision of the universe. But the plane is dead. The philosophical conception that humanity projected anta it no longer satisfies no more than does the idea of an externai God persist. In becoming aware that it is a matter of an internai poetry of the self that is projected into the exterior, it is understood at the same time that this poetry must be reintegrated - as an indivisible part of the individual. It is this introjection that has also burst the pictorial rectangle asunder. This rectangle in pieces has been swallowed up by us and absorbed into ourselves. Before, when artists situated themselves in front of the rectangle, they projected themselves anta it and in this projection they charged the surface with transcendent value. To demolish the picture plane as a medium of expression is to become aware of unity as an organic, living whole. We are a whole, and now the moment has come to reassemble ali the pieces of the kaleidoscope into which humanity has been broken up, has been tom into pleces. We plunge into the totality of the cosmos; we are a part of this cosmos, vulnerable on ali sides - but one that has even ceased having sides high and low, left and right, front and back, and ultimately, good and bad - so radically have concepts been transformed. Contemporary humanity escapes the spiritual laws of gravity. It learns to float in cosmic reality as in its own internai reality. It experiences vertigo. The crutches that held it up fali far from its arms. It feels like a child who needs to learn to balance itself in arder to survive. The primai experience begins. Lygia Clark
Lygia Clark
Para o Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro realizar a coordenação das Salas Especiais de Lygia Clark e Hélio Oiticica, a convite da Fundação Bienal de São Paulo, foi uma grande experiência. Ambos os artistas, que tiveram toda a sua produção ligada ao MAMRJ, são um marco significativo da produção artística brasileira deste século, alcançando hoje um merecido destaque internacional. O MAM-RJ desenvolve há cinco anos o Projeto Lygia Clark com o apoio do CNPQ. Nele estão reunidos os arquivos da artista e a maior parte dos objetos relacionais e sensoriais por ela produzidos. Esse amplo material que inclui fotos, documentos e artigos sobre Lygia tem sido catalogado e estudado ao longo desses anos, estando à disposição do público.
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For the Museum of Modem Art of Rio de Janeiro it was a great experience to coordinate the Special Rooms of Lygia Clark and Hélio Oiticica, upon invitation by the Bienal de São Paulo Foundation. Both artists, whose production was entirely linked to the MAM-RJ, are a significant landmark of this century's Brazilian artistic production, attaining well deserved international recognition. The Lygia Clark Project has been developed by MAM-RJ for five years, with the support of CNPQ. It gathers the artist's archives and most of the relational and sensorial objects produced by her. This comprehensive material which includes photos, documents and articles about Lygia has been catalogued and studied through the years and is available to public view
Partindo do movimento neoconcreto, Lygia e Hélio ultrapassaram os limites da geometria e se comprometeram com a experimentação. Enquanto Oiticica mergulhou na alma coletiva para extrair o corpo individual, Clark pesquisou a alma individual para revelar o corpo coletivo. Nesta 22ª Bienal, foro de discussão da ruptura do suporte da obra de arte, Lygia Clark e Hélio Oiticica se inserem como representantes maiores da criatividade e contundência da arte brasileira. Marcus de Lontra Costa Coordenador-geral do MAM-RJ Denise Mattar Coordenadora de Artes Plásticas do MAM-RJ
Starting at the Neo-Concrete movement, Lygia and Hélio went beyond the boundaries of geometry and committed to experimenta tion. While Oiticica went deeply into the collective soul in order to extract the individual body, Clark researched the individual soul to reveal the collective body In this 22ª Bienal, discussion forum on the rupture of the support to the work of art, Lygia Clark and Hélio Oiticica stand as the most significant representants of the creativity and poignancy of the Brazilian art. Marcus de Lontra Costa General coordinator of MAM-RJ Denise Mattar Fine Arts coordinator of MAM-RJ
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Bicho. 1962 Coleção Adolfo Leirner Foto Fausto Fleury
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Bicho, 1960 Foto Sérgio Zalis
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1920 Nasce em Belo Horizonte. 1947 Inicia-se 'na arte no Rio de Janeiro, sob orientação de Burle Marx. 1952 Viaja a Paris, onde estuda com Léger, Dobrinsky e Arpad Szenes. Expõe no Institut Endoplastique, Paris, e no Ministério de Educação e Saúde, no Rio de Janeiro. 1954 Integra o Grupo Frente. 1954-58 Desenvolve uma pintura de tendência construtivista, restrita ao uso do branco e preto em tinta industrial. 1959 Assina o Manifesto Neoconcreto. Cria Casulos e Trepantes, com os quais começa
a desdobrar o plano em articulações tridimensionais e a possibilitar a participação do espectador. Participa da Exposição Neoconcreta no Museu de Arte Moderna do Rio Janeiro. 1960 Cria os Bichos, estruturas móveis de placas de metal que convidam à manipulação, e a Obra-mole, pedaços de borracha laminada entrelaçados. A partir de meados da década de 60, trabalha a poética do corpo, apresentando proposições sensoriais e enfatizando a efemeridade do ato como única
realidade existencial. 1970-75 Reside em Paris. Como professora da Sorbonne, propõe exercícios de sensibilização, buscando a expressão gestual de conteúdos reprimidos e a liberação da imaginação criativa. 1985-87 Usa "objetos relacionais" com fins terapêuticos. 1988 Morre no Rio de Janeiro. 1994 Bienal Brasil Século XX. 1920 Bom in Belo Horizonte, 1947 Starts her artistic career in Rio de Janeiro, under Burle Marx's guidance. 1952 Travels to Paris, where she has c/asses wíth Léger, Dobrinsky and Arpad Szenes. Exhibits at the Instítut Endoplastique, Paris, and at the Ministery of Health and Education, in Rio de Janeiro. 1954 JoinsJhe Grupo Frente (Front Group). 1954-58 Develops a kind of painting fo//owing a constructive trend, limited to the use of black and whíte in industrial paint. 1959 Signs the Neo-Concrete Manífest.Creates Casulos (Cocoons) andTrepantes (Climbing), where she starts to unfo/d the plane in tridimensional articulations and to enable the particípation of the spectator Exhibíts at the NeoConcrete Exhibition at the Museum of Modem Art, Rio de Janeiro. 1960 Creates the Bichos (Beasts), mobile metal plate structures which invite the spectator to handle them, and the Obra-mole, pieces of interwoven laminated rubber As from the mid 60's, deals with the poetry of the body, introducing sensorial propositions and emphasizing the fleetingness of the act as the only existential realíty 1970-75 Líves in Paris. As a Sorbonne professor, she proposes sensibilization exercíses, searching for the gestural expression of repressed contents and the
liberation of the creative imagination. 1985-87 Uses "relationalobjects" with therapeutic purposes. 1988 Dies in Rio de Janeiro. 1994 Bienal Brasil Século XX (Biennial Brazil Twentieth Century).
Obras apresentadas/Works in the . exhibítion Bicho "Ponta", 1960 Coleção particular, RJ Bicho, 1960 Coleção particular, RJ Bicho, 1960 Coleção particular, RJ Bicho, 1962 Coleção Adolpho Leirner, SP Bicho"O dentro é o fora", 1964 Coleção Álvaro Clark, RJ Caminhando, 1964 Caminhando, 1964 Caminhando, 1964 Caminhando, 1964 Pedra e ar, 1966 Objeto sensorial Nostalgia do corpo, 1965-1988 Camisa-de-força,1968 Nostalgia do corpo, 1965-1988 Arquiteturas biológicas, 1969 Nostalgia do corpo, 1965-1988 Corpo coletivo, 1986 Nostalgia do corpo, 1965~1988 Objetos relacionais
CU~DO~ ~AUlO MAllA CAM~O~ CU~DO~ A~~I~rtNrt C~I~rINA ~OGOZIN~KI
CU~AíO~ fAUIO MAlíA CPMfO~ A~~I~íANí CUMíO~ C~I~ílNA ~OGOZIN~KI
A divisão do trabalho de Mira Schendel por fases, de forma cronológica e linear, parece se contrapor ao próprio espírito de sua obra, marcada por séries que se entrelaçam circularmente '.
The different phases in Mira Schendel's work, approached in a linear and cronological way, seems to be in opposition to the spirit of her art, which is shaped by series that interlace themselves circu//ar/yl.
Outra observação a reforçar essa idéia é a de que sua obra não se constitui dentro de uma noção de ruptura, mas sim de coerência, de desdobramentos e experimentações sobre questões levantadas em
Another observation that stresses this idea is the fact that her art is not founded on the idea of breaking up, but rather of coherence of unfolding and experimenting issues that appeared in earlier works.
trabalhos anteriores.
Dadas essas características, torna-se difícil o enquadramento desta artista dentro dos movimentos artísticos tradicionais que lhe são contemporâneos. Só em parte a personalidade difícil da artista - aliada ao fato de o respeito que tinha por seu trabalho ter sido sempre maior que qualquer necessidade de reconhecimento por parte do público pode explicar uma compreensão até agora apenas parcial de sua obra 2• Reveste-se então da maior importância a escolha de Mira Schendel para uma das Salas Especiais desta 22ª 8ienallnternacional de São Paulo, ao lado de Lygia Clark e Hélio Oiticica. Cabe agora uma nova análise de sua obra, a partir mesmo de seus próprios parâmetros internos3• É inútil a tentativa de limitá-Ia às correntes artísticas estabelecidas dos anos 50, 60, 70 e 80, como informalismo, minimalismo, arte conceitual, etc., que acabam sempre por reafirmar a superada dicotomia entre centros artísticos e países periféricos.
According to these characteristics, it is difficult to link this artist to any of the traditional art schools of her time. And it is not only due to her introverted personality - together with the fact that the respect she had for her own work had always been greater than any need for public recognition - the reason why we have, up to now, onlya partia I understanding of her work2. Thus, it is important that Mira Schendel's work has been chosen by the general curator to be exhibited in one of the special rooms of the 2Z'd Bienal Internacional de São Paulo, next to Lygia Clark and Hélio Oiticica works. It is necessary to undertake a new analysis of her work starting from its own inner parameter~. The attempt to circumscribe Schendel's work to the established artistic movements of the 50s, 60s, 70s and 80s, as informalism, minimalism, conceptual art, etc., are useless as they eventua//y lead to the already overrun dichotomy between the artistic and peripheric centers. The works of Mira Schendel, Lygia Clark and Hélio Oiticica are basic for the assertion of an autonomous Brazilian art. Their proposal is sti// in force and fuels art today. It is difficult to attain the necessary detachment so as to assess this contribution thoroughly.
Os trabalhos de Mira Schendel, Lygia Clark e Hélio Oiticica têm importância capital na afirmação de uma arte autônoma brasileira, e a riqueza de suas obras está em pleno vigor, em processo de prospecção, alimentando a produção atual: é difícil ainda o necessário afastamento para percebermos suas proporções.
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A obra de Mira Schendel, apesar de desenvolvida em inúmeras experiências e ramificações, com toda a dispersão e ecletismo que erradamente podemos crer que ela possua, tem uma coerência inegável, uma assinatura inconfundível que marca todo o seu perclJrso. Essa linguagem própria, afirmada sucessivamente, é constituída por dados característicos. Os elementos presentes em seu trabalho -linha, cor, forma, matéria, etc. - são sempre reduzidos. Cada um deles é tratado preferencialmente, mantendo entre si uma relação de equivalência, sem hierarquias, o que os potencializa ao máximo. O suporte, normalmente relegado a uma atitude passiva - ou então simplesmente negado -, adquire um novo significado. Não representa mais a ausência, nem as convenções a serem superadas. Ele é sempre presente, e atua nos materiais que lhe são aplicados, modificando-os ou obrigando-os a se adaptarem à sua natureza. Contrapmulu-se ~o qiU~~>~,)deria ser uma submissão do trabalho às intemjüS preocupações ~i1telectua§s da artista -ligadas à filosofia, à psica~.~~isei etc. ~, ex~~~e um notável gosto pelo fazer. O prazer em lidar com O~ confere a seu trabalho uma extraordinária leveza, introduzindo a corporeidade como superação do racionalism0 4•
Desses procedimentos, que a aproximam do pensamento oriental e da música erudita contemporânea, é natural o desdobramento em séries5, que são conjuntos de trabalhos de mesma técnica e mesmas dimensões, realizados na mesma época, quando se chega a um bom resultado na experimentação. Partindo desses conceitos é possível visualizar na obra de Mira Schendel, como uma base para apreendê-Ia em todo o seu desenvolvimento, alguns núcleos ou períodos que podem circunscrever estas séries.
Mira Schendel's work, although developed in many different experiences and branches - with its apparent ecletism and dispersion - possesses an undeniable coherence, an unmistakable personality that can be found in ali her artworks. Her particular syntax is made up of characteristic features. The elements we find in her work - line, color, shape, material, etc - are always economic. Each of them undergoes a privileged treatment, and the equivalence that is casted on them is such that they attain their maximum potential, excluding ali hierarchy. The support, which usually has a passive role, is simply neglected acquiring a new meaning. It does not represent the absence anymore, or conventions to be overcome. It is always present and acts on the materiais which are supplied to it, so as to alter or force them to adapt to its nature. Opposed to what could be considered a submission to her intense intel/ectual concerns - such as philosophic and psychoanalytic questions we can find a profound pleasure in her craft. The enjoyment with which the artist deals with the materiais casts an ·extraordinary lightness to her work, introducing corporeity as a mean to overcome rationalism 4. This procedure, which brings her close to the oriental way of thinking and to contemporary classical music, led her to create series 5_ sets of works which uses the same technique, has the same dimensions, is produced in the same period, and obtains good results from these experiments. Within this approach it is possible to identify in Mira Schendel's work some units ar periods which can circumscribe these series. It is necessary to overcome the exemption referred to before, which stemmed, up to a certain point, from the artist's own attitude always reluctant to explain her work verbal/y6. Schendel did not want to contribute to a unique and definite approach on her work, since this would destroy its openness.
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S/título/ untit/ed (série Objetos gráficos). 1967 desenhos montados entre placas de acrílico/ drawings mounted between acry/ic p/ates 100 x100 cm Coleção Museu José Pancetti (Museu de Arte Contemporânea de Campinas), Campinas Foto Fernando Chaves
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Torna-se necessário superar a ressalva introduzida no início deste texto, que foi de certa maneira estimulada pela atitude da artista, sempre cética em explicar verbalmente sua obra às pessoas6, pois naturalmente não queria que se fechasse uma visão única sobre seu trabalho, o que tiraria dele o caráter de obra aberta. Um primeiro momento na sua obra compreende o período entre os anos de 1949 e 1953 aproximadamente, tempo em que vive em Porto Alegre, recém-chegada ao Brasil, procedente de Milão. Inicia então sua carreira artística, quase sem recursos, trabalhando com pintura em temática figurativa, e assina essas obras ainda com o sobrenome do primeiro casamento, Hargesheimer. Seu trabalho se desenvolve para uma crescente depuração de elementos. As obras do início dos anos 50 já apresentam ênfase na composição e no tratamento dado às superfícies, substituindo aos poucos - em retratos, naturezas-mortas, etc. - a perspectiva e o volume pósmodernistas (ver, por exemplo, óleo de 1953, sem título, pertencente à Coleção Theon Spanudis, hoje no acervo do Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo). Desta fase podemos ressaltar a sua primeira exposição individual no Auditório do Correio do Povo, em Porto Alegre (1950), e sua participação na 1ª Bienal de São Paulo (1951). A segunda etapa da obra de Mira Schendel se inicia em 1954, ano em que realiza uma exposição individual no Museu de Arte Moderna de São Paulo (MAM-SP), símbolo de seu estabelecimento nesta cidade e de sua integração aos circuitos de vanguarda da arte contemporânea brasileira. Mira se aproxima de críticos e teóricos importantes como Mário Pedrosa e Mário Schenberg e conhece Knut Schendel, seu futuro marido. Determinam esse momento um predomínio da abstração, os tons geralmente sombrios e um meticuloso tratamento dado à matéria, submetida sempre a um rebaixamento e a uma contenção. Além da exposição no MAM-SP (onde curiosamente coloca na montagem algumas de suas pinturas em posição perpendicular à parede) realiza individuais nas galerias Selearte (1962), São Luiz (1963), Astréia (1964), todas em São Paulo, e na galeria Aremar (1964), em Campinas; participa da 3ª (1955) e da 7ª Bienal (1963) e do 11º Salão Paulista de Arte Moderna (1962) em São Paulo. Em 1964, com a série de desenhos sobre papel japonês - que se estende até 1966 -, inicia-se um novo núcleo de seu trabalho, sem dúvida o mais importante de sua carreira. Realiza uma série de
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The period between 1949 and 1953 covers the first phase of her work, when she moved fram Milan, in Italy, to Porto Alegre, in Brazi/. Then, she began her artistic career. With very limited means, she started doing figura tive painting. At this time she was still using her first husband's surname, Hargesheimer. Her work attains an increasing depuration of its elements. The art pieces dane in the early 50's already show an emphasis in their composition as well as in the treatment given to the surfaces, replacing, by and by - in portraits, still-lives, etc. - the post-modernism's volume and perspective (see, for instance, the painting dane in 1953, untitled, at the Museu de Arte Contemporânea da Universidade de São Paulo). We can point out, in this period, her first solo exhibition at the Auditório do Correio do Povo, in Porto Alegre (1950) and her participation in the 1st Bienal de São Paulo in 1951. The second phase in Schendel's work starts in 1954, when her first solo exhibition took place in the Museu de Arte Moderna de São Paulo. This exhibition is a symbo/ of her integration in São Paulo as wel! as the beginning of her identification with the avant-garde circuíts af contemporary art in Brazi/. This is the period when the artist establishes a close friendship with important art critics and theorists such as Mário Pedrasa, Mário Schenberg,' by this time she met Knut Schendel, who was to become her husband. In this period abstract painting predominates; she usual/y uses somber colors and subjects materiais to a meticulous treatment. The materiais are always diminished and used in an economic way. Besides the exhibition that took p/ace at the Museu de Arte Moderna in São Paulo (where, surprisingly, she p/aces some of her paintings in a perpendicular position regarding the wall); she also shows her works in solo exhibitions at the galleries Se/earte in 1962, São Luiz in 1963, Astréia in 1964, ali of them in São Paulo, and in the Aremar Gallery in Campinas in 1964; she also is represented in the 3 d (1955) and 7h Bienal (1963) and in the 1t h Salão Paulista de Arte Moderna (1962) in São Paulo. The series of drawings on Japanese paper - a work that was undertaken in 1964 and extended to 1966 - established a new phase of her work. This is, no doubt, the most important moment in her artistic journey. Schendel has participated in many Eurapean exhibitions such as the solo exhibition at the Signals Gallery, in London, 1966, and the Venice Biennial in 7968. Her work is acclaimed by experts such as Guy Brett and Max Bense. Her art pieces show characters, signs and calligraphy and black and white as the predominant colors. The drawings mentioned above (a series of them was exhibited at the Galeria Camargo Vilaça in São Paulo, 1994) use the same
exposições na Europa, como a individual na Signals Gallery, em Londres (1966), participa da 34ª Bienal de Veneza (1968), e tem sua obra reconhecida por teóricos como Guy Brett e Max Bense. Os trabalhos passam a conter letras, signos e caligrafismos, e o preto e o branco preponderam claramente. Os desenhos mencionados (uma série destes trabalhos foi exposta na Galeria Camargo Vilaça em São Paulo, 1964) utilizam uma técnica não convencional assemelhada à monotipia 7• Também dessa época são as Droguinhas, objetos realizados com o mesmo papel, enrolados e, através de um processo próximo à costura, amarrados em uma espécie de estrutura vazada, a ser manipulada pelo espectador, e o Trenzinho, um fio estendido com folhas inteiramente brancas do papel japonês, presas como num varal. Trabalhos destas séries foram expostos no Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro (MAM-RJ) (onde a artista teria sido auxiliada na montagem por Lygia Clark) e na Galeria Signals, em Londres, ambas em 1966. Partindo da transparência do papel a artista desenvolve esses desenhos para uma montagem entre duas chapas de acrílico. Os Objetos gráficos eram suspensos por fios no teto, afastados da parede. Foram expostos em 1967 no 111 Salão de Arte Contemporânea de Campinas e na 9ª Bienal de São Paulo e em 1968 na 34ª Bienal de Veneza (após aqual muitos desses trabalhos parmaneceram em coleções na Europa), Em 1969, Mira Schendel realiza para a 10ª Bienal de São Paulo a instalação Ondas paradas de probabilidade, onde explora a imaterialidade de finíssimos fios de ny/on pendurados do teto ao chão (talvez os mesmos que suspendiam os acrílicos) e o espaço vazio, uma obra praticamente invisível em contraposição ao ambiente ruidoso de excitação sensorial tão em voga na época. Ainda desse período da obra da artista podemos citar os Cadernos, a serem folheados pelo espectador observando-se simultaneamente várias páginas através de transparências em papel vegetal e incisões em cartolinas. Segue-se a essa fase de produção intensa, principalmente a partir da segunda metade da década de 70, um período intermediário e menos brilhante no percurso da artista, em que há um retorno à cor e ao desenho, em trabalhos de pequenas dimensões. Do final da década de 70 à morte da artista, em 1988, podemos visualizar ainda uma outra fase, quando ocorre, através dos grandes formatos e da volta à pintura, um retorno ampliado e depurado a motivos de etapas anteriores: a cor, o suporte, a matéria, a naturezamorta. Respectivamente, podemos citar como exemplo a série inacabada de têmperas com ouro (1979-1986), os Sarrafos (1987), a série inacabada de trabalhos com pó de tijolo (1988) e a série Mais ou menos frutaSS. Deste período sem dúvida se pode ressaltar a série
unconventional technique which is similar to monotype7. The Droguinhas also date from this period. Theyare objects made of the same paper which rolled up and, by means of a process which is similar to sewing, they are joined forming a kind of structure with voids; these objects have to be manipulated by the spectator. The Trenzinho (Small train) is an extended wire with white sheets made up of the same paper mentioned above, hung as in a clothesline. Works from both these series were exhibited at the Museu de Arte Moderna in Rio de Janeiro (Lygia Clark is said to have he/ped Mira Schende/ to organize the exhibition) and the Signa/s Ga//ery in London. Both exhibitions took p/ace in 1966. Working on the transparency of paper, Schende/ creates drawings for an object these drawings are placed between two acrylic plates; theyare the Objetos gráficos (Graphic objects), that in a later stage will hang, attached to wires, from the ceiling. These pieces were exhibited in 1967 at the 3rd Salão de Arte Contemporânea de Campinas and at the 9th Bienal de São Paulo and at the 34 th Biennial of Venice in 1968 (after the exhibition many of these works were purchased by art co//ectors). In 1969 Mira Schendel showed at the 10th Bienal de São Paulo the installation Ondas paradas de probabilidade (Waves of probability paralized in the air), in which she plays with the nearly immaterial quality of very thin ny/on wires that hang from ceiling to f/oor (maybe they were the same wires used to fasten the acrylic objects) and the void,· it is a nearly invisible piece as opposed to the noisy environment with an atmosphere of sensory excitement which was usual at the time. The Cadernos (Notebooks) also date from this period,· the spectators were supposed to browse through them. One could see more than one page at the same time due to the transparency of the paper used and the engravings carried out on cardboard8. The next phase is characterízed by an intensive production, specia//y in the late 70's. This phase, least successful, was defined by the resumption of colors and drawing in pieces of small dimensions. From the end ofthe 70's until Schendel's death in 1988, we are able to detect sti// another phase, period when she works with pieces of huge dimensions and resumes painting, an enlarged and depurated retaking to earlier phases: colar, support, material and still-lives. The series of tempera paintings with gold finishing (1979-1986) are another example of this trend as well as the Sarrafos (Slats) dating from 1987 and the unfinished series using brick dust (1988) and the series Mais ou menos frutas (More ar less fruit)9.
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S/título/ untitled, 1964 desenho/ drawing Coleção Museu de Arte Contemporânea - USP, São Paulo Foto Fernando Chaves
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S/títu I0/ untitled, 1964 desenho/ drawing Coleção Museu de Arte Contemporânea - USp, São Paulo Foto Fernando Chaves
S/título/ untitled, 1964 desenho/ drawing ,Coleção Museu de Arte Contemporânea - USP, São Paulo Foto Fernando Chaves
S/títu I0/ untitled, 1964 desenho/ drawing Coleção Museu de Arte Contemporânea - USP, São Paulo Foto Fernando Chaves
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dos Sarrafos (última série completa realizada pela artista, em 1987). São 12 trabalhos em que sobre uma base de textura totalmente branca de 90 x 180 cm é afixada uma peça preta de madeira, como uma materialização da linha sobre o suporte. Segundo depoimento da artista na época, referindo-se ao momento político-institucional do país, essa série "nasceu de um momento de falta de decisão, de desordem, que o Brasil viveu em março deste ano, quando parecia que estávamos morando em uma Weimar tropical. Naquele momento, como todos, eu também sentia necessidade de ter uma direção, um rumo. Essas obras são uma reação ao marasmo daquele momento". Através de uma feliz conexão entre diversos fatores - que não constitui de forma alguma mera coincidência, como a adequação ao tema do suporte, tema desta Bienal, a aproximação às obras de Hélio Oiticica e Lygia Clark e a importância dentro da obra da artista -, foram escolhidas as séries a integrarem a Sala Especial Mira Schendel. As Oroguinhas, o Trenzinho, os Objetos gráficos, e a instalação Ondas paradas de probabilidade se inserem claramente no núcleo de trabalhos iniciados com os desenhos de 1964-66, já mencionados, e no seu desdobramento na última fase da artista, através dos Sarrafos. A pesquisa da questão do suporte leva à inserção dessas obras na corrente que procura explorar os desdobramentos do concretismo, como a busca por um novo espaço10, a participação do espectador, a objetualização e desmaterialização da arte. Esta procura levou a trajetória destes três artistas a uma espécie de tangenciamento em meados da década de 60, como atestam as exposições individuais dos três artistas em Londres: Lygia Clark (1965) e Mira Schendel (1966) na Signals Gallery, e Hélio Oiticica (1969) na galeria Whitechapel - exposição inicialmente programada também para a Signals, em 196711 • Mas os objetivos de Mira Schendel são mais desdobramentos do desenho do que propriamente construções tridimensionais. E aí está a chave da distinção de seu trabalho com relação ao de Lygia Clark e Hélio Oiticica: enquanto estes buscam a própria negação do objeto (e simbolicamente da arte), Mira Schendel procura novos caminhos a partir mesmo das relações tradicionais do fazer artístico, dando-lhes novos significados, ampliando - para além de um suposto fim da arte - seus horizontes. Paulo Malta Campos
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The choice of the series which were to be presented in the Mira Schendel Special Room was due to many different factors - which did not happen hazardously - as, for example, her adequation to the support as a subject, (the theme of this Biennial), the closeness with the works of Hélio Oiticica and Lygia Clark and their importance within the artist's work. The Oroguinhas, the Trenzinhos, the Objetos gráficos and the installation Ondas paradas de probabilidade belong to the set of works that started with the already mentioned drawings created from 1964 up to 1966 and the Sarrafos, which represents the unfolding of the last phase of her production. The research on the support carried out by Schendelleads to the insertion of these works in the movement that seeks to explore the possibilities opened up by concretism as, for example, the search for a new space 1O, the active participation of the viewer, the objecthood and the dematerialization of art. This research led these three artists to a tangent work in the middle 60's, as can be seen in their solo exhibitions which took place in London: Lygia Clark (1965) and Mira Schendel (1966) at the Signals Gallery, and Hélio Oiticica (1969) at the Whitechapel Gallery. Oiticica's exhibition was first planned for the Signals Gallery, in 196711 • Mira Schendel's scope, however, is the unfolding of the drawing rather than tridimensional constructions. This is the existing difference in her work as compared to Lygia Clark's and Hélio Oiticica 's. While both Clark and Oiticica seek the negation of the object (and thus, simbolically, the negation of art), Mira Schendel strives to determine new paths stemming from the traditional relations of the artistic craft, creating new meanings for them, as well as enlarging - beyond the end of art - its horizons. Paulo Malta Campos
NOTAS
NOTES
1 Como já definiram com clareza Ronaldo Brito e Rodrigo Naves em "Projeto para livro de Mira Schendel", documento inédito elaborado em fevereiro de 1988. 2 Pode-se somar a isso também o fato de que sua obra é freqüentemente avessa à reprodução (ver texto de José Resende, "Entre o desenho e a pintura", publicado na revista Arte em São Paulo, nº 36, 1987), e que Mira Schendel não tenha se engajado em quaisquer grupos ou manifestos artísticos. 3 Um primeiro esboço de análise sobre a obra de Mira Schendel, ponto de partida deste texto, foi apresentado pelo autor em 1991 na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo: "Percurso de Mira Schendel", inédito. 4 A artista tinha grande interesse pela fenomenologia da corporeidade, desenvolvida pelo filósofo alemão Hermann Schmitz. Ver, por exemplo, depoimento da artista por ocasião do 10º Salão de Arte Contemporânea de Campinas - Arte no Brasil Documento/Debate, 1975. 5 "Sempre nos apresentam o ascetismo como uma coisa desligada do mundo, mas pode haver outros tipos de ascetismo, o ascetismo tântrico, por exemplo, que é extremamente sensorial e sensual, portanto ascetismo não quer dizer necessariamente ausência de sensorialidade ou de sensualidade (... ) Um belo exemplo são certos trabalhos de Stockhausen, onde existe uma contenção extraordinária para dar uma explosão quase que cósmica no final." Entrevista a Jorge Guinle, em 1981. Ver também a série de oito desenhos, Canto dos jovens - a propósito de Stockhausen, de 1964, exposta na 8ª Bienal Internacional de São Paulo. 6 Certa vez, instada a fazer um depoimento sobre sua obra, declarou: "Para mim não há nada a dizer além do que está dito (e não dito) nas obras apresentadas". 7 "Essas monotipias são na verdade desenhos. Na sua execução a folha finíssima de papel japonês é aplicada sobre uma placa metálica, recoberta de tinta especial, e o desenho feito com estilete sobre a face externa do papel. Essa técnica permite dar à linha impressa uma suavidade particular e também obter efeitos de aguada ou de massa escura impressa". Mário Schenberg, 1964. É impressionante a quantidade destes trabalhos realizada pela artista (muitos dos quais podem ser aproximados à obra do artista norte-americano Cy Twombly, que tem grande retrospectiva no MoMA, Nova York, entre setembro de 1994 e janeiro de 1995): estimase que em praticamente dois anos (1964 e 1965), tenha produzido mais de dois mil desenhos que se ramificam em inúmeras séries e sub-séries. 8 Ver texto de Aracy Amaral "Mira Schendel: os cadernos", publicado no jornal O Estado de S. Paulo em 7 de novembro de 1971. 9 Série exposta na Galeria Paulo Figueiredo, em São Paulo, e analisada por Alberto Tassinari em texto publicado na Folha de S. Paulo em 23 de setembro de 1984. 10 Ver o excelente texto de Guy Brett "A radicalleap", no catálogo Art in Latin America - The Modern Era, 1820-1980, publicado por ocasião da exposição na Hayward Gallery, Londres, 1989. 11 Ver o "postscript"de Mark Glazebrook ao catálogo da célebre exposição de Hélio Oiticica na Whitechapel Gallery, 1969. Sobre o efervescente meio artístico dos anos 60, ver os "Signals Newsbulletins", editados entre 1964 e 1966 por Paul Keeler e David Medalla, em Londres.
1As Ronaldo Brito and Rodrigo Naves have already c/early defined in "Projeto para livro de Mira Schendel" (Project for a book on Mira Schendel), document written in February 1988 and still unpublished. 2 We can add to this the fact that her work is often impossible to reproduce (see text by José Resende "Entre o desenho e a pintura" - Between drawing and painting - , published in the magazine Arte em São Paulo, nº 36, 1987) and that Mira Schendel has never participated in any groups nor signed any artistic document. 3 A rough of this analysis of Mira Schendel's work - the starting point of this text - was the theme of a lecture by the author, in 1992, at the Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo entitled Percurso de Mira Schendel (Mira Schendel's Journey). 4 The artist has showed much interest in the phenomenology of corporeity, a theory developed by the German philosopher Hermann Schmitz. As an example, see the statement by the artist at the time of the X Salão de Arte Contemporânea de Campinas - Arte no Brasil Documento/Debate, 1975. 5 "Asceticism is always presented to us as something detached from the world. However, there are different kinds of asceticism as the tantra asceticism, for example, which is extremelly sensuous and sensorial; thus, asceticism does not necessarily mean absence of sensuality ar sensory(...) A good example of this is Stockhausen work, where Vou can find an extraordinary restraint, whereas at the end of the piece a cosmic explosion takes place. "Interview to Jorge Guinle in 1981. In reference to the same subject, see the series of eight drawings Canto dos jovens - a propósito de Stockhausen (The chant of the young - on Stockhausen) , created in 1964 and exhibited in the VII Bienal Internacional de São Paulo. 6 When asked to speak about her work she stated: "There is nothing for me to say except what has already been said (and not said) in the exhibited work". 7 "This monotypes are, after ali, drawings. In them a very fine sheet of Japanese paper is applied on a metallic pIa te, plated with a special paint; the drawing is dane with a stiletto on the outside surface of the sheet of paper. This technique grants the printed fine a gentleness and a watery effect or suggest a dark printed patch ". Mario Schenberg, 1964. The number of these drawings is impressive (many of them can be put aside with the work of Cy Twombly, an American artist whose works are being exhibited in a retrospective at the MoMA in New York, from September, 1994, to January, 1995). We think that about 2,000 such drawings were carried out by Mira Schendel in two years (1964 and 1965). They can be found in series and sub-series of this period. 8 See text by Aracy Amaral: "Mira Schendel: os cadernos", published at the newspaper Estado de S. Paulo in November 7th, 1971. 9 These works were exhibited at the Galeria Paulo Figueiredo, in São Paulo, and analysed by Alberto Tassinari in an artic/e published in September 23rd, 1984 in the newspaperFolha de S. Paulo. 10 See the excellent artic/e written by Guy Brett ':4 radicalleap", in the catalogue Art in Latin America The modem era, 1820-1980 published at the time of the exhibition at Hayward Gallery in London (1989). 11 See postscript by Mark Glazebrook in the catalogue of the celebrated exhibition of Hélio Oiticica's work at the Whitechapel Gallery in 1969. On the subject of the artistic exuberance of the 60's read the Signals Newsbulletins published in London from 1964 to 1966 by Paul Keeler and David Medalla.
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S/título/ untitled (série Sarrafos), 1987 têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/ acrylic tempera on plaster and lath 90 x 180 cm Co leção Museu de Arte Brasileira - FAAP, São Paulo Foto: Fernando Chaves
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S/título/ untitled (série Sarrafos). 1987 têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/ acry/ic tempera on plaster and lath 90 x 180 cm Coleção Ada Schendel, São Paulo Foto Fernando Chaves
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S/título/ untitled (série Sarrafos). 1987 têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/ acrylic tempera on plaster and lath 90 x 180 cm Coleção Museu de Arte Brasileira - FAAP, São Paulo Foto Fernando Chaves
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Nasceu em Zurique em 1919. Mudou-se com a família para Milão, Itália, onde estudou filosofia. Iniciou sua carreira como autodidata ao chegar ao Brasil, em 1949, estabelecendose inicialmente em Porto Alegre. Em 1952 mudou-se definitivamente para São Paulo, onde morou até falecer em 1988. Bom In Zurich, .797 9. She moved with her family to Milan, Italy, where she studied philosophy. She began her self-taught carreer when arrived in Brazil in 7949, at first staying in Porto Alegre. She finally moved to São Paulo in 7952, where died in 7988. Exposições individuais/Solo exhibitions 1950 Auditório do Correio do Povo, Porto Alegre. 1954 Museu de Arte Moderna, São Paulo. 1966 Museu de Arte Moderna, Rio de Janeiro; Signals Gallery, Londres. 1967 Studiengalerie Uni Stuttgart, Techniche Hochschule, Stuttgart. 1972 Galeria Ralph Camargo, São Paulo. 1987 Gabinete de Arte Raquel Arnaud, São Paulo. 1989 Paulo Figueiredo Galeria de Arte, São Paulo. 1990 Museu de Arte Contemporânea da USP, São Paulo. 1994 Galeria Camargo Vilaça, São Paulo. Exposições coletivas/ Group exhibitions 19511ª Bienal Internacional de São Paulo. 1955 3ª Bienal Internacional de São Paulo. 196211º Salão Paulista de Arte Moderna, São Paulo.
1963 7ª Bienal Internacional de São Paulo. 1965 Propostas 65, FAAP, São Paulo; 8ª Bienal Internacional de São Paulo. 1967 9ª Bienal Internacional de São Paulo. 196834ª Bienal de Veneza. 196910ª Bienal Internacional de São Paulo. 1971 Amelia Toledo, Donato Ferrari, Mira Schendel, Museu de Arte Contemporânea da USP, São Paulo. 1978 Objeto na Arte/Brasil Anos 60, FAAP, São Paulo. 198116ª Bienal Internacional de São Paulo. 1987 Modernidade - Art Brésilien du XX Siecle, Musée d'Art Moderne de la Ville de Paris, Paris. 1989 Art in Latin America - The Modern Era, 1820-1980, Hayward Gallery, Londres. 1993 LatinAmerican Artists of the XX Century, Museum of Modern Art, Nova Vork. Obras apresentadas/Works in the exhibition S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos) têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/acrylic tempera on plaster and lath 90x180cm Coleção Ada Schendel, São Paulo S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos) têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/acrylic tempera on plaster and lath 90x180cm Coleção Ada Schendel, São Paulo S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos) têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/acrylic tempera on plaster and lath
90 x 180 cm Coleção Ada Schendel, São Paul S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos) têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/acrylic tempera on plaster and lath 90x180cm Coleção Amílcar de Castro, Minas Gerais S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos) têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/acrylic tempera on plaster and lath 90 x 180 cm Coleção Jaime Sverner, São Paulo S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos) têmpera acrílica s/gesso e sarrafo ~e madeira/acrylic tempera on plaster and lath 90x180cm Coleção Dulce e João Carlos de Figueiredo Ferraz, Ribeirão Preto S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos)
têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/acrylic tempera on plaster and lath 90x 180 cm Coleção José Resende, São Paulo S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos) têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/acrylic tempera on plaster and lath 90 x 180 cm Coleção Marcantonio Vilaça, São Paulo S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos) têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/acrylic tempera on plaster and lath 90 x 180 cm Coleção Marco Antonio Amaral Rezende, São Paulo S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos) têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/acrylic tempera on plaster and lath 90 x 180 cm Coleção Esther e Maxime Castelnau, São Paulo
S/título/ untitled (série Droguinhas), 1966 objeto em papel/paper object dimensões variáveis/variable sizes Coleção Ada Schendel, São Paulo Foto Fernando Chaves
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S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos) têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/acrylic tempera on plaster and lath 90 x 180 cm Coleção Museu de Arte Brasileira - FAAP, São Paulo S/título/untitled, 1987 (série Sarrafos) têmpera acrílica s/gesso e sarrafo de madeira/acrylic tempera on plaster and lath 90 x 180 cm Coleção Ricard Akagawa, São Paulo S/título/untitled, 1968 (série Objetos gráficos) desenhos montados entre placas de acrílico/drawings mounted between acrylic plates 100 x 100 cm Coleção Ely e José Bueno de Aguiar, São Paulo S/título/untitled, 1969 (série Objetos gráficos) desenhos montado~ entre placas de acrílico/drawings mounted between acrylic plates 100 x 100 cm
Coleção Luiz Villares, São Paulo S/título/untitled, 1967 (série Objetos gráficos) desenhos montados entre placas de acrílico/drawings mounted between acrylic plates 100 x 100 cm Coleção Museu José Pancetti MAC - Campinas S/título/untitled, c.1970 (série Objetos gráficos) desenhos montados entre placas de acrílico/drawings mounted between acrylic plates 100 x 100 cm Coleção Sergio Fadei, Rio de Janeiro S/título/untitled, 1968 (série Objetos gráficos) desenhos montados entre placas de acrílico/drawings mounted between acrylic plates 100 x 100 cm Coleção Konrad Gromholt, Noruega S/título/untitled, 1968 (série Objetos gráficos) desenhos montados entre placas de acrílico/drawings mounted between acrylic plates
100 x 100 cm Coleção Konrad Gromholt, Noruega S/título/untitled, 1968 (série Objetos gráficos) desenhos montados entre placas de acrílico/drawings mounted between acrylic plates 100 x 100 cm Coleção Konrad Gromholt, Noruega S/título/untitled, 1968 (série Objetos gráficos) desenhos montados entre placas de acrílico/drawings mounted between acrylic plates 100 x 100 cm Coleção Konrad Gromholt, Noruega S/título/untitled, 1968 (série Objetos gráficos) desenhos montados entre placas de acrílico/drawings mounted between acrylic plates 100 x 100 cm Coleção Henie-Onstad Art Center, Hovikodden, Noruega S/título/untitled, c. 1966 (série Droguinhas) objeto em papel/paper object-
dimensões variáveis/variable slzes Coleção Ada Schendel, São Paulo S/título/untitled, c. 1966 ( Trenzinho) óbjeto em papel/paper objectdimensões variáveis/variable sizes Coleção Ada Schendel, São Paul~
Ondas parada~ de probabilidade, 1969 Instalação com fios de náilon/ insta//ation with nylon threads - dimensões variáveis/variable sizes Reconstituição da obra executada originalmente na/reconstitution of the work origina//y presented at the 10ª Bienal Internacional de São Paulo
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CU~DO~ CHANG IZONG·ZUNG
CU~Aro~ CHANG rZONG-ZUNG
ECOS DISTANTES
DISTANT ECHOES
A postura adotada por Deng Lin em sua série de tapeçarias de seda Ecos distantes baseia-se em sua visão da história da arte chinesa. Ela parte da intrincada delicadeza da arte das recentes dinastias, buscando inspiração na robustez das eras Qin e Han e também na arte do período neolítico. Sua visão estética fundamenta-se na pintura tradicional, dando preeminente importância às pinceladas. Dentre os mestres modernos, ela se volta em especial para Wu Changshuo (1a44-1927), cujo poderoso trabalho de pincel encontra eco em suas próprias linhas fortes e decididas. Wu baseou sua técnica de pinceladas na caligrafia da escrita Qin, enquanto a de Deng Lin tem suas raízes na escrita Han.
Deng Uns own position on the Distant echoes series of silk tapestries is rooted on her views of Chinese art history She wants to depart from the intricate delicacy of the art of the recent dynasties, and to seek inspiration on the robust strength of the Oin and the Han and also on the art of the Neolithic period. Her aesthetic views are grounded in traditional painting, placing proeminent importance on brushwork. Among the modem masters she particularly favours Wu Changshuo (1844-1927), whose powerful gnarled brushwork echoes in her own strong and decided lines. Wu based his brush technique on the calligraphy of Oin script, while Deng Ungs is rooted in Han script.
Nada revela tanto o cultivo de um artista quanto suas pinceladas; A força amarga no trabalho de Deng Lin é temperada por um espírito arcaico distante, que surge das influências da pintura em cerâmica neolítica e é modelada pelo temperamento da artista. Uma incursão paralela pelas fontes primordiais da psique acompanha a jornada artística de Deng Lin pela pré-história de sua cultura. Ela não se apropria, apenas, dos motivos da cerâmica neolítica: sua arte transforma esses temas num sentimento pessoal, tocando instintos profundamente ocultos na psique. As obras mais marcantes da série são as que contêm imagens espelhadas lateralmente, sugerindo misteriosas máscaras. Elas possuem uma força surpreendente, primitiva e inspiradora. São pujantes em sua monumental idade, detendo a mente na imagem central enquanto envolvem o campo de visão com suas asas simétricas. Não há como escapar de seu foco. A intensidade psicológica que deriva da forma estrutural das tapeçarias faz lembrar um experimento psicológico, o teste de Rorschach, que propõe ao participante narrativas de livre associação de experiências pessoais e contos imaginários, induzidas por um padrão simétrico de tinta que surge ao dobrar-se uma folha de papel sobre uma mancha de tinta. Experiências esquecidas e emoções abafadas costumam brotar desse experimento.
Nothing betrays an artists cultivation as c/earlyas his brushwork. The bitter strength in Deng Uns brushwork is tempered by a forlom archaic spirit, which comes from the influence of Neolithic pottery painting and is shaped by her own temperament. A paral/el joumey into the primordial source of the psyche fol/ows Deng Uns artistic joumey into the prehistory of her culture. She has not merely took to her own pattems from Neolithic pottery: her art has transformed motifs into a personal sentiment and stirs instincts buried deep in the psyche. The most impressive work in the series are those with images mirrored on either side, which suggest mysterious masks. They possess a striking power that is primitive and awe inspiring; each one is overwhelming in its monumentality They fix the mind in their central stare while embraces the field of vision with their symmetrical wings. There is no escape from their focused gaze. The psychological intensity which derives from the tapestries structural form brings to mind an experiment in psychology, the Rorschach test, which induces the participant to spin free associa tive narratives of personal experiences and imagina tive tales prompted by a symmetrical ink pattem made by folding a sheet of paper on a blot of ink. Forgotten experiences and suppressed emotions are often lured out by this experiment.
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Distant echoes n° 5. 1993 tapeçaria de seda/ silk tapestry 182 x 352.5 em Foto Wong Yao
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A presença de traços faciais nas tapeçarias - olhos, por exemplo faz lembrar máscaras e a magia de poderes ocultos. Máscaras imediatamente sugerem rostos escondidos, e a experiência de ser protegido por uma máscara misteriosa pode supostamente gerar um encontro ameaçador com aspectos ocultos do selt As tapeçarias de Deng lin conseguem criar no espectador essas associações perturbadoras e esclarecedoras. Ao apropriar-se de motivos da cerâmica neolítica para seu idioma pessoal, Deng lin enfatiza detalhes biomórficos e sugestivos da força geradora da vida. Em suas formas internas, as tapeçarias simétricas também sugerem um órgão procriador. As origens desses temas na arte neolítica são incertas. Abundam interpretações acadêmicas, mas, a não ser por alguns desenhos evidentes, como o peixe e a figura humana, não passam de especulações. Tome-se, por exemplo, o motivo de espirais paralelas freqüentemente usado por Deng lin, tema de destaque na cerâmica Majia Vao; alguns chamamno motivo de nuvens, outros dizem que lembra cordas enroladas, outros acreditam que se inspira nos redemoinhos vistos ao longo do rio Amarelo. Não há uma leitura definitiva. Em arte talvez não seja importante identificar as fontes originais de inspiração. O que importa é lembrar que a pintura em cerâmica acompanha o vaso como uma entidade completa: sua força estética manifesta-se como um todo. A decoração ressalta, ou aviva, o vaso como recipiente de um espírito individual. A decoração de um vaso pode ser comparada ao encanto de um instrumento mágico, ou à tatuagem numa pessoa, que protege e acentua o espírito e o poder vital do corpo hospedeiro. Ao transformar motivos de cerâmica em sua iconografia pessoal, Deng lin torna-se, metaforicamente, um vaso: suas pinturas tornam-se suas tatuagens, a magia do microcosmo que é a artista. A utilização de motivos da cerâmica neolítica na pintura chinesa não começou com Deng lin, mas, ao manter o contato com a força primordial dessa arte, ela logrou criar a partir disso uma linguagem artística convincente. Ela preparou-se para isso durante anos de estudo da pintura tradicional em tinta, e é essa disciplina da . expressão caligráfica que lhe permite captar naturalmente o espírito desta nova iconografia. Ao traduzir a pintura sobre papel em tapeçarias de seda, as obras também sofrem uma transformação: as qualidades de peso e densidade, impossíveis de se obter no papel, adquirem na tapeçaria uma dimensão de monumentalidade. Ao trocar o meio, Deng consegue distanciar sua arte da fácil fluidez das pinceladas caligráficas. A afirmação artística consolida-se numa presença monumental. As tapeçarias Ecos distantes são a obra mais madura de Deng lin. Com esta série, ela ampliou o âmbito da pintura com pincel e ao mesmo tempo encontrou sua própria voz artística. O resultado é que esses Ecos distantes reverberam com uma força integrada que é essencialmente pessoal, enquanto estabelecem contato com sua herança cultural. Chang Tsong-zung
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The presence of facial features in the tapestries, such as eyes, also recalls masks and the magic of hidden powers. Masks immediately suggest hidden faces, and the experience of being preserved by a mysterious mask can presumably tum into a threatening encounter with aspects of ones hidden selt Deng Lins tapestries succeed in creating such disturbing and enlightening associations for the viewer. In appropriating Neolithic pottery motits within her personal idiom, Deng Lin emphasizes details which are biomorphic and suggestive of lite and procreative power. The symmetrical tapestries also hint at the internai forms of a procreative organ. Origins of the motifs in Neolithic pottery art are most uncertain. Academic interpretations abound, but except for certa in specitic designs, such as the fish and the human figure, interpretations are mostly conjectures. Take, for example, the parallel whir/ing pattem Deng Lin often uses, which is a prominent feature in Majia Yao pottery; some call it the cloud pattem, some say it suggests coiled rope, and some believe it was inspired by whir/pools found along the course of the Yellow River. There is no definitive reading. In terms of art it is perhaps unimportant to identity the original sources of inspiration. It is important to remember, however, that pottery painting accompanies the vessel as complete entity: its aesthetic power comes across as a whole. The decoration highlights, or brings to lite, the vessel as a container of an individual spirit. The decoration of a vessel may be compared to the charm of a magical instrument, or a tattoo on a person, wich protects while it accentuates the spirit and lite-power of its host body. By transforming pottery motits into her personal iconography, Deng Lin has, metaphorically, tumed herself in to a vessel: her paintings become her tattoos, the magical charms of the microcosm wich is the artist. The use of Neolithic pottery motits in Chinese painting did not start with Deng Lin, but she succeeded in creating out of it a convincing artistic language by remaining in touch with the primordial power of that art. She was prepared for this breakthrough by her years of training in traditional ink painting, and it is the discipline in calligraphic expression that allows her to merge effortlessly into the spirit of the iconography. In translating ink painting on paper into woven tapestries in silk, the works undergo a transformation: the qualities of weight and density impossible to achieve in paper acquire on tapestrya dimension Df monumentality. By changing the medium Deng has managed to distance her art from the easy calligraphic fluidity of brush lines. The artistic statement consolidates itself into a monumental presence. The Distant echoes tapestries are Deng Lins most mature works up to now With this series she has broadened the scope of brush painting, and at the same time has found her own artistic voice. The result is that Deng Lins Distant echoes reverberate with an integrated power that is intensely personal while contacts her cultural heritage. Chang Tsong-zung
Distant echoes n° 4, 1993 tapeçari a de seda/ silk tapestry 185 x 355 em Foto Wong Yao
1941 Nasce em 11 de setembro em Shexian, província de Hebei. Uma semana depois é mandada para ~ casa de um camponês. 1943 E enviada a um internato em Van'an, na província de Shanxi. 1945 Após a rendição japonesa reencontra seu pai, Deng Xiaoping, e sua mãe. 1949 Chega a Chongqing, com o Exército de Libertação do Povo. Matricula-se na Escola Elementar do Povo. 1952 Fixa-se em Pequim. Matricula-se na Escola 1º de Agosto. 1955 Entra para a Escola Média para Meninas, ligada à Universidade Normal de Pequim (depois rebatizada Escola Média Experimental). Interessase por literatura e música. 1959 Entra para a Escola Media, ligada ao Conservatório Central
de Música. Começa estudos de pintura tradicional com tinta, com Wang Shensheng. 1961 Étransferida para a Escola Média ligada à Academia Central de Belas-Artes. 1962 Entra para a Academia Central de Belas-Artes, no departamento de Pintura com Tinta, para estudar pintura de pássaros e flores. 1966 Início da Revolução Cultural. Seu pai é criticado. 1967 Forma-se na Academia Central de Belas-Artes e aguarda designação de trabalho. 1973 É designada para trabalhar na Seção de Referência da Academia de Arte de Pequim. 1976 O contra-revolucionário Grupo dos Quatro, liderado por Jiang Qing (viúva de Mao) e Zhang Chunqiao, é esmagado e seus principais membros
são detidos. 1977 Começa carreira como artista profissional em tempo integral. As pinturas Ameixa vermelha e Pinheiro são incluídas na exposição Arte da Primavera da Academia de Arte de Pequim. 1979 É nomeada vice-diretora do Ateliê de Pintura de Pássaros e Flores da Academia de Arte de Pequim. 1981 Participa da exposição Pintura Chinesa da Academia de Arte de Pequim, patrocinada pelo Centro Cultural Chinês no Canadá. 1982 Participa da exposição Trabalhos de Quatro Artistas Chineses, na Wally Findlay Gallery, Nova Vork. 1984 Participa de exposiç'ão com Ma Xiao na Tokoha Art Gallery, em Shizuoka, Japão. As pinturas Uva e Ameixa são
adquiridas pela galeria. Encontra-se com pintores japoneses. 1985 É publicado em Tóquio o livro Deng Lin, obras com pincel. Viaja ao Japão para o lançamento. Participa de exposições em museus de Macau. Duas pinturas suas são adquiridas pela coleção do Museu Municipal. A 'pintura Ameixa de tinta é adquirida pela Galeria de Arte Chinesa, de Pequim. Ajuda a criar e é eleita presidente da Associação de Intercâmbio de Arte Oriental. . Visita os E.stados Unidos, a convite de Armand Hammer, e dedica~se a intenso estudo das artes contemporâneas e folclóricas ocidentais. 1986 Étransferida para a Academia de Pintura Chinesa como artista residente. Participa da exposição Pintura
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Moderna em Tinta de 1986, patrocinada pela Associação Japonesa de Pintura Moderna em Tinta, na Kyoto Art Gallery, e recebe menção honrosa. Chefia uma delegação a Hong Kong para a abertura da exposição Pintura Chinesa, patrocinada pela Associação de Intercâmbio de Arte Oriental. A pintura Nuvens rosadas é adquirida pelo colecionador Bao Vugang. As pinturas Pinheiro e Ameixa são exibidas na exposição Pinturas Orientais em Tinta, em Hong Kong. 1987 Viaja à França. Trabalha na série Ameixa, incluída na exposição Artistas da Academia de Pintura Chinesa. Várias obras suas são adquiridas pela academia para o acervo permanente. 1988 Participa da exposição Pintura Chinesa, organizada pela Unesco em Paris. A pintura Ameixa branca é leiloada pela Sotheby's no leilão Retorno de Marco Pólo, realizado na Cidade Proibida, Pequim, e adquirida por um colecionador francês. Épromovida a pesquisadora adjunta da Academia de Pintura Chinesa. Algumas obras são expostas na Cihui Art Gallery, em Taiwan. É convidada para a exposição Pintura em Tinta de Deng Lin, na Hefner Galleries, Nova Vork. O álbum Deng Lin brushworks é publicado nos Estados Unidos. A pintura Ameixa e vasos pintados é adquirida pelo Boston Museum of Fine Arts para seu acervo. A pintura Ameixa é incluída na exposição Pintura em Tinta Internacional, em Pequim, e recebe o prêmio
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de excelência. O livro Deng Lin paints p/um b/ossoms é publicado em Hong Kong. 1989 Uma pintura da série Ecos distantes é leiloada por Drouot na Cidade Proibida, em Pequim, e adquirida por um colecionador francês. Faz uma exposição individual no Nakakawa Art Museum, Hiroshima, Japão. 1990 Participa da exposição Séries de Artistas Contemporâneos Chineses, em Bangkok, Tailândia. Faz uma exposição individual em Tóquio, patrocinada pelo Nakayama Office. 1991 Participa de uma coletiva em Manila, Filipinas, e de outra no Singapore Cultural Relics Museum, em Cingapura. Uma pintura em laca da série Ecos distantes recebe a medalha de ouro na Exposição de Arte Moderna Asiática em Tóquio, patrocinada pela Associação de Arte Asiática. 1992 Faz uma exposição individual de pinturas e tapeçarias da série Ecos distantes no Museu de Arte da China, Pequim. 1993 Faz uma exposição individual de tapeçarias da série Ecos distantes na Hanart T Z Gallery, de Hong Kong. 1941 Bom in Shexian, Hebei Province. One week later sent to live in a peasant home. 1943 Sent to board at kindergarten in Yan'an, Shanxi Province. 1945 After the Japanese surrender, sent from Yan'an to be reuníted with her father, Deng Xiaoping, and mother. 1949 Arrived in Chongqing wíth the
People's Líberation Army. Enrol/ed in the Chongqing People's Elementary School. 1952 Settled in Beijing. Enrol/ed in the August 1st School. 1954 Entered the Middle School for Girls attached to Beijing Normal University (Iater renamed the Experimental Middle School). Became interested in literature and musico 1959 Entered the Middle School attached to the Central Conservatory of Music. Began studies in traditional ink painting wíth Mr. Wang Shensheng. 1961 Transferred to the Middle School attached to the Central Academy of Fine Arts. 1962 Entered the Central Academy of Fine Arts, Chinese Painting Department to study bird-andflower painting. 1966 Beginning of the Cultural Revolution. Deng Xiaoping is críticized. 1967 Graduated from Central Academy of Fine Arts and awaited work assignment. 1973 Posted to work in the Reference Section of the Beijing Art Academy. 1976 Gang of Four counterrevolutionary group led by Jiang Oing and Zhang Chunqiao crushed and its chief members arrested. 1977 Began career as fuI/-time professional artist. Paintings Red plum andPine exhibited at the Spring Art exhibítion of the Beijing Art Academy. 1979 Appointed deputy director of the Bird-and-Flower Painting Studio of the Beijing Art Academy. 1981 Exhibited at the Chinese Painting exhibítion of the Beijing Art Academy sponsored by the Chinese Cultural Centre in Canada.
1982 Exhibited at the Works of Four Chinese Artists exhibition at the Wal/y Findlay Gal/ery, New York. 1984 Exhibited at Modem Chinese Ink andWash: The Works of Deng Lín and Ma Xiao exhibition at the Tokoha Art Gal/ery in Shizuoka Prefecture, Japan. Paintings Grape and Plum acquired by gal/ery for its col/ectíon. Met with Japanese painters. 1985 Book Deng Lin brushworks published in Tokyo. Travel/ed to Japan for launch celebration. Took part in museum exhibítíons in Macao. Two paintings acquired by municipal museum for íts çol/ection. Painting Ink plum acquired by China Art Gal/ery, Beijing, for its permanent col/ection. Helped to establish and elected chairwoman of Oriental Art Exchange Association. Visited United States at invitation of Mr. Armand Hammer and undertook extensive study of Westem contemporary art and folk art. 1986 Transferred to the Academy of Chinese Painting as artist-inresidence. Exhibited at the 1986 Modem Ink Painting exhibition sponsored by the Japanese Modem Ink Painting Association at the Kyoto Art Gal/ery, and received award of merit. Led a delegation to Hong Kong for the opening of the Chinese Painting exhibítion sponsored by the Oriental Art Exchange Association. Painting Rosy clouds acquired by a col/ector, Mr. Bao Yugang. Paintings Pine and Plum exhibited at the Hong Kong Oriental Ink Painting exhibition. 1987 Travel/ed to France. Visited art museums and gal/eries and gave severallectures. Works from Plum series 1 through 8 exhibited at Artists of the Academy of Chinese
Painting exhibition. Several works acquired by the academy for its permanent col/ection. 1988 Exhibited at the Chinese Painting exhibition organised by UNESCO in Paris. Painting White plum auctioned by Sotheby's at Retum of Marco Polo auction held in the Forbidden Cíty, Beijing, and acquired by a French col/ector. Promoted to associa te research fel/ow at the Academy of Chinese Painting. Works exhibited at the Cihui Art Gal/ery, Taiwan. Invited by Mr. Hefner to hold the Deng Lín Ink Painting exhibition at the Hefner Gal/eries, New York. Album Deng Lin brushworks published in the Uníted States. Painting Plum and painted pottery acquired by Boston Museum of Fine Arts for its permanent col/ection. Painting Plum exhibíted at the 1988 Beijing Intemational Ink Painting exhibition and given award of excel/ence. Book Deng Lin paints plum blossoms published in Hong Kong by Líang You Co., Ltd. 1989 Painting from Distant echoes series auctioned by Drouot's at the Retum of Marco Polo auction in the Forbidden City, Beijing, and acquired by a French col/ector. Solo exhibítion at the Nakakawa Art Musevm in Hiroshima, Japan. 1990 Exhibited in the Exhibition Series of Chinese Contemporary Artists in Bangkok. Solo exhibition in Tokyo sponsored by the Nakayama Office. 1991 Exhibited at the four-person group show Modem Chinese Ink Painting held in Manila. Exhibíted at the Art of Deng Lín, Long RUI~ Zhan Gengxi, and Zao Wei exhibition at the Singapore Cultural Relics Museum. Lacquer painting from Distant echoes series awarded gold
Distant echoes n° 2, 1993 tapeçaria de seda! silk tapestry 183,5 x 355 em Foto Wong Yao
medal at the Asian Modem Art Exhibition in Tokyo, sponsored by the Asian Art Association. 7992 Solo exhibition of ink paintings and tapestries from Distant echoes series at the China Art Museum, Beljing. 7993 Solo exhibition of tapestries from Distant echoes series at Hanart TZ Gallery, Hong Kong.
Obras apresentadas/Works in the exhibition Distant echoes nº 2, 1993 tapeçaria de sedalsilk tapestry 183,5 x 355 em Distant echoes nº 3, 1993 tapeçaria de sedalsilk tapestry 184 x 355 em Distant echoes nº 4, 1993 tapeçaria de seda/silk tapestry 185 x 355 em Distant echoes nº 5, 1993 tapeçaria de seda/silk tapestry 182 x 352,5 em
Distant echoes n° 3, 1993 tapeçaria de seda! silk tapestry 184 x 355 em Foto Wong Yao
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ARTISTAS CONVIDADOS DA CHINA GUEST ARTlSTS FROM CHINA CU~DO~ CHANG r~ONG·ZUNG
CU~AíO~ CHANG í)ONGlUNG
o"REMAKE" DA CULTURA DE MASSA: A ARTE POP CHINESA o entusiasmo pelo mito da revolução camponesa e o culto de Mao
THE REMAKING DF MASS CULTURE: PDP ART IN CHINA
Tsé-tung está em seu ápice nesta última década. O ressurgimento do interesse popular pela revolução de Mao ocorre numa época em que a China tenta aceitar o desafio de construir uma economia capitalista. Isso é evidente hoje, desde os vendedores ambulantes de antigos souvenirs à glamourosa remontagem das "óperas-modelo" da Revolução Cultural. Sem esforço, por consenso popular, o torvelinho e as atribulações de quarenta anos de comunismo dissolveram-se nos anais impessoais das dinastias. A revolução ingressou no panteão das lendas folclóricas.
Enthusiasm for the peasant revolution myth and the Mao Zedong cult is at its highest point in more than a decade. The resurgence of popular interest in Mao 's revolution has come at a time when China is but braving the challenge of building a capitalist economy. It is now evident everywhere, from antique souvenir vendors on street corners to glamorous re-staging of the Cultural Revolution's "model operas ". Effortlessly, the turmoils and tribulations of forty years of communismhave been dissolved by popular consent into China 's faceless dynasties annals. The Revolution has reached the pantheon of folk legend. With the success of the communist revolution in 7949, "mass culture was given the status of an official art for the first time in Chinese art history. Mao Zedong defined the nature of this art in a much publicized speech as lia joy to the eye and a pleasure to the ears of workers, peasants and soldiers ". These mass culture virtues (actually, propaganda culture) were magnified to mythic status over Mao 's reign years, and collapsed with the catastrophic Cultural Revolution 's end in 7976. This propaganda mass culture and the transparent myth of the revolution is perhaps the only culturallegacy passed on to the present generation which, through Mao 's systematic devastation, is bereft of its historical traditions and customs. 11
Com o sucesso da revolução comunista de 1949, a "cultura de massa" ganhou status de arte oficial pela primeira vez na história da arte chinesa. Num discurso famoso, Mao Tsé-tung definiu as características dessa arte em como "uma alegria para o olhar e um prazer para os ouvidos de trabalhadores, camponeses e soldados". As virtudes dessa cultura lide massa" (que na verdade era propaganda cultural) foram ampliadas a um status mítico durante o reinado de Mao e sucumbiu com o fim da catastrófica Revolução Cultural, em 1976. Essa cultura de massa de propaganda e o transparente mito da revolução talvez sejam o único legado cultural transmitido à presente geração, que, através de devastações sistemáticas produzidas por Mao, foi despojada de suas tradições históricas e culturais.
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A magia brilhante do inescrutável Mao e de sua revolução foi transformada na totalidade da história e mitologia chinesas. Com esse objetivo, a Revolução Cultural fez um amplo esforço para erradicar as histórias pessoais, assim como os monumentos do passado chinês, para produzir na nação uma memória coletiva homogênea. Embora na década de 1980 outra esfera mágica - o "mundo lá fora" - tenha ocupado os artistas criativos da China, que engoliam e digeriam avidamente tudo o que lhes foi negado nos longos anos de Mao, a partir de 1989 o pensamento desses artistas completou um ciclo. O legado da revolução, com seu idealismo impiedoso e sua magia carismática, passou a ser avaliado por seu significado contemporâneo, e o mito da cultura de massa novamente entrou no domínio das belas-artes, desta vez canonizado pelo pop. Embora a arte pop como possibilidade para as belas-artes tenha se inspirado no exemplo da arte ocidental, o pop chinês tem suas próprias raízes. Na era de Mao, o "prazer e a alegria dos camponeses" não era apenas cultura de massa, era a única cultura. Por muitos anos essa arte foi a realidade visual do mundo chinês. É
The shining magic of the inscrutable Mao and his revolution was made out to be the totality of Chinese history and mythology. To this end, the Cultural Revolution made a thorough effort in eradicating personal histories as well as monuments of China 's past, in order to bring the Chinese nation to a homogeneous collective memory. Although in the 7980s another magical sphere -- the "outside world" -- preoccupied China 's creative artists, who eagerly swallowed and digested ali that was once denied to them in Mao 's lean years; since 7989 their thinking has come full Gircle. The Revolution 's legacy, with its ruthless idealism and charismatic magic, is being assessed for its contemporary significance, and the myth of mass culture again enters the realm of fine art, this time canonized by Pop. Although Pop as a possibility for fine arts was inspired by Western art, in China pop has its own separate roots. In Mao's years what was ''pleasure and joy to the peasants" and was not only mass culture, it was "the only culture. For many years this art formed the Chinese world visual reality. It is out of this visual reality that Pop has developed; Chinese artists have reshaped it as a landscapist would mountains and rivers, to appropriate it for individual creativity. As an art Chinese pop relies on the fact that Maoist culture, with its propaganda art and mythical saga of the Long March, for example, was a "Ianguage complete with its own language and logic. By 11
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fora dessa realidade visual que o pop evoluiu; os artistas chineses a remodelaram como um paisagista o faria com montanhas e rios, adequando-a à criatividade individual. Como arte, o pop chinês repousa no fato de que a cultura maoísta, com sua arte de propaganda e a saga mítica da Longa Marcha, por exemplo, era uma "língua" completa, com sua linguagem e lógica próprias. Ao trabalhar com essa "língua", o movimento pop chinês criou uma arte que reverbera hoje na cultura de massa.
o pop chinês é fascinado pelo glamour e pela teatralidade da revolução, alimentando-se de seus "vermelhos, brilhos e luminosidades" (os três cânones da arte ideal da Revolução Cultural). Vu Vouhan tornou-se conhecido nos anos 80 por suas pinturas abstratas de pontos coloridos em hipnóticas espirais. Suas novas imagens de Mao continuaram a ser dominadas por padrões gráficos de eletrizante beleza. As pinturas baseiam-se invariavelmente em fotografias históricas da vida de Mao, ecoando a postura dos pintores de ícones, que enfatizam a fiel adesão a imagens sagradas. Coloridas e festivas, cheias de energia e alegria, elas oferecem uma interpretação da história popular que se tornou mito. As pinturas de Mao feitas por Li Shan assumem as dimensões psicológicas de um ícone político-religioso. A atração pelo poder e o apelo sexual convergem nessas imagens andróginas do jovem Mao. O efeito é satírico e profundamente perturbador. Diferentemente das cínicas e condenatórias imagens de líderes políticos na arte pop russa, Mao é ridicularizado, mas ainda com deferência. Descobre-se um elemento de admiração imiscuído na sátira. O fervor idealista de Mao ainda arrebata a imaginação chinesa, e a dimensão moral de seu pensamento impediu que sua reputação tivesse o mesmo destino que inevitavelmente atinge outros tiranos. Os artistas pop chineses aceitam a autoridade de Mao como ídolo popular, enquanto se pronunciam como novos fazedores de mitos. Deve-se ter em conta que, apesar de seus pecados, Mao ainda é considerado popularmente o verdadeiro imperador chinês deste século. Para um imperador, o julgamento de bom ou mau é deixado à sabedoria da posteridade. Tornar a história pública um mito coincidiu, na geração de Vu e Li, com a demolição das histórias pessoais. Ao apagar as lembranças do passado, a Revolução Cultural foi efetivamente um programa nacional. Não apenas os laços familiares foram cortados, mas até lembranças, como fotografias, foram destruídas. A história pessoal foi absorvida na história pública, e finalmente tudo se tornou um continuum indiscernível. Ao escavar essas memórais, a China reconhece a influência decisiva desse período. na formação do caráter chinês contemporâneo.
working within this "Ianguage" the Chinese pop movement has created an art which reverberates in mass culture today. Chinese pop is fascinated by the glamour and theatricalíty of the Revolution, thriving on its "redness, brightness and luminosity" (the three canons of the ideal Cultural Revolution in art). Yu Youhan first became known for his abstract paintings of colorful and hypnotic spiraling dots in the 7980s. His new images of Mao continued to be dominated by graphic pattems of mesmerizing beauty. The paintings are invariably based on historical photographs of Mao's lite, echoing the attítude of icon painters who emphasize faithful adherence to sacred images. Colorful and celebratory, full of energy and fun, as a corpus they form a personal interpretation of a popular history which has become myth. Li Shan's Mao paintings take on the psychological dimension of a politicaljreligious icon. The lure of power and the appeal of sex converge in these androgenous images of the young Mao. The effect is satirical and deeply disturbing. Unlike the cynical and condemning imageries of polítical leaders in Russian pop art, Mao is ridiculed but still deferred to. One finds an element of admiration mixed with satire. Mao's idealistic fervor still captures Chinese imagination, and moral dimension of his thinking has preserved his reputation from the inevítable fate of other tyrants. Chinese pop artists acceptMao's authority as a popular idol while pronouncing themselves as new myth makers. One must appreciate the fact that in spíte of his sins, Mao is still popular/y regarded to be the true Chinese emperor of this century. For an emperor, judgement of good and evil is suspended for the wisdom of posterity. Making public history tum into myth coincided in Yu's and Li's generation with the demolition of personal histories. The Cultural Revolution was effectivelya national program in erasing memories of the past. Not only were family ties severed, but even memorabilia such as photographs were destroyed. Personal history was absorbed by public history, and ali eventual/y became an indistinguishable continuum. In excavating memories of this period, China comes to recognize the most forma tive influence on its contemporary character. Although a forerunner of Chinese pop, Wang Guangyi's recent interest has been drawn to intemational events. His Picture Calendar: Eastern Europe 1994 makes a poignant statement about the impotence of mass media, in which política I messages are often diverted to commercial ends. Although Mao's era is now behind us, the machinery of mass communication continues to play a dominant role in shaping public opinion and casting new idols. The calendar year brings its seasonal harvests of media images which as icons of history continue to challenge artists' criticai attention, whose vigilance should always rema in the conscience of our time. Chang Tsong-zung
Precursor do pop chinês, Wang Guangyi recentemente passou a se interessar por eventos internacionais. Seu Calendário de imagens: Europa Oriental, 1994faz um depoimento incisivo sobre a impotência da comunicação de massa, através da qual as mensagens políticas são freqüentemente desvirtuadas com fins comerciais. Embora a era de Mao tenha ficado para trás, a máquina da comunicação de massa continua a desempenhar um papel predominante na formação da opinião pública e na contrução de novos ídolos. A cada ano a mídia produz uma safra de imagens que, como ícones históricos, continuam a desafiar a atenção crítica dos artistas, cuja vigilância deveria ser, sempre, a consciência de nosso tempo. Chang Tsong-zung 99
li SHAN
Nasceu em 1944. Em 1968, completou seu curso universitário na Academia de Teatro de Xangai. Bom in 1944. In 1968 he graduated from Shangai Drama Academy. Exposições/Exhibitions 1993 Biennale di Venezia, Itália; Mao Goes Pop, Museum of Contemporary Art, Sydney, Austrália; Hong Kong Arts Festival, Hong Kong.
Obras apresentadas/Works in the exhibition Rouge: young Mao (conjunto de 3 obras/set of 3 works), 1994 óleo s/tela/oi! on canvas 115 x 200 cm cada/each Rouge: Mao and the artist (conjunto de 2 obras/set of 2 works),1994 óleo s/tela/oi! on canvas 150 x 180 cm cada/each
Rauge series: yaung Maa with tatus, 1994
acrílico s/tela/ acrytic an canvas 114 x 119,5 cm Foto Wong Yao
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WANG GUANGYI
Nasceu em 1956. Em 1984 graduou-se pela Academia de Belas·,Artes de Zhejiang, Departamento de Pintura a Óleo. Bom in -1956, In 1984 he graduated from the Oil Painting Department of lhejiang University Exposições!Exhibitions 1993 Biennale di Venezia, Itália; Mao Goes Pop, Museum of Contemporary Art, Sydney, Austrália; Hong Kong Arts Festival, Hong Kong. Obra apresentada!Work in the exhibition Picture calendars - Eastem Europe 1994, 1994 instalação (30 peças): técnica mista!insta//ation (30 pieces): mixed media 30 x 50 x 30 cm cada! each
Picture calendars - Eastern Europe 1994, 1994 instalação (30 peças): técnica mista/ installation (30 pieces): mixed media 30 x 50 x 30 cm cada/ each Foto Wong Yao
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YU YOUHAN
Nasceu em 1943. Em 1970, graduou-se no Instituto Central de Tecnologia de Pequim. Bom in 1943. In 1970 he graduated from the Central Institute of Technology in Beijing. Exposições/Exhibitions 1993 8iennale di Venezia, Itália; Mao Goes Pop, Museum of Contemporary Art, Sydney, Austrália; Hong Kong Arts Festival, Hong Kong. Obras apresentadas/Works in the exhibition Mao voting, 1994 acrílico s/tela/acrylic on canvas 118 x 166 cm The war years, 1994 acrílico s/tela/acrylic on canvas 114 x 166 cm Double Mao: Cultural Revolution, 1994 acrílico s/tela/acrylic on canvas 118 x 166 cm
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The war years, 1994 acríl ico s/tela/ acry/ic on canvas 114 x 166 em
Foto Wong Yao
ARTISTAS CONVIDADOS DE HONG KONG GUEST ARTlSTS FROM HONG KONG CU~AíO~ CHANG íjONGlUNG
CURAro~ CHANG r~ONG·IUNG
VIGíLIA E LEVEZA DO MOMENTO
WAKEFULNESS AND WElGHTLESS PRESENT
O aparente abandono sensual que caracteriza as pinturas recentes de Fang Lijun e Liu Wei contrasta vividamente com o clima meditativo do trabalho de Zhang Xiaogang. Os três são pintores figurativos que adotam como tema retratos imaginários de si mesmos, de familiares e amigos, colocados em ambientes que dramatizam o estado íntimo do artista. Sejam descontraídos ou sombrios, no entanto, esses retratos partilham uma qualidade essencial: a de serem capturados por um presente inescapável.
The apparent sensual abandon which characterizes the recent paintings of Fang Lijun and Liu Wei contrast sharply with the dark brooding moods of lhang Xiaogang. Ali three are narrative painters who take as their subject matter imaginary portraits of self, family and friends, placed in settings which dramatize the artists' personal state of being. But whether giddy ar doomed these portraits share one essential quality: that of being trapped by an inescapable present.
Alegres, brincalhões, Fang e Liu estão perpetuamente engajados nesse momento, do qual foram banidas as sombras do passado. Recebemos poucos indícios de suas histórias e, de modo geral, somos desencorajados de qualquer introspecção pelo colorido sol de suas pinturas. Por outro lado, fantasmas do passado, na forma de genealogias familiares, reencarnam para habitar o mundo presente de Zhang, do qual ele não pode desvencilhar-se, fossilizado pela imutável realidade do passado. Podemos dizer que seu presente (e, por interferência, seu futuro) foi contaminado pelo passado, a ponto de surgir uma "doença de pele" em seus retratos. Para os três artistas, o futuro não encerra surpresas especiais e, igualmente, não promete falsas ilusões. As pessoas nos quadros estão isoladas em seu momento presente comum. Se forem libertadas desse estado, é ao passado que irão se referir, mas isso parece estar além de seu controle. Desde 1989, a cultura chinesa ingressou numa nova era, em busca de autodefinição no mundo moderno. Nos anos 70, o clima era de um delírio revolucionário colorido e agressivo. Nos 80, tornou-se mais experimental e voltado para o exterior, mas igualmente positivo. No pós-1989, a cultura chinesa estabilizou-se numa vigília desiludida e instável. Se antes os temas políticos e sócio-culturais impeliam adiante os artistas, hoje uma inércia letárgica resiste a essas forças.
Cheerfully, often in frolic, Fang and Liu are perpetually engaged in the present moment, from which shadows of the past are banished. We know very little about theirbackground and are generally discouraged from ominous ruminations by the bright sunshine in their painting. On the other hand, ghosts from the past, in the form of famillial "bloodlines", reincamate to inhabit lhang's present world from which he cannot unshakle himself He is fossilized by the immutable reality of the past. One may say his present (and by inference, his future) has been contaminated by his past, to the effect that a physical "skin disease" appears on his portraits. For ali three artists, the future holds no particular surprises and equally promises no false illusions. People in the paintings are isolated in their communal present momento If they are to be released from this state, it is the past they must reckon with, yet it appears to be beyond their control. Since 1989 Chinese culture has entered.a new era in its search for selfdefinition in the modem world. In the 1970s, the mood was a colorful and aggressive revolutionary delirium. In the 1980s it was more experimental and outward-Iooking, but equally positive. Now post-1989 Chinese culture has settled down to a disillusioned, uneasy wakefulness. If politics and sociocultural issues previously compelled artists to move along, nowan equally lethargic inertia resists such forces. In the three painters' work is evident a heightened alertness of one's own presence - a sharper consciousness of one's existential being - which as a result immobilizes them in their self in volvement.
Na obra destes três pintores fica evidente uma acentuada atenção, ou vigília, à própria presença - uma consciência mais aguda do ser existencial -, que em conseqüência os imobiliza em seu próprio entorno. 103
Um sentido de trágica resignação perpassa a série Bloodline, de Zhang. Nota-se que o artista acaba de perceber que suas coordenadas foram preestabelecidas por seus antepassados, e não há como escapar. Visões dos parentes pairam em sua imaginação, muitos pintados numa técnica chinesa dos anos 20 para enfatizar a irrealidade de sua presença. Zhang parece condenado a um interminável pesadelo em vigília, no qual sua conexão com os outros baseia-se não na comunicação, mas nos laços sanguíneos incontestáveis. A falta de comunicação entre companheiros também é uma verdade nas pinturas de Fang e Liu. As figuras partilham um espaço comum, cada uma, porém, encapsulada em sua própria indulgência. Parecem viver num limbo hedonista do qual não há saída. Sem qualquer futuro ao qual voltar-se, seu presente carece de gravidade, dominado por uma satisfação despreocupada. Assim como a Zhang é negado o luxo da nostalgia melancólica, Fang e Liu não podem se refugiar em seus devaneios. Mesmo a sensualidade voyeurística que envolve as belas banhistas de Liu resultam apenas em masturbação, olhares esgazeados e ausência de sonho. O reino permissivo da água, freqüentemente símbolo de um mundo fetal perfeito, é o campo ideal para o princípio do prazer. Aqui Liu se diverte num erótico teatro burlesco, permitindo-se um voyeurismo e um exibicionismo conspícuos. Mesmo então, o prazer sexual deixa de se consumar no ato propriamente dito. O mundo aquático das pinturas de Fang também não oferece resolução. Enquanto Liu utiliza a água para efeitos cômicos, Fang cria um mundo líquido ameaçador. As pinturas inspiram um medo existencial em que nos sentimos desorientados pela ausência de direção. A única sensação segura éa de flutuar na superfície, imóvel. Estes três artistas produziram metáforas abrangentes da condição humana, sem peso ou direção, suspensa no tempo. Aqui, mesmo o prazer é condicional, porque a comunicação é suspeita. A comunidade é predeterminada pelas relações de sangue ou pela esfera comunal representada pela água. Pode-se apenas aguardar, sem esperança nem desesperança. Pode-se murmurar uma tola canção pop, como a inscrita nos quadros de Zhang. Pode-se agir como voyeur; ou, com humor, dedicar-se a galhofas eróticas. Chang Tsong-zung 104
A sense of tragic resignation pervades Zhang's Bloodline series. One feels that the artist has just come to the realization that his predicament was preordained by his forebearers, and there is no escape. Imageries of his relatives 100m large in his imagination, many painted in a 7920s Chinese portrait technique to emphasize the unreality of their presence. Zhang seems to be condemned to an endless nightmare of wakefulness, in which his connection to others is based not on communication, but upon fateful blood ties. An absence of communication among companions is also true of Fang's and Liu's paintings. Figures in the paintings share a common space, but each is encapsulated by his own indulgence. They seem to live in a hedonists' limbo fram which there is no escape. With no future to look forward to, their present carries no gravity, and a mindless glee takes over. Just as Zhang is denied the luxury of melancholic nostalgia, Fang and Liu may not escape into day-dreams. Even the voyeuristic lust which seizes Liu's bathing beauties results merely in masturbation, wide-eyed and undreaming. The permissive realm of water, frequentlya symbol of a perfect fetal world, is an ideal playgraund for the pleasure principie. Here Liu revels in a theater of eratic burlesque, indulging in blatant exhibitionism and voyeurism. Even so, sexual pleasure fails to consummate in praper intercourse. The waterworld of Fang's paintings, toa, does not bring resolution. While Liu uses water for comic effect, Fang's paintings create an aquatic world that is threatening. The paintings inspire an existential fear; one feels disoriented by the absence of direction. The only certain sensation is of f/oating on the surface, shiftless. These three artists have pravided gripping metaphors of the human condition: direction-Iess and weightless, suspended in time. Here even pleasure is. conditional because communication is suspect. Community is predetermined by blood relations ar by the communal sphere represented by water. One waits, neither feeling particularly hopeful nor hopeless. One may hum a si//y pop tune as inscribed on Zhang's paintings. One may become a voyeur; ar one may, in humor, engage in eratic fralic. Chang Tsong-zung
fANG lIJUN Water series, 1994
óleo s/tela /oil on canvas 170 x 250 em Foto Wong Yao
Nasceu em 1963. Em 1989 graduou-se no Departamento de Gravura da Academia Central de Belas-Artes de Pequim. Bom in 1963. In 1989 he graduated from the Printmaking Department of the Central Academy of Fine Arts, Beijing. Exposições/Exhibitions 1993 Biennale di Venezia, Itália; Mao Goes Pop, Museum of Contemporary Art, Sydney, Austrália; Hong Kong Arts Festival, Hong Kong.
Obras apresentadas/Works in the exhibition Water series, 1994 óleo s/tela /oil on canvas 170 x 250 cm Water series, 1994 óleo s/tela /oil on canvas 170 x 250 cm Water series, 1994 óleo s/tela/oil on canvas 170 x 250 cm Water series, 1994 óleo s/tela /oil on canvas 170 x 250 cm
Water series, 1994
óleo s/tela/oil on canvas 170 x 250 em Foto Wong Yao 105
lIU WEI
Nasceu em 1965. Em 1989 graduou-se no Departamento de Gravura da Academia Central de Belas-Artes de Pequim. Bom in 1965. In 1989 he graduated from the Printmaking Department of the Central Academy of Fine Arts, Beijing.
Bathing beauty (conjunto de duas tel as/ set af twa canvasesl, 1994 óleo s/tela/ail an canvas 174,5 x 154,5 cm cada/each Foto Wong
Exposições/Exhibitions 1993 Biennale di Venezia, Itália; Mao Goes Pop, Museum of Contemporary Art, Sydney, Austrália; Hong Kong Arts Festival, Hong Kong. Obras apresentadas/Works in the exhibition Swimmers (conjunto de oito telas/ set of eight canvases, 1994 óleo s/tela /oil on canvas 159 x 250 cm cada/each Bathing beauty(conjunto de duas telas/set of two canvases), 1994 óleo s/tela /oil on canvas 170 x 250 cm cada/each
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ZHANG XIAOGANG
8loodline: family portrait, 1994
óleo s/tela/oil on canvas 150 x 180 em Foto Wong Yao
Nasceu em 1958. Em 1982 graduou-se no Departamento de Pintura da Academia de BelasArtes de Sichuan. Bom in 7958. In 7982 he graduated from the Oil Painting Department of the Sichuan Academy of Fine Arts. Exposições/Exhibitions 1993 Mao Goes Pop, Museum of Contemporary Art, Sydney, Austrália; Hong Kong Arts Festival, Hong Kong.
Obras apresentadas/Works in the exhibition Bloodline: family portrait, 1994 óleo s/tela /oil on canvas 150 x 180 cm Bloodline: family portrait, 1994 óleo s/tela /oil on canvas 150 x 180 cm Comrades, 1994 óleo s/tela /oil on canvas 150 x 180 cm
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CU~DO~ JUAN CO~ONcl ~IYc~
CU~ArO~JUAN CO~ONf[ ~IVf~A
Diego Rivera nasceu na cidade de Guanajuato, México, em 1886, filho de Diego Rivera Acosta e María dei Pilar Barrientos. Seu pai foi professor de espanhol e escreveu um livro intitulado Elementos de gramática castellana destinado às escolas primárias do Estado. Desde pequeno Diego já fazia suas incursões pelo desenho, e um deles, denominado Locomotora, foi realizado em 1889. Devido a problemas internos do país entre a facção conservadora e a liberal, à qual pertenciam os Rivera, a família teve que se mudar para a Cidade do México no ano de 1893.
Diego Rivera was bom in Guanajuato, in 1886. He had a twin brother and was the son of Diego Rivera Acosta and María dei Pilar Barrientos. His father was a Spanish teacher and wrote a book on Spanish grammar entitled Elementos de gramática castellana for first grade public schools. Diego started to draw very ear/y. One of his ear/y drawings, Locomotora, was dane in 1889. His parents were members of the Liberal party and in 1893 they moved to Mexico City due to strong pressures exerted by the Conserva tive party.
Aos dez anos de idade, em 1896, Diego ingressa na Academia de San Carlos, tendo como professores Félix Parra, Santiago Rebull, que estavam trabalhando na decoração dos murais do castelo de Chapultepec, e José María Velasco, considerado por ele seu principal mentor e aquele que definitivamente o influenciou na primeira etapa de sua carreira. Aos treze anos, passa a freqüentar os cursos regulares da mesma academia; em 1903, assume a direção o pintor espanhol Antonio Fabrés, que instituiu o si~tema de cópia em gesso chamado Pillet, inspirado no modelo da Ecole des Beaux-Arts de Paris. Diego Rivera discorda inteiramente desse método. Em 17 de janeiro de 1905, Justo Sierra, subsecretário de Estado do presidente Porfirio Díaz, destina-lhe uma bolsa mensal de vinte pesos. Com outra bolsa de estudos, desta vez do governo do Estado de Veracruz, vai para a Europa em 1907 e tem aulas com o pintor espanhol Eduardo Chicharro y Agüera, que o influencia muito. Por volta de 1911 começa a fazer experiências com as técnicas do divisionismo e pontilhismo, mas é definitivamente através do cubismo que realiza suas melhores obras dentro da escola francesa, as mesmas que lhe deram grande prestígio na Europa; mas ao incluir em suas telas traços puramente mexicanos - chapéus e esteiras de
In 1896, when he was ten, Diego started having classes at the Academia San Carlos. Félix Parra and Santiago Rebull were his teachers. Both of them were involved in the restauration of the murais of Chapultepec Castle. José Maria Velasco was his mentor during the first period of his career. In 1899, at the age of thirteen, Diego enrolled at the Academia San Car/os and attended classes regular/y. In 1903, the Spanish painter Antonio Fabrés became the director of this institution and pioneered Pillet, a technique of gypsum reproduction, influenced by the model created at the École des Beaux-Arts in Paris. Diego Rivera radically disagreed with this proposal. In January, 17, 1905, the Govemment of Partiria Paz put him on the federal payroll with a monthly grant of 20 pesos. In 1907, he went to Europe by means of a scholarship offered him by the Estado de Veracruz. In Spain he had classes with Eduardo Chicharro y Agüera, who exerted a strong influence on him. In 1911, he started experimenting with the divisionist technique and pointillism, but it is in the realms of the cubist movement that he does his best work within the French School influence. These works accounted for his success in Europe. However, it also included his paintings Mexican features the sarapes, straw hats and hammocks - and the art critics as well as Picasso started labelling him "exotic". Disappointed with the rigidity of the modem European trends, including cubism, Rivera broke away from this painting
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J
palha -, incomoda a crítica e em especial Picasso, que passaram a chamá-lo de "exótico". Decepcionado com a rigidez das correntes européias modernas, inclusive do cubismo, rompe com esse estilo e volta à figuração através da análise cezaniana. Por volta de 1920 encontra-se com David Alfaro Siqueiros, que o questiona quanto a sua participação dentro da nova pintura nacionalista e politizada. O contato de Rivera com os grupos internacionais de esquerda se dava por intermédio dos pintores cubistas russos que trabalhavam na França. Suas idéias eram consideradas essenciais para o progresso do Estado, e Rivera concordou com Siqueiros em relação à necessidade de difundi-Ias em seu país; esses dois fatores o levaram a voltar para o México e a participar do que mais tarde seria conhecido c'Jmo a escola mexicana de pintura e o muralismo mexicano. E importante ressaltar que essas foram as duas primeiras correntes da arte moderna que se manifestaram no continente americano. Ele deu ao seu primeiro mural o nome de La Creación, obra que conserva a profunda impressão que lhe causaram as composições de Giotto em sua última viagem à Itália. Quando Diego Rivera termina esse trabalho, José Vasconcelos, secretário da Educação, observa que ele não tinha uma idéia clara do perfil que estava adquirindo o México pós-revolucionário devido a sua permanência fora do país. Convida-o então para uma viagem a Oaxaca, ao istmo de Tehuantepec e à península de Vucatán. O que ele vê nesses lugares revoluciona completamente seu conceito estético, e através de uma justaposição de elementos pictóricos, políticos e estilísticos Diego cria um estilo muito pessoal, já plenamente identificável no mural EI corrido de la revolución, realizado nos três andares do edifício da Secretaria de Educação Pública. Diego Rivera e Frida Kahlo, com quem se casou em 1929, são hoje considerados os pintores mexicanos mais representativos. Juan Coronel Rivera
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s
movement and resumed figura tive painting using Cézanne representation methods. Around 1920 he met David Alfaro Siqueiros, with whom he discussed the new nationalist and política I painting. Rivera made contact with international Leftist groups through Russian painters who were working in France. Their ideas were considered fundamental for the progress of the State. Rivera and Siqueiros agreed that ít was necessary to dissemina te these new ideas throughout the countrv. That is the reason why Rivera went back to Mexico and joined the group that later would be known as the Mexican Painting School and Mexican Muralism. It is important to point out that these were the firsttwo modernist movements that came to light in the Americas. His first mural was entitled La Creación (Creation), a work which shows the deep impression conveyed on him by Giottos paintings on his last trip to Italv. When this mural was finished the Secretary of Education, José Vasconcelos, observed that Rivera was not acquainted with the new Mexican profile which emerged after the revolution as he had been living abroad for many years. Vasconcelos invited him to visít Oaxaca, the Tehuantepec isthmus and Yucatán. What he saw in this trip completely changed his aesthetic concept. By means of a juxtaposition of pictoric, polític and stylistic elements, Diego gave birth to his very particular style. This new phase matured in the mural entitled EI corrido de la revolución, a work developed in three phases - each one of them can be seen in one of the three floors of the building of the Secretaria de Educação Pública. Rivera married Frida Kahlo in 1929. Both are currently considered the most representa tive of the Mexican painters. Juan Coronel Rivera
Desfile deI 1Q de mayo en Moscu. 1956 รณleo s/tela/oil on canvas 135.2 x 108 em Banamex
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EI molino de damme, 1909 óleo s/te la/oil on canvas 50 x 60 em Ing. Juan Pablo Gomez Rivera
DIEGO RIVERA E A BIENAL
DIEGO RlVERA AND THE BIENNIAL
Em 1953 Diego Rivera realizou as seguintes obras públicas: o mural do Teatro de los Insurgentes, chamado de Historia dei teatro en México, os murais transportáveis Tradiciones navideiías e o afresco do Hospital de la Raza, ao qual ele deu o nome de La historia de la
In 7953 Diego Rivera created the following works: the mural at the Teatro dei Insurgentes entitled Historia dei teatro en México, the itinerant murais Tradiciones navidefías, and the fresco La historia de la medicina en México: el pueblo en demanda de salud.
medicina en México: fi pueblo en demanda de salud. Nesse mesmo ano, Diego foi convocado a assistir, como único representante do México, ao Congresso Continental de Cultura, realizado em maio de 1953 em Santiago do Chile, atendendo a um chamado de Gabriela Mistral, Baldomero Sanín Cano e Joaquín García Monge. Nesse encontro, estabeleceu uma estreita relação com a delegação brasileira, da qual faziam parte J. Villanova Artigas (arquiteto), Teresa D'Amico (escultora), Djanira da Matta e Silva (pintora), Paulo Werneck (pintor), Mário Gruber (pintor) e Salomão Scliar (fotógrafo). O grupo brasileiro o incumbiu da tarefa de divulgar a notícia de que a Bienal de São Paulo estava excluindo muitos artistas latino-americanos devido a suas inclinações políticas - que eles abertamente manifestavam - e, o que era ainda mais grave, a sua postura em relação às artes plásticas. De volta ao México, Rivera conclamou todos os artistas locais a não participarem da mostra.
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In the same year Diego was the sole representant of Mexico at the Congresso Continental de Cultura, which took place from April, 26th to May, 2nd, 7953 in Santiago dei Chile. The invitation came fram Gabriela Mistral, Baldomera Sanín Cano and Joaquín García Monge. Rivera established a close relationship with the Brazilian representatives at the Congress: The architect J. Villanova Artigas, the sculptress Teresa D'Amico, the painter Djanira da Matta e Silva, the painter Paulo Werneck, the painter Mario Gruber and the photographer Salomão Scliar The graup asked Rivera to divulge the fact that the Bienal de São Paulo had excluded many Latin-American artists due to their political standing - which was revealed quite openly - and, what is worse, to their aesthetics position. Back in his country Rivera asked the Mexican artists not to participa te in the second edition of the Biennial.
,1 .
Paisaje, 1896-97 óleo s/tela/oil on canvas 70 x 55 em Ora . Guadalupe Rivera Marin
"México, D.F., 29 de maio de 1953. Sr. David Alfaro Siqueiros David: Angélica (Arenal) telefonou ontem e disse para Raquel Tibol, minha secretária, que me avisasse a respeito da reunião a ser realizada hoje às oito da noite na casa do dr. Carrillo Gil, com a presença do embaixador do Brasil e de alguns pintores jovens, com a finalidade de tratar de nossa participação na Bienal de São Paulo. Estou há cinco dias no México e desde que cheguei estou às voltas com o encargo que me deram os companheiros argentinos, brasileiros, uruguaios, chilenos e venezuelanos, tarefa que resultou nas deliberações tomadas em Santiago nos dias do Congresso de Cultura e ao término das quais decidimos formalmente que nenhum membro do congresso, do Movimento Pró-Paz ou do Partido Comunista, na sua condição de artista plástico, participará da Bienal de São Paulo, que, depois de análises e provas, descobrimos ser um instrumento de penetração imperialista, dirigido dos bastidores pela Unesco e com a concordância da burguesia brasileira pró-ianque. A tendência evidente dessa mostra foi confirmada pelos distintos delegados, especialmente pelos brasileiros, que reconheceram nela um meio de exaltar a pureza da arte, em cumplicidade com as manobras imperialistas, e que ela está procurando desprestigiar a batalha artística na qual temos estado empenhados, especialmente
"Mexico, D.F, May, 29th, 1953 To Mr. David Alfaro Siqueiros David, Yesterday Angélica (A rena I) called and said that my secretary Raquel Tibol should inform me about the meeting which is to take place tonight at the home of dr. Carri//o Gil. The purpose of the meeting, which is going to be attended by the Brazilian ambassador and some young painters is to talk about our participation in the Bienal de São Paulo. I have been back home for five days and since I arrived I have been working at a task given to me by the Argentinian, Brazilian and Uruguaian, Chilean and Venezuelan colleagues. In Santiago, during the Congresso da Cultura, it was decided that no artist belonging to the Communist Party, to the Movement For Peace or member of the Congress would participa te of the Bienal de São Paulo. Af te r serious research, we found out that this exhibition is an instrument of the imperialist movement, manipulated by UNESCO and with the agreement of the Brazilian pro-American bourgeoisie. The evident intention of this Salon was already confirmed by the representatives at the Congress in Santiago, especially the Brazilian, who stated that the goal of the Biennial was to glorify the purity of art in connivance with imperialism, trying to discredit the artistic battle in which we ali are engaged - particular/y the Mexicans - and, now, more than ever decided to fight.
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os mexicanos, e que neste momento estamos decididos a defender mais do que nunca. Assim, o importante agora é delimitar nossos campos, deixando que sigam para São Paulo aqueles que querem ou têm necessidade de ignorar a coação, procurando desse modo o afago e as conveniências da reação. Cândido Portinari, devido a problemas de saúde, não pôde comparecer ao Congresso de Santiago, mas encarregou a delegação do Brasil - da qual participaram destacados artistas plásticos - de manter essa posição, que é a sua e que todos apoiamos entusiasticamente, decidindo investir nossas forças de organização e de arte em mostras de caráter interamericano, mas liberadas de qualquer convivência com o aparelho de sujeição ao imperialismo anglo-saxão, com mais ou menos dissimulação. Organizaremos uma bienal ou anual e exposições móveis, com organizadores que não tenham poder de escolha, deixando que os próprios artistas participem delas, com o fim de desenvolver nossas culturas nacionais, unir nossos países e contribuir para a liberação da pátria integral e para a paz. Cumpro assim, por meio deste documento, a missão de que me encarregaram, de levar ao seu conhecimento a decisão coletiva e pedir-lhe que a exponha aos pintores jovens, camaradas ou não do PC, com os quais tenha feito contato sobre o assunto, que não é oficial nem oficioso, mas uma decisão coletiva tomada formalmente dentro de nosso movimento internacional, a qual o encarregamos de seguir, caso você deseje manter-se dentro da linha de nossa organização. Se você não achar isto correto, peço-lhe que o confirme por escrito, para que eu, por minha vez, o comunique aos companheiros de toda a América. Esta não é uma decisão secreta sobre a Bienal de São Paulo, mas uma decisão pública que você pode apresentar a todos os que comparecerem à reunião desta noite. Esperando contar com sua adesão e entusiasmo diante da posição que adotamos, confirmo-me seu amigo de sempre, Diego Rivera."2 As discussões entre a arte pura e a arte comprometida (abstração figuração) vinham se confrontando de maneira ríspida desde os anos 30, época em que um bom número de pintores importantes começaram a trabalhar dentro dos alinhamentos sociais nascidos em diferentes períodos históricos da então URSS. Em todo o mundo os artistas plásticos iniciaram uma crítica mordaz ao capitalismo e passaram a exaltar os valores sociais como tema da arte. O quadro que antecedeu todas essas idéias apresentou-se durante os anos do movimento cubista que se desenvolveu na França, quando os pintores que estavam ativos nesse país entraram em contato com os artistas russos que promoviam o movimento bolchevique. Um quadro de Diego Rivera conhecido como EI guerrillero ou Paisaje zapatista, de 1915, foi pintado nessas circunstâncias e é talvez uma das primeiras obras modernas que têm como tese uma idéia de índole revolucionária/romântica. Mas é nos anos 30 que as idéias socialistas foram adotadas pelos produtores de artes plásticas, por exemplo: os pintores alemães Otto Dix e Georg Grosz, o italiano Renato Guttuso, os mexicanos Diego Rivera e David Alfaro Siqueiros, o brasileiro Cândido Portinari, entre outros. Nesse período inclusive os sibaritas do surrealismo entraram em contato com a esquerda: Salvador Dalí pinta um retrato de lênin e André Breton assina um manifesto com Trótski. 114
Thus it is fundamental to define our boundaries, allowing those who need or have to ignore this enforcement to go to São Paulo and look for shelter and the advantages opened up by conservatism. Cândido Portinari could not come to the Congress in Santiago due to illness but charged the Brazilian team - which included many renown artists - to keep this standing which he has adopted and which we warmlyendorse. We decided to invest our organizational and artistic power in inter-American shows, events free of the Anglo-Saxon imperialistic establishment, in a more or less evident manner. We will organize a biennial or annual Salon, mobile exhibitions with organizers who do not have the power of choice, allowing ali artists to participate in them so as to develop our national cultures, unite our countries and strive for our country's freedom and for peace. Through this document I am carrying the task given to me, that is to say, to dissemina te the decision made at the Congress and ask Vou to explain ali of this to the young painters, those who belong to the Communist Party and those who do not - whom vou have contacted upon this matter; the decision, although not an oficial one, was, nevertheless, collectively made by members of our international movement. We ask Vou to follow our decision if vou wish to remain a member of our organization. However, if Vou don't agree with this I ask Vou to clarify your position by means of a written text as to allow me to communicate your decision to the colleagues throughoutAmerica. This is not a confidential matter related to the Bienal de São Paulo, but rather a resolution which was taken in an open manner and one which Vou can divulge tonight to ali of those who attend tonight's meeting. Hoping to hear of your enthusiastic adhesion to our principIes, I rema in your ever loyal friend, Diego Rivera. "2 The discussions between the followers of pure art and commited art (abstraction - figura tive) had acquired an agressive tone since the 30's, when a great number of outstanding painters started to advocate social change within the realm of the numerous social alignments that emerged in the different political periods of the former Soviet Union. Ali over the world artists gave vent to a satirical approach to capitalism while choosing social subjects as the most valued subject for their art. A pioneer picture based on these ideas surfaced during the peak of the cubist movement, which emerged in France, when the French painters were veryactive and contacted the Russian artists who promoted the Bolshevik movement. The painting by Diego Rivera known as fI guerrillero or Paisaje zapatista, dating from 7975, was depicted under the same circumstances and is, maybe, one of the first modernist artworks based on a romantic and revolutionary thesis. However, it is in the 30's that art producers adopt socialist ideas. An example of this outlook are the German Otto Dix and Georg Grosz, the Italian Renato Guttuso, the Mexicans Diego Rivera and David Alfaro Siqueiros and the Brazilian Cândido Portinari, among others. At the time the sybarites linked to surrealism contacted the Leftists: Salvador Dalí portrayed Lenin and André Breton signed a manifesto together with Trotsky.
Los pigmentos y su uso. fI caracol y el tefiido, 1942 Projeto para a grisalha Cultura purépecha/Project for the grisaille "Cultura purépecha ", 1942 lápis e carvão s/papel/pencil and charcoal on paper 106 x 118 cm Coleção Juan Coronel Rivera Foto Jesús Sánchez Uribe
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Historias de las religiones li, 1950 - 1957 óleo s/te la/oil on canvas 197 x 74 em Coleção Rafael Coronel Arroyo Foto Jesús Sánehez Uribe
Historias de las religiones 111, 1950 - 1957 óleo s/tela/oil on canvas 198 x 74 em Coleção Rafael Coronel Arroyo Foto Jesús Sánehez Uribe
Quando Diego Rivera tenta bloquear a participação dos artistas mexicanos na Bienal de São Paulo, esse problema não era inteiramente novo; outros certames internacionais já haviam passado por isso, a Bienal de Veneza teve que criar um júri especial, para que este fizesse a seleção especial da arte figurativa, evitando assim desavenças que estavam ocorrendo na Bienal de São Paulo. Na 25ª Bienal de Veneza, em 1950, o curador da delegação mexicana, Fernando Gamboa, levou José Clemente Orozco, Diego Rivera, David Alfaro Siqueiros e Rufino Tamayo. O comissário-geral era Giovanni Ponti, que por sua vez teve que nomear uma comissão para a arte figurativa, integrada por Nino Barbantini, Carlo Carrà, Felice Casorati, Giuseppe Fiocco, leoncillo leonardi, Roberto longhi, Giacomo Manzu, Marino Marini, Giorgio Morandi, Rodolfo Pallucchini, Carlo ludovico Ragghianti e Lionelo Venturi. O grande prêmio internacional foi para Henri Matisse; o grande prêmio nacional, para Carlo Carrà. Dentro da segunda categoria, Siqueiros obteve um "Premio Museo d'Arte Moderna di San Paolo dei Brasile. L. 500.000: ai pittore David Alfaro Siqueiros."3
However, when Diego Rivera tried to stop the Mexican participation at the Bienal de São Paulo, this was not a novelty Other international Salons had faced the same problem; in 7950, even the Venice Biennial had to institute a special body of jurors so as to avert what was happening in the Bienal de São Paulo. In 7950, at the 25th Venice Biennial, Fernando Gamboa, the Mexican curator, selected José Clemente Orozco, Diego Rivera, David Alfaro Siqueiros and Rufino Tamayo as the representatives of Mexican art. The general director, Giovanni Ponti, had to choose special jurors for figurative art which included Nino Barbantini, Carla Carrà, Felice Casorati, Giuseppe Fiocco, Leoncillo Leonardo, Roberto Longhi, Giacomo Manzu, Marino Marini, Giorgio Morandi, Rodolfo Pallucchini, Carla Ludovico Ragghianti and Lionelo Venturi. The first international prize went to Henri Matisse and the national one to Carla Carrà. Siqueiros was awarded the prize "Premio Museo d'Arte Moderna di San Paolo dei Brasile. L$ 500,000: ai pittore David Alfaro Siqueiros".3
UM NOVO CONVITE POR PARTE DE JORGE AMADO
A NEW INVITATlON BY JORGE AMADO
A convocação de Diego Rivera para evitar a adesão de artistas plásticos à Bienal de São Paulo deu resultado. Um ano depois de ser admitido no Partido Comunista Mexicano (1954), recebe uma carta de seu amigo, o escritor Jorge Amado: "Jorge Amado, Rua Rodolfo Dantas, 16, ap. 704, Copacabana, Rio de Janeiro, Brasil. 4 de abril de 1955. Para Diego Rivera. Querido Diego: Junto a esta encontrarás um recorte com a tradução do teu artigo, traduzido de uma revista mexicana que recebi aqui. Se tiveres alguma coisa mais, interessante, manda-me que publicaremos. Agora outro assunto: nossa posição diante da Bienal de São Paulo sofreu uma modificação. Resolvemos participar da Bienal e tratar assim de mudar-lhe o caráter. Estamos, nós e a direção, interessados em que tu e Siqueiros - além dos demais pintores e gravadores progressistas mexicanos - concorram. Nesse sentido, discutimos com a direção da mostra. Grandes salas serão reservadas para ti, Siqueiros e os demais. Nós estamos interessados, particularmente, na tua presença com uma série de grandes quadros. Tu, Siqueiros e os demais devem se dirigir, para os assuntos referentes ao envio dos quadros, ao Sr. Carrillo Giles [sic], representante da Bienal aí. Por outro lado, a Bienal se dispõe a financiar tua vinda ao Brasil por ocasião da mostra (junho). Isso também nos interessa muito. Ficaríamos muito contentes se pudesses vir. Sobre tudo isso peço-te que me respondas urgentemente. Zélia te envia lembranças e eu te abraço afetuosamente, Jorge Amado."4
Diego Riveras request for the non-participation of artists in the Bienal de São Paulo achieved good results. In 7954, one year after joining the Communist Party, Rivera receives a letter written by his friend, the writer Jorge Amado: "Jorge Amado, Rua Rodolfo Dantas, 76, ap. 704, Copacabana, Rio de Janeiro, Brasil. April,4th , 7955. Dear Diego: you will find enclosed the Brazilian translation of your article, which was published in a Mexican magazine that I received here in Rio. If you have any other interesting texts send them to me and we will have them published. Changing the subject, our attitude regarding the Bienal de São Paulo has changed. We decided to participate in the Salon and, thus, modify its stance. We would like - we and the directors of the Bienal - you, Siqueiros and other progressive Mexican painters and engravers to join the exhibition. We have discussed this with the Bienais directors. Huge special rooms will hold yours, Siqueiros and the other artists' works. We are particularly interested in having your work, maybe a series of large paintings. You, Siqueiros and ali the others should contact Mr. Carrillo Giles, representa tive of the Bienal in your country, regarding the transportation of the artworks. The Bienal is also offering to pay for your travei expenses in June when the Bienal takes place. We would be very happy if you came. We ask you to send us a reply shortly Zélia sends her regards and I send you my warmest wishes, Jorge Amado ". 4
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Não encontrei a resposta de Rivera a esta carta de Amado, mas o fato é que ele não participou da Bienal, embora também seja provável que não tenha recusado a oferta, apenas protelado. Encontro duas razões para isto: a carta do escritor está datada de 4 de abril, e a Bienal seria aberta em junho; portanto, o tempo era curto; mas o que realmente o levou à recusa foi que nesse mesmo ano -1955 descobriu-se que ele tinha câncer, o que o levou a fazer uma longa viagem à URSS. "9 de agosto de 1955. Ao C.D.E. Secretário-Geral do PCM e à correspondente comissão. Estimado Camarada: estando doente, com um epiteloma canceroso que exige tratamento especial existente só na URSS, e tendo sido convidado por intermédio do adido cultural para viajar à URSS, quero aproveitar essa viagem para solicitar tratamento médico urgente. Venho pedir ao PC licença pelo tempo que exigir meu tratamento e convalescença, assim como providências para os trâmites correspondentes perante as entidades envolvidas no caso, como me foi sugerido pelo adido cultural da URSS. Devido a circunstâncias especiais, é preciso a maior discrição a esse respeito por tudo aquilo que não seja a alta direção do PC e para maior celeridade imediata dos trâmites. As possibilidades de êxito, segundo os médicos especialistas consultados, são de mais de oitenta por cento, o que garante a conveniência política de minha viagem ~ tratamento, com possibilidades de divulgação, em nosso país e em escala internacional, do desenvolvimento da ciência cancerológica na URSS devido ao regime comunista. Saúde! Diego Rivera."5 Rivera volta ao México em 4 de abril de 1956. Como testemunhou a revista Todo: "Diego Rivera disse ao voltar da Rússia: 'Estou curado do câncer'. Amigos, discípulos e admiradores do famoso pintor deram-lhe as boas-vindas no aeroporto. O corpulento Diego Rivera apareceu, sorridente, na escada do avião que alguns segundos antes pousara no aeroporto central da Cidade do México. Eram 21h10 da quarta-feira 4 de abril, e as duzentas e tantas pessoas que haviam conseguido chegar perto do final de uma das pistas não puderam senão aplaudir ao descobrir o célebre muralista com um gorro de astracã na cabeça e vestido com um pesado sobretudo de pele, segundo o costume russo, já que a temperatura nas estepes daquele país deixa lá em cima o zero dos termômetros. Ofato de o original pintor apresentar-se assim vestido motivou uma corrente de simpatia entre seus numerosos amigos que foram recebê-lo e entre aqueles que nada estranhavam vindo do famoso mestre. (... ) Momentos antes da chegada do pintor, os estudantes que se acotovelavam para receber o mestre distribuíram panfletos nos quais estavam impressos versos dedicados ao muralista. A Frente Nacional de Artes Plásticas, que por seu lado organizou a recepção, estava representada essa noite por muitos de seus membros, que avançaram ao ver Rivera
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I did not find Rivera's answer to this letter but, ali the same, he did not participa te in the Salon. Probably he did not reject the offer but postponed it. I state this for two reasons: the letter from Amado was written on April, 4th and the Bienal would open its doors in June. This means that only a very short time was available. However, the real reason for his refusal was that this was the year when he found out he had cancer and went to the Soviet Union for treatment, where he stayed for a long period. "August, gh, 7955. To the General Secretary of the c.p and the commission. Dear Colleague: Being sick with cancerous epiteloma which requires special treatment - that is not available in Mexico - as to avert a se vere surgical mutilation by means of medicaI techniques only mastered in the USSR, I request a travelling grant. I was also invited by VOX - by means of the cultural attachée of the Soviet Embassy - to traveI to the Soviet Union. I wish to take the opportunity of this trip to submit to this urgent medicaI treatment. Thus, I ask you to be put on leave during the time needed for this cure and convalescence. I also would like the Party to contact the authorities of the necessary institutions according to suggestion of the cultural attachée. Due to specific circumstances I ask you to take this matter into consideration with the utmost discretion - except regarding the Party's High Committee. I also ask you to undertake the necessary measures rapidly. According to the doctors I have visited, the chances of my recovery are very good - above 80% - which warrants my trip in the political aspect. If the treatment is successful the development of the cancer science in the Soviet Union under the communist regime will be widely disseminated in Mexico and worldwide. Diego Rivera. "5 The artist went back to Mexico on April, 4th , 7956, as the magazine Todo announced: " 'I am cured of the cancer', said Diego Rivera when he came back from Russia. Friends, students and followers of the renowned painter welcome him at te airport. The smiling and corpulent Rivera suddenly emerged from the airplane that had landed some seconds before at the Central Airport of Mexico City. It was 70 minutes past nine PM. of that Wednesday, April, 4th , and the two hundred people who had managed to get near the runway applauded the famous muralist dressed in a heavy fur coat and wearing a fur hat, adequately clad - according to the Russian tradition to the freezing weather. This unconventional attitude resulted in a special warmth from the friends who had gone to the airport to welcome him and also by those who were ready to face any sort of odd behavior from Rivera. (...) Some moments before the arrival of the painter bom in Guanajuato, students who were in the midst of the crowd were distributing sheets of paper with a poem, a homage to Rivera. The Frente Nacional de las Artes Plásticas, which organized the welcome was represented by many of its members, who went forward as they saw the muralist greeting the crowd.
saudando a multidão. Desde o momento em que pisou em terra, o pintor foi recebido com carinho pelos amigos, e sua ex-mulher, Guadalupe Marín, emocionada até as lágrimas, estava lá para levar seu abraço a Rivera. A essa altura, já se ouvia dos lábios dos jovens estudantes a canção composta em sua homenagem. 'Já chegou Diego Rivera, já o saúda o vulcão, já os campos mexicanos as boasvindas lhe dão'. E havia outros versos que falavam de sua ida à Rússia em busca de saúde. O grande artista, ao ser interrogado pelos jornalistas, apenas disse: 'Estou curado do câncer. Estou totalmente restabelecido, graças à ciência médica soviética':'6
From the moment he stepped on Mexican soil, he received much tendemess by his friends and Guadalupe Marin, his former wite, deeply touched, who was also there to welcome him. Later, the students started singing the song prepared for Rivera: 'Diego Rivera has arrived, the volcano greets him, and the Mexican fields are already welcoming him. ' Other lines of the song referred to his trip to Russia seeking recovery. When he was interviewed by the reporters he only stated that: 'I am healthy again thanks to the Soviet medicai science'. "6
AS ÚLTIMAS IDÉIAS DE DIEGO RIVERA SOBRE A ARTE BRASILEIRA
DIEGO RIVERA'S LAST OPINIONS ON BRAZILlAN ART
Diego Rivera não estava curado do câncer. As radiações a que havia sido exposto apenas controlaram o quadro da doença por um breve tempo. Os médicos da União Soviética lhe recomendaram repouso, e Rivera foi para Acapulco por alguns meses, mas o fim se aproximava. Uma das últimas entrevistas que concedeu foi a que a jornalista Sílvia Helena Girandi lhe mandou do Brasil; ele respondeu quando voltou de Guerrero, em seu ateliê em San Angel, México, D.F, em 19 de fevereiro de 1957, e entre outras coisas comenta [sobre a arte brasileira]: "Conheço bastante, mas infelizmente vi pouco, porque entre o piores males de que padecem os ibero-americanos está a falta de comunicação entre as expressões de nossas culturas nacionais. A pintura brasileira tem repercussão e é apreciada em todo o mundo, mas eu só pude ver um único original de Portinari e uma dúzia de Di Cavalcanti, dos quadros que ele pintou aqui no México. Nada desejo tanto quanto poder ir ao Brasil e apreciar lá o trabalho de meus colegas brasileiros, que através das reproduções estimo e admiro. Um de meus maiores desejos é ir ao Brasil; sonhei com suas paisagens, quero bem a muitos amigos brasileiros e gosto tanto das brasileiras, pelas que conheci em outros países, que desejo poder ir ver todas elas. O objeto de um de meus maiores e mais profundos afetos de amor é uma brasileira, e ela está no Brasil".7
Rivera had not recovered from the cancer. The radiations he had been submitted to had only temporarily stopped the development of the disease. The Soviet doctors hadrecommended a rest and Rivera spent some months in Acapulco. Nevertheless, his death was close. He gave one of his last interviews to the Brazilian joumalist Silvia Helena Girando, who sent him her questions from Brazil. He answered them in his studio in San Angel, Mexico City when he came back from Guerrero. This happened in February, 1gh, 1957. Among other subjects he commented on Brazilian art: " I know it well but unhappily I have seen little of it due to one of the worst problems that exist in Latin America: the lack of communication among our national cultures. Brazilian painting is well known and people ali over the world are fond of it. I was onlyable to see a sole original by Portinari and a dozen by Di Cavalcanti - paintings he created here in Mexico. I wish nothing better than to visit Brazil and get to know the work of my Brazilian colleagues, whom I greatly like and admire based on the reproductions I have seen. One of my great wishes is to go to Brazil; I had dreams about its landscapes and I have good Brazilian friends; also, the Brazilian women I have met abroad were so interesting that I would love to go there to see them aI/. I am in deep love with a Brazilian woman and she is now in her na tive country. ''7
À pergunta sobre se gostava de viver, ele respondeu: "Suporto a vida, precisamente porque a amo, se bem que é verdade que esse amor e seu desfrute comportem tal quantidade de incômodos que, se tivesse sido consultado sobre se dese~ava nascer ou não, teria dito que não, pelo menos não neste planeta, sobre o qual o rei Netzahualcóyotl escreveu: 'Toda a redondez da Terra é um sepulcro. Nada há em sua superfície que ela não crie e em seguida devore'. E, francamente, o método de viver devorado me repugna profundamente, além de me parecer idiota e grosseiro. Espero que, uma vez que já conseguimos fazer seda e outros produtos com o nitrogênio do ar, cheguemos a usar a cabeça para transformar a matéria não em forma de ser vivo para adequá-Ia a nossa alimentação, sem necessidade de assassinar para viver. E mais me repugna o assassinato dos seres indefesos animais - do que o dos canalhas idiotas que só usam o cérebro para inventar meios para melhor se destruírem uns aos outros". 8
Asked it he enjoyed lite, he answered: "1 survive beca use I love lite, although it ís true that thís love and its enjoyment bríngs about so many uncomfortable moments that it I had been asked whether I wanted to be bom I would have chosen not to, at least not in this planet, about which the king Netzahualcóyotl wrote: ''Ali the Earth's roundness is a cemetery. On its surface, there is nothing that is created by it that fails to be devoured later. " And, to be honest, the method of living while being ravenously eaten displeases me enormously, besides being silly and disagreeable. Let us hope that, as we have already mastered the art of making silk and other goods using nitrogen taken from the air, we leam to use our intelligence to transform matter in something we can eat, without having to murder in order to live. The slaughter of defenseless creatures - animais - is more repugnant to me than the murder of stupid scoundrels who only use their minds to invent means of destructing one another".B
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Cabeza de indígena,1927 óleo s/tela/oil on canvas
49,5 x 41 em
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Coleção Enrique Martín Moreno e senhora Foto Jesús Sánehez Uribe
Retrato de Rosa Rolanda, 1930 óleo s/tela/ oil on canvas
56 x 45 em Coleção Galería Arvil Foto Jesús Sánehez Uribe
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AS DIFERENÇAS CONTINUAM ANOS DEPOIS
THE DIFFERENCES ARE STlLL THERE MANY YEARS LATER
A discussão entre figuração e abstração, a primeira entendida como representante da pintura progressista e a segunda, como símbolo do capitalismo, continuou até o início dos anos 70 e foi somente com a transformação ideológico-política da URSS nos anos 90 que esse capítulo se encerrou, pelo menos a partir dessa perspectiva. Rivera postulou: "Penso que uma escola de arte é invariavelmente tão ridícula quanto seria uma escola que ensinasse a fazer amor. Há muitíssimo que aprender, e, em conseqüência, que ensinar, para se poder fazer essas coisas que se chamam obras de arte, notavelmente se se tratar de grandes construções no espaço, mas o que se precisa saber não é ensinado em parte alguma do mundo, o que resulta, entre outras coisas, no florescimento de edifícios horríveis sobre toda a terra e a proliferação de abjetas figuras - na pintura e escultura - que algumas pessoas chamam de 'abstratas' e 'concretas'.
The debate between figurative art and abstraction - the first seenas representative of the progressive painting and the latter as a symbol of capitalism - was stil! valid until the early 70's and only the political and ideological transformation which occurred in Russia in the 90's caused its decline, at least if seen from this perspective. Rivera forecasted: "In my opinion an art school is always so ridiculous as a school that taught how to make love. There is much to leam and, obviously, to teach in order to be able to produce these things which are dubbed artworks, chief/y if we are to deal with huge constructions into space; however, what we need to know is 170t taught anywhere in the world; this causes, among other things, the emergence of monstruous buildings ali over the world and the proliferation of abject forms - in painting as wel! as in sculpture - which some people cal! abstractiQns ar concreteness.
Quanto às diferentes 'escolas', ou seja, maneiras de fazer arte, na medida em que se transformam em 'escolas', valem tanto quanto as outras. Escola em arte significa repetição de uma fórmula, e a repetição de qualquer fórmula em arte é a negação da própria arte, ou seja, o aca"demismo, qualquer que tenha sido a fórmula repetida. Em arte só existe aquela que consegue entender a voz do povo, para dizer a ele, por sua vez, algo que antes não se lhe havia dito. O resto é. apenas entulho e apelação comercial".9 As palavras ásperas de Rivera com respeito a um tipo de criação artística tiveram ressonância em muitas esferas. A crítica Raquel Tibol, argentina radicada no México, escreveu num artigo intitulado "As Bienais de São Paulo e a advertência de Diego Rivera" em 1961: "Curioso fenômeno este do Brasil, exemplar no sentido cervantino, tragicômico por tudo oque tem de colonialismo cultural; mais trágico ainda quando se pensa na ~norme força inventiva daqueles núcleos que reconheceram um tronco nacional, vernáculo, e partiram dele, como os arquitetos, que foram os primeiros em sua terra a estudar a arte do passado. A arquitetura brasileira é um exemplo magnífico de um nacionalismo bem entendido, ou seja, de uma obra criadora,com raízes no tempo e nas éircunstâncias de um país. Assim o entenderam Lúcio Costa, Paulo Santos, Sérgio Bernardes, Oscar Nierr-eyer e todos aqueles que em menos de vinte anos levantaram cidades belíssimas, cheias de graça funcional e de engenhosos apegos a tradições válidas. Mas esses arquitetos raras vezes pediram a colaboração de pintores abstratos, de fátuos
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Regarding the different "schools" that is to say, the different ways to create art, as soon as they freeze into "schools" their value becomes equivalent to the others. In art "school" means the repetition of a formula, and the repetition of a formula in art is the negation of art: academism. The onlyart which is valid is that which l./nderstands the voice of the people, and is able to tel! them, in tum, something which had not been said before. That which is not includedin this cathegory os just rubbish and commercial interest. "9 Rivera's strict opinions on a specific art language reverberated in many spheres of the artistic community. In 1961 the critic Raquel Tibol, for instance, wrote an article entitled "The Biennials in São Paulo and Diego Rivera's waming" in which she writes: "This is a curious Brazilian phenomenon, didactic according to Cervantes, tragicomic in its cultural colonialism and even more tragic if we think about the enormous inventive force possessed by the nucleus who have recognized a national structure, vocabularyand started working from them - as the architects who were the first (in the country) to study the art of the past. Brazilian architecture is the best example of a well understood nationalism, that is, of an original work rooted in the time and specific circumstances of the country. That was the way it was understood by Lúcio Costa, Paulo Santos, Sérgio Bemardes, Oscar Niemeyer and ali of those who built beautiful cities that were planned with functional charm and witty solutions which represent valid traditions, in less than twenty years. However, those architects have rarely asked for the colaboration of abstract painters, of the vain imitators of forms whose existence is warranted in developed countries like Holand, Switzerland, Belgium and Germany.His favorite colaborator was Portinari who by means
imitadores crioulos de formas que tinham e têm sua razão de ser em países de civilização avançada como a Holanda, Suíça, Bélgica e Alemanha. Seu colaborador favorito foi Portinari, que provocou com sua obra e sua atitude uma das batalhas mais importantes e básicas para a cultura na América".l0 Todas essas apreciações já têm outra perspectiva, outro momento histórico, e sobretudo a humanidade já não é a mesma que concluiu aqueles argumentos da primeira metade do século XX. Embora seja óbvio que toda atividade humana - histórica ou contemporânea - faz parte do conjunto de nossos costumes, temos que aprender a ver-nos e, sobretudo, a redefinir-nos.
oser humano tem que começar a estabelecer um reordenamento de seus conceitos; face a si mesmo e aos que o rodeiam, tem que realizar uma nova aprendizagem e uma nova descrição; creio que esse tipo de acontecimento nos convida a ver as expressões de outras culturas e países, não para julgar, mas para entender o que é feito, porque assim compreenderemos melhor o conjunto de seres vivos. que compõem nossa espécie e para isso a arte em si é uma ferramenta fundamental.
of his work and attitude provoked one of the most fundamental battles in favor of culture in America. "10 Those considerations belong to other circumstances, to a different time in historyand were made by people who lived in the first half of the 20th century. Although it is obvious that human activity - whether historical or comtemporary - is part of our customs, we have to leam to look inside ourselves and redefine our values. It is high time the human beings reorganized their concepts. They have to start a new apprenticeship and a new description of themselves and those around them. I believe that this kind of event does not invite us to judge what has been done, but to see the way other cultures and countries express themselves. Art is an indispensable tool for the understanding of the beings that belong to our species. Juan Coronel Rivera
Juan Coronel Rivera
Notas 1 "A Bienal de São Paulo, 43 anos de internacionalismo", Ivo Mesquita. Em Poliester, volume 2, nº 8, págs. 53-54. 2 Do original, inédito. 325" Bienal de Veneza, catálogo, Alfiero Editore, Veneza, 1950, págs. 20 e 21. 4 Do original, inédito. 5 Do original, inédito. 6 Todo, La Meior Revista de México, nº 1170, 12 de abril de 1956, México, O.F., págs. 6,8 e 18. 7 Do original, inédito. 8 Idem. 9 Ibidem. 10 "As Bienais de São Paulo e a advertência de Diego Rivera", Raquel Tibol, 2 de agosto de 1961. Siempre, nº 423, págs. 48, 49 e 70.
Notes 1 "A Bienal de São Paulo, 43 anos de internacionalismo", Ivo Mesquita. In: Poliester, volume 2, number 8, pp.53-54. 2 Extracted from the text which is still unpublished 3 Fram the catalogue ofthe 25th Biennial of Venice, Alfiera Editore, Venice, 1950, pages. 20 and 21. 4 Extracted fram the text which is still unpublished 5 Extracted from the text which is still unpublished 6 Extracted from the text which is still unpublished 7 Extrated from Todo, La Mejor Revista de México, nº 1170, April12th 1956, México, DI. pages. 6, 8 and 18. 8 Extracted fram the text which is still unpublished 9 Idem. 10 "The Biennials of São Paulo and Diego Rivera's warning", written by Raquel Tibol, August 2nd, 1961, Siempre, number 423, pages 48, 49 and 70.
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Retrato de Ruth Rivera, 1949 óleo s/tela/oil on canvas 199 x 100,5 em Coleção Rafael Coronel Arroyo
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Obras apresentadas/Works in the exhibition Esboços para o afresco intitulado/Sketehes for the fresco EI corrido de la Revolución. Ouisiera ser hombre sabia de muehas sabidurias, 1925 lápis s/papel!peneil on paper 48,3 x 53,3 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo Dan la una dan la dos y el rico siempre pensando, 1925 lápis s/papel/peneil on paper 31,5 x 49 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo Diehoso el árbol que da frutos, 1925 lápis s/papel!peneil on paper 43x 52 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo Esboços para os vitrais de Los elementos e o afresco Salud y vida, localizados no Salón de Actas, Vestíbulo do laboratorio Central, na escadaria da Secretaría de Salubridad y Asistencia, 1929/Sketehes for the stained-glass windows foi the 'Los elementos" and the freseoe "Salud y vida ", loeated at the Salón de Aetas, in the hall of the Laboratorio Central, at the stairease of the Seeretaría de Salubridad y Asisteneia. Los elementos, 1929 a) EI fuego, 1929 lápis s/papel/ montado em aglomerado/peneil on paper mounted over plywood 71,5 x 26 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo b) EI agua, 1929 lápis s/papel montado em aglomerado/peneil on paper mounted over plywood 71,5 x 26 cm c) EI aire, 1929 lápis s/papel montado em aglomerado/peneil on paper mounted over plywood 71,5 x 26 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo Esboço para o mural Salud y vida/Sketeh for the wall painting "Salud y vida" Retrato de Guadalupe Marín, 1929 lápis s/papel!peneil on paper 108 x 56 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo
Projeto para o mural do Rockefeller Center/Projeet for the wall painting of the Roekefeller Center EI hombre en la enerueijada, 1931' óleo s/tela/oil on eanvas 128 x 212 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo Esboços para o painel número 4 do corredor norte de Palacio Nacional intitulado Cultura purépeehajSketeh for the number 4 panel of the North eorridor of the Palaeio Nacional, entitled "Cultura purépeeha ", Cidade do México Cultura purépeeha, 1942 lápis e tinta s/papel montado em aglomerado/peneil and ink on paper mounted over plywood 51,2 x 34 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo Esboço para o·retrato do general Dwight David Eisenhower, presidente dos Estados Unidos da América caracterizado como bomba de alta potência/Sketeh for the portrait of General Dwigth David Eisenhower, eharaeterized as a high-powered bomb, 1954 lápis s/papel!peneil on paper 57 x 47 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo Cuauhtemoe, 1950 lápis s/papel!peneil on paper 38 x 31 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo Historias de las religiones li, 1950 -1957 óleo s/tela/oil on eanvas 197 x 74 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo Historias de las religiones 111, 1950 -1957 óleo s/tela/oil on eanvas 198 x 74 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo Retrato de Ruth Rivera, 1949 óleo s/tela/oil on eanvas 199 x 100,5 cm Coleção Rafael Coronel Arroyo Esboço para o mural PanAmeriean UnityjSketeh for the wall painting "Pan-Ameriean Unity" Primeiro esboço geral!First generalsketeh,1940 lápis s/papel/peneil on paper Coleção Maria Teresa González Sales de Franco
Los pigmentos y su uso. Su aplicación en la escultura, 1942. Esboço para a grisalha Cultura purépecha/Project for the grisaille "Cultura purépecha" lápis e carvão s/papel/peneil and charcoal on paper 106x71 em Coleção Juan Coronel Rivera Los pigmentos y su uso. Su aplicación en los códices, pintura mural y tatuaje, 1942. Projeto para a grisalha Cultura purépecha/Project for the grisaille "Cultura purépecha" lápis e carvão s/papel/peneil and charcoal on paper 105,5 x 116 em Coleção Juan Coronel Rivera Los pigmentos y su uso. EI caracol y el tefiido, 1942. Projeto para a grisalha Cultura purépecha/Project for the grisaille "Cultura purépecha" lápis e carvão s/papel/pencil and charcoal on paper 106 x 118 em Coleção Juan Coronel Rivera EI Molino de Damme, 1909 óleo s/tela/oil on canvas 50 x 60 em Coleção Juan Pablo Gómez Rivera Paisaje,1896/1897 óleo s/tela/oil on canvas 70 x 55 em Coleção Guadalupe Rivera Marín Esboço para o mural Historia dei teatro en Mexico Los Héroes. Mareias Juárez e Hidalgo,1953 Sketch for the wall painting "Historia dei teatro en Mexico" lápis s/papel/pencil on paper 47 x 53 em Coleção Guadalupe Rivera Marín . EI Grande de Espana, 1914 óleo s/tela/oil on canvas 210 x 140 em Coleção Museo de Monterrey Cabeza de indígena,1927 óleo s/tela/oil on canvas 49,5 x 41 em Coleção Enrique Martín Moreno e senhora Los hijos de mi compadre, 1930 óleo s/Iâmina/oil on lamina 43x34cm
Coleção Banamex Desfile de! 10 de Mayo en Moscú, 1956 óleo s/tela/oil on canvas 135,2 x 108,3 em Coleção Banamex Retrato de Rosa Rolanda de Cavarrubias,1930 óleo s/tela/oil on canvas 56 x 45 em Coleção Galería Arvil Refugio de Hitler. Ruínas de la caneillería de Berlín, 1956 óleo e têmpera s/te Ia/oil and tempera on canvas 105 x 135 em Coleção Galería Arvil Esboço para o mural/Sketch for the wall painting "Historia dei Estado de Mareias, Conquista y Revoluceión" localizado no Palácio de Cortés, Cuernavaca, Morelos, México. Esboço para a seção 11 "Cruzando la Barranca", 1929 lápis s/papel/pencil on paper 42 x 48,5 em Coleção Museo Franz Mayer Paseo de los melancólicos, 1904 óleo s/tela/oil on canvas . 85x 50 em Coleção Museo Franz Mayer Naturaleza muerta, 1918 lápis s/papel/peneil on paper 32,5 x 25 em Coleção Museo Franz Mayer Las Ilusiones, 1944 óleo s/tela/oil on canvas 75 x 59 em Coleção Museo de Arte de São Paulo Esboço para o mural/Sketch for the wall painting "Sueno de una tarde dominical en la Alameda Central" Diego nino. Autoretrato, 1947-48 lápis s/papel/peneil on paper 62 x 53,3 em Coleção Museo Rafael Coronel, Zacatecas Retrato de Rosa Weimberg, 1951 óleo s/tela/oil on canvas 98x 70 em Coleção Galería Lourdes Chumacero Projeto para a grisalha Cultura purépecha/Project for the grisaille "Cultura purépecha"
Refugio de Hitler. Ruínas de la canci//ería de Berlín, 1956 óleo e têmpera s/tela/oil and tempera on canvas 105 x 135 em Coleção Galería Arvil Foto Jesús Sánehez Uribe
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CU~DO~ f~cDDY CA~~c~O
SOTO POR INTEIRO A criação é a prova da existência transcendental do ser humano. Com o aparecimento do homem, tem início uma trajetória colossal. Um processo criador que se renova a cada instante, que penetra na realidade e a modifica, que estende as fronteiras humanas aos planos de todos os universos reais e possíveis. Ohomem, com sua mente e suas descobertas, não apenas adentra o desconhecido, desvenda mistérios e segredos, revela e aproxima: também é, em grau mais elevado, um criador de novos significados. Não se trata de "decifrar", de dar significado à realidade. Pelo contrário, trata-se de "cifrar" o mundo até convertê-lo em algo claro, acessível, real enquanto fato e como entendimento. Forjamos a realidade. Humanizamos o cosmo. Orealismo não implica a perpetuação da aparência das coisas e sua conseqüente transformaçã~ e_m um . sentido final, em uma expressão acabada. A decomposlçao da figura, que começa com o impressionismo, é no enta~to.um estági~ apenas fisiologicamente mais avançado nas artes plastlcas. Oefeito procurado era buscar uma nova aparência das apa.rências, ~alvez mais verossímil, pois, em vez de tratar de reproduzir mecanicamente, servia-se dos valores cromáticos para prever seus efeitos na retina. Mais tarde, o cubismo iria procurar uma reestruturação formal através da síntese, onde as ambivalências também podiam ser ambigüidades de forma e de sentido: a multiplicidade dos escorç~s reunidos (os retratos de Picasso com os rostos de frente e de perfil, por exemplo), a forma sincrética que agrupa q~ali~ades ~ traços, as associações emotivas da colagem e as ressonanclas SUtiS das texturas foram capazes de criar um novo lirismo evasivo, quan~o paradoxalmente se pretendia criar uma grande s~ntese da realidade. Mondrian enxergou claro o problema ao buscar, Independentemente do atrativo figurativo, o fascínio puro da cor, seus dinamismos, suas relações com a forma; ao isolar o caráter da proposiçã~ d_e toda _ semelhança naturalista e apresentar, em suma, novas vlsoes que nao eram outra coisa senão outras necessidades imperativas do homem em seu confronto real com a existência. A proposta surrealista teve um valor extraordinário p~rque revel~u pela primeira vez o objeto em si, a importância da COisa, que mais tarde os artistas da pop art norte-americana transformaram em um autêntico frenesi para romper, denunciar, ludibriar o cerco da civilização de consumo, como uma imperiosa necessidade. de . respirar, quando se está sufocando, e não como uma. m~nelra de fixar sentidos. A proposta surrealista e a proposta pop cOincidem no fato de não serem alienantes, porém o surrealismo, pelo menos em sua origem nas primeiras décadas do século, con~e~u~u criar o .e~paço pensado, a reflexão mundial, o contrasenso ~lna~ICO, o labirinto do absurdo e a especulação; em suma, consegUiu criar uma nova mobilidade (é certo que intelectual) na experiência plástica.
CU~AíO~ f~fDDY CA~~fNO
ALL ABOUT SOTO Creation is the evidence of the transcendental existence of human beings. The emergence of man unleashed an unmeasurable jou:ney. A crea.ti.ve . process, which is continuously innovated pervade~ reallty and modtfles It. This creative process extends the human boundanes to ali pla~es of rea.! and possible spheres. Man, with his mind and achievemen~s, ~nvet!s mystenes and secrets, reveals and shortens distances. He also IS, m an upper levei, a creator of new meanings. We do not refer to the ability of deciphering, of imparting sense to reality but, on the contrary, to create "symbols" of re~/ity until it becomes clearer, connectable, real as far as fact and understandmg are concerned. We humanized the cosmos. Realism does not mean the perpetuation of the appearance of things and its elemen.t~1 transform.ation in a final meaning, in a definite expression. The decomposttton of th.e flg~re, which started with Impressionism, is onlya period that was physlOloglc~lly more advanced in fine arts, as the effect which was sought was to attam a newappearance of the appearances, which maybe is more likely beca use impressionism did not deal with mechanical reproduction but used color to imprint its effects on the retina. Later, Cubism wouldstrive for a formal restructuring by means of a synthesis in which ambivalence also could conveyambiguities in shape and meaning: the multiplicity of resource.s (Picasso's portraits, for example, in which you see the face of the deplcted person from across and in pro file), the syncrethic shape whi~h subsumes quality and lines, the emotive associations which emerge wlth the use of collage and the subtle resonance of textures were able to impart a new and evasive Iyricism when, paradoxically, the purpose was to create a great synthesis of meaningful reality. Mondrian was able to c1ear/y detect the problem when he started his quest for the ~ure fas~ination ?f colo: - . regardless of the figura tive attraction - thelr dynamlsm, the/~ relatlOnshlp with form; while isolating the similarity proposed by naturaftsm and presenting new approaches which were nothing but stringent needs of man in his confrontation with reality and existence. The Surrealistic collaboration was extraordinaryas it revealed, for the first time, the object in itself, the importance of the element which later the North-American Pop Art artists turned into a frenzy of breaks and . denunciations, trying to avert the overpowering civilization of consumptl?n as if this was equivalent to the need for breathing when we are suffocatmg and not as a means to make meaning surface. Both the Surrealistic and the Pop proposals are c10sely linked if we take into account that both of them do not induce awareness; but Surrealism, at least on its outset, in the first decades of this century, was able to create a thought out space, a reflection about the wor/d, a dynamic contra position, the labyrinth of the absurd and speculation; in short, it passed on a new mobility (an intellectual one) to the painter/yexperience.
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Timidamente, Delaunay e Herbin iniciam com Kandinsky, este último em um sentido mais livre, uma exploração em torno do dinamismo cromático em si, tomado como valor. Vasarely obtém o autêntico movimento plástico ótico. Tinguely, a fantasia da obra em movimento caótico, desesperadamente poético. Schoffer, a transmutação mecânica das relações formais. Calder, o deslocamento de seres inventados que parecem festejar o acontecimento natural, os movimentos dos bosques e as praias, a silenciosa perseverança do que está ocorrendo. Jesús Soto nasce em seu tempo e para seu tempo. Sente a influência cultural de uma época, responde às novas idéias, aos incentivos criadores das investigações estéticas contemporâneas. Sua resposta não está em conformidade com o único imperativo da consciência historicista.Tem uma consciência profunda da maravilhosa continuidade da arte como expressão elevada do humanismo, onde não está em questão criar o belo, glosar a natureza, segu,ir padrões em voga e fórmulas seguras de aceitação generalizada. E fácil ser um artista cinético em uma época em que o cinetismo não é um movimento dominante, que exerça grande influência sobre os grandes meios de comunicação, a publicidade, a decoração, a indústria e o comércio. Difícil é aceitar o compromisso de conduzir a investigação mais importante de uma época para então superar o que se herda, deixar novas propostas, abrir perspectivas, tornar mais ampla a contribuição genérica de uma corrente estética.
In a hesitant manner, Delaunay and Herbin, together with Kandinsky (whose intervention was freer) launched an exploration focused on chromatic dynamism itself, taken as an independent value. Vasarelyachieves the authentic optical plastic movement. Tinguely brings forward the fantasy of the artwork, in a chaotic and highly poetic movement. Schoffer operates the mechanical transmutation of formal relations. Calder displaces his invented beings which se em to celebra te natural events as the movement in forests and on beaches, with the silent persistence of that which is occurring. Jesús Soto was bom rooted in his time and for his time. He undergoes the cultural influence of his epoch; he responds to new ideas, to the creative incentives of the contemporary aesthetic investigations. However, his response does not conform with the dictates of the historical conscience. He has a deep and sensitive understanding of art as the utmost expression of humanism, where the issue is not to create beauty, to interpret nature, to follow the current pattems in a secure formula to obtain officially sanctioned approval. It is easy to be a Kinetic artist in a period when this movement is not prevailing, but still has a great influence in the media, advertisement, decora tive, industrial and trade worlds. The difficulty is to accept the commitment of undertaking the most important investigation of a period, a research which has to go beyond that which has already been attained. It has to overcome its legacy, paving the way for a new proposal, opening new perspectives, enlarging the generic contribution of an aesthetic movement. Soto is a consequence of his period but, on the other hand, when we refer to it we have to think about Soto. That is how we identify a true creator.
Soto é a conseqüência de uma época, mas ao se pensar essa época, deve-se pensar também em Soto. Assim se pode medir um criador. Assuming an era
Assumir uma época Questiona-se apenas um aspecto do vocabulário usado por Jean Clay para analisar a obra de Soto e isso se dá, provavelmente, devido à relatividade de acepções ou diversidade de enfoques. Clay fala de uma obra que ajuda a elucidar a realidade por meio de chaves perceptíveis que permitem uma nova leitura. Acrescente-se logo que este é um processo para se "decifrar" a realidade. Como já dissemos antes, acreditamos tratar-se do contrário: Soto e todos os grandes criadores têm buscado uma gigantesca elaboração da realidade, um modo de "cifrar", através do pensamento implícito em toda criação do homem, a realidade no sentido de consciência sensível do universo. Decifrar pode ser entendido como traduzir; cifrar indicaria que se estabelecem vias permanentes de aproximação que não são acessórias, mas essenciais. A arte não alude, não persegue a realidade, a arte é realidade. Arte é tornar o universo perceptível, por intermédio de uma proposição clara, universal e permanente. Soto parte de uma revogação do valor da forma como sentido plástico essencial. Começa conseqüentemente pela relação de elementos em uma composição que quer ser cada vez mais livre. No início, os elementos observam entre si uma tensão que constitui sua própria força interior; são relações seriais em que se aboliu o conceito de forma, transformado em inter-relação dinâmica, em apoio recíproco, recorrente, que desloca. Essa sensação de realidade instável, de movimento que salta aos olhos, esse enriquecimento da visão formam a base para as buscas seguintes. As tramas de finas linhas verticais em uma multiplicidade de experiências vão constituir a parte dominante da busca de Soto 128
We question only one aspect of the vocabulary used by Jean Clay to analyze the work of Soto and this is probably due to the relativity of the assertions ar to the diversity of approaches. Clay speaks about an artwork which helps to clarify reality by means of perceptible symbols which allow a new reading. We have to add immediately that it is a process fot ~'deciphering" reality. We have stated before that: we believe this movement to be in the opposite direction; Soto as ali the great creators has seeked a gigantic ellaboration of reality, a way to "cipher" it - by means of the thought which underlies ali human creation - as a sensible conscience of the universe. To decipher can be understood as the act of translating, and to symbolize would mean the establishment of permanent approaching paths which are essential - not accessory. Art does not refer, does not pursue reality as it is, reality. To create art is to make the universe emerge by means of a universal and permanent proposal. The onset of Sotos work is a refusal of form as an essential pictorial significance. Thus, his first act is to focus the relationship between the elements in a composition which strives to become even freer. In the beginning, the elements generate a tension among them which derives from their own inner force;they are serial relationships which have abolished the concept of form; this concept is replaced by a dynamic inter-relationship, bya mutual and recurrent support which has the power to displace. This feeling of an unstable reality, of mo vement, which is evident, this enriched vision constitutes the basis of the investigations which are to follow. The thread of fine verticallines pervading a multiplicity of experiences will be, for many
Doble progresión azul y negra, 1975 metal, madeira/metal, wood 250 x 300 x 200 em Coleção do artista, Paris
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durante muitos anos: são as vibrações que ocorrem diante do espectador como um acontecimento mínimo e sugestivo, alterando com freqüência a consciência dos planos e gerando uma ambigüidade entre o virtual e o real. Elementos, materiais, relevos: toda uma imensa bagagem experimental alimenta a etapa que se forma e se confunde com as vibrações e que só de um modo especulativo e circunstancial poderia ser caracterizada como arte. A experiência da desmaterialização é um trabalho que se baseia na capacidade da visão para isolar de sua ordenação real certos elementos que, por efeito de cruzamento ou interação de linhas, parecem perder consistência, desvanecer, transformar-se em entidádes imateriais. Tudo isso ocorre para o espectador que vai a museus, galerias. e exposições com a mesma motivação que vê uma paisagem, um nu, um Cézanne ou um Giotto: aco,ntece diante de um espectador que pode ou não responder à proposicão, porque pode escapar dela, participar mais ou menos, negar-se. A soma de virtual idades e realidades nesse processo forma uma unidade que pode ou não ser assumida pelo espectador, mas depende dele. Com Soto abre-se uma nova possibilidade: a de circundá-lo, criando uma obra de ambientação, isto é, uma obra que ocupa todo o espaço do recinto ou lugar ou mesmo se desdobra dentro dele. O universo dos trabalhos luminotécnicos de Le Parc, por exemplo, seus grandes círculos brancos com projeções, são uma novidade por representarem a desmaterialização por outra via, diferente, ligada à noção de sucesso, à temporal idade. No entanto, seu espírito expressivo, o que afinal de contas a obra transmite, é de tom lírico, evasivo, romântico. Soto tem em mente chegar à concepção em que a obra é tempo e não alusão temporal; em que a obra não representa um espaço, como poderia fazer Magritte ou qualquer outro pintor espacialista, mas é espaço, realidade espacial; em que a obra não se defronta com o espectador, mas é realidade conjunta. Soto chegou a essa proposição com sua exposição determinante de 1969 em Paris por múltiplas vias, outras tantas investigações artísticas de primeira importância. Se a realidade, como estabelecem as premissas teóricas da investigação de Soto, é em última instância perceptível e imaterial, podemos chegar a ela através de um caminho real, pleno, vigoroso, que não faça referência à realidade, que não a prenda à ficção da tela bidimensional e que, quando relembrada, a coloque plenamente nos espaços físicos do mundo. Esse caminho foi o apresentado nessa importante mostra de Soto, onde suas investigações de então foram trazidas a público no Musée d'Art Moderne de la Ville de Paris. Soto aparece como o mais vigoroso investigador cinético daquele momento, criador definitivo e decisivo dentro do movimento mais forte e importante da época. Esse critério nasce da constatação objetiva do trabalho de Soto nas duas noções mais essenciais de sua etapa anterior: espacialização e ambientação. A obra enquanto entidade total conjunta com o espectador concretiza-se no "penetrável" de um modo surpreendentemente pleno: era preciso ver o público heterogêneo, crianças ou velhos, adolescentes ou adultos, pessoas simples ou intelectuais, inquietos, angustiados ou regozijantes em júbil~, passeando em meio a chuva de tiras brancas de plástico que ocupavam quase todo o pátio externo do Musée d'Art Moderne de la Ville de Paris; ou talvez muito mais: nas salas, os que
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years, the dominant part of Sotos research: they cause the vibrations detected by the spectator when he looks at Sotos work as a minimal and suggestive event, often altering the awareness of the planes and generating an ambiguity between what is virtual and what is real. Elements, materiaIs, relieves, which constitute an immense experimental baggage fuels the phase which is emerging and blends with the vibrations; Only in a speculative and circumstantial manner this phase could be characterized as art. The dematerializing experience is a kind of work which is founded on the visual capability to isola te from its organization of reality certain elements which due to the linking or interaction of its lines - seem to lose consistency, becoming evanescent and immaterial. Ali this is felt by the spectator who goes to museums, galleries and exhibitions with the same drive with which he sees a landscape, a nude, a Cézanne or a Giotto; this can occur with a viewer who is able ornot, to respond to the proposition, as he can avoid it, or participa te more or less intensively or even refuse to accept it. The total amount of the virtualities and realities of this process forms a whole which can or not - depending on him - be assimilated by the spectator. With Soto, a new horizon emerges: the possibilityof circumna viga ting the artwork, thus creating an ambiance, that is to say, a work which lies ali over the place or even one which unfolds within this same space. The universe of the luminous-technical works of Le Parc, for instance, his huge white circles which jut out are a novelty as they represent dematerialization attained by a different pathway, linked to the notion of success and transitoriness. Nevertheless, Sotos expressive spirit, which is transmitted by his work, has a Iyrical, evasive and romantic connotation. The artist wishes to attain a concept in which the work is time itself and an allusion to it; in which the work does not represent space - as Magritte or any other spatial painter - but shows space itself, spatial reality; thus, the work does not face the spectator but blends with him, giving birth to a new whole. Soto was able to meet this proposal at the 1969 exhibition held in Paris; he attained this by means of multiple avenues, by different fundamental artistic investigations. If, according to Sotos theoretical premises, which result from his investigations, reality is the last perceptible and immaterial instance, we can reach it by means of a real, vigorous, path which does not refer to reality, which does not depend on the fiction of the two-dimensional canvases and that, when it recalls reality, is able to transfer it fully to the physical spaces of the world. This was the approach on which the important exhibition shown to the audience at the Museum of Modem Art in Paris was founded. Soto stands out as the most vigorous Kinetic investigator of the time, a decisive and definitive creator emerging in the midst of the most significant movement of the period. This assessment is founded on an objective view of Sotos work on two of the most important concepts of his previous work: spatialization and "ambientation". The artwork seen as a new entity that includes both the spectator and the piece of art becomes a substance in Sotos penetrable in a surprisingly vigorous way: the heterogeneous audience, both children and old people, teen-agers and adults, people who do not have a wide knowledge of art and intellectuals, anguished or exhilarated, walking through the shower of white plastic stripes which were spread ali over the courtyard of the Paris Museum of Modem Art; but that is not ali:
atravessavam as insólitas selvas geométricas feitas com linhas de finas hastes pretas que produziam uma ilusão visual quando se moviam, um vaivém de horizontes, uma retumbante imagem sonora paralela à excitação visual. Esse é Soto em plena descoberta: a obra total. O uníssono conceitual e real entre proposição estética e espectador, ligados pela mais completa liberdade, pela mais absoluta independência de um com o outro, que portanto não pode produzir nada menos que uma participação contínua e inevitável. Logo, as coisas penetráveis são a temporal idade, a espacialidade, a forma do vir-a-ser, a culminância, em certo sentido, daquela busca singular por uma tensão entre séries de elementos sobre uma simples folha de papel, iniciada duas décadas antes.
within the rooms, those who crossed the odd geometric forests made up with fine black stripes which produced a visual illusion when they moved - a pendulum movement on the horizon - resulted in a resounding image similar to that which provokes visual excitation. This was Soto in the midst of discovery: the absolute artwork. The overlapping of both conception and reality, the link between aesthetic proposal and spectator, fastened together by utmost freedQm, completely independent from one another; thiscan only lead to a continuous and unavoidable participation. Thus, the things that are to be penetrated are temporality, spatiality, the form of that which will be, the apex, in a sense, of that singular search for a tension among series of elements placed on a sheet of paper, a journey that started two decades before.
o penetrável foi possivelmente a proposição mais atraente dessa exposição, porém não a única em importância. O penetrável pressupunha a idéia de plenitude, a densidade visual disposta em uma situação espacial real; outras buscas propostas naquela época por artistas americanos e europeus partiam do mesmo princípio das investigações com estruturas primárias, mas distanciavam-se da frieza esquemática, do excessivo rigor geométrico e do anonimato de quase todas elas. Nessas experiências de sensibilização do espaço por cotação, demarcação, exposição e desdobramento, Soto manteve-se fiel a si mesmo e deu prosseguimento a suas idéias com uma formidável continuidade que foi rompida. As mais importantes dessas investigações são as duas séries de progressão, extensão e saturação, todas voltadas para novos objetivos de criação. A surpresa insólita de uma selva rigorosa, de espigas obscuras e rígidas, erva erigida do pensamento e a sensibilidade projetada sobre a superfície do piso de uma sala são, sem dúvida, um encont(o com o fantástico, um sonho surrealista vertido por uma imaginação mais precisa e não menos implacável; face dupla, fundo duplo da proposição. Quando o espectador dá voltas e percorre a extensão de puas pretas suspensas, a maldade desafiadora mistura':'se e forma a trama mutante, ondulante frente aos olhos e à mente. Essa é a verdade fisiológica. A verdade subconsciente, as associações, o encontro com o real-fantástico e o deslocamento do espectador, de uma situação em conformidade com o mundo para uma situação de questionamento, permanecem intactos. A progressão amarela é, por exemplo, a visualização de uma continuidade ascendente, o mesmo sentido da extensão referido a um elemento novo, o da evolução criativa. A saturação movida por recursos mecânicos é a reconstrução em um ambiente de uma obra dinâmica, em constante renovação, densamente iluminada, ritmada, até se converter em espetáculo-proposição, em uma verdadeira saturação visual através de múltiplas solicitações perceptíveis e abarcantes.
The penetrable was probably the most attractive proposition of this exhibition but was not the only important one. The penetrable forecast the idea of plenitude, of visual density arranged in a real spatial situation; other searches which were undertaken at the time by American and European artists departed from the same principIes of investigation of primary structures but Sotos work was unique in the sense that it refused the schematic frigidity, the excessive geometric rigor and the lack of a signature which pervaded the other proposals. In these experiences of imparting sensibility to space by means Df outlining, exhibiting and unfolding the elements, Soto was faithful to himself and developed his ideas continuously without breaches. The most important of these investigations originated the two series oa progression, extension and saturation, which were directed to new purposes. The unexpected surprise of a rigorous forest, full of rigid and obscure spikes and plants which derived from thought and sensibility, jutting forward on the ground of a roam are, no doubt, a meeting with that which is fantastic, a surrealist dream poured out by an accurate imagination which is also implacable; double face and double bottom of the proposition. When the spectator walks along the extension of two black sharp hanging points, the challenging evil blends to the mutating thread which undulates before the . eyes and mind. This is physical truth: the subconscious truth, associations, meeting with fantastic reality and the displacement af the spectator from a situation of conformity with the world to a questioning attitude. The yellow progression is, for example, the visualization of an ascending continuity, the same allusion to extension referred to a new element, a creative evolution. The saturation, achieved by means of mechanical devices, is in constant innovation and is densely lighted and rhythmic until it becomes the true visual saturation by means of multiple perceptible and encompassing suggestions.
Criar outra Com freqüência nos esquecemos, pelo fato de vivermos imersos em um universo pré-ontológico e instrumental, em uma realidade à qual estamos acomodados pela rotina e por processos estereotipados, que a verdadeira essência da realidade é profundamente humana. A separação homem e natureza é menos radical quando pensamos que a maneira de que dispomos para chegar até ela se dá através dessas
To create another one As we live in a pre-ontological and instrumental world, in a reality we are used to with its routines and stereotypes, we frequently forget that the real core of reality is deeply humano The separation promoted between man and nature is less radical when we realize that we can reach it by means of symbols which we call "representations", in a site which is half-way
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cifras que chamamos de "representação", ponto médio entre objeto e sujeito, vínculo autêntico do qual jamais podemos prescindir. Soto busca a arte como uma via de conhecimento sensível da realidade imaterial desse universo-representação, inteiramente criado pelo encontro do homem com o mundo, renovado e perpetuado a cada instante. Seria uma etapa na direção do absoluto? Será que Soto chega à metafísica de que tantas vezes tem falado com certo tom de menosprezo? E dificil ver este adepto fervoroso da tecnologia e da ciência, o artista da clareza objetiva, da nitidez absoluta de recursos e proposições, depois de tudo entrar em um domínio tão filosófico, tão inevitável. Mas por acaso é estranho que o artista, como dizia Friendland há mais de um século, lute por sua existência espiritual da mesma maneira que o organismo luta para sobreviver? A experiência estética não significa neste caso uma via sobrenatural, é ao contrário disso um caminho de enfrentamento real. Protágoras já nos indicava esse destino prodigioso: "0 homem é a medida de todas as coisas; das que são uma vez que são; das que não são uma vez que não são." Ir atrás desse destino é uma tarefa titânica e ninguém melhor do que os artistas para assumi-Ia. Isso é explicado, pelo menos por enquanto, pela coragem e grandeza de um artista como Jesús Soto. O valor de ser honesto, de ir até o fundo das coisas.
between the subject and the abject, and which is an authentic band that we cannat break from. For Sata art is a substantial pathway leading to the knawledge af the immaterial reality af this universe - a representatian which . is canstituted by the meeting between man and the warld, and is reestablished and perpetuated at every mament. Wauld this be a jaumey tawards the unknawn? Will Sata attain the metaphysics which he aften refers to with cantempt? Althaugh it is certainly difficult to think af this passianate admirer af technalagy and science - the artist af neat c/arity in his resaurces and propasals - withaut entering the realm af philasaphy, af the unavaidable. But is it sa very add, as Friendland used to say more than a centuryaga, that the artist wauld struggle an behalf af his spiritual existence in arder to survive? In this approach, the aesthetic experience does nat mean the chaice af the supematural, but rather a path to meeting reality. Protágaras has already specified this prodigiaus human destiny: "Man is the measure af ali things; af thase that exist as theyexist; af thase wha are nat as theyare nat. " The search af this destiny is a titanic task and nabady is more entitled to undertake it than artists. This is warranted, for naw, by the caurage and uniqueness af an artist such as Jesús Sata, wha, with intrinsic hanesty, gaes deep inta the battam af things. Sata taday
Soto hoje
o que nos pode indicar o porte de um criador é sua capacidade de inovar dentro do campo expressivo que lhe diz respeito. Soto é hoje um dos raros, dos muito raros artistas cinéticos que se supera continuamente em seus resultados e propostas. Em plena maturidade criativa, longe de se contentar - como tantos - em desdobrar as brilhantes possibilidades do movimento visual, Jesús Soto empreendeu uma fantástica aventura artística ao programar uma experiência vasta e bem definida para tornar presente uma realidade que é, em última instância, algo perceptível e imaterial, uma correspondência integral com todo o domínio humano da criação.
À natureza física, factual, impenetrável como coisa em si, contrapõese a visão do homem que a cifra, penetra-a e a projeta em uma nova dimensão clara e acessível; e usando a expressão de Soto, também sensível. Essa é no presente a plataforma expressiva do artista que com sua grande exposição no Musée d' Art Moderne de la Ville de Paris impôs-se como um dos mestres fundamentais da arte cinética contemporânea. Os meios culturais franceses devem tê-lo considerado dessa forma ao lhe conceder uma distinção poucas vezes outorgada a um artista vivo. O êxito, o respaldo unânime, corroboram plenamente esse critério já generalizado na Europa. O fato de a exposição de Soto ter sido o acontecimento mais importante em muito tempo é significativo, não por ser isolado, ocasional, mas sim por essa constituir precisamente uma exposição exemplar da carreira de um artista audaz, capacitado para abrir novos campos e dar maior importância a toda uma vasta corrente estética de nossa época.
We can recagnize a creatar by his ability to innavate his approaches in the expressive area in which he warks. Taday, if we take inta accaunt his results and propasals we can say that Sata is ane af thase rare Kinetic artists which is canstantly reaching new scapes. Having achieved full creative maturity, he is far from being satisfied - as manyare - in limiting himself to unfald the many passibilities apened up by visual mavement. Jesús Sata undertaak a fantastic jaumey when he prepared an encampassing defined experience in an attempt to present a reality which is, after ali, samething perceptible and immaterial, in a perfect and tharough respanse to ali human creative doma in. Physical nature, impenetrable in itself, exposes itself to the human gaze that creates cades when interpreting it, penetrates it and extends it to a new and c/ear dimensian by means af which it can be accessed; quating Sata, physical nature alsa becames "sensible". This is currently (7987) the expressive platfarm.on which the artist - with his keynate exhibitian at the Paris Museum af Modem Art - attained his status as ane af the great masters af cantemparary Kinetic art. The French cultural media must have agreed with this assessment as they granted him an award which is rarely given to living artists. The success and unanimaus suppart stress the caherence af this criterian, which is already being adapted throughaut Europe. The fact that Satas exhibitian was cansidered the mast impartant event in a lang time is significant, nat due to its accasianal, isalated aspect, but rather beca use it is the apex af a career undertaken bya singular and daring artist wha is able to define new harizans and put in relief the vast aesthetic current af aur time. To camment an this Paris exhibitian is a difficult task. Let us start by stating that it encampassed ali af Satas essence. To fallaw it is to accampany Sata with his incamparable creativity. Let us start with the process that leads Sata
Comentar essa exposição de Paris é uma tarefa muito difícil. Comecemos dizendo que ela compreendeu toda a essência de Soto . . Acompanhá-Ia é acompanhar Soto em sua portentosa invenção. Partamos do processo que leva Soto a abrir mão da forma e por fim se separar do academicismo oco e cansado, ainda que aplicado a
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Esfera virtual amaril/a, 1983 alumínio, madeira, náilon/ aluminum, wood. nylon - 0 500 cm Coleção do artista, Caracas
campos relativamente novos. Tratava-se de entender a arte como uma proposta capaz de tornar compreensível a realidade e não de imitar, refletir ou envolver formalmente temas, fossem. eles abstratos ou concretos, alusivos ou não. Soto desconstrói a forma para buscar em primeiro lugar relações, tensões e dinamismos. Esses trabalhos de duas dimensões vão se complicando até alcançarem outras duas fases capitais da trajetória de Soto: a vibração e a desmaterialização. Os elementos adquirem mobilidade visual própria graças à capacidade que a obra possui de provocar no olho associações, constrastes e movimentos; o deslocamento do espectador também provoca, em outros casos, esses processos que tendem a conduzir a essência da obra no sentido da sucessão. Se alguma coisa não for estável, tiver movimento próprio, não estará sujeita a uma forma, já não será forma pura. No entanto esses princípios brilhantes não preencheram a necessidade expressiva do grande artista: queria que o espectador não ficasse diante da obra, vendo o espaço e as relações da obra, sujeito à obra; ele queria, e conseguiu, que o espectador e a obra estivessem situados no mesmo espaço, que ambos participass~m da mesma realidade. Dessa forma explicam-se os trabalhos de ambientação e os trabalhos penetráveis. Dentro do penetrável a pessoa está em uma realidade, não se trata de uma referência em uma ficção pintada. Está localizado no centro d~ um acontecimento maravilhoso, fascinante, do qual é um participante ativo. Pode acontecer de sua reação ser variável: surpresa, desconfiança, intimidação, euforia ou divertimento. O que é evidente, inegável é que não pode escapar de estar na obra, assumindo-a de uma maneira ou de outra. A ambigüidade espacial do quadro das amazonas no bosque de Magritte, ou de muitas outras de suas telas e, está precisamente na tela, na ficção' criada por ela, isto é, está na mente. Soto converte essa ambigüidade em duração perceptível, algo que na realidade ocorre diante do espectador; ainda mais: algo que circunda, envolve o espectador de maneira inevitável. Assim, a obra cinética conforma-se ao tempo real. Também é tempo. Além disso, os valores da realidade estão presentes, ou melhor, convertidos em fato concreto, em vir a ser. Muitas idéias estão atualmente na imaginação criadora de Soto. Tantas que agora só podemos mencioná-Ias de passagem. A de plenitude, nos penetráveis, é apenas uma delas. Há também as de progressão, saturação, extensão. Idéias transformadas em fatos concretos, em expressão artística, não em mera formulação hipotética e especulativa com vários apoios teóricos. Soto hoje'é isso: um grande artista, um dos maiores do momento.
Soto no Guggenheim O Museu Guggenheim representa um duplo desafio. Sua arquitetura imponente é uma verdadeira prisão para a obra plástica que venha a alojar-se em sua já célebre espiral-muro-rampa, a essência do espaço de exposições do museu. Existe porém algo mais importante que esse marco por si só eloqüente a ponto de oprimir a maioria das coisas ali expostas: o desafio de estar em uma das vitrines mais exigentes e prestigiosas do mundo para mostrar a arte çontemporânea, o difícil momento da consagração. E preciso dizer sem rodeios: Soto venceu ambos os desafios. Sua obra conseqüente e profunda invadiu o Guggenheim com a presença
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to break away from form and overrule the void and tired academicism even when applied to new areas. His proposal is founded on the concept that art is able to understand reality and to copy it, to reflect or focus forms - either in an abstract or concrete language, whether or not allusive - is not within its purpose. Soto deconstructs form in a search for relationships, tensions and dynamism. The early two-dimensional works become increasingly more complex until reaching other two capital phases of Sotos trajectory: vibration and dematerialization. The elements acquire a visual mobility within themselves by means of the ability of the artwork to provoke associations, oppositions and movement on the retina; in different works, the spectators displacement also have the same effect; these processes tend to direct the core of the artwork to a realm of sequences. If something is unstable and has inner motion it will never attain the status of pure formo However, the brilliant principies do not fulfill the expressive needs of the great artist. He did not want the spectator to be placed across from the works, watching the space and the relationships derived from the work; he wanted the viewer to be active, a subject of art. This is what he wished, and he was successful in inscribing both the work and the spectator into the same space, sharing the same reality. This is the explanation for the ambiance and the penetrable works. Once within the penetrable, the viewer enters a reality which isnot a painted fictional reference. He is admitted into the core of a marvelous, fascinating event as an active participant. The participant can respond to it in different ways: with surprise, mistrust, uneasiness, euphoria or amusement. What is evident and cannot be denied is that he cannot evade the work and has, forcefully, to relate to it. The spatial ambiguity of the picture focusing the Amazons in the Magritte wood, or many of his other paintings, derives from the canvas, from the fiction proposed in it, that is to say, the ambiguity is in our minds. Soto turns this ambiguity - so that it becomes perceptible - into something which occurs when the spectator looks at the work. It goes even further, surrounding and unavoidably involving the viewer. Thus, the Kinetic work adheres to real time. It also becomes time itself Besides, the values of reality are present, that is to say, they become concrete facts, facts about to be. Many ideas have emerged in Sotos creative mind. Theyare so many that we can only mention them now The idea of plenitude we find in the penetrable is only one of them. There are also the plans for progression, saturation, extension. Theyare ideas which are transformed into concrete facts, in artistic expression and are not limited to mere hypothetical and speculative formulations based on theoretical supports. Today, Soto is one of the most important living artists.
Soto at the Guggenheim The Guggenheim Museum presents a double challenge. Its architecture presents a double challenge. Its imposing architecture represents a real prison to the fine arts work that is exhibited in its renowned spiral-wallslope, which is the outline of the museums exhibition hal/. However, there is something which is more important than overcoming this oppressing ambiance: the challenge to be in one of the more demanding and prestigious windows stores in the world dedicated to contemporary art. It is the difficult moment of consecration. To put it in a straightforward manner, Soto overcame both challenges. His coherent and essential work adapted to the Gugenheim with the stance otan
de um criador de porte mundial,.para quem o trabalho de quase três décadas foi um longo e produtivo caminho de contribuições, buscas e propostas revolucionárias. Soto é um pioneiro. Seus primeiros passos no campo abstrato, no início dos anos 50, apresentavam-se já com toda a luz de um investigador seguro e rigoroso. A pintura convencional estava em crise e portanto a composição, a harmonia e todos os recursos da arte acadêmica deviam ser relegados como via de expressão. Em seu lugar era preciso inventar toda uma nova perspectiva de criação, uma nova linguagem. Soto o, conseguiu, começando por admitir a necessidade de "destruir" a forma, considerando como tal a base da composição tradicional; em contraposição, Soto propõe um contexto baseado em elementos de valor similar, onde o mais interessante são as interações, o fluxo dinâmico dos valores seriais. Através de Mondrian e Malévitch conhece o enorme potencial de concreção do abstracionismo. Quer todavia ir mais além de um domínio silencioso e plano. Quer provocar um movimento interno na obra a partir do ângulo do olho do espectador; e também um movimento real, produzido pelo vento, pelo roçar ou pelo impulso humano voluntário. Tem início o caminho do cinetismo. Depois de questionar a forma com seus trabalhos seriais, Soto busca a instabilidade visual e os contrastes vibrantes de duas superfícies superpostas (uma de plexiglás transparente e a outra opaca). O espectador torna tudo aquilo dinâmico, móvel e transmutável. Logo faz com que o quadro composto em geral por tramas raiadas e relevos metálicos ou pendentes ofereça, um campo visual mais unido; mais íntimo, ligado em todas as partes. E o surgimento de uma vibração, esse efeito extraordinário que desintegra a realidade dos elementos e estabelece uma nova e fulgurante relação entre todas as partes. A obra é um lugar de fusão e transformação. Os quadros com relevo estável e que se movem através da instabilidade das linhas complementam-se com as vibrações mais livres dos pêndulos e das "escrituras". Por um momento, sua obra mostra-se algo mais gestual e os signos gráficos "escrevem-se" em espaços ambíguos. Logo Soto conquista o espaço de fora, sua obra torna-se escultural. Sensibiliza o espaço por meio de categorias de volume, extensão, progressão, ascensão e outras, o que permite criar ambientações originais e fascinantes, uma vez que são concebidas para dar ao espectador uma margem de participação exçepcional. Dentro desta última etapa, o penetrável é a obra máxima. E a maneira de viver a sensação de plenitude, de estar em condição de penetrar e percorrer um espaço repleto de objetôs pendentes, às vezes simples cordas de náilon, outras, elementos sonoros que multiplicam a presença por meio de ressonâncias incomuns. E essa é a obra que atinge o ponto máximo da visão histórica apresentada no Museu Guggenheim até 5 de janeiro de 1975. O esforço foi imenso e nele tomaram parte os amigos íntimos de Soto e algumas instituições venezuelanas conscientes do que representa uma oportunidade como essa na vida de qualquer artista contemporâneo. Uma homenagem recebida por poucos artistas vivos, e que Soto transformou em sua revelação definitiva perante o público dos Estados Unidos.
international creator, for whom the work carried out in three decades was a long and fruitful path of contributions, searches and revolutionary proposals. Soto is a pioneer. His first steps in the abstract realm, in the early 50s, already expressed ali the inspiration of a sound and rigorous investigator. Conventional painting was undeigoing a crisis of meaning, and composition, harmony and ali the resources of Academic art had to be overlooked in terms of pathways to expression. It was necessary to create a new perspective for creation, a new language. Soto was able to meet these requirements, departing from the admission of the need to "destroy" form, considering this to be the basis of the traditional composition. As opposed to conventional art, Soto proposes a context based on elements of similar value in which the most interesting aspect are the interactions, the dynamic sequence of serial values. In the works of Mondrian and Malevich he acknowledges the enormous potential of concretism and abstraction. However, he wishes to go further from the silent and plane domain. He wants to provoke a movement within the work starting from the spectators angle of vision as well as from real movement, that which is produced by wind, by touch or by a delibera te human intention. Kinetic art is on its way. Af ter questioning form with his serial works, Soto seeks visual instability and the vibrant contrasts of two overlapping surfaces (one ma de up of transparent Plexiglas while the other one is opaque). It is up to the spectator to make it dynamic, mobile and changeable. Next, his paintings composed of crisscrossing threads and metallic relieves or pendants offer a visual field which is more homogeneous, more intimate, with ali the elements linked to one another. This is when vibration emerges, this extraordinary effect which disintegrates the reality of the elements establishing a new and fulgura tive relationship among ali the parts. The artwork is the place where both fusion and transformation take place. The paintings with stable relieves which move through the unstableness of the lines are complemented with the freer vibrations of the pendulums and "writings". For one moment his work seems to be more closely linked with gesture and the graphic signs "are written" in ambiguous spaces. In little time Soto conquers outer space, his work acquires sculptural qualities. He imprints on space volume, extension, progression, ascension as well as other categories which pave the way to fascinating and original ambiance as they were conceived to allow the spectator to have an exceptional participation. Amid his works of this last phase, the penetrables are the apex. It shows a way of living, a sensation of plenitude, to be in condition of pene tra ting and walk along a space full of hanging objects which are some times, simple nylon threads, and other times sounding elements which multiply its presence by means of uncommon resonance. This is the work which is the climax of the exhibition - which followed Sotos work in an historic approach - held at the Gugenheim Museum and which could be seen by the public until January, 5th, 7975. An immense effort was spent in organizing it. Some friends of Soto and some Venezuelan institutions look part in it, aware of the important role that such a show represents in the lite of a contemporary artist. It was a celebration which few living artists were granted and which Soto transformed in a definitive consecration in terms of the American public. Roberto Guevara Transcribed from Ver todos los días, Monte Átila Editores, Caracas, 7987.
Roberto Guevara Transcrito de Ver todos los días, Monte Átila Editores, Caracas, 1981. 135
Penetrab/e, 1983 nái lon, madeira/ny/on, wood 500 x 500 x 500 cm Coleção do artista, Caracas
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Penetrab/e, 1983 náilon, madeira/ny/an, waad 500 x 500 x 500 em Coleção do artista, Caracas
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Nasceu em Ciudad Bolívar, Venezuela, em 1923. Estudou na Escuela de Bellas Artes de Caracas e de 1947 a 1950 foi diretor da Escuela de Artes Plásticas de Maracaibo. Mudou-se para Paris em 1950, cidade onde vive até hoje. Em 1970 foi inaugurado em Ciudad Bolívar o Museo de Arte Moderno Jesús Soto. Bom in Ciudad Bolívar, Venezuela, in 1923. He studied at the Escuela de Bel/as Artes de Caracas and has been the principal of the Escuela de Artes Plásticas de Maracaibo from 1947 to 1950. He moved to Paris in 1950, where he stil/ lives. In 1970 the Museo de Arte Moderno Jesús Soto was created in Ciudad Bolívar. Exposições individuais/Solo exhibítions 1949 Taller Libre de Arte, Caracas. 1956 Galerie Denise Ren, Paris. 1957 Galerie Aujourd'hui, Palais des Beaux-Arts, Bruxelas; Museo de Bellas Artes, Caracas. 1959 Galerie Iris Clert, Paris; Galleri Vallingatan, Estocolmo. 1961 Galerie Rudolf Zwirnwer, Essen, Alemanha; Galerie Brusberg, Hannover; Museo de Bellas Artes, Caracas. 1962 Galerie Ad Libitum, Antuérpia; Galerie Edouard Loeb, Paris. 1963 Museum Haus Lango, Krefeld, Alemanha. 1964 Galerie Müller, Stuttgart. 1965 Kootz Gallery, Nova Vork; Galerie Edouard Loeb, Paris; Signals, Londres. 1966 Galerie Schmela, Düsseldorf; Galleria dei Naviglio, Milão; Galleria dei Deposito, Gênova; Centro Arte Viva, Trieste, Itália; Pfalzgalerie, Kaiserslautern,
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Alemanha; Galleria dei Cavallino, Veneza; Kootz 'Gallery, Nova Vork. 1967 Galerie Denise René, Paris. 1968 Galerie Françoise Mayer, Bruxelas; Kunsthalle, Berna; Stedelijk Museum, Amsterdam; Kunstverein, Düsseldorf; Kestner Gesellschaft, Hannover; Marlborough Galleria d'Arte, Roma. 1969 Palais des Beaux-Arts, Bruxelas; Galleria Lorenzelli, Bérgamo, Itália; Galleria Notizie, Turim; Galleria dei Naviglio, Milão; Galleria Fiori, Florença; Galleria Giraldi, Livorno, Itália; Musée d'Art Moderne de la Ville de Paris, Paris; Svensk-Franska Konstgalleriet, Estocolomo; Marlborough-Gerson Gallery, Nova Vork. 1970 Galleria della Nuova Loggia, Bolonha; Kunstverein, Mannheim, Alemanha; Galerie Denise René, Paris; Galerie , Bonnier, Genebra; Galerie Godard Lefort, Montreal; Galerie Semiba Huber, Zurique; Galerie Buchholz, Munique; Ulmer Museum, Ulm, Alemanha; Kunstverein Kaiserslautern, Alemanha. 1971 Museum of Contemporary Art, Chicago; Galerie Denise René-Hans Mayer, Düsseldorf; Galleria Rotta, Milão; Martha Jackson Gallery, Nova Vork; Museo de Bellas Artes, Caracas; Ariete Grafica, Milão. 1972 Estudio Actual, Caracas; Galeri Beyeler, Basiléia; Galerie Paul i, Lausanne, Suíça; Galleria Levi, Milão; Formes et Muraux, Lyon; Museo de Arte Moderno, Bogotá; Marlborough Godard, Toronto. 1973 Estudio Dos, Valencia,
Venezuela; Universidad Central de Venezuela~ Caracas; Galería Arte Contacto, Caracas; Galleria Corsini, Roma; Galleria Goddel, Roma. 1974 Salomon Guggenheim Museum, Nova Vork; Galerie Denise René, Nova Vork. 1975 Joseph Hirshhorn Museum, Washington, D.C.; Galería Arte Contacto, Caracas. 1976 Galerie Watari, Tóquio. 1977 Galerie Bonnier, Genebra; Centre International de Création Artistiqu'e, Sénanque, França; Galería EI Parque, Valencia, Venezuela; Galería Arte Contacto, Caracas; Bibliotheque Municipale, Caen, França; Galerie Valeur, Nagóia, Japão. 1978 Louisiana Museum, Humlabaek, Dinamarca; Liljevalchs Konsthalle, Estocolmo. 1979 Helsinki Kaupungin Taidekokoelmart, Helsinque; Musée National d'Art Moderne, Centre Georges Pompidou, Paris. 1980 Sala Ipostel, Museo de Arte Contemporáneo de Caracas; Universidad Simón Bolívar, Caracas; Galleri Ferm, Malmõ, Suécia; Galerie Denise René, Paris. 1981 Galería de Arte Rolando Oliver Rugeles, Mérida, Venezuela; Museo de Arte Contemporáneo Francisco Narvaez, Porlamar, Venezuela; Galería Tempora, Bogotá; Casa de Colón, Las Palmas de Gran Cana ria, Espanha. 1982 Palacio de Velázquez, Madri; Caja de Ahorros Provincial, Alicante, Espanha; Fundació Joan Miró, Barcelona; Colegio de Arquitectos, Santa Cruz de Tenerife, Espanha; Galería Theo, Madri; Galería
Quintero, Barranquilla, Colômbia; Ateneo de Zea, Venezuela. 1983 Casa de la Cultura, La Victoria, Venezuela; Museo de Arte Contemporáneo de Caracas; Sala Ipostel, Museo de Arte Contemporáneo de Caracas, Centro de Bellas Artes, Maracaibo, Venezuela; Sala Luzan,Zaragoza,Espanha. 1984 Charles Cowles Gallery, Nova York. 1985 Galería C. Velázqu~z, Bogotá; Aschenbach Art Consulting, Düsseldorf; Center for the Fine Arts, Miami. 1986 Centro de Escultura Contemporâneal Contemporary Sculpture Center, Tóquio/Osaka; Expressions Art Gallery, Miami. 1987 Galerie Gilbert Brownstone, Paris. 1988 Elisabeth Franck Gallery, Knokke-Le-Zoute, Bélgica; Hyundai Gallery, Seul; Instituto de Cultura Puertorriquena, San Juan, Porto Rico. 1989 Galerie Hermanns, Munique. 1990 Galería Theo, Madri; Theospacio, Madri; Galerie , Sapone, Nice,França. Exposições coletivas/Group exhibitions 1943-49 Salón Anual de Arte Venezuelano, Caracas. 1951-68 Salon des Réalités Nouvelles, Paris. 1952 Exposición Internacional de Arte Abstracto, Havana; Espace, Lumiere, Galerie Susanne Michel, Paris. 1954 Salon de Mai, Paris. 1955Le Mouvement, Galerie Denise René, Paris. 1957 4ª Bienal de São Paulo. 1958 Bienal de Veneza; Exposição Internacional de Bruxelas/Brussels International Exhibition; 1º Festival de Arte de Vanguarda/1 st Avant-Garde Art
Festival, Cité Radieuse Le Corbusier, Marselha. 1959 5ª Bienal de São Paulo; Martha Jackson 'Gallery, Nova York; Galerie Arnaud, Paris. 1960 Konkrete Kunst - 50 Jahre Entwicklung, Helmbaus, Zurique. 1961 Bewogen beweging, Stedelijk Museum, Amsterdam/Moderna Museet, Estocolmo/Louisiana Museum, Humlebaek, Dinamarca; Zero, Düsseldorf. 1962 Bienal de Veneza; Nul, Stedelijk Museum, Amsterdam. 1963 7ª Bienal de São Paulo; l'Oeil de Boeuf, Galerie 7, Paris; Salon Comparaisons, Paris; Structures Vivantes, Galerie Diderot, Paris. 1964 Bienal de Veneza, Galerie Jacques Kerchache, Paris; Signals, Londres. 1965 Mouvement 2 , Galerie Denise René, Paris; Anthology of Kinetik Sculpture and Perceptual Art, Signals, Londres; Kinetic Art, AlbrightKnox Art Gallery, Buffalo, EUA; Salon Comparaisons, Paris; Nul 65, Stedelijk Museum, Amsterdam; Lumiere, Mouvement et Optique, Palais des Beaux-Arts, Bruxelas; licht und Bewegung, Kunsthalle, Berna/Baden-Baden/Düsseldorf; Art et Mouvement, Museu de Tel-Aviv. 1966 Weiss und weiss, Kunsthalle, Berna; Bienal de Veneza; Salon Comparaisons, Paris; Sigma 11, Galerie des Beaux-Ats, Bordeaux; Structure et Mouvements, Galerie Denise René, Paris. 1967 Lumiere et Mouvement, rArt Cinétique à Paris, Musée d'Art Moderne de la Ville de Paris; Structure, Lumiere et Mouvement, Galerie Denise René, Paris; Villanueva-Soto, Exposição Internacional,
Montreal; Art et Mouvement, Musée d'Art Contemporain, Montreal; International Exhibition of Contemporary Painting and Sculpture, Carnegie Institute, Pittsburgh, EUA. 1968 l'art Vivant, Fondation Maeght, Saint-Paul de Vence, França; Art Cinétique, Musée de Louviers, Le Havre/Les Sables d'Olonne, França; Cinétisme, Environnements, Spectacle, Maison de la Culture, Grenoble, França; Montréal11, Art d'Avant-Garde, Montreal; Multiples, Wallraf-Richartz Museum, Colônia; Art Cinétique et Espace, Maison de la Culture, Le Havre, França/Kunstnernes Hus, Oslo; Haus der Kunst, Muniqu~; Le Musée dans rUsine, Pavilhão de Marsan, Museu do Louvre, Paris/Palais des Beaux-Arts, Bruxelas/Stock Exchange, Berlim; Environnements, Kunsthalle, Berna; Le Silence du Mouvement, Krôller-Müller Museum Otterlo,Holanda/Musée d'Art Moderne, Bruxelas; Soto, Vasarely, Le Pare, Ritchie Hendriks Gallery, Dublim/Ulster Museum, Belfast, Irlanda do Norte/Art Gallery, Bedford, Inglaterra/Redfern Gallery, Londres. 1969 Bienal de Nuremberg; Bienal Middleheim, Antuérpia; Galleria Notize, Turim; Festival International de la Peinture, Cagnes-sur-Mer, França; Galerie Denise René-Hans Mayer Krefeld, Alemanha; Pollock Gallery, Toronto; Hannover Galerie, Hannover; Ateneum Taidemuseum, Helsinque. 1970 l'art Cinétique, Nanterre, França; Galleria Paolo Barozzi, Milão; Art 1 '70, Basiléia; Pollock Gallery, Toronto; Irving B. Harris Gallery, Chicago; Galerie Françoise Mayer,
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Bruxelas; Galerie Center, Antuérpia. 1971 Salon Comparaisons, Paris; Salon Grands et Jeunes d'Aujourd'hui, Paris; L'acier, Galerie Denise René, Paris; Multiples, the First Decade, Philadelphia Museum of Art, Filadélfia. 1972 Salon Grands et Jeunes d'Aujourd'hui, Paris; 12 Ans d'Art Contemporain, Galeries Nationales du Grand Palais, Paris; The Non-Objective World 1939-1955, Annely Juda Fine Art, Londres; Galerie Liatowitsch, Basiléia; Galleria Milano, Milão; Düsseldorf; Talbot Rice Art Centre, Universidade de Edimburgo, Escócia. 1973 Salon Grands et Jeunes d'Aujourd'hui, Paris; Le Mouvement, Biennale des Nuits de Bourgogne, Dijon, França; Grands Artistes, Grands Bijoux, Galerie Sven, Paris; Internationale Kunstmesse 3, Düsseldorf. 1974 La Galerie Denise René en Madrid, Galería Aelo, Madri; Salon Grands et Jeunes d'Aujourd'hui, Paris; 11º Festival de Arte Contemporânea!1 Jlh Contemporary Art Festiva/~ Royan, França. 1975 Salon de Mai, Paris; Art Cinétique, Castelo de Monibétiard, França; Edition GEM, Montebello, Itália; ArpMagnelli, Centre Culturel Noroit, Arras, França; Salón Framauro, Caracas; L'oeil en Ouestion, Centre Culturel Noroit, Arras, França; Ouinzaine sur I'Espagne, M.J.C., Cannes; 20 Jahre Museum Haus Lange, Krefeld, Alemanha; Bienal International de Gravura!Engraving Intemational Biennial, Museu Nacional de Arte Modern"a!National Museum of Modem Art, Tóquio. 197610 Ans -10 Affirmations,
Maison de la Culture, Amiens, França; Mouvement Peint Mouvement Agi, Abadia de Beaulieu, França; Hommage à Mondrian, Salon Comparaisons, Paris; Latin Américains, Galerie Denise René, Paris; OualitéOuantité, Galerie de Larcos, Paris; Art-Science, Centre Culturel du Chaperon Vert, Gentilly!Salon Comparaisons, Paris; An american Portrait, Transworld Art, Nova Vork. 1977 Musée International Salvador Allende, Maison de la Culture, Nanterre, França; Hommage à Mondrian, Maison des Étudiants Canadiens, Cité Universitaire, Paris; L'Artiste et I'Environnement, Unesco, Paris; Sigma, Munique. 1978 L'Oeil en Action, Centre Georges Pompidou, Paris; Journées Vénézuéliennes, Unesco, Paris; Aspects de I'Art en France; Contemporary Venezuelan Artists, Londres; L'Art dans la Ville - Art dans la Vie, Fondation Nationale des Arts Graphiques et Plastiques, Paris; América Latina, Geometria Sensível, Rio de Janeiro. 1979 20º Aniversário da Revolução Cubana!20h Anniversary of the Cuban Revolution, Unesco, Paris; 1ª Biennale Italo Latino Americana di Tecniche Grafiche, Roma; Arte Constructivo Venezolano 1945!1965, Galería Arte Nacional, Caracas; Thema Zero, Stuttgart, L'Oeil en Action, Centre Georges Pompidou, Paris. 1980 Le Défi à la Peinture 19501980, Paris; 1êre Biennale: Art et Papier, Ville du Touquet, França; Art Systématique, Caen, França. 1981 Bienal da Gravura Moderna!Biennial of the Modem Engraving, Galeria Ljubljana, Liubliana, Eslovênia; Paris-
Paris, Centre Georges Pompidou, Paris; Pesci Galeria, Budapeste; Arte Contemporânea na América Latina e no Japão/Contemprary Art in Latin America and Japan, Museu Nacional de Arte, Osaka. 1982 6ª Bienal Internacional da Gravura/6h International Engraving 8iennial, Frederikstad, Noruega; L'Amérique Latine à Paris, Grand Palais, Paris; Junge lateinamerikanische Kunst, DAAD-Galerie, Berlim; Salon Grands et Jeunes d'Aujourd'hui, Paris; Le Relief Mural en France de 1955 à nos Jours, Galerie Zabriskie, Paris; ARCO '82, Madri; Les Hommages, Musée des Beaux-Arts, Le Havre; Arteder '82, Bilbao, Espanha; Europa - America Latina, Museo di Ca' Pesaro, Veneza; 60-80 Attitudes-Concepts-Images, Stedelijk Museum, Amsterdam; 1983 Cercle-Carré-Triangle, Atelier de Recherche Esthétique, Caen, França; ARCO '83, Madri; Exposição Internacional de Gravura/lnternational Engraving Exhibit, Liubliana, Eslovênia; Arte Programmata e Cinetica 1953/1963, Milão; 1960 Musée d'Art et d'lndustrie, St.-Etienne, França;100 Artistes de I'Amérique Latine, Maison de la Culture, Amiens/Centre Culturel, Compiegne, França. 1984 Norsk Internasjonal Grafikk Biennale, Frederikstad, Noruega; Carte Blanche à Denise René, Paris Art Center, Paris; Musée des Arts Décoratifs, Paris; Ein anderes Klima, Stãdtische Kunsthalle, Düsseldorf; Salon Grands et Jeunes d'Aujourd'hui, Paris; Autour de Michel Ragon, Paris Art Center, Paris; Face à la ' Machine, Maison de I'Amérique Latine, Paris; Grafica - Maestri Contemporanei Italiani e
Stranieri, Fumagalli Galleria d'Arte Moderna, Bergamo, Itália; Art contre/against APARTHEID, Lund, Suécia/Porin, Lahden Tampere, Finlândia/ Charlottenborg, Copenhague, Dinamarca; Concierto Espacial, Galería Theo, Madri. 1985 Konstructiv Tendens, Estocolmo; Les Artistes du Monde Entier contre I'Apartheid, La Vieille Charité, Marselha; Art contre/against APARTHEID, Nieuwe Kerk, Dam, Amsterdam; Salon Grands et Jeunes d'Aujourd'hui, Paris; FIAC, Grand Palais, Paris; Art Party, Haus Bernd Peters, Langenfeld, Alemanha; Aspects of Constructivism, The Atri um Gallery, Nova Vork; Concierto Espacial, Galería Theo, Madri. 1986 Contrasts of Form: Geometric Abastract Art 19101980 from the Guggenheim Museum and the Museum of Modern Art of New Vork, Biblioteca Nacional, Madri/Museo Nacional de Bellas Artes, Buenos Aires/MASP, São Paulo/Museo de Arte Contemporáneo, Caracas; Soy Loco por Tí, América, Museu Auditório H. Stern, Rio de Janeiro; Le Cinétisme dans les Pays Latins, Galerie Renoir-Latina, Paris; 1ª Exposição Internacional de Esculturas Efêmeras/1st Ephemeral Sculptures Exhibition, Fundação Demócrito Rocha, Fortaleza; Tendências na Arte Abstrata Geométrica/Trends in Geometric Abstract Art, The Tel Aviv Museum, Tel Aviv. 1987 Art pour I'Afrique, Musée des Arts Africains et Océaniens, Paris; FIAC, Grand Palais, Paris; Dos Continentes Pintan América, Galería Carmen Waugh, Santiago, Chile; Venticinco Anos de Arte Contemporáneo Espanol, Sala
Luzán, Zaragoza, Espanha; Art Chicago, Chicago; Galerie Zero, Estocolmo. 1988 Veinte Anos, Galería Theo, Madri; Science, Art et Technologie, Galerie d'Art I'Estrade, Paris; Zero, un Movimento Europeo: Colección Lenz Schõnberg, Fundación Juan March, Madri; The Latin American Spirit: Art and Artists in the United States 1920-1970, The Bronx Museum of the Arts, Nova Vork; Salon Grands et Jeunes d'Aujourd'hui, Paris; Presencia Internacional, Galería Theo, Madri; 15 Masters of Contemporary Sculptures, Hyundai Gallery, Seul; FIAC, Grand Palais, Paris; Art LA, Los Angeles; Kõlnmesse, Colônia. 1989 Einweihungsausstellung, Stiftung für Konkrete Kunst, Reutlingen, Alemanha; Aventuras de la Óptica - Soto y Cruz-Diez, Palacio de los Condes de Gabia, Granada; Art in Latin America, Hayward Gallery, Londres/Nationalmuseum e Moderna Museet, Estocolmo/Centro de Arte Reina Sofía, Madri; Art Chicago, Chicago; Art 20, Basiléia; Formes et Couleurs, Galerie Gilbert Brownstone, Paris; ARCO '89, Madri; Konstmassan, Estocolmo; Kunstmesse, Frankfurt; Denise René Back in London, Redfern Gallery, Londres; FIAC, Grand Palais, Paris; Art Cologne, Colônia. Prêmios/Prizes 1957 Premio de Pintura Abstracta, Galería Don Hatch, Caracas. 1960 Premio Nacional de Pintura, Venezuela; Premio Virgilio Cora0, Caracas. 1963 Premio de la 2ª Bienal Reverón, Caracas; Prêmio Wolf, 7ª Bienal de São Paulo.
1965 Primer Premio dei Primer Salón Panamericano de Pintura, Cali, Colômbia. 1967 Medaglia d'Oro de116º Convegno Internazionale, Artisti, Critici e Studiosi d'Arte, Rimini, Itália. 1968 Chevalier de I'Ordre des Arts et des Lettres, França. 19693eme Prix du Festival International de la Peinture, Cagnes-sur-Mer, França. 1970 Premio Apollonio, 1ª Bienal dei Grabado Latinoamericano, San Juan, Porto Rico. 1972 Orden Andrés Bello en 1er Grado, Venezuela. 1978 Mérito ai Trabajo en 1er Grado, Venezuela; Doctor Honoris Causa de la Universidad de Oriente, Venezuela. 1979 Conseiller d'Honneur de I'Association Internationale des Arts Plastiques, Unesco, Paris. 1980 Intergraphik Preis 1980, Berlim Oriental. 1981 Prix d'Achat, 14eme Biennale d'Art Graphique, Liubliana, Eslovênia; Médaille Picasso, Unesco, Paris. 1982 Gold Medal, 6. Norsk Internasjonal Grafikk Biennale, Noruega. 1983 Prix d'Achat, 15eme Biennale Internationale de Gravure, Liubliana, Eslovênia; Orden Francisco de Miranda en 1er Grado, Venezuela. 1989 Médaille des Arts Plastiques, Académie d'Architecture, Paris. Obra apresentada/Work in exhibition Penetrável de plástico/plastic penetrable dimensões variáveis/variable dimensions
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CU~DO~ JOHN CHclM
CU~AíO~JOHN CHflM
Por cerca de 40 anos, Joan Mitchell tentou fazer suas pinceladas apaixonadas refletirem a luz de sua profunda experiência da natureza. Como seu antecessor Willem de Kooning e seu colega Cy Twombly, ela redirecionou o contínuo fluxo geral de abstração gestual tão marcante no expressionismo abstrato que dominou a cena no final da década de 40. Sua obra encapsula as profundas alegrias e atribulações do fluxo da consciência secular; e, com mais empenho que a maioria de seus antecessores imediatos, ela demonstra tanto uma profunda imersão na natureza como suas referências pictóricas. A singularidade de sua pintura assimila a translucidez planar de Matisse, a fisicidade banhada em luz personificada por Vincent van Gogh e a intensidade lírica das pinceladas lineares de Jackson Pollock.
For some forty years, Joan Mitchell has sought to make her impassioned strokes reflect the light of her deep experience of nature. Like her elder Willem de Kooning and her peer Cy Twombly, she has redirected the continuous flow of the overall gestural abstraction so marked in much of Abstract Expressionism as it came to the fore in the late 1940s. Her work encapsulates the deeply felt joys and tribulations of flux of secular consciousness; and, more willingly than most of her immediate forebears, she acknowledges both her deep immersion in nature and her painter mentors. The singularity of her painting assimilates Matisse's planar translucence, the bristling light-drenched physicality embodied by Vicent van Gogh, and the Iyric intensity of Jackson Pollock's linear skeins of paint.
Os desenhos aqui exibidos são parte de um surto contínuo de trabalho em pastel que ocorreu durante o verão e o outono de 1991. Eles têm uma simplicidade elementar, assim como uma bravura cromática e sensual, raramente associada às inclinações mais pálidas e contidas do pastel. São ao mesmo tempo vulneráveis e desafiadores. Mitchell explorou por completo a frágil e pulverulenta generosidade do pastel, o modo como furtivamente se insere e ilumina a trama superficial do papel. A sensibilidade do pastel às diversas pressões da mão foi utilizada numa surpreendente panóplia de marcas, de traços borrados em staccato a riscos amorfos e trajetórias sinuosas de uma decisão atlética. Esses pastéis possuem uma espécie de fúria aveludada. Em sua profusão cromática e gestual, essa obra tem uma prodigalidade aparente que beira a incoerência. Mas sua recusa veemente da vacuidade do plano consolida-se em fardos semânticos que conduzem à imobilidade contemplativa. O desenho é um movimento encarnado, o gesto detido e pronto a concluir-se. Mitchell hipnotiza o movimento e o espaço com sua capacidade de suspender o plano em luzes brilhantes e de implicitamente calibrar suas orgânicas configurações gestuais com a configuração geométrica do suporte. As primeiras tentativas de Piet Mondrian, ainda inspirado pela natureza, em direção à abstração, foram uma influência formativa sobre Mitchell, assim como o foi a paisagem de vacilante geometrismo de Paul Cézanne. A concisão prodigiosa destes pastéis não trata apenas de movimento, mas também de emoção contida e prestes a ser retomada. As marcas orgânicas de Mitchell e seus fortes contrastes de cores ressoam com suas profundas reações à paisagem. Ela viveu desde 1968 em Vétheuil (ao norte de Paris), onde esteve rodeada de três lados por campos suavemente ondulados, e do quarto, pelo rio Sena. É a esse cenário contido que estes pastéis remetem com
The drawings exhibited here are part of an uninterrupted burst of pastel making that took place in the summer and fali of 1991. They have an elemental directness as well as a sensuous, chromatic braveness not customarily associated with the pastel's paler and politer proc!ivities. They are at once vulnerable and defiant. Mitchell has fully exploited the fragile powdery effusiveness of pastel - the way it fugitively settles into and illuminates the nap of the paper surface. Pastel's willing responsiveness to the varying pressures of the hand has been deployed in a startling panoply of mark making, from blurred staccato tracks, to amorphous wisps, to sinuous trajectories of athletic assertiveness. These pasteIs have a kind of velvet fury. In its chromatic and gestual profusion, this work has a seeming prodigality that risks incoherence. But its breathtaking reproaches of the plane's emptiness coalesce into semantic bundles that settle into contemplative stillness. Drawing is a movement incarnate, motion arrested and about to resume. Mitchell hypnotizes movement and space with her ability to suspend the plane in shimmering light and to implicitly calibrate her organic gestural configuration to the geometric configuration of her support. Piet Mondrian 's ear/y, nature imbued strivings toward abstraction were a forma tive influence on Mitchell, as was, and still is, the slower vacillation of Paul Cézanne's geometry-informed landscape. The prodigious conciseness of these pasteIs is not just about motion but also about emotion arrested and about to resume. Mitchell's organic mark making and high-keyed colar contrasts resonate with her deep responses to landscape. She has lived, since 1968, in Vétheuil (some forty miles north of Paris), where she is surrounded on three sides by gently rolling fields and, on the fourth, by the flow of the Seine. It is to this contained landscape that
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veemência. A profusão de azuis, tão recorrente na obra de Mitchell, é polimorfa em sua referencialidade. Os azuis da água, os azuis do céu e os azuis de um mordaz confronto com a mortalidade, todos entram em jogo. Não são abstrações da natureza; são visualizações de uma reação à natureza. Organizam e transformam memórias intangíveis numa invenção óptica premente. A fragilidade do pastel torna-se uma sonora e musculosa metáfora da fragilidade do ser.
these pasteis urgently call. The profusion of blues, so recurrent in Mitchell's work, are polymorphous in their referentiality The blues of water, the blues of sky, the blues of a mordant confrontation with mortality, are ali called into play here. Theyare not abstractions of nature; theyare visualizations of responses to nature. Theyorganize and transform elusive remembrance into compelling optical invention. The fragility of pastel becomes a sonorous and muscular metaphor for the fragility of our being.
Klaus Kertess
Klaus Kertess
Reproduzido de Joan Mitchell: Pastel © 1992, Whitney Museum of American Art, Nova York
Reprinted from Joan Mitchell: Pastel © 1992, Whitney Museum of American Art, New York
Vi a primeira exposição de Joan Mitchell, na New Gallery de Nova Vork, em 1952. Eu era novo em Nova Vork e a pintura de Nova Vork era nova para mim. Não teria ido à exposição se uma amiga minha, a pintora Jane Freilicher, não me houvesse levado até lá, dizendo que era algo que devia ser visto. Lembro-me apenas de uma sensação de formas girando, como pás de ventiJador, cores vibrantes e uma energia que parecia ter outras coisas em mente além de agradar. Devo ter visto a grande tela Cross section of a bridge (Corte transversal de uma ponte), já que fazia parte da mostra. Não me lembro dela, mas, vendo-a hoje em reproduções, parece resumir o clima daqueles primeiros quadros: um desejo feroz de comunicar-se e uma igualmente desesperada recusa em facilitar essa tarefa para o emissor e o receptor de qualquer mensagem que estivesse sendo transmitida. Um corte transversal de uma ponte não ajudará ninguém a chegar a lugar algum; no máximo, analisará e dissecará a estrutura que o faria, caso estivesse subservientemente colocada sob nossos pés, em vez de voando diante de nós, como estava aquele amontoado confuso de planos justapostos e finos contornos.
I saw Joan Mitchell's first exhibition at the New Gallery in New York, in 1952. I was new to New York and the painting of New York was new to me. I would not have known enough to go to the show it a painter friend, Jane Freilicher, I believe, had not guided me there, mentioning that this was something one should see. I remember only a sensation of gyrating fan-blade shapes, chilly colors, and an energy that seemed to have other things in mind than the desire to please. I must have seen the large painting called Cross section of a bridge, since it was in the show. I don't remember it, but when I look at it now in reproduction it sums up the mood of those ear/y picures: a fierce will to communicate and an equally frantic refusal to make this task any easier for the sender and the receiver of whatever message was being transmitted. A cross-section of a bridge is not going to help anyone get from here to there; at most it will analyze and dissect the structure that would let us do so it it were placed subserviently under our feet ratherthan flung in our faces, as this confused, wildly flailing aggregate of jagged planes and wiry outline was.·
Quando conheci Joan em Paris, alguns anos depois, ela havia abandonado esse estilo inicial, planar, por um diferente, que continuaria a praticar e aperfeiçoar por toda a vida e que seu nome nos evoca hoje: formas densas e indefinidas, que poderiam ser um monte de feno ou uma camada de manchas ou qualquer coisa que pudesse sugerir essas formas, e as voluptuosas pinceladas que surpreendentemente confinam a cor à pintura, de modo que não se pode voltar a ver o pigmento extraído de um tubo s~m imaginar onde está a cor, e de onde Joan a obteve. O primeiro impulso é de simultaneamente provar, acariciar e circundar esse teatro de cor; ensaiar seus discursos e submeter-se a suas regras como um ator seguindo as indicações de cena, amando o ir e vir proposto: "Seguir o fluxo", uma força que é como uma maré inescapável quando se aceitam os termos do compromisso. E é difícil não fazê-lo, assim como era difícil não ver a própria Joan em seus próprios termos. Pois Joan era uma mulher dura, que gostava de beber, dura com os amigos e mais ainda consigo mesma. Mas sua aspereza dava vontade de abraçá-Ia, como se pensa (duas vezes) em abraçar uma roseira. A tal paixão é difícil de resistir, mesmo quando nos confronta de modo desconfortável. Um crítico francês que conhece e ama seu trabalho recentemente me perguntou qual a lembrança que eu tinha dela, e ouvi-me dizendo: "Ela tinha um jeito de nos deixar imediatamente desconcertados". Ele pareceu um pouco chocado com isso, mas eu o disse como elogio. Era, paradoxalmente, uma das coisas que me atraíam nela. Levar algumas sacudidas, naquele 144
When I got to know Joan in Paris a few years later she had already abandoned this ear/y planar style for a ditferent one that she would continue to practice and perfect throughout her lite, and which her name now evokes for us: shaggy, dense forms that might be a haystack ar a coat of burrs ar anything that might suggest these forms, and the luscious brushwork that confines colar amazingly within paint so that one can never again look at raw pigment squeezed from a tube without wondering where the colar is, and where Joan got it from. One's first urge is simultaneously to taste,caress and roll around in this theater of calor; to rehearse its speeches and submit to its rules like an actor following stage directions, loving the coming and going they propose: "Going with the flow", a force that is tidal and inescapable once one accepts the terms of the engagement. And it is as ditficult not to do so as it was ditficult not to take Joan herself on her own terms. For Joan was a tough lady, a hard drinker, hard on her friends and harder on herself Yet her thorniness made Vou want to hug her, as one thinks (twice) of embracing a rosebush: such passion is hard to resist, even when it confronts Vou in uncomfortable ways. A French critic who knows and laves her work recently asked me how I remembered her, and I found myself saying, "She had a knack for putting Vou ill at ease immediately". He seemed a little shocked by this, yet I meant it as a compliment. Paradoxically, it was one of the things that drew Vou to her. Being shaken up a little, in the context of so
Pastel, 1991 1225 x 80 em pastel s/papel/pastel on paper , Coleção Robert Mill er Gallery Foto Tom Powel
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Pastel, 1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Foto Tom Powel
Pastel, 1991 pastel s/papel! pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Foto Tom Powel
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contexto de tanta amizade calorosa, era certamente uma experiência reanimadora, da qual emergíamos com novas idéias, especialmente porque a víamos em seu ateliê, com suas novas pinturas nas paredes ou no cavalete. Joan e eu colaboramos certa vez num livro, uma edição de luxo, limitada, com serigrafias dela e poemas meus, inclusive um poema a que dei o título mitchellesco de 8/ack vio/ets (Violetas negras). Foi em 1960, época que vivi em Paris, sentindo-me desnutrido com a língua estranha que pairava ao meu redor e carente da vitalidade tonificante do cenário artístico de Nova Vork. Havia apenas alguns artistas trabalhando em Paris cuja obra dava-me a carga que eu desejava e precisava, e menos ainda com quem eu pudesse encontrar-me para discutir pintura e poesia (Joan era uma leitora apaixonada de poesia) com freqüência regular, quase semanal. O almoço em seu ateliê na feiosa rue Frémicourt era quase um caso de tab/e ouverte, preparado por sua cozinheira e confidente e compartilhado com Jean-Paul Riopelle, dois cãezinhos terrierque nos mordiam os calcanhares, e qualquer desgarrado, francês ou americano, que aparecesse. Consumíamos muito vinho e álcool, depois do que Joan começava a trabalhar com afinco e eu ia para casa dormir. Era assim minha vida num período em que me sentia mais inseguro do que de costume sobre meu próprio trabalho e que os freqüentes contatos com Joan me ajudaram a superar. Esqueci-me do poema que chamei de 8/ack vio/ets, mas lembro-me da excitação que sentia ao observar o contínuo progresso de Joan na pintura, que de alguma forma sugeriu aquele título. Pois suas pinturas geralmente constituíam uma paisagem na qual um ou mais elementos estavam ausentes ou descaracterizados, mas em que tudo se ordenava, do mesmo modo que as violetas nunca são negras, mas poderiam ser. Vendo esses grandes quadros dos anos 60, sentia-se o perfume e o sabor da terra úmida revolvida, piscava-se diante de manchas de céu em cores fantasticamente inadequadas, embora corretas na pintura; o primeiro impulso era limpar os sapatos e inspecionar os joelhos, buscando manchas de grama, cuja cor única aparece freqüentemente em suas obras daquela época. Hoje é possível, graças a uma monografia copiosamente ilustrada sobre sua obra, de Michel Waldberg, acompanhar seu progresso como pintora - algo até então difícil, já que as obras de um período poderiam assemelhar-se às de períodos anteriores, a menos que . estivéssemos realmente diante delas, quando as diferenças ficam evidentes. Seu desenvolvimento é tão difícil de avaliar quanto é difícil uma única pintura sua atrair-nos quando a olhamos: ela se aproxima e recua ao mesmo tempo, um reflexo que simultaneamente encanta e exige do olhar. É impressionante a freqüência com que ela parece atingir o ápice que poderia ser definitivo ... até que surge o próximo; e como cada novo nível é palpavelmente um estágio .mais avançado, embora de modo algum diminua os anteriores. A série de enormes e ambíguas pinturas feita em 1983 e 1984, chamada La grande vallée (O grande vale) é um exemplo claro. Elas têm uma nova monumentalidade e vastidão, e mesmo uma vacuidade assustadora: com uma paleta mais limitada que de costume, sobretudo com verdes e azuis, e zonas de tinta menos povoadas de eventos, ela criou um mundo paralelo com algo da profundidade expansiva de "seu" vale, o do Se na em Vétheuil, ou de uma sinfonia de Bruckner: a destilação de uma vasta vida.
much friendly warmth, was invariably a refreshing experience fram which one emerged with new ideas, especially since one usually saw her in her studio, with her newest paintings on the wall ar the easel. Joan and lance collaborated on a book, a luxurious limited edition of silk screens by her and poems of mine, including a poem to which I gave the Mitchell-esque tit/e Black violets. It was in 1960, a period when I was living in Paris and feeling undernourished by the foreign language that swirled araund me and missing the tonitying vitality of the art scene in New York. There were only a few artists working in Paris whose work gave me the charge I wanted and needed; and fewer still with whom I could meet and discuss painting and poetry (Joan was a passionate reader of poetry) on a regular, almost weekly basis. Lunch in her studio in the dull rue Frémicourt was almost a table ouverte affair, prepared by her cook and confidante and shared with Jean-Paul Riopelle, two ankle-nipping Skye terriers, and whatever French ar American waits happened to be passing thraugh. Much wine and alcohol would be consumed, after which Joan would begin to work in earnest and I would go home to take a nap. This was how I lived during a period when I felt more uncertain than usual about my own work, and which my frequent contacts with Joan helped me thraugh. I have forgotten the poem that I called Black violets, but I can remember my excitement watching Joan's steady advances in painting, which somehow suggested the phrase. For her paintings typically conjured up a landscape in which one armare elements were missing ar askew, but where everything hung together, just as violets are not really black but could just as well be. Looking at those large 60s paintings one tasted and smelled fresh dampness and turned earth blinked at stabs of sky and colors fantastically inapprapriate to it, though right for the painting; your first impulse was to wipe your shoes and inspect your knees for grass stain, whose unique colar turns up frequently in her works of that time. It is now possible, thanks to a copiously illustrated monograph on her work by Michel Waldberg, to follow her pragress as a painter - something that was difficult before, since works fram one period would appear to resemble those fram previous periods unless one actually had them before one, in which case the ditferences can se em enormous. Her development is a hard to seize as a single painting of hers is hard to take in when you are looking at it: it appraaches and retreats at the same time, a shimmer that simultaneously taxes and enchants one's seeing. What is remarkable is how often she seems to reach a pinnacle that seems definitive - until the next one comes along; and how each new levei is palpably a further state yet by no means diminishes those which have preceded it.. The series of immense and ambitious paintings dane in 1983 and 1984 called La grande va Ilée is one obvious example. They have a new monumentality and spaciousness , even an awe-inspiring emptiness: With a more limited palette than usual, greens and blues especial/y, and stretches of paint less peopled with events, she has created a parallel world with something of the expansive depth of "her" valley, that of the Seine at Vétheuil, ar that of a 8ruckner symphony: a distillation of vast lite.
Esta seguiu-se da surpreendente série Between (Entre): pinturas menores, cujas manchas entrelaçadas de cores preciosas parecem trazer para perto detalhes daquele infinito, como através de uma lente zoom, e ao fazê-lo oferece uma alternativa para se apreender e absorver a selva de fenômenos que chamamos de mundo por falta de termo melhor. Sombriamente luminosos, eles fazem lembrar a frase de Dylan Thomas: "como um altar à luz das corujas"; ao mesmo tempo não sugerem cantos privados subitamente iluminados, mas sobretudo regiões despercebidas da alma, realçadas para representar toda a entidade, fragmentos finalmente reconhecidos como emblemas de completude. Em seguida vêm as pinturas com títulos de tonalidades discursivas, como Then (Então), Last time (Última vez) - cujo número IV parece uma evocação especialmente forte do luto - e A few days (Alguns dias), cujo número 11 traz o subtítulo "After James Schuyler" (Após James Schuyler) e alude ao poema de mesm~ nome do poeta, que começa com: "Alguns dias/ são o que nos resta. E melhor contá-los, pois passam depressa ... " Estas alusões à mortalidade são, no entanto, brilhantes e cheias de particularidades, e conduzem ao trabalho sem dúvida magistral de seus últimos anos, em que estão presentes todos os níveis de realização vistos até então, celebrados e expandidos, em pinturas de imensa liberdade e autoridade. Todas as marcas de sua assinatura estão presentes: os riscos elétricos e pesados que parecem chuva (e surgem num quadro chamado Rain/Chuva) ou as lombadas coloridas de livros, que estranhamente resumem seu conteúdo; os estratos empilhados de cores (como em Champs/Campo), onde ricas sombras não anulam a brilhante tinta subjacente, ou então competem com outras sombras de várias intensidades; as discretas explosões de cores diferentes que sugerem buquês desordenados na série Sunflowers (Girassóis); a capacidade de criar uma forma tão acidental, mas viável, como uma pilha de folhas amontoadas (Phy/lisi, ou a grande e surpreendente tela lei (Aqui), feita em seu último ano de vida, saturada de cores melodiosas e vitais, pinceladas rápidas e zonas de cor unidas por uma cadeia sinuosa que relembra as figuras de La danse (A dança) de Matisse - não que sejam remotamente figurativas, mas sua conexão celebratória faz eco aos píncaros de alegria expressos naquele quadro.
lei, aqui, é onde está a vida, é o que é, parece estar dizendo Mitchell no final de sua vida, uma daquelas verdades que ignoramos apesar de estarem debaixo do nosso nariz, mas que, sob as circunstâncias adequadas, podem tra,nsformar-se de um mero truísmo numa realidade palpitante. E claro, não foi a primeira vez que Mitchell fez essa descoberta, mas o fato de surgir no fim lembra-nos de novo quantas vezes ela dera o melhor de si, dando depois ainda mais, sem alterar muito as regras do jogo, apenas redefinindo-as com um pou'co mais de precisão a cada vez, centenas de vezes. "Prosseguir é avançar", escreveu o poeta Kenneth Koch. Joan Mitchell parece ter vivido essa verdade literalmente, e se é trágico que hoje ela não possa mais avançar, ainda assim resta-nos uma obra cuja vontade de prosseguir permanece, ajudando-nos a "avançar" pelo caminho comum em que todos viajamos. John Ashbery
These are followed by the astonishingBetween series: smaller paintings whose tangled daubs of jewel-like colors seem to bring a detail of that infinity up c/ose, as though through a zoom lens, and in so doing offer an alternative way of getting at and absorbing the jungle of phenomena we call the world for lack of a better termo Darkly luminous, they bring to mind Dylan Thomas' phrase "atarwise by owl-light": at the same time they do not suggest priva te corners suddenly illuminated, but hitherto unnoticed regions of the soul brought forward to stand in for the whole entity, fragments finally given their due as emblems of completeness. Next come paintings whose titles have valedictory overtones, such as Then, last time (of which number IV seems an especially strong evocation of mourning) and A few days - number Ii is subtitled ''A fter James 5chuyler", and alludes to that poet's poem of the same title, which begins: "A Few Days/are ali we have. 50 count them as they passo They pass toa quickly ... " These intimations of mortality are, however, bright and full of particulars, and lead to the truly magisterial work of her last years, in which ali the leveis of achievement seen so far are captured, celebrated and expanded, in pictures of enourmous freedom and authority. Ali of her signature marks are present: the heavy, electric scribbles that are like rain (and occur in a painting called Rain) or like the colored spines of books, that strangelysummarize their contents; the stacked strata of colors (as in Champs), where rich darks fail to cancel out blazing underpainting or else compete with other darks of a ditferent intensity; the discrete explosions of ditferent colors that suggest disorder/y bouquets in the 5unf/owers series; the ability to create a form as casual but viable as a pile or raked leaves (Phyllis); or the trulyamazing large canvas Ici, done in the last year of her lite, which seethes with songful liteaffirming color, spattering brushwork, and zones of color linked in a swaying chain that reca//s the figures in Matisse's La danse - not that they are remotely figurai, but their celebratory connectedness echoes the summit of joy expressed in that painting. lei - Here!, Mitchell seems to be saying at the end of her lite, is where lite is, is what it is - one of those, truths under one 's nose that one ignores for that reason but which, in the right circumstances, can transform itself from truism into palpitating reality. Df course this is not the first time Mitchell made that . discovery, but its coming at the end reminds us again how often she has done her best and then done even better than that, without greatly altering the rules of the game, only redefining them a little more precisely each time, hundreds of times. "To go is to go farther", wrote the poet Kenneth Koch. Joan Mitchell seems to have lived that truth literally, and it it is tragic for us that she can now go no farther, we are still left with a body of work whose will to continue stays with us, helping us to "go farther" along the common way that ali of us traveI. John Ashbery
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Paste! (díptieo/ diptychl, 1991 pastel s/papel/paste! on paper 122 x 160 em Coleção Robert Miller Gallery Foto Tom Powel
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Pastel, 1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Foto Tom Powel
Nasceu em Chicago, EUA, em 1925. De 1930 a 1942, estudou na Francis W. Parker School, em Chicago. De 1942 a 1944 estudou literatura inglesa e história da arte na Smith College, em Northampton. De 1944 a 1947 estudou nQ Chicago Art Institute, tendo como professores R'obert von Neumann e louis Ritman. Entre 1947 e 1948 travou contato com as obras de Pollock e Gorky. Pensou em estudar com Hans Hofmann, mas se opôs a seu método de apagar e "corrigir" o trabalho dos alunos e não se matriculou. Mudou-se para a França em 1948. Casou-se com Barney Rosset, de quem se divorciaria em 1952. Em 1950 voltou a Nova Vork e envolveuse no cenário artístico da cidade, o Cedar Bar e o'Artists' Club. Conheceu Franz Kline, Willem de Kooning e outros pintores abstratoexpressionistas. Faz sua primeira exposição em galeria, em Saint Paul, Minnesota. Em 1951, foi convidada a participar da famosa exposição Ninth Street, organizada pelo Artist's Club e supervisionada por leo Castelli. Estudou história da arte na Columbia University e francês na New Vork University. Em 1952, ano de sua primeira exposição individual, conheceu o poeta Frank O'Hara, cuja obra e amizade a influenciariam. Fixou-se em Paris em 1959. Recebeu o título de doutora honoris causa da Miami University, Ohio, em 1971, e do School of Art Institute, Chicago, em 1987. Em 1989, recebeu o Grande Prêmio Nacional de Pintura, na França, e em 1991 o Grande Prêmio de Arte (pintura) da Cidade de Paris. Em 1992, foi tema de um documentário de uma hora de duração, Joan
Mitchell, portrait of an abstract painter, de Marion Cajori, e publicou Poems, um portfólio de litografias que ilustram poemas de Nathan Kernan. Morreu em Paris, em 30 de outubro de 1992. 152
Joan Mitchel/, bom in 7925 in Chicago, Us.A., studied at the Francis W Parker School in Chicago from 7930 to 7942. From7 942 to 7944 she studied English Literature and Art History at the Smith Col/ege in Northampton. From 7944 to 7947 she attended the Chicago Art Ins titu te, where Robert von Neumann and Louis Ritman were acting as teachers. It was in 79477948 that she got in touch with Pol/ock's and Gorky's works. Although she considered the possibility of studying with Hans Hofmann, she gave up the idea as she opposed his method of erasing and "correcting" students' works. Moving to France in 7948, she merried Bamey Rosset, whom she divorced four years later. In 7950, Joan Mitchel/ went back to New York and got actively envolved with the city artistic scenario , the Cedar Bar and the Artist's Club, having the opportunity to meet Franz Kline, Wil/em de Kooning and other abstract-expressionist painters. Her first exhibition was held in this same year at a gal/ery in Saint Paul, Minnesota, and in 7957 she was invited to participate in the famous show Ninth Street, under the auspice of the Artist's Club and the supervision of Leo Castel/i. She studied Art History at the Columbia University and French at the New York University. In 7952, year in which her first solo exhibition took place, she met poet Frank O'Hara, whose work and friendship would influence her in the future. In 7977, she was granted with the honoris causa title by the Miami University, Ohio and, once again, by the School of Art Institute of Chicago in 7987. In 7989, she was granted with the Grand National Award of Painting in France and with the Grand Award of Arts (painting) of Paris in 7997. In the fol/owing year, her lite was the subject Df a one-hour documentary entitled: Joan Mitchell, portrait of an abstract painter, by Marion Cajon~ and published the piece Poems, which consisted Df a lithography portfolio il/ustrating poems by Nathan Keman. In Paris, she died on October 3D, 7992.
Exposições individuais/Solo
exhibitions 1950 Joan Mitchell, Saint Paul Gallery, SI. Paul, Minnesota 1952 Joan Mitchell, New Gallery, Nova Vork. 1953 Joan Mitchell, Stable Gallery, Nova Vork. 1954 Joan Mitchell, Stable Gallery, Nova Vork 1955 Joan Mitchell, Stable Gallery, Nova Vork. 1957 Joan Mitchell, Stable Gallery, Nova Vork. 1958 Joan Mitchell, Stable Gallery, Nova Vork. 1960 Joan Mitchell, Galerie Neufville, Paris; Joan Mitchell, Galleria dell'Ariete, Milão. 1961 Joan Mitchell, Stable Gallery, Nova Vork; Joan Mitchell, B.C. Holland Gallery, Chicago, lIIinois; Joan Mitchell, Dwan Gallery, Los Angeles; Joan Mitchell Paintings 19511961, Southern lIIinois University, Carbondale, lIIinois. 1962 Paintings by Joan Mitchell, lhe New Gallery, Hayden Library, Massachusetts Institute of lechnology, Cambridge; Joan Mitchell, Galerie Jacques Dubourg, Paris; Joan Mitchell, Galerie Lawrence, Paris; Joan Mitchell, Galerie Klipstein und Kornfeld, Berna, Suíça. 1965 Joan Mitchell, Stable Gallery, Nova Vork. 1967 Joan Mitchell, Galerie Jean Fournier, Paris. 1968 Joan Mitchell, Recent Paintings, Martha Jackson Gallery, Nova Vork. 1969 Joan Mitchell, Galerie Jean Fournier, Paris. 1971 Blue Series, Martha Jackson Gallery, Nova Vork; Joan Mitchell, Galerie Jean Fournier, Paris. 1972 Joan Mitchell: My Five Vears in the Country, Everson Museum of Art, Syracuse, Nova Vork/ Martha Jackson Gallery, Nova Vork. 1974 Joan Mitchell, Ruth F. Schaffner Gallery, Santa Barbara, Califórnia; Joan Mitchell, lhe Arts Club of Chicago, lIIinois; Joan Mitchell,
Whitney Museum of American Art, Nova Vork. 1976 Joan Mitchell, New Paintings 1976, Xavier Fourcade, Inc. Nova Vork; Joan Mitchell, Galerie Jean Fournier, Paris. 1977 Joan Mitchell, New Paintings 1977, Xavier Fourcade, Inc. Nova Vork. 1978 Joan Mitchell, New Paintings and Pasteis, Ruth F. Schaffner Gallery, Los Angeles; Joan Mitchell, Webb and Parsons Gallery, Bedford Village, Nova Vork; Joan Mitchell, Galerie Jean Fournier, Paris. 1979 Joan Mitchell, Paule Anglim Gallery, San Francisco. 1980 Joan Mitchell: lhe Fifties, Importants Paintings, Xavier Fourcade, Inc. Nova Vork; Joan Mitchell: Major Paintings, Richard Hines Gallery, Seattle, Washington; Joan Mitchell, Galerie Jean Fournier, Paris. 1981 Joan Mitchell, Gloria Luria Gallery, Bay Harbor, Flórida; Joan Mitchell: New Paintings, Xavier Fourcade, Inc. Nova Vork; Joan Mitchell: New Paintings, Janie C. Lee Gallery, Houston, lexas. 1982 Joan Mitchell, Choix de Peintures, 1970-1982, Musée d'Art Moderne de la Ville de Paris. 1983 Joan Mitchell, New Paintings, Xavier Fourcade, Inc., Nova Vork. 1984 Joan Mitchell, La Grande Vallée, Galerie Jean Fournier, Paris; Joan Mitchell, La Grande Vallée et Autres Peintures, FIAC, Galerie Jean Fournier, Paris. 1985 Joan Mitchell, lhe Sixties, Xavier Fourcade, Inc., Nova Vork. 1986 Joan Mitchell, New Paintings, Xavier Fourcade, Inc., Nova Vork; Joan Mitchell, an Exhibition of Paintings and Works on Paper, Keny & Johnson Gallery, Columbus, Ohio. 1987 Joan Mitchell: River, Lille, Chord, Galerie Jean Fournier, Paris. 1988-1989 Joan Mitchell,
Pastel,1991 pastel s/pape l/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Foto Tom Powel
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Selected Paintings Spanning Thirty Vears, Manny Silverman Gallery, Los Angeles; The Paintings of Joan Mitchell:-The Thirty-Six Vearsof Natural Expressionism, Herbert F. Johnson Museum of Art, Cornell University, Ithaca, Nova Vork, exposição itinerante/travelling exhibition: Corcoran Gallery of Art, Washington, D.C.! San Francisco Museum of Modern Art/ Albright-Knox Art Gallery, Buffalo, Nova Vork/ La Jolla Museum of Contemporary Art, La Jolla, Califórnia. 1989 Joan Mitchell, Recent Paintings, Robert Miller Gallery, Nova Vork; Joan Mitchell, Paintings and Drawings, Barbara Mathes Gallery, Nova Vork 1990 Joan Mitchell, Champs, Galerie Jean Fournier, Paris; Joan Mitchell, -Paintings and Drawings, Barbara Mathes Gallery, Nova Vork. 1991 Joan Mitchell, Recent Paintirigs, Robert Miller Gallery, Nova Vork. 1992 Joan Mitchell, Pasteis, Whitney Museum of American Art; Joan Mitchell, Recent Lithographs, Susan Sheehan Gallery, Nova Vork/ Tyler Graphics Ltd.; Joan Mitchell, Galerie Jean Fournier, Paris. Exposições coletivas/Group
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Museum of Art, San Francisco/ Walker Art Center, Minneapolis, Minnesota/ City Art Museum of Saint Loius, Missouri; The Museum and Its Friends: 20th Century American Art from Collection of the Friends of the Whitney Museum, Whitney Museum of American Art, Nova Vork; Fifteen American Artists, Festival dei Due Mondi, Spoleto, Itália. 195926th Biennial Exhibition of Contemporary American Painting, Corcoran Gallery of Art, Washington, D.C.; Documenta 2: Kunstnach 1945, Internationale Ausstellung, Museum Fridericianum, Kassel, R.F.A.; 5a Bienal do Museu de Arte Moderna de São Paulo, Museu de Arte Moderna de São Paulo, São Paulo, Brasil; Annual Exhibition of Contemporary Painting, Whitney Museum of American Art, Nova Vork; New Vork and Paris: Painting in the Fifties, Museum of Fine Arts, Houston, Texas; School of New Vork: Some Vounger Artists, Stable Gallery, Nova Vork, exposição itinerante organizada pela /trave//ing exhibition organized by American Federation of Arts: John Herron Art Museum, Indianápolis, Indiana/ Southern lIIinois University, Carbondale, lIIinois/ Andrew Dickson White Museum of Art, Cornell University, Ithaca, Nova Vork/ Holiday Art Center, Watch HiII , Rhode Island/ Atlanta Public Library, Atlanta, Georgia/ Wells College, Aurora, Nova Vork; New Vork and Paris: Painting in the Fifties, Museum of Fine Arts, Houston, Texas. 1960 Contemporary American Painting, the Colombus Gallery of Fine Arts, Columbus, Ohio; Business Buys American Art: Third Loan Exhibition by the Friends of the Whitney Museum of American Art, Whitney Museum of American Art, Nova Vork; Sixty American Painters, 1960: Abstract Expressionist Painting of the Fifties, Walkers
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Arts Center, Minneapolis, Minnesota; Neue Malerei: Form, Struktur, Bedeutung, Stãdtische Galerie in Lenbachpalais, Munique, Alemanha. 1961 Pittsburgh International Exhibition of Contemporary Painting and Sculpture, Museum of Art, Carnegie Institute, Pittsburgh, Pensilvânia; American Abstract Expressionists and Imagists, the Solomon R. Guggenheim Museum, Nova Vork; Annual Exhibition of Contemporary American Painting, Whitney Museum of American Art, Nova Vork; Group Show, Binghamton
Museum, Nova Vork; Group Show, Dayton Art Institute, Dayton, Ohio; Group Show, Museum of Art, University of Michigan, Ann Harbor, Michigan; Group Show, Vale University Art Gallery, New Haven, Connecticut. 1962 65th Annual Exhibition: Some Directions in Contemporary American Painting and Sculpture, Art Institute of Chicago, lIIinois; New Acquisitions, The Museum of Modern Art, Nova Vork; Forty Artists Under Forty, from the Collection of the Whitney Museum of American Art,
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Whitney Museum of American Art, Nova Vork, exposição itinerante!travelling exhibition: Munson-Williams-Proctor Institute, Utica! Rochester Memorial Art Gallery, Rochester! Robertson Memorial Center, Binghampton! Albany Institute of History and Art, Albany! Everson Museum of Art, Syracuse! Andrew Dickson White Museum of Art, Cornell University, Ithaca! AllbrightKnox Art Gallery, Buffalo; Art Since 1950: American and International, Seattle World's Fair. 1963 Three Voung Americans,
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Sem título/ untitled (díptieo/ diptychl, 1992 oleo s/tela/oi/ on canvas 280 x 360 em Co leção Robert Miller Gallery Foto Tom Powel
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Paste!, 1991 pastel s/ papel! pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Mi ll er Gallery Foto Tom Powel
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itineranteltrave//íng exhíbítíon: Vale University Gallery, New Haven, Connecticut/ Santa Barbara Museum of Art, Santa Barbara, Califórnial Virginia Museum of Fine Art, Richmond, Virginial Nelson-Atkins Museum of Art, Kansas City, Missouri; Group Exhibition, Bette Stoller Gallery, Nova Vork; Paintings, Xavier Fourcade, Inc., Nova Vork; Selections from the
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Pastel, 1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Co leção Robert Mi ll er Gallery Foto Tom Powel
Museum of Modern Art, Nova Vork; Four Centuries of Women's Arts (seleção do/selection ofthe National Museum of Women in the Arts, Washington), The Bunkamura Museum of Art, Shibuya, Tóquio, exposição itinerante/trave//ing exhibition: The Museum of Modern Art, Kamakura, Kanagawa/ Sapporo Tokyo, Hokkaido/ Tenjin Iwataya, Fukuoka/ Daimaru Museum, Umeda, Osaka/ Nagano Tóquio, Nagano/ Hiroshima Museum of Art, Hiroshima/ Matuszakaya Museum, Nagoya; Group Exhibition, Manny Silverrrian Gallery, Los Angeles. 1991166th Annual Exhibition, National Aeademy of Design, Nova Vork; Drawing Conelusions, Guidarte New Vork, Nova Vork; Biennial Exhibition, Whitney Museum of Ameriean Art, Nova Vork; Masterworks of Contemporary Seulpture, Painting and Drawings 1930-1990s, Bellas Artes, Santa Fé, Novo México; Important Works on Paper, Meredith Long and Company, Houston, Texas; Painting: Drawings and Gestures, Galerie Lelong, Nova Vork; Women Artists, Miramar Gallery Sarasota, Flórida; Too Freneh, Contemporary Freneh Art, (organizada em conjunto por/jointly presented by Cartier Foundation), Hong Kong Museum of Art, Kowloon. 1991-1992 Landseape of Ameriean: The Hudson River Sehool to Abstraet Expressionism, Nassau County Museum of Art, Nova Vork; Painting, Galerie Lelong, Nova Vork. Obras Apresentadas / Works in the exhibition Pastel, (díptieo/diptych), 1991 pastel s/papel/pastel on paper122 x 160 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel, 1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel, 1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel,1991 pastel s/papel/pastel on paper
122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Galler Pastel, 1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel, 1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel, 1991 pastel s/papel!pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel,1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel, 1991 pastel s/papel!pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel,1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel, 1991 pastel s/papel!pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel,1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel, 1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel,1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel,1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel, 1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel,1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Pastel, 1991 pastel s/papel/pastel on paper 122,5 x 80 em Coleção Robert Miller Gallery Sem título/untitled (díptieo/diptych),1992 oleo s/tela/oil on canvas 280 x 360 em Coleção Robert Miller Gallery
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CU~DO~ ~Al~ICK f~lflGH
CU~AíO~ fAí~ICK r~AWGH
A COR NO REDONDO E ENTÃO ... A obra de John Chamberlain, 1954-1985
COLOR IN THE ROUND AND THEN SOME. .. John Chamberlains Work, 1954-1985
Durante quase trinta anos, John Chamberlain avaliou, comprimiu, dissolveu e abraçou os detritos do consumismo americano para criar, de modo informal e vigoroso, esculturas provocativas, de beleza visualmente brilhante, além de formalmente inteligentes. Empregando materiais bastante comuns, ele reinventou a fundição e a modelagem, libertando-as de restrições expressivas, técnicas e estéticas. Afastando-se tanto do cerceamento cubista-construtivista quanto do simbolismo surrealista, que ameaçaram enredar a escultura na década de 50, Chamberlain encontrou um meio de acrescentar a dimensão do volume à espontaneidade e à clareza processual tão vitais para os pintores expressionistas abstratos. Valendo-se do acaso e da intuição, transgrediu prodigamente a proibição do uso da cor na escultura, empregando matizes que variavam do esmaecido ao vívido como protagonistas principais da estrutura escultural.
For some thirty years, John Chamberlain has cajoled, crushed, melted, and embraced the detritus of American consumerism to create, casual/yand forceful/y, sculptures whose provocative beauty is as visual/y brilliant as it is formal/y intelligent. Employing means as ordinaryas his materiaIs, he has reinvented casting and modeling and liberated them from expressive, technical, and aesthetic restraints. Moving out of both the CubistConstructivist gridlock and the Surrealist symbolism that together threatened to trap so much sculpture of the 1950s, Chamberlain found a way to add the dimension of volume to the urgent spontaneity and procedural clarity so crucial to the Abstract Expressionist Painters. Engaging chance and intuition, he transgressed lavishly the prohibition of color in sculpture, employing hues that ranged from the virginal to the lurid as major protagonists of sculptural structure.
O excesso visual de Chamberlain une-se à sua reticência verbal: ele tem pouca inclinação para o dogmatismo. O programático é estranho a seu modo de ser; ele percorre as conjunções da flutuação e da invenção. À semelhança de Robert Rauschenberg e Jasper Johns, Chamberlain praticamente não tem formação artística institucional. Regularidade e organização estão ausentes de sua personalidade e de seu trabalho; ele matriculou-se na School of the Art Institute of Chicago em 1951 e saiu no ano seguinte para tentar a Universidade de lIIinois, onde ficou apenas seis semanas. Se a escola não pôde aliviar a pronunciada inadequação de Chamberlain, as aulas de história da arte e o esplêndido acervo do Art Institute descortinaram-lhe opções.
Chamberlains visual excess is matched by his verbal reticence; he has little desire to dogmatize. The programmatic is foreign to his being; the conjunctions of drift and invention are his way. Like his peers Robert Rauschenberg and Jasper Johns, Chamberlain has had almost no institutional art training. Regularity and regimentation are alien to his personalityand work; he enrol/ed in the School of the Art Institute of Chicago in 1951 and left the next year to try the University of lIIinois-that lasted six weeks.
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Bacchanag/ia rega/ia. 1991 aço cromado e pintado/painted and chromium p/ated stee/ 238 x 167 x 100 cm vista/view 1 Coleção Pace Wildenstein Foto Peter Foe
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Bronzes chineses, Paul Cézanne, Georges Seurat e Alberto Giacometti, todos ocuparam um ,lugar em sua memória; ele escreveu um ensaio sobre a escultura na India que o influenciou definitivamente. A escultura de David Smith e as pinturas de Franz Kline e Willemde Kooning, no entanto, foram as que mais visceralmente envolveram Chamberlain. Elas apresentavam tanto frescor, diversidade, força e abertura, que o fizeram desejá-Ias para si mesmo. Com sua profunda percepção das possibilidades de configuração dos movimentos rotineiros das mãos, pareceria natural que Chamberlain elegesse a escultura como vocação, mas foi a pintura que lhe forneceu inspiração. A imensidão errante de Excavation (1950), principal pintura da fase inicial de De Kooning, e a clareza e força das pinceladas de Kline seriam de certa forma integradas de forma tridimensional em seu trabalho. A escultura de Smith acelerou o potencial. Em meados da década de 50, quando Chamberlain começou a definir suas ambições, a escultura situava-se muito atrás da pintura em relação ao radicalismo modernista. No final dos anos 40, a pintura havia conquistado um espaço na imagética abstrata, não-narrativa e não-composicional, cuja homogeneidade fundiu a planicidade da pintura e a fisicalidade da tinta numa unidade que transformou o ato de fazer no próprio tema dos quadros. Este salto visual confundiu os escultores dessa geração. A espontaneidade e a incorporação de processos casuais, tão típicos de Jackson Pollock, De Kooning e Kline, pareciam incompatíveis com os métodos relativamente lentos e de difícil manipulação dos materiais escultóricos. Escultores contemporâneos de De Kooning e Pollock, como Herbert Ferber, David Hare, Seymour Lipton e Smith, continuavam a amalgamar o desenho-no-espaço do cubismoconstrutivismo com o antropomorfismo atavista do surrealismo. Muitos desses artistas atingiram uma expansão de escala e uma exploração mais enfática dos materiais e técnicas industriais introduzidos na escultura por Pablo Picasso e Julio González, assim como pelos construtivistas, nas primeiras décadas do século 20. (Metais não-forjados e não-preciosos, assim como o uso da solda, ainda eram desconhecidos na história da arte dos anos 20 - para não mencionar materiais como o plástico.) Ferber estendeu a imagética surrealista ao desenho espacial monu-mítico. Frederick Kiesler transformou a gaiola espacial de Giacometti Opalácio às 4 da manhã (1932-33) em configurações ambientais que levavam o espectador a um confinamento cósmico. As formas biomecânicas de Lipton começavam a chamar atenção para os processos escultóricos de recortes e soldaduras. Enquanto os escultores lutavam pela beleza crua e simples, eram freqüentemente compelidos a composições premeditadas e superfícies rústicas mais adequadas aos artefatos escavados de grutas pré-históricas do que a tótens da contemporaneidade. Foram Alexander Calder e Smith os mais consistentes realizadores de esculturas no cenário americano. Uma estada em Paris (1926-33) e o encorajamento de Marcel Duchamp e Joan Miró catalisaram a primeira síntese marcante que Calder fe~ do biomórfico e do mecânico: ele recortou os planos bidimensionais do construtivismo em formas derivadas de Miró e Jean Arp. Suspendeu, equilibrou e dispersou essas formas no que poderiam ser as mesmas brisas que animavam os cataventos da arte folclórica americana. Os móbiles surgiram no início da década de 30 e logo foram acompanhados de estábiles (1937), cuja estrutura simples, recortada e aparafusada, mesclava a imagética primai do surrealismo com técnicas de construção industrial. 162
If school did líttle to relieve Chamberlain's aggravated placelessness, arthistory classes and the impressive holdings of the Art Institute opened his eyes to his options. Chinese bronzes, Paul Cézanne, Georges Seurat and Alberto Giacometti ali took their places in his memory; he wrote a paper on thesculpture of India, which made a lasting impression on him. The sculpture of David Smith and the paintings of Franz Kline and Willem de Kooning, however, were what engaged Chamberlain most viscerally. They had a newness, an abstract otherness, openness, and strength that he found he wanted to achieve for himself With his preference for the physical and his acute awareness of the configuraI possibilities of the routine movements of the hands, sculpture would seem to have been the natural winner in Chamberlain's vote for a vocation, but painting, nonetheless, provided the inspiration. The rambling vastness of de Kooning's major early painting Excavation (1950) and the procedural clarity and force of Kline's surging swathes of paint would somehow have to be integrated into a threedimensional formo Smith's sculpture propelled the potential. In the mid-1950s, when Chamberlain began to objectífy his ambitions, sculpture lagged far behind painting in terms of the sense of radicalism so crucial to modernismo In the late 1940s painting had achieved a breakthrough to an abstract, nonnarrative and noncompositional imagery, whose overall homogeneity galvanized the flatness of the picture plane and the physicality of paint into a unity that turned the making of the painting into the subject of the painting. This leap of vision eluded the sculptors of the same generation. The spontaneity and incorporation of chance procedures so vital to Jackson Pollock, de Kooning, and Kline, seemed incompatible with the relatively slow, cumbersome, and delibera te methods necessary to the manipulation of sculptural materiaIs. Sculptors contemporary with de Kooning and Pollock, such as Herbert Ferber, David Hare, Seymour Lípton, and Smith, continued to amalgama te Cubist-Constructivist drawing-in-space with the atavistic anthropomorphism of Surrealism. Many of these sculptors did achieve an expansion of scale and a more emphatic exploítation of the industrial materiaIs and techniques first introduced to sculpture by Pablo Picasso and Julio González, as well as by the Constructivists, in the early decades of the twentieth century. (Uncast and nonprecious metaIs and welding were still new to art history in the 1920s - to say nothing of materiaIs like plastic.) Ferber extended Surrealist imagery into monu-mythic spatial drawing; Frederick Kiesler transformed Giacometti's space cage The palace at four AM (1932-33) into environmental configurations that engulfed the viewer in cosmic confinement," Lípton's biomechanical forms began to call more attention to the sculptural procedures of cutting and welding . While sculptors strove for raw beauty and directness, toa often they were constrained by premeditated composítions and fussy surfaces more suitable to the barnacled artifacts of some prehistoric grotto than to totems of contemporaneity. It was Alexander Calder and Smith who proved to be the most consistently successful fabricators of sculpture in the American grain. A stay in Paris (1926-33) and the encouragement of Marcel Duchamp and Joan Mirá catalyzed Calder's early and cogent synthesis of the biomorphic and the mechanical,' he cut the flat planes of Constructivism into shapes derived from Mirá and Jean Arp. He suspended, balanced, and dispersed these shapes in what might be the same breezes that waft through American folk-art weather vanes and whirligigs. The mobiles, started in the early 1930s, were soon (1937) joined by stabiles, whose simple cut and bolted structure merged the primaI imagery of Surrealism wíth industrial construction techniques.
o sucesso da modernidade de Calder foi relativamente isolado, enquanto as conquistas de Smith, mais que de qualquer outro, foram responsáveis por tornar a construção com solda a base da escultura americana dos anos 40 até o início dos 60. Na década de 30 e início dos anos 40, ele rapidamente assimilou o modernismo europeu, sendo fortemente influenciado tanto pelas construções abertas e lineares de Picasso e González como pela escultura surrealista de Giacometti dos anos 30. O início da carreira de Smith marcou a maioria de suas esculturas com uma intensa frontalidade pictórica. Ele havia começado a soldar nos anos 20, e fez sua primeira peça em aço soldado em 1933. Como tantos outros escultores, fabricou bandos de formas esqueléticas, míticas, freqüentemente em forma de pássaros, mas com uma simplicidade que dava a seu desenho-noespaço uma velocidade marcante, uma claridade de configuração e uma escala imponente não alcançadas por seus colegas. No final da década de 40, Smith começou a abandonar a expressividade apocalíptica em favor de um formalismo mais frio; enquanto retinha uma figuração residual, sua obra tornava-se bem mais abstrata. Em 1951, iniciou uma série de cerca de vinte esculturas que incorporavam ferramentas abandonadas (a série Agrícola), que trouxe nova monumental idade e unidade à colagem cubista, além de uma insistência crua e poética no vernacular. Em Agrícola IX(1952), utilizou sua antiga concepção da linha de horizonte sobre uma base e acrescentou-lhe uma série de hastes que lembram utensílios mecânicos que se estendem da linha horizontal como galhos despidos no inverno. Aqui a arte de Chamberlain encontrou seus princípios. Encorajado por seu amigo Joseph Gotto a experimentar a soldadura, Chamberlain começou a assimilar a simplicidade linear e monumental da obra de Smith do início dos anos 50. Suas primeiras esculturas de sucesso, terminadas em 1954, inspiravam-se fortemente no vocabulário das Agrícolas de Smith. Calliope (1954) incorporava partes mecânicas, mais especificamente automotivas, diferentes das ferramentas agrícolas de Smith. A escultura também se irradiava num pictorialismo vertical e frontal, mas estava livre de qualquer resíduo narrativo, paisagístico ou figurativo. Calliope era vertical, erguendo-se da base numa configuração bípede, mas pendendo para um lado numa longa horizontal multisseccionada e fraturada, que se curvava sobre si mesma. Tiras lineares de metal cortado e soldado, reagindo e trabalhando contra um plano pictórico implícito, eram os componentes da obra de Chamberlain até 1957 (por exemplo, Interíors, de 1955, com sua estrutura que lembra aparelhos de ginástica achatados). Essas obras eram menos totêmicas e tinham um aspecto menos composto que as de Smith; tendiam a esparramarse, bamboleantes, e celebravam decisivamente o lixo urbano. O trabalho de Smith, mesmo sua magnífica série posterior em aço inoxidável, Cubí, era mais compatível com o ambiente rural. Se as primeiras obras de Chamberlain não atingiram completamente a clareza de Smith, sua composição casual, sua confiança e sua inclinação a fechar-se em formas redondas, começavam a tatear o território que ele logo reclamaria como seu.
The success of Calder's modernity is relatively isolated, whereas Smith's achievement has had far more wide-ranging repercussions. Smith, more than anyone else, is responsible for making welded construction the center of American sculpture from the forties through the early sixties. In the thirties and early forties he rapidly assimilated European Modernism, and was strongly influenced by the open, linear constructions of Picasso and González, as wel/ as by Giacometti's Surrealist sculpture of the thirties. His beginnings as a painter marked most of his sculpture with a strong pictorial frontality. He had already started welding in the twenties, and made his first welded-steel piece in 7933. Like so many other sculptors, Smith fabricated flocks of skeletal, mythic, frequently birdlike presences, but with an elegant economy and directness that gave his drawing-in-space a stately velocity, a resilient clarity of configuration, and an imposing scale unsurpassed by his peers. By the late forties, Smith began to relinquish apocalyptic expressiveness in favor of a cooler formalism; while retaining residual figuration, his work became far more abstract. In 7957 he began a series of some twenty sculptures incorporating discarded farming tools (the Agricola series) that brought a new monumentality and unity to Cubist cal/age, as wel/ as a raw but poetic insistence on the vernacular. In Agricola IX (7952), he perched his longfavored device of a horizon line on a base and welded to it a series of wrenchlike mechanical rods that reach out from the horizontallike branches in winter's bareness. Here Chamberlain's art finds its beginnings. Encouraged by his friend Joseph Gotto to try his hand at welding, Chamberlain began to assimila te Smith's linear, monumental matter-offactness of the early fifties. His first successful sculptures were completed in 7954, and drew heavily on the vocabulary of Smith's Agricolas, Calliope (1954) incorporates mechanical parts but they are more specifical/yautomotive ar mechanical than Smith's agricultural tools: a wrench similar in configuration to the rods of Agricola IX is joined by a jumper cable with its al/igator plug. The sculpture radiates out into a linear, frontal pictorialism similar to Smith's but purged of any residual narra tive, landscape, ar figura tive al/usions. Calliope is staunchly vertical, rising from its base in a bipedal configuration, but it cantilevers out to one side in a long, multisectioned, fractured horizontal that curves back in on itself Linear bands of cut and welded metal, responding to and working against an implied pictorial plane, are the components of Chamberlain's work until and through most of 7957 (e.g., Interiors of 7955, with its fattened jungle-gymlike structure). These works are less totemic and composed-Iooking than Smith's; they tend to ramble and shamble, and they revel in a decidedly urban scruffiness. Smith's works, even his later, magnificent stainless-steel Cubi series, are more compatible with a rural environment. If Chamberlain's early works do not ful/y achieve Smith's scale and clarity, their casual composition and confidence, as wel/ as their inclination to rol/ into roundness, begin to stake out the territory that he very soon claimed completely for his own. Toa ambitious to remain a mere appendage of Smith, Chamberlain stil/ needed other nourishment and stimulation to give ful/er definition to his early growth. He decided to risk further study and in 7955 left Chicago for one of the remotest but most vital outposts of the avant-garde Black Mountain Col/ege in North Carolina. Rigorous and radical thought was the norm at Black Mountain, as was the freedom to tinker and drift so crucial to many a
Ambicioso demais para permanecer como mera extensão de Smith, Chamberlain ainda necessitava de alimento e estímulo para dar uma definição mais ampla a seu trabalho. Decidiu estudar mais, e em 1955 deixou Chicago para um dos mais remotos porém vitais redutos da vanguarda, Black Mountain College, na Carolina do Norte. Ali, o
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pensamento rigoroso e radical era a norma, assim como a liberdade de divagar, fundamental para o ato criativo. Chamberlain chegou numa época em que poetas e escritores eram a força dominante na escola; Josef Albers não mais ensinava pintura ali, e Rauschenberg e John Cage já haviam partido para desafiar os olhos e ouvidos de Nova Vork. Foi nos ensinamentos do poeta Charles Olson que Chamberlain encontrou o catalisador definitivo para sua escultura; e no poeta Robert Creeley, um colega vital e um amigo para toda a vida. Os versos de Olson, como a pintura de Pollock, perseguiam uma vitalidade absoluta. Em seus textos críticos, ele propunha a "composição por campos" e enfatizava a "obediência do [ouvido do] poeta às sílabas". O paradigma era "a estrutura derivada das circunstâncias de sua feitura". Olson buscava uma poesia aberta, uma "descarga energética" alimentada por verbos ativos, tempos espontaneamente distorcidos, associações casuais, simplicidade e retidão - uma espécie de pragmatismo americano energizado, a partir de Ezra Pound e William Carlos William. Seu verso tornava verbal o que Chamberlain desejava converter em visual. Encorajado pela ênfase de Olson nos processos diretos, e totalmente aberto à sua antipatia pela interferência no conceitual, Chamberlain começou a realizar desenhos caligráficos espontâneos e colagens de palavras sem sentido - enfatizando mais a junção e a disjunção de sons do que a associação freudiana de palavras. A poética da estrutura tornava-se sensata. O jogo de palavras desenhado e escrito de Chamberlain era tão significativo quanto as esculturas influenciadas por Smith, que ele continuou a construir em Black Mountain. A palavra "colagem" pressagiava os non sequiturs melódicos que ele freqüentemente utiliza como título de suas esculturas, criando paralelos verbais de suas imagens. Em 1957, como teria feito qualquer outro artista ambicioso da época, Chamberlain mudou-se para Nova Vork. Começava então a sentir-se cada vez mais confinado pela bidimensionalidade de Smith, e passou a buscar formas mais redondas. Canos metálicos mais grossos e peças planas eram amassados e agrupados em configurações com a intenção de compor volumes; em Cord (1957), o metal dobrava-se como tecido. A linearidade ainda prevalecia, mas já não era capaz de satisfazer sua fome de volume. Tampouco as composições de chapa de metal recortadas podiam preencher seu desejo de espontaneidade e clareza visual. Como ir adiante evitando as caprichosas obrigatoriedades da composição convencional? Ao visitar larry Rivers em Southampton, Chamberlain viu-se sem materiais. Buscando algo com que trabalhar, descobriu o receptáculo perfeito para seus desejos - um velho Ford. Arrancou do carro os pára-lamas dianteiros, amassou-os um pouco e os encaixou num abraço enrolado com fitas de aço. Considerando que o abraço não estava totalmente consumado, ele passou com o carro uma ou duas vezes sobre a peça e chamou-a de Shortstop (1957). Nesta obra, pela primeira vez dobras, vincos e planos arredondados inchavam-se e envolviam volumes que substituíam a linearidade frontal dos vetores de tempo reunidos no espaço. Mantendo literal e figurativamente os traços de sua feitura, o amassamento claramente visível, a configuração recusava-se a surgir numa forma discreta. Shortstop dobrava-se sobre si mesma num fluxo constante de força e . formação.
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creative act. Chamberlain arrived at a time when poets and writers were the school's dominant force; Josef Albers no longer taught painting there and Rauschenberg and John Cage had already left to provoke the eyes and ears of New York. But in the poet Charles Olson's teaching, Chamberlain found the final catalyst for his sculpture; and in the poet Robert Creeley he found a vital ·peer and friend for lite. Olson's verse, like Pol/ock's paint, strove for an overal/ vitality. In his criticai writings, he propounded "composition by field", and stressed the "obedience of [the poet's] ear to the syl/ables. " "Structure derived from the circumstances of its making" was paramount. Olson sought an open poetry, an "energy discharge" fueled by active verbs, spontaneously twisted tenses, chance associations, simplicity, and directness-a kind of energized American pragmatism grown from Ezra Pound and Wil/iam Carlos Wil/iams. His verse makes verbal what Chamberlain wished to make visual. Encouraged by Olson's emphasis on direct procedures, and ful/y sympathetic to his antipathy to the interference of the conceptual, Chamberlain began to make spontaneously cal/igraphic pen-and-ink drawings and abbreviated word-col/ages of nonsense-emphasizing the junction and disjunction of sounds more than Freudian word association. The poetics of structure were becoming sensate. Chamberlain's drawn and written word-play is at least as signiticant as the Smith-influenced sculptures he continued to construct at Black Mountain. The word cal/ages presage the melodious non sequiturs that he often stil/ uses in the titles of his sculptures to create verbal paraI/eis to his images. In 1957, as almost any ambitious artist of the time would have dane, Chamberlain moved to New York. He now began to feel increasingly confined by Smith's flatness, and started to strive for more roundness. Thicker metal rods and flat bands were loosely urged to bunch and crunch into configurations with a will to volume; in Cord (1957), he made the metal droop like folds of drapery. Stil/, linearity prevailed, and linearity could not ful/y satisfy his new hunger for volume. Nor could compositions of cut planes of metal fultil/ his desire for spontaneity and the visual clarity of procedures. How to proceed while avoiding the toilsome vagaries of conventional composition? While visiting Larry Rivers in Southampton at this time, Chamberlain found himself without materiais. Looking around for something to work with, he discovered the perfect container for his wil/-an old Ford. He stripped the car of its front fenders, crushed them a bit and fitted them into an embrace wrapped with stringy steel. Finding the embrace not ful/y consummated, he drove over the piece once ar twice and cal/ed it Shortstop (1957). In this work, for the first time, folds, wrinkles, and rounded planes envelop and swel/ into volumes that replace the frontallinearity of welded vectors of time in space. Literal/y and figuratively retaining the tracks of its making, a readilyapparent crushedness, the configuration refuses to resolve in a discrete shape. Shortstop folds in on itself in a constant flow of force and forming.
Savoy Koi, 1991 aço pintado/ painted stee/ 138 x 152 x 121 em vista/view 1 Coleção Paee Wildenstein Foto Peter Foe
Savoy Koi, 1991 açopintado/painted stee/138 x 152 x 121 em vista/ view 2 Coleção Paee Wildenstein Foto Peter Foe
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Muito mais que um mero dobramento numa montagem, Shortstop e as obras seguintes reinventaram completamente a modelagem, a fundição e o volume - alterando a idéia de ready-made de Marcel Duchamp e usando o automóvel como meio e como utensílio. Nelas, Chamberlain incorporou a espontaneidade eufórica, a destruição e o acaso, corporificando o princípio emergente do modernismo de que o tema da arte era sua própria feitura. Estas mesmas estratégias introduziram então nova vida ao volume, que o modernismo havia esvaziado, e reviveram as técnicas de modelagem e fundição que o modernismo declarara obsoletas. Na primeira década deste século, Elie Nadelman e Constantin Brancusi, que simplificaram radicalmente o volume, a forma e a figura, assim como Henri Matisse distorceu largamente a modelagem, haviam dado novas esperanças aos meios escultóricos, então relativamente decadentes. Mais ou menos na mesma época, Picasso havia sumariamente desmontado e comprimido essas técnicas numa bidimensionalidade plana e fragmentada. Em sua Natureza-morta com armação de cadeira, de 1912, ele havia incorporado um pedaço de corda verdadeira como moldura e oleado estampado para simular a estrutura da cadeira do título, reclamando para a pintura parte da tridimensionalidade da escultura, e perturbando profundamente a idéia tradicional de pintura (assim como a própria habilidade da mão em breve se tornaria virtualmente supérflua pelas linhas de produção). Sua Guitarra construída em papelão, também de 1912, estendeu o meio tipicamente modernista da colagem a uma tridimensionalidade maior e redefiniu completamente a escultura como fora praticada desde a pré-história. A partir do cubismo e do construtivismo, o caráter central e unificado da escultura foi cada vez mais dissolvido em construções abertas, lineares e planas. Nos Estados Unidos, a predominância retrógrada do entalhe direto e o tradicional respeito pela forma e o volume mantiveram-se até a década de 40, quando Smith e os soldadores passaram a dominar.
o renascimento do volume na escultura, desenvolvido por Chamberlain, contém ecos do modernismo inicial, mas também algumas inovações radicais. Sua obra não compõe e encerra formas discretas, como as obras anteriores de Nadelman e Gaston Lachaise. Os volumes de Chamberlain florescem em formas redondas flutuantes, amassadas, dentadas e amorfas. Ele despreza a composição pré-organizada em favor da união ou encaixe aleatório de componentes criados individualmente. Os volumes de cada escultura são desconexos em energia, mas não em superfície. Bordas rasgadas, buracos abertos e a indisfarçada independência das diversas partes amontoadas colocam as superfícies em contínuo movimento. Essas junções frenéticas dão pela primeira vez volume escultural à espontaneidade gestual do expressionismo abstrato, e fornecem um claro resumo das investigações, manipulações, retenções e recomeços do artista, enquanto busca o volume. No entanto, os materiais e processos de Chamberlain são empregados conscientemente para reduzir a intensidade do calor do expressionismo abstrato. Ofervor orgânico da redondeza comprimida e compressora de suas esculturas é superado pela frieza mecânica do aço e da modelagem e fundição parcialmente prefabricadas. Como Jasper Johns e Rauschenberg, Chamberlain imobiliza o existencialismo mítico do final da década de 40 e início da de 50 com colagens de construção vernacular.
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Far more than just another new wrinkle on assemblage, Shortstop and subsequent works completely reinvented modeling, casting, and volumealtering MareeI Duchamp's notion of the ready-made, and using the car as both medium and tool. In them, Chamberlain incorporated euphoric spontaneity, destruction, and chance and gave body to modernism's developing belief that the subject of art be its own making. These very strategies were then ma de to breathe new lite into the volume modernism had deflated, and to revive the techniques of modeling and casting modernism had declared obsolete. In the first decade of this century, Elie Nadelman and Constantin Brancusi's radical simplitications of volume, form, and carving, as wel/ as Henri Matisse's boldly distorted modeling, had aI/ given new hope to the then relatively moribund means of sculpture; at around the same time, Picasso had summarily col/apsed and compressed these techniques into planar, fragmented flatness. In his Stilllife with chair caning of 1912, he had incorporated a piece of real rope as a frame and printed oilcloth to simula te the chair-caning of the title, thus c1aiming some of sculpture's threedimensionality for painting and profoundly disturbing traditional notions of painting (just as the facility of the hand itself was soon to be rendered virtual/y superfluous by assembly-line production). His constructed cardboard Guitar, also of 1912, extended the uniquely modernist medium of col/age into greater three-dimensionality and completely redefined sculpture as it had been practiced since prehistory. From Cubism and Constructivism on, sculpture's central, unified core was increasingly dissolved into open, planar, linear constructs. In America, the retrograde dominance of direct carving and traditionalist respect for form and volume held on until the forties, when Smith and the welders took over. Chamberlain's revival of volume in sculpture contains echoes of early modernism, but also some radical innovations. His works do not compose and enclose discrete forms as did the prior works of Nadelman and Gaston Lachaise. Chamberlaln's volumes blossom in fluctuating, bruised, dented, and amorphous roundness. He eschews preorganized composition in favor of the casual or randomly compatible fit and juncture of individual/y created components. The volumes of each sculpture are seamless in energy but not in surface. Ragged edges, open gaps, and the undisguised independence of the clustered, separa te parts throw the surfaces into continuous movement. These frenetic junctions and junctures for the first time give sculptural volume to the gestural spontaneity of Abstract Expressionism and pro vide a clear index of the artist's investigations, manipulations, stops, and starts as he strives for volume. However, Chamberlain's materiaIs and procedures are consciously employed to lower the intensity of Abstract Expressionist heat. The organic fervor of his sculptures' crushed and crushing roundness is offset by the mechanical coolness of the steel and the partial/y prefabricated modeling and casting. Like Jasper Johns and Rauschenberg, Chamberlain immobilizes the mythic existentialism of the late forties and early fitties with vernacular constructs of col/age.
Chamberlain não apenas revive o volume, mas o ativa e banha em camadas de várias cores. A cor também é ready-made: ele simplesmente se beneficia da cor existente em cada fragmento de carro que utiliza. Dessa forma, sua exploração pictórica varia d~ ferrugem grosseira às nuances mais selvagens do delírio detroitiano, com uma gama intermediária de pastéis atenuados com branco, tão apreciado pelos fabricantes de automóveis e também (por acaso) por De Kooning. As partes de cada escultura são escolhidas por sua redondeza e cor. Como as peças já são pintadas antes de serem montadas, e não depois de completada a configuração, ele despreza as características limitadoras, compostas e decorativas que a cor geralmente confere à escultura. A cor é automaticamente integrada à escultura para dar uma clara evidência da -interação de cada parte com as outras. A cor mapeia e define os estágios, fases e procedimentos da formação da escultura - à maneira como Johnsemprega feixes de pinceladas coloridas em pinturas como False stal1(1959) e Map (1961). O laqueado brilhante do esmalte de automóvel reforça as delgadas membranas das superfícies de aço e facilita o deslizamento do olhar sobre e ao redor delas. Por fim, mas não menos importante, deve ser reconhecido o puro prazer ótico da policromia; uma das maiores forças de Chamberlain é sua capacidade de reunir prazer e inteligência. A cor aplicada esteve de modo geral ausente da escultura ocidental desde o Renascimento, e foi programaticamente proibida pela máxima modernista de fidelidade aos materiais. No trabalho de Chamberlain, o uso de materiais e cores pré-fabricados segue as regras do modernismo mas, ao mesmo tempo, o liberta das restrições monocromáticas, permitindo uma variedade visual mais ampla. Shol1stop e outras obras feitas de aço ainda prestam homenagem às primeiras obras do modernismo, enquanto torcem a bidimensionalidade plana dominante e se valem fortemente dos tons ricos da ferrugem e da corrosão. Em 1959, o trabalho de Chamberlain havia adquirido a plena volumosidade eo complexo cromatismo que lhe foram únicos até 1967, e voltaram a ser usados novamente de 1974 até hoje. Johnny Bird(1959) ergue-se numa configuração de predominância vertical, com bordas e recortes definidos. A angularidade protuberante das peças planas retorcidas conduzem a obra a uma crueza confrontadora, que se reforça pela opacidade corroída e queimada de algumas cores - vermelho raspado e . queimado, cinza desbotado e manchado, branco-sujo e azul-marinho sem brilho. Os volumes compactados de H.A.W.K. (1959) mesclam-se mais à vontade, num casamento suave e redondo de cor e forma: um "Z" fraturado e irregular, metade azul-escuro brilhante, metade amarelo-ácido, é encabeçado por uma bolha de verde-menta brilhante. As duas esculturas dão pouca atenção à imagem de pássaro de seus títulos. Como muitas obras de Chamberlain dessa época, elas são montadas em configurações que lembram torsos. Mas as constantes mudanças e rupturas do contorno evitam a resolução de qualquer gestalt antropomórfica, ou simplesmente de qualquer gestalt. Há mais redondeza superficial do que seria necessária para encerrar um volume numa forma acabada: o metal rodeia e estrutura um espaço e um volume em constante mudança. A leitura concreta da forma se frustra, embora tomemos consciência de ambíguas referências sexuais nos abraços, acoplamentos e penetrações que ocorrem entre os componentes. As inúmeras junções, fissuras, rachaduras e protuberâncias fálicas muitas vezes beiram o orgiástico, mas a orgia é puramente abstrata. A dureza do aço, às vezes ameaçadoramente aguçada, repele o toque e detém a excitação.
Chamberlain has not only revived volume but activated and swathed it in coats of many colors. The color, too, is mostly ready-made: he simply takes advantage of the existing color of each individual car fragment he uses. His palette thus ranges from ragged rust to the wilder shades of Detroit delirium, with a middle range of the pasteis softened with white so favored both by car manufacturers and (as it happens) by de Kooning. The individual parts of each sculpture are chosen for their roundness and color. Because the parts are already colored before theyare assembled, rather than painted after the configuration is completed, he side steps the constricted, composed, decora tive quality that color often lends to sculpture. Color is automatically integrated into the structure to give clear visual evidence of each part's interaction with the others. Color maps and defines the stages, phases, and procedures of forming a sculpture-very much the way Johns's colored bunches of brushstrokes are employed in such paintings as False start (1959) and Map (1961). The shiny lacquer of car enamel punctuates the membranelike thinness of the steel surfaces and facilitates the glide of the eye over and around them. Last, but hardly least, the pure optical pleasure of polychrome must be reckoned with; one of Chamberlain's principal strengths is his ability to unite pleasure with intelligence. Applied color has been largely absent from Western sculpture since the early Renaissance and was programmatically prohibited by twentieth-century modernism's dictum of truth to materiais. Chamberlain's use af prefabricated materiais and colors at once conforms to the tenets of modernism and releases him from modernism's monochromatic restraints to indulge in greater visual variety. Shortstop and other formative steel pieces still pay token homage to early modernist works, while twisting the planar flatness that dominates them and relying heavily on the rich tones of rust and corrosion. By 1959, Chamberlain's work had acquired the full voluminousness and complex chroma that were unique to his sculpture through 1967, and have been again from 1974 to the present. Johnny Bird (1959) rises up in a predominantly vertical configuration, sharp edges and cuts and the protruding angularity of flat, twisted bands push the piece into a confrontational rawness that is reinforced by the corroded and torched opacity of some of the color-a scratchy and scorched red, faded and speckled gray, dirty white, and muted military blue. The compacted volumes ofH.A.W.K. (1959) bil/ow more willingly into a smoother, rounder marriage of color and shape, a fractured, irregular Z half dark, shiny blue, half acid yellow, is topped with a blob of glistening mint green. Both sculptures pay only the slightest attention to the bird images of their tit/es. Like much of Chamberlain's work from this time, theyare bunched and stacked into torsolike configurations. But the constant shifts and breaks in contour prevent the resolution of any anthropomorphic gestalt, or any gestalt at aI/. There is more surface roundness than is necessary to c/ose a volume in a finite form, the metal surrounds and structures a constant/y shifting space and volume. The concrete reading of form is frustrated, though we are aware of ambiguous sexual references in the mounting, plugging, and hugging that take place among the individual components. The multiple junctures, cracks, crevices, and phallic protrusions frequentlyapproach the orgiastic, but the orgy is purely abstract. The coldness and hardness of steel, often menacing in its sharpness, repel touch and arrest arousal.
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No Schmoz Ka Pop, 1991 aço inoxidável cromado e pintado/painted, chromium plated and stainless steel 177 x 173 x 80 cm Coleção Pace Wildenstein
Embora Chamberlain sempre empregue objetos de aço pintado em sua obra (um banco, placas, palha de aço, uma lancheira, utensílios de cozinha, tambores de óleo, etc.), sua assinatura é o material automotivo. E, claramente, o motivo de seu auto é erótico - o erotismo da arte. O anseio de Chamberlain por um meio simples e direto e por métodos que minimizem os obstáculos à feitura - que poderiam impedir o acesso aos atos artísticos - o volume ready-made, a modelagem, a fundição, a forma e a cor das peças de carros são certamente adequados às suas intenções. Ele já declarou que as partes de automóveis são simplesmente um material disponível, assim como o mármore o era na época de Michelangelo. Uma cultura atrelada ao consumismo e à obsolescência planejada naturalmente incorpora os próprios detritos em sua arte, como têm feito os artistas desde Picasso e Duchamp. Se Chamberlain não se inclina para o simbolismo literário das imagens biomecânicas de Duchamp e Francis Picabia, a ironia de desconstruir o ícone número 1 do consumo americano o seduz. Na década de 50, o culto ao automóvel estava no auge; carros e autopistas facilmente suplantavam a natureza no interesse popular. O carro tornara-se uma extensão do corpo e tinha papel ativo na fantasia da vida burguesa. Os carros pareciam então o desejo aerodinâmico; hoje parece a discrição aerodinâmica. Eram entusiasticamente antropomorfisados (um conversível era uma amante exótica; um cupê, a esposa). O carro era tanto o ginete de confiança quanto a brilhante armadura do cavaleiro. A incredulidade ainda freqüentemente provocada pela obra de Chamberlain deve-se pelo menos em parte à força do consumismo em nossa cultura. Se há ironia no ataque de Chamberlain ao orgulho americano, ela é poderosamente visual: a ironia de um produto acabado e transformado em um estado de energia indeterminada e abstrata - uma arte que incorpora visível e visceralmente os atos destrutivos necessários ao ato de criação. A violência inicial de um acidente automobilístico, implícita nas esculturas, dissolve-se na premência da arte de Chamberlain. Ele é de uma geração que produziu uma verdadeira avalanche vernacular. Em meados dos anos 50, inúmeros artistas pareciam ter transformado seus ateliês em ferros-velhos e oficinas de reparos. Se a maioria das esculturas feitas então retornaram merecidamente à obsolescência da qual haviam sido exumadas (sendo seus mais dignos sobreviventes as esculturas de pára-choques de Jason Seley, os totens industriais de Richard Stankiewicz, derivados de Smith, e os carros compactados de César), a pintura foi mais feliz ao extrair novos sumos do lixo e dos clichês. As pinturas combinadas de Rauschenberg, cheias de dejetos nostálgicos, e as bandeiras e alvos pintados e colados de Johns, assim como a escultura de Chamberlain, neutralizaram as preocupações do expressionismo abstrato e as estenderam ao reino da poética do banal. Chamberlain, ao contrário de Johns, de Rauschenberg e dos artistas pop, permaneceu decididamente abstrato, evitando qualquer sátira ou comentário social e político direto. Sua abstração intuitiva e casual é próxima da elegante pintura semelhante a grafites de Cy Twombly. Entre os escultores, Reuben Nakian e Mark di Suvero foram os únicos a tentar estender à terceira dimensão os processos pictóricos de Pollock, Kline e De Kooning. Nakian empregou finas camadas de gesso úmido sobre tecido montado numa armação de canos de aço ou de arame. Tudo era então fundido em bronze, criando composições ondulantes de massas curvas e orgânicas. Numa série de grandes esculturas, feita entre 1955 e 1958, ele acrescentou chapas de aço curvas e diagonais a um complexo arranjo de canos metálicos. Por mais impressionantes e imponentes que fossem essas formas de aspecto, maleável, elas ainda exprimiam a composição plana cubista-construtivista. A clareza não-compositiva escapa às
Although Chamberlain has always been willing to employ anything steel and painted in his work (a bench, signs, sand pails, a lunch box, kitchen appliances, oil drums, etc.), his signature source of materiais is automotive. And clearly the motive of his auto is erotics-the erotics of art. Given Chamberlain's desire for a simple, common medium and methods that minimize the obstacles to making that may impede access to the acts of art, the ready-made volume, modeling, casting, shape, and colar of car parts are certainly suitable for his intentions. He has offhandedly stated that car parts are simplyan available material, as marble was in Michelangelo's time. A culture geared to consumerism and planned obsolescence quite naturally incorporates its detritus in its art, as artists have dane since Picasso and Duchamp. While Chamberlain has no inclination toward the literary symbolism of Duchamp's and Francis Picabia's biomechanical images, the irony of deconstructing America 's number-one consumer icon must appeal to him. In the fifties the cult of the car was at its peak; cars and highways easily took precedence over nature in popular interest. The car had become an extension of the body and played an active role in bourgeois fantasy lite. Cars looked like aerodynamic desire then; now they look like aerodynamic discretion. They were enthusiastically anthropomorphized (a convertible was an exotic mistress; a coupe a wite). The car was both trusted steed and knight's shining armar. The incredulity that Chamberlain's work still often provokes is at least partially due to the grip consumerism has on our culture. If there is irony in Chamberlain's attack on America's pride, it is powerfully visual: the irony of a finished product turned into an in de termina te, abstract state of energy-an art that visibly and viscerally incorporates the acts of destruction necessary to the act of creation. The initial violence of a car crash implicit in the sculptures dissolves in the forcefulness of Chamberlain's art. Chamberlain is of a generation that produced a veritable avalanche of the vernacular. In the mid-fitties numberless artists seem to have moved their studios to junkyards and thritt shops. If the majority of the sculpture made then has deservedly sunk back into the obsolescence from which it was extruded (Jason Seley's bumper sculptures, Richard Stankiewicz's Smithderived, industrialized totems, and Cesar's compacted cars being among the more deserving survivors), painting was generally more successful in squeezing new juices from junk and cliché, Rauschenberg's combine paintings, filled with nostalgic debris, and Johns' s painted and collaged flags and targets, like Chamberlain's sculpture, neutralized Abstract Expressionist concerns and extended them into the realm of the poetics of the ordinary. Chamberlain, unlike Johns, Rauschenberg, and the Pop artists, remained resolutely abstract, avoiding ali direct social and political commentary and satire. His matter-of-fact, intuitive abstraction is most closely related to Cy Twombly's elegant, graffitilike painterliness. Among sculptors, the older Reuben Nakian and Chamberlain 's contemporary Mark di Suvero were the only others to attempt the extension of Pollock's, Kline's, and de Kooning's painterly procedures into the third dimensiono Strongly influenced by de Kooning, Nakian employed thin coats of wet plaster over cloth attached to an armature of steel pipes ar wire mesh. Ali was then cast in bronze to create rippling impositions of curved, organic slabs. In a series of large-scale sculptures dane between 1955 and 1958, he welded curved and diagonal steel plates anta a complex arrangement of metal pipes. As impressiveand imposing in scale as these seemingly malleable slabs are, they still adhere to Cubist-Constructivist planar compositional constructs. Chamberlain's non-compositional directness escapes the constraints of Nakian's similarly intended sculpture, as it does those of Di Suvero. Di Suvero's work of the early sixties incorporates
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restrições da escultura de Nakian, de intenções similares, assim como a de Di Suvero. Este, no início da década de 60, incorporou restos de material de construção em formações enérgicas diretamente relacionadas à pintura de largas pinceladas de Kline. O peso dos materiais e a lentidão e deliberação exigidas em sua engenharia descartam a velocidade, a espontaneidade e a clareza alcançadas por Chamberlain. Isto não pretende diminuir Di Suvero; a monumentalidade musculosa e flexível que ele passou a obter completamente no início dos anos 70 o torna, assim como Anthony Caro, o maior herdeiro do legado de Smith. Chamberlain é singular também no uso da cor. Calder já a empregara no final da década de 30 em seus móbiles e estábiles, mas limitou-se às cores primárias - vermelho, amarelo e azul -, além do preto e branco, nos móbiles, e a uma única cor para cada estábile. Sem interessar-se particularmente pela cor, Calder usou-a principalmente para aliviar o peso do metal e, com a maior economia possível, para realçar a individualidade de cada forma. Smith utilizou ocasionalmente uma policromia de origem cubista nos anos 40, e nos 50 aplicou esporadicamente uma cor a cada obra depois de terminada a junção, para aliviar o peso do material, como fizera Calder, e para conferir unidade ao pictorialismo subjacente. No final da década de 50 e início da de 60, ele experimentou novamente a policromia sobre aço, mas não foi capaz de obter o tipo de resolução que conseguira nas primeiras peças de aço inoxidável. A cor parece arbitrária e torna-se problemática quando as bordas externas de uma forma são pintadas de cor diferente da que foi usada em seu interior. Nos anos 60, Caro aplicou regularmente uma cor a cada obra, depois de terminada, não apenas para obter uma leveza antigravitacional, mas também para unir os componentes soldados que se dispersavam no espaço. Novamente, a cor era secundária e com freqüência parecia arbitrária. A breve e posterior incursão de Jules Olitski pela escultura (1968) está mais próxima das intenções de Chamberlain de espalhar cores sobre volumes brilhantes. Suas formas curvas e volumosas são revestidas de pontos de pigmento dispersos num meio transparente. A cor se revela elegantemente discreta, mas a composição das formas é demasiado impositiva para dissolver-se na luz da solução transparente e libertar o fluxo de cor. Chamberlain também havia começado dois grupos de pinturas com pigmentos suspensos numa solução transparente. Na primeira série, Embudor de 1963, um gabarito (um quadrado dividido em nove quadrados) foi colocado sobre uma peça de fórmica de 30 por 30 centímetros, que recebeu cem camadas de esmalte de automóvel quase transparente, contendo flocos de pigmentos metálicos em suspensão. Na segunda série de pinturas, de 1964, cada uma com 120 centímetros de lado, ele empregou a mesma técnica com uma configuração diferente (duas formas em "L", cada qual emoldurada de um só lado com uma faixa de metal plana e saliente). Experimentando os efeitos da luz sobre a cor, Chamberlain pretendia ver quantas camadas de verniz quase incolor seriam necessárias para fazer uma cor cristalizar e subir à superfície. A imagem derivada do gabarito flutuava em algum ponto entre o fundo de fórmica e a superfície da última camada de pintura. Essas investigações da transparência e densidade de superfícies têm uma composição menos intencional que as das esculturas de Olitski, mas faltam-lhes a fragrância e a liberdade das esculturas de Chamberlain. As intenções de Olitski se realizam melhor na pintura e as de Chamberlain, na escultura. O único escultor, no final dos anos 50, a dedicar-se tanto à cor quanto Chamberlain foi George Sugarman. Talvez incentivado pelo rápido sucesso de Chamberlain, Sugarman realizou sua primeira escultura 170
discarded construction materiais in forceful, energetic formations directly related to Kline's boldly stroked paintings. The weight of the materiais and the slowness and deliberation required for their engineering rule out the manifest speed, spontaneity, and clarity achieved by Chamberlain. This is not to belitt/e Di Suvero; the muscular, flexible monumentality he began to achieve fully in the early seventies with his I-beam constructions makes him, as much as Anthony Caro, the major heir to Smith's legacy. In his use of colar, toa, Chamberlain is singular. Calder had already employed colar in the late thirties, in his mobiles and stabiles, but he limited himself to the primaries-red, yellow, and blue-as well as black and white in his mobiles, and to a single colar for each of his stabiles. Not particularly interested in colar as such, Calder used it mainly to lighten the weight of the metal and, as economically as possible, to punctuate the individuality of each shape. Smith occasionally employed a Cubist-derived polychrome in the forties, and in the fifties sporadically applied a single colar to a work, after completion of the welding, to lighten the material as Calder had dane, and to give unity to its underlying pictorialism. In the late fifties and early sixties, he experimented again with polychrome on steel, but was not able to achieve the kind of resolution he had attained in his earlier stainless-steel pieces. The colar seems arbitrary and becomes fussy when the outside edges of a shape are painted a different colar from its interior. In the sixties Caro regularlyapplied a single colar to each work, after completion, not only to achieve antigravitational lightness but also to link together welded components that were widely dispersed in space. Again, colar itself was secondaryand frequently seemed arbitrary. Jules Olitski's later (1968), brief foray into sculpture is c/oser to Chamberlain's intentions of spreading colors over glossy volumes. His ground-hugging, volumetric curved forms are coated with speckles of pigment suspended and dispersed in transparent medium. The colar is politely lavish, but the composition of the forms is toa imposing to dissolve sufficiently in the light of the transparent solution and free the flow ofthe colar. Chamberlain had also started two groups of paintings that suspend pigment in a c/ear solution. In the first Embudo series, of 1963, a found template (a square divided into nine squares) was laid on a twelve-by-twelve-inch piece of formica, which was then coated with as many as one hundred layers of almost clear auto lacquer holding metal-flake pigment in suspension. In the second series of paintings, of 1964, each forty-eight inches square, he employed the same technique with a different configuration (two L shapes, each framed on one side with a flat, protruding metal band). Experimenting with the effects of light on colar and its fugitive nontactility, Chamberlain wanted to see how many layers of near-colorless glaze were necessary to make a colar congeal and rise to the surface. The template-derived image floated somewhere between the bottom surface of the formica and the top of the last layer of paint. These investigations of surface transparencyand densityare less compositionally contrived than Olitski's sculpture; still, they lack the full fragrance and exhilaration of Chamberlain's sculpture. As Olitski's intentions are better realized in painting, so Chamberlain's are better realized in sculpture. The only sculptor in the late fifties as intent upon colar as Chamberlain was George Sugarman. Perhaps emboldened by Chamberlain 's slightly earlier success with colar, Sugarman made his first polychrome sculpture in 1959 after having made a series of engagingly awkward cubistic sculptures in wood. Rambling elements crawl across the floor ar sprout up in a discontinuous vertical to form a variegated, abstract composition out of forms
Rhyme af passian, 1991 aço inoxidável cromado e pintado/painted. stain/ess and chramium p/ated stee/ 250 x 130 x 127 cm vista/view 1 Coleção Pace Wildenstein
Rhyme af passian, 1991 aço inoxidáve l cromado e pintado/painted, stain/ess and chromium p/ated stee/ 250 x 130 x 127 cm vista/ view 2 Coleção Pace Wildenstein
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policrômica em 1959, depois de uma série de estranhas esculturas cubistas em madeira. Elementos bizarros rastejam pelo chão ou brotam numa vertical descontínua para formar uma composição abstrata variada, sem referência às formas naturais. Cada forma é banhada em tintas de tom vivo e opaco, tomadas de uma policromia semelhante à de Stuart Davis. A cor de Sugarman penetra na madeira e é opaca, portanto enfatiza a massa e a forma do material que se estende pelo espaço. Chamberlain, por sua vez, buscou um fluxo mais imaterial. A firmeza e a unidade-na-variedade alcançadas por Sugarman na cor e na forma oferecem maior tensão e agressão que as de Smith ou Caro; mas, como estes, ele manteve as estratégias compositivas conservadoras já rejeitadas pela pintura. Somente Chamberlain, nos anos 50, conquistou um radicalismo nãocompositivo na escultura, que pôde incorporar a cor de maneira bem-sucedida. Chamberlain continuou a fazer volumosas acumulações de aço pintado até 1966, ganhando maior confiança em seu uso da escala e da complexidade visual. Em 1960, fez sua primeira peça para parede, Essex. Paradoxalmente, a invasão do lugar da pintura livrou sua escultura do respeito pictórico residual pelo plano, ainda evidente em algumas de suas primeiras esculturas com peças de carros. Essex brota e incha como a armadura rugosa de um monstro de ficção científica (Rodan encontra Rodin), rugindo e sibilando com o humor feroz da ruptura e feitura. O tamanho avantajado dessa peça (cerca de 2,80 metros de altura) permite um maior sentido visual de velocidade e uma multiplicidade estonteante de formas coloridas redondas e distendidas, curvas, rachaduras, pregas e vincos. Uma atração mútua de bordas e volumes evita a queda no caos; a precária inclinação para a esquerda mal se sustenta pelos dois apoios verticais. Mr. Press(1961) é mais composta em sua monumental idade, feita de menos seções, e maiores, que se deslocam e torcem em direção a um retângulo oscilante. A protuberância inalante é ancorada por uma diagonal multisseccionada de brancos que ocasionalmente secretam um azul pálido e brilhante e pingam numa cascata de amarelo-alaranjado. lâminas retangulares vermelhas, largas e irregulares, projetam-se de dentro até o topo e a base. Como em tantas obras de Chamberlain, essa monumentalidade cromática parece ter ocorrido por acaso. Como as novas peças para parede, a obra completamente tridimensional ganhou uma presença abundante. Os apêndices e bases de mesa que haviam sustentado esculturas anteriores foram eliminados; as obras assumem suas próprias instâncias e poses freqüentemente precárias. O crescente controle da escala agora permite a Chamberlain evocar uma força monumental numa pequena obra (Scotch spur, de 1961, tem apenas 20 centímetros de altura) tão prontamente quanto numa grande. A postura liberada pode variar em atitude, de ameaçadora a gentil, enquanto as cores desdobram-se numa panóplia que se inicia com tórrida cacofonia e termina em mudo monocromatismo. Peças com uma cor predominante, geralmente branco-sujo, também surgiram nessa época. Velvet white (1962) é uma caixa vertical dentada, encimada por uma forma de torso perturbado; em sua beleza desgraciosa e manchada, ergue-se como uma noiva maltratada mas orgulhosa. A escultura de Chamberlain, com seus volumes fraturados e convulsos, é totalmente tridimensional. Não há frente ou verso, nenhum ângulo favorecido que se incline para o estático ou plano. O olhar do espectador é levado numa viagem instigante por uma topografia sinuosa e cascateante, como não se vira desde as extravagâncias do barroco. Fotografias de dois ângulos diferentes da 172
that frequently refer to nature. Each form is soaked with paint of a bright, matte hue, taken from a palette similar to Stuart Da vis 's. Because Sugarman's colar soaks into the wood and is matte, it emphasizes the mass and form of the material as it extends into space, whereas Chamberlain sought a more immaterial flow The boldness and unity in-variety achieved by Sugarman's colar (and form) provide more tension and punch than does Smith's ar Caro's colar', but, like them, he has maintained the inherently conserva tive compositional strategies already long rejected by painting. Chamberlain alone in the fifties achieved a noncompositional radicality for sculpture that could successfully incorpora te colar Chamberlain continued to make volumetric accumulations of painted steel at full force through 1966, gaining greater confidence in his use of scale and visual complexity. In 1960, he made his first wall piece, Essex; paradoxically, the invasion of painting's place purged his sculpture of the residual Pictorial respect for the planar still evident in some of his first car-part sculptures. Essex heaves and swells out like the crumbling breastplate of some embattled science-fiction monster (Rodan meets Rodin), crackling and hissing with the ferocious humor of breaking and making. The increased sÍle of this piece (it is some nine feet in height) permits a greater visual sense of speed and a dizzying multiplicity of colored shapes-round swellings, bends, cracks, wrinkles, and fissures. A mutual attraction of edges and volumes prevents eruption into chaos,· the precarious leftward tilt is barely held in tense check by two restraining verticais. Mr. Press (1961) is more self-composed in its monumentality,· it is made up of fewer and larger sections that shift and bend toward a billowing rectangularity. The inhaling swell is anchored by a multisectioned diagonal of off-whites that occasionally secretes a pale, shiny blue and drips with a cascade of yellow-orange. Broad, irregular rectangular blades of red push out from underneath, at the top and the bottom. As in so many of Chamberlain's pieces, this chromatic monumentality seems to have happened by chance. Like the new wall pieces, the fully three-dimensional work gained an abundance of presence. The appendages and table bases that had propped up earlier sculptures were now eliminated· the works assume their own stances and poses frequently precariously. Chamberlain's growing control of scale now allowed him to evoke monumental power in a small work (Scotch spur of 1961 is but eight inches high) as readily as in a large one. The liberated stance could range in attitude from menacing to mellow, while the colors unfolded in a panoply that started with torrid cacophony and ended with mute monochrome. Pieces of predominantly one calor, generallyan unwashed white, also made their first appearance at this time. Velvet white (1962) is a dented, tapering vertical box topped with a flustered torsolike shape,· in its gawky, tarnished beauty it stands like a battered but determined bride. Chamberlain's sculpture, with its fractured and convoluted volumes, is totally three-dimensional. There is no front ar back, no favored view inclining toward the static ar planar The viewer's eye is taken on an alluring trip over a rolling and cascading topography such as had not been seen since the extravagances of the baroque.
mesma obra geralmente parecem ser de esculturas distintas. Uma peça relativamente pequena como Ca-O'Oro (1964), com 86 centímetros de altura, expande-se, contrai-se e se excede, numa multiplicidade de ações e volumes coloridos em constante mudança e revolução. Uma visão apresenta um recipiente em forma de caixa, lilás-claro, encimado por uma forma de guarda-chuva dourado. Esta configuração começa a romper-se na medida em que o espectador a rodeia, até abrir-se numa explosão, revelando uma abóbada inchada que abriga um cone enrugado com um orifício revestido de dobras vermelhas. Atos desnaturais transformaram o continente em conteúdo - oticamente suntuoso, tatilmente repelente. No início da década de 60, Chamberlain já era conhecido em ferrosvelhos e oficinas. Às vezes ele realmente trabalhava em ferrosvelhos, mas com maior freqüência escolhia e reunia peças que empilhava em seu ateliê. As partes eram selecionadas por sua cor e redondeza, às vezes para serem recortadas e remodeladas no ateliê, e ocasionalmente para serem restauradas ou pintadas com novo esmalte automotivo. Cada peça era tratada como entidade individual antes de ser devolvida ao aglomerado sobre o chão. Chamberlain usava uma variedade de ferramentas: laminador, buril para aço, maçarico de acetileno, serra de fita, rebolo, compactador, etc. Cada um tinha um impacto diferente sobre o metal: as bordas desiguais deixadas pela serra eram tão agradáveis para o artista quanto as marcas de fogo do maçarico. Após um período de gestação, Chamberlain começava a reunir algumas dessas peças trabalhadas numa configuração que maximizava os volumes e as cores numa presença e postura únicas. Buscando o que ele sempre descrevia como "união" ou "união sexual", Chamberlain juntava as peças formando um quebra-cabeça cuja configuração final não seria conhecida até que estivesse completa. Quase todas as esculturas com partes de carros são auto-sustentadas - unem-se sem solda -, mas depois de terminadas eram soldadas em alguns pontos para que pudessem ser transportadas e mantidas em segurança fora do ateliê. A chapa de aço é relativamente macia e maleável, e prontamente recebe e guarda os atos realizados sobre ela. Chamberlain tem a intuição de que a chapa de aço possui resistência semelhante à do corpo humano, e ele age sobre o metal de modo correspondente. Assim como seu processo une acaso e intuição com os préfabricados e ready-mades, também une o industrial e o orgânico. Os procedimentos que se seguem à escolha inicial das partes são claramente visíveis e seduzem o olhar do espectador. O uso de partes pré-fabricadas que se unem num todo coerente nãocompositivo, puramente visual, relaciona seus objetivos mais aos escultores e pintores dos anos 60 do que aos dos 50. Donald Judd, Carle Andre e Dan Flavin, todos usaram partes industriais em configurações homogêneas e unificadas. Como a obra de Chamberlain, a deles apresenta-se como fatos não-figurativos. Como a escultura de Chamberlain, as luzes fluorescentes ready-made de Flavin e as caixas fabricadas de Judd incorporam ativamente a cor industrial, mas com muito maior contenção. Sua geometria não é manipulada e composta, mas sim baseada em repetições ou em simples progressões matemáticas e geométricas - ready-mades virtuais. (Na década de 60, Judd tornou-se um dos maiores incentivadores de Chamberlain, como crítico e como colecionador.) As intenções relacionadas de Judd, Andre, Sol Lewitt, Flavin e Robert Morris reposicionam completamente a escultura na vanguarda do modernismo. Chamberlain faz uma conquista mais isolada, tão diferente dos minimalistas quanto parecida. Sua uniformidade não-figurativa depende fortemente da intuição e do pulsar da paixão, enquanto a deles baseia-se numa regularidade
Photographs of two different views of one work quite seem to be of two completely different sculptures. A relatively small piece such as Ca-D'Oro (1964), thirty-four inches high, expands, contracts, constricts, and expels in a constantly changing and revolving multiplicity of actions and colored volumes. One view presents a pale silver-lilac boxlike container capped with a peaked golden umbel shape. This configuration begins to break up as the viewer moves around it, until it bursts to reveal a flatulent gable sheltering a wrinkled blue cone with an orifice enveloping red folds. Unnatural acts have turned the container into the contained-optically sumptuous, tactilely repellent. By the early 1960s Chamberlain had become a regular at junkyards and body shops. Sometimes he actually worked in junkyards, but more often he chose and collected pieces to pile up in his studio. Individual pieces were selected for their colar and roundness, sometimes to be cut up and reshaped, in the studio, and occasionally even to be touched up ar painted over with fresh auto lacquer. Each piece was treated as an individual entity before it was returned to the pile on the floor. Chamberlain used a variety of tools: a slicer, a steel-cutting chisel, an acetylene torch, a bandsaw, a grinder, a truck, and a compactar. Each tool had a different impact on the metal,' the rough edges left by a saw were as pleasing to the artist as the burn of the torch. After a gestation period, Chamberlain began to assemble some of these worked pieces into a configuration that maximized the volumes and the colors into a unique presence and attitude. Seeking what the regularly refers to as "fit", ar "sexual fit, " Chamberlain joined piece to piece, forming a puzzle whose final configuration would not be known until it was completed. Almost ali ofthe car-part sculptures are self-supporting-the pieces hold together without welding-but were spotwelded after completion, so that they could be safely transported and maintained outside the studio. Sheet steel is relatively soft and ma//eable and readily receives and retains the acts performed upon it. Chamberlain has an intuitive sense that sheet steel gives about the same resistance as a human body does, and he has acted upon the metal accordingly. Just as his process joins chance and intuition with the prefabricated and the ready-made, it also unites the industrial and the organic. The procedures that follow the initial choice of ready-made parts are openly visible and engage the viewer's eye. Chamberlain's use of individual prefabricated parts cohering in an overall, noncompositional, purely visual unity relates his aims more to the sculptors and painters of the sixties than to those of the fifties. Dona/d Judd, Carle Andre, and Dan Flavin ali used prefabricated ar made-to-order industrial parts in homogeneous, unified configurations. Like Chamberlain's, their works present themselves as nonimagistic, abstract facts. Like Chamberlain's sculpture, Flavin's readymade fluorescent lights and Judd's fabricated boxes actively incorporate industrial colar, but with far greater restraint. Their geometry is not manipulated and composed but, rather, based on repetition ar on simple mathematical and geometrical progressions virtual ready-mades. (In the sixties, Judd became one of Chamberlain 's strongest supporters, both as a critic and as a collector.) The related intentions of Judd, Andre, Sol LeWitt, Flavin, and Robert Morris fully restored sculpture to the forefront of modernismo Chamberlain's is a more isolated achievement, as different from the Minimalists as it is similar. His nonimagistic uniformity relies heavily on intuition and the pulse of passion, whereas theirs is grounded in regimented, pragmatic regularity-they have rules; he plays. He remains the pagan friend of the monastic arder.
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Oearie 050 enseau, 1992 aço escovado e pintado/painted and chromium p/ated stee/247 x 153 x 144 cm vista/ view 1 Coleção The Pace Gallery Foto Peter Foe
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Dearie 050 enseau. 1992
aço escovado e pintado/ painted and chromium p/ated stee/247 x 153 x 144 em vista/view2 Coleção Pace Wildenstein Foto Peter Foe
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regimental e pragmática - eles têm regras; Chamberlain brinca, e permanece o pagão amigo da ordem monástica.
o amplo senso intuitivo de Chamberlain não deixa de ter suas falhas, mas o manteve aberto a novos riscos e oportunidades, seja em seu ateliê ou num bar. Em meados dos anos 60, ele se tornara um membro fixo do cenário artístico; mas sua aceitação dava-se basicamente entre colegas artistas e no círculo imediato do mundo artístico. O merecido sucesso de crítica e de vendas ainda o desconcertava. Talvez, em parte, porque ele desejasse superar sua reputação de dobrador de pára-lamas (fender bender), e em parte porque estivesse pronto para tentar algo novo. Chamberlain começou a trabalhar com outros meios e técnicas. Em 1967, decidira parar de usar aço pintado; com exceção de duas séries de esculturas, manteve sua decisão até 1974. Em 1966, Chamberlain experimentou formas construídas (em vez de encaixadas) e preconcebidas, fazendo pequenas esculturas de fibra de vidro com base em desenhos de curva-francesa. Estes parecem utensílios hollywoodianos alados e perfilados, de função desconhecida. São apenas um pouco melhores e mais concisos que a maioria das coisas que se produziam na época. Chamberlain foi o primeiro a admitir sua inconseqüência. Por outro lado, uma série de peças de espuma, iniciada em 1966, deu origem a diversos grupos de trabalho, todos mais ou menos fundamentados na observação de Chamberlain dos movimentos corriqueiros das mãos: desenrolar tecidos ou papel higiênico, estourar sacos de papel, amassar maços de cigarros vazios. As peças de espuma começaram simplesmente, com o apertar de uma esponja - rápido, simples e fácil. Quando esteve em Malibu, em 1966, Chamberlain fez cerca de trinta pequenos esboços (de 8 a 16 centímetros) usando esponjas apertadas e tingidas. Mais tarde naquele mesmo ano ele mudou para grandes pedaços de espuma de uretano, mais densa e resistente, que o encorajaram a configurações mais ousadas e complexas (veja-se I-Chiang, 1966). Depois de apertada e amarrada com uma corda, a espuma era atada em forma de uma rosca doce enrugada -lembrando uma cratera vulcânica ou uma vagina em tamanho épico. A simplicidade da forma, a suavidade porosa e uniforme da superfície, a generosidade das curvas, tudo confere a essas peças uma monumentalidade negada por seu tamanho real. Uma segunda série, iniciada em 1967, foi feita com pedaços maiores de espuma e às vezes amarradas com duas cordas. Em 1970, outra série menor foi começada, seguida por uma quarta, em 1972, audaciosamente decorada com "confetes" de aquarela. A espuma de uretano é o mármore de Chamberlain - porosa e tátil, mas barata, reagindo suave e imediatamente às mãos. Estas e, em menor grau, as peças posteriores em papel são as únicas esculturas táteis feitas por Chamberlain. Suas superfícies macias e sensuais e suas formas salientes imediatamente sugerem mãos tateando a pele falsa. Nelas, Chamberlain revela um respeito pela natureza e pelas exigências do material (não são empregadas formas ready-made) e encontra em sua transformação a lógica simples da obra. Portanto, sua ênfase na estrutura e na construção, baseada na atenção minuciosa à natureza do material, torna-se o tema da obra, antecipando em pelo menos um ano as ataduras de feltro cinza de Morris, cortadas e drapeadas por gravidade, iniciadas em 1967.
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Chamberlain's rangy intuitive sense is not without its pitfalls, but it has kept him open to new risk and opportunities, whether in his studio ar in a bar. By the mid-sixties, he had become a ranking member of the art scene; but his acceptance was primarily among fellow artists and the immediate inner circle of art the world. Deserved criticai and commercial success still eluded him. Partially, perhaps, beca use he wished to overcome his reputation as a fender bender and partially because he was ready to try something new, Chamberlain started working with other media and techniques. By 1967, he had decided to stop working with painted steel; with the exception of two series of sculptures, he maintained this resolve until 1974. In 1966, Chamberlain tried his hand at constructed (rather than fitted), preconceived forms, making small fiber glass sculptures based on Frenchcurve drawings. These look like sleek winged and finned Hollywood appliances of unknown function. Theyare only slightly better and more concise than much of the stuff that was being praduced then; Chamberlain was the first to admit their inconsequence. On the other hand, a series of foam pieces, started in 1966, initiated several successful graups of works, ali more ar less based on Chamberlain's observation of the commonplace movements of the hands: wadding tissues and toilet paper, popping paper bags, crumpling empty cigarette packs. The foam pieces started simply, with the squeeze of a sponge-quick, ordinary, and easy. While in Malibu in 1966, Chamberlain made some thirty small (three-tosix-inch) sketches using squeezed and tied sponges. Later that year he switched to larger pietes of urethane foam, which denser and more resistant and encouraged more buoyant and complex configurations see ~-Chiang, 1966). After being squeezed and tied with a rape, the foam was bounced into a writhing donut form - now like a volcanic crater, now like an epic-sized vagina. The simplicity of the form, the uninflected, poraus smoothness of the surface, and the generasity of the curves ali give these pieces a monumentally belied by their size. A second series, begun in 1967, was made with larger pieces of foam and some times bound with two rapes. In 1970 another smaller series was begun, followed by a fourth in 1972, sparingly dappled with a confetti of watercolor. Urethane foam is Chamberlain's marble-poraus and tactile but cheap, and softly and directly responsive to the bare hands. These, and to a lesser degree the subsequent paper pieces, are the only tactile sculptures made by Chamberlain thus far. Their smooth, sensuous surfaces and bulging forms immediately suggest hands kneading-and-needing-surragate flesh. In them, Chamberlain reveals a respect for the dictates and nature of the material (no ready-made shapes are employed) and finds in its transformation the direct logic of the work. Thus, his emphasis on structure and construction, based on close attention to the nature of the material, becomes the subject of the work, predating by at least a year Morris's swathes of gray felt, cut and draped by gravity, started in 1967.
No final da década de 60, Morris, juntamente com artistas como Richard Serra, Eva Hesse, Alan Saret, Barry Le Va e Lynda Benglis, propuseram uma escultura de materiais maleáveis e muitas vezes mutáveis, em que as ações do artista e da gravidade eram visíveis e interativas. Tornaram-se conhecidos como artistas "processuais", reagindo e sucedendo ao minimalismo. Embora as peças de aço pintado de Chamberlain não se preocupem exclusivamente com os ditames do material e da gravidade, o desdobramento espontâneo e visível do processo reclama para ele o papel de precursor dessa extraordinária geração de escultores. Suas peças de uretano dão-lhe lugar de destaque nesse grupo. Como Chamberlain, a maioria deles buscava reativar alguns princípios do expressionismo abstrato. Benglis, com suas peças de uretano líquido despejado em múltiplas camadas, e Saret, com suas dobras e volutas coreografadas de arame, partilham o desejo de Chamberlain por uma volumosidade aberta e orgânica. Morris, o porta-voz autonomeado desse grupo (como o havia sido para os minimalistas), ignorou completamente Chamberlain em seus manifestos, publicados em artigos em Artforum ("Anti-form", volume 6, abril de 1968, pp. 33-35, e "Notes on sculpture, part IV: beyond objects", volume 7, abril de 1969, pp. 50-55). Enquanto Morris curvava-se ao expressionismo abstrato e à necessidade de acaso e indeterminação na escultura, apontava Claes Oldenburg como precursor do movimento (apesar de ter denegrido em outro lugar a falta de acabamento de toda a escultura figurativa e minimalista). As esculturas moles de Oldenburg (feitas pela primeira vez em 1962) são certamente submissas à gravidade e menos acabadas que as versões em materiais duros; no entanto, seu interesse básico se centrava em uma forma acabada e concreta, totalmente oposta aos princípios da arte processual. Estaria Chamberlain próximo demais para servir de exemplo? Ou colhia os resultados de seu desinteresse em autopromover-se? Os curadores uniram-se a Morris nesse ponto cego: Chamberlain não foi incluído nas maiores exposições em museus que primeiro documentaram esse grupo (When Attitudes Become Form, no Kunsthalle Bern, e Anti-lIIusion: Procedures, Materiais, no Whitney Museum de Nova Vork, ambas em 1969). Dois anos depois, Chamberlain teve uma grande retrospectiva no Guggenheim Museum, mas até hoje não foi visto no contexto do movimento processual. Chamberlain não costuma desenhar em toalhas e guardanapos, mas não é avesso a exercer seu talento em bares. Muitos companheiros de copo, no final dos anos 60, saíram do Max, em Kansas City, segurando um dos maços de cigarros vazios amassados por Chamberlain. Essas maquetes tornaram-se modelos para duas séries em aço galvanizado e alumínio, realizadas entre 1967 e 1969. A primeira foi feita com caixas metálicas não-pintadas de dimensões proporcionais às de maços de cigarros; o compactador fez o resto. Essas peças referem-se ao todo de que derivam: desmoronam-se e dobram-se sobre si mesmas com menos clamor e mais dignidade do que as peças de aço pintado multisseccionado. As dobras, dentes e pregas motivam a suavidade macia e prateada das superfícies num jogo discretamente luxuriante de luzes e sombras ondulantes. As peças galvanizadas estão ligadas, por sua autocontenção relativa, a algumas das obras pintadas inteiramente de branco. Há mais que humor e crítica implícitos na deformação e re-formação feitas por Chamberlain de uma forma e de um material industrial identificados tão completamente com os rigores do minimalismo (muitas dessas esculturas foram executadas com caixas ligeiramente danificadas produzidas por Judd).
In the late sixties, Morris, together with such artists as Richard Serra, Eva Hesse, Alan Saret, Barry Le Va, and Lynda Benglis, propounded a sculpture of malleable and often mutable materiais in which the actions of the artist and of gravity were made visible and interactive. They became known as "Process" artists, reacting against and succeeding Minimalism. Although Chamberlain's painted-steel pieces are not so exclusively concemed with the dictates of material and gravity, their spontaneous, visible unfolding of process claims for him the role of preeminent precursor of this extraordinary generation of sculptors. His urethane pieces give him a senior place in this group. Like Chamberlain, most of them sought to reactivate some of the tenets of Abstract Expressionism,' Benglis, with her multilayered, poured liquid urethane-foam pieces and Saret with this bodily choreographed folds, furls, and swirls of chicken wire, share Chamberlain's desire for an open, organic voluminousness. Morris, the self-styled spokesman for this group (as he had earlier been for the Minimalists), completely ignored Chamberlain in his manifestos, published as articles in Artforum ("Anti-Form ", volume 6, April 1968, pp. 33-35, and "Notes on sculpture, part IV beyond objects", volume 7, April 1969, pp. 50-55). While Morris bowed to the Abstract Expressionists and wrote of sculpture 's need for chance and indeterminacy, he called Claes Oldenburg the movement's precursor (despite having elsewhere denigrated the finiteness of ali figurative and Minimal sculpture). Oldenburg's soft sculptures (first done in 1962) are certainly responsive to gravity and less finite than the versions in hard materiais, however, his primary interest was in a finite, concrete form totally antithetical to the tenets of Process art. Was Chamberlain too close for comfort? Did he suffer from his disinterest in self-promotion? Curators joined Morris in his blind spot; Chamberlain was not included in either of the two major museum exhibitions that first documented this group (When Attitudes Become Form, at the Kunsthalle Bem and Anti-Illusion: Procedures, Materiais, at the Whitney Museum in New York, both in 1969). Two years later, Chamberlain was given a major retrospective at the Guggenheim Museum, but has never, until now been seen in the context of the Process art movement. Chamberlain is not one to doodle on tablecloths or napkins, but he is not averse to exercising his visual acuity at a bar. Manya fellow drinker, in the late sixties, left Max's Kansas City gingerly holding one of Chamberlain's crumpled, empty cigarette packs. These sketches became the loose models for two series of galvanized-steel and aluminum pieces done between 1967 and 1969. The first series was done with unpainted metal boxes whose dimensions were proportionate to cigarette packages, but now the compactor did the wadding. These pieces acknowledge the whole they were derived from: they collapse and fold into themselves with less clamor and more upright dignity than do the multisectioned, painted-steel pieces. The bends, dents, and wrinkles motivate the smooth, silvery softness of the surfaces into a discreetly luxuriant play of rippling light and shadow The galvanized pieces are related, in their relative self-containment, to some of the all-white painted works. There is more than a little humor and criticism implicit in Chamberlain's deformation and re-formation of a form and an industrial material identified so completely with the rigors of Minimalism (several of these sculptures were made from slightly damaged boxes initially produced for Judd).
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o que o metal industrial era para Nova Vork, o plástico significava para Los Angeles. Em 1970, Chamberlain começou a versão californiana de suas caixas enroladas, usando plexiglás. Ele alugou um enorme forno onde colocava as caixas plásticas até que se fundissem. Entrava, então, rapidamente para conduzir o fluxo de suas curvas no momento em que as caixas retornavam ao estado líquido. Depois de esfriar no forno, cada peça era levada ao ateliê de Larry Bell para ser revestida a vácuo por um arco-íris transparente e sinuoso de quartzo e alumínio. O calor extremo do forno e a dificuldade de revestir uma superfície tão irregular impediram o completo desenvolvimento dessas obras, mas ao reduzir a matéria plástica a sua liquidez original e manipulá-Ia, Chamberlain foi capaz de extrair mais de sua vulgaridade mesquinha e anti-séptica do que aparece nos inúmeros souvenirs artísticos freqüentemente fabricados. O jogo das ondas de luz, as bordas líricas e ondulantes, os volumes que rolam para dentro e fora de transparências produzem uma presença exótica e viva, a partir de uma origem quase sem vida. Essas obras são como a flora e a fauna mutantes de alguma fantasia pós-nuclear. Dois outros grupos de obras contemporâneas retornam a meios mais mundanos. Nas esculturas Penthouse, de 1969, Chamberlain, agudamente consciente da resistência única de cada material, voltou sua energia para a resistência do ar encontrada quando um saco de papel era inflado e estourado. Essas peças de papel amassado têm expressão simples e modesta, com forte afinidade com o desenho. Muitas vezes são delicadamente manchadas com aquarela, e suas frágeis formas de papel são preservadas com resina transparente, derramada ao acaso em algumas dobras. Voltando-se em 1972 para a folha de alumínio, que poderia ter embrulhado os sanduíches nos sacos de papel, Chamberlain fez em seguida amassados meteóricos, que iam do tamanho minúsculo ao enorme. Em cada peça, ele grampeava duas folhas de alumínio grosso, as amassava e então realçava o brilho das infinitas dobras e facetas com esmalte de automóvel. Uma camada final de resina transparente não foi suficiente para preservar as formas dessas frágeis peças pintadas. Embora não sejam totalmente atraentes, serviram para encorajar uma nova liberdade com a tinta. Chamberlain também fez uma incursão pelo design de móveis, usando a espuma de uretano em uma de suas utilidades primordiais, embora não da maneira prevista. A partir de 1970, uniu enormes pedaços de espuma e escavou diversas concavidades como assentos - fazendo grandes sofás ambientais ligados aos espaços aos quais se destinavam (com até 12 metros de comprimento). Confortáveis, eles abraçam o usuário numa licenciosidade aveludada, tranformando-o num anão. Como as outras esculturas de espuma, infelizmente estas também se mostraram perecíveis, mas apesar disso deliciosas. Entre 1967 e 1974, Chamberlain rompeu duas vezes sua abstinência do aço pintado ready-made. Em Chicago, em 1969, foi incapaz de resistir aos inúmeros objetos de aço branco e cromado que encontrava freqüentemente (sobretudo utensílios e armários de cozinha). Grandes esculturas como Nanoweap e Coconino são selvagens, escabrosas, muito mais confrontadoras do que as outras obras brancas de Chamberlain. Em Nanoweap, os despojos de um armário com gavetas, ainda reconhecível, dança no pesadelo burlesco de algum cozinheiro. Uma segunda série, feita em 1972 em Amarillo, não é menos confrontadora, porém mais decididamente abstrata, e volta a soar a rítmica polifonia das cores. Em 1974, 178
What industrial metal was to New York, plastic was to Los Angeles. In 1970 Chamberlain started the Califomia version of his wadded boxes, using Plexiglas. He rented a walk-in oven in East Los Angeles, and in it brought Plexiglas boxes to the melting point, then stepped in quickly to encourage the flow of their curves as the boxes retumed to a liquid state. After annealing in the oven at a lower temperature, each piece was brought to Larry Bell's studio to be vacuum-coated with a slithering, transparent rainbow of quartz and aluminum. The extreme heat of the oven and the difficulty in using Bell's machine to coat so irregular a surface impeded the full development of three works,· but by reducing the plastic material to its originalliquidity and then manipulating it, Chamberlain was able to draw more from its ungiving, antiseptic vulgarity than was evident in the countless art-souvenirs so often fabricated by one plastician ar another. The cascading play of waves of light Iyric, rippling edges,· and volumes rolling in and out of transparency pull an exotic, living presence from an almost entirely lifeless source. These works are like the mutant flora and fauna of some post-nuc/ear reverie. Two other contemporary groups of works retum to more mundane means. In the Penthouse sculptures of 1969, Chamberlain, sharply aware of the unique resistance of a given material, tumed his energies to the air resistance encountered when a paper bag was blown up and popped. These crushedpaper pieces speak plainly and modestly and have strong affinities with drawing. Theyare often delicately stained with watercolor, and their fragile paper forms are preserved with c/ear resin, randomly dripped in some of the crumpled crevices. Tuming in 1972 to the aluminum foil that might have wrapped the sandwiches in the paper bags, Chamberlain next made meteorlike wads, ranging in size from softball to boulder. For each piece he stapled together two sheets of heavy foil, then crinkled them up and heightened the gleam of the endless wrinkles and facets with auto lacquer. A final coat of c/ear resin proved not fully successful in preserving the shapes of these fragile painted pieces. While theyare not completely compelling, they did serve to encourage a new, more responsible freedom with paint later on. Chamberlain also made a foray into fumiture design, using urethane foam for one of its intended purposes-though certainly not in an expected formo Starting in 1970, he united huge sections of foam and scooped out a number of shallow depressions for seating-making environmental couches geared to the spaces for which they were intended (they are large-up to forty feet in length). The couches comfortingly dwarf the user, embracing him in velvety, sensuosity Like the other foam sculptures, they toa have proved sadly perishable, but delicious nonetheless. Chamberlain broke his abstinence from ready-made painted steel twice between 1967 and 1974. While in Chicago in 7969, he proved unable to resist the countless objects of white-and-chrome steel (mainly kitchen appliances and cabinets) he kept encountering. Large sculptures like Nanoweap and Coconino are ragged, raucous, and far more confrontational than Chamberlain's other white works. In Nanoweap a stranded drawer and stillrecognizable cabinet dance through a kitchen worker's burlesque nightmare. A second series, dane in 7972 in Amarillo, is no less confrontational but more resolutely abstract and once again rumbles with the rhythmic polyphony of colar. In 1974, Chamberlain fully retumed his attention and intentions to painted steel.
Chamberlain voltou completamente sua atenção e suas intenções para o aço pintado. Inegavelmente, algumas obras que completou entre 1963 e 1974 são melhor vistas como uma exploração e experimentação de alto risco. Poucos artistas se dispõem a recomeçar repetidamente seu processo de aprendizado, do alto de sua maturidade. Mas o sucesso da obra de Chamberlain, a partir de 1974, prova que o risco valeu a pena. As esculturas de uretano e aço galvanizado devem ser consideradas marcos importantes em seu desenvolvimento e no desenvolvimento da escultura nos Estados Unidos. Em 1974, os procedimentos mantiveram-se essencialmente os mesmos de antes, mas as obras pintadas que Chamberlain exibiu reluzem com uma nova e estimululante liberdade. Um novo grupo de peças para parede foi realizado com componentes mais maleáveis, compactados de forma simples num forte eixo vertical ou diagonal. Essa superfície mais afilada despojou a obra de suas últimas afinidades com a pintura expressionista abstrata e acelerou o vôo das cores sobre a membrana metálica. No passado, Chamberlain havia ocasionalmente modificado a cor preexistente de alguns componentes; agora, ele toma a liberdade de aplicar sua própria pintura: espirros e gotejamentos multicoloridos explodem com a euforia de imprimir sua própria marca. Essa pintura alegre espelha e ironiza a policromia geral da obra e torna clara a pré-fabricação independente de cada componente. O apelo gravitacional da tinta espirrada sobre uma forma reforça sua redondeza com altos e baixos, muitas vezes transformados num eixo diferente quando a forma é finalmente integrada ao todo. O que é pintado tanto reforça como contradiz o volume. Vemos um expressionismo abstrato disneyesco, pintado mais literalmente, que substitui algumas indentações e dobras do seu expressionismo abstrato anterior, mais esc~ltural, apenas para revelar que a tinta tornou-se ela mesma um volume escultural. Obras como Coke Ennyday(1977) sabem por que estão rindo. Chamberlain continuou a experimentar ousadamente a cor. Em 1977, passou a revestir algumas formas com grafites pintados com spray, em velocidade de metrô e cores sujas. Mais recentemente, chegou por acaso a uma forma de pintura negativa. Desenhando com jato de areia, grava um padrão de pele de girafa ou camuflagem numa superfície, ironizando e transformando em desenho as formas das marcas do compactador. As torsões verticais e diagonais vistas nas peças para parede são ainda mais ativas nas esculturas, nas redondas e nas que se mantêm de pé apoiadas na parede (geralmente em formação horizontal dominada por quatro ou mais volumes verticais). Aqui, também, os componentes individuais são menos compactados e mais simplesmente enrolados, porém empacotados mais densamente em trouxas de selvagem disparidade. A multiplicidade de volumes redondos e junções é mais evidente. Luftschloss (1979) inclina-se e ergue-se casualmente a mais de 3,60 metros. De um ângulo, é dominada por uma forma laranja-avermelhada que se inclina e quase tomba sobre uma acumulação mais vermelha, encimada por branco. Outro ângulo restitui o equilíbrio com um arcobotante voador brancosujo. A compactação e contração reduzidas das formas e sua nova vertical idade, de certa forma insistente, insinua uma figuração antropomórfica, mas, ainda, qualquer tentativa de se ler uma gestalt fechada nessas obras se frustra e dissolve assim que o olhar inicia seu percurso rolante.
Undeniably, some of the work Chamberlain completed between 7967 and 7974 is best regarded as high-riskexploration and experimentation. Not many artists are so willing repeatedly to start the leaming process ali over again, at the height of their early maturity. That Chamberlain's risks often proved fruitful is bome out by the success of his work since 7974. The urethane and galvanized-steel sculptures must be considered important milestones in his ongoing development, and in the development of sculpture in America. In 7974 the procedures remained essentia//y the same as before, but the painted works Chamberlain showed then bristle with an exhilarating new freedom. A new group of wall pieces was made up of smoother, more simply compacted components bunched together in a strong vertical or diagonal thrust. This sleeker surface purged the work of its last similarities to Abstract Expressionist painting facture and speeded up the flight of the color across the metal membrane. In the past Chamberlain had occasionally added to or modified the preexisting color of a component; now he took the liberty of applying his own paint: multicolored splatters and drips, bursting with the euphoria of mark-making. This joyous, garish paint both mirrors and mocks the uniform overall polychrome of the work and makes emphatically c/ear the independent prefabrication of each component shape. The gravitational pull of the splattered paint on a shape punctuates its roundness with ups and downs, often tumed on a different axis when that shape is finally integrated into the whole. What is painted both reinforces and contradicts what is volume. We see a more literally painted, Disneyesque Abstract Expressionism replace some of the physical dents and creases of the earlier, more sculptural Abstract Expressionism, only to then see the paint in its tum becon}e sculptural volume. Sculptures like Coke Ennyday (1977) know why they are laughing. Chamberlain continued to experiment boldly with color and paint. In 7977, he began to coat some of his shapes with spray-painted graffiti, with subway speed and trashy color. More recently, he has by chance hit upon a form of negative painting. Drawing with a sandblaster, he etches a giraffe-skin or camouf/age pattem into a surface, mocking and making a design out of the shapes of the compactor's bruises. The vertical and diagonal torsion seen in the wall pieces is even more active in the sculptures in the round and those that are free-standing but placed against a wall (most often in a horizontal formation dominated by four or more vertical volumes). Here too, the individual components are less compacted and more simply rolled; but they are more densely packed into huddles of wild disparity. The multiplicity of roundness and juncture is more confident. Luftschloss (7979) hazardously leans and rises to over twelve feet. From one view, it is dominated by an orange-red shape tipping into and almost over a purer red accumulation topped with white. Another view restores balance with the counter-movement of a billowing white f/ying buttress. The reduced compaction and contraction of the shapes and their new, relatively insistent verticality insinua te anthropomorphic figuration; but still, any attempt to read a c/osed gestalt in these works is frustrated and dissolved as soon as the eye starts on its rolling ride.
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'C'est what, 1991 aço cromado e pintado/painted and chromium p/ated stee/ 227 x 121 x 111 cm vista/view 1 Coleção The Pace Gallery Foto Peter Foe
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C'est what, 1991 aço cromado e pintado/painted and chromium p/ated stee/ 227 x 121 x 111 cm vista/ view 2 Coleção Pace Wildenstein Foto Peter Foe
Desde 1981, Chamberlain levou sua configuração a formas cada vez mais verticais, que se desenrolam para cima, e horizontais, que abraçam o chão. A série Gondola, iniciada em 1981 em Osprey, Flórida, e dedicada a seus escritores favoritos (Hart Crane, Charles Olson, Herman Melville, Robert Creeley, etc.), utiliza formas de chassis como armação e as guarnece de pacotes dispersos de aço pintado - como carros alegóricos num carnaval, trazendo presentes às almas-gêmeas. Numa escultura vertical recente como Wongkong Melong (1982), uma diagonal fálica em azul-água ergue-se de uma base vaginal, por um ângulo, tornando-se de outra perspectiva o pano de fundo para uma forma de ventilador amassado que brota de um monte vermelho pintado como manchas de girafa. Em The arch of lumps (1983), uma vertical mais definida ergue-se de um casulo com manchas de girafa para descascar-se e ascender em três metros de alegria desdobrada. Essas esculturas têm uma incessante riqueza visual de redondeza e cores variegadas. Como as pinturas de Twombly, Johns e Frank Stella, a escultura de Chamberlain permaneceu na vanguarda da arte contemporânea por diversas gerações de pintores e escultores. A iniciativa de Stella em direção à redondeza tridimensional, à cor pulsante e ao uso de uma inquietação expressionista-abstrata começou em 1977 com sua série de baixos-relevos para parede -Indian bircl; seu trabalho continuou a adquirir maior complexidade espacial e certamente desenvolveuse com a visão das obras de Chamberlain - uma das quais Stella possui. Diferentemente de Chamberlain, Stella, mesmo quando máis arrojado, mantém um controle obcecado (a curva-francesa, por exemplo, é mais compatível com seu procedimento do que com o de Chamberlain). A geração de artistas que amadureceu nos últimos dez anos deu ênfase renovada à expressividade da superfície e do objeto, enquanto os resfriava com uma variedade de estratégias subliminares; seus meios e fins são muitas vezes semelhantes aos de Chamberlain, se não diretamente influenciados por ele. A brilhante intuição de Julian Schnabel, especialmente suas pinturas com louça quebrada; a pintura de Cora Cohen, com a tinta espremida diretamente do tubo, parcialmente borrada e à beira da figuração estes, entre outros, reagiram às inovações de Chamberlain. Surgiram artistas com interesse renovado em relação à presença e ao volume da escultura: as figurações orgânicas neocubistas de Mel Kendrick; os volumes industrializados organicamente sensuais de John Newman; as acumulações algo ingênuas de BiII Woodrow. Chamberlain continua a incitar. John Chamberlain é o primeiro artista dos Estados Unidos do pósguerra a reabilitar o volume da escultura e a conquistar-lhe uma presença possante e a radicalidade da pintura. Sua capacidade de transformar a redondeza em cor e a cor em redondeza, levando ambas a uma unidade geral, é inigualável. Suas esculturas incitam e desejam intermináveis adjetivos, mas nenhum deles é adequado. Suas configurações estão em estado referencial, mas sua constante re-formação esquiva-se do alcance dos adjetivos; em suma, transcendem a linguagem da análise e da descrição. A maravilhosa opticidade deve ser seu próprio prazer e recompensa.
Since 7987 Chamberlain has increasingly pushed his configurations into upwardly cascading verticais and ground-hugging horizontais. The Gondola series, begun in 7987 in Osprey, Florida, and dedicated to his favorite writers (Hart Crane, Charles Olson, Herman Melville, Robert Creeley, etc,), utilizes chassis forms as armatures and piles them with loosely dispersed packages of painted steel-floats in a carnival of celebration, bearing gifts to kindred spirits. In a recent vertical sculpture such as Wongkong Melong (7982), an aquatic blue, phallic diagonal rises out of a vaginal base in one view, only to become a mere backdrop in another for a rumpled fan shape that flowers out of a rich, red giraffe-patterned mound. InThe arch of lumps (7983), a more insistent vertical opens out of a giraffe-patterned cocoon to peel and soar into twelve feet of unfolding bliss. These sculptures have an unceasing visual richness of variegated roundness and color. ' Like the paintings of Twombly, Johns, and Frank Stella, Chamberlain's sculpture has remained on the cutting edge of contemporary art through several later generations of painters and sculptors. Stella's push toward three-dimensional roundness, pulsing color, and use of an Abstract Expressionist, painterly agitation began with his Indian bird wall-relief series in 7977; his work has continued to acquire ever greater spatial complexity and has surely developed with an eye on Chamberlain's works-one of which Stella owns. Unlike Chamberlain, Stella, even at his wildest, always maintains obsessive control (the French curve, for example, is more compatible with his procedures than with Chamberlain 's). The generation of artists that has matured in the last ten years has placed renewed emphasis on expressiveness of surface and subject, while cooling them off with a variety of undermining strategies; their means and ends are often similar to Chamberlain's, if not directly influenced by him. Julian Schnabel's flashy intuitiveness, especially in his broken crockery paintings; Cora Cohen 's bristling, squeezed-from-the-tube strokes, partíally wiped out and blurred on the edge of figuration:rhese, among others, are responding to Chamberlain's innovations. Artists with a renewed interest in sculpture's presence and volume have emerged: Mel Kendrick's organic, neo-Cubist figurations; John Newman's organically sensuous industrialized volumes; Bill Woodrow's Chamberlain-gone-to-prep-school accumulations. Chamberlain continues to provoke. John Chamberlain is the first artist in post-World War li America to rehabilitate sculpture's volume and to achieve for it a potent presence and the radicality of painting. His ability to make roundness into color and color into roundness, pushing the two into an overall unity, is without equal. His sculptures invite and desire endless adjectives, but none of them can stick. His configurations are in a referential state, but their constant re-forming slips out of the adjectival grip; ultimately they transcend the language of analysis and description. The ravishing opticality must be its own pleasure and reward. Klaus Kertess (This text is an extract of the catalogue: John Chamberlain - A catalogue raisonné of the sculpture 1954-1985 - Hudson Hills Press, New York, 7986).
Klaus Kertess (Extraído do catálogo John Chamberlain - a catalogue raisonné of the sculpture 1954-1985 - Hudson Hills Press, Nova Vork, 1986).
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Nasceu em Rochester, Indiana, em 1927. Serviu a Marinha dos Estados Unidos, a bordo do porta-aviões USS Tulagi. De 1951 a 1952, freqüentou a School of the Art Institute of Chicago. Recebeu duas bolsas de estudo da John Simon Guggenheim Memorial Foundation, Nova Vork. Realizou três filmes: Wedding night, The secret life Df Hernando Cortês e Wilde Point. Em 1990, foi eleito para a Academia Americana e Instituto de Artes e Letras como membro do Departamento de Arte. He served in the U.S.Navy aboard the arcraift carrier USS Tulagi. From 7957 to 7952, he attended The School of the Art Institute of Chicago. He received two fellowships from John Simon Guggenheim Memorial Foundation. He made three films: Wedding night, The secret life of Hernando Cortés, andWilde Point. In 7990, he
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was elected to the American Academy and Institute of Arts and Letters as a member of the Art Department.
escultura/medal for sculpture, Skowhegan School of Painting and Sculpture, Skowhegan, Maine, Estados Unidos; prêmio pelo conjunto da obra em escultura/lifetime achievement award for sculpture, International Sculpture Center, Washington. c
Exposições individuais/Solo exhibitions 1957 Wells Street Gallery, Chicago. 1960 Martha Jackson Gallery, Nova Vork. 1971 Solomon R. Guggenheim Museum, Nova Vork. 1986 Museum of Contemporary Art, Los Angeles. 1991 Staatliche Kunsthalle Baden-Baden; Staatliche Kunstsammlungen Dresden, Alemanha. Prêmios/Prizes 1984 Medalha de escultura/medal for sculpture, Brandeis University Creative Arts. 1993 Medalha de
Obras apresentadas/Works in the exhibition Délias dozen, 1988 aço cromado e pintado/painted and chromium plated steel 233 x 96 x 69 cm Coleção: Pace Wildenstein Bacchanaglia regalia, 1991 aço cromado e pintado/painted and chromium plated steel 238 x 167 x 100 cm Coleção: Pace Wildenstein C'est what, 1991 aço cromado e pintado/painted and chromium plated steel 227 x 121 x 111 cm Coleção: Pace Wildenstein
Dearie oso enseau, 1992 aço escovado e pintado/painted and chromium plated steel 247 x 153 x 144 cm Coleção: Pace Wildenstein No Schmoz Ka Pop, 1991 aço inoxidável cromado e pintado/plainted, chromium plated and stainless steel 177 x 173 x 80 cm Coleção: Pace Wildenstein King Zoiks, 1988 aço cromado e pintado/painted and chromium plated steel 227 x 105 x 85 cm Coleção: Pace Wildenstein Rhyme of passion, 1991 aço inoxidável cromado e pintado/painted, stainless and chromium plated steel 250 x 130 x 127 cm Coleção: Pace Wildenstein Savoy Koi, 1991 aço pintado/painted steel 138 x 152 x 121 cm Coleção: Pace Wildenstein
King Zoiks, 1988 aço cromado e pintado/painted and chromium p/ated stee/227 x 105 x 85 em Coleção Pace Wildenstein Foto Douglas M. Parker
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o MÁGICO ESEU DUPLO
THE MAGICIAN AND HIS DOUBLE
A insônia, ou a vigília, correspondem a estados intermediários entre estar dormindo e estar acordado. Num sistema de equivalências entre essas situações, estar acordado corresponderia à percepção do real enquanto ao sono caberia o sonho. Tradicionalmente, a fotografia nos remete a uma ligação privilegiada com o real. O fotógrafo, enquanto repórter, investigador, seria, portanto, o mais acordado de todos os homens, encarregado de registrar e documentar a realidade. Segundo esse entendimento, a fotografia seria menos arte do que as outras artes plásticas, já que nestas - especialmente depois da invenção da fotografia e do declínio da arte como imitação da realidade - o elemento fundamental não está centrado na ligação com o real, mas na capacidade de criação do artista, em sua possibilidade de instaurar a realidade própria e autônoma da obra enquanto afirmação do poder de um autor. A fotografia, dessa forma, estaria mais próxima do real, enquanto às outras artes plásticas caberia a invenção. No caso de Jorge Molder, no entanto, não estamos diante de uma concepção tradicional da fotografia que privilegia a dimensão documental, mas de uma prática reconhecida no campo da arte contemporânea e das artes plásticas em seu sentido mais amplo e em pleno exercício de seus poderes e liberdades. Ainda assim, a fotografia, mesmo quando o registro documental não é determinante, mantém sempre, devido às suas características técnicas, uma relação necessária com o real, com elementos exteriores a ela. Poderíamos então dizer que a fotografia ocupa o lugar ideal entre o sonho e a realidade, entre o estar dormindo e o estar acordado. Fotografia, lugar de insônia e de vigília.
Insomnia ar vigil correspond to intermediate states between being asleep ar being awake. In an equivalence system between these situations and their respective experiences, being awake would correspond to perceiving reality while to sleep would correspond to a dream. Traditionally, photography remits us to a priviledged connection with reality. A photographer as a reporter and investigator, would, therefore, be much more awaken than ali the men in charge of registering and documenting reality. If . we follow this reasoning, photography would be considered a lesser art than other fine arts - especially after the invention of photography and the decline of art theory as an imitation of reality - the fundamental element is not directed in the connection to reality but on the artist's creative ability. This ability to generate his own and autonomous reality from an art work while affirming an authors' power. According to this understanding, photography is closer to reality than other fine arts which are closer to invention. In Jorge Molder's case it is evident that we are not facing a traditional conception of photography in which documentary dimension is priviledged. On the contrary, we are facing an assumed and recognized practice in the contemporary and fine arts environment and are fullyexercising their corresponding powers and freedoms. However, photography even when documental registry is not a determining factor, always maintains, beca use of its technical characteristics, a necessary relationship with something real which is externai to it. We could say that photography occupies an ideal place between dream and reality, between being asleep and beeing awake. Photography, a place of insomnia and vigil.
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Todos conhecemos a experiência de intermináveis noites, madrugadas e manhãs em que nos debatemos entre adormecer e continuar acordados, entre acordar e continuar a dormir, entre querer adormecer e não conseguir. Mas o que significa nesse caso o verbo querer? Qual é esse outro desejo ou essa outra vontade mais forte que resistem ao querer? O que é que se quer? A fratura da mítica unidade do eu, a cisão do sujeito, instala-se através dessa contradição entre o que se quer e o que, de alguma outra maneira, também se quer. Em algum lugar, não se sabe onde, cabeça e corpo desejam ter, ao mesmo tempo, experiências diferentes em lugares diferentes. Perdida a clara e lúcida unidade da vontade de um eu que se assume como sujeito, perde-se igualmente a concepção unitária e o convívio normal com a normalidade do mundo. Estamos então disponíveis para experimentar mundos paralelos, para os desdobramentos da personalidade e para os prazeres do jogo em que existem as múltiplas figuras do duplo. Antes de adormecer ou acordar completamente, quando a consciência vacila e os olhos se fecham, estamos em um filme. Quando a consciência se sobressalta e os olhos se abrem, estamos em um outro filme. E depois já não sabemos se a consciência está desperta ou adormecida nem se os olhos continuam abertos ou fechados. As imagens e as cenas misturam-se, os filmes entrecruzam-se, multiplicam-se. A situação torna-se ainda mais complexa e sedutora quando teimamos, por exemplo, em ler um livro, ver um filme ou olhar para uma série de pinturas ou fotografias. Uma realidade em segundo grau, com sua estrutura ficcional própria, descola do real e oferece-se como matéria-prima privilegiada para desvios, apropriações e subversões, a serviço e ao sabor de nossas próprias ficções. Entramos num sistema de flutuação generalizada de imagens - reais, artísticas, mentais, oníricas - que se confundem para nos permitir a experiência de mundos paralelos tão efetivos como quaisquer outros. . Convém, agora, perguntar o que foi feito do eu que tinha começado por ser, ou melhor, por deixar de ser um sujeito de vontade. Se for um artista como Jorge Molder, estará na situação ideal para manter um mínimo de controle - e é importante que seja mesmo mínimo - que lhe permita continuar a administrar discretamente e de longe, através de fios muito tênues, sua circulação, suas figuras e funções, no interior da intrincada rede de possibilidades, imagens e ficções que vão se desdobrando à sua volta. Esse controle mínimo lhe permitirá seguir o fio das imagens que se encadeiam segundo seqüências de propósitos indetermináveis, entrecortados por acidentes e encontros fortuitos cujas conseqüências permanecem
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Ali of us have had those endless nights experiences, dawns and mornings in which we struggle between sleep and continuing awaken, between awakening and continuing to sleep. Trying to sleep and not succeeding. But what does the verb to want mean? What are these strong wishes that resist this wishing? What do we want? The break of the mythical unit of self, the division of an individual, is installed within this contradiction between what we want and what we, in some other way, want too. Somewhere, we do not know where, mind and body want to have different experiences in different areas at the same time. When the clear and lucid unity of oneself's will is lost and one assumes oneself as an individual, lost are also the unitary conception and normal convivium with worlds normality. Now we are available for parallel worlds experiences, for the unfolding of personality and joys of playing with multiple figures in double. Before we sleep or wake up completely, when consciousness vacillates and eyes close we are in a movie. When consciousness takes us unawares and eyes open, we are in another film. And after this we do not know if our consciousness is allert or asleep nor if our eyes are open or closed. Images and scenes get mixed up, films cross, expand and multiply. The situation becomes even more complex and seductive when during this process we insist in, for example, reading a book, watching a film or looking at a series of paintings or photographies. A reality of second degree, with its own fiction structures, detaches from concrete reality and offers itself as priviledged raw material for diversions, appropriations and subversions, at our own fictions' service and flavor. We enter a system of floating images whose origins - real, artistic, mental, oniric- dilute and confuse to permit us a "dismultiplied" experience of parallel worlds as effective as any other. When we arrive at this point in our speculations, we should ask what has happened to that one who had started to be, or better still, foresaking an individuais strong will power. If this individual is an artist, for example, Jorge Molder, he will be in the ideal situation of maintaining minimum control - it is important that it be minimum - permitting him to continue discreetly managing from a distance, through very fine threads, his passage, figures and functions, in the interior of a complex net of possibilities, images and fictions which are unfolding around him. This minimum control will permit him to follow a thread of images concatenated according to an undetermined sequence of purposes, intersected by accidents and casual encounters which consequences are maintained suspended.
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suspensas. Mas o que são afinal essas imagens? São os segredos do agente secreto, as provas do detetive, as visões do sonhador acordado, os truques do prestidigitador, a bola de-cristal do bruxo, o tesouro do mágico, a matéria-prima do artista. Este trabalho consistirá então em saber colocar-se na situação que lhe permita ver e viver essas imagens e poder produzi-Ias materialmente para colocá-Ias à disposição dos outros.
o artista, evidentemente, não precisa recorrer aos truques e artifícios da falta de sono. Ele sabe colocar-se na situação que lhe permitirá produzir as imagens que deseja. Para isso, um artista como Jorge Molder pode, por exemplo, desdobrar-se em duplos ou figuras que, por definição, engendram, alimentam ou habitam mundos paralelos e v,erdades de ficção, a meio caminho entre a realidade e a irrealidade. E o caso do detetive especulativo que Molder adotou em The secret agent, do prestidigitador melancólico que anima O sentido do prestidigitador, ou do bruxo erudito que passeia por esse lugar - hábitat por excelência de todas essas figuras - que Molder define no título da sua mais recente série com uma frase: "Por aqui quase nunca alguém passa".
o estado de prestidigitação corresponde, como a insônia, a uma situação semiconsciente, a um estado de entorpecimento deliberado do exercício onipotente da razão. Em estado de prestidigitação, sabemos que o que estamos vendo não é verdade, que é feito de um truque. No entanto, nos abandonamos à esperança de que o truque seja suficientemente perfeito e rigoroso para produzir a surpresa, o efeito, o acontecimento: o acontecimento da verdade do truque. Ninguém deixa de acreditar na magia por ela ser uma sucessão de truques. O sucesso do truque instaura a verdade paralela da magia. A noção do truque tem ainda a vantagem de nos afastar de toda a espécie de arbitrariedade espontaneísta. A magia exige o respeito por um conjunto fixo de regras e métodos, a utilização disciplinada de gestos meticulosos e precisos. Como se vê, estamos bastante próximos de l!m enunciado das condições de realização do trabalho do fotógrafo. E, afinal, um trabalho de rigor e precisão, aquele que permite a um autor como Jorge Molder desdobrar-se em múltiplos duplos que têm a liberdade de criar fantasias sem deixar de ser verdadeiros. Por isso, eles podem partilhar conosco fragmentos ficcionais de mundos paralelos, onde ainda são possíveis jogos, enigmas e crimes contra a ordem deste mundo. A máquina fotográfica, como a bola de cristal, tem tudo lá dentro. Mas, mesmo assim, é preciso saber olhar, ver e mostrar.
But what are these images? Theyare a secret agents secrets, a detectives evidences, an awaken dreamers visions, a prestidigitators tricks, a wizards crystal ball, a magician s treasure, the artists work raw material. This work will consist of knowing how to place oneself in a situation that permits looking at and living these images and finding out how to concretely produce them and how to make them available to others. Now we must explain that an artist does not need to use tricks and artífices of dreams or insomnia. An artist knows, and this he definitely knows, how to put himself in a situation that will allow him to produce the images he will make. To this end, an artist like Jorge Molder can, for example, unfold in doubles that which are figures that by definition create, feed or live truths of fiction and parallel worlds, in a mid-way between reality and unreality This is the case of a speculative detective whom Molder adopted in "The secret agent", a melancholic prestidigitator who encourages "The sense of the prestidigitator" or the erudite wizard who walks in these areas, a place where ali these figures that Molder defines in the title of his most recent series: "Here almost nobody passes". The state of prestidigitation corresponds, like insomnia, to a situation of semi-consciousness. A delibera te state of numbness, an all-powerful exercise in reasoning. In a state of prestidigitation we know that what we are seeing is not the truth, it is the effect of a trick. However, we abandon ourselves hoping that the trick is sufficiently perfect and rigorous to produce a surprise, effect or event: an event involving the truth of a trick. Nobody will stop believing in magic because it is a succession of tricks. The success of a trick installs a parallel magic truth. The notion of trick has another advantage, i.e., carrying away ali sorts of spontaneous arbitrariness. Magic requires respect for a set group of rules and methods, a correct use of meticulous and precise gestures. As one can see, we are pretty close to a statement on the photographers work conditions. In the end it is a rigorous and precise work permitting authors, such as Jorge Molder to unfold himself in multiple doubles and have enough freedom to make double dealings continuing to say the truth, hence sharing with us the fiction fragments of other parallel worlds where games, enigmas, one or another attempt against the current order of this world are still possible. The photographic machine, as a crystal ball, has everything inside. But, even being well equipped it is necessary to know how to watch, see and show Alexandre Melo
Alexandre Melo
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Nasceu em Lisboa em 1947. Estudou filosofia e fez sua primeira exposição individual em 1977. Bom in Lisbon, 1947. He studied philosophy and had his first solo exhibitions in 1977. Exposições individuais/Solo exhibitions 1983 Um Dia Cinzenta, Módulo, Lisboa. 1985 Ethos, Cósmicos, Lisboa; O Fazer Suave de Preto e Branco (em colaboração com o pintor Jorge Martins), Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa. 1987 Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, Lisboa; Autoportraits, Journées de la Photographie et de I' Audiovisuel, Montpellier, França.
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1988 Cabinet d'Amateur (em colaboração com o pintor Gaetan), Cósmicos, Lisboa; L'Oubli, Musée de L'Elysée, Lausanne; Zerlina, uma Narrativa, Teatro da Trindade, Lisboa; Galeria Labris, La Coruna. 1989 Fragments d'une Presence, Le Grand Huit, Rennes; Comptoir de la Photographie, Paris. 1990 The Portuguese Dutchman, Imagolucis, Porto; Artotheque de Grenoble, Grenoble; Contretype, Bruxelas. 1991 Convento de São Francisco (trabalhos anteriores/earlier works), Beja, Portugal; The Secret Agent, Cósmicos, Lisboa; Joseph Conrad, Cósmicos, Lisboa. 1992lnsomnia, Festival de Cahors/Derby Photo Festival, Derby.
1993 The Secret Agent, Galeria Trem, Faro; História TrágicoMarítima (projeto), Centre Georges Pompidou, Paris; Zerlina, uma Narrativa, Paço Imperial, Rio de Janeiro/Museu de Arte Moderna, São Paulo. 1994 The Sense of the Sleight of Hand Man, Jayne Baum Gallery, Nova Vork. Exposições coletivas/Group exhibitions 1990 Última Fronteira - 7 Artistas Portugueses, Centro Santa Mónica, Barcelona. 1991 Arco, Cósmicos, Madri; Tokyo Art Fair, Cósmicos; The Heart of Science, Centro de Estudos Fotográficos, Coimbra/Contretype, Bruxelas; Chicago Art Fair, Cósmicos; The Fourth Wall, Amsterdam; Photography Today,
The sense af the s/eight af hand man, 1993-94 série de 12 fotografias/ series af 12 phatographs 102 x 102 em
Moderna Galerija, Liubliana. 1992 Voyeurism, Jayne Baum Gallery, Nova Vork; Arco, Cósmicos, Madri; Vokohama Art Fair, Cósmicos; Primavera Fotográfica, Barcelona; La Premiere Photo, Galerie du Jour, Paris; 2ª Internationale FotoTriennale, Esslingen; L'Échapée Europeene, Pavillon des Arts, Paris; Minimal Relics, Universidade de Amsterdam. 1993 História Trágico-Marítima, Galeria Valentim de Carvalho, Lisboa; Arco, Cósmicos, Madri; Minimal Relics, Museu de História Natural, Rotterdam; Image First: Eight Photographers for the 90s, Laura Carpenter Fine Art, Santa Fé; Gitanes, Arles; Le Jardin de la Vierge, Espace 251 Nord, Bruxelas; Set Sentits, Sete Artistas Portugueses na Coleção da Fundação
Luso-Americana para o Desenvolvimento, Palau Robert, Barcelona; Jardins do Paraíso, Encontros de Fotografia de Coimbra, Coimbra. 1994 O Rosto da Máscara, Centro Cultural de Belém, Lisboa; Lieux de I'Écrit, Cahors. Coleções/Colleetions Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian; Fundação Luso-Americana para o Desenvolvimento; Art Institute of Chicago; Centro Cultural de São João da Madeira; Centro de Estudos Fotográficos de Coimbra; Fonds National d'Art Contemporain; Everson Museum of Art; Ayuntamento de Vigo; Museu de Arte Moderna do Rio de Janeiro; Musée de L'Elysée; Artotheque de Grenoble; Paris Audiovisuel.
Obras apresentadas/Works in the exhibition Insomnia,1992 série de 12 fotografias, 45 x 45 cm - c/moldura de 70 x 70 cm! series of 72 photographs, 45 x 45 em - with frame 70 x 70 em The sense of the sleight of hand man, 1993-94 série de 12 fotografias, Urlx 1m em -c/moldura 120 x 120 em! series of 72 photographs, 702 x 702 em - with frame 720 x 720 em Opassado, 1994 série de 12 fotografias 1mx 1m em -c/moldura 120 x 120 em! series of 72 photographs, 702 x 702 em - with frame 720 x 720 em
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INTRODUÇÃO A UMA COSMOGRAFIA
INTRODUCTlON TO A COSMOGRAPHY
Desmontar a estrutura complexa de uma obra como a de José Bedia, peça por peça, pode ser uma experiência tão proveitosa quanto desmontar um relógio para desvendar os segredos do tempo. Corremos o risco de encher nossas mãos com parafusos e engrenagens. Ainda assim, todos nós já tivemos algum dia vontade de fazê-lo, para analisar seus órgãos internos metafísicos, sem nos importar se ele voltaria a funcionar ou não.
Dismantling the complex structure of José 8edia's work in order to understand it is as helpful as to dismantle a clock in order to unveil the secrets of time. The only practical result of such an action will be a handfLfI of cog-wheels, screws and gears. Nevertheless, once in a lifetime, everybody has felt liklJ taking a clock to pieces in order to survey its metaphysical insides without being concerned to put them together again.
Nem sempre possuímos a erudição necessária para o reconhecimento da origem e significado dos elementos simbólicos que aparecem na obra de José Bedia. Nem todos sabem a importância do veado para a religião huichol ou da aura tinhosa para o culto afro-cubano de Paio Monte. Não temos na ponta da língua a história da América e dos incas como nos pedia José Martí. E também não conhecemos bem a história da África. Talvez sejam justamente estes os pontos que saltam aos olhos quando nos confrontamos com uma obra de José Bedia. Estamos tão compenetrados em nosso próprio mundo que nos é difícil compreendê-Ia. Não temos bagagem, familiaridade e paixão suficientes pelo que é nosso. A arte de Bedia parece solicitar do público uma atitude de consagração e irmandade, um compromisso que o impeça de trair ou mesmo esquecer esse universo retratado com devoção e respeito. Talvez o centro de toda a criação de Bedia seja a América, mais precisamente as Américas. Ainda assim, esse vasto território não parece grande o suficiente para abrigar sua obra, que ao longo dos anos foi adquirindo um caráter universal. Esse universalismo, ou melhor, esse pan-humanismo, é resultado de um esforço de fusão de
In fact, not always one will have erudition enough to understand the meaning and origin of each of the symbolic elements present in any of the works of José 8edia. Not everybody knows of the importance of the deer for the "huichol" religion and of the "aura tifíosa" for the PaIo Monte African and Cuban cult. We also do not have the history of America - of the Inca civilization - or the history of Africa at our fingertips, and they are, probably, the first thing we see when we look at works such as José 8edia 's. It focuses the American world in such a manner that our understanding of it is hindered by our lack of knowledge, familiarity and passion for that which belongs to this world in order to understand it. José 8edia's work seems to demand consecration and brotherhood from the public. Something that will prevent this universe, which the artist has created with such devotion and respect, from being betrayed or falling into oblivion. Perhaps, the core of alI the works created by 8edia is America, or even more precisely, the Americas. However, I believe that this territory is not large enough to describe the scope of his work, since throughout the years it has become more and more universal. This universalism, or rather, this humanist Pan-American aspect proclaimed by 8edia's work, results from an effort to summarize, unite and merge elements which belong to different geographic, historical and cultural horizons. Today, his work can be considered a kind of Esperanto. Although one can identify the root, the origin of each linguistic 197
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Pemba blanco, 1993 acrílico, óleo s/tela com objetos esparsos/acrylic, oilon canvas with found objects 211 x 353 cm
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elementos dos mais variados horizontes geográficos, históricos e culturais do planeta, com os quais o artista entrou em contato não somente através dos livros mas também de sua vivência pessoal. Atualmente, a obra de Bedia pode ser encarada como uma espécie de esperanto. Nela identificamos a raiz e a origem de cada elemento lingüístico que faz parte dessa mescla. A língua que utiliza é, entretanto, totalmente nova, porque a ela foram agregados componentes nascidos da imaginação criadora do artista. A homogeneidade alcançada por esse processo complexo e aleatório que confere unidade à linguagem de Bedia é resultado de um estudo pormenorizado de cada um dos elementos que participam da mescla, cuja analogia formal ou conceitual os transforma em um único elemento significativo. Já se disse sobre ele: "Não é assustador perceber que uma simples cruz grega concebida por Bedia conserve todos e cada um de seus significados culturais? Nela podemos ver claramente o 'Vowa' negro que representa o cosmos; o 'quincunce' de Ouetzalcoatl, os pontos cardeais venerados pelos índios lakotas, a madeira que representa o suplício para os cristãos, a morte, o traço fundamental da assinatura que identifica o nkisi Sarabanda e a si/á, ou seja, a encruzilhada (quatro caminhos, quatro ventos) do culto de Paio Monte. Como não deixar que a leitura que fazemos do amarelo em sua obra seja influenciada pelo fato dessa cor representar, ao mesmo tempo, a luz do sol, o capim seco das pradarias norteamericanas, o deserto e as 'vestes de ouro' dos astecas? Não é intrigante o fato de que dentro do caráter irregular e espontâneo de sua obra intervenham, paralelamente, recursos manuais de pintura corporal de uma tribo da Amazônia e técnicas de decoração de um tipi kiowa-apache?" Esses pormenores de seu processo criativo não são resultado de elucubrações retorcidas, mas sim de algo natural. Simplesmente aparecem como se fossem seqüelas inevitáveis do desenvolvimento de seu aprendizado, ao qual Bedia se dedica tanto ou mais que a suas obras. Ele parece conceber o exercício criativo como uma espécie de instrumento de corroboração, de confirmação de seu exercício especulativo, como se este fosse uma pista de provas onde verifica o resultado de seus conhecimentos. Cada obra possui esse critério experimental. Através de seu trabalho, Bedia nos mostra não só o nível de sua experiência cognitiva, mas também a verdade e riqueza dos interesses culturais que a compõem. O centro desses interesses sempre foi o homem das chamadas sociedades tribais, "primitivas", "selvagens", que possui uma cultura autóctone e ainda vive em muitas áreas do planeta de forma isolada ou como parte de diferentes culturas nacionais modernas. Bedia estuda a pré-história e a história dessas sociedades, seus costumes, estilos de vida, processos criativos, pensamentos mitológico, mágico e religioso, símbolos e expressões artísticas, enfim, o que sempre foi objeto de estudo da arqueologia e da etnologia. Utiliza-se dessas ciências mais do que da história da arte. Portanto, mesmo que encontremos em sua obra algum ponto de contato com procedimentos estilísticos do movimento pop ou do conceitualismo da arte povera, estes foram obtidos através de fontes remotas e tradições e não da arte contemporânea. Essa volta às origens não significa falta de conhecimento, mas sim indiferença em relação à arte contemporânea e valorização dos mecanismos e princípios criativos do mundo primitivo. Para Bedia, a história da arte se apresenta como um referencial secundário se comparada à informação que a etnologia, a arqueologia e sua experiência direta lhe propiciam.
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component that intervenes in the mixture, the language is new, beca use the artist's imagination and creativity have added original elements to it. The homogeneity achieved by this complex randomic processing, which causes Bedia IS work to blend perfectly without showing welding marks, is the result of a thorough study of each of the elements that take part in the mixture, which a formal ar conceptual analogy tums into a single significant organismo Here are some questions about his work that I have already mentioned in another text, but which I think worth quoting: "Isn It it scary to see that a simple Greek cross designed by Bedia keeps ali and each of its cultural meanings during its accomplishing? There, one can clearly see the 'Yowa I, a colored man who represents the cosmos; the Iquincunce de Quetzalcoat!', the cardinal points worshipped by the Lakota indians; wood, representing the Christian ordeal; death,' and the fundamental trace of the signature that identifies nkisi Sarabanda and the silá - a crossroads (four paths, four different winds) - of Pala Monte cult. When Ireading the yellow present in his work, can we avoid being influenced by the fact that it simultaneously represents the sun, the dry grass of the North-American fields, the desert, and the gold garment of the barefaced Aztecs? Can we disregard the fact that the spontaneous and irregular aspect of his paintings contain, in a parallel way, techniques which come from body painting procedures adopted byan Amazon tribe and those specially used in the decoration of a tipi Kiowa-Apache? " l
This unique characteristic of his creative process does not result from complex calculations, but occurs in a natural way It emerges as a side-effect of Bedia IS delving in America IS history, which keeps him as busy as the creation of his works does. He seems to consider the creative exercise as a kind of tool of his speculative exercise, as something that will be used as testing ground to his knowledge. This trial and error approach is present in every piece of his work. Bedia, by means of his work, shows us not only the levei achieved by his cognitive experience but also the variety and richness of the cultural interests which give shape to it. The core of these interests has always been the man who formed the so called tribal, "primitive" and "savage", societies, bearers of an original and authochthonous culture, and which still exist scattered ali over the planet, as islands ar part of different modem national cultures. Bedia delves into the pre-history and the history of these societies. He studies their habits, way of life, creative processes, mythological, magic and religious approach, symbolic systems and artistic expression, epigraphs that have been the subject of archaeology and ethnology He uses these two fields of study in his work more than history of art itself Therefore, even if we can see traits of stylistic procedures characteristic of pop art ar of the conceptualism of arte povera in his work, they were probably taken from remate sources and traditions that are far away from any contemporary artistic movement. If he makes use of procedures adopted by contemporary art in his pieces, he first disinfects, purifies and resumes them to their original condition. This step back does not mean lack of knowledge. It is an act of voluntary dismissal of the contemporary style and ratification of creative principies and mechanisms of the "primitive" world. In Bedia IS work, history of art plays a secondary role if compared to ethnology and archaeology, since he gathers much more information from the last two and from personal experience acquired in traditional events than from history of art itself His bookcases and files store a minimum indispensable amount of documents related to contemporary art and an enormous number of books and magazines about anthropological themes. In other words, while other Cuban artists of his generation were eager readers of magazines such as Art News and Art in America, Bedia collected the National Geographic Magazine and
Suas estantes e arquivos contêm um mínimo indispensável de documentos relacionados a arte contemporânea e um grande número de livros e revistas sobre antropologia. Em outras palavras, enquanto muitos dos artistas cubanos de sua geração eram leitores ávidos de revistas como Art News and Art in America, ele era um apaixonado colecionador da National Geographic Magazine e um estudioso de levi Strauss e de Frazer. O caráter homogêneo do fenômeno Bedia baseia-se portanto em suas referências bibliográficas# seu estilo de vida, os temas abordados em suas conversas, seu modo de vestir e até mesmo a decoração de sua casa. Por que depositamos toda a nossa confiança nos objetos e não no homem? As obras não devem monopolizar e definir nosso interesse pela arte. São apenas emanações, conseqüências, cujo centro de irradiação é sempre o homem. A personalidade de Bedia é moldada por princípios muito similares aos de sua obra. Sua vida tornou-se o prolongamento de sua arte. A biografia de Bedia deve ser concebida como uma espécie de antropologia. Nele, vida e arte formam uma única entidade. Suas viagens, seus estudos, sua coleção etnográfica e suas crenças são também formas de participação criativa. lembro-me de um acontecimento que mostrou como devemos procurar fora de sua arte muitos dos elementos que a compõem. Durante sua exposição individual Persistencia dei Uso, Bedia anunciou que faria uma palestra acompanhada de slides. Todos os presentes esperavam que falasse sobre suas obras, muitas das quais de difícil compreensão. Fomos surpreendidos, entretanto, com uma palestra de duas horas sobre como os índios de uma determinada tribo pintavam seus corpos, deformavam seus dentes e engrossavam o pescoço. Oueria transportar-nos para um mundo "primitivo" onde encontraríamos uma beleza "não-civilizada", "selvagem", e acreditou que o melhor modo de fazê-lo seria através de uma palestra didática. Sua obra propunha uma via indireta, demorada e complexa que requeria conhecimento prévio para que pudéssemos compreendê-Ia. Isso nos leva à questão: devemos ver Bedia apenas como um artista preocupado com a criação de uma linguagem pessoal, ou como um comunicador capaz de utilizar meios não artísticos para atingir seus objetivos? Na verdade, Bedia não deve ser encarado como um conquistador, mas como um conquistado. Ele se vale do universo "primitivo" sem a intenção de depredá-lo, entrega-se conscientemente à sua influência e experimenta uma transformação que permite que participe das vantagens e desvantagens que esse universo oferece. Esse processo envolve toda a sua existência. Segundo ele próprio, "as obras criadas a partir dessa transformação não são nada mais que testemunhos que tornam possível a participação das pessoas em minha experiência". O que Bedia chama de "minha experiência" reduz a criação artística a uma posição subalterna, cuja eficácia instrumental é utilizada pelo artista apenas para nos transmitir, parcialmente, sua profundidade e sua beleza. A paixão de Bedia pelo "primitivo" não é resultado de sua maturidade nem produto de suas leituras de antropologia, de suas viagens ou do contato com comunidades étnicas da América ou da África. Também não vem de sua devoção ao culto de Paio Monte. É uma paixão anterior, quase congênita. As primeiras imagens dela nos mostram um menino brincando com "índios" e "vaqueiros" de chumbo ou de plástico e que acompanha as peripécias de Pow Wow, o "indian boy" da TV da época. O menino lia Salgari e Verne e se deslumbrava com mundos exóticos. Os mais remotos documentos da
studied the lite and work of men such as Levi Strauss and Frazer. I believe that an analysis of the books he read, lite style, talks, clothes and the way he has decorated his house would be extremely fruitful to the assessment of the homogeneous aspect of this phenomenon called Bedia. Why do we focus the objects and do not focus the subject with the same interest? The works of art shouldn 't monopolize and define our interest in art. Theyare mere emanations, consequences and effects that derive from mano Bedia 's personality is molded by principies which are very similar to those present in his work. Somehow the lite of the artist has become an extension of his work. His biography must be conceived as a kind of anthropology, or at least as something more signiticant than a mere sequence of personal events. In Bedia lite and art merge as it they were a single entity. His trips, studies, ethnographic collecting and beliefs are some of the many ways through which he creates his work. They remind me of a passage that shows us the importance of searching for elements of Bedia's pieces outside them. During his solo exhibition entitled Persistencia dei Uso Bedia announced a speech and a slide show about his work. Everybody expected to hear about his creations, many of which were ditficult to understand. Surprisinglyenough, he spoke for two hours about the way some indians painted their bodies, deformed their teeth and stretched their neck. He wanted to take us back to the "primitive" world, to a "noncivilized", "savage" beauty. So as to achieve his goal he chose the didactic speech. His works represented an indirect, long and ditficult way to reach this "primitive" society. They required some previous knowledge to be understood and the speech provided it. This event makes us wonder it we can see Bedia only as an artist concerned with the establishment of an individuallanguage. In my opinion he is someone which is able to use artistic media to communicate and achieve personal goals. He is not a conqueror, but someone who is conquered. Bedia uses the "primitive" universe free of any predatory intention. When he enters this world, he surrenders to its influence and undergoes a transformation that enables him to equally share the vantages and disadvantages of it with its original participants. This transformation does not take place only at an imaginary levei. It can be clearly seen in his works. Its process in volves everything related to his existence. It is within the sphere of existence - that precedes and dominates the sphere of the imaginary - that the essential changes occur. According to Bedia, "the work pieces are mere evidence which enable people to participa te in my experiment". What he calls "my experiment" draws the artistic creation to a subordina te position and indicates that its instrumental efficiency is used by the artist only to partially show us its depth and beauty, and make us realize that sometimes art cannot express ali the knowledge he has and wants to transmit. Bedia's passion for the "primitive" is not the result of his maturity as an artist. It does not derive from his readings about anthropology, trips, contact with the ethnic American or African communities or his voluntary devotion to the Paio Monte cult. It is an old passion which revealed itself for the first time when as a child he played with lead or plastic "indians" and "cowboys", imitating the deeds of Pow Wow, the "indian boy" of a TV program of the time. During his childhood he read Salgari and Verne and was drawn to exotic worlds. Nobody knows why the North-American indians have always enthralled his imagination. The first documents which evidence his artistic gitt are copies of pictures of comics - called "mufiequitos" in Cuba - which show these indians, their battles and clothing. The artist-to-be dreamed of working for the "mufiequitos" as a cartoonist and of being one of these plumed and majestic characters. He was a Cuban white man who wanted to be a red-skinned North-American indiano This dream wi// partially come through in two remarkable occasions. In 7982, Bedia visited the Ethnographic 201
vocação artística de Bedia eram desenhos copiados de revistas em quadrinhos chamadas "muiíequitos", que falavam sobre a vida dos índios, suas batalhas e suas indumentárias. O futuro artista sonhava em trabalhar como desenhista para a revista e também em ser um desses majestosos personagens: um pequeno "cara-pálida" cubano que gostaria de ser um "pele-vermelha" americano. Seu segundo sonho será parcialmente realizado em duas memoráveis ocasiões. Em 1982, visitou o museu etnográfico de Budapeste, onde teve a oportunidade de vestir um autêntico traje de guerreiro Sioux. A importância desse acontecimento se reflete em uma obra que contém uma foto tirada na ocasião. O artista reconhece que foi a materialização de um sonho de infância. Em 1985, acontece algo ainda mais importante: durante uma viagem aos Estados Unidos, Bedia visita uma reserva Sioux, na Dakota do Sul, e passa uma breve temporada com a família Cuervo Perro. Nessa seqüência de acontecimentos, a arte está em segundo plano. Para o artista, ela representa a satisfação de necessidades de ordem espiritual muito mais amplas. Através dela, Bedia não se desenvolve como artista, mas como ser humano. Isso vale ta~bém para suas experiências com comunidades tradicionais da Africa, do México e do Canadá e sua devoção ao culto de Paio Monte. Em Bedia, a informação será sempre precedida pela formação, pelo aprendizado pessoal. Quando utiliza um elemento exótico, este já não pode mais ser considerado como tal, pois já foi assimilado e tornado parte de sua personalidade. Esse pode ser um recurso artesanal, um simples material ou uma forma de pensamento mitológico. Como, se não através da imaginação, pode um cubano chegar a ser um esquimó, um navajo ou um shipibo? Indo mais longe: como poderia encarnar um asteca da época de Montezuma? A imaginação, sem dúvida, tem papel importante nesse processo, portanto é praticamente impossível identificar o complexo cultural escolhido pelo artista. Em alguns casos tal processo se dá através da via real, como quando de sua palestra durante uma exposição: "O processo 202
Museum of Budapest and there he put on an authentic Sioux warrior garment. The importance of this event will be revealed in a work which makes use of a photo taken on this occasion and where the artist admits that it was the "materialization of a child's dream". In 1985, however, something even more significant happens: during a trip to the United States he visited a site, in South Dakota, where a Sioux tribe sti// lives, and stayed with the family Cuervo Perro for some time. The relevant aspect of this sequence of events conceming North-American indians is that it represents an interest only related to art in a secondary plane. It is far more connected to the fulfi//ment of spiritual needs that go beyond any artistic profit that he could take from these experiences. They do nót evidence the artist but inform and make the individual improve as a human being. This is also true for his experiences with traditional communities of Africa, Mexico and Canada as we// as for his participation in the Pala Monte cult. In Bedia we wil/ always see that information is preceded by formation, by the personal leaming of alI these ways of living and thinking that our modem civilization is naive enough to believe it had already transcended. Thus, when the artist uses an element which looks exotic in his work, one can be sure that it is not as exotic as it seems to be, once it had already been assimilated and became part of his personality. It does not matter if this element is a craftsmanship resource, plain material ar any kind of magic ar mythology. How can a Cuban become an Eskimo, a Navajo ar a Shipibo without availing himself of imagination? ar even going a bit further, How can he become an Aztec of Montezuma's time? As imagination is relevant for the accomplishment of this process, there is practica//y no chance to tota//yand effectively identify the cultural whole chosen by the artist. In some cases Bedia expresses himself within reality. These can be i//ustrated by the brief but clear text and slide show which I mentioned above. I believe that it is worth quoting a passage of the texto "The process - I ca// transcultural, since I have to name it somehow - which is taking place in the core of many autochthonous cultures, is happening within
Win, lose, play, 1994 acrĂlico s/tela com objetos esparsos/acrylic on canvas with found objects 300 x 400 cm
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transcultural, já que tenho que dar-lhe um nome - que se dá, atualmente, no seio de muitas culturas autóctones, também ocorre em mim, de maneira similar, mas inversa. Sou um homem de formação 'ocidentar que mediante um sistema pessoal, voluntário e premeditado, se aproxima dessas culturas e experimenta essas influências de modo igualmente transcultural", diz ele. Esta declaração revela a essência do mecanismo empregado pelo artista para garantir sua inserção nesse mundo primitivo. Ele consiste em renunciar a valores "civilizados" em benefício de outros "não-civilizados", em inverter radicalmente o sentido dos condicionamentos culturais que atuam sobre sua "formação ocidental", "moderna", e propiciar uma espécie de retificação histórica. Ofato dessa retificação envolver apenas o próprio artista não invalida sua intenção. Através de sua obra e atitude pessoal em relação a esse mundo "primitivo", Bedia consegue interferir na transformação de uma antiga noção de "progresso" presente na base de nossa cultura, em nome da qual deixamos de lado muitas das contribuições materiais e espirituais das sociedades etnográficas. Bedia não acredita, entretanto, em um retorno à barbárie, assim como não nega a tecnologia ou o pensamento científico moderno, mas enfatiza a necessidade de um equilíbrio que possibilite a universalização do conhecimento e a mescla das culturas "moderna" e "primitiva". Não devemos nos esquecer que o maior trunfo de Bedia em sua batalha para,fazer desse mundo "primitivo" o centro das atenções é sua paixão. E ela que gera no artista o impulso inicial de criação e não o intelecto, a razão. Assim como também é ela que o proíbe de inscrever-se de maneira ortodoxa nas chamadas tendências conceitualistas. Há sempre uma espécie de ardor e entusiasmo na forma com que Bedia assume o ato criativo que o torna incompatível com o distanciamento que caracteriza a arte do conceito. O que há de conceitual na arte de Bedia pertence mais ao nível preparatório de sua criação do que aos resultados plásticos. Os labirintos com que freqüentemente nos deparamos em sua obra são traçados por nossa ignorância, não por intenção do artista. Não existem elementos que dificultem deliberadamente sua leitura. Se para muitos parece impenetrável, isso se deve em grande parte à deficiência de nossa formação. Lembro-me de meus primeiros encontros com sua obra, especialmente com os desenhos de 1984 e 1985 e da estranha impressão de segurança e desconfiança que me causaram. Segurança, porque parecia que tudo era muito simples, quase uma burla à imaginação e inteligência; e desconfiança porque tinha o pressentimento de que algo, talvez o essencial, me escapava naquela rápida leitura. A simplicidade e quase infantilidade daqueles traços eram uma sutil armadilha: por um lado permitiam compreensão imediata e por outro causavam um secreto mal-estar, pois me colocavam no umbral do conhecimento e da compreensão. Atualmente, mesmo tendo consciência dessa ambigüidade, não consigo superar esse sentimento. Creio ter compreendido sua obra, mas ao conversar com ele percebo que nem tudo ficou claro. Entretanto, é bom que isso aconteça. A melhor arte sempre obedece ao seguinte princípio: simplicidade por fora e complexidade profunda e inesgotabilidade por dentro - se é que podemos dizer que haja "dentro" e "fora" em obras de arte. I
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myself in a similar, however inverted, fashion. I am a man with a "westem" background that by means of a personal, voluntary and intentional process intends to come c10ser to these cultures and experience their influence in a equal/y transcultural way". This statement, that wil/ remain incomplete for the time being, brings to light the mechanism used by the artist to ensure his entrance into the "primitive" world. It consists of the negation of some "civilized" values in favor of some "non-civilized" ones; radical inversion of meaning of the cultural conditioning present in his "modem westem background':· and providing, to a certa in extent, a kind of historical rectification. The fact that this rectification only in volves the artist does not nul/ify the positive aspect of the intention. Through his work and personal attitude towards this "primitive" world, 8edia manages to interfere in the modification of the old meaning of "progress" present in the basis of our education and culture. Due to this meaning, many material and spiritual contributions granted by the ethnographic societies to modem ones have been forgotten. It does not mean that 8edia wants to resume to barbarism, as one may think beca use of what was said above, or that he is against technology or modem scientific thoughts; on the contrary, his works pay respect to them. He only wants to emphasize the need for a new correlation, for a balance that wil/ enable the true universalization of knowledge and culture. He believes that this balance wil/ not be attained unless we make use of elements present on both sides. We must not forget that 8edia 's greatest advantage in this struggle to bring the "primitive" world to our attention lies in his passion for it. This is the real driving force behind his creativity. This is what prevents his work from being included, in a traditional way, into the so cal/ed conceptualist trends. There is always a kind of enthusiasm present in the way 8edia performs the creative task. It makes him incompatib/e to the detachment and indifference characteristic of conceptual art. The conceptual elements of 8edia 's works refer to the first stage of the creative process rather than to the images we see. The labyrinths we may see in his pieces are not drawn by the artist, but by our ignorance. There is not a single element which has the purpose of making the "reading" of the pieces difficult. If they seem weird and devious or even inaccessible it is, to a great extent, due to flaws in our education, not to any sort of meanness of the artist. In my opinion he represents his ideas and beliefs as plainly as possible. When I recaI/ my first contact with 8edia 's work, especial/y with his drawings dated '84 and '85, I remember the peculiar feeling of safety and suspicion that they evoked. I felt safe, beca use for me it was as if everything were on the surface. It was so plain that it was nearly a joke with my imagination and intel/igence. On the other hand I felt suspicious, beca use I had the foreboding that something essential was being missed in that first and quick "reading". The straightforwardness of those works was sort of a trap: on one hand it al/owed immediate understanding,· on the other, provoked a horrible feeling that you were not able to total/y understand them. Today, being aware of this ambiguity, I stil/ feel the same. I normal/y think that I have completely understood the piece and when I ask him about it Ileam that I have missed something. However, I believe that it is a good signo What is the use of being the wittiest? The best works of art have always fol/owed this principie: plainness on the outside and complexity inside - that is, if we can say that works of art have "ou tside s" and "insides". This usual/y happens without any effort by the artist; it is more a physiological than a cultural manifestation. From a cultural point of view we cannot see 8edia as a prototype delineated by characteristics common to his countrymen. Actual/y, he is the product of a special kind of cultural miscegenation that he himself has emphasized as he
Culturalmente, Bedia não constitui um protótipo que pode ser traçado a partir de características comuns a seus compatriotas. O artista sofreu um processo peculiar de "mestiçagem" cultural, que se encarregou de reforçar uma direção quase contrária à habitual, dando preferência àqueles elementos culturais ,presentes em estágios arcaicos de culturas mais desenvolvidas. Bedia detecta esses elementos onde quer que estejam e apropria-se deles, utilizando-os em seu trabalho. Conheço poucos artistas que tenham essa capacidade de descobrir o pomposo e o artificial em qualquer acontecimento cultural, antigo ou moderno. O "espírito barroco" tem sido utilizado para definir muitas de nossas expressões culturais e artísticas, mas não podemos aplicá-lo a José Bedia. Todo o seu trabalho é marcado por certo asceticismo. Mesmo suas instalações, que dariam margem a exageros, são econômicas. Ele tende a descongestionar, eliminar todos os elementos barrocos e supérfluos que possam prejudicar a leitura da idéia central da obra. Bedia vê a arte mais como meio de comunicação do que de expressão. Para ele, o o que é mais importante do que o como. Privilegia a mensagem, não o estilo, que aparece como conseqüênci,! de seu esforço de comunicação. Ao referir-se à sua obra, disse: "E uma intenção de comunicação e de comunhão entre o universo material e espiritual do homem "moderno" e "primitivo". Em nome dessa intenção, ele sacrifica qualquer outro propósito, inclusive a descoberta de uma linguagem nova e diferente que para muitos artistas é o caminho da fama e o único modo de atingir a individualidade. Se Bedia conseguiu criar um novo vocabulário, isso ocorreu como uma feliz conseqüência de sua arte. Não devemos nos esquecer que sua linguagem, ou parte de seus recursos pictóricos, resultam de linguagens anteriores das quais o artista se apropriou para estabelecer seu próprio discurso (por exemplo, a incorporação do chamado "estilo realista masculino", próprio dos índios Dakota como padrão de representação gráfica). O laconismo gráfico que caracteriza o desenho de Bedia o aproxima da origem da escrita. Sua linguagem parece ter a mesma capacidade sintética das antigas pinturas pictográficas, não só pelo emprego sistemático de alguns signos estereotipados (como as marcas de ferraduras que significam cavalos ou a linha em ziguezague que . representa o raio), mas também porque estrutura suas imagens como textos que possuem várias leituras, dependendo de como os códigos são decifrados (de forma mitológica, simbólica, histórica, etc.). Essa estrutura é apoiada por uma linguagem escrita presente em quase todos os seus desenhos, pinturas e instalações e funciona como um breve desdobramento de significados, ou servem para enfatizar o conteúdo literário e poético das imagens. Esses signos verbais nos ajudam a decifrar situações ou identificar personagens, e reduzem o campo sempre crescente das suposições. Talvez Bedia saiba ou pressinta a existência de um horizonte inalcançável em suas obras e divirta-se criando pontes com a certeza deque o espectador sempre terá dúvidas e buscará caminhos através da imaginação. Seus deuses são heróis culturais, guerreiros capazes de mover-se e atuar em qualquer época e revolucionar a história. Através de sua arte, tenta trazer os deuses à terra para completar a obra do homem, não para transformá-Ia em um novo paraíso, mas para levá-Ia de volta à sua condição original. Em tempos de desconfiança e incredulidade, podemos pedir algo melhor à arte?
tumed his interests towards an unusual direction. This direction is that which grants more importance to cultural elements of a lower levei of evolution, and which are present in archaic stages of developed cultures. He detects them wherever they are and appropriates them for his work. I know very few artists who have this ability of dismissing artificial and pompous things in any cultural context. The "baroque spirit" that has been used to define many of our cultural and artistic expressions as well as our daily attitudes and behaviors, is not quite suitable when the subject is José 8edia. His whole work is marked by an asceticism which has rarely been put aside during his career. Even his installations that could have been marked by excess are free of baroquism. 8ediatends to "clean" the space, getting rid of any superfluous element that may hinder the understanding of the basic proposition of the piece. 8edia approaches art as a means of communication rather than one of expression. For him the wordwhat is much more important than the word how, and style appears as an extra element while he is trying to gethis message through. His interest exceeds by far his self-worship need that is present in the basis of nearly ali his pieces, and which can be defined as the way he found to express his feelings and ideas, so as to affirm and impose his individuality. 8edia seems to have an ambitious and quite utopian objective. Once, talking àbout his work he said, "It is an attempt to establish communication between the material and spiritual universes of the 'modem' and 'primitive' man ". In behalf of this, he has sacrificed everything else, including the finding of an originallanguage which - according to many artists - will identify and distinct one individual from the other. If he has succeeded in developing this individual vocabulary, one can be sure that it happened as a consequence of his attempt to communicate his message. His language - ar part of the graphic, pictorial and structural resources he uses results from previous languages adopted and processed by the artist (as an example, there is the so called "masculine realist style characteristic of the Dakota indian 's drawings). 11
The graphic laconic style which characterizes 8edia 's drawings draws him near the first alphabets and scribbles created by mano His language seems to search for the same ability to condense information of some ancient pictographic scribbles. He not only uses some stereotyped signs systematically (marks left by horseshoes to represent horses; zigzag lines to represent chain lightning) but also structures his images as texts that demand from the viewers as many readings as codes they can decipher (mythological, symbolic, historical, etc.). This kind of structure is supported by the presence of written language in nearly ali his drawings, paintings and installations, and constitute a brief unfolding of meaning ar literary and poetic reinforcing of the general content of the images. The role of the verbal signs is to help lhe viewer to identify situations and characters and diminish the always increasing roam for suppositions. Perhaps 8edia knows ar forebodes that his works always present a receding horizon and enjoys himself drawing bridges, certa in that they are going to have to use their imagination in arder to be able to understand his work. This attitude makes his apparent plainness and simplicity even more mysterious and enigmatic. His gods are cultural heroes, warriors that are able to move and act at any time in history and change it. Through his work José 8edia is trying to bring these gods to Earth so that they can complete man 's work. He does not want to tum the Earth into Paradise, he just wants to resume it to its original state. In a time of suspiciousness and skepticism can we ask art for anything better than that? Orlando Hemández
Orlando Hernández
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Un animale errante, s/d acrílico s/tela/ acrylic on canvas
Nasceu em 1959 em Havana, Cuba. Cursou a Escuela de Artes Plásticas San Alejandro, em Havana, formando-se em 1976. Em 1981, formou-se no Instituto Superior de Arte, Havana. He was bom in 7959 in Havana, Cuba. In 7976 he graduated from the Escuela de Artes Plásticas San Alejandro and in 7987 from the Instituto Superior de Arte, both in Havana. Exposições individuais!Solo exhibitions 1910 Crónicas Americanas, Casa
de la Cultura de Plaza, Havana.
1982 Crónicas Americanas 11, Casa de la Cultura de Plaza, Havana. 1984 Persistencia dei Uso, Museo Nacional de Bellas Artes, Havana. 1986 Crónicas Americanas 111, Centro Wifredo Lam, Havana! Museo Metropolitano de Manila, Manila. 1.7 Tres Visiones dei Héroe, Castmo de la Real Fuerza, Havana. 1989 Viviendo ai Borde dei Río, Castillo de la Real Fuerza,
Havana/ Galería Angel Romero, Madri; Final dei Centauro, 3ª Bienal de Havana, Havana. 1990 Recent Work, Forest City Gallery, London, Canadá. 1991 Los Presagios, 4ª Bienal de Havana, Havana; Special Project, Frumkin/Adams Gallery, Nova Vork; Sueno Circular, Ninart, Centro de Cultura, Cidade do México. 1992 José Bedia, Frumkin/Adams Gallery, Nova Vork; Brevísima Relación de la Destrucción de las Indias, Museo de Arte Contemporáneo
Carrillo Gil, Cidade do México; EI Hombre de Hierro, Galería Curare, Cidade do México. 1993 EI Viaje de Bedia e Capelán en Suecia, Kulturhuset, Estocolmo; La Isla en Peso, Galería Nina Menocal, Cidade do México. Exposições coletivas/ Group
exhibitions 1981 Volumen I, Galería de Arte Internacional, Havana; First Look: 10 Voung Artists from Today's Cuba, Westbeth Gallery, Nova Vork; Contemporary Cuban
Posters, Drawings and Graphics Exhibition, Kabul, Afeganistão; Cuban Grafic, Galeria Husets, Suécia; Kuubalaisia Piirustuksia, Galeria Taidema Lariliiton, Helsinque; Posters, Drawings, Graphics from Cuba, Galeria Lait Kala, Nova Délhi; Salón Nacional Girón 1981, Museo Nacional de Bellas Artes, Havana; Sano y Sabroso, Centro de Arte 23 y 12, Havana; 10 Salón Nacional de Pequeno Formato, Sala Lalo Carrasco, Havana . . 1982 Los Novísimos Cubanos, Signs Gallery, Nova Vork; Salón Paisaje '82, Museo Nacional de Bellas Artes, Havana; Salón Permanente de Jóvenes, Museo Nacional de Bellas Artes, Havana; EI Paisaje en la Pintura Contemporánea,2ª Bienal Iberoamericana de Arte: Museo de Arte Contemporáneo Carrillo Gil, Cidade do México; 4x4: José Bedia, Gustavo Pérez Monzón, Ricardo Rodríguez Brey, Rúben Torres Llorca,Galería Havana, Havana; XXI Premio Internacional de Dibujo, Fundació Joan Miró, Barcelona. 1983 Encuentro de Jóvenes Artistas Latinoamericanos, Casa de las Américas, Havana. 19841ª Bienal de Havana,
Museo Nacional de Bellas Artes, Havana; Voung Cuban Painting, Toronto University, Toronto; Dibujos Cubanos, Museo Nacional de Bella·s Artes, Havana; Indoamérica, Fondo Cubano de Bienes Culturales, Havana; Jóvenes de Hoy, Museu Central, Tóquio; Twenty Cuban Painters, Galeria Stuttgart, Alemanha. 1985 New Art from Cuba, Amelie Wallace Gallery, Nova Vork; De 10Contemporáneo, Museo Nacional de Bellas Artes, Havana. 19862ª Bienal de Havana, Museo Nacional de Bellas Artes, Havana; EI Arte con la Sonrisa, Milão/ Veneza/ Regio Emilia/ Turim/ Gênova/ Roma; Ejes Constantes/Raíces Culturales, Galería Alternativa, Cidade do México; Exposición de Dibujos, Galería Angel Romero, Madri; Exposición de Paisaje, Galería de Galeano, Havana; Pintura Cubana Actual, Museo de Arte Costarricense, San José. 1987 Art of the Fantastic - Latin American 1929/1987, Indianapolis Art Museum, Indianapolis/ Queens Museum, Nova Vork; 1ª Bienal de la Pintura de Cuenca, Cuenca,
Equador; 19ª Bienal Internacional de São Paulo, São Paulo; 70th International Exhibition of Drawing, Galeria Moderna, Rjjeka, lug,oslávia. 1988 Signs of Transition: 80's Art from Cuba, Museum of Contemporary Hispanic Art (MOCHA), Nova Vork; Raíces en Acción, Museo de Arte Contemporáneo Carrillo Gil, Cidade do México; Bienal de Gráficas, Rijeka, Iugoslávia; Made in Havana, New South Wales Art Gallery, Sidney. 1989 Trajectoire Cubaine, Centro Cultural Pablo Neruda, CorbeilEssonnes, França/ Comuna de Orvieto, Toscana/Comuna de Gibelina, Sicília, Itália; Contemporary Art from Havana, Riverside Studios, Londres; Magiciens de la Terre, Centre Georges Pompidou, Paris. 1990 Bienal de Veneza, Veneza; Arte Contemporáneo de Cuba, Museo de Arte Contemporáneo de Sevilla, Sevilha; Kuba O.K., Stadtische Kunsthalle, Düsseldorf; No Man is an Island, Museu de Belas-Artes, Pori, Finlândia; Among Africas/ln Americas, Walter Phillip Gallery, Banff, Alberta, Canadá. 199115 Artistas Cubanos, Ninart, Centro de Cultura, Cidade do
!
México; Los Hijos de Guillermo Tell: Artistas Cubanos Contemporáneos, Museo de Artes Visuales Alejandro Otero, Caracas/Banco de la República de Colombia, Bogotá; Mito y Magia en America: los Ochenta, Museo de Arte Contemporáneo de Monterrey, Monterrey; Renacimiento Cubano, Maatschappij Artiet Amicitiae, Arttra Foundation, Amsterdam; Okanata, A Space, Toronto; The Bleeding Heart, Contemporary Art Institute, Boston. 1992 La Década Prodigiosa: Plástica Cubana de los '80, Museo dei Chopo, Cidade do México; Artistas Latinoamericanos dei Siglo XX, Estación Plaza de Armas, Sevilha; Hotel de Arts, Paris; Ante América, Biblioteca Luis Angel Arango, Casa Luis López Mesa, Bogotá; Si Colón Supiera ..., Museo de Monterrey, Monterrey; Arte Cubano Actual, Centro Cultural/Arte Contemporáneo, Cidade do México; José Bedia, Arturo Cuenca, Italo Scanga, Porter Randall Gallery, La Jolla, Califórnia; AI Encuentro de los Otros, Universidade de Kassel, Kassel, Alemanha; Turning the Map: Images from the Americas, Camerawork, Londres; América: Novia dei Sol, Museu Real de Belas-Artes de Antuérpia, Antuérpia. 1993 Cartographies, Winnipeg Art Gallery, Manitoba, Canadá; Latin American Artists of the Twentieth Century, JosefHaubrich-Kunsthalle, Colônia. Lei Iões/A uctions
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Auction '92, Museo de Arte Contemporáneo, Monterrey. Prêmios/Prizes 1982 Gran Premio dei Salón dei Paisaje, Havana. 1986 Prêmio da 2ª Bienal de Havana, Havana. Coleções/Collections Museo de Bellas Artes, Havana. Porin Taide Museum, Finlândia. Museo de Bellas Artes, Caracas. Filadelfia Art Museum, Filadélfia. Museo de Arte Contemporáneo, Monterrey. Ludwig Museum, Colônia. Centro Cultural/Arte Contemporáneo, Cidade do México. Ninart, Centro de Cultura, Cidade do México. Frumkin/Addams Gallery, Nova Vork. Galería Angel Romero, Madri. Peter Ludwig Collection, Colônia. Coleção Joel Rocha, Cidade do México. Coleção Aurelio López Rocha, Guadalajara. Coleção Licio Minvielle Lagos, Cidade do México. Coleção Volanda Santos de Garza Laguera, Monterrey. Coleção Diego Sada, Monterrey. Coleção Maurício Fernández Garza, Monterrey. Coleção Lorenzo Zambrano, Monterrey. Carlos Manuel de la Cruz Collection, Miami. Coleção Jerry Lindzon, Marbella. Carlos J. Gómez Collection,
Nova Vork Obras apresentadas/Works in the exhibition Who will p/ay the drum, 1994 acrílico s/tela/acry/ic on canvas 300 x 400 cm Win, Jose, p/ay, 1994 acrílico s/tela com objetos esparsos/acry/ic on canvas with found objects 300 x 400 cm Entrevista com José Bedia* Nina Menocal: Em que se diferencia o trabalho de vanguarda cubano e mexicano? José Bedia: Com exceção de alguns casos, como o de Silvia Gruner, Gabriel Orozco e Diego Gutiérrez, que têm propostas diferentes, a arte mexicana está voltada para uma pintura que parece acima de tudo excessivamente preocupada em demonstrar uma qualidade factual. Os quadros apresentam técnicas elaboradas do começo ao fim, o que chamamos de "ali over painting". Já o trabalho dos cubanos consiste em expor conteúdos de maneira sucinta e clara. Enquanto o artista mexicano tem de pensar em um colecionador burguês - que quer um quadro digerível em relação ao tema, tamanho, técnica e boa apresentação -, nós expressamos nossas idéias sem preconceitos e impomos uma apreciação estética diferente. Não temos preocupações formais porque não precisamos provar nosso ofício a ninguém.
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N.M.: Onde nasceu essa vanguarda cubana? De onde você vem? J.B.: Em 1981, a partir da exposição Volumen I, reàlizada em Havana, artistas e críticos americanos e franceses começaram a prestar atenção em nossas obras. Viram que algo diferente estava acontecendo em Cuba. Não produzíamos mais aquela arte gráfica e os cartazes que caracterizaram a década de 70. Os artistas de minha geração nunca pintaram quadros de Lênin, de Che Guevara ou de Fidel discursando em praça pública. Não foi fácil, mas orgulho-me de dizer que não fizemos concessões. A partir daí, Cuenca, Elso, Ricardo Brey e eu começamos a ser convidados para participar de eventos internacionais e ganhamos bolsas de estudos. N.M.: Acreditava-se que Cuba era um país fechado. O que aconteceu com os artistas? J.B.: Na verdade, era assim até depois da 1a Bienal de Havana, em 1984. Em 1985, recebi a primeira bolsa de estudos e fiquei em Nova Vork durante quatro meses como convidado da Fundação Ford. Até então uma bolsa equivalia a ir para a União Soviética, Hungria ou Polônia. N.M.: Você recebeu ajuda do Estado? J.B.: Sim, deram-me liberdade
de expressão e a chance de participar de mostras importantes como as bienais de Veneza e de São Paulo. Casualmente, naquele momento a direção do Ministério da Cultura estava muito interessada em promover valores jovens e mandava os melhores artistas cubanos aos eventos internacionais. Foram justos. Muito antes de mim, por exemplo, mandaram Cuenca à Bienal de Paris de 1983. Entretanto, a situação no Ministério começou a mudar com a substituição de Marcia Leiseca e de Beatriz Aulet em 1990. Isso se deu por causa de obras de cunho político de jovens artistas que decidiram representar temas de ordem social e retratar o dia-a-dia cubano. N.M.: Você não foi afetado por essa troca? J.B.: Eu não pertencia a esse grupo de jovens cuja obra possuía um caráter quase jornalístico, muito centrada em determinado momento histórico de Cuba. Assim como muitos da minha geração, prefiro trabalhar com valores mais eternos, se é que se pode chamá-los assim. N.M.:Há dois anos você vive fora de Cuba. Por quê? J.B.: O país nunca forneceu os recursos necessários para os artistas trabalharem, por isso quase todos foram embora. Para sobreviver, era obrigado a dar aulas. O Fondo de Bienes Culturales não vendia meus
trabalhos em Cuba, alegando que não eram comerciais. Vendia, no entanto, obras de outros artistas que não tinham a mesma qualidade nem a competência para ensinar. Havia quatro poderes paralelos na cultura: o Fundo; o Ministério; Lilian Llanez, do Centro Wifredo Lam; e Alfredo Guevara que, com prestígio e independência, promovia um grupo de artistas. Havia disputa de poder entre eles, portanto dependendo de quem nos protegia acabávamos sendo prejudicados de alguma forma. Minha geração era c0l!10 uma mesa sem uma perna. Odios pessoais e ress~ntimentos faziam parte da convivência, causando a formação de pequenos grupos rivais. N. M.: Vocês ainda estão divididos? J.B.: De certa forma, sim, por causa de rancores antigos e de mal-entendidos. N.M.: Nesses dois anos que passou no México, você se transformou em uma estrela internacional, participando de exposições no MOMA, em Sevilha, Paris e agora em Colônia e Nova Vork, onde fez três exposições individuais na Galeria Frumkin/Adams. Qual é o papel do México nesse processo? J.B.: Desde que me mudei para o México tenho tido muitas idéias e vontade de trabalhar. Interesso-me em especial pelas comunidades indígenas'do
norte do México: huicholes, coras, yaquis, seris e tarahumaras. Eram antigos caçadores, dotados de bagagem técnico-artística e muito ligados a uma sabedoria ancestral que pretendo reconstruir. Em minha cultura afro-cubana e nas tradições indígenas encontro pontos comuns que me confirmam como uma espécie de portador de um patrimônio histórico muito velho. Artistas do início do século detiveram-se em aspectos específicos da arte primitiva, como as talhas em madeira, por exemplo, porque isso lhes permitiu dar formas cubistas às suas obras. Prefiro buscar um conhecimento geral, mais sensível e inspirado. Pretendo destacar a presença do passado no presente. Você não precisa ter nascido no México para ter carinho pelo país, aprender com ele e produzir arte. N.M.: E você pretende continuar morando no México? J.B.: Gostaria de continuar morando aqui para sempre. O Ninart trouxe a oportunidade de me estabelecer aqui com minha mulher e meu filho e de ter boas condições de trabalho. O Ninart tem sido a prova de que nosso trabalho tem valor comercial, é bem aceito e pode ser promovido com dignidade. Participei de uma exposição chamada 15 Artistas Cubanos que foi considerada histórica do ponto de vista ideológico. Pela primeira vez, dois grupos
cubanos supostamente diferentes apresentaram-se juntos. Percebemos então a importância de fazermos parte da mesma cultura e de reconhecermos mutuamente nosso valor. N.M.: É possível um artista cubano fixar residência no México? J.B.: Há problemas legais por parte do México ou de Cuba e isso causa certa intranqüilidade. Pela primeira vez na vida, encontrei um lugar onde posso trabalhar, onde tenho à mão minha coleção de livros e objetos que representam mais do que uma coleção de arte e culturas etnográficas, uma vez que são meus instrumentos de trabalho. Aqui no México tenho todas as coisas de que necessito para minha informação. N.M.: A que coisas você se refere? J.B.: A todos esses objetos de arte prove!1ientes da Asia, Oceania, Africa, América Latina e América do Norte. Tudo isso é parte de mim, tem um significado estético. São flechas, máscaras, escudos, objetos que influenciam meu trabalho. N.M.: Como você encarou ter sido objeto de uma reportagem na Newsweek e capa da edição de janeiro de 1993 da Art Nexus? J.B.: Tudo aconteceu por acaso, foi uma série de coincidências favoráveis: artistas agruparam-
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se para produzir uma arte diferente; um grupo de pessoas foi ao nosso país e reconheceu o valor de nosso trabalho; tiraram-nos de lá e divulgaram nossas obras no exterior; tínhamos idades próximas, compúnhamos a nova geração. Isso coincidiu com a proposta do Ministério da Cultura, que nos mandou a eventos e bienais de importância internacional. O aniversário dos quinhentos anos do descobrimento da América, ou do início da formação de uma cultura latino-americana, no ano de 1992, chamou a atenção do mundo para a arte latino-americana e para a arte cubana. N.M.: Os cubanos estão na moda? J.B.: Mais que moda, é uma coisa concreta, real. Se até mesmo o Ocidente nos dá valor, é por que temos algo que eles não têm. Temos sensibilidade, espiritualidade, riqueza cultural e experiências interessantes, coisas que se algum dia eles possuíram, já não têm mais. N.M.: E quanto a sua nova obra, La isla en peso? J.B.: Otítulo do livro de Virgilio Pinera me agradou porque esta é a primeira exposição que faço fora de Cuba, pensando na ilha com nostalgia. A idéia de carregar a ilha como um peso me agradou. Quis transportar sua cultura para outro lugar, ter todo o tempo consciência do que eu era. É como uma montanha onde se plasma a ' imagem da Virgem de la Caridad 210
dei Cobre, padroeira de Cuba, amamentando uma criança. A montanha está sobre um barco e este, por sua vez, sobre a cabeça de um grupo de pessoas que representa os cubanos. É o quadro intitulado La isla en peso. Nina Menocal
* Transcrita do catálogo da exposição La Isla en Peso, Galería Nina Menocal, Cidade do México, janeiro de 1993 Interview with José Bedia * Nina Menocal: Is there any difference betweei1 the Cuban and Mexican avant-garde art? José Bedia: With the exception of few artists such as Silvia Gruner, Gabriel Orozco and Diego Gutiérrez, who are working with new proposals, I feel that Mexican art is excessively preoccupied with "painting-painting", aiming at demonstrating quality above ali. The paintings are filled with good craftsmanship from end to end, what is known as "ali over painting". On the other hand, the Cubans work with ideas, or content, in a clearer and more concise fashion. While the Mexican artist has to keep in mind the bourgeois collector - who wants a painting with a theme, size, technique, and appearance which is easily digested - we state ideas free of prejudices. So we are imposing a different kind of taste and of art appreciation. Our preoccupations are thus not exclusively formal because we do not have to prove our workmanship to anyone.
N.M.: Where does this Cuban avant-garde come from? Where do Vou come from? J.B.: Ever since 1981, after the Volumen I exhibition in Havana, American and French artists and critics started to come down. They took interest in our work. They realized, contrary to what they expected, that something very different to the graphic art and posters of the 70s was going on in Cuba. Indeed, the artists of my generation never painted Lenin nor Che Guevara, nor did we paint Fidel talking in the plaza. The fact that we made no concessions in art, but did what we should do in ali honesty, fills me with pride. And then everyone came looking for uso They already had my name, Cuenca 's name, Elso 's, Ricardo Brey's... we started getting grants and invitations to international events. N.M.: Cuba is supposedly a very closed country. What happened to the artists then? J.B.: It was, until the First Havana Biennial in 1984, and the first grant came in 1985. I went to New York for almost four months invited by the Ford Foundation. Before that moment to think of a grant was to go to the Soviet Union, or to Hungary, or Poland. .. N.M.: So Vou would say the Cuban government helped vou. J.B.: It did. In the sense that it permitted me to do the work I wanted to do and sending me to participa te in such important events as the Venice and São Paulo Biennia Is. By chance, at that
moment the directors of the Ministry of Culture had real interest in promoting young talent, so they sent the best Cuban representation to international events. I believe they did it in a fair and moderate manner. For example, Cuenca was sent much ahead of myself to the Paris Biennial, in 1983. The situation in the Ministry of Culture started to change, however, in 1990. Marcia Leiseca and Beatriz Aulet were substituted when young artists than ourselves began to do contesting work, with very criticaI images referring to social themes and every day Cuban lífe. N. M.: But Vou were not affected by this change? J.8.: I did not belong to that tendency of young artists whose work was almost journalistic, recording daily lífe, and very localized in one moment of Cuban history. Instead, I do prefer, together with others from my generation, to work with general and possibly eternal values, íf Vou can call them such. N.M.: You have now been living outside Cuba for the last two years. Why? J.8.: The country never came up wíth the necessary resources for my generation to give ali it had to give. This is why almost ali artists have left. We had no space, no studio to paint. No resources. I was tied to teaching, in which I had no interest whatsoever, in order to subsist. The Fondo de Bienes Culturales was not selling my work in Cuba because, or so it was said, it was not commerciaI. But it was selling works by other artists who did not
have the possibility, not our quality, as to be teachers. There were four parallel powers in the Cuban art world: /lEI Fondo/l, the Ministry of Culture, and the two figures that are still holding their posts: Lílian Llanez from the Wífredo Lam Center and Alfredo Guevara, a prestigious and independent promoter of a group of artists. Each power was always fighting with the other. That is why we artists were always missing something, depending of which power was protecting uso My generation was like a table without one leg. Personal hates sprung among us, divisions, resentments, little groups and teams. N.M.: Are vou stíll divided? J.B.: In a certa in way, because of old rancor and misinterpretations. N.M.: In these last two years Vou have become an international star. You have participated in the exhibition organized by the MOMA that showed in Seville, Paris, now Cologne, and that will end up in New York. You have had three solo shows at FrumkinjAdams Gallery in New York. What does Mexico have to do with this process of transformation? J.B.: Sincel am in Mexico I have many ideas and I really want to work. I am specially interested in the northern indian communities: the Huicholes, the Coras, the Yaquis, the Seris, the Tarahumaras. Theyare nearer to my spirit and sensibilíty. They were ancient hunters with a mentality and an artistic-technical baggage that are connected to other things themselves part of ancestral wisdom - which I intend to
reconstruct in time. Both in my AfroCuban culture and in the indian traditions I find parallel points that reaffirm me as bearer of a very old human patrimony. Artists of the beginning of the century paid attention to specífic aspects of primitive art, wood carving, whith permítted them to find cubist solutions for their work. In my case, I seek a more general knowledge, more sensible, more inspired. .. I seek to bring out the presence of the past in the present, much further than any localism. I do not believe one has to be a Mexican by birth to come near to this country with affection, to learn from it and to leave one's work here. N.M.: Would Vou stay in Mexico? J.B.: I would like to stay indefinitely. Ninart, above ali, has given me the opportuníty to establish myself in this country with my wífe and son, so that I can work from here wíth seriousness and comfort. Ninart has been the obvious proof that our work has also a commercial value; that ít is accepted and can be promoted with tremendous dignity. Ninart has produced exhibítions such as 15 Cuban Artists, which was historical at the ideological leveI. For the first time, two groups of Cubans, supposedly dífferent, separated, came together. The importance of being one only culture was seen in the exhibition, as also the mutual recognition between artists. N.M.: Can a Cuban artist stay permanently in Mexico? J.B.: There are things contrary to my will as legal problems from Mexico's or Cuba's side that make
me uneasy. For the first time one finds a place where one can work with materiaIs, with space. A place where, inclusively, I can display my book collection of ethnographic cultures, theyare my working objects... Here in Mexico I have the things I have to see everyday in order to inform myself and influence myself from them. N.M.: What are these things? J.B.: Ali these art objects from Asia, Oceania, Africa, Latin America, North America... Theyall form a part of me. They have a meaning that also becomes a thing of aesthetics. There is from an arrow to a mask, to a shield, to a loin cloth. Objects that in the end will leave a mark in me élnd in my work. N.M.: What do Vou say of your success in the international press: The Newsweek publication, and vou are on the cover of the January 1993 Art Nexus? J.B.: There are things that have come out fortunately due to a situation of coincidence in time and space: that a group of people got together to make a dífferent type of art; that a group of people came to visit our country with the vision to understand that it had value, and with the means to take us, and our work, outside; that our age coincided - we were the new generation - with the Ministry of Culture's proposal to send us to important international events and biennials. Then, the year '92 marks the Five Hundred Years of the discovery, or conquest, or the looting, or the destruction of America. Or, of the formation of a mixed Latin-American culture. And
this forces attention upon LatinAmerican art, and upon Cuban art as well, not by chance but beca use this art has a qualityalready recognized by a lot of people. N.M.: Are the Cubans in fashion? J.B.: More than a fashion it is a concrete, real thing. If Occidental eyes are looking at us, this is beca use we have something they lack. A sensibility, a kind of spirituality, cultural richness and interesting experiences that we have and they, íf they once had, have lost. N.M.: Your new work made for the inauguration of this new gallery, La isla en peso (The island in weight)... J.B.: Iliked the title of Virgilio Pifiera's book beca use it is the first exhibition that I produce outside Cuba, thinking about my country with nostalgia. Iliked the idea of carrying the island like a weight upon oneself of transporting our culture and our things to another place; of being aware ali the time of what Vou are. It is like a mountain where the image of the Virgin of the Caridad deI Cobre (patroness of the country), sets itself in, while nursing a child. The mountain goes upon a little boat, and the boat goes upon the heads of a group of people, understood as Cubans. That is the painting called La isla en peso. Nina Menocal * Transcripted from the catalogue of the La Isla en Peso exhibition, Galería Nina Menocal, Mexico City, January 1993.
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Who will play the drum, 1994 acrĂlico s/tela/acrylic on canvas 300 x 400 cm
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Desde a primeira exposição das p/ate paintings de Julian Schnabel, em 1979, na Mary 800l~e Gallery de Nova Vork, tornou-se impossível interpretar a pintura sem tomarmos como referência o novo vocabulário formulado por ele. Apesar de sua recente aparição, esse jovem e prolífico artista exerce grande influência na arte moderna, pois nos guia através da pintura de modo impetuoso.
When Julian Schnabel first exhibited his plate paintings at the Mary Boone Gallery in New York, in 1979, it became impossible to look at painting without referring to the new vocabulary formulated by Schnabel. The time since has been short, but his influence is already far-reaching, as this stillyoung prolific artist leads us not merely on a walk but on a breathless jog through his relentless explorations of painting.
Schnabel foi uma das forças catalisadoras que causou o arrefecimento da estética minimalista, dominante no final da década de 1970. Em 1975, passou a produzir telas ásperas e danificadas que mostravam formas cruas repletas de significado histórico e pessoal. Apesar de haver uma clara seqüência entre suas primeiras obras, as p/ate paintings criadas a partir de 1979 demonstram a audácia de Schnabel em ultrapassar os limites da definição de arte estabelecida por alguns críticos.
Schnabel was one of the catalytic forces that pushed aside the dominant minimalist aesthetic of the late 70s. The canvases he began to produce in 1975 were rough and damaged, and contained raw images laden with personal and historical meaning. While there is an obvious continuity between these early works, the 1979 plate paintings, and what he was to develop later, Schnabel took a bold step beyond the limits of what some critics defined as art.
Embora duas p/ate paintings de Schnabel estivessem prontas antes de sua primeira exposição individual, em fevereiro de 1979, ele optou por não apresentá,;,las, pois só queria mostrar ao público a série completa. Em sua exposição de novembro daquele ano, surgiu a primeira das muitas controvérsias sobre ele nos meios de comunicação. Em vez de isolá-lo do mundo da arte, no entanto, essa controvérsia provocou um fértil debate que sempre acompanha toda obra nova. Suas obras apresentam efeito singular, o uso criativo das imagens, a combinação de temas e materiais peculiares e intensa incorporação de fatos de sua vida pessoal. Fez tamanho sucesso que provocou opiniões e críticas bastante controvertidas, muitas das quais centradas mais no artista do que em sua obra. Entretanto, por ter consciência de seu papel e de sua missão perante a arte, o artista não se deixa abalar por todas essas críticas. Dois anos após a apresentação de suas p/ate paintings, ele participou da histórica exposição A New Spirit in Painting, organizada pela Royal Academy of Art de Londres, que, com essa mostra (que incluiu obras de 38 artistas), promoveu um novo enfoque da pintura. Colocadas ao lado das de outros artistas como Frank Stella, Andy Warhol, Willem de Kooning, e de novos nomes como Malcolm Morley e 8rice Marden, suas obras destacavam-se por sua determinação. Desde então, Schnabel tem produzido trabalhos que infalivelmente suscitam interesse. Apesar de considerar-se principalmente um pintor, tem exposto desenhos e esculturas. Schnabel explora as possibilidades de diversos materiais, deixando de lado as ferramentas normais de um pintor e optando por qualquer outra coisa que possa transmitir sua mensagem: não somente usa pratos quebrados e talheres de madeira ou compensado, como também veludo pintado, peles de animais, biombos de teatro kabuki, tapetes, tecidos estampados e lonas enceradas. Cada um desses materiais traz à obra sua própria história, seja esta o padrão rosa e branco das sacolas da lati, a popular loja de departamentos parisiense, ou furos e manchas feitos acidentalmente em lonas enceradas verde-oliva.
Although Schnabel had completed two plate paintings when he had his first solo exhibition in February of 1979, he decided to delay showing them at that time - he didn't want to aliena te viewers before they gave his work a chance. When the paintings were shown that November, they prompted the first of many media controversies surrounding Schnabel. But far from provoking his excommunication from the art world, they led to one of the many spirited dialogues that has since accompanied each release of his work. Schnabel inspires the most strongly conflicted reactions, often for the same traits in his art: his prodigious output, brash use of imagery, mingling of disparate themes and odd materiais, and incorporation of intensely personal references. Much controversy has centered upon his persona, for Schnabel has been so successful that response to his art has some times become hopelessly entangled with reactions to him. Ali of this seems not to perturb theartist who has his own sense of personal significance and mission. Only two years after the presentation of the plate paintings, the 30-year-old Schnabel was among the 38 artists included in the landmark exhibition entitled A New Spirit in Painting, which celebrated a renewed focus on painting. The show was organized by the Royal Academy of Art in London. Side by side with the work of established artists such as Frank Stella, Andy Warhol, and Willem de Kooning, and with the work of newer arrivals like Malcolm Morley and Brice Marden, Schnabel's paintings were remarkable for their resoluteness. Since then, Schnabel has continued to produce work that unfailingly excitesinterest. He has exhibited drawings and, more recent/y, sculpture, but he considers himself primarily a painter. Schnabel has explored the possibilities of diverse materiais, setting aside the painter's usual tools in favor of anything that can encapsulate his message: not only broken plates and crockery on wood ar masonite, but painted velvet, animal hides, Japanese Kabuki theater screens, pile rugs, printed fabric, and tarpaulins. Each material brings its own history to the work, whether it is the pink-and-white pattem from the shopping bags of the Tati department stores in Paris ar the accidental perforations and stains on green military tarpaulins.
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Hurricane 80b (YoYo en Chasté), 1991 óleo e gesso s/Iona/oil, gesso on tarp 457 x 457 em Co leção Ga leria Ramis Barquet Foto Ken Cohen
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Hurricane 80b (Northern painting), 1991 óleo e gesso s/Iona/oil, gesso on tarp 457 x 457 em Coleção Galeria Rami s Barquet Foto Ken Cohen
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Movendo-se entre o figurativo e o abstrato, Schnabel enche suas telas com tudo o que desperta sua atenção. A natureza de sua obsessão é colocar a si mesmo dentro da obra. Ele tem a capacidade de capturar instantes e impulsos, de absorver uma enorme quantidade de estímulos visuais e de responder rapidamente a assuntos que lhe interessam. Como pintor, está sempre alterando o estado das coisas. Schnabel tem o poder de enganar o espectador. Faz com que um quadro de grandes proporções pareça um trabalho de cavalete, ou esmaga o espectador com uma explosão de formas. Consegue fazer com que trechos de suas obras sejam líricos, puros e poéticos, deixando espaços vazios que ressoam como os de Twombly. Evoca a musicalidade de Kandinsky através da justaposição de cores e formas. Como os cubistas, pode quebrar e distorcer a figura, ou como Polke absorver os destroços da imagética e da parafernália contemporâneas. Impregna a tela com um sentido de natureza que o associa às paisagens do norte europeu de Caspar David Friedrich, ou capta a luminosidade americana de um modo que lembra os luministas americanos. Ainda assim, sua obra é inegavelmente pessoal. Uma vez mais, Julian Schnabel leva a pintura um pouco além. Suas séries de pinturas concretizam o que o crítico Hilton Kramer chamou de "desconexão entre imagem e fundo". Schnabel tem produzido obras coesas impregnadas de uma atmosfera espiritual que trazem consigo "as vibrações da alma" evocadas por Kandinsky. As quatro obras da série The end ofthe summer(1990), mostram o estado de espírito que prevalece durante essa estação do ano. Segundo Schnabel, "elas se relacionam com a luminosidade louca do outono em Montauk - a sensação de que algo está terminando, um momento no tempo, mudanças de temperatura. ,Tem algo de morte. Talvez o verão tenha morrido e ido para o céu. E como se essa atmosfera existisse nas pinturas." Essas telas colossais, de quase 5 x 5 metros, são pintadas com tinta a óle!» e gesso sobre lona cinza encerada. O tom é sombrio e elegíaco. Areas negras e vermelhoalaranjadas dominam três dessas pinturas, enfatizando a tristeza, como se fossem linhas descendentes de um diagrama emocional. Schnabel combina esses elementos controlados com outros, mais acidentais: formas brancas indefinidas feitas de gesso. Ele descreve seu método para a aplicação dessas formas: "Algumas vezes pinto no chão, outras, em uma escada. O gesso é aplicado quando a pintura está na vertical, e em seguida a coloco no chão para que seque como está, sem que nada escorra." Um terceiro elemento encontrado nessa pintura propicia um contraponto lírico às formas pretas, vermelho-alaranjadas e brancas dominantes. Mergulhando retalhos de linho em tinta violeta e atirando-os sobre a tela, consegue um efeito surpreendentemente delicado que à primeira vista lembra anjos ou cupidos, apesar de Schnabel enfatizar que foram feitos "sem concepções prévias. As formas simplesmente aconteceram. Só as analisei depois, como qualquer outro espectador." A última pintura dessa série parece, de início, se localizar muito além da chave espiritual e emocional das três primeiras. As áreas de cor preta e laranja desapareceram, as formas violeta-mineral ficam mais toscas e lutam pelo espaço como maciças formas brancas que flutuam no vazio. Uma luz amarela parece emanar de um dos cantos da tela, indicando, talvez, uma regeneração da elegia sombria das quatro pinturas. 218
Shífting between the figura tive and abstract as his works require, Schnabel fills the canvases with everything that strikes a chord in him. The nature of his obsession is to bring himself in to the work. He has a remarkable ability to capture an instant or impulse, to absorb a myriad of visual information, and to respond quickly to issues that interest him. As a painter, he is constantly changing things. Schnabel can play tricks on the viewer. He can make a painting of enormous size se em easel-like, or overwhelm the viewer with an explosion of borrowed and created forms. He can make a passage as Iyrical, pure, and poem-like as the work of Twombly, and leave empty spaces that resonate as Twombly's do. He can evoke Kandinsky's musieality by juxtaposing forms and color. He can fracture and distort the figure like the Cubists, or absorb the flotsam of contemporary imagery and paraphemalia, like Polke. He can imbue the canvas with a feeling of nature that one might associa te with the northem European landscapes of Caspar David Friedrich, or catch the Ameriean light in a way that echoes the American luminists. And yet ali the work is undeniably Schnabel's. Once more, Julian Schnabel has taken painting a few steps farther. The three series presented in this catalogue mark yet another tum in Schnabel's prolífic career. Here, he seems to have resolved what the critie Hilton Kramer has called the "disjunction between surface and image" in his work. Schnabel has produced cohesive works imbued with a spiritual atmosphere that brings forth "the vibrations of the sou/" evoked byKandinsky. These three series are remarkable, as well, for the range of their treatments and tone. The four works in the series calledThe end of the summer, painted in 1990, depict the mood of that time of year. Schnabel says, "They have to do with the crazy light of fali in Montauk - the feeling about the end of something, a moment in time, temperature changes. There is something about dying. Maybe summer died and went to heaven. It is as íf the climate exists in the paintings. " These colossal works, 16 by 16 feet, are painted on gray tarpaulin using Gil and gesso. They have a somber, elegiac tone. 81aek and orange-red bands domina te three of the paintings, sinking lower from one to the next, like falling lines on an emotional chart. Schnabel combines these controlled elements with others that are more aecidental: amorphous white forms made withgesso. He describes his method of applying these: "Sometimes I paint on the floor and sometimes I paint on a ladder, applying the gesso when the painting is vertical, and then I put the painting down, so that it dries in that particular shape". A third element in these paintings provides a Iyrieal counterpoint to the dominant black, orange-red, and white forms. Schnabel dipped wet linen rags in mineral-violet paint and flung them at the canvas. The results are surprisingly delieate, and at first resemble drawings, perhaps of angels or putti, although, says Schnabel, they were done "without preconception. The shapes happened. I read them later like any viewer might. " The last painting of the series at first seems to sway far beyond the emotional and spiritual tone of the first three. The bands of black and orange are gone, the mineral-violet shapes are cruder and jostle for space with massive white forms floating in a void. A yellow light seems to emana te from one comer, perhaps a sign of regeneration from the sense of elegy that suffuses ali four paintings.
Schnabel explica o que a série significa para ele: "Nas pinturas de The end of summertalvez eu esteja enfocando o limite do mundo, um lugar - será o paraíso? Há um ritmo comum às pinturas, mas nenhuma narrativa. Tenho certeza de que as respostas a elas variam radicalmente de pessoa para pessoa."
Schnabel explains what the series means to him: uln The end of the summer paintings, maybe /'m lookíng at the edge of the world, a place - heaven? There is a rhythm between the pictures, but absolutely no narra tive. But /'m sure that the range of responses to the paintings varies radically from person to person.
As pinturas de The end of summertêm algo em comum com as da série Hurricane Bob (Furacão Bob), feitas no verão de 1991. Nestas, o artista utiliza as telas como meio para interagir com forças naturais e fortuitas. Schnabel chama esses trabalhos de "antropomórficos".
The end of the summer paintings share a certa in kindred spirit with the Hurricane Bob paintings of the summer of 7997. Here, the artist uses the canvas as a medium that allows him to interact with natural forces and u accidents. Schnabel says theyare uanthropomorphic .
Esses cinco trabalhos feitos em lona, cada um com 4,5 x 4,5 metros, têm em comum com a série The end of summer o sentido de equilíbrio precário entre o acidental e o deliberado. Ele atou as lonas à parte posterior de seu jipe e as arrastou por uma rua de asfalto próxima à sua casa em Montauk. Ele explica: "As pinturas estavam no Furacão Bob. Estavam amarradas ao chão do estúdio, que consiste em três paredes e chão, senão teriam sido destruídas. Era melhor as paredes caírem sobre elas do que serem levadas pelo vento. Quem sabe? De qualquer maneira, elas estiveram no furacão."
These five works on tarpaulin, each 75 by 75 feet, share with The end of the summer paintings the sense of precarious balance between the accidental and the delibera te. The canvases on which the drama is played out are the u products of two different kinds of uaccidents . He attached the tarpaulins to the back of his jeep and dragged them over an asphalt road near his house in Montauk. He explains, uthe paintings were in Hurricane Bob. They had to be tied down to the floor of the studio, which had three walls and a floor, otherwise they would have been destroyed. It was better to have the walls falling on them than their blowing away Who knows? Anyway, they were in the hurricane.
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Nessa série, as telas são ativas. São de um cinza forte, diferente do cinza mais impessoal das séries anteriores. Elas ondulam e se dobram como se tivessem sofrido a ação do vento, da água e da terra. Gestos audazes, representados por cores primárias, movem-se contra o tecido danificado. Schnabel desenvolveu um tal diálogo entre as formas acidentais e as que foram criadas que o trabalho se torna um todo energético. Schnabel afirma que intitulou um dos trabalhos dessa série de For Jean Tingue/y, quando "soube que ele tinha morri do. Talvez fosse como seu espírito. Normalmente, se possível, dou nome a um trabalho depois de obter uma resposta." Neste caso, uma forma preta faz uma espiral no centro da pintura, como uma grande bioforma ou uma tempestade, dirigindo o espectador para dentro do quadro. Este compartilha a mesma sensibilidade com outro trabalho da série, Northern painting, em que uma forma central suspensa está ao mesmo tempo balançando e caindo em um vasto espaço. Como em todas as pinturas de Hurricane Bob, esses trabalhos implicam um sentimento de conflito com uma força cósmica sempre presente. Yo Yo en Chasté, a pintura mais ativa da série, deve seu nome a uma amiga de Schnabel, Vo Vo. Chasté, explica Schnabel, "é o nome do pequeno lago onde Nietzsche viveu, de modo que Yo Yo en Chasté é Vo Vo nesse lago". O trabalho ganha vida com um traço vivo (derivado de algo que pode ser visto como uma forma fálica, mas é n~ verdade uma mangueira de jardim) andando pelo centro da pintura, enquanto uma forma escura e opressiva paira sobre ela. Se comparados às duas séries anteriores, os sete trabalhos da série O/atz adquirem uma delicadeza que normalmente é associada à pintura de cavalete, um paradoxo, se pensarmos nas grandes dimensões das pinturas, 2,43 x 1, 82 metros e 2,43 x 3,04 metros (as pinturas O/atz, ao contrário das outras séries, têm molduras, como as pinturas de cavalete). Enquanto as séries The end ofthe summere Hurricane Bob refletem um cenário tosco e típico da região norte, as pintur.as O/atz evocam um sentimento que remete ao sul da Europa, local onde a mão do homem deixou tantas marcas. "As pinturas da série O/atzsão bastante mediterrâneas", enfatiza Schnabel,"e totalmente abertas. Elas mostram diferentes momentos do dia e diversos locais. Não são cenários, mas lugares que existem em minha imaginação. Lugares onde eu vivo."
In this series, the canvases are active. They are a warm gray, unlike the cooler gray of the earlier series; they ripple and fold like wind, water, and land. Bold, primary-colored gestures move against the damaged cloth. Schnabel has developed a dialogue between the accidental and the created .shapes in such a way that the work becomes an energetic whole .. Schnabel says that he titled one of the works in the series For Jean Tinguely, when uI was told he had died. Maybe it was like his spirit. I usually name a paínting if I can,'after a response. " Here, a black form spirals in the center of the painting, like a huge biomorph or a hurricane, drawing the viewer into the paínting. The work shares a sensibility with another of the series, Northern painting, where a central suspended form is both swinging and falling, in a vast space. Like ali the Hurricane Bob paintings, these have a feeling of conflict with an everpresent cosmic force.
Yo Yo en Chasté, the most active of the series, was named after a friend of Schnabel's named Yo Yo. Chasté, Schnabel explaíns, "is the little lake where Nietzsche lived, so Yo Yo en Chasté is Yo Yo in that lake. " The work is anímated with a lively line (thrown from what could well be construed as a phallic form, which is actually a garden hose.) taking a walk across the center of the painting, while an oppressive, dark form hovers overhead. Compared to the previous two series, the seven works in the Olatz series evoke a sense of delicacy usually associated with easel painting, a paradox given the large sizes of the paintings, 8 x 6 and 8 x 70 feet. (Like easel paíntings and unlike the other series here, the Olatz paintings are framed.) While The end of the summer and Hurricane Bob series reflect a raw, northern landscape, the Olatz paintings evince a feeling for a more southern European destination where the hand of man has left so many marks. "The Olatz paintings are very Mediterranean", says Schnabel, "and very open. Theyare about different times of day, different locations. Theyare not landscapes, but places that exist in my mind. I exist in those places. "
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Hurricane 80b (For Jean Tinguely), 1991 óleo e gesso s/Iona/oil, gesso on tarp 457 x 457 em Coleção Galeria Ramis Barquet Foto Ken Cohen
Olatz é o nome de um amigo basco de Schnabel. 4'Houve um período na Espanha em que as pessoas eram proibidas de usar seu nome basco", explica. "Eu pensava muito sobre isso e comecei a escrever o nome nas telas. O nome corporifica muitas coisas. Mas também é uma palavra peculiar, como se fosse uma carta para alguém, as cartas que escrevi a minha mulher, as cartas que escrevi a Olatz, uma resposta ao espírito personificado em um sentimento por uma determinada pessoa. É óbvio que pode significar muitas coisas diferentes para o espectador. Para mim, são questões que nunca foram respondidas, de projeções pessoais que só podemos registrar numa carta - ou talvez em uma pintura." Esses trabalhos foram realizados no verão de 1991 e pintados sobre trapos utilizando óleo, gesso, resina, couro e apliques. Como nas duas primeiras séries, as formas são pintadas delilíéradamente ou formadas pelos trapos, e a paleta é ampliada. Essas similaridades superficiais diminuem quando em contato com suas diferenças significativas. As pinturas Olatz parecem ser mais premeditadas. Elas possuem qualidade lírica e intimidade. Os amarelos e vermelhoalaranjados encontrados nas outras séries explodiram em brilho, banindo tudo, exceto o preto (com exceção de uma das pinturas, em preto e roxo). As cores se misturam e as formas começam a se mover, guiadas por um espírito pessoal, em vez de serem dirigidas por elementos da natureza. Passagens pintadas e não pintadas criam um equilíbro ativo. Schnabel comenta: "Todos os níveis de atividade, seja aplicando a massa ou jogando os trapos (... ) têm um efeito cumulativo. Parecem formar uma imagem em vez de ter uma imagem pronta antes de eu começar a pintar." Essas pinturas são para uma mulher. Também são sobre uma mulher. Elas suscitam questões. Quem é ela? A que universo pertence? Em Olatz mira, uma pintura particularmente voluptuosa da série, a palavra "Olatz" aparece como um arco no centro do trabalho. Embaixo, a palavra "mira", que significa "olhe" em espanhol. Como uma mulher vaidosa, o trabalho obriga o espectador a olhar (como é bonito). Ou a pintura pode estar pedindo: "olhe para mim". Em outra tela, uma massa redonda de resina e tintas de várias tonalidades, localizada no centro do trabalho, sugere a face da lua gloriosamente coroada pela palavra Olatz. Grandes áreas da tela permanecem intocadas, cercadas por formas que lembram nuvens vermelhas reminiscentes de Twombly, artista que Schnabel admira. Ambas as pinturas criam a mesma sensação de exuberância, uma pelo uso moderado da forma e da cor e a outra pela sua profusão.
Olatz is the name of a Basque friend of Schnabel's. "There was a period io Spain when people couldn't use their Basque names", he explains. "I was thinking about that and I started to write the name on the canvas. It embodied a lot of things. It is also a peculiar word, like a letter to somebody, like letters to my wife, letters to Olatz, a response to the spirit embodied in a feeling about a person. Df course, the viewer might have a very different response. For me, theyare about unanswered questions, personal projections that people can only record in a letter - f?r maybe a painting. " These works from the summer of 7997 are painted on drop cloths, using oil, gesso, resin, leather, and appliqué. As in the previous two series, shapes are painted deliberately ar formed by flung rags, and the palette is amplified. But these superficial similarities diminish in the face of their significant differences. The Olatz paintings se em more premeditated. These have a Iyrical quality, and an intimacy of passages. The orange-reds and yellows found in the other series have exploded into brilliance, ali but banishing the black (except in the black and purple Olatz painting.) The colors blend, and the forms begin to move, guided by a personal spirit rather than the elements of nature. Unpainted and painted passages create an active balance. Schnabel comments, "Ali layers of activity, whether attaching the shammy ar throwing the rags etc (...), have aÍ? accumUlative effect. They seem to be forming an image, rather than having an image before you start to paint. " These are paintings for a woman and about a woman. They beg the questions: Who is she? What universe does she belong to? In Olatz mira, an especia//y voluptuous painting from the series, the word "Olatz" arcs over the center. Below is the word "Mira ", which means, in Spanish, "Iook". Like a vain woman, the work commands the viewer to look (how beautiful). Or, the painting could be asking "Look at me ". On another canvas, a round mass of tesin and mottled paint in the center of the work suggests the face Df the moon gloriously crowned by the proud name Olatz. Large sections of the canvas are left untouched, and surrounded by red, cloud-like shapes reminiscent of Twombly, an artist Schnabel admires. Both paintings create the same feeling of exuberance, one with the spare use of form and colar, and the other with a profusion. Schnabel's explorations continue, proving once again that he is most comfortable with risk. With them, Schnabel tries out an adventurous abstraction, created by the crush between the man-made shapes and the man-prompted phenomena in the canvas, between the contro//able and the uncontrollable. His bold steps invite us to explore a whole new path in his work. Gabriella De Ferrari
As explorações de Schnabel continuam provando que ele se sente muito à vontade enfrentando o risco. Com elas Schnabel tenta uma abstração criada pela colisão entre as formas feitas pelo home[11 e as que resultam de fenômenos propiciados pelo homem sobre a tela; entre o controlável e o incontrolável. Suas corajosas incursões nos convidam a explorar um novo caminho em seu trabalho. Gabriella De Ferrari
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Nasceu em Nova Vork, em 1951. Estudou na Universidade de Houston, Texas, de 1969 a 1972. Viajou para a Europa em 1972, permanecendo em Paris, Milão e por mais tempo na Toscana. Em 1978 esteve em Barcelona, na Espanha, onde ficou muito impressionado com o trabalho de Gaudí. Viajou para a Itália e Alemanha, expondo em Düsseldorf. Em 1979, realizou sua primeira exposição na Mary Boone Gallery, em Nova Vork. Julian Schnabel vive em Nova Vork. Bom in New York City, in 1951. Studied at the University of Houston, Texas, in 1969-1972. In 1972 he travelled to Europe, and stayed in Paris, Milan and for a longerperiod of time, in Tuscany. In 1978/he was in Barcelona, Spain, where he was very much impressed by the work of Gaudí. He travelled to Italy and to Düsseldorf, Germany, where he had an exhibition. In 1979 he had his first exhibition in Mary Boone Gallery, in New York. Julian Schnabellives in New York. Exposições individuaislSolo exhibitions 1976 Contemporary Arts Museum, Houston, Texas. 1978 Galerie December, Düsseldorf, Alemanha. 1979 Mary Boone Gallery, Nova Vork; Daniel Weinberg Gallery, São Francisco; Mary Boone Gallery, Nova Vork. 1980 Bruno Bischofberger, Zurique, Suíça; Voung/Hoffman Gallery, Chicago. 1981 Mary Boonel Leo Castelli, Nova Vork. 1982 Stedelijk Museum, Amsterdam, Holanda; Frankfurt Kunstverein, Alemanha; The Tate Gallery, Londres. 1983 Galerie Bruno
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Bischofberger, Zurique, Suíça; Castelli Graphics, Nova Vork; Galerie Daniel Templon, Paris; Galleria Mario Diacono, Roma; Akira Ikeda Gallery, Nagoya, Japão. 1984 Akira Ikeda Gallery, Tóquio; Galerie Bruno Bischofberger, Zurique, Suíça; The Pace Gallery, Nova Vork. 1985 Galleria Gian Enzo Sperone, Roma; Waddington Galleries, Londres; Pace Editions, Nova Vork. 1986 Mario Diacono Gallery, Boston; The Pace Gallery, Nova Vork. 1986-88 Whitechapel Art Gallery, Londres; Stãdtische Kunsthalle, Düsseldorf; Whitney Museum of American Art, Nova Vork. 1987 Galerie Vvon Lambert, Paris; Akira Ikeda Gallery, Tóquio. 1988 Israel Museum, Jerusalém; Waddington Galleries, Londres. 1989 The National Museum of Art, Japão; Museo d'Arte Contemporaneo, Prado, Espanha; Palais des Beaux-Arts, Bélgica; Fruitmarket Gallery, Escócia; Staatliche Graphische Sammlung, Alemanha. 1990 Galerie Vvon Lambert, Paris; The Pace Gallery, Nova Vork. Exposições coletivas/Group exhibitions 1971 Hidden Houston, Houston, Texas. 1972 Louisiana Gallery, Houston, Texas. 1974 W.I.S.P. Exhibition, Whitney Museum of American Art, Nova Vork. 1977 Surrogate-Self Portraits, Holly Solomon Gallery, Nova Vork. 1979 Visionary Images,
Renaissance Society, University of Chicago, lIIinois; Four Artists, Hallwalls, Nova Vork; Mary Boone, Nova Vork; Voung Hoffman Gallery, Chicago. 1980 Daniel Templon, Paris; Nuova Immagine, Milão; L'Amérique Aux Indépendants, Grand Palais, Paris; Mary Boone (with Ross Bleckner and David Salle), Nova Vork; Drawings, Mary Boone, Nova Vork; New Vork-New Vork, VarlowSalzman Gallery, Toronto, Canadá; On Paper, Institute of Contemporary Art, Richmond, Virginia; Bienal de Veneza, Veneza; Painting and Sculpture Today, Indianapolis Museum of Art, Indianapolis, Indiana; New Gallery, Ohio; Drawings, Mattingly Baker Gallery, Texas; Annina Nosei Gallery, Nova Vork. 1981 A New Spirit in Painting, Royal Academy, Londres; Biennial Exhibition, Whitney Museum of American Art, Nova Vork; Westkunst, Colônia, Alemanha; Anthony D'Offay Gallery, Londres; New Vork, New Vork, Addison Gallery, Andover, Massachusetts, Estados Unidos; Mary Boone Gallery, Nova Vork; Sperone Westwater, Fischer, Nova Vork; Schnabel, Rothenberg, Moskowitz, Basel Kunstmuseum, Basiléia, Suíça; The Contemporary'lmage, Akron Art Institute, Ohio, Estados Unidos; Figurative Aspects of Recent Art, Hayden Gallery, Massachusetts, Estados Unidos; Aspects of Post Modernism, New Jersey, Estados Unidos; U.S. Art Now, Kinsthallen, Suécia. 1982 Schnabel, Rothenberg, Moskowitz, Frankfurter Kunstverein, Frankfurt,
Alemanha; Issues: New Allegory, The Institute of Contemporary Art, Boston; Sweet Art, Ronald Feldman Gallery, Nova Vork. 1983 New Vork Now, Kunstverein für die Rheinlande und Westfalen, Düsseldorf, Alemanha; New Art, The Tate Gallery, Londres; Tendencias en Nueva Vork, Palacio de Velásquez, Madri/Fundació Joan Miró, Barcelona, Espanhal Musée du Luxembourg, Paris (exposição itineranteltravelling exhibition). 1983-84 Back to U.S.A., Kunstmuseum Luzernl Rheinisches Landesmuseum Bonnl Württembergischer Kunstverein Stuttgart, Alemanha (exposição itineranteltravelling exhibition). 1984 The Heroic Figure, Contemporary Arts Museum, Houston, Texas; Rosc '84, Dublin, Irlanda; La Grande Parade, Stedelijk Museum, Amsterdam. 1985 Nouvelle Biennale de Paris, Paris; Carnegie International, Carnegie Museum of Art, Pittsburgh. 1986 Beuys zu Ehren, Stadische Galerie im Lenbachhaus, Munique, Alemanha; Individuais, The Museum of Contemporary Art, Los Angeles. 1987 Biennial Exhibition, Whitney Museum of American Art, Nova Vork; Exhibition: Ross Bleckner, Albert Oehlen, Julian Schnabel, Galerie Max Hetzler, Colônia. 1988 Contemporary Art from New Vork, Tóquio; Art of the 1980's, Artists from the Eli Broad Family Foundation Collection, Kresge Art Museum, Michigan. 1989 Recent Acquisitions, San Francisco Museum of Modern Art, São Francisco; Sculpture by
Painters, The Pace Gallery, Nova Vork; Exposition Inaugurale, Fondation Daniel Templon, Fréjus, França; Collecció d' Art de la Fundació Caixa de Pensions, Barcelona. 1990 Culture and Commentary: An Eighties Perspective, Hirshorn Museum and Sculpture Garden, Washington; Gegenwart Ewigkeit, Berlim; The Biennial of Sidney, Austrália; Infinities and Intuitions: Selections from the Collection of Gerald S. Elliot, The Art Institute of Chicago. Obras apresentadas/Works in the exhibition Hurricane 80b (For Jean Tinguely), 1991 óleo e gesso s/Iona/oil, gesso on tarp 457 x 457 em Coleção: Galeria Ramis Barquet Hurricane 80b (Yo Yo en Chasté), 1991 óleo e gesso s/Iona/oil, gesso on tarp 457 x 457 em Coleção: Galeria Ramis Barquet Hurricane 80b (Die Eiger Nortwand), 1991 óleo e gesso s/Iona/oil, gesso on'" tarp 457 x 457 em Coleção: Galeria Ramis / Barquet Hurricane 80b (Northern painting), 1991 óleo e gesso s/Iona/oil, gesso on tarp 457 x 457 em Coleção: Galeria Ramis Barquet
Hurricane 80b (Die Eiger Nortwand), 1991 óleo e gesso s/Iona/oil, gesso on tarp 457 x 457 em Coleção Galeria Ramis Barquet Foto Ken Cohen
CU~DO~ fONDAZIONt fONIANA
CU~AíO~ fONDAZIONf fONíANA
o HUMANISMO DE VANGUARDA DE FONTANA
FONTANA'5 AVANT-GARDE HUMANI5M
Antes de mais nada, gostaria de fazer duas observações sobre o fato, creio incontestável, de que Lucio Fontana é uma das principais figuras - assim como uma das mais características - do cenário artístico do nosso século. Écertamente o artista italiano mais amado e mais influente no âmbito da vanguarda internacional (a comparação refere-se, portanto, aos principais artistas futuristas, Boccioni e Baila, além de De Chirico, em seu período mais criativo). Fontana é também o artista italiano do século XX mais presente nos acervos dos museus de todo o mundo.
First, I would like to stress a couple of points: Lucio Fontana is one of the most representa tive exponents of this century's artistic scene. He is certainly the most appreciated and influentialltalian artist of the international avantgarde, and can be compared to the most important futurists (to Boccioni and Baila, or to De Chirico's most creative period). No other 20th century Italian artist has so many works in museums ali over the world.
Uma primeira observação diz respeito à natureza intimamente inventiva da ação criativa, assim como à poética de Fontana, que nunca se sujeitaram aos limites das soluções formais, mas que, ao contrário, romperam com o próprio conceito da forma como limite, tanto estilística como ideologicamente. Seu trabalho, portanto, é sempre a favor de uma relação vital com o futuro psicológico e epistemológico da realidade contemporânea e enquadra-se, assim, em uma perspectiva extremamente positiva das possibilidades da imaginação criativa do ser humano. Em meados da década de 30, Edoardo Persico (talvez o crítico mais inteligente e mais dedicado da Itália daquela década) já anunciava que o ponto de chegada da pesquisa de Fontana era na vida na arte". Ele se referia ao cerne da sensibilidade contemporânea, ao fluxo fenomenológico vital, ao contínuo impulso inventivo e criativo que se contrapõe a qualquer cristalização ideológica e formal. Esta é uma referência fundamental para o entendimento do trabalho posterior de Fontana. A segunda observação refere-se ao exemplo de profissionalismo e ética, ou, se preferirmos, de ética profissional no sentido existencial (e, portanto, não estritamente profissional) do artista. Falamos do Fontana experimental e criativo (assim como foi Baila, de quem Fontana é herdeiro ideal em muitos aspectos das modalidades operativas e de invenção no âmbito de uma vanguarda originalmente italiana), livre e nunca condicionado por imposições de consumo. Ele sempre foi capaz de prever, e ao mesmo tempo evitar, qualquer tipo de comprometimento. E é esse aspecto, talvez, o responsável pela profunda diferença entre a vanguarda ( à qual Fontana pertence historicamente) e a neovanguarda (ou retomada da .... ), postura que sempre lhe foi estranha. Foi justamente o profissionalismo instintivo de Fontana que o motivou, ao longo do tempo, entre esculturas, cerâmicas, pinturas, ambientações arquitetônicas e ambientes espaciais, a uma natural disposição para uma pontuação qualitativa do resultado. Uma qualidade perceptível não somente na extrema
My first comment refers to Fontana's intimately inventive and creative nature, and to his ''poetica''. Neither one nor the other are limited by formal solutions. Actually, they break away, both stylistically and ideologically, the concept of form as a limit. His work a/ways favors a vital relationship between the psychological and epistem%gical future of contemporary rea/ity It is within the boundaries of an extreme/y positive perspective of human beings' creative imagination possibilities. In the mid-thirties, Edoardo Persico (who was probably Italy's most brilliant and dedicated critic of that decade) foresaw and announced where Fontana's research would arrive at: "Iite in art". 50 to say, the innermost of contemNôrary sensibility, the phenomen%gical vital flux, the continuous inventive and creative impulse is opposed to any ide%gical and formal crystalization. This was an important point to the understanding of his /ater works. My second comment refers to Fontana's professional and ethical example, that is to say, to his professional ethics in an existentia/ (and not only in a strictly professional) sense. We are referring to his experimental and creative aspects (which he inherited from Baila, concerning the operationa/ and inventive modes in an originally Italian avant-garde environment); he breaks away from and is never conditioned by consumption. He had a/ways been a pioneer and avoide d any kind of commitment. Maybe this explains the ditference between avant-garde (to which Fontana historically belonged) and neo-avant-garde (or the retrieval of .. .) a stance which he never adopted. In fact, it was Fontana's instinctive professionalism that impelled him towards qualitative results in his ceramics, scu/ptures, paintings, architectural ambientazioni and ambienti spaziali. Ouality is perceived not only as an extreme conceptual c/earness of a new vision but a/so in terms of a precise new communication necessity This is where his sign is shaped according to substance and space. Fontana's imaginary was shaped slowly - in half a century of a creative career - from his early years as a sculptor, between the twenties and the forties up to his years as a painter, in the early fitties and sixties.
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Concetto spazia/e, 1960 óleo s/te la/oi/ on canvas 70 x 55 em Co leção Teresita Fontana Foto Bellamio
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Concetto spaziale, 1953 óleo e técnica mista s/tela/oil and mixed media on canvas 55 x 70 cm Coleção: Fondazione Fontana Foto : 8ellamio
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lucidez conceitual de uma nova visão, mas também em termos de uma destreza manual em resposta a uma nova necessidade comunicativa. E é esse o terreno no qual seu signo se configura em relação à matéria e ao espaço; o imaginário fontaniano foi se configurando lentamente em meio século de carreira criativa, desde o empenho do então escultor do período de 1920 a 1940 ao pintor dos anos 50 e 60.
o percurso criativo de Fontana mantém uma profunda ligação com os acontecimentos da vanguarda artística de nossa época, desde o início da década de 30, logo depois dos anos de sua formação. A vanguarda foi para Fontana uma vocação espontânea, uma necessidade íntima e vital de adequação ao ritmo do nosso tempo sempre em contínuo movimento. Foi um artista de vanguarda não no sentido externo, programado, pois não podemos rotular sua obra com a etiqueta que aplicaríamos a uma solução inventiva e rapidamente institucionalizada (e precocemente esgotada), como nos acostumamos a ver com excessiva freqüência (e a aceitar) nas últimas décadas. Para Fontana, a vanguarda significava o comprometimento com uma solicitação criativa contínua, que não se desenvolvia em uma dimensão cultural abstrata da realidade e, portanto, inevitavelmente efêmera, mas como uma ação concreta de contestação e criatividade a partir de uma determinada condição cultural, aceita e imediatamente superada. Nesse sentido, Fontana foi um homem que se envolveu concretamente na evolução da pesquisa artística, vivida enquanto dimensão existencial. Sua obra teve dois momentos diferentes quanto à fenomenologia dos trabalhos - primeiro a escultura e em seguida a pintura -, que, no entanto, estão intimamente ligados e caracterizam a sua intensa atividade, rica de experimentações e de dúvidas, mas baseada em um substancial entusiasmo criativo, em uma instintiva concepção da positividade da vida. Desde as suas primeiras obras do início da década de 30, Fontana se interessava pela dialética espacial - desde o início ele foi de fato espacial-, e é esta característica que constitui o denominador comum que une os diferentes tempos e momentos de sua obra. Esta breve antologia de obras proposta para este evento, porém, enfoca o Fontana mais explicitamente espacial do início da década de 40 até os anos 60 (ele faleceu em 1968), isto é, os vinte anos decisivos para a sua afirmação criativa. O ponto de partida são seus Ambientes espaciais, que surgiram exatamente no final dos anos 40 e início dos anos 50. No período compreendido entre 1948 e 1949 o tema espacial adquire uma iconografia precisa no trabalho de Fontana; é a verticidade como origem do espaço. Mas ele é abordado em uma dimensão efetiva, física, e não somente simbólica, de espacialidade; o Ambiente negro, exposto em fevereiro de 1949 na Galleria dei Naviglio, em Milão, é uma obra fundamental na história da obraambiente, que tem um notável relevo na fenomenologia artística mundial das primeiras décadas da segunda metade do nosso século.
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Fontanas creative path maintains a deep connection with the artistic avantgarde movement since the beginning of the thirties, right after he finished his studies. For him, the avant-garde movement was a spontaneous vocation, a necessity to adequa te himself to the rhythm of the continuous innovations of our times in which he was immersed due to a vital necessity. He was an "avant-garde" artist not in an externai, programmed sense, although we cannot label his work in the same way we would an inventive and rapidly institutionalized production (which tends to vanish prematurely) like those we have seen frequently (and tend to accept) in the last decades. To Fontana, avant-garde meant a commitment to a continuous creative request and not a cultural dimension detached from reality, hence inevitably efemerous. For him avant-garde was concrete action of creative confrontation and creativity within certa in accepted and suddenly surpassed cultural conditions. In this sense, Fontana was totally involved in the artistic evolution of research, perceived as an existential dimensiono We can divide his work into two ditferent periods: first sculpture and later the paintings which are related to one another and which mark his prolitic output, rich in experiments and doubts, as well as based on a substantial creative enthusiasm, on an instinctive conception of the positive side of lite. From his very personal ear/y works, in the 30s, Fontana was interested in a spatial dialectic; in fact, since the beginning he was "spatial" - This is the common denominator that unites the ditferent phases and periods of his work. The brief selection of Fontanas work which we bring to this event, specificallyemphasizes the spatial Fontana, from the beginning of the forties up to the sixties (he died in 1968), i.e., the decisive twen'ty years of his creative affirmation. The starting point are his Spatial environments which were created at the end of the forties and beginning of the fitties. In 1948 and 1949 the spatial theme acquires a precise iconography in Fontanas work; the vortex as the starting point, the origin of space. It is approached as an effective physical dimension, and not only as a symbolic dimension of space; the Black environment exhibited at the Galleria dei Naviglio, in Milan, in February, 1949 is a fundamental work in the history of opera ambiente which I believe has an enormous importance in the artistical phenomenology of the first decades of the second half of our century.
Concetto spaziale, 1953 óleo, grafite, vidro s/tela/oil, graphite, glass on canvas 70 x 55 em Coleção Teresita Fontana Foto Bellamio
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F.Oi também em 1949 que nasceram os primeiros Buracos de Fontana, uma espécie de emblema espacial vinculado a duas grandes experiências espaciais que são o Ambiente negro de 1949 e o famoso Grande arabesco de neon, apresentado no interior da ambientação realizada pelo arquiteto Luciano Baldessarri, na 9ª Trienal de Milão de 1951. Eles não são, portanto, elementos gráficos de um arabesco da superfície pictórica; mas elementos simbólicos de uma outra espacialidade. Fazendo Buracos no espaço físico da superfície pura, Fontana de fato introduz uma ulterioridade. O espaço não é mais terreno, nem de perspectiva, nem de pura iminência física, pois passa a ser cósmico. Não é a superfície que d,efine~\fecha o espaço (no sentido da perspectiva conquistada pelo cubismo como um valor absoluto da superfície), mas é uma fratura daquela superfície que abre uma dimensão ulterior, infinita (e cósmica) do espaço. Os Buracos são uma espécie de projeto dessa ulterioridade espacial, seu símbolo, sua representação. São projetos espaciais enquanto conceitos espaciais de acordo com o título que Fontana usa constantemente (já o encontramos em desenhos de 1946) e que adquire um significado próprio muito preciso à luz das experiências de "arte conceitual" dos anos 60 e posteriores. Em 1952, e sobretudo em 1953, Fontana não somente rasga a tela e coloca cores utilizando areia" purpurina e outras técnicas, como também introduz nos trabalhos fragmentos de vidro, elementos que criam uma complexidade de dimensão ulterior. Os fragmentos de vidro formam relevos em relação à superfície, em contraponto com os Buracos, e geram novas possibilidades fantásticas no jogo cromático e luminoso. E em 1954 e 1955 Fontana alcança um grande estilo na utilização daquilo que denomina Pedras, em constelações que também são ricas de taches tipicamente informais. Os vidros coloridos, assim como a purpurina prateada de alguns dos Buracos, acentuam e explicitam ao máximo o caráter artificioso da intervenção imaginativa de Fontana na sua intenção mais íntima. O homem contemporâneo se debate entre a sua origem, o barro, que assinala o tempo das origens, e uma realidade de criatividade artificiosa, exaltada pelo tempo tecnológico. Nos anos 60 as duas polaridades da imaginação de Fontana - a mais barroca, dos anos 40 e 50, mais tipicamente informal, e aquela mais organizada e livre, onde o signo definido e puro entra no exaltante jogo das relações signo-matéria - se distanciam e assinalam dois modos de ser fundamentalmente diversos dentro de sua inexaurível atividade inventiva. De fato, o monocromatismo se afirma no início dos anos 60 a partir de uma intenção de clareza e ordem que tenta superar a experiência informal, abrindo uma nova perspectiva de pureza plástica abstrata e ideal (em diálogo muito próximo com as novas pesquisas feitas pela jovem geração artística européia do início da década de 60). Mas, na verdade, Fontana se mantém absolutamente fiel ao contato com a matéria, ao gesto e signo contínuos. E suas experiências dos anos 60 podem ser interpretadas tendo como chave esta polaridade: de um lado particularmente os Cortes, os auanta, assim como outros Buracos, os Teatrinhos e as Elipses, além das novas esculturas metálicas e os novos Ambientes espaciais; de outro, os Óleos, as Naturezas e os Metais. De certa forma, Fontana dava continuidade ao desejo de imediatismo sígnico e de sobreposição de matéria, que, embora tenham sido característicos do seu período informal, mesmo assim já estavam presentes nas experiências que fez nos anos 30. Por outro lado, ele entra no cerne do diálogo encetado pelas pesquisas européias pósformais, tanto as das novas tendências monocromáticas neoabstratas como um quase-diálogo com a pop art e ainda com a 230
In 1949 Fontana created his firstHoles, a kind of spatial emblems connected to the two great spatial experiences which are the Black environment of 1949 and the famous Huge neon arabesque presented at the 9th Triennale of Milan, 1951, installed by Architect Luciano Baldessari. Theyare not graphic elements of a pictorial surface arabesque, but symbolic elements of another spatiality. While making holes in the spatial configuration of apure clean surface, Fontana introduces another dimensiono Space is no longer, nor pure physical imminence, because it becomes cosmic. It is not surface that defines and enc/oses space (in the sense of the perspective conquered by cubism as an absolute value of surface), but it is a slash in that surface which opens towards another dimension, an infinite (and cosmic) space. The Holes are a projection of this new spatial dimension, somewhat like its symbol, its "representation". Theyare spatial projects, "Spatial concepts" in accordance with the title Fontana constantly uses (it can be found in drawings from 1946) and which acquires precise meaning, at the light of the "conceptual art" experiences of the sixties and the following decades. In 1952 and 1953, Fontana not only makes Holes in canvases adding colors and using sand, purpurine and other techniques, but also adds glass fragments, elements which create a new complexity in their dimensiono Glass fragments form reliefs, which contrast with Holes, generating new fantastic possibilities within a chromatic and luminous setting. In 1954 and 1955 Fontana reaches a spetacular style in the use of what he calls Stones, in constellations that are also rich in typically "informal" taches. Color glass, as well as silver purpurine in some Holes, stress and show the artificial character of Fontana's imagina tive intervention. Contemporary man struggles between his origins - c/ay - and the reality of artificial creativity, praised in technological times. In the sixties, the two polarities of Fontana's imagination - the more baroque and tipically informal of the forties and fifties; and the more "organized" and freer one, in which definedand pure signs participa te in a relationship between substance and sign - keep apart and mark two totally different approaches within Fontana's enormous inventive activity. Actually, if monochrome is present in the beginning of the sixties to convey clearness and order in an attempt to overcome "informal" experience, opening a new perspective of abstract and ideal pictorial purity (in a clear dialogue with the new researches made by the younger European generation of the ear/y sixties), in fact Fontana keeps faithful to his contact with substance, gesture and signs. His experiences in the sixties can be interpreted by using this polarity as a key: on one hand, Slashes, Quanta, as well as other Holes, Small theaters and Ellipses, besides the new metallic sculptures and new Spatial environments, on the other the Oils, Natures (terracotta) and Metais. In a sense, Fontana was directing his powerful will towards the immediatism of sign and the overlapping of materiaIs, which were a common denominator of his informal period, but were already present in his experiences in the thirties. On the other hand, Fontana gets involved in the core of the dialogue, generated by ''post-informal'' European researches, involving the new monochromatic and neo-abstract tendencies, and also with pop art,within a perspective of "mechanical" art, while resuminghis "conceptual" proposals. For Fontana, Gil is a substance which he has used since the beginning of the
perspectiva de uma arte quase mecânica, ao mes~o tempo em que continua com as mesmas propostas conceituais. E claro que para Fontana a tinta a óleo é uma matéria, e ele a empregou, desde o início dos anos 60, sempre como matéria, uma materialidade dútil que permite inscrever e imergir nela o signo do gesto que grafa e do gesto que esburaca, rompe e lacera. Em 1961, em uma série de telas excepcionais, Fontana se lança à interpretação fantástica de Veneza, em uma resposta que equilibra a contemplação lírica e uma imaginosa resposta ao barroco veneziano, um deliberado efeito de outdoorque, a seu modo, é uma intuição da mentalidade pop. A partir de 1962 até o final, em 1968, estão presentes nos Óleos, como elementos protagonistas da imagem abstrata, verdadeiros dilaceramentos em lugar dos Buracos anteriores. O dilaceramento é uma violência, uma apropriação da matéria por parte de Fontana, mas sobretudo, eu diria, uma apropriação da imagem, estabelecendo uma relação sensual, carnal, com aquela imagem cósmica delineada na superfície pelo grafismo gestual. Mesmo nos Cortes do início de 1959 já se afirmava um monocromatismo decidido e uma determinada vontade de ordenar o próprio corte ou os múltiplos cortes como se fossem estruturas primárias e elementares. E os Cortes tendem, rapidamente, a adquirir uma monumentalidade de largos ritmos justamente no rigoroso monocromatismo que assume todo o valor de abertura de uma nova página depois das experiências materiais informais. Em termos de volume, este foi, ao longo de dezenas de anos, o ciclo mais amplo e rico de toda a sua obra. Com certeza também foi um dos mais significativos e de maior sucesso. Sua fenomenologia reconduz sempre ao valor gestualabsoluto que o corte assume, um signo que irrompe na superfície, que é por sua vez absoluta, propondo uma nova alteração espacial que não segue mais a relatividade, mas dá lugar a uma espécie de peremptoriedade irreversível. É claro que, mais do que o buraco - através do qual o gesto de esburacar é lembrado - o corte torna essencial o gesto, numa plenitude quase conceitual. Desde o começo até o final, em 1968, os cortes são denominados por Fontana como espera ou esperas, especificando porém sua natureza de conceitos espaciais. Espera em um sentido amplo e assumidamente ambíguo, que parte de uma hipótese de vanguarda e em seguida se abre para uma intenção contemplativa, quase metafísica, até alcançar uma alusão sexual, mesmo que de um simbolismo erótico depurado, que se aproxima da abstração do arquétipo. Não seria difícil, por outro lado, estudar os tempos de seu ritmo gestual, que vai desde o absoluto, composto de um único corte, até a ação da interação múltipla. Assim como também não seria difícil estudar suas motivações, que vão desde o mais puro gesto rítmico, às vezes desdobrado em uma interação que é quase uma dança, até uma espécie de construção arquitetônica.
sixties, always as a substance, a ductile substance which allows inscribing and conveying the sign of the gesture that draws and of the gesture that makes Holes, slashes and dilacerates. In 1961 in a series of exceptional canvases, Fontana presents a fantastic interpretation of Venice, in a well balanced Iyric contemplation and an imagina tive answer to Venezian baroque, with delibera te effects almost like out-doors which, in his way of thinking, are an intuition of pop mentality. From 1962 until he died in 1968, his Oils present elements of abstract images, dilacerating elements, in place of the Holes of his previous works. Dilacerating is violence, an appropriation of substance undertaken by Fontana; but it is above ali, an appropriation of the image, that cosmic image whichgestual grafism delineates on the surface, in a sort of sensuous and carnal relationship. In the Slashes of the ear/y 1959 his "monochromatism" was already present, with a strong power to organize his own slash ar multiple slashes as íf they were primary and elementary structures. The Slashes tend to acquire a monumentality of large rhythms in the strict monochromatism which encampasses ali the values of opening a new page after "informal" material experiences. I am sure that, this was his most ample and rich phase. I am certain that it was one of the most important and most successful. Its phenomenology takes us back to the absolute value of the gesture encompassed by the Slash. A sign that emerges on the surface, which in its tum is absolute, proposing a new spatial alteration that no longer follows relativity, but gives place to a kind of irreversible peremptority. It is clear that, more than the hole that is implied in the physical gesture, the slash is mainly gesture, a conceptual absolute. From the beginning until the end in 1968, Fontana cal/ed the slashes, as a wait, specífying their nature of spatial concepts. Wait in its more ar less ample and ambiguous sense, which starts from a futuristic hypothesis and opens itself to a contemplative intention - almost methaphysical - until it reaches a sexual allusion, like a purífied erotic symbolism, near to archetypal abstraction. However, it would not be dífficult to study the timing of his gestual rhythm which departs from the absolute, made up of just one slash, up to multiple interactive action. Furth erm ore, it would not be dífficult to study his motivations, which start with pure rythmic gesture, sometimes divided into an interaction that is almost a dance, up to a kind of architecture construction. While rereading again his creative itinerary (of which some examples are presented here) we can seize the exceptional dimension of Fontana's legacy to the history of our century, the dífferent questions he raised were interpreted in his own personal way, both enthusiastic and wise, confident in the substantial positive aspects of lífe and in its authentic intimate rhythm, with his continuous creative resources. His message is formed on cosmically intelligent humanism, geared towards the future (in deep connection with the most inventive experiences of Italian futurism). Enrico Crispolti
Ao reler seu itinerário criativo (dos quais temos aqui alguns exemplos), podemos captar a dimensão excepcional da colaboração de Fontana para a história do nosso século, assim como as múltiplas inquietações das quais foi um intérprete extremamente pessoal, entusiasmado porém sábio, confiante na positividade e na autenticidade da vida, com uma inesgotável capacidade de renovação dos recursos criativos. Sua mensagem contém um humanismo cosmicamente inteligente, voltado para o futuro (uma profunda relação com os aspectos mais inventivos da experiência do futurismo italiano). Enrico Crispolti 231
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Concetto spaziale, Attese, 1959 anilina, cortes e buracos s/tela/aniline, slashes and holes on canvas 97 x 130 cm Coleção Fondazione Fontana Foto Bellamio
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Concetto spazia/e, 1968 óleo, cortes e grafite s/te la/oi!, s/ashes and graphite on canvas 81 x 65 cm Coleção Teresita Fontana Foto 8ellamio
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1899 Nasce em Rosario de Santa Fe, Argentina, de mãe argentina, descendente de italianos, e de pai italiano, escultor decorativo. 1905-1921 Viaja a Milão com o pai, com quem começa a estudar escultura. Em 1917 é voluntário na Primeira Guerra Mundial e em 1918 é ferido em batalha. Termina os estudos e inscreve-se na Academia de Belas-Artes de Brera, em Milão. 1921-1927 Volta a Rosario de Santa Fe, onde trabalha na firma do pai, a FontanaScarabelli. Em 1924 abre um estúdio de. escultura. Realiza obras de influência futurista e art-déco. Ganha um concurso para criar um monumento em homenagem a Juana Blanco, em Rosario. 1928-1930 Volta à Itália e estabelece-se em Milão. Estuda com o escultor simbolista Adolfo Wildt, na Academia de Brera. Cria o túmulo de Berardi no Cemitério Monumental de Milão. Em 1929, participa de exposições na Itália e em outros países da Europa. Obtém em 1930 o diploma de escultura com EI auriga. Participa do concurso para o Monumento a Grandi com um projeto abstrato e realiza a primeira exposição individual na Galleria dei Milione em Milão. 1931-1932 Cria esculturas abstratas em metal e concreto, entre elas Vittoria, para o Monumento aos Soldados
Mortos de Erba, projeto do arquiteto Terragni. 1934-1935 Participa do grupo de pintores e escultores abstratos da Galleria dei Milione com Melotti, Soldati, Reggiani, Veronesi, Licini, G. Ghiringhelli e Bagliardi. Em 1935, assina com os mesmos artistas e com De Amicis e D'Errico, o manifesto da Primeira Mostra Coletiva de Arte Abstrata Italiana, realizada em Turim. Inicia a atividade de ceramista em Albisola, ponto de encontro de artistas de vanguarda. 1936 Cria um grupo escultório de grandes dimensões para o Sallone della Vittoria na 6ª Trienal de Milão. 1937 Trabalha na fábrica de Sêvres. Em Paris encontra Brancusi, Joan Miró e Tristan Tzara. Realiza exposição individual de cerâmicas na Galerie Jeanne BoucherMirbor de Paris e na Galleria dei Milione em Milão. 1938-1939 Continua a atividade de ceramista ,em Albisola, realizando também esculturas em mosaico colorido. Cria a estátua de São Protásio para o Duomo de Milão e um relevo para o Palácio da Justiça. Em 1939 participa da 11 Mostra di Corrente em Milão. 1940 Viaja para a Argentina, onde vive até 1947. Sua escultura assume caráter figurativo com traços expressionistas. Participa ativamente do ambiente artístico da Argentina. 1942 Ganha o primeiro prêmio
de escultura do Salão de Belas Artes com a obra Muchacho dei Paraná e o primeiro prêmio do Salão Municipal de Córdoba. 1945 Ensina na Escola de Belas -Artes de Buenos Aires. 1946 Com Jorge Romero Brest e Jorge Larco organiza em Buenos Aires a Academia de Altamira, importante centro cultural em que elabora, com jovens estudantes e intelectuais, o Manifesto Blanco. 1947 Volta a Milão e em maio assina o I Manifesto dello Spazialismo, com G. Kaisserlian, Joppolo e Milena Milani. Colabora com os arqu·itetos Zanuso e Menghi, executando a decoração de um edifício da Via Senato em Milão. 1948 Exposição individual de cerâmicas na Galleria dei Camino, Milão. Participa da 24ª Bienal de Veneza com uma escultura espacial e obras em cerâmica e mosaico. Assina o 11 Manifesto dello Spazialismo. 1949 Apresenta na Galleria dei Milione o Ambiente espacial com luz preta. Inicia a pesquisa espacial na pintura com uma primeira série que denomina Buracos. Começa a trabalhar para a Arredamenti Borsani, produzindo tetos, luminárias e elementos de decoração. Participa de exposições na Itália e no exterior. 1950 Realiza uma exposição individual na Galleria dei Milione. Assina o 111 Manifesto dello Spazialismo, com Milena
Milani, Giani, Joppolo, Crippa e Cardazzo. Participa da 25ª Bienal de Veneza. 1951 Participa do concurso para a quinta porta do Duomo de Milão. Para a 9ª Trienal de Milão realiza o Arabesco em neon e um teto com luz indireta no hall. Participa da 1ª Bienal de São Paulo com duas esculturas em cerâmica. Assina o IV Manifesto dello Spazialismo. 1952 Assina o Manifesto Spaziale per la Televisione. Apresenta pela primeira vez as obras espaciais Buracos, na Galleria dei Naviglio de Milão. Participa da mostra As Artes Figurativas na Arquitetura. Continua a série Buracos, introduzindo nas obras outros elementos, como pedras e vidro. 1953 Colabora com arquitetos criando uma decoração espacial para uma sala de cinema e um teto para o pavilhão Sidercomit na Feira de Milão. Desenvolve as séries Buracos e Pedras que expõe na Galleria dei Naviglio. 1954 Participa da 27ª Bienal de Veneza com uma mostra retrospectiva. Participa da 10ª Trienal de Milão e realiza um teto de neon para a Feira de Milão. Continua trabalhando na série Pedras e inicia a dos Gessos. 1955 Exposições individuais em Roma e Milão. Participa do Premier Festival de la Céramique em Cannes e da 7ª Quadrienal de Roma.
1956 Cria em cerâmica o altar para a igreja de San Fedele em Milão. Trabalha nas séries Pedras, Gessos e Barrocos. 1957 Expõe na Itália e no exterior. Trabalha nas obras da série Barrocos, que conclui. Inicia a série Tintas e Papéis. Realiza uma grande escultura mural para a Camera di Commercio de Milão. 1958 Sala especial na 29ª Bienal de Veneza. Assina o VII . Manifesto dello Spazialismo. Participa de numerosas exposições na Itália e no exterior. Continua a série Tintas, nas quais intervém com cortes múltiplos, inaugurando a série Cortes. 1959 Apresenta a nova fase dos Cortes em individuais em Milão e Paris. Participa da 11 Documenta de Kassel e da5ª Bienal de São Paulo. Trabalha numa nova série de esculturas em terracota denominada Naturas, que desenvolve entre 1959 e 1960. 1960 Intensifica a atividade expositiva na Itália e no exterior. Realiza o ambiente espacial Exaltação de uma forma, com tecidos. A crítica internacional dedica-lhe numerosos ensaios. 1961 Na exposição Arte e Contemplazione em Veneza, expões as grandes pinturas dedicadas a Veneza. Expõe em Nova Vork e elabora um novo ciclo dedicado às grandes metrópoles norte-americanas, iniciando a série Metais. 1962 Grande retrospectiva no
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Concetto spaziale, Attese, 1959
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hidropintura s/tela/waterpainting on canvas 68 x 108 em Coleção Teresita Fontana Foto Bellamio
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Stadtisches Museum de Leverkusen.Exposições individuais em Turim, Milão, Veneza, Bruxelas, Tóquio e Londres. O editor Schwarz publica em Milão o texto de Alain Jouffroy L'epée dans /'eau, dedicado a Fontana. Continua as séries Buracos, Óleos e Cortes. Cria jóias. 1963 Apresenta a série Fim de Deus. Em L'Aquila, é realizada uma grande retrospectiva de sua obra, organizada por Enrico Crispolti. 1964 Individuais em Paris, onde apresenta as obras Fim de Deus, com o título de Les Oeufs Célestes. Expõe em Gênova, Osaka, Tóquio, Estocolmo, Milão e Veneza. Inicia a nova série Teatrinhos. 1965 Individuais em Turim, Paris, Klagenfurt, Bruxelas, Lausanne, Milão e Trieste. Ilustra com gravuras o livro Apocalissi e sedici traduzioni, de Giuseppe Ungaretti. A crítica internacional dedica-lhe intensa atenção. Trabalha as séries Óleos, Cortes e Teatrinhos e retoma a série Buracos. Desenha modelos de roupas espaciais. 1966 Individual em Minneapolis, em Austin e em Buenos Aires. Sala especial na 33ª Bienal de Veneza. Individuais na Marlborough Gallery de Nova Vork, na Galerie lolas de Paris e no Museu Castagnino em Rosario de Santa Fe. Exposição circulante nos Estados Unidos, organizada pelo Museum of 238
Modem Art. Desenha cenários e figurinos para o balé Retrato de Dom Quixote, de A. Millos, encenado no Teatro alia Scala de Milão. Trabalha nas séries Óleos, Buracos e Cortes e conclui a série Teatrinhos. 1967 Individual no Louisiana Museum de Copenhague, no Stedelijk Museum de Amsterdam, no Stedelijk van Abbemuseum de Eindhoven e no Moderna Museet de Estocolmo. Intensa participação em mostras coletivas na Itália e no exterior. Realiza a série Elipses e novas esculturas em metal. 1968 Participa da 34ª Bienal de Veneza e da Documenta IV de Kassel, nas quais realiza dois ambientes espaciais. Individual no KestnerGesennschaft de Hannover e em Paris, Düsseldorf, Gênova, Livorno, Milão e Pádua. Participa de numerosas exposições coletivas, entre as quais L'Art Vivant, Destruction Art, Destroy to Create e Recent Italian Painting and Sculpture, ambas em Nova Vork. Morre em Varese, no dia 7 de setembro. 1899 Lucio Fontana was bom in Rosario de Santa Fe, Argentina. His mother was Argentine of Italian extraction and his father Italian a decora tive sculptor. 1905-1921 He moved to Milan with his father. He began studying sculpture with his father. In 1917 he was a volunteer to serve in the Great War. In 1918 he was
wounded in the front. He finished his studies and enrolled at the Fine Arts Academy of Brera, Milan. 1921-1927 He Returned to Rosario de Santa Fe, where he worked at his father's firm, FontanaScarabelli. In 1924 he opened his sculpture studio. His works were of futuristic and art deco influence. He won the contest for a monument to Juana Blanco in Rosario, 1927. 1928-1930 He returned to Italy to live in Milan. He studied sculpture with Adolfo Wildt symbolistic sculptor, at Accademia di Brera. He made Berardi's tomb for the Monumental Cemetery of Milan. In 1929, he participated in exhibitions in Italy and other European countries. In 1930, he received the degree in sculpture with EI auriga. He participated in the contest for the Monument to Grandi with an abstract project and he had his first individual exhibition in Galleria dei Milione in Milan. 1931-1932 He produced abstract sculptures in metal and concrete including Vittoria for the Erba Monument to Dead Soldiers, projected by Architect Terragni. 1934-1935 He was a member of the abstract painters and sculptors' group, together with Melotti, Solda ti, Reggiani, Veronesi, Licini, G. Ghiringhellli and Bagliardi who had exhibited at Galleria dei Milione. In 1935, they signed together with De Amicis and D'Errico the Prima Mostra Colletiva di Arte Astratta Manifesto, in Turin. He began his works in ceramics, in Albisola, a meeting point for
avant-garde artist. 1936 He produced a large group of sculptures for the Salone della Vittoria at the 6th Triennale of Milan together with Nizzoli, Palanti and Persico. 1937 He worked at the Sevres plant. In Paris, he met Brancusi, Joan Miró and Tristan Tzara. He held a solo exhibition of ceramics at Galerie Jeanne Boucher~Mirbor in Paris and Galleria dei Milione in Milan. 1938-1939 He continued working as a qeramist in Albisola; at the same time he made mosaic sculptures in color. He produced Saint Protasio's statue for the Duomo of Milan and a relief for the Palace of Justice. In 1939 he took part in the Seconda Mostra di Corrente in Milan. 1940 He travelled to Argentina where he lived during World War 11. His sculptures had a figurative character with expressionist traces. He participated actively in the artistic circles in Rosario, Buenos Aires, La Plata, and Córdoba. 1942 He received the first prize in sculpture with his work Muchacho dei Paraná at the Fine Arts Salon and the first prize at the Municipal Salon in Córdoba. 1945 He taught at the Buenos Aires School of Fine Arts. 1946 He organized together with Jorge Romero Brest and Jorge Larco the Academia de Altamira in Buenos Aires, an important cultural center, where he signed with young students and intellectuals the Manifesto Blanco. 1947 He returned to Milan. In May,
he signed the Primo Manifesto dello Spazialismo with G. Kaisserlian Joppolo and Milena Milani. He worked together with Architects Zanuso and Menghi producing the polychrome ceramic decoration for the façade of a building in Via Senato in Milan. 1948 He held an individual exhibition of ceramics at Galleria dei Camino, Milan. He participated in the 24 th Biennale di Venezia with a spatial sculpture, ceramic and mosaic works. He signed the Secondo Manifesto dello Spazialismo. 1949 He created for the Galleria dei Milione the Black Spatial Environment. He began the spatial research in painting with the first series Holes. He began working for Arredamenti Borsani producing ceilings, artificial illumination and decora tive elements. He participated in exhibitions in Italy and abroad. 1950 He held an individual exhibition at Galleria dei Milione. He signed the Terzo Manifesto dello Spazialismo, with Milena Milani, Giani, Joppolo, Crippa and Cardazzo. He participated in the 25ª Biennale di Venezia. 1951 He participated in the contest for the fifth door of the Duomo in Milan. For the 9ª Triennale of Milan he produced the Arabesque in Neon and a ceiling with indirect light for the hall. He took part in the 1st Bienal Internacional de São Paulo with two sculptures in ceramics. He signed the Quarto Manifesto dello Spazialismo. 1952 He signed the Manifesto dei
Concetto spaziale, 1950 óleo s/tela/oil on canvas 85 x 65 em Coleção Teresita Fontana Foto 8ellamio
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Concetto spaziale, Venice moon, 1961 óleo e cortes s/tela/oil and slaches on canvas 150 x 150 cm Coleção Teresita Fontana
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Movimento Spaziale per la Televisione. He presented for the first time his spatial works Holes in Galleria deI Naviglio in Milan. He participated in the Figurative Arts in Architecture Show. During these years he worked intensively with architects. He continued the Holes cyele introducing other elements such as stone and glass. 7953 He collaborated with architects producing a spatial decoration for a movie theater and an illuminated ceiling for the Sidercomit Pavillion at the Fair of Milan. He developed a new series ofHoles and Stones which he exhibited at Galleria deI Naviglio. 7954 He participated in the 2lh Biennale di Venezia with a retrospective. He participated in the 70th Triennale di Milano and produced a neon and painted ceiling for the Fair of Milan. He continued working with Stones and began working with Plaster. 7955 He held individual exhbitions in Rome and Milan. He participated in the Premier Festivallnternational de la Céramique in Cannes, and in the lh Ouadriennale di Roma. 7956 He produced the altar of San Fedele s church in Milan. He continued the series ofHoles, Stones and Baroque. 7957 He had an intense participation in exhibitions in Italy and abroad. He continued his works of the Baroque cyele which he concluded this year; he began his Pen-and-Ink Drawings and Paper cyeles. He produced a large mural sculpture for the Camera di Commercio of Milan.
7958 He had a special room at the 29th Biennale di Venezia. He signed the Settimo Manifesto dello Spazialismo. He participated in several exhibitions in Italyand abroad. He continued his Inchiostri series in which he intervened with multipIe slashes inaugurating the Slashes cycle. 7959 He introduced his Slashes in individual exhibitions in Milan and Paris. He participated in the 2nd Documenta of Kassel and in the 5ª Bienal Internacional de São Paulo. He worked in a new series of sculptures in terracotta called Nature which he developed between 7959 and 7960. He began his Quanta series. 7960 He completed the sculpture cycle Nature. He held more exhibitions in Italy and abroad. He produced the spatial environment Exhultation to a form in fabrico He began his series ofOils. International art critics dedicated many reviews to Fontana and his work. 7967 At the time ofArte e Contemplazione exhibition in Venice, he showed large paintings dedicated to Venice. He held an exhibition in New York: he prepared a new cyele on North-American metropoles using paintings and metaIs. He began the Metais cycle. 7962 He held a large retrospective at the Stadtisches Museum of Leverkusen, as well as individual exhibitions in Turin, Milan, Venice, Brussels, Tokyo and London. Publisher Schwarz published Alain Jouffroys article L' épée dans I'eau on Fontana with ten engravings in
metal, in Milan. He continued his series ofHoles, Slashes andOils. He also produced jewelry. 7963 He began the End of God cycle. First large reprospective of his workorganized by Enrico Crispolti, in L'Aqui/a. 7964 He held an individual exhibition in Paris where he presented End of God with the title Les Deufs Célestes. He held exhibitions in Genoa, Osaka, Tokyo, Stockholm, Milan and Venice. He began a new series: Small theaters. 7965 He held individual shows in Torino, Paris, Klagenfurt, Brussels, Lausanne, Milan, Trieste. He illustrated with engravings Apocalissi e sedici traduzioni by Giuseppe Ungaretti. International art critics devoted extraordinary attention to his works. He worked on Oils, Slashes, Small theaters and Holes. He drew models of spatial clothes. 7966 He held individual exhibitions in Minneapolis, in Austin, and Buenos Aires. Special room at the 33rd Biennale di Venezia. 7967He held individual exhibitions at the Louisiana Museum of Copenhagen, Stedelijk van Abbemuseum of Eindhoven and Moderna Museet of Stockholm. He had intense participation in collective exhibitions in Italyand abroad. He began a new series of Ellipses and new sculptures in metal. 7968 He participated in the 34 th Biennale di Venezia and 4th Documenta of Kassel for which he produced two ambienti spaziali. He held individual exhibitions at
Kestner-Gesennschaft of Hannover and in Paris, Düsseldorf, Genoa, Livorno, Milan and Padova. He participated in a great number of collective exhibitions among which L' Art Vivant 1965-1968 in SaintPaul-de- Vence, Destruction Art, Destroy to Create and Recent Italian Painting and Sculpture, New York. He died in Varese on the lh of September. Obras apresentadas/Works in the exhibitions Ambiente nero, 1948-49 reconstrução/reassembly estrutura metálica e papel pintado/metallic framework and painted paper Coleção: Teresita Fontana Ambiente spaziale aI neoo, 1951 reconstrução/reassembly Coleção: Teresita Fontana Concetto spaziale, 1950 óleo s/tela/oil on canvas 85x65cm Coleção: Teresita Fontana Concetto spaziale, 1953 óleo e técnica mista s/tela/oil and mixed media on canvas 55x 70 cm Coleção: Fondazione Fontana Concetto spaziale, 1953 óleo, grafite e vidro s/te Ia/oil, graphite and glass on canvas 70x 55 cm Coleção: Teresita Fontana Concetto spaziale, 11 Paradiso, 1956 óleo, técnica mista e vidro s/tela/oil, mixed media and glass on canvas 120x91cm Coleção: Nini Laurini Concetto spaziale, Attesei 1959
anilina, cortes e buracos s/tela/aniline, slashes and holes on canvas 97 x 130cm Coleção Fondazione Fontana Concetto spaziale, Attese,1959 hidropintura s/tela/water-painting on canvas 68x 108 cm Coleção: Teresita Fontana Concetto spaziale, 1960 óleo s/tela/oil on canvas 55x 70 cm Coleção: Teresita Fontana Concetto spaziale, Venice moDo, 1961 óleo e cortes s/tela/oil and slashes on canvas 150 x 150 cm Coleção: Teresita Fontana Concetto spaziale, 1964 óleo e cortes s/tela/oil and slashes on canvas 81 x 100 cm Coleção: Teresita Fontana Concetto spaziale, 1965 óleo s/tela/oil on canvas 92,4 x 73,2 cm Coleção: MAC-USP Concetto spaziale, 1968 óleo, cortes e grafite s/tela/oil, slashes and graphite on canvas 81 x65cm Coleção: Teresita Fontana
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CU~DORWIM ~ccRcN CU~DOR A~~I~lcNlc ~lclcR IJA~~c~
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MALÉVITCH EM SÃO PAULO
MALEVICH IN SÃO PAULO
Em 1957,22 anos após sua morte e menos de 40 anos atrás, Malévitch era um pintor famoso, mas não se conhecia quase nada de seu trabalho. Havia apenas um livro - de uma série da Bauhaus dedicado a suas obras"Oie gegenstandslose Welt(O mundo abstrato), publicado em 1927, que tinha conquistado de imediato a atenção do público. Durante décadas ele foi a principal fonte de informações que existia sobre o artista fora da Rússia. Os museus russos, que possuíam muitas de suas obras, não tinham permissão para expô-Ias. Uma ou outra pintura apenas foi exibida no Ocidente. Em 1922, Katherine Dreier comprou em Berlim um quadro que mais tarde doou à Vale University. O Museum of Modern Art de Nova Vork pôde expor alguns de seus trabalhos. Peggy Guggenheim possuía em sua coleção uma pintura, e uma outra foi parar no Solomon R. Guggenheim Museum de Nova Vork. Éclaro que uma representação tão esporádica da obra de Malévitch refletiu-se também na literatura que havia sobre ele. Michel Seuphor, em seu dicionário de pintura abstrata publicado em 1957 em Paris e em Munique (edição da Knaur), debruçou-se sobre as teorias de Malévitch, mas não chegou a mencionar nenhum lugar onde sua obra pudesse ser vista. Essa falta de informações começou a incomodar quando se tentou formular juízos sobre sua obra, como fez Marcel Brion. Em sua Art abstrait, ele apresenta Malévitch como um artista totalmente isolado do contexto social e distante das contradições políticas da Rússia de 1917. Não faz também referência aos trabalhos da primeira fase do artista nem aos produzidos depois de 1927.
In 1957, twenty-two years after Malevichs death and less than forty years ago today, virtua//y nane of this famous painters work was on public display. His Bauhaus book Die gegenstandlose Welt (The non-objective wor/d) was published in 1927 and became widely known. For decades, this book remained the primary source of information outside Russia on his suprematist work. Russian museums, which had many of his works in their co//ections, were not a//owed to display them. Very few of Malevichs paintings had reached the West. Back in 1922, Katherine Dreier purchased a painting in Ber/in, which she later donated to Yale. The Museum of Modem Art in New York was able to exhibit a few paintings. Peggy Guggenheims co//ection included one of Malevichs works. Another work ended up at the Solomon R. Guggenheim Museum in New York. Df course this sporadic representation of Malevichs work influenced what was written about him. In 1957, a Lexicon by Michel Seuphor about abstract painting, preceded by a concise history of the art, appeared in Paris and Munich (published by Knaur). While Seuphor discussed Malevichs theories, he was hardlyable to mention any places where his work was on display. This shortcoming reflected the circumstances. It became a problem when people nevertheless passed judgement on the basis of their limited knowledge. For example, in Art abstrait (Paris, 1956, p. 142), MareeI Brion described Malevich as an artist who was tota//y isolated from any social context and who kept his distance from the política I contrasts that prevailed in Russia after 1917. He referred neither to Malevichs ear/y works, nor to those from after 1927.
A visão da obra de Malévitch foi, no entanto, consideravelmente ampliada quando uma grande parte dos trabalhos que confiara em 1927 ao arquiteto Hugo Hãring foi exposta no Stedelijk Museum de Amsterdam, em 29 dedezembro de 1957. Depois disso, a coleção de Hãring, inicialmente cedida a título de empréstimo, foi incluída na coleção permanente do museu, em 1958, e com o decorrer dos anos transformou-se em exposição itinerante em Braunschweig, Bruxelas, Berna, Roma, Londres, Humlebaek, Ulm, Linz, Viena, Leverkusen, Winterthur, Nova Vork, Pasadena e Paris. Ela incluía uma parte considerável da exposição que Malévitch organizou em 1927 em Berlim, na Grosse Berliner Kunstausstellung. Cerca de metade das 28 pinturas e sete guaches enquadram-se no que o artista denominou suprematismo. Os outros trabalhos eram neoprimitivistas, cubistas e cubofuturistas. Na exposição de Berlim, a fase neoprimitivista estava fortemente representada, o que permitiu uma imagem equilibrada da obra de Malévitch naquele momento. Dessa exposição há trabalhos que desapareceram, provavelmente perdidos durante o período que passaram em um armazém, ou talvez durante os transportes efetuados entre Berlim e Hannover, onde o Provinzialmuseum acolheu a coleção durante algum tempo. O próprio Malévitch não incluiu na mostra berlinense seu Quadrado negro, privando desta forma o Ocidente de um momento crucial de sua obra.
Insight into Malevichs work was considerably enhanced when many of the paintings that the artist had entrusted to the architect Hugo Haring in 1927 were exhibíted at the Stedelijk Museum in Amsterdam on December 29, 1957. In the years that fo//owed, this co//ection, which was initia//yon loan from Haring and became part of the museum s permanent co//ection in 1958, was exhibited in Braunschweig, Brussels, Bem, Rome, London, Humlebaek, Vim, Linz, Vienna, Leverkusen, Winterthur, New York, Pasadena and Paris. The co//ection includes a considerable portion of the exhibition organized by Malevich in Die Grosse Ber/iner Kunstausste//ung in Ber/in in 1927. Approximately half of the 28 paintings and 7 gouaches are part of Malevichs suprematism. Dther works pertain to neo-primitivism, cubism and cubofuturismo The original exhibition in Ber/in contained a strong element of neoprimitivism, which reflected an accurate balance of Malevichs art at that time. Certain works from that original co//ection have not reappeared and were probably lost while in storage at a transport company in Ber/in ar en route from Ber/in to Hannover, where they spent some time at the Provinzialmuseum. It is likely that Malevich omitted his Black square from the exhibition in Ber/in for diplomatic reasons (?), thereby depriving the West of a crucial moment in his work.
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244 Suprematismo (Supremus nU50;' 1915 61eo s/tela/oiI on canvas 97 x 66 em Coleção Stedefijk Museum, Amsterdam
Suprematismo, 1915 óleo s/tela/oil on canvas 80,5 x 81 em Coleção Museu Russo, Leningrado
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Esses fatos, referidos aqui de forma resumida, só poderão ser compreendidos se tivermos uma noção da situação política que lhes serviu de pano de fundo. A revolução nas artes plásticas russas aconteceu antes mesmo da Revolução de Outubro de 1917. Malévitch e outros artistas de vanguarda aderiram nesse ano à revolução política e tiveram um papel importante, embora temporário, na nova organização da vida artística, como por exemplo na reorganização do ensino de artes. Em 1919 Malévich foi recrutado pela academia de Vitebsk, da qual foi convidado a sair em 1921, levando muitos alunos com ele. A 16ª Mostra Estatal foi, no começo de 1920, totalmente dedicada a uma grande panorâmica de sua obra: K. S. Malévitch, Exposição Individual, Seu Caminho do Impressionismo ao Suprematismo. Em 1921 foi fundado em Petrogrado em museu de cultura artística do qual Malévitch tornou-se diretor em 1923, em caráter provisório. Em 1924, o museu foi substituido pelo GINKhUK (que se tornou estatal em 1925), uma espécie de instituto de história da arte onde artistas exerciam a atividade de "cientistas da arte". Das cinco seções existentes, Malévitch dirigia a de cultura artística. Nesse periodo, crescia progressivamente a oposição aos conceitos artísticos mais avançados, principalmente por parte da conservadora AKhRR, a União de Artistas da Rússia Revolucionária, que começou a ter uma influência cada vez maior sobre o partido. Os ataques da União ao GINKhUK eram muito violentos. Em 1926, acusado de pretensas práticas contra-revolucionárias, Malévitch foi demitido de suas funções. O GINKhUK foi fechado e encampado pelo Instituto Estatal de História da Arte. Em 1929, historiadores de arte conseguiram que Malévitch fosse despedido e que "seu departamento fosse extinto. O artista pôde dar prosseguimento à pintura, mas foi-se marginalizando pouco a pouco da vida artística. A exposição de Berlim, em 1927, foi um passo importante em seu caminho para o Ocidente. No entanto, forçado a voltar à Rússia, não pôde dar prosseguimento a seus planos - um deles era expor em Paris. Nessa época, começou a desenvolver um novo,estilo de pintura. Voltou à figuração e à temática dos camponeses e do trabalho na terra, porém manteve em seu trabalho aspectos do suprematismo na aplicação das cores, no caráter anônimo e despersonalizado das figuras e na utilizaçã'o dos espaços. Depois de 1930, embora não tenha abandonado esse estilo por completo, os detalhes fisionômicos voltaram a fazer parte de seus retratos. Malévitch viveu e trabalhou sob um regime ideológico e burocrático que controlava a arte e a atuação dos artistas, e que era especialmente rígido em relação à apresentação da arte para o público. Durante sua vida, porém, Malévitch e suas obras não saíram completamente de cena. Em 1929, ele ainda realizou uma exposição na Galeria Tretiákov, onde mostrou novos trabalhos que antedatou para que passassem por antigos. Um pouco alterada, essa exposição repetiu-se em Kíev em 1930, e dois desses trabalhos novos, antedatados para 1913 e 1915, foram incluídos numa mostra em Berlim sobre pintura soviética. Participou também com uma pintura da exposição Arte Russa Hoje, em Viena. Em 1932, expôs na mostra Arte da Era Imperialista e teve ampla presença na exposição Quinze Anos de Arte Soviética, no Museu Russo de Leningrado. No ano de sua morte, participou com quinze retratos da Primeira Mostra de Artistas de Leningrado. No entanto, depois de seU falecimento, sua obra não chegou a ser exposta nem mesmo no Museu Russo, que chegou a adquirir postumamente vários de seus trabalhos e conseguiu para a família uma pensão governamental. Também na Alemanha a situação das artes plásticas tornava-se progressivamente catastrófica. Com a tomada do poder por Hitler, um grande número de artistas foi demitido de suas funções em academias. Muitos deles procuraram refúgio no estrangeiro. 246
An understanding of the confusing facts mentioned above in a necessarily summary fashion is possible only by considering the political context in which they took place. The revolutionary change in visual art in Russia occured before the Dctober Revolution of 7977. That year, Malevich and many of his avant-garde colleagues joined the political revolution and temporarily played a major part in the new state organization of the art world, such as in revamping art education. In 7979, Malevich was recruited by the academyat Vitebsk, from where he and many of his students were told to leave by 7927. In early 7920, The Sixteenth State Exhibition was entirely devoted to the large special exhibition K S. Malevich: Dne Person Exhibition. His Wayfrom Impressionism to Suprematism. In 7927, a museum for artistic culture was established in Petrograd, where Malevich temporarily served as director in 7923. In 7924, this museum was replaced by the GINKhUK (which became a state institution in 7925), an art history institute where artists worked as art scien tis ts. Df the five departments, Malevich was placed in charge of Artistic Culture. During this period, resistance mounted against progressive views on art, especially at the AKhRR, the union of artists in revolutionary Russia with a more conserva tive outlook that had increasing influence on the party. It vehemently criticized the GINKhUK In 7926, Malevich was dismissed as director for his a//egedly counter-revolutionary practices. The institute was dismantled and became part of the State Institute for Art History. In 7929, art historians managed to oust Malevich along with his department. Although he was permitted to continue as an artist, Malevich was gradually forced onto the sidelines of the official art world. His' 7927 exhibition in Berlin provided him with a trump card in the West. When his forced retum to Russia prevented him from carrying out his plans, which included travelling to Paris, Malevich developed a new style of painting in his own country. This approach involved a retum to figuration and the theme of farmers and their work on the land while presérving aspects of suprematism in his use and application of colours, the anonymous, impersonal appearance of the figures and his use of space. After 7930, Malevich did not abandon this style, although facial features retumed to his portraits. Malevich lived and worked under a regime with a compulsive ideological and organizational involvement in art and the performance of artists, which was even greater where the presentation of art was concemed. During his lifetime, Malevich and his works of art did not disappear altogether. He was granted an exhibition at the Tretiakov Gallery, where he displayed new works that he antedated to present as old work. A slightly different version of this exhibition also appeared in Kiev in 7930. The exhibition Soviet Painting in Berlin included two of Malevich's new pictures, which he antedated to 7973 and 7975. He entered one painting in the exhibition Russian Art of Today in Vienna. In 7932, Malevich's work appeared at the exhibition Art from the Imperialist Era and was also represented extensively at the exhibition Fifteen Years of Soviet Art at the State Russian Museum in Leningrad. The year Malevich died, he entered five portaits in The First Exhibition by Leningrad Artists. From decades after his death, his work did not appear on display, not even at the State Russian Museum, which acquired several of his works after h1s death and provided his family with a govemment pensiono In Germany, art was in an increasingly dire predicament. Manyartists were dismissed from their posts at academies following Hitler's takeover of power, and many fled abroad. The Bauhaus closed in 7933. Animosity towards modem art, abstract or otherwise, was rampant. By 7938, this sentiment led to the confiscation, storage, destruction or sale of about 7200 masterpieces in German museums, which had been the most progressive in Europe. Hugo Haring, himself under attack for being the director of an allegedly suspect
A Bauhaus foi fechada em 1933. Era imensa a hostilidade contra a arte moderna, abstrata ou não, o que provocou, em 1938, o confisco, destruição ou venda de cerca de 1 200 obras-primas dos museus da Alemanha, até então os mais avançados de toda a Europa. Mesmo em tais circunstâncias, Hugo Hãring, ele próprio vítima de ataques por sua posição de diretor de uma academia de arquitetura "suspeita", conseguiu preservar os trabalhos de Malévitch da destruição. Uma atuação corajosa, em especial depois de o museu de Hannover - que os guardara por algum tempo e expusera alguns no famoso Gabinete Abstrato, elaborado por Lissitzky - tê-los devolvido diante da ameaça da intervenção nazista. Em 1957, os primeiros autores que estudaram a arte abstrata ainda não tinham qualquer informação sobre a vida artística na União Soviética. Só cinco anos depois, Camilla Gray escreveria sobre a obra pioneira de Malévitch. Graças à revelação da coleção Hãring, no entanto, o mundo ocidental pôde ter uma noção dos períodos cubista, futurista e sobretudo suprematista da obra do grande artista. Mas as lacunas continuaram enormes, já que os trabalhos mais antigos (de antes de 1910) e todos os posteriores (de depois de 1927) estavam na URSS, enquanto as principais obras da fase intermediária (de 1911 a 1927) permaneciam no Ocidente, especialmente em Amsterdam. Até a exposição de 1988, não se fazia uma imagem coerente da obra do pintor, embora ele fosse universalmente conhecido como um dos grandes inovadores da arte do século XX. Mas a apresentação de sua obra ao público enfrentou fortes obstáculos. O ano de sua morte, 1935, foi, também o período em que Stálin fechou de vez as portas à vanguarda, proclamando o realismo socialista como estilo obrigatório. A partir daí, os trabalhos de Malévitch não puderam mais deixar os depósitos subterrâneos dos museus russos. Em 1988 foi possível, pela primeira vez, realizar uma mostra retrospectiva da obra do artista, apoiada fundamentalmente nas coleções do Museu Russo de Leningrado e da Galeria Tretiákov de Moscou, bem como do Stedeli'jk Museum de Amsterdam. A exposição foi realizada em Leningrado, de 10 de novembro a 18 de dezembro de 1988; em Moscou, de 29 de dezembro de 1988 a 10 de fevereiro de 1989; e em Amsterdam, de 5 de março a 29 de maio de 1989. Foi um golpe de sorte a cooperação entre os três museus, iniciada pelo Ministério da Cultura da URSS com o apoio do Ministério dos Negócios Estrangeiros. Mas o mais importante foi o milagre da aparição da obra de Malévitch intata e em toda a sua plenitude. Com a maior parte de seus trabalhos à disposição, era possível reconstituir todos os seus passos, desde a absorção dos estilos "históricos" até a interpretação de novas concepções como o cubismo e o futurismo, e daí para a mudança radical que significou o suprematismo. Além disso, puderam ser admiradas também suas maquetes arquitetônicas e a aplicação das concepções suprematistas às artes decorativas e ao design, inclusive projetos de cenários e figurinos para o teatro. O artista, que por seus escritos e ilustrações causou forte impressão, e que ficou famoso com a pintura mais radical,da arte moderna auadrado negro (1915) -, mas quê pela in'acessibilidade da maioria de seus trabalhos foi impedido de ter maior influência internacional, mostrava agora todo o vigor de sua obra. Embora fosse uma figura histórica, com um trabalho iniciado no começo do século e terminado quase quarenta anos depois, Malévitch era mais do que uma sensacional revelação: sua obra parecia ter conservado toda a energia, e até hoje continua a despertar o interesse de artistas e não artistas. Esse fascínio se deve também à personalidade desse artista tão multifacetado e à sua vida repleta de momentos críticos, marcada tanto pela originalidade e dinamismo como pela
academy of architecture, managed to protect Malevich's work from destruction under these circumstances. As the museum in Hannover had returned the paintings to Haring when threatened with Nazi intervention after storing them for a while and displaying some of them in the celebrated Abstract Cabinet designed by Lissitzky, his act reflected tremendous courage. In 1957, when the first authors on abstract art stilllacked any information on the art world in the Soviet Union, and five years 'would elapse before Camilla Gray reported on her pioneering work, the public display of Haring's collection gave the West insight into the cubist, futurist and especially suprematist periods in Malevich's work. Nevertheless, impenetrable blind spots remained in his art. This caesuras ran deep, as most of his early work (before 1910) and ali his later work (after 1927) remained in the Soviet Union, and the bulk of paintings from the intervening years (1911 to 1927) were in the West, especially in Amsterdam. Until the 1988 exhibition, a coherent picture of work by this artist was lacking, despite his ubiquitous recognition as one of the greatest artistic innovators of the 20th century. Nevertheless, major barriers remained to public displays of his work. The Russians kept his paintings in storage. In 1935, the year of Malevich's death, Stalin permanently banned avant garde art and mandated social realism. After Malevich's death, his works were confined to the repositories of Russian museums. In 1988, the first retrospective exhibition of Malevich's art became possible. It primarily featured the collections of the State Russian Museum in Leningrad and the Tretiakov Gallery in Moscow, as well as those of the Stedelijk Museum in Amsterdam. This exhibition also appeared in these museums: in Leningrad from November lOto December 18, 1988, in Moscow from December 29 to February 10, 1989, and in Amsterdam from March 5 to May 29, 1989. This fraternal cooperation between these three , museums that soon turned amicable was a stroke of good fortune that was initiated by the Soviet Ministry for Cultural Affairs with support from the Soviet Ministry for Foreign Affairs. The greatest miracle of ali was Malevich's untarnished appearance. It was sensational and deeply mo'ving to viewall aspects of this artist's work at long last. Poetically, one could claim that a Phoenix rose up from his ashes. More specitically, it was finally possible to view the majority of Malevich's works and to trace his steps from his absorption of historic styles through his personal interpretations of new views including cubism and futurism to his radical shitts towards his own suprematism theory and practice. This interpretation subsequently surfaced in a new type of figura tive depictions with emotional overtones that culminated in majestic portraits of an extensive individualism. In addition, there were architectonic models and applications of suprematist views of art and designo Last but not least, there were designs of theatrical sets and costumes. This man, who had made a tremendous impression through his published writings and illustrations and was renowned for the most radical painting of modem art (Black square, 1915) and who had achieved mythical fame through the inaccessibility of his masterpieces, rather than through an internationally convincing and influential presence, appeared in the full glory of his art. While he was already an individual of historic renown whose work began at the turn of the century and ended in the middle of the fourth decade, the art that was discovered had retained its dynamic quality aside from this sensational revelation and continues to enthral artists today. Many nonprofessional visitors were also fascinated, both by the work and by the personality of this versatile artist and the course of his lite, which wasfilled with criticai moments and was just as imbued with originality and energy as with flexibility, perseverance and courage. Without being an adventurer, Malevich took art on a great adventure. Although he worked the front lines,
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Moças no campo, 1928-32 óleo s/tela/oi! on canvas 106 x 125 em Coleção Museu Russo .
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flexibilidade, persistência e coragem. Malévitch envolveu a arte numa grande aventura, mas não era um aventureiro. Operava nas primeiras linhas de combate, mas era também um estrategista. Teorizava apaixonadamente, tirava conclusões e expunha suas opiniões, provando, através de sua pintura, que estava certo. Argumentava e conseguia convencer, atacava e arrebatava. Quando não houve mais espaço para ele, calou-se e criou um silêncio em sua obra. No entanto, continuou a comunicar-se com aqueles que eram capazes de ler seu vocabulário pictórico.
he was also a strategist. Given to passionate theorizing, he drew conclusions, advanced his theses verbally and substantiated them with his visual art. Malevich argued convincingly to a wide audience, organized, lashed out at and moved others until no space remained for hiin. Then he held his tongue and created a silent quality in his art, thereby reaching an understanding with those able to read his expressive vocabulary and receptive to his sweeping delivery, his noble poses. See his farmers, as well as his final portraits. Malevich had already achieved historic importance, alongside Kandinskyand Mondrian.
A mostra de 1988 evidenciou como Malévitch evoluiu pessoalmente e como eram suas relações com os colegas. De todos, era provavelmente o mais combativo, no entanto teve uma trajetória trágica. Foi rejeitado pelo regime comunista, destituído das altas funções que ocupava ~o ensino artístico e privado de uma parte muito importante de sua obra. Guardada na Alemanha, onde não era valorizada, teve, depois de 1933, que ser protegida e escondida de mais um regime totalitário. Até hoje desconhecemos com que preocupação ou confiança Malévich encarava o futuro de sua obra. O que sabemos é que no quarto onde morreu estava rodeado por ela, sem os trabalhos deixados no exílio, mas com o Duadrado negro. Não resta a menor dúvida de que se manteve até o fim fiel à sua pintura.
The 1988 exhibition revealed the development of his career and his relationships with his colleagues. Although he may have been the most militant and the most social/y concerned in his circle, he ended as a tragic artist. He was rejected by the communist regime, relieved of his prestigious posts in art education and cut 9ff from a crucial portion of his work, which was not considered signiticant in Germany (where he had left it) and ended up having to be protected and11idden from the totalitarian regime there after 1933. The tragedy concerns Malevich as an individual and the role of his work over an extended period. His concern for ar confidence in the future of his work remains a mystery. We do know that he was surrounded by his art in the roam where he died, separated from the works that remained in the exile for the time being, but together with the Black square. His loyalty to his work is beyond question. It is also highly likely that this work included paintings from various periods in his lite, with very distinct themes and concepts, but related through their use of colour and intense imagination.
Depois de 1988, quando foi possível reunir todos os trabalhos do artista no Ocidente, prevaleceu durante muito tempo o preconceito de que o verdadeiro Malévitch estava presente apenas em sua obra suprematista e que os trabalhos posteriores a 1927 deixavam entrever a degradação de um talento antes vigoroso. Já fora demonstrado, entretanto, nas exposições de Paris e Düsseldorf, que esse ponto de vista era insustentável. Não só há trabalhos muito fortes da última fase, como eles revelam um caráter inovador, não no sentido puramente abstrato, mas na ligação de sua estrutura formal com a expressão do comportamento humano. Essa exposição também evidenciou a relação entre as formas das abstrações e as da nova figuração de Malévitch. Não há dúvida de que em seus trabalhos posteriores ele abandonou o universo do suprematismo, mas colocou novos pontos de vista que podem ser considerados prolongamentos das antigas teorias radicais. A mostra de 1988 promoveu a reintegração de Malévitch corllo artista. Pela primeira vez foi possível examinar se as diferentes imagens presentes em seu trabalho designavam uma personalidade. Mas como era essa personalidade? Seria Malévitch o modelo do teórico fanático, compelido a utilizar apenas elementos essenciais da arte visual, libertos da representação de objetos, ou seria um humanista buscando transmitir seus sentimentos por meio tanto de 250
In 1988, this gathering of the segments that could be distinguished in this manner shifted the approach to his work by 90 degrees, frequentlyaffecting the evaluations as well. According to a long-standing prejudice in the West, Malevich's true nature surfaced in his abstract suprematist art, while his work from the brief period after 1927 revealed the disintegration of his previous great talent. Exhibitions in Paris and Düsseldorf had already disproved these views. In addition to excellent samples of Malevich's later work, they revealed innovation, not a purely abstract sense, but in the relationship of their formal structure to their expression of human behaviour. In many cases, this approach would also have yielded superior results in a monumental execution. Furthermore, this exhibition clearly indicated the relationship between the shapes ofabstractions and those of Malevich's new figuration. Although he had indisputably abandoned the cosmos of suprematism, his objectives in his new work definitely revealed extensions of his earlier radical theories. The 1988 exhibition reintegrated Malevich as an artist. For the first time, one location provided an opportunity to examine whether the ditferent images in Malevich's work emerged recognizably from a single personality. Did this personality reflect the fanatical theoretician in need of personal representation as an artist in essential elements of visual art that determined its value, devoid of the appearance of a depiction of objects? Dr was he a
Cabeça de camponês, 1928-32 óleo s/te la/oi/ on canvas 71,7 x 53,8 em Coleção Museu Russo
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abstrações como de figuras humanas? Neste caso, é também verdade que sua abordagem dessas figuras era formal. Situou-as no primeiro plano de suas imagens como figuras espaciais e deu-lhes com ou sem uma disposição de cores fragmentada - funções em relação à composição do fundo. Essas composições faziam uso de grandes áreas autônomas de cor para representar a amplitude ou a profundidade de uma paisagem, por vezes uma cena de mulheres trabalhando na colheita. Cada cena revelava um esforço deliberado de criar um horizonte. Não considero a representação figurativa e o realismo de Malévitch uma fuga desesperada do fracassado suprematismo. Talvez ele se sentisse forçado a abandonar o gegenstandslose Welt para criar uma nova iconografia. Sua nova provisão de imagens fornecia-lhe um novo meio para demonstrar sua sensibilidade. Embora isso possa ter constituído uma resposta a circunstâncias infelizes, ele por vezes compõe sua obra através de uma análise da percepção. Além disso, esse trabalho revela quase sempre um interesse em situar o volume dos corpos tanto no espaço sugerido da pintura quanto no real. A primeira mostra conjunta russa e holandesa, entre 1988 e 1989, revelou descobertas, uma sensacional reunificação, reconciliação, emoções profundas, amizade e uma nova fraternidade. Capturou a atenção do mundo artístico como um todo e levou Armand Hammer a organizar, em tempo recorde, uma continuação nos Estados Unidos. A história da arte estava exposta ali com maior detalhamento e a ampla apresentação de sua 'arte era enriquecida com obras de coleções americanas. Foi exibida nos mais prestigiados museus (a National Gallery of Art de Washington e o Metropolitan Museum of Art de Nova Vork) entre 16 de setembro de 1990 e 24 de março de 1991, chegando a inaugurar o Armand Hammer Museum de Los Angeles. . A generosidade do Museu Russo de São Petersburgo e do Stedelijk Museum de Amsterdam possibilita agora que a América do Sul conheça a arte de Malévitch. Entre as pinturas mais antigas apresentadas nesta Bienal, estão as cenas de um bulevar no verão, datadas do início do século XX. Uma luz móvel banha objetos e pessoas e o estilo de pintura revela tanta espontaneidade nas pinceladas que traz à mente o impressionismo. Uma certa ordem e uma distribuição espacial em primeiro plano são visíveis. A influência da obra de Cézanne está presente. Aqueles que conhecem a obra mais tardia de Malévitch podem detectar também outros aspectos. Poderão ver, por exemplo, como certas cores presentes nas figuras principais estão isoladas em manchas quase autônomas. Ao mesmo tempo que indicam volume e absorvem a luz, prenunciam as formas autônomas de cor que acabarão por se tornar fragmentos cromáticos em sua arte figurativa.
É notável também que algumas das principais figuras apareçam em posição frontal, diretamente voltadas para o público, posição que faz lembrar a postura de santos em alguns ícones. As grandes dimensões dessas figuras sugerem também um ponto de vista em primeiríssimo plano, como no realismo cinemático. O estilo de Banhistas, de 1908, é mais inflexível e formal, talvez até mesmo mais conceitual. A pose dos corpos femininos - com a supressão de qualquer indicação naturalista de cor -, vistos de frente ou de costas, evoca uma imagem de silhuetas acadêmicas presente em uma das paisagens de Cézanne. 252
humanist who wanted to convey his feelings through abstractions as wel/ as through human figures? If so, then it is equal/y true that his approach to his figures was formal. He situated them in the foreground of his images as spatial figures and assigned them, with ar without a fragmented colour scheme, official roles with respect to the background settings. These settings used large, autonomous stretches of colour to represent the expanse ar depth of a landscape, some times fil/ed with a lively scene of farmers' wives harvesting. Every scene revealed a delibera te effort to create a horizon. I do not consider Malevich 's figuration and realism to be a desperate flight from failed suprematism. He may have felt compel/ed to leave the Gegenstandlose Welt and to create a new iconography. His new supply of images provided him with a new medium to demonstra te his sensitivity. While this move may have been a response to the unfortunate circumstances, at times he clearly composes art through an analysis of perception. Furthermore, this work virtual/y always reveals an interest in situating the volume of bodies ar objects in both the suggested and the actual space in the painting. The first joint Russian and Dutch exhibition of 1988/1989 featured discoveries, sensational reunification, reconciliation, deep emotions, friendship and a new fraternity. It caught the attention of the entire art world and led Armand Hammer to organize a fol/ow-up in America in record time. This exhibition leatured greater art history detail and enriched the comprehensive presentation of his art with works from American col/ections. It appeared at the most prestigious museums (the National Gal/ery of Art in Washington and The Metropolitan Museum of Art in New York) between September 16, 1990, and March 24, 1991, and went on to open Hammer's own museum, the Armand Hammer Museum of Art in Los Angeles. The generosity of the State Russian Museum of St. Petersburg and the Stedelijk Museum in Amsterdam is currently enabling South America to become acquainted with Malevich's art. A more modest but highly representative exhibition has brought his work to an environment perfectly suited to this artist, surrounded by art from a new era, in the midst of his col/eagues and at one of the basis of the international art world: the throne of the Bienal de São Paulo 1994. The earliest paintings at this exhibition include the summer boulevard scenes from the beginning of the 20th century. They feature a moving light that touches, aI/ objects and people, and the style of painting reveals such a spontaneity of strokes that impressionism springs to mind. Nevertheless, theyalso contain a certain arder as wel/ as a spacial distribution into sections: foreground, centre and background. Influences of Cézanne's works are present. Those of us familiar with Malevich's later work can also detect otheraspects. For example, we can see how certa in colours of the main figures are isolated into nearly autonomous patches. While they indica te volume and catch the light, theyare also harbingers of the autonomous shapes of colour that eventual/y turned into colour fragments in his figurative art. It is also striking that some of the main figures appear in a frontal view, directly facing the audience. Their placement is reminiscent of the position of saints on some icons. The large appearance of these figures also suggests a close-up view, as in cinematic1ealism. The style ofBathing women of 1908 is more obstina te, more formal, perhaps more conceptual. The pose of the women's bodies, devoid of any naturalist indication of colour, whether shown from a frontal ar rear view, evokes an image of academic silhouettes in one ofCézanne'slandscapes.
As obras de 1912 revelam uma evolução altamente dinâmica. Colhendo centeio absorve o cubismo, tem algo da abordagem de Léger, e ainda assim reflete o calor e o interesse de uma cena primitiva. Cabeça de menina camponesa, de 1913, é uma pintura essencial na carreira de Malévitch. Seus verdadeiros traços fisionômicos, cabelos e lenço foram transformados em um veículo espacial de formas plásticas, cores, luz e sombra.
osoldado da guarda, de 1913-1914, e Senhora na parada do bonde, de 1913, são considerados cubofuturistas. A análise, a união sem hesitações de fragmentos de formas e histórias e a presença enfática de formas autônomas puras resultam em vívidas composições que se apresentam quase congestionadas, embora coesas. Em Suprematismo (Supremus 50), de 1915, e em Suprematismo, de 1915-1916, Malévitch chegou a um estilo completamente seu, que ch~mou de suprematismo. Apresentou pinturas nesse estilo na "1.10. A Ultima Mostra Futurista de Petrogrado", em 1915, onde redefiniu o suprematismo como um novo realismo pictórico. Dissociou assim a pintura de objetos perceptíveis na vida real, cada qual com sua aparência, função e significado, além da experiência artística pura. A sensibilidade define formas que, livres da gravidade, assumem seu próprio espaço, um espaço que devido a designações associativas deveríamos considerar não como sendo terrestre, mas cósmico. São formas geométricas contra um fundo branco com freqüência posicionadas de forma diagonal à pintura. Esse suprematismo, cujas manifestações abstratas datam de 1915 a 1927, revela variações nítidas que incluem formas geométricas básicas como quadrados, círculos e cruzes. A partir de 1915, essas formas apareciam sós ou envolvidas em íntimos diálogos. Mais tarde, ocupam o espaço em grandes aglomerados. Entre 1917 e 1918, os contrastes cromáticos deram lugar a formas transparentes de cor em sutilíssimas transições. Por fim, apareceram formas nítidas, dominantes, quer em diálogos dentro do espaço quer em completa identificação com a superfície da pintura. Nos trabalhos que datam do período de 1928 a 1932, M!llévitch retoma a temática de cenas e paisagens campestres. E possível detectar aspectos de 1912, como o desenho dos personagens e o brilho metálico. Um novo efeito é a ampliação das figuras, que aparecem enormes e imóveis, vistas de frente ou de trás~ Embora contenham claramente figuração e por vezes até mesmo características emocionais e detalhes realistas, as qualidades artísticas dessas pinturas incluem imagens autônomas que consistem em formas geométricas representadas por cores.
Malevich's work from four years later reveals highly dynamic development. Taking in the rye, 7972, absorbs cubism, recal/s Leger's technoid approach and nevertheless ref/ects the warmth and care of a primitive scene. Head of a peasant girl, 7973, is a crucial painting in the course of Malevich's career. The actual features of her face, hair and kerchief have been transformed into a spacial vehicle of plastic shapes, colours, light and shadow The guardsman, 7973-7974, and Lady at the tram stop, 7973, are considered cubo-futurist. Analysis, uninhibited assembly of fragments of shapes and anecdotes and the emphatic presence of pure autonomous shapes result in lively compositions that are almost overcrowded but nevertheless cohesive. In Supremus 50 (7975), Suprematism (7975) and Suprematism (7975-7976) Malevich achieved a style entirely his own, which he named suprematism. He first displayed paintings in this style at 7.7 OThe Last Futurist Exhibition in Pertrograd, in 7975, where he redefined suprematism as a new painterly realism. It disassociates painting from perceptible objects in real lite, from every appearance and every function and significance outside pure artistic experience. Feeling defines shapes that, stripped of gravity, have assumed a space of their own. For the sake of associa tive designations, we should consider this space cosmic rather than terrestrial. They specitical/y consist of geometric shapes against a white background, often diagonal with respect to the painting. This suprematism, of which the abstract manitestations date from 7975 to 7927, reveals clear variations that include basic geometric shapes, such as squares, circles and crosses. Initial/y (7975 and later), they appeared individual/y or engaged in intimate dialogues. Later, they swarmed through space in clusters. The colour contrasts subsequently made way for transparent shapes of colour in very subtle transitions, 7977-7978. Final/y, clear, dominant shapes appeared, either in dialogues within the space or in complete identification with the surface of the painting. In the works that have so far been dated between 7928 and 7932, Malevich resumes the theme of farm scenes and landscapes. It is possible to detect aspects of 7972, such as the style of the characters and the metal/ic glow A new effect is the monumentalizing of figures, which are depicted as massive and immovable, whether from a frontal or {ear view Although these paintings clearly contain figuration and sometimes even emotional characteristics and realistic details, their artistic quality includes autonomous images that consist of geometric shapes and are conveyed by colours. Thus, they lend themselves to a dual interpretation: as stories that are both hieratic and anecdotal or as formal compositions of colours and shapes that use their depiction as an alibi. It would, however, be more accurate to regard them as modem art paintings that reflect unusual wealth and originality in their fabrication of shapes and their social interest in this theme.
Assim, essas pinturas se prestam a uma dupla interpretação.: histórias ao mesmo tempo hieráticas e anedóticas ou composições formais de cores e formas cuja representação serve como um álibi. Seria mais exato considerá-Ias pinturas modernas que refletem uma abundância e uma originalidade incomuns em sua construção de formas e em seu interesse social por esse tema ..
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Banhistas, 1"908 óleo s/tela/oil on canvas 59 x 48 em Coleção Museu Russo
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Cabeça de camponês, de 1928, é um exemplo inconfundível. O primeiro plano da pintura apresenta uma visão frontal da cabeça com uma face oval, olhar interessado, nariz fino, cabelo desalinhado e barba. Ao fundo aparecem as mulheres, trabalhadoras rurais desenhadas de forma a parecerem atraentes, apesar da descrição realista de suas posturas, de seu trabalho. Os campos mostram-se verdes e azuis ou aparecem em faixas de diferentes cores, além de minúsculas silhuetas de árvores e igrejas que pontilham o horizonte. Acima, o arco celeste é agora povoado por aviões. Podemos ver o cultivo, o agricultor que protege e trabalha a terra, as mulheres em seus afazeres, o céu que se tornou meio de transporte, expulsando assim os pássaros. Enquanto a arte de Malévitch revela uma vez mais objetos e figuração, a pintura extrai sua base inalterélvel de fatores expressivos que suplantam o realismo. As cores são encapsuladas em campos ou fluem de um para outro, destacando-se em grupos grandes ou pequenos. As agitadas extensões da paisagem parecem dinâmicas em comparação à máscara estática e digna do agricultor. Nessas cenas, a representação figurativa comunica as qualidades da forma. A terra guarda a intensidade do vermelho, o céu traz o azul e a paisagem multicor compreende quase toda a paleta. Muitas das figuras humanas, sós ou ~m""grupo, não têm traços fisionômicos particulares. Ainda assim, os indivíduos podem ser representados com enorme sensibilidade em um estilo entre o primitivismo e o refinamento. Em ação ou congelados em uma pose, essas pessoas algumas vezes parecem emocionalmente frágeis. Por fim, ao fim da vida de Malévitch, domina o realismo puro. Seus retratos mostram homens, mulheres e crianças em poses sóbrias, aparatados com um tipo de veste suprematista e com suas fisionomias definidas em detalhes. Apesar da distância entre essas pinturas e o sonhado universo do passado, Malévitch assinou-as fielmente com o símbolo de sua convicção: um pequeno quadrado negro.
Wim Beeren
Head of a peasant, 7928, is anunmistakable example. The foreground of the painting presents a frontal view of the head with an oval face, interested eyes, a sharp nose, hair that juts out and a beard. The background features his work entourage, consisting of women farm labourers who are nicely styled despite the realistic portrayal of their postures and work. The fields are either green and blue ar striped with different colours, and tiny silhouettes of trees and churches dot the horizon. Above, the arched sky actually contains airplanes. We see the hilly land being cultivated, the farmer that guards it and works ir, the women performing their tasks, the sky that has become a field of transportation and have thus displaced the birds. While Malevich's art world once again reveals objects and figuration, the painting derives its inalterable basis from expressive factors that supersede realism. The colours are enclosed in fields ar flow into one another. They contrast in large and small groups. The waving, striped stretches of the landscape appear dynamic compared to the farmer's static, dignified mask. In these scenes, the figuration conveys the qualities of shape. The earth bears the intense red, the sky provides blue, and the multi-hued landscape presents a range of colours. Many of the human figures, whether alone ar in a group, have faces without any personal features. Nevertheless such an individual may be depicted with tremendous sensitivity in a style of painting that lies between primitivism and refinement. This person may be at work ar striking a pose, sometimes abstracted in emotional fragility Finally, pure realism prevails at the end of Malevich's life. His portraits show women, children and friends in dignified poses, decked in a type of suprematist costume with their individual physiognomy portrayed in loving detai/. Even though they were remate from the dreamed cosmos of yesteryear, Malevich faithfully signed these paintings with the symbol of his conviction: a small black square. Wim Beeren
CRONOLOGIA1 1878 Em 14 (26) de fevereiro segundo registro de alguns estudiosos, 11 (23) -, nasce Kazimir Severínovitch Malévitch, filho de Severin Antónovitch (1845-1902) e Liudviga Alexándrovna (18581942), na casa de sua tia, Maria Antónovna, em Kíev, capital da Ucrânia. Seus pais eram de ascendência polonesa, e as notas autobiográficas de Malévitch registram que seu pai trabalhou como administrador de várias refinarias de açúcar ucranianas nas proximidades de Kíev. 1889 Severin Antónovitch muda-se com a família para uma refinaria em Parkhomovka, perto de Belopólie (distrito de Kharkov), e cerca de quatro anos mais tarde, para outra refinaria em Voltchok, perto de Konotop, entre Kíev e Kursk. Em Parkhomovka, Kazimir completa o curso de dois anos na escola agrícola. Atraído pela vida no campo e pela natureza, aprende sozinho a pintar num estilo rústico bastante simples as paisagens locais. Vive algum tempo em Konotop, onde vem a conhecer Nikolai Roslavets (1880-1944), que mais tarde se tornaria um compositor futurista. De Konotop, Malévitch vai a Kíev procurar o conhecido pintor realista local Nikolai Pimonenko (1862-1912), que lhe
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oferece a oportunidade de freqüentar a Escola de Desenho de Kíev. Malévitch dedica-se inteiramente à pintura e produz sua primeira obra acabada. 1896 A família Malévitch muda-se para Kursk. Kazimir conhece sua primeira esposa, Kazimira Ivánovna Zgleits, oito anos mais velha que ele. Desse casamento nascem dois filhos: Galina e Anatólii, que morre ainda pequeno, de febre tifóide. Através de reproduções, Malévitch familiariza-se com a obra de Ivan Tchichkin (18311898) e de lliá Repin (1844-1930), renomados pintores realistas pertencentes ao grupo conhecido como Ambulantes. Ele considera uma missão representar a natureza com a maior fidelidade possível. Em Kursk, encontra amantes da arte e pintores amadores com quem monta um ateliê cooperativo e forma uma associação. Nesse grupo estão dois artistas de formação acadêmica, com quem aprende as características específicas das escolas de arte de Moscou e da Academia de Artes de SãD Petersburgo. Com um desses artistas, Liev Kvachévski, trabalha com freqüência ao ar livre. A obra de Malévitch tornase cada vez mais impressionista. Sentindo uma necessidade urgente de instrução acadêmica,
decide ir estudar em Moscou. 1904 No outono, Malévitch vai para Moscou. Para manter-se, arranja um emprego de desenhista técnico na estrada de ferro. 1905 O "Domingo Sangrento", 9 (22) de janeiro, marca o início de um ano de perturbação política e social que começa em São Petersburgo, com a dispersão armada de uma manifestação pacífica de operários por melhores condições de trabalho e de vida, e termina com a Batalha das Barricadas, no fim do ano, em Moscou. Malévitch volta a Kursk na primavera e continua a pintar ao ar livre; seu trabalho assume um caráter neo-impressionista. Retorna a Moscou no outono. Em dezembro junta-se a grevistas na Batalha das Barricadas. Entre 1905 e 1910 trabalha no estúdio do pintor moscovita Fiódor Rerberg (18651938). 1906 Malévitch cria alguns desenhos simbolistas para produtos comerciais. 1907 Instala-se definitivamente em Moscou com a mãe, esposa e filha. Em março expõe doze esboços na 14ª Exposição da Associação dos Artistas de Moscou, a mais antiga publicação conhecida de seu trabalho num catálogo. Entre os
outros participantes estão Vladímir Burliuk (1888-1917), Natália Gontcharova (18811962),Vassílii Kandinski (18661944), Mikhail Larionov (18811964), Alexei Morgunov (18841935) e Alexander Chevchenko (1882-1948). De abril a maio, a mostra dos grupos de artistas simbolistas de Moscou Rosa Azul, patrocinada pelo pintor e colecionador de arte Nikolai Riabuchinski (1876-1951), deixa em Malévitch uma impressão inesquecível. 1908 Em Moscou, no começo do ano, os irmãos David (1881-1967) e Vladímir Burliuk organizam Guirlanda, a primeira de uma série de exposições que seriam montadas em Moscou e São Petersburgo com Gontcharova, Larionov, Aristarkh Lentulov (1882-1943), Geórgui lakulov (1884-1928) e outros. A primeira mostra Tosão de Ouro, montada em Moscou entre abril e maio, inclui não só o trabalho de artistas russos, como Gontcharova e Larionov, mas também uma grande seção de arte francesa, com trabalhos de Bonnard, Braque, Cézanne, Derain, Van Dongen, Gauguin, Gleizes, Van Gogh, Le Fauconnier, Matisse, Metzinger, Redon, Signac e Vuillard. Malévitch participa da 15ª e da 16ª Exposição da Associação dos Artistas de Moscou, a última no final do ano, com
vários estudos para afrescos. 1909 De janeiro a fevereiro, quatro trabalhos cubistas de Braque, entre os quais seu Nu de 1908, são expostos na segunda mostra Tosão de Ouro, ao lado de obras de Derain, Van Dongen, Le Fauconnier e Matisse. A primeira mulher de Malévitch o abandona. Em colaboração com o artista V. Petin, Malévitch decora a igreja de Mstera. Conhece Sofia Mikhailovna Rafalovitch, filha de um psiquiatra, e casa-se novamente. No fim do ano participa pela última vez da mostra da Associação dos Artistas de Moscou, com quatro obras: Apanhando flores, Aldeia, Passeio e Cavalgada. Entre os participantes estão Lentulov e Morgunov. 1910 Familiariza-se com Gontcharova e Larionov. Preocupados em conferir a seu trabalho pósimpressionista, fauvista, um caráter russo mais definido, eles cada vez mais procuram inspiração na arte popular primitiva russa e na pintura de ícones; o trabalho resultante vem a ser conhecido como neoprimitivo. Malévitch interessa-se em especial pela obra e pelas idéias de Gontcharova. Em dezembro, Malévitch é convidado por Larionov e Gontcharova a participar da
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Boulevard, 1903 óleo s/tela/oil on canvas 56 x 66 em Coleção Museu Russo
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Suprematismo, 1918 óleo s/tela/ oil on canvas 97 x 70 em Coleção Stedelijk Museum, Amsterdam
Suprematismo, 1921-27 óleo s/tela/ oil on canvas 84 x 69,5 em Coleção Stedelijk Museum, Amsterdam
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Cabeça de camponesa, 1912 óleo s/tela/ oil on canvas 80 x 95 em Coleção Stedelijk Museum, Amsterdam
primeira mostra do Valete de Ouros, uma colaboração da nova geração de artistas inovadores: os neoprimitivistas de orientação russa como os irmãos Burliuk, Gontcharova. larionov e Malévitch; os cézannistas de orientação parisiense como Alexandra Exter (1882-1949), Robert Falk (1886-1958), Piótr Konchalóvski (1876-1956), lentulov e lliá Machkov (1881-1944); e os expressionistas estabelecidos em Munique, como Alexei Javlenski (1864-1941), Kandinski e Gabriele Münter (1877-1962). Entre os participantes de outros países contavam-se Gleizes e le Fauconnier, de Paris. Malévitch expôs três obras: Banhista, Frutas, Donzela com frutas. Em dezembro, o colecionador de arte Serguei Tchúkin (1851-1936) compra as monumentais pinturas La danse e La musique, de Matisse. 1911 No primeiro Salão de Moscou, de que participou também Ivan Kliun (1873-1943), Malévitch expõe três séries de obras: a Série Amarela, com representações de santos e anjos, e a Série Branca e a Série Vermelha, com representações de banhistas e casas de banho. De abril a maio, Malévitch participa da segunda exposição do grupo de São Petersburgo União da Juventude, com seus colegas de Moscou David e Vladímir Burliuk, Gontcharova, larionov, Morgunov e Vladímir Tátlin (1885-1953), este último apresentado por larionov; Malévitch expõe quatro obras. 1912 larionov e Gontcharova desligam-se da associação Valete de Ouros, por sentirem que ali se dá atenção excessiva a novidades da Europa
Ocidental, em especial às francesas, em detrimento da arte russa característica. Simultaneamente à segunda mostra Valete de Ouros (março), eles organizam sua própria exposição, Rabo de Burro, com um grupo de simpatizantes que inclui Malévitch, Morgunov, Chevtchenko, Tátlin e o recémchegado Marc Chagall (18871985). A mostra é ao mesmo tempo o clímax e o último evento importante na história do neoprimitivismo. Malévitch expõe um grande número de obras que representam a vida no campo em um estilo neoprimitivista. Na segunda mostra Valete de Ouros, Fernand léger (18811955) expõe seu Essai pour trais portraits, pintado entre 1910 e 1911. O pintor e compositor de São Petersburgo Mikhail Matiúchin (1861-1934) visita Moscou com Olga Rozanova (1886-1918) e outros membros da União da Juventude para promover uma colaboração entre as vanguardas de Moscou e de São Petersburgo. O encontro. entre Matiúchin e Malévitch marca o início de uma amizade para toda a vida. Em abril, oito membros do grupo Rabo de Burro participam da terceira mostra da União da Juventude. Malévitch expõe quatro obras apresentadas também na mostra Rabo de Burro. No fim do ano, inclui cinco obras na primeira mostra Arte Contemporânea em Moscou: Homem com foice, Camponesa com baldes e criança, Ceifadeira, Cabeça de camponês e Na colheita. Na mesma época, participa da quinta mostra da União da Juventude de São Petersburgo, expondo entre outras obras Na colheita, Homem com foice, No campo e Retrato de
Kliun. Entre outros participantes de Moscou estão David e Vladímir Burliuk, Gontcharova, lorionov, Chevtchenko, Tátlin e Ivan Puni (1894-1956), um novo membro. Nas obras expostas em ambas as mostras, suas primitivas formas naturais deram lugar a desnaturalizadas formas cônicas de aparência "metálica". No catálogo da quarta mostra da União da Juventude, mais tarde no mesmo ano, ele as descreve como zaumnyi realizm (realismo transracional). Em dezembro, David Burliuk e os escritores Alexei Krutchenikh (1886-1968) e Vladímir Maiakóvski (1893-1930) lançam seu próprio manifesto, "Um tapa no rosto do gosto do público", reivindicando o direito do poeta de criar novos termos fazendo uso de palavras arbitrárias ou derivadas. 1913 Em 3 (16) de janeiro, Malévitch é inscrito como membro da União da Juventude, juntamente com David e Vladímir Burliuk, Morgunov e Tátlin. Em fevereiro, Malévitch diz a Matiúchin que a única direção que tem sentido para a pintura é o cubofuturismo. Em 23 de março (5 de abril), um dia antes da abertura da mostra Alvo, em Moscou, Malévitch fala sobre arte contemporânea na primeira de duas mesas-redondas organizadas pela União da Juventude em São Petersburgo. Participa da mostra Alvo, organizada por larionov de março a abril. Enquanto larionov e Gontcharova expõem sua interpretação do futurismo italiano, que chamam raionismo, a interpretação de Malévitch sugere o movimento pela quebra das formas cônicas em formas quase
irreconhecíveis: Manhã no campo após tempestade de neve, Camponesa com baldes, Desconstrução dinâmica e Afiador de facas/Princípio de oscilação - o trabalho intitulado Desconstrução dinâmica (Dinamikeskóie razlojenie) provavelmente é Olenhador. Em julho, Matiúchin convida Malévitch a colaborar na criação de uma ópera - com Vielímir Khlebnikov (1885-1922) e Krutchenikh - para a União da Juventude de São Petersburgo. De 18 a 20 de julho (31 de julho a 12 de agosto), Matiúchin, Malévitch e Krutchenikh reúnem-se em Uusikirkko, Finlândia (agora uma fazenda coletiva soviética, Vitória, a dez quilômetros da estação ferroviária Kanneliarvi, ao norte de Leningrado), para o que eles chamam de Primeiro Congresso de todas as Rússias de Poetas do Futuro (poetofuturistas). O projeto é concluído com um manifesto que anuncia a ópera Vitória sobre o sol. O manifesto prossegue defendendo a destruição da "Iimpa, clara, honesta e ressonante língua russa", do "antiquado movimento de pensamento baseado em leis de causalidade" e da "elegância, frivolidade e beleza de artistas e escritores baratos que constantemente põem em circulação cada ve~ mais obras novas em livros, tela e papel". Malévitch produz ilustrações litográficas para vários livros, alguns em cooperação com Rozanova, escritos ou editados por Krutchenikh: Vzorval (Explosão), Vozrapchtchem (Rosnemos), Porasiata (leitões), Traie (Os três) e Slovokak takovoie (A palavra como tal). Em 3 e 5 (16 e 18) de dezembro, Vitória sobre o sol é apresentada no Teatro luna Park de São Petersburgo, com prólogo de
Khlebnikov, libreto de Krutchenikh, música de Matiúchin e guarda-roupa e cenários desenhados por Malévitch. Na sétima e última mostra da União da Juventude, Malévitch expõe dois grupos de obras: um do período entre 1912 e 1913, com suas composições figurativas construídas com formas cônicas "metálicas", descritas como realismo transracional. Embora algumas obras já tivessem sido expostas anteriormente, como Camponesa com baldes e criança, por exemplo, Retrato aperfeiçoado de I. V. Kliun e Cabeça de menina camponesa são novos. O segundo grupo, com obras de 1913 descritas como cubofuturistas, inclui Samovar. Serguei Tchúkin, que já possuía uma coleção das primeiras obras cubistas de Picasso, compra dois trabalhos de 1912 e quatro de 1913; no ano seguinte acrescentará à coleção três trabalhos de 1914. As obras de papier collé e do cubismo sintético tornaram-se especialmente importantes para Malévitch e outros artistas. 1914 No fim de janeiro, Malévitch envia trabalhos para a quarta mostra Valete de Ouros, que tem como novos participantes Liúbov Popova (1889-1924) e Nadejda Udaltsova (1886-1961). Junto com as três obras nas fotografias da instalação, Malévitch expõe Retrato do compositor M. V. Matiúchin. Na última semana de janeiro chega à Rússia Filippo Tommaso Marinetti (1876-1944), o pai do futurismo, para uma visita de duas semanas. larionov sugere receberem Marinetti com ovos podres, mas o igualmente futurista Malévitch condena essa provocação. Em 8 (21) de
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oguarda, 1913-14 óleo s/te la/oil on canvas 57 x 66,5 em Coleção Stedelijk Museum, Amsterdam
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fevereiro, Malévitch e Morgunov fazem uma manifestação futurista em Kuznetskii, usando ambos na lapela colheres vermelhas de madeira. Em 21 de fevereiro (6 de março), mais uma vez ostentando uma colher vermelha de madeira, Malévitch protesta numa noite de debates sobre arte moderna organizada pelo grupo Valete de Ouros. De março a abril, expõe três obras no Salon des Indépendants, em Paris. Puni e sua esposa, Xênia Boguslávskaia (1892-1972), que viviam em Paris, tomam providências para a inclusão do trabalho de Malévitch, assim como o de Vladímir Berliuk e Matiúchin. Em 21 de fevereiro (6 de março), Malévitch e Tátlin desligam-se da União da Juventude.
Tátlin faz uma apresentação fechada de seus primeiros Relevos picturais, de 10 a 14 (23 a 27) de maio. 19 de julho (1º de agosto): a Alemanha declara guerra à Rússia; a Áustria faz o mesmo em 24 de julho (6 de agosto). No dia em que a guerra é declarada, o nome de pronúncia germanizada da capital São Petersburgo é mudado para Petrogrado. Nos primeiros meses da guerra, Malévitch produz seis litografias de propaganda antigermânica no estilo das gravuras populares 'russas (lubok) - sua contribuição à série de cartazes de propaganda e cartões-postais ilustrados encomendada pelo governo para conquistar apoio para a Querra contra a Alemanha e a Austria. Entre outros artistas que produzem cartazes estão
David Burliuk, Larionov, Lentulove Maiakóvski, autor dos títulos e legendas. 1915 Entre março e abril, Malévitch participa da Mostra Futurista: Bonde V, organizada em Petrogrado por Puni e Boguslávskaia, expondo Aviador, Senhora na coluna de anúncios, Senhora num bonde e Um inglês em Moscou. Os outros participantes são Rozanova, de Leningrado, Kliun, Morgunov, Popova, Tátlin e Udaltsova, de Moscou, e Exter, de Kíev. Na abertura, todos os participantes exibem colheres vermelhas de madeira. Em maio, Malévitch pede a Matiúchin que o ajude a escrever um ensaio definitivo sobre os novos progressos que vem realizando em seu trabalho, o que alguns meses mais tarde chamará de suprematismo. Após sua visita inesperada ao
ateliê de Malévitch em Moscou, em setembro, Puni divulga informações sobre seu trabalho mais recente, que Malévitch pretendia que fosse uma surpresa para o público na segunda mostra futurista de Puni, em dezembro. Nessa segunda mostra futurista, 0.10 A Última Mostra Futurista, organizada em dezembro por Puni em Petrogrado, Malévitch expõe pela primeira vez um total de 39 obras completamente abstratas, apresentadas como o "novo realismo pictórico". Embora lhe solicitem especificamente que não chame sua contribuição de suprematismo, para evitar confrontar o público com mais um termo novo, a palavra "suprematismo" aparece na parede da instalação. Para a mostra, Malévitch e seus primeiros discípulos Boguslávskaia, Kliun, Mikhail Menkov (datas desconhecidas) e Puni - publicam uma breve declaração como parte do manifesto e expõem uma pintura coletiva. Malévitch publica uma brochura intitulada Do cubismo ao suprematismo em arte, ao novo realismo da pintura, à criação absoluta. Durante o ano seguinte a declaração é usada como introdução a outra brochura, Do cubismo e futurismo ao suprematismo, Onovo realismo pictórico. Os outros participantes são Natan Altman (1889-1970); Vassílii Kamenski (1884-1961), Anna Kirillova (datas desconhecidas), Vera Pestel (1886-1952), Popova, Rozanova, Tátlin e Udaltsova. 1916 Em 12 (25) de janeiro, por ocasião da 0.10, Malévitch e Puni, como suprematistas, dão uma "palestra pública popular-
científica" sobre cubismo, futurismo e suprematismo e uma demonstração de "como se faz um desenho da natureza de acordo com os métodos do cubismo e do futurismo". Em março, Malévitch participa da mostra futurista A loja. Organizada por Tátlin e ambientada em uma loja de Moscou, é constituída inteiramente de cubofuturistas. Entre os treze participantes estão Exter, Kliun, Morgunov, Pestel, Popova e Udaltsova. O novo membro é Alexandr Rodtchenko (1891-1956), apresentado por Tátlin. Quatro obras de Malévitch aparecem sob o título" Alogismo da Forma", 1913: Vaca e violino,' Um inglês em Moscou,' Aviador e Jogadores de xadrez. Malévitch é convocado a apresentar-se para serviço militar em julho e enviado a Smolensk. No decorrer desse ano, Alexandr Archipenko (18871964), Natália Davídova (datas desconhecidas), Kliun, Malévitch, Matiúchin, Menkov, Pestel, Popova, Rozanova, Udaltsova e outros formam o grupo Supremus e planejam uma publicação com esse nome. Em novembro, Malévitch e seu grupo participam da quinta mostra Valete de Ouros em Moscou. A referência a ele no catálogo diz simplesmente: "140-199. Suprematismo na pintura". Em dezembro, Malévitch recebe ordens para ir ao front. 1917 Rompe a Revolução de Fevereiro: 23 a 27 de fevereiro (7 a 12 de março). 2 de março: o czar Nicolau abdica~ encerrando a monarquia russa. E formado um governo
provisório, seguido em julho pelo governo de coalizão chefiado por Alexandr Kerenski. 26 de março (8 de abril): Malévitch fala na Primeira Noite Republicana das Artes no Teatro do Eremitério, Moscou com os poetas Kamenski, Maiakóvski, Vassílii Gnedov (1890-1978), o compositor Roslavets e os artistas David Burliuk, lentulov, Tátlin e lakulov. Malévitch colabora no projeto de decoração para o desfile do Dia do Trabalho, em Moscou. Malévitch integra a Federação da Esquerda na recém-fundada União Comercial de Pintores de Moscou. Eleito diretor adjunto do departamento de arte do Soviete dos Soldados de Moscou em agosto, propõe imediatamente a organização de uma Academia do Povo em Moscou e Petrogrado. Seu programa para escolas de arte, divulgado em outubro de 1917, é a primeira proposta para o tipo de escolas estabelecido mais tarde como Ateliês de Arte Estatais Livres (SVOMAS). 25de outubro (7 de novembro): a Revolução de Outubro estabelece o regime soviético. Nos primeiros dias da revolução, Malévitch é designado comissário do povo para a preservação de monumentos e antiguidades (em especial no Krêmlin) pelo Comitê Militar Revolucionário. Em novembro o Comissariado do Povo para Esclarecimentos (Narkompros) é criado, ficando sob a jurisdição de Anatólii lunacharski (1875-1933). 2 (15) de dezembro: lênin assina o armistício com a Alemanha e a Áustria em Brest Litóvsk, encerrando a participação russa
Senhora na parada do bonde, 1913-14 óleo s/tela/oi! on canvas 88 x 88 em Coleção Stedelij k Museum, Amsterdam
na Primeira Guerra Mundial. Segue-se um tratado de paz, em 2 de março de 1918. Malévitch mais uma vez contribui com trabalhos suprematistas para a sexta e última mostra Valete de Ouros. 1918 . 29 de janeiro (11 de fevereiro): estabelece-se um Departamento de Artes Visuais (lZO), Narkompros, chefiado por David Chterenberg (1881-1948). Malévitch é eleito membro da Divisão Moscou, chefiada por Tátlin. 19 de de fevereiro (14 de fevereiro): introdução do calendário ocidental, gregoriano, em substituição ao juliano. 12 de março: o governo central muda-se de Petrogrado para Moscou. Malévitch começa a anunciar seu programa de ensino de arte moderna para trabalhadores. Em
uma série de artigos curtos na revista Anarkhiia (Anarquia) em março e abril, assume posição contra a tentativa, por parte de artistas conservadores prérevolucionários, de manter seu poder no mundo da arte através da oposição a artistas de vanguarda que apóiam conscientemente a Revolução. Alguns dos artigos são republicados em 1919 no novo jornal Iskússtvo Kommuni (Arte da Comuna), por iniciativa do Narkompros e com o apoio de Maiakóvski. Descontentes com os métodos de trabalho de Chterenberg, o chefe do IZO, agora instalado em Moscou, Malévitch e Tátlin vão para Petrogrado. Em outubro são criados SVOMAS em Petrogrado e Moscou. Malévitch tem um ateliê em cada lugar. Em Moscou compartilha um ateliê
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Camponeses, 1928-32 óleo s/tela/oi/ on canvas 77 ,5 x 88 em Coleção Museu Russo
têxtil com Udaltsova. Em colaboração com Matiúchin, Malévitch projeta uma grande decoração mural e um portfólio para o Congresso de Comitês para a Pobreza Rural, realizado em novembro no Palácio de Inverno, em Petrogrado. Malévitch cria os cenários para a grande produção de Maiakóvski Mistéria Buf, dedicada à Revolução e apresentada em Petrogrado em novembro, no seu primeiro aniversário. O diretor é Vsiévolod Meyerhold (18761940). 1919 Durante esse ano e 1920, a Guerra Civil irrompe em diversas frentes, provocando extremas dificuldades econômicas para a nova república. É estabelecida uma economia de guerra para controlar os problemas. Em 9 de fevereiro de 1919 Nikolai Púnin (1888-1953) publica uma carta no Iskússtvo Kommuni, afirmando que o suprematismo está "florescendo por toda Moscou" e que "o dia do suprematismo chegou de fato". Mas sugere também que o movimento está perdendo sua "importância criativa". Malévitch integra a recémformada União dos Trabalhadores em Arte (Rabis). Em fevereiro, comparece ao encontro onde se decide estabelecer museus de cultura artística (MKhK), dedicados exclusivamente à arte contemporânea. No Iskússtvo Kommuni de fevereiro, questiona a validade dos museus tradicionais de arte mais antiga. Retoma a Moscou. Entre os artistas que trabalham em seu ateliê estão Ivan Kudriacev (1896-1972), Gustav Klutsis (1885-1944) e Serguei Sênkin (1894-1963).
Malévitch participa com dezesseis obras suprematistas da Décima Mostra Estatal: Arte Não-Objetiva e Suprematismo, realizada em Moscou em abril. Os outros participantes são Davídova, Kliun, Menkov, Popova, Rodtchenko, Rozanova e Alexandr Vêsnin (1883-1959). O registro de Malévitch inclui uma série recente de composições "branco sobre branco", a que Rodtchenko respondeu com composições "preto sobre preto". Em junho, Malévitch completa seu primeiro ensaio teórico longo: Sobre os novos sistemas de arte: estática e velocidade, impresso e editado por EI Lissitzki (1890-1941) em seu estúdio do SVOMAS de Vitebsk. Por sugestão de Lissitzki e a convite de Vera Ermolaieva (1893-1938), reitora da escola, no fim de outubro ou começo de dezembro Malévitch começa a lecionar no Instituto de Arte Popular de Vitebsk, reorganizado por Chaga 11 no princípio do ano. Nos recéminstituídos ateliês livres de arte, torna-se logo evidente a intenção de Malévitch de introduzir um novo estilo de educação artística; todas as formas de arte devem ser desenvolvidas alicerçadas no' suprematismo e integradas num sistema universal. Recebe total apoio de Ermolaieva, Nina Kogan (1887-1942), chefe dos ateliês preparatórios, e de Lissitzki, chefe do estúdio gráfico e de arquitetura. A 16ª Mostra Estatal de Moscou (dezembro de 1919 a janeiro de 1920) é dedicada inteiramente a uma extensa retrospectiva intitulada K. S. Malévitch, Exposição Individual: Sua Trajetória do Impressionismo ao Suprematismo (pesquisas muito recentes indicam que essa
mostra foi aberta provavelmente no início de 1920). 1920 14 de fevereiro: em duas palestras Malévitch expõe suas idéias sobre coletividade no processo criativo. Em abril, o novo método de ensino é posto em prática na organização acadêmica de Vitebsk. O princípio de coletividade é fundamental à execução desse plano, denominado Afirmação da Nova Arte (UNOVIS). Seus principais discípulos são lliá Tchachnik (1902-1929), Ivan Tchervinka (datas desconhecidas), Anne Kagan (1902-1974), Lazar Khidekel (1904-1986), Mikhail Kunin (datas desconhecidas), Evguêniia Magarii (1902-1987), Efim Raiak (1906-1987), Nikolai Suétin (1897-1954), Liev ludin (1903-1941) e Solomon ludovin (1892-1964) . 20 de abril: nasce a filha Una (1920-1989). No começo de junho, Chagall vai a Moscou para participar da reunião de diretores de belasartes e não volta mais. Ermolaieva sucede-lhe no cargo. O Departamento de Artes Visuais do Narkompros publica o panfleto de Malévitch De Cézanne ao suprematismo, um esboço crítico. Em Petrogrado, entre março e novembro, Tátlin, com a ajuda de seus alunos e colegas, constrói o modelo de seu Monumento à Terceira Internacional, apresentado em Petrogrado entre 8 de outubro e 1º de dezembro e depois em Moscou. Em dezembro, o UNOVIS publica o livro de Malévitch Suprematismo: 34 desenhos. 1921 Em Moscou, em Janeiro, Konstantin Medunétski (18991935) e os irmãos Vladímir
Camponês. 1928-32 óleo s/tela/oi/ on canvas 120 x 100 em Coleção Museu Russo
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Suprematismo. Figura de mulher, 1928-32 óleo s/tela/oil on canvas 126 x 106 em Coleção Museu Russo
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Retrato de homem (N. N. Punin), 1933 óleo s/tela/oil on canvas 70 x 57 em Coleção Museu Russo
Stenberg (1899-1982) e Geórgui Stenberg (1900-1933) organizam uma mostra de seu trabalho intitulada Os Construtivistas. Os três são membros da Sociedade de Jovens Artistas (Obmokhu), fundada em 1919. 21 de janeiro: Malévitch visita o Instituto de Cultura Artística (INKhUK) de Moscou, ~riado em maio de 1920, para assistir à . conferência Cubismo e Suprematismo, em que são discutidas duas de suas pinturas. Esse foi um dos numerosos debates teóricos realizados para esclarecer a distinção entre composição e construção. 28 de março: uma mostra de um único dia do UNOVIS é realizada em Vitebsk (não há catálogo). Com a introdução da 268
Nova Política Econômica, dando espaço a um retorno parcial do sistema de livre iniciativa, o governo tenta revitalizar a economia em estagnação. Setembro: em Moscou a mostra 5x5=25 anuncia o fim da pintura e o avanço em direção ao construtivismo. Participam Exter, Popova, Rodtchenko, Varvara Stepanova (1894-1958) e Vesnin - cinco artistas, cada um expondo cinco obras de arte. Um crescente desagrado na academia de Vitebsk pelo novo método de ensino e a postura do governo municipal forçam Malévitch a procurar outra sede para o UNOVIS. Em dezembro o grupo do INKhUK de Vitebsk, chefiado por Malévitch, visita Moscou, onde dá uma palestra no INKhUK local. Nessa época, as
diferenças entre o grupo construtivista formado à volta de Rodtchenko e o grupo suprematista de Malévitch são consideráveis. A sugestão de transformar o grupo de Vitebsk num ramo oficial do INKhUK é adiada, aparentemente "devido a questões financeiras", mas é evidente que as razões são mais complexas. 1922 A última publicação independente de Malévitch, o livro Deus não está destronado, é editada pelo UNOVIS em Vitebsk. Ele começa então a escrever um texto filosófico de maior fôlego - Suprematismo, o mundo como não-objetividade - que irá ocupá-lo até o final da década de 20. 12 de fevereiro: Malévitch escreve para Chris Beekman
(1887-1964), discípulo do grupo De Stijl, "caros colegas inovadores da Holanda", em resposta às suas inúteis tentativas de entrar em contato com inovadores russos. Um de seus comentários diz respeito à "crescente pilha de manuscritos que não podem ser publicados ou colocados em jornal algum". Deixa claras suas posições negativas a respeito do construtivismo. Em Moscou, em fevereiro, a 47ª mostra dos Ambulantes, cujos fundadores defenderam o realismo entre 1860 e 1890, tem notável sucesso oficial e de público. Alguns membros desse grupo, em forte oposição à vanguarda esquerdista, desligam-se e fundam a Associação dos Artistas da Rússia Revolucionária (AKhRR) para cerrar forças contra o papel dominante assumido pela vanguarda desde a Revolução. Declaram que a arte deveria fornecer uma imagem precisa, documental e realista do cotidiano contemporâneo da Rússia, assim como as diferenças etnográficas entre os estilos de vida dos trabalhadores por todo o país. O grupo sustenta o "realismo heróico", retratando eventos da Revolução e as contribuições revolucionárias do Exército Vermelho. Malévitch faz duas palestras no INKhUK de Petrogrado em junho. Ao lado de outros membros do UNOVIS, expõe obras suprematistas na mostra levantamento das Novas Tendências na Arte, que foi aberta em 15 de junho no Museu de Cultura Artística. Participa das mostras do UNOVIS no INKhUK, Petrogrado. No Erste Russische Kunstausstelling, em Berlim, de outubro a novembro, Malévitch
é representado por uma obra cubista e quatro suprematistas, entre estas últimas uma pintura "branco sobre branco". A colecionadora americana Katherine Dreier compra a obra cubista Afiador de faca para seu museu de arte moderna, a Société Anonyme. A mostra é levada para o Stedelijk Museum, em Amsterdam, de abril a maio de 1923. Dezembro: é fundada a União das Repúblicas Socialistas Soviéticas (URSS). 1923 28 de fevereiro: Malévitch apresenta no laboratório Psicofísico da Academia de Ciências Artísticas de Moscou uma palestra intitulada Sobre a Base Artística: a Respeito de Cor, luz e Pontilhismo no Espaço e no Tempo. Malévitch colabora numa participação coletiva do UNOVIS na mostra Obras de Artistas de Petrogrado de Todas as Tendências, 1918-1923, realizada em maio na Academia de Artes de Petrogrado. Nessa ocasião ele anuncia seu manifesto zero,"O espelho suprematista", no jornal Jizn Iskússtva (Vida da Arte). Em colaboração com a Fábrica de Porcelana lomossonov de Petrogrado, ele e outros membros do UNOVIS desenvolvem projetos para novas formas e decorações baseadas nos princípios suprematistas. Malévitch estuda as possibilidades de uma arquitetura suprematista em anteprojetos dos chamados planites. Em junho, Pável Filónov (18831941) apresenta uma proposta para converter o Museu de Cultura Artística (MKhK), fundado em abril de 1921, num instituto de estudos para pesquisa de arte moderna. Em
Retrato da esposa do artista, 1933
óleo s/tela/oil on canvas 67,5 x 56 em Coleção Museu Russo
sua sessão de setembro a comissão do museu decide incorporar quatro departamentos de estudos acadêmicos ao museu e elege Malévitch seu diretor temporário. Morre a segunda esposa de Malévitch. Ele continua a usar sua datcha em Nemtchinovka. perto de Moscou. até o fim da vida. Em outubro. inicia a reorganização do MKhK. 1924 21 de janeiro: Lênin morre. Malévitch escreve um longo ensaio em sua homenagem. 26 de janeiro: Petrogrado passa a se chamar Leningrado, 2 de fevereiro: Malévitch publica um artigo no Jízn Iskússtva contrapondo-se 'à direção artística da AKhRR. O MKhK de Leningrado é fechado e substituído pelo INKhUK. que. com o nome de GINKhUK. ganha status de instituto estatal oficial em fevereiro de 1925. Além do museu. o instituto é composto de cinco departamentos de estudos acadêmicos: cultura pictórica. o departamento teórico-formal. sob a direção de Malévitch; cultura orgânica. dirigido por Matiúchin; cultura material. dirigido por Tátlin; o departamento experimental de Pável Mansurov (1896-1983. em atividade no SVOMAS de Petrogrado desde 1919); e metodologia geral. a princípio sob a direção de Pável Filónov e mais tarde do crítico de arte Púnin. Malévitch escolhe Ermolaieva. Khidekel e ludin como seus assistentes. Os novos alunos de seu departamento são. entre outros. Anna Leporskaia (1900-1982) e Konstantin Rojdestvenski (nascido em 1906). Participa da seção russa da 14ª
Bienal de Veneza (de abril a outubro); expõe seis planítes juntamente com Ouadrado negro, Cruz negra, Círculo negro. 1925 Encontra o cineasta Serguei Eisenstein (1890-1948) e polemiza com ele em dois artigos no jornal de cinema ARK (1925-1926; órgão da Associação de Cinematografia Revolucionária). 10 de março: faz uma palestra no Laboratório Psicofísico. em Moscou. sobre "A teoria do elemento adicional na pintura". De maio a junho. na primeira mostra representativa do INKhUK. Malévitch apresenta uma série de 32 diagramas que desenvolvem sua teoria do "elemento adicional". No verão. Tátlin deixa Leningrado para lecionar no Instituto de Arte de Kíev. assumindo a direção do departamento de artes dramáticas. cinematográficas e fotográficas. Seu cargo de chefe do departamento de cultura material é dado a Suétin. Com Tchachnik e Suétin. Malévitch põe em prática suas idéias de uma arquitetura 'suprematista numa série de modelos. descritos como arkhítektons. usando blocos retangulares de gesso e madeira. O museu do instituto é fechado e sua coleção. transferida para o Museu Estatal Russo e vários outros museus. Em um encontro de que participaram Malévitch. Matiúchin. Púnin e Suétin. o departamento teórico-formal muda de nome para departamento de cultura pictórica. Casa-se com Nátalia Andrêievna Mantchenko (nascida em 1902). Em dezembro. o Diretório
Principal de Instituições Científicas (GLAVNAUKA) decide abrigar uma mostra internacional; se isso não desse certo. seriam tomadas providências para que os chefes de departamento viajassem para outros países. Malévitch escreve a proposta em 19 de dezembro. assinando-a junto com Boris Ender (1893-1960. assistente de Matiúchin). Púnin e Suétin. 1926 Em fevereiro. Malévitch expõe quatro projetos de planítes na Mostra Internacional de Arquitetura Moderna. em Varsóvia. Em junho. apresenta um grande número de seus arkhítektons na representativa mostra desse ano do GINKhUK de Leningrado. A exposição é atacada por
opositores do GINKhUK. entre os quais se incluem agora membros da AKhRR. num esforço para demonstrar o status politicamente questionável do GINKhUK e provocar seu fechamento. O argumento para isso é dado por G. Serii numa crítica. "Um monastério à custa do Estado". publicada em 10 de junho no Leníngrádskaía Pravda (Pravda de Leningrado). 16 de junho: Malévitch apresenta sua "Teoria da pintura do elemento adicional" numa sessão interdepartamental do GINKhUK. A publicação. datada de 3-7 de julho de 1926 não passa da etapa das provas. 15 de novembro: Malévitch é demitido do cargo de diretor do GINKhUK. No fim do ano o GINKhUK é
desmantelado. e sua equipe e departamentos são absorvidos pelo Instituto Estatal de História da Arte (GIII). 1927 A transição evidentemente não foi suave; o trabalho de Leporskaia. colaboradora de Malévitch. é interrompido ("até serem resolvidas as questões concernentes aos docentes visitantes"). e ela só é admitida no instituto em 1º de novembro de 1928. Para sua viagem para a Alemanha. completa (auxiliado por seus alunos Leporskaia. Rojdestvenski e ludin) uma série de 22 painéis explicativos para serem usados como complementos visuais em suas palestras sobre a importância do "elemento adicional" e sua 269
Suprematismo, 1915 óleo s/tela/oil on canvas 87,5 x 72 em Coleção Museu Russo
270
utilidade no ensino da arte. Em 8 de março parte para Varsóvia, onde permanece até o dia 29; mostra a artistas poloneses alguns dos trabalhos que levou consigo, faz uma palestra e comparece a um banquete em sua homenagem no Hotel Polônia. Permanece em Berlim de 29 de março a 5 de junho. Tadeusz Peiper (editor do jornal polonês Zwrotnica) viaja para lá em sua companhia. Fica hospedado com Gustav von Riesen, um engenheiro que trabalhara em Moscou antes de 1914. O filho de Von Riesen, Alexander, serve· de intérprete para Malévitch. Em 7 de abril visita com Peiper a Bauhaus, em Dessau, onde encontra Walter Gropius e Lázló Moholy-Nagy, que intermedia a publicação do texto de Malévitch "Suprematismo e o elemento adicional em arte" na série Bauhausbücher. Por intermédio de uma associação de arquitetos progressistas de Berlim, Malévitch consegue um espaço especial para mostrar seu trabalho na Grosse Berliner Kunstausstallung daquele ano (7 de maio a 30 de setembro). Discute com o cineasta de vanguarda Hans Richter a idéia de um filme sobre o suprematismo e escreve um breve texto ilustrado. À sua partida, em 5 de junho, Malévitch confia a seu anfitrião, Von Riesen, um pacote contendo escritos teóricos; entrega as obras que trouxe consigo e a série de painéis explicativos, juntamente com uma série semelhante feita por Matiúchin, a Hugo Hãring, secretário da associação de arquitetura. Durante a ausência de Malévitch, a situação política das artes deteriora-se ainda mais. Na primavera de 1927, o Comissariado de Educação e a Administração Científica começaram a sofrer crescente pressão da seção de mobilização e propaganda do Comitê Central do Partido Comunista para abandonar o apoio ao pluralismo artístico. Após seu retorno da Alemanha, Malévitch dá prosseguimento a sua pesquisa no Instituto Estatal de História da Arte de Leningrado. Com Tchachnik e
Suétin começa a trabalhar na idéia da construção de cidadessatélite ao redor de Moscou, com base nos conceitos suprematistas de organização espacial. Em 1º de novembro suas obras são incluídas na instalação regular Novas Tendências em Arte, no Museu Estatal Russo de Leningrado, organizada por Púnin, que se tornara curador do museu após o fechamento do INKhUK.
1928 No período de abril de 1928 a outubro de 1930 Malévitch publica uma série de doze artigos (em ucraniano) no mensário de Kharkov Nova Generatsiia (Nova Geração) sobre os novos avanços na arte desde Cézanne. Seu manuscrito "0 cinema, o gramofone, o rádio e a cultura artística", enviado para publicação, é devolvido com a crítica de que "não coincide com a ideologia estética do jornal", o que demonstra a crescente polarização ideológica.
1929 Abril: O Primeiro Plano Qüinqüenal é lançado no 16º Congresso do Partido (com data de outubro de 1928). Começa assim o impulso para a rápida industrialização, coletivização e erradicação do analfabetismo. Com o intuito de estabelecer a uniformidade criativa que tornaria a arte soviética eficiente no apoio a essas metas, é instituída em Moscou a Cooperativa dos Artistas da União Soviética, como uma agência central para a comissão de supervisão, suprimentos, viagens e assim por diante. A partir daí, os artistas devem representar em suas obras os valores da sociedade socialista. O Novembergruppe convida Malévitch a expor em Berlim, mas a oferta não se concretiza. Seu trabalho de pesquisa passa a desagradar os historiadores de arte do Instituto Estatal de História da Arte. Em 1930, Malévitch e seu departamento são expulsos do instituto. Concedem-lhe a oportunidade de trabalhar por duas semanas e meia por mês no Instituto
Artístico de Kíev. Numa retrospectiva de sua obra na Galeria Tretiákov de Moscou, em novembro, expõe novos trabalhos, que resgatam temas já pintados entre 1912 e 1913, mas num estilo totalmente novo. As obras são datadas de 1909-
1910. Após o encerramento, a mostra é trélnsferida para a Galeria de Arte de Kíev, mas o diretor Fiódor Kumpan (1896 - 1970), por organizar uma exposição da obra do "burguês" Malévitch, recebe severa punição. Malévitch só consegue reaver suas pinturas após dois anos e meio.
1930 Malévitch dá um curso de teoria da pintura na Casa da Arte, em Leningrado. Entre o fim de setembro e início de dezembro ele é detido e interrogado "sobre a ideologia das tendências existentes". "Eu, como teórico e ideólogo, tinha de oferecer interpretações de todas as correntes. Perguntavam-me se havia tendência para a esquerda ou para a direita nesses movimentos, se havia divergências" - carta ao artista Liev Kramarenko (1888-1942), 8 de dezembro de 1930. Como medida de precaução, amigos queimam vários de seus manuscritos. De novembro de 1930 a março de 1931, é registrado no Sindicato dos Trabalhadores em Arte como desempregado. Em julho, dois de seus trabalhos são incluídos na mostra berlinense Sowjetmalerei, organizada pelos Freunde des Neuen Russland. Embora os trabalhos sejam datados de 1913 e 1915, a crítica perceptiva de Adolph Donath (Berliner Tegeblatt, 9 de julho de 1930) deixa claro que são pinturas figurativas recentes, de vultos rígidos e sem rosto semelhantes a marionetes, e monótonas paisagens. "É possível reconhecer nestes trabalhos a 'máquina' para dentro da qual o homem é empurrado - seja na pintura ou fora dela". A mostra Russische Kunst von Heute, em outubro, em Viena, inclui uma pintura de Malévitch, Osoldado da guarda.
Alexander Dorner do Provinzialmuseum, em Hannover, Alemanha, um dos poucos diretores de museu da Europa interessados em arte abstrata, obtém a custódia da coleção das obras de Malévitch deixada em Berlim e expõe várias delas em seu museu.
1931 Malévitch cria um projeto de pintura dos elementos arquitetônicos do interior do Teatro Vermelho, em Leningrado, que é realizado. Trabalha num livro intitulado Isologia, aparentemente baseado em artigo seu publicado no Nova Generatsiia. Em carta a um amigo de Kíev, Liev Kramarenko, faz uma distinção entre "mundo da arte" (como o "mundo da nãoobjetividade") e "arte soviética" (como uma "arte simbólica e não uma arte naturalista ou realista").
1932 Abril: todos os grupos artísticos oficiais são dissolvidos por decreto governamental, para serem substituídos por sindicatos de escritores, músicos, artistas e outros grupos criativos. Malévitch consegue espaço no porão do Museu Estatal Russo para prosseguir com suas pesquisas. Seu trabalho é incluído na mostra Arte da Época Imperialista. A pintura recente Esportistas é apresentada como exemplo de arte "burguesa" pré-revolucionária. É amplamente representado na mostra Quinze anos de Arte Soviética, apresentada de novembro a maio de 1933 no Museu Estatal Russo e em seguida em Moscou, com o nome de Artistas da URSS nos Últimos Quinze Anos. A coletivização forçada de fazendas resulta numa desastrosa escassez de alimentos durante o inverno de
1932-1933. 1933 Malévitch pede permissão para conservar sua oficina no Museu Estatal Russo. Participa da Mostra de Obras de Artistas Itinerantes (sem catálogo), no Clube dos Professores de Leningrado.
1º de dezembro: Malévitch redige um testamento no qual declara que deve ser cremado e sepultado em Borvikha (atualmente Nemtchinovka) e que tem Kliun e Suétin como executores. No fim do ano Malévitch entrega ao jovem escritor Nikolai Khardjiev o texto datilografado de "Capítulos da autobiografia de um artista".
1934 Presidido por Máximo Górki
(1868-1936), o Congresso de Escritores Soviéticos reúne-se em Moscou e se encerra defendendo o realismo socialista como o estilo exclusivo para escritores e artistas soviéticos. "A verdade e a concretude histórica da descrição artística da realidade deve se combinar com a tarefa de transformação ideológica e educação dos trabalhadores dentro do espírito do socialismo". Participa da mostra A Mulher na Construção Socialista, em Leningrado. Duas obras são listadas no catálogo: Cabeça de menina e Retrato feminino.
1935 Abril: com quatro retratos de
1933 e 1934 - inclusive Autoretrato (Art in America, setembro de 1989) e Retrato masculinoMalévitch participa da Primeira Mostra de Artistas de Leningrado. É a última apresentação de sua obra na União Soviética até 1962. Em 15 de maio, Malévitch morre, tendo ao lado a mãe, a esposa e a filha, após vários meses de enfermidade. Suétin faz uma máscara mortuária e tira o molde de suas mãos. Em reconhecimento a sua contribuição para a arte, a municipalidade de Leningrado decide pagar as despesas do funeral. Depois de ficar exposto em seu apartamento no antigo edifício do GINKhUK, seu corpo foi colocado em um ataúde "suprematista", executado por Suétin de acordo com esboços feitos por ele, mas sem a cruz na tampa que aparece num dos desenhos. O ataúde é levado à Casa do Artista para ser velado, sendo depois acompanhado por um longo cortejo de amigos até 271
a Estação de Moscou, de onde é levado por trem até Moscou. Após a cremação, a urna com as cinzas é enterrada em campo aberto próximo à datcha em Nemtchinovka. O lugar é marcado com um cubo branco e um quadrado negro, projetados e construídos por Suétin. 2 de junho: Alfred H. Barr, Jr., diretor do Museu de Arte Moderna de Nova Vork , seleciona várias obras de Malévitch em Hannover, onde também estava a coleção de Berlim, para a primeira grande mostra retrospectiva Cubismo e Arte Abstrata, realizada em Nova Vork em 1936. 1936 Março: Malévitch é representado com sete pinturas e seis desenhos na mostra Cubismo e Arte Abstrata, no Museu de Arte Moderna de Nova Vork. Grande parte do espólio de Malévitch é retida pelo Museu Estatal Russo, embora ainda seja propriedade de sua família. Durante décadas as obras não são expostas. Em 1977, no entanto, são oficialmente incorporadas à coleção permanente do museu, por ordem do Ministério da Cultura. Com exceção da coleção que está no Museu de Arte Moderna de Nova Vork, nenhuma obra de Malévitch é exposta, na Rússia ou no Ocidente, até a Mostra de Pintura Russa, em Paim Beach, Flórida, em 1945. No final da década de 50, a numerosa coleção, agora pertencente ao Stedelijk Museum, é transferida da Alemanha para Amsterdam. Joop M. Joosten IAs datas anteriores a 1900 no contexto russo estão no calendário juliano, portanto doze dias adiantadas em relação ao calendário ocidental, gregoriano; as datas entre 1900 e 14 de fevereiro de 1918 estão treze dias à frente. As datas do calendário ocidental aparecem entre parênteses. Após a deflagração da Primeira Guerra Mundial, em agosto de 1914, São Petersburgo passou a se chamar Petrogrado. Este nome se manteve até a morte de Lênin, em 1924, quando novamente foi trocado para Leningrado. Os títulos de associações, mostras, publicações e obras de arte estão transliterados. Este texto foi escrito no final da década de 80.
BERLlM,1927 Em 1927 Malévitch viaja de
Leningrado para a Polônia e a Alemanha com uma grande mostra retrospectiva de seu trabalho. Em Varsóvia a exposição é realizada no Hotel Polônia e em Berlim é apresentada como uma mostra individual em sala especial na Grosse Berliner Kunstausstellung anual. Há poucos registros da mostra, e não se sabe exatamente nem como Malévitch veio a ser convidado nem por quem. Obviamente, o arquiteto progressista Hugo Hãring desempenhou um papel de destaque nessa iniciativa na Alemanha, como fez Henry Stazewski em Varsóvia. O catálogo da mostra de Berlim não continha listagem de obras, mas quando, na década de 60, foram descobertas quatro fotografias da instalação foi possível ter-se uma idéia da apresentação de Malévitch. Quinze das 55 obras reproduzidas no catálogo parecem estar irrecuperavelmente perdidas; das outras 40, 24 estão agora no Stedelijk Museum, em Amsterdam, três estão em coleções particulares e de duas, anteriormente em coleções particulares, não se sabe o paradeiro. As quatro fotografias da instalação, no entanto, não cobrem a totalidade da obra que Malévitch levou a Berlim. Havia também muitos desenhos, um número desconhecido de modelos arquitetônicos e 22 painéis preparados por membros do Departamento Teórico-Formal (chefiado por Malévitch) para explicar o trabalho teórico do Instituto de Cultura Artística de Leningrado. Desde 1935, cinco dos painéis teóricos estão na coleção do Museu de Arte Moderna de Nova Vork. Os dezessete restantes estão no Stedelijk Museum, tendo sido adquiridos por Hugo Hãring juntamente com as pinturas e os desenhos. Todos os 22 trabalhos foram publicados em detalhes por Troels Andersen (1970, 115-136). Em junho de 1927, quatro meses antes do encerramento da mostra de Berlim, Malévitch retorna a Leningrado, deixando
seus trabalhos aos cuidados de Hugo Hãring, com instruções explícitas de que não deveriam ser enviadas de volta a ele. Aparentemente, Malévitch esperava retornar no ano seguinte e expor seu trabalho em outras cidades ocidentais. Parecia ter cogitado até mesmo a possibilidade de estabelecerse no.Ocidente. Nenhum desses planos se materializou, no entanto, e antes de sua morte, em 1935, tendo perdido todo o contato com os colegas alemães, Malévitch presumiu que todas as obras da mostra haviam sido destruídas. O destino dessas obras está agora até certo ponto documentado, e embora quinze delas pareçam definitivamente perdidas, o restante pôde ser rastreado. Quase todas foram a princípio encaixotadas e armazenadas pelo agente de expedição Gustav Knauer, em Berlim. Em algum momento os caixotes foram transferidos de Berlim para a custódia de Alexander Dorner, diretor do Provinzialmuseum de Hannover, há muito interessado nas inovações da arte russa e que pode ter planejado uma mostra da obra de Malévitch. Em fevereiro de 1933, no entanto, com a chegada dos nazistas ao poder, tornou-se impossível pensar em expor ou mesmo em lidar com arte abstrata. Apesar de um risco pessoal considerável, Dorner escondeu os trabalhos em seu porão. Em 1935, Alfred H. Barr, Jr., diretor do Museu de Arte Moderna de Nova Vork, viaja pela Europa em busca de obras para incluir em sua mostra Cubismo e Arte Abstrata, de 1936. A boa reputação e suas relações de amizade com Dorner levam Barr a começar sua busca em Hannover. Mas a descoberta da coleção de Malévitch foi totalmente inesperada. Barr conseguiu empréstimo de seis pinturas, um guache, cinco desenhos e cinco dos 22 painéis teóricos. Além disso, adquiriu duas pinturas suprematistas e dois desenhos arquitetônicos para a coleção permanente do museu. Conseguiu tirar as obras do país e incluiu-as na mostra de Nova
Vork. Após o encerramento da exposição, era absolutamente impossível devolver os trabalhos emprestados, pois seriam confiscados incontinenti e destruídos pelas autoridades nazistas. Em Hannover, em 1936, Dorner não tinha mais condições de manter em segurança o resto da coleção: 270 obras de seu museu foram apreendidas pelos nazistas e vendidas como entartete Kunst (arte degenerada). Todo o movimento moderno estava em perigo na Alemanha, e Dorner decidiu mandar as preciosas obras de Malévitch de volta para Hãring, que corajosamente as guardou, primeiro em sua casa em Berlim e, após 1943, quando deixou a cidade para sempre, em sua cidade natal de Biberach, no sul da Alemanha. Na primavera de 1951, Willem Sandberg, diretor do Stedelijk Museum de Amsterdam, fez uma viagem exploratória pela Alemanha, com seu assistente Hans Jaffé. Embora afirmasse que seu objetivo era organizar uma mostra do expressionismo alemão, sua intenção, na realidade, era encontrar o homem que, conforme ele sabia, tinha uma coleção de obras de Malévitch sob seus cuidados. Localizaram Hugo Hãring, que lhes mostrou as obras restantes. Quinze trabalhos do grupo original haviam desaparecido de forma inexplicável. Joop Joosten sugeriu que, como a maior parte desses quinze trabalhos era de grande porte, eles deviam ter sido acomodados num caixote à parte em 1927, mas em vez de ser enviado a Hannover teria sido deixado no armazém de Knauer, esquecido e destruído. Embora Hãring parecesse interessado na proposta de Sandberg de uma exposição em Amsterdam, não foi firmado nenhum compromisso com respeito a isso. Somente quando Naum Gabo e Mies van der Rohe intervieram, vários anos mais tarde, Sandberg teve sucesso em reacender o interesse de Hãring. Em 1957 as obras foram enviadas a Amsterdam, tendo sido adquiridas em 1958 pelo Stedelijk Museum com uma
subvenção adicional da cidade de Amsterdam. Donald Barthelme CHRONOLDGy7 1878 On 14(26) February (recorded by some scholars as 11(23), Kazimir Severinovich Malevich is bom to Severin Antonovich (1845-1902) and Liudviga Alexandrovna (1858-1942), at the house of his aunt, Maria Antonovna, in Kiev, the capital of Ukraine. Both parents are of Polish descent. Malevich's autobiographical notes state that his father worked as a manager at various Ukranian sugar refineries in the vicinity of Kiev. 1889 With his family, Severin Antonovich moves to a refinery in Parkhomovka, near Belopolye (district of Kharkov), and then, about four years later, to another refinery in Voltchok, near Konotop, Kiev and Kursk. In Parkhomovka, Kazimir completes the two-year program at the school of agriculture. Attracted to farm lite and nature, he teaches himself to paint his surroundings in a single peasant style. For a time he is in Konotop, where he comes to know Nikolai Roslavets (1880-1944), later a Futurist composer. From Konotop, Malevich goes to Kiev to contact the we/l-known local Realist painter Nikolai Pimonenko (1862-1912), who makes it possible for him to attend classes at the Kiev School of Drawing. Malevich dedicates himself entirely to painting and produces his first finished work. 1896 The Malevichs move to Kursk. Kazimir meets his first wite, Kazimira Ivanovna 19leits, eight years his senior. Two children are bom of this marriage: Galina and Ana to li. The latter dies of typhoid fever ear/y in childhood. Through reproductions, Malevich becomes acquainted with the work of Ivan Shishkin (1831-1898) and /lia Repin (1844-1930), we/l- known Realistpainters who belong to the group known as the Wanderers. He considers it his mission to represent nature as faithfu/ly as possible. In Kursk, he meets art lovers and amateur painters with whom he sets up a coopera tive studio and forms an association. Among this group are two artists with academic
training, from whom he learns about the particular characteristics of the Moscow art schools and the Saint Petersburg Academy of Arts. With one of these artists, Lev Kvachevsky, he often works outdoors. Malevich's work becomes increasingly impressionistic. He feels an urgent need for academic training and decides to seek it in Moscow. In order to pay for his stay there, he takes a job as a technical draftsman for the railroad. 1904 In autumn Malevich goes to Moscow. 1905 "Bloody Sunday", 9 (22) January, marks the beggining of a year of political and social unrest. Beginning in Saint Petersburg with the armed breakup of a peaceful demonstration by working-class people for improvements of working and living conditions, it ends with the Battle of Barricades at the end of the year in Moscow. Malevich returns to Kursk in spring and continues to paint outdoors; his work takes on a neo-impressionist character. Returns to Moscow in the autumn. In December he participates with striking workers in the Battle of the Barricades. Between 1905 and 1910 he works in the studio of the Moscow painter Fedor Rerberg (1805-1938). 1906 Malevich produces some Symbolist designs for commercial products. 1907 Malevich moves permanently to Moscow with his mother, wife and daughter. In March he shows twelve sketches in the fourteenth exhibition of the Moscow Association of Artists, the earliest recorded publication of his work in a catalogue. Dther participants include Vladimir Burliuk (18881917), Natalia Goncharova (18811962), Vasilii Kandinsky (18661944), Mikhail Larionov (1881-1964), Alexei Morgunov (1884-1935) and Alexander Schevchenko (18821948). The exhibition in April-May of the Moskow Symbolistartists' group Blue Rose, sponsored by the painter and art collector Nikolai Riabushinsky (1876-1951), makes an unforgettable impression on Malevich. 1908 In'Moscow, early in the year, the brothers David (1881-1967) and
Vladimir Burliuk organize Wreath, the first in a series of exhibitions to be held in Moscow and Saint Petersburg with Goncharova, Larlonov, Aristarkh Lentulov (18821943), Georgil Yakulov(1884-1928) and others. The first Golden Fleece exhibition, held in Moscow in April-May, includes not only the work of Russian artists such as Goncharova and Larionov, but also a large section or French art, including works by Bonnard, Braque, Cézanne, Dera in, Van Dongen, Gauguin, Gleizes, Van Gogh, Le Fauconnier, Matisse, Metzinger, Redon, Signac and Vuillard. Malevich takes part in the fifteenth and sixteenth exhibitions of the Moscow Association of Artists, the latter at the end of the year, with several studies for fresco painting. 1909 In January-February four Cubist works by Braque, among others his Nude of 1908, are shown in the second exhibition of the Golden Fleece, together with works by Derain, Van Dongen, Le Fauconnier and Matisse. Malevich's first wife leaves him. Together with the artist V Petin, Malevich decorates the church in Mstera. Malevich meets Sofia Mikhailovna Raphalovich, daughter of a psychiatrist, and enters a second marriage. At the end of the year he participates for the last time in the exhibition of the Moscow Association of Artists with four works: Picking flowers, Village, Pramenade and Ride. Among other participants are Lentulov and Morgunov. 1910 Becomes acquainted with Goncharova and Larlonov. Concerned with giving their Late Impressionist, Fauvist work a more definite Russian stamp, they increasingly seek inspiration in primitive Russian folk art and icon painting; the work that results becomes known as Neo-primitive. Malevich becomes especially interested in the work and ideas of Goncharova. In December, Malevich is invited by Larionovand Goncharova to take part in the first exhibition of Jack of Diamonds, a collaboration of the new generation of innovative artists: the Russian oriented NeoPrimitivists, such as the Burliuk
brothers, Goncharova, Larionovand Malevich; the Parisian-oriented "Cézannists", such as Alexandra Exter (1882-1949), Robert Falk (1886-1958), Petr Konchalovsky (1876-1956), Lentulov and lIia Mashkov (1881-1944); and the Expressionists who had settled in Munich, such as Alexei Jawlensky (1864-1941), Kandinskyand Gabriele Münter (1877-1962). , Among the participants from abroad are Gleizes and Le Fauconnier from Paris. Malevich shows three works: Bathing Woman, Fruits and Maid with Fruits. In December the Moscow art collector Sergei Schukin (18511936) acquires Matisse's monumental paintings La Danse andLa Musique. 1911 At the first Moscow Salon, in which Ivan Kliun (1873-1943) also participated, Malevich shows three series of works, the Yellow Series with representations of saints and angels, the White Series and the Red Series with representations of bathers and bathhouses. In April-May, Malevich takes part in the second exhibition of the Saint Peterburg group Union of Youth, together with fellow Moscow artists David and Vladimir Burliuk, Goncharova, Larionov, Morgunov and Vladimir Tatlin (1885-1953), the last introduced by Larionov. Malevich shows four works. 1912 Larionov and Goncharova resign from the Jack of Diamonds association, beca use they feel excessive attention is given to Western European, and especially Frenchdevelopments at the expense of characteristic Russian art. Simultaneous with the second Jack of Diamonds exhibition (March), theyorganize their work exhibition, Donkey's Tall, together with a group of sympathizers, including Malevich, Morgunov, Shevchenko, Tatlin and the newcomer Marc Chagai! (18871985). The exhibition is the climax as well as the last important event in the history of Neo-Primitivism. Malevich shows a large group of works depicting peasant life in a Neo-Primitivist style. In the second Jack of Diamonds exhibition, Fernand Léger (18811955) shows his Essai pour trais portraits of 1910-1911. The Saint Petersburg painter and
composer Mikhail Matiushin (18611934) visits Moscow with Diga Rozanova (1886-1918) and other members of the Union of Youth to bring about a collaboration between the Moscow and the Saint Peterburg avant-garde. The meeting between Matiushin and Malevich marks the beginning of a lifelong friendship. In April eight members of the Donkey's Tail group participa te in the third exhibition of the Union of Youth. Malevich shows four works that were also in the Donkey's Tail exhibition. At the end of the year he places five works in the first Contemporary Art exhibition in Moscow: Man with Scythe, Peasant Woman with Buckets and Child, Reaping Woman, Peasant's Head and Harvest. At the same time he takes part in the fifth exhibition of the Saint Petersburg Union of Youth, with works including Harvest, Man with Scythe, In the Field and Portrait of Kliun. Among other participants from Moscoware David and Vladimir Burliuk, Goncharova, Larionov, Shevchenko, Tatlin and Ivan Puni (1894-1956), a new member. In the works shown in both exhibitions, his earlier natural forms have given way to cone-shaped, apparently "metallic", denaturalized forms. In the catalogue of the fourth Union of Youth exhibition late in the year, he describes them as zaumnyi realism (Transrational Realism). In December, David Burlluk and the writers Alexei Kruchenykh (18861968) and Vladimir Maiakovsky (1893-1930) launch their own manifesto, "A Slap in the Face of Public Tas te ", asserting the poet's right to create new words by making use of arbitrary and deriva te words. 1913 Dn 3 (16) January, Malevich is enrolled as a member of the Union of Youth, along with David and Vladimir Burliuk, Morgunovand Tatlin. In February, Malevich tells Matiushin that the only meaningful direction for painting is that of Cubo-Futurismo Dn 23 March (5 April), a day before the Target exhibition opens in Moscow, Malevich speaks about contemporany art at the first of two panel-discussion evenings organized by the Union of Youth in Saint Petersburg.
Participates in the Target exhibition organized by Larionov in MarchApril. While Larionov and Goncharova exhibit their interpretation of Italian Futurism, which they call Rayonism, Malevich's interpretation of Futurism suggests movement by breaking cone shapes into almost unrecognizable forms: Morning in the Country after Snowstorm, Peasant Woman with Buckets, Dynamic Deconstruction and Knife GrinderjPrinciple of Flickering (the work entitled Dynamic Deconstruction ( Dinamicheskoye razlozheniye) is possibly The Woodcutter ). In July, Matiushin invites Malevich to help create an opera (together with Velimir Khlebnikov (1885-1922) and Kruchenykn) for the Saint Petersburg Union of Youth. From 1820 July (31 July-12 August), Matiushin, Malevich and Kruchenykn assemble at Uusikirkko, Finland (now a Soviet collective farm Victory, ten kilometres from the railroad station Kanneliarvi, north of Leningrad), for what they call the First AII-Russian Congress of Poets of the Future (PoetFuturists). They end the project with a manifesto announcing the opera Victory over the Sun. The manifesto goes on to advocate destruction of the clean, clear, honest, resonant Russian language, the antiquated movement of thought based on laws of causality and the elegance, frivolousness and beauty of cheap artist and writers who constantly issue newer and newer works in words, in books, on canvas and paper. Malevich produces lithographic illustrations for a number of books, some in cooperation with Rozanova, written or published by Kruchenykh: Explosion (Vsorvel), Let's Grumble (Vozropshchem), Piglets (Porosiata), The Three (Troje) andThe word as Such (Slovo kak takavoje). Dn 3 and 5 (16 and 18) December Victory over the Sun is staged at the Luna Park Theater in Saint Petersburg with pro loque by Kruchenykn, music by Matiushin, and costumes and decor designed by Malevich. In the concurrent seventh and last exhibition of the Union of Youth, Malevich shows two groups of works: one from 1912-1913, of his figure compositions made up of 273
cone-shaped "metallic" forms, described as Transrational Realism. Although some works had been shown before (e.g. Peasant Woman with Buckets), the Perfected Portrait of IV Kliun and Face of a Peasant Girl are new The second group, of 1913 works described as Cubo-Futurist, includes Samovar. Sergei Shchukin, who already owns an extensive co//ection of early Cubist works by Picasso, acquires two works of 1912 and four of 1913; in the fo//owing year he wi// add three works of 1914. The papier co//é and synthetic Cubist works became especia//y important to Malevich and other artists. 1914 At the end of January, Malevich sends works to the fourth Jack of Diamonds exhibition. New participants are Liubov Popova (1889-1924) and Nadezhda Udaltsova (1886-1961). In addition to the three works in the insta//ation photographs, Malevich shows Portrait of the Composer MV Matiushin. On the last week of January, Filíppo Tommaso Marinetti (1876-1944), the father of Futurism, arrives in Russia _ for a two-week visit. As a Futurist, Larionov suggests that they greet Marinetti wíth rotten eggs, but the Futurist Malevich condemns this pro vocation. On 8 (21) February, Malevich and Morgunov hold a Futurist demonstration in Kznetskii most, a downtown area of Moscow; both have red wooden spoons attached to their coat lapels. On 21 February (6 March), again bearing a red wooden spoon, Malevich protests at an evening of discussion on modem art organized by the Jack of Diamonds. In March-April he shows three works at the Salon des Indépendants in Paris. Puni and his wife, Xenia Boguslavskaia (18921972), who are living in Paris, arrange for the inclusion of
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No boulevard, 1903 óleo s/tela/oil on canvas 55 x 66 em Coleção Museu Russo
Malevich's work as we// as that of Vladimir Burliuk and Matiushin. On 21 February (6 March) he and Tatlin resign from the Union of Youth. Tatlin has a studio exhibítion of his first Painterly Reliefs, 10-14 (23-27) May. 19 July (1 August): Germany declares war on Russia,· Austria fo//ows on 24 July (6 August). On the day war is declared, the German-sounding name of Saint Petersburg is changed to Petrograd. In the first months of the war, Malevich makes six anti-German propaganda líthographs in the style of the Russian folk print ~ubok), his contribution to the govemmentassigned series of propaganda posters and picture postcards intended to win support for the war against Germany and Austria. Other artists who produce posters are David Burliuk, Larionov, Lentulov and Maiakovsky, author of the captions. 1915
In March-April, Malevich takes part in the Futurist Exhibition: Tram V in Petrograd, organized by Puni and Boguslavskaia. He shows Aviator, Lady at the Advertising Column, Lady in a Tram and An Englishman in Moscow. The other particípants are Rozanova from Leningrad, Kliun, Morgunov, Popova, Tatlin and Udaltsova from Moscow and Exter - from Kiev. At the opening, alI participants bear red wooden spoons. In May, Malevich proposes that Matiushin help him write a definítive essay on new developments in his work, which some months later he is to ca// Suprematism. Af ter his unexpected visít to Malevich's Moscow studio in September, Puni reveals information to the outside world about the newest work, which Malevich intended as a surprise to the public at Puni's second Futurist exhibítion in December.
At this second Futurist exhibition, 0.10. The Last Futurist Exhibition, organized by Puni in Petrograd in December, Malevich exhibits a total of thirty-nine completely nonrepresentational works for the first time, presented as the "new painterly realism ". Even though he is specifica//y asked not to ca// this contribution Suprematistic, to avoid antagonizing the public wíth yet another new term, the word Suprematism appears on the wa// of the insta//ation. For the exhibítion Malevich and his first: fo//owers (Boguslavskaia, Kliun, Mikail Menkov (dates unknow) and Puni), issue a short statement as part of the manifesto and exhibít a co//ective painting. Malevich publishes a brochure entitled From Cubism to Suprematism in Art, to the New Realism of Painting to Absolute Creation. During the fo//owing year the statement is used as an introduction to another brochure From Cubism and Futurism
to Suprematism The New Painterly Realism . The other particípants are Natan Altman (1889-1970), Vasilii Kamensky (1884-7961), Anna Kiri//ova (dates unknown), Vera Pestel (1886-1952), Popova, Rozanova, Tatlin and Udaltsova. 7916 On 12 (25) January, on the occasion of O. 10, Malevich and Puni, as Suprematists, give a public popularscientific lecture on Cubism, Futurism and Suprematism and a demonstration of how a drawing from nature is done according to the methods of Cubism and Futurism. In March, Malevich particípates in the Futurist exhibítion The Store. Organized by Tatlin and held in a Moscow store, it is made up entirely of Cubo-Futurist works. Among the thirteen particípants are Exter, Kliun, Morgunov, Pestel, Popova and Udaltsova. The newcomer is Alexander Rodchenko (7891-1956), introduced by Tatlín. Four of Malevich 's works appear
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Moça com flor, 1903 óleo s/te la/oil on canvas 80 x 100 em Co leção Museu Russo
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under the heading "Alogism of Form, 1913": Cow and Violin; An Englishman in Moscow; Aviator and Chess Players. Malevich is ordered to report to military duty in July and is sent to Smolensk. During this year Alexander Archipenko (1887-1964), Natalia Davydova (dates unknown), Kliun, Malevich, Matiushin, Menkov, Pestel, Popova, Rozanova, Udaltsova and others form the group Supremus and plan a publication by that name. In November, Malevich and his group participate in the fifth Jack of Diamonds exhibition in Moscow His entry in the catalogue simply states: "140-199 Suprematism of painting". In December, Malevich receives orders to go to the front. 1917 The February Revolution breaks out: 23-27 February (7-12 March). 2 (15) March,' Czar Nicholas abdicates, ending the Russian monarchy A provisional govemment is formed,
followed in July by the Coalition Govemment under Alexander Kerensky 26 March (8 April): Malevich speaks at the First Republican Evening of the Arts at the Hermitage Theatre, Moscow (together wih the poets Kamensky, Maiakovsky, 'Vasilii Gnedov (1890-1978), the composer Roslavets and the artists David Burliuk, Lentulov, Tatlin and Yakulov.) Malevich assists in designing decorations for the May Day parade in Moscow Malevich joins the Left Wing Federation of the newly founded Moscow Trade Union of Painters. E!ected deputy director of the art department of the Moscow Soldier's Soviet in August, he immediately proposes the organization of a People's Academy in Moscow and Petrograd. His program for art ScllOOls, made public in October 1917, is the first proposal for the kinds of schools later established as
Free State Art Studios (SVOMAS). 25 October (7 November): the October Revolution establishes the Soviet regime. In the first days of the Revolution, Malevich is appointed Commissar for the Preservation of Monuments and Antiquities (especially in the Kremlin) by the MilitaryRevolutionary Committee. In November the People's Commissariat for Enlightenment (Narkompros) is established under the jurisdiction of Anatolii Lunacharsky (1875-1933). 2 (15) December: Lenin signs the armistice with Germany and Austria as Brest Litovsk, ending Russia's participation in World War I. A peace treaty follows on 3 March 1918. Malevich again contributes Suprematist work to the sixth and last Jack of Diamonds exhibition. 1918 29 January (11 February): a Department of Visual Arts (IZO) is
established within Narkompros, headed by David Shterenberg (1881-1948). Malevich is elected a member of the Moscow Division, headed by Tatlin. 1 February (14 February): Introduction of the Westem calendar replaces the old style of dates. 12 March: the central govemment moves from Petrograd to Moscow Malevich begins to advertise his teaching program on modem art for workers. In a series of short articles in the magazine Anarkhijia (Anarchy) in March and April, he takes a stand against the attempt by conserva tive pre-Revolutionary artists to preserve their power in the art world by opposing avantgarde artists who consciously support the Revolution. Some of the articles are reprinted in 1919 in the new joumal Iskusstvo Kommuny (Art of the Commune) (Petrograd) on the initiative of Narkompros and with the support of Maiakovsky
Dissatisfied with the working methods of Shterenberg, the head of the now Moscow-based IZO, Malevich and Tatlin go to Petrograd. In October SVOMAS opens in Petrograd and Moscow Malevich has a studio in each place. In Moscow he also has a textile studio, which he shares with Udaltsova. In collaboration with Matiushin, Malevich designs a large wall decoration and a portfolio for the Congress of Committees on Rural Poverty, held in November at the Winter Palace in Petrograd. Malevich designs the sets for Maiakovsky's massive production Mystery Bouffe, dedicated to the Revolution and performed in Petrograd in November, on the first anniversary of the Revolution. The director is Vsevolod Meierkhold (1876-1940). 1919 Throughout this year and 1920, the Civil War is fought on several fronts, giving rise to extreme economic difficulties for the new republic. A war economy is introduced to address the problems. . On 9 February 1919 Nikolai Punin (1888-1953) publishes a letter in Iskusstvo Kommuny, asserting that Suprematism is flourishing ali over Moscow and that the day of Suprematism has really come. But he also suggests that the movement is losing its creative significance. Malevich joins the newly formed Union of Art Workers (Rabis). In February he attends the meeting at which it is decided to establish Museums of Artistic Culture (MKhK), museums intended solely for contemporary art. In the February Iskusstvo Kommuny he questions the validity of traditional museums of older art. Retums to Moscow Among the artists working in his studio there are Ivan Kudriashev (1896-1972), Gustav Klutsis (1885-1944) and Sergei Senkin (1894-1963). Malevich contributes sixteen 275
Suprematist works to the Tenth State Exhibition: Nonobjective Art and Suprematism, held in Moscow in April. The otherparticipants are Davydova, Kliun, Menkov, Papava, Rodchencko, Rozanova and Alexander Vesnin (7883-1959). Malevich's entry includes a recently developed series of "white on white" compositions, answered by Rodchencko with "black on black" compositions. In June, Malevich completes his first long theoretical essay. On the New Systems in Art Statics and Speed, printed and published by EI Lissitzky (1890-1941) at his SVoMAS studio in Vitebsk. At Lissitzky's suggestion and by invitation of Vera Ermolaeva (18931938), dean of the school, in late october ar early November, Malevich starts to teach at the Popular Art Institute in Vitebsk, reorganized by Chagall ear/y in the year. At the newly instituted free art studios, Malevich's intention to introduce a new style of art . education rapidly becomes evident; ali forms are to be developed on the basis of Suprematism and integrated into a universal system. He receives the full support of Ermolaeva, Nina Kogan (7887-1942), head of the preparatory studios and Lissitzky, head of the graphic and architecture studio. The Sixteenth State Exhibition in Moscow (December 1919-January 1920) is devoted entirely to a large retrospective entitled K S. Malevich, one Person Exhibition. His Way from Impressionism to Suprematism (very recent research indicates that this exhibition probably opened ear/y in 1920). 1920 14 February: in two lectures Malevich explains his ideas about collectivity in the creative processo In April the new form of training is put into effect within the academic organization of Vitebsk. The principIe of collectivity is fundamental to the execution of this plan, named Affirmation of the New Art (UNoVIS). His leading pupils are IIlia Chashnik (1902-1929), Ivan Chervinka (dates unknown), Anna Kagan (1902-1979), Lazar Khidekel (1904-1986), Mikail Kunin (dates unknown), Evgenila Margarll (19021987), Efim Raiak (7906-1987), Nikolai Suetin (1897-1954), Lev 276
Yudin (1903-1941) and Solomon Ydovin (1892-1964). 20 April: daughter Una (1920-1989) is bom. In ear/y June, Chaga 11 goes to Moscow to participa te in the conference for fine art managers and never retums. Ermolaeva suceeds him as director. The Department of Visual Arts of Narkompros publishes Malevich's pamphlet Fram Cézanne to Suprematism, A Criticai Sketch. In Petrograd, between March and November, Tatlin, with the help of his students and colleagues, builds the model of his Monument to the Third International, shown in Petrograd between 8 october and 1 December and then in Moscow In December UNO VIS publishes Malevich's book Suprematism: 34 Drawings. 1921 In Moscow, in January, Konstantin Medunetsky (1899-1935) and the brothers Vladimir Stenberg (78991982) and Georgii Stenberg (79001933) organize an exhibition of their work entitled The Constructivists. Ali three are members af the Society of Young Artists (obmokhu), founded in 1919. 21 January: Malevich visits the Institute of Artistic Culture (INKhUK) in Moscow, established in May 1920, to attend the session Cubism and Suprematism, in which two of his paintings arediscussed. This is one of numerous theoretical debates that conducted to clarify the distinction between composition and construction. 28 March: a one-day UNoSIS exhibition is held in Vitebsk (no catalogue). With the introduction of the New Economic Policy (NEP), allowing for a partiaI retum to the free enterprise system, the govemment tries to revitalize the stagnant economy. September: in Moscow the exhibition 5x5=25 signals the end of painting and the move toward constructivism. The participants are Exter, Papava, Rodchenko, Varvara Stepanova (1894-1958) and Vesnin five artists, each showing five works of art. A dislike for the new method of training grows within the Vitebsk academyas well as the stance of the municipal govemment force Malevich to find other accommodations for UNO VIS.
In December the Vitebsk INKhUK group, headed by Malevich, visits Moscow, where he lectures at the Moscow INKhUK By this time the differences between the Constructivist group around Rodchenko and Malevich's Suprematism group are considerable. The suggestion that the Vitebsk group become an official branch of INKhUK is postponed, ostensibly "beca use of financiaI implications" but clear/y for more complex reasons. 1922 Malevich's last independent publication, the book God is Not cast down, is published by UNoSIS in Vltebsk. He begins a major philosophical text Suprematism. The World as Non-Objectivity, which keeps him busy until the end of the 1920s. 12 February: Malevich writes to De Stijl follower Chris Beekman (18871964), "dear fellow innovators in Holland", in response to their vain attemps to make contact with Russian innovators. one of his comments concems "the growing pile of manuscripts that cannot be published ar placed in any newspaper". He expresses nega tive views about Constructivism. In Moscow, in February, the fortyseventh exhibition of the Wanderers, whose founders championed Realism between 1860 and 1890, has remarkable official and public success. Some members of this group, pronounced opponents of the avant-garde leftists, defect and found the Association of Artists of Revolutionary Russia (AKhRR) to rally forces against the dominant role played by the avant-garde since the Revolution. They declare that art should pro vide an accurate, documentary, realistic image of contemporary everyday life in Russia as well as of the ethnographic differences among the lives of workers throughout the country. The group supports heroic realism, depicting events of the Revolution and the Red Army's revolutionary contributions. Malevich gives two lectures in June at the Petrograd INKhUK Participating with other UNoSIS members, he shows Suprematism works at the exhibition Survey of New Tendencies in Art, opening on 15th June at the Museum of Artistic Culture.
Participates in UNO VIS exhibitions at INKhUK, Petrograd. At the Erste Russische Kunstausstelling in Berlin in october-November, Malevich is represented by one Cubist and four Suprematist works, one of the latter is a white on white painting. The Americam collector Katherine Dreier buys the Cubist work Knife Grinder for her Museum of Modem Art, the Société Anonyme. The exhibition travels to the Stedelijk Museum in Amsterdam in AprilMay 1923. December: the Union of Soviet Socialist Republics (USSR) is established. 1923 28 February: Malevich delivers a lecture "on the Artist Basis: on Colar, Light, Pointillism in Space and Time" at the Psycho-Physical Laboratory of the Russian Academy of Artistic Sciences in Moscow Malevich contributes to the collective UNO VIS entry in the exhibition Works by Petrograd Artists of Ali Trends, 1918-1923, held in May at the Academy of Arts of Petrograd. on this occasion he apnounces his "zero" manifesto, The Suprematist Mirrar, in the joumal Zhizn Iskusstva (Life of Art). In collaboration with the Petrograd Lomonosov Porcelain Factory, he and other UNO VIS members develop designs for new forms and decorations based on Suprematist principIes. He investigates the possibilities for a Suprematist architecture in design sketches of the so-called planits. In June, Pavel Filonov (1883-1941) makes a proposal to convert the Petrograd Museum of Artistic Culture (MKhK), founded in April 1921, into a scholarly institute for research on the culture of modem art. In its September session the museum commission decides to attach four scholar/y departments to the museum and elects Malevich its temporary director. Malevich's second wife dies. He continues to use her dacha in Nemchinovke, near Moscow, for the rest of his life. In october he begins the reorganization of MKhK 1924 21 January: Lenin dies. Malevich writes a long essay in praise of Lenin. 26 January: Petrograd is renamed Leningrad.
2 February; Malevich publishes an article in Zhizn Iskusstva opposing the artistic direction of AKhRR. The Leningrad MKhK is closed and replaced by the INKhUK, which as GINKhUK receives the status of an official state institute in February 1925. In addition to the museum, the institute consists of five scholar/y departments: painter/y culture, the formal-theorical department, under Malevich's direction; organic culture under the direction of Matiushin; material culture under Tatlin; the experimental department under Pavel Mansurov (1896-1983); active at the Petrograd SVoMAS since 1919; general methodology, first under the direction of Pavel Filonov and later of the art critic Punin. Malevich chooses Ermolaeva, Khidekel and Yudin as his assistants. New students in his department are, among others, Anna Leporskaia (7900-1982) and Konstantin Rozhdestvensky (bom 1906). Participates in the Russian section of the fourteenth Venice Biennale (April-october); he shows six planit drawings together with Black Square, Black Cross and Black Circle. 1925 Meets the filmmaker Sergei Eisenstein (1890-1948) and argues with him in two articles in the joumal ARK (1925-1926) ofthe Association of Revolutionary Cinematography. 10 March: delivers a lecture "The Theory of the Additional Element in Painting" at the Psycho-Physical Laboratory in Moscow In May-June, at the first representa tive exhibition of INKhUK, Malevich presents a series of thirty two charts that develop his theory of the "additional element". In summer Tatlin leaves Leningrad to teach at the Kiev Institute of Art, where he becomes director of the department of dramatic, cinematic and photografic arts. His position as the head of the department of material culture is given to Suetin. Together with Chashnik and Suetin, Malevich works out his ideas for a Suprematist architecture in a series of models, described as arkhitektons, using rectangular blocks of pIas ter and wood. The museum section is shut down and its collection transferred to the State Russian Museum
and various other museums. At a meeting attended by Malevich, Matiushin, Punin and Suetin, the formal-theorical department is renamed to department of painter/y culture. Marries Natalia Andreevna Manchenko (bom 1902). In December a decision is made at the Main Directorate of Scientific Institutions (GLAVNAUKA) to stage an intemational exhibition; failing that, provisions were to be made for department heads to traveI abroad. Malevich writes the proposalon 19 December, signing it along with Boris Ender (1893-1960, assistant to Matiushin), Punin and Suetin. 1926 In February, Malevich shows four planit drawings at the Intemationl Exhibition of Modem Architecture in Warsaw In June he shows a large number of his arkhitektons at the representative exhibition of the Leningrad GINKhUK of this year. The exhibition is attacked by GINKhUK opponents, who by now include members of AKhRR, in an effort to demonstrate the politically questionable status of FINKhUK and to bring about its closing. The argument for its closing is made by the critic G. Seyi in a review, "A Cloister at the Expense of the State", published on 70 June in Leningradskaia Pravda (Leningrad Pravda). 76 June: Malevich presents his Theory of the Additional Element in Painting at an interdepartmental session at GINKhUK. The publication, dated 3-7 July 7926, goes no further than printer's proofs. 75 November: Malevich is dismissed as director of GINKhUK. At the end of the year GINKhUK is dismantled by merging its staff and departments with those of the State Institute for Art History (GIII). 7927 The transition is clear/y not smooth: the work of Malevich's collaborator, Leporskaia, is interrupted (until the questions conceming the visiting facultyare solved). She is not admitted at the institute until 7 November 7928. In connection with his trip to Germany, he completes (with the help of his students Leporskaia, Rozhdestvenskyand Yudin) a series of twenty-two explanatory charts to be used as visual aids in his
lectures on the significance of the additional element and its usefulness in relation to art education. On 8 March he leaves for Warsaw, where he stays until29 March; he shows Polish artists some of the works he has brought with him, delivers a lecture and attends a banquet in his honour at Hotel Polonia. Stays in Ber/in from 29 March until 5 June. Tadeusz Peiper (editor of the Polish joumal Zwrotnica) travels with him from Warsaw He finds lodging with Gustav von Riesen, an engineer who had worked in Moscow before 7974. Von Riesen's son, Alexander, acts as an intepreter for Malevich. On 7 April he visits the Bauhaus in Dessau with Peiper; there he meets Walter Gropius and László MoholyNagy The latter sees to it that Malevich's introduction Suprematism and the Additional Element in Art is published in the series Bauhausbücher. Through an association of progressive Berlin architects, Malevich is granted a separa te space to show his work at the Grosse Ber/iner Kunstausstellung of that year (7 May-30 September). Discusses the idea of making a film on Suprematism with avant-garde filmaker Hans Richter and writes a short illustrated text. Upon his departure on 5 June, Malevich entrusts to his host, Von Riesen, a package containinig theorical writings; to the secretary of the architectural association, Hugo Haring, he entrusts the works he has brought with him and the series of explanatory charts together with a similar series by Matiushin. During Malevich's absence from home the political situation in the arts had further deteriorated. In spring, 7927, the Commissariat of Education and the Science Administration come under increasing pressure from the Communist Party Central Committee's agitation and propaganda section to abandon their support of artistic pluralism. After his retum from Germany, Malevich proceeds with his research at the State Institute for Art History in Leningrad. He works out ideas with Cheshnik and Suetin for satellite cities near Moscow, based on Suprematist concepts of the organization of space.
On 7 November his works are included in the regular New Tendencies in Art installation at the State Russian Museum in Leningrad, organized by Punin, who had become a curator of the museum after the closing of INKhUK. 1928 Between April 7928 and October 7930 Malevich publishes a series of twelve articles (in Ukrainian) in the Kharkov monthly Nova Generatsiia (New Generation) on new developments in art since Cézanne. His manuscript "The Cinema, Gramophone, Radio and Artistic Culture ", submitted for publication, is retumed with the criticism that it "does not coincide with the joumal's aesthetic ideology", which testifies to the escalating ideological polarization. 7929 April: the First- Year Plan is inaugurated at the Sixteenth Party Congress (to be launched retroactively in October 1928). With this the drive begins toward rapid industrialization, collectivization and the eradication of widespread illiteracy To establish the creative uniformity that would allow Soviet art to be effective in supporting these goals, the AII-Union Coopera tive of Artists is established in Moscowas a central agency for supervising commission, supplies, travei and so forth. Artists henceforth are to depict the establishment of a socialist society The Novembergruppe invites Malevich to exhibit in Ber/in, but the proposal comes to nothing. Appreciation of his research among art historians of the State Institute for Art History steadi/y decreases. In 1930 Malevich and his department are expelled from the ins titu te. He is given the opportunity to work two and a half weeks a month at the Kiev Institute of Art. In a retrospective exhibition of his work at the Treatiakov Gallery in Moscow, in November, he shows new works that recapitula te subjects first depicted in 7972-7973, but in an entirely new style. The works carry dates such as 79097970. After closing, the exhibition is transferred to the Kiev Art Gallery, but as punishment for organizing an exhibition of the work of the bourgeois Malevich, the director,
Fedor Kumpan (1896-7970), is given a long sentence. It takes Malevich two and a half years to retrieve his paintings. 7930 Malevich gives a course on painting theory at the House of Art in Leningrad. Between the end of September and the beginning of December he is intemed and questioned "about the ideology of existing trends. I, as theoretician and ideologist, had to offer interpretations of ali trends. I was asked whether there are any right or left tendencies in these movements, any de via tions " (Ietter to the artist Lev Kramarenko (78881942), 8 December 7930). As a precautionary measure, friends bum a number of his manuscripts. From November 7930 to March 7937 he is registered at the Union of Art Workers as unemployed. In July some of his works are included in the Ber/in exhibition Sowjetmalerei, organized by the Freunde des Neuen Russland. Though the works are dated 7973 and 7975, the perceptive review by Adolph Donath (Berliner Tageblatt, 9 July 7930) makes it clear that they are recent figura tive paintings of stiff, faceless puppetlike figures and flat landscapes. "One recognizes in these works the machine into which man is being forced - both in painting and outside it". The exibition Russische Kunst von Heute in October, in Vienna, includes one painting by Malevich, The Guardsman. Alexander Domer of the Provinzialmuseum in Hannover, Germany, one of the few museum directors in Europe interested in abstract art, takes custody of the collection of Malevich's works left in Ber/in and exhibits several of them in his museum. 7937 Malevich designs a scheme, which is carried out, for the painting of architectural elements in the interior of the Red Theater in Leningrad. Malevich works on a book entitled lzology, apparently based on his article in Nova Generatsiia. In a letter to a friend in Kiev, Lev Kramarenko, he makes a distinction between the "Wor/d of art as the wor/d of nonobjectivity and Soviet art as a symbolic art and not a naturalistic or realistic art".
7932 April: ali official art groups are dissolved by govemment decree, to be replaced by unions for writers, musicians, artists and other creative groups. Malevich is given a basement space at the State Russian Museum for carrying out his research. His work is included in the exhibition Art from the Imperialist Epoch (fig. 22). The late painting Sportsmen is presented as an example of preRevolutionary bourgeois art. He is extensively represented in the exhibition Fifteen Years of Soviet Art, held from November to May 7933 at the State Russian Museum and subsequently in Moscow under the title Artists in the RSFSR over the Last 75 Years. The forced collectivization of farms results in a disastrous famine during winter 7932-1933. 7933 Malevich applies for permission to maintain his workshop at the State Russian Museum. Participates in the Exhibition of Works by Touring artists (no catalogue), in the Scholar's Club in Leningrad. 7December: Malevich draws up a will that specifies that he is to be cremated and buried at Borvihha (now Nemchinovka),' Kliun and Suetin are executors. At the end of the year Malevich delivers the typed text of his "Chapters from an Artist's Autobiography" to the young writer Nikolai Khardzhiev. 7934 Chaired by Maxim Gorky (18687936), the First AII-Union Congress of Soviet Writers meets in Moscow and concludes by advocating Socialist Realism as the exclusive style for Soviet writers and artists: "Truth and historical concreteness of the artistic depiction of reality must be combined with the task of the ideological transformation and education of the workers in the spirit of Socialism". Participates in the exhibition Woman in Socialist Construction in Leningrad. Two works are listed in the catalogue: Head of a young girl and Female portrait. 7935 April: with four portraits of 7933 and 7934 (including Self-portrait 277
(repr. Art in America (September 1989); 176) andMale portrait Malevich participates in The First Exhibition of Leningrad Artists. It is the last presenta tion of his work in the Soviet Union until/1 962. On 15 May, Malevich dies in the presence of his mother, wife and daughter after several months of illness. Suetin makes a death mask and cast of his hands. In view of his contribution to the art wor/d, the City Council of Leningrad decides to pay the burial costs. After Iying in state at his apartment in the former GINKhUK building, his body is placed in a "Suprematist" coffin, executed by Suetin according to sketches by Malevich but without the cross on the lid that appears in one of the sketches. The coffin is brought to the House of the Artist for mouming and then a long procession of friends and colleagues follow it to the Moscow Station, to be taken to Moscow by train. After the cremation the um of ashes is buried in the open field next to the dacha in Nemchinovka. The site is marked with a white cube and a black square, designed and made by Suetin. 2 June: Alfred H. Barr Jr., director of the Museum of Modem Art in New York, selects a number of Malevich's works in Hannover, from the relocated Ber/in collection, for the first large retrospective exhibition Cubism and Abstract Art, held in New York in 1936. 1936 March: Malevich is represented with seven paintings and six drawings in Cubism and Abstract Art exhibition at the Museum of ModemArt. A large part of Malevich's estate is taken into custody by the State Russian Museum, though it still belongs to his family. The works are not shown for decades. In 1977, however, theyare officially incorporated into the permanent collection by arder of the Ministry of Culture. Apart from the collection in the Museum of Modem Art, works by Malevich are not shown again, neither in Russia nor in the West, until the Exhibition of Russian Painting, in Paim Beach, Florida, in 1945. In the late 1950s the large collection now owned by the
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Stedelijk Museum arrives in Amsterdam from Germany. Joop M. Joosten NOTE: 1. Dates befare 1900 in the Russian cantext are in the sa-called Old Style and are twelve days earlier than thase in the Western calendar; dates between1900 and 14 February 1918 are thirteen days earlier. Western dates are in parenthesis. After the autbreak af Warld War I, in August 1914, Saitn Petersburg was renamed Petrograd. This name was retained until Lenin's death, in 1924, when the city was renamed Leningrad. Titles af assaciatians, exhibitians, publicatians and warks af art are transliterated.
BERLlN 1927 In 1927 Malevich travelled from Leningrad to Poland and Germany with a large retrospective exhibition of his work. In Warsaw the exhibition was held in the Hotel Polonia, and in Berlin it was presented as a solo exhibition within the annual Grosse Berliner Kunstausstellung. Few records of the exhibition remain and it is not known exactly howMalevich came to be invited ar by whom. Clear/y, the progressive German architect Hugo Haring played a leading role on the German side as did Henry Stazewski in Warsaw. The Ber/in exhibition catalogue contained no list of works, but when four installation photographs came to light in the 1960s it became possible to develop an idea of the nature of Malevich's presentation. Fifteen of the fifty-five works reproduced in the catalogue seem to have been irretrievably lost; of the other forty, twenty-four are now in the Stedelijk Museum in Amsterdam, three are in private collections, seven in the Museum of Modem Art in New York, four in other museums and two, former/y in priva te collections, are now unlocated. The four installation photographs, however, did not cover the entire scope of the work Malevich brought to Ber/in. There was also a large group of drawings, an unknown number of architectural models and twenty-two charts prepared by members of the Formal Theoretical Department (which Malevich headed) to explain the theoretical work of the Institute of Artistic Culture in Leningrad. Since 1935 five of the theoretical charts have been in the collection
of the Museum of Modem Art. The remaining seventeen are in the Stedelijk Museum, acquired from Hugo Haring together with the paintings and drawings. Ali twentytwo were published in detail by Troels Andersen (1979). On 5 June 1927, four months before the Ber/in exhibition closed, Malevich retumed to Leningrad, leaving his work in the care of Hugo Haring, with explicit instructions that they not be sent back to the artist. Malevich apparently had hoped to retum the following year and exhibit his work in other Westem cities. He even seems to have considered settling in the West. But nane of these plans materialized and before he died in 1935, having lost ali contact with his German colleagues, Malevich assumed that the entire contents of the exhibition had been destroyed. The fate of these works has now been documented to a considerable extent and although fifteen of them se em to be definitely lost, remainders can be traced. Almost ali were initial/y crated and stored with the shipping agent Gustav Knauer in Ber/in. At some stage the crates were transferred from Ber/in to the custody of Alexander Domer, the director of the Provinzialmuseum in Hannover, who had long been interested in the innovations of Russian art and may have planned to exhibit Malevich's work. In February 1933, however, when the Nazi came to power, it became impossible to consider exhibiting ar even handling abstract art. At considerable personal risk, Domer concealed the work in his basement. In 1935 Alfred H. Barr Jr., director of the Museum of Modem Art, was travelling through Europe in search of works to include in his Cubism and Abstract Art exhibition of 1936. In view of Domer's reputation and their acquaintance, Barr decided to start his search in Hannover. But the discovery of the Malevich collection was entirely unexpected. Barr managed to borrow six paintings, a gouache, five drawings and five of the twenty-two theoretical charts. He also purchased two Suprematist paintings and two architectural drawings for the museum 's
permanent collection. He successfully brought the works out of the country and included them in the New York exhibition. After the exhibition closed, it was clear/y impossible to retum the loans, which would have been confiscated instantly and destroyed by the Nazi authorities. Meanwhile, Domer no longer felt that he could safely keep the rest of the collection in Hannover,' in 1936, 270 works from his museum had been seized by Nazis and sold as entartete Kunst (degenera te art). The entire modem movement was at risk in Germany and Domer decided to transfer the precious Malevich works back to Haring, who courageously stored them, first in his house in Berlin and after 1943, when he left Ber/in for good, in his native town of Biberach in southem Germany. In spring 1951, Willem Sandberg, the pioneer director of the Stedelijk Museum in Amsterdam, travelled to Germany with his deputy Hans JaffĂŠ. Their ostensible purpose was to organize an exhibition of German expressionism, but in fact it was to find the man whom they knew had a collection of works by Malevich in his care. They located Hugo Haring, who showed them the works still remaining at that time. Fifteen of the original group had inexplicably vanished. Joop Joosten suggested that since most of these fifteen works were large they may been packed in a separate crate in 1927; but instead of being sent to Hannover, the crate was left at the Knauer warehouse, forgotten and ultimately destroyed. Although Haring seemed interested in Sandsberg's proposal for an Amsterdam exhibition, no commitment was made. Only when Naum Gabo and Mies van der Rohe intervened several years later Sandberg succeeded in regaining Haring's interest. In 1957 the works were sent to Amsterdam, where they were purchased in 1958 by the Stedelijk Museum with an additional grant from the city of Amsterdam. Donald Barthelme
Agradecimentos/ Acknowledgements Queremos agradecer ao Museu Russo de São Petersburgo nas pessoas do diretor e vicediretor, Vladimir Gusev e Evguêniia Petrova, e ao Stedelijk Museum de Amsterdam, na pessoa de seu diretor Rudi Fuchs, pela colaboração: a mostra de Malévitch na 22ª Bienal Internacional de São Paulo só foi possível graças ao empréstimo dos quadros de suas coleções. Agradecemos também o empenho do curador, Wim Beeren, responsável pela primeira exposição retrospectiva de Malévitch em São Petersburgo, Moscou e Amsterdam, em 1988-89. We would like to thank the director and deputy director of the Russian Museum of Saint Petersburg, Vladimir Gusev and Evgueniia Petrava, and also Rudi Fuchs, the director of Stedelijk Musem of Amsterdam, for their help: Malevich's participation in the 22ª Bienal Internacional de São Paulo was only possible due to their collaboration in the loan of paintings fram their collections. We also thank the earnest efforts of the curator Wim Beeren, responsible for Malevich's first retraspective exhibit in Saint Petersburg, Moscowand Amsterdam in 7988-89. Obras apresentadas/Works in the exhibition Vendedora de flores, 1903 óleo s/tela/oil on canvas 80 x 100 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Boulevard,1903 óleo s/tela/oil on canvas 56x 66 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo No boulevard, 1903 óleo s/tela/oil on canvas 55x 66 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Moça desempregada, 1904 óleo s/tela/oil on canvas 80x66 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo
Banhistas, 1908 óleo s/tela/oil on canvas 59 x48 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Rio na floresta, 1908 óleo s/tela/oil on canvas 53x 42 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Colhendo centeio, 1912 óleo s/tela/oil on canvas 72 x 74,5 cm Coleção Stedelijk Museum, Amsterdam Cabeça de menina camponesa, 1912 óleo s/tela/oil on canvas 80x 95 cm Coleção Stedelijk Museum, Amsterdam Osoldado da guarda, 1913-14 óleo s/tela/oil on canvas 57 x 66,5 cm Coleção Stedelijk Museum, Amsterdam Senhora na parada do bonde, 1913-14 óleo s/tela/oil on canvas 88x88 cm Coleção Stedelijk Museum, Amsterdam Suprematismo (Supremus nº 50), 1915 óleo s/tela/oil on canvas 97 x66 cm Coleção Stedelijk Museum, Amsterdam Suprematismo, 1915 óleo s/tela/oil on canvas 80,5 x 81 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Suprematismo, 1915-16 óleo s/tela/oil on canvas 87,5 x 72 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Suprematismo, 1918 óleo s/tela/oil on canvas 97 x 70 cm Coleção Stedelijk Museum, Amsterdam Suprematismo, 1920-27 óleo s/tela/oil on canvas 84 x 69,5 cm Coleção Stedelijk Museum, Amsterdam Na colheita, 1928-32 óleo s/tela/oil on canvas 82x61 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Moças no campo, 1928-32 óleo s/tela/oil on canvas 106 x 125 cm
Coleção Museu Russo, São Petersburgo Cabeça de camponês, 1928-32 óleo s/tela/oil on canvas 71,7 x 53,8 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Suprematismo. Figura de mulher, 1928-32 óleo s/tela/oil on canvas 126 x 106 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Pressentimento complexo, 1928-32 óleo s/tela/oil on canvas 99x 79 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Camponesa, 1928-32 óleo s/tela/oil on canvas 98,5 x 80 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Camponês, 1928-32 óleo s/tela/oil on canvas 120 x 100 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Camponese~ 1928-32 óleo s/tela/oil on canvas 77,5 x 88 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Paisagem com cinco casas, 1928-32 óleo s/tela/oil on canvas 83x62cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Trabalhadora, 1933 óleo s/tela/oil on canvas 71,2 x 59,8 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Retrato da esposa do artista, 1933 óleo s/tela/oil on canvas 67,5 x 56 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo Retrato de homem (N. N. Púnin), 1933 óleo s/tela/oil on canvas 70x57 cm Coleção Museu Russo, São Petersburgo
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Pressentimento complexo, 1928-32 óleo s/tela/oil on canvas 99 x 79 em Coleção Museu .Russo, São Petersburgo
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CU~DO~ CAlHe~INe De C~Oe~
CU~AíO~ CAíHf~INf Df C~OfS
Marcel Broodthaers foi um dos artistas europeus que, desde a década de 60, mais fortemente influenciaram a produção contemporânea.
Marcel Broodthaers belongs to the group of European artists that, since 1960's, have most influenced the contemporary production.
Apaixonado pela literatura, admirador de Mallarmé, Baudelaire e Edgar Allan Poe, foi também poeta e escritor, autor de vários livros, entre eles~ Minuit; Magie - art et politique; Un voyage en Mer du Nord. Seu primeiro gesto artístico aconteceu em 1964 quando imortalizou em gesso cinqüenta exemplares de sua coletânea de poesias, Pense-bête. Criador de objetos enigmáticos, incorporou a seu trabalho todos os meios disponíveis: pintura, escultura, fotografia, cinema, poesia e elementos do cotidiano. Suas primeiras obras, calcadas na realidade e concebidas, entre outras coisas, com cascas de ovos, mexilhões e batatas fritas, datam de 1964. Nessa época, utilizou o processo da emulsão fotográfica sobre a tela, confrontando o objeto real com o fotográfico. Um de seus temas principais foi o papel do museu na sociedade. Em 1968, em Bruxelas, transformou sua casa em um museu que chamou de Museu de Arte Moderna - Departamento das Águias - Seção Século XIX. Essa reflexão vai florescer na Documenta de Kassel de 1972, apresentada por Harald Szeeman, onde se encontravam, sob as formas mais diversas, os temas favoritos de Broodthaers: museus reais e imaginários dos séculos XIX e XX. A partir de 1968, experimentou uma nova técnica de impressão, recorrendo ao plástico. Concebeu cerca de sessenta placas em que os temas do museu, do objeto e da relação entre palavra e imagem estavam sempre presentes. Durante os últimos anos, definiu um novo conceito de instalação que chamou de Décor. A primeira exposição dessa série, realizada no Palais des Beaux-Arts, em Bruxelas, em 1974, chamou-se Catalogue, Catalogus. Nela, o artista integrava obras antigas a novas com uma incrível habilidade.
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Impassionate for literature, admirer of Mallarmé, Baudelaire and Edgar Allan Poe, he was also a poet and the writer of various books, among them, Minuit; Magie - art et politique; Un voyage en Mer du Nord. It was in 1964 that he made his first artistic movement, immortalizing in plaster fifty works of his co//ectanea of poems, Pense bête. Creator of enigmatic objects, he has incorporated ali available means: painting, sculpture, photography, cinema, poetry and day-by-day elements. His first works, based on realityand conceived, among other elements, with eggshe//s, mussels, and french fries, date back to 1964. During this time, he made use of the photographic emulsion process on canvas, confronting real object and photographic object. One of his major themes was museum's role in society. In 1968, in Brussels, he tumed his house into a museum which was named The Modem Art Museum - Eagles Department - 19th Century Section. This reflection will blossom in Kassel's Documenta dated 1972, introduced by Harald Szeeman, where, under various forms, Broodthaers' favorite themes were found: 19th and 20th centuries real and imaginary museums. From 1968 onwards, he experienced a new printing technique, when making use of plastic. Marcel conceived approximately sixty boards on which themes on museums, objects and relationships between word and image were always present. During the last years, he defined a new concept of insta//ation, which he ca//ed Dêeor. The first exhibition of this series, taken place in Palais des Beaux-Arts, in Brussels, 1974, was the Catalogue, Catalogus, where, ski//fully, the artist integrated old works into new ones.
Broodthaers sempre teve consciência de que sua arte estava destinada a mudar em função de acontecimentos sociais e artísticos. Dentro dessa visão, inaugurou uma série de exposições: Eloge du Sujet (Kunstmuseum, Basiléia), Invitation pour une Exposition Bourgeoise (Nationalgalerie, Berlim), lhe Privilege of Art e Décor - a Conquest by Marcel Broodthaers (Museu de Arte Moderna, Oxford) e Angelus de Daumier (salões do Hôtel des Rothschild, Paris), A Máscara, a Mulher e a Morte: Resistências Poéticas (Culturgest, Lisboa, 1994).
Evocar a obra de Marcel Broodthaers significa apelar ao secreto e ao misterioso e colocar-se diante de um enigma. Sua intensa ligação com os surrealistas durante a juventude, seu passado literário e boêmio conduzem à figura de um poeta romântico. Mas se seu trabalho começa como um jogo, num ato espetacular - a transformação de seus poemas em objeto artístico -, seu desenvolvimento posterior vai enfocar especialmente a "melancolia ácida" do homem moderno, resultado da fusão entre uma lucidez muitas vezes dolorosa e a crítica corrosiva do cotidiano. Em seu projeto artístico, as questões fundamentais da vida e da natureza da arte estão sempre no centro. Com seus objetos estranhos, com elementos heterogêneos que parecem sempre fora do lugar, ele critica os limites políticos, institucionais e sociais da produção artística, reduzida às leis da moda e do mercado e à reciclagem permanente dos "novos truques e combinações". A leitura da obra de Broodthaers é, portanto, um exercício exigente, uma pesquisa quase arqueológica, capaz de reconstruir e ordenar um conjunto fragmentado, disperso e, ao mesmo tempo, pleno de significados essenciais.
Broodthaers was always aware of the fact that his art's fate was to change according to social and artistic events. Based on this vision, Mareei initiated a series of exhibitions: Eloge du Sujet (Kunstmuseum, Basel), Invitation pour une Exposition Bourgeoise (Nationalgalerie, Ber/in), The Privilege of Art, and Décor - a Conquest by Mareei Broodthaers (The Modem Art Museum, Oxford), and Angelus de Daumier (at Hotel des Rothschild, Paris), A Máscara, a Mulher e a Morte: Resistências Poéticas, (Culturgest, Lisbon, 1994).
Evocating Mareei Broodthaers' work means to cal! for the secret and the mysterious and to put oneself facing an enigma. His strong relation with surrealists during youth, his literary and bohemian backgroung lead to the figure of a romantic poet. If, however, his work begins as a game, in a spectacular action - the transformation of his poems into artistic object - his later development wil! special!y focus on the "acid melancholy:' of modem man, result of the fusion between the frequently painful! lucidity and the dayby-day corrosive criticism. The major questions of lite and nature of art are the core of his artistic project. With his peculiar objects and heterogynous elements apparently out of place, he criticizes political, institutional and social limits of artistic production, reduced to fashion and market laws and to the permanent recycling of "new tricks and combinations". Reading Mareei Broodthaers' work is, therefore, a demanding exercise, an almost archaeological research, capable of rebuilding and arranging a fragmentized, dispersed set, and, at the same time, complete of essencial meanings.
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Académie I, 1968 placa de plástico em relevo/ plastic board in relief 86 x 120 cm Coleção Stedelijk Van Abbemuseum, Eindhoven, acervo do Ministério da Cultura, Bruxelas
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Académie 1/, 1968 placa de plástico em relevo/plastic board in relief 86 x 120 em Coleção Stedelijk Van Abbemuseum, Eindhoven, acervo do Ministério da Cultura, Bruxelas Foto: Divulgação
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Le sous-sol, 1970 placa de plástico em relevo/ plastic board in relief 121 x 83,5 cm Coleção Crédit Communal, Bruxelas
Cinéma-modete, 1970 placa de plástico em relevo! p/astic board in re/ief 85 x 120 cm Coleção particular
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La salle b/anche, 1975 madeira, fotografias, lâmpada, inscrições manuscritas, corda/wood, photographs, /amp, handwrítten inscriptions, rape 390 x 336 x 658 cm Coleção Maria Broodthaers
Marcel Broodthaers nasceu em Bruxelas, em 1924. Poeta, repórter fotográfico, guia de exposições, cineasta, começou sua carreira de artista plástico em 1963. Motivado pelos acontecimentos de maio de 1968 na França, participou da ocupação do Palais des BeauxArts de Bruxelas, onde organizou performances e exposições. Nos anos seguintes, morou em Düsseldorf, instalando-se em Londres a partir de 1973. Morreu em Colônia em 1976. Mareei Braodthaers was bom in Brussels, 1924. Poet, photograph reporter, exhibitions guide, film maker, he started his career as an artist in 1983. Moved by the events that took place in 1988 in Paris, he participated in the Palais des Beaux-Arts occupation in Brussels, where he had the opportunity to organize performances and exhibitions. In the following years, he lived in Düsseldorf moved to London in 1973 and finally died in Cologne in 1978. Exposições individuais/Solo exhibitions 1964 Gaterie Saint-Laurent, Bruxelas; Parc du Mont des Arts, Bruxelas. 1965 Galerie Aujourd'hui, Palais
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des Beaux-Arts, Bruxelas. 1966 Galerie J, Paris; Wide White Space Gallery; Antuérpia, Bélgica; Galerie Cogeime, Bruxelas. 1967 Palais des Beaux-Arts, Bruxelas. 1968 Le Corbeau et le Renard, Antuérpia. 1969 Broodthaers, Galerie Gerda Bassenge, Berlim. 1970 Museu de Arte Moderna, Departamento das Águias, Século XIX, Düsseldorf. 1971 Film ais Objekt - Objekt ais Film, Stãdtisches Museum, Mõmchenglabbach. 1972 Galerie Françoise Lambert, Milão; Museu de Arte Moderna, Departamento das Águias, Século 19, Documenta 5, Kassel. 1973 Retrospectiva, Arts & Project, Amsterdam. 1974 Catalogue-Catalogus, Palais des Beaux-Arts, Bruxelas. 1975 Décor - A Conquest by Marcel Broodthaers, Institute of Contemporary Arts, New Gallery, Londres. 1977 Marcel Broodthaers, Galerie John Gibson, Nova Vork. 1979 Galerie Barry Barker, Londres. 1981 Marcel Broodthaers, Museum Boymans van Beuningen, Rotterdam.
1983 Die Bücher und andere Arbeiten, Galerie Michael Werner, Colônia. 1986 Marcel Broodthaers, Selected Editions, Galerie John Gibson, Nova Vork. 1987 Marcel Broodthaers, Galerie & Edition Stahli, Zurique. 1989 Marcel Broodthaers, Museum of Contemporary Art, Los Angeles. 1991 Marcel Broodthaers - The Complete Prints, Galerie Michael Werner, Nova Vork. Exposições coletivas/ Graup exhibitions 1958 Festival do Filme Experimental, Bruxelas. 1964 Lauréats du Prix Jeune Sculpture Belge, Bruxelas. 1965 Pop Art, Nouveau Réalisme, etc., Palais des Beaux-Arts, Bruxelas. 1968 Documenta 4, Kassel. 1970 Information, Museum of Modern Art, Nova Vork. 1972 Documenta 5, Kassel. 1973 Prospect 73, Düsseldorf. 1976 Bienal de Veneza, Veneza. 1977 Europe in the Seventies: Aspects of Recent Art, Chicago. 1978 Bienal de Veneza, Veneza. 1982 Documenta 7, Kassel. 1986 Bienal de Veneza, Veneza; Forty Vears of Modern Art 1945-
1985, The Tate Gallery, Londres. 1988 Zeitlos, Berlim. 1989 rArt Conceptuel, Une Perspective, Paris. 1990 Marcel Broodthaers Marcel Duchamp - Dieter Roth, Barbara Gladstone Gallery, Nova Vork; Le Territoire de rArt, Leningrado; Présentation de la Collection Contemporaine du Musée - Acquisitions des Trois Dernieres Années, Centro Georges Pompidou, Paris. 1991 Iron by Vision, Tóquio. Obras apresentadas/Works in the exhibition Placas 45 placas de plástico em relevo/45 plastic boards in relief dimensões variáveis/variable dimensions La salle blanche, 1975 madeira, fotografias, lâmpada, inscrições manuscritas, corda/wood, photographs, lamp, handwritten inscriptions, rape 390 x 336 x 658 cm Coleção Maria Broodthaers Un jardin d'hiver, 1974 reconstituição em 1994 para a 22ª Bienal Internacional de São Paulo/ reassembled in 1994 for the 22ª Bienal Internacional de São Paulo
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CU~DO~ JA~ON HOlIZMAN
CU~AíO~ JA)ON HOUZMAN
CRIAÇÕES DO ÚLTIMO ATELIÊ DE PIET MONDRIAN: "TRABALHOS PARIETAIS"
PIET MONDRlAN'S LAST STUDIO CREATlONS: THE "WALL WORKS"
No princípio do outono de 19431, ao mudar-se para seu segundo e último ateliê em Nova Vork, Piet Mondrian começou a criar o ambiente que, com o passar dos anos, descobrira ser o mais condizente com seu modesto modo de vida e o mais estimulante para sua arte. As duas necessidades eram inseparáveis, refletindo o neoplasticismo que há 26 anos Mondrian começara a definir, aos 45 anos de idade. '
When Piet Mondrian moved into his second and last studio in New York in the early fali of 1943,1 he set about immediately creating the kind of enviroment he had leamed over the years which was both most congenial to his modest way of lite and most stimulating to his art. The two needs were basically inseparable, reflective of the Neo-Plasticism he had begun defining twenty-six years earlier, at the age of forty-five.
Mondrian se mudara duas vezes nos cinco anos anteriores, carregando consigo pouco mais do que um baú contendo seus poucos pertences. Em 1938, abandonara o seu ateliê em Paris, cidade então ameaçada pelos nazistas, indo para os arredores supostamente seguros de Londres. Em maio de 1940, após a . ocupação de Paris, ele solicitou um visto de imigração para os Estados Unidos e começou a despachar suas pinturas; seus documentos chegaram somente em outubro - logo após a casa de um vizinho ter sido destruída por uma bomba -, quando finalmente conseguiu cruzar o Atlântico. Mondrian foi recebido em Nova Vork por seu amigo, o jovem pintor Harry Holtzman, instalando-se em um quartinho barato e um tanto apertado perto da Primeira Avenida, onde ficou três anos. Ao final desse período, já completamente adaptado, continuou a cultivar hábitos espartanos na companhia de amigos mais despreocupados, dentre os quais vários outros artistas refugiados, cedendo de vez em quando a uma paixão, a dança ao som do jazz. Com mais de setenta anos de idade sentia-se mais feliz do que jamais fora; Nova Vork, o arquétipo da cidade moderna, com que sonhara durante décadas, era agora sua casa. O novo estúdio, na rua 59, situava-se no centro geográfico e espiritual não apenas da cidade, mas também, durante a guerra, do mundo da arte contemporânea internacional. Mondrian arrumou seu ateliê com apuro neoplástico. Todas as graças sedutoras da natureza foram eliminadas, na forma, nas linhas e nas cores. As curvas eram tabu, assim como as diagonais.
He had moved already twice in the previous five years, carrying little more than a trunkful of possessions. First, in 1938, he had left his studio in Nazithreatened Paris for "safe" suburban London. Following the occupation of Paris in May 1940, he had applied for entry into the Un(tes States and begun shipping his paintings,' his papers had not come through until September, however, and it was not until October - soon after a neighbor's house was flattened by a bomb - that he had finally crossed the Atlantic. In New York he was met by his young painter friend and sponsor, Harry Holtzman, and installed in an affordable and somewhat cramped niche off First Avenue, in which he spent the next three years. By the end of that time, he was thoroughlyacclimated, quietly pursuing long-held Spartan habits while enjoying the company of more easygoing friends - among whom were a considerable number of other emigré artists - and indulging occasionally in a passion for dancing to jazz. At seventy-plus, he was happier than he had been anywere else; New York, the archetypical modem city he had yeamed for decades, was his home. The new studio, at 15 East 59th Street, was at the geographic and spiritual center of the city's - and, during the war years, the intemational contemporaryart world. It offered just the space he wanted, and he organized it with Neo-Plastic zeal. Ali the seductive graces manitest in Nature were to be eliminated in form, line and colar. Curves were
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Último ateliê de Mondrian em Nova York/
Last Mondrian's studio in New York Foto Galerie Tokoro, Táquio
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As cores naturais compostas presentes em sua infância e em sua juventude como pintor na Holanda foram abolidas: o marrom e o verde (sobretudo os tons de verde!) das árvores e das pastagens, as tonalidades púrpura, rosa e laranja do pôr-do-sol tingindo as dunas, o colorido das flores em telas que pintara por muitos anos quando premido por necessidades financeiras. (Caso sentisse falta da natureza - e não sentia - ela estava apenas a meia quadra, no Central Park.) Tudo o que se permitiria agora eram as cores primárias mais . puras e suas cores opostas, o preto, o cinza e o branco; o uso exclusivo de linhas retas, verticais e horizontais, em equilíbrio dinâmico, era essencial. Mondrian concluíra após anos de experimentação que somente a partir da pureza plástica ele estaria apto a levar para a tela as manifestações mais claras possíveis de sua visão criativa. Deixando de lado telas inacabadas e idéias em gestação, ele começou a projetar e a executar as peças que comporiam o seu estúdio. Usando caixotes de maçã e laranja, construiu móveis, fazendo-lhes modificações sutis, porém críticas, e pintando-os uniformemente de branco. Pintou de vermelho-vivo o tampo redondo de uma banqueta de metal branco e revestiu sua rádio-vitrola com papelão do mesmo tom - marcando com cores os ritmos de seus discos de jazz preferidos. Pregou com tachinhas retângulos de papelão pintado nas paredes muito brancas, mudando-os de lugar ao sabor da sua inspiração, o que alterava de pronto a dinâmica das relações de cor e espaço. As visitas descobriam, quase sempre surpresas, que essas composições nas parede eram ao mesmo tempo, paradoxalmente, repousantes e estimulantes. Desde 1919, quando residia em Paris, ele pregava cartões de cores vivas e neutras nas paredes de todos os ateliês que ocupava. Naquela época, no entanto, eles eram do tamanho de suas telas ou até maiores - destaques isolados em lugares estratégicos, ou camuflagens para falhas na arquitetura. Nesse último estúdio, poucos cartões tinham mais de trinta centímetros de comprimento ou de largura. Dessa vez, ele colocou os quadrados e retângulos em molduras invisíveis, reminescências de suas pinturas de 1917, cujos componentes interligavam-se em tenso equilíbrio. Livres para serem deslocados à vontade, eles se transformaram em exercício para sua visão criativa, um campo de testes para o equilíbrio dinâmico, meta constantemente perseguida e alcançada nas suas telas com efeito extraordinário. É dificil saber o que Mondrian viria a fazer no ambiente sereno/cinético de seu último estúdio após produzir suas pinturas revolucionárias, Boogie-woogie, se ele não tivesse sucumbido a uma pneumonia, um ano antes da descoberta da penicilina, em 1º de fevereiro de 1944. A redução ao essencial feita por Mondrian da parafernália da vida cotidiana (o essencial incluía discos de jazz e cigarros, mas eliminava móveis estofados e todos QS livros, exceto três tratados teosóficos antigos) decorria, sem dúvida, da redução ao essencial de seus meios de expressão na cor e na forma: suas teorias neoplásticas invadindo a vida e vice-versa, pois, para ele, elas eram indivisíveis. As teorias (segundo Mondrian) eram na verdade as consequências e não as preliminares da experiência direta, o resultado de composiões concebidas intuitivamente. Mondrian começou a escrever sobre os princípios do neoplasticismo em 1917 no jornal de vanguarda holandês De 5tijl, do qual foi um dos fundadores. Seus textos densos, alternando-se entre a paixão e a frieza, quase sempre cheios de circunlóquios, raramente equiparamse à brilhante clareza de suas pinturas.
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taboo. 50 were diagonaIs. Ruled out were the composite natural colors of his provincial childhood and youthful years as a painter in Holland: the browns and greens (especially the greensl) of trees and pastures, the purples, pinks and oranges of sunset seas washing across expansive dunes, the flower colors in paintings he produced for years beyond his interest when the need for money was exigent. (If he had a thirst for Nature - which he didn't - it was onlya half-block away, in Central Park). Ali that would be permitted here were the purest primary colors and their counterbalancing opposites, black, gray and white; strict adherence to straight lines, vertical and horizontal, in dynamic equilibrium, was essential. He had found through years of experimentation that only under these conditions of plastic purity was he able not only to bring to canvas the c1earest possible manitestations of his creative vision but also to live peacefully 5etting aside half-finished canvases and gestating ideas, he applied himself to designing and fashioning the studio's components. For the better part of three months, he constructed furniture from apple and orange crates, reconfiguring them with subtle but criticaI alterations, and painting them unitormly white. He glossed the round top of a white metal stool with boldest primary red, and sheathed his radio-phonograph in cardboard of the same bright hue - punctuating in color the rhythms of his favorite and welltravelled jazz records. Meanwhile, he tacked rectangles of painted card board to the off-white walls with tiny brads, occasional/y moving one here and another there as inspiration struck, instantly changing the dynamics of relationships in color and space. Visitors would find, often to their astonishment, that these wall compositions were simultaneously and paradoxical/y both restful and stimulating. He had disposed brightly colored and neutral placards on the walls of every studio since taking up resirience in Paris for the second time, in 1919. In those ear/y years, however, the cutouts were often individual/y the size of his canvases, or even larger - single accents in strategic places, or camouflage for architectural flaws. In this last studio, few exceeded a foot in length or width and most were smaller. Here he arranged the squares and rectangles in clusters within invisible but implied frames, reminiscent of paintings done in 7977. The components held together in a tense balance. Free to be shitted at will, they became exercises for his creative vision, a testing-ground for the dynamic equilibrium that was always his aim and that, time and again and with stunning effect, he achieved in his canvases. One can only wonder what in the kineticjserene surroundings of his last studio, might have followed his recent revolutionary Boogie-woogie paintings had he not - a year before the discovery of penicillin - succumbed to pneumonia on February 7st, 7944. Mondrian's reduction to essentials of the paraphernalia of daily living (essentials that included jazz records and cigarettes but banished upholstered furniture and ali books except three ear/y theosophical treatises) doubtless owed much to the reduction to essentials of his means of expression, in color and form: his Neo-plastic theories spilling over into lite, and vice-versa, for to him they were indivisible. The theories in fact (as he explained repeatedly) were the outgrowth, and not the precursors, of direct experience, the product of intuitively realized compositions. Writing about the principies of Neo-Plasticism - which he had begun to describe in 7977, in the pages of the avant-garde Dutch periodical De Stijl, of which he was a founder - would occupy a large portion of his lite; he would continue to trace the evolution of theory in tandem with the evolution of his works to the end of his days. Dense, alternately passionate and cool, often circumlocutory, his writings seldom match the brilliant hard-edged clarity of his paintings, but theyare crucial guides to his unique power to engage and move his audience. Friends and scholars have devoted decades to unfolding the fabric of
Amigos e acadêmicos analisaram a vida de Mondrian através do exame de seus eséritos e de suas criações gráficas. O estudo dessas análises e o retorno às suas fontes - as manifestações de Mondrian nas duas linguagens - revelam facetas inesperadas. Para exemplificá-Ias, citamos a seguir algumas memórias e impressões de Mondrian sobre os dois ateliês que remodelou - o estúdio em Paris, na rue du Départ 26, onde viveu de 1921 a 1936, e o outro em Manhattan, na rua 59. (Harry Holtzman é muito citado, devido ao seu papel central na vida de Mondrian e ao fato de ter preservado as últimas criações do artista, os Trabalhos parietais.)2 Segue-se também uma breve apresentação de alguns dos elementos da doutrina do neoplasticismo de Mondrian. As notas e uma curta bibliografia apresentadas são meros indicadores que visam uma melhor compreensão desse artista e pensador sem paralelo no século XX.
Mondrian's lite and examining both his writings and his graphic creations. To study their findings - and to return to the source, Mondrian's own expressions in both media - brings rewards barely hinted at in the foregoing sketch of only one facet of his richness. To flesh out the picture, a few first-hand memories and impressions of the two studios most congenially transformed by him - the Paris studios at 26, rue de Départ, in which he lived from 1921 to 1936, and his last, on Manhattan's 59th Street - follow below, with some of Mondrian's own comments as well. (Harry Holtzman is quoted at length, thanks to his pivotal role in Mondrian's lite, and to his rescuing the artist's final creations, the Wall works. 2) It is also included a brief presenta tion of some of the elements in Mondrian's doctrine of Neo-Plasticism. Notes and an abbreviated bibliography are mere pointers toward a more comprehensive understanding of this uniquely Twentieth Century artist and thinker. Sue Davidson Lowe
Sue Davidson Lowe
ABOUT THE STUDIOS: MONDRIAN COMMENTS SOBRE OS ESTÚDIOS: COMENTÁRIOS DE MONDRIAN [Com relação ao estúdio anterior ao da rue du Départ] .. Já que não posso pintar diretamente sobre a parede, preguei nela cartões pintados. Percebi então com clareza que na verdade é possível para a Nova Plástica apresentar-se dessa forma. Naturalmente, tive que pintar também a mobília. Não me importo com o esforço, uma vez que isso tem um bom efeito sobre o meu trabalho."3 "Muitos pintores (... ) gostam de ter ao seu redor pinturas e móveis antigos, tapetes etc (... ) Acredito que se atrasa o desenvolvimento de um novo conceito de beleza, se o artista transformar sua casa ou ateliê em museu de arte antiga, criando uma atmosfera incompatível com o novo e apegada ao velho. Este estúdio expressa algo da idéia da Nova Plástica."4 "Creio que a pintura pode se tornar muito mais real, muito menos subjetiva, muito mais objetiva, quando suas possibilidades são concretizadas na arquitetura de tal maneira que as aptidões do artista estejam ligadas às da construção (... ) Estudei o problema e exercitei essa prática com planos removíveis, coloridos e sem cor, em vários de meus ateliês na Europa, exatamente como fiz aqui em Nova Vork [referindo-se ao estúdio da rua 59]."5
[Concerning the studio previous to rue de Départ] "Since I can't paint directly on the wall, I have merely placed painted cards on it. But I have come to see clearly that it is indeed possible for the New Plastic to appear in a roam in this way. Of cause I had to paint the furniture as well. I don't mind theeffort, since it has a good effect on my work. "3 "Most painters (. ..) like to surround themselves with antique furniture, old paintings, carpets, and so on (. ..) I think it retards the development of a new concept of beauty it the artist turns his studio ar house into a kind of museum of ancient art - [creating] an atmosphere that is unsuited to the new and clings to the old (...) This studio expresses something of the idea of the New Plastic. "4 "1 feel that painting can be made much more real, much less subjective, much more objective, when this possibilities are realized in architecture in such way that the painter's capabilities are joined with constructive ones (...) I have studied the problem and practiced the approach with removable colar and non-color planes in several of my studios in Europe, just as I have dane here in New York [referring to the 59th Street studio]. "5 [Jokingly, to Harry Holtzman, concerning a guest who deplored the absence of upholstered chairs]: "If it is toa confortable [herel people will stay toa long! When I want to rest, Ilie down on my bed."6
[Brincando com Harry Holtzman, referindo-se a um hóspede que reclamou da ausência de cadeiras estofadas]: "Se (aqui) for muito confortável, as pessoas ficarão muito tempo! Quando quero descansar, deito-me na minha cama."6
OTHERS REMINISCES ABOUT THE STUDIOS. .. OUTRAS RECORDAÇÕES DOS ESTÚDIOS "Alexander Calder falou do efeito que o estúdio de Paris teve sobre ele como fonte de inspiração para seus móbiles. William de Kooning, que viu apenas o último estúdio em Nova Vork, disse-me que era 'como passear dentro de uma das pinturas de Mondrian'."7
"Alexander Calder spoke of the effect the Paris studio had on him as a source of inspiration for his mobiles. Wi//iam de Kooning, who saw only the last studio in New York, said to me that it was 'Iike walking around inside one of Mondrian's paintings'. "7 After visiting Mondrian, painter Ben Nicholson wrote of the "astonishing
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Depois de visitar Mondrian, o pintor Ben Nicholson escreveu sobre "a admirável sensação de quietude e repouso (!)" que não o deixava mesmo quando estava sentado a uma mesa de calçada na movimentada Gare de Montparnasse, lia sensação de luminosidade em sua sala (.. ,) as pausas e silêncios enquanto ele falava e depois (... ) algo como os eremitérios procurados pelos leões para que lhes fossem tirados espinhos das patas."s Amigo íntimo em Paris e primeiro cronista de Mondrian, o escritor e editor Michel Seuphor disse a respeito do quarto da rua 59: A sobriedade e pureza de linhas conferiam ao quarto uma maravilhosa elegância. Ousados quadrados de papelão pintado produziam um vivo pizzicato com as três cores primárias"g sobre as paredes. Michel Seuphor recordava os comentários de Mondrian a respeito dos papéis, lençóis e roupas sujas jogadas no armário do estúdio de Paris: "essas coisas oprimem muito a gente (... ) elas tomam muito espaço, ameaçam atravancar a mente, e ela que não deve ser afastada de sua única necessidade, a arte, o novo trabalho a ser criado."1o li
Herbert Henkels, eminente estudioso de Mondrian, cita o amigo nova-iorquino do artista, o marchand Sidney Janis (um grande colecionador da obra de Mondrian): "O ateliê de Mondrian revelava a heróica abnegação de um monge. E, no entanto, devido às grandes áreas de paredes brancas iluminadas aqui e ali por pedaços de papelão, o estúdio era tão alegre quanto o mundo das crianças (... ) Um cavalete (... ) parecendo um altar, solitário no fundo do cômodo despojado. Parecia um altar, sobretudo à noite, quando as luzes caíam sobre ele (... ) Os pedaços retangulares de cartão (... ) eram peças de um jogo estético-geométrico que lhe servia como experimentação do equilíbrio em que as relações eram continuadamente estudadas."11 Henkels refere-se aos "surpreendentes" contrastes entre esse estúdio e os anteriores. Suas "composições cuidadosas de retângulos coloridos, cujos tamanhos diferem consideravelmente (... ) [suas] montagens [construções] esmeradas (... ) harmonizando com o restante da composição." Janis relatou que Mondrian sempre se referia a seus móveis feitos à mão dizendo que: "São como minhas pinturas""2 De maneira convincente, Henkels conjetura um "diálogo intenso e perpétuo" entre os peripatéticos recortes de parede e Victory boogie-woogie, a tela que Mondrian estava terminando no mês anterior a sua morte. Coube a Harry Holtzman a tarefa de relatar a passagem dos "trabalhos na parede" para os Trabalhos parietais. "Antes de desmontar o ateliê [após a morte de Mondrian], abri-o para o público durante seis semanas", escreveu. "Com a ajuda de Fritz 'Glarner [pintor suíço e amigo íntimo de Mondrian] fotografamos o estúdio e também fiz um filme em cores de 16 mm. Observamos então cuidadosamente as composições feitas nas paredes do estúdio (... )
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feeling of quiet and repose (I)" that lingered even as he sat at a sidewalk table of the frenzied Gare Montparnasse, "the feeling of light in his roam (...) the pauses and silences during and after he'd been talking (. ..) not unlike the feeling in one of those hermits' caves where lions used to go to have thorns taken out of their paws. "8 His close friend in Paris and first chronicler, the writer/ editor Michel Seuphor, said of the bedroom at 59th Street, "The sobriety and purity of line gave the roam a wonderful elegance. The same squares of painted cardboard as in the studio played a lively pizzicato of the three primary colors"g on the wa//s. Df the few papers kept with linens and laundry in the closet of the Paris studio, he reca//ed Mondrian's saying that "these things easily overwhelm you... they take up toa much space and threaten to clutter up the mind, which should not be distracted from its single need art, the new work to be created. "lO The eminent Mondrian scholar Herbert Henkels quotes Mondrian's New York ' friend, ga//ery owner Sidney Janis (also a major co//ector of his work):"Mondrian's studio attested to the heroic abnegation of a monk. And yet, because of the large areas of white wa//s upon which were placed bright spots of cardboard it was as gay as a child's world (...) An easel (...) stood like and altar, alone at the end of the almost barren roam. It was a specia//yaltarlike at night, when the flood-lights on either side were focused on it (...) The rectangular pieces of cardboard (...) were parts of a geometric-aesthetic game which served him as an experiment in equilibrium, in which relatioships were being continua//y studied. "11 Henkels himself refers to the "striking" contrasts between this studio and its precedents. Its "carefu//y composed assemblies of coloured rectangles whose sizes differ considerably. .. [its) painstakingly put together [constructions}... harmonizing with the rest of the arrangement. " Janis reported that Mondrian often said of his hand-built furnishings, "They are like my paintings. "12 Henkels convincingly infers a "perpetuai, intense dialogue" between the peripatetic wa// cutouts and Victory boogie-woogie, the canvas Mondrian was laboring to finish in the month before his death. It remains to Harry Holtzman to chronicle the transferral of "works on the wa//" to the Wall works. "Before dismantling the studio [after Mondrian's deathl I opened it to the public for six weeks", he wrote. "With Fritz Glarner's help [Glarner, a Swiss painter and photographer, was another close friend of Mondrianl we photo-documented the studio, and I also made a 16 mm colar film. We then carefu//y traced the studio wa// compositions (...) The original
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Os cartões coloridos originais foram cuidadosamente preservados e, em 1982, remontei essas composições sobre oito painéis de compensado (... ) tratados com verniz para isolar a acidez da madeira. Apliquei acrílico liquitex branco com um rolo para simular a textura da parede original. Delimitei o espaço para dispor cada uma das composições, espalhando-as sobre marcas no amplo assoalho do meu ateliê. Minhas decisões basearam-se na complexa estrutura plástica assimétrica, a fim de aproveitar ao máximo o ritmo e o equilíbrio de cada peça (... ) Em minhas freqüentes visitas a Piet, eu tinha observado a evolução das composições de parede (... ) Incontáveis buracos de prego no gesso indicavam as muitas mudanças de tamanho, lugar e cor até que Mondrian percebesse a escala que iria estabelecer, [mas] (... ) era evidente que desde o início Mondrian tinha calculado intuitivamente toda a composição da parede." Holtzman recusava a falsa idéia de que o modo de vida de Mondrian indicava um recolhimento monástico. "Mondrian não teve muita oportunidade de se tornar um recluso, mesmo se o quisesse (... ) e ele não quis", escreveu, acrescentando que "um pouco antes de sua morte, discutíamos um plano para projetarmos juntos uma casa noturna"} 3 Até sua própria morte em setembro de 1987, Holtzman freqüentemente descrevia a amigos suas muitas visitas junto com Mondrian aos clubes noturnos mais badalados de Nova Vork, onde dançavam ao som do "autêntico" jazz.
colored cards were carefully preserved, and in 1982 I remounted the compositions on eight plywood panels under lucite (...) primed with alcoholenamelac to isolate the acidity of the wood. Dff white, liquitex acrylic was applied with a roller to simulate the texture of the original wall. I determined the delimitation of the surrounding space for framing each composition by spreading them over the tracings on my large studio floor. My decisions were based upon the complex asymmetrical plastic structure, to maximize the rhythm and equilibrium of each unit (...) In my frequent visits with Piet, I have observed the evolution of the wall compositions from the very beginning (...) Myriad nail-holes in the plaster indicate[d] the many changes in size, position, and color until Mondrian realized the scale he was to estabilish, [but] (. ..) it was evident from the begining that Mondrian had intuitively anticipated the total wall composition. Holtzman refuted the common misperception that Mondrian's way of lite indicated a monastic withdrawal. "Mondrian had very little opportunity to become a recluse, even it he had wanted to (...) which he didn '(', he wrote, adding, "Just before he died, we were discussing a plan to design a nightclub together. " 13 Until his own death in September 1987, Holtzman often regaled friends with descriptions of his many excursions with Mondrian to New York's hottest night-c!ubs where each could dance to "authentic" jazz.
TRECHOS DE "REALIDADE NATURAL E REALIDADE ABSTRATA" DE MONDRIAN (publicados em série nas edições do primeiro ano do De Stijl, 1919-20)
EXCERPTS FRDM MDNDRIAN'S "NATURAL REA LI TY AND ABSTRACT REALI TY" (published serially in the first year's issues ofDe Stijl, 1919 to 1920)
"Acredito que a contemplação, a visão plástica, tem grande importância para o homem. Quanto mais a contemplação rigorosa nos conduz a uma visão consciente do imutável e do universal, mais o mutável, o individual e o humano, as trivialidades que nos habitam e nos circundam, nos parecem fúteis."
"My view is that contemplation, plastic vision, has great importance for mano The c!oser contemplation brings us to a conscious vision of the unchangeable and the universal, the more the changeable, the individual, and human, pettiness'in us and around us will se em futile to uso
"O homem pode atingir através da contemplação estético-abstrata uma unidade consciente com o universo (... ) O principal objetivo da pintura sempre foi dar existência concreta, através das cores e das linhas, a esse universal que surge na contemplação. A nova pintura, que está rompendo com a aparência natural e é caracterizada por uma representação mais claramente ~efinida do universal, deveria ser vista como uma manifestação do espírito de nossa época."14 "A visão plástica pura deve formar uma nova sociedade exatamente como está criando na arte uma nova plasticidade. Será uma sociedade baseada na equação do material e do espiritual, uma sociedade composta de relações equilibradas."15
"Man is enabled by means of abstract-aesthetic contemplation to achieve conscious unity with the universe (...) The deepest purpose of painting has always been to give concrete existence, through color and line, to this universal which appears in contemplation. The new painting, which is breaking away from the natural appearance and is characterized by a more c!ear/y defined representation of the universal, should be seen ,as a manitestation of the spirit of your age. " 14 "The pure plastic vision should set up a new society just as in art it sets forth a new plasticism. This will be a society based on the equation of the material and the spiritual, a society composed of balanced relationships. " 15
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"A relação [plástica] não está no tamanho das linhas e dos planos, mas na posição das linhas e dos planos em relação aos outros. A instância mais perfeita é o ângulo reto, o qual expressa a relação entre dois extremos (... ) Essa inter-relação equilibrada de diferentes posições [a oposição de linha e planos por meio do ângulo reto] (... ) expressa plasticamente o repouso."16
"The [plastic] relation lies not in the size of lines and planes, but in the position of lines and planes with respect to each other. The most perfect instance is the right angle, which expresses the relation between two extremes (. ..) This balanced interrelation of different positions (the opposition of line and plane by means of the right angle) (...) expresses repose plastical/y. "16
"[Extirpar completamente] o fator individual (... ) é impossível na arte. A plasticidade exata do universal é inconcebível sem a plasticidade do equilíbrio puro, e o equilíbrio puro é inconcebível sem a dualidade. Pois é a dualidade que expressa a relação (... ) A plasticidade exata do universal não é a representação de um dos dois termos; é a relação equilibrada entre os dois."17
"[To completely excise] the individual factor (...) is impossible in art. The precise plasticism of the universal is inconceivable without the plasticism of pure equilibrium, and pure equilibrium is inconceivable without duality. For it is the duality which expresses the relation (...) The precise plasticism of the universal is not the representation of one of the two terms; it is the balanced relation between the two. "17
TRECHOS DE "RUMO À VISÃO VERDADEIRA DA REALIDADE", DE MONDRIAN (Primavera de 1941)
EXCERPTS FROM MONDRlAN'S "TOWARD THE TRUE VISION DF REALI TY" (Spring 7947)
"Em meus primeiros quadros o espaço ainda era apenas um fundo. Comecei a determinar formas: linhas verticais e horizontais tornaram-se retângulos. Estes ainda apareciam como formas soltas contra um fundo; suas cores ainda eram impuras. "Ao sentir a falta de unidade, eu juntei os retângulos: o espaço tornou-se branco, preto ou cinza; a forma tornou-se vermelha, azulou amarela. Unir os retângulos significava ampliar as verticais e horizontais da fase anterior para a composição inteira. (... ) A seguir, a fim de suprimir a manifestação de planos enquanto retângulos, reduzi a cor e acentuei as linhas delimitantes, cruzando-as umas sobre as outras. Dessa forma, os planos não foram apenas cortados e suprimidos, mas também suas relações tornaram-se mais ativas. O resultado foi uma expressão muito mais dinâmica."18
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"In my ear/y pictures, space was still a background. I began to determine forms: verticaIs and horizontaIs became rectangles. They still appeared as detached forms against a background· their color was still impure. "Feeling the lack of unity, I brought the rectangles together: space became white, black or grey; form became red, blue or yellow Uniting the rectangles was equivalent to continuing the verticaIs and horizontaIs of the former period over the entire composition (...) Later, in order to abolish the manifestation of planes as rectangles, I reduced my color and accentuated the limiting lines, crossing them one over the other. Thus the planes were not only cut and abolishAd, but their relationships became more active. The result was a far more dynamic expression. "18
TRECHOS DA CARTA DE MONDRIAN A JAMES JOHNSON SWEENEV, Museum of Modern Art, 1943.
EXCERPTS FROM MONDRIAN'S LETTER TO JAMES JOHNSON SWEENEY, Museum of Modem Art, 7943.
[Em Nova Vork, em 1943, Mondrian revisou alguns de seus antigos princípios neoplásticos, concluindo que o elemento dinâmico em seu tr!lbalho deveria ter precedência sobre o estático.] "E importante [escreveu ele a Sweeney] discernir dois tipos de equilíbrio: 1. Harmonia estática. 2. Equilíbrio dinâmico (... )
[In New York in 7943, Mondrian revised some of his earlier Neo-plastic guidelines, having concluded that the dynamic elementin his work should take precedence over the static.} "It is important lhe wrote Sweeney] to discem two sorts of equilibrium: 7. static balance. 2. Dynamic equilibrium (...) Static equilibrium [balance] of
o equilíbrio [harmonia] estático é obviamente necessário para a existência no tempo. No entanto, a vitalidade na sucessão contínua do tempo sempre destrói essa harmonia. A arte abstrata é uma expressão concreta dessa vitalidade."19 Sue Davidson Lowe NOTAS 1. A data exata da mudança de Mondrian é imprecisa, podendo ter ocorrido no princípio ou no final de setembro ou no dia 1º de outubro; o contrato de aluguel do ateliê foi de três, quatro ou cinco meses, segundo diferentes informações. 2. A amizade entre Mondrian e Holtzman começou quando este, aos 22 anos, resolveu ir a Paris com o único propósito de conhecer o artista, então com 62 anos de idade. Em agradecimento à generosa hospitalidade que Holtzman lhe ofereceu em Nova Vork, Mondrian designou-o seu testamenteiro e herdeiro muitos anos antes de morrer. Artista amador e professor de arte por mais de quarenta anos, Holtzman promoveu com muito empenho exposições e publicações dos trabalhos de Mondrian até a sua própria morte, em 1987. Os Trabalhos parietais 1943-1944 foram primeiramente expostos no Museum of Modern Art em 1983, mas só seis anos após a morte de Holtzman foram exibidos em uma cópia fiel do último estúdio de Mondrian em Nova Vork, recriado admiravelmente na Galerie Tokoro de Tóquio, com projeto arquitetônico concebido por Jason, filho de Holtzman. O espaço maior para exposição da Bienal de São Paulo permitiu que ele apresentasse uma réplica ainda mais precisa. 3. Carta de Piet Mondrian de 4 de dezembro de 1919 enviada a Theo van Doesburg (co-fundador em 1917, com Piet Mondrian,da publicação De Stij/), conforme citação em The new art, the new life: the collected writings of Piet Mondrian, p. 83, de Harry Holtzman e Martin S. James. 4. Artigo de Piet Mondrian em De Stijl nº. 3 de 1920: "Natural reality and abstract reality" (A realidade natural e a realidade abstrata), conforme citação em Holtzman e James, op. cit., pág. 109. (Versões bastante divergentes destes e de outros trabalhos de PM podem ser encontradas em Holtzman e James e em Piet Mondrian: fife and work, de Michel Seuphor. Mencionei em citações subseqüentes, vários trechos de Seuphor, pois eles tendem a ser mais fluentes do que as traduções de Holtzman e James, mais literais. N. da autora.) 5. Entrevista de Piet Mondrian com James Johnson Sweeney, em Herbert Henkels, em Mondrian, from figuration to abstraction (Da figuração à abstração), p. 186, extraida da tese de Nancy J. Toy, Vale University, 1979. 6. Holtzman e James, op. cit., p. 5. 7.lbid., p. 4. 8. John Summerson, Ben Nicholson, em Seuphor, op. cit., p. 171. 9. Seuphor, op. cit., p. 182. 10.lbid., p. 57. 11. Sidney Janis, em Herbert Henkels, There is too much old in the new(Há muita coisa velha no novo), do catálogo da Galerie Tokoro, Tóquio, Mondrian in New York, 1993, p. 38. 12. Ibid., pp. 38-9. 13. Harry Holtzman, Piet Mondrian: The wall works (Os trabalhos parietais), 1943-1944, catálogo, Carpenter & Hochman, Nova VorkfDallas, 1984-1985, republicado no catálogo da Galerie Tokoro, op. cit., pp. 65-6. 14. Piet Mondrian em Seuphor, op. cit., p. 311. (Pontuação alterada po.r motivos de clareza.) 15.lbid., p. 322. 16.lbid., p. 304. 17. Ibid., pp. 340-41. 18. PM, Toward the True Vision of Reafity (Rumo à Visão. Verdadeira da Realidade), catálo.go, Valentine Gallery, janeiro./fevereiro. de 1942, de Holtzman e James, op. cit., p. 339. 19. Ibid., p. 357, das cartas publicadas po.r Sweeney para o "Bulltin of the Museum of Modem Art(13, nos. 4-5, 1946)."
course is necessary to existence in time. But vitality in the countinual succession of time always destroys this balance. Abstract art is a concret expression of this vitality. "19 Sue Davidson Lowe NOTES ,. The exact date of Mondrian's move is unclear, having been given variouslyas early and late September and even precisely as October 1st; his tenancy of the studio has been described in several texts as three, four and five months. 2.Holtzman's friendship with Mondrian began when, at twenty-two, he made his way to Paris solely to meet the sixty-two-year-old artist. Mondrian's gratitude for his hospitable generosity in New York led him to name Holtzman his executor and heir several years before his death and - until he himself died in 1987, Holtzman (a practitioner and university teacher of art for we// over forty years) vigorously promoted exhibitions and publications of Mondrian's works. The Wall Works, 1943-44 were exhibited first at the Museum of the Modem Art in 1983, but it was not until six years after Holtzman's death that these works were shown in a near-facsimile of the last New York studio, stunningly recreated at the Galerie Tokoro in Tokio from plans designed by Holtzman's architect son, Jason. The more amply configured exhibition space of the São Paulo Bienal has enabled him to present an even more precise replica. 3.Piet Mondrian letter, 4 December, 1919, to Theo Van Doesburg (co-founder in 1917, with Piet Mondrian, ofDe Stijl), as quoted in Harry Holtzman and Martin S. James, The new art - the new life: The collected writings of Piet Mondrian, p. 83. 4.Piet Mondrian's article in De Stijl, /li, 1920: "Natural reality and abstract reality" as quoted in Holtzman and James, op. cit., p. 109. [Widely divergent renditions of this work and others by Piet Mondrian appear in Holtzman and James and in Michel Seuphor's Piet Mondrian: life and work. In subsequent quotations, I have cited, where indicated, several from Seuphor, whose edited renderings tend to be more fluently readable than Holtzman and James's more literal translations.] 5. Piet Mondrian interview with James Johnson Sweeney, as cited by Herbert Henkels, Mondrian, from figuration to abstraction, p. 186, from Nancy J. Troy dissertation, Yale University, 1979. 6. Holtzman and James, op. cit., p.5. 7. ibid., p.4. 8.John Summerson, Ben Nicholson, as quoted by Seuphor, op. cit., p.171. 9. Seuphor, op. cit., p.182. 10.ibid, p.57. ".Sidney Janis, as quoted in Herbert Henkels, "There is toa much old in the new, " from the catalogue of exhibition Galerie Tokoro, Mondrian in New York, 1993, p.38. 12.lbid., pp. 38-9. 13. Harry Holtzman, catalogue of the exhibition Piet Mondrian: The Wall Works, 1943-1944, Carpenter & Hochman, New York/Da//as, 1984-85, n.p., reprinted in Galerie Tokoro catalogue, op. cit., pp. 65-6. 14.Piet Mondrian in Seuphor, op. cit., p.3". [Punctuation altered for c!arity.] 15.lbid., p.322. 16:lbid., p.304. 17.lbid., pp. 340-41. 18.Piet Mondrian, Toward the true Vision of Reality, catalogue, Valentine Ga//ery, January/February 1942, from Holtzman and James, op. cit., p.339. 19.1bid., p.357, from letters edited by Sweeney for Bulletin of the Museum of Modern Art (13, nos. 4-5 [1946]).
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1872 - Nasce em Amersfoort, na Holanda, em 7 de março, primeiro filho dos Mondriaan. Como o pai, é chamado Pieter Cornelis, mas é conhecido como Piet Modriaan e, depois de mudar para a França, Piet Mondrian. 1892-97 - Recebe autorização para ensinar desenho para nível secundário. Muda-se para Amsterdam e inicia dois anos de estudo em tempo integral na Rijksacademie. 1900 - Nessa época começa a interessar-se por teosofia. 1901 - Concentra seu trabalho em paisagens, trabalhando com freqüência às margens do rio Gein, nos arredores de Amsterdam. 1906 - Período das Paisagens Noturnas, 1906-1907: cenas de crepúsculo ou começo de noite, em expressiva representação de luz, espaço e cor. Detalhes são agrupados em grandes massas, uma tendência já perceptível nos trabalhos de Mondrian desde 1900. 1908 - A fase modernista (19081911): pinturas luministas (i.e., late Divisionist) de Sluyters e Jan Toorop na exposição em Saint Lucas, Amsterdam, marcam o surgimento do modernismo na Holanda. Continua a pintar em Oele. 1909 - Exposição coletiva com Sluyters e o mais conservador Cornelis Spoor no Museu Stedelijk, Amsterdam (janeiro); o trabalho modernista ou luminista de Mondrian em 1908 coloca-o entre os artistas holandeses mais controversos. 1911 - Adota o método de empregar planos angulares. 1912 - Fixa residência em Paris (11 de maio), a princípio na avenue du Maine nº 33, e depois no nº 26 da rue du Départ, perto da Gare Montparnasse. Na França, começa a escrever seu nome com apenas um "a". A fase cubista (1912-1914):
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figuração progressivamente dissolvida. "Composições" em tons de ocre, marrom e cinza são baseadas principalmente em árvores (1912-1913) e fachadas de igrejas (1913-1914). 1913 - Expõe no Salon des Indépendants. 1914 - A última fase cubista (1914-1916). Através de intensa abstração, Mondrian enfatiza cada vez mais o reto e o horizontal-vertical. O curvo e o oblíquo são gradualmente eliminados. As composições chamadas "mais-menos" têm origem em estudos de fachadas de igrejas, quebra-mar, mar e céu estrelado. 1915 - Vive em laren, uma vila perto de Amsterdam, local favorito de artistas e escritores.
Conhece Salomon Slijper, que se torna seu amigo e principal colecionador de suas obras figurativas e cubistas. Divide a casa com os Van Domselaers. Participa de discussões com os Van Domselaer, bem como com outro vizinho, o filósofo esotérico dr. M.J.H. Schoenmaekers, que nesse ano publica A imagem do novo mundo. Familiariza-se com as obras escritas pelo professor holandês G.J.P.J. Bolland. 1916 - Composição 7976é a primeira tela a ser montada "sobre em vez de atrás da moldura". Entre 1915 e 1916, Mondrian completa poucas pinturas novas por estar escrevendo e pela necessidade de ganhar dinheiro. Durante os
anos seguintes, por sugestão de H.P. Bremmer, consultor artístico da sra. H. KrolerMuller, recebe uma remuneração periódica em troca de um número de trabalhos estabelecido. 1917 - Mais de duzentas páginas da obra A nova plástica na pintura são concluídas em maio; apenas a introdução fica faltando. O primeiro número da revista De Stijl, editada por Theo van Doesburg, é lançado em outubro e contém a primeira parte de A . nova plástica na pintura e artigos de Van der leck e do arquiteto J.J.P.Oud. Composição em linha, iniciada em 1916 na forma "mais-menos" e concluída no início de 1917 na
nova forma, pode ser considerada como o primeiro trabalho da nova fase neoplástica (Nieuwe Beelding). Seus planos acentuadamente delineados contra um fundo branco mostram a influência de Bart van der leck. Planos maiores aparecem no final do ano. Nessa época, Mondrian também denominou seu trabalho arte real-abstrata (e a partir de 1920, neoplasticismo). 1918 - Composições com planos de cores claras e divisões da cor cinza; composições baseadas em uma grade normal. Primeira composição em forma de diamante. 1919 - Retorna a Paris em junho, morando inicialmente na rue du Départ nº 26, mudando-se em
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da Europa, aumentando-as e intensificando-as com pequenos planos de cores primárias sem margem preta, Faixas de cores que atravessam o formato inteiro aparecem na sua primeira pintura iniciada na América: New York, 1941-1942, Escreve "Arte abstrata" e "Rumo à visão verdadeira da realidade", 1942 - Primeira exposição individual de Mondrian na Valentine Dudensing Gallery (janeiro-fevereiro), 1943 - Sua segunda exposição na Valentine Gallery (marçoabril), juntamente com a artista brasileira Maria Martins, inclui
••
Broadway boogie-woogie, 1942-43,
novembro para o nº5 da rue de Coulmiers, 1920 - É estimulado por escritos dadaístas e futuristas, interesses compartilhados por Theo van Doesburg, que visita Mondrian em Paris na primavera, Ele encoraja Mondrian em seus experimentos literários: "Les grands boulevards" (publicado no De Telegraa f em março-abril) e "Little restaurant" (não publicado), 1921 - Em outubro, retorna ao endereço rue du Départ, onde estabelece seu renomado estúdio em linhas neoplásticas, 1923 - Depois de 1922 Mondrian usa apenas as cores primárias vermelho, amarelo e azul contra branco e preto, O cinza torna-se cada vez mais raro, 1925 - "Le néo-plasticisme" e
quatro dos ensaios de Mondrian extraídos da revista De Stijl são publicados em tradução alemã como Neue Gestaltung, Bauhaus
Book n~ 5 1926 - Escreve "Arte puramente abstrata", "A nova expressão plástica na pintura" e "Casa rua - cidade", 1927 - A crítica agressiva de Van Doesburg ao neoplasticismo na revista De Stijl precipita a . ruptura por parte de Mondrian, Escreve" Jazz e neoplasticismo" e "Pintura e fotografia", 1929 - Escreve "Pura arte abstrata," 1930 - Expõe com o grupo Cercle et Carré, fundado por Michel Seuphor e Joaquín TorresGarcía, e colabora com o seu jornal, Expõe em Estocolmo, 1931 - Termina o manuscrito "A
nova arte - a nova vida: a cultura de relacionamentos puros", 1934 - Escreve "O verdadeiro valor de oposições na vida e na arte", 1935 - Escreve "Resposta a um questionário" , 1936 - O desenvolvimento urbano leva Mondrian a sair de seu estúdio na rue du Départ, Em março muda-se para o nº 278 do boulevard Raspail, onde vive por dois anos e meio antes de partir para Londres, 1937 - O primeiro ensaio de Mondrian publicado em inglês, "Arte plástica e arte plástica pura", aparece na antologia Circle (Londres), editada por Nicholson, Gabo e Martin, 1938 - A assinatura do Pacto de Munique faz com que Holtzman e amigos ingleses de Mondrian o pressionem para sair de Paris,
Em setembro muda-se para Londres, levando todos os seus trabalhos (algumas pinturas iniciadas em Paris são posteriormente concluídas em Londres e Nova Vork), Escreve "Arte sem sujeito" e "Neoplástica", 1940 - Bombardeios nazistas convencem Mondrian a mudarse para Nova Vork, Ele chega em 3 de outubro de 1940, patrocinado por Harry Holtzman, Tem seu primeiro estúdio no nº 353 da East 56th Street. Trabalha na finalização do ensaio Libertação da opressão na arte e na vida, o último de seus ensaios mais 10IJjOs (iniciado em 1940 como "A arte mostra a face diabólica da opressão nazista e soviética"), 1941 - Em Nova Vork trabalha a princípio em telas que trouxera
.que é adquirido pelo Museum of Modern Art, de Nova Vork, Inicia a obra Victory boogiewoogie, deixada incompleta por ocasião da sua morte, Em 1º de outubro muda-se para seu último estúdio, no nº 15 da East 59t h Street. Aplica-se intensamente ao design desse ambiente, colocando planos de cartões coloridos nas paredes e construindo sua própria mobília, 1944 - Está na fase de conclusão de Victory boogie-woogie quando morre de pneumonia em 1º de fevereiro, aos 72 anos de idade, É enterra~o no Cypress Hills Cemetery, Holtzman, designado herdeiro e executor no testamento de Mondrian, abre o estúdio para o público por seis semanas e, assistido por Fritz Glarner, documenta-o com fotos, filmes e traçados dos Trabalhos parietais,
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1872 - Birth on March 7th, in - Amersfoort, Holland, of the Mondriaans first son, named after his father Pieter Comelis, known as Piet Mondriaan and, after his move to France, Piet Mondrian. 1892 - 97 - Ucensed to teach drawing on the secondary leveI. Moves to Amsterdam and begins two years of full-time study at Rijksacademie. 1900 - Around this time, becomes interested in theosophy. 1901 - Concentrates on landscapes, often working along lhe River Gein on the outskirts of Amsterdam. 1906 - Period of the Evening Landscapes, 1906-1907: dusk or ear/y night scenes, with expressive rendering of light, space, and color. Details are subsumed within broad masses - a trend already discemible in Mondrian's work since about 1900. 1908 - The Modemist phases (19081911): Luminist (i. e., late Divisionist) paintings by Sluyters and Jan Toorop at Saint Lucas exhibition, Amsterdam, mark the rise of Modemism in Holland. Continues to paint at Dele. 1909 - Joint exhibition with Sluyters and the more conserva tive Comelis Spoor at Stedelijk Museum, Amsterdam (January); Mondrian's Modemist or Luminist work of 1908 places him among the most controversial Dutch artists. 1911 - Adopts a mode employing angular planes. 1912 - Registers as resident of Paris (May 11), living first at 33 avenue du Maine, then at 26 rue du Départ, adjoining the Gare Montpamasse. In France, begins to spell his name with one "a". The Cubist Phase (1912-1914): figuration progressively dissolved. "Compositions" in ochres, browns, and grays are based chief/y on trees 304
(1912-13) and church façades (1913-14). 1913 - Exhibits at Salon des Indépendants. 1914 - The Late Cubist Phase (1914-16): Through intensitied abstraction, Mondrian increasingly emphasizes the straight and the horizontal-vertical. The curved and the oblique are gradually eliminated. The so-called "plusminus" compositions origina te in studies of church façades, breakwaters, sea and starry sky. 1915 - Uves in Laren, a village near Amsterdam favored by artists and writers. Meets Salomon Slijper who becomes hisfriend and foremost collector of his representational and Cubist works. Shares house with the Van Domselaers. Discussions with Van Domselaer, as well as with another neighbor, the esoteric philosopher Dr. M.H.J. Schoenmaekers, who in this year publishes The new world image. Becomes familiar with the writings of the Dutch Hegelian Professor G.J.PJ. Bolland. 1916 - Composition 1916 is the first canvas to be mounted "on, instead of behind, the frame. " Mondrian completes few new paintings in 1915-1916 owing to the demands of his writing and his need to eam a /iving. Over the next few years, at the suggestion of H.P Bremmer, art advisor to Mrs. H. Kroller-Muller, he receives a regular stipend in retum for a seated number of works. 1917 - Over 200 pages ofThe new plastic in painting are completed by May; onlyan introduction is /acking. The first number ofDe Stijl, edited by Theo Van Doesburg, appears in October. It contains the first installment ofThe new plastic in painting and articles by Van der Leck and the architect J.J.P Oud. The Neo-Plastic phase: Composition in line, begun in 1916 in the "plus-
minus" manner and completed in ear/y 1917 in the new manner, can be regarded as the first work of the New Plastic (Nieuwe Beelding). Its hard-edged planes against a white ground show the inf/uence of Bart van der Leck. Larger planes appear by the end of the year. Mondrian also called his work Abstract-Rea/ art at this time (from 1920on, NéoP/as tique, Néo-Plasticisme). 1918 - Compositions with light color planes and gray divisions; compositions based on a regular grid. First composition in diamond format. 7919 - Retums to Paris in June, living first at 26 rue Départ and moving in November to 5 rue de Coulmiers. 7920 - Stimulated by Futurism and Dada writing, interests shared by Theo van Doesburg, who visits Mondrian in Paris in spring. He encourages Mondrian's literary experiments: "Les Grands Boulevards" (pub/ished in De Telegraaf in March-Apri/) and "Uttle restaurant" (unpublished). 1921 - In October, retums to 26 rue du Départ building, where he establishes his renowned studio along Neo-Plastic lines. 1923 - After 7922 Mondrian uses on/y primary red, yellow and blue against white and b/ack. Gray becomes rare. 7925 - "Le Néo-Plasticisme" and four of Mondrian 's essays from De Stijl are published in German translation as Neue Gestaltung, Bauhaus Book nº 5. 1926 - Writes "Purely Abstract Art", "The New Plastic Expression in Painting, " and "HomeStreet - City". 7927 - Van Doesburg's aggressive critique of Neo-Plasticism in De Stijl precipitates break on Mondrian's part. Writes "Jazz and Neo-Plasticism"
and "Painting and photography" 1929 - Writes "Pure abstract art" 7930 - Exhibits with the Cercle et Carré group founded by Michel Seuphor and Joaquín Torres-García and contributes to its jouma/. Exhibits in Stockholm. 1931 - Completes manuscripts of "The new art - the new lite: The cu/ture of pure relationships". 1934 - Writes "The true va/ue of oppositions in lite and art". 1935 - Writes "Reply to an enquiry". 1936 - Urban renewal compels Mondrian to vacate his rue du Départ studio; in March he moves to 278 bou/evard Raspail, where he resides for two and a half years until his departure for London. 1937 - "Plastic art and pure p/astic art, "Mondrian's first essay published in English, appears in the anthology Circle (London), edited by Nicholson, Gabo, and Martin. 7938 - The signing of the Munich Pact brings pressure from Holtzman and from English friends for Mondrian to leave Paris. In September he moves to London, bringing ali his work (some paintings begun in Paris are later completed in London and New York). Writes "Art without subject" and "Neo-Plastic". 1940 - Nazi bombing raids persuade Mondrian to move to New York. He arrives 3 October 7940, sponsored by Harry Holtzman. Has first studio at 353 East 5fJh Street. Works on completion ofLiberation from oppression in art and life, the last of his longer essays (begun in 7940 as "Art shows the evil of nazi and soviet oppression") 1941 - In New York, he at first works on canvases brought with him from Europe, augmenting and intensitying them with small planes of primary color unbounded by black. Bands of color that cross the
entire format appear in his first painting initiated in America: New York, 1947 - 42. Writes "Abstract art" and "Toward the true vision of reality. " 1942 - Mondrian's first one-man show at the Valentine Dudensing Gallery (January - February). 1943 - His second exhibition at Valentine Gallery (March - April), together with the Brazilian artist Maria Martins, includes Broadway boogie-woogie, 1942-43, which is acquired by The Museum of Modem Art, New York. Begins Victory boogie-woogie, unfinished at his death. On 1 October, moves into his /ast studio, at 15 East 5ghStreet. Applies himself intensely to the design of this environment, positioning planes of colored card on the walls and constructing his own fumiture. 1944 - Largely completes Victory boogie-woogie. Dies of pneumonia on February 1st, aged seventy-two. Is interred at Cypress Hills Cemetery. Holtzman, named testamentary legatee and executor in Mondrian's will, opens the studio to public view for six weeks, and assisted by Fritz Glamer, documents it with photos, motion pictures, and tracings of Wall Works.
Obra apresentadalWork in the exhibition Último ateliê de Mondrian em Nova VorklLast Mondrian's studio in New York
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I )
ENTREVISTA A EDDV DEVOLDER* dezembro de 1990
INTERVIEW BY EDDY DEVOLDER* December, 1990
Eddy Devolder: Além da pintura, desenho e escultura, você também escreve e ensina. Tudo isso faz parte da mesma atividade ou são coisas completamente diferentes? Per Kirkeby: Não, tudo faz parte da mesma atividade. Não acho que eu precise de uma explicação pronta' e elaborada de como passo de um meio para outro. Isto é, nem sequer especulo sobre a diferença entre minhas estruturas ou esculturas de tijolos e minhas esculturas de bronze. Sinto que são de certa forma a mesma coisa; há uma armação, uma estrutura interna que é sempre igual. Obedecem a um sistema que existe em mim. O mesmo vale para o que escrevo. Mas tudo isso é secundário à minha atividade principal: a pintura. Basicamente, vejo o mundo como pintor. Um pintor tem certas obsessões. Às vezes, vejo o mundo de modo diferente da maioria das pessoas. Quero dizer que você só precisa abrir os olhos. A maioria das pessoas não olha além da ponta do nariz. Estou falando sobre um consenso no modo como vemos as coisas e as usamos. Basta você estar com pessoas para perceber. Isso chamou-me a atenção, por exemplo, na Groenlândia. Quando estive lá, pintava aquarelas das montanhas que vira durante o trabalho. Certa vez, vi algumas pedras ocres que havíamos quebrado em pedaços dias antes, e pintei-as não de ocre, mas de violetaazulado. Isso tornou-se motivo de grande discussão entre mim e meus colegas. Todos protestaram, dizendo que a verdadeira cor das pedras era ocre. Esse é apenas um exemplo simples daquilo a que nos prendemos, da forma como pe~samos. O que vemos tem na verdade uma profundidade maior. As vezes, em momentos muito especiais, sinto estar vendo o mundo como realmente é, e é isso o que tento pintar. Nesse sentido sou um pintor realista; não porque retrate o realismo aceito por todos; pinto o que vejo.
Eddy Devolder: My first question is about ali the different activities in which you are involved: aside from painting, drawing and sculpture, you write and you also teach. Are ali these part of the same activity or are they different altogether? Per Kirkeby: No, theyare ali part of the same activity. I do not believe I need a ready, sophisticated explanation of howl go from one medium to another. I mean, I don 't even speculate about the difference there is between my brick structures or sculptures and my bronze sculptures. I feel theyare ali somehow the same; there is an inner scaffolding, an inner structure that is the same throughout. They obey a pattem that exists within me. The same is true for what I write. But ali of this is secondary to my ma in activity: painting. Basically, I see the world as a painter. A painter maintains certain obsessions. At times, I see the world in a different way from most people. I mean, you only have to open your eyes. The majority of people don't think to look further than the tips of their noses. /'m talking about a consensus on the way we see things and the way we use them. As soon as you sit down with people you realize this. This struck me, for example, in Greenland. When I was there I would paint watercolours of landscapes in the mountains which I had spotted during our work. Once, I saw some ochre-coloured stones we had broken into piecessome days before, and I painted them not in ochre but in bluish-violet. This became a great matter of constemation and debate between myself and my colleagues. Everyone protested, stating that the real colour of the stones was ochre. This is just to give a very simple example of what we adhere to, what we think. What we see in fact has greater depth. Sometimes, at very special moments I feel that /'m seeing the world as it really is, and this is what I try to paint. In this sense, /'m a realistic painter,· not because I portray the realism that everyone accepts: I paint what I see.
E.D.: Então a pintura é sua principal atividade, à qual os outros trabalhos estão relacionados. P.K.: Isso mesmo. E.D.: Mas a facilidade com que passa de um meio para outro nos leva a pensar. Você se considera um artista, um pintor ou um intelectual? P.K.: Espero não ser um intelectual. Sou pintor porque é assim que vejo o mundo. Se você tivesse feito essa pergunta dez ou vinte anos atrás, provamente teria respondido que era um artista. Isso tem a ver com a ró ria biologia. Quando se envelhece, passa-se a ver as coisas de -o diferente. Como artista, sou claramente filho da década de 60, e estou feliz por ter vivido essa época. Algumas coisas muito importantes aconteceram. Eu vivia na Dinamarca, um país muito pequeno, com uma visão limitada da arte. Muito populares na época eram os pintores dinamarqueses de paisagens do século XIX. Pollock e as invenções da arte moderna eram absolutamente desconhecidos.
E.D.: For you painting is therefore the central activity to which your other work is linked. .. PK.: That's right. E.D.: Yet, the ease with which you pass from one medium to another makes one wonder if you feel yourself to be an artist, a painter or anintellectual. PK.: I hope that /'m not an intellectual. I am a painter because that is how I see the world. If you had asked me that question ten or twenty years ago, I probably would have answered that I was an artist. This has something to do with your own biology. As you get older, you see things in a different way. As an artist, /'m clearlya child of the sixties and /'m happy to have experienced the sixties. Some very important things happened at the time. I was then living in Denmark, which is a very small country with a limited view of art. What was very popular at the time were the Danish landscape painters of the 19th century. Pollock and the inventions of modem art were absolutely unknown.
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E.D.: Você não conhecia Jorn e os artistas dinamarqueses do movimento Cobra? P.K.: Sim, conhecia Jorn, mas de uma maneira estranha. Os jovens artistas dinamarqueses da década de 30 eram muito interessantes; mais ainda do que aqueles que, mais tarde, viriam a constituir o grupo Cobra. Eles desenvolveram uma forma de expressionismo abstrato vinte anos antes dos americanos, mas eu não sabia disso porque não havia como ver essas pinturas. A Dinamarca se recusava a reconhecer esses artistas, e quando os reconheceu foi devido a sua ligação com o Cobra. Mas o movimento Cobra ignorou suas obras mais interessantes. E.D.: Mas você não havia ouvido falar de Egill Jacobson e sua pintura Ophopning (Empilhando)? P.K.: Sim, ouvira falar, mas não muito bem, e ele não teve um papel realmente importante. A pintura dinamarquesa, tradicionalmente, é de paisagens. Na década de 60 as coisas subitamente começaram a mudar. Um grupo de pessoas mostrou interesse pela arte moderna ao fundar o que se chamou Den Eksperimenterede Kunstskole (Escola de Arte Experimental). Aderi a esse grupo, que afirmava renunciar à arte acadêmica. Gostaríamos de voltar ao que havia acontecido na década de 20, em particular ao dadaísmo. Queríamos parar de pensar com a cabeça para pensar com as mãos. Era muito interessante, e formamos uma espécie de irmandade, sem nomes: trabalhávamos anonimamente, porque não queríamos que nossa individualidade se destacasse. De certo modo, era um movimento: todos compartilhávamos as mesmas idéias. Estávamos envolvidos socialmente, o que era mais interessante do ponto de vista pessoal do que do artístico. E.D.: E nessa época você ainda não tomara conhecimento das obras de Sonja Ferlov, Ejler Bille e outros? P.K.: Isso foi muito mais tarde. Nessa época, na Academia de Arte de Copenhague, todos se inspiravam no movimento Cobra, e nosso grupinho odiava aquilo. Detestávamos Jorn e todos os bons pintores europeus desse período. Queríamos a sátira. Ao mesmo tempo, fomos influenciados pela corrente americana. O minimalismo nos atraía porque parecia uma espécie de ação de limpeza, e precisávamos disso. O minimalismo para nós era algo muito saudável. E.D.: Nessa época você viajou a Nova Vork e conheceu Georges Maciunas ... P.K.: Isso aconteceu em meados da década de 60. Fui vê-lo em conseqüência do que havíamos feito em Copenhague: performances, happenings, instalações, estruturas minimalistas e todo esse tipo de coisa. Eu fazia parte disso tudo, o que é possível quando se vive num país pequeno. Não como na Alemanha, onde havia tantos artistas que todos se dividiam em categorias. Isso me surpreendeu quando comecei a trabalhar com eles. Todos eram ou escultores ou pintores, e assim por diante. E.D.: Quer dizer, cada um tinha uma disciplina específica? P.K.: Sim, eram muito especializados. Em Copenhague era uma questão de sentir o que estava no ar e retratar o que aparecesse, usando qualquer meio. E.D.: Você acha típico de um país pequeno ser obrigado a abrir a mente? P.K.: Acho que sim, no meu caso. Mas também tem a ver com a década de 60. Por exemplo, éramos fascinados por Picabia, porque ele era capaz de mudar de estilo várias vezes. E.D.: Uma espécie de nomadismo ... P.K.: De certa forma, a pintura nos era proibida. Não havia como pintar sem recair na velha arte. Mas eu não conseguia afastar-me 308
E.D.: Didn't Vou know Jom and the Danish artists of the Cobra movement? PK: Yes, I knew Jom, but in a strange way. The young Danish artists of the thirties were very interesting; more interesting than what later became the Cobra group. They developed a form of abstract expressionism twenty years ahead of the Americans. But I didn't know about that beca use there was no way of seeing those paintings. Denmark refused to recognize them and when they were recognized it was due to their connection to Cobra. But the Cobra movement was ignorant of their most interesting works. E.D.: But still, hadn't Vou heard of Egill Jacobson and of his painting Ophopning (Piling-up)? PK: I had heard of him, but not very well and he didn't really play an important role. In Denmark painting, by tradition, means landscape. During the sixties things suddenly started moving. One group of people showed their interest in modem art by founding what was called Den Eksperimenterede Kunstskole (The Experimental Art School). I joined this group that claimed to renounce academic art. We were glad to go back to what had happened during the twenties, especially Dadaism. What we wanted was to stop. thinking with our heads, and to think with our hands. It was very interesting and we joined into a sort of brotherhood. No names: we worked anonymously beca use we didn 't want to make our individuality stand out. In a way, it was a movement: we ali shared the same ideas. We were socially involved, which was more interesting from a personal point of view than from the artistic point of view. E.D.: And at that time, vou still hadn't heard of the works of Sonja Ferlov, Ej/er Bille etc. ? PK: Much later. At the very official Arts Academy in Copenhagen everyone was inspired by the Cobra movement at that time, and in our little group, we hated that. We hated Jomand ali the good European painters of that time. What we wanted was satire. At the same time, we were ali influenced by the American trend. Minimalism for us was something very healthy. E.D.: At the time Vou travelled to New York and there vou met with Georges Maciunas... PK: That happened in the middle of the sixties. I went to see him as a result of what we had dane in Copenhagen: performances, happenings, installations, minimal structures and ali those kinds of things ... I was part of it ali, and that is something which Vou can do when Vou live in a very small country. It didn't happen as it did in Germany, where there were so many artists that they ali belonged to a category. That surprised me when I started working with them. Everyone was either a sculptor ar a painter etc. E.D.: You mean that each had a specific discipline? PK: Yes, they were very specialized. In Copenhagen it was a matter of sensing what was in the air at the time and of portraying anything it could be, using whatever medium Vou liked. E.D.: Do Vou think it is a characteristic of a small country, that Vou have to oblige yourself to open your mind? PK: I think so, in my case. But it also has to do with he sixties. For example, we were fascinated by Picabia beca use he was constantly able to change styles. E.D.: It's a sort of nomadism ... PK: In a way painting was forbidden to uso There was no way of painting without falling back into the old art. Yet, I couldn't keep my hands away from this painting business. That is why I perfected a sort of style based on square
dessa coisa da pintura. Por isso aperfeiçoei uma espécie de estilo baseado em formatos quadrados. Num quadrado, cada lado é idêntico, equivalente. Mas equivalente no sentido de "tanto faz". Eu colocava esses quadrados na parede, eqüidistantes, afirmando que não eram as pinturas em si que importavam, mas o conjunto, o sistema. Elas eram apenas objetos pendurados na parede, e eu me satisfazia com a visão das coisas como é magistralmente expressa numa abordagem como a de Donald Judd. Naquela época, eu via a arte e a história da arte como uma progressão lógica que ia do cubismo a Mondrian, Pollock, Rothko, Ad Reinhardt, até o ponto em que a única afirmação era que não havia mais pintura, mas um objeto na parede. O próximo passo lógico seria tirá-lo da parede! E se você insistisse em continuar pintando seria considerado uma espécie de traidor ou renegado, um reacionário! Mas, não esqueça, eu também aceitei essa postura nos anos 60. Precisei fazer um esforço consciente para superá-Ia e continuar pintando. Considero-me um europeu, e na Europa sempre soubemos que tudo já foi feito antes. Do instante em que o homem pré-histórico começou a pintar nas cavernas, o artista sabe que tudo já foi feito, e nossa tarefa é simplesmente refazer coisas já existentes. É um projeto colossal, que impõe severas obrigações. Não é como o arquiteto pós-moderno, que acha que pode entrar numa loja e comprar uma coluna. O pintor sente que, se precisa de uma coluna, deve refazer a coluna. Sabe que já foi feita antes, mas isso não facilita as coisas. É um dos motivos pelos quais estabeleço uma diferença entre pintor e artista. Sem dúvida, isso também foi o que Cézanne quis fazer - em sua fase tardia. Tenho certeza de que ele queria apenas pintar paisagens comuns. Não queria causar grandes sensações, apenas pintar honestamente, entende? Basicamente, ele olhava para paisagens muito comuns e tentava fazer pinturas comuns, as mais comuns que pudesse ... (Não pareciam tão comuns para as pessoas, mas essa é uma história totalmente diferente.) É o mesmo sentimento que tenho; gostaria de ser comum. Um pintor comum, fazendo pinturas que, na superfície, não produzem qualquer emoção. Acho que isso tem algo a ver com ficar mais velho. Mas ainda acho que os artistas jovens devem seguir as tendências, fazer parte de seu tempo e aderir a movimentos diferentes. Não devem se importar se os artistas mais velhos os chamarem de oportunistas ou de palavras pejorativas como essa. Devem estar realmente "em seu tempo", porque os artistas que estão em seu tempo na juventude são capazes de, mais tarde, ficar "fora de seu tempo", por assim dizer. Meu trabalho não tem nada a ver com uma nova concepção da paisagem. Minhas pinturas são modernas na forma como são construídas. Em termos espaciais, estão mais próximas do cubismo do que as paisagens comuns. Também são construídas a partir de coisas que roubei de toda parte. São, nesse sentido, muito "pornográficas" . E.D.: Você começou estudando ciências naturais ... P.K.: Quando terminei o colégio, em 1957, cedi às pressões sociais que diziam que eu devia ter uma sólida educação universitária. Talvez seja difícil entender isso hoje, mas na época a universidade era uma necessidade absoluta. Mais que isso, parecia um modo de conseguir um seguro para o futuro. Isto é, se eu fracassasse na pintura, sempre poderia voltar para a geologia. Talvez pareça tolo, mas na época eu pensava assim. Apesar disso, nunca tive dúvidas: queria tornar-me artista a qualquer preço. No entanto, isso não significava que eu quisesse ir para a Academia Real de Artes. Isso pela simples razão de ter descoberto, depois de algumas pesquisas, que nenhum pintor importante dos últimos cem anos havia saído daquela instituição. Ao terminar o colégio, fui inicialmente atraído pela arqueologia. No colégio, fiz matemática e física. Mas para estudar arqueologia era preciso saber latim. Um dia, estava lendo o catálogo da universidade e vi que se escolhesse geologia poderia ir para a Groenlândia e ser pago por isso. Foi o que definiu minha
formats. In a square, each side is identical, equal. But equal in the sense of "it doesn't matter". These squares, I would place on the wall, equidistant, claiming that it was not the paintings themselves, which mattered, but the whole, the system. They were just objects hanging on the wall, and I was satisfied with this vision of things which is expressed marvelously in an approach like Donald Judd's. At that time I conceived of art and art history as a logical progression that went from Cubism to Mondrian, Pollock, Rothko, Ad Reinhardt, to the final point in which the only claim left was that there was no more painting but an object on the wall. The next logical step would have been to take it down from the wall! And if you had insisted on continuing to paint, you were considered a sort of traitor ar renega de, a reactionary! But don't forget, I also accepted that attitude in 60's. I had to make a conscious effort to overcome it in arder to get down to painting. I recognize myself as an European, and we in Europe have always known that everything has already been dane before. From the first moment that prehistoric man started painting in caves, the artist has known that everything has been dane and our task is simply to re-do already dane things. It is a colossal project and it imposes se vere obligations. It's not like the post-modem architect who thinks he can go into a store and buya column. The painter feels that, if you need a column, you must re-do the column. You know that it has been dane before, but that doesn't make it any easier for you. This is one of the reasons why I set a distinction between painter and artist. That is also no doubt what Cézanne wanted to do - the older Cézanne. I am convinced that he wanted to paint just very normal landscapes. He didn't want to make any great sensations, you know, he just wanted to paint honestly. Basically, he looked at very normallandscapes and tried to make very normal paintings out of the very normallandscapes, almost as normal as he could... (it didn't look so normal to people, but that's a different story altogether.) This is the same feeling I have; I would like to be normal. A normal painter doing paintings which, on the surface, don't produce any thrills. I think this has something to do with getting older. But I still think that a young artist should follow current trends, be part of his time and adhere to different movements. He shouldn't care if the older artists call him an opportunist ar derogatory words like that. He should really be "in his time ", because artists who are "in their time" during their younger years are able to be "out of their time", so to speak, later on. My work has nothing to do with a new way of conceiving landscape. My paintings are modem in the way they are constructed. In terms of space they are closer to cubism than normallandscape. Theyare also constructed out of things /'ve stolen from everywhere. Theyare, in that sense, very "pomographic". E.D.: You started by studying natural sciences... PK.: Afte r finishing high school in 7957, I yielded to social pressure which dictated that I get a sound university education. It is perhaps difficult to understand today, but back then university was an absolute must. What's more, it seemed like a way of getting an insurance for the future, so to speak. That is, if I failed at painting I could always fali back on geology. Perhaps it seems silly, but at the time I thought like that. Yet, there was never any doubt in my mind: I wanted to become an artist at ali costs. Nevertheless, that didn't mean that I wanted to go to the Royal Arts Academy. This was for the simple reason that, after having dane some research, I found out that no important painters over the last 700 years had come out of that institution. After finishing high schooll was at first attracted to archeology. During high schooll had dane maths and physics. However, to study archeology one had to know Latin. One day, I was reading the university catalogue in which I leamed that by choosing geology I could go to Greenland and be payed for it. This is what determined my decision; what's more, I eamed a pretty good living while doing my studies. Therefore I went to Greenland three ar four months a year, and this was an exciting adventure. I had the luck to be part
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decisão; além de tudo, tive uma boa vida enquanto estudava. Então passava três ou quatro meses por ano na Groenlândia, e era uma aventura estimulante. Tive a sorte de participar de uma expedição muito antiquada, com trenós puxados por cães e esse tipo de coisa. levei comigo blocos de desenho e chapas para gravuras. Desse modo pude praticar várias coisas ao mesmo tempo e, embora isso possa parecer surpreendente, foi fácil! Além disso, fui o único aluno a terminar o curso no tempo previsto. Talvez por ser naturalmente muito organizado. Eu era estudante da manhã até o meio-dia; então punha minhas roupas velhas e tornava-me artista à tarde, e à noite saíamos para beber e essas coisas. Guando me lembro dessa época, tudo parece um sonho; quero dizer, o fato de estar envolvido num estudo realmente interessante de ciências naturais e fazer parte de uma boa turma. Fazíamos experiências radicais, e numa época em que as coisas estavam de fato mudando. Revendo tudo, fica muito claro que a década de 60 foi importantíssima quanto à mudança no campo das idéias. Tínhamos certeza de estar num período crucial, e não nos enganamos. Acho que os artistas de minha geração que não entenderam isso estão meio perdidos hoje! Foi nessa época que conheci os trabalhos de Bille, Jacobsen e Mortensen, que haviam produzido seus melhores trabalhos nos anos 30, mas eles não gostavam nem um pouco de nós! _~embro-me de que Bille certa vez foi ver uma pequena exposição de meu trabalho, e quando perguntaram sua opinião disse que eu era "um oportunista". Fiquei muito decepcionado, porque admirava o homem. Ele preferia pinturas de paisagens mais tradicionais, sólidas. Mas não me desencorajei. Pelo contrário, aprendi a ser mais radical. E.D.: Nesses anos você fez muitas colagens ... P.K.: Na época, todos nós fizemos. Na verdade, havia dois tipos de colagem. Um era pintado, retrabalhado com efeitos de cor visando a tactilidade e o jogo de superfícies. O outro era mais politicamente engajado, e consistia por exemplo em recortar a cabeça do papa e colá-Ia no corpo de uma mulher nua, esse tipo de coisa. Não gosto dessa técnica; é muito fácil obter efeitos assim. Por outro lado, gostava de fazer colagens políticas p,orque pertencia a um grupo de jovens comunistas na década de 60. E algo que não se deve dizer hoje, mas na época era a melhor forma de ser realmente rebelde. Meu envolvimento baseava-se em duas coisas: minha indignação pelo modo como o mundo evoluía - a pobreza, por exemplo -, e em segundo lugar tinha algo a ver com o desejo de ser o mais rebelde dos rebeldes: o melhor modo de fazer isso era ser comunista. Nessa época, na Universidade de Copenhague, acho que éramos ao todo apenas dez comunistas. Era um círculo muito pequeno, e editávamos uma revista chamada Clarté, para a qual eu fazia colagens políticas. Mas aquilo para mim não era arte, era propaganda, agitação. E.D.: Mas a colagem teve certa influência em seu trabalho como pintor, não? P.K.: Se você tomar certas pinturas dos anos 60, elas possuem algo de colagem. Isto é, são feitas de .imagens reunidas. Fotos de revistas de moda, imagens da pop art. Mas não as considero inteiramente colagens, já que todas as imagens são colocadas no mesmo nível, o que neutraliza a-caraCterística de colagem. E.D.: Foi nessa época que você começou a afastar-se de seus envolvimentos anteriores, como o minimalismo, para dedicar-se mais seriamente à pintura? P.K.: Aconteceu de modo diferente. A vanguarda à qual pertencíamos tornou-se cada vez mais politizada e nosso grupo começou a desaparecer. Então comecei a me mexer. Com alguns amigos, fiz uma viagem à América Central. Já havíamos passado vários anos estudando a arte maia, e eu era quase um especialista nesse assunto. Foi uma viagem maravilhosa, uma verdadeira aventura, porque fomos a regiões ainda intocadas pelo turismo. Mais tarde, 310
of a very old-fashioned expedition with dog sleds and things like that. I was able to bring sketch pads and engraving plates with me. Therefore I was able to practise several things at the same time, and though it may sound surprising, ít was easy! Moreover, I was the only student to have finished the course within the set time. Perhaps ít is because I am by nature very organized. I was a student the morning until noon, then I changed into my old clothes and I became an artist in the afternoon and in the evenings we went out drinking and things like that. When I think back to those years, it ali seems like a dream; I mean, the fact of being involved in a really interesting study in natural sciences and part of a really good group. We did very radical experiment$. And then having ali of that at a time when things were really moving. In restrospec.t its clear that the early sixties were very important from the point of view of changing ideas. We were convinced that we were in the midst of a crucial period, and we weren't mistaken. I think that the artists of my generation that didn't understand that are kind of lost now! It was during that time that I got to know the works of Bi/le, Jacobsen and Mortensen, who had produced their greatest works duríng the thirties, but they didn't like us at ali! /'m especially thinking of Bille who came once to see a small exhibition of my work. When Bille was asked about my work, he said, "hes an opportunist". I was very disappointed beca use I admired the mano He preferred the more tradítional, very solid landscape paintings. But I wasn't discouraged, instead I learned to be more radical. ED.: During those years Vou did a lot of collages... PK.: We ali did at that time. In fact there were two kinds of collages. One was painted over, re-worked for colour effect with a concern for tactility and the play of surfaces. The others were more polítically involved, and consisted, for example, in cutting out the head of the Pope and gluing it on the body Df a naked woman, things of that sort. I do not like that technique; it is far toa easy to get an effect from it. On the other hand, I liked to makepolitical collages since I belonged to a young communist student group during the sixties. This is something that you're not supposed to say today, but at time ít was the best way to be really rebellious. My involvement was based on two things: my indignation at the way the world was working - poverty, for example; secondly, ít had something to do with the wish to be the most rebellious of ali the rebels: the best way to do that was to be a communist. At the time at the Universíty of Copenhagen I think we were only about ten communists in ali. It was a very small circle and we edited a magazine called Clarté for which I contríbuted political collages. But that was not art in my eyes, it was propaganda, "agit-prop". ED.: And yet collage had a certa in influence on your work as a painter, didn't it? PK: If Vou take certa in paintings of the sixties, they have a certa in collagelike quality about them. That is, theyare ali made of images put together. Pictures from fashion magazines, pop art images. Yet, I do not consider them entirelyas collages since ali the images are put on the same levei, which neutralizes the collage qualíty. ED.: Was it at that time that Vou started to turn away from your earlier involvements, such as minimalism, to devote yourself more seriously to painting? PK.: It happened in a different way. The avant-garde to which we belonged became more and more politicized and our group began to disappear. So, I started to move. Together with a few friends I took a trip to Central America. We had already spent several years studying Mayan art, so I was a kind of specialist on that subject. It was a beautíful journey, a real adventure beca use we went to regions that were still untouched by tourism. Later, we published the book The land of the Mayas. The experience was very rich not
publicamos o livro A terra dos maias. Foi uma experiência muito rica, não apenas pelo que aprendemos sobre a arte maia, mas também do ponto de vista da poesia e da ficção. E.D.: Da ficção? P.K.: Inventamos um personagem fictício chamado Miguel La Cruz, um cientista sobre quem sempre escrevíamos. Quando iniciamos a expedição, meu objetivo era transportar-me a algo muito fundamental. E.D.: Mas em seu livro Bravura você tentou criar um mito. P.K.: Era apenas uma metáfora. Meu verdadeiro objetivo era passar para o outro lado de toda a especulação dos anos 60; chegar às coisas mais básicas possíveis como pintor. O que quer dizer isso? Eu levava meu bloco de esboços e tentava desenhar, o tempo todo me perguntando o que significava registrar as imagens no papel. Fazia a mim mesmo perguntas básicas, como"o que é uma linha?", "o que é uma imagem?" Também pensava seriamente em como integrar a perspectiva a meu trabalho. Todas essas questões elementares levaram-me a perceber, por exemplo, que em lugar algum do universo existe uma linha simples. Nessa viagem aprendi a ser o mais honesto, o mais sincero possível. Todo dia, com meus lápis e pincéis, fui absolutamente sincero. Não produzi nenhum desenho elegante nessa época, alguns são até meio estúpidos, mas sentia-me muito seguro com aquilo e comecei a construir minha nova pintura a partir dali. E.D.: Foi uma espécie de renascimento? P.K.: Sim. E alguns anos depois de minha volta, Michael Werner veio me ver. Esse encontro foi um sinal do destino, porque Michael me deu a oportunidade de deixar meu país. Eu sabia que tinha de sair do mundo artístico dinamarquês; era seguro, certo, mas muito entediante, e eu podia prever o que seria o resto de minha vida. Estava procurando outro ambiente. Encontrar um bom marchand era importante, mesmo que pudesse parecer contraditório porque significava ser "comercial". Depois disso, durante dez anos poucas coisas me aconteceram em termos de carreira, mas continuei trabalhando muito. Entre 1978 e 1980, as pinturas começaram a aparecer, e é um período de que gosto muito. Ninguém sabia o que fazer com aquelas pinturas porque pareciam muito fracas. Pareciam não ter direção. Todos diziam que não tinham uma imagem clara. Mas sob a superfície elas apontam para questões básicas, como "o que é uma imagem?". Quando se revêem essas pinturas, nota-se sem dúvida que são minhas. Na época, porém, era difícil ver e entender o verdadeiro valor. E.D.: Em seus escritos, você fala com freqüência de um acidente de trânsito. É algo que você vivenciou? . P.K.: Acidente de trânsito? Nunca sofri acidente nenhum. Mas, de certa forma, vejo tudo o que me acontece como uma espécie de perpétuo acidente de trânsito. Também falei nisso em relação ao classicismo. Todos vêem o classicismo como algo tranqüilo, pacífico, ordenado e conservador; mas também costumo ver uma enorme tensão sob a superfície. Tentei encontrar uma metáfora para falar sobre o classicismo. Deve-se ler esse termo de maneira poética; os termos poéticos sãodifíceis de explicar. Em meu modo de ver, tudo na arte européia pode ser dividido basicamente em barroco Oll clássico. Na história da arte que criei, a arte barroca inclui a arte antiga, o período romano e também o impressionismo. A corrente clássica representa um retorno ao passado, juntamente com uma tentativa de tornar as coisas mais claras. Esse é o caso de Canova, Thorvalsen, Füssli... gente que tentou fazer afirmações mais decisivas; A progressão do impressionismo para o cubismo é o mesmo tipo de coisa - mesmo que as obras do cubismo ainda não tenham sido totalmente entendidas desse ponto de vista. A transformação da arte romana
only due to what we learned about Mayan art, but also from the point of view of poetry and fiction. E.D.: Df fiction? PK: We invented a fictive character called Miguel La Cruz, a scientist whom we always wrote about. When we started off on the expedition my purpose was to bring myself down to something very basic. E.D.: Yet in your book Bravura, Vou intended to create a myth. PK: That was just a metaphor. My real purpose was to get to the other side of ali the serious speculation of the sixties, to get down, if Vou like, to the most basic things Vou can do as a painter. What does this mean? I took my sketch block and I tried to draw, and ali the time I asked myself what it meant to be laying images down on paper. I asked myself very basic questions, such as, "What is a line?", "What is an image?" I also thought very seriosly about how to integrate perspective into my work. Ali of these elementary questions led me to notice, for example, that nowhere in the universe is there a simple line. What Ilearned during that trip was to be as sincere, as honest as possible. Every day, with my pencil and paint brush, to stay absolutely sincere. I didn 't produce any elegant drawings at that time, some are even a little stupid, but I felt very secure with that and I started building up my newer painting from that point. E.D.: Was it a kind of rebirth? PK: Yes. And a few years after my return Michael Werner came to see me. This meeting was a sign of destiny, beca use Michael gave me the opportunity to leave my homeland. I knew that I had to get out of the Danish art world: it was sure, it was safe, but was so boring and I could foresee what the rest of my life would be like. I was looking for another environment. Finding a big dealer was important, even if it seemed contradictory because it meant being "commercial". For ten years after that very few things happened in terms of my career but during that time I was working very hard. Between 78 and 80 paintings started toappear and that is a period Ilike very much. No one knew what to do with those paintings because they seemed too weak. They seemed to have no direction. Everyone said that they had no clear image. But under the surface those paintings point to some very basic questions, such as, "what is an image?" When Vou look back at those paintings Vou see without a doubt that they are my own. At the time, however, it was difficult to see and understand their true worth. E.D.: In your writing Vou often speak about a traffic accident. Is this something that Vou experienced? PK: Traffic accident? I never had a traffic accident. But if Vou like, I see everything that happens to me as a sort of perpetuai traffic accident. I also spoke about it in relation to classicism. Everyone sees classicism as something quiet, restful, ordered, conserva tive; yet, I often see an immense tension underneath the surface. I have tried to find a metaphor to speak about classicism. Dne must read this term in a poetic way,· the poetic terms are difficult to explain. The way I see it, everything in European art history can basically be divided into baroque or classical. In the art history that f've made up, Baroque art includes antique art, the Roman period, and also impressionismo The classical trend represents a return to the past together with an attempt to make things more crystal clear. This is the case of Canova, Thorvalsen, Füssli... people who attempted to make firmer statements. The progression from impressionism to cubism is the same sort of thing - even if . t~e works of cubism have not yet been fully understood from this point of vlew The transformation of Roman art happened in the catacombs, where a new interpretation of this naturalistic, impressionistic painting came to light. A mutation took place. Its ambition was to express something completely different, a different relation to sacredness.
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Untitled, 1986 PK 435/01 óleo s/tela/oil on canvas 200 x 250 cm Coleção Galerie Michael Werner, Inc. Foto Nic Tenwiggenhorn
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aconteceu nas catacumbas, onde veio à luz uma nova interpretação dessa pintura naturalista, impressionista. Ocorreu uma mutação. Sua ambição era expressar algo completamente diferente, uma relação diferente com o sagrado. Isso mudou a forma de pintar e também o modo de ver as coisas. Como se tratava de evocar o sagrado, a pintura deu ao impressionismo romano tardio novas interpretações iconográficas. As imagens também mudaram lentamente e levaram à iconografia bizantina, à pintura de ícones. Todo o tema da iconoclastia em Bizâncio é muito interessante, porque não foi apenas uma questão política e burocrática. A verdadeira questão era: "Podem as imagens revelar uma verdade superior, podem expressar todo o universo?" É preciso ter uma fé muito bem fundamentada para afirmar isso. É um debate fundamental, que se deve discutir todos os dias com os estudantes. Hoje, ninguém sente paixão ou convicção suficiente para justificar a atitude dos bizantinos. Alguns o tentam, mas não conseguem mostrar com suficiente clareza toda a sua angústia, todo o peso da vida. Devíamos escutar os antigos bizantinos e perceber o preço que se tem de pagar para pintar como pintaram, para perceber o quanto se tem de abandonar. De certa forma, Mondrian retomou o debate: ele sabia o que estava abandonando ao dar as costas à pintura de paisagens. Sabia estar pagando um preço muito alto para fazer as pinturas que fez no final. E.D.: Na época das Querelas Bizantinas, as pinturas eram vistas como coisas que tinham poderes miraculosos. Eram encarnações de algo absolutamente sagrado. P.K.: Sim, mas a sociedade atual vê as coisas de forma muito diferente. Contudo, cada artista tem de pensar dessa forma. Ninguém está lhe pedindo para pintar. Claro, talvez precisemos de algum tipo de decoração em nossa sociedade, mas também existe a fotografia e assim por diante. Em suma, se você não tivesse feito uma pintura ninguém sentiria falta dela. Por isso o pintor está realmente só; deve ser capaz de depender de si mesmo. Isso é muito difícil, e só é possível se você tiver muita clareza a respeito do valor de sua pintura, no sentido espiritual. Não se pode trocar isso por dinheiro, fama ou qualquer outra coisa. Você pode falar sobre dinheiro ou fama à noite, com um copo de vinho e um bom charuto, mas não o ajuda quando está diante da tela, trabalhando. E.D.: Você costuma dizer: "A pintura é a única realidade para mim". P.K.: Alguns anos atrás, eu teria vergonha de falar assim. Mas aos poucos vim a pensar que atrás da chamada realidade que vemos há uma realidade oculta, que é a verdadeira. Apenas a vislumbramos. Como pintor, você é a pessoa que a vê, às vezes. Antes de pensar assim, eu achava que um dia pararia de pintar. Agora, quando pinto, é porque tenho esses vislumbres, é porque enxerguei através da verdadeira realidade. A única linguagem que tenho para expressarme é minha pintura. Minhas mãos nunca param de escavar esse reino inefável. E.D.: No fim da vida, Asger Jorn afirmava que todo pintor devia manter seu próprio buraco negro. É o seu caso? P.K.: Primeiro, devo dizer que é mais fácil para um pintor pintar do que falar de pintura. Sinto-me incapaz de traduzir o que faço em termos de linguagem. O que posso dizer, porém, é que a pintura me conduz a lugares desconhecidos, lugares que não esperava no princípio. Quando chego ao final de um trabalho, costumo dizer a mim mesmo: "Ah, então é essa sua aparência!" No início, sempre tenho algumas idéias. Sempre começo com uma estranha lembrança que expresso em termos de cor. Não as cores como as encontramos nos tubos ou com os nomes que lhes damos, mas cores relacionadas com fatos: um naufrágio, um casal se separando, coisas assim. Podese notar uma conotação de ordem psicológica, mas hoje não penso 314
That changed the way of painting, and also the way of looking at things. Because ít was a matter of evoking sacredness, painting gave the late Roman impressionism new iconographic interpretations. The images also changed slowly and led to Byzantine iconography, the painting of icons. The whole issue of iconoclasm is Byzantium is very interesting because it was not just a polítical and bureaucratic question. The real question was: "Can images reveal a higher truth, can theyexpress the whole universe?" One must have a very well-founded faith to claim that. It is a fundamental debate, one which you should discuss with your students everyday. Today, no one feels enough passion or conviction to justity the attitude of the Byzantines. Some try to do it however, their figures fail to show clear/y enough ali their angst, the whole burden of lite. We should listen to the old Byzantines and come to realize the price you have to pay to paint the way they did, to realize how much you have to give up. In a way, Mondrian got debate going again: he knew what he was giving up by turning his back on landscape painting. He knew that he was paying a very high price to do the paintings that he did in the end. ED.: At the time of the Byzantines Ouarrel, paintings were seen as things which had miraculous powers. They were incarnations of something absolutely sacred. PK: Yes, but today society sees things very ditferently. Yet, every artist has to think like that. No one is asking for your painting. Sure, perhaps we need some sort of decoration in our society, but then again, there's photography and so forth. In short, it you hadn 't done the painting no one would miss it. So, a painter is really on his own,' he has to be able to rely on himself This is very ditficultto do, and ít is only possible to keep it up it you have very strong ideas about the value, in a spiritual sense, of your painting. You cannot change that for money of fame ar anything like that. You can talk about money or fame in the evening with a glass of wine and a good cigar, but it doesn't help when you're in front of the canvas in your working hours. ED.: Often you say, "Painting for me is the only reality". PK: A few years ago I would have been ashamed to talk like that. But /'ve slowly come to think that behind the so-called realíty that we see there is a hidden reality and this is the real reality. We only see it in glimpses. As a painter, you're the person that sees it sometimes. Before I thought like this, I would have stopped painting one day. Now, when I paint, it is beca use I have those glimpses, ít is because I have seen through to the real reality. The only language'/ have to express this is my painting. My hands never stop digging into this ineffable realm. ED.: At the end of his lite, Asger Jorn claimed that every painter had to maintain his own black hole. Is it your case? PK: First, I must say that it is easier for a painter to paint than to talk about painting. I feel incompetent to translate what I do in terms of language. What I can say, however, is that painting leads me to unknown places, places I did not expect at the beginning. When I finally get to the end of a work I usually say to myself, "Oh! So that's the way it looks!" At the beginning, I always have a certa in number of ideas. I always start wíth a strange memory that I express in terms of colour. Not colours such as we find in tubes or the names we give to them, red, blue, yellow, etc. but colours that are connected to things that have happened, a sinking ship, or your wite leaving you or things like that. One could see there a connotation of a psychological order. But at present, I do not think in those terms but in a pictorial way. I register a set of colours. After that Ilook for a form, a motif The motit may not mean very much, but I have to start wíth something. And when Ileave my workshop, /'m often convinced that /'ve found the right form.But when I come back, it collapses. Then begins the long journey of painting, beca use each time I add new things, new ideas. I even try to forget lhe obsessive memory that was at the beginning of the work. Then one day, at the end of the long journey, the painting is over, it is there. Then comes the moment in which I say: "Oh! So, that's the way ít looks! If only I had known that at the beginning, it ali would
nesses termos, mas de um modo pictórico. Registro um conjunto de cores. Depois, procuro uma forma, um motivo. O motivo pode não representar muito, mas tenho de começar com alguma coisa. E quando deixo o ateliê, geralmente estou convencido de ter encontrado a forma certa. Mas quando volto ela costuma desmoronar. Então começa a longa jornada da pintura, porque a cada vez acrescento coisas novas, novas idéias. Tento até esquecer a memória obsessiva do início do trabalho. Então, um dia, no final da longa jornada, a pintura está pronta, está ali. Chega o momento em que digo: "Ah, então é essa sua aparência! Se eu soubesse disso no começo, tudo teria sido muito mais fácil!" E vejo com total convicção que era aquilo que estava procurando o tempo todo! Minha pintura sempre exige um longo período de gestação, seguido por um longo período de trabalho, e no final cada pintura completa um ciclo. Costumo conservar um trabalho acabado perto de mim por muito tempo. Tenho de tomar cuidado para resistir à sedução da pintura e não cair na armadilha de pensar que está acabada porque parece interessante ou inteligente, ou porque os diversos elementos estão bem construídos ou são surpreendentes. Em meu trabalho, as idéias e conceitos assumem um caráter mais experimental. Quando sucumbo a eles, tenho de ser cuidadoso; quando acontece, obrigo-me a trabalhar mais um mês numa pintura. Digo a mim mesmo: "Ah-ah, você fez de novo! Pensou que a pintura estava terminada, mas na verdade não é uma pintura, e sim uma ridícula peça de especulação!" Meu "buraco negro" talvez sejam os momentos ~m que dou um pulo e digo: "Não é uma pi~tura de verdade". As vezes, certas idéias tenazes me detêm. E então que a escrita se insinua, porque nessas ocasiões escrevo muito para livrarme dessas idéias e continuar pintando. Em conseqüência, é difícil explicar ou analisar minha pintura através do que escrevo ... escrever é uma espécie de escape, uma válvula de segurança que me permite continuar pintando. E.D.: Você fala de seu trabalho como uma espécie de progressão que começa com uma cor e termina numa pintura. P.K.: Minha pintura baseia-se na cor. Isso é o que me distancia de muitos pintores de minha geração - estou pensando em lüpertz, Penck, Immendorff, etc. Quanto a isso sou muito nórdico. Não é algo que possa ser programado, algo que eu racionalize. Sinto a cor de um modo diferente. Na Europa central e no Mediterrâneo você tem esse conceito de forma e cor. A forma domina, a cor preenche e pode ter um papel muito expressivo. O que diferencia a arte escandinava é que a cor em si pode dominar a função da forma, pode substituí-Ia. Isso acontece no meu trabalho. E gerou muita incompreensão entre o público. Além disso, não combina tanto com os tempos modernos, porque estamos muito habituados a ver reproduções que não podem mostrar essa qualidade de uma pintura. Posso demonstrá-lo por minha própria experiência. Algumas vezes fui ver uma pintura famosa e meu primeiro pensamento foi: "Bem, é um tanto escura, não? Parece empoeirada. Não é nada do que eu esperava!" Mas então, se você ficar olhando um pouco para o quadro, algo atrai seu olhar. A princípio parece interessante. Então, se você ficar mais tempo, transforma-se em algo realmente sensacional. O que quero dizer é que compreender uma pintura significa passar certo tempo com ela; quanto mais, melhor, e esse tempo é raro hoje em dia. Veja a Documenta, por exemplo, onde milhares de pinturas são expostas. Na verdade, o que o público quer é ordenar as impressões, colocá-Ias em caixas, sentir que pode compreender as emoções evocadas pela arte. Quanto mais uma pintura gira em torno da cor, mais é difícil encaixá-Ia num determinado nicho. Acho que uma pintura pode evoluir em etapas formais, mas não acho que deva seguir um desenvolvimento formal. Pintar refere-se a... digamos, psicologia. Não no sentido comum, mas psicologia em termos do que é específico, do que é estranho, do que torna essa pintura diferente de outras; do que expressa a necessidade que há por trás dela, o poder e coisas assim. Acredito que não se pode
have been somuch easier!" And I see with intimate conviction that was what I was looking for ali alongl My paintings always need a long gestation period followed by a long working period, and in the end each painting completes a loop. I often end up keeping a completed work near me for a long time. I have to be very careful to resist being seduced by a painting and falling into the trap of thinking that it's finished because it seems interesting or clever or because different elements are striking or well-constructed. In my work, ideas, concepts, assume a more experimental character. When I succumb to them, I have to be very careful; when it happens, I make myself work for another month on a painting. I say to myself, "Oh-oh, you've done it againl You've thought it was a finished painting, but in fact it's not a painting at ali but a lousy piece of neat speculation!" My "black hole" is maybe those moments in which I take the leap and say, "It's not a real painting". At times certa in tenacious ideas grip me. It is then that writing creeps in, beca use at those times I write a lot to get rid of those ideas and get on with painting. As a result, it is difficult to explain or analyze my painting through my writing... beca use writing is a sort of outlet, a safety valve that allows me to keep on painting. E.D.: You speak of your work as a sort of progression that starts from a colour and ends with a painting. PK.: My painting is based on colour. This is what sets me apart from many painters of my generation - /'m thinking of Lüpertz, Penck, Immendorff, etc. In that way /'m very Nordic. It is not something that cari be programmed, something that I think about. I feel colour in a different way. In Central Europe and in the Mediterranean you have this concept of form and colour. Form dominates, colour fills it and it can play a veryexpressive role. What sets Scandinavian art apart from the rest is that colour in itself can take over the function of form, it can substitute formo This is so in my work. And it has caused a good deal of misunderstanding with the public. Moreover, it doesn't go so well with modem times because we are so usedto looking at reproductions which are not able to bring out this quality of a painting. I can prove this from my own experience. There have been times when I have gone to see a famous painting and my first thought was, "Well, it's rather dark, isn't it? It looks dusty. It's nçt what I expected at ali I" But then, if you stay a while and stand looking at the painting, something catches your eye. At first it looks mildly interesting. Then, if you stay long enough, it grows into something really sensational. What I mean is that understanding a painting means speding time on it; the more time the better, and this time is no longer available to uso Take the Documenta, for example, where thousands of paintings are exhibited. Indeed, what the public wants is to order impressions, put them into boxes, to feel that they can comprehend the emotions which art evokes. The more a painting revolves around colour, the more difficult it is to do this, to fit it into a neat box. To get back to painting, I think that a painting can progress in formal steps, but I do not think that a painting must follow a formal development. Painting is about - let's call it psychology. Not psychology in the normal sense, but psychology in terms of what is specific, what is strange, what makes this painting different from other paintings,' what expresses the need behind it, the power and things like that. I believe that you cannot calcula te this fact, you cannot calculate the psychology of a painting. If you try, you'lI just come up with idle gossip. That is why I believe in little formal jumps, outside of continuity. And each time, a little door opens up, a little door through which a breeze blows and it swallows you up. But if you dwell on the formalistic approach, then the door remains closed; you become hermetic. That is why I think in terms of leaps, necessary leaps, formalleaps that open up new paths. If things fail to progress, I reckon that it's due to a lack of work or of patience. One must be able to tum one's back on a painting in progress for a week, and in general, it is then that the leaps takes place.
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calcular esse fato, é impossível avaliar a psicolog,ia de uma pintura. Se tentar, conseguirá apenas um blablablá inútil. E por isso que acredito em pequenos saltos formais, descontínuos. E a cada vez abre-se uma portinha, uma portinha pela qual sopra uma brisa que o engole. Mas se você insiste na abordagem f~rmalista, a porta continua fechada; você se torna hermético. E por isso que acredito em saltos, saltos necessários, saltos formais que abrem novos caminhos. Se as coisas deixam de evoluir, reconheço que é devido à falta de trabalho ou de paciência. Deve-se ter a capacidade de dar as costas a uma pintura em andamento por uma semana, e de modo geral é aí que ocorre o salto. E.D.: Em suas pinturas, há massas que se enfrentam como obstáculos intransponíveis. Em princípio, elas não são fáceis de entender, há algo reservado. P.K.: Minhas pinturas também possuem um claro sentido de espaço. Mas isso acontece de maneira estranha, porque você percebe isso e ao mesmo tempo sente-se fechado. Quer entrar nesse espaço e termina batendo a cabeça contra a parede. Não posso explicar isso; não sei por que é assim! E.D.: Logo, não há espaços abertos, mas muitos espaços fechados, dentro da pintura. P.K.:Sim. E.D.: De tal forma que o olhar deve ziguezaguear, deslizar e vagar entre diversos níveis de profundidade ... P.K.: Acho importante mencionar Picasso e Braque e o que eles viram, por um curto tempo, quando se ocuparam do cubismo. Isso foi entre 1907 e 1914, aqueles anos cruciais. Eles foram incapazes de compreender na época, e também mais tarde, o que estavam fazendo. Isso os assustou um pouco, e em certo momento pararam. Desde então, as massas de percepção, na época apenas vislumbradas, permaneceram intocadas. Elas contêm imensas possibilidades. A pintura americana, que influenciou a arte nas últimas décadas, bateu a porta que fora deixada entreaberta por Picasso e Braque. Deve-se voltar e ver, tentar descobrir o que havia atrás daquela porta. Eu mesmo tenho uma profunda sensação de que há ali um potencial insuspeito. O que tento fazer em minha pintura é escavar esse território inexplorado. Muitos não vêem isso porque insistem no aspecto da cor. Mas em minha mente há claramente um novo tipo de espaço emergente, que a maioria das pessoas ignora. Quando se olha para minha pintura, deve-se tentar descobrir a estrutura subjacente. E.D.: Sua pintura basicamente se relaciona tanto com a parede como com a natureza, na medida em que não apresenta um horizonte entre céu e terra. Não há obras suas em que o céu se destaque. P.K.: Você tem absoluta razão. Mas onde vivo a terra é plana e o céu tem uma presença tremenda. Você ressaltou uma coisa importante, mas que sou incapaz de explicar. Lembra-me Jorn. Ele sempre se manteve na tradição paisagística, já que todas as suas paisagens têm uma linha demarcatória, um horizonte. E.D.: Isso significa que sua relação com a natureza pode ser concebida em termos da parede, que toda relação com a natureza é o confronto de duas forças? P.K.: Sim, talvez. E.D.: Sua pintura não tenta de certa forma erguer parte da terra, elevar o chão? P.K.: Sim. É o que faço, até certo ponto. Sei, que sempre tomo a cor de um ponto da tela e a levo até outro ponto. E uma espécie de transferência, ou, digamos, de transplante. Esta metáfora é muito 316
E.D.: In your paintings, there are masses that face each other like unsurmountable obstacles. Your paintings are not easy to understand at first, there is something reserved about them. PK: My paintings also have a clear sense of space. Yet it happens in a strange way beca use Vou experience this sense of space, and at the same time Vou also feel enclosed. You want to enter this space and vou end up knocking your head against the wall. I cannot explain that; I don't know why it isl E.D.: Therefore, there are no open spaces, but many closed spaces within the painting. PK: Yes. E.D.: In such a way that one's eye must zigzag, slalom and meander through different leveis of depth. .. PK: I think it is important at this point to mention Picasso and Braque and what they saw, for a very brief time, when they were busy with cubismo This was back sometime between 79D7 and 7974, during those very crucial years. They were unable to understand at the time, nor even later, what they were doing. This scared them a little, and at a certa in point they stopped. Since, the masses of insights, only glimpsed at then, have remained untouched. They contain immense possibilities. American painting, whichhas influenced the last decades in art, slammed shut the door which was left ajar by Braque and Picasso. One must go back and see, try to find out what was behind that door. Myself, I have a deep feeling that there is unsuspected potencial there. What I try to do in my painting is to delve into this unexplored territory. Many people do not see it beca use they insist toa much on the colour aspect. But in my mind there is clearly a new kind of space emerging which most people ignore. When Vou look at my painting, vou must try to rediscover the structure that lies undemeath. E.D.: Basica//y, your paintings relate as much to the wall as to nature insofar as they appear head on, with no horizon between sky and earth. There are no works of yours in which the sky stands out. PK: You are completely right. Yet, where Ilive the land is flat and the sky is tremendously present. You have put your finger on something important, but which I am unable to explain. It reminds me of Jom. He has always stayed in the landscape tradition insofar as ali his landscapes have a demarcation line, a horizon. E.D.: Is this to say that your relation with nature can be conceived in terms of the wa//, that every relation to nature is the confrontation of two forces? PK: Yes, perhaps. E.D.: Doesn't painting, your painting, try in some way to lift part of the earth, to raise the ground? PK: Yes. This is what I do to an extent. What I know is that I always take the colour from one point of the canvas and I carry it over to another point. It is a sort of transfer, or, let's say, transplantation. This metaphor is very important to me because when I paint I like to think of myself as a gardener. My canvas is the plot of land and my colours - that is, the matter of the paint itself - are the soil, the flower beds, with their different components and varying textures. Here there is a dark spot, over there it's much brighter. I tum the soil over to let in the air and I move the beds about, like a gardener. I come and go from one part of the canvas to another. Here, the bed is sad, over there it needs a bit móre light. This may be a quaint way of speaking; yet, in practice, it is exactly how I work.
importante para mim, porque quando pinto gosto de pensar em mim mesmo como um jardineiro. Minha tela é o terreno e minhas cores isto é, a própria matéria da tinta - são a terra, os canteiros, com seus diferentes componentes e texturas. Aqui há uma mancha escura, ali é muito mais brilhante ... Reviro o solo para deixar penetrar oar e mudo os canteiros de lugar. Vou e volto entre as partes da tela. Aqui o canteiro é triste, adiante precisa de um pouco mais de luz. Pode ser uma maneira estranha de falar, mas na prática é exatamente como eu trabalho. E.D.: Ao longo de seu trabalho, você visualiza imagens esboçadas, como os escritores que ouvem murmúrios de seus pensamentos enquanto escrevem? P.K.: Em meu caso é essencialmente uma questão de cor... de minha memória da cor acima de tudo. A cada vez, adoto uma cor específica, sem saber o que signtlica. Às vezes luto durante meses com uma cor maravilhosa, mas não é aquela que estou realmente procurando. A linha mestra é essa cor que brota de minha memória. Claro, às vezes surgem imagens em minha mente, ou simplesmente brotam na tela. Isso é um paradoxo, porque trabalho com essas imagens que não são importantes para mim, mas elementos que dialogam com essa memória de cor que tenho. Estou falando de cor num sentido muito amplo, místico. As imagens não são a base do meu trabalho, são apenas ferramentas; são intercambiáveis. E.D.: O que acontece quando ,você começa a pintar? P.K.: Começo com um ponto. E um recipiente, um reservatório de idéias, uma memória. Faço muitos esboços, demais até. Com o tempo, aprendi a usar imagens e, através do desenho, a mobilizar as forças que contêm. Aprendi a desenvolver essa força. Em minhas novas pinturas, pode-se ver novas imagens; sem dúvida elas vêm de meus esboços. Aprendi que, ao se trabalhar bastante com imagens, acabase por esgotá-Ias. Veja Picasso, que trabalhava um tema até que não restasse mais nada, apenas cinzas. Baseltiz também trabalha dessa forma. Quando você chega às últimas conseqüências, o material finalmente perde a resistência e se rompe, como o metal de um avião usado demais. O que fascina na pintura é que, no momento em que as velhas imagens se partem e desmoronam, novas imagens emergem. Em meu caso, esse processo é menos sistemático simplesmente porque dou menos ênfase às imagens. Pode-se dizer que o faço num nível mais inconsciente. E.D.: Você trabalha em uma única tela por vez? P.K.: Não. Há muitas delas em progresso. Por um lado, uma pintura me exige muito tempo; por outro, trabalho em vários ateliês ao mesmo tempo. Tenho quatro. Quando deixo um deles, posso não voltar por três meses, e quando volto percebo que continuei a pintar no fundo da mente. Quando isso' acontece, posso terminar um ou dois quadros rapidamente. E.D.: Você sempre precisa de um trabalho inacabado perto de você, em cada ateliê? P.K.: Não. Tenho todos na cabeça. É uma questão de deixar a pintura amadurecer, por assim dizer, como um vinho. Há algumas que se esquece e amadurecem como licores raros, outras tornam-se vinagre. Mas às vezes me esqueço completamente delas e acabo refazendo a mesma pintura num ateliê diferente.
EO.: During the course of your work, do you visualize sketchy images, such as writers who hear a certa in murmur of their thoughts while writing? PK.: In my case it is essentially a matter of colour. .. of my memory of colour above ali. Each time I tend towards a specific colour without knowing what it means. Some times I struggle for months with a superb colour, yet it is not the colour that /'m really looking for. The guideline is this colour that springs from my memory. 'Of course,'at times images come to mind or they mayJust spring up on the canvas. This is a paradox beca use I work with these images that are not very important to me, and yet theyare elements that converse with this colour-memory that I have. I am speaking about colour in a very mysticaJ, broad sense. The images are not at the base of my work, they are just tools; theyare interchangeable. EO.: When you begin to paint, what happens? PK.: I begin with--a point. It is a container, a reservoir of ideas, a memory. I sketch a lot, enormously. Over time, I have leamt to use images, and, through sketching, to mobilize the force that they hold. I have leamt to develop this force. In my new paintings you see new images; no doubt, they come from my sketching. I have leamt that by working with images very much you end up by exhausting them. Look at Picasso, who worked a theme until there was nothing left, just ashes. Baseltiz works in thisway, as well. When you go to the bitter end your material finally looses resistance and cracks, like the metal of an airplane that is over-used. What is fascinating in painting is that, at the moment the old images break up and crumble, new images emerge. In my case, this process is less systematic for the simple reason that I put less emphasis on images. You might say that I do it on a more unconscious leveI. E.O.: 00 you work on a single painting at a time? PK.: No. There are many of them in progresso For one reason, a painting takes me a long time, for another, I work in several studios at once. I have four in ali. When Ileave one studio, I might not set foot in it again for three months, and when I do go back I realize that I had been continuing to paint in the back of my head.So when it happens, Iam able to finish one or two very quickly. E.D.: 00 you always need an unfinished work next to you, in each studio? PK.: No. I have them ali in my head. It's a matter of letting the painting mature, so to speak, like a wirie. There are some that you forget and they mature into exquisite liqueurs, others tum to vinegar. However, sometimes I forget about them completely and I end up re-doing the same painting in a different studio. EO.: You work with relatively unusual canvases, very large in size ... PK.: For me, theyare normal sizes. The most unusual ones are two metres by two. Theyare square, and for me the square is a difficult shape to handle. I like to use large canvases," but I also use smaller ones. For me, the smaller canvases are more difficult to handle. On a large-scale canvas, a big fie/d of colour a/ways has an intrinsic value. On a smal/er format, that becomes more complicated, Vou have to be more precise, you have to know exact/y what you want and be ab/e to formu/ate it with great precision. You have to be sharper, and you take more risks when you work on a small canvas.
E.D.: Você trabalha com telas bastante incomuns, muito grandes ... P.K.: Para mim, são de tamanho normal. As mais incomuns são as de dois metros por dois. São quadradas, e para mim o quadrado é uma forma difícil de lidar. Gosto de usar telas grandes, mas também uso menores. Para mim, quanto menor a tela mais difícil. Numa tela grande, um grande campo de cor sempre tem um valor intrínseco. 317
Num formato menor, isso se torna mais complicado, você deve ser mais precis·o, tem de saber exatamente o que quer e ser capaz de formular isso com maior precisão. Deve ser mais exato e corre mais riscos quando trabalha com uma tela menor. E.D.: Você já recortou telas menores de uma maior, como fez Bonnard? P.K.: Não, nunca. O formato é definido desde o princípio, e sempre trabalho uma pintura até ela estar pronta. Quando uma não me satisfaz, sei que devo trabalhar nela mais e mais, até terminá-Ia. Posso demorar muito até ter certeza de que está acabada. E.D.: Você já tentou retrabalhá-Ias mais tarde (estou pensando em Rouàult e Tal-Coat, que não hesitam em retrabalhar uma pintura mesmo após vários anos ... )? P.K.: Não. Para mim, o que está pronto está pronto! E o próprio tempo faz seu trabalho. Quando uma pintura sai do ateliê não me preocupo mais com ela. Jorn, por outro lado, costúmava retornar a suas pinturas, mesmo que houvessem sido vendidas ou dadas a amigos. As pessoas que possuíam seus quadros se preocupavam com a possibilidade de que um dia ele batesse à porta, dizel]do: "Desculpe, preciso acrescentar umas coisinhas àquele meu quadro" . Para piorar as coisas, ele costumava mudar completamente as pinturas quando as refazia! Isso tem a ver, creio, com sua forma de trabalhar. Jorn trabalhava suas pinturas de modo mais espontâneo. As melhores eram as que fazia de uma só vez. Eu sou muito mais lento. E.D.: Você tem idéia do número de pinturas que já fez até hoje? P.K.: Na Galerie Werner estão numeradas até cerca de 600, mas de um total de cerca de duas mil, entre as quais há muitas pequenas e outras de menor importância. É uma ,questão de postura. Um pintor não produz apenas objetos bonitos. E importante estar no meio, no coração de um movimento espiritual. Veja Jorn, por exemplo, cujo primeiro compromisso foi com o movimento Cobra, depois com o movimento situacionista. Re~ultado: ele se consid,erava uma espécie de pintor de domingo. Era sua forma de afetação. E alguém por quem tenho verdadeira estima. Tinha uma energia tremenda: pintava, escrevia livros... Foi também uma pessoa muito generosa. Acho que devo ter herdado muito dele. Por exemplo, o fato de estar envolvido em diversas atividades - pintura, escultura, literatura, etc. Sinto-me muito próximo de Jorn, embora ele pertença a outra geração e eu nunca o tenha conhecido pessoalmente. Fiz até um filme sobre ele. Meu objetivo era mostrar quem eie foi e o que representou. Sinto que cresci o suficiente, tenho idade suficiente para arriscar-me a isso. E.D.: Suas pinturas costumam tei' uma dinâmica horizontal, como se você trabalhasse por camadas, ou faixas, que surgem de cima para baixo. P.K.: Você está totalmente certo, e não sei exatamente por quê. Não sei mesmo. Mas agora estou tentando romper essa dinâmica, inscrevendo elementos verticais, uma estrutura que abre minha pintura. Mas isso é inconsciente. E.D.: Você tenta criar um estilo de pintura que contenha outro horizonte, mas também "desenvolvê-Ia" em termos de volume ... P.K.: Correto. É algo que comecei a descobrir na década de 80. Na época, parecia algo difuso, mas desde então tornou-se cada vez mais forte e bem construído. Minhas novas pinturas são mais positivas. Fui obrigado a isso, porque não queria arriscar-me a me tornar um pintor nórdico no pior sentido, marcado por um lirismo pobre e uma estrutura fraca. Fiz então um esforço consciente para pintar estruturas sólidas. O que quero agora é abrir minhas pinturas, manter as possibilidades abertas, usar o máximo potencial.
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E.D.: Have you ever, like Bonnard, cut up small canvases fram larger ones? PK: No, never. The format is set fram the beginning and I always work on a painting until it is finished. When a painting does not satisfy me, I know that I must work it over again and again until it is complete. It can take very long . before you are sure it is finished, sometimes it is a matter of years. E.D.: Do you ever try to re-work them later (/'m thinking of Rouault, Tal Coat, who don't hesitate to re-work a painting even after several years ... )? PK: No. For me what is finished is finished! For the rest, time does its own work. When a painting leaves the studio I don't worry about it any longer. Jorn, on the other hand, often went back to his paintings, even after they had been sold ar given to friends. People that had his paintings often worried that he'd knock on the doar one day, saying, "Sorry, I have to add something to that painting of mine!" To make matters worse, he usually changed the paintings completely when he re-did them! This ali has to do, I think, with his way of working. Jorn worked on his paintings more spontaneously. His best ones were dane in a single sitting. Myself, I am much slower. E.D.: Do you have an idea of the number of paintings you have dane up until now? PK: At the Werner Gallery, they are numbered at about 600, but fram a total of about 1.000, amongst which there are many small paintings, ar ones of lesser importance. It is a matter of attitude. A painter does not just praduce pretty objects. It is important for him to be in the middle, at the heart of a spiritual movement. Take Jorn, for example, whose first commitment was the Cobra movement and next, the situationist movement. Result: Jorn reckoned himself as a sort of Sunday painter. It was his form of coquetry. Indeed, he is someone for whom I have a great deal of esteem. He had tremendous energy: he painted, wrate books ... He was also a very generaus person. I feel that I have inherited a lot from him. For instance, the fact that I am involved in different activities - painting, writing, sculpture, etc... I fell very close to Jorn, although he belonged to another generation and I never really got to know him personally. I even made a film about him. My purpose was to show who he was and what he stood for. I feel that /'m grawn up enough, old enough to risk doing that. E.D.: Your paintings often have a horizontal dynamics, as if you worked by layers, ar stripes, which appear fram top to bottom. PK: You're absolutely right, and I don't know exactly why. I really don't know However, now /'m tryingto break this dynamic by inscribing vertical elements, a structure that opens up my painting. But it happens unconsciously. E.D.: You try to develop a style of painting that contains another horizon, but also to "develop" in terms of volume ... PK: That is exactly right. That is one thing I started to disco ver in the 80s. At that time it seemed to be diffused, but since, they have become increasingly firm and well-built. My new paintings are more assertive. I had to do that because I didn't want to risk becoming a Nordic painter in the worst sense, that is, one 'marked by poor Iyricism and weak structure. So I made a conscious effort to paint solid structures. What I want now is to open up my paintings, to keep the possibilities open, to use the maximum potential. E.D.: Your paintings contain lines, rings that are drawn. .. PK: Exactly. I work hard and honestly, with the sole desire to confer solidity to things. Sometimes my paintings are structured like works by Poliakoff I invest a lot in the paintings, but I feel that if you're not able to risk everything in the end, risk the seriousness that goes into it, then the whole thing just doesn't come off Why this risk? To make elements emerge spontaneously. So, it is very important for me, in the last minute, my back against the wall, to add these sometimes funny drawings, ar tattoos, to the surface of the
E.D.: Suas pinturas contêm linhas, círculos desenhados ... P.K.: Exato. Trabalho duro e com honestidade, com o único desejo de conferir solidez às coisas. Às vezes minhas pinturas são estruturadas como obras de PoliakoH. Invisto muito nas pinturas, mas sinto que se você não for capaz de arriscar tudo no fim, arriscar a seriedade que lhes foi dedicada, a coisa não acontece como um todo. Por que o risco? Para fazer elementos surgirem espontaneamente. Para mim é muito importante no último minuto, sob pressão, acrescentar esses desenhos às vezes engraçados, essas tatuagens, à superfície da pintura. Só então a pintura revela sua verdadeira identidade. São momentos muito intensos. Primeiro, ando de um lado para o outro como um urso ,enjaulado, oprimido pela tela, e então ajo subitamente, num impulso. As vezes sinto-me como um guerreiro samurai atacando! Todo esse processo é muito difícil, extremamente difícil. Na verdade~ preciso de certos ritos que me permitam agir e arriscar a pintura. E.D.: Acontece, nesses momentos, de você não atingir seu objetivo? P.K.: Sim, com mais freqüência do que se possa imaginar. Tenho então d,e refaz,er por completo a pintura, sua estrutura, sua organização. E um momento crucial. Muitas pessoas acham que esses signos são desenvolvidos ao longo do trabalho, mas não. Quando pinto, trabalho com um esforço doloroso, como um trabalhador, laboriosamente. Mas no final arrisco-me a perder tudo, a uma catástrofe. É um paradoxo, mas vivo-o como uma necessidade. Pode-se ver essa dupla natureza em todas as minhas pinturas. Também é muito difícil dizer quando funcionará e quando não. Para fazer as linhas caligráficas finais, tenho de destruir certas imagens. Quando digo "imagens", não é uma questão de representação, mas de luminosidade, de nervosismo. E.D.: Éo último impulso? P.K.: Quando termina o último estágio do trabalho, tenho uma pintura definida, bem construída. Então acrescento essas tatuagens para de certa forma romper a ordem. Ao mesmo tempo, elas podem reforçar ou alterar o valor plástico de certos elementos da pintura. Essas pequenas linhas produzem uma sombra na pintura. Acrescentam complexidade, introduzem um diálogo. Mas confesso que esse método confunde muita gente. Não sou, como em geral se acredita, um pintor gestual. E.D.: Na verdade, você está chegando a uma espécie de domínio indominado, ao planejamento do não-planejado ... P.K.: Sim, é um momento crucial que exige concentração e meditação, mas não meditação no sentido clássico. Está mais próximo do tipo de reação condicionada que se tem numa emergência. Comparo-o a situações na vida de minha família em que, por exemplo, minha esposa poderia gritar: "Temos de sair em cinco minutos!" Quando ouço isso, sou subitamente forçado a mobilizar toda a minha energia e iniciar a ação. E.D.: Suas pinturas nunca são assinadas. P.K.:,Não gosto. Meu nome está escrito no verso, em letras de fôrma. Assinar é tão pretensioso! A natureza não assina nada. Meu sonho é que minhas pinturas acabarão voltando a ser algo absolutamente comum.
paíntíng. It ís only then that the paíntíng reveals íts true ídentíty. These moments are very íntense. At fírst, I pace around líke a caged bear, oppressed by thís canvas, and then I act suddenly, ímpulsívely. I sometímes felllíke a Samuraí warríor chargíng ínto combatI Thís whole process ís díffícult, extremely díffícult. In fact, I need certaín rites whích enable me to act, to rísk the paíntíng. ED.: Does it ever happen, at those moments, that you faíl to reach your objectíve? . PK.: Yes, very often, more often than one míght thínk. Then, I have to redo the paíntíng totally, its structure, its organízatíon. It ís an extremely crucial momento Many people thínk these sígns are developed duríng the course of the work. Thís ís not the case. When I paínt, I work wíth paínstakíng effort, líke a labourer or a hard-workíng farmer. But at the end, I rísk losíng everythíng, wrecklessly. It ís a paradox, but I experíence ít as a necessíty. You fínd thís double nature ín ali of my paíntíngs. It ís also very díffícult to say when ít wíll work and when ít won't. In order to make the fínal callígraphíc línes, I have to explode certaín ímages. When I say "ímages", ít ís not a matter of representatíon, but of lumínosíty, nervousness. ED.: It ís the last ímpulse .. ? PK.: When the fínal stage of the labouríous work ís over, what I have ís a neat, well-constructed paíntíng. 50, I add these tattoos to dísrupt the order somewhat. At the same tíme, they may reínforce or alter the plastíc value of certaín elements ín the paíntíng. These tíny línes throwa shadow on the paíntíng. They add complexíty, íntroduce a díalogue. But I admit, thís method has led many people astray. I am not, as there has been a tendency to belíeve, a gestural paínter. ED.: What you are arrívíng at, ín fact, ís a sort of unmastered mastery, calculatíon of the uncalculated. .. PK.: Yes, it ís a crucial moment that requíres concentratíon and meditatíon, but not medítatíon ín the classícal sense. It ís closer to the sort of reflex responses one has ín an emergency. I can compare ít to sítuatíons ín my famíly lífe ín whích, for example, my wífe míght shout, "We have to leave ín 5 mínutesf" When I hear that, Iam suddenly forced to mobílíze ali my energy and launch ínto actíon. ED.: Your paíntíngs are never sígned. PK.: Because I don't líke that at ali. My name ís written on the back ín block letters. Sígníng ís so pretentíous. Nature sígns nothíng. You know, I dream that my paíntíngs wíll end up by returníng to somethíng absolutely normal. ED.: When a Chínese paínter depícts nature, he belíeves that hís pícture changes somethíng ín the order of thíngs. PK.: Unfortunately, we are not able to experíence such an attítude. For that,one must nurture the ídea that we come from nature and that we wíll go back to nature. I myself belíeve that true nature ís found beyond nature. The problem ís that we see thíngs through our own thoughts. It ís the consensus that makes us do so. We translate ali the tíme and we are expected to use consensual ímages, whích we use líke we would use tools, to produce ímages and, as a result, we dístort the true beauty of nature. If I knew more about phílosophy, I could probably speak about ít better. In the tradítíon of western thínkíng, nature ís a major concept - look at Plato and ali of the great Greek phílosophers. In my mínd thís ís somethíng very sophístícated.
E.D.: Quando um pintor chinês retrata a natureza, ele acredita que sua pintura muda algo na ordem das coisas. P.K.: Infelizmente, não somos capazes de vivenciar tal postura. Para isso, é preciso nutrir a idéia de que viemos da natureza e que
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voltaremos a ela. Acredito que a verdadeira natureza está além da natureza. O problema é que vemos as coisas através de nossos pensamentos. é" o consenso que nos faz agir assim. Traduzimos o tempo todo, e esperam que úsemos imagens consensuais, que utilizamos como se fossem ferramentas para produzir imagens e, em conseqüência, distorcemos a verdadeira beleza da natureza. Se eu conhecesse mais filosofia poderia falar melhor sobre isso. Na tradição do pensamento ocidental, a natureza é um dos principais conceitos - veja Platão e todos os grandes filósofos gregos. Para mim, isso é algo muito sofisticado. E.D.: Há pouco você falava da cor como ponto de partida de sua pintura; a matéria é o ponto de partida de sua escultura? P.K.: Sempro uso gesso, e sempre começo dando a mim mesmo uma base. Não me deixo partir de maneira aleatória. As grandes esculturas são chamadas Portão ou Entrada. Isto porque começo moldando uma estrutura através daqua~ se possa passar, como uma porta, um arco, uma fronteira. Por quê? E inexplicável. Esse . procedimento está começando a me incomodar cada vez mais; mas é assim que faço, uma estrutura com a qual começo e que à medida que o trabalho avança fecha-se em si mesma, dobra-se, até que o portão ou passagem tenha desaparecido por completo. Paro quando não há como acrescentar mais nada. A superfície não me interessa muito. É a forma que conta, em geral, não o modo como ela se manifesta. Logo, não jogo com os efeitos da matéria ou coisas do gênero. E.D.: Também há formas fantasmagóricas que lembram formas humanas ou partes do corpo - pernas, cabeça, etc. P.K.: Esses elementos não são importantes, como não são importantes as imagens básicas das pinturas. São intercambiáveis. O que me interessa é o que existe na escultura, e isso não posso explicar. E.D.: Quando você começou esse trabalho? P.K.: Sempre trabalhei com escultura. Na década de 60 já havia feito algumas instalações. E.D.: E essas instalações têm a ver com as esculturas ambientais? P.K.: Exatamente. Mas qual a diferença, a não ser que as esculturas monumentais não têm pedestais? Elas erguem-se livremente. Além disso, comecei as esculturas de bronze no início dos anos 80. De certo modo, foi Baselitz quem primeiro me inspirou, na Bienal de Veneza. Foi muito mais fácil para Penck, Lüpertz e eu seguirmos o movimento pelo fato de Werner cobrir todas as despesas. Sua contribuição foi incomensurável. O que acho interessante é a emulação que reina nesse grupinho de artistas que se reuniu na Galerie Werner. Há uma espécie de competição. E.D.: Quando você trabalha com gesso, pensa em termos de gesso? P.K.: Não, sempre penso em termos do resultado final - isto é, o bronze -, porque o modelo é sempre sacrificado. Poderia pensar em termos de gesso se estivesse fazendo uma escultura em gesso. Já fiz isso quando não estava bem de finanças. E.D.: Você trabalha com escultura enquanto pinta ou esculpir é uma espécie de "descanso" da pintura? P.K.: Nunca paro de pintar, na verdade, mas a escultura ·me absorve. É muito demorada, mas ainda assim tenho tempo para pintar nas praias! Nunca interrompi meu trabalho em um meio para dedicar-me a outro. Por exemplo, desde que era estudante mantenho um diário.
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ED.: A while ago you were speaking of colour as the starting point of your painting; matter is the starting point of the sculpture, isn't it? PK: I always use plaster, and I always begin by giving myself a base. I do not let myself go in an undirected fashion. The great sculptures are ali called Gate ar Entry. This is because I begin by shaping a structure through wich one may pass, such as a doar, a threshold, an arch. Why? It's inexplicable. This way of proceeding is beginning to bother me more and more; but that's the way it is, it's a frame with which I begin, and as the work progresses it closes in on itself, folds up, until the gate ar passage has entirelly disappeared. I stop when there is no way to add anything else. The surface does not interest me very much. It is the form that counts in general, not the way in which it is manitest. Therefore, I do not play with the effects of matter ar things of that sort. ED.: Also, there are ghost-like forms that remind one of human forms, ar parts of the body - legs, heads, etc... PK: To the same extent, that ground images in the paintings are not important, neither are these elements. Theyare interchangeable. What interests me is what is in the sculpture that I cannot explain. ED.: When did you begin this work? PK: I reckon that /'ve always worked at sculpture. In the 60's I had already built some installations. ED.: And these installations have to do with the environmental sculptures? PK: Exactly. But what's the ditference, other than the fact that the monumental sculptures have no pedestal? They stand freely. Moreover, I started the bronze sculptures at the beginning of the 80's. In a way, it was Baselitz who first inspired me at the Venice Biennial Festival. It was much easier forPenck, Lüpertz and myself to follow the movement owing to the fact that Werner covered ali the expenses. His contribution was immeasurable. What I find interesting is the emulation that reigns in this little group of artists of ours that gathers around the Werner Gallery. There is a sort of competition. ED.: When you work with plaster, do you think in terms of pias ter? PK: No, I always think in terms of the end result - that is, bronze - because the model is always sacritied. I could think in terms of plaster it I were making a plaster sculpture. This, I have dane at times when my finances were tight. ED.: Do you make these sculptures while you paint, ar does sculpture constitute a sort of "holiday from painting?" PK: I never really stop painting, but sculpture does absorb me. It takes very long to do, but then again I still have time to paint on the beaches! I have never interrupted work in one medium to pursue another. For example, ever since I was a student I have kept a journal. Sometimes I find myself hating this constraint it seems so pretentious, pedantic and removed from lite. At times I stop, but then I soon feel that f'm missing something. Even when f'm not especially inspired, I keep on painting. When f'm away travelling, ar whenever I cannot paint manually, I continue to paint in my head. ED.: Your environmental sculptures are much more well built. .. PK: They obey a certain inner pattern. The environmental sculptures, more than those in bronze, describe lite in space. Theyare machines to capture light. ED.: In fact, which function do you attribute to yourself as a painter? In your eyes, do you fill a role? PK: This is a question which I have to answer twice - once Iam unable to split myself in two! There is the statement of the everyday citizen and that of the painter. If you are asking the painter it he has a function in society, then my answer is a categorical no, beca use when f'm busy painting a picture no
Às vezes me pego odiando essa obrigação; parece muito pretensiosa, pedante e distante da vida. Às vezes paro, mas logo sinto que está faltando algo. Mesmo quando não estou especialmente inspirado, continuo pintando. Quando estou em viagem, ou quando não posso pintar de forma manual, continuo a pintar mel1talmente. E.D.: Suas esculturas ambientais são muito mais bem-construídas ... P.K.: Elas obedecem a um certo padrão interno. As esculturas ambientais, mais que as de bronze, descrevem a vida no espaço. São máquinas de capturar luz. E.D.: Que função você atribui a si mesmo como pintor? Em seu ponto de vista você cumpre um papel? P.K.: Essa é uma pergunta que tenho de responder duas vezes, já que sou incapaz de me dividir em dois! Há a opinião do cidadão comum e a do pintor. Se você perguntar ao pintor se ele tem uma função social, então minha resposta é um categórico não, porque quando estou ocupado pintando ninguém precisa des~a pintura. Pinto como um indivíduo movido por razões específicas. E uma decisão pessoal no sentido kirkegaardiano do termo. Como cidadão comum, ao olhar para essa pintura se encontram várias razões para justificar a arte contida nela. Você também perceberá que sua função não é apenas preencher nichos em museus ou acrescentar cor a ambientes agradáveis. Olhando cuidadosamente para ela, verá que não se adequa completamente a um padrão de pensamento acadêmico ou intelectual; pelo contrário, pode instá-lo a olhar para suas próprias mãos! Esta é uma observação muito interessante, porque aponta para algo que praticamente desapareceu de nossa sociedade. Cada vez mais nos esquecemos de pensar com as mãos, e isso é muito ruim. Refiro-me à arte feita por computador, ou vídeos e todas essas invenções sem sentido. Quando você tem um pincelou lápis na mão, as coisas subitamente parecem muito mais complexas do que tudo o que você já havia imaginado. Acredito que um artista deve insistir em modos de pensar cada vez mais diretos. Este é o caminho mais responsável, o que prova que toda nova decisão abre novos caminhos. Quando você se decide a fazer arte, é sua decisão pessoal, e de certa fórma não se encaixa em lugar nenhum. É uma decisão pura. Além disso, olhar para a arte não tem absolutamente nada a ver com as fórmulas supostamente contemporâneas que doutrinam as massas com a idéia de que devem ver a arte. Este é o grande erro de nosso tempo: tentar atrair o maior número de pessoas para os museus. Acho que é um modo de pensar profundamente anti democrático. Para mim, é bom dizer, se existe um museu e se a sociedade deseja museus, a única justificativa possível para esse museu é que ele seja capaz de mudar a vida de apenas um ou uma jovem. Isso basta por si, e é a maneira verdadeiramente democrática de pensar. Infelizmente, não é o caso hoje. De todas as pessoas que invadem os museus e grandes exposições, poucas estão ali por vontade própria. Pelo contrário, são instadas p~la mídia, obrigadas por considerações econômicas ou pela moda. E minha crença pessoal, no entanto, que a verdadeira missão da arte é provar que cada um possui seu próprio poder de decisão, sua própria inici,!tiva. Talvez eu diga isso porque sou dinamarquês. Não posso evitar. E Kirkegaard.
one needs it. I paint it as an individual moved by specific motivations. It is a personal decision in the Kirkegaardian sense of the termo As an everyday citizen, you take a look at this painting and you will find plenty of reasons to justify its art. You will also realize that its function is not just to fill niches in museums or add colour to cozy places. Looking at it carefully, you will see that it cannot completely fit into an academic or intellectual frame of thought on the contrary, it may prompt you to look at your own hands! This is a very interesting observation beca use it points to something that has ali but vanished from our society. More and more, we are forgetting to think with our hands, and this is very bad. /'m referring to the art made by computer, or vide os and ali of those senseless contraptions. When you've got a brush or pencil in hand, things suddenly seem much more complex than anything you had ever imagined. I believe that an artist has to insist on ever more straightforward ways of thinking. This is the most responsible way, the one that proves that ali new decisions pave new paths. When you make up your mind to do art, it is your personal decision, and, in a way, it doesn 't fit in anywhere. It's apure decision. Moreover, looking at art 'has absolutely nothing to do with the supposedly contemporary formulae that indoctrinate the masses with the idea that they should be looking at art. This is the big mistake of our time: to attempt to attract as many people as possible into the museums. I think this is a profoundly undemocratic way of thinking. In my mind, one should say that, if a museum isavailable, and if the society wants museums, then the only possible justification for that museum is that it is liable to change the life of just one young person. This is enough in itself, and it is the truly democratic way of thinking. Unfortunately it is not the case today. Df ali the people that pour into the museums and great exhibitions, feware there by their own volition. Instead, they are prompted by the media, obliged by economic considerations, or by fashion. However, it is my personal belief that the true mission of art is to prove that each one possesses his own decision making power, his own initiative. Perhaps I say this because /'m Danish. I can't help it. It's Kierkegaard.
* Transcribed from the catalogue of the exhibition Per Kirkeby, organized in collaboration with the Galerie Michael Werner, at the Galerie Philippe Guimiot, Brussels, 7997. © Eddy Devolder
* Transcrito do catálogo da exposição Per Kirkeby, organizada em colaboração com a Galerie Michael Werner, na Galerie Philippe Guimiot, Bruxelas, 1991. © Eddy Devolder
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Nasceu em 1938, em Copenhague, Dinamarca. Formou-se em geologia na Universidade de Copenhague e estudou pintura, desenho, técnicas de gravura, cinema em 8 mm e performances na Escola de Arte Experimental de Copenhague. Visitou a Groenlândia, a América Central ~ara estudar a arte dos maias, o Ártico e a União Soviética, além da Austrália, Nova Zelândia e Extremo Oriente. Kirkeby é um artista completo. Produziu pinturas a óleo, aquarelas, cartazes. Fez gravuras, participou de performances, realizou instalações. Étambém poeta, romancista e ensaísta, além de cenógrafo. Vive e trabalha em Copenhague e Frankfurt. He was bom in 7938, in Copenhagen, Denmark. He graduated at the University of Copenhagen, in Geology, and at the Experimental Art School in Copenhagen, where he studied painting, drawing, engraving techniques, 8 mm film-making and performances. He visited Greenland, Central America to study Mayan art, the Arctic, and the Soviet Union, as well as Aus tra lia, New Zealand and Far East. Kirkeby's work ranges from painting and sculpture to literature and film-making, involving several means. He lives and works in Copenhagen and Frankfurt. Exposições individuais/Solo exhibitions 1964 Hoved-Biblioteck, Copenhague (desenhos e colagens/ drawings and collages). 1965 Den Freie Ulstillingsbygning, Copenhague (primeira mostra pessoal com a Escola Experimental de Arte/first personal exhibition with the Experimental Art Schoo~.
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1967 Galeria 101, Copenhague (esculturas/sculptures). 1968 Jysk Kunstgaleri, Copenhague Kunstmuseum, Odense, Dinamarca. 1972 Daner Galeriet, Copenhague, Karlsons Klister 1; Gentofte Kunstbibliotek, Copenhague; Galleri Olsen, Fredericia. 1973 Galeria St. Petri, Lund, Suécia. 1974 Haderslev Museum, Haderslev; Galerie Michael Werner, Colônia. 1975 Daner Galleriet, Copenhague, Karlsons Klister 2; Statens Museum for Kunst, Copenhague (mostra retrospectiva de desenhos e gravuras/a retrospective exhibition of drawings and prints). 1976 Galerie Cheap Thrills, Helsinque, Finlândia; Ribe Museum, Ribe. 1977 Museum Folkwang, Essen, Alemanha. 1978 Galeria Sven Hansen, Copenhague; Galerie Michael Werner, Colônia; Kunstraum, Munique. 1979 Kunsthalle, Berna; Aarhus Kunstmuseum. 1980 Galeria Fred Jahn, Munique; Galerie Helen van der Meij, Amsterdam; Galeria Michael Werner, Colônia. 1981 Museum Ordrupgaardsaml ingen, Copenhague; Galerie Fred Jahn, Colônia. 1982 Galerie Michael Werner, Colônia; Galerie Springer, Berlim; Taidemaalant, Helsinque; Galerie Ascan Crone, Hamburgo; Nigel Greenwood Gallery, Londres; Stedelijk Van Abbemuseum, Eindhoven, Holanda; Galerie Fred Jahn, Munique. 1983 Galerie DAAD, Berlim; Galerie Sabine Knust, Munique;
Galerie Gillespie-LaageSalomon, Paris; Galeria Heinrich Erhardt, Madri; Galerie Ascan Crone, Hamburgo. 1984 Museu de Arte Moderna, Estrasburgo; Galeria Boibrino, Estocolmo, Galeria Anders Tornberg, Lund; Kunstraum, Munique. 1985 Douglas Hyde Gallery, Dublin; The Fruitmarket Gallery, Edimburgo; Galeria Knoedler, Zurique; Galerie Ascan Crone, Hamburgo; Galerie GillespieLaage-Solomon, Paris (pinturas, esculturas, filmes/paintings, sculptures, films); Whitechapel Art Gallery, Londres. 1986 Galerie Mühlenbusch, Düsseldorf; Kunstmuseum, Berna (filmes/films); Galeria Riis, Oslo; Galerie Michael Werner, Colônia; Galerie Thaaddeus Ropac, Salzburgo; Mary BooneMichael Werner Gallery, Nova Vork; Pamela Auchincloss Gallery, Santa Barbara, Califórnia. 1987 Kunstverein, Freiburg; Museum Boymans-van Beuningen, Roterdam; Musée St. Pierre, Lyon; Obras Recentes/Recent Works, Centre de Création Contemporain, Tours, França; Retrospectiva/Retrospective, Centre Régional d'Art Contemporain Midi-Pyrenées, Labeges, França. 1988 Kunsthaus Lempertz, Colônia (desenhos e esculturas 1979-1986/drawings and sculptures 7979-7986); Palácio de BelasArtes, Bruxelas (pinturas, esculturas e modelos em bronze/paintings, sculptures and models in bronze); Roger Ramsay Gallery, Chicago (pinturas, desenhos e gravuras/paintings, drawings and prints); Mary Boone Gallery, Nova Vork; Galeria Beaumont, Luxemburgo.
1989 Pamela Auchincloss Gallery, Nova Vork (escultura/sculpture); Galeria Bismarck, Bremen; Cleto Polcina, Roma; Galeria Lelong, Zurique; Galeria Wanda Reiff, Maastricht; Centro de Artes Nórdicas, Helsinque; IVAM Centro Julio Gonzales, Valência. 1990 Hildo Kropplein, Amsterdam; Graziella Graziani, Villa Domenica, Treviso; Louisiana Museum, Humlebaek; Galerie Biedermann, Munique; Moderna Museet, Estocolmo; Fred Hoffman Gallery, Santa Monica; Neue Galerie an Landesmuseum Joanneum, Graz, Áustria. 1991 Galleri Riis, Oslo; GaUeri Faurschou, Copenhague; Galerie Lelong, Zurique; Kunstverein Nord, Bremen; Gamarra Garrires, Madri; MIT List Visual Art Center, Cambridge, Mass. 1992 Michael Werner Gallery, Nova Vork; NordLB, Hanôver; Centre Nationale d'Art Contemporain de Grenoble, Grenoble; Galeria Kampl, Passau; Parrish Art Museum, Southampton, NV; Galerie Borkowski, Hanôver; University Art Museum, Berkeley (pinturas e desenhos/paintings and drawings); Galerie Michael Werner, Colônia. 1993 Centro de Artes Contemporâneas, Cincinatti; Galeria Hübner & Thiel, Dresden; Indianapolis Art Museum, Indianapolis; Galeria Wanda Reiff, Maastricht; A Arquitetura na Obra de Per Kirkeby/The Architecture in Per Kirkeby's Work; Galeria Beaumont, Luxemburgo; Musée de Toulon, Toulon, França; Museu de Arte da Cidade, Helsinque.
Fra Den Ny Verden, 1987 PK 446 óleo s/tela/ oil on canvas 200 x 175 cm Co leção Ga lerie Michael Werner, Inc. Foto Nic Tenwiggenhorn
Exposições coletivas/Group exhibitions 1976 Bienal de Veneza. Veneza. 1980-81 Museude Arte e Indústria de Saint-Etienne. .1981 Royal Academy of Arts. Londres. 1982 Documenta 7. Kassel; Guggenheim Museum. Nova Vork; Port of History Museum. Filadélfia; Municipal Art Gallery. Los Angeles; 4a Bienal de Sidney. Austrália. 1984 Museum of Modern Art. Nova Vork. 1985 Castello di Rivoli. Turim; Museu Calouste Gulbenkian. Lisboa. 1986 Carnegie Museum of Art. Pittsburgh; Hayward Gallery. Londres; Stãdtisches Museum im Lenbachhaus. Munique; Museum Ludwig. Colônia. 1987 Monumenta. Openluchtmuseum voor Beldhouwkunst. Middelheim. 1988 Hamburger Bahnhof. Berlim; Museo de Arte Contemporaneo. Prado. 1989 Museum Ludwig & Rheinhallen. Colônia; Museu Nacional de Arte Moderna. Paris. 1991 Museum Ludwig. Colônia; Kunstmuseum. Düsseldorf. 1992 Documenta 9. Kassel. 1993 Bienal de Veneza. Veneza. Obras expostas/Works in the exhibition Esculturas/Sculptures Kleines Modell für Architekturbeobachtung. 1975 PKK 1/2 bronze 17 x 12 x 18 em nº 2/6 Modell.1984 PKK36/4 bronze 15 x 17 x 17 em nº 4/6 Modell til murstensskulptur. 1984
PKK 33/1 bronze 23x6x7 em nº 1/6 ModelllV, 1985 PKK 45/1 bronze 25x 7 x 7 em nº 1/6 Modell V, 1985 PKK 46/1 bronze 25x 7 x 7 em nº 1/6 Modelll.1985 PKK 42/1 bronze 32 x 11 x 7 em nº 1/6 Modell VI. 1985 PKK 47/1 bronze 15x18x11 em nº 1/6 Modell VII. 1985 PKK 48/1 bronze 3 x 16 x 18 em nº 1/6 Modell VIII. 1985 PKK49/1 bronze 12 x 14 x 15 em nº 1/6 ModelllX 1985 PKK50/1 bronze 10 x28x26 em nº 1/6 Modell für Paris. 1985 PKK50/A2 bronze 25x29x14cm nº 2/6 Modell.1985 PKK 56/1 bronze 4 x 13 x 13 em nº 1/6 Modell für Kiel. 1985 PKK 57/1 bronze 6x20x20 em nº 1/6
Modell für Monchengladbach, 1985 PKK 58/1 bronze 4x20x19cm nº 2/6 Modell für Münster. 1986 PKK 59/1 bronze 28 x 12 x 12 em nº 1/6 Modell für Münster. 1986 PKK 63/1 bronze 4 x 14 x 14 em nº 1/6 Modell- Rotterdam, 1987 PKK64/2 bronze 14x28x25cm nº 2/6 Modell.1987 PKK 65/2 bronze 4 x 14 x 14 em nº 2/6 Modell. 1987 PKK 66/3 bronze 7 x 19 x 19 em nº 3/6 Modell für Valencia. 1989 PKK 76/0 bronze 13 x 28.5 x 26 em Pinturas/Paintings S/Título/ Untitled. 1977 PK20 óleo s/tela/oil on canvas 201 x 140 em S/Títu Io/Untitled. 1979 PK29 óleo s/tela/oil on canvas 206 x 130 em S/Títu Io/Untitled. 1980 PK 75/B óleo s/tela/oil on canvas 200 x 130 em S/Títu Io/Untitled. 1981 PK 133/H óleo s/tela/oil on canvas 200 x 130 em S/Títu Io/Untitled. 1982 PK 143
óleo s/te Ia/oil on canvas 200 x 130 em Arkitektur.1982 PK 144 óleo s/tela/oil on canvas 200 x 130 em Neue Baume I. 1984 PK313 óleo s/tela/oil on canvas 252 x 90 em Neue Baume 111. 1984 PK315 óleo s/tela/oil on canvas 252 x 90 em Neue Baume IV, 1984 PK316 óleo s/tela/oil on canvas 252 x 90 em Neue Baume V, 1984 PK317 óleo s/tela/oil on canvas 252 x 90 em Vibeke Sensommer 11. 1983/1984 PK341 óleo s/tela/oil on canvas 200 x 130 em Vibeke-Sensommer 111. 1983/1984 PK342 óleo s/tela/oil on canvas 200 x 130 em Krystall Baum. 1985 PK356 óleo s/tela/oil on canvas 200 x 150 em Julll-vinterbillede-Laeso.1984/1985 PK360 óleo s/tela/oil on canvas 200 x 130 em Skovbryn I-Laeso. 1985 PK366 óleo s/tela/oil on canvas 200 x 200 em S/Título/Untitled.1986 PK 435/1 óleo s/tela/oil on canvas 200 x 250 em Aften.1987 PK435/A óleo s/tela/oil on canvas 200 x 110 em Fra Den Ny Verden. 1987 PK446 óleo s/tela/oil on canvas 200 x 175 em
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CAMINHANDO EM CíRCULOS ENCRUZilHADAS: NOTAS SOBRE A OBRA DE RICHARD lONG
WALKING IN CIRCLES CROSSING PLACES: SOME NOTES ON THE WORK DF RlCHARD LONG
A arté de Richard long é simples e direta, apoiada na originalidade das idéias e motivada por um rigoroso comprometimento com os materiais escolhidos. Inspira-se na vivência do artista com a natureza, em suas caminhadas, retomando a tradição inglesa de engajamento com a paisagem. Sua arte incorpora a essência da própria experiência, não sua formalização visual, e assinala um radical distanciamento da representação tradicional de paisagens.
Richard Long's art is simple and direct, based on the primacy of ideas and motivated by a purposeful, rigorous engagement with his chosen materiaIs. It draws on the artist's experience of nature encountered through walking, at once continuing an English tradition of engagement with the landscape and immediately unique in its personal characteristics. His art embodies the essence of his experience, not a visual representation of it and signals a radical departure from the tradition of landscape depiction.
A abordagem de Richard long é pragmática, não-heróica e tranqüila: ele utiliza marcas simples e registra claramente suas ações e emoções. Nos últimos 25 anos, seus meios e materiais artísticos básicos expandiram-se, embora tenham permanecido enraizados na prática que desenvolveu em meados da década de 60, quando levou sua arte para os espaços abertos. Materiais naturais, geralmente pedras, são dispostos ao longo de uma trilha, perto do local onde foram encontrados, formando uma escultura, que é então registrada por uma fotografia e um título. As pedras (muitas vezes lavradas) também podem ser transportadas para espaços domésticos ou galerias e dispostas no chão em formas definidas e fortes, sobretudo em círculos e linhas, enquanto registros textuais de idéias, observações, sensações ou medidas ocorridos durante a caminhada dão origem a obras em texto. Esses meios formam a base de sua ane, conjuntamente com obras mais recentes que envolvem barro e água, uma extensão natural de suas experiências ao ar livre.
Richard Long's approach is pragmatic, unheroic and quiet: he uses simple marks and clearly records actions and emotions. Over the past twenty-five years, his basic artistic means and materiaIs have expanded, yet they rema in rooted in the practice he first developed in the mid-7 960s when taking his art outdoors. Natural materiaIs, often stones, are displaced close to where they are found along a walk, to make a sculpture which is recorded by a photograph and title. Alternatively, stones (usually quarried) are moved to domestic and gallery spaces and placed in straightforward, powerful shapes, mainly circles and lines, on the floor, while textual records of ideas, observations, sensations ar measurements recorded along a walk are made into text works. These means form the basis of his art in conjunction with more recent works involving mud and water, a natural extension of his experiences outdoors. The sculptural concerns of form, volume and structure within self-sufficient objects, the guiding philosophy behind the New Generation exhibition at the Whitechapel Art Gallery in 7965, had by the beginning of the 7970s, given way to a wide diversity of approaches to artistic questions and practices. Issues such as reínvestigatíng the intrinsíc propertíes of natural materíals, exploríng art línks to environment, redefíning the spatíal, perceptual and temporal exchange between the work of art, its dísplay and íts relatíonshíp to the spectator, ali stood at the forefront of artístíc debate. Ríchard Long's earlíest works involved subtle and temporary adjustments to the landscape, to controlled and preordaíned actions by the artíst, resulting ín works of apparent símplicity and considerable conceptual daring.
As relações entre forma, volume e estrutura no interior de objetos independentes - filosofia mestra da exposição Nova Geração, na Whitechapel Art Gallery, em 1965 - dera origem, no início da década de 70, a grande variedade de abordagens das questões e práticas artísticas. Temas como a reinvestigação das propriedades intrínsecas de materiais naturais, a exploração das ligações da arte com o meio ambiente, a redefinição do intercâmbio espacial, perceptivo e temporal entre a ob~a de arte, sua exibição e relação com o espectador - tudo isso se colocou na vanguarda do debate artístico. Os primeiros trabalhos de Richard long envolviam adequações sutis e temporárias à paisagem, através de ações controladas e preordenadas pelo artista, resultando em obras de aparente simplicidade e considerável ousadia conceitual. Antes de ingressar no curso vocacional da St. Martin's School of Art, em 1966, long já havia trabalhado ao ar livre, reagindo ao forte sentimento de que coisas como nuvens, relva, água e espaços naturais definiam sua atitude em relação à arte e seu interesse pelo mundo natural. Ele sentia que uma realidade maior estava sendo ignorada pela arte de sua época. As primeiras obras, em que ele usava turfa, neve e folhas, envolviam o engajamento direto com materiais naturais. A efemeridade dessas obras era apenas um subproduto do pensamento gerador que havia por trás de cada uma.
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Before enrolling on the St. Martin's School of Art vocational course in 7966, Richard Long had already worked outdoors, responding to strong feelings that things like clouds, grass, water and natural places defined his attitude to art and its interest in the natural world. He felt that a larger reality was being left untouched in the art of his time. Early works, made using turf, snowand
Tratava-se de questão secundária que obras como Snowball tracks (Trilha de bola de neve, 1964) ou Line made by walking (Linha feita pelos passos, 1967) só pudessem ser conhecidas mais tarde através de fotografias. Após 1967, caminhar tornou-se um modo de incluir grandes distâncias numa obra de arte, de comprometer-se com o espaço e a forma reais do mundo através do envolvimento físico direto.
leaves, involved direct engagement with natural materiais. The transience of these works was merely a by-product of a generating thought behind each one. That works such as Snowball tracks of 7964 or Aline made by walking (7967) might later only be known through photographs was at that time a side issue. After 7967, walking became a way to bring great distances into a work of art, of engaging the real space and shape of the world through direct physical commitment.
A área de atividade de Long, a princípio centrada no West Country, particularmente em Dartmoor e nas gargantas do rio Avon, muito próximos de sua casa e local de nascimento, hoje inclui vários continentes e algumas das regiões mais remotas da Terra. Cruzando trilhas conhecidas e desconhecidas, com especial preferência por locais onde a terra encontra a água, ou onde a água erodiu canais em direção ao mar, Richard Long soma suas pegadas às deixadas por outros, ou acrescenta marcas nunca feitas às camadas de caminhos que registram o avanço humano e animal através da terra. Em algumas caminhadas, histórias humanas são mapeadas, cultivadas e nomeadas, integrando-se aos próprios planos e observações do artista e propondo uma arqueologia sedimentar da presença humana através dos tempos. Em outras, a localização da terra, o curso dos rios ou a falta de mapas adequados determinam a trilha do artista. A linha de caminhada definida em Fresh water saft water line walk, 1980 (Linha de caminhada água doce água salgada), exemplifica como a rota predefinida do artista molda-se às barreiras naturais de lagoas e riachos que impediram seu avanço direto por terra.
The arena for Richard Long's chosen activity, initia//y centered around the West Country, in particular Dartmoor and the Avon Gorge in the immediate vicinity of his home and birthplace, now embraces many continents and some of the most remote regions on the earth. Traversing known and unknown tracks across the surface of the ground, with a special association for places where the land meets the water or where water has eroded channels down towards the sea, Richard Long adds his tracks to those made by others, or adds those never before made to the layers of paths marking human and animal progress across the land. On some walks, human histories, mapped, cultivated and named, are integrated into the artist's own plans or observations, intimating a layered archaeology of the human presence over the ages. On others, the lie of the land, the flow of its rivers, or the lack of adequa te maps determine the artist's path across the ground. The walked line marked in Fresh water salt water line walk (7980) exemplifies the artist's predetermined route yielding to the natural barriers of alternate fresh and salt water lochs and inlets which impeded his direct progress across the ground. Long's way is fugitive, and his markings on the surface of the land ephemeral: photographic records of lines and circles in remote regions and notebook jottings are demonstra tive moments of unassuming presence. To make a record, he takes photographs, without artifice, from ground levei and usua//y from the angle revealing the work at the point of greatest visual impact. Richard Long takes what he finds from his surroundings when he feels a work needs to be made. Unlike other artist working predominantly in wide open spaces, particularly the American Land artists, he neither excavates nor tries to stamp his presence on the land in other ways, preferring minimal to massive interventions and demonstrating his physical commitment to his art through the rigours of walking great distances. He moves with his bare hands or through kicking, those stones which are closest by, aware sometimes that he is probably the first person to have ever disturbed them, or, that he has become simply one further man engaged in a ritual exchange with the land.
o caminho de Long é fugaz, e suas marcas na superfície da terra, efêmeras: registros fotográficos de linhas e círculos em regiões remotas e anotações esparsas representam momentos de uma presença despretensiosa. Para fazer seus registros, ele fotografa sem artifício, ao nível do solo, e geralmente do ângulo que mostra a obra do ponto de maior impacto visual. Ouando quer fazer uma obra, Long usa o que descobre nos arredores. Ao contrário de outros artistas que costumam trabalhar em espaços abertos, sobretudo os land artists americanos, ele não escava nem tenta marcar de outras formas sua presença na terra, preferindo efetuar intervenções mínimas e demonstrando sua dedicação à arte pelo rigor das caminhadas de grandes distâncias. Ele movimenta com as mãos ou com os pés as pedras mais próximas, às vezes consciente de ser a primeira pessoa a perturbá-Ias, ou de ser apenas mais um ser humano comprometido com uma troca ritual com a terra. Os vestígios de suas intervenções são muitas vezes apagados pelo tempo, lavados pela água ou deslocados pelo vento. A forte maré do canal de 8ristol, perto de sua casa, reforçou seu conhecimento intuitivo das forças subjacentes de transformação e fluxo existentes na natureza. Ele realizou várias obras com madeira encontrada no litoral e, algumas vezes, pôde observar os processos naturais da maré transformarem magicamente algumas obras. Numa conversa com Anne Seymour, citou uma cruz de pedras, intitulada Half-tide
The physical traces of his interventions are frequently erased over time, washed away by water or shifted by the winds. The strong tidal flow in the Bristol Channel, near his home, has reinforced an intuitive awareness of the underlying forces of transformation and flux in nature. He has made many works with driftwood co//ected or dropped at the water's edge and, on occasion, has seen the natural processes of ebb and flow magica//y transform specific works. In conversation with Anne Seymour, he reca//ed a
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(Meia maré), que ele fez na baía de Bertraghboy, na Irlanda, durante a maré baixa: "A maré estava baixa, e havia uma linda formação de algas molhadas, sujas, borbulhantes, numa praia de pedras; fiz uma cruz de pedras sobre as algas. Quando acordei na manhã seguinte, a maré havia subido e, em vez da cruz, vi na verdade a imagem de minha obra suspensa na superfície da água, pois as pedras mantinham as algas embaixo ... Quando a maré subiu completamente, as algas ficaram submersas ... só se via a cruz na superfície da água a meia maré".
criJss of stones - entitled Half-tide - made in Bertraghboy Bay in Ireland at low tide: 'the tide was out and there was this beautiful bed of wet soggy, bubbly seaweed on this stony beach and I made a cross of stones on the seaweed. .. When I woke up the next morning, the tide had come in and instead of seeing my cross of the stones, I actually saw the image of my work suspended on the surface of the water, beca use the stones were keeping the seaweed down ... when the tide came up full, ali the seaweed was completely under the water. .. . You only saw the cross on the surface of the water at half-tide.'
Nos últimos anos, long tem usado barro, geralmente do rio Avon, para fazer obras em galerias, impondo a si mesmo o desafio de trabalhar rapidamente, sem a possibilidade de corrigir erros. O corolário dos riscos envolvidos em sua execução é o poderoso impacto espontâneo dessas obras e sua íntima relação com as mais antigas formas humanas de demarcação. Tanto a água como o barro levados para o interior das galerias equivalem às marcas aquáticas feitas na paisagem. Em diversas outras obras, ele reconhece o implícito poder transformador da água de reduzir montanhas a lama através da erosão.
In recent years he has used mud, often from the River Avon to make wall and floor works in gallery spaces, thus imposing on himself the challenge of working swiftly, without the possibility of correcting errors. The corollary of the risks involved in their making is the powerfully spontaneous impact of such woks and their intimate connection to the most ancient forms of human mark-making. As much about water as mud, theyare the indoor equivalents for his pure watermarks in the landscape. In many other works, he acknowledges the implicit transforma tive power of water - reducing mountains to mud through erosion and itself experienced in both fluid and solid states.
Ao pesquisar e registrar suas caminhadas através de fotografias, mapas e textos e levar para espaços fechados os materiais que utiliza em suas trilhas ou colocá-los em sua forma de extração mais crua, long encontrou um modo altamente concentrado e formalmente puro de chamar a atenção do público. Seus círculos e linhas de pedra, como Planet circle (Círculo planetário, 1991), são feitos para exposições e espaços especiais, nos quais ele freqüentemente utiliza pedra lavrada ou materiais encontrados perto do local de exibição. Ultimamente, suas obras textuais contêm um amplo conjunto de referências, além de lugares e fenômenos visualmente perceptíveis, e incluem cada vez mais registros dos outros sentidos paladar, olfato e audição -, assim como as interrelações de cada elemento: fogo, água, ar e terra. 1449 stones at 1449 feet(1449 pedras a 1449 pés, 1979), como outras obras semelhantes desse mesmo ano, assinala o elo simbiótico entre terra e mar, não apenas no mundo natural mas também em sua medição sistemática pelo homem, que determina cada ponto do mapa a partir do nível do mar como padrão básico de medição cartográfica. O som torna-se a expressão predominante em Stone water sound (Som de pedra e água), uma caminhada feita pelo País de Gales em 1990.
Through encoding, researching and recording his walks in photographs, maps and texts, and by bringing into interior spaces the materiaIs he uses along the way or which are readily available in their most crudely extracted form, Richard Long has found a highly focused and formally pure way of bringing his work to public attention. Hís stone circles and lines, such as Planet circle (1991), are first made with particular exhibitions and spaces of mind, frequently using quarried stone or materiaIs found near the place of the exhibition. In recent years his text works contain an expanded set of references beyond places and visually perceived phenomena, and increasingly include records of the other senses - taste, smell and sound - as well as the interrelationships of each of the elements: fire, water, air and earth. 1449 Stones at 1449 feet (1979), along with similar works of the same year, underlines the symbiotic link between land and sea, not only in the natural world, but also in mankind's systematic calibration of it, relating each point on the map to the sea leveI as a basic standard for cartographic measurement. Sound becomes the predominant expression within Stone water sound, a walk made across Wales in 1990.
Nos últimos 25 anos, Richard long simplificou e purificou a linguagem de suas obras-texto. As legendas mais descritivas de suas primeiras fotografias, principalmente as publicadas em seu extenso conjunto de livros artísticos, foram superadas por outras que dão informações factuais mínimas. A tensão lingüística dos textos de long deu a sua linguagem uma característica de condensação talvez equivalente à linguagem poética, onde as palavras, embora comuns, adquirem uma densidade e um ritmo específicos e parecem ressoar mais poderosamente do que no discurso coloquial. Para long, as palavras são como pedras: "Posso fazer uma escultura utilizando uma linha de pedras. Posso fazer uma escultura utilizando uma linha de palavras. Pedras e palavras são a mesma coisa". A evocação de experiências fugazes e intangíveis repousa em particular no centro de suas obras-textos, que se tornam mapas lingüísticos que localizam, determinam e reúnem as descontinuidades físicas criadas por sua passagem itinerante. O tempo decorrido entre as sensações e as percepções registradas, a
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Over the past twenty-five years, Richard long has simplified and purified the language in his texts works. The more descriptive captions to his earliest photographic images, particularly those published in his extensive body of artist's books, have been supplanted by texts works giving the barest factual information. The linguistic tautness of Long's texts has given his language a condensed quality, an equivalence perhaps to the language of poetry, where words, however common, acquire a specific rhythm and density and appear to resonate more powerfully than in everyday speech. For Richard long, words are interchangeable with stones: 'I can make a sculpture. using a line of stones. I can make a sculpture using a line or words. Stones and words are both the same '. The evocation of fleeting and elusive experiences lies at the heart of his texts works in piJrticular, which become linguistic maps charting, fixing and joining the physical discontinuities created by his itinerant passage. The time laps
verdadeira separação dos objetos físicos - a natureza essencialmente episódica de suas ações e experiências - são momentos vitais incluídos no equilíbrio e na unidade geral da caminhada. As propriedades de tempo (enquanto duração e agente de mudanças), distância e lugar se interrelacionam em sua obra, sendo às vezes invocadas deliberadamente, como parte da estratégia que está por trás de determinado trabalho, ou admitidas como parte da experiência essencial dos seres humanos no mundo natural.
between sensatian and perceptians recarded, the actual separatian af physical abjects - the essentially episadic nature 'af his actians and experiences - are ali vital maments subsumed within the averall balance and unity af the walk. The praperties af time (whether as duratian ar agency af change), distance and place interrelate in his wark, sametimes invaked deliberately as part af the strategy behind a given wark, ar admitted as part af the essential experience af human beings within the natural warld.
NO MEIO DA ESTRADA HAlFWAY STONE NO MEIO DO CAMINHO
IN THE MIDDLE DF THE RDAD HALFWAY STDNE IN THE MIDDLE DF THE WALK
Uma caminhada de 995 quilômetros em 21 dias, da costa norte à costa sul da Espanha, de Ribadesella a Málaga, 1990.
His awn presence, sitting in his tent, making tea, recallíng the phrases af a sang (No woman no cry), emptying his baats af grit ar flapping dawn fatigued at the end af the day, is sametimes integrated as a biagraphical fragment, lacatían specífic and persanal maments within the wider experiences af walking. This serve, alsa, as an affirmatian af the processes af artistic mediatian, an essential part af the warks' cantent. ( ane af the artist's favarite images is the phatagraph af twa rucksacks belanging to himself and Hamish Fultan - with wham he has traveled an several accasians - propped against a wall in Mexica during a walk in 1979).
Sua própria presença, armando a tenda, fazendo chá, lembrando as frases de uma canção (No woman, no cry), esvaziando as botas de terra ou caindo exausto no fim do dia, é às vezes integrada como fragmento biográfico, localizando momentos específicos e pessoais no âmbito da experiência mais ampla de caminhar. Estas ações também servem como afirmação dos processos de mediação artística, parte essencial do conteúdo da obra. (Uma das imagens favoritas do artista é a fotografia de dois sacos de dormir pertencentes a ele e a Hamish Fulton - com quem viajou em diversas ocasiões -, encostados num muro no México, durante uma caminhada em 1979.) No conjunto em expansão de obras resultantes de caminhadas, Richard long distingue claramente as linhas-mestras que adota em cada jornada em particular e que lhe dão um caráter e uma ênfase diferentes. O conhecido território de Dartmoor e os muitos cruzamentos que ligam caminhadas de épocas diferentes - a evolução de uma história pessoal associada a uma região tornaram-se parte reconhecível da obra de longo Uma caminhada de cinco dias em 1980, de Totnes a Bristol, foi longa precisa: o próprio artista estabeleceu a disciplina de caminhar dez milhas (dezesseis quilômetros) no primeiro dia, aumentando essa distância em múltiplos de dez, até que no quinto dia cobriria cinqüenta milhas. A geometria da mudança de dias em milhas e o equilíbrio entre facilidade e dificuldade era a questão principal da caminhada. O próprio passo, dentro de limites preestabelecidos de tempo e distância, determinou seu progresso em A thousand miles a thousand hours (Mil milhas em mil horas, 1974), enquanto variações de velocidade e ritmo estão no centro de A walk of four hours and four circles (Uma caminhada de quatro horas e quatro círculos, 1972). Aqui, long planejou uma caminhada ao redor de quatro círculos concêntricos, de distâncias equivalentes, desenhados no mapa de Dartmoor: distâncias diferentes a serem cobertas no mesmo espaço de tempo. O artista costuma estabelecer antecipadamente os parâmetros de suas caminhadas - a distância a ser coberta, o ritmo, a direção, se ela deve seguir uma orientação fixa da bússola -, embora às vezes deixe o trajeto ao acaso e à necessidade de contornar obstáculos. A "caminhada de Cerne Abbas", 1975), centrada no marco paisagístico de Cerne Abbas, registra um tipo especial de caminhada, isto é, um trajeto dentro de uma área completa (um círculo), usando todas as estradas e trilhas, em oposição a uma jornada linear de um "ponto" a outro.
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Within the expanding bady af warks resulting from walks, Richard Lang makes clear distinctians between guidelines he adapts for each particular walk and which give each a distinct character and emphasis. The familiar territary af Dartmaar and the many crossing paints linking dífferent walks fram dífferent times - the evalutian af a persanal histary cannected to a regian - have became a recagnízed paint af Lang's wark. A five day walk in 1980, from Tatnes to Brístol, was robust and precise: the artist set himself the discipline af walking ten miles an day ane, increasing by multiples af ten until fifty miles were cavered an day five. The geametry af days to miles and the shífting balance between ease and dífficulty was the main subject af the walk. Pace itself, within present limits af time and distance, determined his pragress in A thousand miles a thousand hours (1974) , while variatians in speed and pace lie at the heart af A walk of four hours and four circles (1972). Here, Richard Lang planned a walk round faur evenly spaced, cancentríc circles drawn an a map af Dartmaar: dífferent distances to be cavered an the same unit af time. Richard Lang aften sets parameters for his walks in advance - the distance to be cavered, the pace to be set, the directian af the walk, whether the walk shauld fallaw a fixed campass paint - while the ather times the actual route is left to chance and the necessity af círcumventing abstacles. The "Cerne Abbas walk"(1975), centered an the landmark af the Cerne Abbas giant, recards a particular kind af walk, that iS,a walk within and over a complete area ( a círcle) using ali roads and tracks, as appased to a linear ar jaum eying walk from ane 'end' to anather. Dver the years, the range af Richard Lang's wark has became more diverse and the warks' presenta tians more refined, allawing dífferent facets af the
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Midsummer circles, 1993
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Ao longo dos anos, a obra de Richard Long tornou-se mais diversificada e sua apresentação, mais refinada, permitindo que diferentes facetas da experiência do artista ao longo do caminho, como as mudanças de vento (Wind stones, Pedras de vento, 1985) ou a observação de cores especiais, sejam exibidas ao espectador com grande simplicidade formal. Todas as suas obras, motivadas por uma clara idéia central, exemplificam uma qualidade básica e uma capacidade de transcender a esfera pessoal e comunicar-se num nível mais amplo. Em uma de suas declarações, ele escreveu:- "Uma caminhada exprime espaço e liberdade, e o conhecimento dela pode viver na imaginação de qualquer pessoa, e isso também é outro espaço". A força da arte de Long repousa em sua capacidade de invocar uma reação imaginativa no espectador; de partilhar a corrente de fragmentos e pensamentos particulares que formam um delicado fio, que envolve o círculo completo do comprometimento do artista com a ordem natural das coisas. Sua arte, inconfundível e consistente, conquista uma posição quase clássica entre movimento e inércia, atividade e contemplação, nada e substância, como reflete seu comentário: "Uma boa obra é a coisa certa no lugar certo na hora certa. Um cruzamento".
artíst's experience along the way, such as the changing wind (in works such as Wind Stones of 1985), ar the observation of particular colors, to be evoked by the spectator with great formal simplicity. Ali his works, motivated by a clear, central idea, exemplifya core quality in Richard Long's art and its ability to transcend the priva te sphere of the artist and communicate on a wider levei. In one of his statements, he has written, 'a walk expresses space and freedom and the knowledge of it can tive in the imagination of anyone and that is another space toa'. The power of Richard Long's art rests in its ability to invoke an imagina tive response in the viewer; to share publicly the stream of priva te fragments and thoughts that form a delicate thread closing the full circle of the artíst's engagement with the natural arder of things. His art, unmistakable and consistent, achieves an almost classical poise between movement and stillness, activity and contemplation, nothingness and substance, as reflected in his comment: 'a good work is the right thing in the right place at the right time. A crossing place. ' Sean Rainbird
Sean Rainbird
Na arte de nosso tempo Richard Long está sozinho; sincero, consistente, trabalhando num ritmo e passo próprios, ele é um ponto silencioso nas águas turbulentas dos movimentos e modismos. Traçam-se as paralelas de seus trabalhos na tradicional paisagem inglesa de Constable e Nash, nas longínquas tradições orientais do taoísmo e do budismo, nos sinais e nas marcas dos chamados povos "primitivos", como os antigos índios nazca da América do Sul, ou os aborígenes australianos. Entretanto, percebe-se também que, como Poussin, Cézanne e MC~ldrian, sua arte é basicamente racional, até mesmo clássica, em sua preocupação com a harmonia interior da ordem natural e com o lugar do homem nos domínios terrenos. Caracteristicamente, sua arte assume a forma de uma caminhada, que é registrada por uma linha em um mapa, pelas impressões de lugares anotadas em um texto, por sinais e sons encontrados pelo caminho, pela fotografia de um local importante, ou por uma escultura ou marca feita pelo artista num determinado ponto de sua jornada. Esses registros podem ser apresentados na forma de uma foto ou de um texto, na parede de uma galeria ou museu, ou publicados em catálogos ou livros. Nas galerias ele faz também esculturas, dispondo materiais naturais, em geral pedras e madeira, mas às vezes também lama de rio, ou solução de giz, literalmente
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In the art of our time Richard Long stands alone,' single-minded, consístent, working to his own rhythm and at his own pace he is a still poínt in the turbulent waters of movements and fashion. Parallels for his work have been traced in the English landscape tradition of Constable and Nash, in the Taoist and Buddhist traditions of the Far East and in the signs and markings of socalled ''primitive'' peoples, such as the ancient Nazca Indians of South America ar the Aboriginals of Australia. However, we mayalso observe that like Poussin, Cézanne and Mondrian his art is fundamentally rational, even classical, in its concern with the inner harmony of the natural arder and with the place of man in the terrestrial real. Characteristically, his art takes the form of a walk recorded by means of a line on a map, bya text noting places, signs and sounds encountered en route, bya photograph of a significant location, ar by a sculpture ar mark made by the artist at a particular point on the journey. These records may be displayed as photographs ar texts on the wall of a gallery ar museum, ar published in catalogues and books. In galleries he also makes sculptures, arranging natural materiais, usually stones and wood but also sometimes in river mud ar a solution of chalk, literally "walking the line" on the floor ar imprinting the hand on the wall. In these, as in his outdoor sculptures, he works with the most simple and delibera te marks known to man: the line, the cross, the circle and the spiral.
"andando em linha" no chão, ou imprimindo a mão na parede. Nisso, como em suas esculturas ao ar livre, ele trabalha com as marcas mais simples e intencionais conhecidas pelo homem: a linha, a cruz, o círculo e a espiral. Em galerias, a maioria das vezes ele utiliza pedras retiradas de pedreiras locais, nunca especialmente cortadas ou serradas, mas simplesmente escolhidas por alguém que conhece as propriedades de uma pedra em particular, sua densidade, a qualidade da superfície e o modo como ela reflete a luz. Portanto, dois círculos ou linhas nunca são idênticos, desde que as pedras são dispostas de acordo com regras diferentes, de modo a extrair toda a vantagem do caráter do material. Suas caminhadas o levam a todas as partes do mundo, com mais frequência às partes remotas e antigas da terra, onde poucos ~stiveram antes. Ele viaja pelas terras altas da Europa, pelo Círculo Artico, pelas depressões e desertos poeirentos das Américas e da África, pelas cadeias montanhosas de todos os continentes. Em cada um de seus trabalhos, vê-se a simplicidade da forma adquirida através da economia de meios. "Rigor" é a palavra que melhor descreve o estado de espírito e o compromisso de andar por terrenos selvagens recolhendo pedras. Embora esteja intimamente ligada à natureza e aos ritmos naturais, sua arte nunca descreve, ou mesmo evoca, a natureza como tal, mas serve para elevar nossa compreensão do lugar que ocupamos no universo. Lembra-nos que não somos meros observadores mas que, trabalhando a favor ou contra a natureza, nós próprios participamos da ordem natural. Cada trabalho pode ser executado num determinado momento, mas também traz em si os ecos do lugar que o homem ocupa no planeta ao longo das eras. Sua arte nos torna agudamente conscientes do tempo; o tempo gasto em sua feitura, na coleta de materiais, na duração de uma caminhada, na evolução do tempo, ou mesmo o tempo que sua marca deve permanecer na superfície da terra até ser obliterada por animais, o crescimento natural e os elementos.
In galleries he most commonly uses stones, taken from local quarries but never specially cut or sawn, simply off-cuts selected by a man who knows the properties of a particular stone, its density, its surface qualityand the way it may reflect the light. Thus no two Gircles or lines are identical, since stones will be laid down according to different rules in order to take advantage of the character of the material. His journeys have taken him to ali parts of the world, but most frequently to the remo te and ancient parts of the earth where few have preceded him. He travels to the uplands of Europe, to the Artic Circle, to the dust bowls and deserts of the Americas and Africa and to the mountain ranges of every continent. In each of his works there is a simplicity of form achieved by an economy of means. "Rigour" is the word which most aptly describes both the state of mind and the commitment involved in walking through wild terrain or in collecting stones. Though it is intimately bound with nature and natural rhythms, his art never describes, or even evokes nature as such, but serves to heighten our understanding of our own place within the universe. Long reminds us that we are not simply observers but, working with or against the grain, we are ourselves participants in the natural order. Each work may be executed at a particular moment but it also carries echoes of man 's place on the planet through the ages. His art makes us acutely aware of time; the time spent in its making, in the gathering of material, in the duration of a walk, in the evolution of the weather, or indeed the time which his mark may rema in on the surface of the earth until it is obliterated byanimals, natural growth or the elements. But there is also the time which we must give to an art which only discloses the layers of its meaning in response to prolonged contemplation. Like ali art which seeks to explore the order of the universe, Richard Long's work serves as a stone pitched into the centre of a calm pond. The spread of the ripple is limited only by the banks of our own imagination and by our ability first to still the sUrface so that the ripple may traveI without impediment. Nicholas Serota
Mas também do tempo que devemos dar a uma arte que apenas revela os níveis de seu significado em resposta à contemplação pro'longada. Como toda arte que busca explorar a ordem do universo, o trabalho de Richard Long funciona como uma pedra atirada nas águas de um lago calmo. As ondas se espalham e são limitadas apenas pelas margens de nossa imaginação e por nossa capacidade de antes silenciar a superfície para que a onda caminhe sem impedimento. Nicholas Serota
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CORRENTE DE FRAGMENTOS
A STREAM DF FRAGMENTS
sons internos e externos dos rios - baía Bertraghboy - extraído por minha mão na superfície do lago Titicaca, à noite - uma linha de 164 pedras uma caminhada de 164 milhas - mil milhas mil horas - começa de onde a encontrei - uma caminhada do tamanho do rio Avon dispondo cinco pilhas de pedras ao longo do caminho - entre as nascentes dos rios Dart, Tamar e Exe - nas nuvens sob as nuvens paredão do irlandês - quinto dia cinquenta milhas - distribuídos em linha reta de 9 milhas - andar na linha da água doce da água salgada - para as montanhas Ballyhoura - círculo de lugares que se cruzam mil pedaços de madeira flutuante - nível do mar na linha d'água andando em torno de três círculos ao longo do caminho - lã para o caminho - pedras incontáveis - alerta feliz equilibrado - desenho a carvão para água-viva - uma hora a cada pico - céus baixos sonos longos pés molhados - andar na linha do caminho - de uma pedra a outra - grandes pedras pontudas - primeiro dia uma pedra moveu-se um passo a oeste - sangue de 68 milhas - uma estrada plana seca reta vazia - seguindo um desejo - da nascente ao meio-dia - um círculo em cinzas quentes - céu róseo silêncio - sexta noite voltado para o norte - pegadas poeirentas pela neve - para o pico rochoso para os bons sentimentos - olhos azuis de uma criança a 56 milhas onde a caminhada chega ao lugar - excrementos de camelo para os espinhos - colhendo um punhado de lama do rio Avon - rugido da arrebentação - derramando de meu cantil - linha d'água do Mississipi na linha de caminhada - música ao vivo para dançar - dois chutes numa pedra no caminho - pedras roladas pelo rio Grande andar fora das pedras - um dente-de-leão perto de Douzoumayroux uma borboleta perto de Bessan - círculo sonoro
In and out sound of rivers - Bertraghboy Bay - drawn with my hand on the surface of Lake Titicaca at night - a line of 764 stones a walk of 764 miles - a thousand miles a thousand hours - starting from where I found it - a walk of the same length as the river Avon - placing five of stones along the waybetween the source of the Dart, Tamar and Exe Rivers - in the clouds under the clouds -Irishman's wal/- fifth day fifty miles - scattered along a straight 9 mile line - fresh water salt water line walk - to the Bal/yhoura mountains circle of crossing places - a thousand of driftwood - sea levei water line ~ walking around three circles along the way - wool to root - countless stones happy alert balanced - charcoal to jel/yfish - one hour at each summit - low skies long sleeps wet feet - walking lines along the footpath - from one stone to another - long pointed stones - first day a stone moved one step west blood of a thrush 68 miles - a flat dry straight empty road - fol/owing a desire from source to midday - a circle in hot ashes - pink sky silence - sixth night facing north - dusty footprints through snow - to laughter tor to good feelings - blue eyes of a child at 56 miles - where the walk meets the place - camel droppings to thorn - casting a handful of river Avon tida I mud - surf roarpoured from my water bottle - Mississippi waterline walking line -live music dancing kicking a stone along twice - skimming stones across the Rio Grande - walking out of stones - a dandelion near Douzoumayroux a butterfly nearsound circle
Richard Long 1971-1990
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Richard Long 7977-7990
White water fine, 1994
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White water eire/e, 1994
Nasceu em Bristol, Inglaterra, em 1945. Entre 1962 e 1965 estudou na West of England College of Art, em Bristol, antes de se mudar para a St. Martin's School of Art, em Londres, onde completou seus estudos entre 1966 e 1988. Richard Long fez muitas exposições desde a metade dos anos 60, e em 1989 recebeu o Prêmio Turner "pela qualidade excepcional e persistente de sua contribuição à arte britânica". Bom in Bristol, England, in 1945. Between 1962 and 1965 he studied at the West of England College of Art in Bristol,before moving to St. Martins School of Art in London, where he completed his studies between 1966 and 1968. Richard Long has exhibited widely since the mid sixties and in 1989 he was awarded the Tufner Prize for "the exceptional and enduring quality of his contribution to British art". SELEÇÃO DE T~ABALHOS COM O ELEMENTO AGUA Um porto irlandês, 1966 - Uma linha dágua escavada na turfa, 1967 - Uma escultura deixada pela maré, Inglaterra, 1970 Reflexos no rio Little Pigeon (Pequeno Pombo), Tennessee, 1970 - Meia maré, Irlanda, 1971 - Uma lua desenhada por minha mão na superfície do lago Titicaca à noite, Peru, 1972 - Um passeio de canoa de 84 milhas rio abaixo pelo Savern, um passeio do mesmo comprimento que o rio Avon, Inglaterra, 1977 - Da primeira à última ponte: um passeio de bicicletade 163 milhas em 14 horas pelo rio Tâmisa abaixo, cruzando o rio em dez lugares, Inglaterra, 1977 - Dart Tamar Exe: uma caminhada triangular
de três dias nas cabeceiras dos Rios Dart, Tamar e Exe, Inglaterra, 1978 - Uma caminhada de quatro horas pelas cabeceiras dos rios num círculo imaginário sobre Dartmoor,1978 - De~pejando água no leito de um rio em Sierra Madre numa caminhada de 5 dias no México, 1979 Footstones: 754 pedras colocadas a 754 pés acima do nível do mar, um de 5 montes de pedras feitos num passeio costa-a-costa através da inglaterra, 1979 - Passeio na linha dágua fresca Água Salgada, Escócia, 1980 Linha dágua ao nível do mar, Vale da Morte, 1982 - Linha dágua caminhante do Mississippi,1988 - Passeio " no caminho das águas: uma camin'hada de 152 milhas de uma fonte a um poço, Inglaterra, 1989 - Linha dos corais: uma fileira de corais no fundo do Oceano índico, velejando entre duas ilhas, 1989 - Linhas dágua: todo dia uma linha de água despejada de minha garrafa de água pela linha da caminhada por um caminho de 560 milhas em 20 1!2 dias da costa do Atlântico à do Mediterrâno, atravessando Portugal e Espanha, 1989 Caminhada seca: percurso de 113 milhas entre duas pancadas de chuva, Inglaterra, 1989 Milhas de chuva; 211!2 milhas de caminhada pela chuva num percurso de 203 milhas na Irlanda, 1989 - Som de pedras batendo na água: uma pedra jogada em cada um dos 50 rios que cruzam o percurso costa a costa através de Gales, 1990 Pulando pedras através do Rio Grande numa caminhada de 10 dias no Texas, 1990 - Caminho
das marés: um percurso contínuo de 104 milhas em 21!2 marés em relação ao andarilho, Inglaterra, 1992 ~ Watershed: uma cami"nhada de 120 milhas em 39 horas do Rio Avon ao Tâmisa, Inglaterra, 1992 Atirando pedras no Rio Grande numa caminhada de 8 dias pela beirada do canion, 1993 Caminhada do tempo molhado: uma caminhada de 223 milhas em 7 1!2 dias em direção ao sul através da Suíça, 1993 - Linha dos locais para urinar: uma caminhada contínua de 36 milhas em 30 horas, Inglaterra, 1993 A SELECTlDN DF WDRKS WITH THE ELEMENT DF WATER A Irish harbour, 1966 - A water line cut into turf, 1967 - A sculpture left by the tide, England 1970 - Reflections in the Uttle Pidgeon River, Tennessee, 1970Half Tide, Ireland, 1971 - A moon drawn with my hand on lhe surface of Lake Titicaca at night, Peru, 1972 - An 84 mile canoe joumey down the River Sevem, a joumey of the same length as the River Avon, England 1977 - From the first bridge to the last bridge: A bicycle joumey of 163 miles in 14 hours down the River Thames, crossing the river at ten places, England, 1977 - Dart Tamar Exe: A 3 day triangular walk between the sources of the Dart, Tamar and Exe Rivers, England, 1978 - A 4 day walk along ali the riverbeds within an imaginary circle on Dartmoor, 1978 - Pouring water on a riverbed in the Sierra Madre on a 5 day walk in Mexico, 1979Footstones: 754 stones placed at 754 feet above sea levei, one of five piles of stones made on a coast to coast walk across, England, 1979 - Fresh Water Salt Water Une Walk, Scotland, 1980 - Sea Levei
Water Une, Death Valley, 1982Mississippi Waterline Walking Une, 1988- Water Way Walk: A 152 mile walk from a spring to a well, England 1989 - Coral Une: Aline of coral dropped into the Indian dcean sailing beetween two Island, 1989 - Waterline$: Each daya waterline poured from my water bottle along the walking line along a walk of 560 miles in 20 1/2 days from the Atlantic shore to the Mediterranean shore, across Portugal and Spain, 1989 - Dry Walk: 113 walking miles between two showers of rain, England, 1989 - Rain Miles: 21 1/2 miles of walking in the rain on a 203 mile walk in Ireland, 1989, - Stone Water Sound: Astone thrown into each of 50 rivers crossed on a coast to coast walk accross Wales, 1990 - Skimming stones across the Rio Grande on a 10 day walk in Texas, 1990 - Tide Walk: A continuous walk of 104 miles in 2 1/2 tides, relative to the walker, England, 1992 - Watershed: A walk of 120 miles in 39 hours from the River Avon to the River Thames, England, 1992 - Throwing stones into the Rio Grande on an 8 day walk along the canyon rim, 1993 - Wet Weather Walking: A southward walk of 222 miles 7 1/2 days across Switzerland, 1993 - Urinating Places Une: A continuous walk of 96 miles in 30 hours, England, 1993.
Obra apresentada!Work in the exihibition White river, 1994 instalação!installation trabalho em desenvolvimento! work in progress
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CU~DO~ DAVID WHllc
CURAfO~ DAVID WHlfE
SER MAU
BElNG BAD
o problema de Rauschenberg (ou um de seus problemas) é como ser mau durante trinta anos ou mais. Manter um alto nível de mau comportamento durante um terço de século não é uma tarefa fácil. O escritor alemão.Heimeto von Doderer definiu: "As pessoas começam quebrando vidraças. Depois, elas próprias se tornam vidraças."
Rauschenberg's problem (one of Rauschenberg's problems) is how to be bad for thirty years ar more. To sustain a high leveI of misbehavior over a third of a century is not the easiest of tasks. The German writer Heimeto von Doderer put it this way: "One begins by breaking windows. Then one becomes a window oneself "
Rauschenberg esforçou-se mais do que ninguém para ser inaceitável, mas logo (e com satisfação) descobriu que nada é inaceitável. Consideremos a variedade e a ingenuidade dos recentes esforços nesse sentido. X esculpe seu próprio pênis, Y salta de janelas e Z, aquele maldito, faz decoração de interiores domésticos em East Hampton. A MTV comprometeu seriamente o . surrealismo, talvez arruinando-o para sempre, e Michael Graves confere má reputação aos excessos mais desprezíveis. David Salle e Eric Fischl cada dia se parecem mais com carneirinhos. E assim por diante. A dificuldade não é produzir escândalos corriqueiros, mas sim o processo normal de transformação da realidade através do qual aspectos do mundo tornam-se arte. Como impedir o feio (o que se convencionou chamar assim) de converter-se de alguma forma, ao longo do tempo, em belo (o que hoje convencionamos chamar assim), perdendo desse modo !l magnetismo que fez o artista escolhê-lo em primeiro lugar? E impossível. Mas há estratégias de adiamento. Céline, com a ajuda de alguns políticos realmente revoltantes, conseguiu permanecer um monstro quase até o fim.
Rauschenberg has tried as hard as anyone to be nonacceptable but ear/y (and rather cheerfu//y) discovered that nothing is nonacceptable. Consider the variety and ingenuity of recent efforts in this direction. X whittles upon his penis, Yjumps out of windows, and Z that dirty dog, paints East Hampton domestic interiors. MTV has severely compromised surrealism, perhaps ruined it forever, and Michael Graves is giving wretched excess a bad name. Beuys is in trouble; what'sa boy to do when his fat melts? David Sal/e and Eric Fischl are looking more and more lamblike every day. And so on. The difficulty here is not producing more run-of-the-mi// outrageousness, but the natural of the transformational process by which aspects of the world are made over in to art. How to prevent the ugly (what we have agreed to cal/ ugly) from becoming, in some sense, beautiful (what we nowagree to cal/ beautiful) over time, thus losing the electrical charge which made the artist choose it in the first place? You can't. But there are strategies of delay. Céline, with the aid of some truly revolting politics, managed to rema in a monster almost to the end.
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A transfiguração do lugar-comum, na expressão de Arthur Danto, é para Rauschenberg a manobra fundamental e seu dilema. Ele se destaca naquela maravilhosa categoria dos desordeiros, tendo sem dúvida estudado com De Kooning, que conseguia ser mais desordeiro que Hans Hofmann, que hoje parece um modelo de bom comportamento. Em 1962, em visita ao ateliê de Rauschenberg com o fotógrafo Rudy Burkhardt, notei que as janelas que davam para a Broadway estavam cinza-escuras graças à nossa boa poluição nova-iorquina. Rauschenberg trabalhava em suas primeiras obras em silkscreen, em preto-e-branco, e o tom dessas pinturas era bem semelhante ao das janelas. Publicamos uma foto das janelas ao lado das pinturas no jornal para o qual eu trabalhava na época: história da arte instantânea. Nova Vork é uma grande dádiva imunda, e sua imundície ajudou o artista, revigorou-o. Robert Hughes comentou (citando altos funcionários do departamento de limpeza pública) que em uma semana Manhattan joga fora mais bens industrializados do que a França do século XVIII produzia em um ano, e o uso artístico desse material tem sido diretamente proporcional ao seu volume.
o silkscreen fotomecânico também expande muito a gama de materiais à disposição dos artistas que trabalham com colagem. Proporciona o acesso a qualquer coisa que já tenha sido fotografada, favorece citações exaustivas e em qualquer escala. Permite a superposição de imagem sobre imagem, de tal forma que a primeira sangra sobre a segunda, o que a colagem física não faz - isto é, permite um acentuado grau de desordem. As cores da imagem original podem ser alteradas à vontade do artista, possibilitando a paródia e até mesmo um escândalo de cores à la Warhol. O processo adapta-se a quase qualquer superfície; pode-se fazer silkscreens sobre véus, ovos ou até sobre o prefeito. Nenhum outro artista encontrou tantos usos brilhantes para essa técnica, e nenhum tornou tão potente sua combinação com objetos rejeitados, como Rauschenberg. Há algumas constantes nessa massa heterogênea de possibilidades. Veja-se, por exemplo, o uso do papelão marrom comum de embalagens, que aparece repetidamente no trabalho de Rauschenberg. Amassado e rasgado, ele invariavelmente assume formas definidas (fato que Schwitters não ignorava). Como coisa, o papelão é a própria definição de mundanidade, um lixo desde que nasce - talvez apenas o papelão cinza de camisas tenha menos status. Insistir nisso é, metaforicamente,
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The transfiguration of the commonplace, in Arthur Danto's phrase, is both Rauschenberg's fundamental maneuver and his dilemma. He is particularly adept in that wonderful category, the messy, having studied it, no doubt, with De Kooning, who managed to be messier than Hans Hofmann, who now appears positively tidy. In 1962, visiting Rauschenberg's studio with the photographer Rudy Burkhardt, I noticed that the windows overlooking Broadway were dark gray with our good New York grime. Rauschenberg was then working on some of the earliest of his blackand-white silkscreen paintings, and the tonality of the paintings was very much that of the windows. We ran a shot of the windows alongside photographs of the paintings in the joumall was then laboring for instant art history. New York is a great filthy gift, and its very filthiness has worked to the artist's advantage, has been tonic. Robert Hughes observes (quoting highly placed officials at the New York City dump) that Manhattan throws away more manufactured goods in a week than eighteenth-century France produced in a year, and the artist's use of these portable stigmata has been richly proportionate. The photomechanical silkscreen, too, expands the bin of materiaIs available to the col/agist enormously. It provides access to anything that has ever been photographed, al/ows quotation at great length and at any scale. It permits superimposition of one image upon another in such a way that the first bleeds through the second, as physical col/age does not - that is, it al/ows a heightened degree of messiness. The colàrs of the original image can be changed as the artist wishes. Parody is possible, even color-scandal a Ia Warhol. The process adapts to almost any surface; you can silk-screen onto veils or eggs or the mayor. No other artist has found so many brilliant uses for it, and in no other hands has its combination with orphaned objects been so potent. There are constants within this welter of possibilities. Take for example his use of the familiar brown corrugated cardboard shipping carton, which presents itself again and again in his work. Flattened and tom, it invariably fields strong shapes (a fact not unknown to Schwitters).
Eco - Echo V. 1992-93 tĂŠcnica mista/ mixed media 224 x 186 x 72 cm
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Pegasus' first visit ta America in the shade af the F/atiron Bui/ding (sĂŠrie Kabal American Zephir), 1982 tĂŠcnica mista/ mixed media 245 x 339 x 57 cm Foto Dorothy Zeidman
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condenar o sistema de vai ores em que o papelão tem um status irremediavelmente inferior. Dizer que outros utilizaram o mesmo objeto com objetivos artísticos, ou que o objeto é apresentado não de maneira pesada, mas com deliberada leveza, omite que o artista o escolheu repetidamente, que de certa forma está comprometido com ele. Rauschenberg quase sempre prefere o áspero ao suave, o imperfeito ao inteiro, o velho ao novo, mas nisso, também, é acompanhado por vários outros artistas. Um procedimento baseado em tais preferências exige que o conjunto seja suficientemente mau - isto é, suficientemente diferente de todas as outras visões para que se permita ser visto, captado e até que predomine numa paisagem visual por si só muito atraente. Vidraças, novamente: "As obras têm de parecer pelo menos tão interessantes quanto qualquer outra coisa que esteja acontecendo do lado de fora da vidraça", disse Rauschenberg.
o artista busca uma construção que imobilize o espectador numa espécie de tensão, e é através desse estratagema que as grandes reputações se constroem e perduram. As próprias conquistas transformam-se no que deve ser evitado. Rauschenberg supera-se, como é necessário, ao manter-se à esquerda de sua própria história. E consegue isso através de atos de verdadeira intuição poética. Se o princípio básico da colagem é a justaposição de coisas desiguais dentro de um campo visual (em geral, no caso de Rauschenberg, o que Leo Steinberg chamou apropriadamente "de "superfície do plano da pintura"), na teoria ele precisa apenas encontrar coisas cada vez mais estranhas e com elas construir logogrifos não totalmente decifráveis. A teoria é bastante clara, mas com certeza imprópria. Ela ignora a verdadeira origem da força deste artista, que repousa no mistério de suas escolhas. Charles Mauron, escrevendo sobre a acolhida dós primeiros trabalhos de Mallarmé, disse que, embora os leitores se sentissem excluídos da obra, reconheciam que ela era magnífica. A sedução, neste caso, é sempre anterior à compreensão. É um aspecto essencial da contradição acima mencionada, e é onde repousa o verdadeiro gênio de Rauschenberg - o que faz o espectador, seduzido, capitular diante de suas obras. Donald Barthelme Copyright 1985 Contemporary Arts Museum, Houston, Texas. Todos os direitos reservados. Este ensaio foi originalmente publicado no catálogo da exposição Robert Rauschenberg, Work from Four Series: A Sesquicentennial Exhibition, apresentada no Contemporary Arts Museum, Houston, Texas, dezembro de 1985 a março de 1986. Reproduzido aqui por gentil permissão.
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As a thing it is the very definition of mundanít'l trash from birth perhaps only the gra'l hopeless shirt cardboard has less social status. To insist upon it is, metaphoricall'l to condemn the system of value in which íts status is seen as abysmal. To say that other people have used the same or similar objects for the purposes of art or that the object is presented not ponderously but often with a delibera te gaiety misses the point, which is that the artist has chosen ít repeatedl'l that he is in some way committed to it. Rauschenberg wíll almost always pick the rough over the smooth, the tlawed over the whole, the old over the new but so, too, wíll many other artists. A procedure based on such choices requires that the ensemble be bad enough - that is, distinct enough from ali other sights to allow itself to be seen, to take hold, even to prevail in a visuallandscape that is already clamorous. Windows again: "The works had to look at least as interesting as anything that was going on outside the window", Rauschenberg says. The artist seeks a construction that holds the viewer in a certain sort of tension, and ít is in being able to pull this off, year after year, that major reputations are made and endure. One S own achievements become what must be circumvented. Rauschenberg excels, as he must, in getting to the left of his own history. He manages this by what can only be called acts of poetic intuítion. If the basic principIe of collage is the juxtaposítion of unlike things wíthin a visual field (in Rauschenbergs case, most often what Leo Steinberg has aptly called the "work surface picture plane"), he needs in theory only find stranger and stranger things and build not-quitedecipherable rebuses from them. The theory is straighforward enough but, of course, inadequate. It ignores the true source of this artists power, which lies in the mystery of particular choices. Charles Mauron, writing of the reception of the early work of Mallarmé, notes that although readers felt rebuffed, excluded by the work, they nevertheless also knew it to be magníficently written. Seizure, as ít were, is always prior to understanding. It is an essential aspect of the tension mentioned earlier, and it is where Rauschenbergs real genius lies - the tire wrestled over the goats hind legs. Donald Barthelme Copyright 1985 Contemporary Arts Museum, Houston, Texas. Ali rights reserved. This essay was originally published in the catalogue of the exhibition Robert Rauschenberg, Work from Four Series: A Sesquicentennial Exhibition which was presented at the Contemporary Arts Museum, Houston, Texas, Oecember 1985-March 1986 (and tour). Reprinted here with their kind permission
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Dattodil (Shiner) - 1986 acrílico e objetos sobre aço inoxidável com moldura de alumínio/ acrylic and objects on stainless steel with aluminum trame 184 x 122 cm Foto Dorothy Zeidman
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Mercurial yahoo Kabal American construção com LvvllllvC'I "II;)Wj mixed media constnlctii'JlJ 79 x 127 x 68 cm
Mercury zero summer glut, 1987 metal rebitado/ riveted metal 26 x 44 x 21 em Foto Dorothy Ze idman
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Nasceu em Port Arthur, Texas, EUA, em 1925. Estudou no Kansas City Art Institute; na Academie Julien, em Paris; no Black Mountain College (com Josef Albers), na Carolina do Norte; e na Liga dos Estudantes de Artes (com Vytlacil e Kantor), em Nova Vork. Viajou pela Itália e norte da África, entre 1952 e 1953, retornando a Nova Vork em 1953. De 1955 a 1964, desenhou e executou cenários e figurinos para a Merce Cunningham Dance Company, trabalhando também como diretor técnico. Bom in Port Arthur, Texas, in 7925. He studied at Kansas City Art Institute, at Academie Julien, in Paris, at Black Mountain College (with Josef Albers), North Carolina, and at Art Students League, New York City (with Vytlacil and Kantor). Travelled in Italy and North Africa in 7952-7953, retuming to New York City in 7953. From 7955 to 7964 he designed and executed stage sets and costumes for the Merce Cunningham Dance Company, also serving as thecnical director. Exposições individuais/Solo exhibitions 1953 Scatole e Feticci Personali (pequenos objetos feitos no norte da África/small objects made in North Africa), Galleria Dell'Obelisco, Roma/Galleria d'Arte Contemporanea, Florença, Itália; White Paintings, Black Paintings, Stable Gallery (esculturas em pedra e madeira/rock and wood sculptures), Nova Vork. 1958Leo Castelli Gallery, Nova Vork (exposições anuais/annually thereafter). 1959 Galerie 22, Düsseldorf, Alemanha; Galleria La Tartaruga, Roma.
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1963 The Jewish Museum, trabalhos a partir de 1949/works from 7949, Nova Vork; Galerie lIeana Sonnabend, Paris (regularmente, até 1980/regular/y until 7980). 1964 Museum Haus Lange, Krefeld, Alemanha; Gian Enzo Sperone Art Moderna, Turim; Whitechapel Gallery (pinturas, desenhos e combinações/paintings, drawings and combines), Londres. 1965 Museum of Modem Art, Nova Vork; Contemporary Arts Society, Houston; Stedelijk Museum, Amsterdam; Moderna Museet, Estocolmo; Robert Rauschenberg Paintings 19531964 retrospectiva/re trospec tive, Walker Arts Center, Minneapolis; Amerika Haus, Berlim. 1968 Galerie Gerald Cramer, Genebra; Museum of Modem Art, Nova Vork; Soundings, Stedelijk Museum, Amsterdam/ Kõlnischer Kunstverein, Colônia/ Musée d'Arte Moderne de la Ville de Paris. 1969 Rauschenberg in Black and White: Paintings 1962/63 and Lithographs 1962/67, Newport Harbor Art Museum, Balboa, Califórnia; Douglas Gallery, Vancouver; Museum BoymansVan Beuninger, Rotterdam. 1970 Visual Arts Gallery, Nova Vork; Kunstmuseum, Basiléia, Suíça; Kunstverein, Hannover; Stoned Moon, Pasadena Art Museum; Currents, Castelli Graphics & the Automation House, Nova Vork/ Dayton's Gallery, Minneapolis. 1972 Galerie Buren, Estocolmo; Stoned Moon e/and Currents, Multicenter Grafica, Milão; Made in Tampa, Castelli Graphics e Leo Castelli Gallery,
gravuras e peças de argila/prints and c/ay pieces, Nova Vork. 1973 Robert Rauschenberg: Prints, Mitchell Gallery, Carbondale, EUA; White Paintings, Ace Gallery, Venice, Califórnia/ Vancouver; The Mayor Gallery, desenhos/drawings, Londres; Jack Glenn Gallery, San Diego. 1974 Rauschenberg in Israel, Israel Museum, esculturas e desenhos/sculptures and drawings, Jerusalém; Hoarfrost, Castelli Graphics, Nova Vork; Galerie Buren, Estocolmo; Lucio Amelio Modem Art Agency, Nápoles; Museum Haus Lange, Krefeld, Alemanha; John Berggruen Gallery, San Francisco; Galerie Mikro, Berlim; Jared Sable Gallery, Toronto. 1975 Hoarfrost, Dayton's Gallery, Minneapolis; Robert Rauschenberg: Drawings, Visual Arts Gallery, N.V.; Bones and Unions, Gemini GEL, Los Angeles; Museo d'Arte Moderna Ca'Pesaro, Veneza; Visual Arts Museum, N.V.; Galeria Tanit, Munique; Galerie de Gestlo, Hamburgo; The Art Assotiation, Newport. 1976 Galleria Civica d'Arte Moderna, Ferrara, Itália; Galerie H.M., Bruxelas; Greenberg Gallery, St. Louis; Robert Rauschenberg (retrospectiva/re trospec tive), National Collection of Fine Arts, Smithsonian Institution, Washington, D.C./Museum of Modem Art, Nova Vork, San Francisco Museum of Modem Art, San Francisco (exposição itinerante/traveling exhibition); Forte di Belvedere, Florença; Alberta College of Arts, Alberta, Canadá; Galerie O, Bruxelas;
Galleriet, Lund, Suécia; Margo Leavin Gallery, Los Angeles; Galerie de Gestlo, Hamburgo. 1978 Robert Rauschenberg: An Exhibition of Recent Work, The Mayor Gallery, Londres; Art Gallery, Vancouver; Gemini GEL, Los Angeles; Denise Rene Hans Mayer,Düsseldorf. 1979/80 Kunstmuseum Tubingen, Alemanha; Rauschenberg: Werke 1950-1980, Staatliche Kunsthalle, Alemanha/ Kunsthalle, Düsseldorf/ Louisiana Museum, Humlebaek, Dinamarca/ Stadtisches Kunstinstitut, Frankfurt! Stadtische Galerie im Lenbachhaus, Munique! Tate Gallery, Londres; Ace Gallery, Vancouver; Galleriet, Lund, Suécia. 1981 Robert Rauschenberg: A Portfolio of 12 Photographs, Galerie Watari, Tóquio; The Sable-Castelli Gallery, Toronto; Rauschenberg Photographs, Musée National d'Art Moderne, Centre Georges Pompidou, Paris, Musée Cantini, Marselha/ Musée des Beaux-Arts, St.Étienne; Moderna Museet, Estocolmo. 1982 In + Out City Limits: New Vork (fotos em preto-ebranco/black and white photographs), Sonnabend Gallery, Nova Vork; Hara Museum of Contemporary Art, Tóquio; Galleriet, Lund, Suécia; Prints by Robert Rauschenberg, Long Beach Museum of Art, gravuras/prints, Long Beach; Sculpture by Robert Rauschenberg (seleções da série/selections of the Kabal American Zephyr series), Flow Ace Gallery, Paris; Rauschenberg: Paintings and Works on Paper, Van Stratten
Gallery, Chicago; Robert Rauschenberg in China (7 Characters), Museum of Modem Art, Nova Vork. 1983 Louisiana Museum of Modem Art, Humlebaek, Dinamarca/ Tranegaar-den, Copenhague; Esbjerg and Henie-Onstad Museum, Oslo; Prince Hotel, Tóquio, KBS Kaikan, Guioto (trabalhos em argila/Japanese clayworks); Flow Ace Gallery, Los Angeles; Jingxian, República Popular da China; Galleria di Franca Mancini, performance/happening, Pesaro, Itália; versão ampliada viaja para/expanded version travels to Nova Vork/ Houston/ Cleveland/ Carolina do Norte/ West Paim Beachl Flórida e Long Beach; Douglas Elliot Gallery, fotos/photographs, San Francisco; Castelli Graphics, fotogravuras/photogravures, Nova Vork; Dalsheimer Gallery, Baltimore; Susanne Hilberry Gallery, desenhos/drawings, Birmingham; Marianne Friedland Gallery, Toronto; Australian National Gallery, Canberra. 1984 Harcourts Contemporary Gallery, San Francisco; Galerie Beyeler, retrospectiva/retrospective, Basiléia, Suíça; Heland Thorden Wetterling Galeries, Estocolmo; Center for Fine Arts,Miami; Fondation Maeght, St.-Paul-deVince, França; Adagio Gallery, Bridgehampton, Nova Vork; Gemini GEL, Los Angeles; Allen Street Gallery, Dallas; Objects Gallery, San Antonio, Texas; Gallery of Fine Art, Fort Myers; Scheinbaum & Russek Gallery, Santa Fe. 1985 Fundación Juan March, Madri; Fundació Joan Miró,
Snowberry Fudge (Spread), 1980 Reprodução çom solvente, plexiglás espelhado, acrílico e colagem s/painéis de madeira com cadeiras/ solvent transfer, mirrored plexiglass, acrylic and col/age on wooden panels with chairs 243 x 321 x 66 cm
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Barealis shares I, 1990 (vista frontal/front view) tĂŠcnica mista/mixed media 190 x 103 x 58 cm uma das 26 cadeiras/ane af 26 unique chairs Foto Douglas M. Parker
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Barealis shares I, 1990 (vista posterior/back view) tĂŠcnica mista/mixed media 190 x 103 x 58 cm . uma das 26 cadeiras/ane af 26 unique chairs Foto Douglas M. Parker
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Barea/is shares li, 1990 (vista frontal/front view) tĂŠcnica mista/mixed media 190 x 103 x 58 cm uma das 26 cadeiras/ane af 26 unique chairs Foto Douglas M. Parker
Borea/is shares li, 1990 (vista posterior/back view) tĂŠcnica mista/mixed media 190 x 103 x 58 cm uma das 26 cadeiras/ane af 26 unique chairs Foto Douglas M. Parker
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Barcelona; B. R. Kornblatt Gallery, Washington D.C.; Rauschenberg Overseas Culture Interchange - ROCI - seis anos de exposição itinerante organizada pelo artistala six-year traveling exhibition organized by the artist: Cidade do Méxicol Santiagol Caracas! Pequiml Lhasa, Tibetel Tóquiol Havanal Moscoul Berliml Kuala Lumpur, Malásial Washington D.C.; Daniel Templon, Paris. 1986 Contemporary Arts Museum, Houston; Espace Niçois d'Art et de Culture, Nice; Larry Gagosian Gallery, Nova Vork; Setagaya Art Museum e Sogetsu Kaikan, Tóquio. 1987 The Metropolitan Museum of Art, Nova Vork; Heland Thorden Wetterling Galleries, Estocolmo; Kaj Forsblom Gallery, Helsinque; Galeria Denise Rene Hans Mey~r, Düsseldorf; Galeria Lucio Amelio, Nápoles; Blum-Hellman Gallery, Los Angeles; Waddington Galleries, Londres. 1988 Blum-Helman Gallery e Pace/MacGiII Gallery, Nova Vork; Museo Nacionall Castillo de la Fuerzal Casa de las Américas, Havana; Galerie Alfred Kren, Colônia; Galerie Isy Brachot, Bruxelas; Galerie Jamileh Weber, Zurique; BMW Showroom, Berlim; Heland Wetterling Gallery, Gotler, Suécia; Greene Gallery, Coral Gables, Flórida. 1989 Universal Limited Art Editions Gallery, Nova Vork; Casa de Cultura e Galeria Tretyakov, Moscou; Fabian Carlsson Gallery, Londres; Castelli Graphics, Nova Vork; Akira Ikeda Gallery, Tóquio; Ace Contemporary Exhibitions, Los Angeles; Schwartz, Cierlak Gallery; Fred Hoffman Gallery, Santa Monica; Heland Wetterling Gallery, Gothenbergl Estocolmo; Knoedler & Company, Nova Vork; Meadows Museum, Dallas; Galerie Jamileh Weber, Zurique. 1990 Lorance/Monk Gallery, Nova Vork; Lang & O'Hara, Nova Vork; Scott Hanson Gallery, Nova Vork; Neue
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Berliner Galerie, Alten Museum, Berlim; Galerie Montaigne, Paris; Runkel-Hue Williams Ltd., Londres; Galerie Alfred Kren, Colônia; National Art Gallery, Kuala Lumpur, Malásia; Knoedler & Co., Nova Vork; Galeria Pyo, Seul, Coréia; Nippon Convention Center, Makauhari Messe, Japão; Feigen Gallery, Chicago; Galerie Baudoin Lebon, Paris. 1991 Knoedler & Company, Nova Vork; National Gallery of Art, Washington, D.C.; Jamileh Weber Gallery, Zurique; City Gallery of Contemporary Art, Raleigh, North Carolina; Robert Rauschenberg,Recent Paintings, Galleria 11 Gabbiano, Romal Galleria Appiani, Milão. 1992 Knoedler & Co., Nova Vork; Gemini GEL, Los Angeles; Alfred Kren Gallery, Colônia. 1993 Museu de Arte Contemporânea de Hiroshima, Japão. 1994 Leo Ca.stelli Gallery, Nova Vork; Mandarin Oriental Fine Arts, Hong Kong. PrêmioslPrizes 1964 Grande prêmiolGrand Prize, Bienal Internacional de Veneza. 1965 Medalha de ouro e prêmio William A. Clark/William A. Clark gold medal and prize, 29a Bienal da Pintura Contemporânea Americana, Washington, D.C. 1976 Prêmio LoganlThe Logan Award, Art Institute de Chicago. 1977 Medalha de honra para artes e culturalMayors Award of Honor in Arts and Culture, Mayor's Commission for Cultural Affairs. 1978 Medalha de artes criativas para pinturalCreative Arts Medal in Painting, American Academy of Arts and Science, Boston; Chicago Arts Award. 1979 Grande Prêmio de Honra, Exposição Internacional de Arte GráficalGrand Prix d'Honneur, International Exhibition of Graphic Art, Liubliana, Eslovênia; Prêmio Especial da 8a Bienal de Artes Gráficas/Special Award: Eight Graphic Arts Krakow Biennale, Cracóvia, Polônia; medalha de ouro de artes gráficaslgold
medal for graphics, Oslo. 1982 Medalha Skowhegan de pinturalMedal Skowhegan for painting. 1984 Prêmio Grammy, pela capa de Speaking in tongues, álbum do grupo Talking Heads/Grammy Award, "Best Album Package'; Prêmio Jerusalém para Artes e LetraslJerusalem Prize for Arts and Letters, Friends of Bezalel Academy of Jerusalem, Filadélfia. 1985 Círculo de Críticos de Arte do ChilelAssociation of Art Critics from Chile, Certificado de Mérito do Ministério da CulturalMerit award granted by the Ministry of Culture, Pequim. 19871nternational Center of Photography Art Award. 1989 Medalha de ourolGold Medal National Arts Club, Nova Vork; Prêmio FlóridalFlorida Prize, Governo da Flórida e The New Vork Times Company Regional Newspaper Group. 1991 Florida Artists Hall'of Fame; Federal Design Achievement Award; National Endowment for the Arts: Rauschenberg Overseas Culture Interchange. 1993 Prêmio Primeiro Dia da TerralFirst Earth Day Award, Imagine Magazine; The Knight Purchase Prize, Akron Art Museum; Medalha Nacional de Artes, outorgada pelo presidente e a primeira-dama dos Estados UnidoslNational Medal of Arts awarded by the United States' President and First Lady. Obras apresentadaslWorks in the exhibition Miter I (Scale), 1980 técnica mistal mixed media 218 x 243 x 66 cm Snowberry Fudge (Spread), 1980 Reprodução com solvente, plexiglás espelhado, acrílico e colagem s/painéis de madeira com cadeiras/solvent transfer, mirrored plexiglass, acrylic and collage on wooden panels with chairs 243 x 321 x 66 cm The suicide of two foreign clerks ar The moving fever (série Kabal
American Zephil), 1981 construção com técnica mistal mixed media construction 208 x 234 x 130 cm Demons of illness and poverty stalking the lucky gods (série Kabal American Zephir), 1981 construçã() com técnica mistalmixed media construction . 241 x 205 x 95cm Mercurial Yahoo sprout (série Kabal American Zephil), 1982 construção com técnica mistal mixed media construction 79 x 127 x 68 Pegasus' first visit to America in the shade of the Flatiron Building (série Kabal American Zephil), 1982 técnica mistalmixed media 245 x 339 x 57 cm Daffodil (Shiner) - 1986 acrílico e objetos sobre aço inoxidável com moldura de alumíniolacrylic and objects on stainless steel with aluminum frame 184 x 122 cm Mercury zero summer glut, 1987 metal rebitadolriveted metal 26x44x21 cm Eco - Echo V, 1992/93 técnica mistalmixed media 224 x 186 x 72 cm Borealis shares I, 1990 (vista frontallfront view) técnica mistalmixed media 190 x 103 x 58 uma das 26 cadeiras/one of 26 unique chairs. Borealis shares I, 19'90 (vista posteriorlback view) técnica mistalmixed media 190 x 103 x 58 uma das 26 cadeiras/one of 26 unique chairs. Borealis shares 11, 1990 (vista frontal/front view) técnica mistalmixed media 190 x 103 x 58 uma das 26 cadeiras/one of 26 unique chairs. Borealis shares 11, 1990 (vista posteriorlback view) técnica mistalmixed media 190 x 103 x 58 uma das 26 cadeiras/one of 26 unique chairs.
The suicide af twa fareign clerks ar The maving fever (série Kabal American Zephir), 1981 construção com técnica mista/ mixed media canstructian 208 x 234 x 130 cm
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Miter / (Sca/eJ, 1980
tĂŠcnica mista/ mixed media 4 pa rtes/ parts 218 x 243 x 66 cm
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CU~DO~ JUAN CA~lO~ ~c~cDA
CU~AíO~JUAN CA~[Oj rf~fDA
CAMINHOS DE lUZ: A ARTE DE RUFINO TAMAVO
PATHS DF LlGHT THE ART DF RUFIND TAMAYD
"Se pudesse exprimir com uma única palavra o que distingue Tamayo dos outros pintores de nossa época, diria, sem um momento de hesitação: sol. O sol está em todas as suas pinturas, quer o vejamos ou não; a própria noite é, para Tamayo, o sol carbonizado."1 Com essas palavras, Octavio Paz definiu, em 1982, a arte de Rufino Tamayo.
In 1982 Dctavio Paz wrote the following words about the art of Rufino Tamayo: ulf I could express with a single word what is it that distinguished Tamayo from other painters of our age, I would say, without a moment's hesitation: sun. For the sun is in ali his pictures, whether we see it or not; night itself is for Tamayo simply the sun carbonized. UI
A descrição é reveladora do maior artista mexicano. Durante sua longa carreira, ele sempre foi sensível aos dois elementos-chaves que caracterizam seu trabalho: a cor e a luz, nascidas ambas da mesma fonte, o próprio México. Ao estudar a complexa arte de Tamayo, percebemos que em nenhuma de suas pinturas a cultura e a tradição de sua terra deixam de estar significativamente presentes. Algumas vezes as referências ao México aparecem veladas e são difíceis de decifrar, mas, mesmo assim, surgem em todos os quadros, desenhos ou gravuras. As escolhas estéticas de Rufino Tamayo foram realizadas com independência, sem que ele jamais se desviasse de seu caminho em função de tendências artísticas do momento. Apesar de não ter sido sempre fácil manter sua integridade artística (durante muitosJanos precisou viver fora do país para conseguir desenvolver sua arte com liberdade), o resultado foi um vasto conjunto de trabalhos de alta qualidade, marco de liberdade pessoal e artística. Seu exemplo tem sido seguido por gerações de jovens pintores mexicanos, que, sem as lições deixadas por Tamayo, não poderiam ter definido suas opções artísticas. Rufino Tamayo nasceu em 1899 em Oaxaca, sul do México. lembrar sua cidade natal é relevante para qualquer abordagem a respeito de sua arte. Oaxaca é uma das regiões onde as tradições indígenas são preservadas com grallde reverência. Os artistas de lá sempre foram atraídos pela atmosfera de mistério e lenda que é parte integrante de seu território. Apesar de Tamayo nunca ter ilustrado diretamente mitos indígenas, sua obra é permeada por uma atmosfera de fábula etérea, conseqüência de seus contatos com a cultura de sua cidade, tanto através da herança sanguínea - ele é de ascendência zapoteca - como por afinidade espiritual.
This description sums up a great deal about the most distinguished Mexican master. Throughout his long career he has remained consistently sensitive to the two key elements that define his work: color and light. 80th of these components of his art are derived from the same ultima te source: Mexico itself. In studying the subt/y complex art of Tamayo there is not one painting in which the culture and traditions of his native country are not present in great part. At times the references to Mexico are veiled and difficult to decipher, but they are nonetheless present in every painting, drawing and print. The aesthetic paths followed by Rufino Tamayo have been entirely of his own choosing. He has never been swayed to work in a given manner by artistic fashions of the day Although it was not always easy for Tamayo to maintain his strict artistic integrity (for many years he felt it necessary to live abroad to develop his art as he pleased) the result has been a vast body of highly distinctive work that has consistently stood as an example of personal freedom and liberty This example has been followed by generations of younger Mexican painters who have often stated that without the lessons leamed from Tamayo, they could not have found their own artisti~ voices. Rufino Tamayo was bom in the southem Mexican city of Daxaca in 1899. The mention of his birthplace is relevant to any discussion of his art. Daxaca is one of the regions of Mexico where indigenous traditions and more are preserved with reverence. As we will se further on in this essay, artists from Daxaca have been traditionally drawn to the atmosphere of mysteryand legend that is an integral part of their native territory Although in his work Tamayo has never illustrated Indian myths per se, his oeuvre is permeated with the fabled air of the ethereal, ultimately derived from his contacts with native culture (through both blood - he is of Zapotec descent - and spiritual affinity)
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Autorretrato, 1967 óleo s/tela/o;1 on canvas 179 x 129 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA. México
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Retrato de DIga, 1964 óleo s/tela/oil on canvas 210 x 135 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA México
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Rufino Tamayo alcançou sua maturidade em 1920, momento em que eclodia uma grande crise na arte e na sociedade mexicanas. A Revolução tinha acabado havia pouco e todo o país estava à procura de novos padrões culturais e meios de expressão. Qualquer elemento europeu era rejeitado e a emergência de um espírito nacional se manifestava em imagens do povo e de seus costumes, assim como em representações do cenário mexicano. O muralismo emergia como movimento artístico e seus três maiores expoentes, Diego Rivera, José Clemente Orozco e David Alfaro Siqueiros, que vieram a ser denominados los tres grandes, tornavam-se verdadeiros ditadores artísticos no país. Os padrões de conteúdo político na arte eram definidos por eles, que exigiam ainda que a pintura se tornasse uma expressão de pontos de vista ideológicos. Tamayo, ao contrário, insistia naquilo que denominava a "universalidade da arte", posição que defenderia durante toda a sua vida. Em sua opinião, a arte devia transcender os acontecimentos cotidianos e voltar-se para o horizonte mais amplo das emoções e necessidades humanas. Os valores da forma, cor e estética eram primordiais em sua arte. Grande parte de sua sensibilidade artística vinha do contato com formas pré-hispânicas que experimentara quando jovem. Continuou, ao longo da vida, a ter profundo respeito 'pelas civilizações asteca, maia e outras. Em 1921 foi nomeado diretor da divisão de desenhos etnográficos do Museu Nacional de Antropologia, experiência que lhe valeu o seguinte comentário: "Foi aí que abri meus olhos, ao entrar em contato com a arte pré-colombiana e popular. Descobri imediatamente a fonte que iria usar em meu trabalho - a nossa tradição"2. Tamayo, no entanto, também se mostrou sensível a uma ampla herança artística. Seu conhecimento da história da arte ocidental é significativo e, durante toda a sua carreira, estudou e transformou com sutileza uma grande variedade de fontes. Acompanhava as tendências da arte desenvolvida em outros países através das publicações que chegavam ao México em 1920. Se examinarmos sua obra de uma perspectiva cronológica, poderemos perceber de imediato que, apesar de ser jovem e de ainda não ter saído de seu país, suas primeiras pinturas demonstram uma singular proximidade com grande número de formas de arte internacionais. A retrospectiva de 1987-88 realizada no Museu Rufino Tamayo e no Palácio de Belas-Artes da Cidade do México foi um evento definitivo para a arte moderna mexicana. Nessa exposição, o espectador podia testemunhar, entre outros aspectos, a enorme variedade de estilos que Tamayo havia estudado nos primeiros anos de seu trabalho. Entre os destaques desse período podemos mencionar A chapel in Oaxaca e Patzcuaro, de 1920 e 1921. Eles mostram que o jovem artista conhecia com intjmidade o vocabulário pósimpressionista e era capaz de imprimir vida nova a essa linguagem artística. O crítico mexicano Carlos Monsiváis denominou a década de 20 no México a "era do jazi' e o início de uma nova "sociedade aberta"3. Tamayo foi mais longe ao despertar a consciência do mundo artístico mexicano a novas experiências e formas de expressão que até então não haviam sido exploradas.
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Tomou contato pela primeira vez com essas novas áreas ,estéticas quando visitou Nova Vork em 1926 e lá permaneceu, em companhia do compositor Carlos Chávez, durante dois anos. Ele descreve essa viagem em tom lacônico: "Ficamos dois anos nos Estados Unidos. Falhamos nessa viagem e voltamos ao México". O sucesso da empreitada, no entanto, assim como a importância das relações estabelecidas na América, foi fund~mental no início de sua carreira. Em 1980, a respeito disso, ele afirmaria: "Sempre pensei que Nova Vorkfosse o centro do mundo artístico. Minha arte formou-se lá"4. Em Nova Vork, Tamayo viveu num
Tamayo reached his artistic maturity in the 7920's, a time of great crisis for Mexican art and society. The Revolution had just ended and the country was searching for cultural standards and means of expression. Anything European was rejected and a national spirit was manifested in images of the people and their customs as well as representations of the Mexican landscape. Muralism came of age as a movement and the three greatest exponents of the style were Diego Rivera, José Clemente Drozco and David Alfaro Siqueiros. These men, who came to be called los tres grandes (the "three great ones") became virtual artistic dictators in Mexico. They set standards of political commitment in art and demanded that painting become an expression of ideological concem. Throughout his career Tamayo has insisted on what he has called the "universality of art". For him art should transcend the events of the day and address itself to the widest range of human needs and emotions. Tamayo is innately interested in form, color and aesthetic values in his art. Much of his artistic sensibility is derived from his earliest experiences with pre-hispanic forms and he has continued to have a deep respect for the accomplishments of the Aztec, Maya and other groups. In 7927 he was made director of the division of ethnographic drawing at the National Museum of Anthropology. Df this experience he has said: "It opened my eyes, putting me in touch with both pre-Columbian and popular arts. I imm.ediately discovered the sources of my work - our tradition"2 However, Tamayo had also shown himself to be highly sensitive to a wide artistic legacy. His knowledge of the history of westem art is remarkable and throughout his career he has studied and subtly transformed a myriad of sources. Tamayo had been aware of trends in foreign art through the European and American publications that reached Mexico in the 7920 's. If one examines his oeuvre in chronological perspective it soon becomes apparent that despite his youthand the fact that he had not traveled abroad, his early paintings show a remarkable conversance with a multiplicity of intemational forms of art. The 7987-88 retrospective held at the Museo Rufino Tamayo and the Palacio de Bellas Artes in Mexico City was a landmark event for Mexican modem art. There the visitor was able to witness, among other things, the enormous variety of styles which the artist had studied in his early days. Among the most outstanding early paintings exhibited were two works entitled A chapel in Oaxaca and Patzcuaro of 7920 and 7927 respectively. These paintings show the young artist to have been fully immersed in the Post-impressionist idiom and able to breathe new lite into this mode of artistic vision. The Mexican critic Carlos Monsiváis has called the 7920's Mexico's "Jazz Age" and the beginning of a new "open society".3 Tamayo was one of the artists who went furthest in opening the eyes of the Mexican art world to new experiences and to new forms of expression that it had therefore not explored. Tamayo's eyes were opened further to new aesthetic areas when he first visited New York in 7926. He arrived in Manhattan in the company of the composer Carlos Chá vez and stayed for two years. Tamayo's own description of this first visit to New York is laconic ("We spent two years in the USo We failed there and retumed to Mexico") yet the success of his trip and the importance of the contacts he ma de there were of great importance to his . early career. In 7980 Tamayo stated: "1 always thought that New York was the center of the art world. Myart was really formed there. "41n his early
apartamento na 14th Street e fez amizade com os vizinhos Marcel Duchamp, Stuart Davis, Reginald Marsh e Vasuo KuniyoshP A arte do mundo nova-iorquino o marcou de diversas maneiras. Interessouse pelas experiências abstracionistas e de redução da forma que estavam sendo feitas por Davis e outros artistas. Em outra viagem aos Estados Unidos, em 1939, também ficou impressionado com várias pinturas murais, não-objetivas e figurativas, que viu na Feira Mundial de Nova Vork.
days in New Yark Tamaya lived in a tenement an Faurteenth Street and became friendly with his neighbars which included the painters Marcel Duchamp, Stuart Davis, Reginald Marsh and Yasua Kuniyashi. 5 The New Yark art warld left a mark an him in many ways. He was evidently interested in the experiments in abstractian and reductian af farm being carried aut by Davis and athers. During a later stay in the city he wauld alsa be impressed by the many mural paintings (bath nan abjective and representatianal) at the New Yark Warld's Fair af 7939 and ather places.
Da segunda vez, o pintor chegaria a Nova Vork na época da Grande Depressão. Apesar das dificuldades econômicas, realizou uma exposição individual nas John Levy Galleries que obteve boa repercussão. Seu momento mais significativo em Manhattan, porém, aconteceu em 1936, quando foi um dos representantes do Congresso de Artistas Americanos. Depois disso, Tamayo e sua mulher Olga ficaram na cidade durante dez anos - com exceção dos verões passados no México. O artista sentia-se mais livre para desenvolver sua visão estética na atmosfera americana mais liberal. No México, as pressões para que se adaptasse à ideologia politicamente engajada dos muralistas era freqüentemente muito severa. Apesar de sua genialidade, Rivera e seus colegas eram muitas vezes rigidamente doutrinários em sua abordagem artística e criticavam qualquer artista que não se submetesse à sua postura programática. Tamayo resistiu às pressões, optando, ao contrário, por uma oportunidade de criar imagens que utilizavam seu próprio vocabulário, dirigidas a um público o mais amplo possível. Durante os anos em que residiu nos Estados Unidos, sua arte enraizou-se cada vez mais em sua própria imaginação e tornou-se menos dependente de estímulos exteriores. A arte de outros grandes mestres, no entanto, continuou a interessá-lo muito. Era especialmente atraído pelo trabalho de Pablo Picasso. Ficou muito impressionado, por exemplo, pela grande obra Guernica, quando a viu em 1938 nos Estados Unidos.
The artist's secand jaumey to New Yark caincided with the great Depressian. Despite the ecanamic difficulties, Tamaya was given a successful ane persan exhibitian at the Jahn Levy Galleries. His mast significant periad af time in Manhattan hawever began in 7936 when he came to New Yark with his wife DIga as ane af the Mexican representatives to The American Artists' Cangress. After this the cauple stayed in New Yark, more ar less cantinuausly (with the exceptian af summers which they wauld spend in Mexica), for aver a decade. Tamaya undaubtedly felt samewhat freer to develap his persanal aesthetic visian in the more liberal atmasphere af New Yark. In Mexica the pressures af canfarming to the palitically engaged idealagy af the muralists were aften severe. Despite their genius, Rivera and his calleagues were aften ruthlessly dactrinaire in their approach to art and were quick to criticize any artist wha did natcanfarm to their programmatic cancems for the future af Mexican art. Tamaya resisted the implicatians af their dictates apting instead for an appartunity to create images that spake with his awn highly persanal vacabulary to the widest passible public. His art during the years af his residence in the Us. and later, during his stay in Paris became increasingly more roated in his awn imaginatian and less dependent an autside stimuli. It is nanetheless true that his fascinatian for the art af ather masters cantinued to be af great interest to him. He was specially attracted to the wark af Pabla Picassa. Tamaya was particularly struck, for example, by his first viewing af Picassa's masterpiece Guernica in New Yark in 7938 and throughaut his career the Mexican artist had always displayed a particular sensivity to the Spaniard's example.
A presente exposição inclui desenhos feitos por Rufino Tamayo na década de 80. Por um lado, podemos ver esse extraordinário conjunto de obras como a representação de uma década de produção do artista. Por outro, podemos considerar esses trabalhos como um resumo dos inúmeros temas com que Tamayo conviveu durante toda a sua vida. Otrabalho realizado na década de 80 pode ser abordado como o ápice do talento do artista mexicano. Como forma de orientação para o espectador no interior do complexo território·representado por sua arte, seria interessante conhecer mais de perto algumas preocupações temáticas e tendências de estilo encontradas em seu trabalho. Émuito difícil escolher uma única área onde um artista tão sofisticado quanto Tamayo tenha se destacado. Pode-se dizer, no entanto, que o domínio da cor talvez tenha sido sua maior contribuição. O gênio de Tamayo como colorista inventivo foi superado apenas por poucos. Ele usava a cor como a maioria dos outros artistas usa a forma. Suas cores não definem somente a tonalidade de um objeto ou de um espaço, mas criam uma atmosfera e delineiam a emoção. Durante os anos 30 e 40 - período em que o artista fez experimentos com formas complexas e onde se pode encontrar de forma sutil a influência de Cézanne, Picas.s.oe.outros cubistas em suas composições - as cores predominantes eram mais escuras e sombrias do que em épocas posteriores. A década de 40 foi testemunha de uma espetacular proliferação de tons brilhantes. Laranjas, vermelhos e intensos azuis - freqüentemente aplicados em campos planos, sem apresentar grandes variações - tornaram-se habituais.
The present exhibitian cancems paintings dane by Rufina Tamaya during the 7980 's. On ane hand we might view this extraardinary range af wark as representative af ane decade in the productian af this prolific artist. On the ather, we might cansider it as an encapsulatian af the myriad themes that Tamaya has dealt with throughaut his life. The wark af the decade af the 80's can be seen as a summatian as well as a culmination af the mastery af the doyen af Mexican art. In arder to guide the viewer (and the reader) through thecamplex territary represented by his art it might be helpful to make several remarks abaut lhe variaus thematic cancems and stylistics tendencies demanstrated by this wark in general. It is extremely difficult to chaase a single area in which an artist as accamplished as Tamaya had excelled yet if farced to do sa, the damain af colar might be that to which he cauld be said to have cantributed the mast. Tamayo's genius as an inventive calarist has been surpassed by few ather artists. Tamaya emplays colar as mast ather artists use shapes and farms. His calars nat anly state the hue af an abject ar a space, they create a maad and delineate ematian. Tamaya's approach to colar has evalved in a fairly dramatic way aver the many years af his career. During the 7920's and 30's a time af camplex formal experimentatian for the artist when the impulse af Cézanne, Picassa and ather cubists was present just belaw the surface af many af his campasitians - the predaminant calars af his canvases and water calars were darker and samewhat more samber thai1 they wauld be later an. The 7940's witnessed a spectacular proliferatian af brightness in Tamaya's palette. Oranges, reds and deep blues - aften applied in flat and unvariegated fields - became the rule.
Posteriormente, Tamayo deu início a um processo onde misturava e
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Retrato conyugal, 1981 óleo s/tela/oil on canvas 95,3 x 130,4 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA. México
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Pareja en gris, 1981 óleo s/tela/oil on canvas 95,7 x 129,5 em Coleção Bernard Lewin Galleries
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sobrepunha com sutileza suas cores. Essa abordagem persistiu até o final de sua vida. Pinturas como Los comediantes, de 1985, ou Sonriente en rosa, de 1988, são claros indicadores de sua habilidade em suscitar um sentido de otimismo e mesmo de euforia com suas tonalidades brilhantes de vermelhos, rosas e laranjas. Em duas de suas últimas pinturas, ambas de 1990, ele leva essa técnica ainda mais longe. EI vaso con flores e Amigas de los pájaros apresentam tons puros combinados com uma grande variedades de tonalidades próximas e trazem à tona sutilezas e nuances que revelam a relação do artista com a cor.
Later Tamayo began a long process of subtly mixing and blending his colar, an approach which he continues to develop in highly innovative ways at the present time. Paintings like the 1985 Los comediantes (Comedians), ar the 1988 Sonriente en rosa (Smiling woman in pink) are clear indicators of Tamayo's ability to convey a sense of optimism and even euphoria with brilliant shades of reds, pinks and oranges. In two very recent paintings dated 1990 he carries this technique several steps further. In EI vaso con flores (Vase of flowers) and Amigas de los pájaros (Friends of the birds) the pure tones are blended with a large variety of related tones so as to bring out the subtleties and nuances of the artist's approach to colar.
Tamayo também demonstrou uma contínua sensibilidade em relação às formas e cores das frutas e de outros alimentos. Esses temas sempre tiveram papel preponderante em seu repertório. Algumas de suas frutas podem até ser interpretadas como símbolos do próprio México e da identificação do artista com seu país natal. Esse aspecto está ainda mais evidente em suas pinturas de melancias, fruta pela qual, como diversos artistas mexicanos, Tamayo demonstrou afeição especial. Tinha um bom motivo para isso: quando criança, viveu na Cidade do México com os tios, que . ganhavam a vida comercializando frutas em uma banca. Em diversas ocasiões, o artista se referiu à sua fascinação juvenil pelo aspecto, toque e cheiro das frutas. Ao pintá-Ias, encontrou também o veículo perfeito para expressar seu amor pela cor. Afirmou, porém, que "minha teoria da cor não nasceu do contato, quando criança, com essas frutas. Ela, assim como minhas outras teorias estéticas, veio de meu conhecimento das culturas pré-colombianas"6. Uma de suas pinturas mais exuberantes, Ofrenda de frutas, realizada em 1985, mostra um homem exibindo, com entusiasmo, uma capa repleta de símbolos das riquezas naturais mexicanas, numa extraordinária demonstração do êxtase representado pela fecundidade da terra.
Tamayo has shown a consistent sensivity to the wide variety of shapes and colors of fruits and other foad stuffs and these elements have always played a major role in his thematic repertory. Some fruits can even be interpreted specificallyas symbols of Mexico itself and the artist's identification with his native country, something which was a leitmotif throughout his entirely visual production. This is particularly the case in his many paintings of watermelons, a fruit for which, like numerous Mexican artists, he has demonstrated a special affection. When Tamayo came to Mexico City as a child he lived with an aunt and uncle who had fruit stand. He has often told of his youthful fascination with the look, feel and smell af fruits. The painting of fruit has also provided the artist with a perfect vehicle with which to express his lave of colar. He stated, however, that "My theory af colar was not bom of my ear/y contact with these fruits ... It, like ali my aesthetic thearies, really came from my contact with the pre-Columbian cultures".6 In the current exhibition one of the most exuberant paintings depicts a wide variety of fruits. Ofrenda de frutas (Offering of fruits) af 1985 shows a man displaying, with apparent enthusiastic joy, a cloak loaded with the symbols of Mexica 's natural riches and plentitude. This is an extraordinary depiction of life-affirming ecstasy embodied by the riches of the earth.
otrabalho de Tamayo nunca chegou à abstração. Apesar disso, são freqüentes os momentos em que quase atravessa a fronteira da não figuração e faz experimentações com formas muito reduzidas, como no Reloj dei pueblo, de 1986. A simplicidade dessa pintura é enganosa. Vemos somente a forma rudimentar de um relógio sobre um edifício alto. Há, porém, algo de misterioso - poderíamos até dizer de ameaçador - nele. As cores são sombrias, evocando um sensação de seriedade, quietude e estranheza, semelhante aos sentimentos despertados por alguns quadros de Giorgio de Chirico. Tamayo não se alinhava ao surrealismo, mas é importante lembrar que em toda a história da arte mexicana, desde o período préhispânico até hoje, sempre houve interesse pelo misterioso e bizarro. Na década de 40, o surrealismo desenvolveu-se muito no México através de pintores que deixaram a Europa e foram viver naquele país. Apesar de Tamayo não se associar diretamente a esse grupo (ele viveu fora do México durante a maior parte desse período), podemos ver em seus quadros - mesmo nos realizados ao final dos anos 80 - certa contribuição da herança surrealista, sempre presente, embora de modo não evidente, ao longo do desenvolvimento da arte mexicana.
Tamayo's wark has never become abstract. Nonetheless, there are aften certain instances in which he has arrived at the edge ofnon-objectivity and experimented withhighly reduced forms as in the 1986 Reloj dei pueblo (Village clock). The simplicity of this painting is deceptive. In it we see nothing more than the rudimentary shape of a clock hovering above a large building. There is something eerie - one could almast menacing - about it. The colors are samber, evoking a sense of seriousness and quietude - as well as unease - that is not dissimilar to analogous sentiments aroused in us by some of the canvases of Giorgio de Chirico. Tamayo did not align himself with any of the surrealist artists, yet we must remember that throughout the history of Mexican art, from pre-hispanic times until the present, there has been an interest in the mysterious and the bizarre. In the 1940's there was a particular/y strong development in Mexico of surrealism in the hands of numerous painters who has emigrated there from Europe. Although Tamayo did not directly associa te himself with this group (he was living outside the country for most of this time) I think it fair to say that we can see in some of his works - even those dane as late as the mid 1980's - something of the heritage of a surrealist sensibility that has always lurked just beneath the surface in the development of the art of Mexico.
Tamayo demonstrava preferência por pinturas que continham
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elementos pictóricos muito reduzidos. "Logo depois da Segunda Guerra Mundial, comecei a refletir nas implicações do novo período que começava e pintei minhas primeiras telas com temas de constelações e projeções através do espaço.",7 Muitas obras de arte excepcionais do final da década de 40 e dos anos 50 tematizam os céus e o espaço. Esse assunto continuou a preocupar 'o pintor desde então, havendo uma ênfase crescente do sentimento de transcendência no trabalho de Tamayo como um todo. Nas pinturas mais recentes verificamos uma atmosfera convincente de espiritual idade, assim como um clima de união com o cosmos. Esse aspecto também pode ser descrito como uma tentativa de estar além do tempo. Muitos dos trabalhos feitos na década de 80 sugerem ações e acontecimentos que começaram em um passado longínquo e que continuarão a ocorrer, talvez para sempre. A pintura de 1985 intitulada Diálogo, por exemplo, mostra uma espécie de conversação sem fim que podemos imaginar ter-se iniciado nos tempos antigos e que se prolongará ainda por muito tempo.
Tamayo had a special attraction for paintings which displayed severely reduced pictorial elements. "Immediately after the Second World War. .. I began to reflect on the implications of the new space age and painted my first pictures of constellations and projections through space'? Many masterpieces of the late forties and fifties have as their theme the heavens and space. This has continued to be a preoccupation of the artist ever since that time. Although none of the paintings on the present exhibition have as their subjects stars of space. I believe that there is a continuously stronger emphasis on a feeling of transcendence in Tamayo's work as a whole which can be observed in a number of these canvases. There is, in these late paintings, a deeply convincing air of spirituality and a feeling of one-ness with the cosmos. This might also be called a sensation of timelessness. Many of these works done in the 1980's suggest actions andevents that began in the long-ago past and will continue perhaps forever. The 1985 painting entitled Dialogo (Dialogue) for example, depicts a kind of unending conversation that we might imagine to have begun in ancient times and will continue for years to come.
Já afirmei que o local de nascimento de Tamayo - Oaxaca - é responsável, em parte, pelo evidente conteúdo mítico e lendário presentes em sua arte. Não há, no entanto, qualquer objeto ou pessoa em seus quadros que possa ser rotulado de folclórico. Tamayo sugere a fábula de modo indireto e elusivo. As demonstrações de aíegoria tiveram muita influência no trabalho dos jovens pintores de sua região. Podemos até nos referir a uma "escola de Oaxaca"', da qual faziam parte Francisco Toldeo (n. em 1940), Rodolfo Nieto (1937-1985) e Rodolfo Morales (n. 1925), todos eles com boa reputação no México e no exterior. Apesar de cada um mostrar um estilo artístico altamente pessoal, há alguns pontos em comum, como a brilhante manipulação da cor e o desenvolvimento de um vocabulário visual extremamente individual que envolve evocações, quase sonhos, de pequenos vilarejos e cidades de Oaxaca. Tanto esses pintores como muitos outros provenientes dessa e de outras regiões do México têm uma grande dívida com Tamayo, o que, aliás, é um dos aspectos que mais se destacam em sua carreira. Seu trabalho - sempre estabelecendo novas caminhos artísticos - proporcionou um importante exemplo de riqueza nas cores, erotismo, vibração de formas e amplitude de propostas às gerações mais novas, que vêem nele não só a mais destacada figura da recente história da arte de seu país, mas também um artista que se rebelava consistentemente contra os padrões artísticos e estéticos estabelecidos. Como vimos, ele se posicionou contra o realismo-socialista nos anos 30 e 40, recusando-se a criar imagens que contivessem apenas mensagens políticas. Mais tarde, nas décadas de 50 e 60, quando a abstração pura tornou-se o modo de expressão mais aceito na arte mexicana, ele a rejeitou, pois via nela uma dependência de estilos importados.
Earlier on I stated that Tamayo's birthplace - Oaxaca - has been partly responsible for the palpable over-Iay of myth and legend in his art. In no instance are we shown any object or person that could be labeled "folkloric". Tamayo's suggestion of fable is far more indirect and elusive. The unique intimations of allegory in his art have been highly influential for the development of the work of many younger painters from this region of Mexico. One can actually speak of a "school of Oaxaca" - a loosely defined group of painters from this region. Among the most well known of this artists are Francisco Toldeo (b. 1940), Rodolfo Nieto (1937-1985) and Rodolfo Morales (b. 1925). Each of these artists has reached a position of high esteem in Mexico and abroad. Although they ali exhibit a highly distinct artistic outlook there are certain points they each have in common including their brilliant manipulation of color and their development of a highly individualized visual vocabulary involving dream-like evocations of the small towns and villages of the state of Oaxaca. In the case of these painters and many others from the region, their debt of inspiration to Tamayo is very great indeed.
Manteve-se fiel à sua própria visão artística, que se baseava na abundância voluptuosa das formas e das cores de seu país natal. Esses elementos exercem forte atração nos artistas da atual geração, em que a marca do vocabulário artístico de Rufino Tamayo pode ser observada.
We can speak of Tamayo's impact on younger painters - not only those from Oaxaca but from ali parts of Mexico - as one of the most outstanding aspects of his career. Always a trend setter in his art, his work has given to the younger generation of painters an important example of coloristic richness, eroticism, formal vibrancy and richness. Many Mexican painters who are today in their twenties, thirties and forties look to Tamayo not only as the most outstanding figure in the recent history of art in their nation but as an artist who consistently rebelled against established patterns in art and aesthetics. As we have seen he went against the grain of social realism in the 1930's and 40's, refusing to create images with a purely political message. Later, in the 1950's and 60's, when pure abstraction became the most accepted mode of expression in Mexican art, he rejected what he saw as a reliance upon foreign styles and remained faithful to his own artistic vision which is inherently based on the voluptuous abundance of form and color of his na tive country These elements deeplyappeal to artists working todayand throughout the production of younger Mexican painters, the heritage of Rufino Tamayo's spirit can be and the stamp of his artistic vocabulary can be observed.
Uma das convenções artísticas mais utilizadas pelos povos nativos
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La familia, 1987 óleo s/tela/oil on canvas 180 x 124,5 cm Coleção particular, México
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do México - tanto no período pré-hispânico como atualmente - é a máscara. Ela estabelece uma aura mágica, cria novas personalidades; transforma quem a usa em alguém - ou algo totalmente diferente de sua persona cotidiana. Em sua carreira, Tamayo fez freqüentes referências às máscaras. Isso também ocorre em seus últimos trabalhos, em que os protagonistas parecem estar usando máscaras que remetem a enigmas de antigos cerimoniais. Gestos simbólicos e formas totêmicas emergiram com maior clareza nas pinturas que realizou nos anos 70 e 80. Em Hombre a la puerta, de 1980, podemos ver uma figura cujos traços faciais foram reduzidos a proporções geométricas essenciais. Ela está em primeiro plano, contra um fundo composto de uma sutil mistura de cores: rosas, cinzas e marrons. Retrato conyugal apresenta um homem e uma mulher tão reduzidos a seus traços essenciais que podem representar todos os casais do mundo. Essa redução é, talvez, o fundamento da universalidade de Tamayo, tão procuràda por outros artistas. As raízes desse brilhante sistema de "redução" artística podem ser creditadas à sua fascinação, quando ainda era muito jovem, pela arte pré-hispânica. Os maias, astecas e outros povos nativos do México foram verdadeiros gênios ao expressar as qualidades da figura humana ou de objetos com apenas alguns traços. Sua economia visual é lendária. Tamayo sofreu o impacto desse aspecto da arte pré-colombiana quando começou a desenhar, ainda jovem, esculturas indígenas no Museu de Antropologia. Mais tarde tornou-se um colecionador de arte pré-hispânica, e hoje podemos ver sua coleção no Museu Rufino Ta!11ayo, em Oaxaca, e, se tivermos sorte, em sua casa no bairro San Angel, na Cidade do México.
Dne of the most widely used artistic conventions among the indigenous peoples of Mexico (pre-hispanic times as well as in our own era) has been the mask. Masks creates new personalities. They transform the wearer into someone - and something - totally different from their everyday persona. Masks help in the cre.ation of a magical aura around the wearer. Throughout his career Tamayo had made reference to the convention of the mask in his art. This continued to be true in his latest works. In many of Tamayo's most recent pictures the protagonists appear to be wearing masks suggestive of the enigmas of ancient ceremonials. Symbolic gestures and totemic forms have emerged more c/early in the paintings that Tamayo did during the 1970's and 1980's. In Hombre a la puerta (Man at the doar) of 1980 we see a figure whose facial feátures had been reduced to essentially geometric proportions . He stands against a background composed of an extraordinary subtle mixture of colors: pinks, grays and browns. The 1981 Retrato conyugal (Conjugal portrait) represents a man and a woman who have become so reduced in their essential features as to stand for any and ali couples in the world. This reduction is, perhaps, the essence of Tamayo's strived-after universality. Ultimately, I believe, the roots of this brilliant system of artistic "reductions" in Tamayo's art can be traced back to his early (and continued) fascination with pre-hispanic art. The Maya, Aztecs and other indigenous peoples of Mexico were geniuses at expressing the essential qualities of a human figure ar other object with a few lines. Their visual economy was legendary. Tamayo has been impressed with this aspect of pre-Columbian art since he began to draw the indigenous sculptures as a young man at the Museum of Anthropology. Later, he became a great collector of pre-hispanic art and one can admire his collection today in the Rufino Tamayo Museum in Daxaca ar, if one is fortuna te enough to know the artist personally, in his house in the San Angel district of the Mexican capital.
O diálogo ininterrupto de Tamayo com a estética da arte préhispânica pode ser notado de modo mais amplo, no entanto, em suas últimas pinturas. Baiíista quitándose los lentes, de 1989, pode parecer à primeira vista a simples representação de uma mulher moderna exercendo uma atividade simples. A inegável fonte dessa figura solidamente construída e pintada em tonalidades que derivam das cores da terra, porém, são as esculturas em barro dos antigos povos do México. Tamayo varreu a história da arte antiga de seu país em busca de formas imaginativas e criou, nesse trabalho, uma imagem que remete ao passado, sem deixar de ter referências na contemporaneidade. Assim como muitas de suas últimas pinturas, essa obra sugere uma tridimensionalidade vinda da escultura. Em suas pinturas dos anos 80, ele parece estar voltado à redução das figuras humanas à sua forma mínima. Isso, porém, não significa um sacrifício da intensidade emocional que sempre foi sua marca. Na obra La familia, de 1987, por exemplo, encontramos ao mesmo tempo uma grande simplicidade visual e a sugestão de carinho e de afeição maternais quando a esposa segura o braço do marido, ao mesmo tempo em que uma criança olha os dois com adoração. Os anos 80 representam o período em que Tamayo mais se envolveu com a escultura. Suas experiências com a tridimensionalidade começaram muitos anos antes, em trabalhos imortais como Retrato de Diga, de 1940. Suas obras mais estritamente geométricas de 1980, porém, definem um marco no desenvolvimento desse aspecto. A influência da escultura na pintura é um claro indicador do significado das formas para Tamayo.
Tamayo's uninterrupted dialogue with the aesthetics of pre-hispanic art in a wider sense is plainly seen in some of the latest paintings. Bafíista quitándose los lentes (Bathing woman taking off her glasses) of 1989 may appear, at first glance, to be a simple representation of a woman of today involved in a simple activity. The unmistakable source, however for this solidly constructed figure painted in tones derived from the colors of the earth is the clay sculptures of the ancient people of Mexico. Tamayo has combed the history of ancient art of his own country for his imagina tive forms and has created here an image as redolent of the past as it is referential to today. Like many of his latest paintings, this work has a strong suggestion of sculptural three-dimensionality. In his paintings of the 1980's Tamayo appears intent upon reducing his human figures to the barest minimum formo This does not mean that he sacrifices the emotional intensity that has always marked his work. In such a painting as the 1987 La familia (Family), for instance, there is both a visual simplicity as well as the implication of tenderness and familial affection as the mother's arm grasps that of the father while theyare beheld by a child looking adoringly at her parents from below The 1980's was a time when Tamayo became more involved with sculpture than ever before. His experiments in threedimensionality began, of course, many years before. We can see his interest in sculpture in such important pieces as the 1940 Retrato de Diga (Portrait of DIga). Yet, his more severely geometric pieces of the 1980's mark a high point in the development of this aspect of his art and its reflections in his paintings are c/ear indicators of the significance that sculptural forms hold for him.
A sensibilidade do artista em relação a formas tácteis é transmitida
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em Oelicia de quesos, de 1988, onde uma mesa sobre a qual se encontra grande variedade de queijos aparece em meio a uma brilhante massa de cor dourada que remete ao sol. As palavras de Octavio Paz reproduzidas no início deste ensaio referem-se a esse trabalho. A pintura representa também uma variação atual da antiga tradição da natureza-morta. A mesa com os queijos parece surgir a partir de um clarão brilhante de luz dourada - novamente sugerindo uma qualidade etérea ao tema mundano. O senso de humor e a ironia de Tamayo também tornaram-se mais profundos e sagazes em muitas de suas últimas pinturas. fi rockanrolero, de 1989, e Picasso ai desnudo, do mesmo ano, são comentários jocosos de ícones culturais. A representação de Pablo Picasso é uma pintura particularmente curiosa devido ao grande interesse de Tamayo pelo artista espanhol. Desde os anos 30, e mesmo antes, Tamayo estabeleceu um diálogo visual e intelectual com a arte de Picasso, que influenciou fortemente muitos aspectos de sua visão estética. No entanto, nunca imi-tou ou reproduziu Picasso, apesar de acompanhar as brilhantes inovações do mestre, cujas soluções estudava e transformava segundo seus próprios objetivos.
The artist's sensitivity to tactile shapes and forms is conveyed in the Oelicia dequesos (Stilllite with cheese) of 1988 in which a table with a variety of cheeses stands amidst a burst of the brilliant sun-inspired colar to which Octavio Paz's words quoted at the beginning of this essay referred. In addition, this painting represents a brilliant modem-day variation in the ancient stilllite tradition. The table of cheeses seems to burst anta the scene in a brilliant flash of golden light - again lending an ethereal quality to the essentially mundane subject matter that the artist had chosen in this instance. Tamayo's sense of humor and irony has also grown deeper and more witty in many of his la ter paintings. EI rockanrolero (Rock and roll singer) of 1989 andPicasso ai desnudo (Nude Picasso) ofthe same year are droll comments on cultural icons. This representation of Pablo Picasso is a particularly interesting picture given the long standing interest that Tamayo ~as maintained in Picasso's art. As we have seen, since the 1930's and even earlier, he has been involved in a visual and intellectual dialogue with the art of Picasso. It has affected Tamayo's aesthetic vision in many ways throughout his career. Never has Tamayo imitated ar slavishly copied Picasso but has been consistently aware of the Spanish artist's brilliant innovations, studying and transforming them for his own unique purposes.
Também é importante notar a resposta de Tamayo à angústia e à melancolia, assim como ao medo e à violência da vida contemporânea. Hoy, de 1988, onde um homem é atacado por um pássaro e um cachorro selvagem, faz-nos lembrar algumas de suas brilhantes composições em que imponentes animais representavam os papéis principais. Outra leitura pode revelar, entretanto, um plano mais profundo. Nesta abordagem, Tamayo revela sua ansiedade e consternação a respeito do futuro da humanidade. Os medos que representa em seu quadro são ao mesmo tempo reais e imaginários medos de ameaças em potencial contra nosso corpo e nossa mente. Colocadas em primeiro plano, contra um fundo brilhante de amarelos e verdes, as figuras nos fazem perceber que nesse impressionante trabalho o mestre realmente alcançou seu objetivo: o de falar em nome da consciência universal.
We might also note this brilliant painter's response to the angst and melancholy - and to the fear and violence of contemporary lite. Hoy (Today) of 1988, in which a man is attacked by a bird and a wild dog, may remind us of some of his brilliant compositions of the 1940's in which imposing animaIs played the predominant roles. Yet, it can also be understood on another deeper plane. Here Tamayo expresses his anxieties and constemation over the plight of mankind. The fears he paints are both real and imagined - the fears of potential threats against our bodies and our minds. Set against a dazzling background of yellows and greens, we see that in this stunning work the master has indeed reached his goal- to speak for the universal consciousness.
Edward J. Sullivan (extraído do catálogo editado pela Marlborough Gallery em 1990)
Notes:
Edward J. Sullivan (extracted from the catalogue published by Marlborough Gallery, in 1990)
1 Octavio Paz, Rufino Tamayo (co-authored with Jacques Lassaigne), New York, 1982, p21. 2 Rufino Tamayo, Pinturas (exhibition catalogue), Madrid, Centro Reina Sofía, 1988, p. 175.
Notas:
3 Carlos Monsiváis, "Las siete décadas de Rufino Tamayo", in Rufino Tamayo 70 anos de creación
1 Octavio Paz, Rutino Tamayo (em co-autoria com Jacques Lassaigne), Nova Vork, 1982, p. 21.
(exhibition catalogue), Mexico City, Museo Rufino Tamayo and Palacio de Bel/as Artes, 1987-88, p. 15.
2Rufino Tamayo, Pinturas (catálogo de exposição), Madri, Centro Reina Sofía, 1988, p. 175.
4 Raquel Tibol (ed.), Textos de Rufino Tamayo, 1987, p. 130.
3 Carlos Monsiváis, "Las siete décadas de Rufino Tamayo", in Rutino Tamayo 70 anos de
5 For further information regarding Tamayo's visits to New York see Rita Eder, "Tamayo, en Nueva York",
creación (catálogo de exposição), Cidade do México, Museo Rufino Tamayo e Palacio de 8ellas
in Rufino Tamayo 70 anos de creación, pp. 55-65, and Edward J. Sullivan, "Tamayo, el mundil/o artístico
Artes, 1987-88, p. 15.
neyorquino y el mural deI Smith Col/ege", in Rufino Tamayo pinturas, pp. 14-32.
4 Raquel Tibol (ed.), Textos de Rutino Tamayo, 1987, p. 130.
6 Rufino Tamayo, Pinturas, p. 185.
5 Para mais informações sobre as visitas de Tamayo a Nova Vork, ver Rita Eder, "Tamayo en
7 Rufino Tamayo, Pinturas, p. 181.
Nueva Vork", em Rutino Tamayo 70 anos de creación, pp. 55-65, e Edward J. Sullivan, "Tamayo el mundillo artístico neyorquino y el mural dei Smith College, in Rutino Tamayo pinturas, pp. 14-32. 6 Rufino Tamayo, Pinturas, p. 185. 7 Rufino Tamayo, Pinturas, p. 181.
RUFINO TAMAYO (1899-1991)
RUFINO TAMAYO (1899-1991)
A pintura mexicana desenvolvida a partir da segunda metade do século XX e que se contrapôs às teses da arte pública caracterizada pela volta ~s origens e pela exaltação dos símbolos nacionais - não poderia ser explicada sem a presença de Rufino Tamayo, o primeiro artista que se recusou a seguir o caminho oficial que os muralistas haviam traçado. Os valores plásticos da maioria deles estavam fundamentados na narração epopéica do desenvolvimento histórico e social do povo do México. Orozco, Rivera e Siqueiros, junto com Tamayo, participaram da criação da arte moderna no México.
Since 1959, the Mexican painting which has stood against the thesis of "public" art - characterized by the resumption of Mexican origins and the exaltation of national symbols - cannot be explained without taking into consideration the contribution of Rufino Tamayo, the artist who rejected the official pathway designed by the muralists. Their artistic values were founded on the epic narra tive of the peoples historic and social development in Mexico. Orozco, Rivera and Siqueiros, together with Tamayo, were responsible for the advent of modem art in Mexico.
A obra de Rufino Tamayo tem o mérito singular de fazer fluir numa única vertente os diversos Méxicos que coexistem: o das lembranças arcaicas de uma cultura antiga na qual estamos enraizados, o da clara e forte vontade de integrar-nos na modernidade, de valorizar a riqueza da arte popular e de manter firme a força espiritual do homem no seu confronto com o universo. Tais inquietações estão sempre presentes na obra deste artista mexicano que projetou no mundo inteiro as cores vibrantes e as vivências de sua terra natal, Oaxaca, "com os pés bem fincados em terra, mas com os olhos e o espírito postos no universo", como ele mesmo dizia. Tamayo conciliou as idéias que pareciam contradizerse na pintura mexicana, o nacional e o moderno, propondo abrir possibilidades para a inteligência e a sensibilidade do espectador, que não poderia ser um receptor passivo diante da obra de arte saída das mãos do artista, mas que teria que ultimar o sentido do quadro com sua participação. Uma das contribuições da obra de Tamayo para a arte universal é o uso que ele fez da cor, que evoca e sugere sensações próximas daquelas que a leitura de poesia poderia proporcionar. Tamayo cria um ambiente que envolve o espectador num clima em que o espaço tem a mesma densidade dos objetos que aparecem na tela. Tamayo esgota as possibilidades da cor em cada tela, tanto nos explosivos e poderosos contrastes quanto nas extravagantes monocromias nas quais, através de uma quase infinita quantidade de tons, transporta a cor a uma de suas expressões mais acabadas. Tamayo soube construir uma nova sintaxe estética com elementos profundamente mexicanos, mas vistos através da análise de um homem imerso nos mais complexos problemas que a arte contemporânea havia originado. Estudioso das posições estéticas de artistas como De Chirico, Marinetti, Picasso, Gris e Dubuffet e de movimentos como o futurismo italiano, a pintura metafísica, o cubismo, e a art brut, Tamayo soube conjugar tudo isto com a experiência inédita de analisar esteticamente a arte escultórica do México pré-colombiano, a riqueza da arte popular mexicana e as experiências pessoais de sua precoce juventude, na qual soube valorizar o colorido do ambiente mais próximo. Apaixonado por sua poética, Tamayo privilegia o puramente estético, renuncia ao literal e anedótico e busca o mais essencial para reordená-Io poeticamente através da síntese de formas inéditas, que com suas deslumbrantes cores permitem que o espectador experimente, ao contemplar seus quadros, uma estranha sensação na qual o mundo do artista impressiona e seduz desde o primeiro olhar, mas só se entrega num encontro silencioso. Juan Carlos Pereda Museo Rufino Tamayo, México 370
Rufino Tamayos artworks have the singular merit of reuniting in a single flow the ditferent Mexicos that live side by side. One of them formed by arcaic remembrances of an ancient culture in which we can find our roots, the Mexico of the strong wish to make us take part in modemity, the one which values popular art and sti// that one which strenghtens the spiritual force of man in his relationship with the universe. These subjects are always present in the work of this Mexican artist who disseminated worldwide the vibrant colors and the experience of daily lite in his native town, Oaxaca "with his feet on the ground but the eyes and spirit focusing the universe" as he used to say. Tamayo bridged the gap between ideas that se em to contradict themselves on the sphere of Mexican painting: nationalism and modemity, paving the way for the spectators inte//igence and sensitivity to flourish; this spectator could not be restrained to passivity when facing a work by Tamayo,' on the contrary, his contribution had to be decisive, imparting meaning to the painting. One of the chief contributions of Tamayos work to universal art its his use of colar which evokes and suggests similar sensations to those conveyed by poetry. An ambiance which in volves the spectator emerges from his work creating an atmosphere in which the space has the same densityas the objects shown on the canvas. In each painting Tamayo explores to the maximum the possibilities opened up by colar - both in vibrant and powerful contrasts - as in the extravagant monochromes, by means of a countless number of hues, he achieves the keynote in colar. Tamayo created a new aesthetical syntax using deep rooted Mexican elements but having as background the approach of a man deeply involved in the more complex problems of contemporary art. Having painstakingly explored the aesthetic stances of artists such as De Chirico, Marinetti, Picasso, Gris and Dubuffet as we// as Italian futurism, methaphysical painting, cubism and "art brut", Tamayo was able to add to this encompassing experience the aesthetical analysis of the Colombian sculpture produced in pre-historic Mexico, the richness of popular Mexican art and the precocious personal experiences of his youth, during which he was able to take advantage of the colorful nearby surroundings. Enraptured by poetry, Tamayo emphasized the asthetic aspect in art renouncing to that which is literal and superficial - for the sake of what is essential in arder to rearrange it poetica//y by means of his synthesis of new forms - and inebriating colors which convey to the spectator an odd feeling which draws the viewer to the artists world in a seductive manner at first sight, but only surrenders itself in a silent meeting. Juan Carlos Pereda Museo Rufino Tamayo, Mexico
Hombre a la puerta, 1980 óleo s/tela/oil on canvas 180,3 x 130,4 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA, México
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Hoy, 1988 óleo sltelaloil on canvas 130 x 195 cm Coleção particular, México
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1899 Nasce na cidade de Oaxaca, em 26 de agosto. 1926 Primeira exposição individual na Cidade do México, depois de um período de estudos e de trabalhar como chefe do Departamento de Desenho Etnográfico do Museo Nacional de Arqueología. No final desse ano expõe na The Weyhe Gallery, Nova Vork. 1927 Exposição no Art Center de Nova Vork. 1928 É nomeado professor da Escola Nacional de Belas-Artes do México. 1929 Expõe na galeria do Palacio de Bellas Artes, " México. 1931 Exposição nas John Levy Galleries, Nova Vork. . 1932 Chefe da Seção de Desenho da Secretaria de Educação Pública~ 1933 Pinta seu primeiro mural La música y el canto, afresco, na Cidade do México, e se casa com Olga Flores Rivas. 1935 Exposição na Paul Elder Gallery, San Francisco, e na Pasaje América, na Cidade do México, com o apoio da Galería de Arte Mexicano. 1936 Delegado da LEAR no American Artists' Congress, Nova Vork. 1938 Segundo mural, chamado de Revolución, no hoje Museo de las Culturas, Cidade do México. É nomeado instrutor na Dalton School, Nova Vork. 1939 Expõe na Valentine Gallery, Nova Vork. 1943 Terceiro mural, intitulado
La naturalela y el artista: la obra de arte y el espectador, no Smith College Museum of Art, Northampton, Massachusetts. 1945 Expõe seus trabalhos de 1929 a 1944, The Arts Club, Chicago. 1946 Organiza no Art School of Brooklyn Museum o Seminário Tamayo. 1948 Retrospectiva no Palacio de Bellas Artes, Cidade do México. 1950 Representa o México na 25ª Bienal de Veneza. Expõe na Galerie Beaux-Arts, Paris, e depois no Palais de BeauxArts, Bruxelas, patrocinado pela Knoedler Gallery, Nova Vork. 1952 Expõe no Instituto de Arte Moderno de Buenos Aires. Pinta os murais: Homenaje a la rala india e, especialmente para o Palacio de Bellas Artes de México, Nacimiento de nuestra nacionalidad y México de hoy Retrospectiva na Panamerican Union of Washington, D.C. 1953 Pinta o mural EI hombre, para o Museum of Fine Arts, Dallas, Texas. Ganha o Grande Prêmio Internacional de Pintura da Bienal de São Paulo, que dividiu com o artista francês Alfred Manessier. 1954 Em reconhecimento ao prêmio da Bienal de São Paulo, o Salón de la Plástica Mexicana organiza uma exposição em sua homenagem. Pinta os murais La noche y el día e Naturalela muerta, na Cidade do México.
1956 Pinta o mural América para o Bank of Southwest de Houston, Texas, e expõe no Museum of Fine Arts, Houston, Texas. 1957 Pinta o mural Promete0 para a Universidade de Porto Rico. Recebe da França o título de Cavalheiro da Legião de Honra. 1958 Pinta o mural Promete0 dando el fuego a los hombres para o Edifício da Unesco em Paris. Expõe na galeria 11 Miglione, Milão, Itália. 1960 Recebe o Prêmio Internacional da 2ª Bienal Latinoamericana de Pintura y Grabado de México. 1961 Eleito membro da Academy of Arts and Letters dos Estados Unidos. 1962 Expõe na Gallery One, Londres. A Associação de Museus de Israel organiza uma exposição itinerante de sua obra. 1963 Pinta os murais Israel de ayer e Israel de hoy. Expõe no Sirogane-Geihinkan Hall, Tóquio. 1964 Pinta o mural Dualidad para o Museo Nacional de Antropología. Retrospectiva no Museo de Arte Moderno; recebe o Prêmio Nacional de Arte na Cidade do México. 1965 Expõe na Galeria Semiha Huber, Zurique. 1967 Pinta 'o mural EI mexicano y su mundo para o pavilhão mexicano na Exposição Mundial de Montreal.
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Exposição em homenagem aos seus cinqüenta anos de trabalho no Museo dei Palacio de Bellas Artes, Cidade do México. 1968 Participa da Bienal de Veneza com uma sala especial. Pinta o mural Fraternidad para a Feira Internacional Hemisfair 68, San Antonio, Texas, doado depois à ONU. Expõe no Museu Nacional de Arte de Belgrado, Iugoslávia. 1969 Pinta o mural Energía para o Clube dos Industriais da Cidade do México. Obtém o Prêmio Ibbico Reggino, de Reggio Calabria, Itália. 1971 Pinta o mural Hombre frente ai infinito na Cidade do México. É nomeado comendador da Ordem do Mérito da República Italiana. 1972 É nomeado "filho predileto" de Oaxaca, sua cidade natal. 1974 Inauguração do Museo de Arte Prehispánico Rufino Tamayo, na cidade de Oaxaca, com 1.300 peças doadas por ele. Expõe no Musée d'Art Moderne, Pá ris. \ 1975 Grande mostra no Palazzo Strozzi, Florença. 1976 Retrospectiva itinerante no Japão. 1977 Pinta o mural Eclipse total. Apresentação especial na Bienal de São Paulo. 1979 Exposição Rufino Tamayo: Mito e Magia, no museu Solomon R. Guggenheim, Nova Vork. Recebe o título de doutor honoris causa pela Universidad Nacional Autónoma do México. 1980 Doa as esculturas monumentais Homenaje ai sol para a prefeitura da cidade de Monterrey e Germen, para a UNAM. 1982 Realiza o vitral monumental EI universo. 1983 Exposição Rufino Tamayo na Grapische Sammiung
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Albertina, Viena. Realiza para o aeroporto de San Francisco a escultura La conquista dei espacio. Recebe o Prêmio Albert Einstein da Technion Society, Israel. 1984 Membro da Academia de São Lucas, Roma. 1985 Doa a Casa Hogar Tamayo, em Cuernavaca, México. Membro da Royal Academy, de Londres. A Espanha lhe outorga a Medalha de Ouro ao Mérito em Belas-Artes. 1986 Retrospectiva no Museo de Monterrey. Convidado especial à 6ª Bienal dei Grabado Latinoamericano y dei Caribe, Porto Rico. Retrospectiva no Museu Regional de Guadalajara, México. 1987 Recebe da França o título de Comenda dor das Artes e das Letras. Retrospectiva no Modern Art Museum de Woodland Hills, Califórnia. Seus setenta anos de criação são comemorados com exposições nos museus de Ciudad Juárez, Culiacán, Guanajuato e Oaxaca e nos museus Palacio de Bellas Artes e Rufino Tamayo, da Cidade do México. O compositor Blas Galindo dedica-lhe uma cantata e publica-se uma série de livros sobre sua vida. 1988 Mostra antológica no Centro de Arte Reina Sofía, Madri. A República Dominicana o condecora com a Ordem de Cristóvão Colombo. Recebe as chaves da cidade de Comitán. O presidente da República mexicana lhe outorga a medalha Belisario Domínguez. Expõe no Museo de las Casas Reales e no Museo de Artes Visuales de Montevideo, Uruguai. 1989 Recebe a medalha Commendatore de Italia. Expõe a mostra Rufino Tamayo: Pintura y Gráfi.ca, na Sala Principal dos Artistas Plásticos, Moscou, no Museu Edvar Munch, em Oslo, e
no Museu Ermitage, em Leningrado. 1990 Exposição na Staatliche Kunsthalle, Berlim. 1991 Ingressa no Colegio Nacional de Mayo. Morre na Cidade do México, em 24 de junho. 1993 Primeira homenagem internacional nos museus de Nagóia, Kamakura e Ouioto, Japão. 1994 Exposição na Associated American Artists, Nova Vork. 1899 Rufino Tamayo was bom in Oaxaca in August, 26. 1926 First solo exhibition in Mexico City, after many years of studying and working as head of the . Department of Ethnographic Design at the Museo Nacional de Arqueologia. Late this year he exhibited his works at The Weyhe Gallery, New York. 1927 Exhibited his work at the New York Art Center. 1928 He became a professor at the Escuela Nacional de Bellas Artes in Mexico. 1929 Exhibited his work at the gallery of the Palacio de Bellas Artes, Mexico. 1931 Exhibited his works at the John Levy Galleries, New York. 1933 Painted his first mural La música y el canto, fresco, in Mexico City and got married to Diga Flores Riva. 1935 He exhibited his work at the Paul Elder Gallery, San Francisco, and at the Pasaje America, Mexico City, with the support of the Galería de Arte Mexicano. 1936 He represented LEAR at the American Artists' Congress, New York. 1937 Exhibited his 'works again in New York and San Francisco. 1938 He painted his second mural entitled Revolución in the institution that today is the Museo de las Culturas, Mexico City. He taught at Dalton School, New York. 1939 Exhibited his works at the
Valentine Gallery, New York. 1943 Depicted his third mural, La natureza y el artista: la obra de arte y el espectador, at the Smith College Museum of Art, Northampton, Massachusetts. 1945 Exhibited the works produced between 1929 and 1944 at The Arts Club, Chicago. 1946 Organized the Tamayo Seminar at the Art School of Brooklyn Museum. 1948 Retrospective exhibition of his works at the Palacio de las Bellas Artes, Mexico City. 1950 He represented Mexico at the 25th Venice Biennial,' he also exhibited his work at the Galerie des Beaux-Arts in Paris and la ter at the Palais des Beaux-Arts, in Brussels, sponsored by the Knoedler Gallery, New York. 1952 He exhibited his works at the Instituto de Arte Moderno de Buenos Aires, and painted the murais Homenage a la raza india and especially for the Palacio de Bellas Artes de México the Nacimiento de nuestra nacionalidad y Mexico de hoy,' retrospective exhibition at the Panamerican Union of Washington, o.G. 1953 Painted the mural EI hombre for the Museum of Fine Arts, Da lias, Texas; he was awarded, together with the French artist Alfred Manessier, the First International Prize at the Bienal de São Paulo. 1954 In a celebration of the prize awarded by the Bienal de São Paulo, the Salôn de la Plástica Mexicana organized an exihibition of hisworks; he painted the murais La noche y el día and Naturaleza muerta in Mexico City. 1956 He painted the mural América· for the Bank of Southwest, Houston, Texas, and exhibited his works at the Museum of Fine Arts, Houston, Texas. 7957 He painted the mural Promete0 for the Universidad de Puerto Rico,' he was awarded the title of Chevalier de la Légion
d'Honneur in France. 1958 He painted the mural Promete0 dando el fuego a los hombres for the building which houses the Unesco in Paris,' he exhibited his works at the gallery li Miglione, Milan, Italy. 1960 He was awarded the International Prize of the 2ª Bienal Latinoamericana de Pintura y Grabado de Mexico. 1962 Exhibited his works at the Gallery One, London; the Museum Association in Israel organized an itinerant exhibition of his works. 1963 He painted the murais Israel de ayer and Israel de hoy; he exhibited at the Sirogane-Geihinkan Hall, Tokyo. 1964 Painted the mural Dualidad for the Museo Nacional de Antropologia; a retrospective exhibition of his works took place at the Museo de Arte Moderno,' he was awarded the Premio Nacional de Arte in Mexico. 1965 He exhibited his works at the gallery Semiha Huber, Zurich. 1967 He painted the mural EI mexicano y su mundo for the Mexican pavillio.n at the Wor/d Fair, Montreal, Cana da,' an exhibition that celebrated his 50 years of work took place at the Museo dei Palacio de Bellas Artes, Mexico City. 1968 Specialexhibition at the Venice Biennial; he painted the mural Fraternidad for the international fair Hemisfair 68, San Antonio, Texas,' later the mural was donated to the United Nations; he exhibited his works at the National Art Museum in Belgrade, Yugoslavia. 1969 He painted the mural Energía for the Association of the Industries of Mexico City; he was awarded the prize Ibbico Reggino in Reggio Calabria, Italy. 1971 He painted the mural Hombre frente ai infinito in Mexico City; he was awarded the title Commendatore dell Ordine dei Merito in Italy.
1972 He was awarded the title Hijo Predileto de Oaxaca, his native town. 1974 The Museo de Arte Prehispánico Rufino Tamayo was inaugurated in Oaxaca with 1,300 artworks donated by him. 1975 A great exhibition took place at the Palazzo Strozzi, Florence. 1976 An itinerant exhibition took place in Japan. 1977 He painted the mural Eclipse total; a special exhibition was held at the Bienal de São Paulo. 1979 Exhibition Rufino Tamayo: Mito y Magia was held at the Solomon R. Guggenheim Museum, New York; he was awarded the title Doctor Honoris Causa by the Universidad Nacional Autônoma in Mexico. 1980 He donated the huge sculptures Homenaje ai sol to the City Hall of Monterrey and Germen to UNAM. 1982 He depicted the huge stainedglass window EI universo. 1983 An exhibition of his works took place at the Grapische Sammiung Albertina, Viena,' he sculpted La conquista dei espacio for the San Francisco airport; he was granted the prize Albert Einstein, by the Technion Society, Israel. 1984 He became a member of the Academia San Luca, Rome. 1985 He donated the Casa Hogar Tamayo for Cuernavaca, Mexico,' he became a member of the Royal Academy, London; Spain granted the Golden Medal of Merit in Fine Arts. 1986 A retrospective exhibition of his works took place at the Museo de Monterrey; a special exhibition was he/d at the 6ª Bienal dei Grabado Latinoamericano y dei Caribe, Puerto Rico; retrospective exhibition at the Museo Regional de Guadalajara, Mexico. 1987 France granted him the title of Commander of the Arts and Letters; a retrospective exhibition of his
works was held at the Modem Art Museum of Woodland Hills, Calitornia; his seventy years of activity were celebrated with exhibitions at the museums of Ciudad Juárez, Culiacán, Guanajuato and Oaxaca and at the museums Palacio de Bellas Artes and Rufino Tamayo in Mexico City; the composer Blas Galindo dedicated a cantata to Tamayo,' many books about his lite were published. 1988 An antologic exhibition of his works took place at the Centro de Artes Reina Sofía, Madrid; the Dominican Republic granted him the Order of Christopher Columbus; he received the keys of the city Comitán; the President of the Mexican Republic granted him the medal Belisario Domínguez; he exhibited his works at the Museo de las Casas Reales and at the Museo de Artes Visuales de Monte vide o, Uruguay. 1989 He was granted the medal Commendatore in Italy,' the exhibition Rufino Tamayo: Pintura y Gráfica took place in the Main Ha// of the Plastic Artists, Moscow, at the Museum Edvar Munch, in Oslo and at the Ermitage Museum, in Leningrad. 1990 Exhibition at Staatliche Kunsthalle, Ber/in. 1991 He became a member of the Colegio Nacional de Mayo; he died in Mexico City on June, 24th. 1993 The first international hommage exhibition took place in museums in Nagoia, Kamakura and Kyoto, Japan. 1994 His works are exhibited at the Associated American Artists, New York. 1993 The first international hommage exhibition took place in museums in Nagoya, Kamakura and Kyoto, Japan. . . 1994 His works are exhlblted at the Associated American Artists, New York. 375
Sil/a roja, 1983 óleo s/tela/oil on canvas 135 x 94 em Coleção 8ernard Lewin Galleries
Amigas de los pájaros, 1980 óleo s/tela/ oil on canvas 130 x 95 em Coleção Grupo Industrial Alfa
Relo} olvidado, 1986 óleo s/tela/oil on canvas 97 x 130 cm Coleção particular, México
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Obras apresentadas/Works in the exhibition Retrato de Diga, 1964 óleo s/tela/oil on canvas 210 x 135 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA, México Autorre tra to, 1967 óleo s/tela/oil on canvas 179 x 129 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA, México Sandías, 1968 óleo s/tela/oil on canvas 130 x 195 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA, México Hombre en rojo, 1976 óleo s/tela/oil on canvas 129 x 96,2 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA, México Hombre a la puerta, 1980 óleo s/tela/oil on canvas 180,3 x 130,4 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA, México Dos mujeres, 1971 óleo s/tela/oil on canvas 131 x 195,8 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA, México La gran galaxia, 1978 óleo s/tela/ oi! on canvas 94x 129 cm Coleção Museo Rufino Tamayo,
INBA, México Dos mujeres, 1981 óleo s/tela/oil on canvas 180 x 130 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA, México Retrato conyugal, 1981 óleo s/tela/oil on canvas 95,3 x 130,4 cm Coleção Museo Rufino Tamayo, INBA, México Desnudo de hombre, 1982 óleo s/tela/oil on canvas 130 x 95 cm Coleção Bernardo e Irma Zarkin, México Reloj olvidado, 1986 óleo s/tela/oil on canvas 97 x 130 cm Coleção particular, México La familia, 1987 óleo s/tela/oil on canvas 180 x 124,5 cm Coleção particular, México Hoy, 1988 óleo s/tela/oil on canvas 130 x 195 cm Coleção particular, México Picasso ai desnudo, 1989 óleo s/tela/oil on canvas 130 x 95 cm Coleção particular, México fi rockanrolero, 1989 óleo s/tela/oil_op canvas 181 x 124,5 cm Coleção particular, México Picasso aI desnudo, 1989
óleo s/tela/oil on canvas 130 x 95 cm Coleção particular, México
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EI fisgón, 1988 óleo s/tela/oi/ on canvas 95 x 130 cm Coleção Mauricio Fernández Garza
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It
CU~DO~ HcN~1 MAlDINcY
CU~Aro~ HfN~1 MAWINfY
o LUGAR DA OBRA DE ARTE A PINTURA DE TAL-COAT
THE PLACE DF THE WDRK DF ART TAL -CDAT'S PAINTlNG
Já é tempo de a consciência da arte despertar de seu sono históricosociológico. Deve aquilo pelo qual a arte é arte depender dos valores e contravalores de uma época, cujo fundo sócio-cultural nela se expressaria? Isso a relativiza e impede a compreensão de sua copresença em qualquer época, pois a obra nos é imediata e originariamente contemporânea.
Time has arrived for the conscience of art to awaken from íts historícsociological slumber. Does that, which defines art as art, depend on the values and countervalues of an epoch whose social-cultural basis is apt to express itself in such a way? This makes it relative and sets barriers to the understanding of its simultaneous presence in any time as the work of art is both forthwíth and contemporary in its origino
Na realidade, o que faz de uma obra uma obra de arte não é sua inscrição em um contexto histórico-social cujo sistema de valores lhe garanta consistência. Ao contrário, é por ser frágil que ela se subtrai à relatividade. Uma obra de arte tem a fragilidade de um cimo, de um cimo que surge da vertigem dos sentidos e do coração. Não é caminhando que se chega até ele e, uma vez atingido, é por um triz que dele não se cai. Ele só pode ser alcançado como ele se erg-üe:-porumsalto. Siiifàltitude remete todos os outros cumes à insignificância. Ela conhece apenas uma lei: a do tudo ou do nada. Não admite aproximações, abordagens ou atalhos, nenhum ponto de partida fora de si mesma. Por isso não há possibilidade de passagem de uma obra de arte a outra. Nem vizinhança. Quando uma obra está no topo mais alto e ressoa no tom mais agudo, como o arco de Ulisses, é a morte dos pretendentes. Assim, não há caminhos até ela, a não ser aquele que ela mesma é. "Werk ist Weg", diz Paul Klee. "A obra é caminho." A formação de sua forma, da forma que é, é seu próprio caminho. Por isso é intransformável.
In realíty, what defines a work of art is not íts insertion in a historie-social context whose values would guarantee íts consistency As opposed to, it is due to íts fragility that it escapes relativíty A work of art shares eíther the fragility of an apex, or of an apex which appears in the vertigo of the senses and emotions. The distance from summít to ground is absolute and if the top is reached the balance is precaríous. It can only be attained when ít raises ítself in a leap. Its altítude reduces alI the other summits to insignífícance. It only knows a sole law: take ít or leave it. It does not admit approximatíons, approaches nor short cuts, no departure outside ítself That is the reason why there are no paths between dífferent works of art. Nor connections. When a work of art reaches íts climax and resounds in íts sharpest tone, as Ulisses arch, the death of the suitors occurs. Hence, there are no avenues leading to U ít unless the one opened by the work of art ítself uWerk ist Weg states Paul Klee. UThe work is the wayu. The shaping of íts form, the form which is, is íts own path - unchangeable.
No retrato de Ambroise Vollard e nos Santa Vitória dos museus de Basiléia e de Zurique, Cézanne deixou brancos. Em qualquer desses quadros, se recobrisse os brancos, teria mudado tudo, ou o tudo em nada, pois aboliria precisamente a dimensão formal segundo a qual sua forma se forma. "Compreenda, Sr. Vollard, se eu preenchesse os brancos, teria que refazer todo o meu quadro a partir desses pontos." Assim como se oferecem ao olhar, esses brancos não parecem lacunas, mas pontos disponíveis, onde se recicla a energia espacializante do quadro. São focos de irradiação de todo o espaço. SeCézanne os tivesse preenchido e houvesse retomado o quadro a partir deles, todas as tensões geradoras de espaço teriam sido outras. O resultado seria outra obra, malograda ou não, mas sempre radicalmente diferente do quadro tal como existe, tal como é.
In Ambroise Vollard's portraít and in the Saint-Victoria in Basel and Zurich museums Cézanne left whíte spaces. If he had covered these whíte spaces he would have transformed everything into nothing because he would have precisely abolished the formal dimension according to which his form is shaped. 'Please understand, Mr. Vollard, that if I painted these whites I would have to start the picture alI over again departing from these specífic spaces. UWhen theyare offered to the sight, these whíte spaces do not look like gaps but rather available spots where the spatial energy of the picture is recycled. Theyare the focus of irradiation of alI the space.lf he filled them out and started working again on the painting from them, alI tensions that generate space would have changed. The result would be another work of art, whether good or not, but always radically dífferent from the existing work of art, as ít is.
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Paradoxalmente, entre uma forma artística e uma forma qualquer, a distância mensurável é menor que entre duas formas quaisquer, justamente porque não é mensurável. A distância entre o cimo e o chão é absoluta: eles não pertencem ao mesmo espaço. Dessa altura, para onde se cai? Não em lugar algum, no mundo - no mundo précondicionado dos hábitos, onde as surpresas do sentir, previamente capitalizadas, são logo depositadas na conta corrente da percepção e dos valores de uso. Todavia, está aí o mundo? A obra de Tal-Coat prova o contrário. No Brasil é quase desconhecido, se bem que essencial. Na França, embora há muito reconhecido, é mal conhecido porque essencial. Não que no conjunto os franceses sejam mais superficiais que os outros. A razão desse falso reconhecimento é mais geral. Diz respeito à relação das sociedades contemporâneas com a arte. Para esclarecê-Ia, recorro a uma lembrança de Wilhelm Worringer, o autor justamente célebre de Abstraktion und Einfühlung. Ele estava no terraço de um café de Paris, acompanhado por Max Scheler. Delicioso momento de descanso em meio ao tumulto. A certa altura, Max Scheler diz: "Há países onde se vive sob a ditadura dos produtores. Como é repousante e fascinante estar em um país onde se vive sob a ditadura dos consumidores". Worringer incluiu essa frase em sua Problemática da arte atual (1948), por ela expressar bem a oposição, real na época, entre a arte dos artistas e a arte do público. Mas esqueceu o terceiro termo do silogismo econômico, a ditadura dos distribuidores: dos galeristas, dos críticos de arte (sic), da imprensa escrita, das celebrações televisivas, das instituições culturais, em suma, dos serviços mediáticos que interpõem entre a obra e o olhar um jogo complacente de espelhos cuja função é fornecer ao público perfeitamente acomodadas uma à outra - uma imagem da arte e uma imagem dele mesmo. Essa trinca pseudocultural dos produtores, distribuidores e consumidores da arte constitui um verdadeiro "triângulo das Bermudas", do qual nunca se viu alguém sair. Mas como poderia a arte, quero dizer a arte autêntica, sair, se nunca chegou a entrar lá? Existe em outro lugar e de outra maneira. Então, de onde provém a arrogante inaptidão dos grandes atravessadores em encontrar o que constitui a especificidade da arte? Provém de que, segundo a expressão de Heráclito, "presentes, estão ausentes": ausentes da arte, ausentes do mundo. Como se pode estar ausente do mundo? Mas, ausente, como se poderia ter acesso à obra de Tal-Coat? Se preferi falar desta obra não é por ela ser - sem dúvida - original, mas por ser originária. A pintura de Tal-Coat procede do lugar onde a pintura se origina. Não se propõe como objeto. Abre-se como olhar. Não oferece aos jovens pintores de hoje um modelo a ser imitado, permitindo datar-se e enquadrar-se no "contexto artístico". Ela os conduz diante de seu ser pintor. Ela os reconduz para aquém de todas as linhas de fuga, à raiz comum da arte e do real. A arte não é uma diversão que nos desvia do mundo e de nós. Não é obrigada a escolher entre o impressionismo que objetiva as sensações, isolando-as do sensível, e o expressionismo que organiza o trágico do imaginário. Ela nos abre para a Realidade. "Realidade": palavra desgastada pelo uso, cujo ~entido evaporou. Circula como a moeda falsa, que expulsa a boa. E um bônus que não bonifica mais nada ... quando só deveria ·ser pronunciada na alegria ou no temor e tremor. A mais justa, a mais rigorosa definição que já 384
Paradoxically, the measurable distance between an artistic form and any other form is smaller than the one between any two other forms exactly beca use it is not measurable. The distance between the summit and the ground is absolute: they do not belong to the same space. Where do we fali to from this pinacle? Not to nowhere, but down to the world - in the pre-conditioned world of our usual behavior, wherein the surprises of feeling, previously capitalized, are quickly deposited in the bank account of perception and of usage value. However, is the world there? Tal-Coat's work is evidence of the opposite. In Brazil he is nearly unknown, although essential. Although renowned in France, he is not adequately known, because he is essential. This does not mean that on the whole Frenchmen are more superficial than others. The reason behind this spurious acknowledgement has a larger scope. It concerns societies' relationship with art. In arder to explain it I will resort to the recollection of Wilhelm Worringer, the author of the dulyappreciated Abstraktion und Einfühlung. He was on a court in a cafe in Paris in the company of Max Scheler. It was a wonderful moment of rest in the midst of turmoil. At a certa in point Max Scheler says: " There are countries in which people live under the tiranny of producers. How peaceful and fascinating it is to be in a country where tiranny is that of consumers. " Worringer included this comment in his Problems in Contemporary Art (1948) as it conveyed accurately the opposition, which was a reality in those days, between the art of the artists and the art of the audience. However, he forgot the third item of the economic syllogisfl- the dictatorship of the distributers: gallery owners, art critics (sic), the printed press, the television celebrations, cultural institutions, in short, the media vehicles which interface a condescending play of mirrors between sight and the work of art. The purpose is to supply the audience with an image of the art and an image of itself, both perfectly adjusted to one another. Yet these three pseudo-cultural terms created by producers, distributers and consumers of art constitutes a real "Bermuda Triangle" from which nobody was ever seen to depart from . However, how could art - I am referring to real art - depart if it never entered there? It exists in another place and another manner. What is then the source of the arrogant ineptitude of the middle men in defining precisely what is art's specificity? As Heraclitus stated, it stems from "extant, although absent": absent from art, absent from the world. How can one be absent from the world? And, while absent, how can we have access to Tal-Coat's work? If I chose to foeus this work it is not because it is, undoubtedly, original, but beca use it is origin in itself Tal-Coat's painting derives from the point where art is created. It does not present itself as an object. It opens itself as a glance. It does not supply young painters with a model to be followed, thus allowing the work of art to be dated and inscribed in the "artistic context". As opposed to this, she leads them towards its painter self It draws them to the foreground, afore the perspective lines to the common root of art and reality. Art is not an entertainment which turns us aside from the world and from ourselves. It does not constrain us to choose between impressionism, which objectifies sensations, insulating them from that which is sensible, and expressionism, which organizes the tragic side of imaginary thinking. It unveils Reality. "Reality": a word worn out by use whose meaning has been lost. It circulates as false currency, expelling the real one. It is a bonus that does not bestow its favors ... a word which only ought to be used in joy, ar in fear ar anguish. Its most precise, rigorous and fair definition has been that of the poet, Hugo
lhe foi dada vem de um poe"ta, Hugo von Hofmannsthal: "A realidade éuma significância insignificável". Ela nos visita quando algo se oferece na inocência do ente e na inquietude do ser. Sempre coloca em causa nossa existência como tal. Por isso mesmo, normalmente a eludimos: chamamos real aquilo sobre o que podemos operar. Operamos sobre um mundo de objetos. Mas para poder operar sobre o mundo, é preciso que antes tenha havido abértura para ele. Em tal abertura, sem preâmbulo, está sempre em jogo, conjuntamente, o ser do mundo e o nosso ... o de um ente, insigne, cujo ser está em jogo nesse ser mesmo. Como significá-lo? Ésignificável, convertível em signos, o objeto de uma operação, nunca essa significância pressentida, cuja lucidez de poder precede e transcende toda lucidez de saber, abrindo-nos para "essa santa Realidade" - como diz Jean Bazaine - com a qual é preciso saber tratar. Ela aparece obliquamente em seu signo mais claro exatamente quando seu dom é mais precário, à beira da ruptura, como mostra a seguinte frase de um esquizofrênico: "O real é o que está aí". Fórmula banalmente - tautológica se não fosse a fala de luto pronunciada por um homem que justamente não tem mais aí... onde poder ser. Aí... o que quer dizer? Para descobrir, vamos sairl Uma poça d'água sob os pés. Um homem que passa ao longe, uma algazarra de pássaros nas árvores. Com todos os sentidos abertos, eis-me aqui no mundo. Mas devo dizer "Eis-me aqui", ou "eis-me aí"? Minha certeza cinde-se. A realidade decompõe-se, disjunta, em duas possibilidades osc iIantes: Vejo aí onde estou ou estou aí onde vejo? Essa incerteza liminar a duas vertentes é chamada por Viktor von Weizsacker "dúvida sensível". Para cada vertente, uma resposta, unilateral. "Quando percebemos um objeto qualquer com a vista", diz Plotino, "vemos, e nossa visão aplica-se ao lugar onde o objeto se acha." E Bergson confirma: "Todos começávamos por crer que entrávamos no próprio objeto, que o percebíamos nele e não em nós". Para ser testemunha, é necessário estar "no lugar", no lugar onde um acontecimento tem lugar. Lembro-me de meu primeiro encontro com aVista de Delftde Vermeer. Subitamente, ao primeiro olhar, estava andando nas águas, de pé sobre a superfície de água cuja extensão aberta diretamente pelo espaço de VermeerdesHzava sob meus pés e, sobrevindo à minha presenç-a, elCpunha-me a mim mesmo nessa abertura. Estou aí onde vejo. Mas como posso estar junto auma coisa,aum ser, aum acontecimento, se eles não tiverem lugar em meu campo de presença? Ora, esse campo só é meu quando, em vez de me apropriar dele retrospectivamente, eu mesmo o abro, aqui. Como diz Plotino mais uma vez coma maior clareza -, é impossível circunscrever o espaço de minha presença: "Não há um ponto onde se possa fixar os próprios limites de modo a dizer: até aí sou eu". Estou em poder de qualquer ponto do espaço e, para estar aí, não preciso atravessá-lo como um meio estranho. "Cheguei desde sempre ao todo", diz Plotino, "sem nunca ter dado um passo a mais." Énesse espaço aberto a partir de meu aqui que se produzem todos os encontros e o simples aparecer das coisas. Vejo aí onde estou. Assim, de uma experiência a outra, aí muda de sentido, e nossa relação com o mundo se inverte. Então, o que quer dizer: aí?
von Hofmannsthal: Ureality is a word whose full meaning we cannot signifyu. It visits us when something offers itself through the innocence of its being there and the restlessness of Being. It always questions our existence as such. That is the reason why we usuallyelude it: we call reality that upon which we can operate. We opera te upon a world of objects. Nevertheless, in arder to operate upon the world it is necessary that firstly an opening towards it has taken place. Through such an opening, in a straightforward manner, the issue is always both the being of the world and ours... that of an entity, illustrious, whose being is questioned in itself How to signify it? It is signifiable, convertible into signs, the object of an operation, and never this already sensed significance whose power of clarity preceeds and transcends ali the lucidity of knowledge, preparing us for Uthis saintly realityU- according to Jean Bazaine - with which we have to learn to endure. . It appears obliquely in its clearer sign exactly when its ability is more precarious, finds itself on the brink of splitting as exemplified in the following statement, u uttered by a schizophrenic: ureality is that which is out there . A casual tautologic formula if it weren't a mourning sentence uttered by a man who does not have the being there anymore ... there where it can be. Being there ... what does it mean? To find out, let us go outdoors! A water puddle under our feet. A man who passes in the distance, the chirping of birds in the trees. With ali the awareness of the senses, here I am in the u world. Rather, I should say, uhere I am ar "am I out there?" My certitude is divided. Reality decomposes itself in two oscillating possibilities: I see where I am ar am I out there where I see? This uncertainty at the threshold of two watersheds is called by Viktor von Weizsacker a usensitive do ub t". There is a unilateral answer for each watershed. uWhenever we perceive an object with our sight, says Platina, we see, and our sight is applied to the place where the object is found. UAnd Bergson confirms: uall of us started by believing that we entered the object, that we perceived it in itself rather than in ourselves. UIn arder to be a witness it is necessary to be Uin the place u, there where an event takes place. I remember when I first saw Landscape in Delft by Vermeer. Ali of a sudden, at first glance, I was walking in the water, standing on the water surface _ whose extension was direct/y unveiled by Vermeers space. It slid under my feet and supervened me, I exposed myself in thisyery opening. I am "th€re" where I see. However, how can I be there next to a thing, a being, an event, if they do not occupya space in the field of my presence? Well, this field is only mine as long as - instead of appropriating it retrospective/y - I, myself, open it, being here. According to Platina ~ once again accurately - "it is impossible to u circunscribe the space of my presence : there is no outer borderline to say uthat is me up to there". I have any point in space under my power and, to get there, I do not have to cross it as if it were an extraneous environment . U "I was always able to reach anywhere , states Platina Uwithoutever having to do an extra stepu It is inside this open space, that stems from my being here, that ali meetings occur as well as the simple surge of things. I see there where Iam. Thus, from one experience to another, being there changes its meaning and our relationship with the world is inverted. So, what does it mean being there?
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Amas Coqul//es, 1970 óleo s/tela/ol/ on canvas 130 x 130 em Coleção Pierrette Oemmolon
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Cendres, 1968 óleo s/tela/oil on canvas 130 x 130 em Coleção Pierrette Oemmolon
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Na realidade, a dúvida sensível coloca em dúvida a própria alternativa, o "isso ou aquilo". Nos dois casos o erro é o mesmo: consiste em situar o aí, posicionando-o, como se diz hoje, em um mundo previamente constituído.- Ora, "aí " não pode designar uma posição no interior do mundo, pois também dizemos que o mundo está aí. "Aí" nomeia o locativo absoluto, condição de todos os lugares possíveis e da própria possibilidade de ter lugar. Há reciprocidade absoluta entre minha abertura ao espaço e a abertura do espaço em torno de mim. Aí onde vejo, estou. Aí onde estou, vejo. Esse aí não se pode tornar presa de nenhuma análise objetiva. Não está no mundo nem no homem. Para ambos ele é o lugar inaugural de seu co-nascimento/conheciment0 1• O esquizofrênico vive o aí sob a forma de ~ma carência q~e ~feta seu ser, cuja ameaça qualquer um pode experimentar, na angustl~ da vertigem, como perda do centro. Um homem é tomado de vertigem quando, num declive ou num cimo, encontra-se inteiramente exposto. O em cima, parede ou céu, o domina ou o envolve, avançando sobre ele em uma espécie de movimento vibratório e expulsivo, como o de uma matriz em trabalho de parto; enquanto o abaixo o fascina e o atrai, com o chão fugindo sob os pés, até o horizonte. Privado de qualquer lugar, ele é órgão sofredor de uma circularida.de em turbilhão. Ele não é o aqui de nada, nem mesmo da vertigem. A vertigem não é um acontecimento no qual o mun~o possa desp~ntar (ou possa ter seu ponto de partida). Na Santa Sofl~ de Consta~tmopla é justamente quando a vertigem cessa com o surgimento do ritmo que, subitamente, estamos aí... aí, no ritmo, cujo evento-advento abre um mundo. Paul Klee inicia a Confissão do criador com a seguinte frase: "A arte não reproduz o visível: ela torna visíveL" O quê? O invisível. O que durante toda a vida Tal-Coat quis tornar visível, aquilo que sua obra buscou e do qual ela permanece a surpresa, é o invisível aí. Ele o chama "0 invisível lugar". "Nesses lugares desertos, habitados pelo invisível lugar no frêmito da passagem, o silêncio, o aqui atento são todas as coisas a serem ditas que unem e fazem que assim, habitado e parte do universo do invisível lugar ele é o aberto." Ouçamos bem essas últimas palavras. Elas dizem: "do invisível lugar o aberto é". O que chamo "aí" é encontrado e formulado sempre que pensamos ou dizemos l'iI y a 1'2. O que este "y" designa? Não um lugar no mundo. Ele destina o mundo a um aí. Se quiséssemos a qualquer custo localizá-lo, referindo-o ao espaço do mundo como campo de todo o real, sem entretanto nele situá-lo, diríamos: "0 aí que dele não faz parte". O "aí" significado pelo "y" do "i/ y a" é o aí de tudo que tem lugar, e lugar... de ser. Mas, poderia perguntar o homem de bom senso, o que um pintor, que não escolheu ser filósofo, tem a ver com esse "aí", e com esse "ser", que enunciamos a todo momento, sem nunca pensar no que querem dizer? Pois bem! O pintor tem a ver com esse "aí" e com esse ser: ele é interpelado pelo ser aí onde sua obra de pintor se origina, ao nível mesmo do sentir. 388
In truth, the sensitive daubt questians the alterna tive "this ar that". In bath situatians the same mistake accurs. It derives from placing the being there, lacating it at a previausly canstituted warld, as we say taday. Nevertheless, "being there" cannat designa te a pasitian within the warld as we alsa say that "the warld is there". "Being there" stands for the absalute alatment af place, the canditian for ali places to exist and the very pas~i~ility af a place to existo There is an absalute reciprocity between my unvetltng space and the unveiling of space around me. I am there where I see I see from here where Iam. This being there cannat be subjected to an abjective analysis. It is nat in the warld nar in man. And for bath af them it is the inaugural place simultaneausly apened by its birthjknawledge. The schyzaphrenic lives his being there as a lack, affecting his being, whase menace anyane can experience in the anguish af vertiga as ~ loss ~f center. A man is taken by vertiga when in a dawnward slape ar summlt, he ftnds himself campletely expased. That which is abave, either wall ar s~y, . daminates ar invalves him, advancing upan him in a kind af expelltng turmall as it it were a wamb in labor, while the battam fascinates and attracts, with the ground escaping under aur feet until the hari~an. Captured ~y these twa cannected mavements within the same surroundtng space deslgned by space itself, man naw lacks a being here. Lacking space, he undergaes a.circular~ty in turmai/. He is no more the being here af anything, nat even vertlga. Vertlga is nat an event thraugh which the warld can appear. In Santa Sofia, Canstantinaple, it is the mament in which vertiga ceases and rhythm app~ars that, suddenly, we are there ... there, in rhythm, whase event-advent unvells the warld. Paul Klee starts his Confessions of the creator with the fallawing phrase: "art does nat reproduce that which is visible: it becames visible". What is it that becames visible? The invisible. What Tal-Caat struggled ali his lite to make visible was that which in his wark he always searched and it expresses surprise; it is the invisible there ... He calls it the "invisible place". "In these deserted places, lived in by the invisible place in the shudder af passage , the silence, the attentive here are ali things to be said which unite and thus make, that which is inhabited and part af the universe af the invisible place is that which is apen". Let us pay attentian to these last wards. They state that "af the invisible place is that which is apen". What I call "being there" is fa~nd and expressed whenever we think ar say "il y ali . What does thls y refer to? Certainly nat a place in the warld. Naw the warld is referred to a being there. If we wauld decide, no matter what, to lacate it, referring it to a warld that wauld be the basis af ali reality yet withaut lacating it there, we wauld say: "being there is the anywhere af everywhere. " The ward "being there" meant by the French "y" ar "il y ali is the being there which refers to everything that has a place ... and a place ... af being. Hawever, a balanced man cauld ask what kind af relatianship can a painter have - sameane wha did nat chaase to be a philasapher - with this being there and with this being that we refer to cantinuausly withaut stapping to think what they mean? Well! The painter has to deal with being there, with this being: he is questianed by this being there where the painter's wark ariginates, at the very leveI af feeling.
Essa relação com o ser caracteriza propriamente o sentir humano que não é o de um simples ser vivo, mas de um existente, ou seja, de alguém cujo ser está em jogo no próprio ser - o que se chama existir. O sentir é o ato de nosso primeiro reconhecimento, ou, segundo Claudel, de nosso co-nascimento com o mundo. Nele, o mundo e nós, juntos, realmente despertamos um para o outro. O homem em vigília e o sonhador distinguem-se em primeiro lugar não pela decisão, mas pelo sentir.
This relationship with the being is that which characterizes human feeling which is different from the feeling of anything which is alive - but of an existing being, that is, of someone whose own being is questioned within its own being - that which we call existing. Feeling is our first act of recognition ar, according to Claudel, of our simultaneous birth together with the world (*). .In it both the world and us become reallyaware of each other. The man on the watch and the dreamer are distinguished mainly by their feelings, not by their decisions.
O sentir está para o perceber, escreve E. Straus, como o grito está . para a palavra. O grito especificamente humano não é o grito de dor, de cólera ou de pavor que nos é arrancado reativamente, mas um apelo: o grito que lançamos às vezes como "uma criança perdida", "o grito - quando nada à vista - semelhante a uma pedra" (André du Bouchet), mas tão primordial, o grito ao mesmo tempo de apelo e de surpresa que lançamos na direção de alguém ou algo que aparece, passa ou desaparece. Ele é uma tentativa de esclarecer esse clarão de realidade que é um acontecimento. Um acontecimento é um rasgo na trama do ente, através do qual temos abertura ao ser.
According to E. Straus, feeling is to the act of perceiving as the scream to the word. The human scream specifically is not the scream that derives from pain rage ar dread and which is a reaction but rather a call; it is the scream we sometimes utter as a "Iost child", "the scream - when nothing is in sight similar to a stone" (André du Bouchet), yet so primeval that it is at the same time a scream of call and of surprise which we direct to someone ar to something that appears, passes ar disappears. It is an attempt to clarify this surge of reality that is an event. An event is a breach in the fabric of beings through which we can find a breakthrough to the being.
Perceber é pegar (per-capere). Estamos envolvidos com entes, lidamos com eles, mas não com o ser, ao qual, por eles, temos abertura. Não podemos pegar aquilo pelo qual o ente é. Sua surpresa excede toda presa. Ela escapa tanto à 'percepção como à palavra. Experimentamos no sentir e chamamos por um grito. O sentir é o primeiro momento da existência desperta, nomeado em grego pela palavra aisthesis (sensação), de onde procede diretamente "estética". Kant mostrou uma lucidez singular ao chamar de estética tanto sua análise das formas do sentir, isto é, do espaço e do tempo, quanto sua análise da arte. Ambas, a estética sensível e a estética artística, se comunicam entre si, já que a arte repousa sobre estruturas espaciais e temporais e não sobre estruturas semânticas ou categoriais que constituem o tecido verbal. É o que mostram as obras picturais ou plásticas dos doentes mentais. Certos esquizofrênicos que perderam o uso da fala são capazes de se significar e de significar seu mundo modelando, esculpindo, pintando. O sentir, momento mais inocente e arriscado de todos, ao nível do qual se produz o advento-evento do mundo, erige o fundo que sustenta a atenção própria do pintor. Cézanne conta uma história sobre Courbet e os feixes de lenha: "Estava pintando e colocava a cor tal como a via. De repente pergunta: 'Mas o que estou pintando?' Foram ver: eram feixes de lenha". Nesse momento a palavra fechou-se sobre a coisa. Mas não sobre a obra. Pois Courbet, precisamente, não estava pintando feixes de lenha. Pintar feixes de lenha visando identificá-los enquanto tais, como uma palavra num dicionário, é subtraí-los do fundo de mundo que lhes permite ser, abolindo o momento de realidade. A objetivação - seja na percepção ou na imagem - é a primeira retração a partir da abertura à livre amplidão (freie Weite), onde o aparecer das coisas as mantém suspensas no aberto.
To perceive is to catch (per-capere). We are involved and deal with beings but not with the Being, to which we are able to contact through them. We can not seize that (i.e. Being) by means of which each being is. Its surprise exceeds everything we can seize. It escapes both perception and speech. In feeling we experiment and call by means of a scream. Feeling is the first stance of awakening, and the Greek word for it is (sensation), which is, in its tum, the origin of "aesthetics". Kant very wisely defined as aesthetic both his analyses of the forms of feeling, that is, of space andtime, as his analysis of art. Both communicate as the aesthetíc of sensítívíty and aesthetíc of art as art is based upon temporal and spatial structures and not on semantic structures ar categories which constitute the verbal fabrico The plastic ar pictorical works of the mentally ill are an evidence of this. Certain schizophrenics who lost their speech are nevertheless, able to signify their world through sculptures, painting and modelling. Feeling is the most innocent and risky moment during which the adventevent takes place, constituting the background on which the painter's attention is based. Cézanne te//s a story about Courbet and pieces of wood: "I was painting and used colar according to what I was seeing. Suddenly he asks himself "after ali, what is that which I am painting? They went to see and found out: they were pieces of wood. " Thus, the word surrounded the object but not the painting. For Courbet was not painting pieces of wood. He was not painting pieces of wood for the purpose of identifying them. To paint pieces of wood in arder to identify them, as a word in a dictionary, is to subtract them from the background of the world which allows them to bel abolishing the moment of reality. Objectivation - both in perception ar image - is the first withdrawal from the Opening towards free Vastness, where things do appear, and are maintained suspended in the openness. Courbet was painting the "anguished passage ". When Tal-Coat refers to the "anguished passage, the silence, the attentive here" these three terms are not linked by a mere association of ideas. Together, theyarticulate the needed space for the manifestation of "ali things that are to be said".
Courbet pintava justamente o "frêmito da passagem". E quando TalCoat diz "no frêmito da passagem, o silêncio, o aqui atento", os três termos não estão ligados por mera associação de idéias. Juntos, articulam o espaço necessário para a manifestação de "todas as coisas a serem ditas".
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D'ardeur, 1972 óleo s/tela/oi/ on canvas 89 x 116 cm Coleção particular, Fribourg
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Vers 10 heures, 1984 óleo s/tela/oil on canvas 81 x 100 em Co leção sr. e sra. Jaeques Polge, Paris
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Muitas vezes, acompanhando Tal-Coat às colinas do Tholonet, senti o estremecimento da passagem quando olhávamos uma sombra, um curso d'água, uma fenda. Ficávamos suspensos neles, e, nessa suspensão, presentes em todo o espaço. Tal visão pode ser comparada à do alpinista. Da mesma forma, a fenda, à qual já ,de baixo seu olhar se ajusta, não é um objeto, mas um caminho. E até um motivo de escalada, no sentido de motivus: o que coloca em movimento. Desde o momento em que toca a parede com o olhar, o alpinista mede-se a ela, e ela a ele. É a partir dessa fenda que o espaço da parede abre-se a seu olhar interrogador, e toda a sua presença se implica na iminência desse ato de apresentação. Para reconhecer uma passagem não basta antecipar os gestos necessários para nela penetrar, é preciso ter certeza de que ela não conduzirá ao impossível, a um lugar do qual não se poderá mais nem subir nem descer... nem ficar suspenso. Cada operação é, em sua forma, determinada pela seguinte, e a forma desta última por uma terceira. Todas se integram em uma mesma gênese espaço-temporal que se desenvolve sempre a partir de um aqui momentâneo. O espaço do qual essa fenda é a linha da vida não é um trecho balizado de antemão, mas um espaço operacional incessantemente reaberto a partir e em torno de um incomparável aqui, no instante. Não se trata aqui de palavras vãs. Antes de ser objeto, o mundo é aquilo a que nós estamos diretamente ligados. Mas isso não é ainda o mais original. Énecessário primordialmente ter abertura ao mundo. Ora, o olhar do artista - e nisso ele se diferencia do alpinista perpetua o movimento da abertura, o momento aparicional de uma sombra, de uma fenda, de um traço de luz como fenômeno puro. Aqui começa o divórcio não entre artista e público, mas do público com a realidade. Perguntar "0 que é que isto representa?" é pedir que se nomeie. Ora, nomear um fenômeno, uma sombra, um nascer de sol, equivale a fixá-los nos limites de uma definição-contorno, tematizando-os como objetos. A visão torna-se possessiva. Como uma mão fechada, avara, que se recusa a acolher o mundo, ela esquece o momento aparicional do Ilil y alI, e a surpresa de aí ser... ou seja, o real. Pois o real é sempre o que não se esperava, e que cria a surpresa - no momento em que a preenche - de sempre ter estado aí. Vocês já viram uma sombra ou uma fenda assinalando com sua presença o espaço de um rochedo? Disse "espaço", não "superfície". Pois essa sombra ou essa fenda não está recortada e aplicada sobre um suporte de pedra. Uma sombra não é plana: por muito tempo afirmou-se que era côncava. Cézanne descobriu, olhando Santa Vitória, que era convexa: ela "fugia de seu centro". Na realidade, ela é as duas coisas ou nenhuma delas. Tem profundidade e abertura, que escapam a qualquer métrica. Não há interface. A profundidade/abertura constitui, em sua extensão irradiante (fugindo de seu centro), um espaço único multidimensional cujas áreas coexistem em simultaneidade de profundidade e radiância. A sombra não é localizável nos limites prévios do rochedo. Pelo contrário, os limites se constituem a partir dela, fugidios, flutuando no ilimitado e como que suspensos em todo o espaço marginal, em meio ao qual estamos expostos até as mais remotas distâncias - pois são as nossas próprias.
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Accompanying Tal-Coat on the hills of Tholonet, I often felt the impact of the landscape when we were looking at a shade, a stream, a slit. We were suspended in them and, through this suspension, we were present throughout the space. This vision can be compared to that of the climber. In the same way, the slit, alreadyadjusts itself to his sight, it isnot an object, but a path. It is even a motivating force for climbing in the sense ofmotivus: that which generates movement. From the moment when he touches the wall with his sight, the climber measures himself by it as well as it measures itself by him. It is from this slit that the space of the wall opens up to his questioning gaze and ali its presence is involved in the imminence of this presentation act. In order to recognise a passage it is not enough to foresee the necessary gestures to penetrate it, but we have to ensure that it will not lead to the impossible, to a place from which we will not be able to climb nor to descend. .. neither be suspended. Each operation is, in its own form, determined by the following one and the form of the latter one bya third one. Ali of them merge in the same spatial-temporal genesis that always stems from that which is always developed from a temporary here. The space upon which this slit opens up is the lite line and not a side track previously designed. It is rather an operational space unceasingly reopened from and around an incomparable here, at the moment. These are not mere words. Before being an object, the world is that with which we are involved. However, this is still not the most original. It is fundamental, beforehand, to be open to the world. Nevertheless, the gaze of the artist - and in this he is ditferent from the climber - perpetuates the opening movement, the moment of the appearance of a shade, a slit, a ray of light, as pure phenomenon. Here starts the divorce, though not between the artist and his audience, but between the audience and reality To ask "what does this represent" is asking for a name. However, to name a phenomenon - a shadow, a dawn - is equivalent to fix them within the limits of a definition-outline, focusing it as objects. Thus vision becomes possessive. It is as a close fisted hand which refuses to welcome the world, it forgets the moment of the appearance of the "il y ali and the surprise of the being there ... that is, of reality For reality is never that which we expected it to be and creates the surprise - at the moment in which it is fulfilled - of having always been there. Have Vou ever seen a shadow or a slit stressing, through its presence, the space of a clitf? I referred to "space" and not to "surface". This shadow or slit is not apllied to a support of stone. A shadow is not plane: for a long time it was said to be concave. Cézanne found out, looking at Saint- Victoria, that it was convex: "it escaped from its center". In reality, it is these two things or none of them. It has depth and opening which evades any metrics. There is no interface. The depth/opening constitutes, in its irradiating extension (escaping from its center) a sole multidimensional space whose areas coexist in simultaneous depth and radiance. The shadow cannot be located in the previous borders of the clitf In reality it is the opposite, the borders are constituted from them, theyare fleeting, floating in the unlimited and as it suspended in ali marginal space in the middle of which we are exposed up to the most remo te distances - as it they were our own. Unlike the artists, the being in the world of the climber is always somewhat close to Welzenach ideal: "where there is a will there is a way". The artist, as opposed to the climber, can open himself to the world in an attitude of pure welcome: "ali his desire" says Cézanne "has to be that of silence".
Distinto do artista, o ser no mundo do alpinista é sempre mais ou menos próximo do ideal de Welzenach: "Onde há uma vontade, há um caminho". O artista, pelo contrário, pode estar aberto ao mundo numa atitude de acolhimento puro: "Toda a sua vontade", diz Cézanne, "tem que ser de silêncio". Essa diferença corresponde a uma linha divisória que atravessa o conjunto da cultura humana desde seus primórdios. Foi reconhecida e evidenciada por Leo Frobenius, que dividiu as civilizações africanas em dois tipos: as "camitas" e as "etíopes". O princípio de distinção estende-se a todas as civilizações primitivas. Exprime estruturas arcaicas profundas (sempre presentes em nós e particularmente ativas em um homem como Tal-Coat), subdivididas em "mágicas" - onde o homem parece predestinado ao jogo da vontade - e "místicas" - onde parece predestinado ao jogo do abandono. Abandono não significa renúncia, mas consentimento participativo com o mundo. As primeiras são civilizações de caçadores, quase sempre nômades, para quem o sucesso dos atos vitais depende de um rito ou uma fórmula eficaz que detêm: "Eu sou, que o mundo seja". As segundas são civilizações de agricultores e coletores que entram no jogo do mundo com as águas, as plantas ou as estrelas. A essa oposição corresponde uma escolha, uma escolha do eu, destinando-se a si próprio. Dividido, em seu esforço para ser, entre duas formas de existência, opta por uma ou outra, mobilizando-a através de suas próprias potencialidades: a inflação e a participação. A inflação: querer ser tudo por si mesmo. A participação: querer ser por um outro. Nas civilizações históricas, o homem oscila entre as duas. "Por vezes", diz Hõlderlin, "0 mundo é tudo e nós nada, por outras, somos tudo e o mundo nada." O homem deseja as duas coisas: "Estar ao mesmo tempo em tudo e acima de tudo". Dilacera-se entre esses extremos, entre duas formas de existência de tons opostos: seu "tom próprio" - o tom do ser que somos - e o "tom de sua alma" - o tom do ser ao qual aspiramos. Hõlderlin mostrou, com precisão inédita, que a arte é a resolução dessa contradição. O poema - e de maneira mais genérica a obra de arte - contém os dois tons. De fato, o tom ao qual está afinado o "eu" do poeta e que constitui a tonalidade fundamental do poema não constitui seu caráter artístico - o estilo. Este se expressa em um tom contrário. Um poeta que viva na proximidade não-problemática das coisas acha-se com o mundo numa relação imediata que corresponde ao tom natural ou ingênuo. Mas, se adota o mesmo tom no poema, incorre numa banalidade chã e monótona. Caso sua maneira de comportar-se no mundo esteja espontaneamente afinada em um tom enérgico ou heróico e caso se expresse nesse mesmo tom no poema, este soará como uma proclamação altissonante.
This difference corresponds to the dividing line which crosses human culture as a whole since primeval time. It was recognised and put in evidence by Leo Frobenius, who divided African civilizations in two brackets: the "Hamite" and the "Ethiopian". The principie of this division can be extended to ali primitive societies. Theyexpress deep archaic structures (which are always present in us and are particularly active in a man as Tal-Coat), subdivided in "magical" - where man seems to be foreordained to a hazardous will- and "mystica/" - where he seems to be foreordained to hazardous desertion. Desertion does not signify resigna I but participa tive consensus with the world. The first are civilizations made up of hunters, almost always nomadic, for whom the success of vital acts depends on a ritual ar an efficient formula that defines: "as Iam, so be the world". The latter are civilizations of farmers and collectors that enter the world in an interaction with water, plants ar stars. To this opposition corresponds a choice, a choice of the self, addressed to its own self In conflict with its effort for existence between two different forms of being, it chooses one of them, activating it by means of its own potentialities: inflation and participation. Inflation: to be everything by itself Participation: to be through another one. In historical civilizations man oscillates between the twa. According to Holderlin "sometimes the world is everything and we are nothing; some other times we are everything and the world is nothing". Man wishes for the two: "to be, at the same time, in everything and above everything. " He disrupts himself between these two extremes, between two forms of being with oppasite tints: its own tint - "the tint of our own being" - and the "tint of our sou/" - the tint of being what we wish to be. With unprecedented accuracy, Holderlin showed how art resolves this contradiction. The poem - and in a broader approach the work of art contains both tints. Actually, the tint to which the self of the paet is tuned to and which constitutes the fundamentai tint of the poem, does not constitute its artistic character. This expresses itself in an apposite tint. The poet who lives in a non prqblematic proximity of things finds itself with the world in an immediate relationship which stands out from a natural ar naif attitude. However, if he adapts this same tint in the poem, he incurrs in a monotonous and primary triviality. Yet, if he faces the world in a spantaneaus wayand tunes to an energetic and heroic tone, and whether he expresses himself in the same tone in the poem it will sound like a pompous proclamation. Finally, if the poet conceives the harmonic base of the whole work in an intelectual intuition, and if, in arder to express it, he gives the poem the tone of sublimity, this will bring about a void ideal, soaring over the rea/ity which he strives to describe and not seeing it. A wark of art is, in itself, in its beingwork of art, the passage, the metaphor, states HOIderlin, ar, that is to say, the transportation ar the transfer of a tone to another one, to its opposite one.
Finalmente, se o poeta concebe a unidade harmônica do todo em uma intuição intelectual e se, para dizê-Ia, dá a seu poema o tom da sublimidade, chegará à predicação de um ideal vazio, sobrevoando sem vê-lo - o real do qual pretende falar. Uma obra de arte é em si, em seu ser-obra, a passagem, a metáfora, diz Hõlderlin, ou seja, o transporte ou a transferência de um tom a outro, oposto.
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Signes dans une talaise rouge, 1965 óleo s/tela/oil on canvas 114 x 195,5 em Coleção Musée National d'Art Moderne, Paris
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Qual era o tom próprio a Tal-Coat? Era marcado por dois traços. De um lado a violência (violenti rapiunt illud: são os violentos que se apoderam do reino). Nele, o demônico (não estou dizendo demoníaco) estava sempre prestes airromper. De outro, seu pensamento intuitivo orientava-se à unidade do todo. O primeiro desses traços define, no vocabulário de Hõlderlin, o tom heróico, "das grandes vontades e das grandes paixões". O segundo corresponde ao tom ideal. Ohomem do ideal determina por si mesmo a lei de um mundo cuja unidade harmônica integral é garantida por seu querer-ser. Mas esse eu inflacionado, que quer ser tudo por si, é tão excessivamente tenso que tal estado de suprapotência corre sempre o risco de cair no informe. Só escapa disso pela negação de sua própria vontade de potência no ser. Por isso o tom heróico é também o do dilaceramento. Oherói só pode corresponder à sua própria medida se combater a desmedida. Uma destruição incessante obriga a criação a se fazer insistente. A história de quase todas as pinturas de Tal-Coat é uma sucessão de destruições, de recuperações, de recomeços, de re-criações. Qual era o tom de sua alma? Oque foi cada vez mais constituindo o caráter artístico de sua obra e que, por sua vez, reagiu sobre seu próprio ser é a conjunção do tom ideal, afinado com a respiração única de todo o espaço do mundo, e do tom natural ou ingênuo, de um ser no mundo à proximidade de todas as coisas. Tal-Coat buscava no interior de cada coisa a interioridade do mundo, "onda única de que sou o mar gradual"3. Mas não se deve pensar que o jogo do abandono equivale à passividade do eu. Tal eu abre-se ao mundo deixando-o ser - o que não tem nada a ver com negligência. "Em busca do impossível, não há desvelamento Há ... a tensão de viver, de não perturbar esperar· a espera sem nada esperar". Das primeiras às últimas obras, a espera foi progressivamente substituindo o projeto. E isso no olhar do pintor. O "aqui atento" expressa o homem todo. Mas um olhar que se refere tanto "ao frêmito da passagem" quanto ao silêncio implica uma dualidade, ou uma difração. Quando Tal-Coat desenhava, a imobilidade tensa do corpo parado passava a seu olhar, um olhar impossível de ser distraído, que apanhava as coisas a partir do retraimento. "Aqui começa o duro retraimento. Engastado ao calcário, à sua brancura inesgotável, um olhar negro e duro, o sílex. Foi seguindo meus passos, seguindo-me com sua incessante vigilância: dele aprendi essa atenção que não pisca, incansável." Esse olhar de sílex está "predestinado ao jogo da vontade". Mas quando, do calcário, irradia-se "a brancura inesgotável", "a onipotente brancura", ele evoca sua "tensão, face erguida em direção à luz". Como a face dos ídolos cicládicos, face nua, tensa, que é nada mais nada menos que a curva exata, a justa inclinação para acolher a luz, que seu reflexo, emanando de todo o rosto, converte-se em olhar. Regarcf é uma palavra que muitas línguas poderiam invejar do francês. É composta de garder: "tomar sob aguarda", e <do prefixo re, que marca a volta. Regarder implica uma volta do olhar à origem de sua guarda. Não se trata de volta ao aqui do espreitador, mas de volta a seu aí, de volta ao ali onde ele vigia, e a partir de onde todo o seu campo visual se desdobra. É uma volta para aquém. Não simplesmente para aquém das coisas vistas, das quais deve incessantemente se desprender, mas para aquém da coisa a ser vista e que não está aí. Uma volta à possibilidade de qualquer surgimento. 396
Which was Tal-Coat's own tone? It had two characteristic features. On one hand, violence (violenti rapiunt iIIud: it is the violent who take possession of the kingdom). In him, the rascal aspect ( I am not saying demoniacal) was always ready to erupt. On the other, his intuitive way of thinking was always oriented towards the unity of the whole. The first one of these features defines, according to HOIderlin's vocabulary, the heraic tone of the "great wishes and passions". The latter corresponds to the ideal tone. The man who has ideais determines himself the rules of a world whose total harmonic unity is guaranteed by his wish to be. However, this inflationed self, who wishes to be everything by himself, is so excessively tense that such a superpower state always runs the risk of loosing formo He only escapes this condition by refusing his own wish for power in the Being. That is the reason why the heraic tone is also the disruptive one. The herae can only correspond to his own status it he avoids the unbounded condition. An incessant destruction obliges creation to maintain itself in a permanent state of constant request. The story of nearly ali Tal-Coat's painting is a sequence of destructions, retrievals, discoveries, re-creations. Which was the tone of his sole? What became increasingly important in the constitution of the artistic character of his work - and which, in its tum, reacted over his own being - is the overlapping of the ideal tone, tuned to the sole breath of ali the space in the world, and the naif ar natural tone of a being who is in the world and near to ali things. Tal-Coat searched within ali things the inner character of the world "the sole wave of which I am the gradual sea. " Nevertheless, we should not think that this abandonment is equivalent to the passivity of the self This self opens itself to the world letting itbe - in an attitude which is the opposite of negligence. "In search of the impossible, there is no unveiling rather. .. the tension of lite, of not interfering to wait and while waiting, not expect anything". Fram his first to his last works, waiting gradua//y replaced design in the painter's own appraach. The "attentive here" expresses the man as a whole. However, a look that refers to the "anguish of passage" as well as to silence implies ina duality, a diffraction. When Tal-Coat used to draw, the tense immobility of the body passed anta his gaze, a gaze that was impossible to be side-tracked, that grasped things by means of its own restraint. " Here starts lhe hard restraint Embedded upon limestone, with its endless whiteness a black and hard stare, the silex. It followed my steps, following me with its incessant vigil: from it I leamed this unblinking, tireless attention". This silexgaze is "predestined to the whim of will". But when "the endJess whiteness" emerges fram the limestone, "the omnipotent whiteness", evokes his "tension, his face litted towards light". His face is like the faces of the cycladic idols, naked, tense, that is, no more nor less than the exact curve, the right inclination to accept light, its reflex stemming from the whole face becomes sight. Regard is a word which many languages could envy the French for. It is made up ofgarder: shelter, and ofthe prefix re, which refers to the idea of "going back to". Regarder - to look, in English - implies to the retum of the eye back to that which it shelters. It does not refer to the idea of going back to the viewer's being here, but rather to the being there, going back to there where it watches, to the site fram which its fie/d of vision unfolds itself It is like going back to the foregraund. Not only to the foregraund of the things seen fram which it must ceaselessly detach itself - but to the foregraund of the
Trata-se de volta! para aquém do aparecimento das coisas para surpreendê-Ias. E uma volta ao nada - que Tal-Coat designa com a palavra "silêncio".
thing which has to be seen and is not there. It means going back to the possibility of any emmergence, before they appear so as to surprise them. It is going back to the void, which Tal-Coat calls "silence".
Muitas vezes, no campo, vi Tal-Coat desenhar em seu caderno. O olhar ia do motivo ao papel, do papel ao motivo, mas o tempo dado a cada um não era o mesmo. Passava mais tempo seguindo o motivo que controlando seu desenho. Era ali, ao longe, que, ao ritmo do motivo, o olhar se mantinha num estado de surpresa sempre renovada, enquanto a mão entrava em ressonância com ele. A operação tinha dois tempos. Havia de início uma tensão, a tensão do olhar requerendo todo o corpo, cujas sinergias afluíam para a mão. O olhar de sílex, totalmente concentrado, comunica à mão seu rigor. Nem o olhar pisca, nem a mão treme. Pronta a tudo, mas exigi~a por toda parte, mantém-se retraída, sem poder ou ousar começar. E o primeiro momento. Depois, o segundo, que os pintores chineses chamam de "punho vazio". Anulando-se toda a tensão do corpo, a mão não conduz, mas é conduzida, e conduzida em ressonância com o movimento do mundo, com o motivo, este "movente". O olhar induzido pelo motivo é um esboço motor cuja transmissão até a mão não é de modo algum direta. Tampouco é direta a relação de mundo a mundo entre o motivo e o desenho. Entre eles, advém o instante do punho vazio; Essa passagem ao vazio é uma passagem pelo Vazio, pelo Nada. E bem mais que uma passagem. Nesse vazio, o artista é intimado a desaparecer ou a nascer para si e, consigo, para o mundo, do qual o desenho não é a cópia, mas a metamorfose. A prova do nada é a do paradoxo do ser.
Many times, when we were strolling on the hills, I saw Tal-Coat drawing on his notebook. His look went from the paper to that which drawed his attention and and vice-versa; however, the time alloted to it was not the same. He spent more time following the theme's rhythm than controlling the drawing. It was there, at the distance, that - according to the rhythm of his theme - his eye was nourished in a state of endless surprise while his hand worked accordingly. The work had two different moments. In the beginning there was tension, the tension of the eye requiring the whole body, whose sinergy flowed to the hand. The silex gaze, totally concentrated, communicates to the hand ali its rigor. The eye does not blink and the hand is steady. Ready for anything, and required by ali parts, maintaining the restraint, without being able to start ar lacking the courage to start. This is the first moment. Next, the second, that which the Chinese painters call "the empty hand". Ali the tension in the body is annulled, the hand does not drive but is driven; it is driven in resonance to the movement of the world, with the theme which leads the eye. The eye is induced by the theme, it is a moving sketch whose transmission to the hand is not automatic. The same way the relationship from world to world is not automatic, as between theme and drawing. Between them stands the moment of the empty hand. This passage through void is a passage along the Void, along Nothingness. It is much more than a passage. In this void, the artist has to disappear ar to be bom to himself, and, through him, to the world. The drawing is not a copy of this world but its metamorphosis. The evidence of the void is that of the paradox of the Being.
É o que mostra o exemplo dos grandes desenhistas (que são, muito raros): não desenham pelos pretos, mas pelos brancos. Que não são reservas inertes, ainda que harmoniosas. São as energias brancas que, segundo a expressão de Malévitch, fazem da folha de papel uma superfície espacializante. Os pretos estão a seu serviço. Os poderes opostos de abertura e fechamento, de acolhida e ataque, que pertencem respectivamente às concavidades e às convexidades de uma linha, a concentração atrativa ou o irradiar difuso dos traços, a rapidez ou lentidão do traçado, determinam, no branco, variações de brilho e mesmo de tonalidade, ou seja, diferenças de tensões superficiais, descontínuas, cuja integração rítmica engendra um espaço. Na arte não existe espaço a não ser rítmico. Um ritmo não se desenrola no espaço, onde viria se instalar. Muito pelo contrário, seu espaço está implicado nele, assim como sua temporal idade. O espaço ,de um desenho de Tal-Coat está implicado no ritmo dos brancos. E nele que os traçados negros se comunicam e que cada um renasce onde se interrompe. Nenhum compromisso é possível de uma borda à outra da fenda. Esta não é um intervalo entre dois negros, mas uma área branca, aberta a todas as outras. O salto que a ultrapassa toma impulso em todos os brancos com os quais está em ritmo. Os brancos não são lacunas. São, como dizem os chineses, "vazios medianos", em cada um dos quais aflora o "Grande Vazio" inicial e final, circulando em si próprio através deles. "Em pintura", diz Hang Pin-hung, "ligar uma linha a outra não equivale a enxertar um ramo num outro. O enxerto visa a solidez, ao passo que o traçado dos traços busca não sufocar o sopro."
This can be seen in the work of exceptionally fine draughtsmen (who are rare): they do not draw departing from the black spaces but rather from the white spaces - which are not extra spaces, unactivated although harmonious. Theyare the white energies, which according to Malevich, transform the white surfaceof the paper into a spatial surface. The black spaces are . controlled by these surfaces. The opposite powers of opening and closing, sheltering ar attacking, which pertain either to the concavities ar convexities of a line, the drawing power ar the diffuse irradiation of the drawing, the fastness ar slowness of the set of strokes determine variations in the brilliance of the white, that is, a difference in the superficial, discontinuous tensions whose rhythmic integration engenders a space. In art there is no space unless it is rythmic. A rhythm does not unfo/d in the space where it is to be installed. It is the opposite, its space is imbricated in it as well as its temporality. Space in Tal Coat's drawing is imbricated in the rhythm of the white spaces. It is in this space that the black strokes communicate and it is in it that every stroke reconstitutes itself there where it was interrupted. There is no possible commitment between both ends of the slit. The slit is not a breach between two black spaces but rather a white space which is open to ali the others. The leap which surpasses it gains momentum from ali white spaces with which it is synchronized. The white spaces are not gaps. According to the Chinese, theyare "medium voids", and in each of them emerges the initial and final "Great Void" which circulates in itself through them. According to Hang Pin-hung, "to link one stroke to another when painting is not equivalent to graft one branch in another. Grafting aims at solidity while the strokes of the lines tries not to suffocate the breath. "
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Terres labourées, 1983 óleo sltelaloil on canvas 58 x 46,5 em Coleção Françoise Simeeek, Suíça
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Autoportrait, 1980
óleo s/tela/oil on canvas 55 x 46 cm Coleção particular
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Um traçado de Tal-Coat é, de um extremo a outro, imprevisível. Busca a si próprio adiante de si, sempre mais à frente, para se reencontrar com uma espécie de dispositivo inteligente, que parece procurar . apenas o que encontra, e abrir espaço à medida que o percorre. A autogênese sem preâmbulo dos desenhos faz de Tal-Coat um dos grandes desenhistas do Ocidente, ao lado de Dürer, Rembrandt, Rubens e Lorrain. A abertura radiante de seu espaço, no não-traçado do qual "surge subitamente outra coisa", é ao mesmo tempo mais juvenil e mais infalível que aquela, no século XX, de um desenho de Matisse e, com ainda mais razão, de Picasso. Foi o desenho que levou Tal-Coat a romper a associação ou a confusão clássicas entre apresentação e figuração. A figuração implica a constituição enquanto objeto de um fenômeno previamente revelado no sentir. Enquanto momento do sentir, uma sensação não é descritível. Como então poderia se expressar? Sentir e mover-se articulam-se do· interior. Ao "mover-se", imanente ao sentir, momento motor da estética sensível, corresponde, no ,nível da estética artística, o ritmo do motivo, ou seja, do "movente". E, no desenho, o dimensional da obra. . A pintura, assim como o desenho, não consiste na inserção de uma forma, figurativa ou figurai, em um espaço cuja gênese seria diversa da sua. Num quadro de Tal-Coat, a relação figura-fundo desaparece, substituída pela relação espaço focal-espaço marginal. O núcleo (ou o ponto nuclear) do espaço é um nó rítmico que liga as energias da cor geradoras de espaço. Desenhista nato, e dos maiores, talvez Tal-Coat fosse antes de tudo profundamente pintor. Pintor... o que isso quer dizer? Não haveria tantas respostas quantos tipos de pintura? Entretanto, o decisivo é a relação com a cor. O que faz a pintura ser pintura, tornando-a incomparável, reside-nesse ponto delicado, que está sob os olhos de todos mas raramente é percebido, onde Matisse encontra Cézanne e separa-se de Ingres e de Gauguin. O princípio da pintura de Cézanne é a sensação. Não aquela, já objetivada, do impressionismo ("Monet é apenas um olho ... "), mas a que, não curto-circuitada 110 sentir, é o primeiro momento de nosso co-nascimento com o mund05• Ela é o motor da ação pictural. Na obra realizada expressa-se diretamente por uma pincelada colorida que, em qualquer relação, central ou marginal, em que esteja implicada, continua sendo um foco do espaço. Uma pincelada de cor, liberada de seu "cerne", "que por toda parte mantém um tom prisioneiro" (Cézanne), expansiva em sua suspensão, abre um espaço onde determina de uma só vez a curvatura e o tom. O brilho escuro ou . claro basta para evidenciar a presença e a forma de um rosto. Sua transparência ou sua acuidade suscita uma profundidade de extensão que envolve e atravessa uma paisagem. Esse espaço pictórico não admite medidas ou distâncias. E constituído de tensões. Não é mé~rico, mas tensorial. Poucas pinturas fazem compreender tão bem a insólita expressão de Cézanne: "sensações coloristas", quanto as paisagens e as naturezas-mortas pintadas por Tal-Coat entre 1942 e 1946. A energia luminosa da cor, ao mesmo tempo constitutiva e expressiva de sensação, exatamente onde requisita o olhar, abre o espaço no qual irrompe. A sensação é o fundamento das pinturas de Tal-Coat: é o segredo criador, de início e por muito tempo soterrado, e que subitamente irrompe, de seu nascimento. 400
A set of stroke~ by Tal-Coat is, fromane end to the other, unpredictable. It strives forward in search of itself in order to find itself as a kind of intelligent device that seems to find only what it searches and to make room when needed. This auto-genesis makes Tal-Coat stand close to the great Westem masters of drawing: Dürer, Rembrandt, Rubens and Lorrain. The radiating opening of his space, in the non-stroke from which "something else suddenly emerges" is at the same time, more juvenile and infallible - in the 20th century - than that of a drawing by Matisse, or, even more warranted, by Picasso. It was the drawing that led Tal-Coat to break the classical association or confusion between presentation and figuratism. Figuratism implies the constitution - as an object - of a phenomenon previously revealed through feeling. While it is being felt, a sensation is not describable. How, then, could it be expressed? Feeling and movement articula te themselves within the self. "Movement", which is immanent to feeling - inducing moment of the sensible-aesthetic, correponds, at the leveI of the artisticaesthetics, to the rhythm of the theme. It is the dimensional aspect of the work in the case of drawings. Painting, as well as drawing, is not the insertion of a form, figurative or which works as a figure in a space whose genesis would be different from its own. In a painting by Tal-Coat, the relationship between figure and background disappears, and is replaced by the relationship between focal space- marginal space. The nucleus of the space is a rythmic knot that links the energy of color which generates space. A bom draughtsman, and one of the greatest, maybe Tal-Coat would have been above ali a painter. Painter ... what does this mean? Wouldn't we have as many answers as we have different kinds of paintings? However, the decisive aspect is the relation with color. That which makes painting be painting, so that it becomes incomparable stems from this delicate point, that can be seen by ali but which is rarely perceived. This point is, for instance, where Matisse meets Cézanne and detaches himself from Ingres and Gauguin. The principIe of Cézanne's painting is sensation. Not that which is already objectified - nor short-circuited - of the impressionism ("Monet is only an eye ... ") but that which is the first moment of our co-birth with the world. It is that which induces the pictorial action. The effective work expresses itself directly, by means of a colored stroke - regardless of the relation in which it is· implied - which is still, central or marginal, the core of space. A stroke of color, freed from its outline, "which maintains a captured tone throughout" (Cézanne), expanding itself in its own suspension, opens a space where it determines at once the curvature and tone. The dark or light brilliance is enough to put in evidence the presence and shape of a face. Its transparency and its acuity creates a depth of extension which involves and crosses a landscape. This pictorial space doesn't admit measures or distances, it is made up of tensions. It is not metric but tensile. Few paintings enable us to understand so well the unusual statement of Cézanne: "colored sensations" as the landscapes and still-lifes painted by Tal-Coat between 1942 and 1946. The bright energy of color, at the same time constituting and expressing sensation, opens the space in which it emerges precisely where it draws the attention of the eye. Sensation is the basis of Tal-Coat's paintings: it is the creative secret that was buried for a long time and emerges suddenly from its birth. I remember our first meetings
Lembro-me da época de nossos primeiros encontros, em 1947, quando ele percorria as colinas e os vales do Tholonet para familiarizar-se com a terra, as águas, os rochedos que queria pintar. Quando passava ao longo dos rochedos, as luzes e sombras que deslizavam comunicavam-se entre si no espaço-tempo movido por seu modo de andar ou caminhar. Daí os títulos: "Eu passo", "Passando", suspensos entre a incidência e a decadência do gerúndio. Ele costumava contrapor duas maneiras de estar no mundo e de encontrar as coisas: estar diante, estar dentro. Estar diante é tomar posição frente a objetos que encaramos, para discernir características através das quais possam se inscrever em um catálogo do mundo. Estar dentro é estar no centro deum mundo côncavo que nos envolve, com o qual nos deparamos antes de sua cristalização em objetos cuja convexidade se volta contra nós. O mundo está aí antes das coisas, como o sentir antes do perceber. Nele, a que nos abrimos? Ao fenômeno. Essa palavra aparecia com freqüência nas frases de Tal-CoaI. Ofenômeno é o tecido pré-objetivo do mundo. É, na aparição de toda realidade, o momento inaugural do real, que faz erguer-se em nós a surpresa do mundo erguendo-se em si próprio. É o que dizia Cézanne: "Há um minuto do mundo que passa. Pintá-lo em sua realidade". Em cada uma de suas manifestações, é o mundo que, em si mesmo, passa. Pintá-lo em sua realidade não significa nem fixá-lo nem fluidificá-Io no informe. Nessa época, Tal-Coat buscava antes de tudo captar em sua pintura o fenômeno e - com ele e nele - a luz, mas de tal maneira que, como nos mosaicos do arcebispado de Ravena, "captados, eles reinam livres". Nessas pinturas, nada é objeto, tudo é trajeto - não trajetória. Um traço de Tal~Coat nunca poderia ser pego em flagrante delito de domicílio fixo. Existe no horizonte de tensões intersticiais suscitadas, em seu traçado, pelas variações da luz cujas tensões dependem da obra inteira. Da mesma maneira, uma mancha de cor, suspensa em si mesma, é ec-stática com respeito ao espaço que sua tensão solicita. Tal-Coat só podia pintar o frêmito da passagem em sua realidade realizando-o em sua pintura. Mas para que a luz capturada reinasse livre, era preciso libertá-Ia do caráter embaciado da cor. A mobilidade só é possível em pintura pelo jogo das transparências. Nessa época, muitos só via,m fundos nos quadros de Tal-CoaI. Ora, seu fundo não é um fundo. E um espaço. Todos os seus elementos formadores - traços, manchas, fluxos - abrem-se uns aos outros ~o mesmo movimento em que o espaço os investe em sua diástole. E isso que a veladura realiza. A veladura não é a "cozinha" local, como pensaram tantos restauradores de quadros que, retirando-a com o verniz, arruinaram muitas pinturas de Rubens, de Jacob van Ruysdael ou de Hercule Seghers. Responde à primeira experiência do olhar, que é encontrar no espaço do quadro o próprio espaço do mundo, uma vez que o mundo se torna mundo espaçando-se. Nos mosaicos bizantinos, o vermelho saturado de um esmalte difunde-se na cor do mesmo matiz, mas não saturada, das tésseras de pedra ou de mármore, e suscita um espaço de luz radiémte. Da mesma maneira, uma cor, aflorando na semitransparência de uma veladura, irradia um espaço difusor no qual o olhar desliza livremente, como entre o ar e a água de um lago. .
. in 1947 when I wandered over the Tholonet hills and valleys to become familiar with the ground, water and cliffs which he wanted to paint. When he passed next to a cliff, the lights and shadowswhich floated communicated themselves in the space~time induced by his way of walking. Hence, the titles: I Pass, Passing , suspended between the incidence and the decadence of the gerund. He used to create an opposition between two different ways of being in the world and of finding things: being in front of, being within. Being in front of is assuming an attitude facingthe objects we see in arder to perceive the characteristics through which theyare inserted in the world's catalogue. To be within means to be in the center of a concave world that in volves us, a world which we see before us, before it was cristalized into objects whose concave aspect turns against uso The world is there before the objects, as feeling occurs before the perception. Are we open unto it? To the phenomenon. This word appeared frequently in Tal-Coat's writings. The phenomenon is the pre-objective fabric of the world. It is the first moment of the appearance of ali reality - which awakes in us the surprise at the world which is organizing itself. According to Cézanne: "there is a fleeting moment of reality We should paint it in its reality" In each Df its manifestations, it is the whole world which passes. To paint it in its reality does not mean to freeze it, as it is, nor to fluidify it in its nonshape. At the time, Tal-Coat seeked, above ali, to capture in his painting the phenomenon - with it and in it- the light in such a way that, as in the mosaics of the Archbishop of Ravena, "although captured, they reigned freely". In these paintings nothing is an object, everything is a journey - not a trajectory A stroke by Tal-Coat could never be caught in a fixed address of a transgression act. It arises in his set of strokes in the horizon of the marginal tensions, by the variations of light whose tensions depend on the whole work. In the same way, a patch of colar, suspended in itself, is static in regard to the space which its tension demands. Tal-Coat could only paint the anguish of passage in its reality, depicting it effectively in his painting. However, to ensure that the captured light would reign freely, it was necessary to re/ease it from disturbances induced by co/ar. Mobi/ity is on/y possib/e by the interp/ay of transparencies. At this time many peop/e on/y saw background in Ta/-Coat's paintings. As a matter of fact, his background is not a background. It is a space. Ali the e/ements that shape it - strokes, patches, flows open to each other in the same movement in which space invests them in its diasto/ic motion. This is obtained by g/azing, which is not an issue restricted to technique as many picture restorers thought, and who removed varnish, ruining many pictures by Rubens, Jacob van Ruysdae/ ar Hercu/e Seghers. It answers the first experience of sight, which is to find in the space of the picture, the own space of the world, once the world becomes a world by opening space. /n the Bizantine mosaics the saturated red of an ename/ diffuses itse/f in the co/ar of the same hue, but it is not saturated, from the stone ar marb/e tesserae. The red brings forth a space of radiant /ight. In the same way, a co/ar emerging in the semi-transparency of a g/azing irradiates a diffusing space in which the sight glides free/yas if between the air and the water of a lake.
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A vela dura cria um certo distanciamento. Mas entre o branco do matiz de fundo e o branco ligeiramente matizado da veladura não há nada. Não há "entre". No entanto, esse nada tem que ser vencido, e deve ser assim. Ele é vencido, e só assim dado, pelo espaço automovente no qual se resolve a tensão de duas tonalidades luminosas - cada uma com seu próprio gradiente de abertura e de profundidade e que, fibra por fibra, se entrepenetram. Ela se resolve em um espaço "onde as marcas do movimento exterior deixam de ser operantes" (André du Bouchet). Não há qualquer outra mobilidade além da extensão se expandindo, levando consigo todas as suas marcas. O brilho da superfície emerge em "êxtase" no entreaberto. Essa transparência absoluta é o diáfano, no qual se identificam a não-resistência e a atividade do vazio. Um dia no Museu do Louvre vi, com surpresa, que um copista tinha armado o cavalete em frente ao quadro de Goya A marquesa de Solana. Lá estava ele, de pé, desamparado, decepcionado com seu esboço que, já saturado, se afastara definitivamente, desde a primeira camada, da acuidade aérea de seu modelo. Digo-lhe: "É preciso ser bem corajoso para se lançar ao quadro mais difícil de copiar do Louvre". Ele respondeu: "Um dos mais difíceis: não há nada para pintar". De fato, não há nada a ser pintado, a não ser tornar visível o invisível nada que se irradia através dessa aparição impalpável e irrevogável, presente em todo o espaço. Na janela ao lado do quadro, só aparecia o céu: a Solana estava da cor do tempo. Pouco depois, através de uma outra janela do Louvre, eu via apenas, acima dos telhados, um espaço habitado por sua própria amplidão: o espaço livre, primeira aproximação do aberto e do vazio. Mas como dizer o vazio? Imaginem um homem de pé no meio do mundo, inteiramente exposto ao espaço e que, completamente perdido, tente dizer isso. Não há gesto que se iguale ao espaço. Desde o primeiro fracasso, só restaria ao homem recolher-se em si mesmo - a menos que seu gesto fosse rítmico e produzisse uma dança convocando o espaço. Entretanto, por maior que seja a leveza do dançarino, sempre se apóia no chão. Habita sob o céu e sobre a terra. E é a partir dela que ele se eleva, tomando impulso. Como a marquesa da Solana de pé no meio de tudo na ponta do sapato. Para Tal-Coat, homem da terra, ela era o lugar das jazidas de matéria e memória. "O que foi soterrado, revolvido pelo lavradio ferido, dilacerado pelo fracasso recolocado no fundo recoberto ainda salvo ressurgindo assim que depurado pela passagem da sombra à possível claridade como pedras erguidas pelos lavradios oferecendo o rosto ao sol." Essa emergência do fundo era-lhe essencial. Em uma de suas anotações de ateliê escreveu a seguinte frase: "Pintura se ergue aqui permanece ainda a quietude de seu repouso." Ela se ergue - em cada obra e através de todas - de camada em camada, não de tinta, mas de existência; pois a pintura quer todo o homem. Mas o que se move na espessura é constantemente rearticulado. 402
Glazing brings forth a certa in distance. But between the white of the background hue and the faintly hued white of the glazing there is nothing, "There is no between ". Nevertheless, this nothing has to be overcome, and so must it be. It is conquered and only by this means given, by the automoving space in which tension of two luminous shades is resolved - each of them with its own gradient of opening and depth and which, fiber by fiber, interpenetrate themselves. It resolves itself in a space "where the imprints of outer movement stop being active" (André du Bouchet). There isn't any area of movement beyond full extension, taking with it ali the imprints. The brilliance of the surface emerges in "extasis" within those gaps. This absolute transparency is the diaphanous, where non-resistency and void activityare identified. One day, at the Louvre Museum, lobserved, surprised, that a copyist had placed his easel in front of a picture by Goya, The Marchioness of Solana. There was he, standing up, forlom, discouraged with his sketch, already saturated, and had definitely withdrawned, since the first layer, from the airy accuracy of its mode!. I tell him: "one has to be very courageous in order to face the most difficult picture to copy in the whole Louvre ". He answered: "one of the most difficult; there is nothing to be painted". In fact, there is nothing to be painted, but to make visible the invisible nothing which irradiates through this impalpable and irrevocable apparition present in ali the space. In the window next to the picture there was only sky: Solana had the color of weather. Shortlyafter, through another window of the Louvre, I only saw, above the roofs, a space inhabited by its own amplitude: the free space, the first approximation of the open and of the void. However, how to express the void? Imagine a man standing in the midst of the world, entirely exposed to space and who, completely lost, tries to say precisely this. There is no gesture comparable to space. After the first failure, man could only withdraw into himself - unless his gesture was rythmic and originated a dance summoning space.However, no matter how light is the dancer, he must always rest on the ground. He lives under the sky and on the earth. It is from the earth that he raises himself, gaining impulse, as the standing Marchioness of Solana dominating ali on the tip of her shoe. For Tal-Coat, a man of the earth, the Marchioness of Solana was the symbol of a large deposit of matter and memory "What has been buried, revolved by the wounded tillable land dilacerated by the failure restored in the re-covered depth still safe reemerging as soon as purified by the passage of the shadow to a possible clarity as stones raised by tillable farmlands offering their faces to the sun. " This emergence from the depth was essential to him. In his annotations he wrote the following sentence: "Painting raises itself and here still remains the quietness of its repose. " It raises itself - in each work and through ali of them - from layer to layer, not from paint, but from existence;" beca use painting wants the whole mano But, what moves itself in the thickness is constantly rearticulated.
o que se move assim, constituindo de uma só vez a história interior e a essência da pintura de Tal-Coat? Paul Claudel, em L'oei! écoute, contrapõe a pintura holandesa do século XVII a todas as outras pinturas ocidentais, afirmando que ela pinta o fenômeno, e as demais, o acontecimento. Para ele, o acontecimento é uma ação ou um fato que intervém no decorrer das atividades humanas. Pode ser histórico, doméstico, mítico, mas é sempre no sentido próprio, "dramático" (drama: ação, em particular teatral). Passa-se sob a forma de uma cena centrada no homem. Tais cenas não estão ausentes - muito pelo contrário - da pintura holandesa. Mas, quer ocorram no interior ou no exterior, é o fenômeno elemental, evidenciado pelo pintor, que comunica ao conjunto o momento de realidade. Os elementos: água, ar, terra, matérias, e a luz que os liga, são o objeto primeiro da obra. Entretanto, "acontecimento" tem ainda outro sentido. Aqui, não se inscreve num tempo histórico, mas irrompe no sentir, onde tem cumplicidade com o fenômeno. Possuem em comum o fato de se produzirem, o que quer dizer: primeiro, advir, e segundo, manifestarse. A pintura de Tal-Coat é a realização de sua diferença e coexistência íntima. O milagre do "i! Y a "6 contém dois tempos, cuja diferença o trabalho de Tal-Coat aponta e percorre no instante único em que a obra nasce. O que antes de tudo quer mostrar é o momento de realidade dos fenômenos do mundo. Muitas vezes, em seu ateliê, diante de uma tela inacabada, dizia: "0 fenômeno está aí". Isso queria dizer que a tela, em estado incoativo, não se apresentava como um fundo inerte. A pintura "aí se erguia", através da "quietude de seu repouso", e, tal qual a quietude do mar, vibrava por tensões superficiais como aquelas que, antes de qualquer objetivação, traduzem o aflorar por toda parte do fenômeno mundo. O mundo não se oferece como superfície. E a profundidade das coisas, sua espacialidade íntima e aberta, que as torna coisas. O asfalto da estrada e a terra do caminho afirmam-se como reais por aquilo que Tal-Coat chamava o "inchaço" ou a "curvatura". Termos impróprios, mas significativos. Descrevem o caráter volúmico, e não volumétrico, do espaço que atravessa a si próprio segundo todas as dimensões, sem qualquer referência a uma superfície de base. O fundo de suas pinturas inacabadas, erguendo-se através de si próprio, suscitando o espaço dessa travessia, mostrava-se sob a forma da pura fenomenalidade, no elemento da luz. Nesse estágio, a pintura ainda não tinha se pronunciado. Nela, um mundo se sonhava. Ainda não tinha sido expulso do não-ser e entretanto já estava aí. Logos não proferido, o verbo estava no modo quase nominal, onde o tempo, indiferentemente criador e destruidor, vibra numa espécie de eternidade escalar. O fundo esperava existir. Mas para isso era necessário que já tivesse sido preparado pelo pintor na surpresa da ocasião, do kairós. Estava à espera do acontecimento no qual afloraria até o presente da manifestação.
What moves itself like this, being ali at once the inner story and the essence of Tal-Coat's painting?Paul Claudel, in L'oeil écoute opposes Dutch painting of the 17h century to ali the other Western paintings and affirms that it paints the phenomenon, and ali the others, the events. For him the event is an action or a fact that interferes during human activities. It can be historic, domestic, mythical, but it is always in its own sense "dramatic": (action, in particular theatrical). It is as if it were a scene centered in mano Such scenes are not absent of the Dutch painting,on the contrary. But, whether they occur in or out, it as an elemental phenomenon put in evidence by the painter who communicates to the whole the moment of reality. The elements: water, air, earth, matter and the light which links them are the main focus of his work. However, "event" still has another meaning. Here, it does not inscribe itself in the historic time but emerges in feeling where it establishes a close relationship with the phenomenon. They have in common the possiblity of producing themselves, which means: first, to become, and second, to manifest themselves. Tal-Coat's painting is the realization of his intimate difference and coexistence. The miracle of"il y a" contains two moments whose difference Tal-Coat's work indicates and runs through in a sole instant when the work is created. What he wants to show above ali is the moment of reality of the phenomenons of the world. Several times in his studio, in front of an unfinished painting, he used to say: "th e phenomenon is there ". This meant that painting in its inchoative state, did not present itself as an inert background. The painting, "raised itself there" through the "quietness of its repose", the same as the quietness of the sea, vibrated by superficial tensions, as those which before any objectiveness translate the emergence of the world phenomenon everywhere. The world does not offer itself as a surface. It is the depth of things, its intimate and open space that turn them into things. The tar of the highway and the dirt of the road become real through that which Tal-Coat denominated "bulging" or "curvature". Improper words, but meaningful. They describe volume features but not the volume of space which crosses itself in accordance to ali dimensions without any reference to a surface base. The background of his unfinished paintings, raising itself from itself, creating the space needed for this crossing, showed itself under the pare form of phenomenality in the light element. In this stage, painting had not manifested itself In it, the world dreamt itself, it had not been expelled from the non-being and, nevertheless, it was already there. Logos was not proferred, the verb was almost in the nominal case, where time, indifferently from creator and destructor, vibrated in a kind of eternal climbing. The background hoped to be. For this to happen, however, it was necessary that it had already been prepared by the painter for the surprise of the occasion, of the Kairós. It was in the expectation of the event in which it would surface up to the present of manifestation.
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Présence. 1975 óleo s/tela/ oi/ on canvas 65 x 72 cm Coleção particular
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Mas isso não é evidente. Para que o fundo se anime com essas tensões espacializantes, ainda furtivas, surgindo para o novo semblante de um campo fenomenal onde o acontecimento possa se investir, é preciso que a cor possua um poder particular. Durante toda a sua vida, Tal-Coat tentou obter uma matéria pictural capaz de suscitar "sensações coloristas" que possuíssem a mesma acuidade do acontecimento. Compôs e experimentou, tanto para a trituração de suas tintas quanto para o emprego na tela, um grande número de veículos, cujas fórmulas e propriedades registrava em cadernos. Ora, o objeto preciso de sua busca é designado por um termo cujo uso pode parecer insólito ou banal. Indicando o resultado de uma tentativa bem-sucedida, aparece regularmente a palavra presença. "Presença do ocre vermelho", "presença do negro", "presença do branco", "presença do ocre amarelo", "presença de sombra". Uma vez, ele escreve: "A presença veio quando juntei ao ocre vermelho, moído como descrito acima, um pouco de ... " Na realidade, emprega a palavra "presença" no sentido absolutamente próprio. "Presença" vem de prae-sens: que existe adiante de si. Ora, é esse justamente o segredo do poder espacializante da cor. Uma cor de Tal-Coat especialmente de seus quadros após 1970 - existe adiante de si, onde tende a encontrar consigo mais adiante. Essa tensão que abre, levando-a ao auge, movendo-se portanto nela própria, define a acuidade. Carrega assim o segredo da existência que não espera ser dita para significar, e que já abriu seu lugar de ser antes de aí inserir seus signos. Entretanto, a presença de uma cor não se reduz à acuidade resultante de sua tensão superficial e da coesão de seus pigmentos. Provém da conspiração de todas, interiormente ligada ao surgimento do acontecimento. Conspiração de opostos. Como na China, "montanha e água", paisagem poderia ser dita naquilo que a Holanda sugeriu de mais alto: "céu e terra". Numa pequena paisagem de pôlder de Jan van Goyen do Museu de Amsterdam, o horizonte é uma profundidade luminosa impenetrável, comum ao céu e à terra. A terra e o céu não começam ou terminam em lugar algum. Nada pode ser objetivado. De real - e quão real - há apenas o resvalar, como de um só bloco, de toda a extensão, onde o céu repousa sobre a terra, daí projetando-se novamente ao céu. Apenas uma troca é visível: o horizonte torna-se uma dobra do mundo, através da qual o mundo verte-se nele mesmo. As variações do céu e da terra participam de um mesmo ritmo que as integra. Tal-Coat extraiu daí a conseqüencia mais extrema: onde o espaço está implicado pelo ritmo, este não se remete senão a si próprio, sendo seu próprio sistema de referência. Experimentamos assim uma forma de espacialidade onde deixam de existir as distinções características do espaço motor: frente e trás, direita e esquerda, alto e baixo. Não se pode mais dizer, não há mais lugar que permita dizer: o céu está no alto, a terra embaixo.
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But this is not evident. For the background to become animated with these spatial tensions, still elusive, emerging to a new feature of a phenomenological fie/d, where the event may invest itself, it is necessary for color to master a special power. During ali his life, Tal-Coat tried to obtain a pictorial matter capable of creating "color sensations" which had the same accuracy of the event. He composed and experimented, either for the grinding of its paints or for its use on canvas. A great number of vehic/es whose formulas and properties were registered in notebooks. Well, the specific object of his search is designated by a term whose use may seem unusual or trivial. Indicating the result of a well succeeded attempt, the word presence is mentioned regularly. "Presence of red ochre~', "presence of black", "presence of white ", "presence of yellow ochre ", "presence of shade". Once he wrote: "presence came when I added to the red ochre, crushed as above described, a little of .. " For him the word "presence" has a special meaning. "Presence" comes from prae-sens: that which exists in front of itself Well, this is exactly the secret of the spatial power of color. A TalCoat's color - and specially in his pictures after 1970 - exists ahead of itself and tends to meet with itself further on. This tension which opens leads to the climax, moving therefore in itself, it defines accuracy. Thus it carries the secret of existence which does not wait to be said in order to have a meaning. And which has opened its place of being before inscribing there its slgns. Therefore, presence in a color does not reduce itself to the accuracy resulting from its superficial tension and the cohesion of its pigments. It derives from the conspiration of ali these factors, innerly connected to the emergence of the event. Conspiration of opposites. As in China, "mountain and water", a landscape which could be translated in that which Holland suggested as "sky and earth ". In a small polder landscape by Jan van Goyen of the museum of Amsterdam the horizon is of an impenetrable luminous depth, common to sky and earth. Sky and earth do not begin or end in any place, nothing can be objectified. Real - how real - there is only the sliding of an only layer,of ali the extension as one only wave. Onlyan exchange is visible: the horizon becomes a fold of the world through which the world spills in itself Variations of sky and earth participa te in a same rhythm which integrates them. Tal-Coat extracted from this an extreme consequence: where space is implied by rhythm, rhythm does not refer but to itself, being its own system of reference. We experiment therefore, a form of space where the differences, characteristic of inducement of space, cease to exist: front and back, right and left, top and bottom. We cannot say anymore that there is no more place which allows us to say: the sky is at the top, the earth is at the bottom.
"Não entendo o céu", escreve Tal-CoaI, "como elemento distinto; ele está em toda parte. Guando digo céu, estou sempre pensando na luz. Onde é que estaria o céu? e a terra ... ? O céu está mergulhado numa poça d'água." Pouco depois de sua morte, encontrei no chão de seu ateliê um velho convite, onde esboçara a disposição geral de um quadro. Não como uma preparação, mas como uma evocação. O espaço estava dividido em três zonas sobrepostas. E num canto da zona inferior, bem embaixo, figura esta injunção: "Aqui, céu". Num dos lados da folha há as seguintes palavras: "E da lama o céu ainda retido no sapato de seus brilhos alça vôo" (um vôo de pássaro). Olhem o céu refletido numa lagoa. Parece bem mais profundo que o fundo do alagado, e a partir desse céu o alagado mostra-se mais profundo que ele mesmo, projetando-se, ao mesmo tempo, por seu brilho, até o céu. A simultaneidade dos movimentos opostos de subida e descida, de ascensão e queda, é um dos paradoxos do sentir - do qual a arte de Tal-Coat é a verdade, "a linha galgando a queda", a árvore vertiginosamente levada pela descida, enquanto em sentido inverso sua sombra sobe. Os chineses chamam a substituição recíproca de tais opostos de mutação. Devido a uma mutação como essa entre o advir e o devir numa forma em formação, é impossível atribuir-lhe um ponto de partida num espaço de referência. Uma forma é seu próprio sistema de referência, que nunca deixa de se transformÍlr com ela; essa transformação, que acarreta uma rearticulação de sua gênese, impede qualquer localização prévia e, portanto, a fixação de qualquer ponto de partida. A mutação maior, na pintura de Tal-Coat, é a do cheio e do vazio. Os quadros do último período (após 1970) são com muita freqüência falando grosseiramente - monocromáticos. Ora, é exatamente nessa última fase, onde a cor se encontra em sua plenitude, que o vazio é mais ativo, justamente por ser menos manifesto. Esse regime espacial está ligado ao surgimento incondicionado do acontecimento. O acontecimento pelo qual e no qual o mundo se abre é o momento de realidade. Não se trata de um ou outro acontecimento. Trata-se do acontecimento no desamparo de sua nudez. Do acontecimento sem exemplo que é o advento da obra. "Enigma o que nasce de um jorro puro", diz Hõlderlin em O Reno, frase cujo eco pode ser ouvido nas palavras de Tal-Coat:
"I do not understand the sky "wrítes Tal-Coat " as a distinctive element; it is everywhere. When I mention sky I am always thinking about light. Where would the sky be? and earth? The sky is sunk in a puddle of water." Shortly after his death, I found on the floor of his studio an old invitation where he had sketched a general draft of a picture. Not as a preparation, but an evocation. The space was divided in two overlapping zones. In a comer of the lower zone, way down, there is an indication: "here, sky". In one of the sides of the sheet there are the fol/owing words: "and from the mud the sky stil/ retained by the shoe, from íts fragments ít takes off in a flight (the flight of a bird). Look at the sky reflected in a bog. It looks deeper than the bottom of the bog, and from this sky the bog appears to be deeper than it is in reality, projecting ítself, at the same time, up to the sky through its brilliance. The simultaneity of the opposed movements of ascent and descent, ascention and fal/ is one of the paradoxes of feeling - of which Tal-Coat's art is evidence, "the line c1imbing descent", the tree vertiginously led by the descent whilst in a reverse direction its shadow ascends. Chinese cal/ the reciprocal replacement of such opposites mutation. Because of a mutation between the come to be and the result in a form being formed, it is impossible to define a departure point to ít in a space of reference. A form is its own system of reference which is always transforming according to it; this transformation which entails a rearticulation of its genesis avoids any previous localization and, therefore, the fixation of any departure point. A greater mutation in Tal-Coat's painting is that of the fuI/ and the void. The paintings of the last period after 1970 are frequently - general/y speaking monochromatic. Wel/, it is exactly in this last phase when colar finds its plenitude, where void is more active special/y because ít is less manifest. This spatial condítion is connected to the inconditional emergence of the event. The emergence by which and in which the world opens itself, is the moment of reality. It is not one ar another event. It is the event in its unprotected nakedness. Df the event without example that is the event of the work. Its a puzzle which is bom from apure gush, says HOIderlin, in "The Rhine ", a sentence whose echo can be heard in Tal-Coat's words: A point emerged from the invisib/e at the moment of being caught by the world in the fever of the instant is the supreme grace" ... which bestows us the reality of being there.
"Ponto surgido do invisível no instante ser apanhado pelo mundo no calor do instante é a graça suprema" ... que nos concede o real de estar aí.
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Está aí, no acontecimento. Quando um acontecimento nos lança ou desperta para o mundo, a aparição do real tran~torna, co-loca em jogo não só o ser das coisas, mas também o nosso. E exatamente assim que existe um quadro de Tal-Coat. Fora do acontecimento não se pode dizer sobre o fundo - quer se trate do fundo de um quadro ou do fundo que nos é subjacente - nem que não é nem que não está. Ele só é no instante mesmo em que um acontecimento o faz (como fundo de si próprio): advento de nós mesmos ou advento desta obra. Não existe história que possa responder por esse instante. O momento fundador de uma obra é o momento de abertura. Quando um quadro de Tal-Coat concluía-se, era sempre no instante, menos conclusivo que inaugural, onde o pintor, a mando de uma evidência surpreendida, nele introduzia uma luz, absolutamente imprevisível. Então nascia realmente a luz. Nenhuma metáfora cósmica pode dar conta desse espaço. Ele não é a imagem de nada. Nasce de um acontecimento focal - tão intransponível quanto nossa existência. "00 abismo com efeito saímos" (Hõlderlin). Injustificável, irrevogável, no próprio quadro, a aparição de seu foco de origem requisitando o olhar, transformando a presença, eis o acontecimento. Esse foco não é a condensação do espaço-meio que, ao contrário, emana dele. Seu aparecer é absoluto, sem preâmbulo e sem ponto de apoio. Surge como que por trás. Mas não do espaço exterior. "Só me cabe a imprevisível acolhida, recurso de seu aparecer", diz Tal-Coat. Qual é esse recurso? O que se segue responde: "Ao risco da nulidade. Ao risco do Nada. Esse vazio, esse nada, irrepresentáveis. Falando como matemático, eu diria: "0 espaço de Tal-Coat é um Aberto que não tem complementar, pois seu complementar é o Vazio que se mostra nele". Mostra-se, efetiva-se, visibiliza-se exatamente no acontecimento que é o advento da obra. O Nada não é a causa do visível, nem lhe é acrescido. Éa condição da existência, do visível em virtude do qual o quadro é seu lugar de ser. Éexatamente em seu surgimento, aquém de qualquer história, que uma obra de Tal-Coat e o mundo mantêm cumplicidade. Ali, como diz Lao-tsé, onde "0 nó perfeito não precisa de corda e não pode ser desatado". Henri Maldiney Notas: 1. Perde-se na tradução o jogo de palavras cunhado pelo poeta francês Paul Claudel entre connaissante e co-naissance. Para reativá-Io, é necessário conferir o étimo. Conhecer, como também o vocábulo francês connaitre, provêm do latim cognoscere, que, por sua vez, é formado do prefixo cum, de contiguidade, e do vocábulo grego gnosis, sabedoria. Portanto, conhecer significa originalmente ser vizinho da sabedoria. Claudel visa com sua invenção enfatizar a relação de contemporaneidade entre o mundo e o ser. (N. da T.) 2. O professor Maldiney se refere à partícula dêitica "y" do "jJ y a"(= há) francês, semelhante a "there" inglês, a "cf' italiano, e a "dasein" alemão. Em português, não existe tal partícula, contudo há interpretações dos verbos haver e ter como enunciados existenciais. Maiores detalhes em "Deixis e existência: dos três níveis de existência dêitica subjacentes à diferenciação da cópula em sentenças existenciais do português", de Cláudia Lemos, in Almanaque nº 5, Brasiliense, São Paulo, 1977. 3. Rilke, R. M., Poemas, tradução de Paulo Guintela, Editorial O Oiro do Dia, Portugal, 1983. 4. "Olhar", em português. 5. Ver nota 1. 6. Ver nota 2.
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It is there, in the event. When an event launches or awakens us to the world, the emergence of reality upsets and questions not only the being of things as our own being.lt is exactly like this that a picture by Tal-Coat's exists. Apart from the event we cannot say anything about the background - whether it is the background of a picture or the background which underlies us - neither that it is not. It is in the very instant that an event exists (as a background of itself): advent of ourselves or advent of this work. There is no history which responds to this moment. The founding moment of a work is the moment of opening. When a Tal-Coat's picture was finished, it was always at the moment less conclusive than inaugural, where the painter commanded by a surprising evidence, introduced a light in the painting, absolutely unpredictable. Then light really existed. No cosmic metaphor can explain this space.lt is not an image of anything, it derives from a focal event - as unsurmountable as our existence. "From the abyss we certainly came away" (HOIderlin). Unjustifiable, irrevocable in its own picture, the appearance of its origin requiring sight, transforming its presence, this is the event. This focus is not the condensation of space-environment, which, on the contrary, emanates from it. Its appearance is absolute, straighforwardlyand without introduction and support. It appears as from behind, but not from outer space. "There is only the unpredictable encounter, source of its appearance", says Tal-Coat. What is this source? The sequence exp/ains: "risk of nullity". The risk of void. This void, this nothing cannot be expressed. Speaking as a mathematician, I would say: "Ta/-Coat's space is an Opening which has no complement, because its complement is the Void which shows in itse/f. It shows, it becomes real, visib/e exactly in the event which is the advent of the work. Void is not the cause of the visible nor it is added to it. It is the condition for the existence of the visible through which the picture is the p/ace of being. It is exact/y in its emergence beyond history that a work by Tal-Coat and the wor/d maintain cumplicity. There, according to Lao- Tse, "the perfect knot does not need a rope and it cannot be undone". Henri Maldiney
Nu, 1982 óleo s/te la/oi/ on canvas 54 x 73 cm Coleção particu lar, Paris
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En carriere I, 1984 óleo slte laloil on canvas 27 x 35 cm Co leção Jan ine Pasca l Léger, Paris
Pierre Jacob (Tal-Coat) nasceu em 1905, em Clohars-Camoet, Finistere. Aprendeu o ofício de ferreiro e, em 1923 com uma bolsa, estudou na École Primaire Supérieure de Ouimperle. Começou então a desenhar e fazer esculturas. Em 1924 foi modelador e pintor na Faiencerie de Ouimperle. Mudou-se para Paris em 1925 e associou-se ao pintor Sautter; realizou sua primeira exposição individual na Galerie Fabre, a convite de seus difetores; adotou o pseudônimo de TalCoat (front du bois, em bretão ). Retornou à Bretanha em 1929 e . viajou com H. Bénézit, Paul Poiret e Émile Compard. Em 1930 instalou-se em Paris, associouse a Francis Gruber, Francis Tailleux e Andre Marchand. Em
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1935 encontrou Hemingway, Gertrude Stein, Francis Picabia, Giacometti, Balthus, Artaud, Tzara. Expôs com o grupo Forces Nouvelles; recebeu o prêmio Paul Guillame pelo Portrait de Gertrude Stein. A Guerra Civil Espanhola (19361937) inspirou a série Massacre. Em 1946 executou a série Oes poissons et des aquarium e a série Oes coqs; em 1950, a série Rochers, faillets et lignes; em 1952-1953 a série Oes passages et des signes. Em 1955 estudou apaixonadamente a arte préhistórica, que o levou mais tarde a visitar Lascaux e Eysie. Em 1963 executou um mosaico para o muro de entrada da Fundação Maeght, Saint-Paul-de~Vence. Em 1968 recebeu o Grand Prix National des Arts.
Em 1971 trabalhou no ateliê de gravuras de Pietro Sarto em Saint-Prex. Fez cenografia para o Ballet Theatre - Kill what I love - com coreografia de John Butler e música de Igor Stravinsky, em 1975. Em 1976 rea~izou importante retrospectiva na Galerie Nationale du Grand Palais. Foi promovido a Commandeur de la Légion d'Honneur. Faleceu em 11 de junho de 1985 em SaintPierre-de-Bailleul. Pierre Jacob (Tal-Coat) was bom in 1905, in Clohars-Camoet, Fin is tere. He has leamt how to be a blacksmith and in 1923 was granted a scholarship to study at the École Primaire Supérieure de Ouimperle, where he started to produce drawings and sculptures. In 1924, he worked as a sculptor and a
Traversée, 1984 óleo s/tela/oil on canvas 38 x 55 cm Coleção Janine Pascal Léger, Paris
painter at the Faiencerie de Ouimperle. In 1925, he went to Paris and started working with Sautter; the directors of the Galerie Fabre invited him to perform a solo exhibition; he assumed the alias Tal-Coat (it means "front du bois", in breton ). In 1929, he went back to Brittany where he traveled around with H. Bénézit, Paul Poiret and Émile Compard. In 1930, he moved to Paris and started working with Francis Gruber, Francis Tailleux and Andre Marchand. In 1935, he met Hemingway, Gertrude Stein, Francis Picabia, Giacomett/~ Balthus, Artaud and Tzara. He participated in an exhibition with the group Forces Nouvelles; he was granted the prize Paul Guillaume by Portrait de Gertrude Stein. The Spanish Civil War (1936-1937) inspired the production of the series Massacre.
In 1946, he produced the series Des poissons et des aquarium, and Des coqs,' in 1950, the series Rochers, faillets et lignes,' in 1952-1953, the series Des passages et des signes. In 1955, he studied pre-historical art keenly and some time later went to Lascaux and Eysie. In 1963, he produced a mosaic for the front wall of the Fondation Maeght, Saint-Paul-de- Vence. In 1968, he was awarded the Grand Prix National des Arts. In 1971, he worked at the studio of Pietro Sarto in Saint-Prex. He also engraving for the Ballet Theatre - Kill what Ilove choreography by John Butler and sound track by Igor Stravinsky, in 1975. In 1976 he f)erformed a retrospective exhibition at the Galerie Nationale du Grand Palais. He was promoted Commandeur de la Légion
d' Honneur. Pierre Tal-Coat died in June 11th, 1985, in Saint-Pierre de Bailleul. Exposições individuais/Solo exhibitions 1927 Pierre Tal-Coat, Galerie Fabre et Cie., Paris. 1929 Galerie Fábre, Paris. 1930 Galerie Fabre, Paris. 1936 Galerie Renou et Colle, Paris; Galerie Julien Levy, Nova Vork. 1937 Galerie Renou et Colle, Paris. 1943 Tal-Coat Peintures (19411942), Galerie de France, Paris. 1945 Tal-Coat Peintures, Galerie de France, Paris. 1948 Tal-Coat, Galerie de France, Paris. 1949 Tál-Coat Peintures 19271939, Galerie de France, Paris.
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Surgissant, 1978 óleo s/te la/oi/ on canvas 123 x 93 em Coleção Françoise Simeeek, Suíça
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Surgissant, 1981 óleo s/tela/oi/ on canvas 70 x 55 em Coleção Françoise Simeeek, Suíça
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1950 Tal-Coat Peintures Récentes, Galerie de France , Paris. 1954 Tal-Coat Peintures 19521954, Galerie Maeght, Paris. 1956 Tal-Coat Peintures 19551956, Galerie Maeght, Paris. 1959 Tal-Coat, GalerieMaeght, Paris. 1960 Tal-Coat, Dessins d'Aix 1947-1950, Galerie Maeght, Paris. 1961 Carnegie Institute, Pittsburgh, EUA. 1962 Tal-Coat Peintures Récentes, Galerie Maeght, Paris. 1963 Galerie Claude Bernard, Paris. 1964 Carnegie Institute, Pittsburg. 1964-1965 Pierre Tal;.Coat Dessins, Galerie Beno d'lncelli, Paris. 1965 Tal-Coat Peintures, Galerie Maeght, Paris. 1968 Exposition Rétrospective: Galerie Seno d'lncelli, Galerie Henri Bénézit, Galerie André Schoeller, Paris. 1969 Tal-Coat, 30 Ans de Dessins, Palais de I'Europe, Menton; Maison de la Culture et Nouveau Musée, Le Havre; Maison de la Culture, Amiens, França. 1970 Tal-Coat, Oeuvres Récentes, Galerie Daniel Benador, Genebra. 1971 Almanach de Tal-Coat, Galerie Daniel Benador, Genebra. 1972 Tal-Coat, Peintures Récentes 1971-1972, Galerie Maeght, Paris; Dessins, Galerie Jacques Benador, Genebra.
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1973 Dessins et Gravures, Galerie I'Entracte, Lausanne. 1974 Tal-CoaI, Peintures 19261974, Musée de Metz, Metz; Galerie Maeght, Zurique. 1975 Ueno Royal Museum, Tóquio; Tal-CoaI, Peintures 1926-1974, Open-Air Museum, Hakone; Tal-CoaI, Dessins d'Aix 1940-1947, Galerie Jacques Benador, Genebra. 1976 Tal-Coat, retrospectiva organizada pelolretrospective organized by Musée National d'Art Moderne, Grand Palais, Paris; Galerie Eveil, Marlenheim (Bas-Rhin); Tal-Coat, Peintures, Galerie de France et du Bénélux, Bruxelas. 1978 Galerie I'Entracte, Lausanne; Galerie Biren, Paris. 1979 Galerie Kersten Greve, Colônia; Galerie Daniel Benador, Genebra; Galerie Jacques Benador, Genebra; Bibliotheque de la Ville, Lyon. 1981 Hommage à Tal-Coat, Centre d'Art Contemporain, Jouys-sur-Eure; Galerie Clivages, Galerie HM, Paris. 1982 Galerie Clivages, Paris; Galerie I'Entracte, Lausanne; Hommage à Tal-Coat, Peintures du Mantois, Mantes-Ia-Jolie; Galerie HM, Paris. 1983 Tal-Coat Parcours 19451963, Musée d'Évreux, Évreux; Tal-Coat, Peintures, Galerie Patrice Trigano; Galerie HM; Galerie Clivages; Galerie Trigano, Paris. 1984 Galerie Clivages, Paris; Centre Noroit, Arras; Galerie Sapone, Nice; Galerie Jacques Benador, Genebra. 1985 New Museum of
Contemporary Art, Nova Vork; Hommage à Tal-Coat, Musée des Beaux-Arts, Quimper; Atelier de Saint-Prex et Françoise Simecek, Musée d'Art et Histoire, Cabinet des Estampes; Hommage à Pierre Tal-Coat 1905-1985, Galerie Jacques Benador, Genebra; Galerie Clivages, Paris. 1986 Gallery Art Point, Tóquio; Galerie Clivages, Paris; Galerie I'Entracte, Lausanne; VI Salon d'Art Contemporain, Bourg-enBresse. 1987 Maison de la Culture, Bourges; Musée École des .Beaux-Arts et Médiatheque Municipale, Valence; Galerie Andrien Maeght; Galerie Clivages, Paris; Galerie Oniris, Rennes. 1988 Centre National des Lettres, Paris; Bibliotheque Municipale et Musée Municipal, Rennes; Galerie Fanny Guillon-Lafaille; Galerie Clivages, Paris; Musée des Beaux-Arts, Rennes; Maeght Éditeur, Paris. 1989 Galerie Fanny GuillonLafaille; Galerie Clivages, Paris. 1990 Galerie Jacques Benador, Genebra; Galerie Morave, Brno, Tchecoslováquia; Bibliotheque Française, Praga; Galerie de Boheme Orientale, Paroubice; Galerie Lafaille; Saga 90, Paris; Galerie Sapone, Nice. Exposições coletivas/Group exhibitions 1933 Galerie Billiet-Pierre Vorms, Paris. 1935 Forces Nouvelles (com Humblot, Jannot, Lasne, Pellan
e Rohner), Galerie Billiet-Pierre Worms, Paris. 1936 Nouvelle Génération (com Despierre, Fougeron, Gruber~ Heraut, Humblot, Jannot, Venard), Galerie Charpentier, Paris. 1938 (com Despierre, Gruber, Lasne, Marchand, Pignon, Tailleux), Galerie Jean Dufresne, Paris. 1938-1939 Galerie Pittoresque, Paris. 1941 Galerie Braun, Paris. 1944 Galerie de France, Paris. 1945 Salon de Mai, Paris. 1946 Galerie de France, Paris. 1949 La Jeune Peinture Française (com Borés, Pignon et Tailleux), The Leicester Galleries, Londres; Galerie de Beaune, Paris. 1951 Kunsthalle, Berna; Galerie Charpentier, Paris; Kunsthaus, Zurique. 1952 The Cincinatti Modern Art Society, Cincinnatti. 1953 Galerie I'Étoile Scellée, Paris. 1955 Documenta I, Maison de France, Kassel. 1956 Bienal de Veneza, Veneza. 1957 Kunsthalle, Berna. 1959 Documenta 11, Kassel; Musée Stocolmo, Viena; Innsbruck, Unz, Graz; Corcoran Gallery, Washington. 1960 Musée des Arts Décoratifs, Paris. 1961 Amien-Eidhoven, Moscou, Vancouver. 1962 Tate Gallery; Londres. 1963 Bienal, Menton. 1965 Museo Civico, Bolonha. 1968 National Gallery, Washington; Metropolitan
Museum of Art, Nova Vork; Museum of Fine Arts, Boston; Voung Memorial Museum, San Francisco; Art Institute, Chicago. 1970 Baukunst, Colônia. 1971 Fondation Mercedez-Benz, Paris. 1973 Musée Rath et Cabinet des Estampes, Genebra. 1976 Ancienne Gare de la Bastille, Paris. 1978 Forum des Halles, Paris. 1978 Galerie Ariel, Clivages, Paris. 1979 L'Art Vivant à Paris, Maitredu XVIII; Le Uvre-Objet, Le Uvre-lIIustré, Centre Georges Pompidou, Paris. 1980 Forces Nouvelles 1935-1939 (com Héraut, Homblot, Jannor, Lasne, Pellan, Rohner), Musée de I'Art Moderne de la Ville de Paris; Galerie Benador, Paris. 1981 Rivages des Origenes, Archives des Cahiers du Sud, Marselha; Paris-Paris 1937-1957, Centre Georges Pompidou; FIAC 81, Galerie Clivages, Paris. 1982 Fondation Maeght, SaintPaul-de-Vence; Grand Palais; FIAC 82, Galerie Clivages, Paris; Château de Ratilly, Treigny; Fondation Nationale des Arts Graphiques et Plastiques, Paris. 1983 FIAC 83, Galerie Clivages, Paris; Centre Culturel, Boulogne-Billancourt; Thérése d'Avila et I'Art Contemporain, Palais du Luxembourg, Paris; Château de Ratilly, Treigny; Galerie Michel Cachoux, Paris. 1984 Collection FRAC Bretagne au Musée de Brest; CNAC, Paris; FIAC 84, Galerie Clivages, Paris; Galerie du Luxembourg, Luxemburgo.
1984 Centre d'Art Contemporain, Jouy-sur-Eure; Galerie du Puits, Ulle; Galerie la Pochade, Paris. 1985 Galerie Clivages, Paris; ARCO 85, Madri; FIA C85, Galerie Clivages, Paris; Centre d'Art Contemporain, Jouy-sur-Eure. 1986 Hôtel de Ville, Lorient; Galerie Clivages, Paris; Galerie Clivages, Paris; Fête de I'Humanité, La Courneuve; Galerie Clivages, Valence; VII Salon de Peinture de Bretagne, Carantec; Centre Gérard Philippe, Brétigny-sur-Orge. 1987 (com Cordesse, Marfaing, Ouzani), Galerie Clivages, Paris; SAGA 87, Galerie Clivages, Paris; Galerie Sapone, Nice; Hôtel du Département, Créteil; Galerie Municipale et Hôtel de Ville Val-de-Marne, Vitry-surSeine. 1988 Foyer de I'Opera, Ulle; Vieille Eglise Saint-Vincent, Bordeaux-Merignac; Auditorium Maurice Ravel, Lyon; Chapelle Saint-Louis, Rouen; Hôtel Dieu Saint-Jacques; Musée Hébert, Marselha. 1988 Palais de la Bourse, Nantes; Casino Municipal, Royat; Maitre, Nancy. 1989 Centre d'Animation Culterelle de Compiegne et du Valois; Galerie Fontainas, Bruxelas; Arthotheque, Toulouse; Espace 3, Baraguon; Villeneuve Le Tolosane; Galerie Clivages, Paris; Atelier Cantoise, Joigny; Schurmkunsthalle, Frankfurt; FIAC 1989, Galerie Jacques Benador, Galerie Clivages, Paris. 1990 Autour de la Galerie
Clivages, Galerie Clivages, Paris. Obra ilustrada por/Work illustrated byTal-Coat 1946 De Balzac (Honoré), Genebra. Obras apresentadas/Works in the exhibition Incise, 1966 óleo s/tela/oil on canvas 130 x 162 em Coleção Pierrette Demmolon Grand trace noir, 1966 óleo s/tela/oil on canvas 130 x 162 em Coleção Pierrette Demmolon Amas Coquilles, 1970 óleo s/tela/oil on canvas 130,5 x 130,5 em Coleção Pierrette Demmolon Cendres, 1968 óleo s/tela/oil on canvas 130 x 130 em Coleção Pierrette Demmolon S/título/untitled,1968-70 óleo s/tela/oil on canvas 114 x 146,3 em Coleção Pierrette Demmolon Présence, 1975 óleo s/tela/oil on canvas 65x 92 em Coleção Pierrette Demmolon Qui leve, 1974 óleo s/tela/oil on canvas 300 x 200 em Coleção G. A. Maeght Sleu surgi, 1974 óleo s/tela/oil on canvas 200 x 300 em Coleção Marc Larock
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Ainsi qu'une nuit claire, 1972 óleo s/tela/oil on canvas 73 x 91,5 cm Coleção particular
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CU~DO~ JO~Gt CA~llllO
CU~AíO~JO~Gf CASílUO
VANGUARDA E CLASSICISMO
AVANT-GARDE AND CLASSICISM
As retrospectivas da obra de Joaquín Torres-García realizadas nos últimos anos em museus europeus e americanos marcam o retorno de sua presença e fazem parte do reencontro com mestres que, como ele, foram figuras primordiais, mas que ao se retirar dos centros europeus permaneceram numa "periferia" cultural, e sua presença foi menosprezada na história oficial das artes do século XX. Na América do Sul, porém, seu prestígio teve contínua ascensão, a despeito de opiniões como a de Michel Seuphor no Oiccionario de la pintura abstracta. Decantadas as polêmicas, faz-se decisiva sua importância nos momentos primordiais. A obra de Torres-García é regida por um conceito fundamental, a estrutura, e deste centro ramificam-se- e reunificam-se inúmeros aspectos de suas idéias. Falando da estrutura na pintura, ele afirma: "Tomemos tons puros (tenhamos esse valor); estabeleçamos planos de cor, medidas, façamos uma estrutura e teremos feito uma pintura atual" (Universalismo constructivo). E, analisando o jazz, continua: "... há construção e som concreto antes do conceito musical". Dirigindo-se a escritores, aconselha: "... afunde-se na palavra, busque o ritmo, conte, meça ... Porque uma arte própria deve basearse em uma estrutura própria". Para Torres, é na estrutura que se enraíza a criação, e esta idéia está na base do universalismo construtivo, seu grande aporte teóricoplástico que veremos adiante. A constante busca da trama que une no criador intuição e razão, "ordem vital e ordem racional", classicismo e modernidade, levou Torres a uma elaboração teórica das mais originais jamais realizadas na primeira metade deste século. Sua concepção estético-humanista a'pàrece em escritos hoje fundamentais para a compreensão, não apenas para"nos aproximarmos de sua obra como também do processo das vanguardas.
The retrospectives that have been held in American and European museums focusing the work of Joaquín Torres-García over the /ast years stress the importance of his contribution. This resumption happened in the wake of a reappraisement of the work of major masters who, like Torres-García, were - key figures that had their work underestimated in the official history of art of the 20th century and were confined to a cultural "peripheryfl after having left the European centers. On the other hand, in Latin America, his authority increased steadi/y despite opinions such as that of Michel Seuphor in the Oiccionario de la pintura abstracta. Regardless of ali the controversy upon him, during important moments in the history of contemporary art in that continent his standing was decisive. The artwork of Torres-García is based on a fundamental concept: structure. It is the source of a number of aspects present in his ideas. Once, ta/king about structure in painting he stated: "Iet us use pure colors (we have to maintain this va/ue) and create a structure by establishing planes for colors and measures, and we will have a painting that follows today's standards. (in Universalismo constructivo). Analysing jazz, he said: "... we can find fl construction and real sound rather than musical concept . When he talked to writers, his message was: "base your work on the word, look for the rhythm, count, measure ... an autonomous art has to be founded on an independent structure. fi
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For Torres it is in structure that creativity is found and this is the idea which is at the base ofUniversalismo constructivo, his major theoretical contribution to fine arts, as we will see further on. The constant search of the creator for the thread which unites (intuition and thought), "the vital and the rational order", c/assicism and modernity, led Torres-García to produce a theoretical approach that we can place among the most original ones that have surfaced in the first half of this century. His aesthetical andhumanistic concepts are conveyed in texts which today not only enlighten his work, but are fundamental to our understanting of the avant-garde movement.
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A austeridade de suas idéias é acompanhada de uma sensualidade plástica que o leva a preferir os materiais com história: velhas madeiras com cicatrizes e pregos foram a base de muitas obras, e essas dois histórias, a da base material e a da pintura, integram-se num resultado mais rico, que ele prefere à tela branca. O mesmo ocorre com muitos de seus suportes em cartão, que deixam entrever as nervuras de quadros anteriores. Outra forma do amor pelos materiais está presente na sensibilidade lúdica com que se acerca do mundo infantil através de seus -brinquedos, com uma artesania um tanto humilde, reminiscente da carpintaria de sua infância, que resiste à polida perfeição das máquinas. O homo faberé parte decisiva de sua personalidade. Daí também o gosto pelos papéis rústicos, nos quais apresentou, entre outros, textos como Raison et nature ou Historia de mi vida; e o grafismo de seus livros manuscritos,. que faz parte do mundo humanizado, personalizado, num diálogo sobre o maquinal. A sutileza de seu processo de comunicação leva-o a elaborar numerosos textos ideográficos, nos quais associam-se o explícito e o inominável, distante da intenção do ilustrador. Seu desenho é um mundo paralelo, onde a linha sensível e a estrutura dizem o que a palavra não consegue expressar. Os símbolos de suas obras construtivas são formas arquetípicas de uma linguagem universal, mensagem mil vezes reiniciada do reencontro do homem com sua tradição. Assim, em Larecuperación dei objeto (1948), ele afirma que a arte "já não seria somente uma realização, senão um simulacro de algo invisível que se supõe existir por trás da imagem. Mas, por outro lado, algo bem concreto: uma escritura ... as imagens esquemáticas do plano cósmico; isto é, do que ele é na verdade: um microcosmo. Isto é a essência da arte construtiva". Como salientou André Malraux, Torres-García estabelece a primeira ponte entre as artes da América pré-colombiana e a arte universal. Já em Paris, comove-o a primeira grande exposição de arte précolombiana, realizada no Museu de Artes Decorativas. Em 1933, através do Museu Arqueológico de Madri, reencontra obras que lhe inspiram uma série de quadros com essa temática. Talvez seja então que se plantam as bases de uma nova mentalidade: para o novo mundo, uma arte nova. Como dirá em seguida, em Nueva escuela de arte dei Uruguay, 1946: "... uma arte mais concreta. Entrar na GEOMETRIA e no RITMO ... varrer o subjetivo ... Construir objetivamente ... cor pura ... EQUILíBRIO ... excluída a terceira dimensão ... todo plano de cor e toda forma ... isto é: tudo será CONCRETO ... VARRIDO do APARENTE para que tudo se represente a si mesmo. Um NOVO REALISMO. E de acordo com a época presente. Isto ,é o que seria proposto como progral1)a máximo, já que a AMERICA deveria produzir uma ARTE INEDITA". Pessoalmente, todo artista americano - e isso ele sente profundamente - deveria lutar a grande batalha que se desenrola continuamente entre o Homem Universal e o homem-indivíduo. Sem plágio indigenista nem folclore, nem cópia de modelos europeus. Uma arte nova num continente novo. Sua aspiração é que a arte construtiva seja "uma contribuição à unificação da arte e da cultura americanas", como define o universalismo construtivo. Quer uma arte de todos, quase anônima, como anônimos foram os ceramistas e os tecelões pré-colombianos, ou os construtores das catedrai~ medievais. 420
The austerity of his ideas is followed by a pictorial sensuality which made him prefer materiaIs loaded with history .Old wood full of scars and spikes were the basis of many of his artworks. This double history - that of the material and that of the painting - integrate in a rich proposal, which he prefers to the white canvas. The same happened with many cardboards that disclose traces of former pictures. A different approach to his love for the materiaIs surfaces in the playful sensibility present in his toys - executed with a humble craft that reminds us of the carpentry of his infancy which resists the polished perfection brought about by machines - which take him close to the world of children. The homo faber is a decisive aspect of his personality. Like in the rough papers on which he presented texts like Raison et nature and Historia de mi vida, the graphic element of his handwritten books are part of the human, personalized world in a much valued dialogue that avoids machines. The subtlety of his communication procedures lead him to write many ideographic texts in which the graphic element of his writing is linked to the drawings in a continuum in which what is explicit adheres to what is nearly impossible to express, a result which is far from the purposes of somebody who does illustrations. His drawings live in a parallel sphere where both the sensible line and structure say what the word cannot expresso The symbols of his constructive works are archetypes ora universallanguage, messages which were undertaken a thousand times since man resumed the dialogue with his traditions. Thus, in La recuperación dei objeto he states that art "is not only an achievement but rather a simulacrum of something invisible which we suppose to be behind the image. On the other hand, something concrete: writing ... the schematic images of the cosmic plane; that is to say: a microcosmos. This is Constructive Art in its core. " (La recuperación deI objeto, 1948, p. 88 and 89.) According to André Malraux, Torres-García bridges the first existing gap between pre-Colombian and universal art. When living in Paris, Torres-García was touched by.the first large exhibition of pre-Colombian art held in the Museo de Artes Decorativos. In 1933 he reencounters in the Museo Arqueológico in Madrid works which will inspire a series of paintings focusing this theme. Maybe that was the moment when the basis for a newapproach emerged: the need of a new art for the New World. As García stated in Nueva escuela de arte dei Uruguay, 1946: "an art more concrete. To enter GEOMETRY and RHYTHM... break away from subjectiveness... to construct objectively. .. Pure color. .. BALANCE. .. exclude the third dimension ... ali planes of color and ali form ... that is to say: ali will be CONCRETE... ali that is APPARENT will be BANISHED so that everything is represented by its own selt A NEW REALlSM. And, in accordance with present times. This is what we propose as the ultima te programo AMERlCA must have an UNPRECEDENTED ART" Ali American artists - and this was a deep belief that Torres-García had have to struggle in the battle held between Universal Man and the individual man without resorting to Indian traditions, folklore, or copies of European models. This has to be a new art for a new continent. His wish was that Constructive Art would contribute to : "the unification of art and culture in America", as he states in the tit/e ofUniversalismo constructivo. He wished for a widespread art, made by ali and nearly anonymous as were the preColombian ceramists and weavers and the builders of the medieval cathedrals.
Composición constructiva, 1932 óleo s/te la/oi/ on canvas 73 x 60 cm Coleção particular
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Quartier de port, 1928 óleo s/cartã%il on cardboard 50 x 74,5 cm Coleção particular
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Constructivo con cal/e y gran pel, 1946 óleo s/cartã%i! on cardboard 53 x 79 cm Coleção Eduardo F. Costantini, Buenos Aires
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Esta tarefa não é pontual e não termina com a ausência do mestre e seu ateliê. Sua proposta é aberta, certa, real, americana e universal. E ademais teve êxito histórico: uma escola e uma maneira de ver original, que terá sem dúvida desdobramentos.
This is not a task to be met in the short run. It does not desappear with the abscence of the mas ter. His was an open proposal, right, real, American and universal, which met with a historie success: a school and an original approach, which, no doubt, will pave the way for new evolutions.
Ao abordar a complexa personalidade de Torres, impõe-se um duplo percurso: o de sua vida e o de sua obra.
In arder to understand Torres complex personality we have to undertake a double approach: his life and his work.
Torres-García, nascido em Montevidéu em 1874, chega aos dezessete anos a Barcelona, onde recebe formação em moldes clássicos. Na biblioteca do Circol Artistic Sant Lluch, familiariza-se com a literatura clássica e especialmente com a filosofia espiritualista de raízes neoplatônicas, a base conceitual que presidirá toda a sua obra. Desde então, sua criação, carregada de idéias novas e ousadas, tenderá a um constante confronto com o clássico, o "eterno", como ele prefere dizer. A dicotomia clássico-moderno lhe dá uma original e renovadora presença do passado. Gaudí, en 1903, convida-o a colaborar na realização dos vitrais da Catedral de Palma de Maiorca. Eugenio O' Ors o vê como exemplo do movimento "noucentista" catalão. Cultiva uma arte mediterrânea de grandes composições alegóricas, inspirada no mundo greco-latino. Esta é uma obra extensa, na qual os murais da Generalitat de Barcelona (1912-17) são a criação mais destacada. Em 1913, funda em Tarrasa a Escuela de Decoración, com a proposta de integrar artes e ofícios a serviço da arquitetura. Esta relação da arte com a arquitetura, assim como o trabalho em equipe - o ateliê -, são outra constante ao longo de sua vida. Em 1916, publica Descubrimiento de si mismo e Un ensayo de elasieismo, com o subtítulo "La orientación conveniente ai arte de los países dei mediodía". Expõe regularmente na Galeria Dalmau, que reúne as vanguardas catalã e internacional, e com a qual colaborará permanentemente, mesmo em Paris. Já nesta época aparecem preocupações com a estrutura, e há exemplos de organização em ortogonais e o uso da seção áurea. Em 1917-18, a paisagem neoclássica e atemporal mobiliza-se em direção à vida moderna, à cidade e sua dinâmica. Uma forma de futurismo que parte de visões das ruas, portos e estações ferroviárias. É então que nasce a amizade de Torres com Barradas, pintor uruguaio também radicado na Espanha, que nessa época realiza sua obra futurista, que chama de "vibracionismo". Numa carta de Bilbao, Torres diz a Barradas: ..... a ria entra por quase toda a cidade e traz barcos e vapores de todo tipo. De maneira que tudo se junta (como em nossos quadros): barcos, casas, ferrovia, bondes, carros, guindastes, fábricas ... é o que de mais nosso se pode encontrar". Esta visão dinâmica terá projeção em sua obra de Nova Vork dos anos 1920-21, quando realiza formidáveis registros da cidade. Em março de 1918, aparece na revista Are Voltaie, dirigida pelo poeta Salvat-Papasseit, o manifesto de Torres-García .. Art-evolució". No mesmo ano, integra o Grupo Courbet com Joan Miró, Francisco Domingo e Llorens-Artigas. No ano seguinte, publica fi arte en relaeión ai hombre eterno y ai hombre que pasa e La regeneraeión de simismo. Em 1920, viaja a Paris. Encontra-se com Miró, Arp e Picasso. Em julho, parte para Nova Vork, onde permanece por dois anos difíceis. Freqüenta artistas como o futurista americano Joseph Stella, com quem manterá uma longa amizade, Marcel Duchamp, o músico Edgar Varese, John Xceron. Continua projetando brinquedos, tarefa que já
Torres-García was bom in Montevideo, 1874, and when he has 17 years old, he moved to Barcelona where he received a classical education. He became familiar with classicalliterature - especially with spiritualistic Neoplatonic philosophy at the Circol Artistic Sant Lluch - that became the conceptual basis upon which he will assemble his work. Since then -Ioaded with new and daring ideas - he started his constant confrontation with the classic world, the "eterna/" as he prefered to call it. The classic-modern concepts paired up lead him to an original and innovative approach to the past. In 1903 Gaudí invites him to collaborate in the execution of the stain-glass windows of the cathedral at Palma de Mallorca. Eugenio D' Ors sees in him the true example of the Catalan movement. He develops a Mediterranean art of large allegorical compositions based on the Greek and Roman world. This is the onset of a period which has its apex in the muraIs of the Generalitat of Barcelona (1912-1917). In 1913 he founds in Terrasa the Eseuela de Deeoraeión which proposes the integration of art and architecture. This relationship between art and architecture along with the preference for working in groups was a constant value throughout his life. In 1916 he published Deseubrimiento de si mismo and Un ensayo de elasieismo with the subtitle "La orientación conveniente aI arte de los países deI mediodía". He exhibits regularly at the Galeria Dalmau which is the core of the avantgarde movement for international and Catalan artists. Torres worked ali his life with Galeria Dalmau even while he lived in Paris. His concerns with structure have been present in his work since this period and we can find examples of orthogonal organization and the use of the golden section. Between 1917 and 1918 his neo-classic and timeless landscape started to encompass contemporary living expressions, with references to urban settings and its dynamics. It is a kind of Futurism which starts with street, harbor and railways stations. This period marked the beginning of Torres close friendship with Barradas, the Uruguayan painter who also lived in Spain. At that time, Barradas was carrying out his futurist work which he calledVibraeionismo. In a letter to Barradas sent from Bilbao Torres-García wrote: "the river flows through the village bringing ships and boats of ali kinds. Thus, everything blends together (as in our paintings), boats, houses, railway, roads, cranes, plants... " This dynamic approach will be present in the work he executed in New York during the years 1920-1921, period in which he depicted urban scenery. In March, 1918 the manifesto written by him entitled "Art-evolució" was published by the magazine Are Voltaie published by the poet SalvatPapasseit. Later that year he joined the Courbet group, which included Joan Miró, Francisco Domingo, Llorens-Artigas. In 1919 he published EI arte en re!aeión ai hombre eterno y ai hombre que pasa and La regeneraeión de si mlsmo. In 1920 he visited Paris, where he met Miró, Arp and Picasso. In July he moved to New York where he went through two difficult years. He established a close friendship with Joseph Stella and contacted MareeI Duchamp, the musician Edgar Varese and Xceron. He continued designing toys, a task he had started in Barcelona. He tried to manufacture them in
havia começado em Barcelona.. Tenta a fabricação em série desses brinquedos, sem sucesso. Expõe com Stuart Davis e S. Szukaski no Whitney Studio Club. De volta à Europa em 1922, vive em Fiesole, Pisa, Florença, Livorno.e no final de 1924 instala-se em Villefranche-sur-Mer. Tenta novamente montar uma fábrica de brinquedos, que fracassa. Em 1926, estabelece-se numa Paris agitada por movimentos intelectuais e manifestos. Éo ambiente de que precisa para desenvolver toda a diversidade criadora de que é capaz. Pinta, escreve, conhece artistas, reúne-se a eles e os reúne. Interessam-lhe, além da arte pré-colombiana, as artes primitivas e a escultura africana. Em 1927, começa a deixar para trás o classicismo mediterrâneo que havia reaparecido em sua primeira exposição em Paris. Diante das obras anônimas africanas, reafirma o valor intuitivo dessas criações, como diz Macke: ".. .formas palpáveis de uma idéia incompreensível, personificação de um conceito abstrato" (Las máscaras, 1912). A força da escultura africana, carregada de dinamismo, também havia impressionado Braque e Picasso. Em Torres, essa busca instintiva do mágico, como acesso a um centro espiritual que tenta através do inconsciente chegar à consciência, marca essa etapa e a futura obra americana. Pachamama e La idea, de 1944, são esculturas em madeira com reminiscências africanas que reverenciam a cultura pré-colombiana. A partir de 1924, realiza e experimenta construções com madeiras sobrepostas, buscando ritmos com planos de cor, e em alguns casos introduz signos. Sua escultura muito particular não aspira nem ao grande formato nem ao desenvolvimento volumétrico. Mas essa obra escultórica, sendo tão modesta, inclusive pela rusticidade voluntária dos materiais e por sua montagem, constitui uma de suas mais sensíveis e originais criações, às quais retorna em diversos momentos de sua obra. Sua pintura no período 1927-29 torna-se intensamente fauvista e expressionista. Está num momento de transição "entre a natureza e a abstração". Mais tarde, Torres dirá dessa época que seu conflito entre as coisas concretas e as formas abstratas se resolverá um ano mais tarde, quando, "obedecendo inconscientemente a uma visão interna, pus nessa primeira obra e em seus nichos uma casa (como as desenhadas pelas crianças), um barco, uma âncora, a letra B, um homem, um peixe ... " (Historia de mi vida). Havia encontrado uma forma que era como a representação do mundo. Aquele achado original o levará ao desenvolvimento de sua teoria construtiva. Sua grande preocupação é "construir", isto é, medir e geometrizar planos e volumes.'
Encontra-se regularmente com Michel Seuphor, Mondrian, Kandinsky, Theo van Doesburg, Vantongerloo. As idéias do surrealismo, do cubismo e do neoplasticismo são o centro de muitas discussões. A experiência radical que lhe traz a relação com Mondrian e Van Doesburg reafirma sua confiança no triunfo final da luta por uma nova visão da arte. Embora o idealismo e a idéia de ordem os aproximem, a obra de Torres, mais sensorial, mais próxima da "pintura-pintura", afasta-se do ascetismo extremo do neoplasticismo. Diz sobre Mondrian: "... duas linhas, a vertical e a horizontal, cruzando-se. Mas o que ele fez com essas duas linhas!" (Universalismo constructivo). Em 11 de abril de 1930, realiza-se na Galeria Zak a primeira exposição do grupo latino-americano de Paris, integrado por C. A. Castellanos, P. Figari, Forner, Lazo, Merida, Monteiro, Orozco, Pissarro, Redón, Diego Rivera, Cueto ... e o próprio Torres-García.
series but was not successful at this. He participated in exhibitions with Stuart Davis and S. Szukaski at the Whitney Studio Club. He went back to Europe in 1922 and lived in Fiesole, Pisa, Florence, Livomo and eventual/y moved to Vil/efranche-sur-Mer in 1924. There he again tried to carry out a company to build toys but went bankrupt. In 1926 he moved to Paris, city that was constantly agitated by Manifestos and new intelectual propositions. This was the environment he needed in order to unfold a frantic creative activity. He painted, wrote, met important intelectuais, and organized meetings. His interests were directed towards - besides pre-Colombian art - primitive art and African sculpture. In 1927 he started breaking away from the Mediterranean classicism which had emerged again in his first exhibition in Paris. When referring to anonymous African works he reaffirmed the intuitive contribution of this art. According to Macke: "theyare the material forms of an uncomprehensible idea, the embodiment of an abstract concept" (las máscaras, 1912). The power of African sculpture, loaded with animism, had also impressed Braque and Picasso. In Torres this instinctive pursuit of the magical sphere paves the way to a spiritual realm which tries - through the unconscious - to reach the conscience and generates the work he carried out in America. Pachamama and La idea, created in 1944, are wooden sculptures which remind one of African art and pay respect to pre-Colombian culture. Since 1924 he carried out his experiments in overlapping assemblies using color planes in search for rhythm. In some of them, he introduced signs. His sculpture is a very individual work which neither sought for huge formats nor the development of volume. Although modest, this sculptures - due to their delibera te rough aspect and the materiais used - are among the most original and innovative of his artworks. During the 1927-1929 period, his painting became intensively fauvist and expressionist. He underwent a period of change from "nature towards abstraction". Torres referred to this period as the time of conflict between concrete things and abstract forms, which would be solved one year later when "unconsciously responding to an inner vision, I put in my first work and its respective niches a house (Iike those houses drawn by children), a boat, an anchor, the letter B, a man, a foot ... " (Historia de mi vida). He had found a form equivalent to the representation of the world. That original inspiration wil/lead him to the development of his constructive theory. He was concemed with "constructing", that is to say, to measure and tum planes and volumes into geometric forms. He regularly met Michel Seuphor, Mondrian, Kandinsky, Theo van Doesburg, Vantongerloo. At that time, the ideas of surrealism, cubism and neoplasticism were being heatedly debated. The radical experience shown him by Mondrian and Van Doesburg strenghtened his conviction in the struggle for a new approach to art. Although idealism and the search for order were common to both, Torres work was more sensorial, nearer to the "paintingpainting". It got farther from the severe asceticism of neo-plasticism. Talking about Mondrian, he stated: "two lines, a vertical and a horizontal one which come across one another. The things he has done with those two lines!" (Universalismo constructivo). In April, 11 th, 193D, the first exhibition of the Latin-American group took place in Paris at Galeria Zak. The following artists participated in it: G.A. Castel/anos, P Figari, Fomer, Lazo, Merida, Monteiro, Orozco, Pissarro, Redón, Diego Rivera, Cueto... and Torres-García himself
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Estación, 1918 óleo s/cartã%il on cardboard
31 x 46 cm Coleção particu lar
Nesse mesmo ano, no primeiro número da revista Cercle et Carré, Torres escreve o editorial "Vouloir construire", em que afirma: "Se pensamos que deveríamos no~ reunir é porque lá fora reina a desorientação e a desordem. E para encontrar uma base, para ter certezas. E nossa razão mostrou-nos que essa base é a construção". Em 18 de abril, na Galeria 23, acontece a conferência inaugural da primeira exposição internacional do grupo Cercle et Carré. Ali estavam presentes Arp, Baumeister, Kandinsky, Le Corbusier, Léger, Mondrian, Ozenfant, Prampolini, Pevsner, Stella, Russolo, Schwitters, Vantongerloo, Van Rees ... Em janeiro de 1931, na Casa de Catalufia, expõe com Miró, Picasso, J. M. Sert, Creixams, Daura, Gargallo, Julio González e Sunyer... Em outubro do mesmo ano, na Galeria Georges Petit, está ao lado de Borés, Cossio, Dalí, Giacometti, Laurens, Lurçat, Marcoussis, Masson, Max Ernst, Miró, Ozenfant e Zatkine. Essas diversas exposições e atividades, tão próximas entre si, falam da liderança que teve Torres em diversos círculos, tanto plástica como conceitualmente. Duras polêmicas o afastam de Cercle et Carré antes do terceiro e último número da publicação. · Esse período de intensa1atividade criadora ressente-se da crise econômica que havia começado em 1929; a subsistência torna-se difícil, e em 1932 Torres decide, pesarosamente, afastar-se de Paris como tantos outros artistas.
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In the same year Torres wrote in the editorial of the first issue of the magazine Cercle et Carré entitled "VoulD// construire": "if we thought we should work together it is because outside we can only find disorientation and disorder. We meet in order to forge a common denominator, to define our purposes. And our minds have shown us that this common base is construction. ". In April, 18th, in the Galeria 23 he was in charge of the opening conference of the first international exhibition of the Cerc/e et Carré group. Several artists participated in it, namely, Arp, Baumeister, Kandinsky, Le Corbusier, Léger, Mondrian, Ozenfant, Prampolini, Pevsner, Ste//a, Russolo, Schwitters, Vantongerloo, Van Rees... In January, 1931 he participated in an exhibition together with Miró, Picasso, J.M. Sert, Creixams, Daura, Garga//o, Julio González and Sunyer at the Casa de Cataluna. In October of the same year, at the ga//ery George Petit he showed his works together with Borés, Cossio, Dalí, Giacometti, Laurens, Lurçat, Marcoussis, Masson, Max Ernst, Miró, Ozenfant and Zatkine. The several exhibitions and activities so c/ose together disclosed the leading role played by Torres both in painting and as a conceptualist in manyareas. Harsh polemics drew him apart from the Cercle et Carré before the third and last issue of the magazine was published. The burden of the economic crisis which started in 1929 influenced this period of intense creative activity Survival became a severe struggle for Torres, who, in 1932, against his wish, decided to leave Paris as many other artists had to.
Dos figuras de negros, 1928 óleo s/cartã%il on cardboard 50 x 40 cm Coleção particular
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Em 1933, muda-se para Madri, onde seus amigos lhe organizam uma retrospectiva no Museo de Arte Moderno. Também ali a falta de soluções econômicas o obriga a buscar outros destinos. Pensa no México e na grande tradição de sua arte. Finalmente resolve que seu lugar deve ser Montevidéu. O regresso ao Uruguai, aos sessenta anos de idade, é também uma decisão arriscada, mas Torres, com atitude inovadora, sente a atração do reencontro com o Novo Mundo. Está consciente do muito que há a fazer na América do Sul, propõe-se a abri-Ia às idéias estéticas contemporâneas, reencontrar a grande arte de todos os tempos com o legado cultural indo-americano, originando assim uma arte nova de valor universal. Necessita experimentar suas idéias com liberdade. Defende uma arte monumental a partir do desenvolvimento do universalismo construtivo, para criar, em suma, um movimento que supere o de Paris. Afirma que modernidade é ter consciência do momento em que vive e de si mesmo. E que essa tarefa a que se propõe não é a do artista isolado, mas uma tarefa coletiva. Torres tem então um poderoso incentivo nessas terras "virgens", e defende uma integração das artes que leve a uma cultura superior, a um classicismo moderno. Traz consigo um universo de idéias e precisa de interlocutores válidos para prosseguir seu diá,logo. Esta vontade próxima da utopia tem nele um ardor incansável. E assim que somente no primeiro ano depois de sua chegada faz 88 conferências, como registra em seus cadernos pessoais. Recebe o apoio do Estado, o reitor da Universidade e as Faculdades de Humanidades e de Arquitetura lhe oferecem suas classes. A rádio oficial o tem como mestre de conferências. Seu magistério se exerce não como professor, mas como criador da cultura artística de que o país necessita; não como um comunicador de idéias, mas como o elaborador de uma nova teoria, adequada ao ambiente. É aceito e admirado, e um grupo de artistas e intelectuais o rodeia, embora suas palavras polêmicas também despertem oposição. Não resiste aos convencionalismos nem à mediocridade. Continua incansável em seu trablaho magistral. Vão surgindo seus livros: Estructura, em 1935, dedicado a Mondrian; La tradición dei hombre abstracto, em 1936; Historia de mi vida, em 1939; Metafísica de la prehistoria indoamericana, em 1939; La ciudad sin nombre, em 1942; sua obra principal, Universalismo constructivo, editada em Buenos Aires em 1944; Nueva escuela de arte dei Uruguay, em 1946; Mística de la pintura, em 1947; Lo apariente y lo concreto en el arte, em 1948.
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In 1933 he moved to Madrid where a retrospective of his works organized by friends was held at the Museo de Arte Moderno. Economic problems also made him look for new perspectives. First he thought about going to Mexico due to its signiticant art tradition. Final/y, he decided that Montevideo was the place to go to. Going back to Uruguay when he was 60 years old was a risky decision but Torres was attracted by the idea of contacting the New Wor/d again. He was conscious of South America dire needs and decided to strive for disseminating the contemporary aesthetic ideas in his native country. He wished to link great timeless art to the Indo-American legacy, so as to origina te a new universal art. He had to put his ideas into practice with absolute freedom. His purpose was to constitute monumental art which was to stem from the development of Universal Constructivism. In short, he wished to unleash a movement that was to become more important than the ideas divulged in Paris. According to him to be modem was to be aware both of the historic moment and of oneself, and this was a group task and not something to be carried out byan individual artist. Thus, Torres had a powerful incentive to push him to work in these "virginar land and decided to strive for the integration of the arts that was to lead to a superior culture, to a modem classicism. He had a whole sphere of ideas and needed to find the right channels for them to take root. The importance of this near/y utopic dream made him a tireless worker. This was the reason why in his first year in Montevideo he gave 881ectures which were registered in his personal notebook. He was awarded Govemment grants and the University and the Humanities and Architecture Col/eges often invited him for conferences. The Radio Official hires him as a chief lecturer. He imparts knowledge not as a teacher but as the creator of the artistic culture needed by the country; not as a communicator of ideas but as the creator of a new theory. He was admired and wel/ accepted and a group of artists and intelectuaIs always surrounded him. Nevertheless, his polemic statements were rejected by specitic sectors. He did not accept conventionalism and mediocrity. Referring to himself he once said ironical/y: "1 am a pain in the neck". He continued to work as a teacher and his books were published regular/y: Estructura (Structure) in 1935, which is dedicated to Mondrian; La tradición dei hombre abstracto (The tradition of the abstractionist man) in 1936; Historia de mi vida (The history of my lite) in 1939; Metafísica de la prehistoria indoamericana" (The metaphysics of Indo-American pre-History) in 1939; La ciudad sin nombre (The nameless city) in 1942; his major work, Universalismo constructivo (Constructive universalism), published in Buenos Aires in 1944; Nueva escuela de arte deI Uruguay (New art school in Uruguay) in 1946; Mística de la pintura (The mystié of painting) in 1947; Lo apariente y lo concreto en el arte (The apparent and the concrete in art) in 1948.
Reinicia a revista Círculo y Cuadrado, em nova fase, da qual são publicados dez números entre 1938 e 1942, e Removedor, a partir de 1945, publicação combativa do Ateliê Torres-García. Três anos depois de sua morte, aparece La recuperación dei objeto, uma compilação de suas últimas conferências na Faculdade de Humanidades. Desde sua volta, sua produção plástica foi intensa. Em 1938, realiza o Monumento cósmico para o Parque Rodó de Montevidéu: um muro de pedras graníticas encaixadas, gravadas com alguns signos universais do homem em relação com o cosmos. Nos anos 40, realiza a série dos Homens Célebres: Rafael, Leonardo, Velázquez, Goya, Cézanne ... na qual desconstrói a imagem tradicional e, com adesão espiritual, a reelabora dentro da seção áurea. São verdadeiras construções, de arquitetura medida, que deixam de lado o anedótico para atender ao mais pessoal de sua dignidade universal. Em 1935, fundou a Associação da Arte Construtiva (AAC, como aparece em muitos quadros desse período), que congregou artistas, arquitetos e intelectuais. Em 1944, inicia suas atividades o Ateliê Torres-García, que com sua morte, em 1949, ficará nas mãos de seus discípulos até 1962. Nesse ateliê trabalharam seus filhos, Augusto e Horacio Torres, J. Gurvich, G. Fonseca, F. Matto, Alpuy, A. Hernández, J. Montiel, os irmãos Ribeiro, E. Andrada, Aguiar, Pailos, os irmãos Visca, A. Pezzino, A. Nieto, H. Ragni, R. Acle, Arden Quin e muitos outros artistas. Em 1943, Torres-García encara a obra mais ambiciosa de todos os projetos do ateliê: os murais do Hospital Saint Bois. Executa sete grandes obras nas cores primárias, branco e preto. Trata-se de uma arte pianista, fundamentada no valor material dos elementos plásticos: "valor real, concreto, absoluto do plano de cor, da linha e da medida". E um grupo de seus alunos realiza outros vinte murais para o mesmo hospital. Essa escola de arte, cujo único paralelo na América é a escola mexicana de pintura, teve uma projeção decisiva em toda a cultura uruguaia, atravessando fronteiras. Dela surgiu um grupo extraordinário de artistas e sua influência se fez sentir em toda uma geração de arquitetos. O cultivo desses valores persiste hoje nas novas gerações e é motivo de pesquisa dentro e fora do país.
He started publishing again the magazine Circulo y Cuadrado (Circle and Square); between 7938 and 7942ten issues were published and in 7945 he published EI Removedor, a combative magazine issued by the Tal/er TorresGarcía. Three years after he had passed away La recuperación dei objeto (The retrieval of the object), a compilation of his last conferences at the Facultad de Humanidades, was published. His artistic production was intensive since his retum to Montevideo. In 7938 he executed Monumento cósmico (Cosmic monument) for the Parque Rodá in Montevideo: a wal/ made up of granitic stones containing incisions with universal signs of man in relation to the cosmos. In the 40's he carried out the series Important Characters: Rafael, Velázquez, Goya, Cézanne... in which he deconstructed the traditional image and, in a spiritual adherence, reelaborated them according to the rules of the golden section. Theyare constructive, with a measured architecture that breaks away from the anedoctal in arder to attain the more intimate side of his universal dignity. . In 7935 he founded the Asociacián de Arte Constructivo (AAC, as we can see in many of his works carried out at the time), which included intelectuaIs and artists. In 7943 he started his activities at the Tal/er Torres-García. After his death the studio was directed by his pupils until 7962. In the studio worked his sons Augusto and Horacio Torres, J. Gurvich, G. Fonseca, F Matto, Alpuy, A. Hemández, J. Montiel, the Ribeiro brothers, E. Andrada, Pailos, the Visca brothers and many other artists. In 7943 he started the most ambitious project of his Tal/er: the muraIs of the Hospital Saint Bois. Torres carried out seven large works using primary colors, black and white. His was an art based on the material value of the pictorial elements which were used: "real value, concrete, absolute of the plane of colar, of the lines and of the measure". Some of his pupils executed other twenty muraIs for the same hospital. This school of art, which can only be compared to Mexican school of painting, had a decisive expansion over the Uruguayan culture and progressed beyond the country's borders. From this school emerged an extraordinary group of artists and a whole generation of architects was influenced. Its values persist today in the new generations and are the subject of studies within the country and abroad. Jorge Castil/o
Jorge Castilho
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Grafisme noir et rouge, 1931 ' óleo s/tela/oi/ on canvas
74 x 55,5 cm Coleção particular
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Pintura constructiva, 1931 óleo s/tela/oil on canvas 75 x 55,5 cm Coleção particular
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Agradecimentos/ Acknowledgements Agradecemos ao Ministério de Educação e Cultura do Uruguai, nas pessoas de Antonio Mercader e María Luisa Torrens; ao Ministério das Relações Exteriores do Uruguai na pessoa de Sergio Abreu; à Embaixada do Uruguai na República Argentina, na pessoa de Adolfo Díaz Estapé; ao Museu Nacional de Artes Visuais na pessoa de Angel Kalenberg e à Comissão Nacional de Artes Visuais nas pessoas de Amalia Polleri, Diego Abal, Jorge Páez Vilaró, Jorge Rodríguez Delucchi, Luis García Pardo, Oscar García Robles e Roberto de Espada, o apoio especial que permitiu a realização dessa mostra. Ressaltamos também a contribuição do Museu IVAM de Valência nas pessoas de José Francisco Vvars e Vicente Todoli Cervera, e o apoio pessoal de Alberto Pedronzo, Alejandro Soldati, Alfonso Durán, Ana Jauregui, André Vlasto, Anhelo Hernández, Carlos Bister, César Baranano, Demetrio Papantonakis, Doris Castillo, Eduardo Maiorano, Enrique Lessa, Estela Campos, Gregorio Gordon, Joaquín Molina, Mariana Castillo, Martín Castillo, Miguel Battegazzore, Natalia Kohen, Pilar Berthet, Plácido Arango, Ricardo Estévez, Rodolfo Visca, Rubén Méndez e Susana Nin.
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We would like to thank for their special support to this exhibit: Antonio Mercader and Maria Luisa Torrens, of the Ministry of Education and Culture of Uruguay; Sergio Abreu of the Ministry of Foreign Affairs of Uruguay; Adolfo Díaz Estapé of the Uruguayan Embassy in Argentina; Angel Kalenberg of the National Museum of Visual Arts and Amalia Pol/eri, Diego Abal, Jorge Páez Vilaró, Jorge Rodríguez Delucchi, Luis García Pardo, Oscar García Robles and Roberto de Espada of the National Commission of Visual Arts. We would also like to thank the col/aboration of José Francisco Yvars and Vicente Todoli Cervera of the IVAM Museum of Valencia, and the personal support of Alberto Pedronzo, Alejandro Soldati, Alfonso Durán, Ana Jauregui, André Vlasto, Anhelo Hernández, Carlos Bister, César Barafiano, Demetrio Papantonakis, Doris Castil/o, Eduardo Maiorano, Enrique Lessa, Estela Campos, Gregorio Gordon, Joaquín Molina, Mariana Castil/o, Martín Castil/o, Miguel Battegazzore, Natalia Kohen, Pilar Berthet, Plácido Arango, Ricardo Estévez, Rodolfo Visca, Rubén Méndez and Susana Nin.
Fotos/Photos Fotos IVAM Fotossíntese Léon Hepner Testoni Studios
Obras apresentadas/ Works in the exhibition Pinturas/Paintings Estación de trenes, 1917 óleo s/tábua/oil on wood 52 x 74,5 cm Coleção particular Estación,1918 óleo s/cartã%il on cardboard 31 x 46 cm Coleção particular Joseph Stel/a, 1921 óleo s/tela/oil on canvas 37 x 33,5 cm Coleção particular Adán y Eva, 1926 afresco s/tela/fresco on canvas 40 x 57,5 cm ' Coleção particular Tertulia de café, 1926 têmpera s/tela/tempera on canvas 122x65cm Coleção particular Tres figuras, 1926 gesso s/tela/plaster on canvas 37,5 x 46 cm Coleção particular Figura, 1928 óleo s/cartã%il on cardboard 37,7 x26 cm Coleção particular Ouartier de port, 1928 óleo s/cartã%il on cardboard 50 x 74,5 cm Coleção particular Dos figuras de negros, 1928 óleo s/cartã%il on cardboard 50x 40 cm Coleção particular Naturaleza muerta, 1930 óleo s/cartã%il on cardboard 36 x 32,5 cm Coleção particular
Bateau rouge, 1930 óleo s/tela/oil on canvas 38x46cm Coleção particular Escena cal/ejera, 1930 óleo s/cartã%il on cardboard 57,7 x 78 cm Coleção Eduardo F. Costantini, Buenos Aires Composition symetric universel/e en blanc et noir, 1931 têmpera s/tela/tempera on canvas 122 x 61,7cm Coleção Placido Arango, Madri Edificiouniversal,1931 óleo s/tela/oil on canvas .65,5 x 56 cm Coleção particular Edificio universal, 1931 óleo s/tela/oil on canvas 72x60 Coleção particular Grafisme noir et rouge, 1931 óleo s/tela/oil on canvas 74x 55,5 cm Coleção particular Pintura constructiva, 1931 óleo s/te Ia/oil on canvas 75x 55,5 cm Coleção particular Composición constructiva, 1932 óleo s/tela/oil on canvas 73x60 cm Coleção particular Composición constructiva, 1932 óleo s/tela/oil on canvas 79 x 58 cm Coleção particular Constructivo simétrico en acre, 1932 óleo s/tela/oil on canvas 73 x60 cm Coleção particular
La ciudad(esboço para o/sketch for the Mural de Saint Bois), 1943 óleo s/cartã%il on cardboard 52 x 59,3 cm Coleção Betty y Grégorio Gordon, Buenos Aires
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Dos figuras constructivas, 1946 nanquim/China ink 22 x 20 cm Coleção particular
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Constructivo indoamericano, 1939 ti nta s/papel/ paint on paper 12 x 15,5 cm Coleção particular
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Construcción,1933 óleo s/madeira/oil on wood 33 x28 em Coleção particular Composición constructiva, 1937 têmpera s/cartão/tempera on cardboard 45,5 x 85,5 em Coleção particular Ritmos curvos en blanco y negro, 1937 óleo s/cartã%il on cardboard 96,5 x 49 em Coleção Museo IVAM - Centre Julio González, Valência Ritmos curvos y oblicuos en blanco y negro, 1938 têmpera s/cartão/tempera on cardboard 80,5 x 49,5 em Coleção particular Artefacto en blanco y negro, 1938 têmpera s/cartão/tempera on cardboard 81 x 52 em Coleção particular Hombre con sombrero de paja, 1939 óleo s/cartã%il on cardboard 55 x 44,5 em Coleção particular Matrimonio,1939 óleo s/cartãoioil on cardboard 49 x 81 em Coleção particular Caras fragmentadas y ciudad, 1940 óleo s/cartã%il on cardboard 52 x 60 em Coleção particular Constructivo con máscara, 1943 óleo s/cartã%il on cardboard 44,5 x 61,5 em Coleção particular
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Composition symetrie universelle en blane et noir, 1931 têmpera s/tela/tempera on eanvas 177 x 111 7 r.m
Pintura constructiva con plano de color,1943 óleo s/cartã%il on cardboard 52,5 x 70,5 em Coleção particular Constructivo trabajo, 1943 óleo s/cartã%il on cardboard 46 x 42 em Coleção particular La ciudad (esboço para o/sketch for the Mural de Saint Bois), 1943 óleo s/cartã%il on cardboard 52 x 59,3 em Coleção Betty y Gregorio Gordon, Buenos Aires Constructivo con calle y gran pez, 1946 óleo s/cartã%il on cardboard 53 x 79 em Coleção Eduardo F. Constantini, Buenos Aires Puerto matafísico, 1947 óleo s/tela/oil on canvas 190 x 275 em Coleção particular Estructura a cinco tonos con dos formas intercaladas, 1948 óleo s/cartã%il on cardboard 50x 52 em Coleção particular Madeira/Wood Hombre, c. 1922 brinquedo de madeira/wood toy 20,5 x 8 x 3,5 em Coleção particular Hombre, c. 1922 brinquedo de madeira/wood toy 24,5 x 8 x 3,5 em Coleção particular
Escena cal/ejera, 1930 óleo s/cartã%il on cardboard 57,7 x 78 cm Coleção Eduardo·F. Costantini, Buenos Aires
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Pintura constructiva con plano de colar, 1943 óleo s/cartã%il on cardboard 52,5 x 70,5 cm Coleção particular
Pá}aro, c. 1922 brinquedo de madeira/wood toy 17,3 x 14,6 x 2,4 cm Coleção particular Perro, c. 1922 brinquedo de madeira/wood toy 20 x 15 x 2,2 cm Coleção particular Abstraceión de maderas superpuestas, c. 1924 madeira pintada/painted wood 26 x 13 cm Coleção particular Hombre con triángulo ineiso, 1927 óleo s/madeira/oil on wood
17,5x6cm ' Coleção particular Hombre, 1929 madeira pintada/painted wóod 28 x 10 cm Coleção particular Planos de color, madera constructiva, 1929
óleo s/madeira/oil on wood 28x22 cm Coleção particular Dos figuras primitivas, 1930 óleo s/madeira/oil on wood 33 x 24,5 cm Coleção particular Hombre con reloj~ 1930 óleo s/madeira/oil on wood 12 x 63 cm Coleção particular Grafismo con caracol, c. 1930 madeira incisa/wood cut 37,5 x 24,5 cm Coleção particular Construcción con madera, 1931 óleo s/madeira/oil on wood 64 x 38 cm Coleção particular Ob}et plastique/composición, 1931-34 têmpera s/madeira/tempera on wood
52,1 x 41,9 x 9 cm Coleção Museo IVAM - Centre Julio González, Valência Desenhos/Drawings Harborscen~ 1921 lápis s/papel/peneil on paper 10 x 13 cm Coleção particular HOfT}bre con relo}, 1929 tinta s/papel/paint on paper 10,5 x 10,5 Coleção particular Port,1930 tinta s/papel/paint on paper ' 35 x 53 cm Coleção particular Constructivo con casa e iglesia, 1931 tinta s/papel/paint on paper 13,5 x 11 cm Coleção particular Constructivo Z P 534, 1932
tinta s/papel/paint on paper 13 x 7 cm ' Coleção particular Forma animal, c. 1933 aquarela e tinta s/cartolina/watercolour and paint on lightboard 7 x 6,5 cm Coleção particular Hombre yanimales indoamericano, c. 1934 aquarela s/papel/watercolour on paper 11 x 13,5 cm Coleção particular Estructura con hombre y pez, c. 1935 tinta s/papel/paint on paper 10 x 8,5 cm Coleção particular Rosa abstracta, c. 1937 lápis s/papel/peneil on paper 14 x 9,3 cm
Coleção particular Estructura, c. 1937 lápis s/papel/pencil on paper 19 x 13 cm Coleção particular Estructura con símbolos, c. 1938 lápis s/papel/pencil on paper 12 x 17,3 cm Coleção particular Pachamama, 1938 tinta s/papel/paint on paper 16 x 21 cm Coleção particular Constructivo indoamericano, 1939 tinta s/papel/paint on paper 12 x 15,5 cm Coleção particular Dos figuras constructivas, 1946 nanquim/China ink 22x20 cm Coleção particular
A "invenção" de Plessi consiste exatamente em criar uma nostalgia do real pela formulação de uma linguagem autônoma, a suposição do emprego distinto do meio televisivo não fetichizado, mas inserido numa paisagem em que ele deixa de ser frontal, como costuma ser.
Plessi's "in vention " consists of generating nostalgia of reality through an independent language defihition, assuming a unique use of unbiased televisive media, within a scenery which is no longer frontal, as it usua//y tends to be.
A suposição, e não a segurança, constitui a prova do uso maneirista que Plessi faz do vídeo, de sua inserção no monumental. Para ele, é evidente que a realidade não pode ser resgatada pela arte, porque a arte não se detém na simples reprodução da imagem. Plessi reduz a velocidade dos tempos, amplia a moldura, cumprindo assim uma série de deslocamentos lingüísticos extravagantes que evidenciam o tratamento neomaneirista de toda a operação. O uso horizontal e não vertical do televisor confirma que o artista não crê numa contemplação puramente gramatical do meio, mas numa contemplação atormentada e intelectual, emotiva e expressiva, relativa e problemática.
Conjecture, and not certainty, constitutes proof of the manner/y way in which Plessi uses vide o, of his insertion on the monumental. For him, it is evident that reality cannot be rescued by art. He does not stop at pure image reproduction which constitutes the natural limit to normal reproduction. Plessi reduces tempi, enlarges frames, performing a series of extravagant linguist shiftings which c/ear/y shows the "neo-mannerist" treatment of his production as a whole. Horizontal and not vertical utilization of television sets confirms that the artist does not believe in a purely grammatical contemplation of environment but in one that is troubled and inte//ectual, emotive and expressive, relative and problematic.
O "superficialismo" de Plessi denota o uso dos instrumentos lingüísticos semelhantes, mas sem prejuízo do resultado, que habita sempre os domínios da complexidade da arte. Porque a arte, sobretudo a contemporânea, tem consciência de sua operação ao nível do olhar, é ciente de que a reprodução ocorre sempre sobre uma superfície que permite sua duplicação. "A profundidade está oculta. Onde? Na superfície." A afirmação de Hoffmansthal resume toda a operação de Plessi, que se atém aos códigos do meio, introduzindo-lhe substâncias do imaginário que se filtram sob a sutil pátina da tela e fluidificam-se em todo o espaço da instalação com a lentidão silenciosa do óleo.
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Plessi's "superficialism" denotes the use of linguistic instruments in a similar form, without any prejudice to results, inherent to art domaíns complexíty. Because art, especia//y contemporary art, ís conscious that it functíons at eye levei, knows its reproductíon always occurs on a surface which permits its duplicatíon. "Depthness ís hidden. Where? On the surface". Hoffmansthal's assertion becomes the symbol of Plessi's whole work, whích stays within the boundaries of envíronmental codes, íntroducíng imagínary substances fíltered under a subtle patina of canvas and fluídifíed over the whole space occupied by the ínsta//ation in presence of oíls' silent gentleness.
Além disso, Plessi introduz a força persuasiva da festa barroca, o enriquecimento de um cenário necessariamente elaborado e custoso, capaz de pôr a serviço de sua fantasia diversos meios que assinalam uma espécie de reviravolta das regras ditadas pela utilidade, e não pelo sentido de jogo. A persuasão passa naturalmente pelo cenário eletrônico, pelo funcionamento dos autômatos que constituem um incentivo à contemplação. Porque, com suas instalações, além de produzir conhecimento, Plessi deseja introduzir o caráter de "maravilhoso". Ao rumor do mundo ele não responde com o distanciamento de uma imagem imóvel e silenciosa, mas acirra a competição e adorna suas obras com elementos cinéticos e sonoros que instigam à aproximação. De resto, o caráter barroco, simplesmente espetacular, é resgatado pelo fato de que estas máquinas são portadoras de processos de conhecimento e de aprofundamento psíquico que contestam a aparência superficial apresentada pelas imagens. Estas não conduzem para fora, mas para dentro. A obra de Plessi é orientada por uma sensibilidade que sabe assumir a frieza estrutural dos meios expressivos, submetendo-os a uma temperatura diferente, que é a da fantasia que brinca entre projeções e deslizamentos para fora de si mesma. Isso resulta de uma exatidão na execução que, no aperfeiçoamento do mecanismo, na construção exasperada, encontra a possibilidade de melhor realizar uma instalação fantástica. Uma transparente perfeição metafísica habita os espaços e rege o tempo da obra.
In addition, Plessi introduces the persuasive forces of a baroque feast, the enrichment of a necessarily elaborated and expensive scenery, capable of making his fantasies acquire various means which signal a complete reversal of rules dictated by their usefulness and notby their sense of frolic. Persuasion natural/y passes through the electronic scenery, through the functioning of self-operating instruments which constítute an incentive to contemplation. Because what Plessi wants with his intal/ations is to introduce a symbol of excel/ence and produce knowledge. To the world's hearsay he dOf1s not answer but with the remoteness of stationary andsilent image, generating competition and ornating his works with kynetic and sound elements which instigate nearness. Spectacular baroque character emerges rescued by the fact that these machines are carriers of knowledge processes and of psychic depthness contesting the superficial aspect of these images. These do not direct to the outside, but to the inside. Plessi's work moves definitely under a tangent of sensibility which knows how to assume structural coldness of significant media submitting them to a dífferent kind of temperature which is fantasy playing between projections and sliding to the outside. This result is a consequence of elabora te and effective preciseness finding better ways to make a fantastic instal/ation. A transparent metaphysical perfection inhabits spaces and manages the tempo of his work. Plessi's entire work becomes imbued with a historical forefront sense of construction and sense of elabora te remoteness which updates it. Achil/e Bonito Oliva
A obra total de Plessi arma-se do sentido de construção das vanguardas históricas e do sentido de elaborado distanciamento que a torna atual. Achille Bonito Oliva
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Fabrizio Plessi nasceu em Reggio Emilia, em 1940, e estudou na Academia de BelasArtes de Veneza, da qual mais tarde se tornou professor de pintura. Desde o início de sua carreira, em 1968, o tema central de seu trabalho tem sido a água, expressa em instalações, filmes, vídeos e performances. A partir de 1982, passou a se interessar pelas possibilidades do vídeo e a incorporar estruturas tridimensionais. A relação ilusionista entre a representação e a realidade do elemento líquido aparece ampliada em seu trabalho pelas extremas possibilidades tecnológicas da reprodução mecânica e eletrônica. Em 19871988, participou da equipe de produção do programa de televisão Immagina, da RAI. Em 1987, ganhou o prêmio internacional lhe Eletronic Image. Em 1992, dirigiu um workshop patrocinado pela Unesco para vinte jovens artistas estrangeiros na Kunsthochschule für Medien, em Colônia, Alemanha, onde é responsável pelo curso "A humanização da tecnologia" desde 1990. Fabrizio Plessi é representado na Alemanha pela Weisses Haus e pela Weisser Raum desde 1991. Suas vídeoesculturas e suas instalações de vídeo estão reunidas no Centro Video Arte, no Palazzo dei Diamanti, em Ferrara, Itália. Fabrizio Plessi was bom in Reggio Emilia in 7940 and studied at the Fine Arts Academy in Venice, where he became a professor of painting. From the beginning, in 7968, the
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central theme of his work has been water, expressed in installations, films, videos and performances. Since 7992, his interest has shifted to the video possibilities, incorporating 3-dimensional structures. The illusionistic relationship between representation and reality of the liquid element appears to be magnified in his works by the extreme technological possibilities of mechanical and eletronic reproduction. In 7986-7987 he was the artistic contributor 017 the production team of the tv show Immagina, presented by RAI. In 7987 he received the intemational award The Eletronic Image. In 799Z he led a Unesco workshop for twenty foreign young artists at the Kunsthochschule für Medien in Cologne, where he has been teaching "The humanization of technology" since 7990. Since 7997 Plessi has been represented in Germany by Weisses Haus and Weisser Raum. His video-sculptures and video-installations are assembled at Centro Video Arte at Palazzo dei Diamanti, Ferrara, Italy
Exposições!Exhibitions 1974 Palazzo dei Diamanti, Ferrara, Itália; Stãditische Galerie im Lenbachhaus. 1975-78-80 International Culturel Centrum, Antuérpia, Bélgica. 1975-83 Palais des Beaux-Arts, Bruxelas. 1982 Centre Georges Pompidou, Paris. 1984 Biennale di Venezia, Veneza. 1985 Musée d'Art Contemporain Villeneuve d'Ascq, Lille, França; Rotonda della Besana, Milão.
1986 Galleria d'Arte Moderna, Bolonha; Biennale di Venezia, Veneza. 1987 Documenta 8, Kassel, Alemanha; Museo Espanol de Arte Contemporáneo, Madri; Casa de Cultura, Cavaillon; Videoland (exposição individual/solo exhibition), Galleria d' Arte Moderna, Bolonha; cenários eletrônicos 'para o balé!electronic sets for the ballet Sciame, Rovereto Festival. 1988 Museo Correr, Veneza; Palacio de Sastago, Saragoça, Espanha; Neue Galerie der Stadt, Linz; Europa Oggi, Centro per I'Arte Contemporanea Luigi Pecci, Prato, Itália. 1989 Video-Skulptur Retrospektiv und Aktue1l196389, Colônia; Videosal, Palau Sollerie, Palma de Maiorca, Espanha; Movimenti Catodici (exposição individual/solo exhibition), Palazzo dei Diamanti, Ferrara; Borealis 4, Louisiana Museum, Humlebaek, Dinamarca; Bienal Artec '89, Nagóia, Japão; cenários eletrônicos e figurinos para a ópera!electronic sets and costumes for the opera The falI of Icarus, Opera Nationale La Monnaie, Bruxelas. 1992 cenários eletrônicos para a ópera! electronic sets for the opera Titanic, Opera Nationale La Monnaie, Bruxelas. Obra apresentada! Work in the exhibition Roma 111, s.d. instalação de vídeo!video installation
Roma /li, s.d. instalação de vídeo/video instal/ation
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ENTRE-VISTA
INTER-VIEW
Você começou como escultor, trabalhando com aço. O que o levou ao vídeo? Usei o vídeo pela primeira vez em 1973. Nessa época, eu estava fazendo uma série de trabalhos sonoros na escultura. Trabalhava quase exclusivamente com bastões de aço soldado que, por acaso, tinham grandes possibilidades sonoras. Isso me levou aos gravadores, às fitas magnéticas, ao leedback e, por fim, ao som gerado eletronicamente. Fiz algumas gravações com um equipamento portátil, e a fluidez do videoteipe libertou radicalmente meu pensamento. De repente, a escultura que eu vinha fazendo há muitos anos tornou-se terrivelmente tediosa e distanciada desse atual processo. O vídeo me proporcionava a possibilidade de "pensar em voz alta".
Vou started as a sculptor working with steel, what brought Vou to video? I first used video in 1973. At that time I was doing a lot of sound work with sculpture. I worked almost exc!usively with steel welding rods which by chance had rich sonic possibilities. This got me into tape recorders and tape loops, feedback and ultimately electronica//y generated sound. I did some recording with a porta-pak and the fluidity of videotape freed up my thinking in a very radical way. Suddenly, the sculpture I had been doing for several years seemed overwhelmingly tedious and distant from this present-tense processo Video a//owed a kind of real time play, the possibility to 'think out loud'.
Dentro da arte contemporânea qual seria, para você, a principal diferença entre o vídeo e outros meios, especialmente no contexto da arte conceitual? O tempo. Ele é fundamental para o vídeo, mas não pelo que implicam suas raízes etimológicas. O feedback é o que há de mais essencial no vídeo. Não se trata do tempo linear, mas de um movimento vinculado ao pensamento. A experiência do tempo se dá dentro de parâmetros eletrônicos específicos: para os olhos, é uma tela retangular, mas que está muito distanciada de um processo cibernético capaz de incluir o observador. Acho que foi esse paradoxo entre ter intimidade com o tempo e ser estranho a ele que me levou a optar pela expressão verbal, e não por alguma forma de texto escrito na tela. A vocalização foi uma maneira de marcar fisicamente o tempo com o corpo através da fala - a voz agindo como uma espécie de gerador de imagens. Cada sílaba vincula-se a uma imagem; de repente as palavras pareciam espaciais e o observador tornava-se consciente do tempo de cada palavra. Talvez o melhor exemplo dessa construção imagem/palavra esteja em Primarily speaking. Esse parece ser o trabalho que antecipou muitas das idéias posteriores, por exemplo, de ordem dentro da desordem, como se vê em Why do things gets in a muddle?, Crux e Site recite. Existe também a possibilidade de múltiplas narrativas a partir de um único conjunto de imagens. Há um grande número de imagens fortes, como você em posição fetal, ou o vinho derramado
na mesa. 444
Within contemporary art what would Vou say is the primary difference between video and other mediums, particularly in the context of conceptual art? Time, this is what is central to vide o, it is not seeing as its etymological roots imply. Video's intrinsic principal is feedback. So it's not linear time but a movement that is bound up in thinking. This experience of time exists within specific electronic parameters that, to the eye, is a rectangular screen but which is very distant from a cybernetic process that includes oneself I think this paradox of being intimate with time and estranged from it is what brought me to speech and specifica//y speech rather than some form of written text the screen. Vocalization was a way to physica//y mark the time with the body through utterance - the speaking voice acting as a kind of motor generating images. Every sy//able is tied to an image: suddenly words seemed quite spatiéJl and the viewer becomes conscious of a single word's time.
on
The most extensive illustration of these imagejword constructs is perhaps Primarily speaking. This seems to be a pivotal work that also anticipated much later ideas, for example, order within disorder as seen in Why do things get in a muddle?, Crux and Site recite (a prologue) among others. There is also the possible construction of multi pie narratives from a single set of images. There are a number of charged images such as yourself in a fetal position, or the wine spilling on a table.
Primari/y speaking também tinha a ver com o número de imagens que eram necessárias para o intercâmbio entre os dois canais, dada a proporção entre imagem e sílaba que eu queria manter. Pode-se pensar que existe um número infinito de imagens, mas num determinado ponto a gente se pergunta: o que posso capturar, enquadrar, gravar, (ter) agora? Torna-se um processo de seleção. Você já percebeu a relação entre possuir e ver - enxergar uma coisa e querer tê-Ia? De qualquer forma, os idiomas já estavam formalizados em dicionários e gramáticas. Apenas escolhi uns e eliminei outros. Quando comecei a juntá-los, foi como se caíssem no lugar certo. Sua arte foi do som para a linguagem e incorporou inúmeros textos literários. Aparentemente, não houve uma abordagem única nessas investigações. Pelo menos visto de fora, seu trabalho muda radicalmente num curto período de tempo. Existe alguma linha que seja identificável? Eu diria que o que existe em comum é o desejo de chegar à fisicidade da linguagem e destruir essas categorias. Suponho que compartilho algumas preocupações com os poetas da linguagem, mas, por outro lado, geralmente parto das normas do "significado" e prossigo buscando as rupturas. Quero suspender a relação alternativa entre sentido e nonsense; ver o que acontece dentro da experiência da linguagem à medida que o significado cria raízes ou é desenraizado. Meu questionamento reside mais na natureza da linguagem, à medida que ela se move entre o som, a linguística e a literatura. O compositor la Monte Voung fala em entrar dentro do som; essa sintonia é, em última instância, uma função do tempo (tempos extremamente longos). Talvez ele pretenda dizer que a música/som não é uma coisa morta presente no ar, mas vibrações que se movimentam por ele, e que precisamos estar constantemente ouvindo e sintonizando. É interessante pensar numa relação análoga para a linguagem: um continuum que "sintoniza" o mundo. Muitos de seus trabalhos lidam com a relação entre palavras e imagens - os confrontos entre ambas. Você diria que isso é mais uma preocupação européia que americana, digamos, na tradição da semiologia? Sem dúvida, é o que acontece com muitos de meus trabalhos do começo dos anos 80, nos quais é difícil negar a relação com a semiologia; mas esse nunca foi o ponto central. Minhas idéias parecem mudar, voltar, inverter, contradizer, em vez de desenvolver, refinar e serializar. É claro que nesse trabalho me oponho a alguns escritores e artistas que estão identificados com certas teorias. A diferença significativa é que minha preocupação com a linguagem começou pelas noções esculturais que vinham do som, do corpo, da pronúncia e da fala. Além do mais, isso ocorreu dentro do discurso da mídia eletrônica: quando se trabalha no tempo real, a mediação dos sinais é muito diferente da que ocorre no contexto leitura/escrita. Se vamos falar de meu trabalho num contexto de desconstrução, acho que vale a pena ter em mente que Derrida, de quem se originou essa noção, é considerado principalmente um leitor. Eu sou principalmente um criador de imagens. O vídeo incorpora o espaço reflexivo da diferença através da produção simultânea de presença e distanciamento. Acho que ele tem uma realidade visceral mais abrangente que a escrita e ainda permite a mediação sem que se fique à mercê da imagem. E embora minha arte esteja baseada em imagens, estou muito mais preocupado em minar essas imagens através da linguagem.
Primarily speaking also had to do with the sheer number of images which were necessary for the two channel exchange, given the image to syllable ratio I wanted to maintain. You might think there are an infinite number of images, but at one point you ask: what can I capture, frame, record, (have) now? It becomes a collecting processo Have you ever noticed the relationship between possession and seeing - you see it and you gotta have it? Anyway the idioms had already been gathered in dictionaries and phrase books. I simply selected some and eliminated others. Dnce I started putting them together, they just sort of fell into place. Your art has moved from sound into language, and incorporated a number of literary texts. There doesn'tseem to have been a singular approach to these investigations. Comparably speaking, your work, at least from the outside, changes fairly dramatically over short periods of time. Is there an identifiable thread here? I would say that the commonality is linked to getting at the physicality of language and in breaking those categories down. I suppose I share some concems with the language poets but on the other hand I generally start a little closer to the norms of 'meaning' and proceed to look for the cracks. I want to suspend the either/or relation of sense and nonsense; see what happens inside the experience of language, as meaning is taking root or being uprooted, as the case may be. My questioning lies more in what the nature of language is as it moves between sound, linguistics and literature. The composer La Monte Young speaks of getting inside the sound; that tuning is ultimately a function of time (very long times). He seems to be saying that music/sound is not a dead object in the air but rather vibrations moving through the air and that one must continually listen and tune. It's interesting to think about an analogous relationship with language,' as a processual continuum that 'tunes' the world. Most of your work deals with the interrelationship of words and images confrontations between them. Would Vou say this is more of an European concern than an American one, le1's say in the tradition of semiology? Certainly with a number of my works from the earlyeighties, it would be hard to deny the relationship to semiology, but this was never a focal point. My ideas se em to shift, tum, invert, contradict, rather than develop, refine and serialize. Df course, working in this manner I come face to face with particular writers, or artists that are identified with certa in theories. The significant difference is that my preoccupation with language began with very sculptural notions coming out of sound, the body, utterance and speaking. Furthermore, this took place within the discourse of electronic media: when you work in real time the meditation of signs is very different than is a reading/writing context. If one is going to talk about my work in a deconstruction context, I think it's worth keeping in mind that Derrida, whom the origin of this notion comes from, is said to be primarily a reader. I am primarilyan image maker. Video embodies a reflexive space of difference through the simultaneous production of presence and distance. I think it has a visceral reality more encompassing than writing and still allows for meditation without falling prey to the image. And yet, although my art is based on images, Iam very much involved in the undermining of those images through language.
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Équando você começa a escrever seriamente os textos que constituem as trilhas sonoras de seus vídeos que se inicia o processo de desconstrução, o reverso da imagem dominando o som. Escrever foi uma libertação depois de um intenso período centrado nas possibilidades da imagem eletrônica e em sua transformação. Fui até onde podia e só queria fazer algum barulho. Sentia-me muito desconectado. A fala foi uma espécie de reentrada. Encontrar uma dependência sintática entre a fala e a imagem acabou me indicando uma direção. Uual foi o primeiro vídeo em que você falou? Foi em Elements; ouvem-se partes das palavras que compõem os quatro elementos, fogo, água, terra e ar, entrecortadas eletronicamente. Ocasionalmente reconhece-se uma palavra. Mas só quando comecei a escrever meus próprios textos percebi que existia uma conexão a ser feita entre os sistemas eletrônicos e a lingüística. Foi quando fiz Picture story, Processual vide o e Black/white/text. Este último trabalho é estruturado em torno de um texto que cresce matematicamente baseado no número exato de sílabas de cada frase adicional. Começando pelo fim, "retângulo", "no interior do retângulo", "o quadro de referência no interior do retângulo", e assim por diante, cada frase tem o dobro de sílabas da anterior. Num certo sentido, frases e vozes vão se acumulando de trás para a frente, até que todo o parágrafo seja ouvido. É como entrar de marcha à ré no tempo. A imagem raramente muda. Expandindo-se e contraindo-se lentamente, o vídeo feedback rastreia os níveis do texto. A imagem assemelha-se mais a um gráfico de linguagem, centra o observador no espaço da linguagem. Uuanto ao fato de a linguagem ser o ímpeto para "movimentar a imagem", como isso se relaciona com a noção de narrativa dentro de seu trabalho? Exceto, talvez, por Incidence of catastrophe, onde até o flerte com a narrativa tradicional é altamente consciente, estou trabalhando num campo diferente da narrativa que tem mais a ver com uma espécie de metanarrativa; os trabalhos evoluem a partir de uma prática autoreflexiva que inclui a mim, como autor/ator, na mise-en-scene. Em vez de a personagens ou locações, existam eles ou não, meus temas estão mais ligados à entropia, à memória, à consciência e à morte. Essa outra narrativa provoca uma rede de questões interrelacionadas que, novamente, sinto estar fortemente encravada no tempo. Uma vez que uma palavra é falada ou lida (ou uma imagem é "lida"), o tempo torna-se um elemento no qual o observador "narra" a experiência. Até a cognição torna-se parte do esquema narrativo. Interessa-me insistir nessa questão da narrativa, que talvez eu esteja usando de forma similar ao modo como você se refere ao tempo. E quanto às instalações, tanto Disturbance ... quanto Between cinema ... parecem intrinsecamente narrativas... E óbvio que esses trabalhos estão encravados no espaço narrativo, mas sempre em relação a uma estrutura auto-referencial específica. Novamente, os parâmetros em que me baseei foram o tempo e o
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It's once vou begin seriouslv to write the texts which constitute the soundtracks to vour tapes that the deconstruction process begins, the reversal of the image dominating the sound. Writing was a release from an intense period of focusing on the possibilities of the electronic image and its transformation. I went as far as I could go and just wanted to make some noise, I felt very disconnected. Speaking and talking were a kind of re-entry. Finding a syntaxical dependency between speech and image signaled itself as a direction for me. What is the first tape in which Vou spoke? In Elements, Vou hear portions of the words which make up the four elements: fire, water, air, earth which were electronical/y intercut together. Occasional/y there is a recognizable word. But it wasn 't until I started writing my own texts that I began to see that there was a connection to be made between electronic systems and linguistics. This is when I made Picture storv, Processual video and Black/white/text. This latter work is precisely structured around a text (hat grows mathematical/y based on the exact number of syl/ables in each additive phrase. Starting from the end, 'rectangle: 'within a rectangle', 'The frame of reference within a rectangle', and so on, each successive phrase has twice the number of syl/ables. Is a sense it accumulates phrases and spoken voices backwards until the entire paragraph is heard forwards; it backs up into time. The image barely changes. Slowly expanding and contracting vide o feedback tracks the layers of the text. In these tapes, the image becomes more like a graph of language. The image centers Vou within the space of language. In terms of language being the impetus for 'moving the image'. How does this relate to the notion of narrative within vour work? Except for perhaps Incidence of catastrophe, where even the flirtation with traditional narra tive is highly self-conscious, I am working a different doma in of narra tive having more to do with a kind of me ta-narra tive; the works evolve from a self-reflexive practice that includes me as authorjperformer in the mise-en-scêne. Rather than characters and locations, whether or not they exist literal/y, my subjects are more akin to entropy, memory, consciousness and death. This other narra tive brings about a web of interrelated questions which again I feel are strongly embedded in time. Once a word is spoken or a word is read (or an image is 'read') time becomes an element in which the viewer 'narrates' experience. Even cognition becomes part of the narra tive scheme. ' I'm interested in pursuing this question about narrative which perhaps I use in a similar wav that Vou refer to time. What about installations, both Disturbance ... and Between cinema ... seem intrinsicallv narrative ... Obviously these works are very much embedded in narra tive space but it is always in relationship to a specific self-referential structure. Once again time and metaphorical spaces for texts to unfold are the parameters I begin with.
espaço metafóricos para que os textos se revelassem. Em Disturbance... as pessoas movem-se através de uma espécie de sentença fragmentada vista em sete monitores à medida que recitam fragmentos de textos. Há um contínuo entrelaçamentodesenredamento de linguagens. pessoas. questões e indagações diferentes; o ponto de vista muda constantemente. Between cinema and a hard place joga com a construção de quadros como se correspondesse à fotografia e ao cinema. Imagens de fontes únicas são distribuídas pelo computador a vários monitores. Em algumas partes as cenas se dividem em duas. três. e assim por diante. A cada divisão todas as cenas ficam mais lentas - metade ~a velocidade. um terço da velocidade. um quarto da vélocidade. etc. E uma espécie de tempo telescópico que torna o espectador consciente do processo de ver - contemplar o mundo através da vista que existe nas dobras do tempo; Imagens da paisagem e de cenas domésticas são estruturadas espacial e temporalmente. justapondo-se ao texto de Heidegger. que fala da proximidade entre pensamento e poesia e diferencia isso dos parâmetros de tempo e espaço. usando a natureza como referência metafórica para o lugar do pensamento.
Você já trabalhou várias vezes com vídeos de um só canal e instalações. Conceitualmente, qual a diferença, em termos de tempo, do uso da escala e de metodologia? Fazer um vídeo. assim como assistir a ele. é semelhante a ler e escrever. O videoteipe existe num tempo linear: é sempre uma montagem - uma imagem/som depois da outra. da esquerda para a direita. Embora a natureza não-linear da memória possa ser iludida através da edição. um trabalho em um só canal não está no mundo da mesma maneira como uma instalação ou uma escultura. A imagem móvel numa caixa não pode ter a mesma relação física com o espectador. Há um claro intercâmbio. A instalação tem uma teatralidade inevitável que tento minimizar. Quero que o espectador se incorpore ao trabalho. tenha consciência de sua colocação dentro da estratégia conceitual da peça específica. A experiência de tempo é substituída pela experiência física num grau muito superior. Na melhor das hipóteses. o espectador será visceralmente confrontado com objetos. imagens e idéias. Acho que uma das maiores dificuldades de se usar o vídeo numa instalação é descentralizar o foco da televisão e de suas incessantes imagens. Como fugir da sedução diária do constante fluxo de imagens expresso como informação? Tentei fazer isso de formas diferentes. Por exemplo. em Beacon.... o objeto televisão desaparece completamente e é visto como o duplo feixe de luz de um farol. A luz como fonte e a imagem como fonte tornam-se intercambiáveis. Não só a "TV" foi removida fisicamente de seu quadro de referência. como o objeto que produz a imagem é uma metáfora voltada para si mesma. conversando com a própria imagem. Em And sat down beside her. a TV é vista como uma aranha. e em I believe it is an image in light of the other, o aparelho é corporificado em um vaso algo como um tubo de oxigênio. Só vemos as imagens projetadas. cujas bordas são definidas por livros abertos.
In Disturbance ... people are moving throug h "" ;nd of broken sentence seen as seven monitors as they recite fragments of texts. There's a continuous weave and unraveling of different languages, people, questions and inquiry; it is layered almost like a stratum; the point of view is constantly shifting. Between cinema and a hard place plays with the construct of frames as it relates to photography and cinema. Images from single sources are distributed by computer controlled electronic switching to several monitors. There are certa in sections where scenes divide into two scenes, three scenes and so on. With each division ali the scenes slow down - half speed, third speed quarter speed etc. It is a kind telescopic time that makes the viewer aware of the process of seeing - of beholding the world through sight that exists in the folds of time. Images of the landscape and domesticity are precisely structured spatially and temporally juxtaposing with Heidegger's text, which speaks about a neighboring nearness between thought and poetry and differentiates this from parametric notions of time and space, using nature as a metaphorical referent for the place of thought. You've worked with both single-channel tapes and installations for quite sometime. Conceptuallv, what do Vou see as the difference in terms of time, the use of scale and methodologV? Making tape, and likewise viewing tape, has similarities to reading and writing. Videotape lives in linear time; it's always an assemblage - one image/sound after another (one single pixel after another) - it writes left to right. Although the non-linear nature of memory can be played with extensively through editing, a single-channel work is not in the world the way installation and sculpture are. The moving image in a· box cannot have the same physical relationship with the viewer. There's a definite trade off With installation there's an inevitable theatricality which I try to minimize. I want the viewer incorporated into the work; to be self-conscious about the sense of place within the conceptual strategy of the specific piece. The experience of time is displaced by the physical experience to a much greater degree. Hopefully, the viewer is viscerally confronted with things, images and ideas. I think the most difficult aspect of using vide o in an installation is decentralizing the focus on the television object itself and its never-ending image. How does one get away from that everyday seduction of the continuous flow of images couched as information. I tried to do this in different ways. For instance, in Beacon ... the television object disappears completely and is seen as the dual beacon of a lighthouse, light as a source and image as source become interchangeable. Not only has the 'TV' been physically removed from its frame of reference, but the object producing the image is a metaphor turned on itself conversing with its own image. In And sat down beside her, the 'TV' is seen as a spider and in I believe it is an image in light of the other the display has been incorporated into a cannister - something like an oxygen bottle perhaps. We only see projected images in which the borders are defined by open books.
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Suas instalações recentes diferem radicalmente quanto à aparência, e mesmo assim percebe-se uma linha conceitual, ou pelo menos uma interconexão entre idéias diferentes e, acrescento com cuidado, sistemas que incorporam o pensamento. Grande parte de meu trabalho recente desenvolve-se em torno de duas estratégias. And sat down beside her, Beacon..., I believe... e, mais recentemente, Tall ships, surgiram de formas diferenciadas dessa idéia de imagem difundida. E como fazer com que algo que já é imaterial perca ainda mais sua identidade; observá-lo estatelar-se sobre as coisas e se dissipar no espaço. Em Tall ships isso é levado ao extremo. Num corredor escuro de quase 27,5 m as únicas coisas que se vêem são figuras projetadas, que são ao mesmo tempo imagens da realidade (pessoas) e a única fonte de iluminação para quem passa. Luz, imagem e representação tornam-se uma presença ontológica singular que vai de encontro ao espectador. Tudo isso é ainda mais amplificado pelos movimentos das figuras, que interagem com a presença ou ausência do espectador. Em Ta 11 ships, a relação com o espectador parece indicar uma nova direção. Você pode dizer alguma coisa sobre suas intenções com esse trabalho, a começar pelo título? O título surgiu quando vi uma velha fotografia tirada em Seattle por volta de 1930. O último "navio alto" (tall ship) está sendo retirado do lago Union antes que a seção final da ponte Aurora seja posta no lugar. Imaginei um navio em alto mar - a visão frontal de uma extrema verticalidade vindo na direção do observador. Há uma leveza majestosa nessa imagem, algo dotado de uma extrema segurança, que continuará vindo com uma graça assustadora, não importa o que aconteça. Está escuro, muito escuro, mas se vê claramente aquela coisa bonita cortando a noite - noite que não tem o dia como referência. Pensar em alguém assim - a aproximação humana -, a idéia de "navios passando na noite", ocupava um certo espaço poético que parecia muito aberto. Eu não estava muito seguro sobre a peça até chegar a esse título. Queria que toda a situação fosse o mais despretensiosa possível. Desde a concepção da peça até sua produção, simplifiquei o movimento das pessoas, que simplesmente andam para a frente e então voltam a um lugar e a uma posição determinados, em pé ou sentadas. Há algumas interrupções, como por exemplo quando elas chegam à metade do caminho, param e voltam, ou voltam outra vez depois de já terem começado a voltar. Dei muito poucas instruções durante a gravação. Não queria nada teatral ou estético. E, em termos da peça como um todo, quis evitar que se tornasse uma experiência com tecnologia, ou qualquer coisa ligada a uma agenda multicultural. Era apenas a idéia de alguém se aproximando do observador e perguntando: "Quem é você?", como se estivesse espelhando o observador e ao mesmo tempo iluminando um espaço de possibilidades para que a própria pergunta surgisse. Basicamente, quis criar uma experiência aberta que fosse intencional e ao mesmo tempo desmontasse quaisquer construções particulares que as pessoas pudessem trazer consigo, especialmente quando chegam a um museu. Trechos de entrevistas, reescritos por Gary HiII.
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Your recent installations differ radically in their outward appearance and yet one is aware of a conceptual thread, or at least an interconnectedness of divergent ideas and, cautiously I might add, systems that embody your thinking. For the most part my recent work has developed around two strategies. And sat down beside her, Beacon ... , I believe ... and most recently, Tall ships came about in varying ways from the notion of this diffused image. It has to do with making something that is already immaterial lose its identity even further; watch it sprawl over things and dissipate into the space. In Tall ships this is brought to the extreme where, in a darkened 90 foot corridor the only things seen are projected' figures that at once are images of reality (people) and the only source of illumination for the passer-by Light, image and representation become a singular ontological presence that confronts the viewer. This is ali the more amplified since the figures' movements are interactive with the presence or absence of viewers. What about Tall ships. The relationship to the viewer seems like a new direction. Can Vou say something in general about your intentions with this work perhaps beginning with the title? The title comes from seeing and old photograph taken in Seattle around 7930. The last 'tall ship' is being moved out of Lake Union before the final section of the Aurora Bridge is put into place. I imagined a sailing ship on the high seas - that frontal view of extreme verticality coming towards you. It has a kind of majestic buoyancy of something very sure of itself - something that will come forth with a kind of terrifying grace no matter what. It's dark, it's very dark but you can see c/ear/y this beautiful thing cutting through the night - a night that isn't referenced by day To think of a person like this - the human approaching - the notion of 'ships passing in the night' took on a certain poetic space that felt very open. I don't think I was really c/ear about the piece until I had this title. I wanted the whole situation to be as unassuming as possible. From the time of conceiving the piece to actual production, I simplified the movement of the people to only coming forward and then returning to a particular place and position of either standing or sitting. There are a few interruptions to that, for instance, after coming half way forward they would pause and go back or they would come back a second time after beginning to returno I gave very little instruction during the recordings. I didn't want any theater or aesthetic. And in terms of the piece as a whole I wanted to avoid it being an experience with technology or anything having to do with a multi-cultural agenda. It's simply the idea of a person coming up to you and asking, 'who are you?' by kind of mirroring you and at the same time illuminating a space of possibility for that very question to arise. Basically, I wanted to create an open experience that was delibera te and at the same time would disarm whatever particular constructs one might arrive with especially in a museum. Excerpts of interviews, rewritten by Gary Hill
Crux
Crux
Esta vídeo-instalação de Gary HiII (1983-87) é uma enorme composição de cinco monitores que mostram cinco teipes sonoros. Os cinco monitores estão dispostos numa espécie de crucifixo, mostrando respectivamente a cabeça do artista, as mãos direita e esquerda, e os pés direito e esquerdo, contra um cenário mutável: uma grande casa dilapidada, árvores e céu, muito cascalho e pedras quebradas, por vezes cobertos pela água. Há obviamente um desenvolvimento, de cerca de 28 minutos, no vídeo. Na breve apresentação que Edith Decker faz de Gary HiII, incluída em seu inspirador trabalho conjunto com Wulf Herzogenrath, Vídeo skulptur(DuMont 1989), ela descreve a criação dos videoteipes: foram filmados na arruinada ilha Bannerman, no rio Hudson; HiII prende cinco câmeras no peito, braços e pernas, respectivamente, voltadas para sua cabeça, mãos e pés, e então começa a andar, cruzando a ilha em direção à praia. Decker nos informa que HiII chama sua instalações, que ele distingue de seus vídeos, de system performances. A instalação é uma espécie de míse-en-scene espacial, uma performance. Mas enquanto outras "vídeo-esculturas" de HiII são performances de uma instalação, Crux é a instalação de uma performance, ou seja, um passeio filmado. Mastambém aqui, como em todo trabalho de Gary HiII, a representação é filosoficamente substancial e sensual. Cruxfala da ausência do corpo. Sou cinco câmeras. Elas estão colocadas no espaço negro, onde os cinco monitores constituem os pontos extremos. O corpo está incrito no escuro, na ausência. "A alma é o lugar onde o corpo e o mundo exterior se encontram", declara o romancista alemão Novalis. O rosto é geralmente obscurecido por sombras, enquanto mãos e pés se tornam cada vez menores, cada vez menos humanos - mecanismos quase abstratos destinados a prender e soltar. Então, de repente, voltamos a ver o rosto, as mãos e os pés à luz cambiante do mundo que os cerca (uma ilha). Os monitores tornam-se superfícies de contato e as imagens lidam com coisas simples: ver, tocar, erguer-se, caminhar. Agora, o rosto, as mãos e os pés fazem parte do cenário, da natureza, e é como se eles (isto é, ele) empurrassem a superfície da imagem contra nós; as mãos e os pés transformam-se em nossas mãos e nossos pés, enquanto o "mundo" gira e desaparece sem cessar. A instalação transforma-se num épico, num arquetípico passeio romântico pelo deserto. E Cruxtransforma-se também no que os antigos teólogos chamavam de "cruz do intelecto", ou seja, um paradoxo que é intelectualmente incompreensível, mas deve ser aceito pela fé. Temos que ter fé na presença do corpo, mesmo em sua ausência.
Gary Hill's video installation Crux (7983-87) is a very large composition of five monitors, showing five tapes with sound. The five monitors are arranged in a kind ofcruciform figure and show the artist's head, left and right hand, and left and right foot respectively, against a changing background of landscapes: a large dilapidated house, trees and sky, a lot of rubbles and broken stone, eventually covered with water. There is obviously a development, of about twenty eigth minutes, in the video. In Edith Decker's brief presentation of Gary Hill, which is included in her own and Wulf Herzogenrath's' very exclting and inspiring Video Skulptur (DuMont 1989), she describes the creation of the video tapes: theyare shot on the ruined Bannerman Island in the Hudson River where Hill attached five cameras to his chest, arms and legs respectively, aimed at his head, hands and feet, and then he began to wander down across the island to the waterline. Hill calls his installations, which he distinguishes sharply from his video films, "system performances", Decker informs us; the installation is a kind of spatial mise-en-scene, a performance situation. But whereas other of Hill's "video sculptures" are performances of an installation, Crux is an installation of a performance, namely the filmed wandering. But also here, as in ali of Gary Hill's work, the representation is philosophically substantiated and sensuous. Crux "is about" the absence of the body I am five cameras. They are placed in the black space in which the five monitors constitute the extreme points. The body is inscribed in blakness, in absence. "The soul is where the body and the outer world meet", the German romanticist Novalis claims. The face is often obscured by shadows, and at the same time the hands and feet are experienced as sma//er and smaller, as less and less human - they become almost abstract devices for gripping and averting. Then suddenly again it is the face and two hands and two feet we see in the changing light from the surrounding world (an island). The monitors become contact surfaces, and the images deal with simple things: seeing, touching, standing and walking. Similarly now the face, the hands and feet are part of the background, of nature and it is as if they (he, that is) hold out the image surface against us, the hands and feet become our hands and feet, while the "world" i~ constantly whirling and disappearing. The installation turns into an epic, the very archetypal romantic wandering in a wasteland. And the Crux also turns into what the old theologians called "a cross of the intellect", that is, a paradox that is incomprehensible to the intellect but had to be accepted by means of falth. We must have faith in the presence of the body in its absence.
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Gary HiII nasceu em Santa Monica, Califórnia, em 1951, e vive atualmente em Seattle, Washington. Originalmente escultor, começou a trabalhar com som e vídeo no início da década de 70 e produziu vídeos e instalações multimídia. Recebeu bolsas das fundações Rockefeller, Guggenheim, National Endowment for the Arts, além de uma bolsa de intercâmbio cultural JapãoEstados Unidos. Gary Hill was bom in Santa Monica, Califomia, in 1951, and currently lives in Seattle, Washington. Originallya sculptor, he began working with sound and video in the early 1970s and has produced vide o works and mixed media installations. He has received fellowships from the Rockefeller, Guggenheim Foundations, and The National Endowment for the Arts, including a JapanjUnited States cultural exchange fellowship. Obra apresentada/Work in the exhibition Crux, 1983-87 instalação/ installation 5 videoteipes, 5 monitores, 5 alto-falantes e sincronizador/ 5 videotapes, 5 monitors, 5 speakers and synchronizer Coleção Donald Voung Gallery, Seattle
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Crux, 1983-87 5 videoteipes, 5 monitores, 5 alto-falantes, sincronizador/ 5 videotapes, 5 monitors, 5 . speakers, synchronizer Coleção Donald Young Gallery, Seattle
oTRABALHO DA FLORESTA
THE WORK DF THE FOREST
"Novas formas mesclam-se às antigas de maneiras fantásticas. Na natureza, o novo é mítico porque seu potencial ainda não foi realizado. Na Consciência, o antigo é mito, pois seus desejos nunca foram satisfeitos."
IINew forms mingle with old forms in fantastic ways. In nature, the new is mythic beca use its potential is not yet realized. In Consciousness, the old is myth beca use its desires were never fulfilled. " Walter Benjamin 1
Walter Benjamin
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Vivemos numa era de imagens, em que a eficácia da imagem transformada e transmitida é que nos indica em que devemos acreditar. É através da força das imagens que chegamos a um consenso com nosso passado histórico e nossos desejos de futuro. O que podemos fazer com essas imagens de nosso passado que existem como relíquias, como vestígios de outros tempos, de um momento divergente? Podemos "Iê-Ias" à luz das histórias oficiais? E seu papel como histórias "turísticas", que neutralizam o passado, tornando-o de fácil consumo? Essas eram questões que me interessavam quando comecei a pesquisar a Exposição do Congo de 1897. Essa exposição, que reuniu artefatos colhidos na colônia do rei Leopoldo 11, o Congo Belga, e a arquitetura dos praticantes do Art Nouveau vanguardista de Bruxelas, produziu uma constelação de influências que nos permitem examinar de que modo a expansão colonial, a arquitetura utópica, a política do fim de século e a ideologia da Feira Mundial se entrecruzaram e ao mesmo tempo sustentaram significados conflitantes e distintos dos que originalmente faziam parte de suas histórias. Na obra-prima inédita de Walter Benjamin, Passagen-Werk (uma interrogação sobre a Paris do século XIX), ele tentou criar uma "dialética do ver", em que o poder interpretativo das imagens é que concretiza seus temas conceituais, com referência a um mundo maior, externo aos textos e às imagens. Em sua metodologia, é a justaposição de texto e imagem sobre o tempo que elucida uma verdade histórica. Ao idealizar esse método, Benjamin estava interessado nas maneiras como as técnicas alegóricas do período barroco poderiam reviver em forma de imagens dialéticas: imagens que, como os emblemas barrocos, pudessem ser "Iidas".
We live in an age of images, where it is the efficacy of the image transformed and trasmitted that tells us what to believe around the world. It is through the power of images that we come to terms with our historical past and our desires for the future. What are we to make of these images of our past that exist as relics, as traces of a different time, of a divergent moment? Can we read them in the light of official histories? And in lieu of "touristic" stories that neutralize the past and make for easy consumption? These were questions that faced me as I began research on the Congo Exposition of 1897. This exhibition, which showcased both artifacts collected from King Leopold 1I's priva te colony, the Belgian Congo, and the architecture of Brussels' leading Art Nouveau practitioners, produced a constellation of influences that might allow us to examine the ways in which colonial expansion, utopian architecture, end-of-the-century politics and World's Fair ideology intersect, and simultaneously sustain conflicting and different meanings than those that were originallya part of their initial histories. In Walter Benjamin's unpublished masterpiece Passagen-werk (an interrogation of 19th-century Paris), he attempted to create "a dialectics of seeing" where it is the interpretative power of images that makes his conceptual points concrete, with reference to the larger world outside the texts and images. In his methodology, it is the juxtaposition of text and image over time that elucidates a historical truth. In devising this method Benjamin was interested in the ways in which allegorical techniques of the Baroque period might be revived in the form of dialectical images: images which like the Baroque emblems, could be "read".
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Como escreveu Susan Buck-Morss, "os dramas barrocos eram reflexões melancólicas sobre a inevitabilidade da deterioração e desintegração. Em Passagen-Werk, a desvalorização da (nova) natureza e seu status de 'ruína' tornam-se politicamente esclarecedores. Os dejetos da cultura industrial nos ensinam não a necessidade de submissão à catástrofe histórica, mas a fragilidade da ordem social, que nos diz que essa catástrofe é necessária. As ruínas de monumentos construídos para representar a imortalidade da civilização tornam-se prova, na verdade, de sua transitoriedade".2 Ao unir uma tradição alegórica à teoria da montagem, Benjamin tentou criar um sentido histórico que se coadunasse com a tecnologia e as categorias cambiantes do que seria considerado natureza (ou o passado recente da natureza - representações que a civilização fizera parecerem naturais). Esta foi uma empreitada filosófica, e não literária, pois demonstra como a história é submetida às justificativas ideológicas do mundo material. De modo significativo, o interior burguês assume papel crucial como "imagem dialética", na qual a realidade do capitalismo industrial manifesta-se visivelmente. "A 'imagem dialética' tem tantos níveis lógicos quanto o conceito hegeliano. É a maneira de ver que cristaliza elementos antitéticos ao fornecer eixos para seu alinhamento. Benjamin mapeia visualmente as idéias filosóficas no âmbito de um campo irreconciliável e transitório de oposições, que poderia ser mais bem descrito como coordenadas de termos contraditórios, cuja 'síntese' não é um movimento em direção à resolução, mas o ponto de intersecção desses eixos."3 No vértice desse eixo estão os objetos comercializados, cuja estampa é especialmente visível nos luxuosos interiores burgueses: o "fetiche" como palavra-chave do objeto, como fantasmagoria mítica, uma forma imobilizada da história. "Corresponde à forma materializada da nova natureza, condenada ao moderno Inferno do novo como algo sempre igual (moda). Mas essa fantasmagoria fetichizada é também a forma em que jaz congelado o potencial humano, socialista da natureza industrial, aguardando a ação política coletiva que poderia despertá-la."4 E é na "ruína" que as imagens-desejo do século passado surgem, como entulho, como sonhos frustrados no momento presente. Pode a tradição documental, tão superutilizada pela mídia televisiva, ser rearticulada através de uma "dialética do ver", ou estaria a forma de montagem esgotada e irrecuperável? Inversamente, seria possível criar uma estrutura visual em que a montagem possa ser re-situada, além dos limites de estereótipos televisuais? Seria a idéia de uma teoria radical da montagem incompatível com a produção do que eu esperava ser uma intervenção na evidente celebração do estilo arquitetônico mais notável, e turístico, de Bruxelas? "Nunca pensei neste Art Nouveau como um estilo com um nome. Não. Vi-o como a Nova Arte. Uma arte liberta, mas também aliada à tecnologia a serviço da beleza, revivendo as tradições do passado, reformulando-as para o presente. O que vi?
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As Susan Buck-Morss writes, uthe Baroque dramas were melancholy reflections on the inevitability of decay and disintegration. In the Passagenwerk the devaluation of (new) nature and its status as 'ruin' become instructive polítically. The debris of industrial culture teaches us not the necessity of submitting to historical catastrophe, but the fragility of the social arder that te//s us that this catastrophe is necessary. The crumbling of the monuments that were built to signify the immortality of civilization become proof, rather, of its transiency. U2 In tying an allegorical tradition to montage theory, Benjamin was attempting to create a sense of history that could come to terms with technologyand the shifting categories of what might be taken as nature (ar the recent past of nature-representations that civilization had made seem natural). This was a philosophical and not a literary undertaking, for it shows the ways in which history is subjected to the ideological underpinnings of the material world. Significantly, it is the bourgeois interior that plays a crucial role as a udialectical image Uin which the reality of industrial capitalism is manifested visibly. uThe 'dialectical image' has as many leveis of logic as the Hegelian concept. It is a way of seeing that crystalizes antithetical elements by providing axes for their alignment. .. Benjamin charts philosophical ideas visually within an unreconciled and transitory field of oppositions that can perhaps best be pictured in terms of coordinates of contradictory terms, the 'sythesis' of which is not a movement toward resolution, but the point at which their axes intersect. U3 And at the apex of this axis is the commodity, the imprint of objects particularly visible in plush bourgeois interiors: uthe fetish Uas the keyword of the commodity, as mythic phantasmagoria, an arrested form of history. Ult corresponds to the reified form of new nature, condemned to the modem Hell of the new as always the same (fashion). But this fetishized phantasmagoria is also the form in which the human, socialist potential of industrial nature lies frozen, awaiting the collective political action that could awaken it. U4 And it is in the uruin Uthat the wish-images of the past century appear, as rubble, in the present moment as unfulfilled dreams. Can the documentary tradition, so overworked by television media be reU articulated through a udialectics of seeing , ar is the form of montage exhausted and unredeemable? And conversely, is it possible to create a visual construct in which montage can be resituated, outside the bounds of the televisual stereotypes? Is the notion of a radical montage theory at odds with the production of what I hoped would be an intervention within the straightforward celebration of Brussels' most notable, and touristic, architectural style ? UI never thought of this Art Nouveau as a style with a name. No. I saw it as the New Art. An art liberated from, but also wedded to technology in the service of beauty, reviving the traditions of the past, reforming them for the present. What did I see ?
"Grandes edifícios de ferro; interiores fantásticos - não para os aristocraté}s, mas para todos; viagens por ferrovia, a máquina do desejo; a Africa civilizada; a mulher liberada; os edifícios como monumentos a uma grande arte de expressão e sentimento interior. A cultura e a natureza, como uma coisa só. Todo o mundo transformado."5
oArt Nouveau assumiu diferentes formas em diferentes culturas. É importante compreender que o Art Nouveau na Bélgica foi utópico e implicava uma transformação social com base na integração de todas as artes na vida cotidiana, em oposição, por exemplo, ao Art Nouveau na França, onde foi um reposicionamento aristocrático do movimento artesanal, destinado a proteger a hegemonia francesa. No entanto, há traços comuns entre as diversas manifestações do Art Nouveau nos diferentes países europeus. "Vi isso como se estivesse sonhando. Talvez estivesse, não sei. Não era eu mesmo. Você e eu estávamos valsando, girando pela sala, quando subitamente ela se transformou numa floresta. As cadeiras tornaram-se árvores. O piso, o tapete da natureza. Tão verde, o cheiro. Por um instante, senti a felicidade mais completa. Mas então as árvores lançaram longos galhos, que envolveram meu corpo, detendo-me. Eu não podia escapar. Pensei que sufocaria."6 Um desses traços comuns poderia ser caracterizado como a busca da interiorização; a criação de um espaço doméstico em que a fantasia e a imaginação pudessem mesclar-se livremente com o mundo dos sentidos. Jean-Martin Charcot estava trabalhando com histéricos em Paris; Sigmund Freud começava a tratar pacientes em Viena; a estimulação nervosa e o trabalho com a psique eram atividades legitimadas no âmbito de um largo espectro, inclusive a coleção e os escritos dos irmãos Goncourt e os romances de Marcel Proust. Na "sala em torvelinho" do início de O caminho de Swann, o narrador não necessita mais de indicações históricas para fornecer uma estrutura anedótica (como no caso dos irmãos Goncourt brincando de corte do século XVIII nos confins de sua casa) para a projeção visual. Pelo contrário, o tumulto da energia mental gerada pelos moradores basta para pôr a sala a girar, envolvendo a todos na centrífuga da psique. A "sala em torvelinho" funciona como metáfora que dissolve o corpo e os sentidos no espaço doméstico. 7 As teorias sobre a psique foram assimiladas pelos artistas, especialmente os simbolistas. O simbolismo objetiva o subjetivo. O estado de sonho é a vida. Na pintura, isso pode ser visto claramente na obra de Gustav Klimt, em que o corpo da mulher parece se fundir ou se dissolver no espaço a seu redor.
Great iron buildings; fantastic interiors-not for aristocrats, for everyone; rail travei, the engine of desire,· Africa, civilized· woman, liberated,· buildings as monuments to a great art of expression and inner feeling. Culture and nature, the same. The whole world, changed. "5 Art Nouveau took ditferent forms in different cultures. It is important to understand that Art Nouveau in Belgium was utopian and implied a social transformation based on the integration of ali the arts within daily lite, as opposed for example, to Art Nouveau in France where it was an aristocratic resituation of the craft movement designed to protect French hegemony. Yet among the various manitestations of Art Nouveau in ditferent European countries there are common traits. "1 saw it as though I was dreaming. Perhaps I was. I don't know I was not myself You and I were waltzing, spinning in the room. When suddenly, the room became a forest. The chairs turned to trees. The floor, nature's carpet. 50 green, the smell. For a moment I felt the most complete joy. But then, the trees grew long branches. Theyencircle my body, not letting me go. I couldn't escape. I thought I would suffocate. "6 One of these common traits might be characterized as the pursuit of interiority,· the creation of a domestic space where fantasy and imagination could mingle freely with the world of the senses. Jean-Martin Charcot was working with hysterics in Paris,· 5igmund Freud was beginning to treat patients in Vienna; nervous stimulation and work on the psyche were activities that were legitimated across a broad spectrum, including the collecting and writings of the Goncourt brothers and the noveis of Marcel Proust. In Proust's "whirling room" at the beginning ofSwann's way, the narrator no longer needs historical cues to provide an anecdotal frame (as was the case with the Goncourt Brothers' recreation of 18th century court lite within the confines of their home) for visual projection. Instead, the tumult of mental energy generated by the inhabitant is enough to set the room spinning, trapping ali in a centrituge of the psyche. The "whirling room" functions as a metaphor which dissolves the bodyand the senses into domestic space. 7 Theories about the psyche were assimilated by artists, in particular the 5ymbolists. 5ymbolism objectities the subjective. The dreamstate is lite. In painting this can be seen clearly in the work of Gustav Klimt, where it is the body of the woman which seems to have merged or dissolved with the space around her. New technologies elimina te ditferences among workers as ali workers can now perform the same jobs. In terms of women, this depersonalization of gender ditferences connoted a loss of sexuality and produced the disassociation so characteristic of the hysteric.
Novas tecnologias eliminam as diferenças entre os trabalhadores, já que todos os trabalhadores podem desempenhar hoje as mesmas tarefas. Quanto às mulheres, essa despersonalização de gêneros conotou uma perda de sexualidade e produziu a dissociação tão característica dos histéricos.
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"Ó êxtase: o corpo dissolve-se na claustrofobia da vida doméstica. O lar, um santuário capaz de reproduzir todas as maravilhas da natureza - opulência e enfado. A melancolia típica dos reis poderia ser sentida por qualquer um. O corpo da mulher torna-se inútil, enquanto as invenções tecnológicas a libertam, embora sem um lugar."s "A cultura jamais progride. Apenas os estilos mudam. A história está emperrada como um disco quebrado na atual estrutura de relações sociais. Os trabalhadores não podem parar de trabalhar, assim como as classes que vivem desse trabalho não podem permitir que a história avance. Tantas revoluções, mas nada mudou realmente. "9 "0 Art Nouveau belga pode ser visto como um produto de várias forças: a criação do Partido dos Trabalhadores em 1885, com suas inclinações utópicas; a adoção do sufrágio universal em 1892; a contribuição dos intelectuais franceses que fugiram da Comuna de 1871; a vasta riqueza pessoal acumulada por Leopoldo 11 com o controle do Congo Belga. Muitos arquitetos envolvidos no Art Nouveau em Bruxelas, inclusive Paul Hankar e Victor Horta, pertenciam a grupos artísticos e literários, como o Grupo dos XX ou o Cercle du Sillon. Esses grupos tinham orientação idealística e discutiam as diversas maneiras como a nova arte poderia transformar a ordem social existente."lo A arquitetura, como ápice de todas as artes, era especialmente apropriada para efetuar essa transformação, já que podia conter e unir todas as artes sob uma só disciplina. Embora semelhante a movimentos predecessores de artes e ofícios em outros países, na Bélgica não havia uma agenda política específica a ser implementada. Pelo contrário, havia um vago desejo de transformação de tudo o que era desvitalizante na vida burguesa; mas em que isso seria transformado permaneceu.uma incógnita. E, certamente, essa falta de programa político contribuiu para sua fácil assimilação, ao ser superado por outros estilos. A arquitetura art nouveau em Bruxelas é uma lembrança veemente da riqueza da cidade no final do século XIX. Há inúmeras casas preservadas cujo enfeitado individualismo acena desde a estreita entrada, que homenageia a habitação unifamiliar; um lugar onde as idiossincrasias podem florescer e mesmo ser celebradas em tom eminente. Os arquitetos art-nouveau empregaram clarabóias e outros tratamentos de iluminação para descerrar os terrenos profundos e estreitos que constituem os loteamentos de Bruxelas. Os expressivos tratamentos de madeira e azulejos visavam investir o interior com um sentido de natureza, trazendo para dentro os espaços abertos. Essa relação com a natureza não era nova; tanto as tradições artísticas e artesanais como o rococó tinham empregado motivos naturais. Na tradição de inspiração rousseauniana, a natureza equivalia a uma simplicidade sem adornos, enquanto no rococó os motivos naturais foram levados a fantásticos extremos filigranados. Em Bruxelas, desejava-se o toque, a sensação da natureza, a natureza trazida para dentro, indômita, não domesticada. Esta era a natureza de outro lugar, um lugar selvagem e indômito, não a das suaves terras agrícolas, mas de uma exótica e distante paisajlem. Era uma aventura, uma natureza a ser explorada. Era a Africa. Não se pode deixar de notar que todos os países que possuem l!ma tradição de Art Nouveau estiveram envolvidos na colonização da Atrica.
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"Oh ecstasy: The body dissolving into the claustraphobia of domestic lite. The home, a sanctuary capable of repraducing ali the wonders of nature opulence and boredom. The melancholy known to kings could be experienced byanyone. The body of woman ali but useless as technological inventions render her free, yet without a place. 8 Culture never pragresses. It is only styles that change. History is stuck like a braken record in the present structure of social relations. The workers cannot afford to stop working any more than the classes that live off their labor can afford to let history go forward. 50 many revolutions, yet nothing has really changed. 9 Belgian Art Nouveau might be seen as a praduct of several forces: the creation of the Workers Party in 1885 with its utopian leanings; the adoption of universal suffrage in 1892; the contribution of exiled French intellectuals freeing the Commune of 1871; the vast personal wealth accrued by Leopold li thraugh his contrai of the Belgian Canga. Many of the architects involved in Art Nouveau in Brussels, including Paul Hankar and Victor Horta belonged to literary and artistic graups, such as the Graup of XX, ar the Cercle du 5illon. These graups were idealistically oriented and discussed the many ways that a new art might transform existing social orders. "10 Architecture, as the culmination of ali the arts, was particularly suited to effect this transformation as it could contain and unite ali the arts under one discipline. Although this is similar to earlier arts and crafts movements in other countries, in Belgium there was no specitic polítical agenda to be implemented. Rather, there was the vague longing for a transformation of ali that was stultitying within bourgeois existence; but into what ít would be transformed was left unknown. And certainly, this lack of a political pragram contributed to its easy assimilation as other styles supplanted it. The architecture of Art Nouveau in Brussels is a startling reminder of the wealth of Brussels at the end of the 19th century. Preserved are numeraus houses whose ornate individualism beckons fram the narraw entrance ways that make up a homage to the single family dwelling; a place where idiosyncracies can flourish and even be celebrated within an eminent doma in. The Art Nouveau architects employed skylights and other light-we/l treatments in arder to open up the narraw, deep plots that comprise a Brussels' city lot. These expressive wood and tile treatments were meant to invest the interior with a sense of nature, bringing the outdoors inside. This relation to nature was not new,· both earlier arts and crafts tradítions and the Rococo had employed nature motits. In the Rousseau-inspired tradition, nature was the equivalent of unadorned simplicity, whereas in Rococo nature motits were taken to fantastic filigreed extremes. In Brussels, it was the feel of nature, the sensation of nature that was desired, nature braught inside, not tamed, not domesticated. This was nature from another place, a wild, untamed place, not fram the gentle ra/ling farmlands, but fram an exotic landscape far away. This was an adventure, a nature to be explored. This was Africa. It cannot go unremarked that ali the countries that possess an Art Nouveau tradition were involved in the colonization of Africa.
"A África é mais inteligente que os estereótipos - primitiva, selvagem, o continente sombrio -, pois foi capaz de manter afastados os mercadores brancos até quase o final do século XIX:'11
"Africa is smarter than the stereotypes - as primitive, as savage, as the dark continent - for it was able to keep white traders out until near/y the end of the 79th century. "71
Em 1872, o jornal The New York Heraldfinanciou a expedição de H. M. Stanley à África para encontrar o dr. Livingston, o missionário e explorador do "coração" da África. Em 1878, Leopoldo 11 contratou Stanley como seu primeiro-ministro no Congo, uma área de 2,3 milhões de quilômetros quadrados~ equivalente a quase metade dos Estados Unidos. A colonização da Africa foi uma das últimas tentativas de subjugar completamente a civilização das culturas indígenas. Nesse mesmo período, os EUA implementavam seu "destino manifesto", reclamando todas as terras tão longe quanto o olho (branco) pudesse enxergar (e não enxergou que essa terra pertencia aos americanos nativos). Stanley dedicou-se ativamente a descobrir a melhor forma de explorar as riquezas naturais do Congo. Em 1885, a Ata Geral da Conferência de Berlim deu a Leopoldo 11 o direito de gerir o "Estado Livre do Congo" como sua propriedade particular. Foi, na verdade, a grande riqueza do Congo que permitiu os luxuosos projetos de edificação empreendidos por Leopoldo em sua época, e que também produziu muitas residências da grande burguesia, pois Leopoldo incentivou os investimentos no Congo.
In 7872The New York Herald financed H.M. Stanley's expedition to Africa to find Dr. Livingston, the missionary and explorer in the "heart" of Africa. In 7878 Leopold 11 hired Stanley as his chief minister in the Canga, a 900,000 square mile area equal to near/y one halfthe size of the u.s.A.. The colonization of Africa was one of the last attempts to completely legisla te the wholesale civilization of indigenous cultures. During this same period the U.S.A. was implementing its "manifest destiny", which c1aimed allland as far as the (white) eye could see (and did not see that this land belonged to Native Americans). Stanley was actively involved in discovering how the natural resources of the Canga could best be exploited. In 7885 the General Act of the Ber/in Conference gave Leopold 11 the right to develop "The Canga Free State" as his personal property. It was, in fact, the great wealth of the Canga that allowed for the luxurious building projects undertaken by Leopold during this time and which also produced many of the haute bourgeoisie homes, for Leopold encouraged Canga investment.
"0 efeito mais conspícuo da Exposição U,niversal de 1878 foi reforçar a idéia do destino colonial da França na Africa. Quando o Musée Africain foi fundado (1879), seus patrocinadores esperavam convencer o público da continuidade que pensavam existir entre a ciência e suas aplicações na conquista de novos territórios. Durante essa era, muitas das ciências - zoologia, botânica, etnografia - foram concebidas em parte para fornecer informações sobre os países para que pudessem ser colonizados:'12 "Passeamos por todo o maravilhoso Parque Tervuren.Saímos da ruidosa galeria das Máquinas - que chiam, cospem, gemem e rugem para a Exposição do Congo e sua celebração da nova arte, o Art Nouveau. A vida é arte. Aqui estão as ferramentas para a concórdia social, mais poderosa e mais bela que qualquer outra. Aqui está uma arte viva que nos pede para conquistar o que ela faz: a harmonia total com a natureza. E aqui está a natureza, tão abundante, tão magnânima, irrecusável. Essa é a maravilha que a Arte pode produzir:'13 De certa forma, a colonização era vista como o antídoto da escravidão. A Force Publique derrubou o tráfico escravo muçulmano que ainda florescia na África central na década de 1890. Se analisarmos alguns dos frisos exibidos na Exposição do Congo de 1897, veremos como a colonização se opõe à escravidão como força civilizadora. Do lado esquerdo, árabes armados, com longas túnica~, conduzem vários homens negros, supostamente para a escravidão. A direita há uma cena de aldeia. Diversas mulheres sentadas atrás de cestos, com a cabeça entre as mãos, transmitem uma tristeza indizível. A imagem sugere que essa pobre gente não tem uma ordem salvadora em sua vida. E que é vítima dos árabes, que violam as mulheres e vendem os homens à escravidão. Comparada a isso, que gentil e benigna é a dominação belga. 14
"The most conspicuous effect of the Exposition Universelle of 7878 was to . strengthen the idea of France's colonial destiny in Africa. When the Musée Africain (7879) was founded, its sponsors hoped to convince the public ofthe continuity that they thought should exist between science and their applications in the conquest of new territories. During this era many of the sciences - zoology, botany, ethnography - were conceived in part to provide better information about the countries so that they could be colonized. "12 "We wander ali over the beautiful park Tervuren. Away from the noisy gallery of Machines - hissing, spittting, howling, roaring - to the Canga Exposition and its celebration of the new art, Art Nouveau. Life is Art. Here are the tools for social concord, more powerful, more beautiful than any other. Here is a living art that asks us to achieve what it does: total harmony with nature. And here is nature, so abundant, so bountiful, who could refuse. That is the wonder that Art can accomplish. "13 In some ways colonization was seen as the antidote to slavery. The Force Publique knocked out the Muslim slave trade that was still flourishing in Central Africa in the 7890s. If we analyze some of the friezes shown in the Canga Exposition of 7897, we can see how colonization is opposed to slavery as a civilizing force. On the left side armed Arab men, in long dresses, take several black men presumably into slavery. On the right is a village scene. Several women sit behind baskets with their heads in their hands communicating an unspeakable grief. The display suggests that these poor people have no saving arder in their lives. And that theyare victimized by Arabs, who rape their women and sell their men into slavery. Compared to this how mild and benign is Belgium rule. "
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Esses valores foram institucionalizados por missionários que, ao converterem os chefes tribais ao cristianismo, forçando-os a abandonar as esposas e também grande parte de suas riquezas, dissolveram a estrutura da vida tribal num modelo fundado no individualismo ~ numa cultura em que o individualismo ainda não tivera lugar. Mas a colonização não foi o antídoto para a escravidão. Campos de trabalho com servidão forçada dividiram as famílias. Homens e mulheres usavam coleiras que designavam o campo a que pertenciam. De longe, os piores abusos ocorreram no período conhecido como da "borracha vermelha", em que o exército colonial tinha permissão para pilhar e massacrar, de modo a "encorajar" os nativos a fornecer-lhes borracha. Quase 10 milhões de pessoas morreram durante esse período, e em 1908 Leopoldo 11 foi convencido a ceder o Estado Livre do Congo à Bélgica, quando se tornou o Congo Belga. A estrutura da vida tribal é extremamente diferente daquela da cultura ocidental. As relações sociais processam-se por caminhos indiretos e sem comandos hierárquicos. São culturas orais, de modo que as histórias e provérbios têm papel importante. "Se um homem for mais importante que outro, e o homem menos importante lhe fizer uma pergunta direta e ele não souber a resposta, perderá prestígio. E se ele souber a resposta parecerá saber mais que o homem mais importante, e este ficará desprestigiado. Logo, é melhor não fazer perguntas diretas, e as relações sociais permanecerão intactas}5 "Conheci há pouco tempo um homem num bar. Ele era africano. Tomamos vários copos juntos, mas na hora de pagar ele não o fez. Não era um bandido, era apenas como os exploradores europeus que investigaram a vida nativa na África, apanhado sem moeda local no bolso."16 Já na Exposição Universal de 1889, em Paris, os africanos foram persuadidos a morar em habitações "típicas" nos terrenos da exposição. Concordaram, porque lhes haviam prometido uma vida melhor quando terminasse o evento mundial. Muitos morreram de frio e de doenças cujos nomes não sabiam. Os sobreviventes foram colocados em zoológicos, em perm~nente exibição. 17 Leopoldo 11 tinha uma fantasia sobre a vida na Africa. Construiu os viveiros Laeken para imitar o Congo, numa espécie de jardim ideal, uma versão fantástica da vida africana. E foi ali que viveu com uma garota parisiense de 16 anos, que ficou conhecida como baronesa Blanche de Vaughan. Ela lhe deu dois filhos. E foi ali que ele passou seus últimos dias. Laeken foi iniciado em 1874 e levou quase vinte anos para ser concluído. Por volta de 1890, Leopoldo 11 percebeu que precisava de muito mais investimentos para produzir a infra-estrutura necessária ao desenvolvimento do Congo. De várias maneiras, a Exposição do Congo pode ser vista como a realização de suas fantasias sobre o Congo. Como em sua representação idealizada da vida no Congo, ela tentou vender aos empresários belgas a idéia de investir seus capitais.
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These values were institutionalized by missionaries whose conversion of chieftains into Christians, forcing them to give up their wives and hence much of their wealth, dissolved the structure of tribal lite into a model based on individualism; in a culture where individualism had as yet no place. But colonization was not an antidote to slavery. Work camps with forced indentured servitude separated families. Men and women wore collars that announced which camp they belonged to. By far the worst abuses occurred during the period known as "the red rubber period" where the colonial army was allowed to pillage and massacre so as to "encourage" the natives to furnish rubber. Nearly 7Omillion people died during this period, and by 7908 Leopold Ii was convinced to cede the Congo Free State to Belgium where it became the Belgian Congo. The structure of tribal lite is exceedingly different from that of Western culture. Social relations proceed along indirect routes, and without hierarchical commands. Cultures are oral so story-telling and proverbs play an important role. "If a man is more important than another man, and is asked a direct question bya less important man, and he does not know the answer he willlose face. And, if he does know the answer, he wíll seem to know more than the more important man, and then the more important man will lose face. Therefore, it is best not to ask questions directly and social relations will stay intact. "15 "1 met a man in a bar recently. He was from Africa. We had a lot of drinks together, but when it came time to pay, he did not. He was not a criminal, he was just like those European explorers in Africa investigating native lite, and caught without any local currency. "16 As early as the 7889 Exposition Universelle in Paris, African peoples were persuaded to inhabit "typical" dwellings on the exposition site. Theyagreed because they were promissed a better lite after the World's Fair finished. Often they died from the cold and from diseases whose names they did not know Survivors were placed in the zoos, permanently on display.17 Leopold Ii had a fantasy about African life. He constructed the Laeken greenhouses to mimic the Congo as a kind of idealized garden, a fantastic version of African lite. And it is here that he lived with her, a sixteen-year-old Parisian girl, whp came to be known as Baroness Blanche de Vaughan. She bore him two sons. And it was here that he spent the last days of his lite. He began Laeken in 7874 - it took nearly 20 years to complete. Byabout 7890 Leopold Ii realized that he needed much more investment capital to produce the infrastructure necessary to develop the Congo. In many ways the Congo Exposition might be seen as the fulfilment of his fantasies about the Congo. As in its idealized representations of Congo lite, it attempted to sell Belgium businessmen the idea of investing capital.
Essa história sobre o Congo é bem conhecida. Mas na arte temos outra história, que vem a ser a marcante influência que os objetos africanos detêm sobre o mundo artístico - de meados da década de 1880, quando os primeiros objetos foram mostrados no Musée de I'Homme, em Paris, e reproduzidos em revistas como L'lIlustration, até os anos 1950. Como era possível valorizar a arte e os objetos produzidos por culturas africanas e não valorizar a cultura desses povos? Isso foi possível porque, ao nível da representação, os povos africanos tinham o status de meros objetos comerciais. O naturalista alemão Sch,weinfurth fez muito para promover a idéia de que no interior da Africa, livre das influências cristã e muçulmana, havia sociedades com alto nível cultural, como as tribos Zande, Congo e Mangbetu. Muitos objetos reunidos em suas jornadas e nas de outros cientistas pela África foram parar no Musée Africain, e também foram publicados em Le Tour du Monde, uma importante revista da época. E embora não haja prova direta de que os arquitetos ligados ao Art Nouveau tenham coletado objetos africanos, é muito provável que tenham visto alguns deles em museus ou revistas. Leopoldo deu instruções explícitas para que seus ministros reunissem artefatos. Esses objetos parecem ter sido guardados em edifícios reais até a Exposição do Congo, mas certamente eram conhecidos dos arquitetos quando estes começaram a preparar a mostra, em 1893. Na primavera de 1991, Noir et Blanc (Preto e Branco), uma exposição do sociólogo holandês Félix de Rooy, foi inaugurada em Bruxelas. Em diversas salas, foi mostrada a história devastadora das representações brancas dos povos africanos. A começar pelos primeiros estudos de esqueletos e pelos anúncios da escravidão, continuando com a colonização e, mais tarde, com a transformação de imagens africanas em produtos comerciais, Noir et Blanc dá voz a um passado reprimido, permitindo-nos examinar o que foi reprimido e como essa repressão foi representada. E há o próprio Museu Terverun, com uma das melhores coleções de objetos do Congo Belga. Lá estão artefatos de mais de cem povos indígenas, e pode-se ver em suas muitas formas curvilíneas o poder da arte e dos objetos africanos. Infelizmente, o Art Nouveau adotQu os elementos formais das culturas africanas sem compreender a c!lltura. Ao tomar emprestada a forma da chamada arte "africana" (Africa é um nome ocidental), o Art Nouveau meramente reduziu a um estilo o que era poderoso na cultura africana. Se tivessem compreendido que o que produzia aquele poder era uma atitude diferente em relação à vida, talvez esse empréstimo tivesse ido além da apropri~ção e feito uma crítica dos problemas da família burguesa. E irônico que o Art Nouveau, que mais que qualquer outra invenção arquit~tônica recente glorifica o espaço individual, tenha tomado emprestadas tantas de suas formas de culturas que não possuíam o conceito de espaço privado.
That is one history of the Canga that is well known. But in art we have another history and that is the remarkable hold that African objects possess over the art world - from the mid-7 880s when objects first appeared in the Musée de /'Homme in Paris and were reproduced in magazines like L'lIIustration, until the 7950s. How could we value the art and objects that were produced by African cultures and not value the culture of its peoples? This could happen beca use, on the leveI of representation, African peoples never enjoyed any status other than that of a commodity. The German naturalist Schweinfurth did much to promote the idea that in the interior of Africa, free from Christian and Muslim influences, existed societies with a high leveI of culture - these included the Zande, Canga and Magbetu tribes: Many of the objects gathered on his and other scientists' journeys through Africa found their way into the Musée Africain and were also published in Le Tour de Monde, a leading magazine of the day. And although there is no direct evidence that the architects associated with Art Nouveau collected African objects, it is quite probable that they would have seen some of them either in some of the museums ar magazines. Leopold had given explicit instructions that artifacts should be collected by his ministers. These objects seemto havebeen stored in the Royal quarters until the Canga Exposition, but they were certainly known about by the architects as they began to prepare the exhibition in 7893. In spring 7997, Nair et Blanc, a show by the Dutch saciologist Félix de Raoy, opened in Brussels. In roam after roam, the devastating history of white representations of African peoples was shown. Beginning with early skeletal studies and slavery ads and continuing up through colonization and, later, commodificatian af African images and products, Nair et Blanc gives a voice to a repressed past, allowing us to both examine what has been repressed and how this représsion has been represented. And then there is the Terverun Museum itself It has one of the finest collections of Belgian Canga abjects. Here are artifacts from aver 700 indigenous peoples. And here Vou can see, in the many curvilinear forms, the power of African art and artifacts. Unfortunately, Art Nouveau took the formal elements of African cultures without understanding the culture. In borrowing the form of so-called "African" art (Africa is a Western name), Art Nauveau merely reduced what was powerful within African culture to a style. Had they understood that what praduced that power was a different attitude to daily life, perhaps their borrowing would have been able to go beyond appropriatian and into a critique of the problems at the heart of the bourgeois family. It is ironic that Art Nouveau, which more than any other recent architectural invention glorified individual space, borrowed many of its forms fram cultures that had no concept of priva te space. If Vou look at the section in the Terverun Museum on colonialism yau will see preserved in cases sculptures made by African peoples after their first contact with white traders. Here Vou see white people represented as gods.
Observando-se a seção sobre colonialismo do Museu Terverun, vêem-se preservadas, em vitrines, esculturas feitas por povos africanos após seu primeiro contato com os mercadores brancos. Ali, vêem-se pessoas brancas representadas como deuses.
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Os objetos de Terverun não podem ser reapropriados. Não há qualquer cultura original à qual possam ser devolvidos, embora isso não signifique que esses objetos devessem retomar seu lugar de direito como parte de uma herança cultural original. Ouando as culturas são destruídas, seus objetos tornam-se marcos locais. Como escreveram Freud e os surrealistas, os objetos têm como propriedade assumir as características de seus proprietários, por isso não é de admirar quando eles se vingam. Escolhi a metáfora da "sala em torvelinho" de Marcel Proust como estrutura básica de The work Df the forest(O trabalho da floresta) porque no ambiente infinito de um painel contínuo eu poderia montar imagens das histórias conflitantes da colonização da Africa e do período do Art Nouveau. Essas histórias podem ser construídas pelo espectador de diferentes pontos de observação, enquanto ele vê as imagens e ouve narrativas diferentes e contraditórias. Três grandes telas encaixadas ao redor de um círculo, com três aberturas que permitem a passagem para o centro do círculo, constituem a área de projeção de The work Df the forest. O desenho das telas, baseado num motivo art-nouveau, é transparente e pode ser visto de diversos pontos de observação. A instalação projeta três videoteipes sincronizados que mostram um panorama contínuo. Por exemplo, na seção 1, ambientada nas ruínas de uma casa artnouveau, há uma série de imagens fantasmagóricas que surgem à medida que a câmera se move. São, momentos referentes à história da relação entre a colonização da Africa e a vida no fim do ~éculo, especialmente o lugar das mulheres no espaço doméstico. A medida que os elementos da montagem aparecem em diferentes telas, o espectador ouve outra trilha sonora, com uma história diferente. Desse modo, pode escolher entre diversas histórias e estórias, percebendo o tema de diversos ângulos. Cada seção da obra corresponde a um conjunto particular de temas. A seção 2, ambientada no Arquivo Stanley, investiga a relação entre exploradores, mercadores e missionários. A seção 3, numa casa artnouveau, trata dos mitos do canibalismo e da comercialização dos povos africanos pelos europeus. A seção 4 contrasta dois jardins: o que Leopoldo 11 construiu para si mesmo, copiando o paraíso africano, e o jardim da Exposição do Congo de 1897, onde povos africanos, vivendo in situ, morreram ao retratar esse não-paraíso. A seção 5 retorna à casa em ruínas, dessa vez percorrendo os elementos da montagem na ordem inversa, para mostrar a impossibilidade de volta a um tempo historicamente anterior. A seção 7 continua essa idéia e mostra que mesmo com a emancipação dos objetos, sem uma transformação social básica que reordenaria as relações entre as classes, a história está fadada a repetir-se eternamente. A estrutura desta obra ergueu-se em torno da idéia de ativar o espaço por meio de uma "dialética do ver" - nesse sentido, as diversas posições diferentes do tema e pontos de vista a serem ocupados pelo observador. Do balcão ou das entradas laterais podese ver toda a obra. Essa visão oferece o conforto e a autoridade mais intimamente associada à perspectiva monocular e ao cinema clássico de Hollywood.
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Objects from the Terverun cannot be reappropriated. There is no original culture to return them to, although this is not to say that these objects should take their rightful place as part of their original cultural heritage. When cultures are destroyed, their objects become place markers. And as Freud and the Surrealists wrote, it is a property of objects to take on the characteristics of their owner, so is it any wonder when they take their revenge? I chose the metaphor of the "whirling roam" of Marcel Proust as the basic structuring device ofThe work of the forest beca use within the endless surround of a continuous pan, I could montage images from the conflicting histories of the colonization of Africa and the Art Nouveau period. These are histories that the spectator can construct from different vantage points as she ar he sees the images and listens to the different and competing narratives. Three large screens, made to fit around a circle with three openings allowing passage to the center of the circle, comprise the projection area ofThe work of the forest. The screen design, based on an Art Nouveau motif, is transparent and can be viewed from several vantage points. The installation projects three synchronized videotapes that show a continuous panorama. For instance, section 7, set into the ruin of an Art Nouveau house, is a series of ghostly images that come to light as the camera moves. These are historical moments that refer to the history of the relationship between the colonialization of Africa and end-of-the-century life, especially the place of women in domestic space. As the montage elements reappear on the different screens, the viewer hears another sound track, conveying a different history. In this way the spectator can pick and choose among different histories an stories, taking up a variety of subject positions. Each section of the work corresponds to a particular set of issues. Section 2, set in the Stanley Archive, explores the relationships between explorers, traders and missionaries. Section 3, in an Art Nouveau house, concerns the myths of cannibalism and the commodification of African peoples by Europeans. Section 4 contracts two gardens; the garden Leopold li built for himselfto replicate the paradise of Africa, and the garden at the 7897 Canga Exposition where African peoples, living "in situ", died as they protrayed this non-paradise. Section 5 returns to the ruined house, this time running the . montage elements in reverse arder to show the impossibility of returning to an earlier time, historically speaking. Section 7 continues this idea and shows that even with the release of the objects, without a fundamental social transformation that would reorder relations among classes, that history is doomed to forever repeat itself. The structure of this work was built around the idea of activating the space by means of a "dialectics of seeing" - in this sense, several different subject positions, points of view, for the observer to inhabit. In the view from the balcony ar from the side entrances, you can see the entire work. This view provides the comfort and authority that is most closely associated with monocular perspective and classical Hollywood cinema. You are in control of
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espectador controla a narrativa e pode escolher como se identificar. Inversamente, a vista do centro do panorama é a mais desorientadora. Só é possível ver duas telas por vez, e o espectador jamais controla o que está enxergando; o próprio panorama rompe a sensação de clausura. Também desse ângulo, descobre-se que cada tela possui uma trilha sonora distinta e, conseqüentemente, o significado das mudanças de imagens. O terceiro ângulo é obtido ao se caminhar ao redor da circunferência externa do panorama. Como as telas são transparentes, pode-se quase prever as seqüências de movimento, assim como manter-se ligeiramente adiante da ação. E é desse ponto de observação que se pode melhor desconstruir como os diversos e contraditórios elementos da montagem produzem seus significados. Este texto é a versão resumida do ensaio para o catálogo da instalação de Judith Barry The work of the forestna Fondation pour I'Architecture, em Bruxelas, de 15 de fevereiro a 8 de março de 1992. Judith Barry agradece especialmente a Carol Thompson (diretora de educação do Center for African Art, Nova York) por sua valiosa pesquisa. Notas: 1. Paráfrase de Benjamin extraída de The dia/eeties af seeing, Susan Buck-Morss, Cambridge, Mass., MIT Press, 1989, p. 117. 2. Ibid., p. 170. 3. Ibid., pp. 209-210. 4.lbid., p. 211. 5. Anon., Le Journal du Soir(Paris, outubro de 1899). 6. Paciente de Charcot, citado em Nelson Abrams, Chareot's diary, Londres, Samson Press, 1955, p. 78. 7. Marcel Proust, O eaminho de Swann. 8. Georges Valbert, 'Tâge des machines", Revue des Deux Mondes, 93 (1889), p. 696. 9. Buck-Morss, ap. eit., p. 134. 10. François Loyer e Paul Hankar, Dix ans d'Art Nouveau/Ten years of Art Nauveau, C.F.C./A.A.M., Bruxelas, 1992, p. 31. Tanto Horta como Hankar estiveram envolvidos perifericamente no Grupo dos XX, formado por pintores, escritores, escultores e músicos que organizavam um salão anual. Revistas como La Wollanie também foram importantes. A dissolução do Grupo dos XX em 1893 corresponde ao ano de nascimento do Art Nouveau. Nesse ano, surgiu a revista Libre Esthétique, editada por Octave Maus, que acreditava que toda a produção artística deveria ser unificada sob uma forma de arte - as artes decorativas poderiam então ser consideradas pares da pintura e da escultura. Em 1895, Gustave Serrurier Bovy empreendeu a organização de L'Oeuvre Artistique, em que foram exibidos mais de 600 obras de arte e desenhos de arquitetura. Nessa exibição foram incluídos muitos artistas que vieram a representar a cristalização do estilo art-nauveau. Ao mesmo tempo, Horta e Hankar eram membros da Société Centrale des Architectes de Belgique, onde promoveram a Art Nouveau. No entanto, entraram em choque com os sócios mais tradicionais e foram obrigados a demitir-se. Em 1894, Horta fundou o ramo belga da Société Populaire des Beaux-Arts, chamada Cooperative Artistique. Com essa organização, Horta perseguiu suas ambições políticas, candidatando-se a eleições locais. 11. Robert Farris Thompson, The flash af the spirit, Nova York, Vintage, p. 156. 12. Ver, por exemplo, Patricia Leighton, "The white peril and I'art negre", The Art Bulletin, 72/4 (Nova York, 1990), p. 613. 13. Octave Uzanne, L'art et /'idée, Paris, 1899, pp. 12-13. 14. Patricia Leighton, op. cit., p. 620. 15. Conversa com Maurice Boiykasse, Bruxelas, outubro de 1991. 16. Alfred Jarry, "Ubu.colonial", Almanaeh lIIustré du Pere Ubu, Paris, 1901, p. 562. 17. Johannes Paudrat, "From Africa", in W. Rubin, ed. Primitivism in 20th eenturyart, Nova York, Museum of Modern Art, 1984, p. 145.
the narra tive and can choose how you wi// identify. Converse/y, the view from the center of the panorama is the most disorienting. /t is on/y possib/e to see two of the screens at one time, so you are never in contro/ of what you are seeing, and the panorama itse/f disrupts your sense of c/osure. /t is a/so from this view that you disco ver that each screen possesses a different sound track, hence the meaning of the images changes. The third view is avai/ab/e by wa/king around the exterior circumference of the panorama. As the screens are transparent, you can seem to ,:dict the movement sequences and seem to keep s/ight/y ahead of the , And it ís from this vantage point you can best deconstruct how the diffe/~;nt and competing montage e/ements produce their meanings. The above is an edited version of the catalogue essay for Judith Barry's insta//ation video The work of the forest, Fondation pour l'Architecture, Brussels, 15 February 15 - March 8, 1992. Judith Barry would particularly like to thank Carol Thompson (Education Director from the Center for African Art, New York), whose reasearch proved invaluable.
Notes: 1. Paraphrase of Benjamin taken from Susan Buck-Morss, The Dialectics of Seeing, Cambridge, Mass., MIT Press, 1989, p. 117 2. Ibid, p. 170. 3. Ibid, pp. 209-210. 4. Ibid, p. 211 5. Anon., Le Journal du Soir (Paris, OCtober 12, 1899) 6. Charcot patient, quoted in Nelson Abrams, Charcot's diary, London, Samson Press, 1955, p. 78. 7 Marcel Proust, Swann's way, New York, Pantheon Press, 1978, p. 34 8. Georges Valbert, "CAge des machines", Revue des Deux Mondes, 93 (1899), p. 696. 9. Buck-Morss, op.cit., p.134. 10. François Loyer and Paul Hankar, Dix ans d'Art Nouveau/Ten years of Art Nouveau, C.FC';A.A.M., Brussels, 1992, p.31. Both Horta and Hankar were involved periphera//y in the Group of XX made up of painters, writers, sculptors and musicians who held an annual salon. Magazines like La Wollonie were also important. The dissolution of the Group of XX in 1893 corresponds to the year that Art Nouveau was bom. For in this year, the magazine Libre Esthétique came into existence, edited by Octave Maus who believed that ali art production should be unified under one form of art - decora tive arts could now be considered the same as painting and sculpture. In 1895 Gustave Serrureir Bovy undertook the organization of L'Ouvre Artistique where over 600 works of art and architecture drawings were shown. Included in this show were many of the artists who came to represent the crysta//ization of the Art Nouveau style. At this same time Horta and Hankar were members of the Société Centrale des Architectes de Belgique where they promoted Art Nouveau. However, they got into a fight with the more traditional members and were forced to resign. In 1894 Horta founded the Belgian branch of the Société Populaire des Beaux Arts, ca//ed Cooperative Artistique. With this organization Horta pursued his political ambitions, standing for local elections. 11. Robert Farris Thompson, The flash of the spirit, New York Vintage, p. 156. 12. See, for example, Patricia Leighton, "The white peril and /'art negre", The Art Bulletin, 72/4 (New York, 1990J, p. 613. 13. Octave Uzanne, L' art et I'idée, Paris, 1899, pp. 12-13. 14. Patricia Leighton, op.cit., p.620. 15. Conversation with Maurice Boiykasse, Brussels, October 1991. 16. Alfred Jarry, "Ubu Colonial", Almanach illustré du Pere Ubu, Paris, 1901, p.562 17 Johannes Paudrat, "From Africa", in W Rubin, ed., Primitivism in 20th century art, New York, Museum of Modem Art, 1984, p. 145.
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The work of the forest, 1992 projeção de vídeo com técnica mista/ mixed media video projection 300 x 250 cm Coleção Nicole Klagsbrun Gallery
Judith Barry é mestre em comunicação e artes (computação gráfica) pelo New Vork Institute of lechnology de Nova Vork. Vive e trabalha em Nova Vork. Judith Barry is M.A. in communication arts (computer graphics) at the New York Institute of Techonology, New York. She lives and works in New York. Exposições individuaisl Solo exhibitions 1986 Echo (Projets 2), Museum of Modern Art, Nova Vork. 1989 Maelstrom (MAlRIX), University Art Museum, Berkeley, Califórnia. 1991 Imagination, Dead Imagine, Nicole Klasbrun Gallery, Nova Vork; Public Fantasy (quatro instalaçõeslfour installations), Institute of Contemporary Art, Londres; In Other Words (Riverside Studios), Hammersmith Underground Station, Londres. 1992lmagination, Dead Imagine/Model for Stage and Screen, lhe Renaissance Society, University of Chicago, Chicago; lhe Work of the Forest (mostra itineranteltravelling exhibition), 460
The work of the forest, 1992 projeção de vídeo com técnica mista/ mixed media video projection 300 x 250 cm Coleção Nicole Klagsbrun Gallery
Fondation pour I' Architecture, Bruxelas. 1993 Imagination, Dead Imagine/Model for Stage and Screen, Presentation House, Vancouver, Canadá; lhe Work ,of the Forest, MOPl, Madri. Exposições coletivas/ Group exhibitions 1987 Whitney Biennale, Whitney Museum of American Art, Nova Vork. 1988 Biennale di Venezia, Aperto (instalação/insta//ation), Veneza. 1991 Ars Memoria Carnegiensis, lhe Carnegie International, Pittsburgh; lhe Savage Garden, FU~ldación Caja de Pensiones, Madri. 1993 Le Génie du Lieu, rUsine Fromage, Rouen, França; On laking a Normal Situation and Retranslating it into Overlapping and Multiple Readings of Conditions Past and present, Museu de Arte Contemporânea, Antuérpia. 1994 Multiple Dimensions, Centro Cultural Belém, Lisboa. Obra apresentada/ Work in the exhibition The work of the forest instalação/ insta//a tion 461
Garrin começou a trabalhar com vídeo enquanto estudava belasartes na Cooper Union School of Art, em Nova Vork. Suas obras combinam a simplicidade documental a um processamento de imagens sofisticado, mesclando tecnologia e crítica social. Seus conhecidos videoteipes, que já foram transmitidos em redes de televisão e exibidos internacionalmente, incluem A human tube (Um tubo humano, 1986), Free society(Sociedade livre, 1988), Byany means necessary(Necessário de qualquer forma, 1990) e Home(less) is where the revolution is (Nos (des)abrigados está a revolução, 1990). Seu documentário sobre o tumulto na lompkins Square, em Nova Vork, em 1988, expôs através da mídia a violência policial gratuita contra os manifestantes e espectadores. Sua primeira instalação interativa de videodisco, Yuppie ghetto with watchdog (Gueto yuppie com cão de guarda), foi criada em 1989 em colaboração com David Rokeby e inaugurada em 1990 em lhe Clocktower, Nova Vork. Em White devil, (1992-93), uma instalação interativa de computador/disco laser, o participante entra no terreno de uma mansão e encontra um agressivo cachorro branco, da raça pit buli, que vive num "poço" com doze grandes monitores de vídeo. Controlado por um sistema interativo que "vê" os participantes através de uma câmera de vídeo (ligada a um computador Macintosh que utiliza o sistema IntAct de David Rokeby), o cão segue ferozmente os espectadores e tenta atacá-los sem sucesso. Projeções de vídeo por trás de um portão de ferro mostram as mansões vizinhas em chamas. Esta obra altamente elogiada foi inaugurada na Mediale de Hamburgo, em fevereiro de 1993.
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Garrin began working with video when he was studying fine arts at Cooper Union School of Art, in New York. His works match the documental simplicity to sophisticated image processing, mingling technology and social criticism. His well-known videotapes, which have been widely broadcasted shown internationally, include A human tube, 1986, Free society, 1988, By any means necessary, 1990 andHome(less) is where the revolution is, 1990. His documentary on the riots at Tompkins Square in New York, in 1988, showed the unnecessary police violence against manifestors and spectators. His first interactive videodisc installation, Yuppie ghetto with watchdog was created in 1989 in collaboration with David Rokeby, and innaugurated at The Clocktower, New York, in 1990. In White devil (1992-93), an interactive computer/laser disc installation, the participant enters the gardens of a mansion and finds an aggressive white dog, a pit buli breed, which lives in a well with twelve big vide o monitors. The dog is controlled by an interactive system that "sees" the participants through a video camera connected to a Macintosh computer using David Rokeby's IntAct system; it ferouciously follows spectators and try to attack them with no success. Video projections behind an iron gate show neighborhood mansions on fire. This highly praised work was innaugurated at the Mediale in Hamburg, in February, 1993.
White devi/, 1992-93 vista da intalação/ insta//ation view Coleção Holly Solomon Gallery
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Nasceu em Filadélfia em 1957. Estudou na Pennsylvania Academy of Fine Arts (1977) e na Cooper Union School of Art (1978-1982). Recebeu bolsas de estudo do New Vork State Council on the Arts Media Production (1989-1990) e da New Vork Foundation for the Arts (1988). De 1980 a 1982 foi assistente dos curadores de vídeo dos Anthology Film Archives, Nova Vork. Desde 1981 trabalha com o vídeo-artista Nam June Paik. De 1984 a 1990 foi professor da New School for Social Research, onde ensinou história e estética da videoarte. Em 1985 criou e apresentou um concerto ao vivo de videomúsica em colaboração com o compositor Ryuichi Sakamoto e o vídeo-artista Kit Fitzgerald, projeto produzido pela Sony Corporation e apresentado na lsukuba Expo, no Japão. Em 1988 criou o vídeo Free society, em colaboração com o compositor Elliott Sharp. De 1989 a 1993 desenvolveu um sistema interativo de videodisco em colaboração com David Rokeby e criou o vídeo Home(less) is where the revolution is, com música de Elliott Sharp.Em 1992 participou do International Dziga Vertov Symposium, em Moscou, e dirigiu um workshop intensivo de vídeo no Center for Electronic Media em Poori, Finlândia. Desde 1993 é professor de artes na mídia na New Vork University.
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Bom in Philadelphia, Pennsylvania, 1957. He has studied at Pennsylvania Academy of Fine Arts (1977) and at The Cooper Union School of Art (1978-1982). Received the New York State Council on the Arts Media Production Grant (19891990) and the New York Foundation for the Arts Fellowship (1988). From 1980 to 1982 he was assistant of the video curators at Anthology Film Archives, New York. Since 1981 he has collaborated with the vide o artist Nam June Paik. From 1984 to 1990 he taught history and aesthetics of the video art at New School for Social Research. In 1985 he created and performed the live video-music concert in collaboration with the musician-composer Ryuichi Sakamoto and the vide o artist Kit Fitzgerald; the project was produced by Sony Corporation and performed at the Tsukuba Expo, in Japan. In 1988 he created the vide o work Free society, in collaboration with the musician-composer Elliott Sharp. From 1989 to 1993 he developed a interactive videodisc system in collaboration with David Rokeby and created the video documentary By any means necessary. In 1990 he created the vide o work Home(less) is where the revolution is, music by Elliott Sharp. In 1992 he participated at the Intemational Dziga Vertov Symposium, in Moscow, and instructed a intensive video workshop at Center for Electronic Media in Poori, Finland. Since 1993 he has been teaching arts in media at New York Universitv.
Exposições!Exhibitions 1985 lhe Kitchen, Nova Vork; Musée d'Art Moderne de la Ville de Paris, Paris; New Video Music, EUA. 1987 Artists in the Electronic Age, Davis Hall, City College of New Vork, Nova Vork; Medienwerkstatt, Viena; Westfalisches Landesmuseum fur Kunst und Kulturegeschichte, Münster, Alemanha; Kunsthaus, Zurique; American Video Festival, American Film Institute, Los Angeles; Folkwang 3 Video, Museum Foikwang, Essen, Alemanha; Bonn Videonale, Bonn, Alemanha; US Videovisit, Video Offensive, Dortmund, Alemanha. 1988 Hayward Gallery (com Nam June Paik), South Bank Centre, Londres; lhe American Festival, American Film Institute, Los Angeles; Bonn Videonale, Bonn, Alemanha; Dallas Video Festival, Dallas Museum of Art, Dallas; La Diade, Centro di Studi i Diffusione d'Arte Contemporanea, Bérgamo, Itália. 1989 Festival de Cinema de Berlim, Strange Attractors: Signs of Chaos, New Museum of Contemporary Art, Nova Vork. 1990 Festival de Cinema de Berlim; Cl.ocktower, Nova Vork; Amerika Haus, Berlim; Image World: Art and Media Culture, Whitney Museum, Nova Vork. 1992 Videoformes, ClermontFerrand, França; Mostra de Arte
Interativa!Exhibition of Interactive Art Galeria Otso, Helsinque, Finlândia. 1993 Eisfabrik, Hanôver, Alemanha; Mediale, Hamburgo, Alemanha. 1994 Holly Solomon Gallery, Nova Vork. Videografia!Videography 1985 A place to hide (4:00), música de 3 leens KiII 4. 1985-86 A human tube (5:00); The dreaming (3:30); A rain song (2:30), música e performance de Ryuichi Sakamoto. 1987 Hear nothing... see nothing... say nothing (2:30), música de Elliott Sharp e Bob Previtt. 1988 Free society(3:30), música de Elliott Sharp. 1989-90 By any means necessary (27:00). 1990 Home(less) is where the revolution is (2:00). 1993 Cops & video (18:00).
Prêmios!Prizes 1988 prêmio especial!special prize, Bonn Videonale, Bonn, Alemanha. 1990 Medienkunstpreis, Karlsruhe, Alemanha. 1993 Mediale, Hamburgo, Alemanha. Obra apresentada!Work in the exhibition White devil instalação!installation
White devi/, 1992-93 "Pit buli" (detalhe/ detain
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CAPíTULO I Das Manifestações ART. 1º - A 22ª Bienal Internacional de São Paulo (doravante designada 22ª BISP) terá como meta descrever a mutação da arte contemporânea. J!. . partir sobretudo dos anos 60, o propno suporte da obra de arte sofreu uma expansão. A tela e a escultu!a !o.ram envolvidas por eventos multlmldla. Os 'movimentos subseqüentes questionam os territórios predeterminados. A intervenção no próprio corpo, na paisagem, na concepção d~o q~e é arte assinala uma nova abrangencla do fenômeno artístico, que repercute nos próprios suportes tradicionais. A distinção entre moderno e contemporâneo atesta um novo estado de coisas, sobre o qual a próxima Bienal terá por vocação refletir. ART. 2º - A 22ª BISP será realizada no período de 12 de outubro a 11 de dezembro de 1994, no Pavilhão Ciccillo Matarazzo, Parque Ibirapuera, Portão 3, São Paulo, SP, Brasil, bem como em diversos locais da cidade de São Paulo, cedidos por outras entidades e que, a critério da Fundação Bienal de São Paulo (doravante designada BIENAL) estejam aptos para tal. ART. 3º - A BIENAL poderá realizar gestões junto aos curadores das delegações estrangeiras que participarem da 22ª BISP, quanto ao envio específico de artistas, movimentos ou salas especiais que representarão o país em questão. ART. 4º - A BIENAL poderá, eventualmente, patrocinar encontros entre artistas brasileiros e estrangeiros para realização e apresentação de projetos em comum. ART. 5º - A 22ª BISP organizará e disporá as participações segundo lhe parecer mais adequado ao critério estético proposto.
CAPíTULO 11 Da Participação Estrangeira ART. 6º - Para a realização da 22ª BISP serão feitos convites aos países que mantenham relações diplomáticas ou acordos culturais com o Brasil, através da entrega, às respectivas missões diplomáticas, do regulamento, ficha de participação e etiquetas de identificação de obras. ART. 7º - As delegações estrangeiras deverão nomear um curador, que será o elemento de ligação e comunicação entre a BIENAL e o Departamento Cultural do Ministério de Relações Exteriores do respectivo país. Excepcionalmente a BIENAL poderá solicitar a um membro correspondente internacional que selecione artistas. Neste caso, uma instituição cultural deverá se responsabilizar financeiramente pelo envio das obras. Parágrafo 1º - Os membros correspondentes internacionais fazem parte do Conselho Consultivo ligado ao
curador da BIENAl. ART. 8º - Ao curador caberá: a) fornecer à BIENAL os dados completos concernentes. à fi~ha. de participação de cada artista mdlc~do, até o dia 31 de Março de 1994. A nao observância deste prazo implicará a não participação do artista; b) informar a BIENAL sobre a necessidade de instalações, desembalagens e reembalagens especiais das obras, antes de expirado o prazo previsto na alínea "f" abaixo; c) esclarecer expressamente a possibilidade e a forma de comercialização das obras inscritas, mediante remessa da ficha de participação fornecida pela BIENAL, que deverá ser devolvida no prazo previsto na alínea "a". acima, . devidamente preenchida e assmada; d) verificar se as obras a serem remetidas trazem as etiquetas de identificação devidamente preenchidas; e) tomar todas as providências quanto ao transporte no país de origem e seguros em geral, bem como remeter as obras até o dia 30 de agosto de 1994 à sede da BIENAL (acompanhadas de fotocópias das respectivas apólices de seguros); f) remeter fotos dos trabalhos e uma apresentação crítica do conjunto das obras, bem como os dados biográficos e bibliográficos fundamentais dos artistas. A apresentação crítica deverá ter no máximo 3 (três) laudas de 20 (vinte) linhas e 70 (setenta) toques. Parágrafo 1º - Em se tratando de fitas de vídeo ou slides, seu envio deverá ser feito através de correspondentes de empresas de courier no Brasil. ART. 9º - A participação dos artistas escolhidos pelos curadores estrangeiros deve se pautar pelo disposto no Artigo 1º. A BIENAL su.gere a inclusão, entre outros, de um artista que desde os anos 60 venha renovando suas formas de expressão. Tal procedimento pode orientara público e produzir condições ideais para a fruição da arte contemporânea. ART. 10º - A BIENAL sugere que o curador de cada país convidado envie no máximo 3 (três) artistas, salvo em projetos especiais realizados em comum com a 22ª BISP. ART 11º - O curador dos países participantes deverá indicar um representante, residente no Brasil, para ser o responsável único junto à BIENAL por todas as obras do país representado encaminhadas à 22ª BISP, competindo-lhe, entre outras tarefas: a) providenciar transporte e seguro das obras do local de desembarque no Brasil até a sede da BIENAL, onde estará instalado um Depósito Alfandegário para efetuar o desembaraço aduaneiro, sua vistoria na presença de um representante da BIENAL e, se necessário, assinar a ata de ocorrência; b) estar presente na data e local de desembarque das obras para acompanhar sua conferência e eventuais procedimentos junto ao porto alfandegário local; c) providenciar a verificação do estado
e a identificação adequada de todas as obras enviadas, conferindo a integridade de suas partes e complementos; d) providenciar e acompanhar, quando necessário, a montagem das obras de acordo com as intruções do artista, responsabilizando-se inteiramente por ela. ART. 12º - Caberá a cada país participante toda e qualque~ responsabilidade referente as obras de artistas inscritos, incluindo: a) seguro total das obras,desde sua remessa até a devolução, a partir do local de origem até seu destino, permanência e retorno ~o país de ., origem. A BIENAL se eXime, desde la, de toda e qualquer responsabilidade por eventuais danos que p,o~sam sofrer as obras enviadas. Uma copia da apólice de seguro deverá acompanhar os formulários; b) seguro saúde e de acidente dos artistas e demais integrantes da delegação participante; c) despesas decorrentes da estada dos integrantes da delegação participante; d) despesas de instalações, montagens, desembalagens e reembalagens necessárias às obras enviadas; e) despesas de embalagens e desembalagens no país de origem; f) despesas de transporte das obras desde o local de origem até a sede da BIENAL e vice-versa. ART. 13º - As obras deverão ser despachadas para o seguinte endereço: 22ª BISP - Fundação Bienal de São Paulo - Pavilhão Ciccillo Matarazzo - Parque Ibirapuera - Portão 3 - São Paulo - SP - Brasil, via Porto de Santos (quando remetidas por mar) ou via aeroportos internacionais de Guarulhos ou Viracopos (se o transporte for aéreo). ART. 14º - Todas as obras estrangeiras deverão ser acompanhadas de processo alfandegário, mesmo no caso de transporte gratuito. Aos conhecimentos de embarque deverá ser anexada uma relação das obras em três vias. Dessa relação deverá constar: nome do artista, título da obra, técnica, dimensões no sistema métrico, peso em quilogramas, valor e a indicação de que o desembaraço aduaneiro será feito no Depósito Alfandegário instalado na sede da BIENAl. ART. 15º - Ouando as obras não necessitarem de embalagens e desembalagens especiais, a mão-deobra referente a elas correrá por conta da BIENAl. ART. 16º - Devido a exigências alfandegárias, as obras estrangeiras não poderão permanecer no país por prazo superior a 180 (cento e oitenta) dias, a contar da data de sua chegada ao local de desembarque no Brasil. Parágrafo Único - Se o prazo previsto no caput deste Artigo 16º não for observado, a BIENAL não se responsabilizará pela manutenção, conservação e guarda das obras.
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CAPITULO 111 Da Participação Brasileira ART. 17º - A participação nacional será constituída por artistas brasileiros ou residentes no país. ART. 18º - Caberá ao curador da BIENAL a indicação dos artistas que comporão a participação brasileira. ART. 19º - Compete ao artista participante: a) entregar à BIENAL, até dia 31 de março de 1994, a ficha de participação devidamente preenchida, acompanhada de um resumo biográfico e bibliográfico individual, fotos, bem como a apresentação do conjunto da obra ou descrição e projeto da instalação. Este material servirá para confecção do catálogo geral e divulgação pelos órgãos competentes. O atraso de seu envio implicará a não participação do artista no catálogo. O atraso na remessa da ficha de participação excluirá o artista da 22ª BISP; b) remeter as obras até o dia 30 de agosto de 1994, para o endereço constante no Artigo 13º acima; c) estar presente ou autorizar por escrito um procurador junto à BIENAL para, na data e local previamente designados, acompanhar a desembalagem das obras, bem como as providências correspondentes à reembalagem, por ocasião da devolução, e assinar a ata da ocorrência; d) providenciar a identificação adequada das obras a serem expostas usando as etiquetas destinadas a esse fim; e) enviar os resumos biográficos e bibliográficos individuais com no máximo 3 (três) laudas de 20 (vinte) linhas e 70 (setenta) toques; f) informar a BIENAL sobre a necessidade de instalação, desembalagens e reembalagens especiais das obras antes de expirado o prazo previsto na alínea "a" deste artigo; g) providenciar seguro das obras desde seu local de origem, permanência na mostra e retorno ao seu local de origem (remeter à BIENAL xerox da apólice de seguro);
ART. 22º - Os preços das obras que estiverem à venda deverão ser indicados na respectiva ficha de participação, referida no Artigo 8º acima. O preço das obras estrangeiras será aquele declarado no processo alfandegário, não sendo permitidas alterações posteriores. ART. 23º - Do preço de venda estipulado nos termos do Artigo 22º anterior, serão sempre deduzidos, por ocasião de seu pagamento ou remessa: (i) a parcela de 10% (dez por cento) destinada à BIENAL, a título de comissão pela intermediação efetuada; e (ii) os tributos incidentes sobre a operação de venda da obra, bem como os respectivos custos e encargos bancários. ART. 24º - Por todas as obras estrangeiras estarem sujeitas a uma taxação e custos de nacionalização, o comprador ou beneficiário deverá se conscientizar desses custos, e o ato de compra deverá ser precedido de carta de intenção assinada por todas as partes. A carta de intenção deverá especificar: a) o comprador ou beneficiário será totalmente responsável pelas despesas de nacionalização das obras, assim como pelos emolumentos; . b) o valor cobrado pelos impostos e custos de nacionalização deverá ser apresentado com antecedência e disponibilidade para auferição; c) o comprador deverá pagar esse valor diretamente ao vendedor e a comissão, diretamente à BIENAL, assim como apresentar recibos e prova do recolhimento dos impostos acima mencionados e comprovantes da nacionalização; d) a venda deverá se concretizar até o encerramento da 22ª BISP, pois os procedimentos de embalagem e reexportação serão iniciados em seguida. Caso o processo de nacionalização se estenda além desse período, o comprador ou beneficiário deverá se responsabilizar pelos custos de armazenamento e seguro dos respectivos trabalhos.
I - DA COMPETÊNCIA
ART. 25º - Em caso de doação de obras a entidades culturais devidamente reconhecidas pela BIENAL, se a natureza do beneficiário for estritamente cultural, ele estará isento do pagamento da comissão destinada à BIENAL conforme Artigo 23º, item (i) acima. A entidade cultural deverá se responsabilizar pelo recolhimento dos impostos, assim como pelas providências e despesas de nacionalizC)ção da obra. Parágrafo Unico - A cobrança se dará normalmente quando o beneficiário da doação for um terceiro, cabendo-lhe também a responsabilidade pelo recolhimento integral dos tributos incidentes e pelas despesas de nacionalização, conforme disposto nos Artigos 23º e 24º deste regulamento.
ART. 21º - A venda das obras da 22ª BI~P será feita exclusivamente por meIO do Departamento Comercial da BIENAL e com prévio conhecimento da Diretoria.
ART. 26º - O comprador deverá providenciar, diretamente junto ao Banco Central do Brasil, a respectiva remessa do valor devido ao proprietário.
ART. 20º - As obras deverão ser retiradas dentro de até 30 (trinta) dias, a contar da data de encerramento da 22ª BISP. Parágrafo Único - Se o prazo previsto no caput deste Artigo 20º não for observado, a BIENAL não se responsabilizará pela manutenção, conservação e guarda das obras.
CAPITULO IV Das Vendas
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11 - OBRAS ESTRANGEIRAS
Parágrafo Único - As obras vendidas ou doadas serão entregues pela BIENAL aos compradores e beneficiários somente após o encerramento da mostra, de acordo com o que foi estabelecido no caput deste Artigo, e o recebimento pela BIENAL da comissão devida nos termos do Artigo 23º acima. As entregas ficam sujeitas ainda à (i) confirmação do recebimento, pelo proprietário, do respectivo preço de venda; (ii) conclusão do processo de nacionalização da obra pelo comprador junto às autoridades competentes e (iii) comprovação do recolhimento dos impostos devidos. 111 - OBRAS BRASILEIRAS ART. 27º - O preço de venda das obras brasileiras será o indicado pelo artista na ficha de participação. Esse preço não poderá ser alterado ou rasurado, devendo ser fixado em reais e reajustado pela taxa referencial do IGPM ou, se este deixar de existir, pelo índice que vier a substituí-lo. O valor referencial válido para o indexador e compromisso de compra deverá ser o da data da carta de intenção. Parágrafo 1º - Fica desde já certo e ajustado que, do preço de venda estipulado nos termos do caput deste Artigo serão sempre deduzidos, por ocasião de seu pagamento: (i) a parcela de 10% (dez por cento) destinada à BIENAL a título de comissão pela intermediação efetuada; (ii) os tributos incidentes sobre a operação de venda da obra, bem como os respectivos custos e encargos bancários incorridos, os quais deverão ser recolhidos diretamente pelo comprador ou pelo beneficiário da obra. Parágrafo 2º - Caso os procedimentos legais se estendam além desse período, o comprador ou beneficiário deverá se responsabilizar pelos custos de armazenamento e seguro dos respectivos trabalhos. Parágrafo 3º - Somente no caso de doação da obra a entidade de caráter cultural, a beneficiária ficará isenta da parcela destinada à BIENAL, prevista no Parágrafo 1º, item (i) deste Artigo. A beneficiária responsabilizar-se-á, porém, pelo recolhimento dos tributos incidentes e pagamentos de custos e encargos bancários referidos no Parágrafo 1º, item (ii), supra. Parágrafo 4º - As obras vendidas ou doadas somente serão entregues pela BIENAL aos compradores ou beneficiários após o encerramento da mostra, o pagamento e recebimento da quantia acordada pelo artista ou representante, taxa de comissão cobrada pela BIENAL, prova do recolhimento dos impostos e pagamento de custos e emolumentos previstos no Parágrafo 1º, item (ii), assim como sua comprovação. CAPITULO V Das Disposições Gerais ART. 28º - Não será permitida a retirada de trabalhos expostos antes do encerramento da 22ª BISP. ART. 29º - Se houver divergências de
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grafia no nome do artista, no valor ou nos demais dados referentes às obras, prevalecerão sempre as informações constantes da ficha de participação. ART. 30º - A BIENAL se exime de qualquer responsabilidade pela não participação do artista na 22ª BISP em decorrência da inobservância dos prazos e condições estabelecidas quanto à entrega, montagem, envio de documentação e instruções relativas à obra. Pelos mesmos motivos a BIENAL também não se responsabilizará pela omissão do nome do artista ou de qualquer outro dado no catálogo geral da 22ª BISP ou em outras publicações que a BIENAL vier a lançar. ART. 31º - Para efeitos deste ~egula.mento~ no tocante ao pagamento, inclusive de Impostos, re-exportação e correspondência, o critério de identificação das obras brasileiras e estrangeiras será o do domicílio do proprietário. ART. 32º - Os artistas participantes da 22ª BISP autorizam a BIENAL a, livre de quaisquer ônus, inclusive os de direitos autorais, fotografar, filmar ou registrar por diversos meios técnicos de rep.rodução - as respectivas obras que estiverem expostas na 22ª BISP para fins de publicação e catálogos, posters, outdoors, artigos especializados e divulgação da 22ª BISP. ART. 33º - O sistema elétrico do Pavilhão da BIENAL é alimentado por 110 volts monofásico ou 220 volts monofásico ou trifásico (60 HZ). O sistema de televisão no Brasil é PAL-M (60 HZ - 525 linhas) ou NTSC somente para reprodução de fitas no sistema VHS. ART 34º - A assinatura da ficha de participação implica a aceitação integral deste regulamento. ART. 35º - Os casos omissos serão resolvidos pela Fundação Bienal de São Paulo. São Paulo, setembro de 1992 (RevisadCl setembro de 19114) FUNDAÇAO BIENAL DE SAO PAULO
CHAPTER I On The Manifestations ART 7 - The objective of the 22ª Bienal Internacional de São Paulo (22nd Intemational Biennial of São Paulo) henceforth referred to as the "22nd BISP" is to describe the transformation undergone by contemporary art. Especially after the 7960's, the support of the work of art underwent a significant expansion. Canvas and sculpture were replaced by multimedia events. Subsequent artistic movements began to question pre determined ~erritories. Interventions in the human body, m the !ands.cape, in the concept of what art effectlvely I~, now determine the new range of the artlstlc phenomenon and its repercussions on traditional supports. The distinction between modem and contemporary art mirrors a new "status
quo" which the next Biennial must reflect. ART 2 - The 22nd BISP will be held from October 72 to December 77, 7994, at the Pavilhão Ciccillo Matarazzo, Parque Ibirapuera, Portão 3, São Paulo, SP, Brazil, as well as endorsing and stimulating exhibitions and events in several other areas in the city of São Paulo (provided by different cultural entities) eligible for such an event, according to the criteria adopted by the Fundação Bienal de São Paulo (Biennial Foundation of São Paulo) henceforth designated "BIENAL ". ART 3 - The BIENAL may conduct negotiations with the Curators of foreign delegations taking part in the 22nd BISP, representing their respective countries, as to the specific choice of artists, movements ar special rooms. ART 4 - The BIENAL can, eventuallv sponsor meetings between Brazilian and foreign artists ar curators for the preparation and presentation of common projects. ART 5 - The 22nd BISP will organize the disposition of the works as it deems most appropriate, according to the esthetic criteria adopted.
CHAPTER /I On Foreign Participation ART 6 - In arder to hold the 22nd BISP invitations will be sent to those count/ies maintaining diplomatic relations ar cultural awe~ments with Brazi/. The diplomatic mlSSlOn of each country will receive the Regulations, a Participation Form and Identification Labels. ART 7 - The foreign delegations will elect a Curator who will be the link and means of communication between the BIENAL and the Cultural Department of the Ministry of Foreign Affairs of their own countries. Exceptionallv the BIENAL can ask an Intemational Corresponding Member to select artists. In this case, a Cultural Institution will support financially the remittance of the artworks. Sole Paragraph - The Intemational Corresponding Members are part of an Advising Consultory Board associated to the BIENAL Curator. ART 8 - The Curator will: a) provide the BIENAL with complete data in the Participation Form relative to each artist chosen, by March 37, 7994. Non-compliance with this term will imply the nonparticipation of the artist; b) report to the BIENAL any requirements for facilities, within the building's limitations, for the installation of artworks, unpacking and repacking of the artworks before the term covered in item 'T below expires; c) fully c/arify the possibility and form of sale of artworks listed, forwarding the Participation Form supplied by the BIENAL with the accurate market sales price. This Form must be retumed within the term specified in item "a" above, duly completed and signed; d) verify if the Identification Labels sent together with the artworks are duly filled in, as requested by the BIENAL; e) adopt ali the necessary measures conceming transportation in the country of
origin and insurance in general, as well as send the artworks to the headquarters of the BIENAL by August 30, 7994 (a photocopy of the insurance policy should be attached); f) send photographs of the artworks and a criticaI appraisal of the collection of works, as well as essential biographical and bibliographical data on the artist. The criticaI review should consist of a maximum of 3 (three) pages with 20 (twenty) lines and 70 (seventy) strokes. P~ragraph 7 - In the case of videotapes ar slides, these should be sent through courier service agents in Brazi/. ART 9 - The participation of artists chosen by foreign Curators must comply with that determined by Article 7. The BIENAL suggests the inclusion, among others, of an artist who has innovated his means of expression from the 7960s onwards. This will provide guidelines for the public and produce ideal conditions for the enjoyment of contemporary art. ART 70- The BIENAL suggests that the Curator of each country invited sends a maximum of 3 (three) artists, except for especial projects carried out jointly with the 22nd BIS? ART 77 - The Curator of the countries participating should indica te a representative, residing in Brazil, as the sole person responsible (in regard to the BIENAL) for ali the artworks sent to the 22nd BISP by the country represented. Among other functions, this representative will be responsible for: a) the transportation of the artworks from the site of arrival in Brazil to the headquarters of the BIENAL, where a Customs Warehouse will be installed for the customs c/earing procedures; the inspection of the artworks will proceed in the presence of the representative of the BIENAL and, if necessarv signing the pertinent records and minutes of the proceedings; b) being present on the date and site of the arrival of t~e artworks, so as to accompany the check m procedures and other activities related to the local Customs authorities; c) verifying the status and adequa te identification of ali the artworks sent checking the parts and complements 'as to their integrity; d) supervising and providing, whenever necessary, the assemb/y of the artworks, according to the artist's directions, for which action he/she has total responsibilitV' ART 72- Each country participating will be fullyand totally responsible for the artworks and artists indicated. This includes: a) full insurance of the artworks from their shipment until their retum; frorr'i the site of origin to their destination, permanence and retum to original site. The BIENAL is, henceforth, exempt from any and ali responsibilities for po ten tia I damages which may occur. A copy of the insurance policy should be provided with ali forms; b) health and accident insurance for the artists and other members of the delegation participating in the 22nd BISP; c) accommodation and other expenses for the participating delegation; d) expe~ses with the i~stallation, assembly, unpackmg and repackmg required by the artworks sent;
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e) expenses resulting fram the packing and unpacking in the country of origin,o f) expenses with transportation of the artworks fram their place of origin to the headquarters of the BIENAL and vice-versa. ART 13 - The artworks must be dispatched to the following address: Fundação Bienal de São Paulo, Pavilhão Ciccillo Matarazzo, Parque Ibirapuera, Portão 3, São Paulo, SP, Brazil, thraugh the Port of Santos (when shipped), ar thraugh the Intemational Airport of Guarulhos ar Viracopos (when air freighted). ART 14 - Ali foreign artworks should have attached to them a filled-in custam form, even in case of free transportation. The bill of lading should include three copies of a list of the artworks. Description should include the artist's name, the title of the work, its measurements in metric system, its weight in kilos, its value, technique, and the indication that customs clearing will praceed in the Customs Warehouse set up at the headquarters of the BIENAL. ART 15 - When the artworks do not require special packing and unpacking, the labor expenses referring to these will be met by the BIENAL. ART 16 - Due to customs requirements, foreign artworks cannot remain in the country for more than 180 (one hundred and eighty) days, counting as of their arrival in Brazil. Sole Paragraph - If the term specified in the above mentioned item of this article is not observed, the BIENAL will absolutely not be held responsible for the maintenance, conservation and custody of the artworks.
CHAPTER 111 On Brazilian Participation ART 17 - Brazilian participation will consist of Brazilian artists ar foreign artists, presently residing in the country. ART 18 - The Curator of the BIENAL wil/ indica te the Brazilian participants. ART 19 - It behooves the participating artist to: a) forward the Participation Form, duly fil/ed in and accompanied by individual biographical and bibliographical summary, photographs and a presentation of the collection of the artworks ar, should be it the case, description and plan of installation, no later than May 31, 1994. This material will be used for the general catalogue and for the media and publicity of the BIENAL. Any delay in forwarding the Participation Form will automatically exclude the artist fram participating in the event and catalogue of the 22nd BISp,· b) forward the pieces to the address in Article 13 above, by August 30, 1994; c) to be personally present, ar authorize by praxya representa tive towards the BIENAL to, on the date and site previously appointed, supervise the unpacking of the crates/artworks, as well as the assure the praper repacking pracedures at the closing of the 22nd BISP, sign the pertinent records and minutes of the praceedings; d) pravide the apprapriate identification of the artwork to be exhibited, with adequa te labels; e) forward the individual biographical summary of a maximum of 1 (one) page with 20 (twenty) lines and 70 (seventy) strakes; f) report to the BIENAL the need for special
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facilities, packaging, unpacking and repacking of the artworks, before the term foreseen in item "a" of this article expires; g) insure the artworks fram their site of origin, during exhibition and their retum to the site of origin (forward a photocopy of insurance policy); ART 20. The artworks should be removed within 30 days starting on the closing of the 22nd BISP. Sole Paragraph - If the term specified in the above mentioned item is not observed the BIENAL will not be responsible for the maintenance, conservation and custody of the artworks.
expenses of the nationalization of the artwork. Sole Paragraph - A normal commission will be charged when the beneficiary of the donation is a third party. The beneficiary will also be fully responsible for the collection of any eventual taxes, as well as for the expenses of nationalization, as per Article 23 and 24 of the present Regulations.
Art. 21 - The sale of the artworks of the 22nd BISP will be conducted exclusively thraugh the Sales Department of the BIENAL and with the previous knowledge of the BIENAL Board of Directors.
ART 26 - The buyer must pravide directly to the Banco Central do Brasil (the Central Bank of Brazil) the respective remittance of amount due to the owner. Sole Paragraph - The artworks sold ar donated will only be delivered to the acquirer after the closing of the exhibition, as determined in the caput of this article and after the receipt by the BIENAL of its mediation fee, under terms of article 23 above. The final delivery of the artworks, moreover is subject to (i) the confirmation of receipt of amount due by the owner (ii) the completion of the process of nationalization of the artwork by the buyer next to the relevant authorities and (iii) proa f of payment of ali due taxes.
li) FORElGN ARTWORKS
//I. BRAZILlAN ARTWORKS
ART 22 - The artworks that are negotiable should be so described in the respective Participation Form, referred to in article 8 above. The price of the foreign artworks will be always the one declared in the customs clearance documents, subsequent alteration being forbidden.
ART 27 - The sales price of the Brazilian artworks will be that indicated by the artist in the Participation Form. This price cannot be altered ar amended, and should be determined in Reais using the IGPM readjustment reference on the Participation Form. Should this reference no longer be valid, the existing legal index should prevail. The valid reference date for the index and closing is the date of the letter of agreement. Paragraph 1 - It is henceforth certain and agreed upon, under the terms of the caput of this article, that the sales price, on the occasion of its payment shall always incur in the following deduction: (i) 10% (ten per cent) allocated to the BIENAL as fee for mediation and (ii) taxes on the sale of the artworks as well as costs and bank charges which may occur, these shall be paid directly by the buyer/beneficiary of the artwork. Paragraph 2 - Should for any reason the period of legal procedures be overextended, the buyer ar beneficiary wil/ be responsible for armourage and insurance fees for the respective artwork. Paragraph 3 - Only in case of donation of an artwork to a cultural organization legally recognized by the BIENAL will the beneficiary be exempt from the payment of the amount allocated to the BIENAL as per paragraph 1, item (i) if this article. The beneficiary however, is responsible for the payment of taxes and costs and bank charges, as per Paragraph 1, item (ii) above. Paragraph 4 - The artworks so/d ar donated will only be delivered by the BIENAL to the buyer/beneficiary after the closing of the exhibition, and after the payment and receipt by the artist ar representative of due price, fee charged by the BIENAL proof of payment of taxes and costs and charges specified in Paragraph 1 item (ii), as well as proof of the latter.
CHAPTER IV On The Sales I) ON THE JURISDICTlON
ART 23 - The following fees are to be deducted fram the sale price, as specified in the terms of previous articles, upon payment ar dispatch (i) 10% (ten percent) allocated to the BIENAL as mediation commission and (ii) taxes on the sale of the artwork, as well ali costs of handling and bank charges. ART 24 - Because ali foreign artworks are subject to taxation and nationalization costs, the buyer ar beneficiary has to be made aware of such costs and the closing should proceed with letter of agreement signed by ali parties. The letter of agreement will specify that: a) the buyer ar beneficiary will be fully responsible for the expenses of nationalization of the artworks as well as for eventual taxes; b) the amount charged for the taxation and nationalization costs wil/ be previously presented and made available for inquiries; c) the buyer will then pay the amount directly to the seller and the fee directly to the BIENAL as well as present the receipts and proof of payment of the above mentioned taxes and nationalization; d) the sale has to proceed up to the closing of the 22nd BISP, as the normal packing and re-exporting pracedures will be initiated by then. Should for any reason the period of nationalization pracedures be overextended, the buyer ar beneficiary will be responsible for armourage and insurance costs for the respective artwork. ART 25 - In case of donation of artworks to cultural entities, duly recognized by the BIENAL and being of cultural nature, the beneficiary shall be exempt fram payment of the fee allocated to the BIENAL as per article 23 item (i) above. The cultural entity remains fully responsible for the collection of taxes as well as the measures and
CHAPTER V On The General Rules ART 28 - The removal of the pieces in the
exhibition wil/ not be allowed before the closing of the 22nd BISP. ART 29 - Should any doubts arise as to the spelling of the artist's name, value, ar any other data relating to the artworks, the information given in the Participation Form will prevail. ART 30 - The BIENAL is unobligated fram any responsibility as to the nonparticipation of an artist in the 22nd BISP due to the non-observance of the terms and conditions established for the delivery, assembly and forwarding of the documentation and instructions related to the artworks. For the same reasons, the BIENAL will not be responsible for the omission of the artist's name ar of any other data fram the general catalogue of the 22nd BISP ar other publications that the BIENAL may release. ART 31 - For the purposes of these Regulations, in relation to payment, (including taxes), re-exportation and correspondence, the criteria of identification for Brazilian and foreign artworks will be owner's address. ART 32 - The artists participating in the 22nd BISP authorize the BIENAL to, free of any dues including author's right, photograph, film ar register, through various technical means of repraduction, the respective artworks exhibited in the 22nd BISP for purposes of publications and catalogues, posters, billboards, articles in specialized magazines, periodicals and the advertising of 22nd BISP. ART 33 - The electrical system at the BIENAL Pavilion is 110 single-phase volts ar 220 single-phase ar triple-phase volts (60HZ). The television system adopted in Brazil is PAL -M (60 HZ - 525 lines) ar NTSC, only for the reproduction of tapes using the VHS system. ART 34 - The signing of the Participation Form implies the full acceptance of these Regulations. ART 35 - The cases not contained within these Regulations will be judged by the BIENAL. São Paulo, September 1992 (Revised ~eptember 1994L FUNDAÇAO BIENAL DE SAO PAULO
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700.06381 C28
Catálogo das salas especiais, Nelson Águilar, organizador, in: Bienal Internacional 22, São Paulo, 1994. São Paulo: Fundação Bienal de São Paulo, 1994 .
1. Arte-exposições-catálogo I. Águilar , Nelson. 11. Título. CDD 700.06381