Edição 343 do Brasil de Fato MG

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Belo Horizonte, 16 a 22 de julho de 2021

ENTREVISTA 11

Redes governistas estão mais extremistas”, diz pesquisador que está em 73 grupos de Whatsapp BOLSONARISMO Segundo o estudioso, grupos propagam teorias cada vez mais fantasiosas e odiosas; narrativas para 2022 estão prontas Willian Dias

Edison Veiga, da DW Brasil

N

a rotina do pesquisador brasileiro David Nemer está ler, todos os dias, a atividade de dezenas de comunidades bolsonaristas. Em 2017, quando começou esse trabalho, eram apenas quatro grupos, todos de Whatsapp. Com o passar do tempo, ele acabou se inscrevendo também no Telegram. Para o pesquisador, o cenário vai além da desinformação, “que sempre existiu na política”. Naquilo que ele vem chamando de um comportamento de “milícias digitais”, há o uso indiscriminado de plataformas sociais, baseadas em algoritmos, para induzir escolhas e reduzir debates e liberdade de pensamento — um modus operandi financiado por grupos de empresários e verbas que seriam de gabinetes parlamentares, conforme ele aponta, em entrevista à DW Brasil. Graduado em ciências da computação e administração, Nemer é professor no departamento de Estudos de Mídia da Universi-

A central da desinformação, o gabinete do ódio, parece desarticulada ou perderam financiamento

O ataque novo é ao processo eleitoral, ao TSE e às urnas eletrônicas

O deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL) é apontado como um dos coordenadores do gabinete do ódio, de proliferação de conteúdo pelas redes sociais

dade da Virgínia, nos Estados Unidos. Como você faz para monitorar esses grupos bolsonaristas? David Nemer: Tenho um celular específico para isso. Desde o fim de 2017, estou em grupos que são políticos, bolsonaristas. Principalmente Whatsapp; mas, devido a um movimento recente, também Telegram. Muita gente fala que sou infiltrado, mas não, eu recebi esses convites para ingressar, o link para fazer parte dos grupos. Comecei em quatro, hoje estou em 73, já que de um acaba saindo outro. Eles se implodem [com o passar do tempo] e colocam convites de grupos nos próprios grupos. Uma bola de neve. Passo de 1h a 2h por dia lendo os comentários desses grupos, vou tentando identificar temas e tento entender um pouco a cultura da desinformação, das milícias digitais, como eles se organizam e como funciona a difusão

Desde 2018, as milícias digitais têm a esquerda como um alvo: o Lula, o PT, o comunismo da desinformação. É minha abordagem teórica. Considerando o cenário atual, de CPI e baixa popularidade do governo Bolsonaro, como você tem avaliado o comportamento dessas redes? As redes bolsonaristas estão acuadas e na defensiva. Isso não quer dizer que não estão atacando, [mas sim que, por conta do cenário] elas ficam mais extremistas, com teorias mais fantasiosas, mais odiosas e com narrativas que não fazem muito sentido. Também há a questão da central da desinformação, o chamado gabine-

te do ódio, que parece não estar enviando mais ordens para as redes ou para os grupos de Whatsapp. Isso faz com que os grupos fiquem desalinhados, cada um falando uma coisa. Até meados de 2020, eles ficavam alinhados, hoje não mais. Orquestrações tenho visto em poucas oportunidades desde o fim de 2020, o que mostra que esses gabinetes centrais ou estão perdidos ou perderam o financiamento. Você já percebe discursos preparados para as eleições do ano que vem? Desde 2018, as redes bolsonaristas, as milícias digi-

Bolsonaro ganhou todas as vezes que concorreu pelas urnas eletrônicas

tais, têm a esquerda como um alvo — o Lula, o PT, o comunismo. Não é de surpreender que, hoje, com o Lula liderando as pesquisas de intenção de voto, eles dobrem a aposta nesses alvos. Esse discurso já estava pronto, é um ataque que nunca saiu das redes. O ataque novo que a gente vê recentemente é o ataque ao processo eleitoral e às urnas eletrônicas. Bolsonaro já fala insistentemente que não vai aceitar as eleições se não tiver voto impresso, embora já esteja mais que explicado que o voto é auditável, é seguro, que as eleições são seguras. É irônico falar isso, já que Bolsonaro, todas as vezes que concorreu pelas urnas eletrônicas, ele ganhou. Não teve uma eleição em que perdeu. As narrativas para 2022 já estão preparadas: dobrar a aposta no ataque ao Lula e ao PT e continuar ainda mais essa guerra contra o sistema eleitoral, o Tribunal Superior Eeleitoral (TSE) e as urnas eletrônicas.

Leia entrevista completa no site brasildefatomg.com.br


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