Conselho de participação e desenvolvimento da comunidade negra: 26 anos de história

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Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra

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Governo do Estado de São Paulo Alberto Goldman Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania Ricardo Dias Leme Secretaria de Economia e Planejamento Francisco Vidal Luna Fundação Prefeito Faria Lima - Cepam Nelson Hervey Costa

Coordenação-geral | Elisa Lucas Rodrigues Texto | Antonio Carlos Malachias e Rosangela Malachias Colaboração | José Eduardo Malheiros Jr.

Produção editorial | Gerência de Comunicação e Marketing do Cepam Editora | Adriana Caldas, MTB 23.878 Editoração de Texto e Revisão | Eva Celia Barbosa, Márcia Labres e Silvia Galles Direção de Arte | Michelle Nascimento Chefia de Arte | Carlos Papai Assistência de Arte | Janaína Alves Cruz da Silva Estagiária | Simone Midori Ishihara Tiragem | 1.500 exemplares


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são paulo, 2010


Fundação Prefeito Faria Lima – Cepam Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal Av. Professor Lineu Prestes, 913 – Cidade Universitária São Paulo/SP – CEP 05508-000 11 3811-0300 | Fax: 11 3813-5969 cepam@sp.gov.br | www.cepam.sp.gov.br Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra Pátio do Colégio, 148/184 – Centro São Paulo/SP – CEP 01016-040 11 3291-2600 www.comunidadenegra.sp.gov.br | cpdcn@conselhos.sp.gov.br


Apresentação É recente o reconhecimento da promoção da igualdade racial como objeto de intervenção governamental, apesar da centenária presença da temática racial no debate político nacional. Basta lembrar que o Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo, criado em 1984, no governo de Franco Montoro, é o primeiro órgão governamental surgido após 1888 e que inspirou a formação de outros conselhos, como os de Minas Gerais, Rio Grande do Sul e também da Fundação Palmares. No momento em que o debate sobre a questão racial ganha contornos mais abrangentes e que a importância e o entendimento de aspectos antes secularizados são fortalecidos, a Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania lança esta publicação, em que são relatadas todas as experiências e registrados os avanços promovidos pelo Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo. Com essa iniciativa, o conselho cumpre um dos principais objetivos dessa gestão, publicizando, principalmente, os heróis anônimos que tanto contribuíram para consolidar esse órgão como principal articulador das políticas públicas para a população negra paulista. O Estado de São Paulo, por meio de sucessivas administrações, desde o governo Franco Montoro, conta com grande empenho do Poder Público no sentido de criar as condições necessárias para que a população negra, com seus representantes organizados em conselhos, faça se representar e interferir na elaboração de políticas públicas. Isso só vem comprovar o forte compromisso com a democracia e justiça social dos governantes que estão à frente do principal Estado da nação.

Ricardo Dias Leme Secretário da Justiça e da Defesa da Cidadania


Sumário Apresentação Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo 9 Histórico da Criação

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No Coração da Cidade: Ativismo e Cultura Desafios e Políticas Públicas

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1988 – Ano da Constituição Cidadã e do Centenário da Abolição

Democratização do Brasil – Participação e Desenvolvimento Mercado de Trabalho Educação

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– Grupo de Trabalho para Assuntos Afro-brasileiros (Gtaab) – Caderno 63 – Raça Negra e Educação – Salve o 13 de Maio?

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A Internacionalização da Questão Racial 27 Direitos Humanos e Emancipação Cidadã 31 Reestruturação

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Direitos Humanos e a Questão Racial Quilombos em São Paulo

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Combate ao Racismo Institucional e Promoção da Igualdade 41 Programa Educando pela Diferença para a Igualdade Saúde da População Negra Empreendedorismo Negro

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Selo da Diversidade do Estado de São Paulo

Os Presidentes do Conselho 47

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O Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra (CPDCN) foi criado em 1984 como resposta governamental às lutas empreendidas por diversas organizações negras ao longo do século 20. Dentre os grupos em questão, destacam-se os reunidos em torno das publicações da Imprensa Negra Paulista (1915-1950); da Frente Negra Brasileira (FNB) (1930-1937); e do Teatro Experimental do Negro (TEN) (1944). Já na segunda metade do século 20 – também reivindicando emancipação democrática e direitos civis, econômicos, políticos e sociais –, destacam-se o Movimento Negro Unificado (MNU) e outras entidades que fazem parte da construção do contexto político de surgimento do CPDCN.

Entidades negras relevantes nos anos 1970 e 1980, período de surgimento do Conselho Casa de Cultura e Progresso (Cacupro), Casa da Mulher Negra de Santos, Centro de Cultura Afro-brasileira (Cecab), Centro de Cultura e Arte Negra (Cecan), Geledés – Instituto da Mulher Negra, Grupo Congada de São Carlos, Grupo de Teatro Evolução de Campinas, Grupo de Teatro Rebu de São Carlos, Grupo de Teatro Zumbi de Santos, Instituto do Negro Padre Batista (INPB), Nação Centro de Estudos e Resgate da Cultura Afro-brasileira (Cercab), Quilombhoje

Um pouco antes dessa segunda fase de surgimento de organizações negras, o País sofre o golpe militar de 1964, que instaura por 21 anos a ditadura militar. Esses acontecimentos dão início a


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um período de luta pela redemocratização do País – sobretudo após o ano de 1968, quando do recrudescimento do regime após o fechamento do Congresso Nacional e a edição do Ato Institucional 5 (AI-5)1. Movimentos sociais, lideranças religiosas de várias denominações, entidades estudantis e de trabalhadores de diferentes setores econômicos, grupos políticos progressistas somam-se à luta pela redemocratização, que começa a surtir efeito em meados dos anos 1970 e culmina com o fim da ditadura em 1985. No caso específico das entidades negras, a agenda era ainda mais ampla, por incluir também o combate ao racismo, ainda distante de ser reconhecido2 pela Nação como problema estrutural de produção e manutenção das desigualdades no País e instrumento perpetuador da violência contra os negros. Em 7 de julho de 1978, uma multidão formada por pessoas negras sai às ruas do centro de São Paulo e ocupa as escadarias do Teatro Municipal para protestar contra o assassinato do jovem negro Robson da Luz, morto por policiais e, portanto, pelo Estado brasileiro. Os participantes repudiam também a discriminação racial contra quatro jovens negros, atletas de voleibol vinculados ao Clube de Regatas Tietê, impedidos de frequentar a piscina do próprio clube em que treinavam. O ato dá início a uma nova fase na luta de combate ao racismo no Brasil e motiva a fundação da entidade política nacional denominada Movimento Negro Unificado contra a Discriminação Racial e Violência Policial (MNUCDRVP).

1 Em 13 de dezembro de 1968, foi editado o Ato Institucional 5, acompanhado do Ato Complementar 38. Por esses instrumentos, o Presidente da República obteve o direito de interferir nos outros Poderes da República (Legislativo e Judiciário), além de intervir nos Estados e municípios sem as limitações previstas na Constituição. O Congresso Nacional foi fechado. Instaurou-se o que passou a ser conhecido na História como golpe dentro do golpe – inauguraram-se os Anos de Chumbo. 2 Somente em 1995, durante as celebrações do tricentenário do líder negro Zumbi dos Palmares, o então Presidente da República Fernando Henrique Cardoso discursa reconhecendo publicamente a dívida da nação brasileira para com a população afrodescendente. (Ver gestão de Antonio Carlos Arruda da Silva.)

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O MNUCDRVP reduziria, depois, seu nome para Movimento Negro Unificado (MNU) e alguns de seus fundadores despontam como personagens3 relevantes dos acontecimentos que culminaram com a criação do Conselho da Comunidade Negra. O ano de 1979 também torna-se emblemático. Em 28 de agosto, a Lei 6.683 é sancionada, concedendo anistia aos cassados pelo regime militar e aos integrantes do governo acusados de tortura. No dia 22 de novembro, foi aprovada a lei da reforma política, que restabelece o pluripartidarismo.

Histórico da Criação No ano de 1982, ocorre a primeira eleição direta para governador de Estado desde o golpe militar. Em 1983, o governador eleito por São Paulo, Franco Montoro, cria o Conselho Estadual da Condição Feminina (CECF)4, destinado a promover políticas públicas de gênero. A criação representa, naquele momento, uma inovação, pois pela primeira vez um órgão governamental era composto com os objetivos explícitos de combater as desigualdades de tratamento e de acesso às oportunidades existentes entre homens e mulheres, além de formular e promover políticas públicas em prol da participação e do desenvolvimento delas. Em 1984, lideranças negras, inspiradas com a criação do CECF e convictas da necessidade iminente de ações de combate ao racismo (cada vez mais explícito nos atos de violência policial e de discriminação racial no acesso ao mercado de trabalho), reivindicam a criação do CPDCN. Coube às lideranças e entidades negras a indicação da presidência e a escolha do nome, que passou a incluir as palavras Participação e Desenvolvimento, indicando as diretrizes, atribuições, características e os objetivos do CPDCN, ou seja, ampliar a participação democrática e promover o desenvolvimento da população negra numa sociedade dominada pelo autoritarismo e pelas práticas individuais e institucionais de discriminação racial. 3 Ver: SANTOS, Ivair Augusto Alves dos. O movimento negro e o estado. 1983-1987. O caso do conselho de participação e desenvolvimento da comunidade negra no governo de São Paulo. Tese (Mestrado)- Unicamp, 2001. 4 O Conselho Estadual da Condição Feminina foi criado pelo Decreto 20.892, de 4 de abril de 1983, e institucionalizado pela Lei 5.447, de 1o de dezembro de 1986. Assim como o Conselho da Comunidade Negra, é composto por representantes da sociedade civil e do Poder Público e responsável pela formulação e acompanhamento das políticas públicas dos direitos da mulher.

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O CPDCN foi o primeiro órgão governamental criado no País com a finalidade de combater o racismo e promover o desenvolvimento da população negra, articulando a política governamental às ações, reivindicações e à agenda político-social da população em geral e da comunidade negra em particular. A vocação democrática do CPDCN expressa-se na composição dos seus 32 membros-conselheiros, dos quais dez são representantes das secretarias de Estado, indicados pelo governo em exercício, e os outros 22 são representantes da sociedade civil, indivíduos com participação em associações comunitárias, Organizações não Governamentais (ONGs), núcleos de estudos e pesquisas, lideranças sociais e intelectuais, todos com reconhecidos trabalhos realizados em prol da igualdade. Ao longo de sua atuação, o CPDCN esteve na vanguarda das ações participativas e emancipatórias, constituindo-se em órgão de referência organizativa e representativa de muitas entidades negras, como o Coletivo de Advogados Negros do Estado de São Paulo; o Centro de Estudos das Relações de Trabalho e Desigualdades (Ceert); o Nação Centro de Estudos e Resgate da Cultura Afro-brasileira (Cercab); o Coletivos de Empresários e Empreendedores Afro-brasileiros (Ceabra), entre outras importantes agremiações e ONGs. No âmbito público, o CPDCN inspirou e assessorou consultivamente o governo federal na criação da Fundação Cultural Palmares, em 1988, e do Grupo de Trabalho Interministerial para Valorização da População Negra (GTIVPN), em 1995, que teve papel relevante para a redação do Plano Nacional dos Direitos Humanos (PNDH), principalmente no tocante às políticas afirmativas direcionadas às populações historicamente excluídas (indígenas, negros, mulheres).

No Coração da Cidade: Ativismo e Cultura Durante os seus 26 anos de atuação, o Conselho da Comunidade Negra sempre esteve sediado na Rua Antonio de Godoy, 122, 9o andar, no centro de São Paulo. Coincidentemente, tem como vizinhas duas igrejas seculares que, além de comporem um belo conjunto arquitetônico, foram erigidas para atender escravizados, negros forros (que obtinham sua liberdade com a carta de alforria) e nascidos livres.

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A apenas uma quadra do CPDCN, no Largo do Paissandu, está a Igreja do Rosário dos Homens Pretos, cuja irmandade, fundada em 1711, completará 300 anos em 2011. Em frente à sede do Conselho, no Largo Santa Ifigênia, outra igreja registra a história dos negros de São Paulo, tendo como padroeira uma santa africana, a etíope devota de São Mateus, Ifigênia, que carrega, em suas mãos, uma casa que simboliza sua proteção aos sem-teto. A sede do Conselho da Comunidade Negra está próxima à Rua Xavier de Toledo, onde, na década de 1970, a juventude negra de São Paulo divulgava seus bailes black, panfletando e vendendo convites. Esses mesmos jovens tornaram-se protagonistas do épico movimento que tomou as escadarias do Teatro Municipal, marco inicial do denominado movimento negro contemporâneo. Nos anos 1980, a juventude negra fica ainda mais perto do Conselho e agita a estação São Bento do metrô paulistano, exibindo piruetas e passos geometricamente marcados e sincronizados pelas letras do rap e pelo break dance. Como esquecer a Galeria da 24 de Maio? Ainda hoje congrega jovens de diferentes tendências musicais, que se encontram nas lojas e nos salões de beleza especializados em cabelos crespos, nos quais o visual passa de um estilo a outro: do liso a tranças e frisos; dos cabelos esculpidos e desenhados ao penteado african american style; do corte radical ao estilo pagodeiro. A comunidade negra é plural: jovem, adulta, idosa; católica, umbandista, muçulmana, evangélica, candomblecista; partícipe de escolas de samba, das entidades do movimento negro, de partidos políticos. São pessoas da capital, residentes nos diferentes bairros – da Serra da Cantareira (zona norte) ao Capão Redondo (zona sul); da Cidade Tiradentes (zona leste) ao Pico do Jaraguá (zona oeste); das cidades interioranas, de outros Estados brasileiros e também de outros países. Todos têm em comum a ancestralidade africana e o fato de compor o grupo etnicorracial que está, segundo índices oficiais e pesquisas acadêmicas, entre o mais vulnerável à exclusão do sistema educacional e, consequentemente, do mercado de trabalho, sendo vítima preferencial da violência policial e da mortalidade juvenil.

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O Conselho da Comunidade Negra tornou-se o ponto de encontro e de referência das ações de cidadania protagonizadas por esses(as) afro-brasileiros(as), mulheres e homens negros(as) institucionalmente organizados(as) em entidades do Movimento Negro e/ou como indivíduos conscientes ou não de seus direitos à igualdade. Desde então, o CPDCN tem se notabilizado por realizar inúmeros encontros, reuniões, seminários – estaduais, regionais, municipais e internacionais – com o firme propósito de combater o racismo, as discriminações, o preconceito, a xenofobia e intolerância correlatas, objetivando a equidade e a promoção da igualdade racial e justiça social.

Desafios e Políticas Públicas Durante 26 anos, as prioridades de cada presidência do CPDCN nem sempre coincidiram, embora tivessem em comum o desafio de introduzir temas difíceis como racismo, preconceito, discriminação e desigualdades nas esferas do governo e da sociedade. Hélio Santos foi o primeiro presidente, empossado na administração do governador André Franco Montoro (1983 a 1986); Ivair Augusto Alves dos Santos, seu vice-presidente e também vice durante o início da gestão de Eduardo Joaquim de Oliveira, foi gestor do CPDCN durante os governos de Orestes Quércia (1987-1990) e Antônio Fleury Filho (1991-1994). O vice-presidente Ivair Augusto Alves dos Santos tornou-se o articulador político para a criação do CPDCN e das políticas públicas elaboradas pelo órgão.

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Ivair Augusto Alves dos Santos é doutor em Sociologia pela Universidade de Brasília (2009), mestre em Ciência Política pela Universidade Estadual de Campinas (1991), assessor especial da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República e secretário executivo do Conselho Nacional de Combate ao Racismo. Possui graduação em Química pela Universidade Federal de São Carlos (1975). Atualmente, é voluntário da Universidade de Brasília. Tem experiência na área de Sociologia, com ênfase em Sociologia e Direitos Humanos, Direitos Humanos e Antirracismo, Políticas Públicas para a População Negra, Ação Afirmativa. Foi membro fundador, conselheiro e vice-presidente do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra.

Antonio Carlos Arruda preside o CPDCN no período administrado por Mário Covas (1995-1998), permanecendo no cargo quando o vice-governador Geraldo Alckmin assumiu o governo (2001-2002), após o falecimento do titular. Ao ser reeleito (2003-2006), o governador Alckmin empossa Elisa Lucas Rodrigues, presidenta reeleita no governo José Serra (2007-2010).

1988 – Ano da Constituição Cidadã e do Centenário da Abolição O histórico do CPDCN evidencia que, em sua primeira fase, as reivindicações dos movimentos negros caminham paralela e transversalmente à luta pela democratização do País, que, na perspectiva da população afrodescendente, incluía denunciar a falácia da democracia racial brasileira. O ano do centenário da abolição da escravatura, 1988, marca a mobilização empreendida pelas mulheres negras integrantes do Movimento de Mulheres e do Movimento Feminista. Após se sentirem preteridas da pauta principal do IX Encontro Nacional Feminista, realizado na cidade de

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Garanhuns (PE), as mulheres negras decidem organizar um movimento próprio, visto que as questões alusivas às desigualdades etnicorraciais e às subjetividades do preconceito e do racismo não foram inseridas no plano de discussões definido pelas mulheres brancas. Naquele mesmo ano, em Valença (BA), acontece o 1o Encontro Nacional de Mulheres Negras, que reúne 450 participantes e delibera pela organização de entidades específicas.5 A nova Carta Magna brasileira, também chamada de Constituição Cidadã, foi promulgada em 1988, 24 anos após o longínquo março de 1964, início da ditadura. Segundo Farah (2001)6, a era dos militares foi marcada pela centralização, pelo corporativismo e assistencialismo. No período, a gestão das políticas sociais obedecia a “uma lógica financeira de segmentação do atendimento e de exclusão de amplos contingentes da população do acesso aos serviços públicos”. Com a organização dos movimentos sociais, enfatiza-se a “democratização dos processos decisórios e dos resultados das políticas públicas, reivindicando a ampliação do leque de atores envolvidos nas decisões e a inclusão de novos segmentos da população brasileira entre os beneficiários das políticas públicas” (FARAH, 2001, p. 50). Seguindo o exemplo de São Paulo, o governo federal cria, em 1988, a Fundação Cultural Palmares, instituição vinculada ao Ministério da Cultura, para formular e introduzir políticas públicas e potencializar a participação da população negra brasileira no processo de desenvolvimento. Para tanto, procura e recebe apoio técnico do CPDCN.

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Em 1986, juntamente com outras lideranças, a conselheira do CPDCN, Vilma Lúcia Rodrigues, organiza o 1o Encontro de Mulheres Negras de São Paulo.

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FARAH, Marta Ferreira Santos. Gênero e políticas públicas. Estudos Feministas, 12 (1): 47-71, Florianópolis, jan./abr. 2001.




Democratização do Brasil – Participação e Desenvolvimento

A gestão de Hélio Santos (1984 a 1986), primeiro presidente do CPDCN, inaugura uma fase inédita na história das relações raciais no Brasil, em decorrência de o conselho ser o primeiro órgão governamental do Brasil, com foco na elaboração de políticas públicas destinadas à população negra. É presidido pela sociedade civil, mas tem competência governamental para articular propositivamente ações de governo e da sociedade civil orientadas para o combate ao racismo e promotoras do desenvolvimento e da participação da população negra.

O mais importante é deixar claro que o CPDCN não caiu do céu. Havia todo um ambiente construído no sentido de o Estado se posicionar frente à subcidadania do negro. Isso se daria 96 anos após 13 de maio de 1888. O CPDCN quebra esse silêncio de quase um século. Esta a sua importância estratégica para tudo o que se conquistou depois no Brasil no campo racial. Hélio Santos

Para Santos, sua gestão notabilizou-se pelo pioneirismo das ações, pois “não havia um modelo anterior para se levar em conta”. Portanto, um dos desafios era “efetivar a participação do Estado em atendimento às ideias e iniciativas que jamais haviam sido feitas”, o que, de certo modo, foi alcançado rapidamente, ainda que esse desafio esteja permanentemente em curso e em renovação.


Democratização do Brasil - Participação e Desenvolvimento

Já o segundo desafio até hoje não foi superado e consiste em combater e acabar com o racismo institucional contido nas esferas pública e privada da sociedade brasileira. Para obter êxito, essa gestão mobilizou-se por dotar o CPDCN de um quadro técnico competente, recrutado ora por meio de comissionamentos no âmbito das autarquias e secretarias de governo, ora pelo voluntarismo ativista, advindo das organizações negras detentoras de conhecimento sobre relações raciais em diferentes áreas, como comunicação, saúde, direito, etc. Contudo, foram as áreas de trabalho e educação que mais avançaram em proposições, produtos e resultados. O mencionado “voluntarismo ativista” fez Vilma Lúcia de Oliveira ser lembrada por Hélio Santos como uma das conselheiras mais atuantes.

É fundamental transversalizar as atividades. Não adianta apenas vontade política e recurso financeiro. São fundamentais ideias, modelos de gestão, definição de políticas que têm de ser avaliadas e monitoradas. Hélio Santos

Vilma Lúcia de Oliveira foi conselheira da sociedade civil na gestão Hélio Santos. Organizou, em 1986, o 1o Encontro de Mulheres Negras de São Paulo. Membro do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) e também militante do Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), trabalhou intensamente para a criação do CPDCN. Segundo o vice-presidente Ivair Augusto Alves dos Santos, Vilma Lúcia “ampliou as alianças da esquerda no PMDB”.

Hélio Santos relata que essa preocupação com a competência técnica decorre da mobilização política que envolveu a criação do CPDCN.

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Em torno da candidatura de Franco Montoro organizou-se um forte grupo negro em apoio à sua campanha. Em um encontro histórico ocorrido na Rua Madre Theodora, nos Jardins, cerca de 300 pessoas, num domingo, se encontraram com o candidato. Resumindo: havia uma pauta do movimento negro próximo ao MDB naquela eleição. Houve participação ativa de muitos militantes. Lembrar nomes não me parece adequado porque houve muita gente anônima importante. Hélio Santos

Dentre as ações pioneiras mais relevantes na gestão de Hélio Santos destacam-se: • A questão negra na escola pública. A atuação de Rachel de Oliveira na Secretaria de Educação, juntamente com a pesquisa da Fundação Carlos Chagas.

Rachel de Oliveira é professora doutora no Laboratório de Estudos e Pesquisas para a Educação das Relações Etnicorraciais da Universidade Estadual Santa Cruz, em Ilhéus (BA). Foi conselheira governamental na gestão de Hélio Santos; idealizadora e coordenadora do Grupo de Trabalho para Assuntos Afro-brasileiros (Gtaab) e de projetos de educação desenvolvidos no CPDCN.

• Trabalho com as centrais sindicais sobre a mão de obra negra, com Cida Bento7 e Hédio Silva Júnior8. A partir daí, a questão racial passou a compor a pauta sindical. • Interiorização do trabalho do CPDCN para Araçatuba, Bauru, Campinas, Limeira, Lins, Marília, Ribeirão Preto, Rio Claro, Santos, Sorocaba e outras cidades do Estado de São Paulo. 7

Maria Aparecida Silva Bento é diretora executiva do Centro de Estudos das Relações do Trabalho e Desigualdades (Ceert).

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Ex-secretário de Justiça do Estado de São Paulo e diretor executivo do Ceert.

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• Trabalho feito por Antônio Carlos Arruda da Silva, com o grupo de advogados negros, que se tornou um modelo para que Maria da Penha Lopes Guimarães9, em seguida, criasse o primeiro grupo de advogados negros na OAB do País. • Edição do jornal do CPDCN, com cerca de 500 mil exemplares, distribuídos em todo o País. • Início do trabalho sobre a formação dos policiais militares e civis e sobre a violência policial. • Criação de quatro conselhos estaduais: na Bahia, no Mato Grosso do Sul, em Minas Gerais e no Rio Grande do Sul. Nesses Estados, a atuação do presidente do CPDCN foi pessoal.

Mercado de Trabalho O Seminário sobre Discriminação Racial no Trabalho foi o primeiro evento organizado pelo Conselho da Comunidade Negra logo após a sua criação.10 Dentre as resoluções finais do seminário, realizado no Sindicato dos Metalúrgicos de São Paulo, estavam a criação, no Conselho, de uma Comissão das Relações do Trabalho formada por profissionais e especialistas; a realização de seminários e cursos sobre o tema, a fim de ampliar o conhecimento do problema e as possíveis soluções; implementação de ações conjuntas entre o CPDCN, a Secretaria de Estado das Relações do Trabalho e os sindicatos e as organizações do movimento negro. A comissão foi também responsável pela elaboração e lançamento da publicação O Lugar do Negro na Força de Trabalho (1985), tendo como parceiros a Fundação Seade e o Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese). 9 Advogada, membro da coordenação do Instituto do Negro Padre Batista (INPB). Maria da Penha foi uma das fundadoras da Comissão do Negro da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-SP). 10

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O seminário aconteceu de 30 de novembro a 1o de dezembro de 1984.


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Educação Grupo de Trabalho para Assuntos Afro-brasileiros (Gtaab) Educação sem racismo sempre foi uma das metas prioritárias do Conselho da Comunidade Negra. Nesse sentido, a criação do Gtaab foi uma vitória inclusive para a população negra. Pensado para oferecer instrumentos reflexivos e didáticos aos profissionais da educação e sensibilizar a sociedade, o Gtaab chega a ter 15 pessoas coordenadas por Rachel de Oliveira, então conselheira governamental, representante da Secretaria da Educação (SE). O tema aglutina pessoas negras e brancas, profissionais da educação, leigos e comunidade. A crítica ao eurocentrismo e aos estereótipos vigentes na educação formal era, acima de tudo, propositiva, e o período histórico, 1986, obrigava o questionamento sobre o real significado do centenário da abolição, a ser celebrado em 1988, para a tomada de consciência da relevância do currículo na perpetuação das desigualdades educacionais. O trabalho sistemático realizado pelo Gtaab em inúmeras reuniões, seminários e estudos contribui para a publicação, pela SE, da Resolução 95, de 30 de abril de 1986. O documento dispõe que a data 13 de maio, Dia da Abolição da Escravatura, se tornaria no calendário escolar o Dia de Debate e de Denúncia contra o Racismo. Essa decisão reafirma historicamente o ativismo social negro, reconhecido pelo governo no próprio texto da Resolução 95/1986, item “c”, que considerou “a necessidade de incorporar nas atividades da SE os anseios da comunidade negra e as sugestões do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra”.

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Democratização do Brasil - Participação e Desenvolvimento

Caderno 63 – Raça Negra e Educação Outra parceria relevante ocorre com a Fundação Carlos Chagas, no período 1986-87, para a publicação de estudos de especialistas acadêmicos sobre a temática das relações raciais na sociedade brasileira, com ênfase no sistema educacional. O Caderno 63 – Raça Negra e Educação torna-se divisor de águas no campo da pesquisa, por apresentar dados quantitativos e qualitativos sobre o sistema público de ensino e vários artigos inovadores. Uma das mais impactantes constatações dessa publicação aparece no artigo da professora doutora Fúlvia Rosemberg sobre o alunado negro na escola pública. Rosemberg conclui ocorrer uma expulsão sistemática da criança negra da escola, motivada por diferentes razões, como o preconceito e a discriminação inerentes ao currículo (alheio à realidade de vida das crianças negras e pobres). A necessidade de trabalhar fora para auxiliar a renda familiar foi outro indicador levantado e, apesar das dificuldades, constata-se a persistência da criança negra em permanecer na escola, um fato evidenciado pela constante tentativa de retorno às aulas, após abandonos anteriores, que redundam na defasagem entre a idade do aluno e a série cursada, bem como no seu nível de aprendizado. Em contrapartida, demonstrando resistências elaboradas pela própria comunidade negra, apesar da preocupação de como inserir no sistema educacional e currículo novos olhares sobre a história e cultura brasileiras, o texto da pesquisadora Petronilha Beatriz Gonçalves apresenta experiências educacionais alternativas para o País propostas por lideranças e associações negras. É interessante notar que, 17 anos mais tarde, a professora Petronilha torna-se conselheira do Conselho Nacional de Educação (CNE) e uma das redatoras das Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino das Relações Etnicorraciais (2004), orientadoras da Lei 10.639/2003, que alterou o artigo 26-A da Lei 9.394/1996, de Diretrizes e Bases da Educação (LDB), mantendo a sua conduta acadêmica teórico-propositiva.

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Salve o 13 de Maio? A questão era apropriada para o momento e deu nome a um projeto educacional que envolveu as seguintes fases: (1) Programa transmitido pela Rádio e TV Cultura (RTC) intitulado O Papel da Escola na Erradicação do Preconceito Racial (transmitido em 6 de maio de 1986); (2) Mesa-redonda intitulada A Discriminação Racial na Educação e no Trabalho e exibição do vídeo O Negro no Mercado de Trabalho, na sede da Secretaria de Estado da Educação, em São Paulo, no dia 12 de maio de 1986; (3) De 13 de maio a 6 de junho de 1986, realização de atividades didático-pedagógicas nas escolas públicas, a partir da leitura do texto Salve o 13 de Maio?. Tais atividades tinham por temas o sistema escravista, as condições de vida dos escravizados, resistências, a participação africana e afro-brasileira na construção do País, entre outros. Em 1988, já na gestão do novo presidente, Eduardo Joaquim de Oliveira, o Gtaab e a Comissão contra a Discriminação do próprio conselho elaboram a revista Salve o 13 de Maio?. A publicação foi um sucesso e transformou-se em referência obrigatória dos estudos sobre o tema Negro e Educação no País. A coletânea de textos, majoritariamente escritos por ativistas e intelectuais negros(as), apresenta eventos históricos e manifestações de resistência negra nos campos da cultura, artes, academia e ciência, visando a instrumentalizar professoras(es) dispostas(os) a inserilos em suas aulas. A publicação comprova, ainda hoje, a ocorrência no País de uma história oficialmente negada e omitida dos livros didáticos.

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A Internacionalização da Questão Racial

A gestão de Eduardo Joaquim de Oliveira (1987 a 1994) notabilizou-se, segundo suas próprias palavras, por três grandes ações: • A continuidade nos avanços promovidos pela área de educação na gestão do seu antecessor, Hélio Santos. Essa ação alcançou repercussão nacional, inclusive preenchendo certa lacuna de publicações, artigos e metodologias sobre a temática etnicorracial existentes na época. • A articulação entre as Secretarias da Justiça e da Segurança Pública com governos, sociedade civil representada pelas comunidades negra, judaica e associação dos nordestinos para assessorar a criação da Delegacia de Crimes Raciais, outra realização de repercussão nacional, inspiradora de órgãos similares formados em outros Estados brasileiros. • A internacionalização de ações do Conselho por meio de intercâmbio com o governo dos Estados Unidos da América (EUA), além de efetivar a vinda a São Paulo do líder do Congresso Nacional Africano, Nelson Mandela, em visita pelo Brasil.

O Itamarati já havia fechado a programação e o dr. Nelson Mandela chegaria pelo Rio de Janeiro (...) iria para Brasília, seria recebido pelo presidente da época e tomaria o destino da Bahia, sem passar por São Paulo. Aí houve uma interferência da nossa parte (...) fui ao Palácio dos Bandeirantes (...) expliquei o que estava acontecendo (...) o governo do Estado apoiou nosso desejo de trazê-lo para São Paulo.


A Internacionalização da Questão Racial

(...) dias depois embarquei para a África do Sul e, lá, fui recebido na sede do Congresso Nacional Africano, onde enfatizei a importância econômica e política do Estado de São Paulo destacando também o fato do nosso Estado concentrar, em números absolutos, a maior população negra do País. Sensibilizada pelos nossos argumentos e esforços, a direção do CNA ligou para a Embaixada do Brasil e o dr. Walter Suzu fez a solicitação para que o embaixador brasileiro incluísse São Paulo entre as cidades visitadas pelo senhor Nelson Mandela. Eduardo Joaquim de Oliveira

Vale lembrar que, nos anos 1990, Nelson Mandela era o principal nome internacional na luta contra o racismo, pois, ao ser libertado do cativeiro, reconduziu o processo que colocou fim ao regime do apartheid na África do Sul. Em 1992, ano em que visitou o Brasil, as leis segregacionistas foram, finalmente, abolidas, com a sua participação decisiva e o apoio do então presidente da África do Sul, Frederik de Klerk. Em 1993, Mandela e de Klerk dividem o Prêmio Nobel da Paz e as primeiras eleições multirraciais da África do Sul acontecem em clima de paz. A vitória eleitoral de Nelson Mandela expurga as práticas racistas do Estado sul-africano e lhe rende amplo reconhecimento internacional. Afora os esforços para a vinda de Nelson Mandela, a gestão de Eduardo Joaquim de Oliveira desenvolve outras importantes ações, como a manutenção do Grupo de Trabalho (GT) de Saúde, herdado da gestão anterior; a apresentação, feita pelo conselheiro e medalhista Ademar Ferreira da Silva, de propostas para a área de esportes; a continuidade dos avanços obtidos na área do trabalho.

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Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra 26 Anos de História

Ademar Ferreira da Silva, paulistano da Casa Verde, (29/9/1927 – 12/1/2001). Bicampeão olímpico de salto triplo, recordista sul-americano e mundial. Medalha de ouro nas Olimpíadas de Helsinque, na Finlândia, em 1952, e em Melbourne, na Austrália em 1956. Formado em Educação Física, Direito e Relações Públicas. Entre 1964 e 1967 é adido cultural na Embaixada Brasileira em Lagos, na Nigéria. Conselheiro na gestão de Eduardo Joaquim de Oliveira, atua nas áreas de esporte e juventude.

Theresa Santos, carnavalesca, publicitária, atriz, autora e diretora de teatro, professora. Participou dos movimentos estudantil e político no Brasil. Esteve exilada em países africanos, onde lutou pela independência. Ativista do movimento negro e de mulheres, foi assessora na Secretaria da Cultura do Estado de São Paulo e idealizadora do evento cultural Kizomba, que reuniu em São Paulo importantes nomes da cultura negra internacional durante as celebrações do centenário da abolição. Foi conselheira governamental durante cinco gestões no CPDCN, desde sua criação.

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Direitos Humanos e Emancipação Cidadã

A Conferência ECO-92, acontecida no Rio de Janeiro, é o evento internacional que abre a nova década, contextualizando a questão ambiental e os novos aspectos de inserção dos Direitos Humanos. Em 1994, o Movimento de Mulheres participa da Conferência de População organizada pelas Nações Unidas na cidade do Cairo, Egito. Em 1995, acrescido pela presença das Mulheres Negras, o Movimento de Mulheres segue para Pequim, China, para participar da Conferência da Mulher. Nos dois eventos, as reivindicações giram em torno dos seus direitos sexuais e reprodutivos. O ano de 1995 também marca o tricentenário de Zumbi dos Palmares. Se o 13 de Maio não servia mais como data celebrativa e sim de denúncia e reflexão sobre o racismo, o 20 de Novembro ganha relevância legitimada pelo ativismo, tornando-se o Dia Nacional da Consciência Negra11. As entidades do Movimento Negro de todo o País articulam manifestações comemorativas dos 300 anos da “imortalidade”12 do líder quilombola Zumbi dos Palmares. A mais significativa delas foi a Marcha a Brasília. Empreendida em 20 de novembro de 1995, durante as festividades oficiais do tricentenário, 20 mil pessoas oriundas de todo o País entregam ao então Presidente da República, Fernando Henrique Cardoso, uma pauta de reivindicações que começaram a ser consideradas um ano depois, quando o governo federal edita o Programa Nacional dos Direitos Humanos, em 1996. O Presidente Fernando Henrique, como ocorrera em 1984 com o governador paulista Franco Montoro, também reconhece oficialmente a existência de racismo no Brasil.

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O poeta gaúcho Oliveira Silveira (1941-2009) foi o idealizador do Dia da Consciência Negra – 20 de novembro. A data começou a ser comemorada em 1971, com o Grupo Palmares, em Porto Alegre.

12

O líder quilombola Zumbi dos Palmares foi assassinado por Domingos Jorge Velho, em 20 de novembro de 1695, na Serra da Barriga, atual Alagoas. O ativismo social optou por utilizar a palavra “imortalidade” em vez de “morte” para evidenciar que o Quilombo dos Palmares continua vivo na história, como espaço de resistência negra ao escravismo.


Direitos Humanos e Emancipação Cidadã

Reestruturação O advogado Antonio Carlos Arruda da Silva, antigo ativista parceiro de Hélio Santos e de Ivair Augusto Alves dos Santos na articulação política que desencadeou a criação do Conselho, recebe o convite para presidir o Conselho da Comunidade Negra em 1995, quando Mário Covas assume o governo de São Paulo. Recémegresso de uma pós-graduação na Universidade do Texas, nos Estados Unidos, Arruda aceita o desafio. Novos conselhos são criados pelo governo, porém a sua vinculação institucional é alterada. O CPDCN, inicialmente ligado ao Palácio do Governo, especificamente à Casa Civil, passa a ter vínculo institucional com a Secretaria de Governo e Gestão Estratégica. Anos mais tarde, o então governador José Serra cria a Secretaria das Relações Institucionais (2006) e transfere para essa nova pasta a gerência dos conselhos. Hoje, o CPDCN está vinculado à Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania. Arruda inicia a reestruturação do espaço físico, assim como o restauro de suas instalações e a aquisição de equipamentos (computadores e impressoras). Em relação ao seu funcionamento político, empreende a estratégia de ampliar e expandir o número de conselhos municipais pelo Estado, oferecendo assessoria para tais criações. Essa estratégia pensada por Arruda (e equipe de novos conselheiros) possibilita sua atuação junto com os governos municipais e a sociedade civil, revigorando, em algumas cidades, entidades, agremiações esportivas e culturais, grupos de estudos, clubes de negros e outras formas de resistência e organizações étnicas. Ao constatar que “nem todos(as) os(as) conselheiros(as) – governamentais e da sociedade civil – eram realmente compromissados com o órgão”, Arruda inicia um difícil mas bem-sucedido processo de mudança.

Havia pessoas indicadas pelas secretarias de governo apenas para atender às regras de funcionamento do Conselho; outras ocupavam a função por status. Antonio Carlos Arruda da Silva

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Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra 26 Anos de História

Arruda narra que o início de sua gestão foi um “período difícil”. Buscou o apoio da Secretaria de Governo e Gestão Estratégica, “a princípio reticente”, e passou a empreender viagens ao interior do Estado para reapresentar o CPDCN e ampliar a representatividade das organizações do Movimento Negro. Simultaneamente, iniciou um “cadastramento e banco de dados reunindo indivíduos e organizações”, dando visibilidade a um empreendedorismo econômico de diferentes níveis: empreendedores(as) informais, formais; pequenas, médias e grandes empresas; profissionais liberais e autônomos engrossaram a chamada “lista negra” composta em sua gestão. Faz visitas constantes às secretarias de governo para solicitar a renovação das indicações dos(as) conselheiros(as). “Quase sempre eu era recebido por um assessor, nunca pelo secretário”, recorda. Porém, sua persistência rendeu frutos. Organizações e lideranças dos municípios de São Paulo voltaram a buscar a parceria do CPDCN para a realização de eventos e políticas públicas locais; os secretários de governo atenderam à solicitação para indicar funcionários(as) interessados(as) em assumir o trabalho (não remunerado) de conselheiros(as).

Direitos Humanos e a Questão Racial O Estado de São Paulo inova ao elaborar, no final dos anos 1990 e início do novo milênio, o seu Programa Estadual de Direitos Humanos (PEDH), que prevê políticas afirmativas e de promoção da igualdade racial. A revisão da gestão de Antonio Carlos Arruda da Silva demanda, portanto, a consideração do impacto que o Decreto 42.209 – assinado por Mário Covas em 15 de setembro de 1997 e que lança o Programa Estadual de Direitos Humanos – causa nas ações que passam a ser empreendidas no e pelo CPDCN. Assim como o Programa Nacional, assinado pelo então Presidente Fernando Henrique Cardoso, o Programa Estadual comprometia-se a promover ações de valorização e defesa dos Direitos Humanos em São Paulo. Os itens 7 e seguintes do Programa Estadual referentes à população negra ampliam e fortalecem as atribuições do CPDCN ao se comprometer a:

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Direitos Humanos e Emancipação Cidadã

(...) 7. População Negra 7.1 Apoiar o Conselho Estadual da Comunidade Negra e incentivar a criação de conselhos municipais da comunidade negra. 7.2 Promover o acesso da população negra ao mercado de trabalho e ao serviço público, por meio da adoção de ações afirmativas e programas para profissionalização, treinamento e reciclagem dirigidos à população negra. 7.3 Divulgar as convenções internacionais, os dispositivos da Constituição Federal e a legislação infraconstitucional que tratem da discriminação racial. 7.4 Revogar normas discriminatórias ainda existentes na legislação infraconstitucional e aperfeiçoar normas de combate à discriminação racial. 7.5 Apoiar políticas que promovam a comunidade negra econômica, social e politicamente. 7.6 Desenvolver ações afirmativas para ampliar o acesso e permanência da população negra na rede pública e particular de ensino, notadamente em cursos profissionalizantes e universidades. 7.7 Desenvolver campanhas de combate à discriminação racial e valorização da pluralidade étnica do Brasil. 7.8 Implementar a Convenção sobre a Eliminação da Discriminação Racial no Ensino.

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Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra 26 Anos de História

7.9 Incluir no currículo de 1o e 2o graus a história e a cultura da comunidade negra no Brasil. 7.10 Desenvolver programas que assegurem a igualdade de oportunidade e tratamento nas políticas culturais do Estado, particularmente na rede pública e privada de ensino, no que se refere ao fomento à produção cultural e à preservação da memória da comunidade negra no Brasil. 7.11 Mapear e promover os atos necessários ao tombamento de sítios e documentos de importância histórica para a comunidade negra. 7.12 Promover a titulação definitiva das terras das comunidades remanescentes de quilombos, nos termos do artigo 68 do Ato das Disposições Transitórias da Constituição Federal, bem como apoiar programas que propiciem o desenvolvimento econômico e social das comunidades. 7.13 Desenvolver pesquisas e divulgar informações sobre a violência e discriminação contra a população negra e sobre as formas de proteção e promoção de seus direitos. 7.14 Incluir o quesito “cor” em todos os sistemas de informação e registro sobre a população e bancos de dados públicos. (...) (Extrato do Programa Estadual de Direitos Humanos, criado pelo Decreto 42.209, de 15 de setembro de 1997, assinado pelo governador Mário Covas)

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Direitos Humanos e Emancipação Cidadã

Naquela época,

o governador Mário Covas não fazia nenhuma política relevante de governo na área de segurança pública, na área de saúde e mesmo na educação, sem que nós (CPDCN) fôssemos ouvidos. O secretário de Governo e Gestão Estratégica, professor Angarita, muda a postura reticente dos anos iniciais e respalda as ações do CPDCN. Antonio Carlos Arruda da Silva

A questão dos direitos humanos aproxima o CPDCN da comunidade judaica, contribui para o investimento nos esportes (Olimpíadas Afro-brasileiras), mas, sobretudo, favorece a realização de políticas direcionadas à Segurança Pública – pauta histórica dos movimentos negros.

Vitória Brasília, paulistana do Tucuruvi, é advogada e a primeira mulher a se tornar coronel da Polícia Militar do Estado de São Paulo, onde comandou a Polícia Feminina de 1997 a 2000. Conselheira durante duas gestões de Antonio Carlos Arruda da Silva, de 1995 a 2002, no CPDCN.

No campo da religiosidade, o CPDCN abre sua sede para babalorixás e yalorixás de terreiros de Candomblé e também para os seguidores da Umbanda, Tradições de Orixá, Vodun e Nkise reuniremse regularmente, com o intuito de fortalecer sua Comissão Afro, iniciada em 1997 na Assembleia Legislativa de São Paulo, a fim de superar preconceitos e promover o diálogo inter-religioso. A yalorixá Sandra Epega, uma das líderes da entidade, foi conselheira na gestão de Arruda, representando a sociedade civil.

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Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra 26 Anos de História

A violência policial, sempre denunciada pelo ativismo, recebe tratamento inovador. Assessorado por pesquisadores(as) negros(as) da Universidade de São Paulo e Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, Arruda inicia um diálogo contínuo com a Polícia Militar, objetivando sensibilizar a instituição para a forma como sua corporação abordava pessoas negras. Cabe lembrar que, nas gestões anteriores, a violência policial sempre foi pautada como problema a ser enfrentado; todavia, o contexto histórico não propiciou a continuidade formativa dos agentes policiais. Em 2000, o CPDCN estabelece parceria com a Secretaria Nacional de Direitos Humanos da Presidência da República, visando à difusão, articulação e mobilização dos municípios do interior de São Paulo nos encontros nacionais e regionais preparatórios da 3a Conferência Mundial contra o Racismo, Discriminação Racial, Xenofobia e Intolerância Correlata, agendada para ocorrer em setembro de 2001, na cidade de Durban, África do Sul. A psicóloga Edna Roland, fundadora da Organização de Mulheres Negras Fala Preta, promove, na sede do CPDCN, uma reunião entre a alta comissária das Nações Unidas, Mary Robinson, e entidades do movimento negro, com o intuito de dar visibilidade aos índices de desigualdades e violência que afetavam os afrodescendentes. Em 2001, Roland é alçada à categoria de relatora oficial da Conferência de Durban. Outra ação pioneira, alusiva aos direitos humanos, enfatizada na era de Antonio Carlos Arruda, refere-se às populações remanescentes de quilombos localizados no Estado de São Paulo.

Quilombos em São Paulo Atendendo a reivindicações das comunidades quilombolas do Estado de São Paulo, o governador Mário Covas assina o Decreto 40.7231/1996 criando um GT, empossado no Palácio dos Bandeirantes em 14 de maio de 1996, com o objetivo de fazer proposições, dentro dos dispositivos constitucionais, que contribuissem para a efetivação do direito de propriedade aos remanescentes das comunidades de quilombos em território paulista.

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Direitos Humanos e Emancipação Cidadã

O Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo, na gestão de Antonio Carlos Arruda, compôs esse GT juntamente com o Instituto de Terras do Estado de São Paulo José Gomes da Silva (Itesp), representantes da Secretaria da Justiça e da Defesa da Cidadania, da Secretaria do Meio Ambiente, da Procuradoria-Geral do Estado, da Secretaria de Governo e Gestão Estratégica, da Secretaria de Cultura, do Conselho de Defesa do Patrimônio Histórico, Arqueológico, Artístico e Turístico (Condephaat), da Subcomissão do Negro, da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil – Secção SP e do Fórum Estadual de Entidades Negras. O GT priorizou três frentes de ação: procedimentos básicos para a condução dos trabalhos; pesquisas bibliográficas e obtenção de pareceres técnicos; divulgação dos trabalhos e chamamento à participação. Como resultado inicial, o GT publicou, em 1997, o livro Quilombos em São Paulo, Tradições, Direitos e Lutas, distribuído pelo CPDCN à população, em especial a estudiosos do tema.

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Combate ao Racismo Institucional e Promoção da Igualdade

A atual presidenta do Conselho da Comunidade Negra, Elisa Lucas Rodrigues, insiste na estratégia de investir na educação, em diferentes modalidades e áreas, para que as práticas preconceituosas legitimadas na sociedade possam ser questionadas e combatidas. Educar para a saúde, para o empreendedorismo e, principalmente, para o respeito às diferenças e a promoção da igualdade. Isso porque, segundo Elisa, o mito da democracia racial brasileira ainda paira na sociedade, a despeito das inúmeras manifestações racistas denunciadas e constatadas. “A coragem e a vontade política para a promoção da igualdade são fundamentais, mas o conhecimento tem o poder de quebrar barreiras discriminatórias”, salienta. Os conselheiros que assessoram Elisa Lucas em sua atual administração no CPDCN são os seguintes: • Sociedade Civil: Anair Aparecida Gomes, Bernadete Maria Augusto, Carlos Augusto dos Santos, Celso Roberto Paulo, Claudete de Sousa Nogueira, Davilson Nascimento dos Santos, Eginaldo Marcos Honório, João Carlos Benicio, José Humberto Henrique Dias, Jurandir Silvestre, Marco Antonio Batista, Marcos Antonio Costa, Marco Antonio dos Santos, Maria Cecília Galvão N. Batista, Pérola Monteiro dos Santos, Rosangela Aparecida Manoel, Silvia Helena Seixas Alves, Sueli Aparecida Gonçalves, Terezinha de O. Marciano Costa e Washington Lúcio Andrade. • Governo: Antonia Maria de Assis, Aparecido Eduardo dos Santos, Débora Aparecida dos Santos, Ionice Ferreira Dias, Eunice Aparecida Prudente, Leandro da Silva Rosa, Luis Eduardo Batista, Margarette Barreto, Roberto de Almeida e Ronaldo Simões. Em sua gestão no CPDCN, dá ênfase à formação de professores(as) e gestores(as) da rede estadual, atingindo um número inédito. Na área da saúde, avança ainda mais, promovendo cursos, seminários


Combate ao Racismo Institucional e Promoção da Igualdade

e publicando o livro Saúde da População Negra. Elisa destaca o apoio dos conselheiros de ambas as áreas pelo trabalho propositivo e especializado.

Programa Educando pela Diferença para a Igualdade Mais de 16 mil professores da rede pública, em todo o Estado de São Paulo, foram capacitados pelo Programa Educando pela Diferença para a Igualdade (2003-2007), um dos carros-chefes da gestão de Elisa Lucas. O programa foi criado pelo Decreto 48.328, de 15 de dezembro de 2003, para atender à Lei 10.639/2003 (que alterou a LDB), determinando a obrigatoriedade do ensino de História da África e da Cultura Afro-brasileira na educação básica. Elisa Lucas salienta que a conselheira de Ribeirão Preto, professora Sílvia Helena Seixas Alves, foi a idealizadora do programa, tendo procurado o CPDCN para concretizá-lo.

Sílvia Helena Seixas Alves é pedagoga, idealizadora do Programa Educando pela Diferença para a Igualdade. Diretora do Instituto Plural de Educação e Cidadania de Ribeirão Preto e conselheira do CPDCN, representando a sociedade civil.

Para que o programa acontecesse, Elisa Lucas buscou o apoio da Coordenadoria de Estudos e Normas Pedagógicas (Cenp) da Secretaria Estadual de Educação e sensibilizou o governo para a importância da lei. O CPDCN estabeleceu, então, parceria com o Núcleo de Estudos Afro-brasileiros da Universidade Federal de São Carlos (UFSCar), responsável pela seleção e contratação da equipe de especialistas formada por mestres, doutores e graduados de instituições públicas como a Universidade de São Paulo (USP), a Universidade Estadual Paulista Júlio de Mesquita Filho (Unesp) e a própria UFSCar. Essa equipe atuou em todas as zonas da Região Metropolitana de São Paulo e nos municípios localizados no interior do Estado, ministrando aulas em conformidade com as orientações definidas

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Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra 26 Anos de História

pelas Diretrizes Curriculares Nacionais para o Ensino das Relações Etnicorraciais publicadas pelo Ministério da Educação (MEC). O impacto e a repercussão do Programa Educando pela Diferença para a Igualdade têm sido tema de teses de doutorado e dissertações de mestrado. Dentre as mais recentes pesquisas, o trabalho de Rafael Ferreira Silva (USP, 2010) conclui que o programa promove a “articulação de políticas de igualdade com políticas de identidade por meio da fusão entre as modalidades de educação permanente e a formação continuada”.

Saúde da População Negra A promoção de eventos e políticas sobre a saúde da população negra sempre foi pauta das diferentes gestões do CPDCN. Em 1998, na gestão de Antonio Carlos Arruda, foi desencadeada, em parceria com a instituição Fala Preta, uma campanha de conscientização direcionada aos afrodescendentes sobre a probabilidade de sofrerem hipertensão arterial. Esse risco agrava-se para as gestantes. A mortalidade materna no País também é causada pela toxemia gravídica, ou seja, hipertensão arterial não tratada no período da gravidez. O CPDCN ainda divulgou a anemia falciforme, doença hereditária prevalente nos negros em todo o mundo. Em 2004 e nos anos subsequentes de sua administração, Elisa Lucas também adota a Saúde da População Negra como prioritária, contando com o apoio de um conselheiro do CPDCN, Luis Eduardo Batista, especialista e coordenador do Comitê Técnico de Saúde da População Negra do Estado de São Paulo (2006-2007).

O conselheiro do CPDCN Luis Eduardo Batista representa o governo. Possui mestrado e doutorado em Sociologia pela Unesp (2002). Pesquisador científico do Instituto de Saúde e coordenador da área de Saúde da Associação Brasileira de Pesquisadores Negros (ABPN). Tem experiência na área de Saúde Coletiva, com ênfase em Saúde Pública, atuando principalmente com os seguintes temas: desigualdades raciais e saúde, gênero, saúde reprodutiva e sexualidade.

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Combate ao Racismo Institucional e Promoção da Igualdade

O comitê trabalhou para sensibilizar governos dos municípios do Estado e a sociedade sobre as especificidades que afetam a população negra na área da saúde. Pesquisas acadêmicas já demonstram que o racismo institucional está presente no atendimento prestado em postos de saúde e hospitais. Soma-se a esse fato a ocorrência de doenças mais propensas aos negros, como as já mencionadas, além de diabetes e miomatoses. A introdução do quesito cor no sistema de saúde, em especial no Programa de DST/Aids do Estado de São Paulo, é outra política importante. No interior, cidades como Igarapava, Ribeirão Preto e outras sediaram seminários sobre o tema.

Empreendedorismo Negro Desde o início de sua gestão, Elisa Lucas promove encontros de empresários(as) negros(as). Em 2007, o Conselho contribuiu para que empresárias afro-brasileiras participassem do encontro De Mulher para Mulher nos Negócios, intercâmbio bicultural e profissional entre mulheres negras norte-americanas e brasileiras. Realizado no Memorial da América Latina, no evento foi apresentado o trabalho no qual as empresárias norte-americanas promovem assistência às pequenas e microempresas no Brasil e compartilham estratégias para o crescimento de seus negócios. Teve como parceiros as entidades The Center For Afro-Brasilian-American Cooperation; Integrare – Centro de Integração de Negócios; o Núcleo Cultural Niger Okan e Nations Minority Suplier Development Council Inc; e o Memorial da América Latina.

Selo da Diversidade do Estado de São Paulo O CPDCN apoia e divulga, entre as organizações da sociedade civil, um selo, que de acordo com o Decreto 52.080/2007, assinado pelo então governador José Serra, deve ser concedido à empresa e/ou instituição que “valorizar a diversidade no mercado de trabalho”.

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Os Presidentes do Conselho

Hélio Santos (1984 a 1986) Hélio Santos é doutor em Administração e mestre em Finanças pela Universidade de São Paulo (USP), professor das Universidades de São Marcos, em São Paulo, e Santana, na Bahia. Foi fundador presidente do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado de São Paulo, em 1984. Desde 1996, coordena o Grupo de Trabalho Interministerial (GTI) para a valorização da comunidade negra no Ministério da Justiça. Suas ideias sobre problemas raciais e desigualdade social estão reunidas em seu livro, como proposta de caminho para o Brasil.

Eduardo Joaquim de Oliveira (1987 a 1994) Paulista nascido no bairro do Tucuruvi, ativista do Movimento Negro, em 1983 dirigiu a Paulistur. Em 1987 assume a presidência do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra e em 1991 é reeleito presidente por mais uma gestão. Eduardo Joaquim é também um dos responsáveis pelo aprimoramento do carnaval no Estado de São Paulo, tendo presidido a União das Escolas de Samba de São Paulo entre 1984 e 1987. Condecorado com a Medalha Anchieta pela Câmara Municipal de São Paulo.


Os Presidentes do Conselho

Antonio Carlos Arruda da Silva (1995 a 2002) Paulistano, professor universitário, ativista do movimento negro, advogado formado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo (PUC-SP), pós-graduado em Políticas Públicas pela Universidade do Texas, na Lyndon Johnson Business School, foi presidente do Conselho na gestão de 1995 a 1998, e reeleito para a gestão 1999 a 2002. Tem ainda passagens pelo SOS Racismo, Geledés e pela gestão pública nos governos municipal e estadual de São Paulo.

Elisa Lucas Rodrigues (2003 a 2010) Natural de Barretos (SP) é formada em Letras. Foi a primeira mulher eleita presidenta do Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra. Integra também o Comitê de Saúde da População Negra do Estado de São Paulo e o Comitê de Mortalidade Materna, vinculados à Secretaria Estadual de Saúde, e o Conselho Consultivo da Ouvidoria da Polícia Militar do Estado de São Paulo. Em suas duas gestões à frente do Conselho, destacam-se a criação do projeto São Paulo: Educando pela Diferença para a Igualdade (Decreto 48.328/2003), destinado à capacitação de professores para lecionar a história da África e dos afro-brasileiros, e à realização de seminários sobre diversidade etnicorracional nas escolas, em parceria com a Secretaria Estadual da Educação.

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Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra

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A n o s

de História Criado em 1984 pelo governo Franco Montoro, foi o primeiro órgão governamental estabelecido no País para promover o desenvolvimento da comunidade negra. Composto por representantes da sociedade civil e do Poder Público, o Conselho de Participação e Desenvolvimento da Comunidade Negra do Estado é responsável pela formulação e acompanhamento de políticas relacionadas aos direitos sociais, econômicos, civis e políticos da população afrodescendente de São Paulo.


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