Canguru | RJ | Maio de 2017 | número 01

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www.canguruonline.com.br | mai 2017 | nº 01

Criando filhos no rio

E XE M P LAR G RAT U I TO PARA E SCO LAS PARCE I RAS

É preconceito, sim! Ainda hoje, mulheres PERDEM O EMPREGO POR SE TORNAREM MÃES

Até que ponto

PODEMOS CONFIAR NO

dr. Google?

Conheça a história POR TRÁS DO

Mundo Bita

DISCIPLINA

positiva

Saiba quais são os princípios e as estratégias que estão mudando as relações com os filhos – e que prometem amenizar as explosões emocionais e birras dos pequenos




4nesta edição

26

seções

51 52 54

Primeiras palavras www.canguruonline.com.br Missão Instagram Eles dizem cada coisa Canguru viu e curtiu Corrente do bem Mundo Kids Moda Comprinhas Para ler com seu filho, por Leo Cunha Viagens, modo de usar, por Luís Giffoni

Paz em família: Mateus, de 10 anos, e Lucas, de 5, vivem rotina de disciplina positiva dentro de casa

34

Nosso quintal Padecendo no Paraíso, por Bebel Soares e Tetê Carneiro Artigo, por Isabel Rey Madeira Artigo, por Bernardo Antonio Gonçalves Monteiro Crônica, por Cris Guerra

[2]

Sem justa causa: Fernanda Nascimento foi demitida após engravidar pela segunda vez e teve que se reerguer apesar do preconceito

Reportagens 24

Personalidade | Ícone dos anos 80, Daniel Azulay oferece oficinas de desenho no Rio e em Niterói

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Comportamento| Conheça os princípios da disciplina positiva

31 34 40

Inspiração | Proposta quer trazer Dia da Gratidão para as escolas brasileiras

42

Saúde | Até que ponto podemos confiar no Dr. Google?

44

[1]

44

Especial | Em pleno século XXI, mulheres ainda são dispensadas das empresas porque se tornaram mães Entretenimento | Com mais de 700 milhões de visualizações no YouTube, Mundo Bita não para de crescer

Estilo | Crianças cacheadinhas e crespas estão empoderadas

[3]

Fazendo a cabeça: Pollyana Farias, 7, se arrependeu de alisamento e aprendeu a valorizar o cabelo crespo

Nossa capa

LUCAS, de 5 anos, é filho de Juliana Cidade Cardoso e Marcelo Augusto Candido Cardoso. Foto: Ricardo Borges

FOTOS: [1] RICARDO BORGES; [2] MOACYR LOPES JUNIOR/MALAGUETA; [3] GUSTAVO ANDRADE

6 10 14 15 16 17 18 20 22 47 48 49 50



FOTO: GUSTAVO ANDRADE

4primeiras palavras

Criando filhos melhores para o mundo Ivana e os filhos Pedro e Gabriel Meus dois filhos já estão grandinhos. Pedro fez 13 anos, Gabriel já está às vésperas dos 9. Ser mãe desses dois meninos tem sido uma aventura para lá de radical, uma montanha-russa de emoções. Felicidade, orgulho, angústia, medo. Tudo junto e misturado, o tempo todo. Eles são inspiração diária para o meu trabalho à frente da Canguru, essa plataforma de conteúdo sobre primeira infância, voltada para pais e educadores, que foi lançada em outubro de 2015. Tão maravilhoso quanto assistir ao meu Pepê e ao meu Biel virando rapazinhos é testemunhar a Canguru crescendo, atingindo um número cada vez maior de leitores. Até abril, nossa atuação era restrita a Belo Horizonte, atingindo 25 000 famílias e 150 escolas de educação infantil. Neste mês, estamos dando um imenso salto: aterrissamos no Rio de Janeiro e em São Paulo, com a missão de levar nossa mensagem a um total de 100 000 famílias e mais de 500 estabelecimentos de ensino nas três cidades. Estou me sentindo, mais uma vez, como uma mulher à porta de saída da maternidade com um recém-nascido nos braços. Cheia de incertezas, inseguranças. O que vai ser daqui para frente? Será que as famílias cariocas e paulistanas vão acolher nossa proposta com tanto carinho quanto as belo-horizontinas? Como uma mãe que está sempre pronta a fazer o que for preciso pelo filho, estou cheia de disposição para trabalhar duro e merecer a confiança da nova audiência. A Canguru é muito mais do que essa revista impressa que você tem nas mãos. É uma plataforma que reúne diversos canais gratuitos de comunicação on-line e off-line. Leia a revista, navegue no nosso site, siga nossas redes sociais, ouça nossos podcasts, assista aos nossos vídeos, participe das nossas promoções, frequente nossos eventos. Tenho certeza de que você encontrará, em algum desses espaços, inspiração para cumprir o que acredito ser a principal missão dos pais: criar filhos melhores para o mundo. Afinal, são os meus filhos e os seus filhos que construirão o futuro. Se pudermos fazer deles adultos melhores do que nós mesmos temos sido, aí sim daremos uma contribuição grandiosa para que este seja um mundo melhor para todos. Concorda comigo? Discorda? Escreva para mim! Sugestões e críticas são sempre muito bem-vindas.

Ivana Moreira, DIRETORA DE CONTEÚDO ivana@canguruonline.com.br

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Anúncio Menino - 001701 - JUNHO/2015

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DIRETOR EDITORIAL: Eduardo Ferrari DIRETORA DE PROJETOS ESPECIAIS: Ivana Moreira

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A Canguru é uma publicação mensal da Scrittore Comunicação e Editora Ltda. CNPJ 12243254/0001-10 (Rua Alberto Bressane, 223. Belo Horizonte/MG. CEP 30240-470)

CONSELHO EDITORIAL Eduardo Ferrari, Guilherme Sucena, Ivana Moreira, Márcio Patrus e Suellen Moura DIRETORA DE CONTEÚDO Ivana Moreira (ivana@canguruonline.com.br) EDITORA-CHEFE Cristina Moreno de Castro (cristina@canguruonline.com.br) EDITORAS Luciana Ackermann (luciana@canguruonline.com.br) e Sabrina Abreu (sabrina@canguruonline.com.br) REPÓRTERES Rafaela Matias (rafaela@canguruonline.com.br) e Verônica Fraidenraich (veronica@canguruonline.com.br) ESTAGIÁRIAS Catarina Ferreira (catarina@canguruonline.com.br), Daniele Franco (daniele@canguruonline.com.br) e Gabriela Willer (gabrielawiller@canguruonline.com.br) EDITORA DE ARTE Aline Usagi (aline@canguruonline.com.br) PROJETO GRÁFICO Chris Castilho (Mondana:IB) (www.mondana.net) EDITORA DA TV CANGURU Juliana Sodré (juliana@canguruonline.com.br) REVISORA Shirley Souza Sodré COLABORADORES DESTA EDIÇÃO Cris Guerra, Leo Cunha, Luís Giffoni e Isabella Grossi FOTÓGRAFOS Gustavo Andrade, Moacyr Lopes Junior/Malagueta e Ricardo Borges GERENTE DE COMUNICAÇÃO E MARKETING Camila Capone (camila@canguruonline.com.br) ESTAGIÁRIO DE MARKETING Filipe Cerezo (filipe@canguruonline.com.br) GERENTE ADMINISTRATIVO E FINANCEIRO Roberto Ferrari (roberto@canguruonline.com.br) DIRETORA COMERCIAL Suellen Moura (suellen@canguruonline.com.br) EQUIPE COMERCIAL Janna Souza (janna@canguruonline.com.br), Laura Ramos (laura@canguruonline.com.br), Marcelo Moraes (marcelo@canguruonline.com.br), Simone Dianni (simone@canguruonline.com.br), Luiz Póvoa (steve@canguruonline.com.br) e Vera Belini (vera@canguruonline.com.br) DIRETOR DE NOVOS NEGÓCIOS Guilherme Sucena (guilhermesucena@canguruonline.com.br) ATENDIMENTO A LEITORES E ESCOLAS PARCEIRAS Gabriela Linhares (gabriela@canguruonline.com.br)

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TIRAGEM TOTAL: 100.000 exemplares (BH: 25.000 exemplares, Rio: 25.000 exemplares, SP: 50.000 exemplares) IMPRESSÃO: O Lutador DISTRIBUIÇÃO: SM Log* * Distribuição gratuita para as Escolas Parceiras Canguru, uma rede de instituições particulares de educação infantil que se comprometem a enviar a revista aos pais de seus alunos na mochila dos estudantes. A relação das escolas parceiras em Belo Horizonte, Rio de Janeiro e São Paulo pode ser consultada por anunciantes.

Artigos assinados são de inteira responsabilidade dos autores e não representam, necessariamente, a opinião da revista e de seus responsáveis.

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Tv Canguru FOTO: GUSTAVO ANDRADE

Novidades na tela Uma TV Canguru reformulada estará no ar neste mês de maio, cheia de surpresas e estreias QUER OUVIR A opinião de especialistas renomados sobre temas relacionados à criação dos filhos? Assista a Canguru Entrevista, o programa semanal que será apresentado pela jornalista Ivana Moreira na TV Canguru, todas as quintas, a partir do dia 18. Quer dicas de moda, comportamento e outros assuntos para ser uma mamãe cheia de estilo e autoestima? Não perca 50 Crises, com nossa colunista Cris Guerra, todas as terças, a partir do dia 9. Assine nosso canal no YouTube (TV Canguru) e acompanhe, além dos programas semanais, reportagens especiais e bastidores de matérias da revista.

3° Seminário Internacional de Mães

Acompanhe a cobertura ao vivo Reconhecido como o maior evento de maternidade do país, o Seminário Internacional de Mães tem a Canguru entre os organizadores e a diretora de conteúdo, Ivana Moreira, como moderadora da sua terceira edição, no dia 6 de maio, em São Paulo. Acesse www.canguruonline.com.br e confira nossa cobertura especial, com entrevistas dos palestrantes (entre eles, o médico Drauzio Varella) e depoimentos das participantes.

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[2]

Promoção Dia das Mães

Uma tarde de compras com Cris Guerra Participe da promoção que pode dar uma renovada no seu guarda-roupa Moda pode ser um jeito de acentuar sua individualidade (e não de uniformizar pessoas). Pode ser simplesmente um jeito bonito de viver. É o que diz nossa colunista Cris Guerra, autora do livro Moda Intuitiva. No mês das mães, uma de nossas leitoras vai ganhar de presente a oportunidade de descobrir o próprio estilo com a ajuda da Cris. Criadora do primeiro blog de look do dia do país (o Hoje Vou Assim), ela dedicará uma tarde de junho a escolher roupas para uma de nossas leitoras. E o melhor: quem vai pagar a conta é a Canguru. Uma oportunidade e tanto para renovar o guarda-roupa. Acesse www.canguruonline. com.br e confira as regras para participar desta promoção. Os papais também podem se inscrever! Mas, se um deles for sorteado, terá de indicar uma mamãe para ser beneficiada. Porque o mês é delas, não é?

Evento

Vem aí

Aos sete meses de gravidez, a publicitária e escritora Cris Guerra ficou viúva. Viveu, a um só tempo, a maior das dores (a de perder o amor de sua vida) e a maior das alegrias (receber o filho tão desejado em seus braços). A experiência foi o ponto de partida para uma revolução íntima que a transformou em escritora e palestrante. No dia 22 (segunda-feira), a Canguru receberá mães blogueiras e líderes de grupos de mães do Rio para um café da manhã com Cris Guerra, que apresentará sua palestra “A Arte de Ser Mãe”. Se quiser participar do evento, peça seu convite para camila@canguruonline.com.br. As vagas são limitadas.

FOTOS: [1] GUSTAVO ANDRAD, [2] HÉLIO MONTEIRO, [3] DIVULGAÇÃO

App da Canguru Encontro de mães blogueiras será lançado em junho Fique atento! A partir de junho será possível baixar o aplicativo da Canguru, nas versões Android e iOS. Além de ter acesso a conteúdo exclusivo e sistemas de filtros de matérias, será possível participar de promoções como sorteio de convites para filmes, peças de teatro e parques. E ainda fazer uma busca avançada, com sistema de geolocalização, para encontrar os melhores programas da cidade para as crianças.

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www.canguruonline.com.br

Todos os meses, a Canguru promove seminários gratuitos sobre temas relacionados à educação dos filhos. Fique atento à programação dos próximos eventos.

Palestra

Como estimular o potencial empreendedor do seu filho? Fernando Dolabela é o convidado do Encontro Canguru de maio Autor do best-seller O Segredo de Luísa e um dos mais respeitados estudiosos de empreendedorismo no Brasil, Fernando Dolabela diz que toda criança nasce com potencial empreendedor — não o de ser dono do próprio negócio, mas, o mais importante, de pensar fora da caixa. São os pais (e os educadores) que acabam por tolher a crença de que é possível realizar os próprios sonhos. O professor fará a palestra “Como estimular o potencial empreendedor do seu filho”, no Encontro Canguru

[1]

[2]

de maio, que será realizado no dia 20 (sábado), às 10h30, no Nex (Ladeira da Glória, 26, Glória). O evento é gratuito, mas as vagas são limitadas. Faça sua inscrição no www.canguruonline.com.br.

Pluralidade

Site ganha novos blogueiros [1]

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Nosso time de blogueiros cresceu neste mês de maio! Direto de Orlando, Silvia Cervi vai compartilhar tudo sobre a terra da magia — não só sobre a Disney, mas também outros passeios que as famílias com crianças pequenas podem fazer por lá! Mamãe de primeira viagem, a DJ Carol Ramiro vai compartilhar a experiência de educar a pequena Malena junto com o papai, Jesus Luz. Já a blogueira Vanessa Ribeiro, criadora do Programa Mamãe de Sucesso, abordará as dores e os prazeres que envolvem o empreendedorismo materno. E o advogado Bernardo Monteiro escreverá sobre os direitos das crianças. Fique por dentro dos novos posts em www.canguruonline.com.br.


apresenta

Uma história que merece ser contada Projeto que doa cadeiras de rodas é tema de livro publicado por meio de financiamento coletivo Três anos, 155 pessoas beneficiadas e milhares de cidadãos engajados em uma corrente do bem. Assim é possível resumir a história do Lacre do Bem, um projeto criado por Julia Macedo quando ela tinha apenas 9 anos. Mesmo tão nova, Julia descobriu uma forma de contribuir para um mundo mais solidário. Tudo começou quando uma instituição que cuida de crianças com paralisia cerebral presenteou a família da menina em agradecimento a uma doação. Esse gesto a tocou profundamente e despertou nela a vontade de ajudar. Foi aí que Julia descobriu a possibilidade de juntar lacres de latas de alumínio para comprar cadeiras de rodas e começou a recolher todos os lacres que encontrava, contagiando outras pessoas a seguir seu exemplo. PROJETO COLETIVO Hoje, o Lacre do Bem já chegou à marca de mais de 16 toneladas de lacres reciclados e 155 cadeiras de rodas doadas. Esta história já rendeu até um livro, que será lançado em 11 de maio. A obra, intitulada Julia do Lacre do Bem, é fruto de um crowdfunding — ou financiamento coletivo — e leva o selo “Pedagogicamente Responsável”. A chancela é concedida pela Associação Educore a conteúdos que despertem nas crianças a vontade de fazer o bem e a segurança de fazer o que é certo.

Após o lançamento, o livro Julia do Lacre do Bem poderá ser adquirido no site Infancia.com.br. Toda a renda obtida com a venda da obra será revertida para o projeto. Além disso, a cada livro vendido, outro será doado a instituições voltadas à infância e à juventude.

Para mais informações, acesse o site: www.educore.org.br MAIO 2017 .

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Criança sabe desenhar canguru? Claro que sabe! Veja só o capricho destas artes que chegaram até nós pelo Instagram!

João Paulo, 5, teve sua arte publicada na conta de @bello5672. Parabéns!

As irmãs Letícia, de 6 anos, e Gabriela, de 8, fizeram estas belezuras, postadas no Instagram de @claudia_antonini_rizzuto. E é claro que a mamãe entrou na brincadeira também! “Adoramos desenhar juntas!”, diz Cláudia.

Isabela Santos, de 9 anos, fez o desenho junto com a vovó Zélia. Clique de @leandro_malacco.

Próxima missão: Preparados para o inverno O inverno começa em 21 de junho. Seu filhote já está devidamente preparado para o friozinho? Faça uma foto de sua criança agasalhadinha, vestindo algum acessório típico da moda de inverno (gorro, pantufa, luvas, cachecol etc.) ou se aquecendo numa fogueira ou lareira! Ao postar a foto no Instagram, marque a hashtag #canguruonline para a gente escolher as imagens que vão sair na revista de junho, viu?

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FOTOS: REPRODUÇÃO INSTAGRAM

E tem mais em nossas redes sociais, viu?


POR Rafaela

Matias

Não tem p o ovo de roblema se P caro. Na áscoa está minha ca sa a gente nã o coelho tr compra, o az pra ge nte!

CECÍLIA, 6 anos, filha de Carolina M.M. Oliveira Lucchesi e Rodrigo Lucchesi.

Papai, eu sou o filho primogênito ou um irmãogênito?

Mamãe, seus cabelos são da cor do céu quando está de noite.

Uber lâ a cid ndia é a de m fácil pra c ais ha Uber mar !

Mamã e, des cobri p você c or q hama a vovó ue mãe, é d porqu só min e ela n e ha vov ão é ó, e é sua mãe, ig la também ual vo cê é minha mãe.

MIGUEL, 5 anos, filho de Juliana Fagundes Ferreira e José Roberto Ferreira, após refletir um pouco sobre o nascimento de seu primeiro irmão, previsto para o fim de abril. FOTOS: ARQUIVO PESSOAL

GUILHERME AUGUSTO, 4 anos, filho de Mirian Prata do Nascimento Barros e Leonardo Augusto do Val Barros.

WAGNER JR., 5 anos, filho de Andréa Vaz e Wagner Oliveira.

GIOVANA, 4 anos, filha de Alessandra Rosa Petrassi e Wagner Petrassi.

Se seu filho também diz pérolas, envie a frase para o e-mail redacao@canguruonline.com.br.

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EDIÇÃO Camila

Capone

O QUE ESTÁ ROLANDO DE ÚTIL, DIVERTIDO OU CURIOSO NA WEB E NAS REDES SOCIAIS

Cordel Animado Pequenos bichinhos Mais fofo do que bichinhos, só bebês vestidos de bichinhos. Morra de amores por essas fotos.

[1]

Cordel para crianças? Isso mesmo! Essa é a proposta do canal do YouTube Cordel Animado. Uma mistura de cordéis infantis com muita música e sonoplastia. Uma delícia de projeto, para aproximar as crianças do universo rico da literatura de cordel.

Conheça esse projeto usando nosso QR Code Canguru ou acessando o link: http://bit.ly/CordelAnimado

Use nosso QR Code ou acesse: http://bit.ly/ PequenosBichinhos

Brincando com sombras Um patinho, um coelhinho, um cachorrinho. Quem nunca brincou de fazer animais com as sombras? Assista a este vídeo e divirta-se com seu filho criando histórias com personagens animados na parede. Use o nosso QR Code ou acesse: http://bit.ly/BrincandoDeSombras

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IMAGENS: [1] REPRODUÇÃO FACEBOOK; [2] REPRODUÇÃO YOUTUBE; [3] REPRODUÇÃO FACEBOOK

[2]


POR Luciana

Ackermann e Gabriela Willer

Instrumentos que transformam A premiada ORQUESTRA DE CORDAS DA GROTA (OCG) promove, há quase 22 anos, uma revolução nada silenciosa na vida de crianças, adolescentes e jovens da Grota do Surucucu, em Niterói. Flauta doce, violino, viola, violoncelo e contrabaixo são alguns dos instrumentos usados para despertar novas perspectivas e caminhos em alunos de escolas públicas e moradores de periferia, que acessam, além das aulas tradicionais de música clássica, oficinas livres de percussão, cavaquinho e violão. Tudo realizado no Espaço Cultural da Grota (Rua Vereador Otto Bastos, 23, Niterói). Hoje, a orquestra conta com 1000

alunos, que são orientados por trinta professores, entre musicistas, voluntários e ex-alunos do próprio projeto. Além de Niterói, são contempladas comunidades de municípios vizinhos como São Gonçalo, Itaboraí, Maricá e Nova Friburgo. Um dos grandes desafios é a recorrente dificuldade financeira e a necessidade de doações. Para ajudar, é possível enviar contribuições anuais e mensais, com dedução no Imposto de Renda, ou adquirir o CD da orquestra e o livro, que retrata com detalhes o projeto. Informações pelos telefones 9.9178-0001 e 9.9463-7203, ou pela página do Espaço Cultural da Grota no Facebook.

EM ALGUM MOMENTO da vida já ouvimos dizer: “A união faz a força”, ditado popular que tem tudo a ver com a organização não governamental TETO, que busca combater a extrema pobreza em favelas, especialmente com a construção de casas. Com ajuda de voluntários e moradores, a ONG promove ações para a melhoria de comunidades precárias, realizando oficina de leitura para crianças e formando líderes comunitários. As equipes são capazes de construir casas de emergência para os moradores em um único fim de semana. A TETO foi criada em 1997 no Chile. De lá para cá, faz-se presente em dezenove países da América Latina e do Caribe. No Brasil, existe há mais de dez anos. Para saber como doar ou se tornar voluntário entre no site www.techo.org/paises/brasil. =

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FOTO: DIVULGAÇÃO

Construir, sonhar e viver


POR Rafaela

35%

é o porcentual de crescimento do cérebro nos primeiros 1 000 DIAS do bebê, que vai da concepção até os 2 anos de idade.

Papá saudável para o bebê MAMÃES! PAPAIS! Vejam só que boa notícia! O Senac acaba de lançar um curso a distância que ensina a preparar comidinhas saudáveis para os bebês. As aulas do “Preparo de Papinhas” são divididas em quatro módulos, com duração to[1] tal de vinte horas, e dão dicas para preparar refeições balanceadas para crianças entre 6 e 12 meses. As videoaulas contam com a participação de nutricionistas, que oferecem detalhes sobre o preparo e a transição de alimentos pastosos para sólidos. Para se inscrever, acesse www.ead.senac.br/cursos-livres. O valor é R$ 82,30.

Matias

Uma ajuda para enxergar o mundo Segundo a Organização Mundial da Saúde, existem cerca de 1,4 milhão de crianças com deficiência visual no mundo. O dado é preocupante já que, segundo a Sociedade Mineira de Pediatria, 85% do relacionamento de uma criança com o ambiente é feito por meio desse sentido. Neste aspecto, os óculos de grau as[2] sumem um papel importante. Alguns sintomas de que seu pequeno pode fazer parte do grupo de 15% das crianças que precisam usar óculos: ›› Dores de cabeça ou mal-estar durante ou depois de um esforço visual (leitura, aula etc.); ›› Franzir a testa para olhar a distância; ›› Aproximar-se muito de livros ou cadernos para ler; ›› Desinteresse por leitura.

(Bem) pequenos aprendizes conteúdos de português e matemática. A expectativa é que a Base Nacional Comum Curricular chegue às salas de aula a partir de 2019. Veja o que será exigido:

[3]

A ONDA DE APRENDIZADO precoce que se alastra pelas escolas particulares parece ter chegado também à rede pública de ensino. Novas definições, apresentadas pelo MEC na primeira semana de abril, determinam que as crianças de todo o país tenham acesso desde cedo a

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2º ano do ensino fundamental (7 anos): além de já saberem ler e escrever, os estudantes aprenderão conteúdos de estatística e probabilidade. Eles devem ser capazes de coletar, classificar e representar dados em tabelas simples e em gráficos de colunas, e classificar eventos cotidianos como pouco ou muito prováveis, improváveis e impossíveis.

FOTOS: [1, 2, 3] PIXABAY

Educação infantil (até os 5 anos): devem ser desenvolvidas "a oralidade e a escrita". Caberá às creches garantir que as crianças até 1 ano e 6 meses reconheçam seu nome quando chamadas e demonstrem interesse ao ouvir a leitura de poemas e a apresentação de músicas.


eu já fui

criança Marcelo Jeneci

TODOS OS PAIS se preocupam quando os pequenos têm a temida febre. Veja algumas dicas da médica Mariane Franco, presidente do Departamento de Pediatria Ambulatorial da Sociedade Brasileira de Pediatria (SBP), para lidar com o problema sem pânico e saber quando é preciso procurar um especialista.

#1 Fique atento a sintomas como prostração e sonolência. São indicativos de febre;

#2 Caso a criança esteja com febre (temperatura acima de 37,5°C), dê um banho com água morna;

#3 Se a temperatura estiver em torno de 37,8°C, ofereça o antitérmico de rotina para prevenir a elevação da temperatura – com a dosagem indicada pelo pediatra;

#4 Se a criança já teve convulsão febril, é possível que o quadro se repita. Não se apavore: elas são benignas e não causam danos neurológicos se ocorrerem entre os 6 meses e os 6 anos da criança;

#5 A princípio, não existe restrição alimentar quando a febre se manifesta isoladamente;

#6 Se a febre não ceder em até cinco dias ou se aumentar após 48 horas, é necessário atendimento pediátrico.

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FOTOS: REPRODUÇÃO / INSTAGRAM.

Deu febre! E agora?

Ele já fez turnês mundiais e tocou com alguns dos maiores nomes da música brasileira, como Arnaldo Antunes, Vanessa da Mata e Zélia Duncan. Mesmo assim, suas canções ainda são um pouco mais conhecidas que seu rosto. Talvez pelo jeito tímido e reservado que carrega do menino nascido em 1982, na Cohab Juscelino, em Guaianases, Zona Leste de São Paulo. Criado pela mãe, paulista, e pelo pai, pernambucano, Jeneci aprendeu a tocar sanfona bem pequeno e cresceu cercado por músicos. O pai, Manoel Jeneci, era famoso entre os sanfoneiros locais por ter criado um sistema de captação de som para o instrumento e não se cansava de mostrar aos amigos os talentos do filho do meio. Apesar do pai sanfoneiro, Jeneci gostava mesmo era de tocar teclado e sua rotina se dividia entre ir à escola, praticar o instrumento e frequentar a igreja evangélica duas vezes por semana, ao lado da mãe. Nas férias, o passeio era na casa dos avós paternos, em Sairé, no interior de Pernambuco — local escolhido para gravar o clipe da música Felicidade. Nostálgico, Marcelo já declarou que grande parte de suas músicas é uma tentativa de voltar para casa, retornar à infância, mesmo que de forma inconsciente. Orgulhosa, a família Jeneci faz questão de se reunir periodicamente para ouvir as novas canções do artista, dar palpites sobre os acordes e, claro, elogiar o grande compositor que ele se tornou.

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4moda

Preparados

para o

inverno

No dia 21 de junho começa oficialmente o inverno brasileiro, mas as temperaturas baixas não esperaram a estação mais fria do ano para dar as boas-vindas. E é um charme usar roupinhas com a cara dessa estação, não é mesmo? Vejam como ficou uma graça Larissa Almeida Noronha, de 7 anos, com as peças da loja Vila Mells. POR Rafaela

Matias

[1]

GORRO, R$ 49,90 Vila Mells www.vilamells.com.br

COLETE FEMININO, R$ 155,99 Carinhoso www.carinhosokids.com.br

FOTOS: DIVULGAÇÃO; [1] GUSTAVO ANDRADE.

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CACHECOL, R$ 99,00 Lilica Ripilica www.lilicaetigor.com Preços pesquisados em abril de 2017. A Canguru não se responsabiliza pela alteração de preços ou pela falta de produtos. Imagens ilustrativas.

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Para a mamãe, com carinho Além de um abraço bem apertado e um “eu te amo” verdadeiro, elas merecem ganhar uma lembrança no segundo domingo de maio, não é mesmo? Veja algumas sugestões de presentes criativos! CANECA

25,00

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69,00

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R$

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PORTA-RETRATO R$

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FOTOS: DIVULGAÇÃO

PINGENTE



4Personalidade

O criador de

sonhos

Prestes a completar 70 anos, Daniel Azulay, ícone dos anos 80, continua povoando o imaginário das crianças, com oficinas de desenho no Rio e em Niterói POR Luciana

Ackermann

SE VOCÊ PASSOU dos 30 anos, certamente conhece a Turma do Lambe Lambe-Lambe, formada, en entre outros, pelo professor Pirajá, a Xicória, a Damiana e a vaquinha Gilda. Quem nunca tentou seguir os traços que Daniel Azulay ensinava na tevê? Ou chegou a fazer, com itens simples e caseiros, um daqueles brinquedinhos que Azulay construía com a maior facilidade, muito antes de o termo reciclagem aparecer na vida dos brasileiros? Por dez anos, Azulay esteve à frente de programas infantis, abrindo um mundo de fantasias e possibilidades para os pequenos. Primeiro, na TVE, depois, na Bandeirantes. Foi a partir das recorrentes cartas que recebia de pais e mães, querendo saber se ele tinha ou indicava algum curso semelhante ao que apresentava na telinha, que o multiartista mergulhou no mundo dos negócios e desenvolveu a Oficina de Desenho Daniel Azulay, que existe há 22 anos, em sistema de franquias. Atualmente, a oficina funciona em cinco bairros do Rio de Janeiro: Largo do Machado, Ipanema, Tijuca, Vila da Penha e no recém-inaugurado UpTown Barra. Todos os professores passam por capacitação e treinamento do método desenvolvido pelo próprio Azulay, que se faz presente nas aulas por meio de material audiovisual destindo aos alunos já no momento

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de boas-vindas. Nos vídeos, Azulay ensina, por exemplo, a técnica de desenhar rostos. E, para incrementar a lição, ele usa, além do papel e da caneta piloto, um balão de ar, mostrando também como se faz um perfil. Vinte temas, nomeados de alfabeto visual, compõem o curso. O fundo do mar e os dinossauros são os preferidos da garotada. Enquanto os vídeos são exibidos na sala de aula, a "amiga desenhista", jeito carinhoso com que Azulay chama as professoras, atende a cada um dos alunos, complementando as explicações. "Eu quis oferecer algo diferente, a oficina é um espaço de sonho. Não tem certo ou errado, nem desenho feio ou bonito. Não usamos lápis nem borracha, mas caneta piloto, para a criança não ficar preocupada em apagar os erros”, diz Azulay, que complementa: “Ao fazer do jeito dela, trabalha a confiança. O menino introvertido, por exemplo, precisa do desenho para preencher o espaço. E se o faz muito pequeno, a gente pede para fazê-lo grande. O desenho convive com o universo de representação. O herói que ele desenha é aquele que ele quer ser”. Os módulos vão do ini-


FOTO: RICARDO BORGES

O multiartista em seu ambiente: Daniel Azulay estourou nos anos 80, mas ainda hoje leva arte a crianças e adultos

ciante, a partir dos 5 anos, ao avançado. A cada fim de ano, há sempre uma exposição conjunta com os desenhos dos alunos de todas as unidades e faixas etárias. Em 2016, a exposição foi sobre os 100 anos do samba, realizada no Instituto de Arquitetos do Brasil (IAB). Entre as opções das oficinas estão desenho artístico, história em quadrinhos, mangá e mangazinho, pintura em tela e até o preparatório para teste de habilidade específica (THE) para vestibulandos das áreas de arquitetura e urbanismo, desenho industrial, artes plásticas etc. Isso sem falar nos cursos de férias. Para o carioca autoditada, ao desenhar, a criança adquire concentração, coordenação motora, aguça a criatividade e a curiosidade, ajudando em sua capacidade de assimilar conhecimentos. Também fortalece a autoestima a partir do estímulo afetivo e pessoal da descoberta. “O desenho aproxima a criança do foco, fixa a atenção, em especial nos dias de hoje, diante do excesso de informação e estímulos, tornando comum a dispersão. Faz com que os pequenos passem a lidar de forma harmoniosa com o seu interior e exterior. Rabis-

cando, trabalham o diálogo mesmo antes de saber falar”, resume o artista, que amava desenhar com os dedos em carros empoeirados e nas coberturas de bolos. Aos 13 anos, fez cursos de desenho por correspondência. Anos mais tarde, formou-se em direito para agradar ao pai, mas nunca deixou os traços de lado. Trabalhou como ilustrador e, em 1971, criou os primeiros personagens da Turma do Lambe-Lambe, passando a publicar tirinhas e cartuns nos jornais Correio da Manhã, Última Hora e Jornal do Brasil. Além das oficinas, o artista vem dando os primeiros passos em seu canal no YouTube e reformulando o projeto social Crescer com Arte, que já atendeu crianças e adolescentes da Associação Beneficente São Martinho e do Instituto Nacional do Câncer. Azulay é categórico: “desenhar na infância é fundamental, porque permite o desenvolvimento do universo de representação e a aglutinação do processo cognitivo. A criança desenha o que sente, o que pensa, o que sabe, o que aprende. Explica uma história com um desenho. Criança que não desenha passa a infância em branco.” =

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[1]

4comportamento

Educação com

conexão

Nem rígida nem permissiva, a disciplina positiva traz princípios e estratégias que ajudam a estreitar e aprimorar as relações entre a família POR Verônica Fraidenraich POR

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Nova atitude: Maria Luiza, de 4 anos, definiu como meta não mais chorar na hora de ir à aula


FOTO: [1] GUSTAVO ANDRADE, [2] MOACYR LOPES JUNIOR/MALAGUETA, [3] RICARDO BORGES

TER DE IR à escola todos os dias da semana nem sempre é visto com bons olhos pelas crianças. Sono, vontade de ficar em casa brincando ou junto com o irmão são alguns dos motivos que levam os pequenos a reclamar dessa rotina. Com Maria Luiza, 4 anos, não era diferente. Não raro, ela chorava e resistia quando tinha de se arrumar para sair. Até que, na primeira reunião familiar promovida pela mãe — a pediatra mineira Juliana Ribeiro de Melo Franco, 44 anos —, a criança decidiu mudar de comportamento. Maria Luiza definiu como meta não mais chorar na hora de ir à aula. E conseguiu cumprir a promessa. Depois, feliz com o feito, quis contar na escola que amava aquele lugar — o que o fez junto com a mãe. Isso aconteceu há nove meses, quando a pediatra passou a usar em casa a disciplina positiva, uma abordagem pedagógica baseada em respeito mútuo e cooperação, que visa a ajudar os pais na educação dos filhos. Considerada um meio-termo entre a forma rígida e a permissiva de educar, tal proposta defende a liberdade com ordem — os pais dão limites aos filhos, porém, sempre que possível, com opções de escolhas — que demonstrem respeito por todos. A abordagem foi criada há mais de trinta anos pela americana Jane Nelsen, uma terapeuta de casais e famílias da Califórnia, que é doutora em educação, mãe de sete filhos e avó de dezoito netos. Segundo Jane, a chave do programa é a não punição. “A disciplina positiva propõe tratar as crianças com dignidade e respeito, usar o encorajamento para que desenvolvam o sentimento de pertencimento e a noção da importância de ensinar a elas habilidades para que se sintam capazes de contribuir em casa e com a sociedade”, disse a terapeuta por e-mail a Canguru (leia ao lado a entrevista com a autora). Jane e diversos coautores já escreveram dezoito livros sobre o assunto, dois deles traduzidos no Brasil pela Editora Manole — Disciplina Positiva, em 2015, e Disciplina Positiva em Sala de Aula, no mês passado. 4

5paraperguntas Jane Nelsen Em entrevista à Canguru, a terapeuta norte-americana Jane Nelsen, criadora da disciplina positiva, fala a seguir sobre critérios da abordagem, punição e desafios para os pais

Para quem nunca usou a disciplina positiva, qual o maior desafio? Ajudar as pessoas a entender que, mesmo que a punição e as recompensas funcionem a curto prazo, elas não ensinam os valores sociais nem as habilidades de vida de que as crianças necessitam a longo prazo para se tornarem membros bemsucedidos da sociedade. Levando em conta que a disciplina positiva exige tempo para a prática, como pais que passam poucas horas por dia com seus filhos podem usar o programa com sucesso? A qualidade do tempo é tão importante quanto a sua quantidade. Crianças podem aprender a se sentir capazes e conectadas em poucas horas por dia. Por que a educação com punição é uma prática tão comum? E como a disciplina positiva sugere substituí-la? Para muitos pais e professores o pensamento funciona, mes mo que haja um custo a longo prazo. Várias crianças que são punidas se tornam rebeldes ou complacentes. A disciplina positiva ensina ferramentas que são mais eficazes a curto e longo prazo. Quando os pais e professores aprendem (e realmente entendem) isso, eles ficam felizes em deixar as punições de lado. Desde que a disciplina positiva surgiu, há mais de 30 anos, a sociedade mudou muito, assim como o comportamento das pessoas. Como a abordagem faz para se manter atual nos dias de hoje? O fato é que todas as pessoas, inclusive as crianças, querem ser tratadas com dignidade e respeito, bem como aprender as habilidades que as ajudarão a ser bem-sucedidas na vida. Há dados sobre quantas pessoas usam a disciplina positiva no Brasil e no mundo? Eu não sei bem ao certo. A disciplina positiva tem crescido por todo o mundo. Acabou de acontecer a primeira conferência sobre o tema na Europa, em Barcelona, com 130 treinadores certificados, de 24 países. Em maio, a China fará a quinta conferência a respeito do assunto. E no último evento, nos Estados Unidos,º havia representantes de dezenove países.

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Os adolescentes, os primeiros três anos de vida e os pais solteiros são o alvo de algumas das outras obras da série.

Ferramentas práticas Baseada no trabalho de dois psiquiatras vienenses – Alfred Adler (1870-1937) e Rudolf Dreikurs (18971972), essa maneira de educar não apresenta um passo a passo nem uma fórmula pronta, mas sim critérios e ferramentas práticos para as situações mais comuns que a criança enfrenta segundo sua faixa etária — como as explosões emocionais, entre 2 e 3 anos. No livro Disciplina Positiva, Jane Nelsen afirma que, à medida que os pais se aprofundam nos princípios básicos, as aplicações se tornam mais fáceis. Ela orienta para que as pessoas tentem um método de cada vez. “Use apenas o que fizer sentido para você.” Entre as várias ferramentas disponíveis estão envolver as crianças na definição de limites, focar nas soluções e promover reuniões familiares (leia mais sobre as ferramentas no quadro no final do texto). Na casa da pediatra Juliana, os encontros ocorrem às sextasfeiras, com a participação do marido — o ginecologista Júnio Ribeiro, 44 anos — e dos filhos, Rafael, 15 anos, João Pedro, 13 anos, e Maria Luiza. A ideia é que a conversa sirva para incentivar a colaboração entre a família, repartindo tarefas domésticas que permitam dar responsabilidades aos filhos e discutindo problemas que cada um enfrenta para tomar soluções em consenso. Foi a partir de uma reunião que o filho mais velho se dispôs a lavar a louça nos fins de semana e Maria Luiza a arrumar os brinquedos. Quando eles não querem fazer nada, a mãe define a tarefa — lavar a roupa, por exemplo — e dá aos filhos outras opções entre as demandas existentes. Juliana diz que a disciplina positiva a transformou. “Percebo que estou mais calma e meus filhos também. Maria Luiza até brinca dizendo que não me vê mais nervosa”, afirma a médica e coordenadora do prontosocorro pediátrico do Hospital Felício Rocho, em Belo Horizonte, que já deu palestra sobre o tema em um dos Encontros Canguru. Para a consultora em educação Bernadette Rodrigues, que participou da tradução dos dois livros de disciplina positiva para o português, são muitos os benefícios dessa abordagem. “As crianças e os adolescen-

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tes aprendem a desenvolver habilidades sociais e de vida, como autoconhecimento, autodisciplina, empatia, trabalho em equipe e capacidade para decidir e resolver problemas.” Ela estuda o assunto desde 2008, é membro e certificada como formadora da Positive Discipline Association — a associação americana de disciplina positiva — e também atua como palestrante, coach e professora universitária.

Praticando a empatia Validar os sentimentos dos filhos é uma das ferramentas que a carioca Juliana Cidade Cardoso, 41 anos — mãe de Mateus, 10 anos, e Lucas, 5 anos —, incorporou ao cotidiano da família há quatro anos. Em mo[2]

Alternativa positiva: Lucas, de 5 anos, bate na almofada quando precisa descarregar a raiva


Tarefas domésticas: Luiza, de 4 anos, ajuda a colocar a mesa e arrumar o quarto e sua mãe, Yara Tropea, reconhece o esforço da pequena

mentos de birra, como quando Lucas queria comer um chocolate antes do almoço, ela passou a dizer que entendia o seu desejo e a sua raiva, mas não dava o doce e explicava que aquilo era ruim para a saúde dele. “Lucas tem um temperamento forte, então ele gritava e às vezes até queria bater em mim, mas eu percebi que não adiantava apagar o fogo com mais fogo.” Em vez do castigo ou da palmada, Juliana preferiu mostrar ao filho formas positivas de se expressar — batendo numa almofada para descarregar a raiva, por exemplo. A conversa fica para depois, quando todos estão mais calmos. “Não queria mais seguir modelos baseados em punição e recompensas e me identifiquei completamente com essa abordagem baseada em empatia, conexão e vínculo.” Tamanha paixão fez com que Juliana se tornasse consultora de educação positiva certificada pela associação norte-americana. Hoje, ela ministra workshops e palestras e coordena um grupo de estudos sobre o tema, entre outras atividades. “Vejo quanto meus filhos sentem-se felizes de serem tratados de modo amoroso e empático, e eles reproduzem esse comportamento em outros ambientes, pois é o que vivenciam em casa.” Em geral, as mães descobrem a disciplina positiva enquanto buscam informações que as auxiliem na criação dos filhos. Foi assim com a professora de inglês paulistana Yara Tropea, 36 anos, mãe de Pedro, 10 anos, e Luiza, 4. “Eu assistia a um programa na televisão sobre o cotidiano das famílias e sabia que não queria aquele tipo de educação, mas não conhecia outros modelos e me sentia perdida.” Na internet, ela encontrou textos relacionados à proposta, gostou do que leu e decidiu pôr em prática com a família. Por coincidência, a escola de línguas onde foi trabalhar tempos depois também seguia a

abordagem. Yara relata que costuma ressaltar as atitudes positivas dos filhos, de seus alunos e até dos amigos. “O mais comum é chamar a atenção para o que não deve ser feito, mas acho válido praticar o encorajamento — se Luiza arruma o quarto, por exemplo, comento o que ela fez e reconheço o seu esforço.” Ensinar a ser colaborativo e ajustar as expectativas são outros preceitos seguidos pela professora. “Quando vamos sair, explico o que vamos fazer, quais são as regras do lugar – no cinema não dá para conversar — ou mesmo a que horas vamos voltar, pois isso ajuda a evitar frustrações e desentendimentos.” Na casa de outra Yara, desta vez uma bebê de 10 meses que vive na capital paulista, foi o pai, Yuri Faiani Branco, 29 anos, quem se encantou com a temática. 4 Proprietário de uma livraria, ele soube do assunto por meio da sócia, que fez um curso com a consultora Bernadette Rodrigues. “Se ela chora, procuro entender suas necessidades e sempre que possível evito dizer o ‘não’, direcionando sua atenção para outro atrativo, como quando ela quer mexer em algo que não pode.” Yuri ressalta que a mulher, Lígia, 31 anos, trouxe outras abordagens relativas à maternidade e eles acabam mesclando um pouco de tudo que acreditam fazer sentido para a família.

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Tanto em casa quanto na escola, a mudança do clima para melhor e a busca por soluções — e não pelos culpados — são outros frutos dessa filosofia educativa, relata Fernanda Lee, que é treinadora certificada em disciplina positiva para pais e professores. Ela vive

Conheça as ferramentas #1

Envolver as crianças na criação de limites

“Crianças são mais dispostas a respeitar limites que elas ajudaram a criar.”* Definir em conjunto as regras de momentos como ver TV, a hora de brincar e de dormir. Discutir a importância dos limites, como eles devem ser e as responsabilidades de cada um.

#2 Praticar

a crença de que erros são boas oportunidades para aprender

“De onde tiramos a ideia de que para uma criança agir melhor precisamos fazê-la se sentir pior?” Os adultos têm de aprender e ensinar as crianças a se animar com os erros, vendo-os como oportunidade de aprendizado. Nas reuniões familiares ou durante o jantar, vale contar um erro cometido no dia e o que aprenderam com ele.

#3

Promover reuniões semanais com a família

“As reuniões permitem aumentar a cooperação e a proximidade entre os membros da família.” Organizar encontros regulares para falar sobre coisas boas e ruins ocorridas nos últimos dias, as tarefas domésticas e as * Citações do livro Disciplina Positiva, Editora Manole, 2015.

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em San Diego, na Califórnia, Estados Unidos, e também ajudou a traduzir o livro Disciplina Positiva em Sala de Aula. “Ao ver que o adulto se importa com ela, a criança sente-se valorizada, e isso favorece a atmosfera do ambiente, que fica mais agradável, um dando suporte ao outro.” =

Comoestimular estimularnas nascriancrianças Como ças habilidades valiosas habilidades valiosas

metas para a semana seguinte. Após a conversa, fazer uma brincadeira ou um jogo com todos para descontrair e deixar memórias felizes.

#4 Dar um tempo positivo “Quando as crianças se sentem melhor, elas podem trabalhar em uma solução ou fazer reparos.” Sair de cena na hora do conflito ajuda a tranquilizar-se e recompor-se para conversar depois sobre o ocorrido. Para tanto, vale organizar um canto — o adulto pode deixar um livro de humor na mesa de cabeceira e a criança pode criar uma área para ler ou brincar.

#5

Focar nas soluções

“O sentimento de responsabilidade cresce se as pessoas podem escolher uma solução em vez de alguém lhes dizer isso.” Em vez de ensinar as crianças o que não fazer, convide-as a refletir sobre a situação e a buscar uma solução com respeito e disposição. Ao pegar uma esponja e uma toalha para limpar o leite derramado na mesa, a criança pode perceber que é capaz de resolver aquele problema.


4inspiração

Um dia para

agradecer! Projeto quer incentivar escolas ao redor do mundo a promoverem a noção de gratidão entre seus alunos

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que você é grato? Já pensou nisso hoje? Pois o Jubilee Centre for Character and Virtues, da Universidade de Birmingham, na Inglaterra, lançou uma iniciativa que propõe uma reflexão a respeito. A ideia é instituir o Dia da Gratidão nas escolas, oferecendo um kit de ideias que direcione professores e alunos a desenvolverem diversas atividades voltadas para a temática. A proposta foi trazida para o Brasil pelo Instituto Brasileiro de Psicologia Positiva (IBRPP) e o dia 19 de maio foi o escolhido para colocar o projeto em prática. As escolas interessadas devem entrar no site bit.ly/gratidaoescolas e se cadastrar para receber o kit de inspiração, para baixar em formato PDF. Nele, haverá ideias como construir uma árvore da gratidão com fotos e textos selecionados pelos alunos e assistir a filmes sobre o tema. Quando estiver com o material em mãos, o representante da escola deve se reunir com professores, diretores, alunos e outros funcionários para discutirem as práticas que mais se

Matias

aplicam àquela instituição e começar a se organizar. Lembrando que o kit é apenas uma inspiração, e novas ações também podem ser propostas durante os debates. Com tudo pronto, basta convocar alunos, pais e colaboradores para celebrar, juntos, a gratidão no dia 19 de maio. A participação é gratuita e os requisitos são simples: 1) Trabalhar o tema gratidão nas ações; 2) Registrar, com fotos, filmes e depoimentos, a ação na escola e enviar até o dia 22 de maio de 2017 pelo email contato@ibrpp.com.br. O material enviado pelas escolas será colocado no site do IBRPP com uma mensagem especial de agradecimento e também será enviado à Universidade de Birmingham. A ideia é que todas as instituições participantes, ao redor do mundo, possam ver as ações promovidas e se inspirar para o próximo ano. Além de desenvolver e celebrar a gratidão nas escolas, o projeto quer mostrar que é possível transformar o mundo pela educação, desenvolvendo nas crianças as suas virtudes e força de caráter. = MAIO 2017 .

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FOTO: FREEPIK

POR Rafaela


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4especial

Dois filhos e uma demissão: nove meses após o nascimento de seu primeiro filho, Fernanda Nascimento engravidou de novo e passou a ser afastada de projetos

Temos de vencer o

preconceito! Em pleno século XXI, mulheres ainda são dispensadas das empresas porque se tornaram mães POR Isabella

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Grossi

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Com a Revolução Industrial, ocorrida entre os séculos XVIII e XIX, as mulheres ganharam espaço no mercado de trabalho, embora recebessem menor remuneração — ainda hoje, em média, o salário das mulheres é 24% inferior ao dos homens na mesma função, de acordo com a Organização das Nações Unidas (ONU) — e fossem subjugadas em suas funções. Após muita luta e resistência, aos poucos o cenário foi mudando, especialmente com a promulgação da CLT no Brasil, em 1943. Em relação às gestantes, além da estabilidade provisória, a legislação trabalhista estabeleceu uma série de regras (veja o quadro ao lado) para proteger as mães do preconceito e da discriminação. “É importante ficar claro que o fato de uma mulher estar grávida não significa que ela não possa ser demitida. É diferente, ela não pode ser demitida porque está grávida”, pontua a advogada Tarsila Neiva. “Se uma empresa estiver reduzindo o quadro de funcionários ou passando por uma reestruturação, as gestantes poderão ser desligadas, mas, além da verba rescisória, elas terão de receber a indenização pelo período de estabilidade.” Foi o que aconteceu com a relações-públicas Luísa Alves, de 34 anos. Pouco tempo depois de entrar em um dos maiores grupos têxteis do Brasil, com filial em São Paulo, ela descobriu a gestação. “Fiquei insegura de dar a notícia, porque eu não tinha a intenção de engravidar naquele momento”, afirma. Embora tenha aumentado a carga horária para organizar todas as pendências e trabalhado até uma semana antes do nascimento de Aurora, que está prestes a completar 2 anos, Luísa voltou da licença-maternidade e imediatamente foi demitida. “A desculpa foi a crise, mas eles já tinham contratado outra pessoa para ficar no meu lugar”, conta. Sua chefe nem ao menos esperou a estabilidade. “Ela me disse que achava justo que eu fosse para casa ficar com a minha filha e preferiu me indenizar pelo tempo que restava.” Com o dinheiro do Fundo de Garantia, a relações-públicas empreendeu e lançou o Guia Fora da Casinha, com dicas de eventos para pais e filhos na cidade de São Paulo. A realidade para quem não trabalha no regime CLT é ainda mais dura. A designer niteroiense Cristiane Biolchini, de 32 anos, que o diga. Assim que completou três meses de gravidez, ela contou a novidade aos gestores da empresa de live marketing focada em esportes na 4

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FOTOS: [1], [2] MOACYR LOPES JUNIOR / MALAGUETA

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QUANDO COMPLETOU SEIS anos de carreira em uma multinacional alemã que pertence a um grupo americano, a puvblicitária paulistana Fernanda Nascimento, hoje com 44 anos, fez fertilização in vitro. “Me planejei e foi tudo muito organizado”, conta. “Eu tinha bastante proximidade com o board da empresa e conversava com eles sobre família.” Não demorou muito para que as obrigações do trabalho interferissem em sua rotina. “Tive uma reunião na China e fiz banco de leite”, lembra. “Passei sete dias viajando e deixei meu filho de 5 meses com o meu marido, a minha mãe e a babá. Eu tinha boas perspectivas.” Nove meses após o nascimento de Bernardo, no entanto, Fernanda engravidou de Vicente. “A segunda vez foi demais para a empresa. Quando voltei de licença, vi sinais de mudança. Nas reuniões, minhas ideias eram rechaçadas e eu fui afastada de vários projetos.” Até acabar o período de estabilidade — direito assegurado pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) que garante a permanência no emprego desde a confirmação da gravidez até cinco meses após o parto —, a publicitária amargou, inclusive, um processo de seleção interno. “Foi como se tivessem armado um teatro, então fui ao meu chefe e perguntei: ‘Dá para falar que vou ser demitida?’.” Não deu outra. Mãe de dois filhos pequenos, a profissional, que atualmente é dona da Stratlab, agência especializada em comunicação integrada, estava na rua.


qual trabalhava havia três anos. “Todo mundo ficou muito feliz por mim”, afirma. “Eles beijavam minha barriga, faziam carinho e chegaram até a preparar um chá de fraldas.” A alegria durou pouco. “Descobri que era uma gravidez de risco e, por isso, precisei trabalhar de casa alguns dias na semana.” A ausência do escritório não prejudicou a produtividade de Cristiane, que cumpriu o cronograma até uma semana antes dar à luz João Vitor, hoje com 2 anos. Quase no fim da licença-maternidade, ela colocou o filhote na creche e organizou seu dia a dia para conciliar os compromissos profissionais com a responsabilidade materna. Um mês após o retorno, veio a notícia. “O diretor me chamou na sala dele e disse que eu não me enquadrava mais no perfil da empresa.” Embora fosse contratada como pessoa jurídica (PJ), a instituição respeitou o período de estabilidade e pediu o adiantamento de quatro notas fiscais. “Eles me pagaram cerca de 9 000 reais a mais, alegando uma espécie de rescisão”, diz. “Pelos cálculos feitos com o meu advogado, se fosse pela CLT, a diferença seria de quase 100 000 reais.” Cristiane encontrou dificuldades para se reinserir no mercado de trabalho e acabou optando por abrir a própria empresa, de moda praia infantil, a Le Infanti. “Acho engraçado eles usarem a gravidez como motivo de dispensa”, argumenta. “Quando você é mãe, o seu rendimento não cai, pelo contrário. Sua performance melhora, porque você quer entregar tudo mais rápido para evitar virar a noite e pegar o seu filho acordado, por exemplo.” Assim como Fernanda e Luísa, Cristiane deu a volta por cima e hoje consegue passar mais tempo com o pequeno enquanto comanda o próprio negócio. Mas nem todas as histórias de discriminação a gestantes têm um final feliz.

Baque na carreira Rafaela (nome fictício), de 23 anos, natural de Guarulhos (SP), passou no programa de estágio da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) em meados de 2015, mas negou a oportunidade porque descobriu que estava enfrentando uma gravidez de risco. Em 2016, todavia, ela participou do processo seletivo para trainee, mas não conseguiu avançar nas análises de currículo. “Cheguei a conversar com uma responsável pelo RH e ela disse que, assim que tivesse uma oportunidade, me chamaria pelo LinkedIn”, lembra. “Quando enviei meu currículo

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para a tal vaga, ele não passou nem na triagem. Seu filho, hoje, está com 1 ano e 2 meses e só agora Rafaela está conseguindo, aos poucos, voltar ao mercado. “Isso porque eu mudei completamente o foco de atuação, de psicologia organizacional para clínica.” De acordo com a advogada Ana Paula Braga, do escritório Braga e Ruzzi, em São Paulo, nesse caso, o interessante é fazer uma denúncia ao Ministério Público do Trabalho. “O MPT pode averiguar e inclusive tem poderes para aplicar multas”, ressalta. Vale lembrar que, pela legislação, a mulher não é obrigada a informar sobre a gravidez no processo seletivo.

O outro lado A CSN informou, em nota, que “não pratica qualquer tipo de discriminação em seus processos seletivos para vagas”. “Nas diversas áreas em que atua (mineração, siderurgia, cimento, logística e energia), a Companhia mantém um processo seletivo justo, priorizando sempre a qualidade dos profissionais. Quanto à contratação de mulheres, para se ter ideia, na CSN Mineração nos últimos dez anos o número de mulheres trabalhando triplicou, inclusive nas áreas operacionais.”

O relato de Joyce (nome fictício), de 30 anos, demonstra que atitudes discriminatórias também podem vir de onde menos se espera. Formada em letras, com experiência internacional em marketing, ela trabalhou como revisora numa agência de conteúdo publicitário em São Paulo até descobrir que estava grávida. Detalhe: o diretor da empresa é o pai de seu filho, que hoje tem 9 meses. “Ele me disse que havia perdido o cliente que eu atendia. Como eu era PJ, fui demitida e recebi apenas o acerto referente aos dias trabalhados naquele mês”, explica. “Eu tinha acabado de alugar um apartamento, mas, com a demissão, tive de entregar e, ainda, pagar multa. Fiquei sem nada e precisei voltar para a casa dos meus pais, no interior do estado.” As portas se fecharam para a profissional, e, a cada entrevista de emprego, aumentava o sofrimento. “Diziam que não podiam assumir uma estabilidade de dois anos.” Joyce consultou um advogado e


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está em vias de entrar com um processo na Justiça para que a agência reconheça o vínculo trabalhista e lhe garanta todos os direitos. Entre 2014 e 2016 ocorreram 25 634 novos casos envolvendo gestantes na Justiça do Trabalho de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais, conforme levantamento da Coordenadoria de Estatística e Pesquisa do Tribunal Superior do Trabalho (CEST). Ainda assim, muitas mulheres, nessas circunstâncias, preferem se calar. Executiva da área social do setor de mineração, a mineira Raquel (nome fictício), de 46 anos, viu seu currículo de vinte anos de experiência ser massacrado quando resolveu adotar uma criança. “Não estava nos meus planos, até que eu conheci minha filha no programa de voluntariado da empresa em que eu trabalhava. Me apaixonei na hora”, recorda. No início, ela recebeu o apoio dos seus gestores, mas, assim Demitida logo após a licença: que deu entrada ao processo a chefe de Luísa Alves nem ao de adoção, a coisa mudou de menos esperou o período de estabilidade para afastá-la figura. Pela legislação, as mães adotivas possuem exatamente os mesmos direitos que as mães biológicas. “Cheguei a dizer que eu não precisava sair uma opção pessoal e por isso eu teria de arcar com as de licença, que poderia trabalhar remotamente, já que consequências.” eu tinha toda a infraestrutura em casa.” O apelo não foi Raquel recebeu a indenização, mas, quase um ano considerado, e Raquel foi obrigada a tirar a licença-mae meio depois, continua desempregada, prestando ternidade. Passados dois meses, a conta do seu e-mail foi desligada e a profissional soube, por colegas de trabalho, serviços como PJ, embora seu currículo contenha que já havia outra pessoa em seu lugar. “Fiquei sabenpós-graduação pela PUC-Minas, MBA pela Fundação do que eu não retornaria. Disseram que a adoção era Getúlio Vargas e mestrado pela Universidade Federal 4

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de Minas Gerais (UFMG). “Tudo isso me abalou muito, principalmente porque minha carreira foi construída na área de responsabilidade social”, declara. “O objetivo é o lucro, muito se prega e pouco se pratica. Hoje, quero trabalhar para uma empresa que tenha a real intenção de

ser transformadora.” A despeito da injustiça, a passagem pela companhia foi um fenômeno na vida da executiva. “Ela me colocou no caminho da pituca”, diz, referindose à filha, que completou 2 anos e meio ao lado dos pais adotivos. =

Direitos assegurados às gestantes ou mães adotantes Estabilidade

É um direito constitucional assegurado desde a concepção até cinco meses após a chegada da criança. Se a mulher for demitida nesse período, independentemente de estar cumprindo aviso prévio ou em período de experiência, pode ser readmitida ou receber indenização.

Salário-Maternidade

O benefício é concedido às mães, por meio do INSS, durante o período de afastamento. Vale tanto para CLT quanto para microempreendedor individual (MEI) ou pessoa jurídica (PJ).

Licença-Maternidade

São 120 dias contados a partir do nascimento da criança ou do momento da adoção. O prazo pode ser estendido para 180 dias se a empresa contratante é adepta do programa Empresa Cidadã. Nesse caso, a instituição pode deduzir de impostos federais o total da remuneração integral da funcionária nos dois meses de extensão voluntária do salário-maternidade.

Licença-Amamentação

Consiste em dois intervalos de trinta minutos, por dia, até a criança completar 6 meses. Por causa da complexidade na logística, muitas empresas optam por liberar a chegada uma hora mais tarde ou a saída uma hora mais cedo. O período é remunerado.

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Creche ou Auxílio-Creche

A legislação trabalhista obriga os estabelecimentos que têm mais de trinta mulheres acima de 16 anos em seu quadro de funcionários a oferecer creche em suas dependências. Caso contrário, a empresa deve pagar auxílio-creche até que a criança complete 6 meses. O valor é determinado conforme negociação coletiva na empresa.

Exames e consultas médicas

Durante a gestação, é permitida a dispensa do horário de trabalho pelo tempo necessário para a realização de, no mínimo, seis consultas médicas e demais exames complementares, sem prejuízo do salário e de outros direitos.

Troca de função

A mulher grávida tem o direito de mudar de função temporariamente quando as condições de saúde exigem, especialmente se houver esforço físico acentuado capaz de prejudicar o desenvolvimento da gravidez.


3 perguntas para Sofia Vilela de Morais e Silva

Procuradora do Trabalho e vice-coordenadora da Coordenadoria Nacional de Promoção de Igualdade de Oportunidade e Eliminação da Discriminação no Trabalho – COORDIGUALDADE, do Ministério Público do Trabalho (MPT)

Por que é tão comum a discriminação de gestantes no mercado de trabalho? Toda a nossa legislação visa a proteger não só a mulher, mas a própria criança. E, ainda assim, existe a discriminação. Para os empregadores, a gravidez não é vista como algo normal ou natural, mas como um obstáculo ao comprometimento da mulher com a empresa. Sua dedicação é posta em xeque quando ela engravida. Persiste a noção de que a mulher é uma figura sensível, que vai dar prioridade à família? Temos que romper com esse preconceito de que a função de cuidar de um filho é inerente à mulher. Você preserva a questão biológica, porque é a mulher quem vai engravidar e amamentar, mas, fora isso, é responsabilidade de todo o círculo familiar, dos pais aos avós. Precisamos mudar a mentalidade. De que maneira? Denunciando, sempre. O MPT tem um sistema de recebimento de denúncias, e elas podem ser sigilosas. Não podemos admitir que empresas tenham atitudes discriminatórias. Por essa razão é tão importante o empoderamento. A mulher tem de ter consciência de que o fato de poder engravidar não a inferioriza. Pelo contrário, justamente por isso ela precisa ser valorizada e preservada.

Na Justiça

Casos novos nas varas trabalhistas (1ª instância), conforme dados da Coordenadoria de Estatística e Pesquisa do Tribunal Superior do Trabalho (CEST)

Reintegração / Readmissão ou Indenização de Gestantes

RJ SP MG

2.276

2.570

2.210

4.819 2.439

3.175

2.654

2.288

1.388

2014

2015

2016

Licenças / Afastamentos de Gestantes (Aborto Espontâneo - Repouso Remunerado)

RJ SP MG

145

125 94

571 440 94 99 77 35

2014

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Período de Referência: 2014 a 2016 MAIO 2017 .

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4Entretenimento

o mundo dentro da

Com letra e desenhos educativos, Mundo Bita alcança mais de 700 milhões de visualizações no Youtube e se prepara para o mercado fora do Brasil POR Cristina

Moreno de Castro

Quando a primogênita Anabel estava prestes a nascer, Chaps Melo e Ivana de Souza fizeram o que todos os pais fazem: pensaram com carinho na decoração do quarto da bebê. Ela deu ideias, que ele transformou em desenhos e, em uma semana, o tema circense estava pronto, com direito a picadeiro, nuvens no céu e um apresentador de terno, cartola, sorriso bonachão e um imenso bigode laranja no rosto. O casal não fazia ideia que estava dando vida ao que viria a se tornar um dos principais personagens infantis do país, exatos sete anos mais tarde. O bigodudo em questão foi depois batizado de Bita e seu “Mundo Bita” já possui quatro DVDs (com disco de ouro pela Sony Music), está na grade do Discovery Kids e da Netflix, tem espetáculos teatrais, shows e produtos licenciados, aplicativos e seu maior trunfo: mais de 700 milhões de

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visualizações no YouTube. O carro-chefe da produtora Mr. Plot, sediada no Recife, se tornou concorrente de pesos-pesados do segmento 0 a 6 anos, como Galinha Pintadinha, Patati Patatá e o veterano Palavra Cantada. Neste ano, vai alçar voos maiores: além do quinto DVD, “Bita e a Natureza”, que já vem sendo divulgado, com uma música inédita por mês no Youtube, a marca “Mundo Bita” também está em fase de pré-produção de uma série em dramaturgia, com episódios de 5 minutos, prepara novos aplicativos, e uma versão em espanhol dos clipes musicais, para tentar atingir o mercado externo. Mas nada disso aconteceu de repente. “Estamos colhendo os primeiros resultados financeiros e atraindo atenção das grandes marcas só agora”, revela o diretor de criação Chaps Melo, 36, em entrevista à Canguru. A Mr. Plot nasceu, em 2011, para ser uma empresa de tecnologia, com a ideia de produzir aplicativos educativos para crianças. O bonachão Bita entrou como personagem de um desses apps, mas o negócio não dava lucro. Foi só quando a equipe resolveu inserir um clipe musical ao “Bita e os Animais”, em 2013, que o personagem descobriu a que veio. O clipe bombou no Youtube, e logo foi firmado contrato com a Discovery Kids e a Sony Music, que encomendou um primeiro DVD feito às pressas. “A Mr. Plot nasceu para ser de tecnologia, não de economia

FOTO: DIVULGAÇÃO

cartola mágica


criativa, não de audiovisual. Nasceu de uma forma e nos descobrimos de outra por acaso”, resume Chaps. Ele se tornou o sócio responsável pelas músicas. Filho de professora de piano, o empresário só tinha tocado em bandas por hobby, mas começou a compor letras e canções para o repertório do “Mundo Bita”, com arranjos de Walman Filho. É ele também quem faz o vocal de “s” puxado – em parte por sua origem carioca, em parte por seu sotaque já forte de Pernambuco, onde mora há 19 anos. As letras são o ponto forte dos clipes de Bita. “Cozinheira de ideias, costureira de sonhos, onde se fabrica o pensamento. (...) E ela é rainha, comanda e desmanda e o corpo da gente obedece bem. Ouça e obedeça que a cabeça vai mandar” – diz a música “Onde é que se fabrica o pensamento”, do DVD “Bita e o Corpo Humano”. A canção “Ela e Ele” prega direitos iguais a meninos e meninas: “Garota, garoto, espelho do outro, somos diferentes demais. Menino, menina, respeito e estima, nós temos direitos iguais.” Os versos não se repetem exaustivamente, como em algumas canções infantis: as letras são longas, com rimas não muito óbvias, e acompanhadas por ritmos que trafegam pelo rock, samba e country. “No começo recebíamos críticas de que as letras eram muito complexas para crianças, mas vinha dos pais, não dos pequenos. A gente não trata a criança como um bobinho. Comunicamos com a criança como uma pessoinha, que vai entender, vai processar aquilo e transformar em alguma coisa”, diz Chaps. Os temas tratados pelas canções vão desde coisas corriqueiras, do dia a dia, como a escovação de dentes (“Xic, Xic, Xic”), até, na letra de “A Diferença É o que nos Une”, o respeito às outras crianças que têm necessidades especiais (veja alguns temas no quadro ao lado). A equipe da Mr. Plot tem mais liberdade ao criar os clipes com temas mais simples, mas tem que discutir mais a fundo os conteúdos que podem gerar alguma polêmica. A esposa de um dos sócios, que é pedagoga, é uma das principais procuradas nessas horas. Para a canção “A Diferença é o que nos Une”, o grupo buscou consultoria da AACD (Associação de Assistência à Criança Deficiente), que acompanhou não só a criação da letra, mas também da animação. “Queríamos que eles vissem se, na nossa ignorância, tínhamos feito algo que pudesse ferir sem intenção”, diz Chaps. “A gente procura ser bem caxias, Ouça as músicas e veja a agenda de shows em nosso site: www.canguruonline.com.br

para o conteúdo realmente engrandecer a criança, não ser apenas um conteúdo vazio.” Assim como as letras, os desenhos também são politicamente corretos e educativos. Bita ganhou a companhia das crianças Lila (loira), Dan (negro) e Tito (ruivo), que têm personalidades próprias. Os pequenos estão sempre alegres, são educados, se respeitam, brincam juntos tanto de boneca quanto de dragão. Mesmo assim, o conteúdo também é alvo de críticas: já teve gente questionando o Bita por abordar “esse negócio de gênero”, já teve corrente religiosa radical vendo mensagem subliminar nos clipes ou pais interpretando errado algum trecho de música. “Mas a gente nunca se atrita com o público. Se não agrada, pode agradar em outra canção. Só queremos passar nossa mensagem positiva.”=

Seleção da Canguru Veja alguns temas tratados nas músicas do “Mundo Bita” DESFRALDE Música “Ai, que vontade!” Trecho: “O xixi sai bem quentinho, expresso e direto pro peniquinho. Pois eu não uso mais fralda!”

IMPORTÂNCIA DE ESCOVAR OS DENTES Música “Xic, xic, xic” Trecho: “Xic, xic, xic, para lá e para cá, da escova quando escova o nosso dente. Toda vez que a gente se alimentar é preciso fazer isso novamente”

DIREITOS IGUAIS PARA MENINOS E MENINAS Música “Ela e ele” Trecho: “Garota, garoto, espelho do outro, somos diferentes demais. Menino, menina, respeito e estima, nós temos direitos iguais”

CONVIVÊNCIA COM AS DIFERENÇAS Música “A diferença é o que nos une” Trecho: “Tantas são as formas de cruzar a imensidão demonstrando pro mundo nossa superação”

PASSEIO NA PRAIA Música “Chuá Tchibum!” Trecho: “Eu cruzo as marés maravilhas e surfo numa onda encantada. Eu viro um marujo maroto e navego meu navio pirata”

MEDO DAS CRIANÇAS Música “Não existem de verdade” Trecho: “Alô, bicho papão, venha pra cá, me dê a mão, pois quando anoitecer, montado num cavalo alado, eu vou te achar engraçado” MAIO 2017 .

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4saúde

Podemos confiar no

Dr. ggoo o g le ?

Número elevado de buscas relacionadas a doenças movimenta a comunidade médica para produzir resultados mais confiáveis

ANTIGAMENTE ERA ASSIM: se as crianças ficavam doentes, as suposições pipocavam entre os pais e avós e usava-se aquela receita caseira que foi passada por gerações e costumava ser "batata". Se não desse certo, uma ligação para o pediatra para relatar os sintomas e, se necessário, uma consulta. O segundo passo permanece o mesmo até hoje, mas a evolução tecnológica mudou a forma de especular. Hoje, ao constatarem sinais de mal-estar nos pequenos, os pais — é quase certo — correm para tirar suas dúvidas e buscar sugestões de tratamento no oráculo do século XXI: o Google. De acordo com a empresa, cerca de 1% das buscas na plataforma está relacionada a sintomas de doenças. Se considerados todos os sites de busca, uma em cada vinte pesquisas (ou 5% delas) é sobre saúde. É provável que o número elevado esteja relacionado a duas características do ambiente virtual: rapidez e praticidade. Tudo o que um pai com filho doente almeja. É o caso, por exemplo, do publicitário paulista Thomás Callas, de 26 anos, referindo-se ao filho Noah, de 1 anos e 3 meses: “Eu corro para o Google quando aparece alguma coisa estranha nele, algo diferente, que não consigo identificar o que pode ter causado”. O problema é que nem todas as informações são

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confiáveis, e a maior parte dos leigos não tem as habilidades necessárias para filtrar as fontes. Mas o Google sabe disso e tratou de resolver a questão. Em meados de 2015, o site de buscas firmou uma parceria com a Mayo Clinic, nos Estados Unidos, para que os profissionais da saúde produzissem descrições confiáveis das doenças com maior índice de procura na internet. Agora, foi a vez de o Hospital Israelita Albert Einstein, em São Paulo, fazer o mesmo papel em terras brasileiras. Desde fevereiro deste ano, quem procura por sintomas no aplicativo do Google para dispositivos móveis encontra resultados que foram escolhidos e revisados por médicos. Painéis informativos em português apontam as possíveis condições para os sintomas pesquisados, quais são os tratamentos e as orientações para procurar um médico. Indicações sobre métodos contraceptivos também estão disponíveis. Ao todo, 400 doenças e 200 sintomas já foram catalogados pela equipe do Albert Einstein, e outras 350 doenças serão incluídas até o fim deste ano. Uma boa notícia para mães de primeira viagem como a belo-horizontina Fernanda de Oliveira Dias Carvalho, de 36 anos. Se antes e durante a gravidez a servidora pública já era uma pesquisadora assídua de todos os de-

FOTO: ISTOCK

Por Rafaela Matias


talhes sobre a própria saúde, depois do nascimento da pequena Ana Beatriz, hoje com 3 anos, não desgrudou mais do dr. Google. "Li sobre o teste do pezinho, icterícia, viroses. Gosto de me informar sobre tudo.” Mas, às vezes, a abundância de informações traz preocupações desnecessárias. “A Ana Beatriz teve refluxo e li que poderia estar associado a outras doenças mais sérias. Fiquei apavorada, mas fomos a pediatras e a um gastroenterologista e eles explicaram que o caso dela não era grave. Me desesperei à toa”, lembra. É por isso que grande parte da comunidade médica frisa a importância de sempre procurar um profissional. “Um mesmo sintoma pode ser sinal de diversas doenças, desde resfriados até patologias mais graves. O pediatra vai saber analisar o contexto e pedir exames mais profundos, se for necessário”, afirma o médico Joel Lamounier, membro do Comitê de Nutrologia Pediátrica da Sociedade Mineira de Pediatria. Mesmo assim, ele defende as pesquisas feitas pelos pais a título de curiosidade e pela vontade de se informar. “Nesses casos, o ideal é selecionar sites confiáveis e não apenas clicar no primeiro que aparece.” Um exemplo é o pediatriaparafamilias.com.br, criado pela Sociedade Brasileira de Pediatria para responder às dúvidas dos pais conectados. Na lista da plataforma aparecem respostas para perguntas como: “O que é microcefalia e quanto devemos nos preocupar?” e “Quando o refluxo se torna doença?”. Assim como Lamounier, a médica Juliana Aparecida Soares, uma das responsáveis do Hospital Israelita Albert Einstein pela parceria com o Google, defende a disseminação de informações de qualidade, que orientam o paciente e facilitam a sua relação com o médico. “A partir do momento em que a pessoa dispõe de informações acerca da sua condição de saúde, é possível, além de compreender melhor sua situação, argumentar junto ao profissional de saúde, esclarecer dúvidas e entender de forma mais clara quais os próximos passos do tratamento”, diz. Propostas como as da Sociedade Brasileira de Pediatria e do Hospital Albert Einstein não apenas mostram um movimento da comunidade médica para disseminar informações corretas sobre doenças e seus tratamentos, mas também evidenciam, mais uma vez, que a tecnologia pode ser maravilhosa. Basta encontrar a medida. =

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4Estilo

Meu cabelo

enrolado, todos querem querem imitar imitar todos

Com muita personalidade e beleza, as crianças com fios cacheadinhos e crespos estão chegando com tudo em um movimento que, mais do que moda, é de resistência POR Daniele

Franco

DEPOIS DE MUITO tempo de puxa, alisa e prende, é hora de deixar os cabelos livres, leves e soltos. E isso vale para a criançada também. Há pelo menos dez anos, segundo especialistas – psicólogos, antropólogos e empresários do mercado da beleza – ouvidos pela reportagem, a cultura do liso está dando lugar às vistosas cabeleiras crespas e cacheadas, com os mais variados cortes e penteados, sempre carregados com muito orgulho. Ou seja, uma geração inteira de crianças, que se beneficia dos resultados do empoderamento dos cachinhos. Para a psicóloga belo-horizontina Magali Figueiredo, o crescimento do movimento de valorização dos cabelos naturais traz uma onda positiva de autovalorização para as crianças, que mudam em si mesmas uma ótica de inferioridade imposta por uma sociedade cheia de preconceito. “As características das crianças devem ser enaltecidas e cultivadas desde o seio da família, para que elas respeitem sua individualidade e se orgulhem de ser quem são”, afirma Magali, que ainda destaca a importância de as crianças terem a possibilidade de perceberem sua própria beleza, força e poder e aprenderem que seu

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INSPIRAÇÃO nas redes sociais: Elis, de 5 anos, incentiva outras crianças a gostarem dos cabelos crespos

valor existencial vai muito além da aparência. Doutora em antropologia social pela USP, com uma tese que abordou justamente cabelo, beleza e construção da identidade, a professora da UFMG Nilma Lino Gomes, que também é ex-ministra de Igualdade Racial do governo de Dilma Roussef, aprofunda a discussão e coloca a forma de uso dos cabelos como símbolo de resistência, principalmente no caso das crianças negras. “Corpo e cabelo são símbolos muito fortes da construção da identidade negra e, com a valorização desses símbolos, a comunidade se fortalece, se identifica e se aceita”. Foi pensando em criar referências de beleza para as crianças negras que a carioca Renata Morais, 32, criou a campanha “7 meninas crespas”, que viralizou na internet em 2015 ao trazer sete garotinhas superestilosas munidas de seus black powers enfeitados com os acessórios da marca que produziu o editorial, a Lulu & Lili. Fundadora da marca e também dona da Crespinhos S.A., uma produtora de modelos infantis negros no Rio de Janeiro, Renata acredita que o crescimento da adoção dos fios naturais é um passo enorme para que as crianças que não


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FOTO: [1] RICARDO BORGES, [2] GUSTAVO ANDRADE

CACHINHOS DOURADOS: Joana, de 6 anos, adora os elogios que recebe na escola e o apelido de contos de fadas que recebeu

têm o padrão de cabelo liso imposto pela sociedade tenham referências de beleza como a sua própria: “A criança precisa se amar, se entender, para exigir respeito. Naquela campanha, eu quis mostrar às meninas negras e de cabelos crespos, inclusive à minha filha, que elas podem ser lindas do jeitinho que são”. A filhota de Renata captou bem a lição. Elis, de apenas 5 anos, já atraiu mais de meio milhão de visualizações em seu canal de YouTube (Elis MC), em que é sempre categórica ao falar de seu cabelo crespo e incentivar outras crianças a gostarem dos seus. Desenvolta que só, a garotinha conta que recebe muitos elogios na rua e nas escolas, mas se alguém fala algo ruim do seu cabelo, ela já tem a resposta na ponta da língua, parafraseando a mãe: “Eu adoro o meu cabelo do jeitinho que ele é”. Em seu primeiro vídeo que bombou, com 56 mil views, a garotinha dispara: “Meu cabelo não é ‘peluca’, ele não é liso e eu só uso ‘cleme’ se for pra deixar ele pro alto”. Elogios e agradecimentos no Instagram da pequena, que tem mais de 36 mil seguidores, mostram que sua mensagem de inspiração surte efeito e estimula cada vez mais pessoas, crianças e adultos, a fazerem as pazes com seus cabelos naturais. Reconciliação que nem sempre é fácil, como mostra o caso da belo-horizontina Pollyana Farias, de 7 anos: ela cresceu vendo a mãe, Ludmilla da Silva Farias, 25, alisando os cabelos quimicamente – “desde sempre”. Com apenas 6 anos, quis que seus cachinhos também fossem alisados. Um mês depois, a pequena se arrependeu. Agora, a criança acaba de sair de um longo processo de transição capilar, que durou seis meses. Quando a reportagem se encontrou com Pollyana, ela tinha acabado de cortar as últimas pontinhas de cabelos alisados. O tratamento foi no salão Beleza Negra, que

atua há 30 anos em Belo Horizonte, sob a batuta da empresária Betina Borges. Ela chama atenção para a importância de procurar um profissional qualificado e que trate os cabelos da criança de acordo com as particularidades que cada um tem e lembra que “química no cabelo é só a partir dos 13 anos – e com ressalvas”. Profissionais de beleza, como Betina, têm exercido um trabalho de conscientização e valorização dos cabelos naturais. Salões de beleza de todo o Brasil se concentram, agora, muito mais em trata-

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4Estilo mento sem transformação da forma natural dos fios. A carioca Lola Monteiro, proprietária do espaço que leva seu nome, diz que é comum receber pais reclamando que o cabelo da criança “é difícil”. “O que nós fazemos é orientar e ensinar como cuidar mais facilmente, pois o que essas mães não sabem é que a falta de tempo gera ainda mais perda de tempo”. Na zona Sul de São Paulo, a Clínica dos Cachos, do empresário Almiro Nunes, recebe cerca de 40 crianças por mês e os pais dos pequenos assistem ao trabalho dos cabeleireiros, para aprender o correto tratamento dos cachos infantis. Não que seja exatamente um mistério tratar os cachinhos. A consultora belo-horizonta Nathália do Nascimento, 40, mãe da pequena Joana, de 6 anos, dá a receita:

3 penteados para os cacheados Quem tem cacho sabe: há um mundo de possibilidades para mudar o penteado. Cortes, cores, acessórios e tranças fazem a cabeça de crianças e adultos. Conheça alguns:

Nilma e Betina têm uma coisa muito especial em comum: a obra Betina, escrita pela ex-ministra contando a história de infância da cabeleireira e de sua relação com os cabelos enquanto ainda era uma criança. Com uma linda e emocionante relação entre avó e neta, o livro tem como teia principal o cuidado da avó com o trançar dos cabelos da menina.

=

Texto de Nilma Lino Gomes Ilustrações de Denise Nascimento Mazza Edições, 2009

“Não tenho nenhuma dificuldade de tratar do cabelo dela, é só passar o xampu adequado e, para manter os cachinhos, umedecer na hora que ela acorda”. Joana é conhecida na escola como Cachinhos Dourados e diz que seus coleguinhas dizem que seu cabelo “é lindo, maravilhoso e bonito”. Pensa em acabar com os cachinhos algum dia? “Nunca! Quero deixar meu cabelo assim pra sempre!” =

Puff, penteado preferido da Elis Você vai precisar de elásticos de cabelo, um pente de dentes largos, de preferência de madeira, e uma escova macia, como as de bebê. Para começar, penteie o cabelo com o pente de dentes largos e, se você for fazer dois puffs, divida ao meio. Depois é só amarrar o cabelo com os elásticos e usar a escova para finalizar a parte da frente. Torcidinho lateral Para esse penteado, você só vai precisar de um grampo ou uma presilha. Parta o cabelo de lado, deixando um “franjão”. Do outro lado da franja, onde tem menos cabelo, pegue uma porção e torça. O resultado vai ser parecido com uma trança, que você vai pegar e prender puxando para trás. Desse penteado também pode derivar o torcidinho duplo, onde a franja sai e a frente do cabelo fica toda puxada para trás. Para ficar que nem princesa Você vai precisar de uma presilha. Junte as duas laterais do cabelo na parte de trás do topo da cabeça, mas deixando um pouco solto na frente. Prenda com a presilha. Além de fácil, esse penteado valoriza muito os cachinhos.

BONS E VELHOS CACHINHOS: Pollyana Farias, 7, se arrependeu de alisamento e fez tratamento em salão para retomar cabelo crespo


FOTO: GUSTAVO ANDRADE

4para ler com seu filho

De olho nas letras LER UM LIVRO em voz alta é uma delícia para o adulto que conta a história e para a criança que escuta. É nessa hora que a gente percebe a musicalidade do texto, seu ritmo, seus silêncios, seus segredos. Os escritores (muitos deles, pelo menos) se preocupam com cada palavra, cada letra até. Muitas vezes quem está lendo nem percebe o trabalho minucioso por trás de textos aparentemente simples.

leo cunha e os filhos Sofia e André

À primeira vista, Medonho, de Rosana Rios, parece ser apenas uma história de monstros. Uma história divertida de monstros, curiosidade e solidão. E realmente o livro é assim. Mas experimente ler em voz alta para seu filho, sobrinho, ou para você mesmo. Surpresa! Você vai descobrir, também, uma história perfeita pra saborear a nossa língua, especialmente um detalhe peculiar do português: o som das letras "nh". Essa sonoridade tão bacana, que muitos estrangeiros nem conseguem pronunciar, atravessa o livro todo. Afinal de contas, Medonho, no banhado, cozinha nhoque e bolinho, mas é tristonho pois não tem vizinhos. Então sobe a montanha, cruza o riozinho e... Leia para descobrir! SOBRE OS AUTORES: Rosana Rios, paulista, é escritora e tradutora, com mais de 100 livros publicados e diversos prêmios. Juan Chavetta, argentino, é ilustrador e designer gráfico.

Márcia Leite, no livro Poeminhas da Terra, também explora a sonoridade das palavras. Não só do português, mas também do tupi, língua que já se espalhou por muitos estados e povos indígenas, e que deixou muitas palavras de herança para o nosso dia a dia. Os poemas são curtos e recheados de termos do tupi, como em Comilança: “Na boca: pipoca, tapioca, farinha de mandioca, paçoca de amendoim, pamonha, biju, aipim”. O projeto gráfico do livro ressalta, em cores, algumas vogais que se repetem, ou mesmo palavras inteiras, levando a gente a prestar mais atenção no som e na origem desses termos. SOBRE OS AUTORES: Márcia Leite, paulista, é escritora e editora de livros para crianças e jovens. Tatiana Móes, pernambucana, é artista plástica, ilustradora e professora de artes.

Leo Cunha é escritor e publicou mais de 50 livros, como "Um dia, um rio" (Ed. Pulo do Gato) e "Cachinhos de Prata" (Ed. Paulinas). Recebeu os principais prêmios da literatura infantil brasileira, como Jabuti, Nestlé e João-de-Barro. Na Canguru, dá dicas de livros para crianças. leocunha@canguruonline.com.br MAIO 2017 .

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IMAGENS: REPRODUÇÃO

POEMINHAS DA TERRA. Texto de Márcia Leite, imagens de Tatiana Móes. Editora Pulo do Gato, 2016.

MEDONHO. Texto de Rosana Rios, ilustrações de Juan Chavetta. Editora Jujuba, 2014.


4viagens, modo de usar

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Cabrais do sertão Luís Giffoni

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nio Cultural da Humanidade. Há animais gravados na rocha que não mais existem no Brasil, como a lhama ou estranhos cavalos selvagens. Há covas onde se resgataram os restos mortais, que podem ser visitados no Museu do Homem Americano, na sede do Parque Nacional. Há um brinde especial: os macacosprego, considerados os mais espertos de sua família, capazes de construir ferramentas para quebrar cocos, o que comprova sua inteligência. O parque possui trilhas entre árvores ou abertas para a caatinga. Paredões feitos com pedregulhos podem ser escalados para se obter melhor visão do panorama. A Pedra Furada desafia-nos a descobrir como a natureza escavou um buraco no meio da rocha. Riachos convidam para banhos refrescantes. Cavernas e grutas mostram os segredos da Terra. Adolescentes com espírito aventureiro se sentirão em casa. Sobretu-

do quando descobrirem que aqueles primeiros habitantes não viviam, em média, além dos 18 anos, e que portanto todos aqueles desenhos foram feitos por adolescentes. A identificação entre gerações separadas por milhares de anos se consolida. São Raimundo Nonato possui estrutura básica para o turismo. Os guias são competentes. A região pode ser visitada o ano inteiro. O primeiro coração do Brasil bateu por lá, no peito dos nossos verdadeiros descobridores. Cabrais cujos nomes a História esqueceu. =

Luís Giffoni é cronista, romancista e palestrante. Autor de 26 livros, tem nas viagens uma de suas paixões. Nelas aprende a diversidade do mundo e das pessoas, experiência que acaba traduzindo em suas obras. Neste espaço, dá dicas sobre como aproveitar o mundo com os pequenos. giffoni@canguruonline.com.br

FOTOS: [1] GUSTAVO ANDRADE [2] SERRA DA CAPIVARA WIKIMEDIA COMMONS

Estamos tão influenciados pela Europa que nossos filhos ainda aprendem que Cabral descobriu o Brasil. Raramente nos lembramos de que os índios aqui chegaram milênios antes. Se examinarmos melhor, houve gente que desbravou nosso país muito antes dos índios. Luzia, o famoso fóssil de Lagoa Santa, com 11.500 anos, é uma prova. Ela possui traços africanos, muito diferentes das tribos da Amazônia. No entanto, Luzia já não é nosso mais antigo habitante. Pesquisas mostram que, 12.500 anos antes dela, havia brasileiros no Piauí. Talvez muito antes disso. Foram os mais antigos colonizadores das Américas. A busca por esses pioneiros no sertão piauiense, perto de São Raimundo Nonato, quase na divisa com a Bahia, é uma aventura para nossos filhos mais crescidos que lhes trará diversão e conhecimento. Aventura de fato. Significa um mergulho no passado distante, na arte da sobrevivência, num modo de vida extinto, na cultura ancestral, na fauna e na flora da Idade do Gelo. Sem falar na beleza do lugar. Nossos antepassados deixaram milhares de pinturas no Parque Nacional da Serra da Capivara, cada uma mais interessante que a outra. Mostram seu dia a dia com caçadas, danças, cerimônias xamânicas. Há, ainda, desenhos que ninguém consegue interpretar direito. Formam o maior acervo rupestre do mundo, com mais de 700 sítios catalogados. Não por outro motivo a Unesco transformou o conjunto em Patrimô-


4nosso quintal

Boulevard Olímpico

FOTOS: BRUNO BARTHOLINI

POR Gabriela

Willer

VOCÊ JÁ SABE que o Boulevard Olímpico é um ótimo passeio para curtir com a família, mas o que muita gente ainda não descobriu é que a região ganhou dois novos parquinhos, que fazem o maior sucesso com a criançada. Um deles fica em frente ao AquaRio, na Praça Muhammad. Nele, há escorrega, discos pula-pula, balanços e um Spaceball, uma espécie diferente de trepa-trepa. O outro, pertinho da Igreja da Candelária e da Pira Olímpica, que, mesmo apagada, tem seus encantos, possui gira-gira, cama-elástica e gangorra. Os espaços contam com piso emborrachado, oferecendo maior segurança aos pequenos, e, de quebra, dão um colorido a mais ao complexo. A região, que reúne o Porto Maravilha e a Orla Prefeito Luiz Paulo Conde, foi idealizada para o lazer e a interação entre os cariocas e os visitantes que acompanharam os

Jogos de 2016, mas continua a fazer bonito. O programa é um verdadeiro passeio turístico por parte do centro do Rio. A paisagem é inspiradora, formada pela Baía de Guanabara, o Museu do Amanhã, o Museu de Arte do Rio (MAR) e a Ponte Rio-Niterói. O passeio público tem 3,5 quilômetros, desde a Praça da Misericórdia, próxima ao Aterro do Flamengo, ao Armazém 8 do Cais do Porto. No trajeto, não faltam crianças e jovens de patins, bike e skate. Caminhando pela orla na altura da Praça Mauá, há diversos painéis de nomes consagrados no grafite, como o de Eduardo Kobra, responsável pelo Etnias, que entrou para o Guinness Book como maior do mundo. Ao todo, mais de vinte artistas participaram do espaço destinado à arte de rua. Um dos locais preferidos para as famosas selfies. Isso sem falar que os painéis garantem char-

me e modernidade nas fachadas dos antigos armazéns do porto, onde ocorrem eventos durante o ano. Pertinho dos murais, adultos e crianças também se divertem registrando a visita em meio às enormes letras que formam a frase “Rio te amo”, onde, anteriormente, havia “Cidade Olímpica”.

Para se abastecer com comidinhas e bebidas, food trucks garantem uma variedade de sabores. Também são frequentes apresentações de artistas de rua. Caminhando mais um pouco, estão os centros culturais dos Correios, da Marinha, do Banco do Brasil (CCBB) e a Casa França Brasil. Então, que tal turistar com os filhotes em um dos mais recentes cartões-postais do Rio? A região está recheada de cultura e diversão para todas as idades, não dá para perder... =

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4padecendo no paraíso

Amor não tem erro Soares

JÁ SE FOI o tempo em que a mulher virava mãe e dedicava toda a sua vida aos filhos. Hoje a gente sabe que ter o nosso tempo é muito importante. A mulher não morre quando nasce uma mãe e estamos aprendendo isso. Mães felizes, filhos felizes. Quer se dedicar aos filhos? Dedique-se! Quer trabalhar fora? Trabalhe. Quer deixar a criança na escola em horário integral? Deixe. Quer ter babá? Tenha. Nenhuma dessas escolhas nos torna mães melhores ou piores.

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O que a torna uma boa mãe? Talvez nada. Pode ser que você nunca chegue lá. Talvez baste saber ouvir além das palavras e entender o que seu filho está sentindo. Nem todo o amor que você sente será suficiente para fazer um filho feliz, porque a felicidade de cada um está dentro de si mesmo e não nos outros. O primeiro passo para acertar a mão na criação dos filhos é entender que eles não surgiram de uma receita de bolo. Provavelmente eles não vão se tornar as pessoas que nós imaginamos, mas eles vão superar nossas

expectativas e vão nos ensinar mais do que aprendemos na vida. A gente sempre vai errar quando tenta acertar — e tudo bem! Amor não tem erro.

Padecendo no Paraíso é uma plataforma de apoio a mães coordenada pela arquiteta Bebel Soares e pela designer Tetê Carneiro. O grupo de discussão tem hoje mais de 7.000 membros. Na Canguru, as diretoras do Padecendo discutem assuntos como saúde, alimentação, sexo, viagens, inclusão e educação. www.padecendo.com.br

FOTO: PIXABAY

POR Bebel


FOTO: CELSO PUPO / DIVULGAÇÃO

4artigo | Isabel Rey Madeira

A introdução alimentar como prevenção de doenças O ESTILO DE vida saudável está em voga e é cada vez mais reforçado por especialistas e pelas mídias sociais, tanto do ponto de vista da prática de atividade física quanto do da alimentação balanceada. Os benefícios a longo prazo são comprovados e é indicado às famílias que introduzam as práticas desde cedo na vida das crianças. Para ser mais específica, isso deve começar ainda na gestação — e, dessa forma, depende diretamente da saúde da mãe. Estudos indicam que, mesmo antes do nascimento, durante a gravidez, o feto sofre influência dos níveis de gordura no sangue materno, podendo, inclusive, apresentar lesões nos vasos sanguíneos. Isso se mantém posteriormente, já que os bebês dependem fortemente do aleitamento para manter o organismo equilibrado. O leite materno é vivo: ele contém, além de nutrientes específicos para aquele bebê, microrganismos do bem e várias outras substâncias que promovem a saúde do pequeno, incluindo a formação da flora gastrointestinal. Por isso é tão importante que a mulher tenha seus direitos trabalhistas respeitados, especialmente nos primeiros meses após dar à luz. Toda mulher efetivada no regime CLT tem direito a quatro meses de licença-maternidade. Há uma legislação que faculta aos empregadores a concessão de um período de mais dois meses. O prazo segue uma lógica médica, pois é recomendado que a fase de aleitamento materno exclusivo seja mantida por seis meses. Após esse período, inicia-se a importantíssima fase de introdução de alimentos complementares. É nela que se criam os hábitos que provavelmente acompanharão a pessoa ao longo da

Para prevenir patologias, é preciso, além de proporcionar um estilo de vida saudável, acompanhar o crescimento e o desenvolvimento do pequeno

vida e influenciarão diretamente na prevenção de doenças como obesidade e a dislipidemia (presença de níveis elevados de gordura no sangue). Outras doenças comuns e que podem ser consequência de maus hábitos alimentares são a hipertensão arterial e o diabetes, que se agrupam na chamada síndrome metabólica e agregam fatores de risco para doenças cardiovasculares. Para prevenir esse tipo de patologia com a introdução alimentar, é preciso, além de proporcionar um estilo de vida saudável, acompanhar o crescimento e o desenvolvimento do pequeno. O pediatra e a família devem monitorar o índice de massa corporal e seguir os indicadores por sexo e idade estabelecidos pela Organização Mundial da Saúde. Assim, é possível contornar quadros de sobrepeso, impedindo que evoluam para níveis de obesidade, e garantir que a alimentação esteja cumprindo seu papel e fornecendo todos os nutrientes necessários ao desenvolvimento saudável da criança — e do adulto no qual ela vai se tornar. =

Isabel Rey Madeira é presidente da Sociedade de Pediatria do Estado do Rio de Janeiro.

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Uma brevíssima história dos direitos das crianças ANTES DE COMEÇAR a contar esse fragmento recente da história dos direitos das crianças, devo esclarecer um pouquinho sobre o direito à vida, à dignidade, à integridade física, à saúde, à liberdade, como existem hoje. Eles não são direitos patrimoniais. São chamados de direitos da personalidade. São inestimáveis e indisponíveis e, portanto, não podemos renunciar a eles, negociá-los ou transferi-los para outra pessoa, de forma geral e definitiva. O corpo não é propriedade do indivíduo, e uma pessoa não pode ser propriedade de outra pessoa. No entanto, esse modo de pensar é muito recente! E não pense que estou falando de escravidão. Eu me refiro a filhos legítimos, crianças, que eram consideradas propriedade de seus pais, nas melhores famílias! Até na Inglaterra do século XVIII. Os pais tinham liberdade para fazer quase tudo o que quisessem com seus filhos, que eram tratados muitas vezes como coisas. Mas foi justamente na Inglaterra que se originou o “princípio do melhor interesse da criança”. Em 1836, o princípio do best interest (melhor interesse) tornouse efetivo naquele país, levando o Estado a proteger as crianças dos abusos do poder dos pais. Em 1924, a Declaração de Genebra introduziu a ideia de dar à criança uma proteção jurídica especial. Naquela época, no Brasil, a lei só existia para punir o menor que praticasse infrações, ou seja, a lei protegia a sociedade da criança delinquente, mas não protegia a criança dos abusos da sociedade, do Estado e da família. A nossa Constituição da República de 1988 adotou a “absoluta prioridade” da criança e do adolescente em seu artigo 227.

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A aplicação do melhor interesse da criança permanece como um padrão, dando mais valor às suas necessidades do que aos interesses pessoais dos pais

A adoção desse pensamento no Brasil reafirmou o princípio do melhor interesse da criança também presente na Declaração Universal dos Direitos da Criança, da ONU, de 1959. O Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990, também teve como princípios orientadores a prioridade absoluta no atendimento dos interesses das crianças, o princípio do melhor interesse da criança, entre outros. Atualmente, a aplicação do melhor interesse da criança permanece como um padrão, dando mais valor às suas necessidades do que aos interesses pessoais dos pais. No entanto, é preciso entender que os “princípios” funcionam de modo diferente das “regras”. Regras funcionam no “tudo ou nada”: são válidas e aplicadas integralmente ou não são aplicadas por não serem válidas. Já os princípios concorrem com outros princípios, e devem ser ponderados. E o princípio do melhor interesse da criança não é uma exceção.=

Bernardo Antonio Gonçalves Monteiro é advogado formado pela UFRJ com pós-graduação em direito civil pela PUC-RJ. Atua em seu escritório, MTK Advogados, no Rio de Janeiro.

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4artigo | Bernardo Antonio Gonçalves Monteiro


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4crônica

Minha vida sem mim Há pouco conheci a expressão “mãe solo”. Finalmente compreendi que o conceito de “mãe solteira” não fazia sentido — difícil notar o absurdo quando nunca estivemos fora dele. Em meio à tristeza de perder o pai do Francisco em plena gravidez, foi um susto me encaixar no tal estereótipo. Não me preocupavam olhares preconceituosos, e sim o medo de assumir sozinha um papel para o qual eu não me sentia madura, mesmo aos 36. Ainda não me sinto, embora o Fran já tenha 10 anos, mas não há como negar: já andamos um bocado. Das lanternas que iluminaram meu caminho, minha mãe e minhas avós acenderam sins e nãos. Eu poderia dizer que minha grande inspiração foi Dora, mãe da minha mãe, que também perdeu o marido grávida — aos 23 anos e tendo já duas meninas pequenas para cuidar. Mas ela precisou ter tanta força, que carregou a mão. Passei a vida citando sua história, impactada pela viuvez eterna que ela se impôs. Foi meu exemplo a não seguir. Já minha mãe, que como meu filho não pôde conhecer o pai, viveu levando a palavra altruísmo às últimas consequências — herdou o heroísmo da mãe e um peso a mais. As duas tinham luz de sobra, mas falhavam quando voltavam os holofotes para si mesmas. Sei que tenho muito das mães que elas foram, mas busco a todo custo ser outra mulher. Francisco sabe que seu coração bateu por mim quando o meu ficou sem voz. Que cavou em mim talentos escondidos, vindos à tona para que eu reagisse. Sabe também que não foi só para que eu desse conta de sustentá-lo — dar conta é pouco para o meu gosto. Eu queria saborear a trajetória. Por isso me foi tão importante o exemplo da outra avó, a paterna, cujo forte não era a maternidade, e sim quebrar paradigmas. Não imaginava que isso me seria tão necessário. Com o tempo percebi que justamente as mães que não estão sozinhas na tarefa de criar seus filhos são

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cris guerra e o filho francisco

O abandono de si mesma compromete a autoestima, ameaça que chega rápido à relação com os próprios filhos e com o parceiro as que muitas vezes se abandonam durante a viagem. Mitifica-se o papel materno a tal ponto que parece irresistível tornar-se mártir em nome do amor a um filho. As consequências, porém, podem ser devastadoras. O abandono de si mesma compromete a autoestima, ameaça que chega rápido à relação com os próprios filhos e com o parceiro. De uma coisa, eu tinha certeza: eu só seria boa mãe sendo feliz. Não hesitei em lutar pela mulher que havia em mim, certa de que passar pelo luto não é morrer junto. Acordava sozinha nos fins de semana pra cuidar do Francisco, mas ia dormir pensando em como produzir o prazer que seria meu combustível. E a moda, que havia sido tão importante na construção da minha identidade, não largou da minha mão nem por um minuto. Não pude seguir sem mim. Mãe e mulher se uniram de forma definitiva, e assim não me faltou sequer um pedaço. A perspectiva absolutamente particular de maternidade me mostrou que podemos, sim, ser mulheres inteiras (e deliciosamente imperfeitas), desde que isso seja prioridade. Se é um desafio aceitar que nossos filhos não nos pertencem, a boa notícia é que eles também não são nossos donos. E na leveza do não pertencimento mora o prazer do voo. =

Cris Guerra é publicitária, escritora e palestrante. Fala sobre moda e comportamento em uma coluna na rádio BandNews FM e a respeito de muitos outros assuntos em seu site www.crisguerra.com.br. Na Canguru, escreve sobre a arte da maternidade. crisguerra@canguruonline.com.br


a r e f e vc, é em

quê?

É UM, DOIS, TRÊS E JÁ!



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