Comportamento e Psicologia

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simples e atual

Comporteamento Psicologia Ano XIII nº 109 / Fevereiro / 2016 Diretor Responsável: Valdir Carleto

Geração dos prazeres Opiniões, hábitos, expectativas e desejos dos jovens da atualidade GENTE Wilson Lourenço Jr. e Débora Gibertoni BEM VIVER Gordura pode ser boa e água pode ter sabor


[ COMPORTAMENTO

ENJOY Por Cris Marques Fotos Banco de imagens

Autossabotagem:

convivendo com um inimigo íntimo

P

ensar em autossabotagem pode parecer algo muito estranho; afinal, não é lá muito lógico que uma pessoa queira seu próprio mal, correto? E é exatamente aí que está o problema: esse ato não é uma escolha, e sim uma tendência inconsciente de criar e repetir atitudes consideradas destrutivas para si mesmo. Um distúrbio emocional e/ou de personalidade muito mais comum do que se imagina. Sabe quando você acorda atrasado, meio sem querer, justamente no dia em que tem aquele compromisso importante? Ou que acorda rouco no dia de uma apresentação da faculdade? Pois bem, é aí que está a sua sabotagem. José Francisco Pires Geraldes, psicólogo e psicoterapeuta, explica que esse tipo de comportamento normalmente tem relação direta com o que cada um almeja para seu futuro ou acredita merecer, além de se apresentar como uma repetição de referências obtidas, comumente na infância e adolescência,

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por quem representa uma autoridade maior (pais ou tutores) ou teve extrema importância em seu crescimento (tios, padrinhos, amigos). “Essas informações ficam praticamente inquestionáveis e são internalizadas como verdades absolutas”. Por isso, não é coincidência que suas formas mais comuns sejam referentes a relacionamentos emocionais e empregos, promoções ou ganhos financeiros. O psicoterapeuta conta que atendeu um senhor que costumava levar sua família sempre à mesma praia, durante as férias. Por causa dos protestos da esposa e filhos, ele resolveu fechar um pacote turístico para um destino diferente. No dia anterior à viagem, ele adoeceu e o passeio se tornou inviável, frustrando toda a família. “É muito difícil substituir conceitos, valores e opiniões que nos nortearam a vida inteira, e quando tentamos, vem a autossabotagem que nos impede e nos lança novamente ao circulo de repetições a que estamos habituados”.


ENJOY

Sabotando seu “eu sabotador”

O perfil de um autossabotador De acordo com a psicóloga clínica Analú Brito Silva, a autossabotagem sempre está associada a outros distúrbios emocionais como ansiedade, inferioridade ou baixa autoestima, o que dificulta na hipótese diagnóstica. Mesmo assim, ela possui particularidades únicas. “Uma pessoa negativa é identificada por achar que tudo o que faz ou fazem por ela não vai dar certo. Quem sofre de autoestima baixa tem uma percepção errada de si mesma. Já a sabotagem aparece para fazer com que os planos nunca deem certo e seja possível continuar na zona de conforto”. Esse tipo de comportamento ocorre como um mecanismo psicológico de defesa, quando o consciente quer uma coisa e o inconsciente quer outra. E pode se revelar durante todas as etapas da vida. Dessa forma, a própria pessoa age como um inimigo íntimo, potencializando medos e ansiedades a fim de criar dificuldades, bloqueando vários setores da vida. “Em 1916, Freud escreveu um artigo de grande repercussão intitulado: ‘Os que Fracassam ao Triunfar’. Na época, ele já falava de pessoas que tinham medo de ter satisfação e, por isso, sentiam-se aliviadas quando o que estavam fazendo dava errado”, acrescenta a psicóloga. O autossabotador normalmente faz as coisas por fazer, não termina o que começou, vive iniciando novos projetos e, quando planeja algo, não atinge os objetivos que traçou. Ele cria uma barreira dentro de si mesmo ao se deparar com situações novas, que despertam certo medo, insegurança ou ansiedade. “Quando pisamos num terreno novo, sempre nos sentimos inseguros e perdidos e tendemos a retornar ao terreno anterior que, apesar de esburacado e instável, é conhecido”, explica José Francisco. Essa atitude é natural, mas aí é que está a diferença entre sabotadores e não sabotadores: não se deixar retroceder ou estacionar.

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Olhar para si mesmo e identificar o que está ou não está fazendo bem nãoétarefadasmaisfáceis.Maiscomplicadoaindaédescartarconceitos eprincípiosenraizadosequeagoraprecisamsersubstituídosporoutros mais atuais e úteis. Entretanto, difícil não é impossível! Normalmente, a autossabotagem é identificada quando leva a pessoa a um prejuízo visível, tangível, palpável, seja ele social, emocional ou financeiro. Esse é o primeiro passo: a conscientização, perceber que essa sabotagem não precisa continuar. Conscientedoproblema,agoraéhoradeescolhercomolidarcomele. Comtreinamento,umaboadosedepositividadeereprogramaçãomental, é possível substituir estes velhos julgamentos rumo ao autoconhecimento e se libertar de antigos tabus e pré-conceitos. Esqueça velhas desculpascomo:“Dinheironãotrazfelicidade”,“Quantomaisalto,maior o tombo”,“Não tenho tempo”,“Não tenho dinheiro”,“Sabe que eu sinto medo de melhorar”,“Só não fui hoje porque estava chovendo”,“Cheguei atrasado por causa do trânsito” ou“Na segunda, eu começo a dieta”. Por mais que sejam clichês, as máximas “Vai. E se der medo, vai com medo mesmo” ou “Um passo de cada vez” cabem perfeitamente aqui. Caso a situação seja mais complexa, o ideal é procurar a ajuda de um profissional.“Aimportânciadapsicoterapiaestánasegurançaqueopacientesenteaosaberquenãoestásozinhonessacaminhada,nosuporte para o enfrentamento de seus medos e das diversas situações que irão apresentar-se”,orientaopsicoterapeuta.Outrasopçõessãoapsicanálise, para refazer aprendizados do passado, ou terapia cognitiva comportamental, que ensina estratégias para superar esses comportamentos.

Para mudar já Amanhã Planejamento Imaginação Eu quero Não posso Não dá Talvez Estacionar Seguir a correnteza Zona de conforto

Hoje Tentativa Ação Eu posso Vou tentar Pode ser Com certeza Estar em movimento Remar Novas oportunidades


[ COMPORTAMENTO ]

ENJOY Por Cris Marques

Chega de ser

Fotos Banco de imagens

sua própria vítima

V

ocê já sentiu que o mundo estava sendo injusto com você? Que a vida ao redor era melhor e que só você não conseguia evoluir? Que estava sendo prejudicado, de alguma forma, pela “felicidade alheia”? Se a resposta para uma ou mais perguntas acima foi sim, então cuidado: você pode estar se tornando sua própria vítima. De acordo com a psicóloga clínica Analú Brito (www. facebook.com/psicologaanalubrito), o vitimismo – neologismo para o ato de se vitimizar – é uma patologia psicológica caracterizada pela presença da autopiedade. Ela também pode acarretar outros sintomas e doenças mais graves como, por exemplo, a depressão. Ainda segundo a profissional, o quadro pode ter diversas causas, entre elas a necessidade de chamar atenção. “Quem é protagonista desse ‘coitadismo’ fica na inércia, estagnado, não consegue fazer mudanças na própria vida, acreditando não ter capacidade para mudar. Acaba dependendo dos outros. Elas fazem isso para atrair atenção e cuidados, assumindo uma postura de dependência emocional e psíquica extremamente nociva”, explica.

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*Matéria publicada na Weekend 285

POR QUE É DIFÍCIL ASSUMIR AS CONSEQUÊNCIAS? Normalmente, as pessoas que são vítimas de si mesmas tendem a não entender ou assimilar que para toda ação existe uma reação. Assim, a responsabilidade de seus atos e, principalmente, resultados ruins são atribuídos a fatores externos ou a outras pessoas: “Fiz a minha parte”, “Ninguém quis me ajudar”, “Cheguei tarde por causa da chuva”, “Não me ouviram”. Ao fazer isso, quem pratica o vitimismo não consegue assumir as consequências de seus próprios feitos e, muito menos, aprender a lidar com certas situações, enfraquecendo-se. Quem não se reconhece como protagonista não olha para si mesmo para consertar o que não está funcionando. “À medida que alguém se vitimiza, o outro se torna cada vez mais culpado. Pode parecer mais fácil, mas não é bem assim. A pessoa vive sem se dar conta de que é dona de sua trajetória, incluindo derrotas e conquistas.”


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ENJOY PARA REFLETIR EVITANDO O SOFRIMENTO

Tornar-se Pessoa, do psicólogo norte-americano Carl R. Rogers. Editora: WMF Martins Fontes. “A obra constitui uma introdução ao processo do tornar-se, destina-se não apenas a psicólogos e psiquiatras, mas a todos os que se interessam pelo desenvolvimento do homem e de sua personalidade.”

De Derrotada a Poderosa, da reconhecida coach Eli Davidson. Editora: Vida e Consciência. “Neste livro, a especialista vai direto ao cerne de tudo que causa estagnação; em seguida, oferece estratégias valiosas, porém divertidas para se libertar dos velhos padrões e mergulhar na experiência que é a vida.”

Assim como outras patologias psicológicas, o vitimismo é uma tendência inconsciente que pode surgir de diversas formas e níveis na vida de uma pessoa. Por vezes, esse comportamento pode ser desencadeado por outros fatores, como pais superprotetores, falta de maturidade e uma sociedade competitiva e opressiva. O papel psicológico de vítima pode evoluir de um leve pensamento sobre a grama do vizinho ser sempre mais verde até um problema mais grave: a falta de protagonismo. “Quando o indivíduo não consegue mudar esse pensamento de vítima sozinho, a psicoterapia vai ajudá-lo a experimentar outras formas de se enxergar, de receber e perceber desafios e problemas”, enfatiza a psicóloga clínica Analú. Sabe aquela história de analisar um problema por diversos ângulos, antes de agir? Essa pequena atitude é exatamente o primeiro passo para se livrar do sofrimento da culpa e pode mudar todo o rumo da vida de uma pessoa. Além disso, é preciso adquirir responsabilidades, superar frustrações, assumir culpas e, principalmente, reconhecer que é sim permitido errar, mas também é possível dar a volta por cima. Afinal, tudo isso faz parte do amadurecimento necessário para o crescimento pessoal.

QUEBRE AS AMARRAS DO VITIMISMO • Pratique o autoconhecimento; • Conheça seus limites e necessidades; • Reconheça o que é de sua responsabilidade, mas também saiba identificar quando ela for do outro; • Planeje sua vida, metas e projetos, traçando objetivos claros do que você quer conquistar; • Seja responsável pelas suas escolhas e assuma as consequências; • Aprenda a lidar com as frustrações; • Não seja dependente de suas relações emocionais; • Tenha autonomia sobre sua própria vida; • Cuide de sua autoestima.

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*MatĂŠria publicada na Weekend 286




[ COMPORTAMENTO ] Por Cris Marques

Planeje estrategicamente

Banco de imagens, Durval e Paulo Rogê

seu 2016

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ucesso, qualidade de vida, dinheiro, saúde, amor, viagens... O começo de um novo ano sempre dá um fôlego a mais para tirar os sonhos do papel e, mesmo que janeiro já esteja acabando, nunca é tarde para definir as metas de 2016. Mas, para colocar definitivamente em prática tudo o que foi pensado, é preciso se planejar. É o que afirma Dila Brandão (foto), life coach, palestrante e gestora educacional na Prefeitura Municipal de Guarulhos. “Planejamento estratégico é um termo muito conhecido na área de gestão empresarial e nada mais é do que elaborar planos, buscar meios para encontrar soluções e analisar todos os aspectos do trabalho para atingir o resultado. Porém, ele pode ser utilizado também na área pessoal, o que, além de facilitar a conquista dos objetivos, favorece a autoestima e a motivação. [...] A diferença de criar um planejamento usando técnicas de coaching é que essa metodologia favorece o autoconhecimento e suas ferramentas já foram pensadas e estruturadas para que seja possível obter melhor desempenho. Quando você planeja sem isso, é muito provável que algum aspecto seja negligenciado e o resultado comprometido”. A profissional ainda explica que dentro do planejamento podem ser criadas metas de curto, médio e longo prazo, mas que

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para essas mais extensas o ideal é dividir em etapas menores para aumentar as chances de sucesso e, principalmente, diminuir as desistências. “Independente do prazo, a atenção deve ser dada constantemente, mesmo quando não é possível realizar nada de concreto. Você pode olhar pra sua meta e se imaginar concretizando o objetivo; desta forma, você une emoção e ação e o resultado será surpreendente. [...] Nós, seres humanos, vemos o mundo sob a nossa própria ótica, valores e conceitos e, para que uma transformação real ocorra, é necessário ampliar essa visão sobre nós mesmos. Além disso, todos nós praticamos em maior ou menor grau a autossabotagem e esta só pode ser superada quando tomamos consciência de que ela existe. Por isso, a ajuda de um profissional de coaching é importante neste processo”.


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Para começar, Dila Brandão indica o uso da planilha abaixo, para identificar quais áreas da vida precisam de maior atenção. “Atribua uma nota de 0 a 10 para cada item, depois some e preencha o resultado final: assim você terá um panorama melhor”.

ÁREAS DA VIDA Qualidade de vida

Área pessoal

Área profissional

Emocional/mental

Saúde e disposição

Diversão e hobby Plenitude e felicidade

Desenvolvimento intelectual Realização dos sonhos

Realização e propósito Recursos financeiros Contribuição na sociedade

Nota final

Nota final

Nota final

Área de relacionamentos Família Desenvolvimento amoroso Vida social

Nota final *fonte: Wande Nabarro

Usando o resultado como norte, é hora de começar a traçar as metas. Para garantir que elas possam, verdadeiramente, ser cumpridas, o ideal é usar outra ferramenta: a SMART (S - específica/ concreta; M - mensurável; A alcançável; R - realista e T - tangível). Confira mais sobre o significado de cada letra: Específica: seja bem detalhista e específico. Neste momento não cabem generalidades, como: “em 2016, eu quero emagrecer”. A hora é de determinar; então a meta adequada é: “Em 2016, eu quero emagrecer 15 quilos, do dia 1º de janeiro até 30 de setembro”. Mensurável: é importante medir o processo para saber em qual estágio você se encontra. “Lembra-se da brincadeira de infância na qual escondíamos um objeto e o amigo tinha que procurar? Quando ele se aproximava, nós gritávamos ‘quente’ e, quando ia pra longe, a gente gritava ‘tá frio’. É exatamente isto que você deve fazer com suas metas. Desta forma você poderá mensurar se está próximo e analisar suas estratégias. Isto te dará motivação”. Alcançável: defina uma meta possível de ser atingida. “Voltando ao exemplo inicial, se você quer perder 15 quilos e deseja realizar

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isto em apenas um mês, é muito provável que desista no meio do caminho ou que não atinja sua meta por ser muito difícil. Seja ousado, sim; mas com os dois pés no chão. Então, você pode reestruturar sua meta: perder 15 quilos, sendo 5 a cada três meses. Quando você vencer a primeira etapa, no primeiro trimestre, ficará motivado e encontrará disposição para continuar. Ah, e uma dica: comemore muito a cada etapa vencida, mas não perca o foco de seu objetivo final”. Realista: busque criar metas reais e relevantes, que realmente vão fazer alguma diferença. “Não perca seu tempo e sua energia com metas bobas ou fantasiosas. A meta deve ser real e importante; por isso, antes de defini-la, analise suas dificuldades e vantagens”. Tangível: é muito importante determinar um prazo para concretizar a meta. “Sugiro que você escreva suas metas e deixe em um local visível, como um mural no quarto. À medida em que as metas forem alcançadas, você terá mais vontade de concluir as outras e, ainda, criar novas. Desta forma, você vai transformando sua vida, superando limitações e adquirindo novas marcas mentais positivas e de sucesso”, garante Dila.

METAS PARA OS MAIS NOVOS Segundo Mara Suassuna (foto), psicóloga, mestre em psicologia, master coach, coordenadora do MBA master coach do Instituto de Pós-Graduação e Graduação (IPOG) e autora do livro “Coaching Kids – Estabelecendo metas para uma educação para a vida”, o processo de coaching também pode auxiliar crianças e jovens. “Os mais novos estão sem direcionamento, pois os pais estão absorvidos em sua própria luta. Então, eles criam métodos próprios que muitas vezes não geram os resultados esperados”. E foi a partir dos mais de 20 anos atuando com psicologia que ela criou a obra. “Tomei a decisão de escrever algo que auxiliasse tutores, professores e coachs a usar a metodologia do mundo adulto para a vida das crianças”. Com relação à definição de metas, ela conta que o pequeno pode definir como objetivo passar de ano, por exemplo, e, a partir daí, definir o processo: estudar três horas todos os dias, não conversar durante a aula ou ter horários específicos para diversão. Ela afirma também que não conseguir cumprir alguma meta faz parte. “Temos que preparar os filhos para uma vida real. Não deu certo? Em vez de feedback, vamos trabalhar o feedforward: o que você pode fazer de diferente daqui para a frente para obter outro resultado?”, finaliza.


CAPA Por: Cris Marques Fotos: Marcelo Santos, Lucas Costa Jerônimo, arquivo pessoal, banco de imagens e divulgação

Que tempo bom! uem teve o prazer de viver a década de 80 e o início dos anos 90 presenciou um tempo de rica produção cultural: a música ganhava mais e mais lançamentos, a televisão estava cheia de séries e grandes programas, os cinemas lotados de estreias que virariam grandes sucessos, as lojas de videogames começavam a encher suas prateleiras com consoles

da Sega e da Nintendo, a moda trazia tendências inovadoras e estilos bastante diferenciados. Foi um tempo de efervescência e inovação, com o surgimento de novos nomes no MPB e a criação de grandes bandas do pop rock nacional, como Legião Urbana, Barão Vermelho, Paralamas do Sucesso, Capital Inicial, Ira, Ultraje a Rigor e Titãs. Uma época de grandes baladas

românticas, de videoclipes e de cultura pop, marcada por nomes como Madonna, Michael Jackson e até mesmo Xuxa, a Rainha dos Baixinhos. Um tempo bom que não volta nunca mais. Ou não, já que o saudosismo oitentista está mais em alta do que nunca, com referências por todos os lados: nas telinhas e telonas, na moda e na música.

SAUDOSISMO PURO Marcos Cárfora, 42, cartunista e professor na faculdade Eniac, viveu sua adolescência nos anos 80/90 e guarda ótimas lembranças desse tempo, na memória e em prateleiras também. “Tenho quadrinhos, álbuns de figurinhas, livros e coisas da época, como um Super Nintendo com diversos jogos, entre eles Super Mário, Mortal Kombat e Donkey Kong 1, 2 e 3, uma pelúcia do Snoopy na embalagem original e diversos bonecos Playmobil, angariados no Mercado Livre. Também tenho coleções inteiras de vinis, como a do Queen. Cheguei a ter mais de 400 LPs. Hoje, esse número deve estar um pouco acima dos 200. Gostaria de ter um espaço para eles, mas, como não tenho, eles estão guardados na casa da minha cunhada esperando para serem resgatados. [...] Recentemente, ganhei do meu irmão Marcelo, especialista em garimpar raridades, um gibi antigo da Mônica que tem a resposta a uma cartinha que enviei para o Maurício de Sousa,

*Matéria publicada na Weekend 348 [ 10 ]

em 1984. Foi muito legal ganhar algo assim, por todo o sentimento envolvido”. Para ele, ver tantas referências a essa época na produção cultural de hoje é puro saudosismo. “Era um período bastante incerto. A democracia estava voltando, mas ainda havia muitos problemas especialmente com a inflação. Porém nos divertíamos muito, éramos jovens, com menos preocupações e seriedade, e o mundo era mais off-line. Além disso, com o fim da ditadura, houve uma explosão de cultura que estava engasgada no povo; grandes bandas, cineastas, escritores e outros artistas soltaram o verbo. Os sentimentos afloraram. Por isso, esse resgate cultural é muito válido. Para nós, que vivemos, vale a lembrança e a saudade; para os que estão conhecendo agora, a certeza de que foram anos fantásticos e maravilhosos, como os que eles vivem hoje e gostarão de relembrar mais pra frente”, pontua.


REFERÊNCIA CULTURAL Valdenir Medeiros da Silva, 49, professor de matemática da rede estadual, músico nas bandas CLT 40 (pop rock cover) e Vitrola Mágica (rock autoral), conta que viveu, parafraseando uma música dos Titãs, “Tudo ao mesmo tempo agora”, na década de 80. “Além de ter virado pai demasiadamente cedo, toda minha formação política e cultural surgiu ali. Minha principal referência foi no campo artístico, mais precisamente na música. No terreno do pop rock, creio que foram as décadas mais criativas e duradoras.

As letras falavam de contestação, poesia, festa... Algumas bandas existem até hoje e os clássicos passam de geração em geração, atualíssimos”. Segundo ele, que é mais conhecido como Zinho, a riqueza cultural daquele período é transcendental. “A saga ‘Star Wars’ se encaixa perfeitamente nisso. São pais, filhos e avós consumindo avidamente uma mesma produção. Meus pais assistiram, eu assisti e minhas filhas também. É como o desenho do Pica-Pau ou o seriado do Chaves, por exemplo”.

NAS TELINHAS E TELONAS Tempos áureos para a produção cinematográfica, especialmente a norte-americana, o final dos anos 70, toda a década de 80 e o comecinho dos 90 criaram um legado inestimável para a sétima arte. Foi nessa época que os grandes clássicos surgiram, marcando, definitivamente, uma geração, com obras como “E.T. – O Extraterrestre”, “Os Goonies”, “O Exterminador do Futuro”, “Querida, Encolhi as Crianças”, “De Volta Para o Futuro”, “Os Aventureiros do Bairro Proibido”, “Gremlins”, “Tubarão”, “Jurassic Park” e muitos outros. E o sucesso é tanto que, recentemente, muitos deles ganharam remakes (regravações), reboots (novas versões) e/ou continuações nas telonas. É o caso de “Indiana Jones e o Reino da

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Caveira de Cristal”, “Karatê Kid”, “Carrie A Estranha”, “Jurassic World”, “Poltergeist - O Fenômeno”, “Star Wars - O Despertar da Força” e “Caça-Fantasmas”, com um elenco feminino que gerou muita polêmica e controvérsia. “Um dos motivos que levam a esse resgate é que, naquela época, a história (o enredo) ainda era a coisa mais importante, não os efeitos especiais. Por isso, muitos destes filmes são bons para serem vistos até hoje. Além disso, algo que já vem de uma franquia conhecida tem muito mais chances de levar as pessoas ao cinema. É como a diferença entre comprar um produto que você já conhece ou algo completamente novo. Esse público que curtiu tanto aquilo numa época em que seu caráter e gosto estava

sendo formado vai querer ver como ficou o material final e ainda pode levar outras pessoas com ele”, afirma Marcelo Forlani, 41, publicitário e diretor de marketing do Omelete Group, que edita o site de entretenimento Omelete (omelete.uol.com.br), com informações sobre filmes, séries, quadrinhos, games e música.


SUCESSO COM UM TOQUE DE ODE AOS 80 Caso você ainda não tenha assistido “Stranger Things”, série original Netflix escrita e dirigida pelos irmãos Duffer, deve, pelo menos, ter ouvido falar. A produção, criada com influência no trabalho de cineastas e autores, como Steven Spielberg, Stephen King e John Carpenter, é uma verdadeira ode aos anos 80 e agradou em cheio ao público, dos mais velhos aos mais novos. A trama, que se passa em 1983, na fictícia cidade de Hawkins, em Indiana, conta a história de um garoto que desaparece misteriosamente, deixando polícia, família e amigos atrás de respostas, num grande suspense, que envolve experiências governamentais altamente confidenciais, forças sobrenaturais assustadoras e uma menina um tanto quanto estranha. Nos fatores que podem explicar esse sucesso, quase instantâneo, além das muitas referências aos clássicos da época e um elenco com Winona Ryder e Matthew Modine, que estrelaram importantes filmes da década, está o resultado de uma pesquisa feita com base

no comportamento e gosto dos milhares de usuários da Netflix. “Assisti à primeira temporada com sorriso no rosto. Cada cena, cada homenagem era um ‘gol’. Eles conseguiram pegar o que era bom, homenagear e ainda fazer algo novo”, ressalta Marcelo. Para Zinho, a nostalgia presente na produção fez reviver aquele clima de sessão da tarde, de filmes nem tão inocentes assim, com personagens carismáticos e uma trilha sonora que dá vontade de continuar ouvindo por muito tempo. “É um paradoxo cultural em 2016. Retrata o passado, mas traz um frescor incomparável. Grande para um filme, pequeno para uma série e do tamanho exato para o público disposto a eleger o próximo fenômeno de cultura pop. Se foi mesmo feita para agradar, conseguiu e tal feito não pode ser desconsiderado. A busca pelo formato e jeito de produzir da época, aliado a um bom roteiro e o que de melhor existe no campo da tecnologia, criou uma mistura que certamente angariará mais e mais fãs”.

PARA (RE)LEMBRAR Para quem viveu os anos 80, não foi só “Stranger Things” que agradou. Recentemente, muitos seriados antigos ganharam novas temporadas, como “Arquivo X”, “Três é Demais”, “Twin Peaks”, “24 horas”, “Arrested Development”, “MacGyver” e “Gilmore Girls”. Isso sem contar a transformação de filmes em séries, como “Máquina Mortífera”, “Bates Motel”, “Hannibal” e “Ash vs Evil Dead”.

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A VOLTA DO VINIL Com o avanço da tecnologia, algumas coisas vão ficando para trás, mas sempre existe espaço para os colecionadores, que, aos poucos, trazem o passado à tona novamente. E é nesse contexto, que o vinil ressurge, em um movimento de valorização, que levou, inclusive, algumas empresas a reativarem suas antigas prensas para novas produções. “Um disco novo custa muito caro, já os aparelhos toca-discos estão bastante acessíveis. Então por enquanto, esse retorno do vinil é mais uma coisa saudosista mesmo. Mas se a onda for pra valer, a produção vai aumentar e o preço tende a cair. [...] A tecnologia invadiu tanto a vida das pessoas que a impressão que eu tenho é que há certo desejo de se apegar a algo que não seja tão tecnológico e quem gosta mesmo do vinil acha aquele som mais real do que o gravado digitalmente. E também

tem o chiado, aquele barulhinho da agulha roçando no disco, que chega a ser até um charme”, conta Valdir Carleto, jornalista à frente da Carleto Comunicação. Amante da música desde muito cedo, ele cresceu ouvindo os discos 78 rotações de seu pai. “Na minha adolescência, a diversão que meus primos, tios mais novos e eu tínhamos era nos reunir domingo de manhã para ouvir os LPs dos Beatles, Roberto Carlos no começo da carreira e a Jovem Guarda. Com 18 para 19 anos, montei uma loja de discos em São Paulo, com meu primo Sérgio. Foi uma aventura que durou apenas um ano, o movimento era muito pequeno e também não tínhamos capital para um acervo muito completo. Na sequência, ingressei por concurso no Banco do Brasil, mas o contato com esse ramo permaneceu e passei a pegar encomendas dos colegas de banco. Fiz isso por muitos anos e o que eu ganhava com a venda investia nos discos que queria”, conta ele, que hoje tem entre 200 e 300 vinis dos mais variados estilos musicais em sua coleção, com destaque para os de MPB, como Milton Nascimento, Chico Buarque, Ivan Lins, Guilherme Arantes, MPB-4, Elis Regina e Taiguara, os maiores xodós da coleção, além de Bee Gees e Simon & Garfunkel. Já Laudemil Veloso, 61, mais conhecido como Batata, fez o caminho inverso: colecionador de vinis desde seus 16 anos, ele abriu a Caverna do Disco de Vinil – Sebo (www.cavernadodiscodevinil.com.br), que fica na rua Luiz Faccini, no centro de Guarulhos, e segue até hoje no ramo. “Com muitos discos em meu acervo, decidi ser um vendedor, abrindo minha loja em 1994: um espaço de compra, venda e

VINIL NA REDE Quer angariar novos LPs para sua coleção, interagir com quem também é fã dos antigos bolachões ou apenas negociar? Então você precisa conhecer a Luvnyl (www.luvnyl.com), rede social voltada para os amantes do vinil, que permite o cadastro de pessoas físicas e comércios. Criada pelos curitibanos Rômulo Troian e Lucas Stavitzki, e lançada em julho deste ano, a plataforma

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gratuita já conta com 1.500 usuários cadastrados e mais de 10 mil discos. Cada participante atualiza sua página conforme seu interesse, pode adicionar amigos, marcar itens que quer trocar ou comprar e criar sua própria “lista de desejos”. Além disso, a ferramenta ainda oferece funcionalidades específicas para sebos e lojas que vendem vinis. Vale o acesso!

troca de discos, CDs, livros e revistas, com grande variedade de produtos, incluindo telefones clássicos, bonecos de coleção e cachimbos. Mexer com isso é o que gosto de fazer. Vivo nesse ‘portal para o passado’, relembrando o que já passou, conhecendo novas pessoas e vendo os mais novos descobrirem o antigo”, finaliza.



CAPA Por Cris Marques Fotos: Newton Medeiros, banco de imagens e divulgação

Aquele abraço De urso, de lado, de rosto colado, apertado, em grupo, rápido ou demorado... É inegável que abraçar ou receber um abraço faz bem. E o gesto não é importante apenas para a saúde mental, agindo também na saúde física. Em Pittsburgh, na Pensilvânia,

*Matéria publicada na Weekend 357

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um time de pesquisadores da CMU (Carnegie Mellon University) comprovou que os abraços funcionam como uma forma de “apoio social”, protegendo as pessoas de infecções associadas ao estresse. Já na Universidade da Carolina do Norte, os cientistas constataram que o ato eleva o nível de oxitocina, dopamina e serotonina: hormônios relacionados à felicidade e ao bem-estar e responsáveis pela redução da pressão sanguínea, diminuição dos níveis de cortisol, controle da ansiedade, relaxamento dos músculos e fortalecimento do sistema imunológico, os mesmos liberados no momento do parto, quando você faz atividades físicas ou come um chocolate, por exemplo. “Somos seres com cinco sentidos: audição, visão, paladar, olfato e tato. E é por meio desse último que sentimos boa parte do mundo e das pessoas. Além disso, nosso cérebro reage automaticamente bem a gestos e toques de amor. E um bom abraço, sincero e verdadeiro, transmite

essa energia que, para a pessoa abraçada, pode suprir até mesmo suas carências emocionais. O abraço também é uma forma de confirmar o que dizemos. Existe uma grande diferença entre dizer ‘eu te amo’ e abraçar a pessoa e virar as costas logo após essa frase. O abraço tem a capacidade de afirmar como verdade a saudade, a alegria e o conforto que a boca diz. Por isso ele é usado para expressar tantos sentimentos diferentes”, explica o psicanalista Aurélio Gonzales, coach, analista comportamental e palestrante. Ele também destaca que não existe uma forma correta para o ato. “Não acredito em jeito certo ou que as pessoas não saibam abraçar. E sim que, por conta de seus históricos de vida, o ato pode gerar vergonha, ser motivo de constrangimento ou apenas menos usual; mas um abraço bem dado, faz muito bem e está totalmente em alta. Uma ‘terapia’ mais do que recomendada e necessária diante da realidade da sociedade em que vivemos”, reforça.


UM ELEMENTO PODEROSO Segundo Willian Lin, head trainer do Instituto i9c, que alia coaching e PNL (programação neurolinguística), o abraço é uma linda declaração em silêncio. “Ele transmite amor, reconhecimento, troca de energia, agradecimento, segurança, proteção, carinho, respeito e sensação de bem estar. Na PNL, muito mais que um gesto carinhoso, o ato é uma forma de comunicação não-verbal muito poderosa, que traz uma conexão real, em um mundo que, cada vez mais, as pessoas estão conectadas virtualmente e desconectadas fisicamente”. Para ele, que utiliza a terapia do abraço como ferramenta em seus treinamentos do programa “Liderança Inspiradora” e nos workshops e cursos da empresa, um bom abraço é aquele no qual você envolve o outro e se sente envolvido também. “Chegue perto da pessoa, um braço sobre os ombros e outro na altura da cintura, se aproxime a ponto de colar seu peito sobre o peito dela. Com respeito. Feche os olhos e sinta o bater dos dois corações”, orienta.

ABRAÇO COMO VERBO Mais do que dar um abraço em alguém, o verbo abraçar também é usado como sinônimo de ligar-se, sensibilizar-se e aderir a algo. E é isso que o Projeto Abraço (www. projetoabraco.org.br/) propõe. “Somos uma organização não governamental, sem fins lucrativos, com atuação na área de assistência social. Nossa missão é engajar e formar pessoas para o trabalho voluntário, com o objetivo de promover ações sociais. Conseguimos captar e viabilizar recursos por meio da organização de eventos temáticos reunindo famílias e

amigos para fazer da diversão uma boa ação. E o projeto tem esse propósito também: abraçar as causas das pessoas e/ou instituições necessitadas”, explica Elisa Toda (de camiseta azul, na foto abaixo), coach e diretoria executiva da iniciativa. Dentro do calendário anual de ações, a Abraçolandia ganha destaque. “Trata-se de um evento social, cultural e recreativo. Inspirado em Walt Disney, mais especificamente na Disneylândia, ele tem como marca registrada atrações variadas para encantar adultos e

crianças. Sem contar a ‘comitiva’ que realiza a recepção dos convidados com muitos abraços, que acabam emocionando quem chega. [...] Também usamos a prática como objeto de integração quando realizamos visitas em instituições, com os internos/ acolhidos e nossos voluntários. É uma forma de dar e receber amor e carinho de alguém que não conhecemos. Sem dúvidas, o maior beneficiado somos nós mesmos, pois a sensação de gratidão é algo indescritível”, destaca ela.

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O MELHOR PRESENTE Para o guarulhense José Augusto Pinheiro, jornalista da Rede Boa Nova de rádio, o abraço tem o poder de unir, integrar, aquecer e irmanar. E é o melhor presente do mundo: simultaneamente, você dá e recebe. “Houve um tempo em que as pessoas tinham um hobby: juntavam selos, moedas, figurinhas, tampinhas; enfim, tudo que pudesse ser agrupado, a fim de mostrar para as visitas em casa. Dava trabalho, mas valia a pena. Era fator de integração, entretenimento e de cultura. Eu já fui filatelista e, hoje, coleciono amizades. É sempre bom conhecer pessoas novas: são universos em particular, normalmente, com muito em comum com os nossos propósitos de vida. Faz 12 anos que soube do valor intrínseco de um abraço sincero”, conta ele. E foi pensando no poder do gesto que ele, ao lado de Márcia Barbosa, colaboradora das Casas André Luiz, criou o Abraço Natalino, um evento que, desde 2010, reúne um grupo de pessoas na principal rua comercial de Guarulhos para trocar abraços na véspera do Natal. “A ideia surgiu a partir de um abraço fraterno entre nós dois, em um momento de profunda gratidão dela, que passara por um tratamento médico rigoroso com pleno êxito. Distribuir abraços gratuitos para as pessoas (muitas, absolutamente desconhecidas) foi a forma que encontramos de retribuir a Deus o que nós recebemos durante todo o ano em termos de saúde física, mental e espiritual. [...] Até hoje, foram seis edições e as participações variaram bastante, mas a cada ano temos um número maior de pessoas”, conclui. Quer participar? Em 24 de dezembro de 2016 (sábado) eles repetem a dose na rua D. Pedro II, Centro, em frente à Igreja Matriz, das 9h às 11h. O grupo fica reunido em uma área de 50m2 a 70m2 e terá o prazer de te receber. Com um abraço, é claro!

PARA LER “A Terapia do Abraço”: escrito pela psiquiatra Kathleen Keating, mestre em enfermagem e pedagoga americana, a obra (com dois volumes) ensina a dominar o abraço e suas técnicas avançadas, mas, mais do que isso, propõe o gesto como uma ciência, um método simples de oferecer apoio, cura e crescimento. Além disso, ainda descreve os tipos de abraço com uma divertida mistura de impulsividade e seriedade e ursos encantadores ilustrados por Mimi Noland.


*MatĂŠria publicada na RG 101



*MatĂŠria publicada na RG 102



CAPA

A internet

como potencializadora Por Cris Marques Fotos: Divulgação e reprodução

De acordo com um estudo da agência internacional We Are Social, publicado no ano passado, o Brasil figura como a terceira nação mais conectada do mundo, contabilizando cerca de nove horas on-line por dia, cinco delas via computador ou tablet e o restante no celular. E com um perfil comunicativo, estritamente criativo, bem-humorado, e até um pouco sem limites e tanto tempo assim logado, o brasileiro encontra na internet o palco perfeito para se manifestar com blogs pessoais, perfis nas redes sociais, canais de vídeos, espaço para comentários nos sites de grandes veículos, piadas e “textões”. Martha Gabriel, consultora e escritora na área de marketing digital e inovação, explica que a potencialização

Pedra (internacional) no sapato

Com características tão diferentes de outros países, o Brasil acaba incomodando ainda mais lá fora. E a profissional explica. “Em um contexto mundial, existem dois fatores que são interessantes. Um é cultural mesmo, nós somos mais abertos e gostamos de nos expor, de compartilhar, e o outro é parte da educação, do imediatismo que estamos vivendo. Diante de um acontecimento, as pessoas falam, publicam, implicam e reclamam sem entender ou pesquisar mais a fundo. E isso não é exclusivo da internet. O brasileiro é rápido em suas tiradas cômicas e externa com muita facilidade aquilo que vem à cabeça. E isso acaba sendo uma pedra no sapato dos outros”. 22

*Matéria publicada na RG 111

Meme X Viral

acontece por que a tecnologia permite e a cultura favorece. “A gente sempre teve esse perfil de gostar do humor, de propagar, de criar meme [termo usado na internet para descrever conteúdo de humor que se espalha; explicado mais detalhadamente no final da página]. Isso antes da internet, com a televisão e seus programas humorísticos ou mesmo características de pessoas públicas, celebridades, jornalistas ou repórteres, que rapidamente viram bordões e incorporam no que as pessoas falam. A diferença é que a rede amplifica isso. [...] Na época da copa, eu acompanhava pelo Twitter e não pela televisão e era incrível como, ainda durante o jogo, as pessoas já criavam as piadas com o que estava acontecendo”, exemplifica ela.

Ao contrário do que muita gente pensa, os memes existem muito antes do virtual e não dizem respeito apenas a coisas engraçadinhas da internet. A expressão foi vista pela primeira vez em 1976, na obra “O gene egoísta”, do biólogo Richard Dawkins. Assim como ele conseguiu decifrar a mecânica do gene, unidade mínima de propagação de informação hereditária, ele interpretou o meme como uma unidade mínima de propagação da cultura. “A gente só está aqui porque, lá atrás, alguém aprendeu a fazer fogo e isso foi copiado. Ele é uma estrutura de cópia, transmitida de pessoa a pessoa. Quem cria não tem o poder de decidir se vai viralizar ou não; quem determina isso é a cultura que precisa incorporar o conteúdo. O antigo ‘não é assim uma Brastemp’ ou ‘menos a Luiza que está no Canadá’ são exemplos de meme, porque, na realidade, não falam sobre a marca ou a garota que viajou e sim sobre a ideia que a expressão representa”, pontua Martha. Já o conteúdo viral é diferente, apesar de ter a mesma estratégia de ser abraçado pela cultura, ele não é copiado e sim compartilhado/propagado exatamente da forma que nasceu. 


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Todo mundo adora o Tyler James Conhecido no País como o protagonista de “Todo mundo odeia o Chris”, que faz grande sucesso por aqui e passa até hoje na TV Record, o ator Tyler James Williams também sabe o quanto o humor tupiniquim não tem limites. Ele, que já deixou o Chris para trás com papéis em “Go On” e “The Walking Dead”, recebe, diariamente, em seu perfil no Instagram (@willtylerjames) centenas de comentários brasileiros utilizando bordões do antigo programa, como “pisante maneiro” e “Sua mãe sabe que você está andando com gente branca?”. Irritado com a situação, ele chegou a publicar uma imagem com dizeres em português, bem à la Google Tradutor, com concordância e palavras traduzidas erradas, pedindo para que os brasileiros parassem com isso. Sem sucesso e depois de refletir sobre o amor pelo personagem, ele ainda mandou um novo recado, por meio de um vídeo da youtuber brasileira Nubia Veturiano: “Ei, Brasil, eu amo vocês. Vocês são muito legais, mas, se você puderem, diminuam um pouco o spam na minha página”.

O Brasil no Facebook Se por um lado, Mark Zuckerberg, um dos fundadores da rede considerada a terceira “marca” mais influente entre os brasileiros, presencia, diariamente, o boom de sua empresa no País e lucra com isso, por outro, ele também sofre com a “zoeira”. Um dos casos mais marcantes envolvendo o empresário ocorreu no final de 2014, quando, sem nenhum motivo aparente, seu perfil foi bombardeado por uma enxurrada de comentários daqui, que o fizeram, inclusive, bloquear a funcionalidade em sua página. Na postagem que ele anunciava seu casamento com Priscila Chan em maio de 2012, por exemplo, foram mais de 187 mil manifestações, entre elas memes, imagens e emoticons.

No Grammy for you Se Tyler chegou a ameaçar dar um “block” nos usuários do País, a página do Grammy, maior prêmio da indústria musical mundial, no Facebook foi além e concretizou a ação no ano passado. Isso aconteceu, após Inês Brasil, que ficou famosa com a divulgação de seu vídeo de inscrição para o Big Brother Brasil 13, liderar a votação de um prêmio para artista-revelação.

Brincando com coisa séria

Dias após o brutal ataque do Estado Islâmico a Paris, fato que parou o mundo em novembro do ano passado, uma postagem no Twitter garantiu que o Brasil seria o próximo alvo. O que na época não teve muita repercussão, voltou agora à tona com a proximidade das Olimpíadas e a confirmação da Abin (Agência Brasileira de Inteligência) de que o perfil é mesmo de Maxime Hauchard, integrante do grupo terrorista. A situação, 24

que deveria causar apreensão, foi recebida com humor na internet e logo surgiram postagens e memes sobre o assunto, de tweets com a divulgação das coordenadas exatas da Câmara dos Deputados durante a votação do impeachment da presidente Dilma Rousseff até estratégias de defesa com a Carreta Furacão, Mc Melody, a “Metralhadora” da banda Vingadora e diversos artistas, incluindo Wesley Safadão, vestidos de super-heróis.


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O perigo dos rojões para a saúde auditiva ,

E a família como vai?

O mês mais saboroso do ano chegou e trouxe consigo uma série de preocupações com a nossa saúde auditiva. Por Cris Marques Fotos: Rafael Almeida, de imagens e divulgação Junho é o mês das grandes festas juninas, embaladas porbanco muita festança, dança e os tão conhecidos e barulhentos rojões. Além dos riscos de queimaduras, o estrondo de um rojão pode emitir um som de 135 db (decibéis). Se levarmos em conta que o limite máximo permitido de exposição a sons é de 85 decibéis, conseguimos perceber os quão perigosos eles são para os nossos ouvidos. Se a quantidade permitida for ultrapassada, há risco de perda auditiva. Esse problema também depende da intensidade do som (volume), do tempo de exposição e da sensibilidade individual de cada pessoa. “Dependendo do tempo de exposição, os sons apresentam diferentes efeitos no organismo humano e, quando muito intensos, podem provocar a perda de audição temporária e até definitiva”, explica a fonoaudióloga do Grupo Microsom, Maria do Carmo Branco. Os sintomas da perda auditiva são diversos, como sensação de pressão nos ouvidos, zumbido, dificuldade para ouvir, tontura, irritabilidade, sensação de ouvido tampado, pressão e estalos no ouvido. Caso um ou mais sintomas A vida torna-se cada vez permaneçam, mesmo horas após a exposição ao ambiente com som intenso, recomenda-se procurar um dinâmicajáe tem até aspredisposição cobranças a otorrinolaringologista para a realização de uma avaliação. Vale ressaltar que, semais o indivíduo e osconsistente, conceitos sãoele revistos. desenvolver uma perda auditiva ou se, no dia a dia, está exposto ao ruído intensosociais de forma terá maior “Estamos em uma fase de grande probabilidade de desenvolver uma perda auditiva e, portanto, deve ser ainda mais cauteloso. evolução e tem muita coisa ba- e, Se constatada a perda auditiva, o paciente deve procurar um fonoaudiólogo para iniciar um tratamento Mulher, homem casal ofiaparelho lhos, pressão quemais continua fortepara no seu caso. cana acontecendo. É obvio que dependendo do grau edecriança; perda, utilizar auditivo indicado

As mudanças sociais

homoafetivo com filhos; casal sem mercado de trabalho, ou adiar tanto existem alguns exageros, mas as fi lhos; solteiro; neto criado pela avó e que seu relógio biológico não permimudanças sociais são assim: o Informação de Grupo Microsom. quem convive com madrasta, padras- ta mais. “A mudança vem de dentro pêndulo vai de um extremo ao to e irmãos ‘postiços’. É, pensando pra fora e, tem que haver questionaoutro, para quebrar paradigmas, bem, a família tradicional não é pa- mento; se não a gente se desconecta e depois ele vai voltando para drão há muito tempo. Com as mu- do desejo interior, toma uma decisão o centro. [...] Não sou católica, lheres ganhando as ruas e espaço no que não é ‘nossa’ e, além de ser infeliz, mas vejo o papa Francisco como mercado de trabalho, movimento que ainda faz os outros infelizes”. um líder de vanguarda, trazendo começou com força na década de 70, Autora de “Mulheres de Sucesso uma orientação mais moderna a as configurações familiares mudaram. Querem Poder… Amar” e co-autora respeito dos homossexuais e do O sexo feminino empoderou-se, ven- de “Mulheres modernas, dilemas papel da mulher, falando, incluceu (alguns) preconceitos e conseguiu modernos – e como os homens posive, com pessoas de outras reliir atrás de suas realizações pessoais e dem participar (de verdade)”, a progiões. Mark Zuckerberg também profissionais. Nesta mesma corrente, fissional aborda em seu segundo lipode ser usado como exemplo, já o homem viu a necessidade e opor- vro, escrito com a ajuda de Claudio que, depois de ser pai, entendeu a tunidade de se fazer presente no lar. Henrique dos Santos, ex-executivo importância de estar presente em Isso sem contar as leis que garantiram que largou a carreira para assumir o casa e estendeu a licença-paternidireitos relacionados à união de casais posto de dono de casa e apoiar espodade de seus funcionários. Como O uso de aparelhos auditivos é indicado em casos de perda auditiva. do mesmo sexo. sa e filha, as novas relações sociais, influenciador, ele provoca uma Para Joyce Moysés, jornalista fo- discutindo caminhos para inspirar mudança, passa uma mensagem. cada em comportamento, carreira e as mulheres de hoje e também os Essa extensão também aconteO Grupoescritora Microsomeéconsultora uma das mais empresas de soluções e a única em tratamento da gagueira. A companhia negócios, deconceituadas te- homens que fazem parteauditivas da vida ceu aqui no País e ela é um marco foi femininos, fundada em as 1991 e oferece soluções bem-estar para pacientes problemas gagueira e zumbido. mas pessoas estão con- dedelas. “Uma esposa que com ganha mais de audição, importante, porque antes a menDesde 2014, o Grupo Microsom o distribuidor empresa de aparelhos auditivos AudioSync. Com o intuito de quistando maior liberdade de éconsque oexclusivo maridodaainda geraamericana desconforsagem social que era dada era de oferecer soluções o família, bem-estar, 2008,e outros a companhia o SpeechEasy, único aparelho no mundo para truir sua própria vidapara e sua de desde to. Esse temascomercializa são assuntos que o filho era uma responsabiligagueira. O SpeechEasy discreto eaparelho promove a fluência em pessoas que gaguejam e que é adaptado umtratamento jeito queda combine mais com elas. é um delicados até umque pouco subjetivos, dade só da mãe e o marido só ia a partir da necessidade individual de cada porque paciente.dependem muito dos valores Mas é preciso tomar cuidado e olhar distribuir charuto na maternidaCom a intenção de reconhecer proporcionaroum personalizado e oferecer discretos e de alta tecnologia, o para si mesmo para queatendimento e da criação de cada um, mas éaparelhos preci- modernos, de. Isso é legal para mostrar que Grupo Microsom mais de 50 pontos de sobre atendimento todoque Brasil, com profissionais altamente capacitados e oferece é vontade própria econta o quecom é imposição. so falar isso. Éem assim nossa a família também recebe influênserviços diferenciados e especializados, uma estrutura de primeira quando linha, coma laboratórios equipados com os mais modernos Não é porque, hoje, a mulher pode co- em sociedade vai evoluindo, cias sociais positivas do meio, não recursos e ferramentas para confecção moldes auriculares e aparelhos intra-aurais, além de uma ampla sala de locar a carreira em primeiro lugar, que de gente coloca holofote, discute, auditivos tira só coisa negativa; e que, felizmenequipamentos última geração avaliação, revisão e limpeza de circuitos digitais. elaassistência tenha quetécnica, desistircom do sonho de ter dede debaixo do para tapete”, comenta. te, o mundo muda”.  *Matéria publicada na RG 114

0800 11 64 91 www.microsom.com.br


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Liberdade feminina

Michele Barbosa, 29, jornalista e apresentadora na Centauro Comunicaciones, adora crianças e se dá muito bem com elas, tanto que vive recebendo, em sua casa, amigos e familiares com bebês. Apesar disso, ela nunca pensou em engravidar. “Amo os pequenos, muito mais que os adultos. Mas uma coisa é receber visitas, outra é ter um 24 horas por dia. Ao contrário das juras do casamento, criança só quero na saúde e na alegria. Não quero ninguém dependendo de mim, não tenho rotina, gosto de dormir, de fazer o que me der ‘na telha’, de sair e não estou disposta a largar a vida que tenho para realizar algo que não faz parte dos meus planos, só pelo fato de a sociedade ‘achar’ que tem que ser assim”. Casada há quase quatro anos, ela conta que o marido já sabia de sua escolha antes do “sim”. “Minha mãe cobrou muito, mas como viu que não tem jeito, parou de falar. Os pais dele não se manifestam sobre isso. Já tios, primos e agregados fazem cobranças a cada encontro. Dependendo da abordagem, sou grossa mesmo. Há pessoas que nem me conhecem direito e questionam. Criar o estereótipo de moça perfeita e dizer que Amélia que era mulher de verdade é um erro. Sim, existem mulheres que sonham com tudo isso, eu as respeito e só peço o mesmo”.

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Família pop rock

Marco Piangers, jornalista da Rede RBS, afiliada da Globo, e repórter do programa Encontro com Fátima Bernardes, já relatava a vivência com suas duas filhas, Anita e Aurora, no jornal Zero Hora desde 2003, quando decidiu compilar todas aquelas histórias em um livro: “O papai é pop”, que saiu em 2015, pela Belas-Letras, e, logo, virou best-seller. “Acho que esse pai que estava louco pra participar mais ou já estava participando se vê espelhado, representado ali. Agora lançamos ‘O papai é pop 2’, que continua essa mesma jornada”. O profissional, que cresceu sem a presença paterna, afirma que sua participação ativa não é só mérito próprio e tem muito a ver com o esforço que vê sua mãe, esposa e filhas fazerem todos os dias para que ele seja presente. “Pai não ajuda, divide. O casamento já é um acordo entre partes que prevê uma dedicação dos dois. Eles estão nessa para dividir tarefas e se ajudar. O homem deve participar assim como a mulher; se possível, até mais, já que ela tem seu corpo modificado e uma série de cobranças sociais que

o sexo masculino não tem. E, pasmem, muitos vão descobrir um enorme prazer nisso”. Do outro lado dessa história, está Ana Cardoso, esposa de Marco, jornalista, socióloga, feminista, mãe das meninas e autora de “A mamãe é rock”. “Meu marido sugeriu ao editor que sua segunda edição também tivesse textos meus. Gostei da ideia, esbocei uma dezena de crônicas e enviei a ele. No dia seguinte, fiquei sabendo que, na verdade, teria meu próprio livro”. Na publicação, voltada para mães reais, que vão muito além daqueles seres amorosos que nunca gritam, que fazem bolinhos sem glúten e arrumam os brinquedos, Ana fala da parte “in/tensa” de tudo isso. “Considero uma baita injustiça as mulheres não poderem ser verdadeiras com os seus sentimentos e dificuldades. Tinha certo receio da obra ser mal recebida. No entanto, percebo que existe, sim, espaço para falar da maternidade sincera. Nem todo mundo concorda comigo, age como eu, mas tenho recebido mensagens lindas de leitoras dizendo que vão tentar relaxar, se cobrar menos e se divertir mais nessa aventura radical e rock’n’roll”. 


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A internet e seus exemplos Por Cris Marques

Fotos: Marcelo Santos, arquivo pessoal e banco de imagens

Em um tempo em que a internet e as redes sociais propiciam informação, entretenimento, geração e compartilhamento de conteúdos, o que atrai adultos, adolescentes e crianças, é normal que esse instrumento torne-se importante na educação do século XXI. A ferramenta pode ser usada, por exemplo, como meio de acompanhar a rotina do filho, com seus serviços de mensagens, como o WhatsApp, ou até como objeto de castigo, deixando a prole sem computador, wi-fi ou smartphone por determinado período. Para a psicóloga e pedagoga Analú Brito (www.facebook.com/ psicologaanalubrito), a rede pode trazer vantagens ou problemas; tudo depende da forma como é utilizada. “Infelizmente, o que observamos é que, devido à ausência ou até mesmo falta de paciência, os pais acabam deixando os filhos conectados a maior parte do tempo. Isso não é saudável. Proibir também não é a solução, já que não dá para observar o tempo todo e a facilidade do acesso somada à curiosidade pode trazer a perda de controle do que é acessado. O importante é existir conversa, e, principalmente, limites. O on-line pode ser introduzido na vida da criança por períodos curtos, de forma que não prejudique outras atividades importantes para o desenvolvimento. Com responsabilidade, a internet pode estreitar os laços familiares, à medida que expõe gostos, interesses e habilidades das crianças”. *Matéria 38publicada na RG 117

O ambiente virtual também pode ser usado pelos pais para dividir suas experiências pessoais, bem sucedidas ou não, nessa difícil tarefa que é criar outro ser. E exemplo é o que não falta: tem o pai que criou um método de desconto na mesada, debitando as desobediências de seus filhos; o que troca diariamente a senha do roteador, disponibilizando-a para a filha só depois da conclusão de algumas tarefas domésticas; o que inventou a “camiseta da união”, que deixa os irmãos, um menino e uma menina, dentro de uma mesma peça de roupa após uma briga, para ficarem próximos e resolverem o desentendimento, e a

mãe que tornou o filho o lavador de louças oficial da casa, após ele falar que isso é tarefa de mulher. Se por um lado a postagem pode servir de exemplo, por outro é preciso tomar cuidado, pois isso pode levar à superexposição da criança ou do adolescente, mesmo que essa não seja a intenção. “A situação pode tornar-se vexatória trazendo inúmeros retornos negativos, como o cyberbullying, bullying e traumas psicológicos futuros, além de problemas de aprendizagem, dificuldade de concentração, choro, insônia, ansiedade e até baixa autoestima”, alerta Analú (foto), que não recomenda e nem concorda com a prática. 


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Meio de aproximação Sobre o uso da rede como um canal entre pais e filhos, a psicopedagoga baseia-se na ótica do pediatra e psicanalista inglês Donald Woods Winnicott. “Segundo o estudioso, não há como evitar, retardar ou impedir a adolescência; esse processo é natural e necessário para se chegar à maturidade. A comunicação deve estar sempre presente e os tutores

precisam transmitir preocupação e demonstrar que estarão por ali, caso o jovem precise de ajuda e amparo, bem como para perceber suas necessidades. Ele ainda afirma que os adolescentes não devem ser ‘curados’, como se estivessem sofrendo de alguma doença e, sim, que sejam encontrados caminhos e saídas para transmitir afeto e chegar ao diálogo”.

Canal da mamãe Deborah Curci, designer gráfica na Fundação Cecierj (Centro de Ciências e Educação Superior a Distância do Estado do Rio de Janeiro) encontrou na internet uma forma eficaz de se comunicar com o filho Rafael, de 15 anos: criou um vídeo engraçado, caricato e cheio de gírias, bem próximo ao material produzido pelos youtubers, que fazem sucesso entre os jovens de hoje, para lembrar ao garoto que ele precisava estudar para uma prova. “Ele tem déficit de atenção; então, sempre dei uma força nos estudos. Ele é superinteligente e tem muito potencial, mas a distração é uma coisa típica de quem tem TDA. Naquele dia, gravei, postei e compartilhei, porque sabia que ele ia acessar as redes sociais antes de estudar. Foi pra ele descontrair e rir um pouco”. O que a família não sabia era o sucesso que a publicação faria. “Entre eu ir pro trabalho e ele chegar em casa, a postagem [youtu. be/3BVgUCLhj50] já tinha tido muito acesso.

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Eu não sabia que ia ter todo esse alcance, mas acho que as pessoas se identificaram pela questão do tempo que as crianças e adolescentes passam vendo vídeos na internet”. Mais de 70 mil visualizações, 6 mil joinhas, como os “likes” do Youtube são conhecidos, e cerca de 1.200 compartilhamentos no Facebook depois, ela gravou também o direito de resposta do garoto, que tirou 9,5 no teste. “O desafio de criar um filho não está no tempo que a gente está vivendo, mas sim em tentar passar bons conceitos pra eles, respeitando a individualidade, os gostos, o jeito e, principalmente, a dificuldade de cada um. Ver a postagem de outros serve como exemplo. O dia a dia está tão duro, que as pessoas estão ávidas por bom humor e também por identificação com outras histórias, o que mostra que elas não estão sozinhas. Mas, vale repetir: é preciso respeitar o perfil e o limite do ser humano que você está criando”, completa. 


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O peso de um segredo Guardar um segredo, saber de algo que mais ninguém pode descobrir ou presenciar uma situação que não pode ser revelada é sempre uma situação complicada. Nem todo mundo é bom na arte da boca fechada, o que pode gerar um grande dilema entre a vontade de contar e as consequências ou implicações que isso pode gerar, para si e para os outros. Nessa situação, a informação sigilosa torna-se um fardo, um sofrimento que pode gerar estresse emocional, comprometendo o bem -estar e até a saúde física. “Existe, simbolicamente e inconscientemente, um mecanismo de colocar para fora o que consumimos. Podemos tomar como exemplo nosso próprio corpo, que gera esta movimentação em grande par*Matéria publicada na RG 120

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Por Cris Marques

Fotos: arquivo pessoal e banco de imagens

te de seu funcionamento. Carregar uma informação sigilosa aciona este recurso de ‘jogar para fora’ algo em busca de alívio. Além disso, a ação se assemelha a mentir, já que a região do cérebro acionada é a mesma. Sendo assim, é necessário conter o ímpeto de fazer o que é automático e mais fácil: falar a verdade ou revelar a confidência, por exemplo. Não contar exige o acionamento de um mecanismo chamado de controle inibitório e isso requer monitoramento e gasto de energia constante, o que pode gerar problemas”, esclarece Adriana Fernandes, neuropsicóloga em seu consultório particular e no Instituto Psicológico Recomeçar, na Vila Augusta, que também atua com orientação psicológica on-line no site www.olharparadentro.com.br.


Efeitos nocivos

Segundo Adriana, guardar um segredo pode gerar, dentre outros sintomas, estado de alerta, desencadeando tensão e ansiedade; esgotamento físico e mental; falta de concentração por conta do pensamento fixo na problemática, o que leva ao isolamento social; sentimentos de culpa, de não pertencimento; medo das consequências; delírio persecutório, quando a pessoa acha que está sendo vítima de perseguição ou conspiração; e depressão. E ainda, dependendo da gravidade e importância da confissão, é possível que, devido a esses sentimentos prejudiciais, a pessoa passe a somatizar e apresentar sintomas físicos, como tensão muscular, complicações digestivas, alteração na pressão arterial, doenças que afetam o coração e dores de cabeça. “Isso sem mencionar os problemas secundários representados pela busca do consumo de álcool e drogas como válvula de escape. Risco tanto pela parte física (tóxica) quanto pela parte que envolve segurança (frequentar lugares perigosos para adquirir ou consumir substâncias)”.

É possível fugir de um segredo?

De acordo com a neuropsicóloga, nem sempre. Afinal, essa é uma situação delicada e que, geralmente, envolve outras pessoas, mas existem algumas estratégias para lidar com isso. Confira: - Procurar um psicólogo é uma boa alternativa. No decorrer das sessões, o segredo é compartilhado e elaborado, então o peso de carregá-lo vai ficando cada vez mais leve. Isso sem mencionar a segurança, pois existe a ética profissional do sigilo; - Quando alguém quiser dividir algo com você, que possa gerar certa ansiedade em compartilhar, peça para que mais um amigo em comum

participe. Assim, é possível dialogar sem que o segredo saia do contexto programado pelo confidente. “Sabe aquela coisa de contar só para o seu melhor amigo, que conta para outro melhor amigo dele, até o segredo ser espalhado para todo mundo, como um telefone sem fio? Essa estratégia diminui esse risco”, ressalta; - Escrever até desgastar o assunto ou gravar um vídeo falando sobre isso, ajuda a aliviar a tensão. “Quando se fala muito sobre algo, mesmo que seja ‘enganando’ o cérebro, falando consigo mesmo, aquele assunto vai perdendo a energia e deixando de ocupar tanto os pensamentos”, pontua.  25



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