Quarentena - Parte 10

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10 Quarentena Dias de mudanças

Parte 10: Textos escolhidos Organização de Claudio Ferlauto

Cachorro

Louco


Sem compromisso dez dias, dez novelas, dez pessoas.

Foi o que fez Boccaccio ao compor o Decameron na quarentena da Peste Negra.

Qualquer semelhança…

Oitocentos anos depois do último aparecimento, a peste bubônica tinha voltado à Europa. Começando a contaminação na Ásia, a doença chegou à Europa mediterrânea e ocidental em 1348 (possivelmente de comerciantes fugindo de italianos lutando na Crimeia), e matou vinte milhões de europeus em seis anos, um quarto da população total e até metade nas áreas urbanas mais afetadas. Wikipedia.

Uma pandemia (do grego παν [pan = tudo/ todo(s)] + δήμος [demos = povo]) é uma epidemia de doença infecciosa que se espalha entre a população localizada numa grande região geográfica como, por exemplo, um continente, ou mesmo o Planeta Terra. Wikipedia.

Cadernos do olhar 10 maio 2020 Contato clauf4455@gmail.com


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Farejador de carniça, coveiro prematuro, perquiridor

do ninho do mal no seio de uma boa palavra, tu, que dormes em nossa vigília e jejuas para nosso júbilo, tu, com tua razão desloucada, predisseste preciso, um jófeta em tua própria ausência, cego ver tendo sobre tuas muitas escalcaduras, bolhas e queimaduras, purulentas úlceras e pústulas, pelos auspícios daquela nuvemcorvo, tua sombra, e pelos augúrios de um palramento de gralhas, morte com todos os desastres, a dinamitização de colegas, a redução de registros a cinzas, o arrasamento de todos os impostumes pelas chamas, o retorno de um monte de longâmines polverulentos feitos a fezes, mas nunca entrou em tua obtrusa cabaça de vento, (Oh inferno, e-vem nosso enterro! Oh peste, perdi a posta!) que quanto mais cenouras rales, quanto mais nabos piques, quanto mais batatas peles, quanto mais alho no teu olho, quanto mais boi esfoles, quanto mais carneiro esmoas, quanto mais verdura esmagues, tanto mais lenha queima, mais longa tua concha, mais suor na tua sopa, mais fogo na tua roupa, com mais graxa e mais força, — mais fumega a tua bela panela irlandesa. Finnegans Wake, James Joyce, em Panaroma do FW, de Augusto de Campos. Tradução Haroldo de Campos.


Boccaccio

“Già per tutto aveva il sol recato colla sua luce il nuovo giorno, e gli uccelli su per gli verdi rami cantando piacevoli versi ne davano agli orecchi testimonianza, quando parimente tutte le donne e i tre giovani levatisi, ne’giardini se n’entrarono, e le rugiadose erbe con lento passo scalpitando, d’una parte in un’altra, belle ghirlande faccendosi, per lungo spazio diportando, s’andarono.” Decameron, 1349-1352

In piena empidemia, ma già sul declinare di essa, si dedicò alla composizione del Decameron e ne abbozzò la forma screivendo forse anche alcune prime novelle. Ma i caractteri interni dell’avventura compositiva del capolavoro, le sue fasi e suoi tempi, restano un mistero. […] Andava per la sessantina , che non era esattamente età giovanile nel secondo Trecento, ed era passato, a quel che pare indenne, dalla grande epidemia. […] Il 21 decembre del 1375, nella sua casa de Certaldo, fece il sua balzo dalla povera carne che si corrompeva all’eternità. Boccaccio per sempre. per Franco Cardini.


Quarto de trabalho Fausto, Johann W Goethe, tradução Jenny Klabin Segall.

Fausto Conta-me histórias mais, de leve, Demora-te mais um instante. Mefistófeles Larga-me agora! eu voltarei em breve; Informar-te-ás, então, a teu talante.

Fausto Não fui eu que te persegui, Vieste tu dar na rede aqui. Segura o diabo, quem com ele esbarra! Pela segunda vez, de certo, não o agarra. Mefistófeles Pois bem, posso, para agradar-te, Ficar momentos mais contigo; Porém, só se eu puder, condignamente, amigo, Passar-te o tempo com minha arte.


Era preciso ir além. Savonarola: Levam-se hoje em dia para as igrejas quadros de tanta arte e tanto luxo no ornamento, que destroem a luz de Deus. Há que desejar mais simplicidade; senão, a arte faz com que Deus seja esquecido.’ […] O zelo dos adeptos e das confrarias ‘piagnoni’ estendeu-se naturalmente, portanto, a toda arte profana; teve início uma campanha contra a imoralidade. […] As crescentes dificuldades da nova república tornavam necessário exaltar o fervor da multidão e, foi em 1497, na antiga data do Carnaval, que se deu o grande “bruciamento delle vanità”. Em uma fogueira piramidal de sete graus (para os sete pecados capitais), os livros ‘libertinos’, as jóias, as vestes luxuosas, as obras ‘pagãs’, os quadros considerados ‘impúdicos’, os retratos de cortesãs foram solenemente destruídos: era preciso expiar meio século de erros. Savonarola e a arte em Arte e humanismo em Florença, André Chastel.


Aquele foi um dia de angostura para mim esperando boas notívagas de meu cara amigo, entrei em desespelho e nem pude terminar meu crespesuzanne, nem era coisa de Shamrock me deixar aqui solistácito, isolábio; sem ele eu estava perdízimo. Teletonei para alguns amigos mais íssimos mas ninguém sabia tantoquanto, nem o Inspectror Basil nem não sabia, e se alguém devia saber saber devia o Inspectror pois ele era da polícita. Uma semana se foi antes até eu vê-lo de novo e perfiquei plexo com sua aparenta, toda descabelhuda. — Meu deus Holmen, gritei, meu Deus, onde quer que você estive? — Cada coice no seu tempo, Wóspede, ele interpélago. Espera até eu recuperar meu fôlego. Espicaçoei o fogo e aqueci seus calafrígidos, quando se recupirâmide me contou uma história que não consiga lembrar até hoje. Singularga Experiência da srta. Anne Duffield. John Lennon, transcriação Paulo Leminski. em Um atrapalho no trabalho.


O céu vai cair sobre as nossas cabeças

Adélia Borges Ando cada vez mais fã do Guilherme Wisnik. Seus textos sempre revelaram uma grande capacidade de abrangência de pensamento, indo para além da crítica da arquitetura para análises mais amplas do mundo contemporâneo – como se pôde ver recentemente, por ocasião da cerimônia do Oscar, quando ele comentou o filme Parasita. Hoje ele volta à Ilustríssima com um belíssimo ensaio. Colo a íntegra no primeiro comentário abaixo. Simplificando muito, Wisnik aborda os dois caminhos possíveis hoje. O primeiro é se realizar a profecia ianomâmi de que o céu vai cair sobre as nossas cabeças e proliferarem cenários distópicos nos próximos anos. O segundo é a “possibilidade de freio, numa escala antes impensável, ao consumo excessivo e irracional”, hipótese em que a crise provocada pelo vírus pode ser um surpreendente agente civilizatório. O susto, a sensação de vulnerabilidade e a perplexidade que nos dominam hoje, afinal, convivem com a apreensão de que não é possível mais a dicotomia do “nós contra os outros”, pois caiu a ficha de que somos todos “nós”. Temos muito a debater sobre as consequências de tudo isso no universo do design.


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