Revista Produção

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PRODUÇÃO

O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre Miriam Borchardt; Guilherme Luís Roehe Vaccaro; Debora Azevedo; Jacinto Ponte Jr.

Modelo de apoio à decisão multicritério para terceirização de atividades produtivas baseado no método smarts Último de Valois; Adiel Teixeira de Almeida

Obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo: uma análise utilizando regressão logística Antônio C. Pacagnella Jr.; Geciane S. Porto; Sérgio Kannebley Jr.; Sérgio L. da Silva; Carlos A. G. Bonacim

Modelagem e análise de um novo centro cirúrgico para um hospital em crescimento: uma abordagem baseada em simulação Élcio Douglas Joaquim; Guilherme Ernani Vieira

Geração de resíduos de madeira e derivados da indústria moveleira em função das variáveis de produção Éverton Hillig; Vania Elisabete Schneider; Eloide Teresa Pavoni

Estudo da utilização de materiais de referência nas análises de água por laboratórios envolvidos no sistema de acreditação Suzana Saboia de Moura; Stella Regina Reis da Costa

Análise comparativa de modelos de alinhamento estratégico Vanderli Correia Prieto; Marly Monteiro de Carvalho; Adalberto Américo Fischmann

O custeio ABC e a contabilidade de ganhos na definição do mix de produção de uma metalúrgica Evandro Sylvio Lima Sinisgalli; Ligia Maria Soto Urbina; João Murta Alves

Importância das características na precificação de veículos nacionais Camilo Brandão de Resende; Rodrigo Arnaldo Scarpel

Formação de competências para o desenvolvimento de produtos em subsidiárias brasileiras de montadoras de veículos Marcos Amatucci; Roberto Carlos Bernardes

Relacionamento interorganizacional na cadeia de suprimentos: um estudo de caso na indústria da construção civil Renata Albergaria de Mello Bandeira; Luiz Carlos Brasil de Brito Mello; Antonio Carlos Gastaud Maçada

O subsetor de edificações da construção civil no Brasil: uma análise comparativa em relação à União Europeia e aos Estados Unidos Luiz Carlos Brasil de Brito Mello; Sérgio Roberto Leusin de Amorim

Vol. 19

Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey Eduardo Guilherme Satolo; João Marcos Andrietta; Paulo Augusto Cauchick Miguel; Felipe Araújo Calarge

no 2 ano 2009

Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia Eliane Gonçalves Gomes; Célia Regina Grego; João Carlos C. B. S. de Mello; Gustavo Souza Valladares; João A. de Carvalho Mangabeira; Evaristo E. de Miranda

Vol.19 no 2 Maio/Ago. 2009

ISSN 0103-6513


Produção A Revista Produção é um veículo quadrimestral de divulgação de trabalhos acadêmicos na área de engenharia de produção, publicado pela Associação Brasileira de Engenharia de Produção – ABEPRO, com distribuição gratuita a associados institucionais.

Editor-chefe e Editores Associados Linda Lee Ho (EPUSP) - Editora Marly Monteiro de Carvalho (EPUSP) - Co-editora Horácio Hideki Yanasse (INPE/SOBRAPO) - Editor Associado na área de Pesquisa Operacional José Orlando Gomes (UFRJ/ABERGO) - Editor Associado na área de Ergonomia

Núcleo Editorial - ABEPRO Mário Otávio batalha (UFSCar) Adiel Teixeira de Almeida (UFPE) Fernando José Barbin Laurindo (EPUSP) Francisco Soares Masculo (UFPB) Linda Lee Ho (EPUSP) Antônio César Bornia (UFSC) Helder Gomes Costa (UFF)

ISSN 0103-6513

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A Revista Produção é indexada nas seguintes bases de dados: Scientific Electronic Library Online – Scielo (http://www.scielo.br/revistas/prod/ pinstruc.htm) e Rede de Bibliotecas da Área de Engenharia – REBAE (http://rebae.cnptia.embrapa.br/). A Revista Produção conta com apoio do Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), da Fundação Vanzolini (FCAV) e do Departamento de Engenharia de Produção da Escola Politécnica da USP.

Apoio Administrativo Paula Madeira (EPUSP/ABEPRO) Karen da Silva (EPUSP/ABEPRO)

Tiragem

500 exemplares

Diagramação Cristiane Tassi


Produção volume 19 número 2 ano 2009

EDITORIAL Prezados Leitores Está pronto o segundo número do volume 19. Pela abrangência da Engenharia de Produção os assuntos abordados neste número são bastante diversificados. Começamos com um artigo de Borchard e Vaccaro sobre a visão de empresas da Região Metropolitana de Porto Alegre em relação ao perfil do Engenheiro de Produção. A seguir estão alguns artigos de cunho mais quantitativo: Valois e Almeida utilizam um modelo de apoio à decisão multicritério baseado no método SMARTS para terceirização de atividades produtivas; Pacagnella Jr, Porto, Kannebley Jr, Silva e Bonacim usam a regressão logística para analisar os fatores de influência na obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo; Joaquim, Vieira modelam e analisam o desempenho de um novo centro cirúrgico através do uso de simulação; Hillig, Scheneider e Pavoni apresentam uma estimativa da geração de resíduos da indústria moveleira em função das variáveis de produção; Moura e Costa fazem um estudo da utilização de materiais de referência nas análises de água por laboratórios envolvidos no sistema de acreditação. Uma análise comparativa de modelos de alinhamento estratégico é o tema abordado por Prieto, Carvalho e Fischmann. Na seqüência, custeio ABC e a contabilidade de ganhos na definição do mix de produção de uma metalúrgica é o assunto pesquisado por Sinisgalli, Urbina e Alves. A seguir, Resende e Scarpel tratam da importância das características na precificação de veículos nacionais; o artigo seguinte de Amatucci e Bernardes é sobre a formação de competência para o desenvolvimento de produtos em subsidiárias brasileiras de montadores de veículos. Bandeira, Mello e Maçada escrevem sobre o relacionamento interorganizacional na cadeia de suprimentos através de um estudo de caso na indústria de construção civil e Mello e Amorin fazem um estudo comparativo do subsetor de edificações da construção civil entre Brasil, União Européia e os Estados Unidos. A partir de um levantamento tipo survey, os autores Satolo, Andrietta, Miguel e Calarge analisam a utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma e para finalizar Gomes e Grego discorrem sobre a dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Uma boa leitura a todos! Linda Lee Ho Editora



SUMÁRIO Produção, vol. 19, n. 2, ano 2009

O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre Miriam Borchardt; Guilherme Luís Roehe Vaccaro; Debora Azevedo; Jacinto Ponte Jr.

Modelo de apoio à decisão multicritério para terceirização de atividades produtivas baseado no método SMARTS Último de Valois; Adiel Teixeira de Almeida

Obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo: uma análise utilizando regressão logística Antônio C. Pacagnella Jr.; Geciane S. Porto; Sérgio Kannebley Jr.; Sérgio L. da Silva; Carlos A. G. Bonacim

Modelagem e análise de um novo centro cirúrgico para um hospital em crescimento: uma abordagem baseada em simulação Élcio Douglas Joaquim; Guilherme Ernani Vieira

Geração de resíduos de madeira e derivados da indústria moveleira em função das variáveis de produção Éverton Hillig; Vania Elisabete Schneider; Eloide Teresa Pavoni

Estudo da utilização de materiais de referência nas análises de água por laboratórios envolvidos no sistema de acreditação Suzana Saboia de Moura; Stella Regina Reis da Costa

Análise comparativa de modelos de alinhamento estratégico Vanderli Correia Prieto; Marly Monteiro de Carvalho; Adalberto Américo Fischmann

O custeio ABC e a contabilidade de ganhos na definição do mix de produção de uma metalúrgica Evandro Sylvio Lima Sinisgalli; Ligia Maria Soto Urbina; João Murta Alves

Importância das características na precificação de veículos nacionais Camilo Brandão de Resende; Rodrigo Arnaldo Scarpel

Formação de competências para o desenvolvimento de produtos em subsidiárias brasileiras de montadoras de veículos Marcos Amatucci; Roberto Carlos Bernardes

Relacionamento interorganizacional na cadeia de suprimentos: um estudo de caso na indústria da construção civil Renata Albergaria de Mello Bandeira; Luiz Carlos Brasil de Brito Mello; Antonio Carlos Gastaud Maçada

O subsetor de edificações da construção civil no Brasil: uma análise comparativa em relação à União Europeia e aos Estados Unidos Luiz Carlos Brasil de Brito Mello; Sérgio Roberto Leusin de Amorim

Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey Eduardo Guilherme Satolo; João Marcos Andrietta; Paulo Augusto Cauchick Miguel; Felipe Araújo Calarge

230 249 261 274 292 304 317 332 345 359 376 388 400

Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia Eliane Gonçalves Gomes; Célia Regina Grego; João Carlos C. B. S. de Mello; Gustavo Souza Valladares; João A. de Carvalho Mangabeira; Evaristo E. de Miranda

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CONTENTS Produção, vol. 19, n. 2, ano 2009

The industrial engineer profile: a point of view of the companies from the metropolitan region of Porto Alegre Miriam Borchardt; Guilherme Luís Roehe Vaccaro; Debora Azevedo; Jacinto Ponte Jr.

Support model for multicriteria decision to outsource productive activities based on SMARTS method Último de Valois; Adiel Teixeira de Almeida

Patent obtaining in the São Paulo State industry: an analysis using logistic regression Antônio C. Pacagnella Jr.; Geciane S. Porto; Sérgio Kannebley Jr.; Sérgio L. da Silva; Carlos A. G. Bonacim

Modeling and analysis of a new surgical center for a growing hospital: a simulation-based approach Élcio Douglas Joaquim; Guilherme Ernani Vieira

Generation of wood waste and derivatives on furniture industry related to production’s variables Éverton Hillig; Vania Elisabete Schneider; Eloide Teresa Pavoni

Case study on the usage of reference materials in water analysis by laboratories involved in the accreditation system Suzana Saboia de Moura; Stella Regina Reis da Costa

Comparative analysis of strategic alignment models Vanderli Correia Prieto; Marly Monteiro de Carvalho; Adalberto Américo Fischmann

The Activity Based Costing and the throughput accounting in the definition of the production mix in a metalwork firm Evandro Sylvio Lima Sinisgalli; Ligia Maria Soto Urbina; João Murta Alves

Importance of characteristics in pricing national vehicles Camilo Brandão de Resende; Rodrigo Arnaldo Scarpel

Building competencies for product development in Brazilian subsidiaries of the automotive industry Marcos Amatucci; Roberto Carlos Bernardes

The interorganizational relationship in the supply chain: a case study in the civil construction industry Renata Albergaria de Mello Bandeira; Luiz Carlos Brasil de Brito Mello; Antonio Carlos Gastaud Maçada

The subsector of buildings of the civil construction in Brazil: a x-ray of the sector compared to the European Union and the United States Luiz Carlos Brasil de Brito Mello; Sérgio Roberto Leusin de Amorim

Analysis on the usage of techniques and tools from the Six-Sigma program on a survey-type assessment Eduardo Guilherme Satolo; João Marcos Andrietta; Paulo Augusto Cauchick Miguel; Felipe Araújo Calarge

230 249 261 274 292 304 317 332 345 359 376 388 400

Spatial dependence of land use efficiency in an Amazon rural settlement Eliane Gonçalves Gomes; Célia Regina Grego; João Carlos C. B. S. de Mello; Gustavo Souza Valladares; João A. de Carvalho Mangabeira; Evaristo E. de Miranda

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Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 230-248

O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre Miriam Borchardt Unisinos Guilherme Luís Roehe Vaccaro Unisinos Debora Azevedo Unisinos Jacinto Ponte Jr. Unisinos

RESUMO Este trabalho tem por finalidade apresentar os resultados de um levantamento realizado junto a gestores de empresas industriais da região metropolitana de Porto Alegre. O objetivo da pesquisa é identificar o grau de importância e a atual capacidade de aplicação dos diversos conhecimentos básicos, específicos, habilidades e atitudes requeridas na atuação de engenheiros em funções afins à Engenharia de Produção. No referencial teórico apresentam-se as diversas definições de competências disponíveis na literatura, bem como as competências sugeridas pelo INEP (MEC) e pela ABEPRO para essas funções. Os resultados da pesquisa discutem as lacunas observadas sobre as competências avaliadas. Também são identificados os vetores de avaliação dessas competências, através de análise fatorial. Merecem destaque, em função dos maiores graus de importância ou dos menores índices de aplicação, capacidade de expressão oral e escrita, análise de cenários, domínio de língua estrangeira, análises econômicas e financeiras. PALAVRAS-CHAVE Competências, habilidades, perfil do engenheiro, engenharia de produção.

The industrial engineer profile: a point of view of the companies from the metropolitan region of Porto Alegre ABSTRACT This paper targets the presentation of the results of a survey done together with managers from manufacturing companies in Great POA. The aim of this survey is to identify the importance and the present capacity of the application of several basic or specific knowledge and attitudes towards the engineers’ performances in jobs related to the Industrial Engineering. In relation to the theoretical framework, there are several definitions of competence available in the specialized literature as well as the ones suggested by INEP (MEC) and ABEPRO to the Industrial Engineering. The results of this survey discuss the observed gaps in the evaluated competences. It is also identified the evaluation index of these competences through a factorial analysis. Because of the biggest levels of importance or the smallest index of applications, the oral and written fluency, scenarios analysis, a foreign language proficiency and both economical and financial analysis have been emphasized. KEY WORDS Competences, abilities, engineering profile, industrial engineering.

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Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

1. INTRODUÇÃO Determinar as competências necessárias para exercer a atividade de engenheiro, e mais especificamente de engenheiro de produção, é uma demanda tanto das empresas industriais como das universidades. De um lado, esta demanda é pressionada pela busca por diferenciais competitivos de qualidade e produtividade. De outro, porque parte da responsabilidade pelo perfil do egresso recai sobre as Instituições de Ensino Superior (IES), enquanto mediadoras de conhecimentos e formadoras de habilidades. Espera-se dos profissionais das mais diversas formações que possam ter atuações competentes, próximas do estado da arte do conhecimento existente e que possam enfrentar problemas atuais e futuros de seu ambiente de trabalho, assim como da sociedade (CASTELLS, 1999). Nesse sentido, cabe à comunidade acadêmica posicionar-se diante de um cenário de competitividade acirrada, priorizando as reais necessidades de seus clientes, beneficiários da pesquisa e da prestação de serviço. Sob este ponto de vista, Colenci (2000) sugere que a comunidade universitária tem apresentado lacunas em sua estrutura de gestão acadêmica e no seu modelo educacional, que devem ser reconfiguradas depois de amadurecida discussão. No caso específico da Engenharia de Produção (EP), a demanda principal vem das empresas industriais visando atender à necessidade de prover produtos e serviços que combinem alta confiabilidade, inovação, preços competitivos, processos de fabricação e de distribuição sustentáveis e de baixo impacto ambiental (SLACK; CHAMBERS; JOHNSTON, 2002). A dinâmica dos sistemas produtivos exige que os profissionais que atuam em funções típicas da EP tenham perfil integrador e estejam em constante atualização de suas competências. A consequência natural é a demanda pela atualização dos conteúdos ministrados nos cursos de graduação e de pós-graduação em EP, de modo a manter o alinhamento às necessidades mercadológicas das empresas industriais. Para identificar essas necessidades é fundamental um contato frequente com os atores do mercado, de modo a monitorar mudanças no perfil requerido do profissional de EP. No contexto particular do RS, observa-se que até o ano de 2000 apenas uma IES graduava engenheiros de produção; todas as demais implementaram seus cursos após esse ano. Este fato sugere que, no presente, o número de egressos de EP dessas instituições atuando no mercado em suas funções é inferior ao número de postos oferecidos. Como consequência, o parque industrial conta com profissionais oriundos de

outras formações, principalmente outras engenharias, para atenderem demandas de funções tipicamente associadas ao perfil do engenheiro de produção. Frente ao cenário apresentado, emerge a seguinte questão de pesquisa: “De acordo com um dado mercado, quais as competências relevantes para os profissionais da EP?”. Visando investigar essa questão, foi efetuada uma pesquisa exploratória em empresas da região metropolitana de Porto Alegre, RS. O objetivo geral deste trabalho foi identificar as competências julgadas relevantes (por importância ou aplicação) pelos gestores das empresas no que se refere às funções típicas da EP. Esse objetivo foi desdobrado nos seguintes objetivos específicos: (i) identificar as principais lacunas existentes entre o grau de importância das competências e o grau de aplicação das mesmas pelos profissionais atuantes em funções típicas do engenheiro de produção, não sendo estes necessariamente um engenheiro de produção; e (ii) identificar os vetores de avaliação dessas competências, formadores da avaliação sobre a importância e a capacidade de aplicação percebida pelos gestores dessas organizações sobre o profissional que atua na área da EP. O método de pesquisa utilizado foi o levantamento, com base em um cadastro de 82 empresas de diferentes segmentos ligados à prática da EP na região metropolitana de Porto Alegre.

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competência profissional só é constatada quando de sua utilização em situação profissional, quando é passível de avaliação. Até onde se pesquisou, o tema competências é amplamente abordado na literatura. No entanto, no que se refere às competências do engenheiro de produção e/ou ao ensino de EP, observou-se, em periódicos nacionais de classificação B2 e B3 da EP (lista Qualis da Engenharia III - 2009), a pouca presença do tema. Algumas das referências identificadas, relacionadas com o tema deste trabalho, são: (i) duas referências à avaliação dos programas de pós-graduação da Engenharia III da CAPES (MIRANDA; ALMEIDA, 2003, 2004); (ii) uma análise das atitudes de alunos e professores com relação a cursos de mestrado em EP a distância (STEIL; BARCIA, 2006); e (iii) uma discussão sobre as potencialidades de mudanças na graduação em EP decorrentes das diretrizes curriculares (SANTOS, 2003). Nos Anais dos ENEGEP de 2003 a 2007 apresentam-se: (i) uma discussão sobre as competências no ensino de tecnologia (RIOS et al., 2005); (ii) uma reflexão acerca da atualização dos currículos de EP no Brasil (FURLANETTO; MALZAC NETO; NEVES, 2006); (iii) uma análise da estrutura curricular dos 231


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

cursos de EP (OLIVEIRA; BRUGIOLO; MUCHINELLI, 2006); e (iv) uma análise das tendências do mercado de trabalho do engenheiro de produção, a partir de uma pesquisa bibliográfica (SANTOS; DUTRA, 2005). Destaca-se, no entanto, que nas bases consultadas não foram observadas discussões sobre as competências essenciais ao engenheiro de produção sob a perspectiva das IES e sob a perspectiva do mercado. Desta forma, espera-se, como decorrência da pesquisa, contribuir com informações relevantes para a reformulação curricular dos cursos de graduação e pós-graduação em Engenharia de Produção do RS, de modo que futuramente o resultado dessas ações seja reconhecido pelo mercado. Apresenta-se, na sequência, um breve referencial teórico sobre competências. Segue-se descrevendo os requisitos legais do INEP/MEC e recomendações da ABEPRO (Associação Brasileira de Engenharia de Produção) acerca da formação do engenheiro de produção. O item subsequente apresenta o delineamento da pesquisa. Os resultados obtidos, as análises e considerações são, por fim, descritos.

2. COMPETÊNCIAS 2.1 A noção de competências Na noção de competência, duas abordagens se destacam: a das competências organizacionais (PRAHALAD; HAMEL, 1995) e a das competências individuais (BOYATIZIS, 1982; LE BORTEF, 2003). Na discussão acadêmica, o conceito de competências há muito deixou de ser apenas o somatório de conhecimentos, habilidades e atitudes. Foram incluídos nessa noção outros aspectos como: papel da experiência (BITENCOURT, 2001); comportamentos observáveis (BOYATIZIS, 1982); mobilização (FLEURY; FLEURY, 2000); contexto (LE BORTEF, 2003); e resultado (RUAS, 1999). A tendência atual da discussão de competências individuais, apesar dos diferentes enfoques propostos, encontra três pontos mais frequentes: (i) competência envolve conhecimentos, habilidades e atitudes, mas não se restringe a eles; (ii) competência envolve resultado, sendo freqüentemente relacionada a desempenho; e (iii) competência refere-se a um processo dinâmico, não reside apenas no campo das possibilidades, relaciona-se ao que de fato é mobilizado na ação. No que se refere à competência profissional, Zarifian (2001) considera a mesma como uma combinação de conhecimentos, de saber-fazer, de experiências e comportamentos que se exercem em um contexto preciso. Esta pode ser dividida em competência sobre processos, competência técnica, 232

competência sobre a organização, competência de serviço e competência social. Para Ubeda e Santos (2008), a competência profissional só é constatada quando de sua utilização em situação profissional, quando é passível de avaliação. Corroborando com o exposto, para Westera (2001) as competências profissionais cobrem um intervalo de habilidades e comportamentos que representam a capacidade de lidar com situações complexas e imprevisíveis; incluem-se nessa perspectiva operacional habilidades, atitudes, metacognição e pensamento estratégico e pressupõe-se uma tomada de decisões consciente e intencional. No âmbito da regulação do exercício profissional dos engenheiros, observa-se a definição de competência profissional adotada pelo CONFEA (2005): “Competência profissional é a capacidade da utilização de conhecimentos, habilidades e atitudes necessários ao desempenho de atividades em campos profissionais específicos, obedecendo a padrões de qualidade e produtividade”. No contexto da EP, empregadores buscam profissionais que sejam aptos a operar em ambientes complexos, caracterizados por problemas pouco definidos, informações contraditórias, colaboração informal e processos abstratos, dinâmicos, integrados e com prazos, via de regra, exíguos (WESTERA, 2001). 2.2 Desenvolvimento de competências na formação acadêmica O debate a respeito do conceito de competências passa pelo seu entendimento no campo da educação. A questão conceitual da formação das competências ainda apresenta desafios a serem superados. Um deles refere-se à própria definição de competências pelo MEC, que considera, assim como o CONFEA / CREA, competências como um conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes, mas apresenta em suas diretrizes expectativas sobre conhecimentos, habilidades e competências (BRASIL, 2002). Esse desnivelamento conceitual é refletido nas expectativas apresentadas pelas associações de classe, como a ABEPRO, que devem zelar pela concretização das expectativas de atribuições profissionais apresentadas tanto pelos órgãos governamentais como pelos empregadores dos profissionais de sua classe. A discussão de competências pelo MEC toma corpo a partir da publicação da Lei 9.131, de 24/11/95, que modifica a Lei 4.024, de 20/12/1961. Dentre as alterações relevantes encontra-se a elaboração do projeto de Diretrizes Curriculares Nacionais (DCN), cujo objetivo é orientar os cursos de graduação. As DCN ensejam a flexibilização curricular e conferem maior autonomia às instituições na definição dos currículos dos seus cursos, possibilitando-lhes elaborar seus projetos pedagógicos de acordo com as demandas sociais e


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os avanços científicos e tecnológicos. É encorajado o reconhecimento de conhecimentos, habilidades e competências adquiridos fora do ambiente escolar, inclusive os que se referem à experiência profissional julgada relevante para a área de formação em consideração (BRASIL, 2002). Encontram-se nas Diretrizes Curriculares Gerais dos Cursos de Graduação as especificações relativas ao perfil desejado do formando e aos conhecimentos, habilidades e competências por curso. Tais Diretrizes são divididas em diretrizes comuns aos cursos e diretrizes específicas por curso. Dentre as primeiras, tem-se aquelas que se referem ao projeto pedagógico, à organização curricular, aos estágios e atividades complementares e à monografia de conclusão de curso. Nas Diretrizes Específicas por Curso, encontram-se a definição do perfil desejado do formando, as habilidades e as competências que devem ser desenvolvidas na formação do estudante, bem como os conteúdos curriculares específicos. Considerando-se as diferentes abordagens dadas à noção de competências, para este estudo utilizou-se o conceito de competências conforme apresentado pelas DCN/CES do MEC/CNE, no qual os conhecimentos e habilidades aparecem em paralelo às competências. A opção deve-se a essa mesma estrutura referencial ser replicada pela ABEPRO. No entanto, a discussão acima evidencia que o conceito de competências adotado confunde-se com o de experiências e capacidades de aplicação, usados ora com diferentes significados, ora como sinônimos. Essa constatação leva à inferência de que o conceito de competência, voltado para a educação, é ainda pouco explorado e entendido, o que dificulta a sua efetiva adoção enquanto referência balizadora dos projetos pedagógicos. Essa discussão conceitual serve como pano de fundo ao levantamento e análise.

EP no Brasil, indicando a formação do engenheiro a partir de uma de seis áreas básicas (Civil, Elétrica, Mecânica, Materiais, Metalurgia e Minas) e indicando a EP como uma formação secundária ou vinculada às áreas principais. Com o crescimento da oferta de cursos e a formação de uma comunidade de EP no país, fez-se necessário o realinhamento da formação do engenheiro de produção. Tais elementos foram oficializados em 2002 pela resolução CNE/CES do MEC, introduzindo um novo perfil de profissional dotado de formação generalista, humanista, crítica e reflexiva, capaz de absorver e desenvolver novas tecnologias para a solução de problemas relevantes à sociedade. Atualmente, a EP propõese a trabalhar de forma integrada, requerendo para tanto a base de formação existente na Engenharia.

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engenheiro de produção desempenha um papel importante nos processos de produção sustentável, inovação e otimização de processos produtivos e de serviços.

3. A ENGENHARIA DE PRODUÇÃO NO BRASIL 3.1 O campo de atuação da Engenharia de Produção O campo de atuação da EP reflete-se no projeto, na implantação, na operação, na melhoria e na manutenção de sistemas produtivos. Para tanto deve compreender a gestão dos recursos e dos processos, bem como a especificação e avaliação de resultados através de indicadores (CUNHA, 2004). O engenheiro de produção é visto como um elemento capaz de desempenhar um papel importante nos processos de produção sustentável, inovação e otimização de processos produtivos e de serviços (FLEURY, 2008). Para Santos (2008), as resoluções 48/76 e 10/77 do MEC fundamentaram uma estrutura inicialmente rígida para a

A ABEPRO identifica uma base científica e tecnológica própria da EP que a caracteriza como grande área. Esse conjunto de conhecimentos, parcialmente listado a seguir, é fundamental para que qualquer tipo de sistema produtivo tenha um funcionamento eficaz (CUNHA, 2004): Engenharia do Produto; Processos Produtivos; Engenharia de Métodos e Processos; Planejamento e Controle da Produção; Custos da Produção; Qualidade; Planejamento da Manutenção e Engenharia de Confiabilidade; Ergonomia e Segurança do Trabalho; Logística e Pesquisa Operacional. 3.2 Evolução da Engenharia de Produção Conforme Fleury (2008), a EP começou há mais de um século com uma concepção de racionalidade econômica aplicada aos sistemas de produção. Tal concepção foi fundada pelas obras seminais de Taylor e Ford, mas migrou, posteriormente, para uma visão ampla que leva em conta diferentes stakeholders associados aos processos decisórios e de sustentabilidade de uma organização. Elementos regulatórios, de gestão ambiental, de percepção de qualidade e alinhamento de cadeias produtivas são hoje integrados às decisões de engenharia do produto ou do processo produtivo. Oliveira, Barbosa e Chrispim (2005) resgatam a história de EP no Brasil. A Engenharia de Produção tem sua origem no país quando a Escola Politécnica aprovou os cursos de Engenharia de Produção e Complemento de Organização Industrial como disciplinas do curso de doutoramento em 233


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

Engenharia existente na época. Visto que a nova área estava sendo bastante solicitada pelo mercado, em 1958 foi aprovada, em nível de graduação, a criação do curso de Engenharia de Produção como opção da Engenharia Mecânica. Após essa iniciativa da Poli/USP, também o ITA, em 1959, e a FEI, em 1963, implantaram habilitações em Produção. Na UFRJ, em 1957, o curso de pós-graduação em Engenharia Econômica passou a contar com conteúdos de Produção. A partir de 1962, a PUC-Rio incluiu disciplinas de Produção na sua pós-graduação em Engenharia. Ressalta-se que até o início da década de 1970 não existiam cursos de graduação em EP como modalidade. Os cursos criados até então eram de pós-graduação ou de graduação, tendo a Produção como habilitação de outra modalidade de Engenharia. Ao que tudo indica, os dois primeiros cursos de EP surgiram efetivamente no início da década de 1970 na UFRJ e na USP – São Carlos (OLIVEIRA, BARBOSA e CHRISPIM, 2005). No final da década de 1970 começaram a surgir outros cursos de EP, além dos existentes na UFRJ e na USP. Em 1980 já existiam 18 cursos, e até 1997 criaram-se aproximadamente dois cursos a cada três anos no país. A partir de 1998 houve um crescimento vertiginoso do número de cursos, chegando a aproximadamente 200 cursos em 2005; neste período criaram-se cerca de 20 cursos por ano. A Figura 1, elaborada a partir de cadastro do INEP (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), ilustra o crescimento mencionado. No que se refere ao RS, existem 13 ofertas de graduação em EP. Destas, quatro se localizam na região metropolitana de Porto Alegre, área de abrangência desta

Figura 1: Crescimento do número de cursos de Engenharia de Produção no Brasil Fonte: Oliveira, Barbosa e Chrispim (2005).

234

pesquisa. O curso mais antigo na Grande Porto Alegre sendo, também, o mais antigo no Estado, foi criado no início de década de 1990; todos os demais, situados na região de abrangência da pesquisa, surgiram a partir de 2000 (INEP, 2007). 3.3 Conhecimentos básicos e específicos para engenheiro A EP adota o núcleo de conhecimentos básicos propostos pelas DCN do Curso de Graduação em Engenharia – Resolução CNE/CES 11, de 11 de março de 2002 (CUNHA, 2004). O núcleo de conhecimentos básicos para a graduação em engenharia é formado pelos tópicos: metodologia científica e tecnológica, comunicação e expressão, informática, expressão gráfica, matemática, física, fenômenos de transporte, mecânica dos sólidos, eletricidade, química, ciência dos materiais, administração, economia, ciências do ambiente e humanidades, ciências sociais e cidadania. O núcleo de conhecimentos específicos para a formação do Engenheiro de Produção é indicado pelas Diretrizes da ABEPRO (Quadro 1). Uma visão mais ampla pode ser também encontrada em Santos (2008). 3.4 Competências e habilidades requeridas para o engenheiro de produção Tomando como referência as DCN do Curso de Graduação em Engenharia – Resolução CNE/CES 11, Cunha (2004) apresenta uma proposta de Diretrizes Curriculares para os cursos de EP também baseada em competências, indicando, além das competências, as habilidades requeridas para o engenheiro de produção. As mesmas são descritas no Quadro 2. Com esses conhecimentos, habilidades e competências compondo a formação do egresso em EP é esperado que o mesmo deva estar capacitado a identificar e solucionar problemas ligados às atividades de projeto, operação e gerenciamento do trabalho e de sistemas de produção, considerando aspectos humanos, econômicos, sociais e ambientais em atendimento às demandas da sociedade. No entanto, Santos (2008, p. 25) afirma que “de forma genérica e abrangente como estão expostas atualmente, as competências das Diretrizes Curriculares não possibilitam uma gestão da graduação baseada em competências. Embora haja grande mobilização a favor das competências, elas não são definidas em seus detalhes, não se planeja sua implementação e, assim, não se tem como avaliá-las”. A esse argumento soma-se a discussão apresentada anteriormente sobre o conceito de competências, sua abrangência enquanto tema de pesquisa e a forma como é endereçada pelas DCN.


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

4. DELINEAMENTO DA INVESTIGAÇÃO A conjugação das áreas da EP com o indicado nas DCN do Curso de Graduação em Engenharia com o proposto por Cunha (2004) no que se refere a conhecimentos básicos, específicos, habilidades e competências, formam os elementos de referência para o delineamento da investigação. O método de pesquisa utilizado foi o levantamento, visto que esta pesquisa busca identificar a percepção de gestores de um grupo de empresas em relação a diversos itens, a fim de avaliar o “quanto” cada item analisado é importante e aplicado. Segundo Malhotra (2001), o instrumento de avaliação para essa abordagem será um interrogatório ou questionário a ser respondido pelos participantes. 4.1 Estrutura do instrumento de avaliação O instrumento de avaliação foi organizado em quatro blocos de análise; cada bloco contém os respectivos itens de avaliação: (i) conhecimentos básicos, com 17 questões; (ii) conhecimentos específicos, com 10 questões; (iii) habilidades, com 12 questões; e (iv) competências, com 18 questões. Os elementos de cada bloco de análise foram constituídos a partir dos conhecimentos básicos e específicos e das competências e das habilidades requeridas para o engenheiro de produção, descritos anteriormente.

As questões são classificadas como fechadas (REA; PARKER, 2002). Para cada questão, o respondente foi solicitado a indicar, em uma escala, um único atributo, que representa a sua percepção quanto ao grau de importância e ao grau de aplicação. As opções de respostas, para o grau de importância e para o grau de aplicação, foram organizadas usando escalas Likert (COOPER; SCHINDLER, 2003) variando de 1 a 5, sendo que 1 corresponde à pior avaliação (ruim) e 5 à melhor avaliação (muito importante para o grau de importância e excelente para o grau de aplicação). Foi realizado um pré-teste, com cinco respondentes, a fim de validar o instrumento de avaliação. 4.2 Seleção da amostra O escopo delimitado para a pesquisa foi a população de empresas industriais e de consultoria com ação específica em EP situadas na região metropolitana de Porto Alegre. Essa restrição deve-se ao fato de que esses segmentos são os mais representativos na contratação de engenheiros em geral e de engenheiros de produção egressos das IES da região. O instrumento de avaliação foi enviado por e-mail para 79 gerentes industriais de empresas manufatureiras, um gerente de logística de uma empresa de transportes terrestres e dois diretores de empresas de consultoria. As empresas foram selecionadas com base em um cadastro

Quadro 1: Núcleo de conhecimentos específicos para a Engenharia de Produção Núcleo de conhecimentos profissionalizantes

Componentes do núcleo de conhecimentos profissionalizantes

Engenharia do Produto

Planejamento do Produto; Projeto do Produto.

Projeto de Fábrica

Análise de Localização; Instalações Industriais; Arranjo Físico; Movimentação de Materiais.

Processos Produtivos

Processos Discretos de Produção; Processos Contínuos de Produção; Fundamentos de Automação; Planejamento de Processos.

Gerência de Produção

Planejamento e Controle da Produção; Organização/Planejamento da Manutenção; Logística e Distribuição; Estratégia da Produção; Gestão Ambiental.

Qualidade

Gestão da Qualidade; Controle Estatístico da Qualidade; Normalização e Certificação; Metrologia; Inspeção e Ensaios; Confiabilidade.

Pesquisa Operacional

Programação Matemática; Processos Estocásticos; Simulação de Sistemas de Produção; Avaliação e Apoio à Tomada de Decisão.

Engenharia do Trabalho

Organização do Trabalho; Ergonomia; Higiene e Segurança do Trabalho; Engenharia de Métodos e Processos.

Estratégia e Organizações

Planejamento Estratégico; Organização Industrial; Economia Industrial; Gestão Tecnológica; Sistemas de Informação.

Gestão Econômica

Engenharia Econômica; Custos da Produção; Viabilidade Econômico-financeira.

Fonte: adaptado de Cunha (2004)

235


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

preexistente na Universidade de origem da pesquisa, não se constituindo em uma amostra probabilística. Por informações do cadastro, há evidências de que essas organizações possuam estruturas bem definidas no que refere a funções típicas relacionadas à EP. Buscou-se, dessa forma, minimizar o erro decorrente de problemas de interpretação dos itens em avaliação.

O

variáveis categóricas, pela não normalidade dos dados, muitos autores em ciências sociais o usam (FLEMING, 2005; HAIR et al., 2005b). O teste t pressupõe que a distribuição de diferenças seja Normal e que os dados tenham sido coletados sob as mesmas condições. Não foram encontradas evidências de que estes pressupostos tenham sido violados. A seguir foi aplicada a técnica de análise fatorial (AF), com o intuito de identificar elementos decisórios para a avaliação da importância e da aplicação de conhecimentos, habilidades e competências por parte dos respondentes. A AF é uma técnica de análise multivariada que visa identificar inter-relações entre variáveis, bem como dar apoio na interpretação da estrutura latente dos dados. Sua aplicação pode fornecer maior compreensão sobre quais variáveis agem conjuntamente em uma decisão (HAIR et al., 2005a). Recomenda-se que o tamanho de amostra para a aplicação da AF seja 50 e, em não sendo possível, não inferior a 20. Em ambos os casos, deve-se identificar um número substancial de correlações superiores a 0,30. Cargas superiores a 0,5 são consideradas de significância prática, com influência aproximada de 25% sobre a variância do fator. No caso de amostras pequenas sugere-se avaliar se a variância comum explicada (comunalidade) dos fatores é superior a 0,60 (HAIR et al., 2005a). Para a seleção dos fatores, foram utilizados os critérios de percentagem da variância total explicada e a análise visual do gráfico de autovalores (scree plot). De modo a

engenheiro atual é menos qualificado que a expectativa considerada pelos respondentes

4.3 Métodos de análise Os questionários recebidos foram compilados em uma base de dados eletrônica compatível com o software de análise SPSS 14.0. Inicialmente foram utilizados testes para comparação das médias das avaliações de importância e das avaliações de aplicação. Para tanto foram aplicados os testes t para amostras emparelhadas e de Postos com Sinais de Wilcoxon, visto que o mesmo respondente foi solicitado a avaliar tanto importância quanto grau de aplicação de cada quesito. A aplicação do teste não paramétrico de Postos com Sinais de Wilcoxon, mais apropriado para dados ordinais, requer somente a validade da hipótese de simetria da distribuição de diferenças (SIEGEL; CASTELLAN, 2006). Apesar de mais adequado para dados intervalares ou razão, o teste t pode ser utilizado para dados ordinais (HAIR et al., 2005b). Embora o uso do teste t (paramétrico) na comparação de médias seja controverso quando empregado com

Quadro 2: Competências e habilidades requeridas para o engenheiro de produção Competências

Habilidades

Ser capaz de: - dimensionar e integrar recursos físicos, humanos e financeiros a fim de produzir, com eficiência e ao menor custo; - usar ferramental matemático e estatístico para modelar sistemas de produção e auxiliar na tomada de decisões; - projetar, implementar e aperfeiçoar sistemas, produtos e processos; - prever e analisar demandas, selecionar tecnologis/know-how; - incorporar conceitos e técnicas da qualidade no sistema produtivo; - prever a evolução dos cenários produtivos; - acompanhar os avanços tecnológicos, usando-os a serviço das empresas e da sociedade; - compreender a inter-relação dos sistemas de produção com o meio ambiente; - utilizar indicadores de desempenho, sistemas de custeio, avaliar a viabilidade econômica e financeira de projetos; e, - gerenciar e otimizar o fluxo de informação nas empresas.

- Compromisso com a ética profissional; - iniciativa empreendedora; - disposição para autoaprendizado e educação continuada; - comunicação oral e escrita; - interpretação e expressão por meios gráficos; - visão crítica de ordens de grandeza; - domínio de técnicas computacionais; - domínio de língua estrangeira; - conhecimento da legislação pertinente; - capacidade de trabalhar em equipes; - capacidade de identificar, modelar e resolver problemas; - compreensão dos problemas administrativos, socioeconômicos e ambientais; - responsabilidade social; e, - “pensar globalmente, agir localmente”.

Fonte: adaptado de Cunha (2004)

236


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

promover maior distinção entre os fatores gerados, foi utilizada a rotação ortogonal Varimax. Apresentam-se, na sequência, os resultados obtidos a partir da aplicação do instrumento de avaliação.

5. APRESENTAÇÃO E DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Dos 82 questionários enviados, 28 retornaram adequadamente respondidos no prazo estabelecido, o que está dentro dos índices de devolução citados por Mattar (1996). Os dados obtidos permitiram uma análise considerando 5% de significância e um erro padrão de 0,5 numa escala de 1 a 5 (ou seja, 10% da escala). Das empresas respondentes, usando a classificação do SEBRAE em relação ao número de empregados, 19 são de grande porte, sete de médio porte e duas são microempresas (SEBRAE, 2008). A Tabela 1 apresenta o setor industrial, conforme classificação indicada pela FINEP (2008), ao qual pertencem as empresas respondentes. Para cada item avaliado em cada bloco de análise, foram identificados os escores mínimo e máximo atribuídos, o es-

core médio, o respectivo desvio-padrão e o valor do teste de Postos com Sinais de Wilcoxon. A Tabela 2 indica os valores referentes ao bloco de análise “conhecimento básico”; a Tabela 3 refere-se ao bloco de análise “conhecimento específico”; os valores referentes ao bloco “habilidades” são apresentados na Tabela 4 e a Tabela 5 mostra os valores correspondentes ao bloco “competências”. Tabela 1: Setor industrial das empresas respondentes Setor industrial

Quantidade de empresas 11 2 2 2 2 2 1 1 1 1 1 2 28

Fabricação de produtos de metal Alimentos e bebidas Couro e calçados Componentes eletrônicos Fabricação de produtos químicos Produtos de borracha e plástico Pasta de papel, papel e produtos de papel Veículos automotores Têxtil Metais básicos ferrosos Transporte terrestre Serviços prestados à indústria Total

Tabela 2: Avaliação do conhecimento básico Conhecimentos Básicos

Avaliação de Importância

Avaliação de Aplicação

Postos com sinais de Wilcoxon

N

Min

Max

Média

D.P.

N

Min

Max

Média

D.P.

Z

Sig. (2-tailed)

Matemática

28

3

5

4,18

0,77

28

2

5

3,36

0,78

-3,839

0,000

Física

28

3

5

3,82

0,82

28

2

4

3,07

0,72

-3,257

0,001

Informática

28

3

5

4,21

0,79

28

2

4

3,61

0,63

-3,545

0,000

Eletricidade

28

2

5

3,25

0,65

27

2

4

2,70

0,67

-3,119

0,002

Química

28

2

5

2,89

0,83

28

1

4

2,39

0,79

-2,501

0,012

Desenho Técnico

28

2

5

3,61

0,79

28

2

5

3,14

0,89

-2,285

0,022

Expressão Oral

28

3

5

4,36

0,62

28

1

5

2,89

1,10

-4,115

0,000

Expressão Escrita

28

3

5

4,25

0,70

28

1

5

2,54

1,00

-4,136

0,000

Estatística

28

3

5

4,25

0,59

28

2

5

3,21

0,92

-3,683

0,000

Resistência dos Materiais

28

1

5

3,11

0,74

26

1

5

2,96

1,00

-0,880

0,379

Materiais

28

1

5

3,29

0,76

28

1

5

3,00

1,05

-1,311

0,190

Economia

28

3

5

3,68

0,72

28

2

5

2,93

0,90

-3,107

0,002

Finanças

28

3

5

3,89

0,69

28

1

5

2,64

1,06

-3,940

0,000

Térmica

28

1

5

2,96

0,79

28

1

4

2,71

0,98

-1,137

0,256

Direito

28

2

5

3,00

0,77

27

1

3

1,89

0,80

-3,527

0,000

Sociologia

28

1

5

3,00

0,98

28

1

4

2,14

0,85

-3,083

0,002

Gestão Ambiental

28

3

5

3,93

0,72

28

1

4

2,39

0,99

-4,159

0,000

237


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

No bloco de análise “conhecimento básico”, os itens associados à “expressão” (oral e escrita) e à “estatística” apresentam o maior grau de importância médio. Os itens relacionados a “química” e “térmica” apresentam menor grau de importância médio. Quanto ao grau de aplicação, “matemática”, “informática” e “estatística” foram os itens mais bem avaliados, enquanto “direito” e “sociologia” apresentaram menor escore médio. As maiores lacunas foram obtidas em “expressão escrita”, “gestão ambiental” e “expressão oral”.

No bloco de análise “conhecimento específico”, os itens “gerência de produção”, “qualidade” e “estratégia e organizações” foram identificados como sendo os de maior importância e de maior grau de aplicação pelos atuais profissionais. Os de menor importância média foram “engenharia do produto” e “pesquisa operacional”, enquanto os de menor escore médio de aplicação foram “pesquisa operacional” e “gestão ambiental”. As maiores lacunas significantes foram nos itens “gestão ambiental”, “estratégia e organizações” e “ergonomia e segurança”.

Tabela 3: Avaliação do conhecimento específico Conhecimentos Específicos

Avaliação de Importância

Avaliação de Aplicação

Postos com sinais de Wilcoxon

N

Min

Max

Média

D.P.

N

Min

Max

Média

D.P.

Z

Sig. (2-tailed)

Gerência de Produção

28

3

5

4,71

0,53

28

2

5

3,61

0,92

-3,853

0,000

Qualidade

28

3

5

4,61

0,69

28

2

5

3,50

0,79

-3,885

0,000

Gestão Econômica

28

3

5

4,18

0,77

27

1

4

2,81

0,74

-4,123

0,000

Ergonomia e Segurança

28

3

5

4,07

0,72

28

1

4

2,57

0,84

-4,308

0,000 0,000

Engenharia do Produto

28

2

5

3,75

0,97

28

1

5

2,82

0,98

-3,568

Pesquisa Operacional

28

2

5

3,61

0,88

28

1

5

2,46

0,96

-3,736

0,000

Estratégia e Organizações

28

3

5

4,46

0,58

27

1

5

2,96

1,09

-4,115

0,000

Gestão da Tecnologia

28

2

5

3,96

0,92

28

1

4

2,75

0,84

-3,787

0,000

Sistemas de Informação

28

2

5

4,00

0,90

28

1

4

2,89

0,83

-3,885

0,000

Gestão Ambiental

28

3

5

4,07

0,81

28

1

4

2,46

0,92

-4,155

0,000

Tabela 4: Avaliação das habilidades Avaliação de Importância

Avaliação de Aplicação

Postos com sinais de Wilcoxon

N

Min

Max

Média

D.P.

N

Min

Max

Média

D.P.

Z

Sig. (2-tailed)

Empreendedor

27

3

5

4,15

0,60

28

2

5

3,18

0,86

-3,452

0,000

Iniciativa

28

4

5

4,79

042

28

2

5

3,54

0,88

-4,202

0,000

Comunicação Oral

28

3

5

4,29

0,66

28

1

5

3,11

1,07

-3,849

0,000

Habilidades

Comunicação Escrita

27

3

5

4,15

0,72

28

1

5

2,86

0,97

-3,900

0,000

Leitura e Interpretação

28

3

5

3,93

0,66

28

2

5

3,14

0,97

-2,685

0,010

Visão Crítica e Ordem de Grandeza

28

3

5

4,36

0,68

28

1

5

3,29

1,01

-3,596

0,000

Domínio de Técnicas Computacionais

28

2

5

3,75

0,89

28

2

4

3,43

0,63

-2,324

0,020

Língua Estrangeira

28

2

5

4,00

0,86

28

1

4

2,43

0,84

-4,158

0,000

Trabalho em Equipe

28

3

5

4,54

0,64

28

2

5

3,25

0,89

-3,593

0,000

Identificar Problemas

28

3

5

4,64

0,56

28

2

5

3,25

0,84

-4,021

0,000

Resolver problemas

28

3

5

4,75

0,52

28

2

5

3,25

0,84

-4,302

0,000

Pensamento Sistêmico

28

3

5

4,36

0,56

28

2

5

3,04

0,96

-3,985

0,000

238


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

No bloco de análise “habilidades”, “iniciativa”, “ser capaz de identificar problemas” e “ser capaz de resolver problemas” têm o maior grau de importância. Os menores escores médios de importância surgem para “domínio de técnicas computacionais” e “leitura e interpretação”. Os maiores escores médios de aplicação foram indicados para “iniciativa”, “domínio de técnicas computacionais” e “visão crítica e ordem de grandeza”, enquanto os menores escores foram para “domínio de língua estrangeira” e “comunicação escrita”. As maiores lacunas foram observadas nos itens “domínio de língua estrangeira”, “ser capaz de resolver problemas” e “ser capaz de identificar problemas”. No bloco “competências”, os itens “utilizar indicadores de desempenho”, “analisar viabilidade econômica” e “melhorar processos” foram considerados os mais importantes, em média, enquanto “projetar e implementar produtos” e “melhorar produtos” foram os de menor importância. Quanto ao grau de aplicação, os itens melhor avaliados foram “melhorar processos”, “projetar e implementar processos” e “utilizar conhecimento técnico”. Os itens pior avaliados foram “prever evolução de cenários” e “analisar viabilidade financeira”, indicando que os atuais profissionais são vistos

como carentes principalmente em atividades de planejamento. Esta inferência é corroborada pelos itens com maiores lacunas entre avaliação e importância, que foram “analisar viabilidade econômica”, “analisar viabilidade financeira” e “prever evolução de cenários”. Observa-se que, à exceção dos conhecimentos básicos sobre resistência de materiais, engenharia de materiais e engenharia térmica, todas as outras diferenças são significantes. As lacunas negativas indicam que, na avaliação dos respondentes, há carências em relação aos conhecimentos básicos, técnicos, habilidades e competências dos atuais profissionais de EP considerando-se as expectativas de importância dadas a cada um dos quesitos avaliados. Essa análise permite concluir que, excetuando-se conhecimentos básicos sobre resistência de materiais, engenharia de materiais e engenharia térmica, o engenheiro atual é menos qualificado que a expectativa considerada pelos respondentes. A análise individual dos itens permite inferir que os gestores dão maior importância a competências associadas à comunicação e ao relacionamento interpessoal (comunicação oral, comunicação escrita), ao fazer (gerenciar operações, melhorar processos, identificar e resolver problemas,

Tabela 5: Avaliação das competências Competências

Avaliação de Importância N

Avaliação e Utilização de Recursos

28

Min Max Média 3

5

Avaliação de Aplicação

Postos com sinais de Wilcoxon

D.P.

N

Min

Max

Média

D.P.

Z

Sig. (2-tailed)

4,18

0,66

28

2

5

3,21

0,69

-3,796

0,000

Matemática e Estatística

28

3

5

3,82

0,69

28

2

4

2,93

0,66

-4,226

0,000

Projetar e Implementar Sistemas

28

3

5

4,21

0,83

28

2

4

2,89

0,69

-3,489

0,000

Projetar e Implementar Processos

28

3

5

3,25

0,74

28

2

5

3,29

0,85

-3,451

0,001

Projetar e Implementar Produtos

28

2

5

2,89

0,92

27

1

4

2,81

0,83

-3,266

0,001

Melhorar Sistemas

28

2

5

3,61

0,88

28

2

5

3,21

0,79

-3,182

0,001

Melhorar Processos

28

3

5

4,36

0,57

28

2

5

3,36

0,83

-3,945

0,000

Melhorar Produtos

28

2

5

4,25

0,88

27

1

4

2,89

0,85

-3,201

0,001

Prever e Analisar Demandas

28

3

5

4,25

0,79

28

1

5

2,86

0,89

-3,823

0,000

Selecionar Conhecimento Técnico

28

3

5

3,11

0,84

26

2

5

3,18

0,72

-2,366

0,018

Utilizar Conhecimento Técnico

28

3

5

3,29

0,65

28

2

4

3,25

0,70

-3,374

0,001

Prever Evolução de Cenários

28

3

5

3,68

0,80

28

1

5

2,68

0,94

-4,308

0,000

Atualização dos Avanços Tecnológicos

28

3

5

3,89

0,65

28

1

5

3,14

0,97

-3,753

0,000

Gerenciar Fluxo da Informação

28

3

5

2,96

0,56

28

1

4

3,00

0,77

-4,290

0,000

Analisar Viabilidade Econômica

28

3

5

3,00

0,58

28

1

5

2,89

0,99

-4,195

0,000

Analisar Viabilidade Financeira

28

3

5

3,00

0,73

28

1

5

2,75

1,00

-4,157

0,000

Utilizar Indicadores de Desempenho

28

3

5

4,54

0,64

28

2

5

3,21

0,74

-3,985

0,000

Entender a Interação entre Sistemas

28

3

5

3,93

0,73

28

2

5

3,11

0,83

-4,093

0,000

239


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

utilizar indicadores de desempenho) e ao planejar (analisar viabilidade financeira, estatística). A seguir foi realizada a análise fatorial para as avaliações de importância atribuídas aos conhecimentos, habilidades e competências do profissional de EP. Uma análise preliminar indicou a extração de 15 fatores. Cargas com módulo igual ou superior a 0,45 foram consideradas significantes para esta análise, por representarem cerca de 20% de potencial de explicação da variância do fator. Nenhuma das variáveis apresentou indícios para ser desconsiderada na análise, sendo 0,853 o menor valor de comunalidade (variância comum explicada). Os 15 fatores extraídos representam aproximadamente 92,851% da variância total das avaliações de importância. O fator mais impactante explica 11,413% da variância e o menos impactante, 2,970%. Após a análise, os fatores foram interpretados pelos autores, conforme apresenta a Tabela 6.

N

petência de “utilizar matemática e estatística” e “utilizar o conhecimento técnico”. O quarto fator refere-se às habilidades de comunicação, sendo associado a “comunicação oral”, “comunicação escrita” e “leitura e interpretação”. Este fator apresenta uma forte carga associada à habilidade de “ser empreendedor”. O quinto fator refere-se a conhecimentos de “finanças”, “gestão ambiental”, “expressão oral”, “economia” e “direito”, tendo sido associado aos conhecimentos mínimos necessários para que um engenheiro torne-se gestor. O sexto fator apresenta forte associação com as competências de “analisar viabilidade financeira”, “analisar viabilidade econômica” e “prever e analisar demandas”. Também tem associação com conhecimentos de “direito”, indicando elementos necessários ao planejamento do ponto de vista da Engenharia Econômica. O sétimo fator foi associado à análise e solução de problemas, apresentando cargas elevadas para conhecimentos sobre “desenho técnico”, habilidades em “identificar problemas” e “resolver problemas” e a competência “atualização nos avanços tecnológicos”. O oitavo fator foi associado ao planejamento de médio e longo prazos, devido às cargas pronunciadas sobre a habilidade de “comunicação escrita” e as competências de “prever a evolução de cenários” e “utilizar indicadores de desempenho”. O nono fator foi associado à competência de projetar e implementar produtos e processos, estando correlacionada às competências de “projetar e implementar sistemas”, “projetar e implementar processos” e “atualização nos avanços tecnológicos”. Também está associado a conhecimentos específicos de “gestão econômica”. O décimo fator foi associado à Engenharia de Produto, com cargas elevadas para as competências em “melhorar produtos”, “melhorar sistemas”, “projetar e implementar produtos”. Uma carga elevada surge também com relação ao domínio de “língua estrangeira”. O décimo primeiro fator foi associado à Gestão das Operações, requerendo conhecimentos de “gerência da produção”, habilidades de “visão crítica e ordem de grandeza”, e competências em “atualização nos avanços tecnológicos”. Conhecimentos sobre “sociologia” aparecem com cargas negativas relativamente elevadas neste fator. O décimo segundo fator foi associado à dialética da visão local x visão sistêmica; apresenta cargas positivas para conhecimentos técnicos (“eletricidade”, “química”) e competências em “utilizar conhecimento técnico”; uma forte carga

a ótica dos respondentes, há um distanciamento entre os vetores que direcionam as avaliações de importância e de aplicação no que tange às dimensões de competências dos engenheiros de produção O primeiro fator indica que os respondentes têm expectativa elevada de que os engenheiros de produção dominem elementos de gestão com foco em tecnologia da informação, associados aos conhecimentos de “sistemas de informação”, “informática”, “gestão da tecnologia”, “pesquisa operacional”, “gestão ambiental”, “engenharia do produto” e “gestão econômica”, às habilidades em “domínio de técnicas computacionais” e “leitura e interpretação”, e às competências em “avaliação e utilização de recursos” e “entender a interação entre sistemas”. Este fator parece indicar uma expectativa de que o engenheiro esteja inserido na chamada “Era da Informação”. O segundo fator refere-se aos elementos de engenharia de aplicação, com cargas elevadas sobre os conhecimentos de “estratégia e organizações”, “engenharia do produto”, “térmica”, “ergonomia e segurança”, “resistência dos materiais” e “materiais”. Uma carga negativa é associada aos conhecimentos de “matemática”. Este fator indica que a estratégia da empresa é vista de forma integrada com o projeto de produtos pelos respondentes, o que é corroborado pela carga associada à competência de “projetar e implementar produtos”. O terceiro fator é relacionado à melhoria da qualidade, envolvendo conhecimentos de “estatística”, “qualidade” e “matemática”, a habilidade de “trabalho em equipe” e a com240


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

negativa é apresentada para a habilidade de “pensamento sistêmico”, indicando um viés de avaliação centrado sobre a solução de problemas técnicos com visão local. O décimo terceiro foi associado à melhoria de processos,

envolvendo competências em “melhorar processos” e “usar matemática e estatística”. O décimo quarto fator foi associado aos conhecimentos básicos de “física”.

Conhecimentos Específicos

Conhecimentos Básicos

15

Comunalidade

14

Gestão da Informação

13

Física

12

Melhoria de Processos

11

Visão Local x Sistêmica

10

Gestão das Operações

9

Engenharia de Produto

8

Engenharia de Sistemas e Processos

7

Planejamento e Análise de Cenários

6

Análise e Solução de Problemas

5

Engenharia Econômica

4

Conhecimentos Básicos para Gestão

0,1

3

Habilidade de Comunicação

Matemática

2

Melhoria da Qualidade

Gestão na Era da Informação

1

Engenharia de Aplicação

Tabela 6: Extração de Fatores para Avaliação de Importância

-0,45 0,56

0,25

0,15

0,06

-0,13

0,12

0,02

-0,19

0,25

0,12

-0,25

0,41

0,05

0,988

Física

-0,14

-0,04

0,18

0,11

-0,09 -0,11

0,09

-0,03

0,04

-0,06 -0,06

0,02

-0,01

0,87

-0,01 0,860

Informática

0,72

0,21

0,09

0,32

0,09

0,06

0,23

0,16

0,2

-0,26

0,23

0,05

0,1

-0,1

-0,02 0,940

Eletricidade

-0,18

0,2

0,26

-0,23

-0,2

0,05

0,11

0,07

0,44

-0,19

0,08

0,54

0

0,09

-0,27 0,865

Química

0,35

0,1

-0,02

-0,25

0,25

0,15

0,03

0,07

0,28

-0,08 -0,12

0,49

0,35

0,38

-0,09 0,901

Desenho Técnico

0,16

0,13

-0,12

-0,15 -0,04

0,05

0,79

0,09

0,29

0,16

0,01

-0,07

0,04

0,13

0,17

0,879

Expressão Oral

-0,13

0,05

-0,02

0,44

0,72

0,08

0,07

0,12

-0,2

0,08

-0,01

0,15

-0,29

0,13

0,2

0,958

Expressão Escrita

-0,07

0,05

0,05

0,31

0,41

-0,14

0,06

0,39

0,12

0,34

0,28

0

-0,42

-0,07

-0,31 0,927

Estatística

0,38

0,03

0,82

-0,02

0,03

0,25

0,15

0,08

0,03

0,09

0,16

-0,13

0,14

0

-0,07 0,979

Resistência dos Materiais

0,17

0,54

0,08

-0,27

0,13

-0,02

0,38

-0,21

0,33

0,02

-0,14

0,22

-0,32

0,03

-0,17 0,912

Materiais

0,22

0,54

-0,01 -0,25

0,35

-0,02

0,43

-0,29

0,18

-0,01 -0,01

0,13

-0,15

0,19

-0,23 0,955

Economia

0,22

0,21

0,29

0,14

0,55

0,32

0,22

0,01

0,1

-0,11

0,37

0,06

-0,01

-0,27

0,13

Finanças

0,06

0,23

-0,1

-0,09

0,8

0,28

0,22

0,18

-0,08 -0,03

0,23

0,02

0,15

-0,05 -0,06 0,955

Térmica

0

0,73

-0,03

-0,07

0,21

0,18

0,14

-0,22

0,31

-0,05

-0,1

0,3

0,04

0,12

0,15

Direito

0,22

0,27

0,03

-0,19

0,45

0,57

-0,11

0,16

0,12

0,14

-0,05

-0,14

0,07

0,17

-0,25 0,875

Sociologia

0,21

0,32

0,32

-0,08

0,06

0,17

-0,06

0,13

0,16

0,1

-0,66

0,16

0,23

0,31

0,21

0,924

Gestão Ambiental

0,23

-0,02

0,15

-0,16

-0,16

0,77

0,02

-0,16

0,15

0,1

-0,36 -0,08

0,02

-0,15

0,03

0,942

0,63

0

0,909

0,927

Gerência de Produção

0,09

0

0,37

0,1

-0,21 -0,06

0,11

0,32

-0,17

0,17

0,21

0,29

0,16

0,929

Qualidade

-0,04

0,17

0,82

0,4

-0,04 -0,02

0,05

-0,04

0,03

-0,01 -0,12 -0,01

0,17

0,11

0,06

0,928

Gestão Econômica

0,45

0,33

0,17

0,27

0,23

0,13

0,12

0,12

0,45

0,11

-0,08

0

-0,15 -0,41

0,15

0,943

Ergonomia e Segurança

0,34

0,64

0,16

0,24

0,27

0,1

0,09

0,17

-0,14

0,05

0,09

-0,28

0,24

-0,14

0,09

0,925

Engenharia do Produto

0,47

0,74

0,16

-0,06

0

0,25

-0,01

0,07

0,01

0,28

0,04

-0,09

0,1

-0,09

0,09

0,982

Pesquisa Operacional

0,64

0,26

0,26

-0,06

0,06

0,14

0,02

0,33

0,12

0,41

-0,07

-0,11

-0,12

-0,05

0,19

0,934

Estratégia e Organizações

0,09

0,76

0,03

0,05

0,03

0,2

0,22

0,31

0,14

0,12

0,08

-0,03 -0,31 -0,09 -0,01 0,918

Gestão da Tecnologia

0,7

0,25

-0,05

-0,26

0,07

0,22

0,01

0

0,09

0,37

0,2

0,12

Sistemas de Informação

0,87

0,09

0,03

-0,11

0,15

0,16

0,14

0,06

0,16

0,08

-0,01 -0,18

0,07

Gestão Ambiental

0,54

0,16

0,28

0,06

0,44

0,11

-0,34

0,02

0,25

0,12

-0,22

0,08

-0,05

0,3

0

0,03

0,962

0,02

0,08

0,920

-0,11

-0,12 0,882

241


Competências

Habilidades

Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

Empreendedor

0,15

-0,29

0,2

0,68

-0,31

0,25

-0,18

Iniciativa

-0,24

0,26

0,38

0,13

Comunicação Oral

0,01

0,03

0,16

0,92

Comunicação Escrita

0,05

-0,03

0,15

Leitura e Interpretação

0,47

0,2

Visão Crítica/Ordem de Grandeza

0,34

0,2

Domínio de Técnicas Computacionais

0,89

Língua Estrangeira

0,22

-0,13

0,29

-0,42

0,03

0,12

0,06

0,04

0,09

0,79

0,01

0,07

-0,01

0,45

0,19

0,52

-0,09

0,23

-0,06

0,39

0,07

0,14

0,06

0,37

-0,1

0,01

0,1

0,15

-0,07

0,02

0,21

0,1

0,11

0,06

-0,18

0,19

0,35

0,16

-0,12

0,16

-0,08

0,11

0,08

0,03

0,12

0,03

-0,32

-0,11 0,953

0,2

0,33

-0,05

-0,12

-0,18

0,09

0,05

0,03

-0,16

0,27

0,33

0,948

0,07

0,13

0,1

0,982

0,07

0,15

0,24

0,08

-0,06

0,08

-0,01 0,962

0,23

0,24

0,11

-0,04 -0,03

0,2

0,74

0,03

0,1

0,04

0,16

0,945

0,09

-0,06

-0,1

0,05

0,942

0,22

0,05

-0,05 -0,06 -0,03

-0,05 0,955

0,69

0,04

-0,19

0,02

0,19

0,895 0,949

-0,18

Trabalho em Equipe

0,2

0,1

0,54

-0,12

0,39

-0,12

0,37

-0,04 -0,25

0,22

-0,07

0,02

-0,11

0,24

0,32

Identificar Problemas

0,18

0,27

0,21

0,1

0,14

-0,09

0,82

0,14

0,05

0,03

0

0,14

0,2

-0,14

-0,14 0,977

Resolver problemas

-0,05

0,3

0,38

0,13

0,15

-0,18 0,63

0,01

0,03

-0,37

0,11

0,03

Pensamento Sistêmico

0,22

0,08

0,14

-0,27

-0,02

0,12

-0,04

0,03

0,15

0,08

-0,06 -0,87

Avaliação e Utilização de Recursos

0,57

0,07

0,08

0,12

0,23

0,09

-0,05

0,39

0,34

0,16

0,08

Matemática e Estatística

0,04

-0,09

0,58

0,23

0,15

0,15

-0,12

0,22

0,02

0,01

0,32

Projetar e Implementar Sistemas

0,22

0,07

-0,08

0,03

-0,07

0,16

0,15

0,23

0,81

0,13

-0,04

Projetar e Implementar Processos

0,28

0,19

0,07

-0,12

0,01

0,06

0,07

-0,14

0,84

-0,07

Projetar e Implementar Produtos

0,23

0,46

0,17

0,25

-0,01

0,1

0,2

0,16

0,11

0,49

Melhorar Sistemas

0,38

-0,15

-0,07

0,09

0,14

0,37

0,39

0,36

0,1

0,49

-0,13

-0,11

Melhorar Processos

0,14

-0,07

0,18

0,04

-0,04

0,16

0,24

-0,02

0,18

0,18

-0,09 -0,01

Melhorar Produtos

0,33

0,19

0,22

0,17

-0,06

0,18

0,04

0,13

0,04

0,77

0,05

0,02

0,19

Prever e Analisar Demandas

0,29

-0,09 -0,03

0,09

0,04

0,69

0,02

0,35

0,23

0,25

-0,05

-0,25

0,11

-0,04 -0,09 0,909

Selecionar conhecimento Técnico

0,18

0,11

0,18

0,1

0,1

0,17

0,32

0,25

0,43

0,37

0,01

0,25

0,23

-0,13

0,41

0,912

Utilizar Conhecimento Técnico

0,18

0,09

0,54

0,06

-0,07

0,12

0,05

0,2

0,23

0,44

-0,06

0,49

-0,07

0,07

0,06

0,901

0,02

0,15

0,13

0,06

0,03

-0,09 0,971

0,898

0,42

0,14

-0,19

0,01

-0,06

0,53

-0,03

-0,05 0,906

-0,07

0

-0,09

0,07

-0,1

0,07

0,18

0,16

-0,06 0,945

0,37

-0,07

0,02

-0,04

0,14

0,1

0,05

0,07

0,922

0,86

0

0,01

0,956

0

-0,05 0,914

0,948

0,867

0,853

Prever Evolução de Cenários

0,39

0,02

0,19

0,02

0,12

0,13

0,04

0,79

-0,13

0,15

0,06

0,07

-0,16

-0,05 -0,08 0,920

Atualização dos Avanços Tecnológicos

0,35

-0,05

0,1

0,11

0,24

0,01

0,46

-0,08

0,48

0,03

0,46

-0,04

0,01

0,12

0,08

0,903

Gerenciar Fluxo da Informação

0,14

0,23

0,44

0,25

0,21

-0,11

0,16

0,42

0,02

0,32

0,06

0,08

-0,09

0,06

0,5

0,958

Analisar Viabilidade Econômica

0,14

0,15

0,07

0,08

0,16

0,9

-0,07

0,04

0,01

0,03

0,09

0,06

0,04

-0,07

0,13

0,932

Analisar Viabilidade Financeira

0,02

0,16

0,12

0,15

0,13

0,91

-0,02

-0,05

0,09

0,11

0,04

0,05

0,09

-0,07

-0,03 0,948

Utilizar Indicadores de Desempenho

0,09

0,01

-0,05

0,39

-0,03

0,07

0,09

0,79

0,18

0,1

-0,08 -0,01

0,15

0,04

0,17

Entender a Interação entre Sistemas

0,49

0,22

0,09

0,25

0,07

-0,01

0,18

0,42

0,14

0,21

0,21

0,15

-0,13

0,46 0,938

Autovalor

6,505 4,491 4,186 4,183 3,892 3,867

3,62

3,56

3,535 3,505 2,769 2,456 2,448 2,216 1,693

% de Variância Explicada

11,4

6,4

6,2

7,9

7,3

7,3

6,8

Finalmente, o décimo quinto fator foi associado à Gestão da Informação, foi associado às competências de “gerenciar o fluxo da informação” e “entender a interação entre sistemas”. Para fins de comparação, foi realizada a análise fatorial para as avaliações do grau de aplicação dadas aos conhecimentos, habilidades e competências dos atuais profissionais de EP. Uma análise preliminar indicou a extração de 14 fatores. Nenhuma das variáveis apresentou indícios para ser desconsiderada na análise, sendo 0,812 o menor valor de comunalidade (variância comum explicada). Os 14 fatores extraídos representam aproximadamente 92,157% da variância 242

-0,03

6,8

6,2

6,1

4,9

-0,02

4,3

4,3

3,9

0,898

3,0

total das avaliações de importância. O fator mais impactante explica 18,765% da variância e o menos impactante, 2,465%. Após a análise, os fatores foram interpretados pelos autores, conforme apresenta a Tabela 7. Na avaliação de capacidade de aplicação, o primeiro fator foi associado às competências básicas do profissional de EP. O termo competências básicas é um livre uso da palavra competências, com o intuito de representar o senso comum dos representantes de empresas consultados, conforme a definição de Sandberg (1994) de competência associada à concepção que se tem sobre o trabalho. Isto porque o fator


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apresenta cargas elevadas para conhecimentos, habilidades e atitudes comumente associados ao ambiente empresarial: comunicação (“oral”, “escrita”, “leitura e interpretação”), relacionamento interpessoal (“trabalho em equipe”), elementos de contexto (“qualidade”, “estatística”, “gerência de produção”, “economia”, “pesquisa operacional”), senso crítico (“estratégia e organizações”, “visão crítica e ordem de grandeza”, “pensamento sistêmico”, “prever a evolução de cenários”, “gerenciar fluxo da informação”) e foco em resultados (“empreendedor”, “iniciativa”). Uma carga negativa é assinalada para os conhecimentos de “informática”. O fator indica que os respondentes avaliam o atual profissional de EP primordialmente quanto a possuir competências amplas para o desenvolvimento de suas atividades profissionais em um ambiente empresarial. O segundo fator mostra-se associado às competências em gestão, com conhecimentos em “finanças”, “gestão econômica” e “sistemas de informação”, e habilidades em “analisar viabilidade financeira”, “atualização nos avanços tecnológicos”, “entender a interação entre sistemas”, “prever evolução de cenários”, “gerenciar o fluxo da informação” e “prever e analisar demandas”. Este fator mostra que o segundo vetor de avaliação do atual profissional de EP é o de ser capaz de gerir a – ou parte da – organização. O terceiro fator de aplicação é associado à melhoria contínua, com cargas nos conhecimentos de “pesquisa operacional”, nas habilidades em “identificar e resolver problemas”, “pensamento sistêmico” e “visão crítica e ordem de grandeza”, e competências em “projetar e implementar sistemas”, “melhorar processos”, “melhorar sistemas”, “melhorar produtos”, “selecionar conhecimento técnico” e “projetar e implementar produtos”. Este fator indica que os profissionais de EP são avaliados quanto a sua capacidade de promover melhorias na organização na qual estão inseridos. O quarto fator associa-se aos conhecimentos técnicos em materiais, com cargas elevadas para os conhecimentos em “resistência dos materiais”, “materiais”, “térmica” e “química”, e para a competência “projetar e implementar processos”. Uma carga negativa surge associada ao “domínio de técnicas computacionais”, indicando uma diferenciação de habilidades entre perfis de engenheiros de produção. O quinto fator está associado aos conhecimentos em “gestão ambiental”, “qualidade” e “ergonomia e segurança”. O sexto fator associa-se a conhecimentos em “eletricidade” e “física”. As cargas negativas podem indicar uma carên-

cia dessas habilidades na visão dos respondentes, visto que esse fator também se apresenta associado a conhecimentos de “ergonomia e segurança”. O sétimo fator de avaliação foi associado à base de conhecimentos em ciências exatas, envolvendo conhecimentos em “matemática” e “física”. O oitavo fator é associado ao domínio de “língua estrangeira”, indicando que este é um elemento avaliado como relevante para atividades empresariais. Observa-se aqui uma associação dessa habilidade com a competência em “planejar e projetar produtos”. O nono fator foi associado aos conhecimentos de “desenho técnico” e “informática” e a competência em “entender o relacionamento entre sistemas”.

A

comunicação surge como elemento diferenciador, indicando que o conhecimento técnico necessita ser acompanhado de competências para compreender e fazer-se compreender no contexto organizacional. O décimo fator foi associado à aplicação de tecnologias, vinculado ao conhecimento de “gestão da tecnologia” e à competência em “utilizar o conhecimento técnico”. O décimo primeiro fator associa-se aos conhecimentos de “química” e às competências em “utilizar matemática e estatística”. O décimo segundo fator relaciona-se às competências para gestão de recursos através da competência em “gerir recursos” e da habilidade de “ter iniciativa”. Uma carga negativa é apontada para conhecimentos em “sociologia”. Essa carga pode estar associada à dialética “mediar recursos x ter resultados”, como pode indicar uma carência, na avaliação dos respondentes, de tais conhecimentos por parte dos atuais profissionais de EP. O décimo terceiro fator associa-se principalmente aos conhecimentos em “direito” e “sociologia”. Finalmente, o décimo quarto fator foi interpretado como a necessidade da habilidade de “trabalho em equipe”. As análises realizadas indicam, na ótica dos respondentes, um distanciamento entre os vetores que direcionam as avaliações de importância e de aplicação no que tange às dimensões de competências dos engenheiros de produção (Quadro 3). Enquanto a importância é focada em elementos de tecnologia da informação, inovação, qualidade, comunicação e planejamento, a avaliação do perfil dos atuais profissionais de EP é concentrada em competências 243


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Conhecimentos Específicos

14

0,01

0,05

0,07

0,09

-0,08

0,89

0,09

0,04

-0,05

0,07

0,14

-0,12

0,03

0,928

0,21

0,04

0,08

0,38

-0,11 -0,54

0,57

-0,21

0,11

0,21

-0,08

0,09

-0,12 -0,14 0,966

Informática

-0,47

-0,06

0,31

-0,21

0,18

-0,06

0,17

0,4

0,46

-0,25

0,1

0,1

-0,08

0,21

0,928

Eletricidade

0,06

-0,13

0,26

0,13

-0,16 -0,87

0,11

-0,03

0,06

-0,12

0,17

-0,07

0

0,04

0,963

Química

0,07

-0,04

0

0,45

0,04

-0,08 -0,03 -0,08 -0,09

0,1

0,8

0,04

0,1

0,01

0,890

Desenho Técnico

-0,07

0,04

0,1

0,05

0,04

-0,12

0,03

-0,01

0,9

0,13

-0,08 -0,01

-0,1

-0,01 0,877

Expressão Oral

0,85

0,02

0,26

0,17

0,13

0,17

0,07

0,17

0,08

0,02

-0,1

0,01

-0,19 0,959

Expressão Escrita

0,75

0,13

0,32

0,19

-0,02

0,16

0,24

0,02

-0,19 -0,08 -0,04 -0,18

0,05

-0,09 0,897

Estatística

0,63

0,2

-0,13

0,33

0,3

-0,01

0,41

0,21

0,01

-0,02

0,23

0,923

Resistência dos Materiais

0,33

0,02

0,12

0,88

0,03

-0,05

0,06

-0,22

Materiais

0,29

0,1

-0,11

0,88

0,16

0,01

0,08

-0,01

Economia

0,53

0,37

0,15

0,26

0,32

0,38

0,29

0,01

-0,25

Finanças

0,34

0,68

-0,03

0,02

0,36

0,22

0,29

0,07

-0,05

Térmica

-0,08

0,25

0,04

0,59

0,36

-0,24

0,14

-0,08

0,03

-0,04

Direito

0,2

0,25

-0,16

0,12

0,02

0,01

-0,15 -0,04 -0,25

Sociologia

0,26

0,2

0,29

0,04

0,24

0,09

-0,18

-0,13

Conhecimentos em Química

0,24

Física

Melhoria Contínua

Comunalidade

13

Trabalho em Equipe

12

Conhecimentos em Legislação

11

Gestão de Recursos

10

Aplicação de Tecnologias

9

Conhecimentos em Desenho Técnico

8

Lingua Estrangeira

7

Base em Ciências Exatas

6

Conhecimentos em Eletricidade

5 Conhecimentos em Gestão Ambiental e Qualidade

4

Competências em Gestão

3

Matemática

Gestão Ambiental

244

2

Competências Básicas Conhecimentos Básicos

1

Conhecimentos em Materiais

Tabela 7: Extração de Fatores para Avaliação de Aplicação

-0,08

0,06

0,08

0

0,07

0,12

0,05

-0,07

0,1

0,02

0,986

0,01

0,09

0,17

0,09

0,01

0,04

0,963

0,05

0,08

-0,17

0,15

0,03

0,951

0,07

-0,03 -0,09

0,16

0,15

0,904

0,04

0,41

-0,19 0,901

-0,05 -0,06

0,83

-0,02 0,934

0,14

0 0,2

0,25

0,3

-0,51 0,47

0,09

0,936

0,07

0,24

0,11

0,04

0,81

0,04

0,07

0,17

0,01

0,13

0,13

-0,1

0,11

-0,02 0,827

Gerência de Produção

0,61

0,09

0,16

0,07

0,06

0,05

0,37

-0,34

0,05

0,19

0,13

0,41

0,01

-0,1

Qualidade

0,66

0,02

-0,15

0,22

0,51

0,15

0,08

-0,07

0,11

0,25

0,16

-0,02

0,16

-0,17 0,962

Gestão Econômica

0,22

0,53

0,1

-0,07

0,4

0,12

0,38

0,15

0,4

0,06

0,02

-0,11 -0,01 -0,26 0,933

0,900

Ergonomia e Segurança

0,37

0,4

0,07

-0,09

0,49

0,48

0,17

0,14

-0,04

0,09

0,01

-0,02

-0,26

Engenharia do Produto

-0,21

0,29

0,28

-0,39

0,27

-0,01

0,25

0,35

-0,09

0,08

0,33

0,33

-0,24

Pesquisa Operacional

0,45

0,16

0,45

-0,24

0,34

-0,19

-0,19

0,07

0,18

0,23

0,3

0,1

-0,08 -0,31 0,962

Estratégia e Organizações

0,79

0,3

0,1

0,05

0,21

-0,08

0,09

0,03

0,11

0,33

0,14

0,2

0,13

0,1

0,913

-0,23 0,958

-0,03 0,982

Gestão da Tecnologia

0,05

0,35

0,29

0,04

0,16

0,11

0,34

0,3

-0,05

0,56

0,27

0,19

-0,01 -0,01 0,875

Sistemas de Informação

-0,36

0,46

0,15

-0,07

0,31

0,16

0,23

0,27

0,06

-0,16

0,4

0,25

0,05

Gestão Ambiental

0,15

0,32

0,1

0,13

0,85

0,13

-0,02

-0,03

0,1

0,05

0,01

0,15

-0,05 -0,01 0,938

Empreendedor

0,73

-0,03

0,22

0,19

-0,1

-0,05

0,1

0,15

-0,34

-0,1

0,15

0,27

0,12

0,18

0,934

Iniciativa

0,55

0

0,32

0,16

0,04

-0,05

0,32

0,02

-0,22

0,05

-0,07

0,56

-0,02

0,18

0,939

Comunicação Oral

0,88

0,27

0,15

0,04

0,12

0

-0,14

-0,02

0,11

0,02

0,01

0,08

0,06

-0,03 0,922

Comunicação Escrita

0,82

0,13

0,13

0,26

0,14

-0,25

0,1

0,03

-0,12

0,02

-0,05

-0,02

-0,02

0,1

0,891

Leitura e Interpretação

0,71

0,22

0,29

0,32

-0,28

-0,12

0,09

0,2

-0,04

0,24

0,08

0,02

-0,08

0,06

0,952

-0,13 0,890


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

0,5

0,25

0,45

0,25

0,3

-0,16

0,11

Domínio de Técnicas Computacionais

-0,3

-0,12

0,12

-0,59

0,34

0,31

-0,13

Língua Estrangeira

0,12

0,12

0,05

-0,14

0,05

0,05

0,04

Trabalho em Equipe

0,63

0,21

0,38

-0,2

-0,11

-0,03

0,01

Identificar e Resolver Problemas

0,43

0,16

0,62

0,1

-0,17

0,08

0,24

Pensamento Sistêmico

0,53

0,04

0,46

0,19

0,4

0,1

0,12

Avaliação e Utilização de Recursos

0,28

0,23

0,32

-0,07

0,01

0,27

Matemática e Estatística

0,09

0,18

0,37

-0,03

0,16

-0,18

Competências

Habilidades

Visão Crítica e Ordem de Grandeza

-0,12

-0,02

0,03

-0,04

0,39

0,16

-0,23 0,958

0,05

0,36

0,22

0,04

0,92

-0,02

0,18

0,05

0,05

0,09

0,17

0,09

-0,03 -0,01 0,942

-0,07

0

0,31

0,05

0,13

0,01

0,45 0,959

-0,02

0,11

0,29

-0,21

0,17

-0,08

0,19

0,914

-0,15

0,25

0,03

-0,06 -0,08

0,01

0,25

0,870

0,14

0,29

0,32

0,08

0,13

0,62

-0,08

0,03

0,939

0,25

0,27

0,05

0,1

0,61

-0,12

-0,2

0

0,812

0,915

Projetar e Implementar Sistemas

0

0,07

0,84

0,13

0,26

-0,13

0,15

-0,05 -0,06

0,03

0,16

0,05

-0,2

0,17

0,931

Projetar e Implementar Processos

0,24

0,18

0,44

0,47

0,32

-0,05

-0,2

0,01

0,1

0,36

0,2

0,27

-0,13

0,17

0,941

Projetar e Implementar Produtos

0,43

0,16

0,47

-0,08

0,21

0,19

-0,01

0,57

0,06

-0,2

-0,01

0

-0,08 -0,01 0,889

Melhorar Sistemas

0,25

0,24

0,68

-0,14

0,07

-0,18

0,09

0,1

0,33

-0,07

0,23

0,09

-0,04 -0,01 0,847

Melhorar Processos

0,36

0,03

0,76

-0,01 -0,08 -0,09 -0,08

0,11

0,03

0,27

0,14

0,16

0,11

-0,1

Melhorar Produtos

0,3

0,14

0,66

-0,22

0,06

0,04

-0,23

0,32

0,1

0,09

-0,27

-0,14

0,13

-0,18 0,916

Prever e Analisar Demandas

0,44

0,47

0,42

-0,06 -0,08

0,44

0

0,09

-0,21

0,07

-0,11 -0,01

0,19

-0,13 0,916

Selecionar Conhecimento Técnico

0,38

0,4

0,49

0,27

0,23

0,14

0,03

0,21

0,27

0,15

0,03

-0,02

-0,13 0,863

Utilizar Conhecimento Técnico

0,36

0,1

0,26

0,18

0,27

0,1

-0,05

0,09

0,18

0,73

0,04

-0,11

0,06

-0,01 0,918

Prever Evolução de Cenários

0,47

0,53

0,03

0,08

0,08

0,32

0,01

0,09

0,02

0,1

0,15

0,06

0,12

-0,37 0,818

Atualização dos Avanços Tecnológicos

-0,14

0,7

0,16

-0,03

0,02

0,25

-0,05

0,08

0,19

0,24

-0,01

0,23

0,34

0,26

0,08

0,890

0,937

Gerenciar Fluxo da Informação

0,5

0,47

0,12

0,11

0,26

0,19

-0,12

0,05

0,12

0,33

0,32

0,04

0,31

0,02

0,929

Analisar Viabilidade Econômica

0,26

0,85

0,15

0,13

0,12

-0,27

-0,13

0,09

0

0,06

-0,05

0,03

0,04

-0,1

0,964

Analisar Viabilidade Financeira

0,27

0,86

0,13

0,12

0,35

0,02

0,1

0,05

-0,03

0,05

0,07

-0,04

0,06

0,03

0,985

Utilizar Indicadores de Desempenho

0,22

0,43

0,23

0,28

0,22

0,14

-0,19 -0,39

0

0,4

0,2

0,24

-0,08

0,24

0,947

0,11

0,55

0,2

0,16

0,06

0,33

-0,06

0,46

-0,27

0,24

0,14

-0,15

-0,05 0,922

Entender a Interação entre Sistemas

-0,2

Autovalor

10,51 5,836 5,763 4,221 4,161 2,851 2,814 2,644 2,522 2,485 2,372 2,149 1,901 1,381

% de Variância Explicada

18,77 10,42 10,29 7,537

de gestão e de execução de atividades. Isso remete a uma consideração: os profissionais atuais são avaliados quanto a serem dotados de competências em executar a rotina e a gestão de uma empresa. A essa camada sobrepõem-se outras, associadas a conhecimentos técnicos ou de gerenciamento de recursos. No entanto, as empresas consideram como vetores da formação do engenheiro de produção competências integradoras de conhecimentos. A essa discussão soma-se a observação de que os ditos conhecimentos básicos aparentemente formam dimensões diferenciadas dos conhecimentos e competências aos quais poderiam ser associados. Por exemplo, Matemática e Física apresentaram concentrações de carga em dimensões específicas diferenciadas, por exemplo, de conhecimentos como Pesquisa Operacional e habilidades de melhoria e projeto de produtos, processos e sistemas. Pode-se ponderar que seria razoável uma distribuição de cargas desses conhecimentos básicos entre diversas dimensões, mas os dados obtidos indi-

7,431 5,091 5,026 4,722 4,504 4,437 4,236 3,837 3,395 2,465

cam que, para esse conjunto de respondentes, conhecimentos de matemática e física se estabelecem de forma dissociada de seus campos de aplicação. Tal observação converge para o exposto em Mello e Mello (2003); os autores discutem o papel da disciplina de Pesquisa Operacional como disciplina integradora, sendo necessário mudar a forma como a mesma vem sendo ministrada nos cursos de graduação e a sua posição na grade curricular. A questão da comunicação surge como elemento diferenciador, indicando que o conhecimento técnico necessita ser acompanhado de competências para compreender e fazer-se compreender no contexto organizacional.

CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho foi estruturado a partir de requisitos estabelecidos nas DCN do MEC/INEP acerca de competências, 245


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

habilidades, conhecimentos básicos e específicos estabelecidos para o engenheiro de produção. Foi observado que o atual conceito de competências utilizado apresenta questões estruturais ainda ambíguas e que justificariam sua revisão segundo a literatura de referência, de modo a explicitar os elementos que são desejados no que tange ao perfil do engenheiro de produção. Os resultados obtidos a partir da análise das respostas dos questionários mostram dois pontos relevantes para os gestores de empresas e para a comunidade universitária, responsável pela formação dos engenheiros de produção: (i) os conhecimentos básicos, os específicos, as habilidades e as competências, considerados mais importantes pelos gestores das empresas abordadas, apresentam carências que necessitam ser sanadas de modo a promover melhor atendimento às expectativas dos ambientes empresariais consultados quanto à atuação do engenheiro de produção; (ii) os vetores que definem as expectativas sobre a importância dos conhecimentos desse profissional e sua capacidade de aplicação desses conhecimentos são diferentes, indicando que nem sempre a avaliação sobre as competências mais importantes representa as competências mais desejadas por parte das empresas industriais consultadas. Os itens “gerência de produção”, “qualidade”, “estratégia e organizações”, “usar indicadores de desempenho”, “análise da viabilidade econômica”, “análise da viabilidade financeira”, “melhorar processos”, “iniciativa”, “capacidade de resolver problemas” e “capacidade de identificar problemas”

apresentaram os maiores graus de importância segundo os respondentes. Pode-se especular que a baixa importância dada a conhecimentos de “engenharia do produto”, “pesquisa operacional”, “térmica” e “química” indique falta de apelo ou conhecimento de aplicações desses temas nos ambientes de atuação profissional dos respondentes. As maiores lacunas relacionaram-se a “prever evolução de cenários”, “usar indicadores de desempenho”, “analisar viabilidade econômica”, “analisar viabilidade financeira” e “entender interação entre sistemas”. Esses resultados requerem uma análise mais aprofundada do grau de conhecimento necessário, acerca destes temas, para o engenheiro que atua em áreas afins à Engenharia de Produção. Para os gestores dos cursos de EP, a identificação dos itens mais importantes e dos itens com lacunas significantes permite gerar mecanismos de realimentação para ajustes no currículo, na metodologia de ensino e na avaliação do aprendizado, tanto dos cursos de graduação como de pósgraduação e extensão. Essas ações poderão, no médio prazo, suprir parte das demandas atuais do conjunto de empresas analisado. Salienta-se que se faz necessária, por parte das IES, uma visão de futuro visando antever mudanças tecnológicas, comportamentais e organizacionais, bem como de cenários internos e externos a fim de suprir demandas futuras. As constatações deste trabalho reforçam, também, o exposto por Santos (2008) com relação à necessidade de definir detalhadamente as competências necessárias ao engenheiro de produção, planejar sua implementação e estabelecer como avaliá-las. As lacunas entre grau de importância e de aplicação indicam que existem possibilidades para o aprimoramento

Quadro 3: Quadro resumo de fatores extraídos para Importância e Aplicação Avaliação de Importância -

246

Gestão na Era da Informação Engenharia de Aplicação Melhoria da Qualidade Habilidades de Comunicação Conhecimentos Básicos para Gestão Engenharia Econômica Análise e Solução de Problemas Planejamento e Análise de Cenários Engenharia de Sistemas e Processos Engenharia de Produto Gestão das Operações Visão Local x Sistêmica Melhoria de Processos Física Gestão da Informação

Avaliação de Aplicação -

Competências Básicas Competências em Gestão Melhoria Contínua Conhecimentos em Materiais Conhecimentos em Gestão Ambiental e Qualidade Conhecimentos em Eletricidade Base em Ciências Exatas Língua Estrangeira Conhecimentos em Desenho Técnico Aplicação de Tecnologias Conhecimentos em Química Gestão de Recursos Conhecimentos em Legislação Trabalho em Equipe


Borchardt, M.; Vaccaro, G. L. R.; Azevedo, D.; Ponte Jr., J. O perfil do engenheiro de produção: a visão de empresas da região metropolitana de Porto Alegre. Produção, v. 19, n. 2, p. 230-248, 2009

do profissional em questão. Como proposta de continuidade desta pesquisa, sugere-se que sejam investigados os motivos destas lacunas, uma vez que as mesmas podem estar vinculadas a deficiências na formação do engenheiro e/ou a falta de atualização profissional do mesmo quando inserido no mercado de trabalho. O fato de “expressão oral” e “expressão escrita” apresentarem os maiores graus de importância, dentre os conhecimentos básicos avaliados, e apresentarem lacunas significantes pode ser indício de deficiências no ensino fundamental e médio. Analisar e propor alternativas para suprir estas deficiências podem ser possibilidades de pesquisas futuras. Como exemplo de utilização dos resultados desta pesquisa, observa-se que na Universidade, sede deste estudo, está em elaboração uma revisão curricular do curso de graduação em Engenharia de Produção. As competências e os conhecimentos necessários para cada atividade acadêmica foram descritos; foram definidos as metodologias, técnicas e recursos necessários para o ensino e aprendizagem e para a avaliação. A definição dos conhecimentos necessários (básicos e específicos) assim como as competências requeridas para o engenheiro de produção foram norteadas, entre outros ele-

mentos, pelos resultados desta pesquisa. Uma consequência imediata pode ser observada na alteração proposta para as cargas horárias das disciplinas relacionadas com estatística, gerência da produção, qualidade e estratégia e organizações, que por sua vez apresentaram as maiores importâncias. As habilidades “ser capaz de identificar problemas”, “ser capaz de resolver problemas” e “iniciativa” pretendem ser desenvolvidas através das metodologias, técnicas e recursos definidos para o ensino e a aprendizagem. Finalmente, buscou-se com esta pesquisa exploratória compreender o perfil de engenheiro de produção desejado por empresas industriais, bem como identificar o atual perfil dos profissionais atuantes em áreas afins à EP. Espera-se que os resultados deste trabalho contribuam para futuras pesquisas acerca das demandas do mercado empresarial para o engenheiro de produção e das lacunas que possam vir a existir em sua formação. Ressalta-se que este estudo, pela sua abrangência, apresenta as competências julgadas relevantes (por importância ou aplicação) pelos gestores das empresas respondentes. A amostra das empresas pesquisadas não permite generalizações dos resultados para as demais regiões do país.

Artigo recebido em 25/05/2007 Aprovado para publicação em 26/03/2009

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SOBRE OS AUTORES Miriam Borchardt Unisinos – Universidade do Vale do Rio dos Sinos End.: Av. Unisinos, 950 – Bairro Cristo Rei – São Leopoldo – RS Tel.: (51) 3591-1100 ramal 1551; fax: (51) 3590-8447 E-mail: miriamb@unisinos.br Guilherme Luís Roehe Vaccaro Unisinos – Universidade do Vale do Rio dos Sinos End.: Av. Unisinos, 950 – Bairro Cristo Rei – São Leopoldo – RS Tel.: (51) 3591-1100 ramal 1588; fax: (51) 3590-8447 E-mail: guilhermev@unisinos.br Debora Azevedo Unisinos – Universidade do Vale do Rio dos Sinos End.: Av. Sinimbú, 145 ap. 1001 – Porto Alegre – RS Tel.: (51) 3330-6432; fax: (51) 35908447 E-mail: deboraazevedo@terra.com.br Jacinto Ponte Jr. Unisinos – Universidade do Vale do Rio dos Sinos End.: Av. Unisinos, 950 – Bairro Cristo Rei – São Leopoldo – RS Tel.: (51) 3591-1100 ramal 1728; fax: (51) 3590-8447 E-mail: jponte@unisinos.br 248


Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 249-260

Modelo de apoio à decisão multicritério para terceirização de atividades produtivas baseado no método SMARTS Último de Valois A.B.I.J.C.S.U.Dias Adiel Teixeira de Almeida Universidade Federal de Pernambuco

RESUMO Este artigo apresenta um modelo decisório para estruturar o dilema entre terceirizar e executar, com recursos próprios, atividades produtivas dentro de uma organização. A decisão de quais atividades devem ser terceirizadas e com quem exige que o decisor analise vários aspectos, como qualidade, custos, credibilidade e outros, além dos aspectos legais que impõem algumas restrições à execução de atividades por terceiros. O modelo proposto de apoio à decisão está fundamentado na teoria da utilidade multiatributo, através da técnica SMARTS (Simple Multiattribute Rating Technique using Swings). A aplicação deste modelo mostrou-se uma ferramenta simples e adequada ao problema decisório da terceirização de atividades. PALAVRAS-CHAVE Terceirização, Decisão Multicritério, SMARTS, Modelo de Apoio à Decisão.

Support model for multicriteria decision to outsource productive activities based on SMARTS method ABSTRACT This article presents a decision model to sctructure the dilemma between outsource and perform, with its own resources, productive activities within an organization. The decision of where and with whom outsource activities requires that the decision maker examine various aspects such as quality, cost, credibility and others, besides the legal aspects that impose some restrictions on the implementation of activities by third parties. The proposed decision support model is based on the theory of multiatribute utility, through SMARTS technique (Simple Multiattribute Rating Technique using Swings). The application of this model was considered a simple and appropriate tool to the decision problem of outsourcing activities. KEY WORDS Outsource, Multicriteria Decision, SMARTS, Support Model for Decision.

249


Valois, U.; Almeida, A. T. Modelo de apoio à decisão multicritério para terceirização de atividades produtivas baseado no Método SMARTS. Produção, v. 19, n. 2, p. 249-260, 2009

1. INTRODUÇÃO A crescente elevação no nível de competitividade que as empresas enfrentam atualmente exige uma busca constante por alternativas de gestão nos negócios que proporcione a manutenção e a expansão do mercado que disputam. A terceirização de atividades produtivas é uma alternativa de gestão legítima nesta busca por melhores resultados empresariais. A terceirização é tida como uma das mais poderosas ferramentas na administração de recursos (BELCOURT, 2006). De fato, a terceirização vem sendo cada vez mais utilizada como estratégia de produção para obtenção de melhorias no desempenho geral das empresas (QUEROZ, 1998). O conceito da divisão de trabalho, básico na área de gestão, inspira o uso da terceirização como forma de obtenção de melhores resultados. Entretanto, a divisão de trabalho pregada por Adam Smith teve como ambiente de aplicação os limites da própria empresa. A terceirização, por vezes, ainda que praticada dentro dos limites físicos da empresa contratante, tem sua execução realizada por outra(s) entidade(s) com autonomia e políticas próprias, de modo que não se tem gerência direta da mão de obra envolvida na execução das atividades contratadas.

A

Existe uma diversidade grande de estudos na literatura preocupados com problemas relacionados à terceirização. Por exemplo, Walker et al. (2006) consideram como administrar mercados desbalanceados (fornecedores demais ou de menos), causados por as decisões de se terceirizar serem tomadas num âmbito local, observando que isto pode prejudicar tanto fornecedores quanto clientes. Vários trabalhos são encontrados na literatura com propostas de modelos de decisão relacionados à terceirização. Wang e Yang (2007) propõem que, para tomar a decisão de terceirizar, devem ser considerados seis fatores: economia, recursos, estratégia, risco, gerência e qualidade. Para solucionar o problema da decisão, ele propõe o uso do AHP (analytic hierarchy process) e do PROMETHEE (Preference Ranking Organization Method for Enrichment Evaluations). O AHP é usado para analisar a estrutura do problema e determinar os pesos dos critérios, e o PROMETHEE é usado para um resultado final mudando os pesos dos critérios em uma análise de sensibilidade. Almeida (2007) apresenta um modelo multicritério para seleção de contratos de terceirização com base no método ELECTRE integrado à teoria da utilidade para solucionar esse tipo de problema, no qual são analisados os custos, a qualidade e o tempo de entrega. Wadhwa e Ravindran (2007) modelam este mesmo problema em um modelo de otimização multi-objetivo, em que um ou mais clientes fazem pedidos para vários fornecedores. Outro modelo proposto por Araz el al (2007) utilizam metodologia multicritério de tomada de decisão para a gerência da terceirização, desenvolvendose um modelo baseado em fuzzy goal programming. Em uma primeira fase, neste modelo, foram determinados os critérios de avaliação e os objetivos, avaliando as terceirizações existentes na empresa através do PROMETHEE. Em uma segunda fase, o modelo desenvolvido seleciona os fornecedores mais adequados à situação e as quantidades de serviços alocadas a estes. O estudo apresentado neste trabalho propõe um modelo de decisão baseado no Método SMARTS, que foi escolhido em função das características próprias do ambiente estudado, mostrando-se uma abordagem adequada ao problema analisado. Embora a terceirização seja muito empregada, não existem quaisquer garantias de que a estratégia de produção terceirizada traga melhores resultados para a empresa que dela faz uso. Entretanto é fundamental saber quando a terceirização de atividades é, de fato, a alternativa de gestão com melhores chances de sucesso. É exatamente a resposta a essa questão que motivou o desenvolvimento do modelo de apoio à decisão proposto neste artigo.

terceirização de atividades produtivas é uma alternativa de gestão legítima nesta busca por melhores resultados empresariais. Consciente dos desafios das relações interempresarias, os modernos conceitos de terceirização estão associados ao conceito de parceria (GIOSA, 2003). O estabelecimento de parceria nos negócios busca definir objetivos convergentes, com comprometimento das partes em níveis equivalentes, alicerçado em confiança mútua visando o compartilhamento de bons resultados. Não são raros os casos de terceirização malsucedida, entretanto, uma vez aplicada a terceirização como estratégia produtiva para uma atividade, é ainda possível retornar a execução da atividade para a própria empresa. A reversão do processo de terceirização ganhou o apelido de “primeirização”, em mais um neologismo do mundo corporativo. O retorno das atividades para a empresa após um período de terceirização tem origem, na maioria dos casos, no baixo desempenho medido na atividade terceirizada e em consequentes prejuízos, contrariando assim os intentos de melhores resultados pela aplicação da terceirização como estratégia de produção. 250


Valois, U.; Almeida, A. T. Modelo de apoio à decisão multicritério para terceirização de atividades produtivas baseado no Método SMARTS. Produção, v. 19, n. 2, p. 249-260, 2009

2. ASPECTOS RELEVANTES NA DECISÃO DE TERCEIRIZAR Os motivos que levam ao fracasso de uma atividade terceirizada poderiam, em grande parte, ser identificados ainda durante o processo decisório da estratégia produtiva. A escolha desta estratégia de produção envolve diversos aspectos distintos como qualidade, custos, prazos, além dos aspectos legais, organizacionais, políticos e sociais que envolvem uma terceirização. É preciso que o decisor tenha certo grau de conhecimento sobre cada um destes aspectos a fim de fazer os julgamentos necessários para essa tomada de decisão. 2.1 Aspectos Legais da Terceirização Ainda durante o processo decisório, quando está sendo considerada a possibilidade de se terceirizar atividades com parceiros, o conhecimento dos aspectos legais que regulam a prestação de serviços contratados é fundamental para a obtenção dos objetivos que se almejam com essa modalidade de gestão. É nos aspectos legais que residem os maiores riscos para as empresas que transferem suas atividades aos cuidados de terceiros. A complexidade da legislação trabalhista, o constante aumento dos encargos previdenciários e a situação de desemprego instalada no país foram aos poucos aguçando a criatividade de alguns gestores de empresas, no sentido de utilizar métodos sofisticados, muitos dos quais com o intuito de fugir das obrigações trabalhistas e previdenciárias, passando assim a violar a lei trabalhista de forma indireta. Os procedimentos à margem da lei trabalhista utilizados por empresas, sejam contratantes, contratadas ou ambas e que, infelizmente, não são de ocorrência rara no Brasil, ferem os direitos do trabalhador e colocam em risco a imagem e os resultados das organizações envolvidas no processo. Assim, do ponto de vista do centro decisor de uma organização que julga a possibilidade de terceirizar algumas de suas atividades, espera-se que conheça com profundidade adequada os riscos legais oferecidos por essa modalidade de gestão. Há muitas críticas à atual legislação trabalhista brasileira, pois, apesar do grande cipoal de leis e sentenças na tentativa de organizar o mercado de trabalho, evitando e resolvendo os conflitos entre patrão e empregado, o que se verifica na prática é um crescimento contínuo dos conflitos trabalhistas, além do crescente número de trabalhadores fora da proteção legal, no mercado informal (PASTORE, 2001). Políticos, empresários, consultores e a mídia têm falado muito na necessidade de uma reforma na legislação trabalhista. Espera-se que após tal reforma o país possa avançar neste sentido e ganhar maiores condições de competitividade para as empresas nacionais. Entretanto, enquanto isso não

ocorre é necessário adaptar-se às regulamentações vigentes do mercado de trabalho. Embora não exista lei que proíba a terceirização de atividades no Brasil, também ainda não há uma lei específica que regulamente a terceirização e esclareça muitas questões sobre o tema. A preocupação da Justiça do Trabalho com o crescente número de processos de terceirização que envolvem a interposição de empresas, em que muitas vezes se verifica a ocorrência de relações empregatícias camufladas no contrato de terceirização, fraudando a legislação trabalhista, levou o Tribunal Superior do Trabalho (TST) a posicionar-se com relação à questão. Foi proferido então, o entendimento uniformizado por meio do enunciado da Súmula 331, cujo conteúdo revisado em 21/11/2003 é o seguinte: “Enunciado 331 – Contrato de prestação de serviços – Legalidade – Revisão do Enunciado 256. I – A contratação de trabalhadores por empresas interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº. 6.019, de 03.01.1974). II – A contratação irregular do trabalhador, mediante empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da administração pública direta, indireta ou funcional (art. 37, II, da CF/1988). III – Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº. 7. 102, de 20.06.1983) e de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados á atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. IV – O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e contem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº. 8.666, de 21.06.1993)”. Sobre o escrito do inciso I, Silveira et al. (2008) comentam que é um equívoco aplicar esse inciso ao fenômeno da terceirização, uma vez que, na verdade, ele se refere à contratação de trabalhadores. Como terceirizar significa comprar serviços de forma contínua, e não locar a força do trabalhador, entende-se aqui que não há a presença da terceirização típica. A única hipótese de legalidade da locação de mão de obra é a contratação temporária de trabalhadores, feita normalmente através de empresas que se dedicam a essa atividade, também chamadas de fornecedoras ou locadoras de mão de obra, conforme a Lei N. 6.019/74. 251


Valois, U.; Almeida, A. T. Modelo de apoio à decisão multicritério para terceirização de atividades produtivas baseado no Método SMARTS. Produção, v. 19, n. 2, p. 249-260, 2009

As disposições contidas no inciso II, da Súmula 331, são específicas para aplicação da terceirização na administração pública. O Estado já foi vítima de severas condenações trabalhistas advindas de processos judiciais movidos por trabalhadores de empresas contratadas pelo poder público. A intenção deste inciso II é, portanto, barrar o ingresso indesejado na carreira pública de trabalhadores de terceiros, ainda que sua contratação ou relacionamento tenham ocorridos de maneira irregular. Essa disposição segue o que determina o inciso II, do art. 37 da Constituição Federal: “A investidura em cargo ou emprego público depende de aprovação prévia em concurso público (...)”. Em relação ao inciso III da Súmula 331, pode-se dizer que, ao contrário dos dois primeiros incisos, que centram sua atenção na intermediação da mão obra, este trata da contratação de serviços. É, portanto nesse inciso que se autoriza a terceirização, ao informar que, em outras palavras, não pode ser considerado empregado do tomador o trabalhador da empresa prestadora de serviços especializados ligados à atividade-meio, desde que realize suas tarefas sem subordinação direta e nem pessoalidade.

O

A responsabilidade do tomador de serviços é objetiva, conforme a Súmula 331 Inciso IV prescreve que, ocorrendo o inadimplemento das obrigações trabalhistas por parte do empregador, implica na responsabilização subsidiária do tomador. Não se pode admitir que o trabalhador tenha prejuízos com a terceirização. Devem ser resguardados todos os direitos trabalhistas, o que se garante com essa responsabilização do tomador de serviços. Verifica-se, portanto que, em sendo um dos objetivos da terceirização a redução dos custos, pode-se pôr a perder esse alvo por falha na fiscalização dos recolhimentos dos impostos dos trabalhadores da empresa contratada. Diante de todas as considerações aqui feitas sobre a Súmula 331, que rege a contratação de prestação de serviços, fica muito evidente a necessidade de conduzir um processo de terceirização com segurança, de forma a resultar, de fato, uma melhoria nos resultados, inclusive com uma legítima economia dos tributos. Neste sentido, um contrato de prestação de serviço firmado com a empresa prestadora dos serviços deve prever uma relação de parceria, coberta com todos os cuidados necessários a fim de atingir efetivamente a qualidade e produtividade imprescindível à sobrevivência e ao crescimento dos parceiros. Uma análise multicritério de apoio à decisão de terceirizar ou não uma determinada atividade só pode ser efetivada depois que se verifica a legalidade de terceirização desta atividade. Em outras palavras, o aspecto legal de uma atividade é um critério qualificador, que, sendo satisfeito, habilita a atividade a uma possível terceirização mediante uma avaliação criteriosa dos objetivos que se busca alcançar com essa estratégia de gestão da produção.

decisor, então, precisa considerar o importante aspecto da parceria antes de optar por uma terceirização da produção. A terceirização de serviços de vigilância e de conservação e limpeza já vem de longa data, sendo praticada pelas empresas e aceita pelo Judiciário trabalhista, não carecendo aqui de maiores comentários. Já o termo “serviços especializados” presente no inciso III carece de comentário. A caracterização dos serviços especializados está calcada na presença dos seguintes requisitos: previsão no contrato social da empresa prestadora, identificação com o objetivo da contratação, execução das atividades com qualificação, autonomia técnica e exigência de certo know-how. Outro termo que merece destaque no inciso III é “atividade–meio”. Essa definição tem sido motivo de calorosos debates entres os juristas da área trabalhista. Existe uma enorme dificuldade de se classificar de forma precisa e inequívoca as atividades-meio e as atividades-fim. Para alguns juristas a legalidade ou ilegalidade da prática de compra de serviços terceirizados não está relacionada à natureza do serviço como meio ou fim, e sim à forma como é praticada, verificando-se a existência ou não de fraude aos trabalhadores, ingerência, subordinação, idoneidade econômica do prestador, entre outras situações (SILVEIRA et al., 2008). 252

2.2 Parcerias e Objetivos Conflitantes O sucesso de uma produção terceirizada está diretamente relacionado com o desempenho do contratado que executa a atividade produtora dos bens ou serviços, objeto da contratação. Diante deste fato, a terceirização estará sempre associada ao estabelecimento de parcerias, que não é uma tarefa simples nem de curto prazo, entretanto é possível estabelecer critérios que indicarão a potencialidade de um candidato a fornecedor vir a tornar-se efetivamente um parceiro da empresa contratante. O decisor, então, precisa considerar o importante aspecto da parceria antes de optar por uma terceirização da produção. Além da questão da parceria, os objetivos como qualidade, custo e prazo, que se procura em qualquer estratégia produtiva, apresentam conflitos. O conflito do desejo do


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menor custo e a mais alta qualidade estará sempre presente, sendo que nem sempre é fácil para o decisor estabelecer um equilíbrio adequado entre os vários objetivos conflitantes envolvidos na produção de bens e serviços. A capacidade humana de análise apresenta limitações quando é necessário levar em consideração, simultaneamente, um número elevado de fatores e elencá-los conforme sua importância dentro de um processo de escolha (MILLER, 1956). Diante de tantos aspectos relevantes a considerar, no intuito de aumentar as chances de acertar a adequada estratégia para as atividades produtivas da empresa, justifica-se a necessidade de um modelo que estruture o problema posto e sirva de apoio para a decisão a ser tomada.

dos por Keeney e Raiffa (1996), entre os pares de alternativas normalmente são difíceis e instáveis. A SMARTS, entretanto não requer que sejam explicitadas preferências ou indiferenças entre as alternativas como exige a maioria dos métodos que derivam do MAUT (Multiple Attribute Utility Theory), tornando com isso o processo mais fácil, claro e amigável para o decisor, além de propiciar uma menor chance de erros no processo decisório devido a uma maior estabilidade das preferências elicitadas.

A

escolha de um método específico dependerá de vários fatores, como as características do problema, do contexto considerado.

3. MODELAGEM DE APOIO À DECISÃO Para fazer frente à limitação humana de análise surge o Apoio Multicritério a Decisão (AMD), um campo dentro da área de pesquisa operacional onde se reúne um conjunto de métodos aplicados aos problemas de decisão com múltiplos objetivos que se dispõem a auxiliar na sistematização das informações e definições das preferências com relação aos atributos das alternativas avaliadas (GOMES et al., 2006). A escolha de um método específico dependerá de vários fatores, como as características do problema, do contexto considerado, da estrutura de preferências do decisor e da problemática (ALMEIDA, 2003). A metodologia aplicada no modelo aqui proposto é a técnica SMARTS (Single Measure Rating Technique using Swings), desenvolvida inicialmente em 1971 e posteriormente aprimorada. Essa técnica apresenta-se como uma derivação simplificada da teoria da utilidade multiatributo sendo, portanto, um método compensatório (EDWARDS; BARRON,1994). As grandes vantagens desta técnica são: a simplicidade de aplicação, a qual potencializa sobremaneira sua utilidade como ferramenta, e a facilidade das questões colocadas para o decisor, que influenciam positivamente o decisor na compreensão e aceitação desta técnica de apoio a sua decisão. Essa característica da facilidade da técnica SMARTS é alcançada mediante algumas simplificações feitas na modelagem do problema. Edwards e Barron (1994) explicam que os possíveis prejuízos originados das simplificações exigidas na modelagem do problema para a aplicação da técnica SMARTS são compensados pelos prováveis erros cometidos no processo de elicitar as preferências em outros métodos. Edwards afirma que os julgamentos de indiferenças requeri-

As simplificações necessárias para a aplicação da SMARTS exigem que o modelo decisório atenda a propriedade da linearidade das preferências em todos os atributos e que também atenda a propriedade da independência aditiva, na qual é necessário que se verifique que os valores atribuídos a cada uma das alternativas para um determinado atributo não sejam vinculados aos valores de preferências de outros atributos. Caso as condições de linearidade e independência aditiva não sejam satisfeitas, o método fica conceitualmente comprometido e não pode mais ser considerado logicamente aceitável. A escolha da técnica SMARTS no modelo proposto para tratar este problema decisório multicritério de terceirizar ou não terceirizar atividades produtivas foi baseada nas seguintes razões: i) Sua lógica é suficientemente rigorosa e completa para que possa ser aceito como uma ferramenta válida de apoio à decisão; ii) As propriedades de linearidade e a independência aditiva podem ser alcançadas por aproximação sem prejuízo significativo na representatividade da realidade no modelo utilizado; iii) A aplicação pelo analista é simples e o decisor tem facilidade para explicitar suas preferências, iv) A determinação de muitos aspectos envolvidos na terceirização de uma atividade pode ser considerada apenas medianamente dependente de incertezas ambientais, permitindo que as incertezas envolvidas no problema sejam consideradas de forma simplificada, não exigindo nenhum estudo probabilístico da situação. 3.1 Modelo Proposto O modelo aqui proposto parte do pressuposto de que os atores do processo decisório, ou seja, analista, facilitador e 253


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o centro decisor, foram previamente definidos e que este último não tenha qualquer conflito de interesse relacionado a qualquer das estratégias de produção a ser adotada, garantindo-se com isso um processo isento de tendências. Este centro decisor, que pode ser composto de mais de uma pessoa, será referenciado no modelo proposto simplesmente como decisor e o termo organização se refere à instituição que está aplicando o modelo proposto, a qual o decisor representa. O modelo proposto é apresentado em bloco na Figura 1, e mostra três estágios distintos. A divisão em estágios permite uma compreensão lógica além de uma menor operacionalização por parte dos atores do processo decisório, como poderá ser constatado no detalhamento do modelo que se segue. Entrada: A entrada do modelo contém todas as atividades de produção da organização, caso o decisor queira avaliar se a estratégia de produção terceirizada é mais vantajosa para as atuais circunstâncias da organização. Estágio 1: Neste estágio é verificado se as atividades inseridas no modelo atendem às exigências da legislação. Pode ser requerida aqui a participação de um consultor jurídico a fim de esclarecer a legalidade de determinada atividade produtiva ser executada por terceiros. O critério legal funcionará para o modelo como um filtro onde se admitem apenas as atividades com respaldo legal, passíveis de uma terceirização, e rejeitam-se as atividades sem bases legais, as quais devem ser executada pela própria organização. Estágio 2: Faz-se neste estágio uma ordenação das atividades legalizadas a fim de se identificarem as atividades

com mais vocação à terceirização. Essa ordenação será obtida através de uma análise multicritério pela metodologia SMARTS, em que cada atividade legalizada é avaliada por meio de atributos e então ordenada de modo a evidenciar aquelas atividades produtivas mais vocacionadas para uma possível terceirização. Mediante a lista ordenada de atividades, o decisor pode determinar uma linha de corte, onde a partir de um determinado patamar para baixo as atividades deixarão o modelo e permanecerão sendo executadas diretamente com os próprios recursos da organização. Este corte não é obrigatório, contudo pode ser recomendável a fim de evitar despender muitos recursos no próximo estágio do modelo. Estágio 3: Neste estágio, através de um segundo processo decisório multicritério, também pela metodologia SMARTS, pode-se ter finalmente a indicação de se a terceirização é a estratégia de produção indicada para uma dada atividade, ou não. O fundamento deste estágio está baseado no fato de que não se pode avaliar o desempenho de uma atividade sem avaliar o executor ou candidato a executor da mesma. Assim, as atividades produtivas até o estágio 2 foram tratadas como alternativas ao problema de decisão colocado, entretanto neste estágio elas deixam de ser alternativas e passam a ser o próprio objeto de estudo do problema. Aqui, cada atividade é submetida individualmente, as alternativas agora são os candidatos a executores da atividade em análise. A elicitação dos valores para cada um dos candidatos a executor nos atributos definidos exigirá a obtenção de muita informação fora da organização. Por ser esta uma tarefa demorada e crítica é que, no estágio anterior, recomenda-se restringir

Nível vocacional

Atividades não vocacionadas

Atividades não legalizadas

Legalidade

Atividades vocacionadas

Entrada de atividade individual

Possíveis executores

Atividades legalizadas

Entrada

Figura 1: Modelo Proposto - Diagrama em Blocos.

254

Decisão Classificação de candidatos


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as atividades submetidas a este último estágio. Como saída deste estágio tem-se, para cada atividade analisada nele, uma lista dos candidatos a executores ordenada pela capacidade de desempenho na realização da atividade. Note-se que neste último estágio olha-se mais para fora da organização, enquanto que no estágio 2 olha-se mais para dentro da própria organização. A Figura 2 mostra o modelo expandido em estágios e procedimentos. Comenta-se a seguir cada um dos procedimentos do modelo, onde E1P1 significa Estágio1 Procedimento1, e assim por diante. E1P1 (Estágio 1 / Procedimento 1) – Lista de atividades de interesse para submissão ao modelo proposto: Nesta primeira etapa o decisor faz uma lista de todas as atividades da organização que queira submeter ao modelo proposto. A estratégia da organização é a principal fonte de orientação nesta tarefa. E1P2 (Estágio 1 / Procedimento 2) – Verificação da legalidade das atividades para terceirização: Pode ser requerido um consultor jurídico a fim de esclarecer a legalidade ou as possibilidades de legalização de determinada atividade produtiva ser executada por terceiros. A legalidade para terceirização é um critério qualificador para esse modelo. E1D1 (Estágio 1/ Decisão 1) – Decisão da legalidade da terceirização: A decisão neste procedimento é óbvia, e não deve requerer maiores ponderações do decisor. Se a atividade é considerada legal, ela permanece no modelo com chance de uma terceirização, por outro lado, se a atividade não é considerada legal, o modelo já tem uma resposta definitiva para tal atividade, que é executá-la com recursos próprios. E1R1 (Estágio 1 / Resultado 1) – Lista de atividades passíveis de uma terceirização: Este bloco apenas armazena o resultado obtido da decisão do estágio 1, não é requerida nenhuma intervenção neste bloco por parte do decisor. Este resultado, ou seja, a lista das atividades elegíveis legalmente para uma terceirização é a matéria-prima do estágio seguinte. E2P1 (Estágio 2 / Procedimento 1) – Definição dos objetos e critérios para avaliar a vocação das atividades para terceirização: Este procedimento, assim como o procedimento seguinte deste mesmo estágio, é de fato a aplicação de uma metodologia de apoio à decisão multicritério adequada às condições do problema. Para a definição dos atributos e critérios é preciso ter em mente as propriedades de conjunto de atributos de um processo decisório como completude, operacionalidade, independência, ausência de redundância e tamanho máximo. (KEENEY; RAIFFA, 1976) As principais vantagens e desvantagens de um processo de terceirização,

seus benefícios, riscos e possíveis consequências, e principalmente a estratégia da empresa conhecida pelo decisor, são as referências básicas para essa discussão a fim de definir uma lista adequada de atributos a ser empregada neste primeiro processo decisório do modelo proposto. E2P2 (Estágio 2 / Procedimento 2) – Avaliação de alternativas com uso de técnica SMARTS: De posse das alternativas (lista de atividades legalizadas para terceirização) e dos critérios de avaliação é possível obter-se uma priorização destas atividades aplicando-se uma adequada metodologia de apoio de decisão multicritério. O modelo proposto faz uso da técnica SMARTS pelas razões previamente apresentadas. Recomenda-se que seja realizada uma análise de sensibilidade especialmente nos pesos dos critérios para avaliar a estabilidade da solução obtida com a aplicação desta técnica.

É

necessário que se escolham indicadores de desempenho que medirão cardinalmente os atributos definidos. E2D1 (Estágio 2 / Decisão 1) – Decisão da vocação das atividades para terceirização: Agora, mediante a lista priorizada das atividades legalizadas, o decisor pode, a seu critério, decidir por classificar todas as atividades para a próxima fase ou aplicar um corte. O nível deste corte dependerá da dispersão dos valores obtidos nas utilidades de cada alternativa, da quantidade de atividades ainda presentes no modelo, bem como da quantidade de recursos que o decisor está disposto a investir na aplicação da operacionalização requerida no estágio seguinte. E2R1 (Estágio 2 / Resultado 1) – Lista de atividades com vocação à terceirização: Tem-se aqui, o armazenamento da lista priorizada e classificada para a aplicação no próximo estágio. E3P1 (Estágio 3 / Procedimento 1) – Escolha de uma atividade em particular: Note-se que, neste estágio, cada atividade é submetida individualmente. O procedimento inicial deste estágio é tão-somente escolher uma atividade classificada para então submetê-la aos demais passos do modelo. Como se trata de uma lista priorizada seria lógico escolher a atividade de melhor classificação no resultado do estágio anterior, entretanto o modelo permite e respeita a escolha do decisor por qualquer outra atividade classificada. E3P2 (Estágio 3 / Procedimento 2) – Definição de objetivos e atributos para avaliar a performance dos 255


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E1P1 – Lista de atividades de Interesse para modelo proposto

E1P2 – Verificação da legalidade das atividades para terceirização (Critério Qualificador)

Não

E1D1 – Terceirização legal?

Sim

E1R1 – Lista de atividades passíveis de uma terceirização

E2P1 – Definição dos objetivos e critérios, para avaliar a vocação das atividades para terceirização

E2P2 – Avaliação das alternativas - Técnica SMARTS (Problema de Ordenação)

Não

E2D1 – Atividade tem vocação suficiente?

Sim

E2R1 – Lista de atividades com vocação à terceirização

E3P1 – Escolha de uma atividade em particular

E3P2 – Definição dos objetivos e critérios, para avaliar a performace dos candidatos a executores da atividade em análise

E3P3 – Identificação das alternativas (candidatos para a execução da atividade)

Candidatos a executores

E3P4 – Avaliação das alternativas - Técnica SMARTS

Não

E3D1 – Terceirizar a atividade?

S1 - Executar a atividade com recursos próprios

Sim

4. RESULTADOS DA APLICAÇÃO S2 - Terceirizar a atividade

com recursos próprios

Figura 2: Modelo Proposto para Terceirização de Atividades. 256

candidatos a executores da atividade em análise: Neste procedimento são definidos os objetivos, atributos e critérios da decisão de escolher qual dos candidatos a executores reúne as melhores condições de sucesso na realização da atividade em análise. O modelo proposto sugere a utilização de uma família predefinida de atributos, conforme a Tabela 1 que são básicos e se aplicam a todos os tipos de atividades produtivas (SLACK, 2002). Para que comparações entre as alternativas possam ser feitas de maneira coerente é necessário que se escolham indicadores de desempenho que medirão cardinalmente os atributos definidos. É necessário que estes indicadores sejam claros e igualmente aplicados a todos os candidatos a fornecedores, inclusive ao setor da própria organização que executa ou poderá executar a atividade em análise. Alguns atributos não poderão ser efetivamente medidos através dos respectivos indicadores quando não se tem disponível a realização das atividades pelos candidatos. Nestes casos os indicadores serão medidos por experiências passadas ou simulações. Pode-se também usar a medida informada pelo próprio candidato, desde que este se comprometa em cláusula contratual com esta medida, prevendose penalidades compensatórias caso haja descumprimento desse compromisso. E3P4 (Estágio 3 / Procedimento 4) – Avaliação das alternativas com o uso da técnica SMARTS: Tem-se aqui a mesma situação do procedimento 2 estágio 2. Mais uma vez faz-se uso da técnica SMARTS pelas mesmas razões já indicadas. Recomenda-se também que seja realizada uma análise de sensibilidade, especialmente nos pesos dos critérios, para avaliar a estabilidade da solução obtida com a aplicação desta técnica. E3D1 (Estágio 3 / Decisão 1) – Escolha do executor: Como resultado do procedimento anterior tem-se uma lista hierarquizada dos possíveis executores da atividade em análise. Caso a escolha seja por qualquer alternativa que não seja a própria organização, significa evidentemente que a atividade será ou se manterá terceirizada (solução S2). Caso a escolha seja pela execução pela própria organização (solução S1), significa que a atividade não será terceirizada, ou se estiver atualmente terceirizada é recomendado um processo de primeirização.

atividade O modelo proposto foi aplicado numa organização que atua no ramo da construção civil. Por se tratar de estudo de cunho estratégico e para evitar problemas com a mão de obra que atualmente executa as atividades em análise, não


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serão revelados aqui o nome da organização e os fornecedores pesquisados, entretanto essa reserva de informação não afeta a verificação da aplicabilidade do modelo. A lista originalmente inserida pelo decisor na entrada do modelo constava de 15 atividades produtivas, conforme a Tabela 2. As atividades serão codificadas a fim de preservar a confidencialidade das futuras estratégias da organização. A Tabela 2 também mostra essa codificação. Afirma-se que a lista das atividades da primeira coluna da Tabela 2 não corresponde à ordem da lista da terceira coluna da mesma tabela. No primeiro estágio, verificou-se a viabilidade legal de se executar as quinze (15) atividades alistadas por meio da estratégia de produção terceirizada. Todas as atividades foram consideradas legalmente viáveis. No segundo estágio do modelo, que tem o objetivo de aferir a vocação das atividades para a execução por terceiros, foram realizados muitos debates para finalmente chegar à definição dos atributos de avaliação da vocação. Nestes debates estavam presentes o centro decisor, uma consultoria independente e um facilitador externo. Foi inicialmente utilizada a técnica de “brainstorming”. O agrupamento dos atributos sugeridos foi norteado pelos fatores de completude, operacionalidade, independência, ausência de redundância e tamanho máximo, conforme Keeney e Raiffa (1976). Segue abaixo a lista final dos atributos definidos: i) Impacto da atividade no negócio-fim da organização; ii) Investimento para executar a atividade com competitividade; iii) Riscos de transferências de tecnologia; iv) Nível de dificuldade com a mão de obra própria para a atividade, e: v) Satisfação com o desempenho atual da atividade. Após a aplicação da técnica SMARTS obteve-se a ordenação das atividades, segundo a vocação à terceirização conforme a Tabela 3. Em seguida foi feita uma análise de sensibilidade que consistiu na variação dos pesos de cada atributo anteriormente elicitado pelo decisor. Essa alteração nos valores dos pesos foi realizada tanto para mais quanto

para menos da ordem de 10% (sugerida pelo decisor), sendo realizada apenas para um único atributo de cada vez. A diferença no valor do peso do atributo alterado é compensada nos valores dos pesos dos demais atributos de forma relativa, de modo que a soma dos pesos de todos os atributos continue sendo a unidade. A Tabela 4 mostra as consequências na ordenação das alternativas mediante a variação dos pesos para cada atributo.

A

contribuição mais significativa deste modelo é a abordagem desse complexo problema de maneira analítica Observa-se que, nesta fase, a problemática de ordenação (GOMES et al., 2006; ALMEIDA; COSTA, 2003) foi vista e entendida pelo decisor como a mais adequada para as suas necessidades de visualização das recomendações do problema em questão. Outras problemáticas, tais como classificação, portfólio (que poderia ser também visualizado como um problema de programação 0-1) e escolha não seriam apropriadas no contexto de decisão estudado. A identificação da problemática mais adequada deve ser efetuada pelo analista junto ao decisor e depende da natureza do problema, bem com do contexto onde a decisão é desenvolvida (ALMEIDA; COSTA, 2003). Tabela 2: Lista de atividades para submissão ao modelo. Lista de atividades em ordem alfabética para submissão ao modelo

Lista de atividades codificadas Atividade_1 Atividade_2

Aquisição de imóveis (terrenos)

Atividade_3

Compras de materiais Elaboração de projetos Execução de projetos de instalação Execução do projeto de superestrutura

Atividade_4 Atividade_5

Codificação Aleatória

Contabilidade fiscal e contábil

Execução do projeto de infraestrutura

Tabela 1: Atributos para escolha de executor da atividade.

↓↓↓

Administração de frota Análise de viabilidade de projetos

Atividade_6 Atividade_7 Atividade_8 Atividade_9

Fiscalização de obras

1

Qualidade

Limpeza e conservação

2

Rapidez

Propaganda e marketing

3

Credibilidade

Relacionamento com clientes (SAC)

4

Flexibilidade

Segurança patrimonial

Atividade_14

5

Custo

Sistemas de Informação

Atividade_15

↓↓↓

Atributos

Atividade_10 Atividade_11 Atividade_12 Atividade_13

257


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O decisor considerou a estabilidade da solução suficiente, pois as variações entre o primeiro e segundo colocado na lista não representam neste caso uma preocupação, por se tratar de um problema de ordenação e não de escolha de uma única alternativa. A variação entre as atividades 5 e 6 foi contornada classificando ambas para o próximo estágio da decisão. As demais variações ocorreram em atividades com baixa utilidade relativa (vocação) e não consideradas relevantes. As Tabela 3: Ordenação de atividades quanto a vocação para terceirização. Classificação

Atividade

Utilidade

1º.

Atividade_10

0,775

2º.

Atividade_12

0,772

3º.

Atividade_9

0,731

4º.

Atividade_7

0,532

5º.

Atividade_6

0,503

6º.

Atividade_11

0,497

7º.

Atividade_2

0,43

8º.

Atividade_15

0,386

9º.

Atividade_13

0,316

10º.

Atividade_14

0,304

11º.

Atividade_5

0,316

12º.

Atividade_8

0,246

13º.

Atividade_4

0,211

14º.

Atividade_3

0,167

15º.

Atividade_1

0,044

consequências da análise de sensibilidade relatada na tabela 4 ajudaram o decisor a determinar uma linha de corte para classificar apenas algumas atividades para o próximo estágio do modelo. Foram, então, classificadas pelo decisor apenas 7 (sete) atividades com vocação satisfatória para serem submetidas aos procedimentos do estágio 3. No terceiro estágio do modelo, que tem o objetivo de medir o desempenho dos candidatos à execução, são analisadas uma a uma as atividades consideradas com vocação suficiente para uma terceirização, que, neste caso, foram sete (7). Neste terceiro estágio, foram pesquisados no mercado específico de cada atividade possíveis futuros parceiros que reunissem as condições mínimas predefinidas pelo decisor para executar as atividades em analise. Conforme orientação do decisor, foram procurados e identificados oito possíveis executores externos para cada atividade e, com a própria organização, totalizou nove alternativas a ser avaliada nas suas respectivas atividades. Novamente usou-se a técnica SMARTS, agora com os atributos da tabela 1. Durante o processo de elicitação foi identificado algumas alternativas dominadas que foram substituídas por novas alternativas não dominadas, exceto para a atividade sete (7) que só foi possível identificar 5 candidatos externo com as condições mínimas estabelecidas. Tais condições mínimas variaram conforme a atividade em análise, sendo alguns exemplos destas condições: tempo de existência da empresa, número de funcionários, número de processos trabalhistas, etc. A primeira atividade a ser submetida ao estágio 3, foi a atividade dez (10). A escolha do decisor por essa atividade foi óbvia, pois foi a atividade com maior vocação medida. O resultado da aplicação da metodologia SMARTS para essa

Tabela 4: Análise de sensibilidade da ordenação da vocação das atividades. Atributo

Variação 10% Incremento

Decremento

Impacto da atividade no negócio-fim da organização

Sem alteração na ordenação

Inversão na ordenação das alternativas entre a 10ª e a 11ª posições

Investimento para executar a atividade com competitividade

Inversão na ordenação das alternativas entre a 1ª e a 2ª posições.

Inversão na ordenação das alternativas entre a 9ª e a 10ª posições

Riscos de transferências de tecnologia

A alternativa na 9ª posição foi para 11ª posição. As posições 10ª e 11ª subiram um posto cada uma

Inversão na ordenação das alternativas entre a 5ª e a 6ª posições

Nível de dificuldade com mão de obra própria para atividade

Sem alteração na ordenação

Inversão na ordenação das alternativas entre a 1ª e a 2ª posições e entre a 9ª e a 10ª posições

Satisfação com o desempenho atual da atividade

Sem alteração na ordenação

Inversão na ordenação das alternativas entre a 9ª. e a 10ª. posições

258


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atividade é mostrado na tabela 5. Uma vez que a alternativa de maior utilidade é um candidato externo, a indicação do modelo para essa atividade é executá-la com terceiros. Atualmente essa atividade já é executada por um terceiro (Terceirizado A), entretanto o modelo aponta uma possível melhor alternativa de parceria (Terceirizado G) para essa atividade específica. Conclui-se com isso que o modelo também se presta a avaliação de fornecedores. Neste artigo, está sucintamente reportado apenas o resultado do modelo para três (3) das atividades analisadas. Foram escolhidas as três (3) primeiras atividades segundo a sequência definida pelo decisor. Para o resultado de cada atividade foi realizada uma analise de sensibilidade conforme descrito anteriormente. As análises de sensibilidades realizadas mostraram que as soluções apontadas pelo modelo apresentaram uma boa estabilidade. Para as três (3) primeiras atividades analisadas foram obtidas as recomendações conforme Tabela 6, onde é mostrado, para cada atividade, a estratégia de produção atualmente emTabela 5: Ordenação dos candidatos a execução da atividade 10. Ordem

Executor

Utilidade

1º.

Terceirizado G

0,667

2º.

Terceirizado A

0,638

3º.

Terceirizado D

0,608

4º.

Terceirizado B

0,587

5º.

Terceirizado C

0,582

6º.

Terceirizado F

0,571

7º.

Terceirizado H

0,563

8º.

Terceirizado E

0,561

9º.

Organização

0,460

pregada, a recomendação do modelo proposto e, finalmente, a decisão tomada pelo decisor.

5. CONCLUSÃO Nas recomendações da aplicação realizada, chama-se atenção para a não indicação de terceirização da atividade 7, embora esta atividade tenha sido considerada bem vocacionada para uma terceirização. A razão para tal fato ocorre justamente porque no estágio 3 olha-se para além dos limites da organização e, neste caso, não foi encontrado no mercado daquela atividade um candidato a executor externo com melhores condições de desempenho que a própria organização. A recomendação da atividade 10 ratificou a estratégia terceirizada como a melhor opção de execução, porém apontou um candidato diferente do parceiro que atualmente realiza esta atividade. Evidenciou-se com isso que o modelo também pode ser aplicado para avaliação de fornecedores de forma comparativa. O modelo proposto é versátil, podendo ser aplicado para qualquer atividade produtiva, esteja esta sendo atualmente já terceirizada ou não. Os atributos e critérios de cada aplicação do modelo serão sempre consequências diretas da estratégia da organização. É importante ressaltar que a solução apontada pelo modelo proposto, embora represente as preferências do decisor elicitada no processo, é prescritiva, e não normativa. O decisor tem total liberdade para revisar, ou até mesmo decidir contrariamente à recomendação do modelo, embora essa última opção exponha uma falta de coerência e racionalidade. A contribuição mais significativa deste modelo é a abordagem desse complexo problema de maneira analítica, decompondo tal complexidade em partes de simples compreensão, capacitando o decisor a fazer uma escolha com mais segurança e racionalidade no sentido de melhorar os resultados da organização que representa.

Tabela 6: Quadro resumo das recomendações e decisões. Atividade Produtiva 10

9

7

Estratégia de produção atual

Terceirizada

Não terceirizada

Não terceirizada

Recomendação do Modelo Proposto

Terceirizar, porém com executor diferente do atual

Terceirizar

Não terceirizar

Decisão

Revisar o contrato atual considerando uma possível troca de fornecedor

Terceirizar

Não terceirizar

259


Valois, U.; Almeida, A. T. Modelo de apoio à decisão multicritério para terceirização de atividades produtivas baseado no Método SMARTS. Produção, v. 19, n. 2, p. 249-260, 2009

Artigo recebido em 26/09/2008 Aprovado para publicação em 26/03/2009

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AGRADECIMENTOS Este trabalho foi desenvolvido com apoio parcial do CNPq.

SOBRE OS AUTORES Último de Valois A.B.I.J.C.S.U.Dias End. Av. Prof. Francisco Morato, 2430, Caxingui – São-Paulo – SP – 05512-900 Tel.: (11) 3723-3487 Fax: (11) 3723-3581 E-mail: valoisu@gmail.com Adiel Teixeira de Almeida Universidade Federal de Pernambuco Cx. Postal 7462, Recife – PE – 50630-970 Tel.: (81) 2126-8728 Fax: (81) 2126-7110 E-mail: almeidaatd@gmail.com

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Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 261-273

Obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo: uma análise utilizando regressão logística Antônio Carlos Pacagnella Júnior UFSCar Geciane Silveira Porto FEARP/USP Sérgio Kannebley Júnior FEARP/USP Sérgio Luís da Silva UFSCar Carlos Alberto Grespan Bonacim FEA-USP

RESUMO Este artigo tem como proposta central analisar as variáveis de influência na obtenção de patentes da indústria paulista, utilizando, para isto, dados da Pesquisa de Atividade Econômica Paulista (PAEP), realizada pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (SEADE), considerando o período de 1999 a 2001. Trata-se de uma pesquisa com abordagem quantitativa, de caráter descritivo e explicativo, na qual foi utilizada a técnica de regressão logística. Os resultados encontrados mostram a orientação exportadora, a origem do capital controlador, a origem principal de receita (bens ou serviços), o fator relacionado aos investimentos em pesquisa e desenvolvimento (P&D), a presença de laboratório ou departamento de P&D, a cooperação em P&D e as fontes de informação para atividades inovativas são variáveis significativas de influência na probabilidade de obtenção de patentes por parte das empresas industriais paulistas. PALAVRAS-CHAVE Patentes, inovação tecnológica, regressão logística.

Patent obtaining in the São Paulo State industry: an analysis using logistic regression ABSTRACT This paper aims at analyzing the influence variables of patent obtaining by the industries from São Paulo State, using to this, data from Pesquisa de Atividade Econômica Paulista (PAEP) provided by Fundação Sistema de Análise de Dados (SEADE) from 1999 to 2001. The research has a quantitative approach with descriptive and correlational characteristics, where the statistical method used was the logistic regression. The results show that the export orientation, the capital origin, the main outcome source (goods or services), the factor related to the investments on research and development, (R&D) availability of R&D specific department or laboratory, R&D cooperation and the information sources for innovative activities are significant influence variables on the probability of patent obtaining. KEY WORDS Patents, technological innovation, logistic regression.

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Pacagnella Júnior; A. C.; Porto, G. S.; Kannebley Júnior, S.; Silva, S. L.; Bonacim, C. A. G. Obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo: uma análise utilizando regressão logística. Produção, v. 19, n. 2, p. 261-273, 2009

1. INTRODUÇÃO As patentes são instrumentos utilizados pelas organizações para proteger suas invenções e inovações, constituindo uma alternativa ao segredo industrial, ao “know-how”, aos acordos de licenciamento e outras maneiras que buscam garantir a exclusividade da exploração comercial da tecnologia desenvolvida. Trata-se de um artifício legal, utilizado para impedir a apropriação da propriedade intelectual por terceiros, que visam a sua utilização para benefício próprio.

A

A escolha pelo Estado de São Paulo se justifica por se tratar do estado mais industrializado e de maior importância econômica para o Brasil, além disso, de acordo com a Fapesp (2004), as empresas industriais paulistas respondem por aproximadamente 56% do dispêndio privado em P&D no Brasil e por cerca de 51% das patentes depositadas no Instituto Nacional de Propriedade Industrial. A Figura 1, extraída de Albuquerque et alii (2002), apresenta a distribuição espacial no mapa brasileiro das patentes obtidas em cada município, verificando-se uma grande concentração no Estado de São Paulo quando se compara com o resto do país. Os autores ainda destacam que o Estado é responsável por cerca de 32% do total de pesquisadores e 47% do total de artigos científicos publicados no país, reforçando a relevância de sua contribuição científica e tecnológica. A partir dos argumentos supracitados, da importância das patentes como indicadores de inovação tecnológica e de crescimento econômico e da indústria do Estado de São Paulo também quanto a estes dois quesitos, o presente trabalho tem por objetivo analisar as variáveis de influência na obtenção de patentes por parte das empresas industriais paulistas, utilizando-se para este fim a técnica de regressão logística. Espera-se que este trabalho possa contribuir para o entendimento dos mecanismos associados à obtenção de patentes por parte da indústria paulista, de forma a fornecer subsídios para uma compreensão mais profunda da sua dinâmica inovativa e para o desenvolvimento de leis e políticas públicas que incentivem o desenvolvimento tecnológico, melhorando a competitividade destas organizações.

economia baseada no conhecimento exige que as organizações protejam cada vez mais seu capital intelectual. Uma patente é um título de propriedade temporário, emitido no Brasil pelo Instituto Nacional de Propriedade Intelectual (INPI) e internacionalmente por órgãos como o United States Patent Office (USPTO) e European Patent Office (EPO), que permite ao seu proprietário fazer uso do objeto da patente de forma exclusiva durante determinado período de tempo. A patenteabilidade de uma determinada tecnologia depende, de acordo com Humphreys (2006), de três fatores: novidade, quesito que define se o objeto reivindicado não existe e nem está acessível, atividade inventiva, que define que o objeto da patente deve estar no “estado da técnica”, ou seja, que para um técnico do assunto o objeto não decorra de forma óbvia e evidente, e a aplicação industrial, devendo o objeto ser aplicável em um sentido amplo, não necessariamente de forma imediata ou economicamente viável. Por estarem diretamente associadas ao desenvolvimento de tecnologias, a análise das patentes tem sido utilizada em diversos estudos como indicador de inovação tecnológica, permitindo verificar o desempenho tecnológico de empresas, regiões, setores industriais e mesmo de países. Corroborando estas afirmações, Abraham e Moitra (2001) argumentam que os estudos sobre patentes utilizam-nas como uma ferramenta para indicar o desenvolvimento tecnológico e o crescimento econômico no contexto nacional e internacional. Ainda segundo Abraham e Moitra (2001), no ambiente empresarial a análise de patentes também é de grande importância, pois serve como base para a avaliação das políticas sobre P&D, estimação das forças e fraquezas dos concorrentes e da identificação de oportunidades de exploração de novos mercados. 262

2. PATENTES A economia baseada no conhecimento exige que as organizações protejam cada vez mais seu capital intelectual, de forma a manter competências essenciais que subsidiem sua competitividade (CHOY; YEW; LIN, 2006). Com o auxílio da utilização de patentes, é possível assegurar vantagem competitiva por meio da exploração comercial exclusiva de um determinado tipo de conhecimento com proteção legal, desencorajando eventuais cópias ou plágio por outras organizações. Além disso, segundo Hou e Lin (2006), a posse de patentes permite ao seu dono outros benefícios em negócios relacionados às mesmas, como a venda de produtos patenteados ou o licenciamento para a exploração da patente. Os autores ainda afirmam que também existem benefícios para quem


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adquire as patentes, como menores investimentos P&D e a redução do risco inerente ao desenvolvimento de novas tecnologias. Embora os motivos que levam a organização a patentear tecnologias possam variar segundo diversos aspectos, como o tamanho ou o mercado onde ela atua, Olsson e McQueen (2000) argumentam que de forma geral existem nove razões para que se busque a proteção da propriedade intelectual por meio de patentes: (1) As características comerciais das invenções da organização (potencial de comércio); (2) Aspectos financeiros (obtenção de financiamento ou capital de risco); (3) Deserção de pessoal; (4) Oportunidades de licenciamento; (5) Desejo de bloquear competidores; (6) Reconhecimento do inventor; (7) Melhorar a imagem do produto da empresa; (8) Baixa efetividade de segredo industrial; (9) Baixa efetividade de outras formas de manter a exclusividade da invenção. No Brasil existem três modelos de patentes: o primeiro é o Privilégio de Invenção (PI), aplicado para inventos inéditos e com prazo de proteção de vinte anos; o segundo é o Modelo de Utilidade (MU), aplicado a inventos e soluções técnicas novas, que consistem de melhora na função, uso ou aplicação do objeto e que possui prazo de proteção de quinze anos; o terceiro é o Desenho Industrial (DI), aplicado para proteger durante dez anos a forma ou o formato construtivo de objeto. O processo brasileiro de registro de patentes é composto, segundo Humphreys (2006), por quatro fases: Depósito, quando o requerente apresenta um relatório descritivo do objeto patenteado, desenhos e outros; Publicação, declaração pública do objeto de patente (o que muitas vezes leva a organização a preferir o segredo industrial à patente); Exame, fase em que se avalia a patenteabilidade do objeto; e Decisão, que em caso favorável garante a “carta-patente” ao solicitante. Além de se tratar de um importante instrumento de proteção intelectual, as patentes são de suma relevância para o processo de difusão tecnológica, segundo Encaoua, Guellec e Martinez (2006). Isto acontece devido ao fato de que para se obter uma patente, e consequentemente a exclusividade de exploração de seu conteúdo, o inventor deve divulgá-lo, o que pode dar origem a novas tecnologias. Este último ponto é reforçado por Burke e Reitzig (2007), que apontam para a importância das patentes enquanto elemento estimulante para a pesquisa e o desenvolvimento e para facilitar a transferência de tecnologias.

Outro aspecto importante sobre as patentes é a sua utilização como indicadores da capacidade tecnológica das organizações. A análise do número de patentes obtidas, embora seja uma medida útil, gera dois problemas significativos, segundo Coombs e Bierly (2006): o primeiro é o fato de existirem tecnologias não patenteáveis e o segundo está relacionado ao princípio de que patentes diferem enormemente umas das outras de acordo com aspectos técnicos e econômicos. O primeiro problema está relacionado à incapacidade de proteção de uma patente sobre determinados tipos de conhecimento, como fórmulas ou algoritmos matemáticos (incluindo sua aplicação em softwares), teorias científicas, matérias biológicas e outros. Já o segundo problema reflete o fato de que patentes são diferentes em termos de valor, que pode ser avaliado, segundo Reitzig (2001), por meio dos seguintes aspectos: • Tempo de vida: o tempo de validade de uma patente determina seu valor; quanto maior este período, maior a possibilidade de que ela traga retorno financeiro; • Grau de novidade: distância entre a tecnologia atual e a da invenção patenteada; • Usos ou funções das patentes: as possibilidades de utilização do objeto patenteado podem aumentar seu valor; • Dificuldade de invenção: está relacionada com a dificuldade imposta pela obtenção da patente no que se refere à invenção de algo semelhante pelos concorrentes;

Figura 1: Patentes por município. Fonte: Albuquerque et alii (2002)

263


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• Posição no portfólio: a importância da patente vai variar dependendo do portfólio de patentes do mesmo tipo que existirem; • Abrangência da patente: patentes podem diferir quanto ao grau de proteção oferecido para a invenção; assim, quanto mais abrangente melhor; • Capacidade de barganha: está relacionada com a capacidade comercial da patente e de como ela pode ser utilizada como moeda de troca entre empresas, ou mesmo como produto; • Exclusão de direitos: relacionada à vantagem que a patente oferece à empresa que a obtém ao conseguir bloquear concorrentes no desenvolvimento de tecnologias; • Abertura (“disclosure”): a abertura de informações técnicas pela patente pode fazer seu valor aumentar, já que permite que outras empresas analisem a possibilidade de sua utilização, o que aumenta sua capacidade de barganha. Fora do contexto da capacidade tecnológica das organizações, ressalta-se que, no que tange ao seu uso como indicador, as patentes têm sido amplamente utilizadas em análises sobre inovação tecnológica em setores, regiões e mesmo para comparação internacional entre países, destacando-se como exemplo a publicação Compendium of Patent Statistics, publicada anualmente pela Organisation for Economic Co-operation and Development (OCDE).

O

3. ASPECTOS METODOLÓGICOS No meio acadêmico é comum classificar as pesquisas em relação a seus objetivos gerais, o que é de grande utilidade para estabelecer uma aproximação conceitual com o objeto de estudo. Desta forma, sob o ponto de vista dos objetivos, este trabalho apresenta elementos de pesquisas descritivas, que visam primordialmente a descrição das características de determinadas populações ou fenômenos, como também a descrição de um processo numa organização, o estudo do nível de atendimento de entidades, levantamento de opiniões e atitudes, além disso, também são pesquisas descritivas aquelas que visam descobrir a existência de associações entre variáveis (GIL, 2002). Ainda quanto aos objetivos, Dane (1990) afirma que uma pesquisa pode apresentar mais de um tipo. Assim, o presente trabalho também possui elementos de pesquisas explicativas, que têm como preocupação central a identificação dos fatores que determinam ou que contribuem para a ocorrência dos fenômenos, suas causas e consequências (RICHARDSON, 1999). A abordagem utilizada neste estudo é a quantitativa e utiliza dados secundários provindos da Pesquisa de Atividade Econômica Paulista (PAEP), realizada no ano de 2002 e que abrange o período que vai de 1999 a 2001. Para processo de amostragem, a Fundação SEADE utilizou o Cadastro de Empresas (CEMPRE), fornecido pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), onde foram selecionados 1.006.037 registros, dando origem a uma amostra de 42.023 empresas de 21 setores industriais (ou estratos) que seguem a Classificação Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) de dois dígitos.

utro aspecto importante sobre as patentes é a sua utilização como indicadores da capacidade tecnológica das organizações. Sobre este aspecto, vale destacar que embora o Estado de São Paulo se destaque no âmbito nacional como citado anteriormente, a participação do Brasil no âmbito internacional é pequena; para se ter uma idéia, as patentes brasileiras registradas no USPTO representam menos de 0,005% do total. Entretanto, de acordo com a OCDE (2007), o número de patentes de países emergentes como o Brasil tem crescido rapidamente, aumentando a participação em mais de cinco vezes no período de 1991 até 2002; por isso, estudos que permitam avançar a discussão sobre o assunto no Brasil são de fundamental importância para promover melhores políticas públicas de incentivo à geração de novas tecnologias, sua adequada proteção e consequente difusão (como já discutido previamente), pelo uso de patentes. 264

4. DESCRIÇÃO DA AMOSTRA A Tabela 1 apresenta os estratos da amostra da PAEP, trazendo informações sobre a composição de cada setor em termos do total de empresas e o percentual de empresas que obtiveram patentes. Os estratos da amostra (setores) seguiram a classificação do Cadastro Nacional de Atividades Econômicas (CNAE) de dois dígitos, devendo-se destacar que a quantidade de empresas presentes em cada estrato é diferente, sendo pequena em alguns casos, que foram agrupados na Indústria extrativa e em Outras indústrias, de forma a garantir sig-


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nificância estatística para todos os setores que compõem a amostra. Desta forma é possível observar que os setores com maior participação na amostra são os setores de Produtos metálicos, com 11,98%, Vestuário e acessórios, com 11,49%, Outras indústrias, com 11,03%, Alimentos e bebidas, com 9,92%, e o setor de Máquinas e equipamentos, com 7,65% do total, enquanto que os setores com menor participação nesta composição são os setores de Refino de petróleo, com 0,19%, Equipamentos de informática, com 0,30%, Outros equipamentos de transporte, com 0,53%, Equipamentos médicos, com 1,37%, e a Indústria extrativa, com 1,38%. Quando se observam os dados referentes à obtenção de patentes, percebe-se em primeira instância o baixo número de empresas, sendo no total apenas 1.839, ou 4,38% da amostra. Entre os setores é relevante destacar o setor de Máquinas e equipamentos, responsável pela maior parcela destas empresas (19,14%), além do setor de Produtos químicos, que corresponde a apenas 4,70% do total da amostra, mas onde estão 12,45% das empresas que obtiveram patentes, e do setor de Borracha e Plásticos, que participa com 14,96% do total de empresas que obtiveram patentes no período considerado pela PAEP. Também é possível citar como destaques “negativos” os setores de Refino de petróleo, onde nenhuma empresa obteve patentes, a Indústria extrativa, com apenas 0,27% de empresas que obtiveram patentes, e o setor de Outros equipamentos de transporte, onde as empresas que patentearam representam apenas 0,44% do total. Quanto à distribuição da amostra com relação à faixa de pessoal ocupado, é possível observar, pela Tabela 2, que a amostra da PAEP é composta em sua maior parcela por empresas de 5 a 29 pessoas, correspondendo a 78,27% do total. A segunda maior parcela é de empresas na faixa de 30 a 99 pessoas ocupadas, com 14,05% do total da amostra, enquanto que a faixa de 100 a 499 corresponde a 6,06% e a faixa de 500 ou mais pessoas ocupadas corresponde a apenas 1,62%. Para as empresas que obtiveram patentes, esta proporção se inverte, evidenciando a influência do tamanho. Assim, das empresas que estão na faixa de até 29 pessoas ocupadas, apenas 2,97% obtiveram patentes, enquanto que nas outras faixas este percentual aumenta sequencialmente com 6,88% na faixa de 30 a 99 pessoas ocupadas, 13,16% na faixa de 100 a 499 pessoas e 17,74% na faixa de 500 ou mais pessoas. Outros aspectos relevantes sobre a amostra estão presentes na Tabela 3, que mostra a composição em termos de orientação exportadora e origem do capital controlador do

total de empresas e das empresas que obtiveram patentes no período considerado pela PAEP. A grande maioria das empresas que compõem a amostra, segundo os dados apresentados na Tabela 3, é de empresas não exportadoras, representando 83,82% do total, enquanto que as empresas exportadoras correspondem a 10,96%. Entretanto, quando se observa a obtenção de patentes, verificase que entre as exportadoras o percentual de empresas que obtiveram patentes é de 15,07% enquanto que entre as não exportadoras este percentual é de apenas 3,06%, indicando uma possível influência da orientação exportadora na obtenção de patentes. Da mesma forma, quando se trata da origem do capital controlador das empresas, observa-se que a imensa maioria é de empresas cujo capital controlador é de origem nacional, onde esta parcela é de 92,83% contra 2,66% de empresas com capital controlador de origem internacional ou mista. Com respeito a obtenção de patentes, o percentual de empresas com capital controlador de origem internacional ou mista é de 21,22%, bem superior ao percentual de empresas de capital controlador de origem nacional, que representam 3,99% do total, indicando também uma possível influência deste fator na obtenção de patentes.

5. TÉCNICA ESTATÍSTICA A regressão logística é uma técnica estatística que tem por objetivo discriminar dois grupos de observações dentro de uma amostra, diferindo da regressão linear por utilizar uma variável dependente dicotômica ou binária. De acordo com Hosmer e Lemeshow (1989), a técnica de regressão logística tornou-se um método padrão para análise de regressão para variáveis binárias, sendo amplamente utilizada em situações da medicina (estado de saúde de um paciente), marketing (compra de produtos) e outras situações em que a análise de dados envolve prever o valor de uma variável de resultado categórico. Trata-se, portanto, de uma técnica apropriada para este estudo, onde variável dependente é dicotômica, assumindo um entre dois resultados possíveis: “obteve ou não obteve patentes”. Para Hair (2005), esta técnica deriva seu nome da transformação logística usada com a variável dependente e que permite calcular diretamente a probabilidade do fenômeno analisado ocorrer. Segundo Johnson e Wichern (1998), o modelo de regressão logística é baseado na função logística: ,

(1)

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Podendo ser expresso na forma: (2) Onde: p = probabilidade de resposta para o i-ésimo fator (ou covariante) α = constante βi = coeficientes das variáveis independentes Xi = variáveis independentes A técnica de regressão logística é normalmente preferida em relação a outras técnicas como a análise discriminante, segundo Hair (2005), devido a não dependência de que diversas suposições rígidas sejam atendidas e pela robustez quando estas não são satisfeitas, como a relação linear entre variáveis dependentes e independentes e a distribuição nor-

mal da variável dependente e dos termos de erro. Entretanto, segundo Garson (2008), a regressão logística ainda necessita que outros pressupostos sejam atendidos, destacando-se: • A variável dependente deve ser dicotômica ou multinomial; • Inclusão de todas as variáveis relevantes no modelo; • Exclusão de todas as variáveis irrelevantes no modelo; • Ausência de multicolinearidade; • Ajuste adequado do modelo. Desta forma, nas próximas seções serão apresentadas análises sobre o modelo especificado, buscando garantir que os pressupostos da técnica de regressão logística sejam atendidos. 5.1. Especificação do modelo O quadro 1 apresenta as variáveis inicialmente selecionadas para serem utilizadas no modelo de regressão, sendo

Tabela 1: Composição da amostra por setores e quantidade de empresas que obtiveram patentes. Setor

Total

Empresas

n

%

n

%

582

1,38

5

0,27

15. Alimentos e Bebidas

4.168

9,92

85

4,62

17. Produtos Têxteis

1.841

4,38

56

3,05

18. Vestuários e Acessórios

4.828

11,49

67

3,64

19. Artefatos de Couro

1.349

3,21

30

1,63

905

2,15

23

1,25

2.742

6,52

76

4,13

12. Indústria Extrativa

21. Celulose e Papel 22. Edição e Impressão 23. Refino de Petróleo

79

0,19

0

0,00

24. Produtos Químicos

1.977

4,70

229

12,45

25. Borracha e Plásticos

2.962

7,05

202

10,98

26. Minerais não-Metálicos

2.894

6,89

37

2,01

27. Metalurgia Básica

1.226

2,92

30

1,63

28. Produtos Metálicos

5.035

11,98

175

9,52

29. Máquinas e Equipamentos

3.045

7,25

352

19,14

128

0,30

34

1,85 4,95

30. Equipamentos de Informática

1.215

2,89

91

32. Eletrônicos e comunicações

444

1,06

84

4,57

33. Equipamentos Médicos

575

1,37

86

4,68

1.171

2,79

65

3,53

223

0,53

8

0,44

39. Outras Indústrias

4.635

11,03

104

5,66

Total

42.023

100

1.839

100

31. Material Elétrico

34. Veículos Automotores 35. Outros Equip. de Transporte

266


Pacagnella Júnior; A. C.; Porto, G. S.; Kannebley Júnior, S.; Silva, S. L.; Bonacim, C. A. G. Obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo: uma análise utilizando regressão logística. Produção, v. 19, n. 2, p. 261-273, 2009

esta escolha baseada essencialmente em pesquisas anteriores sobre obtenção de patentes e inovação tecnológica, buscando incluir todas aquelas com relevância para explicar o fenômeno estudado. Destaca-se que as variáveis incluídas no quadro 1 tomam por base os trabalhos de Watanabe, Tsuji e Brown (2004), Milson e Wilemon (2006), Hagedoorn (2002), Shefer e Frenkel (2005), Olsson e McQueen (2000), Quadros et alii (2001) e também outros elementos propostos pelos autores deste trabalho para ampliar seu potencial investigativo. Desta forma, a construção do quadro 1 tem por objetivo satisfazer os dois primeiros pressupostos da técnica de regressão logística, identificando a variável de resposta como binária e buscando incluir todas as variáveis relevantes no modelo de regressão. Entretanto, em face de possíveis problemas de multicolinearidade (cuja análise será feita na seção posterior), devido ao grande número de variáveis no modelo, o que provocaria uma relevante diminuição na quantidade de seu poder explicativo, foi utilizada a Análise Fatorial de Componentes Principais para as variáveis com escala de razão, buscando reduzir o modelo e qualificá-lo.

A

s patentes brasileiras registradas no USPTO representam menos de 0,005% do total.

Tabela 2: Distribuição da amostra da PAEP por faixas de pessoal ocupado.

Total de empresas

Empresas que obtiveram patentes

n

%

Até 29 Pessoas

32.891

78,27

30 a 99 Pessoas

5.904

14,05

100 a 499 Pessoas

2.546

6,06

500 ou mais

682

1,62

Até 29 Pessoas

977

2,97

30 a 99 Pessoas

406

6,88

100 a 499 Pessoas

335

13,16

500 ou mais

121

17,74

Esta decisão se justifica, pois de acordo com Dantas e De Souza (2008), o uso da análise fatorial no tratamento e configuração das variáveis explicativas as qualifica ainda mais, colocando-as em grupos de explicação que captam melhor seus efeitos sobre a variável dependente. Assim, serão utilizados fatores para compor as variáveis explicativas quantitativas do modelo.

O método utilizado neste trabalho foi o Varimax, destacado por Garson (2005), sendo extraídos 3 fatores, com autovalores maiores do que 1 e que explicam 64,121% da variância total, sendo este percentual considerado aceitável (HAIR et alii, 2005). Por meio do Quadro 2 é possível perceber que as seis variáveis com escalas de razão foram reduzidas a três fatores: o fator F1 equivale ao tamanho da empresa em termos de força produtiva, o fator F2 representa os investimentos realizados pela empresa em pesquisa e desenvolvimento, já o fator F3 traduz a atratividade de profissionais qualificados que a empresa possui, unindo seu tempo de mercado ao seu salário médio. Com o objetivo de melhorar a especificação do modelo, visando retirar variáveis que possivelmente sejam irrelevantes, foi adotado o método backwards stepwise, pelo critério do menor Likelihood Ratio. O método stepwise é baseado em um algoritmo estatístico que avalia a importância de cada variável independente e as inclui ou exclui do modelo segundo uma determinada regra. Neste estudo o parâmetro utilizado foi 10% de significância para a saída das variáveis, resultando em um modelo final composto pelo fator F2 e pelas variáveis X2, X3, X8, X11, X12, X14, X15 e X17. 5.2. Análise de multicolinearidade Um aspecto importante a ser analisado ao utilizar a regressão logística é a possibilidade de existência de mul-

Tabela 3: Orientação exportadora e origem do capital controlador das empresas da amostra. Total de empresas

Empresas que obtiveram patentes

n

%

n

%

Orientação exportadora

Exporta

4.604

10,96

694

15,07

Não exporta

35.225

83,82

1.078

3,06

Origem do capital controlador

Nacional

39.012

92,83

1.557

3,99

Internacional ou misto

1.117

2,66

237

21,22

267


Pacagnella Júnior; A. C.; Porto, G. S.; Kannebley Júnior, S.; Silva, S. L.; Bonacim, C. A. G. Obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo: uma análise utilizando regressão logística. Produção, v. 19, n. 2, p. 261-273, 2009

ticolinearidade, que de acordo com Myers, Montgomery e Vining (2002), é um problema causado pela correlação entre variáveis independentes, o que pode levar a redução do poder explicativo do modelo de regressão. Para a avaliação da multicolinearidade, Garson (2008) sugere a utilização do Variance Inflation Factor (VIF), que avalia o aumento da variância devido à presença de multicolinearidade e é calculado pela equação 3: (3) De acordo com Gujarati (2000), o valor limite do VIF para estabelecer se uma variável não é colinear é 4, sendo que se este valor for superior a 10, a variável é altamente colinear.

O

Assim, os valores destes indicadores encontrados para o modelo utilizado no estudo estão apresentados na Tabela 4 a seguir: A Tabela 4 evidencia o aumento do poder explicativo em cada passo do método stepwise, mostrando que o modelo final é capaz de explicar corretamente 84,5% (Nagelkerke R²) das ocorrências de obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo, levando à conclusão de que o modelo foi corretamente especificado para a análise proposta neste trabalho. 5.4 Teste de ajuste do modelo Uma vez definido o modelo é necessário testar a sua validade. Em regressão logística existe uma série de testes de ajuste para assegurar a validade do modelo, permitindo identificar as variáveis que não se ajustam bem, ou que têm forte influência sobre a estimação dos parâmetros. Entre estes testes é possível destacar o de Hosmer-Lemeshow (HL), que avalia o modelo ajustado, associando os dados e suas probabilidades estimadas da mais baixa à mais alta, realizando um teste qui-quadrado para determinar a proximidade entre as frequências observadas e esperadas. De acordo com Brito e Assaf Neto (2008), o teste HL avalia a hipótese nula de que não há diferenças significativas entre as classificações preditas e observadas, sendo que ao nível de significância de 5% esta hipótese pode ser aceita, indicando que o modelo é capaz de produzir estimativas e classificações confiáveis. Segundo Hosmer e Lemeshow (1989), para um adequado ajuste deve-se ter pelo menos um valor superior a 0,5, sendo que neste trabalho o valor encontrado para o teste HL foi de 0,721, mostrando um bom ajuste para classificar a obtenção de patentes na indústria paulista.

modelo final é capaz de explicar corretamente 84,5% das ocorrências de obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo. A existência de multicolinearidade entre as variáveis pesquisadas neste trabalho foi testada pelo fator VIF, sendo que na verificação realizada nenhuma variável apresentou valor superior a 4,0, que é o valor máximo para indicar que as variáveis não são multicolineares. Portanto, nenhuma variável do modelo final especificado na seção anterior foi excluída da regressão logística. 5.3. Análise de qualidade geral do modelo Para determinar o poder de explicação do modelo são utilizada, na regressão logística métricas similares às usadas na análise de regressão tradicional, em que se calcula o coeficiente de explicação ou de determinação (R²). Na regressão logística, este coeficiente recebe a denominação de “pseudoR²” e é calculado por meio da equação (4) a seguir: (4) De forma similar ao pseudo-R², podem ser utilizadas como medidas de qualidade geral do modelo o R² de Cox e Snell e o R² de Nagelkerque, onde, quanto maior o valor encontrado, maior será o poder explicativo do modelo. O Cox-Snell R² tem uma escala que começa em zero mas não alcança um em seu limite superior. O Nagelkerke R² é similar ao Cox- Snell R², porém tem uma escala que vai de zero a um. 268

6. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS DA REGRESSÃO LOGÍSTICA Os resultados encontrados com a utilização da técnica de regressão logística para a obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo estão apresentados na Tabela 5, que traz as variáveis que são estatisticamente significativas (a 10%) e os seus efeitos marginais, que representam a variação na probabilidade de obtenção de patentes quando a variável explicativa sofre um incremento ou quando assume valor igual a um (em se tratando de variáveis dummies). A primeira variável a ser destacada nesta seção para explicar o fenômeno estudado é a orientação exportadora,


Pacagnella Júnior; A. C.; Porto, G. S.; Kannebley Júnior, S.; Silva, S. L.; Bonacim, C. A. G. Obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo: uma análise utilizando regressão logística. Produção, v. 19, n. 2, p. 261-273, 2009

onde os efeitos marginais mostram que empresas exportadoras possuem 1,53 vez a probabilidade de obterem patentes do que empresas não-exportadoras. Isso provavelmente acontece devido à forte competitividade do mercado internacional, o que estimula a empresa a proteger a propriedade intelectual. A origem do capital controlador apresenta efeitos margi-

nais cujo valor mostra que empresas com origem do capital controlador internacional ou misto possuem probabilidade de obter patentes iguais a 1,48 vezes a probabilidade das empresas cujo capital controlador é de origem nacional. Este aspecto pode ser explicado pela preocupação da matriz da empresa em proteger as inovações desenvolvidas nas filiais, buscando patentear principalmente em seu país

Quadro 1: Variáveis inicialmente selecionadas para o modelo de regressão. Y1

Variável dependente

Escala adotada

Tipo de escala

Obtenção de patentes no Brasil ou no Exterior

1 = Obteve 0 = Não obteve

Nominal (dummy)

Variáveis Independentes

Escala adotada

Tipo de escala

X1

Número de funcionários

Variável contínua, > 0

Razão

X2

Orientação exportadora

1 = Exporta 0 = Não exporta

Nominal (dummy)

X3

Origem do capital controlador

1 = Estrangeiro ou misto 0 = Nacional

Nominal (dummy)

X4

Salário médio pago na empresa (R$)

Variável contínua, > 0

Razão

X5

Idade da empresa (anos)

Variável contínua, >= 0

Razão

X6

Pertencer a grupo empresarial

1 = Pertence 0 = Não pertence

Nominal (dummy)

X7

Percentual dos recursos humanos alocados em atividades de produção

Variável inteira, >=0

Razão

X8

Origem da maior parte da receita da empresa

1 = Venda de bens 0 = Venda de serviços

Nominal (dummy)

X9

Percentual da receita investido anualmente em pesquisa e desenvolvimento

Variável contínua, >=0

Razão

X10

Percentual dos recursos humanos alocado em atividades de pesquisa e desenvolvimento

Variável contínua, >=0

Razão

X11

Laboratório ou departamento específico de pesquisa e desenvolvimento

1 = Possui 0 = Não possui

Nominal (dummy)

X12

Cooperação em pesquisa e desenvolvimento

1 = Coopera 0 = Não coopera

Nominal (dummy)

X13

Apoio governamental na forma de subsídios ou financiamentos

1 = Recebeu 0 = Não recebeu

Nominal (dummy)

X14

Fontes de informação internas para atividades de inovação

1 = Utiliza 0 = Não utiliza

Nominal (dummy)

X15

Fontes de informação ligadas ao mercado para atividades de inovação

1 = Utiliza 0 = Não utiliza

Nominal (dummy)

X16

Fontes de informação institucionais para atividades de inovação

1 = Utiliza 0 = Não utiliza

Nominal (dummy)

X17

Outras fontes de informação para atividades de inovação

1 = Utiliza 0 = Não utiliza

Nominal (dummy)

269


Pacagnella Júnior; A. C.; Porto, G. S.; Kannebley Júnior, S.; Silva, S. L.; Bonacim, C. A. G. Obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo: uma análise utilizando regressão logística. Produção, v. 19, n. 2, p. 261-273, 2009

de origem, fato muito comum entre empresas com esta característica. Outra característica significativa é a origem da maior parte do faturamento das empresas, onde aquelas que possuem a maior parte de suas receitas provinda da venda de bens, possuem probabilidade de obterem patentes 1,37 vez maior do que aquelas que prestam serviços industriais, o que pode ser explicado pelo fato de que bens podem ser patenteados e serviços não, por isso elas são naturalmente estimuladas a se proteger por meio de patentes. Um aspecto importante nos resultados apresentados na Tabela 5 são as variáveis associadas a pesquisa e desenvolvimento, destacando-se inicialmente o fator relativo aos investimentos em P&D (em recursos humanos ou financeiros) apresenta efeitos marginais que mostram que ao sofrer um incremento, a probabilidade de obtenção de patentes aumenta em 17%. Este resultado indica que ao disponibilizar recursos para novas pesquisas, a empresa aumenta a chance de desenvolver novas tecnologias que posteriormente podem ser patenteadas. Já os efeitos marginais da variável relativa à presença de laboratório ou departamento específico de P&D mostram que empresas que possuem este tipo de infraestrutura têm 1,32 vez a probabilidade de obter patentes das empresas

Quadro 2: Fatores extraídos da análise fatorial. Fator

Definição

F1

Tamanho da empresa (Número de funcionários e porcentagem de funcionários alocados em atividades de produção).

F2

Investimentos em P&D (Investimentos financeiros e de recursos humanos em P&D).

F3

Atratividade profissional (Idade da empresa e Salário médio pago na empresa).

270

que não possuem. Isto se explica por se tratar de ambientes específicos para a geração de conhecimentos e tecnologias aplicáveis à indústria e, portanto, altamente patenteáveis. Também se deve destacar a cooperação em P&D, cujos resultados apontam que a probabilidade obterem patentes das empresas que realizam cooperação é igual a 1,21 vez a probabilidade das que não realizam este tipo de cooperação. Este resultado pode ser explicado pela maior capacidade de investimento e complementaridade de recursos quando a empresa realiza suas atividades de P&D de forma cooperada. Em se tratando de fontes de informação para atividades de inovação, a variável, relativa às fontes internas, mostra que empresas que atribuíram importância a este tipo de fontes possuem probabilidade de obterem patentes igual a 1,29 vez a probabilidade de empresas que não atribuíram, o que pode ser explicado pelo fato de que o conhecimento gerado dentro da própria empresa (no departamento de P&D ou em outras áreas) tem um caráter diretamente aplicável ao seu próprio negócio, gerando inovações em produtos e processos e estimulando a sua proteção por parte das empresas por meio de patentes. Em relação às fontes ligadas ao mercado, surpreendentemente os resultados mostram que empresas que atribuíram importância a estes tipos de fontes têm probabilidade de obter patentes igual a apenas 0,72 vez a probabilidade das empresas que não atribuíram, tendo, portanto, uma influência negativa, o que se explica pelo fato de que embora o conhecimento provindo do mercado seja útil, muitas vezes já é de propriedade de outras empresas, não podendo portanto ser patenteado.

Tabela 5: Resultados do modelo de regressão logística. Variáveis Explicativas

Efeitos marginais

X2

Orientação exportadora

1,53

X3

Origem do capital controlador

1,48

Tabela 4: Poder explicativo do modelo de regressão logística.

X8

Origem da maior parte da receita (bens ou serviços)

1,37

Step

Cox & Snell R²

Nagelkerque R2

F2

Fator F2 (investimentos em P&D)

0,17

1

0,422

0,561

X11

Laboratório de P&D

1,32

2

0,561

0,734

X12

Cooperação em P&D

1,21

3

0,604

0,801

X14

Fontes internas

1,19

4

0,614

0,812

X15

Fontes ligadas ao mercado

0,72

5

0,631

0,845

X17

Outras fontes

2,19


Pacagnella Júnior; A. C.; Porto, G. S.; Kannebley Júnior, S.; Silva, S. L.; Bonacim, C. A. G. Obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo: uma análise utilizando regressão logística. Produção, v. 19, n. 2, p. 261-273, 2009

A última variável estatisticamente significativa é a atribuição de importância às chamadas outras fontes (feiras, eventos ou aquisição de licenças), cujos resultados mostram que as empresas industriais do estado que atribuíram importância para este tipo de fontes possuem probabilidade de obterem patentes igual a 2,19 vezes a probabilidade de empresas que não atribuíram. Este resultado indicar, que ao ter contato com este tipo de eventos, onde os produtos e processos já estão protegidos por meio de patentes, ou mesmo ao adquirir novas licenças e patentes, as empresas ficam estimuladas a proteger seu próprio patrimônio intelectual, o que explica a maior probabilidade de se obter patentes.

tação exportadora), De Negri e Turchi (2007) (origem do capital controlador), Santarelli e Sterlachini (presença de laboratório ou departamento específico de P&D), Dowling e Helm (Cooperação em P&D) e Quadros et alii (2001) (fontes de informação para atividades inovativas).

E

ntender este perfil pode auxiliar na criação de estratégias tecnológicas ou ainda fornecer subsídios para a implementação de políticas públicas.

7. CONCLUSÕES Esta pesquisa teve por objetivo analisar as variáveis de influência na obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo. Para atingir este objetivo foi construído um modelo de regressão logística que relacionou diversas variáveis que podem influenciar a probabilidade de obtenção de patentes nestas empresas. Os resultados mostram que o modelo utilizado possui um poder explicativo expressivo quando aplicado para explicar o fenômeno estudado, sendo capaz de explicar cerca de 84,5% dos casos de obtenção de patentes, além disso o modelo foi testado quanto à multicolinearidade (VIF < 4,0 para todas as variáveis) e quanto ao ajuste (teste HL = 0,721), o que permite a conclusão de que o modelo foi corretamente especificado. Os resultados encontrados permitem concluir que as variáveis significativas para explicar o fenômeno estudado são: a orientação exportadora, a origem do capital controlador, a origem da maior parte da receita, os investimentos em P&D, a presença de laboratório ou departamento específico de P&D, a cooperação em P&D, atribuição de importância para fontes internas, ligadas ao mercado e outras fontes de informação. Estes resultados confirmam estudos empíricos presentes na literatura, como os de Salomon e Shaver (2005) (orien-

Entre os resultados é possível destacar aqueles relacionados a pesquisa e desenvolvimento (investimentos, infra-estrutura específica e cooperação), mostrando a importância deste elemento no desenvolvimento de novas tecnologias comerciais que possam ser patenteadas pelas empresas. É preciso ressaltar que estes resultados são relativos à indústria paulista de forma agregada e que setorialmente (considerando os vinte e um setores com significância estatística na PAEP) existem diferenças quanto a quais variáveis impactam a probabilidade de obtenção de patentes e qual a contribuição de cada variável para o aumento ou a redução desta probabilidade, como pode ser verificado em Pacagnella Júnior (2006). De modo geral os resultados encontrados por este trabalho apresentam como contribuição a junção de diversos aspectos relevantes em um mesmo modelo teórico-empírico que permitiu traçar um perfil da empresa com maior chance de obter patentes e qual a influência das variáveis que compõem este perfil. Entender este perfil pode auxiliar na criação de estratégias tecnológicas ou ainda fornecer subsídios para a implementação de políticas públicas que fomentem a inovação tecnológica por parte das empresas. Desta forma, espera-se que este trabalho possa contribuir para a compreensão do fenômeno estudado e de outros relacionados. Além disso, deixa-se como sugestão a realização de estudos semelhantes, baseados em surveys em outros estados ou nos setores industriais mais importantes economicamente ou de maior relevância tecnológica, de modo a verificar a validade e relevância do modelo formulado ou ainda encontrar outras variáveis não discutidas neste trabalho.

Artigo recebido em 20/08/2008 Aprovado para publicação em 26/03/2009 271


Pacagnella Júnior; A. C.; Porto, G. S.; Kannebley Júnior, S.; Silva, S. L.; Bonacim, C. A. G. Obtenção de patentes na indústria do Estado de São Paulo: uma análise utilizando regressão logística. Produção, v. 19, n. 2, p. 261-273, 2009

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SOBRE OS AUTORES Antônio Carlos Pacagnella Júnior Departamento de Engenharia de Produção / UFSCar End.: Lindoro Vicente Santana, 190, Sumarezinho – Ribeirão Preto/SP Tel.: (16) 3630-2163 Fax: (16) 3630-2163 E-mail: acpjr@usp.br Geciane Silveira Porto Departamento de Administração – FEARP/USP End.: Av. dos Bandeirantes, 3900, Monte Alegre - Ribeirão Preto/SP Tel.: (16) 3602-3914 Fax: (16) 3602-3922 E-mail: geciane@usp.br Sérgio Kannebley Júnior Departamento de Economia – FEARP/USP End.: Av. dos Bandeirantes, 3900, Monte Alegre - Ribeirão Preto/SP Tel.: (16) 3602-3887 Fax: (16) 3602-3922 E-mail: skj@usp.br Sérgio Luís da Silva Departamento de Engenharia de Produção / UFSCar End.: Rua 28 de Setembro, 2360, ap. 41T, Centro, São Carlos/SP Tel.: (16) 3352-8239 Fax: (16) 3351-8240 E-mail: sergiol@power.ufscar.br Carlos Alberto Grespan Bonacim Departamento de Contabilidade / FEA-USP End.: Rua Romeu Engrácia de Faria, 210, ap. 15-A Tel.: (16) 8118-9360 E-mail: carlosbonacim@yahoo.com.br

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Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 274-291

Modelagem e análise de um novo centro cirúrgico para um hospital em crescimento: uma abordagem baseada em simulação Élcio Douglas Joaquim PUCPR Guilherme Ernani Vieira PUCPR

RESUMO Uma instituição hospitalar precisa de constante aperfeiçoamento para ser eficiente no seu principal negócio: o bem-estar do ser humano. Este artigo descreve um projeto realizado no Hospital Universitário da PUCPR, cujo principal objetivo é avaliar alterações no Centro Cirúrgico com o intuito de se preparar melhor para o aumento de demanda esperado para os próximos anos. Foram simulados e analisados quatro novos cenários, os quais incluíram restruturação de atividades de atendimento e ampliação do número de salas cirúrgicas. Os modelos de simulação mostraram que em geral as alterações sugeridas trarão benefícios ao centro e que o melhor cenário deverá ter duas novas salas de cirurgia e uma restruturação das atividades internas do centro. Isto reduzirá o tempo de espera do paciente por sala cirúrgica e também a própria taxa de ocupação das salas, além de atender bem à comunidade até 2010/2011. PALAVRAS-CHAVE Processos hospitalares; centro cirúrgico; simulação.

Modeling and analysis of a new surgical center for a growing hospital: a simulation-based approach ABSTRACT A hospital institution needs frequent improvement to be efficient at its core business: the care of the human being. This paper describes a project conducted at PUCPR’s University Hospital, which main objective is to evaluate changes to the Surgical Center aiming at being better prepared for the demand increase expected for the coming years. Four new scenarios were simulated and analyzed, which included restructuring of internal activities and the increase on the number of surgical rooms. The simulation models showed that the suggested changes will benefit the center and that the best scenario should have two new surgical rooms along with the restructuring of the internal activities flow. This will reduce the patient waiting time for surgical room and the rooms’ utilization, besides providing a good service to the community until 2010/2011. KEY WORDS Hospital processes; surgical center; simulation.

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1. INSTITUIÇÕES HOSPITALARES PRECISAM SER EFICIENTES Como as empresas de manufatura, as instituições hospitalares também precisam buscar constantemente ferramentas que possibilitam a melhoria da qualidade dos seus serviços, visando se manter nos patamares de competitividade atualmente exigidos. Embora muitos hospitais sejam instituições filantrópicas e/ou públicas, a busca constante por alternativas que possam melhorar seus processos para oferecer atendimento de qualidade ao maior número possível de pacientes, em um contexto de investimentos financeiros limitados, é uma necessidade real e constante. Neste contexto, um dos primeiros passos para que se otimize o uso dos recursos existentes em um hospital é a análise e, quem sabe, reorganização da sua atual estrutura funcional, com o auxílio da tecnologia de informação, sem perder de foco custos e sem prejudicar o desempenho e a qualidade dos serviços prestados à sociedade. Por tratar do bem-estar e saúde de pessoas, processos hospitalares devem estar bem estruturados para que pacientes sejam atendidos com qualidade e no menor tempo possível. Uma instituição hospitalar também deve estar preparada para os aumentos de demanda esperados. Barros e Sena (1998) constataram, por exemplo, que ampliações na infraestrutura de atendimento dos hospitais, com o objetivo de atender o crescente aumento de demanda, apresentaram um aumento de custo desproporcional ao aumento do volume de atendimento (que se caracteriza em receita ao hospital). Ou seja, não se conseguiu obter economia de escala na prestação dos serviços. Abel-Smith (1996) afirma também que não é possível obter economia de escala quando hospitais funcionam com uma taxa de ocupação inferior a 70% e sugere que, nestes casos, a solução viável, embora politicamente impopular, é fechar parte do hospital. Longe de significarem um desestímulo em investir na infra-estrutura de saúde, esses trabalhos reforçam a ideia de que investimentos precisam ser acompanhados de técnica e método adequados, fazendo uso, por exemplo, de ferramentas que possam avaliar com eficiência o retorno dos recursos aplicados. Simulação computacional pode contribuir para tais análises e tomadas de decisão. Neste projeto, simulação computacional é usada como ferramenta de análise para um novo Centro Cirúrgico do Hospital Universitário Cajuru (CCHUC), da Pontifícia Universidade Católica do Paraná. Quatro novos cenários

serão analisados com o objetivo de se descobrir a melhor configuração para o novo centro cirúrgico, de forma a se lidar com o aumento de demanda esperado. Assim, no total, cinco cenários serão modelados e simulados. O primeiro a ser desenvolvido representará o cenário atual, seu objetivo é comprovar que os resultados reais atuais podem ser repetidos em um modelo de simulação. As outras quatro configurações representarão possíveis alternativas para o novo centro. As propostas a serem analisadas serão: 1. Cenário proposto I – considera somente as alterações no fluxo de atividades internas ao centro, mantendo o mesmo número de salas de cirurgia; 2. Cenário proposto II – prevê o aumento no número de salas de cirurgia (de seis para dez), mantendo o fluxo atual das atividades cirúrgicas; 3. Cenário proposto III – considera ambas as alterações possíveis, isto é, mudanças no fluxo de atividades e aumento do número de salas de cirurgia (seis para dez). Espera-se que este cenário traga as melhores respostas, entretanto, este cenário possivelmente não será implantado devido ao alto custo financeiro necessário. Para minimizar os custos desta opção, propõe-se uma configuração parecida com este cenário III, só que mais barata: 4. Cenário poposto IV – exatamente igual ao Cenário III mas com um aumento de apenas duas salas de cirurgia (total de oito salas cirúrgicas) aliado à reconfiguração dos fluxos de atividades internas do centro (II + III).

O

timize o uso dos recursos existentes em um hospital com o auxílio da tecnologia de informação, sem perder de foco custos e sem prejudicar o desempenho e a qualidade dos serviços. Este artigo está organizado da seguinte maneira: A próxima seção revisa alguns trabalhos encontrados na literatura que aplicam simulação computacional em instituições hospitalares. A seção 3 descreve o ato cirúrgico e o atual Centro Cirúrgico do Hospital Universitário Cajuru. A seção 4 mostra como foi executado o projeto de melhoria no atual centro cirúrgico, seu modelo de simulação e os resultados para validação do modelo. A seção 5 descreve os cenários propostos, os modelos desenvolvidos e os resultados experimentais obtidos. Nesta seção, faz-se também uma comparação dos cinco cenários analisados. A seção 6 traz alguns comentários finais e faz algumas sugestões para trabalhos futuros. 275


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2. SIMULAÇÃO EM INSTITUIÇÕES HOSPITALARES E CENTROS CIRÚRGICOS O uso da simulação no setor hospitalar ainda é modesto, entretanto, alguns trabalhos já relatam os sucessos e benefícios dessa tecnologia neste setor. Perdoná et al. (2003), por exemplo, aplicaram simulação para estimar a ocupação de recursos, o dimensionamento de filas e tempos produtivos. Borba e Rodrigues (1998a e 1998b) apresentam uma pesquisa realizada com os hospitais da região metropolitana de Porto Alegre, onde se buscou observar o conhecimento e o interesse dos hospitais na ferramenta. Neste foi constatado que 82% dos entrevistados já tinham ouvido algo sobre simulação e, quando questionados sobre quais seriam os benefícios sobre o seu uso, os mais citados foram: • Melhor alocação de recursos. • Agilizar serviços e tomada de decisão. • Melhorar a qualidade do atendimento. • Traçar alternativas para a resolução de problemas. • Análise de investimentos. • Redução de desperdícios e gastos desnecessários. • Identificação de restrições no sistema. Sanches et al. (2000) afirmam que a simulação pode auxiliar pelo menos quatro áreas no contexto hospitalar: previsão de demanda (volume de pacientes a serem atendidos), análise de padrão de desempenho, dimensionamento de recursos (layout, número de salas, equipamentos) e dimensionamento de equipes de atendimento. Como os departamentos de atendimento de emergência dos hospitais trabalham normalmente com uma quantidade limitada de recursos, tanto de pessoal como de equipamentos e materiais, o tempo de espera e o tempo que o paciente permanece no sistema são elevados (MILLER et al., 2003) – a simulação pode auxiliar hospitais a melhorar a utilização dos recursos de forma a minimizar tais tempos. Osidach e Fu (2003) utilizaram simulação para determinar qual layout e composição de equipe de atendimento apresentaria os maiores benefícios e os menores custos para uma central móvel de exames que atua no controle e prevenção de doenças e saúde dental nos Estados Unidos. Foram testadas seis combinações de cenários, variando-se a quantidade de técnicos de saúde e a quantidade de pacientes atendidos por técnico. Experimentos de simulação mostraram que a configuração ótima deveria utilizar três técnicos, com média de sete atendimentos por técnico. De acordo com Brady (2003), após o atentado terrorista de 11 de setembro, verificou-se a necessidade de se elaborar um plano de atendimento às vítimas desse tipo de incidente. 276

Construiu-se um modelo de simulação que utiliza como variáveis de entrada a hora da ocorrência, a localização, o número de pessoas diretamente afetadas e o efeito de latência (um atentado que utilize agentes químicos ou biológicos causará efeitos após a hora de ocorrência, diferentemente de uma explosão, que o efeito é imediato). De acordo com a combinação das variáveis de entrada, serão acionados diferentes planos de ação, que preveem acionamento de polícia, bombeiros, ambulâncias, locais para destino das vítimas, médicos, enfermeiros, equipamentos e materiais para cuidado das vítimas, etc. Blasak et al. (2003) utilizaram simulação computacional com o objetivo de reduzir o tempo de permanência de pacientes na unidade de emergência do Rush North Shore Medical Center e analisar os requisitos para melhorar a interação entre a unidade de emergência e a UTI. As sugestões existentes como alternativas de melhoria seriam: designar uma enfermeira dedicada a efetuar a triagem dos pacientes admitidos na unidade de emergência, informar a unidade de emergência imediatamente quando um leito de UTI está liberado e ampliar a quantidade de leitos na UTI. As alternativas foram testadas no modelo, e como conclusão verificou-se que a redução do tempo de permanência do paciente na unidade de emergência poderia ser alcançada adotando-se determinadas medidas. Barnes e Quiason (1997) relatam que no University Hospital and Medical Center at Stony Brook (New York, EUA), a simulação foi usada na remodelagem do setor de atendimento a procedimentos pré-operatórios. Este setor é responsável por efetuar exames em pacientes que foram indicados por seus médicos para sofrerem uma intervenção cirúrgica. A simulação foi indicada para esse caso devido ao potencial impacto de redução de custos na qualidade do serviço a ser prestado ao paciente e à dúvida existente na especificação do projeto. Através da simulação, pôde-se identificar o cenário com os melhores resultados de custo e qualidade. No Brigham and Women´s Hospital (Boston, EUA), Lowery e Davis (1999) utilizaram simulação para determinar a quantidade de salas de cirurgia necessárias para atender à crescente demanda da instituição. Inicialmente o projeto previa a necessidade de 32 salas de cirurgia. Após a validação do cenário existente, foram propostos novos cenários onde se concluiu que 30 salas seriam suficientes para atender ao fluxo da organização. Ramis et al. (2001) apresentaram um estudo realizado na Universidad Del Bio-Bio (Concepción,Chile), onde foi utilizada simulação para avaliar diferentes alternativas para a implantação de um Centro Cirúrgico (CC) ambulatorial destinado à realização de pequenos procedimentos, o que


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reduz o fluxo de pacientes no hospital. Como conclusão desse trabalho, obteve-se um cenário otimizado onde se definiu: um novo layout a ser implantado, o número de leitos para a preparação dos pacientes e o número de leitos para a recuperação após o procedimento. Denton et al. (2006) também fizeram um trabalho interessante sobre o agendamento em um centro cirúrgico da Mayo Clinic (Rochester, EUA). Neste trabalho eles apresentaram um modelo de simulação para um centro cirúrgico com múltiplas salas de cirurgia. Descreveram alguns dos desafios inerentes aos problemas de agendamento e ilustraram como o modelo pode ser usado como uma ferramenta de auxílio para melhorar a tomada de decisões estratégicas e operacionais relacionadas à execução de procedimentos cirúrgicos. Cardoen e Demeuleneester (2007) analisaram trajetórias de pacientes usando caminhos clínicos e agregaram esses fatores em um modelo de simulação discreta. Este modelo ajuda a gerência de uma instituição hospitalar a avaliar e melhorar importantes indicadores de desempenho, tanto para o paciente quanto para o hospital, através da condução de análises de sensibilidade. Estudos de caso foram realizados em dois grandes hospitais em Antwerp e Leuven (Bélgica).

ciona ininterruptamente para o atendimento às cirurgias de emergência. Já as cirurgias eletivas são agendadas de segunda a sexta-feira em três turnos e nos sábados em dois turnos. Devido a essa regulamentação, constata-se que nos feriados, finais de semana e após as 22 horas, a taxa de ocupação do CC não é crítica, pois não ocorre a concorrência de cirurgias eletivas. Por estes motivos, considerou-se somente o movimento em dias úteis e no período das seis horas da manhã até às 22 horas. Nesse período são realizadas aproximadamente 80% do total de cirurgias.

I

nvestimentos precisam ser acompanhados de técnica e método adequados, fazendo uso, por exemplo, de ferramentas que possam avaliar com eficiência o retorno dos recursos aplicados.

3. ENTENDENDO O ATO CIRÚRGICO E AS PROPOSTAS DE MELHORIAS PARA O CCHUC Um procedimento operatório executado no CCHUC divide-se em seis processos básicos: agendamento, programação, pré-operatório, trans-operatório, pós-operatório e encaminhamento (HUC, 2002). Entretanto, este projeto concentra-se apenas no “trans-operatório” (Figura 1) por ser o processo chave no centro, incluindo o ato cirúrgico propriamente dito, e por ser o processo que pode trazer os maiores benefícios à instituição. Com o intuito de atender à crescente demanda, já existe no HUC um projeto em andamento que prevê a ampliação do número de salas de cirurgia e também a alteração no fluxo das atividades realizadas dentro destas salas. Este projeto faz uma estimativa mais precisa da capacidade de atendimento e do novo layout que o CCHUC deverá adotar, bem como a verificação de alternativas que poderiam aumentar a capacidade de atendimento com o menor investimento, frente a diferentes níveis de aumento de demanda. De acordo com HUC (2001), o Centro Cirúrgico fun-

As cirurgias de emergência possuem prioridade em relação às cirurgias eletivas. Normalmente a sala número um é reservada para esse tipo de cirurgia, porém tendo disponibilidade ela também pode ser utilizada para cirurgias eletivas. Caso a sala um esteja ocupada e for necessário executar um procedimento de emergência, será utilizada qualquer outra sala que esteja liberada. Se as demais salas estiverem reservadas para cirurgias eletivas, verifica-se qual oferece menor impacto para que seja atrasada ou reagendada para uma outra data. O fluxo de atendimento ao paciente para execução do procedimento cirúrgico é composto das seguintes etapas (subprocessos): • Preparação: esta etapa começa com a recepção do paciente na sala de cirurgia. • Anestesia: o tempo desta etapa é computado a partir do momento em que se inicia a indução anestésica até o momento do início do procedimento cirúrgico. • Cirurgia: nesta etapa registra-se o tempo da intervenção cirúrgica. • Término da anestesia: essa fase compreende o momento em que o cirurgião encerra o seu procedimento, até o momento em que cessa a indução anestésica e o paciente é extubado. • Alta de sala: após a conclusão da anestesia o paciente recebe acompanhamento, ainda na sala de cirurgia, até que ocorra o retorno dos reflexos, quando então ele é retirado da sala operatória. • Limpeza: este é um procedimento que não afeta diretamente o paciente, porém é computado no modelo por afetar diretamente o tempo de ocupação da sala. 277


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4. MODELAGEM E ANÁLISE DO ATUAL CENTRO CIRÚRGICO As informações referentes aos procedimentos cirúrgicos foram obtidas através de registros em arquivos, documentação administrativa e entrevistas com funcionários do centro no período de 1 de fevereiro a 31 de março de 2004. Especificamente, foram coletadas as seguintes informações sobre cada procedimento cirúrgico: (a) Sala utilizada; (b) Data do procedimento; (c) Tipo de cirurgia (emergência ou eletiva); (d) Especialidade (geral, neurologia, ortopedia e outros); (e)

Hora de entrada do paciente na sala; (f) Hora do início da anestesia; (g) Hora do início da cirurgia; (h) Hora do término da cirurgia; (i) Hora do término da anestesia; e (j) Hora da saída do paciente da sala. 4.1 Análise dos dados coletados A primeira variável a ser analisada refere-se à distribuição do intervalo de tempo entre chegadas de pacientes ao centro cirúrgico. Considerou-se o uso do centro cirúrgico somente nos dias úteis e no período das 6:00 às 22:00 horas por ser o horário mais crítico, ocorrendo tanto cirurgias de emer-

Início Verificar o material necessário à cirurgia

Material está disponível?

N

Suspender a cirurgia ou providenciar o material

S Receber o cliente na sala de cirurgia Comunicar anestesista e equipe cirúrgica

Equipe cirúrgica presente?

N

Solicitar equipe cirúrgica

S Prestar atendimento às equipes Realizar ato anestésico

Houve intercorrências?

N

Necessita de exames?

Realizar ato cirúrgico

N

S Suspender a cirurgia

Encaminhar cliente para: RPAI, UTI ou necrotério

Fim

Figura 1: Processo trans-operatório. Fonte: HUC, 2002

278

S

Solicitar ao S.A.D.T.


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gências quanto eletivas. Cabe ressaltar que entre o horário de 19:00 e 22:00 horas são realizadas apenas 7% do total de cirurgias eletivas e 17% do total de cirurgias de emergência. A Tabela 1 mostra os tempos médios e semi-intervalos de confiança do tempo entre chegadas de pacientes. Tabela 1: Tempo entre chegadas de pacientes. Tipo de cirurgia

Média (min)

Semi-Intervalo (min)

Eletiva

70,38

7,00

Emergência

126,36

12,81

Ao se analisar o intervalo de confiança (IC) calculado para cada tipo de cirurgia (Figura 2), percebe-se que eles não se sobrepõem e, portanto, tais variáveis devem ser tratadas como distintas (terão distribuições probabilísticas próprias).

Figura 2: ICs para o tempo entre chegadas de pacientes.

Considerando que os procedimentos cirúrgicos são diferenciados de acordo com a especialidade, é importante analisar se existe variação de tempo de execução para cada especialidade médica considerada. As especialidades com maior ocorrência nas amostras são, em ordem decrescente, a especialidade de ortopedia (57%), cirurgia geral (34%) e neurologia (3%). As outras dez especialidades somadas correspondem aos aproximados 6% restantes. Diante dessa constatação, o conjunto de dados obtido foi agrupado considerando a especialidade como característica comum às seguintes amostras: cirurgia geral, neurologia, ortopedia e outras. Definidas as amostras, deve-se, então, calcular os intervalos de confiança para cada atividade executada no fluxo de atendimento. A Tabela 2 apresenta os valores dos ICs dos tempos de execução das atividades executadas na sala de cirurgia calculados para as especialidades e o tempo total de ocupação de sala também

para as especialidades estudadas. A Figura 3 apresenta os respectivos gráficos. Analisando-se os valores referentes aos intervalos de confiança dos tempos das atividades do fluxo de atendimento do centro cirúrgico, percebe-se que em sua maioria os intervalos coincidem, não se podendo afirmar com 95% de certeza que eles sejam diferentes (adotou-se 95% como nível de confiança neste projeto). A única exceção foi a etapa de anestesia, em que se obtiverem intervalos de confiança diferentes para as especialidades de cirurgia geral e ortopedia. Entretanto, também se pode constatar que a especialidade de neurologia e o agrupamento denominado “outras” possuem um intervalo bastante amplo. A amplitude do intervalo é inversamente proporcional ao tamanho da amostra, ou seja, quanto menor a amostra, maiores serão os limites do intervalo de confiança. Assim, julga-se necessário manter as amostras agrupadas por especialidade, visando dar maior representatividade ao modelo de simulação. 4.2 Construindo modelo do cenário atual Para o tempo entre chegada de pacientes para realização de cirurgias, obteve-se tanto para cirurgias eletivas quanto de emergência a distribuição exponencial com média 70,4 minutos e 126 minutos, respectivamente. É importante salientar que todas as análises estatísticas, de modelagem e de simulação foram feitas no software Arena e seu respectivo analisador de dados (Input Analyzer). A distribuição das quantidades de cirurgias foi efetuada de acordo com o percentual de cada uma pelo total de cirurgias que entram no sistema. Essa distribuição é diferenciada de acordo com o tipo de cirurgia e está apresentada na Tabela 3.

O

modelo de simulação do cenário atual precisa ser validado para que se tenha confiabilidade nos resultados experimentais e, na sequência, possa-se fazer conjecturações e análises em cenários alternativos. A variável de tempo de uso das salas cirúrgicas por especialidade compreende os tempos de execução das tarefas desde a entrada do paciente na sala de cirurgia até o momento em que ocorre a limpeza desta, quando, então, a sala estará disponível para a realização de um novo procedimento cirúrgico. Não existe, para cada execução, o registro dos tempos gastos na tarefa de limpeza das salas. Como esta atividade não possui variação dependente do tipo nem da especiali279


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dade da cirurgia, considerou-se, com base na experiência dos executores dessa atividade, como sendo uniformemente distribuído entre 10 e 30 minutos. Analisando-se os tempos de execução das demais etapas do fluxo de atividades da sala operatória, obtiverem-se as distribuições de probabilidade apresentadas na Tabela 4. (Cabe lembrar que se utilizou o software estatístico Input Analyzer, o qual utiliza o erro Quadrático e os testes Chi Quadrado e Kolmogorov-Smirnov (KS) para encontrar a melhor distribuição probabilística para os dados de entrada.) A Figura 4 mostra o modelo de simulação do cenário atual criado no software Arena (detalhes específicos de implementação não foram descritos para manter a concisão do artigo). 4.3 Significância e comparações de desempenho Para realização dos experimentos de simulação é importante definir o número de replicações necessárias com base em um determinado nível de confiança (adotou-se 95%). Para tal, usou-se um método baseado em Law e Kelton (1991) o qual mostrou que pelo menos 95 réplicas deveriam ser usadas. Adotou-se então 100 replicações. As variáveis (indicadores de desempenho) utilizadas nas análises serão: a. Tempo de espera por sala cirúrgica – cirurgia de emergência (KPI1). b. Quantidade de cirurgias na fila de espera – cirurgia de emergência (KPI2). c. Tempo total do paciente no sistema – CCHUC (KPI3).

d. Taxa de ocupação média das salas de cirurgia (ocupação do CCHU): percentual do tempo em que cada sala de cirurgia permanece ocupada por um procedimento cirúrgico (KPI4). e. Percentual de cirurgias de emergência realizadas por dia (das 6:00 às 22:00) – KPI5. f. Percentual de cirurgias eletivas realizadas por dia (das 6:00 às 22:00) – KPI6. As comparações de desempenho entre os cenários serão feitas através de teste de hipóteses. Os resultados serão obtidos na forma de intervalos de confiança: IC = média ± semi-intervalo. Quando há sobreposição dos intervalos de uma grandeza, diz-se que não se pode afirmar que há diferença entre elas, dentro de um nível de confiança de 95%. Caso contrário, pode-se afirmar com 95% de certeza que as grandezas são diferentes. O primeiro nível hierárquico do modelo no Arena está mostrado na Figura 5.

Tabela 3: Distribuição de cirurgias por especialidade Especialidade

Cirurgia eletiva

Cirurgia de emergência

Cirurgia Geral

32%

35%

Neurologia

3%

3%

Ortopedia

58%

57%

Outros

7%

5%

Tabela 2: Tempos de uso de sala (em minutos). Atividade

Preparação

Especialidade Cirurgia Geral

Neurologia

Ortopedia

Outras

Média

10,97

9,56

10,16

8,10

Semi-intervalo

1,72

4,92

1,18

3,19

Anestesia

Média

20,42

34,09

27,55

21,62

Semi-intervalo

1,71

13,22

2,40

4,22

Cirurgia

Média

86,25

154,78

89,39

76,31

Semi-intervalo

8,04

76,19

6,54

24,03

Término de anestesia

Média

14,24

10,77

11,34

10,54

Semi-intervalo

2,80

2,42

1,14

3,27

Alta de sala

Média

13,64

13,57

17,35

17,74

Semi-intervalo

2,54

8,32

9,44

14,59

131,40

207,17

139,29

117,88

9,27

79,88

8,93

29,60

Total

Média Semi-intervalo

280


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4.4 Validação do modelo de simulação do cenário atual O modelo de simulação do cenário (situação) atual precisa ser validado para que se tenha confiabilidade nos resultados experimentais e, na sequência, possa-se fazer conjecturações e análises em cenários alternativos. A Tabela 5 apresenta os valores obtidos para a quantidade média de cirurgias verificadas no cenário real, calculado diretamente dos dados coletados, e os valores calculados referentes ao número de cirurgias (cenário simulado). Efetuando-se a análise comparativa dos intervalos de confiança para a variável quantidade de cirurgias por tipo, constata-se que os intervalos de confiança são coincidentes, tanto para as cirurgias eletivas quanto para as cirurgias de emergência. Pode-se então concluir que, com 95% de certeza, o modelo de simulação representa o cenário real, pois gera resultados compatíveis com os resultados reais atuais

do centro cirúrgico. Fez-se também uma análise (validação) considerando-se a quantidade média de cirurgias realizadas, conforme especialidade médica. Novamente, conforme ilustrado na Figura 6, o modelo de simulação criado representa significativamente o atual centro cirúrgico. Efetuando-se a análise comparativa dos intervalos de confiança para a variável quantidade de cirurgias por especialidade, constata-se que os intervalos de confiança são novamente coincidentes, creditando-se, mais uma vez, a confiabilidade ao modelo simulado construído. A Figura 7 apresenta os valores obtidos para o tempo médio de ocupação da sala de cirurgia por especialidade médica. A última variável a ser analisada é a taxa de ocupação das salas de cirurgia. A Figura 8 apresenta os valores obtidos pela simulação e os valores coletados (reais). Constata-se que em cinco salas de cirurgia os intervalos de confiança

Atividade de preparação (a)

Atividade de anestesia (b)

Tempo (min)

Atividade de cirurgia (c)

Tempo (min)

Atividade de término da anestesia (d)

Tempo (min)

Atividade de alta de sala (e)

Tempo (min)

Tempo de uso da sala de cirurgia (f)

Tempo (min)

Tempo (min)

Figura 3: Tempo médio de uso de sala.

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são coincidentes. Apenas no intervalo de confiança da taxa de ocupação da sala 1 não ocorre coincidência entre os valores obtidos no cenário real e no cenário simulado. Cabe, então, efetuar uma análise mais detalhada da situação específica da sala 1.

N

regra lógica para a ordem de utilização das salas. Situação semelhante é relatada por Stroparo (2005), que constatou existir distorção entre a taxa de ocupação por especialidade médica do cenário real e do modelo simulado. Analisando-se as taxas de ocupação, considerando-se as salas de cirurgia como um conjunto único (CCHUC), tanto para o modelo real como para o modelo simulado, obtêm-se os valores apresentados na Figura 9. Nesta pode-se constatar a sobreposição dos intervalos de confiança, não se podendo afirmar, portanto, que há diferença significativa entre a taxa de ocupação do cenário real com o seu respectivo cenário simulado. Com base na comparação e análise de todas as variáveis apresentadas, conclui-se que o modelo de simulação oferece credibilidade e é um modelo representativo do sistema real, isto é, o modelo criado pôde ser validado.

o modelo de simulação é fácil aumentar a frequência de chegada dos pacientes e, desta forma, estimar o impacto que o aumento de demanda trará ao desempenho do centro cirúrgico. O uso da sala de cirurgia 1, a princípio, destina-se aos procedimentos de emergência, porém o que se verifica é que esse tipo de procedimento tem prioridade no uso de qualquer sala de cirurgia e, portanto, essa norma não é necessariamente seguida. Consequentemente, não se consegue estipular uma

Tabela 4: Expressões utilizadas nas atividades. Atividade

Especialidade

Expressão (minutos)

Número de dados usados

Erro quadrático

Valor p correspondente (p/ Chi Quadrado)

Preparação

Cirurgia Geral

GAMMA (11.7, 1.35)

191

0,042

< 0,005

Neurologia (*)

TRIANGULAR (4.5, 10, 40.5)

13

0,142

N/D

Ortopedia

0.5 + LOGNORMAL (14.8, 14.3)

315

0,166

< 0,005

Outras

0.5 + ERLANG (7.85, 2)

26

0,151

< 0,005

Cirurgia Geral

1.5 + ERLANG (9.46, 2)

257

0.114

< 0,005

Neurologia

TRIANGULAR (10, 20, 110)

22

0.010

< 0,005

Ortopedia

0.999 + ERLANG (13.3, 2)

430

0.013

< 0,005

Outras

NORMAL (21.6, 14.4)

48

0.144

< 0,005

Cirurgia Geral

10 + GAMMA (56.3, 1.35)

275

0,002

0,109

Neurologia

TRIANGULAR (20, 105, 870)

23

0.235

< 0,005

Ortopedia

5 + GAMMA (54.7, 1.54)

470

0.003

< 0,005

Outras

10 + LOGNORMAL (154, 772)

52

0,013

< 0,005

Cirurgia Geral

5 + WEIBULL (3.31, 0.337)

165

0,003

< 0,005

Neurologia

TRIANGULAR (4.5, 10, 15.5)

13

0,316

N/D

Ortopedia

1.5 + LOGNORMAL (9.55, 8.15)

298

0,234

< 0,005

Outras

4.5 + 36 * BETA (0.259, 1.29)

28

0,141

< 0,005

Cirurgia Geral

5 + WEIBULL (2.81, 0.319)

132

0,001

< 0,005

Neurologia

TRIANGULAR (4.5, 5, 30.5)

7

0,184

N/D

Ortopedia

4 + WEIBULL (8.41, 0.672)

199

0,000

< 0,005

Outras

5 + EXPONENCIAL (12.7)

23

0,008

< 0,005

Anestesia

Cirurgia

Término de anestesia

Alta de sala

282


Joaquim, E. D.; Vieira, G. E. Modelagem e análise de um novo centro cirúrgico para um hospital em crescimento: uma abordagem baseada em simulação. Produção, v. 19, n. 2, p. 274-291, 2009

4.5 Simulando aumento de demanda (cirurgias) no centro cirúrgico No modelo de simulação desenvolvido é fácil aumentar a frequência de chegada dos pacientes no centro cirúrgico e, desta forma, estimar o impacto que o aumento de demanda trará ao desempenho do centro, isto é, na ocupação das salas cirúrgicas, nos tempos de utilização e nas quantidades de cirurgias realizadas por dia. O cenário atual possui um tempo entre ocorrências de cirurgias que segue distribuição exponencial com média de 126 minutos (EXPO(126)) para as cirurgias de emergência e EXPO (70,4) minutos para as cirurgias eletivas.

Para se analisar o aumento de demanda no centro deve-se reduzir o intervalo de tempo entre ocorrência de cirurgias. Para isto, inclui-se um fator α na expressão do tempo Tabela 5: Quantidade de cirurgias realizadas. Tipo de cirurgia

Cenário

Média

Semi-intervalo

Eletiva

Real

10,84

1,99

Simulado

12,00

0,69

Real

8,23

1,33

Simulado

7,00

0,51

Emergência

Figura 4: O modelo de simulação do cenário atual do CCHUC.

Figura 5: 1o Nível hierárquico do modelo geral de simulação. 283


Joaquim, E. D.; Vieira, G. E. Modelagem e análise de um novo centro cirúrgico para um hospital em crescimento: uma abordagem baseada em simulação. Produção, v. 19, n. 2, p. 274-291, 2009

entre cirurgias, passando-se a ter α.EXPO(126) para o tempo entre cirurgias de emergência e α.EXPO(70,4) para o tempo entre cirurgias eletivas. A taxa de chegadas de cirurgias de emergência é então 1/ α.EXPO(126), assim, para se analisar um aumento de 50% de demanda, a nova taxa passará a ser [(1+0,50)*1/ EXPO(126)] =1/0,667* EXPO(126) → α = 0,6667.

Desta forma, os quatro padrões de demanda analisados

são representados como: 1. Demanda no ano de 2004: α = 1; 2. Aumento de 50% de demanda: α = 0,6667. 3. Aumento de 100% (dobro) na demanda: α = 0,5. 4. Aumento de 200% na demanda: α = 0,3333. Os resultados das simulações (indicadores de desempenho ou KPIs) da configuração atual do centro cirúrgico para os quatro padrões de demanda considerados estão dados na Tabela 6.

Cirurgia geral (a)

Neurologia (b)

Ortopedia (c)

Outras cirurgias (d)

Figura 6: Quantidade de cirurgias realizadas por especialidade.

Cirurgia geral (a)

Tempo (min)

Ortopedia (c)

Tempo (min)

Neurologia (b)

Tempo (min)

Outras cirurgias (d)

Tempo (min)

Figura 7: Tempo de ocupação de sala por especialidade médica. 284


Joaquim, E. D.; Vieira, G. E. Modelagem e análise de um novo centro cirúrgico para um hospital em crescimento: uma abordagem baseada em simulação. Produção, v. 19, n. 2, p. 274-291, 2009

No padrão de demanda de 2004, não se espera muito tempo por uma sala cirúrgica quando ocorre uma cirurgia de emergência (KPI1) – cerca de 5,37 minutos depois que o paciente entrou no CC. Também praticamente não há cirurgia de emergência em espera (KPI2): 0,06. A taxa de ocupação do CCHUC (KPI4) crescerá de 56% para 89% quando a demanda for o dobro da demanda de 2004. Nesta situação, os enfermeiros, anestesistas e médicos estarão trabalhando praticamente sem parar, em ritmo frenético, durante as oito horas do seu expediente. Isto certamente não será bom para eles, mas, principalmente, não será bom para os pacientes. Assim, a situação fica ruim com um aumento de 50% na demanda e inaceitável com mais de 100% de acréscimo.

5. MODELAGEM E ANÁLISE DE NOVOS CENÁRIOS PARA O CCHUC Quatro novos cenários para o CCHUC são propostos e

analisados por meio de simulação computacional (Seção 1). Esses cenários são criados a partir de duas alterações possíveis de serem efetuadas no atual sistema: • Alteração no fluxo das atividades internas do CC, e • Ampliação na quantidade de salas operatórias. Devido aos custos financeiros, o hospital considera inicialmente somente a possibilidade de implementação dos cenários I, II ou IV. 5.1 Alterando-se o fluxo de atividades A reestruturação nas etapas do fluxo de atendimento poderá ser feita através da criação de um ambiente com a instalação de leitos para a realização de atividades que na configuração atual são executadas dentro da sala de cirurgia, mas que podem ser facilmente feitas em outro local. Especificamente, considera-se que as atividades de preparação, anestesia e de alta da sala cirúrgica podem ir para outra área do centro cirúrgico, desocupando as instalações de uma sala

Sala 1 (a)

Sala 2 (b)

Sala 3 (c)

Sala 4 (d)

Sala 5 (e)

Sala 6 (f)

Figura 8: Taxa de ocupação das salas de cirurgia do HUC.

285


Joaquim, E. D.; Vieira, G. E. Modelagem e análise de um novo centro cirúrgico para um hospital em crescimento: uma abordagem baseada em simulação. Produção, v. 19, n. 2, p. 274-291, 2009

de cirurgia. Permanecerão as atividades de cirurgia e término da anestesia como as únicas atividades a serem realizadas dentro da sala de cirurgia. Essas novas salas têm um custo financeiro de implantação muito menor que o custo de implantação de uma sala de cirurgia, e por isso esta ideia é bastante atraente à direção do hospital, além de ser de fácil e rápida implementação. A capacidade de atendimento dessas novas salas é traduzida pelo número de leitos instalados. No total, o projeto prevê a instalação de quatro leitos na sala de indução anestésica, onde serão efetuadas as atividades de preparação e anestesia, e mais seis leitos na sala de RPAI, onde será realizada a fase de alta. Permanecerá computada no tempo de ocupação da sala de cirurgia a atividade de limpeza, sendo que o término dessa etapa continuará definindo a liberação da sala para a utilização por um novo procedimento. Em relação ao modelo original, algumas diferenças básicas serão: a. Transferência do paciente da sala de indução anestésica para a sala de cirurgia. b. Transferência do paciente para a sala de recuperação, quando se conclui o término da anestesia. c. A atividade de limpeza poderá ser efetuada em paralelo com a atividade de alta de sala, pois nesse momento o paciente já deixou a sala de cirurgia.

Figura 9: Taxa de ocupação do CCHUC.

A enfermeira chefe do CCHUC estimou que a duração de cada uma das atividades a e b, acima descritas, deve ficar em torno de três minutos, nunca sendo inferior a um minuto e nem superior a cinco minutos. De acordo com Freitas Filho (2001), a distribuição teórica de probabilidade mais indicada para esse caso é a distribuição triangular, pois existe a estimativa do valor mais provável e se conhecem o limite inferior e o superior. Consequentemente, a expressão a ser utilizada é triangular – TRIA (1, 3, 5) minutos. O modelo de simulação para os cenários com mudança no fluxo (II e IV) é dado na Figura 10. 5.2 Resultados das simulações – identificação das melhores alternativas para o CCHUC A análise comparativa é feita com os dados de 2004, sem perder de vista o aumento de demanda já ocorrido e que ocorrerá ainda mais nesses próximos anos. Portanto, para fins de comparação, considera-se a situação (desempenho) de 2004 como referência, mesmo porque os indicadores neste ano eram de fato bons e foram disponíveis ao estudo. Sendo assim, um determinado indicador será considerado bom se seu valor estiver próximo (ou for melhor que) ao valor de comparação (2004). A Tabela 7 resume os resultados das simulações para todos os cenários analisados frente aos diferentes padrões de demanda possíveis. Portanto, qual deve ser a melhor alteração no centro cirúrgico de forma a se ter o tempo de espera por sala cirúrgica em torno de 5,4 minutos (como era em 2004)? Para hoje (α=0,667), a resposta seria implantar a configuração II, III ou IV. Entretanto, um projeto de expansão hospitalar deve considerar um aumento de demanda para, pelo menos, três anos à frente. Desta forma, deve-se pensar em um aumento de demanda total de, pelo menos, 100% a partir de 2004 (aprox. 50% a partir de 2007). Pensando-se em uma estimativa de demanda para 2010/2011, as análises comparativas serão feitas principalmente considerando-se um aumento de 100% na demanda. De todos os cenários propostos, é claro que o cenário III

Tabela 6: Desempenho da configuração do atual CCHUC frente aos diferentes padrões de demanda.

286

α = 1,0

α = 0,667

α = 0,5

α = 0,333

KPI1

5,37 ± 1,73

18,06 ± 2,37

28,89 ± 2,48

53,98 ± 5,39

KPI2

0,06 ± 0,02

0,26 ± 0,04

0,52 ± 0,05

1,46 ± 0,21

KPI3

173,01 ± 4,10

202,24 ± 7,69

240,37 ± 7,39

266,45 ± 6,97

KPI4

0,56 ± 0,19

0,77 ± 0,18

0,89 ± 0,14

0,95 ± 0,06

KPI5

91,95

86,49

84,52

78,31

KPI6

86,08

76,92

55,68

30,55


Joaquim, E. D.; Vieira, G. E. Modelagem e análise de um novo centro cirúrgico para um hospital em crescimento: uma abordagem baseada em simulação. Produção, v. 19, n. 2, p. 274-291, 2009

(aumento do número de salas cirúrgicas de seis para dez com alteração no fluxo) dará as melhores respostas. Entretanto, como anteriormente dito, este cenário requererá os maiores investimentos financeiros. Portanto, o que se deseja realmente é saber qual dentre os cenários I, II e IV melhor atenderá o aumento de 100% na demanda. Começando pelo indicador de desempenho mais importante, tempo de espera por sala cirúrgica, a situação no cenário atual (i.é, em 2004) é razoável, tendo o paciente que esperar em torno de 5,4 minutos para iniciar seu procedimento cirúrgico. É importante lembrar que outros tempos de atraso ou espera (registro de entrada, triagem, etc.) não estão incorporados neste tempo. Imaginando-se que há um aumento de demanda em torno de 15 a 20% ao ano, de 2004 até hoje já deve ter ocorrido cerca de 50% de aumento. Se nenhuma melhoria foi feita desde 2004, um paciente já deve esperarar aproximadamente 18 minutos para iniciar seu procedimento cirúrgico. Ainda no que diz repeito ao tempo de espera por sala cirúrgica, as melhores alternativas de implantação continuam sendo as propostas II, III e IV, entretanto, o cenário IV apresenta um tempo de espera 24% menor que o cenário II. Pode-se, também, excluir da comparação o cenário I, pois para o aumento de 100% na demanda, o tempo de espera por sala cirúrgica passa a ser de 23 minutos, considerado inaceitável pelo CCHUC. Para um aumento de demanda de 200%, i.é, demanda esperada em 2015/20016, o único cenário que traria um bom desempenho ao centro (com relação ao tempo de espera por sala cirúrgica) seria o cenário III. O cenário proposto III também manteria o tempo médio total de execução de cirurgia (eletivas e de emergência) próximo aos valores atuais. Nenhum outro indicador, de nenhum outro cenário proposto, estará bom nessa data. Sugere-se, portanto, que o hospital faça um planejamento estratégico para 2015/2016 considerando outras ampliações – possivelmente um número bem maior de salas de cirurgia aliado ao rearranjo dos fluxos. Com relação ao KPI2 (Número de cirurgias de emergência na fila de espera por sala cirúrgica), estatisticamente não há diferença significativa entre o cenário II e o cenário IV. Entretanto, o cenário II responde de forma semelhante ao atual cenário, enquanto que o Cenário IV responde pior que o cenário atual (possivelmente haverá maior fila de espera. Mas veja que os valores, em qualquer um dos cenários, é próximo a zero (0,01 e 0,02), então, na prática, praticamente não haverá fila em qualquer um desses dois cenários.) . Com relação ao tempo médio total de execução de cirurgia (eletivas e de emergência) – KPI3 – o cenário IV responde

muito melhor que o cenário II e muito melhor que a atual situação (2004). O tempo médio de execução de cirurgia neste cenário é inclusive estatisticamente semelhante ao desempenho do cenário III (que, como dito anteriormente, é o melhor possível). Com relação à ocupação média das salas de cirurgia (KPI4), no cenário atual (2004) as salas estão ocupadas 56% do tempo. Com o aumento de 100% na demanda, esta ocupação passaria a ser de 89%, inaceitável na prática. No cenário II proposto, a ocupação média deve ficar em torno de 74% e no cenário IV ficará em aproximadamente 65%. Novamente o cenário IV apresenta uma resposta muito melhor que a do cenário II e mais próxima à situação atual. Isto se deve simplesmente ao fato de que algumas atividades saíram da sala cirúrgica e foram para as salas RPAI.

N

enhum dos trabalhos pesquisados que utilizaram simulação computacional no setor hospitalar considerou tantos indicadores de desempenho nas suas análises. Os indicadores “% de cirurgias de emergências iniciadas e terminadas no intervalo 6:00-22:00” (KPI5) e “% de cirurgias eletivas iniciadas e terminadas no intervalo 6:00-22:00” (KPI6) não são indicadores tão importantes quanto os dois primeiros examindados, mas merecem algumas observações. Quanto mais cirurgias terminam até às 22:00 horas, melhor para os que trabalham no hospital, principalmente para os médicos, os quais muitas vezes precisam de ir para outros consultórios e hospitais. Para as consultas agendadas, também é importante que se possa ter o procedimento cirúrgico no horário e duração esperados. Claro que as cirurgias de emergência têm preferência (e isso foi considerado nos modelos de simulação), mas às vezes cirurgias eletivas precisam ser reagendadas ou são atrasadas. Mas se estas puderem iniciar e terminar no prazo esperado, melhor para todos. O atual cenário apresenta 92% das cirurgias de emergência iniciando e terminando até às 22 horas. Nos cenários II e IV, esses valores são um pouco menores (87% e 88%, respectivamente). Novamente o cenário IV responde melhor que o cenário II, de forma parecida ao cenário III. O cenário I novamente gerou a pior resposta dentre os cenários propostos. O cenário atual apresenta 86% das cirurgias agendadas (eletivas) terminando antes das 22 horas; no cenário II serão 82%; e no cenário IV, quase 85%. Novamente, o cenário IV, 287


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responde melhor que o cenário II, ficando próximo inclusive do cenário III. Vê-se, portanto, que o cenário IV gera um melhor desempenho com relação a todos os indicadores de desempenho do centro cirúrgico. Mesmo com um custo de implantação um pouco maior que o custo necessário para o cenário II, o hospital deve restruturar as atividades internas dos procedimentos cirúrgicos e deve construir duas novas salas cirúrgicas (cenário IV) a fim de poder lidar eficientemente com o aumento de demanda esperado.

6. COMENTÁRIOS FINAIS E SUGESTÕES PARA TRABALHOS FUTUROS O Hospital Universitário Cajuru sabe que para mater a qualidade do serviço oferecido à comunidade da região precisa expandir rapidamente a capacidade do seu centro cirúrgico. Várias alternativas existem, mas, como em tudo, os recursos financeiros são limitados e devem ser investidos com sabedoria. Dentre as alternativas analisadas para melhoria do centro, considerou-se uma restruturação das atividades do procedi-

Figura 10: Modelo de simulação com alteração no fluxo

288


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mento cirúrgico e aumento do número de salas de cirurgia. A primeira alternativa basicamente tira de dentro da sala cirúrgica alguns procedimentos, transferindo-os para outras salas. Estas salas também requerem investimento, principalmente em leitos, mas são incomparavelmente menores que os necessários para construção de salas cirúrgicas. Com relação ao aumento do número de salas, o ideal seria se construir mais

quatro salas, mas, devido aos limitados recursos, talvez apenas duas salas sejam possíveis de ser adquiridas. Este projeto analisou os principais cenários de expansão que podem ser rapidamente aplicados no CCHUC. Para validação dos modelos de simulação desenvolvidos e para comparação de desempenho entre os diversos cenários considerados, utilizaram-se vários indicadores, tais como

Tabela 7: Desempenho do CCHUC frente aos diferentes padrões de demanda. Padrão de demanda Indicador de desempenho

Cenário

α = 1,0

α = 0,6667

α = 0,5

α = 0,3333

KPI1

Atual

5,37 ± 1,73

18,06 ± 2,37

28,89 ± 2,48

53,98 ± 5,39

Prop. I

1,05 ± 0,54

9,77 ± 2,14

23,26 ± 3,43

37,21 ± 2,21

KPI2

KPI3

KPI4

KPI5

KPI6

Prop. II

0±0

0,95 ± 0,43

4,85 ± 1,08

17,22 ± 1,60

Prop. III

0±0

0,13 ± 0,14

0,7 ± 0,30

4,49 ±0,82

Prop. IV

0,3 ± 0,33

1,57 ± 0,96

3,69 ± 0,96

14,91 ± 1,43

Atual

0,06 ± 0,02

0,26 ± 0,04

0,52 ± 0,05

1,46 ± 0,21

Prop. I

0,01 ± 0,01

0,13 ± 0,03

0,39 ± 0,06

0,87 ± 0,06

Prop. II

0±0

0,01 ± 0,01

0,09 ± 0,02

0,45 ± 0,05

Prop. III

0±0

0±0

0,01 ± 0,01

0,12 ± 0,02

Prop. IV

0±0

0,02 ± 0,01

0,07 ± 0,02

0,37 ± 0,04

Atual

173,01 ± 4,10

202,24 ± 7,69

240,37 ± 7,39

266,45 ± 6,97

Prop. I

159,9 ± 3,26

174,2 ± 4,94

195,88 ± 7,79

246,79 ± 7,96

Prop. II

168,86 ± 3,69

167,66 ± 2,86

177,22 ± 4,15

212,42 ± 6,24

Prop. III

160,61 ± 3,83

159,14 ± 2,93

163,96 ± 2,60

173,56 ± 3,96

Prop. IV

161,03 ± 4,10

163,51 ± 3,86

164,03 ± 3,36

199,23 ± 6,23

Atual

0,56 ± 0,19

0,77 ± 0,18

0,89 ± 0,14

0,95 ± 0,06

Prop. I

0,46 ± 0,11

0,67 ± 0,07

0,82 ± 0,04

0,92 ± 0,02

Prop. II

0,39 ± 0,14

0,56 ± 0,11

0,74 ± 0,06

0,91 ± 0,02

Prop. III

0,28 ± 0,13

0,40 ± 0,13

0,54 ± 0,10

0,73 ± 0,05

Prop. IV

0,35 ± 0,13

0,50 ± 0,11

0,65 ± 0,07

0,84 ± 0,03

Atual

91,95

86,49

84,52

78,31

Prop. I

91,96

87,55

84,65

78,18

Prop. II

91,96

87,65

86,6

82,81

Prop. III

92,00

89,61

88,06

84,17

Prop. IV

92,19

89,65

88,12

82,88

Atual

86,08

76,92

55,68

30,55

Prop. I

87,93

85,09

76,74

53,88

Prop. II

88,5

85,97

81,94

65,65

Prop. III

89,16

86,28

86,03

80,54

Prop. IV

88,29

88

84,69

72,62

289


Joaquim, E. D.; Vieira, G. E. Modelagem e análise de um novo centro cirúrgico para um hospital em crescimento: uma abordagem baseada em simulação. Produção, v. 19, n. 2, p. 274-291, 2009

quantidade de cirurgias realizadas por tipo, quantidade de cirurgias realizadas por especialidade, tempo de ocupação de sala por especialidade, taxa de ocupação média das salas cirúrgicas, tempos de espera e percentual de término da cirurgia até as 22 horas. Nenhum dos trabalhos pesquisados que utilizaram simulação computacional no setor hospitalar considerou tantos indicadores de desempenho nas suas análises. Na comparação dos cenários simulados, verificou-se que os modelos propostos oferecem amplas vantagens em relação ao presente cenário. Entretanto, as análises foram além da situação de 2004 e consideram aumentos de demanda na ordem de 50%, 100% e 200% em relação à demanda deste ano. Com relação a um aumento de 100% na demanda, verificou-se que o cenário I não apresentará desempenho satisfatório. O cenário III dará a melhor resposta, mas exigirá um alto investimento financeiro, mas sua implantação está fora de cogitação neste momento. Fez-se, portanto, uma análise detalhada somente entre os cenários II e IV.

Pôde-se ver claramente que o cenário IV (construção de duas novas salas cirúrgicas aliadas à restruturação dos fluxos operatórios) trará melhores benefícios ao hospital do que o cenário II (construção de quatro salas cirúrgicas sem restruturação de fluxo), além de ter um custo financeiro menor. Vários outros projetos de pesquisa podem dar continuidade a este trabalho. Pode-se por exemplo, incluir outros processos existentes em um centro cirúrgico. Pode-se incluir os processos fora do centro, como recepção e triagem. Análises futuras podem considerar recursos de pessoal (médicos e enfermeiros, por exemplo), equipamentos e materiais utilizados no centro. Pode-se também incluir uma análise de custos financeiros envolvidos no processo e custos para implantação dos novos cenários analisados, visando dar um melhor suporte às decisões a serem feitas. Além disso, este projeto mostrou também que ferramentas baseadas em simulação computacional podem (devem?) ser utilizadas nestes tipos de projetos.

Artigo recebido em 06/11/2007 Aprovado para publicação em 26/03/2009

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AGRADECIMENTOS Os autores agradecem à Pontifícia Universidade Católica do Paraná (PUCPR) e ao Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq) pelo apoio financeiro e aos funcionários do Centro Cirúrgico do Hospital Unviersitário Cajuru pela prestatividade e auxílio na execução deste projeto.

SOBRE OS AUTORES Élcio Douglas Joaquim Tangram Sistemas Empresariais Ltda. End.: Rua Acyr Guimarães, 436 – Curitiba – PR – 80.220-240 Tel.: (41) 3566-6213 E-mail: elcio.joaquim@brturbo.com.br Guilherme Ernani Vieira Pontifícia Universidade Católica do Paraná Programa de Pós-graduação em Engenharia de Produção e Sistemas 2º andar – Bloco 3 – Parque Tecnológico End.: Imaculada Conceição 1155, Curitiba – PR – 80.215-901 Tel.: (41) 3271-2473 Fax: (41) 3271-1345 E-mails: gui.vieira@pucpr.br / guilherme@pq.cnpq.br

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Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 292-303

Geração de resíduos de madeira e derivados da indústria moveleira em função das variáveis de produção Éverton Hillig Universidade de Caxias do Sul Vania Elisabete Schneider Universidade de Caxias do Sul Eloide Teresa Pavoni Universidade de Caxias do Sul

RESUMO Os processos produtivos da cadeia madeira-móveis geram quantidades significativas de resíduos de madeira, os quais nem sempre têm uma destinação correta. O potencial de aproveitamento destes resíduos é significativo, quer seja como matéria-prima secundária, quer seja pelo seu potencial energético. O gerenciamento dos resíduos é um dos desafios à gestão e ao desempenho ambiental das empresas. Neste trabalho, utilizou-se a análise multivariada, com extração de componentes principais, para analisar os carregamentos de cada variável original e identificar as principais variáveis que apresentam similaridades em relação à geração de resíduos. As variáveis de produção consideradas foram: quantidade de matéria-prima consumida, número de colaboradores, número de máquinas, consumo de energia e consumo de água. Por meio de regressão linear, utilizando o método stepwise, foram obtidas as equações de estimativa dos resíduos em função das variáveis de produção originais, resultando na quantidade de resíduo gerado por classe de matéria-prima, para determinada empresa ou determinado município pesquisado. A estimativa de geração foi aplicada ao Pólo Moveleiro da Serra Gaúcha/RS. PALAVRAS-CHAVE Gerenciamento de resíduos, resíduos de madeira, indústria moveleira, gestão ambiental.

Generation of wood waste and derivatives on furniture industry related to production’s variables ABSTRACT The production processes of furniture industry generate significant amounts of wood waste, which has not always a correct destination. The potential for exploitation of these residues is significant, whether as secondary raw material, whether by its energy potential. The management of this waste is one of the challenges for the management and environmental performance of companies. This work used multivariate analysis with the extraction of key components, to analyze the load of each original variable and identify key variables that have similarities in relation to the waste generation. The variables of production considered was: quantity of raw materials consumed, number of employees, number of machines, energy consumption and water consumption. By linear regression, using the stepwise method, were obtained the equations to estimate the waste according to the original variables of production. With these results is possible to calculate the amount of waste generated by class of raw material for a particular company or municipality researched. The estimate of generation was applied to the furniture industries located on Serra Gaúcha / RS. KEY WORDS Waste management, wood waste, furniture industry, environmental management.

292


Éverton Hillig, E.; Schneider, V. E.; Pavoni, E. T. Geração de resíduos de madeira e derivados da indústria moveleira em função das variáveis de produção. Produção, v. 19, n. 2, p. 292-303, 2009

1. INTRODUÇÃO A cadeia produtiva madeira-móveis gera uma significativa quantidade de resíduos de madeira que, embora muitas vezes seja aproveitada para alguns fins específicos, pode se constituir num problema de gestão ambiental das empresas. Embora a maior perda de madeira na forma de resíduo ocorra em seu processamento primário, nas indústrias de móveis podem ocorrer perdas nas operações de corte e de acabamento. Segundo Moraes (2002), a indústria de móveis pode ser segmentada em função da matéria-prima que utiliza ou do uso final dos móveis que produz. Como existem diferentes tipos de matérias-primas à base de madeira utilizadas na fabricação de diferentes tipos de móveis, as empresas moveleiras apresentam diferentes características e produzem diferentes resíduos de madeira e de seus derivados. Em geral, esses resíduos se apresentam na forma de serragem e de retalhos e seu aproveitamento tem sido principalmente para geração de energia. No Estado do Rio Grande do Sul, a indústria moveleira tem uma expressiva participação na economia, principalmente na região da Serra Gaúcha. Conforme Roese (2000), embora no conjunto da indústria de transformação a participação do setor seja modesta, o fato de constituir pólos regionais faz com que assuma grande importância em determinadas regiões. A indústria moveleira gaúcha está concentrada na região da Serra Gaúcha, com um pólo em Bento Gonçalves, que responde por 45% da produção estadual. A madeira oriunda de reflorestamentos e os painéis de madeira são os principais produtos utilizados na fabricação e, apesar da alta tecnologia empregada, as perdas ainda são altas, principalmente decorrentes dos cortes primários dos painéis e das operações de beneficiamento da madeira serrada. Para propor alternativas de aproveitamento aos resíduos de madeira e seus derivados gerados no polo moveleiro, que agreguem maior valor aos resíduos, torna-se fundamental conhecer em primeiro lugar os tipos e quantidades de resíduos gerados. Sendo assim, este trabalho tem por objetivo analisar a possibilidade de estimar os resíduos de madeira e derivados gerados na indústria moveleira em função de algumas variáveis de produção facilmente observáveis.

2. REFERENCIAL TEÓRICO 2.1 A cadeia produtiva de madeira e móveis Segundo Guéron e Garrido (2004) a indústria de madeira e móveis deve ser entendida como parte do setor de base florestal, que compreende ainda o segmento de papel e celulose

e de lenha e carvão vegetal. A partir de um primeiro processo de transformação industrial, a indústria da madeira pode ser desdobrada em indústrias de serrados, painéis de madeira reconstituída, remanufaturados e a indústria de móveis. Esta última compreende um segundo processo de beneficiamento, originando produtos com maior valor agregado. De acordo com IBQP (2002), a cadeia produtiva da madeira pode ser segmentada em três grandes vertentes, se considerados os distintos usos finais: a cadeia do processamento mecânico, a do papel e celulose e a da energia, representada pela lenha e carvão vegetal. A cadeia de processamento mecânico caracteriza-se pela utilização da madeira bruta e a aplicação de processos mecânicos para seu desdobramento em três tipos básicos, que podem ser definidos como laminação, produção de painéis e desdobro de toras. Considerando a Cadeia de Processamento Mecânico, Gonçalves (2000) classifica os processos de usinagem da madeira em abate, descascamento, desdobro, laminação, produção de partículas e beneficiamento. Cada um desses processos é formado por diversas operações, as quais definem o trabalho de transformação da forma da madeira num determinado processo, como por exemplo, as operações de corte, seja com uma serra de fita na serraria ou com uma seccionadora na indústria de móveis seriados. Moraes (2002) cita que a indústria moveleira pode ser segmentada tanto em função dos materiais de que os móveis são confeccionados, como também de acordo com os usos a que se destinam. Quanto aos usos, existem os móveis de madeira para residência (que contemplam os móveis retilíneos seriados, os móveis torneados seriados e móveis sob medida) e os móveis para escritório (móveis sob encomenda e móveis seriados). O subsistema da indústria moveleira depende, a montante, da indústria siderúrgica, fornecedora de metais para móveis, da indústria química, fornecedora de colas, tintas, PVC, vernizes e vidro, da indústria de couro, indústria têxtil e da indústria responsável pelo processamento da madeira. Desses grupos, entretanto, o do processamento mecânico da madeira fornece a parcela mais significativa de insumos que acabarão por gerar resíduos. 2.2 Resíduos de madeira da cadeia produtiva madeira-móveis Brand e Hassegawa (2005), num trabalho para determinação da quantidade de resíduos madeiráveis gerados nas indústrias madeireiras em um raio de 150 km do município de Otacílio Costa, verificaram que os resíduos gerados em maior quantidade pelas empresas da região são: cavaco com casca, resíduos de lâminas, serragem e rolo-resto. As atividades com maior representação na produção de resíduos são 293


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as serrarias e laminadoras, que se constituem em indústrias de transformação primária da madeira, e que produzem em torno de 80% do volume total de resíduos. A indústria de lâminas de madeira e do compensado também tem como base toras provenientes de florestas naturais ou de florestas plantadas. Da mesma forma que no caso da madeira serrada, é necessária uma boa qualidade em relação às propriedades físico-mecânicas da madeira e às dimensões das toras. Nesse segmento, os resíduos resultantes podem alcançar mais de 50% do volume das toras que lhes deram origem (RADIOBRÁS, 1997).

G

Outros autores igualmente investigaram o segmento de compensados, visando determinar e quantificar as perdas no processo. Koch (1976), determinou que de uma tonelada de toras de coníferas já descascadas se obtém 0,45 tonelada de compensado sem lixamento e com cola, 0,06 tonelada de lâminas aplainadas para uso em miolos de painéis, 0,08 tonelada de partículas para uso em chapas de partículas, 0,30 tonelada de partículas para uso em polpa e 0,12 tonelada de partículas para uso como combustível. Ecker et al. (2003), por sua vez, trabalhando com painéis compensados sarrafeados, encontraram um rendimento de 43,75% para todo o processo produtivo, desde o corte dos sarrafos verdes. Os estudos de Brand et al. (2004) acerca das diversas operações de uma indústria de painéis de compensado sarrafeado determinaram os rendimentos médios de cada operação. Nesse segmento, por meio da metodologia do balanço de material, os autores demonstraram que a atividade de manufatura de painéis que mais contribui para a geração de resíduos é a preparação dos sarrafos de madeira sólida para a coladeira, que inclui a classificação de madeiras. Por outro lado, a etapa de usinagem com menor geração de resíduos foi a seccionadora, o que, segundo os autores, se deve em grande parte ao pequeno volume de painéis que passa por essa etapa. Foi verificado também que apenas 18,66%, em média, dos resíduos gerados são vendidos, sendo o restante queimado na caldeira. Segundo o Instituto Pró-Natura (2002), existem por volta de 2.500 empresas na região amazônica, que produzem aproximadamente 9,7 milhões de m3 de produtos madeireiros anualmente, dos quais, 63% destinados à construção civil. Arima et al. (1999) citam que essas empresas geram um grande volume de resíduos de madeira, considerando desde a tora no pátio da empresa até as pranchas serradas, compensados ou laminados, estimado entre 60 e 68% do volume de madeira bruta processada. De acordo com os autores, a baixa produtividade deve-se ao equipamento obsoleto, às formas inadequadas de armazenar toras e à falta generalizada de atividades que visem o aproveitamento de aparas de madeira. Gerwing et al. (2001) examinaram os fatores que influenciam o rendimento do processamento de toras em dez serrarias e duas laminadoras em Paragominas, na Amazônia Oriental. Segundo os autores, os rendimentos médios totais foram maiores para as laminadoras (39%), seguindo-se as serrarias que produzem para o mercado doméstico (36%) e as de exportação (32%). Os autores observaram que uma variedade de fatores influencia o rendimento do processamento de toras, como a degradação durante o armazenamento,

eração de resíduos de madeira e derivados da indústria moveleira em função das variáveis de produção Segundo Food and Agriculture Organization – FAO (1968), citado por Silva (1987), para a fabricação de 1 m3 de lâminas é necessário 1,9 m3 de toras de madeira, perfazendo um aproveitamento de 52,6%. Para cada 1 m3 de compensado, considerando toda cadeia produtiva desse segmento industrial, necessita-se de 2,3 m3 de toras de madeira, o que resulta num aproveitamento de 43,5%. Olandoski (2001) ressalta que as fontes de resíduos no processo de fabricação do compensado podem estar atreladas à qualidade das lâminas, ao processo produtivo como um todo, às características do equipamento e ao comprometimento do operador com a operação. Dessa forma, são essas as principais variáveis que devem ser levadas em consideração quando da caracterização dos resíduos. Segundo Polzl (2002), a geração de resíduo na fabricação do compensado varia de 15,13% a 12,55%, dependendo do tamanho da empresa e considerando os desperdícios depois da secagem das lâminas. A perda de insumos durante o processo produtivo de fabricação de compensados, estratificada por tamanho da empresa, proposta pelo autor é apresentada na Tabela 1. Tabela 1: Perdas no processo de produção da indústria do compensado, estratificado por tamanho da empresa. PRODUÇÃO

PERDAS NO PROCESSO (%)

Pequenas

15,13

Médias

14,55

Grandes

12,55

Fonte: Polzl (2002)

294


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danos causados por insetos e a variação na espessura da madeira processada, resultante da utilização de equipamentos de processamento inadequados ou gastos. Por essa razão, encontraram grandes diferenças entre os rendimentos de cada serraria, sendo o maior valor igual a 55% e o menor igual a 27%. O rendimento das empresas madeireiras foi maior (em até 10% do volume total da tora) para aquelas que usavam sobras de madeira ou de laminados para fabricar produtos secundários. 2.2.1 Resíduos de madeira da indústria moveleira Poucos são os trabalhos que analisaram a geração de resíduos nas indústrias moveleiras. Hillig et al. (2004) realizaram o diagnóstico da geração de resíduos do polo moveleiro da Serra Gaúcha, objetivando estimar a quantidade de resíduo de madeira e derivados gerados, que serviu de base para a primeira fase deste trabalho. A Tabela 2 apresenta as quantidades de matérias-primas de madeiras consumidas pelas empresas amostradas e as médias de aproveitamento para cada classe de matériaprima, calculadas em médias proporcionais ao consumo de cada empresa. Os autores comentam que, com relação às principais matérias-primas, madeiras e derivados, utilizadas, verifica-se ainda uma predominância do uso de chapas aglomeradas, seguidas, em ordem de consumo, pelo uso de MDF, madeira serrada e compensado. A utilização de determinada matéria-prima está relacionada às linhas de produtos fabricadas, sendo que o aglomerado atende principalmente à produção de móveis retilíneos seriados. Nota-se que as médias de aproveitamento de cada matéria-prima utilizada estão numa faixa estreita de variação, com exceção do município de Lagoa Vermelha para a

matéria-prima madeira, onde o aproveitamento apresenta uma média maior. Esse fato deve-se a três empresas desse município que se dedicam apenas à montagem dos móveis, não gerando resíduos de processamento da madeira. Na Tabela 3 são apresentadas as quantidades de resíduos gerados de serragem, maravalhas e retalhos, onde se verifica que Flores da Cunha apresenta uma elevada geração de resíduos de serragem em comparação com a proporção de matéria-prima consumida. Este fato decorre de que duas empresas amostradas neste município trabalham com madeira serrada de pinus para produção de móveis seriados. Assim, além da maior perda que ocorre no beneficiamento da madeira serrada, o volume a granel de serragem produzida é aumentado pela baixa massa específica da madeira.

E

quações de regressão linear que fornecessem estimativas da quantidade de resíduos gerados nas empresas em função das variáveis de produção originais. A Tabela 4 apresenta os valores estimados da geração de resíduos por classe de matéria-prima e por município para as empresas amostradas. Os dados estimados podem ser facilmente estendidos para a produção total do município ou mesmo do Estado, se for considerada a proporção da amostra em relação à produção do município e a participação de cada município na produção estadual. Além das estimativas da geração de resíduos, o trabalho identificou as principais espécies de madeiras utilizadas como madeira serrada e apresenta também um valor médio

Tabela 2: Matérias-primas, madeira e derivados, consumidos pelas empresas amostradas e médias proporcionais de aproveitamento. MUNICÍPIO

N

MAD. (m3)

APR. (%)

MDF (m3)

APR. (%)

AGL. (m3)

APR. (%)

COMP. (m3)

APR. (%)

TOT. (m3)

Bento Gonçalves

27

2057,0

68,18

5029,5

94,99

19504,5

93,59

319,4

94,98

26910,4

Caxias do Sul

35

2144,3

63,89

217,5

91,49

236,0

94,69

2497,5

93,82

5025,3

Flores da Cunha

14

2766,5

63,05

2110,3

92,55

1621,7

91,36

46,8

89,55

6542,8

Lagoa Vermelha

18

538,0

88,38

4541,8

94,51

4276,5

94,9

30,5

92,38

9386,8

TOTAIS

94

7505,8

66,51

11899,1

94,31

25638,7

93,68

2894,2

93,86

47865,3

Legenda: N – Número de empresas visitadas; MAD – Madeira; APR – Aproveitamento; MDF - Medium Density Fiberboard/Fibra de média densidade; AGL – Aglomerado; COMP – Compensado; TOT – Total de matéria-prima consumida. Fonte: Hillig et al. (2004)

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da densidade a granel das diferentes classes de resíduos. Como madeiras serradas são usadas madeiras de Pinus taeda, Eucalyptus sp., Apuleia leiocarpa (garapeira) e Tabebuia cassinoides (caixeta). Os valores médios de densidade a granel citados para as diferentes classes de resíduos são: • Serragem (em geral) = 223 kg/m3 • Serragem de MDF = 190 kg/m3 • Serragem de aglomerado = 265 kg/m3 • Serragem de madeira serrada = 216 kg/m3

deira situadas no polo moveleiro de Arapongas, verificou que, de todos os resíduos gerados, os resíduos em maior quantidade são os resíduos de madeira, respondendo por 85% dos resíduos totais gerados. Desses resíduos, como pedaços, pó e cepilho, boa parte são destinados para confecção de briquetes. O autor comenta que no geral 82% das empresas pesquisadas aproveitam algum tipo de resíduo no próprio processo, 53% vendem parte dos resíduos e apenas 6% os queimam.

Com relação ao destino ou aproveitamento, Schneider et al. (2004) verificaram que uma parcela expressiva dos resíduos, igual a 6,7%, ainda é descartada para queima, sem aproveitamento. Outra parcela, que corresponde a 8,3% dos resíduos gerados, é doada, não agregando valor nenhum nesta operação. A Figura 1 apresenta o destino do resíduo de madeira e derivados das indústrias do polo moveleiro da Serra Gaúcha. LIMA (2005) num trabalho com o objetivo de verificar o desempenho ambiental das indústrias de móveis de ma-

3 METODOLOGIA 3.1 Diagnóstico da geração de resíduos do polo moveleiro O diagnóstico da geração de resíduos do polo moveleiro da Serra Gaúcha forneceu os dados para determinação dos tipos e quantidade de resíduos disponíveis. Esses dados, também serviram para testar modelos matemáticos, visando

Tabela 3: Quantidades de resíduos de madeira e derivados gerados nas empresas visitadas. MUNICÍPIO

N1

SERRAGEM2 (m3)

MARAVALHAS2 (m3)

RETALHOS2 (m3)

Bento Gonçalves

27

2558,2

131,5

2444,6

Caxias do Sul

35

485,9

159,2

191,2

Flores da Cunha

14

2619,5

3935,6

599,5

Lagoa Vermelha

18

495,0

851,0

213,5

Totais

94

6158,6

5077,3

3448,8

1

Número de empresas visitadas.

2

Quantidades de resíduos gerados, dados em volume a granel.

Fonte: Hillig et al. (2004).

Tabela 4: Estimativa dos volumes mensais dos resíduos gerados por classe de matéria-prima e por município nas empresas visitadas. MUNICÍPIO

MADEIRA

MDF

AGLOMERADO

COMPENSADO

S (m3)

M (m3)

R (m3)

S (m3)

M (m3)

R (m3)

S (m3)

R (m3)

S (m3)

R (m3)

Bento Gonçalves

771

93

736

297

38

283

1472

1407

19

18

Caxias do Sul

392

156

154

9

3

4

6

2

78

31

Flores da Cunha

2022

3385

463

311

551

71

277

63

10

2

Lagoa Vermelha

58

170

25

232

681

100

203

87

2

1

Totais

3243

3804

1378

849

1273

458

1958

1559

109

52

Legenda: S = Volume a granel de serragem gerada; M = Volume a granel de maravalha gerada; R = Volume a granel de retalhos gerados. Fonte: HILLIG et al. (2004)

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estimar a geração de resíduos de madeira em função de variáveis de produção. Essa análise serviu de base para escolha dos tipos de serragem usados nos experimentos, bem como forneceu uma estimativa da disponibilidade de serragem por município. 3.2.1 Quantidade de resíduo de madeira e derivados disponíveis Para estimativa das quantidades totais de resíduos gerados por classe de matéria-prima e tipo de resíduo, para cada município pesquisado, foram considerados as quantidades de matérias-primas utilizadas, seu aproveitamento e as quantidades de resíduos gerados. Utilizando os dados da Tabela 4 (vide seção 2.2.1), os volumes de serragem foram convertidos para massa por meio da densidade média a granel de cada tipo, e estendidos para a produção total do município, considerando a produção de cada município amostrada. 3.2.2 Estimativa da quantidade de resíduo de madeira e derivados gerados, em função das variáveis de produção Na análise da geração de resíduos por empresa foi utilizada a técnica estatística multivariada de extração dos componentes principais, que possibilitou identificar as principais variáveis que apresentam similaridades em relação à geração de resíduos. Foram selecionadas 16 variáveis entre as pesquisadas, quais sejam: • Consumo de madeira (m3) • Resíduo de madeira (m3) • Consumo de MDF (m3) • Resíduo de MDF (m3) • Consumo de Aglomerado (m3) • Resíduo de aglomerado (m3) • Consumo de compensado (m3)

Figura 1: Destino do resíduo de madeira e derivados das indústrias do polo moveleiro da Serra Gaúcha. Fonte: Schneider et al. (2004)

• • • • • • • • •

Resíduo de compensado (m3) Consumo de matéria-prima (m3) Número de colaboradores Número de máquinas Consumo de energia (Kw) Consumo de água (m3) Total de serragem (m3) Total de maravalhas (m3) Total de retalhos (m3)

Com base na análise multivariada, essas variáveis foram utilizadas para obter modelos de estimativa da quantidade de resíduo gerada, em função das variáveis de produção. Pelo método stepwise, foram selecionadas as variáveis que melhor se ajustam para estimar por regressão linear os resíduos de madeira, MDF, aglomerado e compensado. Todas as análises estatísticas foram realizadas com software SPSS.

4 RESULTADOS E DISCUSSÃO 4.1 Estimativa da quantidade de serragem gerada por município A Tabela 5 apresenta a estimativa da quantidade mensal de serragem gerada, por município e por classe de matériaprima, expressa em massa (toneladas) ao teor de umidade de equilíbrio. Verifica-se que existe uma quantidade significativa de serragem de madeira serrada, de aglomerado e de MDF em todos os municípios pesquisados, com exceção de Caxias do Sul. Por exemplo, a quantidade de resíduo de MDF gerada em Bento Gonçalves, se usada em compósitos com HDPE na proporção de 30%, pode fornecer matériaprima para produção de 470,25 toneladas de compósitos reforçados por mês. 4.2 Modelos para estimativa da geração de resíduos em função das variáveis de produção Das variáveis diagnosticadas, foram selecionadas 16 e aplicado o método fatorial de análise multivariada para extração dos componentes principais. A Tabela 6 apresenta a variância explicada pelo cálculo dos autovalores de cada um dos componentes resultantes, realizado pelo software SPSS. Verifica-se que existe similaridade entre as variáveis selecionadas, pois apenas cinco componentes principais explicam 91,05% da variância total entre as variáveis selecionadas. Na Tabela 7 são apresentadas as variáveis selecionadas e seus carregamentos em cada um dos cinco componentes principais extraídos. É possível verificar que o componente 1 apresenta a maioria das variáveis com valores de carrega297


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mento acima de 0,500. Esse fato mostra que, embora as indústrias de móveis constituam um universo que abrange diversas matérias-primas e diferentes processos de produção, quase todas as variáveis selecionadas têm um alto valor de carregamento no componente 1, que pode ser denominado de componente porte da empresa. Os outros componentes principais da Tabela 7 mostram similaridades entre as variáveis que representam o tipo de matéria-prima consumida e a respectiva geração de resíduos dessa matéria-prima e também separam os componentes pelo tipo de matéria-prima consumida. No componente

principal 2, os maiores carregamentos são para consumo de madeira, resíduos de madeira e total de maravalhas. Esse componente pode ser denominado fator matéria-prima madeira e se refere às empresas que trabalham com madeira serrada. Da mesma forma, os componentes principais 3 e 4 referem-se aos fatores compensado e MDF, respectivamente. O componente 5, por fim, não apresenta valores de carregamentos maiores que 0,500, mas destacam-se variáveis como o consumo de madeira e resíduos de madeira. O componente principal 1, que foi denominado porte da empresa, tem como variáveis principais o número de

Tabela 5: Quantidade mensal estimada de serragem gerada pela indústria moveleira em cada um dos municípios pesquisados. Município

Madeira (ton)

MDF (ton)

Aglomerado (ton)

Compensado (ton)

Bento Gonçalves

416,34

141,08

975,20

10,59

Caxias do Sul

211,68

4,27

3,98

43,48

Flores da Cunha

727,92

98,48

122,34

3,72

Lagoa Vermelha

25,06

88,16

107,59

0,89

Total

1381,00

331,99

1209,11

58,68

Tabela 6: Variância total explicada por cada um dos componentes principais derivados das variáveis selecionadas. Componente

298

Variância Explicada Autovalor

Variância (%)

Variância acumulada (%)

1

6,955

43,467

43,467

2

2,648

16,550

60,017

3

2,051

12,817

72,834

4

1,688

10,551

83,385

5

1,226

7,665

91,050

6

0,567

3,541

94,591

7

0,406

2,536

97,127

8

0,205

1,281

98,408

9

0,077

0,484

98,892

10

0,063

0,392

99,284

11

0,053

0,329

99,613

12

0,025

0,156

99,769

13

0,024

0,150

99,919

14

0.011

0,071

99,990

15

0,002

0,010

100,000

16

< 0.001

< 0.001

100,000


Éverton Hillig, E.; Schneider, V. E.; Pavoni, E. T. Geração de resíduos de madeira e derivados da indústria moveleira em função das variáveis de produção. Produção, v. 19, n. 2, p. 292-303, 2009

colaboradores, o consumo de matéria-prima e o consumo de energia. Todas as outras variáveis, com exceção do consumo de compensado e do resíduo de compensado, possuem carregamentos significativos nesse componente. A matéria-prima com maior carregamento é o aglomerado e a geração de serragem é mais significativa que a geração de retalhos e de maravalhas. Isso mostra que a principal matéria-prima utilizada pelas indústrias é o aglomerado, o qual se encontra presente com larga faixa de participação nas indústrias de maior porte. As empresas de maior porte, embora poucas, são responsáveis por grande parte do faturamento do setor e, em consequência, pela geração de grande parcela dos resíduos. A análise concorda com os fatos verificados no trabalho de Alieve e Vargas (2002), que caracterizaram o arranjo moveleiro da serra Gaúcha com uma amostra de 19 empresas pesquisadas. Os autores citam que, embora no cadastro da FIERGS existam 227 empresas localizadas nos municípios pesquisados, as 19 empresas representam 30% de todo o faturamento da indústria moveleira gaúcha. Em Hierarquia (2000), verificase que apenas uma empresa foi responsável naquele ano por aproximadamente 16% da representatividade das empresas moveleiras de Bento Gonçalves.

Por essas razões, não foi apropriado fazer uma classificação por um método de agrupamento (por exemplo Cluster), o que seria mais comum numa análise multivariada. Foram testados métodos de agrupamento e obteve-se apenas um grupo com características homogêneas. Dessa forma, se utilizou da extração de componentes principais apenas para analisar os carregamentos de cada variável original e se utilizou de regressão linear com essas varáveis, para se obter equações de estimativa dos resíduos em função das variáveis de produção originais. A análise da Tabela 7 mostra, ainda, que o consumo de MDF e o resíduo de MDF, embora tenham um carregamento maior no componente 4, possuem um carregamento significativo no componente 1. Isso vale também para as variáveis consumo de madeira e resíduo de madeira, que no seu caso possuem um carregamento maior no componente 2. Esse fato decorre de que a maioria das empresas não utiliza apenas uma matéria-prima. Principalmente as empresas que têm como matéria-prima principal o aglomerado, utilizam também o MDF e/ou a madeira serrada. Os componentes principais 2 e 4 na verdade representam as empresas que têm como principal matéria-prima esses materiais. Em relação ao uso do compensado essa afir-

Tabela 7: Carregamentos estimados de cada variável selecionada em cada um dos componentes principais extraídos. Variável

Componente 1

2

3

4

5

0,037

-0,170

0,431

0,033

-0,202

0,471

0,841

0,060

3

Consumo de madeira (m )

0,555

0,629

Resíduo de madeira (m3)

0,516

0,622

3

Consumo de MDF (m )

0,428

-0,149

-0,158

Resíduo de MDF (m )

0,538

-0,049

-0,162

0,810

0,042

Consumo de Aglomerado (m3)

0,709

-0,632

-0,030

-0,269

0,031

Resíduo de aglomerado (m3)

0,751

-0,589

-0,045

-0,228

0,011

Consumo de compensado (m )

0,031

-0,025

0,989

0,136

0,005

3

3

Resíduo de compensado (m )

0,030

-0,023

0,989

0,135

0,007

Consumo de MP* (m3)

0,846

-0,460

0,117

0,042

0,130

Número de colaboradores

0,969

0,059

0,112

-0,055

-0,069

3

Número de máquinas

0,646

0,270

0,060

-0,150

-0,607

Consumo de energia (kW)

0,810

0,013

-0,011

-0,068

-0,105

Consumo de água (m3)

0,750

0,360

-0,035

-0,068

-0,513

Total de serragem (m )

0,818

0,291

-0,049

0,052

-0,101

Total de maravalhas (m )

0,620

0,542

-0,058

0,120

0,176

Total de retalhos (m3)

0,704

-0,546

-0,031

-0,199

0,327

3

3

* Consumo de MP = representa a soma dos consumos de madeira, aglomerado, MDF e compensado de cada uma das empresas.

299


Éverton Hillig, E.; Schneider, V. E.; Pavoni, E. T. Geração de resíduos de madeira e derivados da indústria moveleira em função das variáveis de produção. Produção, v. 19, n. 2, p. 292-303, 2009

mação não é válida e, por isso, as variáveis consumo de compensado e resíduo de compensado têm carregamentos significativos apenas no componente 3. Foram testados, ainda, modelos de equações de regressão linear que fornecessem estimativas da quantidade de resíduos gerados nas empresas em função das variáveis de produção originais. A Tabela 8 apresenta os modelos gerados pelo método stepwise, que exclui as variáveis que não possuem uma correlação significativa em cada um dos modelos testados.

P

Por outro lado, a estimativa dos resíduos de compensados apresentou um R2 próximo de um e um erro padrão da estimativa próximo de zero, mostrando que as empresas que trabalham com essa matéria-prima são homogêneas em relação aos processos utilizados e aos aproveitamentos obtidos. Ao contrário dos anteriores, o modelo para estimativa dos resíduos de MDF inclui todas as variáveis de produção testadas, mostrando que sua utilização melhora a precisão da estimativa. Isso mostra que essas variáveis têm influência na quantidade de resíduos de MDF gerados. É possível verificar também que a quantidade de resíduos de MDF gerados por cada empresa aumenta com o aumento do número de colaboradores e com o aumento do consumo de água. Ao contrário, diminui com o aumento da quantidade de matéria-prima total utilizada, com o aumento do número de máquinas e com o aumento da quantidade de energia consumida. Pode-se inferir que as maiores empresas e com maior nível de automatização geram menor quantidade proporcional de resíduos de MDF. Por fim, o modelo para estimativa da quantidade de resíduo de aglomerado gerado inclui, além da quantidade de matéria-prima consumida, o consumo de energia. Essa variável, de certa forma, expressa o porte da empresa e por isso sua inclusão no modelo melhora a precisão da estimativa. Outras variáveis também expressam o porte da empresa, como o número de empregados, mas o consumo de energia é um fator ligado diretamente ao setor produtivo. Aqui também fica ratificado que existe homogeneidade entre os percentuais de aproveitamento das chapas aglomeradas verificados nas empresas. No município de Lagoa Vermelha o ajuste para madeira apresentou um r2 de 0,32 e para MDF de 0,75. Esse fato decorre de existirem no município muitas empresas pequenas,

ara os resíduos de madeira e para os resíduos de compensados, a inclusão das variáveis de produção não proporcionou melhora na precisão da estimativa.

As equações de regressão linear obtidas, além de servirem para estimativa da geração de resíduos nas indústrias moveleiras pesquisadas, complementam as informações obtidas pela análise multivariada. Para os resíduos de madeira e para os resíduos de compensados, a inclusão das variáveis de produção não proporcionou melhora na precisão da estimativa. A estimativa da geração de resíduos de madeira apresentou um coeficiente de determinação (R2) mais baixo que o apresentado para os outros tipos de matérias-primas e um alto erro padrão da estimativa (Syx). Esse fato decorre da maior variabilidade que existe nas técnicas de processamento da madeira serrada e das diferentes espécies que são usadas no polo moveleiro, que causam uma maior variabilidade dos percentuais de aproveitamento obtidos por cada empresa.

Tabela 8: Modelos para estimativa da geração de resíduos de madeira e de seus derivados, obtidos pelo método stepwise de regressão linear. Mod.

Variável dependente

Equação

R2

Syx

F

1

Resíduo de madeira

RESM = -3,571 + 0,532 MAD

0,886

29,85

717

2

Resíduo de compensado

RESC = 0,074 + 0,050 COMP

0,997

0,67

28609

3

Resíduo de MDF

RESMDF = -0,915 + 0,050 MDF + 0,052 COL - 0,002 MP - 0,088 MAQ + 0,028 ÁGUA - 1,725 . 10-5 EN

0,920

6,24

179

4

Resíduo de aglomerado

RESAGL = -0,035 + 0,049 AGLO + 5,788 . 10-5 EN

0,937

14,11

694

Legenda: MOD = MODELO; RESM = Resíduo de madeira; RESC = Resíduo de compensado; RESMDF = Resíduo de MDF; RESAGL = Resíduo de aglomerado; MAD = Consumo de madeira; COMP = Consumo de compensado; MDF = Consumo de compensado; COL = Número de colaboradores; MP = Consumo de matéria-prima total; MAQ = Número de máquinas; ÁGUA = Consumo de água; EN = Consumo de energia.

300


Éverton Hillig, E.; Schneider, V. E.; Pavoni, E. T. Geração de resíduos de madeira e derivados da indústria moveleira em função das variáveis de produção. Produção, v. 19, n. 2, p. 292-303, 2009

com pouco consumo de madeira serrada, que informaram percentuais de aproveitamento mais altos que a média geral verificada para esse tipo de matéria-prima. Sendo assim, a média de aproveitamento da madeira serrada nesse município foi de 88,38% contra uma média geral de 66,51% (vide Tabela 2). Nas Figuras 2 e 3 são apresentados os gráficos da quantidade de resíduos gerados em função da quantidade de matéria-prima consumida para cada tipo de matéria-prima, separados por município.

É possível verificar que existe homogeneidade entre os percentuais de aproveitamento das empresas, considerando os tipos de matéria-prima separadamente, em cada município. Apenas três situações apresentaram um coeficiente de determinação (R2) para a regressão inferior a 0,85. No município de Lagoa Vermelha o ajuste para madeira apresentou um R2 de 0,32 e para MDF de 0,75. Esse fato decorre de existirem no município muitas empresas pequenas, com pouco consumo de madeira serrada, que informaram

Município

Município

Flores da Cunha Rsq = 0,9075 Caxias do Sul Rsq = 0,8874 Bento Gonçalves Rsq = 0,9821

Lagoa Vermelha Rsq = 0,9665 Resíduo de MDF (m3)

Resíduo de Madeira (m3)

Lagoa Vermelha Rsq = 0,3200

Flores da Cunha Rsq = 0,8481 Caxias do Sul Rsq = 0,8692 Bento Gonçalves Rsq = 0,7005

Total Rsq = 0,8862

Total Rsq = 0,8621

Consumo de MDF (m3)

Consumo de Madeira (m3)

Figura 2: Quantidade de resíduo de madeira (a) e de mdf (b), em função da quantidade de matéria-prima consumida, com a linha de regressão linear ajustada por município.

Município

Flores da Cunha Rsq = 0,9775 Caxias do Sul Rsq = 0,9952 Bento Gonçalves Rsq = 0,9225

Lagoa Vermelha Rsq = 0,7478

Resíduo de Compensado (m3)

Resíduo de Aglomerado (m3)

Lagoa Vermelha Rsq = 0,9667

Município

Flores da Cunha Caxias do Sul Rsq = 0,9971 Bento Gonçalves Rsq = 0,9985

Total Rsq = 0,9244

Consumo de Aglomerado (m3)

Total Rsq = 0,9968

Consumo de Compensado (m3)

Figura 3: Quantidade de resíduo de aglomerado (a) e de compensado (b), em função da quantidade de matéria-prima consumida, com a linha de regressão linear ajustada por município. 301


Éverton Hillig, E.; Schneider, V. E.; Pavoni, E. T. Geração de resíduos de madeira e derivados da indústria moveleira em função das variáveis de produção. Produção, v. 19, n. 2, p. 292-303, 2009

percentuais de aproveitamento mais altos que a média geral verificada para esse tipo de matéria-prima. Sendo assim, a média de aproveitamento da madeira serrada nesse município foi de 88,38% contra uma média geral de 66,51% (vide Tabela 2). No município de Bento Gonçalves, o R2 do ajuste para MDF foi de 0,70. Nesse caso, embora a média de aproveitamento das empresas do município tenha sido semelhante à média geral, ocorreu uma maior dispersão dos percentuais de aproveitamento de cada empresa, que variaram de 85% a 98%. Assim, nesse município, pode-se inferir que o ajuste apresenta um erro padrão da estimativa maior.

5. CONCLUSÕES A indústria moveleira da Serra Gaúcha gera uma significativa quantidade de resíduo de madeira e derivados que, segundo a análise multivariada, pode ser caracterizada em função do porte da empresa e da matéria-prima usada. A maior quantidade de resíduo gerado no polo moveleiro provém da madeira serrada, seguida do aglomerado, do

MDF e do compensado, respectivamente. Foi estimada uma geração de 1381 toneladas de serragem de madeira, 331,99 de MDF e 1209,11 de aglomerado nos municípios pesquisados. Esses municípios representam aproximadamente 70% da produção de móveis do Estado do Rio Grande do Sul. A quantidade de resíduo gerado por classe de matériaprima, para determinada empresa ou determinado município pesquisado, pode ser estimada em função das variáveis: quantidade de matéria-prima consumida, número de colaboradores, número de máquinas, consumo de energia e consumo de água. Para os resíduos de madeira e para os resíduos de compensados, a inclusão das variáveis de produção não proporcionou melhora na precisão da estimativa. Ao contrário, o modelo para estimativa dos resíduos de MDF inclui todas as variáveis de produção testadas, mostrando que sua utilização melhora a precisão da estimativa. O modelo para estimativa da quantidade de resíduo de aglomerado gerado inclui, além da quantidade de matéria-prima consumida, o consumo de energia. A metodologia utilizada no trabalho mostrou ser uma eficiente ferramenta para avaliação do potencial gerador de resíduos no segmento madeira-móveis quando consideradas as 16 variáveis de produção pesquisadas.

Artigo recebido em 27/10/2007 Aprovado para publicação em 26/03/2009

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SOBRE OS AUTORES Éverton Hillig Universidade Estadual do Centro-Oeste End.: PR 153 - Km 07 - Riozinho - 84500-000 - Irati - PR Tel.: (42) 3421-3000 - ramal: 3088 Fax: (42) 3421-3000 - ramal: 3016 E-mail: hillig@hotmail.com Vania Elisabete Schneider Universidade de Caxias do Sul End.: Rua Francisco Getúlio Vargas, 1130 – Cidade Universitária – Bloco V – Bairro Petrópolis. 95070-560 - Caxias do Sul - RS Tel.: (54) 3218-2100 - ramal: 2508 Fax: (54) 3218-2100 - ramal: 2507 E-mail: veschnei@ucs.br Elóide Teresa Pavoni Universidade de Caxias do Sul End.: Rua Francisco Getúlio Vargas, 1130 – Cidade Universitária – Bloco V – Bairro Petrópolis. 95070-560 - Caxias do Sul - RS Tel.: (54) 3218-2100 - ramal: 2508 Fax: (54) 3218-2100 - ramal: 2507 E-mail: etpavoni@ucs.br

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Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 304-316

Estudo da utilização de materiais de referência nas análises de água por laboratórios envolvidos no sistema de acreditação Suzana Saboia de Moura UFF Stella Regina Reis da Costa UFF

RESUMO O presente estudo propõe-se discutir o uso de materiais de referência (MR) pelos laboratórios de ensaios de águas, sob o ponto de vista da aquisição dos materiais conforme o item “Aquisição de serviços e suprimentos” (4.6) da norma ABNT NBR ISO/IEC 17025. O papel dos MR nas análises químicas é fornecer referências metrológicas visando assegurar a rastreabilidade das medições. A rastreabilidade é um aspecto essencial da garantia da qualidade para se obter aceitação de dados analíticos nos mercados nacional e internacional. Neste estudo de caso, de caráter exploratório e qualitativo, uma pesquisa foi realizada junto a todos os laboratórios de ensaios prestadores de serviços analíticos para a Agência Nacional de Águas (ANA) e envolvidos no sistema de acreditação pela Coordenação Geral de Acreditação do Inmetro (Cgcre/Inmetro), utilizando-se questionário estruturado e com 50% de retorno. Os resultados mostraram que são muito poucos os certificados de MR com reconhecimento de terceira parte, ou seja, por organismos de acreditação, segundo normas consagradas que tratam efetivamente da rastreabilidade metrológica. Propõe-se, finalmente, uma política para garantir, sempre que possível, a rastreabilidade dos resultados de ensaios dos laboratórios, na ausência de MR certificados. PALAVRAS-CHAVE Análise de água, rastreabilidade, material de referência.

Case study on the usage of reference materials in water analysis by laboratories involved in the accreditation system ABSTRACT This paper aims at discussing the use of reference materials (RM) by water testing laboratories, on the context of RM purchase, based on the requirements of the standard ABNT NBR ISO/IEC 17025, section “Purchasing services and supplies“ (4.6). The role of RM in chemical analysis is to provide metrological reference to assure measurement traceability. This is an essential aspect of quality assurance in order to have analytical results accepted in the international market. In this case study, based on the methodological exploratory and qualitative approach, a questionnaire was sent to testing laboratories which provide analytical services to the National Agency for Waters involved in the accreditation system performed by the General Coordination for Accreditation of Inmetro (Cgcre/Inmetro) by using structured questionnaire and with 50% of return. The results showed that there are few RM certificates with indication of third party recognition, i.e., accreditation bodies, based on standards dealing with metrological traceability. Finally, a policy is proposed to assure the traceability of laboratories measurement results, when certified RMs are unavailable. KEY WORDS Water analysis, traceability, reference material.

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Moura, S. S.; Costa, S. R. R. Estudo da utilização de materiais de referência nas análises de água por laboratórios envolvidos no sistema de acreditação. Produção, v. 19, n. 2, p. 304-316, 2009

1. INTRODUÇÃO O Governo Brasileiro, reconhecendo a importância da sustentabilidade, que também está relacionada à gestão de seus recursos hídricos, assinou a Carta de Princípios do Rio (Rio-92) e adotou as suas orientações. A criação da Agência Nacional de Águas (ANA) é uma das ações decorrentes da política de gestão dos recursos hídricos. Em março de 2005, a ANA lançou o Programa Nacional de Acreditação de Laboratórios em Análise da Qualidade da Água (PROLAB). Foi assinado com a Coordenação Geral de Acreditação do Inmetro (Cgcre/Inmetro) um termo de cooperação, que objetiva implantar uma rede de laboratórios acreditados que forneça o suporte legal para as ações de regulação do uso da água e de monitoramento da qualidade das águas interiores em todo o Território Nacional. O PROLAB identifica uma série de parâmetros físico-químicos e químicos, indicadores de matéria orgânica, biológicos e microbiológicos, e elementos e substâncias potencialmente prejudiciais considerados prioritários para o controle da qualidade da água, dispostos pela Resolução CONAMA n.o 357, de 17 de março de 2005. Considerando-se essa necessidade, é preciso também atender à crescente demanda por resultados de medição de procedência conhecida e aceitável, com rastreabilidade metrológica comprovada. Para atingir esses objetivos, é necessário o uso de elementos de referência – padrões rastreáveis e/ou materiais de referência – na calibração e validação dos métodos de medição. Sem eles é impossível estabelecer uma cadeia segura de rastreabilidade. A rastreabilidade é um aspecto essencial da garantia da qualidade para se obter aceitação internacional de dados analíticos. Se vários laboratórios conseguem atingir o mesmo resultado analítico para um mesmo material de referência certificado, isto mostra que as suas medições podem ser comparáveis (ISO, 2000). No Brasil, a Cgcre/Inmetro é o organismo de acreditação que opera um sistema de acreditação de laboratórios reconhecido por seus pares signatários do Acordo de Reconhecimento Mútuo da International Laboratory Accreditation Cooperation (ILAC), do Acordo Bilateral com a European Co-operation for Accreditation (EA) e do Acordo Multilateral com a Interamerican Accreditation Cooperation (IAAC). Unger (2001) explica que o Acordo da ILAC tem o objetivo de desenvolver uma rede global de laboratórios de ensaio e de calibração acreditados, com resultados de medições confiáveis e exatos. O Acordo proporciona uma infra-estrutura técnica ao comércio internacional, promovendo a confiança

e aceitação além fronteiras, pelas partes envolvidas, de dados de ensaios e de calibração, ou, em outras palavras, “testado uma vez, aceito em qualquer lugar”. A acreditação é definida como “atestação realizada por terceira parte relativa a um organismo de avaliação da conformidade, exprimindo demonstração formal de sua competência para realizar tarefas específicas de avaliação de conformidade” (ABNT NBR ISO/ IEC 17000:2005, p.5).

A

rastreabilidade é um aspecto essencial da garantia da qualidade para se obter aceitação internacional de dados analíticos. Em obediência às diretrizes do Acordo mencionado, a Cgcre/Inmetro adota a norma ISO/IEC 17025 no reconhecimento de competência técnica de laboratórios, publicada no País pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) como ABNT NBR ISO/IEC 17025. Essa norma dá especial importância à demonstração da rastreabilidade da medição, que inclui o uso de materiais de referência. Os materiais são aplicados na calibração e na validação de métodos, no controle da qualidade e na verificação do uso correto de um método (Inmetro, 2005). No Brasil, até onde se conhece, são poucos os materiais de referência certificados produzidos de acordo com as recomendações da ISO (International Organization for Standardization) – ISO Guides 3035. Deve-se ressaltar que a ILAC já decidiu incluir no acordo de reconhecimento mútuo vigente (laboratórios) a acreditação de produtores de materiais de referência, logo que os procedimentos apropriados para essa atividade forem desenvolvidos e acordados. O critério de acreditação será a combinação do ISO Guide 34 e da ISO/IEC 17025 (ILAC, 2004). Esta pesquisa delimita-se a investigar a utilização de materiais de referência na análise de água, ao invés de estudar a aplicação dos materiais de referência em geral, pois esta se estende a outras áreas de ensaios químicos e os materiais são de matrizes variadas. A importância da qualidade da água e da preservação dos recursos hídricos para o Brasil é indiscutível, visto que o nosso País detém 13,7% da água doce superficial do mundo (ANA, 2005). Dessa forma, este artigo propõe-se a discutir a utilização de materiais de referência pelos laboratórios de análises de água. O universo pesquisado compreendeu os laboratórios que atuam na análise de águas, sejam eles acreditados ou em fase de acreditação pela Cgcre/Inmetro, além de outros laboratórios não acreditados que também prestam serviços analíticos para a ANA e que participaram de uma comparação interlaboratorial organizada pela Diretoria de 305


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Metrologia Científica e Industrial (Dimci) do Inmetro, que visou complementar a atuação do Inmetro na parceria com a ANA. Dessa forma, a pesquisa visou analisar as respostas de todos os laboratórios utilizados pela ANA, já que o principal foco era obter informações sobre a garantia da rastreabilidade metrológica dos resultados de medição e, consequentemente a confiabilidade dos relatórios de ensaio utilizados pela Agência.

A

3. REFERENCIAL TEÓRICO A harmonização de normas e regulamentos técnicos é fundamental para as relações comerciais, tanto em âmbito internacional quanto nacional, além da necessidade de se investir em procedimentos que visem à garantia da qualidade dos produtos comercializados. Desta forma, visando a garantir a qualidade dos produtos, cabe a inserção de outros dois temas de suma importância ao comércio internacional: a metrologia e a avaliação da conformidade, formando o alicerce para qualquer sistema aplicado à promoção das relações comerciais, ou seja, produtos produzidos no âmbito nacional com confiabilidade e rastreabilidade metrológica, adequados às normas e regulamentos técnicos internacionais, com a garantia da aplicação de procedimentos de avaliação da conformidade, visando minimizar custos com reensaios, recertificações, dentre outros (BORGES, 2007). Segundo Hufbauer et al. (2000), os procedimentos de avaliação da conformidade de um determinado produto consistem em qualquer procedimento utilizado, direta ou indiretamente, para avaliar se certas exigências quanto a normas ou a regulamentos técnicos foram observadas. Além disso, tais procedimentos incluem amostragem, ensaios, inspeção, avaliação, verificação e garantia da conformidade, registro, acreditação e aprovação, bem como as combinações destas possibilidades. Os procedimentos de avaliação da conformidade são considerados essenciais em regulamentações relacionadas a saúde, segurança e meio ambiente e, contribuem para a melhoria da produtividade e a eficiência na economia de mercado (Apud, BORGES, 2007). Em 2006, foi realizada uma pesquisa com 15 organismos de acreditação dos cinco continentes, representando 30% de todos os organismos de acreditação do Acordo da ILAC, visando a identificar, dentre outros, as principais não-conformidades impeditivas para realizar a avaliação nos laboratórios em fase de acreditação. A Tabela 1 apresenta o resultado da pesquisa, sendo pontos relevantes a não existência das políticas e dos procedimentos requeridos pela ISO/ IEC 17025 e procedimentos inadequados para calibração e para ensaios (SILVA, 2006). O estudo relativo ao uso de materiais de referência no Brasil é relativamente recente. As “Diretrizes Estratégicas para a Metrologia Brasileira 2008-2012”, que sucederam as diretrizes para o período 2003-2007, aprovaram várias metas relacionadas ao estabelecimento de referências metrológicas, dentre as quais o desenvolvimento de materiais de referência certificados. A Resolução do Conmetro, que

pouca disponibilidade de materiais de referência no Brasil é uma limitação que os laboratórios enfrentam no seu dia-a-dia. Comparações interlaboratoriais são a organização, desempenho e avaliação de ensaios nos mesmos itens ou em itens de ensaio similares, por dois ou mais laboratórios, de acordo com condições predeterminadas (ABNT ISO/IEC Guia 43-1, 1999).

2. OBJETIVO A pouca disponibilidade de materiais de referência químicos no País constitui uma limitação que os laboratórios enfrentam no seu dia-a-dia. No Brasil, somente em junho de 2000, foi criada no Inmetro a Divisão de Metrologia Química (DQUIM), que tem a competência para: realizar ou reproduzir as unidades de medida; manter e conservar os padrões metrológicos nacionais que se acham sob sua responsabilidade; realizar o rastreamento dos padrões metrológicos nacionais aos internacionais por intermédio de comparações-chave, comparações internacionais e comparações regionais; colaborar e manter intercâmbio com o Bureau Internacional de Pesos e Medidas (BIPM) e outros organismos nacionais e internacionais, no âmbito da metrologia científica e industrial (INMETRO, 2003). Para a Cgcre/Inmetro o problema é importante, pois dificulta o cumprimento dos critérios de acreditação pelos laboratórios. O objetivo geral da pesquisa foi fazer um levantamento do uso de materiais de referência pelos laboratórios de ensaios em águas no Brasil, sob o ponto de vista da aquisição dos materiais, conforme o item “4.6 Aquisição de serviços e suprimentos” da ABNT NBR ISO/IEC 17025. Este artigo pretende investigar, com base na documentação que os laboratórios recebem dos fornecedores de materiais de referência, como é afetada a garantia da rastreabilidade das medições e, consequentemente, a qualidade dos serviços laboratoriais. 306


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aprovou as diretrizes, considera que a metrologia é uma área estratégica para o desenvolvimento econômico e social do País, por ser parte integrante da infra estrutura básica de apoio à competitividade das nossas empresas, à preservação da segurança, do meio ambiente e à proteção do consumidor. Ademais, o seu fortalecimento é uma forma de assegurar a soberania nacional neste importante segmento científico e tecnológico (CONMETRO, 2008). Durante muito tempo, havia uma forma confusa de referir-se a materiais de referência, que por vezes era referido como “padrão”, termo este que também era utilizado para designar artefatos materializados, especificações, métodos de ensaio e procedimentos de inspeção. Como consequência, o Conselho da ISO (órgão diretor da ISO) decidiu criar, em 1976, o Comitê sobre Materiais de Referência da ISO (Committee on Reference Materials – ISO REMCO) (PARKANY et al., 2001), visando a estudar e a promover o entendimento acerca dos materiais de referência. O Comitê é responsável por elaborar e revisar os ISO Guides 30 a 35 que fornecem orientações sobre: • termos e definições relacionados com materiais de referência; • conteúdo de certificados e rótulos de materiais de referência); • calibração em química analítica e uso de materiais de referência certificados; • utilização de materiais de referência certificados; • requisitos gerais para a competência de produtores de material de referência; • princípios gerais e estatísticos para certificação de materiais de referência. Em abril de 2005, o ISO REMCO aprovou novas definições para materiais de referência e materiais de referência certificados. Segundo Emmons et al. (2006) as definições

da ISO Guide 30:1992 e do Vocabulário Internacional de Termos Fundamentais e Gerais da Metrologia (VIM) (2.ª edição) foram desenvolvidas na década de 1980 e foram baseadas nas necessidades e experiências das principais comunidades usuárias da época. Com o aumento da conscientização da garantia da qualidade analítica e o aumento dos organismos de normalização, de acreditação e dos reguladores que estão envolvidos nesse tema, foi preciso considerar outros aspectos na explicação desses termos para evitar confusão sobre conceitos. As novas definições aprovadas são: “Material de referência (MR) Material suficientemente homogêneo e estável em relação a uma ou mais propriedades especificadas, o qual foi estabelecido como adequado ao uso pretendido em um processo de medição. Nota 1: MR é um termo genérico. Nota 2: As propriedades podem ser quantitativas ou qualitativas, por exemplo, identidade de substâncias ou espécies. Nota 3: Os usos podem incluir a calibração de um sistema de medição, avaliação de um procedimento de medição, valores designados ou outros materiais, e controle da qualidade. Nota 4: Um MR só pode ser usado para um único propósito em uma dada medição”. (EMMONS et al., 2006) Emmons (2005) explica que a nota 1 da nova definição visa a esclarecer que o termo “material de referência” referese a uma família de materiais. Todos os materiais que tenham estabilidade e homogeneidade adequadas para controle da qualidade de uma medição pertencem à família do MR. Aqueles que não são acompanhados de um certificado são, em geral, denominados materiais de referência não certifica-

Tabela 1: Principais não-conformidades que impedem a realização da avaliação de acreditação. Não-conformidades

%

Procedimentos inadequados para calibração e para ensaio

87,5

Procedimentos inadequados para o cálculo de incerteza de medição

87,5

Falta de políticas requeridas

75,0

Falta de rastreabilidade

75,0

Falta de procedimentos requeridos

75,0

Políticas inadequadas

62,5

Procedimentos inadequados

50,0

Resultados insatisfatórios em comparações interlaboratoriais

37,5

Fonte: Silva, 2006

307


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dos. Mas também são utilizados muitos outros termos como materiais produzidos internamente, materiais de controle do laboratório, materiais de referência do laboratório. “Material de referência certificado (MRC) Material de referência, caracterizado por um procedimento metrologicamente válido, para uma ou mais propriedades, acompanhado de um certificado que fornece o valor da propriedade especificada, sua incerteza associada e uma declaração da rastreabilidade metrológica.” (EMMONS et al., 2006) Convém mencionar que o ABNT ISO Guia 31:2004 resume o conteúdo essencial de um certificado de MRC: nome do material; produtor e código do produtor para o material; descrição geral do material; uso pretendido; instruções para o uso apropriado; instruções para as condições de armazenamento; valor(es) de propriedade certificado(s), cada um deles acompanhado de uma declaração de incerteza; método(s) empregado(s) para a obtenção de valores de propriedade (com detalhes completos quando os valores forem dependentes do método de medição); e, prazo de validade, se apropriado. A norma ABNT NBR ISO/IEC 17025, utilizada na acreditação de laboratórios, contém requisitos para competência de laboratórios, escritos sob a perspectiva das boas práticas de gestão e de técnicas de um laboratório. Alguns destes requisitos tratam da seleção e do uso de materiais de referência. São eles: – Requisito da direção – Análise crítica de pedidos, propostas e contratos (item 4.4). O laboratório deve ter capacidade e recursos (inclusive os materiais de referência) para atender aos requisitos dos clientes. – Requisito da direção – Aquisição de serviços e suprimentos em laboratório de ensaio (item 4.6). Esse item referese a políticas e procedimentos, verificação, documentos de compra e fornecedores aprovados. Todos os serviços e suprimentos tratados nesse item são aqueles que afetam a qualidade dos ensaios e/ou calibrações. O tipo de serviço mais comum ao qual se refere o requisito é a calibração de equipamentos (A2LA, 2006). Este serviço interfere na qualidade dos resultados de ensaios, pois está diretamente relacionado à manutenção da rastreabilidade das medições. Pelo mesmo motivo, quando são adquiridos materiais de referência num laboratório de ensaios químicos, deve-se ter o cuidado de selecionar aqueles adequados ao uso pretendido. Uma vez assegurada a rastreabilidade metrológica, o requisito 5.6 da ABNT NBR ISO/IEC 17025 fica válido. – Requisito técnico – Métodos de ensaio e calibração e validação de métodos (item 5.4). No aspecto geral, a 308

norma estabelece que o laboratório deva utilizar métodos e procedimentos apropriados para todos os ensaios e/ou calibrações dentro do seu escopo de trabalho, deve ter todas as instruções necessárias, atualizadas e disponíveis ao seu pessoal, e garantir que desvios aos métodos sejam documentados, tecnicamente justificados, autorizados e aceitos pelo cliente. Utilizar “métodos e procedimentos apropriados” significa que estes devem ser adequados para um determinado propósito ou fim, que já foi previamente acordado com o cliente, conforme visto acima na análise crítica de contrato. – A metodologia de ensaio de águas da natureza mais difundida é a do Standard Methods for the Examination of Water and Wastewater (SMEWW) e para quase todos os parâmetros mencionados existe um método correspondente. – Requisito técnico – Rastreabilidade de medição (item 5.6). Para laboratório de ensaios, deve haver um programa de calibração para os equipamentos de medição e ensaio utilizados com funções de medição, operados de forma a assegurar que as medições feitas pelo laboratório sejam rastreáveis ao Sistema Internacional (SI). Nos casos em que a rastreabilidade das medições às unidades SI não for possível e/ou não for pertinente, a norma dispõe que se deve utilizar materiais de referência certificados e métodos e/ou padrões de consenso (todas as partes envolvidas) como referências para obter-se rastreabilidade. O Vocabulário Internacional de Termos Fundamentais e Gerais de Metrologia (VIM, 2007, item 2.41) define rastreabilidade metrológica como: “Propriedade de um resultado de medição pela qual tal resultado pode ser relacionado a uma referência através de uma cadeia ininterrupta e documentada de calibrações, cada uma contribuindo para a incerteza de medição”. Define também incerteza de medição (VIM, 2007, item 2.26) como: “Parâmetro não negativo que caracteriza a dispersão dos valores atribuídos a um mensurando, com base nas informações utilizadas”. Segundo a definição, a rastreabilidade é uma propriedade do resultado de medição e, portanto a frase muito comum “rastreável à instituição X” é uma simplificação de “rastreável a um valor de referência mantido pela instituição X”. Da mesma forma, “rastreável ao SI” é uma simplificação de “rastreável ao valor de referência obtido pela realização das unidades acordadas do SI” (ELLISON et al., 2003).


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No caso do Brasil, a Cgcre/Inmetro estabeleceu a política de rastreabilidade ao SI de unidades para garantir que os laboratórios brasileiros efetuem a calibração de seus padrões de referência e instrumentos em laboratórios que possam demonstrar competência, capacidade de medição e rastreabilidade para a calibração específica a ser executada (INMETRO, 2003). Requisito técnico – Garantia da qualidade dos resultados de ensaio e calibração (item 5.9). O requisito estabelece que sejam implantadas medidas de controle da qualidade para o monitoramento da validade dos ensaios e calibrações. São sugeridas algumas técnicas, incluindo o uso regular de materiais de referência certificados e/ou controle interno da qualidade com materiais de referência secundários. Convém que as técnicas utilizadas sejam apropriadas para o tipo e volume do trabalho realizado. Mas como encontrar o material de referência apropriado? Conforme afirma Steiger (2006), constantemente os usuários de materiais de referência se deparam com a dificuldade de encontrar o material apropriado: “Existe um material de referência disponível que atenda aos requisitos analíticos (analitos, matriz, nível de concentração, incertezas)? O produtor do material de referência é confiável?”. Por isso, foi desenvolvida a base internacional de dados sobre materiais de referência certificados COMAR (Code d’Indexation des Matériaux de Référence), via “web”, de acesso livre pela Internet no endereço <www.comar.bam.de>. Existem outras bases de dados como a da International Atomic Energy Agency (IAEA), a CRM Producers – Worldwide listing of CRM producers, além de algumas administradas por organizações regionais, mas somente a COMAR cobre uma gama de materiais de referência certificados de produtores de vários países. Atualmente a COMAR congrega 19 centros de codificação, situados em países da Europa, América do Norte, Ásia e Oceania. Os materiais de referência certificados catalogados devem atender às recomendações dos ISO Guides 31, 34 e 35. Os campos de aplicação definidos para cadastro na COMAR são: ferrosos, não ferrosos, inorgânicos, orgânicos, propriedades físicas, biológicos, qualidade de vida e indústria (COMAR, 2008). Consultando o banco de informações da COMAR sobre materiais de referência certificados brasileiros, verificou-se que somente uma instituição brasileira consta nessa base de dados, o Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de S.Paulo (IPT), cujos materiais não se aplicam aos ensaios de águas. Ocorre que, além da dificuldade de encontrar a

informação, os materiais de referência certificados importados são caros e de difícil obtenção, devido aos trâmites burocráticos impostos pelas autoridades alfandegárias, não só do Brasil, mas também dos demais países do mundo. Sobre essa questão, o ISO REMCO está dando andamento a um estudo para conhecer os problemas relacionados ao transporte, importação e exportação e barreiras ao comércio de materiais de referência.

A

Agência Nacional de Águas (ANA) e a Cgcre/Inmetro assinaram o Termo de Cooperação para implantar uma rede de laboratórios acreditados para análise de águas. Conforme já mencionado, o PROLAB estabeleceu critérios para um laboratório de análise de água participar do Programa. Dentre as exigências estão que os laboratórios devem seguir os requisitos da ABNT NBR ISO/IEC 17025 e os parâmetros a serem analisados e respectivos métodos analíticos devem estar em conformidade com as normas técnicas brasileiras e/ou do Mercosul ou, na ausência destas, normas técnicas internacionais cientificamente reconhecidas.

4. METODOLOGIA DE PESQUISA A pesquisa que gerou este artigo é classificada como exploratória, pois “é realizada em área na qual há pouco conhecimento acumulado e sistematizado”. A hipótese para a realização desta investigação é que os laboratórios nacionais de análise de águas não utilizam os materiais de referência, preconizados pela norma ABNT NBR ISO/IEC 17025, para garantir a rastreabilidade metrológica dos resultados dos ensaios executados; também se enquadra como aplicada porque é motivada pela necessidade de resolver problemas concretos (VERGARA, 2005, p. 47), considerando que os resultados da pesquisa têm como objetivo subsidiar o organismo de acreditação na elaboração de uma política a ser seguida pelos laboratórios para a questão aqui apresentada. Do ponto-de-vista da forma de abordagem, pode ser considerada uma pesquisa qualitativa. Para Neves (1996, p. 1), enquanto os estudos quantitativos geralmente procuram seguir com rigor um plano previamente estabelecido, a pesquisa qualitativa costuma ser direcionada ao longo de seu desenvolvimento. Além disso, não busca enumerar ou medir eventos e, geralmente, não emprega ferramentas estatísticas para a análise dos dados – seu foco de interesse é amplo e parte de uma perspectiva diferente daquela adotada pela pesquisa quantitativa. 309


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É, ainda, um estudo de caso, pois foi pesquisado apenas o universo de laboratórios de análises de água, não considerando os laboratórios voltados para outros tipos de ensaios. Na execução do estudo foi utilizado um questionário (estudo de campo), elaborado em planilha Excel, e enviado aos laboratórios pertencentes ao banco de dados de Laboratórios de Ensaios e de Calibração Acreditados (RBC/RBLE) disponível na homepage do Inmetro, por correio eletrônico. Segundo Marconi e Lakatos (2008, p. 86) questionário é um instrumento de coleta de dados constituído por uma série ordenada de perguntas que devem ser respondidas por escrito e sem a presença do entrevistador. Como técnica de coleta de dados, o questionário apresenta uma série de vantagens e desvantagens. Algumas vantagens são: economiza tempo, viagens e obtém grande número de dados; abrange uma área geográfica mais ampla; obtém respostas mais rápidas e mais precisas; há menos risco de distorção pela não influência do pesquisador. Algumas desvantagens podem ser: percentagem pequena de questionários que voltam; impossibilidade de ajudar o informante em questões mal compreendidas. O envio de questionários por meio eletrônico deveu-se à necessidade de incluir todos os laboratórios do universo da pesquisa, distribuídos por vários Estados do País, o que dificultaria a entrevista pessoal. Primeiro foi perguntado aos laboratórios que materiais de referência (MR) são utilizados como padrão nas análises/ensaios dos parâmetros de interesse. A cada laboratório foi solicitado que respondesse somente uma opção – aquela que fosse a mais freqüente – dentre as 11 respostas possíveis. Depois foi pedido aos laboratórios que indicassem que tipo de certificação ou acreditação, por uma organização independente (de terceira parte), é encontrado no certificado do material ou no certificado de análise que acompanha o material de referência. A cada laboratório foi solicitado que respondesse somente uma opção – aquela que fosse a mais frequente – dentre as quatro respostas possíveis. Neste arti-

go serão discutidas as respostas sobre esta última pergunta, mostrando resultados obtidos para os parâmetros. O universo da pesquisa de campo compreendeu todos os laboratórios de ensaios de águas que prestam serviços analíticos para a ANA: os acreditados, os em fase de acreditação pela Cgcre/Inmetro, e outros laboratórios não acreditados que também prestam serviços à ANA e que participaram de uma comparação interlaboratorial organizada pela Diretoria de Metrologia Científica e Industrial (Dimci) do Inmetro em parceria com a Cgcre/Inmetro.

5. RESULTADOS E DISCUSSÃO O questionário da pesquisa de campo apresentou um quadro quantitativo de respostas mostrado na Tabela 2. Segundo Marconi e Lakatos (2008, p. 86), em média, os questionários expedidos alcançam 25% de devolução. São fatores que exercem influência no retorno dos questionários: “o patrocinador, a forma atraente, a extensão, o tipo de carta que o acompanha, solicitando colaboração; as facilidades para seu preenchimento e sua devolução pelo correio (C. SELLTIZ, 1965, apud MARCONI; LAKATOS, 2008). No total, foram consultados os 62 laboratórios de análises de água prestadores de serviços analíticos para a ANA (que compõem o universo da pesquisa), sobre cada um dos 53 parâmetros. O total de respondentes foi de 31, sendo que 17 destes são laboratórios acreditados. Ou seja, em relação ao número de questionários respondidos, mais de 50% foram os laboratórios acreditados, que evidenciaram a implantação dos requisitos da ABNT NBR ISO/IEC 17025. A quantidade de respostas maior do que a média esperada (25%) pode se dever ao fato das facilidades existentes no relacionamento via correio eletrônico. O questionário enviado foi submetido a um pré-teste para verificação de possíveis falhas.

Tabela 2: Questionários enviados x respondidos, de acordo com o status da acreditação. Status da acreditação do laboratório

310

% de funcionários enviados

respondidos

% de funcionários respondidos por status da acreditação, em relação ao nº total de respondidos

acreditado

23

17

54,8%

em fase de acreditação

28

09

29,0%

participantes da comparação interlaboratorial, não acreditados ou em fase de acreditação

11

05

16,2%

Total

62

31

50,0


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Dentre os 53 parâmetros do PROLAB, serão discutidos neste trabalho resultados dos cinco parâmetros considerados básicos pelo Programa, e um grupo de metais pesados na matriz água, tóxicos ao homem e ao meio ambiente. Ao final, são apresentadas as respostas obtidas para todos os parâmetros, mostrando uma visão geral do tipo de certificação ou de acreditação por uma organização independente (de terceira parte) encontrada no certificado do material ou no certificado de análise que acompanha o material de referência. Cabe também esclarecer que os resultados da pesquisa com valores menores do que 10,0% como resposta não foram comentados. O sistema de informações hidrológicas da Agência Nacional de Águas desenvolve uma série de ações como, por exemplo, avaliação ambiental por bacia hidrográfica; avaliação da rede hidrográfica existente incluindo a qualidade da água; adequação da rede de qualidade da água existente e dos parâmetros analisados em função dos eventos potencialmente impactantes. Sendo assim, convém dar atenção a alguns parâmetros da qualidade da água, especialmente aqueles passíveis de se medir em campo, e que sugerem diferentes tipos de poluição. Dentre esses parâmetros destacam-se: pH, associado à poluição de origem industrial e à qualidade das águas para consumo humano e industrial e para manutenção das comunidades aquáticas; o oxigênio dissolvido (OD), associado à poluição tanto industrial quanto doméstica; a condutividade elétrica, associada à qualidade das águas para irrigação e para uso industrial; a turbidez, associada ao conteúdo de sólidos suspensos na água e aos processos erosivos da bacia contribuinte (PROLAB, 2005). Como informado anteriormente, consta do banco de informações da COMAR somente uma instituição brasileira, o Instituto de Pesquisas Tecnológicas do Estado de S.Paulo (IPT), cujos materiais não se aplicam aos ensaios de águas. Convém lembrar mais uma vez que os materiais de referência certificados importados são caros e de difícil obtenção.

3. Um percentual menor dos laboratórios (26,7%) relata encontrar referência à certificação ISO 9001– requisitos para sistemas de gestão da qualidade– que não está relacionada aos requisitos de competência técnica do ABNT ISO Guia 34 ou da ABNT NBR ISO/IEC 17025. Para o oxigênio dissolvido (OD), o Standard Methods recomenda utilizar os métodos iodométrico e o eletrométrico, os quais incluem etapa de padronização de solução para titulação. Os 41,9% que responderam não haver referência a reconhecimento por terceira parte incluem os laboratórios que utilizam reagente pró-analisis (PA) e os que não utilizam padrão na confecção da solução para titulação (Tabela 3).

C

omo estratégia no curto prazo, propõe-se à Cgcre/Inmetro uma política com vistas a efetivar a implementação dos requisitos para “Aquisição de serviços e suprimentos” da ABNT NBR ISO/IEC 17025.

5.1 pH, oxigênio dissolvido, condutividade, temperatura e turbidez Para a avaliação do pH, o Standard Methods recomenda, no método 4500 H+ B (método eletrométrico), o uso de solução tampão do NIST, que no Brasil seria correspondente a uma solução tampão produzida pelo Inmetro. A maioria dos certificados recebidos pelos laboratórios (46,7%) não faz nenhum tipo de referência a reconhecimento por terceira parte, o que pode ser observado na Tabela

Para a condutividade elétrica, o Standard Methods recomenda, no procedimento 2510 B (medição em laboratório – condutivímetro), o preparo de uma solução padrão de referência. A maioria dos certificados recebidos pelos laboratórios (45,2%) não faz nenhum tipo de referência a reconhecimento por terceira parte. Um percentual menor (22,6%), apresentado na Tabela 3, relata encontrar referência à certificação ISO 9001 que não está relacionada aos requisitos de competência técnica do ABNT ISO Guia 34 ou da ABNT NBR ISO/IEC 17025. A turbidez é uma expressão da propriedade ótica que faz com que a luz seja dispersa e absorvida, ao invés de ser transmitida sem alteração na sua direção ou no nível do fluxo através da amostra. O Standard Methods recomenda, no procedimento 2130 B (método nefelométrico), o uso de uma suspensão padrão de referência, que pode ser preparada no laboratório. Os resultados desse ensaio são expressos em NTU (unidades de turbidez nefelométrica). A maioria dos certificados recebidos pelos laboratórios (41,9%) não faz nenhum tipo de referência a reconhecimento por terceira parte. Um percentual menor (19,5%) relatou encontrar referência à certificação ISO 9001 (ver Tabela 3). 5.2 Metais (cádmio, chumbo, cobalto, cobre, níquel, prata e zinco) Os efeitos dos metais em água e efluentes podem ser variados, benéficos, prejudiciais ou extremamente tóxicos. 311


Moura, S. S.; Costa, S. R. R. Estudo da utilização de materiais de referência nas análises de água por laboratórios envolvidos no sistema de acreditação. Produção, v. 19, n. 2, p. 304-316, 2009

Alguns metais são essenciais ao crescimento dos animais e dos vegetais, enquanto outros podem afetar adversamente os consumidores de água e os sistemas de tratamento de efluentes. Os benefícios e toxidez dependem das suas concentrações em água. O Standard Methods prescreve vários procedimentos para determinação de metais, por espectrometria de absorção atômica, espectrometria de emissão de plasma, método eletrométrico para chumbo, cádmio e zinco, método colorimétrico para chumbo, métodos da neocuproína e da batocuproína. Todos os procedimentos requerem a construção de curva de calibração. A maioria dos certificados recebidos pelos laboratórios (35,5%) não contém referência a reconhecimento por terceira parte. Um percentual menor, 19,4%, relata encontrar referência à certificação ISO 9001 que não está relacionada aos requisitos de competência técnica do ABNT ISO Guia 34 ou da ABNT NBR ISO/IEC 17025 (ver Tabela 4). 5.3 Arsênio total O arsênio é usado em ligas com chumbo, em baterias e munições. Os compostos de arsênio são muito utilizados em pesticidas e na preservação de madeiras. O arsênio não é elemento essencial às plantas, mas, em traços, é essencial

a várias espécies animais. A toxidez do arsênio depende da forma química. Alguns compostos de arsênio são considerados cancerígenos. O Standard Methods recomenda, além dos procedimentos espectrométricos utilizados para metais, o método do ditiocarbamato de prata. Todos os procedimentos requerem construção de curvas de calibração. Os resultados desta pesquisa para o parâmetro “arsênio total” foram similares aos resultados de metais discutidos em 5.2, conforme pode ser observado na Tabela 4. 5.4 Bário total O bário é usado nas lamas de perfuração de poços de petróleo, venenos de ratos, pigmentos, produtos pirotécnicos e em medicamentos. Dependendo da concentração, o bário é tóxico ao ambiente marinho. O Standard Methods recomenda, para determinação de bário, os procedimentos espectrométricos utilizados para metais. Esses procedimentos requerem a construção de curvas de calibração. Os resultados desta pesquisa para o parâmetro “bário total” também foram similares aos resultados de metais discutidos em 5.2, conforme pode ser observado na Tabela 4.

Tabela 3: Certificados de MR ou de análise com acreditação/certificação. Respostas

pH (%)

OD (%)

Condutividade (%)

Turbidez (%)

Não analisam este parâmetro

16,7

35,5

22,6

25,8

Não responderam

3,3

16,1

3,2

9,7

Referência à certificação ISO 9001

26,7

3,2

22,6

19,5

Acreditação ISO/IEC 17025

3,3

----

3,2

----

Produtor de MR conforme ISO Guide 34

3,3

3,2

3,2

3,2

Nenhuma dessas referências

46,7

41,9

45,2

41,9

Tabela 4: Metais, arsênio total e bário total - Certificados de MR ou de análise com acreditação/ certificação.

312

Respostas

Metais (%)

As (%)

Ba (%)

Não analisam este parâmetro

41,9

41,9

45,2

Não responderam

----

----

----

Referência à certificação ISO 9001

19,4

12,9

12,9

Referência à acreditação ISO/IEC 17025

----

----

----

Referência à acreditação do produtor de MR conforme ISO Guide 34

3,2

3,2

3,2

Nenhuma dessas referências

35,5

41,9

38,7


Moura, S. S.; Costa, S. R. R. Estudo da utilização de materiais de referência nas análises de água por laboratórios envolvidos no sistema de acreditação. Produção, v. 19, n. 2, p. 304-316, 2009

Na Tabela 5, é apresentada uma consolidação das respostas para todos os 53 parâmetros (pH, condutividade, oxigênio dissolvido, turbidez, cor, teor de sólidos, parâmetros biológicos, indicadores de matéria orgânica, metais, agrotóxicos etc.). A maioria dos certificados recebidos pelos laboratórios de água pesquisados não contém referência alguma a reconhecimento por terceira parte. Uma proporção bem menor dos laboratórios relata encontrar referência à certificação ISO 9001 que não está relacionada aos requisitos de competência técnica do ABNT ISO Guia 34 ou da ABNT NBR ISO/IEC 17025. No entanto, no grupo dos laboratórios postulantes à acreditação, a maior incidência é de certificados com referência à norma ISO 9001. Uma proporção pequena afirmou encontrar referência a reconhecimento de terceira parte baseada na norma ABNT NBR ISO/IEC 17025 ou no ISO Guide 34.

5.5 Proposta de melhoria da rastreabilidade Considerando que diversos fatores determinam a correção e confiabilidade dos ensaios realizados, inclusive fatores humanos, acomodações e condições ambientais, métodos de ensaio e validação de métodos, equipamentos, amostragem, manuseio de itens de ensaio e rastreabilidade da medição (ABNT NBR ISO/IEC 17025, item 5.1.1), uma proposta de melhoria pode ser considerada, baseada em Engelhard et al. (2004) e nos resultados obtidos com esta pesquisa realizada e que foi apresentada ao Inmetro visando a garantir a rastreabilidade dos resultados de ensaios dos laboratórios, quando há dificuldade em obter materiais de referência certificados. Os pontos dessa proposta são: – o laboratório de ensaio deve calibrar os seus equipamentos em laboratório com competência demonstrada para o serviço de calibração pertinente. O laboratório de ensaio deve seguir a política de participação em atividade

de ensaio de proficiência estabelecida no documento da Cgcre/Inmetro NIT-DICLA-026, de forma a demonstrar comparabilidade dos seus resultados de ensaio com os seus pares; o laboratório de ensaio deve procurar por MR rastreáveis, preferencialmente MRC; deve demonstrar que buscou na base de materiais de referência COMAR e que segue as orientações do DOQ-CGCRE 016 para seleção e uso de materiais de referência; o laboratório de ensaio deve questionar o produtor do material de referência se tem ou pretende pedir acreditação segundo a ABNT NBR ISO/IEC 17025, ou ISO Guide 34, pois um MR de um produtor acreditado reduz custos para o laboratório e facilita a confirmação da rastreabilidade. O certificado do material de referência deve estar de acordo com o ABNT ISO Guia 31, demonstrando que o laboratório aplica o item 4.6 da ABNT NBR ISO/IEC 17025; o laboratório de ensaio deve trabalhar com um método normalizado. Quando este não existir, o laboratório deve proceder à validação do método, seguindo as orientações do DOQ-CGCRE-008; o laboratório de ensaio deve definir as incertezas dos resultados e as variáveis do método de ensaio que podem afetar a qualidade do resultado do ensaio. Cuidar para que essas variáveis sejam rastreáveis às unidades SI, sempre que possível, seguindo as orientações do EURACHEM/ CITAC Guide Quantifying Uncertainty in Analytical Measurement. O laboratório de ensaio deve proceder ao controle da qualidade na implantação do método no laboratório e na sua aplicação na rotina (curva de calibração x resposta, cartas de controle etc.); o laboratório de ensaio deve proceder às verificações intermediárias de balanças, termômetros etc.

Tabela 5: Certificados de MR ou de análise com acreditação/certificação – Resultados consolidados para os 53 parâmetros analisados. Respostas

Todos %

Acreditados %

Postulantes %

Participantes do Interlaboratorial %

Não analisam este parâmetro (pH, condutividade, OD, turbidez, metais e os demais parâmetros do PROLAB)

49,7

44,4

59,3

50,2

Não responderam

5,2

3,2

7,1

8,3

Referência à certificação ISO 9001

12,7

8,8

22,2

9,0

Acreditação ISO/IEC 17025

1,5

0,8

3,6

0,0

Produtor de MR conforme ISO Guide 34

1,5

0,2

1,0

6,8

Nenhuma dessas referências

29,4

42,6

6,7

25,7

313


Moura, S. S.; Costa, S. R. R. Estudo da utilização de materiais de referência nas análises de água por laboratórios envolvidos no sistema de acreditação. Produção, v. 19, n. 2, p. 304-316, 2009

– o laboratório de ensaio deve preparar soluções em frascos calibrados e proceder a verificações intermediárias com soluções de trabalho; – o laboratório de ensaio deve documentar e monitorar dados históricos coletados para identificação de tendências; – quando do preparo de MR de trabalho no laboratório, este deve assegurar-se de que o equipamento esteja calibrado, deve monitorar a estabilidade e homogeneidade do MR, documentar procedimentos e os resultados obtidos. Quando não houver MRC de um produtor de MR acreditado ou de um instituto nacional de metrologia, o laboratório de ensaio deve: verificar se o certificado de análise recebido com o composto define o tipo de MR; e solicitar informação adicional do fornecedor do material sobre estabilidade, homogeneidade, rastreabilidade e incerteza para os valores declarados no certificado de análise, aplicando o requisito 4.6 da ABNT NBR ISO/IEC 17025. – O laboratório de ensaio deve manter documentadas todas as informações disponíveis sobre o MR (coletar dados e manter histórico), manter conhecimento histórico sobre o fornecedor de MR, visando o controle da qualidade dos ensaios e propiciando o conhecimento sobre o processo de medição. – Nos casos em que nada do que foi recomendado acima puder ser executado, usar o método de ensaio sempre do mesmo modo, com os mesmos materiais e nas mesmas condições, com controles apropriados (particularmente para métodos empíricos). Fixar todas as variáveis do processo de medição, como analista, equipamento, amostra, método, visando controlar as fontes de erro no processo. Todas as proposições acima só podem ser implementadas com sucesso com pessoal de laboratório adequadamente treinado, o que não é tarefa simples, conforme ilustra uma pesquisa da ILAC, feita em 2004, junto a organismos de acreditação de 51 países, para verificar os problemas encontrados pelos laboratórios em relação à conversão do antigo ISO Guide 25 para a primeira versão da ISO/IEC 17025 em 1999. O resultado mostrou que, na visão dos gerentes dos laboratórios, ainda havia carência de treinamento em temas como estimativa de incerteza de medição, validação de métodos, comparações interlaboratoriais, rastreabilidade e tópicos relacionados ao sistema de gestão da qualidade (McNAIR, 2004). O detalhamento para implantação desta política pode ser encontrado no trabalho de Moura (2006, p.190). Conforme constatado nesta pesquisa, a utilização de poucos certificados de MR com reconhecimento de ter314

ceira parte, de acordo com a ISO/IEC 17025 ou ISO Guide 34 – normas que tratam efetivamente da rastreabilidade – poderá acarretar em barreiras técnicas e poderá trazer sérios problemas na análise das águas, como apontado pela ANA. Uma das causas de os certificados não apresentarem reconhecimento de terceira parte pode estar relacionada ao fato de o usuário não exigir do produtor o fornecimento de certificados de análise reconhecidos. O usuário (laboratório), por sua vez, também pode não estar sendo exigido pelo organismo de acreditação, Cgcre/Inmetro. O cliente do laboratório, que também é parte interessada no sistema de acreditação de laboratórios, também não é exigente nesse aspecto. A infraestrutura para tratar de materiais de referência (e sua rastreabilidade) no País ainda não é capaz de atender às necessidades dos laboratórios. Sabe-se que, por enquanto, o suprimento das necessidades por materiais de referência na maioria dos países do mundo é insuficiente. Com a ILAC sinalizando um futuro acordo de reconhecimento mútuo para produção de materiais de referência, a Cgcre/Inmetro deve preparar-se para tal, sob o risco de ocorrer uma real defasagem tecnológica. Apesar dos esforços de se implantar a metrologia química no País, ficou evidente que ainda há carência de materiais de referência que atendam aos laboratórios de análise de águas. Desse modo, a implementação do item “Aquisição de serviços e suprimentos” (4.6) da ABNT NBR ISO/IEC 17025 por parte do laboratório de ensaio, com políticas e procedimentos para a seleção e compra de serviços e suprimentos utilizados que afetem a qualidade dos ensaios, irá modificar as relações cliente/fornecedor promovendo uma melhoria da qualidade no fornecimento de materiais de referência.

6. CONCLUSÕES Como estratégia no curto prazo, este trabalho foi apresentado à Cgcre/Inmetro, indicando a proposta de uma política para os laboratórios de ensaios integrantes do seu sistema de acreditação, conforme Capítulo 5 deste artigo, com vistas a efetivar a implementação dos requisitos para “Aquisição de serviços e suprimentos” da ABNT NBR ISO/IEC 17025 por parte dos laboratórios, caracterizando os estudos práticos de implantação das etapas da política proposta nesta pesquisa. Como estratégia no médio prazo, a Cgcre/Inmetro está implementando um programa de acreditação de produtores de materiais de referência, em consonância com normas internacionais, além do programa de acreditação de provedores de ensaios de proficiência para apoiar a política de


Moura, S. S.; Costa, S. R. R. Estudo da utilização de materiais de referência nas análises de água por laboratórios envolvidos no sistema de acreditação. Produção, v. 19, n. 2, p. 304-316, 2009

participação em atividades de ensaios de proficiência estabelecida na NIT-DICLA-026. Finalmente, os resultados e recomendações constantes deste trabalho pretendem alertar a sociedade civil, os laboratórios, os centros de pesquisa, acadêmicos ou não, e os governos para a importância do tema, considerando

que conclusões equivocadas quanto ao resultado de análises sejam de água ou de outras substâncias que possam comprometer a saúde dos seres vivos e a sobrevivência do ecossistema, podem ser irreversíveis e, portanto, de grande importância para garantir a sustentabilidade atualmente tão buscada.

Artigo recebido em 27/06/2007 Aprovado para publicação em 26/03/2009

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SOBRE OS AUTORES Suzana Saboia de Moura Inmetro End.: Rua Santa Alexandrina 416, 7º andar – Rio Comprido – Rio de Janeiro – RJ – 20261-232 Cel: (21) 9738-7754 Fax (trabalho): (21) 2563-2860 E-mail: ssmoura@inmetro.gov.br e suzanamoura@terra.com.br Stella Regina Reis da Costa UFRRJ/IT/DTA End.: BR 465, Km 7 – Seropédica – RJ – 23890-000 Cel: (21) 9802-3680 Fax: (21) 3787-3750 E-mail: stella@ufrrj.br e stellare@ig.com.br 316

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Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 317-331

Análise comparativa de modelos de alinhamento estratégico Vanderli Correia Prieto EPUSP e Mackenzie Marly Monteiro de Carvalho EPUSP Adalberto Américo Fischmann FEA/USP

RESUMO Este trabalho se insere no campo de pesquisa em estratégia organizacional e apresenta uma revisão e análise comparativa dos modelos de alinhamento estratégico. A relevância deste estudo está relacionada à importância da execução da estratégia no contexto competitivo e, ao mesmo tempo, à dificuldade enfrentada, devido à complexidade do processo de implementação da estratégia. Foram feitas buscas em periódicos acadêmicos relevantes com a proposta de identificar modelos teóricos que pudessem servir de referência para o processo de alinhamento estratégico. Quatro modelos foram selecionados e analisados utilizando-se o método de análise de conteúdo. A análise comparativa pautou-se em quatro componentes: visão do alinhamento, modelo para implementação, elementos do modelo e processos gerenciais para implementação. Em cada modelo identificam-se diferentes visões sobre como desenvolver o alinhamento, sobre quais elementos e processos gerenciais devem ser considerados. A pesquisa amplia o conhecimento sobre os fatores que contribuem para a eficácia do processo de alinhamento e sobre como desenvolvê-los, além de identificar lacunas na literatura. PALAVRAS-CHAVE Administração estratégica, estratégia organizacional (modelos), eficácia organizacional, planejamento estratégico, desempenho organizacional.

Comparative analysis of strategic alignment models ABSTRACT This work refers to the organizational strategy research field, in which a review and comparative analysis of the strategic alignment models is presented. The relevance of this study is related to the importance of the strategy execution in the competitive context, as well as the difficulties faced due to the complexity of the strategic implementation process. Searches were performed into relevant academic journals in order to identify theoretical models that could be useful as a reference to the strategic alignment process. Four models were selected and analyzed based on the content analysis approach. The comparative analysis was deployed into four components: vision of alignment, model for implementation, elements of the model, and managerial procedures for implementation. In each model was identified different vision on how to develop alignment, and which elements and managerial procedures must be considered. The research enhanced the understanding of the factors that contribute to the alignment process effectiveness and how to develop them, besides it identifies gaps in the literature. KEY WORDS Strategic management, organizational strategy (models), organizational effectiveness, strategic planning, organizational performance.

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Prieto, V. C.; de Carvalho, M. M.; Fischmann, A. A. Análise comparativa de modelos de alinhamento estratégico. Produção, v. 19, n. 2, p. 317-331, 2009

1. INTRODUÇÃO Estudos recentes apontam que a execução bem-sucedida da estratégia é considerada pelos executivos como uma prática relevante para o bom desempenho organizacional. Em particular, a pesquisa de Nohria et al. (2003) junto a 160 empresas, durante um período de dez anos, revela que, dentre mais de 200 práticas administrativas, a execução da estratégia foi destacada como uma das quatro que são críticas para o sucesso empresarial. Nesse contexto, o alinhamento é um conceito central retratado pelas pesquisas na área de estratégia, que representam, em linhas gerais, dois eixos sobre a questão da vantagem competitiva. O primeiro eixo aborda a questão da vantagem competitiva com ênfase no poder do mercado, sendo o alinhamento uma condição inerente ao ajuste da estratégia às oportunidades e ameaças do ambiente de atuação da empresa (PORTER, 1979). Já o segundo eixo foca na visão da empresa baseada em recursos (Resourced Based View – RBV), cuja ênfase do alinhamento recai primeiramente sobre os fatores internos (BARNEY, 1991; COLLIS; MONTGOMERY, 1995; WERNERFELT, 1984). Embora o conceito de alinhamento ou ajuste tenha suas origens nas ciências naturais, no modelo ecológico e na teoria da contingência, ele também aparece como tema central em várias disciplinas (GALBRAITH; KAZANJIAN, 1986; POWELL, 1992; SEMLER, 1997; VENKATRAMAN; CAMILLUS, 1984). Por exemplo, no campo das disciplinas voltadas à gestão das organizações, pode-se encontrar o tema de alinhamento na gestão por objetivos (management by objectives – MBO) e no gerenciamento pelas diretrizes, conhecido pelos nomes que os originaram, hoshin kanri ou policy deployment, com aplicação na área de gestão da qualidade. No campo da estratégia, o conceito de alinhamento é um requisito presente tanto no processo de formulação quanto de implementação da estratégia (HREBINIAK; JOYCE, 2001; VENKATRAMAN; CAMILLUS, 1984;). Na formulação o conceito refere-se ao ajuste da estratégia ao ambiente competitivo e também está presente na ideia do consenso entre os estrategistas quanto ao resultado das decisões estratégicas, o que irá influenciar o grau de comprometimento e impulsionar a comunicação da estratégia aos demais níveis hierárquicos (EISENHARDT, 1999; FLOYD; WOOLDRIDGE, 1992). Na implementação é requerida a integração entre vários elementos, em especial o alinhamento da estrutura, pessoas, sistema de informações, métricas e recompensas para viabilizar a proposta estratégica. Se, por um lado, a literatura e a prática organizacional apontam para a importância do alinhamento, autores como 318

Cypher, (1996), Naman e Slevin (1993), Prieto e Carvalho (2004a, 2004b), Semler (1997), Venkatraman e Camillus (1984) concordam que há lacunas para que o conceito possa ser adequadamente aplicado. Venkatraman e Camillus (1984) assumem esta lacuna especificamente no campo da estratégia, em que coexistem diferentes perspectivas para a aplicação do conceito de alinhamento dependendo das escolas de pensamento que o empregam. Dada sua complexidade, o conceito de alinhamento é tratado e investigado segundo construtos distintos, de alinhamento externo (formulação da estratégia) interno (implementação da estratégia) e integrado. Existem ainda as classificações quanto ao conteúdo, elementos a serem alinhados com a estratégia, ou quanto ao processo, como realizar o alinhamento. Há um consenso na literatura de que a prioridade de pesquisadores e executivos tem sido a formulação em detrimento da implementação da estratégia (ATKINSON, 2006; BOSSIDY; CHARAN, 2005; HREBINIAK; JOYCE, 2001). Em consequência, os executivos se ressentem da dificuldade de gerenciar e controlar as diversas atividades de implementação, e os interesses e conflitos de tantos envolvidos, em diferentes funções ou organizações. Destaque-se que a essência da estratégia é manter as organizações competitivas em meio às descontinuidades, o que implica um processo de implementação dinâmico e que envolve a coordenação de múltiplas variáveis e períodos de tempo mais extensos do que os despendidos no processo de formulação. Neste sentido, atribui-se aos modelos de alinhamento interno a finalidade de assegurar que as atividades necessárias à implementação da estratégia sejam ordenadas de maneira lógica, e integradas e levem ao sucesso na atividade de execução (HREBINIAK; JOYCE, 2001; PRIETO, 2006). Este trabalho visa identificar modelos teóricos que possam servir como referência para o processo de alinhamento interno, bem como as ações ou etapas que fazem parte desse processo. A delimitação do trabalho se deu considerando-se que as diferentes classificações de alinhamento, interno e externo, apresentam uma grande diversidade das variáveis a serem investigadas e, ainda, diante da lacuna identificada na literatura quanto à dificuldade de operacionalização do conceito de alinhamento estratégico, em particular o alinhamento interno, no qual as lacunas são mais significativas. O artigo está estruturado em cinco seções. A seção 2 apresenta a síntese da discussão teórica sobre alinhamento estratégico e operacionaliza os construtos da pesquisa. A abordagem metodológica é apresentada na seção 3, justificando a opção pelo método de análise de conteúdo. Na seção 4 são apresentados quatro modelos de alinhamento


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estratégico, sua análise distintiva e identificação das lacunas na literatura. Finalmente, a seção 5 traz as conclusões, limitações e recomendações para trabalhos futuros.

2. FUNDAMENTOS TEÓRICOS E PRINCIPAIS CONCEITOS O conceito de alinhamento tem as suas origens nos estudos da abordagem contingencial. As principais influências estão nos estudos sobre o alinhamento entre a organização e o ambiente (BURNS; STALKER, 1961; KATZ; KAHN 1966; THOMPSON, 1967). De acordo com Ginsberg e Venkatraman (1985), o pensamento contingencial destaca que não existe uma única melhor maneira de administrar e que tudo depende das características ambientais relevantes para a organização; a ideia central é o alinhamento dos recursos organizacionais às oportunidades e ameaças do ambiente (ANDREWS, 1971; CHANDLER, 1962). Outro alinhamento relevante é entre a tecnologia e a estrutura (WOODWARD, 1965). Adicionalmente, os contingencialistas estabeleceram, também, a conexão entre o alinhamento e a performance organizacional, que, em geral, apresenta uma correlação positiva, ou seja, a boa performance das organizações está associada a um alinhamento adequado entre as variáveis endógenas (estratégia, estrutura e processos gerenciais) e as variáveis exógenas (incerteza ambiental e tecnologia). Outra corrente influente na literatura sobre alinhamento é o pensamento sistêmico, aliado ao conceito de sistemas abertos originário dos estudos de Bertalanffy, nos anos 1950. Nessa abordagem, a organização é considerada como um organismo vivo, que influencia e é influenciada pelo ambiente, o que exige capacidade de adaptação e equilíbrio. Adaptação no sentido de que mudanças internas serão necessárias para atender às demandas do ambiente externo, enquanto que o equilíbrio visa manter o grau de coesão entre as dimensões internas. Na literatura sobre estratégia o conceito de alinhamento pode assumir o sentido de agrupamento, coesão, ajuste, congruência entre diferentes dimensões (GALBRAITH; KAZANJIAN, 1986). O termo mais utilizado para abordar o alinhamento estratégico externo é ajuste (fit). O conceito de alinhamento externo está presente na literatura referindo-se ao ajuste das capacidades, recursos e estratégia ao ambiente competitivo da organização. Mais precisamente, “fit” tem sido definido como o grau de ajuste da organização ao ambiente (NAMAN; SLEVIN, 1993).

As pesquisas sobre alinhamento externo têm sido conduzidas em termos de integração de capacidades (FUCHS et al., (2000); alinhamento dinâmico e inércia organizacional (SIGGELKOW, 2001; ZAJAC, et al. 2000), formulação da estratégia e desempenho organizacional (DESS, 1987), dentre outras. Já o alinhamento estratégico interno pode assumir diferentes denominações na literatura, como implementação da estratégia, coesão e coerência corporativa. Essa classificação refere-se à mobilização dos recursos internos, tangíveis ou intangíveis, para implementação da estratégia formulada. As suas raízes teóricas estão na literatura de implementação da estratégia e de mudança organizacional (STEPANOVICH; MUELLER, 2002; VENKATRAMAN; CAMILLUS, 1984). A proposição de Chandler (1962) sobre o alinhamento da estrutura à estratégia é seminal neste campo de estudos. Também são relevantes os trabalhos que surgiram nos anos 1970 com a visão da organização baseada em recursos (RBV), com destaque para Galbraith (1977), Peters e Waterman (1982) e Miles e Snow (1978). Neste contexto, os elementos chave a serem alinhados incluem a estratégia, as pessoas, a estrutura e a gestão dos processos.

O

processo de alinhamento estratégico é definido como o exercício prático de um conjunto de atividades estruturadas com a finalidade de realizar o alinhamento estratégico. Para Miles e Snow (1984), o alinhamento estratégico é visto tanto como um processo quanto como um resultado, em busca do ajustar dinâmico da organização ao seu ambiente externo e aos recursos internos. Segundo os autores, “organizações de sucesso realizam o alinhamento estratégico em relação ao seu mercado de atuação e suportam as suas estratégias com estruturas e processos gerenciais adequados”. Os estudos geralmente abordam a necessidade de manter os recursos da organização internamente alinhados durante a implementação da estratégia, em particular, em tempos de mudança estratégica, conforme destacado nos trabalhos de Kilman (1989) desenvolvidos em ambientes de fusão e aquisição O consenso estratégico é também uma das dimensões do alinhamento interno que sobressaem na literatura e refere-se à concordância, ao consenso de opiniões que se estabelece tanto na formulação, quanto na implementação da estratégia, representado pelos trabalhos de Dess (1987), Floyd e Wooldridge (1992), Holmburg et al. (1999) e Priem (1990). 319


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O desempenho da organização é altamente dependente tanto do alinhamento interno como do externo e o processo de alcançar ambos os alinhamentos é dinâmico e precisa ser continuamente monitorado e ajustado (LABOVITZ; ROSANSKY, 1967; SIGGELKOW, 2001). Contudo, uma característica dos estudos de alinhamento é que as bases teóricas traçadas e os principais construtos e variáveis para o alinhamento interno e externo são distintos, conforme destacado por Prieto (2006), Prieto e Carvalho (2004a, 2004b), Stepannovich e Mueller (2002) e Venkatraman e Camillus (1984). O alinhamento externo considera a perspectiva da formulação da estratégia e, primariamente, o ajuste da estratégia às variáveis ambientais. Em contraste, o foco do alinhamento interno é a implementação e o ajuste entre a estratégia e as variáveis internas.

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pergunta para o que a organização precisa fazer para ter sucesso com uma estratégia já determinada. Estando a estratégia definida, o problema reside na necessidade de escolher uma forma para alcançar os objetivos propostos. Neste contexto, a literatura propõe ferramentas para medir o grau de alinhamento estratégico, que conduzam a organização a um estágio de controle da estratégia (KAPLAN; NORTON, 1996; FUCHS et al., 2000; LABOVITZ; ROSANSKY, 1997). Por outro lado, outros autores, como Campbell e Alexander (1997) e Hambrick e Cannella (1989) apresentam argumentos contrários à distinção entre formulação e implementação. Para estes autores, apesar de a média gerência não ter necessariamente o perfil requerido de um estrategista, o conhecimento das operações diárias e a gestão de linha de frente do negócio são fontes importantes para a inovação estratégica, sendo que a probabilidade destas idéias emergirem é maior no processo criativo de formulação da estratégia. Outros argumentos dizem respeito à necessidade de planejar e analisar os ajustes necessários à implementação já na fase de formulação para ter certeza de que a estratégia é viável. Em ambientes turbulentos, a estratégia pode ser modificada devido ao próprio processo de aprendizado e crescimento que acontece quando a estratégia é colocada em ação. Nesse contexto a estratégia enquanto processo assume maior relevância. Para Mintzberg (1994) é necessário construir um entendimento de que a estratégia não é necessariamente um exercício formal, pois sua essência é a concretização da estratégia por meio das ações. Em outras palavras, a estratégia é elaborada para ser concretizada, mas a prática da implementação também pode levar a mudanças estratégicas. Deve-se, portanto, considerar não só o intencional, mas também as estratégias emergentes, o que atribui ao processo estratégico a característica de inovação e aprendizado. Eisenhardt (1999) destaca ainda o caráter intuitivo do processo estratégico e advoga uma abordagem por regras simples que permita o rápido ajuste em ambientes turbulentos (EISENHARDT; SULL, 2001). Deriva desse cenário a necessidade de constante revisão, o que dá a característica dinâmica ao processo estratégico (CHRISTENSEN, 1997; COURTNEY; KIRKLAND; VIGUERIE, 1997) Na dinâmica deste processo de transformação da estratégia em ação, o melhor plano estratégico não é considerado linear, mas circular, no sentido de que é continuamente avaliada e revisada a maneira como está sendo conduzido, por meio das ações de planejamento, mensuração e ajuste (Mc-

visão do alinhamento determina a escolha do modelo, de seus elementos e do processo gerencial a ser desenvolvido para promover o alinhamento estratégico 2.1 Implementação de estratégias organizacionais Conforme já destacado, o alinhamento é ao mesmo tempo um resultado e um processo (MILES; SNOW, 1984). Um processo é comumente definido como um conjunto de tarefas e atividades que contribui para transformar entradas em saídas. No caso do alinhamento enquanto processo, o conceito refere-se ao exercício prático de um conjunto de atividades estruturadas com a finalidade de realizar o alinhamento estratégico (PRIETO, 2006). O exercício do alinhamento interno deve levar à implementação bem-sucedida da estratégia. A formulação e a implementação são claramente relacionadas e interdependentes, e fazem parte de um mesmo processo: o processo estratégico. Entretanto, cada uma destas atividades pode ser diferenciada e discutida separadamente, conceitualmente e na prática. Na lógica, a implementação segue a formulação. A ideia de que para promover a implementação é necessário ter uma estratégia claramente definida está presente na literatura acrescida de argumentos sobre os fatores e os processos que favorecem ou não a sua implementação. Bower (1982), por exemplo, ressalta que enquanto o processo de formulação da estratégia foca no que a empresa pode fazer de melhor para enfrentar o ambiente competitivo no qual está inserida, o processo de implementação da estratégia muda o foco da 320


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CONKEY, 1988). Bower (1982) apresenta um entendimento semelhante, quando afirma que o processo de implementação não necessariamente precisa começar com a formulação da estratégia, mas que todas as partes do processo estratégico estão ativas a todo momento. Diante da complexidade que se impõe, um modelo de alinhamento estratégico tem a finalidade de assegurar que as atividades necessárias ao processo de transformação da estratégia em ação sejam ordenadas de maneira lógica e integrada, sem perder a flexibilidade, permitindo que mudanças estratégicas possam ser incorporadas a este processo. Corroborando com este raciocínio, Hrebiniak e Joyce (2001) afirmam que para minimizar a complexidade deste processo, a utilização de um modelo de implementação estratégica possibilitaria aos administradores um delineamento lógico das principais categorias de atividades de implementação e das relações entre elas. Teria como vantagem reduzir a uma dimensão tratável e administrável um problema antes extremamente complexo e, mais importante, deduzir consequências e resultados específicos das atividades de implementação (FISCHMANN, 1987). O modelo integra variáveis que têm sido tratadas separadamente na literatura, mas que precisam ser visualizadas e discutidas em conjunto a fim de aumentar a compreensão do processo total de implementação (HREBINIAK; JOYCE, 2001). Desta forma, optou-se pela análise de modelos cujo foco seja o alinhamento interno, que se desenvolve no âmbito da implementação da estratégia. Esse recorte metodológico permite reduzir a diversidade das variáveis a serem investi-

gadas e auxilia na análise comparativa dos modelos extraídos da revisão de literatura. Além disso, a lacuna de literatura sobre alinhamento interno é maior, conforme já destacado na seção introdutória.

3. ASPECTOS METODOLÓGICOS Conforme exposto na seção introdutória, dada a especificidade e abrangência das variáveis a serem investigadas, as pesquisas sobre alinhamento são conduzidas em termos de alinhamento externo e interno. Seguem a taxonomia dos estudos da área de estratégia, elaborados, respectivamente, em termos de formulação e implementação. O presente estudo tem como objetivo identificar modelos na literatura que possam servir como referência para o processo de alinhamento estratégico interno. Pretende-se investigar quais ações ou etapas fazem parte do processo de alinhamento. Para tanto, um quadro analítico distintivo destes modelos será elaborado, visando identificar lacunas entre os mesmos. A figura 1 sintetiza a abordagem metodológica utilizada. Considerou-se um modelo como sendo uma estrutura teórica que pode indicar quais fatores são mais críticos ou importantes em um dado contexto e como tais fatores estão relacionados entre si, conforme definido por Nadler e Tushman (1980). Uma premissa da construção de um modelo é a efetiva organização de suas subpartes ou componentes, que devem ser consistentemente estruturadas e gerenciadas buscando a congruência.

Abordagem metodológica

Objetivos

Questão

- Identificar modelos teóricos que possam servir de referência para o processo de alinhamento estratégico interno. - Elaborar um quadro analítico distintivo destes modelos. - Identificar lacunas entre os modelos. Quais ações ou etapas fazem parte do processo de alinhamento estratégico interno? Definição do universo

Método de pesquisa – Análise de Conteúdo

Categorização

Análise e interpretação dos dados

Identificação de modelos de alinhamento estratégico A posteriori, buscando elementos que permitam descrever e comparar os modelos

Análise qualitativa

Discussão dos elementos presentes ou ausentes em cada modelo e análise conjunta dos mesmos, utilizando como base o quadro teórico e o quadro analítico distintivo dos modelos

Figura 1: Abordagem metodológica. 321


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Considerando-se a delimitação do trabalho, a prioridade é a seleção de modelos que tenham uma proposta para alinhamento dos aspectos internos da organização. Este e outros termos relevantes para o entendimento da estrutura deste artigo estão definidos no Quadro 1. A formulação do quadro-analítico baseou-se no método de pesquisa denominado análise de conteúdo. Segundo Bardin (2000), é necessário definir os limites da análise de conteúdo, o seu campo, onde começa e acaba e com qual finalidade será empregada. Propõe-se que a análise seja organizada cronologicamente em: pré-análise; exploração do material e tratamento; e interpretação dos resultados. As atividades-chave dentro deste processo são: (1) a definição do universo, ou seja, a escolha de documentos, (2) a categorização e (3) a análise e interpretação dos resultados. Definição do universo: é composta pelos quatro modelos de alinhamento estratégico que serão apresentados e discutidos na próxima seção. Os modelos foram selecionados pela sua adequação à delimitação e ao conceito de alinhamento estratégico interno propostos neste trabalho. A base teórica utilizada para a seleção dos modelos foi construída por meio do levantamento cruzado de referências, o qual foi realizado a partir dos trabalhos de Stepanovich e Mueller (2002) e Prieto e Carvalho (2004a). Foram analisados 40 trabalhos provenientes de periódicos das áreas de administração e negócios e foram encontrados seis modelos de alinhamento estratégico, sendo que dois deles não se adequavam à proposta deste trabalho. Categorização: esta etapa destina-se a determinar as dimensões que serão analisadas e serve para classificar o conteúdo e deve, normalmente, permitir o aparecimento de variáveis e fatores de influência que se ignoravam no início dos trabalhos. As categorias, quando não se tem uma

ideia precisa, devem surgir com base no próprio conteúdo (WEBER, 1990). Na análise inicial dos modelos identificou-se que os autores apresentavam diferentes perspectivas sobre como desenvolver o processo de alinhamento estratégico. Assumiu-se que a visão do alinhamento seria um dos elementos para categorização do conteúdo. Em seguida, para cada um dos modelos, foram extraídas dos textos dos autores todas as frases que representavam características dos modelos. O agrupamento e a análise de tais características levaram à compreensão dos componentes que descrevem os modelos: (1) visão do alinhamento, (2) modelo para implementação da estratégia, (3) elementos do modelo e (4) processos gerenciais desenvolvidos para promover o alinhamento estratégico. Análise e interpretação dos resultados: será elaborado um quadro analítico visando a comparação e identificação de lacunas entre os modelos. A análise será qualitativa, por meio da discussão dos elementos presentes ou ausentes em cada modelo, utilizando como base o quadro teórico.

4. APRESENTAÇÃO DOS MODELOS DE ALINHAMENTO ESTRATÉGICO Foram identificados quatro modelos de alinhamento estratégico interno, por meio do processo de busca e revisão da literatura: - Modelo 1 - Labovitz e Rosansky (1997) - Modelo 2 - Balanced scorecard: Kaplan e Norton (1992, 1993, 1996, 2000) - Modelo 3 - Hambrick e Cannella (1989) - Modelo 4 - Organizational Fitness Profiling (OFP): Beer e Eisenstat (1996, 2000)

Quadro 1: Definição dos termos-chave do artigo. Alinhamento estratégico: tanto um processo como um resultado – uma dinâmica que procura ajustar a organização externamente em relação ao seu ambiente de atuação, por meio da formulação da estratégia (alinhamento externo) e, internamente, buscando um todo coeso entre a estratégia, os recursos e os processos gerenciais (alinhamento interno). Aspectos internos da organização: refere-se aos elementos a serem alinhados internamente, definidos como estratégia, recursos e processos gerenciais, e que englobam, por exemplo, a estratégia, a estrutura, processos, pessoas, clientes, habilidades, liderança, sistemas de remuneração, sistemas de informação e os processos gerenciais. Cada uma das dimensões precisa ser consistente com a estratégia e umas com as outras. Modelo de alinhamento estratégico: representação sistemática de um conjunto de princípios e ações com a finalidade de promover o alinhamento estratégico. Processo de alinhamento estratégico: exercício prático de um conjunto de atividades estruturadas com a finalidade de realizar o alinhamento estratégico. Processo de alinhamento estratégico interno: exercício prático de um conjunto de atividades estruturadas com a finalidade de promover a implementação da estratégia.

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Nesta seção será feita uma breve apresentação destes modelos. 4.1. Modelo 1 - Labovitz e Rosansky Labovitz e Rosansky (1997) vêm o alinhamento como um processo de integração dos elementos da organização em torno do propósito essencial dos negócios, denominado por eles “the main thing”. Não se apresenta uma definição precisa para o termo, a proposta é a elaboração de uma estratégia ampla, um diferencial dos negócios capaz de fazer com que as pessoas tenham uma direção única com um propósito compartilhado. Os elementos a serem alinhados são a estratégia e pessoas (alinhamento vertical) e clientes e processos (alinhamento horizontal) – ver Figura 2. O alinhamento no sentido vertical trata da relação entre a definição da estratégia de negócios da empresa e a efetiva concretização da estratégia pelas pessoas. O modelo considera o sistema de métricas a chave para a realização do alinhamento vertical, aliado a recompensas e reconhecimento. O desdobramento da estratégia requer a implementação de indicadores críticos de sucesso, metas e atividades, definidos a partir do propósito essencial, e que devem ser levados a todos os níveis hierárquicos da organização. O alinhamento no sentido horizontal é um alinhamento entre clientes e processos. A dimensão horizontal envolve a compreensão das necessidades do cliente e o alinhamento dos processos (interfuncionais) capazes de entregar o que o cliente necessita. A ideia também é identificar quais são os clientes alvo deste processo – os clientes certos. Labovitz e Rosansky (1997) propõem uma ferramenta específica para diagnosticar o grau de alinhamento, que per-

estratégia

processos

Propósito essencial

pessoas

Figura 2: Modelo 1 - Labovitz e Rosansky. Fonte: Adaptado de Labovitz e Rosansky, 1997, p. 44.

clientes

mite traçar o perfil de alinhamento da organização. A ideia é de um autodiagnóstico; a própria organização pode aplicar, internamente, um questionário proposto pelos autores. O resultado será uma medida visual e quantitativa do grau de alinhamento entre a estratégia, as pessoas, os processos e os clientes. 4.2. Modelo 2 - Balanced scorecard (BSC) A base para a elaboração do BSC é a definição ou revisão da estratégia da empresa, que deve considerar os fatores críticos de sucesso para atuação no segmento de negócios no qual a empresa está inserida. O modelo considera, então, a estratégia já formulada, a qual será desdobrada em um scorecard multidimensional, integrando, além das medidas de desempenho financeiro, medidas de desempenho relacionadas às perspectivas dos clientes, dos processos internos e de aprendizado e crescimento (KAPLAN; NORTON, 1992, 1993, 1996 e 2000). A Figura 3 apresenta o modelo. Enquanto sistema de alinhamento estratégico, o modelo apoia-se em dois eixos principais, o da comunicação e do controle da estratégia. A proposta do BSC é disseminar o conhecimento a respeito da estratégia por todos os níveis e áreas da organização por meio do mapa estratégico. A dinâmica de controle da estratégia acontece pela definição de medidas de desempenho equilibradas, indicadores de tendência (leading) e de resultado (lagging), financeiras e não financeiras, que permitem acompanhar o desempenho dos negócios no curto e no longo prazo. 4.3 Modelo 3 - Hambrick e Cannella Na visão de Hambrick e Cannella (1989), o alinhamento é visto como um processo gerencial a ser conduzido pelo estrategista. Apoia-se em um processo de negociação da estratégia, interna e externamente à organização, buscando eliminar obstáculos, promover ajustes e convencer a respeito da importância da estratégia. O modelo para realizar o alinhamento caracteriza-se pela definição das etapas a serem conduzidas pelo executivo, desde a formulação até a implementação da estratégia. Uma das ideias centrais destes autores é que a implementação da estratégia começa na formulação. Consideram que um sinal de uma estratégia bem formulada é ser implementável e que separar as fases de formulação e implementação é a raiz para muitas falhas na execução. O modelo envolve três etapas (ver Figura 4). A primeira, é considerada uma “preparação de terreno” para a nova estratégia e inclui ter uma amplitude de entradas para a formulação da estratégia e cuidar dos obstáculos de implementação. A segunda etapa consiste em tratar das influências que são relevantes para a implementação, 323


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segundo cinco aspectos: comprometimento dos recursos, políticas e programas das subunidades, estrutura, recompensas e pessoas. A terceira etapa é o convencimento a respeito da estratégia, envolvendo todos os níveis, dentro e fora da organização. Trata-se do papel do estrategista de construir e manter o suporte necessário para a implementação da estratégia em meio às resistências que naturalmente surgem devido ao interesse de determinadas partes em manter a velha estratégia ou por falta de compreensão da nova proposta. 4.4 Modelo 4 - Organizational Fitness Profiling (OFP) Beer e Eisenstat (1996, 2000) desenvolveram uma ferramenta que foi primeiramente denominada Strategic Human Resource Management (SHRM) e depois Organizational Fitness Profiling (OFP), respectivamente, em duas publicações: 1996 e 2000. O alinhamento é considerado um processo de mudança que envolve o aprendizado da própria organização a respeito da reformulação da estratégia e do realinhamento constante. O modelo proposto (Figura 5) é o diagnóstico de ajuste organizacional que visa à identificação de barreiras ao alinhamento, o qual deve ser seguido da elaboração de um plano para eliminar as deficiências encontradas. Quatro questões-chave orientam o diagnóstico: Na caixa 1 questionam-se quais são as deficiências em capacidades que podem afetar a performance financeira, a

Para ser bemsucedido financeiramente, quais resultados devemos apresentar aos shareholders?

Para realizar a nossa visão, o que nós devemos apresentar aos nossos clientes?

metas iniciativas

Processos Internos

Clientes Objetivos medidas

metas iniciativas

Para satisfazer Objetivos medidas nossos clientes e shareholders, ESTRATÉGIA quais processos precisamos melhorar?

VISÃO

Aprendizado e Crescimento Para realizar a nossa visão, o que nós devemos mudar ou melhorar?

Objetivos medidas

metas iniciativas

Figura 3: Modelo 2 – Balanced scorecard. Fonte: Adaptada de Kaplan e Norton, 1996.

324

5. DISCUSSÃO DOS RESULTADOS Nesta seção faz-se a análise comparativa dos modelos a partir de quatro componentes, seguida de uma análise geral dos modelos face aos principais construtos de alinhamento estratégico.

Financeiro Objetivos medidas

satisfação dos clientes e a satisfação dos empregados, representados na caixa 2. As capacidades organizacionais demandam que a liderança coloque em prática as habilidades de coordenação entre as partes da organização, obtenha o comprometimento das pessoas e dos grupos para a realização das tarefas estratégicas e desenvolva competência técnica e interpessoal para solucionar problemas e coordenar soluções. A satisfação dos stakeholders é condição para a sobrevivência da organização. Na caixa 3 busca-se diagnosticar como as forças e as deficiências nas capacidades organizacionais poderiam afetar o sucesso na implementação das alternativas estratégicas. Além disso, identificam-se quais forças contextuais (caixa 4) – como políticas corporativas e comportamento da alta administração (no caso de divisões de grandes empresas) bem como as forças competitivas ou do mercado de trabalho podem causar os problemas. Conclui-se o diagnóstico investigando os aspectos da estrutura organizacional (caixa 5) que podem estar causando as deficiências identificadas na capacidade organizacional. Uma das condições para a aplicação do modelo é um ambiente participativo, uma vez que todo o processo é conduzido por uma força-tarefa composta para este fim, que conduz o processo internamente e apresenta e discute os resultados com a alta administração.

metas iniciativas

5.1 Análise comparativa dos modelos de alinhamento Os modelos foram submetidos ao método da análise de conteúdo com o objetivo de permitir a análise comparativa e a identificação de lacunas. Aplicou-se a categorização proposta na seção de metodologia para a descrição dos modelos: (1) visão do alinhamento, (2) modelo para implementação da estratégia, (3) elementos do modelo e (4) processos gerenciais desenvolvidos para promover o alinhamento estratégico. Os resultados estão demonstrados no Quadro 2. Foram identificadas quatro diferentes visões a respeito do alinhamento: (1) como um processo de integração dos recursos e sistemas da organização em torno do propósito essencial dos negócios; (2) como processo de desdobramento da estratégia em indicadores de desempenho; (3) como processo de negociação e convencimento a respeito da estratégia; (4) como processo de mudança.


Prieto, V. C.; de Carvalho, M. M.; Fischmann, A. A. Análise comparativa de modelos de alinhamento estratégico. Produção, v. 19, n. 2, p. 317-331, 2009

Nota-se no Quadro 2 que essas visões sobre o alinhamento apresentam duas vertentes, a da seleção e a da exclusão dos elementos e processos gerenciais que devem compor o modelo de alinhamento. Uma análise comparativa dos modelos permite identificar, então, as principais lacunas. Os modelos 1 e 2 apoiam-se em um sistema de métricas para alinhamento estratégico. Ambos especificam clientes, processos e pessoas como dimensões a serem alinhadas. O aprendizado e crescimento (modelo 2) não são enfatizados no modelo 1, assim como finanças. Neste sentido, as perspectivas do modelo 2 são mais abrangentes, uma vez que a perspectiva de aprendizado e crescimento trabalha com as condições de sobrevivência da empresa no médio e longo prazo. Esses modelos têm a estratégia como base para o desdobramento dos indicadores de desempenho. O modelo 2 não enfatiza parâmetros para a definição da estratégia que sirvam de base para o processo de alinhamento interno. Esta definição acontece no modelo 1, ainda que não seja aprofundada, quando trata do propósito essencial. No modelo 2 o alinhamento ocorre por meio da interdependência entre os indicadores quando da construção do mapa estratégico. Já no modelo 1, o alinhamento ocorre por meio do desdobramento hierárquico dos indicadores de desempenho. O modelo 2 mantém a coesão entre as quatro perspectivas, o que não fica claro no modelo 1. Não é uma prioridade do modelo 2 abordar os aspectos intangíveis presentes em um processo de alinhamento. É uma prioridade do modelo incluir tais aspectos no sistema de métricas. O modelo 1 admite a influência de tais aspectos, principalmente liderança e cultura, mas também não trata de como desenvolvê-los.

ção ssoas plememnpta im a sa . Pe n n e s te levan . Estrutura . Reco re s ia c n Influê as das

Amplitude de entradas

Tratamento cuidadoso dos obstáculos de implementação

Os modelos 3 e 4 são mais explícitos ao abordar os aspectos intangíveis presentes em um processo de alinhamento estratégico. No modelo 4, o levantamento de barreiras à implementação da estratégia acontece junto às pessoas no ambiente interno à organização, ao contrário do que propõe o modelo 3. Uma lacuna do modelo, portanto, é não considerar que os obstáculos à implementação da estratégia podem estar no ambiente externo e podem não ter sido percebidos por pessoas internas à empresa. O foco do modelo 4 é diagnosticar as barreiras que possam comprometer a implementação de uma estratégia que se encontra em ação. Neste sentido, comparando-se com o modelo 3, identifica-se uma lacuna neste modelo, de ser reativo e não proativo no levantamento de barreiras à implementação da estratégia. No modelo anterior tem-se a visão de evitar as barreiras à estratégia por meio do processo de negociação e convencimento. Não é uma prioridade dos modelos 3 e 4 definir uma estrutura para desdobramento da estratégia, como é apresentado nos modelos 1 e 2, por meio da construção dos mapas estratégicos. Identificam-se nos modelos diferentes processos gerenciais para implementação da estratégia e, inerentemente, diferentes habilidades para colocá-los em ação. Nos modelos 1 e 2, o sistema de métricas é a chave para o desenvolvimento dos processos gerenciais de planejamento, implementação e revisão da estratégia. Requer, principalmente, a habilidade de construir, comunicar e gerenciar os indicadores de desempenho. Entende-se que os mesmos processos estão compreendidos no modelo 3, porém a chave para o seu desenvolvimento é a capacidade de articulação e planejamento

Nova estratégia

ram to . Prog nidades metimen u ro b p su m o C . os de recurs . De baix o . De cima para cim a . Para fora para baix o

Convenc

imento d

Eficácia da implementação da estratégia . Interdep

a estraté

gia

artamenta

l

Preparação do terreno Figura 4: Modelo 3 - Hambrick e Cannella. Fonte: Adaptada de Hambrick e Cannella, 1989.

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do estrategista. No modelo 4, a base para o desenvolvimento dos processos gerenciais é o diagnóstico realizado em um clima de diálogo amplo, que requer a habilidade, ou coragem (BEER; EISENSTAT, 2004) de publicamente confrontar as barreiras à implementação da estratégia. Ora os modelos tendem a priorizar aspectos tangíveis (modelos 1 e 2), ora intangíveis (modelos 3 e 4) presentes em um processo de alinhamento estratégico. No modelo 3, o processo de alinhamento estratégico assume uma característica proativa – não evidenciada com a mesma ênfase nos outros modelos – devido ao planejamento da implementação da estratégia durante a fase de formulação e pela forma com que propõe a identificação e tratamento de barreiras à implementação em todo o processo. Os modelos também se diferenciam pela proposta da identificação de barreiras à implementação da estratégia (modelos 3 e 4), diagnóstico de alinhamento (modelos 1 e 4), determinação do papel do estrategista na implementação (modelo 3) e por promover um questionamento das capacidades, inclusive dos executivos, nas escolhas estratégicas (modelo 4). 5.2. Fatores-chave para o alinhamento estratégico Os modelos selecionados estão de acordo com a definição de alinhamento proposta neste trabalho (ver Quadro 1). Identifica-se um processo de alinhamento em termos de

4) CONTEXTO Ambiente Organizacional Políticas Práticas Cultura Ambiente Competitivo

2) SATISFAÇÃO DOS STAKEHOLDERS Shareholder Clientes Empregados

1) CAPACIDADES ORGANIZACIONAIS Coordenação Comprometimento Competência Funcional Interpessoal

5) ESTRUTURA E POLÍTICAS DE RH Efetividade da Liderança e staff Organização do Trabalho Estrutura Sistema Influência (Horizontal e Vertical) Mecanismo Estilo Pessoas Critério de Seleção e Promoção Progressão da Carreira Desenvolvimento Sistema de Recompensa Filosofia e Valores da Administração

3) ALTERNATIVAS ESTRATÉGICAS . Baixo Custo . Alta qualidade . Excelência no serviço/entrega . Inovação/Tecnologia . Rapidez na Introdução de Produtos

Figura 5: Modelo 4 - Beer e Eisenstat. Fonte: Adaptada de Beer e Eisenstat, 1996.

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elementos a serem ajustados e processos gerenciais a serem conduzidos, com o objetivo de obter o resultado previsto na implementação da estratégia. A identificação de lacunas entre os modelos deixa explícitas as limitações individuais de cada um deles, ao mesmo tempo em que amplia a compreensão sobre o conceito de alinhamento estratégico interno. Uma análise conjunta dos modelos identificados (Quadro 2) com os principais construtos de alinhamento identificados na literatura (ver seção 2) permite identificar lacunas teóricas a serem desenvolvidas, bem como buscar a complementaridade entre os modelos, aumentando a cobertura do tema. Para promover essa análise foram considerados quatro imperativos consolidados pela literatura (ver Quadro 3): ambiente, estrutura/sistema, liderança e estratégia (MILLER, 1987). Pode-se observar no Quadro 3 que os modelos identificados focam em aspectos relacionados a estrutura/sistemas e liderança. Por um lado, essa característica é derivada do foco em modelos de alinhamento estratégico interno, em que o ajuste externo (formulação), em parte, é assumido como realizado. No entanto, a literatura sobre implementação de estratégia é enfática em salientar a característica dinâmica do processo de alinhamento, que envolve inovação e aprendizado, e pode levar a mudanças estratégicas (MINTZBERG, 1994, EISENHARDT, 1999, EISENHARDT; SULL, 2001). Desta forma, os modelos de alinhamento interno identificados, embora adotem a lógica de que a implementação segue a formulação, devem também conceber que os aspectos endógenos também têm força para influenciar e modificar as estratégias e o ambiente, e que o modelo de implementação deve manter canais abertos de realimentação. Apenas o modelo 3 assume uma característica mais proativa, com canais atrelados à formulação da estratégia e sua revisão com base no tratamento de barreiras à implementação em todo o processo. De maneira geral, os modelos enfatizam, com relação à estratégia, o foco nos interesses dos stakeholders, aspecto, em geral, monitorado por indicadores e relacionado às premiações. Outro aspecto enfatizado nos modelos selecionados é o quão compreensível a estratégia é para aqueles que vão colocá-la em ação. A literatura considera que a definição de objetivos que tenham significado para as pessoas não é uma tarefa tão simples e não pode ser confundida com a simples declaração, sem a devida apropriação pela organização, de termos como visão, missão, intenção estratégica, objetivos dos acionistas e foco no cliente. Campbell e Alexander (1997) sugerem que a chave para o desenvolvimento de uma boa estratégia está na conscientização de seus benefícios pelos executivos. É necessário que os executivos tenham clareza do composto de valor proposto pela organização, sua distinção


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face aos concorrentes, os segmentos de mercado almejados e, em especial, as escolhas feitas e os trade-offs que ela exige (PORTER, 1996) . Quanto ao imperativo ambiente, os modelos são vagos e retornam à temática do interesse dos stakeholders, mas com a perspectiva de gerenciamento das mudanças na estratégia. Os modelos buscam estabelecer canais de informação que levem à revisão da estratégia formulada e também ao tratamento de possíveis obstáculos a mudanças na estratégia, advindos da fase de implementação. Para tanto, propõem, em geral, diagnósticos das capacidades organizacionais, em uma linha aderente à corrente da visão da empresa baseada em recursos (BARNEY, 1991; COLLIS; MONTGOMERY, 1995; WERNERFELT, 1984).

Os modelos dedicam boa parte de suas variáveis a aspectos relacionados à estrutura e aos sistemas organizacionais. A análise dos modelos traz uma contribuição relevante quanto à necessidade do alinhamento tanto dos elementos formais (como estrutura, processos, indicadores, sistemas de recompensa), quanto dos informais (como pessoas, cultura, sistema de liderança). A eficácia na implementação da estratégia vai depender da forma como a organização é gerenciada, da flexibilidade da estrutura e dos sistemas e do grau de envolvimento das pessoas com as mudanças propostas. Desta forma, os modelos buscam mecanismos de desdobramento e comunicação da estratégia, e constroem métricas e/ou ferramentas de diagnóstico que permitam monitorar o grau de alinhamento e a evolução da estratégia em curso.

Quadro 2: Quadro analítico distintivo dos modelos de alinhamento estratégico interno. Componentes

Modelo 1 Labovitz e Rosansky (1997)

Modelo 2 Balanced Scorecard Kaplan e Norton (1992, 1993, 1996 e 2000)

Modelo 3 Hambrick e Cannella (1989)

Modelo 4 Beer e Eisenstadt (1996 e 2000)

Visão do alinhamento

processo de integração dos recursos e sistemas da organização em torno do propósito essencial dos negócios

processo de desdobramento da estratégia em um conjunto equilibrado de medidas de desempenho

. processo gerencial, previamente planejado e conduzido pelo estrategista

. processo de mudança sistêmico e participativo

estabelecimento de indicadores críticos de sucesso, metas e atividades definidos a partir do propósito essencial

construção de mapas estratégicos (balanced scorecards)

etapas (trilha) a serem conduzidas pelo estrategista

diagnóstico de ajuste organizacional e plano de implementação

Elementos do modelo

alinhamento entre quatro elementos em duas dimensões . estratégia e . pessoas (alinhamento vertical) . clientes e . processos (alinhamento horizontal)

indicadores balanceados em quatro perspectivas: . financeira . clientes . processos . aprendizado e crescimento

. amplitude de entradas na formulação . obstáculos à implementação . influências relevantes na implementação . convencimento a respeito da estratégia

. capacidades organizacionais . contexto (ambiente organizacional e competitivo) . estrutura e políticas de Recursos Humanos . opções estratégicas

Processos gerenciais para implementação

PDR . planejamento . desenvolvimento . revisão

. tradução da visão . comunicação e ligação . planejamento do negócio . feedback e aprendizado

.definição da direção estratégica . definição de planos . negociação . convencimento . monitoramento e controle

. ter uma declaração sobre as diretrizes estratégicas . conhecer barreiras e forças à implementação . desenvolver um plano integrado para mudança . refinar o plano . implementar

Modelo para implementação

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São também estabelecidos mecanismos de retroalimentação para promover ajustes necessários ao longo do processo de transformação das estratégias em ação. Nesse contexto, os modelos de alinhamento estudados se aproximam de outros modelos com foco em gestão, como a gestão por objetivos (management by objectives – MBO) e gerenciamento pelas diretrizes (hoshin kanri ou policy deployment) (COLE, 1998; LEE; DALE, 2000, WITCHER, 2003; WOOD JR; URDAN, 1994). Por fim, os modelos se dedicam a explorar o papel da liderança. A própria habilidade de implementar a estratégia é considerada uma fonte de vantagem competitiva. Os modelos atribuem à liderança aspectos como o conhecimento dos obstáculos à implementação (tangíveis e intangíveis) e função proativa na negociação da estratégia, interna e externamente. Adicionalmente, deve garantir o desenvolvimento das capacidades organizacionais, atuando na coordenação, e buscando o comprometimento das pessoas para a execução das estratégias. Finalmente, a liderança deve ser atenta às mudanças ocorridas tanto nas variáveis endógenas quanto nas variáveis exógenas e promover os ajustes necessários com rapidez. Assim como nos modelos selecionados, a literatura destaca esse imperativo. Powell (1992) argumenta que o alinhamento requer que o executivo demonstre uma alta capacidade de integração e que a habilidade de alinhamento organizacional poderia ser considerada um recurso estratégico rentável, capaz de melhorar a performance organizacional. Por outro lado, Eisenhardt (1999) destaca o caráter intuitivo

tão necessário para enfrentar com flexibilidade e agilidade as barreiras tangíveis e intangíveis que surgem ao longo do processo estratégico.

6. CONSIDERAÇÕES FINAIS Este trabalho foi idealizado após a identificação da existência de lacunas na literatura quanto à dificuldade de operacionalização do conceito de alinhamento estratégico interno (CYPHER, 1996; NAMAN; SLEVIN, 1993; PRIETO; CARVALHO, 2004a, 2004b; SEMLER, 1997; VENKATRAMAN; CAMILLUS, 1984). Após a busca e revisão nas bases de dados foram identificados quatro modelos de alinhamento. Os modelos selecionados estão de acordo com a definição de alinhamento proposta neste trabalho (ver Quadro 1) e trazem uma contribuição quanto à definição de elementos a serem ajustados e de processos gerenciais a serem conduzidos no processo de alinhamento interno. Além disso, os modelos apresentam ferramentas para medir o grau de alinhamento (modelo 1), fazer diagnósticos (modelos 1 e 4), bem como sistemas de indicadores de avaliação da evolução das estratégias em curso (modelos 1 e 2). Uma das contribuições do trabalho é apresentar diferentes visões sobre o alinhamento estratégico interno, representadas pelos modelos estudados. No entanto, as diferentes visões não são excludentes e podem ser combinadas ou priorizadas para ampliar a eficácia na implementação da

Quadro 3: Ações para promover o alinhamento estratégico. Estratégia • Clareza na definição estratégica • Definição dos fatores críticos de sucesso • Estratégia alinhada com as necessidades dos stakeholders

Ambiente • Ter informações abrangentes • Analisar obstáculos • Negociar a nova estratégia

Estrutura/Sistema • Desdobrar a estratégia em um conjunto de medidas de desempenho balanceadas • Comunicar a estratégia por meio do mapa estratégico a todos os níveis da organização • Ajustar os processos para atender os requisitos dos clientes • Medir o grau de alinhamento e promover ajustes • Manter atividades de controle da estratégia • Alocação de recursos estratégicos • Sistema de recompensas e reconhecimento • Ajuste de políticas e programas das subunidades • Definição da estrutura • Organização do Trabalho • Pessoas • Cultura Organizacional

Liderança • Conhecer antecipadamente os obstáculos à implementação (tangíveis e intangíveis) • Buscar informação e apoio já no estágio de formulação da estratégia • Negociar a estratégia interna e externamente • Desenvolver as capacidades organizacionais de coordenação, comprometimento e competência técnica e interpessoal voltadas à implementação de estratégias • Ajustar os fatores que influenciam a implementação

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estratégia. Os modelos 1 e 2 representam uma visão mais pragmática do alinhamento, com proposta concreta de envolvimento de toda a organização com a estratégia por meio de um sistema de métricas e mecanismos de diagnóstico e ajustes. A visão deste modelo pode ser ampliada com o entendimento de que um processo de mudança está em ação, de que fatores intangíveis podem representar obstáculos e, também, de que os executivos têm o papel de negociar a estratégia em todos os níveis, aspectos esses mais desenvolvidos nos modelos 3 e 4. Um resultado importante oriundo tanto da análise comparativa dos modelos (seção 5.1) quanto da análise dos imperativos do alinhamento (seção 5.2) é a identificação de lacunas entre os modelos, que deixam explícitas as limitações individuais de cada um deles, ao mesmo tempo em que amplia a compreensão sobre a visão do alinhamento e das ações ou etapas que devem fazer parte do alinhamento para a sua concretização. As lacunas identificadas nesse trabalho podem ser incorporadas aos modelos teóricos e práticos de alinhamento estratégico, que contribuem para ampliar a visão a respeito da eficácia na execução da estratégia, bem como podem aumentar a permeabilidade dos modelos. As diferentes visões e ações podem ser combinadas ou priorizadas para ampliar a eficácia da implementação da estratégia. A escolha do modelo pode se dar, inclusive, de acordo com o grau de maturidade da organização para conduzir um processo de alinhamento. Além disso, os modelos devem refletir o ambiente em que a empresa está inserida. Em ambientes turbulentos, os modelos de alinhamento devem ser mais flexíveis e menos estruturados, dando maior autonomia ao tomador de decisão em busca de agilidade, enquanto em ambientes mais estáveis é possível valer-se de modelos bem estruturados para suporte à decisão, dado que as variáveis e suas relações podem ser modeladas (CARVALHO; LAURINDO, 2007). Por exemplo, o modelo 4 de diagnóstico e implementação da estratégia poderia ser considerado para promover o alinhamento em empresas onde fatores de natureza intangível, tais como capacidades organizacionais de coordenação e formulação da estratégia, filosofias e valores

da administração, além das próprias alternativas estratégicas em relação ao contexto organizacional, precisassem ser prioritariamente questionados e revisados. Já a adoção do modelo 3 parece ser compatível com empresas que tenham um certo conhecimento a respeito do processo de formulação e implementação da estratégia, nas quais o estrategista tende a ter uma visão ampla das variáveis que influenciam a formulação da estratégia e cuide da sua implementação por meio do exercício de atividades, como a alocação de recursos, a remoção de obstáculos e o convencimento a respeito da estratégia.

O

modelo teria como vantagem reduzir a uma dimensão tratável e administrável o problema da implementação da estratégia. Este estudo não se esgota com a identificação das ações e etapas aqui identificadas, que podem ser aprofundadas por meio de uma revisão de literatura pontual sobre cada elemento identificado (exemplo: PRIETO, 2006). As restrições do estudo também dizem respeito à delimitação ao construto de alinhamento interno, quando na prática não é possível dissociar a formulação da implementação da estratégia. Uma sugestão para trabalhos futuros é ampliar a base teórica, identificando outros modelos de alinhamento e outras contribuições para compreensão de como desenvolver o alinhamento estratégico, incorporando a dimensão da formulação da estratégia e ajuste ambiental, ou seja, pesquisar conjuntamente o alinhamento externo e interno. Outra sugestão é confrontar as ações identificadas como sendo relevantes para promover o alinhamento com a prática adotada por empresas. Conforme destacam Hrebiniak e Joyce (2001), trata-se de um tema complexo e os modelos permitem explorar as relações lógicas entre as variáveis e prever os resultados. Por outro lado, os modelos, ao reduzir a realidade à dimensão tratável, promovem simplificações e por isso devem ser vistos dentro de contextos bem delineados, uma vez que a generalização pode conduzir a inadequações.

Artigo recebido em 27/10/2007 Aprovado para publicação em 26/03/2009

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SOBRE OS AUTORES Vanderli Correia Prieto Escola Politécnica da USP / Mackenzie – Centro de Ciências Sociais Aplicadas End.: Av. Prof. Almeida Prado, 128 Tr. 2 Biênio, 2o andar – 05508-900 – São Paulo – SP – Brasil Tel.: (11) 3091-5363 Fax (11) 3091-5399 E-mail: vanderli.prieto@poli.usp.br; vprieto@mackenzie.br Marly Monteiro de Carvalho Escola Politécnica da USP End.: Av. Prof. Almeida Prado, 128 Tr. 2 Biênio, 2o andar – 05508-900 – São Paulo – SP – Brasil Tel.: (11) 3091-5363 r. 303 Fax 3091-5399 E-mail: marlymc@usp.br Adalberto Américo Fischmann FEA/USP End.: Av. Professor Luciano Gualberto, 908 – Sala E-112 – Butantã – 05508-900 – Sao Paulo – SP – Brasil Tel.: (11) 3091-5835 Fax: (11) 3091-5834 E-mail: aafischm@usp.br

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Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 332-344

O custeio ABC e a contabilidade de ganhos na definição do mix de produção de uma metalúrgica Evandro Sylvio Lima Sinisgalli ITA Ligia Maria Soto Urbina ITA João Murta Alves ITA

RESUMO Este trabalho tem como objetivo analisar os métodos do custeio baseado em atividades e da contabilidade de ganhos da teoria das restrições, no que se refere aos critérios de decisão gerencial utilizados pelos mesmos. Uma análise é realizada com a verificação do impacto no lucro, segundo o mix de produção recomendado por cada método. Através de um estudo de caso, constata-se que uma empresa metalúrgica alcança um crescimento expressivo na sua lucratividade, desde o momento em que passou a recorrer à contabilidade de ganhos para sustentar sua tomada de decisões. Mostra-se que o mix de produção selecionado pelo custeio ABC, para o cálculo do custo do produto, gera um prejuízo. Por outro lado, o mix proposto pela contabilidade de ganhos, que recorre ao cálculo do ganho unitário do produto por uso do tempo na restrição, fornece um mix que maximiza o lucro da empresa. PALAVRAS-CHAVE Contabilidade de Custos, Custeio Baseado em Atividades, Contabilidade de Ganhos.

The Activity Based Costing and the throughput accounting in the definition of the production mix in a metalwork firm ABSTRACT The objective of this paper is to analyse the methods of activity-based costing and the throughput accounting of the theory of constraints, with respect to the management decision criteria utilized by them. A analyse is performed to know the impact on profits producing the product mix recommended by each method. It was realized, by means of a case study, that a metalwork firm gets a big increase in its profitability, once it starts using throughput accounting to sustain its decisions. It is shown that the production mix chosen by the ABC costing, for the calculation of the product cost, implies a loss, whereas the mix suggested by the throughput accounting, which calculates product’s unit throughput per use of the time in the constraints, provides a mix that maximize firm’s profit. KEY WORDS Cost Accounting, Activity-Based Costing, Throughput Accounting,

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Sinisgalli, E. S. L.; Urbina, L. M. S.; Alves, J. M. O custeio ABC e a contabilidade de ganhos na definição do mix de produção de uma metalúrgica. Produção, v. 19, n. 2, p. 332-344, 2009

1. INTRODUÇÃO

2. CONTABILIDADE DE CUSTOS

Nos últimos anos a contabilidade gerencial tradicional tem recebido fortes críticas. Muitos afirmam que ela está obsoleta, pois não acompanhou os avanços tecnológicos ocorridos na manufatura. Apesar das mudanças na composição do custo de produção com a introdução da automação nas fábricas, ou seja, a parcela dos custos indiretos de fabricação cresceu de 10% para aproximadamente 65%, a contabilidade tradicional continuou a distribuir esse custo aos produtos utilizando como base de rateio o valor da mão-de-obra direta (CORBETT, 1997). Eliyahu Goldratt é um grande crítico na utilização da contabilidade de custos como ferramenta gerencial. Desde a apresentação da sua teoria TOC (Theory of Constraints), na década de oitenta, ele vem provocando mudanças nas práticas contábeis das organizações, sugerindo a troca da gestão de custos pela gestão de ganhos, evitando-se assim diversos equívocos nas decisões. Neste contexto, surge um novo método contábil cujas raízes se encontram numa teoria que tem uma visão sistêmica da produção e que busca alinhar as decisões locais com as metas de lucro da empresa. Este novo sistema, chamado de contabilidade de ganhos, busca otimizar a utilização dos recursos da empresa que estão sujeitos a restrições de capacidade. Esta otimização preocupa-se com tomar decisões de produção que, no curto prazo, aumentem os ganhos e consequentemente os lucros. Da mesma forma, muitos trabalhos têm apresentado críticas a essa teoria, alegando inconsistência nas decisões no longo prazo, mesmo admitindo seus valores das decisões no curto prazo. Essas críticas são feitas pelos adeptos da utilização, como ferramenta gerencial, da contabilidade de custos e variâncias, como o método de custeio por absorção, o método de custeio variável, o custeio baseado em atividades (ABC – Activity Based Costing), dentre outros. O objetivo deste trabalho é analisar estes dois métodos de custeio, avaliando as soluções oferecidas por eles, para o caso da empresa Guanabara, no que diz respeito a sua contribuição para melhorar a lucratividade da empresa. Este trabalho está estruturado em cinco seções. A seção 2 aborda brevemente os três sistemas de custeio da contabilidade de custos. Na seção 3 é apresentado o método da contabilidade de ganhos da teoria das restrições. A seção 4 traz o estudo de caso da empresa Guanabara, em que é feita a análise do custeio ABC e da contabilidade de ganhos para a identificação do mix de produção mais lucrativo. Finalmente, a seção 5 apresenta as conclusões do presente trabalho.

A tomada de decisões, de acordo com os diversos sistemas de custeio da contabilidade de custos, fundamenta-se no valor apurado do custo do produto. Existem três sistemas de custeio: o custeio por absorção, o custeio variável e o custeio baseado em atividades. Cada um deles é descrito a seguir. 2.1. Custeio por absorção Aprovado pelo sistema fiscal brasileiro, bem como para auditorias externas que aplicam os princípios de contabilidade geralmente aceitos (PCGA), o método do custeio por absorção é o mais difundido, mais antigo e utilizado sistema de custeio empresarial do mundo. Baseado em robustos princípios contábeis, este modelo garante a lógica e integridade dos dados.

O

sistema de custeio baseado em atividade (ABC), primeiramente rateia os custos para as atividades e, em seguida, para os produtos. No custeio por absorção todos os gastos da empresa estão divididos em dois grandes grupos: gastos administrativos e gastos industriais (relacionados à produção). Nesse modelo, somente após a venda de um produto é que serão debitados todos os seus gastos industriais. Portanto, todos os gastos industriais, sejam eles representados pela matéria-prima, mão-de-obra direta ou gastos indiretos com fabricação, devem inicialmente alocar-se nos estoques, transformando-se em custos somente após sua comercialização. Hansen e Mowen (2001, p. 665) explicam esse tipo de custeio: “Ele atribui todos os custos de manufatura, materiais diretos, mão-de-obra direta, custos indiretos de fabricação variáveis e uma parte dos custos indiretos de fabricação fixos para cada unidade do produto”. Desse modo, cada unidade produzida absorve alguns dos custos fixos da fábrica e também os custos variáveis incorridos para fabricá-la. Quando uma unidade de produto é terminada, ela leva esses custos para o estoque. Quando este é vendido, esses custos de produção aparecem na demonstração do resultado como custo dos produtos vendidos (CPV). O lucro bruto é o principal indicador na determinação dos produtos mais rentáveis e que devem ser priorizados na decisão do melhor mix de produção. 333


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2.2. Custeio variável As necessidades legais e de auditoria, sempre na prevenção de fraudes e controle de impostos, geraram uma rigidez no custeio por absorção que inviabiliza seu uso para fins gerenciais. Mesmo os defensores da contabilidade de custos reconhecem a fragilidade do custeio por absorção para esses fins. Martins (2003, p. 197) reconhece que “não há, normalmente, grande utilidade para fins gerenciais no uso de um valor em que existam custos fixos apropriados”. Reconhecendo-se os problemas decorrentes do rateio, no qual eventualmente são alocados custos de um produto para outro, ficou clara a inutilidade, para fins gerenciais, da separação conceitual entre custos e despesas. Desta forma, nasceu o custeio variável, no qual as despesas se misturam com os custos, e estes são analisados somente como fixos e variáveis. Como afirma Martins (2003, p. 198) “portanto, no custeio variável, só são alocados aos produtos os custos variáveis, ficando os fixos separados e considerados como despesas do período, indo diretamente para o resultado; para os estoques só vão, como consequência, custos variáveis”. Hansen e Mowen (2001, p. 668) explicam esse tipo de custeio: “Ele atribui apenas os custos variáveis de manufatura em nível de unidade ao produto; esses custos incluem os materiais diretos, a mão-de-obra direta e os custos indiretos de fabricação variáveis”. Contudo, a definição do custeio variável é discutível, pois nem todos os autores concordam com a definição dada por Hansen e Mowen. Há divergências sobre a classificação da mão-de-obra como custo variável. Vários autores, como por exemplo Guerreiro (2006, p. 17), a consideram como custo fixo. Quando a mão-de-obra direta é considerada fixa, a margem de contribuição é semelhante ao conceito de ganho (preço de venda – custo dos materiais). Os custos indiretos de fabricação (CIF) fixos são tratados como custo do período e não entram no estoque com outros custos dos produtos. Em vez disso, são imputados no resultado do período em que incorrem. O custeio variável apresenta uma boa visão gerencial a partir da margem de contribuição. Eliseu Martins desenvolveu desde meados dos anos oitenta o uso do conceito de margem de contribuição com fator de restrição para definir o mix de produtos mais rentáveis. Neste aspecto o custeio variável com uso do fator de restrição é um precursor da contabilidade de ganhos (MARTINS, 2003). Por não ser reconhecido pela legislação, o custeio variável se transforma num sistema paralelo de custeio gerando custos extras. Martins (2003, p. 203) afirma que “o custeio variável de fato fere os princípios contábeis, principalmente o regime de competência e a confrontação, justificando-se a não aceitação deste para efeitos de balanços e resultados”. 334

2.3. Custeio baseado em atividades (ABC) Na tentativa de apurar o resultado apresentado pelos usuais custeios contábeis surge o custeio baseado em atividades. Este modelo troca o criticado rateio dos custos indiretos, praticado no custeio por absorção, por uma forma mais apurada, na qual os custos são rastreados a partir do mapeamento e da identificação das atividades consumidas pelos produtos. A evolução tecnológica aliada à grande diversidade de produtos e modelos fabricados na atualidade requer um tratamento adequado na alocação dos custos indiretos de fabricação, como afirma Martins (2003), destacando-se a importância de usar o ABC de acordo com os princípios contábeis geralmente aceitos e, desta forma, ser reconhecido pelo Financial Accounting Standards Board (FASB) e Internal Revenue Service (IRS) como um sistema de custeio válido, evitando-se assim a necessidade da manutenção de sistemas de custeios gerenciais paralelos, como é o caso do custeio variável. Muitas referências bibliográficas afirmam que o ABC é apenas uma forma disfarçada de ratear os custos indiretos, porém existe uma grande diferença entre o criticado rateio do custeio por absorção e o rastreamento dos custos ocorrido neste modelo. Nakagawa (2001, p. 29) afirma que “o ABC é um método de análise de custos, que busca rastrear os gastos de uma empresa para analisar e monitorar as diversas rotas de consumo de recursos”. Os custos indiretos de fabricação são estruturados de forma mais realista, ou seja, após um mapeamento dos principais processos que permite localizar as atividades necessárias para a fabricação dos produtos e rastrear o consumo dos gastos para a execução das mesmas. Como no custeio por absorção, o lucro bruto é o principal indicador na determinação dos produtos mais rentáveis e que devem ser priorizados na decisão do melhor mix de produção. O ABC apresenta um lucro bruto mais apurado e realista, se comparado ao custeio por absorção, que contamina o resultado por regras imprecisas de rateio. Hansen e Mowen (2001, p. 392) explicam esse tipo de custeio: “O sistema de custeio baseado em atividade (ABC), primeiramente rateia os custos para as atividades e, em seguida, para os produtos e outros objetos de custo. A suposição subjacente é que as atividades consomem recursos e os produtos e outros objetos de custos consomem atividades”. O ABC tem o seu foco nas atividades e não nos produtos, o que ajuda a evitar as distorções nas informações do custo do produto, que surgem quando da utilização do custeio tradicional, e proporciona uma informação de custo mais precisa.


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Assim, o princípio básico do ABC é identificar as atividades de uma organização e calcular o custo de cada atividade e, depois, calcular o custo do produto baseado no consumo das atividades. Ocorre a utilização de recursos pelas atividades e a demanda de atividades criadas pelos produtos. Recursos são os gastos realizados com a entrada física dos itens requeridos para efetuar uma atividade. Por exemplo: pessoas e máquinas, isto é, gastos com salários e depreciação. Atividade pode ser definida como um processo que combina, de forma adequada, pessoas, tecnologias, materiais, métodos e seu ambiente, tendo como objetivo a produção de produtos (NAKAGAWA, 2001). Hansen e Mowen (2001, p. 396) apresentam os direcionadores de recursos como sendo: “Fatores que mensuram o consumo de recursos pelas atividades”. Por exemplo, o tempo de dedicação das pessoas do departamento de suprimentos para a compra de material. Direcionador de atividade é a medida da frequência e intensidade da demanda colocada em cada atividade pelo produto. Ele é o elo de ligação entre o objeto de custo e as atividades que representam oportunidades para melhorias nos produtos (GUNASEKARAN, 1999). Por exemplo, o número de ordens de compra de material no departamento de suprimentos.

apresenta uma ou mais restrições. De outro modo, ela teria um lucro infinito e nada limitaria o seu desempenho. Portanto, na visão da TOC as diversas decisões internas de uma organização devem centrar-se na otimização da lucratividade obtida no uso do recurso com restrição de capacidade (RRC), se a restrição for interna.

A

contabilidade de ganhos é a contabilidade gerencial criada pela Teoria das Restrições, que se serve de novas medidas operacionais de desempenho para avaliar o impacto das decisões locais na lucratividade da empresa.

3. CONTABILIDADE DE GANHOS A contabilidade de ganhos é a contabilidade gerencial criada pela Teoria das Restrições (Theory of Constraints), que se serve de novas medidas operacionais de desempenho para avaliar o impacto das ações/decisões locais dos gerentes na lucratividade da empresa. Esta teoria, criada pelo físico israelense Eliyahu Goldratt, nos Estados Unidos, em meados da década de 1980, vê a empresa como um sistema, isto é, um conjunto de partes interdependentes, cujo desempenho global depende do comportamento de cada uma das partes. A empresa, como todo sistema, existe para atingir uma meta global. Nem sempre a meta da empresa é imediatamente alcançada, pois existem as restrições do sistema. Goldratt (1990, p. 4), acerca disto, afirma:“A restrição de um sistema é qualquer coisa que impeça um sistema de atingir um desempenho maior em relação à sua meta”. Toda organização produtiva, inserida no contexto do seu mercado, para atingir sua meta de crescente lucratividade

Na busca de “bússolas” que guiassem o gerente na tomada de decisão, Goldratt desenvolveu a contabilidade de ganhos. Ele parte da ideia de que as medidas de desempenho de uma empresa só podem ser conhecidas após a definição da meta da mesma. A meta equivale ao objetivo global da organização. Goldratt (1991, p. 13 e 14) entende que uma empresa com finalidade lucrativa é uma “máquina de fazer dinheiro” e sua meta definida como “ganhar dinheiro, tanto no presente como no futuro”. Busca-se, então, medidas que permitam julgar o impacto de uma ação/decisão local sobre a meta da empresa. Tradicionalmente, dando-se por suposto um fluxo de caixa positivo, têm-se utilizado o lucro líquido e o retorno sobre o investimento; contudo, estas medidas não permitem julgar o impacto de uma ação/decisão local. Goldratt (1991, p. 17), para chegar às medidas operacionais de desempenho, faz a seguinte colocação: “Três perguntas simples: quanto dinheiro é gerado pela nossa empresa? Quanto dinheiro é capturado pela nossa empresa? E quanto dinheiro devemos gastar para operá-la? As medidas são intuitivas, óbvias. O necessário é transformar estas perguntas em definições formais”. Com o intuito de responder às questões levantadas acima, Goldratt apresenta três medidas de desempenho denominadas ganho, investimento e despesa operacional, que são mais bem definidas a seguir. Ganho (G) Esta medida de desempenho é o índice pelo qual o sistema gera dinheiro através das vendas. Concretamente, ganho corresponde ao preço de venda menos o montante dos valores pagos aos fornecedores pelos itens (peças e materiais) incorporados aos produtos vendidos. 335


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Para obter o ganho unitário, recorre-se às seguintes definições: Gu = ganho unitário; Pv = preço de venda unitário; CTV = custo totalmente variável unitário. Assim, Gu = Pv – CTV. Para obter uma medida do ganho total advindo das vendas com o produto, durante o período em estudo, define-se: GTp = ganho total do produto; Q = quantidade vendida no período. Assim, GTp = Gu x Q. Observando-se as fórmulas percebe-se a importância de se definir adequadamente o que se entende por custo totalmente variável. Sob esse aspecto, Corbett (1997, p. 33) colabora esclarecendo o significado do custo totalmente variável: “O fundamental aqui, para dirimir qualquer dúvida, é a palavra totalmente. Totalmente variável em relação às unidades vendidas, isto é, um CTV é aquele montante despendido quando um produto a mais é vendido. O exemplo mais claro de CTV é o custo de matéria-prima; para cada unidade vendida a mais do produto incorre-se no valor da sua matéria-prima”.

P

prima, produtos em processo e produtos acabados) e os demais ativos (máquinas, equipamentos, imóveis, veículos, etc.). Para a TOC, os produtos em processo e os produtos acabados são valorizados apenas pelo custo da matéria-prima neles contida e paga ao fornecedor. O sistema não agrega ao inventário nenhum valor, nem mesmo a mão-de-obra direta. Todos os outros gastos que ocorrem no processo de fabricação, como mão-de-obra, energia elétrica, depreciação, não são alocados ao estoque, mas sim são considerados como despesas operacionais. Não existe critério de rateio dos custos indiretos de fabricação, pois assim se impede a criação de lucros fictícios dos inventários. Despesa Operacional (DO) Goldratt (1991, p. 26) considera que esta medida de desempenho pode ser “... definida como todo dinheiro que o sistema gasta transformando o inventário em ganho”. Neste item são incorporados todos os gastos necessários para o funcionamento da empresa: os salários dos diretores, da mão-de-obra direta, luz, água, impostos, depreciação, seguros, etc. Não se faz nenhuma classificação em fixa, variável, semi-variável, direta ou indireta. Quando são totalmente variáveis, os gastos são classificados como CTV e, quando não são totalmente variáveis, são classificados como despesa operacional. As três medidas operacionais de desempenho, descritas acima, permitem verificar qual é o impacto das ações/decisões dos gerentes no objetivo global da empresa, o lucro. De fato, deve-se notar que essas medidas estão presentes nas fórmulas do lucro líquido (LL) e do retorno sobre investimento (RSI), apresentadas a seguir:

ara medir o impacto de uma decisão no lucro líquido da companhia e no retorno sobre investimento, o custo do produto não precisa ser calculado.

Um aspecto interessante que merece ser salientado é o tratamento que recebe a mão-de-obra direta na contabilidade de ganhos. Nesse método de custeio, a mão-de-obra direta não é deduzida ao calcular o ganho, nem é capitalizada nos estoques, mas considerada como despesa operacional. Percebe-se, ainda, que o emprego das medidas contábeis na TOC pode ocorrer com pequenas alterações, conforme o tipo de negócio relacionado. Em estudo sobre a implementação da TOC em empresas industriais europeias e norteamericanas, Noreen et al. (1996, p. 13) constataram que: “A definição oficial corrente de ganho é receitas menos custos totalmente variáveis. Contudo, na maior parte da literatura TOC, ganho tem sido conceituado como receitas menos o custo do material direto”. Investimento (I) É definido como todo dinheiro que o sistema investe na compra de coisas que pretende vender. O investimento engloba o significado de inventário (estoque de matéria336

LL = G – DO,

RSI = (G - DO) / I.

Então, constata-se claramente a existência de uma relação entre as três medidas operacionais de desempenho (ganho, investimento e despesa operacional) e as medidas financeiras de resultado (lucro líquido e retorno sobre investimento) de uma organização. Analisando a interdependência entre as decisões locais e a lucratividade da empresa Corbett (1996, p. 31) argumenta que: “O ideal é uma decisão que aumente o ganho e diminua o investimento e a despesa operacional. Porém, qualquer decisão que impacte positivamente o retorno sobre o investimento é uma decisão que nos leva na direção da meta do sistema. O juiz final, quem decide se é ou não uma boa decisão, é o retorno sobre investimento. Esse método possibilita que cada um tome as suas decisões como se fosse o acionista”.


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Convém salientar que na avaliação de qualquer decisão é imprescindível não se limitar a analisar apenas uma medida de desempenho. De fato, o que explica o benefício ou a inconveniência de uma decisão é o relacionamento dessas três medidas com as medidas financeiras de resultado. Uma vantagem de se utilizar as medidas de desempenho da contabilidade de ganhos é que não é necessário fazer o rateio dos custos para os produtos, como acontece nos sistemas da contabilidade de custos. Com relação a esta questão, Corbett (2000, p. 39) diz que: “A contabilidade de ganhos não rateia custos para os produtos. Para medir o impacto de uma decisão no lucro líquido da companhia e no retorno sobre investimento, o custo do produto não precisa ser calculado”. Os defensores da contabilidade de ganhos acreditam que este sistema é uma excelente ferramenta para apoiar as decisões de produção. Mais ainda, eles argumentam que este método é superior à contabilidade de custos como “bússola” orientadora nas decisões relativas ao mix de produção mais lucrativo. Assim, a seguir são utilizadas as informações contábeis da empresa Guanabara para realizar uma análise das soluções oferecidas pelo custeio ABC e pela contabilidade de ganhos, no que diz respeito ao mix de produção mais lucrativo para a empresa.

Inglaterra, Alemanha, Canadá, Estados Unidos, China, África do Sul, México e países da América Latina. É especializada em tecnologia de fundição Zamak, injeção de plástico e cromeação e fabrica maçanetas, cilindros de ignição e outros componentes para veículos. Também, fabrica torneiras para residências, registros de pressão e filtros.

O

s investimentos concentraram-se no recurso com restrição de capacidade, para garantir que ele trabalhasse da melhor forma possível e com o mínimo de desperdício.

4. ESTUDO DE CASO: GUANABARA A empresa Guanabara (fictícia) comercializa seus produtos no mercado brasileiro e atua em vários países, tais como,

A divisão automotiva atua no mercado nacional e internacional de auto-peças para reposição, sendo que sua estratégia é investir em exportações, já que o mercado brasileiro apresenta características de saturação. Essa divisão tem um faturamento mensal de R$ 750.000,00. Seus principais concorrentes são as empresas Itacolomi e Alfa. A Figura 1 mostra a posição da Guanabara no mercado de autopeças. A divisão água atua no mercado nacional e fatura mensalmente R$ 630.000,00. Seus principais concorrentes são as empresas: Filtros Cratos e Itaim. A Figura 2 mostra a posição da Guanabara no mercado de água. A Guanabara tem 20.000 m2 de área construída, conta com um total de 120 funcionários, sendo que 70 trabalham na produção da divisão automotiva e 50 na produção da divisão água. A contabilidade de custos, através do custeio por absorção, apresenta a Tabela 1 com a demonstração do resultado da empresa, no período de 1996 a 2003.

Outros 8% Alfa 17%

Outros 5% Guanabara 25%

Guanabara 35%

Filtros Cratos 35%

Itacolomi 40%

Figura 1: Participação no mercado de autopeças

Itaim 35%

Figura 2: Participação no mercado de água

337


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4.1 Evolução histórica dos indicadores financeiros Nos anos 1996 e 1997, quando era utilizada a metodologia do custeio por absorção para a tomada de decisões, a Tabela 1 revela que a empresa alcançou prejuízos anuais de R$ 336.000,00 e R$ 120.000,00, respectivamente. No período de 1998 a 2003, quando a contabilidade de ganhos foi introduzida para a tomada de decisões, a empresa obteve lucros líquidos anuais crescentes de R$ 60.000,00, R$ 480.000,00, R$ 1.152.000,00, R$ 1.620.000,00, R$ 2.470.000,00 e R$ 3.180.000,00, respectivamente. O ambiente externo à empresa no período de 1996 a 2003 correspondeu a implantação do Plano Real, eleição e reeleição do presidente Fernando Henrique Cardoso, com a queda da inflação e pequeno crescimento da economia. Ao longo desse período, os investimentos concentraramse no RRC (Recurso com Restrição de Capacidade), para garantir que ele trabalhasse da melhor forma possível e com o mínimo de desperdício. Nos anos 1998 e 1999 os gastos limitaram-se às despesas com manutenção desses recursos. A partir do ano 2000, com a identificação da divisão água,

como a atividade principal, a especialidade onde a empresa poderia ser mais competitiva, começa-se a investir em novos produtos, moldes, equipamentos e ferramentas para essa divisão. A Tabela 2, elaborada segundo a metodologia da contabilidade de ganhos, mostra a demonstração do resultado da empresa no período 1998 a 2003. O lucro líquido apresenta os mesmos valores da Tabela 1, pois não foram consideradas as variações de estoque de produtos acabados nesse período. A diferença para a contabilidade de custos está na identificação do CTV, do ganho total e no cálculo da despesa operacional. A Tabela 3, elaborada de acordo com o custeio por absorção e com dados oriundos da Tabela 1, mas refletindo uma abordagem gerencial baseada na TOC e na contabilidade de ganhos, traz a decomposição porcentual do resultado da empresa, no período de 1998 a 2003. Ela fornece informações relevantes. Constata-se que de 1998 a 2003 o índice CPV/Fat Líq diminuiu de 96,67% para 77,54%. Quando se começou a

Tabela 1: Demonstração do resultado (valores anuais (*) R$ mil) Anos

1996

1997

1998

1999

2000

2001

2002

2003

Fat. Líquido

11.400,00

12.000,00

10.800,00

12.600,00

13.812,00

14.520,00

15.550,00

16.560,00

(-) CPV

11.400,00

11.760,00

10.440,00

11.760,00

12.240,00

12.360,00

12.540,00

12.840,00

0

240,00

360,00

840,00

1.572,00

2.160,00

3.010,00

3.720,00

(-) DO: DA + DV

336,00

360,00

300,00

360,00

420,00

540,00

540,00

540,00

Lucro Líquido

-336,00

-120,00

60,00

480,00

1.152,00

1.620,00

2.470,00

3.180,00

Investimento

12,00

12,00

0

0

120,00

360,00

500,00

600,00

960%

450%

494%

530%

Lucro Bruto

RSI

Tabela 2: Demonstração do resultado (valores anuais (*) R$ mil) Anos

1998

1999

2000

2001

2002

2003

Fat Líquido

10.800,00

12.600,00

13.812,00

14.520,00

15.550,00

16.560,00

(-) CTV

3.360,00

4.080,00

4.320,00

4.680,00

4.810,00

4.920,00

Ganho Total

7.440,00

8.520,00

9.492,00

9.840,00

10.740,00

11.640,00

1

8.040,00

8.340,00

8.220,00

8.270,00

8.460,00

Lucro Líquido

60,00

480,00

1.152,00

1.620,00

2.470,00

3.180,00

Investimento

-

120,00

360,00

500,00

600,00

960%

450%

494%

530%

(-) DO

RSI

338

7.380,00

-


Sinisgalli, E. S. L.; Urbina, L. M. S.; Alves, J. M. O custeio ABC e a contabilidade de ganhos na definição do mix de produção de uma metalúrgica. Produção, v. 19, n. 2, p. 332-344, 2009

otimizar o recurso restrição e a empregar a contabilidade de ganhos, todas as ações fizeram as receitas de vendas se deslocarem para aqueles produtos que apresentavam os maiores valores do ganho unitário multiplicado pelo número de peças fabricadas em uma hora na máquina que possui restrição de capacidade (Gun x pçs/hRRC). Também, o índice LL/Fat Líq cresceu de 0,56% para 19,2% por esse motivo. Assim, a empresa passou a produzir aqueles itens que geravam mais receitas para pagar a mesma despesa. Este procedimento, conhecido como bússola financeira, é um instrumento de otimização, cuja utilização se reflete na ampliação da diferença entre o faturamento líquido e o custo do produto vendido. Isto ocorre porque o valor da matériaprima varia de modo proporcional ao faturamento, o que não ocorre com os custos de mão-de-obra e CIF. Assim, quando a diferença entre o valor do CPV e o valor do faturamento líquido começa a crescer, significa que a mão-de-obra e o CIF não crescem na mesma razão, o que proporcionou maiores lucros. Há a impressão de que os custos diminuíram, mas na verdade houve um aumento de ganho pela otimização do recurso restrição, sob a nova abordagem gerencial baseada na TOC e sua bússola financeira. Isto também fez o índice DO/Fat Líq manter quase que o mesmo porcentual (2,78% para 3,26%). A Tabela 4, elaborada de acordo com a contabilidade de ganhos e com dados oriundos da Tabela 2, traz a decompo-

sição porcentual do resultado da empresa e também fornece informações relevantes. Constata-se, de fato, que o índice CTV/Fat Líq mantém, ao longo do período de 1998 a 2003, um valor aproximado de 31,0%, confirmação de que o CTV cresceu na mesma proporção que o faturamento líquido. O índice DO/Fat Líq diminuiu de 68,3% para 51,1%, o que confirma que, com a otimização do recurso restrição, a despesa operacional cresce numa proporção bem menor que o faturamento líquido. 4.2 A decisão da empresa entre o custeio ABC e a contabilidade de ganhos no apoio à decisão gerencial Antes de tomar a decisão de implantar a contabilidade de ganhos a empresa estudou a possibilidade e a viabilidade de utilizar o custeio ABC para melhorar a sua contabilidade gerencial, ou seja, obter dados mais coerentes do confronto da realidade da empresa com o mercado, que pudessem levá-la a tomar decisões que redundassem em maior lucratividade para a organização. Neste item, é realizada uma análise do custeio ABC e da contabilidade de ganhos no que diz respeito ao seu papel como guia na tomada de decisão gerencial de escolher o mix de produtos mais lucrativo para a empresa. Utilizam-se os dados da empresa Guanabara, numa situação simplificada, para mostrar o processo de decisão da

Tabela 3: Decomposição porcentual do resultado. Anos

1998

1999

2000

2001

2002

2003

Faturamento Líquido

100,00%

100,00%

100,00%

100,00%

100,00%

100,00%

(-) CPV

96,67%2

93,33%

88,62%

85,12%

80,64%

77,54%

Lucro Bruto

3,33%3

6,67%

11,38%

14,88%

19,36%

22,46%

(-) DO: DAdm + DVen

2,78%

2,86%

3,04%

3,72%

3,47%

3,26%

Lucro Líquido

0,56%

3,81%

8,34%

11,16%

15,88%

19,20%

Tabela 4: Decomposição porcentual do resultado. Anos

1998

1999

2000

2001

2002

2003

Faturamento Líquido

100,00%

100,00%

100,00%

100,00%

100,00%

100,00%

(-) CTV

31,11%

32,38%

31,28%

32,23%

30,93%

29,71%

Ganho Total

68,89%

67,62%

68,72%

67,77%

69,07%

70,29%

(-) DO

68,33%

63,81%

60,38%

56,61%

53,18%

51,09%

Lucro Líquido

0,56%

3,81%

8,34%

11,16%

15,84%

19,20%

339


Sinisgalli, E. S. L.; Urbina, L. M. S.; Alves, J. M. O custeio ABC e a contabilidade de ganhos na definição do mix de produção de uma metalúrgica. Produção, v. 19, n. 2, p. 332-344, 2009

empresa com relação aos critérios de avaliação ou sistemas de custeio, a ser adotado por sua contabilidade gerencial. A empresa tem quatro máquinas diferentes T, X, Y e Z, conforme a Figura 3, com uma unidade de cada, e fabrica apenas dois produtos. O produto filtro é vendido ao preço de R$ 98,00 por unidade e tem uma demanda de 127 unidades por semana. O produto torneira tem um preço de venda de R$ 108,00 por unidade e sua demanda semanal também é de 127 unidades. O produto filtro é constituído de três peças, matéria-prima 1, matéria-prima 2 e matéria-prima 3. A matéria-prima 1 é primeiro processada na máquina X, por 4 minutos, depois é montada na máquina T, com a matéria-prima 2, em 10 minutos, depois vai para a máquina X, onde é processada por 5 minutos, e então é montada com a matéria-prima 3, na máquina Z, em 10 minutos. O produto filtro tem um custo de material de R$ 49,00. O produto torneira usa apenas dois tipos de matérias-primas, a 3 e a 4, e o seu custo de material é de R$ 44,00. Vê-se que os dois produtos usam a matéria-prima 3 e que esse fluxo do meio é o de maior volume. Cada máquina tem um operador, e todos trabalham 8 horas por dia, 5 dias por semana, o que proporciona uma

Filtros

Torneiras

R$ 98,00 127 / semana

R$ 108,00 127 / semana

Z 10 min.

T 5 min.

X 5 min. T 10 min.

X 4 min.

MP 1 R$ 22,00

MP 2 R$ 4,00

Z 5 min.

Y 8 min.

X 3 min.

X 3 min.

Y 6 min.

MP 3 R$ 23,00

MP 4 R$ 21,00

Figura 3: Fluxo de processo. 340

disponibilidade total por semana de 2.400 minutos por máquina. As despesas operacionais semanais equivalem a R$ 11.965,00 (depreciações, aluguéis, luz, salários da mão-deobra direta e indireta, dos gerentes, etc.), tudo o que é gasto para a empresa se manter operando. Fornecidos esses dados, utilizou-se o custeio ABC e a contabilidade de ganhos para determinar qual o mix de produção que maximiza a rentabilidade da empresa. a) Solução obtida pelo custeio ABC Conforme mostra a Tabela 5, a empresa não consegue atender toda demanda do mercado por que existe uma restrição interna de capacidade, que é o recurso Y. Para conhecer o lucro máximo possível da empresa, fazse necessário determinar qual produto apresenta o maior lucro, para que se produza tudo o que os clientes desejam comprar e, só depois, se houver disponibilidade de tempo da máquina Y, fabricar o outro produto. A empresa pode escolher quais pedidos atender segundo seus próprios critérios de avaliação. Esta análise será feita a seguir de acordo com a lógica do ABC. O custeio ABC para encontrar aquele produto que é o mais lucrativo para a empresa recorre ao cálculo dos custos dos produtos. Utiliza diferentes direcionadores (bases de rateio) para alocar os custos da empresa aos produtos. O custo do produto é a soma dos custos de todas as atividades exigidas para fabricá-lo e comercializá-lo. Primeiro, identifica-se quais são as atividades que os produtos consomem e, depois, quanto dessas atividades eles consomem e, finalmente, qual é o custo dessas atividades. Primeiramente, para calcular o custo dos produtos, fazse o levantamento das despesas com as atividades que serão necessárias para confeccionar e comercializar os produtos. São três as atividades nessa situação simplificada do custeio ABC: compras, produção e vendas. A Tabela 6 relaciona os valores das despesas operacionais para uma semana. A Tabela 7 fornece os valores do custo total das atividades calculados para os dois produtos. Já obtido o custo de cada atividade, é necessário rateá-lo para os produtos filtro e torneira. Para isso, será usado um direcionador de custo diferente para cada uma dessas atividades. a) A atividade compras terá como direcionador de custos o número de recebimentos por semana. Ele revela a demanda colocada nessa atividade pelos produtos. Ainda que o produto filtro necessite de três matériasprimas diferentes (MP1, MP2 e MP3), o número de recebimento dessas matérias-primas é igual a 1,5, pois elas são fornecidas pela mesma empresa. O produto torneira tem 2 recebimentos por semana porque o fornecedor da matériaprima 4 faz mais de uma entrega por semana.


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b) A atividade produção terá como direcionador de custos o tempo de consumo das máquinas pelos produtos. Será definido o valor consumido por cada máquina na atividade produção. A Tabela 8 traz os custos da atividade produção alocados às máquinas. Cada máquina tem um operador, assim, o custo da mão-deobra direta é igual para as quatro. As máquinas Z e X absorvem mais tempo de supervisão, já que suas operações são mais difíceis. Com os custos de engenharia e qualidade ocorre o mesmo. O valor de cada máquina é o que define a depreciação. c) A atividade vendas terá como direcionador de custos o número de pedidos feitos por semana. Ele revela a demanda colocada nessa atividade pelos produtos. O produto torneira tem somente dois clientes, que fazem um pedido a cada duas semanas, o que dá uma média de um pedido por semana. O produto filtro possui vários clientes que fazem pequenas compras, apresentando uma média de

cinco pedidos por semana. Assim sendo, o produto filtro é aquele que usa mais capacidade dessa atividade e, portanto, usa mais o tempo dos funcionários e dos recursos relativos a vendas. A Tabela 9 mostra o cálculo da taxa do custo da capacidade, levando em consideração o custo da capacidade fornecida e a capacidade prática dos recursos proporcionados para cada atividade.

A

contabilidade de ganhos é aquela que determina o mix de produção que gera o maior lucro possível para a empresa.

Tabela 5: Tempo consumido pelas máquinas. Máquinas

Minutos Filtros

Torneiras

1.270

635

T

Total

Total Minutos / 2400 (%)

1.905

79,38

X

1.524

762

2.286

95,25

Y

1.016

1.778

2.7944

116,42

Z

1.270

635

1.905

79,38

Tabela 6: Despesas operacionais. Despesa

Atividades

R$

Qualidade

Produção

760,00

Almoxarifado

Compras

1.350,00

A Tabela 10 mostra que caso a empresa fosse atender toda a demanda de cada produto (127 unidades), haveria ociosidade negativa, isto é, escassez do recurso máquina Y. Os produtos não absorvem todos os custos, pois existe ociosidade nos outros recursos. O produto filtro recebe a maior parcela dos custos das atividades, pois os direcionadores de custos revelam que ele consome mais atividades. Visto que o produto filtro possui o menor preço, maior custo de matéria-prima, menor margem de contribuição e maior custo rateado, conclui-se que ele é o produto menos interessante para a empresa. Desse modo, para se alcançar o máximo lucro convém dar preferência ao produto torneira e, depois, se restar tempo na máquina Y, se produzirá o produto filtro. A fábrica produzirá para atender toda a demanda do produto torneira (127 unidades). Ainda sobram 622 minutos5, o que permite fabricar 77 unidades6 do produto filtro. Portanto, o mix que maximiza a rentabilidade da empresa é composto de 127 torneiras + 77 filtros. A Tabela 11 traz o cálculo do lucro máximo semanal obtido pelo método do custeio ABC. O método de custeio ABC mostra que a empresa, no quadro atual, não consegue obter lucro. b) Solução obtida pela contabilidade de ganhos Esse método de custeio precisa das informações acerca do ganho unitário, dos minutos gastos para fabricar uma unida-

Atendimento

Vendas

2.934,00

Mão-de-obra direta

Produção

1.671,00

Recebimento

Compras

976,00

Expedição

Vendas

1.238,00

Depreciação

Produção

532,00

Atividade

R$

Inspeção

Compras

673,00

Compras

2.999,00

Engenharia de Produção

Produção

787,00

Produção

4.794,00

Supervisão

Produção

1.044,00

Vendas

4.172,00

11.965,00

Total

11.965,00

Total

Tabela 7: Custo total das atividades.

341


Sinisgalli, E. S. L.; Urbina, L. M. S.; Alves, J. M. O custeio ABC e a contabilidade de ganhos na definição do mix de produção de uma metalúrgica. Produção, v. 19, n. 2, p. 332-344, 2009

de na restrição e do ganho unitário por minuto na restrição de cada produto. Utiliza uma bússola financeira composta pelas Tabelas 12, 13 e 14. A Tabela 12 traz a classificação dos produtos de acordo com esses valores. A informação ganho por minuto na restrição mostra que o produto filtro é o mais interessante para a empresa. Uma classificação oposta àquela fornecida pelo custeio ABC. A Tabela 13 revela que a empresa não possui capacidade disponível para atender toda a demanda do mercado; para isto, precisaria operar 16,42% acima do seu potencial (RRC = 2.400 minutos).

A Tabela 14 mostra que a empresa fabricará as 127 unidades do produto filtro para atender a toda a sua demanda e que com os 1.384 minutos restantes serão confeccionadas 98 unidades7 do produto torneira. A fábrica, pelo método de custeio da contabilidade de ganhos, pode obter um lucro máximo de R$ 530,00 por semana. De modo contrário, o custeio ABC, para essa mesma fábrica, mostrou que no máximo ela pode alcançar um prejuízo de R$ 24,00 por semana. Os métodos chegam a resultados diferentes. O custeio ABC faz o rateio dos custos da empresa para os produtos, o

Tabela 8: Custos da atividade produção alocados às máquinas. Máquinas

T

X

Y

Z

Depreciação

75,00

160,00

70,00

150,00

Qualidade

100,00

270,00

100,00

304,00

Mão-de-obra direta

275,00

275,00

275,00

275,00

Engenharia

195,00

205,00

195,00

255,00

Supervisão produção

350,00

400,00

340,00

525,00

Total

995,00

1.310,00

980,00

1.509,00

Tabela 9: Cálculo da taxa de aplicação. Atividades

Custo

Capacidade

Taxa

Compras

2.999,00

6 recebimentos

499,83

Vendas

4.172,00

10 pedidos

417,20

Máquina T

995,00

2.400 minutos

0,41

Máquina X

1.310,00

2.400 minutos

0,55

Máquina Y

980,00

2.400 minutos

0,41

Máquina Z

1.509,00

2.400 minutos

0,63

Tabela 10: Custo total dos produtos. Atividades Compras

Filtros

Torneiras

Total

Ociosidade

Real

Fator

Taxa

Custo

Fator

Taxa

Custo

1,5

499,83

749,75

2

499,83

999,67

1.749,42

1.249,58

2.999,00

Vendas

5

417,20

2.086,00

1

417,20

417,20

2.503,20

1.668,80

4.172,00

Máquina T

1.270

0,41

526,52

635

0,41

263,26

789,78

205,22

995,00

Máquina X

1.524

0,55

831,85

762

0,55

415,93

1.247,78

62,23

1.310,00

Máquina Y

1.016

0,41

414,87

1.778

0,41

726,02

1.140,88

-160,88

980,00

Máquina Z

1.270

0,63

798,51

635

0,63

Total

342

5.407,50

399,26

1.197,77

311,23

1.509,00

3.221,33

8.628,83

3.336,18

11.965,00


Sinisgalli, E. S. L.; Urbina, L. M. S.; Alves, J. M. O custeio ABC e a contabilidade de ganhos na definição do mix de produção de uma metalúrgica. Produção, v. 19, n. 2, p. 332-344, 2009

que exige vários cálculos, enquanto que a contabilidade de ganhos não faz esse rateio e só precisa do cálculo do ganho unitário de cada produto por unidade de tempo na restrição e da despesa operacional de toda a fábrica. No caso da contabilidade de ganhos, o cerne da escolha do mix mais lucrativo repousa na classificação baseada na otimização dos ganhos obtidos por cada produto na restrição. Já no caso do custeio ABC, a classificação é baseada no custo e lucro do produto. Estas formas diferenciadas de abordar o processo de otimização do mix de produção mais lucrativo se refletem em um maior ou menor alinhamento com os indicadores financeiros globais da empresa.

O objetivo deste artigo foi analisar as decisões gerenciais sugeridas pelos sistemas de custeios ABC e contabilidade de ganhos, quanto à definição do mix de produção mais lucrativo para a organização.

A análise pretendeu identificar a decisão ótima fornecida por cada método de custeio, utilizando como principal critério a coerência observada entre as ações tomadas internamente e o desempenho global alcançado pela empresa. O estudo de caso mostrou que, baseando-se no cálculo do custo do produto, o custeio ABC forneceu um mix de produção que gerou prejuízo. Por outro lado, a contabilidade de ganhos fundamentandose na identificação do recurso restritivo e no ganho unitário do produto por tempo de uso neste recurso, encontrou um mix que maximizou a lucratividade da empresa. Assim sendo, conclui-se que a contabilidade de ganhos é uma ferramenta capaz de apresentar resultados mais coerentes, quando do confronto da capacidade produtiva da empresa com a demanda colocada nela, pois identifica e explora a restrição, o que é intrinsecamente uma administração sistêmica do negócio, uma vez que para identificar a restrição é preciso olhar o todo, ou seja, pensar sistemicamente. Com base nessas informações, ela busca otimizar os ganhos na utilização da restrição e aumentar a sua lucratividade.

Tabela 11: Cálculo do lucro máximo.

Tabela 12: Determinação da classificação estratégica.

5. CONCLUSÃO

Filtros

Torneiras

Total

7.546,00

13.716,00

21.262,00

Custo matéria-prima

3.733,00

5.588,00

9.321,00

Margem bruta

3.813,00

8.128,00

11.941,00

Despesa operacional Lucro máximo

Receita de vendas

Produtos Filtros

Torneiras

Preço

98,00

108,00

CTV

49,00

44,00

11.965,00

Ganho unitário

49,00

64,00

-24,00

Tempo RRC

8

14

Gun/minRRC

6,13

4,57

Classificação

Tabela 14: Cálculo do resultado final.

Tabela 13: Utilização por grau de prioridade. Produtos

Produtos

Mix lucro máximo

Ganho unitário

Ganho/ produto

Filtros

Torneiras

Demanda

127

127

Filtros

127

49,00

6.223,00

Tempo RRC

8

14

Torneiras

98

64,00

6.272,00

Ocupação

1.016

1.778

Ganho Total

12.495,00

Utilização RRC

42,33%

74,08%

(-) DO

11.965,00

Util acum RRC

42,33%

116,42%

Lucro Líquido

530,00

Artigo recebido em 06/02/2006 Aprovado para publicação em 26/03/2009 343


Sinisgalli, E. S. L.; Urbina, L. M. S.; Alves, J. M. O custeio ABC e a contabilidade de ganhos na definição do mix de produção de uma metalúrgica. Produção, v. 19, n. 2, p. 332-344, 2009

NOTAS O presente artigo trata-se do resumo da dissertação de mestrado defendida em junho de 2004, no Departamento de Produção, da Divisão de Engenharia Mecânica e Aeronáutica, do Instituto Tecnológico da Aeronáutica. 1

CPV = MP + MOD + CIF MOD + CIF = CPV – MP = 10.440,00 – 3.360,00 = 7.080,00

DO = (MOD + CIF) + (DA + DV) = 7.080,00 + 300,00 = 7.380,00 2

10.440,00 / 10.800,00 = 96,67%

3

360,00 / 10.8000,00 = 3,33%

4

[(127 un x 8 min) + 127 un x (8 min + 6 min)]

= 1.016 + 1.778 = 2.794 5

2.400 – (127 un x 14 minu) = 622

6

622 min / 8 min = 77,75 un

7

2.400 min – (127 un x 8 min) = 1.384 1.384 min / 14 min = 98,86 un

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SOBRE OS AUTORES Evandro Sylvio Lima Sinisgalli Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) End.: Rua Teopompo de Vasconcelos, 86 – São José dos Campos – SP – 12243-830 Tel.: (12) 3923-3858 Fax: (12) 3923-3858 E-mail: sinisgal@terra.com.br Ligia Maria Soto Urbina Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) End.: Praça Marechal Eduardo Gomes, 50 – São José dos Campos – SP – 12228-901 Tel.: (12) 3947-5913 E-mail: ligia@ita.br João Murta Alves Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA) End.: Praça Marechal Eduardo Gomes, 50 – São José dos Campos – SP – 12228-901 Tel.: (12) 3947-6971 E-mail: murta@ita.br

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Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 345-358

Importância das características na precificação de veículos nacionais Camilo Brandão de Resende ITA Rodrigo Arnaldo Scarpel ITA

RESUMO O mercado de bens de consumo é constituído por produtos heterogêneos que podem ser vistos como uma união de atributos ou características. Quantificar o valor dessas características pode auxiliar na criação de uma regra de precificação que permita, por exemplo, precificar um produto não existente, auxiliando na sua previsão de demanda. O objetivo deste trabalho é utilizar a teoria do preço hedônico para determinar empiricamente o valor e a importância relativa das características na precificação de veículos nacionais brasileiros. O modelo de previsão foi obtido utilizando-se uma função hedônica linear, cujos coeficientes foram estimados através de mínimos quadrados ordinários. Pode-se concluir que a potência é o fator de maior impacto no preço de um veículo, seguido pelo grau de luxo e marca. PALAVRAS-CHAVE Precificação, regressão hedônica, mercado automobilístico.

Importance of characteristics in pricing national vehicles ABSTRACT The market of consumer goods is consisted of heterogeneous products which can be viewed as a union of attributes or characteristics. Quantifying the value of these characteristics can help in the creation of a pricing rule, allowing, for example, pricing a product which is not available, and helping in the estimates of its demand. The purpose of this work is to use the theory of hedonic price to determine empirically the value of characteristics, as well as their relative importance, in the price of Brazilian vehicles. The model was obtained using data regarding 150 national vehicles and a linear hedonic function, which coefficients were estimated by ordinary least squares. It can be concluded that the engine power is the factor which has the greatest impact on a vehicle price, followed by the luxury level and the brand. KEY WORDS Pricing, hedonic regression, auto market.

345


Resende, C. B.; Scarpel, R. A. Importância das características na precificação de veículos nacionais. Produção, v. 19, n. 2, p. 345-358, 2009

1. INTRODUÇÃO O mercado de bens de consumo é, sabidamente, constituído por produtos heterogêneos. Esses produtos podem ser vistos, em geral, como uma união de atributos ou características. O mercado automobilístico é um exemplo claro da heterogeneidade de produtos, uma vez que as montadoras de automóveis procuram aumentar suas participações no mercado, assim como lucros, produzindo veículos com diferentes características (conforto, potência, tamanho etc.). Uma das necessidades atuais dos produtores de bens de consumo é quantificar a “real modificação de preço” de um produto ao adquirir determinada característica (BRACHINGER, 2002). Somente com essa quantificação é possível estimar o preço de mercado de um produto antes de seu lançamento, assim como tomar uma decisão quanto a qual característica deve ser adicionada ao produto a fim de aumentar suas vendas e/ou margem de lucro. Linz (2004) afirma que essa quantificação pode ser obtida através de um ajuste hedônico, que utiliza análise de regressão para estabelecer uma relação matemática entre a qualidade de um item – que é determinada por suas características – e o preço pelo qual ele é vendido. O objetivo deste trabalho é utilizar a teoria do preço hedônico para determinar empiricamente o valor e a importância relativa das características no preço dos veículos nacionais brasileiros, possibilitando previsões de preços de veículos que não existem no mercado. O modelo foi obtido utilizando-se uma regressão hedônica linear e teve três etapas distintas: (1) a amostra obtida foi dividida em duas partes, sendo três quartos da amostra destinados à formulação do modelo e um quarto ao teste do modelo; (2) os pesos das características foram estimados utilizando a amostra de formulação; (3) o modelo obtido foi testado comparando-se os preços estimados para a amostra de teste com os preços efetivamente praticados pelo mercado. Após a obtenção do modelo, simulou-se sua utilização, através da comparação entre o preço previsto e o preço real de um veículo de passeio nacional que foi lançado após a coleta dos dados utilizados no presente trabalho. 2. TEORIA DO PREÇO HEDÔNICO Os produtos presentes no mercado sofrem constantes modificações. Então, não podemos mais comparar diretamente os produtos disponíveis atualmente no mercado com produtos que existiam antes. Para comparações de preço, esses devem ser qualitativamente ajustados. O ajustamento qualitativo é comumente considerado um dos problemas mais complicados na estatística dos preços. 346

Técnicas como “linking” ou “overlap pricing” estão sendo atacadas depois da publicação do “Boskin-Report” (BOSKIN et al., 1996) por serem, sob algumas condições, tendenciosas. Os métodos hedônicos foram então recomendados como uma alternativa razoável (BRACHINGER, 2002). O ponto inicial de todo índice de preço hedônico é a hipótese hedônica. O centro dessa hipótese é que cada bem é caracterizado pela união de todas as suas características. Dado qualquer bem, façamos essa união ser ordenada e denotada pelo vetor x = (x1, ...,xK)’. Assumiremos que a preferência por qualquer bem é determinada somente por seu vetor de características correspondente. Além disso, também é assumido que, para qualquer bem, existe um relacionamento funcional f(x) entre seu preço e o vetor de características x, i. e. p = f(x).

(1)

Essa função especifica a relação hedônica ou regressão hedônica típica para o bem. Funções de preço hedônico podem ser vistas como resumos empíricos da relação entre os preços e as características de bens vendidos em mercados contendo produtos diferenciados (PAKES, 2003). Baseado no relacionamento funcional (1), o importante conceito de preços hedônicos – ou implícitos – pode ser introduzido. Esses preços são definidos como as derivadas parciais da função hedônica (1), i.e. (2) O preço hedônico ∂f/∂xk(x) indica quanto o preço p de um bem varia se esse bem for, ceteris paribus, dotado com uma unidade adicional da característica xk. Para aplicações práticas da relação hedônica (1) em estatística de preços, os problemas principais são a determinação do vetor de características de um bem e a especificação da função hedônica. Segundo Neto (2002), a análise empírica baseada na abordagem hedônica deve responder a duas questões, inicialmente propostas por Griliches (1961): a) Quais são as características relevantes? b) Qual é a forma de relacionamento entre os preços e as características? Portanto, o presente trabalho procurará responder a estes questionamentos aplicados ao mercado automobilístico brasileiro. 2.1 Origem da teoria do preço hedônico Segundo Nervole (1995), a análise do preço hedônico se originou na economia agrícola, quando F. V. Waugh (1929) publicou seu pioneiro estudo sobre fatores que influenciam


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os preços dos vegetais. Ainda segundo Nervole (1995), Waugh fez uma regressão dos preços por lote de aspargos em Boston (maio-junho, 1927) sob três diferentes dimensões de qualidade: avaliação da cor, tamanho da haste e uniformidade dos brotos. Seu objetivo era determinar as valorizações relativas que os consumidores davam a essas características, as quais considerava como informações úteis para os produtores de aspargos. Colwell e Dilmore (1999) afirmam que Haas (1922) já utilizou o conceito de “hedônico”, e fez um modelo simples de preço hedônico para fazendas, considerando a distância para o centro da cidade e o tamanho da cidade como duas importantes variáveis. A fundamentação teórica do modelo de preço hedônico foi chamada de teoria do preço hedônico, possuindo fundamentalmente dois alicerces: Inicialmente, o acadêmico americano Lancaster (1966) divulgou uma nova teoria do consumidor. A teoria é uma expansão da teoria econômica clássica, também conhecida como teoria das preferências de Lancaster. A partir da heterogeneidade dos produtos, Lancaster analisou “elementos básicos” que formam o produto, e argumentou que a demanda por um produto não dependia do produto propriamente dito, mas sim de suas características. Produtos heterogêneos (como automóveis) possuem uma série de características integradas, e são vendidos como uma reunião de características inerentes. Famílias compram esses bens, utilizando-os como uma espécie de investimento e os transformam em utilidade. O nível de utilidade depende da quantidade de diferentes características. É muito difícil analisar o mercado de bens de consumo com o modelo econômico tradicional, porque não podemos considerar apenas um preço total. Por isso adotamos uma série de preços (preços hedônicos) para expressar as correspondentes características dos produtos. Portanto, o preço de um produto é formado por preços hedônicos, com cada característica do produto possuindo seu próprio preço implícito e todos os preços hedônicos formam uma estrutura de preço. Em seguida, o economista americano Rosen (1974) desenvolveu um modelo de equilíbrio de oferta e demanda baseado nas características de produtos. Utilizando a condição de um mercado perfeitamente competitivo, maximizando a utilidade dos consumidores e o lucro dos produtores como meta, Rosen analisou teoricamente o equilíbrio a curto e longo prazo do mercado de produtos heterogêneos. O trabalho de Rosen estabeleceu a fundamentação de um modelo para a teoria do preço hedônico, baseada em métodos econométricos que podem ser utilizados para estimar a função de preço hedônico, obter os preços implícitos das características dos produtos e analisar a demanda pelas características dos produtos.

Modelos hedônicos já foram utilizados diversas vezes no mercado automobilístico. Segundo Goodman (1998), o primeiro modelo de preço hedônico para o mercado automobilístico foi desenvolvido por Andrew T. Court (1939), analista da indústria automobilística americana. Ele adotou o termo “hedônico” (tendência para agir de maneira a evitar o que é desagradável e a atingir o que é agradável), considerando o preço dos automóveis como uma função de suas diferentes características, e realizou a análise de preço hedônico de bens heterogêneos. Sua proposta final era estruturar um índice de preços para a indústria automobilística. Mais tarde, Griliches (1961) também rodou regressões similares com o propósito de descobrir as preferências dos consumidores em relação a vários opcionais nos automóveis que compravam. Posteriormente, modelos hedônicos foram utilizados buscando diversos objetivos. Por exemplo, Fisher et al. (1962) usaram regressões hedônicas para avaliar mudanças nos custos de automóveis entre os anos de 1949 e 1961. Cowling e Cubbin (1971), Boyle e Hogarty (1975) e Cubbin (1975) usaram regressões hedônicas para estudar o comportamento competitivo e de precificação nos mercados automobilísticos norte-americano e britânico. Agarwal e Ratchford (1980) e Argua et al. (1994) utilizaram de regressões hedônicas para estimação de funções de demanda para características de veículos. Mais recentemente, Reis e Silva (2006) utilizaram regressões hedônicas para estudar os efeitos de mudanças na qualidade sobre os preços de veículos novos no mercado português. 2.2 Formato das funções utilizadas nas regressões hedônicas Em aproximações hedônicas para problemas de índices de preço, quatro diferentes formas de funções foram empregadas no passado (NETO, 2002): linear, exponencial, dupla logarítmica e logarítmica. A aproximação mais simples é a linear, que é dada por (3) com os preços hedônicos (4) O coeficiente da regressão βk (k = 1,......,K) indica a variação marginal do preço com respeito a uma mudança da k-ésima característica xk de um bem. Outra aproximação é a exponencial, que é caracterizada por (5)

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ou (6) com os preços hedônicos (7) Obviamente, nessa aproximação, os coeficientes da regressão podem ser interpretados como taxas de crescimento. O coeficiente βk (k = 1,......,K) indica a taxa na qual o preço aumenta a um certo nível, dado o vetor característico x. Uma terceira aproximação é a função dupla logarítmica, que é descrita por (8)

sentadas na Tabela 1 a respeito de 150 modelos de veículos produzidos no Brasil. Os preços sugeridos pelas montadoras para veículos novos (sem frete) foram colhidos durante doze meses, utilizando-se as edições de janeiro a dezembro de 2005 da Revista Quatro Rodas. No modelo construído, foi utilizada a média aritmética dos preços pesquisados durante os 12 meses. As demais informações (altura, comprimento etc.) foram obtidas nos web-sites oficiais das montadoras. Os dados utilizados são mostrados no Apêndice A. Tabela 1: Informações obtidas a respeito de 150 veículos nacionais. MODELO Marca Tipo de Combustível (Álcool, gasolina ou flex)

ou

Potência do motor (cv)

(9)

Tamanho do porta-malas (l) Comprimento (cm)

com os preços hedônicos

Altura (cm)

(10)

Quantidade de portas Tipo de câmbio (mecânico ou automático)

Nessa aproximação, os coeficientes da regressão podem ser interpretados como elasticidades parciais. O coeficiente βk (k = 1, ..., K) indica em qual porcentagem o preço p aumenta em um certo nível se a k-ésima característica xk aumenta em um por cento. Uma quarta forma de aproximação é a forma logarítmica dada por (11) com os preços hedônicos (12) De acordo com Neto (2002), a teoria econômica ainda não desenvolveu um critério de escolha para a forma funcional, assim sendo, a maioria dos pesquisadores vê a escolha como uma questão empírica para ser decidida pela melhor adequação aos dados.

3. ANÁLISE DOS FATORES DETERMINANTES NA PRECIFICAÇÃO DE VEÍCULOS NACIONAIS 3.1 Dados utilizados A fim de se construir um modelo de previsão de preços de veículos nacionais, foram obtidas as informações apre348

Preço sugerido pela montadora (R$)

3.2 Características consideradas No presente trabalho, as características consideradas são definidas pelas variáveis binárias apresentadas na Tabela 2. As faixas de potência foram determinadas empiricamente e o critério utilizado para a escolha das faixas de comprimento foi a segmentação visual baseada na Figura 1. 3.3 Estimação dos parâmetros Pode-se, utilizando a teoria do preço hedônico, escrever uma relação funcional entre o preço pi de um bem i, seu conjunto de características x e um erro ou distorção u. (13) A forma funcional linear (

) é

frequentemente usada, onde α e β são os coeficientes a serem estimados e pi, x e u, conforme definidos anteriormente. A variável xijk indica se o k-ésimo nível da j-ésima característica está presente no bem i e o coeficiente βjk representa o valor a ser adicionado no preço de um bem que possua o k-ésimo nível da j-ésima característica. Nesse estudo, essa forma funcional foi utilizada, sendo obtida uma regressão linear múltipla com variáveis binárias.


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O critério utilizado para a estimação dos coeficientes foi a minimização do erro quadrático médio (EQM). Após a estimação dos coeficientes, os mesmos foram padronizados de maneira a atribuir peso zero ao menor nível de cada característica (por exemplo, se o menor valor encontrado para um nível de uma determinada característica k é igual a -1, somamos o valor 1 a cada nível da característica k e -1 à constante α, não alterando o valor previsto para o preço p). Esse procedimento torna mais simples a visualização dos resultados e facilita o cálculo da importância de cada uma

das características. Assim, sendo dos, temos:

e

os pesos padroniza(14)

Dentre as 150 observações disponíveis para estudo, 38 foram aleatoriamente retiradas para realizar o teste do modelo. Ou seja, as constantes foram estimadas utilizando 112 observações. Posteriormente, foram obtidas previsões para os preços dos 38 automóveis da amostra de teste e compa-

Tabela 2: Descrição das variáveis utilizadas. NOME DA VARIÁVEL

DESCRIÇÃO

PREÇO

Em reais (R$), atualizado em dezembro/05

MARCA-AUDI

1 se a marca do carro for Audi, 0 c.c.

MARCA-CHEVROLET

1 se a marca do carro for Chevrolet, 0 c.c.

MARCA-CITROËN

1 se a marca do carro for Citroën, 0 c.c.

MARCA-FIAT

1 se a marca do carro for Fiat, 0 c.c.

MARCA-FORD

1 se a marca do carro for Ford, 0 c.c.

MARCA-HONDA

1 se a marca do carro for Honda, 0 c.c.

MARCA-PEUGEOT

1 se a marca do carro for Peugeot, 0 c.c.

MARCA-RENAULT

1 se a marca do carro for Renault, 0 c.c.

MARCA-TOYOTA

1 se a marca do carro for Toyota, 0 c.c.

MARCA-VOLKSWAGEN

1 se a marca for Volkswagen, 0 c.c.

POTÊNCIA <=55

1 se a potência for <=55cv, 0 c.c.

POTÊNCIA 56-80

1 se a potência for >55cv E <=80cv, 0 c.c.

POTÊNCIA 81-100

1 se a potência for >80cv E <=100cv, 0 c.c.

POTÊNCIA 101-115

1 se a potência for >100cv E <=115cv, 0 c.c.

POTÊNCIA 116-135

1 se a potência for >115cv E <=135cv, 0 c.c.

POTÊNCIA 136-150

1 se a potência for >135cv E <=150cv, 0 c.c.

POTÊNCIA >=151

1 se a potência for >150cv, 0 c.c.

LUXO-1

1 se o luxo se enquadrar no nível 1, 0 c.c.

LUXO-2

1 se o luxo se enquadrar no nível 2, 0 c.c.

LUXO-3

1 se o luxo se enquadrar no nível 3, 0 c.c.

LUXO-4

1 se o luxo se enquadrar no nível 4, 0 c.c.

LUXO-5

1 se o luxo se enquadrar no nível 5, 0 c.c.

3PORTAS

1 se o carro tem 2 ou 3 portas, 0 c.c.

5PORTAS

1 se o carro tem 4 ou 5 portas, 0 c.c.

COMB-GASOLINA

1 se o motor do carro é a gasolina, 0 c.c.

COMB-FLEX

1 se o motor do carro é flex, 0 c.c.

COMPRIMENTO <=405

1 se comprimento for <=405cm, 0 c.c.

COMPRIMENTO >405 E <430

1 se comprimento for >405cm e <430cm,0 c.c.

COMPRIMENTO >=430

1 se comprimento for >=430cm, 0 c.c.

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radas com os valores reais. Todos os cálculos foram feitos utilizando a função “lm” do software R (R development core team, 2005). 3.4 Resultados e discussão A Tabela 3 apresenta o resumo dos resultados da regressão hedônica linear. O modelo obtido apresentou coeficiente de determinação R2 igual a 94,5%. A estatística de teste F obtida foi igual a 65,72, indicando, com forte evidência (p-value< 0,001), que podemos rejeitar a hipótese de que os coeficientes do modelo são conjuntamente nulos. Na Figura 2 temos a comparação entre as curvas dos preços reais dos veículos utilizados para a construção do modelo e a curva aproximada pelo modelo. Na Figura 3 segue a comparação entre as curvas dos preços reais dos veículos separados para teste e a curva aproximada pelo modelo. O erro padrão residual para os dados utilizados no teste do modelo foi aproximadamente R$ 3.957. Pode-se observar que o modelo foi capaz de representar com boa precisão os preços dos veículos nacionais, uma vez que a regressão apresentou um alto valor de R2 ajustado (93,1%) e o erro padrão residual obtido para os dados de teste (R$ 3.957) foi bem próximo do erro pa-

drão residual estimado no desenvolvimento do modelo (R$ 4.445). Os valores calculados para cada nível das seis características consideradas são mostrados nas Figuras 4 a 9. Analisando os pesos obtidos por marca, percebe-se que a marca AUDI é aquela que acrescenta maior preço a um veículo (R$ 18.433), o que é razoável por se tratar de uma marca que explicitamente tenta conquistar seus clientes oferecendo status e diferenciação. A marca HONDA é aquela que menos impacta o preço de um veículo, o que também é razoável por se tratar de uma marca que se destaca por menores custos de produção. Os pesos obtidos por potência foram conforme o esperado, sendo que o peso mínimo obtido foi para potência menor do que 55 cv e o máximo de R$ 29.593 para potência maior do que 150cv. O grande valor encontrado para esse nível de potência sinaliza a grande importância da potência na precificação dos veículos nacionais. Os pesos obtidos por luxo também foram conforme o esperado, sendo que o peso mínimo obtido para o nível 1 de luxo (básico) e o máximo de R$ 28.024 para o nível 5 de luxo (completo com câmbio automático). O grande valor encontrado para esse nível de luxo sinaliza a grande importância do luxo na precificação de veículos.

Figura 1: Gráfico utilizado para escolha de faixas de comprimento.

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O peso obtido para tipo de combustível flex (R$ 80) é muito pequeno quando comparado a qualquer outra característica, o que indica que o tipo de combustível não é um fator determinante na precificação de automóveis. Os pesos obtidos por comprimento também foram conforme o esperado, sendo que o peso mínimo obtido foi para veículos com comprimento menor do que 405 cm e o máximo de R$ 6.866 para veículos com comprimento maior do que 430 cm. Tabela 3: Valores calculados para os coeficientes normalizados. COEFICIENTES

MARCA

POTÊNCIA (cv)

LUXO

Nº PORTAS COMBUSTÍVEL COMPRIMENTO (cm)

VALOR CALCULADO ESTATÍSTICA (R$) t

INTERCEPTO

14410,21

3,494

AUDI

18.433,30

5,747

CHEVROLET

3.079,22

1,304

CITROËN

2.186,26

0,716

FIAT

3.700,88

1,460

FORD

2.242,86

0,906

HONDA

0

-

PEUGEOT

3.253,88

1,096

RENAULT

310,57

0,119

TOYOTA

2.137,10

0,598

VOLKSWAGEN

2.704,59

1,087

<=55

0

-

56-80

5.216,85

1,477

81-100

6.148,46

1,572

101-115

10.296,01

2,716

116-135

16.223,54

4,047

136-150

21.186,61

5,065

>=151

29.593,05

5,714

1 - Básico

0

-

2

4.472,40

3,133

3- Ar + DH

12.898,50

8,255

4

21.150,03

9,430

5 - Completo

28.024,37

10,960

3

0

-

5

1.589,11

1,710

GASOLINA

0

-

FLEX

80,19

0,069

<=405

0

-

>405 E <430

3.893,93

3,124

>=430

6.866,34

3,902

Na Figura 10, segue a comparação entre os valores calculados para todos os níveis possíveis de todas as características consideradas. Depois de estimados os pesos de cada nível de cada uma das características, foi determinada a importância relativa de cada característica. A importância relativa de uma característica foi considerada como a razão entre o maior peso estimado para um nível daquela característica e a soma dos maiores pesos de cada uma das características. Os resultados obtidos para as importâncias relativas das características são exibidos na Tabela 4 e na Figura 11. Analisando os valores obtidos para as importâncias relativas na precificação, percebe-se claramente que três fatores são os mais importantes para determinação de preço: potência (34,5%), luxo (32,7%) e marca (21,5%). Esses três fatores juntos corresponderam a 88,7 % de importância no preço. O baixo valor obtido para a importância do tipo de combustível (0,1 %) confirma que realmente essa não é uma característica de importância considerável na precificação de automóveis.

4. SIMULAÇÃO DE APLICAÇÃO DO MODELO Para simular uma aplicação do modelo matemático desenvolvido, estimou-se o preço de um veículo nacional lançado após a coleta de dados e comparou-se a estimativa com o preço real de lançamento (preço sem frete informado no web-site oficial da montadora em outubro de 2006). O veículo analisado foi um Chevrolet Vectra (Modelo Elite). A Tabela 5 apresenta as características do veículo extraídas do web-site da montadora. Realizando a simulação, foram obtidos os resultados mostrados na Tabela 6. O valor estimado foi bem próximo do valor real, apresentando um erro de estimativa menor do que 0,5% em módulo.

5. CONCLUSÕES Através do modelo obtido pode-se perceber a grande utilidade de regressões hedônicas para análise de preços em mercados com produtos diferenciados. Utilizando-se um simples modelo de regressão hedônica linear, foi possível determinar os fatores que mais influenciam os preços dos veículos nacionais e, ainda, construir um modelo de previsão de preços de novos produtos. Pode-se concluir que o fator de maior impacto no preço de um veículo nacional é a potência do motor (34,5 %), seguido pelo grau de luxo (32,7 %) e marca (21,5 %). Outra conclusão importante é que o tipo de combustível não é um fator determinante na precificação dos veículos nacionais. 351


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Figura 2: Comparação entre valores estimados pelo modelo e valores reais (amostra utilizada na estimação dos parâmetros).

Figura 3: Comparação entre valores estimados pelo modelo e valores reais (amostra de teste).

Figura 4: Valores calculados (R$) para o peso de cada marca.

Figura 5: Valores calculados (R$) para o peso de cada faixa de potência (cv).

Figura 6: Valores calculados (R$) para o peso de cada faixa de luxo.

Figura 7: Valores calculados (R$) para o peso do número de portas.


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Figura 8: Valores calculados (R$) para o peso de cada tipo de combustível.

Figura 9: Valores calculados (R$) para o peso de cada faixa de comprimento.

Figura 10: Comparação entre os valores calculados (R$) para os níveis de diferentes características.

Figura 11: Importância de cada característica na precificação dos veículos nacionais novos.

Tabela 4: Cálculo das importâncias relativas de cada característica na precificação. CARACTERÍSTICA

MAIOR PESO ESTIMADO (R$)

IMPORTÂNCIA RELATIVA (%)

MARCA

18.433

21,5

POTÊNCIA

29.593

34,5

LUXO

28.024

32,7

Nº PORTAS

2.718

3,2

COMBUSTÍVEL

80

0,1

COMPRIMENTO

6.866

8,0

Tabela 5: Dados extraídos para realização de simulação de aplicação. MODELO

POTÊNCIA (cv)

COMPRIMENTO (cm)

LUXO

PREÇO (R$)

Nº DE PORTAS

VECTRA ELITE

151

462

5

84.990

4

353


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Tabela 6: Resultados da simulação e comparação com os preços reais. MODELO

PREÇO (R$)

PREÇO ESTIMADO (R$)

ERRO (%)

VECTRA ELITE

84.990

84.691

-0,4

Artigo recebido em 29/01/2008 Aprovado para publicação em 26/03/2009

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LINZ, S. Hedonic price measurements for IT products. Statistisches Bundesamt, 2004.

REIS, H. J.; SILVA, J. M. C. Hedonic prices indexes for new passenger cars in Portugal (1997-2001). Economic Modelling, v. 23, p. 890-908, 2006.

NERLOVE, M. Hedonic price functions and the measurement of preferences: the case of Swedish wine consumers. European Economic Review, v. 39, p. 1697-1716, 1995.

ROSEN, S. Hedonic price and implicit markets: product differentiation in pure competition. Journal of Political Economy, v. 82, p. 34-55, 1974.

AGRADECIMENTOS Os autores agradecem aos revisores anônimos pelas sugestões e à FAPESP pelo apoio financeiro.

SOBRE OS AUTORES Camilo Brandão de Resende Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) End.: Pça. Mal. Eduardo Gomes, 50 sala 2311 – São José dos Campos – SP – 12228-900 E-mail: camilo@ita.br Rodrigo Arnaldo Scarpel Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA) End.: Pça. Mal. Eduardo Gomes, 50 sala 2311 – São José dos Campos – SP – 12228-900 End.: rodrigo@ita.br 354


Resende, C. B.; Scarpel, R. A. Importância das características na precificação de veículos nacionais. Produção, v. 19, n. 2, p. 345-358, 2009

APÊNDICE A: DADOS UTILIZADOS NO TRABALHO TABELA 7: Dados utilizados na estimação dos coeficientes do modelo. MOD

MAR

COMB

POT

PM

COMP

ALT

LUX

CAM

PREÇO

NP

UNO

FIAT

GAS

55

222

369

144

1

MEC

18.780

3

KA

FORD

GAS

65

184

362

141

1

MEC

20.060

5

UNO

FIAT

GAS

55

222

369

144

1

MEC

20.160

5

GOL

VW

GAS

57

246

393

141

1

MEC

20.971

3

PALIO

FIAT

GAS

65

246

383

144

1

MEC

21.580

3

CELTA

CHEV

GAS

70

243

375

134

1

MEC

21.670

3

GOL

VW

GAS

65

246

393

141

1

MEC

22.052

3

GOL

VW

GAS

65

246

393

141

1

MEC

23.224

5

CLIO

REN

GAS

58

255

377

141

1

MEC

23.590

3

CELTA

CHEV

GAS

85

243

375

134

1

MEC

24.540

5

CELTA

CHEV

GAS

85

243

375

134

2

MEC

24.820

3

CLIO

REN

GAS

58

255

377

141

1

MEC

24.840

5

CLASSIC

CHEV

GAS

70

345

405

139

1

MEC

24955

3

SIENA

FIAT

GAS

65

441

414

144

1

MEC

24.990

5

FIESTA STR.

FORD

GAS

65

208

383

140

2

MEC

25.020

5

206

PEUG

GAS

70

222

383

143

1

MEC

25.090

5

GOL

VW

GAS

76

246

393

141

2

MEC

25.304

5

KA

FORD

GAS

65

184

362

141

2

MEC

25.330

5

CELTA

CHEV

GAS

85

243

375

134

2

MEC

26.230

5

FOX

VW

FX

72

257

380

154

1

MEC

26.456

3

CORSA

CHEV

GAS

71

236

382

143

1

MEC

26.760

5

FIESTA

FORD

GAS

66

255

391

145

1

MEC

27.220

5

CLASSIC

CHEV

GAS

92

345

405

139

1

MEC

27.407

5

FOX

VW

FX

72

257

380

154

1

MEC

27.781

5

FIESTA SEDAN

FORD

GAS

66

492

420

149

1

MEC

28.580

5

CLIO SEDAN

REN

GAS

70

484

415

141

2

MEC

28.810

5

FIESTA SEDAN

FORD

GAS

95

492

420

149

1

MEC

29.580

5

206

PEUG

GAS

75

222

383

143

2

MEC

29.840

3

CORSA

CHEV

FX

107

260

382

143

1

MEC

29.920

5

GOL

VW

FX

98

246

393

141

2

MEC

30.510

5

206

PEUG

GAS

75

222

383

143

2

MEC

30.940

5

FIESTA

FORD

FX

108

255

391

145

1

MEC

31.030

5

FOX

VW

FX

102

257

380

154

2

MEC

31.560

3

FIESTA SEDAN

FORD

FX

108

492

420

149

1

MEC

31.640

5

SIENA

FIAT

FX

70

441

414

144

1

MEC

31.750

5

CORSA SEDAN

CHEV

FX

107

435

417

143

1

MEC

32.115

5

CLIO

REN

FX

113

255

377

141

2

MEC

32.150

5

FIESTA

FORD

GAS

95

255

391

145

2

MEC

32.390

5 (continua)

355


Resende, C. B.; Scarpel, R. A. Importância das características na precificação de veículos nacionais. Produção, v. 19, n. 2, p. 345-358, 2009

CORSA

CHEV

FX

107

260

382

143

2

MEC

32.825

5

CLIO SEDAN

REN

FX

113

484

415

141

2

MEC

33.820

5

PALIO

FIAT

GAS

103

246

383

144

2

MEC

33.920

5

KA

FORD

GAS

95

184

362

141

3

MEC

34.130

5

PALIO

FIAT

FX

70

246

383

144

2

MEC

34.570

5

SIENA

FIAT

FX

108

441

414

144

2

MEC

35.050

5

CLASSIC

CHEV

GAS

92

345

405

139

3

MEC

35.241

5

FIESTA SEDAN

FORD

FX

108

492

420

149

2

MEC

35.320

5

PARATI

VW

FX

98

443

419

146

2

MEC

36.274

5

CORSA SEDAN

CHEV

GAS

71

435

417

143

3

MEC

36.580

5

C3

CITR

GAS

110

293

385

152

2

MEC

37.110

5

CLIO

REN

GAS

70

255

377

141

3

MEC

37.530

5

SANTANA

VW

GAS

99

413

461

142

2

MEC

37.844

5

FIESTA

FORD

FX

108

255

391

145

3

MEC

38.590

5

ECOSPORT

FORD

GAS

95

288

422

168

2

MEC

38.760

5

206

PEUG

GAS

110

222

383

143

3

MEC

39.100

5

PALIO WK

FIAT

FX

108

402

422

152

2

MEC

39.570

5

CORSA

CHEV

FX

107

260

382

143

3

MEC

39.960

5

PARATI

VW

FX

98

443

419

146

3

MEC

40.943

5

MERIVA

CHEV

FX

107

339

404

157

2

MEC

41.275

5

FIT

HOND

GAS

80

355

383

152

3

MEC

41.435

5

CLIO SEDAN

REN

FX

113

484

415

141

3

MEC

41.700

5

C3

CITR

GAS

110

293

385

152

3

MEC

41.960

5

CORSA SEDAN

CHEV

FX

107

435

417

143

3

MEC

42.160

5

SANTANA

VW

GAS

114

413

461

142

3

MEC

43.726

5

GOLF

VW

GAS

101

336

415

146

2

MEC

43.868

5

STILO

FIAT

GAS

103

380

425

153

3

MEC

45.390

5

ASTRA

CHEV

FX

125

332

420

143

3

MEC

45.603

3

GOLF

VW

GAS

116

336

415

146

2

MEC

45.723

5

FOCUS SEDAN

FORD

GAS

103

460

436

149

3

MEC

46.870

5

DOBLÒ

FIAT

GAS

103

584

416

183

3

MEC

47.500

5

FOCUS

FORD

GAS

103

285

415

149

3

MEC

47.515

5

MAREA

FIAT

GAS

132

409

439

143

2

MEC

47.790

5

MERIVA

CHEV

FX

107

339

404

157

3

MEC

47.895

5

C3

CITR

GAS

110

293

385

152

4

MEC

48.400

5

COROLLA

TOYO

GAS

110

461

453

148

3

MEC

48.612

5

FIT

HOND

GAS

105

355

383

152

3

MEC

49.065

5

307

PEUG

GAS

110

420

420

151

3

MEC

49.100

5

ASTRA SEDAN

CHEV

FX

125

460

434

142

3

MEC

50.190

5

GOLF

VW

GAS

101

336

415

146

4

MEC

50.628

5

CIVIC

HOND

GAS

115

395

443

144

3

MEC

51.165

5 (continua)

356


Resende, C. B.; Scarpel, R. A. Importância das características na precificação de veículos nacionais. Produção, v. 19, n. 2, p. 345-358, 2009

ECOSPORT

FORD

GAS

98

288

422

168

3

MEC

51.390

5

POLO SEDAN

VW

GAS

116

409

418

148

3

MEC

52.086

5

MAREA WK

FIAT

GAS

132

500

449

152

2

MEC

52.340

5

VECTRA

CHEV

GAS

110

402

450

142

3

MEC

52.694

5

STILO

FIAT

GAS

122

380

425

153

3

MEC

53.450

5

SCÉNIC

REN

GAS

110

396

417

161

3

MEC

53.990

5

FOCUS SEDAN

FORD

GAS

126

460

436

149

3

MEC

54.620

5

CIVIC

HOND

GAS

130

395

443

144

4

MEC

54.780

5

ASTRA

CHEV

GAS

136

332

420

143

3

MEC

55.053

5

PICASSO

CITR

GAS

138

450

427

166

3

MEC

55.830

5

CIVIC

HOND

GAS

130

395

443

144

5

AUTO

55.920

5

MAREA WK

FIAT

GAS

132

500

449

152

3

MEC

59.480

5

ZAFIRA

CHEV

FX

125

535

433

169

3

MEC

59.641

5

ASTRA

CHEV

FX

125

332

420

143

4

MEC

61.495

5

FIELDER

TOYO

GAS

136

395

446

148

3

MEC

61.984

5

MÉGANE SEDAN

REN

GAS

138

510

443

143

5

AUTO

62.990

5

A3

AUDI

GAS

101

303

415

142

3

MEC

63.341

5

SCÉNIC

REN

GAS

140

396

417

161

4

MEC

64.090

5

ECOSPORT

FORD

GAS

143

288

422

168

3

MEC

64.500

5

STILO

FIAT

GAS

122

380

425

153

4

MEC

65.520

5

GOLF

VW

GAS

150

336

415

146

4

MEC

66.409

5

PICASSO

CITR

GAS

138

450

427

166

4

AUTO

66.890

5

A3

AUDI

GAS

125

303

415

142

3

MEC

69.698

5

SCÉNIC

REN

GAS

140

396

417

161

5

AUTO

70.990

5

ZAFIRA

CHEV

FX

125

535

433

169

4

MEC

72.968

5

COROLLA

TOYO

GAS

136

461

453

148

5

AUTO

74.289

5

A3

AUDI

GAS

150

303

415

142

3

MEC

74.355

5

VECTRA

CHEV

GAS

110

402

450

142

5

MEC

76.266

5

GOLF

VW

GAS

150

336

415

146

5

AUTO

78.348

5

MAREA

FIAT

GAS

160

409

439

143

4

MEC

79.540

5

ZAFIRA

CHEV

FX

125

535

433

169

5

MEC

79.676

5

A3

AUDI

GAS

150

303

415

142

4

AUTO

80.267

5

A3

AUDI

GAS

180

303

415

142

5

AUTO

95.971

5

LUX

CAM

PREÇO

NP

TABELA 8: Dados utilizados no teste do modelo. MOD

MAR

COMB

POT

PM

COMP

ALT

PALIO

FIAT

GAS

65

246

383

144

1

MEC

22.930

5

CELTA

CHEV

GAS

70

243

375

134

1

MEC

23.080

5

CELTA

CHEV

GAS

85

243

375

134

1

MEC

23.150

3

GOL

VW

GAS

76

246

393

141

2

MEC

23.785

3 (continua)

357


Resende, C. B.; Scarpel, R. A. Importância das características na precificação de veículos nacionais. Produção, v. 19, n. 2, p. 345-358, 2009

206

PEUG

GAS

70

222

383

143

1

MEC

23.990

3

GOL

VW

FX

98

246

393

141

1

MEC

27.272

5

FIESTA

FORD

GAS

95

255

391

145

1

MEC

27.910

5

CORSA SEDAN

CHEV

GAS

71

435

417

143

1

MEC

28.905

5

PALIO

FIAT

FX

70

246

383

144

2

MEC

28.920

5

CLASSIC

CHEV

GAS

70

345

405

139

3

MEC

31.600

3

FIESTA SEDAN

FORD

GAS

66

492

420

149

2

MEC

32.420

5

C3

CITR

GAS

75

293

385

152

2

MEC

32.900

5

FOX

VW

FX

102

257

380

154

2

MEC

32.957

5

FIESTA SEDAN

FORD

GAS

95

492

420

149

2

MEC

33.370

5

206

PEUG

GAS

110

222

383

143

2

MEC

33.550

5

CORSA

CHEV

GAS

71

260

382

143

3

MEC

34.430

5

CORSA SEDAN

CHEV

FX

107

435

417

143

2

MEC

35.020

5

FIESTA

FORD

GAS

66

255

391

145

3

MEC

35.450

5

CLIO SEDAN

REN

GAS

70

484

415

141

3

MEC

39.000

5

DOBLÒ

FIAT

GAS

80

584

416

183

2

MEC

39.380

5

CLIO

REN

FX

113

255

377

141

3

MEC

40.230

5

POLO

VW

FX

102

270

390

148

3

MEC

40.280

5

PARATI

VW

GAS

112

443

419

146

3

MEC

41.647

5

ECOSPORT

FORD

GAS

98

288

422

168

2

MEC

41.950

5

POLO SEDAN

VW

FX

102

409

418

148

3

MEC

43.125

5

PALIO WK

FIAT

FX

108

402

422

152

3

MEC

45.840

5

ASTRA

CHEV

FX

125

332

420

143

3

MEC

48.487

5

FOCUS

FORD

GAS

126

285

415

149

3

MEC

51.365

5

MAREA

FIAT

GAS

132

409

439

143

3

MEC

54.980

5

COROLLA

TOYO

GAS

136

461

453

148

3

MEC

57.589

5

GOLF

VW

GAS

116

336

415

146

3

MEC

58.366

5

307

PEUG

GAS

138

420

420

151

4

AUTO

59.300

5

ASTRA SEDAN

CHEV

FX

125

460

434

142

4

MEC

63.198

5

VECTRA

CHEV

GAS

110

402

450

142

4

MEC

66.851

5

A3

AUDI

GAS

125

303

415

142

4

AUTO

75.550

5

MAREA WK

FIAT

GAS

160

500

449

152

4

MEC

84.190

5

STILO

FIAT

GAS

167

380

425

153

4

MEC

86.600

5

A3

AUDI

GAS

180

303

415

142

4

MEC

87.124

5

Tabela 9: Dados utilizados na simulação de utilização do modelo. MOD

MAR

COMB

POT

PM

COMP

ALT

LUX

CAM

PREÇO

NP

VECTRA ELEG.

CHEV

GAS

151

526

462

146

5

AUTO

84.990

5

LEGENDA: MOD: Modelo. MAR: Marca. CHEV: Chevrolet. REN: Renault. TOYO: Toyota CITR: Citroën. COM: Combustível. GAS: Gasolina. FX: Flex. LUX: Nível de luxo. PM: Porta-malas (l) ALT: Altura (cm) CAM: Câmbio. MEC: Mecânico. AUTO: Automático. NP: Nº de portas (carros de 2 portas estão como 3 portas e carros de 4 portas como 5 portas). 358

VW: Volkswagen. PEUG: Peugeot. POT: Potência (cv) COMP: Comprimento (cm) PREÇO: Preço sugerido (R$).


Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 359-375

Formação de competências para o desenvolvimento de produtos em subsidiárias brasileiras de montadoras de veículos Marcos Amatucci ESPM Roberto Carlos Bernardes FEI e ESPM

RESUMO O Desenvolvimento de Produtos (DP) em subsidiárias de multinacionais traz enormes ganhos para o país em termos do amadurecimento de fatores de produção avançados, aproveitamento e alavancagem de especialização de mão-de-obra, e inserção estratégica do país na divisão internacional do trabalho. Este trabalho analisa as condições de capacitação de subsidiárias de montadoras de veículos para o DP e apresenta um modelo explicativo do desenvolvimento desta capacitação. O estudo foi feito em duas montadoras que desenvolveram carros no Brasil, a GM e a VW, com a utilização de Grounded Theory. O modelo mostra que a capacitação é resultado de uma combinação da estratégia da matriz com a estratégia da subsidiária, tendo em vista fatores ambientais globais, a saber: a necessidade de adaptação de modelos globais e a impossibilidade de fazê-lo centralizadamente; e fatores locais, a saber, fatores locais do ambiente brasileiro, aprendizado gradualista por adaptação e as ligações com fontes de competências. Implicações para a teoria e para a prática são indicadas. PALAVRAS-CHAVE Indústria automobilística, desenvolvimento de produto, estratégia da subsidiária; formação de competências.

Building competencies for product development in Brazilian subsidiaries of the automotive industry ABSTRACT Product Development (PD) carried out in subsidiaries of multinational corporations (MNCs) located in countries with emerging economies provides advances in factors of production, creates high-quality jobs, increases specialisation of the workforce, and it is favourable to a strategic insertion of the host country in the international division of labour. This paper analyses the overall conditions of Product Development competence building at subsidiaries of automotive companies located in Brazil, and puts forward an explanatory model of this competence building process. The study was held at two Brazilian subsidiaries that had effectively developed new products – General Motors do Brasil and Volkswagen do Brasil – with the use of Grounded Theory. The model shows that competence building is caused by global factors such as the need for adapting global models and the impossibility of performing this adaptation in a centralised way; and local factors such as local conditions of Brazilian business environment, gradual learning by adaptation and links to competence sources. Implications for theory and managerial practice are discussed. KEY WORDS Automotive industry, product development, strategy of the subsidiary, competence building.

359


Amatucci M.; Bernardes, R. C. Formação de competências para o desenvolvimento de produtos em subsidiárias brasileiras de montadoras de veículos. Produção, v. 19, n. 2, p. 359-375, 2009

1. INTRODUÇÃO Tem havido consenso na literatura especializada sobre o setor, sobretudo entre os profissionais que atuam diretamente na área, ao atribuírem às atividades de desenvolvimento de produtos (DP) papel determinante na competitividade do setor automotivo (CLARK; FUJIMOTO, 1991; WOMACK; JONES; ROOS, 1992; CLARK; WHEELWRIGHT, 1993; CUSUMANO; NOBEOKA, 1993; CHANARON, 1998). Além disso, a pressão competitiva tem forçado as montadoras de automóveis a ampliar o foco nas inovações, sobretudo em relação a segurança, qualidade, confiabilidade e estilo. Destaca-se, por exemplo, a expansão dos investimentos em componentes eletrônicos incorporado nos automóveis, e mecanismos para ampliar a economia de combustível, reduzir a emissão de poluentes e melhorar os sistemas de segurança.

E

operações locais. Neste sentido, uma importante contribuição dessa pesquisa foi mostrar que as possibilidades para que haja um incremento das atividades de engenharia automotiva localmente ocorre quando as montadoras são sede de projeto. Ser sede de projeto, segundo os autores, significa que a montadora subsidiária será a gestora do projeto em questão, isto é, responsabiliza-se pelo seu desenvolvimento e por todas as decisões relativas a ele, tais como escolha e homologação dos fornecedores e modificações de peças e componentes. Entre outras vantagens, ser sede de projeto atrai atividades de codesign, amplia as chances de que os fornecedores venham a desenvolver projetos localmente e ainda abre maiores oportunidades de envolvimento entre montadoras e fornecedores de bens de capital nacional. A rigor, embora o conceito predominante na indústria automobilística hoje aponte para a consolidação de uma política de plataformas globais, há sempre a necessidade de que tais plataformas sejam adaptadas segundo as demandas dos mercados aos quais estas se destinam. Tais adaptações podem envolver desde modificações pontuais, que não demandam um trabalho elaborado de engenharia, até a construção de derivativos e, às vezes, de veículos inteiros para determinados mercados. Portanto, trata-se de um conceito distinto daquele de carro mundial, utilizado com frequência pelas montadoras durante a década de 1980, em que o pressuposto era que um único produto poderia satisfazer as demandas de consumo de automóveis em vários mercados. Essa estratégia mostrou poucos resultados positivos e deu lugar à estratégia de plataformas globais, que incorpora alterações no veículo dependendo do mercado de destino. Nesta perspectiva, concentrar projetos de desenvolvimento de produtos no Brasil permitirá à subsidiária centralizar um maior percentual de atividades com mais conteúdo agregado internamente, as quais podem envolver variados graus de complexidade. Além disso, há um efeito de encadeamento que deve afetar as atividades realizadas por seus parceiros, ou seja, pelos fornecedores que atuam diretamente e conjuntamente nesses projetos de desenvolvimento em co-design. Portanto, a compreensão dos fatores que levam à formação das competências para o desenvolvimento do produto em subsidiárias de empresas multinacionais, mormente aquelas situadas em países de economia emergente, é estratégica para a competitividade do país, tendo em vista uma inserção mais favorável na divisão internacional do trabalho, e é fundamental tanto para dirigentes de unidades nacionais quanto para formuladores de políticas públicas.

mbora o conceito predominante na indústria automobilística hoje aponte para a consolidação de uma política de plataformas globais, há sempre a necessidade de que tais plataformas sejam adaptadas.

De fato, evidências têm mostrado que, cada vez mais, a capacidade das montadoras em fornecer respostas rápidas às demandas do mercado a partir do desenvolvimento, da adaptação e da introdução de novos produtos, e, sobretudo com preços competitivos, tem garantido a elas posição de destaque no ambiente de competitividade do setor. Esta tendência é corroborada quando confrontamos o volume de investimentos realizado pelas montadoras de automóveis em P&D. Atualmente, o maior percentual dos orçamentos de pesquisa destas empresas está destinado a atividades tecnológicas de aplicação imediata, sobretudo àquelas voltadas ao desenvolvimento de produtos e adaptação de novos modelos. Segundo estudo desenvolvido por Chanaron (1998), projetos automotivos de longo prazo, sem aplicação imediata às linhas de veículos, absorvem menos de 20% dos gastos totais em P&D do setor. Por sua vez, a pesquisa conduzida por Salerno et al. (2002) chama a atenção para as vantagens, para o país, de as montadoras desenvolverem localmente atividades de desenvolvimento de produtos. Entre as razões, está o fato de tais atividades demandarem o emprego de mão-de-obra qualificada, envolverem alto valor agregado nas suas operações e contribuírem com o fortalecimento da cadeia produtiva em todo o tecido industrial, imprimindo maior importância estratégica às 360


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Não obstante a grande quantidade e qualidade da discussão sobre subsidiárias e sobre a indústria automotiva no Brasil, conforme se verá na revisão da literatura, julgamos restarem para serem respondidas três questões importantes: 1) Qual o papel exercido pela matriz na capacitação das subsidiárias brasileira, e através de quais mecanismos (“como”) este papel se exerceu efetivamente; 2) Qual o papel que os fatores locais externos à organização, exerce na formação de competências; e 3) como os diferentes determinantes da formação de competência se articulam. A resposta a estas três perguntas leva a um modelo explicativo da formação de competências nas subsidiárias.

2. OBJETIVOS E METODOLOGIA Este trabalho tem como objetivo propor um modelo explicativo da formação de competências para o desenvolvimento de produtos nas subsidiárias brasileiras de multinacionais do setor automobilístico. O conceito de competências aqui utilizado é o de competências essenciais tais como definidas por Hamel e Prahalad (1995). Segundo esses autores, “uma competência é um conjunto de habilidades e tecnologias”, enquanto que o termo “essencial” refere-se a competências “localizadas no centro, e não na periferia, do sucesso competitivo a longo prazo”. (HAMEL; PRAHALAD, 1995, p. 233-5). O importante a ser ressaltado é que estamos tratando de característica organizacional e não do indivíduo. Conforme veremos adiante, a literatura internacional sobre transferência de conhecimento intrafirma, formação de competências na subsidiária e estratégias da subsidiária é basicamente formada por estudos quantitativos de empresas de setores diversos e que, por sua natureza, não respondem a perguntas explicativas do tipo “como”. A literatura nacional sobre desenvolvimento de produtos nas subsidiárias conta com estudos qualitativos, porém dão ênfase a aspectos locais internos às subsidiárias e à estratégia da matriz. Portanto, para responder às perguntas sobre o papel da matriz e sua articulação com os fatores locais, utilizamos uma estratégia qualitativa sobre empresas de um mesmo setor. A estratégia de pesquisa consistiu em realizar uma pesquisa qualitativa junto a duas montadoras que desenvolveram produtos no Brasil, através de entrevistas em profundidade e de análise qualitativa do material, com o fito de criar teoria emergente sobre os dados. A metodologia utilizada foi a Grounded Theory (GT) (GLASER; STRAUSS, 1967; STRAUSS; CORBIN, 1998), que é um método emergente, isto é, gerador de teoria nova por indução sobre a análise qualitativa dos dados.

A principal ferramenta da análise qualitativa é a comparação. Através da comparação dos dados em contextos cada vez mais amplos e escolhidos pelas suas diferenças, a teoria alcança sucessivos níveis de abstração e generalidade. A construção da teoria por esta técnica, quando aplicada a executivos de uma ou mais empresas, é compatível com a construção de teoria através de estudos de caso conforme descrita por Eisenhardt (1989). A comparação é ainda a chave da relação entre a teoria que emerge dos dados e a teoria preexistente na literatura, questão amiúde levantada com relação ao uso da GT em estudos organizacionais: a teoria deve emergir dos dados, mas é claro que o pesquisador não pode ignorar a produção em sua área quando pretende fazer uma contribuição científica. A solução dada pela GT é tratar a literatura anterior como dado – e analisar-se os resultados ali encontrados em comparação com os resultados encontrados nos dados primários: “Comparação constante continua sendo o coração do processo. O objetivo quando se lê é comparar a literatura com a teoria emergente, da mesma maneira que se compara os [novos] dados à teoria emergente [já construída]. Por exemplo, pode-se seguir os mesmos procedimentos de coleta de dados (nesse exemplo a leitura) sobrepondo-os às anotações, codificação e produção de memos. Tratando ou não os dados precisamente dessa maneira, a questão chave é como tratar a aparente discordância entre a teoria emergente e a literatura. Não se assume que a teoria emergente esteja errada. Afinal, o pesquisador esteve o tempo todo preocupado com o ajuste dos dados e sua capacidade de fazer sentido sobre a experiência real. Procura-se estender a teoria de maneira que faça sentido tanto para os dados do estudo quanto para os dados da literatura.” (DICK, 2005) [Nossa tradução].

Um bom exemplo de aplicação da GT em temas correlatos, com um bom diálogo entre os resultados de campo e a literatura anterior, pode ser visto em Kotabe, Parente e Murray (2007). Nele os autores constroem um modelo explicativo da adoção da produção modular na indústria automotiva brasileira, utilizando GT como método de análise. A título de protocolo de pesquisa, o estudo consistiu na realização de entrevistas em profundidade, com um roteiro previamente delineado, mas não muito rígido. Entrevistas em profundidade referem-se a entrevistas em que se inicia com perguntas bastante genéricas acerca do assunto a ser pesquisado, e as perguntas subsequentes são elaboradas na hora pelo pesquisador em função das respostas do entrevistado, aprofundando assim os aspectos de interesse. As entrevistas (e palestras) foram gravadas, transcritas e analisadas segundo as técnicas de GT descritas a seguir. Os dados, na forma de textos das entrevistas e palestras gravadas, artigos 361


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de jornais e outros, passaram por três etapas de codificação – a codificação de abertura (open coding), a codificação axial (axial coding) e a codificação seletiva (selective coding). A primeira consiste em rotular ou conceituar os acontecimentos do texto, de maneira a revelar (“abrir”) o significado da fala dos entrevistados. A segunda consiste em agrupar os conceitos em torno dos “eixos” das categorias, em forma de atributos (propriedades, dimensões e tipos). A codificação seletiva consiste em fechar a análise selecionando a categoria central e estabelecendo o relacionamento das demais

T

duto particular; as dimensões da propriedade “natureza do conhecimento” são “explícito” e “tácito”. As propriedades são obtidas a partir de características da própria categoria, ou por comparação por fenômenos semelhantes ou ainda conforme descrição similar na literatura. A propriedade “Natureza do conhecimento” e as dimensões “explícito” e “tácito” (vide Figura 6), por exemplo, são conceitos construídos a partir de descrição de transmissão de conhecimento intrafirma na literatura (BONACHE; BREWSTER, 2001), e aplicados sobre os dados; a propriedade “âmbito de responsabilidade”, e as dimensões “governamental” e “mercado” (Figura 4) são conceitos construídos por comparação entre o fenômeno observado e outro fenômeno com variação semelhante (no caso, a classificação do MEC sobre âmbito administrativo das universidades: governamentais ou privadas). A posição de cada tipo na dimensão das propriedades descreve com detalhes a categoria, conforme pode ser observado, por exemplo, nas Figuras 4 e 6. Finalmente, na codificação seletiva, uma categoria central é escolhida, e a relação das demais categorias com a categoria central é estabelecida. No caso deste estudo, a categoria central é a “formação de competências para o desenvolvimento de produtos na subsidiária”, e as demais categorias são representadas como “tipos” da categoria central (Figuras 7 e 8), na verdade, fatores determinantes da formação de competências. A análise contou parcialmente com a utilização do software Atlas-ti©, de análise qualitativa de dados, que mecaniza as operações descritas acima. A pesquisa focou duas montadoras que reconhecidamente desenvolveram produtos no Brasil, a General Motors do Brasil (GMB), onde focamos o Meriva; e a Volkswagen do Brasil (VWB), que desenvolveu o Fox. Os dados primários são provenientes de onze entrevistas com executivos (diretores e gerentes) envolvidos no DP das duas montadoras, das áreas de Planejamento, Marketing, Design, Compras e Engenharia. Além das entrevistas, geramos dados primários através da promoção de palestras dos executivos de Engenharia em duas faculdades; e registrando palestras promovidas pela Sociedade da Engenharia da Mobilidade (SAE-Brasil). Dados secundários envolveram relatórios aos acionistas das duas companhias, e uma hemeroteca mantida pelos pesquisadores.

anto a pesquisa do setor automobilístico quanto a pesquisa sobre o desenvolvimento de centros de excelência em empresas multinacionais têm enfatizado o gradualismo como o processo de formação de competências. categorias com ela. Dessa forma, os conceitos são analisados, comparados e classificados em categorias, tipos de ocorrência dentro das categorias, propriedades das categorias e dimensões das propriedades. Por exemplo, a descrição “bruta” da presença de funcionários estrangeiros na subsidiária brasileira e da presença de funcionários brasileiros em subsidiárias estrangeiras foi rotulada (conceituada) como “expatriação”. O levantamento diagnóstico de necessidades de treinamento na subsidiária por parte da matriz e subsequente realização do treinamento foi rotulada de “treinamento”. A adoção de softwares de última geração padronizados pelo conjunto de centros de desenvolvimento, com a possibilidade de comunicação on-line entre os técnicos que trabalham sobre a mesma plataforma de computação; os investimentos mundiais das matrizes sobre esta padronização de softwares; e ainda, a evolução da tecnologia de desenvolvimento de produtos pela engenharia como disciplina de nível superior, fora das montadoras, foram denominados “padronização de procedimentos com a utilização de tecnologia”. Estes três conceitos estão relacionados, e constituem tipos de uma categoria (conceito de nível de abstração superior) que foi denominada “transferência de recursos da matriz”. As propriedades desta categoria são: “para que” a matriz efetuou cada movimento, propriedade denominada “natureza da necessidade”; e “o que” foi transmitido com cada recurso, que denominamos “natureza do conhecimento”. As dimensões da propriedade “natureza da necessidade” são “estrutural”, para necessidades duradouras da operação da subsidiária; ou “projeto”, para necessidades específicas ligadas a um pro362

3. REVISÃO DA LITERATURA Tanto a pesquisa do setor automobilístico quanto a pesquisa sobre o desenvolvimento de centros de excelência


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em empresas multinacionais têm enfatizado o gradualismo como o processo de formação de competências: a partir de adaptações dos produtos ou serviços para a realidade local, competências são desenvolvidas e eventualmente devolvidas à rede corporativa. Um destes estudos é o de Moore e Birkinshaw (1998; 1999a; 1999b). Neste trabalho, os autores pesquisaram 16 empresas multinacionais de serviços da Europa e dos EUA, buscando entender o gerenciamento do conhecimento na rede organizacional formada pela matriz e pelas filiais localizadas em diferentes países. Chegaram a um modelo de quatro tipos de gerenciamento do conhecimento (vide Figura 1), mostrando que a formação de um Centro de Excelência reconhecido pela matriz e pelas demais unidades evolui de uma atuação passiva na geração de conhecimentos em termos de desenvolvimento de produtos, serviços e processos, os quais fluem exclusivamente do centro para as

subsidiárias (center-driven); depois, algum conhecimento é desenvolvido a partir das adaptações ao país hospedeiro (country-focused). A partir daí o conhecimento desenvolvido localmente passa a fluir livremente entre as subsidiárias através de uma rede informal de relacionamentos dentro da firma (informal network); até que, a partir do reconhecimento formal da excelência de uma unidade e dos ganhos de competitividade que ela pode trazer para o grupo, tais unidades são “promovidas” a centros de excelência (COE). Amatucci e Bernardes (2007) descrevem esta evolução nas subsidiárias brasileiras como um “quinto passo” no modelo de Moore e Birkinshaw (1998). Neste quinto passo, as unidades da rede multinacional especializam-se como produtoras de conhecimentos específicos para a prestação de serviços de alto valor agregado para a corporação. A forma de transmissão do conhecimento gerado em uma

Figura 1: Modelos de organização em empresas globais de serviços. Fonte: MOORE, Karl; BIRKINSHAW, Julian. Managing knowledge in global servirce firms: centers of excellence. Academy of Management Executive, v. 12, n. 4, p. 83, 1998.

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unidade para outras unidades (da matriz para as subsidiárias e de algumas subsidiárias para outras subsidiárias e para a matriz) depende do tipo de conhecimento a ser transmitido (BONACHE; BREWSTER, 2001). Em um estudo de caso de um banco multinacional de origem espanhola, estes autores afirmam que a expatriação serve basicamente para transmitir conhecimento entre unidades da organização, relacionando a política de expatriação com o tipo de conhecimento a ser transmitido. Afirmam que a utilização de expatriados, pelo custo envolvido, destina-se principalmente à transmissão do conhecimento tácito, reservando-se meios menos custosos para a transmissão do conhecimento codificável. Além disso, que a expatriação dá-se individualmente quando o tipo de conhecimento é individual, ou por equipes inteiras quando o tipo de conhecimento a ser transmitido for coletivo. As condições de formação dos Centros de Excelência envolvem fatores locais e um movimento da matriz. Frost, Birkinshaw e Ensign (2002) descrevem a formação de Centros de Excelência nas subsidiárias das EMNs, elaborando um modelo conceitual segundo o qual a formação das competências dá-se por cinco fatores externos, a saber: (1) a força do “diamante” local (PORTER, 1990); (2) ligações com fontes de competências externas; (3) relacionamentos inte-

runidades ou ligações com fontes de competência internas; (4) autonomia da subsidiária; e (5) investimento da matriz. A ocorrência do centro de excelência foi medida através de perguntas que refletem a definição dos autores, e deve relacionar-se com performance da subsidiária em termos de lucratividade, competitividade, inovação, exportação, aprendizado e transferência de conhecimento. O modelo é visto na Figura 2. A ocorrência de cada uma das cinco variáveis deve aumentar a probabilidade da ocorrência do centro de excelência (quanto maior, mais provável). O estudo testa estas hipóteses através de pesquisa quantitativa em 99 subsidiárias canadenses de EMNs de ramos diversos. Os itens de performance discriminaram centros de excelência dos “não-centros”. Os autores conseguiram forte validação para os fatores ligações com fontes externas e investimento da matriz. Encontram leve suporte para a hipótese de relacionamento interunidades, ressaltando que a importância da fonte de competências (externa ou interna) parece variar com a área funcional do centro de excelência, com maior valor para fontes internas na área de manufatura, e maior valor para fontes externas na área de P&D. Os autores não conseguem validar a hipótese de que autonomia da subsidiária leve à formação de centros

Figura 2: Modelo conceitual da formação de centros de excelência em empresas multinacionais Fonte: FROST, Tony S.; BIRKINSHAW, Julian M.; ENSIGN, Prescott C. Centers of excellence in multinational corporations. Strategic Management Journal, n. 23, p. 1001, 2002.

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de excelência; e não conseguem correlação para a força do diamante, ressaltando que isto deveu-se ao fato de todas as indústrias pesquisadas terem alcançado alto valor no diamante, não havendo discriminação (lembrando tratar-se de um país de economia avançada). Consoni e Quadros (2002; 2003; 2004) estudaram intensivamente o desenvolvimento de produtos nas montadoras brasileiras, e concluíram por um modelo de desenvolvimento da capacitação da engenharia nacional que também é gradativo, e baseado na adaptação progressiva dos modelos globais ao mercado e condições locais. Esses autores retomam a evolução dos modelos desenvolvidos para o mercado brasileiro, projeto a projeto, numa trajetória que retoma a história da indústria no Brasil. Nesse trabalho, reconhecem o papel exercido pelas políticas governamentais, mormente a tributária, como impulsionadoras não só do mercado de carros populares, mas da correspondente especialização da indústria brasileira, por força da demanda, nestes modelos compactos e econômicos. A Figura 3 busca resumir essa capacitação progressiva. Para esses autores, ainda, o papel da matriz é o de prover conhecimentos complexos e suporte técnico à engenharia. Em termos de influência local, destacam o papel histórico das políticas setoriais do governo, em especial para o setor automobilístico. Dias e Salerno (2004) estudam o desenvolvimento de produto nas subsidiárias do ponto de vista da descentralização da atividade na corporação multinacional, enfocando o problema do ponto de vista da estratégia da matriz. Segundo esses autores, o desenvolvimento de produtos “globais” na indústria automobilística mostrou não trazer os resultados esperados: hoje o modelo “global” de carro é adaptado às diversas condições específicas dos mercados (e terrenos) onde são comercializados. Como há uma limitação para a diversidade de modelos que podem ser desenvolvidos cen-

Capacidade de tropicalização limitada

Capacidade de tropicalização avançada

tralizadamente, as empresas do setor passam a adotar algum grau de descentralização no desenvolvimento de produto. Segundo os autores, este grau de descentralização varia com a “estratégia de lucratividade” segundo o modelo de Boyer e Freyssenet (2000). Dias e Salerno (2004) concluem ainda que, além do grau de descentralização, a estruturação de PD envolve a discussão de criação de centros de desenvolvimento fora da matriz; e que existe uma disputa entre as unidades e entre estas e a matriz no sentido de sediar o desenvolvimento de produto. O papel da matriz para estes autores é traçar a estratégia que integra a subsidiária em sua estrutura de desenvolvimento de produto. Destacam também como fator local o papel do governo, na forma de incentivo aos motores pequenos e ao uso de combustíveis alternativos. O Quadro 1, abaixo, resume as principais contribuições da literatura em termos de fatores determinantes para a formação da competência para o desenvolvimento de produtos nas subsidiárias.

4. QUESTÕES A SEREM RESPONDIDAS A literatura deixa abertas questões sobre como a matriz participa da capacitação da subsidiária, isto é, quais são os mecanismos efetivos de transferência de conhecimento e/ou de outros recursos para a subsidiária. Outro problema importante é o do equilíbrio entre os fatores que partem de iniciativas da matriz e os fatores que partem da iniciativa da subsidiária. Alguns estudos dão ênfase à matriz, atribuindo à subsidiária um papel mais passivo; outros dão ênfase à subsidiária, atribuindo-lhe uma independência por vezes excessiva. Birkinshaw (2001), chama atenção para esta discussão, que denomina “estratégia da subsidiária x papel da subsidiária”. “Estratégia” sugere um grau de liberdade da subsidiária, enquanto “papel” sugere funções determinadas

Capacidade de design de derivativos

Capacidade de sediar projetos

Figura 3: Evolução das capacidades das subsidiárias brasileiras de montadoras de automóveis. Fonte: CONSONI, Flávia L.; QUADROS CARVALHO, Ruy. As estratégias de produto das subsidiárias das montadoras no Brasil: adaptação ou desenvolvimento local? In: CONGRESSO SAE BRASIL. A competitividade do Brasil no cenário Internacional – TI, meio ambiente e mercado. São Paulo, Anais... São Paulo, 2003.

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pela matriz. Conclui que existe um espectro de graus de liberdade de atuação para diferentes subsidiárias (BIRKINSHAW, 2001, p. 389). Aqui nos interessa verificar qual a contribuição de cada uma na formação de competências. A metodologia quantitativa dos estudos internacionais não responde às perguntas “como”. Embora dêem conta da importância de fatores locais como ligações com fontes de competência e a força do diamante, por sua natureza quantitativa não podem oferecer explicação, apenas correlação. Os estudos nacionais concentraram-se no papel da matriz, da subsidiária e do governo na formação das competências, e embora mencionem mercado, fornecedores e outros elementos presentes nos estudos internacionais, não o fazem enquanto fontes de capacitação ou de geração de conhecimento para a subsidiária. Finalmente, a literatura não fornece um modelo explicativo integrado para a formação de competências para o desenvolvimento de produtos em subsidiárias de países emergentes.

5. APRESENTAÇÃO DOS RESULTADOS De acordo com a metodologia adotada (GT), os resultados são expostos em termos das categorias levantadas na pesquisa. Apresentamos aqui uma síntese das categorias relevantes para os objetivos em tela. 5.1 Fatores locais do ambiente brasileiro Esta categoria abrange hierarquicamente três conceitos que emergiram dos dados: basicamente, a política tributária local; as vantagens competitivas do Brasil; e a estrutura de mercado de país emergente. A formação dos conceitos a partir dos dados é explicada a seguir.

No tocante às vantagens competitivas do país, o Brasil é, devido ao fenômeno do crowd-in (BRESSER PEREIRA, 1978), um dos países com maior número de montadoras no mundo – se não for o maior; esta competitividade excessiva torna o país um campo de teste de mercado para diversos modelos candidatos a modelos globais; e coloca efetivamente os modelos aqui comercializados numa situação de competitividade agressiva. Paralelamente e como condição sine qua non para a ocorrência desta concentração, encontra-se a correspondente concentração nos demais elos da cadeia produtiva, com a presença de uma enorme gama de empresas fornecedoras de todos os níveis, cerca de metade das quais também internacionalizadas como os seus clientes; mas metade ainda de fornecedores locais. Isto significa um cabedal de recursos fartos à disposição da indústria automotiva, em termos de oferta de capacidade técnica para codesenvolvimento, resolução conjunta de problemas técnicos, preço e prazos avantajados. Os produtos da indústria automotiva são projetados e desenvolvidos dentro de uma cadeia de produção bastante desenvolvida e “aconchegante”, com abundância de todos os nutrientes necessários ao projeto. O Brasil conta hoje com um mercado interno ao qual a indústria automotiva mundial não pode ser indiferente. Em 2006 a VW vendeu 440 mil veículos no Brasil (só passeio – fora caminhões), exportando outros 202 mil a partir daqui (265 mil em 2005). O mercado local justifica o tamanho dos investimentos e a manutenção do corpo de engenheiros e de uma área de engenharia, bem como a profundidade com que esta engenharia tem permissão de agir no sentido de produzir modificações nos modelos para que se adéquem a ele. Atraídos inicialmente pela política desenvolvimentista de JK, o número de players aumenta dramaticamente com a abertura de mercado dos anos 90, passando de 4 para 17 entre

Quadro 1: Fatores determinantes da capacitação da subsidiária na literatura. Fatores Globais • Inviabilidade do “carro global” • Impossibilidade de se proceder às adaptações regionais centralizadamente • Atuação da matriz:  Estratégia global  Suprimento de tecnologia  Reconhecimento da capacitação da subsidiária  Investimentos nas subsidiárias  Ligações com fontes de competências mundiais da EMN  Fonte de conhecimento complexo  Suporte técnico à engenharia da subsidiária  Estratégia de integrar a subsidiária em sua estrutura de DP Fonte: Autores, a partir da literatura supracitada.

366

Fatores Locais • Capacitação progressiva da subsidiária  Desenvolvimento de conhecimento “country focused”  Redes informais entre subsidiárias • Ligação da subsidiária com fontes de competências locais • “Diamante” de Porter local • Papel do governo:  histórico, políticas setoriais  incentivo aos motores pequenos e aos combustíveis alternativos


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1994 e 2005. Estes fatos provocaram um índice de rivalidade que obriga a produtividade, qualidade e inovação. O mercado fornecedor é bastante desenvolvido, globalizado, competitivo, e dá suporte às inovações das montadoras. Finalmente, a estrutura escolar técnica e universitária fornece quadros qualificados para que a indústria exerça sua competitividade. São dadas as condições porterianas para se ter uma indústria automotiva competitiva no país. Os fatores amadureceram, de maneira que a competitividade nacional na área sai do patamar de fatores básicos para o patamar de fatores avançados (PORTER, 1990): o Brasil não mais atrai a indústria pela mão-de-obra barata e sem especialização, mas pela mão-de-obra especializada com vantagem de eficiência. A política tributária do governo brasileiro exerce bastante influência no comportamento dos consumidores de automóveis. A carga tributária incidente sobre veículos no Brasil – e em geral nos países emergentes – é alta, e interfere fortemente nos preços dos modelos, dirigindo suas preferências. Este efeito retroalimenta as montadoras não só em termos de quantidade de produção de cada modelo, mas em termos de projeto de novos modelos que se beneficiem de incentivos fiscais. O governo incentiva com desconto os veículos com motores 1.0; atualmente, os veículos com tecnologia “flex” que permitem o uso de combustíveis renováveis ou menos poluentes. Além disso, incentiva os utilitários (caminhões e pick-ups) com descontos semelhantes. O efeito colateral desta política, positivo e não previsto pelo governo, foi o desenvolvimento, por parte das montadoras, do motor 1.0 mais potente do mundo, com 72 HP (tinha cerca de 50 há quinze anos), por exigência do consumidor. Para aumentar a potência dos motores pequenos que o nosso mercado pode pagar, os projetistas aumentaram gradativamente as taxas de compressão, que saíram de pouco mais de 7:1 há quinze anos para 12,5:1 hoje. Ora, a estas taxas o álcool pode ser comburido, o que permitiu o desenvolvimento do motor híbrido – a tecnologia flex. Existe, portanto, uma relação sistêmica entre a política tributária do governo brasileiro, o comportamento do consumidor e o comportamento das montadoras. O governo busca otimizar a arrecadação, promover empregos e incentivar a produção de carros populares (o que identifica com motor 1.0), e de utilitários. O consumidor busca o motor

de melhor desempenho e o melhor preço, reagindo, portanto, aos incentivos do governo. As montadoras buscam agradar ao consumidor de maneira a aumentar suas vendas, adaptando-se à política tributária do governo. Outro efeito colateral da política tributária está relacionado à escolha da subsidiária brasileira da GM para sediar projetos globais de picapes, especialidade também desenvolvida devido aos incentivos que tal modelo goza no país. Ao lado das condições mais severas de nosso leito carroçável, este fator puxou o desenvolvimento destes veículos para a GM brasileira.

O

s fatores estratégicos de necessidade de adaptação dos modelos globais e impossibilidade de fazê-lo centralizadamente são os motores do processo de adaptação por parte da subsidiária e de investimento por parte das matrizes, e estão na base da formação de competências para o desenvolvimento de produtos nas subsidiárias. Cabe lembrar o papel da política de proteção à indústria adotada pelo governo Kubitscheck pouco após a Segunda Guerra. Segundo Mariotto (2003), esta política governamental teve importante papel no aumento do índice de nacionalização das autopeças e no desenvolvimento da rede de fornecedores nacionais. A abertura econômica dos anos 1990, durante o governo Collor de Mello, reduziu gradativamente as alíquotas de importação de veículos de 85% em 1990 para 35% em 1994; para as peças e componentes, a alíquota foi de 40% para 20% (MARIOTTO, 2003). Em conversa pessoal, este autor afirmou considerar ainda a alíquota elevada o suficiente para consistir barreira tarifária, e que, portanto, é de opinião que a força do diamante de Porter deve ser vista com cuidado na indústria automotiva brasileira. A estrutura de mercado de país emergente inclui, além do comportamento do consumidor (voltado a preço, beleza e outras características), as condições de rolagem das ruas e estradas brasileiras, que exerceram grande impacto na capacitação da engenharia local, por suas características severas de exigência técnica dos produtos – isto é, são ruins, e os veículos projetados em países de melhores condições de rolagem revelam-se “fracos” para atuar em condições tropicais, devendo ser adaptados. De fato, o Brasil oferece uma das piores condições de rolagem do mundo, o que credencia a engenharia local como uma desenvolvedora de produtos capazes de trabalhar em 367


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condições bastante severas, com extrema durabilidade comparativamente a outros projetos. O Brasil também tem uma variedade singular de combustíveis, o que torna o desenvolvimento de motores uma das especialidades locais. Podemos apontar como propriedades dos Fatores Locais do Ambiente Brasileiro suas características econômicas: características de economias atrasadas, como as condições de rolagem e a proteção do mercado (barreiras tarifárias), e características de economia avançada, como as condições de competitividade da indústria local. Da mesma maneira, alguns destes fatores são de âmbito mercadológico, enquanto que outros são atribuições governamentais. Tais propriedades identificam os tipos específicos da categoria Fatores Locais do Ambiente Brasileiro, como pode ser visto na Figura 4. 5.2 Gradualismo na formação por adaptação O aprendizado institucional local obtido pela adaptação do projeto importado inicia-se com a “tropicalização” da suspensão de plataformas européias (necessidade objetiva causada pelas condições de rolagem mais severas); depois, desenvolvimento de carroçarias parciais (basicamente a parte traseira, “da porta para trás”), resultando em derivativos do modelo estrangeiro: o sedan, a perua (SW) e a pequena picape desenvolvidas pela mudança parcial da carroçaria do projeto global hatch, por exemplo, motivada por fatores subjetivos ligados às preferências do consumidor. Então, com o exercício repetido do desenvolvimento parcial e a experiência acumulada ao longo de diversos modelos de veículos, o salto de qualidade para o desenvolvimento completo de um

Adiantadas

Formação da mão-de-obra

Mercado Interno Disponibilidade de Indústria de Suporte

Política Tributária (interna)

Intensidade da Competição Atrasadas

Características Econômicas

Fatores Locais do Ambiente Brasileiro

Barreiras Tarifárias Condições de Rolagem Governamental

Mercado Âmbito de Responsabilidade

Figura 4: Categoria: fatores locais do ambiente brasileiro Fonte: Autores.

368

modelo, de maneira economicamente viável e com sucesso de mercado. Este gradualismo, presente nos dados primários, fora bem caracterizado por Consoni e Quadros Carvalho (2002; 2003 e 2004) para a situação específica da indústria automobilística brasileira, bem como, em situação bastante diferente, em empresas de serviços diversas e em países desenvolvidos, por Moore e Birkinshaw (1998; 1999a; 1999b). Os modelos apresentados anteriormente representam bem esta categoria (Figuras 1 e 3). Os dados de campo acrescentam o desenvolvimento simultâneo de capacidades mercadológicas capazes de perscrutar e interpretar necessidades e desejos do consumidor, transformando isto em atributos de produto obteníveis de forma prática e viável através de modificações no desenho estrangeiro; bem como o desenvolvimento de motorização local, bastante guiado pelas características da legislação tributária e técnica do país; ambos guardam a mesma característica de gradualismo. Além disso, alguns relatos na literatura podem ter deixado a impressão de que este desenvolvimento tenha ocorrido de maneira “autóctone”, enquanto que ressaltamos neste estudo os mecanismos pelos quais a matriz participou no desenvolvimento desta capacitação. 5.3 Ligação com fontes de competências A formação das competências necessárias aos resultados atingidos pela subsidiária brasileira em termos de desenvolvimento de produtos contou com inputs de diversas fontes, aqui expressas em termos de conceitos que formam esta categoria. Primeiro, a disponibilidade de profissionais com formação universitária de qualidade, principalmente na área de engenharia (mecânica, eletrônica, química, de produção) e designers industriais. Não obstante a queixa das montadoras de que apesar das escolas suprirem mão-de-obra de boa qualidade, não o fazem em quantidade suficiente, as universidades brasileiras disponibilizam uma parcela destes profissionais com formação de padrão internacional. Segundo, o codesenvolvimento efetuado de maneira estreita com os fornecedores “tier um”, que contribuem com suas próprias inovações e organizam o fornecimento dos tiers dois e três, caracteriza o contato da subsidiária com fontes externas de competência. Em terceiro lugar, as fontes de competências internas à organização multinacional: a transferência de recursos da matriz (organizada em categoria à parte, v. adiante), através de expatriação de executivos e técnicos, treinamento e padronização de procedimentos com aporte de tecnologia; bem como o intercâmbio de conhecimento com outras sub-


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sidiárias, através da expatriação promovida pela matriz, pela troca de informações através dos sistemas de desenvolvimento ligados online entre as unidades, e relações informais entre técnicos de unidades diferentes. Portanto não se pode desprezar o impacto que o fator de ligação com as fontes externas e internas de competências tem na capacitação das subsidiárias. Note-se que, no caso, as fontes locais são externas à organização, enquanto que as fontes estrangeiras provêm da própria EMN. Para alinhar a nomenclatura com a literatura internacional, optamos por dimensionar a origem das fontes em globais e locais. A categoria Ligação com Fontes de Competências está representada na Figura 5, com os tipos organizados pela propriedade origem das fontes, externas ou internas à firma. 5.4 Transferência de recursos da matriz para a subsidiária Dentre as ligações com fontes de competências, a transferência de recursos da matriz para a filial exerce um papel estratégico e liga a estratégia da matriz à estratégia da subsidiária. Esta transferência ocorre por três meios importantes: expatriação, treinamento e padronização do processo com adoção de tecnologia de ponta. A transferência de recursos da matriz objetiva-se através das iniciativas corporativas de treinamento dos técnicos da subsidiária, dos recursos investidos em expatriação e na padronização das atividades de desenvolvimento com a adoção de tecnologia de informação como suporte. Os dados de campo sugerem que estas iniciativas são motivadas pela percepção da impossibilidade de se realizarem todas as adaptações necessárias aos produtos de forma centralizada (através de relatos de um longo back-log de projetos nos centros tradicionais de desenvolvimento), e pelo reconhecimento da importância da subsidiária, principalmente diante

Ligação com Fontes de Competências Matriz

Fornecedores

Outras Subsidiárias

Universidades

Globais (internas)

Locais (externas) Origem das Fontes

Figura 5: Categoria – ligação com fontes de competências. Fonte: Autores.

do mercado local e dos investimentos em engenharia que ele justifica. Estes conceitos são corroborados pela literatura (DIAS; SALERNO, 2004). Na GMB, o treinamento é realizado sob iniciativa da área corporativa de Recursos Humanos, na matriz, depois de levantamento de necessidades visando identificar gaps de capacitação especificamente em áreas de DP, tendo em vista as especializações dos times em sistemas de componentes do carro. O treinamento realizado pela corporação ocorre, portanto, tendo em vista lacunas de desempenho objetivamente detectadas através de levantamentos sistemáticos que objetivavam o desenvolvimento local de competências, o que caracteriza a intenção da matriz na capacitação da subsidiária para o DP. A adoção de tecnologia de ambiente virtual de desenvolvimento; ferramentas de teste virtual e de comunicação técnica on-line para permitir colaboração internacional em tempo real – e o treinamento dos técnicos na utilização destas ferramentas – representam transferência de tecnologia. Mas não só: a subsidiária recebe recursos específicos para a implantação dos centros de realidade virtual: há investimento da EMN na capacitação da subsidiária, em termos intelectuais e financeiros. A adoção de softwares de projeto em ambientes virtuais, softwares de desenvolvimento colaborativo e interativo através de redes de computadores; softwares de simulação de desempenho de produtos virtualmente desenvolvidos (aí incluídos testes de impacto destrutivo e segurança) e o treinamento para a utilização destes softwares/hardwares constituem padronização internacional do processo de desenvolvimento de produtos e transferência de conhecimento da matriz para a subsidiária. Assim, a padronização do processo nivela o desenvolvimento de produto “por cima”, isto é, através da adoção de tecnologias de ponta utilizadas nos centros técnicos dos países centrais, e representa uma grande transferência de tecnologia para a subsidiária. Na VWB, pouco antes do desenvolvimento do Fox, por ocasião da preparação da linha para a produção do Polo, a engenharia recebeu investimentos do exterior: para a contratação de engenheiros, investimentos em equipamentos e capacidade de teste; a maior parte porém destinou-se à manufatura. Na expatriação, o constante intercâmbio de profissionais entre as unidades – expatriação de técnicos por tempo determinado, tanto do Brasil para o exterior quanto do exterior para o Brasil, a experiência de técnicos dos centros americanos e europeus são trazidos para o país. A Tabela 1, abaixo, relaciona os engenheiros brasileiros no exterior e os engenheiros estrangeiros no Brasil em dezembro de 2007, na GM. A expatriação dos engenheiros e o treinamento técnico na VWB, iniciativas da matriz alemã, contribuíram para a 369


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capacitação dos engenheiros para o desenvolvimento de produtos – embora isto tenha ocorrido como efeito colateral do objetivo de capacitar a subsidiária para a produção local de modelos globais, e a resolução de problemas técnicos de adaptação às condições e legislação locais em diversas partes do mundo – e não capacitar especificamente para o desenvolvimento. As adaptações necessárias a países que não contam com engenharia própria com capacidade para efetuá-la (por exemplo, Espanha e Eslováquia), e que no entanto vão fabricar ou comercializar modelos desenhados ou produzidos no Brasil, são motivos de expatriação de engenheiros. A fabricação local de modelos globais também é motivo de expatriação. Segundo os entrevistados, em alguns momentos da preparação na nova linha, entre 120 e 150 engenheiros brasileiros residiam e trabalhavam em unidades VW no exterior. Esta expatriação gera capacitação local independentemente da intenção inicial. Conforme visto na literatura (BONACHE; BREWSTER, 2001), o conhecimento transferido pode ser tácito ou explícito (codificável) e, ainda, pode atender a necessidades estruturais da subsidiária, detectadas através de diagnóstico, ou atender a necessidades mais imediatas dos projetos em desenvolvimento. Estas duas propriedades da categoria definirão os tipos específicos de transferência, conforme pode ser visto na Figura 6.

6. DISCUSSÃO A formação das competências para o desenvolvimento de produtos na subsidiária foi resultado de fatores de nível local, a saber, os fatores locais do ambiente brasileiro, a ligação com fontes de competência e o aprendizado gradualista por adaptação; e de fatores globais, a saber, a necessidade de se adaptar os modelos globais aos diferentes ambientes locais, a impossibilidade de proceder a estas adaptações de maneira centralizada na EMN e as correspondentes iniciativas da matriz em repassar recursos para as subsidiárias. As duas ordens de fatores foram necessárias para a formação das competências tal como ocorreu nas subsidiárias estudadas. O aporte de recursos da matriz para a subsidiária deuse concretamente através de treinamento, expatriação e padronização de procedimentos de desenvolvimento de produto, com a utilização de tecnologias de desenvolvimento de última geração, sua implantação e todo o investimento correspondente para que isto acontecesse. Os dados de expatriação de nosso estudo em comparação com o estudo de Bonache e Brewster (2001) sugerem que o 370

desenvolvimento de produtos envolve conhecimento tácito, tanto individual quanto coletivo. Os fatores específicos do ambiente brasileiro somam principalmente as vantagens competitivas da indústria automotiva no país, a política tributária do governo brasileiro para a indústria automotiva e as (severas) condições de rolagem para automóveis no Brasil. As vantagens competitivas da indústria automotiva consistem em fatores avançados, amadurecidos em cerca de noventa anos desta indústria no Brasil, como: a presença de um número inusitadamente grande de montadoras, provocando intensa competição; o desenvolvimento paulatino da indústria de fornecimento e de suporte, hoje também globalizada e com intensidade de competição. Este amadurecimento da indústria encontra o amadurecimento de fatores avançados de produção, havendo disponibilidade de mão-de-obra qualificada nas áreas técnicas de engenharia correspondentes às necessidades desta indústria. E, finalmente, o desenvolvimento de um mercado interno capaz de sustentar não só a própria presença dos inúmeros players, como também as estruturas de inovação necessárias para fazer frente à intensidade da concorrência. A força do mercado também impulsiona o desempenho das subsidiárias; e o desempenho da subsidiária é um fator levantado por Frost, Birkinshaw e Ensign (2002) como incentivador do investimento da matriz na subsidiária. A política tributária incentivou tipos específicos de desenvolvimento (como picapes, motores pequenos, motores

Tabela 1: Expatriação engenheiros intrafirma na GMB dez/2007. Engenheiros brasileiros no exterior por destino

estrangeiros no Brasil por origem

EUA

2

8

América do Sul

1

2

Alemanha

2

-

África do Sul

2

2

Coreia do Sul

5

-

Japão

6

-

China

2

-

Total

20

12

Fonte: Autores, a partir de dados de MANUCHAKIAN, Pedro. Palestra proferida na Faculdade de Engenharia Industrial. São Paulo, dez. 2007.


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híbridos) que impulsionaram a especialização da indústria no sentido dos incentivos, com ganhos para a competitividade internacional. As severas condições de rolagem para automóveis no Brasil desencadearam desde o início a necessidade imperativa de se permitir adaptações aos modelos fabricados localmente, sob pena de não funcionarem. Foi na brecha inicialmente aberta por esta força maior que os engenheiros brasileiros trabalharam nos últimos noventa anos; e é a permanência desta condição negativa que justifica facilidades especiais para testes de veículos e também atribui aos fabricantes brasileiros competitividade internacional. A formação das competências para o desenvolvimento de produtos na subsidiária na VW segue um padrão que, para todos os efeitos, é o mesmo observado na GM: a acumulação gradativa de experiência e aprendizado via adaptação de modelos globais para o ambiente local e o desenho de derivativos para extensão de linha, motivados pela diferença entre os mercados mundiais (categoria que aparece no estudo da GM), e pelos fatores específicos do ambiente brasileiro; aporte de recursos da matriz em termos de treinamento, equipamentos e recursos financeiros; e expatriação de executivos para fora do Brasil.

A parcela subjetiva da formação de competências possui na empresa alemã um caráter mais fortuito: não houve treinamento específico para a formação de um centro de competências em desenvolvimento, mas para adaptações bastante concretas de modelos globais para a fabricação local. O mesmo com as expatriações e o aporte de recursos. Mas o resultado final foi o mesmo, a transferência de conhecimento da matriz como parte relevante da formação de competências locais para o desenvolvimento de produtos.

O

“link” com outras fontes de competências aparece aqui como aporte de recursos da matriz; na relação das montadoras com os fornecedores, que participam do desenvolvimento de produto desde suas fases mais tenras, muitas vezes em codesenvolvimento; e na captação de mão-de-obra especializada nas universidades.

Projeto Estrutural

Natureza da Necessidade

Transferência de Recursos da Matriz

Padronização de Procedimentos

Expatriação

Treinamento

Explícito

Natureza do Conhecimento

Figura 6: Categoria – transferência de recursos da matriz. Fonte: Autores.

Tácito

Integrando os conceitos de Frost, Birkinshaw e Ensign (2002) aos dados de campo deste estudo, podemos afirmar que o “link” com outras fontes de competências aparece aqui como aporte de recursos da matriz; na relação das montadoras com os fornecedores, que participam do desenvolvimento de produto desde suas fases mais tenras, muitas vezes em codesenvolvimento; e na captação de mão-de-obra especializada nas universidades. Estas duas últimas fontes são parte integrante do diamante de Porter. A avaliação da força do diamante foi feita qualitativamente pelos autores, a partir de dados qualitativos extraídos das entrevistas; e não pelos entrevistados eles mesmos ou por medidas macroeconômicas do setor. Entretanto, sua presença na indústria automobilística brasileira é notória. A discussão acerca do efeito da proteção do mercado em nossa opinião não derruba estes elementos. Mariotto (2003) destaca que após a abertura houve retrocesso no índice de nacionalização, e um aumento na automação da produção. Podemos acrescentar a isto um forte movimento de aquisições no mercado fornecedor, com maior presença de subsidiárias de EMN neste setor atualmente. Entretanto é inegável que este movimento não só reforçou a expertise da cadeia a montante, como também aumentou o grau de liberdade dos compradores das montadoras, fatores que fortalecem a excelência. O mercado consumidor cresceu e a demanda de mão-de-obra especializada também, uma vez que a automação atinge a mão-de-obra menos qualificada. 371


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Da mesma maneira, apesar de não mostrar discriminação estatística (entre os Centros de Excelência e as demais subsidiárias) no estudo de Frost, Birkinshaw e Ensign (2002), tal ocorreu porque toda a indústria canadense conta com fatores avançados de competitividade local, e, portanto, o diamante está presente num e noutro casos.

N

essas categorias segundo duas propriedades e colocá-las como fatores emergentes para a consecução da categoria. A categoria central, assim, serve de modelo de formação das competências. Como vimos, os fatores que concorrem para a formação da competência da subsidiária têm componentes globais e locais; esta propriedade consiste no nível de influência dos fatores. Outra propriedade destes fatores é a de que alguns deles têm característica ambiental, objetiva ou determinística: não dependem da vontade dos executivos – como as condições de competitividade brasileiras ou a impossibilidade de se fazer sucesso em mercados muito diferentes com um único modelo de produto; enquanto que outros fatores dependem de decisão ou iniciativa dos executivos das organizações – possuindo, portanto, características volitivas. Denominamos esta propriedade de natureza do fator, tendo o primeiro grupo natureza objetiva e o segundo, subjetiva ou volitiva. O modelo explicativo proposto pode ser visto na Figura 7.

ão obstante o “determinismo” das forças do ambiente global, que forçam a estratégia da matriz, a direção da descentralização (isto é, quais subsidiárias sediariam os projetos entre as dezenas de unidades de cada uma das empresas) foi delineada pelos processos da subsidiária e as condições locais. Assim, consideramos que os fatores componentes do diamante de Porter têm influência na formação de competências para o desenvolvimento do produto, e mantivemos este fator no modelo. Tanto o caso GM quanto o caso VW reforçam a idéia, presente no trabalho de Dias e Salerno (2004), de que é impossível para as matrizes efetuarem todas as adaptações que necessitam de maneira centralizada. Algumas entrevistas sugerem que não é sequer possível perceber centralizadamente todas as necessidades de adaptação, não obstante o sofisticado processo de coleta e tratamento de dados de mercado mundiais, presentes nas duas montadoras. Outras entrevistas citaram textualmente o gargalo de desenvolvimento dos centros tradicionais, com uma fila de projetos mundiais que tiraria a competitividade da inovação se o processo permanecesse centralizado. Portanto, os fatores estratégicos de necessidade de adaptação dos modelos globais e impossibilidade de fazê-lo centralizadamente são os motores do processo de adaptação por parte da subsidiária e de investimento por parte das matrizes, e estão na base da formação de competências para o desenvolvimento de produtos nas subsidiárias.

7. CONSTRUÇÃO DA CATEGORIA CENTRAL E PROPOSIÇÃO DO MODELO Havendo discutido as categorias auxiliares que explicam a Formação das Competências para o desenvolvimento de produtos nas subsidiárias brasileiras das empresas automotivas, a categoria central de nosso estudo, podemos organizar 372

8. CONCLUSÃO Tendo sido as categorias caracterizadas através de seus tipos, propriedades e dimensões, resta resumir o relacionamento entre elas, num modelo que exiba as relações de determinação e composição. A Figura 8 mostra esses relacionamentos, estruturados em “é fator de” (determinação), e “é um tipo de” (composição). As dimensões da categoria principal (global x local, e objetivo x subjetivo) foram reproduzidas no modelo e separam as categorias por natureza. O motor da capacitação para o desenvolvimento de produtos nas subsidiárias é a tensão entre as forças de globalização do produto (necessidade de escala e custo do desenvolvimento de produto) e as forças de localização (condições locais que exigem adaptação); esta tensão é trabalhada por Bartlet (1986), que afirma que a combinação específica de globalização e localização deve ser contemplada por uma estrutura organizacional internacional própria – e parte constituinte de uma estrutura organizacional é o seu grau de descentralização. A incapacidade das montadoras de realizarem a adaptação de maneira centralizada força o movimento de descentralização e todos os acontecimentos que o cercam. Não obstante o “determinismo” das forças do ambiente


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global, que forçam a estratégia da matriz, a direção da descentralização (isto é, quais subsidiárias sediariam os projetos entre as dezenas de unidades de cada uma das empresas) foi delineada pelos processos da subsidiária e as condições locais. Portanto, a capacitação para o desenvolvimento de produtos nas subsidiárias do setor automobilístico brasileiro é função do desenvolvimento local de competências através da adaptação dos produtos globais ao mercado local, conjuntamente com fatores de competitividade da indústria no país, ao lado de uma mobilização das matrizes no sentido de descentralizar esta atividade, seja por impossibilidade de efetuar todo o desenvolvimento adaptado a partir dos centros tradicionais de desenvolvimento, seja porque a subsidiária tem expertises locais, desenvolvidas frente a necessidades específicas, difíceis de serem reproduzidas remotamente. O estudo sugere uma relação interessante entre a estratégia da subsidiária e a estratégia da matriz, questão problemática de nível de análise no campo da estratégia: enquanto a matriz reage às pressões da globalização e da localização, diminuindo assim os graus de liberdade da estratégia das subsidiárias, estas se movimentam no sentido de ocupar uma posição privilegia-

Global

Categoria Central: Formação de Competências para o Desenvolvimento de Produtos na Subsidiária Necessidade de Adaptação do Produto Global

Transferência de Recursos da Matr iz

Local

Nível de Influência

Impossibilidade de efetuar adaptações centralizadamente

Ligação com Fontes de Competências

Aprendizagem Gradualista por Adaptação

Fatores Locais do Ambiente Brasileiro Objetivo Natureza do Fator

Subjetivo (volitivo)

Figura 7: Categoria – formação de competências para o desenvolvimento de produtos nas subsidiárias brasileiras (categoria central do estudo). Fonte: Autores.

da no quadro da estratégia geral da matriz, competindo entre si por esta posição, e as condições nacionais exercem um papel relevante nesta competição. O país hospedeiro, por sua vez, é beneficiado pela “promoção” da subsidiária, pois desenvolve tecnologia, puxa as vendas da empresa para os fornecedores locais que participaram do desenvolvimento e pode passar a sediar offshoring de serviços de alto nível no país (como efetivamente ocorreu no caso GM), saindo de uma posição de fornecedor de mão-de-obra barata para a de fornecedor de fatores dinâmicos avançados. Em termos de implicações para a teoria, o modelo proposto estabelece um conjunto abrangente de fatores determinantes da capacitação da subsidiária, organizados por nível de influência (globais x locais) e natureza (objetivos x subjetivos), permitindo que a pesquisa futura saiba o que esperar da contribuição de cada fator. A contribuição da matriz é concretizada em termos de mecanismos e da intenção, deixando bastante claro qual é o comportamento da matriz que quer desenvolver capacitação na subsidiária. O estudo também contribui para a discussão do espaço de autonomia estratégica da subsidiária: a matriz necessita estabelecer papéis para as subsidiárias, por força do seu ambiente global, mas a subsidiária, apoiada nas vantagens de localização, disputa os “papéis principais”. Como implicações para a prática, o modelo instrumentaliza executivos deste e de outros setores para avaliarem suas estratégias locais, analisando os fatores objetivos do contexto de sua indústria e a política tributária aplicada ao seu setor, e balancearem a intensidade com que investirão nos fatores subjetivos, sabedores dos efeitos, principalmente, da expatriação e da padronização de procedimentos com aporte de recursos tecnológicos. Os gerentes de subsidiárias podem entender que o espaço estratégico de suas unidades reside na disputa com outras subsidiárias pelas atividades de maior valor agregado, e que os seus aliados nessa competição são as fontes locais de competências, a saber, fornecedores e universidades. Portanto, é do interesse do executivo da subsidiária local o desenvolvimento de competências desses parceiros e o estabelecimento de alianças estratégicas com eles. O formulador de políticas públicas, sabedor das vantagens para o país da atração de atividades de alto valor agregado para a subsidiária local e a mecânica da construção desta vantagem, pode encarar de maneira menos ideológica a relação entre o Estado e a subsidiária local da empresa multinacional estrangeira, favorecendo o desenvolvimento dos fatores objetivos.

373


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Global

Expatriação Padronização de procedimentos

Impossibilidade de efetuar adaptações centralizadamente

Treinamento Transferência de recursos da matriz

Necessidade de adaptação do produto global Formação de competências para o desenvolvimento de produtos na subsidiária

Objetivo

Formação da mão-de-obra

Ligação com fontes de competências globais

Subjetivo (volitivo) Ligação com fontes de competências locais

Fatores locais do ambiente brasileiro

Intensidade da competição

Fornecedores Universidades

Mercado interno Indústria de suporte

Outras subsidiárias

Aprendizagem gradualista por adaptação

Barreiras tarifárias Política tributária Condições de rolagem

Legenda = é fator de = é tipo de = eixos

Local

Figura 8: Modelo de Formação de competências para o desenvolvimento de produtos nas subsidiárias brasileiras. Fonte: Autores.

Artigo recebido em 15/05/2008 Aprovado para publicação em 26/03/2009

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SOBRE OS AUTORES Marcos Amatucci ESPM End.: R. Dr. Álvaro Alvim, 123 – V. Mariana – São Paulo – SP – 04018-010 E-mail: marcosamatucci@espm.br Roberto Carlos Bernardes FEI/SP e ESPM End.: R. Dr. Álvaro Alvim, 123 – V. Mariana – São Paulo – SP – 04018-010 E-mail: bernardes@fei.edu.br 375


Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 376-387

Relacionamento interorganizacional na cadeia de suprimentos: um estudo de caso na indústria da construção civil Renata Albergaria de Mello Bandeira UFRGS Luiz Carlos Brasil de Brito Mello UFF Antonio Carlos Gastaud Maçada UFRGS

RESUMO O escopo deste trabalho consiste em promover uma discussão sobre os mecanismos de coordenação das relações interorganizacionais – poder e cooperação – na cadeia de suprimentos da indústria da construção civil. O poder, como um construto de relações interorganizacionais, tem recebido um tratamento irregular e conflitante por parte dos analistas. No entanto, esta abordagem ignora relações existentes que são muito apropriadas para certos contextos do relacionamento interfirmas. Logo, foi desenvolvido um estudo de caso em um elo da indústria da construção civil com o intuito de identificar suas relações como sendo baseadas em dominação ou cooperação. São analisadas, ainda, as implicações dos resultados da pesquisa na gestão da cadeia de suprimentos da construção civil. PALAVRAS-CHAVE Cadeia de suprimentos, aliança estratégica, relacionamento, construção civil.

The interorganizational relationship in the supply chain: a case study in the civil construction industry ABSTRACT The article discusses the relationship in the supplier chain in the civil construction industry. The main objective is to define if it is a cooperative relation among the intervenients or if the most powerful dictates the rules. Power as an interorganizational construct has been observed by analysts with an irregular and conflictive point of view. However, these analysts ignore completely existing relationships that are very appropriate in some existing relationships among enterprises. Due to that, it was verified het type of relationship developed by two intervenients in one step of the supply chain of a civil construction company to determine if it is cooperative or if, otherwise, the main actor uses its power to lead the chain. The researchers also analyze what are the implications of this study in the civil construction industry’s supply management. KEY WORDS Supply chain, strategic alliances, relationship, civil construction.

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Bandeira, R. A. M.; Mello, L. C. B. B.; Maçada, A. C. G. Relacionamento interorganizacional na cadeia de suprimentos: um estudo de caso na indústria da construção civil. Produção, v. 19, n. 2, p. 376-387, 2009

1. INTRODUÇÃO O relacionamento nas cadeias de suprimento é um tópico estratégico para o sucesso das empresas, sendo fundamental a compreensão das estruturas dos relacionamentos existentes para que os profissionais de logística saibam como as cadeias devem ser gerenciadas. A literatura de logística considera que o relacionamento da cadeia ocorre apenas com base na cooperação e na confiança (BOWERSOX; CLOSS, 2001; COUGHLAN et al., 2002). De tal maneira, a literatura foca essencialmente em relações de cooperação entre compradores e fornecedores, buscando soluções ótimas para a minimização de custos (MILLS et al., 2004). Entretanto, os relacionamentos em uma cadeia de suprimentos são relações de risco, poder, liderança e cooperação. A gestão da cadeia de suprimentos considera as dimensões comportamentais e políticas do poder e da confiança, além do conflito e dependência entre fornecedores e compradores. Estudos recentes apontam a relevância do poder e da dominação como construtos nas relações em cadeias de suprimento. Contudo, Cox (1999) relata haver pouca discussão sobre esta questão. Recentemente, o tema passa a ter maior relevância na academia, sendo trabalhado por autores como Cox (1999), Cox e Chicksand (2005) e Hingley (2005). Através deste trabalho, pretende-se promover uma discussão a respeito da importância dos relacionamentos na cadeia de suprimentos, tentando identificá-los como relações de dominação ou cooperação. Assim, a pesquisa busca responder à seguinte questão: o relacionamento dominante em uma cadeia de suprimento da construção civil é de dominação ou de cooperação? Para tanto, são analisados, por meio de um estudo de caso, os relacionamentos em um elo da cadeia de suprimentos da construção civil. A relevância do estudo é justificada pela importância da indústria da construção civil no panorama econômico brasileiro. O setor é estratégico para as políticas públicas de geração de riquezas e criação de empregos, sendo responsável por 19% do Produto Interno Bruto nacional e por 6% dos salários pagos aos trabalhadores (Câmara Brasileira da Indústria da Construção, 2005). Além disto, a indústria da construção civil age sobre uma extensa cadeia produtiva de fornecedores, serviços de comercialização e manutenção. Desta forma, as relações interorganizacionais são uma realidade no setor que influencia o desempenho das empresas do ramo. Assim, é essencial que os gestores compreendam os possíveis arranjos empresariais que podem ser estabelecidos, bem como a estrutura de tais relacionamentos.

A primeira parte desta pesquisa traz os conceitos de cooperação, poder e dominação para, então, analisar suas influências no relacionamento entre os membros das cadeias de suprimentos. Realiza-se, então, por meio de um estudo de caso, uma análise sobre relações de suprimentos entre empresas da cadeia de construção civil. Finalmente, são apresentadas as conclusões e sugestões para novos trabalhos.

2. OS MECANISMOS DE COORDENAÇÃO NAS RELAÇÕES NA CADEIA DE SUPRIMENTOS Nesta seção é abordada a conceituação dos mecanismos de coordenação dos relacionamentos interorganizacionais – a cooperação, a confiança, o poder e a dominação. Também é analisada a influência destes mecanismos nas relações entre os membros das cadeias de suprimentos. 2.1 Conceituação de confiança e de cooperação A confiança é um componente importante que torna bem-sucedidas as relações interorganizacionais. Em geral, a confiança é tratada pela literatura com base em aspirações filosóficas e em uma visão harmônica, fundamentada na benevolência e no altruísmo (NIELSEN, 2004). No entanto, analistas críticos rejeitam esta posição, considerando que a confiança é uma ferramenta sofisticada para o exercício do poder à medida que o parceiro mais forte utiliza a confiança para reduzir a incerteza do ambiente e transferir o risco para o parceiro mais fraco. Bachmann (2001) salienta que tais perspectivas marcam os extremos do mainstream do debate teórico sobre confiança. Porém, nenhum destes enfoques aborda a complexidade do processo social que determina a lógica do relacionamento interorganizacional. Para tanto, é preciso analisar as tensões e contradições entre os conceitos de confiança e poder. Não existe uma definição única para o conceito de confiança. Alguns autores a veem como sendo a expectativa sobre o modo de atuação desejado do confiado, enquanto outros a definem em termos da avaliação sobre a boa vontade e a confiabilidade do outro em uma situação de risco (NIELSEN, 2004). Tal divergência conceitual fundamenta as discussões sobre o papel da confiança nas transações econômicas entre estudiosos das correntes de orientação comportamental e econômica. A discussão está, basicamente, no processo através do qual a confiança emerge nas transações (BARNEY; HANSEN, 1994). De acordo com Bachmann (2001), a economia tradicional não contribui para o debate teórico sobre confiança. O autor aponta que a Teoria dos Custos de Transação, fundamentada nas decisões entre hierarquia e mercado e na redução do 377


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oportunismo, é muito simplista para explicar as recentes transações e estratégias econômicas. Ele também considera que os pressupostos da Teoria dos Jogos não podem ser aplicados para entender o papel da confiança nas relações interorganizacionais. A teoria proposta por Axelrod (1983) pressupõe que o comportamento dos atores econômicos é determinado por especulação. Contudo, devido à natureza da confiança, Bachmann (2001) afirma não ser possível medir o potencial de perda ou ganho deste tipo de relação, dado que a previsibilidade das consequências das decisões tomadas implicaria em uma situação onde a confiança não seria mais necessária.

É

fiança no relacionamento entre firmas. Em seu estudo, Nielsen (2004) examina a evolução da confiança e seu impacto nos relacionamentos colaborativos. Como a confiança é uma variável dinâmica, o autor reforça a importância da avaliação do papel da confiança nas diferentes fases de relacionamento colaborativo. É comum encontrar na literatura o conceito de confiança associado ao de cooperação. Para La Porta et al. (1997), a confiança implica a propensão a cooperar. Hagen e Choe (1998) sugerem que a cooperação é aparentemente induzida pela confiança. Contudo, outros mecanismos institucionais e sociais, aliados à confiança, são essenciais para conduzir os relacionamentos interorganizacionais. Os estudos sobre cooperação recaem sobre várias frentes, seja no campo da Sociologia, da Economia ou da Teoria Organizacional. Em termos de abordagens teóricas, Begnis et al. (2005) constatam que, até o final da década de 90, predominam a Economia dos Custos de Transação e as Teorias Organizacionais de modo geral, em especial sob o ponto de vista do Aprendizado Organizacional. Os autores também destacam os enfoques trazidos pela Teoria das Redes Sociais para o avanço dos estudos sobre relacionamentos cooperativos interorganizacionais, acrescentando que ainda há um vasto espaço para discussão da confiança na base destes relacionamentos.

fundamental a compreensão das estruturas dos relacionamentos nas cadeias de suprimento para que os profissionais de logística saibam como gerenciá-las.

Barney e Hansen (1994) apresentam uma abordagem sobre o conceito de confiança que rejeita, simultaneamente, as ideias das correntes comportamental e econômica. Os autores não creem que todas as partes de uma transação são oportunistas e nem que elas sejam confiáveis na maior parte do tempo. Assim, ao invés de assumir posições extremas em relação às partes de uma transação, é necessário compreender que o comportamento das partes pode variar e a variância do grau de confiança possibilita vantagens competitivas. Bachmann (2001) classifica a confiança em pessoal ou sistêmica. A confiança pessoal é o fenômeno de nível individual, enquanto a sistêmica ocorre no nível organizacional. Para o autor, a confiança pessoal é importante em certas situações, sendo essencial no início das relações. O contato face a face ajuda a reduzir o risco, além de ser importante na constituição da confiança, porém não é suficiente para produzir a confiança sistêmica, não sendo capaz de se sustentar como o principal meio de confiança do relacionamento. Segundo Nielsen (2004), embora sejam conceitos distintos, a confiança interpessoal e interorganizacional estão relacionadas. O autor aponta que a confiança interorganizacional (sistêmica) emerge como um direcionador do desempenho das trocas e negociações, estando associada à diminuição dos custos de negociação. Em contraste, a confiança interpessoal mostra uma associação proporcional a esses custos. Assim, a pesquisa de Nielsen (2004) corrobora a proposta de Bachmann (2001) de que a confiança pessoal não é capaz de se sustentar como o principal meio de con378

2.2 Conceituação de poder e dominação A confiança não é a única forma de reduzir a complexidade e incerteza nas relações interorganizacionais. Outro possível mecanismo para coordenar as expectativas e controlar a dinâmica das relações é o poder. Tanto o poder quanto a confiança permitem a coordenação das expectativas e das ações das partes negociantes. Contudo, Bachmann (2001) reforça que tais mecanismos diferem quanto ao modo de seleção das expectativas. Os atores que optam por fundamentar suas relações na confiança consideram que as demais partes se comportarão da forma esperada. Porém, se a parte mais forte considerar que o membro mais frágil não se comportará conforme a expectativa, esta pode utilizar sanções e punições para controlá-lo. Este tipo de relacionamento está sujeito a um mecanismo frágil, dado que o risco de término súbito da confiança nunca pode ser totalmente eliminado. O poder, assim como a confiança, também pode entrar em colapso se ameaçado massivamente. No entanto, as consequências não são tão severas e o relacionamento pode continuar depois deste evento, uma vez que o poder não tem uma carga emotiva como a confiança. Apesar de conseguir reduzi-los consideravelmente, o poder também traz riscos.


Bandeira, R. A. M.; Mello, L. C. B. B.; Maçada, A. C. G. Relacionamento interorganizacional na cadeia de suprimentos: um estudo de caso na indústria da construção civil. Produção, v. 19, n. 2, p. 376-387, 2009

O conceito de poder é compreendido a partir de diferentes denotações. Faria (2004) ressalta a relevância do tema nos estudos organizacionais e reforça que o conceito de poder deve ter seu próprio espaço teórico e lugar epistemológico. Entretanto, esta não é uma prática frequente no âmbito da teoria organizacional, na qual o conceito de poder “não só é utilizado como sendo equivalente aos de liderança, influência, autoridade ou coerção, como é usado com mais de um sentido ao mesmo tempo” (FARIA, 2004). Assim, o autor apresenta uma análise sobre o conceito de poder, abordando os principais enfoques que estruturam teórica e epistemologicamente a análise das organizações: (i) enfoque sistêmico-funcionalista; (ii) weberiano; (iii) do comportamento humano; (iv) organizacional; (v) marxista; e (vi) da psicossociologia. Segundo Faria (2004), estudar a sociologia do poder em Weber implica em estudar os conceitos de dominação, obediência e disciplina, tanto quanto compreender as noções de autoridade, coerção e legitimidade. Sob este enfoque, a coação, a autoridade e a influência são consideradas as bases do poder. Há várias correntes que tratam o poder sob o ponto de vista do comportamento humano. Sob o enfoque behaviorista, Dahl (1968, apud FARIA, 2004) refere-se ao poder como sendo a capacidade de A levar B a fazer algo que não faria de outro modo, considerando o exercício unilateral do poder, sem resistências ou motivações subjetivas. French e Raven (1959) aprofundam a formulação de Dahl ao acrescentar as cinco bases que permitem medir a amplitude e o grau de dependência entre A e B: (i) poder de recompensa; (ii) poder coercitivo; (iii) poder legítimo; (iv) poder referente; e (v) poder de especialização. O enfoque organizacional tem como base o estudo desenvolvido por March e Simon (1979, apud FARIA, 2004), que, inspirado na teoria da firma, trata o poder sob o ambiente de incerteza do processo decisório. Para Friedberg (1995, apud FARIA, 2004), não há ação social sem poder, sendo que todo o poder supõe uma relação de troca em um jogo com regras definidas que regulam a ação. Assim, a proposta de Friedberg salienta o elo entre poder e dependência, enfatizando a cooperação e a troca com a finalidade de realizar um objetivo comum a todos os atores envolvidos. No presente trabalho, não é apresentado o conceito de poder sobre todos os enfoques propostos por Faria (2004). Limitou-se o foco nos autores citados na literatura que analisa o relacionamento nas cadeias de suprimentos. Desta forma, ainda deve-se apresentar a interpretação de Follet (1997) sobre o conceito de poder. Para a autora, o poder é geralmente compreendido como poder-sobre, ou seja, o poder de alguma pessoa ou grupo sobre outra. Follet (1997) apresenta o conceito de poder-com, que é desenvolvido con-

juntamente, sendo compartilhado e não coercitivo. O podercom origina-se da união de poderes individuais, sendo que cada membro do grupo tem poder exclusivo e soberano, derivado da combinação de conhecimento, experiência e habilidades específicas. Não é sempre possível livrar-se do poder-sobre para estabelecer o poder-com. No entanto, deve-se tentar reduzi-lo através da integração. Apesar de serem tratados por diferentes enfoques, os conceitos de poder, em linhas gerais, referem-se à “condição de realização de uma ação que, sem que lhe seja emprestada qualquer direção, não se viabilizaria. Esta condição pode ser obtida pela coerção, autoridade, influência, dependência ou pelo domínio psicológico, com ou sem resistência, baseada em um sistema de regras ou contratos, em negociação ou imposição (FARIA, 2004)”. Destaca-se que a literatura de logística, em sua grande maioria, adota o conceito geral de poder, e este é o critério seguido neste trabalho. 2.3 A influência dos mecanismos de coordenação no relacionamento entre membros da cadeia de suprimentos A confiança e o poder, de acordo com Bachmann (2001), são os principais mecanismos de coordenação das relações interorganizacionais, independentemente do arranjo que estrutura tal relacionamento. Segundo o autor, as relações de curto prazo, em geral, têm o oportunismo como base e são orientadas pelo controle central, enquanto relações de longo prazo, tal como costumam ser as relações estabelecidas nas cadeias de suprimento, tendem a se fundamentar na cooperação. Nesta seção, é discutida a influência dos mecanismos de coordenação nos relacionamentos entre membros da cadeia de suprimentos. Os conceitos de risco, poder e liderança são essenciais para a compreensão das relações na cadeia de suprimentos. Para Bowersox e Closs (2001), o risco desproporcional entre membros da cadeia é central para a determinação da maneira como os relacionamentos são desenvolvidos e gerenciados. Alguns membros da cadeia têm maior dependência do sucesso da cadeia que outros. Assim, os membros com maior risco devem assumir papéis mais ativos e maior responsabilidade para a viabilização da cooperação na cadeia. A cadeia de suprimentos é formada por participantes que dependem uns dos outros. Porém, a dependência nunca acontece completamente em uma direção. Na realidade, ocorre a interdependência. A dependência mútua entre os membros da cadeia incentiva a cooperação. Chopra e Meindl (2003) destacam que devem ser evitados relacionamentos em que uma parte seja mais dependente que a outra. Nos casos de relacionamentos assimétricos, a parte mais fraca e mais dependente assume maior risco. Em situações como 379


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esta, os membros mais fracos podem abandonar a cadeia ou procurar reduzir sua dependência através de alternativas de negócios, organizando coalizões contra a parte mais forte. Porém, o mais comum é que a parte mais dependente aceite a situação, não tendo nenhuma reação (COUGHLAN et al., 2002). Na realidade, muitos relacionamentos de dependência desequilibrada funcionam bem, principalmente em ambientes estáveis.

A

informações nas cadeias ocorre através de sistemas eletrônicos (eletronic data interchange - EDI). Apesar da existência de padrões internacionais de EDI, muitas empresas desenvolvem sua própria interpretação dos dados. Assim, as firmas menores são obrigadas a adaptar seus sistemas segundo os padrões dos membros mais fortes da cadeia. Em pesquisa realizada por Munson et al. (1999), 55% das firmas entrevistadas declararam ter adotado o sistema EDI devido à pressão de seus principais fornecedores ou clientes. Cox (2005) apresenta uma matriz com as possíveis relações entre membros de diferentes estágios da cadeia de suprimentos. A classificação é ilustrada na Figura 1. A partir da análise da Figura 1, verifica-se que as relações variam de acordo com a estrutura e características da cadeia. Desta forma, nem sempre as práticas adotadas em uma cadeia poderão ser replicadas com sucesso em outras configurações. Portanto, os profissionais de logística devem atentar que não há uma única forma correta de gerenciamento das cadeias de suprimentos. Para cada caso, devem ser adotadas diferentes práticas. Para Hingley (2005), o comprador costuma ser a parte favorecida em relacionamento assimétrico. Entretanto, isto não impede que o membro mais fraco também se beneficie desta relação. Na verdade, as relações assimétricas ocorrem mais frequentemente que aquelas baseadas em cooperação e confiança. Em geral, os membros mais fracos da cadeia costumam tolerar esta situação em virtude das vantagens que ela lhes proporciona (devido ao poder de recompensa, segundo o conceito de French e Raven). Pelo enfoque da teoria econômica, esta situação se sustenta porque minimiza os custos de transação. Assim, relações assimétricas são legitimadas, podendo ser estáveis e duradouras. Segundo a abordagem weberiana, estas seriam classificadas como relações de dominação e autoridade. Berthon et al. (2003) consideram o poder e a dominação como mecanismos que devem ser utilizados para atingir a coordenação e a cooperação entre os membros da cadeia. Hingley (2005) reforça que as relações de poder e cooperação coexistem, sendo parte do mesmo construto. Como exemplo, o autor cita as alianças formadas por empresas de pequeno e médio porte para negociação com membros mais fortes. Deste modo, o conceito de “poder-com” de Follet (1997) é perfeitamente compatível com a natureza das cadeias de suprimento, pois supõe a existência de cooperação e colaboração entre os membros para construção dos resultados. A maioria das relações interorganizacionais se baseia em uma mistura de poder e confiança. Estes construtos também são os mecanismos de coordenação dos relacionamentos em cadeias de suprimentos. Contudo, Bachmann (2001) ressalta

confiança e o poder são os principais mecanismos de coordenação das relações interorganizacionais, independentemente do arranjo que estrutura tal relacionamento. São diversas as formas através das quais empresas mais fortes podem exercer dominação sobre os demais membros da cadeia. Entende-se por empresas mais fortes aquelas que têm um papel central na relação, não sendo substituíveis. Em geral, estas detêm o controle financeiro do relacionamento. Munson et al. (1999) afirmam que as empresas podem exercer o controle através de cinco áreas: (i) controle de preços; (ii) controle da estrutura do canal; (iii) controle de operação; (iv) controle da informação; (v) controle de inventário. É notório que empresas como a Wal-Mart, devido ao seu tamanho e papel central na cadeia, exercem o controle de preços, exigindo descontos de seus fornecedores. Porém, firmas de menor porte também podem se aliar para ampliar seu poder de barganha nas negociações. Devido ao controle sobre a estrutura da cadeia exercido pela Wal-Mart, a empresa conseguiu eliminar representantes e intermediários de suas negociações, exigindo contato direto com indústrias manufatureiras. Algumas empresas abusam do controle da estrutura da cadeia para limitar a competição. Com relação ao controle da operação, as firmas têm imposto cada vez mais requerimentos sobre a qualidade dos produtos adquiridos. Em pesquisa desenvolvida por Munson et al. (1999) em 126 firmas de médio porte, verificou-se que 76% das entrevistadas haviam eliminado fornecedores que se recusaram a elevar o padrão de qualidade de seus produtos. Uma das principais vantagens da cooperação entre membros de uma cadeia de suprimentos é o maior compartilhamento de informações. No entanto, no caso de concentração da informação, os membros que detêm mais informação e possuem melhor estrutura de Tecnologia da Informação exercem maior controle sobre a cadeia. Em geral, a troca de 380


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que tais mecanismos são limitados no que concerne ao controle da estrutura e da dinâmica das relações, de modo que a combinação é apontada como a melhor forma de coordenação das expectativas dos membros da cadeia de suprimentos. A seguir, são analisadas as relações de suprimentos entre uma empresa da construção civil e um fornecedor de pequeno porte, buscando-se compreender o relacionamento entre membros de diferentes estágios da cadeia de suprimentos da construção civil.

3. METODOLOGIA Esta pesquisa tem cunho qualitativo, sendo adotado o estudo de caso como estratégia de investigação. Seu escopo consiste em identificar como se estruturam os relacionamentos entre os membros de diferentes estágios da cadeia de suprimentos da construção civil. Assim, o trabalho busca responder à seguinte questão: o relacionamento dominante em uma cadeia de suprimentos da construção civil é de dominação ou de cooperação?

Autoridade do Comprador

ALTA

BAIXA

É importante ressaltar que foi realizado o estudo de apenas um caso, de modo que os resultados obtidos não podem ser generalizados. A pesquisa não permite responder à questão para toda a cadeia de suprimentos da construção civil, mas apenas para o caso estudado. Entretanto, Yin (2001) afirma que, embora os resultados de um estudo de caso não possam ser generalizados, devem possibilitar a disseminação do conhecimento a partir da compreensão e interpretação de fatos e fenômenos, normalmente isolados, de maneira mais profunda. É o que se espera ter alcançado nesta pesquisa. Esta pesquisa é de caráter exploratório, pois este ainda é um tema pouco estudado. Desta forma, o trabalho proporciona uma visão geral sobre o tema em estudo, levantando questões e hipóteses para futuros estudos. O instrumento utilizado para desenvolvimento da pesquisa baseou-se no desenvolvido e validado por Mello (2007), cujo objetivo consiste em auxiliar o processo de avaliação dos relacionamentos interorganizacionais na cadeia produtiva da construção civil. Entretanto, foi necessário adaptá-lo para desenvolver o protocolo do estudo de caso, que contém um roteiro de entrevista semiestruturado. O roteiro foi subme-

Dominação exercida pelo Comprador

Interdependência

• Poucos compradores/muitos fornecedores

• Poucos compradores/poucos fornecedores

• Dependência do fornecedor

• Dependência do fornecedor

• Produtos comercializados são commodities

• Produtos comercializados não são commodities, tendo poucas opções de fornecimento

• Relações com comprador representam alta porcentagem das transações do fornecedor • Custos de troca do fornecedor são baixos

• Relações com comprador representam alta porcentagem das transações do fornecedor • Custos de troca do fornecedor são altos

Independência

Dominação exercida pelo Fornecedor

• Muitos compradores/muitos fornecedores

• Muitos compradores/poucos fornecedores

• Produtos comercializados são commodities

• Não há dependência do fornecedor

• Relações com comprador não representam alta porcentagem das transações do fornecedor

• Produtos comercializados não são commodities, tendo poucas opções de fornecimento

• Custos de troca de fornecedor são baixos

• Relações com comprador representam baixa porcentagem das transações do fornecedor • Custos de troca do fornecedor são altos

BAIXA

ALTA Autoridade do Fornecedor

Figura 1: Matriz de relações na cadeia de suprimentos. Fonte: Adaptado de Cox, 2005

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Bandeira, R. A. M.; Mello, L. C. B. B.; Maçada, A. C. G. Relacionamento interorganizacional na cadeia de suprimentos: um estudo de caso na indústria da construção civil. Produção, v. 19, n. 2, p. 376-387, 2009

tido à avaliação de três especialistas, um acadêmico da área de Estratégias Organizacionais e Interorganizacionais, um especialista em Novas Tecnologias para Engenharia Civil e um empresário do setor de Construção Civil. Estes avaliaram a compreensão e relevância das questões, assegurando a validade de face e de conteúdo. Foi pesquisado o relacionamento entre membros da cadeia de suprimentos de construção civil. Esta escolha fundamenta-se no fato de que o setor age sobre uma extensa cadeia produtiva, onde as relações interorganizacionais influenciam o desempenho das empresas do ramo. Inicialmente, procurou-se selecionar empresas de construção civil, atuantes no subsetor de edificações. Para minimizar as dimensões tempo e custo da pesquisa, devido à escassez de recursos para a realização de uma pesquisa mais ampla, decidiu-se restringir a mesma para empresas situadas no Estado do Rio de Janeiro. Foram listadas cerca de dezessete empresas que haviam colaborado com os pesquisadores em trabalhos anteriores. Estas empresas foram organizadas em uma lista, e a partir desta lista buscou-se contato com as empresas a partir da primeira da lista. Caso alguma delas não se dispusesse a participar, seguia-se para a próxima da lista. Apenas uma das empresas se dispôs a participar, e, mesmo assim, com a pré-condição de que não fosse identificada. A empresa que se dispôs a participar é uma das principais empresas do setor, o que contribui para a validade externa da pesquisa. Na primeira reunião com a empresa de construção civil foi explicado o objetivo da pesquisa, ou seja, estudar se o relacionamento dominante na cadeia de suprimentos da construção civil é de dominação ou de cooperação. Houve dificuldades no entendimento da questão e foram necessárias algumas explicações para que se atingisse o pleno entendimento por parte dos envolvidos da empresa. Contudo, após o pleno entendimento do enfoque da pesquisa e da realização das entrevistas, foi indicado aos pesquisadores que da lista de fornecedores da empresa, a que melhor se enquadrava nos objetivos da pesquisa era a Metalúrgica Z. Não foi permitida a consulta à lista de fornecedores, alegando-se questões de sigilo e de intensas atividades junto aos mesmos buscando melhoria da qualidade. Os pesquisadores aceitaram a sugestão da construtora pela razão de que: a) esta foi a única das empresas consultadas disposta a colaborar na pesquisa; e b) o fornecedor escolhido atua na fabricação e colocação das esquadrias e painéis metálicos, e este setor possui uma boa estruturação e relacionamento com as construtoras. O contato com a Metalúrgica Z, para a aprovação do desenvolvimento do estudo de caso, foi realizado pela própria unidade de análise. A empresa selecionada também indicou quais seriam os entrevistados, atendendo à exigência de que 382

fossem funcionários envolvidos com cadeias de suprimento e que, preferencialmente, participassem diretamente do relacionamento com a Metalúrgica Z. Após a primeira visita, onde foi explicada a metodologia da mesma, foi considerado mais conveniente que as próprias organizações indicassem os funcionários mais adequados a serem entrevistados para melhor atender os objetivos da pesquisa. Foram entrevistados um diretor e três gerentes da construtora. No fornecedor de painéis e esquadrias foram realizadas entrevistas apenas com o dono da empresa, por se tratar de uma empresa de pequeno porte. Nesta empresa havia apenas o dono, o encarregado e o pessoal de mão-de-obra direta. O trabalho de pesquisa foi realizado no período de julho até setembro de 2007. A principal fonte de dados foram entrevistas semiestruturadas. As entrevistas foram gravadas e transcritas pelos pesquisadores, sendo realizada posteriormente a análise de conteúdo das entrevistas. A técnica de análise de conteúdo foi utilizada para analisar as informações obtidas através das entrevistas. Segundo Bardin (1977), a análise de conteúdo é um conjunto de técnicas de análise de comunicações que visa, através de procedimentos sistemáticos e objetivos de descrição das mensagens, obter indicadores que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção e recepção destas mensagens. Além das entrevistas realizadas, também foram adotadas fontes de evidências documentais, tais como os sites das empresas, reportagens e artigos escritos sobre o setor. A triangulação dos dados contribui para tornar o estudo de caso robusto e para aumentar validade do construto. A utilização de um protocolo de estudo de caso e o desenvolvimento do banco de dados também contribuiu para aumentar a confiabilidade da pesquisa (BENBASAT et al., 1987; YIN, 2001).

4. ESTUDO DE CASO Nesta parte do trabalho é dada ênfase ao setor estudado. Faz-se uma contextualização do mercado de construção civil e, em seguida, apresentam-se as empresas estudadas. Analisa-se, então, o caso em questão e, finalmente, resumem-se os resultados obtidos. 4.1 O mercado da construção civil A Construção Civil é integrada por uma série de atividades complexas, ligadas entre si pela diversificação de produtos, com processos com graus variados de originalidade, vinculando-se a diferentes tipos de demanda. Geralmente, a Indústria da Construção Civil é classificada nos seguintes subsetores: i) Materiais de Construção; ii) Edificações; e iii) Construção Pesada (SEBRAE-MG, 2005).


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A Indústria da Construção Civil é um setor importante para o crescimento e desenvolvimento nacional devido a especificidades como: (i) elevado efeito multiplicador; (ii) menor necessidade de investimento, devido à baixa relação capital/produto; (iii) utilização intensiva de mão-de-obra, incluindo a não qualificada; (iv) responsabilidade por significativa parte dos investimentos; e (v) reduzido coeficiente de importação (CBIC, 2004). Trata-se de uma indústria composta por uma complexa cadeia produtiva, que abrange setores industriais diversos. Um perfil setorial da construção civil brasileira, elaborado pelo SEBRAE-MG (2005), apresenta as seguintes características do setor: (i) a demanda apresenta forte correlação com a evolução da renda interna e condições de crédito; (ii) intensiva geração do emprego, principalmente para mão-de-obra não qualificada; (iii) apresenta níveis de competitividade e produtividade abaixo do padrão existente nos países desenvolvidos; e (iv) apresenta baixa atualização nos aspectos tecnológicos e de gestão em relação aos padrões dos países desenvolvidos. O setor é marcado pela utilização de subempreiteiras que, por suas características, estão dentro do perfil de micro e pequenas empresas, ficando possivelmente submissas nas relações com as construtoras. As subempreiteiras da construção civil são caracterizadas, em sua grande maioria, pela pequena agregação tecnológica e pela precariedade no atendimento da legislação trabalhista e das condições de trabalho (MELLO, 2007).

prédios industriais e comerciais. A Metalúrgica Z é uma pequena empresa de capital nacional, fundada em 1992 por ex-funcionário da Empresa X. Atualmente, possui dez funcionários fixos e se o volume de obras aumenta utiliza mão-de-obra terceirizada. Seu faturamento é de aproximadamente R$ 300.000,00 anuais.

A

gestão da cadeia de suprimentos considera as dimensões comportamentais e políticas do poder e da confiança, além do conflito e dependência entre fornecedores e compradores.

4.2 Unidades de análise A unidade de estudo deste trabalho é a Empresa X, que atua, preferencialmente, no Rio Grande do Sul, em Minas Gerais, no Rio de Janeiro e em São Paulo. Trata-se de uma das maiores organizações brasileiras de construção civil que atua no sub-setor de edificações. A Empresa X apresenta um faturamento anual de R$ 800.000.000,00 com lançamentos de 500.000m2 em empreendimentos residenciais de alto e médio padrão, shopping centers, edifícios comerciais, conjuntos de hotelaria e centros de exposições. No mercado carioca, a Empresa X utiliza-se dos serviços da Metalúrgica Z para fabricação e colocação das esquadrias e painéis metálicos. Os painéis metálicos substituem o uso do concreto aparente, permitindo que as fachadas tenham soluções que aliam facilidade de montagem e manutenção, leveza, alta resistência e durabilidade. O material utilizado é o alumínio devido a sua condição de maleabilidade, característica que dá a esse painel metálico grande facilidade de conformação. É utilizado na definição de revestimentos para fachadas e interiores de

Atualmente, o segmento dedicado a esquadrias e painéis metálicos passa por transformações. Os fabricantes deste produto buscam associar-se, visando o desenvolvimento de normas técnicas, padrões de qualidade, padrões de segurança em fabricação e montagem, desenvolvimento de tecnologia e a busca de financiamento para estas atividades. Além disto, há um movimento de entrada de grandes fabricantes nacionais e estrangeiros para o atendimento das encomendas, dificultando a sobrevivência das pequenas e médias empresas. 4.3 Análise do estudo de caso A Metalúrgica Z foi fundada por um ex-funcionário da empresa de construção civil X, de modo que, de início, houve facilidades para que a empresa fabricasse a maior parte das encomendas destinadas às obras da construtora X sediadas no Rio de Janeiro. De fato, havia, em termos de parceria, um acordo informal entre as empresas pelo qual a Metalúrgica Z se comprometia a não fornecer seus serviços e produtos a concorrentes de X, que lhe daria preferência no suprimento. Ainda, as exigências técnicas da construtora não eram tão acentuadas como agora, já que a oferta do produto era feita por empresas de porte similar ao da metalúrgica. Assim, com base no relacionamento de amizade entre as partes, inicialmente, procurou-se estabelecer uma cadeia colaborativa. As empresas buscaram uma aliança de fornecimento, já que tinham como objetivo principal aproveitar a economia de escala e a especialização através do fornecimento de produtos e serviços entre parceiros. A maior parte da produção da Metalúrgica Z, atualmente, é destinada para a empresa de construção civil X. Porém, não se observa mais o antigo relacionamento de amizade entre as partes. A Metalúrgica Z tem alta percentagem de transações com o comprador. Além disto, com a entrada de grandes fabricantes houve uma modificação das exigências 383


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da construtora quanto a especificações técnicas, desenvolvimento de Pesquisa e Desenvolvimento em novas tecnologias de montagem e fabricação dos painéis que a Metalúrgica Z não tem condições técnicas e financeiras de atender. Desta forma, o relacionamento entre a Metalúrgica Z e a Empresa X pode ser considerado como sendo assimétrico, havendo uma alta autoridade do comprador e baixa autoridade do fornecedor. Segundo a classificação de Cox e Chicksand (2005), existe uma dominação exercida pelo comprador. Logo, o estudo de caso corrobora a proposta de Hingley (2005) de que o comprador costuma ser a parte favorecida em relacionamento assimétrico. Inicialmente, a assimetria do relacionamento não impedia que a Metalúrgica Z, que é o elo mais fraco desta cadeia, também se beneficiasse desta relação. A metalúrgica tolerava a situação em virtude das vantagens que a Empresa X lhe proporcionava: ganhava a maioria das encomendas destinadas às obras da construtora X sediadas no Rio de Janeiro. A relação era, então, legitimada e tem se sustentado por um longo período – 15 anos. No entanto, atualmente, não existe mais o objetivo de promover o interesse comum de ambas as partes no relacionamento entre a Empresa X e a Metalúrgica Z. Identifica-se um desinteresse da construtora X em continuar com o relacionamento, já que faz maiores exigências em relação à Metalúrgica X e, mesmo sabendo que esta não tem condições de atendê-las por falta de condições técnicas e financeiras, não procura auxiliá-la em sua capacitação. O sucesso desta relação parece depender do entendimento do parceiro de maior poder em investir no fortalecimento do relacionamento. Faltam componentes básicos, prescritos por Child e Faulkner (1998), para manter uma relação baseada na confiança e cooperação, sendo essencial a existência de uma predisposição em investir de forma segura e compartilhar informações. Não houve investimento dos participantes para a evolução do relacionamento. O início do relacionamento entre a construtora X e a metalúrgica era marcado pela confiança pessoal, uma vez que a Metalúrgica Z foi fundada por um ex-funcionário da construtora. O diretor da metalúrgica destaca que mantinha um bom relacionamento com seus ex-colegas da Empresa X. Assim, tal como propõe Bachmann (2001), a confiança pessoal foi essencial no início das relações entre as duas unidades analisadas. Contudo, como o mesmo autor e Nielsen (2004) defendem, a confiança pessoal não pode ser o principal sustentáculo de um relacionamento interempresarial. Atualmente, constata-se que a construtora X baseia seu relacionamento na utilização do poder, usando o poder coercitivo (FRENCH; RAVEN, 1959). No entanto, este é um mecanismo frágil para sustentação de relações interorganizacionais. Para a prosperidade deste tipo de relacionamento, 384

é necessário que haja uma combinação eficiente do poder e da confiança (BACHMANN, 2001; HINGLEY, 2005). O fracasso da tentativa de relação colaborativa entre as empresas estudadas pode ser explicado, também, devido à discrepância no tamanho das firmas. A Empresa X utiliza seu porte e volume de compras em relação ao fornecedor Z para conseguir vantagens como: (i) preços menores; (ii) maiores prazos de pagamento; (iii) cancelamento de pedidos sem aviso; (iv) interferência nos programas de produção; (v) exigência de exclusividade de serviços e produtos; (vi) requerimentos sobre a qualidade dos produtos e certificações de qualidade; e (vii) transferência de estoque. A parte mais fraca e dependente assume maior risco neste relacionamento assimétrico. A Metalúrgica Z entende perfeitamente a situação, porém é obrigada a aceitá-la. A firma X é seu maior cliente e, devido ao entendimento havido, não pode fornecer produtos e serviços aos seus concorrentes. Ainda, como os custos de troca são baixos, seu produto pode ser fornecido por outros fornecedores rapidamente. Em entrevistas realizadas, nota-se a assimetria deste relacionamento, em que existe por parte da empresa de construção civil uma relação de dominação e autoridade. O dono da empresa Z sabe que precisa diversificar sua linha de produtos e de clientes, buscando desenvolver produtos de tecnologia mais avançada. Porém, no momento, não tem capital para tais investimentos. Ele tem conhecimento sobre a necessidade de novos conhecimentos e ferramentas que permitam o desenvolvimento de novos produtos e processos. No entanto, a maior necessidade no momento é conseguir capital para financiar estes desenvolvimentos. Para tanto, a Metalúrgica Z busca contato com fontes de financiamento. A empresa reconhece que há uma grande dependência dos pedidos da construtora X e esta situação a coloca em posição de risco. Por isto, busca alternativas de negócios. Entretanto, a Metalúrgica Z não quer abandonar a relação com a Empresa X, pois reconhece que, apesar de assimétrica, esta também lhe traz vantagens. Por sua vez, a construtora X não parece disposta a investir na manutenção do relacionamento. O sucesso do relacionamento também é dificultado pelas características do setor da construção civil. Trata-se de um mercado darwiniano, no qual os princípios da seleção natural levam à sobrevivência apenas das empresas mais ajustadas às necessidades do cliente. É crescente o aumento da concorrência neste setor. Assim, as empresas buscam cada vez mais apropriar valor a suas relações. Ao contrário do que pregam Coughlan et al. (2002), estas empresas não estão dispostas a “sacrificar-se para manter o relacionamento e para fazê-lo crescer”, devido à hipercompetição. No caso estudado, a Metalúrgica Z exerce os cinco tipos de controle apresentados por Munson et al. (1999).


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A Metalúrgica Z, considerando o fato de estar num relacionamento de dominação por parte da Empresa X, deve procurar um reposicionamento para sua estratégia empresarial. Assim, a metalúrgica deve buscar uma análise de suas capacidades e considerar a utilização de uma das três abordagens estratégicas genéricas sugeridas por Porter (1986): liderança no custo total, diferenciação ou enfoque. O Quadro 1 tem como objetivo apresentar as principais categorias emergentes do caso analisado resultantes da análise de conteúdo das entrevistas realizadas. 4.4 Implicações dos resultados do estudo de caso para a gestão da cadeia de suprimentos da indústria da construção civil Nesta pesquisa, foi realizado o estudo de caso em apenas um elo de uma cadeia da construção civil. De tal maneira, os resultados não podem ser generalizados para toda a cadeia de suprimentos da indústria. Esta é uma característica comum em pesquisas que adotam o estudo de caso como estratégia de investigação. Os resultados também não podem ser generalizados porque as relações interorganizacionais variam de acordo com a estrutura e características de cada elo da cadeia. Assim, é preciso analisar a estrutura de cada cadeia para compreender como suas relações se constituem. No entanto, apesar dos resultados do estudo de caso em

questão não serem abrangentes para toda a cadeia da construção civil, ainda assim permitem algumas análises com relação à gestão da cadeia de suprimentos da indústria da construção civil. O relacionamento do elo da cadeia produtiva da construção civil, analisada no estudo de caso, baseia-se, predominantemente, na relação de dominação. Acredita-se que esta seja uma tendência na indústria da construção civil, uma vez que este setor é marcado pela utilização de subempreiteiras de micro e pequeno porte. A discrepância no tamanho das firmas, tal como ocorria no elo da cadeia analisado e tende a ser uma tendência na relação entre grandes construtoras e subempreiteiras, foi percebida como um dos fatores que estimulam o desenvolvimento de relações de poder e dominação. As grandes construtoras – assim como a Empresa X – costumam utilizar seu porte e volume de compras para conseguir vantagens. A indústria da construção civil tem poucos compradores (grandes construtores) e muitos fornecedores (subempreiteiras), tal como no caso analisado. Esta característica contribui para a dependência do fornecedor, agravada ainda mais pelo fato de que a maioria das subempreiteiras da construção civil tem pequena agregação tecnológica (MELLO, 2007). Desta forma, estas subempreiteiras costumam ser submissas nas relações com as construtoras.

Quadro 1: Resumo da análise do estudo de caso. Categorias Finais Confiança e Cooperação

Observações • O início do relacionamento entre a Empresa X e a Metalúrgica Z era marcado pela confiança pessoal, pois o fundador de Z é um ex-funcionário da construtora; • A confiança pessoal foi essencial no início das relações entre as empresas; • A confiança pessoal não implicou no desenvolvimento de confiança sistêmica; • A confiança pessoal não sustentou o relacionamento interempresarial.

Poder e dominação

• A construtora X dava preferência de suprimento para a Metalúrgica Z com a condição de que esta não fornecesse para seus concorrentes; • A construtora X tem alta autoridade no relacionamento, de modo que há dominação por parte do comprador; • Atualmente, X baseia seu relacionamento na utilização do poder coercitivo; • A Empresa X utiliza seu porte e volume de compras em relação ao fornecedor Z para conseguir vantagens.

Dependência

• A maior parte da produção da Metalúrgica Z é destinada para a Empresa X; • O relacionamento entre X e Z é assimétrico, havendo alta autoridade do comprador; • Há maior dependência por parte do fornecedor; • O custo de troca do fornecedor é relativamente baixo; • Novos fornecedores, de maior porte, surgem no mercado, o que provocou maior exigência por parte da construtora X. • Z, por ser mais fraca e dependente, assume maior risco no relacionamento.

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5. CONSIDERAÇÕES FINAIS No presente trabalho, foram definidos os conceitos de cooperação, poder e dominação, analisando suas influências no relacionamento na cadeia de suprimentos. Esta pesquisa propõe-se a analisar a relevância dos relacionamentos na cadeia de suprimentos, tentando identificá-los como relações de dominação ou cooperação. Para tanto, identificouse uma fundamentação teórica para entender os principais fatores que influenciam tais relacionamentos, analisando as opiniões conflitantes de pesquisadores da área, e estendendo os conceitos estudados para um estudo de caso na cadeia da construção civil. O poder, como um construto de relações interfirmas, tem recebido um tratamento irregular e conflitante por parte dos estudiosos. Entretanto, a revisão da literatura aponta que algumas pesquisas têm considerado a relevância da relação de poder na cadeia de suprimento (COX, 1999; COX; CHICKSAND, 2005; HINGLEY, 2005). Contudo, estes autores ainda são minoria. Hingley (2005) afirma haver uma lacuna na literatura sobre o papel do poder e da dominação nas relações interfirmas. Conclui-se, então, que a visão da colaboração em cadeias de suprimentos, conforme encontrada na maior parte da literatura existente, traz uma ideologia gerencial de como as organizações deveriam interagir, sem descrever como estas relações de fato ocorrem. Hingley (2005) alerta sobre o risco de considerar que o relacionamento da cadeia ocorre apenas com base na cooperação e na confiança, dado que esta abordagem ignora relações existentes que são muito apropriadas para certos contextos. Em suma, fica clara a importância do poder como um construto das relações entre os membros da cadeia de suprimentos. O relacionamento nas cadeias se desenvolve através de complexas relações de dependência, poder, dominação e cooperação. Entretanto, estas relações variam segundo a

estrutura e características da cadeia, não sendo possível a generalização dos relacionamentos na cadeia simplesmente como relações de dominação ou de cooperação. Deve-se analisar a estrutura de cada cadeia específica para compreender como suas relações se constituem. O poder e a confiança são mecanismos de coordenação das relações na cadeia de suprimentos que tendem a coexistir. O estudo de caso, realizado em um elo da cadeia produtiva da construção civil, demonstra que o relacionamento existente se baseia, predominantemente, na relação de dominação, devido a fatores inerentes ao setor como: grande poder de barganha imposto pelas construtoras, o perfil das empresas subempreiteiras ser de micro e pequenas empresas e pequena agregação tecnológica nos produtos fornecidos pelas subempreiteiras. Entretanto, destaca-se que, em alguns aspectos, o relacionamento também apresenta características de confiança. Ressalta-se que, para o caso em estudo, é importante a busca pelo comprometimento dos membros da cadeia, pelo conhecimento compartilhado, a dependência mútua e o planejamento conjunto. A diversidade das relações na cadeia de suprimentos dificulta a generalização dos desafios encontrados pelos executivos no desenvolvimento de estratégias abrangentes para a cadeia. Assim, nem sempre as práticas adotadas em uma cadeia podem ser replicadas com sucesso em outras configurações. O relacionamento nas cadeias é essencial para a compreensão das fronteiras organizacionais. Para que os profissionais de logística saibam como as cadeias devem ser gerenciadas operacional e estrategicamente, torna-se fundamental a compreensão das estruturas de poder e dos relacionamentos existentes. Desta forma, a discussão sobre estes tópicos deve ser ampliada. Apenas através da compreensão da estrutura de poder entre fornecedores e compradores na busca de apropriação de valor em cadeias de suprimentos é que se pode compreender o verdadeiro ambiente operacional e estratégico das cadeias.

Artigo recebido em 07/05/2007 Aprovado para publicação em 26/03/2009

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SOBRE OS AUTORES Renata Albergaria de Mello Bandeira Escola de Administração / PPGA / UFRGS End.: Rua Washington Luiz 855, sala 317, Centro – 90010-460 – Porto Alegre – RS – Brasil Tel.: (51) 3316-3833 Fax: (51) 3316-3833 E-mail: re.albergaria@gmail.com Luiz Carlos Brasil de Brito Mello Escola de Engenharia / Departamento de Engenharia de Produção/UFF End.: Rua Passo da Pátria,156, sala 241, Bloco D – Niterói – RJ Tel.: (21) 2512-2342 E-mail: luiz.brasil@gmail.com Antonio Carlos Gastaud Maçada Escola de Administração / PPGA/UFRGS End.: Rua Washington Luiz 855, sala 317, Centro – 90010-460 – Porto Alegre – RS – Brasil Tel.: (51) 3316-3833 Fax: (51) 3316-3833 E-mail: acgmacada@ea.ufrgs.br

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Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 388-399

O subsetor de edificações da construção civil no Brasil: uma análise comparativa em relação à União Europeia e aos Estados Unidos Luiz Carlos Brasil de Brito Mello UFF Sérgio Roberto Leusin de Amorim UFF

RESUMO O artigo tem como objetivo principal comparar o desempenho da construção europeia e da norte-americana, tomadas como benchmarking internacional, em relação à situação brasileira, de modo a identificar possíveis ações que contribuam para diminuir as diferenças de desempenho. Descreve-se, de modo sucinto, como a Construção Civil brasileira se insere no contexto econômico do país e são discutidos quais os principais problemas enfrentados e os desafios futuros. Ao mesmo tempo, pretende iniciar a discussão acerca das possíveis soluções para estes problemas. É traçado, também, um breve panorama da Construção Civil na União Europeia, os desafios e problemas a serem enfrentados hoje e nos próximos anos. Apresentam-se, sucintamente, estudos que debatem tais problemas, apontando caminhos e possíveis soluções. Em relação aos EUA, procura-se caracterizar a atual situação da construção civil, tendo como premissa a mesma apresentação feita para o Brasil e a União Europeia. Portanto, busca-se proporcionar um nivelamento da situação, importância, problemas e possíveis soluções para a Construção Civil dentre os três países. Assim, é possível tecer comparações entre os três, permitindo opções para as situações onde a Construção Civil brasileira esteja em desvantagem frente aos EUA e à UE. PALAVRAS-CHAVE Construção civil, edificações, modernização, benchmarking.

The subsector of buildings of the civil construction in Brazil: a x-ray of the sector compared to the European Union and the United States ABSTRACT The article has as its main objective to compare civil construction in Brazil relatively to the same industry in the United States and the European Union, that were used as benchmarking to Brazil, so it will be possible to find solutions that can contribute to minimize possible gaps that may exist. It is described as civil construction is very important to the Brazilian economy, although there are problems and challenges to be confronted. At the same time, the authors intend to open discussions about these problems. The authors do not intend to propose definitive solutions but to start the discussion about the problems and possible solutions. It is described, briefly, what is the status of civil construction in the European Union, its main problems and solutions that are being used to solve them. This is done in order to see what of these solutions can be applied to Brazil. The same is done relatively to the United States, having in mind that the same study structure used to Brazil and European Union was maintained, in order to help comparisons. So, the main objective is to establish a possibility to compare the situation of civil construction in Brazil, United States and European Union and verify what are the alternatives and solutions that are used there and that can be applied in Brazil. KEY WORDS Civil construction, buildings, modernization, benchmarking.

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Mello, L. C. B. B.; de Amorim, S. R. L. O subsetor de edificações da construção civil no Brasil: uma análise comparativa em relação à União Europeia e aos Estados Unidos. Produção, v. 19, n. 2, p. 388-399, 2009

1. INTRODUÇÃO Na última década, o setor da Construção Civil vem passando por uma grande transformação, saindo de um longo marasmo, com poucos investimentos, para um período com grandes obras em andamento e fortes investimentos imobiliários. Nos últimos anos, esta mudança foi intensificada, graças à retomada de investimentos públicos, criação de diversas leis que facilitam a retomada de imóveis em caso de inadimplência, captação de recursos em bolsas e esforços do Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade – PBQP H, que disseminou os conceitos de gestão de qualidade. Isto se refletiu na adoção de novos modelos de organização e inovações tecnológicas em diversas empresas, criando um núcleo de empresas dinâmico e moderno dentro do setor, comparável a empresas europeias e norte-americanas do mesmo segmento. A presença de algumas empresas brasileiras no exterior é a prova mais evidente da capacidade técnica e financeira destes grupos empresariais modernos. Entretanto, a maioria das empresas enfrenta dificuldades para atender a estas novas demandas e o quadro geral de desempenho, expresso pelas médias estatísticas é bastante aquém do desejável para responder adequadamente aos anseios da sociedade brasileira.

cintamente, estudos que debatem tais problemas, apontando caminhos e possíveis soluções. A avaliação de desempenho passa necessariamente pela avaliação de produtividade, volume e prazos de produção. Comparando-se estes dados com informações relativas ao contexto, tais como formação profissional, é possível termos um quadro relativo do setor analisado. Em que pesem certas discrepâncias de metodologia de apuração entre países, a comparação permite uma ordem de grandeza das variações. Esta metodologia, baseada em dados gerais de fontes oficiais infelizmente não permite comparações de segmentos particulares, como, por exemplo, o de edificações habitacionais. Mas no caso de diferenças gerais significativas o resultado é relevante e pode nortear ações a respeito. Em relação aos EUA, procura-se caracterizar a atual situação da construção civil, tendo como premissa a mesma apresentação feita para o Brasil e a União Europeia. Portanto, busca-se proporcionar um nivelamento, visando atualizar a situação, importância, problemas e possíveis soluções para a Construção Civil. Assim, é possível tecer comparações entre os três, permitindo opções para as situações onde a Construção Civil brasileira esteja em desvantagem frente aos EUA e à União Europeia.

3. METODOLOGIA 2. OBJETIVO O presente artigo é resultado de uma pesquisa desenvolvida para o MDIC, Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio, em convênio com a FIESP – Federação das Indústrias do Estado de São Paulo com a finalidade de apresentar subsídios para uma política industrial para a construção civil-edificações. Os autores foram participantes do grupo responsável pelo desenvolvimento do trabalho e neste artigo pretendem abordar, especificamente, um dos temas lá estudados, a análise comparativa de desempenho e regulamentação da construção na União Europeia – UE nos Estados Unidos da América – EUA e o quadro brasileiro. O objetivo principal é comparar o desempenho da construção europeia e da norte-americana, tomadas como benchmarking internacional, em relação à situação brasileira. É descrito, ainda, como a Construção Civil brasileira se insere no contexto econômico do país e são discutidos quais os principais problemas enfrentados e os desafios futuros. Ao mesmo tempo, pretende iniciar a discussão acerca das possíveis soluções para aqueles problemas. É traçado, também, um breve panorama da Construção Civil na União Europeia, os desafios e problemas a serem enfrentados hoje e nos próximos anos. Apresentam-se, su-

O artigo teve como fonte o citado anteriormente, que se baseou em dados estatísticos públicos ou bibliografia consagrada. Inicialmente, buscou-se definir quais as possíveis palavras chaves do tema para que as consultas fossem facilitadas, selecionadas a partir dos temas de produtividade, produção da construção e formação profissional na área. Estas consultas foram executadas nas seguintes fontes: artigos, textos, obras, teses e dissertações, sites da Internet, órgãos estatísticos dos governos americano e da União Europeia, associações profissionais americanas e europeias, utilizandose fontes públicas e privadas. Através de comparações entre os indicadores disponíveis, foram selecionados aqueles que guardavam condições de comparação, por terem conceitos similares. Deste modo, foi possível estabelecer uma análise do quadro de desempenho da construção americana, europeia e brasileira. No Quadro 1 são detalhados os indicadores escolhidos e a partir deste são estabelecidas algumas comparações. Cabe destacar que uma das conclusões mais imediatas do estudo é a falta de dados sobre os setores da cadeia da construção civil brasileira. Existe uma grande dificuldade em obter informações confiáveis sobre todos os segmentos que dela participam, com algumas poucas exceções. A produção 389


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geral de edificações, seja em m² ou em unidades construídas, um indicador relevante em todas as contas nacionais dos EUA e da UE, sequer está disponível. Além disto, as informações em raras ocasiões são plenamente comparáveis. Há também um grande descompasso entre as datas da referência e de publicação dos dados. Desta forma, algumas vezes é necessário um exercício analítico extenso para se chegar a uma conclusão, o que resulta em margens de tolerância acima do desejável.

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tos arquitetônicos, serviços de engenharia, empreiteiros etc. (AMORIM, 1995; MELLO, 2007). A Construção Civil é integrada por uma série de atividades com diferentes graus de complexidade, ligadas entre si por uma vasta diversificação de produtos, com processos tecnológicos variados, vinculando-se a diferentes tipos de demanda. Ela abriga desde indústrias de tecnologia de ponta e capital intensivo, como cimento, siderurgia, química, até milhares de microempresas de serviços, a maior parte com baixo conteúdo tecnológico. Pode-se afirmar que uma das características marcantes do setor da Construção Civil é a sua heterogeneidade. O estudo da ABRAMAT (2007) tem a mais recente descrição desta ampla cadeia produtiva. O macrossetor da Construção Civil é responsável por uma parcela importante do Produto Interno Bruto – PIB nacional, participando com 13,8% do PIB (FIESP, 2005). A tabela seguinte, adaptada de estudos da FIESP (2005), representa a participação em percentual do PIB nos subsetores do CONSTRUBUSINESS. O setor da Construção Civil ocupa um papel importante no panorama econômico brasileiro, sendo responsável por gastos salariais de R$15,5 bilhões, correspondendo a um salário médio mensal de 2,7 salários mínimos, 5,2% do PIB e, aproximadamente, 9 % do pessoal ocupado (IBGE – Pesquisa Anual da Indústria da Construção, 2005). O PIB do setor, de acordo com o Valor Adicionado a Preços Básicos total do país divulgado pela FGV (2006), foi de R$ 181,54 bilhões e o consumo intermediário da Construção Civil é de 181,69 bilhões de reais. Cerca de 55,6% do valor adicionado pela Construção Civil na economia está no setor informal (FGV, 2006), que paga carga tributária de 15,6%, enquanto o setor formal contribui com 37% do Valor Adicionado Bruto do setor, pagando carga

a última década, o setor da Construção Civil vem passando por uma grande transformação, saindo de um longo marasmo, com poucos investimentos, para um período com grandes obras em andamento e fortes investimentos imobiliários. O trabalho de pesquisa e compilação de dados foi realizado no período março-junho 2008, mas as bases de dados brasileiras na ocasião só apresentavam resultados no máximo até 2005. Em seguida, partindo-se de diversas fontes disponíveis, é feita uma análise sucinta da construção civil no Brasil, nos Estados Unidos e na União Europeia, bem como do quadro de desempenho da construção americana, europeia e brasileira em relação aos indicadores previamente escolhidos.

4. COMPARAÇÃO COM ESTADOS UNIDOS E UNIÃO EUROPEIA Aqui é traçado um breve panorama da Construção Civil no Brasil, na União Europeia e nos Estados Unidos, os desafios e problemas a serem enfrentados hoje e nos próximos anos. O objetivo é a possibilidade de tecer comparações entre os três, permitindo opções para as situações em que a Construção Civil brasileira esteja em desvantagem frente aos EUA e à União Europeia. 4.1 A Construção Civil no Brasil A Indústria da Construção Civil é composta por uma complexa cadeia produtiva que abrange setores industriais diversos, tais como: mineração, siderurgia do aço, metalurgia do alumínio e do cobre, vidro, cerâmica, madeira, plásticos, equipamentos elétricos e mecânicos, fios e cabos e diversos prestadores de serviços, como escritórios de proje390

Tabela 1: A participação do CONSTRUBUSINESS no PIB. Atividade

Participação no PIB

Materiais de Construção

4,6 %

Outros Materiais

0,8 %

Máquinas e Equipamentos

0,2 %

Construção (Edificações, Construção Pesada)

5,2 %

Serviços (Projetos de Engenharia e Arquitetura, Atividades Imobiliárias, Manutenção de Imóveis)

0,5 %

Fonte: Adaptado da FIESP, 2005.


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tributária de 45,69%. A Construção Civil paga 24,69% do seu Valor Adicionado Bruto em tributos (CÂMARA BRASILEIRA DA CONSTRUÇÃO CIVIL, 2005). Existem 105.469 empresas de Construção Civil no país, ocupando cerca de 1.600.000 trabalhadores (IBGE – Pesquisa Anual da Indústria da Construção, 2005). Quase 93% são micro e pequenas empresas que empregam até 29 trabalhadores. É importante ressaltar que, aproximadamente, 73% destas empresas estão no segmento de edificações e obras de engenharia civil. Atualmente, muitos empresários do setor de Edificações procuram capitalizar suas empresas, por meio do lançamento de ações em bolsa. De 2005 até novembro de 2007 foram feitos 28 lançamentos de construtoras na BOVESPA pela oferta pública de ações (também conhecida no mercado como Initial Public Offering - IPOs) com 9,5 bilhões de reais captados. Para que essas companhias pudessem oferecer suas ações na BOVESPA foram obrigadas a adotar medidas transparentes, auditar seus balanços e evitar a sonegação de impostos. A pioneira na abertura de capital foi a Cyrella. Os financiamentos do setor imobiliário tiveram um crescimento de 430% no período 2000/2007 e as empresas do setor estão capitalizadas, tendo em vista a captação de recursos, via oferta pública de ações. Além disto, como o crédito imobiliário em relação ao PIB ainda é muito pequeno, sendo cerca de 2%, existe espaço para crescimento. Para fins de comparação, na Holanda tal crédito é de 105%, na Espanha, 46% e em países com nível de desenvolvimento mais próximos ao do Brasil como Chile, Argentina e México são de, respectivamente, 17%, 4% e 11%, demonstrando o espaço existente para crescimento. Como resultado do sucesso destas captações, muitos empresários acreditam que o lançamento de ações no mercado é o caminho mais fácil para obtenção de recursos. Porém, esquecem que a preparação requer um caminho trabalhoso e de ajuste. Além do mais, a receptividade dos investidores para ações de companhias do setor da Construção Civil está diminuindo. Os especialistas acreditam que até o fim da década a consolidação das empresas deve ganhar força (Portal Exame, 2007; Portal Exame, 2008). 4.2 Subsetores da Construção A Indústria da Construção Civil propriamente dita é classificada nos seguintes subsetores: (i) Subsetor de Materiais de Construção; (ii) Subsetor de Edificações; (iii) Subsetor de Construção Pesada. Existem, ainda, outras classificações tais como a que divide o setor em (SEBRAE-MG, 2005): a) Edificações; b) Construção Pesada; c) Montagem Industrial. Trata-se, sem sombra de dúvida, de um segmento extremamente importante para o crescimento e desenvolvimento brasileiros, levando em conta as especificidades do setor, a

saber (SEBRAE-MG, 2005): 1) elevado efeito multiplicador; 2) menor necessidade de investimento, devido à baixa relação capital / produto; 3) utilização intensiva de mão-de-obra, incluindo a não qualificada; 4) significativa porção dos investimentos e; 5) reduzido coeficiente de importação. Um perfil setorial da Construção Civil brasileira, elaborado pelo SEBRAE-MG (2005), apresenta as seguintes características para o setor: a) demanda apresentando forte correlação com a evolução da renda interna e condições de crédito; b) intensividade na geração de emprego, principalmente mão-de-obra desqualificada; c) pequena participação do emprego formal na parcela total de empregados ocupados no setor; d) existência de diversos problemas quanto ao cumprimento de normas técnicas e padronização; e) níveis de competitividade e produtividade abaixo do padrão existente nos países desenvolvidos; e f) pouca atualização nos aspectos tecnológicos e de gestão, quando comparados aos padrões dos países desenvolvidos. 4.3 O subsetor de Edificações O subsetor de edificações, foco do presente estudo, participa com 2,05% do PIB nacional e 39,7% do PIB da construção (PAIC, 2005). Este foco ocorrerá devido às peculiaridades e restrições ao desenvolvimento deste segmento no setor, tais como (MELLO, 2007): a) baixa eficiência produtiva; b) qualidade e produtividade insatisfatórias; c) pouco afeito a modificações; d) utilização de mão-de-obra de baixa qualificação e; e) alta rotatividade de pessoal. 4.4 A Construção Civil na União Europeia A indústria da Construção Civil é importante para a economia europeia, responsabilizando-se por cerca de 4 a 9 % do PIB dos países componentes da União Europeia respondendo por cerca de 4 a 10% do índice de desemprego (European Foundation for the Improvement of Living and Working Conditions, 2005). A Construção Civil europeia, relativamente à Comunidade Europeia, tem como principais características (European Monitoring Center on Change, 2005): a) setor interno fortemente privilegiado; b) grande número de micro e pequenas empresas, incluindo profissionais autônomos; c) número razoável de grandes empresas de porte internacional, que, entretanto, vem decrescendo quando é feita uma comparação com o resto do mundo; d) baixo nível de investimento em Pesquisa e Desenvolvimento, especialmente quando comparada com o Japão. 391


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Atualmente, a indústria da Construção Civil na Europa, tem alguns importantes desafios a serem vencidos. Vários fatores externos estão modificando o ambiente competitivo da indústria, e as empresas, empregados e associações do segmento terão que fazer frente a estes desafios. Tais desafios provêm do aumento da UE pelo acréscimo de novos países, pela nova regulamentação proposta para serviços no mercado interno e pelo aumento da globalização do mercado, entre outros fatores. A competição, no entanto, varia de um subsetor da indústria da construção para outro e de um país da União Europeia para outro. Outro desafio relevante é o envelhecimento da população europeia, trazendo dificuldades para o recrutamento de mão-de-obra para a Construção Civil. No entanto, o ingresso de novos países na União Europeia traz novas demandas e novos mercados para serem desenvolvidos.

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construção com a identificação prévia de falta de materiais, mão-de-obra e equipamentos estão entre os elementos para atingir os objetivos pretendidos. Entretanto, para utilizar estes novos conceitos, é necessário que a indústria da construção na UE contrate pessoal com novas qualificações (European Foundation for the Improvement of Living and Working Conditions, 2005). Esta busca pelas novas qualificações é uma necessidade do setor para crescer, fazer frente à competição global crescente e responder aos anseios dos clientes por maior produtividade e qualidade. É, também, uma necessidade particular das empresas para que possam continuar competitivas e, em última análise, dos empregados do setor para que possam manter sua empregabilidade. Segundo o European Monitoring Center on Change (2005) esta necessidade não é um problema para as grandes empresas do setor que estão equipadas para suprir estas necessidades. Porém, para as pequenas e médias empresas do setor, que são em maior número, este problema é grave, já que não possuem as habilidades necessárias para fazer frente ao desafio. A indústria da construção na UE divide-se em cinco sub-setores (EUROPEAN MONITORING CENTRE ON CHANGE, 2005): a) Preparação de terrenos consistindo em demolições, terraplenagem, furação e cravação de estacas, fundações; b) Edificação de construções completas, consistindo em obras de engenharia civil, construção de edificações, construção de estradas, autoestradas, aeroportos e instalações esportivas e outras construções envolvendo necessidades especiais; c) Instalações elétricas, tubulações, isolamento e outras instalações; d) Acabamento; e) Aluguel de equipamento com operador para construção ou demolição. O setor de edificação de construções completas é o sub-setor mais importante, sendo responsável por mais da metade do emprego e do valor adicionado. A maior parte do emprego restante está no subsetor de instalações elétricas, tubulações, isolamento e outras instalações, bem como no subsetor de acabamento (EUROPEAN MONITORING CENTRE ON CHANGE, 2005).

presente artigo é resultado de uma pesquisa desenvolvida para o MDIC, em convênio com a FIESP, com a finalidade de apresentar subsídios para uma política industrial para a construção civil - edificações. A recente conscientização de sustentabilidade leva a novas exigências por parte dos clientes, públicos e privados, determinando a criação de novos requerimentos e regulamentações, tanto em âmbito nacional como na União Europeia. As autoridades reguladoras da União Europeia estão atentas e respondem a estas demandas. Um outro fator de pressão no setor diz respeito aos novos padrões de saúde e segurança nos processos construtivos, obrigando a mudança e aprimoramento dos referidos processos. A construção, por intermédio de Parcerias Públicas Privadas - PPP, é um novo mercado a ser explorado pelas empresas do setor. Estas parcerias trazem novos tipos de necessidades para o financiamento e operação dos empreendimentos. Outra inovação na Construção Civil europeia é a utilização da Tecnologia da Informação em materiais e edificações (prédios inteligentes), em comunicações com clientes e associados nos empreendimentos, no controle das atividades, materiais e equipamentos, no suprimento de materiais e equipamentos com o e-business, na utilização de equipamentos de inteligência virtual e no projeto e construção. Com a utilização de técnicas, como a “lean construction”, a indústria da Construção Civil pretende minimizar erros, reduzir custos e prazos e melhorar a qualidade. O emprego de elementos pré-fabricados, planejamento das etapas de 392

4.5 A Construção Civil nos Estados Unidos A indústria da Construção Civil americana representa 8,47% do PIB americano, em 2007 (CONSTRUCTION INDUSTRY ROUNDTABLE, 2007). A indústria da Construção Civil nos Estados Unidos, sob muitos aspectos, assemelha-se à da União Europeia. Suas atividades incluem


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a construção de novas edificações e estruturas, preparação de terrenos (site preparation), adições e modificações em edificações e estruturas existentes, manutenção e reparos de estruturas e edificações existentes. A construção se divide em três segmentos: 1) construção de edificações, que inclui os chamados “general contractors”, responsáveis pelas edificações residenciais, comerciais e outros tipos de edificações; 2) construção pesada incluindo estradas, rodovias interestaduais, pontes, túneis e outros projetos especiais; 3) serviços especiais englobando atividades como pintura, hidráulica, eletricidade etc. A indústria da Construção Civil é uma das maiores atividades econômicas nos Estados Unidos, abrangendo cerca de 883.000 empresas. Deste total, aproximadamente 268.000 estão envolvidas na construção de edificações, 64.000 empresas atuam na construção pesada e 550.000 empresas cuidam dos serviços especiais. A maior parte destas empresas é de pequeno porte, sendo que cerca de 65% das empresas empregam até quatro empregados e apenas 1% emprega 100 ou mais empregados (US BUREAU OF LABOR STATISTICS, 2006). A indústria da Construção Civil, segundo o Bureau of Labor Statistics, empregava, em 2006, quase 7,7 milhões de pessoas (fixas e terceirizadas) e 1,9 milhão de autônomos. Aproximadamente 64% dos empregos na Construção Civil estavam no âmbito das empresas de serviços especiais, 24% na construção de edificações e o restante estava empregado nas empresas de construção pesada. Atuam diretamente para os proprietários das edificações residenciais e comerciais 1,9 milhão de autônomos, trabalhando em adições e remodelações, ou agem como “contractors” para estas atividades. Os “contractors” para serviços especiais geralmente trabalham em uma só especialidade, como pintura, carpintaria ou instalação elétrica, ou duas ou mais atividades análogas como tubulação e aquecimento. Geralmente, trabalham sob as ordens do “general contractor” ou de engenheiros arquitetos (“architect”). A Construção Civil americana é responsável por 22% da produção total mundial do setor. O déficit de pessoal qualificado na Construção Civil americana tem levado a um crescimento da mecanização como forma de incrementar a produtividade e suprir a deficiência. Outra providência é o aumento da utilização de conjuntos pré-fabricados (CONSTRUCTION INDUSTRY INSTITUTE, 2003). Todavia, deve ser ressaltado que estas medidas não representam uma alternativa real para a substituição de pessoal qualificado. Empresas com novas tecnologias também requerem pessoal qualificado.

Em seguida, será traçado um quadro comparativo entre alguns indicadores, previamente discutido com os outros pesquisadores envolvidos no trabalho origem do presente artigo e já mencionado, que permita uma comparação entre a Construção Civil brasileira frente à europeia e à americana.

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objetivo principal é comparar o desempenho da construção europeia e norte-americana, tomadas como benchmarking internacional, em relação à situação brasileira. 4.6 Levantamento e análise do quadro de desempenho e regulamentação da construção na Europa e nos Estados Unidos A Construção Civil, como observado no Quadro 1, ocupa papel importante nas economias brasileira, americana e europeia. Apesar da imensa diferença entre o tamanho dos respectivos PIBs, existem similaridades entre as três áreas em relação à Construção Civil. Algumas podem ser citadas: a) O setor é constituído por pequenas e médias empresas; b) Todas as empresas apresentam problemas em relação à qualificação da mão-de-obra; c) Apresentam problemas em relação à segurança do trabalho; e d) São as maiores empregadoras em suas economias. Existe uma diferença significativa em relação ao faturamento das empresas, em cada região, de acordo com cada economia. O faturamento das empresas brasileiras é aproximadamente 8,6 % do faturamento das empresas americanas, o que é explicável pela diferença entre o tamanho das economias americana e brasileira. A Construção Civil americana apresenta, atualmente, sérios problemas, devido à crise imobiliária causada pelos empréstimos podres. Fica constatada uma enorme diferença ao se comparar a produtividade obtida pelos empregados no setor. A produtividade europeia é 75% da americana e a brasileira é 15% da americana, demonstrando que há um imenso “gap” a ser diminuído entre as duas, conforme Gráfico 1. O prazo médio para obras de edificação no Brasil é três vezes maior do que nas construções americanas e duas vezes o despendido nas construções europeias. O licenciamento de obras no Brasil leva duas vezes mais tempo do que nos Estados Unidos e é, em média, 50% maior do que aquele gasto na União Europeia. O gráfico seguinte ilustra estas diferenças em relação às dimensões: prazo médio de licenciamento 393


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Quadro 1: Comparativo de indicadores entre Brasil, EUA e UE. Indicadores

Brasil

EUA

UE

% PIB

5,2% (1)

8,47% (11)

10,2% (21)

Faturamento

US$ 40,98 bilhões (2)

US$ 475,6 bilhões (12)

US$ 710 bilhões (22)

Número de empresas

105.459 (1)

818.000 (13)

807.100 (23)

Faturamento médio

US$ 388.590*

US$ 581.420*

US$ 879.690*

Pessoal empregado

1.550.000 (1)

7.689.000 (14)

4.519.000

Pessoal ocupado

5.170.000 (3)

9.589.000

4.519.000

Produtividade média

US$ 6.177,76 / trabalhador (4)

US$ 41.528,00 /trab. (15)

US$ 31.247,44/trab (24)

Rentabilidade

24,35% (5)

67,5% (16)

não foram obtidos dados

Número de engos e gerentes

125.420 (6)

623.000 (17)

550.530 (25)

Engenheiros/ MO total

2,4%

6,5%

12,2%

Engenheiros/ MO empregada

8%

8%

12,2%

Tempo de formação de pessoal nível superior

5 anos (7)

5 anos (18)

5-7 anos (26)

Tempo de formação de pessoal nível médio

2 - 3 anos (8)

3 anos (18)

2 - 3 anos (26)

Nº de normas técnicas para Construção Civil

938 (9)

ND

1.733 (27)

Prazo médio de obras de edificação

30 meses (10)

10 meses (19)

14,3 meses (28)

Prazo médio de licenciamento

66 dias (10)

30 dias (20)

44 dias (29)

(1) PAIC (2005) e considerado valor do PIB 2005 = R$ 1.937 trilhão (IBGE). (2) PAIC (2005). US$ 1,00 = R$ 2,433. (3) Para emprego formal, utilizado PAIC 2005-IBGE e para informal estimado utilizando a relação de 2003 para emprego formal e informal (SINDUSCON-SP, 2003). (4) FGV (2006). US$ 1,00 = R$ 2,3504. (5) PAIC (2005). Considerada receita bruta de R$ 100 bilhões e R$ 75,65 bilhões de gastos totais (gastos com pessoal + consumo de materiais + outros custos e despesas). A Rentabilidade é entendida como: (Receita Bruta – Gastos Totais)/ Receita Bruta. (6) CREA (2008). Quantitativo de profissionais. (7) MEC (2008). Diretrizes curriculares dos cursos de graduação em Engenharia Civil. (8) MEC (1999). Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Profissional de Nível Técnico. (9) ABNT (2008). (10) SINDUSCON DF (www.sinduscondf.org.br) . (Acesso em 22/3/2008). (11) Construction Industry Institute (2007). (12) US Census Bureau. (13) Consideradas, apenas, as empresas de atuação na área de construção de imóveis (US Bureau of Labour Statistics). (14) U.S. Department of Labour-Bureau of Labor Statistics, 2006. (15) US BLS (2006). (16) US Census Bureau (2002). Considerada receita bruta de US$ 475,6 bilhões e US$ 154,49 bilhões de gastos totais (gastos com pessoal = US$ 53, 48 bilhões + consumo de materiais = US$ 97,69 bilhões + outros custos e despesas = US$ 3,321 bilhões). A Rentabilidade é entendida como: (Receita Bruta – Gastos Totais) / Receita Bruta. (17) U.S. Department of Labour – Bureau of Labour Statistics (2008). (18) NCARB (2008). National Council of Architectural Registration Boards. (19) Dados retirados de http://nwjoinery.com. Acesso em 23/3/2008. (20) Dado válido para a cidade de Houston. Ver: www.publicworks.houstontx.gov. Acesso em 25/3/2008. (21) ECTP (2007). (22) http://www.businessstrategies.co.uk . Acesso em 23/3/2008. (23) European foundation for the improvement of living and working conditions (2005). (24) Valor adicionado de 134,6 bilhões de Euros para a construção imobiliária (European foundation for the improvement of living and working conditions, 2005) e 4.519.000 empregados na Construção Civil imobiliária (Eurostat, 2008. http://epp.eurostat.ec.europa.eu. Acesso em 26/3/2008). 1 Euro = US$ 0,953023 (25) Eurostat (2008). (26) MEC/Espana (2007). Implantación del nuevo sistema educativo (27) CEN (2008). (28) Estimado, considerando-se a produtividade americana como base 100 e a europeia como base 70. (29) http://www.oracle.com Acesso em 27/3/2008. * Dado obtido pela divisão do Faturamento pelo número de empresas.

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e prazo médio de construção no Brasil, Estados Unidos e União Europeia. Além do fato de que a produtividade obtida na construção civil no Brasil apresenta diferenças significativas em relação à dos Estados Unidos e da União Europeia, mesmo internamente, pode ser observado que a construção civil possui uma produtividade que fica aquém daquela obtida em outros setores industriais. Isto demonstra o menor desempenho do setor não só externamente como, também, em relação a outros segmentos produtivos. Isto fica claramente demonstrado no Gráfico 3, onde é apresentada uma comparação entre a produtividade de algumas indústrias selecionadas aleatoriamente, a saber: extração de petróleo, siderurgia, caldeiraria, máquinas e equipamentos, automóveis, construção predial (formal+informal), construção predial formal. Os valores foram obtidos pela divisão do valor agregado pelo número de funcionários (IBGE, 2005). Observa-se que os valores obtidos pela Construção Civil são significativamente menores que os das demais indústrias. Esta diferença pode ser explicada por fatores tais como (AMORIM, 1995; MELLO, 2007): a) Trabalhadores com baixa qualificação; b) Pouco interesse das pequenas e médias empresas em melhorar o nível de qualificação dos empregados; c) Baixo investimento das empresas em pesquisa e desenvolvimento; d) Ausência

de investimentos e conhecimento das empresas em técnicas de pré-fabricação, modularização, gerenciamento e implantação de sistemas e ferramentas de TI; e) Pouca utilização de sistemas de planejamento do trabalho; f) Altas taxas de desperdício de materiais e retrabalho.

E

ste estudo insere-se nos esforços da academia em discutir a construção civil e buscar possíveis caminhos para o setor que permitam seu pleno desenvolvimento. Esta baixa produtividade é influenciada por outros fatores, tais como o fraco desempenho tecnológico da cadeia da construção, que é evidenciado pelo volume de patentes registradas. Isto é demonstrado pelo Gráfico 4 que mostra a comparação entre os setores classificados pelo INPI. Fica evidente que a Construção Civil vem perdendo terreno, mesmo que o Gráfico 5 mostre que o volume de pedidos de patentes tenha acompanhado de maneira próxima a evolução do PIB setorial. Embora internamente na construção civil haja grandes alterações, comparativamente a outros setores, a construção apresenta menor dinamismo tecnológico. Na cadeia de produção na Construção Civil, as construtoras formais são responsáveis por 26,6% do valor adicionado em todo o setor, seguidas pelas empresas formais com

120%

3

100%

Produtividade

2,5 2

80%

1,5 60%

1 0,5

40%

0

EUA

20%

0%

Brasil

UE

EUA

Sequência 1

Brasil

Prazo médio obras UE

Prazo médio obras Prazo médio licenciamento

Gráfico 1: Comparação entre a produtividade brasileira, americana e europeia na Construção Civil.

Gráfico 2: Comparações entre prazos de licenciamento e construção no Brasil, EUA e UE.

Fonte: Autores, com base nos dados de FGV, 2006; US Census Bureau, 2002 e European Foundation for the Improvement of working and Living Conditions, 2005.

Fonte: Autor, com base nos dados de Sinduscon DF; www.nwjoinery.com; www.publicworks.houstontx.gov; www.oracle.com. Acesso em março 2008.

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Mello, L. C. B. B.; de Amorim, S. R. L. O subsetor de edificações da construção civil no Brasil: uma análise comparativa em relação à União Europeia e aos Estados Unidos. Produção, v. 19, n. 2, p. 388-399, 2009

21,0% e, logo adiante, pelas obras informais, como mostra o Gráfico 6. Neste gráfico, percebe-se que as empresas formais no setor produtivo da Construção Civil (21%) agregam três vezes mais valor que as informais (6,1%), sendo superadas, somente, pelas construtoras (26,6%). A informalidade na cadeia produtiva de materiais de construção é estimulada pela falta de fiscalização no trabalho pelos órgãos de saúde e segurança, pela escassez de normas técnicas para a produção e pelo ainda incipiente processo de certificação de produtos. A parcela informal da indústria de materiais de construção não apresenta produtividade representativa no contexto do setor, sendo aproximadamente um terço da produção da indústria formal, que é de 16%. Também a ocupação da indústria informal é responsável por menos da metade do pessoal ocupado no setor formal. Esses números dão indicação imediata da menor produtividade do setor informal. Pesquisas desenvolvidas entre 1998 e 2002 verificaram a necessidade de adequação do setor às exigências de mercado. Assim, na última década, houve um grande esforço para a implantação de programas setoriais de qualidade, como parte do PBQP-H, apresentando avanços significativos na

qualidade de materiais e componentes da Construção Civil. Atualmente, existem 25 Programas Setoriais de Qualidade PSQs, e em alguns segmentos já foi superado o percentual de 90% de conformidade para materiais que compõem a Cesta Básica da construção (PBQP-H, 2006). Outras medidas de modernização e adequação da indústria da Construção Civil às novas realidades brasileiras são: o Sistema Nacional de Avaliações Técnicas – SINAT, que tem por objetivo suprir as lacunas de normalização técnica, quando esta não for prescritiva, e os processos de certificação. A busca pela certificação de produtos, por parte das empresas da Construção Civil, visa principalmente atender o mercado internacional, pois a certificação confere status tanto no meio empresarial quanto no mercado consumidor. Esta situação favorece não só o consumidor final, mas toda a cadeia produtiva. Neste cenário, percebe-se que a questão ambiental não constitui fator principal para serem feitas adequações às recomendações de conformidade, mas à lógica financeira. Apesar disto, muitas empresas já conseguem auferir lucro promovendo cuidados com o meio ambiente, ao adotarem, por exemplo: fonte energética menos poluidora; Mecanismo

Produtividade(R$/trab.)

400.000,00 350.000,00 300.000,00 250.000,00 200.000,00 150.000,00 100.000,00 50.000,00

tru

ns

Co

Co

ns

tru

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dia l

(fo

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0,00

Gráfico 3: Comparações entre produtividade de indústrias brasileiras. Fonte: Autores, com base nos dados do IBGE, 2005

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de Desenvolvimento Limpo – MDL; implantação da cogeração de energia em seus processos produtivos; substituição de matérias-primas não renováveis por produtos reciclados.

6. ANÁLISE E PROPOSTAS 6.1 Caracterização dos pontos críticos Levantamentos junto às entidades representativas, (AMORIM, 2008) indicaram um quadro dos gargalos na Construção e possíveis ações para suplantá-los. O sintoma central da construção pode ser caracterizado pela sua baixa produtividade, cujas principais causas podem ser enumeradas como sendo:

50 45 40 35 30 25 20 15 10

a) Baixa qualificação e desatualização da mão-de-obra; b) Falta de padronização e não conformidade dos materiais; c) Quadro regulatório burocrático e deficiente; d) Pouca utilização da Tecnologia da Informação; e) Pouca utilização de equipamentos que permitam alta produtividade; e f) Alta incidência de tributos e encargos. Note-se que diversos aspectos, que contribuem para a baixa produtividade, estão inter-relacionados ou têm a mesma origem. Por exemplo, a falta de padronização e de modularidade de componentes deriva de aspectos contidos no setor, tais como desconhecimento das normas ou devido a estratégias comerciais de diferenciação, mas vincula-se, também, aos Códigos de Obras que impõem padrões mínimos não-conformes com a coordenação modular. É, também, resultado da formação de profissionais de projeto de que não trata este tema, nem valoriza a economia no projeto e nos produtos do projeto. Por outro lado, o uso restrito de componentes e equipamentos de alta produtividade explica-se, em boa parte, pela questão da tributação e alta informalidade na produção da obra, em alguns subsetores do macrocomplexo da construção. Mas vincula-se, também, a alguns modelos de produção, em que o prazo de execução deve ser mais estendido para atender o fluxo de caixa dos proprietários. Por exemplo, obras realizadas em regime de condomínio, em que os adquirentes contribuem, mensalmente, com parcelas restritas, tendem a dispor de prazos incompatíveis com os custos de aluguel de equipamentos por longos períodos.

100 90 80

5

70

0 1990 a 93

1994 a 96

1997 a 99

60 50 40

Necessidades humanas

30

Operações de processamento

10

Química e metalurgia

20 0 1993

1994

1995

1996 1997

1998 1999

2000 2001

2002

2003

Téxteis e papéis Construções fixas Eng. Mecânica, iluminação, armas Física Eletricidade

Gráfico 4: Patentes por setores. Fonte: INPI, 2008. Acesso em 23 mar. 2008.

Patentes % PIB PIB CC em bi

Gráfico 5: Evolução Patente e participação da construção no PIB. Fonte: Elaborado pelo autor a partir de INPI, 2008; SENAI, 2005 e IBGE, 2005.

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7. CONSIDERAÇÕES FINAIS A construção civil no Brasil, como detalhado no presente artigo, ocupa um papel importante no panorama econômico, tendo participação direta no Produto Interno e agindo sobre uma extensa cadeia produtiva de fornecedores, serviços de comercialização e manutenção (MELLO, 2007). Para manter esta importância, a construção civil vem passando por grandes mudanças, que foram facilitadas por fatores tais como a retomada dos investimentos públicos, a criação de diversas leis que

0,8% Comércio e serviços informais

4,5% Comércio de materiais de construção

21,0% Empresas formais

7,5% Serviços auxiliares de construção

19,8% Outras obras informais

6,1% Empresas informais

13,7% Construção residencial informal

26,6% Construtoras formais

Gráfico 6: Distribuição de VA na cadeia da Construção Civil. Fonte: FGV-Projetos, 2004.

facilitam a retomada de imóveis em caso de inadimplência, a captação de recursos em bolsas e os esforços do Programa Brasileiro de Qualidade e Produtividade – PBQP H, que difundiu os conceitos de gestão de qualidade. Hoje, o setor passa por problemas de falta de mão-de-obra especializada que possa fazer frente às necessidades de crescimento do setor. No entanto, ainda persistem problemas de qualidade e produtividade que impedem o pleno desenvolvimento setorial. Os aspectos de não conformidade, baixa qualidade e informalidade da mão-deobra não foram, ainda, devidamente enfrentados e resolvidos. Neste artigo, buscou-se fazer uma comparação entre a construção civil brasileira em relação à europeia e à americana, focando principalmente o subsetor edificações. Para que estas comparações fossem facilitadas, foram utilizados indicadores, previamente acordados entre os autores e que estivessem respaldados pela bibliografia. Este estudo se insere nos esforços da academia em discutir a indústria da construção civil e buscar possíveis caminhos para o setor, que permitam seu pleno desenvolvimento e a eliminação dos hiatos entre a construção civil brasileira frente aos países mais desenvolvidos. O déficit habitacional brasileiro hoje se aproxima dos oito milhões de unidades, crescendo em decorrência de que a produção atual não atende sequer à demanda do crescimento da população (PLANHAB, 2008), tampouco às novas demandas decorrentes da melhoria de renda. A mudança do patamar de produção para o volume necessário a estas demandas exige um novo paradigma organizacional para o setor. A comparação com países que apresentam bons indicadores de produtividade pode colaborar para que esta barreira seja ultrapassada. Não é pretensão dos autores esgotar o assunto nem apresentar soluções definitivas, mas sim estimular a discussão alternativa para a discussão e o aprimoramento.

Artigo recebido em 13/11/2007 Aprovado para publicação em 07/05/2009

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http://nwjoinery.com www.publicworks.houstontx.gov http://www.businessstrategies.co.uk http://epp.eurostat.ec.europa.eu http://www.oracle.com

SOBRE OS AUTORES Luiz Carlos Brasil de Brito Mello Departamento de Engenharia de Produção Universidade Federal Fluminense – UFF End.: Rua Passo da Pátria,156, sala 241, Bloco D – Niterói – RJ Tel.: (21) 2629-5617 E-mail: luiz.brasil@gmail.com Sérgio Roberto Leusin de Amorim Universidade Federal Fluminense – UFF End.: Rua Passo da Pátria, 156, sala 365, bloco D – Niterói – RJ Tel.: (21) 2629-5490 E-mail: sergio.leusin@gmail.com 399


Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 400-416

Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey Eduardo Guilherme Satolo UNIMEP João Marcos Andrietta Elastotec S.A. Paulo Augusto Cauchick Miguel UNINOVE Felipe Araújo Calarge UNINOVE

RESUMO O programa Seis Sigma é uma iniciativa adotada atualmente por muitas empresas e seu uso ocorre por meio de um processo altamente disciplinado e orientado, no qual são aplicadas diversas técnicas e ferramentas, que objetivam a geração de um ciclo de melhoria contínua. Diante desse fato e considerando a relevância do assunto, foi conduzido um levantamento tipo survey com o intuito de identificar e analisar as técnicas e ferramentas usadas nas etapas do método DMAIC e a sua comparação com a prescrição da literatura. Buscou-se levantar as técnicas e ferramentas mais e menos empregadas pelas empresas, permitindo-se confrontar estes resultados com outros levantamentos já realizados no exterior. Cabe destacar também que os resultados confirmaram o indicado pela literatura, os quais apontam que o programa Seis Sigma necessita apoiar-se em dados mensuráveis e confiáveis, evidenciando assim que o emprego das técnicas e ferramentas é indispensável junto ao método de melhoria DMAIC. PALAVRAS-CHAVE Programa Seis Sigma, melhoria contínua, método DMAIC, levantamento tipo survey.

Analysis on the usage of techniques and tools from the Six-Sigma program on a survey-type assessment ABSTRACT The Six-Sigma program is an approach currently adopted by many companies and its usage occurs through a highly disciplined and guided process, in which several techniques and tools are applied, trying to generate a continuous improvement cycle. Facing this fact and considering the relevance of the subject, a survey-based research was carried out. One of the objectives was to identify and analyse the techniques and tools used in the phases of the DMAIC and their comparison with the literature. The results consisted in assessing the techniques and tools most and least used by the companies, enabling to confront those with other previous research. It is also worthy highlighting that these results confirmed the indications of other publications, which state that the Six Sigma programme needs to be supported by measurable and trustworthy data. This makes evident that the usage of techniques and tools is indispensable for the DMAIC improvement method. KEY WORDS Six-Sigma program, Continuous improvement, DMAIC method, survey.

400


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

1. INTRODUÇÃO Atualmente, as empresas têm buscado vencer a concorrência melhorando a qualidade de seus produtos e o desempenho de seus processos. Assim, para manter a competitividade, as organizações aplicam diferentes práticas de gestão que, se utilizadas com critérios rigorosos e métodos disciplinados, possibilitam a superação dos concorrentes, em função da oferta de produtos e serviços de melhor qualidade (LINDERMAN et al., 2003). O Six Sigma ou Seis Sigma – segundo a tradução utilizada no Brasil – é uma das práticas de gestão que as empresas vêm utilizando atualmente, com o propósito de preservarem a competitividade de seus negócios (ROTONDARO et al., 2002), pois a ênfase das organizações que aplicam o Seis Sigma é respaldar suas decisões em fatos concretos e dados mensuráveis, visando conseguir maior e melhor controle dos processos de produção ou serviços (PANDE et al., 2000). O Seis Sigma é tratado por diferentes formas terminológicas, tanto pela literatura quanto pelas empresas que a adotam, sendo comum verificar termos que relacionam o Seis Sigma a “prática”, “iniciativa”, “metodologia”, “técnica”, “programa”, “estratégia”, dentre outros. Para fins deste artigo, será adotado o termo “Programa Seis Sigma”, por entender esta prática de gestão como sendo um método estruturado, composto por etapas definidas, que visam atender metas preestabelecidas, resultando no termo “programa”, considerando assim esta terminologia mais adequada para a aplicação dada pelas empresas. Uma importante fase na condução do Programa Seis Sigma refere-se à aplicação do DMAIC, que é um método estruturado para solução de problemas, sendo esta sigla originada das letras iniciais de: Define (definir), Measure (medir), Analyse (analisar), Improve (melhorar) e Control (controlar). O DMAIC é um dos métodos mais citados, correspondendo a 75% de um total de 250 em um levantamento de artigos publicados no exterior (BRADY; ALLEN, 2006). A partir do momento em que se percebe que as decisões devem basear-se em fatos concretos e dados mensuráveis, o emprego de técnicas e ferramentas torna-se imprescindível para a gestão. As técnicas e ferramentas foram estabelecidas por vários autores relacionados com a área de gestão da qualidade, sendo que algumas destas permanecem inalteradas desde a sua criação, ao passo que outras evoluíram e algumas, ainda, foram recentemente desenvolvidas (VIEIRA FILHO, 2003). Assim, o termo “técnicas e ferramentas” refere-se, neste artigo, às ferramentas típicas da área da qualidade e da

área estatística (por exemplo, diagrama de Pareto, desdobramento da função qualidade – QFD, planejamento de experimentos, etc.) e áreas correlatas da engenharia de produção (como por exemplo; PERT/CPM, Poka-Yoke, etc.), algumas delas mais simples outras mais estruturadas. O Programa Seis Sigma, que surgiu em 1987 na Motorola após a realização de uma série de estudos sobre a variação dos processos de produção com ênfase no conceito de melhoria contínua (HENDERSON; EVANS, 2000); visa, por meio da aplicação sistêmica e disciplinada de técnicas e ferramentas (ANTONY et al., 2007), melhorar a lucratividade de empresas de qualquer setor de atividade, aumentar a participação de mercado, reduzir custos e otimizar as operações, aprimorando a qualidade e promovendo a eliminação de defeitos, erros e falhas (FOLARON, 2003).

A

ênfase das organizações que aplicam o programa Seis Sigma é respaldar suas decisões em fatos concretos e dados mensuráveis. Considerando a relevância do tema e diante da motivação e importância de obter uma maior quantidade de dados sobre a aplicação do Programa Seis Sigma no país, foi conduzido um levantamento de campo do tipo survey exploratório, que se caracteriza por avançar no conhecimento de um determinado assunto na tentativa de explicar a ocorrência de um fenômeno (FORZA, 2002), com o objetivo de quantificar uma série de práticas relativas à adoção do Programa Seis Sigma, dentre as quais evidenciar a utilização de técnicas e ferramentas como apoio ao programa. A escolha desta abordagem de pesquisa pode ser justificada em função do alcance deste tipo de abordagem no sentido da amplitude (quantidade) de empresas estudadas, possibilitando demonstrar um quadro geral de aplicação. No entanto, neste caso, não tem o objetivo de generalização dos resultados para a totalidade de empresas no país, uma vez que não se trata de um estudo probabilístico. Embora existam estudos recentes sobre o Programa Seis Sigma no Brasil (e.g. PINTO et al., 2006; ANDRIETTA; MIGUEL, 2007; SANTOS; MARTINS, 2008) e no exterior (e.g. LEE-MORTIMER, 2007; SOLTANI; LAI, 2007), estes trabalhos não avaliam a utilização de técnicas e ferramentas no Programa Seis Sigma em profundidade, embora sejam importantes. Outros estudos realizados no país (WERKEMA, 2002; FALANDO DE QUALIDADE, 2004; CARVALHO et al., 2007) são limitados em termos de quantidade de empresas e não tratam de técnicas e ferramentas no contexto dos métodos de solução de problemas (DMAIC, DFSS e outros). Assim, o presente trabalho apresenta os resultados obtidos 401


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

neste levantamento, tendo como foco identificar e analisar as técnicas e ferramentas utilizadas nas etapas do método DMAIC e a sua comparação com a prescrição encontrada na literatura.

2. REFERENCIAL TEÓRICO SOBRE O PROGRAMA SEIS SIGMA O Programa Seis Sigma busca alcançar a excelência na competitividade por meio da melhoria dos processos produtivos. Para isso, o programa visa de maneira estruturada a melhoria contínua dos processos envolvidos na produção de um bem ou serviço, considerando todos os aspectos importantes de um negócio (HAN; LEE, 2002). Para se alcançar este sucesso, a implantação do Programa Seis Sigma requer a aplicação sistêmica e disciplinada de técnicas e ferramentas (ANTONY et al., 2007), que auxiliam a definir os problemas e as situações que necessitam de melhoria, estabelecer procedimentos de medições com o propósito de obter dados e informações, criticar e analisar as informações coletadas, implementar as melhorias nos processos e, finalmente, controlar ou quando necessário redesenhar os processos ou produtos existentes, com o propósito de otimizá-los, proporcionando um ciclo de melhoria contínua (LUCAS, 2002). Embora as técnicas e ferramentas não sejam nem novidade no Programa Seis Sigma ou exclusividade deste (ANTONY et al., 2007), a abordagem dada pode acrescentar considerável valor a elas, pois dissemina um vocabulário de métricas e ferramentas uniformizado em toda a organização e ainda formaliza o uso de ferramentas estatísticas, evitando-se empregá-las isolada e individualmente em aplicações distintas (HUNTER; SCHMITT, 1999).

A

e serviços, bem como a correlação destas com as etapas do método DMAIC. 2.1 Classificação das técnicas e ferramentas utilizadas no Programa Seis Sigma A partir da revisão da literatura, poucas classificações foram encontradas para as técnicas e ferramentas empregadas no Programa Seis Sigma, sendo que See (2006) propõe uma classificação baseada em duas categorias: • Coleta de dados e gerenciamento de análise do processo – inclui técnicas e ferramentas tais como: mapeamento do processo, matriz causa-efeito, análise dos modos e efeito das falhas (Failure Mode and Effect Analysis – FMEA) e planos de controle; • Ferramentas de análise de processo – destaca como técnicas e ferramentas a análise e mensuração do sistema, análise da capacidade (“capabilidade”) do processo, estudos multivariados, planejamento de experimentos (Design of Experiments - DOE). Henderson e Evans (2000) descrevem a classificação realizada pela General Electric das técnicas e ferramentas, sendo que neste caso adota-se uma divisão em três grupos: • Técnicas e ferramentas para os times de trabalho; • Técnicas e ferramentas de processo; • Técnicas e ferramentas estatísticas. Segundo os autores supracitados, os dois primeiros grupos de ferramentas consistem em auxiliar na execução dos projetos no Programa Seis Sigma. O grupo de ferramentas estatísticas é empregado para identificar potenciais causas de variação em processos e, consequentemente, para reduzir esta variação e também os seus defeitos. A Tabela 1 apresenta uma classificação das técnicas e ferramentas sugeridas pelos autores citados e empregadas no Programa Seis Sigma. Um aspecto que cabe destacar quanto às classificações, diz respeito às técnicas e ferramentas citadas pelos autores (HENDERSON; EVANS, 2000; SEE, 2006) para exemplificar as categorias, pois se verifica que as técnicas e ferramentas descritas por See (2006) são, em sua maioria, simples e frequentemente empregadas no ambiente fabril, ao passo que as ferramentas citadas por Henderson e Evans (2000) são ferramentas relativamente mais complexas, necessitando de maior conhecimento e capacitação para a sua utilização. See (2006) cita também a importância de se realizar a integração das técnicas e ferramentas ao método DMAIC,

abordagem dada às técnicas e ferramentas pode acrescentar considerável valor a estas, pois dissemina um vocabulário uniformizado na organização. Assim, considerando a importância destas técnicas e ferramentas para o sucesso do Programa Seis Sigma e para a melhoria de desempenho e consequente aumento de ganhos (INGLE; ROE, 2001), esta seção realiza uma breve revisão da literatura sobre a utilização destas no Programa Seis Sigma, os elementos chave para execução com sucesso, os métodos para seleção das técnicas e ferramentas a serem empregadas para solução de problemas, as inter-relações existentes entre as técnicas e ferramentas aplicadas no setor de manufatura 402


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

porém não descreve como isso deve ser feito. Em contrapartida, esta integração é apresentada por Hagemeyer et al. (2006) e é descrita mais detalhadamente no decorrer deste trabalho.

Este último elemento chave citado pelos autores pode ser auxiliado pelo emprego de uma matriz de técnicas e ferramentas, como a desenvolvida por Hagemeyer et al. (2006), e que é descrita no item a seguir.

2.2 Elementos chave para uma efetiva aplicação das técnicas e ferramentas junto ao programa Seis Sigma Os elementos chave correspondem aos aspectos primordiais para a implantação com sucesso de uma determinada técnica ou ferramenta, e ajudam a compreender quais pontos devem ter uma atenção especial (ANTONY; BAÑUELAS, 2002). Diversos estudos relacionados com a determinação dos elementos chave e seu nível de importância para a implantação do Programa Seis Sigma, seja no ambiente de manufatura ou de serviços, são encontrados na literatura (por exemplo em: PANDE et al., 2000; HEVERSON; EVANS, 2000; ECKES, 2000, ANTONY; BAÑUELAS, 2002). No entanto, quando se trata da determinação destes elementos chave para um efetivo emprego das técnicas e ferramentas junto ao Programa Seis Sigma poucos estudos foram realizados. Antony et al. (2007), em um destes estudos, apontam alguns elementos chave: • Suporte e acompanhamento pela alta gerência; • Desenvolvimento de programas de treinamento para a utilização das ferramentas; • Envolvimento cooperativo; • Suporte dos facilitadores; • Disponibilidade de recursos; • Abordagem rigorosa no gerenciamento do projeto; • Desenvolvimento de uma tabela para indicar qual e quando utilizar uma determinada técnica ou ferramenta.

2.3 Método para seleção de técnicas e ferramentas A complexidade na resolução de problemas requer muitas vezes o uso de técnicas e ferramentas que visam auxiliar a organização na análise dos dados e informações acerca do problema. Com o intuito de facilitar esta seleção, Hagemeyer et al. (2006) desenvolveram uma matriz para ser aplicada junto ao Programa Seis Sigma. A Figura 1 ilustra de forma resumida, dada sua extensão, a matriz de seleção desenvolvida por estes autores. Esta matriz tem como objetivo identificar, organizar e definir qual a melhor técnica ou ferramenta para a resolução de dado problema, auxiliando na solução eficaz e eficiente deste. Segundo os autores (HAGEMEYER et al., 2006), a utilização da matriz Seis Sigma auxilia a: • Selecionar o uso de uma técnica ou ferramenta a partir de uma série de atributos; • Compreender a disponibilidade e propor algumas das mais comuns técnicas e ferramentas de solução de problemas; • Identificar as técnicas ou ferramentas mais adequadas para solução de problemas de processos e entender quando aplicá-las durante o processo; • Compreender a inter-relação e interação entre as técnicas e as ferramentas. Para a elaboração da matriz foram selecionadas 20 técnicas e ferramentas da qualidade. Este conjunto compreende

Tabela 1: Classificação das técnicas e ferramentas utilizadas no programa Seis Sigma. Técnicas e ferramentas para times de trabalho

Técnicas e ferramentas de processos

Técnicas e ferramentas estatísticas

Fatores críticos para o sucesso

Brainstorming

Teste t (uma e duas amostras)

Lista de verificação

Critical to quality

ANOVA

Gráfico inclusão/exclusão

Diagrama espinha de peixe

Gráfico de Box e Whisker

Análise de Pareto

Teste Qui-quadrado

Mapeamento do processo

Variância de homogeneidade ou Teste F

SIPOC (suppliers, inputs, process, outputs, customer)

Gráfico de pontos Teste Kurskall Wallis Plot Matrix Gráficos de probabilidade normal Diagrama de dispersão

Fonte: Heverson e Evans, 2000

403


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

Caracterização

as ferramentas básicas da qualidade (gráficos de controle, diagrama de dispersão, matriz de causa e efeito, diagrama de Pareto, diagrama causa e efeito, folha de controle e histograma), além de outras ferramentas selecionadas pelos autores, sendo citada a análise de capabilidade, análise custo-benefício, DOE, FMEA, estudos de R&R, teste de hipóteses, sistemas a prova de erros, análise multivariada, CEP (Controle Estatístico do Processo), mapeamento de processo e outras técnicas adicionais. Na matriz proposta, estas vinte técnicas e ferramentas são classificadas em duas categorias principais que permitem ao usuário, por meio de uma leitura das suas características, determinar qual ou quais destas devem ser aplicadas. As categorias são: • Caracterização da técnica ou ferramenta: descreve aspectos relativos à sua origem (por exemplo ferramenta básica da qualidade); aponta em qual(is) fase(s) do DMAIC pode ser aplicada; tipo de ferramenta (estatística, analítica ou de apoio para a organização de dados) e o nível de conhecimento (novato, intermediário ou avançado) necessário do usuário para utilizá-la.

Entradas Saídas

A matriz desenvolvida por Hagemeyer et al. (2006) apresenta-se como uma maneira inicial para seleção de técnicas e ferramentas a ser empregadas para solução de problemas junto ao Programa Seis Sigma. No entanto, a matriz proposta possui limitações quanto a extensão de técnicas e ferramentas e em nível de complexidade destas, já que estas

Ferramenta

Matriz causa e efeito

FMEA

DOE

CEP

Origem

Ferramenta básica

Seis Sigma

Seis Sigma

Ferramenta básica

Definir/Medir

Definir/Medir/ Melhorar

Analisar/melhorar

Medir/Analisar/ Melhorar/Controlar

Tipo de ferramenta

Analítica

Analítica

Estatística

Estatística

Nível de conhecimento para utilização

Novato

Avançado

Avançado

Intermediário

Dados necessários para uso da ferramenta

Coleta de dados

Conhecimento processo

Coleta de dados

Coleta de dados

Necessidade de emprego de ferramenta anterior

Mapeamento processo

Mapeamento processo

Análise multivariada

Não

Tipo de informação

Ideias

Ideias

Números

Números

Função

Implementos

Implementos

Medição

Medição

Classificação da ferramenta

Documento

Técnica

Técnica

Ferramenta

Matriz

Matriz

Matriz

Gráfico

Organiza e classifica

Organiza, classifica e prioriza

Organiza, classifica e compara

Provê status, prevê, compara

Fase no Método DMAIC

Atributos

• Atributos: esta categoria é subdividida em entradas (inputs) e saídas (outputs) necessárias para o emprego da ferramenta. Como entradas, são destacadas informações tais como: necessidades para a utilização da ferramenta (conhecimento do processo, coleta de dados, análise numérica, entre outros); necessidade do emprego anterior de outra ferramenta e com que tipo de informações a ferramenta trabalha (ideias ou números). Como saídas, são descritas as funções da ferramenta (medição, implementação, registro ou contagem), os resultados físicos resultantes (matriz, diagrama, análise numérica) e o que a ferramenta realiza com as informações concedidas (organização, priorização, classificação, comparação).

Resultados O que a matriz faz com a informação

Figura 1: Matriz parcial para seleção de técnicas e ferramentas junto ao programa Seis Sigma. Fonte: Hagemeyer et al., 2006.

404


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

são consideradas básicas para a utilização junto ao Programa Seis Sigma. 2.4 Inter-relações entre técnicas e ferramentas aplicadas na manufatura e no setor de serviços Como descrito anteriormente, o Programa Seis Sigma é implementado como forma de se obter de uma maneira estruturada, a melhoria contínua dos processos envolvidos na produção de um bem ou de um serviço. No entanto, as características envolvidas em um processo de manufatura e na prestação de serviço são diferentes, sendo algumas destas diferenças apresentadas a seguir (NICOLS, 2006; ANTONY et al., 2007): • Os dados, quando se trata de serviços, normalmente não estão disponíveis para análise e são mais difíceis de serem coletados e têm de ser coletados com interação face a face com o cliente; • A medição da satisfação do cliente é mais difícil de ser obtida no setor de serviços; • Dificuldade para identificação dos processos que podem ser medidos em ppm (parte por milhão) de oportunidades; • A utilização de gráficos e fluxogramas é menos comum para o setor de serviços; • Processos em serviços estão mais susceptíveis a ações e fatores incontroláveis; • Uma função de transferência normalmente não está explícita nos processos em serviços, sendo mais difícil à aplicação de técnicas estatísticas; • Muitos dos processos em serviços seguem um padrão de distribuição não normal, dificultando com isso a escolha da ferramenta correta para utilização;

• Muitas decisões no setor de serviços são tomadas por meio da intuição; • Os processos em serviços estão muito mais dependentes das mudanças organizacionais e humanas. A partir dessas colocações, o emprego das técnicas e ferramentas Seis Sigma na manufatura e no setor de serviços deve possuir características diferentes. Para verificar estas diferenças, foi elaborada a Tabela 2, que sintetiza os resultados obtidos da condução de dois estudos do tipo survey em empresas de manufatura e de serviços localizadas no Reino Unido (ANTONY; BAÑUELAS, 2002; ANTONY et al., 2007). A partir da análise da Tabela 2 é possível observar que algumas técnicas e ferramentas são comumente empregadas pelo setor de serviços e manufatura, tais como: análise de Pareto, gráfico de dispersão, planejamento de experimentos (DOE), QFD e Poka Yoke. As ferramentas que possuem um cunho estatístico apresentam-se mais frequentemente quando se trata do setor de manufatura, fato este já esperado, pois neste setor a obtenção de dados dessa natureza é mais comum. Já para o setor de serviços, devido à complexa variação dos processos, as outras ferramentas, mais voltadas para a análise de dados, destacam-se como mais empregadas, pois auxiliam para a melhoria destes processos, que têm dados de natureza mais qualitativa. 2.5 Correlação entre as ferramentas e o método DMAIC A aplicação do Programa Seis Sigma utiliza diversos métodos de melhorias e soluções de problemas, que de uma maneira ordenada, lógica e sistemática empregam um conjunto de ferramentas, técnicas, princípios e regras na de-

Tabela 2: Inter-relação entre ferramentas aplicadas na manufatura e setor de serviços . Manufatura

Serviços

Análise causa e efeito; Análise de Pareto; Gráfico de controle; Gráfico de dispersão; Planejamento de Experimentos (DOE); FMEA – Análise do modo e efeitos das falhas QFD – Desdobramento da Função Qualidade Análise de regressão Capabilidade Poka Yoke Método de Taguchi Teste de hipóteses Análise de vorrelação 5S Custos de qualidade

Mapeamento de processo; Brainstorming; Análise da causa raiz; Gráfico de dispersão; Benchmarking; Análise de Pareto; Ferramentas de mudança gerencial; Modelo Kano; CEP – Controle Estatístico do Processo; QFD - Desdobramento da Função Qualidade; Planejamento de Experimentos (DOE); Análise capabilidade de processo; Poka Yoke; Modelo Gap

Mais empregada

Menos empregada

Fonte: construída com base em Antony e Buñuelas, 2002; Antony et al., 2007.

405


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

finição, elaboração, implementação, mensuração e controle dos projetos (MUNRO, 2000; GOFFNET, 2004; MALEYEFF e KRAYENVENGER, 2004). Um desses métodos é o DMAIC, que são as iniciais para: Define (definir), Measure (medir), Analyse (analisar), Improve (melhorar) e Control (controlar). Segundo vários autores (PANDE et al., 2000; KLEFSJÖ et al., 2001; BAÑUELAS; ANTONY, 2003; LYNCH et al., 2003; GUPTA, 2005), o DMAIC é o método estruturado mais utilizado pelas empresas que aplicam o Programa Seis Sigma, bem como o mais citado nas publicações (BRADY; ALLEN, 2006), devido a sua simplicidade e similaridade com o Ciclo PDCA, que é largamente empregado no processo de melhoria contínua. Outro aspecto importante na utilização do DMAIC é o foco na satisfação do cliente (a partir das características críticas para a qualidade ou CTQs – Critical to Quality), a busca contínua da redução da variabilidade, a adaptação para o projeto de produtos e processos e a aplicação efetiva a processos administrativos e de serviços (LYNCH et al., 2003). De acordo com Linderman et al. (2003), cada fase do método DMAIC contempla uma ação relativa a: • Definir: é a definição clara e objetiva do projeto, compreendendo os CTQs e os requisitos técnicos, devendo ser identificados nos projetos no Programa Seis Sigma que serão desenvolvidos na empresa, com o objetivo de satisfazer as expectativas dos clientes em termos de qualidade, preço e prazo de entrega. A habilidade da organização em atender a essa expectativa está intimamente ligada à variação de seus processos (refere-se a qualquer tipo de processo, abrangendo tanto administrativos ou transacionais, como os de serviços, vendas e manufatura), como destacado por Behara et al. (1995). • Medir: é a identificação das medidas-chave da eficiência e da eficácia transportando tais medidas para o conceito do Seis Sigma. Segundo Edgeman et al. (1999), para assegurar os resultados esperados nesta fase, são utilizadas práticas como: métricas do Seis Sigma; Análise de Sistemas de Medição (MSA); Análise de Modos de Falha e seus Efeitos (FMEA); e o Desdobramento da Função Qualidade (QFD), entre outras. • Analisar: é a determinação das causas dos problemas que precisam de melhorias. De acordo com Eckes (2001), nesta etapa as práticas utilizadas incluem: visualização de dados; teste de hipóteses; análise de correlação e regressão; e análise de variância. • Melhorar: é a soma das atividades relacionadas com a geração, seleção e implementação de soluções. Fundamentalmente, esta etapa consiste no desenvolvimento do planejamento de experimentos (DOE), com o objetivo de se conhecer a fundo cada processo, por meio da mudança 406

estrutural de níveis de operação de diversos fatores, simultaneamente ao processo em estudo (BARNEY, 2002; LYNCH et al., 2003). As informações obtidas com o DOE auxiliam a identificar o ajuste das variáveis-chave para modificar e otimizar os processos. • Controlar: é a ação de garantir que as melhorias se sustentem ao longo do tempo. Young (2001) enfatiza que dentre as práticas adotadas nesta fase destacam-se: cartas de controle; planos de controle; testes de confiabilidade e processos à prova de erros. A Tabela 3, elaborada por Hagemeyer et al. (2006), apresenta a relação existente entre as etapas do método DMAIC e algumas técnicas e ferramentas empregadas em Programas Seis Sigma. O presente trabalho tem como um de seus objetivos confrontar os aspectos descritos na literatura com dados empíricos, advindos de empresas que adotam o Programa Seis Sigma no país, com o intuito de realizar uma inter-relação entre os elementos teóricos e os elementos empíricos, sendo que para isso foi conduzido um levantamento tipo survey, pormenorizado a seguir.

3. MÉTODOS E TÉCNICAS DA PRESENTE PESQUISA Antes do presente estudo foram realizados outros três levantamentos sobre a aplicação do Programa Seis Sigma no Brasil. O trabalho de Werkema (2002) enviou questionário para 25 empresas brasileiras obtendo uma taxa de retorno de 44%, ou seja, com 11 empresas participantes. O outro levantamento (FALANDO DE QUALIDADE, 2004) foi realizado via e-mail para 795 contatos, de um banco de dados de 986, com o retorno de 191. Somados os respondentes que efetivamente preencheram o questionário por e-mail e aqueles que fizeram contatos por telefone, foram coletadas 100 respostas efetivas, mas apenas 8 empresas utilizavam o Programa Seis Sigma. Um último levantamento recente sobre o estado de difusão e implantação do Seis Sigma no Brasil foi apresentado por Carvalho et al. (2007), no qual foram enviados aproximadamente 1.000 questionários, sendo obtidos 198 questionários válidos, tendo porém 46 organizações que responderam que haviam implementado o Programa Seis Sigma. Já o presente estudo foi desenvolvido a partir de um levantamento cujo objetivo foi quantificar uma série de práticas relativas à adoção do Programa Seis Sigma, dentre as quais, evidenciar a utilização de técnicas e ferramentas como apoio ao programa. Este levantamento caracteriza-se como do tipo survey, conforme a classificação de Malhotra e Grover (1998).


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

Como o trabalho foi desenvolvido por meio de um levantamento realizado junto a empresas que confirmaram a utilização do Programa Seis Sigma e ainda teve a intenção de confirmar se são válidos os dados divulgados na literatura existente sobre o assunto, o levantamento caracteriza-se como uma survey exploratória-descritiva, pois este tipo de pesquisa tem por objetivo avançar no conhecimento de um

determinado assunto na tentativa de explicar a ocorrência de um fenômeno (FORZA, 2002), não tendo características, portanto, de uma survey de teste de teoria. Os dados foram coletados por meio de um questionário enviado para 121 empresas que asseguraram previamente (via consulta por telefone) que aplicavam o Programa Seis Sigma. Assim, o conjunto de empresas foi definido, valendo-

Tabela 3: Associação das técnicas e ferramentas Seis Sigma às etapas do DMAIC. Técnicas e Ferramentas

Utilização junto ao DMAIC Definir

Análise de regressão Análise de stakeholder Benchmarking Brainstorming Cartas de controle Plano de negócio Consenso Controle Estatístico do Processo CTQ (árvore crítica da qualidade) Diagrama de afinidades Diagrama de causa e efeito Diagrama de Pareto Estratificação Ferramentas de planejamento Fluxograma FMEA Folha de verificação Estudos de R&R Gráficos de controle de processo Gráfico de frequência Gráfico de priorização Gráfico de dispersão Índices de capabilidade Modelo de Kano Planejamento de experimentos Plano de controle Poka Yoke Procedimento operacional padrão Simulação SIPOC Técnica de coleta de dados Técnicas de amostragem Séries temporais Teste de hipóteses Voz do cliente

Medir

Analisar

Melhorar

Controlar

x x

x

x

x x x

x x

x

x x

x

x

x x x x x

x x

x x x x x

x x x x x x

x x x x

x x x

x

x x

x x

x x x

x x

x x x x

x x x x x

x x

x x

x x x x

x x x

x

Fonte: Hagemeyer et al., 2006.

407


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

se de fontes variadas, tais como: buscas em sites de empresas, verificação em revistas especializadas nas áreas de qualidade e gestão, levantamento junto às empresas de consultoria e serviços; consultas aos fóruns e entidades associativas de empresas; e a participação em cursos e seminários. Considerando que a pesquisa teve por objetivo uma extensa abrangência territorial no país, esta amostra não probabilística mostrou-se adequada, principalmente tendo em vista a viabilidade operacional requerida para a conquista de resultados satisfatórios, conforme destaca Mattar (1996). O instrumento de coleta de dados escolhido para a realização da pesquisa foi um questionário, com a maior parte de questões fechadas (pela facilidade de tabulação), pois este instrumento possibilita a racionalização do tempo de preenchimento do respondente, facilita a aplicação simultânea em várias empresas, consegue atingir maior abrangência territorial e confere o caráter de sigilo, propiciando privacidade aos respondentes, que preenchem a pesquisa sem riscos de constrangimentos (MARCONI; LAKATOS, 1996). O questionário também considerou um glossário dos termos técnicos utilizados no decorrer do instrumento.

A

tram no Estado de São Paulo (64,1%), Minas Gerais (8,9%), Amazonas (6,4%), Rio Grande do Sul (5,1%), Rio de Janeiro (3,4%), Santa Catarina (3,8%), Espírito Santo (1,3%), Paraíba (1,3%) e Pernambuco (1,3%). Esta distribuição é muito similar ao direcionamento dos questionários. O fato da maior parte das empresas respondentes serem oriundas do Estado de São Paulo se dá em função da própria população-alvo e também porque grande parte das empresas usuárias do Programa Seis Sigma, estavam localizadas neste Estado quando da condução da pesquisa. 4.1 Caracterização das empresas que aplicam o Programa Seis Sigma Os setores industriais das empresas respondentes são apresentados na Figura 3, conforme os critérios da revista Exame (2005). Nota-se que o setor automotivo destacou-se entre os respondentes com um percentual de 37%, seguindose pelo segmento eletroeletrônico, com cerca de 19%. O levantamento também traçou o perfil das empresas quanto ao porte com base nos critérios do PNQ - Prêmio Nacional da Qualidade (FNQ, 2004), segundo o número de funcionários (empresas pequenas: até 50; médias: de 51 a 500; grandes: mais de 500). A partir desse critério, os dados coletados constataram que 65,4% das empresas analisadas são de grande porte e 34,6% são empresas médias. Cabe ressaltar que, apesar da literatura indicar que o Seis Sigma pode ser utilizado por empresas de qualquer tamanho, como destacam algumas publicações (PFEIFER et al., 2004; WESSEL; BURCHER, 2004), este fato não foi verificado no presente trabalho, haja vista a ausência de micro e pequenas empresas entre as respondentes, bem como na população estudada. Em relação ao indicador de faturamento anual, constatouse que as empresas estudadas apresentaram faixas variando desde R$ 33 milhões a R$ 18 bilhões. Assim, considerando-se o ranking da revista Exame (2005), mais de 60% das empresas respondentes estão entre as 500 maiores empresas em faturamento anual no Brasil.

s técnicas e ferramentas comuns a todas as etapas são as mais utilizadas em razão de preferência ou de maior domínio. Após o retorno dos questionários, os dados foram tabulados seguindo a lógica das questões, sendo elaborados gráficos que subsidiam a apresentação e análise dos resultados, os quais são apresentados a seguir. É importante destacar ainda que a análise dos dados foi baseada no referencial teórico desenvolvido, no sentido de corroborar ou não os dados e informações da literatura. Este trabalho apresenta e analisa os resultados obtidos na pesquisa restringindo-se em abordar os resultados relativos do uso das técnicas e ferramentas utilizadas pelas empresas que aplicam o Programa Seis Sigma no território nacional. No entanto, como citado na Introdução, os resultados não têm como objetivo a sua generalização, uma vez que a amostra é intencional e, portanto, não probabilística.

4. APRESENTAÇÃO E ANÁLISE DOS RESULTADOS Os dados apresentados são resultantes da devolução de 78 questionários preenchidos dos 121 que foram enviados, registrando-se uma taxa de retorno de 64,5%. A localização das empresas no país é mostrada na Figura 2, e se concen408

5. RESULTADOS E DISCUSSÃO A lista de técnicas e ferramentas utilizadas nas etapas do método DMAIC do questionário continha 58 técnicas e ferramentas e, para cada uma, o respondente assinalava, em uma tabela construída com base na literatura, qual (ou quais) etapa(s) do método DMAIC a técnica ou a ferramenta é utilizada. Cabe destacar que no questionário foi inserido um glossário com o significado das 58 técnicas e ferramentas


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

(conhecimento, habilidade e facilidade de uso) pelos participantes do Programa Seis Sigma das empresas respondentes. No entanto, esse é um aspecto que não foi possível de ser confirmado na presente investigação. As Figuras 4 e 5 ilustram, graficamente, os respectivos percentuais acumulados das empresas respondentes para as ferramentas mais usadas e as menos usadas.

relacionadas. A tabulação da planilha é mostrada na Tabela 4, onde consta o percentual de empresas que indicaram o uso das ferramentas e técnicas em cada etapa do DMAIC. A Tabela 4 foi elaborada considerando a ordem de emprego (ranking) das ferramentas em função da média de utilização pelas etapas do método DMAIC (todas), sendo que as 10 técnicas e ferramentas mais utilizadas em cada etapa do DMAIC são indicadas na cor cinza escuro e as 10 menos utilizadas na cor cinza claro. No Apêndice, esta tabela é apresentada por completo. As distribuições da utilização das técnicas e ferramentas em cada etapa do método DMAIC mostram-se bastante uniformes, pois foi testada a normalidade, que indicou uma curva normal e assintótica negativa (média maior que a mediana). Foi realizado também o cálculo de duas medidas de dispersão (desvio padrão e coeficiente de variação) que se apresentaram elevados, porém dentro de padrões aceitáveis e que permitem a realização da análise proposta inicialmente no objetivo deste trabalho sem, portanto, um aprofundamento estatístico. Vale destacar que, de um rol extenso de técnicas e ferramentas, ao redor de 15% delas são as mais utilizadas em todas as etapas do método DMAIC. Isso se deve ao fato de que existem técnicas e ferramentas que se mostram apropriadas para uma etapa e não para outras. Porém, aparentemente as técnicas e ferramentas comuns a todas as etapas seriam mais utilizadas em razão de preferência ou de maior domínio

Os resultados revelaram que as dez técnicas e ferramentas mais utilizadas pelas empresas pesquisadas e que aplicam o método DMAIC no Programa Seis Sigma são: coleta de dados, histograma, diagrama de Pareto, brainstorming, carta de controle, índices de capacidade, fluxograma, mapa de processo, avaliação do sistema de medição e CEP. Os dados coletados no presente trabalho indicaram também que oito das dez técnicas e ferramentas mais usadas no DMAIC estão concentradas na etapa “Medir” do método. Tal ocorrência pode ser explicada em função de que nesta fase são aplicadas as ferramentas que medem o desempenho dos processos, e que, assim, permitem uma visualização do estado atual dos mesmos para a definição das metas de aprimoramento, como destacam alguns autores (BREYFOGLE III et al., 2001; MCADAM; LAFFERTY, 2004).

Figura 2: Localização geográfica das empresas respondentes.

Figura 3: Setor de atividade econômica das empresas respondentes.

O

programa Seis Sigma necessita de dados mensuráveis e confiáveis, evidenciando que o emprego das técnicas e ferramentas é indispensável.

409


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No estudo conduzido por Hahn et al. (2000) também foram identificadas as dez ferramentas mais utilizadas no Programa Seis Sigma, a saber: cartas de controle, histograma, diagrama de Pareto, diagrama de causa e efeito, matriz de causa e efeito, gráfico box plot, estudo de análise multivariada, teste de hipóteses para médias e para variâncias e gráficos de controle por variáveis. Comparando-se os dados do presente trabalho com o que foi realizado por Hahn et al. (2000), apenas três ferramentas e técnicas usadas no Programa Seis Sigma estão presentes nos dois estudos: cartas de controle, histograma e diagrama de Pareto. Comparando-se os resultados deste levantamento com outro realizado por Antony e Bañuelas (2002), que também identificaram as dez ferramentas mais utilizadas no Programa Seis Sigma (análise de causa e efeito, cartas de controle, diagrama de Pareto, mapa de processo, planejamento de experimentos, FMEA, índices de capabilidade, QFD, análise de regressão e

teste de hipóteses) observa-se que existe uma coincidência na utilização de quatro delas (cartas de controle, diagrama de Pareto, índices de capacidade e mapa de processo). A Figura 5 apresenta as ferramentas menos usadas em cada etapa do DMAIC, indicadas pelas empresas respondentes. Os resultados do presente levantamento (Figura 5) quando relacionados com as dez ferramentas menos utilizadas no método DMAIC (OCAP, PDPC, operação evolutiva, teste de operação, PERT/CPM, teste de mercado, Stakeholder Analysis, FTA e teste de vida acelerada) ao ser comparado com o estudo de Antony e Bañuelas (2002), que também aponta as técnicas e ferramentas menos utilizadas nos Programas Seis Sigma (método Taguchi, CEP e sistema à prova de erros), demonstram que quando comparadas com o presente levantamento não são coincidentes. Segundo Antony e Bañuelas (2002), as técnicas e ferramentas “mais poderosas” são menos usadas pelas organizações. O termo “mais poderosas”

Tabela 4: Dez (10) técnicas e ferramentas da qualidade mais e menos utilizadas nas etapas do método DMAIC em % de respondentes. TÉCNICAS E FERRAMENTAS

Etapa do Método DMAIC Definir

Medir

Analisar

Melhorar

Controlar

Todas

Ranking

Técnicas de Coleta de Dados

55,13

89,74

46,15

34,62

34,62

52,05

1

Histograma

33,33

74,36

67,95

28,21

37,18

48,21

2

Diagrama de Pareto

57,69

64,10

64,10

25,64

26,92

47,69

3

Brainstorming

65,38

38,46

61,54

44,87

17,95

45,64

4

Cartas de Controle

19,23

50,00

50,00

29,49

75,64

44,87

5

Índices de Capacidade

26,92

57,69

47,44

39,74

48,72

44,10

6

Fluxograma

60,26

51,28

46,15

34,62

20,51

42,56

7

Mapa de Processo

55,13

46,15

50,00

34,62

16,67

40,51

8

Avaliação de Sistemas de Medição/Inspeção

14,10

83,33

38,46

33,33

25,64

38,97

9

Controle Estatístico de Processo

15,38

41,03

37,18

28,21

70,51

38,46

10

Stokeholder Analysis

29,49

7,69

6,41

8,97

3,85

11,28

49

Teste de Vida Acelerada

0,00

11,54

25,64

10,26

5,13

10,51

50

FTA

2,56

6,41

30,77

7,69

3,85

10,26

51

Stokeholder

29,49

6,41

1,28

6,41

3,85

9,49

52

Teste de Mercado

5,13

11,54

14,10

11,54

5,13

9,49

53

PERT/CPM

8,97

8,97

3,85

14,10

2,56

7,69

54

Teste de Operação

2,56

5,13

14,10

14,10

2,56

7,69

55

Operação Evolutiva

2,56

5,13

11,54

15,38

2,56

7,44

56

PDPC

3,85

7,69

6,41

10,26

1,28

5,90

57

OCAP

0,00

3,85

5,13

5,13

12,82

5,38

58

Legenda

410

Dez técnicas e ferramentas mais utilizadas nas etapas do método DMAIC. Dez técnicas e ferramentas menos utilizadas nas etapas do método DMAIC.


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

(extraído da literatura) é considerado neste trabalho como aquelas ferramentas que propiciam resultados mais robustos e são, geralmente, mais complexas. Estas ferramentas podem significar, por exemplo, que metodologicamente são mais estruturadas, como o QFD ou métodos estatísticos que, por si sós, podem corresponder a uma área de estudo como o planejamento de experimentos. Por fim, vale mencionar que os levantamentos realizados anteriormente (WERKEMA, 2002; FALANDO DE QUALIDADE, 2004; CARVALHO et al., 2007) não trataram da abordagem referente à utilização dos chamados “métodos de solução de problemas” (DMAIC, DFSS e outros) ou ainda, das técnicas e ferramentas que são utilizadas nas etapas do método DMAIC. Buscando confrontar se o emprego das técnicas e ferramentas no Programa Seis Sigma pelas empresas respondentes condiz com a proposta de Hagemeyer et al. (2006) para aplicação destas junto às etapas do método DMAIC, foi construída a Tabela 6. Em cinza escuro estão destacadas as 10 ferramentas mais utilizadas e em cinza claro as dez ferramentas menos utilizadas, considerando as etapas do método DMAIC. Para as técnicas e ferramentas comuns

entre a proposta realizada por Hagemeyer et al. (2006) foram assinaladas (com um “X”) as etapas do DMAIC nas quais os autores sugerem a sua aplicação. Por meio da análise da Tabela 6 é possível verificar que o emprego das técnicas e ferramentas, nas empresas no país, encontra-se em mais etapas do método DMAIC do que a proposta realizada por Hagemeyer et al. (2006). Isto vem indicar que as técnicas e ferramentas podem ser empregadas em todas as etapas do processo, ajudando a promover soluções que levem à melhoria contínua.

CONCLUSÕES O trabalho buscou enfatizar a utilização das técnicas e ferramentas empregadas nas empresas instaladas no Brasil que aplicam o Programa Seis Sigma. Nesse sentido, foram apresentados os resultados de um levantamento do tipo survey exploratória realizada com a finalidade de levantar uma série de práticas relativas ao programa, dentre elas a utilização das técnicas e ferramentas, foco do presente trabalho. Com o objetivo de confrontar aspectos relatados na li-

Figura 4: As 10 técnicas e ferramentas mais utilizadas no método DMAIC.

411


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

teratura, foi realizada uma revisão de literatura destacando diversos aspectos relativos à aplicação das técnicas e ferramentas do Programa Seis Sigma. Os resultados do trabalho de campo possibilitaram a tabulação de 58 técnicas e ferramentas que podem ser usadas em cada uma das cinco etapas do método DMAIC. A obtenção destes dados permitiu a realização da comparação com diversos estudos que identificam técnicas e ferramentas mais e menos empregadas pelas empresas. Verificou-se que são poucas as técnicas e ferramentas coincidentes quando se trata das mais empregadas, ao passo que quando se analisam as técnicas e ferramentas menos empregadas, estas não possuem nenhuma relação. Outra comparação que cabe ser aqui destacada é a associação das técnicas e ferramentas do Programa Seis Sigma e as etapas do DMAIC identificada na literatura. A comparação desta com os resultados obtidos no levantamento per-

mite observar que as empresas estão empregando as técnicas e ferramentas em mais etapas do método DMAIC do que o proposto por estes autores. Isto indica que nenhuma classificação pode ser tomada como única ou verdadeira, nem de que esta classificação seja a mais completa ou singular. Cabe destacar que a pesquisa confirmou os indicativos do referencial teórico, os quais apontam pela necessidade do Programa Seis Sigma se apoiar em dados mensuráveis e confiáveis, a partir de suas técnicas e ferramentas, evidenciando assim que no método DMAIC o emprego das técnicas e ferramentas é praticamente indispensável. Insere-se ainda nesta discussão a possibilidade de se realizar futuramente uma análise estatística mais detalhada e aprofundada dos resultados obtidos, tarefa esta não realizada por divergir escopo do presente trabalho, que se propôs evidenciar sobre diversos aspectos a utilização de técnicas e ferramentas como apoio ao Programa Seis Sigma.

Figura 5: As 10 técnicas e ferramentas menos utilizadas no método DMAIC

412


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

Tabela 6: Técnicas e ferramentas da qualidade utilizadas nas etapas do método DMAIC em % de respondentes. TÉCNICAS E FERRAMENTAS

Etapa do método DMAIC Definir

Técnicas de Coleta de Dados

Medir

Analisar

Melhorar

Controlar

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

X

Histograma Diagrama de Pareto Brainstorming Cartas de Controle

X

Índices de Capacidade

X

Fluxograma

X

X

X

X

Mapa de Processo Avaliação de Sistemas de Medição/Inspeção Controle Estatístico de Processo Mapeamento do Processo FMEA

X

Mapa de Raciocínio Diagrama de Causa e Efeito

X

Análise Econômica Boxplot Análise de Variância Voz do Cliente

X

Análise de Causa Raiz

X

Teste de Hipóteses Planejamento de Experimentos

X

Análise Multivariada Diagrama de Relações Diagrama de Afinidades

X

X

Relatório de Anomalias Carta Multi-Van Diagrama de Matriz Stakeholder Analysis

X

X

Ensaio de Vida Acelerada FTA Teste de Mercado PERT/CPM Teste de Operação Operação Evolutiva PDPC OCAP

Legenda

Dez técnicas e ferramentas mais utilizadas nas etapas do método DMAIC. Dez técnicas e ferramentas menos utilizadas nas etapas do método DMAIC.

413


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

Artigo recebido em 21/06/2007 Aprovado para publicação em 07/05/2009

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AGRADECIMENTOS Os autores do presente trabalho agradecem primeiramente às empresas que propiciaram a realização deste estudo. No entanto, a análise feita é de responsabilidade dos autores, não representando, portanto, a posição das empresas respondentes. Os autores agradecem também aos avaliadores pelas importantes recomendações e sugestões na revisão do texto, contribuindo significativamente para a melhoria na qualidade final do artigo. Finalmente, um agradecimento deve ser dirigido para o CNPq e CAPES pelo apoio ao projeto de pesquisa.

SOBRE OS AUTORES Eduardo Guilherme Satolo Universidade Metodista de Piracicaba (UNIMEP) End.: Rodovia Iracemápolis – Santa Bárbara d´Oeste Km 01 – 13450-000 – Santa Bárbara d’Oeste Tel.: (19) 3124-1767 E-mail: edgsatolo@unimep.br João Marcos Andrietta Elastotec S.A. End.: Rua Pereira da Fonseca, nº 449 – Éden, 18103-043 – Sorocaba – SP E-mail: j.m.andrietta@uol.com.br Paulo Augusto Cauchick Miguel Universidade Nove de Julho (UNINOVE) End.: Av. Francisco Matarazzo, 612 – Prédio C – 1º andar – Água Branca – São Paulo – SP Tel.: (11) 3665-9325 E-mail: pacmiguel@uninove.br Felipe Araújo Calarge Universidade Nove de Julho (UNINOVE) End.: Av. Francisco Matarazzo, 612 – Prédio C – 1º andar – Água Branca – São Paulo – SP Tel.: (11) 3665-9325 E-mail: fcalarge@uninove.br 415


Satolo, E. G.; Andrietta, J. M.; Cauchick Miguel, P. A.; Calarge F. A. Análise da utilização de técnicas e ferramentas no programa Seis Sigma a partir de um levantamento tipo survey. Produção, v. 19, n. 2, p. 400-416, 2009

APÊNDICE Relação das ferramentas e técnicas utilizadas nas etapas do método DMAIC nas empresas respondentes (% dos respondentes da pesquisa).

TÉCNICAS E FERRAMENTAS Técnicas de Coleta de Dados Histograma Diagrama de Pareto Brainstorming Carta de Controle Índices de Capacidade Fluxograma Mapa de Processo Avaliação de Sistemas de Medição/Inspeção Controle Estatístico de Processo Mapeamento do Processo FMEA Mensuração de Defesa Mapa de Raciocínio Diagrama de Causa e Efeito Análise Econômica Técnicas de Amostragem Boxplot Análise do Tempo de Ciclo Análise de Variância Voz do Cliente Folha de Verificação Estratificação Análise de Causa Raiz Teste de Hipóteses Diagrama de Dispersão Planejamento de Experimentos Análise de Regressão 5W2H Gráfico Sequencial POKA-YOKE Procedimento Operacional Padrão Matriz de Priorização QFD Diagrama Árvore Project Charter SIPOC Análise de Tempo de Falhas Simulação Diagrama de Gantt Mapa de Produto Análise Multivariada Diagrama de Relações Diagrama de Afinidades Técnicas Estat. de Prev. Série Temporais Relatório de Anomalias Carta Multi-Van Diagrama de Matriz Stokeholder Analysis Teste de Vida Acelerada FTA Stokeholder Teste de Mercado PERT/COM Teste de Operação Operação Evolutiva PDPC OCAP Legenda

416

Definir

Medir

55,13 33,33 57,69 65,38 19,23 26,92 60,26 55,13 14,10 15,38 55,13 19,23 23,08 37,18 25,64 60,26 12,82 19,23 23,08 8,97 65,38 12,82 35,90 25,64 0,00 6,41 2,56 6,41 24,36 23,08 5,13 7,69 24,36 37,18 25,64 61,54 61,54 8,97 1,28 25,64 25,64 5,13 6,41 12,82 7,69 10,26 3,85 8,97 29,49 0,00 2,56 29,49 5,13 8,97 2,56 2,56 3,85 0,00

89,74 74,36 64,10 38,46 50,00 57,69 51,28 46,15 83,33 41,03 46,15 32,05 61,54 35,90 38,46 19,23 66,67 43,59 43,59 28,21 23,08 48,72 46,15 24,36 14,10 30,77 8,97 16,67 19,23 43,59 3,85 8,97 25,64 24,36 21,79 7,69 16,67 25,64 8,97 16,67 23,08 12,82 17,95 15,38 12,82 14,10 10,26 19,23 7,69 11,54 6,41 6,41 11,54 8,97 5,13 5,13 7,69 3,85

Etapa do método DMAIC Analisar Melhorar Controlar 46,15 67,95 64,10 61,54 50,00 47,44 46,15 50,00 38,46 37,18 34,62 57,69 25,64 30,77 70,51 34,62 32,05 62,82 48,72 75,64 19,23 26,92 44,87 74,36 71,79 69,23 50,00 79,49 26,92 25,64 8,97 12,82 32,05 26,92 42,31 7,69 7,69 43,59 26,92 17,95 19,23 51,28 35,90 33,33 26,92 12,82 32,05 24,36 6,41 25,64 30,77 1,28 14,10 3,85 14,10 11,54 6,41 5,13

Dez técnicas e ferramentas mais utilizadas nas etapas do método DMAIC. Dez técnicas e ferramentas menos utilizadas nas etapas do método DMAIC.

34,62 28,21 25,64 44,87 29,49 39,74 34,62 34,62 33,33 28,21 34,62 50,00 24,36 30,77 23,08 23,08 19,23 19,23 17,95 23,08 15,38 17,95 11,54 8,97 33,33 14,10 56,41 15,38 34,62 10,26 50,00 42,31 30,77 15,38 11,54 10,26 2,56 7,69 47,44 20,51 15,38 10,26 12,82 8,97 11,54 16,67 10,26 12,82 8,97 10,26 7,69 6,41 11,54 14,10 14,10 15,38 10,26 5,13

34,62 37,18 26,92 17,95 75,64 48,72 20,51 16,67 25,64 70,51 17,95 28,21 30,77 25,64 2,56 21,79 25,64 7,69 16,67 8,97 20,51 37,18 2,56 3,85 11,54 7,69 6,41 3,85 16,67 19,23 51,28 44,87 2,56 5,13 2,56 14,10 3,85 5,13 6,41 8,97 5,13 1,28 3,85 2,56 14,10 19,23 10,26 0,00 3,85 5,13 3,85 3,85 5,13 2,56 2,56 2,56 1,28 12,82

Todas

Ranking

52,05 48,21 47,69 45,64 44,87 44,10 42,56 40,51 38,97 38,46 37,69 37,44 33,08 32,05 32,05 31,79 31,28 30,51 30,00 28,97 28,72 28,72 28,21 27,44 26,15 25,64 24,87 24,36 24,36 24,36 23,85 23,33 23,08 21,79 20,77 20,26 18,46 18,21 18,21 17,95 17,69 16,15 15,38 14,62 14,62 14,62 13,33 13,08 11,28 10,51 10,26 9,49 9,49 7,69 7,69 7,44 5,90 5,38

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15 16 17 18 19 20 21 22 23 24 25 26 27 28 29 30 31 32 33 34 35 36 37 38 39 40 41 42 43 44 45 46 47 48 49 50 51 52 53 54 55 56 57 58


Produção, v. 19, n. 2, maio/ago. 2009, p. 417-432

Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia Eliane Gonçalves Gomes Embrapa Célia Regina Grego Embrapa João Carlos Correia Baptista Soares de Mello UFF Gustavo Souza Valladares UFC João Alfredo de Carvalho Mangabeira Embrapa Evaristo Eduardo de Miranda Embrapa

RESUMO Mudanças no uso e manejo da terra podem ser responsáveis por incrementos na produtividade agrícola. Neste artigo propõe-se o uso de modelos de Análise de Envoltória de Dados (DEA) para avaliar a distribuição espacial da eficiência de agricultores familiares na forma do uso da terra. Estudou-se a evolução da “produtividade da terra” para um grupo de agricultores de Machadinho d’Oeste (RO), para quatro períodos de tempo. As variáveis dos modelos DEA foram as produções de arroz, milho e café como outputs, e a área total plantada dessas culturas como input. Os resultados mostram que o plantio simultâneo de arroz e milho foi a combinação de melhor desempenho. Houve dependência espacial para a eficiência produtiva nos quatro anos avaliados. Os anos de 1999 e 2002 apresentaram maior uniformização em termos da eficiência produtiva dos lotes por toda área, com os lotes mais eficientes concentrando-se na parte central da área de estudo. PALAVRAS-CHAVE Uso da terra, eficiência, dependência espacial.

Spatial dependence of land use efficiency in an Amazon rural settlement ABSTRACT Agricultural productivity enhancement can be due to land use and land handling changes. In this paper we propose the use of Data Envelopment Analysis models (DEA) to evaluate the spatial distribution of family farmers land use efficiency. We studied the “land productivity” evolution for a sample of family farmers from Machadinho d’Oeste (RO), during four periods of time. DEA models variables were rice, maize and coffee productions as outputs, and these crops total cultivated area as input. As a result we noticed that cultivating simultaneously rice and maize was the best performance case. Efficiency measurements had spatial dependence in the four periods of time. In 1999 and 2002 farms productive efficiency measurements were more uniformly distributed; the most efficient farmers were concentrated in the central part of the studied area. KEY WORDS Land use, efficiency, spatial dependence.

417


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

1. INTRODUÇÃO Medidas de produtividade são usualmente usadas para avaliar o desempenho de unidades de produção agrícola. Referem-se genericamente à relação produto-insumo de um dado processo de transformação de uma unidade produtiva, organização ou região. Conforme destacado por Sudit (1995), essas medidas incorporam efeitos de mudança tecnológica e de eficiência (técnica, de escala e alocativa). Diferenças de produtividade decorrem da diversidade das tecnologias de produção, da eficiência do processo de produção e do ambiente no qual o processo produtivo ocorre.

U

Para medir a eficiência foram usados modelos de Análise de Envoltória de Dados (Data Envelopment Analysis – DEA), um para cada ano estudado. Foram usadas apenas as culturas mais importantes na região, quais sejam, arroz, milho e café. Como variáveis dos modelos DEA foram usadas as produções de arroz, de milho e de café como outputs, e a área total plantada dessas culturas como input. Esta escolha de variáveis faz com que o modelo DEA avalie uma eficiência em relação ao uso da terra. Para não perder relação causal do modelo, desagregaram-se as diferentes culturas mantendose o uso da terra de forma agregada. O modelo foi aplicado para os agricultores que produziram pelo menos uma das culturas em certo ano. De modo a avaliar a existência de dependência espacial entre as medidas de eficiência foi realizada a análise geoestatística para os quatro períodos avaliados. Em dados amostrados de modo a permitirem análises geoestatísticas tem sido demonstrada a existência de autocorrelação ou de dependência espacial, que deve ser considerada para a interpretação correta dos resultados (VIEIRA et al., 2002). O estudo da variabilidade espacial pode ser um indicativo de determinado local com mais ou menos interferência de fatores como a produtividade das culturas e de solo, no espaço e no tempo. A fertilidade natural dos solos varia na área de estudo (VALLADARES et al., 2003, 2006) e pode influenciar na eficiência dos sistemas de produção. Assim, esta variável pode explicar parte da dependência espacial nesses sistemas de produção com baixo nível tecnológico e de aplicação de insumos, os quais são muito dependentes da reserva natural de nutrientes nos solos.

so de modelos DEA para estudar a evolução da produtividade da terra para um grupo de agricultores de Machadinho d’Oeste. O crescimento da produtividade em agricultura tem sido objeto de estudo na literatura. Citam-se, por exemplo, os trabalhos de Thirtle et al. (2008), Tipi e Rehber (2006), Coelli e Rao (2005), Lissitsa e Odening (2005), Perobelli et al. (2005), Vicente (2005), Evenson e Avila (2004), Gasques et al. (2004), Helfand e Levine (2004), Bayarsaihan e Coelli (2003), Toresan (1998), Gasques e Conceição (1997), Coelli (1996), Bureau et al. (1995), Hoffmann e Jamas (1990), entre outros. Esses trabalhos empregam, geralmente, medidas do tipo Produtividade Parcial e Total dos Fatores ou de eficiência DEA-Malmquist (FÄRE et al., 1994). No setor agrícola, terra e trabalho são fatores básicos de produção e, segundo Alves (2003), produtividade da terra e produtividade do trabalho são duas medidas de desempenho importantes na avaliação em agricultura, em especial para a agricultura familiar. A produtividade da terra é dada pelo quociente entre renda bruta e área total. A produtividade do trabalho é definida pela razão entre renda bruta e o número de trabalhadores. Alves (2003) destaca, entretanto, que não faz sentido estimar simultaneamente as produtividades da terra e do trabalho como definidas. De forma a avaliar as mudanças na forma de uso e manejo da terra, neste artigo estudou-se a evolução da eficiência produtiva para um grupo de agricultores familiares de Machadinho d’Oeste (RO) e sua variabilidade espacial para quatro períodos de tempo. Nesta região, devido à dificuldade de levantamento de dados econômicos, esta é a medida que melhor expressa o desenvolvimento dos sistemas de produção de base local. 418

2. CARACTERIZAÇÃO DA ÁREA DE ESTUDO Machadinho d’Oeste é um município de Rondônia, localizado entre Ariquemes e Jaru, entre as coordenadas geográficas 61o47’ e 63o00’ de longitude WGr e 9o19’ e 10o00’ de latitude S, distanciado cerca de 400 km da capital, Porto Velho. Antes de ser elevado à condição de município em 1988, Machadinho d’Oeste surgiu como um projeto de assentamento rural (PA). Ao ser instituído como município, seus limites foram ampliados e novas áreas foram incorporadas (quatro outros projetos de colonização e oito centros urbanos), em um total de 8.556 km2. O PA Machadinho foi dimensionado inicialmente para um total de 3.000 famílias de colonos; mais de 2.000 já haviam chegado em 1984. Nesse ano, esse PA já tinha infraes-


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

trutura mínima para a colonização agrícola, como estradas, núcleos urbanos de apoio, projeto fundiário implantado, lotes demarcados etc. A partir da implementação do assentamento no início dos anos de 1980, a paisagem original tem sido transformada pelos colonos em um mosaico composto por remanescentes florestais, vegetação secundária, pastagens, culturas agrícolas e pequenas áreas urbanizadas. Em Batistella et al. (2000, 2003) e Batistella (2001) encontram-se estudos sobre as mudanças da paisagem e do uso e cobertura das terras em Machadinho d’Oeste. Em 1986 foi definido um projeto de pesquisa para acompanhar os sistemas de produção agrícola praticados por pequenos agricultores desta região (MIRANDA, 2005). Pesquisas de campo são feitas a cada três anos, com aplicação de questionários com cerca de 250 variáveis agrossocioeconômicas e ambientais, sobre uma amostra de propriedades rurais. A cada ano, o uso das terras é monitorado por imagens de satélites e espacializado em um Sistema de Informações Geográficas (SIG). No primeiro ano da pesquisa, 1986, foi realizado um esforço de amostragem que cobriu cerca de 15% dos lotes, em um total de 438 lotes válidos. Essa amostra aleatória e estratificada foi geocodificada em um SIG. Os resultados do primeiro levantamento de dados in loco permitiram definir um perfil inicial dos agricultores recém chegados e de sua agricultura. Em 1989, um novo levantamento permitiu elaborar e espacializar em SIG o perfil da agricultura e dos agricultores. Em 1993, outra etapa foi realizada, aprofundando aspectos vinculados à economia e ao meio ambiente. A pesquisa de campo de 1996 mostrou que, em dez anos, houve mudanças profundas nas propriedades, tanto na estrutura como nos sistemas de produção (MIRANDA et al., 1997). Em um novo levantamento de campo em 1999 foram entrevistados 438 agricultores, cujos sistemas de produção foram caracterizados. Caso a propriedade tivesse mudado de dono, o novo responsável era entrevistado e, dessa forma, foi elaborado um novo perfil dos agricultores e da agricultura (MIRANDA et al., 2002). Em setembro e outubro de 2002, conforme apresentado em Mangabeira et al. (2005), um novo levantamento foi conduzido junto às propriedades estudadas em anos anteriores, com a atualização das variáveis sobre os sistemas de produção praticados. Nessa ocasião, foram entrevistados 327 proprietários. As publicações referentes a esses 20 anos de pesquisa em Machadinho d’Oeste podem ser encontradas em Miranda (2005). Nessas duas décadas de pesquisa, notaram-se mu-

O

danças na região, seja em relação aos aspectos socioeconômicos, seja em relação ao uso da terra. De modo a avaliar as mudanças na forma de uso da terra, neste artigo fez-se uso de modelos DEA para estudar a evolução da produtividade da terra para um grupo de agricultores dessa localidade.

3. ANÁLISE DE ENVOLTÓRIA DE DADOS Modelos DEA calculam a eficiência relativa de unidades produtivas e usam Problemas de Programação Linear (PPLs), que otimizam cada observação individual de modo a estimar uma fronteira eficiente, linear por partes, composta das unidades que apresentam as melhores práticas (referências ou benchmarks) dentro da amostra em avaliação. É capaz de incorporar diversos inputs (entradas, recursos, insumos ou fatores de produção) e outputs (saídas ou produtos) para o cálculo da eficiência de unidades tomadoras de decisão, designadas por DMUs (Decision Making Units).

emprego de modelos DEA em agricultura pode vir a apoiar as decisões dos agricultores. De forma simplificada, a eficiência relativa é definida como a máxima razão entre a soma ponderada das componentes do vetor de produção e a soma ponderada das componentes do vetor de insumos usados no processo de produção. Os pesos usados nas ponderações das componentes de insumos e produtos são distintos e obtidos dos PPLs de DEA. Há dois modelos DEA clássicos. O modelo CCR (também conhecido por CRS ou constant returns to scale) assume retornos constantes de escala (CHARNES et al., 1978) e proporcionalidade entre inputs e outputs. O modelo BCC (ou VRS, de variable returns to scale), proposto por Banker et al. (1984), considera retornos variáveis de escala; substitui o axioma da proporcionalidade pelo axioma da convexidade. Tradicionalmente são possíveis duas orientações radiais para esses modelos: orientação a inputs, quando é desejado minimizar os recursos disponíveis, sem alteração do nível de produção; orientação a outputs, quando o objetivo é aumentar os produtos, sem mudar a quantidade de recursos. Existem duas formulações equivalentes para DEA. De forma simplificada pode-se dizer que a formulação conhecida como modelo dos Multiplicadores trabalha com a razão de somas ponderadas de produtos e recursos, com a ponderação escolhida de forma mais favorável a cada DMU, respeitando-se determinadas condições (ou seja, cada DMU é auto avaliada). A outra formulação, chamada de modelo do 419


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

Envelope, define uma região viável de produção e trabalha com a projeção de cada DMU na fronteira dessa região. Uma vez que são duais, esses dois problemas calculam a mesma medida de eficiência. Em (1) e em (2) apresentam-se, respectivamente, o modelo DEA CCR dos Multiplicadores e do Envelope, com orientação a inputs. Considera-se que cada DMU k, k = 1...n, é uma unidade de produção que utiliza m inputs xik, i = 1...m, para produzir s outputs yjk, j = 1...s. Em ambas as formulações ho é a eficiência da DMU o em análise; xio e yjo são os inputs e outputs da DMU o. Em (1), vi e uj são os pesos calculados pelo modelo para inputs e outputs, respectivamente. Em (2), λk representa a contribuição da DMU k na formação do alvo da DMU o. A formulação matemática dos demais modelos DEA pode ser vista em Cooper et al. (2006).

(1)

países em desenvolvimento são resumidas por Bravo-Ureta e Pinheiro (1993). Coelli (1995) completa o estudo desses autores e mostra que de 38 artigos encontrados sobre o tema “fronteiras de produção e avaliação de eficiência”, somente três utilizavam DEA até aquela data (FÄRE et al., 1985; RAY, 1985; CHAVAS; ALIBER, 1993). Uma ampla revisão bibliográfica sobre o uso específico de modelos DEA em agricultura pode ser encontrada em Gomes (2008). O uso de modelos DEA para avaliação em agricultura no Brasil pode ser encontrado, entre outros, em Toresan (1998), Pereira et al. (2002), Tupy e Yamagushi (2002), Gomes e Mangabeira (2004) e Gomes et al. (2005a, 2005b, 2009). Para o caso específico de Machadinho d’Oeste, Gomes et al. (2005b) e Valladares et al. (2006) estudaram a relação espacial entre fertilidade do solo e eficiência técnica (medida com modelos DEA) para os dados da pesquisa de campo conduzida em 1999. As medidas de eficiência foram espacializadas e as eficiências e ineficiências foram explicadas a partir de características espaciais, não inseridas no modelo. Modelos DEA e multicritério também foram aplicados aos agricultores de Machadinho d’Oeste, com o objetivo de avaliar o bem-estar social rural (GOMES et al., 2008) e a sustentabilidade da agricultura da região (GOMES et al., 2009).

4. ANÁLISE GEOESTATÍSTICA

(2)

3.1. Uso de modelos DEA em agricultura O uso DEA para medir a eficiência relativa de unidades produtivas tem-se mostrado bastante atrativo em diversos setores de aplicação. O emprego de modelos DEA em agricultura pode vir a apoiar as decisões dos agricultores (e dos órgãos de fomento ou de associações de agricultores), ao indicar as fontes de ineficiência e as unidades que podem servir de referência às práticas adotadas (identificação de benchmarks). Revisões sobre o estado da arte do uso de fronteiras de produção em agricultura podem ser vistas em Battese (1992), que apresenta aplicações de modelos de fronteiras paramétricas. Aplicações de métodos de fronteiras à agricultura de 420

Os dados de eficiência dos quatro anos avaliados (1989, 1996, 1999 e 2002) foram inicialmente analisados pela estatística descritiva exploratória, calculando-se média, variância, coeficiente de variação, valores extremos – mínimos e máximos –, e coeficientes indicativos de distribuição normal de frequências – assimetria e curtose. Com essa análise visou-se a detecção de valores discrepantes e a distribuição de frequência dos dados. Para a análise geoestatística, considerada a hipótese de autocorrelação ou dependência espacial entre os dados georreferenciados, segundo Vieira (2000), foram construídos e ajustados os semivariogramas obtidos pela representação gráfica da semivariância com a distância, conforme equação (3). (3)

Em (3), N(h) é o número de pares de valores Z(xi) e Z(xi + h) separados por um vetor h. Pela equação (3) tem-se que à medida que a distância entre os pares é diminuída em direção a zero, espera-se uma redução da diferença entre os pares.


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

Segundo Druck et al. (2004), o primeiro valor de semivariância calculado, g(h), é denominado “efeito pepita” (Co) e representa a variabilidade em distâncias menores do que aquelas amostradas. A dependência espacial existe quando há aumento da semivariância até determinada distância, denominada “alcance” (a), que é a distância dentro da qual as amostras encontram-se correlacionadas espacialmente. Após o alcance ocorre uma estabilização da semivariância em um valor denominado “patamar” (Co+C1), sendo que após este valor não existe mais dependência espacial entre as amostras. Para o caso dos dados deste artigo, todos os semivariogramas obtidos foram ajustados ao modelo esférico. Segundo Vieira (2000), este é o modelo mais adotado em geoestatística. A interpolação de valores, no campo de estudo, para variáveis dependentes espacialmente foi realizada com o método de “krigagem”, descrito por Vieira (2000). Esta é uma técnica adotada na geoestatística para estimativa de valores de propriedades em locais ainda não avaliados. Para o seu uso adequado é necessário que haja a dependência espacial definida pelo semivariograma. Segundo Druck et al. (2004), a krigagem é um processo para estimativa de valores de propriedades espacialmente distribuídas, a partir de valores adjacentes interdependentes, onde o procedimento é semelhante ao de interpolação por média móvel ponderada. Nesta abordagem, os pesos são determinados pela análise espacial baseada no semivariograma experimental, fornecendo em média estimativas não tendenciosas e com variância mínima. Para as análises de estatística descritiva e semivariograma foram utilizados os programas desenvolvidos por Vieira et al. (2002). A interpolação de dados por krigagem ordinária e a espacialização em mapas de isolinhas foram elaboradas no programa ArcMap 8.3 (ESRI, 2002).

par input-output do modelo. Deve-se observar ainda que a seleção de variáveis representa uma escolha que determina o que o modelo irá medir. Para este caso de avaliação do desempenho no uso da terra foram selecionadas quatro variáveis coletadas no questionário de campo em Machadinho d’Oeste. Essas variáveis indicam as relações da produtividade da terra (relação produçãoárea), em unidades físicas de medida. O uso de medidas físicas ao invés de monetárias para a produção justifica-se, já que a obtenção de preços confiáveis é difícil para a região e seu uso poderia mascarar a eficiência produtiva com erros de medidas de preços e oscilações de mercado. Além disso, o uso de preços pode mascarar relações de eficiência ou ineficiência, e modelos DEA são particularmente úteis quando os aspectos financeiros não são os mais relevantes ou quando não se deseja levá-los em conta (SOARES DE MELLO et al., 2003). Para uma discussão sobre o uso de séries históricas de preços, ver, por exemplo, Pereira et al. (2002).

A

ausência de relação causal entre pares de inputs e outputs pode ser considerada uma armadilha em modelagem DEA.

5. MODELAGEM A estruturação de um modelo DEA necessita da definição das variáveis a constituir o modelo (inputs e outputs), das unidades a avaliar e do modelo DEA adotado (CCR, BCC, entre outros; orientação a inputs, a outputs etc.). A etapa de seleção das variáveis é de grande importância, pois dela depende a qualidade dos resultados. Um modelo com grande número de variáveis pode acarretar uma avaliação extremamente benevolente, com várias DMUs 100% eficientes. Porém, a seleção não deve levar em conta apenas aspectos quantitativos: devido às características dos modelos DEA, é essencial que haja uma relação causal entre cada

Cabe destacar que, conforme descrito em Coelli et al. (2005), a disponibilidade de dados sobre preços e da imposição de uma hipótese de minimização de custos ou maximização de lucros conduzem ao conceito de eficiência alocativa, em adição às medidas de eficiência técnica. Ainda, a combinação das medidas de eficiência técnica e alocativa leva ao conceito de eficiência econômica. Färe et al. (2004) abordam essas questões com o uso de funções de distância direcionais. De modo a obter resultados mais significativos, ao invés de usar as variáveis totais para cada lote foram selecionadas apenas as culturas mais significativas na região. De acordo com pesquisadores que atuam há mais de 20 anos no local, a única cultura perene de alguma expressão é o café, tanto pelo número de propriedades, quanto pela duração dos cultivos e existência de dados. As demais não são passíveis de análise, já que são culturas que demoram a entrar em produção, as estimativas de colheita são irregulares etc. Para as culturas anuais, as de maior importância são arroz e milho. No geral, as culturas anuais alteram-se bastante em Machadinho, pela oscilação dos preços, do clima e pela opção de serem plantadas intercaladas entres as culturas perenes. Algumas outras culturas são cultivadas na região, como mandioca, feijão, cacau, frutas, hortaliças e seringueira. No 421


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

entanto, a sua importância econômica é pequena (MIRANDA, 2005). A inclusão de algumas dessas culturas como output poderia distorcer os resultados do modelo. No caso extremo de apenas um agricultor produzir uma dessas culturas, ele seria eficiente sem considerar as culturas mais importantes economicamente. A opção aqui feita representa o que a maioria dos lotes produzem em Machadinho d’Oeste: uma cultura de renda, que é o café, e uma ou duas culturas alimentares para autoconsumo e eventual venda de excedentes. A venda de excedentes de produção é feita para os cerealistas locais, já que vender em outros mercados torna-se inviável devido aos altos custos do transporte da mercadoria, em função da distância e das condições inadequadas de tráfego nas estradas. A produção simultânea de diversas culturas mostra-se como uma dificuldade de produção local, em especial pela limitação da mão-de-obra. Uma preocupação que deve estar sempre presente nos modelos DEA é a existência de relação causal entre inputs e outputs. Esta relação causal é uma das bases dos métodos automáticos de seleção de variáveis (ANGULO MEZA et al., 2007; COOK e ZHU, 2007; SENRA et al., 2007; WAGNER e SHIMSHAK, 2007; LINS; MOREIRA, 1999). Da mesma forma, a escolha de variáveis pela opinião de especialistas deve levar em conta esta relação causal. A ausência de relação causal entre pares de inputs e outputs pode ser considerada uma armadilha em modelagem DEA. Ver Dyson et al. (2001) para um estudo sobre armadilhas em DEA. Assim, as variáveis do modelo DEA são área cultivada de milho, de arroz e de café (soma das áreas parciais) como input único, e produção de milho, produção de arroz e produção de café como outputs. Algumas observações devem ser feitas em relação a este modelo. Em primeiro lugar, como DEA permite trabalhar com múltiplos inputs e outputs, pode-se questionar a razão de usar a área total plantada ao invés de cada uma das áreas parciais. O que surge é que se fosse feita essa escolha por variáveis parciais, poderia acontecer de uma propriedade ser eficiente por apresentar a melhor relação entre produção de uma cultura e área plantada de outra, o que seria, evidentemente, um absurdo. Embora a situação extrema aqui relatada possa ser mitigada com técnicas como a adição de restrições aos pesos, a ausência de relação causal entre qualquer par output-input pode causar distorções no modelo (ver, por exemplo, SILVEIRA et al., 2008). Em segundo lugar, é necessário interpretar o que significa uma propriedade ser eficiente. Devido à característica benevolente de DEA é eficiente quem conseguir a melhor relação entre a produção de uma cultura e a área cultivada total (das três culturas consideradas). Ou seja, o modelo 422

permite que propriedades especializadas em uma das culturas sejam eficientes. Entretanto, considera também como eficientes propriedades que consigam um bom arranjo de produção combinada. Tem-se, assim, a vantagem de não penalizar a avaliação dos agricultores em razão das escolhas feitas em relação ao que produzir. Um modelo alternativo, não contemplado neste estudo, seria desagregar a alocação de terras para cada cultura e considerar um índice agregado de produção, semelhante ao usado em Pereira et al. (2002). A desagregação simultânea de outputs e inputs incorreria no já citado problema de falta de relação causal, como mostrado em Gomes et al. (2009). As DMUs do modelo DEA são os produtores rurais amostrados, que foram entrevistados pelas pesquisas de campo em 1989, 1996, 1999 e 2002 (um modelo DEA para cada ano), e que produziram pelo menos uma das três culturas em cada um desses anos. Quanto à escolha do modelo DEA, pesquisas recentes (HOLLINGSWORTH; SMITH, 2003) mostram que o modelo DEA BCC tem relação com a falta de proporcionalidade entre inputs e outputs, e não com retornos de escala. Face a essa questão, preferiu-se optar neste artigo pelo modelo CCR. Como é desejado verificar se a produção justifica a quantidade de recursos empregados, foi usada orientação a inputs.

6. RESULTADOS 6.1 Medidas de eficiência Para a avaliação da produtividade da terra com emprego de modelos DEA, consideraram-se todos os agricultores que produziram pelo menos uma das culturas (arroz, milho ou café) em cada um dos quatro anos avaliados. O número total de agricultores (DMUs) em cada modelo DEA foi de 341, 299, 319 e 188 para 1989, 1996, 1999 e 2002, respectivamente. A Tabela 1 traz um resumo das características de cada conjunto de dados em cada ano. Nessa tabela, frequência relativa refere-se, em cada ano, à relação entre o número de agricultores que produziram determinada cultura e o número total de agricultores (que produziram pelo menos uma das culturas). Nota-se o aumento da importância da cultura agroindustrial do café, produzido quase em sua totalidade sem uso de insumos, e a redução das culturas alimentares na região. Conforme destacado em Mangabeira et al. (2005), o café, junto com a pecuária, é a principal fonte de renda dessas famílias. As culturas alimentares limitam-se ao autoconsumo e, em geral, não geram excedente significativo para comercialização. No caso do milho, este é também usado como ração para os animais. Esses fatos justificariam a ex-


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

pansão do café e a contração sofrida pelas culturas anuais, que diminuem de importância agronômica e financeira em Machadinho d’Oeste. Na Tabela 2 encontram-se as medidas de eficiência dos modelos DEA, calculadas com o software SIAD (ANGULO MEZA et al., 2005). As colunas A a G indicam as combinações de culturas praticadas. Nessa tabela, frequência relativa refere-se, em cada ano, à relação entre o número de agricultores que produziram determinada cultura e o número total de agricultores. Para o ano de 1989 na Tabela 2, por exemplo, ao analisarem-se somente os lotes com produção de arroz, estes representavam 24,9% do total (85 em 341 lotes). Para esses, a eficiência no uso da terra foi, em média, de 20,4%, sendo que um dos 85 produtores foi considerado DEA CCR eficiente. Deve-se ressaltar que a frequência relativa está relacionada apenas ao número de propriedades e não ao seu tamanho. Assim, não cabem quaisquer considerações sobre escala de operação das unidades e das culturas. Verifica-se, no geral, que a eficiência média em Machadinho d’Oeste, ao considerar produção e área, é baixa. Entretanto, deve ser ressaltado que isto não significa necessariamente uma baixa produtividade dos agricultores da região, assim como alta produtividade não significaria o contrário. Os agricultores foram comparados apenas em relação a eles próprios e, portanto, a baixa eficiência média significa apenas uma grande falta de homogeneidade nas produtividades ou, devido às características de busca pela excelência de DEA, a existência de uma propriedade ou de um pequeno número delas muito produtivas. Em termos relativos, o café foi, dentre as três culturas, Tabela 1: Características dos grupos analisados, segundo o ano de estudo e o tipo de cultura. 1989

1996

1999

2002

Arroz

Café

Milho

Freq. relativa (%)

88,6

38,4

59,2

Área média (ha)

4,1

5,2

2,6

Produção média (kg)

4.055,7

9.445,3

2.631,2

Freq. relativa (%)

65,2

78,9

55,2

Área média (ha)

2,8

7,1

2,8

Produção média (kg)

2.080,0

4.384,9

6.145,0

Freq. relativa (%)

53,3

90,3

46,4

Área média (ha)

2,5

6,4

2,3

Produção média (kg)

2.280,6

1.830,8

2.365,5

Freq. relativa (%)

38,8

94,7

37,2

Área média (ha)

2,2

7,2

2,1

Produção média (kg)

1.874,5

5.177,1

2.055,1

a que mais cresceu na região, em relação ao percentual de agricultores que o cultivam. Conforme anteriormente destacado, isto se deve à sua importância econômica para a região. Adicionalmente, a maioria dos produtores é proveniente de regiões produtoras de café e levaram o conhecimento dessa prática agrícola para Machadinho d’Oeste. Entretanto, a eficiência daqueles que cultivam café (seja somente o café ou com arroz e/ou milho) é menor quando comparada com a eficiência obtida pelos agricultores que produzem arroz e/ ou milho. Essa situação poderia ser alterada pelo crédito para investimentos, que seria relevante para melhorar determinados sistemas e estruturas de produção, frente a atividades de maior impacto. Por exemplo, conforme destacado em Mangabeira et al. (2005), o fortalecimento das culturas perenes e dos sistemas agroflorestais passa pela construção de terreiros suspensos (o que melhoraria a secagem e a qualidade do café), tulhas, entre outros. Outra questão que pode melhorar a eficiência daqueles que produzem café é a prática de sombreamento com árvores nativas, pela qual o solo fica quase ou totalmente recoberto pela vegetação, protegido das chuvas e da incidência direta dos raios solares. Em 2002, cerca de 30% dos produtores já sombreavam o café e essa prática tem provado ter influência sobre o aumento da produtividade (pela uniformidade de produção entre os anos, já que diminui o efeito bianual de safras altas e baixas), sobre a diminuição de pragas e doenças e sobre a restauração/manutenção de alguns nutrientes nos solos (MANGABEIRA et al., 2005). Para a cultura do arroz em 1989, 1996, 1999 e 2002, a de milho em 2002 e a de café em 1996, 1999 e 2002 foram encontrados produtores DEA CCR eficientes. Estes foram aqueles que obtiveram a melhor relação entre a produção de arroz, milho ou café e a área cultivada dessas culturas (já que eram as únicas, dentre as três, que produziam). Estes produtores podem servir de referência para seus pares ou para órgãos de assistência técnica, na identificação e caracterização de práticas de bom uso da terra. A cultura do milho não é eficiente quando não produzida junto com as culturas do arroz e/ou café. Apenas um agricultor desse tipo consegue eficiência e, mesmo assim, só em 2002. Ela mostra-se mais eficiente quando associada com a cultura do arroz. Em relação aos resultados do modelo dos multiplicadores nota-se que a distribuição de pesos zero foi maior para a produção de café somente em 1989 (62% das DMUs). Nessa época, a produção de café era incipiente na região, ou seja, as mudas que haviam sido plantadas nos anos anteriores estavam em início de produção. Ressalta-se que, em 2002, as plantas de café tinham em média oito anos (MANGABEIRA et al., 2005). Nos demais anos, em média 12% das DMUs atri423


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

buíram peso zero a essa cultura. Em contrapartida, a cultura do arroz teve, em 1989, 14% de pesos zero; nos demais anos esse percentual atingiu a média de 50%. A cultura do milho apresentou uma média de 55% de pesos zero nos quatro anos. Isto se deve à própria estrutura do modelo, já que, na maior parte dos casos, o modelo atribuiu peso zero àquela cultura que não foi produzida naquele ano. Deve-se ressaltar que esses foram apenas os primeiros pesos encontrados pelo software de DEA usado. Não foram examinados todos

O

de eficiência em variação da tecnologia e variação de cada DMU. Já as janelas de tempo são usadas quando se deseja medir apenas a variação de eficiência de cada DMU, sem considerar as variações de tecnologia. Asmild et al. (2004) propuseram a combinação destas duas técnicas de avaliação temporal em DEA. Dada a pouca introdução de novas tecnologias de produção ao longo do tempo em Machadinho d’Oeste, neste artigo foi feita uma adaptação do modelo de janelas de tempo. Aqui foi considerado que cada ano corresponde a uma janela. Assim, um mesmo produtor em dois anos diferentes é tratado como uma DMU diferente, em abordagem idêntica à de Soares de Mello et al. (2003), Rios e Maçada (2006) e Gomes et al. (2009). Esta mesma técnica pode ser usada quando é necessário aumentar o número de DMUs na análise, conforme Podinovski e Thanassoulis (2007). Ressalte-se que este não é o caso no estudo aqui em apreço. Os resultados desse modelo são apresentados na Tabela 3. Verifica-se que a melhor eficiência é obtida pela combinação de produção de arroz e milho. Entre os que optam pela monocultura, destaca-se a baixa eficiência dos produtores de café. Em qualquer combinação com a cultura de café a eficiência é baixa, mas maior que a da monocultura de café. Note-se que, apesar de a eficiência média dos produtores de café ser baixa, em cada ano há DMUs produtoras de café eficientes, como observado na Tabela 2. Evidentemente, es-

s semivariogramas de 1989, 1999 e 2002 mostraram a existência de dependência espacial.

os possíveis ótimos alternativos (ROSEN et al., 1998) nem usada nenhuma técnica de escolha de um dos possíveis pesos (COOPER et al., 2007; SOARES DE MELLO et al., 2002, 2004). Para evitar pesos nulos poderiam ser usados modelos não arquimedeanos (COOPER et al., 2006). No entanto, o efeito do resultado desses modelos nos valores das medidas de eficiência seria infinitesimal. 6.2 Evolução temporal Para avaliar as tendências de variação das medidas de eficiência ao longo do tempo existem duas técnicas principais: o índice de Malmquist (FÄRE et al., 1994) e as janelas de tempo (TULKENS; VANDEN EECKAUT, 1995). O índice de Malmquist é usado quando se deseja decompor a avaliação

Tabela 2: Resultados do modelo DEA.

1989

1996

1999

2002

424

A

B

C

D

E

F

G

Arroz

Arroz e Café

Arroz e Milho

Arroz, Café e Milho

Café

Milho

Café e Milho

Global

Efic. média (%)

20,4

18,5

21,9

21,9

21,6

20,2

29,0

21,3

Freq. relativa (%)

24,9

9,4

33,7

20,5

6,5

2,9

2,1

100,0

DMUs eficientes

1

1

-

1

-

-

-

3

Efic. média (%)

41,3

33,2

41,9

28,2

21,9

38,0

31,9

30,4

Freq. relativa (%)

6,4

14,4

11,0

33,4

24,1

3,7

7,0

100,0

DMUs eficientes

1

-

2

-

1

-

-

4

Efic. média (%)

54,2

30,8

62,6

32,6

16,2

25,2

42,6

28,2

Freq. relativa (%)

5,0

15,7

3,1

29,5

32,9

1,6

12,2

100,0

DMUs eficientes

1

-

1

-

1

-

-

3

Efic. média (%)

53,6

22,7

77,2

35,6

14,3

53,9

30,8

24,4

Freq. relativa (%)

2,1

9,0

1,6

26,1

51,6

1,6

8,0

100,0

DMUs eficientes

1

-

1

1

1

1

-

5


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

tes agricultores podem servir de benchmark para os demais produtores de café. Por outro lado, o quantitativo de agricultores que produzem café isoladamente ou em conjunto com outras culturas tem aumentado ao longo do tempo. Há duas possíveis explicações para esta aparente contradição (redução de eficiência X aumento do número de produtores). A primeira é que os agricultores da região estão mal orientados em relação aos seus cultivos. A segunda está relacionada com o fato de o modelo DEA aqui usado levar em conta apenas a eficiência no uso da terra. Variáveis ligadas a preços e mercados de forma geral não foram aqui consideradas. Assim, a cultura do café, embora não eficiente, pode ser atrativa financeiramente, visto que esta é a principal cultura de renda da região. São necessários estudos adicionais para confirmar ou não estas hipóteses, os quais estão fora da proposta deste artigo. Na Tabela 4 apresentam-se as frequências relativas referentes às faixas de eficiência. Nesta tabela os valores referem-se ao percentual de produtores que tiveram valor de eficiência em certa faixa, categorizados por seus arranjos produtivos. É ainda mostrado o número total de agricultores em cada arranjo produtivo (linha “Frequência absoluta total”). Os resultados desta tabela mostram que há um grande número de produtores ineficientes, independentemente do arranjo produtivo de cada um. A Tabela 5 mostra a evolução das três DMUs que foram eficientes no modelo de avaliação temporal. A propriedade A, eficiente em 1989, trocou de proprietário entre 1989 e 1996 e não teve mais sua eficiência calculada pelo modelo aqui usado, por passar a dedicar-se a outros tipos de exploração da terra. O agricultor B tem sua eficiência decrescente a partir de 1996. Entre 1989 e 1996 houve mudança de proprietário e de política produtiva neste lote, com a crescente dedicação à cultura do café. A eficiência decrescente neste caso está de acordo

com os valores médios observados em parágrafos anteriores. Já o lote C teve sempre o mesmo proprietário e sempre produziu café. Tem eficiência crescente, desde que não se considere o ano de 1996, para o qual não há dados declarados. Este é um benchmark para os produtores de café e suas práticas devem ser melhor estudadas em futuros trabalhos de campo. A verificação de quais fatores influenciam na eficiência requer um trabalho de campo que levante dados sobre variáveis agrícolas e sociais, não inclusas nos questionários aqui usados. Tal fato impossibilita aqui este tipo de análise. Um estudo deste tipo usando testes não paramétricos para um modelo diferente e variáveis contextuais de caráter social foi desenvolvido por Gomes et al. (2009). Naquele caso uma das variáveis explicativas mais importantes era a regularização da posse da terra.

N

os dois últimos anos avaliados (1999 e 2002) houve maior uniformização em termos da eficiência produtiva dos lotes. 6.3 Variabilidade espacial das medidas de eficiência Para a análise de variabilidade espacial, as medidas de eficiência foram inicialmente analisadas pela estatística descritiva exploratória, com o cálculo de média, variância, coeficiente de variação, valores extremos (mínimos e máximos) e coeficientes indicativos de distribuição de frequências (simetria e curtose). Com essa análise detectaram-se valores discrepantes da distribuição de frequência dos dados (mínimo 0,005 e máximo 1,000), conforme Tabela 6, apresentando valores de simetria e curtose diferentes de zero. Isto indica distribuição de frequência log normal. Neste caso, o valor de tendência central média difere da moda e da mediana, o que pode interferir na análise de dependência espacial estruturada no semivariograma. Os altos valores encontrados para o coeficiente de variação reforçam ainda mais esta

Tabela 3: Eficiência média (%) com modelo temporal. Arroz

Arroz e Café

Arroz e Milho

Arroz, Café e Milho

Café

Milho

Café e Milho

1989

20,4

13,9

21,9

17,6

10,1

20,4

15,8

1996

15,5

13,7

23,7

15,0

10,0

19,5

15,5

1999

17,6

10,2

26,1

12,2

5,5

17,5

9,5

2002

16,1

15,6

24,5

17,6

14,3

13,3

15,5

Média

17,4

13,4

24,1

15.6

10,0

17,7

14,1

425


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

discrepância e anormalidade entre os dados. Os semivariogramas de 1989, 1999 e 2002 mostraram a existência de dependência espacial, ou seja, um crescimento da semivariância em função da distância (Figura 1a, 1d e 1e, respectivamente), iniciado em Co (efeito pepita) até um certo alcance (a), atingindo o patamar (Co+C1), conforme

descrito em Vieira (2000) e Druck et al. (2004), sem a necessidade prévia de transformação. A eficiência de 1996 inicialmente não mostrou dependência espacial, ou seja, ocorreu efeito pepita puro, o que indica aleatoriedade entre os dados, não permitindo o ajuste do semivariograma a uma função. Estes dados são mostrados

Tabela 4: Frequências relativas (%) por arranjo produtivo e faixa de eficiência no modelo temporal. Ano

Faixa de eficiência

Arroz

Arroz e Café

Arroz e Milho

Arroz, Café e Milho

Café

Milho

Café e Milho

1989

0-25%

74,1

90,6

61,7

80,0

90,9

80,0

85,7

25%-50%

22,3

6,3

38,3

18,6

9,1

0,0

14,3

50%-75%

2,4

3,1

0,0

1,4

0,0

10,0

0,0

1996

1999

2002

75%-100%

1,2

0,0

0,0

0,0

0,0

10,0

0,0

Frequência absoluta total

85

32

115

70

22

10

7

0-25%

94,7

90,7

75,8

91,0

97,2

81,8

90,5

25%-50%

5,3

9,3

18,2

8,0

2,8

18,2

9,5

50%-75%

0,0

0,0

3,0

1,0

0,0

0,0

0,0

75%-100%

0,0

0,0

3,0

0,0

0,0

0,0

0,0

Frequência absoluta total

19

43

33

100

72

11

21

0-25%

87,5

98,0

70,0

95,7

98,1

100,0

97,4

25%-50%

12,5

2,0

30,0

4,3

1,9

0,0

2,6

50%-75%

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

75%-100%

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

0,0

Frequência absoluta total

16

50

10

94

105

5

39

0-25%

75,0

100,0

100,0

91,8

87,6

100,0

86,7

25%-50%

25,0

0,0

0,0

6,2

8,3

0,0

13,3

50%-75%

0,0

0,0

0,0

0,0

3,1

0,0

0,0

75%-100%

0,0

0,0

0,0

2,0

1,0

0,0

0,0

Frequência absoluta total

4

17

3

49

97

3

15

Tabela 5: DMUs eficientes no modelo de avaliação temporal.

426

A

B

C

1989

Eficiência (%)

100,0

100,0

20,7

Culturas

Arroz

Milho

Arroz, Café e Milho

1996

Eficiência (%)

-

23,6

-

Culturas

Extrativismo

Arroz, Café e Milho

Não declarado

1999

Eficiência (%)

-

2,9

27,6

Culturas

Extrativismo

Arroz e Café

Arroz, Café e Milho

2002

Eficiência (%)

-

6,8

100,0

Culturas

Extrativismo

Café

Café


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

Tabela 6: Parâmetros estatísticos das medidas de eficiência. 1989

1996

1999

2002

N.º de pontos

338

286

311

185

Média

0,213

0,299

0,295

0,245

V

0,024

0,033

0,045

0,046

DP

0,154

0,181

0,212

0,215

CV (%)

72,25

60,58

74,23

87,54

Min

0,008

0,030

0,011

0,005

Max

1,000

1,000

1,000

1,000

Simetria

2,167

1,314

1,162

1,671

Curtose

7,934

2,593

1,177

3,041

na Figura 1b, sem curva de ajuste. Isto pode ter ocorrido também devido a valores extremos estarem localizados a pequenas distâncias e à ocorrência de anormalidade na distribuição de frequência dos dados. Utilizando a transformação logaritmo nos dados de 1996, foi possível o ajuste esférico ao semivariograma, conforme Figura 1c. Após a verificação da existência de dependência espacial através do ajuste do semivariograma foi realizada a interpolação de dados nos locais não amostrados pelo método da krigagem e a espacialização, resultando nos mapas de isolinhas, conforme Figura 2. Ao analisar os dois primeiros anos, 1989 e 1996, comparativamente (Figuras 2a e 2b), a espacialização mostra-se

Figura 1: Semivariogramas ajustados pelo modelo esférico.

427


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

praticamente contrária, pois os lotes mais eficientes no primeiro momento são os menos eficientes no segundo momento avaliado. Isto tanto pode ser devido ao emprego de técnicas para a melhoria do sistema produtivo, quanto ao aumento de área plantada adotada pelos produtores mais eficientes de 1996, localizados principalmente na parte superior da área.

Na parte superior, ao norte da área, segundo levantamento de solos feito por Valladares et al. (2003), ocorre predominância de solos em relevo plano e suave ondulado, refletindo na localização de maior eficiência produtiva em 1996. Contudo, de acordo com Gomes et al. (2007), ao norte da área ocorreu predominância de solos com baixa fertilidade, principalmente quanto à soma de bases e à saturação

Figura 2: Mapas de isolinhas das medidas de eficiência para os anos de 1989 (a), 1996 (b), 1999 (c) e 2002 (d).

428


Gomes, E. G.; Grego, C. R.; de Mello, J. C. C. B. S.; Valladares, G. S.; Mangabeira, J. A. C.; de Miranda, E. E. Dependência espacial da eficiência do uso da terra em assentamento rural na Amazônia. Produção, v. 19, n. 2, p. 417-432, 2009

por bases, o que pode ter levado à não permanência de alta eficiência nestes mesmos lotes ao longo dos anos que se seguem (1999 e 2002). Nos dois últimos anos avaliados (Figuras 2c e 2d) observa-se maior uniformização em termos dos produtores mais eficientes, que deixaram de se concentrar na parte superior, diluindo-se por toda área, com sutil aglomeração central. Adicionalmente, as manchas de dependência espacial foram reduzidas, mostrando um encaminhamento para uniformização da eficiência produtiva dos lotes por toda área de estudo.

7. CONCLUSÕES Os resultados mostram as diferenças de eficiência nos sistemas de produção agrícola praticados em Machadinho d’Oeste, nos diferentes anos de produção. Isto corrobora com o sentimento de que esses agricultores familiares, por falta de opção, financiamento, pouca assistência técnica e pesquisas apropriadas, estão “sozinhos” para produzir. Por outro lado, estes resultados podem direcionar os produtores menos eficientes, pela observação dos eficientes, na busca pela melhoria de seus sistemas de produção. Podem ainda servir de base para que pesquisadores e extencionistas locais apoiem o desenvolvimento desses produtores rurais de desempenho não satisfatório. Como verificado no estudo, há um grande número de agricultores com baixa eficiência, o que sugere a necessidade de aprimoramento e intensificação da assistência técnica. A forte oscilação das medidas de eficiência pode ter várias razões, das quais três são aqui aventadas. A primeira pode ser devida à mudança de proprietário do lote, já que agri-

cultores diferentes têm “racionalidades agrícolas” diferentes, e decisões de produção equivocadas podem influenciar o desempenho. A segunda é por motivos agronômicos, em relação ao uso da terra. A produção em Machadinho d’Oeste é feita praticamente sem o uso de insumos externos. Quando as plantas do café ficam velhas e sem um manejo adequado de adubação verde (ou orgânica) ou reposição de outros nutrientes, o solo perde fertilidade ao longo do tempo, com consequente redução do desempenho produtivo. Para as culturas do arroz e do milho, quando plantadas sem consórcio (não no meio do café ou de outras culturas perenes), o manejo da capoeira pela queima e o tempo de pousio (ou descanso da terra) podem influenciar no desempenho futuro. Se este tempo de pousio for pequeno e as queimadas da capoeira forem frequentes, ocorrerá perda de fertilidade do solo, o que acarreta baixa produtividade da terra. A terceira hipótese é ligada a fatores educacionais e ambientais: um alto desempenho em um ano pode produzir um relativo bem-estar e menos empenho no ano seguinte. Houve dependência espacial para a eficiência produtiva nos quatro anos avaliados. O resultado da espacialização de 1989 foi contrário ao de 1996, pois lotes menos eficientes localizados na parte superior da área no primeiro momento foram os mais eficientes em 1996. A adoção de técnicas para a melhoria do sistema produtivo e o aumento de área plantada podem ter contribuído para este resultado. Nos dois últimos anos avaliados (1999 e 2002) houve maior uniformização em termos da eficiência produtiva dos lotes por toda área de estudo. A parte superior deixou de ser a mais eficiente, concentrando-se na parte central da área.

Artigo recebido em 12/02/2007 Aprovado para publicação em 26/03/2009

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AGRADECIMENTOS Ao CNPq, pelo apoio financeiro. À Embrapa Monitoramento por Satélite, pelo uso dos dados.

SOBRE OS AUTORES Eliane Gonçalves Gomes Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) – SGE End.: Parque Estação Biológica (PqEB), Av. W3 Norte final – Asa Norte – Brasília – DF – 70770-901 Tel.: (61) 3448-4476 Fax: (61) 3347-4480 E-mail: eliane.gomes@embrapa.br Célia Regina Grego Embrapa Monitoramento por Satélite End.: Av. Soldado Passarinho, 303 – Fazenda Chapadão – Campinas – SP – 13070-115 – Brasil E-mail: crgrego@cnpm.embrapa.br João Carlos Correia Baptista Soares de Mello Universidade Federal Fluminense – Departamento de Engenharia de Produção End.: Rua Passo da Pátria, 156 – São Domingos – Niterói – RJ – 24210-240 E-mail: jcsmello@pesquisador.cnpq.br Gustavo Souza Valladares Universidade Federal do Ceará – Centro de Ciências Agrárias – Departamento de Ciências do Solo End.: Av. Mister Hull, 2977, Campus do Pici, Bloco 807 – CP 12.168 – Fortaleza – CE – 60021-970 E-mail: valladares@ufc.br João Alfredo de Carvalho Mangabeira Embrapa Monitoramento por Satélite End.: Av. Soldado Passarinho, 303 – Fazenda Chapadão – Campinas – SP – 13070-115 – Brasil E-mail: manga@cnpm.embrapa.br Evaristo Eduardo de Miranda Embrapa Monitoramento por Satélite End.: Av. Soldado Passarinho, 303 – Fazenda Chapadão – Campinas – SP – 13070-115 – Brasil E-mail: mir@cnpm.embrapa.br

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SOBRE A ABEPRO

A ABEPRO – Associação Brasileira de Engenharia de Produção - é uma instituição que congrega docentes, discentes e profissionais de Engenharia de Produção no Brasil. Há mais de 20 anos a ABEPRO vem exercendo as funções de esclarecer o papel do Engenheiro de Produção na sociedade e em seu mercado de atuação, ser interlocutora junto às instituições governamentais relacionadas à organização e avaliação de cursos (MEC e INEP) e de fomento (CAPES, CNPq, FINEP e FAPs), assim como em organizações privadas, junto ao CREA, CONFEA, SBPC, ABENGE e outras organizações não governamentais que tratam da pesquisa, do ensino e da extensão da engenharia de produção no Brasil.

OBJETIVOS DA ABEPRO

Sempre atuando na área de Engenharia de Produção, a ABEPRO tem entre os seus principais objetivos: • incentivo à pesquisa e realização de estudos; • promoção de eventos para difusão de conhecimentos; • realização de publicações; • promoção de intercâmbio entre pessoas, empresas, organizações e instituições; • assessoria a órgãos governamentais e privados; • contatos e parcerias com entidades do setor produtivo e da sociedade; • análise e apreciação de matérias que se relacionem, direta ou indiretamente, com a pesquisa e o exercício profissional; • incentivo à discussão da formação em Engenharia de Produção; • contatos com entidades congêneres no país e no exterior; • organização de critérios e realização de avaliações e certificações sinalizadoras da qualidade em cursos de Engenharia de Produção; • atuação junto aos órgãos oficiais vinculados ao ensino, pesquisa e extensão; • atuação junto aos órgãos oficiais de regulamentação e fiscalização profissional; • concessão de bolsas de pesquisa para dar suporte às atividades previstas neste artigo; • assessorar órgãos do governo e entidades normalizadoras na elaboração de programas, projetos e normas que visem a ordenação, desenvolvimento, difusão e aplicação da Engenharia de Produção. • quaisquer outras atividades que contribuam para a consecução do seu objetivo.

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• • • • •

Gestão da Produção Gestão da Qualidade Gestão Econômica Ergonomia e Segurança do Trabalho Gestão do Produto

• • • • •

Pesquisa Operacional Gestão Estratégica e Organizacional Gestão de Conhecimento Organizacional Gestão Ambiental Educação em Engenharia de Produção

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Processo de avaliação Os artigos enviados para publicação serão avaliados preliminarmente pela editora, que examina a adequação do trabalho à linha editorial da Revista Produção. Posteriormente, os artigos são encaminhados para apreciação sigilosa por pares (double blind peer-review). Os autores serão comunicados dos passos do processo por e-mail. A partir da aprovação final, o artigo será considerado pela editoria para publicação de acordo com a programação das edições da Revista Produção.

Procedimentos para a submissão O procedimento de submissão de artigos deve seguir os seguintes passos: 1. Acessar o site www.revistaproducao.net, na parte superior da página, logo acima da imagem, clicar em CADASTRAR-SE. Preencher o formulário de cadastro, completando todos os campos, sem exceção, com as informações solicitadas. Clicar em SAlvAR; 2. A página de confirmação de cadastro será aberta automaticamente. Na parte superior da página, logo acima da imagem, completar os campos lOGiN (e-mail) e SENhA com os dados cadastrados previamente e clicar em ENTER; 3. A partir desse ponto, o usuário está acessando uma área restrita, a que somente o mesmo tem acesso, e que poderá ser constantemente visitada. A página de boas-vindas à área restrita será aberta automaticamente. Clicar em SuBmiSSãO DE ARTiGO e em ENviAR ARTiGO;

4. A página de submissão de artigos, contendo o formulário de submissão, será aberta automaticamente. Preencher o formulário de submissão, completando todos os campos, sem exceção, com as informações solicitadas. É imPRESCiNDívEl indicar cinco frases para serem destacadas na versão final impressa do artigo. Clicar em ENviAR. A página de confirmação de artigos enviados será aberta automaticamente. Fim da submissão de artigo. 5. Dúvidas podem ser encaminhadas para os e-mails: editoria@revistaproducao.net ou secretaria@revistaproducao.net ou para Revista Produção a/c Karen Cristina da Silva ou Paula madeira – Secretárias • Av. Prof. Almeida Prado, Trav. 2, 128 – sala 231 – São Paulo – SP – CEP 05508-900 • Fone: (11) 3091-5363, R. 400 • Fax: (11) 3091-5399 6. Dúvidas quanto à política editorial podem ser encaminhadas para os mesmos e-mails: editoria@revistaproducao.net ou secretaria@revistaproducao.net

Versão online da Revista Produção A versão online da Revista Produção está disponível gratuitamente no Scielo: http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_serial&pid=01036513&lng=pt&nrm=iso

Assinatura da Revista Produção Para maiores informações sobre assinatura da Revista Produção entre em contato pelo e-mail: secretaria@abepro.org.br ou pelo telefone: 55 (21) 2533-4897 / 7165.


Uma Publicação da Associação Brasileira de Engenharia de Produção


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