14 | mobilizações
julho de 2013
Porque o povo não é bobo! DEMOCRATIZAÇÃO Organizações populares elaboraram um projeto de iniciativa popular com 33 artigos para regulamentar o que diz a Constituição em relação às rádios e televisões brasileiras Maria Mello de Brasília (DF)
A evidente “virada” editorial empreendida pela cobertura feita do alto dos helicópteros das redes de televisão ao longo das últimas semanas pode ser uma pista da insatisfação da juventude em relação aos meios de comunicação tradicionais. O que de início fora tachado pelo paladino da democracia ditada pelos barões da mídia, Arnaldo Jabor, de “burrice levada a cabo por revoltosos de classe média que não valem 20 centavos” se tornou, dois dias depois, um “momento histórico lindo e novo”. Transfigurar as variadas pautas populares – em grande medida emanadas das redes sociais, que se estabelecem como canais de comunicação não mediada cada vez mais presentes
Reprodução
na vida política do país – em clamores especificamente relacionados aos seus interesses, impondo bandeiras genéricas e antipartidárias e ditando comportamentos potencialmente reacionários, tem sido a tônica atual da cobertura da mídia oligopolizada brasileira.
“O projeto, de iniciativa popular, traz em 33 artigos propostas para regulamentar o setor”
É frente a este cenário que movimentos sociais de todo o país vêm promovendo assembleias populares e aulas públicas, nas ruas, para discutir a cobertura das manifestações e a necessida-
de de fazer avançar políticas públicas que contribuam para reverter o quadro de concentração midiática que obstrui a efetiva liberdade de expressão no Brasil. Nelas, são discutidos temas como a universalização da banda larga, o Marco Civil da Internet -
Projeto de Lei que garante a liberdade de expressão e o direito à privacidade do usuário - e o Projeto de Lei da Mídia Democrática, lançado em maio passado, que pretende ampliar a liberdade de expressão e promover a diversidade e a pluralidade de opiniões nos
meios de comunicação. O projeto, de iniciativa popular, traz em 33 artigos propostas para regulamentar o que diz a Constituição em relação às rádios e televisões brasileiras. A marca de 1 milhão e trezentas mil assinaturas colocará o texto em deba-
te no Congresso Nacional. “Vamos levá-lo para as ruas e recolher as assinaturas necessárias. Se esse projeto não veio de quem tinha de fazer o governo brasileiro e o Congresso -, virá da mão do povo”, aponta Rosane Bertotti, coordenadora do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), entidade que impulsionou a criação do projeto. Os materiais de divulgação e o kit para coleta de assinaturas podem ser encontrados em www.paraexpressaraliberdade.org.br. Além dos debates públicos, também estão sendo agendados em todo o país protestos em frente às sedes da TV Globo – símbolo máximo da estrutura midiática concentrada - e de outras empresas representantes da hegemonia dos conglomerados de mídia nos estados.
Verbas concentradas são entrave Comunicações no país são dominadas por poucas famílias Marcio Zonta da Redação
Segundo o Instituto para Políticas de Mídia e Comunicação da Alemanha, a Rede Globo, umas das principais controladoras de veículos de comunicação no Brasil, está entre os 50 maiores grupos de mídia do mundo. Para o ranking, o instituto não considera o faturamento total do grupo, mas sim a parte referente aos produtos e canais de mídia. Conforme o instituto, a Rede Globo tem uma receita anual de mídia de 4,7 bilhões de euros.
De propriedade da família Marinho, a Globo já comprou os direitos de transmissão da Fifa para a Copa do Mundo de 2018 e 2022, detendo a única licença no Brasil. Os direitos incluem, além de televisão aberta, a distribuição em outras plataformas, como TV paga, internet e serviços móveis. A empresa ainda possui participações em negócios na Net Serviços (6,35%), Endemol Globo (50%), Telecine (50%), USA Brasil Programadora (50%), PB Brasil (60%), GB Empreendimentos (17%), Canal Brasil S.A. (50%) e associadas como
Sky Brasil. Junto aos Marinho, outras famílias se destacam no domínio das comunicações no país. São elas: Abravanel (SBT), Sirotsky (RBS, maior grupo de comunicação do sul do Brasil), Civita (Editora Abril), Macedo (Record), Frias (Folha de S. Paulo), Levy (Gazeta Mercantil), Mesquita (O Estado de S. Paulo) e Saad (Rede Bandeirantes). Dinheiro público A maioria dessas famílias seria beneficiada por interesses políticos, econômicos e ideológicos no recebimento de
verbas públicas. Entre junho e agosto de 2011, publicações no Diário Oficial escancararam parte dessa relação. José Bernardo Ortiz, então presidente da Fundação para o Desenvolvimento da Educação (FDE), nomeado pelo governador Geraldo Alckmin, fechou contratos com empresas de comunicação para que as escolas públicas do estado de São Paulo recebessem edições dos jornais Folha de S. Paulo e O Estado de São Paulo e das revistas Veja, IstoÉ e Época. A família Civita embolsou, pelo contrato de
“Globo já comprou os direitos de transmissão da Fifa para a Copa do Mundo de 2018 e 2022” um ano, R$ 1.203.280,00 milhões. Os Mesquita faturaram, na mesma situação e período, R$ 2.748.616,00 milhões e os Frias, R$ 2.581.280,00 milhões. A Globo abocanhou da verba estatal, R$
1.203.280,00 milhões na ocasião. Em setembro do ano passado, o Ministério Público Estadual requereu à Justiça bloqueio de bens de Ortiz acusando-o de improbidade administrativa, favorecimento a cartel e superfaturamento na compra de 3,5 milhões de mochilas escolares ao preço global de R$ 34,9 milhões. Segundo o MPE, o fato evidencia manejo de dinheiro público como forma de beneficiar certos grupos. Ortiz foi exonerado do cargo em março de 2013 pelo governo paulista.