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Maria Ana Bobone
fado piano
Que Deus me Perdoe
Namorico da Rita
Auto-retrato
(Letra: João Silva Tavares; Música: Frederico Valério)
(Letra: Artur Ribeiro; Música: António Mestre)
(Letra: Rodrigo Serrão; Música: Maria Ana Bobone)
Se a minha alma fechada Se pudesse mostrar, E o que eu sofro calada Se pudesse contar:
No mercado da ribeira Há um romance de amor, Entre a Rita que é peixeira E o Chico que é pescador,
Eu começo e sou só eu mais nada, Que a certeza do fim da estrada, Só se encontra depois da porta aberta E nela a descoberta é feita passo a passo.
Toda a gente veria Quanto sou desgraçada, Quanto finjo alegria Quanto choro a cantar.
Sabem todos que lá vão, Que a Rita gosta do Chico... Só a mãe dela é que não Consente no namorico.
Que Deus me perdoe, Se é crime ou pecado, Mas eu sou assim E fugindo ao fado Fugia de mim,
Quando ele passa por ela Ela sorri descarada, Porém o Chico à cautela Não dá trela, nem diz nada,
Recomeço, finjo não estar cansada, Que um sentido espera à chegada, E caminho, como se o que ficou Não fosse mais do que outra ponte que acabou, Como se eu fosse uma maré que ali virou...
Cantando dou brado E nada me dói, Se é pois um pecado, Ter amor ao fado, Que Deus me perdoe. Quando canto não penso No que a vida é de má, Nem sequer me pertenço Nem o mal se me dá, Chego a querer na verdade E a sonhar - sonho imenso, Que tudo é felicidade E tristeza não há.
Que a mãe dela quando calha, Ao ver que o Chico se abeira, Por dá cá aquela palha Faz tremer toda a ribeira. Namoram de manhãzinha E da forma mais diversa, Dois caixotes de sardinha São dois dedos de conversa, E há quem diga à boca cheia Que, depois de tanta fita, O Chico de volta e meia, Prega dois beijos na Rita.
E se o vento chamar por mim Sou uma asa que se abre enfim! E ao chegar à minha outra margem, Sou a soma da viagem! Recomeço, que nesta nova estrada, Há um sonho, uma alvorada, E caminho, que a cada nova entrega há algo que me espera e leva a outro lado. Eu começo mas levo aqui comigo, Quem de oferta me deu abrigo, Recomeço, não sei aonde vou, Mas ao chegar à outra margem do que eu sou, Hei-de ser tudo o que me trouxe aonde estou! P’lo caminho... descobrindo... passo a passo... quem eu sou.
Melancolia
Fado Xuxu
Fria claridade
(Letra: Maria Ana Bobone; Musica: fado de Sintra de Armandinho)
(Letra: Amadeu do Vale; Música: Frederico Valério)
Um dia, uma agonia se fez passar no sal do mar, da maresia Podia dizer que queria por lá passar, mas esse mar já não se via E havia, nessa praia, um vento que se escondia e alguém, que se via nessa noite de luar, chorava melancolia
O fado, canção bizarra, pôs a samarra todo trecheiro, e lá foi com a guitarra, até ao Rio de Janeiro.
(Letra: Pedro Homem de Mello; Música: José Marques do Amaral)
Um dia, essa agonia que fez gelar o sal do mar, onde ela ia Só disse que não voltava, nem sorria, nem chorava para não saber de mim
Com sambinhas, e modinhas, abacate, vitamate, guaraná, Fez-se um fadista atrevido, maracujá, tão destemido e de tal marca, e caruru. que até já é conhecido, p’lo fadistão da Fuzarca. Com cocada, batucada, para ti, abacaxi, e goiabada... o fado é bom p’ra xuxu. Portuguesinho de raça, bebe cachaça, come pipoca, e no catete até passa, por cidadão carioca. Às vezes vai à favela, calça chinela, todo se bamba... E o fado canção singela, agora é todo do samba.
No meio da claridade Daquele tão triste dia, Grande, grande era a cidade, E ninguém me conhecia! Então passaram por mim Dois olhos lindos, depois, Julguei sonhar vendo enfim, Dois olhos, como há só dois... Em todos os meus sentidos, Tive presságios de Deus E aqueles olhos tão lindos Afastaram-se dos meus! Acordei, a claridade Fez-se maior e mais fria, Grande, grande era a cidade E ninguém me conhecia!
Enigma
Love Ballad
(Letra: Maria Ana Bobone, Rodrigo Serrão; Música: Balada do Tejo de Pedro Caldeira Cabral)
(Letra: Fernando Pinto Amaral; Música: Canção de Pedro Caldeira Cabral)
Porque é que assim foi não sei, Mas tudo o que sou, já te dei, Num gesto sem pensar, Que hoje guardo em meu olhar. E mesmo sem querer, O vento vem trazer, E leva-me a sonhar, Sopra lento, devagar... E deixo-me então levar, E canto p’ra não pensar, Que levo a cada passo, A lembrança do lugar, Onde o céu encontra o mar...
I’ll never forget those days long ago the moment we met with nowhere to go You went far away and did not returned You left me astray as if my own soul had been burned But down deep inside for so many years this love never died although it was made from my tears For in my heart’s shrine You’ve always been mine
And when I recall a glimpse of your face the world looks so small because we both share the same grace For beyond my sorrow there’s always tomorrow And so I shall wait until you come near It’s never too late to love you, my dear And maybe one day you’ll come back at last and silent we’ll stay as if all this time never passed
E ali, por fim, descansei... porque é que assim foi não sei. Agradecimentos:
Galp Energia e Câmara Municipal de Oeiras. Ao Bernardo Couto pela disponibilidade, talento e amizade. Ao Pedro Caldeira Cabral pela confiança com que me emprestou as suas baladas. Ao Fernando Pinto do Amaral pelo entusiasmo com que aderiu a esta ideia e me ofereceu as palavras certas. Ao meu tio Manuel Bobone pelas sarabandas. Ao Miguel Capucho pelo incentivo, força e amizade. Ao Rodrigo Serrão pela excelência do trabalho, pela sensibilidade e pela generosidade com que me acompanhou nesta viagem.
Dança
Balada
(Letra: Fernando Pinto do Amaral; Musica: Castro Daire de Pedro Caldeira Cabral)
(Letra: Jeremias; Música: Manuel Bobone)
Anda, vem dançar comigo Vem dançar a noite inteira Anda e escuta o que te digo Nesta hora verdadeira Vem à chuva, ao frio, ao vento, Dançar comigo na rua Vê como arde a fogo lento A minha vida na tua Anda e dá-me a tua mão Vamos ficar enfim sós O teu sangue é uma canção A vibrar na minha voz Vê como o luar nos diz Coisas tão cheias de luz Vê como acorda feliz A estrela que nos seduz Deixa voar os teus passos Na cidade adormecida Já são asas os meus braços Já é tua a minha vida Depois não digas mais nada Fica toda a noite assim À espera da madrugada Sempre mais perto de mim
Tocam as bandas, As sarabandas E os tambores,
Tocam os anjos, Cantam arcanjos, E trovadores.
Tocam as gaitas, As sirigaitas E os senhores.
E toca a flauta, Que é o som que falta, P’rós meus amores,
Tocam pianos, Todos ufanos, E sonhadores,
E na beleza, Da natureza, Nascem as flores.
São Bentinho (Popular)
Ó meu S. Bentinho, Tens velas a arder, Se elas se apagarem, Voltam-se a acender. Ó meu S. Bentinho, Que moras na capela, À espera de um milagre, Passei a noite em vela.
Imagem
(popular)
(Letra: Rodrigo Serrão; Música: Maria Ana Bobone)
Adeus ó Vale de Gouvinhas Marião, Não és vila nem cidade Marião, Sim, sim Marião, Não, não Marião.
No teu olhar existe um segredo, Que se revela por vezes a medo, Como uma imagem trancada num espelho, Olha de ti e é a mim que me vejo.
És um povo pequenino Marião, Feito à minha vontade Marião, Sim, sim Marião, Não, não Marião.
No teu olhar o silêncio é um apelo, Que fica preso num fio de cabelo, E é nessa imagem que tudo revela, Que o teu segredo se mostra à janela.
Hei-de cercar Vale Gouvinhas Marião, Com trinta metros de fita Marião, Sim, sim Marião, Não, não Marião.
E de repente há uma sombra dobrada, Que dos teus olhos se acerca calada: E a tua sombra que eu armo de espada, Vem por mim, só por mim...
À porta do meu amor Marião, Hei-de pôr a mais bonita Marião, Sim, sim Marião, Não, não Marião.
E com a espada desvendo o segredo, E corto enfim esse fio de cabelo, Que te separa a um passo de nada, Do próprio olhar onde moro fechada.
Os meus olhos não são olhos Marião, Sem estarem dos teus defronte Marião, Sim, sim Marião, Não, não Marião.
Saio de mim e no gesto de um dedo, Pousado ali, onde estava o teu medo, Juntas-te a mim numa imagem pintada, Que nos teus olhos deixo pousada.
Parecem dois rios de água Marião, Quando vão de monte em monte Marião, Sim, sim Marião, Não, não Marião.
Senhora do Almortão (popular) Gravado ao vivo
Senhora do Almortão Ó minha linda raiana Virai costas a Castela Não queirais ser castelhana
Voz, Piano, Guitarra Clássica (em Balada) – Maria Ana Bobone Guitarra Portuguesa – Bernardo Couto Contrabaixo; Irish Tin Whistle (em Marião) – Rodrigo Serrão Programações; Arranjos; Produção Musical, Artística e Executiva – Maria Ana Bobone; Rodrigo Serrão Gravado entre Março de 2011 e Janeiro de 2012 @ Kbranca Std. por Rodrigo Serrão Fotografias – Ricardo Quaresma Design Gráfico– Alexandra Paulino | cordelaranja@gmail.com Capa Branca Produções: capabranca.prod@gmail.com | (+351) 93 676 676 5 www.mariaanabobone.com
Marião
O FADO PARA LÁ DO FADO Sempre foi difícil definir com rigor o que é o Fado, universo cada vez mais vasto onde trabalham hoje muitos autores apostados em explorar os seus limites e em cruzá-lo com outros géneros e outras linguagens. É esse o caso de Maria Ana Bobone: com um percurso já longo e um talento multifacetado que a tem levado a visitar territórios diferentes, oferece-nos agora um bom exemplo de risco e de aventura. Mesmo que lhe fosse mais cómodo cingir-se a um repertório tradicional, que aliás domina bem, a Maria Ana arrisca aqui novos caminhos em que o piano sobressai, numa ligação feliz entre a herança do Fado e a abertura a outras sonoridades. Estamos, assim, em face de um trabalho cada vez mais pessoal, em que a intérprete a nos conduz ao longo de fontes muito diferentes entre si, ora mais vinculadas ao legado da Tradição, ora, pelo contrário, em clara divergência com essa Tradição. O resultado constitui um marco singular na discografia de Maria Ana Bobone, reflectindo uma atitude ecléctica, que integra contributos populares e eruditos, antigos e recentes, e cuja variedade acaba por enriquecer o conjunto, do qual me permitirei destacar, por exemplo, o excelente trabalho a partir das belíssimas melodias de Pedro Caldeira Cabral, mas também de temas tradicionais como a «Senhora do Almortão» ou de alguns clássicos de Amália como «Fria Claridade» e, acima de tudo, a magnífica versão do célebre «Que Deus me Perdoe», um fado em que a voz e o piano da Maria Ana se transcendem e atingem por vezes o sublime. Ainda a propósito deste fado, trata-se, como diria Freud, de uma sublimação, que, como sabemos, consiste numa reacção química mas também psicológica, neste caso não no tubo de ensaio de um laboratório, mas nesse outro tubo de ensaio que pode ser uma alma humana. Reacção essa capaz de transformar tristeza em alegria, fazendo da matéria-prima do sofrimento o cristal sonoro da mais pura e resplandecente beleza. E isto, que faz parte da essência mais íntima do Fado, está e estará sempre para lá do Fado. Lisboa, Primavera de 2012 | Fernando Pinto do Amaral
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Maria Ana Bobone
fado piano
Reservados todos os direitos do produtor fonográfico e do proprietário da obra gravada. Proibidos a duplicação, o ℗ & © 2012 aluguer e a utilização deste disco para qualquer Editado e Distribuído em Portugal execução pública e radiofusão não autorizada. por Capa Branca Prod. Unip. Lda.
KBR 001 12 CD
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Que Deus Me Perdoe Namorico da Rita Auto-retrato Melancolia Fado Xuxu Fria Claridade Enigma Love Ballad Dança São Bentinho Balada Marião Imagem Senhora do Almortão
KBR 001 12 CD
℗ & © 2012 Editado e Distribuído em Portugal por Capa Branca Produções, Lda.
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