Ano 3 • Número 117
R$ 2,00 São Paulo • De 26 de maio a 1º de junho de 2005
José Sarney, o faraó do Maranhão S
e no Brasil é trivial a apropriação privada de bens públicos, no Maranhão, chega às raias do escândalo e do absurdo. Caso da Fundação José Sarney, que recebeu, ilegalmente, a doação de um dos mais valiosos imóveis do centro histórico da capital, São Luís: o Convento das Mercês, prédio tombado pelo Patrimônio Histórico Nacional. A ilegalidade foi cometida há dez anos, pelo então governador João Alberto de Sousa, mais conhecido pelos maranhenses como Carcará (ave de rapina que mata o que pega e come). Denunciada recentemente, a doação teve pouca repercussão no Estado, onde a maioria dos órgãos de comunicação serve aos interesses da oligarquia Sarney. Diante do flagrante desrespeito à lei, o Ministério Público Federal entrou com uma ação na Justiça para anular a doação, e devolver o imóvel ao patrimônio estadual. Segundo a procuradora federal Carolina da Hora Mesquita, a lei impede que um bem público tombado seja doado para uma instituição privada. Pág. 8
Alderon Costa/ Rede Rua
Ex-presidente quer ser enterrado em prédio histórico doado ilegalmente; Ministério Público entra em ação
No Centro de São Paulo (SP), centenas de pessoas pobres e em situação de rua protestam contra o prefeito José Serra
Serra promove limpeza social em SP
Em debate, Quase 14 milhões os rumos de de brasileiros Cuba socialista na informalidade A quase totalidade dos mais de 10,5 milhões de pequenas empresas não-agrícolas que existem no Brasil está no setor informal. E nele trabalham, também na informalidade, 14 milhões de pessoas. Os dados são de pesquisa do IBGE, que mostra, ainda, que entre os trabalhadores não-remunerados, a maior parte (64%) é mulher, também o contingente de ocupados que ganha menos. Págs. 2 e 6
sistência social. Serra decidiu limpar a área central da capital paulista de pessoas em situação de rua, camelôs e sem-teto. Perseguidos por policiais, eles
fazem a cidade pipocar de protestos. Nos discursos, lembram ao prefeito que os pobres não são lixo. Pág. 7
Aizar Raldes/ AFP/ Folha Imagem
Os brasileiros estão convidados a pensar o futuro do socialismo cubano. Essa é a definição que José Estévez Hernández, diretor do Instituto Cubano de Amizade com os Povos, dá à 13ª Convenção Nacional de Solidariedade a Cuba, que ocorre em São Paulo, de 25 a 28 de maio. O arquiteto Oscar Niemeyer e o ex-ministro da Economia de Cuba Osvaldo Martínez estarão presentes. Pág. 9
A população pobre do Centro de São Paulo está na mira do prefeito José Serra (PSDB). Mas não é para políticas de distribuição de renda ou as-
No Brasil, Governo faz cresce o uso de nova ameaça de software livre quebrar patentes Pesquisa mostra que aumenta o uso de software livre no país, apesar das fortes pressões exercidas pelas transnacionais do setor, em particular a Microsoft. Os programas de código aberto vêm sendo adotados sobretudo por grandes empresas privadas, que os consideram mais econômicos e mais estáveis. No setor público, a disseminação do uso de software de código aberto é mais lenta, mas avança continuamente. Pág. 4
Ação pública para conter transgênicos O Instituto de Defesa do Consumidor e o Partido Verde estão pedindo para o Ministério Público entrar com uma ação questionando a constitucionalidade da Lei de Biossegurança. Na argumentação, asseguram que a nova legislação desrespeita a Constituição por permitir a liberação de produtos transgênicos sem estudo prévio de impacto ambiental e por usurpar poderes de ministérios. Para Edson Duarte, deputado federal (PV-BA), o país estaria melhor sem a lei. Pág. 13
As organizações não-governamentais do setor de saúde esperam que o governo cumpra as novas ameaças de quebra de patentes. O anúncio foi feito pelo ministro da Saúde, Humberto Costa, dia 17 de maio, aos laboratórios produtores de medicamentos retrovirais. Entre as vítimas da guerra de patentes, estão os portadores do vírus HIV, cujos medicamentos consomem cerca de 80% do orçamento nacional de drogas. Pág. 3
Em La Paz, indígenas bolivianos participam de manifestação em defesa da nacionalização do petróleo e do gás
Marcha de Senado mexicano Ditador ordena camponeses quer legalizar massacre chega a La Paz a biopirataria no Uzbequistão Pág. 9
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E mais: DEBATE – Para o sociólogo Ricardo Antunes, a exaustão do neoliberalismo explica a emergência de insurreições populares na América Latina, como a do Equador. Pág. 14 CULTURA – Em texto póstumo, o escritor catalão Manuel Vázquez Montalbán destaca o caráter essencialmente criativo dos revolucionários. Pág. 16
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Atingidos por barragens, em luta pelo país Mobilizações de Norte a Sul marcam a luta das populações atingidas por barragens. Dia 23 de maio, foram ocupadas duas usinas em Goiás e uma em Santa Catarina. No Pará, os atingidos pela barragem de Tucuruí resistem, acampados na empresa Camargo Corrêa há mais de um mês. Enquanto isso, a Tractebel Energia descumpre determinação de assentamento, mas paga antecipadamente empréstimo tomado junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Pág. 13
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De 26 de maio a 1º de junho de 2005
CONSELHO POLÍTICO Achille Lollo • Ari Alberti • Ariovaldo Umbelino de Oliveira • Assunção Ernandes• Aton Fon Filho • Augusto Boal • Cácia Cortez • Carlos Marés • Carlos Nelson Coutinho • Celso Membrides Sávio • César Benjamim • Claus Germer • Dom DemétrioValentini • Dom Mauro Morelli • Dom Tomás Balduíno • Edmilson Costa • Elena Vettorazzo • Emir Sader • Egon Krakhecke • Fábio de Barros Pereira • Fernando Altemeyer • Fernando Morais • Francisco de Oliveira • Frei Sérgio Gorgen • Horácio Martins • Ivan Valente • Jasper Lopes Bastos • Jesus Antunes • João Alfredo • João Capibaribe • João José Reis • João José Sady • João Pedro Stedile • Laurindo Lalo Leal Filho • Leandro Konder • Luís Alberto • Luís Arnaldo • Luís Carlos Guedes Pinto • Luís Fernandes • Luis Gonzaga (Gegê) • Luiz Eduardo Greenhalgh • Marcelo Goulart • Marcos Arruda • Maria Dirlene Marques • Mário Maestri • Nilo Batista • Oscar Niemeyer • Pastor Werner Fuchs • Pedro Ivo • Raul Pont • Reinaldo Gonçalves • Renato Tapajós • Ricardo Antunes Ricardo Rezende Figueira • Roberto Romano • Rodolfo Salm • Rosângela Ribeiro Gil • Sebastião Salgado • Sérgio Barbosa de Almeida • Sérgio Carvalho • Sérgio Haddad • Tatau Godinho • Uriel Villas Boas • Valério Arcary • Valter Uzzo • Vito Gianotti • Vladimir Araújo • Vladimir Sacheta • Zilda Cosme Ferreira •Também participam do Conselho Político os membros do Conselho Editorial e jornalistas colaboradores
CONSELHO EDITORIAL Alípio Freire • Celso Horta • César Sanson • Erick Schuning • Frederico Santana Rick • Hamilton Octávio de Souza • José Arbex Jr. • Kenarik Boujikian Felippe • Leandro Spezia • Luiz Antonio Magalhães • Luiz Bassegio • Marcela Dias Moreira • Maria Luísa Mendonça • Mario Augusto Jakobskind • Milton Viário • Nalu Faria • Neuri Rosseto • Plínio de Arruda Sampaio Jr. • Ricardo Gebrim
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NOSSA OPINIÃO
Quem ganha com a política econômica? O governo, mais uma vez, contrariando a todos, aumentou a taxa básica de juro (Selic). Reunido nos dias 17 e 18 de maio, o Comitê de Política Monetária do Banco Central (Copom) elevou a taxa nominal básica para 19,75%. Isto significa que a taxa real de juro, ou seja, ajustada pela inflação esperada no IPCA para os próximos doze meses, é de nada menos que 13,6%. A taxa de 19,75% é, hoje, a mais alta do mundo. Para se ter idéia, o segundo colocado no ranking, a Turquia, com 6,6%, não chega à metade da brasileira, que equivale a 23 vezes a taxa real média vigente nos países desenvolvidos (0,6%), e a onze vezes a média dos demais emergentes como a Argentina, África do Sul, Rússia, Polônia, China, Coréia do Sul, Taiwan, Índia, Indonésia, entre outros, que é 1,2%. Palocci segue à risca a ortodoxia neoliberal, que usa e abusa das taxas de juros a pretexto de segurar a alta de preços, mas que, na verdade, atende aos interesses dos banqueiros, credores da dívida pública. O pior é que, do ponto de vista do combate à inflação essa política tem se mostrado completamente ineficaz, e provoca cada vez mais efeitos colaterais. Freando, por exemplo, investimentos na produção (construção civil, máquinas e equipamentos), que diminuiu no último
trimestre de 2004 e, novamente, no primeiro trimestre deste ano. É evidente que os bancos são os exclusivos beneficiários dessa política. Haja vista os lucros astronômicos do setor e as taxas extorsivas que cobram das empresas e, sobretudo, das pessoas físicas. A manutenção da política econômica neoliberal penaliza o país e a maioria do povo brasileiro. Manter um superavit primário para garantir a tranqüilidade dos credores internos e externos será sempre uma política suicida e marginalizadora. Manter uma política cambial, monetária e tributária de estímulo às exportações, como forma de auferir dólares suficientes para evitar especulações do capital financeiro e evitar crises de pagamento da dívida externa, mostra claramente a subserviência do governo. Isso comprova que a forças conservadoras, aliadas ao capital estrangeiro, continuam tendo hegemonia completa na política econômica do governo Lula. Os que acreditam na possibilidade de sucesso de políticas liberais, para o desenvolvimento econômico sustentado de países pobres, quase sempre também acreditam que a desregulação e a globalização financeira da década de 1990 foram uma obra espontânea do desenvolvimento orgânico dos mercados e do pro-
FALA ZÉ
gresso tecnológico. Não conseguem entender que a desregulação e a globalização financeira foram também o resultado estrutural de escolhas políticas feitas por sucessivos governos estadunidenses, e das demais grandes potências econômicas. Os resultados sociais dessa política são claramente maléficos. Aumento da concentração da riqueza e da renda; aumento do desemprego; diminuição da renda dos trabalhadores; precarização do mercado de trabalho (apenas dois em cada dez trabalhadores possuem carteira assinada e têm seus direitos trabalhistas e previdenciários garantidos). Ou seja, a desigualdade social continua aumentando. Ora, a economia brasileira não consegue sair de sua crise histórica e mantém seu vai-e-vem cíclico, oscilando entre crescimento e estagnação. E, mesmo quando há crescimento, ele beneficia poucos, não promove distribuição da renda ou melhoria nas condições de vida da população. Diante disso, é urgente e necessário construir um novo projeto para o país. Um projeto soberano para resolver os problemas nacionais e os desequilíbrios regionais, dando a devida prioridade ao desenvolvimento do mercado interno e à geração de postos de trabalho. OHI
CARTAS DOS LEITORES ARMA IDEOLÓGICA DA ELITE A grande mídia serve como um dos principais suportes para manter o que está posto. Há um constante trabalho de inversão das intenções dos trabalhadores rurais. Grandes jornais, revistas, emissoras de rádio e principalmente emissoras de TV estão sempre com suas armas ideológicas apontadas e engatilhadas para disparar contra o campesinato. Um trabalho fundamentado, não simplesmente por defender o neoliberalismo ou algo intrínseco ao capitalismo, mas por um motivo muito mais profundo do que se imagina: grande parte dessa mídia é detentora de latifúndios, e aqueles que não os detêm são patrocinados por empresas para fazer esse trabalho sórdido, que lembra os jagunços servindo seus coronéis. O que mais nos indigna, apesar de há muito tempo essa mídia ser assim caracterizada, é o fuzilamento intelectual feito em cada indivíduo, mortificando cada vez mais o bom senso comum, pregando o individualismo, enfatizando que a propriedade privada faz parte da essência humana. Traduzida em uma frase que soa como o disparo de uma arma contra o nosso peito: estão ferindo o direito sagrado da propriedade. Enfim, a mídia funciona como uma arma nas mãos das elites, exibindo matérias cada vez mais tendenciosas, incumbidas de tramar uma história que está longe de ser real. O que expresso nestas linhas é uma indignação comum. Assim, envio essa carta como forma de manifesto e para
também parabenizá-los pelo trabalho que tem sido desenvolvido. Esperamos que este jornal assim continue: compromissado com os fatos da história de nosso povo. Robson Martins por correio eletrônico FINANCIAMENTO DAS PPPS É, sem dúvida, mais um plano arquitetado com aparente boa intenção. Aliás, diz o ditado popular que de bem-intencionados o céu está cheio. Entretanto, ninguém pode negar que precisamos aumentar e melhorar nossa atual infra-estrutura com estradas, pontes, viadutos, túneis, portos, aeroportos, ferrovias, hidrovias, produção, distribuição de energia etc. Agora, o que é condenável, em toda essa boa intenção do governo, é como foram programados o início, o meio e o fim dessa Parceria PúblicoPrivada. Em primeiro lugar, o BNDE (sem o S mesmo) financiará as obras entrando com 70% do seu valor, com prazos de carência e juros especialíssimos. Em segundo lugar, as empresas participantes serão obsequiadas com generosas concessões que vão desde o lucro garantido até o direito de explorar as obras concluídas. E, em terceiro lugar, não é o governo entreguista do sr. FHC, mas sim o do sr. Lula, que passou mais de 20 anos dizendo uma coisa e, após ser eleito, passou a dizer e fazer outra. João C. da L. Gomes Porto Alegre (RS)
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CRÔNICA
Marchei por reforma agrária e fui agredido Marcelo Barros A Marcha pela Reforma Agrária foi o acontecimento mais marcante em 2005. Na grande marcha do dia 17 rumo ao Congresso Nacional, fui convidado para ir na primeira fileira, segurando com companheiros a faixa que abria a manifestção. A multidão aplaudia, a chuva de papéis picados caía de edifícios. Na praça diante da embaixada norte-americana, fechada e superprotegida por centenas de soldados, os manifestantes deixaram lixo, símbolo daquilo que o imperialismo norteamericano impõe ao mundo. Diante do Palácio do Planalto, todos sabiam que o presidente Lula iria receber naquela tarde 40 representantes dos marchantes. Entretanto, foi triste ver o palácio fechado e protegido por milhares de soldados armados. Como se aquela marcha pacífica fosse ameaça ao presidente da República. De repente, nós que estávamos à frente, segurando a faixa, vimos uma barreira de soldados, com cassetetes na mão, vindo sobre nós. Não deu tempo para nada. Ao meu lado, os companheiros não recuaram. Ao meu lado, alguns lavradores tinham na mão foices e outros tinham facões.
Nenhum brandiu estes instrumentos. Mantivemo-nos segurando a faixa. Apesar de empurrões e agressões, conseguimos dobrar a estrada e conquistar o espaço para a marcha prosseguir. Levei no ombro a cotovelada de um soldado, mas, apesar da dor que ainda sinto, o que me agrediu mais foi ver a insensibilidade de homens que deveriam defender o povo e não agredir cidadãos que lutam pacificamente por seus direitos. Diante da sede do Ministério da Fazenda, houve um ato público. Após uma hora, retomamos a marcha para o Congresso Nacional. Aí aconteceu o conflito mais grave. Policiais que ocupavam um carro investiram sobre a multidão. Os manifestantes não tinham espaço para ceder ao carro. O choque foi inevitável. Em horas assim, não há racionalidade nem se pode pedir juízo de ninguém. Um jovem afirmou ter sido agredido porque viu dois soldados batendo em um lavrador caído no chão e foi socorrê-lo. Outros defendiam pessoas mais velhas e até uma senhora grávida que estava na marcha. A polícia agrediu o povo, por puro ato de selvageria e prepotên-
cia; manifestação de uma luta de classes que alguns diriam superada ou que, hoje, toma outra cara. Não tomou não. Eu me senti na década de 70, em tempos da ditadura militar. Senti-me mais agredido ainda vendo no dia seguinte os grandes jornais trazendo a manchete: “Marcha do MST acaba em pancadaria”. O ato público em frente ao Congresso foi belo e profundo. O MST, a Via Campesina e todos os movimentos sociais que participaram da marcha estão de parabéns. A sociedade brasileira só pode agradecer este exemplo de mobilização social e educação cidadã. Na pessoa dos lavradores e seus aliados que marcharam, foi todo o Brasil que foi agredido pela truculência da polícia e pela parcialidade antiética da grande imprensa. Temos ainda muito a fazer. Eles nos mostraram que a marcha tem de ser permanente e envolver a todos. Marcelo Barros é monge beneditino e teólogo. É autor de 27 livros, entre os quais o romance O Espírito vem pelas Águas, da Editora Rede da Paz-Loyola, 2004. Correio eletrônico: mosteirodegoias@cultura.com.br
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NACIONAL SAÚDE
Aids: uma vítima da guerra de patentes Tatiana Merlino da Redação
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ais uma vez, o governo promete decidir sobre a quebra das patentes de medicamentos anti-retrovirais que fazem parte do coquetel anti-Aids. O ministro da Saúde Humberto Costa afirmou, dia 17 de maio, que se os laboratórios não cederem voluntariamente a licença para a produção dos medicamentos no país, o governo poderá quebrar as patentes dos seguintes medicamentos: tenofovir (laboratório Gilead), lopinavir e ritonavir (laboratório Abbott), efavirenz (laboratório Merck Sharp and Dhome). Há quase um mês, os três laboratórios receberam proposta do governo para conceder licença voluntária e permitir que o país produza os medicamentos mediante pagamento de royalties. De acordo com a assessoria do Ministério da Saúde, as negociações sigilosas continuam em andamento e não têm prazo para conclusão. A notícia não anima as organizações não-governamentais (ONGs), que exigem do governo uma posição em relação ao licenciamento compulsório ou voluntário dos medicamentos anti-retrovirais. Veriano Terto Júnior, coordenador geral da Associação Brasileira Interdisciplinar de Aids (Abia), lamenta: “A gente está bastante pessimista quanto ao licenciamento compulsório, até porque o governo já fala disso há muito tempo, mas só ameaça, nunca cumpre”. Para ele, essa atitude abala a credibilidade do ministério diante do país e do mundo.
Hermínio Oliveira/ABr
Enquanto ministério acena com quebra de patentes de medicamentos, organizações protestam e usuários padecem de reduzir gastos e ajudar pessoas, a quebra de patentes beneficiaria a indústria nacional de desenvolvimento e pesquisa de medicamentos, permitindo a exportação de remédios para os países que necessitam, afirma o coordenador da Abia.
FRACIONAMENTO
Funcionários descarregam medicamentos importados, no depósito do Ministério da Saúde, para o coquetel Anti-Aids
“é difícil ter esperança pois há muito tempo se fala nessa licença”. A quebra de patentes é o licenciamento compulsório, em que a empresa perde o direito exclusivo sobre a produção do remédio, mas ainda assim o governo tem de pagar royalties ao fabricante. No licenciamento voluntário, a empresa cede por vontade própria os direitos de reprodução da droga, auxiliando o país com a transferência de tecnologia, e também continua
DIREITO EXCLUSIVO Em março, o ministério havia proposto o licenciamento voluntário a três laboratórios farmacêuticos, tendo dado um ultimato às empresas no dia 15 daquele mês. Três semanas após o vencimento do prazo, sem uma resposta oficial dos laboratórios, o ministério não tomou nenhuma decisão. Para Michel Lotrowska, da organização Médicos Sem Fronteiras,
recebendo royalties. Cerca de 160 entidades da sociedade civil cobraram, em uma carta dirigida ao ministro, a quebra das patentes para baratear os medicamentos contra a Aids – segundo dados do próprio ministério, esses medicamentos consomem cerca de 80% do orçamento nacional de drogas contra a doença, cerca de R$ 560 milhões. Ainda de acordo com dados do ministério, o governo gastará, este ano, mais R$ 900 milhões,
apesar de um crescimento de apenas 20% no número de pacientes a serem atendidos. “O próprio governo assume que os gastos com esse medicamentos são enormes, e que, com o licenciamento, os custos irão diminuir”, afirma Terto Júnior. O ministro da Saúde disse que o governo precisará aumentar em 50% a previsão orçamentária, de 2004 para 2005, de modo a garantir o atendimento aos 156 mil brasileiros que fazem o tratamento. Além
Enquanto o governo negocia com os laboratórios a quebra de patentes, e as organizações não-governamentais protestam, os usuários do Programa Nacional de Aids sofrem com o fracionamento de medicamentos. No Centro Provisório de Atendimento Paulo César Bonfim, da Secretaria Municipal de Saúde de São Paulo, a crise começou no final do ano passado. “Antes, o fracionamento de alguns medicamentos era de 15 dias; depois passou para dez, oito, cinco, e chegou até três dias, em março, no auge da crise”, conta Virgínia Costa, auxiliar de farmácia do Centro. “Os usuários reclamavam muito. Imagine só ter que voltar de três em três dias para buscar medicamentos. Dos 315 usuários do Centro, há pessoas de cidades do interior, como Registro, Santos, Ourinhos”, ressalta Virgínia. Entre os medicamentos fracionados no CPA, dois deles, o tenofovir e o efavirenz, estão na pauta de discussão da quebra das patentes do Ministério da Saúde. As ONGs alertam para o fato da opção de quebrar patentes de alguns medicamentos ser prevista em legislação internacional. Um acordo assinado em 2001, dentro da Organização Mundial do Comércio (OMC), prevê a possibilidade de quebra de patentes em caso de calamidade pública por alguma doença. Em tais casos, o governo de cada país pode tirar uma licença compulsória, fabricando o medicamento sem pagar o direito de patente. As entidades compararam o governo a um “tigre sem dentes”, por defender publicamente, ameaçar, mas não utilizar as flexibilidades previstas no acordo da OMC para quebrar as patentes. “Não é ilegal, então não tem desculpa. Isso é medo do ministério”, avalia Terto Júnior.
CHACINA DE FELISBURGO
Luís Brasilino da Redação
ALTERNATIVAS Segundo o homeopata e psiquiatra Pedro Carneiro, da executiva do Fórum Paulista de Luta Antimanicomial, a grande diferença do tratamento feito pelos Caps é que se trata de um serviço aberto, no qual as pessoas não ficam presas. “Elas fazem atividades durante o dia (entre as 7 e as 18 horas) e, de noite, voltam para suas casas e comunidades. Assim, os usuários não perdem o vínculo com as famílias
nem com a sociedade”, informa. O médico avalia que, no sistema de internação dos manicômios – uma realidade para cerca de 50 mil brasileiros atualmente – as pessoas são excluídas e a evolução é pior. Ao passar muitos anos nos hospícios, os pacientes chegam a esquecer que têm família e estas esquecem os pacientes. Os Caps contam com equipes multidisciplinares – psicólogos, terapeutas ocupacionais, pisquiatras e enfermeiros – que realizam os tratamentos e oficinas. Existe também um serviço substitutivo, a residência terapêutica: locais para oito pessoas conviverem como se fosse numa casa qualquer, mas contando com a ajuda de cuidadores. “Essas residências têm como referência de tratamento os Caps. Isso faz a substituição integral do manicômio”, assegura Carneiro.
Paulo Pereira Lima
Cerca de 200 pessoas reuniramse, dia 18 de maio, na Avenida Paulista, em São Paulo (SP), para celebrar uma proposta de recomeço de vida, longe dos manicômios. Foi um ato público pelo Dia Nacional de Luta Antimanicomial, data na qual homens e mulheres com distúrbios mentais, seus familiares e profissionais da saúde foram às ruas defender um tratamento aberto, sem internações por longos períodos – que, na verdade, agravam o quadro clínico dos pacientes. A manifestação incluiu atividades artísticas e culturais e, sobretudo, histórias de superação de quem já esteve na pior e hoje se vê, novamente, inserido na sociedade. Um caso bem-sucedido foi o de Isaías Macieira, há seis anos freqüentador do Centro de Atenção Psicossocial (Caps) do Mandaqui, na zona norte paulistana: “Estou compreendendo melhor a vida. Tenho outros olhos para as coisas e sinto mais alegria em viver”. Macieira costumava amanhecer na rua, ficava sem comer e “tomava atitudes anormais”. Assim como seu colega de Caps, Marcos Chambo, que revela o que fazia antes de começar seu tratamento, em 1989: “Eu trabalhava com embalagem na Natura (fabricante de cosméticos). Tinha um mês de serviço e comecei a ter visões. Saía da firma e ficava deitado na rua. Esperava o dia amanhecer, ia para
casa, tomava um banho e, à tarde, ia trabalhar”. Esta foi a rotina de Chambo até começar a se tratar no Caps, onde está até hoje. Tanto Chambo quanto Macieira moram, atualmente, com os pais. “Hoje eu fico em casa, almoço, como na hora certa, durmo e levanto na hora certa”, comemora o segundo.
No Dia Nacional de Luta Antimanicomial, a defesa de um tratamento aberto
Renato Lopes/ Estado de Minas
O recomeço, longe do manicômio Novo mandado de prisão
Enterro das vítimas do massacre de Felisburgo (MG), em novembro de 2004
Bernardo Alencar de Belo Horizonte (MG) Foi decretada, dia 19 de maio, pelo juiz da Comarca de Jequitinhonha, Armando Ghedini Neto, a prisão preventiva do latifundiário Adriano Chafik Luedy, acusado da chacina que vitimou cinco semterras dia 20 de novembro do ano passado, em Felisburgo (MG). Chafik Luedy ficou preso até o dia 8 de abril, quando foi libertado por um habeas corpus concedido pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ). O novo mandado de prisão expedido pelo juiz Ghedini Neto foi baseado no entendimento de que há riscos às vidas dos integrantes do acampamento Terra Prometida. Os acampados contam que estão sendo ameaçados quando vão à cidade. Um integrante do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que não quis se identificar por medo de reta-
liações, testemunhou: “Nós ouvimos na rua os comentários de que este ou aquele acampado está com os dias contados”. Segundo relatório da Vara Agrária de Minas Gerais, a família de Chafik mantinha “postura agressiva” contra os acampados do Terra Prometida. Os sem-terra afirmam que jagunços contratados pelos parentes do latifundiário rondavam o acampamento a cavalo. Mesmo com o mandado de prisão, o advogado de Adriano Chafik, Antônio Francisco Patente, diz que, como para entrar com pedido de habeas corpus é irrelevante o Adriano estar preso ou não, a decisão de se entregar à Justiça caberá somente a ele. Para o ministro da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Nilmário Miranda, “esse crime não poderá ficar como outros, no passado”. Nilmário acredita que a prisão de Chafik é uma questão de dias.
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PROGRAMA DE COMPUTADOR
Aberto, econômico e melhor
Luiz Antonio Magalhães Limitação ideológica Os principais jornais diários brasileiros apresentaram uma cobertura jornalística bastante limitada da grande marcha realizada pelo MST, de Goiânia a Brasília, de 2 a 17 de maio. Praticamente ignoraram as reivindicações relacionadas à mudança na política econômica; alguns jornais nem registraram o ato de protesto em frente ao Ministério da Fazenda, apelidado de “Fazenda do FMI”. Exceção jornalística A Carta Capital foi a única revista semanal que tratou a Marcha Nacional pela Reforma Agrária com a dimensão mais exata do fato. Deu matéria de capa com a manchete “A maior marcha do Brasil” e oito páginas sobre a organização do MST, depoimentos de pessoas que participaram do evento histórico e o momento dos conflitos no ato em frente ao Congresso Nacional. Pura provocação O Jornal do Brasil foi um dos poucos veículos a dizer claramente, em sua edição de 18 de maio, que a PM do Distrito Federal havia infiltrado vários agentes entre os trabalhadores semterra para provocar os conflitos em frente ao Congresso Nacional. Mais uma obra do governador Joaquim Roriz, também conhecido por outras ações de truculência. Arauto conservador Principal porta-voz do tucanato, o jornal O Estado de S. Paulo caminha perfeitamente sintonizado com o discurso de Fernando Henrique Cardoso. Em sua edição de 24 de maio, dedicou nada menos do que oito páginas para matérias de “corrupção” no governo Lula; além disso, em editorial, pediu uma “CPI séria” para “pegar” o secretário e o tesoureiro do PT – os quais, no julgamento precipitado do jornal, estão envolvidos no escândalo dos Correios. E ainda tem gente, inclusive no Palácio do Planalto, que acredita na imparcialidade da imprensa brasileira. Liberdade editorial O Instituto Livre de Jornalismo (IJOR) divulgou nota para manifestar solidariedade ao jornalista e escritor Fernando Morais, que teve seu livro Na Toca dos Leões censurado e apreendido por ordem de um juiz de direito de Goiânia. O IJOR, presidido pelo professor Sidney Basile, reúne jornalistas e professores de jornalismo. Visão latino-americana A nova Televisão do Sul – emissora constituída pelos governos da Venezuela, Argentina e Uruguai – iniciou, dia 24 de maio, os primeiros testes de transmissão pelo satélite NNS 806, que pode ser captado da Patagônia até o Canadá. Em Brasília, o sinal da TeleSur será retransmitido pela TV Comunitária, Canal 8 da NET, que já tem mostrado ao vivo os programas dominicais do presidente Hugo Chávez. A nova emissora entrará mesmo em operação no dia 24 de julho. TV via telefone As concessionárias dos serviços públicos de televisão – canais abertos e pagos – estão realizando grande movimentação, nos bastidores do Congresso Nacional, para impedir que a nova lei da comunicação social permita a transmissão de conteúdos via empresas de telefonia, um novo sistema que vem sendo testado em alguns países. Um dos argumentos é que essas empresas são controladas pelo capital estrangeiro. Balanço político A edição de maio da Revista ADUSP – Associação dos Docentes da USP – apresenta um denso balanço do governo Lula, com análises de Armando Boito, Rafael Duarte Villa, Nildo Ouriques, Horário Martins de Carvalho, Soraya Smaili, Roberto Leher, Lujan Maria Bacelar de Miranda e Flávio Aguiar. O material está disponível na página da Adusp na internet: www.adusp.org.br Projeto popular Já está em circulação o número 30 da revista Sem Terra, do MST, que tem reportagens sobre a Consulta Popular, dom Tomás Balduíno, transgênicos, as crises políticas na Bolívia e no Equador, histórias de lutas camponesas e a obra de Graciliano Ramos. Pedidos para: revista@mst.org.br
Mais e mais gente usa software livres porque custam menos e são mais estáveis do que outros Dafne Melo da Redação
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ivulgada no final de abril pelo Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), a pesquisa “O Impacto do Software Livre e de Código Aberto na Indústria de Software do Brasil”, fornece mais informações sobre um debate que tem polarizado o governo federal: o uso de software livres (SL) no país. Encomendada pelo MCT, o levantamento foi feito por pesquisadores da Associação para Promoção da Excelência do Software Brasileiro (Softex) e do Departamento de Política Científica e Tecnológica da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp). Conclusão: o setor privado é quem mais utiliza plataformas abertas, enquanto no setor público sua difusão é mais lenta. (veja box) No caso de empresas privadas, o que mais influencia na adoção de software livres são fatores técnicos e econômicos, explica Giancarlo Stefanuto, coordenador executivo da pesquisa. Isto é, tais programas dão menos problemas e por eles não se pagam licenças de uso.
ESTÍMULO Organizações de grande porte como Pão de Açúcar, Gol Linhas Aéreas, Casas Bahia e Banco do Brasil, entre outras, são usuários de plataformas abertas. “As empresas são pragmáticas, querem o menor custo, não estão nem aí para questões ideológicas. O que nos disseram é software livres representam economia e são mais estáveis”, explica
Paulo Pereira Lima
da mídia
NACIONAL
Software livre dominou integralmente as instalações do 5º Fórum Social Mundial, em Porto Alegre
Stefanuto. A seu ver, a disseminação do software livre no setor privado superou as expectativas. Para o pesquisador, o incentivo do poder público foi e é estratégico para o crescimento do uso de plataformas abertas, tanto no setor público como no privado. O sociólogo Sergio Amadeu, presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), concorda. “Se o governo começar a usar, irá mostrar para a sociedade que há alternativas”, diz. Apesar do forte lobby exercido pelas empresas de software proprie-
Descomplicando o “tecnologês” Entende-se por software livre e de código aberto (SL/CA) todo software que oferece ao usuário as condições de uso, estudo, reprodução, alteração, aperfeiçoamento e redistribuição de seus códigos fonte, que são o próprio programa, que executa um conjunto de funções. No caso de um software proprietário, esse código não é aberto para o usuário, como acontece com os programas fabricados pela Microsoft. Assim, o SL/CA traz uma nova forma de desenvolver e licenciar software que está quebrando modelos tradicionais de propriedade intelectual e propondo um novo conceito de aprendizagem tecnológica, onde comunidades ao redor de todo o mundo compartilham seu conhecimento, aprimorando os produtos. Para mais informações, consulte a página www.softwarelivre.org
tários, Microsoft à frente, Amadeu está otimista com a possibilidade de expansão do uso de software livre em empresas públicas. “Por mais que o lobby tente fazer neste setor o que se fez com os transgênicos, temos força dentro do governo”, comenta, alertando, porém, que no setor público também há pontos vulneráveis às pressões da indústria monopolista.
ARMADILHA Amadeu explica como agem os fabricantes de plataformas proprietárias para manter aprisionados os usuários. “Eles doam os programas por um período de dois anos, por exemplo. Como isso representa uma economia a curto prazo, as empresas aceitam”, diz. Na opinião do presidente do ITI, “o software livre não depende do governo federal para crescer”. Para Amadeu, a última edição do Fórum Social Mundial foi um “marco”, na medida em que se usou pela primeira vez software abertos em suas instalações de forma integral. Além disso, houve uma sensibilização de outros movimentos sociais para a questão, que, agora, percebem que, se a nova linguagem da socieda-
de da informação é feita por software, não pode ser monopolizada. Além de iniciativas do governo federal que estimulam a adoção de plataformas abertas, como o programa PC Conectado (veja matéria abaixo), outras iniciativas pipocam pelo país. Recentemente, o governo do Paraná informou que estabelecerá, por decreto, uma política única para licenciamento de software livre na administração estadual. O decreto será formalizado pelo governador Roberto Requião durante o Fórum Internacional de Software Livre, de 1º a 4 de junho em Porto Alegre. No Rio de Janeiro, o Centro de Tecnologia da Informação também aderiu à plataforma aberta, anunciando que a meta é adotar o Linux em 90% de suas estações de uso administrativo até o fim do ano. Isso significa o uso de software livre em 30% dos micros da administração pública estadual. Já o governo tucano do Estado de São Paulo também vai utilizar Linux nos novos computadores do Metrô, que antes rodavam com o sistema operacional Windows. De acordo com Gustavo Mazzariol, gerente de TI do Metrô, a migração será feita em etapas.
PC Conectado não paga licenciamento O anúncio, dia 12 de maio, de que o governo federal vai, finalmente, tirar da gaveta o programa de inclusão digital PC Conectado, deixou contrariados os setores mais conservadores do governo e entidades representativas de empresas de software proprietários. A grande imprensa tratou de reverberar esse descontentamento, veiculando reportagens que, em sua maioria, desqualificavam a iniciativa. O motivo: os computadores, para obter financiamento, terão que usar o sistema operacional baseado em software livre. O programa fornecerá computadores a preços mais baixos, tornando-os mais acessíveis à população de baixa renda. A redução de preços dos equipamentos será possível por duas razões. Eles serão isentos do recolhimento de contribuições ao PIS (Programa de Integração Social) e Cofins (Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social), e os varejistas terão linha de financiamento concedida pelo Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Para o governo, o micro não poderá custar mais de R$ 1.400. Entre os aplicativos dos computadores do PC Conectado incluem-se editor de texto, planilha eletrônica, software de apresentação, navegador de internet (como Mozzilla ou Fire Fox), antivírus.
Ao todo, 26 aplicativos, todos em plataforma aberta.
CRÍTICAS “Existe uma ação muito pesada das empresas que monopolizam o setor”, explica Sergio Amadeu, presidente do Instituto Nacional de Tecnologia da Informação (ITI), uma autarquia federal vinculada à Casa Civil da Presidência da República. Entre os argumentos disparados contra a opção do software livre estão o perigo de aumento da pirataria, encarecimento da manutenção e cerceamento à liberdade de escolha do consumidor. Para concluir que pirataria vai aumentar, os adversários do código aberto teriam que partir do pressuposto de que os consumidores que comprassem o computador com software livre, iriam preferir software proprietário, argumenta Giancarlo Stefanuto, coordenador executivo da pesquisa “O Impacto do Software Livre e de Código Aberto na Indústria de Software do Brasil”.
INVERSÃO “Isso não faz sentido. Como eles podem partir dessa premissa?”, questiona o pesquisador. Na avaliação de Amadeu, nessa justificativa há uma inversão de valores. “O que determina o aumento da pirataria é a existência do software proprietário, que é vendido a um
alto preço”, argumenta. Além disso, explica o presidente do ITI, a Microsoft, principal adversária, não teria apresentado um produto com a mesma qualidade para concorrer no programa PC Conectado. “Eles ofereceram uma solução parcial, pobre, que não tem condições de competir”, diz. Quanto a questão da assistência
técnica, Stefanuto observa que os resultados da pesquisa apontam para uma queda brusca no preço desse serviço, e que tende a baixar cada vez mais. Ele chama atenção para o fato de que, quando o uso é corporativo, a tendência é de economia, como informaram as empresas de grande porte consultadas na pesquisa. (DM)
O panorama do uso no Brasil • Dos 18,7 milhões de computadores existentes no país, apenas 3% operam com o Linux, o mais conhecido dos software livres. No caso dos servidores, o programa está presente em 15% das máquinas.
• 53% dos desenvolvedores brasileiros estão em empresas privadas, 13% em órgãos públicos e 10%, nas universidades.
• 78% dos desenvolvedores individuais, 81% das empresas desenvol-
vedoras, 84% dos usuários individuais e 85% das empresas usuárias estão nas regiões Sul e Sudeste. Rio Grande do Sul e São Paulo são os dois principais focos de desenvolvimento e uso.
• O mercado tem dimensão mínima de R$ 77 milhões/ano, consideran-
do-se somente a distribuição e serviços correlatos ao Linux. O potencial de crescimento é de 2,5 a 3 vezes até 2008.
• Desenvolvedores individuais: 65% atuam na área de informática, ou
seja, são usuários capacitados. Motivos pelos quais usam SL: aprendizado, empregabilidade e, alguns poucos casos, questões ideológicas.
• Desenvolvedores corporativos: 98% das empresas têm capital de ori-
gem nacional; 79% faturam até R$ 500 mil/ano; 64% faturam mais de R$ 1 milhão/ano. Apenas 11% possuem receita superior a R$ 2,5 milhões/ano.
Os principais motivos citados foram econômicos (diminuição de custos) e técnicos (desenvolvimento de novas habilidades). (DM)
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De 26 de maio a 1º de junho de 2005
NACIONAL REFORMA AGRÁRIA
Marcha sensibiliza e conquista acordos Marcelo Netto Rodrigues da Redação
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alvez a expressão “colocar os pés pelas mãos” nunca tenha sido tão adequada, em seu sentido literal. Os 24 mil pés que chegaram a Brasília após marchar 233 km conseguiram que as mãos que conduzem o governo redigissem, em conjunto com o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), 15 acordos referentes à política de reforma agrária. As decisões começam a ser postas à prova já nos próximos dias (veja o quadro abaixo). Dois desses acordos têm data marcada. O primeiro diz que “o governo federal já tomou a decisão de atualizar os índices de produtividade e que a portaria interministerial será publicada nas próximas semanas”. O anúncio surpreende, pois não revela o que ficou acertado entre o ministro do Desenvolvimento Agrário, Miguel Rossetto, e o ministro da Agricultura, Roberto Rodrigues, que precisavam chegar a um acordo sobre o assunto. A atualização só dependia do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e dos ministros. Rodrigues sempre se posicionou contrário à atualização dos índices – datados de 1975 e ainda em vigor. O segundo compromisso do governo é de enviar ao Congresso Nacional, até 31 de maio, um projeto de lei de suplementação orçamentária que vai garantir o
Douglas Mansur
Depois de caminhar por 16 dias, sem-terra deixam Brasília com avanços concretos para melhorar o acesso à terra
Durante os 16 dias de marcha, os sem-terra também participaram de mais de 30 audiências com ministérios e órgãos federais
cumprimento da promessa de assentamento de 115 mil famílias, em 2005, e de 400 mil famílias até o final de 2006. O governo também se comprometeu a assegurar uma cesta básica mensal para cada uma das 120 mil famílias hoje acampadas em todo
o país, além de dar prioridade, nos novos assentamentos, às famílias dos acampamentos mais antigos, desde que observadas as demais condições legais. Com relação ao Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), foi anunciada a contratação de 137
servidores e a abertura de concurso para mais 1.300 vagas.
SILÊNCIO Para os assentados, os ganhos mais significativos foram: a instituição de um crédito de recuperação para os assentamentos, no valor de R$ 6 mil por família; a criação de um crédito de fomento, no valor de R$ 2,4 mil por família (destinado a financiar a compra de tratores, sementes e outros insumos produtivos); o aumento do teto de financiamento do Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar (Pronaf), de R$ 15 mil para R$ 18 mil, e a criação de uma linha de crédito de R$ 100 milhões para acesso exclusivo
1- Garantia de cumprimento das metas do Plano Nacional de Reforma Agrária (PNRA) em 2005 a) Reafirmação do compromisso do governo com as metas do II PNRA: 115 mil famílias assentadas em 2005 e 400 mil até o final de 2006 b) Promessa de envio ao Congresso Nacional, até 31 de maio, projeto de lei de suplementação orçamentária com recursos necessários para cumprimento da meta 2 - Revisão dos Índices de Produtividade - Decisão de atualização dos índices de produtividade. Portaria Interministerial será publicada nas próximas semanas. 3 - Reestruturação e fortalecimento do Incra a) Autorização de contratação de 137 servidores já aprovados em concurso, principalmente agrônomos. b) Autorização da realização, ainda em 2005, de novo concurso para o Incra, com abertura de 1.300 vagas. c) Criação de nova estrutura organizacional do Incra 4 - Prioridade na seleção para os assentamentos, observadas as demais condições legais em acampamentos antigos 5 - Distribuição de cesta básica mensal para todas as famílias acampadas 6 - Descontingenciamento dos recursos do Programa Nacional de Educação na Reforma Agrária (Pronera) 7 - Melhoria da qualidade dos assentamentos - acesso ao crédito pelos assentados a) Reajuste do teto de financiamento do Pronaf A de R$ 15 mil para R$ 18 mil (1,15% ao ano, carência de até 5 anos, 10 anos de prazo para pagar, desconto de 46% para pagamentos em dia). b) Aumento de um para três nos créditos de custeio aos assentados (juros de 2% e rebate de R$ 200 para pagamentos em dia), no valor de até R$ 3.000 cada, sendo os dois primeiros com risco da União e o terceiro com garantia de compra da produção. c) Instituição de um Crédito de Recuperação de Assentamentos, no valor de até R$ 6.000 por família (1% de juros, carência de até três anos e até 10 anos de prazo para pagar), com disponibilidade de recursos fixada a cada Plano Safra. d) Garantia de disponibilidade de R$ 100 milhões para acesso exclusivo dos assentados ao Pronaf Agroindústria (até R$ 18 mil por família, 3% de juros para pagamentos em dia, até três anos de carência e 8 anos para pagar) por meio de fundo de aval ou outro instrumento de garantia. e) Instituição, além do atual crédito de instalação/fomento de R$ 2,4 mil, de um segundo recurso de fomento aos assentados, no ano seguinte, no mesmo valor. f) Aumento de R$ 1.000 para R$ 1.500 os recursos para construção de cisterna no semi-árido.
Francisco Rojas
Resultados da Marcha Nacional pela Reforma Agrária
dos assentados na modalidade Pronaf Agroindústria. O governo silenciou frente aos outros pontos que compunham a lista de 16 reivindicações da Marcha: defender a Amazônia contra os interesses das transnacionais, impedir o processo de privatização da água, impedir a liberação dos transgênicos, demarcar imediatamente todas as terras indígenas, expropriar as fazendas com trabalho escravo, dobrar o valor do salário-mínimo, realizar uma auditoria pública da dívida interna e externa e retirar as tropas brasileiras do Haiti. Ao longo dos 16 dias de caminhada, o MST também participou de mais de 30 audiências com diversos ministérios e órgãos federais, nas quais foram apresentadas propostas, em sua maioria ignoradas. Na Petrobras, por exemplo, os sem-terra pediram programas de construção de poços profundos para água nos assentamentos e se dispuseram a participar de programas para produção de biodiesel em conjunto com o Ministério de Ciência e Tecnologia. No Ministério de Minas e Energia, os representantes do MST conversaram sobre a instalação, nos assentamentos, de construções ecológicas de aproveitamento de energias alternativas. O movimento também foi ao Ministério do Trabalho e Emprego tentar estruturar centros de capacitação nos assentamentos com equipamentos que permitam a profissionalização nas áreas de marcenaria, artesanato, cerâmica e padaria. O MST ainda propôs parcerias, entre outros, com os ministérios do Desenvolvimento Social, da Educação, da Cultura, dos Esportes, das Comunicações, do Meio Ambiente, das Cidades, da Integração Nacional e com as Secretarias dos Direitos Humanos, Especial da Mulher e Especial da Pesca.
Governo se comprometeu a garantir cesta básica para as 120 mil famílias acampadas
CAMPANHA CONTRA A ALCA
Igor Ojeda da Redação Mais do que a luta contra a Área de Livre Comércio das Américas (Alca), a defesa da Alternativa Bolivariana para as Américas (Alba). Com essa proposta como preparação para as Assembléias Populares, iniciativa da Campanha Brasileira contra a Alca e da Rede Jubileu Sul/Brasil, aconteceu em São Paulo, entre os dias 20 e 22 de maio, o Curso Estadual de Formação da Campanha Contra a Alca. Além da crítica dos tratados de livre-comércio de maneira geral, o evento apresentou aos formadores – que irão preparar as assembléias – o conceito da Alba, uma proposta de integração latino-americana elaborada pelo presidente da Venezuela, Hugo Chávez, já apoiada por Cuba. Por isso, a mesa de debates teve a presença da consulesa cubana em
Arquivo Brasil de Fato
Alba, proposta de reciprocidade entre as nações
Alca mais uma vez no centro do debate com as assembléias populares
São Paulo, Georgina Németh. “Em São José dos Campos, conseguimos 60 mil assinaturas contra a Alca, e depois disso as pessoas passaram a nos perguntar: e agora? Essa proposta da Alba responde o que vamos fazer para nos contrapor à Alca”, anima-se
Angela Aparecida da Silva, ativista do Movimento de Moradia e da Marcha das Mulheres da cidade do interior paulista. Humberto Rezende Capucci, do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) de Registro, cidade do Vale do Ribeira, diz que encontra dificuldade em
trabalhar a lógica da Alca com os índios, o que não acontece no caso da Alba, pois esta “tem muito a ver com a reciprocidade nas relações, valor que as comunidades indígenas possuem”. Outro ponto positivo apontado pelos participantes do encontro foi o intercâmbio de experiências. “Foi importante as pessoas se juntarem. A luta é só uma, pela moradia, pela reforma agrária, pelos direitos dos gays, dos negros, contra Alca. Conheci muitas pessoas com interesses comuns”, relata Meres Maquiba Ribeiro da Silva, do Movimento de Luta por Moradia e Emprego (MLME), de São Paulo. Angela comprova: “Encontrei uma companheira que vai me ajudar num projeto de brinquedoteca. Depois, dei um informe de uma audiência pública que pretendemos fazer na minha cidade sobre a criminalização dos movimentos
sociais e já veio uma advogada dizendo que vai nos ajudar, entrar na comissão.
OUTROS ESTADOS No dia 21 de maio, 40 pessoas de 14 cidades participaram do Curso Estadual de Formação do Distrito Federal. Entre os principais encaminhamentos, destaque para a decisão de se realizar oficinas (marcadas para final de junho e início de julho) para debater a cartilha contra a Alca e a idéia de dar maior visibilidade na mídia à Assembléia Popular, principalmente por meio de jornais e rádios comunitárias. No Rio de Janeiro, o curso se realizará nos dias 11 e 12 de junho. As inscrições podem ser feitas pelo telefone (21) 22102124 ou pelos correios eletrônicos sec_operativa@click21.com.br e secretaria@pacs.org.br. Os demais Estados ainda não definiram suas datas.
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De 26 de maio a 1º de junho de 2005
NACIONAL BRASIL MARGINALIZADO
Milhares vivem na informalidade
Hamilton Octavio de Souza
Quase 14 milhões de trabalhadores e mais de 10 milhões de pequenos negócios no mercado
Lamaçal brasiliense O governo Lula, em sua aliança conservadora e fisiológica, afunda cada vez mais no mar de lama para defender associados como Meirelles, Jucá, Eunício e Jefferson – todos criados e cevados nos esquemas do toma-ládá-cá e nos porões da corrupção dos governos Collor de Mello e Fernando Henrique Cardoso. Quem anda com essa bandidagem toda não tem como provar que é diferente. Nova arena O Diretório Nacional do PT, na reunião do final de semana, em São Paulo, agiu como a velha Arena, o partido criado pelos militares do golpe de 1964: os principais dirigentes fizeram discursos contra a CPI dos Correios para não “desestabilizar o governo Lula”. O ministro chefe da Casa Civil, José Dirceu, chegou a dizer que a CPI beirava o “golpismo”. Estranha maneira de enfrentar a corrupção aliada. Crime genético O jornal inglês The Independent revelou relatório secreto da multinacional Monsanto, no qual o milho transgênico produzido pela empresa causou anomalias no organismo de ratos de laboratório. Esse mesmo milho está sendo contrabandeado para dentro do Brasil e distribuído aos fazendeiros a preços abaixo do mercado. Assim, a empresa criminosa cria o fato consumado, como fez com a soja transgênica no Rio Grande do Sul. O governo vai ficar olhando? Liquidação tucana Como diz o ditado popular, pior cego é o que não quer enxergar. Depois da nefasta privatização promovida pelos dois governos Fernando Henrique Cardoso, de 1995 a 2002, o governador paulista Geraldo Alckmin, também do PSDB, insiste no processo de entrega do patrimônio público para o controle privado: agora está colocando à venda a companhia transmissora de energia elétrica do Estado de São Paulo, praticamente o que resta de tudo o que já foi sucateado. Milagre econômico Aquilo que os economistas neoliberais e o capital especulativo chamam de estabilidade econômica é o juro básico no patamar de 20% ao ano, desemprego voltando a subir e acima dos 17% nos principais centros urbanos do país, as tarifas dos serviços públicos puxando os preços e a inflação para perto dos dois dígitos, a dívida crescendo geometricamente e o contingenciamento dos gastos sociais garantindo o lucro recorde dos banqueiros. Até quando? Controle externo Com a venda de 50% do Grupo Pão de Açúcar ao grupo francês Casino, as quatro maiores redes de supermercados que operam no Brasil pertencem agora ao capital estrangeiro: o Carrefour é francês, o Wal-Mart é estadunidense e o Sonae é português. A transferência contínua do varejo para grupos estrangeiros pode representar o desaparecimento de muitos fornecedores de capital nacional, já que as redes distribuidoras costumam promover indústrias associadas ou da mesma origem. Tempo contado Entrou em vigor em São Paulo, dia 23 de maio, a lei municipal que estabelece o tempo máximo de 15 minutos para atendimento dos clientes nas agências bancárias, em dias normais. Em véspera de feriados e dias de pagamento de servidores, os tempos tolerados são de 25 e 30 minutos respectivamente. Agora é preciso saber se o poder público municipal tem interesse e força para enfrentar os poderosos bancos. As apostas continuam a favor dos banqueiros. Remédio lucrativo O governo federal decidiu isentar cerca de mil remédios – em especial os utilizados em tratamento de doenças crônicas – dos tributos PIS e Cofins, o que pode representar uma redução média de preços de 11%. A medida favorece as camadas mais pobres da população, mas só terá efeito mesmo se for acompanhada de rígida fiscalização. Caso contrário, vai engrossar os lucros das empresas estrangeiras que dominam o setor.
Anamárcia Vainsencher da Redação
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o Brasil, há mais de 10,5 milhões de pequenas empresas não-agrícolas, das quais a quase totalidade – 98%, ou 10,3 milhões, na informalidade. Nelas trabalham 13,9 milhões de pessoas. Segundo especialistas, esses números indicam que o setor informal acaba desempenhando a função de absorver mão-de-obra, minorando a crise do mercado de trabalho. Os dados são da pesquisa de Economia Informal Urbana 2003, realizada pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), em parceria com o Sebrae. Em relação à pesquisa anterior, de 1997, o número de pequenas empresas em geral cresceu 10%, enquanto o de empreendimentos informais aumentou 9%. O aumento dos postos de trabalho nas empresas informais foi de cerca de 8% no mesmo período. São Paulo, Minas, Rio de Janeiro, Bahia e Rio Grande do Sul concentram, juntas, cerca de 58% das empresas do setor informal do país. Dentre as pessoas ocupadas nestes empreendimentos, 69% são trabalhadores por conta própria; 10% empregadores; 10% empregados sem carteira assinada; 6% com carteira assinada; e 5% não remunerados. Nesse universo, a maioria é homem (64% do total). Entretanto, entre os trabalhadores não remunerados, a maior parte (64%) é mulher, que corresponde a 3% da população ocupada. São elas que ganham menos: o IBGE mostra que, no setor informal, o rendimento mais baixo é o das mulheres empregadas sem carteira: R$ 275, pouco acima do saláriomínimo de R$ 240 em 2003.
Adriana Zehbrauskas/ Folha Imagem
Fatos em foco
UNIVERSO AMPLO Desde a última pesquisa do IBGE, em 1977, o número de trabalhadores em negócios informais cresceu quase 8%, o dobro do aumento, no mesmo período, no total de empregados em atividades não-agrícolas no Brasil, com exceção do serviço doméstico. Ou seja, sem o setor informal, o desemprego urbano, entre 1997 e 2003, teria crescido muito mais. A informalidade alcança 98% dos empreendimentos não-agrícolas com até cinco empregados. É um amplo universo que inclui de camelôs a microempresários. No conjunto, 69% são trabalhadores por conta própria, 10% são empregadores, 16% são funcionários com e sem carteira assinada e 5% trabalham sem remuneração.
Ambulantes na Rua São Bento, Centro de São Paulo: no setor informal, rendimento mais baixo é o das mulheres, com R$ 275
No geral, estão na informalidade por falta de oportunidade: 31% começaram seus negócios por não encontrarem emprego e 18% porque precisam de complementação de renda. Na avaliação de especialistas, o setor informal funciona mais como rede de proteção do que como trampolim.
SEM OPÇÃO Em sua grande maioria (88%), as empresas do setor informal pertencem a trabalhadores por conta própria. Que não estão nessa situação por escolha, mas por falta de alternativa. Nestes estabelecimentos, a quase totalidade (95%) tem um único dono, e a maioria (80%), só uma pessoa ocupada. As principais atividades econômicas no setor informal são comércio e reparação (33%), construção civil (17%) e indústria de transformação e extrativa (16%). Do total de pequenas empresas de construção, todas são informais. Devido aos custos e à burocracia do mercado formal, a maioria (53%) das empresas não faz qualquer tipo de contabilidade. Entre as empresas de trabalhadores por conta própria, 57% não registram nada. Do total das empresas do setor informal, 88% não têm constituição jurídica, nesse universo, 93% são de conta própria. Entre as que têm constituição jurídica, 93% faturam mais de R$ 2 mil por mês, enquanto 72% das sem esse registro obtêm, em média, até R$ 1 mil mensais. Quem está na informalidade teve maiores perdas de renda do que
O PERFIL DOS TRABALHADORES em % do total 5% Não remunerados 6% Com carteira assinada 10% Sem carteira assinada 10% Empregadores 69% Por conta própria Fonte: IBGE
O GRAU DE INSTRUÇÃO em % do total Grau de instrução
Por conta própria
Empregadores
Sem instrução
9,93
3,57
1º grau imcompleto
39,03
24,11
1º grau completo
14,10
12,56
2º grau imcompleto
8,91
8,59
2º grau completo
18,79
Superior imcompleto
2,73
5,37
Superior completo
6,30
18,28
Fonte: IBGE
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os demais, em função das crises econômicas por que tem passado freqüentemente o país. Assim, entre 1997 e 2002, a receita do setor diminuiu quase 20%, ao passo que a renda média dos brasileiros encolheu menos de 19%. Nos pequenos empreendimentos informais, o recuo nos rendimentos vem acompanhado de jornadas de trabalho mais longas, contratos mais precários e maior concorrência. Os ganhos dos trabalhadores por conta própria diminuíram 19,5% No já precário mercado informal, as relações de trabalho estão ainda piores. Em 1997, 72% dos empregados no setor informal, menos os donos dos negócios, tinham uma relação de trabalho por tempo indeterminado. Em 2003, só 61% tinham esse vínculo. E cresceu o número daqueles que ganham por tarefa. A fragilização do vínculo com o trabalho ocorreu em meio a um aumento da já excessiva carga horária: 15% de proprietários e por conta própria têm jornada superior a 60 horas semanais.
RECEITA CAI Em 1997, 93% das empresas do setor informal eram lucrativas. Em 2003, a proporção caiu para 73%. No período, houve queda significativa no lucro médio real dos empreendimentos de conta própria, enquanto os de empregadores mantiveram o lucro no mesmo patamar anterior. Dentre as empresas lucrativas, a maior parte delas, 36%, é do segmento de comércio e reparação. Cabe destacar, ainda, que a receita média mensal obtida pelas empresas de empregadores é cinco vezes maior do que a das empresas de conta própria. A grande maioria das empresas do setor informal (94%) não utilizou crédito nos três meses anteriores à pesquisa no desenvolvimento da atividade. Entre as que o fizeram, a principal fonte de recursos foi bancos públicos ou privados (para 58% das empresas), seguida de o próprio fornecedor (16%) e parentes ou amigos (16%). Em novembro de 2003, assim como em 1997, 83% das empresas informais não possuíam qualquer tipo de dívida.
CONCENTRAÇÃO A maioria dos empreendedores informais não tem qualquer tipo de proteção social. Entre os que trabalham por conta própria, 20% não contribuem para a Previdência Social. A pesquisa também mostra que, entre os por conta própria, 39% têm apenas primeiro grau incompleto. No conjunto, 45,6%
O SETOR EM NÚMEROS Número de empresas
10,34 milhões Número de trabalhadores
13,86 milhões Percentual do total de empresas não-agrícolas com até 5 empregados
98% Receita total
R$ 17,6 bilhões (ao mês) Fonte: IBGE
têm entre 40 e 59 anos e 37,%, entre 25 e 39 anos. A maior parte (58%) das empresas informais está nos Estados de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Bahia e Rio Grande do Sul. Nessas cinco unidades da federação também está a maior proporção (56%) dos 13,9 milhões de trabalhadores informais. Apenas São Paulo concentra 25% (2,6 milhões) de empresas informais; em seguida vem Minas Gerais, com 10,3% ou um milhão de empresas; e Rio de Janeiro, com 8,4 % ou 863,4 mil empresas informais. A participação do setor informal dentre as pequenas empresas foi mais evidente no Espírito Santo e no Acre, onde 99,45% se encontravam na informalidade.
FUNCIONAMENTO A pesquisa do IBGE mostra que boa parte (65%) dos empreendimentos desenvolve suas atividades produtivas somente fora do domicílio, e aproximadamente um terço exclusivamente na casa do proprietário. Isso resulta do peso de atividades como comércio e construção civil. Entre as empresas pertencentes a trabalhadores por conta própria, 63% funcionam apenas fora do domicílio de seu proprietário, enquanto entre as pertencentes a pequenos empregadores, essa proporção atinge 79%. Aproximadamente 89% das empresas pesquisadas funcionam todos os meses do ano, sendo a maior parte delas de trabalhadores por conta própria. Cerca de 70% das unidades produtivas utilizam equipamentos e/ou instalações próprios. Em relação a 1997, cresceu a proporção de unidades produtivas que utilizaram imóveis, barracas ou trailers.
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NACIONAL DIREITO À CIDADE
População pobre contra limpeza social Rodrigo Ciriaco e João Alexandre Peschanski de São Paulo (SP) e da Redação
N
o Páteo do Colégio, Centro de São Paulo (SP), centenas de pessoas em situação de rua protestam contra o prefeito José Serra. Pelo megafone, é anunciada a criação do Movimento de Luta da População de Rua. Na Rua Santa Ifigênia, também na área central, vendedores ambulantes entram em confronto com a polícia. Exigem o direito de trabalhar. Catadores de materiais recicláveis, que atuam na região central, escrevem uma carta de repúdio à Lei 171/2004, que impõe restrições à sua profissão. Querem um espaço para discutir o projeto com o poder público, que depende da sanção de Serra para ser implementado. Em uma ocupação na Rua do Ouvidor, na mesma área, famílias sem-teto estendem uma faixa, exigindo casa digna. Todos os protestos ocorreram entre os dias 18 e 20 de maio. São parte de um fenômeno que se alastra pela área central da cidade de São Paulo: a mobilização da população pobre contra Serra. Organizações de moradores de cortiços, sem-teto, prostitutas, crianças e adultos em situação de rua, vendedores ambulantes e catadores de papel acusam o prefeito de promover uma limpeza social na região.
Alderon Costa/ Rede Rua
Grupos urbanos, como trabalhadores em situação de rua e sem-teto, são alvo de violência no Centro de São Paulo
Moradores de rua de São Paulo protestam contra medidas do prefeito tucano José Serra, que pretende fazer do Centro espaço para turistas
tégia da limpeza é executada com o recurso de dois instrumentos. Primeiramente, o estrangulamento financeiro. No orçamento da Prefeitura de São Paulo para 2005, a parte da Secretaria de Assistência Social, responsável pela promoção de projetos de ajuda à população pobre da cidade, incluindo a área central, já era bem reduzida, 0,35% dos R$ 15,2 bilhões totais. Segundo as organizações, ficou ainda pior. Entidades que trabalham com a população de rua por meio de convênios com a prefeitura estão com seus pagamentos atrasados. São obrigadas a reduzir seus gastos e o atendimento. Por falta de verba, projetos de inclusão para pessoas pobres, como moradia provisória,
CORTE DE VERBAS “O Serra quer fazer do Centro um espaço para turistas. É para inglês ver. Tudo o que não ficar bem na foto do turista tem que sair. Ou seja, os pobres têm que sair”, afirma Sebastião Nicomedes de Oliveira, do Fórum da População de Rua. De acordo com Oliveira, a estra-
bolsa-aluguel e locação social, estão sendo abandonados.
REPRESSÃO O segundo instrumento da estratégia de limpeza é a repressão. Que começa com a proibição das rondas realizadas por grupos que distribuem sopa e comida para a população pobre no Centro. O subprefeito da Sé, Andréa Matarazzo, que acumula o cargo de secretário municipal de Serviços, é apontado como um dos principais coordenadores da limpeza social do Centro. Em declarações oficiais, ele afirma considerar o comércio informal, que, segundo ele, pode servir de refúgio para criminosos, como um dos mais sérios problemas da cidade.
O Centro de São Paulo pode ser um bom negócio. A mensagem, repetida pelo prefeito José Serra, é um dos lemas de sua campanha pela recuperação da área central da capital paulista. Segundo ele, é preciso revalorizar o Centro, para atrair empresas e turistas. Esse argumento lhe tem servido para justificar a “Operação Limpa”, cujo principal objetivo é reprimir os pobres que moram e trabalham na informalidade, na área central. Para os movimentos sociais, Serra promove uma limpeza social. No entanto, o lema, caro ao prefeito, não é de sua autoria. No início de seu mandato, recebeu da Associação Viva o Centro, que reúne representantes de corporações, escritórios de advocacia e entidades empresariais, dez propostas para a área central de São Paulo. Elas vão da reforma de áreas da cidade, como o Vale do Anhangabaú, à articulação de zeladorias urbanas (grupos de pessoas articuladas para fiscalizar o uso do espaço público). Em entrevista ao Brasil de Fato, o presidente da Associação, Marco Antonio Ramos de Almeida, ligado ao BankBoston, destacou a necessidade de manter a ordem e a disciplina na cidade. Dois elementos que, para ele, são fundamentais para construir a marca da cidade. “Isso é crucial, tanto para empresas, produtos e cidades. Não se vende uma água que não tenha marca. Não se vende um computador sem marca. É muito difícil vender uma cidade que não tenha uma marca,” argumenta. Para Almeida, construir a imagem do Centro é fundamental para atrair as empresas e os turistas dos quais o prefeito fala. Atraí-los deve ser uma prioridade, afirma Almeida, pois o turista gera uma renda de 600
Alderon Costa/ Rede Rua
A metrópole, uma mercadoria como outra qualquer
O objetivo da “Operação Limpa” é reprimir os pobres que moram na região central
a mil dólares por dia à cidade. É uma fonte de ouro, diz, que necessita de pouco investimento e cria empregos. “A cada milhão de turistas, estamos falando de 600 milhões a um bilhão de dólares de receita”, raciocina. A marca da cidade depende, segundo o presidente da Associação Viva o Centro, da melhoria da segurança da população. “As pessoas acham que o Centro é inseguro porque se tem contato com a população. Em outras áreas, elas saem de seu carro, eventualmente blindado, vão a um shopping, daí seguem para um restaurante, onde deixam o carro no estacionamento. O Centro é diferente e diversificado, e as pessoas gostam disso”, explica.
E OS POBRES? Ele destaca que diversidade não subentende ocupação ilegal do espaço público e prostituição ostensiva e agressiva. Para evitar isso, argumen-
ta, é preciso disciplinar o espaço público. Para Almeida, não dá para deixar que as pessoas de baixa renda ocupem os prédios. “Isso acabaria com o Centro. Se a população tem baixa renda, devemos melhorar a renda ou criar subsídios”, diz. A seu ver, não se pode justificar ações da população pobre só porque ela tem baixa renda. “A população é desrespeitada quando um camelô fica no meio do caminho, impedindo a passagem. A pessoa só pode vender onde for permitido. Onde não for, não vende. A disciplina é em benefício da população, não é do rico”, comenta. Quanto às ocupações de prédios, considera “irresponsáveis e criminosas”, pois põem em risco a vida das pessoas. Almeida lamenta a pobreza do Centro. “A política de distribuição de renda está fora do alcance da Viva o Centro. É o governo que deve fazer isso”. (JAP)
Matarazzo faz parte da coordenação da “Operação Limpa”, ação integrada entre a prefeitura e a polícia para reprimir criminosos no Centro. Entidades ligadas à população em situação de rua acusam os policiais de praticar violências contra os pobres que vivem e trabalham na área central (leia reportagem abaixo). Apesar de ser procurado pela reportagem do Brasil de Fato, Matarazzo não quis conceder entrevista.
VIDA DIGNA Revitalização do Centro. Essa é a justificativa de Matarazzo para as ações da prefeitura naquela região da cidade, incluindo a repressão policial. Com um financiamento de
100 milhões de dólares do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), ele espera atrair investimentos para a área e recuperar o glamour do Centro. “A revitalização é proposta por aqueles que não reconhecem que há vida no Centro”. A frase é de um manifesto do Fórum Centro Vivo, espaço de discussão pública formado por grupos e pessoas que atuam na região central. Sebastião Nicomedes de Oliveira, que participa do Fórum, espera que a violência da prefeitura cesse. “Sonho com um Centro democrático, onde a população pobre tenha uma vida digna. Não sou lixo, não preciso ser limpado, nem varrido,” conclui.
Cidadãos são tratados como bandidos No governo José Serra, a população em situação de rua no Centro de São Paulo não é tratada como questão social, mas como caso de polícia. Diversas entidades e organizações vêm coletando denúncias de atos de violência, maus-tratos e discriminação contra esse grupo, em operações realizadas a mando do prefeito Serra, que iniciou seu mandato em 2005. Carla*, de 30 anos, vive embaixo do Minhocão (viaduto que liga a região central de São Paulo à zona oeste), próximo à Rua Amaral Gurgel, e foi vítima da violência policial: “Eles pegaram e pararam a gente. Falaram que era para tirar todas as nossas coisas, era para sair tudo dali. Aí eu pedi um tempo para eles para colocar minha bolsa em cima da carroça, eles não me deixaram colocar. Cataram minhas coisas e jogaram tudo em cima do caminhão, me jogaram no chão, me xingaram”. Mário*, de 27 anos, acompanhava o grupo de pessoas que estava com Carla e conta: “Eles chegaram, acordaram a gente, assim que a gente se levantou para ouvi-los, colocaram nossos pertences em um caminhão e mandaram a gente embora. Levaram bolsa, colchão, documento, tudo, tudo, tudo... Levaram minha certidão de nascimento, identidade, carteira de trabalho.”
MAIS EXCLUÍDO AINDA Irany Francisco dos Reis, de 42 anos, atualmente trabalha com a revista Ocas, mas já viveu e sofreu com políticas de limpeza social em outras cidades, enquanto esteve na rua. “Para nós, que estamos na rua, faz-nos sentir mais excluídos ainda. Acho uma grande hipocrisia da
parte do Estado, dos políticos, quererem mudar a cara do Rio de Janeiro, de São Paulo, tornar tudo bo-nitinho, mas na realidade a maioria do povo não tem uma condição de vida que deveria ter, uma condição digna. Não digo só para quem está na rua, mas também para quem está na periferia. Por que eles não se preocupam também com as periferias, fazer rede de esgoto, escola, enfim, tudo coisas que traria mais dignidade para as pessoas? Dentro da política de revitalização do Centro de São Paulo também tem que ter uma política voltada para as pessoas, uma política social que resolvesse efetivamente o problema das pessoas que estão na rua porque só assistencialismo, só a manutenção da miséria, não é legal”, relata. De acordo com Sebastião de Oliveira, do Fórum da População de Rua, as ações do Estado deveriam ser feitas com o acompanhamento de profissionais da área social e da saúde. Das atuais operações no Centro participam apenas policiais e funcionários da prefeitura. Carla define o que é a atual política de Serra para o Centro: “Para ele, a gente é como lixo. Lixo! Essa é a verdade”. (RC) Ocas - Revista de temas culturais, políticos e sociais, com vendagem efetuada exclusivamente nas ruas de São Paulo e Rio de Janeiro, por pessoas sem moradia ou que vivem em condições precárias. O objetivo é fornecer instrumentos de resgate da auto-estima, criando condições para que o indivíduo se torne sujeito de sua transformação. Saiba mais na página na internet: www.ocas.org.br
* Os nomes originais foram alterados para preservar a segurança dessas pessoas.
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NACIONAL PÚBLICO X PRIVADO
Sarney se apropria de patrimônio público Emílio Azevedo de São Luís (MA)
A
fundação de propriedade do senador José Sarney (PMDB-AP), que leva o seu nome, recebeu, ilegalmente, do governo do Maranhão, a doação de um dos mais valiosos imóveis localizados no centro histórico de São Luís, a capital do Estado. Conhecido como Convento das Mercês, o prédio é tombado pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan). O ato é ilegal, já que a legislação federal proíbe a doação ou venda para uma pessoa jurídica de direito privado, caso da Fundação José Sarney, de qualquer edificação pública tombada. Diante do flagrante desrespeito à lei, o Ministério Público Federal entrou com uma ação na Justiça para que seja declarada nula a doação, determinando em seguida que o imóvel retorne ao patrimônio do Estado.
Ermínio Oliveira/ABR
No Maranhão, Ministério Público Federal quer impedir doação ilegal de patrimônio público a José Sarney
Ministério Público entrou com ação na Justiça para anular doação do prédio tombado a Sarney e sua família: mais uma ação de coronelismo no Maranhão
SILÊNCIO Maranhão, Kátia Bogéa, confirma uma outra irregularidade cometida na época da doação e que também está citada na ação do Ministério Público Federal. “É verdade. A lei prevê que, para doação de um prédio tombado o Iphan precisa ser consultado e, realmente, na época da doação desse imóvel, não houve a consulta”, diz Kátia. Ela presta a informação correta, mas deixa transparecer que, exercendo no Maranhão um cargo federal que passa por uma indicação política, não tem interesse em criar constrangimento para o esquema Sarney. A ação hoje tem pouca reper-
Carcará, o fiel e precioso aliado da família Além da ilegalidade anunciada pelo Ministério Público, a circunstância em que ocorreu a doação do antigo prédio do Convento das Mercês e os personagens envolvidos mostram claramente como o esquema Sarney age no Maranhão. A doação foi feita em abril de 1990, apenas dois meses depois de a Fundação ter sido criada. Naquele período, o governo maranhense estava investindo muito dinheiro na reforma do imóvel, e a doação foi feita com as obras ainda em andamento. Mesmo após a doação consumada em cartório, o governo continuou trabalhando para entregar ao patrimônio pessoal de José Sarney um prédio inteiramente recuperado com dinheiro público. No Maranhão de muitas obras e projetos inacabados, a do Convento das Mercês foi concluída. O governador que assinou o ato de doação e concluiu a reforma foi João Alberto de Sousa, hoje senador e correligionário de Sarney no PMDB. Os dois são aliados desde a década de 60, e atualmente integram a banda peemedebista que dá apoio ao governo, ou melhor, se agarra a todos os governos, a qualquer governo. Sousa é conhecido na política maranhense como Carcará, ave de rapina que teve seu nome imortalizado na música de João do Vale como aquela que “pega, mata e come”. Ao Carcará sempre ficam reservadas dentro do esquema Sarney algumas das funções mais complicadas. Aquelas que podem gerar insatisfação na opinião pública, ou que requerem mais coragem para um confronto.
JOGO BRUTO Um exemplo pode ser visto no recente rompimento entre o atual governador do Maranhão, José
Reinaldo Tavares, e o comando da oligarquia. Consumada a briga, enquanto Sarney tira onda de intelectual preocupado com a democracia e a filha Roseana sonha em ser ministra para depois voltar ao governo maranhense, cabe a Sousa o jogo bruto. É ele que sistematicamente utiliza o império de comunicações controlado pelos Sarney para, agressivamente, atacar Zé Reinaldo. O caso Jader Barbalho (PMDB-PA) é outro. Quando o político paraense enfrentou sérios problemas por conta de fatos ocorridos quando ele era ministro de Sarney, foi a voz de Carcará uma das poucas a defendêlo publicamente, enquanto Sarney torcia em silêncio.
PATRIMÔNIO E assim, juntando o estilo “pega, mata e come” de Sousa ao “eu quero, posso e mando” de Sarney, a lei foi atropelada e o belíssimo prédio do antigo Convento das Mercês, encravado numa área de aproximadamente 10.300 metros quadrados, construído no século 17 e inscrito nos Livros do Tombo Arqueológico e do Tombo de Belas Artes desde 1974, deixou de ser do povo maranhense para pertencer ao patrimônio de uma fundação particular, que mal existia quando da doação e hoje funciona para atender aos interesses de Sarney e dos seus. A citada Fundação José Sarney foi criada há pouco mais de 15 anos, com o pomposo nome de Fundação da Memória Republicana. Na época, Sarney deixava a Presidência da República com a popularidade baixíssima, resultado de um governo marcado por graves denúncias na área administrativa e uma política econômica que deixou o país à beira do caos e com a maior inflação da história do Brasil. (EA)
cussão no Maranhão, pois a maioria dos órgãos de comunicação do Estado serve aos interesses da oligarquia. Mesmo assim, está provocando indignação entre aqueles que dela tomam conhecimento.
VANTAGENS O presidente da CUT maranhense, Nivaldo Araújo Silva, observa que o esquema Sarney tem como característica principal “confundir o público com o privado, usando o setor público para tirar vantagens políticas e também vantagens pessoais, caso da doação desse imóvel, feito ao arrepio da lei, para beneficiar uma fundação
que serve apenas a interesses particulares”. Ele acrescenta que é preciso divulgar essa ilegalidade para que a população maranhense possa se indignar e se posicionar. A iniciativa do Ministério Público Federal é de agosto do ano passado, e foi motivada por informações colhidas para um procedimento administrativo iniciado desde de 1995, e que não tratava diretamente sobre a doação do imóvel. Foi a partir daí que os procuradores, todos com menos de três anos de atuação no Ministério Público Federal, tomaram conhecimento da ilegalidade. Foi o deputado estadual Ader-
son Lago (PSDB-MA) quem levou o caso a público em maio. Depois de fazer a denúncia na tribuna da Assembléia Legislativa do Maranhão, Lago apresentou um projeto para que as duas leis estaduais que possibilitaram a doação fossem revogadas. O deputado oposicionista lembra que, além da legislação, a Constituição do Estado também proíbe a doação ou venda de prédios públicos tombados. “A doação do Convento das Mercês é uma seqüência de ilegalidades que precisam ser imediatamente sanadas”, argumenta o parlamentar na justificativa do seu projeto de lei.
No Convento das Mercês, cemitério particular Dez anos depois, os objetivos da fundação começaram a aparecer e a instituição mudou de nome, passando a se chamar Fundação José Sarney. A escritura, com o novo nome, foi lavrada em 15 de fevereiro de 2000 e, só para não perder o costume de fazer tudo em família, foi feita em um cartório de uma irmã de Sarney. A fundação tinha lindas finalidades (veja box), todas fantasiosas, posto que nunca foram levadas à prática. Entre o que está no estatuto e a realidade só pode ser atribuído ao delírio mitômano de Sarney, pois quase nenhuma delas foi alcançada. Simplesmente porque a maioria nunca fez parte da rotina da dita fundação. Na prática, ela aluga o prédio doado pelo Estado para eventos. Para os que visitam o Convento, o que tem para ser visto de interessante é a belíssima arquitetura da antiga construção, localizada entre os bairros do Desterro e da Praia Grande, numa das áreas mais bonitas de São Luís, cidade que tem o título, dado pelo Unesco, de Patrimônio Cultural da Humanidade. Fora disso, quase nada. Toda esta beleza arquitetônica é utilizada na tentativa de dar algum charme ao acervo pessoal de Sarney, que lá está guardado e exposto à visitação. E é por conta desse acervo e de interesses particulares do culto à personalidade que a fundação ainda consegue gordos contratos junto ao poder público.
DINHEIRO PÚBLICO Em janeiro do ano passado, a Gerência de Estado da Cultura do Maranhão assinou um convênio de quase R$ 1 milhão (precisamente R$ 960 mil), dinheiro dado ao longo de um ano, para, entre outros objetivos, preservar e divulgar a “obra de José Sarney”.
Dinheiro público do Maranhão gasto com um senador eleito pelo Amapá, que age como Odorico Paraguaçu e, nos seus devaneios, imagina que as pessoas lhe enxergam como Churchill; ou de alguém que escreve como Sarney e acha que é lido como Garcia Marques; ou de um político que após lutar contra eleições diretas, se elege vice-presidente da República pelo voto indireto e, com um cinismo que beira o ridículo, se comporta como se tivesse chegado à Presidência pelo voto popular, carregado nos braços do povo para fazer a transição democrática.
MAUSOLÉU Ele que, nas três únicas vezes que conquistou mandato majoritário no Maranhão, foi com o
apoio de uma ditadura. Enfim, o patrimônio do cidadão maranhense foi doado de forma irregular para atender à vaidade desse caricatural personagem político. E é no prédio do Convento das Mercês que Sarney pensa em instalar o seu mausoléu. Lá já está definido o local onde pretende um dia ser enterrado. Resta saber se a lei vai prevalecer e se as instituições brasileiras se farão respeitar. Caso isso aconteça, o prédio voltará a ser do Estado, e Sarney poderá até ter que desistir de fazer do patrimônio público do cidadão maranhense seu cemitério particular. Do contrário, este será mais um caso que reforçará a tese de que lei no Brasil só serve para pobre e ladrão de galinha. (EA)
Emílio Azevedo
“Houve uma ilegalidade. Foi violada uma norma. A lei é clara e impede que um bem público tombado seja doado para uma instituição privada. Por isso a nossa ação pedindo que essa doação seja anulada e esse imóvel retorne ao patrimônio do Estado”, afirma a procuradora federal Carolina da Hora Mesquita. Ela, junto com outros três procuradores federais, Marcílio Nunes Medeiros, Juraci Guimarães Júnior e Pedro Jorge do Nascimento Costa, assinam a ação civil pública que trata da questão do antigo prédio do Convento das Mercês. A superintendente do Iphan no
Convento das Mercês, localizado numa das áreas mais bonitas de São Luís (MA)
Fundação: um castelo de mentiras A Fundação José Sarney foi criada com lindos objetivos, que nunca foram atingidos. Entre eles: • estudar o exercício da cidadania, a história do Brasil e os problemas brasileiros; • promover o desenvolvimento do homem e da terra maranhenses; • promover a amizade entre os povos da América Latina e dos povos de língua portuguesa e proteger e divulgar o seu patrimônio histórico e cultural; • formar técnicos de arquivos, bibliotecas e museus; • incentivar a criação artística, literária e a pesquisa científica; • realizar estudos, pesquisas e projetos didáticos, técnicos e culturais.
Ano 3 • número 117 • De 26 de maio a 1º de junho de 2005 – 9
SEGUNDO CADERNO CUBA
A política como prática da solidariedade João Alexandre Peschanski e Jorge Pereira Filho da Redação
O
povo brasileiro está convidado para definir os rumos do socialismo cubano. A 13ª Convenção Nacional de Solidariedade a Cuba, que ocorre em São Paulo, de 25 a 28 de maio, não é um espaço de mera discussão. José Estévez Hernández, diretor do Instituto Cubano de AmiInstituto Cubano zade com os Pode Amizade com os Povos – Entidavos, explica: “A de que coordena as mídia burguesa relações com organizações sociais de diz que o socia138 países que se lismo é dogmátisolidarizam com a co e fechado em população cubana. si mesmo. Na verdade, não há nada mais aberto. O socialismo cubano é uma construção constante, que depende da colaboração de outros povos”. Segundo Hernández, a solidariedade com Cuba é um sentimento mútuo e dinâmico. Define-se pelo apoio internacional da resistência do povo da ilha caribenha em relação às agressões do governo estadunidense e pela apropriação, em diferentes países, da alternativa social que os cubanos desenvolvem. Desde 1962, três anos após a revolução cubana, os Estados Unidos impõem um embargo econômico ao país, que ameaçam invadir.
Arquivo Brasil de Fato
Convenção em São Paulo propõe aproximação de brasileiros e cubanos; apoio de Bush a terrorista será tema de debates
Evento em São Paulo quer saldar laços de solidariedade e apoio internacional à resistência do povo cubano há mais de 40 anos resistindo ao bloqueio estadunidense
A Convenção pretende estimular as iniciativas de solidariedade à ilha em todo o Brasil. O evento também vai ser um espaço de debate sobre a revolução cubana. Estão previstas falas do economista Osvaldo Martínez (leia entrevista abaixo) e Abel Sardiña, editor da
Carriles: o Bin Laden tropical O terrorista cubano Luis Posada Carriles, de 77 anos, é um dos criminosos mais procurados da América Latina. É acusado de crimes em Barbados, Cuba, Honduras, Nicarágua, Panamá e Venezuela. Suas principais motivações são a derrubada do governo de Fidel Castro, que já tentou assassinar, e o fortalecimento da influência dos Estados Unidos no continente. Para suas ações, recebeu treinamento da Central de Inteligência dos Estados Unidos (da sigla em inglês, CIA). “É um Osama Bin Laden dos trópicos, pois foi formado pela CIA para tornar-se terrorista”, comenta José Estévez Hernández, do Instituto Cubano de Amizade com os Povos.
agência de notícias Prensa Latina Internacional, entre outros.
TERRORISMO Um dos principais tópicos de discussão da Convenção deve ser o terrorismo – e a dubiedade da política externa do governo estadunidense em relação ao fenômeno. “O presidente George W. Bush diz que orienta sua ação internacional contra o terror, incluindo ataques, como no caso do Afeganistão e Iraque. Ao mesmo tempo, acoberta um dos maiores terroristas latino-americanos em seu território”, afirma Julio Espinosa, coordenador da Comissão de Relações Internacionais da Assembléia do Poder Popular de Cuba. Refere-se a Luis Posada Carriles, a quem o governo estadunidense dá guarida. Carriles é acusado de
Para o economista Osvaldo Martínez, participante da 13ª Convenção Nacional de Solidariedade a Cuba, o socialismo cubano está passando por uma nova fase, com mais articulações e propostas internacionais e melhores condições internas. Em entrevista ao Brasil de Fato, ele destacou a necessidade de resistir ao governo estadunidense. Brasil de Fato – Como tem sido a ampliação da Alba, tanto na implementação de novos acordos entre Cuba e Venezuela como no debate firmado no continente? Osvaldo Martínez – Há uma situação política diferente na América Latina, que abre possibilidades que não existiam há 5 anos. Hoje, temos um governo revolucionário como capacidade comercial, como o venezuelano Hugo Chávez, detentor de um recurso estratégico importante como o petróleo. Houve vitórias eleitorais no Brasil, Argentina, Uruguai, a nova vitória em Equador, e Cuba manteve sua resistência. Governos neoliberais estão cambaleando. Surgiram idéias novas como a da Alternativa Bolivariana para as Américas (Alba). Uma vez que a Área de Livre Comércio das Américas (Alca) recebeu golpes – mas ainda não está derrotada –, chegou o momento de despertar para essa possibilidade. É bom porque os adversários da esquerda nos dizem que somos capazes para criticar, mas incapazes de propor alternativas. As novas idéias partem de um sonho de integração latino-americana do século 19 que, agora, é mais fundamental. Sozinha e dividida, a América Latina não pode ser capaz de se fazer sentir em uma economia
mundial. Mas a visão de integração do continente sempre esteve focada na expansão do comércio entre os países. É uma visão estreita e falsa, pois muitas vezes o crescimento do comércio é apenas o crescimento das trocas entre filiais de transnacionais. A Alba parte da idéia que a integração deve resolver velhos problemas sociais na América Latina. Pode-se avançar na redução da dívida social, como o analfabetismo, a saúde e o da informação – ou seja, dispor de fontes próprias de informação e não ficar dependente da CNN para saber o que passa no Equador. Trata-se de uma integração baseada nos princípios de cooperação e solidariedade que não exclui os benefícios econômicos mútuos de cada país. BF – Em novembro de 2004, o governo de Cuba acabou com a dolarização de parte da economia do país. Qual é o resultado? Martínez – Até o momento, é positivo. O único que saiu enfraquecido foi os Estados Unidos, que perdeu uma arma poderosa contra Cuba. A população cubana recebeu a decisão com alegria. Em primeiro, há uma questão de auto-estima nacional, de defesa da soberania econômica em relação ao governo estadunidense, que é inimigo de Cuba. Em segundo, quebra uma distinção irritante que existia entre os poucos que tinham dólares e a maioria da população que não tinha. Essa medida do governo entra em um contexto de desenvolvimento econômico. Descobriu-se petróleo cubano. Aumentou a produção nacional. Há maiores relações comerciais internacionais, com Venezuela e
Luciney Martins/ BL45imagem
Uma nova fase do socialismo
Quem é Osvaldo Martínez é presidente da Comissão de Economia da Assembléia do Poder Popular de Cuba. Professor de economia na Universidade de Havana, ele foi ministro do Planejamento e da Economia, em 1995. China. Melhorou a capacidade de consumo da população. Há mais investimentos em tecnologia, como software nacional. BF – Qual é o impacto desse desenvolvimento na construção do socialismo em Cuba? O socialismo cubano é um conjunto das alternativas que Cuba constrói com seus apoiadores, como a Alba, e das atividades do cotidiano. O capitalismo se baseia em automatismos, a manutenção constante da lógica do mercado. O socialismo é uma construção humana, uma criação permanente, com um objetivo claro: o bemestar de todos os homens. Com base nisso, define-se o rumo da economia e política. (JAP e JPF)
participar de um atentado contra um avião cubano que deixou 73 mortos, em 1976. Ele estava preso no Panamá, mas a então presidenta do país, Mireya Moscoso, lhe concedeu um indulto, em agosto de 2004, como último ato de seu governo. Depois disso, Carriles teria entrado nos Estados Unidos pela fronteira com o México.
EXTRADIÇÃO O presidente cubano, Fidel Castro, exige a punição do terrorista e conta com a solidariedade do presidente venezuelano, Hugo Chávez, que, em 13 de maio, pediu a extradição de Carriles para a Venezuela. O terrorista também esteve preso em Caracas por nove anos em virtude de ações criminosas que realizou na América Latina.
Se Bush não entregar o terrorista, Chávez ameaça romper relações diplomáticas com os Estados Unidos. O presidente venezuelano solicitou a extradição com base em acordos entre os dois países em vigor desde 1922. Bush tem 60 dias para entregar Carriles. Pressionado, o governo estadunidense anunciou, no dia 17, que havia prendido o terrorista. “Mas mesmo preso, Carriles está sendo tratado como um rei. Talvez o pior criminoso que a América Latina já tenha visto está sendo tratado com as honrarias destinadas a autoridades”, diz Espinosa A maioria das atividades da Convenção vai ocorrer no Instituto Sedes Sapientiae, na Rua Ministro de Godói, 1484, São Paulo. Detalhes no endereço: www.13cnsc.kit.net.
BOLÍVIA
Mais protestos em La Paz da Redação A insatisfação popular na Bolívia continua empurrando diversos setores sociais para a mobilização. Dia 23 de maio, o principal dirigente da oposição, Evo Morales, liderou uma marcha pela unidade do país e contra qualquer tentativa de golpe de Estado. Cerca de 15 mil camponeses indígenas caminharam 200 quilômetros até chegar à capital. O Movimento Ao Socialismo (MAS) deu prazo de até o próximo dia 30 para o Congresso convocar uma Assembléia Constituinte. “Quando se trata dos problemas da oligarquia, o Congresso resolve a questão em um dia, mas o mesmo não ocorre quando falamos de modificações profundas, com princípios de equilíbrio”, avaliou Morales sobre a demora dos parlamentares em convocar a Assembléia – compromisso assumido com o povo em outubro de 2003, na derrubada do presidente Gonzalo Sánchez de Lozada. Houve, também, outra manifestação numerosa em La Paz, detonada por vendedores ambulantes, sindicalistas e mineiros que reivindicaram a nacionalização dos hidrocarbonetos. Em El Alto, porção pobre da capital boliviana, o sindicato dos comerciantes iniciou uma paralisação temporária e, junto com professores em greve por melhores salários, mantém um bloqueio das principais vias que cortam La Paz.
DEMANDAS O estopim desse novo levante popular foi a aprovação de uma lei que eleva para 18% a cobrança de
royalties (direito de licença) sobre os lucros das petrolíferas, como a estatal brasileira Petrobras, e para 32% os impostos cobrados. Setores da esquerda bolivana, como o MAS, defendem que os royalties sejam de 50%. Já a Central Obrera Boliviana (COB) quer a nacionalização do negócio do gás e do petróleo. Há também divergências sobre que estratégia seguir. O MAS é a favor da pressão sobre o Congresso, enquanto a COB exige o fechamento do Parlamento e a expulsão do presidente Carlos Mesa. As Forças Armadas, por sua vez, rejeitaram os boatos de que estaria sendo articulado um golpe militar contra o presidente Carlos Mesa. Ativistas de El Alto afirmam que Hormando Vaca Diez, presidente do Congresso, seria um dos responsáveis da trama. Em comunicado, os militares disseram ainda que não vão permitir nenhuma decisão que viole a Constituição. Foi um recado a outro expediente da direita para manter seus benefícios. A elite de Santa Cruz, os cruceños, convocou um referendo sobre a autonomia da província para 12 de agosto. A oligarquia de Tarija, onde fica a mais importante reserva de gás da América do Sul, também fez o mesmo. Ambas as iniciativas tentam aprovar uma legislação que garanta autonomia às províncias e não as obrigue a adotarem possíveis conquistas que os movimentos sociais possam ter em uma Assembléia Constituinte, como o direito dos indígenas de se beneficiarem da extração do gás. (Com agências internacionais)
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AMÉRICA LATINA LIVRE-COMÉRCIO
Equador ainda sob a mira dos EUA Pedro Carrano de Quito (Equador) Especial para o Brasil de Fato
Rodrigo Buendia
Novo presidente ainda não definiu estratégia de negociação com Bush; 200 mil agricultores quebrariam com acordo América Latina, sobretudo na fronteira entre Colômbia e Equador.
PATENTES
O
Equador assistiu, dia 26 de abril, à mais recente negociação do Tratado de Livre Comércio (TLC) entre os Estados Unidos e os três outros países andinos (Bolívia, Peru e Colômbia) apenas como ouvinte, por uma casualidade. De certa forma, a destituição do ex-presidente Lucio Gutiérrez interrompeu o trabalho da equipe negociadora, mas é certo que o antigo governo deixou a assinatura do acordo adiantada e, até o momento, há poucos sinais para saber qual rumo o novo presidente, Alfredo Palacios, vai dar para as negociações. A mídia corporativa e grandes empresários sustentam o conhecido discurso de que “não há outra alternativa” para o país, senão o TLC. O discurso, porém, não ameniza os problemas que o Equador tem enfrentado ao longo das negociações. Os Estados Unidos são irredutíveis em temas importantes como agricultura, sobretudo porque não pretendem reduzir os elevados subsídios dados a seus produtores. Como o acordo só vale se for firmado em todos os seus pontos, concentrar o debate em um só tema pode inviabilizar o TLC.
DEMOCRACIA? A população, até agora, não teve o direito de opinar sobre o tema. O atual governo levanta a possibilidade de convocar um plebiscito, algo rechaçado por empresários,
Movimentos sociais andinos lançam campanha para esclarecer a população sobre o perigo dos tratados de livre-comércio
pois, segundo eles, a discussão poderia se tornar “ideológica”. Certo é que os campesinos e povos originários não podem ser deixados alheios ao processo, mesmo porque sua produção é, em maior parte, voltada para o mercado interno e a enorme variedade de grãos e tubérculos (algo típico dos países andinos) estaria sujeita a interesses externos.
Segundo Jose Encalada, da Confederação Nacional Camponesa, cerca de 200 mil produtores de arroz quebrariam com a firma do tratado. No caso do milho, das 600 mil toneladas consumidas no país, 400 mil provêm do mercado interno. Mas os Estados Unidos querem colocar 400 mil toneladas do seu milho no Equador – toda a produção interna seria afetada.
Encalada acrescenta: “Na agricultura o problema não é técnico, mas sim de subsídio. E não há apoio do nosso governo para a agricultura campesina. Os camponeses não conseguem cobrir os seus custos de produção, mas a transnacional sim”. Para o governo estadunidense, além dos interesses econômicos, existe também a urgência de implantar sua política militar na
A propriedade intelectual é outro tema atenta à diversidade biológica e à soberania do Equador. Antes do ano de 1993, o país não possuía patente de medicamentos, mas foi pressionado pelos Estados Unidos para que incluísse essa área como tema para a lei de patentes. “Temese que os acordos imponham ao Equador um regime de propriedade intelectual que incremente o preço dos medicamentos para o conjunto da população e impeça que haja suficiente margem política para proteger o direito das pessoas a ter acesso a serviços de saúde”. Com o TLC, indústrias farmacêuticas podem patentear várias matériasprimas, mesmo as que já são conhecidas pelos povos originários. Na voz de ativistas, o TLC coloca-se acima de instituições nacionais e traz uma política divisionista na região andina. Na Bolívia, por exemplo, o país mais cuidadoso até agora nas negociações – também classificado de “atrasado” pela grande mídia –, o discurso do possível isolamento é moeda corrente. O caso do Equador é sintomático e seus efeitos vão ser sentidos da mesma maneira nos outros países vizinhos. Os movimentos sociais devem conseguir um protagonismo nesse debate, mesmo porque a alimentação nos Andes não é um tema econômico. É cultural. (Leia mais sobre patentes de medicamentos na página 3)
ANÁLISE
Silvia Ribeiro Sem discussão, em um processo similar ao que ocorreu com a votação da lei Monsanto de “bioinsegurança”, os senadores mexicanos aprovaram, dias 27 e 28 de abril, duas leis que instrumentalizam a privatização dos recursos genéticos e a concessão de patentes sobre conhecimentos tradicionais indígenas. A medida não é surpreendente. Condiz com a brutal “blindagem legal” que o Congresso está fazendo para assegurar a privatização dos recursos estratégicos mexicanos. Já foram aprovadas, com participação de todos os partidos, a Lei Nacional de Águas (abrindo as portas para as empresas), a Lei Monsanto (liberando transgênicos) e outras normas, complementadas com programas governamentais ou normas oficiais. Mas essa postura não deixa de ser terrível, mais ainda quando o abuso dos termos parece ser algo rotineiro para os legisladores. Tudo ocorre em nome do “desenvolvimento sustentável” (será o das transnacionais?) e do “progresso”, em particular das comunidades camponesas e povos indígenas, paradoxalmente os que mais sofrem o impacto dessa lei.
PIRATAS MODERNOS A iniciativa da Lei de Acesso e Aproveitamento dos Recursos Genéticos segue as diretrizes que as transnacionais definiram no Convênio da Diversidade Biológica das Nações Unidas, feito com o objetivo de transformar biopirataria em “bioprospecção”. Mediante contratos e pagamento de umas moedas a quem aceitar vender o patrimônio comum em nome de todos, a biopirataria ascenderá à categoria de “desenvolvimento científico”, com fins comerciais diretos ou indiretos. O mais importante, no entanto, é que essa prática ganhará valor legal. Trata-se de uma decisão ao estilo
CMI
A legalização da biopirataria no México do sua venda e, posteriormente, patenteamento. A lei estabelece que, para definir quem são os “legítimos proprietários ou possuidores”, deverá ser consultada a Procuradoria Agrária. Mas, apenas em 2004, segundo estatísticas do próprio órgão, havia 62,7 mil demandas por reconhecimento de posse. A tendência é que esse número cresça com a promulgação da lei. Não somente vai se legalizar a biopirataria e o fim da biodiversidade, também se provocará conflitos entre comunidades por quem chegou primeiro a vender os recursos comuns.
BIODIVERSIDADE
Estudantes mexicanos em mobilização contra a política neoliberal do presidente Vicente Fox
do que fez a coroa inglesa do século 16. A corte, em vez de condenar o famoso pirata Francis Drake, deulhe apoio oficial e nomeou-o sir em troca de uma parte do saque. Se aprovada também na Câmara dos Deputados, a lei estabelecerá que quem quiser explorar, investigar, usar, patentear e aplicar comercialmente os recursos genéticos (tais como plantas e animais silvestres, microorganismos, fungos, insetos) poderá fazer, desde que previamente o “legítimo possuidor ou proprietário do terreno onde se encontra o recurso biológico” consentir, em um contrato de bioprospecção. Esse documento deve incluir cláusulas para uma suposta “divisão dos benefícios”. Como Drake, isso é o que já faziam muitas empresas transnacionais junto a universidades nacionais ou estrangeiras e com a mediação de ONGs internacionais (por exemplo, WWF, Conservação Internacional, The Nature Conser-
vancy) ou algumas ONGs locais que vêem na biopirataria uma “receita extra” para as comunidades.
RESISTÊNCIA Ocorre que os quatro contratos de biopirataria mais extensos e denunciados no México foram cancelados ou não renovados graças às denúncias e aos fortes protestos de comunidades e de organizações civis, e ao ambíguo marco legal que existia sobre o tema. São eles: o projeto ICBG Maya em Chiapas, entre a Ecosul, a Universidade da Geórgia e a empresa Molecular Nature; o ICBG Zonas Áridas, entre a Universidade do Arizona, o Jardim Botânico da Universidade Autônoma do México (Unam) e a empresa Wyeth; o projeto Biolead em Oxaca, entre a Novartis e a associação ERA; e a bioprospecção de enzimas do Instituto de Biotecnologia da Unam e Diversa Corporation. A Lei dos Recursos Genéticos pretende eliminar, justamente, a
característica ambígua da legislação mexicana. As transnacionais não poderão evitar a denúncia e a resistência, mas usando o expediente da “divisão dos benefícios” podem conseguir jogar uma comunidade contra outra ou simplesmente calá-las. Outro aspecto é que a lei aceita que os recursos genéticos – ou suas derivações – possam ser patenteados, ou seja, privatizados, sem discriminar se são recursos coletivos e públicos, parte dos territórios dos povos indígenas ou produto do trabalho e conhecimento coletivo dos camponeses e indígenas. Os senadores dizem reconhecer esse fato, já que esses devem “ser consultados” e confirmarem seu consentimento, desde que sejam “os legítimos possuidores ou proprietários”. Por exemplo: no caso de uma planta medicinal presente em várias regiões, uma comunidade se diz proprietária do recurso genético e pode firmar um contrato autorizan-
Da mesma forma perversa, os senadores votaram alegremente que também poderão ser vendidos e patenteados os “conhecimentos tradicionais e coletivos” sobre a biodiversidade. Além disso, modificando a Lei de Propriedade Industrial, criam um Registro Nacional sobre o Conhecimento Tradicional vinculado aos recursos biológicos, e a Medicina Tradicional Indígena, que colocará à disposição das empresas transnacionais os conhecimentos indígenas sistematizados. Às comunidades, será outorgado “o direito” de registrá-los e, aos indivíduos, o de patenteá-los. Tanto o Terceiro Congressso Nacional Indígena, em 2001 – que teve a participação de mais de 3 mil delegados de praticamente todos os povos do México – como os fóruns de médicos tradicionais indígenas já manifestaram sua clara oposição à biopirataria, à bioprospecção e ao patenteamento dos seres vivos e conhecimentos. Ao que parece, esses não contam como “legítimos possuidores” de conhecimentos nem de territórios, já que os senadores sabem melhor do que eles o que lhes convém. Igual ao que passou com a contra-reforma da lei sobre direitos e culturas indígenas. Silvia Ribeiro é investigadora do Grupo ETC www.etcgroup.org
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INTERNACIONAL UZBEQUISTÃO
Direitos violados são a origem da revolta Gustavo Capdevilla de Genebra (Suíça)
A
revolta popular e a repressão por parte do governo, com centenas de mortos na cidade de Andiján, no leste do Uzbequistão, confirmaram as preocupações da comunidade internacional pelas violações dos direitos humanos nesse país da Ásia Central. O Uzbequistão vive sob uma ditadura – nas prisões há mais de seis mil presos políticos e a situação dos direitos humanos é deplorável, resumiu em Genebra a advogada Nozima Kamalova, presidente da organização não-governamental Sociedade de Assistência Legal, com sede em Tashkent, a capital uzbeka. A sociedade civil do Uzbequistão reclama dos governos ocidentais que pressionem o governo para que respeite os direitos humanos, disse a ativista. Esse país, que obteve a independência em 1991 depois do desaparecimento da União Soviética, tem sido desde então ferreamente governado pelo presidente Islam Karimov, que primeiro proibiu toda oposição e, depois, começou a reprimir a religião, contou Nozima, que integrou uma delegação de ativistas humanitários uzbekos em visita a Genebra. Karimov teve apoio ocidental, em particular do governo de George W. Bush, que necessitava de aliados nessa região da Ásia Central quando realizou, no final de 2001, a invasão do Afeganistão. Os episódios dos dias 14 e 15 de maio em Andiján, uma próspera cidade localizada na fronteira com o Kirguiztão, deixaram uma quantidade de vítimas ainda incerta.
SEM INFORMAÇÕES Rolin Wavre, chefe da delegação do Comitê Internacional da Cruz Vermelha em Tashkent, afirmou que é extremamente difícil ter uma idéia precisa do número de mortos ou mesmo conseguir informação sobre o que realmente aconteceu. Entretanto, as organizações não-governamentais uzbekas que
Viktor Drachev
Ativistas humanitários denunciam abusos do governo ditatorial, que mantém mais de seis mil presos políticos
UZBEQUISTÃO Localização: Centro-Oeste da Ásia Nacionalidade: Uzbeque. Cidades principais: Tashkent (2.107.000), Samarqand (362.000), Namangan (362.000) (1995). Línguas: uzbeque (oficial), russo Divisão administrativa: 12 regiões e 1 república autônoma (Karakallpakstan) População: 24,3 milhões (2000), sendo uzbeques 71%, russos 8%, tadjiques 5%, cazaques 4%, outros 12% (1996) Moeda: sum Religiões: islamismo 88% (sunitas), cristianismo 1% (ortodoxos russos), outras 11% (1997) Revolta popular no Uzbequistão põe em xeque ditadura apoiada pelos Estados Unidos
chegaram à Genebra, convidadas pela Organização Mundial Contra a Tortura (OMCT), mencionaram um número superior a 500 mortos. Muitas vítimas foram mulheres e crianças, porque os soldados do governo abriram fogo contra eles, afirmou Dilshad Tillamodjaev, do não-governamental Centro para as Iniciativas Democráticas, com sede em Adiján. “Karimov garantiu que não ordenou que os soldados disparassem contra os manifestantes, mas, isso não é certo”, afirmou Tillamodjaev. O governo aumentou para 169 o número oficial de mortes. Segundo fontes jornalísticas russas, o partido de oposição, Ozod Dekhoniar (Camponeses Livres), contabilizou 745 vítimas – 542 em Andiján e 203 entre a população aldeã de Pakhtaabad. A revolta popular de Andiján tem raízes nas insurreições dos últimos tempos contra os governos de outras ex-repúblicas
soviéticas como Geórgia, Ucrânia e Kirguiztão, disse Kamalova. Em Andiján se vive um clima particular porque se trata da cidade de economia mais florescente do país, sustentada principalmente por sua indústria automotriz e pelo surgimento de uma sólida classe média, desconhecida no resto do Uzbequistão, explicou a advogada. Em Tashkent nunca se repetiria uma explosão popular semelhante porque a capital do país de mais de dois milhões de habitantes “é muito conservadora”, ressaltou Kamalova. Entretanto, Tillamodjaev disse que em qualquer região do país pode ocorrer um episódio semelhante por causa da crise política, econômica e social existente no Uzbequistão. Um estudo divulgado esta semana pelo Fundo Monetário Internacional diz que a pobreza afeta 27,5% da população, cerca de 6,8 milhões de pessoas. Laetitia Sédou, coordenadora para
a Europa da OMCT, disse que uma das categorias de violações dos direitos humanos no Uzbequistão é a que afeta os grandes grupos da população, incluídas mulheres e crianças, em particular nas províncias do país.
ABUSOS CONTRA RELIGIOSOS A outra esfera principal de direitos humanos desconhecidos é a que inclui os abusos contra membros de organizações religiosas, especialmente muçulmanas, consideradas como grupos terroristas. No mesmo contexto se situam os ataques contra defensores dos direitos humanos a partidos políticos e jornalistas de atividade mais destacada, afirmou Sedou. O clima de efervescência em Andiján começou com a detenção, no ano passado, de 23 empresários de sucesso, presos sob acusações relacionadas com sua fé religiosa, disse Kamalova. O protesto estourou na noite
de 12 para 13 de maio, quando um grupo de homens armados invadiu a prisão de Andiján para libertar os empresários muçulmanos, acusados de “extremismo islâmico” porque cumpriam o preceito da caridade estabelecido por sua religião, contou a advogada. Junto com os 23 empresários também foram soltos outros 1.200 presos, segundo um relatório da Anistia Internacional. Horas depois, houve o incidente mais grave, quando os soldados cercaram uma multidão concentrada na praça principal da cidade que reclamava justiça, liberdade e o fim da pobreza. A Anistia disse que os informes se referiram a uma troca de fogo entre civis armados e soldados e a tiros disparados contra a multidão. Kamalova insistiu em que Karimov foi quem deu a ordem para os soldados atirarem. “Creio que esse é o começo do fim para o governo”, ressaltou. (IPS/Envolverde, www.envolverde.com.br)
ANÁLISE
Marie Nassif-Debs Muitos libaneses se perguntam se não estamos à beira da guerra civil, ou se o conflito que vem ocorrendo na classe política (confessional) não passa de uma farsa que terminaria com algumas cadeiras a mais no parlamento – que seria imposto graças às forças que exercem tutela sobre o país. O Líbano, uma República das Bananas? Não se vêem, desde a criação da Primeira República, nos anos 20, deputados e presidentes “eleitos” e ministros nomeados somente porque são maronitas, sunitas, xiitas, greco-ortodoxos etc. (Temos 18 confissões religiosas que partilham nossos direitos de cidadãos!). Não se vêem, desde a criação da Segunda República, com o acordo de Taëf (1989) leis eleitorais bizarras que nos dividem e nos unem ao bel-prazer deste ou daquele chefe confessional? Não somos o único país onde os chefes religiosos fazem as leis e os políticos o cortejam? Não somos também o único país em que o chefe de um Partido Socialista representa uma confissão religiosa, enquanto seus militantes na quase totalidade são dessa confissão? Não somos o único país “democrático” onde se usa e se abusa do dinheiro para comprar consciências, com o consentimento da grande democracia mundial governada por George W. Bush?
Hoje, continuamos a sofrer a síndrome de 30 anos de guerra civil, de partilha, de tutela síria imposta pelos Estados Unidos. Mal terminamos a presença militar, econômica e política síria e já nos vemos prestes a nos dilacerar, sob o olho vigilante dos novos tutores estadunidenses, sauditas e franceses, por uma cadeira no Parlamento, votando no deputado que representa essa ou aquela confissão religiosa nessa ou naquela circunscrição. O acordo de Taëf previa o fim do confessionalismo político, mas os deputados continuam correndo atrás dos chefes religiosos. Em Bkerké, sede do patriarcado maronita, há indignação porque os aliados de ontem (como Walid Jumblatt, líder dos drusos) romperam com a coalizão cristã Kornet Chahouane, e se associaram aos adversários xiitas do Hezbollah e do Amal. Em Koraitem, residência da família do falecido presidente do Conselho (primeiro-ministro) Rafic Hariri, as pessoas se felicitam porque as futuras eleições na capital já estão praticamente terminadas, antes de terem começado, pois só restam alguns pontos de desacordo e já temos dois deputados de Beirute “eleitos por unanimidade”, pois ninguém se apresentou para disputar as eleições com eles; e nos anunciam (felizmente) que há negociações para fazer desistirem os que disputam as cadeiras restantes de Beirute, pois têm o apoio da
Arábia Saudita, o que levaria os sunitas a se abster. No Sul do país, os dois bulldozers xiitas, o Amal e o Hezbollah, já fizeram a partilha e teriam até escolhido dois dos três representantes maronitas, deixando apenas um para a escolha do patriarca maronita. No Monte Líbano, está se formando uma aliança entre o Partido Socialista do druso Walid Jumblatt; o Movimento do Futuro, de Hariri; a Jamaa islamiyya (partido fundamentalista sunita), as Forças Libanesas (partido fundamentalista cristão até há pouco próximo de Israel), o Amal e o Hezbollah. Essa mesma aliança, à qual se precisaria acrescentar o deputado Sami Khatib, próximo dos sírios, poderia partilhar as seis cadeiras do Beqaa Ocidental. Quanto ao restante, entre o Beqaa e o Norte, já se poderá ver o que vai ocorrer no campo das alianças num futuro muito próximo. Pobre Líbano! Pobres libaneses, sobretudo os jovens, que tinham acreditado naqueles que se uniram contra sua própria natureza, da direita fascista à esquerda dita democrática, e que, no dia 14 de abril, alardeavam a unidade nacional brandindo o Alcorão e a Cruz! Marie Nassif-Debs é jornalista do diário francês L´Humanité, www.humanite.presse.fr, veículo parceiro do Brasil de Fato
France Presse
Líbano: uma República das Bananas?
Libaneses protestam contra campanha militar estadunidense no Oriente Médio
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INTERNACIONAL AFRO-LATINOS
Pobreza dos negros fica em segundo plano Diego Cevallos Cidade do México (México)
Alex Silva/ AE
Apesar da forte presença na região, afrodescendentes não recebem atenção necessária em fóruns internacionais
A
população negra da América Latina e do Caribe é quase quatro vezes maior do que a indígena, mas sua situação de pobreza e discriminação permanece atrás dos bastidores, apesar de ser igual ou maior do que dos povos originários da região. É que, ao contrário dos indígenas, calculados em cerca de 40 milhões, os 150 milhões de afrodescendentes têm pouco poder político e sua situação recebe menos atenção em fóruns internacionais e pesquisas acadêmicas. Os estudos disponíveis indicam que mais de 90% da população descendente dos escravos trazidos da África para a América na época colonial são pobres, têm acesso apenas aos empregos de menor remuneração e contam com baixo nível de instrução. Além disso, são sujeitos a uma aguda discriminação por causa da cor da pele. “Os negros continuam os mais excluídos. São, em geral, a última roda do carro, depois até mesmo dos indígenas”, disse Quince Duncan, da Comissão Científica do programa A Rota do Escravo, do Fundo das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (Unesco). Uma pesquisa de 2001 feita pela Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal) conclui que “a população afro-latina e afrocaribenha”, que chega a quase 30% do total de habitantes da região, é de “alta densidade e pouca ressonância”. Embora somem 150 milhões de pessoas, a maioria concentrada no Brasil, na Colômbia e na Venezuela, chama a atenção a tênue presença política dessa comunidade, seu pouco acesso a instâncias de governo, bem como a falta de dados completos sobre sua situação econômica, diz o estudo da Cepal intitulado “Discriminação Étnicoracial e Xenofobia”. Existe uma “invisibilidade do problema negro”, concluiu esse estudo. No Brasil, a população branca é 2,5 vezes mais rica do que a negra; na Colômbia, 80% dos afrodescendentes vivem na pobreza extrema e, em Cuba, único país da América com sistema econômico socialista, vivem nas piores habitações e têm os trabalhos de pior remuneração,
Marginalização dos negros começa a mudar com ação dos movimentos sociais afro-latinos em países como Brasil, Equador e Colômbia
segundo pesquisas feitas nesses países. “A situação dos negros merece menos atenção do que a dos indígenas, pois chegaram à América depois da conquista européia, seus parâmetros culturais não são originários da região e sua integração ao trabalho foi mais plena e rápida”, explicou Duncan, da Costa Rica, onde reside. Na América Latina e no Caribe, “o racismo se concentra, sobretudo, nos negros, mais do que nos indígenas, e isso é evidente em toda a América, embora haja países que realizam esforços importantes para reverter a situação”, acrescentou o pesquisador.
PRECONCEITO DE FOX Duncan faz parte de um programa da Unesco, criado em 1994, que realiza estudos e promove encontros sobre a história e situação dos descendentes dos escravos africanos. O presidente do México, Vicente Fox, levantou uma onda de críticas por ter declarado dia 13 de maio que seus compatriotas fazem trabalhos nos Estados Unidos “que nem mesmo os negros aceitam fazer”. Fox
teve de pedir desculpas e se explicar para Washington, cujos porta-vozes reclamaram dessa declaração. “As críticas feitas ao presidente mexicano são justas, pois ele assumiu os estereótipos que existem sobre os negros. Porém, devemos dizer que grande parte da população da América pensa de maneira semelhante”, afirmou Duncan. No início do ano, e por iniciativa oficial, foi realizada no Equador a Primeira Pesquisa Nacional sobre Racismo e Discriminação Racial”, com 37.500 pessoas. Os resultados mostram que 65% dos entrevistados acreditam que em seu país existe racismo e 88% afirmam que os negros são os mais discriminados. No México, onde menos de 2% dos 104 milhões de habitantes são de raça negra, uma pesquisa divulgada em outubro de 2000 pelo jornal El Universal revelou que 56,6% dos consultados consideravam que em seu país existe racismo. Além disso, 61,1% disseram crer que a discriminação existe por causa da cor da pele. Estudos do Ministério da Educação do Brasil, o país com a população de origem
RUANDA
France Presse
O presidente ruandês Paul Kagame pediu à mídia internacional que não limite sua cobertura da África aos “aspectos negativos”, mas que seja “advogada e educadora”. “A África não é um amontoado de povos primitivos, de brutos selvagens prestes a se matar assim que tiver oportunidade”, disse ele, na abertura do Congresso Mundial Anual do Instituto Internacional da Imprensa (IPI), que reuniu durante três dias, em Nairóbi, no Quênia, 350 participantes de 50 países. Kagame falou diante do presidente queniano Mwai Kibaki e de Aga Khan, dirigente de um fundo que financia numerosos projetos de desenvolvimento no continente. “Em face da pobreza que debilita, do analfabetismo, dos ataques contra os direitos humanos, da degradação do ambiente e do terrorismo internacional, eu lhes peço que desempenhem seu papel, não somente de cães de guarda ou de sinal de alarme, mas de advogados e educadores no nosso projeto comum de melhorar a África e o resto do mundo”, continuou. “Provem que os profetas da catástrofe estão errados! Um mundo em que a maioria vive com menos de um dólar por
Formas de Discriminação Racial, impulsionada pela Organização das Nações Unidas, foi ratificada por quase todos os países da América Latina e do Caribe, e o compromisso de diminuir esse flagelo foi reiterado em declarações feitas em numerosas reuniões de chefes de Estado e de governo sobre o assunto. Duncan destacou, em especial, os esforços que vêm sendo feitos há vários anos pelo governo do Brasil, ressaltando que no país já existem secretários de Estado e magistrados de raça negra. O estudo da Cepal também avalia as mudanças. A marginalização dos negros “começa a mudar com a maior presença de movimentos sociais afro-latinos no Brasil, Equador, Colômbia e em outros países, que não só apresentam suas demandas nos fóruns internacionais e aos seus respectivos governos como, também, tornam mais notórias suas especificidades como grupos com identidade própria de longa trajetória”, destacou Duncan. (IPS/Envolverde, www.envolverde.com.br)
MARROCOS
Presidente pede imprensa educativa da Redação
africana mais numerosa da América Latina e do Caribe, indicam que entre os universitários apenas 2,2% são negros, contra 18% de mestiços e 80% de brancos. A porcentagem de analfabetismo no Brasil é 2,5 vezes maior entre os negros do que em outros grupos raciais. Em Cuba, onde 30% dos 11,2 milhões de habitantes são negros, o racismo continua vivo e inclusive se intensificou nos últimos dez anos, segundo estudo de 2003 feito pela Academia de Ciências, a pedido do governo de Fidel Castro. A revolução não conseguiu reduzir “as diferenças no status social e econômico da população negra do país”, reconheceu Castro em um discurso. Na Colômbia, o Departamento de Planejamento Nacional (estatal) informa que 80% dos negros do país vivem abaixo da linha da pobreza. “Mas – segundo Duncan – a situação de discriminação está mudando em toda a América Latina, pois são feitos esforços, embora ainda pequenos, para revertê-la”. A Convenção Internacional sobre a Eliminação de todas as
Presos políticos fazem greve de fome da Redação
Mídia internacional está viciada em mostrar só tragédia africana
dia não é um mundo sem perigos. O IPI tem o poder e os meios de influenciar a comunidade internacional, para que tome consciência de que a ordem mundial deve mudar”, acrescentou Kagame. O presidente queniano Kibaki, em seu discurso, disse que o Congresso do IPI “está sendo organizado este ano num dos países mais democráticos da África e do mundo, em que o governo é apegado à liberdade de imprensa e a mídia é vibrante”. O IPI havia expressado
sua “preocupação” com a decisão da Justiça do Quênia de suspender as acusações contra a mulher do presidente Kibaki, processada por um operador de câmera por destruição de equipamento – a primeira dama do Quênia irrompeu, à noite, na sede do principal grupo de mídia do país, o Nation Media Group, acompanhada de um esquadrão de guarda-costas, para contestar a cobertura “injusta” de suas atividades e as de sua família. (Com agências internacionais)
As autoridades marroquinas disseram que são “apenas” 541 os presos políticos em greve de fome, e não mais de mil, como afirmam as organizações de direitos humanos. Tratam-se de extremistas islâmicos, muitos dos quais presos depois dos cinco atentados em Casablanca, que, em 16 de maio de 2003, causaram 45 mortos, dos quais 12 homens-bomba. A greve de fome começou quando se completaram dois anos de detenção, para pedir a revisão do processo e melhoria das condições carcerárias. Segundo organizações não-governamentais, entre os grevistas também estão presos políticos que não participaram de ações violentas. Com base na nova lei contra o terrorismo, que aumenta enormemente os poderes da polícia, foram presas nos últimos dois anos cerca de 5 mil pessoas, com 2.112 processadas, 903 condenadas, das quais 17 à morte. Ao mesmo tempo, se anuncia que o Marrocos terá, em breve, uma nova base militar dos Estados
Unidos. Na região desértica de Tan Tan, uma aldeia de poucas centenas de habitantes, perto do mar, diante das Ilhas Canárias, as forças estadunidenses já instalaram pessoal e material para fins logísticos. Não há ainda nenhuma notícia sobre a efetiva utilização da nova base, posicionada numa zona estratégica, a pouca centenas de quilômetros do Saara Ocidental, com fácil acesso aéreo e por mar aos Estados Unidos, ao Mar Mediterrâneo e ao Oriente Médio. Em Tan Tan, recentemente foram realizadas manobras conjuntas entre os exércitos estadunidense e marroquino. Até agora, o único acordo militar entre Rabat e Washington se referia à cessão, aos Estados Unidos, da base de Ben Guerir, a 60 quilômetros ao Norte de Marrakech, já desativada, e que, segundo a imprensa marroquina, poderia ser desmantelada em breve, ameaçada que está pelos fundamentalistas islâmicos. Segundo o plano estadunidense, à base de Tan Tan poderiam se acrescentar bases cedidas aos Estados Unidos na Tunísia e na Argélia. (Com agências internacionais)
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AMBIENTE SOBERANIA ALIMENTAR
Lei de biossegurança é inconstitucional Luís Brasilino da Redação
Greenpeace
Idec e PV enviam representação ao Ministério Público pedindo ação contra legislação que promove transgênicos “Podemos dizer que a população estaria muito mais segura sem a lei”, lamenta Duarte. Segundo o deputado, a proposta encaminhada ao Congresso visava regulamentar o setor e proteger as pessoas, mas as alterações feitas no projeto levaram à formulação de uma legislação para promover os transgênicos. “É uma vergonha a lei ter recebido esse nome: biossegurança”, protesta.
O
Partido Verde (PV) e o Instituto de Defesa do Consumidor (Idec) lançaram mão de uma nova arma para defender a população da liberação indiscriminada de produtos e sementes transgênicas. Nos dias 17 e 20 de maio, respectivamente, enviaram representações ao procurador-geral da República Cláudio Lemos Fonteles questionando a legalidade da Lei de Biossegurança, sancionada em março pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva. As entidades esperam motivar Fonteles a mover, no Supremo Tribunal Federal (STF), uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin) contra a nova legislação. Em outras ocasiões, tanto o Idec quanto o PV já recorreram à Justiça para proibir a comercialização e o plantio de organismos geneticamente modificados (OGMs). No entanto, graças à lentidão do Poder Judiciário, nada aconteceu. As ações do Idec vêm desde de 1998 e ainda não chegaram aos tribunais superiores. O PV formulou Adins contra as três medidas provisórias (MPs) editadas pelo governo federal, em 2003 e em 2004, para liberar a comercialização e o plantio de soja transgênica. Até hoje, o STF não se posicionou sobre o assunto.
INSEGURANÇA
LEI INCONSTITUCIONAL O deputado federal Edson Duarte (PV-BA) explica que, na avaliação do seu partido, a opção pela representação ao Ministério Público Federal (MPF) pretende dar força à Adin. “Sentimos receptividade dos procuradores e optamos por enviar a representação (em vez de mover a ação por conta própria) para evitar desgaste”, afirma o parlamentar. Dulce Pontes Lima, advogada
Ventura Barbeiro, do Greenpeace, acredita que população estaria mais segura sem a lei
do Idec, confia que Cláudio Fonteles e o STF vão concordar com as suas posições: “As inconstitucionalidades são evidentes”. Segundo o Instituto, o primeiro aspecto crítico da Lei de Biossegurança é a concessão, à Comissão Técnica Nacional de Biossegurança (CTNBio), do poder de dispensar estudo prévio de
impacto ambiental – considerando-se que o artigo 225, inciso IV, da Constituição Federal, obriga a realização de tal procedimento para qualquer atividade com potencial de causar degradação ao meio ambiente. Por sua vez, o mesmo artigo, no seu inciso V, reconhece que os OGMs representam esse risco.
BARRAGENS
Eduardo Zen e Alexania Rossato de Brasília (DF) Cientes de que só a luta pressiona para a garantia dos direitos, representantes de populações atingidas por barragens se mobilizaram, esta semana, em Goiás e Santa Catarina, engrossando a mobilização já em andamento no Pará. Dia 23 de maio, duas usinas hidrelétricas foram ocupadas em Minaçu, norte de Goiás. Na barragem de Serra da Mesa 500 agricultores montaram acampamento junto à sala de controle da usina. Logo em seguida, foi a vez da barragem de Cana Brava ser ocupada. Construídas por empresas diferentes, as duas usinas trouxeram problemas semelhantes para as populações atingidas. A barragem de Serra da Mesa, em funcionamento há nove anos, expulsou 925 famílias de suas terras e as poucas indenizações concedidas foram calculadas pelas empresas construtoras, Furnas e o Grupo VBC (Votorantin, Bradesco e Camargo Corrêa), com valores muito abaixo dos praticados no mercado, sem permitir contestação. Nessa obra, houve vários casos de expulsão violenta, na época do enchimento do lago, com despejos forçados e casas queimadas pela construtora para impedir o retorno das famílias. Na usina de Cana Brava, criada há três anos, a situação é igualmente crítica. Construída pela multinacional belga Tractebel, com financiamento do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), a barragem expulsou 986 famílias, pagando
MAB Nacional
Atingidos se mobilizam por cumprimento de dívida social
Duas mil famílias foram expulsas de suas terras em Goiás
poucas indenizações em torno de R$ 5 mil. Houve casos de indenizações de R$ 500 e até de R$ 39. Inúmeras famílias de pescadores e mineradores que viviam do rio também foram prejudicadas pela barragem, sem receber reparação alguma. A usina já gerou denúncias e protestos internacionais, especialmente na Bélgica, sede da Tractebel. A principal reivindicação dos atingidos pelas duas barragens é o reassentamento de todas as famílias. O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) também pede a suspensão das licenças de operação das duas usinas, até que os problemas sejam resolvidos. O problema se repete na divisa entre o Rio Grande do Sul e Santa Catarina, onde a barragem de Foz do Chapecó desalojará mais de 3.500 famílias. Por isso, dia 23, mais de 300 manifestantes montaram acampamento no canteiro de
obras da barragem. A cada semana o acampamento será coordenado por dois dos doze municípios atingidos diretamente pela barragem, de responsabilidade do consórcio CPFL, Vale do Rio Doce e CEEE. No Pará, os atingidos pela barragem de Tucuruí estão acampados no canteiro da empresa Camargo Corrêa há mais de um mês, enquanto transcorrem as negociações com a Eletronorte. Os representantes das 2.300 famílias dizem que o acampamento permanecerá até que passos concretos sejam dados pela empresa. Dia 25 de maio, foi lançado o Comitê de Solidariedade aos Atingidos por Barragens, composto por representantes de pastorais sociais, pelos movimentos dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), dos Pequenos Agricultores (MPA), pela Cáritas e por parlamentares ligados aos movimentos populares.
A Lei de Biossegurança também é inconstitucional ao conferir superpoderes à CTNBio, usurpando dos respectivos ministérios a responsabilidade de averiguar a segurança de transgênicos para a saúde e o meio ambiente. Os ministérios só podem entrar em ação quando a Comissão requisitar.
Em setembro de 2004, foi divulgada na Alemanha uma pesquisa secreta da transnacional Monsanto revelando que ratos alimentados com o milho transgênico Mon 863, cultivado pela transnacional, apresentaram anormalidades nos órgãos internos e alterações no sangue. No Reino Unido, onde se avalia atualmente a liberação ou não dessa semente, o assunto foi retomado, dia 22 de maio, pelo jornal britânico The Independent, e repercutiu no Brasil. O que chama atenção é o fato de a Monsanto ter escondido a informação. Segundo o engenheiro agrônomo Ventura Barbeiro, da campanha de engenharia genética do Greenpeace, o caso confirma que os dados fornecidos pela indústria de transgênicos não são suficientes para dar consistência a decisões. A isso, soma-se o histórico da CTNBio. De acordo com Dulce Lima, do Idec, todas as liberações de OGMs conferidas pela Comissão até o momento limitaram-se a validar estudos apresentados pela própria Monsanto. “São as indústrias que decidem”, resume Barbeiro, com base no texto da Lei de Biossegurança. A segurança da população depende apenas de dois pontos. Ou a Justiça decide pela inconstitucionalidade da legislação ou a pressão da sociedade organizada interfere na composição da CTNBio, ainda à espera de regulamentação.
Tractebel só paga ao BID, não ao povo A maior empresa privada do setor elétrico brasileiro, a Tractebel Energia, subsidiária da SuezTractebel, com sede em Bruxelas, Bélgica, deu mais uma mostra da maneira como trata as populações atingidas pelas usinas hidrelétricas que constrói no país. Na última semana, a Tractebel anunciou a captação de R$ 200 milhões no mercado financeiro para pagar com “antecipação” um empréstimo tomado junto ao Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), em dezembro de 2000, para construir a barragem de Cana Brava. Diante da gravidade da situação e da pressão de diversos grupos da sociedade civil, o banco decidiu abrir um processo de verificação para avaliar se as diretrizes de responsabilidade social haviam sido cumpridas pela Tractebel em Cana Brava. Três relatórios foram feitos por comissões independentes contratadas pelo BID e um painel de inspeção está atuando no momento. As comissões constataram arbitrariedades da Tractebel no trato com a população atingida. A última verificação concluída, uma “auditoria social”, listou todas as famílias que deveriam ter sido reassentadas e não foram. Esse processo de verificação do BID resultou num constrangimento à Tractebel. No entanto, em vez de resolver os problemas em Cana Brava, a empresa prefere fazer nova dívida com outras instituições financeiras e saldar a conta com o BID. Segundo Agenor da Costa, integrante da coordenação do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) em Cana Brava, essa
prática revela a irresponsabilidade e o desrespeito da Tractebel com a população atingida. “Até o banco que financiou a obra reconheceu os problemas causados pela Tractebel em Cana Brava. Mesmo assim, a multinacional se recusa a resolver as questões”, denuncia o dirigente. Segundo Costa, a situação em Cana Brava é de fome e desespero: “As famílias perderam tudo, não têm mais terras para plantar e não há trabalho na região”. Para o MAB, em Cana Brava ocorre uma queda-de-braço entre a população e a transnacional, que evita abrir precedentes para as barragens que pretende construir no futuro. “As empresas estão acostumadas a construir hidrelétricas e contabilizar apenas o custo para erguer o muro e instalar as turbinas. À população atingida, resta a polícia, para realizar os despejos. A Tractebel quer que continue assim, por isso não quer ter mais custos nos investimentos que pretende fazer no país”, revela Gilberto Cervinski, da coordenação nacional do MAB. Para ele, a situação em Cana Brava demonstra “a falência do modelo energético brasileiro e a incapacidade do judiciário e dos órgãos públicos responsáveis pelo licenciamento em garantir os direitos mínimos do povo, que está perdendo tudo por conta das barragens”. Há dois anos o MAB pede a intervenção do governo federal e do Ministério das Minas e Energia para exigirem da Tractebel a solução dos problemas em Cana Brava. “Mas o governo tem feito vista grossa, com medo de afugentar investidores”, conclui Cervinski. (EZ e AR)
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DEBATE AMÉRICA LATINA
O novo ciclo de rebeliões usurpadores-presidentes, nos dias que abalaram a Argentina. Estamos vendo também a ampliação de um importante processo de ocupação de fábricas pelos trabalhadores exigindo trabalho e emprego, num país que chegou ao fundo do poço e do servilismo em relação ao FMI e sua política destrutiva. Resposta popular ao neoliberalismo que desmontou os direitos públicos e sociais, privatizou tudo que funcionava na res publica argentina, arrebentando as condições de trabalho cuja informalidade e desemprego atingiram o grosso da população trabalhadora e financeirizou ao limite a sua economia, tornandoa ainda mais servil ao FMI e aos EUA, durante o governo mafioso dirigido por Menen. E que com Kirchner oscila entre tentar acalmar as elites para bem representá-las e reconquistar o sentido de autonomia e nação que se foi pelo ralo na última década.
Ricardo Antunes as últimas décadas a América Latina vivenciou um verdadeiro genocídio neoliberal que se abateu na quase totalidade de seus países. Genocídio caracterizado pelos enormes índices de indigência social, concentração da riqueza, preservação e ampliação do latifúndio e da propriedade concentrada da terra. Período que se caracterizou ainda pela expansão do grande capital transnacional, sob a hegemonia do capital financeiro e seus enormes mecanismos de lucro e acumulação, como se pode ver nos bancos no Brasil, bem como pelo papel servil das burguesias locais, pela ação dos modelos econômicos que seguem a cartilha do Fundo Monetário Internacional (FMI), desintegradora para dentro e integrada para fora. Pela vigência de parlamentos degradados e de judiciários coniventes com as classes dominantes e responsáveis pela ampliação dos cânceres da corrupção. E, se tudo isso não bastasse, o neoliberalismo nos ofereceu ainda uma mídia cúmplice, com seus reality shows que se “dedicam ao que há de mais vulgar, embotando o espírito e os sentidos para as impressões do belo e do perfeito”, oscilando entre o “frívolo e o insulto”, para lembrar o genial Goethe em seu clássico Os Anos de Aprendizado de Wilhelm Meister.
Ressurge um novo ciclo de rebeliões, dando claros sinais de cansaço e irritação em relação ao neoliberalismo e suas políticas destrutivas EXAUSTÃO DO NEOLIBERALISMO
Mas o neoliberalismo vem dando mostras de exaustão, especialmente desde os fins da década de 90 do século que se foi. Não é por outro motivo que a chamada imprensa burguesa tem dito, com alguma freqüência, que os países andinos estão vivenciando uma fase de “instabilidade democrática”: Bolívia, Equador, Peru, Colômbia, Venezuela, vários seriam os exemplos capazes de inquietar e tirar o sono dos senhores da América. É como se, uma vez desenhada a arquitetura institucional eleitoral, os povos indigenas deveriam cumprir o ritual e, como conseqüência do ato, aceitar todas as mazelas, embustes e estelionatos que têm sido freqüentes nos processos eleitorais latino-americanos. A história, porém, é outra. Nos Andes, responsável por uma cultura indigena milenar, cujos valores, sentimentos e modo de vida são muito distintos daqueles vigentes em nosso tempo, ressurge um novo ciclo de rebeliões, dando claros sinais de cansaço e irritação em relação ao neoliberalismo e suas políticas destrutivas, à “democracia institucional” cada vez mais geradora da conservação, cada vez mais acomodada aos mercados globais, cada vez mais coniventes com a miséria e vilipêndio, brutalidade e barbárie, desemprego e flagelo. No Peru, por exemplo, saiu pelos fundos o pequeno bonaparte Fujimori, corrupto até a alma e subiu Toledo, aparência de índio e cabeça de ianque. Captou o sentimento de mudança para manter o receituário da barbárie. Agora acumula índices de completa e cabal rejeição popular.
Kipper
N
Renasce, então, a democracia popular, de base e de massa, aumentando a consciência e a repulsa popular ao neoliberalismo naquele país andino
No Equador, Gutiérrez, um ex-lider militar que encabeçou um levante popular e indigena em 2000, tornou-se presidente pelo voto é transmudou-se num vil gendarme dos EUA, responsável por um governo corrupto e abjeto. De representante eleito pelo povo “cambiou-se” em representante das “elites”. Foi posto para fora do país, numa fuga em que o governo brasileiro esteve tristemente presente. E o movimento indígena e popular, que o apoiou nas eleições presidenciais, pediu desculpas ao povo pelo erro. Passou para a oposição e teve papel central no levante recente que depôs o governo Gutiérrez.
A luta do MST e sua bela manifestação contra o Brasil do latifúndio e da concentração fundiária, são vivos exemplos dos impulsos que brotam das lutas sociais e políticas da América Latina REPULSA POPULAR
Renasce, então, a democracia popular, de base e de massa, aumentando a consciência e a repulsa popular ao neoliberalismo naquele país andino. Na Bolívia, os povos indígenas não suportam mais a “institucionalidade” e “governabilidade” da conservação e da submissão. Um presidente foi deposto faz pouco tempo (Gonzalo Lozada) e o que lhe sucedeu, Mesa, seu vice, tem a mesma cara da privatização que traz mais privação. Herdeira de uma tradição revolucionária, o povo boliviano
tem dado mostras de muita força e rebeldia, sinalizando que o levante popular é cada vez mais intenso e que os rearranjos dos governos latino-americanos para preservar a “governabilidade” dos governos antipopulares parecem fadados ao fracasso. Lá também está presente um outro traço dos descontentamentos: além da revolta popular dos indigenas, camponeses e operários, setores das classes médias assalariadas – que num certo período deram sustentação ao neoliberalismo – aproximam-se das lutas populares e participam dos levantes. Na Venezuela, contra as várias tentativas de golpe sofridas por Hugo Chávez, os pobres dos morros de Caracas desceram as ruas para recuperar o poder do povo e recolocar Chávez na Presidência da República, depois de um ignóbil golpe civil-militar, ao qual se seguiu um locaute da empresa petrolífera que ia se locupletar com a privatização, sem falar na majestosa vitória popular do governo Chávez no recente referendo. Qualquer cidadão que anda pela Venezuela, hoje, em todas as partes do país, percebe a forte organização popular que lá está se gestando, o que é suficiente para exasperar as “elites” que querem a preservação da barbárie latino-americana. Ampliando a base popular, acentuando seu traço antiimperialista, aproximando-se cada vez mais das alternativas de inspiração socialista, o governo Chávez é o único exemplo de algo verdadeiramente novo na nossa América Latina, quando se pensa em seus governos. Cada vez mais ancorado em forte impulsão popular, tornou-se uma
pedra na política de dominação e terror dos Estados Unidos junto ao continente latino-americano. Na Colômbia, apesar da ingerência militar direta dos imperialismo dos EUA, a guerra civil se mantém intensa e, apesar da presença norte-americana, é forte a resistência armada. Ingerência ianque que tem como bandeira o combate ao narcotráfico, mas que de fato quer impedir a vitória da esquerda armada colombiana, temendo um novo ciclo de rebeliões e revoluções em nosso continente que está cansado de tanta espoliação.
Qualquer cidadão que anda pela Venezuela, hoje, em todas as partes do país, percebe a forte organização popular que lá está se gestando, o que é suficiente para exasperar as “elites” que querem a preservação da barbárie latinoamericana LUTAS SOCIAIS NA AMÉRICA LATINA
Junto com os andinos, outros povos latino-americanos também vêm se rebelando, como se pode visualizar nessa fase de resistência e avanço das lutas sociais em toda a América Latina. Na Argentina, por exemplo, estamos presenciando já há alguns anos a organização dos trabalhadores desempregados, denominados “piqueteros”, que depuseram, junto com as classes médias, no levante de dezembro de 2001, tanto o governo De La Rua quanto os vários pretensos
A resistência zapatista no México, que teve papel fulminante nos anos 90, quando muitos acreditavam que a história tinha encerrado seu ciclo; a resistência heróica do povo de Cuba que desconcerta o bloqueio tenaz do gigante imperial do Norte e que há mais de 45 anos desafia o imperialismo norte-americano; a luta do MST e sua bela manifestação contra o Brasil do latifúndio e da concentração fundiária, são vivos exemplos dos impulsos que brotam das lutas sociais e políticas da América Latina. Alguns podem, então, perguntar: são “antidemocráticos” estes movimentos e estas manifestações? Querem a volta das horripilantes ditaduras militares na América Latina? Talvez fosse interessante, ao contrário, fazer outra indagação: será que a chamada “institucionalidade” e “governabilidade” vigentes não tem se tornado freqüentemente antípoda da efetiva democracia, do real poder popular? Não estarão os povos andinos, amazônicos, indígenas, negros, homens e mulheres trabalhadores dos campos e das cidades, a estampar que a América Latina não está mais disposta a suportar a barbárie, a subserviência, a iniquidade, que em nome de “democracia das elites” assume de fato a postura do império, da truculência, da miséria e da indignidade? Não estaremos presenciando o esgotamento dos rearranjos “pelo alto” das classes dominantes no solo latino-americano e o afloramento de um novo desenho de poder popular, construído pela base, pelos camponeses, indígenas, operários, assalariados médios urbanos que começam novamente a sonhar com uma sociedade livre, verdadeiramente latino-americana e emancipada ? Ricardo Antunes é professor de Sociologia do IFCH/ Unicamp e autor, dentre outros, de Os Sentidos do Trabalho (Boitempo), A Desertificação Neoliberal no Brasil: Collor, FHC e Lula (Ed. Autores Associados) e Adeus ao Trabalho? (Ed. Cortez)
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agenda@brasildefato.com.br
AGENDA PRA MIM CHEGA – A BIOGRAFIA DE TORQUATO NETO Lançada pela Editora Casa Amarela, a obra, de autoria de Toninho Vaz, mostra não apenas o lado mais conhecido da vida de Torquato Neto, mas também algumas marcantes intimidades. Torquato Pereira de Araújo Neto nasceu em Teresina, no Piauí. Foi, em parceria com Gilberto Gil e Caetano Veloso, um dos mentores intelectuais do movimento tropicalista. Compôs, entre outras, Louvação (com Gil), Geléia Geral (com Caetano), Pra Dizer Adeus e Lua Nova (com Edu Lobo), Let´s Play That (com Jards Macalé). Após completar 28 anos de idade, ligou o gás do banheiro e se suicidou. Deixou um bilhete: “Tenho saudade, como os cariocas, do dia em que sentia e achava que era dia de cego. De modo que fico sossegado por aqui mesmo, enquanto durar. Pra mim, chega!” O livro tem 234 páginas e custa R$ 33. Mais informações: www.carosamigos.com.br DICIONÁRIO DE REFORMA AGRÁRIA – AMÉRICA LATINA A obra, do professor Clodomir Santos de Morais, foi elaborada como um manual auxiliar para os profissionais e os beneficiários das mudanças ocorridas no campo. O livro reúne um conjunto interdisciplinar de conhecimentos que ultrapassam os limites acadêmicos de uma só profissão. Dessa forma, são evitados os “tropeços” em terminologias que podem acontecer entre profissões diferentes. Com o Dicionário, buscase superar os obstáculos da “comunicação inter-profissional” e, também, fornecer aos técnicos e beneficiários das reformas agrárias o conhecimento de fenômenos socioeconômicos das mais diversas áreas e culturas da América Latina. O livro, já com edições em inglês e espanhol, é formado por doze seções correspondentes aos assuntos vinculados com os programas de reforma agrária e desenvolvimento rural. Publicado pela Editora da Universidade Federal de Rondônia (Edufro) e o Iattermund, o Dicionário custa R$ 35 Mais informações: (77) 483-2328
NACIONAL SLOGAN PARA OS 30 ANOS DO FEMINISMO NO BRASIL O Centro Latino-Americano em Se-
xualidade e Direitos Humanos está lançando uma campanha nacional para escolher um slogan comemorativo dos 30 anos do feminismo no Brasil. O objetivo é escolher uma frase que valorize a contribuição desse movimento social nas transformações da sociedade brasileira. A frase será estampada em camisetas e adesivos. As frases em votação estão disponíveis na página da internet www.clam.org.br Mais informações: (21) 2568-0599
e práticas, utilizando a Reserva Natural Salto Morato como um modelo para o desenvolvimento das atividades previstas. O transporte da cidade de Curitiba à reserva, assim como material didático, estadia e alimentação serão oferecidos pela Fundação O Boticário. Local: Reserva Natural Salto Morato, Guaraqueçaba Mais informações: www.fundaca oboticario.org.br/site/br/educacao/ curtaduracao.asp
CEARÁ
RIO DE JANEIRO
15ª ASSEMBLÉIA NACIONAL DA PASTORAL OPERÁRIA 26 a 29 de maio Durante a assembléia serão debatidos os seguintes temas: Avaliação; Bandeiras de Luta; O que fazer diante do desemprego e O que fazer sobre a Nova Cultura do Trabalho. Todos os Estados terão representatividade de duas pessoas por diocese. Local: Av. Francisco Sá, 1833, Fortaleza Mais informações: (85) 3238-1400,
JORNADA DE POLÍTICA PÚBLICA 31 de maio, das 9h às 18h Promovida pela Comissão Permanente de Monitoramento da Política de Assistência à População em Situação de Rua do Rio de Janeiro, a jornada tem como objetivo a elaboração de uma proposta de política pública para pessoas que vivem nas ruas. A Comissão, criada em 2002 em assembléia do Conselho Municipal de Assistência Social do Rio de Janeiro, é formada por representantes de organizações da sociedade civil e dos governos municipal e estadual. Local: Catedral Metropolitana do Rio de Janeiro, Av. Chile, 245, Rio de Janeiro Mais informações: (21) 3234-4710
PARANÁ 4º ENCONTRO DA JORNADA DE AGROECOLOGIA 25 a 28 de maio O Encontro deve reunir seis mil pessoas, na maioria agricultores familiares e camponeses, além de técnicos e acadêmicos. Serão debatidos: a definição de políticas públicas voltadas para agroecologia, especialmente nas áreas de crédito rural, pesquisa, assistência técnica e extensão rural, agroindustrialização e educação para o campo, além dos temas ligados diretamente ao lema da jornada: “Terra Livre de Transgênicos e Sem Agrotóxicos”. Local: Centro de Convenções e Eventos, Av. Rocha Pombo, 987, Cascavel Mais informações: (41) 8403-8057
CURSO - CRIMINOLOGIA E DIREITOS HUMANOS 11 de junho Promovido pela organização nãogovernamental Projeto Legal, o curso, que começa dia 11 de junho, pretende proporcionar contato teórico e prático com o tema, sua aplicação na produção de conhecimento científico e no desenvolvimento de programas e projetos sociais governamentais e não-governamentais. Serão duas turmas com aulas aos sábados ou às quartas e sextas-feira. Local: Av. Mem de Sá, 118 , Rio de Janeiro Mais informações: (21) 2507-6464
CURSO - PLANEJAMENTO E MANEJO DE ÁREAS NATURAIS PROTEGIDAS 12 a 15 de junho Promovido pelo Centro de Capacitação em Conservação da Biodiversidade, o curso tem por objetivo apresentar e discutir princípios de conservação da natureza e tópicos relacionados ao planejamento, à administração e ao manejo de unidades de conservação. Os temas serão abordados em aulas teóricas
SÃO PAULO SEMINÁRIO: OS DESAFIOS DOS TRABALHADORES FRENTE ÀS REFORMAS SINDICAL E TRABALHISTA Dia 3 de junho, às 19h O debate, promovido pelo Sindicato dos Professores do ABC, terá como palestrante o professor de sociologia da Universidade Estadual de Campinas Ricardo Antunes.
Local: Escola de Formação do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, R. Senador Fláquer, 813, Santo André Mais informações: (11) 4994-0700 6ª MOSTRA DE MÚSICA MONTE AZUL Até 5 de junho A mostra, que pretende provar que a periferia é, sim, lugar de boa arte e boa música , já é consagrada na região. Recebeu, na última edição, cerca de 200 pessoas por apresentação. Além dos shows, a idéia é também abrir espaço para momentos de discussão e aprendizado, com oficinas, e debates. Haverá, também, dois Encontros Temáticos na Favela Monte Azul, mesclando nomes consagrados com as novas propostas do cenário cultural. Local: Centro Cultural Monte Azul - Av. Tomás de Souza, 552, Jardim Monte Azul; Favela Monte Azul - R. Vitalina Grassmann, 290, Jardim Monte Azul; CEU Casa Blanca - R. João Damasceno, 85, Jardim Casa Blanca - Núcleo Horizonte Azul - R. Agatino de Esparta, 25, Jardim Horizonte Azul; Núcleo
Peinha - R. Itapauna, 36, Jardim Novo Morumbi, São Paulo Mais informações: (11) 5851-5370 ENCONTRO COM A ARTE Até 12 de junho O arquiteto Oscar Niemeyer e o artista plástico Gershon Knispel estiveram em Israel, em 1964 e em 1965, para um trabalho conjunto na Universidade de Haifa. Foram convidados para visitar Jerusalém, o que resultou numa série de desenhos de Knispel homenageando a Cidade Velha, de predominância palestina. A exposição mostra um desenho sobre o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e A Mão que Segura a Flor da Esperança, que Niemeyer desenhou como grafite sobre as paredes de seu escritório no Rio de Janeiro, ambos impressos na Oficina de Serigrafia de Knispel. Ainda: obras de Aldemir Martins, Cícero Dias, Antonio Poteiro, Lynn Carone, André Wagner, Cárcamo, Felipe Gimenez e Elisa Camarote. Local: R. Professor Artur Ramos, 551, São Paulo Mais informações: (11) 3031-0828
RIO GRANDE DO SUL Divulgação
LIVROS
6° FÓRUM INTERNACIONAL DE SOFTWARE LIVRE 1º a 4 de junho O fórum tem como objetivo fazer o software livre avançar em países de economia emergente, como o Brasil. A 5ª edição (2004) teve participantes de 35 países, incluindo Alemanha, Argentina, Espanha, Estados Unidos, França, Holanda, Paraguai, Peru, Russia, Uruguai, Costa Rica, México, Suécia, Japão, Chile, Venezuela, Colômbia, Canadá, Portugal, Dinamarca, Finlândia e Noruega. Ainda mais países são esperados este ano. Entre as atrações, estão diversas figuras importantes da comunidade de software livre, tanto do Brasil como do mundo. Serão realizados debates técnicos nas áreas de desenvolvimento, banco de dados, desktop, redes, segurança, aplicativos sociais, nas áreas de política/filosofia, inclusão social/digital. Local: PUC-RS, Campus Universitário Central, Av. Ipiranga, 6681, Porto Alegre Mais informações: http://fisl.softwarelivre.org/6.0/press
IMPRENSA
Anamárcia Vainsencher da Redação
D
esde o dia 11 de maio, há uma nova revista, mensal, em circulação. ARede, porém, não é uma publicação comum, tanto pelas questões que trata, e como trata. Com um belo projeto gráfico, as reportagens vão discorrendo sobre temas pertinentes ao mundo dos excluídos. O texto é limpo, direto e agradável. E evita anglicismos tão ao gosto da mídia, grafando o nome de uma de suas seções “raitéqui”. Por que ARede? É simples, responde Lia Ribeiro Dias, diretora editorial. “Foi um projeto construído para ser um canal de comunicação entre os movimentos e projetos de inclusão e de comunicação comunitários. E como um canal de comunicação, nada melhor do que um nome como ARede”, diz. A idéia nasceu da observação feita a partir da produção do livro Inclusão Digital: Com a Palavra, a Sociedade, editado em 2003 pela Plano Editorial (da qual Lia era uma das sócias), com patrocínio da Telefônica. “Para nossa surpresa, muitos projetos de empresas e de organizações não-governamentais (ONGs) não tinham qualquer canal de comunicação permanente entre eles para trocar experiências”, conta Lia. Então, o objetivo da revista é ser aquele canal de troca de informações entre os movimentos de in-
clusão digital e a sua apresentação à sociedade brasileira, em especial os formadores de opinião e políticos. A equipe d’ARede está longe de considerar a inclusão digital uma panacéia para os históricos males sociais que afligem o país. Mas está convencida de que a democratização do acesso à internet possibilita um salto mais rápido na aquisição do conhecimento. “Nada disso, porém, dispensa a educação formal, pois é importante ter uma estrutura de ensino com qualidade. Mas o acesso mais rápido ao conhecimento transfere seus resultados para a própria educação formal, acelerando a formação e a informação dos jovens”, argumenta a diretora editorial da revista.
Divulgação
Na rua, uma nova revista que só defende a inclusão
EFICIÊNCIA Para a jornalista, os projetos e programas de inclusão digital são muito mais eficientes quando não se restringem a meras escolas de informática. A tecnologia da informação deve estar associada a espaços de organização comunitária, que contribuem para reforçar a cidadania. “Organizadas, as pessoas aprendem a reivindicar, a participar, tomam consciência de seus direitos”, argumenta. Dessa forma, os projetos mais enraizados nas suas comunidades acabam desenvolvendo atividades paralelas como teatro, grupos de leitura, atividades de geração de renda. Em torno desses espaços as
ARede, um canal de troca de informações entre movimentos de inclusão digital
comunidades se mobilizam e se organizam, um passo importante para a sua inclusão social. “A inclusão digital não é uma panacéia, mas a tecnologia é um diferencial”, insiste Lia Ribeiro
Dias, argumentando que, há alguns anos, seria impensável um menino de 19 anos da periferia virar um programador, ter uma qualificação. E essa é uma visão do mundo que a educação convencional não dá.
Com tiragem de 15 mil exemplares, ARede é um projeto patrocinado por empresas que vêem a tecnologia como fator de inclusão e, geralmente, têm seus próprios projetos. É distribuída gratuitamente para a rede de projetos de inclusão públicos e do terceiro setor, monitores e gestores de telecentros , produtores de conteúdo e ONGs que atuam na área, locutores e gestores de rádios comunitárias, produtores de conteúdo para essas rádios, centros de produção de vídeo comunitários. Devido, inclusive à sua pequena tiragem, a revista é integrada com sua página na internet (www. arede.inf.br). Nela, além de todo o conteúdo editorial da publicação, há alguns serviços disponíveis, como links úteis para o universo comunitário de inclusão. Os interessados em receber ARede, podem enviar sua solicitação para o endereço momento@momentoeditorial.com.br Em futuro próximo, os serviços serão ampliados. No portal, breve, a revista será apenas um serviço, não o principal. Entre os novos serviços, registro de projetos, diretório de ferramentas disponíveis para uso comunitário, de metodologias para montagem de projetos. E, a área colaborativa, hoje restrita ao conselho editorial, será aberta. “Algo parecido com a enciclopédia interativa wikipedia, voltada para tecnologia”, informa a jornalista.
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CULTURA
De 26 de maio a 1º de junho de 2005
ANÁLISE
A esquerda e a cultura E
nquanto patrimônio, a cultura é um longo rio cujas águas envolvem uma determinada geração de seres humanos e lhes transmite valores morais e estéticos, ideologias, história, códigos e símbolos... Enfim, um rico patrimônio elaborado por seus ancestrais que as novas gerações recebem quando existe um ponto de passagem e encontro possível entre este tesouro e o receptor dessa enorme oferenda. Os revolucionários sempre questionaram o passado e estabeleceram uma certa distância em relação a este patrimônio, considerando-o como produto das antigas classes dominantes, derrotadas na luta pelo poder e que até ali detinham o controle da história. Assim agiram na revolução francesa e na revolução de outubro: colocaram em quarentena a cultura herdada acusando-a de ser feudal, de pertencer à classe derrotada. Na revolução soviética, sem dúvida a mais radical de todos os tempos, acontece a famosa polêmica entre “cultura proletária” e “cultura de classe”. Alguns teóricos da revolução sustentam a tese da política de fazer tábula rasa e erradicar a herança de seus ancestrais e substituí-la pela cultura da nova classe proletária.
Os revolucionários sempre questionaram o passado e estabeleceram uma certa distância em relação ao patrimônio cultural, considerando-o como produto das antigas classes dominantes A “CULTURA HUMANA” Leon Trotsky, com uma vontade indomável de salvar o patrimônio cultural, coloca-se pessoalmente contra essa posição. E afirma que a cultura, exatamente por causa da mudança política, deixava de ser uma “cultura burguesa” para se tornar uma “cultura humana”. Portanto, a revolução deveria agir de maneira que seus valores fossem assimilados pelo conjunto do povo para iniciar uma nova era histórica. Eis o início da solução de um problema. O caráter reacionário do patrimônio cultural não está no patrimônio, mas na maneira como ele é usado pelas forças reacionárias e a impossibilidade de ele ser assumido pela maioria da sociedade. Entretanto, é possível mudar isso ao utilizar simples medidas como criar bibliotecas para a expansão do hábito da leitura; um sério programa de vulgarização das artes que favoreça sua prática e sua difusão; uma política que derrube as barreiras da concepção de cultura como mercadoria que impede um determinado setor social de usufruí-la. Em seguida, temos a cultura como consciência, sua forma mais onipresente. A partir do instante em que estejam conscientes de sua situação e de suas relações com seus congêneres e com a natureza, todos os seres humanos têm uma cultura. Desta constatação emana uma série de concepções culturais. Tudo aquilo que é consciência do ser, da existência, das relações com o mundo e com o outro. É, por isso, que ousar fazer uma distinção entre aqueles que têm e aqueles que não têm cultura é dar prova de uma arbitrariedade e de um analfabetismo intoleráveis.
CULTURA: MODOS DE USAR Toda pessoa capaz de ter consciência daquilo que ela é e do que
A cultura onipresente surge no instante em que os seres humanos estão conscientes de sua existência e de suas relações com os outros seres e com a natureza
ela faz e, sobretudo, do papel que tem nas relações com o outro, possui uma cultura. Ninguém pode ser excluído do reinado da cultura. Diante destas duas concepções – cultura como patrimônio, cultura como consciência – está o tradicional exercício de duas políticas, duas tentativas de manipulação política. Por um lado, a política cultural da reação consiste em açambarcar a cultura-patrimônio e a culturaconsciência, incorporá-las a um conjunto de verdades estabelecidas e fazer do acesso à cultura uma maneira de se integrar, de estabelecer um processo de comunhão com a ordem estabelecida. Esta política, na melhor da hipóteses, fez da cultura um meio de integração, mas também propicia a sua mutilação, permite o seu controle ditatorial, quando não a sua destruição, a sua falsificação ou a sua mistificação, sobretudo em períodos fascistas. Em geral, as forças progressistas partem de uma tomada de consciência e, portanto, de uma posição crítica que questiona a ordem estabelecida e tem como propósito modificá-la. Isto se aplica à cultura como consciência. Por outro lado, no que se refere à cultura-patrimônio, a esquerda tem evitado dela se assenhorear para tentar enquadrá-la por suas próprias motivações.
co: o questionamento do conceito de progresso. Cornelius Castoriadis afirmava que nossa época deveria escolher entre “socialismo ou barbárie”. Ao impor essa escolha, coloca em relação duas culturas diferentes, duas concepções opostas da relação histórica que engloba os sistemas de organização da vida, de produção, das relações humanas. Um baseado no lucro, no sucesso das conquistas materiais para as minorias dirigentes e os setores dominantes. O outro baseado no socialismo, estabelecido como racionalização diante dessa barbárie e criando novas relações humanas, uma nova cultura, a possibilidade de uma nova autonomia do homem na realidade. O socialismo se apresenta como uma verdadeira encruzilhada para onde convergem todos os parâmetros que dão sentido à circulação da cultura.
A ESSÊNCIA DA CULTURA T.S. Elliot, excelente poeta de direita, descreveu o que significa cada situação cultural. Para o homem contemporâneo, compreender que o fato cultural se perpetua, que continua a partir de uma troca dialética entre a tradição e a revolução, é a própria essência da cultura. A cada época corresponde uma tradição cultural que se choca com a consciência crítica do momento; e deste choque entre o patrimônio cultural que herdamos e a consciência crítica emana a possibilidade de uma continuidade. Elliot identificou este mecanismo na compreensão da cultura e nós devemos agradecê-lo por isso. Defendendo uma cultura relacionada ao progresso, as forças progressistas, em geral, assumem a tradição e, em conseqüência, o patrimônio cultural; e ao se colocarem a favor da revolução, estabelecem uma consciência critica em relação a esse patrimônio cultural. Mas para chegar até isso, devem
Toda política cultural da esquerda deveria passar pela assimilação, sem limite, da cultura patrimonial. Em seguida, pela promoção do papel transformador da consciência critica ASSIMILAÇÃO E CRÍTICA Toda política cultural da esquerda deveria, primeiramente, passar pela assimilação, sem limite, da cultura patrimonial. Em seguida, pela promoção do papel transformador da consciência crítica. E finalmente, pela análise da maneira pela qual uma política cultural progressista deve considerar a promoção de uma consciência de classe como uma forma superior de cultura. Ter consciência que uma política cultural deve considerar o grau de desenvolvimento da dinâmica histórica dentro de uma concepção global de progresso obriga a esquerda fazer um esforço gigantes-
oferecer ao mundo uma visão baseada em uma idéia fundamental, próxima da escolha “socialismo ou barbárie”: a necessidade de sobreviver às tendências destrutivas. Uma vez ganha a luta pela sobrevivência – primeiro objetivo – uma cultura da igualdade, que não buscará uniformizar, mas assegurar a satisfação das necessidades, entre elas as culturais, de todos os seres humanos, será o segundo objetivo.
A reivindicação da paz é revolucionária porque é a favor da mudança. A paz aposta nas energias criativas do homem, na sua liberdade de expressão, de realização, de transformação
Uma cultura de luta Manuel Vázquez Montalbán foi um grande escritor e militante que lutou permanentemente contra as injustiças e desigualdades sociais. Nascido em Barcelona, em 1939, tornou-se um dos maiores expoentes contemporâneos da literatura espanhola Morreu no dia 18 de outubro de 2003. Em homenagem a seu talento e seu compromisso político, publicamos este texto inédito, parte de uma Conferência realizada em Alicante, Espanha, em 2001. Montalbán participou ativamente da oposição ao regime ditatorial de Franco e chegou a ser condenado a passar três anos no cárcere, em 1962. É autor de romances, alguns traduzidos para o português como Autobiografia do General Franco, Os Mares do Sul, O Quinteto de Buenos Aires, entre outros. Na definição do subcomandante Marcos, Don Vázquez Montalbán “não era nosso amigo, era nosso companheiro.”
LUTA CONTRA A ALIENAÇÃO O terceiro objetivo será uma cultura de liberação, de luta contra a alienação, não no sentido marxista (segundo a qual o homem desprovido dos meios de produção não possui aquilo que ele fabrica, fica afastado do produto que criou), mas no sentido mais amplo do termo: a liberação das tendências aos cultos negativos, às comunhões obscurantistas que anulam toda a capacidade crítica. A desalienação no sentido da liberdade de condutas coletivas como também individuais no campo da política, moral ou sexual. O quarto objetivo é a reivindicação da paz como valor cultural supremo. É indispensável denunciar a guerra como valor ideológico contra-revolucionário. A ameaça de guerra busca estabelecer uma
Luciney Martins/ BL45imagem
Manuel Vázquez Montalbán
Luciney Martins/ BL45imagem
A reivindicação da paz é revolucionária porque é a favor da mudança e aposta nas energias criativas do homem
Cultura para todos: a idéia da cultura como mercadoria deve ser abandonada
A cada época corresponde uma tradição cultural que se choca com a consciência crítica do momento; e deste choque emana a possibilidade de uma continuidade cultura de medo, que paralisa as consciências, fazendo-as mais conservadoras. A reivindicação da paz, ao contrário, é revolucionária porque é a favor da mudança. A paz aposta nas energias criativas do homem, na sua liberdade de expressão, de realização, de transformação. As forças do progresso são majoritárias e quando forem conscientes, os partidários de uma ordem arcaica ficarão isolados. A esquerda deve lutar em duas frentes. Defender sua própria consciência e lutar contra esse medo que procuram nos transmitir como valor cultural supremo. Para que os patrimônios culturais permaneçam à disposição da imensa maioria. Tradução: Celeste Marcondes. Publicado na versão brasileira do jornal Le Monde Diplomatique (www.diplo.com.br)