José Adriano Filho
Estudos sobre Coríntios, Hebreus e Apocalipse
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ESTUDIO 1
Diakonia dos pobres: 2 Coríntios 8-9 Não repelirás quem está na indigência, mas colocarás todas as coisas em comum com teu irmão e não dirás mais serem tuas próprias: pois, se compartilhas um bem imortal, com mais razão os bens mortais! (Didaquê 4,8) a segunda carta de Paulo aos Coríntios destacam-se os capítulos 8-9, conhecidos como a coleta para a comunidade de Jerusalém. Paulo já havia mencionado antes esta coleta em 1 Coríntios 16,1-4 e não era a primeira vez que ele se envolvia numa atividade como essa, pois antes o encontramos atuante no envio de um socorro aos irmãos que moravam na Judéia (Atos 11,27-30). Essa passagem é uma indicação de que o socorro financeiro pelo qual o apóstolo tanto se empenhou, não é acidental, mas tinha para ele um sentido mais profundo. A tradição deu o nome de “coleta” a essa coleta, mas Paulo refere-se a ela como “serviço” (“diakonia”), um serviço” importante porque está estreitamente ligado ao evangelho de Jesus Cristo. Para os coríntios participar desse serviço é mostrar obediência ao evangelho de Cristo e a sinceridade da fé. Ajudar aos pobres é um dom de Deus que se manifesta na ação concreta dos homens. A graça não é um dom inerte, não é uma riqueza da qual cada um pudesse gozar egoisticamente: graça é participar da partilha dos bens com os irmãos (8,1.4.6.7.9; 9,8.13-15).
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Este “serviço” não consiste também numa simples coleta porque a unidade da igreja estava em jogo, já que a abertura da missão para fora de Israel estava sendo alicerçada e legitimada com essa coleta. Assim, o serviço aos pobres está destinado a expressar, fundamentar e estabelecer a estrutura do novo povo de Deus. Paulo estende a solidariedade do povo para além das fronteiras da lei. O apelo aos pobres fez surgir a oportunidade para um novo relacionamento com o povo de Israel e fazer os coríntios entenderem que eram parte de um povo maior. No encontro de Jerusalém Paulo percebeu a oportunidade para provocar uma nova forma de agir nas igrejas gregas. Era importante tecer relações entre os de Jerusalém e os gregos, mover bens espirituais, pôr em movimento a generosidade material, modelar um novo estilo de relações sociais e criar um novo modelo de sociedade. Nesse sentido, a diakonia dos pobres visava fortalecer a unidade da igreja entre judeus e gentílico-cristãos.
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2 Coríntios 8,1-5 introduz o assunto “o serviço dos pobres”, procurando despertar o interesse dos coríntios por meio de um exemplo: Paulo elogia o comportamento dos macedônios no serviço aos pobres. Menciona a generosidade das comunidades da Macedônia, cuja fonte é a graça de Deus (2 Coríntios 8,1-2). A “coleta” como serviço aos pobres de Jerusalém é expressão da própria graça de Deus. É um dom de Deus que assume a forma do dom humano. A atitude dos macedônios mostra que Deus está ativo neles e opera por meio deles. Os macedônios eram pobres, mas a sua generosidade era maior. Generosidade, no grego “haplótes”, significa simplicidade, sinceridade, franqueza. Trata-se da generosidade sincera, que visa o bem estar do próximo, a partir da qual os macedônios participaram na arrecadação de fundos para os pobres de Jerusalém (2 Coríntios 8,3-5). A generosidade e a grande disponibilidade dos macedônios manifestaram-se de duas maneiras: participaram com grande alegria no meio de imensos sofrimentos e, apesar de serem pobres, mostraram grande generosidade. Essa alusão à situação particular das pessoas que formavam a comunidade mostra que da extrema pobreza nasceu a sua extrema riqueza. Assim, podemos caracterizar a generosidade dos macedônios da seguinte forma: deram segundo as suas possibilidades, além das suas possibilidades, espontaneamente, pediram com insistência para participar na coleta. As comunidades da Macedônia, portanto, mesmo sendo pobres e passando por perseguições, fizeram a “coleta” para garantir a construção do reino. Essas igrejas eram tão pobres quanto a de Jerusalém, mas a contribuição financeira era fundamental para garantir a continuidade dos cristãos de Jerusalém na participação na construção do reino: os mais pobres deram mais dinheiro, um sinal de que o reino já está presente.
2. Os coríntios devem seguir a prática de Jesus A generosidade dos macedônios foi a sua disposição de pôr os bens materiais a serviço dos necessitados. A solidariedade gera a disponibilidade, a qual gera a comunidade. Por sua vez, a comunidade gera a igualdade. A arrecadação era um serviço, um trabalho em favor das comunidades pobres de Jerusalém. Paulo pede que o bem estar do pobre valha o nosso “investimento” e que a arrecadação consiga mobilizar tudo o que os cristãos têm em disponibilidade para doar. Dessa forma, ele desenvolve a idéia de serviço apresentada no texto. No v.4 os macedônios pediram a graça de participar da assistência aos santos e Paulo “espera que Tito consiga completar essa graça entre os coríntios” (v.6) e que eles “abundem nesta graça” (v.7). Se coríntios tinham superabudância e excelência em suas virtudes, porque não acrescentar a isso a generosidade na participação do serviço aos pobres? Para mobilizar os coríntios a participarem do serviço aos pobres Paulo desenvolve três argumentos: a) O exemplo de Cristo.. Os coríntios devem seguir o modelo de Jesus Cristo: “Pois conheceis a graça de nosso Senhor Jesus Cristo, que, sendo rico, por amor de vós se fez pobre, para que pela sua pobreza fôsseis enriquecidos” (2 Coríntios 8,9). Cristo tornou-se pobre, ou seja, tornou-se humano e abdicou de sua riqueza divina, para enriquecer as pessoas com as dádivas da salvação (Filipenses 2,5-8). Com isto a pobreza, que culmina no sacrifício de na cruz, torna o marco da missão de Cristo. Isto é graça! Essas palavras são importantes pois mostram que um termo teológico tão importante como graça é aplicado à esfera da economia (das 18 vezes que 2 Coríntios usa a palavra graça, 10 estão no contexto da coleta). Paulo usa palavra graça designando salvação e coleta. Salvação está ligada ao pão nosso de cada dia, os dois estão interligados, um depende do outro. Trata-se de uma coleta que na verdade atinge o ser cristão da
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1. O exemplo dos macedônios
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comunidade. É a prática do amor a partir da fé que leva à salvação, a qual provém da graça de Deus. No fundo a coleta dada é a gratidão pela graça recebida e que é revertida aos cristãos de Jerusalém. b) O útil ou convincente. Paulo parte da consideração de bom senso: convém acabar uma obra começada (2 Coríntios 8,10-12). Algo ocorreu e a coleta começada no ano anterior havia sido interrompida. O que teria acontecido? Com certeza foi a grande crise acontecida, em cujo contexto Paulo escreveu a carta apologética (2 Coríntios 2,14-6,13; 7,2-4), que ficou sem efeito. Então ele mandou uma segunda carta (10-13), que também ficou sem efeito. Houve, então, a segunda visita de Tito a Corinto e Tito conseguiu a reconciliação (2 Cor 1,1-2,13; 7,5-16). Paulo pede agora que eles continuem o que já havia sido começado. A carta produziu efeito e Paulo pode reiniciar a coleta. Assim, 2 Coríntios 8-9 tem por objetivo reestimular os coríntios a reassumir a coleta parada. A carta deu resultado, pois Romanos 15,25-32 mostra que a coleta foi feita. c) A igualdade. Jesus Cristo é o exemplo divino para a ação da comunidade junto aos co-irmãos. Ele não se tornou pobre para que todos ficassem pobres, mas para que todos fossem ricos. Dessa forma, em lugar da pobreza, todos terão pelos menos a suficiência, graças à redistribuição feita pelos ricos. Assim como Cristo, as comunidades cristãs devem estar dispostas a desprender-se de tudo o que representa supérfluos e colocá-los a serviço dos pobres, para que haja igualdade (2 Coríntios 8,13-15; 9,12-14). Assim, Paulo afirma que será realizada a igualdade, a qual deve reinar entre os cristãos. Este modelo se encontra em Êxodo 16,18, a propósito do maná: “Nem quem tinha colhido muito tinha de sobra, nem quem recolhera pouco lhe faltava”. O maná não podia ser acumulado, mas colhia-se a cada dia o suficiente para um dia. Isto era feito para garantir a igualdade. Da mesma maneira, coleta é feita pela comunidade cristã que crê na ressurreição do corpo e esta não admite a fome, pobreza e desigualdade social. A coleta, que não tem por base a lei, mas sim a graça, é feita por amor aos pobres. É dessa maneira que se denuncia a desigualdade social.
3. A sementeira e a colheita (2 Coríntios 9,6-15) Paulo envia uma delegação para resolver o assunto da coleta nas comunidades da Acaia, pois não acredita que possa resolver tudo por carta. 2 Coríntios 9,1-5 afirma que o exemplo dos acaios suscitou a imitação de um grande número. Os acaios prometeram fazer da coleta um ato de generosidade. Assim, 2 Coríntos 9,6-14 reúne cinco argumentos capazes de convencer os acaios a praticar a mais abundante generosidade. Paulo expressa por meio desses argumentos uma concepção nova das relações humanas e da constituição da sociedade. a) Primeiro argumento. O desafio: “Mas digo isto: Aquele que semeia pouco, pouco também ceifará; e aquele que semeia em abundância, em abundância também ceifará” (2 Coríntos 9,6) lembra outras passagens da Escritura: “Um dá liberalmente, e se torna mais rico; outro retém mais do que é justo, e se empobrece” (Provérbios 11,24); “Então, enquanto temos oportunidade, façamos bem a todos, mas principamente aos domésticos da fé” (Gálatas 6,10). A coleta deve ser uma dádiva, o que significa superar e ultrapassar a si mesmo em direção ao próximo. b) Segundo argumento. A generosidade não levará ninguém à penúria: “Cada um contribua segundo propôs no seu coração; não com tristeza, nem por constrangimento; porque Deus ama ao que dá com alegria. E Deus é poderoso para fazer abundar em vós toda a graça, a fim de que, tendo sempre, em tudo, toda a suficiência, abundeis em toda boa obra” (2 Coríntios 9,7-8). Para Paulo há dois tipos de doadores: o que semeia pouco, com tristeza e por obrigação e que, por isso, pouco ceifará; o que semeia em abundância, com alegria e confiança
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c) Terceiro argumento. A verdadeira justiça consiste em dar o excedente: “Conforme está escrito: Espalhou, deu aos pobres; a sua justiça permanece para sempre. Ora, aquele que dá a semente ao que semeia, e pão para comer, também dará e multiplicará a vossa sementeira, e aumentará os frutos da vossa justiça. Enquanto em tudo enriqueceis para toda a liberalidade, a qual por nós reverte em ações de graças a Deus” (2 Coríntios 9,9-11). Devemos semear com alegria pois é o próprio Deus que cria nas pessoas a possibilidade de semear alegremente. A dádiva de Deus é motivo e condição para as dádivas da comunidade. Este dar generoso, que se apresenta alegre e sem cálculos, é ação de justiça, pois quem reparte com o irmão, realiza a vontade de Deus. Deus mesmo dará a semente (os recursos) para uma sementeira (ação) abundante. Ele também cuidará para que as dadivas não venham a empobrecer os doadores. A generosidade não só faz crescer frutos de justiça que honram a Deus, mas que ela tem a virtude de despertar a gratidão a Deus naqueles que são o alvo da generosidade d) Quarto argumento. Uma coleta é nitidamente uma ação diaconal. Paulo fala em leitourgia. Diaconia e leitourgia sempre são testemunhos que louvam a Deus, o verdadeiro doador de todos os bens. A redistribuição dos bens aos pobres é a verdadeira liturgia, a verdadeira religião. Ela desemboca numa ação de graças: “Porque a ministração deste serviço não só supre as necessidades dos santos, mas também transborda em muitas ações de graças a Deus” (2 Coríntios 9,12). A partilha das dádivas divinas se efetiva em múltiplas formas: na gratidão, no suprimento das necessidades dos que são ajudados, na intercessão pelos doadores, na saudade dos beneficiados por fraterna comunhão com os benfeitores (os destinatários terão desejo de conhecer os doadores). Vendo a diaconia dos doadores, os irmãos beneficiados reconhecerão a filantropia do próprio Senhor. Vendo o serviço dos coríntios, os irmãos de Jerusalém louvarão a Deus. e) Quinto argumento. O serviço aos pobres manifesta as verdadeiras disposições dos acaios e dele deriva a ação de graças dos pobres de Jerusalém (2 Coríntios 9,13-14). Os acaios manifestam pela sua generosidade que vivem uma verdadeira comunhão, têm um verdadeiro espírito comunitário. A comunidade é uma realidade material e concreta: manifesta-se na redistribuição dos excedentes. A generosidade para com os pobres de Jerusalém é o sinal de que os pobres acaios praticam a comunhão, não somente com eles, os de Jerusalém, mas também com todos. A graça de Deus está presente em toda essa seção: a coleta é uma graça de Deus, visto ser uma participação no próprio ser de Deus. Deus é dom, e poder dar é prolongar o agir de Deus. Prevendo essa riqueza multiforme da coleta, confiando na comunhão de todos os envolvidos e na ação de graças a Deus que a todos unirá, o próprio apóstolo se vê envolvido pela gratidão: “Graças a Deus pelo seu dom inefável” (2 Coríntios 9,15). Portanto, a coleta é graça, generosidade, diaconia, benção, serviço sagrado e confissão.
4. Temas a serem discutidos no texto a) Necessidade e excedente. 2 Coríntios 8-9 mostra que algumas pessoas tinham necessidade, em comparação com outros que tinham em abundância. Uns estão na penúria, não têm os bens necessários e sofrem por isso no seu corpo. Outros têm mais que o necessário. O que ultrapassa o necessário é o supérfluo. O necessário é o que faz falta, o excedente é aquilo de
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em Deus e que, por isso, muito ceifará. A suficiência permite transferir o dom de Deus para os necessitados. A comunidade não deve demonstrar pequena fé ao dar, mas olhar para Deus, que tem muitos recursos. Ele pode dar o necessário para a própria subsistência e ainda o suficiente para transbordar em favor de outros (Filipenses 4,19).
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que não se sente falta (8,13.14; 9,12). O necessário é o que é preciso para que os pobres possam viver. Esse conceito de direito dos pobres vem do judaísmo. No caso dos pobres de Jerusalém havia outros motivos: Jerusalém era a cidade mãe dos cristãos, o ponto de partida do novo povo de Deus. Assim, os coríntios podiam compreender um pouco melhor este argumento, pois, tendo uma vez aprendido a ajudar os pobres de Jerusalém, poderão também ajudar outros pobres e assim pouco apouco aprender que se está tecendo uma nova solidariedade entre todos os crentes. b) Pobreza e riqueza. Ricos e pobres são termos correlativos. O texto apresenta um paralelismo entre ricos e pobres por um lado e, por outro, necessidade e supérfluo. Os pobres são os que passam necessidade e os ricos são os que têm supérfluo. No texto, opõe-se a pobreza dos macedônios à riqueza da sua generosidade e a riqueza que Jesus tinha e a pobreza que adotou, a fim de que os que eram pobres se tornassem ricos. Jesus veio trazer a riqueza, mas esta riqueza exclui o privilégio e inclui uma distribuição justa dos bens disponíveis. c) Igualdade e suficiência. A finalidade do serviço aos pobres é que haja igualdade. O sentido do serviço é estabelecer a igualdade onde há desigualdade. A igualdade bíblica é igualdade econômica, uma igualdade na distribuição dos bens e no gozo dos bens materiais. Nem a pobreza, nem a riqueza, mas a igualdade. Paulo encontrou o rosto concreto da suficiência na sua própria experiência missionária. Como apóstolo, teve uma vida itinerante e sempre insegura. Como peregrino, sempre foi ao encontro do imprevisto (Filipenses 4,12-13). d) Comunidade ou koinonia Em Atos 2,42-47 os cristãos tiram as conseqüências da solidariedade, colocando tudo o que possuíam em comum. A koinonia consiste em pôr tudo à disposição dos necessitados, sem reservar nada para si só, pois se baseia essencialmente no fato de que os fiéis gozam dos mesmos bens divinos. Uma comunhão tão profunda conduz naturalmente à obrigação de partilhar bens temporais com os que dele carecem. e) Amor (agape). O amor estabelece a aliança entre Deus e o povo. O amor é um atributo fundamental de Deus e a origem de toda a história de Deus no meio dos homens. Amor é dom primordial, a substância da vida cristã. Amor tem um significado social. É solidariedade. O “serviço dos pobres” deriva do amor e é sinal da solidariedade que reúne as comunidades num só corpo (8,7.8.24; 9.7). A solidariedade mostra que o amor é uma disposição prática, que produz efeitos materiais e muda o sentido da propriedade dos bens. f) Disponibilidade. Paulo não pede aos coríntios o que eles não têm, mas unicamente o que eles têm em excesso, o supérfluo, pois o excedente de um pode gerar ou perpetuar a carência do outro. O cristianismo se fundamenta num movimento exatamente o contrário ao da perpetuação da miséria, pois ele é construído sobre a prática da solidariedade.
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As questões levantadas por 2 Coríntios 8-9 podem ser relacionadas não só com a vida econômica da igreja mas também com o sistema econômico vigente. a. Um padrão de vida cada vez mais opulento, que tem nos publicitários os seus profetas, é afirmado como o valor maior nas sociedades atuais. A ganância pelo lucro fácil e rápido das sociedades atuais tem gerado a fome e a miséria para milhões de pessoas em todo o mundo. Segundo o texto, a lógica do acúmulo deve ser contestada. Devemos trabalhar pela construção de um projeto coletivo que garanta a vida para todos. Como é possível existir tanta falta de solidariedade e ajuda para com os necessitados no mundo atual? b. As comunidades devem praticar um sistema econômico que tenha como objetivo a garantia de vida integral dos seus membros. O motivo que impulsiona o apóstolo a fazer essas afirmações tem origem no direito dos pobres do Antigo Testamento. É o projeto de igualdade. Hoje há concorrência. As comunidades estão abertas para receber todos os que queiram aceitar a graça de Deus e vivê-la concretamente? c. A contribuição para a igreja é a garantia de sobrevivência de uma igreja que tem um projeto concreto de transformação do mundo. Esse projeto se inicia na sua própria prática econômica da igreja que, por sua vez, vem da graça de Deus. A vida em abundância é determinada por um projeto econômico: só há vida em abundância se há um projeto econômico igualitário. A prática econômica da comunidade, que é conseqüência da graça de Deus, tem questionado a prática econômica vigente? A igreja tem se baseado no sistema econômico vigente ou tem procurado outra prática que garanta a sua unidade e a sobrevivência dos seus membros? d. 2 Coríntios 8-9 parece indicar que “a libertação” começa dentro das próprias fileiras”. Ela vem de baixo, não de cima. A pobreza é um mal que pode ser erradicado a partir de baixo, dos pobres, devido ao seu potencial evangelizador. Quando queremos transformar alguma coisa, geralmente procuramos os influentes. Quando Deus quis salvar o mundo, escolheu os “desprezados deste mundo”. A postura em favor dos pobres é determinante em Jesus e na comunidade primitiva. De se fez pessoa pobre, começando pelo nascimento, para que na sua pobreza nos tornássemos ricos. Ao assumir a condição de miserável, Cristo torna possível a vida total. Fica a questão: a partir de onde temos construído a nossa prática cristã?
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5. Questões a serem discutidas
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ESTUDIO 2
A experiência passada da comunidade cristã como um paradigma de ação para seu presente e futuro imediato: Hebreus 10,32-34 ebreus, após demonstrar que o sistema da antiga aliança é inferior quando comparado com a nova aliança (7,1-10,18) e que Jesus abriu “novo e vivo caminho” pelo qual temos acesso pleno a Deus (10,19-23), apresenta as conseqüências do afastamento do sacrifício único da nova aliança (10,26-31). Em seguida, em 10,32-39, apresenta uma experiência da comunidade cristã no passado, exortando-a à perseverança, numa passagem que apresenta a primeira ocorrência de reprovação e de ameaça à comunidade cristã (10,33a). A exortação contém um apelo que deriva de citações do Antigo Testamento (10,37-38) e apresenta a fé pela qual o “justo viverá”. Hebreus relembra aos destinatários a força deles em meio ao sofrimento passado (vv.32-34) e, em face daquela memória, exorta-os à esperança e perseverança para que possam receber a promessa. Ao relembrar a experiência da comunidade no passado sob circunstâncias adversas e exortá-la a considerar aquela experiência e perseverar para receber o galardão, transforma-a num paradigma de ação para o seu presente e o futuro imediato.
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As conexões que indicam o desenvolvimento do pensamento nos vv.32-36 são importantes não só para uma percepção mais clara de como o paradigma se desenvolve, mas também para uma compreensão da sua relação com 10,37-38, onde o contraste entre “pela fé” e “voltar atrás” ocorre. Os vv.32-34 estão conectados com o v.36 por meio das palavras “perseverar” e “perseverança”. “Não percais a vossa “segurança”, ela recebe uma grande recompensa”, de 10,35, está conectado com “De fato, o que precisais é de persistência para cumprir a vontade de Deus e, assim, conseguir a realização da promessa” (10,36). A perseverança, de 10,36, já havia sido sugerida no v.35 com a menção de “segurança” e a exortação a não abandonar a “confiança” está fundamentada na esperança de um galardão futuro. O desenvolvimento do pensamento conduz também a outro aspecto em 10,37-38. Por um lado, “suportar o sofrimento” (v.32) está fundamentado na “melhor possessão” (v.34) e a “intrepidez” tem em mente a “recompensa” (v.35). Por outro, a necessidade de “perseverança” (v.36) fundamenta-se não em “para cumprir a vontade de Deus e, assim, conseguir a realização da promessa”, mas nas citações do Antigo Testamento nos vv.37-38, que indicam que o tempo de espera ainda não passou. Assim, 10,36: “De fato, o que precisais é de persistência para cumprir a vontade de Deus e, assim, conseguir a realização da promessa”, conduz a 10,37: “Pois ainda tão pouco, tão pouco tempo, e aquele que vem estará aí, não tardará”, que apresenta a razão pela qual a comunidade deve manter a “segurança”. Assim, o compromisso e coragem da comunidade em circunstâncias adversas no passado, são apresentados como um modelo de ação para o momento atual da comunidade cristã. A experiência passada da comunidade é apresentada da seguinte forma: “Mas recordai-vos dos vossos primórdios: mal havíeis recebido a luz e já aturáveis um pesado e doloroso combate, aqui, oferecidos em espetáculos sob injúrias e perseguições; ali, feitos solidários dos que sofriam tais tratamentos. E, de fato, participastes nos sofrimentos dos prisioneiros e aceitastes com alegria a espoliação dos vossos bens, sabendo que estáveis de posse de uma fortuna melhor e duradoura” (10,32-34). Estes versos estão estruturados quiasticamente, constituindo uma indicação de que Hebreus procura enfatizar a experiência da comunidade:
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Aqui, oferecidos em espetáculo sob injúrias e perseguições Ali, feitos solidários dos que sofriam tais tratamentos E, de fato, participastes nos sofrimentos dos prisioneiros E aceitastes alegremente a espoliação dos vossos bens
O uso da conjunção adversativa “mas”, em 10,32, indica que Hebreus procura levar os destinatários a agir de maneira oposta à que ele acabou de descrever em 10,26-31. A exortação a relembrar a experiência passada, uma característica regular da homilia cristã primitiva, não só envolve a memória dos eventos ocorridos durante a perseguição da comunidade (12,1.2.3.7), como também indica que a comunidade deveria agir no presente como agiu no passado. As indignidades sofridas pela comunidade são destacadas e a referência à experiência de perseguição torna-se mais específica com a apresentação do que aquela experiência envolveu. Uma parte da comunidade foi exposta ao ridículo, presa e sofreu abuso das autoridades, mas os demais membros da comunidade foram solidários com aqueles que passaram por estes sofrimentos.
1. Exposição à vergonha pública Hebreus destaca a humilhação pública sofrida pelos destinatários: “oferecidos em espetáculos sob injúrias e perseguições”. “Oferecidos em espetáculos” significa tornar-se espetáculo, ser ridicularizado e exposto à vergonha. “Injúrias” e “perseguições” indicam a natureza da humilhação a que os destinatários foram sujeitos. “Injúria” significa “desgraça”, “vergonha”, “escândalo” e, secundariamente, abuso e abjuração. Esta palavra descreve vários tipos de abuso verbal e o seu uso repetido em 11,26 e 13,13 sugere que o abuso foi um aspecto real e constante da experiência dos destinatários de Hebreus. O seu significado varia, portanto, de reprovação a maldição, passando a afronta, escárnio, injúria e ultraje, associando-se com comentários sarcásticos e, freqüentemente, com escárnio, acompanhado por comentários degradantes, e, embora não possamos saber com precisão quando isto ocorreu, o autor de Hebreus considera a lembrança desse momento de alguma forma necessária para a resposta da comunidade cristã no presente. A descrição da experiência passada revela que a honra deles estava sendo atacada individual e coletivamente e exposta cada vez mais à degradação. A vergonha infligida pelos perseguidores surgia normalmente de uma desgraça ligada a um crime ou era resultado de uma condenação pública. Ela envolvia ataques verbais à honra e caráter da pessoa e parece que isto foi comum aos cristãos em vários contextos sociais, estando diretamente ligada à associação deles com Cristo (1 Pedro 4,14-16; Mateus 5,11; Lucas 6,22). O mais amargo elemento da experiência da comunidade foi a sua exposição à vergonha pública, mas Hebreus também mostra que o abuso verbal estava ligado a ataques físicos. Hebreus utiliza a palavra thlipsis para descrevê-la, um expressão que indica todas as formas de perseguição que os cristãos sofreram. Thlipsis é uma palavra usada na Septuaginta para descrever o sofrimento de Israel (2 Reis 13,4), especialmente quando o salmista fala em nome do povo (Salmo 4,1; 9,9; 10,1), nas referências a um dia ou tempo de angústia (Salmo 37; 50,15. Thlipsis é também um dos elementos mais comuns e gerais que o Novo Testamento utiliza para descrever a perseguição (Mateus 13,19.24; Atos 7,10; 14,22; Romanos 5,3; 8,35; 2 Coríntios 4,8; Apocalipse 2,9). A fonte da aflição é tipicamente um inimigo humano e Hebreus não identifica ou ataca aqueles que têm perseguido os seus destinatários e, embora Hebreus afirme que os destinatários ainda “não haviam resistido até o sangue” (12,4), ou seja, não ocorrera morte como resultado dos julgamentos suportados, o compromisso deles com Cristo os expôs à censura, difamação e ao abuso físico. Todos estes tormentos fizeram com que os destinatários de Hebreus se tornassem espetáculo público e não podemos saber com precisão quando isto ocorreu e as experiências de sofri-
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A: B: B’: A’:
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mento indicadas pertencem claramente ao passado da comunidade. É também provável que a intensa experiência de desgraça e a aguda desaprovação da sociedade tenham provocado nos cristãos um sentimento de vergonha, ou seja, eles se viram tentados a respeitar uma vez mais seus valores, relações e tradições. Mas, segundo Hebreus, foi a resistência a estas tentativas de controle social no passado que fez deles os melhores exemplos para o presente, razão porque Hebreus considera a lembrança desse momento de alguma forma necessária para a resposta dos seus destinatários no presente, cuja honra estava sendo atacada individual e coletivamente e exposta cada vez mais à degradação. Sem dúvida alguma, o espetáculo público a que foram expostos contribuiu para a dolorosa e natural ligação entre “injúrias” e “perseguições” que Hebreus fala (10,33a).
2. Confisco da propriedade e prisão Outro aspecto da experiência de perseguição e marginalização dos destinatários de Hebreus consiste no confisco da propriedade e na prisão de alguns deles (10,34b). Não se sabe ao certo se estamos diante de uma ação judicial oficial dos magistrados que impuseram pesadas multas ou confiscaram as propriedades devido a infrações suspeitas ou se a referência é ao saque de casas depois que seus proprietários foram presos ou banidos. De qualquer forma, a perda de riqueza, particularmente como parte do ataque à honra da pessoa e à própria pessoa, envolvia a perda de status. Riqueza e posses geralmente não eram acumuladas como um fim em si mesmo no mundo antigo, mas para prestígio e honra através do sistema de beneficência privada ou pública. Uma perda de riqueza envolvia uma potencial perda de prestígio. A honra estava ligada à demonstração da riqueza, mesmo a pequena riqueza de um camponês. Qualquer que fosse a riqueza de alguém, ela consitia num tesouro e indicação do status da pessoa. A perda de riqueza envolvia também uma perda proporcional de honra e provocaria o desprezo de outros se fosse considerada como resultado de uma falta da própria vítima. A situação de reprovação e rejeição apresentada indica que os cristãos poderiam trazer a desgraça sobre eles mesmos ao se recusarem a cumprir as obrigações exigidas pelos padrões vigentes. A perda oficial, ou não, da propriedade, ligada com a degradação deles como cristãos envolveria desgraça adicional, pois ela poderia também colocá-los numa situação econômica mais difícil, sendo difícil para eles recuperar a sua posição econômica anterior. De qualquer forma, o efeito geral daquela experiência foi de marginalização social, rejeição e degradação. O lugar dos cristãos na sociedade foi desafiado e as pessoas envolvidas perderam seu status como cidadãos firmes e confiáveis. Podemos supor que com o passar do tempo a situação mudou e eles começaram a sentir o desejo de recuperar seu lugar na sociedade, bem como sua honra diante dos incrédulos. No decorrer do tempo, foram confrontados por aqueles que estavam conscientes da sua degradação, que bem poderiam lhes ter lembrado o seu novo status na sociedade. Assim, eles começaram a sentir vergonha, ou seja, a ficar preocupados com a sua reputação diante dos representantes da sociedade. Foi talvez mais fácil no fogo da perseguição, no fervor da solidariedade religiosa, deixar de lado a opinião dos de fora. Viver com sua perda, entretanto, estava se tornando mais difícil. Por isso, Hebreus realiza um jogo entre as palavras “propriedades, posses” (v.34b) e “possessão” (v.34c), que é retoricamente efetivo ao desenvolver o contraste entre posses que podem ser perdidas e posses permanentes que os cristãos possuem devido ao seu relacionamento com Deus através de Cristo. O adjetivo “superior” é usado regularmente em Hebreus para expressar a efetividade da realidade que os cristãos possuem (6,9; 7,19; 9,23; 11,16; 12,24). A confiança dos primeiros cristãos de que eles possuíam “uma fortuna melhor e duradoura” no
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3. A solidariedade da comunidade Hebreus nota também que outro componente na ação dos seus destinatários foi a disposição daqueles que, presumivelmente, não tinham sofrido a mesma punição pública, demonstrar solidariedade com os que eram tratados daquela forma. Aqueles que não haviam sido atingidos pessoalmente pela hostilidade a qual alguns membros da comunidade foram sujeitos se identificaram abertamente com seus irmãos e irmãs. A afirmação de 10,33: “aqui, oferecidos em espetáculos sob injúrias e perseguições; ali, feitos solidários dos que sofriam tais tratamentos”, acentua a persistência demonstrada pelos destinatários em compartilhar o sofrimento dos seus companheiros. Além de suportar as aflições, eles tornaram-se “participantes” dos que foram tratados daquela maneira. Hebreus 10,25 alerta para o perigo de negligenciar a comunhão, mas agora destaca a mais ampla comunhão da comunidade cristã que alcançou completa expressão em tempos de necessidade. No v.34 a recordação torna-se mais específica na afirmação da compaixão e sofrimento pessoal que os destinatários tinham experimentado. Sua comunhão com a aflição dos outros foi manifestada em sua compaixão pelos prisioneiros, a qual, sem dúvida, foi mais que mera simpatia, envolvendo o apoio concreto que o irmão preso necessitava (ver 13,3). Os que não tinham sofrido a mesma punição pública, manifestaram uma verdadeira compaixão para com os que estavam na prisão ao visitá-los e levar-lhes alimento e, sem dúvida, procurar a sua libertação. Os que vieram em auxílio dos que foram diretamente espoliados deram testemunho de que preferiam a comunidade dos seus companheiros na fé e não aquela da cultura dominante. Eles vieram ousadamente em auxílio de seus irmãos e irmãs diante daquela sociedade (10,35) e não tiveram medo de possíveis represálias. O envolvimento deles com os seus companheiros não foi gratuito e a solidariedade manifestada naquele período é similar à maneira com que Cristo se identificou com a condição humana (2.14; 4,15). A comunidade agiu de forma solidária para com aqueles que necessitavam de apoio, tornando visível no mundo a solidariedade que Cristo compartilhou com o seu povo. Vemos, portanto, que Hebreus 10,32-34 apresenta a coragem e compromisso da comunidade cristã sob circunstâncias adversas no passado como um modelo para a sua perseverança atual. Partindo de uma tradição cristã primitiva designada a fortalecer os cristãos na crise de perseguição, o autor aplica aquela tradição aos destinatários, a fim de encorajá-los a imitar seu próprio exemplo. A perseverança da comunidade indica que seus membros “receberão a promessa”. A promessa, um motivo que aparece antes em Hebreus como uma alusão à salvação inaugurada por Cristo (4.1.8; 6,12.17; 8,6), surge novamente, constituindo-se num fio condutor importante através do capítulo 11 (vv.13.17.33.39). Hebreus procura motivar a comunidade a “não abandonar a segurança” (10,35), que é, significativamente, oposta à vergonha, assinalando o grande galardão que eles tinham recebido e que receberiam se permanecessem firmes no seu compromisso. Os fiéis são exortados a demonstrar fé e não voltar atrás no seu compromisso com Cristo. Neste contexto, Hebreus retorna aos exemplos celebrados de com-
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mundo celestial que Cristo havia aberto para eles permitiu-lhes desenvolver uma perspectiva própria sobre a privação sofrida em meio à perseguição. Quaisquer que tenham sido as circunstâncias, os destinatários de Hebreus aceitaram alegremente aquelas perdas porque sabiam que possuíam “uma fortuna melhor e duradoura”, tinham consciência de possuir uma realidade superior, melhor que as posses terrenas, pois da mesma forma que o sumo sacerdote celestial e a cidade que há de vir, a possessão deles é uma realidade permanente (7,3; 11,14-16; 13,14).
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promisso e fé, a fim de estimular o zelo deles pela honra diante de Deus e reforçar a idéia de que eles deveriam continuar afastados dos valores da sociedade vigente.
4. Questões a serem discutidas 1. A confissão cristã provocou a degradação e trouxe privação aos destinatários de Hebreus. O perigo real para ela seria colocar em perigo a sua honra diante de Deus ao voltar atrás diante da pressão da sociedade. Assim, Hebreus 10,32-34, partindo de uma tradição que procurava fortalecer os cristãos na crise de perseguição, procura encorajar a comunidade cristã a imitar o seu próprio exemplo no passado, quando uma parte da comunidade foi exposta ao ridículo, presa e ficou indefesa diante do confisco da sua propriedade, mas a outra parte foi solidária com o grupo que sofreu aquelas atrocidades. Como podemos recontar a história das comunidades cristãs e como a vida delas pode hoje iluminar a nossa vida como comunidades cristãs comprometidas com o Reino de Deus? 2. A confiança da comunidade cristã de que ela possuía “uma fortuna melhor e duradoura” no mundo celestial que Cristo havia aberto para ela permitiu-lhe desenvolver uma perspectiva própria sobre a privação sofrida em meio à perseguição. Quaisquer que tenham sido as circunstâncias, os destinatários de Hebreus aceitaram aquelas perdas porque sabiam que possuíam “uma fortuna melhor e duradoura”, tinham consciência de possuir uma realidade superior, melhor que as posses terrenas, pois da mesma forma que o sumo sacerdote celestial e a cidade que há de vir, a possessão deles é uma realidade permanente (7,3; 11,14-16; 13,14). No mundo atual, contudo, assistimos não só a expoliação de muitas pessoas bem como a justificação da miséria de muitos em nome de “melhores riquezas celestiais”. Como, como comunidade cristãs, devemos lidar com a questão das “possessões materiais” de forma que a justiça do reino de Deus seja contemplada? 3. No relato da experiência de sofrimento passada dos destinatários de Hebreu vemos que aqueles não haviam passado pelo sofrimento se tornaram “solidários dos que sofriam tais tratamentos, participando nos sofrimentos dos prisioneiros”. Da mesma forma, em nosso contexto, diante so sofrimento provocado por diversas causas, como, como comunidades cristãs, podemos criar redes de solidariedade e acolhimento para os que são desalojados pelo sistema vigente? Lembremos da exortação de Hebreus 13,2-3: “Não negligencieis a hospitalidade, pois alguns, praticando-a, sem o saber acolheram anjos. Lembrai-vos dos encarcerados, como se presos com eles; dos que sofrem maus tratos, como se, com efeito, vós mesmos em pessoa fôsseis os maltratados.”
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A queda da Babilônia em Apocalipse 18 pocalipse 18 descreve a destruição da Babilônia e o colapso do mundo associado a ela. Na época do Apocalipse, Babilônia era um nome utilizado como um símbolo do “poder mundial”, portanto como um símbolo do império romano. O texto mostra navios comerciais que passam dia a dia a caminho da Babilônia. Não é surpresa que João condene aqueles que transportavam as mercadorias para a grande cidade. A literatura apocalíptica da época revela que ele não estava sozinho em sua condenação da Babilônia e o uso que ele faz da da literatura profética indica que ele estava preocupado com a ação recíproca da idolatria, poder militar e comércio. João exorta os cristãos a separar ou evitar ligações econômicas e políticas com a Babilônia, pois as instituições e estruturas representadas por ela eram leais ao imperador que reivindicava ser divino ou era tratado como tal. Para ele, a propaganda imperial era um embuste e sua lealdade pertence à nova Jerusalém.
A
Vejamos o texto: 1
Depois disso vi outro anjo que tinha grande autoridade descendo do céu e a terra foi iluminada com a sua glória. 2 E gritou com forte voz dizendo: Caiu, caiu, Babilônia, a grande e tornou-se morada de demônios covil de todo espírito imundo covil de toda ave imunda e covil de toda besta imunda e detestável 3 porque todas as nações beberam do vinho da fúria da sua prostituição os reis da terra com ela se prostituíram e os mercadores da terra da força da sua luxúria enriqueceram. 4 E ouvi outra voz do céu dizendo: Sai dela ó povo meu para que não participeis dos seus pecados para que não recebais das suas pragas 5 porque os pecados chegaram até o céu e Deus se lembrou das suas injustiças. 6 Dai-lhe como também ela deu e dai em dobro segundo as suas obras no cálice em que ela misturou, misturai dobrado para ela, 7 tanto quanto glorificou a si mesma e viveu em luxúria tanto dai a ela tormento e pranto. Porque no seu coração disse: Estou sentada como rainha, não sou viúva e pranto jamais verei. 8 Por causa disto em um dia virão as suas pragas, morte, pranto e fome, e em fogo será queimada porque poderoso é o Senhor Deus que a julgou. 9 E chorarão e se lamentarão sobre ela os reis da terra que com ela se prostituíram e viveram em luxúria, quando virem a fumaça do seu incêndio, 10 de longe ficam de pé por causa do medo do seu tormento dizendo: Ai, ai, da grande cidade Babilônia, a poderosa cidade porque em uma hora veio o seu julgamento. 11 E os mercadores da terra choram e lamentam sobre ela porque ninguém mais compra a sua mercadoria, 12 mercadoria de ouro e de prata, de pedras preciosas, de pérolas, de linho e púrpura, de seda, de escarlate, toda madeira odorífera, todo vaso de marfim, todo vaso de madeira preciosa, de bronze, de ferro, de mármore, 13 cinamomo, amono, perfumes, ungüento,
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ESTUDIO 3
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incenso, vinho, azeite, farinha finíssima e trigo, animal de carga e ovelhas, cavalos e carros, escravos e vidas humanas. 14 E o fruto do desejo de sua alma retirou-se de ti e todas as coisas delicadas e brilhantes perderam-se de ti e jamais serão encontradas. 15 Os mercadores destas coisas, que com ela enriqueceram, de longe ficarão de pé por causa do medo do seu tormento, chorando e pranteando, 16 dizendo: Ai, ai, da grande cidade vestida de linho, púrpura e escarlate adornada de ouro, pedras preciosas e pérolas, 17 Porque em uma hora foi devastada tão grande riqueza. E todo piloto e todo o que navega livremente, marinheiros e os que trabalham no mar, permaneceram de longe, 18 e gritavam vendo a fumaça do seu incêndio dizendo: Quem é semelhante à grande cidade? 19 E lançaram pó sobre as suas cabeças e gritavam chorando e pranteando dizendo: Ai, ai, da grande cidade a qual, da sua opulência, enriqueceram todos os que têm navios no mar porque em uma hora foi devastada. 20 Alegrai-vos sobre ela ó céus e vós santos, apóstolos e profetas porque Deus contra ela julgou a vossa causa. 21 E um anjo forte tomou uma grande pedra como de moinho e a atirou no mar dizendo: Dessa maneira, com violência, Babilônia, a grande, será lançada e jamais será encontrada. 22 E a voz de harpistas, de músicos, de flautistas, de tocadores de trombetas jamais será ouvida em ti e todo artífice (de toda arte) jamais será encontrado em ti e a voz do moinho jamais será ouvida em ti 23 e a luz da candeia jamais brilhará em ti e a voz do noivo e da noiva jamais será ouvida em ti porque os teus mercadores foram os grandes da terra porque na tua feitiçaria foram seduzidas todas as nações 24 e nela foi encontrado sangue de profetas, santos e de todos os que foram mortos sobre a terra.
Comentário do texto A destruição da Babilônia e o colapso do mundo associado a ela descrito em Apocalipse 18 são apresentados com os elementos do cântico fúnebre, já presente nos profetas do Antigo Testamento. Os profetas utilizaram o cântico fúnebre para falar da comunidade, da nação, do povo, do declínio político, agitando, exortando e antecipando a queda do reino, variando do contexto afetivo de tristeza para a ironia. Os lamentos fúnebres dirigidos contra Tiro (Ezequiel 26-28) e com os oráculos proféticos sobre a queda da Babilônia (Jeremias 50-51; Isaías 13-14; 47) são de grande significado para a composição do Apocalipse 18. Estes cânticos, que assinalam o contraste entre o brilho da cidade e sua devastação, entre o seu passado e o agora, contém o modelo para o lamento fúnebre de Apocalipse 18.
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Apocalipse 18:1-3 relata uma visão da queda da Babilônia. Os vv.1-2a apresentam a visão e os vv.2b-3 apresentam as razões pelas quais a cidade está sendo destruída. O mensageiro, “um outro anjo”, se dirige ao vidente de forma diferente que outros anjos e o vidente ouve uma proclamação: um anúncio público do céu à terra, uma mensagem que consiste na queda da Babilônia. A linguagem “Caiu, caiu Babilônia, a grande”, que proclma a queda da Babilônia, a mesma usada no Antigo Testamento nos oráculos contra a Babilônia, exprime a certeza de um evento que ainda não havia ocorrido. A descrição da Babilônia destruída como “morada de demônios, morada de espíritos imundos, de aves impuras, de bestas impuras e detestáveis”, segue as figuras usadas nas profecias da devastação da Babilônia, Edom Nínive (Isaías 13:1922; 34:11-15; Jeremias 50:39; 51:37). Apocalipse 18:3 apresenta as razões da queda da Babilônia e atribui uma atividade diferente a cada um dos grupos associados com a Babilônia: “as nações beberam o vinho da fúria da sua prostituição” (14:8; 17:2); “os reis que com ela se prostituíram”; “os mercadores da terra se enriqueceram da força da sua luxúria”. Assim, Apocalipse 18:1-2 demonstra a reapropriação da Babilônia como a denominação simbólica do poder mundial hostil através de uma releitura dos oráculos proféticos contra a Babilônia. As metáforas da má conduta sexual e intoxicação são desenvolvidas no v.3 e este versículo, ao mencionar as transgressões econômicas, prepara o caminho para o uso dos oráculos de Ezequiel contra Tiro e seu rei nos vv.9-19. Com o uso dos oráculos contra Tiro, a dimensão econômica das transgressões da Babilônia vêm à luz. Apocalipse 18,4-8, por sua vez, contém um aviso que consiste numa ordem para sair da cidade, cujas razões são especificadas (vv.4b-5) e uma ordem para executar julgamento sobre a Babilônia (vv.6-8). As ordens são dadas nos vv.6-7a e explicadas nos vv.7b-8. O povo de Deus é exortado a romper a sua relação com a Babilônia para não compartilhar do seu pecado pois “estes chegaram até o céu e Deus se lembrou das suas iniquidades”. O povo de Deus é também chamado a retribuir à Babilônia o mal, o sofrimento que a Babilônia lhe causou (v.6). “Dai-lhe em dobro segundo as suas obras”, “preparar a taça”, são expressões da lex-talionis (Jeremias 50:29; 51:34-40; Êxodo 22:4.7; Isaías 40:2). A noção da dupla retribuição está combinada com a imagem da taça, a metáfora da intoxicação desenvolvida anteriormente (17:2; 18:3). Babilônia será punida apropriadamente: ela beberá uma dupla porção de sua própria taça, de acordo com as suas obras. A metáfora da taça é empregada numa irônica inversão: a imagem aplicada à influência intoxicante da Babilônia sobre as nações é também a imagem usada para descrever a sua sentença (16:19; 17:2.4). A retribuição é expressa em termos da inversão de situações e as repetições “dai/deu”, “dai-lhe em dobro”, “misturou/misturai em dobro” enfatizam a correspondência entre os crimes de Babilônia e a punição que ela deve sofrer. O v.7 descreve a auto-glorificação e o orgulho da cidade, mas o seu destino é o resultado do seu próprio orgulho. Assim, a exortação ao povo a sair da cidade termina com um apelo ao justo julgamento de Deus: “em um só dia” (v.8). A repentinidade deste julgamento é ainda destacada nos vv.8,10.17.19, onde “em um só dia” é o refrão recorrente na boca dos reis, mercadores e marinheiros. Este julgamento, que traz morte, pranto, fome, a cidade queimada em fogo, é realizado pelo “poder de Deus”. Deus exerce a sua justiça definitiva no “tempo final” em favor do seu povo, como o seu Salvador (v.20).
2. Lamentos sobre a Babilônia: vv.9-20 Os vv.9-19 apresentam os cânticos fúnebres de três grupos: dos reis (vv.9-10); dos mercadores (vv.11-17a); dos marinheiros (vv.17b-19). O v.20, que conclui a seção, é uma ordem dada aos santos, apóstolos e profetas para se alegrarem “porque Deus julgou a causa deles”, e sua sua alegria contrasta com a tristeza dos reis, mercadores e marinheiros. Estudos sobre Coríntios, Hebreus e Apocalipse
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1. Anúncio de queda e exortação a sair da Babilônia: vv.1-8
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2.1.
O lamento dos reis: vv.9-10
O primeiro dos três lamentos pertence aos reis da terra, cujo relacionamento com a Babilônia é descrito no v.3 como “os que com ela adulteraram e viveram em luxúria”. O v.10b apresenta a repetição do lamento “ai, ai” (18,16.19; cf. 8,13; Ezequiel 16:23), os quais fazem parte da enfática declaração de julgamento contra Babilônia. Assim, a expressão “ai, ai” estendida na expressão que segue: “Babilônia, a poderosa cidade”, chama a atenção para este elemento da queda da grande cidade e concentra-se na ruína do seu poder. O final do lamento assinala a repentinidade da queda da grande cidade e reafirma a qualidade forense deste fato ao usar uma expressão “Pois o seu julgamento veio em uma hora”. Dessa forma, o orgulho da Babilônia (v.7), seu poder descrito com a metáfora da má conduta sexual e intoxicação (14:8; 17:2.4; 18:3.9), são repentinamente destruídos. Em Apocalipse 18:8 o poder de Deus é exercido em sua execução do julgamento da Babilônia. Em Apocalipse 18,10b o julgamento da Babilônia envolve a perda do seu poder. 2.2.
O lamento dos mercadores: vv.11-17a
O segundo lamento, pronunciado pelos mercadores da terra, é precedido por uma enumeração das mercadorias fornecidas à Babilônia, que ilustra a luxúria da sua vida e a vastidão do seu comércio que se concentrava sobretudo nos portos da Ásia (vv.12-13). Aqueles que lamentam são identificados como “os que se enriqueceram da força da luxúria da grande cidade” (v.3). Na relação das mercadorias encontramos “ouro, prata, pedras preciosas, linho, púrpura, seda, escarlate, madeira aurífera, vaso de marfim, vaso de madeira preciosa, de bronze de mármore, cinamomo, amomo, perfumes, unguento, incenso, vinho, azeite, farinha finíssima e trigo, animal de carga e ovelhas, cavalos e carros, escravos e vidas humanas” (veja Ezequiel 27:12-25). Encontramos pedras preciosas e objetos de luxo, metais (ouro, bronze, ferro), madeira e mármore, artigos de alimentação (vinho, azeite, farinha, trigo) e o negócio de escravos. O catálogo apresentado descreve a imensa luxúria da Babilônia e enfatiza, principalmente, o que é perdido na queda da cidade. O próprio lamento, que repete seis dos itens da lista (v.16), assinala esta ruína de forma que lembra 18:12-13.14 e faz a ligação entre as vestes da prostituta e as vestes idênticas da grande cidade (ver 17:4). Por sua vez, Apocalipse 18:15 assemelha-se à 18:9 e 18:17b-19 quando descreve o medo dos mercadores e sua distância do incêndio da cidade. Estes, “choram e pranteiam”, pois não mais se beneficiam do comércio com a Babilônia. Eles são os que se enriqueceram com ela. Os vv.16-17a retomam 17:4, que descreve a opulência do aparecimento da prostituta, agora destruída pelo julgamento divino. Assim, se no primeiro lamento os reis choram a queda da cidade, neste os mercadores lamentam a destruição da sua riqueza, numa descrição derivada da grande prostituta. 2.3.
O lamento dos marinheiros: vv.17b-19
No terceiro lamento (vv.17b-19), a identificação daqueles que lamentam como pilotos, os que navegam livremente, marinheiros e os que trabalham no mar enfatiza mais o aspecto comercial que o marítimo: “na qual enriqueceram todos os que têm navios no mar” (19b), já evidente na identificação do grupo como “os que trabalham no mar”. O seu gesto de lamento no v.19: “Lançam pó sobre as suas cabeças” e “gritavam chorando e pranteando”, inclui também a exclamação “Quem é semelhante à grande cidade?”, antes do gesto e do próprio lamento. O lamento, começando com uma expressão geral da tristeza, seguida por uma referência específica à glória anterior da grande cidade: “Porque em uma hora foi tornada deserta”, expressa a tristeza dos marinheiros com a ruína da riqueza ganha através do comércio marítimo com a Ba-
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Neste sentido, a denúncia que se expressa nesta seção na forma do lamento dos reis, mercadores e marinheiros, assinala a destruição do poder imperial e de todos os que se beneficiaram com ele. A releitura de Jeremias 50-51 e Ezequiel 26 não só estabelece a continuidade entre os vv.4-8 e 9-19, mas também integra estes materiais no desenvolvimento do tema do poder como um aspecto da ordem política que é inseparável da ordem teológica. Assim, estes lamentos anunciam a destruição da Babilônia, a cidade para onde confluíam as riquezas do mundo e onde a idolatria do mundo inteiro, dos pequenos e dos grandes, dos trabalhadores e dos chefes, se manifesta com a mais insuportável luxúria. A estrutura de poder na qual o império se converteu, submetendo muitos povos ao seu poderio econômico do qual se sustenta, e a expansão desse poder para os estados e reinos que dele participam e a rede de relações de dependência que foi criada, vêm ao fim. O juízo escatológico de Deus vem sobre este poder absoluto, as riquezas acumuladas e a cidade. O poder de Deus se manifesta no julgamento por meio do qual a Babilônia perde o seu poder e aqueles que choram a sua ruína são os que compartilhavam da sua atividade. Por essa razão, a seção termina no v.20 com um imperativo dirigido aos santos, apóstolos e profetas para regozijarem-se, pois “Deus contra ela julgou a vossa causa”, pois ao julgar a Babilônia, Deus vingou os cristãos e lhes fez justiça. O que é causa de lamento para os associados da grande cidade é proclamado pela voz celestial como causa de celebração para os “santos, apóstolos e profetas”.
3. Ação simbólica e sua interpretação: vv.21-24 Apocalipse 18:21-24 contém o último lamento da queda da Babilônia. Inicia-se com uma narrativa curta que descreve um ato simbólico profético, a ação do anjo de “atirar uma grande pedra, como de moinho, ao mar” (Jeremias 25:10; 51:63-64), interpretado como uma pré-estréia da queda da Babilônia. Apresenta três partes: o relato: v.21; a interpretação: vv.21b-23b; as razoes do julgamento: vv.23c-24. Desta forma, se os vv.9-19 fala da ruína da Babilônia em sua relação com o mundo tal como representado nos seus aspectos político e comercial, os vv.2124 apresentam a destruição repentina da Babilônia, numa referência à extinção da vida interna da cidade representada nos seus prazeres, no trabalho de seus artesãos e na sua vida familiar. A canção de julgamento afirma que “não mais se achará ali a voz de harpistas, de músicos, de tocadores de flautas, de clarins; não haverá mais artífices, não se ouvirá mais a pedra do moinho, luz não mais brilhará, não se ouvirá mais a voz do noivo e da noiva” (vv.22-23; veja Jeremias 7:34; 25:10; Ezequiel 26:13). Os vv.23b-24 apresentam três razões para o julgamento da grande cidade: 1. “Os seus mercadores foram os grandes da terra” (Isaías 23:8) 2. “Na sua feitiçaria foram seduzidas todas as nações” (Apocalipse 14:8; 17:2; 18:3; Naum 3:4; Isaías 47:12) 3. “Nela se encontrou sangue de profetas, santos e de todos os que foram mortos sobre a terra” (Apocalipse 6:10; 16:6; 17:6; 19:2). Por causa de seus crimes, a pena adequada deve ser aplicada contra a Babilônia. É por esta razão que estes versículos apresentam o quadro de uma cidade desolada e desprovida dos sons e atividades que caracterizam a vida urbana. Em lugar destes, é encontrado o sangue daqueles que a Babilônia silenciou e que consiste na evidência dos crimes pelos quais ela merece condenação. Os mercadores, mencionados como os que se beneficiaram com a luxúria de Babi-
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bilônia. Os marinheiros lamentam as oportunidades perdidas para adquirir mais riqueza, da mesma forma que os mercadores o fizeram (vv.15-17a).
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lônia, aparecem pela última vez em 18:24. O retrato da desolação da cidade é completado pelo silêncio dos vv.22-23. Apocalipse 18, portanto, como narrativa da queda da Babilônia, combina cânticos fúnebres escatológicos e anúncios de desgraça, especificando as razões para tal desgraça. Sua mensagem denuncia o sistema econômico que poder político instalou, o qual vem ao fim juntamente com os associados que dele se beneficiavam.
4. Questões a serem discutidas Apocalipse 18, ao fazer uma releitura dos profetas do Antigo Testamento, não denuncia somente as transgresões na esfera religiosa, mas acrescenta uma novidade ao incluir as transgressões na esfera econômica e também denunciá-las como idolatria. Assim, este capítulo nos permite fazer algumas observações em termos da atualidade: a. A descrição da Babilônia apresenta idolatria e envolvimento com o seu comércio, além do destaque dado à sua auto-glorificação e arrogância. Babilônia é um sistema político que abrange tudo. Tem aliados que se beneficiam da sua política e estão associados no seu projeto econômico. Riqueza, orgulho, blasfêmia, atitudes arrogantes e obras injustas estão unidas num mesmo comportamento em passagens que expressam principalmente a certeza de que Deus derruba os soberbos e os injustos. Vários sistemas políticos-econômicos atuais também vitimam milhões de pessoas em todo o mundo, consideram-se eternos e lutam para se perpetuar no poder. Como, como comuindades cristãs, podemos discernir na história estes sistemas e denunciá-los? b. Apocalipse 18:9-19 apresenta o lamento dos reis, mercadores e navegantes. A Babilônia é descrita em sua luxúria e orgulho como um comerciante que se enriqueceu a partir do domínio das rotas marítimas, mas quando a cidade cai, juntamente com ela rompe-se toda uma rede de relações econômicas. Esta é a razão do lamento dos reis, mercadores e marinheiros, pois estes, antes associados à cidade, agora compartilham da sua sorte. Todos estes versículos formam um discurso contra o exercício do poder econômico e o modo como ele se expressa, neste caso através do comércio. Temos outra vez o fator econômico como o elemento básico que constitui o pecado do poder imperial e que merece o juízo de Deus. Portanto, como podemos discernir e denunciar os mecanismos econômicos injustos no no mundo atual que provocam a miséria de muitos em todo o mundo? c. No mundo atual, a globalização do mercado acontece de forma rápida e radical e a expectativa é que a economia e o comércio mundial cresçam, produzindo maior benefício para todos. Mas, ironicamente, enquanto o mercado global triunfa integrando a todos os povos e sociedades, o que visto é a promoção da injustiça econômica entre as nações pobres e ricas, e entre os economicamente fortes e fracos. A ilimitada competição das forças econômicas torna a situação social volátil, provocando conflitos violentos, criando a exclusão de milhões de pessoas: os pobres, os fracos e a maior parte da população são excluídos dos benefícios do mercado globalizado pelos poderes constituídos e autoridades econômicas. As suas vítimas já não mais se restringem a uma parte do mundo e são hoje visíveis em toda parte. O sacrifício dos mais fracos é justificado em nome do progresso. A vitimização dos seres humanos pelo mercado global torna-se hoje um ponto a partir do qual podemos entender os efeitos que a globalização da economia provoca. Por isso, da mesma forma que a descrição de Apocalipse 18, estamos diante de “uma situação pecaminosa que não passa desapercebida aos olhos de Deus, nem é algo pelo qual Ele possa ficar desinteressado”. O sistema econômico-político atual constitui o cerne de uma situação pecaminosa que também cai sob o juízo de Deus.
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PROGRAMA FE Y ECONOMÍA SOLIDARIA • FES
Estudos sobre Coríntios, Hebreus e Apocalipse
CONSEJO LATINOAMERICANO DE IGLESIAS • CLAI
El presente material es una publicación del Programa de Fe, economía y Sociedad, una iniciativa conjunta de iglesias y organizaciones cristianas al servicio de Dios en América Latina y el Caribe. Este material fue publicado gracias al convenio suscrito entre Pan para Todos y el CLAI, para impulsar el Diálogo Global con los Sectores Financieros en América Latina (DGF).
Les agradecemos enviar sus aportes, sugerencias e inquietudes a la atención de: Franklin Canelos • Fe, economía y Sociedad CLAI • Casilla 17-08-8522 • Quito-Ecuador (593-2) 2553 996, 2529 933 • e-mail: franklin@claiweb.org Segunda edición, ampliada y corregida
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