Em folhas soltas, com o que. Cabe a Que textos possam também sejam. Que reverbero.
pinturas e textos não indicam o que tem relação quem interagir com eles a articulação das coisas. ser lidos em voz alta e que as imagens pintadas haja ecos, ruídos, derivas, desdobramentos e
Texto de apresentação do projeto projeto: desejo motivo 1a edição artista proponente: Carolina Paz local: ateliê Coletivo 2e1 ano: 2016
Artista plástica troca pinturas por histórias. Envie uma carta com seu pedido, desejo, assunto, motivo para criação de uma imagem baseada em sua história.
1- A mensagem precisa ser escrita ou impressa em papel. Essa é a condição para a troca. A artista ficará com a carta e a trocará por uma pintura. 2- Todo e qualquer outro conteúdo enviado será considerado como um “anexo” ao texto da carta. 3- As pinturas (em óleo sobre tela) serão produzidas por ordem de chegada das cartas. 4- A data limite para recebimento das histórias é 15 de abril de 2016 (data de postagem ou entrega em mãos). 5- Durante o período de execução das obras, serão realizados encontros (do tipo “ateliê aberto”) para visitação ao processo de realização das obras, confraternização, discussão e palestras com assuntos relacionados ao projeto. 6- "Acontecimento" – Os trabalhos produzidos serão expostos ao público e entregues aos solicitantes no encontro de encerramento desta edição, que deve acontecer em até, aproximadamente, um ano (meados de 2017).
Importante: conheça os detalhes sobre a participação no projeto.
Detalhes sobre a participação no projeto
Além dos termos publicados no texto de apresentação do projeto, também devem ser consideradas as seguintes observações:
1- O remetente (solicitante) pode ser “anônimo”, porém é fundamental conhecer seu endereço para que possa ser contactado. 2- A identificação dos nomes de todos os solicitantes, quando relacionada às histórias enviadas, será mantida em sigilo em todas as publicações derivadas do projeto. Seus nomes serão publicados em forma de lista de agradecimento e menção em divulgação, mas sempre sem a identificação com a história enviada. 3- A participação do solicitante no projeto é vitalícia e parte da obra. Essa participação é atribuída também aos seus herdeiros. 4- O solicitante, ao adquirir uma pintura, torna-se colecionador de arte e como tal deve entender que é um guardião da obra e que deve emprestá-la à artista, sempre que solicitado, para fins expositivos e de publicações. 5- O solicitante deve participar do "acontecimento" (dia da exposição/encerramento da corrente edição do projeto) e retirar sua pintura neste momento. Caso não seja possível estar presente, deve indicar alguém de sua confiança que o represente (esta pessoa também será participante da obra). 6- É de responsabilidade do solicitante manter seu contato atualizado para que possa continuar participando dos desdobramentos do projeto. 7- Este website (desejomotivo.com.br) é o meio principal de contato da artista com todos os solicitantes; através dele serão publicadas informações sobre o andamento do projeto.
Dúvidas e contribuições para mais detalhes, envie um e-mail para: desejomotivo@carolinapaz.com
A fachada do ateliĂŞ Deixe aqui uma carta com seu pedido, desejo, assunto, motivo...
Uma poética das relações humanas O mundo da arte resulta de um conjunto complexo de variáveis que envolve diversos aspectos do que genericamente se chama “cultura”, o que inclui nacionalidade, classe, várias forças econômicas, formas simbólicas, mídia e outras determinações. Essa complexidade, ligada ao perfil heterogêneo das sociedades modernas, que por sua vez se amplifica no mundo globalizado, não torna os rumos da produção artística aleatórios nem arbitrários, mas difíceis de prever, avaliar, interferir. Intervenções bem-sucedidas no mundo da arte são o resultado de uma correta leitura desse “espírito de época”, ou desse “tempo-deagora”, como diriam leitores dos filósofos Hegel e Benjamin. Assim, por exemplo, o filósofo e crítico Arthur C. Danto descreveu o trabalho de Andy Warhol como o de alguém que, ao menos durante alguns “anos milagrosos”, teve inteligência e sensibilidade para compreender os movimentos do mundo da arte e, por isso, ofereceu revelações sem precedentes acerca da própria natureza da produção artística. Em face da indecidibilidade inerente ao mundo da arte, a artista Carolina Paz cria Desejo Motivo pela observação de característica simples e antiga da natureza humana: a relação de interdependência entre os indivíduos no seio das sociedades. O crítico Nicolas Bourriaud acredita ser possível erigir uma “arte relacional” alicerçada no universo das interações humanas, seja com “objetos produtores de socialidade”, seja provocando “momentos de socialidade” propriamente ditos. Apesar da generalidade do que pode ser considerado objeto produtor de socialidade – o que envolve quase todos os tipos de produção artística, a ponto de Bourriaud intitular seu pensamento de “estética relacional” –, os trabalhos com frequência considerados relacionais tendem à esfera conceitual e acompanham o movimento que o crítico Hal Foster descreveu como “horizontal”, em direção a questões políticas, sociais e culturais, por oposição à “verticalidade” das preocupações concernentes à especificidade do meio ou à autonomia do fazer artístico. Sabe-se que as ideias de Bourriaud pertencem ao leque de referências teóricas da artista, que, por outro lado, exerce prática duradoura de pintura. Apesar de uma pintura poder produzir socialidade e do significado originalmente coletivo do “tema”, “motivo”, “assunto” da pintura (por mais enraizado que esteja, como descreve Klee no texto “Confissão criadora”), a pintura parece pouco afeita à arte relacional, sobretudo a pintura de teor intimista. Desejo Motivo surpreendentemente articula a produção pictórica introspectiva à ação de caráter relacional, iluminando o processo ainda cercado de mistérios da criação artística, conforme designa, com inteligência, o título. O que motiva um artista a produzir determinado trabalho, a escolher determinada forma para o trabalho? Uma primeira leitura da expressão “desejo motivo” sugere falta de assunto, um posicionar-se
frente ao esgotamento das linguagens artísticas que obriga a artista a recorrer aos espectadores em busca dos temas, invertendo a direção convencional da atuação da artista sobre o espectador, por meio da obra, por uma atuação do espectador sobre a artista por meio do texto que inspira a obra. Uma vez produzidas as pinturas e compartilhados os textos, essa primeira impressão, que talvez não seja de toda falsa, altera-se sensivelmente. A heterogeneidade dos textos obtidos pela artista revela, contudo, um traço comum nas diversas maneiras de tratar da necessidade de contato com os outros, de que nem mesmo uma boa vida solitária prescinde completamente. A tensão entre a intimidade e o convívio se expressa pela memória do contato ou por sua procura, ou pela própria consideração dos meios da escrita, da carta, da troca e da pintura como formas de contato humano real, por oposição às simulações que se impõem pelo trabalho alienado, pela privatização do espaço público ou pela iconomania das redes sociais. Alguns textos atingem intensidade poética e elaboração formal. Outros evitam de modo intencional qualquer pretensão literária. Todos contribuem para o conjunto da obra com uma realidade humana sem a qual as pinturas produzidas por livre associação seriam uma “ciranda aleatória de signos descarnados”, como o crítico Fredric Jameson deplora no pós-modernismo. Com essa “realidade humana”, essas pinturas ganham o significado afetivo e coletivo que falta aos não-lugares por onde se passa sem deixar marcas, às imagens que tudo querem mostrar e, por isso mesmo, escondem o real. Aflora nos textos uma dimensão humana da experiência vivida, protegida pela intimidade da linguagem epistolar e pela garantia do anonimato. O trabalho de arte propriamente dito não se restringe à pura forma visual das pinturas, o que as tornaria as únicas contrapartes materiais da obra. Os textos, as pinturas e o momento do encontro entre os missivistas e as pinturas são aspectos de um mesmo “objeto distribuído no tempo e no espaço”, conforme formulação do antropólogo Alfred Gell a respeito do corpus das obras de arte. As figuras que aparecem nas pinturas são como portas que se abrem para uma miríade de imagens produzidas coletivamente pelo contato estabelecido entre a artista e os participantes. Com isso, Desejo Motivo inscreve-se na linhagem de experiências como a da psicanalista Nise da Silveira, que via na imagem a “porta para o mundo interno” dos pacientes, alguns dos quais se tornaram artistas chancelados pelo mundo da arte; ou de Lygia Clark, que transitou da produção artística para a prática terapêutica, com seus “objetos relacionais”, que não são obras de arte, mas partes de uma obra de arte que é o próprio uso sobre os “clientes”, que seria mais ou menos bem-sucedido na medida em que esses fossem capazes de produzir e relatar imagens internas a partir da experiência a que se submeteram. A grande diferença entre Desejo Motivo e a “estruturação do self” é que temos acesso aos textos que deflagraram as imagens do trabalho de Carolina Paz, desvendando o
mistério, como diria Danto; ao passo que os registros de Lygia Clark permanecem quase todos desconhecidos por causa da disputa dos herdeiros por direitos autorais. A ideia de um “objeto distribuído” composto por cartas, pinturas e por um encontro aponta para uma definição de imagem que não se restringe à visualidade da figura, mas envolve diversas interações entre figura, corpo e meio, tal como pensa Hans Belting, autor de Uma antropologia das imagens. O jogo livre entre significado e significante é um aspecto central de Desejo Motivo, uma vez que a série se constitui pela associação entre figura e palavra (ou sinal gráfico). O procedimento retoma a associação livre surrealista e implementa uma “produção automática de causalidade”, conforme descrição do crítico Peter Bürger para o legado das vanguardas históricas depois do fracasso das intenções vanguardistas. Sobreposição ou montagem também caracterizam o conceito pós-vanguardista de obra de arte segundo Bürger e aparecem explícitas no trabalho de Carolina Paz. A figura desmente o caráter apenas indicial do sinal gráfico; antes, dá-lhe vida. Já o signo modula a figura, altera o seu sentido e indica, talvez no fundo, uma terceira dimensão da imagem, que não se deixa definir claramente, inapreensível, indizível e irrepresentável, mas ao mesmo tempo interpessoal, afetiva e vivida: um contato humano real, para além de toda simulação. As pinturas de Carolina Paz poderiam ser admiradas independentemente do conjunto de relações travado em torno delas, mas isso equivaleria a considerar uma obra de arte a despeito do contexto histórico, do posicionamento em relação aos outros, da própria vida dos artistas (as cartas escritas por eles). Não estamos dispostos a sacrificar o mundo da vida, nem mesmo quando nos vinculamos a uma certa visão modernista de arte. Assim, não apenas as cartas, com desejos-motivos, devem ser consideradas partes constitutivas do trabalho, mas também o momento que a artista chama de “acontecimento”, termo que a teoria opõe a “evento”, como algo que irrompe no real de maneira espontânea, inexorável e imponderável. Como foi dito, Desejo Motivo opera na chave da “produção automática de casualidade”. Apesar do planejamento das fases do trabalho e do controle técnico da prática da pintura, ou justamente por causa deles, um alto grau de imponderabilidade apresenta-se no perfil dos participantes, no resultado das pinturas produzidas por meio de associação livre e, por fim, mas não menos importante, no momento tradicionalmente significativo para a prática da pintura quando o trabalho for entregue. A história da arte de fato está repleta de relatos sobre deslumbramentos e incompreensões nesse contexto de revelação. Ecos da história da arte serão visíveis no momento em que os autores das cartas buscarão, em meio à série de pinturas, aquela que traduz a sua própria história. A diversidade esperada de reações completa Desejo Motivo, tornando-o uma espécie
de diagrama da experiência de expressão artística, revelando as relações que conectam autor, obra e público. Mas a imagem-acontecimento desse momento de retribuição pelas cartas enviadas não é apenas uma conclusão; deve reverberar, produzindo novas relações. As pinturas serão levadas com as pessoas, mas podem ser expostas em outras circunstâncias. Assim, os “desejosmotivos” dados e retribuídos permanecem inseridos no contexto de uma troca sistemática de dádivas que estabelece um determinado registro da circulação de imagens. Dúvidas, emoções, estranhamentos, hesitações vividas pelos participantes ao escrever suas histórias serão redimidas e compartilhadas nesse encontro, na imagemacontecimento que é também uma imagem-dádiva. A realidade humana não é apenas de interdependência, mas imaginal, isto é, mediada por imagens, seja nas relações interpessoais, seja na relação com o mundo, entre o ser e o mundo, tanto quanto entre o ser e os outros. José Bento Ferreira, Junho de 2017.
CAROLINA PAZ – OS DESEJOS E OS MOTIVOS DO OUTRO Na busca por motivos para dilatar sua pesquisa em pintura, Carolina Paz pôs em circulação na internet e na fachada de seu antigo ateliê a seguinte chamada: “Envie uma carta com seu pedido, desejo, assunto, motivo para criação de uma imagem baseada em sua história”. Assim, a artista acionou um processo de coleta de histórias e de solicitações a ela endereçadas, que resultou em uma coleção de cartas sobre a qual se debruçou para criar uma série de trabalhos. Firmou com diversas pessoas um contrato informal de troca, que rezava o câmbio de uma história por uma pintura, e estabeleceu uma área de relações e cruzamentos que, de certa forma, permitiu ao espectador ter determinado grau de participação na gênese da pintura. Na coleção de cartas, agrupam-se narrativas de diferentes naturezas: memorialismo poético; crônicas do cotidiano; reflexões sobre a arte. Nos dois primeiros grupos, afloraram recordações da infância, afetos, relatos de solidão, saudade, felicidade, amargura, encontro, separação, casos de amor, problemas familiares, desejos de autonomia e independência, projetos de trabalho e de viagem, pulsões de vida e de morte. No terceiro grupo, emergiram problematizações de questões que envolvem o processo artístico aberto e permeável à intervenção de outro agente que não o artista. No mundo contemporâneo, a forma de comunicação que tradicionalmente conhecemos como carta foi posta em xeque com a utilização de equipamentos tecnológicos, que gradativamente alteram os modos de comunicação humana. As facilidades promovidas pela velocidade e pelo alcance dos meios digitais (e-mail, redes sociais) tornaram a carta um veículo moroso, obsoleto, relegado ao abandono e ao esquecimento. Enfim, há ainda que se considerar que, em meio à crise das relações e da comunicação humanas, imperam a impessoalidade, a frieza da objetividade, a síntese e a abreviação que atendem ao imediatismo, o narcisismo e o egocentrismo que impedem de ver e de falar com o outro. O contrário parece não ter mais lugar, mas apenas parece. Em Desejo Motivo, os meandros do processo de troca da narrativa escrita por imagem pintada ativam outro processo de troca entre subjetividades, no qual ocorrem compartilhamentos de intimidades, experiências, vivências, entendimentos e sentimentos. Na verdade, para a artista, o contato com outras pessoas inseridas em seu processo criativo, ao mesmo tempo em que amplia suas relações humanas, substancia e integra as obras da série Desejo Motivo. A conversação inicial, travada por meio de cartas enviadas por dezenas de remetentes a um só destinatário, ao cabo do projeto é aberta por meio da pintura ao público. Apesar de terem como “assunto” e “motivo” temas literários, coletados no inventário de pedidos e desejos levantados junto àqueles que atenderam ao convite da artista, as pinturas resultadas ao final do processo não são literais e ilustrativas das motivações alheias que acarretaram suas existências. Com certa autonomia dos motivos compilados, elas obedecem a um raciocínio interno já presente na concepção das pinturas que integraram a série Teoria dos Conjuntos (apresentada há cerca de dois anos). Trata-se de um raciocínio que opera na produção de alegorias, reunindo fragmentos
descontextualizados de suas respectivas origens, criando sentidos com a junção de partes tão heterogêneas. As alegorias de Carolina Paz são construídas pela relação entre uma única imagem e outro elemento linguístico, tal como letra, palavra, numeral ou sinal. O segundo não atua como legenda do primeiro, embora em alguns casos sugira deslocamentos poéticos e trocadilhos semânticos. As alegorias funcionam visualmente também como espantoso método de alfabetização, no qual as figuras são acompanhadas por palavras, letras ou sinais tipográficos. O que a imagem de um pedaço de carvão tem a ver com a palavra “máquina”? Aí lembramos que a máquina a vapor (movida com a queima de carvão) carrega a mensagem subterrânea da viagem sonhada. Ou o que a imagem de uma bola tem a ver com a palavra “voa”? Pensamos no movimento da bola durante a cobrança de um pênalti. A figura de um coração é associada às letras A e O, que recuperam o som da palavra que nomeia a própria figura. De maneira estranha e desconfortável, parece haver algo impreciso que liga a imagem ao texto ou ao sinal, ainda que seja o simples som de um fonema. Do ponto de vista formal, as pinturas seguem uma metodologia bastante econômica de procedimentos. As telas em pequenos formatos guardam a escala da intimidade e têm as bordas das superfícies e as laterais do chassi destacadas pelo uso de cores e por acidentes que reafirmam a condição da pintura não somente como superfície-imagem, mas também como um objeto no mundo. As pinturas representam fragmentos do corpo humano, elementos vegetais, animais e minerais, alimentos ou objetos de toda sorte, associados a palavras ou sinais, aplicados frontalmente sobre fundos marcados pela materialidade da tinta, ora empastada ora diluída, pelo movimento do pincel e por cores praticamente chapadas, porém desejosas de guardarem afetividades. Em Desejo Motivo, Carolina Paz arma um campo de possíveis articulações entre esses elementos (imagem e palavra, figura e fundo) e convida o espectador a explorá-lo. Divino Sobral Goiânia, maio de 2017.
Desejo Motivo é desdobramento de uma série de trabalhos em pintura que venho desenvolvendo desde 2014, quando comecei a incluir “imagens aleatórias”, textos e grafismos, por associação livre, a partir de um repertório compartilhado com pessoas do meu convívio íntimo, que misturava acontecimentos presentes e cotidianos a memórias e afetos traduzidos em objetos, espaços, práticas espirituais, ditados, entes humanos e animais domésticos etc. Articulando figuração e símbolos gráficos (palavras, ícones, números etc.) em um fundo de cor viva e plana, esses elementos agora configurados em pinturas geravam novas histórias, novas narrativas, se tornavam outras coisas com outros significados. Essas pinturas resultaram em uma exposição realizada em 2015 (Teoria dos Conjuntos) e na idealização do projeto Desejo Motivo. Desta vez o interesse é receber as histórias (que não precisam ser histórias ao pé da letra) materializadas em texto no papel e abrir este jogo de trocas para inclusão de pessoas que ainda não conheço. Foi então que, no início de ano de 2016, publiquei na internet e na fachada do meu ateliê que estava recebendo esses “pedidos, desejos, assuntos, motivos” para criar uma imagem em pintura a partir dos mesmos. Cada carta recebida, sem passar por qualquer seleção, é lida (uma por vez) e, como resposta, crio uma imagem em pintura a óleo. Imagem acompanhada de, na maioria das vezes, uma palavra sem ser legenda. Não tive, nem tenho, interesse em ilustrar os textos recebidos, mas sim devolver algo que abra a conversa para um ponto a frente, para uma nova direção. Afinal, todo esse processo é como um pretexto para criação de vínculos e geração de novas histórias. Recebi 44 cartas entre 04 de janeiro e 15 de abril de 2016. Concluí as pinturas em novembro. Em 24 de junho de 2017, no evento que chamo de “acontecimento”, parte da obra, entrego as pinturas aos autores das cartas (que chamo de “solicitantes” – termo que acho curioso e que de alguma forma distingue sua participação da de demais participantes com outras funções no projeto). Além deste primeiro encontro para entregar as pinturas, há a vontade de que, vez em outra, esse ajuntamento dos trabalhos aconteça em diferentes lugares e tempos, convidando todos a participar mais uma vez, “emprestando” os trabalhos para que estejam novamente e novamente juntos. Pretexto para encontrar essas pessoas e seguir com mais histórias derivadas. Deriva necessária, a caixa-obra é uma publicação poética, um livro de artista, que avança nesse jogo de articulação de imagens e textos para que mais pessoas possam participar dessa conversa. Então, ao final da produção das pinturas, todas foram reproduzidas em cartões impressos no tamanho real de cada uma delas, assim como os textos recebidos (mantendo o anonimato dos seus autores, conforme combinado). Em folhas soltas, pinturas e textos não indicam o que tem relação com o que. Cabe a quem interagir com eles a articulação das coisas.
Que textos possam ser lidos em voz alta e que as imagens pintadas tambĂŠm sejam. Que haja ecos, ruĂdos, derivas, desdobramentos e reverbero. Carolina Paz SĂŁo Paulo, maio de 2017.
Solicitantes desta edição Alexandre Silveira Alina d'Alva Duchrow Alzira Ballestero Amanda Andersen Anderson Costa Barbosa Antonio Malta Caio Junqueira Franco Camila Geracelly Carlos Pilegi Carmen Milka Oquendo Yosino Christiane Martins Claudia Zelmanovits Cristina Suzuki Dalvaci Porto Daniela Arrais Daniele Oliveira Erico Marmiroli Felipe Cabral Fernanda Carvalho Gabriela Noujaim Glaucia Ribeiro de Lima Henrique Mendonça Cutait João Perassolo Laura Teixeira de Oliveira Lilian Walker Luana Lins Maria Erineide Marilia Del Vecchio Michael Silva Myriam Zini Nalim Garzesi Olintos Andrade Pedro Hurpia Pitiu Bomfin Raquel Medeiros Renata Chelli Arcoverde Ricardo Lelis Sheila Ortega Sheila Regiane Soraia Dias Thiago Zilio Valeria Garcia Veronica Filipak
Agradecimentos Ana Rocha Bruno Dunley Carolina Mossin Divino Sobral Douglas Ferreira Gisela Gueiros José Bento Ferreira Josué Mattos Julie Belfer Lótus Luiz Menezes Natália Ivanov Pierre Lapalu Ricardo O. Kugelmas Rivane Neuenschwander Wagner Priante
Ficha técnica Artista proponente: Carolina Paz Produção: Ana Rocha Textos críticos: Divino Sobral e José Bento Ferreira Convidada especial: Rivane Neuenschwander Assistência: Natália Ivanov Revisão: Wagner Priante Fotografia: Carolina Mossin Vídeo: Douglas Ferreira Montagem: Luiz Menezes Local do recebimento das cartas e realização das pinturas: Ateliê Coletivo 2e1 – São Paulo, SP Local do “Acontecimento”: Auroras – São Paulo, SP
Desejo Motivo, edição 01, 2016/17 – 44 cartas, 44 pinturas em óleo sobre tela, dimensões variadas.
maço cata
(r) março carta
Legal! A União faz a força Marta era uma menina muito obediente a seus pais. Um dia seus pais tiveram que ir acampar na mata e Marta não poderia ir, então ela ficou na casa de sua amiga Laura. Quando chegou lá ficou de água na boca pois a casa era enorme e muito chique, cheia de animais, tinha patos, patas e muitos outros. Toc! Toc! Toc! Ela bateu na porta e apertou a campainha, mas ninguém atendeu, ela só viu uma carta na porta que dizia: Querida Marta, fiquei muito doente e agora estou numa maca no hospital e minha família vai ficar aqui comigo então queria que ficasse à vontade na minha casa e se quiser comer é só pedir para a minha robô empregada que ela sabe cozinhar e limpar a casa. Fique à vontade! De sua melhor amiga Laura Fiquei meio sem jeito de entrar lá com um robô cozinheira e faxineira, mas também fiquei com muita pena de minha amiga. Quando entrei não acreditei em meus olhos, a casa era linda! Na hora do almoço, robô me serviu um prato enorme com bife, batata, alface e muitos outros tipos de comida. Quando comi alface percebi que ela tinha colocado o maço também, então pedi um copo de água porque maço é ruim. Quando fui para o quarto, fiquei com vontade de saber o que Laura tinha, então liguei para o hospital e descobri que ela precisava de um coração porque estava fraca, e se não achasse um antes do mês de março ela morreria! Fiquei muitíssimo triste, sem ela a vida era muito sem graça. No dia seguinte fui no quintal e vi marcas de sangue pela grama, então comecei a gritar, mas uma voz fraca dizia: Marta me ajude, é a sua amiga Laura! Então achei Laura caída no chão e seu corpo todo ferido, rapidamente a abracei, chorei, e as lágrimas caíram sobre seu corpo que ficou limpinho, e ela se levantou muito bem, e eu e ela fomos as melhores amigas ❤ Fim ❤
O Peso da Terra Deserto-me. A linha grave, contínua, rodeia longe cada passo que arrasto, riscando com as canelas rastros, vincos, que a areia teima em recusar, recobrindo meus pés com sua borracha de vento. Nesta contínua formação tangente a cada rajada, a deriva dos meus pés sobre este mar amarelo, é casco roto de um navio atracado. Andar parado. Debruço sobre o papel que a escrita não alcança, e antecipo o que não existirá, apesar destas palavras sem espessura. O risco no papel sem a pretensão de busca, para onde me levará? Na supressão do mundo, a palavra denuncia sua ausência. A solidão das palavras encontrará seu não ser aonde a linguagem se realiza, por isso poderei eu, ir em qualquer direção? Em que momento estou na realidade da linguagem? Ouço algo. Poderá Kais Kias estar me tentando com o grito dos antepassados, disfarçado dessa brisa quente? Ou o francês acertou, ao proclamar em meio aos românticos, que Antão estava tendo delírios desejosos ao sol? Esta revelação, minha tez velada torna somente possível, na linguagem insólita, ficção de um lugar que se desdobra no peregrinar que tece incessante sobre a escritura desta imensidão branca sem referencial nem horizonte, limiar de céu e terra. Servirá as escrituras perante esta eterna espera, se nem mesmo a areia estrutura uma muralha para me abrigar? Estas ondas de ouro não guardarão nenhum relato. O deserto em que a palavra se encontra, escorre pela ponta seca do dedo retesado. Criar é exílio. Presença como insuficiência, como indizível, nada mais se encontra sobre a égide do conhecimento. A ilusão é a única verdade. A fumaça que revelava ao profeta se dissipou. Nem a pedra virará pão. A profecia inaudita destes prisioneiros do tempo. Será mesmo minha essa voz que clama no deserto? A quem deus servirá? Terei no vazio minha ausência ou minha plenitude? Terá nessa voz constante a verdade que habita as profundezas do céu e da terra? Amaremos mais as trevas que a luz. Na lentidão do passo, construo as terras estrangeiras que compõem meu esvaziamento. Tempo de abrigar desertos, de dissipar e dissuadir, de se despedir de todas as portas. As três leis proclamadas voltarão para o céu como refletidas pelo espelho de miragens. Transitoriedade intensiva. A mesma solidão que move o dorso das costas induzindo ao passo é a mesma que evita o traço. Este semear das palavras ao vento encontrarão meu próprio ouvido. Algo terá relevância e ainda assim permanecemos perdidos em nossos desertos
Meu desejo é uma memória para além de mim... Temos tantas informações e tão pouco espaço para guardá-las e a arte tem refletido intensamente essa falta de memória, e tenta de diversas maneiras resgatá-la. Porém, o cerne da questão não está na memória propriamente dita, mas antes de tudo está na nossa compreensão e nosso uso do tempo. Vivemos, principalmente nas grandes cidades, um tempo sem tempo. Estamos sempre apressados, atrasados, sempre de olho no relógio. Para muitos até os momentos de lazer são pontuados com a hora de começo e fim. Um dia inteiro no parque virou tarefa quase impossível, fruir uma obra de arte no museu não deve levar mais de cinco minutos, se levar menos tempo melhor. É essa forma de pensar da contemporaneidade que nos faz viver muitas coisas num tempo cada vez menor. Mas o que aproveitamos e guardamos disso tudo? O tempo contemporâneo é um tempo turbinado, tão veloz que apaga aspectos essenciais da experiência que é a base da formação do conhecimento, e nos contentamos com um excesso de informação. Deixamos de ser pessoas conhecedoras para sermos apenas informadas de conteúdos que acabam se esvaindo assim que recebemos outra informação que consideramos valiosa. Vivemos realmente num período de recortar, colar, deletar. Mas para que nos serve toda essa velocidade? Tanta informação não apreendida? Podemos não saber as respostas, mas isso torna a nossa memória um objeto em escassez no mundo contemporâneo, e quando a sociedade perder sua memória por completo chegaremos ao fim de nossa história, não no sentido de que deixaremos de existir, mas seremos uma civilização do esquecimento, do "ao vivo", sem passado e sem futuro. Perderemos as distâncias do tempo e somente o agora interessará para essa civilização da memória vazia. Pensar assim me assusta, pois acredito nisso, mas eu não quero isso, quero uma memória que seja minha e que também vá para além de mim e que se torne nossa, que seja efêmera mas eterna, o que importa é que seja única mesmo que haja cópias.
Carolina, Belo projeto! solicito gentilmente uma pintura que traga uma lembrança de paisagem urbana, atual, caótica, às vezes velada, às vezes em camadas. Uma visão sua deste assunto que me encanta e que tem sido tema constante de meus trabalhos e pesquisas estéticas. Participo de um projeto do ______________________, onde (4 artistas) tratamos de maneira contemporânea a arte Postal. Falo de identificação com seu projeto que também se utiliza da correspondência via Correios. mais detalhes em: ______________________ Incluímos seu nome no nosso projeto. Parabéns pela atitude despretensiosa de compartilhamento. Abraços Piracicaba (SP)
16/01/2016
Desejo motivo p/ Carol Paz ❤ 1- Desenhos com padrões no tapete 2- Ao fazer a unha, cavá-la, brilho, pisar em uma abelha. 3- Ver chão. 4- Espumas. No mar câimbra. 5- No banheiro sentar e lembrar que deseja uma visita diferente, algo que quebre a rotina em um dia chuvoso, onde não há mais planos a seguir. 6- É mais que um – perfeito. 7- Ao procurar, encontra a pata de elefante, os raios e as árvores que um dia ansiou. 8- Um outro salto literal e o salto se quebra 9- O moedor 10- Uma pérola por articulação sob madeira. 20/01/2016
Há muito espero por cartas, aquelas em que se vê o rabisco, que se nota o desespero, o que se atesta que ali está uma verdade. Espero por destino novo, por reconhecimento de uma existência, pelo inesperado momento de encontrar em um simples envelope você eu Sinto que a carta tem cheiro e vida mas que de reviravolta se vive, e que talvez seu rasgo seja a parte mais bonita de nossa história. Não se deve desesperar.
Finjo que não vejo assimilo a culpa julgo a hipótese das minhas estrofes conterem erros sento, reescrevo assumo quem sou em segredo.
ME PEGUEI PENSANDO NO QUE ESCREVER MINHAS DOCES LEMBRANÇAS INFANTIS? MINHAS TRAGÉDIAS ADULTAS? MEUS DESESPEROS MATERNAIS? MINHAS DÚVIDAS AMOROSAS? MEUS QUESTIONAMENTOS PROFISSIONAIS? MEMÓRIAS? CARÊNCIAS? DECIDO POR INSTANTES, NÃO ESCREVER DECIDO ENTÃO, APENAS PEDIR: QUERO ABRAÇOS! ABRAÇO ABRAÇO ABRAÇO ABRAÇO ABRAÇO ABRAÇO ABRAÇO ABRAÇO ABRAÇO ABRAÇO
PINTADO DESENHADO ESCRITO ESCULPIDO TECIDO ENTRELAÇADO FOTOGRAFADO FILMADO DITO PROCLAMADO SENTIDO
ABRAÇO ENCERRADO
(MOTIVO) ___
8/1/16
O motivo pra criar uma imagem pode ser quando me lembro de alguém, alguém que por algum motivo me fez pensar... "onde será que ela tomava café quando esteve aqui?”, por exemplo. E, aí, por alguma razão você acaba falando dessa pessoa para alguém. E alguma coisa pode se concretizar em imagem, texto escrito ou palavras.
Era manhã cedo e fazia um frio gostoso com céu azul. Eu olhava as montanhas ao redor de Ouro Preto e tomava um pingado bem quente. Acendi um cigarro. O primeiro cigarro do dia é sempre o melhor. Vinte e cinco anos atrás, respirei confiante e me sentia indestrutível. Memória resgatada na tarde do dia 6 de janeiro de 2016
Fui uma criança mimada e muito protegida. Daquelas que não podia levar uma gotinha de sereno na casa, pra não ficar doente. Quando adolescente, não podia sair de casa sozinha. Meus amigos eram escolhidos a dedo pelos meus pais. Religião, roupas e namorados, idem. Comecei a trabalhar cedo, para ver se seria dona do meu nariz: não aconteceu nada de diferente. Aos 14, já trabalhava como vendedora de roupas, e ao 15 tive o meu primeiro registro na carteira de trabalho: nada aconteceu. Às vezes não tinha liberdade nem para terminar um namoro, caso o rapaz estivesse muito bem na fita com os sogros. Aos 19, me apaixonei pelo meu ex-marido. Apesar de não ter sido aprovado o namoro, continuamos juntos até nos casarmos. Achei que havia conquistado a minha tão sonhada independência. Os primeiros anos foram maravilhosos. Havia problemas, como em todo casamento, mas eu fechava os meus olhos, ciente de que eram apenas pequenos obstáculos. E de que ser independente era também pagar certo preço: ceder, ser resiliente, ser compreensiva e sempre plantar o bem, mesmo que às vezes colhesse o mal. Hoje é dia 11 de janeiro. Faríamos, eu e o meu ex-marido, 12 anos de casados. Mas o que estamos completando hoje são quase 2 meses de separação. E adivinhem onde estou? Na casa dos meus pais, e sem emprego, sem dinheiro, sem a tão sonhada independência, pois a minha vida foi construída e planejada para viver a dois, e não sozinha. Parece ruim, não? Mas não é. Descobri que a independência está muito além de viver longe da casa dos pais, de ter coisas só suas, de sair de casa para viver com um grande amor aos 22 anos de idade. Independência começa dentro de nós, sem esperar nada do mundo nem de ninguém. É não ter que viver pedindo sempre licença para continuar vivendo, esperando sempre pelas migalhas de aprovação e de apreço que te jogam para que se sinta completo. Eu não preciso de um emprego para começar a ser independente, nem de um príncipe que venha me resgatar em um cavalo branco, nem de um lugar só meu. Claro que estas coisas são importantes, e eu seria muito hipócrita em dizer que não as quero. O que quero dizer é que a liberdade que tenho em ser 100% eu e não o que gostariam que eu fosse, de fazer o que eu gosto, de me autoavaliar, de me reconstruir do zero e construir o que nem tive tempo esses anos todos, sem olhar para mim mesma; de me descobrir, de saber quem sou, o que quero e o que eu gosto, de andar por aí livre, sem peso de agradar e de ser aceita, ou de ter que me explicar sobre minhas loucuras, de não ter que me preocupar com o tempo e suas marcas, de ter todo o tempo do mundo para me reinventar, me reerguer, de estudar, escrever, ler, pintar, meditar, falar com Deus com todas as minhas lágrimas e súplicas... Não tem preço. Vou mentir se eu disser que estou feliz. Vivo em momento muito escuro, incerto, difícil e árduo. Mas estou descobrindo coisas sobre mim e sobre as pessoas, sobre tudo que acontece na vida, que tem feito valer a pena toda lágrima que cai. Se independência também for tudo isso, além de outras coisas que também preciso correr atrás, então eu acho que estou no caminho certo.
Santo André, 27 de janeiro de 2016 Querida Carolina, Achei demais este projeto! Ter uma história traduzida em pintura, e ter uma pintura sua, tudo de bom! A minha história, para sua motivação e inspiração: Quando criança, toda vez que chegava à casa dos meus avós em Ubatuba, sempre procurava por ele. Lembro-me ainda com detalhes o dia que cheguei e ele estava saindo de bicicleta, me chamou – vem ___! – eu corri do carro e pulei na garupa da bike e fomos pelas ruas, posso sentir o vento no rosto, o balanço da bicicleta e a sensação de segurança e alegria de estar passeando com ele ... Eu era seu xodó, fui a daminha no seu casamento. Depois, fui crescendo, nos afastamos, natural. No dia 26 de novembro de 2015, já muito cansado de um enfisema pulmonar, ele foi andar de bike no céu ... Fazia muitos anos que não o via. Ele morava em Ubatuba e estava muito doente; teve tempo de se despedir da família, foi muito cuidado e recebeu muita atenção e amor nos seus últimos momentos. Eu não pude visitá-lo... mas senti quando ele veio até mim, porém quem ele acessou foi a minha criança interior, aquela menininha que era encantada pelo tio e adorava andar na garupa da sua bike. E neste dia viajamos no tempo (o tempo é linear?...) e revivemos aquele passeio pelas ruas de Ubatuba, vento no rosto... sorrisos... Felicidade. Valeu, tio Dirceu! A gente se encontra por aí! ❤ ❤ ❤ (Como o tempo não é linear, sempre que eu quiser posso andar de bike com ele!) Carolina, quero uma pintura deste passeio, uma menina feliz na garupa da bike do tio Dirceu! Um grande beijo pra você, e pela ideia linda deste projeto! Se quiser alguma foto nossa pra ter uma noção de como somos (éramos...), me avise.
Jan 2016 Querida Carol, Fiquei muito feliz ao receber seu convite para escrever uma carta com meu "pedido, desejo, assunto, motivo para criação de uma imagem baseada em sua história." Também achei coincidência receber esse convite logo antes de viajar a Pousada Matutu, lugar que você me recomendou mais que cinco anos atrás. Finalmente cheguei. Vamos ao que importa: meu desejo e motivo para criação de uma imagem. Você pode criar uma imagem que aborde o assunto "homme-femme?" Quando nos conhecemos, em Inhotim em 2009, tinha acabado de passar um tempo sozinha em Campeche (Florianópolis, SC), onde escrevi um curto poema que se tornou uma espécie de mantra: La Vivante Elle est folle Elle est belle Elle est homme, et femme Elle est âme Elle est elle Esse poema se tornou inspiração para uma série de pinturas. Terminei todas (pelo menos acho que sim) com exceção de "Homme" e "Femme". Recentemente me mudei para a Gávea, e levei as duas telas de 1m x 1m20 cm comigo, nas quais vinha trabalhando desde o final de 2009. Você não imagina quantas camadas foram, quantas tentativas frustradas, e não via solução para aquelas duas telas. Pouco antes de meu aniversário em novembro, arranquei as telas dos chassis respectivos e joguei as duas fora. Já que não consegui finalizar esta ideia numa tela, nem criar uma imagem pintada em cima desse tema "homme - femme", peço por favor que você o faço por mim. Até penso em usar os chassis como suporte para trepadeiras num jardim, mas aí já não estamos mais falando de pintura e gostaria muito de completar a série. "Falle" está comigo no Rio, "Belle" está numa coleção em SP, "Âme" está numa coleção em Bruxelas, e "Elle" está comigo no Rio (essa pintura foi cortada em pedaços menores, e pode ser reconstruída como mosaico ou colagem.) Se precisar de mais informação, por favor me avisa, fornecerei o necessário. O pedido é simples – por favor, crie uma imagem que ilustre que "elle est homme, et femme." Uma imagem que mostre essas duas polaridades que se complementam e dialogam. Espero que seja mais simples, e mais claro para você do que foi para mim.
Um grande abraço,
10.01.16 Querida Carol E se a vida fosse uma invenção? Estou aqui em um barco, cruzando o rio da la Plata para ir a Buenos Aires ver uma exposição retrospectiva do Francis Alÿs que tanto amo, e da janela a água se confunde com o céu, azul cinzento ou cinza azulado, toque de amarelo uma linha indefinida infinita. Existe? Fecho os olhos e a linha fica, suspensa no tempo, apenas um instante... e logo vira uma mancha. Abro os olhos, a linha está reconfigurada, horizonte sem fim e sem direção. Existe mesmo? As lembranças também são suspeitas nesse sentido. Lembrança tem gosto de lembrança, sabor de lembrança e até cor de lembrança, bem especial. Aconteceu de verdade? E os fatos, os fatos que variam, apenas mudando um pouco o ponto de vista. E se a vida era uma invenção? Uma história sem narrador, sem fim sem sentido... [Desci do barco, cheguei na exposição... maravilhosa, fantástica, incrível. Esperando por mim um livro do artista chamado << Chimera do horizonte e outras considerações >>.] Ou talvez uma construção bicéfala, eu e os outros. FIM da minha consideração do dia. Beijos
São Paulo, 6 de janeiro de 2016 **Outros olhos. E armadilhas** Rio. Em Janeiro. Eu sempre planejo tudo das minhas viagens, mas neste réveillon decidi que diria sim a todos os convites dos meus amigos e veria onde esta cidade linda e louca me levaria. Assim fui parar na fila da Fosfobox na madrugada de domingo para segunda: um inferninho em Copacabana com uma pista underground que mais parecia uma caverna, paredes pretas e luz estrobo incessante, piso quadriculado à Embalos de Sábado à Noite e banheiros de azulejo vermelho rabiscados de caneta marcadora preta. No som, uma drag negra de dois metros de altura e cabelo com laços laterais, tipo os da Xuxa no anos 80, tocava popices e hip hop pop para uma pista que estava lá para se jogar e se divertir sem carão nem conceito, ou seja, todos os elementos de uma boa noite estavam ali. Sorri e fui ao banheiro. Em seguida, sentei brevemente nos bancos colados junto à parede enquanto esperava meu amigo comprar uma cerveja no bar. No exato instante em que ele pagava, dois conhecidos se aproximaram dele e o cumprimentaram. Um minuto depois chegou o amigo dos conhecidos, um puta gato. Levantei e me aproximei de todos, com a intenção de ser apresentado para aquele homem lindo de camisa preta, calça jeans, sapato estilo Richards - tipo de quem vai para um iate -, mais baixo que eu, alguns poucos cabelos grisalhos e um discreto sorriso contido que teimava em se abrir de tempos em tempos. Na minha cabeça, "How does it feel to feel?", do Ride, disco "Carnival of light", minha trilha sonora de uma semana inesquecível no Rio, tocava repetidamente. G., meu amigo, me apresentou para seus amigos, menos para o cara gato, porque afinal eles recém tinham dito oi. Contei para G. que queria aquele homem, exatamente aquele, e somente aquele, de toda a balada. G. fez a palavra circular, e então fui apresentado para H., o cara gato de preto. Conversamos gritando no ouvindo um do outro; ele fez uma piada de tiozão na linha "aqui tem muito homem, né?", ao que eu respondi ingenuamente que era uma balada gay, ao que ele re-respondeu que estava brincando. Por um segundo pensei que ele poderia ser hétero, levava jeito. Não senti clima de paquera. Ele era bem extrovertido, o que me assustava e me dava certa inveja. Como as pessoas conseguem interagir natural e impulsivamente com o desnorteado, usando meu novo self criado e nove anos de análise para aceitar o meu desejo ao passo em que lido com ele. Fui com G. para a pista, sorrindo e dançando e pensando na minha introversão no meio de tanta gente sorrindo e dançando. Eu vestia uma camisa quadriculada de linho, bermuda laranja e um par de sapatos azuis com estampa de flores. H. estava a passos de mim, sendo aberto com todos, bebendo, falando com um quê que eu achei que fosse paquera, sensualizando levemente com os romenos (sim, da Romênia; descobri na fila, ao entrar) ao seu redor, e eu desencanei. Ok, ele vai pegar alguém dessa roda, é isso. Ouvi a voz do meu analista: "Na vida, às vezes a gente ganha, às vezes perde". Senso comum, verdadeiro. Disse para G. para subirmos porque eu precisava respirar. Virei para H. e lancei um sorriso. Ele me olhou e sorriu de volta enquanto eu andava em direção à escada olhando para trás. No piso de cima, esperando alguém sair da cabine para que então eu pudesse mijar os litros de água e cerveja que vinha consumido desde às 20h, avistei H. subindo e parando atrás de mim. Ele não teria subido quatro lances de escada para ir justamente naquele banheiro, já que havia pelo menos uns dez lá embaixo. Como era lindo. Ele ajudou meu amigo a acender a luz do banheiro da direita, que por alguma razão era impossível de encontrar, e fez menção de me ajudar a achar o interruptor do da esquerda enquanto colocava a mão na minha cintura. Fechei a porta, acendi a luz, fiz xixi, dei descarga, abri a porta, apaguei a luz, lavei as mãos. Fui até à pista de dança deste mesmo andar superior, onde havia menos gente e era possível tomar um ar sem derreter. H. estava lá, dançando. Me aproximei dele, gato pra caralho, mas havia dois desconhecidos entre nós. Eles
saíram em seguida e então ficamos muito próximos. Ele puxou conversa, já com o braço na minha cintura. "Desde quando você está no Rio?" "Cheguei na quarta." Apontando para G.: "E vocês estão juntos?" "Não, ele está em Santa Tereza e eu na Glória." A Glória, do lado da Lapa, com os travestis da Praça Paris e aquela mistura absurda de gente do bairro, negros descalços com cara de que vão te assaltar, turistas americanos muito louros e com a pele muito branca sem pelos e casais formados justamente por estes dois tipos. O Rio, como não amar. "Então vocês são amigos?" "Sim, há anos." "Hum, bom saber que vocês não estão juntos. Bom mesmo saber disso." Esta última fala ele pronunciou já perigosamente perto de mim, com a bochecha roçando na minha enquanto falava no meu ouvido, e de novo a mão na cintura. Obviamente a gente se beijou, demorada e desesperadamente e com vontade, e apertamos o corpo um contra o do outro com força de homem. Estávamos em um canto da pista e isso era tudo o que existia. Eu o pressionei contra a parede, nos beijamos mais um tanto, paramos e seguramos as mãos, nos olhamos nos olhos com uma ternura incapaz de esconder a lascívia, passamos a mão no cabelo um do outro. Há quantos meses eu não sentia esse desejo. H. me olhou: "Você é lindo, sabia?" "Não, você é lindo." "Sou normal." "Não na minha escala." Ele não parava de me agarrar. Embora eu estivesse gostando e de pau duro, era impossível não sentir um desconforto por estarmos em público e sermos um casal que REALMENTE estava se pegando. Tendo a ser discreto e me perguntei se estávamos um grau acima ou se eu estava sendo pudico. Ondas de recato invadiam minha interminável sensação de prazer porque, se me fosse dada a chance de inventar um tipo físico para namorar, certamente seria como o dele. Eu perguntei que idade ele tinha, e ele: "Que idade você me dá?" "42?" "Menos." "Você é de 1983?" "Sim." "Eu sou de 1982, mas sempre me dizem que eu pareço mais velho. Até determinado ponto tudo bem porque eu poso de experiente, mas não quero parecer com 50." "Deve ser porque você tem entradas e alguns cabelos grisalhos." Ele falava e me perguntava coisas. Fico fascinado por essas pessoas que vão. Qual era minha profissão, de onde eu vinha, há quanto tempo estava no Rio, até quando ficaria, onde morava em São Paulo. Me encaixou em uma breve narrativa mental - J., 32 anos, jornalista, de São Paulo, solteiro há sete meses. "Estou colecionando informações sobre você. Coletando, quer dizer." Descemos. Lá a gente poderia se agarrar despercebidamente, me disse. Eu gostava de como ele pegava na minha mão e me levava pela pista, eu amava a sensação que isto me dava, a batida do som, as pessoas fervendo, a noite. A noite, onde habitei por vários anos. Descemos, subimos, descemos, subimos. Ele desprendia o
segundo botão da minha camisa, botava a mão no meu peito e ia com os dedos até o mamilo dizendo que adorava mamilos. Em seguida, abotoava de volta, arrumava a gola, tomava um ar, olhava pra mim: "Comporte-se". Ele me disse que foi casado por dez anos, também estava solteiro há sete meses, morou com o namorado em São Paulo, na Manoel da Nóbrega - a rua do meu restaurante japonês preferido. Mudou para o Rio há três anos e o casal ficou na ponte aérea até que o ex foi transferido pela empresa para fora do Brasil, ele ficou e o casamento acabou. Isso me tocou profundamente porque H. narrou a ida que eu queria ter tido na cidade cinza mas não tive: a de casado. Fiquei imaginando como seria dormir e acordar com aqueles olhos levemente puxados e aquela pele macia todos os dias. Estava pronto para viver um amor no Leblon, enfrentar infinitas horas de ônibus porque o preço dos voos está pela hora da morte, acordar e transar, tomar café da manhã no Cafeína e ir para a praia. Rio. Sonhei, imaginei, fantasiei. Delirei. Porque algum dia vai ter que rolar, não é possível tanta solidão. Por volta de 4h, H. pegou o celular do bolso, abriu o aplicativo de contatos e anotou meu telefone. Ele chamava H. I., nome composto incomum mas de gosto menos duvidoso do que seu avatar no WhatsApp, uma selfie dentro do carro. Sempre achei cafona gente que tira selfie dirigindo mas quando vi aquela fotinho achei apenas ❤ porque era dele e porque era ele. Eram quase 4h30 e, se era para essa história ter uma continuação, eu precisava dormir. "Me manda uma mensagem para eu saber que você chegou bem", ele disse. O motorista do táxi tinha 60 anos e corria pelas avenidas interminavelmente arborizadas do Flamengo ouvindo a previsão do tempo na rádio. Chegamos na frente do prédio, paguei e abri a porta. Entrei no elevador e depois de dar boa noite para o porteiro, que dormia na cadeira de frente para o ventilador ligado na máximo em função do calor, peguei o celular do bolso e li: "Chegou?" Continuava achando tudo incrível e me sentia no céu. Quer dizer, no Rio. Talvez seja por isso que a galera pire com esta cidade: sempre tem alguém aberto para você. Acreditei que a noitada se estenderia para o dia porque o que vem depois da noite é o dia e porque algum dia vai ter que rolar, não é possível tanta solidão. H. já havia feito planos para nós. O que do Rio você não conhece? então vamos tentar ir no MAR, amanhã é segunda, não sei se os museus abrem mas a gente descobre. Até quando você fica mesmo?, vamos viver esta semana. Dia 11 é meu aniversário, tome nota. Fui para o quarto, escovei os dentes, tirei a roupa e deitei. Apaguei a luz às 5h30. Acordei sobressaltado às 11h, meu coração palpitava violentamente e eu precisava comer para a insulina não me consumir. Detesto o efeito deste remédio. Eu sempre desperto destruído, num estado de ansiedade absurdo, quando vou dormir tarde depois de uma balada. Me sentia parcialmente nervoso, muito animado com meu futuro amor carioca e com muita fome. Lavei o rosto, coloquei as lentes de contato, vesti uma camiseta e uma bermuda e fui para a cozinha. Tomei café da manhã conversando com o dono do apartamento onde eu estava hospedado, V., um querido, que havia chegado na noite anterior. O leite morno, os carboidratos do sanduíche integral de queijo e presunto e o nosso papo me acalmaram. Saí da cozinha e voltei para o quarto. 14h22. Mandei um oi para H. no WhatsApp e fui escovar os dentes enquanto esperava a resposta. Aqueles minutos intermináveis em que eu acho que levarei um silêncio, que não vão me responder, que serei excluído e odiado para todo o sempre, mesmo que a realidade em geral me prove o contrário. Seguiu-se uma troca de mensagens em que H. flertava, me
chamando de lindo e dizendo que havia visto meu amigo G. no shopping Leblon e que isso o fez lembrar-se de mim. Ok, maybe we have a chance here. Eu disse que bom, como está o resto do seu dia?, quer encontrar mais tarde?. Crickets. Crickets. Meia hora depois ele responde que precisa mandar uns e-mails de trabalho e que é para a gente se falar novamente mais tarde para combinarmos. Take your time, eu disse, vou no cinema com um amigo. Ali eu senti que não ia rolar. Por que responder com mensagens insinuantes se você já sabe que não vai rolar é algo que não compreendo. Tem gente que banca, tem gente que não banca. Vi o novo filme do Tarantino quase dormindo na poltrona de tanto sono. Voltei, jantei uma pizza com V. 23h e nada de mensagem de H., como eu supunha, Fiquei chateado. *** "As coisas não precisam de você, quem disse que eu tinha que precisar", cantava Marina Lima nos fones de ouvido no ônibus que me trazia de volta para São Paulo dois dias mais tarde. Os inocentes do Leblon não sabem de você. O Hotel Marina, quando se acende, não é por nós dois.
Dear Carol, trabalhei tanto nos últimos dias que a única coisa que queria era chegar em casa e morrer no sofá. Hoje, porém, dia 23/01/16, estou sentada num banco da rodoviária de Curitiba, em pleno sábado. Resolvi dar uma mini fugida no feriado, pra ver se refresco a cabeça. Ai menina, tenho tantas histórias pra contar! Difícil escolher uma só. Mas resolvi desapegar dessa coisa de escrever a história perfeita, se não nunca ia escrever, vamos lá: Há alguns bons anos, estava eu no metrô Ana Rosa observando as pessoas na plataforma. Todos estavam ouvindo música no fone de ouvido e ninguém se olhava. Pensei "o que será que eles estão ouvindo?!". O trem chegou e sentei estrategicamente do lado de um cara da minha idade mais ou menos. Sem pensar muito, abri a bolsa, peguei uma nota fiscal e escrevi no verso: oi! "o q vc está ouvindo?", e dei pra ele com a caneta. Ele pegou, surpreso, e sorriu; entendendo a proposta, respondeu o bilhete e me devolveu. Tivemos então uma breve conversa por bilhete, sem exatamente se olhar nos olhos. Chegando na estação Sumaré, ele desceu e eu pensei: "ok, nunca mais vamos nos ver na vida, mas isso foi muito legal, preciso contar pra alguém! Foi daí que resolvi fazer um blog. Escrever no blog me motivava a fazer mais e mais dessas ações que deixavam minha rotina mais legal e surpreendiam pessoas. Dois anos se passaram, o blog cresceu, e eu ainda escrevia esse tipo de post. Parecia que quanto mais eu dava chance pra coincidências acontecerem, mais elas aconteciam. Daí um dia estava andando na 9 de Julho e achei uma 3x4 no chão. Era de um cara barbado, estilosinho, e resolvi escrever um post no meu blog descrevendo ele na vida real, tudo que eu achava vendo aquela foto. No final do post, sem pretensão, coloquei algo tipo: "Você conhece esse cara? Se sim, mostre esse post pra ele!" Semanas depois, alguém comentou lá dizendo que o nome dele era V. C. e me deram o e-mail dele. Eu não podia acreditar! Como São Paulo, uma cidade tão grande, podia ter se tornado tão pequena? Mandei um e-mail pedindo pra ele ler o post, mas 2 meses se passaram e nada :(. Achei então que não fosse ele, ou o email pudesse estar errado, enfim... O post já tinha sido supercomentado, todo mundo fazendo sua própria "análise" dele, eu estava bem feliz com a repercussão, mesmo sem encontrar ele. Até que recebo o seguinte comentário de um cara chamado J.: "Olá, tudo bem? Cheguei até seu post através de uma amiga, que viu e me passou o link. Além de ser amigo de infância do V., somos sócios em uma produtora! Mas o mais bizarro é que vi sua foto aí no perfil do blog e te reconheci, aliás, tenho quase certeza quem é você. Há dois anos atrás, no metrô, uma menina me deu um bilhete perguntando o q eu estava ouvindo. Achei muito legal, mas nunca mais nos vimos. Era você, não era?" Eu gelei ao ler. Foi como se um ciclo da história do meu blog tivesse sido fechado. E como, quando, ONDE isso foi acontecer?! O motivo pelo qual eu tinha feito o blog reaparece por causa de uma foto 3x4 que achei no chão? No final, V. C. apareceu, leu o post, achou graça. Disse que quando leu meu e-mail achou que fosse vírus (...). Marcamos de nos encontrar, e eram dois queridos! Dançamos horrores numa balada na Barra-Funda. Pegar papeizinhos na rua, prestar atenção nos pequenos detalhes, às vezes pode nos render boas histórias. <3 Espero que tenha gostado da minha! Beijos com carinho e admiração,
Brasília. 20 de janeiro de 2016 Querida, a imagem do meu desejo são duas. Duas iguais em quase tudo. mas através da tua imagem eu quero imaginar que posso corrigir ou reparar um desvio do destino. Então as duas imagens estão sob a mesma luz e proteção.
São Paulo, 10 de fevereiro de 2016 Ele caminhava pela Av. Paulista, num domingo de sol, enquanto conversava com uma amiga. Após uma piscadela, se viu sobrevoando o pico do Jaraguá como se fosse um pássaro. Independentemente o que aquilo significava, sentiu seu coração confortado e seu espírito, livre. Obrigada Carolina, Abraços,
Desejo uma imagem que transborde amor do meu peito e afogue essa mรกgoa que sinto por uma mulher que tanto quis e quero o bem.
Meu desejo/motivo Meu desejo motivo descobri há pouco tempo, embora tenha experiência de fragmentos dele em alguns momentos. Não é trabalhar com arte e sim trabalhar com/nos bastidores da arte. Isso não quer dizer que eu queira ficar num lugar fazendo a mesma coisa, pelo contrário. Os bastidores permitem que eu chegue a lugares que poucas pessoas têm acesso, ver e "tocar" objetos que pessoas nem ao menos chegam perto mas veneram, permite a pesquisa de materiais, da história do objeto, escavar a matéria caso ela esteja danificada (galerias de cupins), subir andaimes e ver o local/objeto se transformar ao longo do trabalho, mesmo que sutilmente isso seja percebido apenas através dos registros ou conversas com o artista. Trabalhar com o patrimônio, requer cuidado, tanto com a saúde quanto com a obra. Cuidados com a saúde porque os materiais na maioria são tóxicos e com a obra porque você trabalha com a criação do outro, já está pronto (embora muitos curiosos se arriscam nesta empreitada e acabam colocando sua criatividade e manchando quem estudou e luta para a qualidade da profissão). O Dever do restaurador não é transformar a peça em nova e sim impedir que ela se danifique, usando materiais que se aproximam do original, sem sê-lo e o que se perdeu, perdeu. Por isso, ao entregar o trabalho não parece que muito foi feito e somente quem fez é que sabe o trabalho por trás. Portanto nada melhor que além de restaurar, ser um educador mostrando o que foi feito e causando espanto de quem vê. Enfim, este é o meu projeto, meu desejo, meu motivo: Viver respirando os bastidores da arte é já minha arte, fica como passatempo, escondida como meu serviço mas alegrando e ocupando minha vontade de criar que não pude no restauro.
Carolina, Bom dia. Meu nome é ___ Nasci numa família de mulheres. Por parte de mãe, por parte de pai é outra história. Minha avó Joana era a figura principal dessa família. Foi a filha mais velha de uma mãe que morreu de parto. Então ela criou todos os irmãos. E toda vez que uma filha dela ia parir, ela tinha certeza que a morte estava rondando a casa. Mais tarde era ela que juntava todo mundo, com todas as diferenças. (Quando ela morreu nada mais foi igual...) Minha avó tinha quatro irmãs: Titonha, Tuga, Pepê e Zizinha, e um irmão, Jorge, que eu não conheci. Esse irmão um dia sumiu das fotos da família e nunca mais falaram sobre o assunto. Agora todo mundo que podia me contar, morreu. E eu não sei de quase nada. Joanna teve duas filhas, Cininha, minha mãe, e Bibica, minha tia querida que morreu quando eu tinha quatro anos. A única tiavó que tinha filhos, tinha duas meninas. Minha mãe só teve uma filha. Minha tia só teve minha prima Denise. E as primas da minha mãe tiveram duas meninas e um menino, e a outra, uma menina. Até eu entrar na escola, eu ficava com a avó e com a Tia Tuga, que não casou e sempre morou com a irmã. Elas nasceram no século XIX, então eu fui criada por mulheres do século retrasado. As duas nunca me falaram de feminismo, mas tinham um desprezo pelos homens, principalmente minha avó. Ela me falava, sem dizer, que homens não serviam pra quase nada porque sempre tiveram que se virar sem a ajuda do pai, depois que a mãe morreu, imagino. Viveram muitos anos. Viram o mundo mudar tantas vezes. Atravessavam a rua como na época dos primeiros automóveis em São Paulo. Tia Tuga foi atropelada duas vezes e minha avó morreu disso. Não tive filhos (talvez a vó tivesse orgulho de mim!). Mas isso me torna a última desse grupo de mulheres. Depois que eu morrer, aposto que ninguém mais vai contar essa história. Um beijo
Olá Amiga parece uma mensagem boba mas que sempre quando leio me recordo de porque somos artistas e o quanto é importante isto para nós: Ser artista é uma possibilidade que todo o ser humano tem, independente de ofício carreira ou arte. É uma possibilidade de desenvolvimento pleno, de plena expressão, de direito à felicidade. A possibilidade de ir ao encontro de si mesmo, de sua expressão, de sua felicidade, plenitude, liberdade, fertilidade é de todo e qualquer ser humano. Isso não é um privilégio do artista, é um direito do ser humano - de se livrar de seus papéis, de exercer suas potencialidades e de se sentir vivo!!!!!
A história de Joana e Tião Joana morava no sertão. Era moça da escrita, costura e bordado. Tião era da cidade, moço das tecnologias - passava o tempo a criar ideias no computador. Ela também gostava da terra, cultivava hortas. E ele adorava cozinhar. Era capaz de ficar um dia inteiro preparando um bom prato. Tinha um cachorro de companhia, o Lambidão. Joana sonhava com histórias e rodas de bordadeiras. Tião queria fazer filmes. Durante as férias, Joana foi na cidade comprar tecidos e linhas. E numa feira conheceu Tião. Quando seus olhos se encontraram, foi aquele toque mágico: a flechinha do cupido acertou seus corações em cheio!!! Tomaram um suco de maracujá na padaria, prosearam um pouco e trocaram os endereços. Despediram-se sem querer tirar os olhos um do outro. E foi cartinha pra lá, cartinha pra cá. Joana fez uma colcha de fuxicos pra Tião. Ele mandou muitos livros pra ela. Tião convidou Joana para passar Natal na casa dele. Desta vez, ela trouxe uns lencinhos bordados com versos de amor pra ele. E a colcha de fuxicos de chita. Tião preparou um belo jantar à luz de velas! Foi uma noite bem romântica. Dia seguinte foram lá no quintal. Logo, tiveram uma ideia. Criaram um lindo jardim com manjericão, alecrim, hortelã, gerânios, flores-de-maio... Na sequência, fizeram vários filminhos sobre as formigas, minhocas, aranhas, joaninhas - seres que surgiram entre as plantas. Joana e Tião se casaram. E formaram uma família bonita, junto com Lambidão. Tião fez um filme sobre os panos bordados de Joana. Participou de um festival. O filme foi premiado. E eles comemoravam com uma viagem de volta ao sertão, onde foram recebidos pela família dela, com três dias e três noites de festa.
Oi Carol! minha história é sobre ser MESTIÇA Desde sempre as perguntas para início de conversa eram: - Você é mestiça? - Quem é brasileiro, sua mãe ou seu pai? Ser mestiça de "ORIENTAL" com "OCIDENTAL" além da aura exótica, sempre me soou simpático, na região onde cresci muitos mestiços como eu, e era um passatempo meu ficar reparando nas diferentes características físicas: eu, morena, cabelos pretos, olho escuros, alta e corpulenta, outras mais, miúda e clara, cabelos aloirados e olhos verdes, outros três irmãos ainda, de olhos puxados, cabelos lisos e mulatos como a mãe, de traços negros e olhos claros. Pertencer ou se sentir parte de duas culturas sempre foi esse meu sentimento. Outro dia, vasculhando meu guarda-roupas, retirei uma peça costurada pela minha mãe e me dei conta que aquela roupa é a síntese do que eu sou: UM QUIMONO DE CHITA nada mais próprio pra uma mestiça de mãe nissei e pai pernambucano.
Beijos
São Paulo, 04 de março de 2016 Sinto muito... Sinto falta... Ainda sinto falta de como eu me sentia. Me sentia como, se afogada, voltasse a respirar, era o sopro de vida, o bálsamo que curava as feridas que insistiam em latejar, pulsando sonhos interrompidos, desejos calados e tempo perdido. Então se fez dia e foi embora a escuridão da minha alma. Vieram novas cores acompanhadas de novos sabores. Voltei a sentir o sabor do vento e os cheiros do mundo. Era delicioso o sabor do cheiro das tuas cores, das tuas tintas e tudo ganhou cor através da luz dos teus olhos que coloriam os cinzas dentro de mim. No meio de tanta vida, uma brisa gélida congelou as memórias, faltou o ar, as cores, o calor do teu coração que eu ouvia tentando gravar em mim o compasso da tua vida. Hoje me resta o mapa do teu rosto que eu fiz com os dedos enquanto você dormia, e a lembrança da tua voz na minha orelha me dizendo: - Eu cuido de você! Agora que você se tornou pó e se espalhou pelo vento, quem vai cuidar de mim? Agora sinto falta de como eu me sentia quando você existia. Com amor, eu!
São Paulo, 02 de março de 2016 " " , 07 de março de 2016 Meu desejo é de vida. Existe desejo de morte também. A minha dúvida é se a arte vem da vida ou da morte. Desejo, vida, morte, arte. Tudo está relacionado. A maior parte dos artistas que me interessam está morta. Ou melhor, estão mortos. Estão mortos como pessoas, mas sua Arte está viva. A minha própria Arte continuará viva depois que eu morrer. Talvez seja por isso que eu sou artista. O meu motivo. Paul Klee é um dos meus artistas preferidos. Todo dia descubro algo novo com ele. Mas ele morreu bem antes de eu nascer. Em 1920, Klee publicou umas palavras (elas depois foram inscritas em sua lápide): "Diesseitg bin ich gar nicht fassbar Denm ich wohne grad so gut bei den toten Wie bei den Urigeborenen Etwas näher dem Herzen der schöpfung als üblich Und noch lange nicht nahe genug." Tradução p/ inglês: vire! ➞ "I cannot be grasped in the here and now. For my dwelling place is as much among the dead as the yet unborn. Slightly closer to the heart of creation than usual. But not close enought."
SP. 29/3/2016 À minha mãe: Quanto tempo sem te ver mas nenhum sem deixar de pensar em vc. Mãe querida. Quero te contar as coisas que passei. Não tem sido uma decisão boa essa de nos deixar 2 apartamentos pra 3 irmãos. Você sabe, mãezinha querida, que teu 3o filho morreu? E deixou 2 filhos. Um adotivo (na verdade uma moça) e o 2o menino filho dele mesmo. Como poderíamos imaginar a mudança de rumo das coisas? Impossível. Papai casou-se. A mulher dele costumava dizer que foi por amor. Eu esqueci de perguntar amor do quê. Mas não foi necessário retomar a pergunta pois as fotos me mostraram o quanto ela gosta do dinheiro e das coisas que tu, mãezinha querida, deixaste em casa. E, mãezinha querida, meu irmão do meio, o único que ficou e, achei eu, seríamos mais unidos do que nunca. Nós não somos. O fato do meu pai tê-lo aliciado para usar indevidamente os bens do meu falecido irmão e os meus – Este teu amado filho deixou-se seduzir e hoje acumulou bens que garantem sua aposentadoria pela eternidade. Não foi essa tua intenção, mãezinha, eu sei. Divisão dos irmãos. Destruição da família. Nós não somos os mesmos. Muitas vezes tenho clamado o teu nome para que você me mostre a qualidade do meu pai que te encantou, pois além de não ver nenhuma nele, tenho me deparado com sua perversidade. A esta altura, mãezinha, não reconheço mais esses dois homens que já foram importantes na minha vida. Meu pai e meu irmão. Ligações profundas que têm me dilacerado as entranhas e só me resta me abraçar no colo da tua lembrança... com profundo respeito por você mãe, sua filha:
Ando com o olhar atento. Ando com o olhar para as cores e para as coisas que nem sempre vejo. Casa rosa. Tem um texto na parede. Leio rápido: artista plástica troca pinturas por histórias. Tem trânsito. Tem vaga também. Paro. Desço. Olho a caixinha do correio amarela entes de decifrar o texto. Um jeito de segurar a quase certeza de um desilusão. Não sei se quero a realidade ou se prefiro a imaginação daquilo que rapidamente voou pela minha alma. Mas o voo que veio me fazer companhia não era um voo só. Leio a parede. Releio a parede. É um convite de voo junto. Aceito. Quero. Ainda olho a casa rosa. Fico pensando como é dentro dela. Será que tem tatu bola em algum canto? Há copos? Como são? Tem alguma criança por ali que sai cavalgando um copo listrado como se fosse sua zebra como eu fazia quando era pequena? Nunca entendi se cavalgar é só com cavalos ou se dá para ser com zebra ou se com zebras é zebrear. Olho de fora, mas queria olhar por dentro. Formigas passeiam pelos azulejos da cozinha? Alguém lá dentro olha as formigas enquanto olho a casa rosa da rua? Lembro da Delfina, a formiga que morou semanas na minha cozinha. É estranho lembrar de uma formiga, mas a Delfina era uma formiga grande, que parecia sair do seu esconderijo só quando eu cozinhava. Andava sempre pela pia. Às vezes ficava imperceptível nas manchas escuras da pedra. Depois de algum tempo, a Delfina nunca mais apareceu. Criança, apreciava o andar vagaroso das taturanas pelos muros externos da minha casa. Eram muitas. Hoje preciso sair da cidade para ver taturanas. Deve ser porque agora vivo em prédio. Mas a casa rosa deve ter taturanas. Tomara que já tenham visto alguma taturana que virou casulo e que foi pega saindo borboleta da sua casa. Entro no carro. Saio da vaga. Devia ter tocado a campainha da casa rosa.
São José dos Campos, 14 de março de 2016 Ao desejo motivo ...
Escrevo-te porque sou admirador da estética relacional e tenho aspiração de perceber a arte relacional na arte educação dentro dos espaços culturais e escolares que trabalho, ou porque gosto de escrever, receber e ainda mais compartilhar bons momentos – o que eu tenho certeza que este é um deles – ou ainda escrevo porque durante a graduação elaborei um trabalho com cartões postais sobre um patrimônio ambiental conhecido por "Banhado" e encaminhado para artistas da minha cidade, todavia mesmo com as várias respostas e saudações positivas não recebi qualquer retorno em papel (carta ou cartão postal). Escrevo-te, porque o projeto "desejo motivo" se tornou referência para o trabalho que vou realizar com os meus alunos de 5 anos de uma Escola Municipal.
Muito Obrigada!
São Gonçalo, 05 de fevereiro de 2016. Cara Carolina, Já é terceira carta que passo a limpo e acabo sempre errando e rasurando, me perdoe, mas se errar outra vez apenas riscarei, senão nunca terminarei essa carta. Só hoje vi pelo facebook a divulgação de seu projeto e achei simplesmente maravilhoso. Sempre tive o desejo de ver em imagens pictóricas meus pensamentos. Infelizmente não sei desenhar e menos ainda as artes da pintura que tanto adoro. Vivo a escrever sentimentos e instantes de mim. Não os tenho para quem dizer ou compartilhar. Quem sabe, pelo menos um vou compartilhar e quiçá o transforme em imagem por meio de sua imaginação e dom? Ao dizer em dois parágrafos, a minha relação com a escrita e a pintura é tão pobre, mas confesso que existem conteúdos indizíveis e que de tão imensuráveis não cabem e não são contidos em nenhuma forma racionalmente conhecida. A única peça de decoração que tenho em minhas paredes é uma tela dessas abstratas que se compra em shopping. Não digo isso porque não considere arte ou que não tenha valor estético. Aliás, essa peça [rasura] faz com que eu me sinta bem e me anima quando contemplo. É tão viva e me transmite vigor e ânimo. Enfim, paremos de fazer rodeios, pois sou mestre em viagens prolixas. Ontem acordei e fui fazer o que sempre faço: abrir todas as janelas e portas. Em uma dessas janelas testemunhei algo que desejei compartilhar com os amigos e amigas do face. Amo a natureza e o dia não é o dia se não comtemplo pelo menos uma nesga de verde. Tenho o privilégio de ter como janela um quadro de natureza viva, uma idosa mangueira que abriga uma infinidade de vidas e frutos. O fato é que em tempos de internet e facebook também eu me rendi ao vício da fotografia. Influenciada por esse vício e querendo registrar aquela visão que não consegui registrar com lentes artificiais, apenas contemplei com minhas lentes naturais: meus olhos. E agora peço-lhe que sua impressão mental e sua imaginação artística reinterprete essa mini crônica que escrevi sobre o evento. Eis aí: Quando a vida pulsa sem visibilidade. Hoje irritei-me profundamente, mas por outro lado, bem feito. Às vezes quero tanto registrar a beleza que me rodeia que infrinjo, com minha câmera, o direito da natureza de seguir seu rumo sem ser incomodada. Eu ia compartilhar o namoro ou companheirismo matinal de um casal de pássaros [rasura]. Uma visão tão bela, tão singela. Corri e peguei a câmera para fotografar aquele instante único. Qual não foi minha insatisfação: tinha um galho e minha lente não é muito potente, não capta de longe. A dificuldade daquele momento me fez perceber que os olhos ainda são as lentes mais poderosas do indivíduo. Coloquei a câmera de lado e [rasura] me contentei feliz por ter o privilégio de testemunhar, como voyeur, aquele instante exuberante da interação entre as pequenas aves. E foi assim que, por um breve istmo, tornei-me uma voyeurornitóloga. PS: Desculpe os erros gramaticais e as rasuras Atenciosamente,
Uma carta não respondida de um ex-namorado SP. 19 de julho de 2013 OI D. PARA OS DESCONHECIDOS, NUNCA... PARA OS MEUS AMIGOS, SEMPRE QUE NECESSÁRIO, MAS PARA VOCÊ ESTÁ SE TORNANDO ALGO IMPOSSÍVEL. ESCREVER É UM DOS CLÍMAX DA ARTE. ESCREVER PARA VOCÊ, A., PODE TER SE TORNADO UM ALIMENTO MAIS IMPORTANTE QUE AS REFEIÇÕES E QUASE TÃO IMPORTANTE QUE O ALIMENTO ESPIRITUAL. SEJA PELA MINHA HABILIDADE PARA ESCREVER EXÍMIA OU MENTECAPTA, FRIA OU EMOCIONANTE, IMPORTANTE OU DESPREZÍVEL, SABER QUE VOCÊ VAI LER ME MOTIVA A ESCREVER SOB QUALQUER SENTIMENTO, SEJA ELE DE MÁGOA, ORGULHO, CIÚME OU DOR. QUANDO ESCREVO SABENDO QUE VOCÊ VAI LER, EU ME SINTO O HOMEM MAIS FELIZ E PODEROSO DO MUNDO, MAS AO MESMO TEMPO SINTO QUE POSSO ESTAR DESTRUINDO A PAZ DE UMA PESSOA TÃO VALIOSA, OU QUE EU SOU UM NADA, JÁ QUE NÃO DESFRUTO DA MELHOR COMPANHIA POSSÍVEL. ESCREVER PARA VOCÊ ME TRANSFORMA NO MÁXIMO E NO MÍNIMO, NO MAIS RICO E NO MAIS POBRE. CHEIO DE VIGOR E FORÇA EU PENSO EM VOCÊ, MAS É EM AGONIA E SOLIDÃO QUE SOFRO O GOLPE DA VERDADE, DESSE NÃO HÁ ESCAPATÓRIA. O CORPO, A MENTE E O SENTIMENTO SE ESVAEM, RESTANDO APENAS O ESPÍRITO. SEM ESSE ÚLTIMO EU NÃO PODERIA AO MENOS SOBREVIVER, E SÓ POR ISSO QUE ELE TAMBÉM NÃO ME ABANDONA. NÃO CONHECER O INIMIGO IMPLICA EM UMA SÓ PALAVRA. DERROTA. NÃO SEI SE O MEU ADVERSÁRIO É O MEU PASSADO. MINHA ATITUDE ATUAL, OU MINHA CAPACIDADE. NÃO CONHEÇO A MINHA MALDIÇÃO. É DEPRIMENTE LEMBRAR DO SEU CALOR, DA SUA TEMPERATURA, SENDO QUE AGORA VOCÊ NÃO ESTÁ MAIS COMIGO, MAS O QUE MAIS MARTELA E DILACERA MINHA SANIDADE É SABER QUE TODA SUA MARAVILHA ESTÁ SE ESCAPANDO ENTRE MEUS DEDOS, COMO SE FOSSE UM LÍQUIDO DENSO E GELADO, MAS QUE ME DEIXOU APENAS FRIO NAS MÃOS, NÃO RESTANDO UMA GOTA SEQUER. O LÍQUIDO? SIM. EU AINDA O VEJO CAIR, E SINTO QUE POSSO NOVAMENTE RESGATÁ-LO ANTES QUE OUTRO HOMEM REALIZE MINHA PERDIÇÃO E O TOME PARA SI.
P.S. DIGO QUE ESSA CARTA É NOCIVA, APENAS PRECISAVA COLOCAR MEUS PENSAMENTOS NO PAPEL, PRECISAVA PENSAR NA GENTE.
UM GRANDE BEIJO
17H45 - TARDE DE SOL. PARQUE IBIRAPUERA
Carolina, Segue um texto, de minha autoria, para fazer parte do seu projeto, caso seja de seu interesse. Tenho muita curiosidade de ver o que as pessoas imaginam ao ler as cenas descritas em minhas obras. Seria muito legal participar do seu trabalho! Gostaria que você, por gentileza, confirmasse o recebimento desta carta. A Beleza Não Revelada Estava posicionada em um dos lados do palco. Outro instrumento, um violão robusto estava ao centro. Apesar de sua discreta localização, aquela guitarra era belíssima e certamente escondia grande potencial! O corpo era em tom escarlate; seu braço, em mogno, era valorizado pela simetria das cordas que, devido ao jogo de luzes no ambiente, brilhavam mais que o normal. O show estava prestes a começar. Seria a apresentação de uma artista local, dessas boas cantoras, que montam seus repertórios mesclando músicas conhecidas com algumas que surpreendem a maioria. Era um palco pequeno, porém repleto de detalhes, o que lhe conferia um aspecto harmônico e casual. Para completar eram projetadas, ao fundo, imagens que proporcionavam um toque envolvente e atraíam o público. Dentre as belas cenas exibidas estavam as do espetáculo "Alegria" da companhia circense "Cirque du Soleil". A intérprete subiu ao palco e pegou o violão. Todos se contagiaram com a potência daquela voz, já que a artista, momento antes, demonstrou uma timidez sutil que só foi subjugada durante a interpretação viva de seu repertório. Apesar de serem dois instrumentos, durante toda a apresentação apenas um deles foi utilizado. A cada música que se encerrava ouviam-se aplausos e pedidos de uma próxima. A guitarra continuava ali, imóvel, misteriosa e aparentemente solitária; apesar do grande número de pessoas ao redor. Aquele maravilhoso instrumento compunha o cenário com maestria, mas não lhe bastava. Sua natureza era atuar de forma completa! Além de sua beleza visível, quando tocada com técnica e sentimento, provoca vibrações no meio que, ao atingirem os ouvidos curiosos, desencadeiam sensações fantásticas. Sentiu-se injustiçada, precisava de oportunidade e, por um momento, a solidão também a acometeu. Alguém deveria conduzi-la numa dança com notas musicais. Mas deu-se conta de que naquela noite ninguém a tocaria. Ela continuaria ali, enigmática, compondo o ambiente, conferindo brilho e vida ao cenário, porém não a ouviriam. Então, perguntou-se sobre qual o seu papel naquele palco, um local em que a vida era representada em pequena escala e em determinado contexto. Estariam apenas explorando a sua beleza? E seu conteúdo maior, não lhe permitiriam revelá-lo? Entendeu que naquela noite seria apenas uma bela peça para ornamentação e não lhe dariam a oportunidade de demonstrar todo o seu valor. Compreendeu que na vida não se pode ser protagonista sempre – há momentos em que somos meros coadjuvantes – e que isso não diminuía o potencial que abrigava. Talvez em outra apresentação, ela, por hora esquecida, se transformasse na atração principal e tivesse a oportunidade de revelar a grandeza escondida no duro e polido mogno que a compunha. Então, teria encontrado seu par e com ele bailaria em meio a "bends", "vibratos" e muitas escalas pentatônicas. Sua voz ecoaria, emocionaria as pessoas e o sentimento e plenitude a envolveria por longos momentos. *bends e vibratos: recursos técnicos muito utilizados para se tocar instrumentos musicais. **escalas pentatônicas: escalas musicais.
São Paulo, 27 de fevereiro de 2016 Olá Carolina, Meu nome é ___. e fiquei sabendo de seu projeto segundo minha amiga A.C. e ela sugeriu que eu mandasse uma de minhas crônicas, pois bem aí está! O gato Sentado no sofá, vejo meu gato olhando atentamente para a porta pela qual meu pai acabara de sair. Com a sua constante expressão apática, não dava para saber o que o gato pensava, mas resolvi me aventurar mesmo assim: talvez estivesse esperando que o enorme animal de madeira cuspisse seu dono são e salvo de volta, ou talvez soubesse o que é uma porta e estivesse só esperando seu dono voltar para dar-lhe um agrado. Quanto tempo será que ele passa olhando para a porta quando eu saio? O gato permanece parado há cinco minutos, não move um pelo sequer. Será que tem medo do colossal ser feito de xilema de mogno com belos entalhes feitos à mão? Se, por ventura, mexe a cabeça, logo volta a contemplar o gigante estático. Sem usar hipérbole, mil e uma imagens continuam a passar pela minha cabeça. Tento imaginar o que a Borboleta Negra de Brás Cubas ou a cachorra Baleia de Vidas Secas pensariam, talvez elas pudessem elucidar-me os pensamentos do meu gato. Enquanto isso, divago. Já faz dez minutos que ele está lá, imóvel. E eu aqui, admirando-me, assobio, faço movimentos bruscos e barulho, rogo pragas nele, até o toco... e nada. O máximo que faz é mover uma orelha em minha direção e, com um movimento rápido, movê-la novamente para saber que sou inofensivo se comparado ao monstruoso golem que continua aprisionando seu dono em seu interior. Frustrado por ser ignorado pelo gato, decido parar de olhar este animal burro, que insiste em permanecer estático, séssil, bentônico, imóvel. Tão imóvel quando uma porta... Sem precisar pensar muito, chego à conclusão: o gato era a porta; e eu, o irracional gato. Fim =) Gostaria de finalizar a carta dizendo que adorei sua iniciativa e te desejo muita boa sorte! Um grande abraço,
Olá Carolina Paz. Aqui segue Minha proposta para o projeto Desejo/Motivo. Pode-se dizer que neste caso trata-se de um "causo" que não é apenas coincidência Quando me informei sobre as regras de participação neste projeto, as duas primeiras imagens que vieram à cabeça foram transportadas diretamente daquela canção de autoria do poeta Lenine intitulada Martelo Bigorna. No meu entender Desejo e Motivo estão muito diretamente expressos nesta música, Principalmente naquele refrão... tanto choro e pranto a vida dando na cara, ofereço a face de um sorriso amarelo, dentro do peito uma vontade bigorna, um desejo martelo. Acreditei naquele instante que gostaria de reproduzir as duas imagens – bigorna e martelo – expressando-as em linguagem de pintura sobre tela. Afinal são também meus desejos/motivos. Lenine - Martelo/Bigorna/Labiata bjs.
Querida Carol, As coisas por aqui estão entrando nos trilhos. Acabo de finalizar e entregar minha monografia e um trabalho extra. Então, dou por concluída mais uma etapa em minha vida. Estou retomando projetos antigos, inspirada pela convivência com pessoas maravilhosas. Um desses projetos é o de escrever contos. Em anexo, segue o primeiro de uma série de quatro contos relacionados a viagens e às estações do ano. Algo que fazer há muito tempo. O conto não está terminado; nem foi revisado. Mas quero dar vida a ele e achei que seria uma boa ideia mostrá-lo para você. Chama-se "Conto de Primavera" (inacabado); ou podia ser: "Conto (inacabado) de Primavera". Ainda há toda uma história para desenvolver nele, mas acho que o essencial já está ali, que é o voyeurismo. Como fotógrafa, tenho sido o motor de trabalhos que gosto muito nas artes em geral e, muito mais marcadamente, no cinema e na fotografia. Bom trabalho! Beijos, Namastê!
"Conto (inacabado) de Primavera" Primavera. Num caminhar ligeiro e firme, Camille desliza pelas calçadas do Boulevard Saint Germain. Seu vestido de cetim, delicadamente estampado nas cores azul e rosa (uma frente única, com a cintura justa e a saia semipregueada até a altura dos joelhos), além de um belo par de sandálias de salto alto e fino, valorizam suas formas perfeitas, tornando-a ainda mais atraente. Consigo, a moça leva uma sacola da Emilia Cosi. Por segundos, é como se o som dos carros e de todo o resto desaparecessem... Camille acabara de deixar um vácuo nos pensamentos de Gerard, no Le Mondrian. Ele a segue com seu olhos, enquanto ela entra na Librairie Polonaise, do outro lado da rua. Com certeza, para Gerard, esses foram os segundos mais inebriantes daquela primavera que acabava de se iniciar. Ele levou um tempo para voltar à realidade e continuar a atender o pedido de um cliente de meia idade, que insistia em detalhar como seu clássico e trivial café deveria ser servido na louça especial da casa. Atônito, Gerard olha na direção do cavalheiro e, soltando um leve suspiro, volta a anotar seu minucioso pedido. Cerca de 20 minutos depois, para o espanto de Gerard, Camille atravessa a rua, no sentido do restaurante, e vai se juntar àquele cavalheiro no terraço. Percebendo sua chegada, este se levanta e ambos se beijam nos lábios; um beijo discreto, porém muito invejado por Gerard, que observa a tudo por trás do balcão. Logo o cavalheiro o chama e ele vai atendê-los. - Camille, querida, o que vc. vai querer? Com um voz suave, Camille vira-se para Gerard e pede uma Panna Cotta Pistache e uma água sem gelo. E acrescenta: - E vc. papai, não vai comer nada? Ao ouvir aquilo, o coração de Gerard dispara junto a seu pensamento: "Eles são apenas pai e filha!" - Bem, acho que vou te acompanhar; uma Panna Cotta, por favor. Gerard serve a ambos. Pai e filha conversam um pouco. Uma réstia da luz do sol lhes alcança suavemente a mesa. Eles saboreiam as sobremesas devagar. O pai, de tempos em tempos atende ao celular. Camille observa a rua e brinca com a colher sobre o doce. Num momento fugaz, Gerard percebe que aquela réstia de luz atinge
delicadamente o rosto da moça e, fechando os olhos, ela ergue um pouco a cabeça, esboça um tênue sorriso e deixa que o sol lhe acaricie a face. Logo depois, seu pai interrompe aquele dublo deleite e pondera: Ao ouvir aquilo, Gerard se desfaz em melancolia, se despedindo de seus secretos pensamentos por aquela inesperada surpresa de primavera. O cavalheiro pede a conta e parte com Camille. Gerard segue para a mesa, para retirar os pratos, mas se dá conta de que Camille esquecera uma sacola de compras. Ele tenta alcançá-los, mas é tarde demais; Camille e o pai entravam no táxi, que partiu com pressa. Uma curiosidade extrema faz com que Gerard olhe o embrulho dentro da sacola e descobre que Camille comprara um belo corpete branco, certamente para as núpcias. Naquela noite, ele foi para casa carregando a sacola de Camille. Ele pensou que ela pudesse voltar no dia seguinte ou depois para reaver suas compras. Seria muito pouco diante de seus desejos, mas seria bom poder revê-la. Passou-se um dia e nada.
Nos primeiros anos do século XX, no interior do Pernambuco, um casal peculiar se formou: os _________ _____. A esposa era conhecida por Dona Mocinha, sabe-se lá por quê, já que não tinha nada de delicada ou juvenil. Era robusta, de personalidade forte, conduzia tudo à sua volta. Seu marido, conhecido posteriormente como Vovô Nonô, era franzino e calado, com um semblante de homem bom, apesar de reservado. Dele só me lembro que usava o garfo pra juntar o arroz e o feijão em cima da faca, que levava à boca com impressionante equilíbrio, sem derrubar um grão sequer. Viviam bem na pequena cidade de Correntes, onde possuíam uma loja de tecidos. Fizeram um pé de meia razoável por ali, além de 7 filhos. Quando tinha um baile na cidade, a vizinhança confiava suas filhas à Dona Mocinha, que tomara conta dos 7 dela e de vários outros com severidade. Ninguém ousava aprontar com uma garota que estivesse sob sua tutela. Com o dinheiro que juntaram da loja, Mocinha convenceu o marido a comprar um pequeno sítio com algumas vacas dentro. Em 1915 terras ainda eram baratas e ela afirmava com convicção: - Quem tem um pedaço de terra tem futuro! Nonô cuidava da loja e ela do sítio e das vacas. Tirava leite, vendia e com o lucro comprava mais vacas. Todas eram marcadas a ferro com o símbolo que ela criou: ATL. Como na música, Amélia era uma mulher de verdade, e isso nada tinha a ver com sua vaidade (ou falta dela). E é por isso que uso esse mesmo símbolo da minha bisavó até hoje nos meus bois. Pela mulher inspiradora que era Amélia (ou dona Mocinha) e pela gratidão de hoje poder me dedicar à arte de certa forma pelo que ela começou com muita garra e trabalho duro 100 anos atrás.
Querida Carolina, Seu desejo é um motivo, então aqui vai uma história. Havia dois anos um homem estava de luto pelo amor que ficara infinitas braçadas de mar distante dele. Navegadas as águas, resolveu que o ponto final da dor estava ali. Abriu uma página branca e esperou que dela brotasse alguma nova história. Distraído como Leminski, mas com a alma em alerta num doce stand-by, certo dia passou em frente da vitrine de sempre e teve a flechada: em vez de livros, corações, de todos os feitios, rebrilhavam sobre tábuas de cortar carne. Os corações viraram uma obsessão, mas corações são valiosos e naquele momento só podiam ser observados através do véu de vidro. Os dias passaram-se sem que em nenhum deles seus olhos deixassem de pousar sobre as tábuas, em especial a que continha a imagem do autor delas. Embora seus bolsos continuassem vazios, aquela epifania encheu-lhe de vida. Eis que um dia, pluft: os corações desapareceram! Tomado de desespero, o homem lembrou-se do nome que havia visto cravado no verso da madeira. Era alguém do sul, parecia longínquo. Martelou teclas e mandou a garrafa para aquele endereço, sem muito acreditar que os cabos fariam seu serviço. Mas fizeram. Uma linha retomou. Agora seu bolso tinha uma moeda, trocada em seguida pelo primeiro coração (feliz!). Outros dois níqueis sucederam àquele, novos órgãos brilhantes surgiram. Eram três. E estavam ligados por seu altar que, ao ver a imagem do dono das moedas, também achou que dali uma nova página em branco poderia ser escrita. Um brinde, quatro horas de conversa. Um café, mais quatro horas. Um vinho, toda uma noite cercada de corações. E lábios, mãos, pés colados. Juntos, os dias completam quase três anos. O homem, agora preenchido dos corações sobre a madeira, aguça o olhar para outros órgãos que batem de diferentes formas, cada um uma expressão distinta. As paredes, antes vazias e silenciosas, hoje batem compassadas ao som imaginário dos ex-votos. Mas o homem não se cansa. Depois de trocar moedas por bronze, papel, madeira e tinta, agora quer trocar vocábulos por mais um órgão: o coração de Paz. Ass: Caçador de Corações
Sinto saudade do arrebatamento. De ficar sem ar, de fingir que estou trabalhando quando na verdade travei uma DR no Gtalk. Sinto falta de querer dar pause no mundo – como assim as tarefas e os prazos acumularam? A vida é mais urgente. Beijar é mais urgente. Dormir de conchinha, fundamental. Fazer playlist cheia de declaração subliminar? Única atividade possível. Esperar a hora de te encontrar? A razão de olhar o relógio. Onde foi que a gente se perdeu, amor?
Olá, Carolina! Vou contar um recorte de uma história muito mais longa. Um dia, numa conversa sobre viagem incríveis, concluímos que a transiberiana era perfeita para uma lua de mel. Decidido isso, ficamos noivos e passamos três anos pesquisando e estudando sobre a Rússia e como era uma viagem hipotética, acrescentamos o Japão. Quando estávamos quase desistindo, por mil motivos, desde doença a dinheiro, compramos as passagens em janeiro para viajar em março. Só depois vimos a loucura que é programar uma viagem em dois meses. Corremos para aprender um pouco de russo, melhorar o inglês, decidir onde ir e onde ficar, roupas, visto... a lista é imensa! No meio da correria toda lembramos o motivo da viagem. E lá fomos nós ligar para as nossas mães e ver quando estariam em SP e quando ambas estavam, fomos procurar um cartório. Assim casamos! E lá fomos nós para a lua de mel mais absurda que conseguimos imaginar. Paro por aqui, porque esta história é um pouquinho mais longa. Beijins
Sistema Operacional - I Lade de dentro - (20h30 -7) Cartas enviadas - (3). Cartas escritas. Sensação de leveza Trepidação e abalo sísmico. Reverberação das ondas pelo corpo. Representação da grafia no espaço (17h14). Carregamento. Acolhimento do corpo do outro. Pêndulo. Corpos que se chocam (18h32-10). Salvamento. Corpo rijo.
Materialização
Sistema Operacional - II Sismo – relativo ao sismo – propagação de ondas acústicas. Abalos. Tremores (5h40 - 2). Montanhas. Cartas escritas (3). fios de navalha. Angústia. pontes. laços. afeto. Profundidade e altura. sons de fora. ruínas e distâncias. açougue varal. Distância - Paisagem. Charque. desequilíbrio. milagre. naufrágio. mexer e não sair do lugar. Equilibrar.
Procedimento
Carta Desejante de uma Pintura
abril/2016
Visitar uma exposição de Pinturas é um acontecimento histórico, de épocas. Quando fui apreciar os impressionistas no CCBB as cenas de investigação dos artistas eram acontecimentos tão intensos para eles que os valores de representação não era suficientes para expressar a realidade. Essa força dos próprios elementos pictóricos tornou-se evidente. A cabeça rosa de Cezanne incrivelmente integrada com o fundo da mesma cor foi importante como as grandes obras sempre são. Penso numa aquarela de Louise Bourgeois, não tem essa carga, mas como sei que é dela viajo na presença do seu traço. O Tiziano suspenso no MASP, quando realocaram os painéis da Lina Bo Bardi, ficou extraordinário. Suspenso e ao fundo o Restaurante. Quer deslocamento mais perfeito do que esse? Nas estreitas ruas de Veneza depois de horas apreciando o Tiziano numa igreja (a Veneza) encontro encrustado um retábulo medieval e um grafite juntos. São acontecimentos extraordinários. A pintura tem esta presença. Posso esquecer qualquer entendimento diante de uma pintura monumental do Kieffer que insiste em nos levar para as barbáries que se repetem. Talvez eu me identifique mais com sua insistência e isso é o que fica ressoando. As nossas Barbáries, todas. Em relação aos miseráveis e, a nós mesmos, que tantas vezes somos também insensíveis! Me apaixonei pelas pinturas realistas em PB do Richter, que encantamento me deu. Eu quis fazer aquilo, de que maneira apresentar imagens que desloquem nossa percepção numa vida plena de imagens. Se a lógica da sensação existe, ela aproxima Francis Bacon de Richter. Essas histórias de pinturas e pintores me fascinam. Sei que a Pintura é a grande Arte, sempre foi. Nem morreu, mentira, falso, o século XX tentou. O Thiago Martins de Melo tem essa barbárie, tem os procedimentos tradicionais que se alastram numa outra percepção, veículo. Que suportes recebem outras intenções e desejos e se tornam pinturas. São tantas que já vi, até Guernica. Eu sei que vou apreciar enormemente sua pintura porque ela já está aqui. obrigada
____, 21 anos, passarinha da vida. Desde pequena sempre consegui ver o mundo colorido e o lado bom das pessoas, por diversas vezes isso me foi tirado com decepções e afins, venho almoçar todos os dias nos restaurantes da rua Teixeira e me deparei com o projeto em uma fase bem difícil da vida que foi o fim de um relacionamento. Nesse momento você encontra todas as incertezas e escuridão guardadas em você. Passei por bons momentos de tristeza onde perdi peso chegando aos 37kg e comecei a achar muitos defeitos meus. Hoje em dia ainda guardo as sobras das poeiras dessa história, mas estou feliz, pois acredito que o sol que ilumina cada dia e a lua que nos acolhe estão me sustentando energeticamente e a minha alegria e espírito grande de passarinho conseguem passar pelas voltas da vida. Me sinto feliz com cada detalhe, com cada sorriso e com cada característica minha. Nesse meio tempo descobri que amo cachorros, amo arte, amo meus amigos assim como eles me amam, voltei a dançar e praticar o ritual de bambolê, mas principalmente me descobri como alma e como pessoa cheia de vida e de infância. De áurea rosa e de sorriso no rosto e na alma, como já dito, uma passarinha da vida. Sei que essa história escrevê-la para você, histórias, na verdade momento da minha vida amiga. Beijos de luz
nem é tão incrível e interessante, mas senti que precisava já que senti uma ligação quando li seu chamado de não espero nada em troca, só queria mesmo dividir esse com uma pessoa que nem conheço e que já me parece tão
Carolina São Paulo, 16 de Fevereiro de 2016 O início da Madrugada O que mais belo que tenho a te oferecer É o meu amor por uma garota que espero e desejo que seja a mãe dos meus filhos Antes de você me apaixonei e sabia que era o amor da minha vida Daquelas oportunidades que não dá para deixar para trás (letra ilegível) Cá estou novamente Apaixonado
Sempre tive extremo interesse pela troca, e costumo abordá-la como forma de materialização de uma intimidade construída. No projeto em anexo, construí uma coleção de cristalizações de intimidade criadas com desconhecidos na rua. Espero que esse projeto seja para ti uma materialização de uma relação, por mais breve que seja, assim como se você fizer a tela, esta será para mim.
FUNDAÇÃO ARMANDO ALVARES PENTEADO FACULDADE DE ARTES PLÁSTICAS CURSO DE ARTES VISUAIS
DISCIPLINA DE FUNDAMENTOS DO PROJETO PROPOSTA DE EXECUÇÃO DE EDITAL
Proposta de execução de edital 1 - Dados Pessoais 2- Dados do Projeto 2.1 - Título do Projeto/Exposição Título do Projeto: Coleção de Intimidade (nome provisório). 2.2 - Características e objetivos A instalação Coleção de Intimidade (nome provisório), executada por H., aborda a superficialização do conceito de intimidade, causada pela espetacularização desta e pela virtualização das relações contemporâneas. Utilizando as relações entre desconhecidos na rua como expressão das relações contemporâneas, a instalação expõe vinte objetos adquiridos com estranhos em ambientes públicos. Os objetos serão expostos em molduras individuais, pretas, dispostas lado a lado ao longo de uma parede de cerca de sete metros. Abaixo de cada moldura, haverá panfletos disponíveis ao público, com textos sobre a aquisição do objeto em específico: características do desconhecido, como ele reagiu à abordagem, descrição do lugar e de um desenho do objeto. 2.3 - Justificativa Os relacionamentos contemporâneos estão passando por um processo de superficialização, fruto da espetacularização da intimidade e da virtualização das relações. Ambas as causas são, por sua vez, sintomas uma da outra, e da crescente importância da internet e das redes sociais, que assumem papel de intermediadores das relações contemporâneas. A superficialização é expressa na construção de relações vazias e distantes, que, como espetáculo, se passam por íntimas. Essa distância é sintetizada nas relações entre estranhos, que ao interagirem na rua, tratam qualquer aproximação como um ato transgressivo, como que transpusesse uma barreira. A instalação expõe uma coleção de objetos que transpuseram essa barreira, como criadores de intimidade entre estranhos, fruto do deslocamento. A transposição dessa barreira se dá de forma sutil, expressando a fragilidade e relatividade desta. Os objetos expostos cristalizam a breve relação criada entre
o artista e o estranho, materializando a breve intimidade construída em ambiente público. Ao deslocar a materialização de uma relação entre desconhecidos para o ambiente expositivo, a própria noção de intimidade é discutida. 2.4 - Ficha Técnica Obra: Coleção de Intimidade (nome provisório). Suporte Instalação. Artista: H. Dimensão: 300 x 700 x 10 cm Profissionais contratados: Curador e Montador 2.5 Cronograma de Montagem A pré-produção do projeto demandará 20 dias, para a aquisição dos objetos e de todo o material necessário. A montagem será executada em dois dias, e a desmontagem em um dia, ambas com auxílio de um montador. 2.6 - Orçamento Orçamento: Molduras: Quantidade: 20 Características das molduras: Dimensão externa: 25 x 25 x 10 cm Largura da moldura: 3 cm Material da moldura: Madeira pinos laqueada Espessura da madeira: 1 cm Cor: Preto fosco. Cor do fundo: Branco Vidro: Não haverá vidro Outras características: As molduras terão a caneleta interna para encaixe de vidro. Preço unitário: R$ 35, 00 Preço total: R$ 600,00 Orçamento executado com a loja: G. Molduras Suporte para folhetos: Quantidade: 20 Características dos suportes: Dimensão: 21 x 15 x 3 cm Material: Acrílico Preço unitário: R$ 25,00 Preço total: R$ 401, 60
Orçamento executado com a loja: Tudo em Acrílico. Presilha 1: Características da presilha: Serão utilizadas presilhas tipo jacaré, sem capa. Quantidade: 20 Dimensão: 26 mm Abertura da boca: 6 mm Preço unitário: R$ 0,50 Preço total: R$ 10,00 Orçamento executado com a loja: Rei do Som. Presilha 2: Características da presilha: Serão utilizadas presilhas do tipo jacaré, sem capa. Quantidade: 20 Dimensão: 32 mm Abertura da boca: 9 mm Preço unitário: R$ 0,50 Preço total: R$ 10,00 Orçamento executado com a loja: Rei do Som Corrente Quantidade:
1
Dimensão: 2 x 2 x 2500 mm Material: Aço Acabamento: Níquel Observações: a corrente será dividida em 20 pedaços de 12 cm Preço por metro: R$ 4,00 Preço Total: R$ 10,00 Orçamento executado com a loja: Monte Biju. Parafuso Ganchos: Quantidade: 20 Dimensão total: 5 x 15 mm Dimensão cabeça : 5 mm
Material: Aço inoxidável Observação: os ganchos são abertos Preço unitário: R$ 0,20 Preço total: R$ 3,00 Orçamento executado com a loja: R.P Panfletos: Quantidade: 2000 Cor: Preto e Branco Dimensão: 21 x 15 cm (A5) Papel: Off Set 120 g/m2 Preço unitário: R$ 0,50 Preço total: R$ 350,00 Observações: serão impressas 100 cópias de 20 imagens diferentes. Orçamento executado com a loja: Lapel. Montador: Será necessário o auxílio de um montador durante três dias Preço da diária: R$ 2250,00 Curador Preço: R$ 3000,00 Orçamento final: Moldura: R$ 600,00 Suporte para panfleto: R$ 401,60 Presilha 1: R$ 10,00 Presilha 2: R$ 10,00 Corrente: R$ 10,00 Parafuso Gancho: R$ 3,00 Panfletos: R$ 350,00 Montador: R$ 2250,00 Curador: R$ 3000,00 Preço Total: R$ 6634,60 2.7 - Memorial Descritivo
A instalação será composta de 20 molduras de 25 x 25 x 10 cm, colocadas a 1,60 m de altura, dispostas de forma horizontal, lado a lado, com espaçamento de 15 cm entre elas. Abaixo de cada moldura haverá um suporte para panfleto, 15 cm abaixo das molduras. Em cada moldura haverá um objeto pendurado por uma corrente, e em cada suporte para panfleto haverá 100 panfletos.
Encuentro con mi marido: Una pequeña fiesta de estudiantes. "Encuentro Cultural" le llamo yo. Donde estudiantes de PUCC y Unicamp disfrutou de buena música, buena companía y buenas intenciones. Era mi último año de estudio. Yo volveria a Bolivia y me despediria definitivabente del Brasil Dulce enganio mio. Aquella fue la trampa definitiva que me sujetó eternamente en esta tierra cálida Son 33 anõs quue vivo con aquél enamorado de la juventud universitaria. Tenemos 2 hijos. La mayor se casa ahora y la historia vuelve al inicio. Carolina, casándose con un descendiente de chino. Ella, descendiente de Boliviana con japonés. Brasilerísimo. Gente que carga en sus venas los genes de casa rozo del mundo. Mente abierta para recibir en amor a cada extranjero. Je soy muy grata a esta tierra que me abrajó, me aceptó como hije y me motivó a crecer y no temer. Quise escapar a mi destino y la fuerza de Dios fui más poderosa dotándome de la inmensa capacidad de amor y de saber adaptarme a esta mi nueva realidad: Brasileña Naturalizada. A muita honra! !Con mucha honra!