Cadernos da FEI - Nº 08

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CONTEÚDO Voz do Presidente Paz .......................................................................................................................................................................... 03 Dia do Mestre ..................................................................................................................................................... 04 Universidade e Sociedade ............................................................................................................................. 05 Semente de Vida Eterna ................................................................................................................................. 09 Homilia de Natal ............................................................................................................................................... 10 Fé / Cultura / Ciência A Igreja e a cultura brasileira hoje .............................................................................................................. 11 A fé em Deus e o amor ao próximo ........................................................................................................... 16 Uma verdadeira conversação e a experiência de Deus ...................................................................... 17 A fé e a Ciência................................................................................................................................................... 18 Presença dos jesuítas no mundo científico............................................................................................. 19 Educação e Dignidade Humana Ética e responsabilidade social nos cursos de engenharia ............................................................... 22 Educar o humano ............................................................................................................................................. 25 A dignidade humana....................................................................................................................................... 27 Projetos BAJAFEI, o sucesso de uma idéia ................................................................................................................ 29 Futebol de Robôs ............................................................................................................................................. 32 Projeto Relâmpago .......................................................................................................................................... 36 Engenharia Têxtil, experiência e tradição ................................................................................................ 40 Controle de um trocador de calor a placas ............................................................................................. 42 Mais sobre projetos ......................................................................................................................................... 45 Testemunhos Gustavo Henrique Bolognesi Donato ....................................................................................................... 46 William Manjud Maluf Filho .......................................................................................................................... 47 Encontro de universitários ............................................................................................................................ 48 Dia da Arte na Semana do Administrador ............................................................................................... 50 Projeto Pró-base de ensino de informática completa o terceiro ano de atividades ................ 52 Comemorações 2005 Centenário do nascimento do Pe. Roberto Sabóia de Medeiros .................................................... 53 IPEI 30 anos depois, novas perspectivas .................................................................................................. 56


Apresentação O leitor tem em mãos o oitavo número de nossos Cadernos. Nossa revista vem acompanhando, passo a passo, a evolução da instituição, sem deixar de insistir naquilo que é o cerne e a preocupação maior da sua existência. As palavras do Presidente reafirmam o papel da universidade na sociedade, a serviço da verdade e da vida. Recolhemos também seus pronunciamentos dirigidos à comunidade, tanto em registro acadêmico como na forma de homilias que marcam momentos relevantes de nossas vidas. Dom Luciano Mendes de Almeida comparece com sua inesquecível palestra de agosto de 2004, falando da luminosidade da fé, que ajuda a descobrir valores em nossa cultura. O assunto da fé e amor ao próximo, fé e ciência, merece ampliação, inclusive com comentários sobre alguns jesuítas cientistas que trabalharam no Brasil. O Centro Universitário caminha para ser universidade. Por isso, reforça-se nosso compromisso com a educação, ganham novo alento projetos que encerram sementes na pesquisa e extensão. Enumeramos alguns deles, legítimo fruto de nosso labor acadêmico. Para encerrar, o ano de 2005 será lembrado por importantes comemorações: três décadas de nosso Instituto de Pesquisas (IPEI) e os dois jubileus de nosso fundador, Pe. Sabóia de Medeiros: seu nascimento para o mundo (1905) e seu outro nascimento para a pátria celestial (1955). Quod deest me torquest – O que falta é o que me atormenta – foi o lema que adotou. E veremos que não poderia ser mais verdadeiro.


O ano de 2005 estará sob o signo da paz. “Solidariedade e Paz” é tema da Campanha da Fraternidade Ecumênica para as Igrejas Cristãs, que abraçará o lema “Felizes os que promovem a Paz”. Onde há pluralidade de elementos – nações, sociedades ou indivíduos –, as relações correm o risco de degenerar em conflitos, e assim, maior se torna a necessidade de paz, de harmonia e concórdia. De outro

modo, a sociabilidade, que caracteriza nossa espécie, transforma-se em hostilidade e o amor dá lugar ao ódio, gerando uma violência contra nossa natureza, que se caracteriza pela razão e pela liberdade. A noção de paz é de grande riqueza e se aplica em todos os níveis da humanidade. Hoje em dia, em um mundo globalizado, a paz tem um conteúdo universal: abarca todos os povos e continentes em suas diferenças políticas e culturais. A humanidade é uma só e seu desenvolvimento é uma convergência para uma só sociedade internacional, que exige paz e harmonia para se estabelecer. A paz também deve reinar dentro das nações, pelo respeito recíproco de todas as suas diversidades étnicas e regionais. A democracia exige o reconhecimento e presença da dignidade em todas as pessoas. A nação é um círculo de círculos, e a diversidade de grupos, estamentos e profissões não pode ser motivo de divisão e muito menos de rejeição, mas de enriquecimento que produz as diferenças, quando há entre elas integração e concórdia. Não se trata da paz dos cemitérios, esmagamento dos mais fracos pelos mais fortes, mas da verdadeira paz, que é fruto da justiça social dentro das nações, e também entre elas. Também o ser humano precisa de paz dentro de si mesmo, pois é constituído de uma rica diversidade. “Eu sou trezentos, sou trezentos e cinqüenta; mas um dia afinal eu toparei comigo”, dizia o poeta Mário de Andrade. A unidade de nossa personalidade não é um dado de origem, mas um objetivo, uma conquista. Como o poeta, cada um precisa encontrar-se; e tem a vida toda para construir-se e realizar sua felicidade. Aqui entra a dimensão religiosa, ou a transcendência. Dizia S. Agostinho: “Fizeste-nos para Ti, Senhor, e nossa alma não tem paz enquanto não descansa em Ti”. A fé, a esperança e o amor nos guiam nessa busca de unidade e de paz, que é encontro consigo mesmo e encontro com Deus. “Felizes os que promovem a Paz”. ❒

VOZ DO PRESIDENTE

Pe. Theodoro Paulo Severino Peters, S.J., Presidente da FEI

Este texto faz parte do Manual do Aluno 2005 do Centro Universitário da FEI

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VOZ DO PRESIDENTE

Pe. Theodoro Paulo Severino Peters, S.J., Presidente da FEI

Mensagem alusiva ao Dia do Professor, outubro de 2004

A sociedade criou um dia para homenagear e reconhecer o magistério para a formação de capital humano de qualidade. Apoiar a formação da juventude, suscitar interesse motivando o ato de aprender, de pesquisar, de dar as razões aos procedimentos próprios e alheios – dos seres humanos e de toda a natureza – é o dia-a-dia do mestre. Mestre é quem alarga horizontes permitindo o ato de formar-se a cada pessoa com quem se relaciona. O ato de aprender inicia-se no regaço materno, no aconchego do lar, no templo da vida. A

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família gera vida, conserva a vida, educa a vida, mas necessita de especialistas preparados para apoiarem o amoldamento das personalidades, o desabrochar das vocações e tendências naturais de cada criança e de cada jovem. Gradualmente, a criança é apoiada na atualização de todo seu potencial de raciocínio, de julgamento, de percepção de seus limites e de como ultrapassá-los. Delega-se ao mestre a função de, dando a mão ao jovem, conduzi-lo com segurança à descoberta da verdade e à sua verbalização. O jovem vai descobrindo as várias perspectivas entre a ciência, a crença, a reação instintiva, a racionalização dos sentimentos, o domínio da vontade, a exigência dos próprios caprichos. Na elaboração da escala de valores exercida pelo despertar de sua consciência crítica, ele necessita de apoio, de sustentação de seu próprio referencial. Assim se revela o magistério como a mão dupla do que ajuda a refletir, a ponderar e do que, por sua vez, é ajudado a refletir e a ponderar. Mestre e discípulo crescem juntos na construção da sabedoria de viver, referenciada pela evidência objetiva nas diversas metodologias do conhecimento, na verbalização oral e escrita do que foi descoberto, criado. Crescimento recíproco. Ninguém pára na pista, caminha-se sempre, renovando a juventude, estimulando a maturidade adulta para a opção pelo bem comum, pela cidadania compartilhada, renovando a vida de todos. O mestre conduz para a vida abrindo perspectivas infindáveis, apoiando a realização dos sonhos, a configuração dos projetos. O mestre interage no espetáculo da vida, que aspira à plenitude, ao rompimento de limites, à comunhão eterna, a partir da vida diária. Ser mestre é sinalizar para a vida de melhor qualidade, de plena realização, de concretização dos passos para a felicidade com Deus. Parabéns mestres, docentes, pesquisadores, auxiliares técnicos e administrativos de ensino, pais e mães. Alegrem-se na árdua e nobre missão confiada. Feliz dia dos professores! ❒


A Universidade e a Sociedade

UNIVERSIDADE E SOCIEDADE

A Unicap foi fundada em 1951, a partir da evolução bem sucedida de sua matriz, o Colégio Nóbrega, e a seguir a Faculdade de Ciências e Letras Padre Manuel da Nóbrega. A Unicap foi a quarta universidade católica a ser fundada no Brasil. Comemora seus 53 anos como universidade de pleno direito, reconhecida pelo Governo Federal. Foi fundada para oferecer alternativa para a sociedade pernambucana na formação da juventude, para a preparação de quadros humanos qualificados para a região e para a nação. Universidade amplamente aberta ao conhecimento humano sem fronteira. Todo o conhecimento interessa aos campos da especialização e do conhecimento geral. A universidade estimula o desenvolvimento de uma visão de conjunto sobre o específico do conhecimento. Ao longo de sua história, formou 56.467 pessoas não só para atuarem profissionalmente em empresas públicas e privadas, como para atuarem no avanço do conhecimento pelo conhecimento, através do exercício da pesquisa na própria universidade e nas suas congêneres aqui e fora de nosso estado. A universidade conseguiu, ao longo da história, expressar seu ser através do ensino às gerações, formando-as para o futuro da pesquisa geradora de novos conhecimentos, ultrapassando os limites do conhecido e legando inovação científica e tecnológica, através do transbordamento de seu agir na extensão. Esses pilares expressam o que se passa em uma universidade: atividade contínua em sala de aula, laboratório, trabalhos de grupos, preparação de projetos e sua execução como resposta aos desafios vividos pela sociedade ao seu redor. Como pode o conhecimento ser colocado ao alcance da população? Como o patrimônio público responde à finalidade pela qual foi criado? O forte de uma universidade é ser pólo estimulador de conhecimento, de capital humano de qualidade, de respostas aos problemas de nosso povo. Como a universidade vê a sociedade na qual está enraizada? Como a sua presença estimula desenvolvimento? Como interessar

VOZ DO PRESIDENTE

Pe. Theodoro Paulo Severino Peters, S.J., Presidente da FEI e Reitor da UNICAP

Excertos do discurso do Pe. Theodoro Peters, S.J., na abertura da II Semana de Integração, Recife, 13/09/2004. Presentes ao evento, o Ministro da Ciência e Tecnologia, o Governador do Estado de Pernambuco e o Prefeito da cidade do Recife.

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VOZ DO PRESIDENTE

toda a comunidade acadêmica a aumentar a velocidade de suas respostas? São perguntas que mostram que a universidade está viva, atuante, influenciando na transformação da própria sociedade. Uma Universidade Comunitária

Nossa universidade é pública não estatal. É uma universidade comunitária, fundada pela sociedade pernambucana para a formação de sua juventude, para o aprimoramento profissional de sua população. Significa que não é uma universidade de um grupo fechado. A UNICAP é uma universidade comunitária, no sentido de que subordina, mais claramente, suas atividades às necessidades da sociedade, confirmando, dessa forma, sua vocação à solidariedade e contribuição aos desenvolvimentos regional e nacional. Reconhece que esse é um requisito implícito de seu caráter comunitário: prestar um serviço de utilidade pública, não estatal, de interesse coletivo e sem fins lucrativos, utilizando e destinando seus recursos para alcançar, constantemente, a melhoria da qualidade dos seus serviços. É qualificada como católica, ou seja, universal, sem discriminação. A palavra católica é a correspondente grega da latina universal, para todos, de todos. A Católica foi fundada em articulação na sociedade para formar as pessoas em nível universitário, referenciadas em valores universais. Valores que valem para todas as pessoas. Veritati et Vitae

O seu lema “Veritati et Vitae” é fonte e objetivo de toda a formação. A começar pela verdade. A busca da verdade é a finalidade de todo raciocínio humano na busca do conhecimento. Qual é a realidade? Como se expressa? Quais as leis que, repetidas nas mesmas condições, permitem criar o fenômeno em exame? A verdade no uso honesto da razão humana é o imã que atrai o sábio, o erudito, a pessoa de opinião coerente. A verdade não é atingida de uma só vez; vai por níveis,

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aprofunda-se, e, como atividade humana, precisa parar em alguns estágios para recuperar a marcha. Chega-se à evidência objetiva pelo uso da razão. A razão humana, aberta a toda a verdade, prepara-se para adentrar na especulação existencial com o transcendente que a atrai continuamente. O ser humano é imantado pelo que o transcende, que vai além dos limites do conhecimento humano. A filosofia abre as portas para a relação religiosa com o sagrado, com os mistérios que a razão humana não pode dominar. Nela, vivem-se os problemas da limitação humana no espaço e no tempo: a dor, o sofrimento, a fatalidade, a morte, a ânsia de sobrevivência imortal. Nossa universidade adentra à luz da fé essas questões propostas a toda pessoa de boa vontade. É confessional sem proselitismo, respeita todas as opções, propondo sua fé, sua crença, sua mediação no conhecimento e no procedimento humano à luz da revelação cristã e da tradição do magistério eclesial. Adere plenamente a afirmação do Sirácida 19:28 “A ciência do Mal não é sabedoria”. De que serviria uma ciência que só desanima e destrói? O complemento do lema é a vida. A Católica está a serviço da vida humana de qualidade para todos os membros da sociedade, para toda a espécie humana. A vida humana não reina absoluta, faz parte de cadeias condicionantes. A pessoa humana faz parte do mundo criado e interage na busca de um equilíbrio sustentável. A vida humana, em sua fragilidade, necessita de cuidados especiais. O uso da natureza a serviço da vida exige maior nitidez hoje do que em outros tempos com relação à clarividência de que a vida só se conserva em contexto de vida. As florestas, os mananciais, o mundo animal fazem parte da companhia humana. O homem isolado não terá condições de qualidade de vida. A revelação bíblica destaca um jardim como ambiente propício para a criação, ou seja, o ser humano, dotado de razão, interage com todos os seres. O desejo do Criador foi de destacar a pessoa humana, homem e mulher, como responsável pelo cuidado de todo ser criado, discernindo o uso para a própria sobrevivência e per-


petuação da espécie. Algumas espécies estão sendo extintas por razões naturais, como sismos, enchentes, secas, aridez, clima ... em razão da interferência humana indiscriminada no meio ambiente e no próprio “habitat”. A ação humana danosa à natureza atenta contra a qualidade de vida do autor desses danos, diretamente ou nas das gerações futuras. Há, em nossos dias, crescimento da consciência ecológica, do respeito à natureza. Em Pernambuco, assistimos às conseqüências da construção de SUAPE, com efeitos na orla, nas marés e na aproximação feroz dos peixes de grande porte. A vida exige cuidados desde a sua gênese. Cuidados materiais, psicológicos, éticos. A vida humana é sagrada desde a origem, com o direito de nascer em boas condições para a matriz e para o feto em geração. A vida, desde o seu início, é um direito da pessoa humana. Como tomar decisões científicas para o progresso da medicina preventiva e corretiva sem considerar a vida inicial como objeto a ser manipulado? Como fazer todo o percurso necessário à descoberta da solução sem eliminar vidas? A reprodução assistida oferece possibilidades a muitos casais que não desejam adotar. Como proceder com os embriões em excesso? Eliminar pelo tempo de validade no banco de embriões ou, já que seriam sacrificados e desperdiçados, usá-los a serviço de outros doentes? Podem o homem e a mulher manipular, decidir sobre quem tem chances de viver, sobreviver, continuar a viver? Pode-se, à luz da dignidade humana, decidir a interrupção da gestação ou a terminalidade de uma vida? São campos de muita objetividade para a ciência moderna, mas de muito pouca isenção para quem está envolvido nos problemas de algum familiar dependente de célula tronco para corrigir problemas gravíssimos de saúde. Aumentando a longevidade, podem-se aumentar os sinais de senilidade e demência. Antigamente se falava em pessoa esclerosada, hoje já se pode classificar a degeneração do organismo em vários males: Alzheimer, Parkinson, falência orgânica.

Outras questões ligadas à ética se apresentam no exercício de cada campo profissional. O bem deve ser feito e o mal evitado. Como é visto e aplicado esse imperativo moral em nossa sociedade? A vida necessita de paz. A paz é agredida pela violência em todas as suas manifestações. A violência pela maldade humana, pela incapacidade de ver no outro a imagem e a semelhança divina e de si mesmo. Nega-se a liberdade alheia num assalto violento, num latrocínio. Diante de um assaltante, o que fazer? Como lidar com o crime que se organiza, com a sociedade de consumo que incita à bebida e a outras dependências mais aviltantes da capacidade de tomar decisões à altura da dignidade humana? É preciso levar em conta a dignidade da vida da pessoa portadora de necessidades especiais para participar plenamente da cidadania, do infrator, do sem teto, da terceira idade. O lema da Unicap – Vida e Verdade – expressa a sua missão, representando-se como a melhor credencial de sua integração com a sociedade. Realiza bem o que se propõe, formando capital humano de qualidade. É o que vimos fazendo, ao longo de nossa história, para Pernambuco e para o mundo, a partir de nossa base operacional: o Recife.

VOZ DO PRESIDENTE

A Pesquisa

A Unicap, confirmando seu desempenho como agente participativo do processo de desenvolvimento sociocultural, científico e tecnológico de Pernambuco e do Brasil, tem realizado investimentos para a consolidação da Pesquisa e da Pós-graduação. Desde 1999, têm-se realizado as Jornadas de Iniciação Científica e a Mostra de Pesquisa, Pós-graduação e Extensão, mobilizando as comunidades interna e externa à Universidade. Conta com um Programa Institucional de Base de Iniciação Científica – PIBIC, com mais de 300 bolsas institucionais. O Diretório de Grupos de Pesquisa da Universidade cresceu mais de 50% em relação à última versão do CNPq. Além disso, tem desenvolvido

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VOZ DO PRESIDENTE

programas e ações voltados à melhoria da qualidade de ensino, da pesquisa e da extensão universitária, o que pode ser observado, especialmente, através do contínuo registro de crescimento das participações de doutores e mestres na composição do quadro docente. O percentual de docentes com titulação entre mestres e doutores da Instituição já ultrapassa 60%. Os Laboratórios de Pesquisa da Universidade estão todos devidamente equipados e em pleno funcionamento. Atualmente, 168 docentes estão cursando diferentes Programas de Qualificação, em sua maioria mestrado e doutorado. É também crescente o número de alunos bolsistas e estagiários na formação das equipes responsáveis pela execução dos diversos projetos de pesquisa, nas áreas sociais, humanas, técnicas e científicas. O ser humano é o centro

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Apud RONCA (1997:22).

Importante a temática de nossa semana porque coloca o ser humano como centro de todo desenvolvimento científico e tecnológico. Trazendo o homem e a mulher para o palco dos debates, enfatiza a imperiosa tarefa da inclusão social e adiciona a questão da educação à investigação científica e técnica. Terminada a última guerra mundial foi encontrada a seguinte mensagem dirigida aos professores1 Prezado Professor Sou sobrevivente de um campo de concentração. Meus olhos viram o que nenhum homem deveria ver. Câmaras de gás construídas por engenheiros formados. Crianças envenenadas por médicos diplomados. Recém-nascidos mortos por enfermeiras treinadas. Mulheres e bebês fuzilados e queimados por graduados de colégios e universidades. Assim, tenho minhas suspeitas sobre a Educação. Meu pedido é: ajudem seus alunos a tornarem-se humanos.

Seus esforços nunca deverão produzir monstros treinados ou psicopatas hábeis. Ler, escrever e aritmética só são importantes para fazer nossas crianças mais humanas. Cabe perguntar que compreensão e que tipo de educação, ciência e tecnologia somos chamados a fazer no hoje de nossa história? Caberia sondarmos as nossas comunidades universitária e científica sobre o projeto histórico que construírmos e o modelo de pessoa humana que estamos contribuindo para formar. Que tipo de lideranças projetamos para o futuro de nosso país? Que médicos, engenheiros, advogados, professores, enfim, que profissional, que cientista estão sendo gestados em nossas Instituições de Ensino e Pesquisa? Ajudar a superar a exclusão social, sobre cujo excluído disse João Cabral de Melo Neto, na voz do retirante: “se morre um pouco por dia”. A caravana governamental no ano passado varreu este país para ver de perto o drama da fome, dos homens caranguejos, vislumbrados por Josué de Castro. Superar a exclusão é um compromisso urgente. As diferentes organizações que produzem ciência e tecnologia, sejam instituições universitárias ou não, certamente poderão oferecer seu empenho na formação de uma comunidade pensante que atue no desenvolvimento de pesquisas e produtos que enfrentem problemas básicos de todo um universo de excluídos. Acreditamos que há uma tarefa para a educação na sociedade em razão do que defendemos: o acesso universal à educação escolar, como mediação para a construção de uma consciência cidadã. Sendo verdade, diríamos que o ato educativo pede uma esperança militante forte, alegre, corajosa. Esperança de quem acredita que a mudança é possível, porém só se passar pela educação. Alegria de quem corre o risco. Corajosa para avaliar e compreender a própria prática, para deixar-se avaliar pelo outro, para permitir que o outro participe da aventura pedagógica. ❒


A liturgia da Palavra hoje nos ajuda a olhar nossa vida à luz das intenções de Deus de modo muito fácil de ser entendida. O testemunho aos Hebreus1 teologicamente nos incita a não abandonar a nossa coragem. Segundo o autor, necessitamos da perseverança para cumprir a vontade de Deus e alcançar o que nos prometeu. Deus nos prometeu sua vida, a vida eterna. Necessitamos, evidentemente, aceitá-la. Para aceitá-la, necessitamos dizer que concordamos com Deus na ânsia de sermos felizes. Deus nos criou para sermos felizes, para partilharmos com Ele de seus dons, graças e benefícios. Deus viu que tudo o que criara era muito bom e deu sua bênção. O Evangelho de Marcos2 confirma a lição. Para Jesus, mestre e didata, nada como duas comparações para apresentar o Reino dos Céus. É semelhante a uma semente carregando vida. Colocada na terra, ela se desenvolve. Com terra fértil, água, luz solar, sereno, ela segue em frente. Deixa de ser semente, tornando-se broto com folhinhas; a seguir, torna-se fonte de vida na maturidade, forjando novas sementes, novos frutos oferecidos para a colheita, para o alimento, para a nova semeadura. O agricultor apenas cultiva, oferece as condições. Não depende mais dele o processo, pode dormir, descansar sem saber como acontece o germinar e o desenvolver da semente em broto e em nova planta. Compreender a natureza – diz Jesus – é necessário para compreender a graça de Deus que nos chega por ele. Somos chamados a dar respostas, a fazer nossa parte, a oferecer a terra fértil de nosso coração e de nossa mente para que a semente da palavra de Deus desabroche em frutos para a eternidade, para a nossa felicidade, para a melhoria da qualidade da vida de toda a sociedade. Porém Jesus é professor dedicado, olhando os olhares admirados ou quiçá embaçados dos ouvintes, insiste com a segunda parábola para descrever o Reino dos Céus, agora igualmente semente e semente pequenina, anã, semente de mostarda. Essa se-

mentinha contém uma árvore capaz de abrigar os pássaros do céu. O potencial é enorme e está a serviço da natureza vegetal, animal e humana. Assim como a semente brota germinando na terra, assim a palavra de Deus é recebida pela humanidade para produzir frutos para a vida do mundo, para a felicidade de cada pessoa. “Somos destinados à vida feliz que se identifica com a alegria da verdade, da adesão ao Bem e à superação do medo diante da morte. É aqui que brilha a beleza da revelação cristã, afirmando o projeto divino da vitória sobre o pecado e sobre a morte e a esperança da realização na plena comunhão entre nós e Deus. Ao mesmo tempo em que se alarga o horizonte na confiança em Deus e na promessa da felicidade, surge também a valorização desta vida terrena, que adquire todo o seu sentido como a experiência fraterna da liberdade que supera o egoísmo e se abre para o dom de si. Nada realiza mais a pessoa humana do que a vivência da gratuidade do amor, aliada à certeza da eternidade feliz. Sem a esperança não entendemos a existência terrena. Mas iluminados por essa esperança, encontramos a alegria de respeitar e amar a pessoa humana, de estreitar laços de amizade, de vencer discórdias e barreiras, de construir relações de solidariedade fraterna” 3. A semente frágil da palavra de Deus iluminou a vida de Gilles, permitindo que ele testemunhasse, refletisse a luz que o iluminava. Hoje celebramos a primeira semana de sua partida, carregamos a tristeza da ausência, da privação de sua vivacidade, mas estamos consolados porque queremos confirmar os valores que ele viveu e transmitiu na família e nas amizades que forjou com sua companheira sempre presente e atuante. A vida de Gilles foi assinada elegantemente e estamos aqui amigos, conhecidos, parentes, familiares, testemunhando que a bondade de Deus haveremos de ver na terra dos vivos. ❒

VOZ DO PRESIDENTE

Pe. Theodoro Paulo Severino Peters, S.J., Presidente da FEI e Reitor da UNICAP

Excertos da homilia pronunciada em 27 de janeiro de 2005, na missa de 7º dia do Dr. Gilles Henri Duchêne, que foi médico do Colégio São Luís

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Hb 10, 19-25.

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Mc 4, 26-34.

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Dom Luciano Mendes de Almeida, S. J. – “Alargar o Horizonte”, publicado no jornal Folha de São Paulo, em 15/01/2005.

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VOZ DO PRESIDENTE

Pe. Theodoro Paulo Severino Peters, S.J., Presidente da FEI e Reitor da UNICAP

Homilia pronunciada em Recife, no dia 23/12/2004.

Homilia de Natal Irmãos e Irmãs na fé, esperança e ideal. Paz e alegria do nascimento de Jesus. O ano letivo termina com grande faina para todos os integrantes da Comunidade Universitária: estudantes, funcionários, professores, pesquisadores. O sol a pino estimula a percepção de nosso cansaço e fadiga. As múltiplas solicitações acadêmicas, administrativas, comunitárias assediam a todos nós, exigindo que desenvolvamos defesas próprias para viver bem e incentivar a todos a bem viver. A celebração do Natal quer ser um oásis em nossa caminhada, uma referência em nossas travessias, uma parada para conferirmos, à luz do Alto, os rumos seguidos e descobrirmos os novos e amplos horizontes que se abrem a perder de vista. Ampliar horizontes, voltar-se para o desconhecido, fazer

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novas descobertas, testar alternativas, partilhar soluções inusitadas, tudo faz parte do nosso dia-a-dia. Queremos colocar nosso capital humano, intelectual e espiritual, à escuta de quem nos fala através da festa de Natal. O Natal celebra o nascimento de Jesus. O nascimento de uma criança é razão de esperança, transformação, promessa, continuidade de vida. Cada família espera com amor a criança em gestação. Como foi o nascimento de Jesus para marcar a humanidade no milênio precedente e nos subseqüentes? Por que Jesus impactou a cultura na antiguidade e na pósmodernidade? Como Ele se faz presente em cada vida humana? Que transformação exerce em nós? Jesus nos foi dado: é o resultado da prece, do choro, do luto, do sofrimento, da escravidão, da esperança em Deus, que não decepciona. O testamento primeiro, testemunha da Aliança entre Deus e seu povo escolhido, transmite, de geração em geração, os sinais e elementos fundadores da fé e da esperança de Israel. O nascimento de Jesus foi o momento de reconhecimento de que, para Ele, convergiam as Escrituras Sagradas. Assim, os apóstolos proclamaram após a sua ressurreição. Abriram-se-lhes os olhos para que vissem a plena identidade de Jesus, o Salvador, Deus conosco para sempre. Jesus passou pela vida fazendo o bem. Com sinais e prodígios manifestou que Deus estava com Ele, que era o Filho de Deus. Pela sua vida, palavra, ação, transfigurou a humanidade. Tornou-se Caminho, Verdade e Vida de toda cultura humana. É tal promessa que contemplamos hoje para que o nosso Natal tenha a autenticidade de um encontro com a vontade de Deus a nosso respeito, para que cada um de nós possa oferecer o melhor de si para acolher a Deus, que se dá a conhecer, amar e seguir Jesus Cristo. É uma festa muito feliz, é uma festa que aumenta nossa auto-estima, é a festa que nos recorda que Deus nos ama e quer que nós o amemos e estejamos de seu lado, testemunhando o bem, a vida, o perdão e o recomeçar de cada dia. A todos feliz natal, ano novo repleto das bênçãos de Deus. Amém. ❒


A IGREJA E CULTURA BRASILEIRA HOJE

FÉ / CULTURA / CIÊNCIA

Dom Luciano Mendes de Almeida Arcebispo de Mariana

Foi-me apresentado para reflexão o seguinte tema: “Como a Igreja está hoje colaborando para a cultura brasileira”. Falo aqui da Igreja Católica. O Brasil foi sempre apresentado como país católico, seja pela história, seja pela densidade populacional de pessoas batizadas, seja por obras que foram realizadas através dos tempos, educacionais, hospitalares. Mas hoje a abordagem não será histórica nem de análise de realizações que afinal seriam como que resultantes da história. Vivemos numa sociedade pluralista e cabe-nos perguntar como é que a Igreja colabora com a cultura, tendo sempre em vista o respeito a outras colocações filosóficas ou teológicas.

Resumo da palestra proferida por ocasião da Semana da Qualidade, em 1º de agosto de 2004

A cidadania

Em primeiro lugar estamos na era da cidadania, dos direitos mas também dos deveres da pessoa humana, da solidariedade na construção de uma nova ordem sócio-política e econômica. Como é que a Igreja está presente ou ausente neste contexto em que tanto se valoriza a dignidade da pessoa humana? Cidadão, cidadania, direitos, deveres são palavras fortes da cultura atual brasileira: “eu sou pessoa”, “eu sou gente”, como diz o povo. A convivência

O segundo nível é o da convivência. A convivência não é fácil. Há conflitos sérios por todo o mundo. Muros,

barreiras, trincheiras, tropas de ocupação. Palestina, Iraque, tribos africanas, os hutus e os tutsis em Ruanda, as perseguições no Sudão. E em Angola como é a convivência? Com os remanescentes dos grupos armados conflitantes, os campos coalhados de minas. Mas há algumas conquistas na linha da convivência, como por exemplo, a comunidade européia. Quem sabe haverá na América também possibilidade de articulação de grupos que organizam a convivência, para além daquilo que era o nosso mapa de geografia: as nações, os limites, as conseqüências das guerras. Apesar

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FÉ / CULTURA / CIÊNCIA

do recrudescimento dos regionalismos, a convivência é uma grande aspiração. As migrações cresceram muito. O Brasil é bem um exemplo desta mobilidade humana. Há famílias de origem alemã, italiana, japonesa e tantas outras com suas festas culturais onde todos se reúnem. Se folhearmos um catálogo de telefones no Brasil vamos encontrar sobrenomes de variadíssimas procedências. A convivência é um desafio, mas é também uma realidade. Às vezes não é fácil perceber esta tendência. O contrário parece predominar. Convivência dentro do pluralismo. O pluralismo pode ser religioso mas é também cultural e ético e às vezes os elementos se somam: basta ver a ex-Iugoslávia com as suas famosas limpezas étnicas. Nova ordem

Além do respeito da pessoa humana ou, pelo menos, do reconhecimento de que as pessoas lutam por ele, além da busca de uma convivência em que as pessoas se respeitam em suas diferenças, de uma convivência dentro de um clima de respeito, onde as pessoas possam ter como se desenvolver, formar suas famílias, guardar suas origens culturais, em terceiro lugar, há hoje a busca de uma nova ordem para o mundo, uma nova ordem que é social, mas também econômica e política. Estes aspectos se entrelaçam, é impossível pensar em economia sem pensar nas articulações que vêm da política e nas resultantes sociais. Mas buscamos uma nova ordem. Certamente no horizonte do mundo hoje há um descontentamento por tantas coisas erradas que a história trouxe para nós; as asfixias econômicas, dominações por grupos mais fortes, esquecimento de nações que se apagaram, essa espécie de exclusão de múltipla raiz que ainda hoje se verifica. A nova ordem deve respeitar a dignidade, deve criar uma convivência, uma convivência que não se feche em guetos mas se abra aos outros, formando um grande horizonte.

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Mensagem de Cristo Ressuscitado

Para isso há alguma palavra que possa vir da Igreja? Quando digo Igreja, quero dizer a mensagem de Jesus Cristo na vivência dos seus discípulos, homens e mulheres. A mensagem do Cristo ressuscitado. Acreditamos que o Cristo ressuscitado é portador de uma novidade, uma boa nova! Esta boa nova tem alguma coisa a ver com o que rapidamente falamos aqui? O que tem a ver com a dignidade da pessoa humana? O que a mensagem do Evangelho tem a ver com esta convivência entre os diversos grupos que se formam através da história, seja ela por etnias, por nações, por grupos econômicos. A boa nova do Evangelho tem alguma coisa a oferecer à nova ordem sócio-política econômica? Jesus em sua passagem pelo mundo não fez grandes obras, não construiu casas, não estabeleceu entrepostos. Ele respeitou muito a liberdade das pessoas, deu testemunho de valores que seus discípulos devem viver. Luminosidade da fé

O que traz a mensagem de Jesus Cristo em relação à dignidade humana? Ela ilumina esta dignidade. Jesus revela como Deus quer bem à pessoa humana, esta luminosidade da Revelação demonstra um conhecimento novo da relação com Deus. A fé é uma luz. Ela nos coloca diante do ser humano do jeito que ele é, mas nos faz penetrar e descobrir riquezas que estavam ocultas. É como um olho mágico. Por ela penetramos o âmago da realidade. O homem é filho de Deus, amado na sua individualidade. A luminosidade da fé cria em nós uma exigência de comportamento muito grande. Esta exigência é mais abrangente que a boa educação, de responder o bem com o bem. Jesus vai além. Os pagãos também fazem o bem a quem lhes faz o bem. Jesus proclama: amai os vossos inimigos, fazei o bem a quem vos ofende, rezai


por quem vos calunia e persegue e sereis filhos do vosso Pai. Ele liga uma atitude comportamental com a filiação divina. Não se trata só de pagar o bem com o bem, nem da brutalidade de revidar o mal com o mal, olho por olho, dente por dente. Ele vai mais longe: é preciso vencer o mal com o bem. Introduz assim na convivência humana um fator de superação da ofensa e isso vai modelar a sociedade marcada pelo discipulado de Cristo. É necessário que no reconhecimento da filiação divina se perceba a fraternidade humana, a noção de irmão e irmã. A fraternidade

O tratamento de irmãos é bem típico. Podemos ter amigos e contudo perder a amizade. Ser irmão é para sempre; mesmo que os irmãos não se dêem, irmão continua irmão. A noção de irmão traz dentro do discipulado uma espécie de perenidade que nos incita a recuperar o tratamento de filhos do mesmo pai. Dentro dos níveis de conquista da nossa cultura, para fomentar a dignidade da pessoa, a convivência, a formação progressiva de uma ordem social, vemos a necessidade de dar um passo e de ir em busca do aprendizado de um relacionamento diferente no mundo. Uma fotografia do mundo atual, ao lado de coisas belíssimas e conquistas notáveis da inteligência, revela também sofrimentos, depredações, falhas gritantes de convivência. Dentro de tudo isto, a percepção da fraternidade traz uma exigência de mudança. Jesus a designa como conversão. Num mundo que perverteu a beleza fontal, é preciso agora uma conversão do procedimento. A convivência solidária deve superar esta situação de injustiça e violência por meio de um mandamento novo que restabeleça a fraternidade. Mais que a fome, o que martiriza a nossa geração é a violência. A fome é até superável. A violência deixa feridas profundas. Não

haverá paz para gerações futuras, se não se superar a espontaneidade do revide. Aqui entra a presença da Igreja, do discipulado de Cristo, com o mandamento novo capaz de vencer a espontaneidade da reação do revide e refazer o tecido da relação humana. Isto é novo e quase inatingível e só é possível acontecer na luz do próprio Cristo ressuscitado. Jesus dizia: “vocês no mundo terão tribulações, mas não tenham medo, eu venci o mundo e estarei com vocês”. A luminosidade da filiação divina se expressa numa fraternidade, que é marcada por um tipo de comportamento em que o reconhecimento da dignidade se traduz no amor, no perdão, ou se quisermos, num amor que supera a ofensa.

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O perdão

Numa hecatombe de toda literatura cristã, se tivéssemos que salvar um elemento, qual seria a palavra chave? Perdão! É exclusivamente cristã, não há outra cultura, que tenha inserida esta palavra. O perdão não é uma categoria filosófica. Você pode estudar os Vedanta, você pode estudar os gregos. Não encontrará o perdão. Platão, tão elevado, dizia que a pessoa deve fazer o bem e não o mal, para não se sujar moralmente, não perder a beleza do ethos. Já a mensagem cristã, ela começa pelo perdão; ela é uma restauração do mundo, uma reconciliação com as pessoas. Transcendência e vida eterna

O terceiro aspecto é uma nova ordem social que nós queremos, quando dizemos: “assim não vai, vamos ver se melhora”. Falamos assim do Brasil e do mundo. A guerra no Iraque, o terrorismo, eliminação de reféns, vítimas inocentes. Mas o certo é que nós almejamos uma nova ordem social que seja articulada em seus elementos econômicos e conduzidos por decisões políticas. Mas como chegar a isso? Este anseio que temos, as Nações Unidas, UNESCO, grande pacto entre as nações, tudo isto ajuda, são conquistas necessárias e é este o caminho, mas mesmo assim não se conseguiu barrar o terrorismo, evitar a retaliação. A nossa vida é breve. Daqui a cem anos viverá alguém aqui dos presentes? Não podemos perder este referencial da transitoriedade. A vida é transitória, nós passamos. Se na projeção da construção de uma convivência global tivermos como limite a parede, não se irá longe na criatividade da pessoa humana. Não há energia vital que possa tentar recriar o mundo para alguns anos, para uma geração. A vida humana fechada na brevidade destes anos é muito tacanha. Então a baliza tem que ser jogada mais longe e este horizonte

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é típico da presença de Jesus Cristo na humanidade. As filosofias falam da transcendência. Para você perdoar, é preciso entender que a justiça não está completa, que ela terá depois sua complementação e plenitude. Sem um projeto claro, certo, verdadeiro da sobrevida futura, da vida perene, se desestrutura o valor do ser, não vamos conseguir vencer a droga, o excesso de bebida, acabar com o crime organizado. Falar de Deus Pai será uma fábula, falar da fraternidade será utopia, se não tivermos clareza de que a paternidade divina garante a perenidade no ser, promete a felicidade ao ser. A vida eterna, eis a grande mensagem. Jesus disse, “vim para que todos tenham vida e a tenham em abundância”, completa, plena. “Este mundo tem tribulações, mas eu prometo uma vida sem limites”, que é a participação na própria vida de Deus, uma vida que transcende as pequenas coisas, que às vezes distraem nossa atenção, como a luzinha do vagalume diante do luar e da luz das estrelas. Uma coisa que é típica da ação da Igreja na cultura atual é colocar luminosidade na dignidade da pessoa humana relacionando-a com o amor fontal de Deus, que quer o bem individual de cada pessoa e que todas as pessoas se relacionem num amor fraterno, marcado por um amor novo, que exige de nós uma conversão. Como a mãe que é ofendida por um filho drogado: ela quer a recuperação do filho e que ele não mais se drogue. A civilização do perdão é a da recuperação total, em que a sociedade tenha realmente um horizonte de globalidade. É isto que nos oferece a luminosidade da mensagem de Cristo, que lançou uma semente. A nós compete recolher esta semente como semente de vida para a renovação e restauração da convivência humana. Neste contexto a Igreja não é tanto um edifício ou uma estrutura organizada, mas é principalmente a mensagem. Para a mensagem ser ouvida e aceita é que existem o local de encontro e a organização. O mais importante é a mensagem que deve cair na terra, frutificar e fazer com


que o mundo se alegre, porque a luz de Deus mostrou o caminho, a vida, a verdade, e a expectativa de uma ressurreição e de uma vida plena e feliz. Sementes de Valores

Recentemente estive em Guaraciaba na festa de Santana. Pessoas boas e simples. A cidadezinha lotada, ruas cheias, frio de fins de julho, uma procissão sem fim. Eu pensava: onde vai esta religiosidade popular, o que este povo quer? Mas logo se percebe que há uma mensagem nisso, mais que a barraquinha, a roda gigante. Nestes sinais externos, humildes e populares está escondida uma mensagem de vida e que a mensagem de vida vai além do que começa agora e para ser verdadeira tem que passar pelo discipulado da conversão e alcançar o âmago da grande mensagem que é uma palavra só “amar como eu amei” que Jesus dizia. Descobrir pois neste “amai-vos uns aos outros, como eu vos amei” de Jesus a dignidade da pessoa humana. E à luz da revelação divina ser capaz de vencer o mal com o bem e dar a vida para que isto aconteça. Há aí uma visão do mundo. Na cultura brasileira entrou forte o apreço à criança, o respeito à mãe e à mulher. Lembro-me de um operário que à sua casa humilde acrescentou um quartinho dizendo que era o quartinho da mãe dele. É um gesto bonito, um valor cristão, a família, a fraternidade, o auxílio aos necessitados, o cuidado que as pessoas simples têm umas com as outras. Claro que estamos longe de uma coerência com a fé, mas as sementes estão aí. A presença da Igreja na cultura brasileira pode ser captada à luz dos frutos desses valores fundamentais. Há sinais de dignidade? Há sinais de fraternidade? Sem dúvida. Há mistura de raças, há sinais de fraternidade na própria convivência do povo. Apesar de todas as desigualdades sociais e de todo o desequilíbrio que isto acarreta e de toda a violência que isto suscita, existe um remanescente na for-

mação de nossa cultura que leva o povo a dizer ainda: “se Deus quiser”, “vai com Deus”, “Deus te acompanhe”. E no fim da tarde, à entrada daquelas igrejas antigas, aquele senhor de chapéu de palha, de roupas modestas, de bengala, diz: “Louvado seja Nosso Senhor Jesus Cristo”. Quem lhe ensinou? Aquilo entrou no coração! O que isso quer dizer para ele? Quer dizer muito, são valores que se traduzem depois numa série de atitudes. Mas a raiz de tudo isto está na aceitação da semente. A Igreja nada mais é do que a semeadora da semente. Infelizmente há limitações e contratestemunhos. Não da semente, mas do semeador. A cultura poderia ser muito mais impregnada destes valores se os discípulos de Cristo fossem portadores mais convincentes e explícitos destes valores. ❒

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Michael J. Himes1

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Professor de teologia, que trabalhou na Universidade NotreDame, South Bend, Indiana e no Boston College. Texto reproduzido do livro Doing the Truth in Love, Paulist Press, New York, 1995, p.54, 91, 87.

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A FÉ EM DEUS E O AMOR AO PRÓXIMO

No começo dos “Irmãos Karamazov” Dostoievski coloca Aliosha, o irmão mais novo, num mosteiro, onde ele se torna discípulo do monge Zósima, que é um renomado diretor espiritual. Bem cedo na novela, Dostoievski apresenta ao leitor uma série de breves conversas entre Zósima e várias pessoas que vêm consultá-lo a propósito de dúvidas e problemas. A série de entrevistas culmina com uma conversa de Zósima com uma mulher que diz estar profundamente transtornada e que não sabe se poderá suportar viver do jeito em que se encontra. Ela diz ao velho monge que se ele não puder ajudá-la, ela não tem mais a quem recorrer e pensa até em tirar a própria vida. Ela está simplesmente aterrorizada pela sua incapacidade de crer na vida depois da morte. Ele não consegue sequer suscitar a questão de crer em Deus. Ela não sabe como deixou de crer. Quando era criança, ela cria em Deus, mas agora o mundo lhe parece tão escuro, tão frio que ela não consegue crer em

nada e esta falta de fé está minando todos os aspectos de sua vida, da sua vitalidade e alegria. Nada parece importar na vida se não há um último propósito, nenhuma razão final, se não há Deus. Ele não consegue crer em nada, a não ser, talvez, no mato que crescerá no seu túmulo. Zósima concorda que ela está passando pela mais terrível experiência que um ser humano pode enfrentar, mas acha que pode ajudá-la. Ele não pode oferecer a ela algum argumento abstrato provando a existência de Deus, mas pode oferecer-lhe uma demonstração concreta. O que ela tem de fazer é voltar para casa e todos os dias, muito concretamente e de modo prático, amar as pessoas com quem ela entrar em contacto naquele dia. Se ela fizer isto, diz ele, ela descobrirá, gradualmente e passo a passo, que ela acredita em Deus. Quanto mais ela se aproximar verdadeiramente do amor desinteressado – a ágape do Evangelho – mais descobrirá que não pode não crer em Deus. Dostoievski conclui, pondo na boca de Zósima: “Este caminho foi experimentado. Este caminho é certo”. E o resto desta longa e gloriosa novela é, creio eu, uma exploração desta tese. Zósima pois diz à mulher, que se ela quiser crer em Deus, ela deve primeiro redescobrir as pessoas à volta dela. Se quisermos crer em Deus, temos de viver tendo como lei de vida a ágape e não o egoísmo. Seu conselho não é “vá para a casa e reze” nem “leia as Escrituras”. Não comece pensando em Deus. Comece por amar aqueles que estão à sua volta da maneira mais concreta e prática possível. E então você descobrirá que crer em Deus é inevitável porque a experiência de Deus está muito intimamente ligada à experiência da autodoação. Não podemos ter experiência de Deus a menos que amemos nossos irmãos e irmãs e não podemos amar nossos irmãos e irmãs a menos que experimentemos Deus. Em certo sentido, a demonstração cristã de Deus é “amo você, logo Deus existe”. Esta força transcendente que encontramos ao amar o outro por amor do outro é Deus. ❒


UMA VERDADEIRA CONVERSAÇÃO E A EXPERIÊNCIA DE DEUS Na primeira carta de João, lemos: “aquele que diz: eu amo a Deus e não ama o seu irmão, está mentindo pois quem não ama o irmão que ele vê, como pode amar a Deus que ele não vê?” (I Jo, 4,20). O autor da primeira carta de João não está falando de Deus como uma idéia ou conclusão de um raciocínio ou demonstração complicada. Ele fala de Deus como parte da nossa experiência “algo que ouvimos, vimos com nossos próprios olhos, olhamos com atenção e tocamos com nossas próprias mãos” (I Jo 1,1). Ele está falando de Deus como alguém poderia falar do amigo, isto é, como parte de sua experiência. Porque Deus é parte da nossa experiência. É importante notar que o autor da primeira carta de João não nos pede para acreditar em Deus, ele nos pede para reconhecer que encontramos Deus com nossos próprios ouvidos, olhos e mãos. E onde encontramos Deus? De acordo com a primeira carta de João, encontramos a Deus como o fundamento de nossa capacidade de amar os outros – e também da capacidade deles de nos amar. Sempre que nós experimentamos – em nós mesmos ou nos outros – uma relação de amor, profunda e íntima, há uma experiência primária de Deus. Lembremo-nos, ubi caritas et amor, Deus ibi est, onde houver caridade e amor, aí está Deus. E quanto mais rico for nosso encontro com Deus, tanto mais rica e mais cheia de amor desinteressado será a nossa relação com os outros. Uma coisa alimenta a outra. Pensemos um instante numa das relações mais básicas e exigentes: uma genuína conversa. Não estou falando de uma conversa fiada para passar o tempo. Refiro-me a uma autêntica conversa que exige conversão

da parte dos interlocutores. Primeiro, devo prestar atenção no que você me diz, para entender o que você quer dizer e como você o entende, para então trocar os lados e me pôr na sua posição. Então, tendo tentado assimilar o que você viu, pensou e sentiu, tento transmitir-lhe o que eu vejo, penso e sinto de um modo que você me entenda. Enquanto isto você se esforça por compreender o que eu quero dizer e como. Você está trocando de lado e se colocando na minha posição. E assim outras tantas vezes. Não é de admirar que uma autêntica conversação seja tão extenuante e por isso mesmo tão rara! Conversa, conversação, está intimamente relacionada com conversão e comunicação com comunhão. Eu tenho que me doar do melhor jeito possível pelas minhas palavras, meus gestos, meu tom de voz para colocar minha mente e meu coração ao seu alcance. E você esforçar-se para receber esta oferta o mais perfeitamente possível para ver o que eu vejo, ouvir o que eu ouço e sentir o que eu sinto. E então trocamos os papéis. É quase um milagre que se consiga isto: é um ato de mútua transcendência. A experiência de uma verdadeira conversação é uma experiência de Deus. De Deus, podemos dizer o menos erradamente possível, que Ele é amor. Amor, ágape (I Jo, 4,8), relação de puro e perfeito dom de si mesmo. Deus não precisa ser o assunto da conversa. Ele é a condição de possibilidade de haver uma real conversa. Você está envolvido com Deus e Deus com você. Onde houver genuíno dom de si, partilha, doação de si mesmo ao próximo, há experiência de Deus. Deus não é nunca um terceiro na conversa. Ele é o que acontece na conversa. ❒

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Michael J. Himes

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Mensagem do Pe. Geral Karl-Hans Kolvenbach, S.J., na abertura do sétimo encontro da ISJACHEM (Associação Internacional de Universidades e Escolas de Química e Engenharia Química ligadas à Companhia de Jesus), realizado nas Faculdades Universitárias Nossa Senhora da Paz, Namur, Bélgica, julho de 2004

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A FÉ E A CIÊNCIA É para mim um prazer dirigir palavras de saudação a todos que vieram a Namur para este 7º encontro internacional da ISJACHEM. A tradição de se reunirem anualmente bem expressa o compromisso de vocês em colaborar no que é essencial para a sua missão como uma associação internacional. Vocês empreendem longas viagens para partilhar uns com os outros os resultados que suas pesquisas produziram, os programas que vocês consideram proveitosos e os desafios que estão enfrentando. Agrada-me saber que vocês estarão tratando da relação entre fé e ciência, um tópico que é muito apropriado para uma reunião de professores de instituições jesuítas. Estou informado que vocês tiveram sucesso em estabelecer alguns programas de intercâmbio entre universidades de países mais desenvolvidos e universidades de países menos desenvolvidos. Estas iniciativas merecem certamente especial recomendação. Espero que o esforço de vocês em conseguir financiamento para seus colegas de países mais pobres seja coroado de êxito e assim eles possam participar dos encontros anuais. A agenda para este encontro inclui uma sessão para a sua associação de estudantes. Vocês procedem corretamente convidando jovens engenheiros e cientistas para participar dos encontros e testemunhar a

dedicação e entusiasmo de seus irmãos e irmãs mais experientes. Assim estão preparando líderes não só para as suas universidades mas também para sua associação. Permitam-me expressar uma palavra de gratidão para duas pessoas que desempenharam papel essencial na preparação deste evento: Professor Willy Dumont, que organizou o encontro e o Reitor das Faculdades Universitárias Nossa Senhora da Paz, Padre Michel Scheuer, que está sediando o congresso. Concluindo, faço os melhores votos e ofereço minhas orações para este momento tão importante. Estou certo de que aproveitarão a mútua companhia e terão discussões vívidas e empenhativas. Agradeço-lhes a vinda a Namur e por tudo o que cada um de vocês está fazendo por sua universidade, por sua associação e pelo Reino de Deus. ❒ Obs.: Há sete anos que o Centro Universitário da FEI vem participando da ISJACHEM. Em 1999 tivemos o prazer de sediar a reunião em São Bernardo do Campo. O nosso representante é o Prof. Milton Gomes, que já presidiu a associação. No contexto dos contactos já estabelecidos recebemos em 2004 a visita do Dr. Juliá e do Dr. Xavier Tomas, do Institut Quimic de Sarrià, de Barcelona, Espanha.


FÉ / CULTURA / CIÊNCIA

O Centro Universitário recebeu alguns exemplares do livro acima, de autoria de Jaime Fernández Rdz, S.J. e Eduardo di Vita, S.J., editado pelas Edições Loyola, São Paulo, Brasil, 2004, 323 p. É uma coletânea-amostragem de 275 minibiografias que evidencia a presença significativa dos jesuítas nas ciências em quatro séculos e meio de existência da Companhia de Jesus. Ela foi fundada em 1540. Reproduzimos aqui trechos de algumas minibiografias que se relacionam mais com o Brasil: Fernão Cardim (p.16), Camilo Torrend (p.252), Francisco Xavier Roser (p.294), Balduíno Rambo (p.295), José Nogueira Machado (p.300), Thomas L. Cullen (p.303).

FERNÃO CARDIM

Naturalista e jesuíta português. Nasceu em Vianna de Albito em 1549. Em 1566 ingressou na Companhia de Jesus em Évora. Em 1583 veio para o Brasil, residindo na Bahia (Ilhéus e Porto Seguro), em Pernambuco, no Espírito Santo, no Rio de Janeiro e em São Paulo (Santos, São Vicente e Piratininga). Escreveu as seguintes obras: • Do clima e terra do Brasil. • Do princípio e origem dos índios do Brasil. • Tratados da terra e gente do Brasil. “Entre os que em fins do século XVI trataram das coisas

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do Brasil, foi Fernão Cardim dos mais sédulos informantes, em depoimentos admiráveis, que muita luz trouxeram à compreensão do fenômeno da primeira colonização do país. Foi um dos precursores da nossa história, quando ainda o Brasil, por assim dizer, não tinha história. Sua história é antes “natural” que civil. Nele há o geógrafo, que estuda a terra, suas divisões, seu clima, suas condições de habitabilidade. O etnógrafo, que descreve os aborígenes, seus usos, costumes e cerimônias. O zoólogo e botânico, por igual aparelhado para o exame da fauna e da flora desconhecidas. Seus depoimentos são os de testemunha presencial” (Rodolfo Garcia, p.11-12). CAMILO TORREND

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O Pe. Roser dizia “quando interpretada corretamente, a ciência moderna, mais do que qualquer outra coisa, leva de volta a Deus, a fonte original de todas as mara-

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Biólogo e jesuíta francês. Nasceu em Saint-Privat d’Allier em 21 de janeiro de 1875. Chefiou a comissão governamental para estudo das moléstias do cacaueiro em 1917 e a delegação da Bahia na 1ª Reunião Sul-Americana de Botânica, celebrada no Rio de Janeiro em 1938. Foi conselheiro técnico do Diretório Regional de Geografia e presidente da Sociedade Baiana de História Natural. Pertenceu à Sociedade Portuguesa de Ciências Naturais e à Real Academia de Agricultura de Turim. Publicou as seguintes obras: • Contribuição para a flora das plantas vasculares da Bahia. • O babaçu na Bahia. • As principais doenças das laranjeiras e seu tratamento. • A influência das matas na cultura do cacau. • Plantas tóxicas para o gado da flora brasileira. • Cogumelos e tuberculose. Faleceu na Bahia em 24 de junho de 1961.

FRANCISCO XAVIER ROSER1

Físico e jesuíta austríaco. Nasceu em St. Martin em 14 de novembro de 1904. Especializou-se em física na Áustria (Viena e Innsbruck) e nos EUA (Oak Ridge), doutorando-se em 1938 com tese sobre os raios cósmicos, tendo trabalhado sob a orientação de Vitor F. Heiss, descobridor dos raios cósmicos. “Para verificar a teoria de Fermi, usou a técnica, então ainda nova, de cristais cintiladores. Investigou a possibilidade de usar tais cristais como contadores proporcionais para partículas de alta energia. No fim usou antraceno para medir perda de energia de m-mesons e provou pela primeira vez experimentalmente a teoria de Fermi” (T. L. Cullen, Verbum, junho de 1967, p.123). Formado em radioisótopos em Oak Ridge (EUA), “realizou trabalhos sobre o mecanismo fundamental e sobre a eficiência de contadores a cintilações líquidos e plásticos, por meio de contadores de grandes dimensões. As suas três publicações sobre o assunto têm sido, até hoje, amplamente citadas” (id., p. 124). De volta ao Brasil, como representante da ONU, organizou uma rede de estações encarregadas da coleta de material radioativo em Guarapari, Poços de Caldas, Araxá, Nova Friburgo. Faleceu no Rio de Janeiro em 12 de fevereiro de 1967. BALDUÍNO RAMBO

Eminente botânico e jesuíta brasileiro. Nasceu em Tupandi (RS) em 11 de agosto de 1905.


Foi fundador da cadeira de antropologia e etnologia na Universidade do Rio Grande do Sul, co-fundador do Instituto Anchietano de Pesquisas e diretor do Departamento de História Natural da Secretaria de Educação do Rio Grande do Sul e do Museu Riograndense de História Natural. “Conhecia o Rio Grande do Sul como a palma da mão. Nas férias costumava trocar o laboratório pelo campo, colhendo espécimes, estudando terrenos e rochas, observando e experimentando, trabalhava no laboratório fundamental da Natureza” (W. Spalding, Estudos, fasc. 100, p.30). Entre suas numerosas publicações, citamos as seguintes: • Flora Riograndense (1946). • An Historical Approach to Plant Evolution (1958). • Euphorbiaceae Riograndenses (1960). • Labiatae Riograndenses (1962; obra póstuma). Faleceu em Porto Alegre (RS) em 12 de setembro de 1961. JOSÉ NOGUEIRA MACHADO

Físico e matemático brasileiro. Nasceu em Barbalha (CE) em 4 de agosto de 1914. Em 1953 transferiu-se para Recife, lecionando na Faculdade de Filosofia “Manuel da Nóbrega” (“Celula mater” da atual Universidade Católica de Pernambuco – UNICAP), tornando-se assim co-fundador dessa Universidade. Lecionou física nuclear na Universidade Federal de Pernambuco, criando também a pós-graduação em física, uma das melhores do Brasil. Fundou o curso de matemática na Universidade Federal do Piauí. Além de sua contribuição decisiva na fundação e formação científica da UNICAP, resumimos assim o campo de seu magistério científico: • Escola Politécnica de Pernambuco. • Universidades Federais de Pernambuco, Campina Grande (PB), Piauí, Ceará, Rio Grande do Norte e Sergipe.

Eis algumas de suas obras: • Um integração no paralelismo das curvas torras (Brotéria, Portugal, 1940). • Relatividade restrita neopositivista (Brotéria, Portugal, 1940). • Poder e as fraquezas da ciência (SBPC, n.2-3, s.d.). • Último (?) teorema de Fermat (Symposium, UNICAP, 1962). • Determinismo e indeterminismo na ciência (Symp., UNICAP, 1980). Faleceu em Recife em 1996.

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THOMAS L. CULLEN

Físico jesuíta norte-americano. Nasceu em 1917. Fez pós-graduação em física na Universidade de Fordham em 1943 e doutorado em 1951 sob orientação do prêmio Nobel de Física Prof. Victor Hess. Em 1956 vem ao Brasil, convidado pelo Pe. Roser, que dava então os primeiros passos para a implantação do Instituto de Física (Departamento) da PUC-RJ. Na PUC dedicou-se às pesquisas no campo da física radiológica com apoio da Comissão Nacional de Energia Nuclear. Visitou várias regiões do Brasil a fim de realizar medições dos níveis de radiotividade ambiental e artificial. Em 1965 transfere-se definitivamente para o Brasil e é nomeado professor associado da PUC-RJ. De 1965 a 1971 dirigiu e consolidou o Instituto de Física (Departamento), continuando a realizar pesquisas de Física Radiológica e a dedicar-se ao ensino. Membro da Academia Brasileira de Ciências a partir de 1963. Participou de numerosos congressos e reuniões científicas no Brasil e no exterior, apresentando valiosas contribuições. Faleceu em 1985. ❒

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EDUCAÇÃO E DIGNIDADE HUMANA Carla Andrea Soares de Araujo1

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Profa. do Depto. de Ciências Sociais e Jurídicas e Coordenadora de Projetos de Ação Social de Extensão do Centro Universitário da FEI.

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“Progress Through Partnership”.

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I – Novos desenvolvimentos em educação em engenharia; II – Pesquisa no contexto; III – O papel dos centros avançados de tecnologia; IV – Nanotecnologia na formação dos engenheiros; V – Tecnologia da informação e matemática computacional; VI – Educação à distância; VII – Processos da Declaração de Bolonha; VIII – Resultados de políticas governamentais; IX – Programas e acreditação internacional.

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Entre os dias 27 e 30 de julho de 2004 participei da Conferência Internacional sobre Educação e Pesquisa em Engenharia – ICEER –, promovido pelo International Network for Engineering Education and Research – INEER. Neste ano, a Conferência foi sediada pela Technical University of Ostrava, realizando-se na cidade de Olomouc, na República Tcheca. O evento é anual e congrega professores, pesquisadores e estudantes de cursos de engenharia de universidades de todo o mundo, com o propósito de trocar experiências e debater assuntos que possam somar à educação e pesquisa em engenharia, qualidade, inovação, desenvolvimento tecnológico rumo ao crescimento e desenvolvimento sustentável. O tema gerador desta conferência foi “Progresso através de Parcerias”2 sendo organizado com nove temáticas, subdivididas em temas específicos3. As que mais despertaram atenção foram: Novos desenvolvimentos em educação em engenharia, da qual uma das proposições para discussão era o ensino de ética em engenharia, grupo em que apresentei meu trabalho. Outras temáticas interessantes, do meu ponto de vista, foram a parceria entre universidade, indústria e governo na pesquisa; nanotecnologia na formação dos engenheiros; tecnologia da informação e matemática computacional; ensino a distância; acreditação internacional; intercâmbios; linguagem e comunicação na formação de engenheiros;

ou mesmo a mulher na ciência e tecnologia. Dessa forma, nota-se uma vasta plataforma que pretende conhecer novas idéias, práticas correntes, discutir aspectos educacionais e promover uma rede de parcerias entre as faculdades de engenharia interessadas, ao mesmo tempo em que traduz tendências e preocupações nesta área, como por exemplo, a discussão sobre a acreditação internacional dos cursos de engenharia, que seria uma norma para o reconhecimento internacional dos programas de engenharia. Muitos dos artigos apresentados versavam sobre pesquisas na área tecnológica, principalmente nanotecnologia. Gostaria de ressaltar que a equipe de professores e pesquisadores de Taiwan, sede da próxima Conferência, se sobressaiu em suas apresentações sobre este tema, não só em termos de desenvolvimento tecnológico, mas principalmente de planejamento estratégico em educação nesta área. Experiências em ensino a distância também tiveram destaque nas discussões. Sobre a educação da ética em cursos de engenharia

Foi organizado para este evento um grupo de discussão sobre o ensino de ética na engenharia, tamanha a importância desta discussão para a formação dos engenheiros.


Neste grupo participaram professores e estudantes da Austrália, dos Estados Unidos, Brasil, Alemanha, República Eslovaca, Finlândia e Japão, numa calorosa discussão sobre metodologias de ensino de ética, projetos e problemas decorrentes da produção de conhecimento e tecnologias dissociados de questões morais e éticas. Pelos artigos apresentados, pode-se observar, através de seus títulos, o quanto a ética e a educação para a ética tem sido questão importante quando se trata da formação de pessoas. Pode-se citar alguns dos artigos, e questões como referência para esta discussão: • As tecnologias empobrecem ou aperfeiçoam as vidas daqueles que as utilizam? Uma perspectiva dos estudantes sobre a ética na engenharia; • Pode a ética ser ensinada?; • Engenharia e Responsabilidade Social. Incorporando cultura ambiental na administração; • Ética e Responsabilidade Social nos cursos de engenharia; • O fenômeno da Internet – desafio ético para a educação em engenharia na era da informação; • A função das Ciências Sociais e Humanas na prática e na educação em engenharia; • Um caminho fenomenológico para a educação ética; • Plágio e pedagogia: reflexões sobre as causas e conseqüências do plágio entre os estudantes de engenharia; • A dimensão ética na educação para o trabalho em engenharia. O artigo que inscrevi para a Conferência destinavase a esta área temática. Em minha exposição falei sobre o papel da Universidade na compreensão da realidade na qual está inserida, devendo desempenhar um papel sócio-transformador através da educação dos sujeitos que participam e constróem a realidade social. Sendo assim, apresentei no artigo as experiências e resultados do ensino de ética e responsabilidade social em cursos de engenharia, obtidos através do Programa de Ação Social

de Extensão – PROBASE – do Centro Universitário da FEI. Partindo do princípio que o engenheiro como pessoa tem um papel social a desempenhar, torna-se necessário recuperar o princípio da dignidade humana, o que é o homem, para compreender o potencial de contribuição social no exercício de sua profissão. O engenheiro é chamado a ser empreendedor de uma nova sociedade imbuído de ética e responsabilidade social no crescimento, desenvolvimento e sustentabilidade desta, para o bem do homem e de toda humanidade. Por esta razão, oferecendo disciplinas de ciências humanas ao longo dos cursos de engenharia, propõe-se ao estudante conhecer o contexto social no qual está inserido a fim de buscar soluções para os problemas enfrentados e suprir as necessidades vigentes, trabalhando princípios éticos e morais, bem como propondo o envolvimento destes alunos em projetos sociais, conscientizando-os, na prática , de seu papel social. Mais do que responder a uma exigência mercadológica através destas disciplinas procura-se responder a formação integral da pessoa e do profissional. A ética na qual educamos o estudante de engenharia é a ética social, do empenho com a realidade como um todo e principalmente a realidade do trabalho, pois é no empenho com esta realidade que ele aprende a conhecer as necessidades e as possibilidades existentes

EDUCAÇÃO E DIGNIDADE HUMANA

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EDUCAÇÃO E DIGNIDADE HUMANA

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A biblioteca do Centro Universitário da FEI dispõe do material da Conferência em CD-room, para quem se interessar pelos artigos apresentados.

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no contexto social e a experimentar novas formas de relacionamentos e trabalho. O Programa de Ação Social de Extensão possibilita aos alunos engajarem-se num trabalho social, utilizando sua formação específica, numa ocasião de experiência e aprendizado. O contato com carências humanas e sociais incentivam o surgimento de projetos científicos ou tecnológicos que venham responder às necessidades da realidade social. Através destes projetos o Programa propicia aos alunos a possibilidade de expressarem sua inteligência, capacidade inventiva e transformadora com coragem, tenacidade, habilidade e esforço, num caminho de descoberta de si

e do outro. Esta é uma proposta de excelência acadêmica acompanhada de realismo social e sentido público. Conclusões

Participar dessa conferência ampliou as possibilidades de discussão sobre a formação integral da pessoa e do engenheiro, estendeu para muito além das fronteiras do Centro Universitário da FEI as possibilidades de troca de experiências, metodologias, documentos que trabalhem a interdisciplinaridade na formação profissional e humana deste sujeito social4. ❒


EDUCAÇÃO E DIGNIDADE HUMANA Francisco Borba Ribeiro Neto1

Artigo publicado no folheto Núcleo de Fé e Cultura da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Luigi Giussani inicia seu Educar é um risco (Bauru, Edusc, 2004) com duas idéias totalmente desconcertantes para nosso senso comum: “O grande problema da sociedade é, antes de mais nada, educar os jovens” e é a “educação [...] do humano, do original que está em nós, que em cada um se desdobra de forma diferente, ainda que, substancial e fundamentalmente, o coração seja sempre o mesmo”. São desconcertantes porque para a mentalidade dominante nosso grande problema é político-econômico. Nessa perspectiva, a educação é muito importante, mas como adestramento profissional, capacitação para enfrentar problemas técnicos e econômicos. Mas educar o humano é um problema de todas as sociedades, em todos os momentos da história. As dificuldades sociais, políticas e econômicas não serão resolvidas imediatamente por meio de um processo educativo, mas é a “educação do humano” que cria as condições adequadas para a superação dessas dificuldades ou, pelo menos, permite que elas não esmaguem o povo.

Ano II, n˚ 11 junho/julho 2004

Educação e transformação social

Nas décadas de 1980 e 1990, o Brasil assistiu a um processo curioso: enquanto o país se democratizava, as pessoas se tornavam cada vez mais individualistas. Foi-se perdendo o modo de ver o mundo que havia marcado a resistência à ditadura e as lutas sociais das décadas de 1960 e 1970: o idealismo, a indignação diante das injustiças e do sofrimento dos pobres, o espírito de sacrifício, a percepção de que uma vida mais humana virá para todos ou não será possível para ninguém. Recentemente, o aumento das iniciativas de voluntariado solidário entre os jovens foi saudado como sinal de uma consciência social e de um comprometimento com a mudança da realidade. De fato, essas iniciativas são tudo isso, mas também representam a particularização das questões sociais: a idéia de que alguns, dotados de uma sensibilidade específica, se dedicam à solidariedade, enquanto a maioria se dedica a cuidar da própria vida. Mesmo nas vitórias eleitorais da esquerda encontra-se uma contradição em grande parte dos

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Biólogo, sociólogo, professor do Depto. de Ciências Sociais e Jurídicas do Centro Universitário da FEI em 2004.

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eleitores: querer a mudança social, mas a partir de uma ação nascida do governo – que não envolve sacrifício e dedicação de cada um pelo bem dos outros. Esse processo representa um tipo de “homologação”, uma forma sutil pela qual cada um perde seu protagonismo na história e se torna espectador, dócil e impotente diante do poder. Ele corrói a capacidade de superação dos problemas sociais, pois ações efetivas nesse sentido exigem criatividade, dedicação e consenso da sociedade. O Estado, por si só, não pode atender a todas as necessidades dos cidadãos: a construção de um “Brasil novo” é principalmente uma questão de “mais sociedade” e não só de “mais eficiência estatal”. A grande matriz de toda vida social é a tradição de seu povo. Foi por uma tradição popular de origem católica que o povo brasileiro aprendeu o significado da solidariedade e da fraternidade, de responsabilidade de uns para com os outros. Não se tratava de discursos moralizantes, mas de um conjunto de práticas sociais, subestimadas hoje em dia, que eram fundamentais na educação do jovem. O cuidado com os velhos e doentes na família, a atenção para com os pobres, o acolhimento dos órfãos da comunidade, a compaixão diante do sofrimento dos outros, o reconhecimento de um Deus Misericordioso, a ênfase na oração, a insistência na unidade familiar, a preparação das festas populares criavam a percepção de que a vida tinha um valor transcendente e de que cada um era responsável pelos outros. Essa consciência não era imediatamente política, mas criava as bases para um empenho político e de transformação da realidade. À medida que essa tradição desaparecia na educação das pessoas, também o desejo de construção de uma sociedade mais justa para todos desaparecia. Não é necessário ser católico, ou mesmo cristão, para comungar daqueles ideais. Mas, se a pessoa não é educada para desenvolver essas tendências que potencialmente estão presentes em seu coração, deixa-as

morrer – sufocadas pelo individualismo e pelo medo da não-realização pessoal. Propor uma vida que corresponda ao coração do homem

A correspondência entre uma proposta de vida e o coração do homem está na raiz de todo empenho não-moralista com a realidade. Por isso existe, em todo processo educativo, um passo decisivo e pessoal de comparação entre a experiência do educador e o desejo de vida do educando. Quando encontra uma experiência de empenho com a realidade, o jovem intui, por trás desse caminho, algo que corresponde a seu coração. É por isso que propostas de trabalho voluntário encontram tanta adesão nos tempos atuais. Quanto mais individualista é a cultura dominante, mais as pessoas se agarram aos sinais de humanidade que encontram. Porém, sem uma educação global do humano, essas experiências definham. A um certo momento todo jovem vive o problema de comparar aquilo que lhe foi ensinado com a sua experiência de vida, com seus desejos mais profundos e suas aspirações. Essa é a primeira, a mais verdadeira e a mais radical de todas as críticas. Nas escolas atuais, professores e pais se escandalizam com a conduta de crianças e jovens, com a “falta de limites e de respeito”. Escandalizam-se, na verdade, com o exercício inevitável da crítica a um mundo que não sabe dar as razões de seus próprios valores. A crítica sempre se manifesta no jovem, mas hoje não lhe são dadas condições para exercê-la de forma construtiva, por razões ideológicas ou econômicas. Assim, o jovem a realiza de forma desordenada e destrutiva. A apatia é o resultado último da crítica que não encontra um valor ao qual se apegar. Sem nada pelo qual valha a pena lutar, o homem se fecha em seu individualismo e se torna apático e indiferente para com os destinos da sociedade. ❒


A encíclica Evangelium Vitae é uma firmíssima reafirmação da posição cristã sobre o caráter digno de todo o ser humano. Tal dignidade tem seu apoio no amor de Deus ao homem, que se manifesta tanto na criação como na Encarnação e Redenção. Deus cria o homem à sua imagem dotando-lhe de faculdades espirituais e dando-lhe a capacidade de ser senhor das coisas e sobretudo de si mesmo. A dignidade da pessoa tem assim um valor ontológico e afeta a todos os homens independentemente do seu comportamento. Daí o sinal que Deus dá a Caim, pelo qual protege sua vida e dignidade. A Encarnação e a Redenção de Cristo vêm realçar ainda mais a dignidade da pessoa. Contemplando o sangue de Cristo, o fiel aprende a reconhecer e apreciar a dignidade quase divina de todo homem. A tese defendida na encíclica apóia-se na Escritura, especialmente Gênesis, Eclesiástico e Salmos no que se refere ao Antigo Testamento, assim como na Patrística, Gregório de Nissa, João Damasceno e Escolástica (Santo Tomás de Aquino). A diferença da fundamentação cristã em relação a outras fundamentações radica em que, no primeiro caso, a universalidade está garantida pelo amor de Deus a todos os homens, enquanto nas demais concepções, inclusive o estoicismo, o ser humano deve provar sua excelência, sua condição de homem virtuoso, para ser declarado digno. Esta redução no número dos considerados dignos é especialmente significativa no caso do pensamento moderno, em que pesem as declarações a favor da universalidade dos direitos. Em relação a isto, a encíclica destaca como a dignidade humana se encontra seriamente ameaçada em nosso tempo devido ao eclipse do sentido de Deus. Esta situação permite excluir a dignidade humana em determinados pressupostos e instrumentalizar ou eliminar a vida daqueles seres humanos, que não seriam propriamente pessoas e portanto nem teriam dignidade.

EDUCAÇÃO E DIGNIDADE HUMANA Dr. Jesús Ballesteros

Extraído das Atas do Symposium Internacional de Bioética (p. 67-69), realizado na Universidade Católica San Antonio de Múrcia, Espanha. 2000. O simpósio comemorou os cinco anos da encíclica Evangelium Vitae do Papa João Paulo II

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Catedrático de Filosofia do Direito, Universidade de Valência, Espanha.

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Esta negação da dignidade aparece no biologismo, ao negar-se a criação, e portanto o ato de predileção especial de Deus pelo homem. O ser humano aparece assim como um simples animal a mais. “O homem não é mais entendido como misteriosamente outro em relação às demais criaturas terrenas, é considerado como apenas um no meio de tantos seres vivos”. Não se trata de algo que se deduza da evolução, mas de uma interpretação ideológica da evolução que a torna incompatível com a criação do espírito humano por Deus. A negação da dignidade se dá igualmente em todas aquelas ideologias de origem empirista que negam a continuidade ontológica do sujeito, da concepção à morte natural e portanto tendem a considerar que o ser humano só é digno no momento em que apresenta determinadas excelências, como a fala, a autonomia, a carência de sofrimento. É o que ocorre sucessivamente no individualismo, no qual só aparece como digno, aquele que é independente em relação aos outros, ao passo que se considera indigno quem é dependente. Tergiversando sobre o conceito de subjetividade ou mesmo deformando-o, só reconhece como titular dos direitos quem se apresenta com plena ou pelo menos incipiente autonomia e sai de situações de total dependência. Um reducionismo semelhante se produz quando se tende a identificar a dignidade humana com a capacidade de comunicação verbal, como fazem os relativistas e a maior parte dos autores vinculados à hermenêutica, já que em tal caso não são mais consideradas pessoas os que não podem falar, ou seja, os infantes e ainda mais claramente os fetos, os embriões e os zigotos. A pretendida indignidade da dependência leva a desprezar a atividade de cuidar e ser cuidado, o que obedece a um planejamento reducionista de caráter

tecnocrático, a que correspondem igualmente um encarniçamento terapêutico e eutanásia, ao passo que a medicina paliativa é a verdadeira alternativa na fase terminal. No utilitarismo é a vida sofredora que é considerada indigna, mais só se leva em conta o sofrimento físico e não o moral e ao se esquecer a dimensão do homopatiens, que se interessa antes de tudo pelo sentido da vida, contribuiu mais que outras doutrinas para o aumento da desesperação humana. Nesta ideologia aparece claramente o reducionismo que provoca a negação da Redenção. Para defender a dignidade de todos, impõe-se a distinção, entre a vida, que é sempre digna, e as condições de vida, nas quais intervém a manipulação ou instrumentalização do outro ou de si mesmo, que são indignas e devem ser erradicadas. Se não há manipulação ou instrumentalização do outro ou de si mesmo, a vida é digna. Trata-se pois de lograr a maior qualidade de vida, sem esquecer que para haver qualidade de vida deve haver vida; portanto os paradigmas da dignidade da vida e qualidade de vida são complementares e não antagônicos. A “Evangelium Vitae” contém uma mensagem tão decisiva para os direitos dos sujeitos na Bioética como foi a doutrina social para os sujeitos no mundo da economia. Agora que a Doutrina Social da Igreja foi reconhecida como a mensagem mais avançada para alcançar a justiça social, como manifestou o Jubileu de 1º de maio em Roma (2000), todos devemos fazer o possível para conseguir o mesmo reconhecimento na Bioética, sem que tenham de transcorrer cem anos, já que o tempo urge para salvar a dignidade e a vida daqueles que não podem defender-se a si mesmos. ❒


PROJETOS

Em fevereiro de 95, quando a SAE (Society of Automotive Engineers) trouxe o Mini Baja para o Brasil, o Centro Universitário da FEI foi uma das oito escolas de engenharia do País a participar do evento. Em dez anos, o projeto BAJAFEI acumulou em sua história uma expressiva série de participações vitoriosas, culminando em 2004 com seu melhor resultado, sagrando-se campeã da prova SAE Midwest Mini Baja, realizada em Milwaukee, no estado de Wisconsin, nos EUA, superando escolas de engenharia de todas as partes do mundo, além das principais escolas norte-americanas. Aprendizado contínuo, evolução tecnológica e domínio da técnica são atributos essenciais para o sucesso do BAJAFEI, mas não são suficientes. A união em torno de um objetivo comum e o espírito de equipe são os fatores imprescindíveis que marcam o desenvolvimento do projeto, desde sua primeira participação até a vitória da prova internacional.

Álvaro Camargo Prado1

História vencedora

O sucesso do BAJAFEI na competição mundial vem sendo construído desde o início do projeto. Na primeira versão brasileira da competição, a escola obteve o terceiro lugar. A partir de 96, passou a participar com dois carros, registrando 2º e 5º lugares na classificação geral. O 8º lugar em 97 e o fraco resultado de 98, com o 28º e 29º lugares, mostraram que o sucesso não é obra do acaso, principalmente em engenharia, onde até mesmo o acaso é mensurável e reversível. O aprendizado com resultados pouco expressivos levou a equipe a rever o projeto e empreender uma total reestruturação, levando um dos carros de 99 a figurar novamente entre os 10 melhores do País, com a 8ª colocação. A comprovação da eficiência das mudanças, entretanto, veio na competição do ano 2000, quando um dos carros, o Crocodillo, tornou-se vice-campeão, conquistando pela primeira vez o direito de participar da prova internacional nos EUA, reservada aos dois primeiros colocados na competição nacional. A primeira participação internacional já trouxe um significativo

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Jornalista e professor do Depto. de Engenharia Mecânica do Centro Universitário da FEI

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PROJETOS

8º lugar na classificação geral, com um expressivo 2º lugar na prova estática, uma das que compõem a competição. O projeto atingiu a maturidade em 2001, ao conquistar o primeiro lugar, com o mesmo carro que havia sido vice-campeão no ano anterior e colocando o outro carro, o Armadillo, em 10º lugar. Ao regressar de Troy, Ohio, nos EUA, o BAJAFEI trouxe na bagagem o troféu de 5º lugar na classificação geral, obtido em uma competição com mais de 80 participantes dos EUA e de outros países. A mesma equipe obteve, em 2002, o bicampeonato no Brasil, registrando também a 2a colocação, conquistando o direito de levar os dois carros para a prova internacional, na qual os veículos mostraram sua evolução, conseguindo o 3º e o 6º lugares. A 2a e 3a colocações no Brasil, em 2003, levou os alunos novamente aos EUA, onde obtiveram 15º lugar na classificação geral, resultado que só fez ampliar a dedicação à melhoria do projeto, em busca da superação de todos os problemas ocorridos na competição internacional. O prêmio legítimo veio no ano passado: 2º lugar no Brasil e campeão da prova internacional, concorrendo com 135 carros construídos por estudantes de engenharia dos EUA, Canadá, África do Sul, Argentina e da Coréia. Além da prova nacional, a SAE Brasil, que ocorre normalmente em abril e qualifica as equipes para a disputa internacional, há ainda uma outra competição, realizada em São Carlos. Em 2004, esta competição foi disputada em setembro, com os carros da FEI obtendo as duas primeiras colocações. Importância incontestável

O projeto BAJAFEI é de grande importância para os alunos, mas também para a instituição, que investe constantemente em recursos técnicos para a melhoria dos carros, investimento este que reverte no caráter didático do projeto de forma abrangente para o curso de Mecânica Automobilística.

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O sucesso do projeto em 2004 transformou-o na principal atração do estande do Centro Universitário da FEI no Salão do Automóvel, onde os componentes da equipe se revezaram para explicar aos milhares de visitantes como os alunos constroem um veículo capaz de vencer uma prova internacional, utilizando apenas os recursos que a escola mantém. Outra mostra da importância do BAJAFEI foi o convite da própria SAE, que coordena as competições, para a participação de seu congresso anual, realizado em São Paulo, no qual os alunos envolvidos no projeto apresentaram uma palestra sobre sua estrutura organizacional, considerada um dos principais diferenciais que conduziram o BAJAFEI às vitórias obtidas em 2004. Roberto Bortolussi, coordenador do curso de Engenharia Mecânica do Centro Universitário da FEI, é também o professor responsável pelo BAJAFEI, desde 1998, quando implantou a estrutura atual do projeto. As duas principais características desta estrutura são a forma de montar a equipe e o acompanhamento constante da evolução técnica e tecnológica. Antes de 98, a equipe do BAJAFEI era constituída por alunos do último ano do curso de engenharia automobilística, o que dificultava a transmissão de informações das equipes que deixavam a escola para as que ingressavam no projeto. Bortolussi alterou o critério de composição da equipe, abrindo a participação para alunos de qualquer ciclo, desde o básico até o de formandos, dos períodos diurno e noturno, com a única restrição de não poderem ser reprovados. Com esse formato mais dinâmico, a equipe ganhou um estrutura básica, com renovação constante, substituindo os alunos que se formam, mas sem perder a continuidade do projeto. Em 2005, a equipe atual será quase que totalmente renovada, pois a maioria dos participantes deixará a escola, entretanto ficarão no projeto os alunos que entraram em 2004, que já terão uma experiência adquirida em dois anos de trabalho para transmitir aos que serão admitidos. A evolução tecnológica chega ao BAJAFEI por meio dos professores da FEI, não somente os ligados direta-


mente ao projeto, mas todos aqueles que têm diferentes contribuições para dar aos alunos que constroem os carros. Uma dessas técnicas, que está em fase de implantação, é a utilização de sensores eletrônicos embarcados para analisar o desempenho das partes do Baja em ensaios de laboratório. Essa tecnologia é a mesma usada pelas equipes de Fórmula 1, ou pelas montadoras de automóveis, quando testam seus produtos. A “família BAJAFEI”

O sucesso do BAJAFEI tem também uma componente de grande importância: a união do grupo. Dos 14 alunos da equipe atual, boa parte está junta há 2 anos, trocando as experiências mais diversas que extrapolam o âmbito do projeto. Quando não estão trabalhando no projeto ou na construção dos carros, estão estudando, sempre em grupo, auxiliando inclusive os mais novos, do início do curso, nos trabalhos e provas. O espírito de equipe é o que fala mais alto na sala do BAJAFEI, a solidariedade é um exercício diário. Sérgio Troy, um dos alunos que se despede do projeto este ano, conta que na prova dos EUA o carro da equipe da Argentina teve problemas que eles não conseguiriam resolver sozinhos, o que causaria sua eliminação; prontamente os alunos da FEI partiram em auxílio dos colegas argentinos, consertando o carro que pôde voltar à competição. “No baja nós aprendemos muito mais do que se imagina, não somente sobre carros; aprendemos com a convivência, também quando vamos aos EUA, onde o clima da competição é muito saudável, de colaboração entre as equipes”, afirma Troy. A convivência à qual Troy se refere talvez seja a principal responsável pela forma natural como Pedro Souza Pinto, aluno do 2º ciclo do curso noturno, encara suas tarefas pouco complexas de manter a organização e a limpeza da oficina do Baja. Na estrutura atual da equipe, todos sabem que irão evoluir com os próprios carros, como relata Luís Gustavo Baciotti Bernardino, que está na equipe desde 2001. Luís deixa o BAJAFEI no final de 2005, Pedro ainda tem 5 anos pela frente,

mas o objetivo comum a ambos reduzem esta diferença ao que um deles pode ensinar ao outro. Os alunos mais antigos, como Sérgio Troy e Luís Baciotti, são responsáveis pela transformação da equipe BAJAFEI em uma “família”, que convive em média 6 horas diárias, durante o período letivo e até mesmo nos finais de semana, feriados e férias. Roberto Bortolussi também acredita na união dos alunos do projeto como um dos principais fatores de seu sucesso, “a facilidade de trabalhar em equipe é um dos aspectos mais desejados pelas indústrias atualmente na contratação de profissionais”, afirma. Os alunos sentem sua evolução pela própria evolução dos carros que projetam e fabricam. Na sala ou na oficina do baja sempre há alguém trabalhando, sempre há alguém disposto a explicar tudo o que sabe sobre o projeto, sobre o que faz dentro da equipe e, principalmente, sobre como o BAJAFEI é importante não somente para sua carreira, mas para sua vida hoje e no futuro. ❒

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Dr. Flavio Tonidandel1

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Professor tempo integral do Depto. de Ciência da Computação do Centro Universitário da FEI. Doutor pela Escola Politécnica da USP. Com diversos trabalhos publicados na área de Inteligência Artificial, membro da rede de pesquisa em automação da manufatura (MANET – Manufacturing Network) e um dos coordenadores do projeto de futebol de robôs da FEI.

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FUTEBOL DE ROBÔS DO CENTRO UNIVERSITÁRIO DA FEI: UMA HISTÓRIA CONTADA PELOS MEIOS DE COMUNICAÇÃO O desenvolvimento de pesquisas e tecnologias no ambiente de futebol de robôs é extremamente motivante e, por que não dizer, cativante. Isto decorre, em parte, da natureza do brasileiro que, desde sua infância, se torna um apaixonado por futebol. Mas não é só isso que move o interesse dos alunos em pesquisar, estudar e desenvolver técnicas para o futebol de robôs. Existe ainda a emoção de ver sua pesquisa e seu esforço de estudo convertido em algo que funcione de forma autônoma, ou seja, sem a interferência humana. De fato, a pesquisa e o trabalho científico, aliado ao desenvolvimento e à aplicação tecnológica é um fator importante na motivação dos alunos e professores envolvidos no projeto. Estes fatores tornam um projeto desse porte algo fantástico desde o seu início. A motivação, entretanto, não é apenas privilégio dos alunos e professores da FEI, mas contagiou também os meios de comunicação. O projeto de futebol de robôs na FEI, que iniciou-se em junho de 2003, foi noticiado desde os seus primeiros passos pelos meios de comunicação (jornais, revistas, tv, rádio, etc). Todas as reportagens e artigos em revistas se confundem com a própria história do projeto, isto pois, uma após a outra, foram noticiando a evolução do projeto a cada passo de seu desenvolvimento.


Uma das primeiras notícias que saiu na imprensa tratava da competição latino-americana que seria realizada em setembro de 2003 em Bauru-SP e ressaltava a participação da FEI: “Os projetos da FEI começaram a ser desenvolvidos no início de junho por alunos entre o 2º e o 5º ano dos cursos de Engenharia Elétrica e Ciência da Computação. A Faculdade terá 8 robôs para os times de futebol de robôs...” (segundo site IDG Now! De 11/09/03), noticiando a equipe de futebol de robôs da FEI que ainda estava em fase de desenvolvimento e registrando, nos meios de comunicação, o início dos trabalhos dos alunos. A equipe de alunos envolvidos no projeto conseguiu montar um time de futebol de robôs para disputar a competição latino-americana. A equipe da FEI conquistou o segundo lugar, o proporcionou diversas manchetes e entrevistas em jornais, revistas e televisão. Mesmo com um time em fase inicial de desenvolvimento, com diversos problemas decorrentes do pouco tempo de trabalho (junho-2003 até setembro de 2003), o futebol de robôs da FEI foi convidado a mostrar seus robôs aos públicos dos programas “ A CASA É SUA” na REDE TV, dia 15/09/2003, e no programa DOIS NA BOLA, na BAND SPORTS, em 30/10/2003. Nesses programas, os professores e alunos da FEI puderam mostrar e explicar, para quem estivesse interessado, como funcionava um projeto e um time de futebol de robôs. Em 2004, o sucesso do futebol de robôs havia chegado aos diversos meios de comunicação e universidades do país. Um exemplo pode ser visto no jornal O ESTADO DE S. PAULO, que fez a chamada da reportagem com a seguinte manchete: “Alunos da FEI criam robô que joga futebol” – (segundo O ESTADO DE S. PAULO de 22/03/04). Com o futebol de robôs compreendido e aceito pelos centros de pesquisa e pela própria imprensa, o interesse começou a ser em entender o quanto útil para a vida do ser humano é a tecnologia desenvolvida no futebol de robôs.

A tecnologia criada e desenvolvida pelo futebol de robôs pode ser aplicada em diversas outras áreas, como ressaltado na entrevista e reportagem publicada na revista do CREA-SP (Conselho Regional de Engenharia, Arquitetura e Agronomia) que noticiou o desenvolvimento da equipe da FEI da seguinte forma: “BATE-BOLA COM ROBÔS – Professores e alunos da FEI mostram como uma partida de futebol entre máquinas pode servir de estudos para sistemas de automação industrial” – (segundo revista CREA-SP nº 13 – fevereiro de 2004). De fato, a tecnologia que estava sendo desenvolvida na época, e hoje continua sendo explorada de forma mais avançada, pelo Centro Universitário da FEI no projeto de futebol de robôs pode ser aplicada, no futuro, em automação inteligente de robôs, seja no ambiente industrial, quanto no ambiente doméstico. Isto porque o sistema de futebol de robôs está centrado na cooperação entre robôs, além disso, o desenvolvimento de times de robôs envolve muita integração de técnicas de Inteligência Artificial. Partidas de futebol entre robôs constituem uma tarefa que possibilita a realização de experimentos reais para o desenvolvimento e testes de robôs que apresentem comportamento inteligente, cooperando entre si para a execução de uma tarefa. A organização chamada Federation of International Robot-soccer Association (FIRA) é uma das responsáveis pelo estabelecimento e controle de diversas copas emergentes de futebol de robôs. Existem diversas categorias de jogos entre robôs, com variações desde o número e o tamanho dos robôs até a capacidade computacional de cada robô, incluindo até robôs humanóides. Entre estas categorias, o Centro Universitário da FEI optou por participar da MIROSOT – Micro Robot World Cup Soccer Tournament por ser considerada a de mais fácil implementação (com robôs menores e de menor custo). A figura abaixo apresenta o esquema

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Bibliografia • FIRA 2004 - Federation of International Robot-Soccer Association. The rules of Mirosot. FIRA. (http://www.fira.net). Último acesso em setembro de 2004. • PENHARBEL, E. A.; DESTRO, R.C.; BIANCHI, R.A.; TONIDANDEL, F. Filtro de Imagem baseado em Matriz RGB de Cores-Padrão para Futebol de Robôs. Publicado nos Anais do XXIV Congresso da Sociedade Brasileira de Computação – I Encontro Nacional de Robótica Inteligente. Salvador, BA. 2004.

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básico de uma partida de futebol de robôs da categoria MIROSOT. A bola utilizada é padronizada: uma bola de golfe laranja.

O funcionamento de cada time segue uma mesma fórmula básica: cada time realiza a aquisição da imagem através da sua câmera, processa a imagem usando técnicas de Visão Computacional para descobrir a posição de todos os robôs e da bola. Com esta imagem, um sistema de decisão define a melhor tática a aplicar e os movimentos instantâneos de cada robô. Todo este processamento é realizado em um único computador sem a menor interferência humana. Com a decisão de movimentação tomada, um sistema comunicação por rádio envia para os robôs uma mensagem com o movimento a ser realizado, também de forma automática sem a interferência humana. Este processo é repetido com a decisão tomada mudando conforme a configuração encontrada na

imagem, em ciclos de 30 a 60 vezes por segundo. Essa tecnologia, portanto, pode ser aplicada em ambientes onde os robôs tem que cooperar entre si. Por exemplo, a operação de robôs em áreas insalubres como mineração, resgate de sobreviventes em acidentes, exploração espacial, entre outros. Claro que tal tecnologia deve ser ampliada além do que o ambiente de futebol de robôs proporciona. A ampliação da tecnologia passa, necessariamente, pelo aprimoramento das técnicas aplicadas no futebol de robôs. Em 2004, a prioridade do grupo de pesquisa foi o de aprimorar as técnicas de visão computacional e estratégia do time de robôs. Esse aprimoramento se deu por meio do desenvolvimento de uma nova técnica de calibração de cores, publicada em agosto no congresso de jornada de robótica inteligente (PENHARBEL et al, 2004). Com isso, o sistema de visão computacional ficou mais robusto, e permitiu ao grupo fazer apresentações de futebol de robôs em eventos na Grande São Paulo e em Campinas. Os eventos que tiveram maior repercussão foram a Mostra de Tecnologia em São Bernardo do Campo, em março de 2004 e o evento AUTOMÁTICA na UNICAMP, em junho do mesmo ano. Embora a parte de reconhecimento dos robôs pelas imagens da câmera estivesse funcionando bem e de


forma robusta, a estratégia da equipe ainda precisava melhorar. Não foi à toa que a imprensa noticiou a presença da equipe da FEI no jogo de demonstração na UNICAMP da seguinte forma: “Robôs atrapalhados disputam partida de futebol na Unicamp” – (segundo Diário do Comércio de Campinas, em 02/06/04). O título dessa reportagem mostrava o trabalho que a equipe de estudantes ainda tinha pela frente para melhorar a equipe para a competição de futebol de robôs que aconteceria em agosto de 2004, em Salvador na Bahia. Embora atrapalhados, mesmo assim os robôs empolgaram o público no ginásio da UNICAMP. Na verdade os robôs não eram só atrapalhados, mas eram individualistas também, naquele momento. O goleiro, querendo dar uma de oportunista, saia da área e ia tentar fazer o gol ! O zagueiro, ignorando o jogo de futebol em equipe, partia para cima do adversário mesmo quando a bola ainda estava com o goleiro do outro time. Os robôs, que são autônomos, naquela altura, estavam ainda precisando de uma estratégia que comandasse o time de forma coletiva. Isso foi feito durante os meses de junho e julho de 2004. Camadas de controles estratégicos foram adicionadas, permitindo definir qual robô vai na bola e qual se posiciona na defesa. O goleiro não deveria sair da área e parar de bancar o oportunista. Assim, após várias técnicas e dias de programação, a equipe de robôs da FEI finalmente passou a jogar um futebol coletivo. Com esse time, a equipe de futebol de robôs da FEI sagrou-se campeã de sua categoria na competição nacional realizada em agosto de 2004 em Salvador. Esse feito foi amplamente divulgado na imprensa de Salvador, inclusive com entrevistas ao vivo na REDE GLOBO local, bem como reportagens em diversos jornais e revistas com manchetes como:

– “FEI e MAUÁ ganham prêmios na Competição Nacional de Robôs”.... “A FEI foi campeã na categoria Very Small” (segundo DIÁRIO DO GRANDE ABC de 10/08/04). – “Futebol de Máquinas”...”Na de robôs Very Small, a equipe da FEI, de São Paulo, levou a melhor” (REVISTA ÉPOCA – 09/08/04). – “Robôs da FEI ganham competição nacional em Salvador” (segundo SITE: UNIVERSIA BRASIL de 06/08/04). – “ FEI conquista título em competição de robôs” (Segundo SITE: IDG Now de 11/08/04). E diversos outros sites e jornais da Bahia também noticiaram a competição e o feito inédito da FEI. O Centro Universitário da FEI ainda foi convidado a expor seu time de futebol de robôs nos eventos SAE Brasil, em novembro de 2004, e BRASILTEC (Feira Tecnológica) no mesmo mês. A verdade é que o futebol de robôs empolga, emociona, motiva e permite que alunos e professores tenham prazer em desenvolver uma nova tecnologia que poderá, no futuro, revolucionar a automação e a robótica do país. A imprensa sabe disso, e está acompanhando essa evolução também com empolgação. É com o mesmo espírito de motivação e alegria que ano após ano os alunos envolvidos no projeto expiram, que a imprensa noticia os feitos e todas as etapas do desenvolvimento do projeto de futebol de robôs. Tudo isso cria um fato interessante, pois além de registrar toda a história de um projeto que vem sendo bem-sucedido, também está contanto essa história para todo o Brasil. Isso faz com que o nome do Centro Universitário da FEI se mantenha entre os principais Centros Tecnológicos, e por que não de pesquisa, do Estado de São Paulo e do País, e sempre na vanguarda do desenvolvimento de novas tecnologias que serão úteis no futuro. ❒

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Dra. Rosangela Barreto Biasi Gin1

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Professora do Depto. de Física do Centro Universitário da FEI, doutora em Geofísica Espacial pelo INPE.

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O Projeto Relâmpago foi criado no Departamento de Física da FEI em 2002 com o intuito de estudar as características físicas das descargas elétricas atmosféricas devido ao grande impacto destas descargas principalmente sobre a Região sudeste do Brasil. Só em 2001 mais de 20 pessoas foram atingidas direta ou indiretamente por descargas atmosféricas na região próxima à cidade de São Paulo. Segundo a CEMIG cerca de 60% dos desligamentos de linhas de transmissão são devidos a descargas atmosféricas e no verão de 1998 a Rede Bandeirante de energia teve um prejuízo de um milhão de dólares devido à queima de 300 transformadores na região do Vale do Paraíba. Assim, o projeto visa a identificar parâmetros elétricos de monitoramento de tempestades criando uma logística adequada para auxiliar os órgãos de defesa civil e sistemas de transmissão e distribuição de energia elétrica. O monitoramento das descargas atmosféricas está

baseado na rede de sensores denominado ”Lightning Positioning and Tracking Systems”(LPATS) da Rede Nacional Integrada de Descargas Atmosféricas (RINDAT). Este sistema identifica, localiza e estima a intensidade de corrente das descargas de retorno dos relâmpagos NS (nuvem-solo). O monitoramento desta rede associado ao monitoramento obtido por radares e satélite de órbita polar identificam os parâmetros elétricos necessários. Este projeto é o resultado da parceria entre FEI, SIMEPAR (Sistema Meteorológico do Paraná) e USP (Universidade de São Paulo) em que pesquisadores, alunos de pós-graduação e de iniciação científica desenvolvem ferramentas computacionais e estratégias de aplicação para as companhias de energia elétrica e áreas afins. Como resultado desta parceria tivemos a participação de projetos de pesquisa e desenvolvimento em empresas de energia elétrica como Eletropaulo, Elektro, Grupo Rede e CTEEP e o desenvolvimento dos


PROJETOS

software SisRaio e RelGrads apresentados na BrasilTec em julho de 2003, feira de Inovação tecnológica com iniciativa da FINEP. Estes softwares são utilizados para visualização e análise de descargas em tempo real e dados históricos.

Figura 2. Laboratório Eletricidade atmosférica_base I.

Figura 1. Apresentação do SisRaio e RelaGrads na feira da Brasiltec-2003.

Ainda como resultados desta parceria temos sete artigos apresentados e publicados em congressos científicos nacionais e internacionais (Congress Space Research_COSPAR, International Conference on Grounding and Earthing_ Ground, International Lightning Detection Conference_ILDC, International Symposium on Lightning Protection_SIPDA, Congresso Brasileiro de Meteorologia_CBMET) e 6 trabalhos no Simpósio Internacional de Iniciação Científica da USP_SIICUSP além de publicação em jornais e revistas de divulgação.

Figura 3. Laboratório Eletricidade atmosférica_base II.

Novo módulo do Projeto Relâmpago

Em 2004, foi iniciado um novo módulo dentro do Projeto Relâmpago que tem como objetivo desenvolver um sistema de monitoramento contínuo de baixo custo. Esta proposta vem ao encontro das dificuldades encontradas no monitoramento contínuo utilizado no país. Atualmente, o monitoramento está baseado em

Figura 4. Laboratório Eletricidade atmosférica_base II.

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PROJETOS

sensores importados e com tecnologia que restringe os locais de instalação, importantes para este estudo. Desta forma, este desenvolvimento busca sensores com tecnologia nacional, apresentando baixo custo e de fácil instalação para serem aplicados em larga escala e também em campanhas específicas. O sistema consiste em sensores eletromagnéticos, câmeras de vídeo, anemômetro e um sistema de computadores sincronizados por Global Position System (GPS) a outros sensores externos. Para tal, foi necessário criar o laboratório “Eletricidade Atmosférica” base I e II. Esta atividade tornou o Projeto Relâmpago multidisciplinar contando com a participação dos professores: MSc. Mário Kawano, Dr. Marcelo Bellodi e Dr. Reinaldo Bianchi, do Departamento de Engenharia Elétrica, e dos alunos Marco Romano, Eduardo Moure e Romário dos Santos. A importância das Tempestades Elétricas no Brasil e o Circuito Elétrico Global

As tempestades elétricas no Brasil têm-se destacado pela sua alta atividade e os danos causados à população principalmente nas grandes cidades. Além disto, estas tempestades parecem ser um dos principais responsáveis por manter o Circuito Elétrico Global ativo. Este foi um dos resultados apresentados na palestra do pesquisador PhD Earle Williams do Massachussetts Institute of technology (MIT), Cambridge, U.S.A., no dia 04 de novembro de 2004 no Centro Universitário da FEI. Esta palestra foi apresentada no auditório do IECAT contando com a participação de pesquisadores, professores e alunos da FEI. A palestra versou sobre o Circuito Elétrico Global que mantém uma diferença de potencial de cerca de 300 kV entre a Terra e a Ionosfera. A atividade elétrica no Brasil parece ser uma das principais fontes de recarregamento deste circuito podendo ser observado em Rhode Island, U.S.A. através da Ressonância de Schumann.

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Figura 5. Palestra do Prof. PhD Earle Williams em 04 de novembro de 2004 na FEI.

Além da palestra houve a visita do Prof. Williams ao campus do Centro Universitário da FEI com a participação dos Departamentos Têxtil, Elétrica, Mecânica e Computação. Posteriormente, houve um encontro científico nos laboratórios de Eletricidade Atmosférica do Departamento de Física onde foram apresentados os sensores desenvolvidos em nossos laboratórios, para a Campanha 2004, e troca de experiências entre os pesquisadores do Projeto Relâmpago e do MIT. A Campanha 2004 tem como objetivo monitorar as tempestades que ocorrem em São Bernardo do Campo no período de novembro de 2004 a março de 2005. Este encontro resultou em algumas publicações em jornais e revistas de divulgação, dentre os quais a revista Lumiére, e reforçou a parceria científica Figura 6. Parceria científica entre pesquisadores entre FEI e MIT. ❒ da FEI e MIT.


O que são relâmpagos Relâmpagos são descargas atmosféricas que apresentam alta luminosidade e alta intensidade de corrente. Este fenômeno ocorre devido à existência de cargas elétricas intensas na atmosfera produzindo um campo elétrico local excedente à capacidade dielétrica do ar. Onde e por que ocorrem os relâmpagos? Em geral, os relâmpagos ocorrem em nuvens de tempestade mas podem ocorrer em tempestades de neve e areia, e algumas vezes em erupções vulcânicas. As nuvens de tempestade são as principais fontes de relâmpagos. Essas nuvens são geralmente representadas por um dipolo vertical, com polaridade positiva. No entanto, estudos feitos dentro da nuvem, através de balão, observaram até 10 centros de cargas. Existem várias teorias que explicam o processo de geração e separação de cargas dentro de uma nuvem. A teoria mais aceita é a produção de cargas por processo colisional entre partículas de diferentes tamanhos. Desta forma, o estudo de relâmpagos traz informações bastante significativas para identificar os princípios físicos. O que é Circuito Elétrico Global? O Circuito Elétrico Global é um modelo utilizado para explicar a diferença de potencial entre a Terra e a Ionosfera. Este modelo tem como base dois principais circuitos: (1) o circuito global clássico ‘DC’, que identifica as nuvens eletrificadas como “baterias” e (2) o circuito global ‘AC’, onde ondas eletromagnéticas gerada por relâmpagos são identificadas como Ressonância de Schumann. A atividade transiente da Ressonância de Schumann é fortemente dominada pelos Sistemas Convectivos de Mesoescala que ocorrem no Brasil sendo estes monitorados por observações em feitas Rhode Island, USA.

Quais os principais tipos de relâmpago e como ocorrem?

PROJETOS

Existem vários tipos de relâmpagos. Os que ocorrem dentro da nuvem (IN) são os mais freqüentes seguidos dos nuvem-solo (NS). Apesar dos intra-nuvem serem os mais freqüentes, os relâmpagos NS são os mais estudados pois, são estes os grandes responsáveis por danos à vida humana. Os relâmpagos NS são constituídos por um conjunto de descargas intermitentes, separadas por um intervalo de tempo de aproximadamente 40 milissegundos, acompanhadas de grande luminosidade. Esse conjunto de descargas tem duração de algumas centenas de milissegundos alcançando até alguns segundos, dependendo do número de descargas ocorridas. A maioria dos relâmpagos possui até três descargas. Esses relâmpagos transferem em média 20 Coulomb. Qual a importância dos relâmpagos? Os relâmpagos parecem ser um dos indicadores do estágio de eletrificação das nuvens, sendo associados à precipitação e à severidade das tempestades. O cálculo da precipitação a partir de relâmpagos tenta identificar o conteúdo de gelo da nuvem fator importante para identificar os processos de carregamento da nuvem. Vários são os estudos que indicam a relação entre descargas atmosféricas e variáveis meteorológicas e que mostram a relação entre atividade de descargas atmosféricas e severidade das tempestades. Estes estudos mostram que a integração destas informações pode identificar processos predominantes de geração e transporte de cargas dentro da nuvem. Portanto, através da utilização de parâmetros elétrico-meteorológicos pode-se aprimorar as técnicas e os métodos de monitoramento do tempo e otimizar a tomada de decisão no gerenciamento dos recursos hídricos, distribuição de energia elétrica entre outras atividades.

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PROJETOS

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No final de agosto de 2004, a Profa. Regina Sanches, coordenadora do curso de Engenharia Têxtil recebeu um e-mail da Bahia. Era do COMPETE, Condomínio de Empreendedores e de Inovações Tecnológicas em sua incubadora de empresas. No e-mail em questão o COMPETE, com suporte em sugestões do IPT – Instituto de Pesquisas Tecnológicas da USP, solicitava o empenho do Departamento Têxtil do Centro Universitário da FEI na elaboração de pequena quantidade de tecido para colaborar no UNEDERM, produto base do projeto Adesivo Trançado de Ponto Falso. Ele substitui a “sutura” e tem aplicações muito vantajosas em cirurgia da pele. O inventor do UNEDERM, é o Prof. Antonio Amancio Jorge da Silva que esteve entre nós explicando aonde queria chegar e o material de que necessitava. Encontrou pronta acolhida. O produto acabado foi apresentado na Brasiltec 2004, em outubro. A Profa. Regina e Prof. Rubens Nicolini puderam atender à solicitação graças aos conhecimentos e habilidades dos instrutores da Oficina de Tecelagem. Aí é que entra o Sr. Anton Lavric. Com ajuda do Sérgio Luis Pereira produziu o tecido e o trançado ideal para o UNEDERM. O Sr. Anton Lavric é uma destas figuras que acabam se incorporando ao patrimônio da instituição. A oficina de tecelagem é o seu reino. Recuperou as máquinas, conserva-as bonitas e lustrosas, conhece cada palmo do seu espaço e resolve qualquer coisa quando o problema é urdir ou tramar. Nasceu na Eslovênia, formou-se técnico têxtil. Já está no Brasil há quarenta e cinco anos, dos quais a metade na FEI. Desde o início da década de 80 os alunos de Engenharia Têxtil, muitos deles hoje em cargos de destaque nas empresas, passaram por seus ensinamentos, aprendendo a técnica da tecelagem, ouvindo suas histórias e partilhando os segredos que ele sabe arrancar dos fios e dos teares. Há ali preciosidades como o tear Ribeiro, um Mavi de pinça e um velho jacquard de 1948 da marca Primus. O curso de Engenharia Têxtil, além do embasamento de Mecânica e Química, tem é claro, disciplinas como Tecelagem, Fiação, Malharia, Beneficiamento Têxtil, Con-


fecção e Tecnologia dos não-tecidos, entre outras. A FEI foi pioneira na engenharia têxtil. O primeiro chefe do depto. foi o Prof. Ronaldo R. Sonsino. O Prof. Ilário Fazioli e outros empresários do ramo foram determinantes para que o curso prosperasse. A primeira aula

foi ministrada em 1965 e a primeira turma formou-se em 1968. A esta primeira turma pertence a Profa. Toshiko Watanabe, que já dirigiu o departamento. A FEI formou nestes quase 40 anos cerca de mil engenheiros têxteis. ❒

PROJETOS

O PRODUTO O Unederm é constituído por duas lâminas semelhantes de tecido, parcialmente revestidas com adesivo, materiais estes adequados para uso em medicina. Pesquisas de tecidos vêm sendo paralelamente desenvolvidas em São Paulo, pelo Departamento Têxtil do Centro Universitário da FEI, enquanto a UCB do Brasil Ltda. vem contribuindo na busca do adesivo ideal. A concepção projetual do Unederm configura características de comprovada eficácia, avalizada por diversas publicações e segmentos médicos. Aliada à extrema simplicidade e baixo custo é também acessível a instituições e parcelas da sociedade com baixo poder aquisitivo. Apresentado em diferentes tamanhos e formatos, o Unederm se adapta a distintos locais do organismo, protegendo cortes superficiais de dimensões variadas. Admite-se a sua utilização em diversas situações, desde o emprego como principal escolha em procedimentos cirúrgicos eletivos, até os atendimentos de urgência e emergência, realizados em hospitais e clínicas, centros e postos de saúde, além de constituir valioso apoio para equipes de socorro. A facilidade de sua aplicação permite uso doméstico ou no campo, em casos emergenciais, tanto em humanos como em animais.

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PROJETOS

Luís Fernando Novazzi1

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Doutorando em Engenharia Química pela UNICAMP e professor do Depto. de Engenharia Química do Centro Universitário da FEI.

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CONTROLE DE UM TROCADOR DE CALOR A PLACAS É de praxe, principalmente no meio acadêmico, dividir-se a Engenharia em suas diversas modalidades. Essa divisão, contudo, tem o inconveniente de muitas vezes limitar a visão global que se tem sobre um dado problema, restringindo as possíveis soluções. Em virtude disso, a união de diferentes ramos da Engenharia pode ser muito rica, e foi essa a idéia que norteou o projeto de formatura descrito nesse artigo. O trabalho em questão, apresentado na XXVII Elexpo do Centro Universitário da FEI, foi executado pelos alunos Carla Pinho Novo, Diego Le Senechal, Fábio Luiz Araújo, Fernando Rodrigo Gomes e Fábio Borges Soares Jr., todos da Engenharia Elétrica com o apoio do Depto. de Engenharia Química, e teve como objetivo automatizar a operação de um trocador de calor a placas. O trocador de placas empregado é de pequena escala, destinado a uso didático no curso de Engenharia Química, onde foi desenvolvido. Esse tipo de trocador apresenta uma relação entre área de troca térmica e volume bastante elevada, ou seja, é bem compacto. Além disso, o equipamento vem tomando espaço dos trocadores tipo casco e tubo em muitas aplicações em indústrias de processo. A troca de calor é realizada de maneira indireta, por meio de placas metálicas que separam os fluidos frio e quente, que escoam alternadamente, como indicado na figura 1. O fluido frio é representado pela cor azul enquanto o quente é representado pela cor vermelha:

O protótipo desenvolvido no Departamento de Figura 1: Esquema de funcionamento de um trocador de calor a placas

Engenharia Química, mostrado na figura 2, possui placas de aço inox, de dimensões 0,10 m por 0,15 m, separadas por mantas de borracha natural. Vêem-se também na foto quatro termopares instalados nas tubulações de entrada e saída dos fluidos quente e frio. Esses instrumentos indicam uma pequena diferença de potencial, da ordem de alguns milivolts, proporcional à temperatura lida.

Figura 2: Foto do trocador de calor a placas desenvolvido

Os pequenos sinais de tensão dos termopares são enviados a transdutores de temperatura, indicados na figura 3, que os filtram e os amplificam até valores de tensão de alguns volts. Esses sinais são então enviados a uma placa de aquisição de dados num microcomputador, onde podem ser lidos e convertidos para valores


PROJETOS

de temperatura. No projeto desenvolvido, optou-se por trabalhar com a placa de aquisição de dados Humosoft AD512, que opera com o Matlab, um software versátil e flexível.

Figura 4: Estratégia de controle em feedback

Figura 3: Quatro transdutores de temperatura

O sistema até esse ponto encontra-se em malha aberta, sendo possível somente a leitura das temperaturas de entrada e saída dos fluidos, em tempo real. Em termos de controle, a questão que se colocou ao grupo do projeto de formatura foi a seguinte: como controlar a temperatura de saída do fluido quente, manipulando-se a vazão do fluido frio? Essa pergunta pode ser respondida empregando-se uma estratégia de controle em malha fechada, chamada de feedback ou realimentação, representada na figura 4, na qual linhas tracejadas indicam sinais elétricos, a linha azul mostra o fluido frio e a linha vermelha o fluido quente. A temperatura de saída do fluido quente, a variável controlada, é lida num termopar e enviada até o controlador de temperatura, indicado por um círculo contendo as letras TC. Nesse controlador, embutido no Matlab, o sinal é comparado com um valor de setpoint ou valor que se deseja alcançar. Se o valor lido da temperatura de saída do fluido quente for diferente do estipulado, atua-se no processo através de uma válvula controladora, que manipula a vazão de fluido frio.

A válvula controladora, acionada diretamente através do microcomputador, foi construída acoplando-se o motor do flap de aeromodelos sobre uma válvula agulha fabricada em latão. A posição exata da válvula era conhecida pois tinha-se como referência um potenciômetro que girava junto com seu eixo.

Figura 5: Válvula controladora

Foi construída uma bancada para suportar todos os componentes interligados. Na parte superior da bancada, ficaram o trocador de calor e a maioria dos aparatos elétricos. Na parte inferior, foi instalada uma pequena caixa de água, duas bombas centrífugas e uma torneira elétrica, com o intuito de fornecer água fria e quente ao trocador de calor. Uma visão da parte superior é mostrada na figura 6:

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PROJETOS

Figura 6: Vista superior da bancada de troca térmica

Não cabe aqui um aprofundamento maior em aspectos técnicos, isso será discutido num momento mais apropriado. Entretanto, é válido se comentar sobre o valor didático e tecnológico do equipamento desenvolvido. Existem trocadores de calor a placas de uso didático disponíveis no mercado, importados, de qualidade elevada. Esses trocadores, no entanto, não agregam grande valor, já que a maioria opera somente em malha aberta. Além disso, é importante que a tecnologia seja desenvolvida dentro do Centro Universitário da FEI, e não simplesmente adquirida como uma caixa preta. Se esses não forem motivos suficientes para o desenvolvimento de tecnologia, é fácil se convencer quando se analisa o aspecto econômico: atualmente a relação de câmbio entre o real e o euro, por exemplo, é de quase quatro para um, sem falar dos impostos de importação. Outro aspecto interessante diz respeito à formação dos alunos que participaram do projeto. Essa formação foi diferenciada, mais ampla, e poderá abrir um leque de opções profissionais na área de controle e automação de processos químicos a esses estudantes. Talvez uma idéia ambiciosa, mas que poderia ser considerada, é a formação de grupos de alunos de diferentes modalidades que pudessem desenvolver projetos de conclusão de curso num tema multidisciplinar. Fica aqui plantada a semente. ❒

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MAIS SOBRE PROJETOS

PROJETOS

Aproveitamento industrial da serragem, controle do consumo de água e guia para cegos ganham espaço POLIMA

AQUÍMETRO

(ÁREA: MECÂNICA PLENA)

(ÁREA: ELÉTRICA)

AUTORES: ANTONIO PLACIO FRANCO ARNALDO TOLEDO ULIANA DENNIS HOLZSCHUH LEANDRO PEDROSO PORCINO FABIO AUGUSTO REGONATO GOMES

AUTORES: CAIO BRUNO CESAR DOS SANTOS DANIEL AUGUSTO MELEIRO RODRIGUES DANIEL MORENO PALMA LEANDRO POLONI DANTAS

Exposição de projetos de conclusão de curso, Engenharia Mecânica Plena e Engenharia Elétrica, Dezembro/2004.

ROGÉRIO MARTINS GÓIS

VICENTE RUFINO BURATTO A madeira está presente no nosso cotidiano em uma infinidade de produtos e seu beneficiamento gera serragem ou pó-de-serra, resíduos que normalmente são queimados ou pouco utilizados. A queima possui a agravante de trazer prejuízos ao meio ambiente a ponto de alguns países, principalmente da Europa, criarem leis para limitar essa prática. Por isso vem surgindo no mundo e, principalmente, em países onde a consciência ambiental tem um caráter ativo e a madeira tem custo elevado, uma forte tendência para o desenvolvimento de produtos a partir da serragem. Um produto em particular, que é abordado em nosso projeto e que vem ganhando destaque nas pesquisas, é o WPC (Wood Plastic Composite) ou, em português, compósito termoplástico com madeira. Este produto combina pó-de-serra com polímeros, mais especificamente o polipropileno (PP). Alguns usos do WPC: 1. Substitui a madeira utilizada na construção de decks, que estão sempre em contato com a umidade. 2. Nas esquadrias de ambientes externos é recomendável o uso do WPC no lugar da madeira, pois o compósito tem mais durabilidade, o que reduz os gastos de manutenção. 3. Os pallets de polímeros utilizados, por exemplo, na indústria alimentícia, podem ser fabricados com o WPC a um custo significativamente inferior. 4. Na construção civil, o WPC pode ser a matéria-prima de moldes e andaimes, os quais podem ser reutilizados. O projeto POLIMA tem como objetivo otimizar composições, desenvolver e selecionar equipamentos de máquinas para a produção de WPC no Brasil através do processo de extrusão em dupla rosca, obtendo o granulado que segue para extrusora rosca simples onde se obtêm perfis semelhantes aos tacos de madeira.

Trata-se de um dispositivo destinado à medição individual do consumo de água em condomínios, com o objetivo óbvio de evitar os desperdícios decorrentes da medição coletiva. O sistema, totalmente computadorizado, permite a leitura remota – via web – dos hidrômetros, reduzindo o custo operacional das empresas responsáveis pela distribuição de água.

GUIA PARA CEGOS (ÁREA: ELÉTRICA) AUTORES: ERIK SIMÕES JULIO CESAR DE CAMPOS FERNANDES MURILO FERNANDES MARTINS RICHARD OSHIRO WAGNER GARCIA JORDÃO VAGNER DAL OLIO

Transitar pelas ruas de uma grande cidade e chegar a seu destino constitui um grande desafio para os deficientes visuais. Para melhorar a vida dessas pessoas, foi desenvolvido um dispositivo apropriado, o guia para cegos. Trata-se de um receptor infravermelho sem fio que recebe informações de pontos transmissores colocados em locais específicos. Ao passar por esses pontos, o usuário recebe uma mensagem de voz gravada que informa onde ele se encontra. ❒

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TESTEMUNHOS

Gustavo Henrique Bolognesi Donato

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É com muito orgulho que neste momento da graduação, a FEI passa a fazer parte da minha história. A engenharia me é fruto de fascinação desde a infância, quando ao visitar meu pai no trabalho, eu observava máquinas em funcionamento e, achando lindo, me perguntava por que e como funcionavam. Os anos se passaram e desde cedo, aos 12 anos, comecei a trabalhar com meu pai na empresa de minha família, especializada em usinagem. Embora estudasse no período da manhã e fizesse inglês à noite, sempre freqüentei o trabalho com gosto. Trabalhei como almoxarife, montador e testador de válvulas, fiz parte do departamento de garantia de qualidade, acompanhei implementação do sistema ISO 9002 e QS 9000, para finalmente aos dezessete anos começar a trabalhar na seção que mais me chamava a atenção, a engenharia e manutenção, onde estou até o presente momento. Eu adoro meu trabalho e como auxiliar de engenharia, auxilio os engenheiros desde a manutenção predial e de equipamentos até o projeto de peças, matrizes de forjamento e dispositivo de usinagem. Sempre apreciei a prática e, considero o laboratório uma realidade tão importante quanto a participação nas aulas. O intenso contato com componentes e máquinas desde simples fornos a gás até grandes prensas excêntricas de 600, 800 ton. e delicados equipamentos CNC explica a grande paixão que tenho hoje por engenharia. A educação que Roberta, minha irmã, e eu recebemos em casa nos habilitou a enfrentar com sucesso os desafios na escola. Graças a Deus, um bom desempenho me abriu as portas do terceiro grau. Era chegada a hora de escolher a profissão, e embora a escolha pela engenharia fosse clara, tive dúvidas quanto à Faculdade. Escolhi a FEI devido à grande fama dos “feianos” como engenheiros de grande qualidade e espírito prático, definição com a qual me identifico. Começava aí uma fase totalmente nova. Os primeiros anos de curso foram muito importantes para mim, pois me

ensinaram a ser mais independente e me virar sozinho, o que gera confiança e dinamismo, fundamentais a um bom profissional. Quando estava no quinto semestre tive conhecimento dos projetos de iniciação científica e me interessei por eles. Foi aí que conheci o Prof. Dr. Rodrigo Magnabosco, peça-chave no meu desenvolvimento na FEI, com o qual trabalhei durante dois anos, realizando pesquisas com aços inoxidáveis dúplex nos campos de transformação de fases e estudo de propriedades mecânicas e fadiga. Estes trabalhos nos renderam diversas publicações em simpósios e congressos nacionais e internacionais, inclusive com premiação de Menção Honrosa concedida pela USP. Como ênfase, optei pela Mecânica Plena e devo agradecer sempre aos ótimos professores que tive na Faculdade, que além de um ensino de qualidade me passaram a experiência de vida e a perspectiva de um futuro promissor. Devido ao meu gosto pela engenharia, os problemas que surgiram puderam ser contornados sem dificuldade. Para mim foi uma grande alegria e para os meus pais também conquistar por diversas vezes a Bolsa de Mérito. Aprendi muito na FEI, não só engenharia, mas principalmente trabalho em equipe, determinação e organização. Foi possível arranjar um tempo para estudar línguas: espanhol, inglês, alemão. Estudei espanhol, conclui o curso de inglês no CEL LEP, obtive certificação de Cambridge e do LSI Canadá e estou concluindo o curso avançado de alemão. Hoje posso dizer que sou uma pessoa muito feliz. Estou me formando na profissão que sempre quis, estou trabalhando e comecei minha pós-graduação pelo ITA, através da qual pretendo aprofundar meus conhecimentos. Obrigado à FEI pelo respaldo em minha formação, ao Prof. Dr. Rodrigo Magnabosco e principalmente aos meus amados pai, mãe, irmã e avós, que sempre me deram e darão todo o exemplo e inspiração para seguir em frente. ❒


295571-4. Este foi o número que constava na minha carteira de identificação, logo após meu ingresso na Faculdade. Uma primeira surpresa foi a possibilidade de atividade esportiva. Pouco antes do vestibular eu fazia parte da seleção paulista de vôlei. Os ensinamentos do prof. Armando Bruno Jr. tinham dado resultado. O prof. Paulo da Educação Física me convidava para integrar a equipe da FEI. Mas acabei deixando os treinamentos para dedicar mais tempo aos estudos. Árduo foi o meu caminho e não poucas as dificuldades. Contudo tive nos professores Fiorani, Aldo Alberto, Carlos Burri e Bulba grandes incentivadores. No quarto ciclo fui monitor no laboratório de Mecânica dos Fluidos e lá trabalhei com os professores Ieno, Brunetti, Coquetto e Sérgio Lopes. Junto com o Manuel (o nosso querido Mec-Flu Garoto) eles me auxiliaram a entender melhor o intrigante comportamento dos fluidos. No ciclo seguinte fui orientado pelo Prof. Rodrigo Magnabosco num trabalho de iniciação científica. Foram 6 meses de dedicação ao estudo dos aços bifásicos. Posteriormente, já formado, fui convidado pelo Rodrigo a colaborar num artigo sobre a iniciação científica. O comentário saiu nos Cadernos de Ciências Aplicadas, em janeiro de 2002. Seria minha primeira “publicação”. No sétimo ciclo o prof. Djalma me deu a oportunidade de auxiliá-lo nas aulas. Anos depois, vim a lecionar naquela mesma sala. Tive de “encerrar” minhas atividades extracurriculares, pois fui convidado a estagiar numa empresa de pneumáticos. Fui efetivado um ano e meio antes de me formar (trabalhei ao todo 7 anos nessa empresa). Não foi nada fácil conciliar trabalho e estudo. Lembro-me de intermináveis conversas com os professores Alberto Vieira, Sérgio, Álvaro, Massote, Caio, Donizetti, Flandoli, Paulo Alt e os três Renatos: Miranda, Gallina e Papaleo, entre tantos outros. A fase de aluno da FEI teve final feliz em 2000. A sólida formação habilitou-me a ingressar no programa de pós-graduação da Escola Politécnica da USP, onde

concluí o mestrado e prossigo minhas investigações no doutorado. Em 2002 tive a chance de estudar na renomada University of Akron em Ohio nos Estados Unidos. Nessa época eu trabalhava na indústria e o prof. Rodrigo Magnabosco me convidou para fazer parte da comissão julgadora dos trabalhos de formatura. Numa das exposições dos Projetos de Formatura da Mecânica Plena, reencontrei um velho amigo: o prof. Arthur Tamasauskas. Ele era o orientador de um grupo que eu estava avaliando. Eu precisava fazer-lhe algumas perguntas de ordem técnica. Acolheu-me carinhosamente. Depois de conversarmos bastante sobre o projeto e sobre outros assuntos, perguntou-me se eu não gostaria de participar de um processo seletivo para professor. Aceitei. Meu currículo e histórico escolar foram minuciosamente sabatinado. Depois, uma “prova” de aula expositiva e uma série interminável de questões. Fui aprovado. Seguiram-se as entrevistas de praxe com a Reitoria. Aquela conversa com o Arthur tinha sido providencial. Fui assim que me tornei professor no curso de Engenharia Mecânica. Em 2003 representei a FEI e a POLI na Arizona State University, Phoenix, Estados Unidos. Apresentei lá num congresso internacional da ASME um artigo escrito em conjunto com o prof. Marcelo Massarani (POLI). Sigo até hoje minha jornada combinando duas importantes e exigentes profissões: engenheiro e professor. Minha ascensão profissional e pessoal se confunde com minha caminhada na FEI. Penso que só a educação pode mudar o destino de nosso país e de nossas vidas. Educação que a gente recebe na família, no ensino fundamental e nos cursos superiores. É por aí que se poderá vencer a pobreza e o subdesenvolvimento. Acredito que posso dar minha contribuição e quero dá-la. Serei feliz se conseguir abrir perspectivas para meus alunos de Máquinas de Elevação e Transporte, Elementos de Máquinas e Resistência dos Materiais. Os mestres que tive ensinaram-me o caminho. ❒

TESTEMUNHOS

William Manjud Maluf Filho

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TESTEMUNHOS

Pe. Luiz Arnaldo Sefrin, S.J. Assessor da Pastoral

Encontro realizado em 23 de outubro de 2004 no Centro Universitário da FEI, campus Liberdade

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ENCONTRO DE UNIVERSITÁRIOS Em 2003, foi possível fazer umas reuniões com um grupo de universitários do Centro Universitário, campus Liberdade, antes das aulas do curso noturno, de 18h30 às 19h10. Não é o tempo ideal, é um tempo curto, mas bem aproveitado. Neste ano, a situação mudou: os alunos interessados não podiam chegar nesse horário. O que fazer? Estudar um dia e um horário na semana, que fosse viável. Acabou sendo o sábado, fora do tempo de provas, depois das aulas das turmas semestrais, que terminavam um pouco antes das 11h00. Foram usadas algumas estratégias: • Oferecer um leque de temas, uns mais diretamente religiosos, outros de solidariedade, outros de relacionamento inter-pessoal, ou mesmo o debate de um filme, um livro, uma peça de teatro, etc. • Fazer uma divulgação da ficha/convite por vários canais de comunicação: cartazes nos painéis dos corredores da Faculdade; enviar a ficha/convite através dos e-mails cadastrados dos alunos na Faculdade; alunos representantes da Pastoral em algumas turmas convidando os colegas e entregando a ficha/convite pessoalmente. • Contar com o apoio da coordenadoria e da infraestrutura de funcionários. Quantos responderam o convite? Quando foram recolhidas as fichas, 17 alunos, dos períodos iniciais, tinham preenchido essa ficha e escolhido seus temas de preferência. Organizamos então o encontro. Na realização do encontro, das 11h00 às 16h00: Éramos 14 pessoas ao todo, dez dos inscritos não vieram, mas apareceram alguns novos. 11 alunos do Centro Universitário da FEI e 3 de fora (1 jovem, da Pastoral da Juventude, violeiro, convidado para animar o encontro; 1 universitário da USP e sua namorada, aluna


da Escola São Francisco de Bórgia). Para alguns era a sua 1ª experiência de um encontro de Pastoral. Criamos um ambiente descontraído e acolhedor, numa sala com cadeiras móveis para nos reunirmos em grupo. Uma mesa de comes-e-bebes para acolher os participantes e criar um relacionamento de abertura mútua. Começamos com cantos de música popular para deixar as pessoas bem à vontade. Depois, uma animada dinâmica de apresentação, baseada num novelo de barbante, que era passado para outro e ia tecendo uma rede, enquanto a pessoa contava alguma coisa de si e manifestava as suas expectativas. O que estou buscando na Faculdade: só o estudo? Ou algo mais para a vida? O tema mais convergente foi Jesus Cristo e 2 alunas escolheram o filme A Paixão de Cristo. Assim preparamos os alunos para assistir o filme (mesmo que fosse pela 2ª vez), não só com a cabeça, mas também com o coração. A seguir, o debate em grupo do que mais tocou, e a ligação com a nossa vida e com o que está acontecendo no mundo, criou uma partilha de

idéias e de vida muito rica. Em união com o tema, foram preparados 2 textos muito significativos sobre a Pessoa e a Missão de Jesus Cristo, que uma “representante” enrolou com uma fita colorida, e entregues a cada participante. Esse grupo de alunos ficou animado com o encontro e poderá ser uma semente plantada no jardim do Centro Universitário da FEI para animar outros alunos. Eles querem dar uma continuidade, dentro das suas possibilidades de participação. O próximo encontro, provavelmente com a presença de outros colegas, será uma reunião de 2 horas, num sábado, para aprofundar e trocar experiências sobre o tema da Solidariedade e planejar uma ação conjunta, por exemplo, uma visita a uma instituição beneficente que trabalha com crianças, jovens ou adultos necessitados. Quero agradecer a todos que colaboraram para que esse encontro se realizasse, e produzisse os primeiros frutos: à coordenadoria, aos funcionários, aos bedéis, à secretaria. Que Deus, Nosso Pai, abençoe a todos! ❒

TESTEMUNTESTEMUNHOS

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TESTEMUNHOS

Giselle Larizzatti Agazzi1

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A Profa. Giselle defendeu tese de doutorado em novembro de 2004 na USP. É filha de nosso pranteado e sempre lembrado Prof. Costantino Agazzi falecido em 2002. Inácio A. D’Elboux, responsável pelas atividades artísticas e coordenador da Associação dos Ex-alunos.

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DIA DA ARTE NA SEMANA DO ADMINISTRADOR A pergunta é fatal: professora, por que essa mania de poesia? e a resposta não poderia ser outra: porque é o texto mais resistente a interpretações e, sabendo da necessidade de qualquer profissional desde sempre ter de conquistar excelentes mecanismos para decifrar textos orais e escritos, pode preparar-nos muitíssimo bem para esse desafio. Fica fácil depois passear entre textos técnicos, relatórios, comunicados internos ou elaborar palestras para diversos públicos. Começamos, assim, desde as primeiras aulas, a adquirir o hábito de falar e ler poesia em classe e deixar que as discussões se apropriem das metáforas de Carlos Drummond de Andrade, Fernando Pessoa, Manuel Bandeira, João Cabral de Melo Neto, Chico Buarque de Holanda. Das que os próprios alunos, diga-se, os mais corajosos para colocarem-se à prova, criam. E os fios vão-se conformando e compondo belos desenhos e encontros inesperadamente significativos como foi o que fizemos na Faculdade de Administração do Centro Universitário da FEI, do campus Liberdade. A idéia surgiu da Maria Miriam, nossa aluna de Comunicação e Expressão I. Estávamos em uma aula, depois de uma colega ter lido um poema, e comecei a explicar como em tempos idos as pessoas se reuniam para compartilhar arte. Completei dando o nome a esses momentos já fora de moda: sarau. Ao que nossa aluna retrucou: por que não fazemos um aqui na Faculdade? De fato, essa é a frase que todo professor de língua e literatura quer ouvir. Repeti sua pergunta em alto e bom tom para toda a turma e, como é uma daquelas particularmente festeiras, logo acolheram a boa idéia. A coordenadora do curso, professora Gilda Mendes, mostrou-se extremamente simpática à proposta e logo

de início deu seu aval e, melhor, apoio logístico e moral. Levou-nos ao encontro de uma das figuras mais interessantes que conheci nos meus quinze anos de magistério, por conseguir transpirar a um só tempo aguçada sensibilidade para o mundo das artes e incrível capacidade de organização. É ele o Inácio2, coordenador das atividades culturais da Faculdade, que logo conquistou os alunos com seu entusiasmo e disponibilidade para o trabalho. Acalentamos o projeto. No ar, a idéia ficou pairando, pairando, até que o Maurílio, aluno da outra turma, começou a contar-me de seu desejo de fazer arte na escola. Ele deu o segundo chute para concretizarmos o evento. Animados com o envolvimento dos alunos, resolvemos, então, assumi-lo. O Inácio o arrematou com a brilhante idéia de juntarmos nossos esforços com os da professora Cristiane, que desenvolve aulas de educação musical para a comunidade há nove anos. Com o esboço em mente


do que poderia ser o acontecimento, acionamos dois jovens talentosos da Faculdade, o André e o Thiago, que se responsabilizaram por produzi-lo, abrindo e costurando cada momento literário e musical. Somados os anseios, a idéia da Maria Miriam de fazermos um simples sarau cresceu e tornou-se no “Dia da Arte na Semana do Administrador”. O título do que se tornou um verdadeiro espetáculo não poderia ser mais sugestivo. Um dia dedicado às artes para comemorar tão complexa atividade profissional como a dos administradores. A platéia estava particularmente bonita, não faltaram os filhos dos alunos, avós, tios, irmãos, cônjuges. A professora Gilda abriu a manhã, enfatizando a importância da arte como um dos eixos fundamentais para uma ampla e sólida formação universitária. Dado que através dela podemos acessar um universo rico e plural, que nos leva a conhecer o mundo de incontáveis pontos de vista e a responder criativamente às dificuldades da vida moderna e às contradições que permeiam nossa realidade e subjetividade. A festa prosseguiu com quatro músicas que a turma do violão preparou. Vieram, então, as leituras dramatizadas de treze poemas, que dialogaram com o tema do encontro “Havemos de amanhecer”, verso do “A noite dissolve os homens” de Drummond. Todos que leram contaram com o privilégio de serem acompanhados pelas músicas tocadas pelo Inácio em um imponente piano de cauda. E de serem apresentados por uma encenação de clowns que o André e o Thiago realizavam a cada intervalo, para focar e iluminar aspectos essenciais dos textos literários. O resultado foi dos melhores. A começar por logo nos preparativos termos ouvido de alguns alunos: “essa foi a primeira vez que li um livro de poesia”, “sou

muito tímido, mas tentarei declamar”, “não sei fazer isso, mas pode dar certo”, “não queria apresentar meu poema, mas quem sabe”. Depois, foi o prazer de ouvir o Maurício, o Thiago, a Cristiane, o Renan, o grupo do Luís Gustavo, Gilberto, Maurílio, Rodolfo, Diogo, Érico, Vanessa, Sarita e Juliana, o Bruno, o Gilson e a Paula, o Danilo, o trio da Elisângela, da Miriam e da Valéria, eu mesma e a professora de matemática, Nadéia, e, para coroar, a Keila, grávida de nove meses da Ana Beatriz, que acaba de nascer. No encerramento, mais um show dos clowns e algumas músicas brasileiras. Nos dias seguintes, confirmamos o sucesso da comemoração. Principalmente, quando os alunos pediram que garantíssemos que teríamos outro evento desses. Também quando vários deles me disseram que foram das lágrimas ao riso nas duas horas em que estivemos no anfiteatro. As expectativas foram, de fato, superadas. A despeito da falta de ensaios e dos pequenos contratempos, absorvidos pelo público, cúmplice das dificuldades que permeiam uma atividade como tal. A arte não pode faltar em nenhum meio. Porque através dela humanizamos nossas relações sociais, tornando-nos mais sensíveis ao alheio e sensivelmente mais tolerantes. Comportamentos violentos ganham menos espaço em pessoas que adquirem o hábito de interagirem com a estética de maneira produtiva. O globo terrestre que os clowns trouxeram para iniciar o dia da arte voou sobre as pessoas e as crianças puderam brincar com essas enormes bolas e sorrir espontaneamente. As vozes amanhecidas compuseram um outro 11 de setembro. E reverberaram a necessidade de fazermos parte de uma comunidade que faz história através dos melhores gestos que o ser humano é capaz de executar: a alegria e o encontro pleno com o outro. ❒

TESTEMUNTESTEMUNHOS

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TESTEMUNHOS

Inês Brosso1

1 Profa. do Depto. de Ciência da Computação do Centro Universitário da FEI. E-mail: ines@fei.edu.br

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PROJETO PRÓ-BASE DE ENSINO DE INFORMÁTICA COMPLETA O TERCEIRO ANO DE ATIVIDADES No dia 04/12/2004, um sábado com tarde ensolarada, comemoramos o final de mais um ano de atividades do Projeto Pró-base de Ensino de Informática para Pessoas Carentes que desde 2002 nosso Centro Universitário da FEI vem desenvolvendo e aprimorando; ele surgiu do trabalho conjunto das Profas. Carla Andréa Araújo e Marli Pirozelli do Depto. de Ciências Sociais e Jurídicas e da Profa. Inês Brosso do Depto. de Ciência da Computação, que prepararam e organizaram o material didático e a pedagogia adequada para implantação dos cursos de noções de informática, editores de texto e planilhas eletrônicas, com o objetivo de permitir acesso à tecnologia e promover a inclusão digital e social de pessoas carentes. O projeto também conta com a participação dos alunos Lílian Kotvan, Fernando, Henrique P. Bernardo, Bruno V. S. Santos, Thiago P. Honorato e Daniel T. Batori do Centro Universitário da FEI, que recebem treinamento e uma bolsa auxílio para ministrarem as aulas de informática, conforme o material didático, três vezes por semana, na sede da Casa Menino Edimar, situada na Rua Conselheiro Saraiva 968, no Bairro de Santana em São Paulo. A Casa Edimar, como é conhecida, é um local para projetos sociais voltados para a juventude; não tem fins lucrativos e tornou-se um lugar de acolhida e educação de jovens e adultos; ela foi cedida pela paróquia de Santana e é administrada por voluntários que ajudam e coordenam as várias atividades sociais da casa. Os esforços empreendidos e os resultados obtidos enfatizam a necessidade de continuação do projeto de ensino de informática e sua melhoria. No evento, era visível a alegria e o entusiasmo dos jovens que participam do projeto. A comemoração pa-

recia uma reunião de família, a entrega dos kits enviados pela Coordenadoria de Comunicações do Centro Universitário, lembrou a chegada do Natal, uma festa onde as pessoas se interessam verdadeiramente pela vida dos outros, tentando proporcionar-lhes além de informação tecnológica, inclusão digital, carinho e atenção. Boa comida, música agradável, cantos de Natal trouxeram a presença de Cristo para aquele lugar simples, mas repleto de harmonia. Os números nos incentivam a continuar e a compartilhar a realidade da vida dos excluídos digitalmente. São 52 alunos treinados em informática só no ano de 2004, um número que parece pequeno, mas é muito significativo quando se sabe que representam chefes ou arrimos de famílias que agora têm oportunidades de acesso ao mercado de trabalho. Os alunos completam os cursos básicos e voltam em busca de novos conhecimentos e troca de informações. A foto mostra as Profas. Marli e Inês entre os alunos Thiago e Daniel que ministram os cursos. Que em 2005, os resultados sejam tão bons! ❒


COMEMORAÇÕES 2005

1.

Em 2005 estamos celebrando cem anos do nascimento do Pe. Sabóia (1905-1955), fundador das obras e escolas hoje reunidas no Centro Universitário da FEI. Ele nasceu no Rio de Janeiro, em 18 de maio de 1905 e faleceu em São Paulo, em 31 de julho de 1955, no dia de Santo Inácio de Loyola. Coincidência e graça para um grande jesuíta. Portanto, igualmente recordamos os 50 anos de seu

falecimento. Uma vida consagrada a Deus e a seus semelhantes. O Pe. Sabóia ingressou na Companhia de Jesus em 1922. Foi ordenado sacerdote em 1936, em Buenos Aires, Argentina. A partir de 1939 desenvolve seu trabalho em São Paulo. Sua grande preocupação era a questão social, objeto de tantas encíclicas e ensinamentos dos Papas. Junto com o estudo e oração, a ação. Nesta tarefa empenhou toda a sua alma, todo o seu

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COMEMORAÇÕES 2005

dinamismo. E as obras, as comissões, os institutos, os centros técnicos e as escolas foram surgindo. Alceu Amoroso Lima define seu trabalho como “uma ponta de lança nas conquistas sociais”. A educação foi outra preocupação sua. Além do aprendizado de disciplinas exatas e técnicas, queria colocar à disposição de seus estudantes de administração e engenharia uma formação ligada aos valores transcendentais do homem.

2.

Mas, os recursos? “Ele não tinha um tostão” disse certa vez um de seus colaboradores. Podemos imaginar o que lhe custou em termos de tempo, paciência, ousadia, insistência, criatividade levantar os recursos para que tudo começasse a funcionar. Na busca de fundos, acabou por estabelecer enorme rede de amigos, empresários, conhecidos e benfeitores, que se convenceram da seriedade de seus propósitos. Os que com ele privaram dão notícia de um homem de temperamento exuberante, extrovertido e até “um pouco espalhafatoso”.

3.

O que não diminuía em nada seu zelo apostólico, sua vida espiritual e atividade intelectual. Foi um grande admirador do Cardeal Newman, figura maior da Igreja da Inglaterra, de quem tinha um retrato sobre a escrivaninha. Foi ardoroso adepto do filósofo francês Maurice Blondel e leitor assíduo de Aldous Huxley. Manteve correspondência com ambos. As absorventes ocupações e os seus empreendimentos não impediram o cultivo da filosofia e teologia. A biblioteca da Ação Social, fundada por ele em 1944, e hoje recolhida na Biblioteca Pe. Aldemar Moreira, no campus de São Bernardo atesta a profundidade e a variedade de suas preocupações, que incluiam também literatura inglesa e a história da União Soviética. O Prof. Dino Bigalli, que ele trouxera da Itália, considerava-o, mais que um fundador de obras, “um pastor de almas”. Não admira que o Dr. Peter Grace, um de seus benfeitores americanos o chamasse “a man in a million”.

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4.

O Pe. Sabóia foi grande comunicador, festejado pregador. Manteve programas de rádio e escreveu artigos; não raro, segundo o gosto da época, envolveu-se em debates de grande repercussão. A Ação Social mantinha um Centro Técnico do Trabalho, que ministrava cursos de orientação social para trabalhadores, a Clínica Santo Inácio, para atender pessoas carentes, numa época em que os serviços da Previdência Social ainda não estavam organizados; uma tipografia (que hoje são as Edições Loyola) e editava as revistas “Serviço Social” e “Carta aos Padres”. Mas foi na área da educação que sua memória mantém-se mais viva e inspiradora. A Escola Superior de Administração de Negócios, a ESAN (1941), a Faculdade de Engenharia Industrial, a FEI (1946) firmaram-se. Até hoje permanece a Escola Técnica São Francisco de Bórgia (1946). O Pe. Sabóia anteviu o desenvolvimento industrial brasileiro. Na década de 40 não existia ainda a figura do engenheiro industrial e a ESAN precedeu, em pelo menos dez anos, os cursos da Fundação Getúlio Vargas.

5.

Idealista, sonhador, profeta. Mas igualmente pioneiro, batalhador, realizador. Para angariar recursos, conquistar benfeitores, empreendeu quatro viagens aos Estados Unidos, uma viagem à Itália e outra à Suécia. Conseguiu aparelhos, máquinas e instrumentos, mas de modo geral as contribuições ficaram aquém das expectativas. Mas em nenhum momento desanimou. Pelo contrário descobriu fórmulas, inventou caminhos, surpreendeu os céticos, enfim superou-se. Sabendo-se muito doente (leucemia), pediu a amigos de confiança que não deixassem perecer suas empresas. A Providência divina ouviu seus rogos. Apareceram muitos continuadores, principalmente o Prof. Joaquim Ferreira Filho e o Pe. Aldemar Moreira, S.J., que cuidaram bem do seu legado. Cuidaram, consolidaram e ampliaram. Hoje, passados 50 anos, o Centro Universitário da FEI, tendo à frente o Pe. Theodoro Peters, S.J., presidente


da Fundação Educacional Inaciana Pe. Sabóia de Medeiros e o Prof. Dr. Márcio Rillo, Reitor, caminha para ser Universidade. A lembrança do homem de fé e de ação, decidido e sorridente, há de inspirar dirigentes, professores, funcionários e alunos a continuar escrevendo esta bela página da educação no Brasil.

366 Meditações Pe. Roberto Sabóia de Medeiros1

COMEMORAÇÕES 2005

O QUE FALTA ME ATORMENTA Santa de Catarina de Sena, cuja personalidade tem sido muito estudada nos últimos tempos – todos concordam – se distinguia por uma vontade muito firme. Em certa ocasião escreveu ela: “Sede, pois, perseverantes e olhai não para aquilo que já está feito, mas para aquilo que ainda tendes que fazer” (Carta 363 (93). Pode-se dizer que os homens se dividem nestes dois grupos. Um é o daqueles que, satisfeitos de si, repousadamente olham para “o que já está feito”. Julgam-se muito bons e muito bem, simplesmente porque não fizeram nenhum excesso ou porque habilmente souberam descobrir qualquer excesso. Tranqüilizam-se, porque das liberdades que se permitiram, não trouxeram conseqüências palpáveis. Imaginam-se apóstolos, porque disseram alguma palavra. É a lagoa parada coberta de folhagens! O outro grupo é o dos que, embora a consciência não os acuse, percebem quão longo é o caminho que falta a trilhar. Jamais contentes consigo, olham para aquilo que ainda lhes falta a realizar. Medem desconsolados a distância entre o ideal sonhado e o pouco que conseguiram. Ansiosos de perfeição, jamais se orgulham: jamais consideram que qualquer aplauso seja merecido ... pois no realizado discernem a imperfeição e no que falta a realizar sentem a própria fraqueza. “Quod deest me torquet!” O que falta me atormenta! É a máxima de todos os que têm um ideal. O Pe. Sabóia, em meio a abrangentes ocupações, encontrava tempo para escrever. Aqui deu larga às suas preocupações no campo espiritual. Nesta meditação que tem o título do lema que elegeu para si e sua obra, acaba esboçando autêntico auto-retrato. ❒

1 Edição da Ação Social, São Paulo, 1957, p. 17. Obs.: 1 Há uma biografia do Pe. Sabóia, de autoria do Pe. José Coelho de Souza, S.J., Edições Loyola, São Paulo, 1980. 2 O Pe. Pedro A. Maia, S.J., em seu livro “Crônica dos Jesuítas no Brasil Centro-Leste”, Edições Loyola, São Paulo, 1991, p.78-80 resume os principais trabalhos do Pe. Sabóia. 3 O Prof. Ferreira Filho, no álbum comemorativo do cinqüentenário da FEI refere-se com detalhes ao seu trabalho, sobretudo na fundação e direção da FEI.

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COMEMORAÇÕES 2005

Renato Giacomini1

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Doutor em Engenharia Elétrica, Diretor do IPEI e Professor do Depto. de Engenharia Elétrica do Centro Universitário da FEI.

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Às vésperas de completar trinta anos de existência, o que ocorre no dia primeiro de março, o Instituto de Pesquisas e Estudos Industriais acompanha as transformações que a FEI, como um todo, vem atravessando. O primeiro passo nestas transformações foi a criação do Centro Universitário da FEI e sua consolidação como instituição de primeira linha de ensino superior em Engenharia, Computação e Administração. Como o objetivo da FEI é a criação de uma Universidade Tecnológica, que implica na existência de pesquisa nos moldes formais, com cursos de mestrado estabelecidos e recomendados, o passo seguinte foi a criação do curso de Mestrado em Engenharia Elétrica

e implantação da infra-estrutura necessária para isso. Claramente, a FEI caminha no sentido da valorização da pesquisa, da integração dos cursos e departamentos e da oferta à comunidade empresarial de profissionais e serviços mais qualificados. Nesse contexto, como parte do Centro Universitário, o IPEI deve estar preparado para ser um meio de ligação entre os cursos de graduação e pós-graduação strictu senso e o setor produtivo, através da prestação de serviços e do desenvolvimento e transferência de tecnologia. Neste sentido, deve atuar como entidade integradora, tanto dos esforços internos da FEI, buscando a atuação cooperativa dos departamentos do Centro Universitário, como dos esforços


conjuntos dos departamentos com o setor produtivo. Na verdade, o movimento do Instituto é de retomar sua essência original, em que os professores e alunos da FEI envolvem-se profundamente nas questões e problemas apresentados pela indústria nacional. A partir da incorporação do IPEI ao Centro Universitário, a Reitoria tem orientado o Instituto em sua reestruturação, sempre tendo em vista seu papel na futura Universidade. Um movimento importante foi a criação de um novo modelo de negócio, a ser utilizado em conjunto com os modelos já existentes. No novo modelo, propõe-se contato permanente com os Departamentos de Ensino, que indicarão linhas de atuação de seu interesse e proporão novos projetos. O IPEI identificará, então, empresas interessadas, possibilidade de apoio por órgãos de fomento e desenvolverá, em conjunto com os Departamentos, as propostas de projeto, a serem apresentadas aos financiadores e à Mantenedora, via Reitoria. A figura 1 representa esse novo modelo. Note-se que os recursos (equipamentos e pessoal) a serem utilizados não serão mais exclusivamente do IPEI, mas compartilhados com os Centros de Laboratórios didáticos, de forma coordenada com sua utilização em aulas. Essa integração proporcionará otimização de uso de todos os laboratórios, bem como de investimentos futuros em equipamentos e formação de pessoal. Também facilitará a transferência de conhecimento.

COMEMORAÇÕES 2005

Figura 1 – Novo Modelo

Para esse novo modelo, os mecanismos de controle dos projetos devem ser moldados às particularidades de cada projeto. Pretende-se que haja um docente vinculado ao IPEI para assumir a coordenação em cada caso. Uma possibilidade importante desse modelo é a contratação de pesquisadores em tempo integral pelo IPEI, com agregação ao corpo docente do Centro Universitário. Tais pesquisadores contribuem para o cômputo de Tempos Integrais exigidos pelo Ministério da Educação para a criação da Universidade e, ao mesmo tempo, podem ter seus custos patrocinados por empresas. Hoje o IPEI já possui cinco professores nestas condições, sendo três patrocinados por empresas.

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Naturalmente, é fundamental o envolvimento dos coordenadores de cursos e chefes de Departamentos de Ensino no processo de evolução do modelo. Esse processo deve ser gradual e atingir um estágio em que seja natural a participação dos chefes de departamentos, professores e alunos nos projetos e pesquisas do IPEI. Uma questão fundamental para um instituto de pesquisa é a revitalização das linhas de pesquisa. As linhas de pesquisa e desenvolvimento do IPEI, a serem desenvolvidas sempre em estrita colaboração com os departamentos, devem estar relacionadas a demandas de mercado e a políticas de estado, de forma que possam gerar receitas que custeiem os investimentos, a médio prazo. Foram implantadas, entre 2004 e o início de 2005, as seguintes novas linhas: ➠ Novos combustíveis. Este tema tem sido recursivamente objeto de editais de ação transversal da FINEP, sob demanda da Petrobrás, com interesse especial pelas tecnologias de uso do gás natural e biodiesel. Este último teve recente estudo concluído no Conselho de Altos Estudos e Avaliação Tecnológica da Câmara dos Deputados e, por ter cunho social, promete bastante apoio político. Esta linha relaciona-se diretamente com um dos cursos mais tradicionais e procurados da FEI, o de Mecânica Automobilística. Os novos equipamentos que estão sendo adquiridos a pedido do Departamento de Engenharia Mecânica vão incrementar a infra-estrutura da FEI na área. Para liderar os trabalhos nessa linha, foi contratado o engenheiro Eduardo Polati. Polati, que é Engenheiro Mecânico formado pela

Faculdade de Engenharia Industrial e graduado em Distillate Fuels pelo College of Petroleum and Energy Studies Oxford. Dedicado às atividades de pesquisa de combustíveis e lubrificantes especiais para competições, coordenou grupo de desenvolvimento de combustíveis, lubrificantes e serviços para a equipe Ferrari de Fórmula 1 e o desenvolvimento de procedimentos de testes em motores e veículos para a Shell Research Ltd e Shell Global Solutions. Como Gerente de Tecnologia para América Latina da Valvoline International, foi responsável pela implantação de sistema de qualidade, formulações, testes e aprovações de produtos junto a fabricantes. Como Consultor Especialista já desenvolveu trabalhos para CENPESPetrobrás, Grupo Ultrafertil, Kellogs, Petrobrás-RPBC, Dow Quimica, Hydro-Acro e outros. É Consultor honorário para Hilub Engenharia de Lubrificação. A busca por parceiros industriais nesta área iniciou-se com a visita do Reitor do Centro Universitário, do Diretor do IPEI, do Chefe de Departamento de Engenharia Mecânica, do Supervisor do Centro de Pesquisas Mecânicas e alguns professores à empresa MWM, cuja engenharia de desenvolvimento está alocada no Brasil e que mostrou-se bastante interessada na cooperação com a FEI. ➠ Tecnologia da Informação. Definido como tema central das políticas públicas, a tecnologia da informação é promissora no mercado de serviços. Amparada pela Lei de Informática, da qual a FEI é beneficiária, ela é, sem dúvida nenhuma, a que apresenta maior demanda do setor produtivo. Já estão sendo


implantados, a partir da negociação realizada até o início de 2004, com a Itautec-Philco, dois novos laboratórios de pesquisa em informática: o Laboratório de Usabilidade e o Laboratório de Tecnologia da Informação da FEI. Alguns profissionais contratados estão sendo integrados ao corpo docente da FEI e tem seus custos de salários cobertos pelo convênio. Também em TI, está sendo estudada uma associação com a UNISINOS, a UNICAP e o Instituto Europeu de Software – ESI , para oferecimento de serviços em qualidade de software. Adicionalmente, uma linha específica de análise de segurança de sistemas computacionais críticos está sendo criada, a partir de um acordo com a Alstom Transportes, multinacional francesa que domina o mercado nacional de sinalização metro-ferroviária. ➠ Engenharia de Produção. Esta linha foi criada para atuação relacionada às políticas públicas de apoio à pequena e média empresa. Para liderar a implantação, foi contratado em tempo parcial, o Professor Giorgio Chiesa, experiente profissional e pesquisador da área. Mesmo antes da implantação deste núcleo de Produção, a FEI, através do IPEI e com participação ativa do Departamento de Produção, conseguiu em outubro de 2004 ser selecionada em concorrência pela Agência de Desenvolvimento Econômico do Grande ABC, para fornecer serviço de consultoria a 50 empresas que formarão os Arranjos Produtivos Locais do ABC da indústria de autopeças e de ferramentaria. Foi realizado, no campus de São Bernardo, um evento que contou com a presença dos empresários, de representantes da Agência e do SEBRAE. A partir dessa reunião, alguns contratos de serviços já foram assinados. A partir desse movimento de transformação, espera-se para o ano em que se comemoram os 30 anos do Instituto, um fortalecimento da interação da FEI com a indústria, um maior envolvimento do corpo docente nestas atividades e a consolidação das novas linhas de pesquisa, para que o IPEI possa colocar-se, da forma mais efetiva possível, como

instrumento de integração e fortalecimento do papel da FEI na comunidade empresarial. ❒

COMEMORAÇÕES 2005

Reunião com empresários das APLs no campus SBC.

Novo Laboratório de Usabilidade – Espelho espião da sala de observação.

Novo laboratório de Tecnologia da Informação da FEI (IPEI), com 300 m2.

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CADERNOS DA FEI Publicação da Fundação Educacional Inaciana Pe. Sabóia de Medeiros, mantenedora do Centro Universitário da FEI e das instituições a ele associadas: IPEI, IRESI, IECAT e Escola Técnica São Francisco de Bórgia.

Presidente Pe. Theodoro Paulo Severino Peters, S.J. Coordenação Editorial Ayrton Novazzi Flavio Vieira de Souza Arte final, diagramação e fotolitos Cleonice Molina Matos Lilian Toshiko Leffer Silvana Vieira Mendes Arruda Fotos Jesus Perlop Matheus Fonseca

Editado no Centro Universitário da FEI, entidade filiada à

Associação Brasileira das Universidades Comunitárias Endereço para correspondência Av. Humberto de Alencar Castelo Branco, 3972 CEP 09850-901 – Bairro Assunção – S.B.Campo – SP E-mail: iresi_sbc@fei.edu.br

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