Jornal Público, 11 de janeiro de 2022

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26 • Público • Terça-feira, 11 de Janeiro de 2022

Cultura Exposição na Galeria Municipal do Porto

Neste mundo “tudo está feito para falhar” mas “temos de ser excelentes” Erro 417: Expectativa Falhada, uma colectiva que lida com as pressões que levam ao medo do fracasso e ao desejo de sucesso que tende a surgir como antídoto. Patente até 13 de Fevereiro

Daniel Dias Texto Adriano Miranda Fotografia Marta Espiridião tinha apenas cinco anos quando se deu a Expo-98, mas lembra-se bem do evento que comemorou os 500 anos dos Descobrimentos e, através de um investimento considerável na construção de infra-estruturas, reabilitou o agora designado Parque das Nações. A jovem curadora, que cresceu em Benavente, vila pertencente ao distrito de Santarém, deslocou-se a Lisboa quase uma dezena de vezes para assistir a vários dos seus eventos, entre exposições e espectáculos de rua. “A experiência marcou-me imenso: uma menina do campo dentro da Expo é outra coisa”, recorda ao PÚBLICO. Foi no âmbito do projecto concursal Expo-98 no Porto que Espiridião obteve o apoio necessário para desenvolver a exposição que inaugurou há cerca de um mês na Galeria Municipal do Porto. Erro 417: Expectativa Falhada, que está patente até 13 de Fevereiro, parte da forma como a jovem começou a olhar para a Expo quando se mudou para a capital, no início da década passada. Foi nessa

altura, salienta, que começou a “perceber que a agitação cultural que havia reanimado o Parque das Nações nunca se prolongou no tempo”. “Comecei a ver na Expo um projecto falhado”, frisa. Quando pensa no Parque das Nações em termos de actividade turístico-cultural, Marta identi ca apenas o Altice Arena, que alberga “concertos maciços”, e o Oceanário de Lisboa, “o espaço cultural que anualmente mais lucra com visitantes” em Portugal. Não é capaz de encontrar a oferta artística abrangente com que se deparou quando visitou a Expo, que, aproveita para lembrar a curadora nascida em 1993, “foi construída sobre um sítio onde eram despejados resíduos químicos” — o que, comenta, é “irónico”, tendo em conta que o tema do evento tinha que ver com a preservação dos oceanos. “A Expo98, enquanto projecto cultural, ambiental, social e habitacional, revelou-se um dos maiores falhanços do início do milénio”, escreveu Espiridião em Setembro do ano passado, num texto em que tentava resumir o conceito da sua exposição (e que partilhou com o PÚBLICO).

Erro 417, que reúne trabalhos de 12 artistas (Alice dos Reis, Aliza Shvarts, Ana Hipólito, Carlota Bóia Neto, Catarina Real, Daniela Ângelo, Elisa Azevedo, Gisela Casimiro, Hilda de Paulo, Jota Mombaça, Odete e Xavier Paes), 11 dos quais criaram obras novas especi camente para a mostra — apenas Shvarts não o fez —, esmiuça o falhanço de uma ideia para estudar o “medo de errar”, que, argumenta a curadora, “é muito alimentado por esta procura constante do sucesso” que o “sistema capitalista” promove. “Esta ideia de que temos de chegar ao sítio ‘x’, fazer ‘y’ ou ascender ao cargo ‘z’, esta sede incessante de realização pessoal e validação”, assinala, “está muito ligada ao sistema capitalista, que objecti ca os nossos corpos”, reduzindo-os a conceitos como “e ciência” ou “produtividade”. Espiridião alega que almejamos a perfeição num mundo em que “tudo está feito para falhar”. “Os transportes públicos atrasam-se, as tecnologias têm a sua obsolescência programada [isto é, são estrategicamente fabricadas para durarem menos tempo do que deveriam, obrigando os consumidores a adquirirem novos


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