Moda para terceira idade ciped 2009[1]

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Moda para terceira idade: concebendo uma coleção a partir do estudo de caso em uma Faculdade Sênior Fashion for seniors: designing a collection from the case study in a Senior Faculty FISCHER, Monica Mestre em Sociologia, Faculdade de Arte e Design / FACED VÍCTER, Cristiane Gontijo Designer de Moda, Faculdade de Arte e Design / FACED TEIXEIRA, Cíntia Mestranda em Filosofia, Faculdade de Arte e Design / FACED Palavras-chave: Terceira idade, design, criatividade. Este trabalho enfoca os resultados da pesquisa já concluída, para subsidiar o desenvolvimento de coleção para senhoras na terceira idade. Objetiva, ainda, ampliar o conceito de moda e a aplicação do design no vestuário deste segmento, levando-se em conta seu comportamento, sua vivência e percepções, no desenvolvimento da coleção proposta. Keywords: Old age, design, creativity. This study focuses on the results of research already completed, to support the development of the collection for women in old age, extending the concept of fashion design for the clothing in this segment, taking into account their behavior, their experiences and perception for the development of this collection.

1 – Introdução Os idosos representam hoje um grupo de 14 milhões de pessoas, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, com base no Censo 2000. O Instituto considera pessoas idosas aquelas com mais de 60 anos, sendo o mesmo considerado pela Organização Mundial da Saúde (OMS) para os países em desenvolvimento. Em uma década o número de idosos no Brasil cresceu 17%. O envelhecimento da população brasileira é um reflexo do aumento da expectativa de vida, devido ao avanço no campo da saúde e à redução da taxa de natalidade. Prova disso é a participação dos idosos com mais de 75 anos no total da população. A expectativa de vida da população brasileira hoje é de 79 anos para homens e 82 anos para mulheres. Estima-se que em 2020 a população com mais de 60 anos no país deva chegar a 30 milhões de pessoas, ou seja, será de 13% do total. Dentro das expectativas mundiais do aumento da longevidade e do aumento da população idosa, o estudo sobre comportamento humano e a psicodinâmica do consumo muito têm a contribuir para a moda e o design para a terceira idade. A moda, para Barthes (2005, p.282), “é um fato completo em cujo estudo se recorre ao mesmo tempo à história, à economia, à etnologia, podendo até ser – como veremos em breve – uma lingüística”. “A moda e a indumentária são, portanto, algumas das maneiras pelas quais a ordem social é experimentada, explorada, comunicada e reproduzida. Englobam assim, práticas significantes, modos de gerar significados, que produzem e reproduzem aqueles grupos sociais ao mesmo tempo em que suas posições de poder relativo. Ou seja, moda e indumentária não são usadas apenas para indicar ou fazer referência a posições sociais e culturais, mas para construir e marcar, em primeiro lugar, aquela realidade social e cultural. Caracterizam-se, por conseguinte, nas maneiras pelas quais a sociedade é produzida e reproduzida, e não meramente uma reflexão de grupos sociais” (BARNARD, 2003, p. 64).


O termo moda é mais comum para designar mudanças no vestuário e na aparência da estética corporal, embora também seja usado para referenciar-se a mudanças periódicas nos padrões formais de todas as esferas: “O caráter efêmero dos itens de moda os diferenciam de outros tipos de vestuário que mais se caracterizam pela permanência. Os trajes religiosos, monárquicos ou etnográficos, por exemplo, buscam a manutenção da tradição, assim, as mudanças nas suas características são quase imperceptíveis, pois se processam em períodos extremamente longos. Para eles o termo mais apropriado é indumentária. Uma peça só poderá ser definida como um item de moda a partir do levantamento do contexto em que foi gerada e usada e conseqüência é nesse percurso que podemos tentar buscar seu significado histórico concreto” (ANDRADE, 2005, p.5).

Por meio da semiótica pode-se observar a moda como um sistema de significação, no qual os significados são produtos culturais entrelaçados; um item de moda, portanto, não pode receber um único significado, pois diferentes “personagens”, ou melhor, agentes sociais, atribuem diferentes significados ao mesmo. O significado da roupa vai se modificando com o tempo e o uso, o fato de ter sido usada em determinada ocasião ou por determinada pessoa, ou de ter pertencido a alguém especial, acaba por gerar uma memória afetiva da roupa, uma história do objeto que corresponde ao significado que lhe é atribuído. Como objeto semiótico, a moda faz parte de um sistema elementar, que através da construção da imagem, pode ser projetada de maneira ‘ideal’, ‘real’ ou ‘social’, traçando assim uma rede de significados complexa. Ao compreender o processo de significações envolvidas nas escolhas, pode-se nortear o processo de criação para conceber produtos que vão de encontro à satisfação de determinado segmento de consumidor. O designer de moda, ao projetar uma roupa, deve antes de tudo, buscar conhecer bem o seu público alvo, apreender suas escolhas culturais, necessidades e desejos, tendo em vista conciliar as características pesquisadas com o conforto e a praticidade. Portanto, é preciso pensar que ao chegar à meia idade, há uma relativa mudança nas formas anatômicas e apesar de outros interesses ligados à sua faixa etária, esta nova geração de idosos tende a consumir produtos de moda. Torna-se necessário, assim, um estudo aprofundado sobre moda e terceira idade, nos seus vários aspectos como: durabilidade, funcionalidade, usabilidade, ergonomia e o fator preponderante moda, apreendendo desejos e necessidades. De acordo com Moraes (2005), os produtos são projetados levando-se em consideração o apelo comercial, o modismo, as estratégias de marketing e não os princípios da ergonomia e usabilidade. Afirma também, que o homem sempre esteve em busca do belo, muitas vezes inconscientemente, e que no decorrer da história do design, o objeto belo se opunha diretamente ao objeto funcional. Levando em consideração estes fatos, podemos dizer que no vestuário, sobretudo na terceira idade, o belo e funcional devem caminhar juntos: “Os fatores que compõem a usabilidade – efetividade, eficiência e satisfação - podem estar subordinados a estas respostas emocionais dos usuários. Primeiramente o fator mais subjetivo - a satisfação - o nível de conforto e de aceitabilidade dos usuários ao usar um produto que exerce fascínio no usuário mesmo que não possua as características fundamentais de usabilidade dos produtos. A satisfação pode ser considerada o aspecto mais importante da usabilidade, pois envolve o sentimento do usuário em relação ao produto que muitas vezes define o relacionamento entre o usuário com o produto” (MORAES, 2005, p 101).

Considerando-se que a população idosa vem crescendo mundialmente e que esta população vem se tornando cada vez mais ativa, pode-se dizer que estamos diante de um novo papel social para os indivíduos de terceira idade: estes estão deixando de ser a vovó ou o vovô que apenas cuidam dos netinhos, para ser a senhora ou o senhor que se reúne com os amigos para discutirem vários assuntos, para se divertirem e fazerem passeios turísticos, enfim, pessoas que gostam de cuidar do corpo, fazer ginástica e consumir produtos de moda.


Neste sentido, os valores sociais e culturais vêm se transformando, a ponto de revelar-se uma nova imagem para a terceira idade. Esta é a temática que motivou e desencadeou uma pesquisa voltada ao público de terceira idade, de uma Faculdade Sênior, que subsidiou o desenvolvimento de coleção, enfocado neste artigo. 2 - O projeto e a metodologia adotada A Faculdade Sênior / FACED viabiliza aos idosos um local de encontro para pessoas acima de 50 anos, que se reúnem para estudar diversos temas, além de promover atividades diversas nas áreas da criatividade, dança, música, entre outros. O grupo é formado em média por 150 pessoas acima de 50 anos, de diversas classes e papéis sociais. A primeira etapa do projeto, já explicitada em outro artigo, consistiu na revisão bibliográfica, estudo de tendências de moda, estudo de caso, com aplicação de questionários. A aplicação de questionários - contendo doze questões de múltipla escolha - voltados a apreender gostos e preferências com relação ao vestuário, foi complementado com um levantamento antropométrico para fundamentar a análise ergonômica e propiciar uma modelagem mais adequada. A população estudada, por amostragem, constituiu-se de 50 entrevistados do sexo feminino, com 60 até 90 anos de idade, freqüentadores da referida faculdade. Diante dos resultados da pesquisa de campo e da compilação de dados, partiu-se para realizar o planejamento de coleção, a princípio conceitual, tendo em vista englobar as aspirações das entrevistadas. Levando em consideração os vários estilos de vida e de personalidades diversas, definiu-se por elaborar uma coleção inspirada em quatro sub-temas distintos - lembranças, luta, ousadia e sabedoria - tendo como título principal: “A vó é minha e daí?”. Este título foi escolhido como alusão à aceitação da sociedade, das pessoas idosas, do jeito que elas se revelam, sem vergonha ou discriminação. Foram realizadas as seguintes etapas: - Montagem do painel do tema, com recortes iconográficos da terceira idade, cartela de cores, onde foi realizado um estudo de cores conceituais que lembrassem e sugerissem os sub-temas; - Seleção dos materiais, tecidos, aviamentos e outras matérias primas relacionadas, que foram selecionados; - Definição do material: após análise sob a ótica da disponibilidade e viabilidade técnica de aplicação, os materiais pré-selecionados foram submetidos a uma seleção final, que determinou o material em que o trabalho se concentraria; Em cada um dos quatro sub-temas foi trabalho uma cartela de cores conceitual, cartela de tecidos, cartela de aviamentos, cartela de interferência de matéria prima e croquis, que serão resumidamente caracterizados, a seguir: Lembranças - um sub-tema que tem como foco senhoras mais conservadoras que gostam do tradicional, e dão grande valor às coisas vividas no passado:


Luta - um sub-tema que tem como foco senhoras que estĂŁo em busca de vencer na vida, e enfrentam a vida de frente, praticam esporte e estĂŁo diretamente ligadas Ă natureza:


Ousadia – um sub-tema que enfoca as senhoras ousadas, à frente do seu tempo, que querem ser o que são, e não estão preocupadas com o que os outros vão achar:

Sabedoria – O último sub-tema que traduz àquelas senhoras que mais ouvem que escutam, que têm muito a oferecer pelo que já viveram, curtem o seu cabelo branco e a sua idade, ficam felizes por terem chegado com saúde e buscam a paz:


Após o desenvolvimento de toda a coleção e da ficha técnica dos produtos, foi escolhido para confecção, o último sub-tema: sabedoria. 3 – Considerações finais A partir dos resultados da pesquisa de campo e da compilação de dados, foi possível realizar o planejamento de coleção, a princípio conceitual, tendo em vista englobar as aspirações das entrevistadas, levando em consideração os vários estilos de vida e as diferentes personalidades e especificidades relacionadas à faixa etária do referido público. Desta forma, foram viabilizadas as diversas possibilidades de criação de coleções, decorrentes do mapeamento das respostas aos questionários e demais dados levantados, específicos aos quatro sub-temas, decorrentes do tema proposto. Verificou-se, também, que é possível projetar produtos que trabalhem a parte ergonômica juntamente com a estética, decorrentes dos padrões culturais, escolhas e desejos individuais, apontados pelo público enfocado. Portanto, etapas como o estudo do público alvo, estudo de tendências da moda, revisão bibliográfica, seleção dos materiais, assim como o estudo dos materiais selecionados, descrição dos processos de transformação dos materiais, definição do material e testes, são de suma importância para a realização de uma coleção. Verificou-se ainda ser imprescindível conhecer, compreender e explorar este nicho de mercado, que aumenta a cada ano. Notas 1 - IBGE, 2000. Brasília: Ministério do planejamento, orçamento e gestão. Disponível em: <http://www.ibge.gov.br/home/estatistica/populacao/censo2000/populacao/pop_Censo2000.pdf> Acesso em18/08/2008

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