Cadernos da FEI - Nº 07

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CADERNOS DA FEI Fundação Educacional Inaciana Pe. Sabóia de Medeiros

Presidente Pe. Theodoro Paulo Severino Peters, S.J. Coordenação Editorial Prof. Ayrton Novazzi Prof. Flávio Vieira de Souza Arte final, diagramação e fotolitos Cleonice Molina Matos Lilian Toshiko Leffer Silvana Vieira Mendes Arruda Fotos Jesus Perlop Júnior Garcia

Publicação do Centro Universitário da FEI, entidade filiada à

Associação Brasileira das Universidades Comunitárias

Endereço para correspondência Av. Humberto de Alencar Castelo Branco, 3972 CEP 09850-901 – Bairro Assunção S.B.Campo – SP E-mail: iresi_sbc@fei.edu.br

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CONTEÚDO Voz do Presidente Nossa missão e os desafios do novo século............................................................................................ 07 Inspiração para o serviço ............................................................................................................................... 09 Parceria bem-vinda .......................................................................................................................................... 11 Pedagogia Inaciana O compromisso da Companhia de Jesus na educação ...................................................................... 14 Considerações em torno do plano estratégico da AUSJAL ............................................................... 17 Ensino Superior da Companhia de Jesus ................................................................................................. 20 Desafios Modernos A universidade católica e as mudanças da sociedade ........................................................................ 21 Uma ética para a água .................................................................................................................................... 23 O papel da informática na redução da distância entre ricos e pobres.......................................... 29 Razão e Fé, Educação A experiência de Deus hoje .......................................................................................................................... 33 Um universo matemático .............................................................................................................................. 37 Educar a razão: educar o homem todo..................................................................................................... 39 O paradigma zero ............................................................................................................................................. 43 Testemunhos, Projetos, Experiências de Sucesso 40 anos de Mecânica Automobilística ...................................................................................................... 47 Uma experiência aplicada ao ensino da engenharia de produção ................................................ 48 Todos os mini bajas parecem iguais .......................................................................................................... 51 Projeto AeroDesign ......................................................................................................................................... 52 Pessoal da Civil em evidência ...................................................................................................................... 53 Convênio FEI/ITAUTEC .................................................................................................................................... 56 A influência do treinamento na inclusão social .................................................................................... 57 Projeto Hovercraft ............................................................................................................................................ 59 Chorinho também é cultura ......................................................................................................................... 60 Programas de Ações Sociais ......................................................................................................................... 61 Trajetórias ............................................................................................................................................................ 64 XII Torneio da Semana da Asa...................................................................................................................... 65 Capela e Mensagem de Natal Nossa Senhora da Estrada ............................................................................................................................. 66 A Estrela de Natal .............................................................................................................................................. 67

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Apresentação A Fundação Educacional Inaciana Pe. Sabóia de Medeiros quer cumprir com fidelidade sua missão: formação de jovens, transmissão e produção de conhecimento, o cultivo dos valores humanos e cristãos dentro da realidade que estamos vivendo. Este sétimo número dos Cadernos não se afasta desta perspectiva, até a amplia, trazendo com mais abundância testemunhos, projetos e experiências de sucesso, tanto estritamente acadêmicos como de alcance social significativo que nosso Centro Universitário tem produzido. As grandes linhas de nossa orientação estão registradas nas palavras do Presidente da Fundação, recentemente conduzido à presidência da ABESC (Associação Brasileira das Escolas Superiores Católicas). Sua instigante homilia por ocasião do último Congresso que sediamos junto com a Faculdade São Luís, mostra bem o caminho. Não faltam, como sempre, palavras abalizadas sobre a pedagogia inaciana e a inspiração cristã de nossas universidades. Problemas pungentes de nossos dias vêm à tona quando o assunto é globalização, ecologia, saúde e ensino. Por falar em ensino, reproduzimos a parte final do artigo do Pe. Mac Dowell, S.J., já publicado na revista Síntese, que mostra a dificuldade de se falar de Deus ao jovem de hoje num ambiente de consumismo e hedonismo. O Prof. Laugeni em bem-humorado artigo lembra como a indução é preciosa no ensino da engenharia. Enfim, para fechar estes cadernos com chave de ouro, nada como uma referência à Nossa Senhora da Estrada (presente em nossos caminhos!) e ao belo texto do Pe. Meneses, S.J., sobre a Estrela de Natal.

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NOSSA MISSÃO E OS DESAFIOS DO NOVO SÉCULO

E qual a relação, para nós, educadores, com esses conflitos? Este é o mundo e o momento que vivemos. Como nos situarmos diante dele? Estimulamos, em nossas escolas, o pleno desenvolvimento da personalidade de nossos estudantes e colaboradores. Induzimos, através de metodologia científica, iniciação aos altos estudos matemáticos e tecnológicos. Desejamos

que aprimorem os conhecimentos, saibam pensar por si próprios, tenham comunicação e expressão com estilo. Sejam compreensivos em relação ao próximo, cooperadores voluntários para o desenvolvimento de nosso povo e de nosso país. Como, pois, induzir os valores nos quais nós acreditamos e sem os quais não poderíamos viver, através de nossos currículos e programas? Como preparar o homem adulto na solidariedade humana? Como fazê-lo entender sua responsabilidade com o mundo? Como apoiar nossos estudantes e colaboradores a realizarem o que nossa geração ainda não conseguiu realizar? É verdade cristalina a relação entre os meios escolhidos e os fins a serem alcançados. O fim não justifica o meio injustificável, nunca. A nobreza do fim exige igual dignidade dos meios. Não é aceitável a morte para gerar vida. O que fazer com o violento? Como eliminar a violência? Todos têm direito à vida com segurança, mas a que preço? Pela violência, apenas se reforça a violência. Como educar para a construção da paz e da cidadania? Como educar para a convivência pacífica e solidária? Jesus construiu a paz pelo perdão aos que o matavam. O justo morreu pelos pecadores. O santo morreu pelos culpados. Ele se fez nossa justiça, afirma Paulo. A Fundação de Ciências Aplicadas1 está ligada, umbilicalmente, à Companhia de Jesus, assumindo a missão que baliza suas ações. O serviço da fé e a promoção da justiça são as forças articuladoras de todos os nossos objetivos e ministérios. A Congregação Geral XXXIV apresenta a Companhia de Jesus como servidora da missão de Cristo. A missão de Cristo vincula nossa fé com a justiça, com a cultura e com o diálogo inter-religioso. É convicção aprofundada continuamente haurir as conseqüências da Encarnação do Filho de Deus: porque Jesus se fez um de nós, abençoou, consagrou a humanidade como templo da presença de Deus. Em decorrência, para anunciar plenamente o Evangelho, é fundamental seguir os pas-

VOZ DO PRESIDENTE

Pe. Theodoro Paulo Severino Peters, S.J., Reitor da UNICAP e Presidente da FEI

Excerto do discurso do Pe. Theodoro Peters, S.J., na abertura da Semana de Qualidade do 1º semestre de 2002 (janeiro). O trecho que publicamos foi precedido pela análise da situação mundial que se seguiu aos atentados terroristas de 11 de setembro de 2001.

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Em abril de 2002 a Fundação de Ciências Aplicadas passou a denominar-se FEI, Fundação Educacional Inaciana Pe. Sabóia de Medeiros.

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VOZ DO PRESIDENTE

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sos de Jesus Cristo, entrando em cada cultura humana, percebendo as faíscas de Deus geradas pelo Criador em cada criatura. Avançando, percebe-se a sacralidade da pessoa humana, imagem e semelhança de Deus, com os direitos humanos a serem respeitados, com os direitos sociais a serem promovidos para a vida em comunidade. No ano passado, o Santo Padre viajou aos territórios e países berços das religiões monoteístas, Grécia, Síria, Israel, Palestina, Turquia. Orou nos lugares sagrados das três religiões, a todos confortando e estimulando ao diálogo para tornar possível a vida, com dignidade e liberdade de expressão. O Santo Padre, ao longo de seu ministério, deu passos importantes na construção da paz duradoura. Reconheceu, publicamente, culpas institucionais ao longo da história. Mencionou as mulheres, os excessos dos missionários, da Inquisição, reabilitou Galileu, assinou

acordo sobre a doutrina de Lutero, enalteceu a obra de inculturação de ritos chineses e malabares, obra do Pe. Mateo Ricci e do Pe. De Nobili, passou pela Terra em todas as latitudes falando o idioma de cada cultura. Fazendo-se tudo para todos, para tornar visível o desejo de Jesus: que todos sejam um, em comunhão humana, espiritual, digna. Esses testemunhos demonstram as conseqüências de uma convivência contínua com os valores hauridos da cultura plenamente humana e cristã. Somos todos na Fundação colaboradores desta grande proposta, através da formação da juventude e da criação de uma comunidade geradora de vida de qualidade. Desejamos estudantes de primeira qualidade intelectual e humana, solidários, comprometidos com a promoção da justiça e capazes de dar as razões de sua fé, de sua esperanças, de suas convicções, de suas práticas irrenunciáveis.

O Centro Universitário da FEI, campus Liberdade, um complexo educacional com 8.600 m2 de área útil localizado próximo à Estação Metrô São Joaquim, oferece o curso de Administração de Empresas, o primeiro de nível superior a funcionar no país. Criado em 1941 nos moldes da Graduate School of Business Administration da Universidade de Harvard, o curso, hoje, é dotado de uma estrutura curricular especialmente direcionada às necessidades e tendências de mercado; seus objetivos estão centrados na formação de profissionais – executivos, empresários e consultores – capazes de gerir desde uma pequena unidade de negócios até um conglomerado de empresas. O campo de

trabalho do administrador é abrangente e vai da tomada de decisões nas áreas de gestão de pessoas, finanças, marketing, projetos, etc., até assessoria e consultoria empresarial. O campus se destaca pela modernidade e conforto ambiental nos locais de estudo e trabalho. Abriga 26 salas de aula, sala de projeção, sala de leitura, biblioteca, laboratórios de informática, quadra de esportes, capela e lanchonete. Além dessa ampla infra-estrutura que vai ao encontro das aspirações dos alunos, o campus apresenta um auditório (capacidade: 300 pessoas) destinado à realização de seminários, congressos, etc., e saguão de entrada – ideal para exposições e feiras – que sobressai pela concepção arquitetônica.


INSPIRAÇÃO PARA O SERVIÇO Irmãs e Irmãos, Diretoras e Diretores, Reitoras e Reitores, Representantes das Escolas Superiores Católicas. A paz e a alegria de Deus permaneçam sempre convosco e com vossas comunidades acadêmicas apostólicas. Nossa assembléia já superou 50% de sua agenda e de seu tempo, propiciando a feliz ocasião de rever-nos, reconhecer-nos e auscultar a vitalidade de nossas co-irmãs de identidade com a missão do serviço à sociedade brasileira, e ao diálogo intercultural, na formação da juventude, na extensão, na pesquisa e no ensino. Nossas instituições, enraizadas na tradição intelectual universitária da Igreja Católica, querem, neste momento, ao encerrarem as atividades desta profícua manhã, abrir-se em prece e ação de graças a nosso Deus para dele haurir otimismo, força e inspiração para se tornarem mais lúcidas no serviço ao nosso povo. Diante do Senhor da História, quisemos celebrar sua palavra, vida e dom em comunidade de fé e esperanças. Só a palavra de Deus ilumina os nossos caminhos; só a vida do seu Filho Jesus evangeliza

nossas vidas; e só o dom do Espírito Santo nos incita a seguir Jesus Cristo como portadores do seu testemunho em nosso itinerário, confortando-nos a prosseguir no tempo presente e projetar nossas instituições para uma configuração futura. Os tempos são novos, os desafios são antigos, exigindo respostas e soluções de melhor qualidade. Na 2ª carta aos Coríntios, Paulo apresenta uma vida heroicamente vivida. Homem indiviso em sua austeridade, dispensou facilidades, assumindo, de corpo e alma, sua missão evangelizadora e cultural. Deus multiplicou milagres para que as pessoas aderissem à fé, porém os economiza em prol dos escolhidos para a missão entre os povos. Flagelado, acusado, carregado de cadeias, refém do Evangelho, náufrago, atacado por serpente, perseguido pelos judeus, prisioneiro do Império Romano, sabe em quem depositou sua confiança. “Sei em quem acreditei”. Ainda fala, após a morte, testemunhando a vitalidade da graça divina concedida pela morte de Jesus Cristo, pelo testamento de Jesus Ressuscitado: a promessa do Espírito Santo, o dom do Paráclito, do Advogado de Deus em nossas vidas. Paulo nos conforta: “a palavra de Deus não está acorrentada”. O Espírito sopra onde quer e reúne em comunidade todas as pessoas agraciadas pela escolha de Deus. Paulo testemunha Jesus Ressuscitado. Aquele que fez a paz entre o céu e a terra, aquele que se fez pecado por nós para que nos tornássemos filhos e filhas de Deus. Paulo nos coloca em sintonia com os sentimentos de Deus, para alcançarmos a felicidade. Com certeza, a marcante presença de Paulo totalmente a serviço do Evangelho nos ensina a acolher, com generosidade,

VOZ DO PRESIDENTE

Pe. Theodoro Paulo Severino Peters, S.J., Reitor da UNICAP e Presidente da FEI

Homilia na capela do Campus SBC, por ocasião do Congresso da ABESC (Associação Brasileira de Escolas Superiores Católicas) junho de 2003.

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VOZ DO PRESIDENTE

as palavras do próprio Jesus retinindo em nossos ouvidos, ressoando em nossas mentes. Jesus nos desafia a Nele colocarmos nossa segurança. Jesus quer ser o nosso tesouro, quer ser a luz do nosso olhar, quer ser a referência de nossas vidas. Por isso, Ele nos convida a caminhar com Ele, a trilhar seus caminhos com nossos passos. E, para tal caminhada, necessitamos de meios para viver bem, assim como são necessários referenciais que permitam mensurar a nossa direção. Se o pão, a bebida e a roupa sustentam e agasalham a vida, que dizer dos tesouros que não podem ser destruídos pelo tempo, nem roubados pelos ladrões e salteadores? É preciso, pois, acumular tesouros para a eternidade, em comunhão com Deus. Ultrapassar o dia-a-dia fatigante, olhando o invisível, e ao próprio Deus que nos incentiva a progredir a avançar sempre. Se Deus estiver convosco, se vosso coração estiver em Deus, Deus será o vosso tesouro. Tesouro garantido pela eternidade. “Onde estiver o vosso tesouro, aí estará o vosso coração”. O olhar e o discernimento são o meio para descobrir a vontade de Deus. Se vosso olhar for sadio, se vosso discernimento for sábio, vossa vida será iluminada pela luz do próprio Deus. Aprender a olhar e discernir é luz da caminhada terrena. Por isso, sois conclamados a pedir na oração a consciência crítica necessária para evoluir continuamente na vida. No Evangelho de Mateus, olhos e coração estão intimamente ligados. Órgão de desejo e de lucidez, o olho simples, não dividido, discernirá a vontade do Pai e colocará o corpo

e o homem todo na luz, caso contrário, tudo fica nas trevas e perderá sua densidade. “O olho é a luz do corpo. O olho sadio ilumina o corpo. O olho enfermo é escuridão para o corpo”. A exigência de Jesus nos coloca diante de Deus sem ambigüidade possível. E é Jesus quem nos desafia, pessoal e institucionalmente, a tomarmos posição hoje em relação ao futuro, diante de todas as necessidades conjunturais com referência ao Pai. Pelo comer e pelo vestir, pode-se exprimir o Reino de Deus e sua justiça. Confortados pelo exemplo de Paulo, companheiro que veio na frente, com argúcia fundamentando seu testemunho, seguimos nossos passos. Ora, assim como Paulo perseguia os passos de Jesus, somos conclamados, também, a liderar nossas instituições na escuta da voz divina nos tempos presentes, ora nas dificuldades conjunturais, ora nos desafios com que nos deparamos nos caminhos que melhor conduzem aos passos de Jesus, Caminho para o Pai, Verdade de Deus, Vida eterna partilhada. Que nossas instituições se orientem por esse Caminho como comunidades acadêmicas, intelectuais, produtoras de conhecimentos e tecnologia, motivadoras da transformação social, enraizadas em nossa terra, sintonizadas com nosso povo, articuladas nas soluções propostas. Que o olhar de Deus paire sobre o nosso, que a luz de Deus fulgure nossas luzes, que os passos de Jesus orientem nossos passos. Que nossas instituições estejam a serviço do Evangelho, da Vida e da Esperança na construção da cultura humana. Amém.

O pequeno avião levava apenas três passageiros: um gênio, um escoteiro e um bispo. Começou a haver problemas, o piloto avisou que estava abandonando o avião. Só havia três pára-quedas e ele estava pegando um. Os outros teriam de decidir quem se salvaria. O gênio disse – “Como sou necessário ao país, acho natural pegar um pára-quedas”, agarrou um e saltou. O bispo olhou para o escoteiro e disse: – “Filho, já vivi bastante, use o pára-quedas que restou. Estou pronto para morrer” – “Isto não será necessário, bispo”, disse o escoteiro. “Temos dois páraquedas. O gênio saltou com a minha mochila”. Nunca permita que os outros o façam sentir-se tão por baixo a ponto de odiá-los. Anthony de Mello, “Verdades de um Minuto”, p.141, Ed. Loyola,1993 .

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PARCERIA BEM-VINDA

A Universidade Católica de Pernambuco recebe com grande satisfação o Dr. Paulo Setúbal Neto, Presidente da Itautec Philco S/A – Grupo Itautec Philco, o Dr. Gabriel Marão, Vice-presidente, os demais executivos, os pró-reitores, decanos, chefes de Departamento, professores e pesquisadores para a inauguração do Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento do DEI, resultado do Convênio de P & D entre nossas instituições. Presentes estão igualmente, o Reitor do Centro Universitário da FEI, Dr. Márcio Rillo e o coordenador do convênio da Itautec Philco com o Centro Universitário da FEI, Dr. Renato Giacomini. A UNICAP

A UNICAP é uma instituição fundada em 1951 pelos jesuítas do Nordeste do Brasil para preparar capital humano de alta qualidade. Referenciada pelos ideais fundadores, a atualização de sua missão foi aclamada pelo corpo docente através do trabalho intensamente participativo de elaboração de sua Carta de Princípios no ano de 1995 na qual se apresenta como Universidade da atualidade eclesial da Companhia de Jesus, inculturada regionalmente, aberta às questões nacionais e internacionais e aspirando sempre à melhor qualidade. Qualidade é a marca perseguida em todas as iniciativas e propostas. O processo de busca da qualidade desenvolvido a partir das aspirações próprias do corpo docente, atendeu às orientações do Papa João Paulo II em sua Carta Magna denominada Ex Corde Ecclesiae, de atualização e preparação no presente da sociedade do futuro através da missão da Universidade Católica, igualmente às perspectivas da Missão voltada para o futuro, estabelecidas pela Companhia de Jesus em sua XXXIV Congregação Geral articulando-a no diálogo: fé e cultura, fé e justiça, fé e diálogo inter-religioso, sensível aos anseios da sociedade brasileira que conseguiu aprovar e consignar em lei de Diretrizes e Bases

VOZ DO PRESIDENTE

Pe. Theodoro Paulo Severino Peters, S.J., Reitor da UNICAP e Presidente da FEI

Inauguração do Laboratório de Pesquisa e Desenvolvimento do DEI/ ITAUTEC PHILCO – Recife, 8 de maio de 2003

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VOZ DO PRESIDENTE

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da Educação Nacional, as condições para a qualidade do ensino brasileiro e universitário. A coincidência cronológica e temática das quatro bases de exigência de avaliação para preparar o futuro: corpo docente, Igreja Católica, Companhia de Jesus e sociedade brasileira, demonstram a vitalidade de dar validade humana, agregar valor ao que se propõe. A partir desta experiência de refletir em comum, levantar os problemas, elencar as possibilidades de solução foi possível ir implementando o que foi sendo desejado, de maneira que a UNICAP passou a concretizar, o que sonhava: o plano de capacitação docente, aspiração profunda da academia, com amplo sucesso. Hoje dos 537 professores, 327 são doutores ou mestres, equivalendo a 60,9%, 92 são doutorandos e 52 mestrandos. Esta qualificação permitiu o início da Pesquisa Institucional na UNICAP, de modo que já foram cadastrados 50 grupos de Pesquisa no CNPq, como pode ser constatado no Catálogo recém-publicado, conseqüentemente foi institucionalizado o PIBIC – Programa Institucional de Bolsas de Iniciação Científica, hoje com mais de 300 estudantes. A mostra de Pesquisa, Pós-graduação e Extensão e a Jornada de Iniciação Científica, em 2002, mobilizou toda a comunidade universitária de modo que foi possível testemunhar a vitalidade, competência e o comprometimento da UNICAP com seu público interno e com os dirigentes de empresas e de órgãos governamentais de fomento em nível estadual e nacional. Conseqüentemente os laboratórios estão devidamente equipados, em pleno funcionamento, em contínua efervescência e evolução. Nossos pesquisadores e professores têm participado de congressos científicos nacionais e internacionais, publicando seus trabalhos em periódicos indexados, de reconhecido valor científico. Assim a UNICAP, como comunidade acadêmica, tem respondido aos desafios através de propostas de trabalho sério, dedicado e qualificado.

Convênios de cooperação com a ITAUTEC

Hoje é um dia de muita alegria, com alto significado. Dr. Paulo Setúbal Neto e Dr. Gabriel Marão estudaram na FEI, conhecem o trabalho executado em São Bernardo do Campo, em São Paulo, pelos jesuítas e leigos na mesma missão universitária. Foi realizado um grande convênio de cooperação interinstitucional entre a Itautec Philco e a FEI. Do trabalho confiável lá desenvolvido, veio a possibilidade de estabelecer o laboratório que estamos agora inaugurando. Os interlocutores já se conheciam, a confiança já era partilhada, o laboratório, as equipes de trabalho e pesquisa estão sendo montadas. Graças ao Prof. Enéas, chefe do DCC do Centro Universitário da FEI e ao Milton Noguchi, foi estabelecido o link com o DEI UNICAP, liderado pelo Prof. Jessé. Os departamentos partilham suas forças e são capazes de proporem projetos seguramente exitosos. Com efeito, duas instituições universitárias seguindo orientações semelhantes estão em diálogo fecundo e integração com a Itautec Philco, buscando o melhor para a pessoa humana, para as empresas de serviço à sociedade. As universidades pesquisam, buscam novas soluções, juntamente com a empresa. A pesquisa será aplicada, dela participando os melhores pesquisadores e estudantes. A Itautec Philco também é pesquisadora de alta qualidade. Desejamos que o caminho ora começado seja profícuo e, de alto significado para o Nordeste. Queremos crescer em auto-estima mudando a face do Nordeste, preparando o futuro no trabalho presente. O laboratório, ora instalado em espaço nobre da UNICAP, mostra a vontade institucional de contribuir para a realização da própria missão: desenvolver de forma indissociável, as atividades de ensino, pesquisa e extensão, visando a formar pessoas profissionais éticas, competentes, criativas, a serviço de uma sociedade mais humana, justa e confiável.


Perspectivas: tecnologia e humanismo

Vivemos uma época de consolidação dos estudos e pesquisas para a criação, desenvolvimento e inovação tecnológica, como parte do nosso diaa-dia. Acolher propostas de pesquisa visando ao desenvolvimento tecnológico é parte de nossa missão para o desenvolvimento regional. O desenvolvimento tecnológico é muito importante para o desenvolvimento humano, para a melhoria da qualidade de vida, para o bem-estar da população. Os avanços no campo da saúde preventiva, na reeducação para hábitos saudáveis, na informática, na comunicação, no conhecimento do ser humano e do conjunto do universo nos abrem os olhos para orientarmos nossos conhecimentos e descobertas a serviço da pessoa humana e dos valores que devem ser defendidos com coerência cristã. A UNICAP, enraizada na visão cristã da pessoa humana e do mundo, testemunha a sacralidade da vida humana que adquire sua dignidade plena de ser imagem e semelhança do Criador. O ser humano dotado de razão pode reconhecer seus semelhantes, pode reconhecer seu Criador. “Deus viu tudo o que fez, e avaliou como muito bom”. Deus é otimista. Deus nos quer otimistas, protagonistas da Criação legada. Dotando-nos de razão para avançar no conhecimento da verdade plena, através das verdades terrestres descobertas em leis, fenômenos e experiências renováveis. De sentimentos para apreciarmos a beleza de viver em família, de cultivar amizades, de apreciar a vida e para colocar o melhor de nós mesmos para ser partilhado, descoberto com o próximo e pelo semelhante. Dotando-nos de vontade, ou seja, capacidade de colocar nas mãos o que foi sentido no coração, articulado pelo cérebro. Mãos, coração e cabeça; ação, sentimentos e raciocínios para concretizar a solidariedade e participação de todas

as pessoas, filhas de Deus e irmãs nossas em bens e serviços oferecidos a toda a sociedade.

VOZ DO PRESIDENTE

O laboratório ITAUTEC-PHILCO, UNICAP e FEI

A instalação deste laboratório, resultado do convênio celebrado com a Itautec Philco, é muito importante. Estamos concretizando a união de duas instituições consolidadas, com grande potencial e massa crítica. Sem dúvida, nosso relacionamento é vital para o desenvolvimento de pesquisas e produtos de avançada tecnologia, impactantes para a região e para o Brasil. O convênio marca, formalmente, o início de uma relação que esperamos seja produtiva, enriquecedora para ambas as instituições e duradoura, permitindo uma integração cada vez maior entre as atividades de pesquisa e desenvolvimento que deverão acontecer visando ao interesse mútuo. Pesquisadores, empresários, estudantes construindo aqui o Brasil melhor, a que aspiramos para as novas gerações, cada vez mais próximas. Felicito a coesão do corpo docente e discente de Ciências da Computação e de Telemática, pois serão altamente beneficiados com a possibilidades de interagirem nestes espaços de desenvolvimento tecnológico e científico. Dr. Paulo Setúbal Neto, expresso à Itautec Philco nossa confiança no êxito do empreendimento que reúne instituições de comprovada competência, honradez ética, compromisso social comunitário, em nível nacional e Internacional. Dr. Márcio Rillo, com sua presença confio que nossas universidades atuarão conjuntamente na busca do melhor serviço na formação da juventude para a alta qualificação profissional, técnica, científica, empreendedora, humana, solidária e cristã. Grato pela atenção de todos.

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PEDAGOGIA INACIANA

O COMPROMISSO DA COMPANHIA DE JESUS NA

Parte final da alocução do Pe. Geral Karl-Hans Kolvenbach, S.J., na bênção do novo edifício do Liceu de Gdynia, Polônia (10/10/98)1

EDUCAÇÃO

Alguns traços característicos da educação jesuíta

Permitam-me assinalar alguns traços do que, neste contexto concreto, poderiam caracterizar a inspiração inaciana deste Liceu.

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Tradução do Pe. Luis F. Klein, S.J. Do opúsculo”Educação Inaciana, Desafios na Virada do Milênio”, Coleção Ignatiana, Ed. Loyola nº 43, p. 52-57

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1.

O primeiro seria o sentido de pessoa. O homem – o ser humano ante a presença de Deus – é a primeira palavra dos Exercícios Espirituais de Inácio de Loyola. Vocês estão saindo de um sistema político e econômico em que o homem

e suas liberdades estavam submetidas a um regime coletivista, e no qual Deus era sistematicamente ignorado. Hoje, mais que nunca, é necessário recuperar o verdadeiro sentido da pessoa humana e sua dimensão transcendente. A educação não pode subtrair-se à globalização e ao fenômeno do mercado. Contudo, inserir-se na realidade, segundo o pensamento de Santo Inácio, não significa considerar bom tudo o que essa realidade implica. É necessário adotar uma atitude sadiamente crítica diante dela e ajudar nossos jovens e suas famílias a discernir o que a nova cultura contém de bom e o que nela é inadmissível. Sob a aparência de máxima liberdade e de realização pessoal podem mascarar-se, no sistema vigente, novas formas de escravidão e de massificação. A sociedade de mercado esconde refinadas formas de individualismo e de egoísmo, assim como uma sutil manipulação do pensamento e dos sentimentos da pessoa humana, especialmente através dos meios. Ensinar a pensar, discernir, escolher retamente e em solidariedade com os demais será hoje a incumbência inescusável de uma educação verdadeiramente inaciana. Num contexto de livre mercado como o que nos invade, será necessário também enfrentar toda tentação de absolutização. O único absoluto é Deus; e em seu grau, a imagem de Deus, que é todo ser humano. Não é o homem para a economia, mas a economia para o homem; assim como o sábado é para o homem, e não o homem para o sábado, conforme o ensinamento de Jesus. O torvelinho do consumismo e a fascinação que exerce sobre jovens – e não tão jovens – o modo capitalista (que de modo algum podemos considerar alternativa válida ao modo comunista, como muito bem o declarou o papa João Paulo II) estão transformando profundamente nossos padrões culturais e afetam o próprio sentido do humano. O discurso da qualidade, da competência e da


eficiência – certamente inevitáveis em nossos dias – pode conduzir a uma exacerbação do individualismo, à competitividade selvagem e inclusive à corrupção, se não vem acompanhado de uma orientação ética e de valor. A própria excelência que deve pretender nossa educação – o magis inaciano – pode chegar à perversão, se perder de vista a dimensão da totalidade. Não é simplesmente a excelência acadêmica que se pretende, mas a excelência humana.

2.

Ao sentido do homem acrescenta-se em nossa educação outra dimensão fundamental: o sentido de Deus. Só em Deus o ser humano encontra sua plena significação. Num mundo em que os avanços científicos e tecnológicos parecem ter tornado supérfluo o conceito mesmo de Deus, não nos deixaremos tentar por insidiosas formas de negação prática de Deus, mais sutis e não menos funestas que o ateísmo oficial sofrido por este país até há poucos decênios. Séculos atrás, em uma sociedade religiosa e crente, a educação dos jesuítas não encontrava dificuldades em fazer concordar “virtude e letras”, como diziam nossos antepassados (virtus et litterae, scientia et mores, sapientia et religio). Hoje, em uma sociedade predominantemente secular, pelo menos no Ocidente, em que o fato religioso se torna cada vez mais irrelevante, nossa educação se encontra diante do desafio de estabelecer a síntese entre “Evangelho e cultura moderna”, “ciência, tecnologia e fé”, “mundo e Deus”. Novos areópagos da cultura e da civilização contemporânea abrem-se ao nosso lado, atraindo irresistivelmente os jovens, enquanto em muitas partes esvaziam-se os templos. Relativismo e permissividade andam hoje de mãos dadas em um mundo que parece ter perdido as coordenadas. O próprio bem-estar material alcançado leva muitos a viverem como se Deus verdadeiramente não existisse, ou a conformar-se com uma religião vaga, incapaz de enfrentar o problema da

verdade e o dever da coerência, como sublinhou João Paulo II (Tertio Millennio Adveniente, n. 35, 57). Não se pode ser cristão a não ser no mundo. É nesta realidade do mundo, neste contexto difícil e muitas vezes indiferente ou adverso à fé, que nos cabe educar hoje, descobrindo e fazendo nossos alunos e suas famílias descobrirem a presença salvadora de Deus.

PEDAGOGIA PEDAGOGIA INACIANA INACIANA

3.

O sentido de Deus e o sentido do homem adquirem para nós sua plena dimensão na pessoa de Jesus Cristo. Seguindo Inácio de Loyola, os jesuítas pedimos cada dia para conhecer mais o Senhor que quis partilhar nossa condição humana, para mais o amarmos e seguirmos. Sem sectarismos e respeitando sempre a liberdade pessoal, uma educação de inspiração inaciana deve propor-se a anunciar a pessoa de Jesus e a Boa Nova do Reino para conseguir de seus alunos, na medida do possível, um compromisso livre e maduro no seguimento de Jesus em sua Igreja. Em Jesus, o homem-para-os-outros por excelência, nossos jovens e suas famílias aprenderão também a tornar realidade uma série de atitudes que toda educação verdadeiramente inaciana considera fundamentais: o serviço, a compaixão, a solidariedade com nossos irmãos mais pequenos e necessitados, a gratuidade, o perdão, o sacrifício, o compromisso, o dom de si mesmo sem retorno, o amor. A vivência da fé na comunidade eclesial tampouco pode esquecer aspectos fundamentais como a catequese e o culto, obviamente adaptados à mentalidade moderna e à linguagem dos jovens, num mundo em que a predominância da imagem está transformando os velhos códigos da comunicação.

4.

Esta fé viva em Jesus Cristo deverá expressarse também em obras de justiça. Neste último quarto de século a Companhia de Jesus redefiniu sua missão como “o serviço da fé e a promoção

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PEDAGOGIA INACIANA

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da justiça”. Fé e justiça são o sinal distintivo que deve caracterizar qualquer obra apostólica da Companhia. Educar na fé, visando à edificação de um mundo justo e fraterno, é compromisso indeclinável de todo colégio da Companhia. Quando ainda não se fecharam as feridas de sistemas absolutistas e de discriminações que fizeram sofrer tantos povos, nosso mundo enfrenta hoje novas formas de injustiça e de exclusão, produto em grande parte do sistema econômico imperante, em que a brecha entre ricos e pobres se aprofunda cada dia. A tão decantada “opção preferencial pelos pobres” deve ser algo mais que uma simples frase repetida nas declarações de princípios de nossos colégios. Em um colégio da Companhia, os pobres não podem ser simplesmente objeto de compaixão, mas o ponto de referência irrenunciável na própria estrutura da escola e em todo o processo educativo, como as bem-aventuranças de Jesus ou o Magnificat de Maria. Quem quer que freqüente nossos colégios deve ter bem claro que as possibilidades que nossa educação

oferece não vão encaminhadas à promoção egoísta dos indivíduos, mas, em definitivo, ao crescimento integral de todo o ser humano e de todos os seres humanos. Não pretendemos formar homens e mulheres só para si, mas para os demais e com os demais, especialmente para os mais empobrecidos, a exemplo de Cristo, que veio para todos terem vida – e vida em abundância – e mostrou sua preferência pelos pobres. Os últimos documentos da Congregação para a Educação Católica caracterizam a escola católica como “escola para todos, com especial atenção aos mais débeis”, e mencionam os “novos pobres” e as “novas formas de pobreza” que não podem senão interpelar a escola católica (A escola católica no limiar do Terceiro Milênio, n. 15). Não será sempre fácil levar à prática estes princípios, considerando-se, sobretudo, os condicionamentos econômicos de muitos colégios, que podem limitar suas possibilidades concretas de ação. Isso não exclui que não se deva tomar muito a sério esta orientação fundamental da Companhia.


CONSIDERAÇÕES EM TORNO DO PLANO ESTRATÉGICO DA AUSJAL Apresentação

A AUSJAL é a Associação das Universidades confiadas à Companhia de Jesus da América Latina. Ela nasceu em 1985. Nos primeiros anos nos limitamos um pouco a reconhecer que somos parentes. Como fazemos com os parentes mandamos um cartão de Natal e algo mais. Pelo início da década de 90, começamos a nos perguntar: “o que significa ser uma universidade vinculada à Companhia de Jesus na América Latina?” Certamente as respostas serão diferentes na Europa e nos Estados Unidos. A primeira formulação desta reflexão foi o trabalho “Desafios da América Latina e Respostas Educativas AUSJAL” para o qual colaborou o Pe. Theodoro Peters, na época o Presidente. Como afirmar nossa identidade?

Há universidades católicas em países não católicos. No Japão e na Índia mais de 90% dos professores e dos alunos destas universidades não são católicos, mesmo assim estas universidades têm uma identidade e são apreciadas por sua excelência. Rejeitamos uma posição totalmente secular nem queremos ser fundamenta-

listas. Afirmamos a inspiração cristã e uma identidade explícita. Mas com enorme autonomia das pessoas e das ciências e preocupação de qualificação profissional. A AUSJAL reúne 25 universidades com grandes diferenças. São autônomas, não há uma cadeia de comando. Procuramos compartilhar uma inspiração comum e ampliar a comunicação, projetos e intercâmbios. Elas não são necessariamente da Companhia de Jesus. Algumas são vinculadas, outras confiadas aos jesuítas. Há modelos jurídicos variados. O que têm em comum? A inspiração cristã, segundo a espiritualidade de Santo Inácio de Loyola.

PEDAGOGIA INACIANA

Resumo da palestra do Pe. Luis Ugalde, S.J., Presidente da AUSJAL e Reitor da UCAB (Universidade Católica Andrés Bello) de Caracas, proferida por ocasião da Semana da Qualidade do Centro Universitário da FEI, campus São Bernardo do Campo, em 1 de agosto de 2003. Para a tradução colaborou o acadêmico Davi de Souza Martins.

Plano estratégico

O plano estratégico da AUSJAL data de 2001 e está dividido em três grandes partes. É feito um diagnóstico da América Latina e são apontados os desafios das universidades com seus pontos fortes e as debilidades. Nas prioridades estratégicas abordam-se três pontos: 1) Para que sociedade formamos? 2) A pessoa que se forma. 3) A instituição formadora.

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Para que sociedade formamos?

Primeiro, a compreensão integral da pobreza. Por que ela aumenta em vez de ceder? Os elementos explicativos não são só econômicos, são também culturais e institucionais. Não se trata simplesmente de uma compreensão de curiosidade, como se eu estudasse o estômago de uma rã. Mas uma compreensão para mudar. Há, pois, uma implicação ética. Depois, os sistemas educativos nacionais e universidade. Há uma crença generalizada de que quanto mais escolas e universidades houver, menos ignorância e mais qualidade de vida haverá. Hoje há 10 milhões de estudantes universitários na América Latina. 30 vezes mais que em 1950. Em 1950 a América Latina tinha 12,5% do comércio mundial e agora não tem mais que 4%. Se a equação “mais faculdades = melhor sociedade” fosse verdadeira, hoje nossos países seriam mais governáveis, haveria menos contrastes entre pobres e ricos, teríamos menos corrupção, haveria mais estabilidade social e política. O ensino fundamental público é de nível muito baixo, os professores são mal remunerados. Quase todos os políticos dizem que educação é prioridade. As prioridades se revelam quando você vê o que acontece. Quem deseja ser professor, sobretudo primário? Os pais não incentivam esta escolha. Um terceiro ponto é: “Empreendedores, gestão, ética e responsabilidade social da empresa”. Discutimos pouco nossos males endógenos. Se o sistema da saúde do

município não funciona, será por culpa do imperialismo? Contentamo-nos em denunciar o imperialismo e dizer que, todos os nossos males são por causa dos Estados Unidos. A questão da qualidade contudo é um problema nosso. Ter empreendedores de qualidade, com ética, com responsabilidade social. Elevação de nossas capacidades internas, como país, como continente. Há pressões externas, sem dúvida. Mas há também limitações, deficiências ou corrupções que com freqüência ocultamos ou subestimamos. O quarto ponto neste item é o “Estado social de direito e direitos humanos”. Isto afeta de modo especial as faculdades de Direito. Como funciona o direito em nossos países? Seria cinismo afirmar que os pobres da América Latina sentem que os juízes e os tribunais garantem seus direitos, que as sentenças não têm preço e que as cadeias não são racistas. A pessoa que se forma

A Universidade é para formar pessoas. A tradição da Companhia de Jesus tem sido forte na formação de pessoas. A formação integral é um fim em si mesmo: ou seja, a pessoa não é um instrumento para a universidade nem para a sociedade. Mas o indivíduo não existe fora da realidade social e então o sentido do público e a solidariedade são elementos fundamentais. Temos que oferecer aos jovens oportunidades de como assumir a sua realidade, a sua e da sua sociedade. Cabe


à universidade transmitir uma antropologia solidária: esta antropologia de inspiração cristã nos diz que para encontrarse a si mesmo é preciso se encontrar no próximo.

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A instituição formadora

É necessário que fique clara a identidade da instituição, leigos e jesuítas devem afirmá-la. Não se trata de implantar uma confessionalidade que não se tem mas sim de compartilhar, aprofundar e explicitar a inspiração de quase 500 anos de tradição educativa inaciana que inclui a pedagogia e a espiritualidade. Todos, jesuítas e leigos, estão comprometidos com o humanismo. O caminho que devemos fazer é marcado por uma inspiração cristã aberta, dialogante e comprometida com a dignidade humana, com o sentido transcendente da vida, com uma antropologia cristã aberta a Deus e ao irmão, sobretudo o mais pobre. É mister também uma cultura que promova a auto-avaliação e desenvolva instrumentos aptos para a acreditação e crescente melhora da qualidade. Acrescentaríamos o desenvolvimento de uma cultura AUSJAL. A Associação das 25 universidades latino-americanas é ainda uma modesta realidade, mas de grande potencial. Os próximos anos, sem dúvida, conhecerão aumento desta cultura cooperativa e de comunicação em rede. Já há intercâmbios e o trabalho dos homólogos, ou seja, de grupos de pesquisa em áreas comuns, por exemplo, pedagogia, direito, administração, psicologia, etc. Você pode comunicar o que tem de melhor e saber dos outros o que eles têm de melhor. E vamos pouco a pouco chegando a uma cultura em rede com uma atividade compartilhada de acordo com as experiências que vamos tendo. A cultura de fácil e rápida comunicação virtual e a crescente identidade inaciana expressa em projetos comuns, permitir-nos-ão realizar melhor a nossa missão, com maior eficiência e redução de custos.

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Segundo as estatísticas da Companhia de Jesus (Educatio SJ, junho 2003), no início de 2003, são 221 as instituições de ensino superior (3º grau) ligadas aos jesuítas em todo o mundo. Incluem-se neste número, universidades, university colleges, centros universitários, faculdades isoladas, escolas superiores e assemelhados. Contam-se também as faculdades eclesiásticas de Filosofia e Teologia e os seminários maiores. Fazem parte deste conjunto igualmente residências universitárias (colégios maiores) e instituições técnicas e profissionais de ensino superior. O termo jesuíta é entendido em sentido amplo. São abrangidas por ele as obras apostólicas propriamente

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jesuítas e também outras instituições que participam do espírito inaciano, se inspiram na herança comum e na missão da Companhia de Jesus, prescindindo dos laços jurídicos que as ligam à Companhia, de sua estrutura diretiva e de quem sejam os proprietários destas instituições. As 221 instituições de nível superior abrigam 702.448 alunos com 58.342 professores e funcionários, sendo 2.347 jesuítas. O número total de jesuítas nas instituições educativas de todos os graus chega a 4.561, o que representa 22% do efetivo da Ordem. Se computarmos todos os graus de instituição jesuítas de ensino (superior, secundário, primário e redes) teríamos hoje no mundo todo 1.934, com mais de 2 milhões de alunos e cerca de 123.985 colaboradores. Estes números são um pouco maiores do que os de 1998. A Companhia fechou centros educativos em alguns lugares, mas abriu em outros, especialmente dedicados aos pobres (redes). Não deixa de chamar a atenção que o maior número de centros de ensino superior esteja na Índia, 55, com 50 mil alunos. Os Estados Unidos têm 30 universidades jesuítas (200 mil alunos). No Brasil são 7 (75 mil alunos). A Unisinos de São Leopoldo, RS, é a maior delas com mais de 30 mil alunos. Na América Central a Universidade Rafael Landivar da Guatemala tem mais de 10 mil alunos. A da Nicarágua tem mais de 6 mil. No Equador a Universidade tem 8 mil alunos. O México tem duas universidades, mas o número de alunos é mais ou menos igual ao do Brasil. Na Colômbia, a Universidade Javeriana tem perto de 30 mil alunos. Há uma universidade jesuíta na Indonésia (12 mil alunos), uma em Taiwan (24 mil alunos), outra na Coréia do Sul (14 mil alunos) e duas no Japão (14 mil). Nas Filipinas são seis universidades jesuítas (43 mil alunos). Na África, o número de escolas superiores e alunos é bem menor. Há escolas em Camarões, Quênia, Madagascar, República Democrática do Congo, Zâmbia e Zimbábue. No Líbano são duas com 7 mil alunos.


A UNIVERSIDADE CATÓLICA E AS MUDANÇAS DA SOCIEDADE Alegro-me de dirigir aos senhores esta saudação e de manifestar-lhes o meu apreço pelo empenho cultural e evangelizador das Universidades Católicas de todo o mundo. A presença dos senhores oferece-me a oportunidade de dirigir-me ao corpo acadêmico, ao pessoal e aos estudantes das suas instituições, que em conjunto constituem a comunidade universitária. A audiência de hoje me faz recordar com emoção o tempo em que tomei parte, também eu, no ensino superior. Agradeço ao Sr. Cardeal Zenon Grocholewski as palavras com que interpretou os sentimentos de todos os senhores, ilustrando ao mesmo tempo as motivações e as perspectivas que animam a atividade de pesquisa e ensino que fervilham em seus ateneus. Organizado conjuntamente pela Congregação para a Educação Católica e a Federação Internacional de Universidades Católicas, este Congresso sobre o tema “A globalização e a Universidade Católica” é particularmente oportuno. Salienta que a Universidade Católica deve sempre ter presente em sua reflexão as mudanças da sociedade para propor novas considerações. A instituição universitária nasceu no seio da Igreja nas grandes cidades européias como Paris, Bolonha, Salamanca, Pádua, Oxford, Coimbra, Roma, Cracóvia, Praga, acentuando o papel da Igreja no âmbito do ensino e da pesquisa. Foi em torno de homens que eram ao mesmo tempo teólogos e humanistas que se organizou o ensino superior não só em teologia e

filosofia, como também na maioria das matérias profanas. As universidades católicas continuam desempenhando hoje um papel importante no panorama científico internacional e estão chamadas a tomar parte ativa na pesquisa e desenvolvimento do saber, para a promoção das pessoas e o bem da humanidade. As novas questões científicas exigem grande prudência e estudos sérios e rigorosos; apresentam numerosos desafios, tanto para a comunidade científica como para as pessoas que devem tomar decisões, especialmente no âmbito político e jurídico. Assim, encorajo os senhores a discernir nos progressos científicos e técnicos, e também no fenômeno da globalização, o que é promissor para o homem e para a humanidade, mas também os perigos que eles trazem em relação ao futuro. Entre os temas que na atualidade revestem um interesse particular gostaria de citar os que se referem diretamente à dignidade da pessoa e seus direitos fundamentais e com os quais estão relacionadas as grandes interrogações da bioética, como são o estatuto do embrião humano e as células estaminais, hoje objeto de experimentos e manipulações inquietantes, nem sempre moral ou cientificamente justificados. A globalização é com freqüência o resultado de fatores econômicos que, hoje mais que nunca, formam as decisões políticas, legais e bioéticas, muitas vezes em detrimento das solicitudes humanas e sociais. O

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Audiência com os Participantes da Conferência Internacional: Globalização e Educação Superior Católica, Roma, 05/12/2002

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mundo da universidade deveria comprometer-se na análise dos fatores inerentes a tais decisões e, por sua vez contribuir para fazer com que se tornem atos verdadeiramente morais, dignos da pessoa humana. Isso significa que é necessário realçar vigorosamente a centralidade da dignidade inalienável da pessoa humana na investigação científica e nas políticas sociais. Através das suas atividades, os professores e os estudantes de vossas instituições são chamados a dar um testemunho clarividente da sua fé diante da comunidade científica, manifestando o seu compromisso em benefício da verdade e o seu respeito pela pessoa humana. Com efeito, para os cristãos, a investigação deve realizar-se à luz da fé enraizada na oração, na escuta da Palavra de Deus, na tradição e no ensinamento do Magistério. “O papel das universidades consiste em formar os homens e as mulheres nas diferentes disciplinas, procurando mostrar o profundo nexo estrutural existente entre fé e razão. “as duas asas com as quais o espírito humano ascende à contemplação da verdade (Fé e Razão 1)”. Além disso, não podemos esquecer que a verdadeira educação deve apresentar uma visão completa e transcendente da pessoa humana e educar a consciência das pessoas. Sei dos seus esforços no ensino das disciplinas para transmitir um humanismo cristão aos estudantes. No currículo universitário, aos estudantes deveriam ser apresentados os elementos essenciais da filosofia, da bioética e da teologia, isto contribuiria para confirmar a sua fé e formar a sua consciência (Ex Corde Ecclesiae, 15). A Universidade Católica deve exercer sua missão com a preocupação de manter sua identidade cristã, participando da vida da Igreja local. Mesmo tendo autonomia científica, ela tem a tarefa de viver o ensino do magistério nos diferentes domínios da pesquisa nos quais está implicada. A carta Ex Corde Ecclesiae sublinha esta dupla missão. A universidade tem uma dupla missão: “como universidade é uma comunidade acadêmica que, de maneira

rigorosa e crítica, contribui para a salvaguarda e desenvolvimento da dignidade humana e da herança cultural, graças à investigação, ao ensino e à oferta dos mais diversos serviços” (Ex Corde Ecclesiae 12), “como católica, manifesta a sua identidade fundamentada na fé católica, na fidelidade aos ensinamentos e às orientações que são oferecidas pela própria Igreja, garantindo assim uma presença cristã no mundo universitário, face aos grandes problemas da sociedade e da cultura” (Idem p.13). Compete com efeito a cada docente ou pesquisador, mas também a toda comunidade universitária e à própria instituição este engajamento como um serviço do Evangelho, da Igreja e do homem. No que lhes diz respeito, as autoridades universitárias têm o dever de velar pela retidão e pela manutenção dos princípios católicos no ensino e pesquisa no seio de seu estabelecimento. É claro que os centros universitários que não respeitam as leis da Igreja e o ensinamento do magistério, notadamente em matéria de bioética, não podem se valer do caráter de uma Universidade Católica. Convido pois cada pessoa e cada universidade a refletir sobre sua maneira de viver na fidelidade aos princípios característicos da identidade católica e a tomar em conseqüência disto as decisões que se impõem. Ao final do nosso encontro, gostaria de exprimir minha confiança e o meu encorajamento. As universidades católicas são inestimáveis para a Igreja. Elas cumprem uma missão a serviço da inteligência, da fé e do desenvolvimento do saber e, incansavelmente, lançam pontes entre os peritos de todas as disciplinas; são chamadas cada vez mais a ser lugares de diálogo com o conjunto do mundo universitário, para que a formação cultural e a investigação se ponham a serviço do bem comum e do homem, que não pode ser considerado como um simples objeto de investigação. Confiando os senhores à intercessão da Virgem Maria, de Santo Tomás de Aquino e de todos os doutores da Igreja, concedo-lhes, aos senhores e àquelas pessoas e Instituições que os senhores representam, a Bênção Apostólica.


Água bem público universal

Durante o mês de maio de 2003 estive representando o Centro Universitário da FEI no simpósio internacional “Água Bem Público Universal” realizado na UNISINOS (Universidade do Vale do rio dos Sinos) que é uma instituição de ensino superior afiliada a AUSJAL, associação que congrega as universidades latinoamericanas sob a orientação da Companhia de Jesus.

O evento procurou discutir os diversos aspectos que envolvem a água: o lado técnico, o sagrado, o social, o político, o econômico, valendo-se do fato de que este ano foi declarado pela ONU o Ano Internacional da Água Doce. O evento também serviu para preparação da Campanha da Fraternidade 2004 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB); cujo tema escolhido foi “Fraternidade e Água”. O simpósio contou com a presença de especialistas brasileiros, internacionais, representantes do governo, de movimentos sociais, de ambientalistas e teve como tema central o acesso universal à água e as alternativas para o seu uso racional. Neste evento já foi possível analisar as decisões do Terceiro Fórum Mundial da Água, realizado em Kyoto, Japão, no mês de março. Um dia antes do início do Fórum Mundial, foi divulgado um relatório da ONU denominado “Relatório Mundial sobre o Desenvolvimento dos Recursos Hídricos – Water for People, Water for Life” (Água para as Pessoas, Água para a Vida). Este relatório alertou para o fato de que 40% da população mundial carece de água em quantidade suficiente para cumprir suas necessidades básicas e de que 2,2 milhões de pessoas morrem a cada ano vítimas de um suprimento escasso ou inadequado de água. Porém o ponto central do debate em Kyoto foi a polarização das posições. A primeira corrente de pensamento corresponde

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Ailton Pinto Alves Filho, arquiteto, geógrafo, mestre e doutor em Geografia Física pela F.F.L.C.H. da USP e pesquisador na área de recursos hídricos. Professor do Depto. de Ciências Sociais e Jurídicas do Centro Universitário da FEI

Bibliografia • PETRELLA, RICCARDO. “O manifesto da água, argumentos para um contrato mundial”. São Paulo: Ed. Vozes, 1. ed., 2002,160 p. • INSTITUTO SOCIOAMBIENTAL (ISA) – “Billings 2000 - Ameaças e Perspectivas para o Maior Reservatório de Água da Região Metropolitana de São Paulo”, 2002.

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à dos que defendem a idéia de que a privatização da água, com o aporte de grandes somas de recursos do setor privado, sobretudo no que se refere ao tratamento e distribuição da água, seria o meio mais eficaz de assegurar a entrada de tecnologia e de recursos para garantir o abastecimento para a maior parte da população dos países em desenvolvimento. Para estes, a fixação de preços da água representa um instrumento essencial para garantir a sustentabilidade desse recurso. Esta idéia esteve explícita no relatório “Financiamento da Água para Todos” que tem a assinatura de Michel Camdessus, ex-diretor do FMI. Esse documento sugere que a falta de financiamento para serviços de tratamento e distribuição de água é mais um problema de gestão do que de falta de recursos financeiros. O estudo sugeriu a descentralização do processo possibilitando que os municípios possam negociar empréstimos internacionais sem a necessidade de aval dos governos centrais. Isto garantiria investimentos e acesso a água até a regiões extremamente pobres. Desta forma surgiriam novas condições para aquilo que se denomina de PPP (Parceria Público–Privada), na qual o setor público de qualquer instância criaria as condições para que o setor privado

assumisse a gestão dos recursos hídricos. Na segunda corrente estão os ambientalistas e ativistas antiglobalização que consideram o acesso à água potável como um direito humano básico e fundamental que não pode ser objeto de comercialização a exemplo do ar que respiramos. Este grupo viu na proposta de Camdessus uma tentativa de imposição de um modelo “privatizante” para garantir os lucros das empresas financiadoras, a maioria delas européias, como a Suez e Vivendi Universal, da França e a angloalemã Thames Water. Daí viria a origem do discurso da União Européia que defende a abertura dos serviços de água dos países em desenvolvimento à competição internacional para garantir um ambiente favorável ao aumento dos investimentos no setor. O objetivo implícito desta posição seria o de abrir mercados rentáveis para as empresas hídricas européias. Para os ambientalistas o aceno para este tipo de financiamento seria uma tentativa velada de transformar a água em um bem econômico. Um dos maiores críticos deste modelo é o economista e professor da Universidade Católica de Louvain (Bélgica), Riccardo Petrella que foi um dos principais conferencistas do evento patrocinado pela UNISINOS. Para ele o principal problema relacionado à privatização dos recursos hídricos é que ela significa também a perda da autonomia política dos governos sobre a alocação e distribuição deste valioso recurso natural. (PETRELLA, 2002). A posição do Brasil

Até o momento o Brasil não tem uma posição oficial sobre o tema. No entanto o governo, através de uma entrevista do Presidente da República à revista Veja (20 de agosto de 2003) acena para a possibilidade de abertura do setor para o investimento externo: “Como é que nós vamos fazer saneamento básico nas regiões metropolitanas deste país sem atrair investimen-


tos de fora? Não cabe mais aquele discurso ideológico de que saneamento básico é obra do governo federal e responsabilidade do governo estadual e do prefeito. Esse discurso seria maravilhoso se tivéssemos dinheiro para fazer. Não adianta fazer um bom discurso ideológico e o povo continuar pisando em esgoto a céu aberto e bebendo água não tratada”. De certa forma esta declaração guarda a grande contradição existente nos dias de hoje entre os compromissos ideológicos e necessidade de promover a captação de recursos em instituições internacionais para implementação de ações relativas a recursos hídricos, saneamento básico, entre outras. Os rumos que o Brasil irá tomar em relação a este tema são muito relevantes uma vez que o país concentra grande parte da água disponível para consumo humano. Os dados são contraditórios, mas se costuma atribuir ao país o estoque de cerca de 12% da água doce da superfície do planeta. Além disso, cerca de 70% do maior reservatório de água subterrânea do mundo está igualmente em nosso país: o Aqüífero Guarani. Segundo dados do Ministério do Meio Ambiente estariam estocados neste reservatório cerca de 45 trilhões de metros cúbicos de água. Apesar de nossa situação aparentemente privilegiada não podemos deixar de apontar para as diferenças na distribuição desta água dentro de nosso território, dado que uma área de mais de 800.000 km2, correspondente ao semi-árido brasileiro, convive com o problema crônico da falta d’água. Além disso, predominam no país intervenções econômicas que não levam em conta a “capacidade de carga” dos ecossistemas, não respeitando os ciclos hidrológicos e nem os princípios de sustentabilidade social. Infelizmente os exemplos de utilização predatória deste recurso natural que é essencial à vida são inúmeros no nosso país e já estamos sentindo as conse-

qüências disto e sofreremos ainda mais se não forem tomadas providências, haja vista os problemas de abastecimento energético que tivemos recentemente.

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As causas profundas da crise

Durante o racionamento de energia que se prolongou por mais de oito meses e que afetou quase todo o país, muito se comentou sobre os motivos que levaram à falta de energia. As causas imediatas foram atribuídas à ausência prolongada de chuvas no Centro-Sul que teve como conseqüência a queda recorde dos níveis dos reservatórios, principalmente daqueles que compõem o sistema hidroelétrico de Furnas. Causas de médio e longo prazo foram a falta de investimento no setor. No entanto, pouco se comentou sobre as causas estruturais do problema. Para um país que depende dos recursos hídricos para gerar energia, o essencial é a preservação de nossos mananciais para garantia do fluxo de água para os reservatórios. No caso de Furnas, por exemplo, é sem dúvida o processo de desmatamento realizado nas últimas décadas ao longo da bacia do rio Grande que compõe a extensa divisa entre o estado de São Paulo e Minas Gerais que proporciona

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constantes quedas recordes nos níveis das represas. As conseqüências diretas deste desmatamento são rios e pequenos riachos minguando até desaparecerem e desta forma, deixando de alimentar os reservatórios. Na bacia do rio Grande, a única área decentemente preservada corresponde à nascente, graças ao decreto n˚ 1.713 de 1937 de Getúlio Vargas que criou o Parque Nacional de Itatiaia, o primeiro do país. O modelo agrícola brasileiro simplesmente ignora planejamento hídrico, tratando a água como se fosse um bem inesgotável e disponível ad aeternum para qualquer cultura em qualquer lugar do país, bastando para isso instalar-se um pivô central para irrigação. O modelo agrícola que privilegiou as exportações e promoveu expansão de lavouras como a soja no Centro-Oeste foi feito sem respeitar nenhum zoneamento agro-ecológico e a “capacidade de carga” ambiental. O exemplo extremo desta falta de sensibilidade é a existência de empresas especializadas na drenagem de solos hidromórficos de rebordo de chapadas do Centro-Oeste brasileiro para uso na lavoura de soja. Em outras palavras, isto significa preparar os terrenos em volta das nascentes dos rios que partem do Centro-Oeste brasileiro para as bacias amazônicas ou do Paraná para o cultivo da soja, comprometendo o futuro

desta rica região. Secar nascente para gerar alguns milhares de dólares: qual será a relação custo benefício deste tipo de intervenção? Outra bacia que sofre hoje as conseqüências diretas de um processo muito antigo de desmatamento e de maus tratos aos cursos d’água é a bacia do rio Paraíba do Sul. Hoje a falta d’água e a poluição ameaçam dez milhões de pessoas abastecidas por esta bacia. No final de março de 2003 o problema foi agravado ainda mais com os danos generalizados à saúde de milhares de pessoas, ao ambiente e ao patrimônio público pelo vazamento de resíduos tóxicos da Indústria Cataguazes de Papel. A ruptura do reservatório de resíduos químicos usados na produção da celulose desta empresa provocou um desastre ambiental que atingiu oito cidades e uma população de mais de 500 mil habitantes, desde a cidade mineira Cataguazes, ao longo do rio Pomba e do rio Paraíba do Sul até a foz deste no norte fluminense. Situação nas grandes metrópoles

Mas o problema de origem hídrica mais grave que enfrentamos hoje está nas grandes metrópoles do país. Um estudo apresentado pelo WWF (Fundação Mundial para a Vida Selvagem) em setembro de 2003 intitulado “A Água, as Florestas e as Cidades” demonstrou que mais de 30% das cento e cinco maiores cidades do mundo dependem de áreas protegidas (parques e reservas) para seu abastecimento de água, entre estas estão grandes metrópoles brasileiras como Rio de Janeiro, São Paulo, Brasília, Belo Horizonte e Salvador. Neste estudo uma das principais recomendações é de que a ocupação no entorno das represas seja feito obedecendo a critérios que permitam a proteção da água para abastecimento atual e futuro das suas populações. O estudo também ressalta a importância da recuperação das zonas degradadas como forma de


garantir a sobrevivência destas cidades e das futuras gerações. No caso específico da metrópole paulistana, a situação do abastecimento d’água tende a se tornar extremamente grave, uma vez que a despeito da importação de água das bacias adjacentes, o sistema de abastecimento tem operado próximo do limite de capacidade nos períodos de estiagem, com constantes ameaças de racionamento. O município de São Bernardo do Campo, onde se localiza o Centro Universitário da FEI, pertence, na sua maior parte, à sub-bacia da Billings que compõe a Bacia do Alto Tietê. O sistema de reservatórios da Billings é o maior da Grande São Paulo. Concebido inicialmente para gerar energia para usina de Henry Borden, acabou sendo incorporado ao sistema de abastecimento da Região Metropolitana de São Paulo.Porém menos de 30% dele é aproveitado. O sistema Billings recebe hoje forte carga de poluição, pois grandes volumes de esgoto não tratados são despejados nas suas águas, uma vez que centenas de milhares de pessoas residem às suas margens em habitações informais (autoconstruções clandestinas, sem rede de esgoto e sem acesso a qualquer equipamento público urbano). Este processo remonta aos anos setenta, quando se iniciou o processo de inchaço urbano das grandes metrópoles brasileiras. Nesta época, também surgiram as primeiras leis que tentaram coibir esta expansão para dentro das áreas de mananciais. Através da famosa “Lei de Proteção dos Mananciais” (lei 898/75) criada em 1975 pelo governo Paulo Egídio Martins, foi estabelecido um mecanismo de controle do uso e ocupação das vertentes tributárias dos mananciais da Região Metropolitana de São Paulo, com a proibição do parcelamento do solo e da instalação de equipamentos urbanos e infra-estrutura nas áreas em torno das represas. Ao mesmo tempo em que a lei estimulava a instalação de chácaras e clubes de lazer

às margens das represas com grandes áreas de solo permeáveis e com baixo lançamento de esgotos por um lado, provocou por outro uma desvalorização do preço do terreno por metro quadrado o que paradoxalmente, estimulou a sua ocupação pela população menos favorecida. Esta se sujeitou a viver nestas áreas mesmo sem acesso à água tratada, luz, transporte ou rede de esgoto por não ter muitas vezes, outras opções de moradia. Em suma, ao invés de coibir a ocupação, esta lei teve efeito inverso: favoreceu o despejo in natura de esgotos nos reservatórios como a Billings. Este processo apesar de ser totalmente irregular sob o ponto de vista da legislação não parou de crescer, afetando a qualidade da água, não somente pelo lançamento de esgoto e lixo sobre os mananciais como também pela alteração significativa do regime hidrológico dos corpos d’água que são as fontes primeiras de alimentação das represas. Porém não se pode deixar de levar em conta que a lei previa a preservação de cerca de metade da área da Grande São Paulo pois, fatalmente a expansão urbana iria atingir em cheio estas áreas. Esta pressão não é exercida individualmente, mas sim por uma imensa rede que inclui loteadores clandestinos de terrenos, lojas de materiais de construção, fiscais e políticos.

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Estes últimos são apontados como coniventes ou artífices deste processo, beneficiando-se financeira ou politicamente da legalização destes terrenos. Alguns defendem que não há mais volta para este processo e que não resta outra solução que não seja tratar todo o esgoto e permitir a expansão urbana indiscriminada. Esquecem-se estes que uma área de manancial não se resume à água captada pelas chuvas que caem sobre o reservatório. O que está em jogo aqui é a quantidade e a qualidade das águas que podem ser absorvidas pelas áreas circunvizinhas formadas pelo pouco que sobrou da Mata Atlântica, seus respectivos lençóis e nascentes. Ao mesmo tempo tirar milhares de pessoas à força de suas habitações, muitas delas erguidas com o esforço de décadas de trabalho é absolutamente inviável. Queiramos ou não, só nos resta uma saída, a solução negociada caso a caso, sub-bacia por subbacia, ou seja, a partir de uma gestão descentralizada com a participação da sociedade civil e das comunidades diretamente atingidas. Problema Ético e Cultural

Um aspecto que não pode deixar de se relevar é que apesar do grave risco no abas-

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tecimento que vivemos, ainda predomina a cultura do desperdício, como se a água limpa e tratada fosse uma dádiva inesgotável da natureza. A educação ambiental é portanto o eixo central na mudança do paradigma pelo uso ético da água. Neste sentido, o Centro Universitário da FEI como respeitada instituição de ensino superior localizada próximo a uma área de proteção de mananciais tem muito a colaborar no aprimoramento desse processo. O primeiro passo foi dado com a efetiva colaboração de todos os órgãos do Município no programa de revitalização da Chácara Silvestre, antiga residência da tradicional família Simonsen que formará parque urbano numa área de 131.000 m2, no bairro de Nova Petrópolis (São Bernardo), para que o espaço possa abrigar um centro de educação ambiental cuja temática principal será a água. A solução para o problema da água está longe de ser conseguida, pois envolve uma gama enorme de interesses muitas vezes conflitantes. Só um conjunto de decisões pactuadas envolvendo todas as partes interessadas e a transparência nas decisões tomadas dará respaldo a uma gestão mais eficaz para os recursos hídricos em nosso país. O caminho, mesmo que tortuoso e longo, é o único a seguir, com a sociedade aprendendo com seus erros e acertos. As medidas tomadas desta forma podem ser consideradas como conquistas e fruto da maturação democrática do país. Os recursos externos são sem dúvida uma fonte importante de financiamento, porém eles só poderão ser avalizados se atenderem as nossas demandas internas, sem passar por cima dos mecanismos conquistados, frutos do debate público e da experiência adquirida nos últimos anos. Cabe uma intervenção firme daqueles que tendo consciência dos riscos que corremos em relação à água, possam barrar as medidas que eventualmente se oponham a esta lógica de racionalidade ambiental.


O QUE FAZER A INFORMÁTICA: FERRAMENTA PARA O DESENVOLVIMENTO SOCIAL

As inovações tecnológicas têm tido sempre um aspecto marcante na vida do homem e na evolução das civilizações. Este impacto modificava a cultura e se refletia, de alguma forma, na economia do país, ou de um povo, que tinha seu comportamento influenciado por essas novas tecnologias, estabelecendo assim novos padrões culturais e socioeconômicos.

De todas, até o momento, a informática foi com certeza a inovação tecnológica que em maior grau, e mais rapidamente, influenciou a cultura e economia de praticamente todos povos na terra. A controvertida globalização da economia, por fim, não teria sido possível de ser implantada, sem a informática. Idolatrada por uns e detestada por outros, a informática em si, na realidade, é tão somente uma poderosíssima ferramenta a serviço da humanidade: cabe ao homem saber fazer uso adequado dela. Sua inserção no nosso quotidiano é irreversível e definitiva, e ignorá-la seria pura ingenuidade, senão tolice. A informática tem sido responsável pela automação e otimização de processos, de qualquer natureza, o que resultou na redução de custos, melhoria de qualidade na produção, e num aumento da produtividade sem precedentes: como conseqüência, infelizmente, isto também trouxe redução da necessidade do tipo de mão-de-obra tradicionalmente empregada no setor produtivo. Este aspecto da informática afetou uma grande parcela da população, que de repente perdeu a utilidade no processo produtivo, e conseqüentemente o emprego, pois suas habilidades e conhecimentos não estavam à altura das novas exigências e foram facilmente suplantados por máquinas. Isto não foi diferente quando, ainda em época recente, centenas de milhares de artesãos, tais como alfaiates, sapateiros, marceneiros e outros, foram substituídos por máquinas, ainda não informatizadas, que podiam fazer as mesmas tarefas com custos e tempos de produção bem menores , e com padrões de qualidade superiores. O fenômeno, portanto, não é novo: a sociedade soube reagir e se adaptar às novas tecnologias, que ajudaram no crescimento econômico, para os que souberam fazer bom uso dela.

DESAFIOS MODERNOS

Costantino Agazzi e Alessandro La Neve1

Reproduzimos aqui a segunda parte da exposição apresentada em junho de 2002, em Montevideo na reunião do NEAL. O Prof. Costantino Agazzi, co-autor e expositor, faleceu no final de 2002.

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Doutor, professor titular do Depto. de Engenharia Elétrica e atual Secretário Geral do Centro Universitário da FEI

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DESAFIOS MODERNOS

CARACTERÍSTICAS E POSSIBILIDADES DA INFORMÁTICA

O conhecimento e uso da informática são hoje fundamentais para a integração do homem na sociedade moderna, e até para a sua própria sobrevivência no mercado de trabalho, não importando quão simples ou complexas sejam suas funções. A informática automatiza processos, tarefas e atividades, permite acessar, gerar e transferir informações rapidamente e de forma aberta, tornando-as facilmente disponível a todos; ela dota de “inteligência” os sistemas, as máquinas, os equipamentos e os instrumentos, o que significa que eles passam a ser independentes da intervenção direta do homem. O uso da computação permite, antes de tudo, a substituição de atividades que tenham características algorítmicas, ou seja, conhecidas, previsíveis ou repetitivas. Por causa disso, num processo inevitável e irreversível, grande parte das atividades exercidas até hoje pela força de trabalho nos vários segmentos da indústria, comércio, escritórios em geral, está sendo substituída por equipamentos da informática, pois estes permitem que seja realizada a mesma atividade, ou boa parte dela, em tempo extraordinariamente menor. Novas tecnologias exigem novas qualificações profissionais. Portanto a esta altura, é importante saber, e poder adequar-se, dentro dos níveis de competência de cada um, a esta nova tecnologia, tanto para conviver com ela como também sobreviver devido a ela. A informática pode se restringir tanto ao uso do equipamento em si, ou à utilização de softwares de diferentes complexidades, como pode ser utilizada para dar apoio à sociedade, das formas mais variadas. No primeiro caso, portanto, incluem-se os usuários da informática, nos seus mais variados níveis de complexidade. Isto compreende o manuseio de um “simples” terminal eletrônico de consultas a informações, que

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pode ser colocado à disposição para toda população em locais públicos (estações rodoviárias, correios, bancos, postos de atendimento, etc.), o uso do microcomputador como simples ferramenta de escritório, para elaboração de documentos, consulta a banco de dados ou preenchimento de planilhas eletrônicas, e também aplicações com equipamentos e instrumentos inteligentes, usados não somente em indústrias, mas até em estabelecimentos pequenos, tais como gráficas, oficinas mecânicas ou laboratórios. A informática também pode servir de apoio à sociedade de várias maneiras e, em particular, na medicina e engenharia biomédica. Este aspecto poderia muito bem ser aproveitado prioritariamente para populações carentes, seja nas periferias, favelas ou localidades remotas ou com dificuldade de acesso. Será portanto de fundamental importância poder ensinar a todos os que precisem, o uso dessa nova ferramenta de trabalho, em seus respectivos níveis de competências, para que essas pessoas não sejam excluídas do mercado de trabalho por falta desses conhecimentos. Da mesma forma, será imprescindível poder disponibilizá-la para garantir alguns serviços de medicina básicos, que podem mudar o perfil das populações carentes. Uso da Informática: Ensino e Saúde

Entendemos que o cuidado com a saúde é um fator fundamental para garantir a inserção do homem na sociedade com dignidade. A informática pode ser uma ferramenta muito importante para ajudar nesses aspectos as populações mais necessitadas. O ensino da informática pode ser pensado e orientado para atender a diferentes necessidades da população, desde as mais básicas até as mais avançadas, e tem várias possibilidades de implementação, para melhor atender os seus objetivos. Poderá ser muito


útil para habilitar pessoas das camadas mais pobres a simplesmente aprender o uso do microcomputador como ferramenta de escritório, e a utilizar aparelhos com algum grau de informatização. Seria essencial que todos pudessem aprender a operar um microcomputador, nas suas funções básicas como uma máquina de escritório e posteriormente, como ferramenta para acessar a informação via Internet. O primeiro aspecto permite ao trabalhador agregar valor às suas competências e lhe dá a possibilidade de se inserir no mercado de trabalho com a exigência mínima requerida. Há inúmeros exemplos de trabalhadores que, nos processos recentes de enxugamento das empresas, foram demitidos, entre outras causas, por falta do conhecimento de informática. Este problema normalmente vinha associado à idade madura do funcionário, que é justamente aquele que não teve o treino da informática na sua profissão quando jovem, e nunca se atualizou. Desenhistas e contadores, por exemplo, que não souberam em tempo se adequar ao uso das facilidades da informática, perderam o emprego quando mais precisavam dele, e têm hoje pouquíssimas chances de reinserção na mesma atividade profissional. Poderiam ser citadas às dezenas, as profissões que foram definitivamente afetadas pela informática, seja nas atividades de escritório, na indústria ou no comércio. O segundo aspecto permite que, através da Internet, todo cidadão tenha acesso a qualquer tipo de informação, seja de órgão público ou privado e de qualquer natureza. É sem dúvida uma forma barata e rápida de disponibilizar uma parte da informação e conhecimento, o que abre as portas para uma integração mais rápida na sociedade. O computador é uma ferramenta valiosíssima também para o ensino de outras matérias, fazendo uso da CAI – Instrução Auxiliada por Computador, ou

como suporte aos cursos presenciais. Particularmente interessante é o uso da CAI na Instrução a Distância (ou parcialmente presencial), que permite levar cursos inteiros (com “instrutor”, e material didático) no local da melhor conveniência do aluno, onde será por ele realizado no momento mais conveniente. É claro que ela não substitui um curso normal com instrutor presente, mas oferece outras facilidades como disponibilidade de tempo e lugar, além da riqueza de informações, na forma de textos, exercícios, figuras, imagens, fotos, gráficos e softwares de simulações. Estes softwares têm uma vastíssima gama de aplicações que permite que se visualize, por simulação e com certo realismo e precisão matemática, o funcionamento de equipamentos, instrumentos ou cenas que precisem de movimento.

DESAFIOS MODERNOS

ENSINO

A televisão e o rádio já foram, e ainda são, utilizados para o ensino a distância e nisso têm ajudado bastante. O uso de fita de vídeo, mais recentemente, também tem sido um instrumento importante na educação continuada, e tem sido aproveitado com sucesso em cursos específicos de treinamento. A característica desses meios é de fornecer informações, sem a possibilidade de comunicação entre o meio que informa e o receptor, o aluno. É muito importante aqui a presença de um instrutor para que haja comunicação no processo de aprendizagem, e o aluno possa aproveitar o material de apoio. A informática, por outro lado, sem descartar essas tecnologias sempre válidas e muito menos diminuir a importância do instrutor, dá um passo adiante significativo, por permitir que haja, por parte do aluno, interatividade no processo de aprendizagem, contrariamente ao que acontecia anteriormente com o rádio e a televisão.

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DESAFIOS MODERNOS

Se isto é importante para todo aluno, de forma especial o é para os mais desprovidos de instrução. Nesse aspecto é possível dar ao aluno, mediante softwares educacionais convenientemente elaborados, um tratamento individualizado, com mais estímulo e autonomia. Várias profissões básicas podem ser ensinadas, através do computador e de softwares CAI e de simulação, e novas habilidades podem ser desenvolvidas. Operacionalidade

Para as populações carentes podem ser encontradas várias formas baratas para viabilizar esta forma de ensino. É necessário apenas um espaço físico, como algumas salas de escolas públicas a serem usadas em horário conveniente, ou outros que prefeituras, postos de atendimento, associações de bairro, associações sindicais, organizações, etc., possam disponibilizar. Microcomputadores podem ser conseguidos a preços bem baixos, em versões mais antigas, ou até gratuitamente, através de ONGs, indústrias de informática ou outras organizações. Alguns instrutores, inicialmente recrutados entre universitários, poderiam se encarregar de ministrar os cursos e de dar apoio aos alunos. SAÚDE

Na área de saúde a informática também pode ser usada, especialmente ao se fazer uso da telemedicina e alguns tipos de análises clínicas, por um sistema de teleanálises. Isto seria de extrema importância para as populações mais carentes e que vivem em regiões afastadas ou de difícil acesso. A telemedicina permite que as pessoas sejam “atendidas” por técnicos de saúde ou pessoal paramédico, fazendo uso de instrumentação eletrônica para a coleta de dados dos “pacientes”, e “enviando as respectivas

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informações a centrais de atendimentos, localizadas em centros urbanos devidamente equipados”. Estas medidas são importantes quando há falta de médicos para atender a essas populações, e a telemedicina propiciaria uma primeira triagem de alguns problemas típicos, especialmente os regionais, a serem possivelmente precocemente diagnosticados. Como suporte à telemedicina, análises clínicas também poderiam ser viabilizadas mais facilmente fazendo uso da teleanálise: feita a coleta de material, tipicamente sangue e urina, em um posto de saúde, por pessoa capacitada, o material seria “lido” por um scanner adequado e sua informação encaminhada, via satélite ou outro meio, a laboratórios especializados que fariam o diagnóstico. Muitas doenças poderiam ser facilmente detectadas e debeladas com um diagnóstico adequado, se realizado na época certa. Mesmo que isto não pudesse ser aplicado a todo o tipo de análises clínicas possíveis, seria um grande passo inicial para combater problemas básicos de saúde nas regiões mais problemáticas. Operacionalidade

Os investimentos aqui também seriam relativamente baixos e, com certeza, várias organizações privadas ou governamentais, nacionais e internacionais, ONGs poderiam ser ativadas para auxiliar nesse processo. Apoio

O sistema de ensino e saúde através da informática poderia contar com o apoio das universidades, especialmente as católicas, para o desenvolvimento de softwares e equipamentos e, também, com a colaboração de especialistas das áreas de ensino e saúde dessas mesmas universidades, tanto para dar apoio na elaboração dos sistemas informatizados, como para dar acompanhamento e atendimento aos necessitados.


RAZÃO E FÉ, EDUCAÇÃO

João A. Mac Dowell, S.J. CES – BH

Parte final do artigo “A Experiência de Deus à luz da experiência transcendental do espírito humano” publicado na revista Síntese, nº 29, Ausência da experiência de Deus e experiência da ausência de Deus

O mesmo esquema que atribui as diferenças na experiência de Deus à maior ou menor abertura do espírito à manifestação de Deus, ajuda a compreender a problemática da experiência religiosa no mundo moderno. Não é necessário demonstrar aqui que uma das características marcantes da modernidade é a secularização da sociedade e da cultura. O mundo moderno tornou-se expressamente secular e, enquanto tal, autônomo em relação a qualquer realidade transcendente. Isto significa para o homem moderno não só a ausência generalizada da experiência religiosa, mas também a experiência de não fazer nenhuma experiência religiosa, isto é, da insignificância de Deus na vida real das pessoas. Falamos de mundo moderno, e não

de mundo atual, já que esta situação se dá na medida em que a vida social e a existência das pessoas são afetadas pelo espírito da modernidade. Com efeito, apesar da irradiação planetária da cultura moderna, há ainda numerosos grupos humanos, certamente na América Latina, cuja mentalidade e cultura não estão, pelo menos por enquanto, moldadas de maneira determinante pelo espírito moderno. E mesmo no seio de sociedades profundamente marcadas pela modernidade é possível aos indivíduos resistir, até certo ponto, às investidas da mentalidade moderna, em particular, no que toca às condições da experiência de Deus e da fé religiosa. Não nos referimos a uma fé religiosa puramente formal, mantida apenas por tradição, rotina ou conveniência, mas da fé pessoal como compromisso com aquele a quem se confia absolutamente o próprio destino. Esta fé autêntica supõe a experiência transcendental do

nº 93 (2002) p.5-34

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RAZÃO E FÉ, EDUCAÇÃO

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Cf., por exemplo, Die Technik und die Kehre (Pfullingen, G. Neske, 1962).

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absoluto divino, mas pode subsistir, ainda que com dificuldade, sem o apoio de uma experiência religiosa propriamente dita, isto é, sem qualquer percepção da presença divina na realidade criada. Não obstante estas eventuais exceções, a experiência da ausência de Deus é característica do mundo moderno enquanto tal. Com efeito, a modernidade se origina da guinada antropocêntrica, pela qual o sujeito humano, com razão e liberdade, se constitui em fundamento de todo sentido e valor e em senhor do mundo e da história. Esta autonomia absoluta manifesta-se, no plano do conhecimento, através da pretensão racionalista de uma explicação total da realidade, cuja expressão mais significativa é a ciência moderna; no plano da liberdade, através do individualismo com suas expressões política (democracia) e econômica (capitalismo). Considerados abstratamente, ciência e técnica, regime democrático e economia de mercado, constituem valores instrumentais, positivos em si mesmos, que, enquanto instrumentos, podem ser utilizados para a construção ou destruição da vida humana, pessoal e social. Entretanto, esta neutralidade desaparece tão logo tais objetivações do espírito humano são integradas no seu contexto histórico concreto. Como criaturas da modernidade, elas trazem a marca indelével do espírito que as gerou e alimentou. Segundo esta visão do mundo de caráter antropocêntrico, racionalista e individualista, a realidade só tem consistência e sentido enquanto objeto da razão humana e projeto de sua vontade de poder. Natureza e história convertem-se em matériaprima da ação do homem que tenta moldá-las à sua imagem e semelhança. Neste sentido, pode-se falar, com Heidegger, de civilização da “técnica”, tomando o termo não num sentido empírico, mas como expressão da atitude dominadora e manipuladora do homem moderno1. Em sua arrogância desmesurada, ele julga que não há nada além daquilo que se pode submeter à racionalidade tecnocientífica.

À medida que participa desta mentalidade imanentista, característica da modernidade, a pessoa perde a sensibilidade para o mistério da existência e torna-se impermeável a uma autêntica experiência religiosa. O espírito moderno choca-se com dois aspectos fundamentais da atitude religiosa, ou seja, por um lado, a convicção da existência de um mundo superior, a esfera do sagrado/divino, com o qual o ser humano, para realizar-se, deve entrar em comunhão nesta vida e, mais ainda, numa vida pós-mortal; por outro, a compreensão de que a própria existência e a realização do destino individual e social são dom gratuito da divindade e não mero produto do esforço humano. De fato, o horizonte existencial e teórico do homem moderno restringe-se ao âmbito intramundano e intra-histórico. Por outro lado, toda a realidade se apresenta como criação atual ou potencial da própria razão humana. Ela já não encontra no mundo senão a concretização progressiva de suas idéias e desejos. Não se altera evidentemente a estrutura fundamental do espírito humano como abertura ao absoluto transcendente presente no mistério da existência. Entretanto, o reconhecimento desta presença fundante como experiência religiosa, que se dá necessariamente numa interpretação da realidade humano-mundana através de formas simbólicas culturalmente condicionadas, fica bloqueado. Superficialidade do homem moderno como bloqueio da experiência de Deus

É verdade que já ao longo do século XX a auto-suficiência da razão moderna foi mortalmente golpeada, seja pela tomada de consciência de sua incapacidade de autofundar-se, mormente enquanto racionalidade científica, seja pela experiência das trágicas conseqüências da confiança cega em sua onipotência. Diante do fracasso da razão na sua pretensão de


encontrar sentido para a existência na autonomia e na imanência de seu projeto histórico, a questão do sentido último tende a renascer. Quando é posta, porém, ela fica sem resposta. O horizonte absoluto que se oferece a quem ousa ultrapassar os limites da razão instrumental mostra-se vazio. São poucos os que têm coragem de encarar de frente este nada esmagador. Esta experiência aponta diretamente para o sem-sentido do conjunto da existência. É possível, contudo, descobrir nela uma ambivalência radical. Há quem pressinta neste silêncio incompreensível uma possível alternativa ao niilismo da civilização atual. Como experiência dolorosa da ausência absoluta de sentido, este silêncio, que não deixa de afetar profundamente quem se dispõe a ouvi-lo, não seria senão o apelo em negativo da presença de um sentido que, como mistério transcendente, supera a compreensão humana2. Tal não é, porém, a reação característica diante das contradições do mundo atual. Elas não geram espontaneamente o questionamento das atitudes fundamentais do homem moderno. Há sem dúvida uma insatisfação generalizada em relação à racionalidade funcional promovida pela modernidade, que valoriza a eficácia dos meios, reduzindo os seres humanos a peças de um mecanismo monstruoso que gira sobre si mesmo sem controle e sem objetivos conscientemente assumidos. Tal insatisfação, porém, não é senão o sintoma mais evidente do processo em curso de substituição do individualismo utilitário pelo individualismo expressivo como característica da modernidade avançada. O útil dá lugar então ao agradável como expressão da realização ideal do indivíduo, a produção ao consumo como critério de valor. De fato, o que se almeja cada vez mais não é, como outrora, a realização profissional do self-made man, buscada por si mesma e alcançada através do trabalho árduo e do esforço pessoal, mas desfrutar

do conforto e das oportunidades oferecidos pela sociedade afluente com o mínimo de trabalho e esforço3. Este é o modelo de vida que atrai não só os poucos privilegiados que podem usufruir do progresso econômico e tecnológico, mas também os muitos excluídos de suas benesses. Trata-se, portanto, de uma radicalização da imanência do horizonte existencial, que se restringe ainda mais ao âmbito do indivíduo e de seus interesses egocêntricos. É verdade que o afrouxamento da lógica da eficácia libera uma quota de gratuidade que poderia predispor para a acolhida do outro na contemplação ou na solidariedade. Entretanto, a gratuidade assim disponibilizada sucumbe normalmente à força do individualismo, convertendo-se num ludismo descompromissado de tudo, menos do próprio prazer. É verdade também que, mesmo nos ambientes aparentemente mais secularizados, o religioso e espiritual, contra o prognóstico generalizado dos analistas da cultura e da sociedade moderna, despertam ainda, ou de novo, um interesse surpreendente. Muito já se discutiu sobre a natureza e sentido do assim chamado ressurgimento do fenômeno religioso. Em sua versão fundamentalista, voltada para o passado, a valorização do sobrenatural corresponde a uma necessidade de segurança diante da desorientação resultante da relativização, provocada pelo racionalismo crítico moderno, de todos os valores e padrões de conduta, fornecidos tradicionalmente pelas religiões. Mas os novos movimentos religiosos apresentam-se também como tentativa de escapar da atmosfera sufocante de um mundo racionalizado e materializado através da criação de um espaço alternativo de vivências espirituais. Este anseio de comunhão universal com o cosmos constitui sem dúvida uma tentativa de responder à atração que o absoluto divino não deixa de exercer sobre o coração humano. Trata-se, entretanto, de uma resposta radicalmente deturpada, como aliás também

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Cf. B. Welte, Gott und das Nichts, Frankfurt a.M., Knecht, 2000, 5473 e também J. Martin Velasco, La experiencia cristiana de Dios, Valladolid, Rotta, 21996, 41 (1ª ed. 1995), 173-184. Cf. Robert N. Bellah, Habits of the Heart. Individualism and Commitment in American Life, New York, Harper and Row, 1986.

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a do fundamentalismo religioso, pelo espírito da cultura moderna. Com efeito, estas expressões contemporâneas da religiosidade estão eivadas de individualismo imanentista. Quando não se trata, como ainda ocorre, de intentos grosseiros de caráter mágico, de manipulação do divino para a obtenção de favores de ordem intramundana, esta busca de experiências, de fato pseudo-religiosas, vem satisfazer aspirações subjetivas de segurança, paz e equilíbrio interior, ou de sensações novas e sofisticadas que rompam a rotina monótona do quotidiano. Fartos talvez dos artigos fabricados pela indústria de bens materiais e culturais, muitos buscam no consumo de produtos espirituais, mais ou menos esotéricos, uma satisfação enganosa para sua sede de realização. No fundo, trata-se do mesmo mecanismo existencial que submete todas as coisas aos interesses do indivíduo. A autêntica experiência religiosa, ao contrário, é essencialmente êxtase e descentramento da pessoa na adoração, confiança e oferta gratuita de si mesmo ao absoluto divino, do qual recebe com reconhecimento e louvor o dom da existência e da plena realização. É verdade que em todas as épocas e em todas as religiões ocorrem formas interesseiras de relação com o divino. A diferença é que hoje, de acordo com o espírito da modernidade, tais deturpações da verdadeira atitude religiosa não são vistas como desvio, mas sim propostas como valor. Conclusão

Fica claro, portanto, que o grande obstáculo para a experiência de Deus hoje não reside no niilismo profundo e desesperançado de quem não experimenta

nenhuma resposta a seu clamor de absoluto – situação que pode até ser o preâmbulo de uma descoberta de Deus –, mas sim no niilismo superficial daqueles que se contentam com buscar a satisfação imediata e egocêntrica de suas necessidades afetivas. Esta superficialidade característica do homem contemporâneo de sua experiência existencial, seus sentimentos e desejos, suas idéias e projetos, blinda-o contra qualquer investida amorosa do absoluto divino, tornando-o incapaz de reconhecer a presença plenificante que se oferece no âmago de seu espírito. Que fazer para ajudar-nos a recuperar esta sensibilidade espiritual para o absoluto divino? A única cura que parece poder ser recomendada com esperança de êxito é a que adotaram as maiores figuras religiosas da história e que, na esteira do próprio Jesus Cristo, propuseram os mestres da espiritualidade cristã, desde os padres do deserto, passando por Inácio de Loyola e João da Cruz, até nossos dias: a humildade e a renúncia por amor em vista da comunhão universal. Trata-se de valores evangélicos contestados hoje, por influência da modernidade, até nos arraiais cristãos. Implicam realmente uma ruptura radical com a auto-suficiência individualista do espírito moderno. Por isso, só poderão ser compreendidos e acreditados através do testemunho da verdadeira liberdade e alegria de profetas que, chamados a fazer uma autêntica experiência do amor de Deus no mundo atual, ensinem de maneira persuasiva como dispor-se para ela, rompendo o círculo infernal do antropocentrismo moderno. Na verdade, é só à medida que se liberta de todas as coisas e de si mesmo, isto é, de seu próprio querer e interesse, que o ser humano pode encontrar-se com o Deus de amor, mesmo que seja na noite escura da fé.

Alguém perguntou ao mestre se ele acreditava na sorte. – “Sem dúvida”, respondeu com uma piscadela. “De que outra maneira poderíamos explicar o sucesso de quem não gostamos?” Anthony de Mello, “Verdades de um Minuto”, p.14, Ed. Loyola, 1993.

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Salmo 111,2 Grandes são as obras do Senhor! Todos aqueles que as amam as estudam. Quando o Cavendish Laboratory foi fundado na Cambridge University, em 1871, seu primeiro professor foi James Clerk Maxwell, um dos maiores físicos teóricos de todos os tempos, cujas pesquisas demonstraram as características das forças eletromagnéticas e possibilitaram uma compreensão melhor da natureza da luz. Maxwell também foi um homem profundamente cristão. Este versículo dos Salmos, em sua versão latina, fora entalhado na arcada que levava a seu laboratório. Fico feliz em dizer que, quando o Cavendish foi transferido, alguns anos atrás, para instalações grandes e modernas nos arredores de Cambridge, as palavras do salmista voltaram a ser reproduzidas em sua entrada. Algumas pessoas poderiam surpreender-se com isso, porque mantêm a concepção enganosa de que a ciência e a religião se encontram, de certa forma, em guerra. Na verdade, os cientistas muitas vezes têm uma crença religiosa, e isso ocorre de forma notável entre os físicos teóricos. Há muitas razões para isso, mas uma delas é que vivemos em um universo matemático que, certamente, parece ser um mundo com uma mente por trás de si. A matemática não é do agrado de todos e, se não for do seu, pense nela simplesmente como um meio de investigar padrões. Repetidas vezes, os mais belos padrões da matemática são justamente aqueles que descrevem a estrutura do universo. De alguma forma, nossa mente e o mundo encaixam-se dessa maneira maravilhosa. Creio que o maior físico teórico que conheci pessoalmente foi Paul Dirac. Ele não é muito conhecido pelo público em geral, mas foi um dos pais da teoria quântica e um grande homem. Por acaso, ele não era uma pessoa religiosa, mas passou sua vida em busca

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John Polkinghorne

Reproduzimos aqui duas páginas (49 e 50) da obra de John Polkinghorne, Um Cientista lê a Bíblia, Ed. Loyola, São Paulo, 1998. John Polkinghorne é físico de formação, pastor anglicano e membro da Royal Society.

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RAZÃO E FÉ, EDUCAÇÃO

de equações belas, porque sabia que seriam estas que teriam uma chance de descrever como era o universo. Se você não for matemático, talvez julgue a noção de equações belas uma idéia muito estranha. Terei de lhe pedir para acreditar em mim quando digo que a beleza matemática, como outros tipos de beleza, é algo difícil de descrever, mas fácil de reconhecer se você tiver a sorte de ter visão para vê-la. E também terá de acreditar em mim quando falo que nunca descobrimos uma teoria física fundamental que fosse expressa em equações matemáticas feias. O mundo é matematicamente belo! Na maior parte do tempo, aceitamos como ponto pacífico as possibilidades da ciência, mas quando se pára para pensar nisso sem dúvida é notável que possamos compreender o mundo tão bem e que a matemática seja a chave para revelar seus segredos. Einstein disse certa vez que a única coisa incompreensível no universo era o fato de ele ser compreensível. Por que a ciência é possível? É difícil encontrar respostas certas e definitivas para perguntas profundas como essa, mas eis minha opinião. A ciência é possível porque o universo é uma criação e nós somos criaturas feitas à imagem de nosso Criador. Quando cientistas como Stephen Hawking falam sobre física, ajudando-nos a aprender algo da mente de Deus, estão falando mais verdadeiramente do que talvez eles próprios se dêem conta.

Oração Senhor, abençoa aqueles que se aprazem com tuas obras e procuram comprender o funcionamento de tua criação. Possam eles honrar-te, àquele cuja mente é o fundamento da ordem maravilhosa que eles descobrem, e possam eles usar o conhecimento para o bem de todo o teu povo.

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RAZÃO E FÉ, EDUCAÇÃO

Marli Pirozelli N. Silva1

Falar em “educar a razão” nos dias atuais parece estar na contramão de todos os estudos que propõem uma abordagem mais complexa do homem. Temas como inteligência emocional, educação da sensibilidade, desenvolvimento de inteligências múltiplas são exemplos do esforço intelectual empreendido ao longo da história para compreender o homem em sua complexidade, procurando não reduzi-lo a um único aspecto. Por que então insistir na educação da razão? Ao contrário do que possa parecer numa aproximação inicial, a preocupação em educar a razão não constitui um fechamento ou a reafirmação de uma tradição intelectualista totalmente oposta à exigência atual de uma formação integral, mas diz respeito ao cerne de qualquer proposta educativa. Para compreendermos melhor este tema, começamos por examinar atentamente os conceitos de homem e de razão.

Quem é o homem? A razão em questão

Quem é o homem? O que o constitui? Ao procurarmos a resposta para estas questões passamos a nos movimentar num terreno bastante instável, composto por respostas convencionais, afirmações subjetivas ou doutrinárias que nos remetem ao domínio da incerteza. Nada pode ser afirmado sobre esta questão, que é a única realmente decisiva para o homem. O homem de hoje não sabe quem é, não sabe para onde vai, qual é o sentido dos pequenos e grandes fatos que se sucedem em sua existência e, mais grave ainda, afasta estas questões de seu horizonte no cotidiano, tornando-se uma pálida imagem daquilo que está chamado a ser. Como afirma Hanna Arendt “a redução do homem a um feixe de reações o separa, com a mesma radicalidade de uma doença mental, de tudo o que nele é personalidade”. (Pino, S. 2001).

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Profa. do Depto. de Ciências Sociais e Jurídicas do Centro Universitário da FEI, membro do Núcleo da Fé e Cultura da PUC-SP.

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As conseqüências do obscurecimento da consciência atual são fáceis de notar principalmente nos jovens: incapacidade de criar e de assumir responsabilidades. Longe de abalar nossa crença no valor do homem, esta constatação leva-nos a trabalhar de modo mais determinado, para exaltar o que é próprio da pessoa. O que é então, próprio da natureza humana? Partindo das palavras de Tomás de Aquino: “A razão é a natureza do homem. Daí que tudo o que é contra a razão é contra a natureza do homem”. (Lauand, L.J. 1995) Razão e liberdade: eis os fatores que constituem o homem. Esta afirmação não parte de uma abordagem teórica, mas do reconhecimento de que o homem é o nível em que a natureza toma consciência de si mesma. Por que vale a pena viver? Qual é o sentido da vida? Por que existem a dor e a morte? Qual é a razão do sofrimento humano? Estas perguntas revelam o dinamismo da razão em busca da verdade, da compreensão do sentido da existência e de toda a realidade. São perguntas perenes ou fundamentais, expressas ao longo do tempo pelos gênios da literatura e ainda que estejam obscurecidas pela vida social, não podem ser eliminadas, pois estão enraizadas no nosso ser. São questões que “exprimem a urgência de encontrar um porquê da existência, de todos os seus instantes, tanto das suas etapas salientes e decisivas como de seus momentos mais comuns. Em tais perguntas, é testemunhada a razão profunda da existência humana, pois nelas a inteligência e a vontade do homem são solicitadas a procurar livremente a solução capaz de oferecer um sentido pleno à vida. Essas interrogações, portanto, constituem a expressão mais elevada da natureza do homem; por conseguinte, a resposta a elas mede a profundidade do seu empenho na própria existência”. (João Paulo II, Fides et Ratio). A presença do homem na natureza introduz um fator peculiar e único: a consciência e o afã de significado.

O homem é diferente de todos os seres de natureza porque não cessa de interrogar-se sobre o sentido do mundo e não apenas porque é capaz de agir sobre ele, moldando-o de acordo com suas necessidades. O desejo de compreender o sentido último da existência, que chamamos de senso religioso, manifesta-se através destas inquietações, é a expressão da própria natureza da razão e está na raiz de todo movimento humano. O senso religioso é então a pergunta da totalidade que constitui a razão, isto é, a capacidade que o homem tem de conhecer, de penetrar a realidade em busca de seu significado total. O desenvolvimento das ciências naturais, da antropologia, da filosofia e de todo o universo do saber comprovam a exigência de sentido, a incansável busca de respostas dentro de um campo limitado da realidade. A razão em busca de sua realização

O processo de secularização que teve início na Idade Moderna e atingiu o ápice no Iluminismo foi o grande responsável pela redução do conceito de razão que chegou até os nossos dias. A razão passou a ser concebida como medida do real, como uma categoria limitada pela capacidade humana de demonstração empírica ou pela lógica. A razão, ao contrário, é um olhar aberto para a realidade e pode ser definida como a “capacidade de dar-se conta do real segundo a totalidade dos seus fatores”, é a abertura para acolher todas as possibilidades contidas na complexidade e multiplicidade do real. (Giussani, L. 2000). Quando é compreendida como exigência de significado, a razão recupera sua real dimensão e a categoria da possibilidade – tão cara à pesquisa científica – que havia sido suprimida na concepção anterior é reintroduzida.


O que busca então a razão?

Nada menos que o Infinito. Nada menos que a realização total. O objeto para o qual se dirige toda a energia humana sempre está além daquilo que nossa capacidade pode atingir. O senso religioso expressa a necessidade de uma resposta totalizante, capaz de abarcar completamente o horizonte da razão, de exaurir a categoria da possibilidade, mas há uma desproporção entre o horizonte último e a capacidade humana de atingi-lo. A desproporção em relação à resposta total é assim descrita pelo poeta italiano Leopardi em seus pensamentos: “ … mas o fato de não se satisfazer de nenhuma coisa terrena, nem, por assim dizer, da Terra inteira; de considerar a amplitude inestimável do espaço, o número e a imponência maravilhosa dos mundos e descobrir como tudo é mísero e pequeno diante de nossa alma; de imaginar infinita a quantidade de mundos, o universo infinito e sentir que nossa alma e nosso desejo são ainda mais vastos que tal universo; de acusar continuamente as coisas de insuficiência e nulidade e padecer angústia e vazio e, portanto tédio, parecem-me o maior sinal da magnitude e da nobreza da condição humana”. (Giussani, L. 2002). A vida é sede de um objeto que pode ser reconhecido pelo homem, mas permanece sempre além dele. Como nos ensina Pieper: “Todo desejo de felicidade do homem, por menores que sejam as satisfações em que se possa perder, se orienta infalivelmente para uma satisfação suprema que é o que na realidade ele procura”, mas constatamos que a mentalidade predominante leva-nos ao esquecimento desta exigência original. (Pieper, J. 1969). Daí a facilidade em identificar o objeto último – realização – com os aspectos parciais que podemos

alcançar – realizações. (Lauand, J. 1999). Com efeito, depois da quebra da unidade operada pelo Iluminismo, o homem passou a aspirar ao sucesso e à realização de aspectos setoriais como trabalho, família, finanças, espiritualidade, saúde e outros, esquecendo-se que o problema central da vida consiste em reconhecer um ideal que dê sentido a todos estes aspectos e colocar-se a caminho nesta direção. Infelizmente, o homem atual renunciou à busca da realização de si mesmo em sua totalidade (nem mesmo cogita tal hipótese) e contenta-se em equilibrar com êxito o maior número de setores. É sintomático que a espiritualidade hoje seja concebida como um dos setores particulares a serem satisfeitos pelo homem, ou seja, uma entre tantas outras partes que compõem o homem, bastando para isto métodos específicos, disponíveis através de uma vasta literatura de auto-ajuda.

RAZÃO E FÉ, EDUCAÇÃO

Indicações para a educação da razão

Não é difícil perceber as conseqüências do obscurecimento da razão ou do senso religioso. Conhecemos de perto a violência do poder, do terrorismo, da miséria e da injustiça, assim como todo o anseio e dedicação do homem para modificar estas circunstâncias. O desenvolvimento da tecnologia e da pesquisa científica atestam o trabalho e a fenomenal capacidade humana de interrogar, descobrir a realidade das coisas, criar, utilizar a herança recebida e moldá-la em benefício da vida, mas revelam também a desorientação quanto à finalidade última. Por vezes, a tecnologia e a ciência são alçadas à condição de causa última, trazendo conseqüências imprevisíveis para a humanidade, já que elas se tornam um fim em si mesmas e não admitem nenhuma orientação ética.

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RAZÃO E FÉ, EDUCAÇÃO

Obras citadas • Pino, Stefano A., Abraão: o nascimento do eu, Rimini, 2001 • Lauand, L.J., Razão, Natureza e Graça – Tomás de Aquino em Sentenças, São Paulo, Edix – FFLCH/USP, 1995 • Carta Encíclica Fides et Ratio de João Paulo II, São Paulo, Paulinas • Giussani, L., O Senso Religioso, Rio de Janeiro • Pieper, J., Felicidade e Contemplação – Lazer e Culto, São Paulo, Herder, 1969 • Navarro, J., Las Preguntas Perenes, www.hottopos.com/ notand7/jorgenav.htm

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Por isto apresentamos algumas indicações para nosso trabalho na Universidade: • É fundamental promover uma educação voltada para o uso pleno da razão, compreendida em seu sentido mais amplo como abertura a todos os fatores da realidade. • Isto pode concretizar-se em todos os níveis do processo educativo, da infância até a idade adulta através de propostas que estimulem a observação de si e da realidade. É preciso estimular a tomada de consciência de si mesmo, não através de reflexões que partem de uma imagem da própria pessoa, mas da observação de si mesmo em ação nas circunstâncias cotidianas. • Além disto, é preciso afirmar uma hipótese explicativa unitária para a realidade. Não se pode exigir decisão e maturidade se não afirmamos claramente uma proposta, uma forma de ver toda a realidade a partir de um ponto unitário, em oposição à concepção fragmentada da vida humana que predomina atualmente (profissão, vida afetiva, dinheiro, sucesso, etc.)

Cabe ao professor afirmar o valor pelo qual vive, de maneira implícita e explícita, revelando as razões daquilo que lhe parece bom e verdadeiro, pois isto permite uma tomada de posição clara do educando. Concluindo: Educar é avivar o desejo que constitui a razão, para que ela reconheça em todas as circunstâncias os fatores originais do homem, levando em conta o senso religioso e sua inevitável busca de satisfação plena. É apontar a precariedade das soluções parciais, ainda que venham ao encontro de necessidades justas e a permanência do desejo, que estruturalmente compõe o homem, buscando os nexos de cada ação com o sentido último de sua existência. Esta é a grande tarefa que temos, cujo resultado não está em nossas mãos possuir, pois, “Reconhecer que somos feitos de inquietude e que em nosso coração pesa um desejo de infinito é uma maneira de afirmar a liberdade incondicional de nossa vida e a maior dignidade que o ser humano pode almejar” (Navarro, J. 2000).


RAZÃO E FÉ, EDUCAÇÃO

Fernando Piero Laugeni1

Uma digressão desestruturada a respeito do ensino da engenharia

Paradigma: Um paradigma é aquilo que os membros de uma comunidade partilham e, inversamente, uma comunidade científica consiste em homens que partilham um paradigma2. O Paradigma Zero

A primeira vez que pensei no Paradigma Zero foi por ter sido envolvido pela idéia do louvável e messiânico “Paradigma Fome Zero”. Com certa acidez mental, confesso, comecei a refletir sobre isto e vieram-me a mente outros “zeros”, tais como “saúde zero”, “desenvolvimento zero”, etc... e, infelizmente, “educação zero”. Será que existe esse paradigma para o ensino da engenharia?

Contudo esse pensamento ficou, momentaneamente, em segundo plano, dados os diversos afazeres em que estava envolvido. A segunda vez aconteceu quando fui convidado/ convocado, para assistir a uma palestra sobre educação, ensino, pedagogia e outros, proferida por um doutíssimo professor da Universidade de Stuttgart (cujo nome e referência me escapam) e que pela quadragésima (ou será qüinquagésima?) vez (exagero por minha parte, foram somente vinte vezes, aproximadamente!) falou as mesmas coisas que todos os professores já ouviram a respeito de como portar-se na sala de aula e de como fazer para que os alunos gerem o conhecimento e que apresentou metodologias de ensino que parecem ser eficazes somente quando se têm turmas de 10 alunos e em cursos de humanidades.

1

Prof. do Depto. de Engenharia de Produção do Centro Universitário da FEI, mestre e doutorando em Engenharia de Produção, Escola Politécnica da USP.

2

KUHN, T. A estrutura das revoluções científicas. 5a ed. São Paulo. Editora Perspectiva.1998.

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RAZÃO E FÉ, EDUCAÇÃO

3

PIAGET, J. Para onde vai a educação. 7a ed. Rio de Janeiro. Livraria José Olympio. Editora UNESCO. 1980.

4

ibidem.

5

DESCARTES, R. Règles pour la direction de l’esprit. Paris. Vrin. 1970 apud PATY., M. A criação científica segundo Poincaré e Eisntein. In USP – Estudos Avançados – 41. v. 15. n0 41, jan/*abr. 2001. São Paulo.

6

BERGSON, H. La pensée et le mouvant. Paris. Alcan. 1934. in BERGSON, H. Ouvres. Edição do centenário. André Robinet (ed). Paris. Presses Universitaires de France. 1959.

7

EISNTEIN, Autobiographical notes apud PATY., M. A criação científica segundo Poincaré e Einstein. In USP – Estudos Avançados – 41. v.15. no 41. jan/abr. 2001. São Paulo.

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Fiquei extremamente frustrado. Perdi tempo, pensei. A terceira e decisiva vez e que motivou este artigo foi quando fiscalizei, novamente as nossas provas. Bendita fiscalização! Voltando ao tema. Pelas respostas dadas por alunos dos cursos de engenharia (não somente de nossa escola, diga-se) às questões propostas, aprendi coisas inusitadas, por exemplo: Que uma bomba d´água que abastece uma caixa de uma casa, deve ter cerca de 1000 cv de potência; que uma laje com 40m2 para um sobradinho, deve ter 1m de espessura e que a probabilidade de ocorrência de um fenômeno pode ser de 200%, entre outras pérolas. Aliás, os professores que lerem esse artigo, pensarão que existem muitos outros exemplos, até mais contundentes, já que esta realidade é conhecida por todos. Por que isto ocorre?

Voltei-me para as teorias pedagógicas e, talvez por ser engenheiro e não estar afeito a tantas considerações sócio-filosóficas, confesso ter encontrado teorias que me parecem inaplicáveis. Então fui reler quem, acredito, entende do assunto e que tem algo a acrescentar. Jean Piaget cita que: “o professor deixe de ser apenas um conferencista e que estimule a pesquisa e o esforço”3. Para ele, no ensino das ciências é fundamental o processo de indução e de experimentação; isto após Piaget ter estudado exaustivamente o ensino de disciplinas como matemática, física, química, biologia e como se desenvolvem as operações lógico-matemáticas e o desenvolvimento e o conhecimento das leis físicas elementares; Piaget é contundente: “se existe um setor no qual os métodos ativos se deverão impor no mais amplo sentido da palavra é sem dúvida o da aquisição de técnicas de experimentação, pois uma experiência que não seja realizada pela própria

pessoa, com plena liberdade de iniciativa, deixa de ser, por definição, uma experiência, transformando-se em simples adestramento”4. Nosso grande “guru” Descartes5, ao que tudo indica, dava muita importância a outro aspecto, a intuição, o que de certa maneira reforça a questão da experimentação, pois que, uma intuição mais estruturada resulta, muitas vezes, de um conjunto de conhecimentos adquiridos através de experiências, idéia reforçada e contextualizada por Bergson6. Mas basta, deixei-me envolver pelo discurso acadêmico. Vamos simplificar e, citando Einstein: “Do it simple, but not simpler! E = mc2” Apresente os fatos de maneira simples, mas não de maneira simplista. (tradução livre) A simplicidade da complexidade. Uma explicação do universo utilizando três variáveis! Lembrei-me de Einstein quando li um artigo em que o próprio Einstein7 cita que o “fenômeno da indução eletromagnética me permite formular o postulado de um princípio de relatividade”. A intuição de Einstein para o estabelecimento da Teoria da Relatividade parece ter derivado de experimentações e das teorias que explicavam aqueles fenômenos. Assim, apesar de todo o trabalho de conceituação que Einstein desenvolveu, nunca deixou de considerar a realidade e a experimentação como fatos essenciais para o estabelecimento da verdadeira ciência. Esse aspecto, é reforçado pelo grande matemático Poincaré que, no mesmo artigo, enfatiza que a intuição é fundamental e que o ensino da matemática deveria desenvolvê-la.


“É através da lógica que se fazem demonstrações, mas é através da intuição que se fazem invenções”.

experimentais e que não permitem o “achismo”, ou que não possibilitam o intuir? A minha resposta é sim.

Os nossos jovens

O que fazer?

As diferentes queixas dos professores quanto aos alunos – afora questões comportamentais que, são difíceis de serem gerenciadas – se prendem ao despreparo dos jovens para entender os conteúdos das aulas e à falta de interesse pelas aulas. Por que será? Verifiquei que, em geral, os jovens têm um comportamento indutivo diante da vida. Gostam de experimentar. Senão vejamos. Tempos atrás comprei um DVD e, evidentemente, comecei a ler o manual para verificar como deveria ser ligado, que facilidades o aparelho utilizava e assim por diante. Pensemos. Um jovem faria isto? Tenho quase certeza que não. Ele agiria de forma heurística. Ligaria o DVD e veria se funciona e depois iria interagir com o controle remoto para ver o que aconteceria. Parece-me que os jovens são indutivos e experimentais. Que grande novidade! Quando nós éramos jovens será que também não apresentávamos esse comportamento? Outra questão é o fato de que o jovem diz: “eu acho que“ ou “o achismo”. Eu digo: “acredito que ....” Quais são as diferenças? Em minha visão, o “acredito” pressupõe um conjunto de valores de personalidade e de conhecimentos que se encontram estruturados e que geram aquela crença. O “eu acho...” parece-me estar ligado à intuição. Será que os jovens por serem intuitivos e experimentais não gostam , não entendem e não se interessam por aulas que não contenham aspectos indutivos,

Para mim engenharia sem experimentação não é engenharia. A engenharia sem experimentação gera aquelas respostas dadas nas provas. A experimentação real faz com que a pessoa utilize todos os cinco sentidos, a saber: visão, paladar, tato, olfato, audição e, possivelmente, outros sentidos ainda não claramente identificados e que, acredito, em conjunto possibilitem o desenvolvimento da intuição. Experimentos laboratoriais como o montar um circuito elétrico, ver que a resistência liga e que se você colocar sua mão nela, provavelmente, toma um choque e se queima; ou misturar substâncias químicas e verificar que a mistura gerada tem uma coloração diferente das substâncias iniciais; ou ainda cortar uma engrenagem em uma fresa e aprender na prática a questão do espaçamento entre os dentes ou soldar uma peça e medir a resistência mecânica após a soldagem; são experiências inesquecíveis, até para quem se formou há muitos anos. A experiência nos dá a medida das coisas. Se o aluno que respondeu que a bomba d´água deveria ter 1000 cv tivesse sido exposto a mais experimentações, poderia até fornecer a mesma resposta errada, mas talvez acrescentasse algo como, em sua linguagem: “deu 1000 cv, mas tá esquisito”. Sou a favor da experiência e de seu ritual. Entrar em um laboratório é agradável. A turma de alunos é pequena (em geral), há toda uma cumplicidade entre o professor e os alunos, o aluno sabe que descobrirá ou investigará coisas novas que ele mesmo desenvolve e que não ficará estático e, geralmente, lutando contra a sonolência gerada por nossas explicações conceituais. Isto confirmei na prática.

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Ouvir a conversa dos alunos sobre as aulas é fundamental. Sentir seu entusiasmo quando constroem algum dispositivo, produto, objeto ou, como acontece no Laboratório de Automação da Produção, quando calculam o que os robôs devem executar e programam os robôs e, incrível, os robôs executam o que foi calculado. É fascinante! Viva o laboratório! Mais prática, mais indução, é isto que devemos fazer? Sim. Para quem gosta de discursos estruturados e terminologicamente correto aí vai a mesma coisa exposta através do “academiquês” , linguagem que às vezes nos é tão preciosa. “Lembremo-nos de que nossos alunos costumam abordar e resolver as situações utilizando um modelo desestruturado heurístico-iterativo-interativo”. Traduzindo: os alunos gostam de “fuçar” e procuram resolver as situações pelo processo de “tentativaerro”. (Pergunto-me quantas vezes os meus alunos não me ouviram falar “academiquês” e não entenderam absolutamente nada e mais, eu ter achado que ministrei uma excelente aula só porque utilizei um vocabulário sofisticado? Pobres alunos!) Vamos voltar aos experimentos. Tenho visto o desenvolvimento (e não somente em nossa escola) de “experimentações virtuais” desenvolvidas somente no computador sem a contrapartida prática. Não tenho muita condição de avaliar até que ponto isto é válido mas para mim, parecem “video game”. Aliás isto me fez lembrar a resposta que um piloto de um bombardeiro americano deu a um repórter quando da primeira guerra do Golfo Pérsico, sendo perguntado a respeito da missão. O piloto respondeu que havia identificado o alvo a 30 km de distância no computador de bordo, que havia apertado o botão que acionava os mísseis e havia verificado que, no alvo, havia sido registrada uma

mancha de calor e, conseqüentemente, o alvo tinha sido destruído e a missão bem sucedida. “Game over”. Reflito: que sentidos o aluno utiliza quando realiza um experimento (?) no computador? A visão sem dúvida. O experimento no computador deu errado? “Game Over”. Começa de novo. Tudo muito “clean”, sem cheiro, sem dor, sem ruído, sem manipulação. Isto é experiência? Isto desenvolve a intuição? Nada contra a TI, mesmo porque estou utilizando um computador para escrever isto e, hoje minha vida seria dificultada caso não tivesse a disponibilidade de computadores. Pensemos, porém que é a experimentação real e não a experimentação virtual que está faltando nos cursos para que nossos alunos de engenharia saibam e entendam as realidades físicas e tenham noção das grandezas físicas. Afinal que tipo de engenheiro queremos, o que sabe ligar um computador e carregar um software que lhe dá as respostas (que muitas vezes nem sabe interpretar porque faltou conceito e experimentação real) e que conhece uma penca de modelos matemáticos, ou um profissional que aplica os conceitos cristalizados pela experimentação, à prática das operações bem como utiliza a experimentação para a criação da ciência? Mudando o foco. Por quem você gostaria de ser operado de apêndice? Por quem realiza diariamente 10 daquelas cirurgias no hospital ou pelo médico que realiza as mesmas 10 cirurgias diárias virtualmente, no computador? Será que o Paradigma Zero da educação na engenharia, entre outros tantos aspectos relevantes, não será também conseqüência também da falta de experimentação real, da falta de desenvolvimento da intuição e da falta de interação?


TESTEMUNTESTEMUNHOS, HOS PROJETOS, PROJETOS EXPERIÊNCIAS EXPERIÊNDE SUCESSO UIRAQUITAN

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40 anos de Mecânica Automobilística No dia 2 de dezembro de 2003, no Ginásio de Esportes do campus de São Bernardo, foi feito o lançamento do belo álbum comemorativo dos 40 anos da Mecânica Automobilística. É uma publicação bem cuidada de 184 p. com farta documentação, texto fluente e ilustrações sugestivas. A Projeto de Comunicação, PCE – Projetos, Comunicação e Editora Ltda, desincumbiu-se da tarefa com competência. Comentando o livro, os editores salientam que em todas as entrevistas puderam perceber a emoção

TALAV

em relembrar fatos distantes ou acontecimentos recentes. Como disse um dos entrevistados, a “Mec-Aut” é uma espécie de vírus que ataca todos que por lá passam”. O evento de lançamento foi repleto de emoção e recordações. Traduziu bem a importância que a Automobilística sempre teve e continua tendo em nosso Centro Universitário. Ao Prof. Roberto Bortolussi, chefe do Departamento de Mecânica e ao Prof. Ricardo Bock, principal propugnador da idéia, os sinceros parabéns.

BAJA

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TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO Prof. Alexandre Massote1 Prof. Wilson Hilsdorf 2

UMA EXPERIÊNCIA APLICADA AO ENSINO DA ENGENHARIA DE PRODUÇÃO Introdução

Faz parte deste novo modelo, a utilização das modernas tecnologias de automação e dos controles computadorizados, como um dos componentes para obtenção de maior flexibilidade e integração dos processos produtivos. Estas tecnologias aplicadas à manufatura se tornaram conhecidas como CAM – Computer Aided Manufacturing, FMS – Flexible Manufacturing Systems e CIM – Computer-Integrated Manufacturing. Objetivo

1

Chefe e Coordenador do Depto. de Engenharia de Produção do Centro Universitário da FEI, mestre em Engenharia de Produção pela COPPE/UFRJ, doutor em Engenharia de Produção pela EPUSP.

2

Prof. do Depto. de Produção do Centro Universitário da FEI, mestre e doutorando em Engenharia de Produção pela EPUSP.

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O laboratório proporcionará aos professores e alunos a possibilidade de manter contato e realizar pesquisas e experiências com as mais modernas tecnologias de manufatura. Foi inaugurado no 1º semestre de 2003 o Laboratório de Tecnologia de Manufatura do Departamento de Engenharia de Produção do Centro Universitário da FEI. A implantação do novo laboratório possibilita a aplicação prática dos vários conceitos relacionados à administração da produção, além da realização de experiências voltadas à busca da melhoria da produtividade e qualidade do sistema produtivo. Com equipamentos importados do Canadá e da Alemanha, o laboratório caracteriza-se como um Sistema Flexível de Manufatura – FMS. Após um longo período de consultas e visitas a fabricantes e usuários de sistemas automatizados de produção para fins educacionais, decidiu-se pela


aquisição de equipamentos de fabricação canadense, completados por acessórios de origem alemã que foram aqueles que mais se adequaram às premissas e objetivos iniciais do projeto. Foram adquiridos então os seguintes equipamentos e acessórios: • 03 Robôs com acionamento por servo motores e 5 eixos de rotação; • 02 Fresas CNC com mesa pneumática e até 2.800 RPM de velocidade; • 01 Torno CNC com placa pneumática e até 3.400 RPM de velocidade; • 02 Módulos de armazenagem com sistema de movimentação automático e 50 posições de armazenagem;

Diversos acessórios, tais como esteiras transportadoras, carrossel rotativo e trilhos de translação para os robôs, foram também incluídos. Estes equipamentos, apesar de serem de tamanho reduzido e projetados especificamente para fins didáticos, executam todas as operações comuns a equipamentos de porte industrial. O porte reduzido assegurou a flexibilidade do conjunto, uma vez que podem ser facilmente manuseados e transportados para formar diversas configurações diferentes e propiciar a experimentação dos resultados obtidos. O conjunto de equipamentos e acessórios associado às diversas possibilidades de configuração, vai constituir-se em “minifábricas”, onde as técnicas da engenharia de produção serão estudadas.

TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO

Estágio Atual

O Laboratório de Tecnologia de Manufatura poderá ser utilizado para o estudo das técnicas de administração da manufatura em diversas disciplinas do curso de engenharia de produção, entre elas: • Arranjo Físico (Lay-out) de sistemas produtivos; • Estudo de Tempos e Métodos; • Métodos e Processos de Produção – Células de Manufatura, Sistemas Flexíveis de Manufatura, Manufatura Integrada por Computador, etc...; • Projeto do Produto – Sistemas CAD/CAM; • Planejamento e Programação de Produção – MRP, ERP; • Controle da Qualidade – Controle Estatístico de Processos, Controles Automatizados; • Armazenamento e Gestão de Estoques. Dois produtos foram inicialmente projetados para serem fabricados, utilizando esta configuração inicial. A peça A consiste num bloco quadrado, no qual são executadas operações de fresagem. A peça B consiste num cilíndro, onde são executadas operações de fresagem e torneamento.

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Peça A - Quadrada

Peça B - Cilíndrica Experiências Iniciais

Foram confeccionadas bancadas móveis com roldanas para movimentação, dispositivos de fixação

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das bancadas para uma determinada configuração e referenciais de posicionamento e fixação dos equipamentos e acessórios em cada bancada, de modo que cada configuração utilizada pudesse ser reproduzida futuramente, sem que as referências utilizadas na programação dos robôs e esteiras de transferências fossem perdidas. Cada configuração, com suas respectivas referências, o fluxo do processo utilizado para cada peça e a correspondente programação dos robôs e demais equipamentos e acessórios, foram registradas e arquivadas para possibilitar sua reprodução. As instalações necessárias também tiveram de ser minuciosamente planejadas, sendo utilizadas calhas elevadas para a condução da fiação de energia elétrica, cabos para transmissão de dados e rede de ar comprimido em diversos pontos da sala, de forma a garantir a possibilidade de movimentação dos equipamentos para a formação das diversas configurações desejadas.


TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO

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TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO

Em setembro de 2003, duas novas equipes coordenadas pelo Prof. Airton Nabarrete – Kondhor e Tatu – formadas por alunos de diversos períodos do curso de Engenharia do Centro Universitário da FEI participaram da V Competição SAE BRASIL AeroDesign, realizada no Centro Técnico Aeroespacial (CTA), em São José dos Campos, SP. Foi nossa segunda participação e as equipes, com os aeromodelos Kondhor e Tatu, conquistaram respectivamente, a 10ª e a 13ª colocação, sem dúvida um desempenho muito bom para uma competição que contou com 56 equipes como ITA, UFMG, Poli, Mauá, USP São Carlos, etc. O evento recebe grande atenção por parte da Embraer que possui em seu quadro de funcionários um grande número de engenheiros formados em nosso centro universitário. O que é o SAE AeroDesign

A competição, que envolve o projeto, a construção e ensaios de aeromodelos criados por universitários com suporte nos conceitos assimilados nas disciplinas dos cursos de Engenharia Mecânica, tem a finalidade de fazer com que o aeromodelo voe transportando o máximo de carga útil possível. Por trás deste projeto aeronáutico existe um roteiro que define a posição de todos os componentes: asa, motor, trem de pouso, cauda, etc. Além do roteiro, há um relatório minucioso dos desenhos técnicos e cálculos necessários para viabilizar o projeto. O julgamento é feito por uma comissão de membros da SAE BRASIL que analisa itens voltados à parte aerodinâmica e estrutural do projeto e também avalia o desempenho do aeromodelo. Para a prova de elevação de carga em vôo, a competição permite que um piloto externo à equipe conduza o aeromodelo. Esta função é muito estratégica, pois contribui para melhorar a pontuação. Levando em conta o fato de nosso Centro Universitário não ter tradição em projetos aeronáuticos, nossos projetos têm sido bem avaliados, o que constitui excelente suporte para desenvolvimentos futuros.

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O Departamento de Engenharia Civil tem incentivado participações em eventos, realizando projetos de grande proveito para a aprendizagem. Dentre eles, podemos citar: Curso de Fundações

TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO

Realizado em julho de 2001, contou com a participação de 103 alunos não só da engenharia civil como também de outras áreas. O curso tratou de forma complementar assuntos já abordados na disciplina Mecânica de Solos, aprofundando temas como a análise dos relatórios de sondagens, projetos de fundações, métodos de cálculo e cuidados na execução dos diversos tipos de fundações.

Kurt André P. Amann1 Creso F. Peixoto2 Marta Tamura3

Curso de Drenagem

Em junho de 2003, foi oferecido no auditório do IECAT um minicurso de Drenagem Superficial, para um grupo de 20 alunos, que permitiu aos participantes rever fundamentos em hidrologia e hidráulica aplicados ao projeto de elementos da drenagem superficial bem como se informar a respeito de diferentes métodos construtivos. No minicurso também se abordaram a patologia e a terapia típicas dos vários sistemas de drenagem. Visita Geológica

Um grupo de 7 alunos participou de uma aula de campo de Geologia Geral, em dezembro de 2002. Estudamos formações geológicas, desde materiais típicos do embasamento do cristalino da Serra do Mar como rochas graníticas, a materiais típicos da Serra Geral, como rochas vulcânicas do tipo basalto. Os alunos participantes puderam refletir melhor sobre a evolução temporal geológica de nosso planeta, desde períodos pré-cambrianos, de mais de 500 milhões de anos, até aos sedimentos modernos, em materiais

1

Chefe e Coordenador do Depto. de Engenharia Civil do Centro Universitário da FEI, mestre em Engenharia Civil pela EPUSP.

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Mestre em Engenharia de Transporte, Escola de Engenharia de São Carlos, da USP.

3

Mestre em Arquitetura e Urbanismo pela Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP.

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TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO

de datação inferior a 2 milhões de anos. O roteiro programado incluia afloramentos na rodovia dos Bandeirantes; exploração e beneficiamento de calcário, argila e diabásio; afloramento de siltito em Rio Claro; afloramento de arenito em Charqueada; exploração abandonada de petróleo em São Pedro; observação de cuestas basálticas em Itaqueri da Serra e Cachoeira em São Pedro. O roteiro se iniciou na rodovia dos Bandeirantes e se prolongou até à íngreme encosta da serra de São Pedro, terminando com um banho de Cachoeira, porque ninguém é de magma, quer dizer, de ferro.

I Mostra Universitária de Santo André

Os alunos Danielle Gonçalves, Danilo de França, Fabrício Lima, Lucas Ibraim, Paula Carneiro, Suzana Vianna e Tomás Orsi participaram da I Mostra Universitária de Santo André – Cidade do Futuro (outubro de 2001). Foi apresentado o trabalho: “Proposta de Redução de Enchentes na Av. Queirós dos Santos” (tema: Qualidade Ambiental). A equipe também esteve presente no I Seminário sobre Águas Metropolitanas e a Relação da Vegetação com a Qualidade da Águas (dezembro de 2001). Aspectos da proposta de redução de enchentes A equipe levantou plantas com a topografia da região, ruas e cruzamentos e determinou a direção do

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fluxo das águas. A utilização urbana das várzeas dos rios, aliada à crescente impermeabilização do solo favorece a aceleração de acúmulo das águas na região. No estudo das soluções, as alternativas de grande porte, como piscinões, mostraram-se inviáveis, pois ocupam grandes áreas, hoje já plenamente urbanizadas, e com alto valor imobiliário. Desta forma, procurou-se trabalhar em escala micro, aproveitando as áreas com maior possibilidade de infiltração e retenção das águas.

Por fim, estudou-se a alternativa de construção de microbacias retentoras no cruzamento de ruas, aproveitando o melhor possível as tubulações de águas já existentes. Tais “reservatórios” apresentam paredes vazadas e infiltração pelo fundo. Com isto reduz-se a velocidade das águas pelo seu acúmulo temporário, recarregando o lençol freático e diminuindo o volume que atinge a Avenida no intervalo de tempo de queda da chuva. Os reservatórios funcionam pois como microbacias de detenção, as águas perdem velocidade, acumulamse por tempo suficiente até o término da chuva, vão-se progressivamente infiltrando e escoando com uma vazão compatível com as tubulações existentes. A idéia vem da própria natureza, onde a superfície da mata em geral apresenta obstáculos que retardam o


projeto para reforma de suas instalações no intuito de melhorar as condições de atendimento à população carente.

TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO

fluxo das águas, o que acaba provocando a infiltração de boa parte da água da chuva. Para a viabilização do projeto outros itens foram levantados como campanhas contra o descarte indiscriminado de lixo nas ruas, planejamento, para execução do projeto sem maiores prejuízos para o tráfego, soluções para interferências com tubulações de concessionárias, sondagens para verificar problemas de fundações de edificações e outros pontos de análise. Creche Osvaldo Alexandro

Estamos empenhados em ajudar a creche Osvaldo Alexandro, no município de Mauá. Atua, com comprovada eficiência, em área de exclusão social. Os alunos participando voluntariamente, vêm desenvolvendo um

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O Centro Universitário da FEI e a Itautec-Philco vêm colaborando na aplicação das melhores práticas de engenharia. Quatro alunos (num total de 70 que se candidataram) foram selecionados para estagiar no Laboratório do Tatuapé. Nos próximos semestres outros tantos se agregarão a eles. Destaque também para o programa de apoio a projetos de graduação. Em setembro de 2003 foram iniciados três projetos de formatura. A Itautec-Philco participará também mais ativamente da ELEXPO, a Exposição de Projetos de Formatura. Na semana da Qualidade (julho/agosto de 2003), os engenheiros Martinho Vendramatti e Edson Dantas Dias pronunciaram palestras sobre as perspectivas do convênio. No início de agosto/2003 a FEI participou do BRASILTEC 2003 (Salão de Fórum de Inovação Tecnológica & Tecnologias Aplicadas nas Cadeias Produtivas), com soluções de auto-atendimento bancário e comercial, software de monitoramento de descargas atmosféricas para o setor de energia elétrica e um veículo para competições de autonomia, desenvolvido por alunos. O novo sistema de controle de acesso é simples de usar. Num terminal de computador, o usuário cadastra seu nome e digita uma senha, e com uma câmera, o sistema captura imagens da face, gravando de 100 a 200 pontos. Quando a pessoa voltar ao estabelecimento, ela apenas digitará a senha e o controlador irá comparar, em segundos, os pontos armazenados e, ao identificar, liberará a porta do ambiente ou mesmo o acesso a um serviço, como caixa eletrônico. “É uma tendência que será comum no futuro: as pessoas serem identificadas pelas suas características e não pelos objetos que elas portam”, afirma Renato Giacomini, professor de Sistemas Digitais do curso de Engenharia Elétrica da FEI e responsável pela parceria FEI/Itautec. A FEI e a Itautec desenvolveram, em conjunto, a aplicação do software do sistema.


Nos dias 27, 28 e 29 de agosto de 2003, foi realizado em Florianópolis, organizado pela Universidade Federal de Santa Catarina, o 1º Congresso Brasileiro de Habitação Social – Ciência e Tecnologia / Mostra de Produtos e Equipamentos para Habitação Social (CTHAB–Brasil). O objetivo deste congresso era congregar os diferentes setores da sociedade científica interessados no equacionamento da problemática habitacional brasileira, trazendo a público o conhecimento acumulado sobre o assunto. O Congresso foi dividido em três áreas temáticas – Aspectos da Concepção, Uso e Avaliação do Espaço; Aspectos Sociais, Econômicos e Culturais; Aspectos do Desenvolvimento Tecnológico. Os subtemas eram: Avaliação, Concepção, Desenvolvimento, Gestão, Sistemas e Processos, Tipologias e outros. Foram selecionados mais de 70 trabalhos para o evento, dentre os quais o que apresentei no subtema Desenvolvimento cujo título é: “A influência do treinamento na inclusão social”. Este é um trabalho de iniciação científica que venho desenvolvendo no curso de Engenharia, com a orientação da Profa. Carla Andrea S. de Araújo, no qual o objeto de análise é o projeto de urbanização da favela do Parque São Bernardo. No projeto de urbanização da favela Parque São Bernardo observou-se um tratamento diferenciado na questão da habitação. Percebeu-se uma preocupação, não só de melhorar as condições de acomodação das pessoas, mas de incrementar de fato as condições de vida daquela região. Esta é uma proposta financiada pelo programa Habitar-Brasil – BID, ligado à Prefeitura de São Bernardo do Campo. O projeto visa a executar a urbanização integrada da área por meio de intervenções físicas e sociais, beneficiando aproximadamente 9.500 pessoas, numa área de 265.000 m2, com características comuns a outros assentamentos subnormais. Some-se a isto o risco de deslizamento, às margens de córregos e fundo de vale. Além disso, há também um elemento que demanda atenção especial, que é a presença de um oleoduto da Petrobras, que corta a área.

TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO Audrey Porto Devechio

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A iniciativa prevê a construção de novas moradias em regime de mutirão e, para tanto, será dado um curso de capacitação dos participantes. Este curso foi escolhido como objeto de estudo de nossa pesquisa. Nossa pesquisa teve início em fevereiro de 2003, e objetivava apresentar como o treinamento pode promover a inclusão social. Percebemos, porém, no decurso dos estudos, que a capacitação técnica dos participantes para a construção das unidades habitacionais e a promoção da inclusão social não poderiam prescindir da valorização da pessoa. Partimos do princípio de que a pessoa é um ser dinâmico, que age movido por valores, que se relaciona com o real e que precisa encontrar em sua realidade, em sua vida, respostas às suas exigências. O próprio trabalho cria um ambiente de inclusão social. Além de atender as necessidades materiais, ele permite a expressão da singularidade do homem e atende a necessidade humana de colocar-se objetivamente a serviço de outros. Uma outra característica observada no projeto é a de procurar uma integração entre o Poder público, a situação real da população e a realidade das exigências técnicas que a problemática propõe. A elaboração do curso é um trabalho intersetorial entre a SHAMA (Secretaria de Habitação e Meio Ambiente) e a SEDESC (Secretaria de Desenvolvimento Social e Cidadania), que tem duração de 3 meses com certificado de qualificação. É um curso que visa, além das atividades de mutirão, ao encaminhamento para o mercado de trabalho, levando-se em conta a sustentabilidade da nova vida da comunidade, e é dividido em dois módulos: • Módulo formativo que trabalha desde a auto-estima até a empregabilidade. • Módulo formação técnica que orienta desde a fundação da casa até seu revestimento.

A pesquisa continua até o final do ano; mesmo assim pode-se concluir preliminarmente que é possível fazer um projeto de urbanização de favela que de fato promova a inclusão social. Não é um trabalho fácil, exige dedicação dos profissionais envolvidos, aceitação da comunidade e perseverança das duas partes. O trabalho de urbanização tem sérias limitações. As regiões em questão estão inseridas num complexo quadro de exclusão social, desumanização, carência de equipamentos básicos de infra-estrutura e formas de ocupação precárias. Entender a contribuição e a influência da pessoa e das relações sociais pode auxiliar na escolha da tecnologia a ser utilizada, otimizando as atividades e gastos e proporcionando uma maior eficácia e qualidade da obra de engenharia civil. O Congresso de Florianópolis foi uma grande oportunidade de conhecer outras iniciativas, fazer contactos, ter material para comparação e nos situarmos dentro do cenário nacional na questão da habitação. Uma grande contribuição para a nossa pesquisa, pois forneceu subsídios para colocá-la dentro da realidade atual, ultrapassando o âmbito acadêmico.


Há cerca de dois meses estamos trabalhando no Projeto Hurricane coordenado pelo professor Arthur Tamasauskas. Projeto esse, ousado na nossa opinião, que despertou interesse logo na primeira aula de Mecânica de Fluidos II. Na verdade, Hovercraft já era paixão desde a infância, mas sempre estivera longe, em desenhos animados ou nos video games. Então, estar cara a cara com um Hover está sendo extremamente fantástico. Mas não foi somente uma mera paixão de crianças que nos atraiu para o Projeto Hurricane. Na verdade sentimos uma oportunidade neste projeto de fazer algo além da sala de aula, da lousa, das carteiras. Algo mais. A oportunidade de vivenciar todo aquele conteúdo, aquela bagagem adquirida dentro de quatro paredes. O que buscávamos era uma sala de aula maior, mais ampla, mas não em dimensões e sim em aplicações. O Projeto Hovercraft está sendo assim: uma sala de aula a “céu aberto”. Mas uma sala de aula que tem fundos com a sala tradicional donde vem a teoria e os conceitos elementares. Certo dia, numa aula de Elementos de Máquinas com o professor Alberto, algo de muito interessante aconteceu. Era uma aula sobre parafusos de fixação. O mestre falava de cisalhamento de parafuso devido a torque excessivo. Instantaneamente nos remetemos à tarde anterior. Montávamos um disco dentado no motor por meio de parafusos. Não tínhamos a menor noção do que poderia acontecer, só sabíamos que aquela peça deveria ficar bem fixada. Não sabíamos que torque aplicar e então decidimos 30 Nm. Resultado: o parafuso cisalhou. Mas o que poderia ter acontecido? Isso nós acabamos descobrindo naquela aula do professor Alberto. O mais curioso é o fato de que as aulas têm se tornado mais interessantes, atraentes e os conceitos mais claros, palpáveis. E isto, aliado à experiência do aluno em vivenciar uma simples quebra de um parafuso no aperto, o faz mais completo. Além da sintonia entre Hovercraft e sala de aula, percebemos como a FEI ficou maior para nós. Nesses meses de trabalho no projeto visitamos inúmeras vezes os mais diferentes setores desse lugar: manutenção elétrica e

TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO Alecio Julio Silva Guilherme Carrapatoso Paulo Vieira Neto Vinicius de Melo Arantes

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mecânica, oficina, laboratório de motores, marcenaria, laboratório têxtil e de materiais. Isso nos fez descobrir aqui pessoas maravilhosas. O fato de serem profissionais competentes e prestativos nos faz sentir como numa empresa e isto, com certeza, nos incentiva ainda mais a seguir em frente dentro deste projeto. Passaram-se dois meses apenas. Aprendemos muita coisa. Esperamos muito mais. Que bom seria se todos nossos amigos estivessem tendo esta

Pelo menos em três oportunidades em nossos eventos, o Prof. Sérgio Delijaicov com o seu conjunto nos tem brindado com o melhor do choro brasileiro. Um saboroso tempero para as lides intelectuais. O Prof. Sérgio reparte seu talento entre a Resistência dos Materiais e um precioso bandolim do qual arranca ressonâncias dignas de um Jacob. Completam o afinado quarteto o Jurandir do cavaquinho, o Gatão do pandeiro e o Joca do violão de 7 cordas. O Prof. Sérgio começa desde os primórdios do choro com a Flor Amorosa do Joaquim Calado, passa por Chiquinha Gonzaga, Ernesto Nazareth (ora é Odeon, ora é o Brejeiro, que aliás é tango brasileiro), Pixinguinha, Zequinha de Abreu (Tico-tico no Fubá não pode faltar) e vai desaguar no Waldir Azevedo, Altamiro Carrilho e, naturalmente, Jacob do Bandolim, sem falar de out-

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mesma oportunidade. Descobrir uma sala “céu aberto” e uma FEI bem maior do que esta na qual estudam diariamente. Que bom seria. O Prof. Arthur Tamasauskas desenvolve já há seis anos o Projeto Hurricane; cada ano os grupos introduzem novidades e aperfeiçoamentos técnicos. Um bom exemplo de projeto continuado.

ras peças e autores. Cada execução é precedida de uma apresentação que explica, encadeia e motiva o ouvinte. Ele nos oferece também uma inspiradora valsa de sua autoria, Encantamento, e o show se encerra com a Ave-Maria de Gounod, para mostrar a todos que nem só de tecnologia vive o engenheiro.


O CENTRO UNIVERSITÁRIO DA FEI E A COMUNIDADE

Partindo do princípio de que a educação dos jovens é um dos grandes desafios para uma sociedade, pois é através desta atividade que ela se reconstrói, o Centro Universitário da FEI procura proporcionar uma formação integral da pessoa, privilegiando não somente o lado acadêmico e profissional, mas também participando de sua formação ética, social, e valorizando sua dimensão estética, religiosa e, de maneira geral, cultural. Por esta razão, entre as muitas atividades oferecidas nos campi do Centro Universitário da FEI, podemos destacar os programas de Iniciação Científica, Iniciação Didática e o Programa de Ações Sociais de Extensão. Este último procura desenvolver atividades de formação humanística através do desenvolvimento de projetos de promoção social e do bem comum. Atualmente estão em andamento os seguintes projetos:

TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO Profa. Carla Andrea Soares de Araújo1

Curso básico de informática: ambiente windows e Word, para pessoas carentes Objetivos

Capacitar jovens e adultos a se inserir no mercado de trabalho formal através da qualificação profissional; • Possibilitar uma formação universitária integral, a consciência do papel de cada um na sociedade e o conhecimento das necessidades existentes no contexto atual; • Realizar a experiência de solidariedade e de contribuir efetivamente para uma mudança social. Este projeto dá-se em parceria com a Casa Edimar (Sociedade Menino Edimar – SOME), localizada no bairro de Santana, São Paulo. A Sociedade Menino Edimar é uma organização não governamental sem fins lucrativos, fundada em março de 2002, regularmente registrada no Cadastro Nacional de Pessoas Jurídicas, que tem como finalidade a promoção integral da pes-

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Profa. do Depto. de Ciências Sociais e Jurídicas e Coordenadora de Projetos de Ação Social de Extensão do Centro Universitário da FEI.

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soa nos âmbitos social, cultural, educativo e formativo, visando em especial ao apoio aos jovens de baixa renda e à inserção no mercado de trabalho. Atualmente há sete alunos participando deste projeto, sendo orientados por três professores: Prof. Orientador: Carla Andrea Soares de Araujo Orientandos: Thiago Pereira Honorato e Daniel Tadashi Batori Prof. Orientador: Maria Inês Lopes Brosso Orientandos: Aldo Maeda e Bruno Vinícius de Souza Santos Prof. Orientador: Marli Pirozelli Silva Orientandos: Letícia Cardozo Ferreira, Alessandro Thiago Ribeiro Pina e Victor Grafe. Aproximadamente 250 pessoas já passaram pelo curso de informática básica.

“Nós, os professores, investimos em uma didática bem descontraída com os alunos, a fim de ganharmos a confiança e o respeito dos mesmos”. Letícia Ferreira “Aprendi muito sobre o conceito de humildade, de valores de que ainda não tinha me dado conta. Realmente só estando lá para saber o quanto é valioso para aquelas pessoas fazer parte de um simples curso básico de informática”. Victor Grafe “Lecionar na Casa Edimar está sendo de grande valor para o meu futuro profissional, somando ao meu currículo valiosa experiência no trabalho em equipe e no trato com diversas pessoas”. Alessandro Pina “Essa oportunidade que estou tendo de fazer parte do Projeto, na Casa Edimar, me está sendo de extrema valia. Assim como nós passamos o nosso pequeno conhecimento a essas pessoas, aprendemos muito com elas; eu vejo como uma troca de conhecimentos”. Aldo Maeda Programa de conscientização ambiental sobre a coleta seletiva de lixo, no campus SBC Objetivos

Depoimento e participantes do projeto

“Se eu tive a oportunidade de fazer um curso de informática e agora tenho a chance de passar isso para outra pessoa, qual é a dificuldade? Isto foi o que mais me motivou a entrar nesse projeto: ajudar o próximo. Sem contar a experiência de ver nos olhos das pessoas a alegria em aprender algo novo e se atualizar nesse mundo globalizado e de avanços tecnológicos tão velozes.” João Paulo Buoro Perandini

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Estimular a mudança prática de atitudes e a formação de novos hábitos com relação à utilização dos recursos naturais. • Favorecer a reflexão sobre a responsabilidade ética de nossa escola com a comunidade e com o planeta como um todo. • Conscientizar e incentivar a participação da comunidade no processo de coleta seletiva do resíduo sólido gerado no campus. Este projeto é desenvolvido pelo Prof. Ailton P. Alves Filho e pelos alunos Nibal Salleh e Cesar Guedes da Silva. Todo lixo reciclável arrecadado no campus é remetido à Associação Cristã Verdade e Luz, mais conhecida como Lar da Mamãe Clory.


Aquecedor solar com responsabilidade social Objetivos

Desenvolver um kit de captação de energia solar de baixo custo, fácil construção e manutenção, para populações carentes. • Capacitar essas populações carentes para a construção de seu próprio aquecedor solar, estimulando a autonomia profissional e facilitando a inclusão desta comunidade no mercado de trabalho. Prof. Orientador: Mário Kawano Orientando: Maicol Karimata Este projeto recebeu o Prêmio Destaque Universidade Tigre em 22 de setembro de 2003 e será aplicado no Centro de Reabilitação de Casa Branca, no interior do estado de São Paulo. Lá, os residentes aprenderão a montar e fazer a manutenção do captador de energia solar para suas casas.

parte de um processo de desospitalização, através da reabilitação psicossocial, que a Secretaria Estadual de Saúde vem procurando implantar. Dos internos, 143 já estão morando em casas, a maioria no território do próprio hospital.

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SAVI – Sistema de Aprendizado Virtual e Interativo

O objetivo deste projeto é desenvolver um ambiente virtual e um sistema interativo aluno X computador, para facilitar o aprendizado de alunos com deficiências de alfabetização e deficiências sensoriais, permitindo o eficiente ensino de informática e de outras disciplinas. Parceria: Casa Edimar e demais ONGs que se interessem pelo projeto Prof. Orientador: Profa. Maria Inês Lopes Brosso Orientandos: Wagner Alcyr da Silva Cabral e Jairson da Silva Campos Programa de treinamento para microempresas

Oferecer a desempregados e subempregados, com capacidade comprovada de fabricar artesanalmente produtos e serviços de qualidade, um programa de consultoria e treinamento que os torne capazes de montar formalmente e gerir seu próprio negócio. Parceria com a Caritas, projeto Feira de Quem Faz Prof. Orientador: Prof. Francisco Granizzo Lopez Orientandos: Paulo César Pires Castanho e Marcos Roberto de Lima (alunos da Administração, São Paulo). COMO PARTICIPAR

O Centro de Reabilitação de Casa Branca está localizado no km 238 da SP-340, e pertence à Secretaria de Estado da Saúde. Trabalha com saúde mental, abrigando 660 homens, entre 50 e 60 anos, com uma média de 30 anos de internação, e 300 pessoas no atendimento externo. A proposta deste Centro faz

Para participar dos projetos os alunos devem ter bom desempenho acadêmico, principalmente nas disciplinas relevantes para a compreensão dos modelos e fenômenos com os quais estará envolvido. Além disso, é necessário ter disponibilidade de 16 horas semanais para dedicação ao programa. O aluno que participa dos projetos recebe uma bolsa (em espécie) como incentivo.

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TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO Angélica Corrêa Moreira de Carvalho

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Angélica termina em 2003 brilhante curso de Engenharia Química. São estes alunos e alunas que justificam o labor de uma Escola. Quando entrei na FEI tinha muitas dúvidas. Queria mesmo estudar? Era muita novidade e isto me assustava. Tive total liberdade e apoio dos meus pais para tomar qualquer decisão. Decidi que cursaria mesmo engenharia. Minha intenção era ser engenheira têxtil pelo fato de achar fascinante a idéia de criar tecidos bonitos e diferentes, mas acabei optando por engenharia química, uma área em que as possibilidades de atuação seriam maiores. Não me arrependo nem um pouco da minha escolha. Logo no primeiro ciclo participei de um projeto de início de curso chamado Bixo Engenhoso em que individualmente ou em grupo deveríamos desenvolver um projeto. Acabei fazendo um na área de engenharia química. Nosso grupo produziu álcool etílico a partir de uma matéria-prima alternativa, no nosso caso, a palha de arroz. Este projeto me ensinou a organizar o meu tempo e me incentivou a correr ainda mais atrás dos meus objetivos. Com ele fiz também grandes e verdadeiras amizades. Depois do Bixo Engenhoso fiz dois anos de Iniciação Científica na área de Biotecnologia da Engenharia Química. Meus dois projetos foram relacionados com uma enzima chamada Glicose-Oxidase e em ambos minha orientadora foi a profa. Adriana Lucarini. Passei dias e dias trabalhando nestes projetos, às vezes os ensaios davam certo, às vezes davam errado e tinha que encontrar uma nova metodologia de trabalho, mas tudo o que vivi e aprendi durante esse tempo foi essencial para meu desenvolvimento profissional e até mesmo pessoal. Saí da Iniciação Científica com lágrimas nos olhos, pois eu realmente gostava do que fazia, mas decidi que estava na hora de conhecer o mundo fora do Centro Universitário da FEI. Nessa fase de mudanças foi fundamental o incentivo que recebi da família e dos amigos. Parti para uma nova etapa da minha vida: o estágio. Fiz quase dois anos de estágio na Itaú Seguros no setor de Seguros de Grandes Riscos Industriais – Indústrias Químicas e Petro-

químicas, estágio este que enriqueceu muito a minha formação. Tive sorte tanto com minha orientadora da Iniciação Científica quanto com meu orientador de estágio, pois aprendi muita coisa com eles. Enquanto fazia Iniciação Científica participei de um Simpósio Internacional de Iniciação Científica da USP em São Carlos, participei das Semanas da Engenharia Química, de cursos e palestras, escrevi e tive publicados artigos técnicos. Mesmo fazendo estágio fora, nunca me desliguei completamente dos assuntos do Departamento de Engenharia Química. Nesse período, a pedido da profa. Adriana, ministrei junto com ela o curso de Pesquisa Bibliográfica. Junto com um amigo, o Santiago, e com o apoio do pessoal do Departamento de Engenharia Química e da Reitoria, demos início à Campanha do Profissional do Sorriso, em que arrecadamos e compramos alimentos, roupas e brinquedos e levamos até os orfanatos e lá passamos uma tarde brincando com as crianças. Posso dizer que nestes cinco anos o Centro Universitário foi minha segunda casa. Vivi intensamente a tensão nas semanas de P1 e P2, o frio na barriga ao me aproximar dos quadros da BO para ver as notas, a alegria de sempre ter passado de P2, ter mais de dois meses de férias no meio do ano, a correria de final de semestre, o jogo de cintura com os colegas de classe, os intervalos supercorridos divididos entre namorado, amigos e trabalho, as conversas e reivindicações com os professores e coordenadores, as campanhas sociais, a alegria e a tristeza de saber que o tempo de faculdade acabou … Enfim, foram cinco anos vividos intensamente. Vou sentir muitas saudades desta época…. Mas com certeza faria tudo novamente. Se hoje consegui escrever tudo isto, é graças principalmente aos meus pais e à minha irmã que me apoiaram, incentivaram e ajudaram, aos mestres que muito me ensinaram e aos meus verdadeiros amigos que superaram comigo diversos desafios. Espero poder na carreira que me aguarda ter a mesma atitude: multiplicar o que recebi.


TESTEMUNHOS, PROJETOS, EXPERIÊNCIAS DE SUCESSO

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CAPELA E MENSAGEM FINAL

Nossa Senhora da Estrada A Capela de Santo Inácio ficou pronta em 1977. A primeira missa foi celebrada no dia 18 de novembro daquele ano em comemoração dos 50 anos de vida religiosa do Pe. Aldemar Moreira, S.J., então presidente da Fundação, celebrantes também o Cardeal Claudio Humes então bispo de Santo André e o Pe. Cristóbal Alvarez S.J., na época provincial (já falecido). A capela foi construída com donativos, contribuição de todos: dirigentes, professores, funcionários e comunidade de amigos. O projeto é do arquiteto Dudas Zoltan, a construção do engenheiro Roberto Ciampolini. Ela é sóbria e acolhedora. O altar tem no fundo o crucifixo de madeira de lei (mogno) em tamanho natural, do escultor Antonius Josephus Maria van de Weil. De um lado e doutro do crucifixo, os vitrais de Santo Inácio de Loyola e de Nossa Senhora da Estrada.

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Os vitrais foram executados pelo artista Conrado Sergenicht Filho e foram uma doação da Província do Brasil Centro-Leste dos Jesuítas. O vitral de Nossa Senhora da Estrada é cópia do quadro que se encontra na famosa Igreja do Gesù em Roma. Santo Inácio e os primeiros jesuítas tinham especial devoção a esta invocação da Santíssima Virgem. Santo Inácio na sua Autobiografia, se intitula o peregrino. Fácil de entender porque recorria tanto à Madonna della Strada. De fato percorreu, sozinho e a pé, como diz um de seus biógrafos, os caminhos da Europa de seu tempo, em inúmeras viagens na Espanha, França e Itália. E quis que seus filhos sempre estivessem dispostos a partir para longes terras (como S. Francisco Xavier, Beato José de Anchieta, Pe. Nóbrega e tantos outros) onde os chamasse a maior glória de Deus.



A Estrela de Natal Diz o Gênesis que o ser humano foi feito do barro, ou seja, da crosta da terra, como os minérios, as plantas e os animais. Mais longe o escritor sagrado não podia ir, com os conhecimentos de seu tempo. Hoje sabemos muito mais: somos feitos da poeira das estrelas. Há bilhões de anos, nesse recanto da Via Láctea, estrelas gigantes colapsaram, e explodiram; mas antes disso, sua colossal gravidade condensara átomos contra átomos até constituir os metais pesados, como o alumínio desse barro de Adão, como o ferro da hemoglobina de nosso sangue, o cálcio de nossos ossos, que foram jogados para o espaço sideral. Provimos da poeira de estrelas, e continuamos sendo estrelas, só que de outro tipo. Em lugar da fornalha de energia nuclear, nosso corpo é um processo de vida multiforme – e a vida é mais maravilhosa do que as explosões das estrelas. E o ser humano é muito mais estrela, pois nele está acesa a luz da razão, aquece-o o calor do amor, irradia em criatividade e liberdade. E estabelece, no espaço da história, galáxias de culturas e de sociedades. Diz a teologia transcendental que Deus já criou o homem para que um membro de nossa espécie se tornasse Deus, e através do Homem-Deus, todos nós pudéssemos participar da vida divina. Então, o ser humano é muito mais do que estrela, por sua vocação divina e seu destino de vida eterna em Deus. Assim a estrela do Natal nos ilumina como um sinal de que toda essa luz nasceu para nós: – a glória e a paz de Deus, e a ternura amorosa do Criador.

CAPELA E MENSAGEM FINAL Pe. Paulo Meneses, S.J., Diretor do NEAL, UNICAP

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