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Introdução ao CoCriança

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Introdução

Introdução

Metodologia CoCriança: os blocos de uma construção coletiva de espaços e de cidadania

O CoCriança nasceu em 2017 na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (FAU-USP) como resultado de um trabalho desenvolvido para as disciplinas obrigatórias de Planejamento Urbano - Desenho Urbano e Projeto dos Espaços da Cidade (AUP0282) - e Paisagismo - Projeto da Paisagem (AUP0654). Nesta oportunidade, foi dada aos alunos a possibilidade de escolha do tema que lhes interessasse mais, com a condição de que o projeto fosse desenvolvido no território da Brasilândia.

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Atentas para a ausência da participação infantil na discussão de planejamento urbano, bem como a ausência da temática da cidade nas instituições de educação, identificamos a necessidade de abrir um canal de diálogo entre arquiteto, urbanista, paisagista, educador e a criança, de modo a construir coletivamente uma cidade mais acolhedora e amistosa. Foi de enorme importância para o desenvolvimento do trabalho o papel das nossas orientadoras Karina Leitão e Catharina Pinheiro, uma vez que elas permitiram e nos incentivaram a olhar de forma cuidadosa para a questão da infância na cidade e com a devida atenção à interdisciplinaridade que a temática requer.

Durante a visita de campo, realizada com o apoio de lideranças locais, visitamos diversos bairros e instituições do distrito da Brasilândia, entre eles, o Centro da Criança e do Adolescente (CCA) no Jardim Elisa Maria. O centro era coordenado pela irmã Clara, que realizou a ponte de comunicação entre nós, os educadores e as crianças. Com a temática definida e o apoio local estabelecido, iniciamos um processo de projeto participativo com uma das turmas do CCA, a do educador Bruno César, com crianças que, na época, tinham entre nove e onze anos. No período em que estivemos cursando a disciplina, realizamos duas oficinas com as crianças com o objetivo de projetarmos juntos um espaço próximo ao CCA.

Para isso, adaptamos a metodologia de concepção de projeto, ensinada na faculdade de arquitetura, adotando uma linguagem lúdica e acessível às crianças. As oficinas buscavam um mapeamento lúdico dos espaços e a realização de desenhos dos sonhos que tinham para eles. A partir delas, as crianças escolheram uma pequena praça para realizarem o projeto de intervenção. Com estas informações e trocas de sonhos e de desejos, pudemos traduzir a experiência em um projeto arquitetônico que foi apresentado como trabalho final da disciplina. Este, entretanto, era apenas o começo da nossa relação com as crianças do Jardim Elisa Maria, já que, assim como elas, havíamos nutrido o desejo de finalizar o processo e realizar a tão sonhada reforma da praça.

A partir de uma vivência profunda e intensa com o CCA, ao término das matérias o grupo continuou atuando como um projeto de cultura e extensão universitária. Dessa forma continuamos a desenvolver nosso projeto, e buscamos incentivar a pesquisa acadêmica nos espaços que a infância ocupa, partindo do olhar da criança e estabelecendo vínculos baseados na escuta e no diálogo.

O CoCriança tem atuado propondo que desde a infância a criança seja considerada como cidadã da nossa sociedade, legitimando a apropriação dos territórios que elas pertencem.

Nessa trajetória, desenhamos, aplicamos, revimos e redesenhamos uma metodologia participativa com as crianças. A partir dela materializamos os desejos das crianças em dois espaços públicos – A Praça livre para as crianças no Jd. Eliza Maria, em Brasilândia, onde iniciamos nossa atuação, e a Praça do Samba, na Vila Anglo.

Em ambos os locais trabalhamos em parceria com o CCA - Centro da Criança e do Adolescente, que oferece atividades sócio-educativas no contraturno escolar para crianças e adolescentes entre os 6 e 14 anos e onze meses de idade. Segundo o site da prefeitura, o público do CCA é composto por “Crianças e adolescentes em situação de trabalho; Crianças e adolescentes reconduzidas ao convívio familiar, após medida protetiva de acolhimento; Crian-

ças e adolescentes com deficiência, beneficiárias ou não do BPC; Crianças e adolescentes oriundas de famílias beneficiárias de programas de transferência de renda; Crianças e adolescentes em situação de vulnerabilidade e risco” (PREFEITURA DE SÃO PAULO, 2013)

Nesses quatro anos de história, ampliamos e aprofundamos nossa identidade enquanto coletivo. Para isso, foi muito importante a identificação e definição dos valores e objetivos que norteiam nossa prática. Esse contorno possibilitou que nossa comunicação interna e externa se tornasse mais clara e direta. Nossos pilares falam sobre as matérias em que apoiamos nossa atuação, nossos valores direcionam a forma como atuamos, seja na relação interna da equipe ou na relação com as crianças, comunidade e educadores. Já nossos objetivos, norteiam nossa visão de como queremos atuar no mundo. Além disso, alinhamos nosso impacto com os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) da ONU como forma de nos comunicar com demandas sociais atuais e colaborar no cumprimento da Agenda 2030.

Pilares:

Enquanto coletivo que atua com criança e cidade, identificamos uma característica que nos torna únicos enquanto coletivo: nossa atuação duplamente direcionada enquanto um processo de codesign e um processo político pedagógico, que se engaja na educação das crianças e no desenvolvimento de suas múltiplas inteligências, uma vez que as consideramos essênciais para o empoderamento das crianças enquanto cidadãs ativas. Essa atuação duplamente direcionada se converge na nossa metodologia que busca medir seus resultados a partir do espaço construído e do conhecimento adquirido pelas crianças. Dessa forma dividimos nossos pilares em: Construir e Formar

Construir porque acreditamos na potência do olhar das crianças na materialização de seus espaços, seus lugares, nosso mundo. Queremos que seus desejos e necessidades sejam reconhecidos, tornando-se diretrizes para repensar as cidades, seus caminhos e espaços de brincar. Queremos, ainda, incentivar a força do coletivo, fazendo com que as crianças experienciem seu poder de, juntas, transformar o mundo e garantir que as cidades sejam mais gentis e acolhedoras para as infâncias e, assim, para todos.

Formar porque acreditamos em uma pedagogia libertadora, que empodera as crianças na busca por entender e atuar no mundo com autonomia. Queremos proporcionar uma educação integral, por meio de aprendizagens vivenciais e contextualizadas que, colocando em constante diálogo o pensar e o fazer, expandam o universo criativo e projetual. Queremos fortalecer uma consciência cidadã que permita a participação ativa e dialógica na construção democrática. Queremos formar pequenos transformadores que, com olhar crítico e curioso, comecem a transformar a realidade desde seu presente, entendendo-se enquanto sujeitos de direitos - à cidade, ao brincar, ao hoje.

Valores:

1. Diálogo: Que as crianças usem o poder da palavra como uma ferramenta para a transformação das relações sociais desde a infância.

2. Cooperação: Por uma rede que pensa junto nas resoluções dos desafios de cada projeto e realidade, criando uma força tarefa para a distribuição das energias e potências, pensando e agindo sempre coletivamente.

3. Educação cidadã: Por experiências que contribuam na constituição de um conjunto complexo que abraça, ao mesmo tempo, a adesão a valores, a aquisição de conhecimento e atividades práticas na vida pública, que construam uma formação democrática para cidadania.

Metodologia CoCriança: os blocos de uma construção coletiva de espaços e de cidadania

4. Autonomia: Que as crianças possam conquistar um governo de si próprio relacionado à capacidade de tomar decisões e analisar criticamente, permitindo sua autonomia por meio de uma postura ativa de intervenção no mundo.

5. Liberdade: Que as crianças sejam livres para ser hoje, livres para brincar, para caminhar pelas ruas de seus bairros, para crescer brincando, livres para se expressar, para se desenvolver em igualdade de oportunidades e livre para decidir o que querem para si e para a cidade.

6. Escuta ativa: Que as crianças sejam ouvidas, primeiro para serem vistas como parte fundamental da nossa realidade e da construção da nossa sociedade e depois para que se possa entender a experiência delas na cidade, no seu bairro, na sua comunidade.

Objetivos:

Reconhecer e instrumentalizar a voz das crianças para a autonomia

Criar condições para que as crianças sejam protagonistas dos processos de transformação de suas comunidades, desenvolvendo nelas potencial para que se tornem agentes de transformação urbana em seus bairros e as conscientizando enquanto cidadãs ativas que têm voz e que produzem cultura, espaços e sonhos. Assim, buscamos possibilitar, através da experiência e do trabalho com habilidades e competências socioemocionais, que as crianças consigam ter uma dimensão mais prática do que é cidadania, e que isso tenha um efeito duradouro, se não multiplicador, em suas vidas. Diz do trabalho e desenvolvimento da consciência que uma transformação individual e/ou pontual também tem um impacto coletivo.

Fortalecer o uso e ocupação da cidade pelas crianças

Buscamos, a partir da criação de espaços mais seguros, diversos, inclusivos, qualificados e verdes, fortalecer o uso e ocupação da criança na cidade por meio do brincar. É a busca por garantir espaços brincantes na cidade, uma vez que o brincar é estabelecido como um dos direitos infantis pelo ECA e pela Convenção Sobre os Direitos da Criança da ONU, e por valorizar essa ação enquanto fundamental às crianças, entendendo a cidade como potencializadora das possibilidades do brincar. Colocamos luz no brincar livre, não dirigido, que segue seu próprio tempo e não necessita – e nem deve – ser controlado, desenvolvendo-se no encontro da criança com o mundo.

Promover a inclusão das crianças nos processos de decisão e transformação urbana.

Nos propomos a pensar e valorizar a participação, especialmente a infantil, a partir de um lugar educacional, que abre portas para futuros frutos para além do processo participativo de um projeto, entendendo que ampliar a voz e escutar às crianças as impacta desde um lugar de pertencimento, de ser parte importante da realidade em que vivem. O que o processo participativo propõe é a construção de um espaço democrático onde as crianças possam não só se expressar, mas serem ouvidas sem condicionamentos vindos de adultos. Um processo desenhado com total abertura para o sonho emergir.

Promover o senso de coletividade entre as crianças, com a afirmação das individualidades

Acreditamos que o desenvolvimento de inteligência interpessoal e intrapessoal é fundamental para a formação de transformadores conscientes com potencial de pro-

mover impacto em seu território. Para isso, propomos atividades de autoconhecimento que ampliam a consciência sobre si e o outro, a fim de promover o reconhecimento dos potenciais únicos de cada criança e a articulação deles em grupo para um fim coletivo.

Promover o senso de pertencimento, fortalecendo os vínculos da comunidade com os espaços públicos

Estimular ao máximo o vínculo entre os espaços públicos e a comunidade em geral, a partir das crianças e de sua validação enquanto cidadãs plenas, hoje. Trazer as pessoas para cidade, potencializando sua participação de modo a criar uma consciência cidadã autônoma e estimulando que as crianças usem os espaços e aprendam a conviver com a diversidade, fortalecendo o sentimento de pertencer ao lugar em que habitam.

Missão:

Promover aprendizagem vivencial para valorizar a voz da criança na cocriação de espaços de brincar inovadores.

Equipe:

Ao longo dos nossos anos de atuação, pessoas entraram e saíram de nossa equipe e agregamos muitos colaboradores. Todos possuem sua marca em nossa história, por isso apresento nossa formação ao longo dos anos até o momento presente.

O CoCriança é hoje, uma equipe multidisciplinar composta por oito mulheres.

TABELA 1. INTEGRANTES COCRIANÇA

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