Seminario Internacional de Microcredito – O Negocio do Futuro

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Governo do Estado de São Paulo Alberto Goldman Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho Pedro Rubez Jehá Secretário Adjunto | Carlos Nabil Ghobril Chefe de Gabinete | Carlos Roberto Barretto Coordenador de Políticas de Empreendedorismo e Diretor Executivo do Banco do Povo Paulista | Antonio Sebastião Teixeira Mendonça Coordenador de Políticas de Inserção no Mercado de Trabalho | Diomedes Quadrini Filho Coordenador de Políticas de Emprego e Renda | Juan Carlos Dans Sanchez Coordenador de Operações | Marcelo Oliveira de Mello

Secretaria de Economia e Planejamento Francisco Vidal Luna Fundação Prefeito Faria Lima Nelson Hervey Costa

Coordenação-geral | Fátima Fernandes de Araújo Edição de texto | Pedro Jacintho Cavalheiro Equipe técnica | Carlos Corrêa Leite (coordenador técnico do projeto), Elizeu Lira Corrêa, Isabete Gabriel da Silva e João Luis Anselmo Estagiários | Romulo Augustus Falcão, Rosângela Aparecida Mendes da Silva e Talitha Fonseca Farran

Produção editorial | Gerência de Comunicação e Marketing do Cepam Coordenação | Adriana Caldas Editoração de Texto e Revisão | Eva Celia Barbosa e Silvia Galles Direção de Arte | Michelle Nascimento Chefia de Arte | Carlos Papai Assistente de Arte | Janaina Alves Cruz da Silva Estagiária | Simone Midori Ishihara Fotos | Arne Lee, Douglas Matsumoto e Renato Tuzzi Tiragem | mil exemplares


São Paulo, 2010

Produção e impressão

Patrocínio

Realização

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Banco do Povo Paulista Rua Boa Vista, 170, 2º andar, Bloco 5 – São Paulo/SP – CEP 01014-000 11 3241-7302 contato@bancodopovo.sp.gov.br | www.bancodopovo.sp.gov.br Fundação Prefeito Faria Lima – Cepam Av. Professor Lineu Prestes, 913 – Cidade Universitária São Paulo/SP – CEP 05508-000 11 3811-0300 | Fax: 11 3813-5969 cepam@sp.gov.br | www.cepam.sp.gov.br


APRESENTAÇÃO O microcrédito produtivo ganhou significativa relevância entre as políticas de enfrentamento à pobreza e redução das desigualdades sociais. Ao se incorporar ao rol de instrumentos de estímulo ao desenvolvimento econômico e social das comunidades, o microcrédito propicia a geração de postos de trabalho e renda, viabiliza o crédito em condições adequadas aos microempreendedores e promove a inclusão social. Foi com esses propósitos que o governo de São Paulo criou, no ano de 1997, o seu programa de microcrédito produtivo, cuja operacionalização e administração são de responsabilidade da Secretaria de Estado do Emprego e Relações do Trabalho (Sert). Conhecido como Banco do Povo Paulista, o programa tem contribuído para a geração de emprego e renda e para a consolidação e ampliação de microempreendimentos antes não atendidos por qualquer forma de financiamento. Hoje, o Banco do Povo Paulista conta com 457 unidades de crédito ativas, em municípios que abrangem cerca de 90% da população do Estado de São Paulo. Desde a sua implementação, já realizou 225 mil operações, emprestando mais de R$ 700 milhões. No sentido de demonstrar sua importância para os segmentos produtivos, a Sert, em parceria com a Fundação Prefeito Faria Lima – Cepam, realizou, em 2010, o Seminário Internacional de Microcrédito Produtivo, cujo conteúdo discutiu os desafios, os obstáculos e os avanços na atuação de instituições no mercado de microcrédito no Brasil. Além da participação de instituições e agentes brasileiros, o evento contou com a contribuição de representantes de outros países da América Latina.

Pedro Rubez Jehá

Nelson Hervey Costa

Secretário do Emprego e Relações do Trabalho

Presidente da Fundação Prefeito Faria Lima – Cepam



SUMÁRIO Apresentação

ABERTURA – autoridades

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Palestra Magna Internacional

Painel 1 – DESAFIOS DO MICROCRÉDITO NO MUNDO

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Painel 2 – DESAFIOS DO MICROCRÉDITO NO BRASIL

Painel 3 – DESAFIOS PARA A FORMALIZAÇÃO

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Entrega do 1º Prêmio Anual do Banco do Povo Paulista – 2009

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ABERTURA Autoridades


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Antonio Mendonça diretor executivo do Banco do Povo Paulista

“Sinto um orgulho muito grande, nesta data, de estarmos realizando mais um seminário do Banco do Povo Paulista. Em nome de Drauzio Pedroso Vitiello (assessor especial da Sert), agradeço a cada um de vocês que trabalha diretamente na coordenação do Banco do Povo Paulista. Agradeço especialmente a cada um de vocês, agentes de crédito, que têm feito, ao longo desses últimos 11 anos, com dedicação esplêndida, a verdadeira transformação que estamos promovendo. É por vocês, é para vocês, que estamos realizando mais este seminário”

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Seminário Internacional de Microcrédito


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Gilberto Kassab prefeito da cidade de São Paulo/SP

“Este Seminário Internacional, com presenças ilustres, é mais uma ação concreta que procura criar condições de conhecimento, criar políticas públicas que fortaleçam essa tese e a oportunidade de dar visibilidade a um programa tão importante e de tal natureza. A cidade de São Paulo tem vocação, por meio da sua gente, do seu povo, de empreender, de construir o desenvolvimento com rapidez, modernidade, gerando riquezas e sendo exemplo para o Brasil”

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Nabil Sahyoun presidente da Associação Brasileira de lojistas de Shopping (Alshop)

“Hoje, mais de 80% dos empresários de shopping centers são pequenos empresários. Esse pequeno empresário, muitas vezes, começou como empregado, teve uma oportunidade e entrou para o mercado, tornando-se pequeno empresário. Tenho inúmeras histórias de pequenos empresários que se tornaram extraordinários empresários, gerando riqueza para nosso País. O microcrédito é fundamental para que tenhamos força no varejo. Hoje, marcamos um passo extraordinário e importante, com este seminário, para discutir, debater e alcançar o objetivo extraordinário que é facilitar a vida daqueles que querem ser empresários, começando por esse microcrédito, que é fundamental e importante para todos nós”

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Carlos Antonio Luque presidente da Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas (Fipe)

“Vocês sabem que gerar emprego é a questão mais importante nas sociedades capitalistas. Considero que, na atuação do setor público estadual, federal ou municipal, a geração da atividade econômica e, consequentemente, de emprego, é a tarefa mais árdua. Nesse sentido, gostaria de felicitar Afif Domingos que, na Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho, reuniu uma série de programas. Não apenas na questão do microcrédito, para financiamento das atividades para as pessoas que mais precisam, mas também na qualificação da mão de obra, enfim, em todos os setores do mercado de trabalho”

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Natanael Miranda dos Anjos secretário especial do Microempreendedor Individual da Prefeitura do Município de São Paulo/SP

“Sabemos que um dos principais fatores de produção é o financiamento, pois sem o recurso financeiro dificilmente qualquer empreendedor teria condições de se dedicar e aquela sua ideia, por vezes, poderia ser muito bem-sucedida, mas ele não tem condições de dar o primeiro passo. O Banco do Povo e o São Paulo Confia, aqui na Capital de São Paulo, vieram exatamente para dar essa sustentabilidade aos nossos micro e pequenos empreendedores. E agora, com a lei que criou o microempreendedor individual, temos certeza de que teremos todas as condições de dar a São Paulo, essa cidade que concentra o maior número de microempreendedores do País – mais de 1 milhão e 100 mil empreendedores informais –, o primeiro incentivo para iniciar o seu grande projeto de vida”

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Nelson Hervey Costa presidente da Fundação Prefeito Faria Lima – Cepam

“Esse é um momento muito especial para mim, não só do ponto de vista institucional do Cepam, mas do ponto de vista pessoal. Tive a oportunidade de trabalhar na Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho na implementação do Banco do Povo e, hoje, na qualidade de presidente do Cepam, me sinto muito feliz de estar neste evento e verificar o envolvimento de nossos funcionários com a questão do microcrédito, com o olhar do município e dos agentes de microcrédito. Estamos falando de um universo gigantesco de pessoas muito simples, de pessoas que estão iniciando sua atividade, e de pessoas excluídas do sistema convencional de crédito. O Banco do Povo tem essa concepção, tem esse olhar para essas pessoas. Acredito no potencial do microcrédito como ferramenta de inclusão social, de desenvolvimento, de geração de renda, de geração de oportunidades”

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Ricardo Tortorella diretor superintendente do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas de São Paulo (Sebrae/SP)

“Emprego e distribuição de renda, de fato, são questões que o Brasil ainda deve para a sociedade. Nos últimos três anos, abríamos no Estado de São Paulo, quando chegamos, 12 mil empresas/mês. Hoje, abrimos quase 20 mil empresas/mês. Melhor que isso: a mortalidade no primeiro ano delas, há cinco anos, era da ordem de 45%. No primeiro ano! A mortalidade delas hoje é menos da metade disso. Ferramentas como o Banco do Povo Paulista, a ação com o microcrédito, é que permitem termos indicadores desse tipo, em nosso País, no curto espaço de tempo como o registramos. Sou testemunha da importância do microcrédito no Estado de São Paulo e o Banco do Povo Paulista tem papel fundamental nessa transformação”

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Natal Léo presidente da Comissão Estadual de Emprego de São Paulo/SP

“É uma felicidade estar com vocês discutindo algo que é importante para o trabalhador brasileiro. Neste ato, represento a minha central, a União Geral dos Trabalhadores (UGT), como presidente da Comissão Estadual de Emprego de São Paulo e, como tal, tenho uma relação muito forte com os municípios e com as unidades do Banco do Povo do Estado de São Paulo inteiro. O que, na realidade, é um prazer, porque as comissões estaduais têm que fazer parte e atuar. Os retornos, inclusive a fórmula, o jeito de dar crédito à população brasileira, são algo muito forte que o Banco do Povo faz em São Paulo. Então, para ser breve, Antonio Mendonça, receba do trabalhador brasileiro nossos parabéns por esse esforço para ajudar o trabalhador brasileiro a ter um pouquinho de renda e a gerar o seu próprio emprego. Parabéns!”

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Marcos Cintra secretário municipal do Trabalho, São Paulo/SP

“Microfinanças, microcrédito, microsseguro, todas as variáveis existentes na área financeira, hoje orientadas para o micro e pequeno empresário, assumem papel estratégico no desenvolvimento mundial. Deixou de ser uma ação quase que assistencial, como já foi interpretada no passado. Deixou de ser uma ação isolada, individual, para galgar o status de política pública, de política nacional, de política importante na promoção do desenvolvimento econômico no mundo inteiro”

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Guilherme Afif Domingos ex-secretário do Emprego e Relações do Trabalho do Estado de São Paulo

“Antes de mais nada, quero falar da importância deste seminário. É um seminário de trabalho. Estamos aqui reunidos, hoje, com nossos agentes de crédito, a maioria dos inscritos presentes no seminário. E procuramos construir um seminário que nos dê uma ideia bastante ampla do que é o trabalho de fomento do microcrédito. Inclusive, trouxemos grandes personalidades, grandes acadêmicos, grandes estudiosos, grandes operadores mundiais desse fenômeno do microcrédito que se alastra pelo mundo inteiro. Por isso, o dia de hoje destina-se a um rico debate. É um dia em que buscamos aperfeiçoar o conhecimento de vocês que estão na linha de frente, os agentes de crédito, que são agentes de desenvolvimento, agentes de fomento. E, dentro desse trabalho, vocês têm papel fundamental, porque o crédito é o oxigênio, o crédito é a vida para o crescimento”

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PALESTRA MAGNA INTERNACIONAL Hernando de Soto Polar

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Palestra Magna Internacional

Hernando de Soto* presidente do Instituto Libertad y Democracia (ILD), Lima/Peru

O Seminário Internacional de Microcrédito – O Negócio do Futuro contou com palestra do economista peruano Hernando de Soto Polar, que falou sobre a importância da formalização. Fez um histórico dos sistemas produtivos da sociedade humana, de suas relações comerciais e de trabalho mantendo, porém, o foco na economia de mercado *

* Economista, autor dos livros El Otro Sendero e El Misterio del Capital, sobre economia e política de desenvolvimento, ambos traduzidos para mais de 20 línguas. Presidente do Instituto Libertad y Democracia (ILD) com sede em Lima/Peru, instituição que se dedica a projetar e implementar programas de formação de capital para os pobres na África, Ásia, América Latina, Oriente Médio e para os países da ex-União Soviética. Atuou como economista no Acordo Geral de Tarifas Aduaneiras e Comércio (General Agreement on Tariffs and Trade – Gatt), da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Emprego, quando foi criada a Organização Mundial do Comércio. Foi presidente do Comitê Executivo da Organização dos Países Exportadores de Cobre (Cipec); diretor-gerente da Universal Engineering Corporation; membro do Swiss Bank Corporation Consultant Group; e diretor do Banco Central de Reserva do Peru.

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Sua abordagem começa no sistema de mercado das sociedades feudais, com seu sistema produtivo centralizado e verticalizado, demonstrando que esse sistema perduraria até o século 18, quando a economia “era uma organização feudal, tribal, era uma organização patrimonial, e a forma era vertical”. Com as mudanças ocorridas no final do século 18 e no século 19, “o feudalismo e o patrimonialismo começaram a desabar totalmente”. O palestrante deu ainda o fulcro histórico dessas mudanças, asseverando que o final do feudalismo, do patrimonialismo e do tribalismo foi anunciado por pessoas como o filósofo escocês, Adam Smith, e o pai do comunismo, Karl Marx, que dizia que “acabava essa etapa da relação vertical e começava a etapa do mercado”. O que viria a caracterizar essa nova etapa de mercado era a divisão do trabalho e, no dizer de de Soto, “agora, as pessoas iriam se dispersar para produzir. Passariam a existir muitos empresários, distintas fontes de trabalho e isso era bom para a produção”. Historiando essa nova etapa de mercado, de Soto ainda recorreu a exemplos de Adam Smith e de Karl Marx. Adam Smith observou dois operários fabricando alfinetes na Escócia, e que produziam em um dia 14 peças. Para Smith, se fossem 11 pessoas trabalhando em sistema de distribuição

de especialidades, em diferentes centros de produção, de uma mesma fábrica, poderiam ser produzidos mais alfinetes: alguns operários se especializariam em comprar o fio metálico, outros em cortá-lo, outros em afiar uma ponta, outros em fazer a cabeça e assim, pouco a pouco, 11 pessoas poderiam produzir até 40 mil alfinetes por dia, contra 77 alfinetes que esses mesmos 11 operários produziam pelo velho sistema artesanal de trabalho. “Marx já dava o exemplo de uma locomotiva. Ele dizia: uma locomotiva é feita de 5 mil pedaços e nenhum pedaço é feito exatamente no mesmo lugar e é preciso juntá-los.” Para exemplificar a necessidade de juntar esse mercado disperso entre várias formalizações e entre vários produtores, de Soto utilizou também o exemplo dado pelo economista Medha, do que é necessário para se fabricar um lápis nos Estados Unidos da América do Norte. E levou a plateia a descobrir que a produção de um simples lápis de madeira, com borracha de apagar em sua extremidade, envolve matériaprima produzida em 17 países: o grafite virá do Sri Lanka; a gordura oleosa com ácido sulfúrico, da Guatemala; parafina, do México; petróleo, da Arábia Saudita; zinco, do Peru; cobre, do Chile; níquel negro, da Nigéria, etc. De Soto disse que a tarefa de unir esse mercado não foi fácil. “Durante todo o século 19, as pessoas não aprenderam a trabalhar na

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economia de mercado. Não encontramos a forma. Assim, se lemos a história do ocidente... Basta ver os filmes de cowboys nos Estados Unidos para perceber que as pessoas não haviam aprendido a conectar-se. As pessoas disputavam literalmente com violência uma grande parte do território, à medida que, nos Estados Unidos, se moviam para lugares como a Califórnia.” A Inglaterra do século 19, conta de Soto, que ainda não assimilara a nova etapa de mercado, vive uma fase socialmente perturbadora. “Charles Dickens descreve como as cidades se empobreciam. A violência das cidades. Como Oliver Twist chegou menino à cidade e estava pobre e desamparado. As leis mais importantes na Inglaterra se chamavam the poor laws, as Leis dos Pobres. E essas Leis dos Pobres eram essencialmente para ajudar com assistência, com crédito, e qualquer maneira que fosse possível, aos pobres, que eram muitos e continuamente migravam para as grandes cidades. E, nesses momentos, em meados do século 19, começa a formalização no ocidente.” Em sua digressão sobre o desconhecimento de como juntar partes dispersas, de Soto cita Jung, quando diz que não é preciso olhar para as plantas para ver como estão unidas, mas é preciso olhar o rizoma, que é as raízes das plantas, que é de onde se mantém a vida, inclusive quando as plantas já morreram. O

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aprendizado de como juntar partes espalhadas em especializações é difícil porque é inato no ser humano compreender o todo como algo único. O homem não conseguia, por exemplo, entender como se uniam as diferentes partes do corpo para formar algo único. Mas, em 1856, Friedrich Miescher, um suíço, primeiro homem a isolar o ácido nucleico – o DNA –, disse que “basicamente, nós todos, qualquer ser humano, alto, gordo, baixo, pequeno, temos aproximadamente 32 milhões de células. Mas não podemos distinguir as pessoas pela quantidade de células que possuem, porém há um ácido que contém a fórmula, o protocolo de como os 32 milhões de células se juntam para criar uma identidade, como posso ser eu. E é o que faz com que Hernando seja diferente de Guilherme e o que faz com que Guilherme seja diferente de Fábio: é o DNA”. O homem, então, passa a perceber que o mesmo fator que individualiza as coisas, as junta, e passa a criar sistemas de identificação que se, por um lado, individualizam cada ser, por outro os reúnem em grupos sociais, os quais, graças a essa identificação, agora podem interagir. de Soto dá como exemplo desse sistema de identificação seu passaporte, em que se encontram todos os dados que podem identificá-lo, um universo de informações a seu respeito, dizendo: “a identidade, de toda forma, é externa: não está em mim. Está


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em um objeto à parte. É isto (mostrando seu passaporte). O que estou tentando lhes explicar é que a formalidade sobre a qual vou falar agora é algo crucial, porque em um mundo onde somos 7 milhões de seres humanos, o mercado somente pode funcionar se tiver certas formas pelas quais nos conheçamos uns aos outros e possamos perceber todos os elementos necessários”. Usando como exemplo uma maçã, de Soto demonstra que nosso mundo é composto de coisas e das relações que elas têm. A maçã, ícone para todas as coisas, no discurso de de Soto, poderia ter sido comprada ou roubada. Então, para provar que é uma propriedade legítima, o homem criou um “título de propriedade”, que prova que alguém é dono dessa maçã. Esse título formaliza sua propriedade. Depois, é necessário saber quais aplicações se poderia dar à maçã, como, por exemplo, comprar, vender, alugar, transformar, arrendar, fazer leasing, hipotecar, utilizá-la como garantia ou como sistema de identificação, etc. De Soto diz: “Há umas cem coisas que comercialmente posso fazer com uma maçã e essas cem coisas não estão aqui (na maçã): estão na lei. Há uma lei em cada país do mundo: há no Brasil, como há no Peru, nos Estados Unidos, que diz o que se pode fazer com a maçã, que coisas eu posso fazer. Isso já

é formalização”. O estabelecimento de regras para as relações entre as coisas é fundamental para o individual e o coletivo. De Soto exemplifica: “Efetivamente, meu passaporte são várias coisas que estão relacionadas segundo uma fórmula que as torna um todo. Assim como o DNA é a fórmula mediante a qual todos nós estamos compostos. Essa é a formalidade”. Nesse universo de coisas, temos que as relações entre elas são os vínculos que estabelecemos. E os vínculos são muito importantes. De Soto exemplifica: “Um beijo pode levar a fazer um bebê, uma hostilidade pode levar a uma guerra”. Portanto, nossas relações são cruciais. o que os europeus e os americanos têm aprendido a fazer é capturar as relações em uma série de protocolos e documentos, que nos permitem não somente intercambiar maçãs, mas saber o estado de nossas relações. E esse estado de nossas relações, que é o DNA de quem somos nós, estão essencialmente em três formas de leis: • As leis sobre a propriedade, que dizem onde as coisas estão, como se vinculam umas às outras, quem é dono, quem é devedor, quem é credor, quem é que dá o crédito; • As leis sobre empresas, nas quais compramos muitas coisas para fazer um trabalho;

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• As leis sobre transações: quanto custa intercambiar uma coisa: colocá-la aqui, colocá-la lá, para juntá-las, quanto custa colocar um pedaço de madeira do Óregon, com argila do Mississipi, com grafite do Sri Lanka, com parafina, para criar um lápis. Então, para o desenvolvimento das relações humanas e inclusão de todos com igualdade de direitos, não só os títulos de propriedade são formalizados, mas também os vínculos entre pessoas e coisas, e as pessoas. Quando alguém não está na formalidade, está excluído. Que significa isso? Bem, em primeiro lugar, significa que ninguém sabe onde você vive. E se você não sabe onde vive, de uma maneira rápida e eficaz, há uma série de coisas que terão problemas para funcionar. Por exemplo, o crédito. Que seja o microcrédito, e isso é muito importante, é um avanço. A maior parte dos capitais do mundo se faz com base no crédito. De Soto afirma que “isso não ocorre para 5 milhões de pessoas dos 7 milhões que estão no mundo. Segundo nossos cálculos, as elites latino-americanas, asiáticas e as elites africanas, nos Estados Unidos da América do Norte, na Europa, constituem 2 milhões de pessoas. Cinco milhões de pessoas no mundo estão no setor informal e não têm o título de propriedade, portanto, têm dificuldade de ser localizadas e

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de entrar em um mercado expandido. Ninguém de sua comunidade os conhece, nem sabe onde tem que comprar e vender, fora de seu lugar, inclusive a 100km. Então, se não há formalidade ou direitos de propriedade, não há crédito”. A formalidade afeta diretamente o capital, porque capital não é dinheiro. Uma casa construída em área ilegalmente invadida e imprópria para ocupação, sem título de propriedade, portanto, não tem o mesmo valor que uma casa de igual metragem quadrada construída e adquirida formalmente. De Soto diz que “o capital é um valor seguro que pode se traduzir em liquidez”. Formalidade e propriedade abrem as portas para o crédito. De Soto não se refere ao microcrédito nos moldes que é praticado pelo Banco do Povo, quando diz: “não importa o quão pequena seja sua propriedade, 200m2, 100m2, um táxi, uma máquina, quem não tem propriedade não pode levantar capital. E recordem que lhes disse que quem não tem essa identidade tampouco pode levantar crédito”. Contudo, mesmo considerando o avanço do microcrédito, é verdade quando de Soto afirma que “quando vocês têm um informal, vocês têm um cidadão brasileiro em desvantagem social, então não há quem lhe dê, marcadamente, um sistema de seguridade”. A formalização afeta diretamente a oferta de crédito no mercado. Em sua palestra, de Soto, que


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foi diretor do Banco Central de Reserva do Peru, conta que perguntou certa vez a Alan Greenspan, então presidente do Banco Central de Reservas dos Estados Unidos: “Como você faz, dr. Greenspan, para emitir dinheiro e saber o custo de emitir dinheiro?”. “Bem”, respondeu Greenspan, “eu procuro ver de que liquidez o mercado necessita”. E de Soto lhe disse: “E como fica sabendo disso?”. “Bem, vou aos mercados e vejo transações de um lado e de outro. E, baseado nisso, posso calcular a riqueza.” Então, de Soto disse: “Ah... É como esse filme de cowboys que eu vi outro dia, de John Wayne, que levava muito gado do Texas até Chicago e quando o gado ia entrando, se calculava uma vaca, um touro, uma vaca, um touro e aí se vê quantos são e se dá a liquidez!”. E ele disse: “Não, ora, já não se faz isso! O que veio foi o intercâmbio em forma de papel. De gente que é dona de uma coisa e a dá a gente que se torna dona dessa mesma coisa”. E de Soto disse: “Bem, então o que fazemos se estamos no caso da maior parte da América Latina, onde 50%, 60% ou 70% das pessoas não têm papéis para trocar, mas tão somente coisas para trocar? Quanto dinheiro você colocaria no mercado para que houvesse crédito?”. Greenspan respondeu: “Ah, eu não saberia como fazer isso”. E de Soto concluiu: “Em outras palavras, se a formalidade não está em seu lugar e não há

informação sobre quem é quem, quem é dono de quem, quem tem qual empresa, não funciona a informação para ter boa quantidade de crédito, boa quantidade de capital e a boa quantidade de dinheiro que é necessária para isso”. Em sua conferência, de Soto afirma que, se você tem uma empresa informal, sua responsabilidade é ilimitada, enquanto se sua empresa é formal sua responsabilidade é limitada. E esclarece: “Se você vem a fazer negócio com os de Soto, no Peru, você vem em minha casa, e eu vou dizer, se me perguntam: ‘Quem toma as decisões aqui?’, ‘Eu digo: eu, eu sou o chefe!”. Mas se olharem vão ver que minha senhora, pelo ar dominante em seu olhar, é realmente a chefa. Então vocês não sabem se sou eu ou se é ela. E se veem a minha avó, a nona, no fundo, manda mais que qualquer um dos outros dois. Você nunca está seguro! Ao contrário, quando entra em uma empresa, por lei, a pessoa está ligada ao ordenamento hierárquico de quem é responsável pelas finanças, quem está na diretoria, quais são os estatutos da companhia e tem uma estrutura que você sabe que não é influenciada pela igreja, pelo partido político, nem por minha mulher, nem por minha sogra, que seria certamente o pior. Mas, além disso, você tem responsabilidade limitada. A lei diz que se você entra no mercado, decide com quanto capital entra. Então, você pode ter

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US$ 100 mil e dizer: “Eu entro na minha empresa com 10 mil’. Minha responsabilidade está limitada a 10 mil’. (...) Quando se está no setor informal, opera-se com responsabilidade ilimitada. Se faz um mau negócio, ele o prende completamente. Você corre riscos que os europeus e norteamericanos já não correm há 650 anos”. A responsabilidade ilimitada, trazida pela informalidade, desvaloriza não só a propriedade, como vimos anteriormente, mas desvaloriza também o produto e o serviço do informal. De Soto narra o caso dos Chipivos, povo indígena, de cerca de 10 mil indivíduos, que habita a Amazônia peruana: “Ultimamente, temos tido uma insurreição na Amazônia peruana. Fomos lá para ver o que acontecia com os indígenas que estavam comercializando com os de fora. Bem, é simples: os indígenas operam com responsabilidade ilimitada! Por isso, quando não cumprem um contrato, estão à disposição do chefe, que os escraviza. Então, a independência também é resultado da responsabilidade limitada”. De Soto contou que a lei peruana dá direitos especiais aos Chipivos, válidos, porém, apenas dentro de sua reserva, que abrange uns 300km2, e que por isso podem comerciar madeira. “Quando vendem, então, uma árvore de mogno, vendemna por três sacos de açúcar”. Se tivessem um direito formal que os vinculasse com o resto do

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Peru, poderiam colocar essa mesma madeira em um caminhão, no Porto de Callao, e receber US$ 12 mil. E se fossem parte do mundo formal globalizado, poderiam colocá-la em San Francisco por US$ 200 mil, enquanto em sua terra puderam vender somente por três sacos de açúcar. Portanto, ser formal é muito importante porque não somente sua responsabilidade fica limitada pela lei, mas também lhe dá a possibilidade de colocar seu produto em um mercado expandido, onde alcança muito valor. Porque, quanto mais distante da fonte, maior valor tem. A limitação de responsabilidade, que é um aspecto da formalização, não implica limitação dos meios para o crescimento. A formalização abre canais para captação de recursos necessários à sobrevivência e ao crescimento de uma empresa. De Soto exemplifica: “Sua empresa não é somente uma casa que lhe pertence: é uma organização que você pode cortar em pedacinhos. Você pode pegar seu título de propriedade – esse é o título de propriedade de sua empresa (mostrando uma folha de papel) – e o dividir (corta o papel em pedaços) e o converter em ações. Então pode vender uma parte das ações para conseguir capital, outra parte para ter patrimônio. Você não tem que vender tudo, mas vender partes do todo. Já, se não é formal, claro, não tem crédito, você não tem capital, não tem dinheiro, não tem


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seguridade, sua família o manipula, seu partido político o manipula, sua religião o manipula e eventualmente não tem responsabilidade que o compromete a fazer somente algumas coisas. Então, o que o ocidente fez de mágico, ainda que não se dê conta, no curso do final do século 19 para o 20 e para o 21, é essencialmente ter criado o DNA da economia. A economia funciona e os valores são transportados em documentos oficiais. (...) Todo o sistema da economia capitalista é essencialmente governado por documentos que estão em fórmulas que nos dão o DNA de tudo e tudo se movimenta em papel”.

transição. Tem que ser um sistema legal que os vincule, que os conecte aos outros 7 milhões de pessoas porque isso é o que lhes permite dar valor aos bens que possuem”. E conclui: “Há um custo de ser formal. Há um custo de ser informal”.

Assim como a lei especialmente feita no Peru para favorecer os Chipivos acaba por alijá-los do mercado expandido e, consequentemente, de oportunidades de desenvolvimento, de Soto alerta-nos para o perigo de leis aparentemente protecionistas, mas que podem excluir os mais pobres das oportunidades advindas da economia formal.

E conclui: “Isso quer dizer que os peruanos não são desconhecedores da lei, não são informais porque assim é sua cultura. Quer dizer que a lei peruana é ruim. E há que se averiguar por que é ruim. Temos ido para diferentes partes do mundo e verificado que ser titular em Manila, nas Filipinas, leva 25 anos; ser titular em uma casa no Egito leva 17 anos; legalizar uma padaria no Cairo, no Egito, leva 548 dias; ter uma máquina de costura no Peru leva 278 dias. Se alguém procura a lei, começa a se dar conta de que criamos uma lei, em muitos países latino-americanos em desenvolvimento, que é hostil. Essencialmente para as empresas e para os pobres”.

Segundo de Soto, “quando temos pessoas em um setor informal, sejam nativos do Amazonas, ou pobres urbanos, ou quem quer que seja que não esteja dentro da norma, temos pessoas que, basicamente, não podem seguir adiante. E, por isso, a formalidade é muito importante. E, por isso, é importante que, quando se formalize, não se crie para os pobres um estatuto legal à parte. Se quiserem, pode ser à parte para uma etapa de

Segundo de Soto, a culpada da informalidade é a lei, que dificulta a vida do pequeno empreendedor. Conta que quando pessoas informais do Peru ou do México viajam para os Estados Unidos, querem ser reconhecidas, querem ser inseridas na lei. Mas, em seus países de origem, preferem permanecer na informalidade.

De Soto apontou como causa para a recente crise econômica internacional a livre e recorrente emissão de títulos, por instituições bancárias, nos

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Estados Unidos, que não existem oficialmente. São títulos “pós-hipotecários” chamados de “derivados”. São títulos de uma hipoteca feita sobre um bem já hipotecado. A narrativa de de Soto é inquietadora: “É a primeira vez na história do ocidente que existe um bem não inscrito! Se forem à Europa, aos Estados Unidos e à Ásia desenvolvida, vão ver que todas as casas, todos os terrenos, todos os automóveis, todos os aviões, todos os barcos, todos os navios, todas as ideias, todos os passaportes, todos os revólveres, todos os roteiros, todas as fórmulas, todos os softwares estão registrados. A única exceção são esses documentos sofisticados que não existem na América Latina e que eles têm. E por considerar que era muito difícil registrá-los, os deixaram aí pelo mercado afora. E quando foi perguntado às autoridades do Security and Exchange Commission (SEC)*, à autoridade da Bolsa de Valores dos Estados Unidos, quantos desses certificados de hipotecas poderiam existir no mundo, sem registro, seu cálculo é de US$ 600 trilhões! Toda a economia dos Estados Unidos é de US$ 13 trilhões. Toda a economia do mundo em um ano é de US$ 60 trilhões. Mas, segundo os Estados Unidos, as hipotecas que eles têm, e não estão registradas, perfazem US$ 600 trilhões! E a crise veio do fato de não poder identificá-los. Porque *

se não se pode identificar quem a propagou, você não dá crédito. E uma crise é essencialmente a paralisação do crédito. (...) O que está ocorrendo agora nos Estados Unidos é que as bolsas estão subindo, mas o crédito tem baixado enormemente porque já não existe confiança um no outro. (...) O Banco para Compensações Internacionais/Bank for International Settlements**, na Europa, crê que a quantidade de hipotecas flutuando no mercado e que não estão identificadas, não é de US$ 600 trilhões, mas de US$ 1,2 quatrilhão! (...) Os países desenvolvidos já entraram em uma economia da sombra na qual ninguém sabe quem é dono do quê, em que falta documentação para que o mercado funcione. (...) Não existe economia de mercado que não seja economia formal!”. Hernando de Soto encerrou sua palestra dizendo que “há duas coisas que são importantes no mundo. É óbvio que temos aprendido que há uma ordem que nos foi dada pela natureza, a mãe natureza, e que, se não a respeitarmos, vamos nos envenenar: a ordem ecológica. Mas o que eu vim dizer-lhes é que a humanidade também criou outra ordem que se chama ordem legal. E se essa ordem legal não for respeitada, também pode nos levar à pobreza e por isso é tão importante fazer a formalização, porque é o que permite incluir no lugar de excluir”.

Equivalente à Comissão de Valores Mobiliários, no Brasil O Bank for International Settlements (BIS) é considerado o banco central dos bancos centrais e está sediado em Basileia, na Suíça.

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DESAFIOS DO MICROCRÉDITO NO MUNDO Coordenação

Walter Barelli Expositores

Fernando Balbuena Favarato Lauro Gonzalez Daniel Higa

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Walter Barelli economista, professor universitário, ex-ministro do Trabalho e ex-secretário do Emprego e Relações do Trabalho do Estado de São Paulo

O coordenador da mesa, professor

Walter Barelli, ressaltou a importância de refletir sobre as questões do microcrédito e suas dificuldades em âmbito internacional, possibilitada pela presença de debatedores da América Latina.

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Fernando Favarato gerente da Divisão de Marketing do Banco de Microcrédito Mibanco de Lima/Peru

Favarato falou da experiência do Peru no campo das microfinanças. Segundo ele, experiência que se iniciou em 1982 e que cresceu mais sentidamente nos últimos dez anos

O expositor exibiu um vídeo sobre o microcrédito no Peru, com a história das microfinanças no país andino, que começou a se organizar dentro de algumas organizações não governamentais, nos anos 1970, para depois ganhar independência. No início, os recursos disponibilizados nem sempre cumpriam suas metas, pela falta de cultura financeira e por deficiência na gestão de carteiras, e os juros praticados eram muito altos. Em 1980, o quadro começou a mudar, com a criação das Caixas Municipais de Poupança e Crédito, mas, a partir de 1985, graças a uma cooperação técnica alemã, os modelos de avaliações de crédito tornaram-se mais técnicos, o que resultou em aplicação mais eficiente dos recursos financeiros. Assim apareceram novas caixas municipais em províncias, que implementaram novas medidas, como o crédito diário, semanal, bissemanal e mensal.

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Com esses programas, as microempresas conseguiram superar a crise econômica do final dos anos de 1980. O desenvolvimento do segmento do microcrédito começou a ganhar importância nacional e a figurar nas agendas dos governos, das empresas privadas e dos organismos internacionais. Passou-se a investir mais em capacitação técnica e especialização e os microempresários a ter contato com conceitos como o de inovação, o uso de tecnologias e de contabilidade. Assim, começou a se estabelecer no Peru a base para assentar o desenvolvimento de uma pujante força produtiva. Em 1992, surgem no país as Caixas Rurais, para oferecer serviços a setores que não eram atendidos, e as Caixas Municipais continuaram em crescimento, convertendo-se em importantes ofertadoras de microcrédito. Em 1994 cria-se no país um novo tipo de instituição para aumentar a oferta de serviços financeiros ao setor: as entidades de desenvolvimento da pequena e microempresa, as Edpymes. Assim, muitas ONGs especializadas em * microfinanças convertem-se em entidades

regulares sob a forma de Edpymes e outras continuam oferecendo serviços em suas próprias escalas. No final dos anos 1990, o crescimento desse setor se consolida com a aparição do primeiro Banco da Microempresa, depois de 29 anos funcionando como uma ONG. Assim, em 1998, esse banco abre suas portas, alcançando altos padrões no mercado. Outros dois fatos marcaram a entrada do século 21: a criação dos Centros de Inovação Tecnológica (Cites) e as melhoras registradas nas centrais de risco. Esta década tem se caracterizado por maior competência no mercado das microfinanças, com a participação, inclusive, de bancos internacionais e de grupos peruanos importantes, fato motivado em parte pela rentabilidade oferecida pelo segmento, maior quantidade de informações oferecidas pelas centrais de risco, e a implementação de um marco regulatório adequado, por parte da Superintendência*, que promove a competência justa entre todos os atores do sistema. Hoje, no Peru, trabalham, no sistema de microfinanças, as ONGs, Caixas Rurais, Caixas Municipais, Edpymes, Financeiras e diversos

* Superintendencia de Banca, Seguros y Administradoras Privadas de Fondos de Pensiones (AFP) – organização responsável pelo regulamento e supervisão do sistema financeiro, de seguros e do sistema privado de fundos de pensões peruano. Fundada em 1932, seus objetivos, funções e atributos foram estabelecidos pela lei geral do sistema financeiro e do regulador da operação bancária e do seguro. Desde 2000 supervisiona o sistema da AFP.

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bancos. Essa variedade de instituições tem permitido aos empresários acessar o crédito em condições muito mais favoráveis. Hoje, 40 em cada 100 peruanos são empreendedores. É o índice mais alto do mundo e 98% das empresas do Peru são micro ou pequenas. A micro e a pequena empresa no Peru são responsáveis por 42% do Produto Interno Bruto (PIB) nacional e 75% da população economicamente ativa trabalha no setor de microempresas. Há mais de 5 milhões de empresários das micro e pequena empresas no país. Favarato acrescentou que o Peru possui 28 milhões de habitantes, dos quais 20 milhões estão na zona urbana e 8 milhões na zona rural e que vem acontecendo a ascensão da classe econômica, graças ao crescimento econômico do país nos últimos anos, mas também em parte pelo fato de 40% do PIB

ser gerado pelas microempresas que estão crescendo fortemente no Peru. O crescimento das microfinanças, desde 2002, tem sido de 30% ao ano, tanto em créditos quanto em dólares de microempresas. Já se estabeleceu um círculo virtuoso das microfinanças: por um lado, estão os mercados, e tem que ser um mercado importante, pois são 5 milhões de microempresários; é preciso ter uma oferta, hoje já são 56 microfinanceiras vinculadas. Outro componente importante tem sido a capacitação, que se dá tanto no nível público quanto nas ONGs e nos institutos privados e técnicos, que antes não a ofereciam, mas passaram a fazê-lo. Concluindo, Favarato observou que a experiência peruana bemsucedida não é necessariamente replicável, porque cada país, cada região, tem sua própria realidade.

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Lauro Gonzalez professor e coordenador do Centro de Estudos em Microfinanças da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP)

Gonzalez começou estabelecendo a diferença entre microcrédito e microfinanças, esclarecendo que o microcrédito é apenas uma parte da microfinança. Tematizou lançando a seguinte pergunta: “Será que o crédito é a maior ou a grande necessidade das pessoas mais vulneráveis?” E completou: “O interessante é que vários estudos apontam que a poupança é mais importante do que o crédito” Quem está pouco habituado com essas discussões poderia pensar: “Mas pobre poupa? Se as pessoas são mais pobres, elas não têm recursos para poupar”. O que é um engano, porque os pobres poupam, porém, de maneira diferente das classes média e mais alta. “Essencialmente, há modelos de poupança, por exemplo, na África, onde a instituição responsável pela coleta dos recursos para a poupança passa diariamente, por exemplo, em camelódramos, em feiras livres, e, nesses casos, os valores de poupança são muito menores do que os valores com os quais estamos habituados.”

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Em conclusão, asseverou que o pobre poupa com mais frequência e valores significativamente menores do que a classe média e que “quando falamos em futuro, devemos nos preocupar também com a poupança e com a capacidade de oferecer serviços adequados para os mais pobres pouparem”. Outra questão analisada foi o fato de que talvez nem todas as pessoas prefiram o empreendimento. “Há claramente uma distinção entre o empreendimento por necessidade, ou o empreendedorismo por necessidade, vamos chamar assim, e o empreendedorismo. Então, é preciso compreender um pouco mais a estrutura de preferências das pessoas mais pobres para ver se não há outros produtos, para além do crédito.” E citou dois produtos: 1. O microsseguro. Fundamental para proteger os mais pobres de eventos adversos. Por exemplo, a cidade de São Paulo passou por um período terrível de enchentes, recentemente. “Agora, é bom notar que, quando alguns desses eventos adversos acontecem, a situação de bem-estar se altera dramaticamente para os mais pobres. Para nós, não. Talvez um evento adverso, como a perda de um automóvel, ou até mesmo a morte de um ente familiar, isso do ponto de vista financeiro, afete muito mais os mais pobres.” Então, há evidências

muito fortes de que o microsseguro é tão importante quanto o microcrédito. 2. O acesso a meios de pagamento. Esse é um tema considerado irrelevante, aqui no Brasil, pela classe média. Mas há cinco ou seis anos havia uma série de municípios no Brasil onde não existia uma agência bancária sequer. “Por exemplo, em uma cidade do interior do Piauí, quando chegava o dia do pagamento do Bolsa-Família, as pessoas se reuniam em uma praça e aí vinha um sujeito com uma moto, que pegava os cartões dos beneficiários do programa e ia até a cidade mais próxima, que ficava a 70 km, para recolher os benefícios. Obviamente, ele cobrava uma taxa para isso. Taxa que, para nós, pode parecer irrisória. Mas, se ele cobrasse R$ 5 de alguém, para sacar R$ 70, R$ 80, vamos calcular aí: R$ 5 sobre R$ 70 ou sobre R$ 80, torna o custo de transação tremendo. Então, o acesso a meios de pagamento para a população mais pobre é de extrema relevância. Resumo o debate que temos lá no centro de estudos da FGV da seguinte maneira: talvez fosse melhor, em vez de microcrédito ou até de microfinanças, se pensássemos num sistema financeiro inclusivo.” Um sistema financeiro inclusivo é formado por “um conjunto de instituições que se articulam e que são

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capazes de aumentar, e aí grifo duas palavras, o acesso e o uso de serviços financeiros por parte da população mais vulnerável, que geralmente está excluída do sistema financeiro tradicional”. Para exemplificar a relevância do acesso e uso, Gonzalez disse: “Tenho um exemplo aqui do caso brasileiro que é bem ilustrativo: no Brasil existe o que se chama de conta-corrente simplificada, cujo número, em dezembro de 2009, atingiu cerca de dez milhões. Ou seja, essas pessoas têm acesso. Mas o número de contas ativas dentre essas simplificadas é de apenas 56%. Ou seja, 44% dessas pessoas que abriram essas contas-correntes não as utilizam. Elas têm acesso, mas não usam. Gonzalez falou sobre futuro e tendências do microcrédito e da importância da tecnologia e da inovação, dois fatores “que sempre andaram de mãos dadas”. Segundo ele, “Yunus nada mais foi que um grande inovador em tecnologia de crédito. Por exemplo, empréstimos em grupo, que hoje conhecemos bastante como grupo solidário, e foco em crédito para mulheres são inovações do microcrédito que não estavam na agenda dos bancos tradicionais”. O microcrédito sempre se caracterizou por um conjunto de inovações:

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na maneira de distribuir o produto, na maneira de avaliar o risco de crédito, na maneira de monitorar a carteira, etc. “Então, sempre que falamos em tendências, temos que atentar para quais são as tecnologias que poderiam eventualmente andar de mãos dadas com o microcrédito e com as microfinanças.” Estudos da FGV demonstram que “as redes de varejo são hoje grandes distribuidoras de produtos financeiros. Não só aqui. Inclusive do ponto de vista de modelo de negócio, os cartões hoje migram dos chamados Privat Labels, aqueles cartões que só podem ser utilizados na loja, para os chamados cartões híbridos, que são os que podem ser utilizados na loja e em qualquer outra instituição, porque já vêm com a bandeira das companhias de cartões de crédito”. Essa é uma tendência sobre a qual não temos informações sistematizadas, mas sabemos que a população vulnerável, que os mais pobres, frequentam essas redes de varejo. “Então, é necessário um entendimento desses canais potenciais.” Gonzalez apresentou também, como exemplo de tecnologia e inovação em microfinanças, dois casos: um do Quênia e outro do Brasil.


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O primeiro e mais recente é o caso do M-Pesa*, no Quênia. “O Quênia é um país essencialmente rural ainda, ao contrário do Brasil, e pelos números que apresentou Fernando Balbuena, ao contrário do Peru também. As pessoas vão para as grandes cidades para trabalhar, para enviar recursos para suas famílias na zona rural. E como é que essas pessoas enviam recursos? O sistema bancário do Quênia é pouquíssimo desenvolvido. Acontece uma revolução, nos últimos anos lá no Quênia, com o uso do telefone celular para a transferência de recursos para os mais pobres. Isso promoveu um impacto no acesso a meios de pagamento e na economia do Quênia”.

Isso não vale apenas para o Brasil, vale pra dezenas de países, principalmente países mais pobres. O celular tem altas taxas de penetração. Em algum momento, o celular terá que conversar com as microfinanças, como já vem conversando em alguns casos. Então, modelos que utilizem o chamado Banco Móvel, o Mobile Banking, são essenciais”.

Gonzalez continuou: “Para vocês terem ideia, esse modelo saiu do zero para cerca de 6 milhões de clientes, em cerca de três anos. Então, não é muito difícil entender quando olhamos para a penetração do celular no mundo, de um lado, fazemos um mapeamento, e quando olhamos pra penetração de microfinanças, do outro, vemos que as pessoas mais vulneráveis, os pobres, têm muito mais * acesso a celular do que a serviços financeiros.

No caso brasileiro, o debatedor falou do caso de correspondente bancário. Disse que os correspondentes bancários têm um grau de cobertura mais amplo do que as agências bancárias tradicionais. Segundo a Federação Brasileira de Bancos (Febraban), existem cerca de 84 mil correspondentes e de 18 mil agências bancárias. Outro dado relevante é que 80% dos recursos do Bolsa-Família são distribuídos pelo correspondente bancário.

Há poucos anos, o modelo predominante no Quênia era o chamado motorista de ônibus. Ou seja, o dinheiro era dado para um motorista de ônibus que o levava para a família na cidade no interior, na área rural, em uma operação sujeita a todo tipo de risco.

* M-Pesa é um serviço de telefonia celular da empresa Safaricom, do Quênia, que permite movimentações financeiras via celular, como depósito, envio e transferência, saques e, ainda, pagamento de contas (PayBills). Mais de 250 companhias já assinaram o serviço de paybills, que permite ao cliente M-Pesa fazer pagamentos como conta de água, luz, etc. Mais informações em <www.safaricom.co.ke>.

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No caso da cidade de Autazes, no Amazonas, que fica a cerca de 150km de barco de Manaus, foi aberto, “em abril de 2002, um correspondente, que é o Banco Postal, e há fortes evidências de que esse correspondente contribuiu muito seriamente para o desenvolvimento local. De 2002 para 2004, foram abertas 2.800 contas-correntes, cem novos empréstimos foram concedidos por mês e houve um crescimento de 90% na coleta de impostos. Hoje, em Autazes, já existem inclusive agências bancárias. Então, há fortes evidências de que as pessoas, antes do correspondente bancário, iam até Manaus de barco, recebiam os seus recursos, inclusive o Bolsa-Família, e lá gastavam tudo. Com o correspondente local, as pessoas passaram a gastar ali na própria região”. Retomando o tema central do seminário, Gonzalez costurou a questão do microcrédito com as tendências que foram apresentadas. “Bem, no Brasil e no mundo todo, inequivocamente, o São Paulo Confia, o Banco do Povo Paulista, o Crediamigo, que é o programa de maior escala no caso brasileiro,

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têm um ativo fundamental que é a proximidade com o cliente. E essa proximidade não é devidamente explorada pelas instituições de microcrédito, que mostram que dentro dos produtos e dos serviços de microcrédito há muita sinergia.” E exemplificou: “Os mesmos problemas dos modelos de negócio do microsseguro são os problemas do modelo de negócio de microcrédito, ou grande parte deles. Ou seja, uma instituição que já opera com microcrédito poderia explorar de maneira muito sinérgica a atividade de microsseguro também. O interessante é que nesse modelo dos correspondentes apresentados, é possível inserir as instituições de microfinanças. O Banco de Palmas, que vários aqui conhecem, um dos ícones de microfinanças do Brasil, é correspondente do Banco do Brasil”. Gonzalez concluiu sua exposição dizendo: “Quando falo em sistema financeiro inclusivo, estou dizendo que devemos criar um sistema que tenha alma e que seja capaz de tornar realidade um sonho de mundo melhor”.


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Daniel Higa diretor executivo da Planet Finance, Buenos Aires/Argentina

Higa começou sua explanação apresentando a PlaNet Finance*, que é uma ONG nascida em 1998, em Paris, criada por um economista francês chamado Jacques Attali. A visão da organização é a de um mundo sem pobreza; os valores de excelência, de ética e de fraternidade; e a missão é desenvolver as microfinanças como um recurso inclusivo e de desenvolvimento Contou que o grupo cresceu e que oferece serviços técnicos, uma empresa de qualificação de risco que é a Planet Rating; a PlaNet University, que se dedica a temas acadêmicos a PlaNet Guarantee, que se dedica a microsseguros, entre outras. “A ONG está em mais de 80 países, com escritórios em 40, e entre os membros do nosso comitê de honra está Yunus, claro.” Depois de detalhar a atuação do grupo PlaNet Finance, Higa mostrou como foi o desenvolvimento das microfinanças na América Latina. Começou por uma experiência mais conhecida, não da América Latina, *Disponível em: <www.planetfinancegroup.org>.

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mas de Yunus, em Bangladesh. “Na América Latina já existia microcrédito antes da aparição do livro de Yunus e de sua experiência. Os mais distantes vêm das civilizações originais, com é o caso do Peru. Os incas tinham a ‘rosca’, que era um mecanismo de finança solidária, espécie de cooperativa em distintos estágios de nossos países. A primeira constatação é de que já existiam microfinanças em nossos países. A segunda constatação é de que, ao mesmo tempo, fomos adaptando em cada país a informação que tínhamos.” O livro de Yunus dizia que 100% dos clientes eram mulheres e o montante que lhes davam era de US$ 50. Vimos que na América Latina essas condições não eram suficientes e, de alguma maneira, as tecnologias creditícias foram se adaptando à realidade de nossos países. Um paradigma é que o microcrédito não poderia ser para outra finalidade que não fosse capital produtivo, capital de giro, e as instituições estariam incorporando o que fosse índice de sustento inicialmente, o que fosse livre disponibilidade competindo com o consumo. De alguma maneira, todos os países foram se adaptando. Contudo, não se poderia pensar no desenvolvimento que obtiveram se a atenção continua sendo muito baixa, a respeito do mercado potencial que tem de toda a América Latina. E há algumas características particulares na base de nossa pirâmide. Por um lado, na medida em que vamos fazer os extratos mais

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altos dos microempresários, o que se denomina microempresários de acumulação ampliada, aquele que é o empresário maior, a tendência é o feito individual e as populações de menores níveis de capitalização, as bancas comuns resolviam o que era mais importante. Ao mesmo tempo na medida em que vai crescendo o tamanho do microempresário, também crescem algumas características dos créditos, como, por exemplo, os montantes em média, os prazos em média e as exigências dos serviços financeiros. Conforme cresce a pirâmide da microempresa, a taxa de juros pode baixar, porque o crédito se torna mais eficiente, e os serviços financeiros e não financeiros, como os de educação, saúde, tende a decrescer e a informalidade também tende a decrescer. Como é um modo bem-sucedido de gestão em função de tudo isso? Higa acredita que a conclusão mais contundente que a essa altura se chega é que não existe um modo vitorioso único de gestão e sim muitos modelos para cada particularidade. Contudo, lembra do que ensinou Fernando Balbuena a respeito de algumas características, como marco regulatório, produtos e serviços, para juntá-las e ampliar o conceito de microcrédito; do que disse Lauro Gonzalez, sobre microfinanças, incluindo outros serviços, mais recursos humanos e a capacitação dos mesmos e os custos de transação decrescente, como características importantes para essa questão.


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Casos latino-americanos Na América Latina, as microfinanças não pararam de crescer, agora no contexto da crise do ano passado, a um ritmo de 20% a 30% em média. No entanto, o meio econômico do país continua sendo crítico em relação a pobreza, a informalidade e a indigência. Há alguns casos que são paradigmáticos, pelo menos na América Latina, para refletir algumas experiências, como é o caso da Bolívia.

Bolívia O país era um dos paradigmas do desenvolvimento das microfinanças. Como características particulares para o desenvolvimento, registrava a falta de um sistema financeiro forte, alto nível de informalidade, e a ausência do Estado como fator de bem-estar, porque na Bolívia tem muito baixa presença. De modo que se desenvolveu, a partir desses condicionantes, o modelo de Brading e de ONGs, que vão crescendo, até se transformarem em bancos, e a experiência mais clara é a do Banco Sol, que passou de ser uma ONG a um banco e hoje atende também às Pymes e o marco regulatório foi acompanhando. Higa diz que “hoje o sistema de microfinanças na Bolívia atende não só às microempresas, mas também às Pymes”.

Peru Higa passa rapidamente pelo Peru, lembrando que Fernando Favarato já explicara muito claramente que os elementos distintivos do país são as Caixas Municipais, as Caixas Rurais e as Edpymes.

Chile No caso do Chile, explica que foi de maneira diferente, pois o país chegou ao microcrédito pelos bancos. Há quatro bancos que concentram 90% da atenção na microempresa: o Banco de Desenvolvimento, que foi um banco privado de segmento; depois o BancoEstado, que é um

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banco público; e, recentemente, o Banco Santander Banefe e o BciNova. É um modelo que tem outra lógica, que parte da plataforma bancária para chegar à microempresa. E há outros atores que têm ajudado, no caso do modelo chileno, como foi a política pública de fundos (Fondo de Solidaridad e Inversión Social – Fosis* ou Servicio de Cooperación Técnica – Sercotec**) – que facilitaram a participação das organizações. E como o Fondo Esperanza*** , a Fundación Contigo****, ONGs que trabalham muito mais na base da pirâmide.

Paraguai O modelo veio recentemente proporcionar o desenvolvimento das microfinanças. No Paraguai, a atenção às microempresas aconteceu principalmente por meio das ONGs, mas também como elemento distintivo das financeiras de consumo. As financeiras de consumo incorporaram uma unidade de microfinanças e se consolidaram como as instituições mais fortes do país.

Argentina, Uruguai e Brasil “O que acontece na Argentina, Uruguai e Brasil, que os coloquei juntos? Porque há algumas características que são comuns”, informou Higa. A estrutura socioeconômica desses países é bastante parecida. Há menores níveis de pobreza e informalidade do que em alguns dos países andinos, provavelmente, e forte presença do Estado.

* Fondo de Solidaridad e Inversión Social (Fosis) é um serviço do governo do Chile, criado em 26 de outubro de 1990. Conta com 15 regionais, 20 escritórios nas províncias e relaciona-se com a Presidência da República por meio do Ministério de Planejamento. Disponível em: <www.fosis.cl>. ** Servicio de Cooperación Técnica (Sercotec) é uma corporação de direito privado, filial da Corporação de Fomento da Produção (Corfo), que existe desde 30 de junho de 1952. Disponível em: <www.sercotec.cl> *** Fondo Esperanza (FE) é uma instituição de microcrédito solidário para pessoas que se encontram abaixo da linha de pobreza. Maior do Chile, tem o objetivo de impulsionar, com empréstimos em dinheiro e educação empreendedora, a gestação de pequenos negócios, orientados a superar a situação de pobreza no país. Disponível em: <www.fondoesperanza.cl>. **** Fundación Contigo é uma ONG, que oferece serviços de microcrédito e capacitação para aqueles que mais necessitam na região metropolitana do Chile. Disponível em: <fundacioncontigo.cl>.

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Na década de 1970, há que se pensar que nesses países o Estado era claramente benfeitor e com muita presença, de forma que isso condicionou o desenvolvimento das microfinanças. Há também uma histórica classe média, mais ampla do que nos países andinos, e também há sistemas financeiros formais maiores, que contiveram a microempresa. “Em um dos estudos, quando vínhamos ao Uruguai e à Argentina, falamos com as microempresas e vimos que se financiava por meio de financeiras de consumo, conseguindo um recibo de salário de um primo, de um parente, e com isso obtinham crédito com desconto em folha.” “Quer dizer que há mais canais para financiar, há diferença do que podia fazer a Bolívia onde não existia a alternativa financeira. Isso dá um modelo combinado que tem um pouco de tudo: as ONGs, o banco privado e o banco público, que está aparecendo, há experiência de programas públicos exitosos, que em outros países não funcionaram, mas nos países do Cone Sul funcionam e, simultaneamente, também surgiram cooperativas e instituições de consumo.” Algumas das organizações que estão em atividade nos países: no caso da Bolívia há o modelo de Upgrading; no Chile, o modelo de Downscalling*, os bancos se tornaram microfinanceiras enquanto as Upgradings se transformaram em bancos; no Peru, também há os modelos das Brandings e os modelos das Caixas; no Paraguai, o modelo das financeiras; e no Uruguai, Brasil e Argentina, como uma incógnita desses lugares, coexistem o banco público, no primeiro patamar, os programas públicos fazendo atendimento direto, e as ONGs e cooperativas de consumo. Esses são alguns dados a respeito das carteiras e se pode ver claramente que o Peru, por exemplo, em determinada atenção de clientes, está longe de qualquer um dos outros países, por isso foi classificado pela revista The Economist como o país com mais desenvolvimento em microfinanças, no último ano. E Mibanco está claramente entre as instituições mais fortes.

* Downscaling (do inglês) é termo técnico em economia utilizado para definir a segmentação de mercado ou maior participação das instituições financeiras reguladas que estão entrando no mercado de microfinanças. São instituições tradicionalmente voltadas a grandes clientes, normalmente corporativos e que passam a atender às micro e pequenas empresas. Upgrading (do inglês) é termo técnico em economia utilizado para definir as ONGs que concedem microcrédito e que se transformaram em instituições financeiras reguladas.

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O papel dos Estados, no caso da América Latina, também é diferente do que se pratica nos países asiáticos, inclusive as experiências africanas, que têm forte presença do Estado. O Estado atua como regulador, no caso de alguns países. Na Colômbia, no Paraguai, tem a Lei de Usura, e no Uruguai tem a Lei de Usura para o topo da taxa de juros. No caso dos impostos, no caso dos tetos de empréstimos, como há em alguns países, como gerar condições para a inclusão como mencionava de manhã Hernando de Soto? Como os Estados vão gerando normas que permitem a formalização? Do lado da política mais macro, o Estado teve papel preponderante na América Latina e, de alguma maneira, os serviços de saúde, educação, foram fortemente canalizados, com muita lógica. Na África, esses serviços foram canalizados para as ONGs, por exemplo. No caso da Argentina, criouse uma política ativa de microcrédito, que é a Comissão Nacional de Microcrédito. As experiências do CrediAmigo, no Nordeste, e as experiências do Banco do Povo, em São Paulo, a experiência da Banca de las Oportunidades, na Colômbia, a Foncap e Fuerza Solidária, na Argentina, são todos programas que tem a ver com a ingerência pública, com a política pública. Esta vista como uma política de Estado das microfinanças. Alguns dos desafios que que o setor tem, contou Higa, são, por um lado, os microcréditos

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e as microfinanças, que sempre são abordados, e as organizações sabem muito bem, de dois lugares: ou do lado social ou do lado financeiro. Isso implica que exista sempre tensão entre essas duas dimensões, que muitas vezes colidem, pois uma faz muito mais em face do impacto e outra muito mais em face da sustentabilidade da instituição. Em qualquer um dos casos, talvez, o importante é essa tensão que existe entre o social e o financeiro. É uma tensão necessária para o desenvolvimento das microfinanças. Há que se sustentar essa tensão entre o social e o financeiro, porque o objetivo, finalmente, para nós, tem a ver com democratizar o crédito e, de alguma maneira, há uma terminologia utilizada pelos espanhóis na Caixa Catalunya que é muito interessante: a “finança de proximidade”. É essa finança que permite estar perto das pessoas. Com relação a alguns desafios particulares, me parece que esses, das terminologias, são desafios que surgem, e mencionado por Lauro Gonzales a respeito do Mobile Banking, que é a contabilização de origem, de onde se deduziu que se pode contabilizar algumas variáveis: o futuro comportamento dos clientes, as centrais de risco. São elementos tecnológicos que ajudam a melhorar a massificação, o que significa, em princípio, reduzir custos.


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Um dos problemas das microfinanças, visto do lado das políticas públicas, é que os custos das transações são muito altos. O que tem a ver com outros serviços, como o das remessas, microleasing, microsseguro. Creio que o microsseguro é uma temática mais forte do que o microcrédito, porque, como aponta o estudo da Fundação Getúlio Vargas, alguns microempresários consideram o microsseguro mais necessário. E microsseguro está intimamente relacionado com a poupança. O seguro, para qualquer um de nós, é a poupança de hoje para a eventualidade de amanhã. Então é preciso gerar uma cultura de poupança. Acredito que há que se prestar atenção aos outros canais, dentre os que são corresponsáveis não bancários, creio que os agentes postais são importantes. Os bancos atuam como agentes de primeiro e de segundo patamar. Os serviços financeiros são uma temática que também está implícita em microfinanças, que as instituições que dão apoio no financeiro, capacitando algumas instituições, vão deixando em nome da sustentabilidade financeira. Parece-me que esse é um erro, tem-se que recuperar parte desses serviços no financeiro. Acredito que a menção de resultados seja outro tema que nossas organizações devem ter. Como medimos os resultados do que estamos fazendo? Quando nos damos conta de que

serve para combater a pobreza, que serve para aumentar a inclusão, o tema do impacto social claramente se desprende disso. Há uma tendência muito forte, ao que se denomina rating social. Rating social cura uma parte, mas não sabemos o que se passa com os clientes, com os sistemas financeiros. O papel dos que pedem (doadores), na América Latina, parece-me que é um ponto crítico em nossos países. Pela taxa de crescimento registrada nos últimos anos, deixaram de ser países incompreensíveis. Entretanto, dentro de nossos próprios países há muitas assimetrias que requereriam ser cobertas. A necessidade de atender a outros segmentos: Creio que esse é um desfio importante. O âmbito rural, que tem um comportamento totalmente diferente do âmbito urbano, em termos de eficiência de chegada, de dificuldades. O sistema dos novos clientes: As microfinanças atendem somente os clientes antigos. Que acontece com os novos clientes, com aqueles que começaram um novo empreendimento? Que acontece com os jovens, na América Latina? As estatísticas mostram dados alarmantes, em termos da juventude. Jovens que têm entre 16 e 20 anos, que não trabalham, não estudam, e, consequentemente, não são sujeitos de crédito, mas sim sujeitos da exclusão. Então,

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como atendemos a esses setores? O tema da inclusão cidadã. Pensar na inclusão financeira como um passo para a inclusão social, para a inclusão cidadã. Algumas conclusões finais. O tema do modelo. Parece-me que os modelos são próprios: o tema do desenvolvimento, as microfinanças como elemento de desenvolvimento e luta contra a pobreza. Creio que há outro efeito, nas microfinanças e no microcrédito. Tudo o que é gerado como efeitos secundários, ou seja, as microfinanças não são somente a possibilidade de obter um crédito, mas também a possibilidade de a pessoa sentir que alguém acredita nela. E creio que isso também é importante: deixa gerar redes, deixa gerar responsabilidades, deixa gerar valorações. Talvez, no caso da América Latina, particularmente, é preciso entender que o Estado é onipresente e que as microfinanças não substituem as políticas públicas. De alguma maneira, para finalizar, o que buscamos, em termos dessa população, é a inclusão. A inclusão por meio da melhora do acesso à cidadania. E isso tem alguns componentes, entre os quais: os serviços básicos, saúde e educação, infraestrutura, a formalização, como ensinou Hernando de Soto. Isso gera inclusão e cidadania, o acesso aos serviços financeiros, que é um pouco o que as microfinanças buscam. Desde onde?

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Desde a tecnologia especializada, porque são tecnologias muito especializadas e com custo de transações que é melhor do que o que têm os microempresários, que são: os que não têm acesso a nenhum crédito, os que os costureiros acessam, os de um lugar que tem taxas muito altas. Essas são as chaves das microfinanças. Isso me parece que está marcado no âmbito da confiança. A confiança é que permite a interação e a inclusão. E, ao mesmo tempo, a confiança gera o maior capital social dentro da comunidade. Dar crédito é crer e se um crê no outro, o receptor do crédito começa a crer em si mesmo. Isso é uma mudança cultural. Aí começa a se gerar um círculo virtuoso, que gera redes, que gera desejos de melhoras. E, finalmente, o capital social, para que sirva às sociedades. Serve para gerar mais desenvolvimento, menor desigualdade e condições de segurança. Em cidades mais populosas, como São Paulo, a segurança não vai melhorar pela severidade maior, vai melhorar seguramente quando as sociedades forem mais justas, e quando as sociedades tiverem desenvolvimento mais harmônico, porque é isso que faz com que o custo da oportunidade seja muito alto. Finalizando, Higa propôs como reflexão uma frase de Teresa de Calcutá: “Às vezes sentimos que o que fazemos é tão somente uma gota no mar, mas o mar seria menor se lhe faltasse uma gota”


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DESAFIOS DO MICROCRÉDITO NO Brasil Coordenação

José Luiz Ricca Expositores

Marcelo Azevedo Teixeira Hugo Duarte Jerônimo Ramos Antônio Sebastião Teixeira Mendonça Fátima Fernandes de Araújo

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José Luiz Ricca coordenador de Desenvolvimento Regional e Territorial da Secretaria Estadual de Desenvolvimento, São Paulo/SP

Ricca abriu os trabalhos ressaltando a importância do tema do painel Desafios do Microcrédito no Brasil, especialmente no século 21, em que a oportunidade de trabalho de maneira mais autônoma, de maneira empresarial, empreendedora, é o desafio

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Marcelo Azevedo Teixeira gerente do Ambiente de Microfinanças Urbanas do Programa Crediamigo, Fortaleza/CE

Teixeira disse que o programa de microcrédito Crediamigo tornou-se referência no País, inspirando outros programas semelhantes. Iniciou sua fala apresentando alguns números do Banco do Nordeste que, segundo ele, é pouco conhecido no Sudeste do Brasil, mesmo tendo uma agência de captação na Capital de São Paulo, na Avenida Paulista

O Banco do Nordeste foi fundado em 1952 e possui 183 agências, que atendem a 1.989 municípios e possui 5.900 funcionários, administrando um ativo de R$ 44 bilhões, com patrimônio líquido de R$ 2 bilhões. A maioria dos ativos do Banco do Nordeste está em aplicações de crédito, com 12,8% de alocação de capital e com risco dentro da linha Brasil por se tratar de um banco federal. Acrescentou que o foco do banco é atuar no setor produtivo e, em 1997, resolveu voltar-se para a camada mais baixa da pirâmide social, iniciando com cinco unidades-piloto, segmentando os empreendedores com faturamento de até R$10 mil/mês, ou seja, R$ 120 mil/ano. Se o empreendedor

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tem uma faixa de faturamento acima desse limite, já pode ser atendido por outras linhas de financiamento do Banco do Nordeste. O programa Crediamigo é o maior do País no segmento, tendo 2.500 funcionários. O princípio básico do programa é o autossustentabilidade. É um downscaler de um banco público, porque aliou a experiência do banco público a uma unidade de negócios especializada em microcrédito e conta hoje com 550 mil clientes ativos e pretende atingir, em 2011, a meta de 1 milhão de clientes ativos. O programa Crediamigo realiza hoje algo em torno de 5 mil operações/dia, com valor médio de R$ 880. Em 2009, desembolsou R$ 1,5 bilhão. Em 2008, recebeu do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) o prêmio de excelência em microfinanças da América Latina, por ter sido a instituição com melhores resultados naquele ano. No cenário latino-americano, o Crediamigo é o segundo maior programa em termos de clientes ativos, atrás do Banco Compartamos, do México. Quanto aos produtos, o Crediamigo oferece uma gama pensada para melhor adequarse à realidade de seus clientes. Assim, oferece o capital de giro, que é o principal produto, normalmente a porta de entrada; o investimento fixo, que abrange operações de

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pequenas reformas, inclusive para residências; o Crediamigo Comunidade, um programa especializado dedicado a grupos de 15 a 30 pessoas que estão entre os mais pobres. Os pobres dos pobres, com empréstimos de no máximo até mil reais. Todo cliente recebe uma conta-corrente, na qual os recursos são depositados, faz um seguro prestamista, para garantir a operação de crédito, e tem acesso a seguro de vida que o banco possui em parceria com a Seguradora Mafre. Todos os clientes do Crediamigo recebem também orientação empresarial contidas em duas cartilhas anuais, que tratam de temas como vendas, planejamento, etc. Talvez seja esse um dos motivos para que o programa opere com uma inadimplência muito baixa, em torno de 1%. Dentre os produtos oferecidos, o capital de giro trabalha com juros de 1,32% ao mês, para empréstimos de até mil reais, com a cobrança de uma Taxa de Abertura de Crédito (TAC) de 3%, dentro do Programa Nacional de Microcrédito Produtivo Orientado (PNMPO), que é uma legislação específica, e com prazo de até 12 meses, prazo máximo para capital de giro. Acima de mil reais, a taxa de juros varia entre 2% e 3%, dependendo do tempo de operação do cliente, que, a partir de três operações, tem


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a menor taxa, que é de 2%. No investimento fixo, o prazo é de até 36 meses, com taxa de 2,95%, para até R$ 8 mil e o capital de giro até R$ 15 mil. A base de sustentação do programa é o assessor de crédito, nome que o agente de crédito recebe no Crediamigo. Os assessores de crédito e todas as pessoas que trabalham em campo são contratados por Oscips. O Crediamigo trabalha com duas: o Instituto Nordeste Cidadania, que atua na região Nordeste, e o Viva Cred, que atua no Rio de Janeiro. Teixeira destacou que o Instituto Nordeste Cidadania foi agraciado com o prêmio de uma das “150 melhores empresas para se trabalhar”, contemplando uma preocupação do Banco do Nordeste que é a qualidade de vida de seus colaboradores. Os resultados qualitativos do Crediamigo geraram um livro, O Mistério Nordestino, escrito pelo professor Marcelo Neri. Nesses resultados, 60% dos seus clientes, que entraram no período de 1998 até 2006, saíram da linha de pobreza, registrando um aumento de 35% de rendimento desses clientes, já descontada a inflação, e 15% do consumo e, ainda, que 51% desses clientes também são beneficiários do Bolsa-Família. Ou seja, esse cliente está altamente focalizado na classe mais pobre.

A conclusão do estudo é que o Nordeste conseguiu ter mais acesso ao crédito do que o restante do País, segundo as pesquisas, e a causa desse melhor desempenho deve-se ao programa Crediamigo. Teixeira trouxe alguns temas que propôs que sejam incluídos na agenda, inclusive nas discussões do seminário, como desafios: 1. Ampliação da oferta. Como, baseados em experiências existentes, entre elas, o Crediamigo, o Banco do Povo, o Banco Santander, pode-se ampliar a oferta de microcrédito? Quando os grandes bancos, e são seis no País, se voltarão para esse segmento tão importante da economia? 2. Como as ONGs, as Oscips, as Sociedades de Crédito ao Microempreendedor e à Empresa de Pequeno Porte (SCMs) podem ter escala? Pela falta de escala, essas instituições tornam-se insustentáveis no médio prazo. 3. Desenvolvimento de novos produtos para o segmento. 4. Simplificação do acesso ao crédito habitacional, fronteira em que ainda não se conseguiu chegar, nesse segmento de baixíssima renda.

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5. A assimetria de informação que ainda existe nesse segmento. Os empreendedores pouco conhecem e, às vezes, são enganados em termos de taxas de juros, por exemplo. 6. O efeito no birô positivo. Já implantado com sucesso em outros países, a ficha positiva do cliente é sua credenciadora. 7. A transparência das organizações, já buscada pelo Banco Central. 8. A tecnologia é outra discussão do futuro, principalmente a questão do telefone celular.

9. Baixar os custos por cliente. 10. Ampliar o papel dos correspondentes bancários, que hoje está restrito ao recebimento de boletos. 11. Introduzir o telefone celular como meio de realizar operações financeiras. Teixeira encerrou sua participação com uma mensagem de Yunus: “Acredite firme e profundamente que podemos criar um mundo livre da pobreza, se assim quisermos. Pensem nisso”.

*

Livro: NERI, Marcelo. Microcrédito: o mistério nordestino e o Grameen brasileiro. FGV, 2008. Sinopse: O livro explicita a visão dos pesquisadores do Centro de Políticas Sociais, da Fundação Getúlio Vargas, sobre as maiores conquistas, percalços e desafios do principal programa de microcrédito do país: o CrediAmigo. E propõe um paralelo ao programa de microcrédito que deu o Prêmio Nobel da Paz de 2006 ao Grameen Bank. O resultado geral do presente projeto são dois produtos integrados: este livro e um site: <www.fgv.br/cps/crediamigo>, composto de bancos de dados amigáveis e interativos.

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Hugo Duarte presidente do Conselho Administrativo da São Paulo Confia, São Paulo/SP

Duarte começou mostrando a imagem de uma fila no centro da cidade de São Paulo e disse: “Essa fila é formada na Rua Barão de Itapetininga, começa na Rua Dom José de Barros e acaba no Teatro Municipal. É a fila do desemprego. Toda segunda, terça e quarta essa fila tem 300 metros. É aí que nasce a desilusão E essa fila é simplesmente para entrar em uma agência de empregos para ter uma oportunidade. Depois de um, dois, três, seis meses, um ano nessa fila, desilude-se. Ao lado dessa fila existe uma vitrine disputadíssima: a do homem-placa que está há mais de um ano com os mesmos cargos. É disputadíssima: todo mundo quer anotar as ofertas de emprego que aparecem nela. Mas quando vai procurar o emprego, não existe esse emprego. Aí a gente começa a gerar o autoemprego. E temos de estar preparados para levar esse pessoal ao empreendedorismo. Divulgar para eles o que existe”.

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Há hoje uma grande preocupação, na Prefeitura de São Paulo, na Secretaria do Desenvolvimento e Trabalho, um trabalho muito forte com os Centros de Apoio ao Trabalho (CATs)*, que recebem centenas de milhares de pessoas por dia e divulgam para essas pessoas que elas podem se tornar empreendedoras. “O que acontece com uma pessoa da classe D que perde o emprego? Imagine uma pirâmide: até esse dia, ela tinha cartão de crédito, cartão de saúde, tinha carteira registrada, e vai caindo para a base da pirâmide sem ter ninguém para socorrê-la nessa hora. Só se fala na periferia e nos excluídos. Temos que lançar uma rede para proteger, não para esperar cair. Para amparar no meio do caminho. E o CAT serve para isso. Serve para divulgar. Você não quer investir em alguma coisa? Você não quer fazer isso? Aqui, gente, eu vou esnobar: dá uma olhada nos parceiros da São Paulo Confia. Temos aqui a União Geral dos Trabalhadores (UGT), o Natal Léo está aqui, o Santander é nosso sócio. Imaginem quanto é importante quando o Fábio Barbosa diz que se sobrar dinheiro é para mandar para a São Paulo Confia”. A São Paulo Confia aumentou, em um ano e * três meses, o número de suas agências de 10

para 18. Um crescimento de 25%, por ter uma estrutura muito bem formada, preparada para receber recursos. Apontou como o maior pilar dessa estrutura a gerência de administração e planejamento de RH. Disse, fazendo analogia com uma escola, que o RH é o departamento pedagógico, seu departamento pedagógico, que é o coração de uma escola. “No microcrédito, é nesse departamento que vamos capacitar, formar, os agentes de crédito. É aí que nasce a tão falada Academia dos Agentes de Crédito. Porque é esse departamento que vai dar todas as diretrizes para os desafios do microcrédito, que vai dar qualidade no atendimento. ‘Mas quem são os professores?’ São vocês, os agentes de crédito! São vocês que vão ensinar lá na base, na periferia, como é que se constrói, como é que se vive com dignidade, como é que se aumenta a autoestima, como é que se pode viver com vontade! São vocês, os agentes de crédito, que vão respirar se, em casa, aquela família comeu hoje, se aquela família viveu hoje. É essa a qualidade que queremos. Dar para o agente de crédito a formação, a coragem, a técnica para descer até a base da pirâmide, esticar a mão e trazer de baixo pra cima aquele que tem restrição bancária, aquele desprestigiado que não sabe o que fazer se dermos o dinheiro na mão dele.”

* Centro de Apoio ao Trabalho (CAT) da Secretaria Municipal do Trabalho de São Paulo

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A São Paulo Confia dá crédito para quem não tem experiência. “Ora, parece meio fácil dar crédito para quem já está constituído. Parece meio covardia emprestar dinheiro para quem dificilmente não vai pagar. Quero ver emprestar dinheiro para quem está em casa e não sabe sequer o que fazer. Mas o agente de crédito vai lá. Em reuniões de família, presencia conversas assim: ‘Ninguém bate na minha porta para dar alguma coisa. Só batem na minha porta para pedir favor’. O agente vai bater em uma porta e perguntar: ‘A senhora está precisando de dinheiro? Quer abrir um negócio?’. E ela: ‘É, até que eu estava pensando, mas não sei fazer nada! Mas eu queria arrumar dinheiro...’. ‘Então, nós tocamos sua campainha porque soubemos que a senhora faz bolos, ou é uma costureira, e viemos aqui oferecer dinheiro para a senhora’.” Duarte enalteceu a qualidade de sua equipe e afirmou que quem investe em microcrédito tem o dobro do lucro líquido sobre o valor investido. Por isso a São Paulo Confia está fazendo um mapeamento social da cidade de São Paulo com o objetivo de levantar as necessidades de cada local e definir onde colocar mais agências da instituição. Uma característica dessas agências é que, no mínimo, 50% dos agentes de crédito são mulheres. Dessa forma, a São Paulo Confia pretende dar sua contribuição para minimizar

a falta de empregos, mais sentida por mulheres do que por homens, no mercado de trabalho. A São Paulo Confia criará mais 80 vagas para agentes de crédito, para prestigiar o trabalho da mulher. Mas há um motivo a mais para que a São Paulo Confia prestigie a mulher: a confiabilidade que ela inspira, o que facilita seu acesso às residências para a prospecção das necessidades do futuro cliente de microcrédito. O resultado dessa confiabilidade é que 60% dos empréstimos são feitos por mulheres. Houve uma mudança na metodologia da São Paulo Confia. Embora não exista nada de científico, todo mundo acredita que, ao emprestar dinheiro para o mesmo segmento, pode-se quebrar. As instituições de microcrédito têm medo de emprestar dinheiro para o mesmo segmento. Existem cinco bares que querem microcrédito? Por que não fazer? Não existe inclusão social sem risco. Não é no decreto que se estabelece a sustentabilidade. É importante atentar para as diferenças locais. Comparando São Paulo e Bangladesh, o palestrante disse que São Paulo não tem apenas bolsões de pobreza, mas que a pobreza está presente em todos os lugares. Tanto que a unidade central da São Paulo Confia, localizada no bairro da Luz, atende uma grande comunidade. Falou ainda que o papel do agente de crédito não é o de um simples portador de

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cheques de empréstimos, mas de um gerador de consciência sobre a importância de sair da informalidade e vir para a formalidade. Como a vantagem de alguém, com 55 anos de idade, passar para a formalidade e, com mais 15 anos de trabalho, ter direito à aposentadoria. Na avaliação de Duarte, o microcrédito é muito mal divulgado ainda e os resultados positivos de uma campanha de rádio realizada para divulgar o microcrédito demonstram o potencial a ser explorado, por meio de uma maior divulgação. Para aqueles que não sabem o que querem fazer profissionalmente, a São Paulo Confia quer disponibilizar uma prateleira de produtos, como

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franquias, de forma que os interessados sejam não apenas financiados, mas também treinados para a inserção no trabalho. Duarte encerrou sua conferência dizendo que a São Paulo Confia tem muitos desafios pela frente, mas o maior deles é a coragem de empreender. A São Paulo Confia ainda é pequena, mas já atua no mercado com arrojo. E acrescentou: “Vamos procurar nas periferias de São Paulo aquela pessoa que deixou de cursar a faculdade porque não pode pagar; vamos dar o emprego para ela, colocar na Academia de Agentes de Microcrédito, que, com 360 horas, forma um ótimo profissional”


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Jerônimo Ramos superintendente da Real Microcrédito, do Grupo Santander, São Paulo/SP

Ramos iniciou sua participação dizendo que, para trabalhar com microcrédito,é preciso ter a convicção de que se pode efetivamente transformar o mundo, construir um mundo melhor. Disse que o trabalho com os empreendedores informais ensinou-o a não chamar o cliente de pequeno empreendedor, mas de grande empreendedor de um eventual pequeno negócio. Porque a importância dele é de um grande empreendedor

Por que o microcrédito no grupo Santander? “Optamos pelo microcrédito produtivo e orientado, aquele que gera renda e emprego. Quando se dá um crédito sem direcionamento para qualquer pessoa, essa pessoa pode pagar dívidas, pagar agiota, seu cheque especial, mas o microcrédito produtivo e orientado é o que vai fazer com que aquela comunidade e aquele indivíduo o transforme num círculo

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virtuoso. Sabemos que o empreendedor e nós, também, temos muitos sonhos, então, é nossa responsabilidade levantar as necessidades desse cliente e ofertar-lhe a linha de crédito correta, caso contrário, aquilo que é sonho vira pesadelo. É o agente de crédito que identifica essas necessidades. Há uma peculiar consequência positiva do microcrédito: a que acontece em cadeia. Além dos microempresários, são beneficiados seus filhos. Pela estabilidade financeira um pouco melhor de seus pais, eles podem estudar e assim garantir um futuro melhor, mais empregabilidade e, consequentemente, melhor renda”. Contou que seu presidente, Fábio Barbosa, costuma dizer que “não podemos ir bem, em um país que vai mal. Aqui em São Paulo, no Ceará, em qualquer Estado, não podemos ir bem, numa comunidade que vai mal. A grandeza do microcrédito é chegar até esses clientes e promover a transformação daquele indivíduo, daquele núcleo familiar, daquela comunidade. Noventa por cento da riqueza gerada por esses empréstimos é consumida dentro da própria comunidade. E aquele PIB, aquela riqueza é consumida dentro da própria comunidade”. A atividade não tem tristeza. “Vamos visitar um cliente e esse cliente, esse empreendedor, nos recebe com alegria, nos oferta o cafezinho na sua melhor xícara e, muitas vezes, a melhor xícara

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desse cliente é um copo de geleia. A relação é de profunda confiança, com esses clientes.” Falando do papel do agente de crédito, disse que além de oferecer orientação financeira, muitas vezes tem que exercer o papel de psicólogo também, de ser o economista da vida daquele cliente, de o estruturar financeiramente. “Mas uma das grandezas que estamos vendo, dentro da abrangência do trabalho de um agente de crédito, é o compromisso que temos com a orientação da educação desses clientes, com a orientação para fazer com que esses pais acompanhem o estudo de seus filhos. É o nosso envolvimento com a sustentabilidade. A Real Microcrédito está sendo projetada para daqui a dez anos e por isso a sustentabilidade do cliente é tão importante. Se o cliente não tiver sucesso, daqui a dez anos a Real Microcrédito não o terá para elevá-lo a outro patamar de consumo.” Esclareceu que, dentro da relação bancária comum, o cliente vai até o banco. O cliente formal. Já o cliente informal tem medo de banco, tem medo do gerente e então é o agente de microcrédito que vai até esse cliente. Deu o exemplo de um agente de microcrédito no Maranhão que pegou um barco, uma bicicleta e andou 8 km a pé para chegar até um cliente. Isso mostra a determinação em mudar a vida de uma pessoa.


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Ramos concluiu dizendo: “Gosto muito de uma frase que diz assim: ‘não sabendo que era impossível, o camarada foi lá e fez’”. E acrescentou: “Hoje, dentro do grupo Santander, temos uma assinatura que é ‘juntos nós somos muito mais fortes’. Penso que, dentro dessa bancada aqui (se referindo à mesa do segundo painel), tem uma fortaleza tremenda. Falta aqui talvez o Itaú Microcrédito, falta o Bradesco Microcrédito, falta o Banco do Brasil Microcrédito, para se juntar a todos nós. Juntos, podemos fazer um País melhor e as linhas de microcrédito podem ser esses agentes de transformação”. Desde 2002, quando a Real Microcrédito foi constituída dentro do grupo Santander, já foram desembolsados R$ 600 milhões. Isso em oito anos, portanto. São 262 funcionários e quase 200 agentes de crédito. Só em 2009, foram desembolsados R$ 230 milhões. “Se considerarmos que o valor médio de empréstimo está em torno de R$ 1.150,00, perceberemos que há um esforço tremendo para atingir essa produção. Pelo programa Real Microcrédito, já passaram 300 mil pessoas, beneficiando

direta ou indiretamente quase um milhão de pessoas. A meta para esse ano é desembolsar algo em torno de R$ 300 milhões, e ter na carteira de crédito ativa valores na ordem de R$ 100 milhões, com 103 mil clientes ativos na carteira de empréstimos.” A Real Microcrédito opera hoje em 12 Estados, com predominância no Nordeste, região em que há uma vocação maior para o microempreendedorismo. A base de clientes do projeto tem algo em torno de 67% de mulheres. O projeto privilegia também os grupos solidários, os bancos comunitários, com até 30 clientes. “Para todos esses clientes informais, o crédito se dá na pessoa física, embora o seu raciocínio seja o de pessoa jurídica. Renovação de 60% no primeiro mês de vencimento daquele contrato e 30% de renovação no segundo mês. Mais à frente, só 10% dos clientes tendem a renovar seus contratos. O cliente que já demonstrou capacidade de pagamento passa a ter um crédito pessoal na Real Microcrédito. A Real Microcrédito não pode concorrer com os produtos convencionais do Banco Santander, mas o trabalho agrega valor à marca para seus clientes.”

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Antônio Mendonça diretor executivo do Banco do Povo Paulista, São Paulo/SP

O objetivo do Banco do Povo Paulista não é apenas incentivar a geração de emprego e renda, mas transformar a vida das pessoas, oferecer cidadania real.“Estamos proporcionando a emancipação não apenas social, mas a emancipação produtiva”

O Banco do Povo Paulista foi criado há 12 anos, no governo do Estado de São Paulo, pelo saudoso Mário Covas. Graças à parceria com o Cepam e ao envolvimento da Fátima Fernandes de Araújo, foi possível trazer o professor Yunus, o inspirador da instituição, para comemorar os dez anos do Banco do Povo Paulista. “Ele veio aqui e relembrou alguns de seus ensinamentos: ‘Para você ganhar um dólar, precisa de um dólar, para quem não pode oferecer garantias, você não pode exigir garantias’. Mas também ensinamos para ele. Ele falou que política não pode se envolver nas questões de microcrédito, olhando lá em Bangladesh, um país pequenininho, menor que o meu Estado do Ceará, com uma população tão numerosa quanto a do Brasil. Infelizmente, a corrupção lá é maior do que aqui. Ele trouxe essa visão, essa vivência dele como conceito maior.” “Nós apresentamos, com o Banco do Povo Paulista, um programa de governo que é um exemplo de política pública que tem que ser assumida pelos governantes do nosso País. Basta ter seriedade.

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Basta ter um propósito único de ajudar àquele cidadão que tanto carece de nosso amparo. Esses ensinamentos, apresentamos com muito orgulho, especialmente para a equipe que acaba construindo os resultados obtidos.” O objetivo do Banco do Povo Paulista não é apenas oferecer a geração de emprego e renda, mas transformar a vida das pessoas, oferecer a cidadania real. “Estamos de proporcionando a emancipação não apenas social, mas a emancipação produtiva. Para isso há um mecanismo que colocamos à disposição, em todos os 431 municípios que hoje são parceiros do governo do Estado de São Paulo. Para chegar em cada município, como a maioria de nossos agentes já sabe, formalizamos um convênio com as prefeituras. O Banco do Povo Paulista oferece 90% dos recursos que são empregados pelo governo do Estado de São Paulo em cada município. A prefeitura entra com 10% dos recursos lá emprestados. A prefeitura oferece, além da infraestrutura, o agente de crédito, o capital humano que vai promover o verdadeiro desenvolvimento nas comunidades. Além da seleção e do treinamento dos agentes de crédito, o governo do Estado de São Paulo gerencia o programa.” Desde a estruturação da Coordenação de Políticas de Empreendedorismo da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho de São Paulo, conseguiu-se montar uma equipe que tem muita

importância na condução do processo burocrático do Banco do Povo. Mas o destaque maior só pode ser dado a uma das figuras mais importantes, se não a mais importante. Na verdade, não estou falando de membro de comitê, nem de agente de crédito, nem de nenhum membro da coordenação, mas do prefeito. Se o prefeito não assumi-lo de fato como propriedade sua, o programa não vai para frente. Temos belos exemplos. Sempre costumo citar o ex-prefeito Itamar Borges, lá de Santa Fé do Sul, que transformou, na sua gestão, uma cidadezinha de pouco mais de 30 mil habitantes naquela que mais empresta recursos em todo o Estado de São Paulo. Para isso, ele se envolveu diretamente na condução do programa. Mesmo como ex-prefeito, hoje fez questão de estar presente em nosso seminário. Quando batizava uma criança, já perguntava quem fazia a fralda: ‘Está precisando de recursos? Vá ao Banco do Povo’. Se ia falar de saúde, citava o Banco do Povo; ia falar de educação, lembrava do Banco do Povo. Montou uma equipe muito estruturada, oferecendo condições reais de trabalho para essa equipe. Estou citando o ex-prefeito Itamar, mas há muitos outros exemplos, em nosso Estado, de prefeitos que de fato assumiram o Banco do Povo Paulista como instrumento de desenvolvimento, de transformação social.

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Os municípios conveniados com o Banco do Povo Paulista abrangem mais de 90% da nossa população. E chegou de fato à cidade de São Paulo, com o prefeito Gilberto Kassab, por determinação e parceria do então governador de José Serra, do prefeito Gilberto Kassab e do exsecretário Afif. O Banco do Povo Paulista dá mais um exemplo de política pública de qualidade. São Paulo tem o espaço para o São Paulo Confia, o Banco do Povo Paulista, e todas as instituições que trabalham com o microcrédito. Antônio Mendonça esclarece: “Se juntarmos todas as instituições que há aqui, talvez faltem recursos para atender aquele cidadão. E são ações que não concorrem entre si, mas se complementam. E é nessa visão de ação complementar que chegamos, aqui na cidade de São Paulo, em parceria também com a Associação Comercial de São Paulo, a 15 novas unidades, instaladas em apenas 45 dias. A exemplo dos outros programas, o nosso também se destina aos empreendedores informais e formais, especialmente agora, com a criação do microempreendedor individual, uma figura desenhada por nosso secretário ainda quando era presidente da Associação Comercial. O então secretário Afif levou a ideia ao Presidente Lula e conseguiu promulgar a lei que hoje já é uma realidade. Esse, com certeza, será o maior programa de inclusão social do Brasil. Temos hoje mais de 800 mil pessoas formalizadas, conforme disse Afif Domingos”.

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Os programas de transferência de renda são muito importantes para ajudar o cidadão num pequeno espaço de tempo e nesses programas há, hoje, um universo de 12 milhões de pessoas no Brasil. A meta agora é levar nova cultura para essas pessoas: a cultura do produtivismo. “Elas têm que se autossustentar, têm que realmente conduzir suas vidas com a liberdade que foi dada pelo criador. Para isso, precisamos colocar apenas os recursos à disposição dessas pessoas, para que de fato possam melhorar e aqui não difere dos outros programas que temos à disposição nesta mesa. Nossa taxa de juros de 1%, praticada por 11 anos até setembro do ano passado, foi reduzida para 0,7%. Essa redução é muito significativa e isso, mais do que um número, mostra a real importância do cidadão de baixa renda como pequeno empreendedor.” Exemplificando a importância da taxa de juros, Mendonça contou a história fictícia de um homem que foi visitar um amigo em uma cidade que não conhecia, do interior. Passaram, na praça principal, em frente a um museu, a uma igreja, em frente ao cemitério e no centro comercial. Quando passaram em frente a um banco, o amigo se benzeu. Em frente ao segundo banco, o amigo se benzeu de novo. Em frente ao terceiro banco, novamente o amigo se benzeu. Foi quando o visitante perguntou por que o amigo se benzera diante dos bancos e não diante da igreja ou do cemitério. E o


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amigo respondeu: “Ah, é porque minha família está toda enterrada aí!”. E Mendonça deu seu complemento à história: “Dois passos à frente, ao se depararem com o Banco do Povo Paulista, o anfitrião ajoelhou-se. E, em resposta ao visitante, que quis saber se havia mais alguém da família do amigo enterrado ali, o homem disse: ‘Não. O Banco do Povo ofereceu uma nova vida para minha família’”. O Banco do Povo Paulista tem promovido a transformação na vida das pessoas. Na ficção, os amigos passaram por três bancos, mas poderiam ter passado por todos os outros, porque as taxas de juros hoje praticadas pelos bancos não são determinadas pelos próprios bancos, mas pela política de mercado, que as define. E essas taxas, para um pequeno empreendedor, acabam afetando muito o desenvolvimento do seu empreendimento. “Muitas vezes, nem faz a conta de quanto é que vai pagar de prestação; só quer o dinheiro naquele momento, mas, dois, três meses depois, verifica que aquele sonho, na verdade, até como mencionou Jerônimo Ramos, acabou se transformando em pesadelo. E a taxa de juros acaba implicando, nesse sentido.” O Banco do Povo Paulista, em 11 anos, registra empréstimos de mais de R$ 643 milhões, mais de 208 mil pequenos empreendedores beneficiados,

com tíquete médio acumulado de R$ 3 mil. Conta hoje com uma carteira ativa de mais de R$ 100 milhões, composta por mais de 34 contratos. Além do ótimo desempenho do Banco do Povo Paulista, Mendonça apresentou também os desafios que enxerga para o futuro. Em suas palavras: • O primeiro desafio é trabalhar o acesso às linhas de microcrédito, agilizando a liberação de recursos. Quando um cidadão, uma quituteira, um cabeleireiro, vão atrás do Banco do Povo Paulista, da São Paulo Confia, do Crediamigo, da Real Microcrédito, na verdade querem o dinheiro praticamente na hora. É questão de sobrevivência de seu empreendimento. • O segundo desafio é apoiar de maneira organizada os setores da economia que representem a vocação do município, gerando maior riqueza local. Temos que incentivar, que estimular o desenvolvimento em cada município e o microcrédito tem importante papel na alimentação de economia local. • O terceiro desafio é desenvolver projetos com entidades de classe, como a Associação Comercial, a exemplo do que fizemos aqui em São Paulo, com a Fecomércio, com os sindicatos, com o Sebrae, que cuida da capacitação desses empreendedores, a fim de facilitar o acesso aos programas de microcrédito. É muito importante o

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envolvimento de toda a comunidade para que de fato cheguemos o mais rápido possível em cada cidadão que merece nosso apoio. • O quarto desafio é aproximar-nos das comunidades carentes dos municípios com os trabalhos oferecidos por unidades móveis e outros. E aqui já antecipo que o Banco do Povo Paulista, até o início do próximo semestre, lançará a primeira unidade móvel, começando aqui na capital, para entrar de fato na favela, e espalhando-se pelo Estado, facilitando a identificação do programa, chegar ao cidadão. • O quinto desafio, e mais importante, é manter os agentes de crédito permanentemente envolvidos com os programas de microcrédito, no caso, especialmente com o Banco do Povo Paulista, com os programas de capacitação continuada e de valorização profissional. A capacitação é fundamental em qualquer atividade, mas a valorização, o reconhecimento, o valor das pessoas que trabalham na execução de fato do programa é fundamental. É muito bom quando encontramos nosso chefe e ele fala: “Valeu! Parabéns! Você atingiu suas metas!”. É muito bom também ouvir do chefe: “Olha, não deu, mas vamos tentar mais um pouquinho que a gente vai chegar lá”. Nos últimos três anos, especialmente, o Banco do Povo Paulista tem promovido uma série de

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trabalhos de capacitação. Em parceria com o Cepam, percorreu duas vezes o Estado para ouvir e conhecer os problemas em cada comunidade, de forma a estruturar um programa que possa realmente atender aos anseios de cada um dos agentes de crédito. A valorização é fundamental para que os agentes de microcrédito possam ter o reconhecimento público de sua importância. Mendonça encerrou sua conferência dizendo: “Começamos 2008 com o primeiro mutirão do microcrédito, que, além de promover a divulgação, estimulou bastante nossa equipe. No segundo mutirão, realizado em parceria com o Banco do Brasil, no ano passado, conseguimos inclusive oferecer alguns prêmios. Já posso anunciar novamente: em parceria com o Banco do Brasil, promoveremos agora, de 1o a 30 de abril, o terceiro mutirão do microcrédito, justamente para estimulá-los, oferecendo mais prêmios. Vamos, cada vez mais, trabalhar no reconhecimento. E o sexto e último desafio, na verdade, é consolidar o Banco do Povo Paulista como o maior programa de microcrédito do Brasil. É esse nosso desejo e nosso desafio e vamos trabalhar arduamente para transformá-lo em realidade. Termino minha apresentação também reconhecendo o trabalho de vocês, agentes de crédito, e de vocês, gestores públicos, mas, ao contrário do professor Hugo, que pediu para ser aplaudido, gostaria que esta mesa aplaudisse especialmente a cada um de vocês, agentes de crédito”.


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Fátima de Araújo técnica da Fundação Prefeito Faria Lima – Cepam, São Paulo/SP

Fátima de Araújo enalteceu os depoimentos dos demais membros pela riqueza de experiências trazidas, especialmente pelo comprometimento com o crescimento das pessoas e com a solidariedade e acrescentou: “Gostaria de colocar aqui dois aspectos para refletirmos, que também já foram abordados, mas gostaria de reforçá-los porque os julgamos da maior importância. Por isso, no Cepam, estamos nos aproximando cada vez mais desse tema, conversando, discutindo e estudando-o” É a questão social do microcrédito. “E para isso quero resgatar a origem do microcrédito. Hoje, já falamos um pouco aqui sobre o professor Yunus, já estivemos com ele, mas gostaria de lembrar como é que surgiu o microcrédito. Surgiu quando o professor Yunus ficou muito incomodado

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com a situação de pobreza, de miséria, da população de seu país e viu que as pessoas que conseguiam produzir, que sabiam fazer alguma coisa, estavam reféns de agiotas e não conseguiam avançar, não conseguiam se libertar e ter uma vida mais digna”. “Foi dessa forma”, continuou Fátima, “que ele, pelo menos na história que mais conhecemos, porque existem outras iniciativas também, mas essa é a mais forte, a que mais se alastrou pelo mundo, ele criou esse sistema de microcrédito voltado principalmente para o desenvolvimento dessas pessoas. Em nenhum momento se pensou nessa instituição, ou nesse programa, como uma unidade de lucro. O lucro, para ele, estava fora de questão”. A palestrante reforçou que “nessa perspectiva é que temos que fazer essa reflexão. E, principalmente, mesmo que não se busque o lucro, quando se criam instrumentos internos que elevam as taxas de juros acaba-se excluindo parte da população, talvez a parcela que mais precisa de investimento para que consiga fazer a sua produção e, muitas vezes, uma população que está excluída do mercado formal de trabalho”. “Então”, enfatizou, “essa é uma reflexão que colocamos: até que ponto criamos mecanismos que acabam excluindo parte importante dessa

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população? Além das taxas de juros, há mecanismos de avaliação e concessão de crédito que muitas vezes também eliminam parte dessa população. Por quê? Porque esses mecanismos são pautados no sistema financeiro tradicional. Temos poucos instrumentos voltados ao próprio desenvolvimento, voltados para pensar sistemas, ou pensar mecanismos que permitam às pessoas crescer com eles”. Lembrou da importância de “discutir o crédit score, que vai avaliar, que tem números, parâmetros para dizer se uma pessoa está apta ou não a tomar um crédito” e de “pensar em mecanismos que vão ajudar essas pessoas na gestão dos seus negócios. Que esses fatores não sejam excludentes, mas possam significar uma atenção, de dizer assim: essa população, esse grupo, ou esse indivíduo, precisa de um acompanhamento mais de perto, mais amiúde. Essa população precisa ter um incentivo, precisa de cursos. Então, essa é uma preocupação: se formos nos armando de técnicas e de instrumentos, devemos tomar o cuidado para que esses elementos sejam para promover as pessoas, porque é isso que, no fundo, o microcrédito busca. Ele busca condições para que as pessoas que estão mais na linha de baixo tenham meios para se promover”. “Essa é uma preocupação que trazemos para todas as instituições, ressaltando aqui


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o importante papel dos governos”, disse. “Inclusive, esta mesa é composta por instituições que, na maioria dos casos, têm os governos por trás de seus financiamentos. E é nessa categoria e é dessa forma que queremos enxergar o microcrédito. Por quê? Para atingirmos essa população, essa camada mais necessitada, de fato precisamos nos despir dos instrumentos convencionais. Noutros patamares, de outras formas, vão se compondo outros instrumentos para realmente incluirmos essa população e para que não retiremos dela essa oportunidade. Precisamos pensar nessa flexibilização. E a cada momento precisamos pensar mais sobre isso.”

contrário, tem muita gente fora do mercado formal de trabalho. Essa é uma oportunidade, mas as instituições precisam chegar lá.”

“É necessário refletir sobre outro aspecto, que também foi bastante abordado aqui: a questão da massificação do microcrédito”, lembrou. “Hoje, temos no país, segundo estudos do Banco Central, apenas 2% do nosso públicoalvo atendido. Considerando outros países da América Latina, estamos em um patamar muito baixo. Por quê? Porque as instituições não foram capazes, com todo o esforço que têm demonstrado, de criar instrumentos, produtos, que de fato cheguem a essa população. Ainda não foram capazes de fazer com que essa população tenha confiança para tomar esse empréstimo. Temos pessoas que precisam crescer, não é um mercado esgotado, pelo

Fátima de Araújo conclui: “É nesse sentido que temos trabalhado, principalmente ao lado do Banco do Povo, e faço também uso de diversas referências de outras instituições, porque essa é uma luta conjunta, que não pode deixar ninguém de fora. Temos que aproveitar todas as experiências positivas. Temos que aproveitar todas as experiências das pessoas que estão na base, para construir um sistema mais flexível, com mais acesso, que seja mais humanitário. Então, é isso que trazemos para reflexão. Muito embora saibamos que todos os que nos antecederam falaram a respeito dessas questões, para nós é de grande valor abordá-las e colocar para vocês nossa posição”.

“Nesse aspecto, de novo, também criamos diversos instrumentos que acabam excluindo essa população. Há um esforço enorme de cada vez mais se chegar nessa base, isso é reconhecido, mas também não é fácil, porque todos os instrumentos que se conhece, ou que se utiliza, são geralmente para excluir. Dessa forma, não vamos avançar. Se não pensarmos nesses produtos, em como podemos flexibilizá-los, de fato não vamos crescer e aí o microcrédito não ganha a importância que poderia ter.”

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Desafios para a Formalização Coordenação

Guilherme Afif Domingos Expositores

Bruno Quick Edson Lupatini Ana Carla Abrão Costa Natanael Miranda dos Anjos

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Bruno Quick gerente da Unidade Nacional de Políticas Públicas do Serviço de Apoio às Micro e Pequenas Empresas (Sebrae)

Quick introduziu sua abordagem dizendo que há 20 anos, quando se ouvia o termo “empresarial”, logo se pensava nos megaempresários e que, hoje em dia, pensa-se no pequeno empresário, na pequena empresa, na microempresa e que, num marco de evolução do sistema econômico brasileiro, podemos chamar de empresário aquele que era chamado antes de ambulante, de “marreteiro”

E ressaltou: “Esse é o processo de transformação do País: é um posicionamento desse cidadão no sistema econômico. Isso não é um detalhe, não é questão de semântica, é a evolução real de inclusão social pela oportunidade econômica”.

Numa sociedade moderna, também o setor privado tem que interagir com as questões de interesse público. Lembrou que temos hoje 13 milhões de informais e quando falamos de política pública não podemos nos esquecer dos aparentes detalhes e que “o sucesso

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é feito de suor e detalhes, muito suor e detalhes importantes”. Na informalidade, existem várias situações diferentes. “Temos um universo de informais em que cerca de 1,5 milhão são empregadores. Por isso, em uma política para o empreendedor individual, estamos hoje priorizando trabalhar esse empreendedor, porque, sendo um empregador, está na informalidade ele e também aquele com quem trabalha. É um universo de 13 milhões de brasileiros e boa parte deles são arrimo de família, que viabilizam as rendas das famílias. A informalidade é responsável por subtrair 40% da diferença da renda do cidadão brasileiro em relação ao cidadão norte-americano. Então, esse fenômeno aparentemente periférico na agenda de desenvolvimento de um país, subtrai quase metade da renda de um cidadão brasileiro comparativamente ao cidadão norte-americano. Quando falamos de desafios da informalidade e soluções para superá-los, falamos de enfrentar esse tipo de situação. Essa é a importância desse enfrentamento, dessa superação, dessa nova agenda que trabalhamos. Um desdobramento da nossa estratégia é a Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, que começamos a trabalhar em 2003 e está aprovada há quatro anos.” Demos mais um passo importante em trazer o empreendedor individual para esse novo ambiente de negócio. Tivemos 100 mil participações

presenciais no processo de construção e aprovação dessa lei. Foram 100 mil pessoas como vocês, que agora estão aqui dedicando o seu tempo a este seminário, sentados para construir essa legislação que é muito simples: estabelece medidas para as empresas se tornarem competitivas na formalidade e procura fazer com que a formalidade seja percebida como um bom negócio. É necessário tempo para que um trabalho se consolide, por mais sério e competente que seja, é digno de nota o fato de o coordenador do Banco do Povo conhecer muitos de seus colaboradores. Em 2004, o Ministério da Fazenda, por meio da Secretaria de Política Econômica, cujo secretário era Marcos Lisboa, fez uma pesquisa para saber do que o empreendedor precisa para se formalizar. Pesquisa provocada por Afif Domingos, então diretor da Associação Comercial, em visita ao ministro da Fazenda. O resultado não surpreendeu: menor custo, mais facilidade e agilidade, ou seja, os mesmos desafios do microcrédito. O informal não tem medo de se formalizar. O Sebrae realizou pesquisa em que a pergunta era: “Você tem medo de se formalizar?” e três em cada quatro entrevistados responderam que não. Derrubou o mito, porque o motivo da informalidade não é o medo da formalidade, mas a burocracia e o alto custo, associados à falta de atrativos reais em ser formal.

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“O empreendedor do negócio pequeno tem um tino muito bom para os negócios. Assim como ele calcula se vale a pena comprar ou vender, também vai calcular se vale a pena ou não ser formal. Então, a burocracia excessiva, o elevado custo de manutenção, a tributação, etc., de um lado da balança, e poucos benefícios, do outro, fazem com que ele tenda para a informalidade. É algo simples, puro exercício de razão.” “Nesse contexto, o Sebrae mais uma vez perguntou aos empreendedores o que realmente seria capaz de criar um bom ambiente de negócios em nosso país e a resposta foi: primeiramente, tratamento tributário diferenciado; em segundo lugar, crédito preferencial e programa de treinamento pessoal”. E concluiu: “Então vemos que a agenda é muito clara. Sabemos o que fazer. o que faltava na época para que nós agíssemos: convergência! Convergência é a palavra! Juntar esforços!”. “O trabalho, iniciado em 2003, culminou, em julho do ano passado, com a vigência da Lei do Microempreendedor Individual. Mas ainda há muito por fazer. É necessário persistência e trabalho duro. Hoje, o empreendedor individual formaliza seu negócio com taxa zero, contudo, existe junta comercial cobrando R$ 120 para alterar um endereço; tem prefeitura cobrando taxa; tem corpo de bombeiro cobrando taxa; ou seja, resolvemos o registro, mas não a vida da empresa. O trabalho continua: desanimar nunca.”

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E esse trabalho vale a pena? Vejamos alguns resultados. Com o Simples Nacional, saímos de 1,337 milhão de empresas em julho de 2007, que migraram automaticamente, e hoje temos quase 3,7 milhões de empresas formalizadas. Os números falam por si. Estamos no caminho certo. No caso do empreendedor individual, em dezembro, eram 61 mil, e no dia 22 de março, à noite, 172 mil brasileiros, pais, mães de família, que estão encontrando a formalização. Os depoimentos são os mais bonitos possíveis. Em Manaus, um empreendedor individual, um senhor de mais de 70 anos, formalizou-se e pôs-se a chorar. Teve uma crise compulsiva de choro pela emoção de ser um cidadão. E nossa projeção para o final deste ano é atingir mais de 800 mil formalizações. O Sebrae vem fazendo intenso trabalho com os contadores, contratará técnicos para visitar os empreendedores, mas vejo os agentes de microcrédito, talvez, como os principais mobilizadores da clientela dessa nova política pública. Nas comunidades, na vila, nas cadeias produtivas. Vale a pena investir na microempresa, no microcrédito produtivo e orientado, porque o pequeno negócio representa uma grande fatia dos empregos no Brasil. Durante a crise do ano passado, por exemplo, enquanto alguns setores das grandes empresas recuaram e demitiram, a pequena empresa empregou ainda mais. é preciso investir nesse segmento.


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Conforme dados apresentados pelo coordenador do Banco do Povo, apenas 2% do público potencial é atendido. Apenas 13% dos empreendedores já tentaram obter microcrédito, mas, de qualquer forma, há muito espaço para disseminar o microcrédito. Por outro lado, em pesquisa recente do Sebrae, perguntou-se a empreendedores individuais quais os benefícios que eles esperavam do mercado e a resposta que ficou em primeiro lugar, apontada por 32% dos entrevistados, foi: mais facilidade para conseguir crédito bancário. Se, de um lado, a facilitação do crédito bancário é o primeiro item de interesse dos pequenos e microempreendedores e, de outro, 13% deles buscam o microcrédito e um universo de apenas 2% desse público é atendido, temos um problema de imagem e de informação que precisa ser resolvido. Pesquisas recentes do Sebrae mostram que o comportamento empreendedor vem avançando; o planejamento prévio e as políticas de apoio também. Contudo, o que não vem avançando é a gestão empresarial. A gestão empresarial vem sendo negligenciada. Aproveitando o fato de que aqueles que oferecem microcrédito são detentores de um atrativo para as empresas, é fundamental que se faça o máximo para induzir o aprimoramento de gestão. Essa mesma pesquisa desmente a ideia de que esse público não quer se capacitar: 92%

dos empreendedores individuais, os informais, afirmam que é importante ter treinamento e curso de capacitação. Então, além de termos uma lei aprovada e instituições envolvidas, é fundamental dar orientação. Entre os programas consistentes, é digno de citação o programa lançado aqui em São Paulo para a capacitação profissional de 100 mil trabalhadores. Essa é a questão central: agregar valores naqueles que financiamos. As pesquisas do Sebrae mostraram que 67% dos microempreendedores entendem que a formalidade é melhor que a informalidade, o que demonstra que uma política de formalização tem chance de prosperar. Mas esses empreendedores disseram também que têm muita dificuldade em transpor as barreiras, o que nos leva a entender que nossos desafios são: primeiro, tornar a formalidade, sem dúvida alguma, um bom negócio. Estamos falando de taxas, de prazo, de tributos, de balcões, deslocamentos, de coisas que não fazem sentido, que não agregam, como, por exemplo, trocar fiscalização por educação, na questão sanitária. Segundo, levar conhecimento e apoio como microcrédito de negócio é negócio, que, por acaso, é o nome de um programa do Sebrae, chamado Negócio É Negócio. Visitaremos 1 milhão de empreendedores, fazendo três visitas de orientação e aconselhamento. Esse é o desafio: construir um ambiente no qual seja vantajoso ser formal e entregar os benefícios.

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Edson Lupatini secretário nacional de Comércio e Serviços do Ministério de Desenvolvimento, Brasília/DF

Por tudo o que já foi exposto até o momento, aqui no Seminário do Microcrédito, já temos elementos importantes para trabalhar, cada órgão em sua área, mas de uma forma bastante integrada. O medo de que o cidadão brasileiro não queira estar formalizado parece que está caindo, porque ele começa a verificar que o custo da informalidade é maior do que o da formalidade, conforme revela a pesquisa apresentada por Bruno Quick, do Sebrae Isso vale para o empreendedor individual, vale para a micro e a pequena empresa, para a média empresa e para a grande empresa. E que esse ambiente de negócios, esse ambiente jurídico, seja o melhor possível. E que é o melhor possível para esse ambiente? Não tenho a menor dúvida de que o primeiro degrau dessa escada é a possibilidade de o cidadão acessar o conhecimento e saber como chegar até a formalidade. Para isso, precisamos contar, cada vez mais, com a capilaridade de todos os órgãos que estão aqui se dedicando, conversando conosco, trocando ideias.

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Se os bancos privados, os bancos oficiais, as associações de classe, associações comerciais, levarem a informação correta para o cidadão, ele se sensibilizará e, sem dúvida, vai se formalizar. A primeira providência é levar a informação. A segunda é evitar a burocracia excessiva, para que ele possa se formalizar. Esse é o trabalho inicial para que depois as outras etapas aconteçam. Em seguida, vem o crédito, o financiamento, a inovação tecnológica, o sistema de gestão. Tudo isso deverá ser passado com a capacitação e o treinamento desses nossos cidadãos. Temos aí um conjunto de ações e medidas que vão ser disponibilizadas para que esse indivíduo consiga formalizar-se de maneira tranquila. Dessa forma, ele nascerá para o mundo formal, fruto de um parto natural e não a fórceps. Nascerá de um parto sem problemas para que, aí sim, possa vir e aprender tudo isso com vocês, agentes de microcrédito, que de alguma forma intervêm no crescimento desse cidadão brasileiro, seja com vacinas, com tratamento pediátrico, durante a evolução para a adolescência, até que a empresa esteja de alguma forma madura o suficiente para não necessitar mais desses cuidados médicos. Esse é nosso desafio. É interessante mencionar a criação do Fundo Garantidor de Operações (FGO). Na concessão de crédito, é muito importante o estabelecimento de um teto de financiamento a partir da análise

dos riscos. Recentemente, foi aprovada a Medida Provisória 469 que criou os fundos de garantidores de operações de crédito, que são o FGO, operacionalizado pelo Banco do Brasil, e o Fundo Garantidor de Investimento (FGI), operacionalizado pelo BNDS, ambos de natureza privada. Esses fundos trarão um pouco de luz para a mudança de tratamento do crédito nesse segmento de empresas que têm difícil respaldo para a tomada de empréstimos. Será possível que a rede bancária se associe, de forma automática, a esses fundos garantidores, concedendo, dessa forma, a garantia não só para o empreendedor, para a empresa, como também para a instituição financeira que está disponibilizando o crédito. Quando esses fundos estiverem funcionando de forma plena, muitos problemas do microempreendedor e das micro e pequenas empresas de acesso ao crédito vão se reduzir. Falta muito ainda, mas, de um lado, lutamos pela formalidade desses nossos cidadãos, e não tenho dúvida de que atingiremos 1 milhão de empreendedores formalizados até o final do ano. Podemos até passar desse número. Por outro lado, estamos trabalhando com os governos municipais e estaduais para que implantem a Lei Geral, principalmente no que diz respeito às compras governamentais, para que a formalidade, em conjunto com esses demandadores de compra e prestações de serviço, possa gerar riquezas na maioria dos nossos municípios brasileiros.

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Ana Carla Abrão Costa superintendente de Pesquisa, Desenvolvimento e Capital do Banco Itaú Unibanco

Contarei uma breve história, antes de começar minha apresentação. Por volta de 1989, 1990, eu me formava em Economia, na Universidade de Brasília.Eu era do centro acadêmico da Faculdade de Economia e um dos meus papéis era convidar pessoas que fossem influentes na cena econômica e política, daqueles anos borbulhantes do final da década de 1980, para falar com os estudantes de Economia E convidei um ilustre deputado para fazer uma palestra sobre um tema que era algo sobre desenvolvimento, crescimento. Ele começou sua palestra dizendo: “Fui aqui convidado para falar sobre desenvolvimento/crescimento, mas preparei outra palestra”. E contou uma história para justificar a palestra que faria. Disse que um conhecido, certa vez, foi convidado para falar sobre elefantes... (na verdade, fora convidado para fazer uma palestra sobre cobras, mas tinha pronta uma palestra sobre elefantes) e aí ele começou dizendo: “Sabiam que a cobra tem algo muito parecido com o elefante que é a tromba?”. E fez a palestra sobre elefante. Hoje me lembrei dessa história por dois motivos: primeiro,

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porque vou falar sobre créditos e pensei: ‘Estou participando de um painel sobre formalização. Será que vão pensar que estou falando sobre elefante e não sobre cobra?’, segundo, porque o deputado que fez a brilhante palestra sobre elefante é Afif Domingos, que naquela ocasião angariou uma legião de fãs, dentre eles eu. Meu desafio aqui é provar para vocês que, na verdade, o crédito é a tromba do elefante. Assim, de fato, não vou falar de cobra, mas da tromba do elefante, que tem importância fundamental. Por isso, essa analogia veio bem a calhar. Meu argumento está baseado em um conjunto de relações, as quais, à primeira vista, podem parecer dissociadas umas das outras, mas que estão 100% vinculadas. Falarei de reforma e desenvolvimento econômico; de crédito e crescimento; de crédito e informação; e, finalmente, de informação e formalização. E dizerei em que ponto estamos, principalmente lá no Itaú-Unibanco, e o que falta para avançarmos um pouco mais. O Brasil avançou muito. Hoje, quando olhamos para trás dizemos: ‘Nossa, como estamos melhor!’. Mas, quando olhamos para frente, também percebemos que falta um chão para andarmos, um caminho ainda bastante longo. Pois bem, para começar, como é que vemos o crescimento, a reforma, o desenvolvimento? Literatura recente mostra que o crescimento, o desenvolvimento, estão vinculados a

reformas estruturais, a avanços institucionais, o que explica, em grande parte, as diferenças observadas entre os países. Por que existem países pobres, países ricos, e diferenças nos graus de desenvolvimento dos países. Essa literatura mostra que isso se deve principalmente a dois fatores: um deles é a situação institucional mais favorável, que dá o primeiro impulso. Outro fator é a continuidade desses avanços, proporcionado pelas economias, que se desenvolvem, e as instituições também tem que se desenvolver. Só assim são garantidos os ganhos, em termos de renda, de crescimento e, principalmente, de distribuição para toda a sociedade. O crescimento, o desenvolvimento vêm sendo realizados e concretizados a partir de um patamar favorável de instituições, um arcabouço legal, um arcabouço tributário, um arcabouço institucional forte. E, além disso, há avanços contínuos na direção de gerar solidez, previsibilidade, uma situação favorável ao investimento e ao crescimento das pessoas. Portanto, o ciclo econômico inicia-se dessa forma. O crescimento inicia-se assim. E não é difícil, ao olhar o passado recente do Brasil, perceber que, desde o começo da década de 1990, vimos colecionando um conjunto de avanços institucionais. E aí posso citar as privatizações, e voltando para a década de 1990, até mais recentemente, a Lei de Falências, os créditos consignados, outras

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conquistas da sociedade, ao longo desses anos, que de fato nos deram um crescimento mais acelerado, distribuição de renda mais justa e, acima de tudo, uma situação de estabilidade, que há pouco tempo não vivíamos.

porque agregam informação, porque geram capacidade de alavancagem e porque, acima de tudo, geram informação suficiente para que as pessoas possam se alavancar e criar situação de crescimento e desenvolvimento.

Agora, existe um conjunto de outras reformas que visam a garantir essa evolução e é disso que falamos quando pensamos em desafios para a formalização. Mas aí há outra relação, que é entre bancos e crescimento econômico. Os bancos têm papel fundamental no microcrédito e no crédito institucional. Eles têm o papel de fazer com que se espalhe, pela economia, o desenvolvimento econômico, ou seja, eles garantem que indivíduos e empresas consigam se desenvolver mais rapidamente do que se desenvolveriam se não tivessem acesso a capital de giro, a uma situação de liquidez melhor do que aquela que somente o dia a dia lhes garante. Os bancos têm, sim, um papel importante. Existem as reformas institucionais, o crescimento econômico que é perpetuado e, acima de tudo, espalhado e amplificado por meio da atuação dos bancos e do crédito.

Outra relação é a existente entre crédito e informação. O banco, hoje, trabalha com informação, ou seja, temos falado aqui do microcrédito e do agente de crédito. Mas, por que esse agente é absolutamente primordial numa economia informal, numa empresa informal ou numa empresa menor? Porque, acima de tudo, temos carência de informação. É por isso que o agente de microcrédito é tão importante: porque traz para a empresa de microcrédito a informação de que hoje não conseguirá capturar das formas tradicionais que os bancos normalmente utilizam. Ou seja, não existem cadastros, informações cadastrais, não existem apontamentos dos birôs de informação.

Portanto, os intermediários financeiros têm o papel de garantir a sustentabilidade para o crescimento e, mais do que isso, de amplificar o crescimento. Sempre houve, no debate econômico, uma questão: Bancos geram crescimento ou crescimento geram bancos mais sólidos? Hoje, essa questão já está pacificada: bancos de fato geram crescimento

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Hoje há carência de informação, que está muito vinculada ao crédito. Não existem balanços, a economia informal padece dessa carência de informação, que é coberta justamente pela atuação do agente de crédito, que faz essa ponte entre a empresa pequena informal e a empresa de microcrédito. Mas, no caso dos bancos, o que acontece é que se temos informação, trabalhamos de uma forma, e se temos pouca informação, trabalhamos de forma menos eficiente. E menos eficiente porque não


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sabemos mensurar o risco que assumimos ao dar um empréstimo a um indivíduo cuja informação é precária. É isso que acontece no mercado de crédito, que tem menos crédito e mais caro. Então, o debate do spread* bancário, o debate de escassez de crédito no Brasil está vinculado principalmente à falta de informação, porque os bancos, hoje, não têm condição de dar mais crédito ou mais barato porque não possuem a capacidade de avaliar o risco de forma eficiente. Mas essa situação mudou e já existe a relação entre informação, crédito e informalidade. Percebe-se um aumento significativo no volume de crédito no Brasil, a partir de 2004, quando, não por coincidência, todos os avanços institucionais iniciados na década de 1990 começaram a maturar, a gerar uma capacidade dos bancos de ter mais informações, mais previsibilidade e condições de creditar, já que conseguem mensurar o risco de forma mais precisa. Por outro lado, empresários, indivíduos em * condições de assumir dívidas com mais tranquilidade, começaram também a procurar os bancos de forma mais ativa. Percebe-se, ainda, que principalmente o crédito pessoal teve grande expansão e também a aquisição de bens, ou seja, indivíduos começaram a

ter acesso a crédito, empresas passaram a ter acesso a crédito de capital de giro. E isso, não por coincidência, veio na esteira da Lei de Falência, do crédito consignado, em que a formação é bastante concreta. E, principalmente, a estabilidade econômica permitiu que o indivíduo se endividasse com tranquilidade e que as empresas investissem com mais segurança. E, pelo lado dos bancos, permitiu que tivessem capacidade de dar mais crédito, juntamente com a queda na taxa de juros, fruto da estabilidade. Os spreads bancários no Brasil são altos, sim, mas já foram muito mais. E mais uma vez não é coincidência que tenham começado a cair justamente quando as reformas institucionais começaram a maturar e a ganhar corpo no Brasil. Quando falamos de crédito, formalidade e informação, o que estamos dizendo é: ‘Sim, é possível ter mais crédito no Brasil, é possível ter crédito mais barato no Brasil, mas precisamos de informação’. Os bancos, hoje, atuam com taxas de juros mais altas do que no microcrédito, para os segmentos da base de pirâmide, justamente porque não há informação suficiente para que precifiquem de forma mais barata. Enquanto as instituições, hoje, investem em microcrédito, justamente para buscar essa informação, as fontes tradicionais dessas informações não existem.

*Refere-se à diferença entre o preço de compra (procura) e venda (oferta) da mesma ação, título ou transação monetária.

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Quanto à formalização, percebe-se que, a par da crise que foi realmente um momento difícil para a economia brasileira, há uma tendência de crescimento dos empregos formais. Mais uma vez, é justamente a partir do período em que as reformas institucionais começaram a existir no Brasil que essa tendência de criação de empregos formais tornou-se muito mais forte. Na verdade, não gosto muito da frase, mas nunca na história, realmente, tivemos uma tendência tão pronunciada e durante tanto tempo. Sobre os empregos formais, o início deste ano já mostra uma tendência de crescimento bastante expressiva, após a crise registrada no final do ano passado. Assim, informação é o que precisamos, quando falamos de mais crédito e mais barato. E informação significa formalização. No mercado mais formal, as informações existem de forma natural e automática e isso faz a diferença, hoje, para o sistema tradicional bancário. A formalização é, justamente, o caminho para que haja mais acesso a crédito por empresas e por indivíduos. Por fim, onde estamos? Estamos em um caminho positivo. Avançamos bastante. Esse conjunto de avanços institucionais foi importante e já maturou. E aí perguntamos: Será que já foram totalmente incorporados? Possivelmente sim. Hoje, já trabalhamos com taxas elevadas de crescimento, porém em

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patamares mais estáveis do que já foram no passado, tanto do ponto de vista da economia, da formalização, como do ponto de vista do crescimento de crédito. Mas existe ainda uma carência de novos avanços institucionais e é isso que percebemos quando olhamos colocações internacionais. Os desafios para a formalização, na verdade, nada mais são do que o conhecimento do que falta no Brasil. Ou seja, falta fazer o que ainda não foi feito. Já fizemos muito, mas ainda há muito que fazer em termos de desburocratização para criar novas empresas, de redução de carga tributária para pequenas empresas, de racionalização dos tributos trabalhistas, ou seja, ainda há uma agenda que certamente nos permitirá não só continuar no ciclo de crescimento, mas, acima de tudo, que consigamos chegar naquele começo da apresentação e dizer: ‘O Brasil é um país rico, não é um país pobre; o Brasil é um país que hoje distribui e que dá condições para seus empresários, grandes, pequenos, médios, microempresários, terem acesso ao crédito, a recursos para investir e para crescer e se desenvolver’. E, para isso, a agenda esta aí, ou seja, envolve reforma tributária, reforma trabalhista e racionalização dos processos de criação e fechamento de empresas e, acima de tudo, a estabilidade econômica. Num ambiente de estabilidade, esses passos já estão dados, e aí só nos cabe trabalhar numa agenda microeconômica, cuja boa parte já foi feita, mas uma parte grande vai nos garantir sucesso por muito mais tempo.


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Natanael Miranda dos Anjos secretário especial do Microempreendedor Individual da Prefeitura de São Paulo/SP

Fazendo uma ponte entre tudo o que foi falado neste seminário, contarei dois ou três casos para que possamos fixar bem o que é esse instrumento de crédito hoje para nosso trabalhador. Uma trabalhadora, que passava a ferro, trabalhava na casa de quem necessitava de seus serviços. Mas, por que ela trabalhava na casa de quem necessitava de seus serviços? Porque simplesmente não tinha recursos para comprar um ferro elétrico. Então, assim que surgiu o sistema do microcrédito, ela se cadastrou e foi privilegiada com financiamento, comprou seu ferro e passou a trabalhar em casa. Com isso, ela obteve vários ganhos: primeiro, aumentou sua produtividade, porque não tinha que sair mais de casa. Segundo, porque obteve mais que um ganho monetário, mas um ganho familiar, já que não tinha com quem deixar os filhos ou como contratar alguém para fazer seus trabalhos domésticos.

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Outro exemplo é o de um grande empreendedor. Existem pessoas que têm boas ideias para realizações, mas ganham pela manhã o sustento daquele dia e no dia seguinte empreendem nova batalha pelo pão. Mas ele conseguiu no Banco do Povo um empréstimo e comprou quatro garrafas térmicas. Com esse recurso pequeno, que era em torno de R$ 100,00 ou R$ 200,00, mandou soldar um dispositivo em sua bicicleta para acomodar as garrafas. Enchia as garrafas térmicas entre quatro e cinco horas da manhã, e saía vendendo café nas construções civis. Com isso, ele começou seu primeiro negócio e, depois de algum tempo, já tinha uma casa de café, numa esquina da cidade, com bom nível de rendimento. O microcrédito transcende a simples questão do ganho monetário: é ganho familiar, é ganho de cidadania. O mais importante de tudo isso, especialmente para nós que recebemos a incumbência do prefeito Gilberto Kassab de implementar o programa do empreendedor individual na capital de São Paulo, é que essa posição reconhece que o programa, além das suas virtudes, é um dos maiores programas sociais que se pode desenvolver em qualquer

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cidade. Principalmente numa metrópole como São Paulo, onde há um contingente de mais de 100 milhões de trabalhadores na condição de informais. E vamos atingir a meta de formalizar 100 mil informais, ou até mesmo ultrapassá-la, não em 12 meses, mas nos meses que faltam para completar o ano, porque contamos com toda a estrutura da prefeitura para chegar a bom termo. Contamos com as Secretarias de Gestão, do Trabalho, do Transporte, das Finanças e da Saúde. Temos certeza de que, conforme disse Edson Lupatini, nossa meta vai ser atingida, se não ultrapassada. O porquê do sucesso que vemos, aqui em São Paulo, é por estarmos trabalhando com uma Parceria Público-Privada (PPP), na qual o governo do Estado de São Paulo disponibiliza o recurso, por meio do Banco do Povo, o governo municipal disponibiliza os agentes de crédito, e a Associação Comercial de São Paulo disponibiliza o espaço físico e todo o equipamento necessário para o bom funcionamento de um posto de atendimento do Banco do Povo. É uma parceria que tem tudo para que possamos alcançar nossos objetivos.


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Guilherme Afif Domingos ex-secretário do Emprego e Relações do Trabalho do Estado de São Paulo

Falando de desafios para formalização, vocês ouviram a palestra de Hernando de Soto. Conversando com ele exatamente sobre esses pontos de estrangulamento para a formalização, junto com o professor Hélio Zylberstajn, da Fipe, da Universidade de São Paulo, a conclusão que tiramos de tudo o que foi dito é a distinção entre a pessoa, a formalização da pessoa, e seus dados existentes para informação Compomos uma sociedade que se constitui pelo formalismo, mas aqui, principalmente nos países emergentes, antes chamados de países em desenvolvimento, ou países mais pobres, o custo das transações é insuportável para o nível de renda das pessoas mais humildes. Por isso elas acabam sendo jogadas na informalidade: por não terem condições de obter renda para pagar o custo de transação do processo de formalização.

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Vou contar um pouco da experiência no processo de formalização ou de regulamentação do Microempreendedor Individual (MEI). Tivemos que enfrentar muitas barreiras para simplificar o processo até chegarmos a um sistema que entrou no ar em julho do ano passado. E quando esse sistema entrou no ar, funcionou como antipropaganda do MEI. Por quê? Porque a burocracia do sistema das juntas comerciais nos davam 42 telas de preenchimento para formalizar um bem. E aí, graças à intervenção segura de Edson Lupatini, com o apoio do Sebrae Nacional, suprimos o sistema até trazer o Serviço Federal de Processamento de Dados (Serpro). Estamos formalizando e esperamos formalizar 1 milhão de pessoas ou mais, que é a nossa meta, mas já começaram a chegar informações de que quando um cidadão que está na informalidade cria o MEI, ele se torna pessoa jurídica e aí a conta d’água dele passa a ser outra, porque a concessionária de serviço público vai cobrar conta de pessoa jurídica. A telefonia vai mandar conta de pessoa jurídica, a conta da luz é de pessoa jurídica. Existe tarifa diferenciada para pessoa física e para pessoa jurídica, porque eles ainda não entenderam que aquele CNPJ é um CPF “CNPJizado” por um artifício que foi inventado para formalizar a pessoa física.

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Outro dia tive que ligar para o presidente de uma federação empresarial e pedir para parar de cobrar imposto sindical de MEI. Uma tal de Associação Comercial e Industrial do Estado de São Paulo tinha esquema dentro da Junta Comercial e quando saía um CNPJ, eles já emitiam uma guia de cobrança para que fosse paga em 48 horas! E as pessoas que não sabiam, pagavam. Esse processo que cerca, porque cada um tem a visão individual, seja ela legal ou ilegal, mas tem a sua visão pessoal de montagem das suas estruturas, as pessoas não se dão conta do impacto que isso gera no custo de transação para trazer as pessoas para a formalidade. Vejam, por exemplo, quanto não custa no cartório registrar um imóvel. Quanto menor o valor do imóvel, mais regressiva é a taxa sobre ele. Então as pessoas preferem não se formalizar. As grandes empresas falam do custo no Brasil de forma genérica. Se as grandes empresas, que têm capacidade de repassar os custos para seus clientes se queixam, imaginem aqueles que não têm a mínima capacidade de repassar seus custos. Eles não se queixam; simplesmente não se registram e vão para a informalidade. Portanto, a formalidade não é causa, é efeito. É consequência de um processo brutal, de um país de origem cartorial, que vai precisar fazer imensa lição de casa


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para diminuir custos de transação, para que tenhamos uma formalidade avançada. Esse é o grande desafio político. Infelizmente, nas campanhas eleitorais não se ouve isso, porque o debate político é muito superficial. E devemos defender profundamente a redução do custo de transação, para que as pessoas mais humildes se tornem cidadãos com plenos direitos, para saírem da condição de assistidas, de um assistencialismo que mais beneficia o assistente do que o assistido, e partir para o processo da autossustentação, que é o processo da sua própria independência. Ana Carla Costa falou que o spread é alto porque a regulamentação do sistema bancário hoje é um negócio em que você não sabe o que é custo de regulamentação trazido pelo Banco Central nas operações, em termos de normas para regulação do sistema. O sistema financeiro tem 33% de imposto na transação. Está no spread. O sistema financeiro tem os compulsórios. Estão nos spreads. O sistema financeiro não tem informação. Por que não tem informação? Porque tudo quanto é cartório entrou no processo de legalização para não deixar fazer o cadastro positivo. E o que é o cadastro positivo? É muito simples: o cidadão abre a sua informação para que o sistema coloque para conhecimento público que ele é bom pagador.

E por que ele quer fazer isso? Porque quer que a circulação a respeito do seu comportamento seja de conhecimento de todos, para que a sua taxa de seguro, a sua taxa de juros, seja menor do que a taxa daquele que não tem a informação. Quando se faz o seguro de um automóvel existe um perfil: se é mulher, se tem idade entre 40 e 50 anos, se tem garagem em casa, se o carro fica mais tempo na garagem do que na rua, sua taxa de risco é muito menor do que aquele que tem menos idade, que não tem garagem... Isso se chama perfil. O sistema financeiro no Brasil não tem perfil porque não é possível ter a informação, em primeiro lugar. Em segundo lugar, enorme parcela da população não tem informação porque não consegue se formalizar para chegar no processo. Desse jeito, vamos, a cada dia, ter mais concentração de renda, porque o sistema financeiro só facilita para quem tem bens para dar como garantia. Os mais conhecidos são os quem têm acesso às linhas de crédito privilegiadas. Para aquele que não tem essa informação, mas apenas caráter e honestidade, os sistemas não leem essas características. Por isso que, no Banco do Povo, apostamos nas pessoas e não estamos regulados pelo Banco Central. O fundo é nosso! Colocamos R$ 70 milhões no fundo há 11 anos. Aplicamos esse dinheiro a 1% ao mês, nesses 11 anos. Os R$

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70 milhões iniciais aplicados a 1% ao mês, para atender à necessidade de microcrédito e crédito de R$ 2,3 milhões, tornou-se hoje um patrimônio de R$ 160 milhões, sem mais aportes do governo do Estado. Ele é autossustentável. Por que isso aconteceu? Porque a inadimplência foi de 1,2%, ou seja, 98,8% de pontualidade desses pequenininhos. E por que foram tão pontuais? Porque sabem que o crédito para eles é a vida. Tanto é que, na mudança de sistema de crédito, pedimos um avalista moral que ele vai informar só na primeira transação, na segunda não precisamos de mais informação, pois já o conhecemos e é por isso que estamos crescendo 45% nesse primeiro trimestre.

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E digo a vocês, operadores do Banco do Povo, que pisem no acelerador da formalização e do crédito! O governador nos disse: “Se faltar, coloco mais dinheiro no fundo”. Por que disse isso? Porque não é despesa, não é fundo assistencial, não é dinheiro a fundo perdido: é dinheiro que retorna. E retornou, multiplicou-se! Não precisa mais ser 1%: estamos cobrando agora 0,7%! Aí vocês perguntam: Mas isso dá certo? Se deu em 11 anos, essa experiência é vivida. Não estou vendendo uma teoria, mas o que aconteceu. Por isso, o caminho da formalização é um: diminuir os custos de transação para que o cidadão tenha poder aquisitivo para se formalizar. Lembrem-se de que o custo da formalidade tem que ser menor do que o custo da informalidade. Se for maior, não adianta, porque a formalização não acontece.


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Entrega do 1º Prêmio Anual do Banco do Povo Paulista – 2009

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ENTREGA DO 1º PRÊMIO ANUAL DO BANCO DO POVO PAULISTA – 2009 Autoridades que participaram da entrega dos prêmios Antonio Sebastião Teixeira Mendonça – diretor executivo do Banco do Povo Paulista Drausio Pedroso Vitiello – assessor especial da Secretaria do Emprego e Relações do Trabalho Guilherme Afif Domingos – ex-secretário do Emprego e Relações do Trabalho do Estado de São Paulo Itamar Borges – ex-prefeito do Município de Santa Fé do Sul/SP Natanel Miranda dos Anjos – secretário municipal do Microempreendedor Individual Nelson Hervey Costa – presidente da Fundação Prefeito Faria Lima – Cepam

Que é o prêmio? Nos últimos anos, o Banco do Povo Paulista tem criado mecanismos de estímulo às suas unidades de crédito e às equipes que nelas operam. O objetivo dessa estratégia é gerar motivação nos operadores do sistema, de modo a levá-los a identificar novos nichos e potencializar os espaços em que já atuam, inclusive na construção e consolidação de demandas ainda não atendidas pelo Banco.


Por isso a proposta de criar um prêmio anual que contemple as unidades mais produtivas. Entretanto, a produtividade deve possuir características que ofereçam determinadas qualidades às carteiras das unidades. Assim, na análise de definição das melhores unidades de 2010, foram consideradas variáveis que justifiquem essa qualificação. A carteira com a qualidade desejada pelo Banco do Povo baseia-se em algumas premissas (melhoria nos indicadores de focalização nos mais pobres, alcance da oferta em relação ao mercado potencial, taxas de inadimplência suportáveis, etc.). Considerando essas premissas, apresenta-se a seguir as 15 unidades municipais de crédito vencedoras do Prêmio Anual do Banco do Povo Paulista de 2009 – e as correspondentes justificativas. O prêmio foi destinado às unidades e não diretamente aos agentes de crédito, ficando a forma de divisão do prêmio a critério dos próprios agentes das unidades contempladas. Na formulação dos critérios para definir as vencedoras do prêmio 2009, foram utilizados fatores que representassem a capacidade produtiva das unidades, a focalização nos mais pobres, a fidelização de clientes e captação de novos, e a saúde das suas carteiras. Com a combinação desses fatores, espera-se que a premiação anual conduza seus operadores à construção de um sistema de microcrédito que contribua com as políticas públicas de desenvolvimento econômico e inclusão social dos municípios, com a oferta de serviços financeiros aos microempreendedores, em condições adequadas às suas características e especificidades.

Critérios e pesos utilizados A escolha das unidades vencedoras foi baseada em critérios definidos pela direção do Banco do Povo Paulista, considerando as premissas avaliadas como importantes para o aperfeiçoamento do sistema. Os dados operacionais e de produtividade utilizados na apuração dos resultados foram produzidos por sistema próprio, bem como as informações para enquadramento nas faixas populacionais.

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Entrega do 1º Prêmio Anual do Banco do Povo Paulista – 2009

Na composição dos critérios que definiram as unidades vencedoras para a premiação de 2010, e com base nos indicadores de produtividade do ano de 2009, os municípios com unidades do Banco foram divididos em cinco faixas populacionais, como seguem*: • 1ª faixa: G1 – municípios com até 10 mil habitantes; • 2ª faixa: G2 – municípios de 10.001 até 30 mil habitantes; • 3ª faixa: G3 – municípios de 30.001 até 50 mil habitantes; • 4ª faixa: G4 – municípios de 50.001 até 100 mil habitantes; • 5ª faixa: G5 – municípios acima de 100 mil habitantes. De cada uma dessas faixas, as três primeiras colocadas foram premiadas, totalizando 15 unidades municipais de crédito. As unidades concorreram dentro da faixa populacional na qual se encontravam e os elementos aferidos foram os seguintes: • Cumprimento das metas estabelecidas (peso 5); • Superação das metas estabelecidas em número de contratos (peso 2); • Número de contratos produzidos com valores abaixo de R$ 1.500,00 (peso 1); • Fidelização de clientes, em número de contratos realizados a partir do segundo crédito (peso 1); • Captação de novos clientes – primeiro crédito (peso 2); • Contratos inadimplentes com atrasos acima de 365 dias (peso -10); • Percentuais de inadimplência acima de 60 dias (peso -10); • Pontuação negativa pelo não atingimento da meta (número menor de contratos multiplicado por três).

* Os indicadores populacionais consideram a contagem da população de 2007 da Fundação IBGE.

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Entrega do 1º Prêmio Anual do Banco do Povo Paulista – 2009

Valores dos prêmios Os prêmios foram distribuídos em conformidade com as posições das unidades vencedoras em cada uma das faixas populacionais: primeiro lugar: R$ 5 mil; segundo lugar: R$ 3 mil; terceiro lugar: R$ 2 mil.

Unidades vencedoras, por faixa populacional REFERÊNCIA

FAIXA POPULACIONAL

Grupo 1

Até 10 mil habitantes

Grupo 2

Grupo 3

Grupo 4

Grupo 5

De 10.001 até 30 mil habitantes De 30.001 até 50 mil habitantes De 50.001 até 100 mil habitantes Acima de 100 mil habitantes

MUNICÍPIO/UNIDADE

POPULAÇÃO

INÍCIO DAS OPERAÇÕES

PERFORMANCE FINAL

Neves Paulista

8.843

6/12/2003

302

Rinópolis

9.393

7/5/2004

213

Guzolândia

4.637

4/9/2002

181

Cândido Mota

29.562

20/7/2000

537

Cravinhos

29.377

18/12/2001

424

Tabatinga

13.965

5/2/2002

402

Espírito Santo do Pinhal

40.769

20/12/1999

481

Ibitinga

49.951

5/2/2002

385

São Joaquim da Barra

43.712

19/5/2000

280

Assis

92.965

3/12/1999

729

Bebedouro

74.865

17/3/2000

449

Amparo

62.852

30/9/2002

443

São José do Rio Preto

402.770

31/1/2002

1.171

Franca

319.094

7/5/1999

601

Ribeirão Preto

547.417

15/8/2000

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Entrega do 1º Prêmio Anual do Banco do Povo Paulista – 2009

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Com o propósito de demonstrar a relevância do microcrédito para os setores produtivos e seu crescente papel estratégico no desenvolvimento do País, a Sert e o Cepam promoveram o 1º Seminário Internacional de Microcrédito Produtivo. Esta publicação apresenta o conteúdo das palestras e dos debates lá realizados, focando as dificuldades, os desafios e os avanços na ação de instituições que operam no mercado de microcrédito.

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