Talentos e Capital Humano para o polo de investimentos e negócios no Brasil

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TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL setembro / 2011



TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL setembro / 2011


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TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL


PREFÁCIO O Brasil vive uma situação ímpar no mundo: além de contar com perspectivas positivas de crescimento econômico, conta também com um bônus demográfico significativo para alimentar e catalisar tal crescimento. Ou seja, a expansão esperada da População Economicamente Ativa deverá ser suficiente para atender a demanda projetada por profissionais. O desafio que se impõe ao País, portanto, é o de como tratar as lacunas em formação e circulação1 de pessoas a fim de transformar este bônus em vantagem competitiva na constituição de um polo internacional de investimentos e negócios. Este documento é a terceira publicação da BRAiN (Brasil Investimentos e Negócios) e aprofunda o entendimento sobre “talentos e capital humano”, um dos pilares da atratividade de um polo, conforme apresentado no relatório “Atratividade do Brasil como polo internacional de investimentos e negócios”, lançado pela BRAiN em junho de 2011. Além de apresentar um diagnóstico da situação atual do conjunto brasileiro de talentos, o presente relatório busca exemplificar esforços positivos da iniciativa pública e privada no campo da qualificação, via educação, e maior oferta de mão de obra, além de adicionar uma visão propositiva de como tratar a situação atual no País. Para preparar este material, a BRAiN realizou, com o apoio do The Boston Consulting Group, um trabalho envolvendo análises, entrevistas e workshops com especialistas e formadores de opinião dos setores público e privado. As conclusões deste estudo, incluindo as proposições feitas ao longo de todo o trabalho, irão definir a agenda de diálogo que a BRAiN pretende estabelecer com as esferas pública e privada para que o Brasil continue desenvolvendo seu conjunto de talentos, tornando-se assim ainda mais atrativo como polo internacional de investimentos e negócios.

Criada em 2010, a BRAiN tem como objetivo assegurar a materialização de uma visão multissetorial da América Latina como uma rede regional de negócios fortemente interconectada, dentro da qual o Brasil deve atuar como um dos polos proeminentes. A BRAiN almeja gerar consenso e ação nos diversos setores da economia ao redor dessa ideia e conta, para isso, com 13 associados atualmente: ANBIMA, BM&FBOVESPA, FEBRABAN, Fecomercio, Banco Bradesco, Banco do Brasil, Banco Santander, Banco Votorantim, BTG Pactual, CETIP, Citibank, HSBC e Itaú-Unibanco. Mais informações sobre a BRAiN e sua visão se encontram no site www.brainbrasil.org.

1 Circulação de pessoas envolve a entrada de profissionais estrangeiros no País e a saída de profissionais brasileiros para atuar no exterior


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ÍNDICE Sumário Executivo Talentos para um polo de negócios

8 16

Demografia 22 Formação de pessoas

26

Quantidade de educação

34

Qualidade da educação

39

Alinhamento do ensino com o mercado

55

Internacionalização da formação

65

Circulação de talentos

74

Brain gain 74 Brain drain 82 Conclusão 88


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SUMário executivo Na elaboração do relatório “Atratividade do Brasil como polo internacional de investimentos e negócios”, lançado pela BRAiN em junho de 2011, foi realizado um extenso trabalho de pesquisa, análise de dados, entrevistas e workshops com especialistas e formadores de opinião dos setores público e privado, objetivando a definição e mensuração da atratividade do Brasil como polo de investimentos e negócios. O resultado deste esforço foi a definição dos sete pilares que constituem a visão BRAiN dos pré-requisitos fundamentais para a formação e a excelência de um polo atrativo de investimentos e negócios (veja Diagrama 1), e a análise das fortalezas e oportunidades para melhoria do Brasil em cada um deles. No presente documento, será dado um enfoque mais detalhado e propositivo para o pilar “Talentos e Capital Humano”. A escolha do pilar de talentos como um dos principais focos da BRAiN não aconteceu por acaso: o tema merece esforços extras por ser essencial para a formação do polo e por ser ponto de convergência de interesse de todos os atores da sociedade – é de consenso geral que talentos são definidores do crescimento econômico do país, são o principal foco dos líderes de negócios no mundo no próximo ano e são necessários à realização de qualquer negócio, em especial aos característicos de um polo de investimentos e negócios. No geral, o conjunto de talentos brasileiro não tem boa avaliação quando comparado internacionalmente – é o 25º colocado entre 30 países no mundo e ocupa a terceira posição entre 10 países na América Latina, de acordo com o Global Talent Index2. Além disso, é o país com a segunda maior dificuldade de se contratar pessoas entre 37 nações, de acordo com a Manpower3, empresa de serviços de recursos humanos. A formação de um conjunto de talentos tem como base três elementos principais: a demografia, a formação de pessoas e a circulação de talentos (veja Diagrama 2). A análise detalhada de tais elementos mostra que o Brasil tem diferentes níveis de evolução e necessita de distintos esforços em cada um deles. Os possíveis esforços e próximos passos foram discutidos e mapeados em várias entrevistas e workshops conduzidos pela BRAiN com seus associados e especialistas no assunto, dando origem às proposições apresentadas neste documento.

2 Fonte: Heidrick & Strugles, Global Talent Index 3 Fonte: Manpower 2010 Talent Shortage Report


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DIAGRAMA 1

Sete grandes pilares fundamentam a formação e excelência de um polo de investimentos e negócios

7. IMAGEM DO PAÍS

6. CONECTIVIDADE

5. INFRAESTRUTURA FÍSICA

4. INFRAESTRUTURA FINANCEIRA

3. TALENTOS E CAPITAL HUMANO

2. AMBIENTE INSTITUCIONAL

1. AMBIENTE MACROECONÔMICO

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DIAGRAMA 2

Três elementos formam o conjunto de talentos brasileiro: demografia, formação de pessoas e circulação de talentos

Componentes do conjunto de talentos brasileiro

DEMOGRAFIA Demografia é base para a formação de um conjunto de talentos. Significa a disponibilidade ou não de População Economicamente Ativa para formar a força de trabalho do país

Permite fechar lacunas temporárias de pessoas na economia

Provê a quantidade de pessoas para o conjunto de talentos

Capacita as pessoas a exercer diferentes funções na economia

Formação transforma pessoas em talentos por meio dos ensinos básico, técnico, superior, de línguas estrangeiras e por meio de experiências internacionais

FORMAÇÃO DE PESSOAS a. Quantidade de educação b. Qualidade da educação c. Alinhamento do ensino com o mercado d. Internacionalização do ensino

Circulação de talentos se refere à importação e exportação de profissionais. A circulação é fenômeno natural e deve ser gerida para trazer benefícios ao país a. Brain gain

b. Brain drain

Permite importar expertise internacional e ampliar/ consolidar a formação dos talentos nacionais

CIRCULAÇÃO DE TALENTOS


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No elemento da demografia, o Brasil apresenta uma grande vantagem estrutural quantitativa: o bônus demográfico. Projeções mostram que o País é hoje a maior economia no mundo a contar com expectativa de equilíbrio positivo entre oferta e demanda de mão de obra nos próximos dez anos. Todas as economias atualmente maiores que o Brasil (Estados Unidos, China, Japão, Alemanha, França e Reino Unido) terão sua demanda por talentos crescendo mais rápido que sua População Economicamente Ativa. Diante da constatação de tal vantagem, passa-se então para a análise dos dois outros componentes do conjunto brasileiro de talentos: a formação de pessoas e a circulação de talentos, aspectos em que o Brasil tem promovido avanços, mas para os quais esforços adicionais significativos são requeridos para suprir as necessidades e suplantar as deficiências. Inicialmente, será analisada a seguir a formação de pessoas, subdividida em quatro dimensões: quantidade de educação, qualidade da educação, alinhamento do ensino com o mercado e internacionalização da formação.

Quantidade de educação. Apesar da estruturação tardia, a educação no Brasil tem realizado importantes avanços e já alcançou a quase universalização do ensino fundamental, existindo ainda espaço para o aumento da quantidade de matrículas4 nos ensinos médio e superior: • A taxa de matrícula líquida no ensino fundamental brasileiro, obrigatório, era de 93% em 2007, acima da média global de 88% e próxima da universalização; • A taxa de matrícula líquida no ensino médio brasileiro, a se tornar obrigatório em 2016, era de 77% em 2007, acima da média global de 68%, mas ainda longe da universalização; • A taxa de matrícula bruta no ensino superior brasileiro era de 30% em 2007, abaixo da média global de 38% e com o maior espaço para ampliação. As sessões de trabalho com associados da BRAiN e especialistas no assunto levaram à compilação das seguintes proposições para tratar as lacunas da quantidade de educação: • Expandir ensino técnico, garantindo alinhamento com as necessidades do mercado; • Implementar sistema de gestão meritocrática das escolas brasileiras para combater a evasão; • Melhorar a administração das escolas e a qualificação dos professores;

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Fonte: UNESCO

• Aumentar as possibilidades de financiamento de alunos para expansão de matrículas do ensino superior.

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Qualidade da educação. Já o cenário qualitativo da educação no Brasil é mais preocupante - o País tem desempenho bastante deficiente nos ensinos fundamental e médio e, apesar de contar com algumas universidades de destaque na América Latina, tem a maioria de suas instituições de ensino classificadas em níveis medianos ou inferiores: • O ensino fundamental brasileiro teve o 12º pior desempenho médio na prova internacional PISA5 de 2009, apesar de ter apresentado a terceira maior melhoria entre os 65 países pesquisados desde 2006; • Somente cinco universidades brasileiras figuram entre as 600 melhores no mundo6. As sessões de trabalho com associados da BRAiN e especialistas no assunto levaram à compilação das seguintes proposições para tratar as lacunas da qualidade da educação: • Aumentar verbas disponíveis para o ensino como um todo; • Racionalizar a distribuição de recursos, com maior foco no ensino médio; • Aumentar e melhorar a remuneração dos professores; • Melhorar o nível dos professores e motivá-los; • Aprimorar o monitoramento da qualidade do ensino superior; • Promover maior interação das instituições de ensino superior com o mercado.

Alinhamento do ensino com o mercado. O atual baixo nível de alinhamento do ensino com as necessidades do mercado também é um aspecto que enfraquece o conjunto de talentos brasileiro: • O ensino brasileiro tem o quinto pior alinhamento com as necessidades do mercado entre 58 países de acordo com pesquisa com executivos realizada pelo IMD7; • Apenas entre 2% a 4% das pesquisas realizadas no Brasil são de coautoria com empresas, enquanto em universidades dos EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido e Coreia do Sul este número fica em torno de 10% a 20%8. As sessões de trabalho com associados da BRAiN e especialistas no assunto levaram à compilação das seguintes proposições para tratar as lacunas do alinhamento do ensino com o mercado: • Racionalizar requisitos de contratação flexibilizando exigências quando apropriado; • Alinhar níveis de remuneração e oportunidades de carreira com competências; • Criar agenda de ensino de médio e longo prazo alinhada com competências exigidas no mercado;

5 Programme for International Student Assessment: prova periodicamente aplicada pela OCDE a estudantes de 15 anos 65 países

Fonte: QS World University Rankings 2010

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IMD World Competitiveness Yearbook

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Fonte: Center for Science and Technology Studies- Leiden University (Holanda) 8


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• Promover a aproximação entre ensino acadêmico e mercado de trabalho; • Financiar pesquisa acadêmica direcionada às necessidades das empresas; • Estruturar sistema nacional de certificações.

Internacionalização da formação. As deficiências no ensino de idiomas estrangeiros e em vivência internacional são bastante conhecidas no Brasil: • 43% dos executivos brasileiros afirmam que o conhecimento de idiomas no País não atende às necessidades do mercado, de acordo com pesquisa com executivos realizada pelo IMD7; • O Brasil tem menos de 0,1 estudante por mil habitantes saindo do País para fazer intercâmbio, número que cai para quase zero em se tratando de estudantes internacionais fazendo intercâmbio estudantil no Brasil9. As sessões de trabalho com associados da BRAiN e especialistas no assunto levaram à compilação das seguintes proposições para tratar as lacunas da internacionalização da formação: • Aumentar a quantidade e a qualidade do ensino de idiomas no ensino básico; • Universalizar os cursos extracurriculares de idiomas; • Elevar exposição dos alunos aos idiomas estrangeiros; • Expandir o número de convênios entre instituições de ensino do Brasil e do exterior para intercâmbio de alunos; • Ampliar a vivência internacional dos estudantes brasileiros.

Terceiro elemento de um conjunto de talentos, a circulação de talentos é realidade crescente no mundo cada vez mais globalizado em que vivemos e, se bem gerida, pode trazer grandes benefícios para o Brasil. Entretanto, o País não trata bem nenhum dos aspectos de circulação de talentos: nem do brain gain, que constitui a entrada de profissionais estrangeiros no País, nem do brain drain, que diz respeito à saída de talentos brasileiros para atuar no exterior: • O Brasil é apenas o 27º entre os 58 países no ranking de atratividade para profissionais estrangeiros de acordo com executivos, mas a atração brasileira começa a melhorar com o desempenho da economia, a instalação de multinacionais e o desenvolvimento de pontos de interesse específicos como na área de P&D10;

Fonte: IMD World Competitiveness Online

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10 Fonte: IMD World Competitiveness Yearbook, analisando a aderência à seguinte afirmação: Foreign high-skilled people are attracted to your country’s business environment


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• Executivos julgam o Brasil como um dos países com maior dificuldade para a entrada de profissionais imigrantes em função dos processos excessivamente burocráticos de obtenção de vistos e de documentos11; • O Brasil não tem iniciativa estruturada para lidar com sua rede de expatriados: o País tinha em 2009 aproximadamente 3 milhões de talentos nacionais residindo no exterior, quase 1,5% de sua população12. Outros países em desenvolvimento, como Chile e Índia, têm iniciativas de gestão de suas diásporas. As sessões de trabalho com associados da BRAiN e especialistas no assunto levaram à compilação das seguintes proposições para tratar as lacunas de circulação de talentos: • Mapear as competências em falta no País, com divulgação mundial; • Desburocratizar e flexibilizar seletivamente os processos de imigração; • Montar grupo de empresas para recrutamento conjunto de estrangeiros; • Criar instrumento e/ou entidade para gestão estruturada de expatriados. O Brasil parte de base sólida para construir seu conjunto de talentos, mas tem ainda importantes passos a dar para consolidar seu pilar de capital humano como ponto de atração de seu polo de negócios. Tais ações de avanço estão especialmente concentradas nos elementos de formação de pessoas e de circulação de talentos e têm consecução factível se contarem com o envolvimento de todos os setores da sociedade. O potencial do conjunto brasileiro pode ser ainda mais concretizado se gerido por um órgão multissetorial que assuma a responsabilidade de mapear o conjunto nacional com suas lacunas atuais e futuras para programar iniciativas necessárias para eliminá-las, como mostram as referências internacionais que serão apresentadas neste relatório, caso de Austrália e Reino Unido. Fonte: IMD World Competitiveness Yearbook 11

12 Fonte: Ministério das Relações Exteriores do Brasil

A BRAiN convida todos os representantes e membros da sociedade que tenham interesse em participar de diálogos estratégicos, bem como de grupos de trabalho para aprimorar o conjunto brasileiro de talentos, e consequentemente a atratividade do Brasil como polo de investimentos e negócios, a entrar em contato pelo e-mail contato@brainbrasil.org.

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Talentos para um polo de negócios

Um polo de negócios baseia-se na existência de atividades que suportem a interação econômica entre diferentes agentes. Por sua natureza, portanto, a formação de um polo depende integralmente da existência de um conjunto de talentos estruturado e desenvolvido, o qual possa fornecer mão de obra e conhecimento técnico necessários para viabilizar a realização de todas as atividades. O fato de o pilar de talentos e capital humano ser essencial para um polo de negócios é ilustrado por sua importância para o desenvolvimento econômico nacional, sobre a qual concordam diversos dos grandes economistas contemporâneos, como Paul Romer e Robert Barro. Economista da Universidade de Harvard, Barro, por exemplo, identifica o capital humano de um país como um dos três elementos-chave para o desenvolvimento econômico, junto com a governança econômica e o nível de partida da renda per capita no país. A importância econômica de talentos é também ilustrada pelos efeitos que sua escassez começa a causar na economia brasileira: a falta de mão de obra qualificada se apresenta como potencial limitador do crescimento nacional, sendo comuns os noticiários de imprensa sobre empresas com obras e atividades atrasadas por falta de trabalhadores. Além disso, essa mesma situação começa a gerar pressão inflacionária: a primeira ata de 2011 do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil (BACEN) alerta para o risco de a falta de mão de obra provocar um aumento dos salários reais superior ao aumento da produtividade do País (veja Quadro A).


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QUADRO A

Indisponibilidade de talentos no Brasil gera pressão inflacionária

A falta de mão de obra no Brasil começa a gerar pressão inflacionária. A ata de janeiro de 2011 da reunião do Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central do Brasil (BACEN) apontou para o risco de aumento da inflação brasileira devido à “estreita margem de ociosidade dos fatores de produção, especialmente de mão de obra”. “Em tais circunstâncias, um risco importante reside na possibilidade de concessão de aumentos nominais de salários incompatíveis com o crescimento da produtividade”, afirma o documento. A preocupação revelada na ata do Copom está alinhada com os aumentos de salários que vêm sendo concedidos devido à falta de mão de obra no País, os quais acabam refletindo em expansão de custos e de preços ao consumidor. Ilustração de tal fato se dá pelo exemplo citado na mesma ata: “a expansão anual de 7,77% [em 2010] experimentada pelo indicador [Índice Nacional da Construção Civil – INCC], ante 3,25% em 2009, esteve associada, em especial, ao aumento de 10,41% no custo da mão de obra”. Nesta mesma linha, de acordo com o Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), 97% das categorias que negociaram aumentos salariais no primeiro semestre de 2010 os obtiveram em proporções superiores à inflação. O aumento salarial não está ocorrendo apenas nas carreiras técnicas e operacionais, mas em todos os níveis das organizações. De acordo com pesquisa realizada pelo jornal Valor Econômico, os diretores de empresas tiveram um aumento de 36% em sua remuneração total em 2010 em relação a 2009. A pesquisa foi realizada com 189 empresas de capital aberto e publicada em abril de 2011. O problema de pressão inflacionária advinda da falta de mão de obra não ocorre somente no Brasil - o mesmo risco foi apontado pelo Banco Central da China desde o meio de 2010.

Talentos e capital humano também estão no topo da agenda dos executivos das empresas em todo o mundo. De acordo com a “Pesquisa Anual Global de líderes de negócios”, lançada no início de 2011 pela PricewaterhouseCoopers (PwC), estratégias de gestão de talentos serão o maior foco de mudanças durante os próximos meses (veja Diagrama 3). Por ter o setor de serviços como base, um polo apresenta demanda ainda mais intensa por talentos, já que o segmento é o que utiliza maior qualificação de pessoas: no Brasil, 67% dos empregados no setor têm pelo menos ensino médio completo e 25% dos mesmos trabalhadores têm ensino superior completo, proporções essas que caem para 43% e 9%, respectivamente, no restante da economia brasileira13. Apesar de sua importância para a constituição do polo brasileiro, o conjunto nacional de talentos não tem boa colocação se comparado aos conjuntos de talentos de outras nações. Ao contrário, o Brasil é o 25º colocado entre 30 países do Global Talent Index14

13 Dados referentes ao total de empregados formais no Brasil ao final de 2009. Fonte: RAIS-CAGED

Fonte: Heidrick & Strugles, Global Talent Index 14


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DIAGRAMA 3

Talentos estão nas agendas de executivos no mundo todo

Talentos serão foco de mudanças nos próximos meses Intenção de executivos globais de realizarem mudanças em suas organizações nos próximos 12 meses - ref.: 2011 17%

Estratégia de gestão de talentos

52%

31%

54%

23%

Abordagem de gestão de riscos

23%

Decisões de investimentos

23%

48%

28%

Estrutura organizacional (incluindo M&A)

25%

47%

27%

Reputação corporativa e reconstrução de confiança

Estrutura de capital

36%

50%

41%

34%

22%

15%

Sem mudanças Alguma mudança

Envolvimento com board de diretores

50%

34%

12%

Grandes mudanças

% de respondentes Fonte: Pesquisa Anual Global de líderes de negócios da PwC, pesquisa na mídia

(veja Diagrama 4), atrás de Ucrânia, Tailândia, África do Sul e Egito, por exemplo. Além disso, as empresas brasileiras têm a segunda maior dificuldade de contratar pessoas, de acordo com a empresa de serviços de recursos humanos Manpower15 (veja Diagrama 5), especialmente em função das lacunas em formação e circulação de profissionais. Quando comparado em nível regional, o conjunto de talentos brasileiro ocupa o terceiro lugar entre 10 países da América Latina analisados, atrás do Chile e do México16. Por outro lado, o Brasil está em primeiro lugar em demografia e qualidade de ensino superior mas, novamente, falha em outros aspectos de formação e de circulação de pessoas.

15

Fonte: Manpower 2010 Talent Shortage Report

Fonte: Heidrick & Strugles, Latin American Talent Index

16

No presente relatório são exploradas a situação atual e as oportunidades de ação sobre o conjunto brasileiro de talentos à luz da necessidade de consolidá-lo para permitir a formação do polo de negócios no País. A abordagem se dará por meio dos três elementos formadores de um conjunto e que serão tratados nos capítulos a seguir: demografia, formação de pessoas e circulação de talentos (veja Diagrama 2, na página 10).

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DIAGRAMA 4

Conjunto de talentos brasileiro ainda não tem boa classificação se comparado com benchmarks internacionais

Brasil está em 25º lugar de 30 países no Global Talent Index

1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10. 11. 12. 13. 14. 15.

Estados Unidos Reino Unido Canadá Holanda Suécia China Alemanha Austrália França Índia Espanha Malásia Coreia do Sul Japão Polônia

16. 17. 18. 19. 20. 21. 22. 23. 24. 25. 26. 27. 28. 29. 30.

Itália Ucrânia Rússia México Grécia Argentina Tailândia África do Sul Egito

Brasil Turquia Arábia Saudita Nigéria Indonésia Irã

Formação e circulação de talentos são principais lacunas brasileiras

Demografia

Demografia (PEA1)

Formação de talentos

23º

Qualidade do ensino obrigatório

26º

Qualidade do ensino nas universidades e escolas de negócio

23º

Mobilidade e abertura do mercado de trabalho local

24º

Capacidade de atrair talentos de outros países

CIrculação de talentos

PEA: População Economicamente Ativa. Nota: além dos itens apresentados, ranking considera também “Qualidade do ambiente para gerar e desenvolver talentos” em que o Brasil está em 19º e “Capacidade para atrair investimentos estrangeiros diretos”, em que o país está em 18º. / Fonte: Global Talent Index 2012, Heidrick & Strugles; análise BCG

“Nessa nova era de grande volatilidade e organizações enxutas, talentos estão se tornando o novo ‘isso’ – substituindo o capital como diferenciador competitivo [...]. Estamos entrando em uma nova era: a ‘Era Humana’.” Jeff Joerres, CEO e Chairman da Manpower Inc.


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DIAGRAMA 5

64% das empresas no Brasil têm dificuldade em encontrar profissionais, o segundo maior índice global % de empresas com dificuldades para encontrar talentos - 2010 76% 64% 53%

Ranking de funções de acordo com escassez de talentos no Brasil

53% 51% 45% 44% 43% 42% 41% 40% 38%

1. 2. 3. 4. 5. 6. 7. 8. 9. 10.

Técnicos1 Trabalhadores manuais2 Operadores de produção Assistentes administrativos Operários Engenheiros Motoristas Staff de finanças e contabilidade Técnicos em TI Representantes de vendas

36% 36% 36% 35% 35% 35% 31% 30% 30% 29% 29% 27% 23% 21% 19% 18% 17% 16% 16% 15% 14%

4%

Média global 31%

11% 9%

1. Operadores, técnicos de manutenção, engenheiros. 2. Eletricistas, encanadores, marceneiros, carpinteiros etc. Nota: Brasil é segundo colocado de 36 países. / Fonte: Manpower 2010 Talent Shortage Report.

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02

DEMOGRAFIA A demografia constitui a base bruta para a formação de um conjunto qualificado de talentos, isto é, representa a disponibilidade ou não da População Economicamente Ativa (PEA), que é a matéria-prima para formar a força de trabalho de um país. A avaliação de projeções de crescimento econômico e das populações em idade para trabalhar em países desenvolvidos mostra que demografia deve começar a ser um problema. Um estudo feito pelo HSBC17 mostra que, enquanto a economia desses países deve continuar crescendo nos próximos anos, o contrário deve acontecer com o tamanho de sua população em idade de trabalho. Tal fato, se não for acompanhado de aumento na produtividade dos trabalhadores, pode gerar um grande apagão de talentos (veja Diagrama 6).

Relatório “The World in 2050” do HSBC

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DIAGRAMA 6

Crescimento da PEA em países desenvolvidos não acompanhará o crescimento de sua economia

PAÍSES EM DESENVOLVIMENTO2

PAÍSES DESENVOLVIDOS1

Crescimento econômico previsto é positivo...

...mas PEA cresce somente em países em desenvolvimento

Crescimento da economia - % a.a.

Pessoas em idade de trab. (bilhões)

3,2

TACC 2010 - 2040

TACC 2010 - 2040

0,9%

-0,1%

2,6 2,0 1,2

1970s

1980s

1990s

2000s

0,9

2010s

0,9

2020s

0,9

2030s

1,0

2040s

Crescimento da economia - % a.a.

0,77

0,84

0,81

0,75

1990

2010

2030

2050

Pessoas em idade de trab. (bilhões) TACC 2010 - 2040

TACC 2010 - 2040

0,5%

1,8% 0,8

0,8

0,8

1970s

1980s

1990s

1,2

2000s

1,6

1,8

1,8

1,9

3,70

4,48

5,14

2,53

2010s

2020s

2030s

2040s

1990

2010

2030

2050

1. Estados Unidos, Japão, Alemanha, Reino Unido, França, Itália, Canadá, Espanha, Austrália, Holanda, Suécia, Suíça, Bélgica, Áustria, Noruega, Dinamarca, Grécia, Finlândia, Irlanda 2. China, Índia, Brasil, Coreia do Sul, México, Argentina, Rússia, Turquia, Indonésia, Arábia Saudita, Polônia, Hong Kong, África do Sul, Tailândia, Israel, Cingapura, Irã, Egito, Venezuela, Malásia, Colômbia / Nota: PEA = População economicamente ativa / Fonte: “The World in 2050” do HSBC, Organização das Nações Unidas; análise BCG


TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

18 Oferta e demanda são puramente quantitativas nesta análise – não consideram a qualificação das pessoas

Stimulating Economies through Fostering Talent Mobility

19

Nesse contexto, o Brasil parte de grande vantagem estrutural, sendo a maior economia atual a apresentar crescimento de PEA superior ao crescimento esperado na demanda por pessoas para o trabalho18, como mostra o estudo divulgado pelo BCG em conjunto com o Fórum Econômico Mundial (WEF) no início de 201019 (veja Diagrama 7). Todas as economias atualmente maiores que a brasileira – Estados Unidos, China, Japão, Alemanha, França e Reino Unido – terão sua demanda por pessoas crescendo a taxas maiores que a sua oferta de trabalhadores.

DIAGRAMA 7

Brasil e Índia serão as maiores economias do mundo com equilíbrio positivo entre oferta e demanda de PEA

Lacuna entre crescimento da oferta e da demanda por trabalhadores – 2010-2020 RUS -0,6% CAN -0,3%

GBR -1,1%

ALE -0,7%

SUE 0,3%

POL -2,6%

FRA -0,7% ESP 0,1%

EUA -0,6%

ITA -1,3%

TUR -1,3%

MEX 0,4%

CHN -1,7%

EGT 2,0% IND 1,8%

BRA 1,6%

IDN -O,3%

AFS 0,9%

Falta de mão de obra

JAP -2,3%

Falta ou excesso limitado

COR -2,6%

Aumento de mão de obra

AUS -1,2%

Diferença média entre cenários com e sem efeitos da crise econômica mundial

Nota: dados apresentados com base em visão quantitativa, não refletem fatores qualitativos (e. g. qualificação dos profissionais) / Fonte: Stimulating Economies through Fostering Talent Mobility,BCG & WEF; EIU CountryData; análise BCG

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A consciência sobre a escassez de mão de obra já começou a gerar debates no mundo. O Fórum Econômico Mundial discutiu o assunto pelo segundo ano consecutivo em sua reunião de Davos em 2011 e já lançou o segundo relatório sobre a mobilidade de talentos como forma de lidar com a falta de mão de obra global. Empresas também começam a pensar em estratégias para solucionar sua dificuldade de contratar talentos e afirmam que devem aumentar o recrutamento internacional e considerar mudar de localidade em busca de maior disponibilidade de trabalhadores (veja Diagrama 8).

DIAGRAMA 8

Empresas moldarão suas estratégias pela busca por talentos

Empresas consideram mudar suas estratégias para solucionar o problema de falta de mão de obra % de empresas que consideram mudar de local atrás de talentos AMÉRICA DO NORTE

7

AMÉRICA LATINA1

8

EUROPA2

AMÉRICA DO NORTE

18

AMÉRICA LATINA1

32 6

ÁFRICA

ÁSIA DESENVOLVIDA4 REGIÃO 3 DO PACÍFICO5

EUROPA2

22 11

ÁFRICA

25 16

ÁSIA EMERGENTE3

38 9 19

14

% de empresas que consideram realizar recrutamento internacional

ÁSIA EMERGENTE3 ÁSIA DESENVOLVIDA4 REGIÃO DO PACÍFICO5

1. Inclui México 2. Inclui Rússia 3. China, Índia, Indonésia, Malásia, Papua Nova Guiné, Filipinas, Sri Lanka, Tailândia e Vietnã. 4. Japão, Hong Kong, Cingapura, Coreia do Sul e Taiwan. 5. Austrália e Nova Zelândia. / Fonte: BCG People Advantage Report 2008, Global Talent Risk – Seven Responses, WEF & BCG; análise BCG

22 48 20 60 23 56 25 52 22 64 27 57 33 60

2007 2010 - 2015


TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

“Estamos entrando em uma era de escassez de talentos nunca vista, a qual, se deixada sem solução, freará o crescimento econômico ao redor do mundo e vai fundamentalmente mudar a forma como lidamos com desafios de mão de obra.” Jean Charest, Premier de Quebec, Canadá

Partindo de uma base demográfica favorável e rara em grandes economias, o Brasil tem a possibilidade de atrair empresas e transformar seu conjunto de talentos em um dos diferenciais de seu polo de negócios. Para isso, no entanto, não basta ter um número suficiente de pessoas. É necessário garantir fortalezas também nos outros dois elementos do conjunto: formação e circulação. Se não os tiver desenvolvidos, o conjunto de talentos brasileiro poderá contribuir para o efeito contrário, a saber, o de esvaziamento dos negócios nacionais devido à simples exportação de pessoas para outras economias, dado o maior recrutamento internacional por outros países (veja Diagrama 9).

DIAGRAMA 9

Disponibilidade de talentos qualificados será determinante na atração de empresas e negócios para o Brasil

O Brasil poderá atrair empresas... Se tiver um conjunto de talentos desenvolvido, o Brasil pode atrair empresas que busquem localidades com mão de obra qualificada disponível

EMPRESAS DEVEM MIGRAR PARA PAÍSES COM MAIOR DISPONIBILIDADE DE MÃO DE OBRA

A PARTIR DA DISPONIBILIDADE DE PESSOAS, O BRASIL PODE ACABAR ATRAINDO EMPRESAS OU SIMPLESMENTE EXPORTANDO TALENTOS – GESTÃO DA DISPONIBILIDADE SERÁ ELEMENTO DE DIFERENCIAÇÃO

...ou simplesmente exportar talentos Sem um conjunto de talentos bem desenvolvido, no entanto, o Brasil intensificará seu papel de exportador de mão de obra qualificada para o exterior

TALENTOS DEVEM MIGRAR DE PAÍSES COM EXCESSO DE MÃO DE OBRA PARA PAÍSES COM ESCASSEZ

25


26

TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

03

FORMAÇÃO DE PESSOAS A formação da População Economicamente Ativa de um país é necessária para transformá-la em conjunto de talentos efetivo. Sem capacitação, a existência de pessoas em idade para trabalhar não garante o fornecimento de mão de obra para o crescimento nacional e nem para atender às empresas instaladas ou que venham a se instalar no país. A análise de dados internacionais mostra alta correlação entre os anos de escolaridade e a renda per capita da população, ou seja, o nível de bem-estar e de crescimento econômico. Países em que a população tem um número médio de anos de estudo mais elevado também apresentam maior renda nacional per capita, se destacando Estados Unidos, Alemanha e Nova Zelândia, por exemplo (veja Diagrama 10).

DIAGRAMA 10

Educação, base para a formação de pessoas, é determinante para o desenvolvimento de um país RENDA PER CAPITA NACIONAL US$ mil PPP em 2010

100

80

CATAR

Países “outliers” com baixa educação e alta renda são grandes exportadores de petróleo

60

KUWAIT BRUNEI ESTADOS UNIDOS

40

ALEMANHA GUINÉ EQUATORIAL

NOVA ZELÂNDIA

20

BRASIL

2

4

6

Fonte: Dados utilizados para o cálculo do Índice de Desenvolvimento Humano da ONU; análise BCG

8

10

12

14 ANOS DE ESCOLARIDADE média em 2010


TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

27


28

TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

A realidade internacional encontra também paralelo no caso brasileiro. Um estudo lançado em fevereiro de 2011 pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)20 ilustra a importância da formação de talentos para a economia brasileira ao concluir que investimentos em educação são os investimentos sociais que mais geram resultados econômicos no Brasil. Aumentos de 1% do PIB em investimentos em educação têm retorno de 1,85% no crescimento da economia, ante 1,70% para saúde e 1,57% para demanda agregada, por exemplo. Analogamente, aumentos dos investimentos em educação contribuem mais também para a expansão da renda familiar (veja Diagrama 11).

20 “Gastos com a Política Social: alavanca para o crescimento com distribuição de renda” do IPEA

DIAGRAMA 11

No Brasil, investimentos em educação são os que mais geram retornos econômicos No Brasil, educação é o investimento social que mais contribui para o crescimento do PIB...

... e também para o maior crescimento na renda familiar brasileira

Aumento no PIB decorrente de um aumento de 1% do PIB em cada tipo de gasto

Aumento da renda familiar decorrente de um aumento de 1% do PIB em cada tipo de gasto

EDUCAÇÃO

1,85%

SAÚDE

EXPORTAÇÕES DE COMMODITIES

1,57% 1,54% 1,40%

1,67%

SAÚDE

1,70%

DEMANDA AGREGADA INVESTIMENTO EM CONSTRUÇÃO CIVIL

EDUCAÇÃO

1,44%

DEMANDA AGREGADA

1,17%

INVESTIMENTO EM CONSTRUÇÃO CIVIL

1,14%

EXPORTAÇÕES DE COMMODITIES

Multiplicador do PIB brasileiro (%)

1,04% Multiplicador da renda familiar brasileira (%)

Fonte: “Gastos com a Política Social: alavanca para o crescimento com distribuição de renda” do Ipea

No Brasil, a educação teve estruturação tardia: somente em 1930 o País criou o Ministério da Educação e transformou a educação básica em compulsória (veja Diagrama 12), o que já havia acontecido em países da Europa e da América do Norte durante o século XIX. A partir dos anos 30, o nível de formação da população brasileira evoluiu aceleradamente, em especial nas últimas décadas. Entre 1920 e o final dos anos 2000, a taxa de escolarização aumentou de 9% para 86%, a taxa de alfabetização subiu de 30% para 90% e o número de matrículas nos ensinos fundamental e médio de 1 milhão para 42 milhões (veja Diagrama 12).


TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

DIAGRAMA 12

Educação no Brasil alcançou importantes avanços em sua história recente A educação no Brasil tem história recente e evoluiu bastante desde seu início em 1930 # de anos de ensino compulsório

12

12

Média OCDE de 10,4 anos será ultrapassada pelo Brasil em 2016

10

9

8 8

9

8

6

4 4 2

1970

1930

1998

2006 2010 2016

Incluíndo 4 anos de inglês

Incluíndo 3 anos de espanhol

Estruturação da educação no Brasil foi tardia: Europa e EUA a fizeram no século XIX

O País teve avanços significativos em escolarização, alfabetização e matrículas1 % da população

100 74

90

Alfabetização (15 anos +)

86

Escolarização (5 a 19 anos)2

61

50

62

44 30 21

33

9

1920

1930

1940

1950

1960

1970

1980

1990

2000

2010

# de matrículas (M)

Ensino Fundamental

40 33

Ensino Médio Ensino Superior

22

20 7 3

1

1920

9 5

4

1 1

1930

1940

1950

1960

1970

1980

1990

2000

2010

1. Dados de 1980 estimados como ponto médio entre os anos 1970 e 1990 para continuidade de dados. Dados dos anos 1990 referem-se a 1992. 2. Escolarização é a porcentagem dos estudantes (de um grupo etário) em relação ao total de pessoas (do mesmo grupo etário). Fonte: MEC, Inep, IBGE, IPEA; Organização dos Estados Ibero-americanos para a Educação; análise BCG

29


30

TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

Os avanços da educação brasileira em um curto espaço de tempo colocam o nível educacional da População Economicamente Ativa (PEA) nacional em posição superior à dos países que têm também equilíbrio positivo entre oferta e demanda de mão de obra: 40% da PEA brasileira têm pelo menos o ensino médio completo, enquanto a mesma proporção cai para 38% no Paquistão, 37% no México, 29% na Indonésia e 9% na Índia (veja Diagrama 13). Se comparado com países desenvolvidos, no entanto, o Brasil tem ainda bastante a evoluir: em Hong Kong, Cingapura, Reino Unido e Estados Unidos, as porcentagens da população que têm pelo menos o ensino equivalente ao médio completo são 70%, 75%, 79% e 91%, respectivamente (veja Diagrama 13).

DIAGRAMA 13

Nível educacional brasileiro é superior ao de outros países com equilíbrio positivo entre oferta e demanda de PEA Polos de negócios internacionais

Populações com excesso de PEA

% da PEA por nível educacional - 2008

% da PEA por nível educacional - 2008

1% 14%

12%

11%

17%

9% 13%

29%

38%

12%

46%

39%

23%

17% 62%

52% 31%

HONG KONG

Ensino superior

33%

REINO UNIDO

Ensino Médio

ESTADOS UNIDOS

Ensino fundamental até 8a série

8% 11%

29% 35%

23%

CINGAPURA

5%

5%

9%

27%

17%

19%

20%

22%

4% 5%

7%

ÍNDIA1

INDONÉSIA

MÉXICO

Ensino fundamental até 4a série

Pré-escola

15% 22%

1. Segmentação da Índia estimada de acordo com quebra da população do censo de 2001 / Fonte: Organização Internacional do Trabalho, The Economist, Censo Indiano 2001; análise BCG

Apesar de estar atrás de outros centros de negócios importantes, diversos exemplos mostram que a evolução do Brasil é possível se os esforços forem bem geridos. Os Tigres Asiáticos – Cingapura, Hong Kong, Coreia do Sul e Taiwan – tinham, na década de 1960, nível educacional similar ao atual brasileiro e hoje contam com nível equivalente ao de países desenvolvidos como Estados Unidos e Reino Unido, servindo de benchmark para a evolução que a educação no Brasil precisa experimentar nos próximos anos (veja Diagrama 14).

18%

31% 9%

BRASIL

Nenhum


TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

DIAGRAMA 14

Evolução educacional nos Tigres Asiáticos foi importante para o crescimento econômico

Capital humano foi responsável por grande parte do crescimento dos Tigres Asiáticos Crescimento médio anual econômico - 1960 a 1990 4,4%

COREIA DO SUL

4,4%

1,7%

10,5% Capital financeiro

3,6%

TAIWAN

3,6%

2,4%

9,6%

Produtividade Capital humano

-0,3%

CINGAPURA

6,1%

3,0%

HONG KONG

-2

0

2,7%

2,3%

2

4

2,0%

6

8,5%

7,3%

8

10

12

Fonte: “The Tyrany of the Numbers” em “Economics of Development” – Perkins, Radelet, Snodgrass, Gillis, Roemer

O caso de transformação do sistema educacional da Coreia do Sul é um dos mais emblemáticos e reconhecidos no mundo (veja Diagrama 15). Na década de 1960, o porcentual da população com ensino médio completo era muito parecido com o do Brasil, ambos ficando abaixo de 10% do total21. A partir daí, a Coreia do Sul passou a focar esforços neste nível de ensino, chegando em 1995 a um patamar de 40% do total, enquanto o Brasil ainda engatinhava, tendo 10% da população com ensino médio completo. Entre outros fatores, o investimento da Coreia do Sul em capital humano permitiu que a taxa de crescimento da sua renda per capita girasse em torno de 8,4% a.a. de 1960 a 2010, saindo de um nível menor que o do Brasil e chegando, hoje, a uma renda per capita equivalente a mais que o dobro da brasileira. Algumas mudanças implementadas pela Coreia do Sul tiveram papel fundamental em transformar a educação do país e em contribuir para o seu desenvolvimento, e o Brasil tem todas as condições de focar seus esforços e atingir os mesmos resultados. Entre as iniciativas, destacam-se principalmente a concentração dos recursos direcionados à educação no ensino fundamental; a ênfase na importância dos professores durante o processo de aprendizado, revisando a política salarial e o tempo dedicado aos alunos; e, principalmente, a busca de alinhamento da educação superior com as necessidades do mercado. A trajetória de Cingapura ao longo das últimas décadas é similar à da Coreia do Sul. Partindo de níveis educacionais subdesenvolvidos na década de 1960, Cingapura tem agora um dos melhores desempenhos educacionais do mundo. Hoje, 80% dos alunos cumprem o período mínimo de escolaridade de 16 anos e o país tem o quarto melhor desempenho médio na prova PISA22 entre 65 países avaliados. 21

Fonte: Banco Mundial

Programme for International Student Assessment. Aplicado a 65 países em 2009: OCDE + convidados. Fonte: OCDE

22

A evolução de Cingapura se deu com base no aumento quantitativo aliado à melhoria educacional qualitativa. O enfoque na preparação de professores teve destaque especial: houve incentivo aos jovens mais talentosos a seguirem carreira de magistério; aumento do prestígio e dos salários de professores, tornando estes competitivos no

31


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TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

DIAGRAMA 15

Coreia do Sul mostrou que mudança de patamar educacional é possível, se bem gerenciada Com patamares iniciais parecidos, Coreia do Sul deu salto em nível educacional antes do Brasil e colheu bons frutos econômicos

A revolução educacional sul-coreana teve apoio forte do governo e iniciativas estruturadas

Escolaridade Brasil e Coreia do Sul

Mudança educacional na Coreia do Sul focou em alguns pontos chave para garantir sucesso:

% da população com ensino secundário completo1

• Investimento público concentrou-se em assegurar ensino fundamental de qualidade e foi complementado por investimento privado no ensino superior

50 40,8

40

37,8

30

26,3

COREIA DO SUL BRASIL

• Maior alinhamento da educação superior com as necessidades do mercado Incentivo à formação técnica Criação de institutos voltados para ciência e tecnologia

20 10

10,6

8,7

• Papel dos professores foi enfatizado Política salarial atrativa Dedicação exclusiva e a uma só escola Ênfase em tempo para atendimento aos alunos

4,2

1960

1970

1980

1990

2000

2010

Até 1995, nível coreano era ~4 vezes maior que o brasileiro TACC (1980-2010)

Renda per capita (US$ PPP mil)

COREIA DO SUL

2,6

8,4

17,2

29,6

8,4%

BRASIL

3,7

5,4

7,4

11,2

3,7%

1. População maior de 15 anos Fonte: Banco Mundial; EIU; pesquisa na mídia; análise BCG

mercado; e formação de educadores por meio de intensa prática pedagógica (análoga à residência médica). Além disto, a utilização de recursos tecnológicos foi priorizada e houve uma mudança de mentalidade em relação à forma de administrar escolas: focou-se em melhorias de qualidade, definição de visão e missão, e profissionalização da gestão, tal como acontece com empresas privadas, buscando a melhoria de desempenho. Abu Dhabi é outro exemplo de evolução na educação, mais focado no alinhamento da formação com as necessidades do mercado. Frente a um desafio de diversificação econômica, o governo de Abu Dhabi estruturou um amplo projeto de revisão do sistema educacional, utilizando as melhores práticas de outras nações, que mapeou as projeções de crescimento do país e de setores específicos, bem como da mão de obra qualificada. O mapeamento deu origem a um plano detalhado de investimentos e ações na área da educação, com acompanhamento quinzenal ou mensal durante a implementação das iniciativas, não só


TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

daquelas do setor público como também das iniciativas das empresas e das instituições de ensino (veja Diagrama 16). Algumas iniciativas executadas em Abu Dhabi incluem: • Priorização do modelo misto de educação, no qual as escolas são responsáveis por proverem o estudo teórico e as empresas por proverem o ensino prático e técnico em seus próprios laboratórios e/ou através de estágios; • Concessão de bolsas de pesquisa para os assuntos priorizados pelo governo, como forma de direcionar a produção acadêmica do país; • Estabelecimento de um amplo processo de inspeção e certificação de escolas para garantir uma qualidade mínima de ensino; • Flexibilização da burocracia migratória para profissionais qualificados nas áreas priorizadas ou em demanda apontadas pelo mapeamento geral. Partindo de base sólida, o Brasil tem condições de avançar na formação de profissionais para seu conjunto de talentos. Serão analisados nas próximas seções o status e os próximos passos necessários à formação de pessoas no Brasil por meio de seus quatro elementos principais: a quantidade de educação, a qualidade da educação, o alinhamento da formação com as necessidades do mercado e a sua internacionalização.

DIAGRAMA 16

Abu Dhabi mostra que iniciativas focadas podem aumentar alinhamento do ensino com necessidades do mercado Ministério da Educação buscou alternativas para a falta de mão de obra especializada

Diversas iniciativas foram geradas e cerca de 35% já foram implementadas

Em esforço de diversificação de sua economia, Abu Dhabi precisava solucionar falta de mão de obra qualificada em setores foco. Exemplos:

Mais de 20 iniciativas para reestruturação foram definidas, focando em objetivos claros, incluindo:

• Indústria de manufatura leve • Energia renovável • Tratamento de água (dessalinização) • Serviços médicos

• Garantir alinhamento com as necessidades do mercado • Aumentar empregabilidade dos cidadãos • Tornar o ensino técnico acessível • Desenvolver habilidades de gestão do sistema em entidades do governo envolvidas

Sem sistema de educação técnica coesa no país, o governo estruturou projeto de revisão e desenho desta área de ensino • Benchmarking amplo envolvendo diversos países FINLÂNDIA / INDONÉSIA / AUSTRÁLIA / DINAMARCA PAÍSES BAIXOS / JAPÃO / BÉLGICA / ÁUSTRIA / ALEMANHA SUÍÇA / ESTADOS UNIDOS / IRLANDA / FRANÇA / HUNGRIA CANADÁ / CINGAPURA / NORUEGA / SUÉCIA REINO UNIDO / MÉXICO / ÁFRICA DO SUL / ARGENTINA EGITO / ESCÓCIA / REPÚBLICA TCHECA / TURQUIA • Engajamento extenso com empresas e entidades educacionais

Primeiras iniciativas já foram implementadas no país • Mudanças legais e institucionais necessárias à implementação do novo modelo de educação foram realizadas • Empresas já estão em contato com instituições de ensino • Processo de inspeção e certificação das escolas está implementado, garantindo qualidade e informação aos alunos sobre opções disponíveis Fonte: análise BCG

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TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

QUANTIDADE DE EDUCAÇÃO A análise da quantidade de educação em um país diz respeito ao entendimento do alcance da escolarização à população em geral. Esta seção focará apenas na quantidade, embora se reconheça – e seja abordado mais adiante no relatório – que a qualidade do ensino tenha papel fundamental na formação de talentos. Garantir o acesso universal à educação é o primeiro passo necessário para consolidação da base de ensino, a partir da qual se podem discutir melhorias qualitativas. Com as evoluções em sua relativamente curta história educacional, o Brasil tem hoje taxa de matrícula líquida23 no ensino fundamental de 93%, superior à média global e próxima da universalização (veja Diagrama 17). A vitória da quase universalização do ensino fundamental no Brasil data da última década e é resultante de esforços governamentais na construção de escolas. O grande desafio agora está relacionado à redução das taxas de abandono e de evasão escolar24, que giram em torno de 5% e 14%, respectivamente. Como resultado, ao final do ensino fundamental, apenas 63% das crianças se formam com idade correta neste nível25.

Exclui matriculados repetentes e pessoas fora de idade escolar

23

Abandono é a saída do ano letivo para volta no ano seguinte. Evasão é o abandono definitivo

24

Fonte: Movimento Todos pela Educação

25

DIAGRAMA 17

Ensino fundamental no Brasil é quase universalizado e dá boa base para o conjunto brasileiro

Ensino fundamental no Brasil está quase universalizado Taxa de matrícula líquida entre pessoas de idade escolar % em 2007

100

98

94

93

top 10: 99% média global: 88%

80

60

40

20 Fonte: UNESCO, Movimento Todos Pela Educação; análise BCG

JAPÃO

MÉXICO

CHILE

BRASIL


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Em resposta a estes obstáculos, a progressão automática, ou sistema de ciclos, foi uma das iniciativas desenvolvidas no país com o objetivo de combater a evasão escolar nos primeiros anos de ensino, durante o período de alfabetização. Este tipo de sistema já mostrou resultados positivos em outras nações, como França e Japão, desde que vinculado a turmas pequenas com acompanhamento quase individual dos alunos, a trabalhos de reforço no contraturno, à reavaliação contínua e a professores extremamente capacitados. No Brasil, a não observância destes fatores e a aplicação da progressão automática além dos primeiros anos de ensino desvirtuaram o objetivo inicial deste sistema, além de ter provocado impactos ruins sobre a qualidade do ensino. Em pesquisa realizada com professores do Estado de São Paulo, 91,9% apontam que há passagem dos alunos de uma série para outra sem domínio dos conteúdos ministrados. Além disto, 91,2% destes dizem se sentir frustrados com o sistema em vigor26.

26 Revista de Educação nº 13 da APEOESP (Sindicato dos Professores do Ensino Oficial do Estado de São Paulo)

No ensino médio, a taxa de matrícula líquida é de 77%, ainda superior à média global, mas longe da universalização (veja Diagrama 18). O ensino médio no Brasil se tornará obrigatório a partir de 2016, o que abre oportunidade para sua oferta a todos os jovens brasileiros. Este movimento faz com que o aumento na taxa de matrículas passe pela construção de mais escolas e também por uma discussão qualitativa sobre o modelo a ser universalizado, potencialmente conjugado ao ensino técnico, como será discutido na próxima seção.

DIAGRAMA 18

Matrícula no ensino médio está acima da média global, mas não universalizada

Brasil tem espaço para aumentar a quantidade de seu ensino médio Taxa de matrícula bruta entre pessoas de idade escolar % em 2007

100 98 top 10: 94%

85 80

77 71

média global: 68%

60

40

20

Fonte: UNESCO; análise BCG

JAPÃO

CHILE

BRASIL

MÉXICO

35


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TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

No ensino superior, a taxa de matrícula brasileira cai para 30%, inferior à média global de 38% (veja Diagrama 19). Apesar disto, a boa notícia é que o número de matrículas no ensino superior tem crescido a uma taxa superior à do crescimento da população. Esse avanço se deu principalmente pelo aumento da rede particular (veja Diagrama 19). A rede pública também registrou crescimento impulsionada por programas como REUNI, que visa a ampliação de vagas nas universidades federais, assim como a criação de instituições como a USP Leste. O avanço de grandes grupos de investidores no ensino superior brasileiro aliado a programas do governo de estímulo a concessão de bolsas, a exemplo do Programa Universidade Para Todos (PROUNI), e aliado à concessão de crédito diretamente ao estudante, como via Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (FIES), tendem a ser a base para o aumento da taxa de matrículas no País. Em termos de tipos de cursos, um dos pilares da expansão do ensino superior são os cursos tecnológicos: cursos de menor duração que a graduação tradicional – em torno de dois a três anos – e voltados para o mercado de trabalho. O número de matriculados em cursos tecnológicos cresceu 26,1% de 2008 para 2009, enquanto nos cursos de graduação tradicional esta taxa ficou em 2,5%. Os alunos deste tipo de curso representavam, em 2009, 11% do total, e tudo indica que continuarão ganhando espaço27. Esta expansão do ensino superior, em particular dos cursos tecnológicos, é benéfica para o Brasil, pois garante maior alinhamento com as necessidades do mercado. Ela precisa continuar, mas deve ocorrer sem prejuízo da qualidade do ensino28, como veremos na próxima seção.

Proposições para tratar as lacunas de quantidade de educação no Brasil O Brasil tem boa base quantitativa de ensino para continuar evoluindo e formar uma base sólida para seu conjunto de talentos. Ainda assim, existem próximos passos importantes para continuar tal trajetória. As sessões de trabalho com associados da BRAiN e especialistas no assunto levaram à compilação das seguintes proposições para tratar as lacunas desta área: • Melhorar a gestão e qualificação das escolas: a qualidade das instituições de ensino tem papel importante sobre o interesse dos alunos em permanecer na escola. Desta forma, a profissionalização da gestão das escolas de nível básico e o aumento da qualificação dos professores são alavancas para aumentar a quantidade de educação. Por exemplo, programas como o PDDE (Programa Dinheiro Direto na Escola, do governo federal) apoiam financeiramente a melhoria na gestão de escolas que aderem ao plano de metas “Compromisso Todos pela Educação”. • Customização do tipo de ensino por desempenho para combater a evasão dos alunos: a flexibilização dos caminhos de ensino disponíveis aos alunos pode ser um fator importante a atuar sobre a retenção destes na escola. Sistemas que permitam o atendimento customizado a alunos com dificuldades e também o ensino diferenciado a alunos avançados têm a capacidade de reduzir o abandono e a evasão escolares e são utilizados por outros países, como os Estados Unidos. • Expandir ensino técnico, garantindo maior alinhamento com as necessidades do mercado: dada a meta de universalização do Ensino Médio a partir de 2016, o ensino

27 Censo da Educação Superior – 2009 (MEC) 28 Qualidade infelizmente ainda não é garantida em todos os cursos: em 2009, dos 4.449 cursos tecnológicos levantados pelo Censo da Educação Superior, apenas 38% já tinham passado por algum tipo de avaliação do MEC


TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

DIAGRAMA 19

Ensino superior tem crescido, mas ainda está abaixo da média global Taxa de matrícula no ensino superior é baixa no Brasil Taxa de matrícula total1 na população em idade escolar % em 2007

100

80

top 10: 79%

58

60

52 média global: 38%

40 30

26

20

JAPÃO CHILE

BRASIL MÉXICO

Matrículas têm crescido, calcadas no setor privado Matrículas no ensino superior brasileiro (milhões)

4,9

5,1

TACC (99-09)

4,5 3,9 3,0 2,4

3,8

3,3

3,6

1,1

1,2

1,2

1,4

2003

2005

2007

2009

2,8

9,4%

2,1 1,5

0,8

0,9

1999

2001

Escolas Públicas

Escolas Privadas

População brasileira cresceu em média 1,3% a.a. no mesmo período

5,0%

1. Inclui matriculados repetentes e fora da idade escolar. Fonte: UNESCO, MEC, Inep; análise BCG

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técnico se coloca como modelo que provê qualidade, alinhamento com o mercado e, assim, empregabilidade para os alunos, a exemplo do que já realizam o SENAI, na indústria, e o Senac, para o comércio e serviços. A canalização de recursos para este tipo de educação, quer pelo governo, por meio do Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC), quer pela iniciativa privada, deve ser continuada. Além disto, as próprias empresas, dadas suas lacunas de profissionais, podem investir em parcerias com instituições de ensino. As organizações privadas também podem valorizar mais os egressos de escolas técnicas, desmistificando a cultura brasileira de exigência de diplomas de bacharéis. • Implantar sistemas de gestão meritocrática para expansão das escolas brasileiras: escolas de melhor qualidade poderiam receber recursos adicionais para se expandirem, atingindo assim mais alunos e aumentando as taxas de retenção. • Aumentar as possibilidades de financiamento para expansão do ensino superior, incluindo cursos superiores de tecnologia: o aumento das formas de financiamento do ensino superior é fundamental para permitir a expansão deste nível em paralelo com a melhor distribuição de recursos do governo para os ensinos básico e secundário. Aqui, tanto a iniciativa privada quanto a pública podem ter papel importante por intermédio de políticas direcionadas. O setor público pode trabalhar com isenção de impostos para empresas que financiem a educação de seus funcionários, de modo similar ao PROUNI. Pode também difundir ainda mais programas existentes de concessão de crédito universitário, como o FIES.

A boa notícia é que o número de matrículas no ensino superior do Brasil tem crescido a uma taxa superior ao de crescimento da população, principalmente baseada na abertura de novas escolas particulares.


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QUALIDADE DA EDUCAÇÃO Se o Brasil parte de base forte quantitativa de ensino, o mesmo não se aplica ao aspecto qualitativo. Foi somente nos últimos anos, após a quase universalização do ensino fundamental, que a atenção antes direcionada ao aumento quantitativo do ensino se voltou também para a sua qualidade. O ensino fundamental brasileiro tem o 12º pior desempenho entre 65 países avaliados no PISA, prova internacional do ensino básico29. Com 401 pontos de média, o Brasil está abaixo da média da OCDE, de 497, e da média de todos os países avaliados, de 468 pontos (veja Diagrama 20). A análise interna do Brasil também mostra situação crítica: a média nacional dos alunos da rede pública de ensino na Prova Brasil/SAEB30 está no limite inferior da faixa esperada no ensino fundamental e abaixo da faixa esperada no ensino médio (veja Diagrama 21). A Prova Brasil tem sua média baseada no desempenho dos alunos nas disciplinas de matemática e português, competências elementares que devem ser desenvolvidas neste nível e que são extremamente importantes mais tarde, quando os alunos ingressam no mercado de trabalho. Desta forma, o baixo desempenho dos alunos brasileiros acaba por determinar não apenas a baixa empregabilidade dos egressos deste nível, mas também a dificuldade das empresas para encontrar pessoas com uma qualificação mínima. Uma consequência desta defasagem é a exigência de formação de nível superior, nem sempre de fato necessário para o desempenho de atividades, como se pode ver através de diversos depoimentos (veja Diagrama 22). A tímida atenção dada ao assunto qualidade durante o período de expansão das escolas tem grande ligação com o baixo desempenho dos alunos. A melhoria deste desempenho requer agora ação sobre as questões que impactam a qualidade do ensino recebido em sala de aula e sobre o direcionamento adequado de recursos para garantir a infraestrutura de ensino necessária.

Programme for International Student Assessment: prova periodicamente aplicada pela OCDE a estudantes de 15 anos de 65 países

29

30 Média das notas de Matemática e Português nas provas aplicadas às escolas públicas no Brasil - SAEB (Sistema de Avaliação do Ensino Básico) até 2005 e na Prova Brasil de 2005 a 2009. Dados referentes aos anos de conclusão de cada ensino 31

Dados de 2008. Fonte: IMD

Uma das primeiras questões que salta aos olhos daqueles que analisam a qualidade do ensino é o direcionamento de recursos do País para o sistema educacional. O Brasil não apenas investe pouco por habitante, como também concentra a maior parte dos investimentos no ensino superior, deixando de priorizar os níveis fundamental e médio, aqueles para os quais a atenção é bastante necessária (veja Diagrama 23). Além da má distribuição de recursos, o Brasil precisa enfrentar uma questão central: a disponibilidade e preparação de professores para o ensino básico. No que diz respeito ao primeiro assunto, o Brasil está mal colocado tanto no ensino fundamental quanto no médio. Enquanto o País tem uma média de 23 alunos por professor no ensino fundamental, nos Estados Unidos, na Argentina e no Reino Unido estas proporções ficam em 13,7; 15,5 e 18,3, respectivamente. No ensino médio, o Brasil também fica atrás: 17,2 alunos em média por professor, enquanto Argentina, Reino Unido e Estados Unidos ficam em 12,2; 14 e 14,4, respectivamente31.

39


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DIAGRAMA 20

Exame internacional aponta baixo desempenho do ensino básico brasileiro

Brasil tem baixo desempenho no exame internacional PISA Colocação

Média PISA1 - 2009

577 546 544 543 541 529 527 519 510 500 497 496 468 439 420

Apesar do baixo desempenho, Brasil teve a terceira maior melhoria entre os 65 países participantes

401 396

Total: 65

Média da OCDE: 497

1. Programme for International Student Assessment – OCDE aplicado a 65 países em 2009 – OCDE + convidados – média das notas em leitura, matemática e ciências Fonte: OCDE, IMD; análise BCG


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DIAGRAMA 21

Exame nacional confirma a qualidade crítica do ensino básico brasileiro

Desempenho nacional é baixo no ensino fundamental e insuficiente no ensino médio Média nacional1 do ensino fundamental

340 320

médias esperadas: 201 a 325

300

Ensino fundamental no limite inferior da faixa esperada

280 260

média

255

240

246

239

220 0 1994

1996

1998

2000

2002

2004

2006

2008

2010

Média nacional1 do ensino médio

500

médias esperadas: 326 a 500

400

Ensino médio abaixo da faixa esperada

300

286

272

média

0 1994

1996

1998

2000

2002

2004

2006

2008

2010

1. Média das notas de Matemática e Português. SAEB (Sistema de Avaliação do Ensino Básico) até 2005 e Prova Brasil de 2005 a 2009, aplicada a escolas públicas. Dados referentes aos anos de conclusão de cada ensino / Fonte: “A Ignorância custa um mundo” de Gustavo Ioschpe; análise BCG

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DIAGRAMA 22

Deficiência em habilidades básicas do ensino médio dificulta empregabilidade de alunos egressos

Efeitos da carência de desenvolvimento de habilidades relativas ao nível básico

“A má qualidade da educação básica atrapalha na capacitação do trabalhador por parte da empresa em atividades específicas, sendo que o principal efeito é a queda da produtividade, porque em todo o trabalho produtivo é necessário um trabalhador com bom raciocínio lógico, boa experiência para reduzir o custo e excessos na produção e isso está muito difícil com a baixa qualificação dos trabalhadores.” Gerência Executiva - CNI

“Eles [jovens candidatos de ensino médio] são barrados logo nos requisitos mínimos exigidos [dos processos seletivos], que são: bom português, postura, paciência, disciplina e até a atitude de saber perguntar, conversar e criticar”

“Mesmo enquanto curso não técnico, ele [Ensino Médio] teria de fornecer ferramentas que os estudantes precisarão na atividade profissional.” Palma Filho – Professor UNESP

“De acordo com 52% dos consultados [Sondagem Especial – Confederação Nacional da Indústria], a má qualidade da educação básica (1ª a 8ª série do Ensino Fundamental) é uma das maiores dificuldades que encontram para capacitar seus funcionários. Conforme os dados, 99% das empresas consultadas acreditam na necessidade de investir na qualificação dos funcionários, mas 99% têm dificuldade para qualificá-los” Você S.A. On-line

Cristina Simões, Diretora da Id Consulting1

1. Consultoria que trabalha com uma média mensal de aproximadamente 600 vagas/mês voltadas para jovens, em três perfis: primeiro emprego, callcenter e trainee / Fonte: pesquisa na mídia; análise BCG


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DIAGRAMA 23

Baixa qualidade do ensino básico pode estar ligada a investimentos baixos e mal distribuídos Nível de investimento brasileiro é inferior a benchmarks internacionais Gastos públicos per capita com educação (US$ PPP mil/ano) - 2008

3,0

1,3 1,1

2,2 0,6

2,1

0,6

2,0 0,2

1,7

0,1

1,5

Além disto, Brasil concentra seus investimentos no ensino superior Concentração dos gastos com educação por nível de ensino - 20071 PRIMÁRIO

SECUNDÁRIO

37 35

12

46

30

19

37 32

34 34

32

36

32

35

31

37

22

28

33

27

44 28

20

46

30

21

50

21

16 11

TERCIÁRIO

51

19 20

58 65 69

Diversos países bemsucedidos concentram investimentos no ensino secundário, ao contrário do que o Brasil vem fazendo

1. Porcentual em cada nível de ensino do gasto total público em educação por aluno - Inclui gastos públicos em instituições de ensino públicas e privadas, custos da administração da educação no país e subsídios privados a alunos ou escolas 2. Dados de 2008 3. Dados de 2010 4. Dados de 2009 5. Dados de 2006 / Fonte: OCDE; EIU Country Data; Banco Mundial; German Federal Statistics Office; análise BCG


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Em relação à formação de profissionais para o ensino no nível básico, infelizmente o quadro não é positivo. O número de anos de estudo requerido dos professores é muito baixo quando comparado com outros países. Hoje, no Brasil, 33% dos professores têm, no máximo, o ensino médio completo. Enquanto isso, na maioria dos países desenvolvidos, é exigência de que os professores de ensino básico tenham formação de terceiro grau, chegando até sete o número de anos de estudo mínimos neste nível (veja Diagrama 24). Esta questão é particularmente relevante, pois, como constatou Cingapura na reformulação do sistema educacional, a qualidade dos alunos formados será no máximo similar à qualidade dos professores pelos quais passou. Ou seja, com raras exceções, é impossível se esperar alunos bem formados que sejam educados por professores pouco capacitados. Para tratar a questão da qualidade da formação de professores, já existem algumas iniciativas em andamento pelo MEC: • A Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) lançou em 2007 o Sistema Nacional de Formação de Professores, que oferece aos docentes cursos nos Institutos Federais de Educação Tecnológica e cursos e programas de educação superior ministrados à distância pela Universidade Aberta do Brasil (UAB), sendo estes últimos voltados a professores da rede pública. • Com o intuito de melhorar a qualificação dos professores de ensino básico das redes de ensino públicas municipais e estaduais, o MEC criou em 2009 o Plano Nacional de Formação de Professores. Através da Plataforma Freire, o programa oferece acesso à universidade para professores que não possuem graduação ou que têm uma licenciatura diferente daquela na área em que atuam. Uma terceira alavanca de melhoria da qualidade do ensino que poderia ser acionada é o aumento do tempo que os alunos brasileiros ficam na escola. Enquanto no Brasil os estudantes do ensino médio, por exemplo, passam uma média de 3,6 horas na escola, nos Estados Unidos permanecem 6,2. Além disto, países como Alemanha e Finlândia exigem matrícula em tempo integral na maior parte do ensino básico (veja Diagrama 25). A entrada do Brasil na fase de dividendo demográfico fez com que a população em idade escolar deixasse de crescer, o que pode ser uma oportunidade para utilizar escolas em período integral. Estudos econométricos32 descrevem correlações condicionais que indicam grande importância de variáveis individuais do aluno como sexo, cor, idade, repetência e trabalho no desempenho escolar. Escolaridade da mãe, presença de livros em casa e ambições futuras também são variáveis importantes. O mesmo estudo mostra que variáveis escolares como carga horária e pré-escola têm bastante relevância, enquanto que tamanho da turma ou disponibilidade de computadores afetam em menor proporção o desempenho dos alunos.

A Qualidade da Educação no Brasil, Naercio Aquino Menezes Filho - 2011 - Dados do SAEB 2003 32

O Brasil dispõe agora de grande oportunidade para avançar na qualidade da educação: o alcance da quase universalização do ensino fundamental aliado à estabilização no número de jovens em idade escolar e à redução na taxa de dependência da população deve continuar transferindo o foco das discussões do aspecto quantitativo para o aspecto qualitativo da educação básica nos próximos anos. Paralelo a esse movimento, iniciativas já existentes nas esferas pública e privada devem continuar melhorando a qualidade do ensino no Brasil e precisam ser multiplicadas:

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DIAGRAMA 24

Deficiência na formação de professores de ensino básico contribui para baixa qualidade

Formação de professores de ensino básico no Brasil é muito baixa Escolarização de professores Chile e Brasil % de professores do ensino básico com cada nível de qualificação1 - 2009 Superior e Pós-graduação Médio Fundamental

68 91

33% dos professores do ensino básico do país têm, no máximo, ensino médio completo

32 9

1

CHILE

BRASIL

MEC instituiu prova para ingresso na carreira de docente a partir de 2012, mas obrigatoriedade ainda não está definida

Em países desenvolvidos, realidade é bastante diferente Exigência de escolarização de professores Número de anos de educação de ensino superior necessária para tornar-se professor2

7 7

6

6

6

6

6

6

5

4

4

4

5

5 5 4 4

4

4

4 4

4 4

3

Média4 Ensino fundamental Ensino médio

EUROPA

ÁSIA

ÁMERICA DO NORTE

4,1 5,6

2,5 3,8

4,0 4,0

1. Níveis de qualificação traduzidos a partir da classificação ISCED – International Standard Classification of Education – Dados de 2003 2. Dados de 2001 3. Dados do Ens. Fundamental considerados dizem respeito ao Junior Middle School (idades de 12 a 15 anos). Equivale à segunda parte do primário 4. Entre os países exibidos Fonte: Teachers Matter, Attracting, developing and retaining effective teachers - OCDE (2005); Teachers and Educational Quality: Monitoring Global Needs for 2015 – UNESCO (2006)

USA

SGP

2

JPN

HKG

2 2

CHN3

GBR

FRA

FIN

ESP

CHE

NOR

DNK

DEU

ITA

2


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DIAGRAMA 25

Tempo que alunos passam na escola é outro fator que prejudica qualidade do ensino básico

Grande parte dos alunos brasileiros passa apenas até 4 horas na escola Tempo médio de permanência na escola de alunos brasileiros (horas) - 2006 4,1 3,6

1,9

PRÉ-ESCOLAR

FUNDAMENTAL

MÉDIO

Países com educação de qualidade mostram exigências mais elevadas • Alunos estadunidenses do ensino médio passam, em média, 6,2 horas na escola1 • Governo inglês recomenda um mínimo de 5,0 horas diárias para alunos no ensino médio • Coreia do Sul exige um número mínimo de horas em cada nível de ensino: • Ensino médio: 5,82 • Junior High (2a parte do fundamental): 5,52 • Finlândia3 e Alemanha4 exigem matrícula em tempo integral na maior parte do ensino básico

A diminuição da população em idade escolar nas próximas décadas é oportunidade para utilizar escolas em período integral

1. Alunos de 15 a 19 anos matriculados na escola. 2005 a 2009. 2. Dados calculados com base nas horas exigidas por ano (1.190 e 1.122, respectivamente) e nos dias letivos do país (205 por ano). 3. Alunos devem estar matriculados em tempo integral dos 7 aos 16 anos 4. Alunos devem estar matriculados em tempo integral dos 6 aos 15 ou 16 anos. Fonte: Ministério da Educação da Coreia; Bureau of Labor Statistics – EUA; Tendências da Educação no Hemisfério Norte – CNI | SENA; CPS-FGV; análise BCG

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• O governo tem elevado o número de anos de ensino obrigatório no País: em 2006, o ensino passou a ser obrigatório dos 6 aos 14 anos e, a partir de 2016, os ensinos infantil e médio também serão obrigatórios; • O MEC lançou em 2007 o Plano de Desenvolvimento da Educação (PDE), cujo objetivo é promover integração entre os ensinos básico, superior, profissional e tecnológico, e alfabetização. O PDE já congrega mais de 40 programas voltados para todos os ciclos educacionais; • Junto ao PDE, o MEC criou também o Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (IDEB), que mede a qualidade da educação básica oferecida pela rede de ensino do País, com base no cruzamento dos dados do censo escolar anual e dos dados de aprovação e evasão escolar; • Em 2011, o governo lançou o Programa Nacional de Acesso ao Ensino Técnico e Emprego (PRONATEC). O Programa pretende ampliar a oferta e elevar a qualidade de ensino da educação profissional no Brasil por meio de uma série de ações e projetos como, por exemplo, concessão de bolsas para cursos de capacitação para beneficiários do seguro-desemprego. O projeto tem como meta a capacitação de até 8 milhões de estudantes até 2014, além da expansão da rede nacional de escolas técnicas; • O Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), iniciativa do governo federal, garante um mínimo de investimento por criança na educação até o ensino médio; • A Prova Brasil permite a medição do desempenho de escolas públicas para o direcionamento de esforços de melhoria; • O movimento “Todos Pela Educação” incentiva e acompanha a evolução do País em direção às metas para a educação básica brasileira; • Instituições não governamentais apoiadas pela iniciativa privada, como o Instituto Ayrton Senna, trabalham para melhorar o ensino básico público no Brasil. No caso do ensino médio especificamente, sua obrigatoriedade em 2016 abriu espaço para a discussão sobre o melhor modelo a ser universalizado. O governo pode ser o responsável pela maior parte do aumento no número de matrículas, dado que a lacuna do ensino está em jovens de menor renda. Para tanto, o setor público pode se basear em um exemplo de modelo de ensino médio que mostra sucesso em termos de qualidade e de preparação de jovens para o mercado de trabalho: o ensino médio integrado a cursos técnicos e profissionalizantes, a exemplo dos ministrados no SENAI, no Senac e no Centro Paula Souza, sendo este uma autarquia do governo do Estado de São Paulo. A grande vantagem do ensino técnico é a maior preparação dos estudantes para o mercado de trabalho e, portanto, o aumento da empregabilidade. Diversos países já têm um sistema de ensino técnico estruturado e que privilegia a interação com empresas, facilitando a inserção no mercado de trabalho33: • Na Suécia, 15% do tempo de ensino secundário profissional são dedicados ao aprendizado no trabalho;

33 Fonte: Tendências da Educação e Formação Profissional no Hemisfério Norte – CNI | SENAI


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• Na Inglaterra, a aprendizagem nas empresas foi implantada em 1994 e já atingiu 1 milhão de alunos; e • Na Finlândia, há a opção de os alunos combinarem o ensino secundário com cursos no local de trabalho. No Brasil, a empregabilidade dos formandos do ensino técnico mostra o sucesso do modelo. Formados neste nível têm renda 12,9% superior aos egressos do ensino médio tradicional e 48% mais chances de encontrar trabalho34. Além disso, segundo pesquisa do MEC, 72% dos alunos egressos de escolas técnicas federais estão atualmente empregados. Ainda há espaço para o crescimento deste tipo de ensino no Brasil. O número de alunos que cursam o ensino médio e o ensino técnico ao mesmo tempo ainda é muito baixo, ficando em torno de 4,3% no País e 5,0% no Estado de São Paulo35. Segundo Almério Araújo, do Centro Paula Souza, “em outros países, a oferta de vagas para o técnico em relação ao médio chega a 30%”. No ensino superior brasileiro, a qualidade é dividida em dois grupos principais. Em um primeiro está o ensino superior com alta qualidade e poucas escolas bastante disputadas em processos seletivos, na sua maioria, públicas. Esse grupo forma a elite dos talentos brasileiros e inclui escolas com qualidade reconhecida internacionalmente: das dez melhores escolas na América Latina em 2010, três são brasileiras e, apesar de menor destaque, o Brasil tem cinco universidades no ranking das melhores do mundo (veja Diagrama 26). Um segundo grupo comporta a maior parte das escolas de ensino superior brasileiro, em sua maioria particulares, com menor qualidade. A análise de um instrumento de avaliação nacional de escolas de ensino superior comprova a distribuição apresentada acima: no Índice Geral de Cursos36, somente 13% dos cursos de ensino superior estão classificados nos dois níveis inferiores de qualidade, enquanto 50% estão no nível intermediário e 38% estão nos dois níveis superiores (veja Diagrama 27). O grupo de escolas de ensino superior com menor qualidade é o que vem vivendo um boom de crescimento motivado por baixas mensalidades. O crescimento do número de cursos no Brasil traz benefícios, especialmente em se tratando de cursos acessíveis a classes com menor renda, mas é necessário o acompanhamento de tais cursos para que a quantidade não apareça em detrimento da qualidade e, portanto, com resultados menos positivos para o País. Nesta linha, a avaliação do ensino superior é um avanço recente no Brasil, mas extremamente importante. Seu início data de 1996 com a instituição do Exame Nacional de Cursos, antigamente conhecido como “Provão”. Em 2004, houve uma reformulação do exame e se estabeleceu o Sistema Nacional de Avaliação da Educação Superior, com base no ENADE37. Algumas melhorias precisam ainda serem feitas para garantir um sistema de avaliação adequado. A divulgação dos resultados ainda é lenta38 e o acesso às informações tem interface bastante difícil, prejudicando a utilização da ferramenta pelos alunos e pelo mercado como indicador de qualidade dos cursos. Além disso, alguns dos critérios de avaliação estão, em alguns casos, desalinhados com os cursos: por exemplo, o número de professores-doutores nem sempre é um bom indicador de qualidade para cursos que exi-

34 Fonte: Estudo de Marcelo Neri da Fundação Getúlio Vargas sob encomenda do Instituto Votorantim (2010) 35 Fonte: Depoimento de Almério Araújo do Centro Paula Souza – abril de 2011 via pesquisa na mídia 36 Índice Geral de Cursos de 2008 – divulgado pelo MEC 37 Exame Nacional de Desempenho dos Estudantes 38 O ENADE de 2009 levou mais de um ano para ser publicado


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DIAGRAMA 26

Ensino superior brasileiro se destaca na América Latina

Três universidades brasileiras estão entre as 10 melhores da América Latina... Ranking de melhores universidades na América Latina U.S. News & World Report - 2010

MÉXICO 1 BRASIL 2 BRASIL 3 ARGENTINA 4 CHILE 5 ARGENTINA 6 CHILE 7 BRASIL 8 MÉXICO 9 ARGENTINA 10

Universidade Nacional Autónoma de México Universidade de São Paulo Universidade Estadual de Campinas Universidad de Buenos Aires Pontificia Universidad Catolica de Chile Universidad Austral Universidad de Chile Universidade Federal do Rio de Janeiro Tecnológico de Monterrey (ITESM) Universidad ORT Uruguay

...mas o País ainda tem pouco destaque em rankings mundiais Brasil é somente o 27º país entre 56 com o maior número de escolas de ensino superior no ranking das 600 melhores universidades do mundo Ranking de melhores universidades do mundoQS World University Rankings - 2010

253 292 381 501-550 551-600

Universidade de São Paulo Universidade Estadual de Campinas Universidade Federal do Rio de Janeiro Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro Universidade Estadual Paulista “Júlio de Mesquita Filho”

Fonte: World’s Best Universities do U.S.News & World Reports, QS World University Rankings 2010; análise BCG

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DIAGRAMA 27

Grande disparidade na qualidade do ensino superior brasileiro Distribuição de escolas de ensino superior em níveis de IGC1 - % em 2008

50%

38%

13%

0%

0%

Nota

Apenas 13% das escolas de ensino superior no Brasil estão nos níveis inferiores de classificação...

... enquanto 38% das escolas concentram-se nos dois níveis superiores

1. Índice Geral de Cursos, considera somente escolas avaliadas em 2008 – nível máximo é 1 e nível mínimo é 5 / Fonte: MEC; análise BCG

gem experiência prática dos mestres. Finalmente, ainda há espaço no País para criação de avaliações do ensino, complementares à pública, que reflitam a visão do mercado. Em relação à pós-graduação, algumas áreas ainda têm regulamentação bastante frágil, como é o caso de cursos de MBA39. Atualmente, o número mínimo de horas (360) nos cursos está abaixo do exigido em outras instituições no exterior e, mesmo assim, esta carga horária nem sempre é cumprida40. Adicionalmente, como no Brasil os cursos deste tipo se enquadram na categoria de pós-graduação lato sensu, de acordo com a legislação, sua abertura independe de autorização, reconhecimento e renovação de reconhecimento pelo Ministério da Educação, como acontece com cursos strictu sensu. A diferenciação de cursos de maior qualidade se dá hoje por meio de certificações internacionais, como AMBA41, AACSB42 e EFMD43, obtidas por pouquíssimas escolas no Brasil.

39

Master in Business Administration

Resultado de pesquisa do Datafolha publicado no jornal Folha de S.Paulo, edição de 17 de outubro de 2010, aponta que 14% dos alunos entrevistados disseram fazer cursos com menos de 350 horas de duração 40

41

Association of MBAs

Association to Advance Collegiate Schools of Business 42

43 European Foundation for Management Development


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Proposições para tratar as lacunas de qualidade do ensino no Brasil O Brasil vive uma oportunidade para aumentar a qualidade de sua formação de pessoas dada sua base quantitativa construída, a experiência positiva com iniciativas de sucesso e o momento da economia que demanda cada vez mais pessoas qualificadas. Torna-se necessário realizar próximos passos cruciais em qualidade para a construção de um conjunto de talentos fortificado, o que envolve iniciativas para aumentar investimentos em educação, capacitação de professores e melhoria das instituições de ensino superior. As sessões de trabalho com associados da BRAiN e especialistas no assunto levaram à compilação das seguintes proposições para tratar as lacunas desta área: • Aumentar verbas disponíveis para o ensino. Alternativas para o governo ampliar a verba destinada ao ensino no Brasil incluem a redução de encargos trabalhistas e/ ou impostos para empresas que financiarem a formação de seus colaboradores. Além disso, o pagamento do estudo superior público pelos alunos pode ajudar a aumentar a quantidade de recursos disponíveis. A Austrália, por exemplo, recupera os investimentos educacionais feitos em parte dos alunos, a posteriori, e proporcionalmente ao salário que eles recebem (veja Quadro B). • Racionalizar distribuição de recursos, com maior foco no ensino médio, privilegiando programas governamentais de ampliação de vagas e concessão de bolsas, como já acontece nos programas PROUNI e PRONATEC. O setor privado, por sua vez, tem o papel relevante de corroborar a visão da importância do estudo secundário, valorizando este nível na contratação e na carreira de seus profissionais. • Aumentar e melhorar a remuneração dos professores, por meio da canalização de recursos e da reestruturação do sistema de remuneração pelo setor público. Desta maneira, pode-se estabelecer um aumento do nível mínimo salarial, com remuneração adicional por desempenho, além de recompensar melhor os educadores do ensino médio. O governo pode também oferecer bolsas para formação superior em magistério. O setor privado pode desenvolver programas de responsabilidade social para recompensar adicionalmente professores com base em desempenho. • Melhorar nível dos professores e motivá-los, através de sistema meritocrático de remuneração e desenvolvimento de carreira. A iniciativa privada pode contribuir promovendo treinamentos específicos para professores e disseminando uma cultura de valorização do professor.

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TALENTOS E CAPITAL HUMANO PARA O POLO DE INVESTIMENTOS E NEGÓCIOS NO BRASIL

• Monitorar a qualidade do ensino superior, particularmente em cursos de pós-graduação não acadêmicos, garantindo assim a qualidade. A inclusão dos cursos de pós-graduação acadêmica e MBAs no processo de abertura e avaliação de cursos é essencial para monitorar a qualidade dos cursos de negócios. A iniciativa privada pode acompanhar as avaliações, utilizando este instrumento em processos seletivos, possivelmente através de selos de qualidade de cursos. • Promover interação do mercado com instituições de ensino superior, de tal forma a criar currículos adequados às necessidades do mercado. A forma mais direta de se obter este alinhamento é promover revisão curricular periódica, idealmente anual.

QUADRO B

O sistema público de ensino superior na Austrália

Desde sua criação em 1989, o Higher Education Contribution Scheme (HECS) tornou-se parte integrante do sistema de educação superior australiano. Ao transferir uma parte significativa do custo do ensino superior para os alunos, o sistema tem possibilitado a contínua expansão e melhoria do setor educacional no país. Os alunos de universidades públicas não são cobrados pela mensalidade enquanto frequentam o curso. Ao invés disso, estes valores são acumulados como uma dívida que os alunos só pagam após a formatura. A amortização do empréstimo é feita através do Imposto de Renda, apenas quando o salário do diplomado atinge um limite mínimo estipulado. A parcela da amortização varia de acordo com aos rendimentos do recém-formado e pode corresponder de 4% a 8% da renda. Assim, quem ganha menos que $ 30.000, não paga nada, e a maior alíquota é somente aplicada para quem recebe mais de $ 60.000 por ano1. O sistema tem a vantagem de oferecer maior segurança ao financiado e, consequentemente, diminuir a aversão ao risco, pois como o repagamento é baseado na renda do diplomado, ele sente-se protegido de possíveis flutuações em seus rendimentos. Por adequar-se melhor à realidade dos estudantes, este modelo de crédito reduz a inadimplência. Outros países também adotaram um modelo de crédito educativo semelhante ao australiano e, apesar das variações na aplicação deste exemplo, todos têm em comum a restituição do valor financiado com base nos rendimentos do diplomado. 1. Dólares australianos / Fonte: Australian Parliament online library – The Higher Education Contribution Scheme; Jacques Schawrtzman – O ensino superior no Brasil; análise BCG


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“Hoje, praticamente 100% das crianças brasileiras em idade escolar estão nas redes públicas e particulares de ensino. Deste passo vamos melhorar a qualidade do ensino. Os resultados não aparecem de uma hora para a outra, mas já há sinais, com a elevação do Brasil nos rankings.” Luiz Carlos Trabuco Cappi, presidente do Banco Bradesco

Alinhamento do ensino com o mercado O alinhamento do ensino com o mercado é a garantia de que a formação de talentos seja feita de acordo com as capacitações necessárias ao mercado de trabalho e, em último caso, de acordo com as necessidades de crescimento do país. Tal alinhamento resulta da conjugação da qualidade do ensino com um diálogo constante entre academia e mercado a fim de mapear as necessidades de profissionais e moldar as atividades de formação. O ensino brasileiro apresenta baixo alinhamento com as necessidades do mercado, sendo o 5º pior entre 58 países segundo com uma pesquisa entre executivos realizada pelo IMD44 (veja Diagrama 28). Uma ilustração do desalinhamento brasileiro é a taxa de aprovação no exame de ordem da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), abaixo de 25% nos Estados do Rio de Janeiro e São Paulo, e comparada a taxas de 76% e 46% em Nova Iorque e Paris, em exames com o mesmo objetivo (veja Diagrama 28).

44 IMD World Competitiveness Yearbook 45

American National Standards Institute

46 Exemplos incluem: Chartered Accountant e Certified Public Accountant para contabilidade; Chartered Financial Analyst e Certified Financial Planner para finanças; Chartered Member of the Institute of Logistics and Transport para transporte e logística; e Project Management Professional do Project Management Institute para gestão de projetos

Licenças e certificações são mecanismos importantes para o alinhamento do ensino com as necessidades de mercado, pois garantem ao empregador um padrão mínimo de qualificação do indivíduo para executar determinada atividade ou trabalho, aumentando o nível de informação do mercado como um todo. As licenças são obrigatórias para o exercício de determinada profissão enquanto que as certificações, embora não sejam obrigatórias, são comumente exigidas pelo mercado. Geralmente obtidas mediante teste ou prova em associações profissionais ou fornecedores de um produto ou serviço, as licenças e certificações são, em alguns casos, temporárias ou devem ser renovadas com alguma frequência. Os Estados Unidos tem um modelo de certificações exemplar, regulamentado nacionalmente pela ANSI45, que regula e define os requisitos para organizações certificadoras. A ANSI garante teste baseado em conhecimentos da indústria e oferece certificações por tempo limitado. As certificações são amplamente utilizadas nos Estados Unidos, em diversas áreas, como: contabilidade, finanças, transporte e logística e gestão de projetos46. A concessão de licenças está sob jurisdição estadual e campos regulados podem variar de Estado para Estado.

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DIAGRAMA 28

Brasil tem baixo alinhamento entre o ensino e as necessidades do mercado

Ensino no Brasil tem o 5º pior alinhamento com mercado Alinhamento do ensino superior com o mercado - Notas de 0 (min) a 10 (máx)

2 3 4

Baixa aprovação na OAB é exemplo de desalinhamento

4

Aprovação no exame da ordem de advogados

4

Brasil é 5º pior entre 58 países

4

76%

4 4 4 46%

5 5 6

23%

6

16%

6 6

NOVA IORQUE1

6

PARIS2

RIO DE JANEIRO3

SÃO PAULO4

7 7 7 8

1. Nova Iorque em 2010. 2. Dado estimado de acordo com website especializado. 3. Média aritmética da aprovação na OAB nas 3 provas de 2009 - OAB São Paulo passou a ter prova unificada com o país apenas em 2009. / Fonte: OAB; MEC; IMD; NYC Bar Exam; “Global Talent Risk – Seven Responses“, BCG & WEF; pesquisa na mídia; análise BCG

8

O modelo de certificações financeiras do Reino Unido também é um caso internacional de sucesso. Consultores financeiros só podem exercer a profissão após obterem aprovação em um exame para receber um entre dois certificados que atestam o nível mínimo de qualificação exigido pela autoridade de serviços financeiros do país (FSA47):

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Financial Services Authority


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Certificate in Financial Planning ou Certificate for Financial Advisers. Apenas três órgãos estão autorizados a emitir as certificações48. Em junho de 2010, a FSA aumentou o nível mínimo de qualificação de referência a ser desempenhada por consultores e o prazo para obter a nova qualificação é o final de 2012. Caso não obtenha o novo certificado, o consultor financeiro perderá o direito de exercer a profissão. O Brasil ainda pode avançar bastante neste tema de certificações e licenças, pois não possui sistema central e a regulação é feita setorialmente, apesar de já serem aplicadas em alguns segmentos. No setor de tecnologia da informação, por exemplo, certificações de qualificação para trabalho com sistemas e aplicativos específicos são comuns, mas não obrigatórios. No mercado financeiro, certificações obrigatórias são emitidas pela ANBIMA49 e CVM50 e certificações não obrigatórias são emitidas em paralelo pela APIMEC51. Na área jurídica, a carteira de advogado é expedida a bacharéis de Direito apenas após aprovação no exame da OAB. Apesar do baixo alinhamento com o mercado, o Brasil começa a evoluir por meio de diversas iniciativas bem-sucedidas pelo governo, por entidades de classe ou diretamente pela iniciativa privada. Esforços como esses precisam ser ampliados para solucionar o problema nacional: • Em 2007, foi criado o Brasil Profissionalizado, com o intuito de integrar o conhecimento do ensino médio à prática. A iniciativa repassa recursos do governo federal para que os estados invistam em infraestrutura, melhoria de gestão, práticas pedagógicas e formação de professores de suas escolas técnicas. • O SENAI, parte integrante do sistema da Confederação Nacional da Indústria (CNI), é o maior complexo de educação profissional da América Latina, atendendo mais de 96 mil empresas e formando anualmente mais de 2 milhões de profissionais para a indústria; • O Senac, instituição de referência em educação profissional no País e administrada pela Confederação Nacional do Comércio (CNC) e seus filiados, ministra cursos em 15 áreas de atuação ligadas ao comércio e a serviços; • O Centro Paula Souza, responsável pelas escolas técnicas estaduais do Estado de São Paulo (Etecs e Fatecs), tem cursos alinhados com as necessidades do mercado via constante interação com o setor privado na definição de grades curriculares, na construção de laboratórios e infraestrutura e na formação de professores; • Muitos sindicatos têm oferecido cursos para aumentar a empregabilidade de seus associados, como no caso do Sindicato dos Metalúrgicos de Caxias do Sul (RS), que está promovendo cursos gratuitos de capacitação nos conhecimentos que mais fazem falta aos candidatos a vagas de emprego no setor; • A Federação Brasileira de Bancos (FEBRABAN) tem escolas de formação técnica e profissional52 que preparam talentos para trabalhar nos bancos, seus associados; • A Totvs, empresa nacional de tecnologia e serviços, tem parceria com mais de 60 faculdades e universidades no Brasil, apoiando aulas relacionadas ao seu negócio e assim garantindo melhor acesso a talentos e o alinhamento de suas capacidades com as necessidades da empresa.

48 Chartered Insurance Institute, IFS School of Finance e Institute of Financial Planning 49 Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiros e de Capitais 50 Comissão de Valores Mobiliários 51 Associação dos Analistas e Profissionais de Investimento do Mercado de Capitais 52 Os quatro tipos de escola que a FEBRABAN possui são: escolas para formação profissional (com 200 cursos em 23 áreas do conhecimento), escola de formação de líderes, escola de finanças para públicos estratégicos, e escola de cidadania financeira


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Iniciativas internacionais também oferecem ao Brasil exemplos a serem seguidos para o maior alinhamento entre o ensino e as necessidades do mercado, todos baseados na aproximação entre pelo menos dois dos três agentes definidores da formação de talentos – governo, academia e mercado: • A empresa de energia Pampa Energia S.A. na Argentina apoia o curso de engenharia elétrica na universidade ITBA para formar os talentos de que necessita; • A empresa de tecnologia indiana Infosys tem um programa de formação em conjunto com universidades para formar talentos de tecnologia – o projeto conta com mais de 395 faculdades inscritas no mundo, já tendo formado mais de 100 mil alunos só na Índia. O programa vem se expandindo globalmente e já tem presença na China, no México e na Malásia; • A Joblinge na Alemanha é uma iniciativa público-privada que faz a transição de pessoas formadas nos 1º e 2º graus para a atuação no mercado de trabalho, envolvendo apoio de orientação de carreira, treinamentos e estágios com contratação por empresas parceiras; • A South African Network of Skills Abroad (SANSA) traz expatriados sul-africanos para treinar talentos nacionais de acordo com as necessidades do mercado. As empresas também têm papel importante na promoção do alinhamento: podem

DIAGRAMA 29

Empresas vêm flexibilizando exigências de contratação diante da escassez de profissionais

Exigências flexibilizadas - Níveis operacional e técnico % do total de respondentes

83%

Exigências flexibilizadas - Níveis tático e estratégico % do total de respondentes

56%

53%

46%

28%

50%

28% 17% 6%

Experiência na área

Habilidade técnica

Curso técnico

Competências pessoais

Pós-graduação

Fluência em idiomas

Experiência Competências na área pessoais

Curso superior

Nota: Estudo com 130 empresas de grande porte pela classificação do BNDES no Brasil (faturamento total de US$ 350B), abrangendo as 5 regiões do país / Fonte: Fundação Dom Cabral (março de 2011)


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adequar suas exigências de contratação às reais necessidades das vagas, valorizando também o ensino técnico e tecnológico e limitando a sobrevalorização do bacharelado. Tais movimentos já estão acontecendo e podem ser observados pelos porcentuais de empresas com exigências flexibilizadas tanto em níveis operacional e técnico, como em níveis tático e estratégico (veja Diagrama 29). Programa Menor Aprendiz: programa criado pelo governo federal que beneficia profissionais entre 14 e 24 anos de idade, alunos de escola pública ou de cursos dos Serviços Nacionais de Aprendizagem (Sesi, SENAI, Senac etc.). Contrato especial de no máximo dois anos, com carga horária de no máximo 6 horas por dia. Uma empresa deve ter no mínimo 5% de espaço para os aprendizes e no máximo 15% 53

54 Fonte: IMD World Competitiveness Yearbook

Como exemplo de flexibilização, o Banco Santander do Brasil, ao se deparar com dificuldades de contratação para suprir sua rede de agências, decidiu flexibilizar seus critérios seletivamente, eliminando a exigência de curso superior para alguns tipos de posições da rede, aumentando sua base de estagiários e/ou menores aprendizes53 e exigindo conhecimento de idiomas apenas em casos específicos locais. Enquanto exames básicos de português e matemática continuam sendo aplicados, o processo passou a relevar ainda mais características como valores pessoais, expectativas de carreira e perfil. Para os contratados, diversos treinamentos continuam a ser ministrados. Além da lacuna de expectativas do mercado com o ensino brasileiro, existe também a sensação de desalinhamento com a pesquisa acadêmica. Em uma pesquisa de opinião de executivos a respeito da transferência de conhecimento entre universidades e empresas, o Brasil ficou colocado em 45º, dentre um total de 58 países54. O baixo porcentual de co-publicações

DIAGRAMA 30

Brasil tem baixa integração entre pesquisa acadêmica e empresas

Integração entre pesquisa acadêmica e empresas - 2010 % de co-publicações universidades-empresas do total da pesquisa realizada

BRASIL1 CINGAPURA2 ÁFRICA DO SUL3 ALEMANHA4 COREIA DO SUL5 REINO UNIDO6 JAPÃO7 EUA8

2% 4%

5%

9%

5%

9%

10%

20%

10%

20%

10%

20%

10%

20%

10%

20%

1. Inclui Unicamp, UFMG, UFRJ, UFRGS e USP. 2. Inclui Nanyang e Natl. Univ. Sing. 3. Inclui Cape Town e Witwatersrand. 4. Inclui Fried. Alex., Humboldt, Tech Dresden, Tech Munchen e Univ. Saarlandes. 5. Inclui Korea Inst., Korea Univ., Pohang Univ., Seoul Natl. Univ. e Yonsei Univ. 6. Inclui Bath, Manchester, Reading, Sheffield e Southampton. 7. Inclui Chiba, Gifu, Hiroshima, Hokkaido e Kagoshima. 8. Inclui Harvard, Johns Hopkins, Northeastern, Univ. Alabama e Univ. Massach. Nota: Percentual calculado com base no total de pesquisas publicadas no Web of Science pelas 500 universidades com maior número de publicações registradas. Fonte: Center for Science and Technology Studies - Leiden University (Holanda)

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entre universidades e empresas só corrobora tal percepção. Enquanto em universidades dos EUA, Japão, Alemanha, Reino Unido e Coreia do Sul 10% a 20% das pesquisas realizadas são de coautoria com empresas, no Brasil este número cai para 2% a 4% (veja Diagrama 30). Felizmente, o Brasil já conta com diversas iniciativas que mostram que a colaboração entre universidades e empresas é possível e frutífera, se bem gerida: • Com o objetivo de aproximar a academia e o setor privado no campo de pesquisas científicas, foi sancionada em 2007 a lei federal 11.487, a qual prevê incentivos fiscais para promover parcerias entre empresas e institutos de pesquisa públicos, como universidades públicas. A isenção fiscal é inversamente proporcional ao direito de propriedade pela empresa – assim, quanto maior a isenção fiscal, menor é o direito da empresa sobre a pesquisa e maior o do instituto; • A Fundação Casimiro Montenegro Filho intermedeia projetos de desenvolvimento e capacitação tecnológica entre empresas como Embraer, IBM e Vale e o Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA); • Criada em 1992, a Fundação de Apoio à Universidade de São Paulo (FUSP) intermedeia a interação entre pesquisadores e agentes externos como Vale, Braskem e Eletropaulo; • O Núcleo de Dinâmica e Fluidos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo desenvolve pesquisas em conjunto com a iniciativa privada, que servem de subsídio para projetos de engenharia mecânica, naval e aeronáutica em empresas como Petrobras, Voith-Siemens e Embraer; • A Universidade de Brasília e o Banco de Brasília estão em fase adiantada de entendimento para celebração de convênios para pesquisa direcionada em temas como administração de carteiras, gerenciamento de riscos e gestão de contratos de terceiros. O governo também já reconhece a importância de maior interação entre pesquisa acadêmica e mercado. Nessa linha, os Fundos Setoriais da FINEP55 vêm sendo utilizados como principais instrumentos públicos de financiamento56 de projetos de pesquisa e inovação no País. Em particular, o Fundo Verde e Amarelo tem editais voltados para parcerias entre institutos de pesquisa e empresas privadas, focando em linhas de ação que atendam às necessidades do setor privado. Em 2010, foram empenhados R$ 120 milhões para esse fundo, sendo que apenas R$ 70 milhões foram distribuídos, o que mostra que ainda há espaço para crescer.

Proposições para tratar as lacunas de alinhamento do ensino com o mercado Embora uma série de iniciativas já esteja em andamento no Brasil, exemplos internacionais mostram que para aumentar o alinhamento entre o ensino e as necessidades do mercado, o Brasil ainda tem grandes passos a seguir, desde a adequação das exigências do mercado, passando pela cooperação com a academia e a melhor estruturação dos sistemas de formalização e regulamentação profissional. As sessões

55 Financiadora de Estudos e Projetos. Empresa pública vinculada ao Ministério de Ciência e Tecnologia, criada em 1967, e que tem como missão promover o desenvolvimento brasileiro através do fomento público à Ciência, Tecnologia e Inovação 56 Fundos são oriundos de contribuições incidentes sobre o resultado da exploração de recursos naturais pertencentes à União, parcelas do IPI de certos setores e de Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico (CIDE)


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de trabalho com associados da BRAiN e especialistas no assunto levaram à compilação das seguintes proposições para tratar as lacunas desta área: • Racionalizar requisitos de contratação flexibilizando exigências, quando apropriado. Tal iniciativa pode ser tomada pelo setor privado, assumindo que haja educação de qualidade, com currículos técnicos alinhados com as necessidades do setor privado. As empresas podem reavaliar internamente suas reais necessidades de capacitação, flexibilizando a exigência de bacharelado e conhecimento de idiomas, por exemplo. Além disso, devem também valorizar profissionais com qualificações “calibradas”, conforme item a seguir.

“Os fundos setoriais [...] têm possibilitado a implantação de milhares de novos projetos em Institutos de Ciência e Tecnologia, que objetivam não somente a geração de conhecimento, mas também sua transferência para empresas. Projetos em parceria têm estimulado maior investimento em inovação tecnológica por parte das empresas [...]” Website da FINEP – O que são os fundos setoriais

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• Alinhar níveis de remuneração e oportunidades de carreira com competências necessárias e não apenas com ensino superior, gerando assim oportunidades que ofereçam o devido reconhecimento. Cabe à iniciativa privada o importante papel de estimular e ao setor como um todo o de valorizar competências, o que pode ser feito por meio da correta calibragem da remuneração e da carreira futura com as competências adequadas do profissional, e não necessariamente só com o diploma de nível superior. • Criar agenda de ensino de médio e longo prazo alinhada com competências exigidas no mercado. Criar projeto, público ou privado, para gerenciar as demandas de profissionais dos setores de mercado mais relevantes para tornar o Brasil um polo de negócios. O governo poderia também considerar a inclusão de critérios de alinhamento com o mercado como, por exemplo, empregabilidade dos egressos, nas avaliações de qualidade de instituições de ensino superior. • Promover a aproximação entre empresas e ensino acadêmico. Iniciativas pontuais como as escolas técnicas do Centro Paula Souza geram, com poucos esforços, resultados importantes para o alinhamento entre a formação de talentos e as necessidades da economia. Através desse tipo de parceria, a academia é beneficiada por contribuições em conteúdo e treinamento de professores e as empresas se beneficiam pelo acesso a pessoas formadas de acordo com suas necessidades. Outra iniciativa semelhante bem-sucedida é a parceria entre a FEBRABAN e as Fatecs, pela qual se formam tecnólogos em serviços bancários para o setor financeiro. Tais parcerias devem continuar sendo expandidas e promovidas. Além disso, o diálogo entre mercado e academia deve ser sistematizado, possivelmente através de associações de classe para, por exemplo, a criação de cursos de extensão com foco em competências profissionalizantes. • Financiar pesquisa acadêmica direcionada às necessidades das empresas. Tal iniciativa poderia ser feita conjuntamente entre o setor público e o setor privado. O estabelecimento de parcerias entre entidades tais como o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico Tecnológico (CNPq), a Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES) ou ainda a Fundação de Amparo a Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP) e a iniciativa privada para o financiamento de bolsas de estudo poderia dar maior impulso à pesquisa no País, assim como aumentar o alinhamento entre a pesquisa e as necessidades de crescimento econômico do País. • Estruturar sistema nacional de certificações, a exemplo do que acontece em outros países, como os Estados Unidos. Cabe à iniciativa privada mapear áreas que mais necessitam de certificação, organizar um sistema central e entender a dinâmica de melhores práticas internacionais como as verificadas no Reino Unido, na Alemanha e em Portugal. O apoio do governo também é fundamental para garantir a participação ativa em questões nacionais de certificação, como a regulação.


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Internacionalização da formação A internacionalização da formação de talentos no Brasil envolve a disseminação do conhecimento de idiomas, em particular o inglês e o espanhol, e de experiências acadêmicas internacionais, ambos elementos necessários ao desenvolvimento de um polo de negócios com projeção internacional. Uma pesquisa mundial realizada em 2010 pela empresa GlobalEnglish mostrou que, para 74% dos 26 mil respondentes, o inglês é necessário ao trabalho e que 55% do mesmo grupo falam inglês diariamente nas atividades profissionais exercidas57. O ensino de idiomas no Brasil evoluiu bastante nos últimos anos, tendo se tornado obrigatório no ensino básico – o inglês é compulsório durante quatro anos no ensino básico desde 1998 e o espanhol é obrigatório durante três anos desde 2010. Além disso, o Rio de Janeiro elevou a obrigatoriedade do inglês de quatro para oito anos, em preparação para a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016, e o Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM) passou a testar um idioma estrangeiro desde 2010. No ensino superior, apesar de o ensino de idiomas não ser obrigatório, as escolas têm realizado parcerias com cursos de idiomas para aumentar o acesso de seus alunos e, em linha com esse movimento, o número de matrículas em cursos de idiomas tem crescido aceleradamente. Adicionalmente, cabe citar que boa parte da literatura utilizada nos cursos de educação superior é estrangeira, o que reforça a necessidade dos alunos pelo aprendizado de idiomas. Os números de escolas e de matrículas em cursos de idiomas também têm crescido nos últimos anos. A escola Alumni, por exemplo, registrou um aumento de 8 mil alunos em 2007 para 65 mil alunos em 2011. Iniciativas de popularização do inglês para profissionais formados também têm sido impulsionadas pelo advento da Copa do Mundo e das Olimpíadas: em virtude destes eventos, o Sindicato dos Autônomos em São Paulo oferece cursos de inglês e espanhol para seus associados (como taxistas). Entretanto, uma maior expansão ainda se faz necessária: apesar dos avanços, o ensino de idiomas estrangeiros no Brasil ainda é insuficiente se comparado com as necessidades do mercado. O País é um dos piores em alinhamento do conhecimento de idiomas com o mercado e tem 43% dos executivos nacionais descontentes com o nível de conhecimento de idiomas entre os brasileiros (veja Diagrama 31).

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The globalization of English Report – GlobalEnglish

A vivência internacional também é outro elemento-chave para a formação de talentos para o polo de negócios brasileiro. Grande parte das universidades e faculdades no Brasil tem hoje escolas parceiras para intercâmbio fora do País e o número de alunos estrangeiros no território brasileiro vem crescendo, embora ainda seja bem menor que

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DIAGRAMA 31

Ensino de idiomas no Brasil é insuficiente para atender às necessidades do mercado nacional

Ensino de idiomas no Brasil é pouco alinhado às neccessidades do mercado... Alinhamento do ensino de idiomas às necessidades do mercado - notas de 0 (mín) a 10 (máx)

3,1 3,1 3,1 3,2 3,7

...ficando abaixo das necessidades de 43% dos empresários

3,7

Nível de satisfação de executivos nacionais com a capacidade de trabalhadores brasileiros em idiomas estrangeiros

3,8 4,5

43%

48%

9%

Fica abaixo das necessidades

Atende necessidades

Excede necessidades

4,6 5,0 5,2 5,2 Fonte: EIU, HSBC, IMD World Competitiveness Yearbook, pesquisa na mídia, entrevistas; análise BCG

5,5 6,9 7,0 7,2 8,1 Média do conjunto: 4,9


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“Idiomas são grande obstáculo para fazermos o casamento entre vagas e candidatos – hoje todas as grandes empresas querem que todos os gerentes falem inglês, o que não é tão fácil de conseguir” Headhunter no Brasil

o número de brasileiros que vão estudar no exterior, e pouco expressivo se comparado à entrada de estudantes em outros países (veja Diagrama 32). Dois exemplos de universidades brasileiras que buscam complementar a formação através de experiência internacional são a Fundação Getúlio Vargas (FGV) e a Universidade de São Paulo (USP).

DIAGRAMA 32

Formação de pessoas no Brasil é pouco internacionalizada se comparada com as de outros países

Mobilidade internacional estudantil Entrada e saída de estudantes - por mil habitantes em idade escolar de ensino secundário e terciário - 2007

37,1 Países principalmente exportadores de estudantes

Países principalmente importadores de estudantes

26,8 Entrada Saída

12,7 8,8 5,8 2,5

1,7

1,1

MÉXICO

ND

ARGENTINA

1,1

BRASIL1

ND

ÍNDIA1

0,5

CHINA

0,0

CHILE

0,6

JAPÃO

0,0

EUA

0,2

FRANÇA

2,5 1,9

REINO UNIDO Números de pessoas entrada/saída (mil)

3,8 1,1

351 24

247 54

610 51

126 54

8 6

42 424

8 157

1 22

ND 8

ND 25

1. Dados referentes ao ano de 2006 / Fonte: Unesco, IMD World Competitiveness Yearbook, pesquisa na mídia, entrevistas; análise BCG

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A Escola de Administração de Empresas de São Paulo (EAESP) da Fundação Getulio Vargas (FGV) foi uma das pioneiras entre escolas de negócios a estabelecer parcerias com instituições internacionais de ensino para intercâmbio de alunos, tendo estabelecido o primeiro convênio internacional em 1972 com a Ecole des Hautes Etudes Commerciales, da França. Hoje, a escola tem diversos programas que proveem a internacionalização dos alunos, destacando-se os programas de intercâmbio com 95 escolas no mundo, os acordos de duplo diploma, o programa internacional de férias e o ONE MBA, programa de MBA com foco em formação global, no qual os alunos participam de projetos internacionais e de visitas de negócios aos outros países e escolas participantes. Tantas oportunidades aumentaram o número de alunos participantes dos programas internacionais ao longo dos últimos anos, de 162 alunos em 2006 para 301 alunos em 2010. A Escola Politécnica da USP também possui um programa internacional diversificado, tendo iniciado o movimento há mais de uma década. A escola conta com parcerias com 61 instituições fora do País, a maioria situada na Europa. Os dois principais programas são o de duplo diploma e o de aproveitamento de créditos. A pós-graduação na escola também apresenta oportunidade internacional, focada principalmente em programas do tipo “doutorado sanduíche”58. Apesar do grande número de oportunidades, a escola nem sempre preenche todas suas vagas de intercâmbio. Segundo a instituição, a imagem histórica do Brasil no exterior e o maior apelo de outros países, como EUA, ainda contribuem para o baixo número de visitantes, enquanto a falta de recursos para financiamento de alunos prejudica o envio de um número maior deles para fora do Brasil. Todavia, a concessão de bolsas de estudos para alunos estrangeiros no Brasil é uma das modalidades mais tradicionais da cooperação do País. A Comissão Nacional de Assistência Técnica (CNAT), criada em 1950, já previa a cooperação do Brasil com outros países por meio da concessão de bolsas de estudos. Além da pesquisa científica, uma das principais vertentes desta modalidade é a formação de professores para países de língua portuguesa, como o Timor Leste. O Programa de Formação Científica (Profor) oferece bolsas individuais a estudantes de Angola, Cabo Verde e Moçambique. O convênio entre o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico) e a Academia de Ciências para o Mundo em Desenvolvimento (TWAS) beneficia jovens estudantes e pesquisadores de países em desenvolvimento que fazem doutorado e pós-doutorado em instituições brasileiras na área das ciências naturais, que depois retornam a seus países de origem para dar continuidade ao seu desenvolvimento profissional e acadêmico. O programa realizado com o Centro Latino-Americano de Física (Claf), sediado no Centro Brasileiro de Pesquisas Físicas (CBPF), recebe estudantes e pesquisadores dos países-membros (Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Costa Rica, Cuba, Equador, México, Nicarágua, Peru, Paraguai, Uruguai e Venezuela).

58 Doutorado sanduíche é o nome dado ao programa de doutorado que é parcialmente realizado em outra instituição brasileira ou estrangeira


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Aqui, o Brasil também pode se inspirar em exemplos internacionais bem-sucedidos para promover ainda mais a internacionalização de estudantes, como: • O Erasmus, programa de intercâmbio internacional para educação superior da Comissão Europeia, liga 90% das escolas de ensino superior em 31 países, tendo assumido papel de rede social devido ao seu tamanho – 2 milhões de pessoas até 2010 e meta de 3 milhões até 2012 (veja Quadro C);

QUADRO C

Erasmus – um exemplo de rede de intercâmbios regional

O Erasmus (EuRopean Community Action Scheme for the Mobility of University Students) é a rede de intercâmbios do ensino superior europeu, parte do Lifelong Learning Programme da Comissão Europeia. Com orçamento de aproximadamente 7 bilhões entre 2007 e 2013, o Lifelong Learning Programme tem como objetivo promover o intercâmbio de estudantes, professores e profissionais ligados à educação entre escolas da região. O Erasmus proporciona a mobilidade de estudantes ao promover a ligação e a cooperação entre suas universidades-membro, ao garantir tratamento adequado aos alunos nas escolas que visitam e ao assegurar o reconhecimento nas escolas de origem dos créditos realizados durante o período de intercâmbio. O Erasmus também apoia seus participantes em cursos preparatórios de idiomas para o intercâmbio e em oportunidades de estágios nas redes de ensino participantes. Com orçamento anual de aproximadamente 450 milhões, o Erasmus já proporcionou experiências de intercâmbio para mais de 2 milhões de estudantes e mais de 250 mil professores e profissionais ligados ao ensino superior desde 1987, tendo ganhado status e função também de rede social. A meta do programa é alcançar três milhões de estudantes até 2012 e, para isso, conta com uma rede de mais de quatro mil instituições de ensino superior em 33 países europeus, aproximadamente 90% das instituições da região. Fonte: European Commission Education and Training; análise BCG

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• O governo sul-coreano oferece bolsas de estudo para estrangeiros interessados em estudar no país, para promover a internacionalização de suas escolas e de sua sociedade – 600 bolsas concedidas em 2010; • O governo de Cingapura dá incentivos fiscais às empresas que enviam seus funcionários para estudar no exterior e patrocinam suas despesas, condicionados ao retorno do estudante ao país; De fato, já começam a serem executadas diversas iniciativas para melhorar a internacionalização e mobilidade estudantil, como por exemplo: • O Universia, rede ibero-americana de colaboração universitária patrocinada pelo Banco Santander, atua principalmente sobre mobilidade internacional aproximando universidades e divulgando oportunidades em todo o mundo para estudantes do Brasil; • O Instituto Minerva (iMinerva), iniciativa recente de ex-alunos da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo e apoiada pela instituição, tem como principais objetivos o networking, a empregabilidade de alunos egressos e o financiamento de intercâmbios. Empresas interessadas pagam para ter acesso à base de dados de alunos egressos que participaram de intercâmbios e os recursos obtidos são utilizados para financiar o intercâmbio de mais alunos; • A AIESEC é a maior plataforma internacional de estudantes do mundo, cujo principal objetivo é promover o intercâmbio entre os países em que está presente, inclusive no Brasil, onde já possui 33 escritórios; • O governo brasileiro lançou em julho de 2011 o programa Ciência Sem Fronteiras, que prevê a concessão de cerca de 100 mil bolsas de estudo no exterior, sendo 25 mil em parceria com a iniciativa privada, inclusive para treinamento de especialistas e engenheiros de empresas privadas.

Proposições para tratar as lacunas de internacionalização da formação O Brasil tem realizado avanços na internacionalização da formação de seus talentos via ensino de idiomas e vivência internacional de seus estudantes, mas ainda há bastante espaço para desenvolvimento desta dimensão. As sessões de trabalho com associados da BRAiN e especialistas no assunto levaram à compilação das seguintes proposições para tratar as lacunas desta área: • Aumentar a quantidade e a qualidade do ensino de idiomas no ensino básico: o governo poderia reavaliar a efetividade dos atuais métodos aplicados nos ensinos médio e fundamental, assim garantindo nível adequado de ensino de idiomas estran-


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A vivência internacional também é outro elemento-chave para a formação de talentos para o polo de negócios brasileiro. Grande parte das universidades e faculdades no Brasil tem hoje escolas parceiras para intercâmbio fora do País e o número de alunos estrangeiros no território brasileiro vem crescendo.

geiros, especialmente o inglês e o espanhol. Para auxiliar na tarefa, a iniciativa privada pode analisar e entender melhor as experiências dos países que têm obtido altas notas em rankings de idiomas estrangeiros, como Argentina e China, e desenvolver proposta de reformulação para apoiar o governo. • Universalizar os cursos extracurriculares de idiomas: garantir acesso ao ensino de idiomas não só nos ensinos técnico e superior, mas para a população como um todo. O estado de São Paulo possui Centros de Estudos de Línguas que oferecem aos

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alunos da rede estadual a possibilidade de aprender um segundo idioma estrangeiro, além do inglês (oferecido nos quadros regulares), iniciativa que pode ser expandida e seguida por outros estados. Outra opção para o governo é oferecer bolsas de estudo em escolas particulares especializadas, em parceria com a iniciativa privada. Além disto, a administração pública pode também estimular alternativas de baixo custo para a complementação do ensino de idiomas como, por exemplo, o “Poliglota” (curso criado pelo Grêmio da Escola Politécnica da USP), e pode também reduzir os impostos de importação sobre certos materiais didáticos e cursos de auto-aprendizado. • Aumentar exposição dos alunos aos idiomas estrangeiros: particularmente ao inglês e ao espanhol, aumentando assim a necessidade do seu uso e, consequentemente, a busca pelo aprendizado. O governo pode incentivar a inclusão de aulas ministradas em idiomas estrangeiros nas grades curriculares das escolas para os alunos que tenham interesse, como já ocorre hoje na Escola Superior de Propaganda e Marketing (ESPM). Iniciativas privadas podem estimular, através de critérios para a concessão de bolsas, o contato dos seus alunos com estudantes estrangeiros e até mesmo a produção de pesquisa em inglês ou espanhol. O setor privado pode ainda promover o ensino on-line, alavancando a tecnologia disponível para conectar alunos brasileiros e estrangeiros em discussões de assuntos relevantes. • Aumentar a vivência internacional dos estudantes brasileiros: em particular dentro da América Latina por meio da criação de uma rede regional de intercâmbios, a exemplo do Erasmus europeu. Para tanto, são necessárias medidas de desburocratização do processo de entrada e saída de alunos intercambistas e de reconhecimento de equivalência de créditos e diplomas. Além disso, o governo, em parceria com a iniciativa privada, pode ampliar a oferta de bolsas de estudo para brasileiros estudarem no exterior e conceder bolsas também a estrangeiros com interesse em estudar no Brasil. Iniciativas bem-sucedidas como o iMinerva devem ser ampliadas. A criação de módulos de MBA a serem ministrados no Brasil, em parceria com escolas internacionais, também é uma forma de atrair estudantes estrangeiros para o País, aumentando a interação entre os alunos brasileiros e estrangeiros.


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CIRCULAÇÃO DE TALENTOS O terceiro elemento para a formação do conjunto de talentos brasileiro, a circulação de talentos envolve a entrada de profissionais estrangeiros no País e a saída de talentos brasileiros para atuar no exterior. Expatriados no mundo já somam hoje mais de 195 milhões e tais movimentos devem se tornar cada vez mais intensos com o aumento da globalização e com a escassez de talentos nas grandes economias do mundo (veja Diagrama 33). Apesar da redução da circulação durante a crise financeira mundial em função de ações protecionistas dos países, o trabalho no exterior é cada vez mais visto como um passo natural na carreira dos profissionais de todo o mundo. Os movimentos de entrada, também chamado de brain gain, e de saída, ou brain drain, geram ganhos e perdas para um país e, se bem geridos, tendem a obter saldo bastante positivo.

Brain gain A entrada de trabalhadores estrangeiros já foi a base para a economia brasileira desde a época colonial até o período das guerras mundiais, quando a lei brasileira estipulou cotas para a entrada de estrangeiros. Estima-se que em 1900 os imigrantes representavam 7% da população brasileira e eram responsáveis por aproximadamente 60% dos estabelecimentos industriais em São Paulo. Entretanto, o tema da entrada de profissionais internacionais para trabalhar no Brasil hoje tem a pré-concepção negativa de se ocupar com estrangeiros as vagas que poderiam ser ocupadas por brasileiros. Se bem gerido, no entanto, o brain gain pode ser utilizado para trazer pessoas de qualificação não existente no Brasil no curto prazo, ou seja, para suprir lacunas temporárias de oferta. A entrada de estrangeiros no País também traz ganhos em termos de aumento do conhecimento técnico nacional em novos assuntos e em aspectos de internacionalização, além de contribuir para a imagem brasileira no exterior.


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DIAGRAMA 33

Circulação internacional de talentos deve se intensificar no futuro % de empresas que consideram realizar recrutamento internacional

ÁSIA EMERGENTE1

22 64 33

REGIÃO DO PACÍFICO2 AMÉRICA LATINA3

60 20 60 27

ÁSIA DESENVOLVIDA4

EUROPA5

ÁFRICA

AMÉRICA DO NORTE MÉDIA GLOBAL

2007 2010-2015

57 23 56 25 52 22 48 +131%

25 57

1. China, Índia, Indonésia, Malásia, Papua Nova Guiné, Filipinas, Sri Lanka, Tailândia e Vietnã. 2. Austrália e Nova Zelândia. 3. Inclui México 4. Japão, Hong Kong, Cingapura, Coreia do Sul e Taiwan. 5. Inclui Rússia / Fonte: BCG People Advantage Report 2008; “Global Talent Risk – Seven Responses”, BCG e WEF; análise BCG

Um estudo59 a respeito dos beneficiados pela imigração em cidades industriais mostrou que um porcentual maior de imigrantes qualificados entre os residentes da cidade traz grandes benefícios à própria população nativa, como a maior probabilidade de conseguir emprego e níveis de salários superiores àqueles praticados nas cidades com menor porcentual de imigrantes. 59 High-Skill Immigration to Industrial Cities: Who Benefits? (Hall, Graefe e Jong – 2010) 60

World Intellectual Property Organization

Exemplos internacionais também comprovam que a entrada de talentos pode trazer benefícios para a economia: profissionais estrangeiros são responsáveis pela maioria dos pedidos de patentes em muitas empresas nos Estados Unidos – 65% na Merck, 64% na GE e 60% na Cisco60.

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Entretanto, o Brasil ainda não opera alinhado com as práticas internacionais de atração de talentos: o País não tem iniciativas estruturadas para a atração de profissionais estrangeiros e a legislação e o processo de imigração brasileira são protecionistas em relação à mão de obra nacional. A entrada de profissionais estrangeiros para trabalhar no Brasil é dificultada por meio de leis, grandes exigências de documentos e processos lentos e onerosos de emissão de vistos. Esta dificuldade é refletida na percepção dos executivos pesquisados pelo IMD: o Brasil obtém nota 5 em escala de 0 a 10, enquanto Argentina, Cingapura, Chile, Hong Kong e França ficam com notas entre 6,5 e 7 (veja Diagrama 34). Ela também é refletida na dificuldade vivida por estrangeiros: o prazo para emissão de visto para trabalhador estrangeiro pode levar oito meses e custar cerca de R$ 15 mil. Apesar da falta de iniciativas estruturadas, a atratividade brasileira para talentos internacionais tem aumentado devido à projeção internacional de sua economia, à entrada de multinacionais no País e às oportunidades existentes para grupos específicos, como é o caso de pesquisadores e cientistas. O Brasil ainda não é, no entanto, visto como o mais atraente para talentos (veja Diagrama 35). O Brasil tem também realizado avanços para a redução da rigidez para concessões de vistos para profissionais estrangeiros. Embora sejam tímidos e pontuais, tais avanços contribuem para a abertura do País a talentos estrangeiros: • Em 2010, foi autorizada a entrada, por um ano, de profissionais estrangeiros para treinamento em filiais ou matrizes de seu empregador no exterior; • Em 2011, foi autorizada a entrada de alunos estrangeiros para intercâmbio profissional por até um ano, desde que algumas exigências sejam cumpridas, como formatura no máximo em um ano, reciprocidade do país de origem e não substituição da mão de obra nacional; • O número de vistos de trabalho concedidos pelo Brasil a profissionais estrangeiros vem crescendo: no primeiro trimestre de 2011, o Ministério do Trabalho concedeu 13 mil vistos temporários a estrangeiros, 12,7% a mais ante igual período de 2010. Em todo o ano de 2010 foram concedidos 56 mil vistos, 30,5% a mais do que em 2009; • O MDIC61 tem feito intermediações entre entidades de classe do exterior e empresas brasileiras em visitas de oferta de trabalhadores estrangeiros para o Brasil; • Organizações de trabalhadores começam a considerar aceitar a liberalização da entrada de estrangeiros no Brasil, mediante movimentos similares em outros países, como é o exemplo da Confea62, que considera abrir mão da exigência de tradução dos diplomas argentinos a serem aprovados no Brasil, contanto que haja reciprocidade63; • O Brasil, e reciprocamente a maioria dos países da América Latina, tem um processo um pouco mais simplificado para imigração de estrangeiros da própria região, apesar de ainda não ser tão liberalizado quanto na União Europeia.

61 Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio 62 Conselho Federal de Engenharia, Arquitetura e Agronomia 63 Tradução chega a custar R$ 15 mil e será liberada diante de maior abertura da Argentina para brasileiros


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DIAGRAMA 34

Processo para a imigração de profissionais estrangeiros no Brasil é visto como complexo

Entrada de estrangeiros no país é considerada complexa Facilidade para a entrada de imigrantes trabalhadores1 (mínimo 1, máximo 10)

7,0 6,8 6,8 6,7 6,6 6,4 6,2 6,2 6,1 5,9 5,8 5,1 5,0 4,4 4,4 3,7 3,2

1. IMD World Competitiveness Yearbook Fonte: High-Skill Immigration to Industrial Cities: Who Benefits? (Hall, Graefe e Jong – 2010); IMD; pesquisa na mídia; análise BCG

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DIAGRAMA 35

Atratividade brasileira para talentos estrangeiros tem mostrado avanços recentemente, mas ainda é baixa

Atratividade brasileira para estrangeiros tem evoluído... Por causa de oportunidades na economia

...mas o País ainda não é considerado atrativo pelos profissionais Nível de atratividade a talentos1 (mínimo 1, máximo 10)

Universidades internacionais de graduação e pós-graduação organizam recrutamento no país devido às oportunidades da economia crescente brasileira

9,1

Por causa de multinacionais que entram no País

2

8,1

3

7,4 7,2

Por causa da atratividade para grupos específicos

6,8

4 7 8 9

6,1

15

5,9

18

5,8

19

Surgem oportunidades específicas para pesquisadores internacionais

“Uma potência emergente em pesquisa: o Brasil vem se tornando um destino cada vez mais atraente para a realização de pesquisas científicas e acadêmicas” The Economist e BBC Brasil

1

8,1

7,8

Várias multinacionais estão ampliando a presença no Brasil e trazendo estrangeiros para trabalharem no país

5,4

22

5,1

27

4,9 4,6

1. IMD World Competitiveness Yearbook, analisando a aderência à seguinte afirmação: Foreign high-skilled people are attracted to your country’s business environment. Total de 58 países pesquisados / Fonte: IMD, HSBC, EIU, The Economist, BBC Brasil, pesquisa na mídia; análise BCG

Ranking

29 33

4,1

42

4,1

43

3,6

49

Apesar dos recentes avanços, Brasil ainda é o 27º no ranking de atração de talentos entre 58 países


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O Brasil precisa adotar posição mais proativa diante da oportunidade de importar talentos estrangeiros para seu conjunto. Tal definição vai garantir o aproveitamento desta oportunidade por meio de flexibilizações seletivas para suprir lacunas nacionais, sem substituir a mão de obra brasileira. Diversos outros países já usam o brain gain como ferramenta para complementarem seus conjuntos nacionais: • O Canadá adotou um sistema de pontuação para emitir vistos de trabalho e facilitou a transformação de vistos temporários de estudantes estrangeiros no país em vistos definitivos. Em particular, Quebec tem iniciativas de atração e integração de talentos internacionais ao mercado local, com acordo de facilitação de trânsito de profissionais com a França; • Cingapura simplificou e reduziu o processo para a obtenção de vistos de trabalho para os talentos com capacitações estratégicas para o país, além de ter colocado headhunters em universidades estrangeiras para tentar suprir suas necessidades não atendidas de talentos; • Uma iniciativa do governo da Dinamarca mapeou os setores da economia com escassez de talentos e estruturou uma organização oficial para conectar empresas dinamarquesas e talentos internacionais – a Work in Denmark atua on-line e tem um centro de atendimento em Nova Deli, na Índia; • Na União Europeia, países contribuem para a formação de um conjunto de talentos regional por meio da harmonização de informações sobre qualificação e experiência de profissionais, além de fazer a combinação entre profissionais e empresas na região inteira por meio do European Job Mobility Portal. Além disso, também desenvolveram um fast track para a migração de trabalhadores estrangeiros de fora da região com alta qualificação e uma oferta de trabalho já feita; • O Reino Unido simplificou sua política de vistos por meio da adoção de um sistema de pontos que balanceia a especialização dos imigrantes com as necessidades do país; • A Austrália também definiu um sistema de imigração baseado na qualificação dos candidatos a imigrantes e a necessidade do país (veja Quadro D).

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QUADRO D

Flexibilização seletiva da imigração na Austrália

A Austrália é um exemplo de país que usa seu sistema de concessão de vistos para talentos estrangeiros como ferramenta para a complementação do conjunto de talentos nacional. Em parceria com empresas nacionais, o governo atualiza constantemente uma lista de profissionais em que o país é deficitário e, a partir dela, flexibiliza a emissão de vistos para profissionais que se encaixem nas características demandadas pelo mercado australiano. A lista de profissionais necessários é também divulgada ativamente pelo governo australiano em meios de comunicação eletrônicos e em feiras e eventos internacionais, como forma de atrair os profissionais estrangeiros de interesse do país. A emissão de vistos na Austrália para profissionais estrangeiros pode ser tanto patrocinada por um empregador australiano e, portanto, vinculada a ele, quanto independente. Ambos os vistos são, no entanto, dependentes de uma pontuação que leva em conta a formação e a experiência de cada talento e as necessidades do país no momento da análise do pedido de imigração. Dessa forma, o país garante a entrada de profissionais de interesse e controla a entrada daqueles já disponíveis na mão de obra nacional. Além de oferecer oportunidades de vistos para profissionais estrangeiros, a Austrália também tem opções de vistos para empreendedores e investidores, ambos com opção de permissão para residência permanente, e para estudantes estrangeiros formados na Austrália e que desejem fixar residência e trabalhar no país. Para esses últimos, o governo australiano também oferece suporte para a busca de emprego e de residência permanente. Fonte: BCG & WEF “Stimulating Economies Though Fostering Talent Mobility”; análise BCG


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Proposições para tratar as lacunas de brain gain no Brasil Para utilizar o brain gain como ferramenta para o fortalecimento de seu conjunto de talentos, o Brasil tem de promover ações tanto no que diz respeito à facilitação do processo de entrada de estrangeiros quanto em relação à percepção de sua atratividade. As sessões de trabalho com associados da BRAiN e especialistas no assunto levaram à compilação das seguintes proposições para tratar as lacunas desta área: • Mapear as competências em falta no País, com divulgação mundial: o setor público pode ter um papel de destaque, como mostra o exemplo de outros países. É preciso mapear a demanda corrente e futura de talentos para o desenvolvimento do País e divulgar as oportunidades nacionais de forma estruturada. Tal iniciativa, alinhada à flexibilização de entrada, pode suprir as demandas de curto prazo, provendo os recursos necessários às empresas. A iniciativa privada tem papel importante em tal mapeamento, ao dialogar com o setor público, sinalizando as áreas de maior carência. Adicionalmente, empresas de determinados setores, através de suas associações de classe, podem criar projetos-pilotos para mapear as suas necessidades presentes e futuras, e para servir de exemplo para o mapeamento mais extenso de toda a economia. • Desburocratizar e flexibilizar seletivamente os processos de imigração: flexibilizar as regras de imigração para profissionais qualificados necessários ao País e desburocratizar todos os processos de emissão de vistos e documentação para imigrantes. Políticas como o sistema de pontos, já utilizado por outras nações, ou pré-credenciamento de empresas são alternativas viáveis que poderiam ser implementadas pelo governo. Além disso, um acordo inicial com América Latina é opção para realização de tal processo em fases. É importante que a iniciativa privada também apoie o governo nesta mudança, por exemplo, apontando melhores práticas internacionais e indicando os principais problemas enfrentados ou até mesmo desenhando uma proposta de reformulação. • Montar grupo de empresas para recrutamento conjunto de estrangeiros: como o recrutamento de estrangeiros ainda é um recurso não muito utilizado por diversas empresas brasileiras, a iniciativa privada poderia montar grupos de interesse comum para sistematizar tal recrutamento. Desta maneira, poderiam ser compartilhados know-how e ganhos de escala, assim como potencial divulgação conjunta para profissionais no exterior.

Brain drain A saída de talentos para trabalhar no exterior, também chamada de brain drain, significa a redução de talentos disponíveis dentro de um país, movimento em parte inevitável, especialmente diante da intenção das empresas estrangeiras em intensificarem suas práticas de recrutamento internacional (veja Diagrama 8, na página 24). O brain drain brasileiro representava três milhões de pessoas, 1,6% de sua população, em 200964, número relativamente pequeno se comparado com o da Índia, por exemplo, com 30 milhões de expatriados, ou 2,5% de sua população (veja Diagrama 36).

64 Fonte: Ministério das Relações Exteriores do Brasil


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DIAGRAMA 36

Brain drain brasileiro soma 3 milhões, 1,6% da população Expatriados brasileiros somaram 3 milhões em 2009... Brasileiros expatriados (mil pessoas em 2009)

AMÉRICA DO NORTE 1.325

ÁSIA 290

EUROPA 816 ORIENTE MÉDIO 32

AMÉRICA CENTRAL 5 ÁFRICA 37 AMÉRICA DO SUL 514

OCEANIA 23

...e número ainda é pequeno se comparado com o de outros países Diáspora por país de origem (M de pessoas)

% da população

30 3

BRASIL

ÍNDIA

2,5% 1,6%

Fonte: Ministério das Relações Exteriores do Brasil, BCG People Advantage Report 2008; pesquisa na mídia; análise BCG

Apesar de ter números expressivos e crescentes de expatriados, o Brasil não faz ainda a gestão estruturada de seu brain drain de forma a reduzir seu tamanho e a garantir a captura de seus benefícios. Existem três alavancas possíveis para tanto: • O desenvolvimento da economia nacional e a transformação do Brasil em polo de negócios internacional geram oportunidades para talentos dentro do País e reduzem a atratividade relativa de oportunidades oferecidas no exterior. O aumento de oferta de oportunidades internas para evitar o brain drain é natural para o Brasil devido à sua situação atual de projeção internacional;

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• O incentivo à repatriação por meio de iniciativas que promovam a atração de brasileiros expatriados não só aumenta o tamanho do conjunto nacional de talentos, como também aumenta sua qualidade com conhecimento e vivências internacionais. Empresas brasileiras têm tentado atrair expatriados brasileiros de volta para o País, mas não há esforços estruturados nacionais para tal; • A criação de uma rede estruturada de expatriados possibilita a gestão da diáspora e, assim, aumenta o potencial de repatriações e de envio de recursos e conhecimento para o país, além de ser uma ferramenta para acionar a diáspora nacional para ações de promoção da imagem do país no exterior. O Brasil não tem instrumento similar a esse hoje em dia. Ao contrário da reduzida atuação brasileira sobre as duas últimas alavancas, existem exemplos de países que têm diretrizes e ações definidas sobre elas e realizam esforços específicos para gestão da diáspora e repatriação de talentos: • A China tem um programa para apoiar a ambientação de repatriados no país, dando a eles tratamento preferencial em centros de empregos e os recebendo em associações que cuidam de sua reintegração à sociedade; • A Indian Diaspora, criada pelo governo indiano, é uma rede de expatriados que busca aumentar o elo entre esses, e desses com o país. A Índia está criando também um plano estratégico para atrair de volta ao país parte de seus expatriados – o primeiro ministro indiano conta com a participação de líderes indianos de grandes empresas para isso, incluindo a CEO da PepsiCo, Indra Nooyi, e o CEO do Citibank, Vikram Pandi; • A Coreia do Sul tem iniciativas de longa data, que incluem o financiamento de expatriados em visitas temporárias ao país, programas de contratação de expatriados pelas universidades por períodos limitados e o reforço das universidades de modo a torná-las mais atraentes aos expatriados; • O Chile Global é a rede de expatriados chilenos que tem como objetivo capturar a contribuição dos chilenos residentes no exterior para promover o desenvolvimento local por meio de investimentos e conhecimento; • A South African Network of Skills Abroad, da África do Sul, tem como objetivo a transferência de conhecimento dos expatriados para a nação por meio de contribuições com pesquisas e treinamentos.


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Proposições para tratar as lacunas de brain drain no Brasil O Brasil vive um bom momento econômico e social, enquanto outras partes do mundo não estão tão aquecidas e, portanto, o País tem perdido cada vez menos talentos para o exterior. Ainda assim, dado que algum movimento de brain drain muitas vezes é inevitável, o Brasil poderia tirar melhor proveito de sua rede de expatriados para enriquecer ainda mais seu conjunto de talentos e sua imagem como polo de investimentos e negócios. As sessões de trabalho com associados da BRAiN e especialistas no assunto levaram à compilação da seguinte proposição para tratar as lacunas desta área: • Criar instrumento de gestão estruturada de expatriados: uma rede brasileira de expatriados pode trazer inúmeros benefícios, como: transferência de conhecimento, atração de mais investimentos e promoção da imagem do Brasil. Portanto, independentemente de quem gerencia a iniciativa, é fato que tanto o setor público quanto o privado podem oferecer enormes contribuições. O governo pode apoiar este mecanismo tanto garantindo a conexão de expatriados com a rede – via órgãos estatais (e.g. CAPES, FAPESP) e consulados que tenham contato com estas pessoas – quanto provendo informações sobre o País aos expatriados. A iniciativa privada, por sua vez, pode divulgar e complementar a rede através dos contatos de multinacionais e associações de classe, assim como também pode investir recursos na promoção e execução desta iniciativa.

“A mobilidade global de talentos está se tornando tão crítica quanto a mobilidade de bens e de capital” Global Talent Risk – Seven Responses – relatório do Fórum Econômico Mundial e BCG


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CONCLUSÃO Um conjunto nacional de talentos que seja forte, qualificado e atrativo é fundamental para o desenvolvimento de um polo internacional de investimentos e negócios. Isto é verdade tanto para o próprio desenvolvimento econômico do país, quanto para a atração efetiva de investidores e de empresas que percebam o conjunto de talentos como um diferencial competitivo do país. O Brasil parte de base sólida para formação do seu conjunto de talentos: o País tem fortaleza clara na demografia, elemento de mais difícil mudança, e tem avançado constantemente nos outros dois elementos, a formação de pessoas e a circulação de talentos. Nesses elementos estão as maiores áreas necessárias para desenvolvimento dos talentos brasileiros, e em cada um dos capítulos deste relatório foram feitas proposições para tratar as lacunas identificadas e fortalecer o conjunto nacional de talentos. Em adição às iniciativas públicas e privadas que precisam e devem continuar sendo executadas, outro modelo de operacionalização das proposições feitas neste documento pode ser adotado: a criação de uma entidade estratégica multissetorial para coordenação de esforços, que envolva os principais participantes do governo, da academia e do mercado. Observa-se que há referências de países que recorreram a este recurso para gerenciarem seus conjuntos de talentos nacionais, como: • No Reino Unido, os Sector Skills Councils (SSCs) são organizações independentes, patrocinadas pelo governo e lideradas pela iniciativa privada, criadas para desenvolver um sistema de capacitação direcionado pelas demandas dos empregadores. Os SSCs já existem em 22 setores, o que representa 90% da economia do país e têm tido papel importante de liderança para os seus setores, através de iniciativas como: • Identificação junto aos empregadores de futuras necessidades de capacitação; • Desenvolvimento de treinamentos; • Definição de padrões ocupacionais mínimos;


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• Desenvolvimento de sistemas de aprendizado; • Incentivo a maiores investimentos em treinamentos; • Fornecimento de informações úteis para o planejamento de longo-prazo do mercado de trabalho. • Na Austrália, o governo desenvolve estratégias nacionais de educação e imigração baseado nas necessidades do mercado por meio do Skills Australia. A principal função do órgão é aconselhar o Ministério de Educação Superior, Capacitação, Emprego e Relações Trabalhistas a respeito das necessidades de mão de obra e capacitação atuais e futuras na Austrália. Tal função é desempenhada através de: • Análise das competências atuais e necessidades emergentes de vários setores; • Distribuição ampla de informações que permitam empresários, empresas e trabalhadores a tomarem suas decisões de treinamentos e contratação; • Recomendações ao governo sobre as competências atuais e necessidades futuras para ajudar nas decisões de incentivo à formação de habilidades e na condução das reformas do setor educacional; • Relacionamento com os órgãos estatais competentes para aconselhar sobre as demandas atuais e futuras de competências e facilitar o alinhamento de prioridades. A execução das proposições feitas e a consecução de uma visão de um conjunto de talentos forte e atrativo para o polo brasileiro (veja Quadro E), portanto, dependem de esforços de cada um dos atores do governo, da academia e do mercado, bem como da coordenação de ações estratégicas entre eles para transformar o potencial brasileiro em realidade.

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QUADRO E

Uma visão para o futuro do conjunto brasileiro de talentos

Coordenação do conjunto de talentos • Conjunto de talentos brasileiro planejado, gerido e acompanhado por uma organização público-privada que monitora as necessidades de talentos do País e as ações necessárias para supri-las • Governo, academia e mercado alinhados por encontros semestrais de acompanhamento do desempenho do conjunto nacional e planejamento de iniciativas necessárias ao seu desenvolvimento. Demografia • Brasil como a atual maior economia do mundo com População Economicamente Ativa suficiente para suprir as necessidades de mão de obra de seu crescimento e para atrair investimentos e negócios para o País e para a região Formação de pessoas • País com ensinos fundamental e médio universalizados, com participação significativa do ensino médio integrado a cursos técnicos nas especializações necessárias ao desenvolvimento do País, definidas e reavaliadas periodicamente pela organização público-privada responsável pelo conjunto • Taxa de matrícula no ensino superior brasileiro superior à média global • Excelência em qualidade do ensino em todos os níveis, com média no PISA alinhada à da OCDE • Ensinos médio e superior alinhados às necessidades do mercado por meio de contínua interação com empregadores, em que grades curriculares são ajustadas e professores são treinados de acordo com técnicas mais avançadas e os mais recentes conceitos • Ensino de idiomas universalizado durante toda a vida escolar dos jovens, com esforços de ensino também direcionados à população já formada • Intercâmbios internacionais durante os ensinos médio e superior frequentes, tanto para saída de alunos brasileiros quanto para a recepção de estudantes estrangeiros, com uma rede de estudantes regional formada e fortalecida na América Latina Circulação de talentos • Importação de talentos usada como ferramenta para o fortalecimento do conjunto brasileiro, para a importação de novos conhecimentos e o fechamento de lacunas específicas de profissionais • Processo para a obtenção de vistos de trabalho e de documentos de imigrantes rápido e eficiente • Rede de gestão de expatriados forte e contribuidora para o crescimento do País

Você que percebe a importância do desenvolvimento de um conjunto de talentos forte e atrativo para estabelecimento de um polo internacional de investimentos e negócios no Brasil e na América Latina está convidado a participar das iniciativas da BRAiN. Visite o site da BRAiN para acompanhar e contribuir com este processo: www.brainbrasil.org


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