PARANÁ
Outubro de 2017
distribuição gratuita
Edição Especial em Defesa das Estatais
PÚBLICO X PRIVADO: O QUE É MELHOR PARA O BRASIL? Repar
A avalanche de privatizações imposta pelo governo Michel Temer traz à tona o debate sobre o papel do Estado e das empresas públicas. Nesta edição especial, o Brasil de Fato apresenta um raio-X das empresas públicas, seu papel na economia e na garantia de serviços essenciais à população, em especial no Paraná. Do setor energético, ao ramo petroleiro, passando pela educação e saúde, os dados e avaliações de especialistas apontam a defesa dessas empresas como estratégica para o país em tempos de crise.
Arquivo EBC
Reprodução
Joka Madruga
Ministério de Minas e Energia
Instituto Humanitas Unisinos
Agência Brasil
Marcos Solivan
2 | Especial
EDITORIAL
Temer quer desmontar a Nação
A
lista fica a cada dia maior de empresas públicas e estatais, patrimônio do povo brasileiro, ameaçadas de leilão barato pelo governo Temer – algo que já aconteceu, em 1997, com a mineradora Vale do Rio Doce (atual Vale). Com isso, o país perde a chance de fazer investimentos sociais, uma vez que o governo retira recursos da Caixa Econômica, Banco do Brasil e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Depois do golpe de Estado contra a presidenta Dilma Rousseff, programas estratégicos são desmontados. É o caso do submarino com propulsão nuclear, fundamental na defesa da costa brasileira. A Petrobras, principal empresa brasileira, é vendida e picotada. A atual direção da BR já vendeu US$
OPINIÃO
Brasil de Fato PR
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13,6 bilhões em ativos da estatal. Setor de Fertilizantes, naval, assim como Correios, serviços públicos em Saúde e Educação, Agricultura Familiar, e Assistência Social são abandonados. No Paraná, o governador Beto Richa (PSDB) há tempos reza esta cartilha da privatização e piora a situação das estatais Copel e Sanepar. É uma forma de justificar a venda delas! A palavra em jogo é então a soberania nacional, que significa a luta em defesa dos bens de um país. As propostas são apontadas pelo movimento social e sindical: mobilização do povo brasileiro pelas empresas que fazem do país a oitava economia mundial. E apresentação de medidas para reativar a economia, como esta edição especial apresenta na página 8. Boa leitura!
EXPEDIENTE Brasil de Fato PR Desde fevereiro de 2016
PRIVATIZAÇÕES
74
unidades de exploração de petróleo foram vendidas em cinco estados
86,1 mil para 68,8 mil
queda de empregos na Petrobras
71.554 para 40.236 Queda de empregos no setor naval (Caged 2016)
75%
Redução dos investimentos entre 2013 e 2016 na Petrobras
13 vezes
inferior ao capital da empresa pode ser o valor da venda da Eletrobras
O jornal Brasil de Fato circula em todo o país com edições regionais em Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Pernambuco, Ceará e Paraná. Esta é a edição Especial em Defesa das Empresas Públicas do Brasil de Fato PR, publicada em 16 de outubro de 2017. Queremos contribuir no debate de ideias e na análise dos fatos do ponto de vista da necessidade de mudanças sociais. EDIÇÃO Ednubia Ghisi e Pedro Carrano REPORTAGEM Daniel Giovanaz, Franciele Petry Schramm e Carolina Goetten COLABORARAM NESTA EDIÇÃO Davi Macedo, Paula Zarth Padilha e Renata Ortega ARTICULISTAS Antonio Frutuoso REVISÃO Maurini Souza e Priscila Murr FOTOGRAFIA Leandro Taques, Joka Madruga e Gabriel Dietrich ADMINISTRAÇÃO Clara Lume DIAGRAMAÇÃO Vanda Moraes CONSELHO OPERATIVO Gustavo Erwin Kuss, Daniel Mittelbach, Luiz Fernando Rodrigues, Fernando Marcelino, Naiara Bittencourt e Robson Sebastian TIRAGEM 50 mil exemplares REDES SOCIAIS www.facebook. com/bdfpr CONTATO E ANÚNCIO redacaopr@brasildefato.com.br IMPRESSÃO Grafinorte (Nei)
Privatizações: o que você tem a ver com isso?
Antonio Frutuoso, mestre em educação e assessor do Sindicato dos Trabalhadores em Educação Pública do Paraná (APP-Sindicato)
V
ocê já deve ter ouvido falar em algum lugar que a iniciativa privada é eficiente, ao contrário dos serviços públicos, que são comumente acusados de ineficientes e problemáticos. A solução apontada por boa parte de quem faz a critica é simplória: privatizar. Mas será que privatizar é a solução para a melhoria dos serviços públicos? Muitos de nós acompanhamos as privatizações no sistema de telefonia. A promessa é de que o sistema ia melhorar. Hoje, em qualquer lista de Procon, veremos que as telefônicas são campeãs em descaso com o consumidor.
Latuff
Por outro lado, interessa à iniciativa privada abocanhar para si os serviços públicos. Qual empresa não gostaria de administrar o sistema de água ou energia elétrica de uma cidade? Ou uma rede municipal de educação e saúde? No caso de
água, petróleo e energia elétrica, são bens naturais e estratégicos. Estar em mãos da iniciativa privada colocaria em risco o próprio desenvolvimento e segurança nacionais. Além do que, água e energia elétrica cumprem uma função social que está para além
de geração de lucro. Via de regra, a qualidade do que você está “comprando” está diretamente relacionada ao quanto você pode pagar. Imagine essa situação na educação e na saúde. Mesmo com precariedade, conseguiu-se ao longo dos anos universalizar o acesso ao ensino fundamental e à saúde, através do SUS. Contrariando a lógica privatista, a educação e saúde visam a produção de humanidade e não do lucro. Não estamos dizendo que os serviços públicos não precisam ser melhorados. Todos nós sabemos o quanto é preciso avançar na melhoria dos serviços públicos oferecidos à população. No entanto, a maioria das ineficiências apresentadas está relacionada ao sucateamento promovido pelos governos. A solução não está na privatização, e sim no aumento de investimento público para atendimento das demandas sociais.
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Privatização dos Correios pode encarecer serviços Carolina Goetten, Curitiba (PR) Em setembro, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, emitiu uma declaração pública sobre a possibilidade de privatizar o serviço prestado pelos Correios. A mesma intenção foi sinalizada em maio pelo ministro das Comunicações, Gilberto Kassab, segundo o qual a empresa deveria promover um rápido equilíbrio ou “caminharia para um processo de privatização”. No Paraná, trabalhadores responderam à ameaça com uma greve de 20 dias e adesão de 70% dos funcionários, que chegou ao fim no dia 9 de outubro. Segundo o secretário geral do Sindicato dos Trabalhadores nos Correios do Paraná (Sintcom), Marcos Rogério Inocêncio, a privatização dos Correios representaria o fim da empresa enquanto um serviço prestado à sociedade. “Usam o pretexto da cri-
PONTO DE VISTA
se para descarregar medidas na conta da população. Privatizar só vai piorar o serviço”, avalia. Ele indica que a venda da estatal já vem ocorrendo gradualmente por meio das agências franqueadas, cujos funcionários têm menos direitos trabalhistas em relação aos que atuam nas estatais. Hoje, no Paraná, são 412 agências próprias em risco – inclusive, sem previsão de concurso público para reposição de profissionais. Preços vão subir Outro problema que permeia a venda dos Correios é o encarecimento dos serviços e a piora no acesso às encomendas nas localidades mais distantes. “A privatização abre espaço para a livre concorrência, cujo foco é o lucro. Enquanto empresa pública, os Correios quase não têm retorno financeiro com a entrega de cartas, por exemplo, e detêm o monopólio sobre o serviço. No contexto de uma empresa privatizada, os preços vão subir”, assinala Inocêncio.
PONTO DE VISTA
“A privatização destrói todo o processo coletivo construído com o esforço e com recursos de toda a população do Brasil ao longo de décadas. Não é possível que, em pleno século 21, nós tenhamos que abrir mão da nossa soberania para que grupos externos e grupos internos possam ter o controle da vida da maioria das pessoas no Brasil”. Tadeu Veneri, deputado estadual (PT-PR), presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Paraná.
3 | Especial
Divulgação
“Os recursos naturais que uma empresa pública brasileira poderia preservar para mais tempo, para a economia do país, são explorados ao máximo pelas empresas estrangeiras que compram as estatais. Elas não têm o zelo pelo patrimônio público”. Werner Fuchs, pastor luterano e coordenador do Grupo de Meio Ambiente da Rede Evangélica Paranaense de Ação Social (Repas). Repas
Você Sabia? Preço de Banana
Tecnologia de ponta
A privatização da mineradora Vale do Rio Doce é um dos piores negócios da história do país. O governo FHC vendeu a empresa por R$ 3,3 bilhões em 1997, quando as reservas minerais eram avaliadas em mais de R$ 100 bilhões. A desestatização comprometeu a gestão e a responsabilidade social da companhia. Em 2015, o rompimento de uma barragem da Vale em Mariana (MG) desabrigou comunidades e matou 18 pessoas.
PONTO DE VISTA
A Petrobras possui uma tecnologia de exploração em águas profundas superior à de qualquer empresa privada. A estatal retira óleo da camada pré-sal a um custo de 8 dólares por barril, enquanto a maioria dos países produtores gasta mais de 15 dólares por barril. As multinacionais que estão de olho no pré-sal não veem a hora de se apropriar dessa tecnologia, que permite ampliar a margem de lucro sobre o combustível.
“A privatização pode ser tão perversa quanto a terceirização. Quando falamos de estatais estamos falando de empresas que tem planos de cargos e salários, de pessoas extremamente qualificadas, que ingressam através de concurso público.” Margaret Matos de Carvalho, procuradora regional do trabalho no Paraná.
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4 | Especial
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Petrobras tem forte influência na economia paranaense Empresa responde por 7% do PIB do Paraná e gera mais de R$ 2 bilhões por ano em ICMS Leandro Moura
Davi Macedo, Curitiba (PR)
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Petrobras atua no Paraná com praticamente toda a cadeia de produção de petróleo. Da extração ao escoamento, passando pelo refino e até mesmo na fabricação de fertilizantes nitrogenados. A estatal petrolífera possui cinco unidades industriais em território paranaense e gera 16 mil empregos, sendo 5,3 mil diretos e 10,7 mil indiretos. A empresa repete sua importância estratégica nacional e internacional também no âmbito estadual. A Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar), maior fábrica da Petrobras por aqui, é responsável por um quarto do Produto Interno Bruto (PIB) industrial do estado e por 7% do PIB total do Paraná, segundo o Instituto Paranaense de Desenvolvimento Econômico e Social (Ipardes/2012). Em 2006 chegou a atingir 13% do PIB
estadual. A estatal lidera o ranking de empresas que mais arrecadam impostos para o estado, com repasses de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) sempre acima da casa dos R$ 2 bilhões por ano. Nos municípios onde têm as plantas industriais instaladas, a importância da Petrobras é ainda maior. Cidades inteiras dependem dos impostos e empregos gerados pela companhia. São os casos de Araucária, na região metropolitana de Curitiba, e
“Em 1993, logo depois que privatizou tudo, mudou todo o conceito da empresa. Se antes a empresa trabalhava preventivamente, antecipava os acidentes, tinha um cuidado maior com os equipamentos, depois passa para um processo de sucateamento. Em cinco anos a fábrica reduz a metade do quadro do número de trabalhadores. Isso gera um risco e começam a acontecer acidentes, desgastar equipamentos, colocando em risco toda a sociedade em volta da empresa e todos os trabalhadores da fábrica”. A estatal Ultrafértil, localizada em Araucária, pertencia a Petrobras até 1993, quando foi privatizada para um grupo de empresas nacionais. Sérgio Luiz Monteiro trabalha na operação da fábrica desde 1989, e sentiu na pele as mudanças da gestão estatal para a privada.
São Mateus do Sul, no Centro Sul do estado. Papel estratégico Em 2014, a refinaria foi responsável por 81% de todo o ICMS gerado pelas indústrias instaladas em Araucária. Isso sem considerar os impostos da Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados do Paraná (Fafen-PR) e da BR Distribuidora, outras unidades da Petrobras presentes na cidade. A estatal também tem participação vital para São Mateus do Sul. A Usina do Xisto, que produz petróleo a
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partir da mineração do folhelho pirobetuminoso (conhecido como xisto), repassou R$ 20 milhões em impostos municipais no ano de 2015 cerca de 50% de toda a arrecadação da cidade. Com uma população aproximada de 40 mil habitantes, apenas a Petrobras emprega 4 mil pessoas na localidade. Pela sua magnitude, a Petrobras exerce papel estratégico em âmbito nacional e internacional. Por isso sempre foi objeto de muita disputa política e desperta a cobiça do mercado. Ocorre que se a
empresa não fosse estatal, jamais chegaria nos patamares alcançado. O presidente do Sindicato dos Petroleiros do Paraná e Santa Catarina, Mário Dal Zot, explica que a história da Petrobras é marcada por gestões desenvolvimentista, tanto na esfera econômica quanto na social. “A estatal investiu maciçamente em pesquisas e acreditou no potencial da cadeia do petróleo nacional. Se fosse uma empresa privada, voltada exclusivamente ao lucro, nunca seria o que é hoje”.
Refinaria Presidente Getúlio Vargas (Repar) Araucária 7,7 mil empregos gerados (2,7 mil diretos e 5 mil indiretos) Produção: 33 milhões de litros/dia de derivados 12% de toda produção nacional Impostos: + de R$ 2 bilhões/ano de ICMS
Fábrica de Fertilizantes Nitrogenados do Paraná (Fafen-PR) 3,2 mil empregos gerados (1,2 mil diretos e 2 mil indiretos) Produção: 700 mil toneladas/ano de ureia 475 mil toneladas/ano de amônia, Produz Agente Redutor Líquido Automotivo (Arla 32) Terminal Aquaviário de Paranaguá (Tepar) Paranaguá 850 empregos gerados (350 diretos e 500 indiretos) Produção: 32 tanques (170.000 m³) e 2 oleodutos (200 a 500 m³ de bombeamento/hora) BR Distribuidora Araucária 410 empregos gerados (110 diretos e 300 indiretos)
Usina do Xisto (SIX) São Mateus do Sul 4 mil empregos gerados (1 mil diretos e 3 mil indiretos) Produção: 3 mil barris/ dia (Bbl) Impostos: R$ 98 milhões/ano
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Eletrobras garante eletricidade como política pública
ENTREGA
Sanepar quer vender mais ações
Caso a Eletrobras seja privatizada, a estimativa de aumento no valor da tarifa de luz é de até 15% Divulgação
Ednubia Ghisi, Curitiba (PR)
A
s 39 famílias do assentamento Robson de Souza Vieira, localizado em Congonhinhas, Norte do Paraná, viveram de 2004 a 2009 sem acesso à energia elétrica. Elas faziam parte da estatística preocupante apresentada pelo Censo 2000 do IBGE: em pleno século 21, 2 milhões de famílias no meio rural brasileiro não tinham luz. A luz chegou naquela comunidade em 2009, junto com a marca de 2 milhões de ligações elétricas do programa do Luz para Todos. O Luz para Todos é um dos motivos pelos quais a tentativa de privatização da Eletrobras, anunciada pelo governo golpista de Michel Temer (PMDB) no final de agosto, encontra resistência na sociedade. Criado durante o primeiro ano no governo de Lula (PT), em 2003, o programa chegou às localidades mais distantes e às famílias de menor renda, sob coordenação do Ministério de Minas e Energia e da Eletrobras, em parceria com empresas estaduais de Energia. No caso do Paraná, a Copel foi decisiva para a realização da política pública: foram 80 mil domicílios rurais atendidos, num total de 400 mil pessoas. Para o jurista Nelton Miguel Friedrich, coordenador do Fórum Popular
ELETROBRAS EM DADOS É uma empresa de economia mista, com 60% do controle nas mãos do Estado brasileiro.
20 bilhões
valor que o Ministério de Minas e Energia do governo Temer, em previsão extraoficial, espera vender a Companhia
60 bilhões
é o valor que somente a receita líquida anual da estatal ultrapassa 47 hidrelétricas
Maior empresa de energia da América Latina. Administra:
12 milhões Contra a Privatização da Eletrobras, somente uma empresa estatal pode executar programas como o Luz para Todos. “Existe algum programa social feito por essas empresas privadas do setor elétrico nos últimos anos? Não existe. Políticas públicas são feitas pelo Estado e por empresas públicas, e não pela lógica do mercado”, garante. A própria comunidade Robson de Souza Vieira sofre as consequência do funcionamento privado de serviços essenciais. Se a energia elétrica chegou só em 2009, até hoje as famílias têm dificuldade no acesso à telefonia celular e fixa, que funcionam mal na região. O setor brasileiro de telecomunicações foi privatizado nos anos 1990,
270 subestações de energia 6 distribuidoras 70 mil quilômetros de linhas de transmissão de pessoas são atendida em seis estados
pelo presidente Fernando Henrique Cardoso (PSDB). Energia mais cara Carlos Bittencourt, presidente do Sindicato dos Engenheiros do Paraná (Senge-PR), alerta para um provável aumento no preço da energia, caso a privatização se concretize. A estimativa do en-
Políticas públicas são feitas pelo Estado e por empresas públicas, e não pela lógica do mercado”
5 | Epecial
genheiro é de que a tarifa suba entre 10% e 15%. Um dos motivos para isso será a mudança no papel do Centro de Pesquisas de Energia Elétrica (CEPEL) da Eletrobras, maior centro de pesquisas de energia elétrica da América do Sul. “O estudo vai ser, se tiver, uma pesquisa de como ter uma rentabilidade maior naquele setor, e não para você baratear a energia ou de discutir novas fontes energéticas”, aponta. Copel na mira O governo estadual do Paraná não confirma a intenção de privatizar a Copel, no entanto, medidas tomadas ao longo do último ano sinalizam o contrário. Em setembro de 2016, a Assembleia Legislativa aprovou um Pro-
A ameaça de privatização também ronda o setor de água e saneamento. No Rio de Janeiro, por exemplo, avança o processo de venda da Companhia Estadual de Águas e Esgotos (Cedae). No Paraná, diretoria da Sanepar prepara uma nova oferta pública de ações. Vera Lucia Pedroso Nogueira, presidente do Sindicato dos Trabalhadores nas Empresas de Água, Esgoto e Saneamento de Maringá e Região Noroeste do Paraná (Sindaen), afirma a ineficácia da lógica do lucro na operação do setor. Caso avança e privatização, haverá um “conjunto geral de baixa na qualidade e de elevação de preços, tanto de tarifas como nos serviços de consertos e manutenção das redes. A população sai perdendo e os acionistas ganhado em alta porcentagem”, alerta. jeto de Lei do governo Beto Richa (PSDB) que autoriza a venda de ações da Copel e da Sanepar, sem que seja necessário consultar novamente os parlamentares. Já em 2017, a Copel tomou medidas contraditórias, de aumento dos lucros aos acionistas à corte em investimentos, conforme apurou o site Livre.Jor: em maio, a empresa aprovou a distribuição de 50% de seus lucros aos acionistas; em junho emitiu um comunicado ao mercado em que indicou estudo de oferta de ações para “otimização de caixa”; já em setembro, a companhia anunciou redução de R$ 545 milhões do investimento previsto para este ano.
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Brasil de 8 Fato PR
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Educação e saúde: a gestão pública à sombra de interesses privados Embora não constem no plano de privatização de Temer, as duas áreas enfrentam processos de desmonte Daniel Giovanaz, Curitiba (PR)
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aúde e educação são direitos assegurados na Constituição de 1988. As duas áreas não constam no pacote de privatizações do governo Temer (PMDB), mas a gestão pública de escolas, universidades e unidades de saúde está cada cada vez mais sujeita a interesses privados. Ricardo Barros (PP), nomeado ministro da Saúde após o golpe de 2016, havia sido eleito deputado federal pelo Paraná dois anos antes. O maior financiador de sua campanha foi Elon Gomes de Almeida, sócio do Grupo Aliança, um gigante do ramo de planos de saúde. Assim que assumiu a pasta, o ministro divulgou a proposta de criação de planos de saúde privados de caráter “acessível”, para diminuir a demanda do SUS. Para o Conselho Federal de Medicina, a ideia só beneficia os “empresários da saúde suplementar, setor que movimentou, em 2015 e em 2016, em torno de R$ 180 bilhões”. Há uma semana, Barros passou a defender o aumento das mensalidades dos planos para pacientes acima de 60 anos. Educação O desvio de R$ 20 milhões do ensino estadual, apurado pela operação Quadro Negro, é um sintoma do desmonte do setor de educação no Paraná. O Ministério Público
O serviço público tem um princípio muito claro que é o atendimento à população como um todo” trabalha com a hipótese de que dinheiro, destinado a obras em escolas estaduais, tenha sido usado para bancar campanhas políticas do governador Beto Richa (PSDB) - ele nega todas as acusações. Segundo Rosangela Petuba, presidenta da Seção Sindical dos Docentes da Universidade Estadual de Ponta Grossa (Sinduepg), o abandono também se reflete na educação superior. “Na UEPG, a verba de infraestrutura foi reduzida e está congelada desde 2010”, afirma. “O que o governo investiu na universidade em 2016 foi 20% do que ela precisou”, comple-
ta. Os professores estão há três anos sem reposição salarial, o que, segundo Rosângela, faz parte de uma ação coordenada de ataque ao serviço público: “E a universidade é muito mal vista nesse processo, porque ainda é um reduto de resistência a esse tipo de projeto”. Na Universidade Federal do Paraná (UFPR), houve um contingenciamento - atraso ou parcelamento de R$ 7 milhões. Todas as obras foram paralisadas, e quem mais sente na pele os cortes de investimentos são os funcionários terceirizados: 10% do setor de limpeza e segurança foi cortado. “O corte de 44% nos órgãos de financiamento para pesquisa é o mais pesado”, critica Herrmann Muller, presidente da Associação dos Professores da UFPR (APUFPR), que acrescenta que os mais prejudicados são os estudantes mais pobres. “O serviço público tem um princípio muito claro que é o atendimento à população como um todo, e não somente uma população elitizada”, finaliza. Lex Kuzlik
Universidade Federal do Paraná sofre reflexos do corte de gastos
ASSISTÊNCIA SOCIAL E SAÚDE Em pouco menos de um ano, Temer cancelou programas como a Política Nacional de Atenção Básica (PNAB), reduziu investimentos do Programa Mais Médicos (PMM), prejudicou programas como o Saúde da Família (PSF) entre outros. Na Assistência Social, o governo federal reduziu em mais de R$ 458 milhões os recursos para co-financiar o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) nos 5.568 municípios brasileiros. Com informações de Déa Rosendo Joka Madruga
Desmonte de Temer se repete nos municípios Pedro Carrano, Curitiba (PR) Em maio de 2017, reunião entre o governo Temer e a Confederação Nacional de Municípios (CNM), foi marcada pelo pedido de ajuda das gestões municipais devido à dívida com a Previdência de R$ 75 bilhões. Mas, ao mesmo tempo, as gestões municipais passaram a apoiar o desmonte proposto pelo governo federal via reformas (trabalhista e previdência), além de aplicar o chamado ajuste fiscal, de corte de recursos. Embora a própria CNM admita, em documento, que não houve, em dez anos, grande aumento de gastos com o funcionalismo. Ainda em maio do mesmo ano, os legislativos de cidades como Curitiba, Colombo, Araucária, e outras 26 cidades do Paraná, buscam aprovar às pressas, com
uso de força policial, mudanças na previdência e nos salários do funcionalismo. “A gente estava na praça, na rua, num dia de greve, as pessoas viram que eles iam fazer a aprovação, e fomos para a Câmara. Eles saem de lá, vão para uma sala fechada e aprovaram, absolutamente sem debate”, afirma Neide Nóbrega, professora da rede municipal há 11 anos em Araucária (PR).
Confederação Nacional de Municípios afirma que aumento da folha dos servidores não foi significativo em dez anos
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Se tem banco público, tem desenvolvimento
7 passos para fortalecer os bancos públicos Fernando Nogueira da Costa cita algumas medidas para fortalecer os bancos públicos e melhorar o Sistema Financeiro Nacional:
Medidas do governo Temer enxugam Banco do Brasil e Caixa para abrir espaço às privatizações Paula Zarth Padilha e Renata Ortega, Curitiba (PR)
O
relógio ainda não marca 10 horas, mas já há fila do lado de fora da agência da Caixa Econômica Federal. São clientes e usuários que chegaram antes do horário, na tentativa de garantir atendimento e diminuir o tempo de espera. Eles aguardam para receber a pensão ou aposentadoria, pagar a parcela do financiamento habitacional ou utilizar outros serviços disponíveis. Mesmo assim, após a distribuição das senhas, a fila que têm que enfrentar é longa, demorada e cansativa. Do outro lado do balcão, bancários se desdobram para conseguir atender a todos. Embora existam vários guichês, há poucos funcionários designados para o atendimento pessoal. Além da realização de saques, depósitos, manuseio de envelopes e malotes e pagamento de benefícios, o trabalho inclui a venda de produtos bancários, como seguros, capitalização, previdência e consórcios. No Banco do Brasil, por exemplo, cada funcionário de agência é responsável pelo atendimento médio de 450 contas. Tudo isso sob a pressão das metas a serem cumpridas. “Essa é a realidade atual, vivida por usuários e funcionários dos bancos públicos brasileiros. Resultado de um processo de desmonte que vem sendo intensificado pelo governo Temer”, explica Elias Jordão, presidente do Sindicato dos Bancários de Curitiba e região. As medidas desta abordagem destrutiva incluem fechamento de agências, diminuição do número de funcionários – através dos planos de aposentadoria incentivada – e constantes reestruturações, que precarizam o atendimento à população e sobrecarregam os trabalhadores bancários. Segundo dados no Dieese, de ja-
De janeiro a agosto de 2017, foram fechados 6.845 postos de trabalho na Caixa, de acordo com o Dieese neiro a agosto de 2017, foram fechados 6.845 postos de trabalho na Caixa. Já o Banco do Brasil fechou 563 agências em todo o pais, no primeiro trimestre do ano. “Trata-se de uma estratégia para diminuir o papel destes bancos, criando uma percepção na sociedade de que eles não prestam e não são eficientes. Com isso, abre-se espaço para o velho discurso de que estão operando mal ou perdendo dinheiro e, portanto, devem ser privatizados a médio prazo, eliminando-os da economia nacional”, conclui o presidente do Sindicato. Lucro X interesse público Nos últimos anos, a Caixa e o Banco do Brasil foram fundamentais para manter o crescimento do país, investindo do acesso da população aos
serviços bancários e na expansão do crédito. Segundo o professor do Instituto de Economia da Unicamp Fernando Nogueira da Costa, os bancos públicos têm papel crucial no acesso popular, ampliando a abertura de contas para trabalhadores formais e informais, e também na capacidade de financiamento produtivo, corrigindo falhas do mercado financeiro, baixando taxas e juros e cumprindo políticas públicas de cunho social. “Os bancos privados têm como foco a área de investimento e a busca pelo lucro, beneficiando principalmente clientes de alta renda. Já os bancos públicos têm maior fonte de captação na poupança – 38% na Caixa e 20% no Banco do Brasil –, o que beneficia a população de baixa renda, e financiam setores menos lucrativos, como a habitação e a agricultura familiar, entre outros”, resume o professor da Unicamp. Agricultura familiar As medidas de desmonte dos bancos públicos implementadas pelo Governo Temer impactam também a população rural. Um exemplo é o corte de 39% no orçamento destinado ao Pronaf, programa de fortalecimento da agricultura familiar operado pelo Banco do Brasil.
1
Desenvolver uma política de acesso ao crédito tendo como prioridade o crescimento sustentável de emprego e renda;
2
Ampliar os cargos de direção do Banco Central para além da representação do mercado, com presença de economista desenvolvimentista, que tenham como prioridade o combate ao desemprego;
3
Criar uma Escola Superior de Administração Bancária, para evitar indicação política nas direções dos bancos públicos, utilizando como critério a capacitação;
4
Incentivar investimentos em infraestrutura pública básica, com financiamento com taxas baixas e estáveis;
5
Mudar o modelo de cobrança e de taxas do rotativo do cartão de crédito;
6
Negociar o crédito imobiliário, vendendo os financiamentos de longo prazo para fundos de pensão;
7
Criar um crédito estudantil consignado para massificação do ensino superior.
R$ 5,2 bi
R$ 4,1 bi
de lucro no primeiro semestre de 2017
de lucro no primeiro semestre de 2017
120
10.012
é a expectativa de fechamento de agências anunciada pela Caixa até o primeiro semestre de 2018
11.726
postos de trabalho fechados de março de 2015 até agosto de 2017
7 | 9Especial
postos de trabalho fechados de março de 2015 até agosto de 2017
11,6%
543
redução do quadro de funcionários Fotos: Joka Madruga
agências foram fechadas de junho de a junho de 2017
1.083
pontos de atendimento a menos de junho de a junho de 2017
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Outubro de 2017
Cinco saídas para a crise econômica Entre as medidas está a antecipação das eleições presidenciais para 2017 Redação, Curitiba (PR)
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e a política de privatização avançar, também ganham corpo as iniciativas em defesa das empresas públicas. O senador Roberto Requião (PMDB), presidente da Frente Ampla de Defesa da Soberania Nacional, anunciou uma iniciativa do Senado para reverter medidas propostas por Temer. No final de setembro, 36 senadores protocolaram um projeto de referendo com o objetivo de revogar leilões de usinas hidrelétricas e de blocos para exploração de petróleo, em defesa da Soberania Nacional. Requião também alertou, em seu Facebook, que a privatização da Eletrobras e da Cemig constituem um “crime de lesa pátria anunciado”. Além da inicia-
SAÍDA DE TEMER DA PRESIDÊNCIA
1
Um programa de governo capaz de superar a crise econômica sem levar ao acirramento das desigualdades sociais, nem recorrer à privatização das empresas públicas, exige uma medida urgente: a saída do presidente golpista Michel Temer (PSDB) da presidência da República. Temer representa a política conservadora e neoliberal que mantém intocados os privilégios dos mais ricos e mexe no bolso e nos direitos dos trabalhadores. A Frente Brasil Popular defende a antecipação das eleições presidenciais para 2017, para que a própria população possa escolher seu representante no Poder Executivo.
tiva parlamentar, mobilizações sociais, de movimentos populares e entidades sindicais, passaram a ocorrer em todo Brasil desde o anúncio das privatizações. No Paraná, a semana de 16 a 20 de outubro é marcada por ações em defesa da soberania nacional e das empresas estatais. A programação prevê marchas em Curitiba, audiências públicas da Assembleia Legislativa e atividades no interior do estado. Além dessa medida, o Brasil de Fato elencou cinco saídas para reverter a crise econômica, como alternativas às privatizações. Os pontos se baseiam em levantamentos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), análises da Frente Brasil Popular e dados apresentados pela associação Auditoria Cidadã da Dívida. Confira:
TAXAÇÃO DE GRANDES FORTUNAS
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O Imposto sobre Grandes Fortunas (IGF) está previsto na Constituição de 88, mas não foi regulamentado nem posto em prática. A ideia é simples: cobrar mais impostos de quem tem mais dinheiro. Uma estimativa de 2015 apresentou que a adoção do IGF pode agregar, para os cofres públicos, R$ 6 bilhões anuais. Comparativamente, a Vale do Rio Doce foi vendida por R$ 3,3 bilhões.
Você Sabia? Pela volta da CLT A Central Única dos Trabalhadores (CUT) lançou uma campanha nacional, em setembro, para coletar assinaturas para revogar a nova legislação trabalhista, prevista para entrar em vigor dia 11 de novembro. A meta é chegar a 1,3 milhão de assinaturas, quantidade necessária (1% do eleitorado brasileiro) para entrar com Projeto de Lei de Iniciativa Popular (PLIP) na Câmara Federal dos Deputados.
REFORMA TRIBUTÁRIA
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A proposta de reforma do sistema tributário brasileiro pode fazer com que a cobrança de impostos seja aplicada de maneira mais justa no Brasil. Esta revisão nos procedimentos pode reduzir a desigualdade social, porque prevê a redução da carga tributária sobre bens e produtos de consumo popular. Ao mesmo tempo, cobra mais de valores herdados e doações, além de prever a regulamentação do Imposto sobre Grandes Fortunas. Fonte: Plano Popular de Emergência da Frente Brasil Popular
Fonte: Senado Federal
FIM DA SONEGAÇÃO FISCAL
Essa alternativa propõe a redução da jornada máxima de trabalho de 44 para 40 horas semanais. O objetivo é aumentar a oferta de empregos, já que mais trabalhadores seriam necessários para completar essa lacuna de mão de obra. Estimativas apontam que a redução da jornada pode gerar 3,2 milhões de novos empregos, com um impacto de apenas 1,99% nos custos totais das empresas.
Sonegar um imposto significa deixar de declarar a renda ou omitir valores para pagar menos impostos. Em 2016, foram sonegados cerca de R$ 500 milhões de reais que deixaram de entrar nos cofres públicos – isso equivale a 13% do PIB brasileiro. No Brasil, quem mais sonega são os mais ricos: pessoas com renda mensal acima de 160 salários mínimos tributam apenas 6,51% de seus rendimentos. Entre os mais pobres, a tributação ocorre por meio do consumo de produtos, que chega a apanhar quase metade da sua receita.
Fonte: Dieese
Fonte: Sinprofaz e Receita Federal
Leandro Taques
REDUÇÃO DA JORNADA DE TRABALHO
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