Turismo

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A criação do Fundo de Turismo e o Boom da Década de 60 O Turismo,sector estratégico do desenvolvimento



A criação do Fundo de Turismo e o Boom da Década de 60 O Turismo, sector estratégico do desenvolvimento



A criação do Fundo de Turismo e o Boom da Década de 60 O Turismo, sector estratégico do desenvolvimento


Rua Diogo de Silves, 55 4400-628 Vila Nova de Gaia Todos os direitos reservados. © 2014 Capa: Camila Nogueira Revisão e paginação: Camila Nogueira Impressão e acabamento: Norcópia, lda


A criação do Fundo de Turismo e o Boom da Década de 60 O Turismo, sector estratégico do desenvolvimento

Exposição dos 14 anos de Política do Espírito do SNI, Centro Português de Fotografia.

É então que, sob a égide do Secretariado Nacional de Informação, decide o governo criar o Fundo de Turismo que, como é definido n Lei n.º 2082, Base XVI de 4 de Junho de 1956, se destina a assegurar o fomento do turismo no país e, em especial a auxiliar e estimular o desenvolvimento da indústria hoteleira e de outras atividades que mais estreitamente se relacionam com o turismo. Na mesma Lei (Base XVII) eram definidas as receitas (20% do produto de receitas ordinárias das regiões e zonas de turismo), igual importância das receitas das zonas de turismo das ilhas adjacentes; receitas provenientes do imposto sobre o jogo; rendimentos de bens próprios, mobiliários e imobiliários; rendas de edifícios do Estado onde funcionem estabelecimentos hoteleiros e similares; o produto das taxas, multas e de vistorias, entre outras importâncias devidas por lei. Na base XVIII do referido diploma definia-se como as disponibilidades do Fundo deveriam ser aplicadas em planos concretos de ação, respectivamente na comparticipação com órgãos locais de turismo ou com empresas privadas em trabalhos de construção, ampliação ou adaptação de edifícios ou parte deles e seu apetrechamento, com destino a estabelecimentos hoteleiros e similares; em prestação à Caixa Nacional de Crédito de garantias especiais relativamente aos empréstimos a efetuar por esta; na concessão de subsídios de compartição aos órgãos locais de turismo e às empresas privadas que construíssem ou efetuassem benfeitorias em locais de verdadeiro interesse turístico, assim como a atribuição de prémios às iniciativas que se destacassem no sector. Iniciava a sua atividade um organismo, cuja gestão era confiada a uma Comissão Administrativa, constituída por um Presidente e por Vogais, que obrigatoriamente exigia a designação de um representante do Ministério das Finanças e de um representante dos órgãos locais de turismo por estes escolhido.

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A partir daqui, estavam delineados os primeiros objectivos para a concepção e concretização da ação do Fundo de Turismo. No Plano de Equipamento Hoteleiro do Secretariado Nacional da Informação Cultura Popular e Turismo, apresentado em 1959 ao Ministro da Presidência pelo Chefe da Repartição de Turismo1 (assinado em Lisboa no dia 8 de Abril de 1959) encontramos algumas das justificações para as atividades do recente Fundo de Turismo.

Cartaz de propaganda turística à Figueira da Foz, Biblioteca Nacional, Lisboa.

(...) seja-me lícito chamar a atenção para um facto importantíssimo em que a clássica ação dos Serviços de Turismo, longe de progredir, teve um regresso sensível em vários sectores. Refiro-me à atuação do Fundo de Turismo, cuja criação foi considerada como altamente favorável para o incremento da atividade turística nacional e em esvpecial para a indústria hoteleira que é sem dúvida a mais importante das que diretamente se relacionam com o turismo. A Lei n.º 2 0732, despertou indiscutivelmente a iniciativa privada para novos cometimentos, esperançada não só nas isenções estabelecidas pela nova providência legislativa mas ainda no auxílio financeiro que a títulos vários se lhe oferecia e a Lei n.º 2082 generalizou a outros sectores de atividade mais promessas cujo benefício se viria a sentir rápida e forçosamente na armadura turística nacional. A própria redação da Base XVI daquela última lei é bem determinante quando atribui ao Fundo de Turismo a missão de assegurar o formato do turismo no País e, em especial, auxiliar e estimular o desenvolvimento da indústria hoteleira e de outras atividades que mais estreitamente se relacionem com o turismo. E porque nessa sua missão se integravam funções idênticas àquelas que durante muitos anos vinham sendo incumbência direta da Repartição de Turismo por força das suas dotações orçamentais, decidiu-se superiormente, no plano da ação precedente, anular certas práticas


1 Era então chefe daquela Repartição o Dr. Jorge Felner da Costa.

2 Este Plano de Equipamento Hoteleiro que não foi nunca publicado é a prova de que já naquele ano (1959) a preocupação com o turismo ao nível das mais altas esferas da vida nacional era uma constante.

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que, apesar de limitadas e mesmo modestas, tiveram reconhecido valor e apreço. Poderei destacar entre outras as que tinham por objecto a assistência a estabelecimentos hoteleiros particulares, o auxílio a órgãos locais de turismo e outras organizações de interesse turístico e o aproveitamento de determinados locais de reconhecido valor para o turismo, sem contar com a imposição que hoje a lei estabelece, para efeitos de comparticipação, da existência de uma base financeira mínima de 50% da importância total das realizações. A ação desenvolvida pela brigada de assistência aos estabelecimentos hoteleiros privados foi das mais meritórias e a sua extinção criou um grande desânimo em todo o País. Salvo as duas exceções que ainda hoje de mantêm e que são o equipamento das Grutas de Mira d’Aire e da Estalagem Ninho de Águias em Marvão, tudo o resto foi remetido para o Fundo de Turismo. Mas o Fundo de Turismo sofre ainda as atribulações de uma criação recente e de falta de recursos financeiros e não é fácil prever-lhe nos seus primeiros anos a indispensável capitalização que lhe permita bem cumprir a sua missão. E mais à frente encontramos o meio, segundo o qual esta instituição atuava. (...) independentemente de outras considerações baseadas no processo operacional deste financiamento, que não nos competirá julgar, parece-me vantajoso exprimir uma opinião sobre qual dos sistemas propostos será exequível sem perturbar a ação que o Fundo de Turismo deverá exercer noutros campos da sua jurisdição. Duas hipóteses se apresentam: a. Recurso exclusivo às receitas do Fundo; b. Recurso ao crédito. Quanto à primeira hipótese, aliás possível através dos simples réditos do Fundo de Turismo, julgo que, a ser aceite, virá perturbar a orientação que

Jornal de Turismo, n.º 1 Junho 1957, capa, Biblioteca Nacional, Lisboa.


1 A propósito desta vontade de intervir, o Dr. Paulo Rodrigues, Subsecretário de Estado, referiunos em conversa uma história que decorreu durante uma visita ao Algarve com o Presidente

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da República daquele tempo, o Almirante Américo Tomás. Fomos convidados a almoçar na quinta do Eng. Azevedo Coutinho em Lagos, que após a refeição e já na varanda com vista para

ao mesmo foi dada pela legislação em vigor, pois quando o compromisso resultante desta operação viesse a ser assumido, ficaria o fundo sem disponibilidades financeiras para ocorrer a outras compartições e subsídios com destino a outras realizações de interesse turístico para além do equipamento hoteleiro. A segunda hipótese – recurso a crédito – é, no meu entender, a que permitirá mais facilmente ao Fundo de Turismo, operar em todos os sectores da sua competência sem qualquer limitação perigosa para o indispensável auxílio a prestar para o necessário equipamento turístico do País. O problema mais difícil que é originado por esta solução, baseia-se no montante do juro que vier a ser fixado ao Fundo quando contrair empréstimos. No entanto, parece-me que seguindo a mesma orientação que foi estabelecida no n.º2 do Art.º 16.º da Lei n.º 2 072 de 23 de Dezembro de 1954, poderia o Ministério das Finanças vir acordar à Caixa Nacional de Crédito, a modalidade do empréstimo e as condições de prazo e juro, por forma a tornar viável a operação que este Plano de Equipamento Hoteleiro envolveria, sem as graves consequências na parte V do Plano de Financiamento que adiante se apresenta. Isto porque, como é referido no prefácio do relatório atrás transcrito, o incremento da atividade turística constitui uma necessidade de interesse nacional, quer sob o ponto de vista de prestígio, e consequentemente com expressão política quer pela suas incidências na economia nacional. Somos hoje largamente conhecidos no mundo porque temos sabido afirmar, com justos títulos, a calma do nosso viver, a afectuosidade da nossa gente, as belezas do País, o nosso moderado nível de vida. Daí o afluxo turístico ter aumentado de ano para ano, tornando possível que milhares de

o mar, nos questionou sobre o que deveria plantar na zona mais próxima da praia. O Almirante Américo Tomás sugeriu-lhe prontamente que plantasse um Hotel. E assim aconteceu.

O nosso anfitrião entrou com o valor do terreno e em sociedade com vários investidores construíram o Hotel da Penina.

estrangeiros, em número sempre crescente, nos conheçam melhor e, conhecendo-nos, nos compreendam. Sob o ponto de vista económico não será exagero admitir, com base nos últimos elementos estatísticos, que atingiremos no ano corrente o milhão de contos de divisas trazidas como inestimável contribuição à nossa balança de pagamentos. Com algum esforço se conseguirá que a indústria do turismo se coloque no primeiro lugar entre todas as indústrias que carreiam para a economia nacional valores monetários estrangeiros.1

Desdobrável das termas de Pedras Salgadas (cerca de 1930).


2 FERRO, António, “Turismo fonte de riqueza e poesia”, coleção Política do Espírito, Edições S.N.I., Lisboa, 1949, páginas 77/78.

Era corrente na sociedade portuguesa a ideia de que o turismo mau arredava o turismo bom e essa era uma característica fundamental desta indústria. Esta alteração de mentalidades antecipava a aposta num turismo de base económica. A obtenção de dividendos era cada vez mais previsível, devido à motivação das pessoas que se dispuseram espontaneamente a apoiar, manifestando o desejo de participar no turismo.2

Revista Panorama, n.º 1, vol. 1, 1941.

Para se chegar, porém, a qualquer resultado visível, positivo, torna-se indispensável, urgentíssimo, que se trabalhe com entusiasmo, com dedicação mas, sobretudo, com unidade, com um só pensamento. Por isso vos pedimos para conversar hoje convosco, para traçarmos juntos algumas diretrizes a seguir. Somos os primeiros a reconhecer a vossa boa vontade, os vossos esforços, os vossos milagres realizados com diminutas verbas. Mas a grande dificuldade é que se torna impossível, praticamente impossível, construir uma grande obra de conjunto através da pulverização e dispersão das verbas e das Comissões e Juntas de Turismo. Reunidas, devem perfazer a soma, já visível, de seis ou sete mil contos. Dispersas, se cabem a esta Zona ou a esta Comissão cinquenta ou cem contos, cabem àqueloutra, com menos recursos, mas não com menos necessidade, cinco ou seis quando não dois ou três. E assim se esta pode dar-se ao luxo de pensar na construção dum casino ou duma piscina, aquela entretém-se a construir limitados e acanhados miradouros onde, em geral, ninguém vai mirar...1 Ora, se queremos, na verdade, que Portugal se transforme num efetivo de pais de turismo, realidade que aproveitará, mais do que aos restritos interesses locais, a todas as regiões do pais, precisamos de mudar imediatamente de critério. É necessário, para isso, antes de mais, que os orçamentos enviados pelas Comissões e Juntas de

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Cartaz de propaganda turĂ­stica a Portugal, 1959, Centro PortuguĂŞs de Fotografia.


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Idem, páginas 77/78. Ibidem, página 104.

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Turismo ao S.P.N., se uniformizarem, se concentrarem no mesmo fim a atingir, que reflitam as diretrizes que lhes forem dadas, anualmente, nestas reuniões. Não podendo atacar todos os problemas ao mesmo tempo, devido à exiguidade e dispersão dos nossos recursos, devemos agir através de campanhas previamente combinadas, em que todos participem, unanimemente, visto tratar-se de debelar males comuns.2 Ninguém melhor que António Ferro havia, até então, concretizado a urgente necessidade de colaboração para que o turismo crescesse em expectativas e em rendimentos concretos para o desenvolvimento da economia. De momento, uma verdade é necessário sublinhar, que constitui a legítima defesa do nosso organismo em face de certos ataques: unidade de ação, pensamento único em matéria de turismo que até agora, só teriam sido possíveis através de uma colaboração estreita entre o organismo central e os órgãos locais, efectivadas no exame atento dos seus planos de orçamentos se todos nos fossem enviados, dentro do prazo legal fixado pelo Código Administrativo, só invocado, com clamorosa dignidade, por algumas Câmaras Municipais, quando se trata de fugir à ação orientadora do S.N.I. (Secretariado Nacional da Informação)... Por enquanto, a situação é aquela que definimos na primeira sessão destes trabalhos. Há aproximadamente noventa Juntas e Comissões de Turismo. Este ano, apenas 12 planos de orçamento foram entregues dentro do prazo legal, isto é, até 30 de Novembro, e desse prazo até ao dia de hoje mais vinte. Falta, portanto, entregar 70, o que significa que somente um terço foi sujeito ao nosso exame, à nossa orientação. E eu pergunto a todas as pessoas de boa fé, aos próprios que se esqueceram de cumprir as suas obrigações legais, se é possível criar uma política

Brochura de circuitos turísticos, operados pela agência que em Portugal representava, nos anos 30, a American Express.


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de turismo, só realizável, com a legislação atual, através do exame sério dos planos de orçamentos, com este desrespeito pelos mais elementares princípios de coordenação e disciplina administrativa? E continua António Ferro, Alguns membros das Comissões de Turismo têm manifestado dúvidas sobre a destrinça entre obras de carácter municipal e obras de turismo, não sabendo onde acabam as primeiras e principiam as segundas. É certo que tal destrinça não é fácil e há também casos em que a fronteira nem sequer existe, sobretudo no que diz respeito à ação das Juntas de Turismo que têm de criar o seu próprio quadro, o seu próprio ambiente. É tudo uma questão de bom-senso e equilíbrio.1

Hotel Vitória, Lisboa.

Sempre que se apresentava o orçamento anual introduziam-se os resultados obtidos e as suas tendências a curto, médio e longo prazo. Nos discursos delineavam-se as tendências de crescimento. Os investimentos turísticos são efectuados, em cerca de 70% do seu volume, na indústria hoteleira. Cabe, pois referir que, além do valioso estímulo resultante das isenções fiscais e outros benefícios indiretos concedidos aos empreendimentos de interesse turístico, a indústria hoteleira beneficiou desde Maio de 1957 a Outubro de 1963, de financiamentos do Fundo de Turismo e da Caixa


1 Idem. 2 Valor equivalente a cerca de 22 milhões de contos, a preços de 1997.

3 Extracto do capitulo dedicado ao turismo no Plano de Fomento – Intercalar, transcrito por Paulo Pina, op. cit., página 169.

Serviços de expedição do SNI, Centro Português de Fotografia.

Nacional de Crédito do total de 427 000 contos.2 Deste montante correspondem 336 000 contos a financiamentos da Caixa, dos quais 119 000 sob a forma de empréstimos realizados a juro da ordem dos 4%, mediante garantia prestada pelo Fundo de Turismo e 91 000 correspondem a financiamentos feitos pelo próprio Fundo, sendo cerca de três quartos deste volume em empréstimos sem juro e o restante em empréstimos a juro inferior a 2% e em subsídios não reembolsáveis. E mais à frente, No plano nacional regista-se, como aprazimento, o crescente interesse que grupos financeiros especialmente idóneos manifestam pelo sector e, no plano da colaboração financeira internacional, abrem-se novas e amplas possibilidades. (...) No ano de 1964 a dotação orçamental do Fundo de Turismo, sobe de 30 000 para 50 000 contos e é de esperar que subam, em escala superior, os financiamentos da Caixa Nacional de Crédito.3

A década de 60 constitui, ao longo do século XX, o período que podemos designar por “década de Ouro” do turismo português. Após a segunda grande guerra, o despertar de novos mercados que resultava, quer da reabilitação político-administrativa dos países tradicionais, libertos das forças invasoras quer do surgimento de novos países, alvo de sucessivas descolonizações que fluíam com os ventos da História, acrescido de uma política de investimentos em áreas geográficas do planeta que visava a exploração de recursos naturais e, sobretudo, energéticos, a par da utilização das experiências da tecnologia bem sucedidas na esfera das indústrias militares, contribuía para as transformações que serviam de ponto de partida para uma nova estrutura da economia mundial. E o turismo reaparecia, ainda que de forma bastante tímida, no horizonte de muitos países, como uma

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panaceia em que muitos passaram a acreditar. Entre as exigências mais prementes dos trabalhadores por conta de terceiros, numa época em que as Centrais Sindicais se mostravam bastante ativas e demonstrando, por vezes, elevada dose de agressividade, contavam-se a ampliação dos períodos de férias e a sua pertinente remuneração, baseada no conceito de “férias pagas”, que já havia sido introduzido nos anos 30 e que servia plenamente os interesses das atividades turísticas que não pararam de crescer. Os governos entendiam que valia a pena apostar quer nos investimentos em infraestruturas que constituíssem o apoio de que necessitava a iniciativa privada, a qual via no turismo também uma forma de satisfazer a procura por parte de grupos sociais em fase de expansão quer no aumento da capacidade de emprego quer, ainda, no favorecimento de políticas de consumo. As indústrias da aeronáutica multiplicavam de forma impressionante a capacidade de transporte através de mais elevados índices de produtividade; os novos aviões duplicavam praticamente a velocidade de voo e quase duplicavam também a sua capacidade de transporte de passageiros e de carga. Por outro lado, aumentava simultaneamente e de forma imprevisível o parque automóvel. Finalmente, os especuladores primeiro e os empresários e investidores depois, encarregavam-se de descobrir, urbanizar, lotear, construir, vender e alugar complexos de alojamento nos mais aprazíveis locais do litoral, criando assim destinos populares para o gozo de férias e comercialização de unidades de residência secundária. Algumas estâncias turísticas que gozavam já de certo prestígio antes da guerra, viram-se confrontadas com o aparecimento e a concorrência de novas regiões situadas predominantemente no sul da Europa, junto do Mediterrâneo que, em breve, viriam a tornar-se destinos daquilo que podemos classificar como “turismo de massas”.

Para contrariar a degradação de velhos (ou envelhecidos) alojamentos e também a fraca qualidade de alguns dos novos complexos turísticos, os governos dos países receptores criaram sistemas de apoio e de incentivo destinados a financiar empreendimentos de qualidade mais elevada e a estimular uma dispersão geográfica mais racional dos equipamentos hoteleiros, por forma a contrariar assimetrias regionais ou a tentar evitar o aparecimento de fenómenos de monocultura. Entendia-se que as responsabilidades dos Estados não deveriam confinar-se à regulamentação e fiscalização das atividades privadas e que lhes competia igualmente criar mecanismos e instrumentos jurídicos, financeiros e administrativos que estimulassem os empresários, apoiando as suas iniciativas e premiando a sua capacidade criativa. Esta estratégia obteve pleno êxito ao longo da década em apreço, durante a qual se verificaram índices de crescimento tão impressionantes que, por exemplo, só em Portugal, o número de visitantes estrangeiros registou, entre 1960 e 1970, um aumento de cerca de 950%. É óbvio que para satisfazer tão substancial expansão da procura, foi necessário aproveitar todas as sinergias resultantes do potencial atrativo de certas regiões onde o impacte do turismo viria a sentir-se muito mais fortemente, como nos casos do Algarve e da Madeira, onde a falta de regulamentação apropriada facilitou atuações oportunistas e especuladoras de que se sofrem, ainda hoje, as consequências. A estabilidade interna, não obstante os problemas resultantes da necessidade de gerir algumas crises, derivadas de certa agitação social, permitiu o estabelecimento de níveis de confiança que promoveram excelentes oportunidades de negócio e novas formas de exploração das capacidades oferecidas nos meios de transporte e no alojamento, os dois pilares que constituem o binómio do fenómeno turístico.


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Desdobrável da Póvoa de Varzim (cerca de 1950).

Cartaz de propaganda turística a Nazaré, 1963, Centro Português de Fotografia.


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Cartaz de propaganda turĂ­stica a Portugal, 1964, Centro PortuguĂŞs de Fotografia.


Efetivamente foi nos anos 60 que se consolidaram os conceitos de “package tour” e “inclusive tour”; que se desenharam as grandes redes de exploração hoteleira; que se desenvolveram os primeiros passos de “franchising” na hotelaria e “self catering” que surgiram em força os sistemas de “free shop”, “tax free”, precursores da desregulamentação e liberalização do comércio internacional e do trânsito de pessoas e bens. Em meados da década e reconhecendo a importância que o turismo representava já para Portugal, decidiu o governo transformar a Direção dos Serviços de Turismo num Comissariado, com amplas atribuições e responsabilidades, bem como criar o Centro Nacional de Formação Turística e Hoteleira que, alguns anos mais tarde, passaria a Instituto responsável pela formação profissional dos trabalhadores das atividades turísticas, através da sua rede de escolas construídas em vários pontos do país. A par dos dois planos de fomento implementados em Portugal, cujo objectivo principal era modernizar a indústria, o turismo obteve da parte do governo uma atenção redobrada. Assim, a Lei n.º 2082 de 1956 definia as atribuições e competências do SNI como organismo nuclear, assegurava as funções de consulta do Conselho Nacional de Turismo, apresentava e delineava a nova figura das Regiões Turísticas, para além de instituir o Fundo de Turismo que representava um real motor de expansão da oferta hoteleira. No âmbito da mesma estratégia dinamizadora, procedia-se à regulamentação das atividades de agências de viagens, do jogo, do aluguer de automóveis sem condutor (rent-a-car) e dos parques de campismo. Na mesma época assistiu-se à normalização orgânica do SNI e das Casas de Portugal no estrangeiro. Em prol da abertura para o exterior, concretizava-se a ratificação da Convenção sobre Facilidades Aduaneiras a favor do Turismo, assinada pelo

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Cartaz de propaganda turística a Portugal, 1964, Centro Português de Fotografia.


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O património histórico é factor de desenvolvimento turístico.

governo português em Nova Iorque. O crescente volume de turistas espalhava-se por todo o território nacional, de tal modo que a necessidade de reestruturar os serviços oficiais se tornava uma prioridade. A Repartição, que até então existia, é elevada ao nível de Direção de Serviços, transformando-se pouco tempo depois, como já referido, em Comissariado do Turismo (1965) e em Direcção-Geral no ano de 1968. Novas perspectivas se avizinhavam para o turismo português que, pela primeira vez, era incluído num capítulo do Plano de Fomento, vigente entre 1965 e 1967. Ao turismo cabia a distinção de um valioso instrumento operacional que, mediante a obtenção de disponibilidade cambiais necessárias à liquidação das despesas com importação de bens e serviços, pode prestar um notável contributo para a manutenção da estabilidade financeira interna e da solvabilidade exterior da moeda nacional. O turismo afirmava-se em todas as frentes e no IV Plano de Fomento, iniciado em 1974, era definido como um sector estratégico de desenvolvimento socioeconómico do País durante o hexénio traçando-lhe os contornos, no sentido de um aumento gradual do saldo da balança turística, na atenuação dos equilíbrios regionais e no desenvolvimento do turismo social.


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Efetivamente foi nos anos 60 que se consolidaram os conceitos de “package tour” e “inclusive tour”; que se desenharam as grandes redes de exploração hoteleira; que se desenvolveram os primeiros passos de “franchising” na hotelaria e “self catering” que surgiram em força os sistemas de “free shop”, “tax free”, precursores da desregulamentação e liberalização do comércio internacional e do trânsito de pessoas e bens.


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