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Ideologia cristã do perdão

Ideologia cristã do perdão

Pra. Cristiane Mota

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Os dados sobre a violência contra a mulher não param de crescer nem de impressionar e, portanto, não saem da mídia. Repetidamente as organizações e casas de apoio a mulheres vítimas de violência apresentam informações signifi cativas quanto à religiosidade das mulheres vitimadas pela violência em que estas se declaram evangélicas e os supostos agressores, muitas vezes, frequentarem a mesma igreja.

Algumas vezes, recai sobre essa mulher a responsabilidade, por conta do medo de ser julgada pela comunidade evangélica, de não ser um exemplo de mulher de oração, de fé ou ainda um suposto escândalo no caso de uma denúncia. Indiretamente essa mulher sofre pressões emocionais, supervalorizando o que a comunidade evangélica irá pensar por estar denunciando seu companheiro ou algum familiar, sentindo-se culpada, como quem trai seu Pastor ou até mesmo o próprio Deus.

Esses abalos emocionais são embasados na compreensão de que denunciar seu suposto agressor, que é o uso do seu direito de sair do ciclo da violência, pode ser entendido como falta de fé, oração, perdão e fraqueza espiritual. A vergonha, o medo de expor o agressor, a dependência emocional e fi nanceira são fatores que, na Comunidade Evangélica, agregam à ideologia do perdão, fazendo a mulher acreditar que denunciar é algo desnecessário já que o perdão deve acontecer sempre.

O papel da igreja, assim como de qualquer grupo social, deve ser de proteção à vítima, e responsabilização do abusador/agressor no intuito de educar os homens. Assim, o papel da igreja é de suma importância. Além de discutir entre as mulheres o quão, através da Bíblia, a palavra de Deus é libertadora em relação à valorização da mulher (Eclesiastes 9:9).

Também se faz necessário debater o assunto da violência contra mulher no âmbito religioso, visto que ainda existe um tabu, e a negação desse assunto e também dessa realidade crescente, impossibilita o tratamento da situação na raiz do problema. A igreja, além do apoio espiritual dessa mulher, deve proporcionar ajuda emocional e meios dela conseguir emprego para sua subsistência que lhe permita uma proteção e autonomia fi nanceira maior. A igreja talvez não tenha estrutura para acolher a vítima, mas precisa saber do funcionamento da rede de atendimento à mulher em situação de violência, para assim poder ligar e encaminhar a mesma.

Tamar, Filha de Davi, moça formosa, foi violentada por seu irmão Amnom e ouviu do seu irmão Absalão: “CALA-TE MINHA IRMÃ, ELE É TEU IRMÃO.” 2 Samuel 13:20. É bem verdade que este silêncio solitário de Tamar foi vingado posteriormente de forma trágica, por seu irmão Absalão. Quantos Gritos estão sendo calados, diante dos nossos olhos, por causa da Ideologia Cristã do Perdão? Continuo crendo no perdão sem nunca deixar de crer na responsabilização.

(Artigo publicado na revista Mulher em Foco, edição n° 5, Maio de 2020.)

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