Para sempre comigo

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Para Sempre Comigo - Cacilda Tanagino

Cacilda Tanagino

Para Sempre Comigo 1ª Edição 2015

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Para Sempre Comigo - Cacilda Tanagino

Título original: Para Sempre comigo Diagramação:Thiago Carvalho Design de capa: Cildinha_may Imagem: Licença: CC0 Public Domain / FAQ www.pixabay.com Revisão: www.ortografa.com Publicação Eletrônica: Clube de Autores Publicações S/A. Publicação Eletrônica Clube de Autores 1ª Edição : 2015 Contatos com o autor: tanaginoc@gmail.com ©2015 by Cacilda Tanagino. Todos os direitos reservados ao autor.Proíbida a reprodução, no todo ou em parte,através de quaisquer meios. Todos os livros no Clube de Autores são de responsabilidade editorial e legal dos usuários que os publicaram, sendo o papel do site exclusivamente de permitir a publicação e de comercializar e entregar as obras adquiridas pelos leitores. Atendimento e venda direta ao leitor: https://www.clubedeautores.com.br Todos os personagens e nomes desta obra são fictícios. Qualquer semelhança com pessoas vivas ou mortas. É mera coincidência. © By Cacilda Tanagino Todos os direitos reservados ao autor.

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Os pés e as mãos conhecem o desejo da alma. Fechemos, pois, a boca e conversemos através da alma. Só a alma conhece o destino de tudo, passo a passo. Vem, se te interessas, posso mostrar-te. Rumi

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Nota da autora Quem já não viveu um turbilhão de emoções? Os relacionamentos não seguem uma regra, e toda história de amor tem seus encantos e desencantos. Este segundo livro vem contando a história de Leila e Nicholas. Dois personagens já apresentados a vocês no livro “Uma noite em teus braços”. Vocês se lembram deles? Pois então, Leila e Nicholas, tiveram uma história tumultuada, confusa, mas muito linda. Particularmente, surpreendi-me com o desenvolvimento dos personagens. Escrever este livro foi muito especial, pois a inspiração brotou lentamente, quase sobrenatural, os personagens se manifestavam em minha imaginação como se realmente existissem, foi muito surreal, estranho, mas muito prazeroso; narrar à história de Nicholas e Leila trouxe-me algumas considerações muito importantes sobre o destino, sobre a vida, sobre o tempo. O tempo às vezes é o melhor dos conselheiros, ele pode fazer maravilhas na vida de uma pessoa, como também pode destruir sonhos. Então, cheguei à conclusão que devemos sempre pensar no que realmente é melhor para a gente, pois se deixarmos o tempo passar, perderemos as oportunidades verdadeiras de ser feliz. Ao lerem este livro, vocês perceberam que tive todo o cuidado do mundo para trazer até vocês mais uma história quente e surpreendente. Espero que gostem desta nova aventura. Este é meu pequeno presente para vocês. Um beijo no coração ... Cacilda Tanagino.

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Pensando em vocĂŞ. Querido amigo, amado e eterno amante.

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Prólogo Quando tudo começou...

O sol já estava alto no deserto, a caravana havia partido a pouco mais de duas horas de Mopti, cidade de Mali. A região seca e extremamente árida era interessante no princípio, mas depois de duas horas andando de carro, aquilo já não apresentava tanto interesse, a poeira e o calor já começavam a incomodar, Leila estava em silêncio, ouvia atentamente a conversa baixa e melodiosa do velho tuaregue chamado Moussa, ele estava radiante em participar do Festival do deserto que era promovido todos os anos no Deserto de Essakane, uma região próxima a Timbuktu, a cidade Tuaregue; Leila ficou se perguntando por que estava ali, sempre que agia por impulso se arrependia amargamente das decisões que tomava. Seu silêncio aos poucos foi percebido pelo seu meioirmão Adonai, que também participava do festival, porém ao contrário dos outros anos em que participava bem mais animado, neste ano ele estava com o semblante bem mais carregado que o de costume, aquilo não passou despercebido aos olhos de Leila, que o conhecia na palma da mão. O comboio era bem grande, além dos alimentos e produtos de primeiras necessidades, eles também transportavam o material para fazer montagem das tendas, a equipe que formava a caravana era especialista em dormir ao relento, grande parte

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do pessoal, haviam sido recrutados pelo deserto alguns anos antes pelo antigo chefe da segurança de Adonai, hoje seu sócio em alguns empreendimentos, era um homem irritante e ao mesmo tempo sedutor, ele a ignorava, era como se ela não existisse, aquilo a incomodava extremamente. Enquanto pensava no sócio de Adonai, ela ouvia a voz dele através do rádio, no interior do carro. — Bbrrzz... Bbrrzz... Lobo falando! Bbrrzz! Câmbio... — Bbrrzz... Bbrrzz...Alcateia na escuta! Bbrrzz! Prossiga... — Bbrrzz! Bbrrzz... Já estamos... Bbrrzz!... No lugar combinado! Bbrrzz! Câmbio... — Bbrrzz! Na escuta lobo, estamos atravessando, nos encontramos em aproximadamente... Bbrrzz... 45 minutos... Bbrrzz... Bbrrzz! — Bbrrzz! Bbrrzz... Ok! — Bom meus amigos vocês ouviram o rádio dentro de quarenta e cinco minutos faremos uma pausa para esticarmos as pernas. Adonai anunciou aos integrantes. Leila continuava a olhar a paisagem árida, o verde que surgia rasteiro era sem-vida, embaçado dava um contraste misterioso naquela poeira vermelha; “como pode alguém sobreviver neste lugar? ” “Não dá para imaginar minha mãe vivendo num lugar como este”, “cuidando de cabras; e Adonai? Como será que ele conseguiu sobreviver a este calor escaldante? ” Leila pensava distraída, fazendo um paralelo da vida confortável que tinha em San Antonio e a vida esquálida das mulheres daquele lugar abandonado. — Menino Adonai? — Diga Velho Moussa. — Já está na hora do Menino Adonai arrumar casamento a vossa irmã?

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Pelo retrovisor Adonai viu a careta de desagrado de Leila com o comentário do velho Tuaregue, Adonai coçou o queixo coberto por uma barba por fazer, enquanto continuava a olhar pelo retrovisor os olhos âmbar da irmã, pensou bem nas palavras para responder ao velho Tuaregue. — Leila vive na América, e como tal seguirá os padrões a que está acostumada. — Como irmão mais velho, e como seguidor de nossa cultura, é preciso indicar um marido, afinal, a Menina Leila já está ficando velha para o casamento. O velho tuaregue falava como se ela não estivesse por perto e não demorou muito para haver uma explosão de palavras: — Não faltando com respeito aos seus cabelos brancos gostaria que você prestasse a atenção no que vou lhe dizer seu velho tuaregue intrometido! Não vou me casar com ninguém que não seja aquele que eu desejar. Adonai, já estava rindo, e ela continuou... — Se você não foi escolhido para desposar ninguém, por que vou ser escolhida? E olhando para o irmão continuou a desferir sua falta de paciência. — Não me façam nenhuma surpresa neste quesito, por que vocês dois se arrependeram amargamente, vão passar vergonha, por que eu não me dobro. Não me casarei com ninguém, principalmente se for alguém dessas redondezas. — Menino Adonai. O velho tuaregue começou a falar novamente. — Veja, se ela estivesse casada, seria mais branda, respeitaria mais, principalmente anciões como eu e com certeza o seu marido já teria lhe ensinado bons modos. Sorrindo Adonai concluiu:

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— Ou ela teria lhe deixado manso como um carneiro. Peçolhe perdão Velho Moussa, mas conhece muito bem o temperamento de nossas mulheres... — Perdoe-me Senhor, não quis ser intrometido. Balançando a cabeça como forma de negação Leila não acreditava no rumo daquela conversa, e tentando controlar sua irritação crescente cortou a conversa dos dois homens: — Senhores! Estou aqui! Adonai, você quer dizer a esse rabugento que eu não mordo, ele age como se eu estivesse invisível. Adonai balançou a cabeça, e falou com Leila. — Leila não seja dura com Moussa. Ele está apenas preocupado. Você já não é uma menina. Aqui no deserto uma mulher de vinte e cinco anos já está preparando a filha para o casamento, então... — Você disse certo, “Uma mulher aqui no deserto” essa não sou eu. Não vivo de acordo com os costumes do deserto, então não quero um marido do deserto. Ok! — Ok! Agora por hora vamos encerrar este assunto. Adonai falou abruptamente. Enquanto olhava o GPS, e indicava ao motorista a trilha dos carros que seguiam na frente deles. O silêncio voltou a reinar novamente dentro do veículo, mesmo com o ar-condicionado ligado, o calor estava insuportável, Leila já havia tomado mais de duas garrafas de água, e começava a se preocupar com aquela sede insuportável, de repente o velho tuaregue lhe estendeu algumas tâmaras, ela olhou desconfiada, e então ele falou: — Às vezes menina Leila, é muito teimosa. Ela sorriu para ele com total desdém e teve vontade de pegar as tâmaras com a mão esquerda, mas desistiu provavelmente ele a repreenderia e ela não achava isso muito bom, então o deixou falar.

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— Isso se deve ao fato de ser uma muwallad1. Ela não gostou do que ouviu, não gostava de ser chamada de mestiça, muito menos mulata, virou-se para a janela controlando para não explodir mais uma vez. Ele por sua vez estendeu-lhe as mãos com as tâmaras e as ofereceu. — Coma algumas, sua sede vai amenizar, as tâmaras podem ser milagrosas, experimente! Leila pegou algumas e começou a comer, depois sorrindo disse um obrigado ao velho tuaregue, do espelho Adonai observava a situação se acalmar entre os dois. Era difícil fazer o velho entender que ele não iria se meter na vida da meia irmã, como também era difícil Leila entender que para o velho tuaregue ela não passava da filha bastarda de Karin al-Wafiq ibn Karin, isso no deserto tinha peso, por isso preferia deixá-la como estava, ele próprio não tinha interesse em se casar. Embora, muitas vezes pensava como seria a vida se amasse apenas uma mulher ou como seria amar uma mulher, porque até então ele ainda não tinha experimentado o doce sabor do amor. O carro já estava se aproximando do local combinado. O rádio novamente fez contato. — Bbrrzz! Bbrrzz... Bbrrzz... Câmbio! Alcateia se aproximando? Lobo na escuta. — Bbrrzz! Bbrrzz... Bbrrzz... Sim, Lobo! Estamos chegando, câmbio. Finalizando — Bbrrzz... Bbrrzz... Ok! A paisagem com tonalidades exuberante mostrava a beleza oculta da aridez, ora um rosa escuro, ora um amarelo ouro, o vento levava a areia de um lugar para o outro, cinquenta graus o termômetro apontava, a camisa cor de areia de Leila estava colada na pele, esperava ansiosa pelo oásis no qual iriam parar; 1

Mestiça.

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a viagem era longa, então deveria aproveitar o pouco que seria oferecido. Conforto? Nem pensar, Adonai, havia lhe avisado sobre as condições da viagem, ela pensou que ele estava apenas tentando assustá-la, agora via com desespero que deveria ter ficado em San Antonio, o cabelo dela estava protegido por um lenço, mas mesmo assim já estava ficando ressecado, ela passou a mão nele e percebeu que já estava todo empoeirado. Permaneceu em silêncio até ao final do trajeto, divagando seus pensamentos nas condições precárias daquele lugar, o carro chacoalhava de um lado para outro no terreno íngreme. Então, logo após uma subida íngreme, avistaram o oásis, e nele alguns dos carros que estavam no comboio. A imagem era bonita de se ver, por um momento pegou-se imaginando em uma cena do filme “o céu que nos protege”, sorriu diante do pensamento, tempo suficientemente rápido colhido pelos olhos de águia que a observavam ao longe, ela sentiu a intensidade daquele olhar ao longo de sua omoplata, então desceu da ranger e se preparou para pisar naquele terreno árido e sem-vida. Suas pernas estavam sem firmeza no primeiro instante, e dolorida, sentiu o principio de formigamento, a coluna também estava dolorida, mas ao passo que foi se alongando ela foi voltando ao normal, caminhou lentamente nas proximidades da Ranger, olhando o local e ao mesmo tempo observando o intruso olhar que lhe incomodava. Ela se fez de desentendida e deliberadamente olhou para aqueles olhos que a observava sem disfarce. Sem demonstrar nenhuma reação começou a falar com seu irmão que estava ao seu lado. ― Meu Deus que sol escaldante é esse? Perguntou olhando para o irmão. ― É o deserto. Caríssima!!! É o deserto. ― Nossa! Estou fritando, a temperatura aqui parece ser bem maior que no Texas.

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― Sim, essa é impressão que temos, mas pode apostar que o deserto do Texas é tão quente quanto aqui. Adonai lhe explicava enquanto lhe ajudava a caminhar até uma das tendas montadas para recebê-los. ― Aproveita para esticar as pernas... E também se hidratar, pois um dos fatores determinantes de sobrevivência no deserto é justamente a hidratação e o descanso, não se aventure nesse sol sem uma proteção, apenas alguns minutos debaixo dele podem debilitar por dias aquele que não está acostumado a viver em altas temperaturas. ― Eu preciso de um banheiro... Leila falou olhando ao redor, viu apenas os homens conversando, alguns empunhavam rifles, outros estavam com submetralhadoras. ― Por que estão tão armados? ― Porque aqui a lei é o que temos em nossas próprias mãos. Quanto ao banheiro terá que ser ao ar livre, temos um pequeno lago, mas não aconselho a se aventurar, é perigoso demais, pode ter animais peçonhentos entre outras coisas. ― Arrrg! Só de pensar já me deu arrepios... Leila falou com uma careta estampada no rosto, Adonai soltou uma sonora gargalhada. ― Mas como você é exagerada, minha irmã. Venha já montaram uma barraca para você, daqui a pouco o velho Moussa deve lhe trazer algo para comer. ― O que eu quero é água para me refrescar, isso é possível? ― Sim. Mas como você sabe tudo aqui é muito limitado. A palavra por aqui é racionar, para ter por mais tempo. Explicou. Ao entrarem no interior da barraca ele continuou a falar: ―Seria muito pedir a você para ser mais compreensiva com os costumes do deserto?

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― O que você quer dizer com isso? Respondeu preocupada. ― Não quero que saia sozinha, e nem fique por aí andando sem o véu. Falou calmamente. Ela o olhou e pensou por um momento no que ele pedia. Então respondeu. ― Não sou uma Tuaregue? Posso usar o véu se eu quiser, além do mais não sou mulçumana. ― O fato de ser uma tuaregue, exige ainda mais de você. Não quero que se exponha. Não quero ter que agir com você conforme os costumes locais; muitas coisas por aqui não estão iguais aos que sua amada mãe lhe contava. Atualmente a maioria dos tuaregues seguem as leis mulçumanas. Adonai respondeu olhando-a firmemente nos olhos, percebendo as mudanças na íris, conforme ela ia abstraindo as palavras dele. ―Entendeu o que eu lhe disse? Perguntou a ela. ― Dentro do possível, poderei lhe atender, mas não espere muito de mim. Adonai ouviu aquelas palavras em silêncio em seguida saiu deixando-a sozinha na esperança que ela fosse refletir sobre o assunto. Apesar do calor insuportável, no interior da barraca o ambiente era confortável; o mínimo de claridade tornava o ambiente propício para um descanso. Leila olhou as almofadas sobre um enorme tapete fofo, sorriu lembrando-se das noites em que passava com a mãe ouvindo as histórias do deserto. A sua esquerda havia um pequeno caixote de madeira e sob ele uma grande jarra com água e uma bacia, também havia duas toalhas branca em cima de um tamborete, Leila não demorou em tirar a roupa e se lavar um pouco naquela água, a bacia era estreita, mas não se importou, o que ela queria era se refrescar. Logo estava vestindo um kaftan 2 de seda escura bordado em fios 2

Veste típica muito usada no oriente médio

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lilás. A impressão que teve que vários quilos de pó haviam saído de seu corpo, em seguida saiu da barraca a fim de atender aos chamados do corpo, sentiu-se ridícula, ter que fazer suas necessidades ao ar livre, mas estando no deserto, estaria propícia a qualquer coisa estranha, inclusive encontrar com animais nada amistosos. Esse pensamento a deixou com receios, então decidiu não ir muito longe. Revigorada, já estava de volta ao seu canto, de onde estava podia ouvir a conversa dos homens, seguiu o som para ver quem estava nas proximidades, não viu ninguém conhecido, nem Adonai, nem o velho Moussa e muito menos o sócio que mexia com a libido e a imaginação dela. Olhando de esguelha, não percebeu quando Adonai se aproximava pelas costas dela, então se assustou com a voz dele. ― Mas você é teimosa, pedi-lhe para manter-se afastada. ― Eu sei, mas onde estou eles não podem me ver. ― Como não? Assim que começou a se aproximar, fui o primeiro a ver o tecido negro esvoaçando com o vento. Ela sorriu e depois caminhando para barraca falou: ― Até parece que vou ser sequestrada por um sultão. ― Se fosse sequestrada por um sultão, mas não é bem assim, você pode ser sequestrada é por bandidos do deserto, para ser vendida em algum harém fétido e sujo, e servir de cortesã para algum sheik sádico e louco. Respondeu sério. Ela o olhou com incredulidade. ― Isso é sério? ― Infelizmente sim. Vou pedir a Nicholas para designar alguém para te acompanhar, porque nem sempre vou poder estar com você. ― Hum! Isso é muito interessante. Poderia ser ele? Despretensiosamente perguntou. Adonai percebeu o interesse na voz da irmã, olhou-a de esguelha e ignorou a pergunta, prosseguiu falando.

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― Essa não é a função de Nicholas, ele não é um segurança, além da amizade que existe entre nós, é um dos meus sócios, mas para me ajudar nessa empreitada ele assumiu a responsabilidade de alguns setores, inclusive da segurança, por isso ele não será sua babá se é que me entende. Ela ouviu aquela explicação, e sentando-se sobre as almofadas, pensou na possibilidade de ser bajulada por aquele homem. ― Que ótimo, já que ele não é um segurança, então você pode nos apresentar. Respondeu com a petulância de uma menina mimada. Adonai coçou queixo, depois se sentou do lado dela e em silêncio pensou no que o velho Moussa havia dito sobre ela se casar. Leila viu a expressão de deboche na face morena dele e deduziu o que ele estava pensando. E num impulso jogou uma das almofadas no rosto dele, ele pegou a almofada no ar, depois sorrindo lhe devolveu. Ela deixou a almofada cair. ― Eu sei no que você estava pensando. Nem ouse a repetir o que o velho Moussa falou durante a viagem. ― Não queria admitir, mas o velho Moussa tem razão. Ambos deram gargalhadas e então ela deitou-se no colo dele, afagando os cabelos dela, ele viu o quanto ela se parecia com o pai dele, apesar de ter os traços da mãe, e uma tez levemente castanha, um silêncio fraternal envolveu os dois irmãos. ― Habibah3, fique tranquila, não serei eu, a pessoa que irá escolher quem lhe desposará, mas seu próprio coração. Vou lhe apresentar a Nicholas, mas não espere muito dele. ― Porque você me diz isso? Leila perguntou curiosa. 3

Querida

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― Nicholas é um cigano, e como tal tem a alma livre, não se prende a ninguém, por isso acredito que você poderá sofrer caso se apaixone por ele. ― Apaixonar? Você ficou louco, jamais vou me apaixonar, não acredito nesse frenesi. Não nasci para me prender a um homem, se fosse para acontecer isso provavelmente eu já teria um noivo, ou quem sabe seria até casada, mas este não é meu caso. ― Você acha que nunca vai se apaixonar? ― Claro que não. Não sou adepta ao papel de mocinha melosa, acho que nem sei com ser assim, prefiro viver o momento, essa coisa de me entregar de corpo e alma, não funciona comigo. ― Então vejo que vocês dois jamais darão certo. Por que, apesar da natureza livre deste cigano acredito que ele tenha planos de se casar e arrumar uma prole bem grande, conforme os costumes de seu povo. ― Nossa! Eu não consigo me ver assim... Casada e cheia de filhos, isso no momento é inconcebível. Falou levantando a cabeça do colo do irmão. ―Eu só quero conhecê-lo nada mais que isso. Antes que Adonai prosseguisse com a conversa o Velho Moussa entrou com a comida. ― Que bom! À comida chegou. Exclamou Leila em meio a um sorriso. ― Sim, menina Leila, uma refeição bem leve, coma e descanse. A alta temperatura do deserto pode desidratar muito rápido. Virou-se para Adonai e falou: ―Menino Adonai, seu amigo quer lhe falar. ― Obrigado velho Moussa, já irei me encontrar com ele. Dirigiu-se para a irmã. ―Mais tarde continuaremos a nossa conversa. Beijou-lhe a face e saiu da tenda. Leila ficou sozinha

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na tenda, alimentou-se e depois se estendeu sobre as almofadas e se entregou ao conforto daquela maciez e antes de pegar no sono ainda pensou naquele homem e imaginou como seria fazer amor com ele. Ele era tão... tão duro... tão másculo. Ele a intrigava. Ela percebeu que apatia dele o fazia mais desafiador. Era como se soubesse dos pensamentos dela e ignorá-la só fazia o querer ainda mais. Adonai se dirigiu a um canto extremo do oásis para encontrar com Nicholas, na caminhada foi observando os contornos de um pequeno monte de terra árida que compunha os limites daquele lugar, com a vegetação rasteira em torno do pequeno lago, ele via beleza naquela extremidade pouco habitável, o solo estava trincado pela ação constante do sol, mas ali naquele pequeno pedaço, podia se ver uma pequena umidade, uma fração de vida, o pequeno lago de águas turvas comandava o direito de sobrevivência dos habitantes daquela região. Por todo lado que se olhava, era impossível não pensar na pobreza e tão pouco na miséria; tudo é escasso, comida, água, educação, saúde, mas Adonai viveu por ali com um grupo de nômade, fazendo parte; abstraindo para dar valor a tudo que poderia conquistar, e ele conquistou. Nicholas estava sentado em uma pequena rocha perto do lago, havia trocado de roupa, estava vestido com uma calça de algodão cáqui e camisa branca, sobre a camisa uma jaqueta da mesma cor da calça, usava óculos escuros e um chapéu tipo australiano, além de seus adornos o que mostrava bem sua origem cigana. Adonai se aproximou em silêncio olhando para o mesmo vazio daquela solidão, fora o barulho dos homens do comboio, tudo era um silêncio natural. ― É impossível imaginar você vivendo num lugar como este, junto às cabras, camelos e os tuaregues. Nicholas rompeu com o silêncio. Adonai olhou para ele e respondeu sem muita surpresa.

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― Não vivi por aqui. Vivi com os tuaregues nas proximidades das fronteiras do Marrocos. Hoje já não vivem mais por lá, para se protegerem migraram ainda mais para o interior do Saara. ― Você não se parece nem um pouco com um tuaregue. ― Você diz isso por causa da minha cor? ― Também. Nicholas respondeu sem rodeios. ― Eu não sei se você tem conhecimento, embora os tuaregues nessa região sejam negros, boa parte é de cor mais clara ou de tez castanha clara como no caso de Leila, porém meus pais eram brancos, minha mãe francesa, meu pai também era filho de uma francesa, então o resto você já pode imaginar. ― Uma salada genética. Nicholas falou entre risos. ― É; uma salada genética. Bom, a pedido de meu pai fiquei por aqui até a adolescência, até a essa fase fui educado dentro dos moldes e costumes tuaregues, embora minha alma seja de um tuaregue, meu coração é texano. Adonai também falou entre risos e prosseguiu: ― Você quer falar comigo? ― Estava pensando, ainda temos mais um bocado de chão para rodar, a equipe está fadigada, o que acha de passarmos a noite por aqui. ― Estava pensando nisso enquanto vinha para cá. Uma pausa e então ele continuou ―Sairemos pela madrugada, o que você acha? Adonai perguntou ao amigo. ― Concordo com você, vamos nos juntar ao grupo, e descansar ao pé de uma fogueira. ― Sim, mas peça ao pessoal da segurança ficar em alerta, estes lugares são frequentemente foco de assaltos e violência, a região está instável, armas, comida e mulheres nessa região tem peso de ouro, e neste momento o mais importante é a segurança de minha irmã.

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― Não sei onde você estava com a cabeça em deixá-la nos acompanhar, o ambiente aqui é inóspito demais para uma dondoca como ela. Nicholas criticou. ― Bem lembrado, preciso de alguém para acompanhá-la, você pode ver isso para mim? ― Ninguém vai querer fazer papel de ama seca de uma mulher mimada, impulsiva e desobediente como uma adolescente, não aceita regras, só sabe arrumar confusões. Muito difícil. Nicholas rechaçou. ― Já que você pensa assim, vou deixá-lo a encargo dela. Talvez ela abaixe o topete diante do machismo cigano do velho Nick. Adonai o provocou. ― Ao meu encargo? Desculpe a minha franqueza, mas não gosto da presença dela. Ela tem o dom natural de me tirar do sério só de olhar. Nicholas falava enquanto chutava algumas pedras pelo caminho. ― Bom, não precisa ficar irritado, tenho certeza que vocês se entenderão. Ela é sim mimada, mas é uma boa moça, às vezes tem um gênio difícil, nada que um homem de pulso não dê jeito. Adonai concluiu sorrindo; observando a expressão carrancuda do amigo e a sua reação inesperada aquilo só podia significar uma coisa: Ou ela mexia com os sentidos dele ou realmente era aversão à falta de limites do temperamento dela. ― Me entender com ela? Duvido muito... Nicholas respondeu entre os dentes, mas seus pensamentos estavam levando-o para os lábios carnudos de Leila, no corpo bem talhado e nas curvas delgada da cintura, ela mexia com a funcionalidade dos pensamentos dele, “droga! Por que penso tanto nessa mulher”, então olhou para o rumo da tenda de Leila, depois olhou para o amigo que também estava olhando para o mesmo rumo que ele e com os ombros caídos disse:

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― Vou ver o que posso fazer, na caravana tem algumas mulheres, vou pedir para que enviem uma para ser companheira dela enquanto estivermos no deserto. Concluiu. ― Mas seria bom ela não ter consciência disso, ela é propícia a se rebelar diante das regras. Adonai falou. ― Mas isso é o que mais me irrita nela, essa característica em não se curvar a nada, você tem certeza que ela é sua irmã? Ela é totalmente inversa de você. Ela é toda ocidental, despojada, aventureira e cruelmente... ― Sexy.... É o que você iria dizer. Adonai falou sem pudores. ― Hã! Sexy? Eu.... Não! Não ia dizer isso, não para você. Nicholas respondeu desconcertado. ― Dizem que quem muito desdenha é porque quer comprar... Adonai disse e saiu rumo ao grupo que já estava se ajeitando em volta de uma pequena fogueira.

Um Uma das características do deserto que sempre diferencia de outras regiões, é que quando a noite está para chegar, ela chega imediatamente, o sol se esconde muito mais rápido no deserto do que em qualquer outra região, e a temperatura também, de cinquenta graus durante o dia, a noite cai para menos de cinco graus. Os dois homens chegaram ao acampamento alguns já estavam acomodados ao redor da fogueira outros estavam na

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ronda, havia alguns berberes com eles, eram artistas do deserto que iriam se apresentar durante o festival, havia também algumas dançarinas, mulheres que ao contrário das que eram criadas para casar essas eram designadas para entreter principalmente os gringos, Adonai e Nicholas apreciavam a música, enquanto experimentavam o famoso chai4 do Saara e comiam o pitah5 com pedaços de carne de carneiro, conversavam animadamente enquanto alguns homens tocavam os bouzouk6 e bendir7, quando algumas dançarinas surgiram em meio à escuridão, elas faziam parte do grupo que ia se apresentar no festival, os homens ficaram acesos com as performances das mulheres, algumas se insinuavam sobre os homens mostrando-lhes seus preciosos dotes, outras mais discretas, mostravam apenas sua dança sensual, mas uma dançarina em especial chamou a atenção de todos, coberta com uma seda negra, como uma guedra8, ela demonstrou toda sua sensualidade e mistério através do olhar velado, ela acompanhava os acordes do pequeno tambor dando todo o charme que a música pedia, Nicholas ficou fascinado com aquela desenvoltura, ele pregou os olhos na dançarina como se estivesse enfeitiçado. Aquilo era totalmente novo para ele, pensou nas mulheres que dançavam em torno da fogueira durante as festas de seu clã, mas aquilo era totalmente novo. A música parecia um narcótico levando Nicholas a um quase transe, o movimento suave da jovem era como um convite ao 4

Bebida feita a base de folhas de hortelã. Espécie de pão feito no deserto. 6 Instrumento de corda muito usado pelos árabes. 7 Espécie de tambor de mão, muito usado pelos árabes. 8 Dança realizada pelas mulheres tuaregues. 5

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prazer, às mãos e os olhos acompanhavam as batidas do bendir como se fossem o próprio coração, parecia um pequeno pêndulo, se dobrando ao meio, mostrando as curvas da cintura e do abdômen todo trabalhado, por um instante Nicholas se viu fazendo amor com aquela jovem. Adonai não acreditou no que seus olhos estavam vendo, e antes mesmo de se manifestar um jovem berbere veio e lhe falou ao ouvido, de relance Nicholas percebeu que as feições do amigo mudaram de repente, mas ele estava tão maravilhado com a dança daquela jovem, que naquele momento só o que interessava era saber quem era a misteriosa dançarina Tuaregue. Sem dizer nada Adonai se levantou e foi em direção à tenda da irmã, entrou e deparou com outra jovem sentada aguardando a volta dela, então entendeu que a inconsequente havia se vestido de dançarina e se misturado às dançarinas. Com as mãos na cintura, ele saiu da tenda e se dirigiu novamente para onde o grupo estava reunido, as mulheres ainda estavam dançando, mas ela já não estava no meio, e nem Nicholas também não se encontrava perto da fogueira. O que ele jamais imaginou acontecer poderia estar acontecendo naquele momento, seu bom amigo provavelmente fora atrás dela, e conhecendo os dois, uma tempestade de areia iria se formar quando Nicholas descobrisse realmente quem seria a dançarina Guedra. Leila saiu de esguelha da tenda das dançarinas, estava eufórica, aquela situação lhe deixara feliz como se tivesse ganhado um brinquedo novo, nada do que acontecesse iria lhe roubar o prazer de ter visto as bocas e os olhos de admiração com sua dança, nem mesmo Adonai, que provavelmente já deveria estar lhe aguardando na tenda, para lhe chamar a atenção, ria baixinho do feito, quando de repente, alguém lhe segurou pelo braço no escuro, no primeiro momento ela não identificou quem era o homem, um medo percorreu seu corpo.

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Ela gelou, ficou tensa diante da situação, por uma fração de segundos pensou nos sequestradores de mulheres, gritar naquele instante poderia lhe trazer problemas mais sérios. Ofegante tentou controlar sua respiração, e então ouviu uma voz forte ao mesmo tempo suave, de timbre baixo ao seu ouvido; — Calma pequena gazela, não é minha intensão te ferir e nem lhe assustar. Ela ouviu aquele sopro em árabe e para sua surpresa o homem era nada mais, nada menos o seu objeto de desejo: — Nicholas Shandar! Falou consigo mesmo. Ainda com o véu sobre o rosto percebeu que estava muito próxima dele, então viu que ele era bem mais alto que ela, aspirou à fragrância amadeirada enquanto sentia o calor que emanava daquele corpo másculo, percebeu que o músculo de seu antebraço era firme como uma rocha; ao contrário dela, não estava ofegante, aparentemente parecia controlado, o que lhe causou uma vontade tremenda de desafia-lo. Então com uma falsa apreensão, ela lhe respondeu em tamasheque9, sorrindo respondeu para si mesmo: — Só me faltava essa! Dialeto local. Desvencilhando das mãos dele, ela correu em direção à pequena duna que havia acima do acampamento. Ele entendeu aquilo como um convite e a seguiu, até onde só se ouvia o som da respiração e das batidas do coração, ela parou e o esperou, o vento cortava a pele, mas ela não se preocupou com isso, e nem pensou nos animais que poderiam estar por ali em busca de alimento. Ela olhava o vulto negro naquela noite cor de prata, era uma imagem que iria guardar no coração, ele veio até ela e novamente tentou retirar o véu que cobria lhe o rosto, ela segurou-lhe as mãos evitando assim revelar precocemente sua identidade, aquilo contribuía 9

Dialeto usado entre alguns berberes ou tuaregues.

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para o mistério, levando a imaginação a devaneios surreais, então usando próprio lenço ela o circulou e o puxou para junto de seu corpo, o desiquilíbrio nas areias fez com que caíssem; aquele jogo, o som do sorriso dela era cativante, mesmo que se arrependessem mais tarde, naquele momento o que interessava aos dois era aplacar o fogo que o consumiam. — Pequena gazela, você está muito afoita, tenha calma. Não estou acostumado a essa urgência, vamos devagar, temos uma noite toda pela frente, vamos curtir cada instante. Ele falou novamente em árabe. Na esperança que ela o tivesse compreendendo. Deitados na areia, um sobre o outro, não havia como voltar atrás, o limite do controle e da sensatez já haviam ido para o espaço. Ele já estava além do limite; ela percebeu tarde demais que o havia provocado além do necessário. O silêncio aterrador tomou conta, a respiração descompassada denunciava o ápice da situação, com um movimento rápido, ele a virou sobre areia e então aos poucos foi sentindo aquela mulher, primeiro a fragrância de seu pescoço e colo, depois com as mãos sentiu as curvas daquele corpo escultural, sentiu a superfície arredondada dos seios volumosos, firmes. Aquilo por si só, já era um convite natural para o prazer, eles estavam prontos para serem deliciados; ela também o alisava, as mãos passeavam pelas costas, sob a camisa, pelas nádegas, pelos cabelos. A barba dele roçava sua pele afogueada. Ela não estava com medo, iria até o fim. Uma parte dele o chamava para a sensatez, a outra dizia que deveria aproveitar aquele momento, então institivamente ele se levantou um pouco e abriu a camisa, afrouxou o cinto da calça e abriu à braguilha, um membro rijo estava preste a estourar dentro do tecido. O frio do deserto não era nada comparado ao calor que emergia daqueles corpos; os sons das roupas sendo retiradas

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faziam o sangue correr mais e mais por entre as veias; não podia pensar em consequências ou mesmo quem era aquela mulher que estava ali o deixando de quatro. Em sua existência jamais encontrara gadis que se entregassem tão voluntariamente, sem perguntas, sem nomes, sem compromissos; agora já era tarde demais, o véu já não estava preso ao rosto, não havia mais volta, mesmo sem o véu era impossível distinguir aquele rosto na escuridão, os beijos e a pressa levaram seus pensamentos para outro universo, um que jamais imaginara encontrar em pleno deserto do Mali. Nem por um momento ele estava preparado para a surpresa que o abateu, um gemido mais profundo o deixou estático, tarde demais percebeu que a mulher que estava ali se entregando sem nenhuma reserva acabara de ser deflorada. —Uma virgem??! Ao mesmo tempo em que falara congelara, tentou recuar, mas ela o impediu e sussurrando em francês ela novamente o surpreendeu. — Ma chère, je te veux, ne vous arrêtez pas ... Ele a ouviu. O pensamento estava mais rápido que as palavras. Demorou para articular as palavras dela em sua mente, « eu quero você, não pare » ela o incentivava a seguir em frente. — Je viens vous voulez. « Quero apenas você » a voz ecoava em seu pensamento, como uma droga ele se sentiu entorpecido com a doçura daqueles lábios, o cheiro de gerânio naquela pele o embriagava, não conseguia pensar nas consequências e nem nos problemas que viriam depois do ato consumado. Consumado!? Estava totalmente entorpecido, desesperado ele sorriu. — Por Sara Kali 10onde fui me meter? Falou entre os dentes. Como um cachorro faminto se viu preso naquele 10

Sara Kali é a padroeira do povo cigano.

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corpo, como se fosse um osso, decidiu ficar até o fim. Para o deleite de Leila se amaram loucamente nas areias do deserto. Horas mais tarde ainda abraçados, ele pôs a pensar em como seria dali para frente, chocado ele se levantou para pegar suas as roupas, então pensou nos perigos que os dois correram, à noite no deserto é perigosa demais, pois é o horário preferido dos animais para se alimentar e também se alguém o pegasse naquele estado seria pena de morte para os dois. Chacoalhou a camisa e a calça, por causa de escorpiões, pensou em falar alguma coisa mas acabara de fazer amor com uma virgem, e agora não sabia o que fazer, nunca em sua vida fizera amor com uma virgem, era uma de suas regras, nunca ser o primeiro na vida de nenhuma mulher para não ter que ser responsável por ela, mas ela.... Ela em nenhum momento demonstrou que nunca tinha estado com um homem, não sabia o que fazer e nem o que dizer. Ainda em silêncio terminou de se vestir, após sentou-se na pequena duna e aos poucos foi visualizando a mulher se vestir, ela cantarolava uma música tribal, pegou o véu e olhou para ele, na escuridão ele pôde ver um sorriso desenhado nos lábios, ela era encantadora, não parecia ser beduína11, embora durante a dança ele nem se lembra de ter visto o rosto dela. Ela se sentou ao lado dele, e suavemente pegou as mãos dele e levou aos lábios, beijou as pontas dos dedos e lhe falou: — Você não tem que ficar preocupado em ter sido meu primeiro homem, alguém tinha que ser, estou feliz que tenha sido você. - Ele compreendeu cada palavra dela com um assombro significativo, sem compreender nada daquela situação inusitada, se sentiu um objeto que havia acabado de ser usado. 11

Povo nômade do deserto.

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— Mas que brincadeira é essa?! O que? - Nicholas está se enfurecendo. — O que está acontecendo por aqui? Quem é você? O tempo todo.... Você me compreendia? Fala meu idioma? Você tem noção do que acabamos de fazer? Ele falou confuso e quase desesperado. Houve um suspiro e em seguida uma voz firme e ao mesmo tempo melosa respondeu: — Não precisa ficar assim, sou uma mulher emancipada, não sou nenhuma criança. Falo sua língua e outras tantas mais. Sorrindo se levantou para ir embora. — Quanto ao que houve aqui? Bem, isso não é o fim do mundo. É algo que irei me lembrar por toda minha vida. Agora preciso ir embora. — Espere. As coisas não são assim tão simples. Você acaba de banalizar uma situação que para mim é algo muito importante. Afinal quem você pensa que é? Ele falou se levantando e indo na direção dela. — Talvez você tenha razão quanta à importância do momento, mas isso não significa que eu esteja banalizando o que acabamos de viver. Muito pelo contrário, escolhi o meu momento e o escolhi muito bem. Sorriu e concluiu. — Você foi maravilhoso. — Eu disse para esperar. Pegou no pulso dela e apertou. — Solte-me, você está me machucando. Falou entre os dentes. Ele afrouxou a pressão e falou novamente. — Desculpe. Não era essa minha intensão. Mas convenhamos, você acabou de me usar e ainda quer que eu seja compreensivo, preciso ao menos saber quem é você. — Você está se irritando porque se sente usado? Que ironia é essa? Então quer dizer que se eu fosse uma mulher experiente, você não estaria ultrajado? Será que realmente você deseja saber eu quem sou? Ou você apenas precisa saber quem pela primeira vez fez de você um objeto? Para mim basta saber que você foi

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meu primeiro homem, isso é tudo. Por que ficar dando nomes? Você tem a sua vida e eu tenho a minha. Ponto final. — Você é filha de um dos bérberes12 que estão nos acompanhando ou veio junto com as dançarinas para o festival? Perguntou temeroso em ouvir a resposta. — Não se preocupe, nenhum pai, avô ou mesmo irmão virá atrás de ti, este será o nosso segredinho. Afinal foi você quem veio atrás de mim. E não o contrário. Ele ainda não acreditava naquela situação ridícula que acabava de viver. Aquela luxúria toda, não podia ficar assim. Ele não era um homem que caçava sexo na noite, ainda mais num lugar daqueles. Nem as mulheres da noite parisiense eram tão oferecidas daquela maneira, por isso, estava encarando aquela situação como uma piada, aquela mulher estava zombando dele. Ela estava tripudiando. Ele jamais fora dominado, jamais abaixara para qualquer mulher que fosse, e de repente uma total estranha, o fez arriar-se aos seus pés. Aquilo o enlouqueceu. Mas ela tinha o domínio da situação então se soltou das mãos dele e aproximando-se deliberadamente lhe deu um longo beijo, e ele idiota correspondeu novamente aquele convite, saboreando os lábios macios, o pescoço, os ombros, e com se acendesse um fósforo, um calor intenso percorreu por suas veias, dilatando suas têmporas e então com uma sensualidade feroz tomou conta do seu âmago, como um ferro de marcar ele se apossou do seu colo, ao amanhecer saberia quem era aquela jovem. Que ilusão a dele. Aquilo poderia ser uma faca de dois gumes. Tarde demais, ela percebeu a verdadeira intenção daquele beijo ardente, então o empurrou e muito zangada alterou o tom de sua voz: — Seu idiota, o que você pensa que está fazendo? Isso pode deixar marca. Marcando-me está se condenando a 12

Povo nômade que vive no deserto.

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responsabilizar-se por essa noite ou quem sabe poderá estar me enviando para o açoite, caso não lhe entregue. Para o nosso próprio bem. Esqueça dessa noite. Em seguida saiu às pressas rumo a sua tenda. Ele ficou olhando para o escuro e de repente pensou nas consequências daquela aventura. «Por Sara Kali, como me deixei envolver dessa maneira, não posso dar as costas para isso, mesmo com a possibilidade de estar com a minha cabeça a prêmio não tem como esquecer o que acabei de viver». Caminhando a passos largos Leila pensava na explicação que teria que dar a Adonai, a noite já estava alta, a música já havia acabado, alguns membros da equipe já estavam adormecidos, provavelmente ele estaria esperando por ela, e foi o que aconteceu, quando entrou na tenda o encontrou sentado lhe aguardando. Por um instante ficou apreensiva, a fisionomia dele estava fechada, o que demonstrava que os ânimos iriam esquentar. — Pensei que já estivesse dormindo. Falou antes dele. — Dormir! De que maneira? Se a doida da minha irmã resolveu se comportar com uma cortesã medieval. Adonai falava o mais baixo que podia, mas sua vontade era de torcer o pescoço dela. — O que deu nessa sua cabeça, aparecer lá dançando daquela maneira? Estava se expondo, você não tem noção do perigo que correu. — Eu não fiz nada demais, apenas mostrei meus dotes dançando guedra. E ninguém me reconheceu, nem o Moussa se deu conta da minha presença...Entre as dançarinas...Eu... Ele interrompeu a explicação dela... — Eu sabia que era você. E com certeza, outros membros do grupo também tinham este conhecimento.

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— Deixa de neurose, ninguém sabe, nem o arrogante do seu amigo percebeu de que se tratava de mim, aquele idiota selvagem.... Agitada concluiu: — E quero que continue assim. Ele a olhou confuso. — Não acredito. Você acha que o Nicholas não sabe que você é a dançarina? — Isso mesmo. — Perdeu o juízo totalmente. Ele colocou as mãos na cabeça e a olhou incrédulo. — Ao amanhecer você falará com ele sobre isso, ou eu vou fazer do meu jeito. — O quê? Você acha, que vou chegar nele e dizer: olha eu sou a jovem que você abateu no meio das dunas ontem à noite, e agora meu irmão quer reparação. Você mesmo me disse que não ia interferir na minha vida. Foi à resposta áspera que deu a ele. Ele ficou em silêncio, levantou-se foi até onde a jarra estava e derramou água em uma taça para beber. — Não se trata disso habiba, Nicholas é meu amigo. Ele é um homem de princípios e com certeza ficará numa situação muito delicada ao saber que esteve com minha irmã. Você querendo ou não, criou uma situação embaraçosa para nós três, se comportou como uma mulher leviana e sem princípios, você tem 25 anos, não é uma criança, não pensou nas consequências, o que vão dizer de você? O que o Nicholas vai pensar de você daqui para a frente. Poxa! Você pode não se importar com sua reputação, mas suas atitudes me afetam diretamente. Pelo menos deveria ter pensado nos sentimentos dele. — Adonai, quem está falando de sentimentos! Então, um homem resolve que vai sair, e encontrar qualquer mulher por aí, vai transar com ela é normal. Agora se é uma mulher que faz isso ela tem que pensar nos sentimentos do cara. Tenha santa paciência! Sou adulta, sei o que fiz, não me arrependo, não vou me arrepender. Respondeu sem emoção nenhuma na voz. Ele

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balançou a cabeça, e ficou se perguntando que tipo de mulher era ela. Ela prosseguiu: — Confesso que não tinha nenhuma intensão que a coisa seguisse por esse caminho, mas aconteceu assim, foi melhor do que eu esperava, mas acabou, pronto! Ele não precisa saber que foi comigo, precisa? Perguntou. — Isso quem terá que decidir será você mesma. Mas entenda ele é integro e honrado, não se brinca com um homem como ele. De alguma forma, isso vai ferir os sentimentos dele e irá trazer problemas para você. — Se isso fosse verdade ele teria pensado duas vezes antes de me seguir na noite. Falou enquanto escolhia uma roupa para dormir. —Acho que você não conhece bem o amigo que tem. — Talvez ele tenha imaginado que você fosse uma das mulheres do grupo de artistas. Já que seu comportamento fugiu aos padrões da normalidade. — Que padrões Adonai? Não estou entendendo a onde você quer chegar com esse discurso. Já sou bem crescidinha. Sei muito bem diferenciar avião de passarinho. E se isso tivesse ocorrido na civilização? Era uma situação também fora dos padrões da normalidade? Sorrindo ela continuou: — Realmente. Ele acreditou que eu fosse uma das dançarinas. Você tinha que ver como ele ficou chocado quando descobriu o contrário. Olhou diretamente para o rosto estupefato do irmão. — Que cara de bobo é essa? Você não pensou que eu iria me guardar para um casamento que nunca irá acontecer, não é? Sorrindo ela colocou as mãos na cintura e olhando para ele falou sem medo ou vergonha: — Sossegue eu sei o que estou fazendo. — Porque insiste nessa rebeldia, você está extrapolando. Ser livre não significa descuidar dos sentimentos alheios ou não ter princípios. Estou começando a ficar preocupado com você.

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Você tem se mostrado cheia de vontades e mimos. É preciso respeito para com o outro. — Não estou faltando com respeito, sempre me coloquei diante das pessoas cordialmente, não foi essa educação que a Bá me deu. Eu respeito à memória dela. Mas o que você não quer compreender é que tomei uma decisão que dizia apenas a mim. Se estou sendo desrespeitosa, talvez, seja comigo mesmo, nunca fui chegada as tradições. Não estou confundindo nada, eu o queria, eu o quis desde quando o vi na sua sala. Ele é um homem sensual, seu estereótipo é viril, másculo. E já estou com 25 anos, já estava na hora de acontecer. Por isso quis que fosse com ele. — Nosso pai está revirando na tumba nesse momento. — Calma, não precisa ficar zangado comigo, lhe prometo que vou ser mais discreta daqui para a frente. Não vou lhe colocar em nenhuma situação ruim. Prometo. Olha para mim Adonai, não tenha vergonha do meu comportamento, eu te prometo, vou pedir desculpas para ele quando chegarmos em Paris, mas por hora, vamos deixar assim. Ok? Então olhou para o irmão com o ar mais angelical que pôde fazer. E ele deu de braços, como que desistindo. — Se você aprontar, você está me ouvindo? Se você realmente aprontar. Coloco-lhe no primeiro avião e mando-lhe para casa. Isso não é uma ameaça, minha querida irmã, por isso não me tente. Adonai saiu da tenda e foi direto para a sua pick-up, no interior dela sentou-se em frente ao volante e pensou no pai, se ele estivesse ali, as coisas não teriam tomado este rumo, provavelmente Leila já estaria casada ou esta história teria outro fim para o casal de amantes, se ele estivesse ali, ele não estaria tendo que preocupar com os desatinos de Leila, ela era muito imprevisível, precisava de colocá-la nos eixos, sua vida liberal

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precisava de mudar, naquela noite tinha sido o Nicholas, amanhã seria quem ? E o que ele estava pensando da irmã? Balançou a cabeça, pegou um cigarro e o acendeu, fazia tempo que não fumava, mas naquele momento precisava ordenar os pensamentos.

Dois Ao

longe, um homem nadava nas águas geladas do pequeno oásis. Precisava esfriar a cabeça. Como uma mulher podia levá-lo ao extremo, a ponto de não perceber a roubada que estava entrando. Ele não havia percebido a inexperiência dela, ela o envolveu de tal forma, que seus instintos de macho, de alfa, falaram mais alto, quem poderia dentro do grupo ser tão atrevida, tão acima das regras, ele sabia que um grupo de dança havia se juntado ao grupo, mas não era possível que uma das mulheres seria tão burra, as mulheres da região tinham princípios e medo, esta, porém foi despudorada, intrigante, ela o seduziu, e ele caiu de quatro literalmente sob seus pés. Quem poderia ter tanta audácia? Sua mente trabalhava, a cada braçada forte nas águas um rosto se rabiscava na sua frente, como miragem, e ao longe um nome surgia, borbulhando nas águas « Leila... Leila... Leila... » e de repente ele parou no meio do lago e então: ... — Não! Não é possível que aquela criatura despretensiosa fosse tão vulgar. A ponto de entregar sua própria virtude a um homem estranho no meio da noite. Mas este homem era ele. Se fosse ela, ele saberia, ele conhece de cor aquela cintura delgada que balança como uma

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pluma ao caminhar, o cheiro de mel que saem dos cabelos, aquela boca carnuda, sedenta, molhada, o tilintar das pulseiras, que parecem pequenos sinos quando ela caminha, o cheiro de canela com gerânio que entorpece os sentidos de longe, « Droga! Como fui idiota! A bandida que esteve comigo só pode ter sido ela! O cheiro de gerânio e mel no lenço de seda, na pele, é inconfundível. E dela. Mil vezes droga! Por Sara Kali o que vou dizer para Adonai », mergulhou novamente nas profundezas e ao voltar à superfície a temperatura fria da noite o fez ficar mais sobre o controle de suas emoções, saiu das águas e enquanto se enxugava, pensava na delicadeza dos gestos dela ao segurar seu membro, as mãos suaves acariciavam seu peito, sua boca era macia, como ele sempre imaginara ao vê-la pela primeira vez. « Louca! É o que ela é... Adoravelmente louca » ele falou consigo enquanto subia para o acampamento para descansar um pouco, iriam partir a qualquer momento, alguns homens já estavam em movimento. Deitou – se sobre as mantas tentou adormecer, mas estava difícil. Ele estava com um baita problema nas mãos. Um problema que só casamento poderia resolver.

Na tenda, alheia ao grande problema que criara, uma jovem dormia feliz, estava tão cansada que não teve tempo nem de pensar no que realmente fez com o pobre diabo, sabia que ao amanhecer teria uma batalha para enfrentar, mas isso ficaria para depois, por que naquele momento queria se aquecer e se entregar ao aconchego das suas cobertas. E então adormeceu, adormeceu sonhando com seu cigano montado em um cavalo branco cavalgando nas areias indo de encontro a ela, o vento soprava seus cabelos, ela sorria, estava feliz...

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Mais tarde, pouco antes do amanhecer, um grito ecoou no acampamento. Assustando a todos, imediatamente Adonai foi para tenda de Leila, ela estava sentada diante do espelho zangada, muito zangada. Ao vê-la ele não acreditou no que viu. — Que diabos está acontecendo aqui Leila? Adonai perguntou firmemente enquanto entrava na tenda. Então ele pôs as mãos sobre a boca e perplexo continuou: — Pelos feiticeiros do deserto, o que é isso em seu pescoço? Leila estava com um espelho nas mãos sob as almofadas coloridas. Muito zangada, ela olhou em direção do irmão e respondeu entre os dentes. — Nada que eu não possa resolver - gritou ela. Depois em tom mais baixo prosseguiu: — assustei-me. Foi isso. Não esperava que tivesse ficado tão feio. Então lhe mostrou o motivo. Adonai não acreditou no que viu. Coçou a cabeça e ficou sem palavras. Saiu da tenda e pediu para que uma das mulheres fosse ajudá-la, enquanto foi tomar um café. Já havia passado alguns minutos, quando surgiu na sua frente Nicholas, com a cara toda amassada, de óculos escuros e jaqueta. Respirando fundo Adonai manteve-se frio e como de costume sem alteração na voz o cumprimentou: — Bom dia! Olhando para seu rosto fechado continuou a falar. — Pelo que vejo sua noite foi não das melhores. Ele olhou para o amigo pensou um pouco, pegou a caneca de café e respondeu. — Prefiro me resguardar aos comentários. — Vai ser difícil. Adonai respondeu meio sério. Ele o olhou indagando silenciosamente. Adonai continuou. — Você já se olhou no espelho? — Não. Respondeu secamente.

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— Tome um café. Partiremos em seguida. Adonai também foi seco. Nicholas não tomou o café imediatamente foi até ao carro e não acreditou no que viu, ele também estava com pescoço todo marcado, a bandida o havia lhe marcado de forma que não haveria nenhuma camisa pudesse cobrir, abriu o portaluvas e procurou um lenço, o jeito era disfarçar cobrindo com um lenço, mas quem ele queria enganar, nem o lenço disfarçou, ele chamava mais a atenção para o lugar. Adonai se aproximou, e bem tranquilo com um boné nas mãos lhe disse: — Já está na hora de partirmos. — Ok. Mas antes quero dar uma palavrinha com sua irmã. — Ela está no outro veículo. Nicholas caminhou de cabeça baixa até onde ela estava, mas ao se aproximar do veículo não acreditou no que viu, ficou confuso, mas o pescoço marcado era de outra jovem que estava com ela. Ele olhou para as duas mulheres com desconfiança; a acompanhante de Leila era roliça e também bem mais baixa, não era ela quem esteve junto dele, aquilo só reforçou a certeza que Leila era a mulher que rolou com ele na areia, mas não iria colocar-se ao papel de homem insultado, não naquele momento. Ele teria a viagem inteira para arquitetar uma vingança contra essa brincadeira de mau gosto. No interior do automóvel, Leila sorria, aquela ideia foi brilhante, ela maquiou o pescoço da criada, enquanto cobriu o seu com uma joia tuaregue e os lenços. O velho Moussa ao vê-la ficou maravilhado. — Menina Leila, que maravilha, a senhorita fica uma boneca nos trajes de nosso povo. Deveria usar sempre. — Aqui no deserto vou usar. Falou e olhou para Adonai. Ele desviou o olhar, estava aborrecido com aquela situação, mas ela se divertia.

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No outro carro Nicholas estava mordido como um cão raivoso. Nunca uma mulher o havia feito de tolo, e tão pouco o desafiado tão descaradamente, essa o havia feito de tolo, duas vezes, ele não ia deixar passar, se vingaria dela, seu sangue estava azedo, ele não conseguia nem falar, dirigia em alta velocidade pelo deserto, o comboio seguia na mesma proporção, ninguém entendia nada, salvo os dois irmãos que sabia muito bem o que estava acontecendo. A caminhada seguiu por três horas incessantes, no caminho encontraram com muitas caravanas e muitos camelos até chegarem ao lugar de Essakane que os grupos estavam reunidos, havia muita gente espalhada pelo vasto campo, Adonai estava novamente com aquela expressão de preocupado. Pararam frente ao seu acampamento, enquanto descarregavam as cargas, ele se dirigiu a Leila. — É o seguinte Leila, aqui as coisas deverão seguir dentro das minhas regras, por favor, se for caminhar por aí, não saia sozinha, esteja com o Velho Moussa ou com outro encarregado, mas sozinha não! Preciso cuidar de alguns interesses, não quero me preocupar com suas loucuras como também não quero ser exposto por causa de alguma confusão sua. Lembre-se do que lhe prometi no oásis. — Pode ficar tranquilo, sei que aqui a coisa é diferente. Falou compreensiva. E ela sabia mesmo. Sabia que poderia ser tripudiada e até mesmo açoitada caso fugisse aos padrões rígidos dos bérberes. Olhou para ele. E concluiu. —Vou sair apenas com o Velho Moussa, ou estarei com as mulheres nas alas onde elas trocam seus artesanatos. Estou doida para adquirir algumas joias. — Tenha cuidado em não expor esse pescoço marcado por aí, ele pode lhe causar sérios problemas.

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— Eu sei. Mas você sabe que para nós tuaregues, homens e mulheres devem ser um para o outro como os olhos e o coração, e não apenas para a cama. Então não tem com que se preocupar. Eu vou ser mais cuidadosa falou sorrindo e se dirigiu para sua tenda. Ao entrar na tenda, pediu para a criada lhe arrumar uma veste masculina, mais tarde a jovem lhe trouxe um caftan e o haik (espécie de manto) índigo e um lenço enorme chamado de Tagelmust, além do pó azul usado pelos homens, Leila sorriu ao ver a roupa, a ideia era circular pelo festival vestida de homem, ela iria se aventurar sem se arriscar, já que como mulher estava limitada, como homem seria um passaporte. Mas o que ela não contava era que alguém havia sido incumbido de lhe vigiar de perto, Adonai não iria arriscar o próprio pescoço conhecendo Leila como conhecia, ela iria aprontar. Estava diante do espelho, quando de repente alguém entrou em seu recinto, seu coração acelerou, antes de virar para ver quem era, já sabia de quem se tratava, era Nicholas. —Vim lhe devolver seu lenço. Falou com uma voz fria e sem emoção. Ela engoliu em seco, e lentamente virou-se para olhar para ele. — Você achou que eu não saberia? Perguntou a ela. Ela continuou em silêncio. Ele então prosseguiu: — Você tem ideia do que nos aprontou? Assim que passar este festival vou me retratar com seu irmão, pela minha honra e a sua também. Ela cruzou os braços de maneira que aquela conversa não tinha sentido para ela, então respirou fundo e falou o mais baixo que pode. — Saia daqui! Não quero saber sobre sua honra. Tão pouco, estou interessada no seu ponto de vista. Por favor, se você não sair vou gritar. Ele se aproximou lentamente e ela se

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afastou tentando se proteger, a raiva estava estampada claramente nas faces dele. — Isso não será necessário. Não depois da noite que tivemos. Dizendo isso, ele puxou o lenço que lhe tampava o pescoço. Recuou um pouco, a marca deixada estava muito feia, definitivamente ele teria que se explicar para Adonai. — Sinto muito! Não esperava que fosse ficar assim. — Se não esperava, por que o fez? — Você foi responsável por isso. Não eu. Foi você quem se ofereceu. — Eu me ofereci? Não seja hipócrita! Você queria bem mais do que eu, tanto que veio atrás de mim. — Não fui atrás de você. Fui atrás da dançarina. Se eu desconfiasse de que se tratava de você jamais teria me aproximado. — O que está feito, está feito. Não se volta atrás. — Sim. Por isso, para nosso próprio bem iremos consertar o que fizemos. — O que você quer dizer com isso? Perguntou com uma falsa curiosidade estampada no rosto. — O que um homem de honra faria, vou reparar o dano que lhe causei. Vamos nos casar! — Ficou louco! Jamais me casarei por uma questão dessas. Nunca! Gritou para ele. — Irei conversar com Adonai sobre essa situação, irei formalizar o pedido de casamento, já está na hora de alguém começar a colocar limites nas suas atitudes moça. — Você não me ouviu. Não vou me casar com você. Nem com ninguém. Sou uma mulher livre. Os ânimos estavam exaltados, quando um tuaregue entrou e com a mão na cintura falou para ambos. Os olhos de Leila

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tremiam, por segundos ela ficou gelada, Nicholas também se preocupou naquele instante. — Vocês dois poderiam deixar para discutir este assunto ao voltarmos para casa. — Adonai!!! Duas vozes em coro encheu o ambiente. — Sim sou eu. E até ao final do festival gostaria que vocês se mantivessem em paz, não quero ter que me explicar para o velho Moussa, e tão pouco ter que decidir sobre a vida de vocês dois conforme os costumes do local. — Peço-lhe desculpas meu caro Adonai. Nicholas falou mais calmo. — Mas preciso resolver este assunto. — Eu compreendo. Mas agora não é a melhor hora, venha preciso de você comigo. Olhou para Leila. — Quanto a você conversaremos mais tarde. Agora tenho que participar do arrollan13 . Falou com ar meio preocupado, e foi saindo da tenda. Ela ficou indecisa, já estava bem enrolada, mas ficar ali não teria graça, precisava sair, e a melhor maneira para isso seria vestida com um tuaregue. Uma hora mais tarde estava perfeita, olhou-se no espelho e viu a sua aparência, ninguém desconfiaria de nada, ela estava sob o caftan azul e um manto o qual disfarçou seu corpo dando um volume extra. Arrumou o turbante azul sobre a cabeça e em seguida passou o véu sobre o rosto, apenas seus olhos eram visíveis, nem ela se conheceu. Em seguida pegou um alforje e colocou algumas coisas para trocar com outros tuaregues e também alguns dirhams14 , lembrando que não poderia se aproximar das mulheres, pois ficaria em maus lençóis. 13

Reunião de vários chefes tuaregues. Decidem sobre questões importantes sobre os clãs. 14

Moeda de troca no deserto.

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Saiu tenda a fora sem ser vista por ninguém, e se misturou entre as inúmeras pessoas espalhadas pelas imediações, havia vários grupos de artistas além dos turistas, ficou impressionada com o número de pessoas ali reunidas, dada a situação instável da região, e politicamente falando ali não era um ambiente propício para turistas, principalmente americanos, caminhava de cabeça baixa, mas observa tudo a sua volta, em meio a rebuliços de cabras e crianças, as pessoas circulavam livremente, o vento seco que vinha do Saara a abraçava como que saudando a filha dos ventos, era assim que o pai a chamava, principalmente quando aprontava, sentiu um vazio como a muito não sentia. Parou um pouco e se sentou para ver as sessões de Tindé15 , sua mãe e as outras mulheres da casa costumavam entoar em tardes quentes, quando o pai já estava de cama, ficou ali olhando aquelas mulheres e pensando em como sua vida teria sido diferente se seus pais tivessem voltado para o deserto, naquele momento vendo aquelas mulheres com um sorriso marcado no rosto triste, ela entendeu o grande amor de seu pai por ela e pela própria mãe, se tivessem voltado elas teriam que ter vivido sob o julgo de uma sociedade que oprimi em nome do amor e da fé. Não! Ela não saberia viver daquela maneira, cheia de filhos, cabisbaixa, semianalfabeta ou de todo analfabeta. Os Senhores do deserto nada mais era o próprio retrato da miséria, a beleza é para uma minoria insignificativa que compõe alto escalão do poder, mas aquela gente ali, aquela gente conhecia palmo a palmo daquelas areias, aquela gente conhecia muito bem o que era o sofrimento, as lágrimas, os dissabores. Ela não conseguia entender onde havia beleza. 15

Cantos tradicionais das mulheres tuaregues.

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Em silêncio assistiu a uma apresentação de tuaregues do sul da Líbia, eles eram bem diferentes dos de Mali, ao som de uma música meio hipnótica, os homens simulavam uma luta, estavam contando a história de uma guerra, onde um nobre sultão ofereceu seu sangue pelo de seu povo, este sultão ao final de uma tarde no Saara, destruiu toda uma nação impura, mas o grande Alá entendeu que ele deveria ser mais altruísta, ele deveria ser imolado e assim o fez ali naquele momento aqueles tuaregues vibravam como se tivessem vivido o momento do sacrifício. Sentada naquele monte de areia dava pra ver como o poder é paradoxo, as vestes daqueles tuaregues demonstram o grande poder aquisitivo de sua tribo trajando um caftan branco, manto vermelho, e calças negras, um turbante branco de seda pura acompanhado do véu terminava o conjunto das vestimentas, além de cintos dourados amarrando o manto, definitivamente ali estava uma classe de nobres, homens acostumados a mandar, mulher ali naquele meio eram as verdadeiras escravas, arrepiou-se só de pensar no assunto. Logo após a apresentação destes tuaregues, aproximou-se outro grupo, menos exótico que o primeiro, mas também através da dança com as espadas e a cantoria das mulheres contavam a história de um grande amor, o refrão da música entoada foi até o coração de Leila. “Deus sabe como ela se sente, Ela dorme embaixo de suas doces lágrimas, Eu sacrificaria todas suas lágrimas para ter um só momento de seu olhar em meus olhos, Para ter seu brilho aqui do meu lado, Passando por mim, Ela se move, se move como uma brisa, Tão doce tão linda, Ela dorme embaixo de suas doces lágrimas,

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Eu sacrificaria todas suas lágrimas em meus olhos, Para ter seu brilho aqui do meu lado. ”

Ao final da apresentação Leila ficou analisando a diferença dos grupos, ali quem mandava eram as mulheres, ela viu um pai cuidando do filho, viu uma senhora dando ordens às outras mulheres que caminhavam unidas cantarolando, estavam felizes, mas felizes por quê? Leila não compreendia aquilo era muito pouco para ser feliz. Levantou-se daquele lugar e voltou a caminhar, pensando e analisando os contrastes daquela nação sem pátria. O papel da mulher era totalmente nulo, e ignorante aquele que acreditava que havia justiça naquele meio de sobrevivência, por um instante odiou ser descendentes deles, e odiou ainda mais o fato de ser uma Iklan16, aquilo corroía sua alma, mesmo que ninguém no Texas soubesse desse pequeno detalhe da sua vida, ela sabia, ela e aqueles que estavam ali comemorando a “Chama da Paz”. Passou diante do palco armado, olhou para os estrangeiros, provavelmente os promoters do evento, verdadeiras sanguessugas, ali estava uma maneira fácil de ganhar muito dinheiro, passou pela equipe de seguranças de seu irmão, e olhou diretamente para um deles, porém ninguém a reconheceu, nem mesmo o velho Moussa, ela se sentiu vitoriosa, caminhando mais um pouco viu um grupo de escambos, tuaregues com várias peças de artesanato para trocar ou vender, ela se aproximou, e através da linguagem de sinais conseguiu fazer bons negócios, aquilo pra ela era importante, era como exercer um pouco uma vida que nunca seria dela. 16

Descendentes de antigos escravos.

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A tarde estava se aproximando, um grande número de camelos estava se juntando para a grande corrida, tratou de procurar um lugar seguro para ver a corrida, sempre aconteciam acidentes terríveis durante a corrida, se instalou perto de um pequeno monte de areia branca, e sentou-se, abriu o alforje e pegou um naco de pão, já estava sem se alimentar por muito tempo, pegou uma garrafinha de água e pôs a beber, de repente ela começou a observar uma movimentação estranha no meio da multidão, ficou em alerta, algo estava errado, viu alguns Tuaregues da tribo de Adonai circulando junto com os seguranças, virou-se para o lado norte viu o Velho Moussa com Adonai também caminhando, a passos apressados, estavam procurando alguma coisa, mas o que seria? De repente ela pôs se a rir, sentiram a falta dela, já deveriam estar procurando por ela; suspirou, coçou a cabeça, e então decidiu voltar à tenda depois da corrida, mas estava apreensiva, havia visto alguns homens do acampamento, mas não tinha visto a equipe de Nicholas, isso provavelmente seria um problema, caso a encontrassem antes deles. Com a raiva que ele estava não poderia se arriscar, então tratou de descer a pequena duna e foi direto para o acampamento. Caminhava depressa, de cabeça baixa, ela conseguiu alcançar o lugar onde estavam as pick-ups, passou por trás delas, e já estava se preparando para enfiar debaixo de sua tenda quando foi surpreendida por alguém. Ela fechou os olhos, estava enrolada. — Pare! Ou eu atiro. Veio à ordem em árabe. A voz não parecia ser de ninguém conhecido. Ela colocou as mãos a vista e virou-se lentamente, era um dos seguranças, ela já ia se revelar a ele quando Nicholas se aproximou, pegando-a pelo braço. — Você sabe o que fazemos com ladrões? O que está fazendo aqui? Por que estava invadindo a tenda do senhor alShihab? Ele estava muito zangado. Ela pôs a tremer, pois sabia

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que tinha sido confundida e provavelmente iriam leva-la as autoridades. O silêncio doído imperava entre eles, o jovem tremia muito, mas ele não se comoveu com isso. Nicholas precisava encontrar Leila. Era preciso interrogá-lo para saber onde ela estava naquela altura, sumida desde o almoço, todos estavam à procura e ninguém a encontrou. O jovem o olhou profundamente nos olhos, ele não gostava daquilo, pois sabia muito bem das lendas que diziam que alguns tuaregues tinham o dom de roubar as almas de seus inimigos através do olhar, este tuaregue o desafiava, seu olhar era uma mensagem estranha, havia calor naquele olhar? Não! Deveria ser medo, claro que era medo. Nicholas o levou para dentro da barraca, e pediu para o segurança aguardar do lado de fora. Ao entrar o jogou no chão e em dialeto bérbere, Nicholas começou a tentar se comunicar. — Espero que esteja me compreendendo - Nicholas falou entre os dentes. — Você pode falar em inglês ou francês? Não estou com muita paciência para conversar no dialeto de vocês. - Concluiu ainda olhando para o jovem tuaregue. O medo estava estampado, o suor escorria por entre a testa empapando o véu sobre a face. —Nada irá te acontecer se me disser onde está à irmã de alShihab. Você sabe onde ela está? Os olhos do jovem tuaregue iluminaram-se. - Nicolas viu que ele estava debochando da pergunta, mais uma vez perguntou, e Leila travou. Pela primeira vez, ela sentiu remorso de suas brincadeiras e agora olhando firmemente para ele, viu que tinha passado dos limites, mas já era tarde, ele perdeu a paciência e lhe deu um belo tabefe na face, derrubando-a ao chão, Leila não acreditou que havia apanhado daquele homem, ele não poderia fazer aquilo, não

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com ela, a sua face estava queimando, o alasho17 não amorteceu o golpe como ela pensou que fosse acontecer. Nicholas pegou o jovem do chão pelo ombro como se fosse palha. E mais irado do que nunca virou o jovem para si. — Acho que não me expressei direito, onde está a jovem Leila, você a levou? Responda ou vou lhe dar outra dose. Dito isso, Leila levou as mãos para o rosto, revelando aos olhos de Nicholas um par de pulseiras feminina conhecida dele; incrédulo Nicholas tirou o véu que cobria a face do jovem; ele emudeceu ao ver na sua frente à própria Leila. Vestida de tuaregue. Aquilo era uma miragem, mas um filete de sangue nos lábios que começavam a inchar lhe mostrou que não era miragem, era Leila em carne e osso. —Por Sara Kali, o que acabei de fazer. O que você me fez fazer. Ele a abraçou tentando minimizar o dano causado na face dela. —Meu Deus! Como pôde? Como pôde me colocar numa situação dessas. Eu jamais bati em uma mulher, você está me ouvindo? Pegou-a nos braços e a levou para um colchão no chão, e terminou de desenrolar o véu que estava envolta do pescoço e da sua cabeça. Constrangido ele olhou as lágrimas quentes que desciam pelas faces de Leila. Ela não estava a fim de falar, mas de chorar de dor e humilhação. E chorou, chorou convulsivamente até não poder parar mais, para desespero de Nicholas. Ele se levantou pegou uma caneca com um pouco de uísque e levou até a boca inchada da moça, ela se esquivou, mas ele a forçou beber. O líquido queimou-lhe a garganta, fazendo-a tossir, e aos poucos parar de chorar. Ainda magoada com a atitude dele, ela virou-se no colchão e em posição fetal fechou os olhos, estava exausta, isso a fez adormecer. Incrédulo, ele 17

Véu usado pelos tuaregues.

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passou as mãos pelos cabelos, pensando no que diria para Adonai, para justificar o erro e a violência que ele cometeu com ela. Ele se levantou do lado dela e saiu da tenda para ir ao encontro de Adonai. — Fique aqui e não deixe que ela saia até que eu volte. Ordenou ao segurança. E seguiu para encontrar-se com o amigo, Adonai estava no interior da tenda sem as vestes típicas, estava com uma camisa branca de algodão e uma calça jeans. Olhou apreensivo para Nicholas. — Alguma pista? —Sim. Respondeu sem olhar diretamente para ele. — E? — Ela está dormindo em minha tenda. — Você está brincando. Estamos aqui todos procurando por ela, e ela dormindo em sua tenda. Mas era só que faltava. Vamos lá quero acordá-la e lhe dizer umas boas. — Calma. Você precisa me ouvir antes. Nicholas falou sem emoção. — O que houve com ela? Adonai sentiu que algo ruim havia acontecido. Então ouviu o relato de Nicholas e ficou em silêncio, depois do que ouvira, era preciso jogar água para acalmar os ânimos. Deu algumas voltas entre si, sentou-se, passou as mãos pelos cabelos e fechou os olhos por um tempo. Não havia como consertar aquela bagunça, a amizade dele com Nicholas estava acima dessa confusão e o amor por Leila também. Ela havia criado a situação, e neste momento percebeu que deveria ter ouvido os conselhos de Moussa. Então, muito aborrecido tomou a decisão: — É melhor trazê-la para cá. Vou buscá-la. Não quero que ninguém a veja em sua tenda, a língua por aqui pode ser pior do que o castigo físico. Adonai falou por fim. Nicholas pediu-lhe

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desculpas, não sabia o que dizer. Era um grande problema aquele. Embora Adonai compreendesse o que havia acontecido, ele não aceitava o sangue quente de Nicholas, ele não poderia ter usado da força física com ninguém, ainda mais sendo um tuaregue, caso não tivesse sido Leila por debaixo daquele manto, ele estaria em uma saia justa com os clãs presentes. Olhou para irmã adormecida na pequena cama e a pegou no colo com uma criança e a levou para seus aposentos, e então pegou uma bacia com um pouco de água e foi limpar-lhe o rosto, a boca já estava ficando bem inchada, ele foi passando o pano úmido para tirar o azul da face, ele pensou que vestida daquele jeito ninguém saberia que era ela, nem mesmo ele. Sorriu pela artimanha que ela usou para passear entre as pessoas. Leila ainda era uma menina mimada. Depois de cuidar dela, ele tirou o manto e em seguida o caftan que ela estava vestida, deixou-a apenas com as roupas debaixo, então a cobriu com um lençol e saiu da tenda. O vento cortava a face, estava muito frio mesmo com as fogueiras acesas do lado norte, era impossível ficar por muito tempo em pé, era preciso se abrigar. Foi à tenda onde funcionavam alguns aparelhos e se comunicou com o ponto de apoio que deixou em Timboktu pedindo-lhes para enviar um helicóptero o quanto antes para o acampamento. Ele iria mandála de volta, a presença de Nicholas a iria perturbar muito, e naquele momento ele precisava ser muito cauteloso, como membro de um clã importante não poderia ser questionado quanto às atitudes dela e nem do amigo, o fato dela ter desfilado em roupas masculinas e depois ter sido agredida por um estrangeiro, seria um prato cheio para os membros do conselho. Sendo Leila uma Iklan, eles iriam massacrá-la e ele a contragosto teria que concordar.

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— Você pediu um helicóptero? Perguntou Nicholas. — Sim. Vou enviar Leila para o Marrocos, de lá ela segue viagem para os Estados Unidos. Será melhor para todos nós. — Sinto muito que as coisas tenham seguido por este caminho. Nicholas tentou se desculpar. Porém Adonai não estava nem um pouco querendo ouvir desculpas. — Não sou muito bom com as palavras, prefiro pensar em atitudes, então lhe pergunto meu amigo você já pensou se caso o Tuaregue não fosse ela, mas o membro qualquer de uma dessas tribos, o que poderia ter nos acontecido? — Eu sei. Nada justifica minha agressão. —Então já basta, acabou. Vou enviá-la antes de nascer o sol. Quero que ela esteja o quanto antes em casa. Eu nunca deveria ter trago ela para cá, mas ela queria ver de perto os tuaregues. Ela é assim, impulsiva, desesperada e sem juízo. Às vezes acho que sou o pai dela e não o irmão. Concluiu aborrecido. —Eu quero me casar com ela. Nicholas falou sem rodeios. —Você terá uma batalha pela frente. Duvido muito que você saia o vencedor; meu pai não a chamava de filha do vento à toa, ela é arredia, difícil de lidar, tempestuosa e fiel aos próprios princípios, como as dunas do deserto ela também se modifica. —Vou correr o risco. Depois de ontem passei a ser responsável por ela, querendo ou não agora ela me pertence, querendo ou não ela já é minha. Nicholas falou e saiu de perto do amigo. Adonai olhou-o afastando e sentiu um peso nos ombros, aquilo daria pano para a manga. Um homem acostumado a mandar e uma mulher que jamais se curva. Mais tarde, bem mais tarde Leila acordou, percebeu que já estava em sua tenda, sentiu também que estava apenas com as roupas debaixo, ficou surpresa, meio desorientada, quando se

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levantou sua cabeça girou, percebeu a contragosto que sua boca estava estranha, colocou a mão sobre ela, e então sentiu inúmeras agulhadas. Deus! Estava ferida, mas como? Então foi se recordando o que havia acontecido Nicholas havia lhe dado um tapa, pela violência ela deveria estar deformada. Começou a chorar, não pela dor, mas pelo fato de ter sido agredida, e ainda teria que se explicar para Adonai, agora ela realmente estava encrencada, ela só queria se divertir um pouco. Não fez nada de grave, nem tão pouco prejudicou alguém. Como ela odiava aquele Nicholas, como ela odiava o homem que ela seduzira. — “Cigano maldito! ” Falou entre os dentes. — Leila? - Uma voz lhe chamou. Ela reconheceu sendo de Adonai. —Você está bem? Aproximou-se da cama. Ela olhou para ele morta de vergonha. Cobriu o rosto com o lençol. E lhe respondeu entre lágrimas: — Não sei lhe dizer. Estou sentindo muita dor. Esse maldito cigano quebrou meu queixo. — Não chegou a tanto, vai ficar feio, mas acho que não chegou a quebrar. Arrume suas coisas você voltará para casa. — Mas... — O helicóptero a levará até ao Marrocos, de lá você pegará um jatinho até o Texas. — Eu não quero ir embora. Respondeu aborrecida. — Devia ter pensado nisso antes de arrumar essa confusão toda. — Esse troglodita chamado Nicholas foi quem arrumou essa confusão. — Que foi começada por você. Retrucou. — Eu não vou para casa. Vou ficar no Marrocos depois vou para França. Ele balançou a cabeça sem paciência, como não acreditando nas vontades dela.

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— Acorda Leila! Você não é mais uma menina cheia de vontades. Você já tem vinte e cinco anos. Quando é que vai crescer? Ele descarregou. — Não precisa gritar. Ela respondeu no mesmo tom. — Eu vou para o Marrocos e depois vou para a França. — O helicóptero já está aguardando, seja rápida. Falou e saiu da tenda. Ela ficou ali sozinha entre as lágrimas de frustração. Precisava se levantar e ir embora. Mas queria ir à forra, ela se vingaria de Nicholas ou não se chamava Leila. Com dificuldades se levantou trocou de roupas e arrumou a bagagem. Já estava quase tudo pronto quando Nicholas entrou e a olhou de frente, seu olhar já não era de zanga, mas de arrependimento, ele estava muito abalado, ela não imaginava encontrá-lo naquele estado. Mas não se dobrou, olhou para ele com desdém e com a voz ríspida perguntou: — Satisfeito! Além de me bater ainda veio aqui tripudiar? — Nada disso. Respondeu com voz amarga. — Você não tem ideia de como estou. Fez-se uma pausa e continuou. — Estou em dívida com você por duas vezes. Estava de cabeça baixa e quase sussurrando desabafou — Desonrei-te e ainda por cima cometi uma sandice como essa. Levantou a cabeça e colocou as mãos na cintura, de modo que ela pudesse realmente ver o quando ele estava decepcionado. — Duas situações da qual não gosto. Isso tudo está muito difícil mim. Este homem que você conheceu não sou eu. Ela o ouviu e pela primeira vez conseguiu ficar calada. O silêncio dela o fez ficar mais seguro para prosseguir: — Me aguarde no Marrocos, em três dias vou encontrar contigo. Falou e olhou para o rosto deformado dela, ele sentiu náuseas, mas se controlou. Ela não disse nada apenas pegou uma das valises e foi saindo da tenda, ele a pegou pelo braço e a puxou para junto dele. Ela o encarou desafiando-o mais uma vez, então mesmo ferida ele a beijou, ela sentiu raiva,

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dor, uma vontade louca de se rebelar, mas não o fez, ela correspondeu ao beijo, inexplicavelmente ela correspondeu ao beijo. —Vai me esperar? Perguntou novamente. —Não. - Então ela saiu deixando para trás um homem taciturno e sem reação.

Três Vinte dias tinham se passado desde que saíra do deserto, deveria estar avaliando tudo que acontecera, mas muito pelo contrário, ela resolveu apagar o assunto enquanto não precisasse prestar contas para Adonai, entre uma vitrine e outra foi caminhando pelas ruas de Paris, quando seu telefone tocou, parou em um café na Boulevard Saint-Germain- depressa, puxou uma cadeira e sentou-se em frente ao rio Sena. Olhou para o visor do aparelho e viu a contragosto que se tratava de Adonai. Suspirou e atendeu a chamada. — Mon cherrie! Que bom ouvir sua voz. Disse em tom casual, displicente como era típico. — Habibah, como você está? Adonai perguntou com voz firme, ela percebeu que ele deveria estar muito irritado. — Estou bem. Estou fazendo algumas compras. Respondeu olhando para si mesmo e vendo a grande mentira que acabara de contar. Enquanto falava olhou para as mãos e viu que precisava ir a um salão, desde que pousara em Paris ela ficou meio

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deprimida. O bofetão que recebeu de Nicholas quebrou alguma coisa dentro dela, mas preferia não pensar nele. — Isso é perfeito sendo assim quero que venha até meu escritório, temos alguns assuntos para tratar. Falou secamente. —Não sei se vou ter tempo, minha agenda anda meio cheia. Para si mesma falou entre seus botões “cheia de pó, cheia de teia, cheia de problemas”. — Você não entendeu Leila, isso não é um convite, estou ordenando que você compareça para tratarmos de sua vida daqui para a frente. Dito isso desligou antes que ela viesse com outras desculpas. Leila ouviu o Tum...Tum....Tum... do outro lado da linha e ficou atordoada, não entendeu o que estava acontecendo, e pelo jeito deveria ser sério, porque nunca Adonai tinha sido duro com ela, mesmo nas piores pirraças, sempre era compreensivo. Alguma coisa havia mudado, e de repente percebeu que o mundinho dela iria virar do avesso. Cruzou as pernas, colocou uma das mãos no queixo e olhou o horizonte além do rio Sena. Uma garçonete aproximou tirando-a do devaneio. —Mademoiselle, qu'allez-vous demander? —Café au lait, s'il vous plaît. Aussi apporter quelques biscuits. No momento precisava de um café ao leite com biscoitos, era como um conforto de mãe. E como deseja que sua mãe ainda estivesse com ela, seria mais fácil enfrentar as consequências de seus atos. Ela sabia que lá no deserto Adonai não a colocaria contra a parede, mas agora que estavam em um terreno neutro, ele iria cobrar as respostas para suas loucuras. A garçonete chegou com o pedido e ela sorriu em agradecimento. Ao pegar na xícara percebeu que tremia, isso era um mau sinal, os biscoitos também não estavam saborosos como gostaria que tivessem. Pela primeira vez em anos viu que o preço a pagar

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pelos seus caprichos seria alto demais e talvez a contragosto tivesse que aceitar o que viesse. Meia hora mais tarde já estava no elevador do apart-hotel na rua esquirol, sempre que ia para Paris se hospedava no “Citadines Austerlitz Paris” era um ambiente simples e acolhedor, se sentia como se estivesse na própria casa. Estava buscando as chaves na bolsa quando um par de sapatos e um sobretudo preto aproximaram-se dela, ela olhou para eles e sentiu o coração disparar, só um homem tinha o dom de provocar essa sensação. Nicholas! Ela levantou o olhar e deparou com o rosto moreno bem a sua frente, seu rosto era uma máscara velada, impossível de prever o que se passava naquela mente. Leila parou por um momento. Ficou sem ar, mas quase que imediatamente se recompôs, pegou as chaves e abriu a porta, entrando em seguida e deixando-a aberta, ele entendeu aquilo como “um entre”. Fechou a porta atrás de si e caminhou pela pequena sala onde havia um sofá uma pequena mesa e uma TV, Leila colocou sua bolsa em cima da mesa e foi até o frigobar, pegou uma garrafa de água e viu que estava tremendo “merda! Por que estou tremendo assim? ” Se perguntou, virou-se para ele aguardando o que ele tinha para dizer. Mas o silêncio era imperativo. Ele por sua vez a estava examinando, viu que o rosto já estava normal. Estava maravilhosa, os lábios macios já não estavam mais inchados, estavam convidativos, aquilo o perturbou, não queria ceder aos apelos de seu corpo, precisava antes conversar com ela, como não dizia nada apenas a olhava, ela começou. —Se você veio aqui com aquela conversa mole que precisa se retratar, pode dar meia-volta e ir embora.

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Ele sorriu, ele adorava aquela mania dela de estar por cima, mesmo quando sabia que poderia perder a batalha. Aquilo a irritou, ele estava rindo dela ou sorrindo para ela? — Do que está rindo. Já me viu agora saia, não temos nada para dizer um para o outro. —Engano seu. Não estou aqui para me retratar. Ela o olhou questionando, inclinou um pouco a cabeça fazendo com que a cabeleira negra caísse pelos ombros e enquanto caminhava pela antessala foi desabotoando o sobretudo, o retirou e o jogou em uma cadeira, ele fez o mesmo, porém não o retirou, ela voltouse para ele e viu que a fisionomia era uma máscara intransponível, afinal o que ele queria dela? —Então desembucha e saia. Disse mantendo o ar de superioridade, porém ele se aproximou e decidiu que com ela deveria agir primeiro, depois conversar; o calor que emanava daquele corpo era algo absolutamente constrangedor, ela sentiu que iria derreter no mais leve toque dele. E foi o que ele fez, levantou o queixo dela com o dedo indicador e olhou para os olhos negros daquela bela mulher, com a outra mão ajeitou uma das mechas atrás da orelha, ela desviou o olhar, mas a respiração estava ficando descompassada, ela sabia que o beijo seria inevitável, então ele a beijou, e apesar da aridez ela se sujeitou aquele beijo que começou morno, suave, porém a intensidade foi elevando como um termômetro se transformando numa promessa de algo mais. Ela tentou resistir, tentou, mas acabou se perdendo momentaneamente nos braços daquele cigano, a truculência dele foi dando lugar a uma maciez que a levou a loucura, ela já não o repelia, mas o prendia em seus abraços, ali mesmo naquela mesa ele a despiu e com um só golpe ele a penetrou, ela se deu conta que dessa vez era ele quem estava o controle, mais uma, mais duas, e os gemidos eram a melodia naquele quarto. Sem sair de dentro dela ele a carregou até o

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quarto, beijos sufocavam seus lábios, mas no pensamento dela estava se perguntando como ele conseguira fazer aquilo com tanta maestria, deitou-a sobre a cama e terminou de despi-la, ela o olhou e viu que ainda estava vestido, então ele também se despiu e deitou-se ao lado dela começando novamente o ciclo de sedução que perdurou por horas a fio. Era inconcebível, mas aquele homem era uma máquina de fazer amor, ela ficou se perguntando se todos os homens seriam assim. Então adormeceu nos braços musculosos daquele cigano. Havia amanhecido e ela ainda se encontrava deitada com Nicholas, ele não havia partido como ela desejava, então delicadamente saiu da cama e viu que ele dormia profundamente, pegou um roupão e foi tomar um banho para se recompor da noite sensual que tivera, a água do chuveiro caia sob sua cabeça e de olhos fechados ela não viu quando ele entrou dentro do box, assustou-se. —Nem no meu banheiro você me deixa em paz? —Também vim tomar meu banho. Respondeu sorrindo. Ela olhou-o zangada e foi saindo, mas ele a deteve. —Não seja infantil. Vamos aproveitar este momento. Não tem coisa mais deliciosa que um banho a dois. Ele a desafiou, e já prevendo a saída dela ele se apossou dos seus lábios, beijando-lhe o pescoço delgado e os seios, a água caia sobre eles dando um toque a mais naquela nova sessão de sedução. Enquanto a saboreava ele acariciava as nádegas dela, fazendo com que ela se inclinasse para trás se deleitando com sua língua, ele viu o quanto ela estava gostando, e então ele disse: — Agora é a sua vez. Ela parou por um momento e olhou estática para ele, balançou a cabeça e como uma menina lhe perguntou: — O que você quer dizer com isso? Agora é a minha vez? Ele gostou, era isso que ele queria, agora seria a vez de começar a domá-la.

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— Quero que faça comigo a mesma coisa que estou fazendo com você. Ela começou a rir de nervoso, e viu que estava diante de um impasse, ele queria que ela também colocasse a boca nele, até então ela só o beijava, o mordia pelo pescoço e ombro, mas chupá-lo como ele estava sugerindo era meio demais, ela olhou para aquele corpo másculo, viu os peitos coberto de pelo, a barriga sarada dele, dava para contar os músculos de tão trabalhado que era, seguiu pelo umbigo e viu uma enorme estaca por entre as pernas dele, ela se perguntou como aquilo estava entrando dentro dela. Diante da indecisão dela, ele pegou a mão dela e levou até seu membro, ela fechou os olhos, e com a mão ele foi demonstrando a ela como cuidar daquela parte do seu corpo em evidência, ela foi experimentando aquela sensação de posse, foi sentindo aos poucos aquele membro tomar vida, sentiu os vasos se enrijecerem, a pele fina sobre aquele corpo que subia e descia, ela percebeu a ponta que mais lembrava a cabeça de um cogumelo, ela percebeu a temperatura subir e então se deu conta que estava ouvindo os gemidos dele. — Isso meu amor, assim... Devagar... não... não tão devagar... isso é muito gostoso... mas quero mais, venha me beije aqui... — Beijar? Perguntou com um bolo se formando na garganta. —Mas isso é nojento. Eu não posso. Ele a olhou convidativo e suavemente disse: — Tente só uma vez... se você não conseguir não tem problema, mas tente. Então ela se ajoelhou diante do inevitável e com os olhos fechados colocou os lábios na ponta daquele falo, aproximou-se devagar e viu que aquilo era mais difícil do que imaginava, ela deu um pequeno beijo e recuou um instante, ele segurou um pouco a cabeça dela afagando os cabelos molhados, ela novamente se aproximou, fechou os olhos e

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deixou que ele a conduzisse. Então ele suavemente foi se introduzindo no interior da boca dela, ela não estava acreditando que estava se propondo aquilo, e o que era pior estava gostando da sensação de provocá-lo. Por um dado momento pensou em lhe morder, mas ele se retesou. — Cuidado com os dentes. Ela olhou para cima para vê-lo e então ela viu a paixão estampada naquele olhar, voltou novamente a brincar com ele, e ele ia se dissolvendo diante dela até que de repente ele a retirou e a virou contra a parede e a penetrou, ele urrava de prazer, enquanto ela tentava entender o que tinha feito a ele. Depois daquele banho erótico ela estava se secando, e ele pedia o café, já vestida foi para a sala, ele estava impecável em seu Armani, ela achou graça por que na noite anterior não havia nem observado a roupa que ele estava. Olhou para ele observou os cabelos negros revoltos, que cabeleira ele tinha, a barba estava por fazer, ele tinha o hábito de deixar um cavanhaque, o que o deixava mais sensual. Sentou-se diante dele e respirou profundamente. — Agora acho que podemos conversar. Disse ele, ela balançou a cabeça concordando. Os olhos dela era só paixão, mas ela não tinha ideia sobre isso. Então ele veio e se sentou diante dela. — Quero lhe fazer um convite. Ele começou. —Quero que conheça minha casa, e veja quem sou realmente. — Por quê? — Aceite isso como meu pedido de desculpas. — Então você está me convidando para ir até sua casa, como forma de pedir desculpas? É isso ou tem mais alguma coisa? — Nada mais que isso. — Nada de casamento surpresa?

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— Não. Nada de casamento. Apenas um passeio. O que você acha? Desconfiada ela olhou-o. — Adonai quer me ver. Preciso voltar para casa. Disse tentando arrumar uma desculpa. — Eu falo com ele, tenho certeza que ele vai concordar. Só falta você concordar. — Sei. Ela olhou para a janela e viu que começava uma pequena nevasca. — Adoro Paris, mas definitivamente o mês de janeiro me deixa deprimida. Ele olhou para janela e voltou para ela aguardando a resposta. — Como você me encontrou aqui? Ela perguntou, tentando desviar do assunto. — Não foi difícil, bastou alguns telefonemas, e seu próprio cartão de crédito, nos revelou onde você estava. Adonai pediu para rastreá-lo. Respondeu. — Ele deve estar muito aborrecido comigo. Falou quase com uma nota de arrependimento na voz. Ele se compadeceu, mas levantou-se, foi até a mesa e pegou o celular. — Vou ligar para ele, e dizer que estamos juntos, e me comprometo levá-la para o Texas até o fim do mês. — Não. Espere. Não posso viajar com você. — Ou é isso ou terá que voltar para o Texas e começar a pegar no batente. Falou zombando dela. Ela se irritou e sem paciência lhe perguntou: — O que você quer dizer com isso. — Nada tão sério. Mas Adonai decidiu que você precisa cuidar de sua vida sozinha, a começar pelo trabalho. — Pelo trabalho? Que trabalho? Até onde sei, ele nunca quis que eu trabalhasse. Respondeu com indiferença. — Depois dos últimos acontecimentos, ele mudou de ideia, acredito que ele corte sua mesada e também seus cartões de crédito, diga-se de passagem, sua estadia aqui estará paga até ao meio-dia.

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— Isso é brincadeira, ele não faria isso sem me avisar, não é do feitio dele. Pelos feiticeiros do deserto, será que eu o aborreci tanto assim. Falou com as mãos no rosto. Depois olhou para o homem a sua frente. —Isso é culpa sua. Se você não tivesse ido atrás de mim, eu nunca iria fazer uma loucura dessas. — Minha culpa? Então você se veste de odalisca, entra numa festa de homens, dança se oferecendo em uma bandeja de prata, e eu que sou culpado? — Sim. Você. Por que foi você quem foi atrás de mim. — Poderia ter sido qualquer um, você estava doida para isso, se não tivesse sido eu, teria sido um daqueles berberes. De repente uma explosão. Leila esbofeteou a face de Nicholas com toda força, ele a olhou e se controlou para não revidar e entre os dentes lhe falou. — Pois bem, má cherrie, estamos quites. — Nunca mais ouse insinuar algo deste tipo para mim, se você não sabe, eu sabia que era você desde o princípio, eu me entreguei para você por que quis, e estou pouco me lixando para sua opinião quanto a minha decisão. Um silêncio preencheu todo o ambiente, causando uma atmosfera tensa e insuportável, ela saiu de perto dele e foi até onde estava sua bolsa e seu sobretudo, pegou-o e saiu porta a fora. Ele não a seguiu, pois sabia que isso seria muito pior. Leila parou o primeiro taxi que viu pela frente e seguiu para o escritório de Adonai na Avenida Champs-Elysées em poucos minutos chegou a Área empresarial La Défense, o maior centro empresarial da Europa, uma das empresas de Adonai estava instalada ali, o taxi parou diante de uma das Torres ao sul, então desanimada pagou a corrida e saltou para o frio descomunal. No interior do edifício pegou um dos inúmeros elevadores que havia no saguão, era sempre assim, ali deveria passar milhares de pessoas por dia, as maiores estatais da Europa tinham sede

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naquele prédio. Chegou ao andar que levava ao escritório de Adonai, caminhou pelo imenso corredor, até uma porta dupla de vidro, onde uma linda placa em ouro estava forjada o nome da empresa The Shihab’s Joias e designer & Cia. Aquela empresa era motivo de orgulho para eles, ela tinha consciência do quanto Adonai lutara para colocá-la entre as dez mais da Europa e uma das primeiras na América, empurrou e entrou no grande escritório, onde tinham várias mesas e alguns funcionários, ao entrar, alguns se dirigiram para suas próprias mesas, ela não estava a fim de ser educada com ninguém, então se limitou a responder os vários “bom dia”. Chegou à mesa principal, e olhando para secretária disse: —Não precisa me anunciar. Ele já está me aguardando. —Senhorita, esper... Leila foi abrindo a porta e deparou com uma sala cheia de pessoas. Ele estava em uma reunião. Sem demonstrar nenhuma emoção, Adonai pediu para os membros saírem da sala por um instante. Após o último membro sair e fechar a porta. Ele se dirigiu a ela com uma voz grave e profundamente áspera. —Mas você não muda. Sempre tem que ser imprevisível. Falou com energia. Ela não se abalou e pisando duro circulou pela sala até a janela, de onde podia se ver a torre e respirando fundo perguntou. —Você não queria falar comigo? —Sim. Mas não agora em meio a uma reunião importante. —Para ser sincera, não me importo muito com sua reunião. —Disso eu já sei. Por isso estou cortando todas as suas regalias. Você terá que lutar para merecê-las novamente. —Você vai ter coragem de fazer isso comigo? —Sim. Você é uma mulher instruída, PhD em economia, vai ser fácil arrumar emprego, até que isso aconteça, não vou

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mais ceder aos seus caprichos, exceto aqueles que eu acreditar ser sua necessidade. Ela olhou para os olhos verdes de seu irmão e viu que ele estava determinado a cumprir com que havia acabado de dizer. Pensou em se desculpar, mas resolveu não abaixar para ele. —Já que você decidiu. O que mais posso dizer? Se você cortou minhas regalias, como vou voltar para casa? Ou vou ter que viajar na classe econômica? Perguntou com desprezo. —Eu deveria fazer isso, mas não ficaria bem com minha consciência, por isso meu avião está pronto para levar-lhe. É só pegar suas coisas e voltar para casa. Ela o olhou contendo as lágrimas que teimavam em rolar pelo rosto moreno, mas não disse uma palavra se quer. Desde menina aprendera com a mãe que em tempos de guerra, era preciso saber o momento de parar. E aquele era o momento. Brigar com ele não seria a solução, e também nem queria isso, já que sabia que aquilo era o mínimo que ele poderia lhe fazer depois da grande mancada que dera se expondo ao ridículo diante de sua equipe e também dos membros de tuaregues. Ele viu a sombra de decepção no semblante dela, mas preferiu não ceder, e cheio de dúvidas ele abaixou a cabeça para os papéis sobre a mesa, ficou também em silêncio. Ela ainda o olhou mais uma vez antes de sair de cabeça erguida daquela sala. Enquanto ela saia, ele respirou fundo e voltou a se preocupar com a reunião que tinha sido interrompida. Ela saiu do prédio e foi para o apart, mas antes se dirigiu a um caixa eletrônico, olhou o seu saldo, e viu que ainda tinha uma boa quantia de dinheiro, resgatou todo o dinheiro que pôde da conta e o colocou na bolsa “Já que meus cartões estão inutilizados, vou precisar de me manter de alguma forma até resolver o que vou fazer”, pensou enquanto subia até seu quarto para arrumar suas malas. Já no quarto ela ligou para a

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recepção e pediu para fecharem a conta, quando foi informada que já haviam feito isso por ela, Leila sentou-se por um instante, abaixou a cabeça e massageou as têmporas, dessa vez Adonai realmente havia falado sério. Precisava organizar o pensamento, mas tudo que estava fazendo naquele momento era pensar naquele cigano, “Estupida! Se eu não tivesse encontrado esse maldito cigano, com certeza não estaria nessa encrenca”. Desiludida, levantou a cabeça e respirou fundo, olhou para o teto branco sob sua cabeça e se dirigiu até ao banheiro, olhando para o sua imagem refletida no espelho, já estava na hora de abandonar suas atitudes impulsivas, Adonai estava coberto de razão, mas naquele momento precisava tirar Nicholas da cabeça e com tristeza percebeu que estava pensando nele o tempo todo, isso não era bom, porque jamais poderia se dar ao luxo de ficar ao lado de um homem como Nicholas, arrogante e exageradamente lindo... Ele seria um grande problema na vida dela. Não. Não poderia se prender a ninguém, mas enquanto escovava os cabelos, seus pensamentos a levou na sensação quente que ele produzia ao beijá-la. Sentiu os bicos dos seios se entumecer ao imaginar o toque das mãos, sentiu os lábios dele no colo, depois mais abaixo, no meio de suas pernas, com horror percebeu que estava molhada, que poder era esse? Ele nem estava ali, e ela já estava se derretendo. Como isso é possível? Perguntou-se. Colocou a escova na pequena valise e saiu do banheiro. Um toc-toc na porta a tirou daquele torpor que se encontrava cada vez que pensava na forma de Nicholas fazer amor. “Será que vai ser sempre assim” ajeitou as roupas, e os cabelos e foi abrir a porta, era o funcionário para pegar as malas, mas também havia outra pessoa com ele. Nicholas! Ela olhou para ele irritada, mas na frente do pequeno rapaz que recolhia suas coisas se conteve, e foi para o elevador. Ele a seguiu sabia

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que não era o momento de falar, e pela expressão carrancuda dela, era melhor esperar. Pois poderia passar o dissabor de mais uma discussão pública. Enquanto era realizado o chek-out, ela aguardou no saguão suas malas serem colocadas na limusine que estava estacionada em frente à porta do hotel. Nicholas veio até onde ela estava sentada, muda e bastante irritada. Trazia um lenço na cabeça, como as mulheres árabes, ele ficou pensando se aquilo era mais um ato de rebeldia ou era uma rendição. Balançou a cabeça em sinal de reprovação, “essa mulher é pior do que uma potranca quando está sendo domada, a gente nunca sabe quando vem o próximo coice. Mas não vou me dobrar a ela, vou domá-la como todo bom cigano sabe fazer”. — Podemos ir? Perguntou. Ela levantou os olhos e se levantou da pequena poltrona, respirou fundo e saiu atrás dele, ao chegar próximo ao veículo, ele gentilmente a ajudou entrar no carro, em seguida fechou a porta e entrou pela outra. Já no interior do veículo aquecido, ele deu ordens ao motorista para seguir. Então sentado de frente para a moça ele começou a falar em tom mais baixo, para somente ela ouvir. — Leila. Se te serve de consolo, sei que você está muito aborrecida, gostaria muito que você não estivesse passando por isso, mas você há de convir que provocou toda essa tempestade. — Eu sei. E sem dar o braço a torcer terminou de falar. — Não estou aborrecida. Só preciso ir para casa. — O convite ainda está de pé, venha conhecer minha casa, acho que será bom para você mudar de ares antes de voltar para o Texas. —E onde é sua casa? Perguntou sem-muito interesse. —Tenho uma pequena propriedade ao sul de Marseille. — É bem a sua cara, justo Marseille, a capital do contrabando e dos prazeres carnais. Ele não se intimidou com a alfinetada dela, deu uma sonora gargalhada.

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—Ma chérie! Há mais de 60 anos que Marseille deixou de ser a prostituta do cais, ela se tornou um grande referencial para a França. É um dos mais importantes portos do Mediterrâneo. Ela o olhou o divertimento nos olhos dele e novamente virou-se para olhar à tarde fria através da janela do carro, viu que já aproximavam do aeroporto. — Você precisa avisar Adonai sobre isso, as ordens dele foi que eu deveria ir para casa. — Eu sei, ligarei para ele, agora você precisa descansar e deixar todas essas confusões para trás.

Quatro Duas semanas se passou, desde que haviam chegado a “pequena propriedade” de Nicholas, Leila estava embrulhada em uma manta olhando para o fogo crepitante da lareira, na primeira semana ela quase não viu Nicholas, ela havia lhe dito que precisava de um tempo só, e por incrível que pareça, ele respeitou-lhe o desejo. Embora realmente desejasse ficar só, não imaginava que ele fosse levar ao pé da letra. Agora ali aquecida e segura, já não pensava mais nos problemas que causara tanto a Nicholas quanto ao seu irmão, ficou curiosa, em saber se Adonai já estava mais calmo com ela, teve vontade de ligar para ele, mas depois ao pegar no telefone desistiu. Já estava pensando em que lugar Nicholas poderia ter se escondido, já que a “pequena propriedade” nada mais era que um castelo no alto

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de uma colina, da janela de seu quarto dava para ver o Golfo de Marselha, o silêncio e o frio imperavam no interior daquela propriedade, ela não teve nem coragem de passear pelos cômodos, a nevasca havia fechado tudo. Estava ficando entediada com a monotonia, quando Nicholas rompeu porta fora lhe causando um sobressalto. —Perdão ma chérie! Não era minha intensão lhe assustar. —Não me assustei. - Falou olhando-o vestido com aquela lã vermelha, sua pele morena se destacava dentro daquele suéter, novamente foi invadida pela sensação de calor em sua pele. Estava ficando viciada nele, seu corpo já não lhe obedecia mais. Calmamente ele se aproximou do pequeno sofá de couro onde ela estava deitada e lhe beijou a face, ela gostou daquele carinho. Então ele foi até o bar e enquanto arrumava uma bebida para ele, disse casualmente: —Aceita uma bebida, neste frio é preciso aquecer o sangue. —Aceito sim, estou congelando, mesmo com o aquecedor ligado, ainda continuou a sentir frio. Falou arrumando a manta. —Já pedi para verificarem o aquecedor, mas com essa nevasca, teremos que nos acomodar da melhor forma possível. Entregou-lhe o copo e sentou-se ao lado dela, ela percebeu o calor que emanava daquele homem, em silêncio pegou o copo das mãos dele e voltou a olhar para o fogo. — Daqui a pouco nossa refeição será servida, você deve estar entediada, lhe deixei descansando por quase uma semana, agora te quero inteirinha para mim. Falou sem rodeios. Ela também o queria, então lhe levantou o queixo sugerido o desejo de ser beijada, e ele correspondeu aos apelos daqueles lábios molhados. Foi intenso e breve. Ela gostava disso, era uma das coisas que apreciava nele.

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—Como sabia que eu estava entediada? Perguntou enquanto acomodava o corpo junto ao dele, ele também foi se ajeitando ao corpo de sua amada, sentiu que estava mais excitado do que nunca, um fogo começava a se formar junto de peito, ela o provocava com pequenas mordidas no lóbulo da orelha, ele se arrepiou. —Não lhe disseram que não se deve mexer com quem está quieto, “mademoiselle”- falou quase sussurrando. Ela sorria, enquanto isso, suas mãos já estavam embaixo do suéter, alisando o peito largo daquele homem. Como podia ficar tanto tempo longe daquele corpo, ele parecia uma rocha de granito, seus músculos eram firmes e trabalhados, ele deveria praticar exercícios para possuir tamanha anatomia. Ela decidiu ser mais ousada, foi se deliciando e escorregando manta adentro, abriulhe o zíper e então o ouviu gemer, ele estava gostando do que ela estava fazendo, e ela prosseguiu nas carícias, suas mãos agarraram seu falo entumecido e rijo como uma espada, ela o cobriu, ele não acreditou no que estava acontecendo, aquela mulher era um furacão, jamais em toda sua vida de amante sedutor conhecera alguém tão ousada e deliciosa, ela se entregava toda, não existia meio-termo, nem tabus. Era tudo que ele havia pedido aos seus ancestrais. Ele se deixou levar naquelas carícias até que não dava mais para segurar, em apenas uma única investida ele a penetrou e então o êxtase chegou. A respiração era ofegante, ela estava ali abraçada junto dele quieta tranquila e em silêncio. Ele amou aquele momento como se fosse o último de sua vida, aquele breve momento de suavidade precisava ficar registrado em sua mente e em seu coração. — Ma chérie, você às vezes me confunde. Ela virou-se para ele e perguntou: — Por quê?

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— Estou acostumado a levar as mulheres ao prazer, e não ao contrário. Você desde o inicio sempre se mostrou tão dona de si, é impossível não a desejar. Ela viu aquilo como elogio. — Nunca houve nenhuma mulher que lhe desse prazer? — Honestamente. Não da maneira como você faz. Sempre tive prazer com as mulheres, mas era algo construído ao longo de uma relação, mas com você isso é diferente, você conhece os caminhos do prazer sem ao menos perguntar, vai invadindo, se entrega com tanta volúpia, jamais imaginei encontrar alguém assim. — Pode parar daqui a pouco você vai falar em casamento, casa e filhos. Ela o cortou de repente. — Mas você não pensa nisso? Ele a olhou incrédulo e surpreso ao mesmo tempo. — Talvez daqui um milhão de anos. Não me vejo nem casada e nem com filhos. Ele se afastou dela por um instante, olhou-a de soslaio. Sentou-se ao seu lado e pegando o copo de uísque sobre a pequena mesa sorveu um trago. — Mas tenho uma notícia para você mocinha, nós iremos nos casar sim, se não for agora será em um futuro próximo. Você selou seu destino no momento em que me sua virgindade, eu sou seu homem, e nenhum outro a tocara. Ela balançou a cabeça e sorriu: — Pois fique o senhor sabendo, as mulheres de minha raça não se curvam tão facilmente a um homem, ainda mais aos machões. Ela sorria e ele não gostou do que ouviu. Ele não era nenhum machão. — Vamos deixar isso para discutir mais tarde, é melhor nos vestirmos, daqui a pouco meu mordomo entra e eu não quero que ele a veja em trajes menores.

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— Você quer dizer sem roupas. Riu da observação, enquanto se vestia. Jantaram em silêncio, mais tarde enquanto saboreava um café ele voltou a puxar conversa. — Estou pensando em levá-la para conhecer minha família. O que você acha? — Por mim tudo bem, desde que essa história de casamento não seja abordada. Depois de alguns instantes ela prosseguiu: — Você ainda tem pai e mãe? Ela estava curiosa. — Não. Meus pais faleceram já algum tempo, mas tenho uma avó e alguns irmãos. — Alguns irmãos? Quantos são? Ele achou graça da pergunta. — Tenho sete irmãos. — Sete? Surpreendeu-se com o número; — Sim. E estes já são casados, e tem um punhado de filhos, sendo assim tenho uma família numerosa. — Me diga quanto sobrinhos você tem? — Você realmente deseja saber? — Sim, porque não deveria. — Não quero lhe assustar, você já está com ojeriza do casamento, se souber quantos sobrinhos tenho, vai pegar o primeiro avião para o Texas. Ela ficou aparvalhada e olhando para ele perguntou: — São tantos assim? — Digamos que meu povo adora uma casa cheia. —Deixa de brincadeira. E me diga —Está bom, Argus é meu irmão abaixo de mim, possui uns oito filhos, em seguida vem Klaus ele tem cinco, Jaelle e Drina possuem quatro filhas cada uma. Richenda e Ephraim não são meus irmãos, mas como fomos todos criados juntos, os considero como se fossem, Richenda tem doze filhos e Ephraim

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apenas dois. Nájma minha irmã caçula está esperando o quinto. A essa altura Leila estava de boca aberta ouvindo-o contar, ela se imaginou cercada de meninos e meninas, todos gritando ao mesmo tempo a palavra mãe. Aquilo lhe deu arrepios. —Você é o único solteiro? —Sim, por enquanto. —Porque vocês ciganos tem tantos filhos? —Minha família mora em Saintes-Maries-de-la-Mer. São todos descendentes de ciganos, comerciantes e artesões; alguns empresários, assim como eu, embora estejam todos ligados ao novo e as transformações constantes do tempo, eles ainda mantêm ligados às tradições. —Jesus! Você está me dizendo que ainda vivem de acordo com as tradições, isso quer dizer em bando e alojados em carroças? Ela exasperou e ele se surpreendeu com o comentário. —Não exagera, é claro que de vez em quando eles acampam para matar a saudade da vida que nossos antepassados levavam, mas isso não é sempre. Ela o olhou desacreditando no que ouvia, então começou a observá-lo, seu estereótipo era de um cigano, mas alguma coisa nele não encaixava com os ciganos, ali estava sentado um homem de pele dourada com uma barba por fazer, os cabelos em desalinho, amarrados em forma de rabo de cavalo, o nariz era clássico, reto e fino, era um conjunto com as maçãs do rosto, seu queixo era quadrado, observou que ele havia emagrecido um pouco, os olhos eram castanhos, mas quando estava tranquilo se tornavam cor de canela, as sobrancelhas eram bem definidas, ao contrário de outros homens elas não eram grossas e tão pouco se encontravam no meio do rosto, tudo nele era delineado, olhou as mãos que segurava o copo, eram mãos firmes, grandes, porém delicadas, suaves e pesadas, ainda sentia a dor daquele tabefe que tomou no deserto. Seu cheiro era inconfundível,

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almiscarado, onde quer que ele esteja reconheceria aquele perfume, incomum e particular. Voltou a olhar para o rosto moreno e belo. Era um homem forte por inteiro, mas ela ainda não o conhecia, e por um momento quis saber quem era ele interiormente, quem era Nicholas Shandar, o que ele pensava, o que o fazia feliz, como seria estar casada com ele? Qual seria a opinião dele sobre ela, por um momento ficou insegura, de repente a opinião dele incomodou-a. Aquele silêncio momentâneo o incomodou também, ele se aproximou dela e com as pontas dos dedos levantou-lhe o queixo e roubou-lhe um beijo, ela se entregou aquela carícia e se viu perdida nos braços daquele homem fascinante. As dúvidas e a insegurança deram lugar a uma entrega total ao suplicio ardente daquelas carícias.

Cinco Um barulho ensurdecedor acordou Nicholas, ele estava com Leila entre os braços, ficou meio confuso, mas depois se lembrou de como havia trago sua gata selvagem para o quarto. O barulho estava aumentando, então deu um sobressalto da cama, aquele barulho só podia ser o que ele menos desejava: sua família estava ali em sua propriedade, e sua avó estava vindo em direção ao quarto, ele correu para trancar a porta, mas era tarde demais a velha senhora embrenhou quarto adentro e rompeu em um sonoro grito e braços: — Mas o que temos aqui? Quem é essa mulher filho amado?

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— Querida mama, que surpresa! Eu posso lhe responder, desde que me deixe vestir, afinal não esperava por essa visita tão cedo em minha humilde morada. Leila estava confusa, havia pessoas no quarto, falavam em um dialeto que não conhecia. Abriu os olhos, confusa e deparou com uma senhora vestida ricamente com sedas e ouro, ela dava de braços em direção a Nicholas, ele constrangido falava em voz baixa com a velha senhora. —Nicholas o que significa isso, quem é essa senhora, e que bagunça é essa? Leila falou enquanto sentava, tomando cuidado em segurar o lençol sob seus seios. A velha senhora falou em um francês alto e claro para Leila: —Eu sou a matrona18 desta casa, e você pode ir pegando suas tralhas e saindo desta casa. Nicholas essa ainda é uma casa de respeito, e você é um homem prometido e comprometido com seu povo. As palavras “comprometido e prometido” entraram nos ouvidos de Leila como uma lança em seu coração. Ela compreendeu perfeitamente as duas palavras por um momento gelou, aquela mulher deveria ser a sogra dele, ou quem sabe a cunhada dele. Agora olhando melhor viu que a mulher era uma cigana. Ficou tensa, e foi se enrolando no lençol e saindo da cama em direção ao banheiro. No instante que mais meia dúzia de gente estava entrando no quarto. Pronto! Era só o que faltava, o bando todo de ciganos estavam sendo espectadores do escândalo da velha senhora, pensou Leila, que saiu da cama e foi para o closet, e em seguida ao banheiro. Nicholas em parte ficou aliviado, que o sangue quente de Leila não começasse a cobrar explicações como sua avó. 18

Matrona é a mulher mais velha dentro de um clã cigano. A mãe de todos.

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— Mama, preciso de sua licença, irei me vestir para conversarmos. Ele olhou para a Richenda pedindo socorro, ela segurou para não rir, e concordando com os olhos foi puxando a velha senhora. — Venha Mama, Nickos irá nos contar o que está acontecendo, tenha calma, não precisa se exaltar. Venha com Richenda, vamos para cozinha preparar um café, todos estamos precisando. — Leve-a Richenda, já irei me encontrar com vocês. Agora por favor, todos vocês saiam do meu quarto, preciso de me arrumar. Ele virou para pegar sua roupa em cima de uma cadeira ao lado da porta, então deu por conta que estava seminu. Que situação constrangedora. Mas o pior estava por vir, antes de enfrentar sua avó teria que falar com Leila. Foi em direção ao closet, onde ela estava arrumando as malas. Ainda vestida de roupão, ele olhou para ela preocupado. — Porque você está arrumando suas malas? — Você ainda pergunta? Não vou ficar aqui ouvindo sua sogra dar chilique porque o prometido está dormindo com outra, sinto muito, mas ouvi muito bem o que a dona bruxa falou. Ele passou as mãos pelos cabelos em sinal de irritação e depois coçou a barba e falou quase com rispidez: — A velha bruxa em questão é a minha avó e não minha sogra, e não sou prometido e nem comprometido com ninguém, você compreendeu tudo errado. — Não precisa se justificar; sua vida não me diz respeito, agora preciso que você diga ao seu motorista para me levar até ao aeroporto, não quero mais ficar aqui, preciso ir para casa. — Não. Você ainda não vai embora, disse ao seu irmão que vou cuidar de você e te levar para casa, assim o será, conforme disse a ele.

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— Sinto muito em decepcioná-lo, mas não vou acatar suas ordens, já lhe falei sobre isso, não aceito ordens de ninguém. — Vou reformular o que lhe disse, por favor, fique. Minha família não ficará aqui por mais de um dia. — Um dia! Sinto muito, mas vou para casa. Saiu de perto dele e foi se vestir, sentou-se diante do espelho e focalizou o rosto destorcido de Nicholas perto da porta do enorme armário que ornamentava um dos lados do closet. Ele estava bem irritado, mas estava tentando se controlar. — Não íamos vê-los? Sua voz parecia mais controlada. — Uma coisa é irmos visitar seus parentes outra é ver o quarto cheio de ciganos todos exaltados, porque o filhinho do coração estava com uma gadjí19 . Respondeu ironicamente e voltou a se arrumar novamente. — Sinto muito pela pequena invasão, mas minha avó é uma mulher bastante tempestuosa, não é muito diferente de alguém que conheço. Olhando para ele parado naquela porta, ela percebeu que ele aguardava sua resposta, sem saber o que dizer, e ao mesmo tempo fraca para brigar. Ela deu de braços e sentou-se diante do enorme espelho do closet. Olhando para o reflexo dele e chegou a um acordo. — Então vamos combinar assim, se ninguém me aborrecer, faço um esforço, mas se eu não aguentar pego o primeiro avião para os Estados Unidos. Aquilo não ia funcionar, ele pressentiu que precisava tomar algumas providências. 19

Termo usado pelos ciganos referindo a quem não é cigano.

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— Mais tarde falaremos sobre isso. Agora vou falar com minha avó, se arrume, provavelmente terei que apresentá-la a todos. — Espere, não diga nada que possa lhe colocar como um mentiroso, não me coloque em nenhuma saia justa, pois não decidimos nada. — Mas quem está falando em saias justas? Depois do que você aprontou! Eu poderia muito benquerer me vingar, mas fique tranquila, não tenho nenhuma intensão em ser presunçoso, ainda mais quando se trata de uma pessoa como você. Ela o olhou em silêncio, pesando bem as últimas palavras. Nicholas entrou porta adentro, todos estavam em torno da mesa farta de comida, “como em tão pouco tempo conseguem fazer tanta comida? ” Se perguntou em pensamento. Ele vestia uma camisa preta e as calças também era de tom escuro, seu semblante estava sério, preferiu manter-se austero para minimizar os efeitos das palavras da velha senhora que se sentava no topo da mesa. Todos se viraram e olharam para o cavalheiro negro de tez fechada que acabara de entrar. A primeira a se levantar foi Asla, Nicholas parou ao ver a filha de seu tio ali, mas não demonstrou surpresa, puxou uma cadeira e se sentou. — Ora, mas por que todos estão por aqui? A neve foi tanta assim? — Não seja um păcăli (bobo). Viemos aqui lhe trazer boas novas, seu velho tio quer uma aliança, e então decidimos fazer seu casamento com Asla. A velha senhora falou sem rodeios. — O que?! Asla? Mas ela é uma criança. Eu me recuso a aceitar uma coisa dessas. Ele respondeu quase que descontrolando.

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— Não senhor, ela não é mais uma criança, já está com 13 anos, já está com o corpo formado, está pronta para casar. A velha senhora continuou. — Nickos, nós entendemos que deveríamos ter lhe consultado antes, começou a explicar Ephraim o irmão mais velho, mas como você não retornou as ligações e o nosso tio estava pressionando, achamos por bem deixar nossa matrona tomar a decisão. Nicholas fechou os olhos diante da explicação do irmão. — Eu não posso me casar com ela, não agora. Preciso resolver algumas coisas e... — Nickos, não me faça ficar como uma mentirosa diante de meu irmão. A avó interrompeu. — Aqui está Asla veja-a, ela já sente amor por você. Ele a olhou e viu o medo e a recusa naquele olhar infantil. — Ela é apenas uma menina, não posso me sujeitar a isso. Falou e olhou para a avó. A pequena criança saiu da sala chorando por ter sido rejeitada por ele. — Olha o que você está fazendo com sua futura noiva, não maltrate a futura mãe de seus filhos. Richenda falou e foi em direção da menina na outra sala. — Iubi o altă femeie... (amo outra mulher) — Uma gadjí? Aquela desavergonhada que estava em sua cama? Não o abençoarei se me desobedecer. — Eu preciso que a senhora me compreenda, aquela mulher é minha responsabilidade, ela não é qualquer. — Sim ela é. Ela não é uma cigana, então ela não é nada. Não poderá continuar nossa linhagem. Ephraim completou a fala da avó. — O que é isso Ephraim? Eu também não sou um cigano verdadeiro...

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— Chega dessa conversa, o que está decidido, está decidido, nada do que você diga, irá mudar minha decisão Nickos. Nicholas se levantou e foi em direção à janela, a neve ainda caia mansa e serena nos campos, era preciso se acalmar. Também era preciso tirar Leila dali, antes que as mulheres de seu clã a envenenasse com essa história de casamento com uma criança. O silêncio estava imperando naquela sala, como o senhor absoluto. Com as mãos no bolso da calça, Nicholas estava estático olhando o vazio e pensando em uma solução. — Ephraim. Venha ao meu escritório para conversarmos. E vocês mulheres permaneçam longe do meu quarto até eu voltar. Ephraim seguiu Nicholas e ambos se trancaram no escritório. O ambiente estava aquecido, e enquanto Ephraim acendia um cigarro, Nicholas enchia dois copos com bebida destilada. Trouxe os copos e indicou uma das poltronas para o irmão. — Não vou me casar com essa criança. — A gadjí vale tanto assim? — Não é só por causa de Leila, quero dizer.... Não totalmente... — Meu irmão. Vejo que está confuso, se explique melhor. — Leila passou ser minha responsabilidade. — Você já disse isso, ela é sua responsabilidade por quê? Vi que ela não é nenhuma criança desamparada, diga-se de passagem, é uma mulher lindíssima, bem exótica por sinal e dona de si. — Eu sei disso, ela é tudo isso sim, mas eu a tornei mulher, eu a tornei minha. — Você está querendo me dizer que a deflorou? É isso? Isso não tem importância na cultura dos gadjis. Fala sério

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Nicholas.... Você a quer por que ela é extremamente linda e muito sensual. — Não. Eu a quero porque ela se tornou minha. Findou Nicholas sem-meias palavras. Ephraim levou o cigarro até a boca e deu uma longa tragada, em seguida soltou a fumaça que exalou um cheiro característico de canela no ar. — Nonô nanê gaji, Barô lajau kan keresa (não queremos uma mulher não cigana, isso é uma vergonha para nosso povo) resmungou Ephraim. — Eu não quero pensar sobre isso, eu não vou abrir mão de Leila. Enquanto os irmãos discutiam no escritório, as irmãs de Nicholas desobedecendo à ordem dada por ele foram ver de perto quem era a mulher que estava dormindo com seu irmão. Bateram suavemente na porta, Leila estava lendo, e ouviu o bater, levantou uma das sobrancelhas curiosa, e deu a ordem para entrar. Em seguida surgem em seu quarto, três lindas moças das quais uma era mais uma criança do que uma moça em si. Virou a cabeça surpresa e esperou que elas se manifestassem primeiro. — Então você é a gadjí que o Nickos quer desposar? Perguntou a mais velha. — Não sou uma gadjí. — Eu sou Jaelle, ela é a Drina e a outra é Asla, a prometida de Nickos. Leila olhou para as três, depois olhou para a pequena menina a sua frente, com a aparência de uma boneca de cera, olhos grandes e bem negros, os cabelos longos estavam em tranças, apesar do inverno todas estavam vestidas com longas saias e blusas de seda.

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— Já mataram a curiosidade? Ou querem mais alguma coisa? — Não precisa ficar na defensiva, não estamos aqui para lhe ofender, queremos apenas conversar com você. Leila sorriu e viu que as moças realmente estavam curiosas, relaxou um pouco e então as convidou para sentarem e conversarem sobre qualquer coisa que ela não sabia o que era. Olhavam-na com curiosidade então Drina começou: — De onde você é? — Sou americana. — Americana! Mas que interessante. Drina respondeu. — Mas como você e Nickos se conheceram? Foi aqui mesmo na França? — Nicholas é sócio de meu irmão. — Seu irmão? Adonai? Você é irmã de Adonai? Jaelle aproximou-se sorrindo. — Você deve ser a Leila. — Sim. Sou Leila. Leila olhou diretamente nos olhos negros de Jaelle, agora quem estava curiosa era ela. — Você conhece Adonai? Perguntou. — Sim, ele esteve em meu casamento, ele é um ótimo gadjó. Ele contribuiu também para o sucesso de meu Dimitri com o negócio dos metais. Somos muito gratos a ele, por nossa vida feliz. Concluiu Drina sorrindo. Jaelle por sua vez estava indiferente com aquele início de amizade e tratou de jogar água fria naquela conversa. — Mas não vamos esquecer que nosso irmão tem um compromisso para ser feito antes da lua nova. Olharam para ela. E Drina sem graça tentou amenizar a situação que Jaelle estava querendo criar. Mas Drina não podia prever que Leila era tão quente quanto às ciganas de seu clã.

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— Mas afinal que compromisso importante é esse? Perguntou Leila para Jaelle, sorrindo Jaelle olhou para a pequena Asla e depois para Leila. — Estamos aqui para o ritual da virgindade. Jaelle respondeu triunfante, com as mãos sobre o livro, Leila ficou muda ao olhar para a adolescente que estava sentada na sua frente. — Ritual da virgindade? Como é isso, não conheço a cultura de vocês, gostaria de ouvir sobre isso. Leila desafiou Jaelle a falar, mas Drina interveio. — Leila, esse assunto é meio constrangedor, vamos conversar sobre outras coisas... — Nada disso Drina, é necessário que a senhorita Leila fique a par de nossos costumes... — Não é preciso que seja assim Jaelle. Além do mais Nicholas não vai gostar que tratemos deste assunto tão particular com uma de suas amigas. Dina estava realmente preocupada com o rumo daquela conversa, mas Jaelle estava adorando, ela gostava de ver sangue. Sorrindo se levantou e foi até onde a pequena Asla estava e abraçando-a olhou para Leila e continuou a falar com sua voz sensual e melodramática: — A prova da mancha, é necessário para perpetuar nossas tradições, em nosso meio existem duas formas de se confirmar a virgindade de uma noiva, a primeira é que a nossa Matrona mesmo verifique, introduzindo o dedo nas partes intimas da noiva, ela pega um lenço para secar o sangue e depois o dá para o noivo a segunda o noivo diante de um conselho se deita com a noiva e verifica ele próprio a virgindade. Mas não será o caso de Nicholas, já que ele não é nenhum menino, já é um homem maduro, então no caso de Asla, nossa matrona é quem irá testar sua virgindade para o noivo Nicholas.

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— Jaelle deixa de ser cruel. Drina gritou estupefata com a irmã, mas Leila não se intimidou, olhou para ela com o mesmo veneno e respondeu a altura. — Que interessante, enquanto vocês se casam na adolescência e tem que passar pelo ritual constrangedor do teste de virgindade, as mulheres tuaregues só se casa quando estão prontas e entre nós não existe este conceito de virgindade e tão pouco, somos servas de nossos maridos. — Vejo que você não tem nenhuma intenção de ser esposa de Nicholas? Perguntou à pequena Asla quase num sussurro. Leila a olhou depois olhou para Jaelle e respondeu. — Não. — Mas você estava dormindo com ele. Continuou a menina receosa. Leila sentiu-se constrangida conversar aquele assunto perto de uma criança, mas continuou. — Estávamos dormindo juntos, mas não temos nenhum compromisso. — Que vida triste Leila. Drina falou. — Você não tem vontade de ser cuidada, adulada e amada por um homem? — Não. Sou muito independente para isso. Jaelle sentiu uma ponta de inveja ao ver a segurança de Leila dizer aquelas palavras, independente era tudo que ela deseja ser. Por outro lado Leila queria sumir dali, queria esquecer de vez aquele povo. Mas ela não podia imaginar que o pior ainda estava por vir naquele dia. Richenda surgiu na porta e entrou encontrou com todas sentadas em volta de uma pequena mesa, percebeu pelos olhares que a conversa devia estar acirrada. Percebeu também que Leila apesar de se mostrar dona de si estava se controlando. Richenda era expert nisso, desde pequena aprendeu analisar as pessoas, era assim quando ia ler a sorte, antes mesmo de olhar na palma da mão ou deitar as cartas, ela analisava quem estava na sua frente, e aquela moça era um poço profundo, sua alma revelava uma tristeza muito grande,

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também viu a marca de uma solidão profunda; apesar de ser desconfiada; era honesta em suas atitudes. Seu olhar revelava uma força e um dinamismo muito peculiar, se não fosse uma gadjí seria uma grande esposa para seu irmão. Aproximou-se e suave como uma pluma se apresentou. — Leila é um prazer te conhecer. Sou Richenda a irmã de criação de Nicholas. Leila foi cordial com Richenda, então ela prosseguiu. —Vejo que vocês vieram perturbar a amiga de Nicholas, bando de curiosas, não podiam esperar nosso irmão nos apresentar? — Richenda você não vai acreditar, mas ela não quer se casar com Nicholas, isso não é formidável? Jaelle maldosamente falava enquanto circulava em volta da mesa, Richenda colocou as mãos na cintura e sorriu olhando diretamente nos olhos de Leila. — Talvez não queira se casar agora, mas tenho certeza que sol e lua ainda se encontrarão em outro eclipse. Você acredita em destino Leila? — Acredito que somos responsáveis pelo nosso traçar, se isso for destino, então acredito. Respondeu Leila sem pestanejar. — Posso ver sua mão? Leila a olhou desafiadoramente e estendeu a mão para Richenda. Richenda olhou e viu que a moça seria uma forte oponente para sua futura cunhada, mas viu também um rompimento do qual ela modificaria toda sua vida e uma amizade leal a traria novamente para os eixos. — Vejo que você é uma mulher livre e independente, porém terá que mudar suas atitudes ou ficará sozinha no meio do caminho. Vejo também que perderá um grande amor e só voltará a reencontrá-lo quando uma criança trouxer uma grande separação. Quando pai e mãe se perdoarem você encontrará a felicidade novamente e então o destino se confirmará, duas tribos se unirão pelos laços do

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matrimônio, embora você não acredite, a solidão será sua companheira por muito tempo porque só quem se entregou por amor poderá tocá-la novamente. Leila se arrepiou com aquela previsão, puxou sua mão e esfregou-a uma na outra. —Não precisa temer, o que está escrito se confirmará, é só uma questão de tempo. Richenda balançou os braços cheios de pulseiras, os dedos estavam cheios de anéis, aquilo demonstravam o quanto era rica e poderosa, ela sorriu e disse para as outras — Vamos todas almoçar, a comida está servida. Venha Leila, venha conhecer o resto da família. — Eu já vou descer. Podem ir à minha frente. Leila falou rapidamente. — Tudo bem querida, iremos descer, mas não demore a Matrona não gosta de esperar. Richenda respondeu já empurrando as outras pela porta. Leila se viu sozinha, respirou profundamente estava massageando as têmporas quando a porta se abriu novamente, era Nicholas. — O que é que você quer aqui? Ela falou ríspida com ele. Nicholas viu que ela estava bastante chateada. — Vi que minhas irmãs estiveram aqui. — Sim, suas irmãs e sua noivinha prometida. Como você pôde me trazer para cá? Agora essa situação ridícula. — Eu sinto muito, mas nem eu esperava por essa situação inusitada. — Eu imagino. Então qual será sua opção para o ritual do desvirginamento? Será nessa noite ou vocês farão uma grande fogueira onde todos os homens se reúnem para o grande espetáculo. Ela foi irônica e totalmente cruel ao dizer aquelas palavras. — Não haverá nenhum ritual, pois não me casarei com essa menina. Quer por favor, me ouvir.

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— Ah! Você vai se casar, pois não faltará com sua família deste jeito. Eu sei o que é um trato de família meu caro, não tem como fugir dele. Nosso relacionamento estava fadado ao desencontro desde o começo, você é teimoso demais. Ela falou quase em lágrimas, então pela primeira vez ele viu a decepção nos olhos dela, se aproximou dela para confortá-la de alguma maneira e seus lábios se tocaram, foi breve, foi intenso, foi dolorido. O coração de ambos amantes estava realmente prevendo o fim. — Eu te prometo que vou encontrar uma solução para este impasse, não vou desistir de você. Anote minhas palavras minha flor do deserto, você é minha e isso ninguém poderá mudar. — Não vou anotar, porque assim que eu sair daqui não quero te ver nunca mais. Para desespero de Leila se viu arrastando com uma imensa dor no coração, ela o amava, mas jamais se entregaria aquele amor, jamais... Seis meses haviam se passado desde que saíra da França, noites tenebrosas assombraram a vida de Leila, mas enfim parecia que havia recuperado novamente sua segurança. Havia arrumado um emprego no escritório de um banco em San Antonio, Adonai havia lhe procurado algumas vezes desde então, mas não tocaram mais no nome de Nicholas, às vezes a curiosidade vinha sorrateira perturbar seu coração, mas desde que voltara da França criara o hábito de se afogar suas frustrações na vodca. Então saia do trabalho e ia afogar sua fossa em um bar juntos com os amigos, não tinha preocupação, se deliciava nas noitadas de San Antonio sem pensar no outro dia, apesar de estar sempre acompanhada, não ficava com ninguém, nenhum homem se igualava a Nicholas, a noite acabava e ela sempre estava sozinha.

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Amanhecia com fortes dores de cabeça e cheia de ressaca, era melhor assim do que pensar na solidão que ocupava seu coração. A água do chuveiro escorria pelos cabelos enquanto ela pensava em Nicholas, sempre ele, ela não conseguia esquecê-lo. Ele estava presente em quase tudo que ela fazia. Muitas vezes se pegava escolhendo roupas para agradá-lo, como se ele estivesse ali com ela. Quanta ilusão. Ele já deveria estar casado com aquela menina, e com algum ciganinho a caminho. Precisava apagá-lo de vez, ia arranjar um namorado, isso mesmo um namorado seria a solução para melhorar aquele mal-estar. Já estava saindo de casa quando o telefone tocou, voltou para atendê-lo: — Alô! — Leila. Precisamos conversar. Um segundo de silêncio para Leila sintonizar que aquela voz firme e sensual era de Nicholas. Ela prendeu a respiração antes de se armar e então respondeu totalmente fria e sem emoção na voz. — Sinto muito, ligou para o telefone errado. Não saio com homem casado. Desligou o telefone e saiu. No transito pensou naquela voz, <<" precisamos conversar ”>>. “O que ele pensa que sou? Uma messalina? Não quero vê-lo novamente. Acabou! Caso encerrado”. Entrou no escritório e a voz dele ocupava todo seu pensamento. <<“ você é minha e isso ninguém poderá mudar “>>. <<“ Eu te prometo, não vou desistir de você ”>>. O dia estava custando a passar, diante daquela pilha de papeis ela só via um nome Nicholas... —Preciso de um drink. Ela se ouviu dizer. Seu chefe surgiu diante dela e lhe falou a respeito de uns investimentos que precisavam de assessoria, era uma boa chance

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dela de se promover dentro do escritório, acertou com ele os detalhes, então marcou um encontro com os investidores. Foi para casa tomar um banho e se trocar para encontrar com os investidores. Escolheu um terninho de seda carmesim, e um salto preto, adorava o contraste desta roupa com seus cabelos e seus olhos, os homens babavam ao vê-la. E ela precisava desnortear o cliente. Maquiou-se e ao ver o efeito de sua beleza sentiu que seria uma grande noite. Um motorista veio até sua porta sentiu falta da vida de princesa que seu irmão lhe proporcionava, mas viver assim estava bem melhor, por um lado sua aventura no Saara serviu para amadurecer um pouco, mas o sofrimento só serviu para lhe deixar arredia em relação aos relacionamentos “... A solidão será sua companheira por muito tempo porque só a quem se entregou por amor poderá tocá-la novamente”. As palavras de Richenda ainda ecoavam em sua mente. Olhando pela janela, ela viu as luzes ao longo de River Walk, havia vida naquelas ruas e bares, cheio de pessoas. A brisa suave soprava seu rosto, lembrou-se do deserto e de tudo que viveu ao se entregar a Nicholas, não se arrependera de nada, nem ao menos das confusões que criara, já havia se desculpado com seu irmão, mas não conseguia perdoar Nicholas, não conseguia esquecer as palavras da velha cigana ao falar sobre as tradições e o dever de seu adorado neto. Acabou! Acabou... disse para si mesma. O veículo foi perdendo a velocidade, o motorista já estava estacionando, viu que estava próximo ao restaurante, deu mais uma olhada no memorando e nos relatórios, já tinha a estratégia arquitetada, bastava apenas ser cautelosa e jogar as cartas certas. O carro estacionou, enquanto aguardava o motorista abrir a porta, olhou no espelho e verificou a maquiagem, estava bem,

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então à porta se abriu e ela desceu como uma lady, chamando todos os olhares para si, atravessou o pequeno saguão rumo a sua mesa onde seus clientes já aguardavam, os olhares de admiração, só trazia segurança para Leila. Naquele momento a empreendedora tomava lugar da inconsequente menina de alguns meses atrás. Que contraditória; mil faces, mil máscaras, mas no fundo Leila sentia-se vazia e em algum lugar de seu coração, gritava e ansiava por Nicholas... — Aí está ela. O chefe de Leila falou entusiasmado ao ver a exuberância da funcionária. Ela sorriu e cumprimentou a todos, enquanto o maître puxava-lhe a cadeira para se sentar. — Senhores, boa noite. — Boa noite senhorita. Foi à resposta em quase unisom. — Um drink antes minha cara? Seu chefe se apressou em perguntar. — Sim. O que estão bebendo? Perguntou. — Estamos tomando um cowboy, você com certeza vai querer algo mais leve. Ela sorriu e se dirigiu ao garçom. — Quero um blue night. — Vejo que não se intimida diante de desafios. Um dos clientes comentou ao vê-la pedindo um coquetel à base de vodca. Ela ignorou o tom sarcástico da voz do homem e respondeu. — Não. - Respondeu secamente. — Gosto de desafios. Finalizou e antes mesmo de desviarem o assunto ela perguntou: — Então o que estamos esperando? — Aos negócios. As negociações renderam bons frutos para Leila, mais tarde se despediram e ela então resolveu ir comemorar a nova fase conquistada em um bar então ligou para um conhecido chamado James Craing. — James? Estou no scotch-bar, preciso de sua companhia.

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— Leila? São onze horas! — E o que tem isso! A noite é uma criança, venha estou te esperando. Enquanto aguardava James, ficou pensando no amigo, estudaram todas as etapas do ensino juntos, mas a amizade nasceu mesmo no ensino secundário, depois que ele formou na faculdade foi contratado pela fundação criada pelo seu irmão, tamanho foi o desempenho dele na instituição que logo ocupou um cargo de executivo, agora ele estava frente à fundação, e aquilo dava um enorme orgulho em Leila, pois o trabalho e o esforço dele foram reconhecidos. Um aroma de canela encheu o ambiente, Leila olhou ao redor aquele cheiro e aquela sensação denunciava a presença de um homem que ela queria esquecer, mas não viu nada, achou estranho, depois acabou esquecendo, James chegou com mais duas amigas a tiracolo. Ela ficou feliz, e todos se sentaram em uma pequena mesa. — Bom você não me disse que estava sozinha, trouxe minhas duas amigas, Payne e Trisha esta é Leila. Responderam em unisom — Olá Leila. — Boa noite Payne, Boa noite Trisha. James... imaginei que você estivesse sozinho, foi por isso que lhe chamei, mas não tem importância, se acomodem. O burburinho das vozes, o barulho dos copos, da bebida e uma música de fundo preenchia o ambiente lotado de pessoas que estavam ali com o mesmo objetivo, beber e se divertir... Porém Leila estava se afogando em costumes que não eram os dela, a imagem que estava criando, mostrava uma mulher quase sem pudor, bebida, noitada e solidão, embora sempre ocupasse da presença masculina, no final da noite era com o travesseiro que terminava. Estava sorrindo, dançando com as recémchegadas a mesa, mas aquilo tudo era falso.

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Um homem à distância a observava, o sangue corria em suas veias, o calor da raiva e do ciúme estava tomando conta do seu coração, ver Leila solta naquele ambiente lhe dava náuseas, mas era preciso ter controle, não poderia expô-la e tão pouco poderia entrar em choque novamente com ela, era preciso estratégia e jogo de cintura, deu outro gole no uísque, e novamente voltou a olhar para a mesa em que ela estava. Viu com ansiedade que ela já estava saindo do bar, percebeu que ela havia bebido bem mais do que o habitual, nos últimos meses aquilo estava ficando frequente, se sentia culpado. Deixou alguns dólares embaixo do copo e saiu atrás dela. Um táxi parou e ela entrou, ainda viu quando ela olhou para trás, abaixou a cabeça, por uma fração de segundos seus olhos se cruzaram, então ela partiu. Desiludido caminhou pela via, a noite estava fria e molhada, desejou se aquecer nos braços dela, ela era tão quente e tão viva, era impossível não se perder naqueles cabelos negros, sentiu uma forte pressão no baixo ventre, era o desejo, ele sabia que não poderia mais encontrar outra mulher como ela, algumas prostitutas vieram ao seu encontro na calçada, mas ele se esquivou, e continuou a caminhar. A imagem do sorriso franco de Leila o assombrava; aquilo era uma tortura, o cheiro de sândalo natural que exalava da pele dela quando faziam amor o perturbava. Mas ela o repudiava, a mulher que lhe roubou o coração não o queria mais. Já passava da meia-noite quando ouviu alguém bater na porta, Leila olhou para o relógio em cima da pequena mesa em seu quarto, quem poderia ser àquela hora, levantou-se e foi até a porta, não acreditou no que viu, deu um profundo suspiro e antes de abrir a porta se armou de coragem. — Nicholas! Não me recordo de ter lhe dado meu endereço.

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— Não vai me convidar para entrar? Ela olhou para ele e em silêncio abriu a porta. Ele entrou e o silêncio imperou dentro do cômodo, um malestar tomou conta dos dois amantes, ela não queria ouvir mais nada, ainda sofria com todo o desenrolar daquela história fatídica. Ela lhe mostrou o sofá para que ele se sentasse, fosse o que fosse não seria grosseira a ponto de não ouvi-lo mais uma vez, mas sua decisão estava tomada, já havia decidido rasgar aquela página. E o que quer que ele diga não mudaria de ideia. — Espero que seja importante. — Não é importante, mas precisava vê-la antes de tocar minha vida para a frente. — Não precisamos mais nos ferir, mas... — O que é isso Leila? Estamos separados apenas alguns meses, e eu não abri mão de você, não vou desistir de você. Eu lhe disse isso antes e continuo a afirmar. — Sim e logo em seguida foi se casar com uma ciganinha para dar continuidade às leis do seu clã. Ela se levantou quase furiosa e continuou... — Você precisa entender que sua família não me quer com você. Não sou uma cigana, não sou uma gadjí. Nem o meu clã me reconhece, por ser filha de uma serva com seu amo. Não passo de uma ikelan bastarda, não assumida pelo nobre tuaregue. É com essa mulher que você insiste em ter uma vida. Não compreendo. E também não quero compreender. E pela primeira vez em meses Leila pegou-se falando com ele, não estava mais exaltada, estava branda. Ele ouvia aquelas palavras dolorosa e então se levantou para se aproximar dela, ela não fez nada, deixou-se ser embalada pelo abraço dele. E pela primeira vez ele temeu aquela frieza. — Nunca pensei na sua condição de meia filha, ou meia irmã, ou mesmo na condição de filha de escrava tuaregue, isso nunca fez diferença para mim, aliás, se você não me dissesse

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não iria saber, porque o que me importa é você, sua garra, sua força e principalmente seu caráter, mesmo sua falta de sensatez na maioria das vezes. Mas isso é você, é natural de você. Não lhe mudaria para agradar minha família e tão pouco a sua. Você me conquistou assim, você tomou minha alma assim. — Então você há de compreender que precisamos colocar um ponto final. Precisamos avaliar nossas vidas... — Não aceito um ponto final. Posso me afastar de ti, se isso for lhe agradar, mas acabar não. Você me pertence e... — Não sou sua propriedade, você fala como se eu estivesse amarrada a você e... —Não me interprete errado, jamais a faria minha propriedade, isso seria monstruoso, não a quero para ser submissa. Quero como minha mulher, minha amante, a quero como meu amor, é isso. Ela se desvencilhou dos braços dele e exasperada passou as mãos pela cabeleira negra, estava tremendo, era frio ou era desejo? — Volte para sua casa e cumpra com os desejos de sua avó. Aquela frase foi como uma navalha cortando seu coração. —Você realmente me quer fora de sua vida? Ele perguntou desanimado. —Sim. É o que eu desejo. Olhou diretamente nos olhos castanhos daquele homem. — Assim o será minha flor do deserto. Assim o será... até que o destino se cumpra e novamente você ficará para sempre comigo. Então se levantou abriu a porta da sala e saiu sem olhar para trás, ela não acreditou, ele se foi sem olhar para trás, ela se converteu em lágrimas. Por dias se sentiu morta, era do trabalho para casa, da casa para o trabalho, por dias não atendeu ao

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telefone, por dias se amaldiçoou por ouvir a voz dele na secretária eletrônica até ela se desligar sozinha...

Seis Três anos mais tarde... — Banco C.H.L investimentos e créditos. Ismail falando. — As salâmo a-leikom20 . Uma voz conhecida causou lhe alegria em ouvir. Era Adonai, aquilo encheu seu peito de alegria. — A-leikom es salâm21 . Meu querido irmão. Que saudades de você. Ela respondeu com alegria. — Também sinto saudades. Como vai você? — Estou bem. Produzindo muito. E aí? Quando o verei novamente. — Eu lhe enviei uma passagem, por que você não veio? — Já lhe disse, o meu trabalho ocupa muito meu tempo. — Então não se aborreça, irei te ver em breve. — Isso me deixa feliz. —Estou indo para Austin. — Negócios? Ou mulheres? Perguntou sorrindo — Não. É algo pessoal. — Entendo. Então é uma Mulher? 20 21

A paz esteja contigo A paz esteja contigo também.

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— Que nada. Ainda não conheci aquela que irá me arrebatar. — Hum!!! Mas as notícias nos tabloides nos dizem outra coisa. — Pura especulação. Estou só, é claro que de vez em quando arrumo alguma companhia interessante. Mas e você? Já ocupou seu coração? - Ela fez uma pausa, pensou profundamente em Nicholas e então respondeu ao irmão. — Meu coração ainda está fechado para balanço. Ele foi uma grande decepção. — Você ainda o ama? — Não sei. Às vezes tenho certeza que não, outras eu tenho certeza que sim. Mas passou. Só o que posso lhe dizer. Nossa história passou. — Se você o está dizendo, quem sou eu para duvidar. Não é mesmo? Fique bem habiba. Adonai finalizou — Oh habib, vou ficar. Smalla'Alik22. — Insha'Allah23. - Ainda emocionada Leila desligou o telefone, há muito tempo que não sentia falta do irmão, como naquela proporção, quase física. O peso da idade estava deixando seu coração mole. Afinal a casa dos vinte nove estava se aproximando. Naquela noite ela iria arrumar um namorado, e iria fazer Kamilah arrumar um também. San Antonio é uma cidade riquíssima à noite, recheada de bares e boates, a cidade oferece várias possibilidades para seus cidadãos se divertirem, é impossível ficar em casa. Todas as noites acontecem variedades de shows e apresentações, e como uma boa texana, Leila jamais se rendeu a passividade, sempre, 22 23

Que Deus proteja você. Se Deus quiser.

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desde a mocidade, curtiu a noite, trafegando pela via San Pedro, ela se esquecia do cansaço, o vento quente que batia em seu rosto, era um sinal de que tudo havia se encaixado novamente. Pensou nas palavras de Adonai, e pensou em Nicholas; por um momento teve a curiosidade de saber o que ele fazia da vida. Ela finalmente aceitou as palavras de Moussa. Sim! O sofrimento ajuda crescer, e as suas aventuras, embora inconsequente, veio trazer crescimento. Quanto tempo fazia desde que o vira pela última vez? Três anos! Três longos anos que não o via e nem tinha notícias dele. De longe ela observava as iluminações do aeroporto internacional, estacionou o carro e ficou ali por algum tempo curtindo aquele visual e estranhamente ela se sentiu abraçada por aquele vento quente que vinha do Noroeste. Como se de alguma forma pensar em Nicholas o trouxesse para perto de si. Sim! Ela ainda o amava, agora era um amor amadurecido, se o encontrasse novamente o aceitaria da forma como ele é, porque aqueles anos de solidão só serviram para lhe mostrar o quanto ele foi importante. Mais tarde, enquanto se banhava, tentava pensar na roupa que vestiria, mas seu pensamento era persistente e quase involuntariamente as lembranças a levaram novamente para o banho com Nicholas, um calor adormecido começou a surgir por todo o corpo. A lembrança das mãos suaves percorrendo todo seu corpo fez seu coração acelerar. Inconscientemente se acariciava pensando nos caminhos que ele percorrera, com os olhos fechados sentindo o calor daquela água, ela se tocou e deixou-se levar pelo instinto, sonhando com os beijos dele chegou ao clímax sozinha. — Droboy tume Romale, Miro Prala (Seja bem-vindo meu irmão). Ephraim cumprimentou Nicholas com alegria. Do

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mesmo modo Nicholas correspondeu e voltou a olhar para a fogueira que crepitava saltitante naquela noite. — Vejo que você anda de pouca conversa nesses últimos dias, o que te aflige? Ephraim perguntou preocupado. Nicholas olhou para ele e viu como ele era um bom líder, não foi erro darlhe esse trono, então colocando um pouco mais de bebida na caneca Nicholas começou a conversar. — Não é nada de importante, estou apenas olhando as chamas da fogueira. — Você deveria estar feliz, fez ótimos negócios neste ano, sua riqueza triplicou você trouxe ouro para nosso clã, e estamos felizes com sua generosidade. A sua lealdade para com nosso povo é muito além desta vida. Ephrain disse em tom de agradecimento e então continuou. — Não consigo entender por que às vezes você fica tão ausente. Veja as nossas paxivalin24 que estão esperando apenas um sinal de seu interesse para manifestarem o desejo de se casar com você. Nicholas lançou lhe um olhar zangado. — Não Ephraim. Não me venha de novo com essa tolice de me apresentar outra noiva, a primeira já me trouxe graves problemas. — Não me lembre daquela vergonha. Amaldiçoados sejam! Trouxeram a desonra para nosso tio e nossa família. — Precisamos mudar a maneira de ver as coisas por aqui, os jovens se gostavam, se eu tivesse aceitado o que me propunham, hoje estaria casado com uma mulher infeliz. Depois de uma pausa — Eu também estaria infeliz. — Você é feliz? Então me diga por que a alegria sumiu de seus olhos desde que aquela tuaregue saiu de sua vida? 24

Mulheres virgens.

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— Ela não saiu de minha vida este é o problema. Ela continua aqui ocupando o lugar que sempre foi dela e de mais ninguém. — Então é isso. — Sim. E estou esperando os nossos antepassados nos unir novamente. — Então meu caro irmão você já tem a metade do seu desejo realizado, por que os nossos antepassados sempre estiveram com você. Ephrain concluiu e saudou os outros homens que chegaram em torno da fogueira para continuar a beber e festejar aquela noite morna. Nicholas acreditava nisso, e esperava por isso, enquanto ouvia as conversas de seus parentes pensou na jovem Asla e seu marido, ele os levou para Paris e lhe arrumou um emprego, assim que eles fugiram no dia do casamento. Somente Richenda sabia que ele havia contribuído para aquela fuga, ele se sentia responsável por aqueles dois, então os ajudou muito, dando emprego e casa, depois os incentivou a estudar e a se qualificar para o mercado de trabalho. De tudo não foi um prejuízo total, já que o jovem Zlatan estava se despontando no ramo da advocacia e isso de certa forma lhe trazia orgulho, pois em futuro proeminente este jovem iria defender os direitos de seu povo, embora naquele momento estivessem em exilio. A jovem Asla estava terminando seu curso de designer e estava trabalhando em uma das oficinas de joias do grupo empresarial que ele fazia parte. Ela era muito boa no que fazia. Parte dos lucros que tiveram naquele ano com as vendas das joias, estavam diretamente ligados aos projetos dela. Então, de certa forma, ele havia concertado algumas coisas, naqueles últimos três anos. Agora precisava ir ao encontro dela, e se à condição para tê-la era largar tudo, ele já tinha decidido se mudar para a

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América, precisamente para o Texas. Enquanto saboreava um pedaço de carneiro, sua irmã Richenda deu-lhe sinal para ir ao seu encontro, aquilo significava uma conversa em particular. Nicholas observou o sinal e lhe correspondeu com os olhos, mais tarde afastou-se da fogueira e caminhou em direção onde sua irmã deveria estar esperando. Ao aproximar viu a bela mulher sentada com seu baralho sobre o tecido vermelho e suas pedras espalhadas. Nicholas levantou uma das sobrancelhas indagando. — Não me chamou para dizer sobre minha sorte? Não é? — Claro que não meu irmão, sente-se. O baralho neste momento é apenas para afastar os curiosos, assim podemos conversar sem ser interrompidos. — Usando de artimanhas? Não conhecia este seu lado. Nicholas disse sorrindo e então se sentou sobre as almofadas de veludo em vermelho e dourado que tinha sido bordado pelas artesãs do grupo. — Vou direto ao assunto. Quero notícias de Asla e Zlatan. Fale-me como está a vida deles. — Você tem o dom de ler meus pensamentos mulher. Ele riu e então continuou. — Os dois estão prosperando, mas ainda é cedo para trazê-los de volta ao clã, embora acredite que você já pode começar a preparar o terreno. — Me diga Asla é feliz? — Sim, ela é uma jovem muito inteligente e bastante esforçada, Zlatan cuida muito bem dela, os dois tem trabalhado muito para vencer os obstáculos do exílio. — Me preocupo tanto com ela, longe do carinho de seu povo, a vida da mulher cigana é muito triste, e longe dos seus afetos deve ser ainda pior. Richenda falou em devaneios. Então Nicholas pensou que uma das coisas que Leila mais questionava era a forma machista que imperava no meio cigano.

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— Tire essa ruga da testa minha irmã, ela pode não estar totalmente feliz, mas tenho certeza que uma parte dela sim, ela ama Zlatan por demais e ele a honra a todo o momento. — Mas eles estão misturados aos gadjis, não vivem com os ciganos, então não podem estar felizes, logo estarão se perdendo também. — Bom isso não é uma regra, conheço muito cigano que não vive feliz no meio do seu povo. — Você está falando de si próprio? Ela olhou bem no fundo de seus olhos esperando pela resposta. — Talvez sim, talvez não. — Nickos quando você vai partir? A pergunta o surpreendeu, mas ele sabia que no fundo iria partir, por que ali já não era seu lugar, seu coração estava em outro continente chamando-o sem-cessar. — Já deveria ter partido há tempos atrás, mas precisávamos ficar afastado um do outro. A nossa relação estava muito conturbada. Cometi muitos erros, ela conseguia me deixar louco. Cheguei a agredi-la fisicamente. Imperdoável o que fiz, mas aconteceu. — Ahhh! Coração! Por que ainda continua tão amargurado? O que aconteceu era para ter sido, mas já está na hora de você cumprir com seu destino, uma criança está chegando, seu amigo vai precisar muito de seu apoio. Ele olhou para ela sem entender bem aquela premonição. — Você está dizendo o que? Com essas palavras. — Guarde-as consigo em breve você saberá. E não se esqueça de que mesmo abrindo mão de nossas tradições, sua lealdade sempre falará mais alto, seus princípios sempre lhe guiaram. Você nunca deixará de ser um cigano. Ela sorriu carinhosamente.

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—Siga seu caminho e que Deus sempre o abençoe. Latcho Drom25! — Ah minha irmã! Espero que desta vez, não erre tanto como no passado. — Quem disse que você errou? Nós é que quase fritamos você como um carneiro. Tudo bem, que a Baba queria o melhor para você. Mas conhecendo você, deveríamos ter lhe perguntado antes. Você não pensa assim? Oh! Perdoe-me pela minha insolência. Ela falou baixo levando as mãos sob a boca. Eu não posso ficar pensando muito alto, mas com você tudo é tão diferente, você é tão mais aberto, me deixa livre para falar o que penso. Que me esqueço da minha condição de mulher e acabo falando como a irmã mais velha. — Richenda você é uma mulher maravilhosa, seu marido foi muito abençoado, você é sabiá sabia e ponderada. — Obrigada meu irmão, mas agora corra em busca da sua felicidade, vou preparar o terreno para trazer de volta Asla e Zlatan para o nosso convívio, Ephraim é um homem bom e muito sábio, quando ele descobrir que você amparou o jovem casal, ele verá que não há razão para crucificar, porque o mais ofendido estendeu as mãos para ajudar. — O mais ofendido? Ele achou graça. — Até onde eu sei ninguém sabe que você os ajudou a fugir, então para todos você foi abandonado e ofendido. Estou errada? — Não, claro que não. Asla nunca me ofendeu, eu sim não pude aceitar as regras de nossa tradição. — A coitadinha estava cumprindo as ordens de seu pai, mas ela de alguma forma ia se rebelar, pode ter certeza disso, a sorte deles é que você também era como eles. 25

Tenha um belo caminho pela frente.

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— Você tem razão, se ela não fugisse quem provavelmente iria desaparecer seria eu. O riso preencheu o espaço. A noite já estava alta, e por uma fração de segundos lhe pareceu que a brisa trazia a fragrância de Leila. Em noites como aquela, sempre era surpreendido por aquela sensação. O que será que ela estava fazendo naquele momento? Um calor começava a se propagar por seu corpo, o instinto natural fez seu membro entumecer sob o tecido grosso das calças, aquilo o incomodou, estava realmente sentindo falta dela, as noites nunca mais foram às mesmas depois que ela saiu de sua vida, às vezes ouvia o sorriso dela pelo quarto, outras vezes ouvia o celular tocando no meio da noite. Já estava na hora de acabar com aquilo. Nicholas deu um longo suspiro e foi ao encontro dos homens em volta da fogueira, era hora de lhes dizer que teria que partir. Os amigos estavam reunidos em torno da fogueira; o calor era intenso e a conversa também, essa era uma particularidade única, a fogueira é um elemento masculino dentro da cultura cigana, a mulher é responsável pelo acendimento do fogo, ela saúda as divindades do fogo e com todo o ritual passado pelos seus ancestrais ela começa a dançar em torno da fogueira para então os homens se reunirem e assim começar a beber e a comer. A música começou a tocar e a cigana com seu trejeito particular, começou a bailar com as mãos e com as suas vestes sorrindo e convidou as outras para participarem da roda, os olhos de Nicholas se perderam por um instante no bailar daquelas chamas, o lamento na voz do cigano expressava exatamente o vazio de seu coração; estava enfeitiçado, alguém falou, mas ele não se intimidou e silenciosamente caminhou até uma pedra e sentou-se nela, depois de beber seu vinho. Ele olhou o ambiente a sua volta, viu os olhos, o sorriso de seus

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amigos e de seus parentes. A família sempre foi muito importante, o amor que tinha por eles estava acima de tudo, os laços eram bem fortes, mas era preciso desatar, olhou para os mais velhos e sabia que eles eram os verdadeiros guardiões da cultura cigana. Seus irmãos estavam bem servidos, a lealdade da tribo estava diretamente ligada à sabedoria de seus antepassados, Ephraim era a personificação da competência e do prestígio. — É meu irmão a vida sem-amor é como um pão sem fermento. Klaus sentou-se ao seu lado e tocou a caneca na de Nicholas. Nicholas o saudou e olhando para ele, percebeu que tempo havia passado muito depressa. Um dia desses estavam pelas matas caçando e agora cada um seguia seu próprio caminho. — Tomei uma decisão, estou partindo. Klaus olhou para Nicholas e sem demonstrar surpresa nenhuma falou. — Achei que você nunca ia se decidir. Afinal um empresário do seu gabarito precisa buscar novos territórios para se expandir. Klaus falou sem emoção. — Mas não é por esse motivo que vou. Nicholas respondeu sério. — Meu irmão. Eu sei disso, mas é uma boa desculpa, o clã não precisa saber seus motivos, afinal a verdade pertence somente a você. — Sim. Mas tenho que ser honesto com Ephrain. — Ele sabe o que passa no seu coração, desde que aquela gadjí se alojou dentro de ti, você já está de partida, é compreensível, só não é compreensível você deixar sua cultura e sua família para ficar com ela, essa foi à prova de amor que ela lhe pediu? — Não. Claro que não. É uma decisão minha, do mesmo modo que ela não pertence aos tuaregues, quero me igualar, se

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os abismos de nossas culturas não podem unir-se. Então, o melhor é deixar tudo de lado. Precisamos construir nosso próprio caminho. Eu nunca vou deixar de ser cigano, como ela também não deixará de ser uma tuaregue. — Bom; você é um homem sábio, estou com você, e seguramente posso falar pelos nossos irmãos, estamos todos com você. Nicholas se emocionou com a sinceridade das palavras de Klaus. — Suas filhas estão crescendo, logo, logo teremos casamento à vista. Nicholas falou. — Eu acho que ainda não. Você acredita que Amarantha decidiu que ainda não revelará a ninguém que Naisha já menstrua. Isso está me deixando muito preocupado, por que se alguém desconfiar, teremos que escolher um marido para Naisha, e confesso que gostaria que ela escolhesse seu próprio caminho. — Isso não será bom para vocês, mas eu concordo com Amarantha, Naisha ainda é uma menina; veja bem, você teria coragem de entregá-la, por exemplo, para Dimitri? — Não! Você ficou louco, minha criança nas mãos de um homem como Dimitri. Klaus respondeu olhando para o homem que estava próximo da fogueira. — Eu dou as costas para o clã e parto com minha família; mas não posso, por nenhum pote de ouro entregar minha menina. Amarantha não me perdoaria jamais. Concluiu. — As nossas tradições às vezes são muito amargas. Veja o caso de Asla e Zlatan. — É, mas você não é nenhum bêbado e preguiçoso como o Dimitri, além do mais ele tem histórico de violência premeditada, e nós sabemos o tipo de homem que ele é. Principalmente, no que diz respeito à cama.

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— Sim. Mas Asla e Zlatan vivem no exílio, só porque foram contra as regras e as tradições. — Eu tenho vontade de saber sobre eles. Será que eles têm onde morar? Porque até o pai dele virou as costas para eles, por ela não ser virgem. Pode? Se o próprio Zlatan assumiu o feito. — Eles estão bem. Ele cuida muito bem dela. — Como você sabe? Você tem notícias deles. — Eu os ajudei. Dei casa, estudo e trabalho para eles. Agora já andam com as próprias pernas, não dependem mais da minha ajuda. — Mas como? Ela desonrou você, primeiro por ter mentido sobre sua virgindade, depois fugiu. - Após uma pequena pausa perguntou: — Como pôde ajudá-los? Não consigo entender a sua lógica. Às vezes você me surpreende. — Klaus! É você quem me surpreende. Acabou de me contar um segredo, e está julgando a atitude de Asla e Zlatan? — Sim. Eu sei. Mas, me entenda, para todos nós o que ela fez foi como pegar um pote de ouro e trocar por um de barro. — Só que o pote de ouro já pertencia à outra mulher. E ela em nenhum momento me ofendeu, porque desde o princípio foi muito sincera, na véspera das festividades do casamento, os dois vieram até a mim, para me contar sobre eles, então, eu os ajudei. Klaus ouviu aquilo e começou a rir olhando para a direção da fogueira ele viu quando o outro irmão se aproximava deles. — Lá vem Ephraim; veja o que vai lhe dizer; seja sábio, nem sempre a verdade é bom começo de conversa. Klaus falou entre os dentes. —Irmãos que conversa animada. O que estão segredando um com o outro, posso saber?

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— Claro que sim nobre irmão. Nicholas respondeu rápido demais. — Estou dizendo a Klaus que estou indo para Paris a trabalho, e provavelmente de lá devo seguir viagem... — Até aos Estados Unidos... Ephraim concluiu a frase. — Estava esperando este momento, você pretende ficar quanto tempo desta vez? E seus negócios por aqui como vão ficar? Já providenciou alguém para gerenciar o que você tem por aqui? Quem ficará responsável pelas oficinas e as joalherias? Você já conhece minha opinião sobre deixar os negócios nas mãos de terceiros; — O pasto só fica bonito quando o patrão vigia pessoalmente o rebanho. Nicholas repetiu a frase que seu irmão dizia a todos, quando falava sobre os negócios. — Isso mesmo; veja; olhai para nós todos, se temos o que temos é porque estamos guiando nossos negócios e nossas famílias com nossas próprias mãos. — Eu concordo com você, mas com a tecnologia de hoje, posso gerenciar meus negócios onde quer que eu vá. — Tinha me esquecido. Ainda sou antiquado com essa coisa de tecnologia, embora precise dela, gosto mais é disso aqui. E com as mãos mostrou o vale e a tribo reunida. Isso aqui Nicholas, é fundamental para o nosso povo, jamais se esqueça disso.

Sete O fuso horário entre Paris e o Texas o deixava de mau humor e muito cansado. Para sua surpresa Adonai estava

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esperando por ele no saguão. A face dele não era das melhores, de cara soube que tinha problemas para ser resolvido. Os dois homens se cumprimentaram com um forte abraço, e seguiram para o estacionamento. —Como foi sua viagem? Adonai lhe perguntou. — Nunca acostumo com este fuso horário, isso me deixa muito mal-humorado. —Também fico assim por alguns dias, nada que uma boa noite de sono não resolva, vou te levar para meu apartamento, fique comigo quanto tempo achar necessário. Depois de seu descanso conversaremos. Nicholas perguntou sem rodeios: —O que está havendo? Adonai deu um longo suspiro e aos poucos foi narrando ao amigo os últimos acontecimentos da sua vida. Nicholas por sua vez estava pensando nas palavras que sua irmã havia dito na véspera de partir, agora ele começava a entender “uma criança está para chegar, seu amigo vai precisar muito de seu apoio”. Ele desligou alguns segundos, enquanto ouvia o amigo que dirigia muito tenso, nem mesmo na crise de Leila o viu assim, ele sempre fora muito ponderado e equilibrado, e ali ao seu lado estava um Adonai totalmente desconhecido. — O que posso fazer para lhe ajudar? Você sempre teve tranquilidade e frieza para resolver seus problemas. Não preciso lhe dizer que no final tudo dará certo. Estou por aqui. Vou lhe apoiar no que for preciso. — Eu conto com isso. Preciso ir a San Antonio, tenho algumas coisas para fazer por lá. Adonai lhe falou. — Entendo. Agora podemos ir para casa. Estou quase morto, preciso de um bom banho e uma cama, acho que vou dormir por uns três dias. Adonai sorriu e pisou forte no acelerador.

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Nicholas estava de volta há quase três meses e ainda não havia procurado por Leila, mas hoje seria o dia D, precisava ir a San Antonio, e com certeza iria encontrá-la. A história de Adonai estava bem confusa, e surreal, ele mesmo não havia entendido direito o que estava realmente acontecendo. Pegando os documentos sob a mesa os colocou dentro de sua pasta e logo foi para o terraço pegar o helicóptero que já o aguardava. Vinte minutos mais tarde já estava no território de Leila, o heliporto localizava-se no alto de edifício, no centro empresarial de San Antonio, ele desceu pelas escadas de ferro e abriu uma porta de vidro logo abaixo da sacada, entrou em um corredor de paredes brancas e fria, andou mais uns segundos e então deparou com o elevador, ao entrar ele apertou o botão de número 13, segundos depois a porta abria para um enorme escritório, algumas cabeças se ergueram para ver quem entrava pelo saguão todo amadeirado, ele cumprimentou a todos, e seguiu para a sala onde se localiza a diretoria, enquanto caminhava, uma secretária vestida em um terninho marrom correu para segui-lo e lhe dar as boas vindas. Ele entrou na enorme sala, e olhou para imensa mesa de vidro com suas vinte quatro cadeiras giratórias, passou por trás de algumas e então abriu uma porta e entrou no escritório de Adonai, a secretária ainda estava no encalço dele, então ele se sentou e lhe dirigiu as ordens que precisava ser realizada para o início do trabalho, até o verdadeiro patrão voltar para ocupar aquela cadeira presidencial. No final da tarde depois do expediente exaustivo daquele dia resolveu tomar um drink antes de ir descansar, enquanto trafegava pela enorme avenida ele observou o céu avermelhado de San Antonio, o vento frio do outono já pronunciava o inverno

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rigoroso que iriam enfrentar nos próximos meses, seguiu pela alameda e entrou em uma rua toda iluminada ladeada de bares e restaurantes. Parou diante de um scotch-bar conhecido, então entregou a chave para o manobrista e entrou naquele ambiente aconchegante, estava no balcão rodando o gelo do copo e pensado no que dizer a Leila quando a encontrasse novamente. Bebendo seu scotch, pensava sobre isso, o burburinho de vozes e a música eram até tranquilizadores, mas sua audição apurada destacou uma voz conhecida, seu coração gelou, ele colocou o copo sobre o balcão e virou-se em direção das mesas, então como uma miragem ele a viu. Teve vontade de ir ao encontro dela, pensou em sair antes de ser visto, mas já era tarde para isso, como um imã Leila olhou em sua direção. A cor fugiu de seu rosto moreno, seu olhar parecia gelado ou talvez ela estivesse tão surpreendida quanto ele com aquela coincidência, institivamente teve vontade de sorrir, e tarde demais percebeu que fazia isso. Sair e sumir não eram bem o seu estilo, então, desafiando a si próprio ficou para ver até onde iria aquela guerra de nervos. Mas ele não aguentou e assim que ela ficou sozinha em sua mesa, ele se aproximou: — Minha flor do deserto, velhos hábitos nunca mudam? Perguntou em tom jocoso. Ela quase enlouqueceu ao olhar para seus lábios, ele estava mais magnifico que antes, o tempo só serviu para deixá-lo ainda mais sedutor. Com um enorme autocontrole ela forçou um falso sorriso e então quase entre os dentes ela lhe respondeu, a intenção dela não era ser tão ríspida quanto pareceu naquele momento. — Caro Nicholas! Que surpresa desagradável te ver por aqui. Ele sorriu para ela, pois sabia muito bem que ela estava querendo se mostrar indiferente a presença dele, ele não se intimidou e sedutoramente voltou a falar:

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— O tempo para você não passou, está ainda mais linda. Ela se arrepiou com o tom de voz que ele usou para falar. — Veio a negócios? — Talvez.... Ou quem sabe estou aqui para pegar o que por direito me pertence. Aquela era uma afirmação velada, ela sentiu pelo tom de sua voz que ele estava falando sério. — Adonai está por aqui também? Perguntou olhando ao redor. — Não. Está em Austin. — Precisamos conversar, minha flor do deserto. — Odeio quando você me trata assim. Eu não sou sua flor, há muito tempo deixei de fazer parte do seu jardim. — Talvez para você. Mas todo bom jardineiro que se preze, é insistente com sua flor predileta. Então pode ter certeza que eu sei o que estou lhe falando. Tenha uma boa noite. Sua amiga está voltando. E antes que ela pudesse retrucar, ele se afastou. Leila ficou com os nervos em frangalhos, ele deixou uma promessa pairando no ar, não como uma fumaça, mas como algo concreto, como uma certeza que ela sabia que seria cumprida. Olhando nas costas dele ela pensou se estava pronta para render-se aquele desejo de ficar definitivamente com ele. Ela sabia que agora não iria resistir mais, mas ainda iria brigar antes de se render totalmente. A noite custou passar para ambos, a lembrança perturbou o sossego dos dois, aquele encontro poderia ter terminado de outra maneira. Mas os dois precisavam ainda se torturar até o destino uni-los novamente. Durante o dia Leila evitava pensar sobre o assunto, mas quando chegava à noite, era um tormento, as lembranças se

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faziam presentes, ver Nicholas e sentir sua presença foi algo que ela não estava preparada, com tristeza percebeu que seu amor não havia acabado, mas havia se intensificado, amadurecido, a solidão que se fazia presente em sua vida começou a incomodar. Seu corpo estava pedindo pelo dele, seu sexo doía de saudades das investidas dele. Sim! Ela sentia saudades de fazer amor com ele. Desesperada pegou o celular e sem pensar ligou para ele. — Nicholas? Onde você está? — Estou em Austin. O que houve? Aquela voz grave e profunda respondeu do outro lado. — Droga! Eu não consigo dormir, desde aquela maldita noite que encontramos no restaurante. Que porcaria! Isso não é justo. - Quase sem voz, admitiu para si mesma que era hora de levantar a bandeira branca. —Eu preciso de você, meu corpo está queimando de saudades. E então ela chorou. Do outro lado da linha um silêncio. Então depois de um tempo ela ouviu a voz do outro lado. — Não pensei que você fosse sofrer pela minha ausência, porque você não me disse isso enquanto estava aí, neste momento estou em Austin, e mesmo que se eu tivesse um jato, assim que eu chegasse até você, eu seria rechaçado como das outras vezes. Era justo o que ele estava dizendo, um silêncio perturbador invadiu o telefone e sem se despedir ela desligou e foi tentar dormir. A semana para ela foi um inferno, ela não deveria ter ligado para ele e tão pouco falado de seus sentimentos, agora estava ali angustiada e triste, então resolveu ligar para Kamilah e foram para Corpus Christi. Logo que chegaram, resolveram ir até a praia, embora Kamilah estivesse com inúmeros problemas, ela viu que Leila também estava com os nervos à flor da pele.

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— Leila eu não pude deixar de perceber, você está com os nervos à flor da pele, quer conversar sobre o que te está consumindo assim? — Kamilah, eu realmente preciso conversar, mas nem sei por onde começar, porque é tanta coisa. Leila respondeu apreensiva. — Que tal desabafar, comece a falar qualquer coisa, talvez assim você se descarregue. — Você tem razão, o que acontece que alguns anos atrás eu conheci um homem que me levou a loucura, deixei me levar pela insensatez e vivi um momento mais do que mágico, porém quando imaginei que fosse ficar com ele para sempre a família dele apareceu e depois de alguns eventos nós rompemos. Isso é tudo. — Este homem é aquele que encontramos no restaurante? — Sim. É ele mesmo. E desde que nos encontramos, estou assim, ansiosa, esperando por ele. — Por acaso este homem também é o mesmo de três anos atrás. — Sim. Toda vez que a gente se encontra acaba virando isso, ele perde a cabeça, ou melhor, o deixo tão doido que ele perde o controle. — Você diz isso assim? Como se fosse normal perder a cabeça e ficar violento. — Ele é um cigano, tem o sangue quente, e para eles a submissão é algo normal, de repente bater em uma mulher acaba sendo algo também natural, embora ele não seja adepto a isso, é que eu realmente tenho o dom de provocar a situação ao extremo. Kamilah ouviu aquilo de boca aberta, como era possível aceitar a submissão e a violência contra a mulher como parte dos costumes de um povo?

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— Você o ama? — Sim, muito. Mais que o ar que eu respiro. — Então porque não fica com ele? — Porque, ele quer uma esposa para dar continuação ao seu clã. Encher a casa de filhos, não é bem o que planejei para mim, como também não planejei amá-lo. Estou muito confusa. — Minha querida você já falou isso com ele? — Não. Mas ele sabe, ele conhece bem meus pensamentos. — E eu achando que estava com problemas, mas ficar assim como você está, é ainda pior. — É talvez você tenha razão. Em silêncio caminharam até a praia, estava acontecendo uma espécie de luau na praia, havia um grupo pequeno de pessoas em torno de uma fogueira, ao som de um violão alguns membros cantavam uma música animada. O vento frio brincava entre eles, fazendo com que todos bebessem para se aquecer, Leila começava a relaxar, apresentou Kamilah a alguns conhecidos que encontrou por ali, e então, quando levou a bebida até a boca não acreditou no que seus olhos estavam focando, um homem moreno de quase dois metros de altura surgia entre seu copo e a visão da fogueira. Nicholas!!! Em pele e osso estava parado bem na sua frente. Os acordes do violão era um convite discreto para cair novamente naqueles braços. O tempo parou para os dois amantes, o silêncio era interrompido pelo som do vento e das ondas quebrando na areia. Não era preciso palavras para justiçar aquele encontro, se abrissem a boca, o instante mágico iria passar novamente, e nenhum dos dois queria isso, porque o desejo que sentiam um pelo outro era maior que as diferenças que o separavam. Quando percebeu, já estavam em seu quarto, Nicholas fechou a porta atrás de si e a fitou demoradamente, na penumbra

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daquele quarto dois seres se despiam lentamente. A respiração de ambos estava totalmente descompassada, a saudade e a ausência que tanto machucara a ambos estavam finalmente sendo medicada. Ele olhou cada centímetro daquele corpo, cada detalhe, cada curva generosa e suave daquela mulher, aspirou o perfume inebriante que tanto lhe perseguiu ao longo dos anos; então os lábios se apossaram um do outro, o calor que queimavam as entranhas de ambos ia sendo substituídos por uma necessidade crescente, eles tinham pressa, era preciso apagar toda aquela dor e mágoa. E foi assim por um longo e feliz momento, até que exaustos adormeceram. Tarde da noite, Nicholas acordou em um sobressalto, estivera sonhando novamente, pensou confuso, então viu Leila em pé olhando pela janela, continuava nua, aquela visão era um deleite para seus olhos cansados. Levantou-se e foi até ela. — O que te perturba? Perguntou ao pé do ouvido. Ela o olhou, ele estava maravilhoso, parecia mais musculoso que da ultima vez que estiveram juntos. — Nós dois. — Porque nós dois? — Eu o quero, sempre o quis. Mas não sei se quero viver com você. — Bom. Depois de tanto tempo, pensei que você já tivesse resolvido seus dilemas. — Sim. Eu sei o que você está pensando. Mas não é tão simples assim. — Psiu.... Afasta esse fantasma do passado de sua mente, agora o momento é outro. Se eu quisesse uma mulher cigana, teria me casado com uma. Ela ficou em silêncio. — Mas não é justo te pedir para ficar sabendo que você ama as tradições de seu povo.

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— Vamos esquecer-nos disso. Eu quero ficar quietinho com você, naquela cama enorme, fazendo amor até você enjoar e só falaremos de casamento quando você achar que está pronta para isso. O que você acha da ideia? Aquela proposta lhe surpreendeu, Nicholas estava diferente, estava suave, aquela demonstração de compreensão lhe deixou sem ar, então se virou para ele, sua atitude foi muito mais que uma demonstração de deleite. Em silencio ela abaixou até seu ventre e com uma delicadeza própria beijou seu falo entumecido. Para que palavras num momento daqueles! Ele ficou ali de olhos fechados, quase sem respirar, curtindo aquele momento, ela beijava e lambia desde a base até a extremidade, àquilo era um estímulo doce e obsceno, uma loucura própria de dois amantes no cio, ele a incentivava acariciando seus longos cabelos, ela deliciava com o instrumento dele como se fosse algo comestível, doce e saboroso. Nicholas já não sentia mais nada no tocante a espaço ou tempo, ele se via ali se entregando aquela luxuria, então ela o colocou contra a parede e com as costas contra a superfície fria ele a pegou no colo, fazendo com que ela o prendesse com as pernas, se esfregando nele. Seus instintos captaram aquele comando segurando-a firme a penetrou forte, em pé fizeram o inconcebível, se amaram sob toda a extensão do próprio corpo. Ele acariciava seu clitóris em movimentos circulares, gemidos e sussurros invadiam o quarto. Leila estava no comando; ele correspondia a cada investida dela; a umidade do seu sexo feminino exalava um perfume que confundia sua cabeça, seu coração descompassado anunciava outro gozo. Então entre sussurros ele disse: — Não posso ficar sem você, você é tudo para mim. Aquelas palavras a encheram de alegria, então ele a abraçou forte e gozo chegou para ambos...

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O dia amanheceu e Leila estava ali, aconchegada nos braços fortes de Nicholas. Quietinha ouvia a respiração tranquila daquele homem, a tempestade será que havia passado? Ela o acariciou, e então ele correspondeu com um forte beijo entre os dedos. —Preciso ir. —E quanto a nós? Leila perguntou. Um silêncio repentino tomou conta do quarto. —Vamos deixar acontecer naturalmente. Nicholas jogou. —Naturalmente? Ela perguntou. —Sim. Depois de tudo o que houve, é melhor irmos devagar. —É... Talvez você tenha razão. - Ele viu a fisionomia desanimada e percebeu que ela esperava por algo mais que uma noite, poderia ficar feliz com aquele avanço.

Oito Quase dois anos haviam se passado, desde que Leila e Nicholas decidiram deixar o relacionamento deles acontecer naturalmente. Nos dias que se seguiram Leila ficou muito desapontada com ele, mas agora olhando para trás viu que foi uma decisão acertada, jamais poderia imaginar a reviravolta que houve no relacionamento de Kamilah e Adonai, e também jamais podia imaginar que seu irmão lhe confiaria à empresa, enquanto estivesse em recuperação do grave acidente que sofrera.

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Como o destino fora caprichoso, primeiro uniu, depois separou e agora por quase uma força maior tornou a reuni-los novamente. Isso fez com que ela se recordasse da premonição de Richenda, um arrepio percorreu seu corpo, ela passou as mãos pelos braços, na crença que aquilo era apenas uma suposição. Mas não tinha como pensar no assunto, a espera da volta do irmão estava sendo sufocante, ela queria ter ido junto a Nicholas para recebê-lo, mas tinha que ficar e verificar se estava tudo ok com os assuntos financeiros, enquanto estava à frente dos negócios, teve total apoio de Nicholas, as negociações internacionais ficaram a encargo dele, depois de tudo verificado marcou uma reunião com os diretores da empresa e lhes comunicou que o patrão estava voltando, e que o trabalho dela estava terminado, por ali. Agora ela podia voltar para sua vida, durante o período que Adonai esteve fora à convivência dela e de Nicholas fora muito tranquila, a cada dia ela se via mais apaixonada por ele, a ternura com que ele a tratava só reforçava mais o desejo de ficar com ele para sempre, aquela decisão encheu seu coração de alegria, mas ela não tinha certeza se Nicholas tinha o mesmo pensamento. Respirou profundamente e do alto daquele arranha-céu ela podia ver um lindo por de sol vermelho rasgando o céu de Austin, ah! Como será que está a casa dela em San Antonio? Ela pensou, ficou tão compenetrada com os afazeres da empresa de Adonai, que sempre adiava as idas até lá. A saudade do irmão e da amiga foi cruel, mesmo Nicholas estando todo o momento com ela, teve dificuldades em se concentrar nas funções que lhe foi delegada, a frieza dos homens de negócio nunca tinha sido seu forte, em seu próprio trabalho, ela se agarrava ao pensamento que tinha competência para estar ali. Agora podia respirar, entregaria a empresa para o irmão com lucros significativos, junto com jazida de topázio azul, bem ali no

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Texas, aquilo sim era uma notícia maravilhosa e com certeza alegraria Adonai. Era uma pena que Kamilah não viesse com ele, ela estava louca para conhecer o sobrinho, sorrindo se deu conta que era tia. O que será que eles haviam decidido quanto ao futuro, conhecendo o irmão ele provavelmente teria adiado uma decisão, ele não gostava de correr riscos desnecessários, e a causa deles era uma muito delicada. Aquilo a fez pensar na própria situação com Nicholas, e de repente se sentiu sufocada, Nicholas poderia querer voltar para a França, agora que as coisas estavam resolvidas para Adonai, ela não queria pensar sobre aquilo, mas nas ultimas semanas, ela o sentiu afastado, pensativo, quieto. Quase não fizeram amor e na maioria das vezes acabava dormindo sem ele. Precisava saber o que estava havendo. E esta era uma matéria que iria tratar com ele assim que retornasse de Houston junto de seu irmão. O tempo parecia que tinha parado, como custava ver a hora passar, afastou-se da janela e foi em direção ao longo corredor daquele apartamento, a cozinha ficava abaixo dos aposentos principais, desceu pelas escadas até ela, e então entrou naquele grande recinto, era linda, sua mãe com certeza teria amado aquele lugar, a mobília era toda em metal, os espaços vagos era circulado por uma imensa bancada, tudo era muito organizado e limpo ao extremo, olhou ao redor para ver onde poderia encontrar uma chaleira para aquecer uma água e assim fazer um chá para se acalmar, ao abrir a primeira porta do armário suspenso o fiel escudeiro de Adonai surge na porta com uma expressão sisuda. Ela olhou de esguelha para o velho tuaregue parado na porta, ele andava assim desde o acidente do seu protegido, teve dias que ficou imensamente preocupada com ele,

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embora ele dissesse que estava tudo bem, ela não acreditou muito nas palavras do velho. —Que susto Moussa! —Perdoe-me menina Leila. Não foi minha intensão. O que deseja aqui? Poderia ter feito o pedido via interfone. Ela ouviu as palavras, mas demorou a sintonizar o que ele havia dito, então respondeu: —Vou fazer um chá. Preciso me acalmar, essa demora está deixando meus nervos em frangalhos. —Essa é minha função, estou aqui para servir, esqueceu-se disto? —Moussa não começa. Você está aqui há tanto tempo que já faz parte da família. —Não menina Leila, a função de fazer o chá sempre foi minha, eu vou fazer o chá, sente-se e aguarde, por favor. — Ah! Por Deus! O que faço com sua teimosia; preciso ocupar meu tempo, para a hora passar mais rápido. Não consigo compreender porque eles estão demorando tanto. — Sempre ansiosa. Deixa, vou lhe fazer um eshahid26 como em nossas tendas. Não adiantava brigar com ele, afinal ele tinha razão, enquanto as mulheres se ocupavam de fazer o pita27 . O chá tradicionalmente é feito pelos homens. Então desanimada sentou-se diante de um balcão, e concordou com ele. — Você sabia que o verdadeiro eshahid possui efeitos terapêuticos e até sobrenaturais? — Meu pai sempre dizia isso, quando ia preparar para gente beber. 26 27

Chá no dialeto tamaquesh. Pão.

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— Seu pai era um homem muito sábio... Bom, o eshahid possui alma, ele é capaz de absorver o mal que há naquele que o ingere, por isso está presente em todas as reuniões ao pé de uma fogueira no deserto e em todas as nossas tribos. — Neste momento estou precisando é calma. — Então vou lhe preparar um ao modo wan-ashin. — Doce como amor? Ela perguntou. — Isso mesmo! Menina Leila. Vejo que você ainda está ligada aos nossos costumes. — E como não? Nos últimos dias até o véu tive que usar em um encontro com alguns árabes, você não vai acreditar a cara que fizeram ao ver-me. — Imagino que o senhor Nicholas estava em sua companhia? — Sim, sem a presença dele não haveria negócio. Nunca neguei minhas origens, o que não concordo é com alguns dos costumes que temos por lá. — Isso é uma discussão que não cabe julgarmos. “Aláh” quis assim por alguma razão. — É; tenho que concordar com você. Um silêncio caiu sobre os dois, então Moussa começou a cerimônia de preparação do eshahid. Ele deitou a água fervente no bule agitando cuidadosamente, logo em seguida ele colocou as ervas juntamente com o açúcar e em seguida voltou novamente a deitar a água quente e mais um pouco de erva e açúcar, o interessante era o ver levantar a chávena no alto da cabeça para a água cair em forma de fio dentro do pequeno orifício do bule de porcelana. Ele fez isso por mais três vezes seguida, então ele pegou uma xícara e em seguida derramou o líquido espumante dentro. Tinha que admitir era muito bonito ver o carinho e a concentração do velho tuaregue preparar aquela bebida.

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— Pronto! Agora saboreie e sinta-se feliz. Ela pegou o recipiente e o levou até aos lábios carnudos, a temperatura estava agradável, e assim ela pôde bebericar a bebida tranquilamente. — Hum! Que agradável. Sim aquela sensação ácida do inicio logo foi substituída por um doce ao final de seu término, aquilo lhe proporcionou um prazer indiscutível. —Que erva você usou para infusão? — Hibisco. Ele sorriu ao responder. — Maravilhoso. — Eu sei, por isso quis fazer lhe este agrado. Você se comportou como uma verdadeira tuaregue ao assumir os negócios do menino Adonai, isso me deu orgulho. — Que fofo você é; se você soubesse quanto sofri esses meses sem ele. Você não iria me dizer isso, temia errar como no passado. — Eu sei minha querida, mas uma coisa que nunca tememos foi o desafio, por isso há séculos continuamos a atravessar os milhares de quilômetros de areia do Saara para levar o sal até as águas do mar Mediterrâneo, somos guerreiros em muitas formas.

Leila ficou pensativa, sentada naquela mesa ela mergulhou no líquido esverdeado que aquecia o copo torneado. Sentiu-se relaxada e menos ansiosa. — Assim que Adonai retornar para a empresa, voltarei para San Antonio. Estou com saudades de minha casa e de meu trabalho. — Vou sentir sua falta. Sempre é um prazer servi-la. Mas espero que me convide para visitar seu lar.

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— Claro que sim! Você não precisa ser convidado, afinal você é parte de minha família. Os olhos do velho tuaregue marejaram emocionados. Leila finalmente havia amadurecido, estava neste momento diante de uma mulher maravilhosa, e ela nem sabia a transformação que lhe ocorrera. — Vou para meu quarto, obrigada pelo eshahid, você e sua sabedoria milenar. Então sorriu para o tuaregue diante dela. — Vá descansar. Quando eles chegarem eu vou lhe avisar. — Está bom, eu vou fazer isso... Mais tarde, bem mais tarde, Nicholas entrou em silêncio no quarto em penumbra. Leila dormia profundamente, parecia tranquila, suave, totalmente diferente da Leila que havia conhecido há anos atrás. Nos últimos meses ela se transformara tanto, que nem mesmo ele se deu conta de quando isso começou, mas algo naquela mulher fascinante havia mudado, e seu amor por ela estava ainda mais forte e permanente. Pensativo a olhou profundamente e depois se dirigiu até o closet, lá tirou as roupas e em seguida foi para o banho. Nos últimos dias as dúvidas invadiram seu coração, estava chegando o momento crucial, Adonai estava de volta, e ela voltaria para San Antonio, ele teria que tomar uma decisão, mas ela nunca manifestava o desejo de ficar realmente com ele, aquilo lhe atormentava. Ligou o chuveiro frio e deixou a água cair sobre sua cabeça na esperança de apagar os pensamentos que surgiam como o vento. O som da água caindo traziam as lembranças daquele oásis em Mopti, ele sentiu um desejo arrebatador nascendo em suas entranhas, então saiu do banho e enxugou-se e caminhou nu até a cama onde sua amada estava deitada, ela vestia um pequeno pijama, ele sorriu ao ver a simplicidade daquela veste, e também na ironia da situação.

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Ainda nu caminhou até a pequena mesa que estava ao lado da cama e então abriu uma gaveta no interior dela havia uma pequena caixa, ele pegou o objeto, abriu e olhou o brilho do Topázio âmbar. Era o símbolo do amor que ele nutria por ela, e tomando a decisão sentou-se ao lado de Leila, ainda adormecida, ele a beijou nos lábios convidativo, então de mansinho ela acordou e deparou com aquele olhar profundo para o seu, ele parecia cansado ou preocupado, o rosto másculo trazia a marca cigana da barba em torno do queixo e dos lábios, aquilo lhe dava um aspecto ainda mais viril, a tez morena contrastava com os olhos azuis, havia cortado o cabelo, ela amava aquele rosto singular, e aquela boca bem delineada, que a fazia perder o fôlego cada vez que tocava sua pele. Ela sorriu e sentou-se na cama, e com a alegria de uma menina sapeca pulou nos braços dele, aquilo sim era o que Nicholas mais gostava de ver acontecer, de mulher sensual e provocante a eterna menina barulhenta. — Estava morrendo de saudades... — Estou vendo... — Tomou banho? Sua pele está fria... Hum!!! Está do jeito que eu gosto!!! — Sim. Precisava afastar o cansaço. — Hum! Esse perfume... seu cheiro me deixa quente... — O seu também, mas antes de realizar suas perversões famintas, precisamos conversar. — Ah! Sério? O que você quer falar comigo? — Agora que Adonai está de volta, e como lhe conheço muito bem, você deve voltar para San Antonio antes mesmo de ele desfazer as malas. — Estou pensando nisso sim, mas... — Espere antes de você terminar de falar me ouça! Preciso que você me ouça e compreenda meu pedido.

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— Nicholas? Qual é a sua preocupação? Você quer me deixar? Leila o olhou surpresa e parou de beijá-lo. — Não! Claro que não meu amor. O que realmente quero é me casar com você. Um silêncio pesado ocupou todo o quarto, e a respiração dela parou, o pensamento dela repetia a última frase como se fosse um refrão, < “quero me casar com você” >. — Você está me pedindo em casamento? Mas e a sua família? A sua vida na França? - Ao invés de responder ele pegou a mão de Leila e então colocou a linda joia na palma de uma das mãos. — Foi o que mais se aproximou do seu olhar, minha amada. Você aceita dividir sua vida comigo, me permitindo cuidar de você como um marido deve fazer. Eu quero envelhecer ao seu lado, me deixa lhe acompanhar pelo resto de sua vida, me deixa fazer parte de sua vida como marido, como amigo e seu único e exclusivo amante... Foi uma declaração profunda, ela ouviu e repetiu mentalmente aquelas palavras, com um longo suspiro ela lhe deu um beijo e então lhe esticou a mão para ele colocar a joia no dedo anelar. Ele pegou o anel e colocou então perguntou: —“Leila al Ismail” aceita ser minha para o resto de nossas vidas? — Sim, aceito ser sua, eternamente sua. Com um sorriso matreiro nos lábios ele sussurrou junto ao ouvido dela; — Então agora que estamos conversados já posso realizar suas perversões mais famintas... com uma sonora gargalhada ela lhe cobriu o rosto com beijos e então o mesmo fogo que sempre aqueceu aqueles corpos se emanou naquele quarto levando-os novamente para aquele pequeno oásis onde tudo começou.

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EPÍLOGO Numa tarde fria ao sul da França, em Marcella, Leila ainda estava se recordando dos últimos dias; seu casamento; o casamento de Adonai e a notícia que Adonai e Kamilah teriam mais um filho, aquilo encheu a todos com grande alegria. Ela e Nicholas decidiram tirar uns dias de férias, então vieram para a França, e ali afastados de todos viveram dias maravilhosos, e agora precisavam voltar, e ela já estava sentido falta daquele aconchego encontrado ali naquele cantinho. Quinze minutos haviam se passado, então ela olhou para a pequena haste em sua mão, com uma cruz vermelha na ponta. Aquele símbolo significava “Positivo”. Ela amassou a pequena caixa nas mãos e quase sem acreditar falou para seus próprios ouvidos ouvirem. — Grávida! Estou gravida! E de repente saiu do banheiro gritando pelo Nicholas, ele estava na sala sentado diante da lareira e virou-se ligeiramente para a direção da escada e surpreso foi ao encontro dela. — O que houve para te deixar assim tão exaltada? Perguntou. — Estou... quero dizer estamos... estamos grávidos! Você me ouviu? Teremos um bebê... Ela gritava de exaltação, mas a notícia no primeiro momento deu um grande choque, ele sentiu algo aquecer seu corpo e logo em seguida aquela sensação lhe trouxe uma alegria tão profunda ao coração que ele apenas agradeceu aos céus por ter sido abençoado.

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— Que notícia maravilhosa!!! Você tem certeza sobre isso? Ela balançou a cabeça confirmando. —Você sabe o que isso significa? Perguntou sorrindo a ela. Ela lhe lançou um olhar interrogativo e então ele se aproximou e delicadamente a puxou para junto de si e envolvendo-a com os braços, ele lhe deu um beijo na testa e emocionado respondeu a própria pergunta. — Fomos abençoados. Nosso amor foi coroado. E isso para meu povo é o melhor presente que um casal pode ter. Filhos é a benção de uma família. Agora sim nós teremos nossa família. Não seremos mais você e eu, seremos: nosso filho, você e eu. E eu lhe amo ainda mais, minha querida. Anos atrás, aqui mesmo nesta sala desejei ardente lhe dar um filho, mas vi que seria cruel lhe engravidar de propósito, mas agora não existe mais nenhuma restrição, estou muito feliz. — Eu também. Estou muito feliz...O beijo suave coroou aquele momento. E depois... bem, vocês já podem imaginar o que estes dois amantes fizeram... Afinal não é todo dia que uma tuaregue se casa com um cigano, duas raças nômades, guerreiras e amantes da liberdade, então podem ter certeza, o cigano domou sua potranca, mas no final foi ela é quem deu a última cartada. Como uma autêntica tuaregue, Leila escolheu seu amor, embora desastrada e cheia de vontades, conseguiu colocar seu cigano a seus pés. O amor é assim, meio louco, meio inusitado e frenético. Dizem que os polos diferentes se atraem. Acredito que os polos se igualam, porque para vencer em uma relação é preciso aprender a ceder. E Leila e Nicholas aprenderam esta lição... Fim.

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Obras da mesma autora: Uma noite em teus braços:

Adonai sempre viveu em dois mundos. De um lado, era o homem do deserto, do outro um forte empresário no mundo das pedras preciosas. Com os dois pés neste universo. Sempre se esquivou de relacionamentos, principalmente casamentos. Mas o destino é muito caprichoso, e o que Adonai não podia prever que numa dessas suas escapadas do seu universo divido, ele encontraria alguém que iria lhe tirar todo o seu foco. A visão daquela mulher fez nascer um desejo incontrolável em suas entranhas. E como um predador ávido do deserto, Adonai foi ao encontro daquela visão, sem pensar em consequências atirou-se nessa doce aventura, mas uma surpresa o faria despencar do alto de seus sonhos, a mulher escolhida talvez não fosse a herdeira de seus sonhos, mas sim aquela que o faria conhecer a raiva e a solidão. Ao contrário de Adonai, Kamilah levava uma vida no mais completo anonimato, depois de uma decepção amorosa ela assumiu sua solidão como bandeira para sua sobrevivência. O que ela não esperava, era que no meio do seu caminho fosse encontrar seu maior desafio. Depois de alguns goles de cerveja deixou-se seduzir por um completo estranho na noite que fez sua vida mudar radicalmente. Este homem a levou para conhecer o paraíso, e depois a deixou padecer nas portas do inferno, mudando todo o seu mundo.

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Trecho do próximo livro

Ao toque de um olhar ... Prólogo

Quando cheguei a Great Falls em Montana, tinha apenas dez anos, não sabia da existência desta cidade e tão pouco conhecia a história de meu pai, muito menos imaginava que poderia existir em algum lugar do meu passado a existência de um pai. O pai que nunca conheci e que falecera muito antes de minha mãe supor que estava grávida. Chegamos à pequena cidade para ficarmos apenas um mês, mas um mês se tornou um ano e um ano se tornou dez e quando percebemos já estávamos mais do que enraizados na pequena Great Falls. Muitas coisas na minha vida mudaram depois que viemos viver com meu avô. Antes disso, minha mãe e eu vivíamos mudando de um lado para o outro, sem-muita parada. Infelizmente, ela tinha o dedo podre para a escolha de seus parceiros. Todos, dos quais me lembro, eram sempre violentos e beberrões. Ela vivia com os olhos e os lábios inchados devido aos maus tratos que recebia de seus parceiros. Isso perdurou por toda minha infância até que um belo dia, depois de brigar violentamente com seu parceiro número seis ou sete, ela decidiu fugir, saímos apenas com a roupa do corpo e as economias que ela conseguiu guardar para alguma emergência, como essa. Então, viajamos por uns cinco dias cortando o estado; em algum momento da viagem chegamos a dormir no relento como também alimentávamos apenas nas paradas que encontrávamos pelo caminho. Por incrível que apareça não me encontrava triste, estava aliviada, minha mãe havia tomado uma atitude, finalmente estava cumprindo com a palavra dada a mim tantas vezes. Ao fugirmos descobri um novo sentimento brotar em meu coração, descobri que podia ter esperanças. 127


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Antes de chegarmos ao rancho de meu avô em 1983, morávamos em um pequeno trailer, onde tinha uma divisória de compensado que separava minha pequena cama de minha mãe. Tínhamos um pequeno banheiro que consistia em um vaso sanitário e um chuveiro, não existia um lavatório para lavarmos o rosto e escovar os dentes. Isto? Bem, fazíamos, isto do lado de fora do trailer, no mesmo lugar onde minha mãe lavava a roupa e as panelas. Pensar nisso é deprimente, mas para mim era uma situação normal, minha infância foi em meio a total pobreza. A nossa sala e a nossa cozinha eram o mesmo ambiente; digo isso, porque tínhamos uma pequena mesa que ficava embaixo da janela, a televisão ficava em uma prateleira acima da janela do lado da mesa; em frente à mesa se encontrava o pequeno fogão de duas bocas, além dos poucos talheres e vasilhas, haviam quatro bancos que ficavam em torno da mesa vermelha. Eu odiava a cor daquele trailer, por fora era todo encardido, por causa da ferrugem e por dentro, além da cor vermelha, tinha um revestimento de parede que imitava madeira. No verão, quase morríamos de calor e no inverno, bem, nem preciso dizer, você pode imaginar o quanto era gelado. O aquecedor vivia quebrado, contávamos com as fogueiras externas que Billy fazia para assar seus pedaços desprezíveis de carne. Mas era minha casa, morava ali com minha mãe e de alguma maneira ela queria que aquele lugar fosse legal e habitável. Uma das desvantagens de se morar em uma cidade pequena é justamente não ter onde trabalhar, pois as opções são.... Como posso dizer.... Precárias? Hum! .... Insuportáveis, seria um termo mais adequado para caracterizar o serviço de uma garçonete, auxiliar de cozinha ou mesmo auxiliar de agentes de coleta seletiva; salvo aqueles que resolvem terminar o secundário para se casarem ou nem terminarem, como aconteceu com minha mãe. Ela trabalhava como estoquista em um empório agrícola, o dinheiro não era muito, mas dava para sobrevivermos. Enquanto viajávamos, para passar o tempo, ela me relatava algumas coisas sobre a história de amor que teve com meu pai. E para vocês compreenderem a minha vida terei que lhes contar um pouco do que ela me contou... Ela se casou com meu pai aos dezesseis anos, ele era, três anos mais velho que ela. Conheceram-se na infância, a paixão nasceu mutuamente. Ela me

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contou entre lágrimas que adorava os domingos, pois era o momento de vê-lo na igreja, ela fazia parte do coral, e do altar ficava olhando para ele. O menino de cabelos vermelhos e o rosto cor de ferrugem. Os olhos pareciam duas grandes esmeraldas de tão verdes que eram, ela ficava hipnotizada cada vez que ele a olhava. Essas características peculiares dele foram passadas para mim; filho de um rancheiro, criador de cavalos, morava em uma grande propriedade, embora, fosse uma família abastada da pequena cidade, eles não eram arrogantes e muito menos orgulhosos, tratavam a todos com muito carinho e respeito. O tempo foi passando, e a aproximação entre eles foi inevitável, viviam juntos, faziam tudo juntos, e num final de tarde, depois de cavalgarem, acabaram cedendo à vontade e a curiosidade, dando vazão ao desejo, e uma vez só não era o bastante para quem estava com os hormônios à flor da pele. Com isso, não demorou muito para os planos de meus avós irem por água baixo, duas famílias extremamente recatadas e religiosas não podiam deixar os dois jovens se amando pelas pradarias e cachoeiras, não houve jeito, tiveram que fazer o casamento dos dois jovens adolescentes. Meu pai era um proeminente caubói, aprendera montar ainda na tenra idade, o que fez jus a sua ascensão profissional, tornou-se um dos mais jovens campeões de rodeio pelo estado de Montana. Mas sua destreza e seus vários prêmios não o impediram de cair violentamente no alambrado e diante de centenas de olhos partira dessa vida deixando minha mãe sozinha. A partir daquele momento nada mais foi perfeito. A dor foi tão grande que ela juntou seus pertences e foi se embora de Great Falls para nunca mais voltar. Três meses depois de sua partida se descobriu grávida, numa tarde fria do mês de dezembro cheguei ao mundo. E agora estávamos juntas rumo a sua cidade natal onde tudo começou. No final da tarde de junho, chegamos em Great Falls, não descemos na cidade, descemos alguns quilômetros antes, na estrada que dava acesso ao rancho de meu avô, receosa, minha mãe caminhava em silêncio, suas passadas fortes pelo chão empoeirado da estrada durou uns quinze minutos, ou talvez mais um pouco, quando já estava preste a lhe dizer que estava cansada avistei uma casa enorme de madeira sobre uma grande rocha arredondada, a casa era acolhedora, porém, parecia que estava abandonada. As janelas estavam empoeiradas e alguns vidros quebrados, a porta também estava fora do lugar, à

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impressão que se tinha era que alguém chutara a porta com toda violência do mundo, um arrepio percorreu meu corpo. Acreditei muito cedo na palavra esperança. Apertei a mão de minha mãe demonstrando meu pavor, porém ela se manteve firme, e sorriu para me dar conforto, então ela chamou pelo nome que supus ser de meu avô: — Mitchel! Mitchel! - Minha mãe chamou mais alto enquanto seguia o entorno da casa. — Ei Mitchel! Onde você está? — Quem chama? Eu... – Em nossa frente estava um velho sisudo e desconfiado olhando em direção a minha mãe. A impressão que tive que ele não acreditava no que seus os olhos estavam vendo, mas depois de alguns instantes de hesitação, ele percebeu que a mulher à sua frente era a viúva de seu filho. Então com uma voz grave e rabugenta perguntou com aspereza: — O que é que você quer por aqui? Meu coração disparou. Minha mãe também tremia, então, ela olhou para o homem de tez pálida, seu olhar era melancólico e profundamente desbotado, cabelos brancos e feições amarrotadas. Eu o olhei com receio, estava vestido com um macacão jeans, e uma camisa xadrez, seu chapéu estava amassado e muito empoeirado, trazia um cigarro na boca, e nenhuma paciência no olhar. — Mitchel, me perdoe por aparecer assim sem avisar.... Eu.... Eu não tinha para onde ir.... Pensei em você, não está me reconhecendo???? - O velho nos olhava, com desconfiança, porém minha mãe continuava: — Sou eu. Audrey.... Não está me reconhecendo? -O velho levou um tempo para responder, ainda nos observando quase desacreditando no que via, então depois de uns minutos de suspense ele respondeu inquisidoramente a minha mãe: — Audrey. Depois deste tempo todo de ausência. Não quero acreditar, que você resolveu aparecer do nada em minha casa. Mas meus olhos estão me mostrando.... É você mesmo.... Por onde você andou? Por que você foi embora? Sua dor não era menos ou mais que a minha? Eu perdi meu único filho, minha dor ainda está aqui - ele bateu no peito com força -, estou ainda mais dilacerado com o passar dos anos. Você foi muito egoísta ao partir. Fiquei muito magoado com sua atitude. Mas agora que está aqui, não sei o que lhe dizer. As coisas por aqui ficaram muito ruins depois que Charlie se

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foi... E depois teve a Charlotte, ela não suportou ver minha dor e a minha bebida e como você partiu sem dizer nada.... Agora ela está casada com outro morando no Canadá. Ele concluiu, enquanto me olhava, me analisando. Então algo nos olhos dele iluminou e ele perguntou quase que em desespero por ouvir a resposta. — Quem é esta menina? Não vai me dizer que ela é sua filha? Minha mãe olhou para ele e depois olhou para mim, e em seguida lhe respondeu: — Ela é nossa Mitchel. Ela é filha de Charlie. — Filha de Charlie, mas como? Você não nos disse nada. Você estava grávida e ficou em silêncio, talvez se tivesse dito a história poderia ter sido diferente para todos nós. Foi-se e a levou de nós? Por quê? E agora aparece assim. O que você ainda quer de mim? Já não tenho riqueza, nem sou mais o grande criador de cavalos. Olha a sua volta, está tudo destruído. Não tenho força para tocar a propriedade, e que dirá mantê-la aqui. Ele olhou para ela não com raiva, mas com muita mágoa, e com certeza ao olhá-la no rosto viu os hematomas no canto dos olhos e no queixo. — É muito complicado. Não fique zangado comigo e nem me condene pelo meu silêncio, eu também... só fui saber que estava grávida um tempo depois que parti. Depois não pude voltar, porquê nunca tinha dinheiro o suficiente. — E agora você tem? Agora? Depois destes anos todos, você me aparece aqui desfigurada com uma menina que eu nem sei se posso realmente ter certeza que é minha neta. Você sabe o que está me pedindo Audrey? Explodiu o velho. — Perdoe-me, jamais quis magoar você ou qualquer outra pessoa na minha vida, mas como você também fui condenada, também fiquei semCharlie, também perdi o sentido da minha vida até que descobri que carregava em meu ventre um pedaço da única pessoa que me fez feliz. Aquelas palavras devem ter sido um murro no estomago do meu avô, pois ele ficou mais pálido e com o chapéu em torno das mãos tremulas se dirigiu a mim: — Como é seu nome menina? Ele me perguntou ainda com aspereza na voz e eu lhe respondi: — Meu nome é Charlie Robson.

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— Charlie? Mas isso é inapropriado para uma menina. — Na verdade meu nome é Charlotte, mas minha mãe me chama de Charlie desde pequena. Ele sorriu, de repente aquele velho rabugento transformou a face amarrotada em um sorriso quase igual ao meu. E eu amei aquele sorriso. — Qual a sua idade Charlie? — Tenho 10 anos. — Também chamávamos sua avó de Charlie. É... Gostei muito de seu nome. E desamarrando os entraves do primeiro encontro com minha mãe, ele relaxou e estendeu as mãos em direção à porta de entrada da casa. — Venham. Vocês devem estar exaustas. Audrey; não sei quais são os seus planos para o futuro, se é que você tenha feito algum, mas quero que saiba que aqui é seu lugar, sempre foi, fique quanto tempo quiser. A casa não está muito bem, depois que Charlie partiu, desgostei de tudo. Vendi os cavalos. Minha mulher foi embora... Bom.... Enfim, chega de histórias. Vamos! Venham.... Podem ficar no quarto que foi de Charlie, acho que é o único lugar da casa que ainda está intacto. E foi assim que tudo começou... Os anos passaram. Em pouco tempo minha mãe fez com que a casa se tornasse habitável novamente, um mês depois de nossa chegada, ela já havia arrumado emprego na cidade e eu havia me matriculado na escola. Na medida em que crescia ia fazendo amigos e me tornando popular entre eles, meu avô aos poucos foi adquirido confiança e com a ajuda de alguns amigos voltou a criar cavalos meses depois de nossa chegada minha mãe encontrou-se com Greg, ele era o xerife da cidade, os dois começaram um relacionamento tão logo já estavam morando juntos, meu avô o conhecia, a chegada de Greg no rancho foi algo muito positivo pois, ele tornou-se um forte aliado de meu avô na criação dos cavalos, então fui para o ensino secundário. Já no primeiro dia de aula conheci Demétrius, o arremessador de ouro do nosso time de beisebol. Durante meses curti uma paixão secreta por ele, até que um dia ele me viu na equipe de torcida. E secretamente começamos a trocar torpedos e logo em seguida já estávamos cavalgando pelas planícies de nossas terras. Como eu, ele adorava cavalgar, por ele teria se tornado um caubói, mas seu pai não permitiu, queria que ele fosse um político. Mas enquanto isso não acontecia

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aproveitávamos o nosso tempo. O tempo que passou muito depressa, então veio à formatura e consequentemente a vaga tão sonhada em Harvard saiu para Demétrius, ele ficou maravilhado com a sorte que teve, posso dizer que nunca tinha visto tanto entusiasmo assim, que acabei aceitando seu convite para ir ao baile de formatura, se eu soubesse tudo que iria acontecer depois daquele dia jamais teria aceitado seu convite. Na noite da formatura, depois de alguns ponches batizados com vodca, não resisti aos seus apelos e me entreguei, sem-nenhuma reserva, semnenhum encantamento deixei me levar. Entreguei minha virgindade em uma bandeja de prata bem embaixo do palco, encostada na parede dura e áspera, com um barulho ensurdecedor da música. Sem romance, sem-luz de vela, semchampanhe, mas estávamos bem, estávamos apaixonados, apaixonados? Não! Corrigindo: Eu estava apaixonada. Eu sabia o que estava fazendo. E ele? Bem... Depois de me deixar em casa, todo constrangido por termos ido além do necessário, ele me beijou apressadamente e saiu quase que correndo de perto da minha casa, mais tarde um torpedo de agradecimento surgiu em meu celular: “Obrigado Charlie, nunca vou esquecer essa noite”. Apenas um beijo e nenhum adeus. Partiu sem fazer promessas. Não chorei, não me desesperei, porém, fiquei realmente arrasada, quando descobri que a nossa noite havia me deixado grávida, não por mim, mas por aquela criança que não tinha sido planejada, não tinha sido amada. E nem esperada. Gerada por dois adolescentes sem juízo e com grandes sonhos para o futuro, um futuro pelo qual não havia lugar para aquele pequeno ser. Fiquei desorientada no princípio, aquela novidade me tirou o chão e pela primeira vez na vida pude avaliar os sentimentos de minha mãe ao se deparar, grávida de mim. Decidi procurar por ele, mas vão consegui comunicar-me. Tentei falar com o pai dele, também não tive nenhum sucesso. Depois daquela noite de formatura, nunca mais o vi e tão pouco tive notícias. Por conta disso, minha família tomou todas as providências a respeito de minha gravidez, decidiram que eu deveria ter o bebê, decidiram que eu me afastaria da escola até ele nascer e depois retornaria para meus estudos, noites exaustivas de conversas e preparação, então numa noite fria, estava eu sentada em frente à lareira da grande sala, meu avô sentado em sua poltrona de costume, olhou para mim e

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me fez prometer que jamais deveria dizer a alguém quem era o pai de meu bebê, este segredo estaria solenemente guardado dentro daquela sala. Assim, ainda duvidando da minha própria vontade, prometi ao meu avô que teria meu filho e que continuaria com meus estudos, mesmo sem ter certeza do que realmente queria, cumpri com minha palavra. Anos mais tarde, depois de formada, comecei a trabalhar para um escritório na Califórnia, então numa tarde de correria entre departamentos e cartórios eu vi Demétrius, eu o reconheci quase que imediatamente, ele estava acompanhado de uma morena estonteante entrando na sala ao lado de onde eu estava, pela primeira vez na minha vida senti-me pequena, escondi-me, e fiquei observando no homem que ele havia se transformado, ele mantinha o mesmo rosto da adolescência, porém os traços agora eram mais fortes e definidos, estava mais forte, sua aparência era notadamente a de um homem decidido e de sucesso, ele emanava uma força que fazia qualquer mulher rastejar aos pés dele. Fiquei imaginando inúmeras coisas, mas aí o vi sorrindo, e vi quando ele colocou a mão estrategicamente nas pernas da acompanhante, vi bem a mesma malícia que me seduziu anos atrás. Quis morrer, foi muito dolorido vê-lo se derretendo com outra. Então, depois de tantos anos, pela primeira vez chorei por causa daquele homem, coloquei para fora toda minha raiva, minhas mágoas. Lágrimas quentes lavaram meu rosto. “Como fui tola e inocente. Como pude imaginar que entre nós havia amor.... Acreditei nas palavras de Demétrius cegamente. E tudo que ele fez, foi apenas um jogo de sedução. Um jogo sujo e cruel”. Fiquei assim por um tempo, mais tarde depois de secar minhas lágrimas decidi que precisava voltar para a casa, aquela cidade se tornara insuportável, o ar me sufocava, o brilho me ofuscava, o ar me lembrava do perfume da mulher que ocupava um lugar que poderia ser meu. Precisava voltar. Afinal, minha família estava em casa esperando por mim, e meu filho também, embora não o tenha criado, minha mãe e meu avô cuidaram da educação dele e desde a tenra idade sempre o fizeram saber da importância de minha existência na vida dele. Então, todas as férias, todos os feriados, meu destino era Montana para ficar junto de meu bebê. Desde pequeno, meu filho sempre foi muito amoroso e meigo, sempre se dirigiu a mim por mãe, isso

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sempre me fez muito feliz. Talvez, a existência de meu filho tenha sido a razão de meu empenho na área profissional e também pessoal. Então, decidida a ir para casa fui para o aeroporto de Sacramento. Já estava no saguão de embarque, quando fui surpreendida por Edmund S’inclair, ofegante ele veio até mim e me impediu de embarcar. — Charlotte! Graças a Deus te encontrei. — Edmund? O que faz aqui? Você não havia embarcado para o Caribe? — Eu ia, porém, resolvi ligar para seu escritório então me disseram que você estava partindo. Eu não poderia deixar você partir sem antes lhe dizer o que preciso. Por favor, ouça-me e se você ainda achar que precisa ir embora. Eu vou entender, mas não deixarei de lutar por você. — Edmund... Não seja precipitado, você tem seus compromissos com o País, sei que você ama o que faz... — Mas amo muito mais você. E se para ficar com você é preciso desistir de meus sonhos, eu declaro a ti neste instante que desisto em nome do amor que lhe tenho. Abro mão de minha carreira militar, mas por favor não vá, quero ficar com você, quero ser seu marido. — Edmund... Eu.... Não sei o que dizer. Você me pegou de surpresa. Eu... — Não diga nada. Apenas aceite. Charlotte Robson aceita ser minha esposa para que eu possa te amar e te respeitar, na alegria e na tristeza, na saúde e na doença, todos os dias de minha vida. Olhei para aqueles olhos profundos, aquele rosto marcado por um vinco no meio da testa e então olhei para suas mãos. Alguns segundos ou um pouco mais que isso, me fez pensar naquela situação. O que significava viver com Edmund? Ele sempre foi tudo aquilo que nunca pensei em ter. Melhor dizendo, pensei em ter sim, mas com outra pessoa, de amigo querido se tornou o melhor dos amantes. O conheci no final da faculdade, ele ainda era um jovem “aspirante-oficial” da Força Aérea, tinha o porte atlético, braços e pernas bem torneadas por músculos firmes, não era muito alto, tinha menos de 1,80m. Louro e de olhos escuros, tez muito clara, tão clara que o sol não o bronzeava o deixava vermelho igual a um tomate, mas Edmund possuía uma qualidade

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que eu amava, aqueles olhos negros que me olhavam profundamente cada vez que me encontrava transmitiam paz, segurança e confiança, três qualidades que meu avô sempre me dizia que devia encontrar nas pessoas, as outras coisas seriam complementos, mas a principal era a honestidade. E Edmund era muito honesto em tudo que fazia. Quando ele chegou em mim no aeroporto, pensei que estivesse brincando, então, ele me mostrou o anel, fiquei sem respirar por segundos.... Quanto tempo, estávamos juntos? Não conseguia me lembrar, nunca falamos de namoro e muito menos de formalizar nossa relação. Ali estava ele emocionado e com os olhos marejados me pedindo em casamento. Respirei profundamente ante aquela decisão. Pensei em Demétrius e vi que ele era um sonho de adolescente que não voltaria jamais. Pensei no meu filho e em meu avô, o sonho dele era que eu tivesse uma família. Que eu tivesse um marido para cuidar de mim, e outros filhos para encher aquele rancho de alegria. Coitadinho de meu avô, ele sempre quis a minha felicidade. Olhei para aqueles olhos negros, profundos como a noite e as minhas dúvidas se dissiparam no momento em que aquele meio sorriso me aqueceu. — Sim! Eu me caso com você. Aceitei o pedido. E dias depois, estávamos no rancho em Montana oficializando meu sim diante de minha família e da família de Edmund, foram os meses mais felizes de minha vida, mas nada é para sempre, antes do natal viajamos para a Europa, e depois de um logo passeio pelas ruas de Andaluzia, fomos surpreendidos com um telefonema na noite, novamente fora convocado para o Afeganistão. Já tinha um tempo que ele vinha se esquivando de voltar para aquele inferno, mas não tinha como mudar as decisões de seus superiores. Então, voltamos para casa. Ele arrumou seus pertences em um grande saco de viagem tipicamente usado pelos militares e com o sorriso mais lindo pediu para eu não me preocupar com nada, que mesmo distante estaria cuidando de mim, fizemos amor até de madrugada, ainda estava sonolenta quando ele me beijou e fechou a porta do quarto para não mais voltar. Uma de suas missões tirou-o de mim para sempre. Agora, como forma de agradecimento preciso tirar Brian da enrascada que entrou. Para minha surpresa terei que enfrentar meu passado mais uma vez. O promotor que está conduzindo o processo é nada mais, nada menos que

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Demétrius Ballinderry. Vou vê-lo frente a frente, antes de voltar definitivamente para casa, antes de voltar para Great Falls.... Estou tão apreensiva, que nem sei se vou dar conta de ajudar meu cunhado. O meu pensamento está confuso, não sei o que está acontecendo comigo. Já estava claro que ele era apenas um sonho que não se realizou, já estava claro que ele jamais seria o homem da minha vida, porém, meu pensamento me bombardeava com perguntas sem respostas... como será que ele está? Será que se casou com a morena estonteante? O que mais me incomodava nessa história toda foi o afastamento total que ele tivera da minha vida, ele nunca me procurou, nunca quis saber de minha vida, nem ao menos ligou para desejar feliz natal ou mesmo feliz aniversário. Nada... E eu pensei tanto nele, pensei tanto em lhe contar sobre o que houve conosco naquela noite, pensei tanto em lhe falar sobre Kaleb, o quanto ele é parecido com ele, mas nunca pude dizer nada, e agora, iria olhar nos olhos azuis dele e tratá-lo com a mesma indiferença que fui tratada, será que terei forças? E se ele me reconhecer o que farei? Meu coração está na goela. Em menos de seis horas estarei diante dele. Preciso ir dormir e deixar as coisas rolarem, já repassei os documentos, já estudei as possibilidades de defesa, já fiz minhas anotações, já pensei nas possibilidades de acordo. E escolhi minhas roupas umas duzentas vezes, sei conseguir decidir qual ficará melhor em mim. No fundo eu sei que quero impressiona-lo. Sei que no momento em que eu entrar naquela sala, tudo poderá mudar em minha vida novamente. Agora, é ver no que vai dar...

Capítulo 1 Demétrius e Aleska

Já passava da meia-noite, quando Demétrius saiu do pequeno pub da rua quase escura de Glen Park em San Francisco, seus pensamentos escorregavam pelas curvas sensuais de Aleska; não gostava de pensar nela, mas naquela noite chuvosa, era a única coisa que lhe perturbava a alma, mas para sua frustração nada

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disso havia acontecido, então depois de algumas doses de uísque decidiu ir embora. Desceu o quarteirão da rua do pub às pressas, neste momento um arrependimento lhe ocorreu à mente, estava sem seu veículo. Era assim, todas às vezes que ia se encontrar com Aleska, caminhando há mais de dez minutos na avenida deserta, eis que a sorte lhe enviou um taxi. Ele deu o sinal para parar; ao abrir a porta sentiu a temperatura morna do interior do veículo, entrou apressadamente. Após um segundo de silêncio disse ao motorista: — Westwood Park, rua Eastwood, 5210. Por favor. - Demétrius falou com seu timbre baixo e firme. O motorista olhou pelo retrovisor e observou o homem que estava sentado na poltrona de atrás. — Ok. O carro começou a trafegar pelo bulevar Montrey em questão de minutos, logo estaria em sua casa para tomar um banho e dormir e deixar de vez Aleska para trás e dar um novo sentido para sua vida. Desde que chegara a San Francisco, Demétrius se entregara ao trabalho por inteiro, até se deparar com Aleska, em um dos corredores da corte superior do município de San Francisco, estava cuidando de um caso complexo de estupro quando a viu passar igual uma brisa suave em uma manhã de outono, foi atração instantânea, ela olhou para ele e sorriu. Seu coração aqueceu, e pela primeira vez desde que saíra de Montana, se viu atraído por uma mulher do mesmo naipe de Charlie, internamente se questionou se não fosse o excesso de trabalho que o estava perturbando ou quem sabe o velho remorso batendo em sua consciência novamente, mas vislumbrar aquela mulher vestida em um tailleur preto com uma camisa branca colada ao corpo foi realmente a melhor coisa que lhe aconteceu em anos depois de Charlie Robson. Quando o taxi o deixou em frente à sua casa, ele caminhou cabisbaixo até o portão, procurando a chave no bolso do

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sobretudo, ele percebeu que estava tenso e mal humorado, por causa do bolo que Aleska lhe deu, pensou em arrumar uma companhia qualquer, mas um homem na posição dele não podia se dar ao luxo de se misturar aos homens normais, afinal, era um promotor público que estava em vias de ser indicado para a procuradoria, a política e a pressão que vinha sofrendo nos últimos meses o estava deixando com os nervos à flor da pele, afinal não era muito comum um jovem homem ser indicado tão precocemente a uma cadeira da magnitude que era ser um procurador estadual. Desde sua indicação ao cargo de promotor na Divisão Criminal do Departamento de Justiça da Califórnia, não pensava tanto em sua carreira como agora, em pouco tempo de serviço na divisão seu nome passou a ser respeitado como nenhum outro, com inúmeras investigações apuradas e inúmeros processos ganhos o fizeram despontar na Associação dos Magistrados da Califórnia, então em meio a essa corrida frenética de trabalho surgiu Aleska, uma mulher forte e muito sensual, que circulava em meio a todos, desde o mais pobre dos réus aos grandes magnatas de San Francisco. O sexo entre Demétrius e Aleska era selvagem e semqualquer sentimento ou pudor. Uma válvula de escape para os dois, não havia compromisso, nem de jantares e muito menos flores. Era apenas sexo por sexo, uma troca favorável e secreta entre uma jovem advogada e um promotor da Divisão Criminal. Ela era estonteante, com quase um metro e vinte de pernas, sem esforço nenhum conseguia mexer com a libido de qualquer pessoa que a olhasse, cabelos castanhos claros, tez morena e olhos de um verde oceano incrivelmente claros. Ela fazia mais o gênero “femme fatale” do que uma mulher séria do meio jurídico; era impossível não ceder aos caprichos profanos daquela mente quase perversa na intimidade, e desde que os dois começaram a se encontrar secretamente, a selvageria e a

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obscenidade de seus encontros só aumentavam a cada dia; era difícil de acreditar que duas pessoas centradas como os dois, fossem tão insanos em matéria de sexo. Mas agora, depois de tanto tempo, ele sentia um gosto amargo em sua boca, o relacionamento deles já estava cansando-o, os encontros furtivos, as viagens e as madrugadas já estavam perdendo a graça, e de repente em uma tarde, depois de uma audiência lhe ocorreu que Aleska estava apenas usando do prestigio dele para se promover; uma situação perturbadora que estava ganhando uma proporção muito maior que o trabalho que havia realizado até o presente momento. Naquela tarde, depois de uma audiência exaustiva, do nada, ele decidiu que era hora de acabar. Então, em meio a uma audiência e outra, conseguiu deixar um recado em sua caixa postal, mas ela não foi ao encontro e não atendeu a nenhuma de suas chamadas. — Demétrius - Uma voz atrás do pequeno arbusto chamou sua atenção, virou-se para ver quem era e então se deparou com os olhos verdes de Aleska. — Você por aqui? - Ele respondeu surpreso e apressadamente olhou em torno das imediações para ver se não havia ninguém os observando. — Vi seu recado agora a noite. Mas meu celular ficou sem bateria. – Ela falou sensualmente, depois percebeu que ele olhava pelas imediações, continuou convidativa: — Não se preocupe. Neste frio, as pessoas querem mais é estar no aconchego de casa ou quem sabe em um quarto. Sorriu languidamente. — Vamos entrar. Ignorando a afirmação dela. — Não lhe disse para nunca vir a minha casa. Finalizou olhando para Aleska. Ela o olhou profundamente e então entrou pelo corredor amplo da sala em granito claro daquela casa, colocou sua bolsa sob um amparador ao lado de uma porta, e atravessou o espaço até o pequeno bar localizado em um dos cantos daquela bela sala, servindo-se de uma bebida, o pequeno copo de uísque brilhava na penumbra, voltou-se para ele e observando-o disse em tom firme:

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— Eu sei o que combinamos. Mas preciso de sua ajuda, estou em um caso que está demandando uma investigação complexa, e confesso, não tenho meios e nem ferramentas para descobrir o que está acontecendo com minha cliente. E também não estou muito afim de me queimar com os meus sócios. — Mais um daqueles casos mirabolantes entre seu sócio e companhia limitada? — Mais ou menos. Vou ser direta com você. - Disse sem rodeios, enquanto sentava-se de maneira a se impor sua presença naquele ambiente. — Estou falando em trocas de influências, manipulação de provas entre outras, vistas grossas para determinados processos. — E de quem se trata? - Perguntou sério. — Juíza Kimberley e o meu sócio Tony Reids. - Demétrius sentiu seu estômago revirar, ele já havia ouvido alguma coisa a respeito, mas eram apenas suposições, boatos de corredor. — Não acredito no que eu acabei de ouvir. - Falou com voz grave. —Isso é muito sério. — Isso mesmo que você acabou de ouvir. Depois de uma reunião entre os meus sócios fui designada para representar e consequentemente defender os direitos da Juíza Kimberly, mas o problema que na medida em que fui apurando os fatos percebi que fui envolvida de propósito em suas artimanhas, e agora estou enrolada até o pescoço. — Em suma. Ela é culpada, mas você terá que fazer vistas grossas sobre isso e provar ao Estado o contrário. — É mais ou menos isso. — Entendo o que isso significa, mas não sei onde você quer chegar com essa conversa. Há muitos meios de deixar outro assumir seu lugar. O escritório de Tony tem outros advogados de nomes tão bons quanto o seu. — Não é tão simples assim. Estou de certa forma à mercê deles. - Ela deu uma pausa avaliando a expressão de Demétrius, e

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prosseguiu: — Ela sabe de nós dois, e também tem conhecimento do seu interesse pela procuradoria do Estado. E como você está para ser indicado .... - Tomou mais um gole do uísque. — Não tenho meios de sair fora dessa situação, sem-que haja um saldo negativo para alguém. – Demétrius a olhou avaliando a conversa e seu instinto investigativo lhe deixou claro que ali havia algo muito maior que aquela simples consideração pelo seu destino como mero procurador do Estado. Ela estava tentando manipulá-lo, e ele não gostava disso, entre o desejo de ser procurador ou a lealdade para com seu trabalho, ele sem dúvida nenhuma ficaria com seu trabalho, entre ser exposto ou ser manipulado, ele preferia ser exposto, afinal, tinha muito mais a perder como alguém suscetível a manipulação do que alguém que de vez em quando fica com a advogada mais gostosa de San Francisco. Uma raiva crescente em seu interior pedia para ter cautela e muita frieza. Ele duvidou daquele cenário que ela estava pintando, parecia tão montado quanto o relacionamento deles. Ele nunca se preocupou com a clandestinidade dos seus encontros, ainda mais com Aleska, mas também não gostava da ideia de saber que andavam futricando sua vida intima pelos corredores do judiciário. Ele respirou profundamente e sorveu um pouco do líquido amarelo âmbar do copo de cristal que estava bem na sua frente nas mãos daquela mulher diabólica. Sem emoção nenhuma; frio como gelo ele argumentou: — Nunca me preocupei com o fato de alguém saber sobre o nosso envolvimento, aliás no início eu queria que fossemos um casal, mas você com seus jogos, sempre se esquivou, até que eu percebi que não era importante que nossa relação fosse de conhecimento das pessoas. – Caminhando pela sala, ele sentou-se em uma das poltronas em frente Aleska ela o fitou com curiosidade, ele parecia um tigre caminhando lentamente em seu próprio território, com uma voz mais controlada ele continuou: — Então, estou aqui pensando, se eles sabem de nossos encontros

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furtivos, alguém muito chegado a eles teve a liberdade de falar sobre nós. E antes que eu tire qualquer conclusão sobre este assunto. Eu lhe pergunto quem mais poderia dizer sobre nós que não fosse você própria. - Antes de ouvir a resposta prosseguiu. — E o que a minha indicação ao cargo tem a ver com o caso em questão? Isso é muito ingênuo e ao mesmo tempo temerário. Essa investigação não tem nada a ver comigo, nunca tive qualquer relacionamento direto com a juíza Kimberly, então não vejo aonde você quer chegar ou qual o meu grau de participação nos meios escusos de Kimberly. - Ela olhou para ele tensa, ele a avaliou e prosseguiu: — Até onde sei, a juíza Kimberly sempre julga sessões litigiosas, uma área totalmente ao contrário do que eu lido em meu departamento. Não estamos vinculados. E mesmo que se tivéssemos, sou do lado do que é certo, doa a quem doer não me preocupo com questões que vão ao contrário daquelas em que eu acredito. - Finalizou com severidade e quase sem paciência para as refutações que ela lhe apresentava. — Você não compreende! - Disse ela áspera. — Muitos dos casos que representei, tanto em seu departamento, quanto na área cível, foram de certa forma beneficiados com a interferência dela. E mesmo que você não tenha estado diretamente ligado a ela, eu estou. E você e eu somos amantes. Isso leva a todos a formularem outras ideias em relação a linha de investigação. Ele ouviu a réplica apresentada em um silêncio mortal; e percebeu que aquela seria uma possibilidade a ser avaliada. Mas afinal? Ela queria o convencer a fazer o que realmente? Olhando para aquele vestido azul, colado ao corpo dela, ele se dividia entre: satisfazer a pressão que sentia abaixo do ventre ou colocá-la para fora de sua casa, mas tentando se controlar, entre a razão e o prazer, ele acabou perdendo a paciência e explodiu, levantando-se da poltrona ele caminhou pela sala com uma série de palavras fortes em sua boca. Pela primeira vez, desde que se conheceram Demétrius se zangou diante de Aleska. Momentaneamente aquilo

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a assustou, mas depois ela retomou seu controle novamente. Ela sabia que ele era duro quando queria, mas não era o tempo todo, ele explodia, mas logo voltava ao seu estado normal frio e cauteloso. — Que droga! Aleska! - Levando a mão até a cabeça e enquanto tentava controlar sua explosão, soltava o nó da gravata e abria a camisa com uma violência aparente. Continuou a esbravejar: — Você não tem ideia do que passa na minha cabeça neste exato momento. As coisas insanas que me ocorrem fazer neste exato momento com este vestido azul sobre o seu corpo. Eu não sou de ferro! E nem sou um santo! - um silêncio mortal caiu pela sala por alguns momentos, então ele respirou fundo e desabafou: — Gostaria muito de mandar você, seu sócio e a juíza para o inferno. Mas já que isso não é possível, estou me linchando para esta investigação. Amanhã verei em qual pé está este lamaçal que você está trazendo para minha vida, mas isso farei só amanhã, depois que eu resolver os meus problemas e já lhe adianto não vou segurar nada. Não pense você que estou preocupado com minha indicação a procuradoria, este é um item que virá a mim naturalmente. Não irei cavar minha sepultura para subir um degrau que seja na minha profissão. Ele concluiu ainda revoltado. Ela sorriu maliciosamente de modo bem significativo, de algum modo que ele não sabia explicar, ela havia conseguido êxito na sua visita. — Bom, estou vendo que você está cansado, e de mal humor. Vou deixá-lo e amanhã nos veremos em seu escritório. Disse ela com uma falsa preocupação estampada no rosto moreno. Ele olhou para o decote proeminente e pensou “por que não tirar este vestido agora? Ela está se oferecendo, vejo isso, tudo nela é obsceno, por que não aproveitar para acalmar minha raiva e me deliciar com ela a noite inteira, como sempre fazemos. ” — Termine seu cowboy. Disse ele aproximando-se dela. — Você quer que eu fique? Ela sussurrou.

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— Não queria. - Ele respondeu grosseiramente. Mas agora que você está aqui, me deu outras ideias. - Ele já estava diante dela contornando seu vestido com uma mão e enfiando a outra nos cabelos de Aleska, juntando uma porção considerável de cabelos ele a puxou forçando-a a oferecer seus lábios a ele. —Não sei como você consegue. - Aleska o empurrou e saiu caminhando até o aparador para pegar sua bolsa, então ele a puxou pelos braços e a prendeu contra a parede, e com um olhar diabólico ele massacrou seus lábios nos dela, deu-lhe um beijo bruto, sem emoção, com raiva. Com um sorriso malévolo Aleska correspondeu aos apelos velados do olhar dele. Entre os dois, o sexo não era normal, era profano, sujo e pecaminoso. Eles conseguiam ultrapassar a barreira da normalidade e caminhavam juntos por uma ladeira de perversões e crueldade na cama. Dominadores por natureza, o choque sempre fora inevitável, ardente e cruel e na maioria das vezes insano. Sem-amor, sem-medo, somente instinto animal. Ruídos de roupas e gemidos se misturavam entre aquelas paredes, ele a apertava com as mãos, enquanto subia-lhe a saia até a cintura e com uma violência já conhecida rasgou-lhe a pequena calcinha, e com apenas uma arremetida a penetrou, sem-culpa, uma respiração mais forte o fez soltar um gemido mais profundo, ele entrou mais forte naquela cavidade, ela tentou se ajeitar para facilitar a penetração, mas ele a imobilizou, ele queria que ela sentisse dor, queria sufocar a tensão que sentia, queria puni-la. E foi assim, por breves e intermináveis segundos, ele entrou e saiu, uma, duas, cinco, perdeu-se a conta; então o ápice estava por vir, ele sentiu aquele calor infernal surgindo entre suas entranhas e seus joelhos amoleceram despejando todo seu líquido quente e viscoso naquele vão. Nem um dos dois se preocupou com a falta do preservativo, naquele momento ele só queria aplacar a raiva que estava sentindo dela.

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— Você é um cretino. Ela dizia entre a respiração ofegante e as trocas de mordidas que davam um no outro. — Nós somos. Cara advogada, nós dois somos. Venha comigo, vou lhe mostrar o restante da casa. Atravessaram um corredor e subiram uma escada com o mesmo tipo de granito claro que viu na entrada da casa, e depois de passar pela porta aberta do escritório, ela viu o enorme quarto, onde uma parede de vidro fumê servia como divisória entre o closet e o toillet. O aroma amadeirado daquele recinto revelava o quão sofisticado Demétrius era. Antes que ela percebesse, ele já estava terminando de tirar-lhe as roupas. Agora sim. Agora ela estava do jeito que ele queria, ele a tocou lentamente por toda extensão dos braços, e a beijou sem-nenhuma gentileza, então a jogou sobre a grande cama coberta pelo cetim negro, ela se espalhou pelo colchão e sorrindo convidativa buscou por ele. Igual a uma gata no cio gemeu. Ele não sentiu pena, mas perversamente sorriu, então disse a ela: — Quero que você se toque para mim. Mostre-me como você faz, quando não está com um homem ao seu lado. Mostre-me seu prazer. — Você está falando sério? - Ela perguntou com falsa surpresa. — Sim. Quero ver como você faz. Quero ficar excitado, enquanto você geme implorando para eu rolar com você novamente. Não seja tímida. Porque isso você não o é. Mostre-me como você pode ser persuasiva. - Uma gargalhada rouca e feminina ecoou naquele quarto, ela adorava quando ele se mostrava assim cafajeste e másculo. Falou quase desdenhando do pedido dele. — Está querendo me subjugar senhor promotor? Ou isso é apenas uma vingança por eu ter vindo me aninhar na sua cama? Ela falou enquanto observava a nudez imperiosa de Demétrius. Seu nome fazia jus, ele parecia com um deus grego, com seus

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quase 2,00 metros de altura, sua masculinidade o tornava maravilhoso. E seus atributos sexuais fazia qualquer mulher se rastejar até ele. Ela gostava dessa faceta de dominador que ele tinha, gostava de ser tratada com aspereza, se sentia desejada, e aquele sentimento a entorpecia. Deixar ele no comando não a subjugava, na verdade a colocava como a verdadeira deusa do sexo. — Chame do que quiser, mas neste momento só o que me importa é te levar para as alturas e depois dormir. - Ele respondeu sorrindo – Ela olhou furtivamente para aquele membro viril, olhou para ele e molhando os lábios com a própria língua começou seu ritual de erotização, ela estava tensa, estava arrepiada, sua pélvis ainda pulsava por causa do sexo que acabara de fazer, estava toda molhada pelo orgasmo de Demétrius, o líquido escorria entre seus dedos, um cheiro forte de sexo pairava no ar e pela primeira vez se viu diante de um desafio arrebatador, pois embora se tocasse com frequência, tocar-se para um homem era a primeira vez que iria fazer. E de repente sentiu-se deslocada, sem graça, mas não deixou se intimidar, era uma mulher forte e como tal deixou ser conduzida para aquele voyeur. Os dedos começaram a passear pelo rosto quente e vermelho e em seguida ela o introduziu na boca, vagarosamente o movimentava como se estivesse chupando algo delicioso, e como uma cascata seus dedos desceram pelo pescoço, até alcançar a ponta do seio direito, apertou-o com delicadeza e com um gemido ela deu uma pequena inclinada com o dorso, continuou a caminhar com os dedos pelo corpo parando suavemente sobre o ventre, gemendo ela abriu as pernas exibindo toda a sua intimidade depilada e seus dedos procurou suavemente seu sexo, ora brincava com os dedos na boca ora massageava um dos seios, ora sua mão descia até o baixo ventre ora brincava com os grandes lábios, até que decidiu introduzir o indicador entre eles. Gemendo, ela se viu totalmente molhada e ao mesmo tempo quente, ela introduzia o dedo na fenda vermelha e retirava, com

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maestria, ela segurou um pequeno ponto duro acima dos lábios, seu broto entumecido pedia por uma língua ávida, mas ela não implorou por isso, novamente introduziu seu indicador pela fenda e retirou, então escorregaram os quatro dedos sob aquele ponto duro e o manipulou, agora gemendo mais alto, falava palavras obscenas para seu interlocutor que estava babando com aquela visão, ele nunca havia visto uma mulher se tocar com tanto desejo até aquele momento, entregue ao seu prazer Aleska continuava a se tocar, e de repente um líquido branco e viscoso descia por entre a cavidade convidativa, molhando a colcha de cetim, ela estava tendo prazer ali bem diante dos olhos dele. Então ele se aproximou de suas pernas abertas e escorregou para dentro dela, um grito ecoou dentro do quarto e ele a socou profundamente. Ela se contorceu pela introdução e ao mesmo tempo o envolveu com suas pernas e braços. Arranhando-lhe as costas, mordendo o torso, o peito, os lábios. A respiração de ambos estava acelerada e entrecortada. Ele sussurrava palavras fortes aos ouvidos dela, ela gemia, correspondendo aos anseios dele. Ele entrava e saia com muito mais vigor. Como se tivessem ligados no automático, ele a virou e a colocou de quatro sobre a cama, quando ele vislumbrou aquele par de nádegas suave e deliciosamente convidativa, ele não pensou duas vezes, lhe agarrou pelos cabelos se introduziu no meio delas ele se projetou urrando bestialidades insanas, dessa vez ele realmente chegou ao seu prazer. Finalmente ele se abastou. Era o que ele estava precisando. Aquele prazer de forma bestial o fez descarregar a pressão dos últimos dias. Então, suado ele saiu de trás dela e dando-lhe uma palmada nas nádegas caiu sobre o colchão ao lado dela. A respiração de ambos estava entrecortada e acelerada. Ele se sentia completo, mas ainda não tinha terminado, queria fechar aquela noite com chave de ouro e era o que ele pretendia fazer. Então, olhando para o rosto vermelho de Aleska, ele se posicionou acima dela e tomou um dos seios, e começou a sugar a ponta entumecida e vermelha, ela já estava o enjeitando,

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mas ele prendeu seus braços sobre o alto da cabeça dela e com uma risadinha rouca sussurrou indecentemente. — Ainda não acabei minha diabinha cruel, ainda quero ver você se derreter mais uma vez. — Você está ficando doido! Não aguento mais nada, você está insaciável, o que significa isso, eu quero... -Ela foi interrompida com um beijo. —Você não está... -E novamente o ciclo de sedução começou só que agora ele estava mais suave, então como um ritual culinário, ele começou a saborear a pele salgada daquela mulher quente que estava derretendo em seus braços. Sorrindo ele a ouviu gemer e sussurrar seu nome. Era isso que ele queria, e beijando-lhe ele ficou sobre ela, e seguiu o mesmo caminho que há poucos instantes ela percorrera com os dedos quando estava se tocando para ele, ele fez o mesmo caminho e chegou até a sua intimidade molhada, o odor forte não o inibiu a fazer-lhe um carinho oral. Era obsceno e erótico colocar a boca naquela pequena cavidade molhada, ela se contorcia, empurrando a cabeleira negra, mas naquele momento ele estava entregue ao prazer de estimulá-la com a língua, e assim chupando seu pequeno ponto entumecido, ele introduzia os dedos na fenda molhada, ela já não o afastava, ela afagava os cabelos dele e gemia, então espasmos sobre o ventre anunciava o prazer terminal, e ela explodiu em um frenesi alucinante, seus pensamentos incoerentes denunciavam a ela que aquele homem tinha realizado sua doce vingança, e ela de bom grado deixou com que ele saboreasse todo o néctar de suas entranhas, sem inibição nenhuma ele a desnudou como nenhum outro homem havia feito, aquilo era quase um flagelo de sua alma. Era desumano, humilhante. Era constrangedor ter consciência do prazer que podia se ter nos braços de um homem viril como aquele. Muito tempo depois. Os dois corpos ainda estavam entrelaçados, misturados entre os lençóis, ela falou quase sem força na voz.

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— Você é um sádico... —Eu sei. Mas você também não está longe, é tão obscena quanto eu. - então sarcasticamente ele enumerou os joguinhos sensuais que cada um gostava de fazer. Ela odiava quando ele fazia aquilo, na verdade antes do sexo ela via aquelas expressões pejorativas como um estímulo, mas depois do sexo, ela se sentia suja. Não havia razão para deixá-lo continuar aquele jogo de palavras contra ela. — Por que você sempre faz isso comigo? Isso é uma falta de respeito muito grande com a minha inteligência, você sabia disso? — Ora, está ofendida nobre colega? Pensei que você gostasse de sexo selvagem, sempre foi assim, por que seria diferente agora? - Ele respondeu sem perceber que ela estava realmente ofendida pelo comportamento dele. — Já lhe ocorreu que nem sempre que estou com você quero ser tratada como objeto! Você nunca pensou que eu também quero ser amada? Ela tentou intimidá-lo. Mas ele não recuou, olhou para ela com as emoções contidas. E falando um pouco mais alto que o habitual ele a rechaçou: — Você? Dra. Aleska! Não! Jamais uma mulher como você quer ser amada. - Ele concluiu e afastando dela sentou-se na beirada da cama, e de costas para ela desabafou: — Entre nós, desde o princípio sempre foi sexo. Você é muito executiva para se render ao amor. No início até pensei em ter um relacionamento sério com você, mas me enganei. Você jamais será uma mulher que ficará em casa esperando pelo marido, ou quem sabe cuidar de filhos. Concluiu levantando-se da cama e indo direto para o banheiro. Ela olhou o dorso torneado dele, e intimamente concordou com o que havia acabado de ouvir. Enquanto ele tomava banho, ela olhou o entorno do quarto, viu uma grande fotografia na parede, uma montanha coberta pela neve, parecia com algum lugar do Canadá, ela ficou curiosa, pois viu que a foto trazia o nome de Charlie Robson na lateral,

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provavelmente o nome do fotógrafo, em outro canto viu outra foto também de mesma proporção era a foto de um grande lago com um rancho ao fundo. Era um lugar rústico, mas de uma beleza singular. Ela se levantou da cama embrulhada no lençol e caminhou até a janela, a noite seguia fria e chuvosa, olhou pela vidraça e viu as luzes da rua, ao virar-se em direção ao toillet, viu a esquerda da porta uma cômoda enorme com umas dez gavetas, em cima dela havia uma sequência de porta retratos, todos de paisagem, exceto uma, era um casal de adolescente. Dois jovens sorridentes perto de um cavalo malhado, ela olhou a foto e viu que o jovem rapaz se parecia com Demétrius, mas a adolescente era ruiva e de olhos cinza bem expressivos, formavam um belo casal, a curiosidade aumentou, quem eram aqueles dois? Demétrius era muito reservado quanto sua vida particular, ele nunca falava de si, e na profissão que exerciam isso era irrelevante. O que realmente contava eram as barganhas que poderiam obter entre um processo e outro. Ele saiu do banho enrolado em uma toalha branca, ela foi ao encontro dele. — Quem são estes na fotografia? - Ela perguntou. — Ninguém importante. - Ele pegou a foto e olhou demoradamente e então colocou novamente sobre a cômoda. — As fotos são maravilhosas. Que lugar é este? — Montana. Onde vivi, antes da universidade. — Montana? Pensei que você fosse californiano. — Tem muitas coisas a meu respeito que você não sabe. — Já pensou que talvez eu queira saber mais sobre você, mas não tenho abertura para isso. — Não tenho nada para dizer sobre minha vida. O que importa você já sabe. Respondeu secamente, depois continuou. — E a propósito? Enquanto você toma seu banho você quer que eu prepare uma bebida ou algo para comer, ou você quer que eu chame um táxi?

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—Vou tomar um banho, não quero comer nada. Pode chamar um táxi. Preciso estar em casa pela manhã. — Ótimo. Então esteja à vontade, vou ligar para a central de táxi. - Ela se dirigiu até o banheiro. E ele foi colocar uma roupa, abriu uma das gavetas e pegou um jeans desbotado. Pegou uma camiseta de algodão branca em outra gaveta. E ao fechá-la, olhou para a foto dos dois adolescentes. Momentaneamente voltou ao dia em que aquela foto foi tirada, e sentiu saudades de Charlie, no que será que ela se transformou? Vinte quatro anos é um tempo muito longo, as pessoas se transformam por inteiro, as aparências não são mais as mesmas, uns engordam, outros envelhecem bem mais que a idade real. Se estiver vivendo ainda em Great Falls deve ser casada e com vários filhos, talvez ela fosse uma professora de jardim de infância cheia de sardas e de óculos com duas tranças vermelhas ladeando o rosto suave. Só de imaginar a cena, ele sentiu um nó no estômago. Uma vida provinciana que ele nunca teve desejo de viver, porém não sabia explicar porque razão sempre se sentia mal, por que razão sentia um vazio profundo quando pensava nessas coisas simples, quando pensava nela. Na noite da formatura, se tornou o mais cretino dos homens, aproveitando-se do sentimento de despedida, ele a seduziu com promessas de amor, Charlie se entregou a ele sem reserva nenhuma, que ridículo, fizeram sexo embaixo do tablado do auditório, enquanto a música tocava; descaradamente se aproveitava do amor de uma adolescente meiga e muito linda, perdidamente apaixonada, se entregou a ele, sem-questionar sobre o futuro, se ofereceu em uma bandeja de prata para ele. Muitas vezes o remorso o corroía por dentro, às vezes ele pensava em procurar por ela. Sentia a necessidade de saber o que havia acontecido depois daquela noite, afinal, ele tinha sido o primeiro homem da vida dela, e ela tinha sido a primeira mulher a lhe dar um orgasmo. “Como será que foi para ela? ” Porém seu

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pensamento o acusou de hipócrita e aproveitador. Este era um dos pecados que ainda não havia se redimido. E agora tinha Aleska, uma mulher que ao contrário da doce Charlie jamais seria a escolhida para ser a mãe de seus filhos. Ela era sem dúvida uma mulher fria e muito previsível, o dom da maternidade não era sua qualidade. Então, antes de sair do quarto para chamar um taxi, ela sai impecavelmente vestida e maquiada do banheiro, era perfeita demais para carregar um filho no ventre, pensou com tristeza. — Tem certeza que não quer dormir comigo? - Ele perguntou sem rodeios. Ela sorriu. — Não. Gosto de dormir sozinha. E como já lhe disse, pela manhã tenho um compromisso em minha casa. — Entendo. Então venha, vamos sair daqui. - Voltaram para a sala e no caminho, Aleska olhou melhor o ambiente. — Sua casa é muito bonita. — Eu também gosto dela. — Nunca pensou em morar com alguém. — Você diz aqui? — Sim. — Não. Desde que mudei para San Francisco, nunca pensei em ter alguém por aqui. — Sério? Então você não pensa em se casar, constituir família, essas coisas que os homens fazem ao chegar a certa idade. — Não pretendo me casar. Não penso em constituir família. Fui criado sozinho, pelo meu pai e a governanta de minha casa, desde que saí de casa para estudar, nunca mais soube o que era ter uma casa ou aconchego de um lar. — Eu também, não pretendo constituir família. Na nossa profissão é complicado demais, e constituir uma família requer dedicação e zelo, duas coisas que não sei se terei competência para realizar. - Ela falou quase como para si mesma. — Seu taxi chegou. - Ele abriu a porta para ela, ela se virou para ele e antes de se despedir lhe deu um beijo.

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— Estar com você é muito bom. Você me faz sentir muito bem. Concluiu séria. — Eu também curti os nossos momentos, mas nada é eterno. - Ele ergueu o queixo dela e olhou para os olhos verdes de Aleska, eles brilhavam, reflexo da noite acalorada que acabaram de ter então lhe deu um beijo suave nos lábios. Em seguida continuou: — Guarde essa noite como uma boa recordação, porque é só isso que teremos, daqui para lá nossa relação será estritamente profissional. - Ele proferiu as palavras em um tom suave, porém firme, já não estava mais alterado como no início, estava calmo, elaborado, estava sendo definitivo, esta era a maior certeza entre eles. Ela o olhou, depois abaixou os olhos para os botões de seu casaco se questionou incrédula: “-Esse cretino está pondo um fim em nossa relação? Assim nessa calma toda? Não acredito!!!!” - Com uma altivez quase extraordinária saiu pela porta e entrou no veículo que estava estacionado em frente da casa dele, e não mais o olhou....

Continua no próximo livro...

Publicação Eletrônica: Clube de Autores Publicações S/A CNPJ: 16.779.786/0001-27 Rua Otto Boehm, 756 Sala 02, América - Joinville/SC, CEP 89201-700.

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