ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, ARTES E DESIGN - FAMECOS CURSO DE PUBLICIDADE E PROPAGANDA
CAROLINE DA SILVA PACHECO ENTRE CLONES, ALIENS E FÃS: A RELAÇÃO ENTRE REPRESENTATIVIDADE LGBT EM SÉRIES E A PRODUÇÃO DE FANFICTIONS NOS FANDOMS DE ORPHAN BLACK E SUPERGIRL.
Porto Alegre 2018
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DO RIO GRANDE DO SUL ESCOLA DE COMUNICAÇÃO, ARTES E DESIGN PUBLICIDADE E PROPAGANDA
CAROLINE DA SILVA PACHECO
ENTRE CLONES, ALIENS E FÃS: A RELAÇÃO ENTRE REPRESENTATIVIDADE LGBT EM SÉRIES E A PRODUÇÃO DE FANFICTIONS NOS FANDOMS DE ORPHAN BLACK E SUPERGIRL
Porto Alegre 2018
CAROLINE DA SILVA PACHECO
ENTRE CLONES, ALIENS E FÃS: A RELAÇÃO ENTRE REPRESENTATIVIDADE LGBT EM SÉRIES E A PRODUÇÃO DE FANFICTIONS NOS FANDOMS DE ORPHAN BLACK E SUPERGIRL
Trabalho de conclusão de curso de Graduação apresentado à Escola de Comunicação, Artes e Design da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Publicidade e Propaganda.
Orientadora: Profa. Me. Gabriela Birnfeld Kurtz
Porto Alegre 2018
CAROLINE DA SILVA PACHECO
ENTRE CLONES, ALIENS E FÃS: A RELAÇÃO ENTRE REPRESENTATIVIDADE LGBT EM SÉRIES E A PRODUÇÃO DE FANFICTIONS NOS FANDOMS DE ORPHAN BLACK E SUPERGIRL
Trabalho de conclusão de curso de Graduação apresentado à Escola de Comunicação, Artes e Design da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), como requisito parcial para obtenção do grau de Bacharel em Publicidade e Propaganda.
Aprovado em 05 de dezembro de 2018
BANCA EXAMINADORA
________________________________________________________________ Profa. Dra. Camila Kieling – PUCRS
_________________________________________________________________ Prof. Dr. Ticiano Paludo – PUCRS
Porto Alegre 2018
AGRADECIMENTOS
Primeiramente, agradeço aos meus pais por todo amor, carinho, ensinamentos e pelo incentivo para que eu nunca desistisse de seguir em frente. Sou grata pela confiança que sempre depositaram em meus estudos e pela igual força que fizeram para que eu alcançasse esse momento que vivo agora. Acredito que a cobrança nunca deixou de existir, mas sinto que conquisto a cada dia mais a admiração daqueles que levo como exemplos maiores da minha vida. Agradeço aos amigos e colegas que fiz durante toda minha trajetória pela PUCRS, pela Famecos e por onde mais a minha Graduação me levou. Sei que minha formação tem um pouco de cada um que passou por mim e dos ensinamentos que comigo compartilharam. Da mesma forma, agradeço a todos os professores que me apresentaram a comunicação por todos os lados, todas as vozes e possibilidades. Minha gratidão àqueles que me mostraram todos os caminhos que poderia seguir com a minha futura profissão e o que poderia conquistar. Agora eu sei um pouco mais sobre o meu papel nesse mundo. Agradeço aos meus amigos de coração, ao meu clã que a Famecos escolheu a dedo para fazer parte da minha vida: Bruna Busse, Rodrigo Rieth, Tamires Rosa, Victor Andrade e Yago Mello. Vocês são a Famecos que levo no peito e na pele. Agradeço ainda aos meus amigos João Langhanz e Nathalia Moraes, que me acompanharam durante essa trajetória todas as noites, compartilhando as felicidades, as pizzas do R.U., o cansaço das semanas de prova e os momentos mais complicados da vida universitária. Meu amor maior a todos vocês. Agradeço a Mariana Franzoi, por todos os conselhos e frases clichês que serviram para me acalmar durante esta etapa da Graduação. Provavelmente, não chegaria até esse ponto sem a sua paciência para me dizer, inúmeras vezes, que daria tudo certo no final. A sua parceria e carinho escreveram este trabalho comigo. Agradeço imensamente a minha orientadora professora Gabriela Kurtz. Sem as suas aulas de cultura digital, jamais saberia que existe espaço no meio acadêmico para um assunto que me apaixonou tanto como a cultura de fãs. Sem o seu apoio e orientação, jamais teria conseguido fazer um trabalho do qual me orgulho tanto como este. Este trabalho não é só meu, ele é nosso.
Como alguém pode sentir que não existe só porque não se vê na TV? Você está lá. Você existe. Você pode se ver no espelho, tocar seu dedo no vidro e ver a mancha que sua impressão causa. Você come, você dorme, você ri, você vive. Mas então, de certa forma, quando você nunca se vê nas histórias sendo contadas, você não existe. É como o equivalente cultural de olhar naquele espelho e ser incapaz de ver o seu reflexo, de estar dolorosamente consciente do espaço entre você e o alumínio prateado do outro lado do vidro. Histórias são reflexos de pessoas, do que está acontecendo no mundo. Então, quando você não faz parte da narrativa maior, quando nem sequer lhe ocorre que você poderia ter permissão de existir lá, parece que você está em uma zona crepuscular de existência, onde você é a anomalia, onde o único lugar em que você existe é na sua própria pele. Você não tem permissão para ser um protagonista. Você não tem permissão para ser um herói. Você não tem permissão para se apaixonar de maneiras grandiosas. Não há narrativa para você. Outros podem se inserir nas narrativas com facilidade. É tão fácil para eles escolher uma história e estar lá. É tão confortável para eles, saber que os outros experimentam a vida como eles, que suas experiências podem ser extraordinárias. Eles existem. Você não. E é por isso que histórias, representações e fanworks são tão importantes. Eles lhe concedem a existência que você sempre sonhou. (MJ BAE, 2017, tradução nossa).
RESUMO A
presente
monografia
tem
como
objetivo
compreender
como
a
representatividade LGBT nas séries de TV aberta Orphan Black e Supergirl se relaciona com a produção de fanfictions pelos respectivos fandoms. Para isso, foram selecionadas as duas fanfictions com maior número de bookmarks - as mais favoritadas - dentro de cada um dos fandoms de Orphan Black e Supergirl na plataforma de fanfictions online Archive of Our Own. A fim de fundamentar a pesquisa, em um primeiro momento, foi realizado um estudo acerca do universo da cultura de fã, identificando conceitos básicos, comportamentos, formas de produção de fã e como eles se relacionam com esses conteúdos. Para tal, utilizamos embasamento de autores como Henry Jenkins (1992, 2006, 2015), Matt Hills (2002) e Maria Lucia Bandeira Vargas (2005, 2015). Em um segundo momento, nos aprofundamos nos conceitos de sexo, gênero, identidade queer e heteronormatividade, bem como exploramos a representação na TV e o queerbaiting, utilizando autores como Guacira Lopes Louro (2000, 2007, 2008), Judith Butler (2003) e Emma Nordin (2015). Ao examinar as quatro fanfictions com base nos mesmos indicadores, foi possível entender a relação entre representatividade e fanfictions nos fandoms selecionados. O trabalho revelou que as fanfictions desempenham papéis importantes em fandoms com interesse no conteúdo queer, seja como resposta ao queerbaiting ou como uma expansão de narrativas satisfatórias presentes nesses fandoms. Palavras-chave: comunicação. cultura de fãs. LGBT. fanfiction. queerbaiting.
ABSTRACT The present monograph aims to understand how LGBT representativeness in the TV series Orphan Black and Supergirl is related to the production of fanfictions by the respective fandoms. For this, we selected the two fanfictions with the highest number of bookmarks within each of the fandoms of Orphan Black and Supergirl on the platform of online fanfictions Archive of Our Own. In order provide evidence to support the research, we first carried out a study about universe of fan culture, identifying basic concepts, behaviors, forms of fan production and how they relate to these contents. To enable this, we based ourselves in authors such as Henry Jenkins (1992, 2006, 2015), Matt Hills (2002) and Maria Lucia Bandeira Vargas (2005, 2015). In a second moment, we delved into the concepts of sex, gender, queer identity and heteronormativity, as well as we explored queer representation on TV and queerbaiting, using authors such as Guacira Lopes Louro (2000, 2007, 2008), Judith Butler (2003 [1990]) and Emma Nordin (2015). By applying the content analysis method and examining the four fanfictions based on the same indicators, it was possible to understand the relationship between representativeness and fanfictions in the selected fandoms. The work revealed that fanfictions play important roles in fandoms with an interest in queer content, either as a response to queerbaiting or as an expansion of satisfying narratives present in these fandoms. Keywords: Communication. fan culture. LGBT. fanfiction. queerbaiting.
LISTA DE ILUSTRAÇÕES
FIGURA 1 - FAN ART .......................................................................................................... 21 FIGURA 2 - Fanzine ............................................................................................................ 21 FIGURA 3 – Fanfilm (Print) .................................................................................................. 23 FIGURA 4 - Fansubbing ...................................................................................................... 24 FIGURA 5 - Fanfiction.net (Print) ......................................................................................... 28 FIGURA 6 - Archive of Our Own (Print)................................................................................ 28 FIGURA 7 - Wattpad (Print) ................................................................................................. 29 FIGURA 8 - Nyah! Fanfiction (Print) ..................................................................................... 30 FIGURA 9 - Fanfic Sherlock x Harry Potter .......................................................................... 33 FIGURA 10 - Tony Stark e Steve Rogers............................................................................. 34 FIGURA 11 - Morte de Lexa ................................................................................................ 53 FIGURA 12 - Cena excluída Moriarty e Sherlock ................................................................. 55 FIGURA 13 - Organização AO3 (Print) ................................................................................ 58 FIGURA 14- Informações de resumo AO3 (Print) ................................................................ 59 FIGURA 15 - Classificadores ............................................................................................... 60 FIGURA 16 - Cosima Niehaus e Delphine Cormier .............................................................. 62 FIGURA 17 - Supercorp....................................................................................................... 65 FIGURA 18 - Reação dos fãs à brincadeira do elenco (Print) .............................................. 66 FIGURA 19 - Esquematização da Análise de Conteúdo ...................................................... 69 FIGURA 20 - Severed Crossed Fingers - Problemas de Cosima ......................................... 71 FIGURA 21 - Severed Crossed Fingers - Cosima atraída por Delphine ............................... 72 FIGURA 22 - Severed Crossed Fingers - O namorado de Delphine .................................... 73 FIGURA 23 - Severed Crossed Fingers - Conversa entre Delphine e Beth.......................... 74 FIGURA 24 - Severed Crossed Fingers - Relação entre Beth e Alison ................................ 75 FIGURA 25 - Severed Crossed Fingers x classificadores AO3 ............................................ 75 FIGURA 26 - 03:24:21 - Atração de Cosima por Delphine ................................................... 78 FIGURA 27 - 03:24:21 - Discussão entre Cosima e Delphine .............................................. 79 FIGURA 28 - 03:24:21 - Sexualidade de Delphine ............................................................... 79 FIGURA 29 - 03:24:21 - Relação entre Cosima e Sarah ...................................................... 80 FIGURA 30 - 03:24:21 - Relação entre Cosima e Scott ....................................................... 81 FIGURA 31 - 03:24:21 - Dr. Leekie, Ethan Duncan e Henrik Johanssen ............................. 82 FIGURA 32 - 03:24:21 - Sarah citando Rachel .................................................................... 82 FIGURA 33 - 03:24:21 - Cosima citando relação entre Beth e Alison .................................. 83 FIGURA 34 - 03:24:21 x classificadores AO3 ...................................................................... 84
FIGURA 35 - Supergirl in Training - Kara sobre relação com Mon-El................................... 86 FIGURA 36 - Supergirl in Training - Kara defendendo Lena ................................................ 86 FIGURA 37 - Supergirl in Training - Sentimentos de Lena sobre Kara ................................. 87 FIGURA 38 - Supergirl in Training - Revelação de sentimentos........................................... 87 FIGURA 39 - Supergirl in Training - Kara e sentimentos confusos ....................................... 88 FIGURA 40 - Supergirl in Training - Ações abusivas de Mon-El .......................................... 89 FIGURA 41 - Supergirl in Training x classificadores AO3 .................................................... 90 FIGURA 42 - My Youth is Yours - Encontro entre Kara e Lena ............................................ 93 FIGURA 43 - My Youth is Yours - Flashbacks ..................................................................... 93 FIGURA 44 - My Youth is Yours - Ciúme de Lena sobre Mon-El ......................................... 94 FIGURA 45 - My Youth is Yours - Crossovers da fanfiction ................................................. 95 FIGURA 46 - My Youth is Yours - Sexualidade de Kara ...................................................... 96 FIGURA 47 - My Youth is Yours x classificadores AO3 ....................................................... 97
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO ................................................................................................................. 11 2.1 O QUE É CULTURA DE FÃ? ..................................................................................... 15 2.2 PRODUÇÕES DE FÃS .............................................................................................. 19 2.3 FANFICTIONS ........................................................................................................... 25 3 REPRESENTATIVIDADE LGBT ...................................................................................... 36 3.1 IDENTIDADE DE GÊNERO ....................................................................................... 36 3.2 REPRESENTAÇÃO QUEER NA TV .......................................................................... 42 3.3 QUEERBAITING ........................................................................................................ 49 4 METODOLOGIA............................................................................................................... 57 4.1 DESCRIÇÃO DOS OBJETOS .................................................................................... 57 4.1.1 PLATAFORMA .................................................................................................... 58 4.1.2 ORPHAN BLACK ................................................................................................. 61 4.1.3 SUPERGIRL ........................................................................................................ 64 4.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS ................................................................... 67 4.3 ANÁLISE .................................................................................................................... 70 4.3.1 SEVERED CROSSED FINGERS ........................................................................ 70 4.3.1 03:24:21 ............................................................................................................... 77 4.3.3 SUPERGIRL IN TRAINING .................................................................................. 85 4.3.4 MY YOUTH IS YOURS ........................................................................................ 92 4.3.5 VALIDAÇÃO ........................................................................................................ 99 5 CONSIDERAÇÕES FINAIS ............................................................................................ 106 6 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICA ................................................................................. 112
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1 INTRODUÇÃO A cultura de fãs é um fenômeno que ganha forma e cresce com o desenvolvimento da sociedade ocidental e da revolução tecnológica pela qual passamos. Essa subcultura - dentro da cultura de massa - abrange todo o universo do fã, seus fandoms e relação com o conteúdo de admiração, bem como a maneira com os fãs encontraram de se apropriar desse conteúdo e criar a partir disso. Com o avanço das tecnologias, os fãs passam a ter mais acesso a criações de outros fãs e mais visibilidade para as suas, o que promove a maior difusão de produções de fãs como fanarts, fanfictions, fanzines e fanfilms. Entre esses conteúdos surgidos dos fandoms, as fanfictions -
- aparecem como uma das
formas de produção de fãs mais antigas, trazendo textos narrativos que abordam aspectos diferentes da história que os fãs estão acostumados e ampliam as possibilidades de enredo do conteúdo original. As fanfictions são conhecidas, além disso, por serem produzidas por grupos da sociedade que se sentem excluídos da cultura de massa, encontrando nessa forma de produção uma solução para invisibilidade que a mídia produz sobre suas identidades. Dentre esses grupos, destacamos a comunidade LGBT, que percorre um longo caminho para conseguir uma visibilidade próxima da que a parcela majoritária da sociedade heteronormativa possui. Sendo contemplados com conteúdos que abordam personagens queer com raso aprofundamento, que negam sua existência ao mesmo tempo que instigam sua atenção, o indivíduo queer precisa buscar por visibilidade em outras formas de conteúdo, longe da mídia de massa quando essa não o representa. Sendo
assim,
nos
questionamos
sobre
como
essa
procura
por
representatividade pode encontrar uma solução em fanfictions, conteúdos moldados para refletir temas excluídos do enredo original com frequência. Para validar essa pesquisa, selecionamos duas séries que possuem histórico distinto quanto à representatividade:
Orphan
Black,
série
premiada
e
reconhecida
pelo
desenvolvimento de um casal LGBT; e Supergirl, série acusada de queerbaiting pelos fãs e que não possui, atualmente, nenhuma representatividade LGBT trabalhada. Dessa forma, nosso problema de pesquisa é compreender como a representatividade LGBT nas séries Orphan Black e Supergirl se relaciona com a produção de fanfictions na plataforma Archive of Our Own (AO3) por esses fandoms.
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Com esse estudo, buscamos verificar se a representatividade LGBT - ou a falta dela afeta de alguma forma fandoms que possuem interesse em conteúdos queer, sendo essa influência visível através das duas fanfictions de maior sucesso de ambos os fandoms no site AO3. E, para alcançar esse objetivo, elaboramos ainda alguns objetivos específicos. Primeiramente, consideramos necessário estudar a cultura de fã e a produção de conteúdo desse público no meio online. A partir desse ponto, podemos entender como surge o fã e o fandom, além de estudar a produção de conteúdo que ocorre nesse meio. Assim, objetivamos também entender, mais especificamente, a produção de fanfictions e as motivações que levam um fã a desenvolver esse trabalho para seu fandom. Entendido o universo do fã, temos como objetivo então estudar a representatividade LGBT em séries de TV, a fim de analisar como ocorre o queerbaiting na série Supergirl e como se dá a representatividade real na série Orphan Black. Com isso, queremos entender o que leva os fãs em diferentes níveis de satisfação com a representatividade LGBT que consomem a procurarem por conteúdos de outros fãs - mais especificamente, fanfictions -, estabelecendo o papel da fanfiction nos fandoms de Supergirl e Orphan Black sob o aspecto da representatividade LGBT. Visando solucionar os questionamentos que o tema levanta, optamos por realizar este estudo através da metodologia da análise de conteúdo. Essa técnica é constituída de seis etapas: seleção do corpo de texto
que pode ser imagem, vídeo,
, definição da pergunta norteadora, delimitação do contexto e seleção dos tópicos sobre os quais será analisado o corpo de texto, realização de inferências sobre a análise e validação das evidências encontradas. Para recolher as informações solicitadas pelo método de pesquisa, buscamos construir base de fundamentos e conceituações através de autores relevantes nas áreas de cultura de fã e de gênero/representatividade LGBT, através da técnica de pesquisa bibliográfica. A análise de conteúdo foi a metodologia escolhida, pois é uma técnica que nos permite levar em conta o que o texto representa para as pessoas que o consomem, identificando os significados do conteúdo que estão estritamente conectados aos contextos nos quais estão inseridos no momento da análise. Este trabalho é constituído por três capítulos. No primeiro, buscamos abordar a cultura de fã e conceitos iniciais da área no subcapítulo inicial, de forma que tratamos
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sobre os termos fã e fandom, revelando suas origens e como a identidade do fã passou por mudanças com o tempo, assim como a própria imagem da cultura de fã. No segundo subcapítulo, exploramos a relação do fã com o fandom, comentando sobre como a barreira que separava o produtor do consumidor de conteúdo está se tornando menos visível e ainda apresentando algumas formas de produção de fã como fanarts, fanzines, fanfictions, fanfilms e fansubbing. Por fim, encerrando o capítulo de fãs, concedemos foco especial às fanfictions, aprofundando nossos conhecimentos nesse que é o objeto de pesquisa do presente trabalho, a fim de entender mais sobre estruturação, gêneros dessa prática de produção, sites de hospedagem e motivação de fãs para produzirem esse tipo de conteúdo. Para realizar esse primeiro capítulo, foram utilizados conceitos e teorias de autores como Clay Shirky (2011), Henry Jenkins (1992; 2006; 2015), Maria Lucia Bandeira Vargas (2005), Matt Hills (2002) e Piva e Affini (2017). Dando seguimento ao trabalho, o segundo capítulo teve como foco a identidade de gênero, TV e representação LGBT na mídia. No primeiro subcapítulo, estudamos os conceitos de sexo, gênero, heteronormatividade e movimento queer, entendendo mais sobre os pilares que sustentam a área de estudo em questão. Já no segundo subcapítulo, nosso foco passa para a TV, onde estudamos a representação do indivíduo queer na mídia e como a natureza dessa está atrelada a conceitos antigos de uma sociedade heteronormativa, mas entendendo as mudanças que o tempo vem impondo nessa questão. No terceiro subcapítulo, discutimos uma das práticas negativas empregada pela mídia em relação ao público LGBT, trazendo exemplos de queerbaiting e buscando entender como ele atinge a comunidade queer ainda atualmente. Nesse capítulo, são utilizadas obras de autores com Douglas Kellner (2001), Emma Nordin (2015), Guacira Lopes Louro (2000; 2007; 2008), Judith Butler (2003), Juliana Bravo (2014) e Letícia Falcão Wunderlich Moraes (2018). O terceiro capítulo compreende a associação entre os conteúdos vistos nos capítulos teóricos com os objetos da pesquisa. No subcapítulo inicial, realizamos a descrição dos principais elementos abordados na análise: a plataforma Archive of Our Own, a representatividade na série Orphan Black e a representatividade na série Supergirl. Já no subcapítulo em sequência, utilizamos Klaus Krippendorff (2004) para fundamentar o método escolhido - a análise de conteúdo -, bem como explicar como aplicamos a técnica de Krippendorff (2004) nos objetos selecionados para a análise. Em seguida, ocorre a análise das quatro fanfictions - duas de Orphan Black, duas de
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Supergirl -, onde analisamos aspectos como mudanças na narrativa, relacionamento dos personagens, abordagens sobre sexualidade e indicadores de popularidade. Nessa etapa, realizamos inferências sobre a análise de todas as fanfictions, as quais validamos no item seguinte, onde fundamentamos esses aspectos com autores como Bravo (2014), Butler (2003), Hills (2002), Jenkins (1992; 2006; 2015), Kellner (2001), Louro (2000; 2007; 2008), Moraes (2018) e Nordin (2015). A partir da análise, percebemos que as fanfictions desempenham um papel importante em ambos os fandoms de Orphan Black e Supergirl. No caso de Orphan Black - que possui representatividade LGBT consolidada -, a produção de fãs possui a função de expandir o universo da série, sem a preocupação de trazer narrativas jovens com único objetivo realizar ships que não sejam canônicos1. Por outro lado, em Supergirl - uma série que produz queerbaiting -, as fanfictions desempenham um papel diferente, na medida que servem como resposta à falta de representatividade na série, preenchendo as lacunas de um universo já existente com aquilo que ele carece de conteúdo para o fandom. A motivação para o presente trabalho surgiu do nosso interesse e participação em fandoms de séries desde muito cedo, produzindo e consumindo fanfictions de conteúdo queer e se deparando com práticas de queerbaiting na TV durante esse período. Após descobrirmos a área de estudo de cultura de fãs, através da disciplina de Mídia Expandida, o tema começou a tomar forma, sendo completo pela decisão de análise sob o aspecto LGBT mais tarde, já na disciplina de Projeto de Pesquisa. Quanto ao meio, esperamos que a monografia traga contribuições para o mercado
de
Publicidade
e Propaganda,
agregando
informações
sobre
o
comportamento de fãs e, consequentemente, consumidores dedicados a alguma marca. Além disso, acreditamos que o trabalho possa colaborar para mostrar como algumas criações e narrativas afetam o público LGBT, assim como a maneira que esse público encontra de reagir a elas, seja através de críticas ao que for danoso para sua identidade queer, ou na difusão ainda maior de um conteúdo devido a sua boa representatividade. 2 CULTURA DE FÃS E PARTICIPAÇÃO
Relativo àquilo que é representado atualmente como verdadeiro, dentro do roteiro real da história como ela é produzida (LINDBERG, 1999). 1
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Este capítulo irá abordar a cultura de fãs, fenômeno que ganha forma e cresce com o desenvolvimento da sociedade ocidental e da revolução tecnológica pela qual passamos. Nosso estudo visa entender como indivíduos se comportam enquanto fãs, de que forma esses comportamentos em torno de objetos de adoração são expressos na identidade de consumo de conteúdos e quais são os principais conteúdos com os quais eles se relacionam em um fandom. Para alcançar esse objetivo, uma das etapas é a conceituação de fã e fandom, utilizando como base em autores Clay Shirky (2011), Henry Jenkins (1992; 2006; 2015), Maria Lucia Bandeira Vargas (2005), Matt Hills (2002) e Piva e Affini (2017) para entender a origem desses termos. Abordaremos ainda a relação entre produtores e fãs, assim como de que forma e por que as barreiras entre esses dois pólos têm se tornado cada vez mais tênues. Analisando essa relação, trataremos exemplos de produção por parte dos fãs, como esses conteúdos são recebidos pela comunidade e as principais motivações para que eles busquem desenvolvê-los para seus fandoms. Tendo em vista o objetivo desta pesquisa, daremos especial foco para as fanfictions dentre essas produções, abordando o surgimento delas, principais gêneros, exemplos de classificadores e plataformas mais utilizadas para publicação e leitura.
2.1 O QUE É CULTURA DE FÃ? Para começar a falar sobre a chamada cultura de fã, antes é necessário conceituar dois termos centrais para este estudo: o fã e o fandom. A pal origem do latim fanaticus, que indicaria uma pessoa com interesse obsessivo por algo, especialmente uma atividade. Ela também deriva de um significado religioso antigo, sendo utilizada para designar alguém inspirado por um deus, relativo ao templo de Fannun ou mesmo alguém cujo comportamento era resultado de possessão demoníaca, um maníaco religioso (JENKINS, 1992). Essa definição deu origem a conceitos de fãs que, muitas vezes, pendiam para o lado negativo da obsessão, como veremos a seguir. A imagem genérica do fã na cultura contemporânea ainda apresentava ligação com as raízes do conceito linguístico da palavra até os anos 90. Segundo a obra de 1992 de Henry Jenkins, Textual Poachers: Television Fans & Participatory Culture , até o momento, o fã ainda fazia parte de uma categoria escandalosa na cultura
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contemporânea, uma posição onde era pintado como alguém de comportamento ridículo, ansioso, assustador ou descontrolado. Para ilustrar a constatação, o autor trouxe exemplos de representações de fã na mídia de época - em filmes ou reportagens -, onde frequentemente caracterizam fãs como psicopatas cujas fantasias frustradas de relacionamento íntimo com estrelas ou desejos insatisfeitos de alcançar seu próprio estrelado assumem formas violentas e anti sociais. As ações assassinas de Charles Manson (um fã dos Beatles), John Hinkley (um fã de Jodie Foster) e Mark David Chapman (um fã de John Lennon), bem como incidentes menos divulgados como o ataque a Sharon Gless de Cagney & Lacey por acordo com uma concepção estereotipada do fã como emocionalmente instável, socialmente desajustado e perigosamente fora de sincronia com a realidade. (JENKINS, 1992, p. 13).
Sendo assim, a sociedade via a figura do fã de forma deturpada, tendo dificuldade em separar o fã comum dos estereótipos exibidos pela mídia. Contudo, atualmente a imagem do fã e sua importância nos estudos da sociedade já estão mais consolidados, inclusive no Brasil (AMARAL; MONTARDO, 2011). Segundo Sandvoss (2005), já não é possível estudar cultura popular ou encontrar domínios públicos que não sejam afetados pela figura do fã. Para Jenkins (2015) os fãs saíram da periferia da cultura popular e entraram no centro das reflexões atuais. No Brasil, as pesquisas de fã aumentaram no decorrer dos anos (CARLOS, 2015). Em pesquisa realizada por Giovana Carlos sobre o crescimento do número de pesquisas sobre fãs e fandom nos bancos de trabalhos dos sites da Intercom2 e da Compós3, foi verificado que esses eram inexistentes antes dos anos 2000 (CARLOS, 2015). Entretanto, entre 2006 e 2015 foram apresentados 5 trabalhos sobre fãs na Compós. Quanto à Intercom, foram encontrados 51 trabalhos de fãs entre 2002 e 2014. Sobre o aumento do interesse p obra que traz uma visão atualizada sobre fãs e seus comportamentos. Podemos entender, então, que o fã tem ganhado destaque e que a atualização na visão de autores importantes para o meio tem colaborado com isso.
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Intercom - Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação. Disponível em: www.portalintercom.org.br 3 Compós - Associação Nacional dos Programas de Pós-Graduação em Comunicação. Disponível em: http://www.compos.org.br
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Quanto à definição em si do termo fã no contexto acadêmico, a tarefa não se tornou menos complicada com o decorrer dos anos, visto todas as possíveis conceituações encontradas na área. Em sua obra Fan Cultures (2002), Matt Hills discute diversos entendimentos sobre esse conceito. O autor aborda definições que pressupõem a diferenciação entre fãs e não-fãs com base na especialização do interesse (AMBERCROMBIE; LONGHURST, 1998 apud HILLS, 2002) ou por necessidade de criação de uma identidade social (TULLOCH; JENKINS, 1995 apud HILLS, 2002), dentre outras, mas chega a um conceito próprio diferente dessas. Para Hills (2002), é interessante a distinção entre fã e cult fan4, sendo o segundo um indivíduo que permanece ligado ao objeto mesmo depois do término da produção do material/conteúdo; seria um fã que mantém a adoração por uma série mesmo após a conclusão da sua história, por exemplo. Contudo, o autor afirma que simpatiza com a ideia de que não há conceito de fã que faça justiça à variedade de significações que o termo pode empregar, e que as definições encontradas apenas limitam a imagem do fã para os estudos. Essa definição dialoga com a de Jenkins (PORTO, 2010), que diz que os fãs são pessoas inspiradas por histórias da mídia de massa e que utilizam elementos dessas histórias de adoração como material bruto para sua própria expressão criativa, buscando ainda outros indivíduos que compartilhem da sua devoção a esses materiais ricos. Ou seja, fã seria uma pessoa que desenvolve adoração por um determinado conteúdo e que interage com ele de forma ativa. Essa é uma definição mais ampla, sem tantas limitações. Sendo assim, entendemos que fã é um indivíduo que apresenta grande adoração ou interesse por um determinado conteúdo e que interage com ele de forma ativa. O conceito não será segmentado em diferentes categorias no presente trabalho, já que concentraremos todas as formas de fãs sob o mesmo conceito. Entendido o conceito que será trabalhado de fã, é pertinente conceituar também fandom. A palavra é derivada da aglutinação das palavras fan (fã) e kingdom fã compreender então um fandom como um local onde os fãs se reúnem em torno de um interesse em comum. Também conhecidos como comunidades de fãs, essa forma de união caracteriza uma subcultura onde os participantes se unem em prol de um Optamos por não traduzir o termo, tendo em vista que não há tradução direta no português brasileiro que exprima por completo o conceito do autor. 4
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produto ou conteúdo de maneira racion o não-racional e com elementos tradicionais como localização, relacionamento, comunidades podem ser entendidas a partir de duas características básicas: a não co-presença física e a interação não-presencial. Esse ponto é reforçado por Jenkins definida por seus estilos particulares de consumo e preferências cultura possibilidade de não ser necessário um encontro físico colabora para maximizar a abrangência de um fandom no meio online. Nesse caso, quando tratado no universo digital, o fandom passa a ser percebido como uma comunidade virtual, conceituada por Lévy (1999) da seguinte forma: uma comunidade virtual é construída sobre as afinidades de interesses, de conhecimentos, sobre projetos mútuos, em um processo de cooperação ou de troca, tudo isso independentemente das proximidades geográficas e das filiações institucionais. (1999, p. 127).
É possível, logo, inferir que o ciberespaço teve uma grande influência na difusão de fandoms e dos seus conteúdos (PIVA; AFFINI, 2017), assim como a convergência das mídias, que não apenas modificou as tecnologias, mas a forma de conexão entre as antigas tecnologias e o público (JENKINS, 2015). Para o autor, a transformação culminou em novas formas de utilização dessas tecnologias e dos meios de comunicação (JENKINS, 2015). Com a mudança na forma de interação com a informação e o seu acesso amplificado pelas novas mídias, o fã passa a ter o poder de produzir e compartilhar conteúdo dentro do fandom convergência
midiática
deu
voz
aos
fãs
através
das
oportunidades
de
compartilhamentos e part Os fãs se tornam, portanto, uma espécie de subcultura dentro da cultura hierarquia da cultura dominante, uma vez que recusa a autoridade autoral e viola a propriedade intelectual (JENKINS, 1992). Podemos entender que o fã na cultura da convergência, assim como toda audiência das velhas mídias, sofre mudanças na sua forma de consumir conteúdo - e até mesmo na produção e difusão de conteúdos autorais. Ele ganha poder e acesso a uma infinidade de possibilidades. Unindo seu amor a um conteúdo, o pertencimento a um grupo em torno do mesmo objeto de adoração e a liberdade para criar e ser
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reconhecido, o fã ocupa seu lugar de protagonismo com a intensidade que nunca antes havia sido possível. Trataremos a seguir sobre as formas de produção de fã conhecidas, produtos da apropriação que os fãs fazem do conteúdo base. Serão evidenciadas, principalmente, as alternativas midiáticas que eles encontram para produção no meio online, que direcionam para consumo dentro dos fandoms.
2.2 PRODUÇÕES DE FÃS Da mesma maneira que os conceitos de fã e fandom são complexos, dada a dificuldade de abranger todo o significado que eles carregam com um simples ponto de vista, a atividade produtiva dentro de um fandom não é tão diferente (COSTA, 2018). A produção cultural em fandoms faz parte da essência da cultura de fã (JÓHANNSDÓTTIR, 2017), e ela é caracterizada por diversas formas de manifestações que exaltam a admiração do fã por um ídolo ou objeto. De acordo com Curi (2010), audiências desenvolvem diferentes tipos de significado sobre produtos da cultura pop próprio sistema de produção e distribuição [...] que fica fora do sistema da indústria CURI, 2010, p. 5). Assim, entendemos que o aspecto criativo e o relacionamento interno do fandom com as produções que gera são um dos principais fatores que diferencia a cultura de fã da cultura de pop. A produção de fã é percebida como uma forma de reforçar os laços que mantém o fandom unido (MONTEIRO, 2007). Ao produzir para a comunidade na qual está inserido, o fã se sente mais próximo do seu ídolo ou objeto de adoração (MONTEIRO, 2007), o que se torna uma experiência recompensadora por si só. Há uma volta à ideia de culto do objeto adorado, onde a autora explica que o afeto investido pelo fã em relação tanto à imagem quanto à obra do ídolo envolve, de maneira determinante para a manutenção da relação fã-ídolo em constante movimento, a compreensão de que o objeto de culto merece ser cultuado pelo seu caráter autêntico. (MONTEIRO, 2007, p. 3).
Sendo assim, os fãs são percebidos como consumidores imersos em "mundos imaginários", investindo seu trabalho afetivo na construção dos universos dos
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conteúdos dos quais são fãs, comenta Hills (JULIO, [2017]). A motivação por trás dessa ideia de investir seu trabalho afetivo de forma espontânea pode ser explicada por Jenkins et al. (2015), que trazem o conceito de economia do dom ou economia da dádiva (MAUSS, 1922 apud JENKINS ET AL., 2015). Os autores citam Richard Barbrook ([1998],) para explicar a economia do dom, quando entendem que as ão formadas através das obrigações mútuas criadas por doações de tempo e ideias Assim, os indivíduos pertencentes a essas comunidades se sentem na obrigação de contribuir de alguma forma - no caso da economia do dom, eles produzem conteúdo. Portanto, podemos entender que os fãs produzem e expandem seus fandoms por verem isso como uma retribuição para suas comunidades. Da mesma forma, esses fãs podem ainda ter esperança de que suas ações contribuam para despertar o interesse de outras pessoas, de fora do fandom, sobre seu objeto de adoração (JENKINS ET AL., 2015). A tecnologia alterou a forma como os fãs se relacionam com a produção de conteúdo (HILLS, 2017). De acordo com ser autônomos, e a mídia social se tornou um ambiente para acionar esses desejos, mais do que os suprimir sempre desejou criar esse conteúdo próprio, e que com o advento das mídias sociais foi possível difundir esse conteúdo. A ideia de Shirky dialoga com Curi (2010), que afirma que cada produto criado por fãs traz consigo suas limitações, mas que a tecnologia foi a responsável por diminuí-las e permitir a criação de obras cada vez mais complexas e próximas do produto ou conteúdo base. Hills (2017) complementa ao afirmar que os fandoms sempre criaram suas próprias versões de conteúdos, mesmo quando o potencial de circulação não era tão grande. Porém, de acordo com em si, mas de acessar ao que outros fãs es 2017). Movidos pela motivação intrínseca de criação, os fãs possuem uma infinidade de possíveis produtos que contribuem para desenvolvimento cultural do fandom (SHIRKY, 2011). Nesta pesquisa, nos concentraremos em alguns tipos de produção ligados ao meio online a título de exemplo de como os fãs produzem conteúdos. Serão abordados então fanart, fanfiction, fanfilms e fansubbing. Percorrendo comunidades online, é comum encontrar colagens, desenhos e criações gráficas/visuais que mostram personagens ou o universo de uma série, filme,
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livro ou outro conteúdo do interesse do fandom. Essa espécie de produção é conhecida como fanart ou fan art
s em
seguida (FIGURA 1), ela representa cenas inéditas ou uma visão nova sobre algo que a criatividade do fã foi capaz de produzir (CURI, 2010). FIGURA 1 - Fanart
Fonte: Irath (2018).
Segundo Leal (2017), essa é uma das formas mais antigas de criações do gênero, que costumavam ilustrar fanzines. Esse último termo faz alusão a fan (fã) e magazine (revista), uma vez que eram revistas preenchidas de conteúdo de fã e distribuídas em convenções ou em encontros de fãs (JENKINS, 1992), como vemos no exemplo da FIGURA 2, uma fanzine conhecida como The Science Fiction Fan, que trazia autores apaixonados pelo mundo da ficção científica (BROGAN, [2015]).
FIGURA 2 - Fanzine
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Fonte: Science Fiction Fanzine (1939?)
Fanzines também eram compostas por fanfictions ou fanfics português), que diferentemente das fanarts (imagens), são produção textuais de fãs (CURI, 2010). As fanfictions próprio, que incorporam elementos diversos das produções o (JENKINS, 2015, p. 325) mas que possibilitam aos fãs darem uma nova visão para a história base. Essa espécie produção de fã será estudada com mais aprofundamento no próximo tópico do trabalho. Além de fanarts e fanfictions, os fãs também provém para o fandom com fanfilms, técnica nomeada pela união das palavras fan (fã) e film (filme), em português fanfilms, os fãs concentram-se na produção de vídeos sobre o universo do seu fandom, contando outros pontos de vista da história e engajando mais pessoas pelo maior empenho em produção (CURI, 2010). Como exemplo, a seguir temos uma produção de fã caracterizada como fanfilm (FIGURA 3), onde fãs produziram um vídeo parodiando uma cena específica de uma webserie chamada Carmilla (2014), mantendo as mesmas falas e personagens e inserindo humor no contexto onde se passa.
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FIGURA 3
Fanfilm (Print)
Fonte: Rotella e Dillonardo (2015)5.
Ainda no meio online, há outra prática de fandoms conhecida como fansubbing, palavra que vem da união de fan (fã) e subtitled (subtítulo/legenda), fazendo referência a fãs que legendam séries, animes, filmes, dentre outros (JENKINS, 2015). Através dessas legendas, os fãs possibilitam que mais pessoas no fandom ou fora dele tenham acesso ao conteúdo (JENKINS, 2015), uma forma de produção que mais se assemelha a um serviço ao fandom, como vemos no exemplo a seguir, onde fãs legendaram episódios do anime Dragon Ball em português para que mais brasileiros pudessem assistir ao programa (FIGURA 4).
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Carmilla Fan Fiction - exemplo de fanfilm. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=1AmliZq-Wj4
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FIGURA 4 - Fansubbing
Fonte: Leinad4mind (2015).
Existem ainda outras várias formas de produção e expressão de fã, uma vez que elas estão sempre ocorrendo e se modificando, seja pelo desenvolvimento tecnológico e/ou pela ampliação da audiência e sua recepção (HILLS, 2017). Contudo, esses indivíduos continuam criando e provendo para a cultura do fandom, instigados pela mesma necessidade que mantém a audiência do fandom consumindo essa cu ). Seja pelo desejo de retribuição, pela necessidade de se sentir mais próximo do seu ídolo ou por puro amor ao fandom, o fã, além de consumir, também produz. Independente das suas habilidades ou forma de produção que ele escolhe, isso contribui para o desenvolvimento cultural do fandom, assim como para despertar o interesse de outros indivíduos de fora desse universo, seja no meio online ou não. No próximo tópico, abordaremos a produção de fã já mencionada fanfiction. Estudaremos mais a fundo esse gênero de produção, assim como apresentaremos gêneros dessa produção textual e como o fã se relaciona com a possibilidade de dar continuidade aos textos-base que moldam seu universo de fascínio.
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2.3 FANFICTIONS Como vimos anteriormente, os fãs se reúnem para realizar produções culturais, principalmente, para as suas comunidades. Dentre essas práticas, abordaremos com enfoque especial as produções textuais de fãs denominadas fanfictions ou ficção de fã, tendo em vista o objetivo deste estudo. A prática é uma das formas de produção de fã mais frequentes em um fandom (COSTA, 2018). A fanfiction é uma história produzida por fãs, que tomam emprestado narrativas já existentes, utilizando personagens e universos da mídia, mais especificamente, do seu objeto de adoração (PIVA; AFFINI, 2017). Essa produção de fã não tem a intenção de quebrar direitos autorais ou de obter lucro enquanto fanfictions; ou seja, os autores escrevem pelo laço afetivo que mantém com o objeto de adoração (VARGAS, 2005). Em função dessa ligação afetiva, os autores sentem zado, passa a haver a necessidade de interagir, interferir naquele universo ficcional, de deixar sua marca de (VARGAS, 2005, p. 13). Isso evidencia a motivação base para consumir e produzir fanfiction: por um lado, há a necessidade de obter mais informações sobre o objeto; por outro, a necessidade de participar do universo. Segundo Piva e Affini (2017), os escritores de fanfictions se baseiam na ideia de que há uma infinidade de possibilidades para a história e, mesmo que elas jamais se tornem canônicas/canon6 na mídia, elas podem se tornar realidade dentro de um fandom através da escrita. Então, a leitura de fanfictions vai além da básica leitura do que já se conhece. Ao ler fanfictions, o fã quer encontrar novidades em outras possibilidades para a história, quer desafiar o próprio conhecimento e desvendar referências que o produtor colocou em sua obra (CURI, 2010). Ainda que a produção de fanfictions tenha ganhado maior notoriedade com a convergência de mídias e a Web 2.07, a atividade teve início muito tempo antes dessa revolução tecnológica (LEAL, 2017). Há, contudo, divergências sobre a época de origem exata da produção textual de fã entre autores. Derecho (2006 apud PIVA E AFFINI, 2017), comenta que a produção de fanfictions data de meados da década de 6
Relativo àquilo que é representado atualmente como verdadeiro, dentro do roteiro real da história como ela é produzida (LINDBERG, 1999). 7 Conhecida como a 2ª geração da web, faz referência às mudanças que alteraram a forma como o comportamento ocorre no meio digital, facilitando o acesso a conteúdo e tornando o ambiente online mais dinâmico (AMOROSO, 2008).
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1960, quando surge como um subgênero da literatura apropriativa ou derivativa
o
que faz referência a questão da originalidade e legalidade dessa escrita. Já para Félix (2008 apud LEAL, 2017), as fanfictions existem desde o século XVII, quando fãs escreviam histórias alternativas baseadas em romances de Miguel de Cervantes e Jane Austen. Mas a própria Derecho (2006 apud PIVA E AFFINI, 2017) concorda que muitos autores afirmam que essa prática data da época da literatura grega e romana, enquanto outros só reconhecem como fanfiction as histórias de fãs auto-proclamados como tal. De qualquer forma, a prática textual de apropriação não é nova, podendo mesmo ser uma das mais velhas representações de cultura de fã existentes. Independentemente da idade que essa espécie de subgênero da literatura tenha, há certo consenso sobre o público principal que se tem foco. Segundo Derecho (2001 apud MASSUNAGA, 2011), fanfictions atraem mulheres e indivíduos marginalizados em função da sua natureza subversiva. De acordo com a autora, esses indivíduos utilizam a possibilidade de reconstruir essas narrativas para realizar críticas sociais, denunciar desigualdades, apresentando uma realidade com valores que acreditam, mesmo que não sejam os mesmos apresentados pela cultura geral. Vargas (2015) concorda ao afirmar que o público interessado em fanfiction é constituído por mulheres e indivíduos que são, muitas vezes, invisíveis para a sociedade. Jenkins (1992) colabora ao relacionar a ficção escrita por fãs à prática de fofoca, considerando a
explorar mais detalhadamente os aspectos da série
primária que mais os interessam [fãs], aspectos frequentemente marginais à trama central, mas que assumem uma importância especial para determinados espectadores.
seja, através da ficção escrita, os fãs veem a
oportunidade de dar enfoque especial àquilo que eles consideram relevante e representativo a eles. A essência da fanfiction permeia os espaços abertos deixados na obra, como infere Susan Clerc (2000 apud VARGAS, 2015). Segundo Vargas (2015, coletadas por eles ao longo da série para comprovar se Vargas dialoga com a metáfora de textos narrativos citada por Umberto Eco em sua obra Seis Passeios pelos Bosques da Ficção (1994), que busca debater sobre o papel do leitor em um texto aberto (ECO, 2015) e como ele tem a liberdade de preencher lacunas enquanto consome o conteúdo:
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Bosque é uma metáfora para o texto narrativo, não só para o conto de fadas, mas para qualquer texto narrativo. [...] Um bosque é um jardim de caminhos que se bifurcam. Mesmo quando não existem num bosque trilhas bem definidas, todos podem traçar sua própria trilha, decidindo ir para a esquerda ou para a direita de determinada árvore e, a cada árvore que encontrar, optando por esta ou aquela direção. (ECO, 1994, p. 12).
Podemos inferir que os escritores de fanfiction traçam caminhos dentro do universo apresentado na obra (ECO, 1994), decidindo pela linha de narrativa que desejam seguir e que os contemple da melhor forma (JENKINS, 2006). Uma vez que os fãs integram às obras representações da sua própria experiência social (JENKINS, 1992) e a multiplicidade é característica básica da sociedade, é compreensível que existam diversas subdivisões e classificações para diferentes focos de fanfictions, assim como existem vários sites para hospedar essas produções, facilitando o acesso de quem deseja consumir o conteúdo e de quem deseja publicar a sua história. Quanto aos sites que hospedam fanfictions, eles variam conforme a proposta dos criadores. Há sites dedicados a um fandom específico, sites dedicados a formatos específicos de conteúdos sobre os quais tratam as fanfictions (animes, séries, filmes, games, etc.) e os sites que agrupam diversos fandoms, consequentemente, os maiores dentre as plataformas (KOWALCZYK, [2018]). Dentre os principais sites, podemos citar: Fanfiction.net, Archive of Our Own (AO3), Wattpad e Nyah! Fanfiction. O Fanfiction.net8 foi fundado em 1998 e é considerado o maior site de fanfictions do mundo (KOWALCZYK, [2018]). A plataforma abriga cerca de 2 milhões de usuários e histórias em mais de 30 linguagens sobre os mais diferentes fandoms e crossovers9, divididos em categorias como formatos, classificações e linguagens (FIGURA 5).
Fanfiction.net. Disponível em: https://www.fanfiction.net/ Termo que faz referência ao gênero de fanfiction que mistura elementos de diferentes universos, unindo-os em uma narrativa nova (PIVA; AFFINI, 2017) 8 9
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FIGURA 5 - Fanfiction.net (Print)
Fonte: Pacheco (2018).
O Archive of Our Own10, também conhecido como AO3, é uma plataforma criada pela Organization for Transformative Works (OTW) como um projeto de arquivo para fanfictions, fanarts, vídeos e podcasts (KOWALCZYK, [2018]). O site não tem fins lucrativos e, mesmo que esteja ainda na sua versão beta, possui uma boa organização de pesquisa por gêneros, fandoms, tamanho de fanfiction (FIGURA 6), além de faixa etárias e orientações sexuais/relacionamentos dentro das narrativas (KOWALCZYK, [2018]).
FIGURA 6 - Archive of Our Own (Print)
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Archive of Our Own. Disponível em: https://archiveofourown.org/
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Fonte: Pacheco (2018).
Outra plataforma de grande acesso é o Wattpad11 (FIGURA 7). O site é uma das maiores comunidades de leitores-escritores do mundo, com uma audiência com cerca de 10 milhões de leitores por mês, que consomem textos que são, em grande parte, romances. No Wattpad, fanfiction é uma subcategoria, mas possui grande audiência que procura, principalmente, por fanfics sobre celebridades (KOWALCZYK, [2018]). FIGURA 7 - Wattpad (Print)
Fonte: Pacheco (2018).
No Brasil, temos o Nyah! Fanfiction12, com conteúdo exclusivamente em português. Desenvolvido em 2005, a plataforma abriga fanfictions de diversos fandoms, além de categoria específica para histórias autorais (FIGURA 8). O Nyah! ainda possui projeto que incentiva a produção textual, oferecendo orientações sobre 11 12
Wattpad Fanfictions. Disponível em: https://www.wattpad.com/stories/fanfic Nyah! Fanfiction. Disponível em: https://fanfiction.com.br/
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regras de português, exemplos para melhorar a escrita, correções, dentre outros recursos. (Nyah!Fanfiction, 2015). FIGURA 8 - Nyah! Fanfiction (Print)
Fonte: Pacheco (2018).
Quanto às categorizações, elas variam conforme o site que hospeda as fanfictions. Há, contudo, um consenso quanto a divisões baseadas em faixa etária, extensão da história, estilo, relação com o texto original e relacionamento entre os personagens (PELISOLI, 2011). Piva e Affini (2017) sugerem duas classificações básicas, presentes em qualquer site de hospedagem de fanfictions: faixa etária do público direcionado e estilos/elementos presentes no texto. Dessa forma, temos as seguintes classificações no Quadro 1: QUADRO 1 - Sistema de Classificação por faixa etária: CLASSIFICAÇÃO
DEFINIÇÃO
G (General) - Geral Livre para todas as idades. K (Kids) - Crianças PG (Parental Guidance) - Orientação dos Pais
Contém cenas de violência (leve).
K+ PG-13
Contém insinuação de sexo, violência
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T (Teens) - Adolescentes
moderada e palavreado chulo; Não recomendado para menores de 13 anos.
R (Restricted) - Restringido M (Mature) - Maduro NC-17 (No One Under 17) - Ninguém abaixo de 17 anos MA (Mature Accompanied) - Maduro acompanhado
Contém violência e cenas de sexo não totalmente explícito.
Contém cenas de violência e sexo explícito; Não recomendado para menores de 17 anos.
Fonte: Piva e Affini (2017, p. 156) adaptado por Pacheco (2018).
As classificações têm como objetivo rotular a fanfiction com tags em português), facilitando para os leitores encontrarem o conteúdo que procuram e saber exatamente sobre o que tratará o texto que irão ler . A partir da classificação de faixa etária, a plataforma respeita convenções de classificação indicativa, mesmo que não seja regulado o respeito do código. Além da classificação de faixa etária, há ainda a classificação quanto a estilo da fanfiction, como exemplifica o Quadro 2, o que determinará o nicho dentro da seção do fandom onde ela irá aparecer, caso seja feita uma busca por filtro (PIVA; AFFINI, 2017). QUADRO 2 - Sistema de Classificação por gênero: CLASSIFICAÇÃO
DEFINIÇÃO
Angst
Tema trata de angústia, tristeza, ódio, entre outros.
AU (Alternative Universe)
Se passam em um universo diferente daquele da produção original, mantendo os mesmos personagens e, muitas vezes, as mesmas relações entre eles.
Crossover
Caracterizado por uma mistura de universos.
Darkfic
Contém cenas depressivas e atmosferas sombrias.
Deathfic
Quando o tema central gira em torno da morte de um personagem significativo.
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Drabble
Uma história com exatamente cem palavras.
Fannon
Quando as ideias presentes já foram propagadas em outras fanfictions e já são tão populares quanto o enredo original.
Fluffy/Waffy
Oposto de uma Darkfic, com situações românticas ao extremo e um final feliz.
Hurt/Confort
História gira em torno de um personagem confortando outro que está em um estado emocionalmente abatido.
Hentai
Contém sexo explícito.
Lime
Contém sexo implícito.
Lemon
Contém sexo homossexual entre personagens necessariamente masculinos, explícito e detalhado.
Orange
Contém sexo homossexual entre personagens necessariamente femininos, explícito e detalhado.
SAP (Sweet As Possible)
Romântico, mas não chega a ser excessivo como em Fluffy.
Self Insertion
Personalização onde o autor participa da história.
Slash
Enredo gira em torno do relacionamento romântico ou sexual entre dois personagens do mesmo sexo.
Smut
Enredo gira em torno do relacionamento sexual entre dois personagens principais.
One-shot
Um único capítulo curto, como uma crônica.
Song fic
Há inserção da letra de uma música.
TWT (Time? What Time?)
Quando a história passa fora da linha do tempo da original.
Canon
Quando os elementos, principalmente a relação romântica, são fiéis à obra original.
OOC (Out of Character)
Quando a personagem não age de acordo com sua personalidade pré-determinada pelo enredo original.
OC (Original Character)
História centrada em um personagem criado pelo escritor da fan fiction.
Fonte: Piva e Affini (2017, p. 157) adaptado por Pacheco (2018).
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Podemos ilustrar melhor como funciona essa utilização de sistemas de classificação nos exemplos a seguir. Abaixo, um exemplo de fanfiction de classificação etária G, de gêneros crossover e fluffy, como mostra a FIGURA 9: FIGURA 9 - Fanfic Sherlock x Harry Potter
Fonte: Pacheco (2018).
Outro exemplo de cruzamento de classificações, a seguir (FIGURA 10), é um trecho de fanfiction categorizada como mature, slash
entre homens
e hurt/confort:
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FIGURA 10 - Tony Stark e Steve Rogers
Fonte: Pacheco (2018).
Em ambos os exemplos, os fãs tomaram para si o texto original e o alteraram de forma a criar uma situação que os contemple ou, de alguma forma, satisfaça uma vontade de ver o enredo pensado sendo produzido. E, para que esse material seja encontrado por outros fãs que tenham interesse, eles são classificados no site seguindo o modelo proposto. Uma vez que as classificações não são impostas ou reguladas na plataforma, pode-se dizer que há respeito entre os indivíduos que utilizam os sites para que elas sejam utilizadas da melhor forma. Como explicam Piva e Affini (2017, p. 157), a categoria é inserida pelo próprio autor, que tem a responsabilidade de julgar qual deve ser o público adequado para o seu texto. Além deste fator, não há nada que impeça um menor de 13 anos de ler uma fanfiction categorizada como T, além de sua própria consciência.
Para as autoras, as classificações surgiram de maneira espontânea, de acordo com a criação de fanfictions e circulação do material dentro do meio (2017). Entendemos então que esse universo é construído inteiramente pelo fã, que desenvolve estilos e estipula regras para a própria comunidade. O funcionamento desses sites se baseia no respeito dos fãs pelas regras que foram determinadas pela própria comunidade (PIVA; AFFINI, 2017). Além disso, a estrutura das fanfictions costumam seguir uma composição padrão, independente dos sites de hospedagem. No universo da ficção de fã, os
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escritores podem escrever sozinhos, mas também é comum que os autores tenham o auxílio de um beta reader ( leitor-beta , em português), para testar e corrigir seu texto enquanto o escrevem (VARGAS, 2005). Entendemos que a função desse segundo elemento é uma forma de alcançar maior qualidade no texto, uma vez que a qualidade não é elemento padrão desse público segundo Jenkins (2006), que comenta: A maior parte do que os amadores criam é terrivelmente ruim; no entanto, uma cultura próspera necessita de espaços onde as pessoas possam fazer arte ruim, receber críticas e melhorar. Afinal, boa parte do que circula pelas mídias de massa também é ruim, sob qualquer critério. (JENKINS, 2006, p. 193).
Sendo assim, conseguimos destacar mais uma vez a característica de colaboração presente no universo dos fãs. Seja para desenvolver o aspecto cultural do fandom, seja para estimular o crescimento e desenvolvimento cultural dos indivíduos que fazem parte dessas comunidades, as produções de fã tem papel de extrema importância. As fanfictions, mais especificamente, possuem um papel social, ao garantir representatividade de pontos marginalizados pelos produtos midiáticos de consumo de massa, respeitando o desejo latente no fandom de ser visto alguns assuntos retratados no universo. Percebemos, assim, essa produção de fã como representação política, um ato de reivindicação, uma vez que eles sentem a necessidade de serem representados pela mídia de massa da mesma forma que outros indivíduos são. Ao se apropriar de textos base para a criação de novas narrativas, os fãs dão vazão as suas histórias. Ao ler fanfictions, fãs enxergam a si e a seus desejos representados, uma forma de validação de características marginalizadas pelo conteúdo original. No próximo capítulo, abordaremos conceitos e aspectos da representação LGBT na sociedade e na mídia. Iremos estudar como foram formados conceitos que permeiam a cultura - e, consequentemente, a representação que é vista na mídia quanto a gênero, orientação sexual e a liberdade de expressão de uma ideologia diferente.
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3 REPRESENTATIVIDADE LGBT Para dar andamento ao estudo, é necessário abordar a temática de gênero, TV e representação LGBT na mídia. Nosso objetivo principal é compreender de que forma o queerbaiting surge, age e deixa marcas em produções audiovisuais - em especial, séries de TV aberta - e nos fãs desses conteúdos. Sendo assim, este capítulo busca, primeiramente, conceituar gênero, sexo, queer e heteronormatividade compulsória, pilares que sustentam a área de estudo em questão. Buscaremos pelas definições de Guacira Lopes Louro (2000; 2007; 2008), Judith Butler (2003), Simone de Beauvoir (2008) e West e Zimmerman (1987), autores que estudam o surgimento de gênero, opressão, heteronormatividade e sexo de diferentes formas e pontos de vista. Após entendermos melhor a base e origem do movimento queer, suas implicações na sociedade e como isso está atrelado a antigos estudos de gênero, iremos trabalhar a representação da mídia sobre esse aspecto. Com base em Bravo (2014), Colling (2007), Kellner (2001) e Sender (2012 abordaremos os aspectos negativos e positivos da representação LGBT na mídia de massa, assim como a forma entendida pelos autores sobre as mudanças da imagem queer ao longo dos anos. Ainda trataremos sobre os fatores históricos que podem nos levar a entender como o quadro atual de representação foi composto e de que forma o queerbaiting atinge a sociedade queer. Nesse ponto, conceituaremos e abordaremos exemplos da prática, utilizando as obras e estudos de autores como Deshler (2017), Fathallah (2015), Moraes (2018) e Nordin (2015).
3.1 IDENTIDADE DE GÊNERO Os estudos acerca de gênero, sexualidade e identidade têm encontrado diversas perspectivas e possibilidades no decorrer da história, seja no campo das ciências biológicas ou no campo da filosofia e ciências sociais (GONZATTI; ESMITIZ; SCOPEL, 2015). Os conceitos e correntes de pesquisa em torno desses fatores mudam de acordo com o desenvolver da sociedade, com ponto de vista adotado e do propósito político e teórico que tomamos (LOURO, 2007). Sendo assim, discutiremos os conceitos de gênero, sexo, queer e heteronormatividade, de acordo com a opinião de diferentes pensadores do meio.
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Simone de Beauvoir, em sua obra O Segundo Sexo nasce mulher: torna-
[1949], p. 205). Essa constatação é baseada na
ideia de que gênero é construção, não naturalidade, premissa que Louro (2007) entende ser uma das poucas bases que unifica as teorias acerca do tema. Louro (2008), baseada na ideia de Beauvoir (2008 constituem-se em processos que acontecem no âm a autora, a designação de gênero não ocorre no momento do nascimento, quando se nomeia o corpo da criança seguindo uma lógica binária. Ela sugere que a construção do gênero dá-se ao longo de toda vida, continuamente, sendo essa característica moldada de acordo com o que o indivíduo conhece e recebe de estímulos da sociedade e suas crenças, conforme comenta: Aprendemos a viver o gênero e a sexualidade na cultura, através dos discursos repetidos da mídia, da igreja, da ciência e das leis e também, contemporaneamente, através dos discursos dos movimentos sociais e dos múltiplos dispositivos tecnológicos. (LOURO, 2008 p. 22).
Podemos inferir, então, que para a autora é clara a ideia de construção de um gênero representado pelos padrões definidos através de normas da sociedade. Encontramos aprofundamento da ideia com o conceito de Judith Butler, em sua obra Problemas de Gênero (2003 [1990]). Butler (2003) parte da mesma premissa de Beauvoir, que não entende gênero como ocorrência natural, mas sim em um processo aberto que nunca chega a um final, sempre alterando-se e constituindo-se de novos
deve ser meramente concebido como a inscrição cultural de significado num sexo previamente dado; tem de designar também o aparato mesmo de produção mediante o qual os próprios sexos são estabelecidos." (BUTLER, 2003, p. 25). A diferenciação da autora entre sexo e gênero encontra suporte na concepção de ambos os conceitos nos anos 70 (WEST; ZIMMERMAN,1987). Nessa época, sexo era entendido como algo atribuído pela biologia, baseado em anatomia, hormônios e fisiologia; enquanto isso, gênero estava em outro plano, sendo atribuído de acordo com meios psicológicos, culturais e sociais. West e Zimmerman (1987, p. 127) afirmam que o critérios biológicos, socialmente acordados, para classificar as pessoas como ificação da genitália ou tipagem
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cromossômica antes do nascimento (WEST; ZIMMERMAN, 1987). A problemática se encontra na forma como isso afeta a percepção da sociedade sobre esses indivíduos, uma vez que, a partir da visão que os identifica apenas pelo gênero baseado em sexo, biológica de seus corpos. Enquanto homens serão vistos como um sexo independente, forte e viril, a mulher será vista sempre como o oposto, possuindo uma im
-estabelecidas pelos seus
órgãos reprodutores (BEAUVOIR, 2008). Voltando à Butler (2003), entendemos que a autora vê então sexo e gênero de forma separada: o primeiro, fixo pela natureza do corpo; o segundo, delimitado apenas dentro das idealizações das sociedades. Essa visão colabora para o entendimento de expressões de gênero que diferem do sexo atribuído ao indivíduo, uma vez que acaba com a ideia de um gênero estável e que apenas representa um sexo fixo e binário. Segundo Butler (2003), gênero é então pré-discursivo, tendo origem antes do sexo; ele é, em resumo, performativo-teatral (GROS, 2016), o que significa que gênero ocorre na repetição de gestos e práticas, um ato intencional que produz significados realidade de gênero é performativa, o que significa, muito simplesmente, que é apenas real na medida em que é perfor dize crê na passividade absoluta do corpo na aceitação do gênero como ele é pressuposto pela sociedade (GROS, 2016). Sobre isso, dentro de sua analogia com o teatro e papéis desempenhados no palco e sobre o corpo, Butler comenta: Os atores estão sempre no palco, dentro dos termos da performance. Assim como um roteiro pode ser representado de várias maneiras, e assim como o trabalho requer tanto o texto quanto a interpretação, o corpo com gênero atua em um espaço cultural restrito corporalmente, e representa interpretações dentro dos limites das diretivas existentes. (2003, p. 526).
Dessa forma, podemos entender que, na concepção da autora, o gênero existe na medida em que performamos os padrões existentes na sociedade, os quais dificilmente questionamos e que estão ligados a práticas entendidas como pertencentes aos dois únicos gêneros aceitos pela heteronormatividade - o feminino e o masculino. Entretanto, não apresentamos completa passividade em face às
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imposições sociais, ainda havendo espaço para interpretações, uma vez que é impossível existir representação completamente fiel ao papel idealizado pela sociedade. Após acompanharmos as concepções de gênero e sexo apresentadas pelos autores, abordaremos sexo como característica biológica identificada pela anatomia, hormônios e fisiologia. Quanto a gênero, será utilizada a visão que o institui como criação social, surgido a partir da repetição de práticas e gestos definidos como característicos do binarismo heteronormativo. Para seguir o debate acerca do tema, é necessário antes conceituar queer. O termo queer vem da língua inglesa e, originalmente, era utilizado como insulto, uma forma pejorativa de se referir às pessoas e grupos cujas sexualidades eram vistas (GROS, 2016, p. 246). De acordo com Gros (2016), a expressão só ganhou uma nova conotação, agora positiva, a partir da crise de HIV dos anos 80, quando grupos ativistas como Act Up, Radical Furies e Lesbian Avengers se apropriaram da palavra e passaram a utilizá-la de forma positiva, identitária. A partir da apropriação, o queer passa a representar o orgulho do movimento, se tornando um sinal de resistência a processos de normalização e exclusão sexual que ocorrem não apenas na sociedade heterossexista, mas também dentro daqueles espaços políticos que se colocam criticamente diante dela: o feminismo e o movimento homossexual. (GROS, 2016, p. 246).
Para Gros (2016), o queer 46), o que só pode ser alcançado através da demonstração da natureza construída desse objeto. À vista disso, o movimento queer é elevado ao status de identidade, englobando a população que, ao transgredir os limites impostos pelos gêneros aceitos socialmente, passa a contestar a realidade da heteronormatividade. Esse padrão pressupõe que o modelo ideal de identidade é aquele em que há coerência entre sexo biológico, gênero e desejo (GROS, 2016). Então, ao possuir características desviantes do modelo heteronormativo - como uma identidade queer, por exemplo - o indivíduo passa a ser visto como uma anomalia perante a matriz cultural heterossexualista vigente (PRECIADO, 2008). Desviar-se do binarismo em conformidade com o sexo é algo inaceitável para a sociedade, que empenha aparatos regulatórios da heterossexualidade para impedir que isso ocorra (BUTLER, 2003). Podemos identificar esse controle através do estado de
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heterossexualidade compulsória, o qual impõe a repressão de outras sexualidades divergentes da matriz heterossexualista, instaurando estímulos que induzem as relações heterossexuais como as únicas corretas e naturais de se seguir (FACCHINI, 2008). Sendo assim, podemos exemplificar a heterossexualidade compulsória por meio do entendimento da autora Adrienne Rich (2010), que comenta: No entanto, cada uma das [práticas] que eu listei vem adicionar-se ao feixe de forças pelo qual as mulheres têm sido convencidas de que o casamento e a orientação sexual voltada aos homens são vistos como inevitáveis componentes de suas vidas mesmo se opressivos e não satisfatórios. O cinto de castidade, o casamento infantil, o apagamento da existência lésbica (exceto quando vista como exótica ou perversa) na arte, na literatura e no cinema e a idealização do amor romântico e do casamento heterossexual são algumas das formas óbvias de compulsão, as duas primeiras expressando força física, as duas outras expressando o controle da consciência feminina. (RICH, 2010, p. 26).
A prática age de diversas formas, contanto que mantenha o indivíduo voltado à heterossexualidade. Segundo Louro (2000), esses mecanismos de manutenção da heteronormatividade vigente tem encontro com o indivíduo desde cedo, quando esse está construindo sua identidade de gênero e sexual. Em sua obra O Corpo Educado (2000), a autora lança o conceito de pedagogia da sexualidade, onde debate sobre a importância vista pela sociedade em agir nessa fase da vida do sujeito, garantindo que esse não vá se desviar da norma e sim ocupar seu papel como heterossexual e de ações que estabeleçam seu local no lado masculino ou feminino dos papéis de gênero. Louro resume sua ideia e comenta sobre os responsáveis pela utilização da pedagogia da sexualidade: Todas essas práticas e linguagens [...] foram - e são - produtoras de "marcas". Homens e mulheres adultos contam como determinados comportamentos ou modos de ser parecem ter sido "gravados" em suas histórias pessoais. Para que se efetivem essas marcas, um investimento significativo é posto em ação: família, escola, mídia, igreja, lei participam dessa produção. Todas essas instâncias realizam uma pedagogia, fazem um investimento que, freqüentemente, aparece de forma articulada, reiterando identidades e práticas hegemônicas enquanto subordina, nega ou recusa outras identidades e práticas. (LOURO, 2000, p. 12).
Entretanto, Louro concorda com Butler (2003) no que diz respeito à passividade do indivíduo em sujeitos são participantes ativos na construção de suas identida p. 12), de forma que eles atuam juntamente às instâncias sociais nesse processo. processos prosseguem e se completam através de tecnologias de auto disciplinamento e autogoverno que os sujeitos exercem sobre si
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(LOURO, 2000, p. 13). Dessa forma, entendemos que, para a autora, a sociedade e suas instituições são responsáveis por, em um primeiro momento, controlar e ensinar a norma tida como correta para crianças e adolescentes. Esses indivíduos aprendem sobre como se comportar e de que forma se apresentar dentro da sociedade, ocupando seu local heteronormativo no meio e, após certo tempo de imposição, eles começam a se autocobrar essas ações e se tornam os responsáveis por controlar seu lugar na sociedade heteronormativa. Contudo, não é sempre que a sexualidade de norma exclui por completo as sexualidades divergentes. De acordo com Foucault (2013 [1976]), sexualidades divergentes do padrão heteronormativo são reprimidas, salvo alguns casos. O autor comenta
ilegítimas, que vão
incomodar noutro lugar: que incomodem lá onde possam ser reinscritas, senão nos , 2013 p. 10). Entendemos com isso que há certos casos onde o queer poderia ser permitido na sociedade, caso agregasse de alguma forma lucrativa a extorsão da sua sexualidade (2010). Compreendemos com essa exposição acerca de queer e heteronormatividade, alinhados aos conceitos de gênero, sexo e heterossexualidade compulsória, que a sociedade apresentou e ainda apresenta restrições a expressões sexuais que difiram da norma vigente. Há esforço para manter um padrão estabelecido por por quem controla o coletivo como um todo, de forma a repelir o que possa atrapalhar a matriz heterossexualista. Esse empenho é colocado em prática desde cedo, atingindo crianças e adolescente em casa, escola, igreja, entre outras instituições de poder, de forma que a possibilidade de expressão de uma sexualidade divergente seja negada e diminuída o quanto antes. Entretanto, é entendido que não há como negar que essas outras identidades existem, e a repressão só colabora para mascarar uma comunidade que se desenvolve e busca seu espaço no mundo, ciente de que é merecedora e tendo orgulho da sua trajetória para chegar aonde chegou. No próximo tópico, entenderemos como a representação queer se dá na TV, a forma como essa representatividade cresceu no tempo e ultrapassou os limites da censura heteronormativa. Trabalharemos as problemáticas que os sujeitos LGBTs enfrentam e os principais casos que ilustram essa trajetória em busca de reconhecimento e aceitação social.
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3.2 REPRESENTAÇÃO QUEER NA TV A televisão é um dispositivo de entretenimento que busca, desde seu surgimento como mídia, refletir os aspectos da sociedade e seus debates sociais. A partir do seu poder de comunicar e difundir informações para um público amplo, a TV canismo democrático cultural de acesso à comunicação interpreta um papel muito além do simples entretenimento. Para Bravo (2014, p. 1), ela tem .] a uma maior e melhor compreensão do mundo e de si ou não ver, organizando sua programação em uma grade de horários e dias, e representando a sociedade a sua própria maneira. Sendo assim, distorções evidentes ocorrem no modo como a televisão representa a realidade social dos cidadãos, os quais irão consumir o conteúdo gerado por elas. A televisão pode, dessa forma, ser vista por duas perspectivas: como a mídia que restringe e manipula a visão do público quanto a temas que o poder não deseja que a população se interesse, ou pela perspectiva que a coloca como a mídia que pode possibilitar a normalização de assuntos por meio do seu potencial de difusão e geração de debate popular (KELLNER, 2001; SZEZECINSKI; ALMEIDA, 2017; GASCÓN; MONTANTE, 2012; SENDER, 2012; BRAVO, 2014; COLLING, 2007). Trataremos as formas como a televisão pode ser vista e agir pela população, assim como a maneira como a representação queer ocorre nesse meio. O autor norte-americano Douglas Kellner, em sua obra A Cultura da Mídia (2001), aborda a televisão como mídia construtora de identidades e de poder inegável na socie visões fictícias de uma sociedade cada vez mais dominada pela mídia e pela (VALIM, 2002). Esse meio comunicacional age por indução (KELLNER, 2001), o que pode levar o indivíduo a absorver ideias como verdadeiras, aderir a atitudes e pensamentos, tornando-se manipulado inconscientemente pelo meio. Acima de tudo, a televisão impacta o público de acordo com o interesse de quem comanda esses meios (VALIM, 2002). O autor defende, entretanto, que o espectador tem capacidade de discernimento, o que torna impossível manipular por completo
43
suas decisões (KELLNER, 2001). Entendemos que Kellner segue o princípio que coloca a televisão como uma mídia manipuladora de sentidos, ainda que de forma não tão agressiva. Essa minimização da ameaça da TV é definida pela não-passividade do espectador que, do ponto de vista do autor, não é um indivíduo desprovido completamente do controle de suas ações e reflexões sobre o conteúdo que assiste. A autora Juliana Bravo, baseada nos conceitos formulados por Wolton (2003) e Butler (2003), defende em sua monografia (2014) uma visão semelhante à de Kellner (2001). Ela comenta que a televisão, ainda que desempenhe o papel de difusora de informações - por vezes, parcial -, disseminando ideias e perspectivas distorcidas para uma audiência extensa e múltipla, parece não ter como finalidade a alienação em si. Bravo ( das emissoras, que visam sempre atender às demandas majoritárias da sociedade. Dessa forma, o meio demonstra prontidão na representação de um público de padrão sócio-cultural hegemônico, generalizando indivíduos na sociedade da qual reflete experiências na tela. Contudo, para a autora, essas ações não são completamente autoritárias e hierárquicas (BRAVO, 2014): os indivíduos têm liberdade para contestar essas representações, demonstrar interesse ou não pelo canal e deixar de acompanhar por discordar da visão retratada. Bravo concorda com Kellner (2001), ao pont
ição de relativizar os discursos,
possibilitando maior liberdade crítica, pois além de espectador, ele é cidadão que com a autora, são as experiências pessoais do indivíduo que determinam o grau de influência e suspeita da mensagem. A autora ainda analisa em seu texto a forma como essa dinâmica entre mídia e sociedade representada é de influência bilateral. Bravo (2014) comenta que, ao representar artisticamente situações da vida cotidiana da população, reforçando ideias e práticas pregadas pelo padrão social vigente, a televisão está educando a sociedade quanto às normas que devem continuar seguindo. Esse reforço quanto a padrões normativos normaliza situações, causando, claramente, o efeito inverso em práticas que divergem do modelo. Para Bravo (2014), quando a televisão reproduz esses modelos, ela naturaliza o olhar, um olhar que é lapidado pelas representações que a TV faz do meio social. Desse modo, ela polariza e harmoniza o que historicamente é reafirmado, conformando a fantasia. Teoricamente, ela evidencia na
44
encenação da sociedade um intenso prazer idealizado com dimensões atrativas e incitantes. (2014, p. 22).
Sendo assim, entendemos que a autora vê o meio como um dispositivo de poder manipulador, não apostando em uma imagem autoritária e antiquada, mas que continua pregando ideais padrões a serem adotados pela sociedade. Além de possuir caráter generalista, a televisão é ainda educativa, excluindo expressões diferentes de identidade e naturalizando a norma padrão que segue as diretrizes conservadoras sobre as quais há interesse em se manter como modelo. Nesse ponto, inclusive, a autora dialoga com os autores Gascón e Montante (2012), que fazem uma crítica ao modelo de televisão atual, o qual utiliza seu papel educativo de forma injusta. Gascón e Montante (2012) argumentam que essa má utilização do cunho educativo da televisão causa problemas sociais, ainda mais sob um recorte da influência da TV sobre a sexualidade. Os autores, baseados em outras obras do meio da mídia, explicam que a televisão desenvolve as maiores capacidades na aprendizagem de princípios de conceitos e regras de convivência, pois é identificada como um dos mecanismos sociais que atua ao longo de toda a vida dos sujeitos, propondo, a partir do universo das imagens e narrativas, o modelo de sexualidade esperado e permitido (GASCÓN; MONTANTE, 2012, p. 3).
Gascón e Montante (2012) debatem sobre como a televisão torna-se cúmplice da omissão de diferentes identidades na sociedade, atendendo a vontades superiores de manter temas como esse em forma de tabu. Os autores comentam ainda sobre as motivações, quando ocorrem, de mostrar determinados temas, ocorre em função de audiência televisiva, como comentam Colling (2007) e Sender (2012) mais adiante. Seguindo o argumento de defesa de Kellner (2001) e Bravo (2014), Colling (2007) apresenta uma percepção sobre a televisão enquanto representante da sociedade. O autor traça a trajetória da representação LGBT na televisão brasileira, levando em consideração aspectos importantes da sociedade na época em questão (COLLING, 2007). Colling divide essa trajetória em 3 fases que compreendem o surgimento do tema nos anos 70 até a data de publicação do trabalho em 2007. A pesquisa revela que a televisão sempre possuiu interesse em adquirir audiência - nesse caso, personagens LGBTs -, mas sempre respeitando a visão da sociedade acerca do tema. Sendo assim, ainda que a sociedade da época tivesse uma visão negativa sobre o universo LGBT, possuía curiosidade para descobrir mais sobre esse outro exótico (COLLING, 2007), e a
45
televisão aproveita essa disposição para inserir representantes de narrativas queer e estereotipando-os da forma que entende agradar mais o público. Um debate interessante que o autor traz para a pesquisa, por fim, é a utilização do termo são tratadas as histórias de personagens LGBTs. Segundo Colling (2007), esse formato de narrativa ocorre quando o programa inclui um personagem não-revelado homossexual até o final da trama, quando enfim ocorre a confirmação sobre sua sexualidade. Dessa forma, não há obrigação por parte do programa em aprofundar a história do personagem, apenas reduzindo-o a sua possível orientação sexual representação, já que não garante uma equidade de narrativas entre os personagens independente da sua identidade de gênero; ela apenas utiliza a novidade da temática para alcançar objetivos de lucro com as produções (COLLING, 2007). Assim como Colling (2007) trata sobre a temática utilizando como base a história, a autora Eve NG (2017) traz reflexões históricas sobre a imagem queer produzida pela mídia. Eve, que estuda a televisão e cinema norte-americano, comenta que a falta de representação LGBT na mídia pode ser interpretada como uma pequena resistência ao fim do Código Hays. Estabelecido em 1930, o Código Hays era
indicavam que as produções lançadas na época poderiam apenas expor homossexualidade se essa fosse representada de forma negativa e não atrativa (NG, 2017). O Código só foi revogado no final dos anos 60. Sendo assim, é possível intuir que as produções lançadas durante o período de 1930 e 1968 sofreram censuras pelo Código, o que acabou tornando o modelo da representatividade negativa como padrão entre os estúdios e, consequentemente, entre as opiniões do público. Seguindo a ideia de mútua influência entre mídia e sociedade (BRAVO, 2014), é possível entender que, ainda que o Código tenha sido revogado, a mídia continuou produzindo conteúdos de acordo com o que a sociedade interpretava como correto. Com ou sem Código, a televisão permanece utilizando a representação negativa como padrão, sofrendo para inserir uma nova imagem sobre a comunidade queer (NG, 2017). A temática da representatividade LGBT equivocada através da mídia de massa discutir o tema, a autora começa o debate esclarecendo como a representatividade
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queer pode ser insatisfatória. Sender (2012) aponta o modelo desenvolvido por Larry Gross (2001 apud SENDER, 2012) de produção, representação e distribuição de conteúdos para minorias. A autora explica que, Nesse modelo, a maior parte da mídia é produzida por, sobre e para o público majoritário [heterossexual e cisgênero]. Alguns conteúdos que representam as minorias sexuais são feitos principalmente por heterossexuais e para os heterossexuais. Poucos textos de mídia são realmente produzidos por, sobre e para pessoas LGBT (SENDER, 2012, p. 208).
Compreendemos assim que o conteúdo produzido na TV, ainda que fale sobre o universo LGBT, não tem como público-alvo o indivíduo queer, mas sim a maior parte da população que se encaixa na faixa heteronormativa da sociedade. Dessa forma, a queer já que não há intenção de representar genuinamente essa pessoa. Entretanto, para a autora, isso está mudando. Sender (2012) aponta como a revolução digital, ocorrida na primeira década dos anos 2000, influenciou na busca pela normalização da imagem queer. Ela afirma que as mudanças tra entender os novos engajamentos das pessoas LGBT com a mídia e exigem uma qualificação que leve em conta histórias e efeitos queer seja, essa nova era começa a modificar os modelos de tratamento na mídia utilizados tradicionalmente para a comunidade queer. Isso ocorre, principalmente, pela possibilidade que o indivíduo queer recebe para se auto-representar em outros formatos de mídia, como os canais abertos pela Internet. Ao tomar para si a representação queer, o LGBT traz à tona narrativas reflexivas sobre a sua vivência, se tornando um storyteller
que tem o
potencial de alterar sua representação tradicional na sociedade. E essa utilização dos novos meios pelo público, que tornam o indivíduo queer produtor e receptor do conteúdo útil, reflete na cultura de massa (SENDER, 2012). Essa, por sua vez, abrese para a apresentar novas formas de representação, mais dignas e verídicas do que o modelo tradicional. Em meio a estudos sobre mídia e representatividade queer em TV aberta, o Gay & Lesbian Alliance Against Defamation (GLAAD) surgiu em 198513 como um grupo de ativistas e comunicadores que tinham como intenção monitorar e mudar a 13
Sobre o GLAAD. Disponível em: https://www.glaad.org/about
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forma como grandes veículos de comunicação representavam a comunidade LGBT. O GLAAD objetiva mudar a cultura de massa, tornando-a mais inclusiva e respeitosa quanto a identidades que variam à forma padrão heterossexual cisgênera. Sendo assim, o coletivo apresenta anualmente o Where We Are on TV , relatório sobre como a televisão aberta norte-americana aborda questões de sexualidade. O mais recente relatório do GLAAD (Gráfico 1) revelou os seguintes dados: GRÁFICO 1 - Relatório Where We Are On TV 2017-2018
Fonte: GLAAD (2018) adaptado por Pacheco (2018).
A pesquisa revelou aumento em 1,5% em comparação com o
We Are
On TV do biênio anterior (GLAAD, 2018). Notamos que 58 dos 901 personagens regulares em programas de TV norte-americana no horário nobre eram gays, lésbicas ou bissexuais, o que totaliza apenas 6% de representatividade queer na televisão. No ano anterior, eram 35 personagens de um total de 895, totalizando 4% de representatividade queer na TV (WHITEHEAD, 2016). É possível verificar as mudanças através dos anos a seguir (GRÁFICO 2), identificando o aumento em 2010 e 2018 em relação ao primeiro ano do relatório: GRÁFICO 2- Comparação Where We Are On TV 2005-2006, 2010-2011 e 20172018
48
Fonte: Pacheco (2018).
Contudo, quando observamos a evolução dessa representatividade ao longo dos anos, vemos que, ainda que não pareçam positivos, o aumento está alinhado à ideia de Sender (2012) sobre o crescimento da representatividade LGBT na TV. Isso pode ser visto pelo primeiro relatório do GLAAD14, pesquisa realizada entre 2005 e 2006, que apontava apenas 10 personagens LGBTs na TV. No relatório divulgado 5 anos mais tarde, eram vistos 35 personagens, representando 3,9% do total. Já o relatório de 2017-201815 apresentou a maior representatividade LGBT da história, com 6% do total dos personagens regulares do horário nobre sendo LGBTs - cerca de 58 personagens. Entretanto, foi apontado que práticas negativas continuam ocorrendo, como a utilização de estereótipos sobre a sexualidade de personagens e práticas de exclusão como o queerbaiting - quando um programa inclui um personagem LGBT ou faz menção de uma relação homossexual para atrair um público mais diverso, mas sem a intenção de fazê-lo ter profundidade de história ou a relação ocorrer de fato (WHITEHEAD, 2016). Sendo assim, podemos afirmar que a situação da representatividade na TV está mudando, mas ainda há muito o que ser feito.
14 15
We Are On TV 2005-2006. Disponível em: https://www.glaad.org/publications/tvreport05 We Are On TV 2017-2018. Disponível em: https://www.glaad.org/whereweareontv17
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Vistas essas opiniões e teorias acerca do tema, compreendemos a televisão como um meio de entretenimento e difusão de informações seletivas para a sociedade. Por meio de escolha própria - baseadas em um modelo de sociedade com o qual não parece ter interesse de romper -, a TV aborda temas que visam a audiência e o lucro, um dos visíveis motivos pelos quais traz narrativas queer para a programação. Quando isso ocorre, a televisão não busca aprofundar as histórias ou dar a mesma relevância para a identidade LGBT dentre os personagens, uma vez que o público que ela procura impactar ainda é o majoritário, excluindo as minorias desse foco. Através de métodos já tradicionais, programas veem saída para não precisar retratar com relevância personagens queer, ainda mantendo esse público como parte da sua audiência. A televisão possui as características essenciais para ser um meio educativo para a sociedade e trazer inclusão a minorias que enfrentam desafios para existir no meio social, porém parece preferir manter os modelos de sociedade como estão. No próximo tópico do trabalho, nos aprofundaremos sobre as práticas da TV que visam isolar narrativas queer, mantendo o público majoritário satisfeito pela hegemonia heterossexual e o público queer preso às narrativas pela falta de representatividade relevante. Dentre essas, daremos especial destaque ao queerbaiting, conceituando a prática e apresentando alguns casos que ilustram as mais conhecidas ocorrências dessa prática na TV mundial.
3.3 QUEERBAITING Como apontava Jenkins (2015) ao comentar sobre a convergência de mídias, a evolução e abertura de novos meios de comunicação e difusão de informação afetaram a relação do público com os grandes produtores. O poder e as formas de demanda entre eles é alterada e, inclusive, teorias sobre a influência dos fãs sobre os produtores acompanham a mudança (MORAES, 2018). Agora, práticas produzidas por grandes estúdios de televisão contra a visibilidade da comunidade LGBT estão sendo
expostas
mais
facilmente
(SENDER,
2012).
Esses
atos
ocorrem,
principalmente, por alegações de queerbaiting, prática comum - do ponto de vista da indústria - que centraliza o debate quanto à representação LGBT na mídia (MORAES, 2018).
- termo que identifica indivíduos não-
50
heteronormativos -
-
isca de queer
-, podendo ser traduzido como (DUARTE, 2018). O conceito
de queerbaiting não possui definição consolidada em dicionários, sendo um termo originado de discussões de fãs e ativismo LGBT no meio online (NORDIN, 2015). O queerbaiting é
ar a
comunidade queer, atraindo-a e tornando-a parte da audiência, porém sem atender às suas expectativas, evitando colocar em risco a grande audiência conservadora (2012, p. 40). Já para Emma Nordin, em sua dissertação From Queer Reading to Queerbaiting (2015), é possível traçar diversas linhas de definição do termo. A autora cita Goldyn (1981, apud NORDIN, 2015), que compreende queerbaiting como uma descrição do abuso verbal e a retórica homofóbica e discriminatória que era usada para justificar as pu p. 4). De outro ponto, Nordin busca a definição de Nadine Hubbs (2009 apud NORDIN, 2015), a qual enxerga queerbaiting como a prática utilizada para expor e punir homossexuais nos anos 50 e 60 nos Estados Unidos, fazendo referência à prática de red-baiting16. Já para Fathallah (2015), queerbaiting pode ser compreendido como uma estratégia por meio da qual escritores e companhias procuram conquistar a atenção de espectadores queer através de dicas, piadas, gestos e simbolismo, sugerindo uma relação queer entre dois personagens e então, enfaticamente, negando e rindo da possibilidade. (FATHALLAH, 2015, p. 491).
A concepção de queerbaiting de Nordin é complementada mais adiante, quando ela expõe a prática como uma forma que os produtores encontram de explorar sível e o invisível, o que está e o que não está sobre essa conduta na indústria do entretenimento, compreendendo que essa negação a narrativas queer permanece em uso, porque não ofende os telespectadores tradicionais. Esse recurso de narrativa precária só prejudica os telespectadores queer, que enxergam o queerbaiting como algo mais doloroso do que o apag representação justa e igual em frente aos olhos do público, para logo em seguida arrebatáa isso, a prática tem como intuito reforçar a potência das narrativas heteronormativas,
16
punir indivíduos ou grupos como se fossem simpatizantes do comunismo (MERRIAM-WEBSTER).
51
que são representadas em maior número e profundidade do que qualquer outra (NORDIN, 2015). Como vimos anteriormente, instituições de poder são utilizados para manter a sociedade seguindo uma matriz heteronormativa (LOURO, 2000), logo entendemos que o queerbaiting pode ser visto como um dispositivo dessa estratégia. Percebemos a prática como uma forma de sabotagem à cultura queer, através da qual o público tem a falsa impressão ou expectativa de um representatividade digna (FATHALLAH, 2015). Enquanto isso, a indústria deseja apenas tornar a audiência heterogênea (NORDIN, 2015) e lucrar sobre essa parcela da população (COLLING, 2007) a todo custo. Abordaremos o queerbaiting como uma prática desempenhada por grandes produtores que compreende representações sempre aprofundamento, resumidas à sexualidade/desconfiança de homossexualidade de personagens e enganação. Essa última, tendo em vista a utilização de insinuações homossexuais entre personagens sem o verdadeiro interesse de explorá-las e investir em representatividade justa à comunidade queer. Moraes (2018) escreve a respeito do engajamento que há em torno do conteúdo queer na mídia, onde existem dois contrapontos: a presença de personagens LGBTs e a forma como eles são retratados. A autora argumenta que os personagens existem em função da procura por esse segmento de conteúdo pelo público (MORAES, 2018). Seja pela inserção voltada para cessar a curiosidade do público majoritário sobre o comportamento queer, seja pela vontade de atrair uma audiência heterogênea aos programas, esses personagens existem e são requeridos pela população. Por outro lado, age o queerbaiting desproporcional de personagens queer (
(2018, p. 41). Ela
comenta que essa é uma forma de conclusão de narrativa utilizada quando o personagem queer já concluiu seu papel no enredo; um desfecho que, ainda que não agrade normalmente nenhum fã, tem um peso maior para esse público (MORAES, sido mais seguro eliminar vidas queer, já estruturadas pela ansiedade e pela morte, do que permitir que proliferem e arrisquem os inevitáveis gritos dos qu personagens queer é vista como uma tropo séria demais para ser empregada nesse segmento com tanta frequência (DESHLER, 2017).
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Tropos são padrões narrativos usados em histórias fictícias (MARTINS, 2017). Semelhantes ao clichê, elas representam a repetição de um modelo identificável pelo público, uma vez que já foi visto em diversas outras histórias. Uma das tropos mais famosas da cultura popular é a damsel in distress ma mulher está em perigo e é salva por algum homem. Entretanto, quando buscamos pelas tropos empregadas em narrativas incluindo personagens queer, elas se tornam mais negativas e problematizáveis. A conhecida como Bury Your Gays (BYG)17 -
- tem destaque dentre
essas tropos, visto o número alarmante de ocorrências nas poucas produções que incluem personagens abertamente LGBTs (DESHLER, 2017). A Bury Your Gays, também chamada de Dead Lesbian Syndrome português - faz referência ao uso do padrão da morte de personagens queer sem maiores explicações. Ainda que acabe ocorrendo um relacionamento e que ele dure por certo tempo, o personagem está fadado a esse destino (MORAES, 2018), ainda mais se ele ou ela forem os mais devotados ao relacionamento, transparecendo estar pervertendo
o outro (TV TROPES, 2010). A tropo Bury Your Gays apresenta grande
utilização, tanto que, em 2016, o site Autostraddle18 iniciou uma contabilização de todas as personagens lésbicas, bissexuais e mulheres queer que foram mortas desde o início da inserção de mulheres não-héteros em séries. Em 2016, a contagem estava com 165 personagens, mas até setembro de 2018, a lista subiu para 199 mulheres mortas. A lista foi iniciada em função da morte da personagem Comandante Lexa, da série The 100 (The CW, 2014 -), morte tida como a mais marcante dos últimos anos (RIESE, 2016; MORAES, 2018; DESHLER, 2017; NG; RUSSO, 2017) dentre as personagens queer na televisão. Com início em 2014 e criação de Jason Rothenberg, a série se passa em um cenário pós-apocalíptico, onde a Terra é considerada inabitável e cerca de 2.400 sobreviventes vivem na Arca, uma estação espacial localizada próxima à Terra. Quando os recursos da Arca começam a faltar, um grupo de jovens criminosos e dispensáveis é enviado ao planeta natal, onde devem verificar se há condições de povoá-lo novamente. Chegando à Terra, eles se deparam com
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Bury Your Gays Trope. Disponível em: https://tvtropes.org/pmwiki/pmwiki.php/Main/BuryYourGays All 65 Dead Lesbian and Bisexual Characters on TV. Disponível em: https://www.autostraddle.com/all-65-dead-lesbian-and-bisexual-characters-on-tv-and-how-they-died312315/?all=1 18
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outros sobreviventes, denominados Terra-Firmes, e o contato não é pacífico, iniciando um truculento conflito entre os dois povos e seus diferentes costumes. Em meio ao embate que se instaura entre o povo do céu - como ficaram conhecidos os sobreviventes da Arca - e os Terra-Firmes, Clarke Griffin se torna líder, decidindo pelo seu povo e tentando mantê-los vivos. Por outro lado, os Terra-Firmes são representados por Lexa, comandante das 12 tribos de Terra-Firmes. A série passa a tratar de um relacionamento que aflora entre as duas líderes, e que, após 3 temporadas, se tornam um relacionamento canon. No mesmo episódio que o relacionamento é confirmado, Lexa é morta (FIGURA 11). FIGURA 11 - Morte de Lexa
Fonte: Hogan (2016).
A morte da personagem, mais tarde, foi defendida pelo criador como necessária para o seguimento da narrativa19, sendo admitido que essa foi tratada sem que fosse completamente pensado em como isso seria recebido pela comunidade LGBT. Jason foi criticado, a série sofreu com sabotagem de fãs - o episódio seguinte foi o de menor audiência em todas as 3 temporadas20 - e a morte de Lexa foi o início de uma grande movimentação de fãs LGBT contra a cultura mortal desses
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The 100 Boss Apologizes. Disponível em: https://www.eonline.com/de/news/751481/the-100-bossapologizes-for-how-lexa-died-in-open-letter-to-fans 20 Angry fans may have actually nível em: https://io9.gizmodo.com/angry-fans-may-have-actually-driven-down-the-100s-ratin-1764318782
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personagens21. O queerbaiting está presente nesse caso na forma como os produtores mantiveram as expectativas dos fãs sobre o retorno da personagem até o final da temporada (MORAES, 2018), e ainda na maneira como utilizaram uma tropo básica para acabar com um relacionamento que vinha ganhando destaque, matando uma personagem lésbica para alavancar o drama na série (DESHLER, 2017). Outro exemplo de queerbaiting é o que usa as tropos Ho Yay22 - contração de Homoeroticism, yay! - ou Homoerotic Subtext23 português. Esse modelo de queerbaiting é considerado um clássico da prática (NG, 2017). No Ho Yay, os produtores se baseiam em técnicas de subtexto e codificam espectadores queer se identifiquem com o programa sem precisar fazer uma de
, p. 2). Essa prática é
identificada há muito tempo, sendo percebida por fãs desde produções antigas como Star Trek (NBC, 1966 - 1969), onde os fãs - em sua grande parte mulheres - afirmavam existir algo além da amizade entre os personagens Kirk e Spock (JENKINS, 1992). O queerbaiting através de subtextos também é percebido na série Sherlock (BBC, 2010 -), baseada nos livros de Sir Arthur Conan Doyle, que contam a história do detetive na Londres atual. Criada por Steven Moffat e Mark Gatiss, a série traz Sherlock Holmes e seu companheiro Dr. John Watson resolvendo mistérios desde o primeiro episódio. Eles se conhecem quando Watson está procurando um lugar para morar e Sherlock alguém para dividir o apartamento onde vive. Morando juntos, em pouco tempo Watson já está ajudando Sherlock a resolver casos, unindo suas habilidades às de Holmes. Por morarem juntos e agirem por vezes como um casal, os personagens são constantemente interpretados como tais pelos outros personagens da série. No terceiro episódio da série, por exemplo, Moriarty - o vilão e arqui inimigo de Holmes insinuações é o próprio irmão de Sherlock, Mycroft, ao comentar que só permitia que John continuasse existindo na vida do irmão, porque ele tinha importância única para o detetive - insinuando que a relação que eles tinham era de um laço mais forte que a
21
Is Lexa TV revolution?. Disponível em: https://www.autostraddle.com/pop-culture-fix-is-lexas-death-the-beginning-of-a-lesbian-tv-revolution332611/ 22 Ho Hay Trope. Disponível em: https://tvtropes.org/pmwiki/pmwiki.php/Main/HoYay 23 Homoerotic Subtext. Disponível em: https://tvtropes.org/pmwiki/pmwiki.php/Main/HomoeroticSubtext
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amizade. Com a entrada de vez de Moriarty na série, o público passa a ver tensões na relação de Sherlock com o vilão também. A tensão entre Sherlock e Moriarty foi explorada, por exemplo, na cena excluída do primeiro episódio da terceira temporada, onde eles quase se beijam (FIGURA 12)24. FIGURA 12 - Cena excluída Moriarty e Sherlock
Fonte: Maloney (2014)25.
Seja pelas piadas sobre a sexualidade dos personagens, pelo subtexto real incluso na histórica parceria de Holmes e Watson ou pelas inúmeras teorias dos fãs a respeito de Johnlock - como é conhecido o ship entre os fãs -, a série é vista atualmente como um típico caso de queerbaiting (MORAES, 2018; FATHALLAH, 2015; ROSE, 2013). Ainda que afirmem que os personagens não possuem possibilidade de estar juntos (MALONEY, 2014), os criadores da série continuam a deixar diversos caminhos em aberto no texto como, por exemplo, a sexualidade de Sherlock. Ao tê-
A Study in Pink), os queer,
ele pode ser gay, hétero, bissexual, assexual ou mesmo pansexual. Ele nunca é abrirá portas para a interpretação dos fãs da série, mantendo-os acreditando na possibilidade de representação pelo casal Johnlock (MALONEY, 2014). Além disso, 24
Sherlock Fandom. Disponível em: https://www.wired.com/2014/01/sherlock-fandom/ Teaser de Sherlock Season 3. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?time_continue=14&v=9YX6Fg9EXq0 25
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os produtores estão cientes sobre o fandom de Johnlock, e ainda assim não mudaram a forma como o relacionamento de John e Sherlock é mostrado, o que comprova que eles podem ter a intenção de manter os subtextos que remetem a versão The Private Life of Sherlock Holmes - na qual Sherlock é gay - e que eles já afirmaram abertamente se basear e admirar (MALONEY, 2014). Com a definição de conceitos, exposições de dados e exemplificações de ocorrências de queerbaiting, percebemos que essa é uma prática ainda em uso atualmente. Ainda assim, com a facilidade de contato e mudança de poder nas relações fãs-produtores, essas situações não passam em branco, sendo identificadas e expostas como uma má conduta sobre personagens queer ou de narrativas com esse potencial. Independente das tropos utilizadas nos casos de queerbaiting, os fãs parecem estar cientes de que merecem mais do que a representação por subtexto ou as mortes sem motivação pontual. E, quando algum caso ocorre, a maneira como o fã percebe a série é alterada, abrindo espaço para eles expressarem sua indignação da forma que podem - manifestações/petições online, produção de conteúdos alternativos, sabotagens aos programas, dentre outros. Compreendemos que o queerbaiting causa grande impacto na relação fã-série e que eles podem recorrer a ambientes fora dos limites dos grandes estúdios para expor como se sentem e como desejam ser representados. Tendo essa base, buscamos entender de que forma o queerbaiting influencia na produção de conteúdos de fã, seja para impulsionamento de materiais ou para a diminuição do interesse desses fãs com o universo da série em questão. Na próxima etapa do trabalho, serão apresentados metodologia, objetos e a maneira pela qual o estudo irá se desenvolver. Utilizando os capítulos anteriores de teoria e com foco nos objetivos do presente trabalho, iremos desenvolver uma análise de conteúdo, dentro do universo selecionado, a fim de responder a questão norteadora da pesquisa.
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4 METODOLOGIA O propósito do presente trabalho é estabelecer uma relação entre produções de fãs - em especial, as fanfictions - e a representatividade LGBT na mídia televisiva. Mais especificamente, desejamos entender qual é a relação entre as representações LGBTs e o queerbaiting que ocorre nas séries e as fanfictions que são produzidas e consumidas pelos fandoms. Para isso, buscamos delimitar o estudo em dois fandoms de séries com representatividade LGBT opostas: uma, premiada pela forma como representa o casal queer regular da série; outra, envolvida em polêmicas com fãs pelo queerbaiting apontado por esses. Respectivamente, essas séries são Orphan Black (BBC America, 2013-2017) e Supergirl (The CW, 2015-). Descreveremos esses objetos de pesquisa, bem como a plataforma onde as fanfictions a respeito desses dois universos estão hospedadas. Em seguida, abordaremos a técnica que será empregada na construção do estudo, a análise de conteúdo. Para conceituar e dissertar a respeito desta, utilizaremos a obra Content Analysis: an introduction to its methodology , de Klaus Krippendorff (2004). Nessa etapa, apresentaremos as fanfictions que serão analisadas, bem como os métodos e critérios que utilizaremos na construção da análise. Por fim, executaremos o método.
4.1 DESCRIÇÃO DOS OBJETOS A fim de desenvolver o contexto onde o estudo será realizado, é necessário breve descrição sobre os objetos que farão parte da análise nessa etapa. Sendo assim, apresentaremos a plataforma de hospedagem de fanfiction selecionada, onde explicamos
sobre
o
funcionamento
e
detalhes
necessários
para o
total
entendendimento do universo onde as fanfictions estão hospedadas. Após essa apresentação, abordaremos especificamente as séries que dão origem às fanfictions da análise, onde traremos mais dados sobre a série e sobre a representatividade LGBT presente ou não nessas.
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4.1.1 PLATAFORMA Para analisar a relação entre a produção e consumo de fanfictions dentro dos determinados fandoms, optamos por uma plataforma de hospedagem de fanfiction para estudo. Sendo assim, escolhemos utilizar o site Archive of Our Own (AO3)26, onde ambas as séries que serão estudadas possuem páginas de fandom. Também conhecido como AO3, o Archive of Our Own é uma plataforma criada pela Organization for Transformative Works (OTW) como um projeto de arquivo para fanfictions, fanarts, vídeos e podcasts (KOWALCZYK, [2018]). Mesmo que a plataforma vise a hospedagem de diversos formatos de conteúdo, o principal foco do AO3 são as fanfictions, que contabilizam cerca de 4.186.000 trabalhos no site. Fundado em 2008, o site não possui fins lucrativos e, mesmo que esteja ainda na sua versão beta, possui uma organização clara de pesquisa por gêneros, fandoms, tamanho de fanfiction, faixa etária e relacionamentos dentro das narrativas (KOWALCZYK, [2018]), como vemos a seguir (FIGURA 13): FIGURA 13 - Organização AO3 (Print)
Fonte: Pacheco (2018).
Fora a busca por categorias, os fãs ainda podem realizar pesquisas pelo nome da fanfiction, por tags ou user dos criadores pela barra de pesquisa. Quanto aos usuários, o Archive conta atualmente com mais de 1.657.000 de indivíduos cadastrados e espalhados por entre os mais de 29.770 fandoms catalogados no site. 26
Disponível em: https://archiveofourown.org
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Ainda que não seja a maior plataforma de hospedagem de fanfiction do mundo (KOWALCZYK, [2018]), o AO3 cresceu com o apoio de fãs, os principais apoiadores e consumidores do canal, o que nos levou a escolhê-lo como melhor ambiente para a análise. Além da seção que disponibiliza fanfictions, o site ainda apresenta links para outros projetos do OTW. Dentre eles, podemos destacar a Fanlore27 - site baseado na Wikipedia que tem como objetivo organizar informações sobre fandoms, eventos relacionados às séries, fanfictions de sucesso e interações -, apoio legal para fãs que desejam proteger seus trabalhos ou estejam passando por algum desafio jurídico envolvendo esses - a Legal Advocacy28 - e, por fim, o projeto Open Doors29, que visa preservar arquivos importantes para a cultura de fã, como conteúdos de sites encerrados e materiais em formatos não lidos digitalmente. Quanto à disposição das fanfictions dentro da seção de um fandom, a busca é facilitada pelos itens de identificação disponíveis. Como vemos a seguir (FIGURA 14), é possível verificar, classificadores (1), nome da fanfiction (2), autor (3), fandoms aos quais pertence (4), última data de update (5), resumo de tags utilizadas (6), sinopse da história (7), além de idioma (8), número de palavras (9), capítulos (10), comentários (11), kudos/likes (12), bookmarks (13) e hits/número de usuários que leram (14). FIGURA 14- Informações de resumo AO3 (Print)
Fonte: Pacheco (2018).
27
Fanlore. Disponível em: https://fanlore.org/wiki/Main_Page Legal Advocacy. Disponível em: http://www.transformativeworks.org/legal/ 29 Open Doors. Disponível em: http://opendoors.transformativeworks.org/ 28
60
O usuário pode utilizar ainda o sistema desenvolvido pelo AO3 para escolher a fanfic que deseja ler. Como podemos ver no resumo anterior (FIGURA 14), junto ao nome da fanfiction, autor (es) e fandom ao qual ela pertence, é possível identificar um resumo de classificadores da fanfiction. O sistema traz itens gerais para situar o leitor quanto ao que ele irá encontrar no trabalho. Como ilustramos a seguir (FIGURA 15), os
usuários
têm
um
breve
resumo
sobre
faixa
etária
indicada,
relacionamentos/orientações sexuais presentes, avisos de segurança - que podem aparecer também nas tags de resumo - e ainda a indicação de conclusão ou não da fanfiction até o momento. FIGURA 15 - Classificadores
61
Fonte: Pacheco (2018)
A classificação e organização das fanfictions é essencial para que trabalhos sejam encontrados e usuários possam ler o que desejam. Dentre os itens indicativos, classificações e gêneros de fanfiction, escolhemos alguns específicos para delimitar a escolha de fanfictions que analisaremos. Então, para o nosso trabalho, teremos como enfoque principal as bookmarks das fanfictions, que representam o número de vezes que ela foi favoritada por usuários, sinal de engajamento maior do que apenas a leitura ou like - respectivamente, hits e kudos. Escolhida a forma de delimitação, é importante entendermos o contexto de cada série cujas fanfictions serão analisadas, uma vez que isso refletirá no aspecto sob os quais elas serão lidas. Para isso, iremos contextualizar a seguir Orphan Black (BBC America, 2013-2017) e Supergirl (The CW, 2015-).
4.1.2 ORPHAN BLACK Com data de estreia em 30 de março de 2013, Orphan Black é uma série canadense de ficção científica produzida pela BBC America e criada por John Fawcett e Graeme Manson (IMDb)30. A série televisiva traz Tatiana Maslany interpretando Sarah Manning, uma jovem mulher que, após presenciar um suicídio nos trilhos de uma estação de trem, se envolve em uma trama de mistérios e conspirações. Logo no início da série, Sarah descobre que é resultado de um experimento científico, um clone dentre outras mulheres que possuem o seu mesmo DNA. Ao entrar em contato com outras clones do projeto experimental do governo, a protagonista se lança em uma longa jornada para tentar descobrir mais sobre o seu passado. Na primeira temporada, os clones somam um total de oito personagens, todos interpretados por Tatiana Maslany, atuação que é um dos pontos fortes da série.
30
Orphan Black. Disponível em: https://www.imdb.com/title/tt2234222/?ref_=ttfc_fc_tt
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O fandom de Orphan Black se autodenomina Clone Club, uma referência a forma como as quatro principais clones da série chamam seu grupo (SCENTTRINI, 2016). Dentro do fandom principal, existe um grande sub-fandom, conhecido como Clonesbians - união das pala
-, o que demarca o
atraído pela poderosa representação de sexualidade e gênero em Orphan segundo Scenttrini (2016, p. 10). Para a autora, Orphan Black possui uma forte narrativa com personagens dinâmicos e humanos. Os personagens não são caricaturas ou estereótipos; eles não são personagens simbólicos. Eles são personagens humanos e suas sexualidades e gêneros não são suas identidades definidoras. Embora suas sexualidades e gêneros não os definam, essas representações são importantes e poderosas na formação de identidades nos fãs. (SCENTTRINI, 2016, p. 12).
A representação LGBT na série ocorre por meio de diversos personagens. Podemos apontar assim a clone do quarteto central Cosima Niehaus, que se identifica como lésbica, da mesma forma que a também clone Sarah (pan/bissexual), seu meio irmão Félix (gay) e Tony (transgênero), clone que surge na série posteriormente. Dentre esses personagens, o destaque representativo e que mais possui a atenção do fandom é Cosima, uma estudante em busca de Doutorado em Biologia, dedicada a aprender mais sobre evolução da espécie humana e, consequentemente, mais sobre si mesma e sobre as suas clone sisters. Enquanto estuda em uma Universidade para graduar-se, Cosima conhece a Dra. Delphine Cormier, aparentemente uma estudante francesa comum em intercâmbio. Mesmo quando descobre mais tarde que Delphine é uma espécie de espiã enviada para acompanhá-la e coletar informações pela empresa que criou o experimento de clones, Cosima continua se aproximando dela e a partir de então, o telespectador pode observar todo desenvolvimento do relacionamento de Cophine - nome de ship dado ao casal (FIGURA 16). Desde a confusa descoberta da bissexualidade por Delphine, passando por momentos delicados e íntimos como beijos, declarações, brigas, términos e reconciliações, o casal parece ter em Orphan Black uma representação de mesmo aprofundamento que outros casais heterossexuais da trama. FIGURA 16 - Cosima Niehaus e Delphine Cormier
63
Fonte: Anne (2017).
Em função da representatividade positiva na série (SCENTTRINI, 2016; YOUNGBAUER; JONES, 2018; DUFFY, 2015), Tatiana Maslany, os criadores e a série em si foram nomeados quatro vezes ao GLAAD Awards (2014, 2015, 2016 e 2017), assim como recebeu outras quatro indicações à premiação anual Dorian Awards31 (2014 e 2015). Ambas as premiações avaliam produções a nível internacional, tendo como foco principal o desempenho da série, filme, elenco e produção quanto a representação LGBT positiva e exemplar. Dentre outros prêmios como Emmy e Golden Globe, Tatiana e Orphan Black também foram nomeados e vencedores em diferentes categorias nos Visibility Awards (AfterEllen), em 2014 e 2015, recebendo prêmios de melhor série de drama, melhor atriz e melhor aliada LGBT. Quanto ao reconhecimento sobre a representação desempenhada na série e os prêmios, Tatiana Maslany comentou em entrevista que a série oferece uma boa representação em termos de personagens complexos que não são definidos apenas em termos de sexualidade, mas em todas as facetas do que é ser uma pessoa. Uma das minhas coisas favoritas que já foram escritas no programa é quando [Cosima] disse "minha sexualidade não é a coisa mais interessante sobre mim". (DUFFY, 2015)
Além da característica da representação de gênero e sexualidade, a série também debate outros assuntos marginalizados pela mídia contemporânea na trama (HUMANN, [2016]
antigo debate sobre a natureza versus
educação, enquanto levanta questões provocativas e oportunas sobre governo,
31
Disponível em: https://www.imdb.com/title/tt2234222/awards
64
[2016]). Diante a essas preocupações com questões relevantes para minorias e debates que estão em alta, Orphan Black ganha espaço e reconhecimento como uma série inclusiva.
4.1.3 SUPERGIRL Produzida pela rede de televisão The CW, a série Supergirl foi criada por Ali Adler, Greg Berlanti, Andrew Kreisberg - a partir da personagem criada pela DC Comics - e teve seu episódio de estreia em 26 outubro 2015. A trama conta a história de Kara (Melissa Benoist), a prima mais velha de Kal-El - o conhecido Superman - e sua trajetória para se tornar a heroína Supergirl. A série mostra como Kara Danvers ou Kara Zor-El, seu nome original - vive na Terra, local onde se abrigou após Krypton ser destruído, e a vida normal que leva até o momento em que decide revelar seus poderes para o mundo. Quando assume sua identidade de super heroína, Kara passa a combater o crime e os vilões que atacam sua cidade e ameaçam seu novo lar com a ajuda de amigos ligados a um esquadrão anti-aliens. A CW é conhecida pelo número de séries pelas quais é frequentemente acusada de queerbaiting (REID, 2017; BISHOP, 2018). Com Supergirl, a rede de televisão acaba seguindo o mesmo caminho. Na segunda temporada, a série apresenta a orientação sexual da personagem Alex (Chyler Leigh), irmã de Kara/Supergirl, como lésbica, incluindo até o interesse romântico Maggie Sawyer (Floriana Lima). O desenvolvimento do novo casal funciona e garante aumento de audiência para a série, que já possuía uma fanbase onde boa parte dos fãs são LGBT (MATHISEN, 2017). A série começa a ter problemas de representação com o próprio casal, que não recebe o mesmo tempo de tela que outros heterossexuais e que rompe, inesperadamente, e possui parte do ship (Maggie) excluído da trama (Caruso, 2017). Contudo, a maior acusação de queerbaiting e desrespeito pelo fandom vem de outro ship da série, o não-canônico Supercorp. O casal é composto por Kara e Lena Luthor (Katie McGrath), personagem inserida na segunda temporada e que parece, inicialmente, ter como função representar a mesma oposição à Kara que Lex Luthor seu irmão - apresenta ao Superman - primo de Kara. Porém, a série mostra as duas como amigas, confidentes e mais próximas do que outras amizades de Kara. Os fãs veem a química da dupla como algo mais forte na série do que os outros
65
relacionamentos da protagonista com seus interesses românticos (DeGalan, 2017). Essa leitura das duas como queer pode ser embasado pelas inúmeras cenas em que Kara e Lena aparecem juntas, situações que fazem paralelo com casais heterossexuais famosos
como Clark Kent e Lois Lane, do universo de Superman
(FIGURA 17) e pelo tom que as atrizes dão a suas formas de interagir. FIGURA 17 - Supercorp
Fonte: Pacheco (2018).
DeGalan (2017, p. 19), em análise sobre as cenas entre as duas atrizes e entrevistas, afirma que é claro que ela [Katie McGrath] reconhece os sentimentos estranhos que acontecem entre Lena e Kara durante toda a temporada. E quando você considera as pistas de atuação que McGrath usa para transmitir química com Kara Danvers, em termos de mordidas de lábio, olhos persistentes, gagueira na fala, insinuações sexuais acidentais, engasgos na respiração, etc., torna-se bastante claro para os fãs que Supercorp tem alguma legitimidade dentro do show.
Para a autora, ainda que o ship não seja canon, é clara a forma como as atrizes agem, tendo noção de como isso tem efeito nos fãs. Não apenas as atrizes têm conhecimento sobre Supercorp como todo o restante do elenco, o que foi centro de um evento recente que deixou os fãs da série indignados não apenas pelo queerbaiting tradicional, mas também pelo desrespeito com a fanbase. Em uma
66
entrevista32 para a MTV na SDCC 2017, o elenco foi solicitado para resumir os acontecimentos da segunda temporada em forma de música, onde um dos integrantes (Jeremy Jordan), ao
las são
(HORKAY, 2017). Ao fundo, o elenco inteiro ri e concorda com o ator, que ainda
2017). O ocorrido causou mal-estar no fandom, que passou a atacar Jeremy e comentar sobre o quão desrespeitosa foi a brincadeira dos atores (FIGURA 18). FIGURA 18 - Reação dos fãs à brincadeira do elenco (Print)
Fonte: Horkay (2017) adaptado por Pacheco (2018).33
Em meio às ações negativas da rede televisiva The CW em questão de representatividade - do ponto de vista da teoria queer -, a forma como a série Supergirl emprega o queerbaiting e as reações negativas que os fãs apresentam em resposta, entendemos a série como uma representação LGBT negativa.
32
Entrevista do elenco de Supergirl na SDCC 2017. Disponível em: https://www.youtube.com/watch?v=LQLU58Adtd4&feature=youtu.be 33 Tradução dos tweets: Tweet 1: Eu nem sequer shippo Supercorp, mas essa é legitimamente a coisa mais rude que eu já vi. Tweet 2: Então, vamos falar sobre isso. Tweet 3: Eu estou genuinamente perturbada por isso. Em meus 6 anos de cobertura de TV, eu nunca vi um elenco se orgulhar de zombar de parte do fandom. Tweet 4: Eu sei que eles acham que estão apenas se divertindo, mas boa parte do fandom de
67
4.2 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS Após abordarmos os objetos que utilizaremos durante a execução da pesquisa, é necessário apresentar o método que iremos empregar neste trabalho. Para realizar a proposta, além do uso da pesquisa bibliográfica, utilizaremos a técnica de pesquisa análise de conteúdo. Segundo Krippendorff
de
pesquisa para fazer inferências replicáveis e válidas a partir de textos (ou outro uma técnica é replicável, ela pode ser aplicada por diferentes pesquisadores em diferentes momentos e sobre diferentes objetos e ter dados semelhantes. Essa é a principal prova de que ela é confiável para uso. Da mesma forma, os resultados devem ser válidos, de forma que possam ser testados de diferentes formas e ainda assim se sustentarem por ser verdadeiros. Pa metodológicos de confiabilidade e validade não são exclusivos [à análise de orna a técnica tão importante para uma pesquisa. Tendo em vista conceituar a análise de conteúdo, Krippendorff (2004) defende que existem três linhas que pesquisadores podem seguir visando solucionar essa tarefa. São elas: 1) definições que consideram o conteúdo inerente a um texto; 2) definições que veem o conteúdo como uma propriedade da fonte de um texto; e 3) definições que entendem o conteúdo como algo a emergir no processo de um pesquisador analisar um texto relativo a um contexto particular. Esses textos comentados são os objetos de pesquisa, não necessariamente textos escritos, mas trabalhos sobre os quais se estuda em busca do conteúdo a ser analisado (KRIPPENDORFF, 2004). Para exemplificar a primeira linha, Krippendorff cita Berelson (1952), que de
a para
a descrição objetiva, sistemática e quantitativa do conteúdo manifesto da afirmação ao explicar que a análise de conteúdo não precisa ser quantitativa métodos qualitativos são tão satisfatórios quanto -, muito menos é algo contido no texto, sendo identificada por manifestação. Além disso, o autor critica como essa linha de pensamento resume os resultados válidos apenas ao que é comum entre fontes, e analistas de conteúdo. Ou seja, se o analista encontra algo diferente
68
do comum -
-, ele não pode afirmar ser um
resultado válido, pois vai contra às regras estabelecidas por essa definição antiga. Gerbner (1985) também entende o conteúdo como algo que está dentro do texto e que precisa ser apenas descrito. Gerbner (1985) entende que o propósito dessa -lo [o conteúdo] de modo a torná-lo passível de correlações com outras variáveis (não-conteúdos) - como se o conteúdo fosse uma variável ou coisa 1985 apud KRIPPENDORFF, 2004, p. 20). Essa linha de definição utiliza o que o autor entende como container metaphor, ou seja, entende o conteúdo como algo carregado dentro do texto, sem se importar com outros fatores, simplificando a técnica de análise de conteúdo. Já na segunda linha de definição, codificação/decodificação em que as fontes de mensagens [textos] são vinculadas aos destinatários por processos de codificação, canais, mensagens e processos de 1969 apud KRIPPENDORFF, 2004, p. 21). Holsti acredita que para que as inferências realizadas sejam válidas, o leitor deve ter acesso a fonte utilizada para comprovar. Essa linha também ignora as contribuições conceituais do próprio analista de conteúdo na hora de realizar as inferências, deixando essa característica - tida como essencial para Krippendorff - de fora da pesquisa. Após analisar as definições de outros autores, Krippendorff traz a sua própria linha de entendimento sobre o que é análise de conteúdo. Ele explica que a mais certeira maneira de entender a técnica é através da ethnographic content analysis, uma vez que ela leva em conta não apenas teorias e caminhos já semi encontrados para o estudo, mas sim a visão do próprio analista. Essa linha sugere que, novos
conceito
(KRIPPENDORFF, 2004, p. 21). Nessa visão, a definição é focada no processo, nas operações que o pesquisador faz para chegar aos dados que deseja analisar. Além disso, a análise de conteúdo deve levar em conta os significados que o texto tem para as pessoas, buscando se engajar com o objeto para chegar a inferências esperadas. E, o mais importante, a análise de conteúdo não pode deixar de fora o uso que as pessoas dão ao texto em análise normalmente, uma vez que os significados do conteúdo estão estritamente conectados aos contextos nos quais estão inseridos. Sendo assim, entendemos análise de conteúdo como uma técnica de pesquisa utilizada para investigar algum objeto/texto, fazendo uso de inferências sobre o
69
contexto onde o texto seria utilizado para responder a perguntas norteadoras da pesquisa. Ao fazer uso dessa técnica, queremos compreender o que está além do objeto em si, o que ele representa para as pessoas que o consomem e que significado ele dá ao contexto no qual está inserido. Krippendorff (2004) desenvolve a seguinte fórmula (FIGURA 19) para esquematização da pesquisa: FIGURA 19 - Esquematização da Análise de Conteúdo
Fonte: Krippendorff (2004) adaptado por Pacheco (2018).
Ao aplicar o modelo de Krippendorff ao nosso trabalho, temos como corpus da análise de conteúdo quatro fanfictions hospedadas na plataforma AO3: Severed Crossed Fingers34, por Arabybizarre (Orphan Black); 03:24:2135, por Jaybear1701 (Orphan Black); Supergirl In Training36, por Wtfoctagon (Supergirl); e My Youth is Yours37, por Lynnearlington (Supergirl). Essas fanfictions foram selecionadas com base no critério de popularidade na plataforma, o que pode ser mensurado por bookmarks atribuídas pelos leitores e comentários deixados na página da fanfiction. A seleção das fanfictions 1, 2, 3 e 4 ocorreu no dia 15 de outubro de 2018. O recorte aplicado diz respeito à limitação de tempo e extensão do nosso trabalho, uma vez que as fanfictions selecionadas contam com histórias longas, tendo em média 20 capítulos cada e cerca de 8 mil palavras por capítulo.
34
Disponível em: https://archiveofourown.org/works/2333768/chapters/5142644?view_adult=true Disponível em: https://archiveofourown.org/works/2295785/chapters/5048954 36 Disponível em: https://archiveofourown.org/works/9802709/chapters/22012490 37 Disponível em: https://archiveofourown.org/works/10557820/chapters/23322612 35
70
Ao empregar a análise de conteúdo, buscamos entender a relação entre a representatividade apresentada nas séries e a produção/consumo de fanfictions analisadas. Procuramos descobrir se existe uma relação entre uma representação positiva ou negativa - do ponto de vista da teoria queer - e as fanfics analisadas, onde identificaremos se a trama permanece a mesma, se os relacionamentos dos personagens não são alterados, se o discurso é mantido ou não na produção de fã. Conforme vimos nos capítulos teóricos anteriores, o contexto no qual a pesquisa é aplicada não é positivo para a representatividade LGBT. Ainda que a indústria televisiva esteja aumentando aos poucos o número de personagens nãoheterossexuais em séries, a tática de queerbaiting ainda é percebida como algo comum pelos fãs. Em meio a esse contexto, as produções de fãs surgem apresentando as temáticas que são escassas na mídia, representando o que o indivíduo deseja ver na TV como realidade em outra plataforma. Como isso influencia na relação do fã com esses conteúdos online? Para responder às questões desenvolvidas, iremos utilizar indicadores que a plataforma AO3 oferece. Assim, serão analisados relacionamentos centrais, assuntos abordados, conteúdos não-canônicos, conteúdos canônicos rejeitados, dentre outros. Faremos uma relação com a realidade da série, identificando os pontos que parecem agradar mais os leitores/fãs - características mantidas nas fanfictions - e o que parece desagradar, assim
como
quais desses
pontos
possuem
relação
com
a
representatividade LGBT presente na série.
4.3 ANÁLISE Desenvolvida a base metodológica para a nossa pesquisa, a seguir executaremos a análise de conteúdo. Iremos analisar os textos selecionados aplicando os mesmos tópicos sobre a análise - e realizar inferências a respeito do encontrado, a fim de responder à questão norteadora da pesquisa.
4.3.1 SEVERED CROSSED FINGERS a) SINOPSE
71
Severed Crossed Fingers traz uma Cosima Niehaus música, líder de uma banda indie chamada Nautilus, onde ela toca com os meio irmãos Sarah e Felix. Ainda pouco conhecida na cena, ela aproveita a oportunidade quando uma banda do momento a chama para participar da sua turnê, chance única de tornar a Nautilus ganhar visibilidade. b) SOBRE A FANFICTION A fanfiction foi criada pela autora @arabybizarre e publicada na plataforma em setembro de 2014. Essa é a fanfiction com maior engajamento dentro das publicações do fandom de Orphan Black38, com um total de 139 bookmarks - classificador que utilizaremos para medir o engajamento - na história que possui 23 capítulos e está finalizada. Além disso, Severed Crossed Fingers conta com cerca de 350 comentários e foi lida por, aproximadamente, 25.450 usuários no AO3. c) O QUE MUDA Por se tratar de uma AU - alternative universe, a fanfiction não segue a mesma linha narrativa existente originalmente na série Orphan Black. A autora optou por manter poucas referências ao roteiro original, sendo o enredo quase inteiramente novo, salvo alguns detalhes. A história se distancia da série logo no início, onde é possível identificar que nenhuma das personagens demonstra semelhança física aparente como na série, onde todas são clones. Além disso, a fanfiction não possui a mesma carga de drama característica da trama original, já que os maiores conflitos envolvem questões do meio musical onde os personagens estão imersos, não mais os problemas envolvendo perseguições e riscos como na série, como podemos ver a seguir na FIGURA 20.
FIGURA 20 - Severed Crossed Fingers - Problemas de Cosima
38
Dados coletados no dia 15 de outubro de 2018.
72
Fonte: Pacheco (2018).
Dentre os detalhes que são mantidos semelhantes à série estão algumas das relações entre os personagens. No centro da história, a autora aborda o desenvolvimento do relacionamento de Cosima e Delphine, que começa da mesma forma do que na série, com Cosima tendo grande interesse em Delphine (FIGURA 21), mas a segunda sem perceber esse sentimento. FIGURA 21 - Severed Crossed Fingers - Cosima atraída por Delphine
Fonte: Pacheco (2018).
Ainda semelhante à série, há conflitos que colocam distância entre as duas, mas esses não são da mesma natureza dos que ocorrem na série. Em Severed Crossed Fingers, o problema que impede o casal de se consolidar de forma imediata é a existência do namorado de Delphine, o qual é mantido em segredo enquanto
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Cosima se aproxima dela. Esse detalhe causa atrito entre as personagens, o que pode ser visto no trecho a seguir (FIGURA 22). FIGURA 22 - Severed Crossed Fingers - O namorado de Delphine
Fonte: Pacheco (2018).
Outro ponto que destoa da série é que, após enfrentar o problema que separava as duas, Delphine dá grande atenção ao fato de sentir interesse por outra mulher (FIGURA 23).
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FIGURA 23 - Severed Crossed Fingers - Conversa entre Delphine e Beth
Fonte: Pacheco (2018).
Na série, a união das duas ocorre quase que de forma automática, quando superado o problema que impedia elas de ficarem juntas. Esse é um ponto de destaque na série, como a bissexualidade de Delphine é tratado com naturalidade, enquanto o fã pode ver o relacionamento delas acontecer sem se importar com o fato de serem duas mulheres. A hesitação da personagem é um detalhe interessante na narrativa. Além desses pontos, o restante dos personagens possui os mesmos relacionamentos canon da série, como os casais Beth e Paul e Sarah e Cal. Contudo, a fanfiction traz, ainda que brevemente, um ship non-canon de Orphan Black, que é Beth e Alison, como conferimos no trecho a seguir (FIGURA 24).
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FIGURA 24 - Severed Crossed Fingers - Relação entre Beth e Alison
Fonte: Pacheco (2018).
Ainda que seja comentado brevemente sobre o casal, esse detalhe pode ser considerado como referência ao plot original. O ship Beth e Alison tem fanbase dentro do fandom de Orphan Black, e, ainda que não seja claramente canon, também não configura como diferente disso, já que a série não mostra como era a relação entre as duas personagens antes da morte de Beth. d) POPULARIDADE A fanfiction Severed Crossed Fingers ocupa o primeiro lugar no ranking do fandom no AO3. Entendemos que isso deve-se ao fato de que a autora utiliza classificadores compatíveis com os mais lidos na plataforma (FIGURA 25), como os classificadores: relacionamentos, ships e avisos. FIGURA 25 - Severed Crossed Fingers x classificadores AO3
Classificação Etária Relacionamentos,
Severed Crossed Fingers
Archive of Our Own
Mature
Geral (1.376) Adolescentes (1.249)
F/F
F/F (2.464)
76
pares e orientações Ship Avisos de Segurança Gêneros
GEN
GEN (1.118)
Cosima/Delphine Sarah/Cal
Cosima/Delphine (1.560) Sarah/Helena (530)
Sem avisos
Sem avisos (3.490)
Alternative Universe
Fluff (313) Angst (295)
Fonte: Pacheco (2018).
Uma vez que não são todos os pontos que Severed Crossed Fingers tem comum com as fanfictions mais lidas na plataforma, acreditamos que o que a eleva à primeira posição é a orientação geral de fanfiction F/F, o relacionamento central com foco em Cosima e Delphine e a escolha pelo gênero alternative universe. e) INFERÊNCIAS Orphan Black, como vimos no capítulo anterior, possui representação LGBT positiva de acordo com o conceito da teoria queer, o que é evidenciado pelos prêmios recebidos pela representação do casal Cosima e Delphine e pela atuação de Tatiana Maslany. Acreditamos que isso é refletido nas histórias desenvolvidas pelo fandom, uma vez que elas não se prendem ao casal em si, explorando outras possibilidades fora do eixo do relacionamento. Nessa história específica, o que fica evidente é que, ainda que o casal possua grande presença, os fãs parecem ter a solidez do relacionamento das duas na série como incentivo para não precisarem focar nesse detalhe nas suas histórias. Ainda que seja direcionada a um público mais velho, visto à classificação indicativa para Mature, a fanfiction aborda o relacionamento de Cosima e Delphine de forma mais juvenil. O tropo de paixão platônica por amiga hetero, a dificuldade de aceitação da sexualidade por Delphine, o uso excessivo de gírias, são vários os detalhes que apontam para uma produção que reflete problemas que fãs mais jovens podem passar. Podemos inferir que, ao se verem representados na série de forma plena, os fãs buscam outros pontos de vista a partir da narrativa central, o que leva a fanfiction a ser tão buscada no fandom no AO3. Outro ponto, envolvendo a sexualidade de Delphine, é que ainda que aborde a questão de maneira distinta à série, há boa recepção por parte de Beth e do restante
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dos personagens. Podemos inferir, dessa forma, que a autora buscou transmitir com a fanfiction uma aceitação positiva de sexualidade, assim como a mensagem passada pela série a respeito disso.
4.3.1 03:24:21 a) SINOPSE Baseada no filme 12:01 de 1993, que trata sobre um misterioso fenômeno conhecido como time loop39, essa fanfiction traz um universo alternativo de Orphan Black. Nessa história, Cosima Niehaus é uma estudante de Doutorado na DYAD, onde um experimento envolvendo partículas subatômicas leva a uma quebra do tempoespaço, e ela se encontra presa em um looping, repetindo dia após dia os mesmos acontecimentos. Em meio a esse pesadelo, Cosima é a única que está consciente do que está acontecendo e tenta, diariamente, conquistar a confiança da Dr. Delphine Cormier - envolvida no experimento e por quem Niehaus é apaixonada - a fim de impedir que tudo ocorra novamente na manhã seguinte. b) SOBRE A FANFICTION De autoria da usuária @jaybear1701, a fanfiction foi postada no AO3 em setembro de 2014. Entre as fanfictions da plataforma no fandom de Orphan Black, 03:24:21 é a segunda com maior número de bookmarks40, totalizando 128. Além desse classificador, o trabalho conta com ainda com 357 comentários e foi lida por cerca de 20.130 usuários. A fanfiction é dividida em 16 capítulos e é uma história já completa. c) O QUE MUDA Assim como a fanfiction anterior, 03:24:21 é uma história AU, então a narrativa não segue a mesma história da série original. Por ser baseada no filme 12:01, a autora constrói a história entre personagens e cenários de Orphan Black e o desenvolver do filme original.
39
Fenômeno fictício onde um período de tempo é repetido incontáveis vezes, sendo re-experienciado por alguém, que tenta quebrar o ciclo e acabar com a repetição. O time loop é usado com frequência em narrativas de ficção científica (BOROS, 2017). 40 Dados coletados no dia 15 de outubro de 2018.
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Ainda que não siga a história original da série, a autora coloca detalhes na narrativa que são semelhantes aos que vemos em Orphan Black. De início, podemos apontar o interesse de Cosima na Dra. Delphine Cormier (FIGURA 26), que trabalha na mesma Instituição que ela, mas em outro setor - a primeira estuda microbiologia, enquanto a segunda, física. FIGURA 26 - 03:24:21 - Atração de Cosima por Delphine
Fonte: Pacheco (2018).
Assim como na série, Cosima se interessa de imediato por Delphine, que parece ser alheia às intenções dela. Da mesma forma, na fanfiction Cosima também segue em frente com seu interesse, tentando de alguma forma atrair Cormier. Como a história não segue uma ordem de avanço cronológico - devido a todos os capítulos iniciarem no mesmo ponto, do mesmo dia, sem que ninguém além de Cosima relembre qualquer coisa -, a autora mistura diversas situações passadas pelo casal na série de forma aleatória. Um exemplo disso é a traição de Delphine a Cosima, quando ela entrega informações sobre ela para Dr. Leekie na série, deixando claro que o envolvimento das duas havia sido simulado e um encontro específico orquestrado para retirar a atenção de Cosima de outro lugar. Na fanfiction (FIGURA 27), a autora introduz da seguinte forma:
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FIGURA 27 - 03:24:21 - Discussão entre Cosima e Delphine
Fonte: Pacheco (2018).
A ideia da cena foi semelhante à original da série, uma forma que a autora encontrou de colocar detalhes de OB dentro da narrativa pré-existente, uma vez que isso não ocorre no filme no qual a fanfiction é baseada. Sobre as duas personagens, outro ponto de destaque é a relação que a fanfiction faz sobre a sexualidade de Delphine. Diferentemente de Severed Crossed Fingers, essa fanfic aborda a bissexualidade de Delphine de forma natural (FIGURA 28), assim como se dá na série.
FIGURA 28 - 03:24:21 - Sexualidade de Delphine
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Fonte: Pacheco (2018).
A diferença, entretanto, é que no primeiro encontro de Delphine e Cosima na série a primeira ainda comenta sobre ser hetero, apenas mais tarde revelando ser bi. Na fanfiction, a identidade queer se faz presente desde o primeiro momento, como podemos ver. Ainda que não trate sobre clones e não tenha o Clone Club unido, a fanfiction traz a personagem de Sarah junto à Cosima, além de citar outras clones como Alison, Beth e Rachel. Na fanfiction, é possível ver a mesma relação que Sarah e Cosima (FIGURA 29) possuem na série, uma proximidade fraterna que embasa o relacionamento delas.
FIGURA 29 - 03:24:21 - Relação entre Cosima e Sarah
81
Fonte: Pacheco (2018).
As semelhanças no vocabulário e na forma de se relacionar entre si das personagens não é exclusividade das duas. Outro personagem da série, Scott, tem a mesma relação com Cosima na fanfiction do que na série, onde ele sempre acaba se preocupando em excesso com a cientista e a trata como um irmão (FIGURA 30). FIGURA 30 - 03:24:21 - Relação entre Cosima e Scott
Fonte: Pacheco (2018).
Alguns relacionamentos e reações mudam, entretanto, como é o caso de alguns personagens que não interagem na série mas na fanfiction são colocados lado
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a lado. Nesse caso, podemos citar Dr. Leekie, Ethan Duncan e Henrik Johanssen, personagens que não se encontram em nenhuma temporada da série, mas em 03:24:21 podemos vê-los juntos (FIGURA 31), como ilustra o trecho a seguir. FIGURA 31 - 03:24:21 - Dr. Leekie, Ethan Duncan e Henrik Johanssen
Fonte: Pacheco (2018).
Quanto a outros relacionamentos românticos da série fora Cosima e Delphine, a autora optou por, mesmo que não abordando claramente, comentar sobre em alguns momentos. Contudo, esses relacionamentos não são canon, mas sim ships adorados pelos fãs e que também são encontrados no fandom. Primeiro, o ship Sarah e Rachel (FIGURA 32):
FIGURA 32 - 03:24:21 - Sarah citando Rachel
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Fonte: Pacheco (2018).
Além de Sarah e Rachel, a autora também aborda o relacionamento entre Beth e Alison (FIGURA 33), brevemente, na seguinte cena: FIGURA 33 - 03:24:21 - Cosima citando relação entre Beth e Alison
Fonte: Pacheco (2018).
O apelido de soccer mom é a forma que o fandom costuma chamar Alison, uma das clones da série. Ela e Beth são um dos maiores ships de Orphan Black non-canon, o que já levantou questionamentos sobre uma forma de queerbaiting presente na história.
c) POPULARIDADE
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A fanfiction 03:24:21, sendo a segunda colocada no ranking de história mais favoritada sobre Orphan Black no AO3, possui alguns classificadores compatíveis com os mais lidos na plataforma, como vemos na FIGURA 34, os itens classificação etária, relacionamentos, ships e avisos. FIGURA 34 - 03:24:21 x classificadores AO3
Classificação Etária Relacionamentos, pares e orientações Ship Avisos de Segurança Gêneros
03:24:21
Archive of Our Own
Adolescentes
Geral (1.376) Adolescentes (1.249)
F/F
F/F (2.464) GEN (1.118)
Cosima/Delphine Sarah/Cal
Cosima/Delphine (1.560) Sarah/Helena (530)
Sem avisos
Sem avisos (3.490)
Alternative Universe
Fluff (313) Angst (295)
Fonte: Pacheco (2018).
Como podemos ver na comparação, a fanfiction não possui exatamente todos os aspectos que as mais lidas possuem, mas ainda assim garante alguns pontos de semelhança. Entendemos que os principais pontos que garantem a melhor classificação da série é a utilização do casal Cosima e Delphine em uma narrativa de alternative universe, o que atrai mais leitores na plataforma. e) INFERÊNCIAS Assim como na fanfiction analisada anteriormente, o relacionamento de Cosima e Delphine está presente de forma importante na narrativa, mas não toma o lugar de guia da história, essa não se desenvolve apenas para o estabelecimento do casal de forma definitiva. Isso nos leva a crer que, uma vez que já possui a representatividade que procuram na TV, os fãs se sentem livres para dar atenção a histórias diferentes do roteiro da série, mantendo pouca ligação com a história original. A sexualidade de Delphine é abordada de forma diferente nessa fanfiction, entretanto, a forma como se lida com esse fato na história é de mesma maneira
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natural. Assim como a sexualidade de Cosima não parece ser um problema, a de Delphine segue a mesma linha. Portanto, inferimos novamente que esse esforço da autora para trazer uma experiência positiva de representação pode ser uma forma encontrada para suprir a necessidade de uma boa visão desse momento na sociedade e mídia no geral.
4.3.3 SUPERGIRL IN TRAINING a) SINOPSE A fanfiction Supergirl in Training tem como centro Lorelai L. Danvers, adolescente vinda de 22 anos no futuro e que clama ser filha de Lena Luthor e Kara Danvers. A história se desenvolve em torno do relacionamento das três personagens, como elas lidam com o acontecimento e de que forma saber sobre o futuro pode alterar o presente e levá-las a concretizar a família que Lorelai afirma ter. b) SOBRE A FANFICTION A fanfiction é de autoria do usuário @wtfoctagon e foi postada no AO3 em dezembro de 2017. Dentre o restante das fanfictions do fandom na plataforma, essa é a que possui maior engajamento dos leitores41, obtendo 1.372 bookmarks, um número consideravelmente grande, tendo em vista que o segundo lugar entre as favoritas conta com 1178 bookmarks. Além das bookmarks, o trabalho conta com 1.581 comentários e foi lida por 161.667 usuários. A fanfiction é dividida em 19 capítulos e é uma história já completa. c) O QUE MUDA Supergirl in Training, ainda que inclua uma personagem inexistente na trama original - a própria Lorelai -, não possui muitos pontos divergentes do universo canon de Supergirl. Os personagens são os mesmos da série e o autor optou por manter também suas características, ocupações e situações vividas. São feitas referências a acontecimentos já passados na série, de forma fiel ao original, e eles são explorados no novo universo desenvolvido para a fanfic, como conferimos no exemplo a seguir (FIGURA 35). 41
Dados coletados no dia 15 de outubro de 2018.
86
FIGURA 35 - Supergirl in Training - Kara sobre relação com Mon-El
Fonte: Pacheco (2018).
O autor manteve a mesma relação entre Kara e Mon-El no início da fanfiction, assim como ocorreu na série. Da mesma forma, é possível ver Kara pensando sobre o relacionamento dos dois, relembrando o tempo que ficaram separados até consolidar o ship. Em outro exemplo (FIGURA 36) a seguir, percebemos outra referência ao roteiro original da série: FIGURA 36 - Supergirl in Training - Kara defendendo Lena
Fonte: Pacheco (2018).
Nesse trecho, o autor situou a fanfiction logo após o episódio 12 da 2ª temporada, onde Lena Luthor é presa injustamente e Kara é a única a acreditar em personagem de Kara na série, que sempre acaba usando contra os constantes ataques da sua equipe à Lena Luthor. Dentre as mudanças feitas pela autora, a principal é a natureza do relacionamento de Kara e Lena, onde a fanfiction inicia-se com a mesma amizade da série, mas já conta com um amor platônico unilateral sentido por Lena (FIGURA 37).
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FIGURA 37 - Supergirl in Training - Sentimentos de Lena sobre Kara
Fonte: Pacheco (2018).
Para ilustrar de forma mais verdadeira a paixão não correspondida, o autor traz detalhes da série que baseiam a atração de Lena, os mesmo detalhes apontados pelos fãs para considerar o ship uma forma de queerbaiting em Supergirl. O episódio em que Lena enche a casa de Kara com flores, a reação visual da personagem à notícia sobre o namoro de Kara e Mon-El, a liberação não usual que ela concede a Kara para que essa possa aparecer em seu escritório sem precisar passar pela liberação da portaria. São diversos os detalhes que chamam a atenção dos shippers de SuperCorp na série e que são utilizados em Supergirl in Training. Um ponto interessante é a forma que a autora utilizou para narrar o momento em que Lena conta para Kara sobre seus sentimentos (FIGURA 38). Logo após descobrir que é mãe de Lori e, consequentemente, casada com Lena no futuro, as duas conversam sobre:
FIGURA 38 - Supergirl in Training - Revelação de sentimentos
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Fonte: Pacheco (2018).
Na história em questão, Kara está envolvida com seu namorado Mon-El, mas transparece a mesma adoração por Lena evidenciada na série. É sutil a forma como o autor aumenta algumas reações de Kara, de forma que fique evidente que ela possui sentimentos confusos por Lena, mas sem fugir da forma como ela age na série (FIGURA 39).
FIGURA 39 - Supergirl in Training - Kara e sentimentos confusos
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Fonte: Pacheco (2018).
São diversos os momentos em que o autor acrescenta maior peso a algumas cenas, deixando claro o possível sentimento de Kara. Quanto a outras mudanças, na realidade dos outros personagens, essas são pequenas, como o relacionamento de Alex e Maggie continuando a existir no futuro da história - diferentemente da série, onde as personagens terminam no episódio 5 da 3ª temporada que são descritos como um casal que se reencontra futuramente, uma vez que na O rompimento de Kara e Mon-El pode ser visto como algo que vem ao encontro de uma solicitação dos fãs da série. Como vemos a seguir (FIGURA 40), na fanfiction, esse término foi concretizado utilizando os mesmos motivos apontados pelos fãs.
FIGURA 40 - Supergirl in Training - Ações abusivas de Mon-El
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Fonte: Pacheco (2018).
Na história, os atos de Mon-El que evidenciam o quão abusivas são suas ações estão mais claros, levando a um término por esses motivos. A forma como ele reage aos limites da liberdade do seu relacionamento com Kara marcam as aparições dele, uma forma que o autor encontrou para dar ao casal um término diferente ao da série, onde ele apenas foi afastado do núcleo principal e, mais tarde, saiu de vez da história. d) POPULARIDADE O sucesso da fanfiction pode ser compreendido pela representação do mesmo universo adorado pelos fãs da série, contando com o aditivo do ship Supercorp se realizando. Se analisarmos o contexto da história sem Lorelai, esse é o mesmo da série, com os mesmo personagens, respeitando os acontecimentos passados e imaginando um ponto para além do momento atual que a série vive. Podemos entender também que o engajamento dos fãs com essa fanfiction pela compatibilidade que ela apresenta em relação aos classificadores mais lidos da plataforma, com apontamos a seguir na FIGURA 41. Destacamos, classificação etária, relacionamentos, ship, avisos e gêneros.
FIGURA 41 - Supergirl in Training x classificadores AO3 Supergirl in Training
Archive of Our Own
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Classificação Etária
Adolescentes
Geral (6.558) Adolescentes (6.424)
F/F
F/F (16.096) F/M (2.253)
Ship
Kara/Lena Alex/Maggie
Kara/Lena (8.623) Alex/Maggie (5.602)
Avisos de Segurança
Sem avisos
Sem avisos (18.898)
Fluff
Fluff (4.109) Angst (3.293)
Relacionamentos, pares e orientações
Gêneros Fonte: Pacheco (2018).
Ainda que a série não possua centro romântico em relacionamentos entre mulheres, esse é o tipo de relacionamento mais procurado em fanfictions da página do fandom no AO3 e o que tem abrangência em Supergirl in Training. Além disso, a fanfiction permanece tratando sobre temas de interesse adolescente, o que reflete na mesma classificação da série e na característica mais lida dentro dos classificadores de faixa etária do AO3. e) INFERÊNCIAS Dessa forma, entendemos que os fãs que são impactados com a falta de representação LGBT televisiva geral e o queerbaiting de Supergirl buscam por fanfictions que garantam a representação que eles almejam com Kara e Lena juntas. Podemos inferir, com base na classificação de faixa etária predileta do fandom, que o público é jovem e está interessado em encontrar respaldo em conteúdos para suas identidades em formação. Uma vez que a série não garante isso, eles passam a consumir fanfictions para se verem representados, trabalhos esses que são iguais ao que eles vêem e gostam na série, mas que suprimem a necessidade de identificação queer ausente. Outro ponto que podemos inferir é que o público que procura por fanfictions de Supergirl está em busca de conteúdo LGBT, tendo em vista que das quase 20 mil fanfictions no site, apenas cerca de 900 são sobre o casal canon da série Kara e MonEl.
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Além disso, nos chama a atenção que a fanfiction apresenta cenários muito semelhantes aos da série. Ela segue a mesma linha de acontecimentos da série, onde a única diferença é a realização de SuperCorp, o que nos leva a inferir que os fãs estão ainda em um estágio em que eles tendem a querer apenas ver seu ship se concretizando na mesma narrativa, de forma tão natural e bem aceita como são os ships heterossexuais. As histórias não apresentam grandes mudanças ou mesmo são situadas em um alternative universe, normalmente, apenas estabelecem o casal Kara e Lena tendo a trama original de fundo.
4.3.4 MY YOUTH IS YOURS a) SINOPSE A fanfiction é uma releitura da 2ª temporada de Supergirl e gira em torno do relacionamento atual e passado de Kara Danvers e Lena Luthor. Nessa história, as duas namoraram durante a universidade, o que torna a relação entre elas mais complicada quando as duas se reencontram em National City, 4 anos mais tarde, e tentam retomar uma amizade que pouco existiu entre elas. b) SOBRE A FANFICTION My Youth is Yours é uma fanfiction de autoria da usuária @lynnearlington e foi postada no Archive of Our Own em abril de 2017. Dentre as quase 20 mil fanfictions do fandom na plataforma, essa ocupa a 2ª posição dentre as que geraram mais engajamento dos leitores42, possuindo cerca de 1.180 bookmarks. Além desse fator, a fanfiction foi lida por aproximadamente 170.439 usuários e têm 2.878 comentários. Entretanto, a fanfiction ainda não foi concluída, tendo atualmente 18 capítulos de extensão. c) O QUE MUDA Assim como em Supergirl in Training, essa fanfiction se passa dentro do mesmo universo original da série. Contudo, ao inserir flashbacks do passado entre Lena e Kara, a autora muda completamente o rumo da história original, ainda que ela siga pelos mesmos acontecimentos da 2ª temporada da série. Esses acontecimentos são 42
Dados coletados no dia 15 de outubro de 2018.
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moldados, ao longo da narrativa, para terem reflexo no desenvolvimento da relação entre Kara e Lena, detalhe que traz mais natureza à aproximação delas, tornando mais possível uma relação como a apresentada existir no enredo original. Em My Youth is Yours, os personagens são os mesmos presentes na 2ª temporada de Supergirl, da mesma forma como suas vivências no decorrer da série sempre se mantém fiéis ao que já foi visto na série. A inserção do relacionamento entre as duas ocorre no primeiro contato entre elas, da mesma forma como ocorreu em Supergirl, como vemos no trecho a seguir (FIGURA 42). FIGURA 42 - My Youth is Yours - Encontro entre Kara e Lena
Fonte: Pacheco (2018).
Nessa história, grande parte do que difere da narrativa original é mostrado ao leitor através dos pensamentos de Lena - ponto de vista utilizado - e dos flashbacks inseridos (FIGURA 43) para contar sobre a juventude delas.
FIGURA 43 - My Youth is Yours - Flashbacks
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Fonte: Pacheco (2018).
Os flashbacks ocorrem em meio a toda história, uma forma que a autora encontrou de justificar ações que ocorrem na série e que parecem atos românticos entre as duas, ainda que Supercorp não seja canon. Dessa forma, os argumentos dos fãs sobre a relação subentendida entre as duas ganha força, tornando-se plausíveis nesse contexto. Um exemplo de situação como essa é quando Lena convida Kara para um evento da L Corp (FIGURA 44), conhecendo Mon-El e transparecendo ciúme da proximidade entre Kara e o homem.
FIGURA 44 - My Youth is Yours - Ciúme de Lena sobre Mon-El
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Fonte: Pacheco (2018).
Assim como na série, Mon-El adquire interesse romântico em Kara e tenta conquistá-la da mesma forma. A diferença na fanfiction é que Kara não retribui os sentimentos do outro, já que ainda tem esperanças de voltar à relação que possuía com Lena anteriormente. Esse detalhe marca a história, já que sem a intenção dos autores de colocar um interesse romântico forçado para Supergirl, o desenvolvimento da história se dá de forma diferente, como se houvesse mais fluidez na narrativa e desenvolvimento pessoal da protagonista. Além dessas mudanças, o restante dos relacionamentos e características dos personagens permanecem os mesmos, como Alex descobrindo sua sexualidade e se interessando por Maggie, James e Winn unindo-se para apoiar o Guardian, Lex Luthor preso e Lilian tentando continuar seu legado. Até mesmo os crossovers originais da série continuam presentes na fanfiction, como na visita de Barry Allen (The Flash) à Kara (FIGURA 45), pedindo ajuda para derrotar um vilão no seu universo.
FIGURA 45 - My Youth is Yours - Crossovers da fanfiction
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Fonte: Pacheco (2018).
Outro detalhe da fanfiction, que ocorre de forma oposta à narrativa de Severed Crossed Fingers (Orphan Black), abordada anteriormente, é a questão da sexualidade. Enquanto na outra análise a série tratou de maneira natural a descoberta da sexualidade da personagem e a fanfiction deu importância a mais para o fato, com essa história ocorre o contrário: a fanfiction não se aprofunda nessa questão, enquanto a série faz grande apelo ao assunto quando o aborda. Em My Youth is Yours, Kara não se importa com o gênero da sua atração (FIGURA 46), mas apenas em descobrir como funciona os relacionamentos na Terra.
FIGURA 46 - My Youth is Yours - Sexualidade de Kara
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Fonte: Pacheco (2018).
Dessa forma, a relação das duas se desenvolve - de acordo com os flashbacks - de maneira natural, sem a importância de profunda abordagem sobre sexualidade e a possibilidade ou não das duas estarem juntas. d) POPULARIDADE Em comparação com os marcadores de classificação do Archive of Our Own e os utilizados em My Youth is Yours, é clara a compatibilidade entre esses. O engajamento dos fãs pode, então, também ser entendido por esse aspecto, já que a fanfiction possui marcadores que estão entre os mais procurados na plataforma (FIGURA 47). Destacamos classificação etária, relacionamentos, ship e avisos.
FIGURA 47 - My Youth is Yours x classificadores AO3
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My Youth is Yours
Archive of Our Own
Adolescentes
Geral (6.558) Adolescentes (6.424)
F/F
F/F (16.096) F/M (2.253)
Ship
Kara/Lena Alex/Maggie
Kara/Lena (8.623) Alex/Maggie (5.602)
Avisos de Segurança
Sem avisos
Sem avisos (18.898)
Alternative Universe - canon divergence
Fluff (4.109) Angst (3.293)
Classificação Etária Relacionamentos, pares e orientações
Gêneros Fonte: Pacheco (2018).
My Youth is Yours possui centro romântico, sendo toda sua história envolvida pelo relacionamento passado e a tentativa de construção de um novo entre Kara e Lena. Sendo assim, o fato da fanfiction ter característica romântica e o ship ser o mais procurado na plataforma, é possível entender mais um pouco sobre o sucesso dessa história. e) INFERÊNCIAS Assim como apontado na análise anterior, percebemos que a história de My Youth is Yours é uma força de resposta ao queerbaiting apresentado na série. Entendemos que construção do relacionamento entre Kara e Lena nessa fanfiction, utilizando o mesmo contexto da série e os mesmos acontecimentos, é uma forma que os fãs encontram de possibilitar visibilidade ao seu ship e, consequentemente, a sua própria sexualidade. Da mesma forma, ao alterar tão pouco a narrativa da série e ainda assim acrescentar a consolidação do relacionamento entre as duas, fazendo uso de cenas e situações originais da série, os fãs mostram como seria possível que o ship SuperCorp se tornasse canon. Compreendemos esse esforço como um protesto contra o queerbaiting da série, uma forma de mostrar como a não utilização da química entre Kara e Lena para um relacionamento é por falta de interesse em uma representatividade positiva e um reforço à heteronormatividade da sociedade.
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4.3.5 VALIDAÇÃO Após analisarmos as quatro fanfictions selecionadas para o estudo, identificando pontos em comum entre as narrativas, o papel da representação nessas e realizarmos inferências, iremos para o próximo tópico. Na etapa a seguir, serão validadas as ideias surgidas nas inferências, utilizando os autores vistos anteriormente e ideias apontadas nas fanfictions. A) FORMAS DE EXPANSÃO DA NARRATIVA Os fãs de Supergirl são jovens, de acordo com a faixa etária indicada pela série, o que nos leva a entendê-los como em fase de formação de identidade, seja ela de gênero ou sexual (LOURO, 2000). Ao se identificar com uma orientação divergente da padrão de uma sociedade heteronormativa (BUTLER, 2003), esse fã irá buscar validação da sua identidade de alguma forma. A mídia tem o papel de representar os padrões de vida (KELLNER, 2001; BRAVO, 2014), então é compreensível que eles possam querer se enxergar representados de alguma forma na TV, validando sua expressão de gênero e identidade sexual. Nesse ponto, ao não se encontrarem representados na série - seja pela negação de Supercorp ou pela representação negativa de Sanvers - e em outros programas, as produções de fãs entram como uma forma de solucionar o déficit de representação da série. Dentro do fandom, local de aceitação e compreensão (VALVERDE, 2011), os fãs podem encontrar materiais relacionados a Supercorp, sem a interferência do queerbaiting provocado no roteiro original. As fanfictions analisadas são uma evidência dessa necessidade de aprovação do ship LGBT e da importância que os fãs dão a ele. De acordo com a análise de Supergirl in Training e My Youth is Yours, percebemos que a maior semelhança entre as fanfictions é a permanência do roteiro original da série, com a adição de Supercorp à narrativa. Como pontua Eco (1994), o leitor tem a capacidade de preencher lacunas enquanto consome uma narrativa. Acreditamos que essas fanfictions de Supergirl sejam uma forma do fã preencher a lacuna que a falta de representatividade significativa causa na série. Ao avaliarmos o engajamento de ambas as fanfictions no AO3, percebemos que são milhares os fãs que parecem concordar e apoiar essas histórias que recontam a série com o novo casal, como se
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quisessem, através das produções de fã em questão, satisfazer a necessidade de representação que não encontram no roteiro original. Por outro lado, quando analisamos as fanfictions de Orphan Black, percebemos que elas seguem um caminho diferente de Supergirl. Essas fanfictions de OB expandem a narrativa para além do roteiro original, dando novos significados a relações, rumos diferentes às histórias, mantendo apenas algumas referências ao roteiro original da série. Da mesma forma como na série, as histórias Severed Crossed Fingers e 03:24:21 mantém o casal Cosima e Delphine, mas o colocam no centro das fanfictions. Podemos entender que isso é uma forma de ver o casal lésbico como importante para o fandom na plataforma, mas que ainda assim não produz nessas fanfictions concentração no desenvolvimento romântico, tendo esse apenas como consequência. A forma como esses fãs de Orphan Black no AO3 tratam a narrativa é semelhante ao argumentado por Jenkins (2015) sobre produções de fãs. O autor discute que, ao se apropriar de um conteúdo, o fã tem a tendência de expandi-lo, dando novos significados a história. Do mesmo modo, lembramos que Vargas (2005) argumenta que os fãs produzem fanfictions, porque não lhes basta o conteúdo original; para eles é inevitável consumir mais do objeto de adoração, vê-lo em outras histórias e tornar esse universo cada vez maior. Sendo assim, podemos entender que as fanfictions analisadas no fandom de Orphan Black no AO3 possuem essas características, uma vez que distorcem a realidade da série, expandindo o universo de OB para além da narrativa original. Entendemos que isso pode ocorrer devido esse fandom não ter a necessidade de comprovar seu major ship, Cosima e Delphine, posto que elas já são canon na série. Quando isso acontece, especulamos que esses fãs não sintam a necessidade de produzir e consumir fanfiction que apenas consolidam o casal, preenchendo qualquer espaço de representação LGBT. Eles parecem passar a ter a liberdade de se aventurar por histórias de gêneros como crossovers ou alternative universe, além de temas não mais tão juvenis como as fanfictions fluff de Supergirl analisadas, as quais eram voltadas para o desenvolvimento amoroso dos personagens. Nesse sentido, supomos que possa haver uma espécie de escala de abordagens que os fãs fazem ao objeto selecionado, tendo o aspecto da representatividade LGBT em foco. Entendemos que, a partir do momento em que o fã sofre queerbaiting e/ou se sente invalidado pela imagem que recebe da mídia, ele recorre a produções no fandom como uma forma de conquistar essa visibilidade
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(JENKINS, 1992; MORAES, 2018). Nesse caso, ele concentra-se em histórias que entreguem justamente isso. Sendo assim, histórias românticas, de gênero fluff, onde temas de descoberta e naturalizações ocorrem, parece ser as mais apreciadas por esse público. Esses fãs apenas querem ver a consolidação de seu ship dentro do universo da série que eles já gostam, portanto, não expandem a narrativa para muito além do roteiro original, satisfazendo-se com a história base somada ao ship LGBT. Em um segundo momento, a partir do ship LGBT consolidado - como é visto em Orphan Black -, as fanfictions analisadas no fandom tem natureza diferente. Ao não ter a necessidade de focar a narrativa em estabelecer um ship dentro do roteiro original, é possível expandi-la para outras visões sobre a história, como apontado por Jenkins na sua obra Cultura da Convergência (2015). Nesse caso, ainda que seja um fandom que possua foco LGBT, a natureza expansiva das fanfictions reflete um comportamento padrão, como de qualquer outro fandom, que tem nessa produção de fã uma forma de dar continuidade conteúdo (HILLS, 2002). Acreditamos então que exista diferença entre as fanfictions de um fandom que possui um major ship LGBT canon e um fandom que torce por um casal que protagoniza queerbaiting, sem grandes chances de se realizar, como foi analisado neste estudo. B) FANFICTION COMO PROTESTO Ao analisarmos as fanfictions Supergirl in Training e My Youth is Yours, percebemos como ambas utilizam parte da série - aspectos do relacionamento canon de Kara e Lena - para embasar suas histórias. Situações que ocorrem em Supergirl, como as ocasiões em que Lena demonstra ciúme de Mon-El, por exemplo, são os mesmos utilizados pelos fãs da série quando julgam as ações dos produtores como queerbaiting (DeGalan, 2017). Ao inserir esses fragmentos da narrativa original nas fanfictions analisadas no AO3, percebemos como o relacionamento das personagens parece natural, tem um fluxo que faz sentido quando pensado dentro do contexto apresentado, que possui poucas diferenciações do original. Por meio dessa narrativa levemente alterada, esses ficwriters43 parecem demonstrar como seria possível
43
Em tradução para o português, escritores de fanfiction.
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introduzir o casal na série, consolidando Supercorp como canon sem muitas alterações no rumo da história. Da mesma forma, como que para embasar a ideia de Supercorp como canon, temos o personagem Mon-El excluído da vida amorosa de Kara. Tanto em Supergirl in Training como em My Youth is Yours, o personagem que na série faz o papel de interesse romântico de Kara é rejeitado pela protagonista. Em Supergirl in Training, o autor optou por expor os traços de relacionamento abusivo do personagem, o que é algo que os fãs reivindicam da série, levando Supergirl a terminar com o namorado após tomar conhecimento da situação de forma mais clara. Já em My Youth is Yours, Kara não chega a se relacionar com Mon-El, visto que a autora tenta expor como o sentimento é unilateral e não faz sentido no contexto em que Kara está. Esse comportamento nas fanfictions analisadas reflete o fandom na plataforma no geral, onde das quase 20 mil fanfictions no site, apenas cerca de 900 são sobre o casal Kara e Mon-El. Com isso, inferimos que as fanfictions de Supergirl analisadas podem conter certa crítica à representatividade LGBT da série. Ao construir o casal dentro da mesma história do roteiro original e fazendo uso dos mesmos aspectos do relacionamento das personagens como base, essas fanfictions demonstram como é possível tornar o ship em algo canon. Podemos supor, a partir dessa leitura, que o que impede a série de concretizar o relacionamento seria a heteronormatividade vigente na sociedade (BUTLER, 2003; LOURO, 2000; RICH, 2010), o que dificulta que uma série tenha uma protagonista com um relacionamento LGBT exposto ao público. Como pontuam Kellner (2001) e Bravo (2014), a mídia se acomoda quanto a importância da representatividade, buscando atender apenas às demandas majoritárias da sociedade, sem se preocupar com minorias e seus desejos. Assim, é compreensível como a CW não tornaria Supergirl em uma série com centro LGBT, ainda que faça uso do queerbaiting para conquistar maior base queer para seu fandom (MORAES, 2018; NORDIN, 2015). Dessa forma, chegamos à teoria de que as fanfictions analisadas
podem
funcionar
de
forma
crítica,
expondo
o
amparo
à
heteronormatividade que a série produz ao relacionar Kara com um homem e negar a química que essa apresenta com Lena, envolvendo a protagonista em um exemplo de heterossexualidade compulsória (RICH, 2010). Quanto à característica crítica das duas fanfictions analisadas, relembramos Derecho (2001 apud MASSUNAGA, 2011), que qualifica esse gênero de produção de
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fãs como algo de natureza subversiva. De acordo com a autora, os fãs utilizam a possibilidade de reconstruir narrativas para realizar críticas sociais, denunciar desigualdades, apresentando uma realidade com os valores que acreditam. Assim, entendemos que os autores de Supergirl in Training e My Youth is Yours utilizam suas obras
de
forma
que
elas
exponham
a
indignação
pelo
queerbaiting
e
heteronormatividade da série. Eles parecem querer expor ao fandom de Supergirl na plataforma AO3 como seria, sim, possível adicionar o casal à narrativa original, e que essa possibilidade é tão interessante quanto a história em curso na TV. Junto a isso, as histórias criticam a relação entre Kara e Mon-El, evidenciando que não há motivos para o casal estar junto, fora o serviço prestado pela série em favor da manutenção da heteronormatividade para o público jovem (LOURO, 2000). C) FANDOM DA ANTI-NORMATIVIDADE Por fim, destacamos nas quatro histórias analisadas nas fanfictions um ponto em comum: a boa aceitação da sexualidade queer. Como foi apontado por Valverde (2011), um fandom é um local de boa recepção, onde ele pode se sentir confortável para falar sobre sua série favorita, casais que mais gosta e consumir conteúdos relacionados a esses. Tendo em vista que os fãs se voltam a essas produções de fãs para suprir alguma necessidade, a qual pode ser a falta de representatividade LGBT na mídia, por exemplo, é esperado que as produções de fãs reflitam as maiores buscas do fandom em questão de temáticas. Como foi analisado, as quatro fanfictions dos dois fandoms possuem centro F/F44, da mesma forma que esses fandoms também mostram predominância de produção desse tipo de relacionamento na plataforma AO3. Entretanto, além de ser F/F, em todas as fanfictions analisadas houve recepção positiva sobre a sexualidade dos personagens dentro da história, quando não foi o caso de apenas naturalização completa. Em Severed Crossed Fingers - única das quatro a abordar com maior enfoque esse detalhe -, Delphine assume seus sentimentos por Cosima para Beth, que recebe ela de forma positiva, aconselhando e trazendo questionamentos sobre o porquê da diferenciação no sentimento só por Cosima ser uma mulher. Há acolhimento e orientação para que Delphine apenas siga o que está sentindo e seja feliz. Já em 03:24:21, a sexualidade de Cosima é
44
Relacionamentos female/female, ou seja, entre duas mulheres.
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naturalizada por completo por seus amigos, bem como a de Delphine é tratada de forma tão natural quanto. Quando as duas se relacionam, não há impedimentos baseados no fato de ambas serem mulheres, apenas outros fatores externos. Na análise de Supergirl in Training, foi percebido a mesma situação. O autor normaliza por completo os sentimentos de Lena por Kara, tratando a paixão inicialmente platônica de forma natural. Até o momento em que Lena confessa para Kara o que sente, essa não parece se importar com o fato de Lena ser uma mulher apaixonada por ela, da mesma forma que não faz grandes questionamentos sobre o futuro onde elas são casadas e têm a Lorelai como filha. Em My Youth is Yours, assim como nas três anteriores, a anti-normatividade se repete. Kara trata com naturalidade sua atração por Lena, interessando-se em namorar com ela sem ao menos considerar padrões de gênero da Terra, e recebe reciprocidade do outro lado. As atrações e a exploração da sexualidade das personagens nunca são grandemente questionadas, o que traz um senso de normalidade para os relacionamentos apresentados. Entendemos esse acontecimento como uma resposta dessas fanfictions à realidade da mídia e meio. Considerando que apenas recentemente a mídia começa a tratar com normalidade o público LGBT (SENDER, 2012), e que a sociedade acompanha as mudanças de pensamento através do que vê na TV (KELLNER, 2001; MORAES, 2018), é possível pensar a sociedade como um ambiente hostil a sexualidades divergentes do padrão heteronormativo (FOUCAULT, 2013). Da mesma forma, quando busca enxergar-se na mídia, esse indivíduo encontra representações negativas ou não satisfatórias (DESHLER, 2017; MORAES, 2018; NORDIN, 2015), tendo que se contentar com o queerbaiting ou nada de representação. Entretanto, esse fã, quando dentro de um fandom, encontra o suporte e o conteúdo que procura, como se o fandom assumisse esse papel de provedor de representatividade que está em falta na mídia de massa, assim como da boa relação com outras sexualidades ausente na sociedade. Nesse ponto, podemos entender que as fanfictions analisadas são como um presente dos autores para seus fandoms. Como pontuou Hills (2017), os fãs investem seu trabalho afetivo na construção de universos para outros fãs no fandom. Da mesma forma, Jenkins et. al (2015) comentam sobre a economia do dom, conceito que vê as produções de um fandom como presentes que os fãs dão uns aos outros. Essa ideia nos leva a acreditar que a temática LGBT dessas quatro fanfictions e a naturalização dos relacionamentos mostrados são uma forma de conforto ao fandom, seja pela
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realidade da sociedade, pelo queerbaiting da série ou pela vontade de ver a sexualidade queer como uma forma de padrão também.
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5 CONSIDERAÇÕES FINAIS Inicialmente, o projeto deste estudo tinha como objetivo central a comparação entre a produção de fanfictions dos fandoms de Supergirl e Orphan Black, visando identificar maior ou menor quantidade de fanfictions, de acordo com a representação que a série oferece para o público LGBT. Com um olhar mais atento aos objetos e investigação das produções na plataforma Archive of Our Own (AO3), percebemos que não seria possível responder às indagações do projeto, visto que seria preciso a leitura e análise de mais de 22 mil fanfictions - soma entre as produções dos dois fandoms na plataforma. Da mesma forma, não seria válida a comparação, tendo em vista os diferentes momentos da série e como o número de fanfictions no site poderia se dar pelo maior fandom, não necessariamente por uma insatisfação maior desses fãs. Sendo assim, modificamos o foco do trabalho, buscando então compreender a relação entre representatividade LGBT nas séries Orphan Black e Supergirl, e a produção de fanfictions na plataforma AO3 pelos respectivos fandoms. Para alcançar o objetivo deste estudo, consideramos necessário estudar a cultura de fã e a produção de conteúdo desse público no meio online e, a partir desse ponto, entender como surge o fã, o fandom e de que forma eles se relacionam com a produção de conteúdo. Objetivamos também entender, mais especificamente, a produção de fanfictions e as motivações que podem levar um fã a desenvolver esse trabalho para seu fandom. Em seguida, tivemos como objetivo estudar a representatividade LGBT em séries de TV, a fim de analisar como ocorre o queerbaiting na série Supergirl e como se dá a representatividade real na série Orphan Black. Com isso, buscamos entender o que leva os fãs em diferentes níveis de satisfação com a representatividade LGBT que consomem a procurarem por conteúdos de outros fãs - mais especificamente, fanfictions -, estabelecendo o papel da fanfiction nos fandoms de Supergirl e Orphan Black sob o aspecto da representatividade LGBT. No decorrer do presente trabalho, diversos autores colaboraram em maior ou menor grau para contextualizar, conceituar e construir a fundamentação teórica que possibilitou a análise das fanfictions dos fandoms selecionados. Assim, começamos a nossa pesquisa estudando a cultura de fã, o papel desse indivíduo em relação ao seu objeto de admiração e como ele se envolve em comunidades com outros fãs. Nessa etapa, utilizamos Clay Shirky (2011), Henry Jenkins (1992; 2006; 2015), Maria Lucia
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Bandeira Vargas (2005), Matt Hills (2002) e Piva e Affini (2017), principalmente. A obra Textual Poachers (1992) de Henry Jenkins foi fundamental para entendermos esse universo e, a partir de então, estudar como os fãs se comportam em comunidades no caso, com ênfase no meio online - e como surgem e são difundidas na cultura as produções de fãs. Dentre essas produções, demos especial enfoque para as fanfictions, uma vez que essas são parte do objeto de pesquisa do nosso trabalho. Quanto às fanfictions, analisamos como ocorrem suas produções, quando surgiu essa forma de produção de fã e buscamos compreender as motivações que levam a sua criação. Assim, exploramos o aspecto da economia do dom e a produção de fanfiction como forma de expansão de narrativa e/ou reestruturação da história com objetivo de proporcionar representatividade não aparente no contexto original. Assim como o estudo sobre o universo do fã, o aprofundamento em conceitos como sexo, gênero, heterossexualidade compulsória, representatividade LGBT na mídia e queerbaiting foi indispensável para analisar a representação queer das séries Orphan Black e Supergirl. A partir desses conceitos, entendemos como ocorre a representação de minorias na TV, bem como a falta de representação é fundamentada em comportamentos enraizados da sociedade, como a heterossexualidade compulsória e a heteronormatividade padrão. Nessa etapa, utilizamos, principalmente, Douglas Kellner (2001), Emma Nordin (2015), Guacira Lopes Louro (2000; 2007; 2008), Judith Butler (2003), Juliana Bravo (2014) e Letícia Falcão Wunderlich Moraes (2018). Para chegar ao objetivo do trabalho, fizemos uso da técnica de pesquisa denominada análise de conteúdo, a qual estuda objetos de diversas naturezas a fim de cruzar informações e produzir inferências sobre o conteúdo (KRIPPENDORFF, 2004). A técnica foi a mais indicada para a pesquisa devido a suas características que permitem maior flexibilidade de análise, dando preferência para descobertas que saiam de teorias já existentes e reconhecendo a importância do olhar do analista e do contexto onde estão inseridos os objetos, como aponta Krippendorff (2004). A partir da análise das fanfictions, embasadas pelo que foi anteriormente estudado na fundamentação teórica, identificamos três pontos-chave na pesquisa: as formas de expansão da narrativa, a utilização da fanfiction de forma crítica ao conteúdo original e a recorrência do padrão de normalização da identidade queer. A análise nos levou a uma teoria acerca da maneira como os fãs parecem expandir a narrativa dos universos que tem afeição. A partir das fanfictions de
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Supergirl analisadas na plataforma AO3, percebemos como as histórias não se afastam do roteiro original da série, modificando apenas minimamente o conteúdo base da narrativa. Entretanto, o ponto em comum de mudança do roteiro foi a consolidação do ship não-canônico Supercorp, formado por Kara e Lena. Entendemos, a partir de Louro (2000) e Butler (2003), que essa ação pode ser explicada pela faixa etária do fã da série, que está em estágio de formação da sua identidade, buscando a representação na mídia, por exemplo, como forma de validação. Além disso, como pontua Eco (1994), o leitor tem a capacidade de preencher lacunas enquanto consome uma narrativa. Acreditamos então que essas fanfictions de Supergirl sejam uma forma do fã preencher a lacuna que a falta de representatividade significativa causa na série, mantendo a narrativa original e apenas inserindo sua identidade queer nos espaços deixados entre o texto. E, de acordo com o número de bookmarks apresentadas pelas fanfictions em questão, supomos que esse estilo de narrativa é bem apreciado pelo fandom na plataforma, sendo uma evidência a mais para a nossa teoria. Por outro lado, quando comparamos essas fanfictions às analisadas dentro do fandom de Orphan Black na plataforma, percebemos como elas seguem linhas diferentes de expansão de universo. Enquanto as fanfictions de Supergirl analisadas tendem a se manter próximas a narrativa original, apenas inserindo Supercorp como mudança visível, as fanfictions de Orphan Black expandem para muito além o universo da série. Elas se utilizam de gêneros como crossovers e alternative universe para criar histórias com pouca conexão com a narrativa original, salvo os personagens e suas relações entre si. Dentre essas relações, demos destaque ao ship canon LGBT da série, Cosima e Delphine, que estão no centro das histórias, ainda que essas fanfictions analisadas não tenham o relacionamento das duas como eixo narrativo. A partir da identificação da diferença entre as linhas de histórias analisadas nos dois fandoms, inferimos que a consolidação da representatividade LGBT na série influenciou na liberdade narrativa dos enredos. Uma vez que não precisa suprir a representação que a série já oferece, o fandom de Orphan Black parece se aventurar por outros caminhos, expandindo a narrativa da mesma forma Jenkins (2015) comenta ser típico do fã. Entendemos, assim, que a consolidação dessa representatividade coloca o fã com interesse em um ship queer na mesma posição de qualquer outro fã, que utiliza essa
ntos de vista
do objeto de adoração, mas para expandir suas possibilidades. Por outro lado, o fã
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que carece de representatividade com Supergirl, parece estar em outro estágio, onde ainda se prende a preencher lacunas no conteúdo original para se ver representado propriamente. Assim, acreditamos que exista uma escala de liberdade na expansão da narrativa, o que é regulado pela representatividade LGBT de fandoms que possuem interesse nesse segmento de representação e identidade. A análise das fanfictions sugeriu ainda outro ponto, o qual evidencia o caráter crítico dessa forma de produção. A partir da análise das fanfictions selecionadas de Supergirl, percebemos que a utilização de fragmentos da narrativa original para dar suporte e veracidade ao desenvolvimento da relação entre Kara e Lena, pode ser vista como uma exposição da heteronormatividade (BUTLER, 2003) da série. De acordo com os enredos das duas fanfics e da colocação de Derecho (2001 apud MASSUNAGA, 2011) sobre fanfiction representar a possibilidade de crítica social e denúncia de desigualdades, inferimos que a construção que posiciona o casal central em meio a narrativa já existente segue essa concepção crítica da produção. Compreendemos que, ao prosseguir com os acontecimentos já apresentados na série, essa pode ter sido uma forma que os autores encontraram para expor a falta de interesse do canal em tornar Supercorp canon, devido ao risco que isso impõe a heteronormatividade vigente, que tem suporte no relacionamento heterossexual protagonista na série (Kara e Mon-El) e alcance certeiro sobre o público jovem. Por fim, evidenciamos na análise mais um ponto de destaque que surgiu a partir das fanfictions estudadas. Em todas as fanfictions, a presença da boa representação e normalização da identidade queer nos fez observar esse aspecto com maior atenção. Tendo em vista a representatividade rasa, negativa ou não satisfatórias queerbaiting - da mídia (SENDER, 2012; MORAES, 2018; NORDIN, 2015) e como a televisão impacta a sociedade e tem o poder de regularizar ideias pro público (KELLNER, 2001; BRAVO, 2014), inferimos que a os autores podem ter encontrado nas fanfictions uma forma de garantir representação positiva. Ao dar destaque para aceitação dos personagens de outras sexualidades e normalização de relações não heteronormativas, os autores parecem estar criando uma realidade confortável para o fã que não encontra a mesma reação na sua vida. Assim, as fanfictions analisadas podem ser vistas como um presente (JENKINS, 2015) de representação positiva, uma maneira encontrada pelos autores do fandom de possibilitar narrativas encorajadoras e mais esperança para os demais fãs que necessitam disso. Seja pela realidade da sociedade, pelo queerbaiting da série ou pela vontade de ver a sexualidade queer
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como uma forma de padrão também, esses fãs podem ter nessas fanfictions uma referência de representação. Esses
resultados
respondem
aos
nossos
questionamentos
iniciais,
comprovando a importância das fanfictions para o suprimento da representatividade LGBT em falta na mídia. Entendemos o papel dessas produções dentro de cada fandom analisado, uma vez que as fanfictions parecem desempenhar função complementar Supergirl, onde a representatividade queer é composta de queerbaiting e desenvolvimento superficial do casal Sanvers, enquanto são utilizadas como expansão em Orphan Black, série que já possui sua representação LGBT consolidada. Consequentemente, percebemos como esse fator implica em motivações diferentes que podem levar o fã a consumir esse conteúdo no fandom. Além disso, apresentamos o papel dessas fanfictions como um meio de destacar as críticas dos fãs sobre representação e heteronormatividade, o que nos leva a considerar essa forma de produção de fã como multifuncional, sendo utilizada em diferentes contextos para diferentes fins. Todavia, durante a construção da análise e leitura dos resultados, observamos que ainda há muito a ser explorado dentro desse recorte de pesquisa. É possível uma continuação do presente estudo com aprofundamento sobre a percepção dos fãs sobre os aspectos comentados, um estudo sobre como o queerbaiting impulsiona a produção de fanfictions, bem como a aplicação do modelo de expansão de narrativas em outros fandoms a fim de comprovação em maior escala da ideia. Da mesma forma, podemos considerar a construção de um futuro trabalho com foco em fanfictions, explorando o fenômeno e suas influências na cultura literária contemporânea, ou mesmo direcionando o foco para o outro fenômeno trabalhado, o queerbaiting, identificando as nuances da prática dentro da relação mídia e fã. Independentemente da linha de foco selecionada, a experiência obtida neste trabalho nos leva à vontade de seguir com o estudo, dando continuidade à pesquisa através de uma dissertação de mestrado. Esperamos que a monografia traga contribuições para o mercado de Publicidade e Propaganda, agregando informações sobre o comportamento de fãs e, consequentemente, consumidores dedicados a alguma marca. Ao conhecer mais sobre o comportamento de fãs em comunidades e como eles respondem à mídia, é possível traçar perfis mais condizentes com o público da marca, tendo mais assertividade em estratégias de comunicação. Quanto à área mais criativa da
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Publicidade, acreditamos que o trabalho possa colaborar para mostrar como algumas criações e narrativas afetam o público LGBT, assim como a maneira que esse público encontra de reagir a elas, seja através de críticas ao que for danoso para sua identidade queer, ou na difusão ainda maior de um conteúdo devido a sua boa representatividade.
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