dez.2015 ● N˚1
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EXCLUSIVO Entrevista com a banda ONZE:20
CONTROLE REMOTO A era dos serviços de streaming
PÁGINAS Trilha sonora ra da Hora H
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SUMÁRIO
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adotados por Hollywood
CAPA
CONTROLE REMOTO
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Filmes para inspirar seu casamento
7ª ARTE
3 EDITORIAL 7 SCREAM THE ROYALS 9 BLACK POWER NA TV O empoderamento da mulher negra nos seriados
12 PERSÉPOLIS SENHOR ESTAGIÁRIO 20 TSUNAMI NETFLIX Novos desafios dos serviços de streaming
30 Entrevista PLAY
com Onze:20
22 NEWSGAMES Os jogos eletrônicos que se baseiam em notícias e acontecimentos reais
FOTO: REPRODUÇÃO
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A trilha sonora da Hora H
PÁGINAS VERMELHAS
35 REFUGIADOS O caos na mobilidade internacional através de A Lista de Schindler
24 DILMA BOLADA Conheça a pessoa por trás da fanpage que balançou as estruturas da última corrida presidencial no país
38 BIENAL DO LIVRO NO RIO E A CRISE ECONÔMICA
28 CONFIDENT
42 O VILAREJO A PLAYLIST DE HAYDEN
32 LANÇAMENTOS O retorno de JoJo, atuação da Sia e mais
44 CRÔNICA Cretino
40 FANFICS O fenômeno que alimenta o mercado editorial
45 QR CODES
FOTO: KEVIN MAZUR
14 Os estereótipos femininos
FOTO: HBO
O valor social de I Am Cait
FOTO: RAPHAEL LIMA
EDITORIAL
Música em obras
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hopping ou festival? O Rock In Rio 2015 terminou colocando essa pergunta na boca do público, mais do que os versos fortes de seus artistas. A Cidade dos Patrocinadores, na Barra da Tijuca, ergueu-se sobre filas enormes com pagantes de centenas de reais em busca de adesivos, pulseiras iluminadas, rolos infláveis e toda a sorte de brindes. O próprio papelhigiênico era um verdadeiro souvenir, raramente visto nos banheiros, com esperas de até 25min e vazamento de esgoto. A suposta lama da 1ª edição de 85 não estava entre as lembrancinhas. À venda por R$185 em um recipiente de acrílico, a peça é a prova do fascínio do festival consigo mesmo, independentemente se isso o impede de enxergar suas falhas. Apesar da falta de informação no Terminal Alvorada, sem sinalizações dos ônibus ou avi-
-sos de saída, os transportes saíam confortavelmente no começo da tarde e em boas levas. Vários estandes de alimentação desviaram das filas até o anoitecer. Até o entrar e sair do público no espaço também foi melhor coordenado. Caóticos mesmo foram os preços. Lá dentro, um copo de 300ml de água custava nada menos de R$5. Para conseguir o hambúrguer comum, foi preciso desembolsar R$15. Uma pizza brotinho, R$22. Segundo a organização, 85 mil ingressos foram comprados para a semana de rock – gente suficiente para enriquecer quem bancou os comes e bebes. Estranho foi ver, apesar desse somatório, uma espaçada plateia cheia de vazios no show do Slipknot. Mais sumidos do que as pessoas naquela noite foram os celulares furtados, entre outros itens de valor. 161 casos foram registrados só na abertura, índice que subiu no dia seguinte.
Paralelo a isso, bandas e DJs pipocavam nos espaços das marcas, desviando a atenção das sessões principais. Falando nisso, o Palco Mundo, epicentro dos espetáculos, amargou cinco apresentações nacionais com um line-up de 28 shows. O Rock In Rio roga por uma renovação em sua linguagem como festival e pela diminuição de seu caráter publicitário. Os patrocinadores deveriam se apropriar do espírito do evento não apenas para se promover, porém opulentar a experiência de quem paga. A administração precisa levar em conta a locomoção interna e locais de descanso menos abarrotados. As atrações principais necessitam de um frescor na mesma linha, preterindo os inexpressivos e tapa-buracos – vide Seal, Magic! e Sheppard. O shopping da música carece de reformas.
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O valor social de
I Am Cait Ora reality show, ora documentário, a produção acompanha Caitlyn Jenner após ter abraçado sua nova identidade de gênero
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50 mil dólares. Esse era o valor de uma foto de Caitlyn Jenner após ter assumido sua transição na entrevista com Diane Sawyer, em abril desse ano. Nove vezes. A taxa de suicídio na comunidade trans é quase 10 vezes maior do que na sociedade em geral. Três trocas de carro. No caminho para Califórnia, ela tentava despistar os paparazzi mudando de veículo constantemente. Um destino. A família de Kyle Prescott, um jovem transgênero de 14 anos, que se suicidou no mês seguinte. É nesse tom que somos apresentamos a I Am Cait. Esqueça o cotidiano frívolo e os dramas pessoais exacerbados que levaram o clã Kardashian, em seu próprio e bem sucedido programa de TV, ao estrelato multimidiático. Com sua temporada construída em oito episódios, em contrapartida, o programa propõe uma visão intimista e humana sobre a nova vida de Caitlyn, ex-atleta olímpica que se assumiu como mulher transgênero. Desde sua estreia, em 28 de julho nos EUA pelo E! Entertainment, o docureality ressaltou a importância que a personalidade tem na luta atual contra a discriminação de gênero. Além disso, as alterações nas relações familiares e a apreensão política em colaborar com a comunidade trans despontam no roteiro. Apesar da influência dos formatos prontos da TV estadunidense, o programa demonstra uma sensibilidade louvável em, passo a passo, buscar o respeito pelas diferenças identitárias. Na média de 40min por capítulo, o projeto transcorre no dia-adia de Jenner, enquanto ela se educa sobre si mesma e sobre as questões vividas pelos transgêneros. Uma especialista da causa chega a sanar as dúvidas de sua própria família na estreia, reforçando, por exemplo, a importância do uso dos pronomes corretos. É um didatismo essencial para a audiência que, assim como os parentes de Cait, precisam compreender e respeitar os agentes dessa pauta positivamente em ascensão. Apesar da possibilidade de decepcionar os espectadores sedentos apenas pela vida pública da personalidade, além daqueles que buscam o exótico mal empregado por uma má imprensa, o propósito de I Am Cait alcança uma intensa humanidade verossímil. Há uma discussão recorrente de Jenner se tornar indubitavelmente uma porta-voz de sua comunidade, em contraponto aos privilégios de seu status de celebridade. Embora emocione ao visitar centros de apoio a pais e filhos em processo de transição, há um estranhamento coletivo, como quando que ela não se inclui quando menciona os LGBTQI, até de fato se sentir apta e incluída para isso. Da pequena dúvida no uso de seu novo nome em seu clube de golfe ao soco no estômago com o nervosismo da aceitação de seus filhos e amigos, Cait se revela uma mulher carismática, honesta e, acima de tudo, real. Seus aprendizados, episódio a episódio, refletem não só o valor social, mas também educativo e a profundidade em exibir os dilemas de uma parcela tão segregada da população na TV aberta estadunidense.
Enquanto isso, o Brasil... ...é o país com o maior número de assassinatos a travestis e transexuais do mundo, de acordo com o relatório internacional da ONG Transgender Europe. São quatro vezes mais de homicídios em comparação com o México, a prata do ranking. Entre 2008 e 2014, cerca de 1612 mortes foram registradas em 62 países pela ONU. De janeiro de 2008 a abril de 2013, 486 atribuídas só ao Brasil. Os números tornaram-se insuficientes ao passo que nações como Sudão e Irã sequer se dão ao trabalho de contabilizar ou disponibilizar dados dessa categoria de crime. No mercado de trabalho, o cenário das trangêneros também é excludente e entristecedor. Graças às suas identidades de gênero, a maior parte das empresas sequer as consideram. Segundo a Associação Nacional de Travestis e Transexuais (ANTRA), 90% se prostituem nas terras tupiniquins. A marginalização dessas pessoas, preteridas das escolas e universidades, praticamente as forçam por esse caminho. Assim, acabam em uma invalidez diurna por uma sociedade que, além de não as considerar gente, cegou-se à sua própria humanidade.
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O futuro de
O canal E! renovou a série para que volte em uma 2ª temporada no primeiro semestre de 2016, apesar da audiência aquém do esperado. A notícia foi a cereja de um bolo de esperança, logo após o seriado Transparent, da Amazon, render a Jeffrey Tambor (à direita) o Emmy de Melhor Ator em Comédia, no qual interpreta uma mulher trans. Além disso, faturaram as concorridas estatuetas de Melhor Ator Convidado, Melhor Direção, Melhor Figurino em uma Série Contemporânea e Melhor Música-Tema de Abertura – paralelos de uma caminhada árdua que precisa apertar o passo. Se Jenner não faz parte das estatísticas trágicas dessa comunidade, basta torcer para que seja a primeira de muitas representações que ela necessita ●
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FOTO: RE
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UÇÃO
Veja o trailer de I Am Cait
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Era de Ouro da Ficção Investigativa terminou por volta de 1950, mas os reboots de obras antigas hoje seguem em alta para resgatar suas fórmulas de sucesso. O subgênero slasher dos filmes de horror, hit das décadas de 80 e 90, não ficou de fora, retornando na releitura de um dos sucessos do diretor Wes Craven, Pânico, dirigido por ele e escrito pelo roteirista Kevin Williamson (Eu Sei O Que Vocês Fizeram No Verão Passado) em 1996. Scream, porém, usa apenas o espírito do longa original para trilhar seu próprio caminho de sangue e suspense, deliciosamente acompanhável. Na trama do revival da MTV estadunidense, em parceria com a Netflix, a viralização de um vídeo na Internet serve de catalisador para um assassinato, que abre uma janela para o passado da cidade, incluindo uma sequência de homicídios que parece ter voltado a acontecer. O suspense teen constrói-se fielmente aos arquétipos do filme homônimo, ironizando o gênero através de seus próprios clichês e de uma incrível metalinguagem. Apesar disso, não abusa da paródia, mas sim nas homenagens que não prejudicam sua própria qualidade. Com 10 episódios bem conectados, a série mantém um ritmo ágil e
Emma (Willa Fitzgerald), como protagonista, incorpora o caráter sofredor e vitimizado que evolui para uma figura destemida e empoderada. Essa progressão, uma das marcas registradas de Neve Campbell como a principal Sidney na franquia original, reforça o bem-vindo girl power em ascensão no entretenimento.
instigador na audiência, ainda mais devido à ferramenta whodunit do enredo – o mistério de saber a identidade do(a) assassino(a) por trás de tudo. Embora delineados sob os formatos previsíveis de high school, os personagens são propositalmente carismáticos e bem aproveitados. Eliminando alguns por meio dos homicídios, há pouco desperdício de tela e dedicação a desenvolvimentos frívolos. Dessa forma, nichos ricos em história ganham destaque, por exemplo Brooke (Carlson Young) e seu caso secreto com o professor Seth (Bobby Campo); o forasteiro Kieran (Amadeus Serafini) e seu ar suspeito e Audrey (Bex Taylor-Klaus) com a abordagem de sua sexualidade.
O coração dos fãs é apunhalado, porém, por Noah (John Karna) e suas tiradas sarcásticas e as referências frequentes à cultura pop – de Game of Thrones a Pretty Little Liars. Ele é perito em filmes slashers. São, de fato, esses personagens que seguram o espectador, mais do que o desenrolar da narrativa roteirizada em si. Conforme é dito no episódio piloto, introduzindo de forma exemplar o clima de Scream, que se insinua sem inibição pela quarta parede, “você torce por eles, você os ama, então quando são brutalmente assassinados, dói” ●
o
canal E!, especialista em reality shows, lançou nos EUA sua primeira ficção seriada, The Royals, em 15 de março deste ano. É história da vida conturbada de uma fictícia família real britânica. Logo na estreia, conhecemos Helena (Elizabeth Hurley), a Rainha megera e fria, seu marido, o Rei Simon (Vicent Regan), condolente e amoroso, e seus três filhos: Robert; Liam (William Moseley), um jovem sensato, mas confuso e sua irmã Eleanor (Alexandra Park), rebelde e avessa aos protocolos reais. Coroando o elenco está o Duque Cyrus (Jake Maskall), irmão do Rei que ganancia pelo trono no melhor estilo hamletiano . A série se apropria até demais de símbolos da cultura pop, como o relacionamento do Príncipe Liam com a plebeia Ophelia (Merritt Patterson), filha do chefe da guarda real, a princesa desvirtuada, a rainha má, além da tendência regicida de Cyrus. São vários clichês reunidos em uma só produção. Mas ela não para por aí. Apesar do começo raso, logo mergulhamos na enorme teia de acontecimentos monárquicos e, rapidamente, as fraquezas da realeza começam a despontar tal qual em qualquer família comum. Conseguimos notar a origem dos problemas de caráter e
compreender esses desvios de conduta, muitas vezes ocasionados para camuflar suas vulnerabilidades. Ponto do roteiro em nos afeiçoar aos personagens. Logo no episódio piloto, a morte do primogênito Robert assola a todos. A partir desse instante, Liam é o novo herdeiro do trono. Entretanto, ele ainda não está preparado para isso. Eleanor, entretanto, é quem rouba a cena dentro e fora do castelo.. O papel de patricinha e rebelde sem causa é interpretado com muito glamour, até vermos seu lado frágil que quer, ao menos uma vez na vida, a devida atenção da mãe. Até a Rainha inabalável, incapaz de demonstrar emoções, nos apresenta sua outra face, suas origens e tudo que a levou a ser como é.
A série é uma ótima opção de guilty pleasure e já está em sua segunda temporada no exterior. As atuações não são impecáveis, o enredo por vezes é fraco e falho, mas cumpre bem o papel de entreter. É uma verdadeira viagem para um mundo inatingível por nós, mortais, no qual somos meros espectadores da vida de luxos, intrigas e códigos de conduta da família real. Cheia de belas paisagens, castelos deslumbrantes e figurinos de tirar o fôlego, a produção fará você vai se apaixonar ainda mais pelo irresistível sotaque britânico e se surpreender com determinadas temáticas polêmicas e contemporâneas ●
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egundo a coordenadora da organização não governamental Crioula, Lúcia Xavier, “embora o racismo não esteja evidente nos casos de violência contra a mulher negra, está por trás de processos de vulnerabilidade dessas mulheres, que as deixam mais expostas a situações de violência”, explicitou a EBC há alguns anos. Mas quem é culpado pelo aumento da vulnerabilidade dessa mulher? Eu, você, seu pai, seu irmão, sua mãe, essa pessoa bem ai do seu lado e, principalmente, os escritores e roteiristas. A exposição hipersexualizada da mulher negra, aplacada de desejos libidinosos, e somente isso, é a maior razão pela qual essa violência não diminui, pelo contrário, só aumenta. A associação de negras na mídia às escravas, às empregadas, às prostitutas das novelas é uma ação velada, mas que deixa explicito que para os capitães do entretenimento essa mulher não serve para outra coisa. Em maio, após cinco anos, a maior revista de moda do mundo, a americana Vogue, trouxe uma mulher negra em sua capa. Pasmem, foi a publicação francesa da revista, existente em países de maioria negra pelo mundo a fora, a estampar a beleza negra em sua capa. Na televisão, também foi a primeira vez que uma mulher negra alcançou a cadeira de garota do tempo do Jornal Nacional, da Rede Globo de Televisão. Porém, em 50 anos do Jornal, ainda não é a vez da cadeira de apresentadora ser dada a uma negra. Só em plena segunda década do século XXI, mulheres negras são escaladas para papéis principais nas telenovelas nacionais, não protagonistas suburbanas, mas mulheres negras de poder, de conceito, com trabalhos bem remunerados, empoderadas. Como é o caso da personagem de Juliana Paes na nova novela das 19h da emissora citada, Totalmente Demais. Tendencialmente no Brasil, esses papéis estão destinados não só na mídia, mas na vida, às mulheres brancas, heterossexuais, que nasceram ou não em berços de ouro. Tentando subverter esse sistema, alguns autores como Miguel Falabella tentaram mudar o jogo, colocando mulheres negras fora dos padrões de objetos sexuais de seus parceiros, mas donas de sua sexualidade. A tentativa, infelizmente, caiu mais uma vez no erro de colocar todas em papéis de empregadas, faveladas e maltratadas. É claro que não há problema algum em ser negra favelada na mídia, o problema está em ser só isso. O projeto Sexo e as Negas, minissérie do autor, pretendia ser a Sex and the City nacional, série norte-americana que retrata um grupo de quatro amigas com sexualidade bem resolvida, empregos maravilhosos, homens lindos a seus pés e poder de aquisição elevadíssimo em Nova Iorque. Foi nessa mesma proposta que apostou Mayra Honorato, aluna de psicologia da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ), integrante, na época, do movimento negro da Universidade. Contudo, a expectativa não se concretizou. Ser essa a única imagem da mulher negra na mídia foi o que a incomodou.
“É a mulher negra no emprego subalterno, a melhor amiga, aquela que serve. A mulher negra é a aquela que serve. Não é excluir as mulheres que se encaixam nesses padrões, mas incluir as que não se encaixam”, explicitou. Para ela, o perigo é essa hipersexualização da mulher negra traz para cada uma de nós no dia-a-dia. “A mulher negra que é objeto, que só é bonita pelada no carnaval. Cadê a mulher negra bem sucedida, a que lutou muito pra ter o emprego que sonhou, a mulher negra que chegou à faculdade pública por puro esforço próprio?” Em seu Facebook, o autor de Sexo e as Negas, Miguel Falabella, lamentou a rejeição do público negro à série. Já que, segundo ele, seu objetivo era presentear a comunidade negra com uma série especialmente produzida para sua realidade.
“Pois é justamente sobre isso que a série quer falar! Sobre guetos, sobre cotas, sobre mitos! Destrinchá-los na medida do possível! Os mitos e lendas que nos são enfiados goela abaixo a vida toda. Da negra fogosa, do negro de pau grande, das mazelas que os anos de colônia extrativista e escravocrata deixaram crescer entre nós. Como é que saem pedindo boicote ao programa, como os antigos capitães do mato que perseguiam seus irmãos fugidos? O negro mais uma vez volta às costas ao negro. Que espécie de pensamento é esse? Não sei o que é mais assustador. Se o préjulgamento ou a falta de humor.” O trecho acima, retirado de sua infeliz publicação no Facebook, leva-nos a pensar que tipo de autores nos cercam e nos inundam de informação. Será que ele realmente não consegue perceber que o problema não é o sexo, tampouco “as negas”? A questão reside em mulheres negras, inundadas de sexualidade volátil, envolvidas com homens desrespeitosos, que as vêm apenas como objetos, escravas sexuais. Homens negros diferenciados por apelidos como Big, que diz respeito ao tamanho de seu pênis (conhecido íntimo de todas as “negas”), ou com envolvimento em trambiques, como o ilegal “jogo do bicho”. São estas as posturas que cercam a construção da mídia brasileira, é esse um autor de renome no entretenimento lúdico. Inundada de estereótipos, a comunidade negra ainda vê suas mulheres tratadas como objetos sexuais, “coisificadas”,
cheias de imagens que lhes restringem o ser. Talvez Falabella e o mundo devessem ser apresentados ao programa An Africa City. Produzido por duas mulheres negras africanas, a web série mostra realmente a perspectiva de Sex and the City na comunidade negra.
Shonda, Annalise e o empoderamento Em contrapartida, está a diretora, produtora e escritora estadunidense Shonda Rhimes. Responsável por sucessos como Grey’s Anatomy e Scandal, Rhimes é amada nos últimos tempos por sua nova criação: How To Get Away With Murder. Estrelada por Viola Davis (foto anterior), a série conta a história de uma excelente advogada, inundada de mistérios e superações que moldam sua personalidade. É sob o nome de Annalise Keating que iola representa, da melhor forma até hoje vista, a mulher negra empoderada, dona de seu corpo, sensual, autoritária, poderosa, aquela que manda, a melhor professora de direito da universidade em que leciona, a que pode o que quiser. A beleza do seriado transcende a protagonista. Esta é a primeira série com quatro atores afroamericanos em seu núcleo principal. Quatro personalidades distintas e fragilidades, mas nenhum deles sexualizados, ou em profissões em que “não precisam pensar”. Pelo contrário, são personagens cheios de conhecimentos, com raciocínios
chave para o desenrolar dos mistérios de Shonda. Essa representação é só o começo do espaço que essas mulheres merecem. E por mais que pensem que sim, a questão não é superar as brancas, mas conquistar o espaço que é seu por direito. Conquistar um lugar de fala que ainda é escasso para as negras e negros de todo o mundo. Ainda cheia de inseguranças e dependências masculinas, Annalise não esconde a fragilidade feminina presente na mulher, principalmente naquela que possui seus traumas e inseguranças. Contudo, a chave encontrada por Rhimes para fugir do clichê foi afastar o foco principal da trama o máximo possível dessas realidades. Não que elas não estejam presentes no enredo com sua importância ●
7ª ARTE FEMINISMO, COMUNISMO E LUTA NO IRÃ
Persépolis por LETYCIA NASCIMENTO
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Marjane é uma jovem recémchegada à adolescência, francoiraniana, pertencente a uma família comunista do Irã. O enredo se desenvolve a partir de sua luta pelos direitos das mulheres de possuir aquilo que desejam, independente das condições do governo, principalmente no que permeia o direito de se vestir e das coerções entre homens e mulheres. A história se desenrola a partir de sua ida aos 14 anos para Viena na Áustria, onde busca exílio dos conflitos da revolução e começa a estudar no Liceu Francês de Viena. Lá desenvolve suas impressões mais enfáticas sobre os problemas que cercam seu país de origem, com toda a repressão dos direitos civis igualitários, após a queda do governo do Xá. O longa de 1h36min amarra o espectador com uma linguagem
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leve e impactante, conquistando críticos sobre o tema a cada diálogo. Satrapi é a responsável pela própria ilustração do filme. Atualmente, mora em Paris e trabalha como autora e ilustradora de livros infantis. Indicado a várias categorias de premiação mundial, com estreia no Festival de Cannes de 2007, o filme foi escolhido pelo governo francês para representá-lo no Oscar como Melhor Filme Estrangeiro e Melhor Animação.
O amor é um sentimento rotineiro.
Através da obra, Marjane homenageia todas as mulheres do país que sentem a repressão contínua, gradual e torturadora e não veem alternativas para fugir de tamanha dominação e subordinação ●
IMAGENS: REPRODUÇÃO
m filme que, à primeira olhada, nos faz crer ser um relato familiar puro e simples, sem conteúdo, é justamente o oposto. Persépolis é uma trama que envolve o espectador em cada cena e mesmo que em animação. O romance gráfico autobibliográfico de Marjane Satrapi conta sua vida no período pré-Revolução Iraniana, na luta pelos direitos civis de forma enfática e clara.
O CURRÍCULO DA MELHOR IDADE
Um Senhor Estagiário por THAÍSA MAIA
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segundo semestre de 2015 não poderia ser melhor com a chegada de Um Senhor Estagiário. O filme conta a história de um senhor de 70 anos (interpretado pelo grande Robert De Niro) que se vê entediado com a aposentadoria e resolve trabalhar em uma empresa de vendas online, dirigida por Jules, personagem da incrível Anne Hathaway. Ela é jovem, casada, tem uma filha e viu sua empresa de ecommerce crescer rapidamente. Com isso, precisa fazer um verdadeiro malabarismo pra ser uma boa mãe, esposa e profissional. E é aí que Ben (personagem de De Niro) entra. Colocado lá para auxiliar Jules, ele acaba ajudando não só em seu trabalho, mas a vida pessoal também.
A diretora e roteirista Nancy Meyers, que também é responsável por Simplesmente Complicado, O Amor Não tira Férias e o clássico Operação Cupido, conduz a história de forma delicada e divertida. Ela aborda de maneira simples questões atualmente candentes, tais quais os conflitos de gerações, o caráter multitarefa da mulher contemporânea e a relação da Melhor Idade com as novas tecnologias.
Tenho 24 anos. É, parece mais. É o trabalho, acaba te envelhecendo.
A relação dos personagens principais arranca gostosas e verdadeiras risadas, porém não se engane: aposentar os lencinhos ao ver o longa pode não ser a melhor das ideias. A construção do roteiro em como os protagonistas desenvolvem uma amizade sadia e mutuamente edificante nos faz achar, de fato, que caiu um cisco em nossos olhos ●
Aos que pensaram que Anne repetiria seu estilo de O Diabo veste Prada, perderá o tempo com a perspectiva. A única semelhança é a deslumbrante atuação da ganhadora do Oscar. Julie é uma figura feminina forte, empresária proativa e sem medo de “pôr a mão na massa”.
IMAGENS: REPRODUÇÃO
O elenco ainda conta com Adam DeVine (Modern Family), que protagoniza muitos momentos divertidos durante o filme e uma pequena participação de Nat Wolf (Cidades de Papel).
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CAPA
Os estereótipos femininos adotados por
HOLLYWOOD Entenda como as indústrias cinematográfica e televisiva excluem a mulher de nossas telas – e que isso é mais comum do que parece ser ● por CAROL FEIJÓ FOTO: HBO
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uando prestamos atenção aos papeis destinados à mulher no panorama cinematográfico, nos deparamos com uma gigantesca falta de inventividade por parte das grandes produtoras e estúdios. Pode soar estranho, já que essa deveria ser a força motriz do meio, contudo sim, falta-lhes criatividade. Assim, percebemos que nem as musas de Hollywood estão a salvo do mercado que exclui a mulher, ao diminuir cargos e salários. Duvida? Segundo o The New York Times, entre 2002 e 2012, apenas 4.4% dos 100 maiores sucessos de bilheteria foram dirigidos por mulheres; e em 2012, só 28.4% de todos os papéis com falas entre os 100 maiores sucessos eram femini-
-nos. Se ligarmos o fato de que apenas seis estúdios dominam atualmente a produção de filmes e que todos eles são controlados majoritariamente por homens, não é tão difícil entender o porquê dessa falta de tato – para dizer o mínimo – ao lidar com papeis femininos, bem como atrizes e diretoras. O machismo da indústria cinematográfica causa duas principais consequências. A primeira é a busca por profissionais homens, em detrimento das profissionais do sexo feminino, bem como as diferenças salariais. É, portanto, mais uma carreira que diminui o espaço para a mulher, importando-se menos com o talento e mais com o gênero. Pense em seu diretor favorito. Ele provavelmente é
um homem, branco, cisgênero e heterossexual. O mundo fílmico vive mais de Francis Coppolas que de Sofias. Isso gera o segundo ponto aqui problematizado: uma infinidade de filmes que abordam a mulher de forma superficial, já que essas personagens saem da cabeça de homens que mal sabem como o mundo feminino funciona. A preferência pela presença masculina para os cargos de maior prestígio transparece em personagens femininas que nada mais são que representações do imaginário masculino, de acordo com a professora da USP, Giselle Gubernikoff. Ela também é autora do artigo “A imagem: a representação da mulher no cinema”
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CAPA As produções independentes propõem uma participação feminina mais expressiva, bem como a de qualquer outra minoria. Mas, os que são de acesso mundial, os chamados blockbusters, ainda contam com uma apresentação bastante pobre das personagens e visões femininas, capazes de dividir a mulher em pequenos e pouco desenvolvidos estereótipos.
Teste Bechdel Em 1985, a cartunista Alison Bechdel propôs uma série básica de três questões para a análise das personagens femininas na indústria cinematográfica. Se o filme em questão falhasse, é porque nele há algum problema relativo a igualdade de gênero. A verificação parte dos seguintes pontos: 1. o filme deve ter pelo menos duas mulheres (algumas variações sugerem que ambas devem ter nomes); 2. elas devem conversar entre si; 3. sobre um assunto que são seja homem. Ao realizar o Teste nos maiores sucessos de bilheteria e público, a resposta é de entristecer. Até os famosos por suas personagens femininas fortes cometem o erro básico de falhar em pelo menos um desses três pontos simples. Isso significa que, por mais forte que seja a personagem feminina, elas são definidas apenas por suas relações com homens. Ou seja, o foco, os diálogos, os relacionamentos continuam girando em torno da personagem masculina, mesmo que o enredo traga uma mulher subversiva e de grande importância para a trama.
A indústria e a mulher negra “A única coisa que separa mulheres negras de qualquer outra pessoa é oportunidade”, disse Viola Davis em seu discurso no Emmy Awards de 2015. A atriz foi a primeira mulher negra a ganhar um prêmio de TV tão significativo como o de Melhor Atriz de Série Dramática, por How To Get Away With Murder. O que ela quis dizer com essa fala é que fica difícil ter espaço em premiações como o Oscar e o Emmy quando os papéis destinados as mulheres negras são quase inexistentes. Como vimos acima, os papeis destinados às mulheres são muito escassos na indústria. Ainda assim, a maior parte deles é encenado por mulheres brancas e, de preferência, magras e bonitas. Para as mulheres negras, normalmente sobram personagens pouco criativas e extremamente estereotipadas. Esses papeis normalmente são escritos especificamente para mulheres negras, e se resumem em: 1. Escrava; 2. Empregada; 3. Barraqueira e 4. Melhor amiga. Perceba que nenhum deles é um papel feito para ser principal. Normalmente, quando os papeis destinados as mulheres negras existem, são secundários. Portanto, as negras não disputam com homens e até mesmo outras mulheres nas premiações: simplesmente são excluídas desse cenário ao desempenhar a pequena gama de papeis que a elas se designam, não tendo espaço para se destacarem. A militância de mulheres como Viola rendeu algumas mudanças, que ainda estão em curso, na indústria do cinema e da TV. Hoje, alguns poucos diretores e roteiristas já escrevem papeis sem especificar por preferência racial. Um exemplo é Shonda Rhimes, criadora de séries como Grey’s Anatomy e Scandal (cuja protagonista é a atriz Kerry Washington, na foto à esquerda). Ao escrever a primeira, a também produtora e roteirista não colocou sobrenome em nenhuma das personagens para evitar qualquer manipulação em relação a escolha do elenco. Dessa forma, foi possível que o papel da médica Miranda Bailey ficasse com a negra Chandra Wilson ao invés da segunda opção, a loira Kristin Chenoweth. : REP
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O papel de Davis em How To Get Away With Murder – produzida por Rhimes – também não foi criado para uma negra, mas felizmente foi preenchido por uma, mostrando que nada a impede de interpretar uma personagem forte, nada superficial e bem resolvida profissionalmente, como é a advogada que interpreta, Annalise Keating.
Brasil na berlinda A situação também assola o ambiente nacional. Em pesquisa realizada pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), revelou-se que, a cada dez filmes entre 2002 e 2012, menos de dois apresentaram uma mulher negra. Elas correspondem a apenas 4,4% dos elencos principais no cinema brasileiro. Além disso, nenhum dos mais de 218 filmes pesquisados contou com uma mulher negra como diretora ou roteirista. Apesar de serem maioria no país (correspondem à 51,7% da população feminina), a representatividade delas é ínfima, acarretando em um panorama de invisibilidade social. Quando unimos os dois preconceitos (o de gênero e o racial), encontramos um quadro duplamente mais complicado e enraizado na indústria cinematográfica.
Ensaio sobre a nudez Uma das formas mais óbvias para constatar a misoginia hollywoodiana é a percepção da nudez feminina em relação a masculina. A indústria não mede esforços para mostrar ao público as belas formas de suas atrizes, mas aparentemente considera que a nudez masculina é desnecessária. Proponho um exercício de memória: tente se lembrar quantas vezes já viu um homem nu na tela do cinema. Agora, pense em quantas viu uma mulher. Com certeza, a primeira tentativa te deu muito mais trabalho. Isso acontece porque os diretores, produtores e grandes estúdios objetificam e estereotipam a mulher de tal forma que ela é mais propensa a aparecer nua quando se pretende realizar um filme rentável. O longa 50 Tons de Cinza tem uma temática bastante sexual e, portanto, diversas cenas de nudez. Entretanto, a grande maioria é realizada pela atriz Dakota Johnson, enquanto Jamie Dornan não tem sequer uma cena de nudez frontal. Isso demonstra mais uma vez que o cinema é feito para homens heterossexuais, mesmo quando o público alvo são as mulheres (que, em sua maioria, se interessariam mais em ver Jamie nu). É muito mais fácil colocar uma mulher nua, para dar veracidade a trama, que desconstruir o poder masculino sobre o meio fílmico.
#FreeTheBacon Por conta de todo esse panorama machista em relação a nudez que nos deparamos em Hollywood (e também na TV, não se engane), o ator Kevin Bacon lançou, através de um vídeo produzido pelo canal de humor Mashable, a campanha #FreeTheBacon, traduzida livremente para #LibereOBacon. O “bacon”, ele explica logo no início, é claramente o órgão masculino. Kevin critica, com muito bom humor, a falta de nudez masculina em relação a feminina e destaca 50 Tons e a série Game Of Thrones, além de propor para os produtores da Marvel um super-herói nu. O QR Code do vídeo você encontra ao final desta edição.
CAPA
A guerra dos nudes Precisamos falar sobre Game Of Thrones. Sim, nós todos amamos As Crônicas de Gelo e Fogo. Sim, nós todos amamos George R. R. Martin (menos quando ele demora décadas para lançar um novo livro). Sim, muitos de nós ficam extremamente decepcionados quando os produtores dão a ela um rumo diferente do caminho dos livros. E não, nós não estamos nem um pouco interessados em ver seios gratuitamente e sem nenhum acréscimo ao enredo da trama nas nossas noites de domingo. O problema não é a nudez. Nós entendemos bem quando ela é necessária para o desenvolvimento da trama e das personagens, até gostamos dela quando se faz útil. O que nós não amamos nem sequer por um segundo é que isso seja reproduzido de forma irresponsável, o que parece acontecer insistentemente nas últimas temporadas. A história é famosa por sua gama de mulheres fortes e bem construídas. Entendemos que, mesmo nos livros, Westeros é uma sociedade patriarcal e machista, o que não impediu a criação de mulheres poderosas em suas mais diversas formas. Vide Brienne de Tarth, Arya Stark, Margaery Tyrell e a nossa mãe dos dragões, Daenerys Targaryen, só para começo de conversa. Entretanto, quando o papel foi transferido para TV, muito se perdeu. Em meio a cenas violentas de estupro que não estavam nos livros, a adaptação televisiva da série também contém cenas de nudez feminina gratuita, como por
exemplo as diversas mulheres dos bordeis de Westeros e arredores, que mostram seus corpos sem acarretar nenhuma alteração necessária ou ao menos significativa. Sim, o corpo feminino é usado como mera ilustração. Enquanto isso, o único nu frontal masculino foi extremamente relevante para o enredo, contra 19 nus frontais completos (partes de cima e de baixo) femininos, quase todos dispensáveis. Em uma entrevista, Martin declarou que escrever personagens femininas tão fortes e nada superficiais se dá ao fato de que sempre considerou mulheres como pessoas, ironizando a parcela da indústria que, muitas vezes, releva esse fator. Está na hora de os produtores de GOT aprenderem um pouco com o escritor. E, aos que não aprenderem: Dracarys! ●
...é a palavra utilizada pela personagem Daenerys para fazer com que seu dragão cuspa fogo. Ela também é a mulher da capa da revista! ARTE: JENNETTE BROWN
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NA NUVEM Mulheres que largam tudo pelo verdadeiro amor: Emprego, família, casa... Vale tudo na troca pelo verdadeiro amor? Essas mulheres normalmente têm seu fator individual diminuído ao que representam como casal. Só existem caso haja também o amor verdadeiro ao lado. Um detalhe é que mulher alguma é tão rasa quanto essas figuras, já que todos seus diálogos giram em torno de um único assunto: o homem em questão.
Televisão
sob demanda Qual o futuro da TV lna era dos serviços de streaming? ● por CAROL FEIJÓ
Mulheres que brigam umas com as outras: essas produções quase sempre trazem duas personagens se enfrentando. O motivo? Boa parte das vezes, um homem. Independente-mente se é um namorado, amigo ou irmão, a briga pelo sexo masculino é bem mais corriqueira em Hollywood do que na vida real. Parece que esse embate, físico ou não, aguça o imaginário masculino do backstage hollywoodiano. Exemplos: O Casamento Do Meu Melhor Amigo, Noivas Em Guerra, Você De Novo.
ARTE: SÉBASTIEN THIBAULT
Exemplos: Casa comigo?, Escrito Nas Estrelas, Tudo Para Ficar Com Ele.
A
era dos serviços on demand chegou. Prova disso são os famosos streamings de vídeo e áudio, como Netflix, Spotify e o recente Apple Music, cada dia mais indispensáveis em nossas vidas. On demand vem do inglês “sob demanda”, e significa que os materiais disponíveis nesse tipo de canal online podem ser emprestados ao usuário a qualquer momento, normalmente por um custo mensal. É uma espécie de locadora com a necessidade de conexão com a Internet e a facilidade de não precisar sair de casa. Além disso, o poder de escolha é maior do que os tradicionais (televisão,
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rádio e locadoras físicas) além da quantidade de acessos e produtos usufruídos durante esse tempo ser ilimitada. Por todas essas vantagens, o público que opta por utilizar o streaming é crescente. Tanto que Reed Hastings, o CEO da Netflix, site que oferece diversos filmes e séries online legalmente sob um valor mensal, decretou o fim da TV como conhecemos hoje em até 15 anos. Em um evento na Cidade do México, ele revelou acreditar que a audiência vem buscando, progressivamente, alternativas a fim de acessar certos conteúdos televisivos.
Quadro atual
Insatisfação
Os grandes canais e empresas televisivas já se adequam aos novos parâmetros, criando, inclusive, seus próprios serviços on demand. Esse processo já teve seu início: a rede Telecine da Globosat, famoso no meio cinematográfico brasileiro, criou o Telecine On Demand, seu próprio streaming.
Em boa parte das vezes, o sucesso desses serviços anda de mãos dadas com a decepção em relação à programação da TV. Somente 29% dos consumidores da TV aberta estão satisfeitos com a qualidade e o nível de detalhes de seu atual guia de programação, o que faz com que haja uma migração mais intensa para alternativas aos produtos televisivos. E então os streamings entram em cena, com um custo relativamente baixo e uma variedade de programação mais ampla, impactante e com maior liberdade de escolha.
Essa é uma realidade crescente no mundo multimídia. Segundo pesquisa encomendada pela Ericsson ConsumerLab, os usuários passam seis horas por semana (2,9 horas por dia) assistindo TV, séries, programas e filmes pelos serviços on demand, mais do que o dobro registrado em 2011. O estudo foi realizado ainda este ano e contou com a participação de mais de 22.500 pessoas de 20 países do globo, todas usuárias de serviços de streaming. Além disso, outros dados são bem espantosos. Os entrevistados brasileiros passam 36% do tempo diário consumindo vídeos e conteúdos sob demanda. Isso contabiliza mais de um terço do dia do espectador. Entretanto, a pesquisa também demonstra que os acessos dependem de fatores externos, como a idade. Por exemplo, 82% dos que têm entre 60 e 69 anos assistem à TV tradicional no dia a dia, enquanto só 60% dos que possuem entre 16 e 34 anos também o fazem.
A possibilidade da mobilidade é um fator que atrai o consumidor, principalmente o público jovem. A pesquisa demonstra que 42% dos usuários acredita que poder acessar conteúdos a qualquer hora, em qualquer lugar, tem uma grande importância. Logo, não é de se espantar que os consumidores com idade entre 16 e 34 anos gastem 53% de todo seu tempo de visualização de vídeos em um smartphone, laptop ou tablet. Os serviços on demand se mostraram grandes combatentes da pirataria ao oferecerem um amplo leque de programação, a qualquer hora do dia e em qualquer dispositivo móvel, com um diferencial: sem publicidade, sem vírus e dentro da legalidade. Não é à toa que os números mudaram: em 2011 nos EUA, 8% admitiu usar dos compartilhamentos ilegais de arquivos, em 2015 são 2%. Com tantos pontos positivos, é difícil não cair no charme singular dos serviços de streaming ●
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NA NUVEM
Newsgames Nova mídia une jornalismo e entretenimento
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história dos newsgames (jogos jornalísticos), aqui no Brasil, começou em 2007, quando um grupo de jornalistas, designers e programadores nerds com um apreço especial por games, e começou a fazer experiências com jogos e notícias. Ainda nesse ano, o site do G1 lançou o jogo Nanopops em sua plataforma, enquanto a revista Mundo Estranho fez o StripQuiz e Sovietes: o quebra-cabeça vermelho (fotos à direita).
Fred Di Giacomo, formado em Jornalismo pela UNESP (Bauru) e editor-chefe da Internet Núcleo Jovem, revela que, na época, as pessoas realmente acreditavam estar inventando um novo gênero jornalístico, e que só tiveram conhecimento do termo por meio de uma resenha escrita pelo também jornalista André Deak, um dos primeiros estudiosos do formato.
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FOTOS: MUNDO ESTRANHO
Em 2008, o site da revista Superinteressante, então liderada pelo jornalista Rafael Kenski (hoje uma verdadeira referência nacional dos newsgames), produziu seu primeiro jogo, CSI: Ciência Contra o Crime. Ele colocava o jogador na pele de um policial forense para desvendar um assassinato.
Desenvolvimento
Novos tempos
Por serem idealizados por jornalistas, a produção dos newsgames tem características bem parecidas com o jornalismo tradicional.
Inicialmente, só as grandes empresas conseguiam produzir jogos jornalísticos. Em 2015, o cenário já é outro. Fred nos conta que seu newsgame pioneiro de autoria própria era em linguagem flash. Hoje, já produziu jogos para o Facebook e em breve lançará seu primeiro game para smartphones.
O processo é composto pela junção de duas etapas: a produção de uma matéria jornalística (reunião de pauta, apuração das informações e edição de texto) e, a produção do jogo (definição de uma mecânica, roteiro, criação de personagens, criação de cenários, animação, programação e teste). O jogo pode ser produzido pela própria redação do veículo de comunicação ou por terceirizados (situação mais comum). Fred explica que o tempo de produção de um newsgame pode variar entre um mês até um ano, dependendo do trabalho em específico. A quantidade de profissionais aplicados também varia, geralmente a equipe é composta por game designer, repórter, editor e produtor, além de designer, ilustrador, animador, programador e tester. Quando perguntado sobre a principal mudança no ramo, com seu surgimento no Brasil em 2007, Di Giacomo acredita que a experiência adquirida com a produção dos jogos capacitou os profissionais envolvidos, proporcionando a criação de jogos mais complexos. O custo de produção também aumentou: “No começo, todo mundo aprendia fazendo. Hoje, já temos jornalistas e designers com PósGradução e Mestrado em games ou game designer.”
O jornalista explica que o poder de imersão e de simulação são diferenciais que indicam se uma história vale ou não ser contada nesse estilo. Nos sites em que trabalhou, os recursos eram limitados e a durabilidade do tema era algo a ser levado em conta. As notícias consideradas “quentes”, com sua menor de duração, eram descartadas. As consideradas “frias”, por serem duradouras, eram selecionadas para serem “gameficadas”. A apuração não difere muito do jornalismo de redação. O repórter vai às ruas e conversa com as fontes, registrando fatos ou pesquisando em livros e afins, fazendo estudos, etc. A diferença está no fato de que, no newsgame, a imagem é a informação.
No newsgame, a imagem é a informação.
“Num jogo sobre o Muro de Berlim é preciso apurar a cor do muro, da roupa dos soldados, o estilo de se vestir na época”, reforçou Di Giácomo. Mesmo que a etapa mais trabalhosa seja a programação, a mais importante e complexa é o game designer. Segundo o jornalista, é preciso uma boa mecânica, divertida e desafiadora, na medida certa para que o jogo não seja um fracasso. “Uma história genial pode virar uma ótima matéria, mas sem um bom game designer, será um péssimo jogo”. Um dos desafios de criar newsgames está em equilibrar informação e diversão. O jogo não pode apenas informar, tampouco somente divertir. O encontro perfeito entre essas categorias forma o newsgame.
Sobre o futuro Questionado sobre o futuro do mecanismo no Brasil, Fred foi otimista. Ele acredita que, mesmo com a crise econômica na qual o jornalismo brasileiro se encontra, boas criações estão por vir, principalmente pelas mãos dos desenvolvedores independentes. “Haverá uma integração melhor com redes sociais, tentativas mais robustas de ganhar dinheiro com o formato e um uso dos rudimentos dos newsgames na educação e no ativismo social” ●
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Dilma Bolada Jeferson Monteiro, 25, criador do perfil de sucesso, analisa sua ascensão após 6 anos no ar e uma corrida presidencial na bagagem ● POR THAÍSA MAIA
Jeferson Monteiro: Bem no começo de tudo, era só “Dilma”. A intenção inicial foi assegurar o nome de usuário no Twitter. Quando criei o perfil, em 2010, as celebridades que tinham nome com a letra “L” sofriam com contas fakes. Algumas pessoas mal intencionadas iam e
faziam perfis substituindo o “L” por um “I” maiúsculo, se passando pela pessoa. Eu tinha noção de como campanha política era algo pesado, que usavam qualquer artimanha para atacar um ao outro. Já que sempre gostei muito da Dilma, criei essa conta e deixei ali quietinha, para que ninguém utilizasse de outra forma. Ficou assim por um bom tempo. Aplausos: Mas por que começar por lá, o Twitter? Jeferson Monteiro: É minha rede social favorita. Acho que as coisas funcionam bem mais lá, é tudo muito rápido. O real-time realmente está no Twitter, um lugar onde tudo acontece. É a rede social que está sempre à frente das outras. Quando criei o Dilma Bolada, já usava pra caramba e passava a maior parte do meu tempo por lá. A: Talvez essa escolha seja um dos motivos de ter tomado a proporção que tomou. Você imaginava algo assim? JM: Jamais. Desde a dimensão da mídia até a oportunidade de encontrar a Presidente. Fiz aquilo despretensiosamente e, por mais que imaginasse o sucesso, nunca poderia pensar que, um dia, aconteceria tanta coisa correlata – inclusive o peso político tão grande que dão ao Dilma Bolada, o que eu discordo. Mas muita gente crê que tem um poder muito grande, maior do que ela tem. Só eu mesmo sei o que aquele perfil representa. FOTO: FACEBOOK
A
plausos : Como foi o processo de idealização e criação do perfil?
A: Você mencionou o encontro com a Presidente da República. Pode contar como foi isso? JM: É natural que, tratando-se de uma figura conhecida, você acabe conhecendo um ou outro no Facebook que trabalhe no Planalto. Antes de conhecê-la, tive que ser convidado ao Palácio e tudo mais, alguns ministros me seguiam, como o ex-ministro da Saúde, Alexandre Padilha. Ele falava sempre comigo que a Presidente conhecia o perfil, tinha ouvido falar e até lido, outras pessoas diziam o mesmo. O encontro foi em setembro de 2014, pouco depois daquela onda de manifestações, quando ela resolveu reativar o Twitter. A Secretaria de Comunicação da Presidência (SECOM) me convidou, o então porta-voz Tomaz Trauman foi quem me ligou oferecendo uma entrevista com ela ao vivo pelo próprio Twitter. Na hora, passa um monte de coisa pela sua cabeça. Claro que aceitei, foi muito legal. A: Esse convite foi bem amistoso por parte do governo em um momento de tanta crítica sobre ele. Como você lida com as aversões ao perfil em si? JM: Passaram-se 6 anos, minha cabeça mudou, minha formação política também. A “Dilma Bolada” começou realmente voltada ao entretenimento e às variedades, mas acabou se tornando, ao longo do tempo, um pouco mais política. A partir do momento que você fala da presidente do país de uma forma positiva, ainda que não trate diretamente da parte política, acaba se tornando alguma coisa política, querendo ou não. Surgiram simpatizantes, pes-
-soas que não gostam, que criticam. Alguns até passam dos limites às vezes, no entanto tento me abster ao máximo. Hoje, eu já sei lidar muito mais, até porque isso é uma exposição. Sou uma figura pública, então, preciso saber lidar com críticas, independente do teor delas. A: E você recebeu muitas críticas recentemente, pelo rompimento com a Dilma em especial. JM: Tirei meu apoio oficial ao governo federal, aconteceu. O motivo principal é pela forma que está sendo conduzida a política econômica, o próprio andamento da questão social, e bandeiras do campo progressista, que eu achava que nesse segundo mandato elas seriam erguidas e bradadas com grande força, mas muito pelo contrário, estão cada vez mais escondidas. Então, é um conjunto de fatores; afastamento de ministros, que eu via pessoas muito competentes para suas áreas e que poderiam representar o começo de uma transformação em áreas como, por exemplo, saúde e educação, também me desagradou. Então, o rompimento foi justamente por conta disso, apesar de continuar gostando e admirando a Dilma pessoalmente. Seria muito contraditório que eu permanecesse apoiando esse governo que contraria meus princípios. Então, preferi deixar muito clara essa cisão de que não vou concordar com tudo o que ele faz. Mas é bom esclarecer que isso não significa que eu seja contra ao mandato da Dilma; sou terminantemente contra o impeachment. Continuo tendo a convicção de que ela é uma pessoa honesta, honrada. Acho que também é outra característi-
-ca dela que me faz admirá-la. Não apenas como política, mas também enquanto pessoa. A: E quais são seus planos agora, após essa cisão? JM: Com relação ao futuro do “Dilma Bolada”, ela retornou depois de um tempo, complementando o fato de ter rompido com o governo e como está o panorama hoje. Ela retorna à figura de 1970, militante que lutou contra ditadura, tinha ideais progressistas. Volta agora como contraponto à própria Dilma atual. Acredito que esse retorno do perfil, dessa forma, indica que o que fiz, de fato, foi por convicção ●
A partir do momento que você fala da presidente do país de uma forma positiva, acaba se tornando alguma coisa política, querendo ou não. revista APLAUSOS •
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PÁGINAS VERMELHAS
Prazer ao pé do ouvido Músicas que instigam o sex appeal e deixam qualquer momento do dia mais vermelho The XX Angels
E
m fevereiro desse ano, o serviço de streaming de músicas Spotify identificou que já eram aproximadamente 2,5 milhões de playlists destinadas só para o momento.
BANKS Waiting Game
J2 e Midian Sweet Little Lies
Ciara Dance Like We’re Making Love
Janet Jackson No Sleeep
Para a mente humana, a recepção musical vai muito além de entretenimento. Ela alcança a produção hormonal da dopamina, substância responsável pelo relaxamento e pelos formigamentos, por assim dizer, prazerosos no corpo.
Não faz muito tempo que bandas começaram a produzir conteúdo voltado para esses momentos. Uma das mais assumidas entre tantas é a inglesa The XX. Na trilha sonora da minissérie da TV Globo, Amores Roubados,
Que o tema é sucesso garantido na composição musical não resta dúvida, mas você sabe quais são os efeitos reais que uma boa música traz na hora H? No livro This Is Your Brain On Music (Este É Seu Cérebro Com Música, ainda sem tradução para o português, Daniel Levitin, professor da McGill University, no Canadá, explica que a música causa percepções no cérebro de forma muito parecida com a ingestão de alimentos e a prática sexual.
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com a canção Angels, o grupo proporcionava aos espectadores sensações quase táteis das cenas estreladas por Cauã Reymond e Isis Valverde. Por outro lado, o trabalho sedutor e provocante da americana BANKS conduz, batida à batida, a um clima mais pretencioso e instigador. Com seus altos e baixos, embala o ritmo da dança, deixando cada segundo mais misterioso e prazeroso. Sweet Little Lies é o paralelo visceral, alçando reconhecimento ao se destacar no trailer da nova série The Catch. A grave voz rasgada de Midian contrasta bem com o arranjo épico de J2. Definitivamente uma ótima escolha para ocasiões especiais.
Covers também podem ser sexy Katy B Drunk In Love/Vulnerable
Kadebostany Crazy In love
Dance Like We’re Making Love se distancia dessa visão metafórica, indo direto ao ponto em cada um de seus versos. Ciara não hesita em dizer a que veio e, se o objetivo é sensualizar deixando os pudores de lado, essa é uma aposta certeira. O começo literalmente tempestuoso de No Sleeep quase conta uma história que o ouvinte pode sonhar em viver. Os vocais sussurrados de Janet instigam o poder sugestivo já escancarado no neologismo do título. Ainda assim, é uma das poucas das escolhas de nossa redação que consegue intermediar entre momentos suaves e quentes. Nossas sugestões buscam exatamente corresponder aos diversos sentimentos despertos durante o sexo. Mas de uma coisa temos certeza: com elas, sua hora H nunca mais será a mesma de antes ●
FO TO
S:
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Playlist da Hora H
Daniel de Bourg Love Sex Magic
Preparamos uma lista com essas e várias outras músicas mais que especiais para apimentar essa ocasião que todo mundo quer que seja perfeito. Ouça e se divirta com segurança sempre:
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PLAY DEMI LOVATO COMO VOCÊ NUNCA VIU
Confident por CAÍQUE PEREIRA
A
fase mais confiante e audaciosa da cantora de 23 anos começou. Com direito a hit no verão estadunidense, apostas no domínio do próprio corpo e até mesmo viagem de divulgação ao Brasil na semana de lançamento de seu novo álbum – bastante incomum nas arenas de gladiadores do cenário musical internacional –, não há como negar que a Era Confident começou com o pé direito. A faixa que intitula o novo trabalho é uma das mais inspiradoras e que melhor representa o momento atual da artista. O ritmo forte pop-rock é uma clara evolução de seus ensaios da época na Disney, na qual sempre se mostrou mais irreverente musicalmente em comparação às contemporâneas da emissora. O refrão colossal carrega o hino de confiança.
Já Cool For The Summer seguiu em uma letra sugestivamente sexy e de um vício tentacular ao arrebatar o ouvinte de mansinho. Os sintetizadores intensificam os arranjos eletrônicos, trazendo Demi de volta às suas raízes no pop-rock; através de vocais abafados e perspectiva provocante. Canção típica do verão estereotipado dos EUA que, apesar de abraçar essa identidade, não perde o fator qualitativo.
: TO FO DIV ÃO
Ç GA UL
O frescor uptempo da batida de Old Ways expõe que Lovato não planeja retornar ao seu passado, de fato. Recentemente, ela admitiu ter se desculpado com funcionários da sua antiga rotina de atriz por situações das quais não se orgulhava. Ao mesmo tempo, o lado positivo demonstra que a automutilação, o uso de drogas, as crises depressivas e os relacionamentos problemáticos também são página virada. For You e Stone Cold são um passo para trás nessa atitude. Mais lentas e calcadas em densos trechos emocionais, as baladas fornecem um equilíbrio compreensível no álbum e permitem à cantora explorar mais sua voz marcante e poderosa. Kingdom Come e Stars, entretanto, são as derrapadas mais notáveis. A primeira, aliada à participação um tanto quanto desnecessária da rapper Iggy Azalea, é confusa nos propósitos e refrão dançante, embora empolgue, soa deslocado. Na outra faixa, nota-se um uso sobrecarregado de sintetizadores, perdendo a identidade dos vocais de Demi por vários trechos – o que não seria tão prejudicial se não fosse seu talento mais louvável. Em paralelo, Waitin For You foi uma parceria bastante proveitosa com a rapper Sirah. Mantiveram a identidade do álbum, mas também ofereceram algo a mais, principalmente no que tange ao empoderamento feminino. Wildfire e Lionheart possuem um clima mais intimista e gostoso de se ouvir, dando oportunidade da artista explorar sua voz como faz de melhor. Yes, embora com vocais fortes e esti-
-mulantes, é uma das faixas confusas em conceito, que dá a impressão de ter sido encaixada às pressas. Também é o caso de Mr. Hughes, aparentemente mal pensada para fechar o trabalho e, em compensação, com mais um refrão chiclete. Stars, aliás, lembra bem os tempos nostálgicos e antigos de Camp Rock. Animada e positiva, é como se os Jonas Brothers fossem surgir para acompanhála. Father segue por esse viés sentimental, dedicada ao pai do cantora, falecido em 2013, com quem tinha uma relação complicada. Se a voz de Lovato já causa arrepios por si só, acompanhada de um coral poderoso em pontos estratégicos da melodia quase gospel, é um fastígio auditivo. É quando ela baixa a guarda e a atitude badass, entregando-se de peito aberto.
Ouça o CD
Confident não é o álbum do ano, talvez nebuloso demais, com altos e baixos, para ser considerado o melhor trabalho da cantora internacional que mais vende CDs no Brasil há dois anos. Não obstante, revela uma Demi Lovato madura e segura de si, tanto como figura performática, quanto instrumentista de voz. A utilização frequente de modificadores pode camuflar um pouco, mas ela é, sem dúvida, uma das vozes mais potentes de sua geração. Se um dia foi considerada um “fenômeno teen”, a nomenclatura já caiu em desuso. A efemeridade dos fenômenos não lhe faz jus e, caso haja uma lição de suas últimas produções, é que ela não vai a lugar algum ●
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PLAY
Exclusiva com a
banda ONZE:20 .Com três discos lançados, o grupo de sucesso volta à cidade onde tudo começou ● por THAÍSA MAIA
A
plausos: Por que vocês resolveram voltar para a cidade natal?
Onze:20: Quando divulgamos ME LEVA, nossa primeira música de trabalho, há uns cinco anos atrás, ainda morávamos em Juiz de Fora. Queríamos dar o próximo passo, então pensamos em mudar de cidade. O Rio é pertinho de Juiz de Fora, mas o mercado é um pouco diferenciado, tem aquele lance boêmio, ou é mais voltado para o pagode, funk. Foi quando mudamos pra São Paulo. Depois de três anos lá, trabalhamos muito e, agora, com a condição financeira um pouco melhor, voltar para Juiz. Aqui a gente tem mais tranquilidade pra compor , não ter tanta saudade da família. Somos muito caseiros também, além de que Juiz de Fora está entre Rio, São Paulo e Belo Horizonte. Acaba sendo uma boa opção morar lá agora para a banda. Aplausos: Falando em compor, quais são suas maiores influências musicais? Onze:20: O grupo é relativamente grande, então isso se difere demais. Ao mesmo tempo, foi a diversidade que nos uniu. Brincávamos que nosso gosto ia
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de Ney Matogrosso à Pantera, o que é verdade. Acho que nossos gostos peculiares foi o que nos juntou. Eu (Athos, tecladista), por exemplo, adoro rock antigo; o Marlos (baixo/backing vocal) também, mas ele curte MPB, reggae. O Victor (vocalista) teve de escola o hardcore, ele e o Broca, nosso guitarrista. O Fábio (guitarrista-base) seguiu essa origem; KiKi (Chris, guitarrasolo) é mais John Mayer, Richie Cotsen. Mas tem uma parada muito legal: somos músicos e músico gosta de música, independente do gênero ou estilo. É nosso diferencial também, sermos tão bem aceitos por muitos, não um público específico. Lógico, algumas bandas marcaram o começo da nossa estrada musical, como Foo Fighters, Sublime e o Skank. A: Qual foi o momento em que perceberam ser atualmente uma das principais bandas do país? 11/20: Sinceramente, até hoje não notamos isso. É tudo muito novo, ainda ficamos maravilhados cada vez que música toca na rádio, cada vez que subimos no palco. É emocionante ver o carinho que recebemos, não só pela Internet, mas também nos shows, nas ruas. Agradecemos
a Deus, porque viver de música no Brasil, ainda mais fazendo o som que a gente faz, é muito difícil. Fugimos um pouco do mercado tradicional e, ao mesmo tempo, conseguimos sempre estar junto do mainstream, isso é incrível. Somos gratos a todos que ajudam e a Deus em proporcionar isso. A: A produção do álbum mais recente, Vida Loka, foi bem agitada, com direito à turnê no Japão. Em meio a tudo isso, como é o processo de composição de vocês? 11/20: Todas as músicas são composições nossas. No Vida Loka, fizemos uma parceria com uma dupla de grandes amigos nossos da Bahia, Guga Fernantes e Oséias Marques. Eles ajudaram nas composições de algumas músicas, mas álbum é todo autoral. Aqui, quem compõe mais são o Victor, o Marlos e o Fábio. Tudo tem uma pitada de cada integrante, mas a parte das letras, da harmonização e, principalmente, da produção, é desse trio. A: Existe algum ritual entre vocês antes das apresentações?
11/20: Tínhamos um prazo para podermos entregar até setembro e aconteceu, fomos convidados para fazermos uma turnê no Japão. Em meio a essa correria de tirar visto, show, agenda e viagens, a gente compôs esse disco de uma forma muito louca. Muitas músicas desse CD foram compostas na estrada, através de WhatsApp, mandando os pedaços
A: Quais os planos para o futuro? Já dá pra enxergar o Onze:20 daqui 20 anos? 11/20: Os planos para o futuro mais próximo é o lançamento de um DVD. Estamos analisando bastante a possibilidade de gravação. Agora, com dois discos, temos mais material para lançar um DVD. Já estamos compondo nosso próximo disco, que deve ser um EP de cinco a seis músicas inéditas. Devemos lançar no ano que vem, talvez no começo de 2016. Daqui a vinte anos... Acho que o sonho do Onze:20 é conseguir ao menos escrever nosso nome na história da música brasileira e poder continuar tocando. Eu (Athos) quero estar com meus cabelos brancos, com meus netos, e poder falar assim: Olha, eu fiz parte da música brasileira. Seria uma honra muito grande. Aos poucos a gente vai, né? ●
Fugimos um pouco do mercado tradicional e, ao mesmo tempo, conseguimos sempre estar junto do mainstream.
Na foto abaixo, da esquerda para direita, Fábio Mendes, Athos, Chris, Victor, Marlos e Fábio Barroso.
ÃO
A: O álbum Vida Loka realmente ocupou muito o tempo de vocês. Como foi sua idealização?
Foi muito engraçado porque, na noite anterior à viagem, o Marlos enviou os áudios para nossa gravadora analisar e darem sequência ao trabalho. O disco se autointitulou “Vida Loka” graças a isso, pois o momento que estávamos vivendo era realmente muito louco, uma correria danada e com a agenda muito, muito apertada.
FOTO: DIVULG AÇ
11/20: Cada um tem certo ritual pessoal. O Victor aquece a voz, o Marlos faz um drink. Eu (Athos) gosto de alongar, o Fábio sempre passa um pouco de gelo na mão para, assim que ele entrar, entrar quebrando tudo na bateria. Mas da banda mesmo, todo show a gente se reúne, chama a equipe antes de subir no palco, faz uma roda, reza um “Pai Nosso” e pede a Deus para proteger o show e nos deixar bem iluminados, para tirar qualquer tipo de energia ruim e negativa. Principalmente, pedimos para Ele iluminar o show e a plateia. A gente também gosta muito de citar uma música do Lulu Santos no final, Tempos Modernos. O refrão dela diz muito, fala para vivermos tudo o que há para viver, e não podemos perder a oportunidade de viver isso que vivemos, tem que ser dedicação ao máximo mesmo.
PLAY SELENA GOMEZ, JOJO E SIA
Lançamentos
por CAÍQUE PEREIRA
Same Old Love
O segundo single do novo CD de Selena Gomez, Revival, traz uma letra determinada a partir de um relacionamento desgastado, unindo alcances sugestivos em um ritmo sedutor. A produção, também mid-tempo, foi composta por Charli XCX (com vocais descreditados), entre outros nomes. A abordagem electro-pop combinou com as hesitações do piano, o refrão se beneficiando da rouquidão cínica e britânica de Charli, em paralelo às nuances de jazz. As emboscadas seguem pela canção, principalmente quando a irritação candente de Selena (destaque para os estalares de dedos) desvia o ouvinte para trechos emocionais e fortes. Contrapõe-se claramente à passiva Good For You, representando Gomez em sua nova fase mais confiante e madura. O instrumental impecável dá
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espaço para a intérprete soar melhor do que nunca, sem ser ofuscada pelos sintetizadores no refrão, muito menos com as inserções da bateria. Essas foram estratégias que funcionaram bem em prol da mensagem de “estar cansada do mesmo velho amor”. A repetição pode causar um certo cansaço e sobrecarregar quem escuta, pedindo para ser ouvida mais de uma vez até que se desperte em você. Entretanto, dos esforços, o menor. A importância de Same Old Love é exatamente reforçar a batalha de mais uma ex-estrela da Disney em ser vista como força do pop em combustão ●
Alive
O carro-chefe do quarto álbum de Sia foi escrito pela mesma em parceria com Adele e Tobias Jesso Jr. A letra decorre sobre a vida e perspectiva da cantora britânica, que ofereceu U$1 milhão de dólares pela canção, sem sucesso. Por outro lado, fora rejeitada por Rihanna. A nova coletânea de Sia, This Is Acting, com lançamento ainda em 2015, é completamente formada por músicas feitas para outros artistas e recusadas por eles. Ainda assim, os vocais assoladores de Furler não deixam a desejar na base dramática que Alive constrói, tijolo a tijolo, nota a nota. Sua voz áspera arrebata para além da audição, embarcando todos que escutam por uma jornada em sua essência. O trabalho expressa uma clara volta por cima das adversidades.
A letra poderosa debate sua própria força entre o retumbar da bateria e os intervalos pungentes. O tom aventureiro paraleliza as estrofes cruas e diretas, criando um ambicioso hino de superação. Apesar de parecer, de fato, uma mid-tempo que Adele apresentaria com toda sua profundidade — ênfase aos trotes que remetem a Rolling In The Deep —, o estilo furioso e a assinatura rouca de Sia moram brilhantemente em cada canto. É uma prova irrefutável de sua proeza enquanto compositora e intérprete. O refrão letal do protótipo de hit poderia levar a vencedora do Grammy a um novo gramofone e ao topo das paradas, porém a sinceridade de Furler transpassa o crescendo de versos, que cantam o enfrentamento constante de dificuldades em contrapartida ao fato de sempre encontrar a vontade e o fôlego a fim de se reerguer. Tomando esse exemplo, Sia parece ter respiração suficiente para escalar seu reconhecimento e sucesso da indústria ●
Save My Soul
Quase dez anos após lançar seu último CD, JoJo retorna com um trio de singles fortes pela Atlantic Records, mostrando uma fatia de sua versatilidade musical. Save My Soul se destaca em meio às canções, uma balada R&B cuja atmosfera sombria envolve o espectador já no início em sua progressão pelo piano. O clímax ascende na construção do refrão enfático, a dor de um relacionamento viciante perpassando versos nada impessoais. As insinuações perturbadoras do efeito dependente de um amor, em alusão a psicoativos, se fazem presentes até a última nota. A melodia mid-tempo (não é dançante, tampouco lenta em excesso) explora a cantora como testemunha dessa compulsão, escancarando nas vitrines de cada estrofe sua proeza vocal. É a música mais emocional no conjunto, consequentemente se tornando a mais forte. A cantora e atriz de 24 anos revelou em um evento promocional que cresceu com pais que lidavam com alcoolismo e a influência da situação em sua juventude e na própria Save My Soul. As cifras cruas acertam, entretanto, ao deixar a interpretação livre às vivências do ouvinte, propiciando uma experiência intimista e arrebatadora ●
revista APLAUSOS •
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7ª ARTE
Filmes para inspirar seu
casamento
por THAÍSA MAIA
Vestida para Casar Evidencia bem a função da madrinha na organização do casamento, além de muitas dicas de vestidos de noivas e madrinhas e detalhes interessantes para quem deseja uma cerimônia na praia.
Noivas em Guerra Reforça a importância na escolha das madrinhas, pois são os braços e as pernas de qualquer noiva. É bom analisar quem realmente irá desenvolver esse papel com excelência. Os vestidos usados no longa são inspiradores, além das decorações elegantes e sofisticadas.
O Pai da Noiva Para relaxar, traz um dos lados menos técnicos do casamento. É um bom filme para compreender melhor o sentimento do seu pai nessa fase da vida. No fim da comédia, a emoção flui sem restrições.
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• revista APLAUSOS
O Casamento dos Meus Sonhos O título sugestivo fala por si só. Esse é super indicado quando o assunto é a organização do evento e contratar o wedding planner ideal, além de lembrar que imprevistos, independente da vontade dos noivos, sempre vão dar as caras alguma hora.
O Casamento do Meu Ex Traz uma cerimônia ao ar livre muito interessante para quem pensa em seguir por esse caminho. É também um alerta, pois chove durante o evento. O ideal é escolher a data verificando a época do ano e prestar atenção ao clima, para que tudo aconteça como foi planejado ●
O
skar Schindker, um magnata alemão, ambicioso, viciado em dinheiro, louco pelas mulheres, filiado ao partido nazista, um herói para seus judeus. Talvez essas sejam boas definições do protagonista de A Lista de Schindler. O longa de 3h de duração estrelado por Liam Neeson, conta a história de como o magnata alemão, Oskar Schindler, despendeu toda sua fortuna para ajudar o povo judeu a salvar-se dos horrores do holocausto sob o auxílio de seu contador e também judeu, Itzhak Stern (Ben Kingsley). Schindler inicialmente usa seu poder e influência apenas com o interesse de conseguir mão de obra judaica barata para o trabalho em sua fábrica de esmaltados na Polônia. Com ela, consegue se valer de mais de mil trabalhadores que, antes, estavam fadados à morte.
Com o decorrer da Segunda Guerra Mundial, Oskar, já tomado de compaixão pelos judeus, compra cerca de 1200 vidas, salvando-as das brutais câmaras de gás. É o próprio magnata que, lembrando de cada rosto que passou por sua fábrica de esmaltados, dita a Stern os nomes a serem adicionados à lista.
Século XXI e seus refugiados Através de observações pessoais feitas pelos correspondentes do programa Não Conta Lá em Casa, do canal à cabo Multishow, em suas contas na rede social Snapchat, é possível perceber que esses refugiados são, em larga maioria, pessoas com vivência profissional, situações financeiras estáveis e dispostas a empreender todo seu conhecimento no serviço que conseguirem para sobreviver. Isso não lembra nosso filme?
Com o início da Primavera Árabe, encabeçada pelo Egito em 2010, os conflitos no Oriente intensificaram-se. Países como a Síria entram em conflito pela deposição do líder do governo, Bashar Al-Assad, há 13 anos no comando do país. Assim como no Egito durante a guerra civil contra Hosni Mubarak, até então no poder Na nova fábrica fundada pelo h á 3 0 a n o s , o s c o n fl i t o s magnata, a misericórdia toma o r e c e b e r a m i n c e n t i v o s d e lugar do simples desejo de salvar grupos de guerrilha. o povo judeu. O zelo e o afeto Os conflitos na Síria e em mútuo passam a ser agentes Israel receberam um incentivo principais dessa relação. O filme, construído em preto e branco a mais na guerra: o famigerado sob uma narrativa coloquial, se Estado Islâmico (ISIS), grupo desenvolve com um avanço liderado pelo califado islâmico quase imperceptível do tempo. xiita (extremista), responsável S u a d u a l i d a d e d e c o r e s é pela perseguição de qualquer contrastada com coloridos sutis p e s s o a q u e n ã o s i g a e m e pontuais, em cenas em que a completude todas as leis por esperança subsiste em meio à eles impostas. Um fator que agrava a perseguição nesses guerra. países é o fato de que muitos Pensar no longa, observando sírios e israelenses têm se todo o panorama atual dos convertido ao cristianismo, refugiados, é tentar encontrar a religião combatida com ódio cor da esperança nos países que pelo ISIS. os acolhem.
Filantropia pelo mundo Dar oportunidade; foi nisso que pensaram nações como Alemanha e Grécia, países que recebem o maior número de refugiados israelenses e sírios na Europa. Se seus motivos para abrigá-los assemelham-se aos de Oskar Schindler no começo de sua trajetória só o tempo irá dizer. O importante é que agora esses países já são, juntos, responsáveis pelo abrigo de milhares de pessoas que possivelmente estariam mortas caso continuassem em seus países. Muitas organizações privadas também manifestaram amplo interesse em ajudar. O time alemão de futebol Bayern de Munique divulgou no começo de setembro a disponibilidade de um dos seus campos de treinamento para receber crianças, especificamente. O objetivo é dar alimentação, treinamento em futebol e apoio psicológico aos jovens refugiados. O clube organiza ainda um amistoso para arrecadar fundos a serem empenhados no auxílio ao povo sírio. Naguib Sawiris, bilionário
egípcio, negocia com a Grécia a compra de duas ilhas para abrigar os refugiados. Sua intenção é colocar nelas quantas pessoas puder e garante ter capital suficiente para investir em meios de produção de subsistência para seus futuros habitantes. Presidente da operadora de telecomunicações Orascom Telecom, o bilionário é atualmente o terceiro homem mais rico do Egito. Junto a ele nesta empreitada, está o turco Hamdi Ulukaya, criador da marca de iogurtes Chobani. Ele afirmou que pretende doar metade de sua fortuna para ajudar os fugitivos de guerra. The Giving Pledgez, iniciativa criada por Bill Gates e Warren Buffett, é a responsável por estimular ambos. Desde 2010, o grupo incentiva bilionários (prérequisito para entrar para o clube) a doarem metade de suas fortunas, ao longo da vida, para causas humanitárias. Pensar além de suas próprias fronteiras é ser o pincel a colorir a vida e dissipar os desesperos e medos daqueles para os quais a felicidade e a calmaria parecem nunca mais voltar ●
No Brasil, são diversas as organizações para ajudar: Acnur – A Agência da ONU para refugiados fornece abrigo, água potável, saneamento e assistência médica vital a milhares de pessoas pelo mundo. Médicos Sem Fronteiras – estão pelo mundo todo para oferecer assistência médica, psicológica e tratamento nutricional. Cruz Vermelha – ajuda pessoas que sofrem com a violência em zonas de conflito, como a Síria. Cáritas – A Cáritas Brasileira é um organismo da CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil), ligado a uma rede internacional de assistência. É uma das poucas entidades que prestam serviço de acolhida e integração aos refugiados no país. Há unidades da Cáritas no Rio de Janeiro e em São Paulo.
A
famigerada “crise econômica” abandonou há tempos – se é que algum dia esteve – o campo da ficção. Chafurdando nas mais diversas áreas, o mercado literário brasileiro não ficou de fora, tampouco seu clímax nos anos ímpares com a Bienal Internacional do Livro do Rio de Janeiro. Apesar do recorde de público, com a estimativa de 676 mil visitantes do Riocentro entre os dias 3 e 13 de setembro, muitos entraram com o bolso contido na 17ª edição do evento. As dificuldades setoriais, entretanto, não são tão recentes quanto parecem. O faturamento despencou 5,16% de 2013 para 2014, o pior número registrado desde 2012, segundo pesquisa feita pela Câmara Brasileira do Livro (CBL) em parceira com o Sindicato Nacional dos Editores de Livros (SNEL). A queda se deu principalmente pela compra de exemplares por parte dos governos, que caiu quase 16%. “Tivemos uma pequena diminuição quanto ao número de expositores e um patrocinador a menos em relação à Bienal de 2013. As negociações começam no ano anterior, e o cenário em 2014 era bem diferente
do que vivemos agora. Nesse ano, houve dois cancelamentos de contratos e o encolhimento de algumas editoras – atestou o presidente da SNEL, Marcos da Veiga Pereira. Ainda assim, o sucesso dos livros de colorir garantiram um desempenho razoável no quadro geral. A Sextante ainda colhe os frutos de seu best-seller Jardim Secreto, o motivo de ser uma das poucas editoras que não padeceu tanto com a crise. O grupo comemorou o aumento de 40% no lucro em relação ao evento de dois anos atrás. A própria Martins Fontes festejou seu maior sucesso em vendas durante uma Bienal carioca, com mais de 500 títulos comercializados e 7 mil exemplares muito bem vendidos durante a feira. Por outro lado, certas casas tradicionais se afastaram da Bienal esse ano, exatamente pela questão financeira. O grupo Melhoramentos é um exemplo, outrora detentor dos holofotes através do pomposo tamanho de seu estande e de convidados frequentes. Moderna, L&PM e DCL também diminuíram seus estandes. Os editores têm certa razão na decisão, mas é evidente que cada caso é um caso.
O aluguel de um espaço médio de 100m² custa em torno de R$60 mil. Fora a contratação de mão-de-obra e serviços – não muito acessível no Rio –, o valor sobe para R$72 mil ao considerarmos as estruturas básicas e a armação das prateleiras. As vendas nem sempre correspondem a tal investimento. “Vários editores aumentaram seus espaços”, contrapôs Veiga, questionando se o público percebeu as ausências e/ou reduções de espaço. Ele ainda complementou: “É um evento tão grande e diversificado que, a não ser que um vi-
-sitante tenha um objetivo específico de conhecer uma editora e ela não esteja presente, o público sempre estará bem atendido.” O feriado da Independência, logo após o primeiro fim de semana da Feira, agregou positivamente. Somente até o dia 10 de setembro, a Intrínseca afirmou ter vendido 43 mil exemplares, um crescimento de 41% em relação à Bienal de 2013. Paralelo a isso, a Autêntica superou em cinco dias seu lucro total na edição anterior. Os saldões também eram grandes chamarizes para os visitantes, com suas disputadas promoções a preços populares. Dos anúncios de três volumes por R$10 à oferta de brinde de uma caixa de lápis de cor na compra de um livro de colorir, os leitores desbravavam pechinchas e se distanciavam de quaisquer ideias de “crise”. “A decisão da comissão da Bienal de investir na programação cultural, apesar destas reduções, foi fundamental para o sucesso do evento”, reforçou Marcos. A organização apostou em espaços novos como o Maracanã e o Copacabana, que reuniram escritores dos grandes públicos, aliados ao crescimento da área de lazer, preenchida com alguns food trucks para todos os paladares. Outra novidade foi a Minha Biblioteca, uma plataforma virtual que permitia acesso à informações científicas. “Vejo um longo período de dificuldades para o Brasil até o final de 2016, mas espero que em 2017 a economia brasileira volte a apresentar bons números e
que foi investido em 2009. Em compensação, os altos preços tabelizados em grupos tais quais Record e Rocco, que também não forneciam tantas possibilidades de desconto, puseram mais uma vez em cheque o real significado de “feira” literária. Os argumentos para isso seguiam sem muitos fundamentos. A próxima edição da Bienal já tem data para acontecer, entre os dias 31 de agosto e 10 de setembro de 2017. Resta esperar para ver se até lá a crise e suas consequências não passarão de velhas histórias para se contar ●
CONTRACAPA
Fanfics
Um exercício de liberdade e criativdade • por ROBERTA REY
H
elena Menezes, 25, formada em História pela PUC Minas, conhece bem o assunto. Começou a escrever nesse gênero literário ainda em 1999, quando tinha apenas 9 anos. Em 2002, passou a postar seus textos na Internet, e gostou tanto do resultado que hoje faz Mestrado sobre o tema.
“Na época (1999), não tinha acesso aos sites especializados e sequer conhecia o termo, mas eu escrevia.” Quando perguntada sobre a importância do mundo da ficção dos fãs para ela, responde que criar fanfics contribuiu com o desenvolvimento de sua escrita e possibilitou o contato com outros escritores e leitores. O que a motiva a ler esse tipo de ficção é, principalmente, quando uma história não a satisfaz completamente. É também o que despertou o interesse da blogueira literária Juliana Oliveto, 26, formada em Jornalismo pela PUC Rio e dona do blog Livros e Bolinhos, de escrever suas próprias histórias. Insatisfeita com a vida amorosa do personagem Harry Potter, criado pela autora de livros J. K. Rowling, Juliana resolveu idealizar uma “mocinha” para estar ao lado do rapaz. Foi o pontapé inicial para sua própria trajetória no mundo das fanfics. “Sempre foi uma espécie de válvula de escape diante da frustração romântica que a J. K. gerou e, principalmente, uma forma de continuar no universo de HP enquanto ela não lançava um novo livro”. Entretanto, é a possibilidade de ter contato com novas histórias criadas a partir de um universo já conhecido que a motiva a ler fanfics. Sejam elas românticas, sobre aventuras ou batalhas, o que importa é serem bem escritas, afirmou Oliveto. Quem também se rendeu à obra de Rowling foi Babi Dewet, 28, autora da trilogia Sábado à
Noite e de um dos contos do bestseller da Gutenberg, Um Ano Inesquecível, ao lado de outros fenômenos do meio, como a famosa Thalita Rebouças, Paula Pimenta e Bruna Vieira. Quando começou no mundo das fics tinha 15 anos de idade, morava em uma cidade do interior, sem ter com quem conversar sobre sua nova paixão. Foi então que resolveu procurar outros fãs da saga na Internet. “A importância de escrever fanfics, no meu caso, é enorme. Foi o que me levou a aprender a escrever para os outros e a dividir minha criatividade com outros fãs.”
Limites, direitos e controle do autor Babi defende que podem até existir limites, mas não é a fanfic que os impõe, mas sim o chamado fandom (coletivo de fãs) em questão. Já que não há fins lucrativos, o fã não está
Sempre foi uma espécie de válvula de escape diante da frustração.
infringindo os respectivos direitos autorais. Segundo ela, conversas e as explicações cabíveis sobre plágio devem ocorrer exatamente para que os internautas saibam que, ao divulgar ou até utilizar textos da Internet, é necessário, no mínimo, dar os créditos ao autor original. Juliana, por outro lado, não acredita em restrições, já que a ideia da fanfic é dar o aval ao fã para criar algo novo dentro de um universo conhecido. “Acho que os limites atrapalhariam essa criatividade”, frisou. A blogueira revela que seu sonho era publicar sua fanfic – registrá-la e possuir uma cópia para si mesma e alguns amigos – mas os direitos autorais a impedem de realizá-lo. “Não posso simplesmente pegar aqueles personagens que não são meus e sair ganhando em cima disso. Agora, sem retorno financeiro? Não vejo problema algum na utilização respeitosa.” Apoiada nas ideias do escritor Umberto Eco, Helena explica a existência de um equilíbrio de forças. O autor tem a propriedade legal sobre a obra, mas não possui qualquer autoridade intelectual a seu respeito. Seu trabalho pode ser contestado, discutido e, por que não, reescrito. E ela ainda reforça: “Na contemporaneidade do mundo informatizado e globalizado, tentar bloquear a criatividade do fã é não apenas inútil, como também um atento à liberdade criativa e intelectual” ●
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CONTRACAPA RAPHAEL MONTES
O Vilarejo por CAÍQUE PEREIRA
S
Os contos são organizados fora da cronologia tradicional, exatamente em prol de uma experiência narrativa muito mais rica e instigante. O enredo conexo à temática demoníaca e, consequentemente, aos sete pecados capitais é um primor de trabalho crível, surpreendendo sem deixar pontas soltas. As ilustrações marcantes de Marcelo Damm agregam ao clima de horror da história, tal qual o trabalho gráfico da edição bem revisada e com ótima leiturabilidade.
e Stephen King é Rei do Terror, Raphael Montes se consagra enquanto seu herdeiro brasileiro. O carioca de 25 anos, elogiado pela crítica e público com seus romances Suicidas e Dias Perfeitos, revisita o feito de embasbacar leitores através dos sete contos macabros que permeiam O Vilarejo; um livro-entidade capaz de aterrorizar seus sonhos mais tranquilos. Em 1589, o padre e demonologista Peter Binsfeld fez a ligação de cada um dos pecados capitais a um demônio, supostamente responsável por invocar o mal nas pessoas. Seus diários dão como exemplo dessas conexões um vilarejo isolado pela guerra, seus moradores pressionados pela fome e pelo frio, despertados pela solidão e pelo medo. No fim das contas, não havia lugar melhor para o mal fazer moradia. A narrativa de Montes é limpa e sem firulas, em contraponto ao conteúdo pesado de sua história. As 93 páginas seguem, e mal se nota seu folhear, ao mesmo tempo em que interrupções são necessárias a fim de inspirar e expirar. A densidade da trama segue nesse jogo interessantíssimo de morbidade simplificada, deliciosa de se vivenciar pela leitura.
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Nesse gancho, os moradores do vilarejo se concretizam agilmente, sem abrir mão da qualidade, com participações bem delimitadas nos capítulos e conexões que embebedam uma sede de ir e voltar por eles a todo momento. O mote coloca suas humanidades à prova em um momento de crise coletiva, tal qual o próprio King fez em Sob a Redoma e Saramago em Ensaio Sobre A Cegueira. A diferença mais notável é o vetor demoníaco que brinca com o ledor, questionando o limite da possível influência por forças ocultas em paralelo à pura crueldade humana em sua natureza mais primitiva.
“Monstros são reais e fantasmas também. Eles vivem dentro de nós e, às vezes, vencem”. A frase de King, por coincidência, exprime com eficácia o sabor que a construção extasiante de Montes deixa na boca após seu ponto final derradeiro. Um mel para os ursos, o açúcar das formigas, o sangue aos vampiros. Como bons “dráculas literários”, já ansiamos por mais do Príncipe do Terror ●
MICHELLE FALKOFF
A Playlist de Hayden B
ullying, perda e superação fazem parte da narrativa de Falkoff. A autora aborda situações reais que afligem muitos jovens. Sam, o protagonista da história, poderia ser um jovem qualquer que conhecemos. Conectado ao mundo tecnológico, gosta de ouvir música e é fã de Star Wars. Seu único amigo, Hayden, com quem divide seus momentos, também não é muito diferente dos adolescentes atuais. Além de compartilhar dos mesmos gostos, o rapaz, assombrado e perseguido por todos a sua volta, não suporta mais viver e decide acabar com a sua própria vida.
através de um fone, contrasta perfeitamente com a tonalidade azul ao fundo. No início dos capítulos está o nome de uma música, seguida pelo nome de bandas ligadas ao enredo. O livro passa uma mensagem de superação, nos traz um novo olhar para situações que podem parecer normais, e até que ponto determinados comportamentos são capazes de causar reações desesperadas. Sam, Hayden, Rayan, entre outros personagens retratados na história, estão no nosso cotidiano, basta apenas olharmos com mais atenção ● e, o maior desafio de todos, aprender a viver sem a presença de Hayden.
Sam encontra seu melhor amigo morto e, junto a ele, está um pendrive com um bilhete: “Para Sam. Ouça. Você vai entender”. Determinado a descobrir os motivos que levaram Hayden à tamanha atitude, o protagonista se empenha em desvendar o mistério escondido na playlist deixada por seu amigo. Com raiva por ter sido abandonado e, ao mesmo tempo, culpado por não ter impedido tal decisão, resta ao rapaz tentar superar esse momento difícil.
A trama gira em torno dos mistérios acerca da morte de Hayden, suas motivações, uma fe sta na noite ante rior ao acontecido e qual a relação desses ocorridos à decisão de acabar com a própria vida. Segue, então, o retorno de Sam à sua vida cotidiana, a relação dele com os garotos que tanto prejudicara seu amigo, e, o maior desafio: aprender a viver sem a presença de Hayden.
Michelle construiu uma narrativa fluida e que nos faz refletir sobre situações cotidiana, a relação dele com os garotos que tanto prejudicara seu amigo,
Em relação ao aspecto visual, a simplicidade das ilustrações da capa, com duas pessoas retratadas de perfil e em tom escuro, separadas, porém conectadas
Muitas pessoas querem ser invisíveis, mas sempre alguém as vê. revista APLAUSOS •
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PLAY
Singles Desperdiçados As músicas injustiçadas tão boas – ou melhores – do que os destaques de seus álbuns ● por CAROL FEIJÓ No Control
Starstruck
Legendary Lovers
Esse hit do One Direction é um grande exemplo de música aclamada pelo público e que não rendeu um clipe. Os directioners decidiram promover a música por conta própria, na tentativa de torná-la um single através das redes sociais, usando a hashtag #WeWantNoControlAsASingle (#NósQueremosNoControl ComoSingle, em tradução livre). A estratégia funcionou relativamente, pois a canção chegou ao topo da concorrida lista da Billboard, porém continuou nas sombras do CD FOUR.
Na época de lançamento da canção, Gaga declarou que se ela e o DJ Space Cowboy tivessem um filho, a criança soaria como Starstruck. Para muitos little monsters, a música define bem o trabalho do álbum The Fame, de 2008. Mesmo assim, ela não entrou para a lista de singles, mas fez grande sucesso comercial, atingindo as 100 mais tocadas nos EUA, Canadá e Reino Unido.
É a faixa favorita de muitos KatyCats no CD Prism, com uma pegada indiana sobre um amor atemporal. Katy Perry prometeu lançar sete singles no disco, um para cada cor refratada no prisma, então a esperança de ver um clipe de Legendary Lovers ainda é a última que morre.
Ouça nossa playlist com esses e outros desperdícios
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End Of Time Presente no 4º álbum de Beyoncé (foto à direita), alcançou surpreendentes números nas paradas internacionais logo na semana de lançamento. Sempre foi uma das principais apostas dos fãs para single, mas, até agora, nossa Queen B não disse nada sobre uma produção audiovisual para a canção ●
FOTO: DIVU LGAÇÃO
CRÔNICA
Cretino por CAÍQUE PEREIRA
P
reciso muito parar de exigir mentalmente das pessoas aquilo que já cobro em excesso de mim mesmo. A frustração inquietante me pega no berço da madrugada, nos instantes eternos de sentidos entre checar as últimas mensagens e ensaiar o sono.
Abro o Facebook e não há ajuste de luminosidade que esclareça o porquê das faltas de respostas, ou daquelas que mais confundem do que elucidam. O Twitter teia narrativas que não captam minha atenção pelo tardar da noite, as exceções se perdem no leito volátil da linha do tempo. Tudo que postei há algum tempo sem um feedback sequer. Tweets e mais tweets, inúmeros, tanto quanto nós mesmos, caindo e subindo. Cercados dessa polifonia e, ainda assim, somos tão sozinhos. A carência por ser ouvido e, mormente, correspondido. É o WiFi supremo em qualidade do universo, sempre alcançando nossos dispositivos cranianos onde quer que estejamos. O silêncio fatia as esperanças de felicidade do dia seguinte nas digitações do WhatsApp, um imediatismo conscientemente dramático que me abraça num cretino boa noite.
FOTO: EDWARD HONAKER
Programo o despertador com um arrastado inspirar e me atrapalho pelo touchscreen na escolha das horas e minutos. No final das contas, lágrimas não teclam ●
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Um prelúdio em forma de fanfic para o Titanic de James Cameron
FOTO: ARTHUR MOLA
ARTE: CAÍQUE PEREIRA
QRCODES
FOTO: LUCAS LANDAU
A campanha feita pelo canal Mashable do #LibereOBacon
Jout Jout, a nova rainha do Youtube
EXPEDIENTE EDITOR, DIRETOR DE REDAÇÃO E DE ARTE: Caíque Pereira ● REPÓRTERES: Carol Feijó, Letycia Nascimento, Roberta Rey e Thaísa Maia ● DESIGN E INFOGRAFIA: Caíque Pereira e Carol Feijó ● PRODUÇÃO EDITORIAL: Caíque Pereira, Carol Feijó, Letycia Nascimento, Roberta Rey e Thaísa Maia ● COLABORADORES: Gabriel Arcanjo.