A GAZETA - "A oposição é oportunista e também envolvida em esquema de corrupção"

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POLÍTICA | 27

DOMINGO, 27 DE MARÇO DE 2016

ENTREVISTA

Luiz Felipe Pondé

“A oposição é oportunista e também envolvida em esquema de corrupção” Doutor em Filosofia critica o discurso da esquerda, ao afirmar que faltou competência ao governo Dilma em meio à Operação Lava Jato DIVULGAÇÃO

ABDO FILHO VINÍCIUS VALFRÉ

Em que momento da história recente o governo federal – nas mãos do PT – tropeçou e não se deu conta da avalanche social e econômica que estava por vir? De onde vem a crise política brasileira, que nesta semana pode atingir seu ápice com a ruptura da aliança PMDB-PT? Esses e outros pontos são postos sob reflexão pelo colunista do jornal Folha de S. Paulo Luiz Felipe Pondé. Doutor em Filosofia pela USP, Pondé estará em Vitória amanhã, às 15h30, para a palestra “Direitos e deveres na República: equilíbrio difícil?”, promovida pelo Instituto Cognorama no auditório da Rede Gazeta. Na entrevista a seguir, ele faz provocações sobre o modelo político vigente e analisa a deterioração das relações do governo Dilma Rousseff (PT). Confira: Que análise o senhor faz do momento brasileiro? Polarização, para além do bate boca, entre duas concepções de país: uma retrógrada, assistencialista, vitimista, outra liberal, voltada para noções como competência e eficácia. Seja lá quem vencer a batalha ao redor do impeachment, deveremos ter alguma instabilidade nas ruas e violência. A novidade do debate político no Brasil hoje é uma direita liberal em costumes e em economia e conservadora em política, contra excessos estatais. O PT não sabe a diferença entre Estado e governo por-

que confunde sua autopercepção de santidade políticacomseroEstadoemsie não apenas um governo (fraco e incompetente).

Seria melhor se o governo Dilma ainda tivesse alguma legitimidade, mas, com a Lava Jato e a incompetência, essa legitimidade acabou”

Vínhamos de duas décadas de avanços em várias frentes:econômica,social, institucional...Oqueaconteceunosúltimosanos? Uma presidente que deixou de lado o respeito pelo equilíbrio fiscal e dirigiu o país com a incompetência que os socialistas têm em termos de economia. O problema está só no governo ou é mais amplo? Que avaliação o senhor faz da oposição? Oposição oportunista e também envolvida em alguma nível com esquema da corrupção. O PSDB é um partido de caciques e sem índios. Veja o que aconteceu na disputa pelas primárias em São Paulo para a prefeitura. Mas, afora isso, o importante é superar o pesadelo que está sendo o governo Dilma e arrumar o governo. Pessoalmente, acho que seria melhor se o governo ainda tivesse alguma legitimidade, mas com a Lava Jato e a incompetência, essa legitimidade acabou. O desafio de destravar o país é algo que todos concordam que está posto, mas ninguém parece ser capaz de apresentar um caminho convincente para isso. O que falta? A política é o reino da não idealidade, só há realidade na política, a fantasia é parte da retórica e refúgio dos picaretas. Toda utopia

é uma forma de mentira política e histórica. Falta muita coisa, mas, creio que um governo que saia do marasmo de Dilma, minimamente organizado, pode sinalizar confiança e as pessoas fazem o que elas sabem fazer, trabalhar e produzir riqueza. O que é ser de direita e esquerda hoje no Brasil, a seu ver? Ser de esquerda hoje no Brasil é ser contra uma sociedade liberal de pessoas autônomas e estimuladas a ser responsáveis por si

mesmas. Ser de direita hoje é ser a favor do que acabei de dizer. Ser de esquerda é estimular a vitimização social, ser de direita é propor uma sociedade de pessoas um pouco mais maduras e corajosas. Por que a direita é tão mal vista no Brasil? Porque é confundida com a ditadura, que foi um instrumento dos EUA no combate à contaminação da America Latina com a União Soviética. Esse horror à direita é anacrônico, mas é estimulado pela es-

querda. No mundo, ser direita é muitas vezes ser visto como malvado e insensível. A maturidade leva à percepção de que a vida é imperfeita e isso é difícil para a esquerda, que tem um temperamento infantil e mimado. O senhor não tem medo de assumir suas posições. Por quê? Não abandonei a carreira médica, sendo filho, irmão e neto de médico (e hoje pai de um médico) pra ser filósofo e ser covarde. Como diz Aristó-

teles, a virtude é uma coisa prática (a ética é uma ciência prática). Quanto mais se vence o medo, melhor se fica em vencê-lo. O pensamento público no Brasil está renascendo, mas a maioria dos agentes públicos é ainda covarde e prefere garantir o amor dos inteligentinhos. Houve uma radicalização nos últimos dias. Teme um rompimento institucional? Não um rompimento pleno, mas deveremos ter instabilidade nos próximos meses. Nenhum dos lados vai aceitar a derrota. Em algum momento, talvez, uma intervenção mais forte seja necessária por parte dos agentes responsáveis pela ordem pública. Serão dias interessantes. Hoje no Brasil caminhamos sobre a história.


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