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Circulação Nacional

Uma visão popular do Brasil e do mundo

Ano 8 • Número 377

São Paulo, de 20 a 26 de maio de 2010

R$ 2,80 www.brasildefato.com.br José Cruz/ABr

Movimentos precisam criar um partido contra o Estado

Por si só, Ficha Limpa não muda ética na política O projeto de lei Ficha Limpa foi aprovado pela Câmara de Deputados. Ele impede a candidatura de pessoas condenadas por instâncias da Justiça. O texto original foi proposto pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral e recebeu mais de dois milhões de assinaturas. Isoladamente, não é um instrumento capaz de mudar a forma de fazer política no Brasil. Na conjuntura de criminalização dos movimentos sociais, tal lei pode se tornar um perigo a lideranças sindicais e populares. Pág. 7

As centrais sindicais pretendem intensificar a luta pela redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais. Para elas, é essencial votar a medida ainda na primeira metade do ano, por conta das eleições. Segundo as centrais, a emenda conta com apoio da Câmara e as associações patronais tentam impedir que o projeto vá a plenário. As entidades sindicais devem entregar uma plataforma de reivindicações aos presidenciáveis. Pág. 6

Direita pressiona e governo recua nos direitos humanos Movimentos sociais e organizações de direitos humanos qualificaram o Decreto n.º 7.177, que alterou nove pontos da terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos, como um retrocesso. As modificações no texto, lançado em dezembro

de 2009, foram uma resposta às reações de setores conservadores, que criticaram duramente o programa. “O Brasil está voltando atrás na visão de direitos humanos”, lamenta Alexandre Ciconello, assessor do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc). Pág. 3 Apαs/CC

Monsanto envia milho transgênico para o Haiti A transnacional de sementes geneticamente modificadas, Monsanto, estaria enviando ao Haiti 475 toneladas de milho. De acordo com o padre inglês Jean-Yves Urfié, autor da denúncia, os grãos serão entregues gratuitamente, com respaldo da embaixada dos EUA. O ministro da Agricultura do Haiti afirmou que a doação é de sementes híbridas. “Nós tomamos todas as precauções antes de aceitar a oferta feita pela multinacional”, afirmou. Pág. 11

Dossiê revela impactos da ilegalidade do aborto Um dossiê lançado no início do mês no Rio de Janeiro fornece dados que reascendem o debate e reforçam argumentos históricos dos defensores da descriminalização do aborto. O estudo, baseado em dados do Sistema de Informações em Saúde (Datasus) e da Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro, expõe o “impacto da ilegalidade do abortamento na saúde de mulheres e na qualidade da atenção à saúde reprodutiva no Estado do Rio de Janeiro”. Pág. 8 ISSN 1978-5134

Gregos marcham em rua da capital do país durante as manifestações do 1º de maio

“Crise grega projeta luta de classes exemplar” Para o jornalista e escritor português Miguel Urbano Rodrigues, as políticas que a União Europeia tenta

Eleições na Colômbia No dia 30, os colombianos deverão confirmar a ida de Antanas Mockus (foto à esquerda) e Juan Manuel Santos (foto da direita) para o segundo turno das eleições presidenciais. O candidato da esquerda, Gustavo Petro (foto central), deverá ficar em terceiro. Já Santos, candidato do oficialismo, avisa que o atual presidente Álvaro Uribe é presença certa em seu governo, caso ganhe. As pesquisas, porém, têm apontado que Mockus deverá ser o próximo mandatário. Págs. 9 e 10

impor na Grécia, Portugal, Espanha e Irlanda tendem a fracassar. Para ele, a crise grega se dá no âmbito da

crise do capitalismo global. Rodrigues interpreta os acontecimentos recentes na Grécia como um exemplo

concreto de luta de classes, com o povo exercendo o seu papel co histórico. Fotos recortadas: Reprodução

Se for votada, jornada de 40 horas deve passar

Manifestantes favoráveis à aprovação do projeto Ficha Limpa lavam a rampa do Congresso Nacional

O Estado brasileiro assume um caráter cada vez mais repressor e segregacionista. As principais vítimas são os setores alijados da economia capitalista, principalmente os pobres das periferias. Para fazer frente à essa crescente exclusão, o jornalista José Arbex Jr. defende que os movimentos sociais impulsionem um novo partido político que, aglutinando os excluídos, parta do pressuposto de que o Estado brasileiro foi construído contra a nação e coloque a questão do poder como elemento central. Págs. 4 e 5


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editorial APÓS O ANÚNCIO do acordo construído entre Brasil, Irã e Turquia para evitar que a nação persa sofra novas sanções ou que tenha que renunciar ao seu direito de desenvolver a tecnologia nuclear para fins pacíficos, certos segmentos políticos e midiáticos brasileiros – os mesmos subservientes aos interesses imperialistas – tentam desmerecer a importância da iniciativa da diplomacia brasileira, que conseguiu apoio também da Rússia e da China. Portanto, é importante ressaltar os desdobramentos políticos que o Acordo Nuclear Brasil-Irã-Turquia poderá promover. O documento desativa de maneira satisfatória os argumentos utilizados pelos Estados Unidos e a União Europeia (UE) para desqualificar e satanizar os esforços científicos da república islâmica. O Irã enviará a território turco 1.200 quilos de urânio enriquecido em baixo grau e, em troca, receberá 120 quilos desse metal, enriquecido no grau que requer seu reator atômico. O pacto constitui uma maneira adequada de conciliar os aspectos até agora em questão. Ou seja, o temor ocidental de que Teerã adquira a capacidade para fabricar armas nucleares e a determinação iraniana de dar continuidade ao seu desenvolvimento tecnológico e preservar sua soberania.

debate

Alguns recados do acordo com o Irã A viagem do presidente Lula à Teerã foi cercada de imenso ceticismo, silencioso ou declarado, como o da secretária de Estado dos Estados Unidos, Hillary Clinton, que disse que o governo brasileiro iria ter que enfrentar uma montanha de problemas, num claro descrédito ao êxito dessa empreitada. Na mesma linha, o chanceler francês chegou a afirmar, de modo deselegante e desrespeitoso, que o presidente brasileiro seria embromado pelos iranianos. Mas foi obrigado a se corrigir e a se desculpar por orientação do presidente Nicolas Sarkozy, talvez mais pragmático e interessado na bilionária venda dos aviões Rafale para o Brasil. O fato é que esse acordo serve de lição para muita gente. Não seria petulante afirmar que o episódio constitui um grande recado para o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama. Afinal, não deveria ser dele – Prêmio Nobel da Paz – a iniciativa principal de promover o diálogo, insistir em saídas pacíficas, apostar em soluções cooperativas, ao invés de falar precipitadamente na lógica das sanções que, obviamente, são muito interessantes para

as encomendas da indústria bélica? Talvez por ser prisioneiro do complexo militar-industrial, denunciado por um ex-presidente dos EUA, Obama ainda não demonstrou claramente que o prêmio está nas mãos mais adequadas. O acordo firmado entre a diplomacia brasileira, Mahmoud Ahmadinejad e o chanceler turco manda recados também para o Conselho de Segurança da Organização da Nações Unidas (ONU), que, antes mesmo de explorar as possibilidades de uma saída pelo diálogo e que não implicasse no veto aos países que – como o Irã e o Brasil, entre outros – estão desenvolvendo tecnologias nucleares para finalidades pacíficas, deu péssimo exemplo ao mundo. O órgão só tem falado em sanções, em ameaças, sem sequer se referir ao fato de que a via das sanções aplicadas por ele até hoje tem resultado, fundamentalmente, em castigos militares de gigantescos sofrimentos, perdas de vidas, destruição e rigorosamente nenhuma solução, como se observa no Afeganistão e no Iraque. Embora o impacto internacional seja inegável, o acordo traz ingredientes novos também para o deba-

te político brasileiro. O candidato oposicionista demo-tucano, José Serra, manifestou-se de maneira negativa à viagem do presidente brasileiro ao Irã, afirmando que, fosse ele, nem iria ao país persa, nem convidaria o presidente iraniano a vir ao Brasil. Se o objetivo é buscar soluções negociadas, por meio de conversações complexas e delicadas, como podem Obama, o chanceler francês, o Conselho da ONU e José Serra não privilegiarem o diálogo direto com a parte envolvida, o Irã, para se alcançar a paz? Ora, não é esse o caminho que o povo brasileiro defende. Já para a grande mídia, sobram muitas lições. Como sempre, a imprensa brasileira, capitalista, defensora dos interesses do capital financeiro internacional, desde o anúncio da viagem do mandatário brasileiro à antiga Pérsia, encontrou inúmeras qualificações negativas e pessimistas para a iniciativa. Aliás, algumas de escassa conceituação, como aquelas que davam a entender que o “Lula não se enxerga”, ou que “isso é apenas uma bravata”. Ou, então, que seria pretensioso acreditar que o Brasil poderia ter

artigo

Roberta Traspadini

Eleições 2010, mudança ou continuidade? O ANO ELEITORAL de 2010 entra para a história como mais um ano de disputas entre os iguais e os quase iguais, sem modificações substantivas no que tange à dimensão política, econômica, social e cultural para a classe trabalhadora do Brasil. No plano das disputas nacionais ao governo federal, ao analisarmos os dois grupos que hegemonizam a eleição, nos deparamos com duas campanhas – PSDB e PT - que, ainda quando guardem pequenas diferenças entre si, no plano geral são tomadas como o carro chefe do capital contra o trabalho. Do lado mais à direita – PSDB – o processo significa retomar aquilo que começou no período Collor. Privatizações, desnacionalizações, intensificação da redução e aniquilamento dos direitos trabalhistas, Estado mínimo para os interesses da classe trabalhadora, do povo brasileiro em geral, e máximo para as parcerias público-privadas, em que reina a potência em ação do capital contra o trabalho. Do lado mais à esquerda, mas sem sair da perspectiva de direita da burguesia – PT – temos o que consideramos uma política de boa vizinhança na correlação de forças com os grupos latinos e alguns Estados nacionais, mediada por uma política de alianças com a burguesia (inter)nacional. Neste lado, a diferença substantiva não está nos elementos constitutivos do lado mais à direita, e sim, na forma como o PT defende a aliança e a conformação de grupos de interesses para além dos que já estão coligados de forma subalterna. Chama a atenção a relação com os países latino-americanos, o vínculo com o BRIC e, especialmente, a política de conformação dos concursos públicos cuja defasagem histórica permite a este grupo aparecer como defensor do público sobre o privado, quando em realidade tal política está muito distante de se conformar como um projeto de classe para os trabalhadores. O que veremos na disputa nacional são propostas de continuidade que não evidenciam, no plano macro, uma diferença substantiva para os que vivem da venda de sua força de trabalho, seja esta formal ou informal. Mais uma eleição sem disputa de classe, de concorrências sem projetos, de votos sem identificação na perspectiva da classe trabalhadora. Esta escolha entre o candidato menos ruim, evidencia na correlação de forças entre as classes, tempos de continuidade do semear da classe trabalhadora. Semear como fruto de uma era em que a esquerda fragmentada é inca-

paz de oferecer, como classe, um projeto em unidade que identifique as diversidades e potencialize os trabalhadores. E, portanto, necessita aproveitar o momento histórico para debater o que se tem, com vistas a executar, no futuro, o que se precisa e se quer. A mudança enquanto projeto de classe não ocorrerá no plano institucional a partir dos sujeitos representantes dos projetos que aparecem como disputa, mas que continuam sob a égide do capital internacional produtivo e especulativo. A mudança que acumulamos no nosso caminhar histórico e que promoverá a diferença no futuro, é a da produção de uma formação política, aliada às lutas e aos processos de reivindicação populares nos territórios onde ocorrem. Essa mudança requererá em seu tempo a tomada do poder institucional. Mas deverá contar com um povo organizado, articulado em unidade em que seja contemplada sua diversidade, capaz de, ao tomar o poder, exercê-lo no reais moldes da transição socialista. Falamos de uma projeção de classe que, ao ser preparada antes da tomada do poder institucional, visa superar o histórico processo que condiciona a classe trabalhadora a votar sem participar: os múltiplos grilhões do capital. A mudança não estará entre a cruz e a espada defendidas como armas diferentes, mas que em realidade são complementares entre o projeto da burguesia mais à direita ou aparentemente mais à esquerda, segundo a forma de governar petista. A mudança estará nas bases concretas de articulação popular em que reinam soberanas outras armas. A foice, o martelo, a enxada, os livros, a produção coletiva de uma práxis libertadora na consolidação de um tempo de cultivar projetos, em meio à sociedade do destempo em que se vive. A mudança estará na articulação que seremos capazes de produzir quebrando as fragmentações instituídas, e promovendo encontros para além das áreas particulares. Sem teto discutindo reforma agrária, sem terra debatendo moradia no urbano, mulheres refletindo sobre o mercado de trabalho formal no Brasil, homens revendo sua função social na partilha das tarefas relativas ao trabalho doméstico.

Gama

Juntos, trabalhadores do campo e da cidade, jovens, mulheres, crianças e adultos, deverão inverter a lógica dominante. E, ao colocála de cabeça para baixo, ao tocar o chão com os pés e as mãos, refletindo sobre o que se toca, viver, quiçá seja possível, instituir, ao mesmo tempo, a leitura da realidade e a produção do novo mundo que se quer viver. Quiçá, com os pés e as mãos postos em terra firme, sejamos capazes de romper com este ideal iluminista de que outro mundo é possível sem luta, sem sujeitos, sem disputa, sem projetos, sem consciência de classe. Entre a continuidade do poder institucional e a mudança necessária - que só virá se esta classe for capaz de produzir, na luta com consciência via formulação de seu projeto -, o que nos movimenta rumo a esta construção futura na unidade da esquerda, é saber que seguimos vivos e produzindo no território outras possibilidades que não as hegemônicas. Estamos vivos tanto na produção de outra concepção de poder, quanto na convicção de que o que está por ora consagrado como disputa hegemônica não representa nosso projeto de classe, enquanto grupo menos ruim no poder. Roberta Traspadini é economista, educadora popular, integrante da Consulta Popular/ES.

alguma importância na solução de um problema de tão grande porte e tão distante. Essas conceituações midiáticas, eivadas de uma certa dose de preconceito, foram, pouco a pouco, desmanchando-se. Até mesmo os mais pessimistas admitem que o acordo reveste-se de importância altamente relevante e é uma vitória da diplomacia brasileira e da política externa do Brasil independente e soberana. O curioso é que essa mesma mídia reconhece o protagonismo de outro brasileiro, Oswaldo Aranha, quando das gestões feitas para a criação de Israel, há décadas. Mas, agora, quando o presidente brasileiro insiste em ter voz ativa, convocando ou até mesmo desafiando as grandes potências a se empenharem na via pacífica seja para o Irã, para o Iraque, como também, por desdobramento, para a questão da Palestina, negam-se a reconhecer. A verdade é que, enquanto a diplomacia brasileira – com o acordo firmado entre os governos do Brasil, do Irã e da Turquia – joga por terra a esperança do conglomerado empresarial Estados Unidos/Israel de promover mais uma guerra, fica evidenciado que tanto o Prêmio Nobel da Paz, como os demais dirigentes dos países ricos, querem caminhos que beneficiem a indústria bélica.

Padre João

Governo mineiro sucateia a educação EM SEU PRECEITO constitucional, a educação apresenta-se como detentora de três fundamentais e imprescindíveis funções: garantir a realização plena do ser humano, inseri-lo em um contexto de verdadeira democracia e torná-lo apto para o mundo do trabalho. Como código maior vigente no Brasil, as regras pela Constituição apresentadas haveriam de ser realidade em todos os estados brasileiros. Porém, ao menos no que se refere à educação no Estado de Minas Gerais, não passam de utopia. Por ser o líder do bloco de oposição ao governo estadual na Assembleia Legislativa do Estado (ALMG) — composto pelo PT, PMDB e PCdoB —, acabo por receber diversas denúncias e críticas à educação mineira, sejam por parte de alunos, sejam oriundas dos professores ou auxiliares administrativos. As reclamações vão desde a indevida cobrança dos alunos para a realização de cópias xerográficas; passam pelo não cumprimento dos pré-estabelecidos calendários escolares, com a realização de reuniões de professores em períodos de férias (estabelecidos na Resolução SEE nº 1.462); permeiam as denúncias de tratamento desigual entre professores e auxiliares (ausência de uniformes e espaços físicos para os últimos) e chegam à precariedade e ausência de fiscalização no transporte de alunos. Em Minas Gerais, os professores que trabalham em municípios do interior do Estado são obrigados a custear o deslocamento aos locais de trabalho, uma vez que não recebem auxílio-transporte. Na “terra das alterosas”, há uma grande lacuna na assistência de saúde escolar: faltam psicólogos, fonoaudiólogos e nutricionistas suficientes para acompanhamento dos alunos. Há apenas uma nutricionista para atender aos 853 municípios do Estado. No estado natal de ícones como Carlos Drummond de Andrade, alunos do campo de séries diferentes ainda têm que aprender as lições juntos, na mesma sala de aula (a inadmissível “nucleação”) e os diretores das escolas ainda são escolhidos pelo governador (em uma lista tríplice de votação, a palavra final é do “chefe de Estado”). As terceirizações (características de governos neoliberais, como o realizado pelo ex-governador Aécio Neves e continuado por seu sucessor, Antônio Augusto Anastasia) aparecem na contratação de empresas privadas para a implementação dos programas estaduais, como tem ocorrido no “Programa de Educação Profissional”. Quando se trata de políticas públicas federais, como o “Programa Dinheiro Direto na Escola”, o que se vê é o incorreto cerceamento por parte do Estado da aplicação dos recursos. Todo esse cenário de negação aos ditames constitucionais é “coroado” com a total desvalorização remuneratória dos trabalhadores em Educação. Atualmente, um professor de início de carreira no ensino médio recebe pouco mais de 300 reais. Um profissional com curso superior, que buscou sua qualificação profissional, também não é reconhecido. Os salários dos educadores aposentados, que por anos contribuíram na tentativa de haver um ensino de qualidade, são vergonhosos. Em greve há mais de um mês, esses profissionais lutam, sem sucesso, pela implementação do Piso Salarial Nacional, já adotado por diversos estados, inclusive alguns que têm o PIB aquém do mineiro. Em atitudes arbitrárias, magistrados consideram a paralisação ilegal e professores chegaram a ser demitidos para, somente após intensas pressões e negociações, terem a garantia de reversão dos desligamentos. E o pior é que as tentativas de contenção das injustiças do governo mineiro com os trabalhadores em Educação não têm resultados frutíferos. Todas as emendas apresentadas pelo bloco do qual sou líder ao projeto de lei governamental que estabeleceu magros reajustes ao funcionalismo público foram rejeitadas pela base governista na Assembleia Legislativa de Minas Gerais. O governo tucano, agora com Anastasia como titular, mostra-se, portanto, a favor do estado mínimo, das privatizações, das terceirizações e do arrocho salarial. Padre João é deputado estadual (PT/MG) e líder do bloco PTPMDB-PCdoB na Assembleia Legislativa do Estado de Minas Gerais.

Editor-chefe: Nilton Viana • Editores: Cristiano Navarro, Igor Ojeda, Luís Brasilino • Repórteres: Beto Almeida, Claudia Jardim, Dafne Melo, Daniel Cassol, Eduardo Sales de Lima, Leandro Uchoas, Mayrá Lima, Patricia Benvenuti, Pedro Carrano, Renato Godoy de Toledo, Vinicius Mansur • Assistente de Redação: Michelle Amaral • Fotógrafos: Carlos Ruggi, Douglas Mansur, Flávio Cannalonga (in memoriam), João R. Ripper, João Zinclar, Joka Madruga, Leonardo Melgarejo, Maurício Scerni • Ilustradores: Aldo Gama, Latuff, Márcio Baraldi, Maringoni • Editora de Arte – Pré-Impressão: Helena Sant’Ana • Revisão: Felipe Dias Carrilho • Jornalista responsável: Nilton Viana – Mtb 28.466 • Administração: Valdinei Arthur Siqueira • Programação: Equipe de sistemas • Assinaturas: Francisco Szermeta • Endereço: Al. Eduardo Prado, 676 – Campos Elíseos – CEP 01218-010 – Tel. (11) 2131-0800/ Fax: (11) 3666-0753 – São Paulo/SP – redacao@brasildefato.com.br • Gráfica: FolhaGráfica • Conselho Editorial: Alipio Freire, Altamiro Borges, Anselmo E. Ruoso Jr., Aurelio Fernandes, Delci Maria Franzen, Dora Martins, Frederico Santana Rick, José Antônio Moroni, Hamilton Octavio de Souza, Igor Fuser, Ivan Pinheiro, Ivo Lesbaupin, Luiz Dallacosta, Marcela Dias Moreira, Maria Luísa Mendonça, Mario Augusto Jakobskind, Nalu Faria, Neuri Rosseto, Otávio Gadiani Ferrarini, Pedro Ivo Batista, René Vicente dos Santos, Ricardo Gebrim, Sávio Bones, Vito Giannotti • Assinaturas: (11) 2131– 0800 ou assinaturas@brasildefato.com.br • Para anunciar: (11) 2131-0800


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brasil

Na contramão dos direitos humanos José Cruz/Abr

PNDH3 Governo federal altera pontos da terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos que haviam gerado reações de setores conservadores Michelle Amaral da Redação NO DIA 12, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva assinou o decreto n.º 7.177, que alterou nove pontos da terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH3), lançada em dezembro de 2009. As alterações no texto são uma resposta às reações de setores conservadores, que criticaram duramente o programa. Parte da Igreja Católica, ruralistas, grandes empresas de comunicação e as Forças Armadas exerceram, desde dezembro, forte pressão para que o governo recuasse em pontos considerados, por eles, anti-democráticos. A nova versão do PNDH3 retira o apoio à descriminalização do aborto e a proibição à ostentação de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos da União; altera a proposta de resolução de conflitos agrários, que previa a realização de audiência coletiva entre os envolvidos e o Ministério Público antes da decisão de concessão de liminar judicial; retira a regulação dos meios de comunicação em relação ao cumprimento dos direitos humanos; e exclui as expressões “repressão ditatorial” e “perseguidos políticos”, passando a tratar as questões referentes à ditadura civil-militar (1964-1985) como violações de direitos humanos. O decreto 7.177 retira, também, o artigo que proibia que logradouros recebessem nomes de

pessoas que praticaram crimes de lesa-humanidade durante o período. Críticas

Movimentos sociais e organizações de direitos humanos lamentaram a decisão do governo e qualificaram o recuo como um retrocesso na questão dos direitos humanos no Brasil. Na avaliação de Plinio Arruda Sampaio, ex-deputado constituinte e, hoje, membro do Psol, o governo federal tirou a força do programa. Ele explica que o PNDH não é um texto jurídico, mas tem peso político. Dessa forma, de acordo com Plinio, ao esvaziar o programa, o governo federal dificultou as lutas populares pela busca de seus direitos, como, por exemplo, a punição aos torturadores do período da ditadura civil-militar. “A característica do Lula é ceder a pressões, desde que elas não sejam as do povo. Ele cede a todas as pressões que não são populares, sejam do sistema externo, sejam da oligarquia interna”, protesta.

O ministro Paulo Vannuchi em audiência na Câmara dos Deputados para debater a terceira edição do Programa Nacional de Direitos Humanos

“A característica do Lula é ceder a pressões, desde que elas não sejam as do povo. Ele cede a todas as pressões que não são populares, sejam do sistema externo, sejam da oligarquia interna”

Processo democrático

Alexandre Ciconello, assessor de Direitos Humanos do Instituto de Estudos Socioeconômicos (Inesc), explica que o texto original do PNDH3, tal como foi apresentado em dezembro de 2009, significou um avanço, pela forma como tratava os direitos humanos. “De um primeiro modo, [o PNDH3] colocava os direitos humanos como eles realmente devem ser tratados, com radicalidade”, explica.

Segundo ele, o recuo do governo federal se deu em pontos importantes para os movimentos que participaram da construção do PNDH3. Ciconello conta que o Programa é resultado de um processo de discussão democrático, levado a cabo em mais de 50 conferências temáticas e na Conferência Nacional de Direitos Humanos, da qual participaram vários setores da socieda-

Brasil não quer punir os repressores Militares pressionaram o governo para retirar do PNDH3 pontos que defendiam a investigação e apuração dos crimes cometidos durante a ditadura civil-militar da Redação A crítica mais dura à terceira versão do Programa Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), lançada no final de 2009, partiu das Forças Armadas. À época do lançamento do programa, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, chegou a colocar seu cargo à disposição, juntamente com três comandantes militares, caso as menções ao golpe civil-militar de 1964 não fossem amenizadas e por discordar de ações que previam a investigação e apuração dos crimes cometidos durante o período. O PNDH3 reconhecia a existência de perseguidos políticos e da repressão política exercida por agentes do Estado e propunha o acompanhamento e monitoramento de processos de responsabilização civil ou criminal sobre atos praticados durante o regime. Além disso, proibia que logradouros recebessem nomes de torturadores e determinava a alteração nas ruas que já tivessem recebido denominações desse tipo. Após a pressão dos militares, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva alterou esses dois trechos do texto do programa, substituindo as expressões “repressão ditatorial” por “violações dos direitos humanos” e “presos polí-

ticos” por “desaparecidos políticos”, e retirando a determinação para mudança dos endereços que receberam nomes de torturadores. Política de Estado

Cecília Coimbra, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro, explica que, com isso, foi retirado o teor original da proposta, que era averiguar e investigar os crimes cometidos durante a repressão política. O novo texto, que trata a repressão como violações dos direitos humanos e os perseguidos como desaparecidos, tira a responsabilidade do Estado sobre o que aconteceu no período. “Na verdade, o que aconteceu durante a ditadura foi que o Estado brasileiro aplicou, através de seus agentes, a tortura, o sequestro, a ocultação de cadáver. E, no momento em que se cria um conflito político, você simplesmente tira o papel do Estado”, protesta. Da mesma forma, Victoria Grabois, do Tortura Nunca Mais de São Paulo, afirma que o termo “violações de direitos humanos” deixa subentendido que os crimes podem ter sido praticados por qualquer pessoa, não responsabilizando necessariamente o Estado. “O Estado pode praticar violações de direitos humanos, mas as pessoas físicas também podem”, completa. Segundo ela, “[a tortura] era uma política do Estado brasileiro, era uma política do estado ditatorial”.

Retrocesso

Para Coimbra, é vergonhoso e lamentável que o governo federal tenha cedido às pressões dos militares. Ela afirma que, da forma como ficou a versão atual do PNDH, a atuação da Comissão Nacional da Verdade – grupo de trabalho que efetivará as determinações do programa no que diz respeito à investigação e apuração dos

crimes cometidos durante o período – ficará prejudicada. O projeto de lei que cria a Comissão foi enviado pelo presidente no dia 13 ao Congresso. O texto original delegava à Comissão o poder de “apurar e esclarecer” as violações cometidas no contexto da repressão política. Já o projeto encaminhado aos congressistas fala em “examinar e esclarecer” as graves violações de direitos humanos. Julgamento internacional

No momento em que o PNDH3 é esvaziado em relação à responsabilização pelos crimes cometidos durante o período ditatorial, o Brasil é réu em um processo na Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA). O Estado brasileiro pode ser responsabilizado pelo desaparecimento de 70 pessoas, militantes da Guerrilha do Araguaia e camponeses locais, e por sua omissão em relação ao esclarecimento do caso. Nos dias 20 e 21 de maio, acontecerá a audiência do caso na sede da Corte Interamericana da OEA, em São José, na Costa Rica, para ouvir os familiares das vítimas e o Estado brasileiro. Cecília Coimbra conta que essa é a primeira vez que um evento acontecido durante o período da ditadura está sendo analisado por um tribunal internacional. “Nós esperamos que haja uma postura de condenação ao Estado brasileiro por parte da Corte da OEA”, afirma. Mesmo sendo uma condenação simbólica, o resultado, segundo ela, terá grande peso na conjuntura interna. “Porque a gente tem tido experiências que [mostram que] somente com pressão internacional nós conseguimos pequenos avanços no Brasil”, opina. (MA, com a colaboração de Jorge Américo, da Radioagência NP)

de civil e do governo federal. Cecília Coimbra, presidente do Grupo Tortura Nunca Mais do Rio de Janeiro, afirma que os dois primeiros PNDH, elaborados durante o governo de Fernando Henrique Cardoso (1995-2002), não refletiam as posições dos movimentos sociais. Já a terceira versão, da forma como foi concebida, sim. “Esse plano refletia alguma coisa dos mo-

vimentos sociais, porque foi feito em função das reivindicações apresentadas na Conferência Nacional de Direitos Humanos, em dezembro de 2008”, conta. Na contramão

Para Ciconello, a versão inicial do PNDH3 tratava os direitos humanos com uma visão contemporânea, de uma forma ampla. Segundo ele, com a decisão do governo federal de retirar questões fundamentais, o Brasil vai na contramão da defesa dos direitos humanos. “O Brasil está voltando atrás na visão de direitos humanos, como direitos universais e interdependentes”, lamenta. Além disso, o assessor do Inesc chama a atenção pa-

ra o fato de o recuo do governo significar maior força aos setores conservadores. “O resultado desse recuo demonstra o poder desses setores na nossa sociedade. Por mais que você amplie a democracia, por mais que você amplie também a presença dos movimentos sociais e das organizações da sociedade civil, você tem grupos que pautam a agenda nacional e que conseguem fazer com que o governo mude um decreto pactuado democraticamente”, protesta. Segundo ele, ao invés de se avançar na questão dos direitos humanos e no reconhecimento de novos direitos, o que tem ocorrido no Brasil é a luta contra o retrocesso em relação a esses direitos.

As alterações no PNDH 3 Garantia dos direitos das mulheres para o estabelecimento das condições necessárias para sua plena cidadania. Onde lia-se: g) Apoiar a aprovação do projeto de lei que descriminaliza o aborto, considerando a autonomia das mulheres para decidir sobre seus corpos. Lê-se: g) Considerar o aborto como tema de saúde pública, com a garantia do acesso aos serviços de saúde. Respeito às diferentes crenças, liberdade de culto e garantia da laicidade do Estado. Foi revogado o artigo: c)Desenvolver mecanismos para impedir a ostentação de símbolos religiosos em estabelecimentos públicos da União. Acesso à Justiça no campo e na cidade. Onde lia-se: d)Propor projeto de lei para institucionalizar a utilização da mediação como ato inicial das demandas de conflitos agrários e urbanos, priorizando a realização de audiência coletiva com os envolvidos, com a presença do Ministério Público, do poder público local, órgãos públicos especializados e Polícia Militar, como medida preliminar à avaliação da concessão de medidas liminares, sem prejuízo de outros meios institucionais para solução de conflitos. Lê-se: d) Propor projeto de lei para institucionalizar a utilização da mediação nas demandas de conflitos coletivos agrários e urbanos, priorizando a oitiva do INCRA, institutos de terras estaduais, Ministério Público e outros órgãos públicos especializados, sem prejuízo de outros meios institucionais para solução de conflitos. Promover o respeito aos Direitos Humanos nos meios de comunicação e o cumprimento de seu papel na promoção da cultura em Direitos Humanos. Onde lia-se: a) Propor a criação de marco legal regulamentando o art. 221 da Constituição, estabelecendo o respeito aos Direitos Humanos nos serviços de radiodifusão (rádio e televisão) concedidos, permitidos ou autorizados, como condição para sua outorga e renovação, prevendo penalidades administrativas como advertência, multa, suspensão da programação e cassação, de acordo com a gravidade das violações praticadas. Lê-se: a) Propor a criação de marco legal, nos termos do art. 221 da Constituição, estabelecendo o respeito aos Direitos Humanos nos serviços de radiodifusão (rádio e televisão) concedidos, permitidos ou autorizados. Foi revogado o artigo: d) Elaborar critérios de acompanhamento editorial a fim de criar ranking nacional de veículos de comunicação comprometidos com os princípios de Direitos Humanos, assim como os que cometem violações.

Incentivar iniciativas de preservação da memória histórica e de construção pública da verdade sobre períodos autoritários. Onde lia-se: c) Identificar e sinalizar locais públicos que serviram à repressão ditatorial, bem como locais onde foram ocultados corpos e restos mortais de perseguidos políticos. Lê-se: c) Identificar e tornar públicos as estruturas, os locais, as instituições e as circunstâncias relacionados à prática de violações de direitos humanos, suas eventuais ramificações nos diversos aparelhos estatais e na sociedade, bem como promover, com base no acesso às informações, os meios e recursos necessários para a localização e identificação de corpos e restos mortais de desaparecidos políticos. Onde lia-se: f) Desenvolver programas e ações educativas, inclusive a produção de material didáticopedagógico para ser utilizado pelos sistemas de educação básica e superior sobre o regime de 1964-1985 e sobre a resistência popular à repressão. Lê-se: f) Desenvolver programas e ações educativas, inclusive a produção de material didáticopedagógico para ser utilizado pelos sistemas de educação básica e superior sobre graves violações de direitos humanos ocorridas no período fixado no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 1988. Suprimir do ordenamento jurídico brasileiro eventuais normas remanescentes de períodos de exceção que afrontem os compromissos internacionais e os preceitos constitucionais sobre Direitos Humanos. Onde lia-se: c) Propor legislação de abrangência nacional proibindo que logradouros, atos e próprios nacionais e prédios públicos recebam nomes de pessoas que praticaram crimes de lesahumanidade, bem como determinar a alteração de nomes que já tenham sido atribuídos. Lê-se: c) Fomentar debates e divulgar informações no sentido de que logradouros, atos e próprios nacionais ou prédios públicos não recebam nomes de pessoas identificadas reconhecidamente como torturadores. Onde lia-se: d) Acompanhar e monitorar a tramitação judicial dos processos de responsabilização civil ou criminal sobre casos que envolvam atos relativos ao regime de 1964-1985. Lê-se: d) Acompanhar e monitorar a tramitação judicial dos processos de responsabilização civil sobre casos que envolvam graves violações de direitos humanos praticadas no período fixado no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição de 1988.




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brasil

Se votada na Câmara, redução da jornada deve ser aprovada Mário Angelo/Folhapress

TRABALHO Centrais sindicais reforçam a pressão no Congresso e na sociedade; encontro da classe trabalhadora deve formular propostas a candidatos

Força patronal

As entidades empresariais da comunicação – Abert, Aner e ANJ – divulgaram nota na qual consideram “louvável a iniciativa do governo de suprimir pontos” do 3º Programa Nacional de Direitos Humanos. Na verdade, o governo recuou mais uma vez diante da pressão dos empresários e retirou do programa o controle social mínimo sobre o que é divulgado pelos meios de comunicação social. Mais uma vitória da direita!

Alerta chinês

Revistas cientistas europeias informam que as regiões produtoras de algodão da China estão disseminando uma nova praga de percevejos, originária de plantações transgênicas e que ataca outras culturas. O algodão transgênico chinês mata um tipo de lagarta que antes se alimentava dos percevejos, mas agora não faz mais o controle natural. O caso comprova os riscos dos transgênicos depois de alguns anos de uso.

Jogo lucrativo

Sindicalistas protestam diante da FIESP, em São Paulo (SP), pela redução da jornada de trabalho para 40 horas semanais

1º de Junho As centrais sindicais devem se reunir, em 1º de junho, no estádio do Pacaembu, em São Paulo, na Conferência Nacional da Classe Trabalhadora. O evento deve formular uma plataforma conjunta das maiores centrais, que deve ser entregue aos candidatos à presidência da República. A ocasião deve ser usada, também, como um grande ato para a redução da jornada. A intenção dos sindicalistas é que ela seja votada ainda no primeiro semestre, pois o segundo semestre deverá ser praticamente “morto” em Brasília, devido às eleições gerais de outubro. Em 18 de maio, a Central Única dos Trabalhadores (CUT) realizou um dia nacional de paralisação, sob o mote “Reduz pra 40 que o Brasil aumenta”. Dilma Aprovada no Congresso, a medida passaria para a presidência da República. De acordo com Denise Motta Dau, secretaria de Re-

COOPERATIVA MULTIPROFISSIONAL DE ASSESSORIA A ASSENTAMENTOS DE REFORMA AGRÁRIA – COOTRASP – CNPJ: 08.027.436/0001-86 I.E.: 149.285.826.118 NIRE: 3540009361-7 EDITAL DE CONVOCAÇÃO Vimos por meio deste, cumprindo o que determina o artigo 38 parágrafo 1º da Lei nº 5.764/71, convocar e convidar todos os cooperados e a associados bem como a sociedade em geral, para a assembléia geral ordinária da Cooperativa Multiprofissional de Assessoria a Assentamentos de Reforma Agrária – COOTRASP que será realizada no dia 29 (vinte e nove) de maio(05) de 2010, em primeira chamada as 9h00 (nove horas) e segunda chamada 60 (sessenta minutos depois), a ser realizada no Centro de Formação Sócio-Agrícola Dom Helder Câmara, na Rodovia Alessandro Balbo, KM 328,5 Anel Viário, Contorno Norte, Vila Monte Alegre, município de Ribeirão Preto no estado de São Paulo, para a discussão da seguinte pauta: 1) 2) 3) 4) 5) 6)

A Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos acaba de escolher como “Personalidade do Ano” o presidente do Banco Central do Brasil, Henrique Meirelles. O prêmio será entregue com grande festa em Nova York. Afinal, só a última elevação da taxa de juro feita pelo BC vai custar, ao tesouro nacional, neste ano, mais de R$ 7 bilhões em juros dos títulos da dívida pública – uma transferência espetacular para os bolsos privados dos especuladores. A vereadora Rosimeire de Almeida Serpa, do PT, teve o seu mandato cassado pela Câmara de Vereadores de Iaras (SP), sob a acusação de ter participado da “invasão da fazenda” da Cutrale juntamente com trabalhadores rurais sem-terra, no ano passado. Vale lembrar que a tal “fazenda” da Cutrale é terra da União destinada à reforma agrária, mas grilada pela empresa. Quem vai protestar contra mais essa injustiça?

A PROPOSTA de Emenda Constitucional (PEC) para a redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais está parada na Câmara dos Deputados. Mas a situação política no Congresso parece estar propícia para a votação da emenda. Baseados nas diversas visitas ao Legislativo Federal, as lideranças das centrais sindicais brasileiras apontam que, se a matéria for ao plenário, deve ser aprovada. O presidente da casa, Michel Temer (PMDB-SP), prometeu aos sindicalistas que a proposta seria posta em votação. No entanto, o parlamentar não resistiu às pressões das entidades patronais e postergou a decisão. Em um esforço de conciliação, Temer chegou a uma proposta intermediária: a redução gradual. Nessa proposição, a jornada seria reduzida imediatamente para 42 horas, passaria para 41 horas em 2011 e atingiria as 40 horas em 2012.

De novo, a postura do patronato foi intransigente. Segundo sindicalistas, os principais interlocutores contrários à medida são o expresidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e deputado federal, Armando Monteiro (PTBPE), a presidente da Confederação Nacional de Agricultura (CNA) e senadora, Kátia Abreu (DEM-TO) e o presidente da Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp) e pré-candidato ao governo paulista, Paulo Skaf (PSB). A maior prova de que o clima é propício para as 40 horas é que os empresários fazem lobby para que a proposta não seja votada, não para que os deputados votem contra.

Quinta coluna

Solidariedade

Renato Godoy de Toledo da Redação

A maior prova de que o clima é propício para as 40 horas é que os empresários fazem lobby para que a proposta não seja votada, não para que os deputados votem contra

fatos em foco

Hamilton Octavio de Souza

Apresentação da carta de saída dos sócios cooperados fundadores da cooperativa; Ingresso de novos associados cooperados; Apresentação do resultado do exercício de 2007, 2008 e 2009; Eleição e posse da diretoria para o triênio 2008/2011; Apresentação do cronograma de atividades para o exercício de 2010; Alteração do endereço da sede da cooperativa.

Sem mais a comunicar, solicitamos assinatura na lista de confirmação da convocação e aguardamos da presença de todos os cooperados. São Paulo/SP, 17 de maio de 2010. Edemir Henrique Batista Presidente

lações de Trabalho da CUT, o governo sinaliza, nos canais de diálogo com as centrais, que é favorável à medida. “Mas gostaríamos que essa postura fosse fortalecida, explicitada. Assim, a bandeira da redução ganharia ainda mais força na sociedade”, afirma. A exemplo do que aconteceu na aprovação do fim do fator previdenciário, alguns deputados ligados à direita podem apoiar a bandeira da jornada de trabalho para constranger o governo. “Sabemos que, nesta época de eleições, muitos apelam para o vale tudo. Mas esperamos que os deputados votem pela redução da jornada por comprometimento com o país”, diz Denise, que afirma confiar no trabalho de convencimento realizado pelas centrais no Congresso – tal como foi feito para a votação do fator previdenciário e do aumento dos aposentados.

“É importante que o Estado se posicione a favor da redução, para proteger os trabalhadores de setores como a construção civil e o comércio, que geram empregos de péssima qualidade ” Recentemente, a pré-candidata do PT à presidência da República, Dilma Rousseff, afirmou que a redução da jornada não é um assunto de governo e deve ser tratado entre trabalhadores e empresários. “Não posso nem apoiar nem ser contra essa medida, pois não é assunto de governo. Legislar sobre isso seria voltar ao passado”, disse à Rádio CBN, em referência às legislações trabalhistas de Getúlio Vargas.

Denise disse ter divergências com a ministra nesse ponto. “Acho que cabe ao Estado mediar as relações capital-trabalho. Na história da relação do trabalho no mundo, o tripartismo sempre esteve presente, com governo, empresários e trabalhadores. Alguns setores fortes, realmente, têm conseguido redução da jornada sem necessidade de o governo legislar. Como é o caso dos metalúrgicos do ABC. Mas outras categorias são muito frágeis em termos de organização sindical. Por isso, é importante que o Estado se posicione a favor da redução, para proteger os trabalhadores de setores como a construção civil e o comércio, que geram empregos de péssima qualidade ”, explica. Impacto econômico Para Wagner Gomes, presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), tem que se colocar urgência no projeto de redução da jornada, “se não, fica para o ano que vem”. “Os empresários estão fazendo uma carga muito grande para que não se vote a medida. Mas a redução da jornada movimentaria a roda da economia, gerando mais 2 milhões de empregos. Ou seja, mais 2 milhões de pessoas consumindo”, defende. Denise Motta Dau aponta que a média de horas extras feitas pelo trabalhador brasileiro está acima da média mundial. “No Brasil, 78% dos trabalhadores fazem horas extras, o que representa uma média de 572 horas por ano. Na Europa, há uma limitação jurídica, que varia entre 200 e 250 horas anuais. Esse limite propicia uma geração de empregos maior”, compara. Para ela, o momento econômico do país é propício para a realização de mudanças que impliquem em melhoria de qualidade de vida e distribuição de renda. “Vivemos em um momento em que há um acúmulo de lucros dos bancos e da indústria. O ministro Guido Mantega [Fazenda] afirmou que o país pode crescer até 7%, por isso, achamos que é o momento ideal para reduzir a jornada”.

As principais incorporadoras imobiliárias registraram aumento de lucro de 73% a 153% no primeiro trimestre deste ano. Não é para menos, já que estão desovando estoques de terrenos urbanos adquiridos há anos e que aumentaram rapidamente de preço após a liberação de financiamentos para moradia. A população paga o custo altíssimo da especulação do mercado, pois o Estado não usa o dispositivo legal que prevê a compra do terreno para fim social.

Muro eleitoral

Em entrevista na rádio CBN, dia 17, a candidata do PT à Presidência da República, Dilma Rousseff, enrolou, enrolou, mas não disse qual é a sua posição sobre a proposta de redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais, conforme campanha das centrais sindicais. Para ela, essa não é uma questão de Estado ou de governo, mas algo que deva ser negociado entre trabalhadores e empresários. Será mesmo?

Negócio privado

Após anunciar que a Telebras seria reativada para operar a rede pública de banda larga, especialmente onde o sistema privado não tem interesse comercial, o governo contemplou, no decreto que cria o Plano Nacional de Banda Larga, a defesa da “livre iniciativa”, o “estímulo a negócios inovadores” e o “compartilhamento de infraestrutura”. Tudo indica que o setor privado pode ser o grande beneficiário.

Descuido estatal

A Petrobras vai de vento em popa, mas quem trabalha para a empresa não tem motivo para comemoração: no dia 11, aconteceu mais um acidente na Estação de Imbé, na Bahia, com a morte do técnico de operação Miraldo da Silva Leal, de 48 anos. De acordo com a FUP, nos últimos 15 anos, ocorreram 282 mortes na empresa, sendo 227 de trabalhadores terceirizados. A terceirização é uma herança maldita da exploração neoliberal.

Brasil real

No Seminário Nacional Sobre Tortura, realizado em Brasília, a coordenadora da Secretaria de Direitos Humanos, Maria Auxiliadora Arantes, declarou: “Esta Coordenação, analisando 79 casos de denúncia de tortura recebidos no ano de 2009, constatou que a tortura continua a ser praticada nos mais diferentes lugares de privação de liberdade, locais que estão sob a responsabilidade do Estado, e todas [as torturas] praticadas por agentes do Estado”. Até quando?


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brasil

Criada por pressão popular, Ficha Limpa, sozinha, não garante ética José Cruz/ABr

ELEIÇÕES Lei aprovada no início do mês recebeu 2 milhões de assinaturas em seu favor, mas significa apenas um passo para a transformação ética na política Eduardo Sales de Lima da Redação A APROVAÇÃO do projeto de lei Ficha Limpa na Câmara dos Deputados, em 4 de maio, foi considerada uma vitória popular, já que o texto original, proposto pelo Movimento de Combate à Corrupção Eleitoral, recebeu mais de dois milhões de assinaturas, coletadas por entidades como a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB). No entanto, especialistas ouvidos pelo Brasil de Fato, embora ressaltem a importância da norma, afirmam que ela, isoladamente, não garantirá a ética na política institucional brasileira.

“Vários projetos apresentados por parlamentares iam mais ou menos nessa direção e estavam há anos paralisados, mas foi necessária essa mobilização toda” A proposta, prevista para ser votada pelo Senado no dia 19, após o fechamento desta edição, impede a candidatura de pessoas condenadas por instâncias colegiadas da Justiça. Entre os crimes que poderão impedir a candidatura de um indivíduo, incluem-se a corrupção, abuso de poder econômico, homicídio, crimes contra o meio ambiente e a saúde pública, prática de trabalho escravo e tráfico de drogas.

Além disso, a lei determina um período de oito anos durante o qual o candidato ficará sem poder se candidatar. Atualmente, a Lei Complementar 64/90 estabelece casos de inelegibilidade fixados com prazos que variam de três a oito anos. O projeto também pune os políticos que renunciarem ao mandato para evitar abertura do processo de cassação. Aquele que o fizer se tornará inelegível nas eleições seguintes. “Essa lei será eficaz? Eu não sei. Eu não posso achar nada senão a partir do testemunho que vier da aplicação”, pondera Cláudio Weber Abramo, diretor-executivo da ONG Transparência Brasil. Ele acredita que qualquer legislação sempre frustrará os proponentes “porque será menos efetiva do que realmente esperamos”. Problema “individual”

Cláudio vai além e toca no ponto em que os partidos pouco, ou quase nada, discutem. “O problema continuará independentemente da existência da lei. Os partidos políticos brasileiros não têm preocupação com a qualidade dos indivíduos que eles abrigam. Esse é um problema fundamental”, critica. Para o filósofo e membro do colegiado do Instituto de Estudos Sócio-Econômicos (Inesc), José Antônio Moroni, o fato da lei Ficha Limpa ter sido constituída a partir de iniciativas populares e de reunir mais de 2 milhões de assinaturas a seu favor fez a diferença. “Vários projetos apresentados por parlamentares iam mais ou menos nessa direção e estavam há anos paralisados, mas foi necessária essa mobilização toda”, afirma. Moroni enfatiza que essa situação mostra o quanto o Parlamento brasileiro está desvinculado dos desejos da população. Por esse e outros motivos, o membro do Inesc acredita

Manifestação diante do Congresso Nacional pede que parlamentares aprovem o projeto Ficha Limpa

Projetos como o Ficha Limpa precisam ser trabalhados dentro do contexto de uma reforma política no Brasil. É o que pensa Moroni que faltou, dentro da estratégia da função pedagógica da participação popular, insistir à sociedade que, no atual sistema político brasileiro, os partidos políticos aceitam pessoas sem critérios algum e, pior, o fato de ser político gera privilégios e proteção contra punições da Justiça. “Se as pessoas que estavam com problemas na Justiça se utilizam dos mandatos para ficar imunes, podese chegar à conclusão que a participação na política institucional no Brasil serve para construção de privilégios”, critica. Reforma

Projetos como o Ficha Limpa precisam ser trabalhados

dentro do contexto de uma reforma política no Brasil. É o que pensa Moroni. Ele acredita que o Ficha Limpa somente apontará uma direção, mas, isoladamente, não é um instrumento capaz de mudar a forma de fazer política no Brasil. Para tal, formaria mais conteúdo à própria sociedade. “Como a gente não tem força política de forçar uma reforma política radical, a estratégia é fazer alguns ajustes”, conclui. Para Cândido Grzybowski, diretor do Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (Ibase), a aprovação do Ficha Limpa mais que rendeu uma lição política: “mostrou que dá trabalho, mas que temos possibilidade”.

“Fichas sujas” fiscalizam obra de Belo Monte Dos dez senadores indicados para a subcomissão temporária para acompanhamento das obras da hidrelétrica de Belo Monte, nove são acusados de corrupção e crimes ambientais. Abaixo, as principais acusações: Senador Flexa Ribeiro (PSDB-PA)

Em 2004, foi acusado pela Polícia Federal (PF) de comandar o esquema investigado na Operação Pororoca, sobre fraudes em licitações no Amapá. Segundo a PF, pelo menos 17 obras haviam sido fraudadas no estado entre 2002 e 2004. O valor total dos desvios foi de R$ 103 milhões. O senador é dono da Engeplan Engenharia e, segundo a PF, entrava nas licitações para dar “aparência de legalidade” à concorrência fraudulenta. Em 2004, Flexa Ribeiro foi preso em Belém.

Senador Renato Casagrande (PSB-ES)

Durante as investigações da Operação Castelo de Areia em 2009, Casagrande apareceu como suposto beneficiário de dinheiro da construtora Camargo Corrêa numa contabilidade paralela da empresa. A Camargo Corrêa ajuda a tocar as obras do aeroporto de Vitória, que está entre os três, no país, em que mais houve desvios.

Senador Delcídio Amaral (PT-MS)

De acordo com investigação da Operação Navalha, da PF, em 2007, o senador foi mencionado na contabilidade paralela da construtora Gautama.

Senador Romero Jucá (PMDB-RR)

Efetividade da lei depende da Justiça da Redação O texto do projeto de lei Ficha Limpa possui um ponto que vem inquietando alguns especialistas. O candidato condenado em segunda instância poderá pedir efeito suspensivo, que, por um lado, permitirá a candidatura, mas, por outro, provocará a aceleração do processo. Se o recurso for negado, será cancelado o registro da candidatura ou o diploma do eleito. “Uma fantasia”. É isso o que pensa Cláudio Abramo, diretor-executivo da ONG Transparência Brasil, sobre a suposta celeridade ocasionada pelo efeito suspensivo. Entretanto, apesar de, à primeira vista, parecer uma protelação do processo, o objetivo do mecanismo, segundo o relator do projeto, José Eduardo Cardozo (PT), é conciliar “o desejo legítimo da sociedade de ver afastada da vida política pessoas que têm uma vida pregressa, que efetivamente apresentam uma situação desabonadora” com o de garantir “o Estado de Direito, a possibilidade do direito do contraditório e da ampla defesa, como situações antecedentes

a toda e qualquer situação de direito”. “Não podemos esquecer que o Judiciário é composto por homens e por mulheres, que não são deuses, são falíveis. Portanto, os mecanismos institucionais do Estado devem levar em conta também a possibilidade plena que uma pessoa possa se defender”, afirma. “Avanço”

Para José Antônio Moroni, do Instituto de Estudos Econômicos (Inesc), será um avanço dar prioridade ao julgamento quando o condenado entrar com efeito suspensivo. “Hoje, a estratégia [comumente utilizada] é o advogado recorrer diversas vezes para adiar o julgamento. Só que, nesse caso, ele vai acelerar o julgamento”, salienta. O problema maior, segundo ele, é saber como a Justiça vai operar. José Eduardo Cardozo aponta que seria um absurdo deixar as coisas como estão hoje, com os políticos que apresentam condutas irregulares continuando a disputar cargos públicos livremente enquanto utilizam meios judiciais para retardar decisões. (ESL)

Uso político pode comprometer Ficha Limpa Com Justiça conservadora, lei tende a ser útil à direita da Redação O projeto Ficha Limpa, isolado, pode se transformar até mesmo num problema, opina Cândido Grzybowski. Numa conjuntura de criminalização dos movimentos sociais e dos lutadores por direitos humanos, tal lei poderia se tornar um grande perigo. De acordo com José Antônio Moroni, do Inesc, apesar do projeto tentar limitar quais os crimes que cancelam candidaturas, o argumento jurídico aceita “quase que tudo”. Para ele, é necessário haver ampla fiscalização de como o judiciário vai lidar com tudo isso, “porque corremos risco”. “As forças conservadoras tentarão pegar carona no projeto para criminalizar mais ainda os movimentos. O próprio relator ao final de 2009, o deputado federal Índio da Costa (DEM-RJ), queria co-

locar como crime possível para a não-candidatura a condenação por ocupação de propriedade privada”, ilustra. Criminalização

Em recente artigo na agência Carta Maior, Marco Aurélio Weissheimer chama a atenção para o fato de que uma lei desse tipo, na África do Sul, não teria permitido a eleição de Nelson Mandela, cuja “ficha suja” envolvia condenação por “terrorismo”. Além disso, ele lembra que várias lideranças sindicais brasileiras possuem condenações em segunda instância por “crimes” que envolveram participação em greves ou em lutas populares. “Cabe lembrar que, no Rio Grande do Sul e em São Paulo, lideranças sindicais estão sofrendo condenações por protestos realizados contra os governos dos respectivos estados. Os governantes dos dois estados, ao contrário, acusados de envolvimento em esquemas de corrupção, de autoritarismo e de sucateamento dos serviços públicos, seguem com a ficha limpíssima”, escreve. (ESL)

O senador teve quase metade (R$ 200 mil) de sua campanha para o Senado, em 2002, bancada pela OPP, empresa petroquímica que foi incorporada à Braskem, da construtora Odebrecht. Além disso, Jucá foi acusado, pelo Ministério Público Federal, com base em investigações da Polícia Federal, de compra de voto e desvio de recursos federais para obras.

Senador Jaime Campos (DEM-MT)

O senador e pecuarista foi acusado de cometer crime ambiental na fazenda Santa Amália, em Alta Floresta, MT (a 821 km ao Norte de Cuiabá), de sua propriedade.

Senador César Borges (PR-BA)

Durante a gestão de César Borges, eleito em 1998 governador da Bahia, o Tribunal de Contas da União constatou que o governo do estado desviou mais de R$ 18 milhões destinados à obra de ampliação do aeroporto internacional de Salvador, à construção de obras viárias na cidade e à duplicação da rodovia que liga Salvador a Sergipe. Todas as obras foram executadas pela OAS.

Senador Valdir Raupp (PMDB-RO)

Responde a ação penal no STF, em que é acusado de formação de quadrilha, estelionato e dispensa de licitação. A denúncia aponta irregularidades em contrato firmado entre o governo de Rondônia e a empresa Meritum durante seu mandato de governador.

Senador Mário Couto (PSDB-PA)

Foi acusado, em 2005, de ter cometido desvios de recursos quando era presidente da Assembleia Legislativa do Pará, por meio da contratação de empresas de fachada, entre elas, um fabricante de tapioca. De acordo com as denúncias, a empresa J.C. Rodrigues de Souza, fabricante de farinha de tapioca e derivados, recebeu quase R$ 80 mil pelo fornecimento de material elétrico.

Senadora Kátia Abreu (DEM-TO)

Em 2008, foi apontada pela PF como receptora de R$ 2 milhões da empresa OAS para propor uma emenda à medida provisória 412, que prorrogou o programa de isenções fiscais Reporto até 2011. A aprovação só saiu depois de um acordo entre a base do governo e a oposição por conta de uma emenda de Kátia Abreu. (Fonte: Movimento Xingu Vivo para Sempre)


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Dados sobre aborto reforçam a necessidade de revisão na lei MULHERES Lançado no Rio dossiê sobre o impacto da ilegalidade do aborto na saúde das mulheres. Em 100 mil cirurgias realizadas por ano, 16% geram internação. Entre as vítimas, há três vezes mais negras do que brancas e pardas somadas João Zinclar

Denunciar os impactos do abortamento inseguro, e as consequências negativas da ilegalidade na saúde das mulheres, é apenas o objetivo primeiro do dossiê. O documento também se propunha a mobilizar segmentos sociais brasileiros, inclusive parlamentares, para fomentar debates e buscar a mudança da legislação. Entretanto, poucos são os políticos que realmente se propõem a defender uma alteração efetiva na legislação, especialmente em ano eleitoral. No Rio de Janeiro, as ONGs e movimentos sociais contam com apoio dos deputados estaduais Inês Pandeló (PT), Marcelo Freixo (PSOL) e Paulo Ramos (PDT), que organizaram uma audiência pública na Assembleia Legislativa (Alerj), no dia 3, para discutir o tema.

Leandro Uchoas do Rio de Janeiro (RJ)

quele ano, as obstétricas. Infecções graves e perfurações no útero estão entre as principais consequências do processo abortivo. O dossiê confirma a suspeita de que, entre as mães que morrem ao fazer aborto, quase todas são pobres e negras. Vitimadas por cirurgias abortivas, falecem três vezes mais mulheres negras do que brancas e pardas somadas. A condenação social e legal acaba induzindo ao aborto clandestino, causa principal da maior parte dos óbitos. “Infelizmente, a maioria das vítimas são jovens, pobres e negras, porque não têm acesso à informação e a serviço de qualidade. As mu-

lheres ricas podem recorrer a clínicas melhores, mesmo clandestinas”, lamenta Paula Viana, das Jornadas Brasileiras pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro. As internações por aborto diminuem ano após ano, mas em ritmo lento. Enquanto em 2000 houve 24,4 mil internações no Estado, em 2007 foram 18,7 mil. O aborto é a terceira entre as causas de internação de mulheres na faixa de 10 a 49 anos. A técnica indicada pelo Ministério da Saúde para o tratamento dessas pessoas é a aspiração manual ultra-interina (AMIU). Os estudos detectaram que o método só foi adotado em míse-

do Rio de Janeiro (RJ) Segundo as entidades de defesa do direito ao aborto, o debate sobre a prática é de tal forma complexo, que a pergunta mais comum, “você é a favor?”, torna-se simplista. Questões de natureza moral, filosófica, religiosa e ética se entrelaçam e, muitas vezes, tornam-se conflituosas. Existiriam, via de regra, três discussões distintas. A descriminalização, a legalização e a discussão sobre a moralidade ou não da prática. Acontecimentos recentes têm despertado a sociedade brasileira

para a discussão. Um deles é o fato de o ministro da saúde, José Gomes Temporão, ser um dos principais defensores da descriminalização. Em 2007, o assunto foi amplamente discutido após a escolha do tema da Campanha da Fraternidade pela Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB): Fraternidade e Defesa da Vida. A batalha da Igreja Católica contra o aborto já havia ficado clara na primeira visita do papa Bento XVI ao Brasil, em 2006. Em seu primeiro discurso em terras brasileiras, ele tratou do assunto. Pesquisas confirmam que a religiosidade é a razão principal da condenação de parte significativa da sociedade ao aborto. “Sem dúvida, os dogmas religiosos têm sido o principal obstáculo para que a luta pela descriminalização avance. Os dados confirmam que, em países que flexibilizaram a legislação, o número de abortos até diminuiu”, afirma Rosangela Taribe, da organização Católicas Pelo Direito a Decidir. A legislação antiabortiva não impede a realização do

aborto. Aproximadamente um terço das gestações termina em aborto no mundo. A diferença é que em países onde se proíbe, como o Brasil, as cirurgias causam sequelas mais frequentes e sérias nas mulheres. No Brasil, cerca de 1,1 milhão de abortos são realizados anualmente. De 220 a 270 mil mulheres são internadas anualmente no Sistema Único de Saúde (SUS) com complicações decorrentes das cirurgias. Mais de duzentas morrem por ano e milhares permanecem com sequelas. O

ros 2,33% dos casos de aborto no Rio de Janeiro. Se a indicação do Ministério fosse respeitada, o tempo de internação seria reduzido de três a um dia apenas.

as pacientes mais negligenciadas quanto aos cuidados de promoção da saúde reprodutiva. Vítimas de preconceito, não são encaminhadas a serviços e profissionais capacitados. “Ficamos impressionadas como, no Rio, uma cidade progressista, há apenas um serviço de abortamento funcionando. Até nos casos em que a lei permite o aborto, há preconceito e as mulheres são maltratadas”, diz Paula.

Preconceito Os dados também revelam que 43% das usuárias de métodos anticoncepcionais interrompem seu uso 12 meses após o início. Segundo o dossiê, mulheres com complicações por aborto estão entre

Dossiê sobre aborto inseguro

Mulheres com complicações por aborto estão entre as pacientes mais negligenciadas quanto aos cuidados de promoção da saúde reprodutiva

Um debate ainda incipiente Existem, pelo menos, três discussões distintas em relação ao aborto: a descriminalização, a legalização e a moralidade

A condenação social e legal acaba induzindo ao aborto clandestino, causa principal da maior parte dos óbitos

Mulheres em marcha pela legalização do aborto: debate gera polêmicas que envolvem questões religiosas e de saúde pública

ça. Essas mulheres raramente adquirem sequelas, exceto psicológicas.

abortamento inseguro é a quarta causa de morte materna no país e a curetagem pós-aborto o segundo procedimento obstétrico mais realizado na rede pública. No mundo, são realizados cerca de 20 milhões de abortos inseguros. Aproximadamente 67 mil mulheres morrem em decorrência do aborto. A lei, portanto, não parece ser um bloqueio seguro para a prática. Além disso, a criminalização transforma o aborto, em países de enorme desigualdade como o Brasil, em problema social. No país, garotas de classe média ou alta encontram facilmente clínicas clandestinas que, na faixa de R$ 2 a R$ 5 mil, promovem cirurgias com maior seguran-

A diferença é que em países onde se proíbe, como o Brasil, as cirurgias causam sequelas mais frequentes e sérias nas mulheres

Dossiê sobre aborto inseguro

A DECISÃO MAIS delicada, e frequentemente traumática, da vida de uma mulher é a eventual interrupção de uma gravidez. Em geral, só é tomada em casos extremos. As causas variam desde as admitidas por lei – gravidez por estupro ou quando há risco de vida para a mãe –, até situações delicadas – incapacidade econômica de se criar um filho, por exemplo. O debate sobre o aborto torna-se, portanto, um dos mais polêmicos da atualidade. Os que condenam costumam recorrer a questões religiosas ou morais – o aborto seria um assassinato. Os que defendem têm tratado como um problema social ou de saúde pública. No Rio de Janeiro, um estudo recente fornece dados que reascendem o debate e reforçam argumentos históricos dos defensores da descriminalização. No inicio deste mês, foi lançado o “Dossiê sobre aborto inseguro: O impacto da ilegalidade do abortamento na saúde de mulheres e na qualidade da atenção à saúde reprodutiva no Estado do Rio de Janeiro”. Trata-se de um cruzamento de dados, a partir de pesquisas realizadas pelo Sistema de Informações em Saúde (Datasus), pelo Sistema de Mortalidade do Departamento de Dados Vitais da Secretaria de Saúde do Rio de Janeiro, entre outros. O trabalho foi desenvolvido a partir de uma parceria entre diversos institutos: Ipas Brasil, Grupo Curumim, Articulação de Mulheres Brasileiras e Jornadas pelo Direito ao Aborto Legal e Seguro. Segundo o estudo, de 1999 a 2007, no Rio de Janeiro, foram realizados cerca de 800 mil abortos – 100 mil por ano (no Brasil, o índice anual passa de um milhão). Três quartos dos casos ocorrem em mulheres jovens – entre 15 e 29 anos. Apenas em 2008, o sistema de saúde estadual registrou quase 16 mil internações de mulheres vítimas de abortos mal sucedidos. As principais causas de internação para as mulheres em idade fértil foram, na-

Argumentação A grande massa de mulheres negras e pobres, sem acesso a instrumentos anticoncepcionais ou formação de educação sexual, e muitas vezes abusada sexualmente até pelo marido, é que acaba com efeitos danosos em seu corpo. Outra argumentação frequente dos defensores da descriminalização é a de que, sendo laico, o Estado brasileiro não poderia legislar tomando por base valores religiosos. Defende-se também que seria um direito das mulheres tomar decisões sobre seus próprios corpos, como os têm os homens. Rei-

Na mesma semana, contudo, no texto oficial do Plano Nacional de Direitos Humanos (PNDH-3), o governo federal recuou em diversos pontos. Entre eles o que dizia respeito ao aborto. O artigo que previa apoio ao projeto de descriminalização da prática foi substituído por um texto que a considera apenas um problema de saúde pública. As mudanças no Plano foram extensamente criticadas por organizações de direitos humanos. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), 21% das mortes maternas na América Latina decorrem de aborto inseguro. Enquanto na Europa Ocidental a incidência de aborto inseguro é próxima de zero, na América do Sul chega a quase três milhões anuais. No Brasil, estima-se que a quantidade varie entre 729 mil e 1,25 milhão.

vindicam a permissão da prática, por decisão da mulher, até a 12ª semana de gestação, até a 20ª em caso de estupro, e em qualquer momento caso haja má formação do feto. Recentemente, Bento XVI chegou a ameaçar excomungar os políticos católicos que votassem a favor de projetos de lei pró-aborto. Em sua vinda ao Brasil, em meio a uma série de requisições ultraconservadoras – como o retorno da obrigatoriedade do ensino de religião nas escolas públicas e o bloqueio de ações trabalhistas contra a Igreja Católica –, o papa pretendeu negociar a revisão inclusive dos pontos em que a legislação permite o aborto – estupro e risco de morte para a mãe. Embora o Bento XVI seja considerado conservador, posturas anti-abortivas também são comuns nos setores progressistas da Igreja Católica. É quase consenso que a impopularidade das medidas pró-aborto impedem o Estado de adotá-las. Dessa forma, o Brasil não se mantém fiel a acordos internacionais de que já é signatário, como a Conferência Internacional sobre População e Desenvolvimento (Cairo, 1994) e a IV Conferencia Internacional de Mulheres (Pequim, 1995). (LU)


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américa latina

Candidato do Partido Verde é favorito para substituir Uribe Reprodução

COLÔMBIA Antanas Mockus, que lidera por pouco as pesquisas de intenção de voto, traz mudança, mas com moderação Dafne Melo da Redação HÁ ALGUNS meses, Juan Manuel Santos parecia ter assegurado seu lugar na cadeira presidencial colombiana. Diante da impossibilidade do atual presidente, Álvaro Uribe, se reeleger, ele foi o escolhido para manter o Partido Social de Unidad Nacional – ou “Partido de la U” – no poder. Em março, no início da campanha para as eleições do dia 30 de maio, Santos tinha, nas pesquisas, dez pontos percentuais a mais que a segunda colocada, a também conservadora Noemí Sanín (do Partido Conservador da Colômbia). Antanas Mockus (Partido Verde), em terceiro lugar, estava 20 pontos abaixo de Santos. Agora, o cenário é outro. A Colômbia poderá, em breve, dar um basta a Álvaro Uribe. Ao longo da campanha, Mockus – que se define como de centro – foi ganhando espaço. Hoje, tem 32,8% das intenções de voto, contra 29,3% de Santos. Em outras pesqui-

sas, Santos aparece à frente, evidenciando que o primeiro turno será apertado. No segundo turno entre os dois, o candidato do Partido Verde aparece como vencedor, com seis pontos à frente. A conservadora Noemí Sanín e Gustavo Petro, do partido de esquerda Polo Democrático Alternativo, se alternam entre a terceira e quarta posições, mas sem chances de chegar ao segundo turno. “Mockus avançou com a bandeira da honestidade e o respeito à lei”, escreveu o analista político colombiano Mario López, para a Agência Latinoamericana de Notícias (Alai). Para Frida Modak, jornalista e ex-secretária de imprensa de Salvador Allende (presidente chileno morto em 1973, durante o golpe de Estado), Mockus soube ganhar espaço rejeitando a agressividade do oficialismo, evitando, também, ser associado a um discurso mais radical. Tensão com Santos Não é necessário muito mais do que a informação de que Juan Manuel Santos foi ministro da Defesa de Álvaro Uribe entre 2006 e 2009 para entender seu perfil. Foi sob seu mandato que explodiram diversos escândalos de “falsos positivos” e se deu a crise com o Equador em março de 2008, após o Exército colombiano invadir e bombardear uma região do país vizinho para capturar o integrante das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), Raúl Reyes. Caso saia vitorioso, Santos já deixou claro que quer Uribe

Nem mesmo a “carona” na popularidade de Uribe (à esquerda) garantiu a liderança de Santos nas pesquisas

em seu governo e que este terá o cargo que escolher. Os chamados “falsos positivos” são assassinatos de civis, normalmente jovens das periferias das cidades e da zona rural, cometidos pelo Exército, e que entram na conta de guerrilheiros mortos. Os números são apresentados à sociedade como demonstração de sucesso na guerra contra os grupos guerrilheiros (leia a matéria “Falsos positivos, a política de extermínio de Uribe”). Caso Santos ganhe, as relações diplomáticas com o Equador permaneceriam cortadas, já que o candidato “de

Falsos positivos, a política de extermínio de Uribe Reprodução

Paramilitares denunciam colaboração com Exército colombiano para executar civis e apresentá-los como guerrilheiros mortos em combate da Redação Ex-membros das Autodefesas Unidas de Colombia (AUC) – grupo paramilitar de extrema-direita –, entre eles, Daniel Rendón, que usa o apelido de “Don Mario”, revelaram a existência de uma colaboração entre seu grupo e o Exército colombiano em algumas regiões do país para realizar “falsos positivos”, ou seja, assassinatos de civis que são apresentados como guerrilheiros abatidos em conflitos. Segundo o jornal colombiano El Tiempo, a aliança ocorreu com a facção das AUC em Meta (região central do país). Diante de um promotor, dois ex-comandantes paramilitares que operavam na zona revelaram que os bloqueios das AUC, a mando de Miguel Arroyave – um paramilitar morto em 2004 – entregaram ao Exército dezenas de ex ‘paras’ e civis mortos, que posteriormente foram apresentados pelas Forças Armadas como baixas de guerrilheiros em combate. Os ex-membros da AUC informaram que a ação fazia parte de um acordo feito com oficiais do Exército em Meta, em especial do batalhão 21 Vargas, para realizar execuções de civis fora dte combate e operações conjuntas contra a guerrilha.

Daniel Rendón é conduzido preso por militar colombiano

Os paramilitares (...) vestiam-nos com roupas camufladas, colocavam um fuzil em suas mãos e os executavam Os paramilitares nomearam vários oficiais e sub-oficiais como responsáveis pelo acordo. Um deles relatou que usavam armadilhas para capturar as vítimas. Os jovens, por exemplo, eram convidados, durante à noite, a ir a bares e bordeis. Os paramilitares pagavam-lhes bebidas para que ficassem bêbados até que perdessem a consciência. Depois, vestiam-nos com roupas camufladas, colocavam um fuzil em suas mãos e os executavam. Posteriormente, os corpos apareciam em outro local. Com essa prática, os militares mostravam resultados a seus superiores e, ao mesmo tempo, garantiam que o Exército diminuísse a pressão sobre as AUC. O Batalhão 21 Vargas foi condecorado pelo Ministério da Defesa, em

2003, como a melhor unidade do país, por seus resultados em operações quando estavam sob comando do coronel Hernán Cabuya de León, conhecido por “Chatarro”. “Don Mario” reiterou, como em outras versões, que, mensalmente, entregava 45 milhões de dólares a “Chatarro” para que este coordenasse, junto com o coronel Cabuya, as operações. O paramilitar afirmou que, em uma ocasião, as AUC ajudaram na montagem de um acampamento guerrilheiro, que foi noticiado como uma exitosa operação do Batalhão Vargas. Além disso, afirmou que, em outras diligências, entre 2002 e 2004, ocorreram, em Meta, mais de 100 casos de execuções apresentadas pelo Exército como mortes de guerrilheiros em combate. (Do Tribuna Latina)

la U” tem prisão preventiva decretada no país por conta do bombardeio de 2008. Recentemente, em um debate, Santos afirmou que, se necessário, faria tudo de novo, e que tinha orgulho do operativo ter ocorrido em sua gestão. O mandatário equatoriano, Rafael Correa, respondeu ao possível novo presidente. “Eu não quero me imiscuir na política interna de um país, menos ainda neste momento de campanha presidencial, mas reafirmo o que já disse: essas declarações atentam abertamente contra o direito internacional e interamericano”, afirmou. Correa ainda agre-

gou que as declarações de Santos mostram que ele “não é um perigo só para o Equador, mas para toda América Latina”. No mesmo debate em que Santos defendeu seu ataque ao Equador, Antanas Mockus discordou do ex-ministro da Defesa, afirmando que não ordenaria uma operação militar em um país vizinho sem a permissão do Executivo, ainda que fosse para capturar um destacado guerrilheiro, pois “os fins não justificam os meios” e “a Constituição colombiana nos obriga a cumprir os tratados internacionais e a respeitar os países vizinhos”.

Mudança possível No geral, esse tem sido o discurso de Antanas Mockus: respeito às leis, combate à corrupção, moderação. Ex-prefeito da capital colombiana (Bogotá) por duas vezes, Mockus fez gestões bem avaliadas pela população e propagandeou suas conquistas na campanha eleitoral. A esquerda, porém, vê com desconfiança o candidato do Partido Verde. O Polo Democrático Alternativo, identificado como o partido de esquerda de maior aceitação na sociedade, propôs uma aliança democrática para derrotar o uribismo. A coalizão do Partido Verde não só não aceitou como iniciou uma campanha contra o candidato do Polo, Gustavo Petro, com o objetivo de ganhar seus eleitores. Jorge Enrique Robledo, senador pelo Polo Democrático Alternativo, afirmou, entretanto, que a proposta de Mockus tem pouco a ver com a de seu partido, principalmente na questão econômica. “Suas propostas se enquadram dentro do Consenso de Washington, da abertura econômica, do neoliberalismo, livre comércio, privatizações. (...) Nesse sentido, seu programa coincide mais, muito mais, com o de Santos, Noemí e com o de Álvaro Uribe”, opinou. Mockus também se posicionou favoravelmente à instalação das bases estadunidenses no país. “[Os EUA] são nossos principais sócios na luta contra as drogas. Nós precisamos contar com a presença em território colombiano de aviões, tripulação e contratistas norte-americanos, numa escala que está regulada pelos acordos. Os países que nos criticam por essa aproximação não nos ofereceram uma ajuda similar, nem têm a tecnologia suficiente”, defendeu. (Com informações do jornal Página/12 e da Agência Latinoamericana de Notícias – Alai)


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américa latina Fotos: Reprodução

Colômbia, onde dizer é proibido, mas urgente

O jornalista colombiano Hollman Morris, responsável pelo “Contravía”, um dos poucos programas de TV a mostrar a perseguição contra os povos

ENTREVISTA Para comunicadores da “Minga de Resistência”, o governo de Álvaro Uribe é a síntese entre a política das transnacionais vinculada ao Estado colombiano e ao narcotráfico Pedro Carrano e Danilo Silva de Quito (Equador) A LUTA POLÍTICA na Colômbia é a síntese entre perseguições abertas contra opositores, criminalização dos povos originários para arrancá-los dos territórios e a tentativa de conter qualquer movimento social e civil – com o pretexto da luta militar. Quem assume essa postura é uma fração do poder que agora unifica o narcotráfico, transnacionais e latifundiários em um mesmo governo, sob o comando do presidente Álvaro Uribe. Essa é a análise dos comunicadores populares Manuel Rozental e Vilma Almendra, em entrevista ao Brasil de Fato. Como parte do movimento indígena, da comunidade Nasa, na região de Cauca, eles já sofreram na pele acusações de participar de uma ou outra força beligerante e hoje são perseguidos. Ambos são construtores da “Minga de Resistência”, surgida ao norte colombiano, no ano de 2004, e difundida pelo país por meio de marchas e da construção de uma agenda com os movimentos sociais. Um movimento de massas que carrega uma experiência social de novo tipo. Brasil de Fato – Qual é a situação dos meios de comunicação alternativos e críticos na Colômbia?

Manuel Rozental – A Colômbia é o segundo país do mundo com a pior situação em termos de perseguição à liberdade de imprensa. O primeiro é o México. Aqui, a perseguição aos jornalistas é sistemática, constante. Há muitos casos conhecidos internacionalmente. O de Hollman Morris, por exemplo, é emblemático. Hollman é mais conhecido hoje em dia por um programa de TV chama-

do “Contravía”, um dos únicos programas na Colômbia que apresenta a realidade de perseguição contra os povos. Como ele diz, ele entrega o microfone e a câmera às pessoas para que elas contem sua história. Perseguiram-no e o acusaram publicamente em muitas ocasiões. Outro caso conhecido na Colômbia é o de Jaime Garzón, que era mais que um jornalista, mas um humorista, um crítico deste regime, um símbolo para este país. Assassinaram-no os paramilitares, com total impunidade até agora. Recentemente se descobre que o assassinato dele está envolvido com o então diretor dos Serviços Secretos do Setor de Inteligência de Colômbia (DAS), porque fabricaram toda uma montagem para mostrar quem havia matado Garzón. A jornalista Claudia Julieta Duque descobre que há vínculos do Estado. Então, ameaçam-na e o serviço secreto aciona uma escolta. Claudia então descobre que essas mesmas escoltas têm a missão não só de espiá-la, mas de fazer um “falso positivo” com ela, inventar coisas e vinculá-la com as Farc. Investigando suas próprias escoltas, Claudia descobre que o DAS desenvolveu manuais para perseguir políticos e periodistas, manuais para ameaçar filhos e filhas de opositores políticos. O Estado da Colômbia, governo e serviço secreto, fabricaram estratégias específicas para perseguir qualquer opositor político. E os jornalistas estão em primeiro nessa fila.

“O que querem não é um processo jurídico, mas matar os militantes” O governo de Álvaro Uribe está envolvido diretamente com esse projeto político?

Manuel Rozental – A situação de jornalistas e comunicadores é grave. Por exemplo, na Colômbia todos ouvimos emissoras privadas de rádio com audiência enorme, como 10 milhões de rádios, em um país de 40 milhões de habitantes. Um desses programas é o de Daniel Coronell, um jornalista que não é de esquerda, mas é crítico, um excelente investigador, vítima de perseguição e ameaças relacionadas com o presidente Álvaro Uribe. Um narcotraficante

“Investigando suas próprias escoltas, Claudia descobre que o DAS desenvolveu manuais para perseguir políticos e periodistas, manuais para ameaçar filhos e filhas de opositores políticos” conhecido, que é amigo pessoal de Uribe e está na prisão, de seu computador saíram as ameaças contra Daniel Coronell. Frente ao juiz, perguntam-lhe quem fabricou as ameaças contra o jornalista e o traficante diz que muitas pessoas têm acesso a esse computador, começando pelos filhos de Uribe. Confrontaram Coronel ao vivo com o presidente Uribe. Então, Uribe, a gritos, diz a Daniel que “ao senhor ninguém perseguiu, o senhor inventa essas mentiras para conseguir bolsas e prêmios de jornalismo no exterior”. Uribe não deixa Coronell falar ao vivo. O jornalista diz publicamente na rádio “que os filhos de Uribe trabalharam em um computador de onde saíram ameaças a mim, e o senhor não respondeu a isso”. Então, Coronell está totalmente ameaçado. Como se dá a perseguição contra militantes e comunicadores ligados às comunidades e à “Minga de Resistência”?

Manuel Rozental – Estou fora de Colômbia desde setembro de 2009. No dia 4 de março a revista Cambio tira uma reportagem especial sobre política, sem assinatura de jornalista, e aparece um parágrafo onde diz textualmente que estou cooperando com o Exército de Liberação Nacional (ELN), uma das organizações na Colômbia, em sua cruenta luta contra as Farc pelo controle do norte de Cauca. Ou seja, que estou ajudando a guerrilha em uma disputa por controle territorial, o que quer dizer que sou de uma guerrilha contra a outra. Logo, sou objeto militar do exército. E se me matam, podem dizer abertamente na mídia que uma guerrilha me matou. A mesma estratégia que falamos que se usou contra Jaime Garzón: primeiro o apontaram como [membro] do ELN e depois das Farc, e depois o mataram para que ninguém soubesse quem o matou. E os meios de comunicação sinalizam os militantes para que sejam perseguidos, além

de fomentar a disputa entre os próprios grupos guerrilheiros.

Manuel Rozental – Suponha que o governo da Colômbia decide fazer um processo político contra mim por acusação de rebeldia, porque faço parte do ELN, como eles mesmos dizem. Assim, todas as provas existentes não se podem fazer públicas enquanto não haja um processo jurídico, então essas provas teriam que virar públicas para o processo jurídico. Quando se fazem públicas vão saber coisas como esta: que não há nada contra mim, que foi uma montagem. Então eles querem processar os militantes, certo? Não. O que querem não é um processo jurídico, mas matar os militantes. Esse processo de repressão vem de quando?

Vilma Almendra – Piorou muito desde quando entrou o governo Uribe. Já nos governos [anteriores] havia paramilitares, narcotráfico, interesses das corporações desde muito tempo atrás, mas o governo Uribe implica uma transição quando o Estado, já não o governo, entra para fazer parte de uma aliança entre narcotraficantes, latifundiários e corporações transnacionais. O governo Uribe é isso. Uma apropriação do Estado colombiano por máfias, assassinos e, de outro lado, das corporações transnacionais. Aí se torna política de

Estado a perseguição aberta contra a oposição. Até o último que se oponha. Já faz oito anos. Caso muito conhecido é o do sociólogo Alfredo Molano, que escreveu muitíssimos livros e esteve exilado na Espanha. Regressou. Todos o conhecem dentro da Colômbia. Ele acusou com provas a família Araújo de narcotráfico e sequestros, assassinatos e paramilitarismo, e eles estão no governo Uribe. Fizeram um juízo e perseguição política. A família o acusa de difamação e querem metê-lo no cárcere. Ele se salva por uma pressão internacional enorme.

“O governo Uribe é isso. Uma apropriação do Estado colombiano por máfias, assassinos e, de outro lado, das corporações transnacionais” Que acúmulo vocês tiveram no trabalho de comunicação com o povo Nasa?

Vilma Almendra – Há na Colômbia cerca de 90 povos indígenas, falantes de 63 línguas, o que não é mais que 2% do país. O povo Nasa é o segundo maior. Esse povo tem uma característica de “caminhar a palavra”, a história desse povo é a história de um processo de comunicação. O principio é este: “a palavra sem ação é vazia, a ação sem palavra é cega, e a palavra em ação por fora do espírito da comunidade é a morte”. O modelo é o proble-

ma, de capital transnacional e de acumulação. A segunda questão é a das leis e os tratados de livre comércio, legislação para tirar das pessoas direitos e riquezas. Há que derrubar essas leis e refazêlas desde os povos. O terceiro é o terror, não a guerra, mas o terror como estratégia do regime transnacional para despojar os povos. Quando dizem que houve um assassinato, dizemos que houve um roubo à mão armada. Pois nos matam para roubarnos. Não há nenhum preso ou desaparecido em Colômbia – nenhum! –, por razões políticas que não sejam para tirar-nos do território. Quarto ponto: não importa quem esteja no governo, os Estados têm obrigações com os povos, algo que conquistamos com luta. A outra questão é que estávamos na resistência, mas passamos à ofensiva. Temos que ter agenda própria, senão sempre se negocia a do outro. Não podemos esperar o que propõe o poder. Esses cinco pontos de agenda são levantados por um povo que é menos de 1% da população da Colômbia, que está submetido à guerra todos os dias. Ameaças, paramilitares, polícia, exército. A agenda nasce aí e se expande. Desde 2004, os movimentos sociais a acolhem, para se converter em realidade, isso é o que se chama a “Minga de Resistência” [mutirão, em português] para entregar uma agenda ao país. Entendemos mobilização como uma ação de comunicação. Nós bloqueamos uma via, recuperamos terra, confrontamos a força pública, sem armas, falamos com outros povos, não só indígenas, para construir a partir desta agenda. Fizemos 600 quilômetros de marcha falando com as pessoas. Tem êxito a mensagem e vem a repressão, diretamente contra um tecido de comunicação. Neste momento, esta palavra que caminha está ameaçada, mas se converteu no mais forte processo de resistência na Colômbia.

Para entender

O presidente colombiano Álvaro Uribe

Falsos Positivos – A política dos “falsos positivos” consiste no assassinato de civis, militantes, jovens, líderes de comunidades e de bairros da periferia, para atingir dois objetivos principais: inflar o número de baixas inimigas obtidas pelos militares e desmobilizar a resistência civil. Em 2002, descobriu-se que as baixas anunciadas pelo exército eram muito maiores que o número estimado de guerrilheiros no país.


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américa latina Monsanto

Monsanto e o “Projeto Vencedor” no Haiti Thalles Gomes de Porto Príncipe (Haiti) SEMENTES transgênicas estariam sendo doadas ao Haiti pela empresa estadunidense Monsanto. A denúncia foi feita, em 10 de maio, em artigo escrito pelo padre inglês Jean-Yves Urfié, ex-professor de química do Collège Saint Martial, em Porto Príncipe, capital do país. “A empresa transnacional Monsanto está oferecendo aos agricultores do país um presente mortal de 475 toneladas de milho transgênico, junto com fertilizantes associados e pesticidas, que serão entregues gratuitamente pelo Projeto WINNER [Vencedor, em inglês], com o respaldo da embaixada dos Estados Unidos no Haiti”, alertou. Segundo ele, a transnacional Monsanto já começou a distribuir sementes de milho transgênicas nas regiões de Gonaives, Kenscoff, PétionVille, Cabaré, Arcahaie, Croixdes-Bouquets e Mirebalais. A forte repercussão dessa denúncia obrigou o ministro da Agricultura do Haiti, Joanas Ford, a convocar uma coletiva de imprensa para o dia 12 de maio, em Porto Príncipe. “O Haiti não tem a capacidade para gerenciar os OGM [Organismos Geneticamente Modificados]”, afirmou, antes de desmentir que a doação da Monsanto fosse de milho transgênico – segundo ele, as sementes são, na verdade, híbridas, “tecnologia” antecessora dos transgênicos.

Além disso, as famílias camponesas não poderão reaproveitar as sementes que brotarem desse milho, já que uma das características das sementes híbridas é que apenas a sua primeira geração é adequada para o plantio

ção integra uma campanha do Ministério da Agricultura para revitalizar o setor agrícola depois do terremoto de 12 de janeiro. Para tanto, informa o ministro, mais de 65 mil hectares de terra estão sendo beneficiados com tratores para o preparo do solo, fertilizantes, defensivos agrícolas e formação para os agricultores. A própria Monsanto se viu obrigada a se pronunciar sobre o caso. “Nós acreditamos que a agricultura é a chave para a recuperação a longo prazo do Haiti”, afirmou a transnacional, em nota publicada em sua página na internet. “Após o desastre, a Monsanto doou dinheiro para a recuperação”, continua a nota, “mas, era evidente que a doação de nossos produtos – milho e sementes de hortaliças de qualidade – poderia realmente fazer a diferença na vida dos haitianos”. Foi imbuída desse “espírito de generosidade” que a maior fornecedora de sementes do mundo resolveu doar ao Haiti o equivalente a 4 milhões de dólares em sementes de milho híbrido, repolho, cenoura, berinjela, melão, cebola, tomate, espinafre e melancia. Sessenta toneladas dessas sementes chegaram em território haitiano na primeira semana de maio. Outras 70 toneladas aportaram na capital Porto Príncipe no dia 13 de maio. A previsão é que, para os próximos 12 meses, mais 345 toneladas de sementes híbridas de milho sejam distribuídas para os agricultores do país. Tática empresarial O terremoto de 12 de janeiro causou a morte de 300 mil pessoas e desabrigou mais de um milhão de haitianos. Suas consequências foram devastadoras. Mas, apesar de ter alcançado sete graus na escala Richter, é bem pouco provável que o tremor de terra tenha abalado as estruturas de funcionamento de uma empresa transnacional como a Monsanto. A doação das 475 toneladas de sementes híbridas pode ser propagandeada como

Placa em campo de experimento do Programa de Urgência de Produção Alimentar 2010 da USAID Winner no Haiti

uma ação de generosidade da transnacional com o povo haitiano. Todavia, se forem analisadas as condições em que essa doação está sendo feita, a generosidade se converte em mera tática empresarial para aumento de divisas. O lucro da Monsanto no trimestre que se encerrou em 28 de fevereiro de 2010 foi de 887 milhões de dólares. No mesmo período do ano passado, o lucro fora de 1,09 bilhão, o que significa uma queda de 19%. Segundo o diretor executivo da transnacional, Hugh Grant, o principal motivo desse decréscimo foi a diminuição nas vendas de herbicidas e produtos químicos. Em conferência a analistas, no início de abril, Grant afirmou que não poderia recorrer ao aumento de preços para reverter a situação, já que os agricultores não parecem dispostos a pagar preços mais altos pelas novas linhas de sementes transgênicas, algumas das quais duas vezes mais caras do que as variedades mais cultivadas hoje. “O retorno que estou tendo dos fazendeiros é o de que, se nossos preços forem diferentes, a curva de adoção das sementes será diferente”, disse. Abrindo mercados Não sendo possível aumentar o preço dos seus produtos, a única saída para a Monsanto reverter a queda na sua taxa de lucros é a abertura de novos mercados consumidores. Não é à toa que, pouco menos de um mês após a conferência de Hugh Grant, as sementes da Monsanto aportaram no Haiti. O que não foi dito nem pela Monsanto, nem pelo Ministério da Agricultura haitiano, é que essas sementes híbridas de milho só poderão cumprir suas promessas de produtividade e adaptação ao clima tropical haitiano se forem tratadas com herbicidas, fertilizantes e produtos químicos específicos, que, não por acaso, são produzidos pela própria Monsanto. Isso significa que os agricultores haitianos que as receberem só conUSAID/CC

“Nós tomamos todas as precauções antes de aceitar a oferta feita pela multinacional Monsanto para fazer uma doação de 475,947 kg de sementes de milho híbrido e 2.067 kg de sementes de hortaliças. Devemos também mencionar que, na ausência de uma lei que regulamenta a utilização de Organismos Geneticamente Modificados (OGM) no Haiti, não posso permitir a introdução de sementes ‘Roundup Ready’ ou qualquer outra variedade de transgênicos”, enfatizou o ministro. Campanha Segundo Ford, as sementes híbridas oferecidas pela Monsanto são adaptadas às condições tropicais do Haiti. A doa-

O presidente haitiano René Garcia Préval e Rajiv Shah, da USAID

Monsanto

TRANSGÊNICOS Transnacional estadunidense é acusada de doar 475 toneladas de milho geneticamente modificado ao país afetado pelo terremoto de 12 de janeiro

Funcionários da Monsanto embarcam as sementes para o país

“A empresa transnacional Monsanto está oferecendo aos agricultores do país um presente mortal de 475 toneladas de milho transgênico, junto com fertilizantes associados e pesticidas” seguirão torná-las produtivas se adquirirem os herbicidas e fertilizantes da Monsanto. Além disso, as famílias camponesas não poderão reaproveitar as sementes que brotarem desse milho, já que uma das características das sementes híbridas é que apenas a sua primeira geração é adequada para o plantio. Se quiserem continuar produzindo na próxima safra, os camponeses terão de comprar novas sementes da Monsanto. Nesse ritmo, com o aumento do consumo de sementes e, consequentemente, de herbicidas, fertilizantes e produtos químicos da Monsanto, a previsão do Padre Jean-Yves Urfié poderá se tornar realidade: “Em breve, haverá apenas sementes da Monsanto no Haiti. Então, será o fim da independência dos agricultores”. Vencedor A Monsanto não está sozinha nessa empreitada. O transporte e toda logística de distribuição das sementes está a cargo de outras duas empresas estadunidenses, a Kuehne + Nagel Emergency and Relief Logistics e a UPS Foundation. Ken Sternad, presidente da UPS, fez questão de se pronunciar sobre essa ação: “Como parte de nossos esforços contínuos para apoiar a recuperação do Haiti, a UPS tem o orgulho de doar os nossos serviços para os navios de sementes, já que o país começa a se mover em direção à construção de um futuro sustentável”. Esse “futuro sustentável” de que fala Sternad, e que vem atraindo o interesse de tantas empresas estrangeiras, está consolidado no Projeto WINNER. Lançado em 08 de outubro de 2009 pela USAID (Agência dos Estados Unidos

para o Desenvolvimento Internacional), o projeto investirá 126 milhões de dólares, nos próximos cinco anos, para construir uma nova infraestrutura agrícola no Haiti, com o objetivo de aumentar sua produtividade. Para tanto, irá fornecer assistência técnica especializada, além de serviços técnicos e insumos agrícolas, como pesticidas e fertilizantes. Atores por trás É por intermédio desse projeto que serão distribuídas as 475 toneladas de sementes da Monsanto. De fato, tais sementes não chegarão diretamente às mãos dos camponeses haitianos. Elas serão destinadas, primeiramente, a lojas geridas pela USAID. Depois, serão vendidas por um preço “significativamente reduzido” às famílias camponesas. “Nossa meta é atingir 10 mil agricultores nesta temporada”, informou Jean Robert Estime, diretor responsável pelo Projeto WINNER. “As sementes ajudarão a alimentar e fornecer oportunidades econômicas para os agricultores, suas famílias e a comunidade em geral”. Para compreender que tipo de “oportunidades econômicas” são essas, é preciso elucidar quem são os atores por trás do Projeto WINNER. Jean Robert Estime, por exemplo, serviu como ministro das Relações Exteriores durante os 29 anos da ditadura Duvalier no Haiti, época em que foram assassinados mais de 30 mil haitianos e o país abriu suas portas para os produtos alimentícios estrangeiros. Graças a essa abertura, a nação caribenha importa, hoje, 80% dos alimentos que consome. Arquiteta e coordenadora do WINNER, a USAID é uma

agência governamental estadunidense criada em 1961. Segundo sua página oficial na internet, tem a missão de “promover os interesses da política externa dos Estados Unidos na expansão da democracia e dos mercados livres, melhorando a vida dos cidadãos do mundo em desenvolvimento”. Com sede em Washington/ DC, a USAID está presente nas cinco regiões do mundo. Seu trabalho apoia “o crescimento econômico e os avanços da política externa dos Estados Unidos”. Novo terremoto “Trata-se de um novo terremoto, mais perigoso a longo prazo do que o que ocorreu em 12 de janeiro. Não se trata de uma ameaça, mas de um ataque muito forte à agricultura camponesa, aos camponeses e às camponesas, à biodiversidade, às sementes crioulas que estamos defendendo, ao que resta de nosso meio ambiente”, denuncia Chavannes Jean-Baptiste, coordenador do MPP (Mouvman Peyizan Papay) e membro da Via Campesina haitiana. Chavannes acusa o governo haitiano de estar aproveitando o terremoto para vender o país às forças imperialistas e às empresas transnacionais. “Não podemos aceitar isso”, adverte. “Devemos iniciar já a mobilização contra esse projeto, contra a Monsanto no Haiti. Necessitamos de uma unidade interna forte e uma forte solidariedade internacional para enfrentar a Monsanto e todas as forças da morte que querem acabar com a soberania total desse pequeno país, que conquistou sua independência com o sangue de seus filhos e de suas filhas desde 1804”. Como primeiro passo desse enfrentamento, o MPP convocou os camponeses a enterrar e queimar todas as sementes de milho provenientes do Ministério da Agricultura. Além disso, uma grande marcha está sendo planejada pela Via Campesina Haiti para os dias 4 e 5 de junho, na ocasião do Dia Internacional do Meio Ambiente. A marcha partirá da região de Papay e terá como destino a cidade de Hinche, capital do departamento Central.


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de 20 a 26 de maio de 2010

internacional

“A crise grega se insere na crise global do capitalismo” ENTREVISTA Para o jornalista e escritor português Miguel Urbano Rodrigues, as políticas que a União Europeia tenta impor na Grécia, Portugal, Espanha e Irlanda estão destinadas a fracassar Indymedia/Grécia

Nilton Viana da Redação A UNIÃO Europeia não pretende solucionar os problemas da Grécia. Essa é a avaliação do jornalista e escritor português Miguel Urbano Rodrigues. Por isso, segundo ele, a entidade impôs um pacote draconiano, com a cumplicidade do governo de Atenas. “A mídia colabora transmitindo uma visão deformada, falsa, da realidade grega”, diz, em entrevista ao Brasil de Fato. Para Urbano, a crise grega se insere na crise global do capitalismo, originária dos EUA. “A humanidade vive uma crise global e estrutural do capitalismo que se agrava, a cada mês, nas frentes econômica, financeira, cultural, energética, ambiental, militar, social e política. É uma crise de civilização”, afirma. Brasil de Fato – Que avaliação o senhor faz da atual crise financeira da Grécia?

Miguel Urbano Rodrigues – A crise grega insere-se na crise global do capitalismo, cujo polo continua a situar-se nos Estados Unidos, contrariamente ao que afirma a grande mídia. Quais as consequências dessa crise para a União Europeia (UE)?

Os grandes da União Europeia – a Alemanha e a França – alarmaram-se com o agravamento da situação na Grécia porque ela integra a zona do euro. Outras crises, como as das repúblicas bálticas e a da Islândia, não mereceram a mesma atenção porque esses países não fazem parte do sistema monetário da Europa. A Islândia nem é membro da UE. No momento, a preocupação em Bruxelas [sede da UE] com a evolução dos acontecimentos em Portugal e na Espanha aumenta a cada dia. O presidente do Banco Central Europeu, Jean Claude Trichet, está consciente de que o futuro do euro se joga nesses três países. O desemprego na Espanha já supera os 20%. A aprovação de um fundo de 600 bilhões de euros – mais 150 bilhões do FMI [Fundo Monetário Internacional] – para enfrentar situações similares à da Grécia “em defesa do euro” é reveladora do pânico instalado em Berlim e Paris. Quase simultaneamente, após idas a Bruxelas, [José Luís] Zapatero [primeiro-ministro da Espanha] e [José] Sócrates [primeiro-ministro de Portugal] anunciaram medidas quase tão duras como as impostas ao povo grego pelo governo de [George] Papandreou [primeiro-ministro grego]. Não resultaram de decisões institucionais tomadas no âmbito do Tratado de Lisboa. O presidente da União Europeia, [Herman Van] Rompuy, e a britânica responsável pela sua política exterior [Catherine Ashton] nem sequer foram ouvidos. O binômio MerkelSarkozy [Angela Merkel e Nicolas Sarkozy, primeira-ministra da Alemanha e presidente da França, respectivamente] apresentou exigências as quais os chefes dos governos espanhol e português se submeteram docilmente: cortes nos salários, congelamentos, taxas sobre o subsídio de Natal, aumento do IVA [Imposto sobre Valor Agregado] e do Imposto de renda, redução de benefícios fiscais e aumento de uma multiplicidade de outros impostos. No caso português, Sócrates garantiu, nos últimos meses, que não aumentaria os impostos. Agora, deu o dito por não di-

Polícia grega reprime manifestação do dia 1º de maio, em Atenas

“Outras crises, como as das repúblicas bálticas e a da Islândia, não mereceram a mesma atenção porque esses países não fazem parte do sistema monetário da Europa” to. Significativamente, o PSD [Partido Social Democrata], o maior partido da oposição, para o qual o aumento de impostos era inimaginável, mudou de posição e surge numa aliança tácita com o governo. Ambos pedem a “compreensão” do povo, falam de “esforço patriótico”, de “sacrifícios necessários”. Não há limites para a hipocrisia do discurso oficial. Em Madri, o telefonema de Barack Obama a Zapatero sobre a crise suscitou um escândalo tamanho que o presidente dos EUA emitiu uma declaração afirmando que não exercera “pressões”, limitando-se a felicitar o presidente do governo espanhol. Como o senhor vê as medidas até agora propostas pela União Europeia para solucionar os problemas da Grécia? Essa crise tende a se agudizar?

A União Europeia não pretende solucionar os problemas da Grécia. Impôs um pacote draconiano com a cumplicidade do governo de Atenas. A mídia, aliás, colabora

transmitindo uma visão deformada, falsa, da realidade grega. Em primeiro lugar, o país não estava à beira da bancarrota. Os grandes bancos, tal como os da península Ibérica, acumulam lucros. Mas o endividamento do país, resultante das políticas neoliberais, atingira um nível tão elevado, superando o PIB, que as portas do crédito internacional se fecharam, pois as taxas de juro exigidas pela banca estrangeira subiram vertiginosamente. As agências de rathing – todas estadunidenses – colaboraram na campanha anti-grega, esboçando um panorama catastrófico. Um dos boatos difundidos foi o de que o país poderia ser expulso da zona do euro. O objetivo de colocar a Grécia sob tutela de Bruxelas foi atingido. Mas o povo reagiu. Essa reação já era esperada? Como o senhor analisa essas mobilizações populares?

Os senhores da finança internacional não esperavam a reação do povo grego. Desde dezembro, houve, no paReprodução

ís, sete greves gerais. Todas levadas adiante com êxito. A de 5 de maio, gigantesca, paralisou o país. Centenas de milhares de trabalhadores protestaram em Atenas e 68 outras cidades contra a agressão exterior, mascarada de “ajuda”. Como era de se esperar, a mídia internacional desinformou, na Europa e na América. Reduziu a dimensão do protesto e deturpou o significado da grande jornada de luta. Não conseguiu, contudo, ocultar que o país parou. Transportes, escolas, hospitais, fábricas, portos, aeroportos, comércio... o setor privado, solidário, juntou-se ao público. Os governantes e banqueiros da UE insistem em falar do “caos” grego, criticando os grevistas que se opõem às “medidas de austeridade” concebidas para “salvar o país”. Mentem conscientemente. A Grécia projeta, nestas semanas, a imagem de uma luta de classes exemplar na qual o seu povo, no confronto com o capital, assume o papel de sujeito histórico. No dia 4 de maio, reagindo à estratégia de Bruxelas, o Partido Comunista da Grécia (KKE) ocupou simbolicamente a Acrópole, em Atenas, e desfraldou naquela colina milenar bandeiras com uma inscrição: “Povos da Europa levantai-vos!”. O KKE está consciente de que a Europa não se encontra no limiar de uma situação pré-revolucionária. Na própria Grécia, não estão reunidas condições para um assalto ao poder. Nem por isso, o brado revolucionário do KKE é menos comovente e oportuno. As grandes revoluções não se forjam em dias, sequer em meses ou anos; não existe, para elas, data no calendário. Resultam de uma série de pequenas e grandes lutas inseridas em contextos históricos favoráveis. Os comunistas gregos não ignoram que a derrota do imperialismo vai tardar. Mas adquiriram a certeza de que a luta deve ser frontal e sem concessões no combate ao sistema que invoca a necessidade de “reformas” e de “políticas de austeridade” para reforçar a opressão social. Por isso mesmo, a exemplar lição de combatividade dos trabalhadores gregos e do seu partido de vanguarda é tão importante, bela e simbólica. O senhor acredita em reações como essa por parte dos povos de Portugal e Espanha?

Fachada do Banco Central Europeu, em Frankfurt, na Alemanha

Seria uma ilusão romântica crer que em Portugal e na Espanha a resposta popular aos

pacotes de “austeridade” será comparável à da Grécia. As condições subjetivas são muito diferentes. O povo grego tem tradições de luta seculares. No início da crise originada nos EUA, em 2008, o senhor disse que se tratava de uma crise estrutural, e não cíclica, como as anteriores. A crise da Grécia está inserida nesse contexto?

Como afirmei antes, o epicentro da crise permanece nos EUA. A humanidade vive uma crise global e estrutural do capitalismo que se agrava, a cada mês, nas frentes econômica, financeira, cultural, energética, ambiental, militar, social e política. É uma crise de civilização. O país que a mídia insiste em apresentar como a maior economia do mundo entrou numa fase de decadência irreversível. Os EUA são, hoje, o país mais endividado do mundo. A sua dívida externa, no final de 2008, atingia 13,7 trilhões de dólares, o equivalente ao PIB do país. Atualmente, já o excede. Supera todas as dívidas externas somadas da Europa, América Latina, Ásia e África. Uma dívida, portanto, impagável, anunciadora de um estouro que abalará o mundo. Só a China é possuidora de mais de 900 bilhões de dólares em reservas de dólares e títulos do Tesouro dos EUA.

A mídia capitalista tem alardeado a recuperação da economia estadunidense. O senhor acredita nesta recuperação?

No mundo corrupto da finança, pouca coisa mudou no último ano. Centenas de bilhões de dólares foram injetadas no “mercado” pela administração Obama, mas não para acudir as vítimas da crise, as camadas mais pobres do povo. As medidas tomadas pelo governo federal visaram a salvar da falência os responsáveis pelas ações criminosas que desencadearam a crise, sobretudo a grande banca, as seguradoras, os gigantes da indústria automotiva. Os patrões da finança são os mesmos, continuam a se atribuir salários e prêmios milionários e retomam as práticas fraudulentas que estiveram na origem do tsunami financeiro. Prêmios Nobel da Economia, como Joseph Stiglitz e Paul Krugman – ambos insuspeitos reformadores do capitalismo – e acadêmicos de prestígio mundial, como Noam Chomsky, arrancam a máscara do governo, desmontando a propaganda da “recuperação”. Acusam Obama de, ao invés de punir os cardeais da finança, ter colocado muitos deles em pontos-chave da administração. É o caso do secretário do Tesouro, Thimoty Geithner, exmagnata de Wall Street, hoje responsável pela política monetária do país. Mais expressivo ainda é o caso de Larry Summers. Esse homem foi, durante o governo de Bill Clinton [1993-2001], o autor intelectual da revogação da lei que impedia a “desregulamentação”, isto é, as políticas criminosas que conduziram a falências em cadeia. O que fez Obama? Nomeou-o seu assessor econômico. Por se tratar de uma crise estrutural do capitalismo, provavelmente teremos um aprofundamento dessa crise. Quais as consequências para os povos de outros países? O senhor acredita que teremos grandes reações da classe trabalhadora?

O prolongamento da crise mundial e o seu provável agravamento anunciam anos de grande sofrimento para a humanidade. Os acontecimentos da Grécia antecipam uma extraordinária intensificação das lutas sociais, sobretudo na Europa. A crise estrutural do capitalismo assinalou a falência total do neoliberalismo. As políticas que a União Europeia tenta impor na Grécia, em Portugal, na Espanha, na Irlanda estão destinadas a fracassar. João Peschanski

Por que, então, a hegemonia dos EUA ainda se mantém?

Dois fatores a garantem. O primeiro é o seu gigantesco poder militar. O outro, a permanência do dólar como moeda de referência no comércio internacional. E não há controle para a emissão da cédula verde. Mas, como o país se transformou numa sociedade parasitária que consome muitíssimo mais do que produz, avança para um desastre – sem data – de proporções colossais. O seu déficit comercial ultrapassou um trilhão de dólares no ano passado. Neste ano, será superior. Como a acumulação capitalista não funciona mais de acordo com a lógica do sistema, o governo Obama saqueia os recursos naturais de dezenas de países e desencadeia guerras de agressão ditas “preventivas”, com a cumplicidade dos aliados europeus. Nesse contexto, o presidente Obama, apresentado como político progressista e humanista, desenvolve uma estratégia que é urgente desmistificar, porque configura uma ameaça à humanidade.

Quem é Miguel Urbano Rodrigues é jornalista e escritor português. Foi redator e chefe de redação de jornais em Portugal antes de se exilar no Brasil, onde foi editorialista principal do jornal O Estado de S. Paulo e editor de internacional da revista brasileira Visão. Regressado a Portugal, após a Revolução dos Cravos, foi chefe de redação do jornal do Partido Comunista Português (PCP) Avante! e diretor de O Diário. Foi, ainda, assistente de História Contemporânea na Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, presidente da Assembleia Municipal de Moura, deputado da Assembleia da República pelo PCP, entre 1990 e 1995, e deputado das Assembleias Parlamentares do Conselho da Europa e da União da Europa Ocidental, tendo sido membro da comissão política desta última.


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