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CIDADE CENOGR

Entre o final de maio e o início de junho, uma equipe de cerca de 60 pessoas desembarcou em Piranhas, a cidade alagoana que se tornou cenário. Nos últimos anos foram muitas produções, como “Baile Perfumado”, “Entre irmãs”, “Rio Cigano”, “Cordel Encantado” e “Velho Chico”. Desta vez, a missão era filmar cenas de “Mar do Sertão”, a nova novela da TV Globo. Dirigida por Pedro Brenelli, a caravana passou antes pelo Vale do Catimbau, em Pernambuco, segundo maior parque arqueológico do Brasil. Na trama, o sertão se torna muito mais do que apenas paisagem, ganhando inédito protagonismo, ao abrigar uma divertida fábula contemporânea, com o triângulo amoroso formado por Candoca (Isadora Cruz), Zé Paulino (Sérgio Guizé) e Tertulinho (Renato Góes). A luta pelo bem mais precioso da região perpassa todo o enredo: a água do Velho Chico.

“Nossa novela retrata o sertão como ele é: um lugar alegre e colorido. Nós queremos mostrar o Nordeste que vai além da aridez. Queremos resgatar a alegria do forró e a vivacidade da flor do mandacaru”, afirmou Mário Teixeira, o autor de “Mar do Sertão”. Para o diretor artístico Allan Fiterman, a ideia é encantar o público: “Aproveitamos ao máximo os dias em que estivemos pelo sertão nordestino para captar as melhores e mais lindas imagens da região. Estou tentado trazer para a novela a poesia na imagem”.

A jornada teve início pelo Vale do Catimbau. Localizado entre o Agreste e o Sertão pernambucano, o vale conta com diversos sítios arqueológicos, grutas, cemitérios pré-históricos e pinturas rupestres com mais de seis mil anos. Os trabalhos seguiram por mais uma semana em Piranhas, onde foram gravadas cenas da exuberância do São Francisco, assim como as cores e a alegria da cidade de aproximadamente 25 mil habitantes, que teve seu centro histórico como inspiração para a criação de Canta Pedra, a fictícia cidade onde se passa a história de ‘Mar do Sertão’. De acordo com o roteiro, Canta Pedra já foi mar e virou sertão. A profecia de Antônio Conselheiro de que o sertão vai virar mar alimenta a esperança da população. Há muito tempo, o povo de Canta Pedra espera pela chuva enfrentando as dificuldades impostas pela seca.

Um dos desafios das equipes de produção de ‘Mar do Sertão’ foi voltar ao Rio de Janeiro, trazendo para os Estúdios Globo a essência do que fora captado em Pernambuco e Alagoas. “Absorvemos bastante tudo o que vimos durante a nossa viagem ao Nordeste. Nossa história é uma fábula, o que nos dá certa liberdade de criação, mas não queríamos perder as características da cultura nordestina. Fomos a Recife e a Olinda, em mercados e ateliês, em busca de material e ficamos prestando atenção nos detalhes e costumes, em como funciona aquele universo”, contou Flávia Cristófaro, responsável pela produção de arte da novela. “Trouxemos amostras de terra para termos como referência na construção dos nossos cenários”, complementou o cenógrafo Paulo Renato.

Vida real

Para Ranieri Davisson, um jovem guia de turismo de Piranhas, as grandes produções que aterrissam na cidade tornaram-se ganha pão. Como conhece cada palmo daquele chão, é ele quem ajuda a encontrar as locações perfeitas para cada roteiro. A próxima produção já está em marcha, com o legendário diretor Cacá Diegues filmando “Deus ainda é brasileiro”. Em “Mar do Sertão”, Ranieri começou a trabalhar no começo do ano: “Fui procurado pelo produtor de locação do Recife (PE), João Miguel. Informaram a ele que eu já tinha trabalhado em algumas locações e aí iniciamos os trabalhos onde eu levei a produção para os locais ideais com os cenários que procuravam para a novela”, comentou.

Uma das principais locações foi o bar Nossa Bodega, no centro histórico de Piranhas, que abrigou a casa do personagem Daomé (Wilson Rabelo), o pai de Zé Paulino (Sérgio Guizé). Com arquitetura colonial do século 19, a casinha azul, pequena e simples, já fora a morada de dona Zidinha e hoje é um bar decorado com muitas peças de época, como cuscuzeira, bomboniere, luminárias, panelas, canecas e o colorido sertanejo. A proprietária Fabiana Amorim, neta da Dona Zidinha, transformara o espaço em bar no ano de 2018. “A minha ideia com o bar não é ser um grande comércio, mas estar junto dos meus”, comentou Fabiana. “A produção de ‘Mar do Sertão’ gravou cenas sem mexer na decoração.

Foi um imenso prazer receber os atores e uma honra ter o local visto nacionalmente. Estamos felizes pelo destaque que estamos recebendo”.

Com a estreia de “Mar do Sertão”, o Nossa Bodega virou atração turística, de acordo com Fabiana: “Os turistas passam e reconhecem a casa, fotogravam, querem saber os detalhes das gravações”.

Presidente do Comitê da Bacia Hidrográfica do São Francisco, Maciel Oliveira, também comemora a visibilidade que a novela “Mar do Sertão” trouxe para a cidade e, sobretudo, para a causa da preservação do Velho Chico. “Mostrar o rio, o povo sertanejo, a Caatinga, a cultura do nosso povo, as belezas naturais da região, a história, tudo é motivo de orgulho”, comentou. “Também é muito importante em temos de valorização do Nordeste. Desta vez, inclusive, muitos atores são da região. Por meio da novela e dos seus personagens os encantos do Velho Chico estão sendo mostrados em sua essência. É uma novela com uma raiz que espalha um pouco do Sertão para o mundo. Com isso espero que os brasileiros de outras regiões reconheçam a cultura tradicional do semiárido brasileiro, bem como a cultura dos nordestinos”.

O agricultor Kelinho Vaqueiro chegou a atuar em “Mar do Sertão”. “Ajudei na produção, emprestando alguns animais. No dia da gravação, acabei fazendo uma ponta”, contou. “Fiquei surpreso e, ao mesmo tempo, feliz. Foi gratificante demais. Creio que nessa vivência ambos ganharam: eu, a experiência; eles, com o fato de ter um morador como personagem, trazendo o modo de falar e agir”. Para Kelinho Vaqueiro, sobrou a fama: “Quando eu passo na rua, dizem: ‘olha o artista’.”

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