Luz, Câmeras, Ilustrações! A obra-título de Luzes,
de objetos da experiência
Câmeras, Ilustrações! dá ao
cinematográfica, saindo do
ilustrador Igor Tadeu uma
saco de pipoca e chegando
tal liberdade que torna
num “homem-audiovisual”,
desnecessária uma assinatura
fusão entre realizador, cinéfilo,
autoral. A cena parte de dentro
telespectador e máquina.
para fora, e não o contrário,
Parece uma bela alusão ao que
ou seja, não há um modelo
o cartunista Angeli desenhou
prévio (o filme) ao qual o
em 1997, uma câmera
artista tem de submeter sua
ocupando o lugar do cérebro
criação, mas sim expandindo
num cinéfilo, e que por ela
sua imaginação à sugestão
olha o mundo (e o cinema).
do infinito. Grande marca dos
Mas agora, momento em que
trabalhos desta ambientação,
o cinema lida com um novo
a “pincelada” que sugere o
tempo, o ser humano possível
filme cinematográfico em
é este criado por Igor Tadeu,
avanço lança uma série
correndo para um novo lugar.
FILMES E DOCUMENTÁRIOS A imagem coloca ficção e
como se avançando do centro
documentário em fronts
à extremidade, com um sereno
distintos, mas a imagem
e absoluto Eduardo Coutinho
estabelece uma relação entre
marcando Últimas Histórias,
os dois lados, que dialogam
seu último trabalho, Sebastião
através dos fluxos de tinta,
Salgado que é tema de O Sal da
quase um cordão umbilical.
Terra, Cássia Eller cantando forte
Sugerindo profundidade 3D,
em Cássia, Tomie Ohtake e Chico
o mural traz, à esquerda, os
Buarque de frente. Fica claro,
longas de ficção, tendo à frente
sobretudo nessa prancha dos
Regina Casé em Que Horas Ela
longas documentais, que Igor
Volta? e Irandhir Santos em A
Tadeu tem êxito na semelhança,
História da Eternidade. Logo
em capturar detalhe e outro do
ao lado, Branco Sai, Preto Fica
original, e não numa reprodução
coloca-se forte entre Califórnia
ips literis. O que exige de seu
e Chatô, o Rei do Brasil, com
público uma postura mais
Ausência inserido abaixo.
ativa, uma formação, um
Os documentários, à direita,
conhecimento prévio jamais
inclinam-se diferentemente,
destituído de intuição.
FILMES ESTRANGEIROS Numa inserção sintética, quase
Talvez a gravura mais forte
sobreposta ao astronauta de
da exposição (porque mais
Perdido em Marte, temos a
gráfica), a protagonista de
imagem dum salto-agulha
Mad Max: Estrada da Fúria é o
espatifando a lente dum óculos,
centro absoluto da cena. Ao
numa poderosa referência
seu redor, os personagens de
ao A Pele de Vênus de Roman
Jogo da Imitação, Star Wars: O
Polanski. O conjunto deste tema Despertar da Força, Birdman, a prima pela contenção, dando
animação O Pequeno Príncipe
conta da seleção de filmes
e o drama Party Girl (estes dois
estrangeiros num espaço mais
últimos, produções francesas)
exíguo. O traço de Igor busca,
não trazem outros países mas
aqui, o essencial, inclusive
compõem uma galáxia fiel à
nos recorrentes “vazamentos
realidade da proporção entre
de fluidos”, que permanecem
filmes norte-americanos e de
mais retidos aos elementos.
outros países.
CINEASTAS São 24 cineastas elencadas, ocupando o espaço da parede branca de igual pra igual, sem distinções geracionais ou de espírito estético. Há Helena Ignez, Ana Carolina, Carla Camurati, Suzana Amaral, Juliana Rojas, Tizuka Yamasaki e Tata Amaral. O estilo que Igor Tadeu adotou para a mostra, simulando uma pincelada que sugere tinta confundindo-se com negativo cinematográfico e com o próprio traço do desenho, ganha um registro mais forte aqui, com os fluidos avançando contra a direita da imagem, ultrapassando a coluna de sustentação, como folhas ou maços de cabelos avançando além do espaço. E com motivo: destacar as diretoras do cinema brasileiro é uma escolha política. A começar pelo título, “Cineastas”, a lembrar que cineastas não são apenas os homens.
120 ANOS DE CINEMA Este é o mural que mais exige
Se nessa historiografia não há
síntese (e escolhas) para
Rogério Sganzerla, Godard,
abarcar 120 anos de cinema
Antonioni ou algum cineasta
numa toada, o que implica
japonês, há o Zé do Caixão de
em ausências importantes. O
José Mojica Marins e o John
estilo no qual a caneta de Igor
Travolta de Pulp Fiction.
Tadeu simula uma pincelada
Esta é, também, a grande obra
conta uma história do cinema
interativa da mostra. Grafada
através de sua iconografia
ao longo da escada que dá
mais conhecida, partindo do
acesso ao auditório, é possível,
Cidadão Kane, de Orson Welles,
do térreo ao andar superior,
e passando por Chaplin,
traçar uma cronologia, com
Brando em O Poderoso Chefão,
seus gêneros e marcos,
Psicose, Nosferatu, de Murnau,
ausências e presenças,
Deus e o Diabo na Terra do Sol,
inclusive para refletir sobre
La Dolce Vita, Laranja Mecânica,
essas escolhas.
Marilyn Monroe e James Dean.
melhor dos melhores As reproduções mais literais continuam presentes:
há uma retificação mais conceitual à esquerda,
filme do que uma iguaria. A mão é a de Igor Tadeu
o severo personagem de Pai Patrão, as mulheres
na mão que segura o hashi da culinária japonesa,
usando um “pincel”, explicitando seu olhar sobre
de Gritos e Sussurros, os amigos do trágico Adeus,
referência ao clássico O Império dos Sentidos, e que
o tema, numa clara “assinatura do autor”, única
Meninos e o Valmont de Ligações Perigosas. Mas
parece erguer algo mais a ver com um rolo de
entre as obras desta série.
IGOR TADEU Desde 2005, atua como ilustrador em João Pessoa - PB, onde já expôs em diversos locais e eventos, como o Festival Mundo, o mesmo ano em que começou a sua produção de tiras e quadrinhos. Foi membro-fundador do Coletivo WC, grupo de quadrinistas paraibanos formado em meados de 2010 até 2013. Através do coletivo, participou da produção dos dois volumes da revista independente Sanitário (lançadas em 2012 e 2013, respectivamente), além de publicar suas tiras no jornal A União e na internet. Lançou duas revistas também de forma independente: as coletâneas One Hits Wonders (2012) e Uma História em Cada Garrafa (2013). No ano passado participou junto com vários nomes do quadrinho nacional no projeto Um Cara que caiu do céu (e não conhecia a vida). Como muralista tem seu trabalho em diversos espaços como hospitais, agências de publicidade, lojas e residências.
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