Fábio Arantes/Secom
145 mil crianças fora das creches
Uma visão popular do Brasil e do mundo
Circulação Nacional Ano 10 • Número 501
Outubro de 2012 www.brasildefato.com.br
EDIÇÃO ESPECIAL – ELEIÇÕES SÃO PAULO
São Paulo para quem? O povo paulistano vive diariamente o drama da falta de moradia, o descaso com a saúde pública, a falta de investimentos em educação e o problema dos transportes públicos. Essa realidade precisa mudar. Danilo Verpa/Folhapress
editorial
Velhos problemas e a necessária mudança O POVO DE SÃO PAULO convive diariamente com problemas ligados à falta de prioridade para melhorar a vida dos mais pobres. Diante disso, é preciso reagir. É preciso mudar. E a mudança começa por derrotar as candidaturas que defendem os interesses da elite, dos que tiram vantagem do sofrimento dos mais pobres. No dia 7 de outubro, o paulistano irá às urnas escolher o novo prefeito e seus vereadores. Para contribuir com o debate, o Brasil de Fato traz, nesta edição especial, reportagens sobre os problemas e desafios que o próximo prefeito terá de enfrentar. A educação de má qualidade e a falta de vagas nas creches, no ensino médio e nas escolas técnicas não são problemas de todos, mas de quem não pode pagar. As grandes dificuldades na área da saúde também são diferentes para quem pode pagar um plano privado e para quem tem de esperar meses e meses para fazer um simples exame.
A falta de programas de moradia favorece a especulação imobiliária, que faz com que a população tenha de morar cada vez mais longe em busca de aluguéis mais baixos ou tenha de comprometer grande parte do seu salário pagando caro pelo aluguel. O histórico problema da falta de transporte público de qualidade estimula a compra de mais carros, o que causa enormes congestionamentos. Isso é agravado por um modelo de organização urbana que jogou os pobres para os bairros distantes e concentrou o emprego no centro expandido. A cidade conhecida como “coração econômico” do país, que tem um orçamento anual maior do que todos os outros estados, é um território de desigualdade social. Na mesma cidade moram milhões de pobres e as famílias mais ricas do país, donas dos bancos e das grandes empresas, que ignoram a realidade do povo. As saídas para os problemas que atingem a maioria da população não virão dos ricos.
A eleição de prefeitos e vereadores compromissados com uma gestão democrática, com prioridade para as demandas dos mais necessitados, faz a diferença
É preciso mudar
As forças políticas que sustentam as candidaturas de José Serra (PSDB) e Celso Russomano (PRB) representam os setores
que não querem essa mudança. Por isso, vendem o que não têm. Não podem dar o que o povo de São Paulo precisa: mudar a política da cidade. Serra é o candidato das forças políticas que aplicaram o neoliberalismo no Brasil, gerando desemprego, privatizações, baixos salários e aumento das desigualdades sociais. Russomano é um velho conhecido, aparece como popular por ter origem em um programa de televisão, mas tem propostas soltas, vagas e isoladas. Tem como principal proposta o fortalecimento do aparato repressivo. Ou seja, está longe de querer enfrentar as causas dos problemas do povo. A população precisa de uma prefeitura que enfrente as questões que aparecem no dia a dia. Para isso, não basta eleger um “síndico de prédio” aventureiro. É preciso resolver os problemas olhando para frente, com planejamento de médio e longo prazo para construir uma cidade que
corresponda às necessidades de sua população. Os problemas dos trabalhadores e trabalhadoras, dos pequenos comerciantes, pequenos empresários e, sobretudo, dos mais pobres não serão resolvidos por candidatos que representam os ricos e poderosos. Tampouco serão resolvidos por candidatos com um bom “palavreado”, mas que no fundo representam as piores práticas políticas do nosso país. Esse tipo de político, mesmo quando são eleitos com bandeiras populares, governam para os ricos. Por isso, só o povo organizado, consciente e com disposição de luta poderá impor as mudanças e garantir direitos, por meio da pressão sobre os governos. As eleições são momentos para se refletir sobre os problemas e se fazer opções. A eleição de prefeitos e vereadores compromissados com uma gestão democrática, com prioridade para as demandas dos mais necessitados, faz a diferença. Pense nisso!
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Ataque ao SUS, lotação e demora João Luiz G. Silva/Secom
SAÚDE Gestão da Saúde no município é marcada pelas péssimas condições de atendimento e por abertura ao poder privado
lha: minar a participação popular no Sistema Único de Saúde (SUS). Em dezembro de 2007, o governador José Serra ajuizou uma Ação Direta de Inconstitucionalidade (Adin), com pedido de liminar no Supremo Tribunal Federal (STF), para derrubar a lei estadual que criou os Conselhos Gestores de Saúde no SUS. Os conselhos gestores têm a função de avaliar e fiscalizar os serviços de saúde prestados à população. Sindicatos e movimentos de trabalhadores da saúde consideram esse modelo de gestão das OSs inconstitucional e que fere os princípios básicos do Sistema Único de Saúde, pois não contrata novos profissionais qualificados e concursados, precariza as relações de trabalho, não garante a integralidade e qualidade do atendimento médico, além de jogar por terra o controle social.
Eduardo Sales de Lima da Redação O QUE NÃO podia acontecer virou rotina. Demora no agendamento de consultas e corredores repletos de macas justapostas disputadas por pacientes portadores de diversos tipos de enfermidades. Eis o retrato da saúde pública no município mais rico do Brasil. É assim que se encontra, por exemplo, o Hospital Municipal do Campo Limpo, zona sul de São Paulo, administrado pela Prefeitura. Além da falta de leitos e médicos, a UTI pediátrica do Hospital está fechada há quase dois anos. De acordo com dados colhidos em 2011 pelo Ministério da Saúde, esse é o hospital mais lotado da cidade. A taxa de ocupação alcançou 111,5% no ano passado. Em segundo lugar está o hospital Jardim Iva, também na zona sul, com 96,9%. Aliás, a qualidade do atendimento em postos e hospitais públicos é hoje o maior motivo de insatisfação na capital, acima até mesmo de outras áreas como educação e limpeza urbana. A saúde é apontada como o principal problema da rede de serviços municipais por 26% dos eleitores. Os números são do Datafolha. Mais especificamente a insatisfação é grande com a demora em relação ao agendamento e realização de consultas. A população deu uma nota de 3,7 para esse sub-item, segundo pesquisa realizada pelo IBOPE Inteligência e pela Rede Nossa São Paulo, em junho deste ano. Ataque ao SUS
Além desses problemas crônicos, a gestão Serra-Kassab aumentou o repasse dos serviços públicos de saúde ao poder privado. Depois das Assistência Médica Ambulatorial (AMA’s), Unidades Básicas de Saúde, Programas de Saúde
UBS em São Miguel Paulista: aumento de repasses dos serviços públicos de saúde ao poder privado A saúde é apontada como o principal problema da rede de serviços municipais por
26
%
dos eleitores
da Família e hospitais, a última investida foi contra os Centros de Atenção Psicosocial (Caps), dedicados ao atendimentos de pacientes com transtornos mentais. Sobretudo as unidades abertas a partir de 2006 foram entregues às OSs (Organizações Sociais). Ocorre que as organizações sociais assinam contrato de concessão com o poder público e passam a administrar um serviço, recebendo uma verba pública correspondente, sem que tenham passado por licitação. Somado a isso, os con-
tratos não são acessíveis aos conselheiros e os critérios de contratação não são transparentes. Possuem metas contratuais, o que faz com que o atendimento médico tenha a qualidade comprometida, uma vez que a preocupação é quantidade, não a qualidade. Sob essa privatização mais sutil, o município busca não se responsabilizar pelos serviços públicos básicos. “As OSs roubam dinheiro público”, já destacava em 2008 o presidente do Sindicato dos Trabalhadores Públicos da Saúde no Estado de São Paulo (Sindsaude), Benedito Augusto de Oliveira.
Cracolândia, mais policiais que agentes de saúde Estratégia de “limpeza social” não deu certo da Redação O fracasso da ação do Estado na Cracolândia refletiu a opção pela repressão policial às ações de agentes de saúde. Segundo dados da Secretaria de Segurança Pública, desde janeiro ocorreram 489 prisões, mais de 6 mil encaminhamentos para serviços de saúde e 775 internações, além de 66 quilos de drogas apreendidos. Seis meses depois das ações repressivas da PM, a região, que abrange os bairros de Campos Elíseos e da Luz, continua com massiva presença de dependentes de crack. A pretendida “limpeza” da área pelo governo Geraldo Alckmin (PSDB), em parceria com a administração Gilberto Kassab (PSD), não deu certo. (ESL, com informações da Rede Brasil Atual)
Anti-democrático
No âmbito estadual, na gestão tucana dos anos de 2000 e 2007, os gastos proporcionais com as OSs cresceram 114,14%, saltando de 9,76% para 20,90% dos recursos gastos com saúde, segundo dados do Sistema de Informações Gerenciais da Execução Orçamentária (SIGEO), ligado à Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo. A experiência com as OSs incentivou José Serra a abrir outra frente de bata-
145 mil crianças estão fora da creche Fábio Arantes/Secom
EDUCAÇÃO Não será cumprida uma das principais promessas de campanha do prefeito Gilberto Kassab da Redação Com um Produto Interno Bruto (PIB) estimado em quase R$ 390 bilhões, a cidade de São Paulo teria potencial para ser a 40ª economia do mundo, caso fosse um país. A constatação foi feita pela Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (Fecomercio), no início de 2012. Ainda assim, a capital paulista ficou abaixo da média nacional na última avaliação do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). As escolas de 1ª a 4ª série mantidas pela Prefeitura atingiram 4,8 pontos, frente aos 5,0 conquistados pelas instituições em geral. Se as condições de ensino são desfavoráveis para quem já ingressou na rede educacional, certamente estão piores para quem ainda não conseguiu uma vaga. Esse grupo reúne desde crianças que vivem a primeira infância até adultos que tentam recuperar o tempo perdido. A avaliação é de Laura Cymbalista, integrante do grupo de oposição na diretoria do Sindicato dos Profissionais em Educação no Ensino Municipal de São Paulo (Sinpeem).
“As entidades conveniadas muitas vezes não têm profissionais qualificados. São profissionais que têm uma jornada super extensa, recebem muito mal, não têm estrutura”
“A gente quer zerar essa fila de espera, mas não por atividade conveniada. Acontece uma barbaridade em São Paulo. A Prefeitura dá prédio público para entidade conveniada. Há uma transferência enorme de recurso público para as entidades. E tem a questão do jogo político também. A gente sabe que depois cada creche elege o seu vereador. Tem o favor e o clientelismo vinculado a isso”, denuncia. Irresponsabilidade
Hoje, 145 mil crianças menores de três anos e onze meses estão fora da creche
“A gente tem duas pontas do atendimento que estão sendo excluídas da escola, inclusive pela política pública da Prefeitura: as crianças pequenas de zero a três anos e as pessoas mais velhas que não puderam se alfabetizar. A gente tem uma dívida principalmente com essas pessoas, trabalhadores e trabalhadoras que não puderam estudar na idade considerada adequada”. O prefeito Gilberto Kassab (PSD) encerra o seu mandato em dezembro de 2012. Considerando que 145 mil crianças menores de três anos e onze meses estão fora da creche, dificilmente será cumprida uma das principais promessas de campanha do então candidato nas eleições de 2008. Kassab anunciava que acabaria com o déficit de vagas em creches na cidade de São Paulo ao final de quatro anos.
Entre as crianças da referida faixa etária, apenas 50% são atendidas atualmente. No entanto, Cymbalista chama atenção para uma política que ela considera equivocada. Na tentativa de atender à demanda a qualquer custo, a Prefeitura criou convênios e transferiu responsabilidades para entidades que não têm condições de promover os serviços educacionais essenciais. “As entidades conveniadas muitas vezes não têm profissionais qualificados. São profissionais que têm uma jornada super extensa, recebem muito mal, não têm estrutura. E as casas que abrigam as unidades não têm condições de receber as crianças”. Ainda de acordo com a educadora, em algumas regiões da cidade, como Guaianazes, na zona leste, o número de creches conveniadas é cinco vezes maior que o da rede direta.
Recentemente, a gestão Kassab perdeu a oportunidade de receber consideráveis recursos que poderiam ser destinados à construção de creches. No final do ano passado, o governo federal liberou R$ 240 milhões para esse fim, mas a verba não pode ser utilizada porque a Prefeitura deixou de apresentar um projeto que atendesse às recomendações do Ministério da Educação (MEC). A intenção de zerar o déficit de vagas nas creches foi adiada para 2020, segundo consta na lista de metas estabelecidas pela atual gestão no Plano Municipal de Educação. O projeto está em análise na Câmara dos Vereadores desde o último dia 26 de setembro, mas deveria ter sido encaminhado pelo governo municipal em 2010. Para que isso ocorresse, foi necessária a intervenção do Ministério Público estadual, depois intensa pressão feita por organizações sociais. Segundo a ONG Ação Educativa, “em 2010, mais de duas mil atividades foram realizadas em escolas, comunidades e organizações para discutir propostas para o novo Plano. As ações culminaram na realização da Conferência de Educação da Cidade de São Paulo, em junho de 2010, no Anhembi, com mais de 1500 representantes”. O documento teve supervisão do poder público, mas foi elaborado com a participação de sindicados, movimentos e organizações sociais, estudantes e familiares.
Editor-chefe: Nilton Viana • Editores: Aldo Gama, Cristiano Navarro, Renato Godoy de Toledo • Subeditor: Eduardo Sales de Lima • Repórteres: Aline Scarso, Michelle Amaral, Patricia Benvenuti • Correspondentes nacionais: Maíra Gomes (Belo Horizonte – MG), Pedro Rafael Ferreira (Brasília – DF), Pedro Carrano (Curitiba – PR) • Correspondentes internacionais: Achille Lollo (Roma – Itália), Baby Siqueira Abrão (Oriente Médio), Claudia Jardim (Caracas – Venezuela), Marcio Zonta (Peru) • Fotógrafos: Carlos Ruggi (Curitiba – PR), Douglas Mansur (São Paulo – SP), Flávio Cannalonga (in memoriam), João R. Ripper (Rio de Janeiro – RJ), João Zinclar (Campinas – SP), Joka Madruga (Curitiba – PR), Leonardo Melgarejo (Porto Alegre – RS), Maurício Scerni (Rio de Janeiro – RJ) • Ilustradores: Latuff, Márcio Baraldi, Maringoni • Editora de Arte – Pré-Impressão: Helena Sant’Ana • Revisão: Jade Percassi • Jornalista responsável: Nilton Viana – Mtb 28.466 • Administração: Valdinei Arthur Siqueira • Programação: Equipe de sistemas • Assinaturas: Francisco Szermeta • Endereço: Al. Eduardo Prado, 676 – Campos Elíseos – CEP 01218-010 – Tel. (11) 2131-0800/ Fax: (11) 3666-0753 – São Paulo/SP – redacao@brasildefato.com.br • Gráfica: Folha Gráfica • Conselho Editorial: Angélica Fernandes, Alipio Freire, Altamiro Borges, Aurelio Fernandes, Bernadete Monteiro, Beto Almeida, Camila Dinat, Cleyton W. Borges, Dora Martins, Frederico Santana Rick, Igor Fuser, José Antônio Moroni, Luiz Dallacosta, Marcela Dias Moreira, Marcelo Goulart, Maria Luísa Mendonça, Mario Augusto Jakobskind, Milton Pinheiro, Neuri Rosseto, Paulo Roberto Fier, Pedro Ivo Batista, René Vicente dos Santos, Ricardo Gebrim, Rosane Bertotti, Sávio Bones, Sergio Luiz Monteiro, Ulisses Kaniak, Vito Giannotti • Assinaturas: (11) 2131– 0800 ou assinaturas@brasildefato.com.br • Para anunciar: (11) 2131-0800
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Imóveis abandonados e 130 mil famílias sem moradia Alessandro Shinoda/Folhapress
Apenas esse ano foram
MORADIA Somente na região central, onde há escolas, hospitais e cultura, há 40 mil domicílios vazios, que poderiam ter destinação social
69 0 3 5
favelas incendiadas, segundo o Corpo de Bombeiros, e
da Redação A CIDADE de São Paulo tem capacidade de atender todas as famílias que atualmente não têm onde morar, de acordo com dados oficiais. Segundo o Censo de 2010 do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), a capital paulista tem 290 mil imóveis não habitados e, conforme informa a Secretaria Municipal de Habitação, são 130 mil famílias sem moradia. Somente na região central, onde há maior oferta de trabalho, escolas, hospitais e cultura, existem 40 mil domicílios vazios, segundo Osmar Borges, coordenador da Frente de Luta Por Moradia (FLM), que organiza 12 mil famílias de baixa renda que reivindicam a garantia do direito à moradia. Para Osmar, uma saída viável seria a reforma e adaptação dos prédios vazios para acolher essa população – que, na sua maioria, ganha de um a três salários mínimos (R$ 622 a R$ 1866) e já trabalha no centro da cidade – a partir de uma ação conjunta entre os governos municipal, estadual e federal. “Para o poder público é vantajoso garantir moradia na área central porque o custo final da unidade é muito mais barato que na periferia, onde precisa construir serviços essenciais como escolas, creches, transportes, hospitais”.
desde 2008
Favelas incendiadas
Manifestação em prédio ocupado no centro de São Paulo
No entanto, está cada vez mais difícil ao trabalhador permanecer na região central da cidade. Uma pesquisa realizada pela Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe) e a ZAP Imóveis revelou que, entre janeiro de 2008 e novembro de 2011, o preço médio do metro quadrado valorizou 119,3% no bairro da Sé, 128,8% no Bom Retiro, 129,2% na República, 133,9% na Santa Efigênia. Nesses locais o preço médio do metro quadrado de um apartamento custa de R$ 3 mil a R$ 4 mil. O aluguel de um apartamento de 40 metros não sai por menos de R$ 1.200. O valor de um quarto em um cortiço custa em torno de R$ 500. “Para uns, o centro é local de trabalho e um meio de vida, para outras pessoas, um meio de extração de lucro e renda. O capital imobiliário não convive com núcleos de pobreza, esses núcleos impactam no preço”, argumenta a urbanista da USP, Ermínia Maricato.
Operações urbanas e remoções De acordo com informações do Observatório de Remoções da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo (FAU) da Universidade de São Paulo, há na cidade 486 favelas com alto risco de serem removidas. Isso porque localizamse em áreas onde estão previstas intervenções urbanas da Prefeitura – como o Projeto Manancial e a construção de parques lineares. “O único valor envolvido na política de moradia em São Paulo é o valor do mercado, o que é absolutamente errado do ponto de vista de uma política de estado. É preciso entender que é um direito as pessoas permanecerem onde estão e terem uma moradia adequada. E isso tem que ser respeitado por qualquer governante”, aponta Raquel Rolnik, relatora especial da Organização das Nações Unidas (ONU) para o direito à moradia adequada.
A falta de moradia tem sido agravada com os últimos incêndios de favelas na cidade. Apenas esse ano foram 69 favelas incendiadas, segundo o Corpo de Bombeiros, e 530 desde 2008. Apesar de não haver provas de que as ocorrências tenham sido criminosas, estudos apontam que elas ocorrem principalmente em favelas localizadas em áreas valorizadas desde 2008. A relação tem sido alvo de investigações do Ministério Público. “O que nos chama atenção é que existe uma coincidência muito grande de incêndios acontecendo em lugares onde o mercado imobiliário tem forte interesse”, destaca o Promotor de Justiça de Habitação e Urbanismo da Capital José Carlos de Freitas. O confronto de dados entre as últimas ocorrências e o estudo da Fipe/ZAP Imóveis coloca essa coincidência em números. Vejamos: as favelas Alba e Buraco Quente estão no bairro Jabaquara, que valorizou 128,4% entre 2008 e 2011; a favela do Piolho está em Campo Belo, com valorização de 113%; a Comunidade Vila Prudente é vizinha do bairro Sacomã, encarecido em 149%; a favela do Moinho está no Campos Elíseos, que registrou valorização de 182,9%. E por aí vai.
São Paulo vive o caos no transporte público Caio Guatelli/Folha Imagem
MOBILIDADE Paulistanos apontam o serviço como um dos principais problemas da cidade Michelle Amaral da Redação Superlotação, falta de conforto, longos períodos de espera para embarcar, falta de prioridade por parte do poder público e o trânsito fazem com que o transporte coletivo de São Paulo seja apontado como o quinto maior problema da cidade pelos paulistanos. O dado é da pesquisa Dia Mundial Sem Carro 2012, realizada pelo Ibope a pedido da Rede Nossa São Paulo e divulgada no dia 17 de setembro. De acordo com o estudo, 78% dos moradores da capital paulista destacam a necessidade de mais investimentos no setor para a melhoria da oferta de transporte. Com a diminuição no tempo de espera, mais linhas de ônibus e corredores exclusivos, tarifas menores e mais conforto, 16% dos paulistanos apontam que deixariam de utilizar o carro e passariam a se locomover com o transporte coletivo, segundo a pesquisa. Priorização O trânsito é um dos principais entraves para a fluidez do sistema de transporte público municipal. Na lista dos problemas da cidade, ele aparece em quarto lugar e é avaliado negativamente por 80% dos paulistanos. O motivo, segundo especialistas, é a política de priorização do transporte individual em detrimento do coletivo pela administração pública que, em sucessivas gestões, optou pela ampliação da malha viária ao invés de investir no transporte público. Para o consultor de tráfego Horácio Augusto Figueira, não adianta os governos proporem grandes obras viárias como solução para os problemas de deslocamento da população, porque não vai resolver. “Quanto mais espaço se ofertar para os carros, mais eles o ocuparão”, alerta. Segundo ele, a solução é a priorização do transporte coletivo, que atende a maior parte da população. Os mais de 11 milhões de habitantes de São Paulo contam com uma frota de ônibus municipais de 15 mil veículos e apenas 126 km de corredores exclusivos para a circulação dos coletivos. Os ônibus, de modo geral, utilizam cerca de 4,5 mil quilômetros do sistema viário da cidade que, no total, tem 17.300 km de extensão. O restante das vias públicas é ocupado pela frota ativa de automóveis, de mais de 5 milhões de carros.
% 8 7 dos moradores da capital paulista destacam a necessidade de mais investimentos para a melhoria de transporte
% 6 1 dos paulistanos apontam que deixariam de utilizar o carro e passariam a se locomover com o transporte coletivo
Figueira avalia que São Paulo precisaria, atualmente, de 400 km de corredores de ônibus para solucionar o problema de circulação nas principais vias. Segundo ele, a conta é simples: “cada faixa para ônibus transporta um número de passageiros equivalente a dez faixas para automóveis”.
Segundo pesquisa, o transporte coletivo é apontado como o quinto maior problema pelos paulistanos
Kassab não fez nenhum corredor de ônibus
Passagem de ônibus é a mais cara do país
da Redação No início de 2011, a Secretaria Municipal de Transportes (SMT) anunciou que até o final de 2012 seriam construídos 66 km de corredores de ônibus. Seis meses após o anúncio, o secretário de Transportes, Marcelo Cardinale Branco, voltou atrás e disse que a administração municipal conseguiria cumprir apenas um terço da meta. No entanto, a três meses do final da gestão de Gilberto Kassab (PSD), nenhum corredor novo começou a ser construído. A prefeitura não cumpriu nem a metade das promessas de mobilidade urbana previstas no plano de metas Agenda 2012. Entre elas, estavam a construção de noves terminais urbanos, a requalificação de outros dez existentes, reparos em 38 km de corredores exclusivos, o término do Expresso Tiradentes e a revitalização de 46% dos pontos de ônibus. Para justificar, a administração municipal disse estar contribuindo com o governo estadual com R$ 1 bilhão na expansão da rede de metrô. No entanto, o engenheiro Lúcio Gregori enfatiza que o metrô tem de ser visto juntamente com os outros sistemas de transporte, porque se a expansão não for realizada de forma integrada, os resultados para a mobilidade serão pobres. “Tem que se ter transporte abundante de todo tipo, de vários modos e muito barato”, pondera. (MA)
da Redação A cidade de São Paulo tem a maior tarifa de ônibus municipal do país. O último reajuste ocorreu em 5 de janeiro de 2011, o valor da passagem passou de R$ 2,7 para R$ 3. Desde então, o Movimento Passe Livre (MPL) realizou diversos protestos contra o aumento, buscando a sua revogação. No entanto, além de não serem ouvidos pela administração municipal, os militantes do MPL sofreram forte repressão durante as manifestações. A última delas ocorreu no dia 29 de setembro deste ano, na reinauguração da praça Roosevelt, quando manifestantes tentaram entregar a Gilberto Kassab (PSD) o Troféu Catraca, saudando-o como o prefeito que mais aumentou as tarifas de ônibus na cidade. Um menor de idade foi agredido pelos seguranças do prefeito e a Guarda Civil Metropolitana (GCM) e preso sob alegação de tentativa de agressão. O jovem ficou detido por algumas horas e acabou indiciado com base no artigo 40 da lei de contravenções penais, que proíbe manifestações em cerimônias públicas. (MA)
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Conservadorismo e explosão imobiliária Nelson Antoine/Folhapress
ADMINISTRAÇÃO Gestão Serra-Kassab é marcada por política de proibições e especulação imobiliária
Personalidades querem mudar São Paulo Janaina Castelo Branco
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O futuro de São Paulo está em saber olhar para a periferia e saber organizar ela de tal maneira que faça a vida circular lá mesmo. Por que a cid ade trava todo dia de manhã? Porque o cara que mora em Interlagos tem que vir pra Santana. Boa parte dos problemas de São Paulo vão se resolver quando o governo olhar para a periferia e deixar de entender São Paulo como esse miolo cheio de prédio. Esse miolo cheio de prédio é uma engrenagem e o óleo que faz essa engrenagem girar são essas pessoas que vem do lado de cá.
”
Emicida, rapper
Renato Godoy de Toledo da Redação DESDE 2005, com a posse de Serra-Kassab, São Paulo assiste a uma ascensão da maneira conservadora de se governar. Em detrimento de políticas sociais, priorizam-se as demandas dos mais ricos, a repressão a manifestações artísticas, políticas e de solidariedade. E a explosão imobiliária, que encarece o preço dos imóveis, afasta os mais pobres do centro da cidade. Esta é a avaliação de intelectuais, que apontam a necessidade de frear esse processo em curso. Ainda segundo essa análise, os espaços públicos de convivência têm sido reduzidos e o acesso da população ao centro da cidade, onde se concentram os empregos e as opções de lazer, é cada vez menor. “O modelo é contra os pobres, que estão longe de constituírem minoria em nossa sociedade. O modelo quer os pobres fora do centro de São Paulo. Isso é óbvio. O que não parece ser óbvio é que, em última instância, a determinação disso tudo é econômica”, afirma a urbanista da USP, Ermínia Maricato, em artigo sobre o projeto urbanístico em vigor na cidade. Política higienista
Ao invés de investir em políticas socioassistenciais para população em situação de rua, a gestão Serra-Kassab priorizou a repressão a esses paulistanos. Um exemplo da maneira como o PSDB e o DEM têm tratado essa população é a Oficina Boracea, na Barra Funda. Inaugurado em 2003, o albergue foi considerado um exemplo mundial de atendimento a desabrigados. Ao assumir a prefeitura em 2005, Serra abandonou o projeto da gestão anterior e transformou o albergue em um “depósito de gente”. Segundo o padre Júlio Lancelloti, da Pastoral da Rua, o ambiente no Boracea hoje é “depressivo, indigno e desumano”. Em junho de 2012, a prefeitura chegou a anunciar a proibição da distribuição do chamado “sopão” aos moradores de rua, alegando que a prática sujava as ruas da cidade. Após o protesto das entidades que realizam essa distribuição e críticas da sociedade, a prefeitura voltou atrás. Em setembro, a Guarda Civil Metropolitana proibiu uma ONG de distribuir 8 mil livros a moradores de rua.
Repressão a manifestações artísticas, políticas e de solidariedade e a explosão imobiliária, que encarece o preço dos imóveis e afasta os mais pobres do centro da cidade Logo no primeiro ano de gestão, em 2005, a administração Serra criou o principal símbolo da sua política de “higienização” das áreas centrais, a rampa “antimendigo” na passagem subterrânea que liga a Avenida Paulista à Doutor Arnaldo. A obra foi idealizada pelo então subprefeito da Sé, Andrea Matarazzo, homem de confiança de Serra, que ocupou diversos cargos na administração municipal desde 2005. A rampa, construída com material áspero e chapiscado, afastou a população que dormia no local. Matarazzo, aliás, em recente declaração a moradores dos Jardins, afirmou que, se eleito vereador, pretende legislar para os bairros nobres, já que, segundo o tucano, ninguém os defende na Câmara Municipal. Irregularidades
A política urbanista de Serra-Kassab privilegiou as grandes construtoras e as legalizações sistemáticas de grandes empreendimentos imobiliários, que impulsionaram uma valorização de 150% do preço dos imóveis nos últimos 4 anos. Há sérios indícios de irregularidades na concessão de autorizações da prefeitura para a construção de imóveis. O diretor do Departamento de Aprovação de Edificações (Aprov), Hussain Aref, com renda mensal declarada de R$ 20 mil, adquiriu 106 imóveis desde que foi nomeado por Serra em 2005. O patrimônio de Aref, hoje investigado pelo Ministério Público, chegou a R$ 50 milhões.
Divulgação
“
Os problemas de São Paulo são proporcionais ao seu tamanho. É necessário que a próxima administração faça uma gestão que distribua com eficiência recursos humanos e materiais, facilitando o acesso da população que mais necessita do serviço público de saúde. Além disso, alguns segmentos precisam receber um olhar especial do poder público, como as mulheres. É necessário que a saúde pública intensifique os programas voltados para as mulheres e, em especial, para a população feminina da periferia.
”
Leci Brandão, sambista e deputada estadual (PCdoB)
“
Alexandra Martins/Agência Câmara
O maior desafio do próximo prefeito de São Paulo é resolver o problema de transporte e trânsito da cidade, que tem sido um fator de deseconomia e de perda de qualidade de vida dos paulistanos”, Luiza Erundina de Sousa, Deputada Federal (PSB/SP)
Passeata no centro de São Paulo contra a exclusão social
Russomano quer liberar porte de arma para parlamentares
Leandro Müller/CC
A proposta do candidato Celso Russomano para a segurança pública é fortalecer a lógica da segurança privada, com a integração 300 mil vigilantes noturnos à segurança do município. Ele é ligado à indústria bélica, que doou em 2010 R$ 100 mil para sua campanha ao governo paulista por meio da Associação Nacional da Indústria de Armas e Munições. Russomano apresentou um projeto de lei para liberar o porte de arma para deputados e senadores quando exerceu o mandato de deputado federal. Esse projeto não foi aprovado.
MENSALÃO
Carta condena “espetáculo” do STF
“
A grande questão que São Paulo tem que resolver é a da educação pública. Não voto no José Serra porque conheço o José Serra. E não voto no Russomanno porque não conheço o Russomanno.
da Redação
”
Fernando Morais, escritor
TV Brasil/CC
“
Vocês que estão matando os pretos, vocês que estão matando os MCs de funk, vocês que estão fazendo campanha na porta da favela tirando a força e a autoconfiança do meu povo: nesta eleição nós vamos derrubar vocês, e vocês não vão voltar nunca mais!
”
Mano Brown, rapper
da Redação PERSONALIDADES como Oscar Niemeyer, Fernando Morais, José de Abreu, Hildegard Angel, Antonio Grassi, Antonio Pitanga, Eugenio Staub, Luís Carlos Barreto, entre outros, assinaram uma Carta Aberta ao Povo Brasileiro, defendendo a presunção de inocência e condenando a transformação em espetáculo do julgamento do mensalão. Veja a carta na íntegra:
Parte da cobertura na mídia e até mesmo reações públicas que atribuem aos ministros o papel de heróis nos causam preocupação Carta aberta ao povo brasileiro
Desde o dia 2 de agosto o Supremo Tribunal Federal julga a ação penal 470, também conhecida como processo do mensalão. Parte da cobertura na mídia e até mesmo reações públicas que atribuem aos ministros o papel de heróis nos causam preocupação. Somos contra a transformação do julgamento em espetáculo, sob o risco de se exigir – e alcançar - condenações por uma falsa e forçada exemplaridade. Repudiamos o linchamento público e defendemos a presunção da inocência. A defesa da legalidade é primordial. Nós, abaixo assinados, confiamos que os Senhores Ministros, membros do Supremo Tribunal Federal, saberão conduzir esse julgamento até o fim sob o crivo do contraditório e à luz suprema da Constituição. (Este documento está assinado por mais de 280 personalidades. A relação dos nomes encontra-se em: www.brasildefato.com.br/cartaaberta)
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