Boletim Maio 05 Portugues

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CAMPANHA NACIONAL PELA REGULARIZAÇÃO DOS TERRITÓRIOS DE QUILOMBOS

QUILOMBOL@ www.cohre.org/quilombos

Editorial As violações de direitos humanos têm tramas complexas que ficam obscurecidas diante da opinião pública. Atrás das cifras de crescimento econômico e ganhos da indústria de celulose, se esconde uma grave violação de direitos de milhares de famílias quilombolas no Espírito Santo. Os ataques aos direitos são produzidos pela ação de empresas que, nos últimos trinta e cinco anos, ampliaram as fronteiras do plantio de eucalipto e provocaram deslocamentos contínuos de famílias, destinadas a viver nas favelas de grandes centros urbanos. Isto ocorre diante de governos que, em alguns casos são apenas omissos, em outros estão comprometidos com estes interesses privados. Em uma das regiões com mais rica tradição cultural do país, existe uma vergonhosa história de atos de crueldade contra os povos africanos escravizados. Atualmente, são submetidos a novas formas de opressão, desta vez disfarçadas por uma imagem pública favorável de contribuição ao “desenvolvimento do país”. É possível um desenvolvimento que implica na destruição de direitos culturais e formas de vida tradicional, na expulsão das comunidades negras rurais e quilombolas de suas terras? Neste boletim, apresentamos a situação das comunidades negras rurais e quilombolas de Sape do Norte, no Espírito Santo. Suas angústias e esperanças. O COHRE AMÉRICAS acompanha a luta destas comunidades exigindo, tanto das empresas como dos governos, respeito à Constituição Federal e aos tratados de direitos humanos firmados pelo Brasil.

No.03 - maio / 2005

Lucro com celulose esconde direitos violados

Monocultura de eucalipto para indústria de celulose, no Estpírito Santo Em plena década de 70, as 15 como devolutas do Estado do comunidades rurais de negros e Espírito Santo sem levar em conta a quilombolas que vivem na região existência de moradores, conhecida como Sapê do Norte (ES) especialmente negros e índios. ganharam um vizinho poderoso e Além da perda das terras de uso incômodo. tradicional, quem conseguiu A companhia Aracruz Celulose é líder permanecer no local está submetido mundial na indústria de celulose aos efeitos nocivos do uso de branqueada e responde por 28 por cento agrotóxicos usado nas lavouras de da oferta mundial do setor. Em seu eucalipto e à contaminação da água relatório, a empresa contabilizou uma e rios da região. Soma-se a isso o produção anual de 2,4 milhões de desmatamento promovido pela toneladas de celulose com um lucro empresa de celulose, responsável líquido de 1.068,5 milhões, em 2004. pelo extermínio de plantas nativas da Cifras que tornam o negócio atraente região, essenciais à elaboração de para seus acionistas : os grupos Safra, remédios caseiros de uso corrente Lorentzen e Votorantim - cada grupo entre os negros. O prejuízo ambiental detém 28 por cento do capital votante - também afetou o plantio de e o BNDES que controla os 12,5 por mandioca, comprometendo as casas cento restantes do capital. de farinha e a produção do “beiju”, Para alimentar a linha de produção, a produto típico da região. empresa precisou abocanhar 252 mil Além da pressão imposta pela hectares para plantar sua matéria-prima. atividade econômica que gira em As lavouras de eucalipto estão torno da celulose, as comunidades distribuídas no Espírito Santo, Bahia, denunciam a omissão governamental Minas Gerais e Rio Grande do Sul e além em relação a necessidades básicas de terras próprias, a empresa já conta como saneamento, energia elétrica e com plantações nas propriedades de 3 condições de moradia. A população mil produtores rurais “associados”. não é servida por serviços de O impacto da atividade é tão transporte e precisa caminhar monumental quando o volume de quilômetros para ter acesso a recursos movimentado, principalmente médicos e transporte coletivo. para as comunidades que vivem na Algumas escolas da região funcionam região. Pressionados e isolados em em igrejas e não têm sequer terras, cercadas por plantações de banheiros. eucaliptos, os moradores denunciam as A situação é grave e a demarcação drásticas alterações de estilo de vida, e legalização das terras quilombolas cultura e redes de solidariedade local. são fundamentais para que as A legitimidade da aquisição das terras é comunidades tenham possibildiades duramente questionada pelas lideranças de recuperar seus direitos e criar locais que chamam atenção para o fato condições para reestruturar suas da empresa ter adquirido áreas tidas vidas.


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