A CIDADE E O RIO UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
Catarina Iara Moço Lopes (Licenciada) Projeto Final de Mestrado para a obtenção do grau de Mestre em Arquitetura Orientação Científica Professora Doutora Ana Marta das Neves Feliciano Professor Doutor António Miguel Leite Professor Doutor José Luís Crespo Júri Presidente: Professor Doutor Carlos Ferreira Vogal: Professor Doutor Miguel Baptista Bastos Documento DEFINITIVO Lisboa, FA ULisboa, Julho, 2016
A CIDADE E O RIO
Título A Cidade e o Rio Subtítulo Um Ícone no Lugar da Frente Ribeirinha de Santos Nome Catarina Iara Moço Lopes Orientação CIENTÍFICA Professora Doutora Ana Marta Feliciano Professor Doutor António Miguel Leite Professor Doutor José Luís Crespo Dissertação/Projeto elaborado para a obtenção do Grau de Mestre em Arquitetura Lisboa, Julho, 2016
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
RESUMO
A arquitetura icónica consagrou-se com a grande procura de novas formas de expressão e de novas imagens que consolidassem uma nova era na construção, sobretudo durante a transição do século XIX para o século XX. Apesar da palavra ícone estar intrinsecamente relacionada com o conceito de imagem, o termo “edifício icónico” como o conhecemos hoje, surge por Charles Jencks quando o mesmo define o “efeito Bilbao” caracterizado pelo fenómeno global construtivo de edifícios facilmente reconhecidos tanto pelas suas formas esculturais como excêntricas. Contudo, mesmo associados a críticas de sensacionalismo e a representações sem significado, alguns destes edifícios possuem de facto a capacidade de surgir enquanto elementos pontuais de revitalização urbana, e de transformar a sua forma emblemática em experiências arquitetónicas específicas do lugar. Deste modo, o presente trabalho pretende compreender o conceito de ícone e a sua relação com a construção de imagens no contexto da cidade, a necessidade de uma expressão monumental na arquitetura, e por fim a capacidade que o edifício icónico possui em revitalizar zonas maioritariamente descaracterizadas. Tendo como análise o lugar da Frente Ribeirinha de Santos, que constitui uma memória do que outrora foi zona portuária da cidade de Lisboa e que no presente se revela enquanto zona urbana por desenvolver.
PALAVRAS-CHAVE Ícone | Frente Ribeirinha | Santos | Memória Cultural | Música
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A CIDADE E O RIO
Title A Cidade e o Rio Subtitle Um Ícone no Lugar da Frente Ribeirinha de Santos Name Catarina Iara Moço Lopes advisers team Professor Architect Ana Marta Feliciano Professor Architect António Miguel Leite Professor Architect José Luís Crespo Dissertation/Project to obtain the Master’s Degree in Architecture Lisbon, July, 2016
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
ABSTRACT
The iconic architecture established itself with the high demand for new forms of expression and new images that were able to consolidate a new era in construction, mostly during the transition from the nineteenth to the twentieth century. Despite the fact of the word icon being intrinsically linked to the concept of image, the term “iconic building” as we know it, arises by Charles Jencks when he defined the “Bilbao effect” characterized by the constructive global phenomenon of buildings easily recognized by its sculptural and eccentric forms. However, even associated with criticism of sensationalism and meaningless representations, some of these buildings have in fact the ability to emerge as specific elements of urban regeneration, and transforming its emblematic form in specific architectural experience of the place. Thereby, this study aims to understand the concept of icon and its relationship with the construction of images in the context of the city, the need for a monumental expression in architecture, and finally the ability that the iconic building has to revitalize uncharacterized areas. Considering Santos Riverfront as the main site analysis, which is memory of what was once the seaport area of Lisbon and that in the present is revealed as an urban area to be developed.
keywords Icon
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Riverfront
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Santos
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Cultural Memory
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Music
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AGRADECIMENTOS
Aos meus pais pelo apoio incondicional e orgulho demonstrado durante todo o meu percurso académico, sem o seu esforço e dedicação o mesmo não seria possível. Em especial à minha mãe, que sempre acreditou em tudo o que me comprometi a alcançar. Aos meus orientadores Professora Ana Marta Feliciano, Professor António Leite, e Professor José Luís Crespo, pelo conhecimento transmitido, pelo apoio e interesse contínuo, e por terem aceite fazer parte deste trabalho, testemunhando as suas dificuldades mas também as suas conquistas. Aos meus amigos de sempre por todo o companheirismo, amizade e motivação. Sobretudo por terem feito parte deste longo percurso. Por fim, ao João pelo incentivo constante, prático e emocional, que foram essenciais desde o início até ao fim. Por tudo.
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ÍNDICE
/01. INTRODUÇÃO 1.1 Enquadramento e objetivos 1.2 Metodologia 1.3 Estrutura e organização
1 5 7 8
/02. ARQUITETURA COM(O) EXPRESSÃO 2.1 Signo, Ícone e Imagem 2.2 Imagens Construídas 2.3 Monumento vs. Monumentalidade 2.4 Edifícios Icónicos 2.5 Crítica à Iconicidade 2.6 The Iconic Building is here to stay 2.7 Síntese
11 16 19 22 29 34 40 45
/03. IMAGEM DE UMA CIDADE 3.1 A Cidade Portuária 3.2 Da Cidade-Porto à Cidade-Cultura 3.3 Lisboa e o Tejo 3.4 Os Aterros 3.5 Regresso à Margem 3.6 Síntese
49 52 55 60 68 72 77
/04. CASOS DE ESTUDO 4.1 Teatro del Mondo, Aldo Rossi 4.2 Teatro sobre a Água, Tadao Ando 4.3 T-Hall, Toyo Ito 4.4 Casa da Música, OMA 4.5 Philharmonic Hall, Barozzi Veiga 4.6 Síntese
81 84 88 91 94 98 102
/05. OUTRA VEZ TE REVEJO LISBOA E TEJO E TUDO 5.1 O Lugar de Santos-o-Velho 5.2 A Frente Ribeirinha de Santos 5.3 Identidade Memorial 5.4 A Sala de Espetáculos como Intervenção Arquitetónica 5.5 Um Lugar para a Música 5.5.1 O Conceito 5.5.2 A Imagem 5.5.3 O Programa
105 108 112 116 120 123 126 128 131
/06. CONSIDERAÇÕES FINAIS BIBLIOGRAFIA ANEXOS
135 143 151
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ÍNDICE DE FIGURAS
CAPA Auditório do Tejo - Ícone do Projeto. Imagem da autora, 2016. 1. Villa Le Lac, Suiça. Le Corbusier 1922-1924. Autor desconhecido, (s.d.). Fotografia.
In https://pt.pinterest.com/pin/433260426626774455/ /01 INTRODUÇÃO 2. A Cidade e o Rio. Imagem da autora, 2015. Fotografia. 3. Ícones de Lisboa. Autor João Ferrand, 2003. Fotografia. In http://www.jferrand.com/ /02 ARQUITETURA COM(O) EXPRESSÃO 4. A Deposição do Olhar por Renato Rizzi; Modelo tridimensional da cobertura do Panteão de Roma. Autor Umberto Ferro, 2004. Fotografia.
In http://divisare.com/projects/286481-renato-rizzi-la-deposizione-dello-sguardo 5. Janela da sala do Capítulo, Convento de Cristo, Tomar. Diogo de Arruda e João de Castilho, 1510-1515. Autor desconhecido, (s.d.). Fotografia.
In http://www.conventocristo.pt 6. La Gioconda, pormenor da pintura a óleo original. Autor Leonardo Da Vinci, 1503-1507. Pintura.
In http://www.louvre.fr/en/oeuvre-notices/mona-lisa-portrait-lisa-gherardini-wife-francesco-del-giocondo 7. Plan Voisin, elaborado por Le Corbusier para a cidade de Paris. Autor Le Corbusier, 1925. Desenho.
In https://www.pinterest.com/pin/306526318359684183/ 8. Pirâmides de Gizé, Egito. Autor desconhecido, (s.d.). Fotografia.
In https://www.flickr.com/search/?q=piramides%20do%20egipto 9. Coliseu de Roma, Itália. Tito Flávio Sabino Vespasiano, 68-79 d.C. Autor desconhecido, (s.d.). Fotografia.
In https://www.flickr.com/search/?q=piramides%20do%20egipto 10. Torre Eiffel, Paris. Gustave Eiffel, 1889. Imagem da autora, 2012. Fotografia. 11. Perspetiva exterior do Arco Gateway, projetado por Eero Saarinem, em conjunto com o Jefferson Memorial. Autor desconhecido, 1954. Fotografia.
In https://pt.pinterest.com/pin/567523990513380349/ 12. Capela Notre - Dame - du - Haut, Ronchamp. Vista das fachadas sul e leste. Le Corbusier, 1955. Autor desconhecido, (s.d.). Fotografia.
In COHEN, Jean-Louis - Le Corbusier. Köln: Taschen, 2005, p.64. 13. Museu Guggenheim, Nova Iorque. Pormenor da fachada principal. Frank Lloyd Wright, 1959. Autor desconhecido, (s.d.). Fotografia.
In https://pt.pinterest.com/pin/333266441145396825/ 14. A Cidade do Globo Cativo. Museu de Arte Moderna em Nova Iorque. Autor Rem Koolhaas, 1972. Ilustração guache e grafite em papel.
In http://www.moma.org/collection/works/104696?locale=pt 15. Swiss Re headquarters, Londres. Norman Foster, 1997-2004. Autor Foster + Partners, 2004. Fotografia.
In http://www.fosterandpartners.com/projects/30-st-mary-axe/
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16. Representação do arranha-céus de Norman Foster, mapeado segundo os códigos referentes à sua iconicidade, presente no livro The Story of Post-Modernism de Charles Jencks. Autor Madelon Vriensendorp, 2011. Ilustração.
In http://madelonvriesendorp.com/ 17. Esquiço de Frank Gehry referente ao projeto Disney Concert Hall. Autor Frank Gehry, 1991. Desenho.
In http://interactive.wttw.com/tenbuildings/walt-disney-concert-hall 18. Library of Alexandria, Egito. Atelier Snohetta, 1989-2001. Autor Snohetta, 2001. Fotografia.
In http://snohetta.com/project/5-bibliotheca-alexandrina 19. Museu Guggenheim, Bilbao. Vista exterior do edifício em conjunto com a escultura viva de Jeff Koons. Autor Pawel Paniczko, 2012. Fotografia.
In https://www.flickr.com/photos/dwape/albums/72157632643206572 20. Centro Heydar Aliyev, Azerbeijão. Zaha Hadid, 2007-2012. Autor Zaha Hadid Architects, 2012. Fotografia.
In Arquitetura e Arte. Ícones Tardios, Nº118 (Mar-Abr 2014), p.67. 21. Kunsthaus Museum, Graz. Peter Cook e Colin Fournier, 2003. Autor Peter Cook, (s.d.). Fotografia.
In http://www.archdaily.com/472429/this-was-our-utopianism-an-interview-with-peter-cook 22. Capas da revista Time, ilustrando figuras da arquitetura ao longo dos anos. Autor Time Magazine, 1961, 1964, 1979, 2005. Fotografia.
In http://content.time.com/time/coversearch/ 23. Idem. 24. Idem. 25. Idem. 26. I am a Monument, desenho icónico do livro Learning from Las Vegas. Autor Robert Venturi e Louise Scott Brown, 1972. Desenho.
In https://www.tumblr.com/search/Learning-from-Las-Vegas 27. Imagem de capa do livro Society of the Spectacle. Autor Guy Debord, 1967. Fotografia.
In https://libcom.org/library/society-of-the-spectacle-debord 28. Ópera de Sidney, Austrália. Jorn Utzon, 1967. Autor desconhecido, (s.d.). Fotografia.
In http://pcwallart.com/sydney-opera-house-section-wallpaper-5.html 29. Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre. Álvaro Siza, 2008. Autor Hisao Suzuki, (s.d.). Fotografia.
In El Croquis. Álvaro Siza 2001 / 2008, Nº 140 (2008), p.286. 30. Centre Pompidou, Paris. Richard Rogers e Renzo Piano, 1977. Autor Charles Platiau, (s.d.). Fotografia.
In http://www.nytimes.com/interactive/2015/06/05/t-magazine/architects-libeskind-zaha-hadid-selldorf-norman-foster.html?_r=0 31. Caja Granada e o novo Museu da Memória de Andalucia, Granada. Alberto Campo Baeza, 2009. Autor Alberto Campo Baeza, 2009. Fotografia.
In http://www.campobaeza.com /03 IMAGEM DE UMA CIDADE 32.O Aterro em 1881. Autor Alfredo Keil, 1881. Oléo sobre madeira.
In http://outlimoabencerragem.blogs.sapo.pt/tag/alfredo+keil
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33. Peine del Viento. Espanha. Eduardo Chillida, 1976. Autor desconhecido, 2006. Fotografia.
In https://www.flickr.com/search/?text=peine%20del%20viento 34. Auditório e Centro de Congressos Kursaal, Espanha. Rafael Moneo, 1990-1999. Autor Pawel Paniczko, 2012. Fotografia.
In http://pawelpaniczko.com/ 35. Ópera de Oslo, Noruega. Snohetta, 2000-2008. Autor Snohetta, (s.d.). Fotografia.
In http://snohetta.com/projects/42-norwegian-national-opera-and-ballet 36. Planta de Análise da Morfologia da Cidade de Lisboa. Imagem da autora (em conjunto com Ana Leal e Pedro Faria), 2015. 37. Planta de Lisboa em 1714, antes do terramoto. Autor Rombout van den Hoeye, (s.d.). Gravura.
In Centro de Cartografia Faculdade de Arquitetura, Universidade de Lisboa 38. Planta de Lisboa em 1785, depois do terramoto. Autor desconhecido, (s.d.). Gravura.
In Centro de Cartografia Faculdade de Arquitetura, Universidade de Lisboa 39. Vista a partir do Miradouro de Santa Luzia entre 1933-1983. Autor Estúdio Mário Novais, 1933-1983. Fotografia.
In https://www.flickr.com/photos/biblarte/albums 40. Esteiro da Baixa em 1147. Autor Júlio Castilho, 1939. Desenho.
In http://fotos.sapo.pt/biclaranja/fotos/?uid=juo0ZtkNykrtjlUBCMAc 41. Linha de Costa de Alcântara a Alfama - 45 A. C. Imagem da Autora (em conjunto com Ana Leal e Pedro Faria), 2015. 42. Linha de Costa de Alcântara a Alfama I 1650 - João Nunes Tinoco. Imagem da Autora (em conjunto com Ana Leal e Pedro Faria), 2015. 43. Linha de Costa de Alcântara a Alfama I 1807 - José Duarte Fava. Imagem da Autora (em conjunto com Ana Leal e Pedro Faria), 2015. 44. Linha de Costa de Alcântara a Alfama I 1858 - Filipe Folque. Imagem da Autora (em conjunto com Ana Leal e Pedro Faria), 2015. 45. Linha de Costa de Alcântara a Alfama I 1911 - Silva Pinto. Imagem da Autora (em conjunto com Ana Leal e Pedro Faria), 2015. 46. Linha de Costa de Alcântara a Alfama I 2016. Imagem da Autora (em conjunto com Ana Leal e Pedro Faria), 2015. 47. Vista e perspectiva da Barra Costa e Cidade de Lisboa Capitale do Reino de Portugal. Autor Bernardo de Caula, 1763. Gravura.
In Biblioteca Nacional de Portugal 48. Panorâmica sobre Lisboa, Porto de Lisboa e Rio Tejo. Autor desconhecido, 1905. Fotomontagem.
In Arquivo Municipal de Lisboa 49. Doca do Terreiro do Trigo. Autor Eduardo Portugal, 1949. Fotografia
In AA.VV. - Lisboa Ribeirinha. Lisboa: Livros Horizonte, 1994, p.28. 50. Vista aérea do Porto de Lisboa. Autor desconhecido, 1967. Fotografia.
In http://restosdecoleccao.blogspot.pt/search/label/Porto%20de%20Lisboa 51. Slogan objetivos Câmara Municipal de Lisboa. Imagem constitutiva do Plano Diretor Municipal. Autor Câmara Municipal de Lisboa, 2012. Fotomontagem.
In http://www.cm-lisboa.pt/viver/urbanismo/planeamento-urbano 52. O Cais do Sodré, 1808. Autor Henri L’Évêque e F. Bartollozzi, 1808. Gravura.
In DIAS, Marina Tavares - Lisboa Desaparecida, vol. VI. Lisboa: Quimera, 1992, p.171.
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53. O Cais do Sodré, 1930. Autor desconhecido, 1933. Postal ilustrado.
In DIAS, Marina Tavares - Lisboa Desaparecida, vol. VI. Lisboa: Quimera, 1992, p.171. 54. Planta de Análise da Morfologia do Estuário do Tejo. Imagem da autora (em conjunto com Ana Leal e Pedro Faria), 2015. /04 CASOS DE ESTUDO 55. Revised Pantheon - Panteão Revisto. Proposta a concurso para a cidade de Marrakech. Autor FALA atelier, 2012. Fotomontagem
In http://www.falaatelier.com/revised-pantheon 56. Teatro del Mondo aportado no Canal Grande durante a Bienal de Veneza em 1979. Autor desconhecido, 1979. Fotografia.
In https://aftervinex.wikispaces.com/Watercity 57. Teatro del Mondo, alçados do projeto. Aldo Rossi, 1979. Autor Aldo Rossi, 1979. Desenho.
In Arquitetura e Arte. Ruínas Habitadas, Nº112 (Mar-Abr 2014), p.131-138. 58. Teatro del Mondo, plantas do projeto. Aldo Rossi, 1979. Autor Aldo Rossi, 1979. Desenho.
In Arquitetura e Arte. Ruínas Habitadas, Nº112 (Mar-Abr 2014), p.131-138. 59. Teatro del Mondo, esquiço referente ao projeto. Aldo Rossi, 1979. Autor Aldo Rossi, (s.d), Desenho.
In BRETON, Gaelle - Theatres. Paris: Editions du Moniteur, 1989, p.117. 60. Teatro del Mondo, fotografia da estrutura do edifício durante a sua montagem para a Bienal de Veneza. Aldo Rossi, 1979. Autor desconhecido, 1979. Fotografia.
In http://take-yoshi.tumblr.com/ 61. Teatro del Mondo, fotografia do teatro durante a Bienal de Veneza. Aldo Rossi, 1979. Autor desconhecido, 1979.
In http://archiobjects.org/aldo-rossi-theoretical-architecture/ 62. Teatro e Capela sobre a Água - maquete com os dois projetos e a sua relação com o curso de água preexistente. Tadao Ando, 1987. Autor Tadao Ando, 1987. Fotografia.
In DAL CO, Francesco - Tadao Ando. As obras, os textos, a crítica. Lisboa: Dina Livro, 2001, p.289. 63. Teatro sobre a Água - maquete com pormenores do projeto. Tadao Ando, 1987. Autor Tadao Ando, 1987. Fotografia.
In El Croquis. Tadao Ando 1983-1993, Nº 44+58 (1996), p.105. 64. Idem. 65. T-Hall, planta do piso térreo. Autor Toyo Ito, 1993. Desenho.
In El Croquis. Toyo Ito 1986-1995, Nº 71 (1995), p.174. 66. T-Hall, secção longitudinal, onde é possível observar-se a relação entre os três teatros. Autor Toyo Ito, 1993. Desenho.
In El Croquis. Toyo Ito 1986-1995, Nº 71 (1995), p.174. 67. T-Hall, maquete com pormenores do projeto. Autor Toyo Ito, 1993. Fotografia.
In El Croquis. Toyo Ito 1986-1995, Nº 71 (1995), p.173. 68. Idem. 69. Idem. 70. Casa da Música, fotografia de enquadramento do projeto e respetiva relação com a Rotunda da Boavista. OMA, 2005. Autor OMA, (s.d.), Fotografia.
In http://oma.eu/projects/casa-da-musica
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71. Casa da Música, fotografia do exterior e detalhes da fachada. OMA, 2005. Autor OMA, (s.d.), Fotografia.
In El Croquis. Oma 1996-2007, Nº 134/135 (2012), p.217. 72. Casa da Música, maquete com pormenores do projeto final. OMA, 2005. Autor OMA, (s.d.), Fotografia.
In El Croquis. Oma 1996-2007, Nº 134/135 (2012), p.227. 73. Casa da Música, conjunto de maquetes referenciais aos diferentes espaços do projeto. OMA, 2005. Autor OMA, (s.d.), Fotografia.
In http://oma.eu/projects/casa-da-musica 74. Casa da Música, fotografia do interior; possível apropriação das escadas como espaço de lazer e permanência. OMA, 2005. Autor Christian Richters, 2005, Fotografia.
In Arquitetura e Arte. Nº31 (Mai-Jun 2005), p.71. 75. Casa da Música, fotografia do interior; Sala Suggia. OMA, 2005. Autor desconhecido, (s.d.), Fotografia. In http://www.casadamusica.com/pt/ 76. Casa da Música, fotografia do interior; concerto na Sala Suggia. OMA, 2005. Autor OMA, (s.d.), Fotografia. In http://oma.eu/projects/casa-da-musica 77. Casa da Música, planta do quarto piso. OMA, 2005. Autor OMA, 2005, Desenho.
In http://www.archdaily.com.br/br/765378/casa-da-musica-oma 78. Casa da Música, planta do oitavo piso. OMA, 2005. Autor OMA, 2005, Desenho.
In http://www.archdaily.com.br/br/765378/casa-da-musica-oma 79. Casa da Música, secção longitudinal do auditório principal. OMA, 2005. Autor OMA, 2005, Desenho.
In http://www.archdaily.com.br/br/765378/casa-da-musica-oma 80. Casa da Música, secção transversal do auditório principal. OMA, 2005. Autor OMA, 2005, Desenho.
In http://www.archdaily.com.br/br/765378/casa-da-musica-oma 81. Philharmonic Hall, fotografia de enquadramento do projeto e respectiva relação com a envolvente preexistente. Barozzi Veiga, 2014. Autor Simon Menges, (s.d.), Fotografia.
In http://afasiaarchzine.com/2015/08/02-estudio-barozzi-veiga/ 82. Philharmonic Hall, fotografia do exterior; detalhes da fachada. Barozzi Veiga, 2014. Autor Barozzi Veiga, (s.d.), Fotografia.
In http://barozziveiga.com/web/project/#410 83. Philharmonic Hall, fotografia do interior; vista do átrio principal. Barozzi Veiga, 2014. Autor Barozzi Veiga, (s.d.), Fotografia.
In http://barozziveiga.com/web/project/#410 84. Philharmonic Hall, fotografia do interior; acessos e vista dos níveis superiores. Barozzi Veiga, 2014. Autor Simon Menges, (s.d.), Fotografia.
In http://afasiaarchzine.com/2015/08/02-estudio-barozzi-veiga/ 85. Philharmonic Hall, fotografia do interior; Sala Sinfónica. Barozzi Veiga, 2014. Autor Barozzi Veiga, (s.d.), Fotografia.
In http://barozziveiga.com/web/project/#410 86. Philharmonic Hall, fotografia do interior; detalhes da Sala Sinfónica. Barozzi Veiga, 2014. Autor Barozzi Veiga, (s.d.), Fotografia.
In http://barozziveiga.com/web/project/#410 87. Philharmonic Hall, fotografia do interior; Sala de Câmara. Barozzi Veiga, 2014. Autor Simon Menges, (s.d.), Fotografia.
In http://divisare.com/authors/10020012-barozzi-veiga
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88. Philharmonic Hall, fotografia do interior; concerto na Sala Sinfónica. Barozzi Veiga, 2014. Autor Simon Menges (s.d.), Fotografia.
In http://www.designboom.com/search-result/?q=barozzi%20veiga 89. Philharmonic Hall, planta do piso térreo. Barozzi Veiga, 2014. Autor Barozzi Veiga, (s.d.), Desenho.
In http://barozziveiga.com/web/project/#410 90. Philharmonic Hall, planta do primeiro piso. Barozzi Veiga, 2014. Autor Barozzi Veiga, (s.d.), Desenho.
In http://barozziveiga.com/web/project/#410 91. Philharmonic Hall, secção longitudinal. Barozzi Veiga, 2014. Autor Barozzi Veiga, (s.d.), Desenho.
In http://barozziveiga.com/web/project/#410 92. Philharmonic Hall, secção transversal. Barozzi Veiga, 2014. Autor Barozzi Veiga, (s.d.), Desenho.
In http://barozziveiga.com/web/project/#410 /05 OUTRA VEZ TE REVEJO LISBOA E TEJO E TUDO 93. Doca da Ribeira, Porto de Lisboa. Século XX. Autor desconhecido, (s.d.). Fotografia.
In Arquivo Municipal de Lisboa 94. Rua 24 de Julho, com o Mercado, ainda em recuperação após o incêndio de 1893, e respetiva feira que decorreu no aterro entre 1902 e 1927. Autor desconhecido, 19101940. Fotografia. In DIAS, Marina Tavares - Lisboa Desaparecida, vol.III. Lisboa: Quimera, 1992, p.126. 95. Rua 24 de Julho convertida em Avenida após a reconstrução do Mercado em 1930. Autor desconhecido, 1910-1940. Fotografia.
In DIAS, Marina Tavares - Lisboa Desaparecida, vol.III. Lisboa: Quimera, 1992, p.126. 96. Avenida 24 de Julho, e respetiva organização viária. Autor desconhecido, 1910-1940. Fotografia. In DIAS, Marina Tavares - Lisboa Desaparecida, vol.III. Lisboa: Quimera, 1992, p.127. 97. Estação da Rocha Conde d’Óbidos, 1935. Autor desconhecido, 1910-1940. Fotografia.
In DIAS, Marina Tavares - Lisboa Desaparecida, vol.III. Lisboa: Quimera, 1992, p.135. 98. Vista aérea da Avenida 24 de Julho e da zona que ficou conhecida por Cais do Gás, sendo visível o edifício neogótico da Fábrica do Gás construído em 1865 por J. Eduardo Arhends. Autor desconhecido, (s.d.). Fotografia.
In DIAS, Marina Tavares - Lisboa Desaparecida, vol.III. Lisboa: Quimera, 1992, p.128. 99. Maquete para apresentação da nova Sede da EDP, com representação do plano para a zona Nascente do Aterro. Autor Ordem dos Arquitetos, 2010. Fotografia.
In https://www.flickr.com/photos/oasrs/albums 100. Planta gráfica do Plano de Pormenor para o Aterro da Boavista, realizado por J. L. Carrilho da Graça em 2008. Autor Ordem dos Arquitetos, 2010. Fotografia.
In https://www.flickr.com/photos/oasrs/albums 101. Relação do Plano de Pormenor com o desenho dos antigos boqueirões. Autor Ordem dos Arquitetos, 2010. Fotografia.
In https://www.flickr.com/photos/oasrs/albums 102. Antigo armazém industrial. Imagem da autora, 2015. Fotografia. 103. Barcos de Pesca no Cais da Ribeira. Autor Horácio Novais, 1930-1980. Fotografia.
In https://www.flickr.com/photos/biblarte/albums
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104. Venda de peixe no Cais da Ribeira. Autor Horácio Novais, 1930-1980. Fotografia.
In https://www.flickr.com/photos/biblarte/albums 105. Varinas à espera do peixe no Cais da Ribeira. Autor Horácio Novais, 1930-1980. Fotografia.
In https://www.flickr.com/photos/biblarte/albums 106. Descarga do peixe no Cais da Ribeira. Autor Arnaldo Monteiro Madureira, (s.d.). Fotografia.
In AA.VV. - Lisboa Ribeirinha. Lisboa: Livros Horizonte, 1994. 107. Antigo ancoradouro. Imagem da autora, 2015. Fotografia. 108. Apropriação dos cais. Imagem da autora, 2015. Fotografia. 109. Relação cais-água. Imagem da autora, 2015. Fotografia. 110. Relação armazém-cidade. Imagem da autora, 2015. Fotografia. 111. Antiga estrutura industrial. Imagem da autora, 2015. Fotografia. 112. Maquete da Cidade de Lisboa anterior ao terramoto, onde se pode ver no canto inferior esquerdo a zona do Palácio Real, e a Ópera do Tejo em frente à Ribeira das Naus. Autor desconhecido, (s.d.). Fotografia. In ANTUNES, Eduardo - Ópera do Tejo. Investigação e reconstituição Tridimencional. Lisboa, 2015. Dissertação de Mestrado em Arquitetura, apresentada à Universidade de Lisboa. 113. Um Lugar para a Música. Imagem do pontão onde se pretende intervir através de uma nova identidade cultural. Imagem da autora, 2015. Fotografia. 114. Esquema conceptual do Projeto. Do Lugar ao Ícone. Imagem da Autora, 2015. Desenho. 115. Meeting. Autor James Turrell, Skyspaces, 1980. Fotografia.
In http://jamesturrell.com/work/type/skyspace/ 116. Revised Outlook. Autor James Turrell, Skyspaces, 2005. Fotografia.
In http://jamesturrell.com/work/type/skyspace/ 117. Auditório do Tejo, perspetiva urbana do conjunto edificado. Imagem da autora, 2016. Modelo tridimensional. 118. Auditório do Tejo, vista aérea da proposta urbana. Imagem da autora, 2016. Modelo tridimensional. CONSIDERAÇÕES FINAIS 119. Músicos no pontão. Imagem da autora, 2015. Fotografia.
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A CIDADE E O RIO
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
1. Villa Le Lac, Suiça. Le Corbusier 1922-1924.
“Mar sonoro, mar sem fundo, mar sem fim. A tua beleza aumenta quanto estamos sós E tão fundo intimamente a tua voz Segue o mais secreto bailar do meu sonho. Que momentos há em que eu suponho Seres um milagre só para mim.” Sophia de Mello Breyner, Mar Sonoro
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INTRODUÇÃO
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2. A Cidade e o Rio. Imagem da autora, 2015.
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INTRODUÇÃO
A cidade e o rio são elementos essenciais da identidade de Lisboa, compondo a permanente dualidade entre terra e estuário. Ao centrarmo-nos numa cidade que viveu, vive e viverá em torno de água, é natural que este fator tenha influenciado toda a sua evolução. Ainda que não se saiba totalmente o que constituiu os usos mais remotos referentes ao estuário do Tejo, é evidente como a morfologia da cidade de Lisboa se encontra profundamente relacionada com a forma do mesmo. Tendo sido de igual modo responsável pelas suas intensas atividades de trocas comerciais, dando origem ao aparecimento dos diversos cais espalhados por toda a margem delineadora, e a uma frente ribeirinha maioritariamente designada como “porto de Lisboa”. Este confronto entre cidade e paisagem de água influenciou criteriosamente o planeamento moderno dos séculos XIX e XX. Contudo, na maioria das cidades portuárias, numa fase pós-industrial, uma descaracterização de extensos territórios, acabou por surgir frequentemente, onde o consequente abandono e desfuncionamento das áreas destinadas ao porto, ditaram ainda mais o declínio de algumas cidades. Como estratégia de intervenção, na maioria dos casos, a valorização da identidade do lugar assume um importante significado, uma vez que nestas cidades as características sociais, territoriais, e acima de tudo, histórico-culturais, possuem um valor igualmente presente sendo a base construtiva das mesmas. A questão cultural acaba por ser algo deveras importante, uma vez que os novos planos não podem servir apenas uma nova ideia de turismo, mas acima de tudo a população que habita e vive estes espaços. Surge então um novo contexto, onde as intervenções fundamentam-se pela preservação de edifícios históricos e, acima de tudo, pela criação de novos elementos icónicos, uma vez que possuem a capacidade de
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A CIDADE E O RIO
transformarem-se em catalisadores dentro da requalificação urbana, tornando os espaços em que se inserem mais atrativos e porventura mais interessantes. No fundo, em possíveis centralidades, que se caracterizam maioritariamente por novas funções urbanas dedicadas ao lazer, e por uma valorização patrimonial e cultural. Não sendo Lisboa a excepção à regra, torna-se fundamental compreender de que forma um contacto mais direto com o seu rio, poderá impulsionar a mesma, uma vez que o Tejo sempre constituiu uma positiva força no passado, e que poderá continuar também a sêlo no futuro. Deste modo, este trabalho tem como principal motor de ideias, a especulação de um possível regresso à margem, pela inserção da componente icónica no lugar da Frente Ribeirinha de Santos, que individualmente exerce funções presentes da Administração do Porto de Lisboa, representando ainda uma zona de património industrial, e uma vasta área territorial por desenvolver.
3. Ícones de Lisboa. João Ferrand, 2003.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
1.1 | ENQUADRAMENTO E OBJETIVOS
O presente trabalho assume a possibilidade de uma intervenção de carácter arquitetónico no aterro junto à linha de água compreendido entre a Rocha Conde d’Óbidos, onde se encontram as atuais instalações da Administração do Porto de Lisboa, e a estação ferroviária e metropolitana do Cais do Sodré, que perfaz em termos jurídicos uma intervenção na frente-rio da freguesia da Estrela, antiga freguesia de Santos-o-Velho, da cidade de Lisboa. Tendo de igual modo, como estruturas de relevo na proximidade, a Avenida 24 de Julho, a Avenida D. Carlos I, a Avenida Brasília a Calçada Ribeiro Santos, o aterro da Boavista, o Museu Nacional de Arte Antiga e o Largo de Santos. A frente-ribeirinha em questão, apresenta-se como uma área privilegiada face à sua proximidade com o rio, porém, isolada, descaracterizada, e sobretudo desintegrada no contexto urbano, face à elevada presença de armazéns devolutos e à inexistência de atividades que suscitem um interesse público duradouro. Constituindo-se enquanto zona estagnada da cidade, representa uma oportunidade única de consolidar a iniciativa de unificar todos os pontos de interesse junto ao rio, que a cidade tem vindo a desenvolver ao longo dos anos. Nesse sentido, A Cidade e o Rio. Um Ícone na Frente Ribeirinha de Santos surge como a possibilidade de intervir num território, com importância histórica e patrimonial, através de um elemento arquitetónico que aumente a sua valorização urbana e que enquadre as especificidades relacionadas com o seu passado portuário. Pretende-se criar uma proposta a nível urbano e territorial para a zona delimitada, mas sobretudo, a implantação de um edifício caracterizado pela sua polivalência enquanto elemento icónico, como estratégia intermediária para a possível revitalização e regeneração do lugar, possibilitando a restruturação geral dos equipamentos ainda presentes, e o desenvolvimento de todos os espaços envolventes. No fundo, como um catalizador para a dinamização do património industrial e cultural, caraterístico da zona de Santos que permanece ainda separado ou mesmo alienado, da naturalidade das funções do dia-a-dia da cidade.
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A CIDADE E O RIO
Com o presente trabalho pretende-se também, devolver a frente ribeirinha às pessoas e à cidade, através da criação de uma composição projetual final que estabeleça com coerência todas as intenções elaboradas e propostas. Tendo como questão de partida, a interrogação sobre se uma intervenção de revitalização junto ao rio Tejo, através de um equipamento cultural, poderá criar uma nova centralidade à escala da cidade, integrando a arquitetura do passado com a do presente, o trabalho possui, por sua vez, um conjunto de objetivos gerais e objetivos específicos. Os objetivos gerais são compostos por premissas teóricas e estão maioritariamente relacionados com um trabalho à escala da cidade. Pretendem definir o quadro conceptual e o âmbito do estudo. - Analisar as componentes que definem um edifício enquanto construção arquitetónica portadora de iconicidade. - Aprofundar todos os conceitos mais relevantes, relacionados tanto com frentes ribeirinhas, como com intervenções baseadas numa nova identidade cultural e social. - Estudar o processo de desenvolvimento e evolução da frente ribeirinha de Lisboa. - Compreender a composição preexistente e o seu papel na cidade. - Identificar lógicas de intervenção semelhantes, para zonas em contacto com o rio. Os objetivos específicos, centram-se nas preocupações e intenções ao nível do projeto que visam qualificar a proposta enquanto um todo, e o seu correto enquadramento no lugar. Promovendo uma proposta de revitalização do lugar com o intuito de o devolver às pessoas e à cidade. - Conferir um novo valor e uma nova presença ao porto de Lisboa. - Requalificar as preexistências, respeitando a sua memória no lugar. - Garantir a integração do elemento icónico sem comprometer o meio envolvente. - “Devolver a música ao Tejo”, sob inspiração da outrora existente Ópera do Tejo. - Criar zonas de lazer e passeio, compostas por programas que elevem o local ao nível de uma centralidade, com o fim de atrair utentes de todas as faixas etárias.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
1.2 | METODOLOGIA
O processo de trabalho que suporta o presente estudo, é composto por uma metodologia de estudo de caso, com uma abordagem qualitativa, procurando-se mobilizar técnicas e métodos que visam compreender o fenómeno em causa, tanto na sua globalidade como na sua multiplicidade dimensional. Tendo sido elaborado inicialmente a partir de conceitos gerais, partindo a posteriori para a escala da cidade, e por fim, para uma lógica projetual composta por princípios mais específicos e objetivos. Para o efeito, a sua organização pode ser compreendida da seguinte forma: - Definição do quadro conceptual e do âmbito do estudo, através de pesquisa e recolha bibliográfica, visando uma base consolidada da estrutura de investigação. - Pesquisa e análise de documentos históricos, assim como, leitura de cartas, planos e regulamentos. - Levantamento urbano e levantamento in situ. Investigação e reconhecimento das preexistências, em conjunto com observação direta através de esquiços e fotografias. - Investigação de casos de estudo com estrutura e contexto semelhantes, pertinentes à componente teórica e prática do trabalho. - Argumentação de projeto, pela elaboração de desenhos conceptuais, esquemas, um programa, uma proposta de desenho urbano, e uma proposta de anteprojeto. - Determinação das conclusões finas do trabalho realizado. - Elaboração da proposta arquitetónica final, como sistematização e reflexo dos conceitos aprofundados e encerramento da componente teórica desenvolvida.
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A CIDADE E O RIO
1.3 | ESTRUTURA E ORGANIZAÇÃO
A estrutura do trabalho que se pretende apresentar, é composta essencialmente por uma componente teórica e uma componente prática, estando ambas organizadas da seguinte forma: - A componente teórica pretende credibilizar a execução da proposta de projeto como solução arquitetónica adotada, enquanto demonstração da investigação e raciocínio efetuados no decorrer do processo de trabalho. Corresponde essencialmente aos capítulos Arquitetura com(o) Expressão, Imagem de uma Cidade, e por fim, Casos de Estudo. Num primeiro momento, desenvolver-se-á uma introdução à temática do ícone e como influencia o conceito de imagem da cidade, sendo realizada, posteriormente, uma abordagem à definição de edifício icónico, e às variantes positivas que este paradigma pode alcançar, tornando-se numa qualitativa estratégia de projeto. Num segundo momento, uma contextualização histórica e evolutiva sobre as particularidades comuns que definem as cidades portuárias terá como finalidade delimitar as especificidades referentes à cidade de Lisboa e consequente frente ribeirinha. Por fim, num terceiro momento, será apresentado o conjunto de casos de estudos selecionados que, por sua vez, possuem como objetivo, ilustrar algumas das diretrizes e conceitos desenvolvidos na investigação temática, assim como representar exemplos práticos de arquitetura considerados como relevantes e importantes ao desenvolvimento do trabalho final. Os exemplos aprofundados são bastante distintos entre si, procurando conhecer e compreender diferentes tipos de identidade, pensamento, abordagem ou intervenção. Sendo que alguns se encontram focados na ideia conceptual enquanto mote de trabalho, e outros nas condições reais que definem e moldam a própria concepção em si. Do conceito ao lugar ou da ideia à arquitetura, todos constituem parte fundamental da longa linha de pensamento que constrói a componente prática do trabalho de projeto. - A componente prática pretende comprovar a proposta arquitetónica como resultado do entendimento e da reflexão realizados a partir do aprofundamento temático proveniente da componente teórica.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
Corresponde ao capítulo Outra vez te revejo Lisboa e Tejo e tudo. Será abordado o exercício prático de projeto enquanto solução arquitetónica adotada. Este capítulo estará dividido em dois pontos distintos, estando o primeiro relacionado com a apresentação e a análise do lugar onde se pretende intervir, e o segundo com a representação do desenho de arquitetura resultante da reflexão teórica realizada no decorrer do presente trabalho, notabilizando o projeto prático proposto, descrevendo-se as suas diretrizes, argumentos, e particularidades espaciais e formais. Visando uma melhor compreensão da investigação temática e sua aplicabilidade na proposta prática de projeto, cada capítulo apresentado, possui uma nota introdutória e uma síntese final dos conceitos específicos tratados no momento. Sendo que, posteriormente, é realizado um conjunto de considerações finais como conclusão delineadora do presente Projeto Final de Mestrado. Possui de igual modo um conjunto de anexos com conteúdo de informação complementar. Em conclusão, A Cidade e o Rio. Um Ícone na Frente Ribeirinha de Santos, enquanto tema do Projeto Final de Mestrado, pretende interpretar um conjunto de conceitos teóricos que visam uma aplicabilidade prática da compreensão formal do edifício icónico enquanto sistema comum agregador e revitalizador da cidade de Lisboa, que por si só já é composta e delineada por um conjunto de edifícios icónicos que imperam junto à margem, e onde o rio também assume uma relação de iconicidade com a cidade. Por fim, o presente trabalho foi redigido segundo o atual Acordo Ortográfico, tendo sido utilizada a Norma Portuguesa 405 enquanto norma de referenciação bibliográfica.
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ARQUITETURA COM(O) EXPRESSÃO
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4. A Deposição do Olhar por Renato Rizzi; Modelo tridimensional da cobertura do Panteão de Roma.
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ARQUITETURA COM(O) EXPRESSÃO
“My buildings will be my legacy...they will speak for me long after I’m gone"1. O Homem diferencia-se dos animais, em parte, pela sua capacidade de produzir símbolos com o fim de transformar o ambiente em que vive. Como tal é naturalmente um ser simbólico2, sendo-lhe inerente que a sua cultura corresponda a um conjunto de formas simbólicas, onde o mesmo coloca a sua experiência na tentativa de a tornar intermutável. Mais natural ainda, é ter utilizado desde o início da sua existência a arquitetura enquanto construção e imagem, como forma de repercutir os seus pensamentos e ideias. Acima de tudo, como mecanismo para se expressar e para comunicar. Transformando, assim, a arquitetura numa segunda linguagem evidentemente eficaz, mesmo sem o uso de palavras. Umberto Eco, um dos primeiros filósofos a considerar a arquitetura como um sistema de comunicações, afirma que a mesma é capaz de comunicar a função que lhe é inerente, mas também é capaz de a comunicar, se esta não estiver explícita. Segundo o autor, é possível afirmar que a arquitetura pode significar de duas formas. Ou seja, o objecto arquitetónico pode ter duas funções. A primeira, composta por uma significação não intencional, onde o objecto permite acima de tudo a função a que se destina. A segunda, direcionada para um outro conjunto de características que o compõem para lá da sua função, e que permite distinguir de um outro objecto do mesmo tipo. 1 MORGAN, Julia. Cit. por LEWIS, Anna - Women of steel and stone: 22 inspirational Architects, Engineers and Landscape Designers. 2014, p.41. “Os meus edifícios serão o meu legado... Falarão por mim mesmo depois de eu já ter partido” (livremente traduzido pela autora). 2
ECO, Umberto - O Signo. 1977, p.127.
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“Quando olho uma janela na fachada de uma casa, não penso o mais das vezes, na sua função; penso num significado-janela, que se baseia na função, mas que a absorveu a um ponto de eu poder esquecê-la e ver a janela em relação a outras janelas como elementos de um ritmo arquitetónico; (...) Mas a forma dessas janelas, seu número, sua disposição na fachada (óculo, seteira, curtain walls, etc.) não denotam apenas uma função; remetem a certa concepção do habitar e do usar; conotam uma ideologia global que presidiu à operação do arquitecto: arco de volta inteira, ogiva, arco duplo funcionam como suportes e denotam essa função, mas conotam modos diferentes de conceber a função. Começam a assumir função simbólica” 3. Tomando como exemplo, a "famosa janela poente"4 do Convento de Cristo, podemos constatar que a mesma encontra-se ladeada por dois contrafortes, exercendo claramente a função primária de uma janela. É igualmente composta por uma exuberante figuração e valorização litúrgica, onde estão presentes a temática da marinha, da Ordem de Cristo e sobretudo da iniciativa manuelina, através da representação de elementos naturais, artefactuais e heráldicos, como o sobreiro, as cordas, as correntes, a cruz heráldica, a esfera armilar ou o brasão do reino. Esta janela, encontra-se assim, guarnecida por uma ornamentação específica e simbólica, que de algum modo dissimula as suas funções estruturais e arquitetónicas, pois é pelo seu carácter escultórico que é reconhecida. Deste modo, a função secundária é composta por características que não são físicas, mas sim sígnicas. O que, de acordo com Umberto Eco, em certos casos, é a que tende por prevalecer. Atenuando ou mesmo eliminando, quase tudo o que diz respeito à função primária. Contudo, coloca-nos igualmente perante um sistema de signos, que se torna necessário compreender, face ao papel que a expressividade e a imagem podem adquirir na arquitetura, conferindo aos edifícios iconicidade, ou o estatuto de icónico.
3
ECO, Umberto - A Estrutura Ausente, 7ª ed. 1997, pp.198 e 199.
PEREIRA, Paulo - Arte Portuguesa. História Essencial. 2011, p.452. Monumento emblemático da cidade de Tomar, classificado como património mundial. Encomendado por D. Manuel governador da Ordem de Cristo, a Diogo de Arruda e João de Castilho em 1510, já com o objetivo de “engrandecer o estabelecimento tomarense”, e considerado até aos dias de hoje como um dos maiores exemplos da arquitetura Manuelina. Constituindo ainda exemplo vivo da elevada complexidade de um pensamento iconológico e de uma elevada precisão de programação iconográfica, enquanto conjunto simbólico de elevado impacto para a sua época e não só. 4
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5. Janela da sala do Capítulo, Convento de Cristo, Tomar. Diogo de Arruda e João de Castilho, 1510-1515.
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2.1 | SIGNO, ÍCONE E IMAGEM
A Semiótica corresponde à disciplina que estuda a teoria e filosofia dos signos, focando-se na precisão da relação entre os mesmos e o discurso correspondente. Fundamentalmente, um signo é o elemento chave de um processo de comunicação. Onde o mesmo é composto por um emissor, uma mensagem, e um destinatário. Sendo que a mensagem, equivale por sua vez ao signo. Porém, segundo Umberto Eco, a sociedade utiliza os signos "para comunicar, informar, mentir, enganar, dominar e libertar"5, transformando, na maioria dos casos, a mensagem numa organização complexa de muitos signos. Situação que conduz à necessidade da existência de um código comum, para um eficaz processo comunicativo. Ou por outras palavras, da existência de um conjunto de regras que atribui aos signos um significado. Consequentemente, o autor defende que o signo não é somente um elemento de um processo de comunicação, pois constitui também uma entidade de um processo de significação e representação. Esta vertente temática mais complexa, considera que o signo não representa a totalidade de um objecto, pois representa-o a partir de um certo ponto de vista ou com o fim de um certo uso prático. Recorrendo aos trabalhos de Charles Peirce6, Umberto Eco acrescenta ainda a ideia, de que o termo em si corresponde a alguma coisa (significante), que está em lugar de outra (referente), para alguém ou aos olhos de alguém (significado). Defendendo que existem diferentes formas de considerar o signo. Nomeadamente em relação àquilo que significa; enquanto elemento que compõe sequências de outros signos; e por fim, pelos efeitos causados no destinatário, e pelos usos que dele se fazem. Sendo que, à posteriori, podem ser validamente classificados e distinguidos. Como foi mencionado anteriormente, o filósofo afirma que, um signo possui um tipo de ligação pressuposta com o objecto a que se refere.
5
ECO, Umberto - Op. Cit., 1977, p.24.
PEIRCE, Charles Sanders - Collected Papers. 1931-1935. (Filósofo que teorizou sobre semiótica. Entre outros autores, os seus resultados constituem base ás várias premissas de Umberto Eco).
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
Todavia, a noção de objecto em si pode constituir uma entidade física, mas também um acontecimento ou acção. Independentemente da natureza do mesmo, podem existir por conseguinte, três tipos de signos: o símbolo, o índice, e o ícone. O símbolo, constitui um signo arbitrário já que a relação que estabelece é definida por uma lei específica. O índice, consiste num signo que possui uma ligação física e direta. Por sua vez, o ícone equivale a um signo que possui uma relação de semelhança entre um significante e o respectivo referente. Ou seja, que possui determinadas características e propriedades intrínsecas do objecto com que se relaciona. São ícones, uma fotografia, um desenho, um diagrama, mas também uma fórmula lógica, e sobretudo uma imagem mental. Podendo então assumir-se o conceito de imagem, como uma subcategoria do ícone. E que algo é icónico, quando se refere à imagem enquanto signo. A origem dos ícones remonta às máscaras funerárias da Antiguidade greco-romana, sendo que a própria palavra em si, deriva do grego eikonion, significando pequena imagem7. Na tradição da Igreja Cristã Oriental, as imagens de culto valiosas, utilizadas para a representação de Cristo, da Virgem e de santos, eram também consideradas ícones. No entanto, é justificado afirmar-se que o campo da imagem nem sempre é claro, podendo ser constituído tanto por uma imagem fidedigna como pela imagem que o objecto pretende dar de si próprio. Para elaborar um signo icónico, é necessário então, um reconhecimento cultural do objecto a que o signo se refere8. Pois não se torna icónico, um objecto que não esteja definido segundo determinados atributos, devidamente reproduzidos e perceptíveis, entre os traços de reconhecimento e os traços gráficos utilizados para os demonstrar.
“Na nossa mente são repertoriadas, não as coisas, mas sim as suas imagens conceptuais, de maneira que produzir uma representação visual, significa relacionar uma ou mais imagens conceptuais”9.
7
AA.VV. - Nova Enciclopédia Larousse, vol.12. 1998, p.369.
8
ECO, Umberto - Op. Cit., 1977, p.73.
9
AA.VV. - Enciclopédia Eunaudi, vol.31 Signo. 1994, p.178.
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Relembrando que o ícone pode ser uma imagem mental, e que esta tende a ser qualitativa pois representa determinadas qualidades do objecto como forma, textura ou cor, é normal que um processo de raciocínio seja realizado através do mesmo. Ou seja, a noção de ícone poder ser de facto aplicada ao que reconhecemos como signos icónicos, porque os ícones mentais são construídos pela mente com o objectivo de coordenar experiências presentes, com base em experiências anteriores. Imitando uma forma ou talvez uma cor, sem na realidade proporcionar os aspectos tácteis do objecto. Desta forma, um signo icónico acaba por não ser uma reprodução do real, pois apenas existe no campo da consciência. Referindo-se apenas, a um determinado objecto culturalizado que surge acima de tudo pela imagem mental que gera. Esta relação entre raciocínio e imagem, é facilmente perceptível quando tomamos como exemplo a obra Mona Lisa10. Enquanto um dos quadros mais famosos do mundo, possui estatuto de ícone cultural. Sendo sucessivamente utilizado em reproduções e utilizações publicitárias. Constituindo, porventura, uma referência no contexto de um processo de reconhecimento automático, mesmo para os que porventura não sabem quem é Leonardo Da Vinci, em que consiste o Renascimento, ou onde fica o Museu do Louvre. A iconicidade tem assim como base, uma eficaz relação visual entre a forma do pensamento e a forma gráfica. Construída por um conjunto de códigos precisos, uma vez que a representação por imagens não consiste numa transferência, mas sim numa operação de selecção. Em suma, nos signos visuais apenas alguns caracteres dos objectos são transmitidos, e a relação entre imagem e objecto, é concebida por certos pontos de vista que se consideram ser mais pertinentes em detrimento de outros, classificados como pouco relevantes ao objectivo comunicativo11. Consequentemente, problematiza um outro factor importante, que é a relação que os signos, e as imagens subentendidas, estabelecem com a realidade prática do dia-a-dia.
Possui como nome original La Gioconda, sendo a obra mais emblemática do seu autor e do período do Renascimento Italiano. Encontra-se presentemente no Museu do Louvre em Paris, onde é uma das maiores atrações turísticas. Quer pela recorrente "batalha" entre França e Itália sobre quem deve possuir o quadro, quer pelas inúmeras tentativas de destruição ou mesmo a interrogação constante sobre quem é a mulher de olhos misteriosos representada, a obra acabou por se tornar muito popular e extremamente conhecida.
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AA.VV. - Enciclopédia Eunaudi, vol.31 Signo. 1994, p.179.
6. La Gioconda, pormenor da pintura a óleo original executada por Leonardo Da Vinci em 1503-1507. A eterna questão sobre quem é a personagem feminina pintada por Leonardo Da Vinci, eternizou o quadro como icónico para os amantes da arte e não só. O próprio artista Andy Warhol, realizou um conjunto de serigrafias com a imagem de Mona Lisa, semelhantes ás realizadas com o retrato de Marilyn Monroe. Mais recentemente, a pintura adquiriu um novo nível de destaque, ao possuir um importante papel na obra literária de grande sucesso de Dan Brown, O Código Da Vinci. Posteriormente adaptada na tela cinematográfica.
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2.2 | IMAGENS CONSTRUÍDAS
A cidade é uma construção no espaço, que não surge como objecto único, mas como produto de várias operações. Vivendo da interação constante entre os seus elementos físicos e as pessoas que os habitam. Do mesmo modo, a percepção de cidade surge de forma fragmentária, influenciada por um distinto conjunto de elementos, mas acima de tudo, pela participação de todos os sentidos inerentes ao homem. No fundo, é como resultante da aplicação dos mesmos, que surge a imagem, ou principalmente, a imagem de um meio ambiente. Esta ideia de imagem mental, em relação ao mundo exterior, tem um papel fundamental no contexto citadino, pois torna-se num mecanismo de legibilidade crucial à habitabilidade. As imagens são produzidas quer de percepções imediatas, quer de memórias já vividas. Contudo, é pela necessidade de conhecimento e de reestruturação do espaço envolvente, que as mesmas acabam por adquirir grande relevância prática, mas também emocional12. Permitindo, um deslocamento e uma orientação, mas sobretudo estruturas envolventes de referência.
“A cidade é potencialmente o símbolo poderoso de uma sociedade complexa. Se for bem desenvolvida do ponto de vista óptico, pode ter um forte significado expressivo”13. Ao descrever uma cidade, tendemos a mencionar exclusivamente a sua forma como uma espécie de dado concreto14. No entanto, a cidade não é só algo sob si mesma, mas também o objeto de percepção dos seus habitantes. Dado que, é pelas imagens claras potenciadas pelas estruturas físicas, que o homem é capaz de reconhecer as cidades, e constituir assim um conjunto de memórias coletivas próprias de uma sociedade. No seguimento do mesmo pensamento Kevin Lynch afirma, que a imagem de um meio ambiente, pode por isso, ser analisada em três componentes.
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LYNCH, Kevin - A Imagem da Cidade. 1982, p.14.
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LYNCH, Kevin - Op. Cit., 1982, p.15.
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ROSSI, Aldo - A Arquitectura da Cidade. 2001, p.43.
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Em primeiro lugar, pela sua identidade, pois um determinado objeto deve ser reconhecido pela sua distinção face a outros. Mais precisamente, pela sua individualidade e particularidade, tanto pela cor, como pela forma ou disposição. Em segundo lugar, pela sua estrutura, dependendo da relação que estabelece com o observador e com os restantes objetos. Por último, pelo seu significado, uma vez que o objeto deve possuir uma relação prática e emocional com o observador, diferente da espacial ou estrutural que já possui à partida. Interessando salientar, ainda assim, os atributos da identidade pois são eles os responsáveis pelos elementos qualitativos que permitem ao objeto físico evocar uma imagem forte num determinado observador, ou seja, por aquilo que o autor define como imaginabilidade15. De acordo com Kevin Lynch, são essas qualidades que facilitam a produção de imagens. Isto porque, as mesmas assumem-se como elementos marcantes da cidade. Constituindo pontos de referência, que se distinguem perante os restantes elementos funcionando assim como indicadores urbanos. Por conseguinte, é passível de se reunir o conjunto das características chave dos então denominados, pelo autor, como elementos marcantes. Nomeadamente, a originalidade pois tornam-se mais fáceis de identificar quando contrastam com o cenário a que pertencem; a atividade, uma vez que também o uso associado a um elemento pode fazer dele contrastante; a escala e posição, pois se forem visíveis apesar de distantes, desempenham um importante papel orientador na linha de horizonte; e por fim, a associação história ou outros significados simbólicos, que podem advertir como ato de mimésis16. Contudo é neste último aspecto, que se pode encontrar uma possível desvantagem da imaginabilidade. Uma cidade carregada de imagens que se valem somente pelo significado, inibindo as atividades reais da mesma.
15 “Uma cidade altamente imaginável (aparente, legível ou visível), neste sentido particular, pareceria muito bem formada, distinta, notável; como que convidaria os olhos e os ouvidos a uma maior atenção e participação. O domínio estético de tal ambiente não só se simplificaria como também aumentaria e se tornaria mais profundo. Uma tal cidade poderia ser compreendida para além do tempo como um modelo de grande continuidade, com numerosas partes distintas interligadas claramente." LYNCH, Kevin - Op. Cit., 1982, p.20.
Termo utilizado por Aristóteles, para designar a sua teoria de que todas as manifestações artísticas são imitação da natureza.
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Embora se pretenda obviamente “imagens vivas”, também se pretende que estas imagens sejam evocadas pela adaptabilidade ás necessidades práticas atuais, desenvolvendo novos agrupamentos e significados. Porque no fundo, “a cidade não está construída apenas para um indivíduo, mas para grandes quantidades de pessoas”17.
7. Plan Voisin, elaborado por Le Corbusier para a cidade de Paris em 1925. O mesmo representava, o que segundo o arquiteto, seria a imagem de uma cidade contemporânea ideal e o “espírito de uma época”.
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LYNCH, Kevin - Op. Cit., 1982 p.123.
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2.3 | MONUMENTO VS. MONUMENTALIDADE
Convencionalmente pensamos nos monumentos como nos principais elementos marcantes de uma cidade. Assemelham-se sempre a um universo cultural, estando presentes nas mais variadas formas em quase todas as sociedades. Possuindo de igual modo, os mais distintos significados e presenças urbanas, já que à partida não se encontrarão dois monumentos iguais em lugares distintos do mundo.
“A cidade é um facto natural como uma gruta, um ninho, um formigueiro. Mas é também uma consciente obra de arte, e inclui na sua estrutura colectiva muitas formas de arte mais simples e mais individuais. O pensamento toma forma na cidade; e por sua vez as formas urbanas condicionam o pensamento. Porque o espaço, não menos que o tempo, é engenhosamente reorganizado nas cidades. (...) Juntamente com a linguagem, é talvez a maior obra de arte do homem”18. Esta concepção de cidade, considera a especificidade do monumento diretamente relacionada com a ação sobre a memória que visa recordar o passado. Aquele que, enquanto artefacto construído por uma comunidade de indivíduos, serve para recordar ou fazer recordar momentos, pessoas ou mesmo crenças19. Similarmente, como as “imagens vivas” que Kevin Lynch aborda enquanto pontos de referência, mas que neste caso funcionam acima de tudo para preservar diferenciados níveis de identidade, ao constituírem uma espécie de garantia de origens. De igual modo, o monumento para além de obra de arte, assume-se também como fato urbano20, sempre ligado a um lugar específico, a um acontecimento, e a uma forma de cidade. Sobretudo, assume-se como característica da imaginação e da memória coletiva proveniente de uma sociedade. Podendo remeter quer para o valor do passado, quer para a grandiosidade do mesmo. Tome-se como exemplo, as pirâmides do Egito ou o Coliseu de Roma.
22
18
MUMFORD, Lewis. Cit. por ROSSI, Aldo - Op. Cit., 2001, p. 46.
19
CHOAY, Françoise - A Alegoria do Património. 2010, p.17.
20
ROSSI, Aldo - Op. Cit., 2001, p. 49.
UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
“Cada um destes fragmentos, da pré-história até hoje, tem uma história. Constitui um lugar antropológico, identitário, relacional e histórico. O nosso povo vai chamando, e bem, Lugar, a cada um destes fragmentos que, como sabemos, não são realidades estáticas mas em contínuo processo de transformação”21.
em cima 8. Pirâmides de Gizé, Egito. em baixo 9. Coliseu de Roma, Itália. Tito Flávio Sabino Vespasiano, 68-79 d.C.
21 COSTA, Alexandre Alves - Lugares praticados versus Lugares de Memória. Revista Património. Nº1 (Nov 2013), p.12.
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A CIDADE E O RIO
10. Torre Eiffel, Paris. Gustave Eiffel, 1889.
“Nós, escritores, pintores, escultores e arquitetos, fervorosos apaixonados, até à data, da beleza incólume de Paris (...) protestamos contra a construção da desnecessária e colossal Torre Eiffel no coração da nossa capital. (...) Para percebermos o que aí vem, imaginemos por uns instantes uma vertiginosa e ridícula torre que se eleva sobre Paris como uma gigantesca e sombria chaminé de uma fábrica, imaginemos a humilhação de todos os nossos monumentos, de todos os nossos edifícios encolhidos, a serem submergidos por este pesadelo”. GARNIER, Charles; HUYSMANS, JorisKarl; ZOLA, Émile in jornal Le Temps. Cit. por PADBERG, Martina - Paris, Arte e Arquitectura. 2008, p.327.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
Com o passar do tempo, o valor da memória acaba por ser negligenciado face a um conjunto de valores estéticos e de prestígio. Onde já não importa caracterizar o monumento como a grande construção dos reis daquele lugar, mas sim como o monumento ilustre, soberbo ou mais distinto. A palavra monumento aplicada às obras de arquitetura, segundo Françoise Choay, remete consequentemente tanto para o edifício construído para eternizar algo, como para o agente de embelezamento e magnificência nas cidades22. Sendo que, sob esta segunda relação, a ideia de monumento passa a fazer referência maioritariamente ao “efeito” do edifício. Esta questão do efeito, suscita uma nova problemática: o edifício enquanto afirmação de uma nova identidade, que se assume pela ideia de poder, grandeza ou beleza. Por outras palavras, substancialmente, pela promoção à sensibilidade estética e pela admiração provocada pela inovação ou mestria técnica demonstrada, como é caso, a Torre Eiffel ou a Pirâmide do Louvre. No seguimento deste pensamento, estamos perante um novo conceito de monumento. O monumento sem passado, como define a autora. Este, ao contrário do monumento histórico que não tem na sua origem um destino memorial possuindo-o apenas pelo seu testemunho e estatuto histórico, é uma criação deliberada cujo objectivo é assumido a priori. Tornado-se assim, elemento de um presente vivido (ao invés de constituir uma memória viva engolida pelo passado), que chama a atenção e intervém no instante. No fundo, este monumento sem passado deixa de estar relacionado com o significado de monumento para estar então relacionado com o conceito de monumentalidade.
“La monumentalidad en arquitectura puede definirse como una cualidad: una cualidad espiritual, inherente a una construcción, que transmite el sentimiento de su eternidad y que no puede añadirse o cambiarse”23.
22
CHOAY, Françoise - Op. Cit., 2010, p.19.
KAHN, Louis. Cit. por LATOUR, Alessandra - Louis I. Kahn. Escritos, Conferencias y Entrevistas. 2003, p.23. “A Monumentalidade em arquitetura pode definir-se como uma qualidade: uma qualidade espiritual inerente à construção, que transmite o sentimento de eternidade e que não pode ser adicionada ou alterada” (livremente traduzido pela autora). 23
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A CIDADE E O RIO
Louis Kahn, em 1944, afirma que nenhum arquiteto pode reconstruir uma catedral de outra época copiando todos os sentimentos associados à mesma. Uma vez que as construções do passado não podem ser revividas novamente com igual intensidade ou significado. Princípio que vai ao encontro do surgimento do conceito de monumentalidade, que nasce unicamente pelo desejo de uma expressão monumental mas através de uma arquitetura capaz de efetuar um diálogo tanto com o seu utilizador como com a coletividade. Consequentemente afiliada a uma nova tradição moderna arquitetónica, é possível referir três tendências24 associadas à procura dos mecanismos para a monumentalidade. O uso da regularidade e ortogonalidade manifestadas pelo uso de prismas e formas puras; a exploração do movimento pelo uso de formas vivas, enérgicas e escultóricas; e por fim, o desenvolvimento de um conjunto de volumes sobre plataformas. Sendo um dos primeiros exemplos de nova monumentalidade o Arco Gateway, próximo do Jefferson Memorial em St. Louis construído por Eero Saarinem entre 1948 e 1964. Contudo, pelo facto de não ter permanecido correlacionada somente à linguagem moderna, e ter adquirido vontade por um significado colectivo e pela capacidade de explicitar memória, tornou-se necessário para alguns autores figurações carregadas de energia expressiva. Conduzindo a uma espécie de obsessão por carácter, expressão e, de algum modo, comunicação25. Concluindo então, que este tipo de “monumento” não tem passado mas possui ainda estatuto de signo, estamos perante aquilo que conhecemos como edifícios enquanto ícones construídos. Relembrese o fato, de que uma imagem mental é criada por cada indivíduo. Ou seja, de modo singular e pessoal. Assim sendo, a imagem de uma determinada realidade pode variar significativamente entre diferentes observadores. Todavia, são as imagens concordantes para um vasto grupo de pessoas, aquelas que se assumem como semelhantes ao estatuto do monumento, que interessa aqui salientar. Pois o edifício pode ser um elemento marcante para alguém individualmente, mas é quando surge como ponto de referência comum, que se torna verdadeiramente icónico.
MONTANER, Josep Maria - A Modernidade Superada: Ensaios sobre Arquitetura Contemporânea. 2014, p.82.
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25
26
MONTANER, Josep Maria - Op. Cit., 2014, p.84.
UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
11. Perspetiva exterior do Arco Gateway, projetado por Eero Saarinem, em conjunto com o Jefferson Memorial.
“A necessidade de uma expressão monumental na arte e na arquitetura sempre existiu e sempre foi resolvida em todas as civilizações. A nossa não pode ser uma excepção”26.
26
GIEDION, Sigfried. Cit. por MONTANER, Josep Maria - Op. Cit., 2014, p.73.
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A CIDADE E O RIO
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
2.4 | Edifícios Icónicos
A arquitetura sempre teve os seus ícones. Porém, as primeiras construções icónicas surgiram de fato como excepções expressivas e humanistas, ligadas a funções agregadoras tanto a nível social como religioso ou cultural27, num contexto de pós-guerra caracterizado acima de tudo por uma arquitetura funcionalista, onde a forma seguia a função. São exemplos a Igreja de Ronchamp28, construída por Le Corbusier em 1955, ou o Museu Guggenheim construído por Frank Lloyd Wright em 1959 na cidade de Nova Iorque, que surgem enquanto arquitetura icónica claramente seguidora de um pensamento.
(página oposta) em cima à esquerda 12. Capela Notre - Dame - du - Haut, Ronchamp. Vista das fachadas sul e leste. Le Corbusier, 1955. em cima à direita 13. Museu Guggenheim, Nova Iorque. Pormenor da fachada principal. Frank Lloyd Wright, 1959. em baixo 14. A Cidade do Globo Cativo. Ilustração realizada por Rem Koolhaas em 1972, atualmente exposta no Museu de Arte Moderna em Nova Iorque (MoMA).
Posteriormente, em 1972, Rem Koolhaas escreve “A Cidade do Globo Cativo”29 retomando a reflexão e discussão sobre a expressividade na arquitetura e o papel do ícone. O ensaio relata uma espécie de cidade surreal, onde o autor associa a ideia de ícone a um universo utópico, como uma espécie de entidade libertadora do exercício arquitetónico vivido até ao momento e hierarquizado por um determinado conjunto de valores, dando origem assim a uma nova arquitetura contemporânea, que de acordo com a utopia do arquiteto, ditava a libertação do ícone30.
“If you look back over the past 2000 years, architecture dignified civic and public life. Then the market economy happened, replacing all former values and erasing almost all ideology over the entire world. What it represents for all of us today is an invitation to simply be extravagant and spectacular. It will not be subtle”31.
27 GILMAN, Rui - O Ícone está morto. Viva o Ícone. Arquitetura e Arte. Nº118 (Mai-Jun 2015), p.102.
A Igreja de Ronchamp, como ficou conhecida, é na realidade a Capela de Notre-Dame-duHaut construída num local de peregrinação que havia sido destruído pela guerra, tendo surgido como a primeira grande revolução plástica, delineadora da imagem de uma era. COHEN, JeanLouis - Le Corbusier. 2005, p.64. 28
29 “(A Cidade do Globo Cativo) é a capital do ego, onde a ciência, a arte, a poesia e os tipos de loucura competem em condições ideias para inventar, destruir e restabelecer o mundo da realidade fenoménica.” KOOLHAAS, Rem. Cit. por GILMAN, Rui - Op. Cit., 2015, p.102. 30
GILMAN, Rui - Op. Cit., 2015, p.102.
KOOLHAAS, Rem. Cit. por LA GIORGIA, Giancarlo - Market vs. Meaning. Architecture Week. (Ago 2007). “Se olharmos para trás ao longo dos últimos 2000 anos, a arquitetura dignificou tanto a vida cívica como a pública. Mas depois, a economia de mercado aconteceu, substituindo todos os antigos valores e apagando quase toda a ideologia do mundo inteiro. Representado atualmente, um convite para simplesmente ser-se extravagante e espetacular. Não vai ser subtil” (livremente traduzido pela autora). 31
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Após a expansão capitalista do pós-guerra e a crise do petróleo na década de setenta, surge uma nova ordem capitalista que teve como principal repercussão a pretensão da cidade como entidade única e individualista, e como mecanismo para estabelecer um novo tipo de ligação e comunicação com o público. Fator que, em conjunto com a ambição por uma reinvenção do estatuto de icónico, vai agarrar as teorias de Rem Koolhaas para as utilizar como espírito de uma nova época arquitetónica. Consequentemente, é então numa era pósmoderna que a idealização do universo utópico, outrora realizada pelo arquiteto, fica associada à liberdade máxima individual e a um espírito criativo sem limites. Dando origem a uma nova arquitetura icónica transnacional onde o ícone arquitetónico contemporâneo passa a ser o carimbo no passaporte para a cidade global32, e à sistematização do conceito de edifício icónico como o conhecemos até agora. Charles Jencks, autor de diversas obras sobre arte e arquitetura, é também o responsável pela primeira caracterização, se não mesmo definição, de edifício icónico enquanto o elemento delineador da arquitetura que se tem estendido até à atualidade. O mesmo autor, defende que existem dois tipos de edifícios icónicos, os ícones iconográficos e os significantes enigmáticos33, estabelecendo assim uma distinção entre a arquitetura icónica do passado e a dos tempos modernos. Por sua vez, o primeiro tipo corresponde aos edifícios que pela sua aparência são fáceis de reconhecer e interpretar. Como constituem exemplo as Igrejas e os Arcos do Triunfo, que através da sua forma e estilo fazem uma clara referência a outros exemplos do mesmo tipo. Enquanto o segundo tipo reúne os edifícios que estabelecem uma substituição óbvia aos ícones iconográficos e que têm surgido nos últimos 50 anos, correspondendo aos edifícios icónicos do agora, ou tal como os idealizamos hoje em dia.
“Obviously there is no simple strategy of design and, as in all things creative, risk and failure stalk every move. Yet there are several basic guidelines, if not rules, for dealing with the iconic building”34.
32
GILMAN , Rui - Op. Cit., 2015, p.102.
33
JENCKS, Charles - The iconic building: The power of enigma. 2005, p.21.
JENCKS, Charles - The iconic building is here to stay. City. Vol.10, Nº 1 (Abr 2006), p.10. “Obviamente não existe uma simples estratégia de projeto e, como em todas as coisas criativas, risco e fracasso perseguem cada movimento. No entanto, existem algumas diretrizes básicas, se não regras, para lidar com o edifício icónico” (livremente traduzido pela autora). 34
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à esquerda 15. Swiss Re headquarters, Londres. Norman Foster, 1997-2004. à direita 16. Representação do arranha-céus de Norman Foster, mapeado segundo os códigos referentes à sua iconicidade, presente no livro The Story of PostModernism de Charles Jencks. Ilustração da autoria de Madelon Vriensendorp, 2011.
Segundo o autor, um edifício para ser “hoje” icónico tem então que responder a duas importantes premissas. Deve surgir enquanto imagem nova e provocadora, através de uma pele exterior original, e deve produzir significados enigmáticos que aludam a códigos incomuns, ou seja que produzam interpretações diversas35. Por outras palavras, a forma do edifício deve simular-se na imaginação das pessoas, para que estas possam criar e projetar as suas próprias ideias sobre essa mesma forma. Sendo responsabilidade do arquiteto garantir que o objeto em si, comunique na mente dos utilizadores uma quantidade satisfatória de metáforas, de modo a que os significados enigmáticos sejam afetivos, e a maior parte do entusiasmo provocado provenha da interação convulsiva dos mesmos. Como acontece com o edifício Swiss Re projetado por Norman Foster em Londres, que de acordo com Charles Jencks, os seus códigos são inúmeros e óbvios.
JENCKS, Charles. Cit. por COMSTOCK, Paul - An interview with Architect Charles Jencks. California Literary Review. (2007).
35
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em cima 17. Esquiรงo de Frank Gehry referente ao projeto Disney Concert Hall. em baixo 18. Library of Alexandria, Egito. Atelier Snohetta, 1989-2001.
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Ainda assim, o autor afirma que o edifício não deve estabelecer uma relação demasiado óbvia nem ser demasiado parecido com a “sua” metáfora, uma vez que é o caráter de vasta codificação interpretativa que lhe confere a possibilidade de ser venerado. As metáforas visuais devem ser feitas, por norma, em relação a detalhes, materiais e espaços interiores. Para que o efeito se baseie nas similaridades que vão surgir da experiência em relacionar comparativamente a nova e incomum forma com códigos mais antigos e sobretudo familiares36. Essa relação, é o que os olhos e o cérebro realizam em conjunto quando confrontados com edifícios chocantemente diferentes. De igual modo, é essa reação que cria o edifício icónico e a arquitetura sob a forma de algo misterioso, fascinante, horrível ou adorável. Tratando-se contudo, da mesma estratégia utilizada pelos edifícios icónicos que falharam precisamente na sua ambição em tornaremse ícones, Charles Jencks distingue a estratégia, por si considerada como a mais consciente e bem sucedida, de codificar as formas do edifício com conotações que de algum modo se relacionam com a função do mesmo. Salientado os exemplos da Igreja de Ronchamp, que considera ser o primeiro significante enigmático moderno, e o Walt Disney Concert Hall construído por Frank Gehry em 2003, onde em ambos se podem observar múltiplas metáforas que se relacionam com coisas diversas, mas que de algum modo foram trabalhadas em conjunto pelo arquiteto com a mesma habilidade de um escultor. Outra estratégia que se verificou resultar positivamente, foi a alusão à natureza e ao cosmos. Nomeadamente o Wales Millenium Centre projetado por Jonathan Adams em 1999 na cidade de Cardiff como uma metáfora às caraterísticas geológicas do seu local de implantação, a Library of Alexandria projetada pelo atelier Snohetta em 2001 no Egito com alusão à simbologia solar, e por fim a Casa da Música projetada por Rem Koolhaas em 2005 na cidade do Porto segundo a ideia de um meteorito que havia caído do céu37. Todos pretendiam glorificar as suas funções interiores e agradar o público com a sua retórica. Todos adotaram formas incomuns e geometrias invulgares para agrupar os seus volumes. Contudo, nenhum é diretamente icónico por um só significado, mas todos se relacionam com a natureza.
36
JENCKS, Charles - Op. Cit., 2006, p.11.
37
JENCKS, Charles - Op. Cit., 2006, p.14.
33
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2.5 | CRÍTICA À ICONICIDADE
“A cidade genérica afirma-se mais ou menos como um regime autoritário. Um líder - seja ele quem for - decidiu desenvolver uma parte da cidade, ou mesmo começar uma nova cidade no meio do nada, e fez disparar um boom que pôs a cidade no mapa”38. Resumidamente, o edifício icónico é um ícone do presente, original, que sugere mas não nomeia, e sobretudo, permite um vasto conjunto de interpretações. Contudo, é com o aparecimento do Museu Guggenheim projetado por Frank Gehry em 1997 para a cidade de Bilbao, que o conceito de edifício icónico se torna global, principalmente pelo reconhecimento político da lógica económica que um gesto escultural pode alcançar. Ao tornar-se mundialmente conhecido, passa então a ser visto como fórmula para a redinamização e transformação das cidades39, fazendo parte daquilo que, assumidamente e internacionalmente, ficou designado como o “Efeito Bilbao”. Este “efeito” resume a arquitetura como a peça central de uma máquina capitalista, onde o edifício icónico surge como espelho de um poder político e económico, assumindo-se consequentemente enquanto personagem principal de uma cenografia urbana composta por um espetáculo de formas excepcionais, contribuindo assim para um fenómeno de globalização ao colocar a cidade em que se encontra sob os holofotes do reconhecimento.
“Porque é que isto aconteceu? Principalmente porque a arquitetura conseguiu criar uma marca, de uma forma como nunca tinha feito antes. Cada cidade ambiciosa, quer agora um arquiteto que faça por ela o que acreditam que a Opera House de Jorn Utzon fez por Sidney e o que Frank Gehry e o Guggenheim fizeram por Bilbao. Quando o Disney Concert Hall projetado por Gehry finalmente abriu em Los Angeles, a maioria dos discursos na cerimónia de inauguração falavam mais sobre o que esta nova sala de concertos faria pela imagem da cidade do que sobre a sua acústica. Agora, todos querem um ícone”40. 38
KOOLHAAS, Rem. Cit. por BRANDÃO, Pedro - O Sentido da Cidade. 2011, p.46.
39
GILMAN , Rui - Op. Cit., 2015, p.103.
SUDJIC, Deyan. Cit. por ALMEIDA, João - Edifícios Icónicos e Lugares Urbanos. 2012, p.42.
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19. Museu Guggenheim, Bilbao. Vista exterior do edifício em conjunto com a escultura viva de Jeff Koons.
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em cima 20. Centro Heydar Aliyev, Azerbeijão. Zaha Hadid, 2007-2012. em baixo 21. Kunsthaus Museum, Graz. Peter Cook e Colin Fournier, 2003. Museu de Arte Contemporânea construído para a Capital Europeia da Cultura.
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Constituindo, símbolo representativo de uma cultura global, infinita e moderna, o edifício icónico vê-se associado a um processo de competição entre cidades segundo o fator atração41. Onde as mesmas, visando a concorrência, tentam criar uma marca a partir da sua imagem. Isto porque as imagens que uma cidade emite de si própria, fazendo parte da sua competitividade, irão influenciar a marca a si associada enquanto recurso principal identitário para a criação do seu valor. Contudo, dois grandes problemas associados à cidade enquanto marca surgem da própria necessidade de servir o mercado. Nomeadamente, o fator atração não ser um bem por si só pois em certos casos pode conduzir a um sentimento contrário, por causar repercussões sobre o ambiente em que se insere, e o caráter efémero que a própria competitividade pode adquirir pois tudo o que é considerado como elemento atrativo da cidade tende a ser reproduzido da mesma forma ou segundo os mesmos meios num outro lugar qualquer.
“The launch of the Guggenheim coincided with the new public apetite for the bling bling architectural image. A competition had developed for this attention and, as this increased, each image had to be more extraordinary and shocking in order to eclipse the last. Each new design had to be instantly memorable; more iconic”42. Consequentemente, perante a procura de uma arquitetura que possa vender pelas imagens que suscita, Graham Morrison afirma existirem os “bons” e os “maus” edifícios icónicos. Sendo os “bons”, aqueles que notoriamente contribuem positivamente para o contexto em que se inserem; e os “maus”, aqueles que surgem enquanto representação construída de uma reivindicação não suportada, como um gesto sem sentido e pomposo, ou que ultrapassam uma representação razoável do seu conteúdo iniciada quer por vaidade quer por conveniência, onde o funcionamento proveniente da sua acomodação está comprometido e o contexto de que faz parte fica em pior situação.
41
BRANDÃO, Pedro - Op. Cit., 2011, p.68.
MORRISON, Graham - Look at me! The Guardian. (Jul 2004). “O lançamento do Guggenheim coincidiu com o novo apetite público por uma imagem arquitetónica mais dispendiosa. Uma competição desenvolveu-se segundo essa atenção, e à medida que aumentou, cada imagem tinha que ser mais extraordinária e chocante do que a próxima em ordem a anular as restantes. Cada novo design tinha que ser instantaneamente memorável; mais icónico” (livremente traduzido pela autora). 42
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A CIDADE E O RIO
Ainda assim, a cidade vende-se hoje como destino, se como produto for competitiva. Tal como os outros produtos, o seu valor aumenta segundo fatores competitivos como estar na moda, promover eventos, oferecer estilo, cultura, e acima de tudo prestígio43. Deste modo, a criação de valor acaba por estar diretamente relacionada com uma espécie de disputa pela localização das atividades consideradas estratégicas e ligadas à produção e ao consumo. Sendo óbvia a associação de uma “enorme” oferta cultural à construção da marca de uma cidade, é possível verificar-se também como óbvia, a associação dos edifícios icónicos maioritariamente a museus, frentes ribeirinhas, parques temáticos, praças, grandes estações e, sem menos importância, sedes corporativas. Por outro lado, como atributo à concepção da marca, a imagem que as cidades procuram, também impõe aos arquitetos uma diferenciação estilística que se destaque por si só. No fundo, que criem também a sua marca como imagem do processo para a conceptualização do espaço e consequente cultura de modernidade. Fator, que contribuiu para aquilo que conhecemos hoje como “star-system-arquitetónico”44, e para a designação de “arquiteto-estrela” ser de igual modo símbolo de confiança. Porém, apenas alguns destes autores atingem um determinado nível de visibilidade, contribuindo para um processo longo e competitivo de seleção de pares, ao obter uma maior parte desproporcionada das oportunidades de trabalho em geral45. No fundo o edifício icónico passa a ser “o edifício” que vende a marca, que por sua vez vende o arquiteto e a sua arquitetura. Tudo isto claramente associado aos meios de comunicação que contribuem fervorosamente para a mediatização da arquitetura, tanto pela necessidade constante de algo novo para falar, como de vender a própria cidade enquanto um novo tipo de consumo, o consumo segundo um qualquer tema de arte.
43
BRANDÃO, Pedro - Op. Cit., 2011, p.124.
“Sistema de produção global, com base no lançamento de personagens do mundo da arquitetura como verdadeiras estrelas, utilizando sistemas eficazes de divulgação. Para se tornarem estrelas, não basta serem arquitetos brilhantes ou encontrarem um comprador que financie os projetos sem se intrometer. É necessário um trabalho cuidadoso de imagem, levando os mesmos a serem reconhecidos pelo público” (livremente traduzido pela autora). LO RICCO, Gabriella; MICHELI, Silvana - Lo Spettacolo dell’architettura - Profilo dell’archistar. 2003.
44
SCHUMACHER, Patrik. Cit. por BAPTISTA, Luís; MELÂNEO, Paula - Ícones Tardios. Arquitetura e Arte. Nº 118 (Mai-Jun 2015), p.27. 45
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Capas da revista Time, ilustrando figuras da arquitetura ao longo dos anos. (de cima para baixo, da esquerda para a direita) 22.Le Corbusier, 1961 23.Buckminster Fuller, 1964 24.Phillip Johnson, 1979 25.Daniel Libeskind, 2005.
Time constitui uma das revistas mais conhecidas do mundo. Ao longo dos anos, a publicação conceituada, procurou apresentar aos seus leitores alguns dos principais arquitetos do mundo, inclusive as novas tendências arquitetónicas.
“We are in the rococo phase of modern architeture. The consummate rococo figure is Santiago Calatrava, whose work people like, in the same way they like Gothic architecture, You see it once and go Wow! (..) However, I personally resent, for example, two billion dollars being spent on a subway station in New York City that looks like a bird. I have no idea why a subway station should either look like a bird or cost two billion dollars”46. 46 EISENMAN, Peter. Cit. por LA GIORGIA, Giancarlo - Op. Cit., 2007. “Estamos na fase Rococó da arquitetura moderna. A figura Rococó consumada é Santiago Calatrava, cujo trabalho as pessoas gostam da mesma forma que gostam da arquitetura Gótica. Veem-na uma vez, e, Uau! (...) No entanto, eu pessoalmente ressinto, por exemplo, dois bilhões de dólares serem gastos numa estação de metro em Nova Iorque que se parece com um pássaro. Não faço ideia porque deve uma estação de metro parecer-se com um pássaro, ou muito menos custar dois bilhões de dólares” (livremente traduzido pela autora).
39
A CIDADE E O RIO
2.6 | THE ICONIC BUILDING IS HERE TO STAY 47
O tema da arquitetura icónica, tem revelado diferentes posicionamentos críticos face ao papel que desempenha na própria cidade, mas sobretudo, face à sua resposta estética em detrimento de outros valores considerados mais relevantes. Tornou-se precisamente num dos debates de eleição dentro da própria comunidade arquitetónica devido à inerente mediatização, a questões ideológicas, e em parte, por ter ficado vinculada ao que Guy Debord designou, ainda antes da década de setenta, como a Sociedade do Espetáculo48.
“A arquitetura, em tempos a sumula mãe de todas as artes, complementada pela pintura e a escultura e portadora de significância e significado, vê-se reduzida a um espetáculo supérfluo”49. Muitos são os autores, que acreditam que os “Edifícios Icónicos” não constituem um momento da história da arquitetura com pretensões de perdurar. Deyan Sudjic, fervoroso crítico dos ícones arquitetónicos, argumenta que os mesmos não passam de um fenómeno de curta duração, de uma tendência de moda prestes a desaparecer. Também Rem Koolhaas, denota os primeiros sinais de cansaço global face à arquitetura que ele próprio “ajudou” a criar, afirmando publicamente em 2007 “O Ícone está Morto”50.
“A revolução levada a cabo pelos arquitetos foi absorvida pela brandização em que os próprios arquitetos e os administradores acreditaram demasiado. (...) O caminho porém continua a ser interessante (...); há uma ideia profunda de cultura das cidades como verdadeiro património europeu, e esta ideia funcionou. A desgraça foi aplicar o sistema da moda da qual os arquitetos hoje são os figurinos. Quando é que um monumento arquitetónico se torna um excesso, um a mais que a cidade não consegue suportar”51?
47
JENCKS, Charles - The iconic building is here to stay. City. Vol.10, Nº 1 (Abr 2006).
Obra publicada em 1967 por Guy Debord, filósofo francês, onde apresenta o conceito de espetáculo e o seu papel no desenvolvimento da sociedade moderna. Para o autor, a história da sociedade moderna pode ser compreendida como o “declínio do ser para ter, e do ter para aparecer”, e onde “o espetáculo não é um conjunto de imagens; pelo contrário, é uma relação social entre pessoas que são mediadas por imagens”. 48
40
49
BUCHANAN, Peter. Cit. por GILMAN, Rui - Op. Cit., 2015, p.102.
50
GILMAN, Rui - Op. Cit., 2015, p.103.
51
LA CECLA, Franco - Contra A Arquitectura. 2011, p.100.
UM ร CONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
em cima 26. I am a Monument, desenho icรณnico do livro Learning from Las Vegas, da autoria de Robert Venturi e Louise Scott Brown em 1972. em baixo 27. Imagem de capa do livro Society of the Spectacle, da autoria de Guy Debord em 1967.
41
A CIDADE E O RIO
Contrariamente, Graham Morrisson acredita que continuamos a precisar de ícones uma vez que não conseguimos perder a necessidade reconfortante e familiar dos considerados como os recentes pontos de referência52 da cidade, pontos esses tão importantes como já defendia Kevin Lynch, na sua obra Imagem da Cidade. Por outro lado, também Charles Jencks, que “incendiou a história e a teoria da arquitetura com os seus textos e livros controversos sobre arquitetura pós-moderna e icónica”53, defende que os edifícios icónicos enquanto edifícios que surgem como importantes por si mesmos, são de fato algo que caracteriza o nosso tempo e a nossa geração. Sendo que, apesar de os arquitetos e a própria sociedade começarem a possuir sentimentos mais negativos face aos mesmos, não parecem conseguir deixar de os produzir, em números cada vez maiores e em formas cada vez mais incomuns. Para o autor, apareceram e irão permanecer porque, no fundo refletem a hegemonia de determinadas forças sobre o declínio de outras, recebem apoio tanto da economia como da sociedade, e acima de tudo, enquanto novo género arquitetónico estão a substituir rapidamente os monumentos.
“Monuments have lost their power to persuade, and enshrine permanent memories, but society has hardly lost its appetite for grand structures”54. Charles Jencks considera existir um declínio dos monumentos, como consequência da ascensão da modernização e das constantes alterações de mercado. Defendendo que muitas partes da cidade têm desaparecido face a um excessivo desenvolvimento, colocando em questão o significado destes elementos marcantes da cidade e provocando uma mudança de sentimentos face aos mesmos, sendo possível verificar-se duas razões para o fato de o edifício icónico estar a ofuscar o monumento. A primeira, porque surge enquanto estrutura capaz de ser venerada, e a segunda porque consegue adquirir função urbana semelhante, ou mesmo equivalente, ao de uma Catedral ou mesmo de um edifício público de grande escala.
52
MORRISSON, Graham - Op. Cit., 2004.
53
FIGUEIRA, Jorge - Um Placebo Arquitetónico. Público Cultura - Ípsilon. (Out 2015).
JENCKS, Charles - Op. Cit., 2006. “Os Monumentos perderam o seu poder de persuasão e de consagrar memórias permanentes, mas a Sociedade pouco perdeu o seu apetite por grandes estruturas” (livremente traduzido pela autora).
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
“Se [os arquitetos] querem ser pequenos, descalços, e fazer o bem, façam-no. Se vão lidar com as corporações estão em território moralmente instável. Como podem manter a integridade moral? Uma maneira é fazer como fazem em Silicon Valley. Vou trabalhar para o mal e tentar lembrar-me de fazer o bem”55. Contudo, para o autor, existe ainda um outro fator de igual relevância que influencia diretamente a permanência futura do edifício icónico: a aceitação por parte da sociedade quando este tipo de arquitetura é realmente bem conseguida e realizada. Nomeadamente, em casos onde estes edifícios se implementaram seriamente, tanto pela provocação de uma nova imagem como pela simultânea importância a nível funcional e pública, e onde, consequentemente, se assumiram enquanto modelos mais completos de nova monumentalidade ao carregar sinais culturais muito além do seu propósito. Constatando-se, porventura que os verdadeiros ícones arquitetónicos, não são necessariamente os mais belos, mas sim os objetos realmente singulares que além de seguirem um sentido estético, seguem acima de tudo um sentido social e espacial56. Sendo de igual modo, os que não parecem possuir qualquer tipo de receio em intervir em zonas já caracterizadas pela essência da memória, estabelecendo uma relação com a já existente natureza do lugar. Como constitui exemplo o Centre Pompidou de Richard Rogers e Renzo Piano, a Fundação Iberê Camargo de Álvaro Siza, e sobretudo a Ópera de Sidney57 de Jorn Utzon, que “reunia os dois tipos de relação que uma obra arquitetónica pode manter com o lugar: por um lado, uma relação de contraste pensada para revalorizar o lugar, do mesmo modo como faziam as pirâmides ou os templos dóricos; por outro lado a amálgama ou integração da obra arquitetónica ao lugar como havia demonstrado a arquitetura orgânica elaborada por Frank Lloyd Wright e Alvar Aalto”58.
55
JENCKS, Charles. Cit. por FIGUEIRA, Jorge - Op. Cit., 2015.
56
BEAUDRILLARD, Jean. NOUVEL, Jean - Les objets singuliers. (s.d.), p.104.
“Utzon eleva ao máximo a possibilidade de expressão da arquitetura moderna com essa obra. Trata-se de um complexo arquitetónico que assume grandes valores simbólicos. As escalinatas do pódio gigante simbolizam a passagem do barulho da vida quotidiana para o espaço sagrado da arte e da cultura, da música e do teatro. (...) Tudo isso, Utzon conseguiu usando formas que concentram tanto a energia da geometria quanto a dos organismos vivos.” MONTANER, Josep Maria - Op. Cit., 2014, p.86. 57
58
GIEDION, Sigfried. Cit. por MONTANER, Josep Maria - Op. Cit., 2014, p.87.
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A CIDADE E O RIO
em cima 28. Ópera de Sidney, Austrália. Jorn Utzon, 1967. ao centro 29. Fundação Iberê Camargo, Porto Alegre. Álvaro Siza, 2008. “Na cidade, as arquiteturas parecem ajudar-se umas ás outras para sobreviver à incompreensão e solidão do edifício único e irrepetível. Individualmente equivalem a nada se em conjunto foram ignoradas. São as proporções, os materiais e as cores que enviam sinais e iniciam diálogos. Juntas, essas relações estendem a mão ao que falta e providenciam a atmosfera e o ambiente que encontramos em cada cidade” (livremente traduzido pela autora). SIZA, Álvaro. Cit. por DOMINGO SANTOS, Juan - El Sentido de las Cosas, una conversación con Álvaro Siza. El Croquis. Nº 140 (2008), p.25 em baixo 30. Centre Pompidou, Paris. Richard Rogers e Renzo Piano, 1977. “Eu admiro a sua coragem e sinceridade, enquanto edifício que participa com - e está intrínseco com - a sua cidade, o seu lugar, o seu tempo. (...) Eu não conseguia tirar os olhos dele quando era estudante de arquitetura. Reverteu o modelo típico de um museu em algo mais envolvente e convidativo para o público. A arquitetura naquele tempo precisava de fazer coisas diferentes, como um choque. O choque permite diversas emoções e percepções” (livremente traduzido pelo autor). VAN DUYSEN, Vincent. Cit. por LANGE, Alexandra Seven Leading Architects Defend the World’s Most Hated Buildings. The New York Times Style Magazine. (Jun 2015).
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
2.7 | SÍNTESE
O homem começou a construir por necessidade e pela procura de conforto, porém, desde cedo percebeu que poderia utilizar a arquitetura como mecanismo para comunicar, como uma segunda linguagem. Enquanto arquiteto, descobriu como criar cidade, como replicar tridimensionalmente a sua cultura, e sobretudo, como expressar-se através de uma ferramenta potenciadora de imagens. Sabendo que, um ícone tem como base uma mensagem que possui as características e propriedades do objeto com que se relaciona, comunicando por ele ao assumir-se enquanto fórmula lógica ou imagem mental, e que a arquitetura funde-se também enquanto imagem, é possível estabelecer-se automaticamente uma relação entre o objeto arquitetónico e o campo teórico da iconicidade. Por norma, associamos a ideia de icónico a algo que nos remete à partida, para a conceptualização de uma determinada imagem visual quer seja por semelhança ou por familiaridade. O que faz sentido na sua plenitude abstrata, uma vez que tudo o que nos lembramos, ou a maior parte das nossas memórias tendem a ser um conjunto de imagens mentais que se relacionam entre si. No fundo, uma espécie de execução involuntária do nosso raciocínio, que traduz consequentemente a iconicidade, como uma eficaz relação visual entre a forma do pensamento e a forma gráfica. Uma reflexão semelhante torna-se aplicável na maneira como construímos, vivemos e percebemos a cidade, uma vez que, a cidade é acima de tudo a imagem das pessoas que viveram e vivem nela, adquirindo a forma de um objecto global alvo da percepção dos seus habitantes. Como tal, é óbvio pensarmos involuntariamente nos monumentos, quando confrontados com os edifícios icónicos de um determinado lugar, pois constituem os elementos que reconhecemos à partida como identitários, distintivos e referenciais de cada cidade. Contudo é perante o fato de o monumento em si apenas servir para relembrar o passado no presente, e que não faz sentido para as cidades tentarem recriar o mesmo na atualidade, que o homem procura construir um novo conceito de monumentalidade. Dando origem a um novo estilo arquitetónico que associamos aos novos edifícios icónicos da cidade, dado que surgiram como excepções expressivas ao panorama previamente construído, sendo facilmente reconhecíveis.
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A CIDADE E O RIO
O fenómeno da arquitetura icónica, teve então o seu momento alto no início do novo século, com o aparecimento dos primeiros edifícios expressivamente e formalmente originais, sendo vários os exemplos que marcaram consecutivamente pela diferença e pela irreverência. Proporcionando, obviamente, um novo papel de destaque à disciplina de arquitetura e ao arquiteto, mas também à cidade. Rapidamente, tornou-se num tema sinónimo de discussão e controvérsia, quer pela ligação construtiva às grandes redes corporativas e políticas, quer pelo fato de toda a energia de uma cidade aparentar focar-se unicamente e simplesmente em torno de um edifício só. O “Efeito Bilbao”, como ficou designado até hoje, provocou aquilo que ficou conotado como as características principais do processo associado aos edifícios icónicos, mas também um reverso inesperado no contexto arquitetónico. Um excesso de competitividade entre cidades por uma imagem arquitetónica, e entre arquitetos pelo estatuto de reconhecimento, acabou por ditar uma onda de negatividade face ao movimento construtivo do presente. Por outro lado, o predomínio da forma sobre a função, a qualquer custo, é igualmente considerado pela comunidade arquitetónica como o grande responsável pela polémica e pelo antecipado fim inevitável do edifício icónico. Residindo a crítica no fato de as cidades, hoje, serem maioritariamente visitadas consoante a narrativa artística que apresentam, o número de equipamentos culturais que possuem, quantos ícones compõem a imagem da cidade, e quantos edifícios da autoria de “arquitetos-estrela” existem, sendo “vendidas” posteriormente segundo um conceito um pouco à parte da vida urbana real. Apesar de tudo, também existe quem defenda que o ícone na arquitetura não pretende desaparecer, por pertencer efetivamente a uma geração arquitetónica. Sendo possível reconhecer e identificar os casos de sucesso que, sem dúvida alguma, foram os responsáveis por autênticas revitalizações urbanas, constituindo-se enquanto potenciadores de novos lugares, e enquanto pontos de centralidade urbana que respondem de forma positiva às necessidades da cidade. Provando que o fator atração também possui o seu lado positivo, e que os modelos portadores de um sucesso particular, são os que funcionam autonomamente e por via de uma relação cúmplice e intrínseca com o lugar em que se inserem.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
Como constitui exemplo, os extensos territórios localizados em cidades caracterizadas pela sua identidade e imagem portuária, que ao tornarem-se lugares obsoletos e por vezes com estatuto de vazios urbanos, utilizaram a presença do elemento icónico como estratégia à sua renovada habitabilidade.
31. Caja Granada e o novo Museu da Memória de Andalucia, Granada. Alberto Campo Baeza, 2009.
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A CIDADE E O RIO
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
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IMAGEM DE UMA CIDADE
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32. O Aterro em 1881. Representação do Porto de Lisboa numa pintura a óleo sobre madeira de Alfredo Keil.
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IMAGEM DE UMA CIDADE
“O porto do século XIX é o elemento de ligação com os grandes oceanos, é a imagem do poder industrial e comercial da cidade, cheia de gentes e mercadorias em movimento para novos destinos, repleta de pessoas, naturais e imigrantes, que habitavam na frente portuária esperando o chegar e o mastrear de barcos antes da partida”59. Os rios e os mares, inicialmente símbolos do perigo e do desconhecido, transformam-se eventualmente na personagem principal do crescimento da maior parte dos territórios, dando origem à construção de inúmeros portos que, por sua vez, enquanto elementos de ligação com os grandes oceanos, passam a representar um importante papel na subsistência e na evolução das cidades. Posteriormente, os portos desenvolvem-se de forma distinta e particular, sofrendo vários períodos de adaptação e adquirindo especificidades dos locais onde se inserem. O confronto entre cidade e a sua paisagem de água, influenciado pela estruturação necessária, manifesta-se no planeamento urbano, sobretudo após a ocorrência da revolução industrial, onde as zonas destinadas aos portos vão sofrer as suas maiores mutações, e por vezes, descaracterizações. Contudo, a criação de uma nova linguagem para este tipo de lugares, tem vindo a ser responsável pela positiva reestruturação dos mesmos. Com o objetivo de compreender a identidade portuária, enquanto génese da imagem de uma cidade, irá desenvolver-se uma breve abordagem ao processo evolutivo das cidades portuárias, focalizandose posteriormente o exemplo de Lisboa.
GUIMARÃES, João - Coleção Expoentes: Cidade Portuária, o Porto e as suas constantes mutações. 2006, p.63.
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3.1 | A CIDADE PORTUÁRIA
Durante séculos, as cidades portuárias, por manterem uma relação de constante diálogo com o seu plano de água, permaneceram com a sua frente de atividades aberta à vida citadina. Onde a denominada área portuária, ainda que adaptada às suas funções, conseguia estabelecer uma ligação permeável entre a própria cidade e o rio. O primeiro grande crescimento portuário acontece perante a necessidade de tráfego de mercadorias e passageiros a nível mundial, e, em simultâneo, com a transformação e deslocação das indústrias para junto dos portos, com o propósito de adquirir fácil e rápido acesso às matérias-primas visando assim o aumento da sua produtividade. Consequentemente, os portos, um pouco por todo o mundo, assistem ao seu período de maior evolução durante o século XIX, após sofrerem grandes “alterações a nível formal, cultural e tecnológico”60, como estratégia para uma melhor e eficaz resposta às exigências provenientes sobretudo por parte das empresas industriais. Essas alterações surgem com base numa libertação estrutural em relação aos portos tradicionais, e através de uma mecanização e expansão territorial na continuidade dos velhos portos. Por sua vez, a expansão é caracterizada pela construção de novas infraestruturas, viárias e ferroviárias, tanto em terrenos desocupados de maior dimensão como em novos limites conquistados à linha de água. Contudo, são estes novos elementos que, em conjunto com uma aproximação à via marítima cada vez mais física por parte das indústrias, surgem enquanto verdadeiras barreiras visuais entre a cidade e o seu elemento natural, quebrando na totalidade o contacto que outrora existira entre os seus habitantes e os usos realizados à beira rio ou mar. A ruptura formal que dá origem a duas entidades distintas, cidade e porto, vai determinar as longas décadas em que ambas são administradas, também, segundo políticas distintas, e onde as cidades, em parte, viram costas aos seus portos e desenvolvemse segundo objetivos muitos próprios e pouco relacionados com a escuridão, o barulho e o perigo, associados à ambiência portuária.
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GUIMARÃES, João - Op. Cit., 2006, p.39.
UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
Posteriormente, será durante o século XX que as cidades portuárias sofrem a sua maior estruturação física, fator que vai modificar profundamente não só os seus portos, como, e principalmente, o papel que os mesmos passam a desempenhar no contexto da cidade. Os portos em geral, passam a debater-se com o problema de incapacidade de resposta à circulação de volume de carga pretendida, alterando o seu método de transporte para o uso maioritário de contentores, deixando assim de utilizar os antigos armazéns que, até à data, compunham a típica paisagem portuária da cidade. Porém, a maior parte dos portos, mesmo os mais históricos, mostram não possuir capacidade física nem territorial para responder à introdução da presença dos contentores, que em quantidades elevadas exigem muito mais espaço e também o uso de barcos de elevada dimensão. Uma vez que o processo de contentorização passa a representar 80% da carga movimentada nos portos por volta da década de oitenta, as autoridades portuárias passam a necessitar efetivamente de “áreas amplas, vazias de construção, privilegiando os estuários dos rios”61. A consequência principal viria a verificar-se imediatamente após, com o abandono das atividades referentes aos antigos portos em direção a zonas periféricas, e com a sucessiva deslocação das indústrias que ocupavam a cidade junto aos mesmos, deixando assim para trás uma delimitação territorial com alguma dimensão que, com o passar dos anos e sem qualquer tipo de movimentação, conduziu a fracções de cidade completamente degradadas e obsoletas. Alguns portos, ainda tentaram como primeira iniciativa readaptarse através de novos equipamentos e aumentando as suas docas e terminais. Porém, uma vez que as mudanças necessárias não se cingiam somente ao nível das infraestruturas, mas sobretudo ao nível do território e na forma como as cidades passariam a encarar as novas atividades portuárias, tornou-se evidente a possibilidade de redefinir o desenho urbano das frentes de água, que por norma tinha como envolvente mais próxima partes históricas da cidade obviamente importantes e simbolicamente relacionadas com a sua história iniciada no mar, e de retomar a habitar centros não formalmente edificados completamente de raiz.
61
GUIMARÃES, João - Op. Cit., 2006, p.8.
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A CIDADE E O RIO
No fundo, surgem duas atitudes a adotar em relação à limitação dos portos tradicionais, tendo a primeira por base a criação de novas zonas portuárias com mais capacidade e estrutura de trabalho mas deslocadas do centro da cidade, e a segunda, a transformação dos antigos portos em grandes espaços urbanizáveis. Com a possibilidade de voltar a tornar o rio/mar elemento delineador da vista da cidade, e de estabelecer uma revigorada relação outrora perdida mas não esquecida, revitalizar as frentes de água passa a ser a principal prioridade para a maior parte das cidades portuárias. As primeiras intervenções significativas verificam-se em cidades norteamericanas, entre os anos cinquenta e setenta, sobretudo através de projetos multifuncionais compostos por medidas de reintegração dos espaços portuários criando uma espécie de nova cidade dentro da já existente cidade. As mesmas vão estabelecer-se como pioneiras e concretizar o início de uma ideia, uma vez que os portos europeus encontravam-se ainda em recuperação face à II Guerra Mundial. Por fim, e somente durante o período do pós-Guerra, as cidades europeias começam a assistir ao aparente fenómeno das frentes de água e a apresentar desenvolvimentos semelhantes em termos dimensionais e sociais. Ainda assim, o processo de revitalização não se apresenta como óbvio ou segundo princípios absolutos, pois cada intervenção exige uma operação complexa e um plano estratégico, consoante as condicionantes e especificidades singulares que cada caso apresenta. A demorada “libertação” das propriedades referentes aos antigos portos e pertencentes a entidades administrativas não públicas, e a não realização da mesma por uma só vez, constitui também uma das principais razões para a problemática das cidades portuárias se manter presente até aos dias de hoje. Em suma, as consequências do período pós-revolução industrial conduziram a um profundo questionamento do papel funcional das áreas portuárias, outrora constituídas por armazéns, carris, silos, estaleiros, mas permanentemente símbolos de uma componente histórica importante enquanto elemento vivo de um passado ainda presente. Alguns portos foram alvo de grandes processos de crescimento, e outros foram abertos à possibilidade de se tornarem obras de referência pelas consequentes intervenções urbanas e arquitetónicas, redefinindo por completo a imagem das cidades.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
3.2 | DA CIDADE-PORTO À CIDADE-CULTURA
33. Peine del Viento. Conjunto de esculturas em aço, incrustadas nas rochas de uma praia em San Sebastián, Espanha. Eduardo Chillida, 1976.
As mudanças mais significativas na relação entre porto e cidade verificam-se sobretudo pela transição de uma relação estática mas definida por pólos de movimento económico, para uma relação mais presente porém caracterizada pelo abandono e isolamento urbano. Contudo, as cidades portuárias, visionando oportunidades de grande desenvolvimento e crescimento, encaram os seus velhos portos como elementos passíveis de vir a ser o palco da cidade, e enquanto estratégia capaz de responder a necessidades económicas, comerciais, lúdicas e sociais.
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A CIDADE E O RIO
Tomando como exemplo o contexto europeu, por ser o mais relevante ao presente trabalho, é possível verificar-se que a perda das funções portuárias coincidiu de igual modo com a destruição de muitos portos como consequência direta do longo período de instabilidade política. Devido à necessidade de realojamento sobretudo após a II Guerra Mundial, os primeiros planos para as frentes portuárias seguiram diretrizes focadas nas necessidades primárias absorvendo sobretudo intervenções ao nível da habitação social. Posteriormente, na década de setenta, esses mesmos planos são questionados precisamente devido à sua intervenção exclusivamente funcional, dando origem à procura de novas orientações e novos planos urbanos, preferencialmente não dependentes de uma só função. Sendo estes lugares profundamente relacionados com a história da cidade onde se inserem, os novos planos vão enfatizar sobretudo a ideia de cultura, utilizando a mesma como novo conceito de intervenção. A maioria dos planos, ainda que diferentes, vão aproveitar a já existente identidade cultural para criar novas estruturas que por sua vez proporcionem à cidade um novo papel cultural próprio, notável e distinguível. Em suma, o primeiro planeamento urbano funcional é abandonado para dar lugar à valorização cultural inerente às cidades portuárias. Juntamente com o receio por parte da sociedade em perder a sua conformidade, fruto do exponencial desenvolvimento económico e da crescente internacionalização pela criação da cidade global, os conceitos identidade e cultura transformam-se na base dos planos que visam a revitalização e a regeneração de zonas portuárias, não significando obrigatoriamente a eliminação do contacto com os elementos representativos do passado.
“Os planos para as frentes portuárias devem ter em conta o passado do local e reconhecer a sua importância na memória urbana coletiva, memória que está interligada com características como identidade, essência, história e capacidade de atração. As novas intervenções deverão ter capacidade de gerar diversidade de interpretações a nível da memória e da identidade, que no seu conjunto podem ser a base de uma vitalidade económica, social e cultural”62.
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GUIMARÃES, João - Op. Cit., 2006, p.19.
UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
A realidade das cidades portuárias enquanto cidades de cultura passa a constituir assim a abordagem principal utilizada, e a que permanece até à atualidade. Onde as frentes portuárias, que definem a cultura de um passado, passam a ser geradoras de cultura no presente constituindo-se sobretudo por espaços e programas destinados ao uso público, não dependendo exclusivamente de um porto, e transformando-se em centros de produtividade atrativa tanto para turistas como para os habitantes locais. Focando mais uma vez o contexto europeu, onde a tradição histórica da relação entre a cidade e o mar não se deixa eliminar, verificamse sobretudo planos que procuram manter o ambiente singular e a identidade natural do porto na cidade, seguindo acima de tudo o objetivo da devolução do contacto das frentes de água à cidade e à sua população. A água passa a ser vista como um elemento estruturante da vida urbana, possível de ser acessível e perceptível fisicamente. Transformandose num prolongamento da mesma, invertendo a ideia proveniente do século XIX em que a cidade termina onde a água começa, e onde a ideia de limite associado à “linha de demarcação entre a cidade e a água”63 que separa duas realidade distintas, é substituída pela procura de um novo limite assente na construção da cidade a partir do espaço público. Este novo limite vai ser caracterizado, acima de tudo, pelo manuseamento da relação entre os espaços interditos, nomeadamente os portos ainda em funcionamento, com os espaços acessíveis ao plano de água; pela “análise dos principais espaços públicos de ligação – física e simbólica – da cidade com a água, muitos deles com origem histórica, mas que, apesar da sua transformação, permanecem na cidade atual”64; e pela introdução de um determinado tipo de edifícios icónicos devido à sua autonomia na criação de atividades de lazer, e, principalmente, à sua capacidade imediata em gerar novas imagens na cidade como símbolo da continuidade horizontal junto à linha de água, e como símbolo claro do “agora” inserido em contextos caracterizados maioritariamente pelo tempo decorrido.
63
OCHOA, Rita - Espaço público e frente de água [repensar o limite]. (s.d.), p.1.
64
OCHOA, Rita - Op. Cit., (s.d.), p.1.
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A CIDADE E O RIO
em cima 34. Auditรณrio e Centro de Congressos Kursaal, Espanha. Rafael Moneo, 1990-1999. em baixo 35. ร pera de Oslo, Noruega. Snohetta, 2000-2008.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
“Os limites são os elementos lineares não considerados como ruas: são normalmente, mas não sempre, as fronteiras entre duas áreas de espécies diferentes”65. É precisamente este “não sempre” da designação de limite, realizada por Kevin Lynch na sua obra Imagem da Cidade, que vai tornar os edifícios icónicos associações óbvias às frentes portuárias, pois vão implementar-se precisamente no limite estabelecido entre a dualidade cidade - água, contudo, sem fixar-se enquanto fronteira. Vão destacarse sobretudo, pela sua capacidade em retomar, ou criar, a ligação entre os dois elementos, por vezes tornando-os um só. Edifícios como o Auditório e Centro de Congressos Kursaal, da autoria de Rafael Moneo, ou a Ópera de Oslo, do atelier Snohetta, constituem exemplos das polivalências que uma intervenção segundo as premissas de um edifício icónico pode provocar no desenho de um novo limite. Descrito pelo próprio arquitecto como “duas rochas enormes que deram à costa na baía e fazem parte da paisagem e não da cidade”66, o edifício Kursaal surge como um complexo arquitetónico na cidade de San Sebastián, Espanha, onde a natureza do seu plano de água já havia sido, também, redesenhada. Transformou-se num projeto de referência da cidade, pelo respeito demonstrado em relação à topografia original e pela associação óbvia ao tema da água, uma vez que os dois volumes que compõe a obra surgem como se fossem pedras depositadas na areia permitindo que as pessoas possam mergulhar junto às mesmas. Por sua vez, a Ópera de Oslo, localizada num, ainda importante, centro de indústria marinha, destaca~se pela sua cobertura conceptualizada enquanto uma parede em onda, que se transformou no próprio espaço público da cidade. Considerada mesmo, como um “monumento social”67, uma vez que estabelece conexões claras com os principais elementos que compõem a paisagem. Distintamente ambos representam modelos de intervenções em cidades portuárias, por fim destacadas pela sua identidade cultural.
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LYNCH, Kevin - Op. Cit., 1982, p.73.
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MONEO, Rafael. Cit. por JODIDIO, Philip - Icons. Architecture Now! 2004, p.116.
“The building is as much landscape as architecture (...) Its accessible roof makes the building a social monument rather than a sculptural one”. SNOHETTA - Norwegian National Opera and Ballet. Disponível em http://snohetta.com/projects “O edifício é tanto paisagem como arquitetura (...) A cobertura acessível torna-o um monumento social em vez de um monumento escultural” (livremente traduzido pela autora). 67
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A CIDADE E O RIO
3.3 | LISBOA E O TEJO
“Frágeis, acenam alvos lenços d’asas As gaivotas que a brisa, mansa, embala. O rio azula, emoldurado em casas — Que lindo quadro para pôr na sala! No lírico perfil fogem veleiros, Onde embarquei uns restos de ansiedade; E, no cais, os guindastes e os cargueiros São prática e viril realidade. É mentira, talvez, Assinar com meu nome esta poesia: O Tejo foi quem na fez… Cheira a limos, a sal, a maresia”68! Apesar de serem escassos os elementos ancestrais sobre os usos portuários mais remotos referentes ao estuário do Tejo69, é do conhecimento histórico que as excelentes condições oferecidas pelo mesmo estiveram na origem da cidade de Lisboa, determinando o seu crescimento enquanto território compreendido entre colinas e ribeiras, e cujos habitantes sentiam o rio como um mar interior.
“Situada junto a foz de um grande rio, Lisboa foi capaz de articular continente e mar. Finalmente, a grandiosidade do sítio, com o Tejo a espraiar-se, e a assimetria das duas margens, oscilando entre pontos altos e pontos baixos, concorreram para a construção de uma paisagem que nos surpreende pelo seu valor de conjunto e pelo modo como a arquitetura se adapta ao território. Talvez por isso Lisboa e a sua área metropolitana tenham crescido com um sentido ribeirinho numa relação de afetos mútuos entre margens e rio”70.
VIANA, António Manuel Couto - Miradouro. In folheto da exposição Maresias - Lisboa e o Tejo. 2014
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“No estuário do Tejo onde se situa Lisboa, o rio e o mar casam-se. Com razão os habitantes chamam mar ao lago que se forma em frente de Lisboa, pois as marés fazem-se aí sentir e a salinidade é próxima da do oceano. A amplitude da maré atinge 3,60m mas aumenta no interior do estuário. Este tem hoje margens delimitadas mas noutros tempos seria um delta com esteiros pouco profundos. Na sua largura máxima, este mar interior atinge 10 km, contra os 2 que separam Lisboa da Outra Banda no seu corredor final.” PINHEIRO, Magda - A Biografia de Lisboa. 2014, p.22. 69
70 TOSTÕES, Ana - Lisboa e Tejo e Tudo. In Área Metropolitana de Lisboa - Gentes, Paisagens e Lugares. 2004, p.112.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
36. Planta de Análise da Morfologia da Cidade de Lisboa, onde é possível observar-se a relação da Topografia com as principais linhas de água.
55m 05m 0
1km
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A CIDADE E O RIO
em cima 37. Planta de Lisboa em 1714, antes do terramoto. ao centro 38. Planta de Lisboa em 1785, depois do terramoto. em baixo 39. Vista a partir do Miradouro de Santa Luzia entre 1933-1983. Ă direita 40. Esteiro da Baixa em Desenho de JĂşlio de Castilho.
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1147.
UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
A sua posição geográfica e diversidade de condições geomorfológicas constituíram fatores essenciais à instalação de núcleos de povoamento próximo das denominadas frentes de água, e ao desenvolvimento de movimentos comerciais, maioritariamente através do contacto mais direto com a sua margem delineadora. Lisboa, emoldurada pelo Tejo, assumia-se consequentemente como cidade e porto, capaz de articular a sua morfologia complexa com uma vital proximidade à água, onde, durante séculos, diversos cais espalhados por todo o estuário designaram-se como “portos do Tejo”, e a frente ribeirinha de Lisboa como “porto de Lisboa”. Apesar dos precedentes vestígios portuários reportarem ao esteiro navegável, que começaria na Baixa e terminaria no Rossio, e por onde as embarcações penetrariam a cidade71, as primeiras referências ao porto de Lisboa surgem a partir das taracenas, ou tercenas, construções medievais localizadas ao longo das praias, utilizadas como bases navais e posteriormente como armazéns, associadas aos séculos XIII, XIV e XV. A atividade portuária desenvolve-se significativamente no século XVI, com a cidade de Lisboa a tornar-se numa das mais importantes cidades comerciais da Europa após o início da época dos Descobrimentos. A cidade assume a sua nova fase política, arquitetónica e cultural libertando-se do abrigo das muralhas no alto das colinas, mudando-se para junto do rio, do (novo) Palácio da Ribeira, e dos estaleiros navais onde é determinado o seu futuro enquanto “capital do Reino, e das Descobertas, uma cidade que definitivamente encontrava no rio e no mar a sua razão de existir”72. A participação no comércio além-mar, determinou a construção naval como a prioridade do Estado, e transformou as ribeiras em centros produtores de navios. A “Ribeira das Naus” surge então como o primeiro grande estaleiro do país, dando o mote à estruturação da margem de Lisboa segundo as necessidades comerciais e o aparecimento das indústrias e armazéns relacionados com a atividade maioritária à beira-rio.
BLOT, Maria Luísa Pinheiro - Lisboa, memória viva de passados portuários distantes. In Atas das sessões IV colóquio temático As Escalas de Lisboa. 2001, p.151.
71
72 TOSTÕES, Ana - Op. Cit. In Área Metropolitana de Lisboa - Gentes, Paisagens e Lugares. 2004, p.110.
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A CIDADE E O RIO
Com o terramoto de 1755, que destruiu toda a cidade, a zona do Rossio que, até à data, era por excelência o principal mercado, perde a importância de centro de atividade popular com a construção da Praça do Comércio mesmo junto ao rio, e onde outrora existira o palácio dos reis durante cerca de dois séculos, também ele destruído pela catástrofe natural. A administração do Marquês de Pombal, em conjunto com os planos de Carlos Mardel e Eugénio dos Santos, começava assim o novo delinear da frente ribeirinha de Lisboa.
“O tempo desta margem é feito de mudança. Inebriado pelos vapores do progresso, o século XIX lançou-se à beira-rio, movido talvez pelas ganas românticas que tanto geraram euforias criativas à torreira do sol, como nostalgias melancólicas ao anoitecer. Indiferente o Tejo ia correndo (...)”73. Somente no século XIX, vão surgir significativas alterações na relação entre Lisboa e a sua paisagem de água, transformando profundamente a sua comunicação com o rio. Após a revolução industrial, e tal como nas restantes cidades portuárias europeias, Lisboa começa a assistir a uma progressiva urbanização do plano do Tejo, e ao aflorar da nova imagem de uma cidade tipicamente portuária. Contudo só em 1884, é proposto em parlamento um concurso público para uma nova construção do Porto de Lisboa, enquanto estrutura formal do novo poder industrial e comercial. As obras são concedidas ao engenheiro francês Hersent e em 1890 o porto surge oficialmente construído e inaugurado, passando posteriormente, em 1894, para o domínio do Estado. Em 1907, passa a ser gerido pela Administração Geral do Porto de Lisboa, entidade independente, sob o qual permanece até hoje. Com o passar do tempo, a sua jurisdição foi crescendo exponencialmente, abrangendo a frente ribeirinha de onze municípios, constituindo uma alargada diversificação quanto à natureza das margens e respectiva ocupação. Deste modo a antiga margem apenas consolidada pelos seus diversos cais, surgia agora reinventada em “comboios fumegantes, aterros batidos, cais empedernidos, fábricas trepidantes, armazéns perfilados, mais guindastes e gruas como que cegonhas metálicas a girar”74.
73 MATOS, José Sarmento de - Paisagem Desassossegada. In folheto da exposição Maresias Lisboa e o Tejo. 2014 74
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MATOS, José Sarmento de - Op. Cit. In folheto da exposição Maresias - Lisboa e o Tejo. 2014.
UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
O Tejo, perdia, assim o seu acesso nobre à cidade, uma vez que o surgimento do comboio, fez com que uma vasta trama metálica de carris rasgasse a paisagem ribeirinha lisboeta. Deste modo, a denominada beira-rio, tornou-se o leito ideal para todos os novos tipos de equipamentos de transportes, e para espalhar pelo país fora o que os cargueiros traziam a Lisboa das outras partes do Mundo. Caracterizada também, por novas vias de acesso e sobretudo pelos grandes aterros consolidados nas antigas praias. No decorrer de meio século após o aparecimento do porto, Lisboa havia oficialmente retirado o rio do seu pensamento, por sentir que este já não fazia parte da sua vista, antes tão apreciada e utilizada. Uma vez que passava a estar apenas para lá de linhas de comboio e da altura das embarcações acostadas aos cais de pedra. O desprezo progressivo pela margem do rio, que acabou por se tornar inacessível e não acolhedora para o seu utilizador, fez com que Lisboa deixasse de ser uma linha à beira Tejo para apenas ser distinguida pelas suas grandes Avenidas Novas, que de algum modo colmataram a falta do passeio público que antes o rio oferecia ás pessoas.
“Lisboa toda, desde 1867, se acostumara com gosto ao desafogado terreiro marginal (...) o mais belo dos passeios públicos (...) a sociedade concorria ali, àquele salão enorme, a ver o Tejo (...) anos depois abriuse a Avenida da Liberdade, e o aterro nem mais lembrou sequer”75. Sem grandes alterações durante a maior parte do século XX, o porto recebe um plano de melhoramentos em 1946, e na década de 70, inaugura uma nova etapa na sua história ao tornar-se o primeiro porto da Península Ibérica a dispor de um terminal equipado para o embarque e desembarque de contentores76. Contudo, a necessidade de expansão por parte da Administração do Porto de Lisboa fez com que muitas das grandes atividades do mesmo fossem sendo desmanteladas ou relocalizadas para a margem sul do rio que, ao assumir o papel de margem de apoio funcional e fabril, transformou-se num dos núcleos essenciais do vasto complexo portuário do estuário do Tejo. Iniciando, assim, o “abandono” de algumas extensões portuárias, tal como aconteceu em muitas outras cidades da Europa.
75 CASTILHO, Júlio. Cit. por JANEIRO, Maria João - Lisboa: Histórias e Memórias. 2006, p. 132. 76
RAMOS, Paulo; NABAIS, António - 100 anos do Porto de Lisboa. 1987, p.158.
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A CIDADE E O RIO
41. Linha de Costa de Alcântara a Alfama - 45 A. C.
42. Linha de Costa de Alcântara a Alfama I 1650 - João Nunes Tinoco.
43. Linha de Costa de Alcântara a Alfama I 1807 - José Duarte Fava.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
44. Linha de Costa de Alcântara a Alfama I 1858 - Filipe Folque.
45. Linha de Costa de Alcântara a Alfama I 1911 - Silva Pinto.
46. Linha de Costa de Alcântara a Alfama I 2016.
0
1km
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A CIDADE E O RIO
3.4 | OS ATERROS
“Lisboa, tal como todas as cidades é o resultado de um longo processo de evolução social, económico e cultural que lhe moldou a imagem, a identidade e a relação com o território. O seu processo de desenvolvimento urbano, feito em momentos muito diferentes e segundo padrões e exigências também eles diferentes, conferiu-lhe uma imagem e uma identidade que se expressa na sua paisagem, na sua textura e na sua cor, a cor de Lisboa. Tudo isto fazendo de Lisboa a imagem da sua história”77. Os aterros, são seguramente, a principal construção realizada pelo homem, em prol da atividade portuária, que mais modificou a frente ribeirinha de Lisboa. O seu aparecimento durante o século XIX, num território que até à data caracterizava-se pela sua forma natural, vai conferir uma nova imagem à cidade, que ainda hoje perdura. Historicamente, surgem enquanto iniciativa possivelmente “geradora de futuro”78 uma vez que são conceptualizados durante um momento urbanístico liberal, na qualidade de construções que pretendiam convincentemente libertar-se da malha regrada e monótona da Baixa, que havia sido o último grande momento de planeamento da cidade. Os aterros surgem, no fundo, como palco de uma possível especulação sobre o que a cidade poderia vir a ser com novas zonas urbanas que aproximassem mais os habitantes ao Tejo, uma vez que permitiam a urbanização sobre as praias, e sobretudo sobre o rio. Providenciando terrenos planos, automaticamente contrastantes com o desenho da cidade antiga e claramente mais fáceis de organizar. Tendo existido, de facto, a pretensão que os aterros se tornassem nos espaços privilegiados para o passeio público da cidade, um pouco segundo o estilo do típico boulevard francês79. 77 FADIGAS, Leonel - Um conceito novo de planeamento para Lisboa. In Lisboa. Conhecer, Pensar, Fazer Cidade. 2001, p.86.
HENRIQUES, Raquel - Planear a Cidade Burguesa. In Lisboa. Conhecer, Pensar, Fazer Cidade. 2001, p.57.
78
Como é exemplo o projeto utópico de Thomé de Gamond, realizado em 1870, para o Porto de Lisboa. “Um anno depois foi publicado o projecto do engenheiro Thomé de Gamond, que seu auctor dedicou ao duque de Saldanha, e no qual se condemnavam as docas de Belém, e se propunha a conquista de grande superfície de terrenos sobre o Tejo, ligando por uma linha recta, na margem direita, o caes das Columnas sobre o terreno mais avançado a jusante e próximo da foz da ribeira de Alcantara (...)” PAES, Miguel. Cit. por RAMOS, Paulo; NABAIS, António - Op. Cit., 1987, p.76. 79
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Na realidade, os aterros enquanto intervenção urbanística, fazem parte da continuidade de um desejo antigo para o desenho da cidade, recuando à época de D. João V, que havia sido o primeiro monarca a idealizar e ambicionar a construção de um cais monumental que reforçasse as potencialidades da cidade, ao criar um porto digno da capital. Sendo do ano de 1750, o plano elaborado por Carlos Mardel, onde se previa uma grande avenida junto ao Tejo, que ligava a zona da Ribeira das Naus, e respetivo Mercado da Ribeira, ao cais de Belém80. Contudo, o terramoto viria a provocar um óbvio desinteresse e receio pelo rio, prevalecendo ainda assim a disposição da submissão do rio face ao território da cidade.
“Até meados do século XIX, Lisboa era limitada a sul por uma série de praias interrompidas aqui e ali por diversas construções e sem nenhum caminho que permitisse um passeio ao longo do Tejo, ou mais importante ainda, uma ligação rápida entre as diversas zonas ribeirinhas. Primeiro construiu-se o Aterro da Boavista, e o nome generalizou-se para todos os terrenos conquistados ao rio”81. É possível corresponder a construção dos aterros a diferentes momentos do crescimento do território de Lisboa82. Nomeadamente o primeiro aterro sobre o esteiro da Baixa que deu origem à cidade, o segundo aterro para a construção da Praça do Comércio, e por fim os aterros do século XIX de maior dimensão e complexidade. Sendo os últimos, os que deram origem à frente ribeirinha que reconhecemos como a atual, primeiro desde Santa Apolónia até Alcântara, depois de Alcântara a Belém, e por fim de Santa Apolónia até ao Braço de Prata e Olivais. Apesar dos planos elaborados, sobretudo a partir de 1824, o porto sempre necessitou de maior dimensão urbana, condicionando os aterros ao uso monopolizado de atividades portuárias. Transformandoos, depois, nos eixos principais da cidade concedendo-lhes algumas das estruturas viárias mais importantes. Com os desejos de passeio público redirecionados para as avenidas a norte, os aterros ficam até ao fim do século XX associados exclusivamente ao Porto de Lisboa, constituindo por isso, no presente, as principais áreas da cidade descaracterizadas ou condicionadas ao uso público.
80
HENRIQUES, Raquel - Op. Cit. In Lisboa. Conhecer, Pensar, Fazer Cidade. 2001, p.57.
81
ADRAGÃO, José; PINTO, Matilde; RASQUILHO, Rui - Lisboa. 1985, p.117.
DURÃO, Vitor - Os Aterros na Baixa e na frente ribeirinha de Lisboa, Portugal. Revista da Gestão Costeira Integrada. (Fev 2012), p.20
82
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A CIDADE E O RIO
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em cima 47. Vista e perspectiva da Barra Costa e Cidade de Lisboa Capitale do Reino de Portugal. Bernardo de Caula, 1763. em baixo 48. Panorâmica sobre Lisboa, Porto de Lisboa e Rio Tejo, 1905.
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A CIDADE E O RIO
3.5 | REGRESSO À MARGEM
“Decididamente, esquecida de si, Lisboa voltava costas ao rio, apesar de, bem lá no fundo, não se desvanecer a saudade esfumada da cadência do chap - chap das águas (...)”83. A relação Lisboa - Porto permaneceu ao longo dos tempos como algo inerte e distante, devido acima de tudo à implementação de todas as infraestruturas que lhe são inerentes, e que tornaram a sua frente “fechada” sobre si mesma impedindo a vista sobre o rio. Ao mesmo tempo a “saudade” do rio foi surgindo, e aos poucos quase como num despertar, pedaços da margem ribeirinha foram, e vão sendo, devolvidos para a criação de uma nova relação com a água. Permitindo que a delimitação do porto volte, assim, a ser palco da cidade, possibilitando oportunidades únicas para o desenvolvimento e para a criação de novos espaços urbanos. A Exposição do Mundo Português em 1940, permite a tão esperada aproximação ao Tejo, que mais tarde vai ser reforçada com o Centro Cultural de Belém em 1992, com a requalificação da frente ribeirinha Algés - Doca de Santo Amaro, e sobretudo com a Exposição Mundial de 1998 (EXPO’98)84, cuja concretização foi capaz de “uma profunda transformação urbana” através da conversão de uma “plataforma industrial e portuária, marginal e obsoleta”, numa “nova centralidade metropolitana”85. O sentimento de manter vivo e perene o gosto pelo rio, impulsionado pela EXPO’98, revelou-se um processo assertivo no retorno da cidade ao Tejo. Contudo, um processo demorado, apesar das inúmeras intenções desenvolvidas ao longo do tempo, uma vez serem muito recentes os projetos de intervenção que visam a continuação de um regresso à margem pela reclamação de espaço junto ao rio para uso maioritariamente público. Nomeadamente, a avenida da Ribeira das Naus, e, futuramente, o Terminal de Cruzeiros e o Museu de Arte, Arquitetura e Tecnologia.
83
MATOS, José Sarmento de - Op. Cit. In folheto da exposição Maresias - Lisboa e o Tejo. 2014.
“Numa perspetiva mais simbólica e significante, podemos afirmar que a Expo’98 Portugal se celebrou mais uma vez junto ao Rio Tejo (...) A transformação do sítio, reconciliando-o com o seu rio, põe à prova a capacidade da cultura moderna portuguesa de traçar um futuro. Uma cultura de que se exige a competência de dar um futuro à altura da tradição da famosa Lisboa.” TOSTÕES, Ana - Op. Cit. In Área Metropolitana de Lisboa - Gentes, Paisagens e Lugares. 2004, p.138. 84
85
72
CAMPOS, João Torres - Introdução. In Lisboa EXPO’98. Arquitectura. 1998, p.7.
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em cima 49. Doca do Terreiro do Trigo, 1949. em baixo 50. Vista aérea do Porto de Lisboa, 1967.
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Ainda assim, a dinamização e devolução da frente ribeirinha constitui uma maiores estratégias dentro do plano de 10 anos para a cidade. No qual, o Plano Diretor Municipal faz a caracterização dos espaços ribeirinhos dentro da grande Lisboa, como “espaços sem utilização portuária exclusiva, com funções de equilíbrio ecológico que permitam a dinâmica das marés e de acolhimento de atividades ao ar livre de recreio e lazer, incluindo estabelecimentos de restauração e bebidas, turismo, cultura, desporto, atividades náuticas, designadamente náutica de recreio, náutica desportiva, pesca e atividade marítimo turística, e atividades lúdico - recreativas para usufruto público, onde devem ser asseguradas, sempre que possível, condições de acesso pedonal à margem do rio e de fruição da paisagem ribeirinha”86. Por sua vez, a Câmara Municipal possui um Plano Estratégico para o Porto de Lisboa, onde traça as linhas mestras da infraestrutura até 2025. Segundo o plano, o primeiro passo para a requalificação da frente ribeirinha passa pela definição das áreas estratégicas para o desenvolvimento da atividade portuária, sendo que a execução dos princípios estratégicos elaborados e previstos, fará com que as mesmas passem somente a ocupar pouco mais de cinco quilómetros de extensão na frente da cidade. Onde, um dos seus grandes objetivos, agora já cumprido, era o da ampliação do terminal de cruzeiros. Para tirar partido das potencialidades do estuário, o plano defende de igual modo a reorientação da gestão de náutica de recreio visando a promoção de novos projetos para pontos de apoio à navegação no estuário, assim como formas de integração entre os usos urbanos e os usos portuários ainda presentes. Ao nível da relação da cidade com o rio, o programa realça apenas que deve ser facilitado o acesso mais alargado à prática de desportos náuticos, e que deve continuar a ser promovida a existência de vias pedonais e para ciclistas assim como a sua articulação com o Plano Verde, também igualmente elaborado pela Câmara Municipal. Torna-se importante salientar que, de facto, a evolução dos processos e tecnologias de operação portuária e a consequente modernização das infraestruturas, conduziu ao crescente desenvolvimento de uma nova relação com o rio.
86 Câmara Municipal de Lisboa - Regulamento do Plano Diretor Municipal de Lisboa. 2012, p.97.
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Contudo, e segundo Teresa Craveiro e João Figueira de Sousa, especialistas da área urbanística e portuária da cidade de Lisboa, o grande desafio será conseguir ligar a cidade ao rio sem perder o porto, desafio que constitui, ainda no presente, elevada importância. Sendo por isso, necessário “pensar a cidade sem complexos face ao Porto”, onde uma “requalificação da frente ribeirinha deverá ter em conta o papel do porto enquanto grande infraestrutura integrada no sistema portuário europeu”, garantido consequentemente o “desenvolvimento do cluster do mar”, recriando a cidade de Lisboa como cidade de referência87. Continuando ainda assim a ser fundamental assegurar a multifuncionalidade dos espaços públicos, pois “não se pode construir completamente a frente ribeirinha nem se deve impedir completamente a construção da mesma”88. Principalmente através da criação de uma frente urbana de algum modo ligada ao rio, fundamentada pela riqueza de uma cidade que se alicerça na diversidade e na culturalidade.
51. Slogan objetivos Câmara Municipal de Lisboa. Imagem constitutiva do Plano Diretor Municipal.
“A longa enumeração dos projetos levantados desde Carlos Mardel até hoje deve servir-nos de lição na conjuntura presente. O Porto de Lisboa está já suficientemente estudado. O que falta é fazê-lo”89.
CRAVEIRO, Teresa. Cit. por FILIPE, Joana - Frente Ribeirinha de Lisboa à espera de decisões. Arquitecturas. Nº29 ( Out 2007), pp.4-5. 87
88
SOUSA, João Figueira de. Cit. por FILIPE, Joana - Op. Cit., 2007, p.5.
MELO, António Fontes Pereira de (ministro das obras públicas, 1884). Cit. por FADIGAS, Leonel - Op. Cit. In Lisboa. Conhecer, Pensar, Fazer Cidade. 2001, p.107.
89
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Imagens que mostram a extensão dos terrenos conquistados ao rio, com o edifício dos Sodrés à direita, na atual Praça Duque da Terceira, como ponto de referência. de cima para baixo 52. O Cais do Sodré, 1808. “Embarque de Junot no cais do Sodré”, Henri L’Évêque, e F. Bartollozzi. 53. O Cais do Sodré, 1930.
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3.6 | SÍNTESE
A imagem de muitas cidades europeias encontra-se diretamente relacionada com a sua identidade enquanto cidades que usufruíram ou usufruem de atividade portuária, uma vez que, sofreram diversas alterações e desenvolvimentos a nível urbano devido à sua relação privilegiada com uma determinada frente de água. Sendo cidades que constituem ainda elevada importância histórica e social, sobretudo por terem participado durante séculos nas principais trocas comercias assumindo quase sempre um papel significativo nos movimentos marítimos a nível mundial, e que apresentam, por norma, características muito próprias porém com metodologias de crescimento e transformação muito semelhantes. A atividade portuária, em si, teve um desenvolvimento muito lento até aos séculos XIX e XX. Com a revolução industrial, a expansão do mercado do petróleo e o período pós - Guerras Mundiais, surgiram as primeiras mudanças significativas no contexto portuário e na relação que os portos estabeleciam com os lugares onde se encontravam. Posteriormente, é devido ao aparecimento dos novos sistemas de acomodação de cargas já no final do século XX, que a maioria dos portos transformou por completo a sua relação com a cidade. Ao transferirem-se para territórios fora do tecido urbano central, os portos deixam para trás as suas velhas estruturas e instalações com elevada presença precisamente entre a cidade e o seu reflexo junto à água. Conduzindo ao aparecimento do fenómeno da regeneração e da revitalização das frentes portuárias, que permitiu às cidades a possibilidade de intervenções capazes de construírem uma nova imagem pela oferta de novos usos aos seus habitantes e visitantes. Por sua vez, a contextualização das cidades portuárias, aplica-se no seu todo à cidade de Lisboa, pois possui desde a sua origem uma relação intrínseca com o rio que a desenha e que a compõe. Na realidade, a sua identidade urbana é essencialmente a sua frente ribeirinha pois já no século XVI, constituía uma das maiores potências marítimas da Europa. Como resultado, a relação cidade - rio vai estabelecer-se com importância fundamental na sua vida política, económica, social e cultural, tornando o Rio Tejo um dos principais, se não o principal, símbolo da sua imagem enquanto cidade.
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-05m -30m Limite Lisboa 0
5km
54. Planta de Análise da Morfologia do Estuário do Tejo, onde é possível observar-se as diferentes profundidades que o compõem.
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CASOS DE ESTUDO
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55. Revised Pantheon - PanteĂŁo Revisto. Proposta a concurso para a cidade de Marrakech. FALA atelier, 2012.
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CASOS DE ESTUDO “E a arquitetura é feita para nós a utilizarmos. Não é nenhuma das Belas-Artes. Acho que esta também é a tarefa mais nobre da arquitetura, o facto de ela ser uma arte para ser utilizada. Mas o mais belo é quando as coisas se encontram, quando se harmonizam. Formam um todo. O lugar, a utilização e a forma. A forma remete para o lugar, o lugar é este, e a utilização é esta"90. Todos os projetos pressupõem uma ideia, um conhecimento, uma análise, uma decisão; dos quais, nenhuma parte é mais ou menos importante do que outra. Por essa mesma razão, o conjunto de casos de estudo selecionados, surge como estrutura fundamental da transição realizada entre a componente teórica do presente trabalho e a aplicação da mesma, enquanto princípio, na execução prática do projeto de arquitetura que se propõe realizar. Ao todo, serão apresentados cinco projetos com caraterísticas muito próprias e delineadoras, mas que coletivamente ditam o fio condutor de um pensamento comum. Nomeadamente: o Teatro del Mondo, de Aldo Rossi, pelo poder que uma imagem, ainda que efémera, pode alcançar permanecendo na memória de uma cidade; o Teatro sobre a Àgua, de Tadao Ando, devido à valorização dos elementos naturais do lugar e à sua conjugação com ideias tradicionais e contemporâneas; T-Hall, de Toyo Ito, pela combinação de um conceito assumido com uma complexidade programática intencional; a Casa da Música, do atelier OMA, por ser assumidamente um edifício icónico e por ter uma das mais eficazes e reconhecidas salas de concerto; e por fim a Philharmonic Hall, do atelier Barozzi-Veiga, pela execução de um programa musical como mecanismo para uma revitalização urbana.
90
ZUMTHOR, Peter - Atmosferas. 2006, p.69.
83
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4.1 | TEATRO DEL MONDO, ALDO ROSSI Veneza (Itália), 1979
“A história da cidade é também a história da arquitetura; mas a história da arquitetura é, quando muito, um ponto a partir do qual a cidade pode ser vista”91. O arquiteto italiano Aldo Rossi, constituiu, meritoriamente, um dos maiores nomes da arquitetura moderna. Tendo sido, contudo, um dos maiores críticos das premissas estabelecidas pelo movimento arquitetónico do seu tempo, através da pública manifestação contra o funcionalismo excessivo e contra as interpretações exclusivamente racionalistas enquanto essência do exercício da arquitetura. Apesar de construir segundo a simplicidade geométrica caraterizadora da sua época, o arquiteto desde cedo mostrou uma tendência para edifícios segundo formas puras mas claramente seguidoras de uma reinterpretação das influências clássicas da arquitetura italiana. Tornando-se pioneiro na releitura da arquitetura, ao defender que a função não deve ser legitimadora do discurso arquitetónico pois o mesmo pode estar correlacionado com parâmetros teóricos e com a observação da cidade existente. Acreditando que a arquitetura pode, então, ser uma extensão dos conhecimentos históricos da cidade, Aldo Rossi cria o Teatro Del Mondo inspirado nos seus próprios conhecimentos sobre Veneza, e conciliando dois importantes conceitos defendidos por si: a arquitetura enquanto fato urbano, e a individualidade do fato urbano como potenciador de memória coletiva. Inaugurado em 1979, e colocado em pleno Grande Canal por ocasião da Bienal de Veneza, este teatro surgiu com efeito como um novo fato urbano e como uma arquitetura transitória entre a inovação e a tradição. Inspirado nos antigos teatros flutuantes venezianos92, foi criado enquanto objeto autónomo e itinerante passível de aportar em diferentes locais, constituindo-se como elemento contrastante na imagem da cidade, ainda que disposto a relacionar-se com a mesma tornando-se parte integrante do lugar.
91
ROSSI, Aldo - Op. Cit., 2001, p.165.
DOMINGUES, Ana - Aldo Rossi: o projeto arquitetónico como reflexo da tensão entre permanência e transformação, (s.d.), p.192. 92
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56.Teatro del Mondo aportado no Canal Grande durante a Bienal de Veneza em 1979.
“Também o teatro vinha do mar e estava na laguna como os navios nos portos; José Charters escreveu-me dizendo que aquilo que mais o tinha impressionado é precisamente este vir do mar e ser um elemento limítrofe entre o mar e a terra. Recordou-lhe o seu país e o que dizia o poeta nacional português: ‘Aqui onde a terra se acaba e o mar começa’. Também o teatro me parecia estar num lugar onde acaba a arquitetura e começa o mundo da imaginação ou até do insensato”93. 93
ROSSI, Aldo - Il Teatro del Mondo. Arquitetura e Arte. Nº112 (Mar-Abr 2014), p.131.
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Apesar de construído em estaleiro e transportado até à água, este teatro construído segundo volumes simples, evocava parcialmente características importantes e comuns dos prédios envolventes tipicamente barrocos. Através da estrutura tubular de ferro, desmontável e revestida a madeira, a forma geral do edifício surgia como fruto de uma composição de prismas e, consequentemente, da soma desses mesmos elementos puros, adquirindo por fim uma altura de cerca de vinte e cinco metros. Com capacidade para 290 lugares94, um prisma cúbico central delimitava a área da sala de espetáculo, com planta quadrangular e composta por um sistema de arquibancadas desenvolvidas em lados opostos do palco situado ao centro. Possuía ainda duas galerias superiores acessíveis por escadas, localizadas individualmente nos volumes colocados no exterior e em lados opostos do cubo. Por cima do prisma central, um volume com planta octogonal e cúpula piramidal recebia uma terceira galeria e definia por fim a cobertura do próprio teatro. Ainda na cobertura, uma haste com uma esfera e uma bandeira, ditavam a semelhança com a arquitetura vizinha, compondo a forma final do Teatro del Mondo. Pequenas aberturas nas fachadas laterais da sala, permitiam ainda “ao espectador assistir do seu interior, ao espetáculo da própria cidade”95. (página oposta) em cima 57. Teatro del Mondo, alçados do projeto. Aldo Rossi, 1979. ao centro 58. Teatro del Mondo, plantas do projeto. Aldo Rossi, 1979. em baixo, da esquerda para a direita 59. Teatro del Mondo, esquiço de Aldo Rossi referente ao projeto. Aldo Rossi, 1979. 60. Teatro del Mondo, fotografia da estrutura do edifício durante a sua montagem para a Bienal de Veneza. Aldo Rossi, 1979. 61. Teatro del Mondo, fotografia do teatro durante a Bienal de Veneza. Aldo Rossi, 1979.
No fundo, o teatro de Aldo Rossi, constitui exemplo de uma obra com clara ligação entre presente e passado. Apesar de efémera e contemporânea, conseguiu conquistar continuidade no tempo ao estabelecer vínculos acentuados com a cidade e ao surgir como herdeira do carácter veneziano, criando assim uma óbvia relação entre memória e imagem, conservando-se na iconografia da cidade.
“No Teatro do Mundo, Rossi cria uma arquitetura cuja missão é exclusivamente simbólica, narração e preparação para um acontecimento. O teatro confunde-se com a vida, mostrando alternativamente o vazio do cenário e a presença da memória na cidade de Veneza. Essa obra de Rossi manifesta como o espaço arquitetónico apresenta um valor intrínseco, além das questões funcionais”96.
94
BRETON, Gaelle - Theatres, 1989, p.117.
95
DOMINGUES, Ana - Op. Cit., (s.d.), p.196.
96
MONTANER, Josep Maria - Op. Cit., 2014, p.66.
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4.2 | TEATRO SOBRE A ÀGUA, TADAO ANDO Hokkaido (Japão), 1987
“(...) as construções de Ando são a demonstração de como, apesar do destino que o progresso e a civilização estabeleceram para a arquitetura contemporânea, ainda é possível que esta atue sob o signo da cultura e projete lugares onde se pode morar poeticamente, no pacífico convívio de técnicas e tradição, de natureza e artificialidade, de poesia e funcionalidade”97. O Teatro sobre a Água, apesar de consistir um importante trabalho que nunca chegou a ser construído, foi projetado por Tadao Ando para localizar-se num planalto das montanhas centrais de Hokkaido, um dos lugares mais frios do Japão, e para situar-se a 400 metros de distância da, também de sua autoria, Capela sobre a Água98. Tendo demonstrado desde cedo, uma inigualável aptidão para trabalhar a geometria como base da relação fundamental entre arquitetura e natureza, e todos os materiais em conjunto com luz, água e céu, visando a introdução dessa mesma natureza nas construções, a Capela sobre a Água e consequentemente o Teatro sobre a Água, constituem exemplos de duas grandes obras onde os elementos naturais se fundem por completo com o imaginário do arquiteto. Ambas as construções, foram conceptualizadas de forma a serem colocadas no seguimento do curso de água já existente, para que, desse modo, estivessem visualmente ligadas e geometricamente relacionadas entre si. No fundo, como se fossem dois pontos distintos, contudo essenciais, do mesmo projeto. A presença do curso de água é um princípio importante, uma vez perceptível a inspiração no mesmo
97
DAL CO, Francesco - Tadao Ando. As obras, os textos, a crítica. 2001, p.7.
A Capela sobre a Água assume-se como um dos projetos mais singulares de Tadao Ando, pela formalização de todas as premissas e ideais fundamentais do seu trabalho enquanto arquiteto, e por mostrar ser um dos exemplos reais mais fidedignos daquilo que o mesmo acredita ser a maneira correta de construir com o meio envolvente e de estabelecer uma relação crítica com o lugar. “Uma única linha separa a terra do céu (...) A parede envidraçada que dá para o lago pode deslizar até desaparecer completamente, a fim de permitir a relação direta com a natureza: ouvir o sussurrar das folhas, o som da água, o canto dos pássaros, e perceber assim, por contraste, o silêncio que envolve tudo. Imersos na natureza, confrontamo-nos com nós mesmos, enquanto a paisagem que a arquitetura enquadra muda a cada instante.” ANDO, Tadao - A Capela sobre a Água e a Igreja da Luz. In DAL CO, Francesco - Op. Cit., 2001, p.455. 98
88
(página oposta) em cima à esquerda 62. Teatro e Capela sobre a Água, maquete com os dois projetos e a sua relação com o curso de água preexistente. Tadao Ando, 1987. em cima à direita, e em baixo 63. Teatro sobre a Água, maquete com pormenores do projeto. Tadao Ando, 1987. 64. Teatro sobre a Água, maquete com pormenores do projeto. Tadao Ando, 1987.
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por parte de Tadao Ando na criação tanto da Capela como do Teatro. É notável a presença pura deste elemento, e o seu papel no lugar antes da intervenção, tendo sido posto em evidência pelo arquiteto, e não desviado ou alterado em função da intervenção. Formalmente, o Teatro foi concebido enquanto teatro semicircular, passível de receber 6000 lugares, e segundo uma clara reinterpretação contemporânea de um teatro romano. Aberto sobre um lago artificial em forma de leque, possui também uma ponte que intersecta o teatro e se encontra por cima do lago, adquirindo funções semelhantes ás de um palco convencional. Possui ainda, um alinhamento de colunas que atravessa todo o conjunto arquitetónico, composto respetivamente por lago, teatro e palco elevado. Através do lago artificial e das colunas, é possível perceber-se uma intenção óbvia em criar relações com o meio envolvente. O lago estabelece uma ligação com o elemento água já presente, tornando-se naturalmente a continuação do mesmo, enquanto que as colunas estabelecem uma espécie de ligação com o céu, conduzindo o olhar para as montanhas que envolvem o lugar. Sendo a água um instrumento assumidamente importante na obra de Tadao Ando, a sua presença no Teatro assume ainda um outro papel significativo, o de o transformar ao longo do tempo, tal como acontece com a natureza, sendo que “nas estações mais suaves, proporciona um ambiente ao ar livre para concertos e desfiles de moda, e no Inverno transforma-se em pista de patinagem”99. Característica que comprova mais uma vez a essência do projeto: a integração no lugar e um relacionamento o mais natural possível com o mesmo.
“Architecture is not simply the manipulation of forms. I believe it is also the construction of space and, above all, the construction of a ‘place’ that serves as the foundation for space. My aim is to struggle first with the site and thereby get a vision of the architecture as a disctinct place. The inside and outside of architecture are not separate things but instead form one continuous place”100.
99
DAL CO, Francesco - Op. Cit., 2001, p.288.
ANDO, Tadao - Spatial Composition and Nature. El Croquis. Nº 44-58 (1996), p.349. “A Arquitetura não consiste apenas na manipulação das formas. Acredito que é também a construção do espaço, e sobretudo, a construção do lugar que serve de base ao espaço. O meu objetivo é sempre como primeiro passo lutar com o terreno e, assim, obter a visão da arquitetura enquanto um lugar distinto. O interior e exterior da arquitetura não constituem elementos separados, pelo contrário, formam um lugar contínuo” (livremente traduzido pela autora). 100
90
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4.3 | T-HALL, TOYO ITO Shimane (Japão), 1993
“Theory does not try to resolve problems so much as excite interests: gymnastics of fantasy. It is ultimately the most individual, almost dreamlike moment of the design process, which is always linked to subjectivity, to the exploration of an individual poesy”101. Shimane, uma pequena região com poucos habitantes localizada no Japão, possui um dos mais antigos santuários do país, o santuário de Izumo, criado para preservar a memória dos deuses e deusas que outrora desceram do céu, nesse preciso lugar, para criar a terra. Por essa razão, desde cedo se tornou num dos locais mais atrativos para um elevado número de turistas, transformando-se mesmo num importante centro turístico102. O projeto de Toyo Ito visava complementar a carência local por mais equipamentos, que de algum modo servissem as necessidades tanto dos habitantes locais como dos visitantes que frequentemente se dirigem ao local pelo menos uma vez por ano. Perante a exigência de uma sala multiusos para espetáculos capaz de receber 800 pessoas, uma sala mais pequena com 200 lugares, uma sala para exposições e salas para conferências, o complexo T-Hall surge enquanto proposta final, localizada no centro da cidade, a menos de um quilómetro do santuário, e composta por 3 tipos de teatro: Teatro do Vento, Teatro da Floresta, e Teatro da Água103. O Teatro do Vento situa-se na cobertura do conjunto arquitetónico composto pelos três teatros. Possui uma forma circular e adquire funções semelhantes às de um observatório, permitindo aos turistas uma vista sobre a cidade. Alberga também, um teatro ao ar livre que pretende servir de palco para os habitantes locais executarem as suas danças tradicionais. ITO, Toyo - Theory and Practice. El Croquis. Nº 71 (1995), p.48. “A teoria não tenta resolver problemas, pelo menos não tanto como provoca interesses: é como uma ginástica da fantasia. Em última instância, é o momento mais individual, quase de sonho, do processo de concepção, que acaba por estar ligado à subjetividade, à exploração de uma poesia mais particular” (livremente traduzido pela autora). 101
102
ITO, Toyo - T-Hall project. Op. Cit., 1995, p.172.
103
ITO, Toyo - T-Hall project. Op. Cit., 1995, p.172.
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Por sua vez, o Teatro da Floresta corresponde à sala existente por baixo do Teatro do Vento, tendo esse nome devido às numerosas colunas em torno do teatro e que suportam a cobertura circular. A sala em si possui uma forma retangular e capacidade para 800 lugares, encontrando-se construída segundo o estilo tradicional japonês. Os camarotes, com pavimento em tatami (pavimento modular japonês), desenvolvem-se em dois níveis e em redor da sala e dos corredores que atravessam a audiência para se ligarem ao palco104. Estes corredores, característicos dos teatros asiáticos, surgem como extensão do palco para que os atores possam surgir entre a plateia durante a ocorrência dos espetáculos. O teatro possui ainda um conjunto de painéis refletores que, quando movimentados em direção ao palco, convertem o espaço numa sala destinada a concertos tornando-a mais convencional e acusticamente funcional. Por fim, o Teatro da Água consiste num teatro exterior, construído à volta de um lago artificial situado na entrada destinada ao público correspondente ao Teatro da Floresta. O palco é flutuante e encontrase na água de modo a, durante os concertos e as várias performances de artes tradicionais, proporcionar aos espectadores um ambiente diferenciado pelo contacto com a envolvente.
ao centro 66. T-Hall, secção longitudinal, onde é possível observar-se a relação entre os três teatros. Toyo Ito, 1993.
A obra de Toyo Ito é, sem dúvida, caracterizada pela fluidez entre as formas construídas e o meio natural, e pela incessante inspiração nos princípios da natureza. O projeto T-Hall enquanto solução arquitetónica, representa esses mesmos princípios correspondendo a um todo orgânico definido por uma permeabilidade eficaz face ao exterior. Contudo, é necessário salientar o notável pensamento conceptual que combina três teatros distintos numa só forma construída, conferindo ao projeto uma complexidade programática além da sua flexibilidade proveniente de uma eficaz relação de transparência com o lugar.
em baixo, da esquerda para a direita 67.T-Hall, maquete com pormenores do projeto. Toyo Ito, 1993. 68. Idem. 69. Idem.
“I have always wanted to reduce the gap between architecture and nature. I don’t want people to live removed from nature. I want people to live and work amongst nature as much as possible”105.
(página oposta) em cima 65. T-Hall, planta do piso térreo. Toyo Ito, 1993.
104
ITO, Toyo - T-Hall project. Op. Cit., 1995, p.172.
ITO, Toyo - I think of architecture as a piece of clothing to wrap around human beings. Dezeen Magazine (2014).“Eu sempre quis reduzir o vazio entre a arquitetura e a natureza. Não quero que as pessoas vivam afastadas do contato com a natureza. Quero que as pessoas possam viver e trabalhar, tanto quanto possível, no meio da natureza” (livremente traduzido pela autora). 105
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4.4 | CASA DA MÚSICA, OMA (REM KOOLHAAS, ELLEN VAN LOON) Porto (Portugal), 1999-2005
“For once in his career, Koolhaas has responded to context. The white concrete is a deliberate reflection of the shades of cloud that the brilliant Porto architect Alvaro Siza uses for his buildings in the city”106. A Casa da Música, emblemática sala de concertos da cidade do Porto, foi projetada pelos arquitetos holandeses Rem Koolhaas e Ellen van Loon pela ocasião do evento Porto 2001 Capital Europeia da Cultura. Inaugurado quatro anos depois do previsto, o grande edifício em betão branco e com aparência semelhante ao de um diamante facetado tornou-se num elemento distintivo da imagem da cidade devido à sua forma “que permanece sólida e credível numa era de muitos ícones”107. Devido a questões de simbolismo, visibilidade e acesso, os arquitetos optaram por localizar o mesmo junto à Rotunda da Boavista mas fora do alinhamento dos edifícios antigos preexistentes, colocando-o antes de forma solitária sobre uma espécie de plateau que providencia uma nova praça urbana à zona histórica da cidade. Sob o desejo de se tornar um espaço dedicado em exclusivo à musica, possui um auditório principal com capacidade para 1238 lugares sentados; um segundo auditório mais pequeno, com 300 lugares sentados, flexível e polivalente, capaz de receber qualquer evento através de estruturas possíveis de ser deslocadas ou movidas; salas de ensaio e salas de gravação. Contudo, apesar do programa musical, o edifício tem também como objetivo complementar um conjunto de diferentes funcionalidades destinadas a todo o tipo de utilizadores, possuindo de igual modo uma sala privada, uma sala destinada a programas educacionais, um restaurante, um terraço exterior e um estacionamento com capacidade para 600 automóveis. A ausência de um grande átrio central, permite que todos os espaços se encontrem conetados por um percurso público contínuo e deambulatório, realizado através de escadas, elevadores e plataformas.
106 SUDJIC, Deyan - We got rid of the shoe box. The Guardian. (Abr 2005). “Pela primeira vez na sua carreira, Koolhaas responde ao contexto. O betão branco é uma reflexão deliberada dos tons das nuvens que o brilhante arquiteto portuense Álvaro Siza usa nos seus edifícios na cidade” (livremente traduzida pela autora). 107
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Atelier OMA - Casa da Música. Disponível em http://oma.eu/projects/casa-da-musica
(página oposta) em cima 70. Casa da Música, fotografia de enquadramento do projeto e respetiva relação com a Rotunda da Boavista. OMA, 2005. à esquerda 71. Casa da Música, fotografia do exterior e detalhes da fachada. OMA, 2005. à direita, de cima para baixo 72. Casa da Música, maquete com pormenores do projeto final. OMA, 2005. 73. Casa da Música, conjunto de maquetes referenciais aos diferentes espaços do projeto. OMA, 2005.
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O auditório maior, denominado Sala Suggia em homenagem à violoncelista portuense Guilhermina Suggia, manifesta-se enquanto elemento âncora de todo o edifício, uma vez que todos os percursos se desenrolam à sua volta, e assume-se como a componente de maior interesse da Casa da Música. Possui inúmeras janelas que a ligam visualmente a outros espaços interiores, e dois grandes vãos envidraçados nas extremidades que, ao proporcionarem a ocorrência de concertos sob luz natural, oferecem de igual modo imagens da cidade como pano de fundo aos espetáculos. A estrutura técnica e a ponte de manutenção sobre o palco, constituem elementos criados propositadamente para que a sala possa receber outros estilos de música além da música clássica e sinfónica.
(página oposta) à esquerda, de cima para baixo 74. Casa da Música, fotografia do interior; possível apropriação das escadas como espaço de lazer e permanência. OMA, 2005. 75. Casa da Música, fotografia do interior; Sala Suggia. OMA, 2005. 76. Casa da Música, fotografia do interior; concerto na Sala Suggia. OMA, 2005. à direita, de cima para baixo 77. Casa da Música, planta do quarto piso. OMA, 2005. 78. Casa da Música, planta do oitavo piso. OMA, 2005. 79. Casa da Música, secção longitudinal do auditório principal. OMA, 2005. 80. Casa da Música, secção transversal do auditório principal. OMA, 2005.
Quando comparada com outras salas, a Sala Suggia apresenta um som mais claro e distinto devido ao seu elevado desempenho acústico, proveniente de materiais como o contraplacado de pinho nórdico aplicado nas paredes e tecto, o vidro curvo que visa a compensação e divergência de ondas sonoras, e o tecido aplicado nas cadeiras que permite imitar a presença humana até 70% de ocupação de sala. Possui ainda um tempo de reverberação ideal devido à inexistência de fosso de orquestra e de torre de cena, com os quais a qualidade acústica ficaria reduzida em 30%, sendo que perante a necessidade de apresentar uma ópera, a função de um fosso é simulada pela remoção das primeiras quatro filas da plateia108. Ao contrário de outros projetos que procuram contrariar apenas a típica forma retangular de uma sala de concerto, a Casa da Música diferencia-se pela redefinição da relação entre um interior normalmente inatingível e um exterior maioritariamente público, sendo possível para os visitantes participar nas atividades do edifício e observar os músicos a ensaiar. Por fim, a sua relação de excelência com a música, confere-lhe o estatuto cultural de magnificência que possui até hoje.
“Quando contactamos com um auditório e com músicos percebemos que a arquitetura não é só sobre pensamento racional, é sobre pôr-nos num mundo de sonho, que usa outros meios. O som é um componente especial que os arquitetos usam muito pouco”109. 108
Fundação Casa da Música - Sala Suggia. Disponível em http://www.casadamusica.com/pt/
109 VAN LOON, Ellen. Cit. por SALEMA, Isabel - Elle n van Loon: “O ouro combina muito bem com a arquitetura contemporânea”. Público Cultura - Ípsilon. (Fev 2016).
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4.5 | Philharmonic Hall, BAROZZI VEIGA Szczecin (Polónia), 2007-2014
“This winning project finds a convincing formal and spatial strategy for a city which strives for a better future in a fast changing economy and social patterns, delivering a dignity to urban life and the same time enhancing the city’s specific historical identity with a contemporary monument”110. Szczecin, localizada na zona noroeste da Polónia, é uma cidade que após décadas de dificuldade, encontra-se atualmente num importante momento de transição. A Filarmónica, projetada pelo atelier espanhol Barozzi Veiga, marca essa mudança situando-se no centro da cidade junto ao rio, e no local histórico onde antes existia a Konzerthaus demolida durante a segunda guerra mundial. Estabelecendo uma clara ligação com o passado cultural, surge como uma nova arquitetura contrastante com a paisagem urbana envolvente. Apesar de se diferenciar obviamente quer das torres espalhadas pelo centro da cidade, quer da igreja neogótica na sua proximidade, assim como das próprias estruturas portuárias circundantes, o projeto, a partir de linhas puras mas expressivas, consegue integrar-se formalmente a partir da inspiração pelas formas triangulares dos típicos telhados acentuados, conectando-se com a imagem do local onde se encontra. A partir da grande praça em frente ao edifício, existe um percurso que conduz os visitantes até à forma quase monolítica do projeto que pretende ser um marco presente, orientador e identitário. As suas formas altas definem a estrutura de todo o volume, que, de forma abstrata, parece-se com um grande cristal devido à transparência vibrante proveniente do revestimento em vidro translúcido, fator que lhe confere uma aparência em constante mutação a partir dos reflexos das estações, do céu, e da cidade111.
Excerto da declaração realizada pelo júri, durante a cerimónia de entrega do prémio europeu Mies van der Rohe 2015 para arquitetura contemporânea a Fabrizio Barozzi e Alberto Veiga pelo projeto Philharmonic Hall. Cit. por ARCHDAILY Editorial TEAM - AD Interviews Barozzi/ Veiga. Archdaily (2015). “Este projeto vencedor encontra uma estratégia formal e espacial convincente para uma cidade que ambiciona um futuro melhor durante um período de rápidas mudanças económicas e sociais, proporcionando dignidade à vida urbana ao mesmo tempo que melhora a identidade histórica específica da cidade através de um monumento contemporâneo” (livremente traduzido pela autora). 110
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BAROZZI, F.; VEIGA, A. - 02 estudio barozzi veiga. Afasia Archzine (2015).
(página oposta) em cima 81. Philharmonic Hall, fotografia de enquadramento do projeto e respectiva relação com a envolvente preexistente. Barozzi Veiga, 2014. à esquerda, de cima para baixo 82. Philharmonic Hall, fotografia do exterior; detalhes da fachada. Barozzi Veiga, 2014. 83. Philharmonic Hall, fotografia do interior; vista do átrio principal. Barozzi Veiga, 2014. à direita 84. Philharmonic Hall, fotografia do interior; acessos e vista dos níveis superiores. Barozzi Veiga, 2014.
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O edifício possui quatro usos principais, nomeadamente um grande foyer onde existe uma cafetaria, uma Sala Sinfónica, uma Sala de Câmara e uma área expositiva, todos conectados por uma circulação contínua. Contudo, foi concebido para que o programa, tanto musical como cultural, não ficasse restrito às salas de concerto tendo a capacidade de se infiltrar por todos os espaços, que através de diferentes escalas, diferentes entradas de luz e diferentes revestimentos acústicos, podem ser utilizados para todo o tipo de espetáculos e eventos.
(página oposta) à esquerda, em cima 85. Philharmonic Hall, fotografia do interior; Sala Sinfónica. Barozzi Veiga, 2014. à esquerda, ao centro 86.Philharmonic Hall, fotografia do interior; detalhes da Sala Sinfónica. Barozzi Veiga, 2014. 87. Philharmonic Hall, fotografia do interior; Sala de Câmara. Barozzi Veiga, 2014. à esquerda, em baixo 88. Philharmonic Hall, fotografia do interior; concerto na Sala Sinfónica. Barozzi Veiga, 2014. à direita, de cima para baixo 89. Philharmonic Hall, planta do piso térreo. Barozzi Veiga, 2014. 90. Philharmonic Hall, planta do primeiro piso. Barozzi Veiga, 2014. 91. Philharmonic Hall, secção transversal das duas salas. Barozzi Veiga, 2014. 92. Philharmonic Hall, secção longitudinal da Sala Sinfónica. Barozzi Veiga, 2014.
A entrada monumental constitui um grande espaço vazio, caracterizado pelos momentos de luz natural que potencializam a espacialidade do edifício. É formado a partir dos volumes das duas salas que surgem como que suspensos no interior, e das escadas quase teatrais que conduzem o público a todos os níveis, passando pelas entradas das salas, pela área vip e pelo espaço multifuncional mesmo por baixo das coberturas triangulares, que possuindo diferentes relações visuais com a entrada pode ser utilizado para exposições ou conferências. A Sala Sinfónica, sala principal, possui cerca de 1000 lugares sentados, apresentando-se como uma sala clássica de concerto e como um espaço confortável e quente, devido ao revestimento em madeira através de painéis triangulares dourados criados propositadamente por razões acústicas. A Sala de Câmara, ou blackbox, possui cerca de 200 lugares para receber todo o tipo de pequenos concertos. Ambas as salas possuem luz natural, o que na sala maior proporciona diferentes tipos de ambiência obtidos por reflexos dos painéis dourados. Por fim, a fachada foi desenhada como uma pele dupla com aparência homogénea, fornecendo ventilação e isolamento acústico, mas sobretudo uma iluminação complexa. Característica que confere ao edifício a possibilidade de se tornar numa “caixa de luz” durante a noite, marcando ainda mais a sua presença e o seu papel na cidade.
“Projects begin and end, and after a few years when their contexts are part of our lives, disappear. Then, they become part of the memory, which we believe, is the place where everything makes sense”112.
BAROZZI, F.; VEIGA, A. - 02 estudio barozzi veiga. Afasia Archzine (2015) “Os projetos começam e acabam, e após alguns anos quando os seus contextos fazem parte das nossas vidas, desaparecem. Aí começam a fazer parte da nossa memória, que acreditamos ser o sítio onde tudo faz sentido” (livremente traduzido pela autora).
112
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4.6 | Síntese
Os cinco projetos selecionados como casos de estudo, permitem de algum modo uma abordagem analítica de aspetos tanto teóricos quanto práticos, passando pela hipótese, pela ideia, pela complexidade, pelo conceito, e pela arquitetura. Contudo, não representam na sua totalidade bases conclusivas ao trabalho que se pretende desenvolver, uma vez que influenciaram o percurso do mesmo, pontualmente e devido a caraterísticas muito particulares. Complementando princípios desde o construído ao não construído, do existente ao já não existente, do lugar natural ao lugar urbano, do teatro à música, ou do objeto à arquitetura, todos permanecem de forma crítica na procura pela compreensão de uma arquitetura relacionada quer com o território, quer com a especificidade programática, ou mesmo com a problemática da iconicidade. Individualmente, importa assim ressaltar a experimentalidade e simplicidade de um teatro que pela sua pureza formal se fez distinguir numa cidade histórica e repleta de ritmos preexistentes, como constitui o Teatro Del Mondo visionado por Aldo Rossi; a importância que o lugar e os elementos mais significativos desse lugar podem ter na concepção do exercício de projeto, como acontece com o elemento água no Teatro de Tadao Ando; as variantes que a constituição de um espaço destinado à performance pode adquirir sem menosprezar a diversidade e intensidade de um conceito ou ideia, como é exemplo o conjunto T-Hall de Toyo Ito; a eficiência absoluta de um programa que sobressai muito além da forma do edifício, que por si só já nasce com a pretensão de ser um ícone arquitetónico, transformando-o numa referência mundial não só pela arquitetura mas sobretudo devido à sua perfeita sala de concertos, como acontece na Casa da Música projetada por Rem Koolhaas e Ellen van Loon; e por fim, o cuidado na criação de uma relação de profunda harmonia entre a arquitetura, as pessoas e a envolvente, como podemos observar no projeto Philharmonic Hall da autoria de Fabrizio Barozzi e Alberto Veiga. Como um todo, assumem-se enquanto representação da escala de desenvolvimento das diferentes diretrizes criadas e associadas ao contexto prático do trabalho de projeto, e a dimensão que um programa cultural pode exercer na apropriação dos espaços da cidade.
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“Vivemos numa época de especialização crescente das formas e dos géneros das artes performativas (...) Nenhum espaço indistinto poderá responder ás soluções específicas de todos estes géneros. Alguns terão de ser concebidos com um destes terrenos como único alvo; outros serão capazes de acumular mais de um objetivo, mediante uma capacidade técnica também ela à partida mais diversificada. Mas cada vez mais essa noção de finalidade é indispensável do próprio ato da concepção e construção do edifício (...) Construção material e criação artística imaterial formam aqui as duas faces inseparáveis de uma mesma moeda”113. NERY, Rui Vieira - A Sala de espetáculos como espaço arquitetónico e como projeto cultural vivo. Arquitetura Ibérica. Nº8 Cultura (Mai-Jun 2015), p.36.
113
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93. Doca da Ribeira, Porto de Lisboa.
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OUTRA VEZ TE REVEJO LISBOA E TEJO E TUDO 114 “Outra vez te revejo, Cidade da minha infância pavorosamente perdida... Cidade triste e alegre, outra vez sonho aqui...” O excerto do poema Lisbon Revisited - Lisboa Revisitada de Álvaro de Campos (Fernando Pessoa), marca o início do capítulo que pretende explorar efetivamente um regresso à frente ribeirinha de Santos, focando-se no projeto de arquitetura proposto enquanto exercício prático fundamental ao presente trabalho. Visando um melhor entendimento das premissas aplicadas, será realizada uma breve contextualização do lugar de Santos-o-Velho, uma vez ser necessária a compreensão da cronologia histórica referente ao primeiro Aterro de Lisboa, que agora compreende a frente ribeirinha onde se pretende intervir, bem como o processo evolutivo que conduziu ao seu estado atual. Posteriormente, e através da concepção do Auditório do Tejo enquanto solução arquitetónica adotada, irá ser apresentada a memória descritiva correspondente à nova identidade cultural aplicada na qualidade de intervenção construtiva e metodologia projetual.
“Há um mundo de lógica básica na construção que representa a única parte da arquitetura que se pode discutir de um ponto de vista objetivo. O único discurso possível sobre a arquitetura é o da construção; qualquer outro é demasiado impreciso e subjetivo”115. CAMPOS, Álvaro (heterónimo de Fernando Pessoa) - Lisbon Revisited. In Poemas. Disponível em http://arquivopessoa.net/textos/158
114
115 MOURA, Eduardo Souto de. Cit. por SILVA, Helena Sofia; SANTOS, André - Coleção Arquitetos Portugueses - Souto de Moura. 2011, nota introdutória.
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5.1 | O LUGAR DE SANTOS-O-VELHO
De acordo com a história, o lugar de Santos remonta ao início do Cristianismo, recebendo o seu nome como memória da tragédia dos Santos Mártires de Lisboa, Veríssimo, Máximo e Júlia116, que uma vez atirados ao Tejo, teriam dado à costa e sido aí sepultados. Sabe-se também, que D. Afonso Henriques mandou construir uma Igreja no mesmo sítio em memória do acontecimento, que decide doar mais tarde aos cavaleiros da ordem de Santiago. Só quando D. Sancho I concede um convento para as comendadeiras da mesma ordem, e D. João II manda construir um novo, em outro lado da cidade, é que a área anteriormente ocupada pelo velho Mosteiro das Comendadeiras de Santos, passa a ser conhecida como Santos-o-Velho. Composto pelos areais de Santos, em conjunto com a praia da “Boa Vista”, e localizando-se proximamente ao estaleiro da Ribeira das Naus, desde cedo possuiu importância para a cidade e para o seu esplendor portuário, onde antes do terramoto (1755) já fazia parte da extensa “praia de Lisboa” compreendida entre Xabregas e Belém. Contudo, a zona que outrora era conhecida pelas suas “tradições boémias”117 e vivência popular, após o terramoto transforma-se no lugar de eleição para a maior parte das indústrias, sendo o local onde habitavam os principais estabelecimentos fabris. Durante a década de 40 do século XIX, o bairro da Boavista tornou-se por excelência o principal bairro industrial de Lisboa, especializandose no sector metalúrgico. Por sua vez, a Rua da Boavista, então artéria principal de Santos, compunha-se fundamentalmente por cais, estaleiros, depósitos de matérias-primas, barracões e telheiros, comunicando com o rio através de boqueirões abertos em leque sobre o mesmo, onde atracavam as embarcações de carga e descarga, e onde, consequentemente, acumulavam-se os detritos das oficinas e os cascos de navios abandonados.
“Tem a freguesia o seu nome ligado ao episódios dos Santos Mártires de Lisboa, filhos de um nobre Senador, supliciados por ordem do delegado de Diocleciano por serem seguidores do Cristianismo e por andarem pela Colónia a divulgar esta fé contrária aos interesses de Roma. Teriam sido arrastados pela cidade (...) Atirados ao Rio Tejo, os cadáveres deram à costa e teriam sido sepultados no lugar de Santos.” ALVES, Maria Paula; INFANTE, Sérgio - Lisboa freguesia de Santos-o-Velho. 1992, p.21. 116
117
108
DIAS, Marina Tavares - Lisboa Desaparecida 3. 1992, p.121.
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Três momentos distintos do Aterro e Avenida 24 de Julho. Imagens tiradas do mesmo ângulo, onde se pode ver à direita a evolução do Mercado da Ribeira (antes do terramoto - Ribeira Velha, junto ao rio e em frente à casa dos bicos; depois do terramoto Ribeira Nova, após demolição do Forte de São Paulo; em 1822 - Mercado 24 de Julho, ao qual o povo continua a chamar de Ribeira Nova; 1905 - Mercado da Ribeira, após o fim da Ribeira Velha). em cima 94. Rua 24 de Julho, com o Mercado, ainda em recuperação após o incêndio de 1893, e respetiva feira que decorreu no aterro entre 1902 e 1927. ao centro 95. Rua 24 de Julho convertida em Avenida após a reconstrução do Mercado em 1930. em baixo 96. Avenida 24 de Julho, e respetiva organização viária.
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Por conseguinte, a praia da Boavista, tornou-se conhecida pelas famosas “Lamas da Boavista” enquanto “espécie de praia infecta que na baixa mar se tornava um monturo de dejetos, devido à inexistência de canalizações sobre o rio e à ocupação selvagem da zona quer pelas atividades piscatórias quer por fábricas e oficinas”118. Posteriormente, a sucessão de epidemias que atingiu Lisboa, a meio do século, e que provocou um mortífero surto de febre amarela, conduziu à necessidade urgente de saneamento da praia e dos bairros adjacentes. A decisão de aterrar a praia da Boavista originou, assim, o aparecimento do primeiro grande Aterro da frente portuária da cidade.
“Remolares, Cata-que-farás, Ribeira Nova, São Paulo, Boa Vista, foram tudo praias ribeirinhas que acabaram por dar - na conquista do rio - o que principiou por se chamar o Aterro, designação extensiva que depois se formalizou em Av. 24 de Julho”119. A obra do Aterro surgiu como a grande obra pública do século XIX, que visava a regularização da margem do Tejo através do enchimento de terras, numa distância de 50 metros entre a linha de costa natural e o rio. A “monumental terraplanagem”120 projetada pelo engenheiro José Vitorino Damásio, que transformava os antigos boqueirões em ruas travessas e que garantia a salubridade da Boavista organizando as instalações industriais, daria depois o mote para a precedente extensão do aterro destinada à instalação do Porto de Lisboa desenhando o novo limite entre cidade e rio.
(página oposta) 97. Estação da Rocha Conde d’Óbidos, 1935. Vista das escadas do Palácio do Conde d’Óbidos, fundado no século XVII e que desde 1919 é propriedade da Sede da Cruz Vermelha Portuguesa (hoje, localizado junto ao Museu de Arte Antiga).
Assim sendo, foi em 1855 que a praia da Boavista testemunhou a substituição do seu areal por terra, sendo que em 1858 o Aterro já se encontrava entre o antigo Forte de São Paulo, agora Praça D. Luís I, e a praia de Santos. No mesmo ano a Câmara expropriou o Palácio dos Marqueses de Abrantes, situado em frente à praia, para rasgar a Rua 24 de Julho que em conjunto com a Rampa de Santos (Calçada de Santos) já ilustrava a obra de Eça de Queiroz. Concluído até à Ribeira Nova (Mercado da Ribeira) em 1865, o Aterro terminava no caneiro de Alcântara já por volta de 1867, data provável da sua conclusão. No ano 1928, ocorre a grande transformação para a Avenida 24 de Julho. HENRIQUES, Raquel - Op. Cit. In Lisboa. Conhecer, Pensar, Fazer Cidade. 2001, p.57.
118
119
ARAÚJO, Norberto. Cit. por JANEIRO, Maria João - Op. Cit., 2006, p. 130.
120
CUSTÓDIO, Jorge - Reflexos da Industrialização. In O Livro de Lisboa. 1994, p.460.
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5.2 | A FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
Tendo sido comprovada a importância da frente ribeirinha de Santos, quer pelo seu papel enquanto representação industrial máxima de Lisboa, quer pela sua influência na construção da imagem da cidade enquanto cidade, a realidade mostra-nos ainda assim que a mesma se mantém descontextualizada em relação à sua proximidade com o plano de água e sem funções de interesse capazes de a oferecer enquanto espaço público de eleição. Apesar de possuir no presente atividades que continuam sob o controlo da Administração do Porto de Lisboa, nomeadamente o estaleiro naval da Rocha Conde d’Óbidos, a frente em si permanece apenas com utilidade pública significativa durante a noite, devido à proximidade à estação do Cais do Sodré e pelo proporcionamento de espaços destinados unicamente à faixa etária jovem. Porventura, devido às funções ainda no ativo referentes à reparação de navios e à descarga e carga de contentores, ou devido à descaraterização aparente de toda a zona envolvente da Avenida 24 de Julho, a frente ribeirinha de Santos permutou-se durante o resto do século XX e início do século XXI como a única zona ainda portuária perto do centro da cidade, contudo caracterizada somente por armazéns devolutos do século XIX, alguns restaurantes de interesse e uma escola náutica junto à estação de comboios. Atualmente, a freguesia de Santos-o-Velho encontra-se face a um conjunto de medidas que visam o melhoramento e a reestruturação urbana do bairro histórico, e a revitalização da margem junto ao rio. Existindo o Plano de Pormenor para o Aterro da Boavista, da autoria do arquiteto João Luís Carrilho da Graça, e o Plano de Requalificação do Cais de Santos, da autoria da Câmara Municipal de Lisboa. O Plano de Pormenor, apesar de realizado já no passado ano de 2008, continua em atualização e parcialmente em vigor, tendo por base a reinterpretação da presença dos antigos boqueirões característicos da essência do Aterro, que mesmo quando construído não conseguiu evitar a presença dos mesmos. O Plano prevê, por isso, o desenho de novos edifícios em lotes estreitos, perpendiculares ao rio e integrados no conjunto urbano, mantendo assim a origem natural do lugar.
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98. Vista aérea da Avenida 24 de Julho e da zona que ficou conhecida por Cais do Gás, sendo visível o edifício neogótico da Fábrica do Gás construído em 1865 por J. Eduardo Arhends.
“Sempre que construímos - o que quer que seja - já lá existe alguma coisa. Não consigo imaginar um sítio sem nada. Qualquer sítio está sempre muito marcado por uma série de situações existentes, de várias naturezas”121.
121
GRAÇA, J. L. Carrilho da - Carrilho da Graça. 2014, citação do arquiteto em 2009.
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A CIDADE E O RIO
à esquerda 99. Maquete para apresentação da nova Sede da EDP, com representação do plano para a zona Nascente do Aterro. à direita, em cima 100. Planta gráfica do Plano de Pormenor para o Aterro da Boavista, realizado por J. L. Carrilho da Graça em 2008. à direita, em baixo 101. Relação do Plano de Pormenor com o desenho dos antigos boqueirões.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
Exemplo disso, constitui a já obra realizada pelos arquitetos Aires Mateus para o edifício Sede da EDP, Energias de Portugal, onde é perceptível o respeito pelas diretrizes do Plano de Pormenor, uma vez que se encontra junto à Avenida, e que, apesar da óbvia presença de toda a estrutura correspondente à linha férrea do comboio e elétrico, consegue manter um coeso plano de vistas em direção ao rio. Por sua vez, o Plano de Requalificação do Cais de Santos realizado em 2011 mas ainda não aplicado, encontra-se inserido no conjunto de intenções do Plano Estratégico para o Porto de Lisboa, abrangendo precisamente toda a área urbana entre o Cais do Sodré e a Rocha Conde d’Óbidos. Segundo o documento estratégico do concurso público para o referente plano, o mesmo prevê a demolição e a reconversão de alguns dos armazéns existentes, a implantação de atividades aquáticas e relacionadas com a náutica de recreio, e a criação de uma área marítimo turística. Em relação ao espaço público, o plano pretende um novo alinhamento arbóreo, ciclovias, acessos pedonais e possíveis passagens aéreas, um novo sistema viário complementado por túneis que liguem a Avenida 24 de Julho à margem do rio e localizado para lá das barreiras que as dividem, e por fim, parques de estacionamento público. Contudo, é necessário salientar, os decorrentes trabalhos por parte da Câmara Municipal de Lisboa, que visam a “devolução do convívio com o rio”, como a requalificação do espaço público no Cais do Sodré - Corpo Santo com ligação à Ribeira das Naus, e a intervenção no Campo das Cebolas e Doca da Marinha. Sendo possível imaginar no futuro, e em conjunto com uma nova frente ribeirinha de Santos, a tão esperada nova imagem para Lisboa: a de uma cidade que continua no rio, e de um rio que nunca se descontinuou da cidade.
“Os aterros não representam nem representaram um fim em si mesmo pois são e foram o modo de obter o pretendido - espaços planos de caráter público. Foram e são a solução técnica que permite a construção de novos territórios conquistados ao rio” 122.
122
DURÃO, Vitor - Op. Cit., 2012, p.28.
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A CIDADE E O RIO
5.3 | IDENTIDADE MEMORIAL
“Todo o gesto expressivo apura, através do poder da razão, aquilo que a sensibilidade percebe, abre novos horizontes e torna manifesto o que ainda é desconhecido no tempo e no espaço. Penetrar toda a espécie de fenómeno, a acumulação da história, as oscilações do presente, aquilo que está suspenso no futuro, ou o bater do coração da terra, as vibrações da luz, o dinamismo de uma cidade, ou ainda o tempo e o espaço, é possível se se puser à prova a sensibilidade da maneira mais profunda e precisa”124. O lugar onde se pretende intervir não é só um lugar, é também uma história, uma imaginação e um acontecimento. É sobretudo memória e identidade da convivência dos dois elementos que o compõem, da importância do Tejo para Lisboa, e de Lisboa para o Tejo. Apresenta-se como uma longa linha horizontal pautada de forma silenciosa pelos armazéns descuidados, onde a sua monumentalidade começa onde acaba o Porto e acaba onde começa o Cais do Sodré, permitindo assim uma infinta vista sobre o rio. Os carris, que correm entre as árvores, envergonhados e meio que escondidos, marcam essa horizontalidade relembrando-nos outrora da ligação física que unia a paisagem portuária aos pontos onde as varinas costumavam aguardar a chegada do peixe. Agora alcatroados, apenas desenham uma continuidade paralela com a água, delimitando a distância entre os antigos ancoradouros e os bancos que marcam a saudade e a consciência do passado que habitou aqui. Neste lugar, está-se no limite entre o alcançável e o inalcançável, onde a linha que define a terra está abertamente a olhar para o rio, tocando no mesmo através dos seus braços que se estendem em forma de cais. Neste lugar, as pessoas passam e andam, os carros passam e ficam, e os barcos já não voltam. O ruído do comboio permanece como o ruído da cidade ao longe, o som das gaivotas é o som do Tejo, e o silêncio do nada relembra a essência de um espaço que está à espera para o ser.
ANDO, Tadao - Experimentar através da sensibilidade. In DAL CO, Francesco - Op. Cit., 2001, p.467. 124
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
“Ao longo dêste cais enorme e maltratado, sobre o rio de águas turvas e barrentas estende-se o mercado... (...) O mercado é agora um monte de destroços onde uma velha bruxa passa, arrastando os ossos. (...) Ingénua e linda apenas um nota: Ao longe, sobre o Tejo, um vôo de uma gaivota”123.
102. Antigo armazém industrial, na frente ribeirinha de Santos, 2015.
CASTRO, Fernanda - O Aterro. Cit. por JANEIRO, Maria João - Op. Cit., 2006, p. 149.
123
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A CIDADE E O RIO
em cima, da esquerda para a direita 103. Barcos de Pesca no Cais da Ribeira, 1930-1980. 104. Venda de peixe no Cais da Ribeira, 1930-1980. 105. Varinas à espera do peixe no Cais da Ribeira, 1930-1980. em baixo 106. Descarga do peixe no Cais da Ribeira. (página oposta) em cima, da esquerda para a direita 107. Antigo ancoradouro, 2015. 108. Apropriação dos cais, 2015. 109. Relação cais-água, 2015 em baixo, da esquerda, para a direita 110. Relação armazém-cidade, 2015. 111. Antiga estrutura industrial, 2015.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
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A CIDADE E O RIO
5.4 | A SALA DE ESPETÁCULOS COMO INTERVENÇÃO ARQUITETÓNICA
Historicamente falando, Portugal possui dois tipos de edifícios dentro do contexto das salas de espetáculo. Um referente aos teatros ancestrais construídos segundo os grandiosos exemplos italianos; o outro referente aos cine-teatros que foram surgindo nos centros das grandes e médias cidades no decorrer do século XX. Porém, é difícil estabelecer qualquer tipo de relação entre ambos, uma vez que o primeiro caracteriza-se pela pequena dimensão das suas salas, enquanto que o segundo constitui já uma arquitetura sobre-dimensionada onde cada sala pode ter um valor superior a mil lugares sentados. Obviamente, tanto um como o outro, acabaram por assumir tipos arquitetónicos praticamente inexistentes, uma vez que do primeiro modelo somente restam ruínas, com excepção do Teatro Nacional de São Carlos, e do segundo poucas construções foram sendo realizadas, salientando-se apenas a Aula Magna da Universidade de Lisboa e o grande auditório da Fundação Calouste Gulbenkian, ambos dos anos sessenta do século passado. Claramente, o Centro Cultural de Belém, veio mais tarde preencher algum do vazio existente face a este tipo de momentos. Contudo, já nada tem a ver com os princípios fundadores de base, surgindo apenas dentro do contexto dos anos noventa, caracterizado pelo elevado investimento disponibilizado a estruturas culturais e desportivas, ou minimamente relacionadas com o lazer. Não esquecendo também, o problema provocado pelo surgimento não controlado dos denominados pavilhões multiusos que visavam ser capazes de acolher qualquer tipo de espetáculo, mas que no fundo acabaram por revelar-se possuidores de salas pobres face ás exigências de um determinado tipo de evento. Esta inadequação, fez com que nos dias de hoje, Portugal tenha de facto um vasto conjunto de salas diferenciadas, porventura nenhuma cem por cento adequada a um tipo de realização mais exigente e com maior qualidade. Surgindo como excepção o projeto da Casa da Música no Porto, o mais recente em Portugal dentro do género, que deve o seu sucesso ao fato de ter sido criada maioritariamente para um tipo de programa em específico, nomeadamente, um programa musical. Sendo por isso, considerada a principal sala de concertos de uma só cidade.
120
UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
Contudo, a música também faz parte da identidade histórica e cultural de Lisboa, sendo que ainda é presente a memória da outrora existente Ópera do Paço da Ribeira, ou Real Casa da Ópera, construída em 1755 e destruída pelo terramoto. Localizava-se precisamente na zona da Ribeira das Naus, anexo ao antigo Paço da Ribeira, tendo sido encomendada por D. José I ao arquiteto italiano Giovanni Carlo Galli Bibiena, que pretendia uma enorme sala com capacidade para 600 pessoas, para poder ouvir as melhores óperas que pudessem existir125. A obra acabaria por se caracterizar pela sua extrema beleza e decoração faustosa com interiores revestidos a ouro.
“Não condiz com um reino que S. M. achou na ultima miseria, vendose na edade do ferro, podendo aliás seu pae fazer que elle vivesse na edade de oiro; e nao havendo este de sobejo, não se póde, nem deve, sustentar a magnificiencia, o esplendor, e o gosto de um theatro com uma orchestra soberbissima, respeitada pelos Embaixadores estrangeiros como a primeira do mundo”126.
112. Maquete da Cidade de Lisboa anterior ao terramoto, onde se pode ver no canto inferior esquerdo a zona do Palácio Real, e a Ópera do Tejo em frente à Ribeira das Naus.
125
COELHO, Alexandra - Os segredos da Ópera do Tejo. Público Cultura - Ípsilon. (Abr 2009).
126
CASTILHO, Júlio de - A Ribeira de Lisboa. 1893, p.411.
121
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Como que um fantasma da cidade, a icónica Ópera do Tejo como ficou conhecida até hoje, apenas recebeu uma ópera nos seus escassos meses de vida, permanecendo ainda assim como símbolo da sala de concertos que a cidade nunca mais voltaria a ter. Se pensarmos nesta Casa da Ópera como uma reminiscência da musicalidade que outrora pairou sobre Lisboa, de alguma forma, a música parece ainda possuir um tipo de relação com a cidade e mesmo com o rio. Não só pela história, mas também pelo facto de, metaforicamente falando, a própria frente ribeirinha servir quase como que de palco para o próprio Tejo. Refletindo por fim sobre a importância de que nenhum espaço poderá corresponder verdadeiramente às soluções requisitadas por todos os programas, e que futuramente cada um individualmente deveria ser concebido apenas sobre uma especificidade, torna-se plausível pensar que investir num lugar para a música, qualquer que ele seja, é investir de igual modo numa nova identidade e imagem cultural, digna de uma cidade que é espelho da sua herança histórica.
“(...) um auditório ou uma sala de espetáculos não são monumentos arquitetónicos de finalidade e validade autónomas; são suportes essenciais do programa de atividades que para esses espaços foram pensados, e a sua eficácia depende, afinal, da capacidade de ocupação e utilização que esses objetos demonstram para com o edifício ou edifícios que os acolhem. Pensar numa sala de espetáculos tem de ser pensar também num projeto cultural a curto, médio e, se possível, longo prazo. Por isso os teatros à velha italiana se revelaram na sua época tão eficazes, e tão susceptíveis de serem copiados e desdobrados um pouco por todo o espaço de cultura europeia“127. Contemplando o texto de Rui Vieira Nery, e tendo também como premissa a então reconhecida como dimensão cultural nos processos de intervenção em frentes de água, surge como hipótese de trabalho, a inserção de um programa músico-cultural com possível estatuto icónico, e como estratégia potencializadora da revitalização urbana da ainda descaracterizada frente ribeirinha de Santos.
127
122
NERY, Rui Vieira - Op. Cit., 2015, p.35.
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5.5 | UM LUGAR PARA A MÚSICA
“Esse direito à cidade deve ser ampliado com a exigência do direito à memória, à beleza e aos lugares para a expressão da comunidade. Eis o lugar metropolitano da arte”128. A proposta arquitetónica que se pretende apresentar, desenvolve uma lógica espacial consolidadora da margem de Santos enquanto uma possível e viável centralidade urbana. Possui como objetivo principal transformar a referenciada frente-rio num lugar dedicado à valorização da música, na qualidade de elemento agregador de um conjunto de intervenções que pretende restaurar a presença do extenso plano de água na vida quotidiana da cidade. A frente ribeirinha de Santos, enquanto lugar para a música, prevê assim uma proposta a nível urbano que visa a revitalização do mesmo através da criação de atividades programáticas distintas que complementem a estabilidade da intervenção face às necessidades do território, e a inserção de um edifício icónico como essência das intenções principais que se propõe cumprir. Por sua vez, a reflexão prática do projeto sugere uma arquitetura que permite a flexibilidade e a permanência do uso de diferentes espaços como continuidade da cidade, e um desenho geral do espaço público que comporta momentos de contemplação do rio, segundo uma potencialização do passeio ribeirinho já existente. Enquanto conjunto urbano, compreende um espaço museológico junto ao Porto de Lisboa, considerando a conversão de duas docas secas em exposição ao ar livre; a transformação do alinhamento de armazéns junto ao Cais do Sodré na Escola Náutica do Tejo; a criação de um Complexo Desportivo e Piscinas Públicas, que complementem os desportos náuticos; e por fim, a reabilitação dos restantes armazéns para novos usos, como comércio e restauração. Enquanto espaço público de excepção na cidade, promove o contacto com o meio natural envolvente através de novos percursos pedonais, novas zonas verdes, e áreas destinadas a atividades ao ar livre.
128
MONTANER, Josep Maria - Op. Cit., 2014 p.133.
123
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113. Um Lugar para a Música. Imagem do pontão onde se pretende intervir através de uma nova identidade cultural.
?
124
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Enquanto resposta à intenção de tornar o espaço mais acessível, utilizável e atrativo, propõe ainda uma nova delimitação viária, novos pontos de estacionamento, a permanência de passeios públicos, delimitações visuais através de um novo conjunto arbóreo, e um pequeno equipamento de recepção de bicicletas. O elemento catalizador da nova identidade do lugar, surge consequentemente como o edifício principal da intervenção prática e arquitetónica, que devido ao seu estatuto icónico vai receber e albergar o programa cultural e musical. Ambicionando um restabelecimento da relação entre a cidade e o rio, o mesmo encontra-se no único ponto de quebra da horizontalidade tão caraterística da frente do aterro, criando assim um novo eixo perpendicular à margem da água. Este eixo manifesta-se como um prolongamento desde o Largo de Santos, atravessando o aterro paralelamente ao armazém onde se encontra o conhecido restaurante Kais, até ao pontão que mais avança sobre o Tejo. Sendo este, o local onde se fixa então o novo ícone da cidade de Lisboa, evidenciando-se e assumindo-se autónoma e vigorosamente em cima do rio, compondo a paisagem cinematográfica da cidade. O novo alinhamento urbano é composto ainda pelo desenho do espaço público resultante da intervenção que se encontra no nível inferior ao do pavimento térreo, e que complementa a unidade programática constitutiva do edifício icónico. Para tal, considerou-se a única demolição efetuada no sítio, aplicada ao maior armazém industrial presente no aterro, situado junto ao Kais e em avançado estado de ruína. Com o propósito de acentuar a delimitação criada, cuja ligação prevalece além da presença da barreira física que constitui a linha férrea e referentes estruturas, é proposto também uma nova ponte pedonal como meio de comunicação entre a zona histórica de Santos e a frente ribeirinha. Este elemento representa um importante papel na transição entre os dois espaços, marcando o momento de chegada e partida em ambas as fronteiras da cidade. Em suma, o projeto de arquitetura que se apresenta para a frente ribeirinha de Santos, pretende acima de tudo complementar as funções já existentes, assumindo o ainda presente Porto de Lisboa, e aplicar uma identidade cultural absorvida pelo tema da música como regulador da intensidade de atividade e de permanência no lugar.
125
A CIDADE E O RIO
5.5.1 | O CONCEITO
“A atmosfera comunica com a nossa percepção emocional, isto é, a percepção que funciona de forma instintiva e que o ser humano possui para sobreviver (...) A percepção emocional conhecemos por exemplo da música (...) Em relação à arquitetura também é um pouco assim”129. O espaço construído tem como base conceptual o princípio de se relacionar intimamente com os elementos naturais que compõem a arquitetura do lugar - terra, água e luz - tornando-se um potenciador da valorização e integração dos mesmos, e devolver a música ao Tejo criando espaços segundo uma composição de silêncios e sonoridades provenientes de uma possível promenade interpretativa. O edifício icónico, enquanto exercício metafórico, pretende assim pertencer ao extenso plano do rio, comunicar visualmente com a cidade e relacionar-se sobretudo com a luz de Lisboa. Sendo que, enquanto complemento ao imaginário da cenografia urbana que abraça o seu mar, procura na pureza do meio natural e na pureza da música, o enaltecer da pureza das suas formas delineadoras e arquitetónicas. Através dos elementos terra e água, a forma do objeto arquitetónico manifesta-se segundo o avanço sobre o rio, no sentido em que a construção humana pode desafiar, ou mesmo incorporar, os elementos naturais no seu espaço. Destacando, assim, o modo como o limite entre ambos pode ser atenuado, potenciando um cenário que funde e proporciona as suas qualidades inerentes. Por fim, através do elemento luz, procura encontrar novas percepções espaciais, sincronizadas com diferentes ambientes interiores e exteriores. Em relação à componente musical, procura relacionar-se com a essência da música enquanto perímetro que se estende até ao mundo exterior. Utilizando as premissas do teatro grego, enquanto espaço consagrado e compreendido no território, procura também redescobrir a verdadeira naturalidade e realidade primária da ação performativa.
129
126
ZUMTHOR, Peter - Op. Cit., 2006, p.13.
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114. Esquema conceptual do Projeto. Do Lugar ao Ícone.
127
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5.5.2 | A IMAGEM
“A arquitetura revela plenitude quanto os materiais, a geometria e a natureza estão fundidos juntamente, e ao homem se manifesta uma visão que, como acontece no Panteão, só a arquitetura pode oferecer”130. Como uma caixa de música, o projeto assume a forma de um cubo suspenso sobre a margem do rio, exibindo o pontão onde se encontra aparentemente intacto. A leitura máxima do edifício é feita através da possível habitabilidade dos seus seis planos, sendo que as suas quatro faces principais escondem parcialmente a massa arquitetónica e programática que se situa no interior. A sua imagem exterior surge com ritmo semelhante à de uma pauta musical, sendo que o edifício que produz, enquanto objeto lumínico e semitransparente, revela uma segunda pele desconstrutiva da forma cúbica original. O elemento água assume também um importante papel na caracterização do cubo, delimitando a forma do mesmo e reforçando a sintonia entre o natural e o construído, entre o rio e o edifício icónico. No interior, o edifício é organizado segundo um volume funcional de carácter monolítico, inscrito sobre um espaço de circulação que se desenvolve em seu redor, sendo limitado pela fachada exterior em toda a sua cércea. O volume monolítico compreende uma fusão volumétrica entre a pureza de duas formas geométricas elementares, círculo e quadrado, assumindo uma forma em “gota” que realça a singularidade das linhas curva e recta na composição geral dos diferentes espaços. Este modelo é utilizado enquanto estratégia de desenho do programa e acessos, configurando uma leitura global simétrica e equilibrada do projeto. Por sua vez, o espaço de circulação pode ser entendido como plataformas circunscritas ao núcleo funcional, que desenham as diversas possibilidades de percurso consoante os sistemas de vista proporcionados.
ANDO, Tadao - Materiais, Geometria e Natureza. In DAL CO, Francesco - Op. Cit., 2001, p.456.
130
128
UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
No piso térreo bem como no piso subterrâneo, a materialidade dos alicerces, paredes e elementos portantes é ilustrada através do betão, traduzindo o universo pétreo inerente ao pavimento que cobre todo plano do cais. Nos restantes pisos, pretende-se evidenciar uma linguagem tectónica e modular, reflectida sobre o panorama industrial envolvente. Os elementos estruturais, bem como os materiais utilizados no revestimento do edifício, projetam uma ideia de leveza e homogeneidade, associada ao conceito de pureza expresso através da forma. Por fim, a estrutura metálica pretende assumir um desenho flexível na dimensão espacial, não comprometendo de modo algum a organização formal e programática pretendida.
à esquerda 115. Meeting. Skyspaces, 1980.
James
Turrell,
à direita 116. Revised Outlook. James Turrell, Skyspaces, 2005.
Essencialmente, a imagem da arquitetura proposta carateriza-se pela evidência das suas formas puras em comunhão com a naturalidade que constrói o lugar onde se encontra, segundo os princípios observados, anteriormente e de igual modo, nos casos de estudo. Pretendendo criar, acima de tudo, uma relação de continuidade entre o espaço arquitetónico e a envolvente.
129
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5.5.3 | O PROGRAMA
O Auditório do Tejo constitui um programa artístico de atividade musical, que pretende estabelecer, numa dimensão metropolitana, um novo pólo para a prática da música em Lisboa. O edifício tem como objectivo reforçar a capacidade das restantes infraestruturas de concertos já existentes na cidade, mas sobretudo, notabilizar um sistema de novas e diversificadas salas de espetáculos, unicamente contextualizadas com o lugar que constitui a frente ribeirinha de Santos. Neste sentido, pretende-se a inserção de um complexo de edificado constituído essencialmente por três auditórios, complementadas pelos espaços servidores e equipamentos necessários para o seu funcionamento. Sendo os mesmos designados por: Sala Tejo, Sala Lisboa e Sala Céu. Como os nomes sugerem, o propósito de cada sala centra-se em captar a essência da paisagem para a qual é direcionada (respectivamente água, terra e luz). O projeto afirmase, deste modo, na descoberta espacial e qualitativa dos diferentes ambientes proporcionados que poderão conferir ao público os mais variados tipos de espetáculo. Piso -1 Define-se por um complexo de espaços servidores e neutros que suportam a dimensão programática do edifício. Metaforicamente, os “alicerces” estruturantes das atividades a realizar nos restantes pisos. Este piso desenvolve-se, de forma circunscrita, em todo o redor da sala Tejo, sendo possível a transição direta dos artistas, desde o seu espaço de preparação até ao palco que se encontra no centro da sala. Dispõe de espaços de preparação para os músicos (vestiários, balneários e camarins individuais), espaços para armazenamento de instrumentos e objetos de composição de cenário.
(página oposta) em cima 117. Auditório do Tejo, perspetiva urbana do conjunto edificado. Modelo tridimensional. em baixo 118. Auditório do Tejo, vista aérea da proposta urbana. Modelo tridimensional.
No topo Norte, é desenvolvido o edifício subterrâneo, que integra um programa autónomo e complementar do anterior. Possui espaços dedicados à preparação e ensaio dos artistas, dispondo de várias opções (público ou privado, individual ou colectivo) consoante a necessidade da performance musical. Inclui salas de ensaio (individuais, de grupo ou para coro) bem como salas de apresentação musical. Todo o programa compromete espaços de diferentes escalas, organizados em redor de pátios de luz, e acessíveis através de um corredor circunscrito de distribuição.
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Piso 0 Entende-se como o piso “nulo”, unicamente delimitado pela projeção do edifício icónico em planta, e pelas suas estruturas de acessos. O vazio conforma um espaço limpo, apenas evidenciando os pontos de entrada no edifício. A rampa circular circunscrita à sala Tejo assumese como o plano de entrada principal, que liga diretamente o piso térreo ao interior do cubo. Constitui também a chegada à plateia da sala, onde se pode contemplar, subitamente, o crescendo da cúpula semiesférica que paira sobre o seu tecto, e que pretende proporcionar uma experiência maioritariamente acústica. A relação com a paisagem envolvente é imediata, uma vez que este piso permanece inteiramente no exterior, coberto pelo restante volume do edifício. Pisos 1 e 2 Traduz-se como o “hall” de entrada do edifício. Constitui um espaço polivalente de pé direito duplo, que pode ser utilizado para todo o tipo de atividades de exposição e promoção da cultura musical, ou de outros temas associados. É complementado pela localização pontual de pequenos serviços no piso inferior (recepção e cafetaria) e superior (instalação sanitária), que tornam o espaço próprio para a permanência do público. Piso 3 Define-se como o piso técnico, estruturante de todo o corpo superior do edifício. A estrutura em forma de treliças metálicas é desenhada sobre o comprimento total do plano, de modo a suportar toda a malha estrutural desenvolvida nos pisos mais elevados. Embora técnico, a utilização deste piso é pensada não apenas para garantir os acessos verticais no edifício, mas também para suportar a instalação de elementos expositivos suspensos sobre os pisos inferiores. Piso 4 Considera-se o primeiro piso da Sala Lisboa, sendo dividido em dois tipos de espaço. O espaço público, que dispõe de um conjunto de pequenos serviços (recepção e bengaleiro) com comunicação interior aos gabinetes administrativos do programa, e que pretende estabelecer a recepção e chegada do público ao espaço do espetáculo. O espaço privado, que concentra os acessos e estruturas de apoio para os artistas e funcionários, e que compreende um corredor de ligação direta ao palco, envolvido por espaços de espera e preparação, arrumo temporário de materiais e ligação às áreas técnicas da sala.
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Piso 5 Piso parcialmente comunicável com o piso inferior, estabelecendo um pé direito duplo, tanto no espaço de chegada do público como na área do palco. Pode igualmente ser dividido por espaço público e privado. Entende-se como área pública o espaço de entrada na plateia da Sala Lisboa, onde o acesso pode ser feito através de dois corpos de escada que ligam o piso com o inferior. É complementado com dois pontos de instalação sanitária localizados à entrada da plateia. Entende-se como área privada a continuidade do espaço do piso anterior, também privado, incluindo neste piso pequenos núcleos de vestiário e balneário que complementam a logística de preparação dos artistas. Piso 6 Define-se como o piso do primeiro balcão da Sala Lisboa. A disposição dos camarotes neste piso é panorâmica (360º), sendo complementados por pontos de instalação sanitária. Piso 7 Corresponde ao piso do segundo balcão da Sala Lisboa, onde também se encontram as duas salas destinadas à assistência de concertos em privado. A disposição dos balcões neste piso é parcial (180º), sendo o restante espaço complementado por duas salas de câmara com possível abertura para o exterior, duas salas polivalentes, e dois pontos de instalação sanitária. Piso 8 Considera-se o primeiro piso miradouro e piso técnico da Sala Lisboa. Em redor à sala, estão dispostas estruturas de serviço ao espaço público de circulação e permanência, tais como um espaço de restaurante complementado com zona particular destinada aos seus funcionários, um espaço de comércio, instalações sanitárias, e área lounge (para repouso ou leitura). Piso 9 Considera-se o segundo piso miradouro e último piso do edifício. No centro encontra-se a Sala Luz, um anfiteatro circular exterior, destinado à prática de atividades performativas e musicais informais, no contexto de um espetáculo ao ar livre. Possibilita também um sistema de vistas flexível entre diferentes ângulos do edifício, permitindo entender a permeabilidade visual entre todos os alçados.
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CONSIDERAÇÕES FINAIS
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CONSIDERAÇÕES FINAIS A definição da identidade das cidades, com base nas suas atividades portuárias, reporta ao tempo em que a ligação efetuada entre as mesmas realizava-se exclusivamente através da água. Onde os portos adquiriram desde cedo, um importante papel na imagem das cidades, quer pela sua forte presença nas frentes de água, quer pela sua relação simbólica com a história cultural das mesmas. Estabelecendo-se como cidade - porto por excelência, Lisboa viveu substancialmente junto à sua margem até ao terramoto de 1755 destruir por completo grande parte do seu território, obrigando ao primeiro redesenho da extensa frente portuária. Em semelhança à maior parte das outras cidades, só no fim do século XIX e início do século XX volta a sofrer alterações mais presentes, sobretudo com a introdução de novas infraestruturas urbanas como por exemplo as estações de caminhos de ferro e respetivas linhas férreas. Contudo, é também durante a mesma altura que surgem os elementos que vão compor substancialmente a frente ribeirinha que reconhecemos como a atual, nomeadamente a construção dos aterros característicos das grandes obras de expansão do Porto de Lisboa. Posteriormente, com a restruturação do papel dos portos no contexto da cidade, são os aterros destinados outrora em exclusivo à atividade portuária que vão transformar-se nas zonas urbanas passíveis de se revitalizar devido à sua mediação clara e fundamental entre a cidade e o rio. Ainda que se apresentem como espaços ambíguos e complexos, pertencentes a dois ambientes diferentes que permaneceram, apesar de tudo, separados durante muito tempo e de formas muito distintas. A executabilidade demostrada pela EXPO’98 e outros recentes projetos, ao retomar de forma positiva o natural contato com o rio, lançou de algum modo a viabilidade da possibilidade em continuar a devolver a frente ribeirinha enquanto lugar de permanência na cidade.
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Sobretudo, perante a frente ribeirinha de Santos que permanece na cidade com atividades ligadas ao porto em permanente funcionamento, mas também como a única zona perto do centro histórico da cidade com uma singular aproximação ao plano de água, ainda com extensa área urbana por desenvolver apesar da sua elevada importância histórica na cultura portuária de Lisboa. Por sua vez, o fenómeno que atingiu a maior parte das cidades portuárias, visando sobretudo a sua revitalização, colocou em aberto a possibilidade da preservação do património industrial e edifícios com interesse histórico, dando-lhes novos usos e funções; a despoluição dos vários territórios portuários; e a criação de novos ambientes públicos e dedicados ao lazer, como mecanismos fundamentais à reinserção das várias zonas afetadas pelo abandono das estruturas dos portos, no panorama contínuo da cidade. Por outro lado, o mesmo fenómeno permitiu também a construção de equipamentos atrativos a nível recreativo e social, capazes de criar novas centralidades urbanas e potencialidades económicas, pela sua óbvia iconicidade geradora de imagens culturais. Contudo, interessa salientar que a pretensão de conceptualizar um edifício icónico não constitui sinónimo ou garantia absoluta da construção de uma imagem enquanto arquitetura icónica, nem a existência de um ícone na cidade constitui a veracidade do mesmo enquanto solucionador da totalidade dos problemas inseridos no contexto urbano das cidades. Ainda assim, os objetos arquitetónicos que representam responsabilidade por uma revitalização urbana são os que funcionam autonomamente e por via de uma relação cúmplice e intrínseca com o contexto em que se inserem, demonstrando ser possível integraremse como estratégia fundamental à conexão entre o público e o lugar. Como foi abordado, torna-se interessante observar os exemplos, em que as intervenções seguem um sentido social e espacial complementado por um sentido estético. Sobretudo, em cidades com necessidades muito específicas e que já possuem uma imagem própria, marcada sobretudo pelo seu carácter histórico, como é o caso das cidades portuárias.
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Assumindo-se que intervir em património, implica ter a capacidade de o adaptar a novas necessidades, reorganizando criticamente o preexistente, seja ele qual for, com a introdução de elementos arquitetónicos novos, tentando assim afirmar a sua consolidação. Assim sendo, defende-se a possibilidade da inserção de um edifício icónico na Frente Ribeirinha de Santos, por acreditar-se ser uma forma possível de reabrir a tão esperada janela sobre o Tejo, e recriar a ligação outrora perdida com a água, nesta zona em concreto da cidade tão profundamente enraizada com a vida popular à beira-rio. Concluindose, que fica a vontade de que a reflexão teórica e consequente aplicação prática do presente trabalho, não absorva somente a realidade problemática da arquitetura contemporânea, mas que reponha a memória de que a música, também já fez parte de Lisboa.
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A CIDADE E O RIO
“Tal como a música, adormecida numa partitura ou num qualquer outro suporte, se anima e se liberta quando o ritual do concerto e da escuta se iniciam, a arquitetura existe quando a habitamos e a experimentamos. Visto desta maneira podemos então compreender que a música e a arquitetura são tão somente duas formas transparentes e imateriais de composição, todavia perenes, no espaço-tempo material e espiritual da nossa existência. Simbolicamente a arquitetura, enquanto contentor de poemas, de poemas que soam, perfaz na construção a sua sublime função de arte para viver”131.
131 AZGUIME, Miguel - O Invísivel e o Silêncio. Cascais Arquitetura: 03 Conservatório de Música de Cascais ARX Portugal. (2008), p.48.
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
119. Músicos no pontão. Imagem da autora, 2015.
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A CIDADE E O RIO
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ANEXOS
ANEXOS I COMPLEMENTOS AO TRABALHO TEÓRICO Plantas Históricas Imagens Históricas
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ANEXOS II COMPLEMENTOS AO TRABALHO PRÁTICO Vista Aérea e Ortofotomapas C.M. Lisboa | Plano de Requalificação do Cais de Santos Registo Fotográfico. Imagens da autora, 2015 Referências de Projeto complementares
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ANEXOS III PROCESSO DE TRABALHO Esboços e Desenhos Maquetes de Estudo Maquetes do Projeto Final de Mestrado
171
189 ANEXOS IV APRESENTAÇÃO GRÁFICA DO PROJETO FINAL DE MESTRADO /01 Lisboa. Enquadramento da Frente Ribeirinha | Ícones de Lisboa | Esc. 1:20 000 /02 Planta de Enquadramento Urbano | Proposta Urbana | Esc. 1:2000 /03 Planta de Implantação | Esc. 1:500 /04 Axonometria Isométrica. Organização do Programa por pisos /05 Planta piso -1 : Cota -3,95 | Esc. 1:200 /06 Planta piso térreo : Cota 1 | Planta piso 1 : Cota 6 | Esc. 1:200 /07 Planta piso 2 : Cota 11 | Planta piso 3 : Cota 16 | Esc. 1:200 /08 Planta piso 4 : Cota 21 | Planta piso 5 : Cota 26 | Esc. 1:200 /09 Planta piso 6 : Cota 31 | Planta piso 7 : Cota 36 | Esc. 1:200 /10 Planta piso 8 : Cota 41 | Planta piso 9 : Cota 46 | Esc. 1:200 /11 Equipamento destinado à nova Travessia Pedonal | Esc. 1:200 /12 Corte AA’ | Esc. 1:200 /13 Corte BB’ | Esc. 1:200 /14 Corte CC’ | Esc. 1:200 /15 Alçado Sul | Alçado Nascente | Esc. 1:200 /16 Planta de Cobertura | Esc. 1:200 /17 Corte AA’ | Esc. 1:50 /18 Planta piso 5: Cota 26 | Esc. 1:50 /19 Pormenor Construtivo de Fachada | Esc. 1:10
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ANEXOS I COMPLEMENTOS AO TRABALHO TEÓRICO Plantas Históricas Imagens Históricas
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Plantas Históricas
Representação do Porto de Lisboa anterior a 1755.
Representação do Porto de Lisboa em 1836.
Planta com proposta de Thomé de Gamond.1870
Plano de Melhoramentos para o Porto de Lisboa, 1946.
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Planta do Porto de Lisboa, Filipe Folque, 1856-1858.
Planta do Porto de Lisboa, Câmara Municipal de Lisboa, 1871. A vermelho: alterações previstas até 1911.
Planta do Porto de Lisboa, Silva Pinto, 1904-1944.
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Imagens Históricas
em cima Praça do Comércio, 1889. ao centro e em baixo Cais das Colunas. Durante séculos, o cais mais monumental de Lisboa (página oposta) à esquerda Descrição do Porto de Lisboa, Diário de Notícias, 1927. à direita, de cima para baixo Vista aérea do Cais do Sodré, 1940. em baixo Vista sobre o rio, do Miradouro de Santa Catarina, 1935.
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ANEXOS II COMPLEMENTOS AO TRABALHO PRÁTICO Vista Aérea e Ortofotomapas C.M. Lisboa | Plano de Requalificação do Cais de Santos Registo Fotográfico. Imagens da autora, 2015 Referências de Projeto complementares
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Vista Aérea e Ortofotomapas.
Vista aérea. Estaleiros da Rocha d’Óbidos, século XX.
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do
Conde
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Ortofotomapas. Vista sobre a área de intervenção, 2016.
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C. M. Lisboa | Plano de Requalificação do Cais de Santos
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Registo Fotogrรกfico. Imagens da autora, 2015
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ReferĂŞncias de Projeto complementares
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em cima Opera House; Étienne - Louis Boullée, séc. XVIII. ao centro, da esquerda para a direita Teatro Total; Walter Gropius, 1926. Teatro El Globo; Peter Street, 1599. em baixo, da esquerda para a direita International Fair of Tripoli; Oscar Niemeyer, Líbano, 1963-1967. Cenografia da Ópera "The Magic Flute from Mozart"; Karl Friedrich Schinkel, 1816. (página oposta) à esquerda, de cima para baixo Les Berges du Rhône; F. Jourda, França, 2008. à direita, de cima para baixo Porto de Tel Aviv; Mayslits Kassif, Israel, 2008. Towards the Sea; Mariana Santana, Portugal, 2013. Between Cathedrals; Alberto Campo Baeza, Cádiz, 2009. Banyoles Public Space; Architects, Espanha, 1998.
Mias
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à esquerda Uncertain Certainty; Christian Kerez, Toto publiching, 2013. à direita, de cima para baixo Icehockey and Volleyball Arena; Alberto Campo Baeza, Suiça, 2012. em baixo, da esquerda para a direita Tanque de Gáz; Bernd e Hilla Becher, 1983-1992. Rotunda ("the world first membrane roof and steel gridshell"); Vladimir Shukhov, Rússia, 1896.
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em cima Radix. Aires Mateus; Veneza, 2012.
Bienal
de
ao centro, da esquerda para a direita Monolith; Jean Nouvel, Suiça, 2001. Data Center Portugal Telecom; João Luís Carrilho da Graça, Covilhã, 2013 em baixo, da esquerda para a direita Indian Institute of Management; Louis Kahn, Ahmedabad, 1974. Bruder Klaus Field Chapel; Peter Zumthor, Alemanha, 2007. Plantahof Auditorium; Valerio Olgiati, Suiça, 2010.
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ANEXOS III PROCESSO DE TRABALHO Esboรงos e Desenhos Maquetes de Estudo Maquetes do Projeto Final de Mestrado
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Esboรงos e Desenhos
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Maquetes de Estudo
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Maquetes do Projeto Final de Mestrado MAQUETE 01 Lisboa. Enquadramento Frente Ribeirinha | Esc. 1:20 000
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Maquetes do Projeto Final de Mestrado MAQUETE 02 Proposta Urbana e Auditório do Tejo | Esc. 1:1000 (Pré-existente vs. Proposta)
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Maquetes do Projeto Final de Mestrado MAQUETE 03 Auditรณrio do Tejo | Esc. 1:200
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Maquetes do Projeto Final de Mestrado MAQUETE 04 Auditรณrio do Tejo. Sala Lisboa | Esc. 1:50
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UM ÍCONE NA FRENTE RIBEIRINHA DE SANTOS
ANEXOS IV APRESENTAÇÃO GRÁFICA DO PROJETO FINAL DE MESTRADO /01 Lisboa. Enquadramento da Frente Ribeirinha | Ícones de Lisboa | Esc. 1:20 000 /02 Planta de Enquadramento Urbano | Proposta Urbana | Esc. 1:2000 /03 Planta de Implantação | Esc. 1:500 /04 Axonometria Isométrica. Organização do Programa por pisos /05 Planta piso -1 : Cota -3,95 | Esc. 1:200 /06 Planta piso térreo : Cota 1 | Planta piso 1 : Cota 6 | Esc. 1:200 /07 Planta piso 2 : Cota 11 | Planta piso 3 : Cota 16 | Esc. 1:200 /08 Planta piso 4 : Cota 21 | Planta piso 5 : Cota 26 | Esc. 1:200 /09 Planta piso 6 : Cota 31 | Planta piso 7 : Cota 36 | Esc. 1:200 /10 Planta piso 8 : Cota 41 | Planta piso 9 : Cota 46 | Esc. 1:200 /11 Equipamento destinado à nova Travessia Pedonal | Esc. 1:200 /12 Corte AA’ | Esc. 1:200 /13 Corte BB’ | Esc. 1:200 /14 Corte CC’ | Esc. 1:200 /15 Alçado Sul | Alçado Nascente | Esc. 1:200 /16 Planta de Cobertura | Esc. 1:200 /17 Corte AA’ | Esc. 1:50 /18 Planta piso 5: Cota 26 | Esc. 1:50 /19 Pormenor Construtivo de Fachada | Esc. 1:10
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A CIDADE E O RIO
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