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ÍNDICE
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APRESENTAÇÃO
RIO E CIDADE HISTÓRICO DE EVOLUÇÃO
O conflito entre a expansão urbana e os rios
A cidade de Vila Velha e sua relação com a água
RECONCILIAÇÃO DA CIDADE COM O RIO
Referências projetuais
DIAGNÓSTICO – O RECONHECIMENTO DO LOCAL DE ESTUDO
Localização, divisão administrativa e conexões com o entorno
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Aspectos hist
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tóricos
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Fluxos
Zoneamento
Uso do solo
Gabaritos
Sinais comportamentais e ambientes
Síntese do diagnóstico
00 CONSIDERAÇÕES FINAIS
00 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
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minha mente fervilhava sobre qual tema falar e então me vi querendo uma cidade melhor. espero que esse produto seja útil para a construção de uma cidade mais humana. dedico a todos os braços que me enlaçaram durante toda a vida. às vozes que acalentaram meu coração nos momentos difíceis. às pessoas que se foram e às que ficaram.a quem me apoiou para chegar até aqui e me fez acreditar no sonho de uma arquitetura e urbanismo para todos.
Matheus Avancini de Lima
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APRESENTAÇÃO Visando a compreensão do trabalho como um todo, o capítulo a seguir expõe a problemática atual dos rios urbanos, bem como uma introdução geral ao tema proposto e ao que se desenvolverá no estudo subsequente.
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Segundo Rebouças (2006), o Brasil possui uma das maiores redes de rios perenes1 do mundo, devido às suas condições climáticas e geológicas e sua localização na faixa mais úmida do planeta. Em diversas regiões do país, ainda hoje, populações vivem às margens dos rios com suas necessidades supridas pelos cursos d’água. Atividades como lavagem de roupas, extrativismo, pesca e pequenos serviços de mineração também podem ser observadas nessas regiões, bem como podia ser observado no surgimento das primeiras civilizações. No entanto, nos dias atuais, a visão para os rios, córregos e cursos d’água das cidades, em geral, é de uma lembrança nostálgica de como já foram importantes e balneáveis, fontes de riqueza e renda para as cidades, mas que atualmente, sofrem enorme decadência e foram esquecidos pela sociedade, tornando-se apenas um depósito de mau cheiro e obstáculo para a circulação, tornando o canal poluído e cheio de lixo. A cidade de Vila Velha possui diversos canais, porém, com o passar do tempo, a cidade se desenvolveu desordenadamente e tais cursos d’água foram desaparecendo. Muitos foram suprimidos, enquanto outros tornaram-se depósito de esgoto e dejetos dos mais diversos tipos. A cidade virou as costas para os rios e eles se tornaram esquecidos, cada vez menos presentes no cotidiano da população. Com isso, detectou-se a necessidade do presente estudo com objetivo de compreender a formação dos cursos d’água e como chegaram à situação atual, embasando-se teoricamente para que haja uma reflexão sobre o tema e uma solução viável e eficiente para o problema.
1. TEXTO DE RODAPÉ
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Para tal, utilizou-se de pesquisas bibliográficas e vivências no local de estudo para levantamento de dados, a fim de se conhecer a área por completo e em seus mais profundos detalhes, o que resultou em registros fotográficos e mapas que ilustram a realidade local. Os mapas são divididos em localização, aspectos históricos, fluxos, zoneamento, uso do solo, gabaritos, sinais comportamentais, relação espaço público e privado e, por fim, uma síntese do diagnóstico, englobando os pontos principais para a compreensão da área. O trabalho compõe-se de sete capítulos, contemplando as inquietações e problemáticas que a segregação do rio na cidade ocasiona, estudos de caso que servem como referências projetuais para a elaboração do futuro projeto na área, a contextualização da cidade em sua totalidade e como acontecem os rios, o diagnóstico mais detalhado da região em estudo efetivamente e a proposta de intervenção para a área. Por fim, as referências bibliográficas utilizadas para embasamento sobre o tema. O produto obtido ao final das pesquisas e projetos para o local será a proposta operação urbana que agregue maior valor a região beira-rio e faça-a viva novamente. Através de um parque linear, o rio de conectará com seu entorno, promovendo usos diversos e vivências ao longo de todo seu curso. Edificações de apoio também podem ser adotadas, de modo que sirvam de suporte ao parque, bem como para a promoção de atividades para a comunidade carente que reside às margens do rio e em seu redor. Para tanto, é necessário que o rio esteja despoluído para que as intervenções possam ser instaladas.
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RIO E CIDADE No capítulo a seguir, expõe-se sobre o histórico de evolução dos rios urbanos e como eles se desenvolveram até chegar nos dias atuais. Aborda-se também o conflito gerado pela expansão urbana e como afetou diretamente os rios e canais. Por fim, apresenta-se a cidade de Vila Velha e como os rios articulamse com sua conformação desde sua formação até os dias atuais.
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Foto 03: Mesopotâmia em mapa - Fonte Encyclopedia Britannica, Inc (2013)
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Desde o surgimento das primeiras civilizações a habitarem o planeta, em geral, os locais com a presença de cursos d’água, sejam eles rios, córregos ou mares, promoviam espaços atraentes para a permanência dos povos, seja de curta ou longa estadia. Além da fonte navegável, os cursos d’água estavam associados à demarcação de território, potencial de produção de alimentos, comércio e, para diversas civilizações, foi uma significativa demonstração de poder e riqueza. O fator de escolha das civilizações por se estabelecerem em locais próximos à água propiciou o surgimento de locais emblemáticos que são referências pela forma como se desenvolveram, como a Mesopotâmia (GORSKI, 2008). Construída entre os rios Tigre e Eufrates, a economia base da Mesopotâmia era a agricultura e o comércio. A abundância de água tornava o plantio de alimentos eficaz, juntamente com a possibilidade da criação de animais como carneiros, bois, gansos e patos. Através dos rios, também, era possível o estabelecimento de atividades comerciais com a região da Índia. Outros locais também se destacaram pelo seu desenvolvimento a partir dos cursos d’água como as cidades egípcias próximas ao Rio Nilo, Londres com o Tâmisa, Paris com o Sena, Viena com o Danúbio e Praga com o Vlatva (SARAIVA, 2005). Na imagem 01, ilustra-se a conformação da cidade com seus rios ao redor.
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Um grande exemplo brasileiro é a cidade de São Paulo, como mostrado na imagem 02, que, fundada em 1554, se desenvolveu entre os rios Tamanduateí e Anhangabaú e próximo aos rios Tietê e Pinheiros. O Tietê possibilitou a colonização e exploração portuguesa ao interior do estado, chegando até o Mato Grosso. Os rios já eram utilizados pelos indígenas com canoas para navegação, bem como os jesuítas e bandeirantes que faziam uso para buscar mão de obra e mineração. Diversas viagens fluviais ocorreram desde o século XVIII até o século XIX, quando as estradas começaram a serem implantadas (HOLANDA, 1994 apud GORSKI, 2008). Outras cidades brasileiras que se destacam por seu desenvolvimento aliado aos cursos d’água são Blumenau, Recife, Cuiabá, Manaus e Porto Alegre que, ainda hoje, têm nos rios grande apreço, mesmo que poluídos ou com suas características alteradas. Belém é um outro exemplo importante pois, localizada à beira do rio Guamá, que possui uma conexão indireta com o mar, permitiu uma ligação
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
direta com Portugal, que passava a controlar o norte do Brasil no século XVII. (DUARTE, 2006 apud GORSKI, 2008)
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2.1 O conflito entre a expansão urbana e os rios
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A compreensão por parte da população da situação em que os rios se encontram e a convicção do esgotamento dos recursos naturais é um fator de extrema importância para a conscientização e engajamento social para recuperação e conservação dessas áreas. Segundo Gorski (2008), a relação amigável entre população e os cursos d’água acabou na metade do século XX, quando a necessidade de desenvolvimento urbano urgente aconteceu e os rios foram suprimidos ou até mesmo desapareceram.
“Não basta despoluir o rio! Mesmo que ele volte a correr límpido, piscoso, potável, de nada modificará a percepção que a população tem do seu ‘esgoto a céu aberto’. O rio precisa voltar a se incorporar na vida do paulistano e, para isso, a única alternativa é reconstituí-lo como espaço de lazer.” (NEIMAN, 2005, p.266) Brito e Silva (2006) alerta que o menosprezo às margens dos rios pode transformá-las em uma área indesejada para a população e propensa a ocupações irregulares. Nos dias atuais, os rios se tornam coadjuvantes na paisagem urbana, onde muitas vezes se tornam invisíveis através da canalização de seus cursos. Entretanto, Costa (2006) alerta para os muitos artifícios que os canais têm a oferecer além de água, como as paisagens fluviais que, por estimularem circulação de pessoas, geram locais com potencial e vida.
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Diversos autores buscam definir o que efetivamente significa paisagem urbana. Sorre (1962) alega que a paisagem urbana é composta por elementos que atuaram na formação e no crescimento do sítio. O autor ainda defende que as paisagens das cidades tiveram de se adaptar aos cursos d’agua, pois estes se demonstram como obstáculos ao seu crescimento. Já Santos (1985), define paisagem como elementos geográficos, dispostos sobre uma determinada área, dependentes de processos sociais para que tenham vida. Por fim, Gorski (2010. p 40) descreve paisagem urbana como elementos que
“fazem-se e desfazem-se, evoluem, ganham e perdem complexidade por ação conjugada do homem e da natureza. Nelas se ligam interativamente comportamentos físicos, químicos e biológicos. Com uma intervenção humana que, direta ou indiretamente, condiciona e interfere com o ciclo e o percurso da água, tornando-o fácil, suave, controlando e aproveitando dela o máximo como recurso essencial à vida ou, pelo contrário, acelerando-o e fazendo-o violento, caprichoso, capaz das maiores destruições. Um castigo em vez de uma benesse.” No Brasil, quando se encontra um rio ou córrego no meio de alguma obra pública, é comum canalizá-lo, contribuindo para a descaracterização da paisagem e, muito possivelmente, a ocorrência de inundações na região. Na ilustração 04 e 05, explicita-se um córrego natural, sem modificação humana, e um outro com interferências aos condicionantes naturais.
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Entretanto, algumas medidas foram tomadas no país para que os cursos d’água fossem conservados. Franco (2000) expõe a iniciativa de Dom João VI, Príncipe-Regente de Portugal, que promoveu em 1817 normas de proteção dos afluentes no Rio de Janeiro, objetivando a preservação da qualidade das águas. Tal regulamentação decretava a preservação das árvores próximas às nascentes dos rios, para que não houvesse assoreamento e intervenções que comprometessem a qualidade da água. Na imagem a seguir é possível verificar uma várzea de rio arborizada, com seu barranco preservado e, consequentemente, a qualidade do seu leito. A água, que sempre era tida como recurso inesgotável no planeta, sempre foi muito desperdiçada e nunca houveram grandes preocupações com seu fim. Usada pela sociedade, na agricultura, indústria, dentre outros, muitas vezes ocorrem vazamentos nas tubulações que acarreta na perda de água potável. Há também os problemas dos subsolos dos edifícios, que necessitam realizar rebaixamento dos lençóis freáticos, o que acarreta em impactos aos cursos d’água. Atualmente, o Brasil possui cerca de 11% da água doce do mundo, sendo que 70% se localizam na Amazônia, que se encontra sob ameaça devido ao desmatamento que assola a região. Segundo Schizato (2006), a disponibilidade anual de água por pessoa caiu 43% entre 1970 e 2000. O autor chama atenção de que no Brasil investiu-se em tratamento de água, mas não em tratamento de esgoto. As populações das grandes cidades, adensadas e sem infraestrutura adequada, estão fadadas à má qualidade das águas e da sua escassez. A falta de saneamento urbano no Brasil contribui para o lançamento de esgoto sem tratamento nos rios, bem como o descarte de materiais dos mais diversos tipos.
Foto 05: Córrego canalizado e suas interferências - Fonte Riley (1998) Foto 06: Córrego natural, sem canalização - Fonte Riley (1998) Foto 07: Esquema de um rio saudável - Fonte Riley (1998)
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De acordo com Salati et al. (2006), conflitos diversos são gerados a partir da escassez de água e pela propriedade de bacias hidrográficas, como ocorreram na Turquia, na Síria e no Iraque, que disputam o rio Tigre e Eufrates; em Israel, Jordânia e Síria pelo rio Jordão; Índia e Bangladesh pelo rio Ganges. No entanto, para Rebouças (2006), o que ocorre no Brasil é diferente. O autor acredita que o problema do país não seja efetivamente o desaparecimento da água, mas sim a deficiência da gestão do poder público acerca dos recursos hídricos do país. Na tabela 01, apresentada por Tundisi (2003), pode-se observar o aumento drástico do consumo doméstico em relação às outras fontes consumidoras.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
No Brasil, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) em sua Pesquisa Nacional de Saneamento Básico de 2008, 55,16% dos municípios brasileiros possuem esgotamento sanitário e serviço de coleta e 100% tratam seu esgoto. Explicitados na tabela abaixo, tais dados vêm certificar o problema de tratamento de esgoto no Brasil, que reflete em problemas de saúde pública, em vista à política de saneamento desconexa proposta pelo poder público.
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Bonduki (2004) ressalta que além da necessidade de novas edificações e moradias para atender aos cidadãos, as cidades sofreram também com o problema das soluções adotadas para a mobilidade urbana que, devido ao intenso crescimento, as supressões dos rios se tornaram mais frequentes, e passaram a ser desviados ou até mesmo cobertos para a implantação de vias. Por fim, os rios que antes eram um dos meios de locomoção, abastecimento e lazer tornaram-se ambientes impróprios para qualquer atividade. Antes eram sinônimos de vida das cidades e hoje são mascarados e escondidos devido ao estado em que se encontram. De acordo com a o Código Florestal, Lei nº 12.651/2012, em seu Art. 4º, considera-se como Área de Preservação Permanente, em zonas rurais ou urbanas, as faixas marginais de qualquer curso d’água natural perene e intermitente, desde a borda de seu leito a largura mínima de:
a) 30 metros, para os cursos d’água de menos de 10 metros de largura; b) 50 metros, para os cursos d’água que tenham de 10 a 50 metros de largura; c) 100 metros, para os cursos d’água que tenham de 50 a 200 metros de largura [...] E em seu §2º determina que “para fins da regularização ambiental, ao longo dos rios ou de qualquer curso d’água, será mantida faixa não edificável com largura mínima de 15 metros de cada lado”. Com isso, pode-se concluir que o curso d’água em estudo não está em conformidade com as diretrizes estabelecidas pela Lei, pois não obedece a faixa de preservação permanente em nenhuma de suas margens, onde é possível identificar edificações que avançam e apoiam suas estruturas em seu leito.
2.2 A cidade de Vila Velha e sua relação com a água
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Como dito anteriormente, os cursos d’água eram muito utilizados como canais navegáveis desde os tempos mais antigos. ROCHA (2008, p. 109) destaca que, Dom Pedro II, chegando ao Convento da Penha, observou que
o Rio da Costa, que entulha de areia o porto entre o morro do Convento da Penha e o Morro do Moreno - é preciso dar-lhe saída para o lado de fora do Moreno, e há pouco que rasgar: o plano do Drumond e do capitão do porto Gama Rosa, que importa em 9 contos e tanto, exige um açude que não será talvez preciso podendo-se deitar pedra da Penha e do Moreno dentro do rio.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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Charles Frederick Hartt, que participou de uma expedição ao Brasil em 1865 e 1867, escreveu diversos relatos sobre suas visitas e, dentre eles, um livro intitulado “Geologia e Geografia Física do Brasil”, o qual possui um capítulo especificamente dedicado à sua experiencia no Espírito Santo. Hartt (1870, p.88) apud Rupf (2016, p.18) faz considerações acerca do Canal dos Jesuítas, que faz transposição para o Rio Marinho, que permite navegação até o porto de Vitória:
o Rio Jecú nasce entre as serras para Oeste, e é um curso insignificante, aparentemente menos que o Muriaé. É dificilmente navegável por canoas, e somente até curta distância. Umas cinco milhas acima de sua foz, um canal, cortado há muito tempo pelos Jesuítas, corre para o norte e comunica-se com o Porto de Vitória, distante umas cinco milhas. Isto se fez para facilitar o transporte dos produtos da região para Vitória, assim como para evitar as perigosas passagens por mar desde a foz do rio até os recifes e pontas penhascosas ao sul da Baía do Espírito Santo.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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Ainda sobre a transposição dos rios Jucu e Marinho, Rupf (2016) salienta que diversas fazendas e aldeias indígenas na Província do Espírito Santo transformaram-se em povoações, com destaque para Araçatiba, atual Viana, que se tornou uma das maiores fazendas da província, sendo responsável pela produção agrícola para abastecimento da Ilha de Vitória por um tempo significativo, tudo isso obra dos Jesuítas do Colégio de Vitória. O transporte dos suprimentos era feito às margens da Baía de Vitória até o Porto de Santana, em Cariacica. Outra forma de transporte era pelo Rio Jucu até sua foz e navegando em mar aberto para acessar a baía. Entretanto, o transporte de mercadorias, seja por terra ou por água, era consideravelmente demorado e muitas vezes ocasionava em perdas. Segundo Caus (2012), a construção permitiu a abertura de um canal de 1.500m, permitindo o transporte de mercadorias da fazenda se estabeleceu por séculos, pois a construção permitiu a contínua navegabilidade mesmo em tempos de estiagem.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
Araçatiba em canoas até à capital. Com isso, o Rio Marinho transformou-se numa hidrovia, ligando o Rio Jucu à Baía de Vitória, que
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As primeiras obras de abastecimento de água do estado começaram com a chegada da família real no Brasil em 1808 e estabelecimento de novas diretrizes para as colônias. Após a Independência do Brasil em 1822, Vitória foi instituída como cidade. Em 1828, na atual Rua Barão de Monjardim, no centro da cidade, foi construído o primeiro chafariz do estado, cujo abastecimento era feito pelas águas do Morro do Vigia. Nos anos seguintes foram construídos outros como o da Fonte Grande, da Capixaba, da Lapa, da Ladeira do Chafariz e de São Francisco que, além de cumprirem seu papel de abastecimento, também eram momentos arquitetônicos (RUPF, 2016). Em Vila Velha, o abastecimento era feito através da Fonte Inhoá, na Prainha. Dom Pedro II visitou a fonte em 1860, mas a mesma acabou sendo canalizada anos depois e tornou-se o primeiro reservatório. Somente após a Proclamação da República em 1889, aconteceram os primeiros movimentos para implantação de um sistema de abastecimento de água canalizada. No governo de Muniz Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
Freire, em 1896, foi criada uma comissão específica para Melhoramentos da Capital, onde foi contratado o engenheiro sanitarista Francisco Saturnino Rodrigues de Brito, que coordenou os trabalhos (RUPF, 2016).
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A cidade de Vila Velha, fundada em 1535, é pertencente à Região Metropolitana da Grande Vitória e é separada da capital por cursos d’água, onde pontes permitem a conexão entre as cidades. Segundo Rupf (2012), no município existem quatro rios principais: o Rio Jucu, que possui maior extensão; o Rio da Costa, que ligava o Jucu à Baía de Vitória; o Rio Aribiri, com nascente na parte central da cidade; e o Rio Marinho, que divide os municípios de Vila Velha e Cariacica. Em condições normais, as águas do Rio Jucu desaguam na Barra do Jucu, ao sul da capital. Em casos de enchimento do rio, a água superava a cota de 2,20m de altura. Em tais momentos, as águas se direcionavam para o Centro de Vila Velha por meio do transbordamento do Rio Jucu pelo Rio da Costa. Segundo jornais da época, Vila Velha passou por uma enchente que, devido à falta de alargamento da foz, deixou centenas de pessoas desabrigadas sob uma cota de água de 2,00m. Na imagem XX, pode-se observar os cursos d’água da cidade de Vila Velha.
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Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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Após pesquisas e estudos, o governo decidiu construir um dique de proteção, o Jucu-Guaranhuns. Em 1960, dois anos após o início da construção do dique, Vila Velha sofreu novamente com as chuvas que ocasionaram o rompimento do dique e fez com que a cidade se tornasse uma calamidade. Em tal enchente, as águas percorreram cerca de 6km de distância, chegando ao Centro da cidade, bem como na Rodovia Carlos Lindemberg, conforme as imagens a seguir.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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Após o rompimento do Dique Guaranhuns, enquanto sua longa recuperação era feita, iniciou-se a construção do Dique Santa Inês. As obras iniciaram em 1962 e, por ter sido construído com material mais resistente, seu topo se tornou a Avenida João Mendes, importante no bairro Santa Mônica. Ao fim, o referido dique ligou o bairro de Santa Inês à atual Rodovia do Sol, em Coqueiral de Itaparica, objetivando proteger o Centro e bairros próximos das possíveis enchentes futuras (RUPF, 2016). O Rio da Costa, que era um afluente do Rio Jucu para a baía de Vitória, se dividiu no atual Canal da Costa e no Canal de Guaranhuns. O primeiro segue seu curso até desaguar na baía entre o Morro do Moreno e o do Convento da Penha. Já o segundo, com fluxo das águas invertido, escoa para o sul até encontrar o Rio Jucu e desaguar no mar. Após a conclusão do Dique de Santa Inês, iniciou-se a reconstrução do de Guaranhuns. Com 5km de extensão e 3,50m de altura, o dique começa na Rodovia do Sol até a atual Estação de Captação de Água da Cesan. Anos depois, em 1979, ocorreu uma nova enchente que atingiu a cota de 3,20m no Dique de Guaranhuns (RUPF, 2016).
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Em um cenário mais amplo, com o passar dos anos e com a imigração causando forte pressão nas cidades desprovidas de infraestruturas para receber as famílias, o saneamento básico era ausente, bem como moradias e políticas públicas do Estado para suprir tais necessidades. Foram então ocupando-se as áreas marginais de mangues e alagáveis, gerando efetivamente a ruptura ambiental e da conexão da cidade com o rio (BONDUKI, 2004). Bonduki (2004) ainda ressalta que além da necessidade de novas edificações e moradias para atender aos cidadãos, as cidades sofreram também com o problema das soluções adotadas para a mobilidade urbana que, devido ao intenso crescimento, as supressões dos rios se tornaram mais frequentes, e passaram a ser desviados ou até mesmo cobertos para a implantação de vias. Por fim, os rios que antes eram um dos meios de locomoção, abastecimento e lazer tornaram-se ambientes impróprios para qualquer atividade. Antes eram sinônimos de vida das cidades e hoje são mascarados e escondidos devido ao estado em que se encontram.
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Tal cenário acontece no contexto nacional, bem como no local de estudo, o Canal de Guaranhuns, que sofre com as consequências da falta de planejamento urbano e territorial que o fizeram passar de um canal navegável para um depósito de esgoto a céu aberto.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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A RECONCILIAÇÃO DA CIDADE COM O RIO Neste capítulo buscou-se por referências projetuais no Brasil e no mundo que agregassem conhecimento para o trabalho. Foram feitas pesquisas no projeto de Piracicaba, em São Paulo, e em Madrid, na Espanha. Eles trazem diferentes abordagens sobre intervenções em beiras de rio, o que agrega maior valor para a intervenção no Canal de Guaranhuns.
3.1 PROJETO MADRID RIO - MADRID
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Parte de um projeto ainda mais amplo, considerado um dos mais importantes projetos de revitalização urbana da Espanha, o Madrid Rio foi concebido através de um concurso de projetos e a equipe vencedora propôs resolver a situação da área apenas com arquitetura de paisagem. Coordenado pelo arquiteto Ginés Garrido, o processo teve início em 2005 com a remoção de 6km de vias próximas ao Rio Manzanares e também de pessoas que viviam em situações precárias por conta do ruído e da falta de equipamentos públicos e liberando 50 hectares de terra para o parque linear conhecido como Madrid Rio, ilustrado na imagem xx e xx.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
O projeto, que teve como principais objetivos a resolução da mobilidade e a necessidade de espaços públicos, conta com áreas de lazer, passagens para pedestres, ciclovias, quadras para esportes, equipamentos públicos e até uma praia artificial, como mostrado na imagem xx. Um ponto forte do projeto de revitalização é a renovação da paisagem, transformando antigas barreiras, a via, em um cenário interessante e agradável. Outro atrativo também é a criação de espaços para diversas pessoas e idades, propiciando a utilização por todos os cidadãos e em todos os horários do dia. Com um total de 47 subprojetos que desde o início têm se desenvolvido, a região teve melhoras quanto às conexões urbanas ao longo do rio, além das várias praças, bulevares, parques e um conjunto de pontes. Destacam-se a Avenida Portugal, Salón de Pinos e Parque da Arganzuela, detalhados a seguir.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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Em 2007, iniciou-se a construção da Avenida de Portugal, um dos mais importantes caminhos no centro de Madri, oferecendo uma linda vista para o centro histórico da cidade às margens do rio. A estrada que havia na região foi realocada em um tunel e um estacionamento subterrâneo foi implantado. O paisagista responsável pelo projeto realizou o plantio de diferentes tipos de cerejeiras, para que durante todos os anos o local tenha flores.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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Realizado em 2010, O Salón de Pinos foi projetado como um espaço verde linear com objetivo de conectar espaços urbanos existentes e novos, ao longo do Rio Manzanares. Pinheiros foram plantados em mais de 8000 metro quadrados com um “ballet” de diferente cortes e características de crescimento das árvores. Plantas combinadas e pensadas transforam o espaço em um caráter natural e escultural, assemelhando-se a um monumento botânico, como pode ser visto na imagem xx.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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Em 2011, implantou-se o Parque da Arganzuela que tem como atrativo principal a água. O parque é composto das diferentes emoções e paisagens possíveis de se promover com a água, tornando o local sensível e interessante. A topografia dos espaços permite com que a água se cruze de um lado para o Toutro através de jatos que despertam o encanto nos visitantes. A variedade de plantas também é um ponto forte dessa intervenção, propiciando diversos ambientes e sensações únicas para cada espaço criado.
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Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
3.2 PROJETO BEIRA-RIO - PIRACICABA
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Piracicaba é um município do interior de São Paulo com população de quase 400 mil habitantes e a ideia do projeto de recuperação do rio Piracicaba originou-se a partir da relação cultural da população com o rio. Diversas manifestações envolvendo o corpo d’água foram apresentadas em lugares históricos, nas paisagens e no folclore, o que serviu como base para a execução do plano de recuperação do rio. Segundo informações da prefeitura local, o Projeto Beira-Rio consiste no desenvolvimento de diretrizes para implantação de projetos e políticas aliando rio e cidade. Os estudos e projetos iniciaram em 2001 sob responsabilidade da prefeitura do município e começou com um diagnóstico antropológico e participativo e, posteriormente, um Plano de Ação Estruturador (PAE). A característica biocultural que une o rio e a cidade se reflete logo na primeira fase do projeto, que teve sua metodologia de diagnostico baseada na participação da população pois, acreditou-se que sendo assim, seria possível colher suas características positivas e negativas. O processo de coleta de informações foi desenvolvido por um antropólogo, Arlindo Stefani, que percorreu a orla do rio resgatando memórias das pessoas que ali viviam e redescobrindo o rio.
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Após o diagnóstico, verificou-se que era necessária uma intervenção de modo a tornar a margem como espaço público e a valorização do percurso a pé, como pode ser visto na imagem xx. O grande objetivo é a sustentabilidade entre o cidadão, cultura e o meio ambiente.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
Após a fase de diagnóstico, elaborou-se o Plano de Ação Estruturador, PAE, que ofereceu recursos conceituais para a criação de um processo de desenvolvimento de diretrizes para as intervenções, focando o rio e suas conexões com a cidade. Os conceitos trabalhados no plano revelam importantes funções e potencialidades dos espaços da cidade, como por exemplo, o de corredor ecossocial, que consiste em um sistema de circulação conectado à calha do rio. A implantação de todos esses conceitos e diretrizes resulta em programas de educação ambiental e estimulador para o turismo, afinal, a inserção cultural da sociedade na região é de extrema importância. Há também a geração de renda, fomentada pelo por público através de ações, como na Rua do Porto, ilustrada na imagem xx.
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Fez-se necessário ao projeto um plano de manejo ambiental, relativo à área de intervenção que estava dentro do perímetro urbano, a “Proposta de adequação ambiental e paisagística do trecho urbano do rio Piracicaba e entorno”, que se divide em três aspectos:
Conhecimento da vegetação existente no trecho, com diretrizes para a recuperação da mata do córrego e formação de corredores verdes; Restauração florestal de um trecho da margem direita, que serve de fundo para a Requalificação da Rua do Porto, uma das intervenções do Projeto Beira-Rio; Restauração florestal e paisagística da Rua do Porto. Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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A implantação foi dividida em 3 etapas, começando pela Requalificação da Rua do Porto, que consistia em implantar um caminho para o pedestre à margem do rio, considerando as cheias dos rios; construção de decks que substituíam os antigos, conforme imagem xx, tornando-os padronizados e uniformes; recomposição da vegetação ciliar com 482 novas árvores de maioria nativa; construção de sanitários públicos; construção de arquibancada e vestiários para o campo de futebol, agora com medidas oficiais; melhora no sistema de drenagem de água da chuva; nova iluminação geral e ornamental; e regularização das vagas de estacionamento com piso permeável e com árvores plantadas.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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O segundo local de intervenção foi no Trecho Largo dos Pescadores visava a permanência do pedestre por mais tempo no espaço urbano, o tratamento da margem do rio como espaço público e que deve ser utilizado, potencializar os usos consolidados e recuperar os patrimônios, naturais e construídos. Tais ideias foram concretizadas com a ampliação e melhoria dos trechos de pedestres, com o alargamento das calçadas do Largo, permitida pela transformação da Avenida Beira Rio, que foi transformada em mão única de direção; eliminação de pequenos muros que cercavam e delimitavam o acesso à margens do rios; remodelação do Largo dos Pescadores, local de diversas manifestações, festivais e eventos religiosos da cidade, que ganhou nova pavimentação, aumento do seu espaço e remodelação da rampa de barcos, como pode ser visto a seguir:
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A terceira etapa de intervenção do projeto referese à Ponte Pênsil. Esta etapa deu continuidade às etapas anteriores com a efetiva transformação da Avenida Beira Rio em mão única de direção, o que permitiu o alargamento das calçadas; plantio de espécies nativas; demolição do mudo de arrimo e a retirada do aterro próximo a Casa do Povoador, o que permitiu a construção de um largo em frente ao local. Tal etapa mantinha os conceitos e objetivos Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
do Projeto como um todo, como a valorização do pedestre, recuperação do patrimônio e manutenção dos usos já consolidados. Nos esquemas ao lado, é possível perceber a relação criada com o rio através de níveis que avançam sob o curso d’água e permitem uma aproximação maior do visitante.
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DIAGNÓSTICO: O RECONHECIMENTO DO LOCAL DE ESTUDO Objetivando a compreensão da área de estudo em sua totalidade, este capítulo aborda diversas análises do local, importantes para sua compreensão. Problemáticas são identificadas e potencialidades são destacadas, de modo a diagnosticar os elementos que compõe a região para que uma futura intervenção ocorra de modo eficiente.
4.1 LOCALIZAÇÃO, DIVISÃO ADMINISTRATIVAE CONEXÕES COM O ENTORNO
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O local de estudo, o Canal de Guaranhuns, se localiza na cidade de Vila Velha/ES e percorre os bairros Araçás, Jardim Guaranhuns, Jockey de Itaparica, Praia das Gaivotas, Ilha dos Bentos, Santa Mônica e Vila Nova. A área está inserida nas Regiões Administrativas 01 e 02 e fazem parte da Região Metropolitana da Grande Vitória. Como dito anteriormente, o Canal de Guaranhuns surgiu a partir da divisão do Rio da Costa, bem como o Canal da Costa. O crescimento da região se deu em função do canal que, por se desenvolver majoritariamente no eixo norte-sul, promoveu a divisão dos bairros ao longo de sua extensão. A ocupação ao sul da cidade se desenvolveu, também, em função da construção de avenidas importantes como a Luciano das Neves e a Rodovia do Sol, que se desenvolvem no mesmo eixo.
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Para diagnóstico, adotou-se o Canal de Guaranhuns e seu entorno próximo, a fim de avaliar o comportamento dos diversos aspectos que compõe o local. Os principais acessos, como mostrado a seguir, acontecem pela Rua João Cipreste Filho, Avenida Leila Diniz/Jorge Rizk, Rua José Celso Claudio, Rua Itapetinga e Rua Dr. Moacir Gonçalves. Existem também outras vias que permitem conexões indiretas ao Canal, como a Avenida Sérgio Cardoso, Av. Cel. Pedro Maia de Carvalho e Rodovia do Sol. Após as análises do mapa ao lado e visitas ao local, foi possível diagnosticar que o Canal de Guaranhuns é bem articulado com seu entorno, permitindo diversas conexões entre seus lados. As vias que compõe essa malha de conexão são, em sua maioria, vias locais, exceto pela Avenida Leila Diniz/Jorge Rizk, que é uma via coletora.
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As vias que margeiam o Canal de Guaranhuns são de médio fluxo, permitindo a conexão entre os dois lados do local através de uma ponte localizada no cruzamento dessas ruas com a Avenida Leila Diniz/Jorge Rizk. Como ilustrado nas imagens abaixo, tais vias são largas, com possibilidade de estacionamento e mão dupla. As consequências da falta de planejamento urbano para a região geraram diversos problemas de infraestrutura como a falta de distribuição de água, problemas na rede de esgoto e na drenagem das águas da chuva. Com isso, os rios da cidade começaram a captar as águas pluviais e os dejetos das residências e indústrias, o que acarretou na poluição dos cursos d’água. O Canal de Guaranhuns sofre até os dias atuais com a poluição de suas águas, que não são mais lançadas no Rio Jucu. Moradores antigos da região relatam que o rio era utilizado para nadar e pescar e a sociedade vivia harmoniosamente no local, o que acabou se perdendo com a falta de planejamento. (SILVA, 2016)
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Com base em informações disponibilizadas pela Secretaria Municipal de Planejamento, Orçamento e Gestão (SEMPLA), obtidos a partir de dados do Senso IBGE 2010, bem como da Secretaria Municipal de Educação (SEMED), da Secretaria Municipal de Saúde (SEMSA) e da Secretaria Municipal de Assistência Social (SEMAS), elaborou-se o quadro abaixo, dividido por regiões administrativas, onde é possível perceber que a renda média dos moradores do entorno imediato do Canal de Guaranhuns é semelhante. Estima-se que o entorno do Canal abrigue 35 mil habitantes, que fazem parte da classe C2 e D3.
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2. TEXTO DE RODAPÉ 3. TEXTO DE RODAPÉ
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Como é possível ver na imagem a seguir, a água do Canal se encontra escura e poluída e seu entorno imediato lança esgoto diretamente em suas águas. Tal situação ocorre por uma distância considerável e gera uma enorme desvalorização do local, que poderia ser melhor aproveitado, visto a área verde e arborizada às suas margens.
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Essa situação em que o canal se encontra, de receber dejetos domésticos, acontece em outros canais da cidade, como no Canal da Costa, que também tem suas águas poluídas por esgoto e está totalmente segregado de seu entorno. Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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Segundo Silva (2016), o canal em estudo está inserido na Bacia Hidrográfica Guaranhuns, que engloba 17 bairros e possui topografia plana, no nível do mar. Com isso, a área está sujeita a inundações em períodos de chuva, como já aconteceu diversas vezes na região, que fica totalmente alagada e quase que irreconhecível, como na imagem a seguir.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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Para tentar amenizar o problema das enchentes, a prefeitura do município instalou uma Estação de Bombeamento de Águas Pluviais no Canal de Guaranhuns, próximo à Rodovia do Sol. As bombas são capazes de lançarem até 21,5 milhões de litros de água por hora do Canal para o Rio Jucu. Entretanto, somente essa estratégia não é possível para tornar o Canal vívido e integrado com a cidade. São necessárias diversas outras medidas para que o local volte a participar do cotidiano das pessoas, sendo um rio de águas limpas e com espaços agradáveis de permanência para a população. Abaixo, imagem da enchente que atingiu a região em março/2018 onde é possível perceber que as bombas não foram suficientes para escoar as águas que atingiram o local, gerando alagamentos e dificuldades de locomoção.
4.2 ASPECTOS HISTÓRICOS
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O crescimento da região se deu em função do canal que, por se desenvolver majoritariamente no eixo norte-sul, promoveu a divisão dos bairros ao longo de sua extensão.Com o crescimento ao longo do tempo, como pode ser visto nas imagens abaixo, a ocupação da região próximo ao Canal aconteceu e se consolidou. Algumas habitações foram construídas de maneira regular, enquanto outras infringiram aspectos urbanísticos e ambientais.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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Através das imagens é possível concluir que a maior ocupação do território próximo ao Canal ocorreu entre os anos de 1978 e 1998, onde se percebe uma grande área construída em relação à imagem anterior, principalmente pela concentração de prédios no bairro Praia das Gaivotas, que foram construídos nesse período cerca de 1.078 unidades habitacionais. No ano de 2005, com a maioria do território ocupado, percebe-se algumas ocupações pontuais, principalmente onde hoje é o bairro Jockey de Itaparica. Já no ano de 2012, a consolidação aumenta ainda mais, com poucos locais sem construções. E, em 2018, nos dias atuais, é possível perceber o real estabelecimento da região. Ela se encontra consolidada, com serviços e comércios que a suprem e, infelizmente, um canal que funciona como esgoto a céu aberto que percorre a área. Nas imagens ao lado, datadas de 1997, a implantação do conjunto INOCOOPES, onde é possível perceber a evolução que aconteceu na região.
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Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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4.3 FLUXOS
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Os principais fluxos da região acontecem nas avenidas principais e se ramificam para as vias locais. A Avenida Leila Diniz/Jorge Rizk serve como principal conexão entre os dois lados do canal e com os locais mais distantes. A avenida passa por diversos bairros, desde a Rodovia Darly Santos até o lado oposto, na Praia de Itaparica. O maior fluxo acontece por essa avenida, que também recebe os fluxos locais das regiões mais internas do bairro. No mapa abaixo, destaca-se os principais fluxos e onde acontecem, bem como os diversos modais que circulam pela região. As linhas de transporte coletivo utilizam as principais vias para se locomoverem que são as vias de maior fluxo na região. Algumas vias são de mão única e outras de mão dupla, como mostrado no mapa, e que fazem o trânsito na região funcionar, não gerando engarrafamentos durante o dia. Não existem ciclovias ou ciclo-faixas na região, entretanto, os cidadãos que utilizam esse meio de transporte transitam por todas as ruas, mesmo sem os espaços exclusivos para seus modais.
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4.4 ZONEAMENTOS
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Segundo o zoneamento determinado pela prefeitura da cidade através da Lei 4.575/2007, alterado pela Lei 5.430/2013, a região em estudo está inserida na Zona de Ocupação Prioritária 5 (ZOP5), que contempla os parâmetros dispostos no quadro a seguir.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
Conforme observado, os coeficientes da região são para o crescimento vertical, visto que não há limites de gabarito ou altura das edificações. Com isso, é possível aprovar projetos na prefeitura e, consequentemente, construí-los no local com alturas realmente consideráveis.
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Entretanto, no ano de 2017, a prefeitura da cidade elaborou um novo plano diretor para a cidade. O novo documento foi finalizado em dezembro/2017 e encaminhado para aprovação na câmara dos deputados. As diretrizes estabelecidas no novo plano caracterizam a região como Zona de Ocupação Prioritária C (ZOPC) e Zona de Especial Interesse Ambiental B (ZEIAB), na região do Canal. No quadro a seguir, os índices urbanísticos estabelecidos para o local.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
Quanto ao Canal, classificado como Zona de Especial Interesse Ambiental B (ZEIAB), não é permitido construções no rio e em suas margens, preservando assim os aspectos ambientais. No entanto, não estabelece diretrizes para o uso e ocupação do entorno imediato do canal. Comparando as duas propostas para zoneamento da região, é possível perceber que no novo documento há uma preocupação maior com a taxa de ocupação dos terrenos, que diminui em 10%, bem como com a taxa de permeabilidade, que dobra de valor. Valores como a altura máxima e gabarito das edificações permanecem sem limites, permitindo ao construtor elevar suas edificações a alturas consideráveis, aumentando a densidade no local.
4.5 USO DO SOLO
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Como já foi possível perceber, a região é bastante ocupada por edificações dos mais diversos usos. Como mostrado no mapa ao lado, o uso predominante é o residencial. A região possui, nas avenidas principais, comércios dos mais variados tipos, que suprem a maioria das necessidades da população local. É perceptível também, alguns comércios maiores que geram fluxos advindos de outros locais, promovendo maior fortalecimento da economia local. Entretanto, o número de vazios é bastante considerável, principalmente no bairro Jockey de Itaparica. O uso em torno do Canal, especificamente, é predominantemente residencial, seja ele multifamiliar ou unifamiliar. Outros tipos de usos estão concentrados nas vias principais, que cortam o Canal, como a Av. Leila Diniz/Jorge Rizk.
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4.6 GABARITOS
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Como pode-se perceber no mapa ao lado, o gabarito predominante no entorno imediato ao Canal de Guaranhuns é composto por edificações entre 1 e 2 pavimentos, em sua maioria de uso residencial. No bairro Gaivotas há um aumento do número de pavimentos, com diversos edifícios chegando a 4 pavimentos. Já no bairro Jockey, é possível perceber uma maior verticalização, com prédios que se destacam na paisagem por sua altura em relação aos do entorno. Do outro lado do Canal, nos bairros Guaranhuns, Nova Itaparica, Novo México e Ilha dos Bentos, as edificações mantêm um padrão baixo de gabaritos, com 2 pavimentos, e outras edificações um pouco mais altas, porém, não ultrapassando os 4 pavimentos.
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4.7 SINAIS COMPORTAMENTAIS E AMBIENTES
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O Canal de Guaranhuns, nas suas margens, é dotado de vegetações de grande porte, compostas por árvores altas e que geram sombras consideráveis. Como pode ser visto nas imagens abaixo, a vegetação é presente em toda extensão do Canal, tornando o local mais agradável.
Foto 04: Cidade de São Paulo no século XVI - Fonte M. A. Rossetto (2006)
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Existem alguns locais que não possuem sombreamento das árvores, mas as áreas sombreadas são majoritárias. Através de visitas ao local, não se observou a permanência de pessoas no entorno do canal, exceto por algumas pessoas em situação de rua que se abrigam em determinada parte, bem como alguns locais que funcionam como estacionamento, como pode ser visto nas imagens abaixo:
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As pessoas em situação de rua que utilizam o local como abrigo se instalam com barracas às margens do Canal e ali mesmo montam sua estrutura de sobrevivência. Tais pessoas são observadas em diversas épocas do ano, mas não permanecem no local por logos períodos. Na imagem abaixo é possível perceber a presença de uma barraca em primeiro plano e, em segundo plano, do outro lado do canal, outras barracas instaladas nas mesmas condições:
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Em outra situação, existem pessoas que construíram suas casas invadindo o canal. As edificações, muitas vezes, estão apoiadas dentro das águas, o que gera impacto significativo na vida do canal e na própria estrutura da edificação. Mesmo que não apoiadas no canal, as edificações se encontram sem afastamento nenhum do curso d’água e, muitas vezes, é possível identificar tubos oriundos das edificações sendo lançados em seu leito. Nas imagens abaixo é possível perceber as situações descritas acima, bem como a poluição presente no canal:
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Como ilustrado na imagem a seguir, para solucionar o problema de mobilidade entre as margens do canal, os moradores tiveram a iniciativa de confeccionar uma ponte e colocá-la sobre o rio. A ponte ajudaria os moradores que se localizavam longe das vias que cortam o canal à atravessá-lo sem grandes deslocamentos.
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No mapa ao lado, destaca-se os locais onde tais sinais comportamentais acontecem ao longo do curso d’água em estudo. Tais fatores colaboram significativamente para a degradação da área e consecutiva desvalorização do local por parte da população.
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4.8 ESPAÇO PÚBLICO X ESPEÇO PRIVADO
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Em toda a área de estudo, é possível perceber apenas algumas áreas de uso público como praças e parques que, quando relacionadas com a quantidade de espaços privados, se torna quase insignificante. No mapa ao lado destaca-se as áreas livres e públicas em relação com o restante da área de estudo. Através do mapa é possível constatar que a quantidade de áreas livres de uso público em comparação com o restante da cidade é insuficiente, visto a quantidade de locais sem espaço de lazer para a população. Existem diversos terrenos vazios na região do Jockey, que poderiam se tornar espaços para a comunidade, mas atualmente são subutilizados e configuram grandes áreas descampadas e vazias no meio da cidade. O canal, que também poderia ser utilizado como um espaço livre e de uso público, encontra-se abandonado e com todo o seu potencial integrador para a cidade suprimido. Suas margens são largas em determinados trechos, o que permite a implantação de diversos equipamentos para a comunidade utilizar e tornar o local vívido e frequentado.
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4.9 SÍNTESE DO DIAGNÓSTICO
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Após as analises, foi possível detectar que o canal em estudo se localiza em uma área com boa infraestrutura e consolidada em seus usos. É bem abastecida nos transportes públicos e é uma região importante no contexto municipal por concentrar grande parcela de residências e comércios locais. Existem ainda muitos terrenos vazios na região, o que pode tornar a área vazia, mas acredita-se que nos próximos anos serão ocupados com edificações, tal como aconteceu na implantação dos diversos conjuntos de prédios que existem no local, em sua maioria com mais de 10 pavimentos, contrastando com o restante do bairro que possui um gabarito mais brando, entre 2 e 4 pavimentos. As margens do rio possuem grandes áreas verdes e arborizadas, tornando o local mais agradável, se não fosse pela poluição visual e de odores causados pelo lançamento de dejetos domésticos por parte de algumas edificações. A região também sofre com enchentes esporádicas, quando a concentração de chuva é alta na região, o que acarreta no acionamento do sistema de bombeamento de águas pluviais, criado pela prefeitura para amenizar o problema das cheias.
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Apesar do zoneamento local não prever grandes diretrizes para o local, no novo Plano Diretor Municipal da cidade o rio foi classificado como Zona de Especial Interesse Ambiental que, segundo a lei, não permite construções no local e em suas margens. Entretanto, não prevê regulamentações para o entorno imediato ao canal, que atualmente é ocupado de forma irregular. Nas margens do canal, existem diversos sinais comportamentais como estacionamento de veículos, pessoas em situação de rua que acampam no local, bem como uma ponte feita por moradores para atravessarem com mais facilidade entre as margens. Tais fatores colaboram para a desvalorização local, o que faz com que os moradores não frequentem o local, tornando-o inutilizado e abandonado.
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PROPOSTA DE INTERVENÇÃO Após todas as análises, o capítulo a seguir faz uma breve conclusão sobre o que foi abordado nos temas anteriores e estabelece diretrizes de ações que precisam ser feitas para que o canal volte a fazer parte do cotidiano da sociedade local de forma saudável e vívido. Apresenta-se também uma proposta projetual para a área, transformando-a em um parque linear.
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Diante do que foi levantado no presente trabalho, detectou-se a necessidade urgente de uma revitalização da área, bem como a despoluição do curso d’água. Para tal, faz-se necessário a criação de políticas públicas por parte do governo municipal que fomentem a preservação ambiental do local e que eliminem as problemáticas destacadas como sinais comportamentais. As edificações que se localizam apoiadas e lançam dejetos domésticos no canal necessitam de remoção por questões ambientais e até mesmo estruturais, necessitando da realocação dessas famílias para os terrenos vazios ou sem o devido aproveitamento do seu potencial próximos ao canal, que podem receber novas moradias, suprindo as remoções ocasionadas pela intervenção no canal. As margens do canal precisam ser melhores trabalhadas no aspecto de trazer elementos para a comunidade, de modo que atraia tanto moradores como pessoas de fora a visitar o canal, o parque e o entorno. Os equipamentos implantados na região devem ser condizentes a realidade local e obedecer às necessidades da população do entorno, de modo a estimular o sentimento de pertencimento das pessoas em relação ao rio e suas margens. São necessárias medidas para que o local volte a participar do cotidiano das pessoas, sendo um rio de águas limpas e com espaços agradáveis de permanência para a população.
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Busca-se com a implementação dessas medidas fazer com que a população se volte novamente para o rio e se relacione harmonicamente com o mesmo. Em um cenário mais amplo, fazer com que, além dos moradores, outros cidadãos de outros bairros também possam usufruir do espaço. Trazendo a revitalização para essa área, procura-se valorizar não somente a porção beira-rio, mas todo o entorno do local. Um projeto urbanístico que trará vitalidade, qualidade de vida e prospecção de um futuro melhor para o perímetro de estudo.
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