Filmes Feitos à Mão - 4

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GUIA PRÁTICO PARA FAZER SEUS PRÓPRIOS FILMES + CONHEÇA OS FILMES FEITOS EM CONTAGEM

FIlmes Feitos à mão Atenção do olhar na edição do seu fiFIlme



Olá leitor, Já pensou como são feitos os filmes? E que tal fazer um filme? Este livreto vem com dicas simples para te ajudar a fazer o seu próprio filme com o que você tem em mãos. Com o objetivo de incentivar a produção de filmes amadores e independentes, este volume contém dicas sobre como começar a fazer um filme de forma simples, sem dinheiro, sem curso, e até mesmo sem equipamento. Quem não tem um amigo ou parente que possa emprestar uma câmera ou um celular que filma, não é mesmo? Este livreto foi idealizado pelo projeto Cine Sem Churumelas por acreditar na importância da produção audiovisual caseira. É começando a filmar na sua casa e seus amigos que nascem os grandes cineastas. E mesmo para aqueles que não almejam chegar às telonas fazer um filme é uma ótima maneira de compartilhar histórias com amigos e se expressar. Neste volume falaremos da edição! Muitas vezes temos uma quantidade enorme de imagens filmadas ou temos facilidade para filmar, mas editar que é o problema. A edição pode ser demorada mas, acredite, vale muito a pena aquele tempão que você usa montando. No final desse processo o filme estará prontinho para ser visto pelo mundo. Não desista agora, essa é a última etapa! Neste volume apresentamos dicas e sugestões de edição de um filme e mais alguns elementos técnicos comuns na montagem. Também conta com uma entrevista com Raquel Maia, cineasta e artista que compartilha um pouco sobre seu processo de criação e mais alguns toques de edição. A equipe 2016


Começando edi Edição ou montagem é a última parte da produção de um filme! É o momento em que, de tudo o que foi filmado, você irá selecionar o que fará parte do seu filme de fato, e a partir daí, fazer a sua edição. Se preferir pode envolver outras pessoas para te ajudar. Em seguida daremos algumas dicas que podem te auxiliar nessa fase:


t ar um filme! 1° Descarregue todo o material gravado em um computador. 2° Assista todo o material e veja o que pode servir. 3º Escolha um programa de edição de vídeo. Alguns computadores já tem um instalado junto com o sistema operacional, ou se preferir escolha um e baixe pela internet, mas, tome cuidado, alguns programas gratuitos deixam uma marca d’água no seu filme. 4° Coloque os vídeos e todos os arquivos que farão parte do filme no programa de edição que você escolheu. Eles ficarão na Linha do Tempo. 5° Na linha do tempo dentro do programa, escolha os trechos que você quer que apareça através da ferramenta ‘’cortar’’. Lembre-se que um trecho sempre terá relação com o(s) outro(s), por isso fique atento às suas escolhas e dê bastante atenção à sua proposta. 6° Verifique se o áudio está bom, se for preciso, insira outras camadas de áudio que você gravou. 7° Coloque o título no início do filme, também pode colocar alguma referência de data, como o ano. No final insira os créditos com o seu nome e de todos os que participaram do filme.


Entendendo a Montagem! A montagem é uma parte muito importante na produção audiovisual. Ela é, sobretudo, um processo criador de sentido. A edição de um filme não pode ser usada somente como um procedimento técnico de junção de planos, cenas e sequências, com o único objetivo de traduzir o que você planejou no roteiro. É, sobretudo, aqui que você vai organizar o material gravado e definir a estrutura narrativa do seu filme, fazendo um jogo que irá misturar imagens e sons. Através da montagem será possível passar uma ideia, ou mesmo aumentar o impacto da ideia ou sentimento que você quer que o espectador sinta ou perceba, dando aquele toque de suspense, comédia, calma, euforia, tristeza, revolta, simpatia, e tantas outras. A montagem pode ajudar, e muito, que seu filme alcance esse objetivo! Ela é tão especial assim porque é uma ferramenta que te permite mostrar como você enxerga o mundo e a importância que você dá para certas coisas. Além disso, através da montagem você vai dar um ritmo mais interessante que prenda a atenção do espectador no seu filme do começo ao fim, dessa forma podemos compreender a montagem como um momento de criação.


A Montagem no seu filme! O cinema é como se fosse o nosso próprio olhar que vê o mundo com curiosidade. A gente se interessa e se desinteressa rapidamente por uma imagem aqui e outra ali, dando mais atenção a umas coisas e menos a outras, não é mesmo? Às vezes precisamos ver e ouvir as coisas mais de perto, ou mais distante, pra entender o contexto e perceber os detalhes. E tudo ganha sentidos variados na nossa cabeça, dependendo da forma como interpretamos esses estímulos, e isso é decorrente da história de vida de cada um. Por isso temos percepções que outras pessoas podem não ter. A montagem vai te ajudar a mostrar e compartilhar as suas percepções, o seu ritmo e a sua forma de ver o mundo. Existem várias formas de montar um filme! Por isso, vamos te ajudar a entender um pouco sobre os tipos de montagem que você pode utilizar; e para isso usamos como referência um livro chamado “A linguagem cinematográfica”, que foi escrito por Marcel Martin. Se você tiver interesse, pode procurar mais informações nele. Este camarada, o Marcel, fez algumas divisões de estilos de montagem. Conhecer essas divisões pode te ajudar a entender melhor e fazer uma edição. Bom, pra começar, existem os tipos de montagem ‘’narrativa’’ e ‘’expressiva’’, e dentro delas, algumas divisões, vejamos: 1.1 Montagem Narrativa É quando você vai relatar uma ação, o desenrolar de um acontecimento, independente da forma como esse tempo se dará. Pode ser dividido em quatro tipos: linear, invertida, alternada e paralela. 1.2 Montagem Narrativa Linear Você quer apenas contar uma história, de forma simples e objetiva? Essa é a melhor forma! Esse tipo de montagem tem poucos detalhes e segue uma linha cronológica linear. Nela você organiza os planos e sequências de forma lógica e direta de forma que a filmagem irá respeitar a sucessão temporal dos fatos. 1.3 Montagem Narrativa Invertida Nesta montagem as cenas, planos e sequências não estão necessariamente presas no tempo presente dos acontecimentos. Sabe aquelas cenas dos filmes em que a personagem relembra algum momento da sua vida, e é como se a gente estivesse na cabeça dessa personagem, vendo tudo? São os famosos flashback, quando o personagem relembra fatos importantes que viveu. Nesse tipo de montagem as cenas passeiam no passado e no presente, indo e voltando


de acordo com a necessidade do filme e a intenção do realizador. 1.4 Montagem Narrativa Alternada Já aqui a montagem irá contar duas histórias que acontecem paralelamente, mas que em algum momento do filme se cruzam. Pode ser que aconteça no começo do filme, no meio ou no fim, também podem se cruzar e se separar várias vezes. O importante é que fique ao espectador a impressão de que ele pode ver tudo que acontece com os dois personagens, mesmo que afastados espacialmente, porém vivendo na mesma época. 1.5 Montagem Narrativa Paralela Na Montagem Narrativa Paralela, assim como na Montagem Narrativa Alternada, existem duas ou mais histórias acontecendo paralelamente (ou seja, espacialmente separadas) porém não necessariamente ao mesmo tempo (na mesma época), dessa forma, as histórias nunca irão ocupar um mesmo momento e se cruzar. Apesar disso essas histórias mantêm uma conversa, ou seja, se relacionam de alguma forma e criam sentido para o filme. Isso tudo é pensado pelo cineasta de forma intencional para passar uma ideia e um sentimento que, às vezes, não aparecerão em forma de imagem, mas sim em forma de conclusões que fazemos com a nossa razão e emoção ao ligar o sentido de uma história com o sentido da outra. 2 Montagem expressiva Na montagem expressiva você tem mais possibilidades de criar efeitos psicológicos no seu espectador. A montagem expressiva deseja, sobretudo, exprimir uma ideia, uma emoção; e para isso, utiliza das formas das montagens narrativas, mas sem se limitar à sua lógica de narração. Segundo nosso amigo Marcel, há duas formas de percebermos a montagem expressiva do cineasta em seus filmes: através da montagem rítmica e da ideológica. 3 Montagem rítmica Como dissemos, a montagem expressiva não se preocupa em mostrar detalhadamente a história, mas sim passar a ideia, se expressar. Quando falamos sobre “montagem rítmica”, vamos pensar em uma coisa muito importante para o cinema: a atenção e o interesse do espectador. Cada cena, plano e sequência tem um objetivo a cumprir, como mostrar um recorte da história, algo que traduz uma ideia maior, uma mensagem importante para a interpretação do filme. Para além disso, na montagem rítmica você irá se preocupar muito mais com a capacidade que cada cena tem de prender a atenção e o interesse de quem a assiste, e a história enquanto narrativa não será mais o seu foco. Para fazer isso é muito importante que você se dedique a cortar as partes que estão entediantes, sem prejudicar a história em si. Assim, você começa a fazer um filme com ritmo,


onde não conseguimos tirar os olhos da tela. Do contrário, poderão acontecer momentos de impaciência e aborrecimento do espectador. 4 Montagem ideológica Aqui, vamos identificar as ideias do cineasta, as quais ele não mostra claramente, mas dá as dicas para você entender e concluir o que ele quer dizer, pode ser uma opinião, uma crítica ou uma moral da história e por aí vai. Ele faz isso criando relações entre acontecimentos, objetos e personagens ao longo do filme, dessa forma, o realizador usa da organização dos planos, cenas e sequências para se expressar em relação a alguma coisa. Para tanto, ele não poderá ficar preso numa forma fixa de montagem, pelo contrário, deve brincar com todas as formas de montagem com um único objetivo: expressar uma ideia. Concluindo, no tipo de montagem expressiva o cineasta não usa mais só a lógica narrativa para fazer seu filme. Ele vai focar na forma como monta e organiza tudo de maneira que o ajude a se expressar, passar uma ideia, uma ou várias emoções através do ritmo do filme, da forma que compõe a sequência das imagens e dos sons, além do que escolhe como conteúdo de cada plano, cena e sequência.

“Um filme é feito, assim, de centenas de fragmentos cuja continuidade lógica e cronológica nem sempre é suficiente para tornar o encadeamento compreensível para o espectador. Para constituir as articulações do enredo, o cinema é obrigado a recorrer a ligações ou transições, tanto visuais como sonoras e que pode ser comparada à pontuação na linguagem escrita.” (CRUZ, Dulce Maria - 2007)

Lembre-se: Os tipos de montagem foram apresentados separadamente para que fique mais claro a compreensão, mas na sua montagem você pode mesclá-los da forma que quiser. Nossa intenção é, sobretudo, que você faça seu filme com consciência do que quer que as pessoas vejam e sintam.


Termos técnicos Agora entenda um pouco mais sobre alguns termos técnicos presentes na produção audiovisual, e essenciais para pensar a montagem:

Plano,cena,sequência O que é chamado de plano no cinema é um trecho filmado sem interrupção. Já a cena é um conjunto de planos que tem um objetivo comum de passar uma ideia e que acontecem no tempo e espaço determinados pelo realizador. O que chamamos de sequência é um conjunto de planos e cenas que compõem um pedaço da história de forma coerente. Em alguns filmes uma seqüência também pode ser formada, por exemplo, por apenas dois ou três planos mais longos.

Campo/Contracampo O Campo é simplesmente o espaço que a câmera enquadra. Já o contracampo funciona para dar continuidade visual às imagens que a princípio não são contínuas. Por exemplo, se eu faço um plano (1) do rosto de um homem sorrindo e, logo após, faço um plano (2) de um sorvete , terei o plano (1) do homem sorrindo como contracampo do plano (2) do sorvete, e o plano (2) do sorvete como contracampo


do plano (1) do homem sorrindo . Assim quando juntar os dois planos vai parecer que o homem está sorrindo enquanto vê o sorvete. Essa é uma técnica que você pode usar para gravar alguns planos em dias ou momentos diferentes, além de brincar com a coerência na ligação de uma imagem com a outra. É uma forma de fazer parecer para o espectador que as tomadas foram gravadas em um mesmo local ou espaço cênico e ao mesmo tempo, mas podem não terem sido feitas assim. Resumindo, o campo é o espaço que a câmera enquadra, enquanto o contracampo são planos mostrando os personagens um de cada vez.

Linha do tempo A linha do tempo é a base onde você irá trabalhar a montagem do seu filme. Nela você vai colocar os trechos gravados para que sejam organizados da sua forma. Todo filme tem um tempo de duração e aqui você poderá adequar o seu material ao tempo de duração que você deseja. É uma ferramenta importante pois é onde você consegue visualizar e editar tudo de forma mais detalhada. Em todos os programas de edição você vai encontrar a barra de linha do tempo, e, ao adicionar os planos nessa linha, você poderá fazer os cortes, alterar a velocidade das imagens, trabalhar o som, entre outras coisas. Quando você insere os planos nela, aparecerão duas barras: a de cima é o vídeo e a de baixo o áudio. A linha do tempo funciona de forma bem simples, o que você coloca no começo da linha vai entrar primeiro e assim sucessivamente até o fim das imagens.

Fade in, fade out e fusão Essas são ferramentas usadas para unir as cenas e sequências. O Fade in é quando a imagem vem aparecendo aos poucos de um fundo inicialmente preto. O fade out é quando a imagem vai desaparecendo. Já a fusão não tem tela preta entre uma imagem e outra. Nela enquanto uma imagem desaparece, a outra já está vindo à tona, e, por alguns segundos, haverá duas imagens se misturando. São efeitos muito usados no cinema clássico estadunidense. São transições diferentes do corte seco pois utiliza de efeito de aparecer e desaparecer de um jeito mais suave, enquanto que o corte seco é apenas uma mudança brusca de uma imagem para a outra.


AGNÈS VARDA

CINEASTA E FOTÓGRAFA BELGA



Dicas EDITAR NO CELULAR

Hoje em dia é possível fazer um filme no celular. Além de filmar você também pode editar no próprio aparelho com ajuda de aplicativos de edição. Tudo depende da sua proposta. Um dos aplicativos que você pode usar é o iMove apple.

CONTINUIDADE DE MOVIMENTO

Fique atento a continuidade da cena principalmente ao unir dois planos utilizando corte seco (corte simples, sem operar com efeitos de transições). Por exemplo: plano (1) em plano aberto uma menina começa a encher um copo com suco; plano (2) close no copo sendo enchido. Para realizar essa cena você irá encher o copo do início ao fim duas vezes, uma vez com plano aberto e outro com plano close. Em seguida, na montagem, fique ligado para fazer o corte exatamente no ponto em que copo no plano (2) esteja com a mesma quantidade que estava no plano (1), evitando assim erros de continuidade.


MESMO PLANO

EDIÇÃO DE COR

Você pode editar alguns aspectos das imagens do filme no programa de edição. Às vezes você pode saturar um poucos as cores para deixar os imagens mais vivas ou pode deixá-las em preto e branco. Essas alterações criarão outras atmosferas no seu filme!

NÃO TENHA PRESSA O processo de edição é demorado e valioso. Por isso tenha calma e persista.

Você pode usar o mesmo plano no seu filme em momentos diferentes. Por exemplo: plano (1) close no rosto da personagem que olha para ver se o ônibus está chegando; plano (2) plano aberto da personagem no ponto de ônibus; plano (3) close novamente no rosto da personagem. Nessa cena foi usado o mesmo plano repetido no plano (1) e no plano (3). Isso te poupa tempo de gravação e ainda cria a sensação no espectador de que a personagem espera há muito tempo.


Vamos experimentar! Aqui vão algumas dicas de trabalhos para você treinar!

MONTAGEM NA CÂMERA Já pensou em fazer um filme fazendo o corte dos planos direto na câmera? Para fazer isso você deve começar a filmar e quando achar que deve fazer o corte simplesmente pare de filmar, fazendo isso sucessivamente para todos os planos, cenas e sequência. Quando terminar tudo, coloque no programa de edição para juntar as partes, mas sem fazer novos cortes. Essa experiência vai te pedir uma atenção no momento que começa a filmar e na hora de fazer o corte

DOIS FILMES EM UM Junte imagens de dois filmes diferentes e faça um novo. Para esse experimento você pode pegar as imagens de um filme de um amigo e mesclar com as imagens de um filme que seja seu, por exemplo. Nele você pode criar uma montagem no estilo Narrativa Alternada ou Narrativa Paralela. Essa sugestão é interessante porque você cria um filme novo em conjunto com outra pessoa e pode até fazer outras parcerias cinematográficas!


COMECE COM UMA MÚSICA Fazer uma montagem a partir de uma música fica bem legal. Comece escolhendo a música. Dê preferência àquelas de uso livre, ou de alguém conhecido que você pode pedir para usar. Vá até o seu arquivo de materiais filmados e busque relações entre suas imagens e a música que escolheu. Monte as imagens que selecionou junto à música tentando sincronizar os cortes com o ritmo e a melodia. Esse procedimento é bem simples e vai despertar em você a capacidade relacionar e compor imagens e sons.

FAZER UM FILME COM UM FILME QUE JÁ EXISTE Pegue um filme seu pronto e faça uma nova edição, mas agora criando outra história. Tente se desprender da ideia inicial do filme, embaralhe as sequências, troque o áudio. Você vai se surpreender com o resultado pois no fim terá um filme totalmente diferente do primeiro.


Entrevista com Raquel Maia A Raquel esteve presente no Cine Sem Churumelas desde o início, participando com sua produção. Agora ela está aprofundando sua pesquisa em cinema fazendo um curso de graduação. É o apoio e envolvimento de pessoas como o da Raquel que nos fazem acreditar na importância destes encontros. CSC: Porque você faz filmes? Como você começou a fazer filmes? Raquel: No início eu não sabia o porquê. Só fui ter um contato mais profundo com as artes quando entrei em um curso técnico de audiovisual em 2012, eu já ia fazer 18 anos e foi uma experiência e tanto! Nas escolas que eu havia estudado eu tinha visto muito pouco, ou quase nada, sobre artes. Em casa também não, era como se essa (poderosa) ferramenta de expressão não existisse para mim, exceto como espectadora, e eu não fazia ideia que esse “exceto” era ocasionado pela falta de democratização dos bens culturais e materiais da vida. Talvez meu interesse tenha surgido da fotografia pois sempre gostei de fotografar e de ser fotografada. Me lembro também de ter tido uma infância e adolescência cercada por desejos visuais, hoje percebo que muitos eram inconscientes. Recordo de uns vídeos que eu fazia em família com o celular, era muito divertido fazer, atuar, dançar e depois ver e ficar rindo de nós mesmxs. Fazer um curso técnico ligado às artes transformou minha vida de forma inesperada. Hoje eu vejo que tive muita sorte! Atualmente o que me motiva é a vontade de realizar filmes voltados para a temática LGBTQ+, que é o mundo a qual me sinto pertencente. Sou lésbica e minha realidade de vida me leva para esse caminho. Estou seguindo meu eu, minha intuição e o meu prazer. CSC: Quais os desafios do começo? Raquel: Ah, o meu começo foi um baque, e ainda estou nesse começo (risos). Não é fácil. O audiovisual e as artes não tem uma cultura de investimento nas produções. A gente se depara com falta de equipamento... falta de tanta coisa, até dinheiro para passagem. Mas aí surge uma vontade bem louca de fazer um filme, de se expressar, de também fazer parte... te toma conta! E aí você faz com o que tem mesmo. Chamo xs amigxs, a família, e faço! O desejo tem que mover! E o começo perdura. Talvez não acabe tão cedo. Mas é isso, resistência. Os desafios são muitos e ando considerando que sempre existirão. CSC: Como você se organiza para fazer seus filmes? Raquel: Na falta de organização (risos). Não sou muito boa na parte de préprodução e produção, sofro um pouco. Sempre recorro à minha namorada e à uma amiga para me ajudar a organizar e produzir. Eu diria que esse trem de organização… é melhor cada pessoa escolher seu modo. Sem certo ou errado. CSC: Como é seu processo criativo? Raquel: As ideias aparecem de modos variados, não tenho controle sobre isso. Surgem enquanto converso com alguém, após ver um filme, tomando banho, um sonho que tive, um problema na minha vida ou na vida de alguém... Meu filme mais atual surgiu assim: eu estava dentro de casa e na rua passou


um carro com uma música bem alta do Legião Urbana! E aí me veio uma ideia. Às vezes anoto, outras esqueço, posso levar a sério, ou não, e acontece de não me agradar e jogo tudo fora. CSC: Que dicas você dá para quem está começando e não sabe editar? Raquel: Não desistir. Comece pelo que tem ou pelo que pode conseguir! Se não tem computador, peça para usar o de amigxs e familiares. É uma dica óbvia, mas é tão frequente colocarmos empecilhos, nos auto-sabotando, que acho importante falar. Procure aquele projeto do seu bairro, que você sabe que poderia te abraçar mas nunca tinha pensado nele (risos). Se seu computador é dos mais lentos, comece pelo Movie Maker pois é bem simples de usar. Há quem arrisque começar pelo Premiere, ótima escolha também! Acho que tudo é válido! A edição é a última etapa, desistir é que não dá. Já editei o mesmo vídeo de 3 minutos por mais de 7 vezes. É claro que já desisti de vez de uma ideia também - acontece. Mas quando a gente termina, mesmo que não seja da maneira que queríamos, dá um alívio. Sempre tento acreditar que aos poucos vamos conseguir aperfeiçoar e chegar mais perto do esperado. Dá certo! Uma hora dá. CSC: Tem algum caso interessante que você queira contar sobre fazer filmes ou edição? Raquel: Há pouco tempo entrei no curso de cinema da Unila. Comecei acreditando que minha área era o cinema experimental, e talvez até seja, mas eu acho mesmo é que eu queria me sabotar. Fui me dando conta que eu mesma me bloqueio de produções grandes por medo de errar, não ficar bom e não conseguir. Recentemente estou indo fundo numa ideia para colocá-la em prática. Consegui equipe, atores, locação, quase tudo. Quando tudo parecia estar certo, tudo deu errado, faltou iluminação, faltou objetos de direção de arte, faltou treinamento... quando vi o resultado me deu uma sensação de que eu não tinha nada. Estou começando a exercer o que eu falei: não desistir. Vamos refazer quase tudo. Cada vez mais fico pensando no quanto o cinema, e as artes em geral, não são democráticos, tento pensar criticamente pois sou mulher e sempre me vejo questionando o porquê, por exemplo, de termos menos de 10% de diretoras no cinema, negras, lésbicas e pobres… nem se fala. Por isso, quero aproveitar para indicar um grupo do facebook para as minas que porventura leiam aqui e estejam começando: MUFA - Mulheres Filmmakers e do Audiovisual. Temos que resistir. E mesmo que fique muito ruim, temos uma meta: fazer e divulgar esse filme! CSC: ndique um filme e conte porque ele foi importante para você? Raquel: É desconfortável para mim que eu venha indicar um filme feito por um homem. Mas me conforta saber que esse homem não é qualquer um no cinema. Não é bem um filme que indico, mas um idealizador fodástico: Xavier Dolan. A maioria de seus filmes abordam questões de gênero e sexualidade e dois filmes que gosto são o “Eu matei minha mãe” e “Laurence Anyways”, esse último é muito importante para mim. Um realizador homossexual no cinema, fazendo e acontecendo, me deixa feliz! Claro que ele tem seus privilégios, e os privilégios são a forma que muitas vezes impossibilitam a diversidade, a equidade etc. POR ÚLTIMO, quero indicar a websérie SEPTO, idealizada por uma mulher ma-ra-vi-lho-sa! Sem mais.


História do Cine Sem Churumelas e outras balelas O Cine Sem Churumelas surgiu em 2014, organizado por Dayane Gomes, Débora Arau e Jonas Filho. A ideia desde o início foi exibir filmes independentes e amadores em locais públicos. Para ninguém ficar de fora todos os filmes recebidos são exibidos sem seleção (desde que de faixa etária livre), como um incentivo à produção audiovisual independente da cidade. Durante o primeiro ano aconteceu uma exibição por mês na praça da Jabuticaba, em Contagem. O formato das exibições é bem simples: um lençol branco é estendido na praça, ou quadra, ou onde der. Projetor ligado, som na caixa e pronto: uma exibição de filmes começa para quem quiser chegar e curtir! Tudo muito simples e, claro, sem churumelas. Hoje, o projeto é organizado por Dayane Gomes e Jonas Filho, e conta com um acervo que inclui filmes de vários temas, formatos e estilos. O Cine Sem Churumelas continua com a mesma proposta, porém, as exibições que aconteciam sempre no mesmo local, agora são itinerantes.

História da Serra Dayane Gomes Este ano participamos da residência ‘’Reboque’’ organizada pelo JA.CA - Centro de Arte Jardim Canadá. Foram meses intensos e gratificantes pois a experiência nos amadureceu muito em relação a orientação para a produção de filmes. Realizamos durante três meses uma oficina no Centro Cultural da Vila Marçola, localizado no aglomerado da Serra, em Belo Horizonte, onde nos encontrávamos duas vezes por semana com uma turma de crianças e adolescente de uma escola da região. A proposta da oficina foi fazer alguns filmes e, para


nossa alegria, conseguimos o envolvimento da turma que era acompanhada pelo Rafael Freire, companheiro que já desenvolvia trabalhos com a turma em várias áreas da arte. Planejamos um roteiro, fizemos testes nas câmeras, e saímos para filmar o bairro. Filmamos o centro cultural e gravamos poemas, sendo todo o material suficiente para a criação de três curtas. A próxima etapa dessa história foi fazer uma exibição para todo o bairro na praça do Cardoso, que é próxima ao centro cultural. Em todos esses três meses contamos com a parceria do Leone Reis, produtor cultural do centro cultural da Vila Marçola. A sua ajuda foi muito importante pois, sempre de bom humor, ele nos orientava com informações sobre o lugar. Infelizmente o Leone não pode estar presente no dia da exibição mas nos auxiliou como pôde na pré-produção e ainda nos proporcionou o contato com seu filho, Diego, que esteve com a gente no dia da exibição. Depois de finalizada a edição, lançamos a vinheta da divulgação e tivemos a oportunidade de fazer uma exibição especial na Kombi do JA.CA. que já tem uma estrutura pronta para exibição itinerante de filmes. Além dos filmes produzidos nas oficinas, contamos com a participação de filmes de moradores e de artistas. Mas o que nos surpreendeu foi o envolvimento de Diego, que se empenhou para produzir um filme sozinho, o qual foi entregue no dia da exibição. Receber um filme no dia, direto do pendrive, talvez seja o que mais gostamos, ainda mais um filme feito especialmente para o Cine Sem Churumelas. Sempre que recebemos um filme assim sentimos que estamos conseguindo estimular a produção, que é tudo o que queremos, despertando o desejo de compartilhar olhares, e histórias.


Lugares de distribuição Loja de Instrumentos Musicais Rua Gasolina n °60 - loja 04 - Petrolândia Mundial Tec Rua Refinaria União n °38 - Petrolândia Academia Dragão Vermelho Rua Refinaria Duque de Caxias n °289 - Petrolândia Loja de Xerox Praça Irmã Maria Paula n °25 - Petrolândia (praça principal do petrolândia) Salão do Mauro Rua Benzina n °193 - Petrolândia Loja Master Av Tropical n°1048 - Tropical Centro Artístico Unificado Attitude Rua Dezenove n°138 - Tropical Projet Cartuchos e Papelaria Rua José Olinto Fontes n°218 - Eldorado Projet Cartuchos e Papelaria Rua José Olinto Fontes n°218 - Eldorado Loja da Marilita Av José Faria da Rocha n°5357 - Eldorado

EDITORA Dayane Gomes TEXTOS Dayane Gomes, Renan Bolcont PROJETO GRÁFICO Dayane Gomes ILUSTRAÇÕES Dayane Gomes REVISÃO DO TEXTO José Junior PRODUÇÃO Jonas Filho ASSESSORIA DE IMPRENSA Renan Bolcont ORGANIZAÇÃO CINE SEM CHURUMELAS TIRAGEM 500 EXEMPLARES ANO 2016



O Cine Sem Churumelas apresenta o manual FILMES FEITOS À MÃO, para ajudar você a fazer um filme. Ao todo são cinco edições do livreto, distribuídos gratuitamente, em cada edição abordando um elemento diferente da produção audiovisual. Os livretos estão disponíveis em diversos locais na regional Petrolândia e em outros pontos pela cidade de Contagem. Fique atento e garanta o seu. Distribuição gratuita. PROJETO PATROCINADO PELO FUNDO MUNICIPAL DE INCENTIVO À CULTURA DE CONTAGEM Realização


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