Foto de capa: Folhapress
Sumário
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PRIMEIRAS PALAVRAS
CAPA
Apesar do maciço crescimento nas últimas décadas, Igreja Evangélica brasileira apresenta paradoxos e precisa superar as próprias mazelas para cumprir seu papel no país
REFLEXÃO Brian McLaren
ESPIRITUALIDADE Eduardo Rosa Pedreira
CARTAS E MENSAGENS SOCIEDADE
Acirra-se a discussão sobre projeto de lei que criminaliza ações consideradas preconceituosas contra gays
FRASES E PENSAMENTOS CH INFORMA PAVAZINE #
MINISTÉRIO
Associação Willow Creek repensa seus métodos a partir de pesquisa que revelou resultados que surpreenderam seu próprio fundador, Bill Hybels
SEXUALIDADE John Piper
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CINECULT
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SONS DO CORAÇÃO
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ENTREVISTA
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LIVROS E RESENHAS
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CH DIGITAL
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ÚLTIMAS PALAVRAS
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INTERNACIONAL
Assassinato de obreiros no Afeganistão gera comoção e põe em xeque vocação missionária da Coréia do Sul
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OS OUTROS SEIS DIAS
BRASIL
Sociedade Bíblica do Brasil lança o “Ano da Bíblia”, ampla programação para promover a cultura da Palavra de Deus e sua leitura em 2008
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Para o pensador e escritor Os Guinness, a participação dos crentes é fundamental no debate dos problemas da sociedade
Perguntas sobre CH Como posso contatar a redação da revista? Envie um e-mail para redacao@cristianismohoje.com.br ou escreva para o endereço postal: Caixa Postal 107.006, Niterói (RJ) – CEP 24.360-970. Inclua seu nome e endereço completos
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PRIMEIRAS PALAVRAS Revista Cristianismo Hoje A verdade com conteúdo evangélico www.cristianismohoje.com.br Quem somos Cristianismo Hoje é uma publicação evangélica, nacional e independente, que tem como objetivo informar, encorajar, unir e edificar a Igreja brasileira, comunicando com verdade, isenção e profundidade os fatos ligados ao segmento cristão, bem como o poder transformador do Evangelho a todos os seus leitores
A serviço da Igreja
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Quais são os desafios para uma Igreja que nos últimos anos vem crescendo e influenciando os mais variados setores da sociedade? Hoje, no Brasil, cada vez mais pessoas se dizem evangélicas, crentes ou cristãs – na verdade, sinônimos que expressam o pertencimento a alguma das mais de 200 mil comunidades protestantes que atuam no país. Professando teologias e eclesiologias das mais diversas, este imenso rebanho, estimado em cerca de 40 milhões de fiéis por muitos pesquisadores, já deixou há muito o gueto social que habitava. Todavia, até que ponto a qualidade de sua fé, ou o compromisso real com os valores do Evangelho, vai interferir no testemunho a uma nação já tão sofrida e defraudada? Ainda jovem e imatura, se comparada à americana, por exemplo, a Igreja Evangélica nacional precisa, mais do que nunca rever conceitos e atitudes. Por isso, nesta edição, duas matérias se destacam e se complementam. A de capa, Grandes desafios de uma jovem Igreja, é uma análise profunda dos paradoxos do segmento evangélico brasileiro. Apesar do gigantismo, do entusiasmo de seus membros e da plena liberdade de que goza, essa Igreja precisa descobrir o caminho da relevância diante da sociedade. Já a reportagem Ajuste de percurso mostra como uma das congregações cristãs mais influentes da atualidade, a Willow Creek Community Church, de Chicago (EUA), teve a coragem de fazer um mea culpa e de reconhecer a necessidade de mudanças. É um grande exemplo de que, quando as coisas não saem exatamente conforme o prometido, a liderança tem o dever de assumir os eventuais erros e corrigir rumos para o bem do Reino. Enquanto isso, em outros cantos do mundo, seguir o “Ide” de Jesus representa pagar um alto preço. O assassinato de dois obreiros sul-coreanos, ocorrido no Afeganistão em julho passado, provocou uma crise na vocação missionária daquela nação asiática. Criticada por todos os lados, a Igreja da Coréia do Sul pode adotar medidas radicais – inclusive, impedir o envio de missionários para regiões conflagradas do planeta, o que teria um efeito imprevisível sobre a evangelização mundial, conforme o leitor pode conferir nesta edição. E Ainda nesta edição de CRISTIANISMO HOJE, destacamos o Ano da Bíblia, iniciativa da Sociedade Bíblica do Brasil que pretende impulsionar como nunca a leitura da Palavra de Deus em nosso país. Leia também a matéria Cabo de guerra no Congresso, sobre a tramitação da polêmica lei anti-homofobia que tem preocupado evangélicos e católicos, num raro momento de convergência entre esses dois grupos religiosos; além, é claro, dos artigos, colunas e seções que levam informação para promover a reflexão. Boa leitura! Marcos Simas Editor
A revista tem uma parceria com o grupo Christianity Today International, um dos mais importantes grupos de mídia cristã do mundo, com 11 revistas e 28 sites de conteúdo Conselho Editorial Carlo Carrenho, Carlos Buckzinsky, Eleny Vassão, Eude Martins da Silva, Marcelo Augusto Souto, Mário Ikeda, Mark Carpenter, Nelson Bomilcar, Richard Werner, Ronaldo Lidório, Volney Faustini e William Douglas Editor Marcos Simas Diretor de redação e jornalista responsável Carlos Fernandes – MTb 17336 Jornalistas desta edição Marcos Couto, Sarah Pulliam, Treici Schwengber e Valter Gonçalves Jr Colunistas Carlo Carrenho, Luciano Vergara, Nataniel Gomes, Nelson Bomilcar, Sérgio Pavarini e Whaner Endo Tradutores Cláudia Ziller Faria, Jorge Camargo, e Karen Bomilcar Revisores Alzeli Simas Colaboradores desta edição Brian McLaren, Eduardo Rosa Pedreira, John Piper, Rubinho Pirola e Ziel Machado Projeto gráfico oliverartelucas Publicidade publicidade@cristianismohoje.com.br Assinaturas 0800 644 4010 assinatura@cristianismohoje.com.br Caixa postal 2351 Brasília, DF CEP 70842-970 Informações e permissões para republicação de artigos faleconosco@cristianismohoje.com.br Distribuição MR Werner Distribuidora de livros Ltda. CLN 201 - Bloco C Subsolo - Asa Norte Brasília - DF - CEP 70832-530 CNPJ 06.013.240/0001-07 – IE 07.450.716/001-45 Impressão Gráfica Ediouro Tiragem - 20.000 exemplares Endereço editorial Caixa Postal 107.006 Niterói - RJ - CEP 24360-970 Cristianismo Hoje é uma publicação da Msimas Editora Ltda. CNPJ 02.120.865/0001-17 ISSN 1982-3614
Cartas e mensagens
É com emoção que vejo o lançamento de CRISTIANISMO HOJE em nosso país. Lembrei-me da década de 1940, quando ainda menino, na redação de O Jornal Batista, via o meu velho pai traduzindo textos de Christianity Today para o nosso jornal. Sei que CRISTIANISMO HOJE estará com seus olhos firmados na rica herança do cristianismo de ontem, vislumbrando com responsabilidade e atualidade o verdadeiro cristianismo de amanhã, que nada mais é do que o autêntico cristianismo de todos os tempos. Almir dos Santos Gonçalves Júnior, diretor executivo da Junta de Educação Religiosa e Publicações (Juerp) da Convenção Batista Brasileira Rio de Janeiro (RJ) O cristianismo tem um grande desafio para este século: resgatar sua missão e se fazer ouvir numa cultura cada vez mais secularizada e hostil à fé cristã. Para isto, nada melhor do que uma boa revista, historicamente comprometida com o evangelicalismo e com propostas relevantes para a Igreja e a sociedade. CRISTIANISMO HOJE chega num
momento crucial de nossa história. Que Deus abençoe este ministério e o preserve fiel ao seu chamado. Ricardo Barbosa de Sousa, pastor da Igreja Presbiteriana do Planalto Brasília (DF) CRISTIANISMO HOJE chega em boa hora para se somar a tantas outras que lutam para colocar a Igreja brasileira no centro da vontade de Deus. Nosso sincero desejo é que CRISTIANISMO HOJE não seja apenas um veículo para repetir notícias, mas que seja um instrumento inspirador e renovador de edificação para o Corpo de Cristo. Parabéns a todos que aceitaram este grande desafio. Tito Oscar, bispo da Igreja de Nova Vida São Paulo (SP) Gostaria de parabenizar a equipe de CRISTIANISMO HOJE pelo lançamento da revista, que mostra um alto grau de profissionalismo e qualidade. Creio que devemos fazer tudo para o nosso Deus com muita excelência, e a revista esta à altura de um povo cristão que busca ver e viver o Reino aqui e
agora. Que o Senhor os abençoe e guie neste caminho, impactando e alcançando vidas através deste projeto. Malu Moreira Via internet Por necessidade de clareza e em função do espaço disponível, CRISTIANISMO HOJE reserva-se o direito de editar as cartas que recebe, adaptando sua linguagem ou suprimindo texto Erramos • Diferentemente do que foi publicado na primeira edição, na reportagem Inocentes sob risco, a menina Hakani é que levou uma flechada de seu avô Kimaru. As cicatrizes do ferimento, como mencionado no texto, mais tarde ajudaram os suruwahá a reconhecer Hakani – salva e tratada pelo casal de missionários Edson e Márcia Suzuki – como a criança doente que a tribo um dia condenara à morte • No rodapé biográfico do artigo Evangélicos, evangelicais e fundamentalistas (edição número 1), consta que o pastor Ed René Kivitz tem três filhos. Na verdade, são dois
Humor
Rubinho Pirola
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SOCIEDADE
Cabo-de-guerr Acirra-se a discussão sobre projeto de lei que criminaliza ações consideradas preconceituosas contra gays Treici Schwengber
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Um projeto de lei da Câmara dos Deputados que, à primeira vista, parece atender a uma causa nobre — salvaguardar a integridade e os direitos de uma minoria —, pode obrigar os políticos que o defendem a sacrificar votos preciosos em futuras eleições. Especialmente, de evangélicos. Ainda que com declarações públicas de respeito mútuo por parte de seus defensores e críticos, a verdade é que o Projeto de Lei da Câmara (PLC) 122/06, que tramita no Senado Federal, converteu-se em um cabo-de-guerra. De um lado, seu conteúdo é defendido pelos grupos de pressão em favor dos homossexuais, que querem uma lei a defendê-los de preconceitos; de outro, segmentos religiosos, sobretudo ligados às igrejas Evangélica e Católica, enxergam na proposta a possibilidade de terem cerceada sua liberdade de expressão e opinião. O motivo é que o texto, que altera a Lei 7.716 /89, a chamada Anti-racismo, além do Código Penal e da Consolidação das Leis do Trabalho, prevê duras sanções a quem causar qualquer tipo de constrangimento a pessoas que tenham orientação homossexual. A pena máxima prevista no projeto, de autoria da ex-deputada Iara Bernardi (PT-SP), chega a cinco anos de reclusão. Em tese, uma simples pregação religiosa que tenha conteúdo considerado anti-homoerótico pode, de acordo com o projeto, ser considerada constrangimento aos homossexuais – e assim, provocar prisão do pregador, a exemplo do que já
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ocorre em alguns países (ver detalhes do projeto no quadro da pág 12). Para alguns opositores do PLC, sua aprovação, dado o rigor do texto, pode até provocar efeito inverso, com um recrudescimento do preconceito contra os gays. No início de 2007, os ativistas homossexuais esperavam que o projeto, no Senado, seguisse trajetória relativamente tranqüila e viesse a ser aprovado ainda no primeiro semestre. Mas dois fatores emperraram a aprovação do PLC 122/06. Primeiro, a crise do Senado, com as denúncias envolvendo seu então presidente, Renan Calheiros (PMDB-AL), tornou tudo mais lento naquela Casa. Pesou contra, também, o fato de evangélicos e católicos terem Manisfestação de ativistas em frente ao Congresso: votação polêmica acirra ânimos entre simpatizantes do homossexualismo e grupos religiosos
Geraldo Magela/Agência Senado.
prestado mais atenção no projeto, que na Câmara tramitou sem passar por nenhum debate público. Na Comissão de Direitos Humanos (CDH), onde o PLC é relatado pela senadora Fátima Cleide (PT-RO), duas audiências públicas discutiram o mérito, com a presença de manifestantes gays e representantes religiosos, além de juristas, que, na maioria, apoiaram a criminalização da discriminação contra os homossexuais. Depois da CDH, o projeto deve ir para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), cujo presidente, senador Marco Maciel (DEM-PE), indicará o novo relator. Até o fechamento desta edição, porém, ainda não havia de-
Jonathan Gayman
a no Congresso finição quanto à decisão da CDH. Mesmo com a pressão contrária, a tendência é que a comissão do Senado aprove o relatório de Fátima Cleide, favorável ao texto, segundo diz, em razão do alto número de assassinatos cometidos contra homossexuais no país. No entanto, a senadora, que em outubro participou da passeata do Orgulho Gay em Copacabana, no Rio de Janeiro, sentiu a pressão. Ao Jornal do Senado, a parlamentar disse que o PLC não significa uma “lei da mordaça” para os cristãos: “O projeto não criminaliza a crença pessoal desfavorável à homossexualidade”, justifica, “mas penaliza ações que conduzam à imposição dessa crença a outros indivíduos, suprimindo a liberdade de uns, pelo arbítrio de outros”, afirma, curiosamente usando o mesmo argumento dos religiosos para combater o PLC 122/06: o de que sua aprovação significaria a imposição de uma perspectiva homoerótica a toda a sociedade. Fervura – O que se antevê, à medida que o projeto tramita no Legislativo, é um acirramento de ânimos. A questão, polêmica como todos os assuntos ligados ao comportamento e aos direitos individuais, mobiliza diversos grupos. Há simpatia, na sociedade, à idéia de que os gays devem ser respeitados – mas uma eventual repressão ao direito de discordar do comportamento homoerótico atemoriza os religiosos. No intuito de pressionar o Senado, grupos evangélicos têm espalhado convocações pela mídia e pela internet. “Diga não!” é a campanha do pastor Silas Malafaia, da Assembléia de Deus, para que os crentes enviem e-mail para os senadores protestando contra o PLC 122/06. Em questão, o direito, garantido na Constituição, de pregar a Bíblia – inclusive os trechos que se referem ao comportamento sexual. “Não tenho nada contra os homossexuais, mas não vou parar de pregar que homossexualismo é pecado. Ninguém vai me calar, não tenho medo de processos”, tem dito Malafaia, veemente, em seu programa de TV Vitória em Cristo, com grande audiência entre os evangélicos.
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SOCIEDADE
Punição rigorosa
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e aprovado, o PLC 122/06 torna crime discriminar ou incitar a discriminação contra homossexuais, o que poderá levar à prisão por até cinco anos. A interpretação dessa determinação, diz o texto, será a mais larga possível, com o objetivo de combater o preconceito. A partir de sua eventual aprovação, a prática, a indução e a incitação da discriminação e do preconceito em relação a sexo, orientação sexual e identidade de gênero passarão a ser consideradas crime. O instrumento altera a Lei 7.716/89, que define os crimes resultantes de discriminação ou preconceito de raça, cor, etnia, religião e nacionalidade. A proibição incluiria ações violentas, constrangedoras ou vexatórias, mesmo de ordem moral, filosófica ou psicológica – o que, teoricamente, pode enquadrar pregações e mensagens de cunho religioso contra o comportamento gay. Além de tentar coibir ações que prejudicariam cidadãos homossexuais – como deixar de contratar ou impedir a ascensão profissional de alguém por sua preferência sexual, além de penalizar com prisão e multa qualquer proprietário ou administrador que recuse a venda e o aluguel de imóveis a gays devido a esta condição –, o projeto tem pontos bem controversos. É o caso do trecho que penaliza com rigor quem impedir que homossexuais “manifestem afetividade” em quaisquer lugares públicos ou privados abertos ao público.
Henrique Teixeira/Agência Senado
“Em breve poderemos assistir pastores sendo presos por pregarem o Evangelho, como em muitos países da África, e pais perdendo a guarda dos filhos por transmitirem a sua convicção religiosa, como ocorre em localidades do Oriente Médio”, alerta a nota divulgada pela Missão Portas Abertas. Agência internacional de defesa da liberdade religiosa, a entidade, que mantém escritório em São Paulo, vai além: “O governo federal é favorável à criação desta nova lei e seu posicionamento está claramente expresso no programa ‘Brasil sem homofobia’”, destaca o comunicado. “O discurso religioso não é homofóbico, ou tem medo dos iguais. Nossa postura nasce do amor a Deus e à sua Palavra”, salientou o pastor e líder presbiteriano Guilhermino Cunha, em debate no Senado. Dentro do Congresso Nacional, o assunto ferve entre os parlamentares ligados a denominações evangélicas. O senador Marcelo Crivella (PR-RJ), que é bispo licenciado da Igreja Universal do Reino de Deus, tem se manifestado contrariamente à aprovação da nova lei. Preocupado, ele diz que a nova medida poderia até mesmo levar à punição o pai que, eventualmente, ensinasse a seu filho que a homossexualidade é pecado, de acordo com preceitos bíblicos. O deputado Robson Rodovalho (DEM-DF), que é líder da Comunidade Sara Nossa Terra, acompanhou
Defesa de princípios: parlamentares evangélicos negociam com a senadora Fátima Cleide, relatora do projeto
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Agência Senado
SOCIEDADE
os debates na CDH do Senado. Durante uma audiência pública, propôs que o texto do PLC fosse amenizado, em busca de um consenso que atenda à demanda por proteção aos homossexuais e à liberdade de expressão para os religiosos. Por sua vez, o ativista Toni Reis, presidente da Associação Brasileira de Gays, Lésbicas, Bissexuais, Travestis e Transexuais (ABGLT), integrante do grupo de trabalho que estudou e colaborou com o projeto, lamenta que parlamentares evangélicos queiram retirar do texto em discussão as expressões “orientação sexual’ e “identidade de gênero”. No seu entendimento, isso mutilaria o projeto. Mesmo assim, Reis chegou a acenar com a possibilidade de um consenso – “Desde que se aprove uma lei em defesa dos direitos dos homossexuais”. A relatora Fátima Cleide afirmou ter conversado com os religiosos em busca de um acordo, que implicaria a aprovação do projeto no Senado com o posterior veto, por parte do presidente da República, Luiz Inácio Lula da Silva, dos pontos que viessem a ser acertados. Isso impediria que o PLC 122/06 sofresse mudanças e, por causa disso, tivesse que voltar à Câmara, o que levaria os ativistas homossexuais a esperar mais tempo para conquistar uma lei em sua defesa. Por sua vez, o senador Magno Malta (PR-ES), um dos evangélicos da Casa, confirmou ter sido procurado pela senadora, mas descartou a possibilidade de um acordo nesses termos. Para ele, o PLC simplesmente tem que ser derrubado no Senado.
O senador Marcelo Crivella: para ele, projeto atenta contra a liberdade de pensamento
Permissividade e intolerância
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uem está certo? Ativistas em defesa dos homossexuais ou grupos religiosos anti-gays? Muitas vezes, é fácil perceber que os dois estão errados... Durante passeata organizada por ativistas gays em Niterói, Região Metropolitana do Rio de Janeiro, uma entidade que milita em favor da diversidade sexual distribuiu uma cartilha indicando aos homossexuais locais públicos onde é possível, segundo o texto, praticar sexo — o que incluiu os banheiros das barcas que fazem a travessia entre Niterói e a cidade do Rio, meio de transporte utilizado por mais de 50 mil pessoas diariamente. A cartilha revoltou muita gente, já que a prática constitui atentado violento ao pudor, que é crime. A Delegacia de Proteção à Criança e ao Adolescente informou que, a partir de denúncias, poderá autuar quem assim agir e reprimir esse comportamento. Outros folhetos, com orientação sobre como usar drogas ilícitas, fo-
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ram distribuídas por outro grupo, a Parada do Orgulho Gay realizada este ano em São Paulo, e também provocou muita polêmica. Por outro lado, também há evangélicos que ultrapassam o limite do bom senso, embarcando numa militância anti-gay. Nos Estados Unidos, uma igreja batista do Kansas chegou ao ponto de realizar um piquete no funeral de um militar americano, levando cartazes como “Graças a Deus pelos soldados mortos”, “Você está indo para o inferno” e “Deus odeia bichas”. A grosseria surgiu porque seus autores relacionaram as mortes dos militares no conflito do Iraque a uma suposta punição divina pela tolerância dos EUA em relação ao homossexualismo. O resultado, para a igreja, foi uma sentença por danos morais que a obrigou a pagar uma multa de US$ 10,9 milhões – cerca de R$ 20 milhões.
Frases e Pensamentos
O cristão e a oração Mary van der byl
faze com que eu receba da tua mão agora também as coisas difíceis. Dietrich Bonhoeffer, em Resistência e submissão Enquanto eu ficava deitado
ali, falando com Deus, sendo sincero com ele, comecei a me sentir um pouco mais sereno. Eu me senti como se estivesse me desculpando com um velho amigo, alguém com quem tinha desenvolvido uma certa amargura; e o amigo estava dizendo que ‘tudo bem’... Eu me senti como se estivesse começando, ou apenas sendo começado. Essa é a coisa de se entregar a Deus: eu senti muita paz. Donald Miller, em Como os pingüins me ajudaram a entender Deus
Quanto mais tempo passar na
presença de Jesus, mais acostumado [você] ficará com a face dele e precisará de menos adulação, porque terá descoberto, por si mesmo, que ele é suficiente. Em sua presença, você se deliciará com a descoberta do que significa viver pela graça, e não pelo desempenho. Brennan Manning, em O impostor que vive em mim
Eu me recordo de um homem de
Deus a quem foi perguntado: ‘O que é mais importante – ler a Palavra de Deus ou orar?’. Ele respondeu: ‘O que é mais importante para um pássaro, a asa da direita ou a da esquerda? A. W. Tozer, em Jesus, our Man in Glory [Jesus, nosso homem em glória]
Então, digo a vocês: busquem a Deus, descubram-no e façam dele um poder em sua vida. Sem ele, todo nosso esforço é cinza e o nascer do sol, a noite mais escura. Sem ele, a vida é um drama sem sentido, no qual faltam as cenas decisivas. Mas com ele deixamos a fadiga do desespero e nos elevamos à alegria da esperança. Com ele, deixamos o desespero da meia-noite
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e alcançamos a alvorada da alegria. Agostinho tinha razão – fomos feitos para Deus e só teremos sossego quando encontrarmos descanso nele. Martin Luther King, Jr., em The Words of Martin Luther King Jr. [As palavras de Martin Luther King Jr.], compiladas por Coretta Scott King Orar a Deus nos torna uma pessoa completa na presença de Deus; é sermos a pessoa que Deus sempre tencionou que fôssemos: abertos, confessores, perdoados, purificados, humildes. É tornarmonos obedientes, sustentados, guiados, fortalecidos, e até renovados e inspirados diariamente. James M. Houston, em Orar com Deus Ouve a voz de Deus, imensa, Poderosa, fica em pé... abre os olhos – para a crença e os ouvidos – para a fé. Gióia Júnior, em Orações do cotidiano Louvor e gratidão a ti por toda a tua bondade e fidelidade. No tempo de minha vida que passou. tu me mostraste muitas coisas boas,
O que aconselho veementemente é: não abandonem o hábito da oração, pois é nela que uma pessoa compreenderá aquilo que está fazendo e buscará arrependimento no Senhor e forças para se erguer. Vocês devem crer que, quando estão desistindo da oração, estão, em minha opinião, cortejando um grave perigo. Teresa de Ávila, em Vida de oração Talvez você não acredite em
oração. Pode ter tentado orar e ficado profundamente decepcionado e desiludido. Parece ter pouca ou nenhuma fé. Não importa. O coração do Pai está aberto. Você é bem vindo ali. Richard Foster, em Oração, o refúgio da alma
Não oramos para liquidar
problemas de forma mágica. Oração é a prática da paciência. Situações difíceis, às vezes, não se resolvem, mas quando oramos somos transformados. Nós nos consagramos a Deus e somos santificados de modo que, em certas ocasiões, não é a circunstância que muda, mas o nosso olhar. Osmar Ludovico, em Meditatio
CH INFORMA
Inofensivo e edificante
Lançado em agosto, o GodTube (www.godtube.com), versão gospel do YouTube, já é um fenômeno. Site de vídeos de conteúdo cristão, o GodTube atrai uma média de três milhões de visitas por mês – marca considerada assombrosa, mesmo em termos de internet. Segundo a consultoria especializada Media Metrix, trata-se do site que mais cresce no momento nos Estados Unidos. Ao contrário do YouTube, o GodTube não abriga todo tipo de vídeos. Ali, não entram filmetes de conteúdo pornográfico ou violento, por exemplo. Segundo seu idealizador e diretor executivo, Chris Wyatt – um produtor de
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TV recém-convertido ao Evangelho –, a iniciativa surgiu com objetivo de aplicar a tecnologia da internet à Palavra de Deus “como forma de atrair os jovens”. Ivan León, gerente da divisão hispânica do GodTube, afirmou à Agência Efe que o portal faz sucesso porque se dirige a um mercado descuidado durante muito tempo. Como exemplo da linha família adotada pelo site, o campeão de audiência no GodTube é um prosaico vídeo mostrando uma garotinha de cinco anos recitando o texto do Salmo 23. Mais inofensivo e edificante, impossível, não é? Fonte: Gospel +
Droga de elite Uma pesquisa realizada pela prestigiada Fundação Getúlio Vargas (FGV) traçou o perfil do usuário de drogas no Brasil. Divulgado há dois meses, o estudo O estado da juventude: Drogas, prisões e acidentes, coordenado pelo professor Marcelo Côrtes Néri, não deixa qualquer dúvida – é mesmo a elite que financia a indústria das drogas ilegais no país. Além disso, o levantamento põe por terra divagações sociológicas que associam o vício às camadas mais pobres da população. Segundo os dados apresentados, 85% dos usuários são de cor branca e pertence às classes A e B. A maioria dos consumidores tem entre 20 e 29 anos (50,74%), enquanto cerca de 36% têm idade entre 10 e 19 anos. Os consumidores do asfalto – assim chamados, normalmente, aqueles que não moram nas favelas e periferias e têm acesso à educação formal e a serviços públicos e privados de qualidade – disseramse em sua maioria católicos (88%) e concentram-se basicamente na Região Sudeste do país. O estudo foi minucioso. Sobre a forma de pagamento que utilizam na compra dos entorpecentes, quase 35% dos entrevistados admitiram recorrer ao cheque especial para quitar suas dívidas com os traficantes. Nada menos que 68% dos pesquisados que se situam na classe A disseram que podem consumir o tipo de droga que quiserem.
Teologia de alto nível
No momento em que o governo brasileiro fatura os dividendos políticos da descoberta de uma mega-reserva petrolífera, uma notícia causou apreensão: as emissões de gás carbônico, o principal causador do temido efeito estufa, cresceram 45% no país ao longo de dez anos. No período compreendido entre 1994 e 2005, houve um crescimento médio anual das chamadas emissões industriais – aquelas geradas por indústrias, geração de energia e transportes – da ordem de 3,4%. O índice, que supera em quase um ponto percentual o do PIB nacional, exclui um dos principais vetores poluentes no país, o desmatamento. Os dados constam do balanço de carbono do Brasil, elaborado em convênio pelo Ministério da Ciência e da Tecnologia e pela organização Economia e Energia. De acordo com os pesquisadores, o aumento deveu-se basicamente ao crescimento da frota rodoviária nacional, que já beira os 60 milhões de veículos, e à entrada em operação de novas usinas termelétricas, sobretudo a partir do apagão de 2001. O Brasil é um dos maiores poluidores entre as nações emergentes.
O anúncio de que bíblias não poderiam circular pela Vila Olímpica durante os Jogos de Beijing-2008 gerou forte reação internacional. Um dos mais vigorosos protestos veio justamente da maior potência olímpica mundial, os Estados Unidos. Embora a Regra 5 do Comitê Olímpico Internacional não permita qualquer tipo de manifestação política, racial ou religiosa nos lugares de competição e áreas similares, não há qualquer restrição às bíblias – mas o Comitê Olímpico dos EUA (USOC, na sigla em inglês) pediu garantias de que seus atletas poderão levar o livro sagrado na bagagem. Uma nota no edital dos Jogos Olímpicos de Beijing explica que a “cada viajante é recomendado não levar mais do que uma Bíblia para a China”. “Esperemos que os padrões estabelecidos pelo COI para Jogos anteriores também estejam em vigor para estes”, avisa o porta-voz do USOC, Darryl Seibel. De regime comunista, o gigante asiático impõe restrições legais ao cristianismo e figura em 12º lugar no ranking da intolerância religiosa elaborado anualmente pela organização cristã Portas Abertas. Fonte: Portas Abertas
Cerca de 400 pessoas participaram da 21ª edição do Theologando Internacional, promovido pela Fonte Editorial entre os dias 24 e 27 de outubro, em São Paulo. O evento, que já se tornou referência para o saber teológico nacional, tem como objetivo trazer aos alunos, professores e estudantes de diversas tradições cristãs a oportunidade de dialogar e aprender com personalidades do segmento cristão. Pensadores como Leonado Boff, Rubem Alves, Frei Betto e Walter Altmann, entre outros, falaram durante os quatro dias do congresso, realizado no Centro de Convenções Rebouças, coração da capital paulista. Além das palestras, a programação incluiu seminários conduzidos por líderes como Ariovaldo Ramos, Jonas Rezende e Rudolf Von Sinner.
Trânsito em São Paulo: crescimento da frota automotiva é apontado como causador do aumento da poluição no país
Divulgação
Liberada, mas com restrições
Arquivo
Poluição em verde e amarelo
O pensador católico Leonardo Boff foi um dos palestrantes do Theologando
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Notas Divulgação
Mago gay?
Alvo Dumbledore, que já foi interpretado pelo falecido ator Richard Harris: suposta paixão por rival
A escritora J.K. Rowling, autora da série de livros do bruxinho Harry Potter, acaba de atrair – de novo – a ira de muitos cristãos. Depois de ser acusada de satanista, ela agora resolveu mexer em outro vespeiro. Durante um evento em Nova Iorque, Rowling revelou que o venerando mago Alvo Dumbledore, que na história é uma espécie de mentor de Potter e diretor de Hogwarts, escola de magia onde estudam o jovem herói e seus colegas, é gay. O personagem teria se apaixonado por seu inimigo Gellert Grindewald, a quem derrota num dos episódios da saga. O escândalo ficcional pode vir a ser abordado no sexto filme da série do cinema, Harry Potter e o Enigma do Príncipe, que chega às telas em 2008. Questionada, a escritora disse que vê sua obra como “um argumento a favor da tolerância”.
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Registro da vergonha Depois de uma sucessão de escândalos sexuais envolvendo clérigos e leigos, a Igreja Anglicana da Austrália resolveu instituir uma espécie de “Registro da vergonha” em caráter nacional. O objetivo é listar seus ministros acusados de pecados morais – inclusive a fornicação e a prática da pedofilia. A Diocese de Sidney defende inclusive o fichamento de religiosos envolvidos e casos extraconjugais. Se aprovado, o cadastro será lançado em março de 2008 e suas informações serão restritas à liderança. Fonte: Rádio Vaticano
Chip na cabeça Cerca de dez por cento dos americanos concordariam em implantar um chip no próprio cérebro para navegar pela internet. A bizarra experiência, que em outros tempos causaria horror diante das advertências do Apocalipse acerca do surgimento do Anticristo, seria aceita até mesmo pelos crentes. A mesma pesquisa aponta que outros 10% dos entrevistados – um universo de 9,7 mil pessoas – acham que a internet os “aproxima de Deus”. Fonte: Diário Digital
Direito e fé A Aliança Evangélica Mundial divulgou nota em que comemora a parceria de abrangência global firmada com a Advocates International, rede de profissionais cristãos empenhados, entre outras atividades, na defesa da liberdade religiosa. “Com isso, a promoção dos direitos humanos será grandemente reforçada”, comemorou Geoff
Tunnicliffe, um de seus dirigentes. Advocates International reúne cerca de 30 mil associados, entre advogados, magistrados e estudantes de Direito e atua em 150 países.
Transexual no púlpito A Igreja Metodista Unida dos EUA decidiu que um pastor transexual poderá continuar exercendo suas funções clericais. O reverendo Drew Phoenix, que nasceu mulher – o nome anterior era Ann Gordon –, decidiu se transformar em homem quando tinha 47 anos. Embora diversos membros da congregação tenham solicitado seu desligamento, o Conselho Judicial da denominação aprovou sua nova identidade civil, alegando que os cânones metodistas são omissos quanto à eventual mudança de sexo de seus fiéis. Fonte: Mix Brasil
Artes, cultura e fé Discutir as nem sempre amistosas relações entre a fé evangélica e a cultura foi o objetivo do I Fórum Nacional de Cristianismo Criativo, realizado em novembro em São Paulo. Em encontros semanais realizados todas as segundas-feiras no auditório da Livraria Cultura, o evento, promovido pela W4 Editora com apoio de CRISTIANISMO HOJE, reuniu atores, poetas, músicos, artistas plásticos e compositores cristãos em torno de palestras, debates e pocket-shows junto ao público presente. Segundo Whaner Endo, publisher da W4, o objetivo da jornada foi encontrar caminhos possíveis para o desenvolvimento das artes no meio cristão e fomentar a produção cultural do segmento.
PavaZine# | Sérgio Pavarini
Cherie Wren
Viver é muito perigoso “Quem sou eu: Apenas uma partícula de existência nesse universo imenso. Sentimentalmente, uma pessoa realizada. Estou sempre de bom humor! Pela graça divina, me esqueço das coisas que para trás ficam e avanço para as que estão diante de mim. Deus é fiel! Religião: Cristão/protestante. Paixões: Deus, minha família e meus amigos da igreja. Livros: A Bíblia. Música: Gospel. Os dados acima foram compilados e combinados do perfil no Orkut de alguns jovens. Em comum, todos mostravam-se cheios de energia e profundo amor por Jesus. O pretérito é necessário porque eles não estão mais conosco. Todos colocaram um ponto final em sua trajetória terrena nos últimos meses. Acostumados a fechar os olhos para vários problemas que afligem o rebanho, muita gente fica atônita ao descobrir que, todas as semanas, alguns jovens evangélicos cometem suicídio. Ao conhecer a trajetória dos que nos deixaram, ficam estarrecidos ao descobrir que o estereótipo de “jovem problema” não se encaixa na maior parte dos casos. Para quem está longe, a solução é fácil. Basta teorizar que o suicida vai para o inferno – mas aos que vivenciaram essa dor inexprimível, o restante dos dias será permeado por questionamentos temperados com certa dose de culpa. Geralmente entretidos com atividades da igreja, os jovens crentes nem sempre têm com quem conversar sobre suas angústias mais esconsas. Numa estratégia que combina falta de sintonia e de sensibilidade, os insepultos acampamentos continuam marcados por “sexo oral” em profusão – no caso,
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“Todas as semanas, jovens evangélicos cometem suicídio. Geralmente entretidos na igreja, não têm com quem conversar acerca de suas angústias” palestras e mais palestras sobre o assunto, rep(r)isando o que acontece há várias décadas. Enquanto drenava minha indignação nestas linhas, soube de mais uma pá de casos de suicídio entre a moçada. Simultaneamente,
minha caixa postal continuava sendo entupida por spams de eventos que vão “impactar a vida” de quem colar por lá. Triste período em que os “lugares altos” perigosamente tornaram-se apenas o ponto escolhido por muitos jovens para o “impacto” final.
Zumbis de Jesus No livro Sobre a esperança, Frei Betto afirma que vivemos numa cultura da desgraça, na qual “as pessoas têm medo da vida, em vez do medo da morte”. Ser íntegro e autêntico é uma decisão que poucos intimoratos tomam quando o patrulhamento é acirrado. O caminho mais confortável é optar por corresponder às expectativas alheias, adotando o que Paul Tournier chama de “persona” e Brennan Manning trata por “impostor”. Vida dupla ou suicídio do “eu” verdadeiro, a existência desse pessoal resume-se a uma fastidiosa encenação. São meros mortos-vivos que não aquiesceram ao conselho do compositor mineiro e foram incapazes de “abrir o peito à força numa procura”. A frase de Guimarães Rosa que intitula este texto somente é veraz enquanto as máscaras permanecerem intactas. Que Deus abra nossos olhos e ouvidos para distinguir os gemidos cifrados de tanta gente sofrendo ao nosso redor. Sejam nossos braços abertos um dos sinais visíveis e terapêuticos do amor inaudito e sem reservas do Pai. Hic et hunc. Sérgio Pavarini é jornalista e marqueteiro. Blog: pavablog.blogspot.com E-mail: pavarini@uol.com.br
Cíntia Martins
BRASIL
Ano da Bíblia no
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Carlos Fernandes
Vai começar o ano da Bíblia no país da Bíblia. Citando o bordão preferido do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, pode-se dizer que, em 2008, a leitura e a divulgação da Palavra de Deus serão impulsionadas como nunca antes na história deste país. Lançada pela Sociedade Bíblica do Brasil agora em dezembro, a promoção Ano da Bíblia celebra uma série de acontecimentos festivos, como o 60º aniversário da SBB e o bicentenário da impressão e distribuição, no Brasil, dos primeiros novos testamentos em português. Além disso, o evento chega em momento especial para a Sociedade Bíblica do Brasil – ano passado, a instituição ficou em primeiro lugar mundial no santo negócio da produção da Bíblia Sagrada, com 5,6 milhões de exemplares completos impressos e distribuídos. É o melhor resultado entre as Sociedades Bíblicas Unidas, confraria internacional de publicadoras que envolve 145 entidades do gênero, com atuação em cerca de 200 nações e territórios. Será um ano inteiro de atividades, eventos e programações visando a popularizar a leitura bíblica (ver quadro na página 24). Para tanto, foi criado o Comitê Nacional de Apoio e Referência ao Ano da Bíblia, formado por pastores, empresários, personalidades, parlamentares e dirigentes de seminários e instituições evangélicas, com a participação de diretores e conselheiros da própria SBB.
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Comitês estaduais também foram implantados, reunindo lideranças locais e secretários regionais da Sociedade Bíblica. De norte a sul do país, diversas iniciativas vão se somar às que já são realizadas há anos pela entidade, como distribuição de bíblias e literatura cristã e programas sociais que atenderam, ano passado, cerca de 50 milhões de pessoas – inclusive, através de barcos-hospital que percorrem a Amazônia e beneficiam as comunidades ribeirinhas isoladas. Há ainda projetos de inclusão de deficientes físicos e apoio a presidiários, entre muitas outras iniciativas. “Esperamos que todos estejam unidos nesta campanha que vai impactar a sociedade brasileira”, discursou o presidente da SBB, o veterano pastor Enéas Tognini, no evento de lançamento do Ano da Bíblia, realizado em São Paulo, em setembro. Há bons motivos para acreditar nisso. Segundo país em números relativos de evangélicos (eles já seriam 22% da população nacional), o Brasil tem consumido cada vez mais bíblias. A evolução está nos números: em 2004, esse mercado faturou cerca de R$ 110 milhões; no ano seguinte, foram R$ 133 milhões, e em 2006, cujas cifras ainda estão sendo fechadas, teriam sido 160 milhões de reais, com uma distribuição de mais de 8 milhões de exemplares. A estatística inclui a produção de todas as editoras que distribuem bíblias no Brasil.
Sociedade Bíblica do Brasil lança ampla programação para promover a cultura e a leitura da Palavra de Deus em 2008
país da BÍBLIA Divulgação
“O grande objetivo do Ano da Bíblia é estimular as pessoas a lerem a Palavra de Deus”, resume o diretor executivo da SBB, o pastor Rudi Zimmer – ele próprio um erudito nas Escrituras, com doutorado em teologia e línguas bíblicas. “Se a leitura da Bíblia realmente cres-
Vista panorâmica da Gráfica da Bíblia: gigantismo empresarial e visão missionária
cer entre o povo brasileiro, certamente teremos pessoas melhores, famílias fortalecidas, igrejas mais consagradas e um país melhor”, entusiasma-se Zimmer. “A programação preparada visa exatamente isso: envolver as pessoas na leitura bíblica e, conseqüentemente, ter uma vida mais dedicada ao estudo das Escrituras.” Gigantismo – É impossível falar da SBB sem reconhecer seu gigantismo. Fundada em 1948, no Rio de Janeiro, com objetivo de difundir a Bíblia e sua mensagem, ela é uma entidade sem fins lucrativos tornou-se referência mundial em seu ramo de atividades. Pesou para isso, sem dúvida, a inauguração, em 1995, da Gráfica da Bíblia, grandioso empreendimento sediado em Barueri, na Grande São Paulo. Maior do gênero na América Latina, a Gráfica da Bíblia ocupa uma área de mais de 6 mil metros quadrados e tem capacidade de produzir, mensalmente, 1,2 milhão de bíblias completas e novos testamentos (ver quadro na página 26). Altamente especializada, a SBB imprime exemplares das Escrituras nas mais diversas apresentações, desde volumes de luxo até bíblias populares, cujo preço ao consumidor não ultrapassa os R$ 5 – mais barato que um lanche. De suas rotativas saem bíblias em 17 idiomas, incluindo línguas maciçamente disseminadas neste mundo globalizado, como inglês e espanhol, e dialetos
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Carlos Fernandes
BRASIL
Programação diversificada
C O diretor Rudi Zimmer: “Estímulo à leitura da Palavra”
tribais, como o iorubá, falado na Nigéria. De suas rotativas saem também bíblias em árabe, muitas das quais acabam chegando às mãos de cidadãos de países onde o cristianismo é reprimido. Ao todo, a empresa exporta para 96 países. Além das bíblias completas, a editora produz uma série de produtos, como porções e seleções de textos, bíblias temáticas e material de vídeo, áudio e multimídia. Equilibrar as necessidades do mundo empresarial com a vocação espiritual da entidade é um desafio. “Nossa missão é levar a Bíblia a todos, numa linguagem que possam entender e a um preço que as pessoas possam pagar. Dentro dessa missão, há também uma visão empresarial – para alcançar isso é preciso muita competência profissional”, frisa Zimmer. “A realidade corporativa e missionária precisam conviver na SBB, como em qualquer outra instituição. Mas, quem orienta o trabalho, sem dúvida alguma, é a missão”, garante o executivo. “Bíblia para todos” – O lançamento do Ano da Bíblia vai ao encontro dessa vocação, garante Erní Walter Seibert, secretário de Comunicação Social da Sociedade Bíblica do Brasil. A idéia é prestar serviços e popularizar como nunca a cultura bíblica. “Temos muitos programas de relacionamento que nos aproximam das pessoas e das instituições cristãs do país”, explica Seibert, que também preside a Associação de Editores cristãos (Asec). “Reali-
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om lançamento previsto para próximo dia 9 de dezembro – não por coincidência, o Dia da Bíblia –, a promoção Ano da Bíblia prevê uma extensa programação. A Sociedade Bíblica do Brasil (SBB) quer fazer de 2008 um ano de disseminação de cultura bíblica e leitura da Palavra de Deus. Com o lema “A Bíblia: Um livro para todos”, a entidade está organizando uma série de atividades, como cultos comemorativos e manifestações públicas em diversas partes do país. Já no dia 9, está marcado um abraço simbólico em Belo Horizonte (MG). Milhares de pessoas, reunidas no centro da cidade, recitarão textos bíblicos a uma só voz. Outra atividade é o Pedalando por Bíblias, passeio ciclístico temático que acontece na capital mineira e em São Paulo. Quem aprecia o estudo das Escrituras vai ter muitas oportunidades – a programação prevê maratonas de leitura e ciclo de palestras em instituições de ensino. Haverá também festivais de música gospel e erudita, exposições e a realização do 4º Fórum de Ciências Bíblicas, no Museu da Bíblia. Isso sem falar, claro, na intensificação das campanhas de distribuição gratuita da Palavra de Deus a públicos específicos. Em junho de 2008, na passagem do 60º aniversário da SBB, será lançado o projeto da Bíblia Manuscrita. Em várias cidades do país, serão montadas réplicas dos scriptorium, recintos da época medieval onde eram copiados livros, onde os interessados poderão ter a experiência de copiar textos bíblicos à mão. Algumas dessas bíblias manuscritas que serão produzidas ficarão expostas ao público. “Uma será doada à Biblioteca Nacional, no Rio de Janeiro, e outra integrará o acervo do Museu da Bíblia”, antecipa o pastor Eude Martins, coordenador do Ano da Bíblia. Quem quiser mais informações sobre o Ano da Bíblia pode acessar o site da SBB (www.sbb.org.br)
“Este livro é profundo, prático e prazeroso de ler. Ele nos propõe idéias novas e nos leva a um lugar onde podemos ver o Reino de Deus se espalhar pelo mundo em nossa geração. Esta obra chegou no momento certo.” John Maxwell, Fundador do INJOY Stewardship Services
Igreja Orgânica
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zamos, em todo o país, seminários de ciências bíblicas, além de encontros com nossos sócios evangelizadores, com livreiros e lideranças”, enumera. A SBB, que já mantém o Museu da Bíblia, também em Barueri, e o Centro Cultural da Bíblia, no Rio de Janeiro, está organizando exposições temporárias sobre temas bíblicos em várias cidades brasileiras. “Preparamos mostras em todo o país. Um exemplo disso é a exposição no Hall Monumental da entrada da Assembléia Legislativa do Estado de São Paulo, em comemoração ao Dia da Bíblia. “Estamos nos esforçando para que as pessoas saibam quem é a SBB, conheçam o que ela faz e apóiem seus trabalhos”, continua. “Nossa avaliação é que hoje um número maior de pessoas conhecem mais sobre a Sociedade Bíblica e a vêem como uma organização que se esforça para levar a Bíblia Sagrada a todos”, encerra.
Para Erní Seibert, a programação tem apelo institucional: “Queremos que as pessoas nos conheçam” 26 | CRISTIANISMO HOJE
Operários na linha de produção: edições em 17 idiomas
MINISTÉRIO
Ajuste de percurso Divulgação
Associação Willow Creek admite erros em sua proposta ministerial a partir de pesquisa que revela o valor dos programas devocionais na vida dos crentes
A Igreja Willow Creek: com mais de 20 mil membros e 12 mil comunidades associadas, ela é ponta de lança de uma organização multinacional
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Uma discussão que já se tornou recorrente no segmento evangélico de uns 20 anos para cá está ganhando novos contornos. Nestas duas últimas décadas, inúmeras igrejas e ministérios cristãos têm adotado métodos de crescimento baseados em programas especiais e fórmulas de otimização. Alguns deles têm critérios semelhantes aos adotados no mundo corporativo: estabelecimento de metas, definição de público-alvo e qualificação de mão-de-obra, entre outros. É a busca pela chamada “relevância”, termo dos mais amplos significados e que passou a designar, para muitos líderes, a própria razão de ser da obra de Deus. Por outro lado, aqueles que questionam a institucionalização do Corpo de Cristo argumentam que nada é mais eficaz do que o bom e antigo Evangelho pregado por Jesus, fundamentado na vida devocional e no discipulado olho no olho. Pois agora, uma das igrejas que melhor expressam a ênfase em métodos de treinamento e discipulado, a Willow Creek Community Church (WCCC), sediada em Chicago (EUA), acaba de reconhecer, publicamente, que
as coisas não saíram exatamente conforme o esperado. A WCCC, dirigida pelo pastor e conferencista Bill Hybels – um dos mais requisitados preletores cristãos da atualidade –, é a ponta-de-lança de uma organização de alcance internacional que envolve mais de 12 mil igrejas associadas, representando 90 denominações em 35 países, inclusive o Brasil. Há pouco tempo atrás, Willow Creek divulgou os resultados de um estudo qualitativo sobre seu ministério. O principal objetivo de iniciativa era saber que programas e atividades da igreja estavam realmente auxiliando pessoas a amadurecer espiritualmente e quais não atingiam essa meta. Os resultados foram publicados em um livro, Reveal: Where Are You? (“Revele: Onde você está?”), de co-autoria de Greg Hawkins, pastor executivo da Willow Creek. Hybels chamou os resultados de “estrondosos” e “inimagináveis”, entre outros termos de igual teor. Em palestra no último Leadership Summit, em agosto – evento anual promovido pela Associação Willow Creek –, o dirigente resumiu os resultados desta maneira: “Al-
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MINISTÉRIO
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gumas das coisas em que investimos milhões de dólares, pensando que auxiliariam as pessoas a crescer e se desenvolver espiritualmente, não estavam ajudando tanto”. Segundo ele, os estudos mostraram que outros aspectos mais convencionais da vida cristã – e que não requerem tantos recursos financeiros e humanos – são justamente “as coisas pelas quais as pessoas estão clamando”. E confessa, de forma literal e taxativa: “Nós cometemos um erro. O que deveríamos ter dito e ensinado às pessoas quando elas atravessaram a linha da fé e se tornaram cristãs é que devem tomar responsabilidade para se nutrirem. Nós deveríamos ter cuidado das pessoas, ensinado-as a ler suas Bíblias entre os cultos, bem como praticar suas disciplinas espirituais mais agressivamente, de forma individual”. Em outras palavras, Hybels reconhece que o crescimento espiritual não acontece da melhor forma quando os crentes tornam-se dependentes de programações elaboradas pela igreja, mas através das práticas antigas como a oração, a leitura bíblica e a comunhão – ou seja, cultivando relacionamentos com o Senhor e com os irmãos. E, ironicamente, estas disciplinas básicas não requerem estruturas dispendiosas ou milhares de funcionários para administrar. Após trinta anos criando e promovendo uma organização multimilionária dirigida por programas, medindo a participação das pessoas neles e convencendo outros líderes de igrejas a fazer o mesmo, é possível entender porque Hybels chamou esta pesquisa de “o despertar” de sua vida adulta.
O pastor Carlito Paes: “Os anseios e problemas das pessoas precisam ser respondidos de forma mais efetiva”
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“Arrependimento” – Greg Hawkins reconhece que, para a instituição, a participação dos fiéis em seus programas é considerada um indicador importante: “Acreditamos que quanto mais pessoas participam destas atividades, com maior freqüência, serão produzidos mais discípulos de Cristo”, sustenta. Acontece que a pesquisa realizada entre a membresia revelou que esse envolvimento não é uma panacéia capaz, por si só, de melhorar o nível de comunhão com Deus. “O crescente nível de participação nestas atividades não prediz se alguém irá ou não se tornar discípulo de Cristo, nem se vai amar mais a Deus ou às pessoas”, constata o pastor executivo. A repercussão de declarações como esta foi enorme nos Estados Unidos, de tal forma que o próprio Hawkins fez questão de emitir uma nova nota esclarecendo que a pesquisa não revelou apenas facetas das igrejas ligadas à WCCC: “Os resultados de Reveal foram baseados em trinta igrejas além da Willow. Em todas elas, encontramos seis segmentos de maturidade espiritual, incluindo alguns insatisfatórios”. Segundo o pastor, nem todas estas comunidades eram “filhas” da WCCC. “Pesquisamos congregações tradicionais, grandes denominações e igrejas afro-americanas, além de outras igrejas de grande representatividade numérica e geográfica. Portanto, Reveal nasceu como um projeto de pesquisa da Willow em 2004, mas seus resultados não incluem exclusivamente a WCCC.” Hawkins fala abertamente em “arrependimento”, mas faz questão de lembrar que a Igreja Willow Creek já passou por outras correções de rumo. Para ele, a divulgação dos resultados da pesquisa é uma demonstração de que a organização está aberta para buscar o que Deus quer. “O nosso sonho é que sejam feitas mudanças fundamentais na forma como fazemos a igreja. Que possamos pegar uma folha em branco e repensar tudo aquilo que assumimos até agora”, diz. “Queremos repor com novas idéias, não apenas as informadas pelas pesquisas, mas as enraizadas nas Escrituras.” Mesmo assim, diz ele, está em andamento uma pesquisa ainda mais ampla, envolvendo 500 igrejas, sendo cem de fora dos EUA. Está prevista a participação de cinco igrejas brasileiras. Reavaliação – “Durante muitos anos, o movimento da rede de igrejas de Willow tem sido atacado. Essa reação é algo que eles devem estar esperando”, destaca Carlito Paes, pastor sênior da Primeira Igreja Batista de São José dos Campos (SP), referindo-se às críticas que se seguiram à divulgação do estudo nos Estados Unidos. Ele é dirigente do Ministério Propósitos Brasil, ligado à Igreja Comunitária
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lidade da organização liderada por Bill do Vale de Saddleback, na Califórnia Hybels. “Somente uma igreja séria e (EUA). Assim como Hybels, o líder de comprometida com Deus tem a coraSaddleback, pastor Rick Warren, nogem de fazer uma auto-avaliação e a tabilizou-se como gestor eclesiástico humildade de admitir seus erros, com– seu livro Uma igreja com propósitos, partilhando os resultados com outras lançado no Brasil pela Editora Vida, igrejas que enfrentam os mesmos devirou um best-seller do gênero e já foi safios”, destaca. Segundo ele, o ministraduzido para 20 idiomas. “Igrejas tério no Brasil não recebeu nenhuma vivas estão sempre reavaliando eclenova orientação. “Nosso propósito não siologia, teologia, ministério, didática, é plantar ‘igrejas Willow’ pelo Brasil ou estratégias e sistemas adotados para Para Mário Simões, a divulgação difundir um modelo ou estrutura. A verificar o que pode ser melhorado dos resultados da pesquisa missão que temos é encorajar, equipar em seu discipulado”, aponta. Sobre a mostrou a coragem e a seriedade e inspirar igrejas a serem comunidades constatação advinda da pesquisa, ele é do ministério relevantes e influentes onde estão plantaxativo: “Este é mais um degrau para subir. Os dilemas, anseios e problemas das pessoas preci- tadas.” Simões lembra que o grupo atua no Brasil não apesam ser respondidos de forma mais efetiva, para que suas nas junto a igrejas, mas também a organizações e empresas vidas sejam transformadas. Não há outro paradigma para cristãs, ministrando cursos e programas com temas voltados para liderança, relacionamentos, família, evangelismo isto senão a Bíblia Sagrada.” Para o pastor Mário Simões, diretor da Associação e organização de ministérios, entre outros. Willow Creek no Brasil, a iniciativa de realizar uma pes- (Carlos Fernandes, com reportagem de Leadership. Traduquisa do gênero e divulgá-la ao público mostra a credibi- ção: Karen Bomilcar)
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INTERNACIONAL
Agence France Presse
First published in Christianity Today, copyright © 2007. Used by permission, Christianity Today International
Protesto em Seul: incidente no Afeganistão motivou críticas à Igreja coreana
Muito mais do que dois mártires
Assustada com o seqüestro e morte de obreiros no Afeganistão, Igreja sul-coreana repensa sua ênfase missionária 30 | CRISTIANISMO HOJE
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Sarah Pulliam
Uma das nações mais envolvidas em missões transculturais de evangelização e assistência social, a Coréia do Sul passa por um momento de crise em sua vocação missionária. O assassinato de dois obreiros coreanos, mortos no Afeganistão em julho passado quando realizavam trabalhos evangelísticos e humanitários naquele país, provocou uma forte reação de diversos setores – inclusive, no governo e dentro da própria Igreja nacional. No centro dos debates, questiona-se a validade da obra missionária em regiões de alto risco e o custo humano que ações do gênero podem acarretar. A situação pode fazer com que a Coréia do Sul, que ocupa a segunda posição mundial no envio de missionários ao exterior – são cerca de mil por ano, um contingente menor apenas que o comissionado pelas igrejas dos Estados Unidos –, mude de posição em relação às missões cristãs ao redor do mundo. Líderes evangélicos sul-coreanos falam em adotar uma postura de “cautela e sabedoria” no trato da questão. Pode ser apenas eufemismo para designar um recuo de proporções imprevisíveis. “O remorso tomou conta da Igreja”, reconhece o pastor Park Eun-jo, da Igreja Presbiteriana Saemmul, influente comunidade com mais de 5 mil fiéis. Localizada na capital Seul, foi essa congregação que patrocinou a viagem de um grupo de 20 missionários ao Afeganistão – um dos quais, o pastor Bae Hyung-kyu, de 42 anos, acabou morto. Lá, eles se juntaram a outros três compatriotas antes de cair nas mãos dos seqüestradores. O episódio ocasionou uma saraivada de críticas ao movimento missionário da nação asiática. “Neste momento, é difícil prever o efeito quantitativo que os fatos causarão na obra missionária”, comenta Steve Moon, diretor do Instituto de Pesquisas para Missões da Coréia. Ele diz que, na melhor das hipóteses, a situação será uma oportunidade para o amadurecimento: “As igrejas precisarão pensar em novas estratégias, e tanto elas quanto as agências missionárias deverão se preparar mais.” Para ele, a motivação que moveu o grupo ao Afeganistão é “pura”, mas classifica sua ação de temerária. “Eles não foram realistas”, aponta. Moon receia que o incidente possa frear o ímpeto missionário dos crentes coreanos. Longa agonia – O seqüestro, ocorrido no último dia 19 de julho, foi uma agonia que durou seis semanas – até agora, o mais longo episódio do gênero envolvendo estrangeiros em território afegão desde a queda do regime talibã, formado por radicais islâmicos que governou o país com mão de ferro até 2001. Apeados do poder graças à intervenção militar comandada pelos Estados Unidos depois do 11 de Setembro, os talibãs mantêm-se à margem do governo constitucional do país e o combatem com táticas de guerrilha. Os coreanos foram capturados por insurgentes na localidade de Qara Bagh, na província de Ghazni, quando viajavam de ônibus
pela estrada que une Cabul, a capital, a Kandahar, importante reduto talibã. Considerada área de alto risco pelo próprio governo do presidente Hamid Karzai, a região é conflagrada e exige segurança redobrada de quem trafega por ali. Mas o ônibus que transportava o grupo, composto em sua maioria por mulheres, não tinha qualquer escolta e foi alvo fácil. Iniciou-se, então, uma complicada negociação envolvendo a milícia talibã, autoridades do Afeganistão e o governo da Coréia do Sul. Karzai, sob pressão americana, recusouse a libertar prisioneiros ligados aos talibãs em troca dos missionários. O terror aumentou seis dias depois, quando os rebeldes executaram o pastor Bae, provocando comoção internacional e intensos protestos do povo coreano. No dia 30 de julho, outro refém, Shing Sun-min, de 29 anos, foi assassinado. A partir dali, a Coréia do Sul resolveu negociar diretamente com intermediários indicados pelos seqüestradores. Seul prometeu atender exigências, como a retirada dos 200 soldados que o país mantinha em território afegão como integrantes da força multinacional de paz comandada pelos Estados Unidos. Os seqüestradores, então, começaram a entregar os reféns. Finalmente, no dia 30 de agosto, o restante do grupo que ainda estava em cativeiro foi liberto. Versões de que um resgate de 20 milhões de dólares teria sido pago não foram confirmadas. De concreto, além
da retirada das tropas coreanas, o saldo do seqüestro foi o anúncio de que as viagens de missionários coreanos ao Afeganistão – e, por extensão, a outras regiões sob conflito – estão canceladas. É uma guinada e tanto para uma Igreja acostumada à ousadia. Segundo o sociólogo americano Robert Wuthnow, da Universidade de Princeton, a diferença entre a obra missionária desenvolvida por seu país e aquela encetada pelos coreanos é justamente esta. “A maioria dos voluntários americanos para missões de curto prazo se dirige a locais relativamente seguros, onde executam atividades assistenciais. Muitas igrejas da Coréia do Sul, ao contrário, se dispõem a enviar grupos às regiões mais perigosas do mundo.” Mea culpa – No entanto, dirigentes do movimento missionário da Coréia vêm questionando a motivação e o propósito das igrejas com relação às missões em larga escala. O mea culpa parece ter atingido boa parte da Igreja asiática. Após a libertação dos reféns, mais de 100 pastores, incluindo representantes do Concílio Cristão da Coréia e do Concílio Nacional de Igrejas Coreanas, realizaram uma reunião de oração e arrependimento. Após o ato, emitiram uma declaração com a relação de supostos erros cometidos pelas igrejas do país devido à sua paixão por missões.
“Provação traz despertamento”
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ara Ronaldo Lidório, um dos mais respeitados missionários transculturais brasileiros, a ênfase evangelística da Igreja da Coréia do Sul tem raízes espirituais e históricas. “Aquele país também martirizou missionários estrangeiros que lhe foram enviados”, conta. “Essa herança sacrificial explica parte de sua vocação hoje”. Pastor presbiteriano e membro da AMEM (A Missão de Evangelização Mundial), Lidório passou dez anos atuando junto aos konkombas, povo que vive em Gana, na África. Ali, traduziu o Novo Testamento para a língua nativa e deixou uma sólida igreja plantada. Hoje, ele coordena projetos missionários na região amazônica. Com tanto conhecimento de causa, ele sabe que nenhuma provação pode extinguir a obra missionária. Ronaldo Lidório conversou com CRISTIANISMO HOJE: CRISTIANISMO HOJE – Acontecimentos traumáticos no campo missionário, como o seqüestro e a morte de cristãos sul-coreanos no Afeganistão, costumam ter grande repercussão. Como obreiro transcultural, de que modo o senhor vê a questão? RONALDO LIDÓRIO – Missionários normalmente são alertados para os principais fatores de risco antes de se dirigirem aos campos onde atuarão – mas isso não dilui a dor da perda e o
sentimento de incerteza em situações de opressão, seqüestro e morte. Percebo que o martírio daqueles que levam a mensagem da cruz sempre produz pelo menos um efeito na Igreja de Cristo: o despertamento de mais pessoas comprometidas a orar e a se envolver com a pregação do Evangelho. A Igreja Evangélica sul-coreana tem tradição missionária cristã, o que não é comum no contexto oriental. Como explicar esse fenômeno? É importante ressaltar que vários missionários estrangeiros também foram martirizados no início da evangelização da Coréia do Sul, o que certamente contribui para que a Igreja daquele país tenha desenvolvido essa força missionária que vemos em nossos dias. Algo semelhante ocorre na China, hoje. A Coréia do Sul experimentou um processo de evangelização, plantio e crescimento de igrejas jamais visto naquela região asiática, em nossa geração. Houve um derramar da graça de Deus de maneira impar sobre a Coréia do Sul, cuja Igreja é uma das mais ativas no envio missionário transcultural. A abundante evangelização, associada às atividades sociais, formam a herança missionária deixada na Coréia do Sul – e a essa herança associaram-se a disciplina, a valorização da honra e do sacrifício, elementos presentes naquela cultura. O efeito tem sido uma força missionária determinada, conduzida pela oração e com bom preparo. (Carlos Fernandes)
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Agence France Presse
INTERNACIONAL
Parentes choram a morte dos obreiros: clamor popular varreu a Coréia do Sul
“Por causa do excesso de entusiasmo, adotamos grandes slogans, como ‘superioridade’, ‘conquista’ e ‘competição’”, reconhece o manifesto, “em vez de compreensão, aceitação e serviço aos que partem para o campo”. O seqüestro não afetou apenas os cristãos. A atitude de Seul, que aceitou a pressão do Talibã, provocou polêmica e críticas veladas dos governos americano e afegão.“Os Estados Unidos defendem, com certeza, a separação entre Igreja e Estado”, afirmou Scott Moreau, professor de missões e estudos transculturais da Wheaton College, de Illinois
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(EUA). “Negociar em nome de uma agência missionária levantaria inúmeras questões espinhosas”, alerta. O incidente teve outras conseqüências. O governo da Coréia determinou a volta do que já estavam lá no Afeganistão. Estima-se que, no momento do seqüestro, haviam outros 120 obreiros cristãos no país. “Eles preenchiam lacunas muito importantes. Suas ausências serão sentidas”, lamenta Rob Werner, obreiro cristão em serviço na Ásia central. Para o pastor Geoff Tunnicliffe, diretor internacional da Aliança Evangélica Mundial (WEA, sigla em inglês), existe atualmente um grande debate sobre o futuro do trabalho de missionários coreanos em situações perigosas ou complexas. “Precisamos discutir as implicações da decisão tomada pelo governo da Coréia do Sul de proibir a ida de trabalhadores cristãos para o Afeganistão”, declarou Tunnicliffe, na esteira dos desdobramentos da crise. Enquanto isso, obreiros de outras nacionalidades em ação no território afegão estão reavaliando sua presença lá e os cuidados com a própria segurança. “Não sei de ninguém que tenha ido embora por ameaças de seqüestro”, continua Rob Werner. “Mas talvez as pessoas percam a coragem para vir. Não é possível ficar aqui muito tempo sem se entregar à soberania de Deus e às promessas dele de nos proteger”, sentencia. (Tradução: Cláudia Ziller Faria. Redação e adaptação: Carlos Fernandes)
SEXUALIDADE | John Piper PixelBoy
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A maldição da
CULPA
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Em 26 anos de pastorado, o mais perto que eu havia chegado de ser demitido da Igreja Batista Bethlehem foi em meados da década de 1980, depois de escrever um artigo intitulado Missões e masturbação para nosso boletim. Eu o escrevi ao voltar de uma conferência sobre missões presidida por George Verwer, presidente da Operação Mobilização. No evento ele disse como seu coração pesava pelo imenso número de jovens que sonhavam em obedecer completamente a Jesus, mas que acabavam se perdendo na inutilidade da prosperidade americana. A sensação constante de culpa e indignidade por causa de erros sexuais dava lugar, pouco a pouco, à falta de poder espiritual e ao beco sem saída da segurança e conforto da classe média. Em outras palavras, o que George Verwer considerava trágico – e eu também considero – é que tantos jovens abandonem a causa da missão de Cristo porque ninguém lhes ensinou como lidar com a culpa que se segue ao pecado sexual. O problema vai além de não cair; a questão é como lidar com a queda para que ela não leve toda uma vida para o desperdício da mediocridade. A grande tragédia não são práticas como a masturbação ou a fornicação, e nem a pornografia. A tragédia é que Satanás usa a culpa decorrente desses pecados para extirpar todo sonho radical que a pessoa teve ou poderia vir a ter. Em vez disso, o diabo oferece uma vida feliz, certa e segura, com prazeres superficiais, até que a pessoa morra em sua cadeira de balanço, em um chalé à beira de um lago. Hoje de manhã mesmo, Satanás pegou seu encontro das duas da manhã – seja na televisão ou na cama – e lhe disse: “Viu? Você é um derrotado. O melhor é nem adorar a Deus. Você jamais conseguirá fazer um compromisso sério para entregar sua vida a Jesus Cristo! É melhor arrumar um bom emprego, comprar uma televisão de tela plana bem grande e assistir o máximo de filmes pornográficos que agüentar”. Portanto, é preciso tirar essa arma da mão dele. Sim, claro que quero que você tenha a coragem maravilhosa de parar de percorrer os canais
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de televisão. Porém, mais cedo ou mais tarde, seja nesse pecado ou em outro, você vai cair. Quero ajudá-lo a lidar com a culpa e o fracasso, para que Satanás não os use para produzir mais uma vida desperdiçada. Cristo realizou uma obra na história, antes de existirmos, que conquistou e garantiu nosso resgate e a transformação de todos que confiarem nele. A característica distintiva e crucial da salvação cristã é que seu autor, Jesus, a realizou por completo fora de nós, sem nossa ajuda. Quando colocamos nele a fé, nada acrescentamos à suficiência do que fez ao cobrir nossos pecados e alcançar a justiça que é considerada nossa. Os versículos bíblicos que apontam isso com mais clareza estão na epístola de Paulo aos Colossenses 2.13-14: “Quando vocês estavam mortos em pecados e na incircuncisão da sua carne, Deus os vivificou com Cristo. Ele nos perdoou todas as transgressões e cancelou o escrito de dívida, que consistia em ordenanças, e que nos era contrária. Ele a removeu, pregando-a na cruz”. É preciso pensar bem nisso para entender plenamente a mais gloriosa de todas as verdades: Deus pegou o registro de todos os seus pecados – todos os erros de natureza sexual – que deixavam você exposto à ira. Em vez de esfregar o registro em seu rosto e usá-lo como prova
para mandar você para o inferno, Deus o colocou na mão de Seu filho e pregou na Cruz. E quem são aqueles cujos pecados foram punidos na cruz? Todos que desistem de tentar salvar a si mesmos e confiam apenas em Cristo. E quem assumiu essa punição? Jesus. Essa substituição foi a chave para a nossa salvação. Alguma vez você já parou para pensar no que significa Colossenses 2.15? Logo depois de afirmar que Deus pregou na cruz o registro de nossa dívida, Paulo escreve que o Senhor, “tendo despojado os poderes e as autoridades, fez deles um espetáculo público, triunfando sobre eles na cruz”. Ele se refere ao diabo e seus exércitos de demônios. Mas como são desarmados? Como são derrotados? Eles possuem muitas armas, mas perdem a única que pode nos condenar – a arma do pecado não perdoado. Deus pregou nossas culpas na cruz. Logo, houve punição por elas – então, seus efeitos acabaram! O problema é que muitos percebem tão pouco da beleza de Cristo na salvação que o Evangelho lhes parece apenas uma licença para pecar. Se tudo que você enxerga na cruz de Jesus é um salvo-conduto para continuar pecando, então você não possui a fé que salva. Precisa se prostrar e implorar a Deus para abrir seus olhos para ver a atraente glória de Jesus Cristo.
são computados como nossos. E essa justificação vence o pecado. Possuímos uma arma poderosa para combater o diabo quando sabemos que o castigo por nossas transgressões foi integralmente cumprido em Cristo. Devemos nos apegar com força a essa verdade, usando-a quando o inimigo nos acusar pelas nossas faltas. O texto de Miquéias 7.8-9 apresenta o que devemos lhe dizer quando ele zombar de nossa aparente derrota: “Não te alegres a meu respeito; ainda que eu tenha caído, levantar-me-ei (...) Sofrerei a ira do Senhor, porque pequei contra ele, até que julgue a minha causa e execute o meu direito”. É uma espécie de “culpa corajosa” – o crente admite que errou e que Deus está tratando seriamente com ele. Mas, mesmo em disciplina, não se afasta da bendita verdade de que tem o Senhor ao seu lado! Há vitória na manhã seguinte ao fracasso! Precisamos aprender a responder ao diabo ou a qualquer um que nos diga que o Senhor não poderá nos usar porque pecamos. “Ainda que eu tenha caído, levantar-me-ei”, frisou o profeta. “Embora eu esteja morando nas trevas, o Senhor será a minha luz.” Sim, podemos estar nas trevas da iniqüidade; podemos sentir culpa, porque somos, realmente, culpados pelo nosso pecado. Mas isso não é toda a verdade sobre o nosso Deus. O mesmo Deus que faz nossa escuridão é a luz que nos apóia em meio às trevas. O Senhor não nos abandonará; antes, defenderá a nossa causa. Quando aprendermos a lidar com a culpa oriunda de nossos erros com esse tipo de ousadia em quebrantamento, fundamentados na justificação pela fé e na expiação substitutiva que Cristo promoveu por nós, seremos não apenas mais resistentes ao diabo como cometeremos menos falhas contra o Senhor. E, acima de tudo, Satanás não será capaz de destruir nosso sonho de viver uma vida em obediência radical a Jesus e de serviço à sua obra.
“O problema vai além de simplesmente cair em pecados sexuais. A questão é como lidar com essa queda, para que ela não leve toda uma vida para o desperdício da mediocridade”
Culpa corajosa – A fé que salva recebe Jesus como Salvador e Senhor e faz dele o maior tesouro da vida. Essa fé lutará contra qualquer coisa que se coloque entre o indivíduo salvo e Cristo. Sua marca característica não é a perfeição, nem a ausência de pecados. Quem enxerga na cruz uma licença para continuar pecando não possui a fé que salva. A marca da fé é a luta contra o pecado. A justificação se relaciona estreitamente com a obra de Deus pregando nossos pecados na cruz. Justificação é o ato pelo qual o Senhor nos declara não apenas perdoados por causa da obra de Cristo, mas também justos mediante ela. Cristo levou nosso castigo e realiza nossa retidão. Quando o recebemos como Salvador e Senhor, todo o castigo que ele sofreu, e toda sua retidão,
John Piper é escritor e pastor da Bethlehem Baptist Church, em Minneapolis (EUA)
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Grandes desafios de uma jovem Igreja Crescimento explosivo dos evangélicos no Brasil não esconde os paradoxos de um povo que precisa combater suas próprias mazelas 36 | CRISTIANISMO HOJE
Culto pentecostal: igrejas avivadas alavancam o avanço evangélico no país
Convertido há apenas três anos, Pereira, que é solteiro, deixou bebida e drogas para viver uma rotina que inclui, às quartas-feiras, a visita ao Hospital de Apoio, em Brasília, especializado em tratamento de pacientes terminais ou com seqüelas graves, onde foi ouvido pela reportagem. “Muitas pessoas vão à igreja apenas para conseguir bens materiais e poucos fazem a obra de Deus com seriedade”, opina. Apesar de ter a Bíblia na ponta da língua, ele lamenta sua baixa instrução, o que em alguns momentos, reconhece, torna o trabalho de evangelização mais difícil. Pereira talvez nem desconfie, mas seus bons frutos aparecem nas estatísticas que apontam para o recente e gigantesco crescimento da Igreja Evangélica brasileira. De acordo com os dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE, ela já conta com quase um quarto da população do país e continua avançando. Mas pouca gente saberia determinar qual a feição e os rumos dessa Igreja e, a partir disso, qual o impacto sócio-cultural da conversão de boa parte dos brasileiros ao Evangelho. “Parece que a única ou a maior preocupação da Igreja Evangélica brasileira hoje é o crescimento do número de igrejas e de fiéis”, diz o pastor presbiteriano Elben Lenz César, fundador da editora Ultimato, criada em 1968, quando a presença protestante ainda era incipiente no Brasil. “Aos outros desafios, aos outros alvos do Reino de Deus, não se dá a devida atenção. Em geral, somos omissos e talvez medrosos”, diz.
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Valter Gonçalves Jr.
Aos 40 anos, o cearense Raimundo Nonato Pereira dos Anjos tem um só objetivo na vida: pregar o Evangelho. Vendedor ambulante, diariamente segue de ônibus entre Brasília e a cidade-satélite de Ceilândia, umas das mais violentas do Distrito Federal, onde mora. Pereira, como é conhecido, prefere não ter um emprego fixo, o que, acredita, o impediria de fazer o que realmente gosta: evangelizar nos coletivos, nas ruas e nos hospitais, enquanto sai para vender produtos como balas, doces e salgados. “Não me vejo sem fazer esta obra. Abri mão de tudo que é meu”, diz sorridente o ambulante, uma espécie de missionário informal. “Coloquei em primeiro lugar as coisas de Deus. Não tenho ganância”, diz, revelando que não faz proselitismo de sua denominação — congrega na Igreja Batista Ebenézer — e que não pede dinheiro aos crentes.
Personalismo – A onda evangélica que hoje avança com força começou tímida, com a chegada das primeiras denominações históricas — igrejas como a Luterana, que veio com os imigrantes alemães na segunda década do século 19, e outras, como a Congregacional, a Presbiteriana, a Metodista e a Batista, implantadas aqui por missionários britânicos ou norte-americanos, em meados dos anos 1800. Os pentecostais vieram em seguida. A Assembléia de Deus começou pela quase isolada Belém do Pará, em 1911. Mostrou vigor, crescendo no interior e na periferia das grandes cidades, e hoje é a maior confissão evangélica brasileira. Desde a década de 70, os crentes se tornaram bastante visíveis, multiplicando-se em incontáveis denominações. Com a explosão dos neopentecostais, essa Igreja não pôde mais ser ignorada. Essa visibilidade é reforçada pelas verdadeiras multidões que acorrem aos grandes eventos evangélicos – caso da Marcha para Jesus, que reúne em São Paulo, todos os anos, algo perto de 2 milhões de manifestantes. No entanto, ao mesmo tempo em que os evangélicos crescem numericamente, aumenta a preocupação com a qualidade
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A Marcha para Jesus, em São Paulo: evento, que atrai todos os anos multidões de crentes, é demonstração da presença evangélica no país
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das igrejas, que se deparam com as grandes mazelas do país e com suas próprias contradições. Fragmentada, personalista, autoritária, pouco atuante na sociedade, mística demais e pouco preparada intelectualmente – as críticas ao segmento religioso que mais cresce no país são muitas, e vêm de seus próprios líderes e pensadores, o que tem raiz na cultura protestante. Afinal, Martinho Lutero preconizou a Ecclesia reformata semper reformanda (Igreja reformada sempre se reformando). O excesso de divisão é um dos pontos frágeis dos evangélicos. “Somos divididos demais, o que nos deixa sem uma voz oficial. Creio também que nem todos os mais conhecidos líderes teriam preparo suficiente para abordar os problemas nacionais, com sabedoria, com equilíbrio, com acerto”, observa Elben. “Se um veículo de comunicação desejar saber o que a Bíblia diz sobre este ou aquele tema, vai procurar a quem? Nosso déficit se sente em várias esferas – anunciamos pouco o Reino de Deus, refletimos pouco sobre a condição humana a partir da mente de Cristo e vivemos pouco o pouco que pregamos. Por isso, nossa palavra é pouco ouvida”, explica, por sua vez, o pastor Israel Belo de Azevedo. Ele é diretor do Seminário TeoO pastor Elben Lenz: “Nossa preocupação não lógico Batista do Sul do pode ser apenas com o Brasil, no Rio de Janeicrescimento numérico” ro, e autor de 22 livros. Algumas de suas obras tratam exatamente da situação da Igreja Evangélica no país. “Se queremos ser relevantes, precisamos ter a coragem dos apóstolos, que diziam: ‘Olhem para nós’’’, desafia. Israel acredita que depois do “inchaço” numérico dos últimos anos, as igrejas, se tiverem lideranças íntegras, encontrarão respostas e o que chama de “equilíbrio cheio de viço”. Para Bráulia Inês Ribeiro, presidente da agência missionária interdenominacional Jovens com uma Missão (Jocum), antes a Igreja brasileira precisará enfrentar o
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problema do forte personalismo do qual padece. “O direito divino dos ‘reis’ de igreja ganha quinhentos anos de legitimidade cultural no Brasil”,afirma, salientando que essa é opinião sua, e não da organização que preside. Bráulia aponta para o “não arrependimento” da Igreja em relação a um certo “padrão colonial, bandeirante, absolutista de liderança”, muito próprio da América Latina e que, para ela, conduz ao autoritarismo ou, em contrapartida, à anarquia. “Isto precisa ser confrontado pela mensagem e pela doutrina das igrejas”, avalia.
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Autoritarismo – “Lideranças com perfil autoritário produzem uma igreja infantilizada”, declara Ziel Machado, historiador, pastor do Concílio Nikkei da Igreja Metodista Livre e secretário regional da Comunidade Internacional dos Estudantes Universitários. Segundo ele, entre a opção pelo amor e pelo poder, a Igreja muitas vezes opta pelo segundo. “O poder permite controlar as pessoas; o amor, não”, continua Ziel, citando o teólogo católico Henri Nouwen. “Controlando seus seguidores, a igreja os infantiliza. Infantilizando-as, não teremos uma Igreja apta a dar uma contribuição adulPara o historiador Ziel ta para o seu entorno Machado, lideranças autoritárias infantilizam social”, analisa. “Por os crentes outro lado, tudo que é histórico é ambíguo”, pondera, identificando na Igreja Evangélica brasileira expressões simultâneas de maturidade e imaturidade. “De um lado, há a compreensão profunda de seu chamado e sua missão, vivida com radicalidade; e, de outro lado, manifestações de desvios, em que a Igreja se distrai com agendas que a afastam de seus verdadeiros objetivos”. Ziel sublinha que as instituições que mais aparecem na mídia e ganham visibilidade na sociedade costumam ser justamente as que fazem a opção pelo poder políti-
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co e econômico. “Como diz o pastor Carlos Queiroz, da Igreja de Cristo de Fortaleza, precisamos de líderes mais identificados com a manjedoura do que com os palácios”, ressalta o historiador. Para ele, o melhor critério é o estabelecido pelo próprio Jesus: “Temos que olhar para os frutos, e não para os produtos”. Escândalos protagonizados por líderes e políticos evangélicos não diminuem o otimismo de quem vê na Igreja Evangélica vitalidade e compromisso com a fé cristã. O doutor em sociologia Alexandre Brasil Fonseca compara a dificuldade do poder público e dos partidos políticos para afastar quem comete irregularidades com o exemplo dado pela Igreja Batista, uma das maiores denominações do país, que, lembra, “teve a coragem de destituir um pastor que exercia liderança havia muitos anos”. Ele refere-se ao episódio do afastamento de Nilson do Amaral Fanini, que durante quase 40 anos comandou a 1ª Igreja Batista de Niterói (RJ), ocorrido em 2005. Ao lançar o olhar sobre os evangélicos, o sociólogo diz que tudo tem seu tempo. “Paulo Freire falava que a gente precisa ter paciência histórica em certos processos sociais. Existe o capital social, a confiança que as pessoas estabelecem umas nas outras, por causa de suas convicções éticas e religiosas. Essa confiança constrói a democracia”, diz, manifestando a esperança de ver a massa evangélica participando de discussões políticas, movimentos sociais e conselhos de cidadãos em todas as áreas – “Estabelecendo, assim, ações positivas na luta contra a pobreza, a ignorância, a violência e a degradação do meio ambiente, gerando desenvolvimento econômico e social”. “Avivamento” – Há a consciência de que os rumos tomados pela Igreja Evangélica brasileira não interessam só ao país. Em A nova cristandade, escrito em 2002, o historiador britânico Philip Jenkins prevê que os destinos do Cristianismo estarão cada vez mais atrelados à ascensão da Igreja na América Latina, na África e na Ásia. “Temos soluções novas e maravilhosas no Brasil, que devem ser passadas para o resto do mundo”, concorda Bráulia Inês, para quem a contribuição brasileira será mais relacional do que conceitual. “No entanto”, afirma, “é preciso construir uma cosmovisão bíblica que confronte o nosso pseudo-cristianismo latino-americano, pagão, vitimizante e fatalista”. Ela critica a solução apressada de, ao invés de construir uma proposta evangélica para os problemas do país, a Igreja tomar o caminho do marxismo cristão. “Por preguiça, preferimos ressuscitar idéias mortas do que propor novas”, conclui.
Treici Schwengber
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Por outro lado, a espiritualidade evangélica brasileira ainda é muito sensorial, observa Ziel Machado. Ele defende a busca de uma teologia que contemple fé e razão, de acordo com a compreensão bíblica da realidade. “Como o crente vai entender sua missão se não entende a revelação bíblica? Como vai relacioná-la com seu contexto se não educa e treina sua mente para entender essas coisas?”, questiona. O professor Israel também alerta para a necessidade de a Igreja aprofundar-se e valorizar os estudos e a reflexão para enfrentar os desafios contemporâneos. Ele alerta para a secularização, que atinge o protestantismo nos Estados Unidos e na Europa. “À medida em que o Brasil vai se ‘primeiro-mundizando’, alcançando novos padrões de poder aquisitivo e consumo, uma ideologia secularizadora é tendência inevitável”, constata. “O secularismo é filho da opulência. O raciocínio não-confessado nestes círculos é: ‘Para quê Deus, se tenho tudo?’’. Para Elben, a Igreja Evangélica nacional tem que deixar de se impressionar com seu tamanho. “Precisamos de um avivamento de fato, operado soberanamente pelo Espírito Santo, profundo e demorado”. Somente assim, afirma, os O ambulante Raimundo escândalos, a superficiaPereira: rotina de lidade, a soberba, a comevangelismo pessoal e petição descarada entre visitação a hospitais líderes e a paixão numérica poderão chegar ao fim. “E que esse avivamento produza desejos de santidade: testemunho impecável, amor mais intenso por Deus e pelos membros da comunidade”, pontifica. Depois de testemunhar, ao longo de décadas, o extraordinário crescimento dos evangélicos, Elben quer mais. E sonha com uma Igreja que tenha “consagração pessoal e consciência social, com vontade incontida de evangelizar e uma lembrança cada vez mais intensa de Jesus como aquele que esvaziou-se a si mesmo e virá outra vez em muita glória”, finaliza.
Evangélicos em culto ao ar livre: eles já seriam 40 milhões no Brasil
Crescimento desigual, mas maciço
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s números do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) mostram o avanço dos evangélicos em todas as regiões do país. De acordo com os dados e as projeções do Censo 2000, considerando que os evangélicos tenham mantido o mesmo ritmo de crescimento que na década anterior, há no Brasil mais de 40 milhões de protestantes, ligados a centenas de denominações. A região Norte é hoje a mais evangélica, com 25% de crentes, entre tradicionais, pentecostais e de outras igrejas. Já na região Sul, os crentes são 17% da população. No Sudeste, a mais populosa das regiões, 19,1% das pessoas se confessam evangélicas. No Centro-Oeste, são 18,3%. E a região menos evangélica do país é o Nordeste, com apenas 11,4% de crentes. Mas o ritmo de crescimento é acelerado. Mesmo no Nordeste, entre os anos 1991 e 2000, os evangélicos cresceram a uma taxa anual de 8,6% – índice praticamente igual ao do avanço verificado na região Norte, com 8,5%. De todas as partes do país, foi nos estados do Sul – Paraná Santa Catarina e Rio Grande do Sul – que o segmento apresentou a menor taxa de crescimento, com pouco mais que quatro por cento. Mesmo assim, bem maior do que a da população brasileira em geral, que naquele período não chegou aos 2%. A expansão numérica da Igreja Evangélica também varia em função do perfil teológico adotado por cada grupo. Se levados em conta os dois principais segmentos – o tradicional e o pentecostal –, é possível constatar que, mesmo dentro de um mesmo estado, seu crescimento varia muito. Em números aproximados, as unidades federativas em que há maior presença de protestantes tradicionais são Espírito Santo, com 11% da população, seguido do Rio de Janeiro, com 10%, Rondônia, que tem 9,5%. Já os estados onde os pentecostais mais se destacam são Rondônia, com 20,2% da população, seguido de Roraima, com 18,5%, São Paulo, com 17,1% e Espírito Santo, com 16,2%.
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Pobres e solidários
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Pesquisas revelam o perfil sócioeconômico dos evangélicos brasileiros e comprovam sua luta para escapar da miséria
É nas periferias das grandes cidades que a Igreja mostra vitalidade e inserção social
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Traços importantes do perfil dos evangélicos no país foram revelados com a divulgação da Pesquisa de Orçamentos Familiares (POF) 2002-2003, amplo levantamento sócio-econômico e cultural com base no nível de consumo. Os números da POF, apurados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística, o IBGE, e publicados há dois meses, mostram como vai a vida dos brasileiros de todas as classes sociais, e cruza isso com indicadores como escolaridade, região de origem e religiosidade. A imprensa deu certo estardalhaço a um aspecto revelado na pesquisa: a despeito das pregações na TV com promessas de prosperidade, os evangélicos pertencem, em média, à faixa mais pobre da população brasileira, enquanto os que crêem no espiritismo figuram como os mais ricos. Diante de sua fragmentação, os crentes foram divididos em três grandes grupos na POF: os pentecostais, os “de missão” (para identificar os tradicionais) e um terceiro segmento, os pertencentes a “outras confissões evangélicas” (denominações classificadas, corretamente ou não, como neopentecostais). Em média, as famílias evangélicas pentecostais apresentaram renda mensal de R$ 1.270. Enquanto isso, as católicas ganham R$ 1.790. Em seguida vêm os integrantes das “outras evangélicas”, que percebem R$ 1.690, e as evangélicas tradicionais, com média de R$ 1.994. No topo da lista, surgem os espiritualistas, cuja renda familiar mensal chegaria a R$ 3,8 mil. A pesquisa mostra que, mesmo estando entre os mais pobres, os evangélicos são também os religiosos que mais fazem doações – os tradicionais dízimos e ofertas – a seus respectivos grupos. Esses dados estão computados entre “pensões, mesadas e doações”. Os crentes de “outras evangélicas” ultrapassam os de todas as confissões quando o assunto é contribuir com a obra de Deus: são R$ 59,16 por mês. Neste quesito, ficaram bem à frente dos adeptos do espiritismo, que contribuem com pouco mais de R$ 42. Interessante notar que as famílias pentecostais, que colaboram com suas igrejas numa faixa por volta de R$ 22 mensais, apresentaram renda abaixo de seus gastos mensais em 31 reais. Os números do IBGE não permitem avaliações apressadas de quem imagina que os crentes estejam empobrecendo e deixando para trás as boas condições para prosperar, observadas por Max Weber na sua clássica obra A ética protestante e o espírito do capitalismo, escrita no início do século passado. “O que Weber apontou foi o caminho inverso: ele identifica entre os burgueses um número maior de protestantes, o que é diferente da premissa de que ser protestante é igual a pertencer à burguesia. Não há uma
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relação causal, de que ser protesnar que todos os dias milhões de tante é igual a prosperar”, declara pessoas são enganadas por todas o doutor em sociologia Alexandre as religiões. Isso não existe. É preBrasil Fonseca. Ele salienta que o ciso reconhecer aspectos positivos. estudioso alemão percebeu, entre Essas organizações sociais sabem os puritanos, características que se comunicar com os mais pobres, os impulsionavam a prosperar, já que procuram ali um espaço de que naquele momento a graça de defesa, de tratamento e segurança.” Deus era percebida pela qualidaO sociólogo destaca que essa gente de de vida deles. “Ser um homem encontra o que busca. “O evangédedicado, honesto e trabalhador lico, que se sente contemplado e Para o pesquisador Alexandre sinalizava, pela sua vida cotidiana, fortalecido por sua fé, pensa: ‘Vale Brasil, igrejas formam uma que aquele indivíduo era de fato a pena colocar até mesmo o meu ampla rede de proteção social um salvo, um predestinado. Isso dinheiro na igreja’.” Para Alexandre não quer dizer que a pessoa seria Brasil, diante de um país tão derica, mas que teria um padrão melhor”, explica. sigual, “os evangélicos têm o imperativo de ter a opção pelos pobres”. Opção pelos pobres – Os dados da POF se somam aos O crescimento dos evangélicos na base da pirâmide da detalhada pesquisa Economia das Religiões, feita pela social do país representa, no entender de Alexandre, uma Fundação Getúlio Vargas (FGV) e divulgada em abril grande oportunidade para as igrejas, dada a chance de deste ano. O coordenador do levantamento, Marcelo promover transformações sociais. “É inegável a inserção Neri, afirma que as condições que favoreciam a pros- social e a capilaridade das igrejas em termos de assistênperidade dos protestantes retratados por Weber não se cia social, de ações de saúde e participação em grandes e transferem, automaticamente, para o Brasil. Por outro pequenos projetos”, diz o estudioso, observando a presenlado, não se sabe onde a conversão dos pobres brasilei- ça, na liderança evangélica, de pessoas com origem nas ros irá desembocar. Os dados da FGV demonstram que, classes populares. “Os crentes são pobres, de periferia. apesar de figurarem na faixa mais carente da população, E os líderes vêm daí também. Então, há uma afinidade os evangélicos, em média, não estão na extrema pobre- maior com gente de origem pobre”. Por isso mesmo, muiza – caso dos pentecostais, que segundo a pesquisa, são tas igrejas podem virar pólos de transformação social. cerca de 15% dos trabalhadores que ganham entre dois “Há missionários que, sozinhos, com orçamento apere quatro salários mínimos, e chegam a apenas 10,89% tado, vendendo o almoço para pagar o jantar, conseguientre os que recebem até dois mínimos. Mais: a FGV ram mudar indicadores sociais de comunidades e até de constatou o aumento do número cidades inteiras”, afirma o pastor de pentecostais entre os integranpresbiteriano Fabrício Cunha, que tes da “nova pobreza” brasileira, faz doutorado em missões urbanas a periferia desassistida das grane comandou o Fórum Jovem de des metrópoles. Essa camada da Missão Integral, um congresso que população seguiu dois caminhos reuniu em junho de 2007, em Itu opostos: ou buscou novas respos(SP), a nata dos novos missionátas religiosas nas igrejas evangélirios evangélicos – gente com grancas ou tornou-se sem religião. Já de preocupação social. a “velha pobreza”, de perfil rural, Para Cunha, as demandas socontinuou católica. ciais são enormes no país e as conAlexandre Brasil lembra que gregações estão despertando para Weber identificou toda uma rede a realidade das periferias, onde de apoio social que as igrejas foros pentecostais ganham espaço. mavam como estratégia de sobre“Vemos nas Escrituras que Deus O presidente da ABU, José vivência. “Durkheim já falava isso tem uma preferência pelo pobre, Miranda Filho: “Além do dinheiro, os crentes doam tempo no século 19: é impossível imagimas não quer que ele fique assim. e atenção à vida comunitária”
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E quando esse pobre encontra o padrão evangélico, que é um padrão ético alto, ele prospera, pois passa a ter a vida mais regrada. Controla mais o orçamento, busca informação”, argumenta. Ele critica, porém, a idéia de colocar todos os crentes no mesmo barco. “Dizer que há uma Igreja Evangélica hoje no Brasil é uma mentira. Não há legitimidade para falar em nome de uma instituição única”, destaca, lembrando de grupos com atuação oposta. “Há gente, louca ou mal intencionada, que leva as pessoas a fazer votos que começam em R$ 10 mil e chegam ao vale-transporte”, lamenta.
ções, entre os evangélicos, não vão para as instituições, mas sim “de bolso para bolso”, já que os crentes ajudam uns aos outros. “Solidariedade não passa pelo caixa das igrejas. Grande parte dos recursos não estão ao dispor delas”, explica. Miranda salienta que, entre os evangélicos, é ainda mais comum doar tempo e atenção, em trabalhos voluntários, do que dinheiro. “Conheço o exemplo de Pentecostes, cidade do interior do Ceará, onde um amigo cristão, doutor em química, resolveu doar os seus Embora multifacetado, o povo fins de semana, durante anos, para evangélico brasileiro apresenta alfabetizar e preparar adultos para traços comuns, como a busca pela a universidade.” Em pouco tempo, estabilidade e a vocação solidária conta, aquele projeto, que come“De bolso para bolso” – No ençou com apenas dois alunos, contender de José Miranda Filho, presidente da Aliança Bí- seguiu alcançar 500 pessoas. “Quanto se gastou naquela blica Missionária (ABU), é muito simplista imaginar que iniciativa? Pouquíssimo. Mas, no ano passado, 80 daquea grande quantidade de doações, detectadas nas pesqui- les alfabetizados fizeram vestibular, e vinte passaram para sas da FGV e do IBGE, seja produto do oportunismo reli- a Universidade Federal do Ceará”, comemora. Miranda, gioso de lideranças corruptas. “Não é possível mensurar a pós-graduado em economia, faz restrições à idéia de avaqualidade da esperança dos que contribuem com coração liar a qualidade de vida apenas em comparações relacioaberto, sendo ricos ou pobres. Há quem doe caindo no nadas ao nível social e à renda. “As pesquisas sócio-econôdiscurso de comprar a bênção; mas há quem tem fé no micas colocam o foco na horizontalidade dessas relações Deus bom que não abandona seus filhos”, declara, distin- de classes, não na verticalidade da relação com Deus. Não guindo pobreza de miséria, em que as condições de vida conseguem mostrar o nível de verdadeira qualidade de ficam extremas. Ele sublinha que a maior parte das doa- esperança, de alegria, de fé.” (Valter Gonçalves Jr.)
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REFLEXÃO | Brian McLaren First published in Leadership, copyright © 2007. Used by permission, Christianity Today International.
Esses cristãos REFLEXIVOS
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A diferença sempre foi vista com curiosidade ou estranheza. A cor de sua pele, por exemplo, pode tornar você um estranho em alguns cenários. Já seu poder aquisitivo ou sua educação têm a capacidade de fazer com que se destaque em determinados ambientes. Até mesmo seu estilo de adoração, a linha teológica que você adota ou sua preferência por algum partido político podem colocá-lo à margem – ou para além dela – em certos casos. A verdade é que ser, pensar, olhar ou agir de modo diferente da maioria pode empurrar determinado indivíduo para fora dos círculos sociais e religiosos. Fato é que, nas nossas igrejas, sempre há uma pessoa, ou um grupo, que na maioria das vezes se sente diferente da maioria – e gente assim quase sempre é marginalizada. Dan Taylor, em The Myth of Certainty [O mito da certeza], chama essas pessoas de “cristãos reflexivos”. Os menos solidários classificam-nas como questionadoras da fé; e, muitas vezes, suas atitudes de inconformismo fazem com que se tornem desrespeitados em suas comunidades. Como quase todos os protestantes sabem, no século 16 a Igreja Católica Apostólica Romana estava empolgada acerca da emissão das famigeradas indulgências. Elas eram alardeadas pelo clero como maneiras de reduzir o
“Ser, pensar, olhar ou agir de modo diferente da maioria pode empurrar determinado indivíduo para fora dos círculos sociais e religiosos” 46 | CRISTIANISMO HOJE
tempo das pessoas no purgatório através da doação de dinheiro ou bens à Igreja. Mas apesar da generalização de tal prática, muitas pessoas não se contiveram e questionaram o programa de indulgência proposto pelas autoridades eclesiásticas. Elas duvidaram do que a instituição sustentava com tamanha convicção, simplesmente porque aquilo não fazia sentido para esses cristãos questionadores. Se permanecessem em silêncio, iriam se sentir desonestos e frustrados; contudo, se levantassem suas questões, seriam vistos com desconfiança. Alguns desses questionadores, como Martinho Lutero se manifestaram e descobriram que cristãos reflexivos, já àquela altura, não tinham futuro na Igreja. Aproximadamente cem anos mais tarde, Galileu Galilei olhou através de um telescópio certa noite e viu luas posicionadas como bailarinas em órbita de Júpiter. Logo percebeu que a Igreja estava errada ao sustentar a visão de mundo tradicional, geocêntrica, que havia herdado de Aristóteles e Ptolomeu. Infelizmente, quando passou a questionar abertamente a corrente majoritária, ele descobriu aquilo que Martinho Lutero já sentira na pele: cristãos reflexivos não eram bem-vindos à Igreja. Uma história semelhante poderia ser contada acerca do célebre evangelista John Wesley, que duvidava daquilo que todos sabiam: que atividades sagradas, como a pregação, precisavam ser desenvolvidas em espaços sagrados, como púlpitos. Por discordar disso, ele foi à porta das minas de carvão do Reino Unido anunciar a salvação em Jesus a trabalhadores que não freqüentavam os templos. Poderíamos falar ainda de crentes reflexivos como Phineas Bresee, fundador dos Nazarenos, que duvidou que pessoas pobres devessem ser evitadas por cristãos honrados. E o que dizer de Menno Simons, o líder dos anabatistas, que discordava da voz corrente de que cristãos deveriam matar outros cristãos em nome de Cristo? Questionadores contemporâneos, como o pastor Martin Luther King Jr e o bispo Desmond Tutu, duvidaram que a raça fosse um fator de comunhão, e enfrentaram forte oposição por isso. Já líderes como Bill Hybels ou Rick Warren, com suas propostas de uma nova eclesiologia, ou talvez você, com suas idéias ainda não devidamente expostas, também tendem a provocar certo desconforto devido a suas posturas... Os heróis que estudamos na história da Igreja começaram como cristãos reflexivos que duvidaram daquilo que todos consideravam ser o óbvio. Como conseqüência foram, em quase todos os casos, marginalizados. Quando comunidades habitualmente marginalizam ou excluem seus membros
“Os heróis da história da Igreja começaram justamente como crentes questionadores, que duvidaram daquilo que todos consideravam ser o óbvio”
mais reflexivos – aqueles que fazem perguntas difíceis sobre coisas que são completamente basilares para a maioria –, é claro que os que são estigmatizados acabam feridos. A comunidade que exclui, no entanto, também é ferida, porque ao agir assim corta da própria pele recursos de crescimento e de renovação. Além disso, constrói resistências exatamente para aquilo que em breve será necessário, o que deixa no ar uma pergunta urgente: quem são os cristãos reflexivos, que talvez sintam que já estão com a camada de gelo bem fina nas margens, ou seja, prestes a serem marginalizados por completo? E o que seria necessário para dizer-lhes que eles são queridos, necessários e respeitados, que a sua diferença não é um problema a ser resolvido por meio da pressão para que se amoldem, mas que sua atitude questionadora é um recurso? Aqui vai uma sugestão: que esses cristãos reflexivos sejam ouvidos! Tentemos entender suas perguntas, frustrações e novas idéias, mesmo que não concordemos com suas inquietações. Sejamos atenciosos, dando-lhes espaço para serem quem são, mesmo se pensam diferente da maioria. Às vezes, talvez seja preciso se posicionar entre eles e seus críticos mais contundentes a fim de defendê-los das forças que mantêm as fronteiras e promovem a exclusão. Um coração bondoso e um ouvido disposto a escutar podem manter os cristãos reflexivos dentro da comunidade – e, se a renovação vier das margens, como quase sempre parece ser o caso, então, ao amputarmos essas nossas margens, fazemos aquilo que os chefes dos sacerdotes e escribas fizeram quando uma voz necessária apareceu às margens de sua comunidade. Será que estamos escutando seu clamor? (Tradução: Jorge Camargo) Brian McLaren fundou e foi por muitos anos pastor da Cedar Ridge Community Church, nos arredores de Washington D.C. (EUA). É palestrante e autor de vários livros, dentre eles A mensagem secreta de Jesus e Uma ortodoxia generosa.
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ESPIRITUALIDADE | Eduardo Rosa Pedreira
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Como qualquer outro tempo da história, o nosso é uma realidade complexa, com muitas variáveis e características. E duas delas saltam aos olhos por expressarem significativamente a lógica de fundo sob a qual nossa vida tem acontecido. A primeira pode ser chamada de culto à eficiência, ou a obsessão por resultados instantâneos. Para algo ser capaz de captar nossa atenção, despertar nosso interesse e ganhar espaço em nossa agenda, é necessário apresentar resultados concretos e rápidos – ou seja, deve provar sua eficiência. Quaisquer ações, exercícios, atitudes, processos ou pessoas incapazes de produzir resultados a curto prazo são descartados. A segunda marca destes dias que vivemos apresentase como um círculo vicioso de inquietação. Radicalmente diferente de tempos outros, hoje nosso cotidiano está repleto de estímulos externos. Estamos numa sociedade over, onde tudo é encontrado às toneladas: informação, alimentos, cultura, arte, religião... Esta enormidade de opções nos faz viver inconscientemente uma angústia provocada pelo excesso. Alia-se a isto o fato de habitarmos cidades extremamente barulhentas. Sem que percebamos, nossos ouvidos captam inúmeros sons advindos dos mais variados objetos, pessoas e situações que compõem a complexa e incrivelmente barulhenta teia da vida urbana pós-moderna. Viver hoje é receber em um só dia enormes doses de estímulos e ruídos, tendo cada um deles poder de afetar nosso mundo interior, produzindo as mais diversas preocupações, ansiedades, distrações, perturbações inquietações.
O valor do
silêncio 48 | CRISTIANISMO HOJE
Estabelece-se, então, o círculo vicioso da inquietação: um ambiente externo alimenta a inquietude do nosso mundo interior; e, por sua vez, é exatamente esta interioridade perturbada a responsável por um mundo cada vez mais barulhento e perturbadoramente estimulante. Falar da experiência do silêncio em tal contexto é, sem dúvida, nadar contra a correnteza. Quando tudo, fora e dentro de nós, convida-nos ao barulho e à inquietação, buscar experimentar a quietude é uma árdua tarefa. Além disso, nosso vício na eficiência vai perguntar: “Para quê serve o silêncio? Que resultados práticos ele proporciona?” Aparentemente, nenhum – por isso mesmo, essa procura pode parecer-nos desestimulante e ineficaz. Mas, certamente, o silêncio tem, sim, um lugar importante na nossa vida e mais especificamente em nossa espiritualidade. Ele não é uma estratégia; antes, trata-se de uma disciplina espiritual. Portanto, promovê-lo não é apenas deixar de falar com os lábios, mas sobretudo calar as muitas vozes interiores. Este silêncio não é somente um jejum de palavras; é um esforço para aquietar ou mesmo domar as múltiplas perturbações interiores que nos assolam. É precisamente esta a lição advinda da experiência do profeta bíblico Jeremias. Ele escreve um livro barulhento. Chama-o de Lamentações. Nele, registra suas inúmeras queixas para com Deus, com sua missão, com o seu povo, com seu mundo. O profeta grita seus lamentos grávidos de irritação, decepção, frustração, ansiedade e muita raiva contida. Sente-se perdido. Tudo que desejava era salvação de Deus. Pois ele a teve e depois reflete sobre esta experiência. “Bom é aguardar a salvação do Senhor, e isso, em silêncio” (La-
mentações 3.26), relata. No deserto vivido pelo escritor bíblico, ele encontra no silêncio seu oásis. Ele nos convida a aguardar a salvação que vem de Deus numa postura de profunda quietude. Ao contrário do que possa parecer, aguardar em silêncio uma salvação que ainda não tinha vindo não é ruim ou angustiante para Jeremias – ao contrário, ele descreve esse processo como algo bom. O silêncio da alma é um gozo a ser usufruído, um elemento curador da ansiedade. Ele nos acalma até que a salvação se faça presente em nossa vida. Este silencioso aguardar pelo socorro que vem do Senhor pode nos levar a uma profunda serenidade interior, uma libertação de perturbações inimagináveis, moldando-nos para ter uma espera tranqüila. Jeremias nos ensina que há lugar para o silêncio na nossa relação com Deus. Mais que isso: poderse-ia mesmo afirmar ter o silêncio uma importância central na nossa experiência espiritual. Nas palavras do profeta, a quietude aparece quase que como uma condição para se usufruir desta salvação. Não há salvação fora do silêncio, pois este é o prelúdio para se experimentar aquela. É preciso entender esta salvação mencionada pelo profeta no seu aspecto cotidiano. O que Jeremias descreve é a intervenção salvífica do Senhor de Israel naquele momento histórico. Não poderia ser de outra maneira, posto que se reduzirmos a salvação de Deus à eternidade, perdemos a sua beleza presente nas tramas e dramas da nossa existência. Assim, há uma dimensão da ação de Deus que nos salva da ansiedade, da inquietação, da perturbação – enfim, dos múltiplos encarceramentos vividos por cada um de nós. É de dentro deste contexto que o silêncio torna-se condição fundamental para se experimentar a salvação diária nascida no alto, porém concretizada dentro e ao redor de nós.
“A quietude da alma é um elemento curador da ansiedade. Ela nos acalma até que a salvação se faça presente em nossa vida”
Eduardo Rosa Pedreira é doutor em teologia e pastor da Comunidade Presbiteriana da Barra da Tijuca, no Rio de Janeiro. É fundador do ministério Renovaré Brasil
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OS OUTROS SEIS DIAS | Carlo Carrenho
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Quando a fé move montanhas
Ventanilla, subúrbio de Lima, no Peru. Numa manhã de minharam lado a lado por sobre a duna, sempre jogando outono, 11 de abril de 2002, os termômetros marcavam um punhado de areia para frente antes de cada passo. Al35 graus. De repente, vários ônibus chegam a uma duna gumas horas depois, o resultado era óbvio: a duna tinha de areia de 500 metros de diâmetro, trazendo 500 volun- se movido alguns centímetros! tários peruanos, um artista belga, um cineasta e um crítiAs cenas são comoventes. Quinhentas pessoas vestidas co de arte mexicanos. de branco, alinhadas, movendo aquele monte de areia me Cais do Porto, Porto Alegre (RS). Visito a 6ª Bienal do fizeram refletir sobre o conceito de “fé que move monMercosul. Era o último domingo de outubro de 2007, e um tanhas”. Com seu experimento, Alÿs mostrou que a fé calor cortante levava os gaúchos às margens do rio Guaíba nas pessoas também pode movê-las. A experiência me para se refrescar. Mal sabia eu, ao entrar nos galpões da fez pensar que muitas vezes ficamos esperando que Deus Bienal, que estava prestes a aprender mova as montanhas e deixamos um novo significado para o conceide acreditar em nós mesmos, na to de “fé que move montanhas”. capacidade que temos de mover Mas antes de falarmos de fé e nossos montes e obstáculos. Afi“A verdadeira fé montanhas, quero enfatizar a imnal, unidos e cheios de fé, somos pode, sim, mover portância das artes plásticas e a capazes das coisas mais incríveis! montes; mas muitas pouca importância que nós, proA mensagem do artista belga testantes, damos a ela. Parece que, não contraria versículos do Evanvezes as ferramentas na Reforma, ao negarmos os santos gelho como Marcos 11.23 e Mateus usadas seremos nós e imagens, abrimos mão de toda a 17.20. Pelo contrário, os ratifica. mesmos, as pessoas, beleza da pintura, da escultura e das A verdadeira fé pode, sim, mover outras artes visuais. E me pergunto: montes; mas muitas vezes as ferraa sociedade” será que não jogamos fora o bebê mentas usadas seremos nós mesjunto com a água da bacia? Enfim, mos, as pessoas, a sociedade. Alÿs, precisamos passar mais tempo em com sua arte, me ensinou isto. E museus e exposições, aguçando nosso senso estético e tudo parece se encaixar em I Coríntios 13.2: “Ainda que apreciando as artes plásticas. tenha tamanha fé ao ponto de transportar montes, se não Mas voltando ao galpão da Bienal do Mercosul, eu me tiver amor, nada serei.” Ou seja, a fé deve sempre existir ao encantei com a obra Quando a fé move montanhas, do lado do amor – e a fé nas pessoas é sempre amorosa. artista belga Francis Alÿs e do mexicano Cuauhtémoc Medina. Na realidade, tratava-se de um filme sobre a Carlo Carrenho nunca moveu montanhas, mas escalou o obra de arte, uma vez que ela foi uma ação, um ato, uma Pico da Bandeira duas vezes e sonha em escalar o monte experiência. Os artistas estavam convencidos de que a fé Olimpo, na Grécia. Ele acredita que uma sociedade unida move montanhas e decidiram provar o que acreditavam pelo amor e respeito mútuo pode mover não apenas com um experimento. Munidas de pás, as 500 pessoas camontanhas, mas todas as cordilheiras do mundo
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CINECULT | Nataniel Gomes
De volta ao reino encantado
Duas visões, uma só obra
Príncipe Caspian, segunda adaptação para o cinema da obra de C.S.Lewis, chega aos cinemas em maio de 2008
Dois homens com visões de mundo bem diferentes aprendem juntos uma lição importante sobre a verdadeira função da Igreja. Este é o pano de fundo de A segunda chance, com o superastro gospel Michael W. Smith no papel do protagonista Ethan Jenkins. Ordenado pastor na igreja liderada pelo pai, Jenkins, começa a ver no ministério um negócio, e não uma ferramenta para alcançar pessoas para Cristo. Mas seu pai o envia para auxiliar a Second Chance Church (“Igreja da segunda chance”), uma comunidade que sofre com a violência e a marginalidade no local onde está plantada. Ali, Jenkins começa a trabalhar com o pastor Jake (Jeff Carr), com quem tem muitos atritos. Mas, para que a igreja seja restaurada, eles terão que aprender muito sobre unidade e como vencer os próprios preconceitos. (Drama, 103 min, 2006, EUA. Distribuição: BVFilms)
Príncipe Caspian é a segunda adaptação para o cinema da série de livros infantis As Crônicas de Nárnia, de C. S. Lewis. Quem gostou do primeiro filme não perde por esperar. Segundo antecipam os produtores, os efeitos especiais estão ainda mais espetaculares. Além de diversas novas criaturas mitológicas – haverá uns 50 tipos possíveis para cada raça –, haverá mais batalhas entre as forças do Bem e as do Mal. Tudo, claro, dentro da já celebrada ótica cristã de Lewis. A história se passa tempos depois da primeira aventura. Nárnia foi dominada pelos telmarinos, que baniram os animais falantes. Os irmãos Pevensie são então invocados pela trompa mágica de Susana para resgatar o reino. Caspian é o legítimo herdeiro dos telmarinos, mas ao mesmo tempo é ele quem clama pelos antigos reis de Nárnia. E o melhor para os fãs da obra de Lewis é que o diretor, Andrew Adamson (O mesmo de Shrek 1 e 2), garantiu um filme por ano nos cinemas, até 2013. Príncipe Caspian tem estréia marcada para 16 de maio de 2008.
Em busca da vitória
Entre a ciência e a fé
Desafiando gigantes narra a jornada de um técnico de futebol americano que, em seis anos de atividade, jamais conseguiu levar seu time à conquista de um campeonato. Pior – a vida pessoal vai tão mal quanto a profissional. Ma ele descobre o poder da fé e a perseverança poderá lhe dar a chave para a vitória. Um diferencial do DVD é o guia estudos com cenas do filme. (Drama, 112 min, 2007. Distribuição: BVFilms)
Baseado nos conceitos do britânico Stephen Hawking – um dos maiores gênios científicos da atualidade –, Teoria de tudo tem como base a história de um físico que perdeu a mulher e vive na busca por Deus através da ciência. O problema é alcançar evidências para sua hipótese antes que uma grave doença degenerativa acabe com sua capacidade para o raciocínio lógico. (Drama, 86 min, 2006. Distribuição: Comev)
Nataniel Gomes é doutor em Lingüística, professor universitário, editor da Thomas Nelson Brasil, membro da Comunidade de Jesus do Rio de Janeiro
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SONS DO CORAÇÃO | Nelson Bomilcar
Talento sem fronteiras
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A volta do filho pródigo, CD de Gerson Borges, reúne talentos musicais de vários estilos
A volta do filho pródigo é um dos mais significativos CDs da música cristã contemporânea brasileira. Baseado no livro mais famoso escrito por Henri Nouwen, grande e influente pensador da espiritualidade cristã, é um álbum que não deve faltar na estante de nenhum artista, líder cristão ou apreciador da boa arte. Trata-se de um trabalho que rompe as fronteiras do ambiente eclesiástico e perfuma a alma de quem ouve. Seu conteúdo estético é fruto da criatividade e da sensibilidade do músico e poeta Gerson Borges, que tem atuado com seriedade na música, acompanhando e orientando outros artistas.
Três décadas de louvor
Acaba de sair o DVD comemorando os 30 anos de carreira de Adhemar de Campos, um dos ministérios mais frutíferos da música evangélica brasileira. Comunhão e adoração 6, gravado em maio no majestoso Theatro São Pedro, na capital paulista, já tinha saído em CD. O álbum registra uma noite de louvor e adoração bem ao estilo de Adhemar, com muita devoção, profundidade e talento. Nesta noite de louvor e adoração foram gravadas músicas e versões do Pr. Adhemar como “A vitória”, “Leão da tribo de Judá”, “Amigo de Deus”, “Tributo a Iehovah”, “Grande é o Senhor”,”Louvemos ao Senhor”, “Nosso General é Cristo”, entre outras. As canções contaram com a participação da Orquestra Filarmônica de São Caetano do Sul. Destaque especial para os duetos feitos com cada um de seus amigos de jornada: Rodrigo Campos, Nelson Bomilcar, Ana Paula Valadão, Massão Suguihara, Nívea Soares, David Quinlan, Daniel Souza, Christie Tristão, Fernandinho, Luo, Soraya Moraes, Rachel Novaes e Ronaldo Bezerra. (Contato: www.apd.com.br )
Missionário do agreste Laércio Lins é um artista muito conhecido no Nordeste pelo seu trabalho junto ao grupo Sal da Terra. Instrumentista e compositor, ele percorre a região levando o Evangelho de maneira bem contextualizada com a realidade local.
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A obra conta ainda com a parceria do respeitado músico e arranjador João Alexandre e tem participações especiais de feras como Fernando Merlino, Jorge Camargo, Guilherme Kerr, Josué Rodrigues, Hilquias Alves e Cíntia Scola, entre outros. Destaque ainda para a produção da capa, com direito a quadro de Rembrandt e texto do escritor Tião Molina Sanches. (Contato: www.gersonborges.com) Por isso mesmo, não poderia ser outro o título de seu CD Contextualizando o louvor. Gravado e produzido em Caruaru (PE), o álbum tem a cara do sertão, com canções acompanhadas por viola, sanfona e percussão e letras como a de Coração Nordestino: Jesus morreu pelo Nordeste/Pelo sertão, pelo agreste/Pelo sanfoneiro, violeiro/Pelo homem sem escola/Pelo homem sem vitória e esperança/Pela mulher rendeira e pelo homem boiadeiro. Verdadeiro missionário do agreste, Laércio faz de sua música o veículo para regar corações secos com a pura água da vida. Contato: 81 3471-5771.
Crer é também pensar É proibido pensar é o título do novo CD de João Alexandre lançado em outubro. João é um músico multifacetado: produz, compõe, é arranjador, multiinstrumentista, cantor e um violonista com o toque e tempero brasileiro inconfundível. Neste novo e belo trabalho, estão composições de Gladir Cabral, Stênio Marcius, Marta Kerr, Guilherme Kerr entre outros, com a ambiência acústica do seu violão e a sonoridade de dois quartetos de cordas, além da percussão competente de Osmário Marinho. É um CD repleto de espiritualidade cristã, e na sua música título (composição dele mesmo), protesta e avalia a superficialidade e confusão que existe na música de adoração em nossa realidade brasileira, chamando-nos a resistir e pensar a fé cristã. Destaque ainda para a arte do CD feita por Adriano Nuevo. (Contato: www.vpc.com.br) Nelson Bomilcar é músico, compositor, escritor e pastor. E-mail: nmbomilcar@uol.com.br
ENTREVISTA
Marcos Couto
Teólogo de seu tempo, profeta da alma Para Os Guinness, o crente precisa engajar-se no debate dos problemas da sociedade, pois só o cristianismo oferece soluções coerentes
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Por diversas vezes, a Bíblia fala de profetas não apenas como homens que previam o futuro – mas também em referência àqueles com capacidade de discernir seu próprio tempo e chamar as pessoas à ação. Neste sentido, o cientista social Os Guinness bem pode ser considerado um profeta dos nossos dias. Filho de missionários ingleses, Guinness nasceu na China de cultura budista durante a Segunda Guerra Mundial. Com o advento do regime comunista, teve que partir para a Europa. Ali, na Universidade de Oxford, no Reino Unido, teve contato com a contracultura e o secularismo. No meio do caldeirão de manifestações filosóficas e comportamentais, Guinness conheceu Jesus Cristo como Salvador. Foi a partir dali que sentiu-se motivado a colaborar para pôr ordem no caos de uma era de confusão moral. “Apenas o cristianismo dá uma visão de mundo que oferece soluções coerentes e definitivas para as incertezas que estamos atravessando”, pontifica o estudioso. “Por isso, o cristão não pode ter medo de engajar-se no debate dos problemas mundiais”, diz ele. Hoje morando nos Estados Unidos e com mais de vinte obras de grande sucesso internacional publicadas, Os Guinness se tornou um dos principais apologistas cristãos da atualidade. Com uma bagagem que poucos têm, ele consegue fazer pontes entre as áridas e complicadas teses acadêmicas e a prática diária. Em setembro, Os Guinness esteve pela primeira vez no Brasil a convite da Universidade Presbiteriana Mackenzie, de São Paulo, para participar de um congresso internacional sobre ética, cidadania, religião e cultura. Durante um intervalo entre as muitas palestras sobre os efeitos da globalização e de como pode ser repensada a relação entre a vida pública e a religião, ele recebeu CRISTIANISMO HOJE para esta entrevista exclusiva: CRISTIANISMO HOJE – Como o senhor define “a jornada”, um conceito que tem utilizado em seu livro O chamado? Ela é pessoal ou universal? OS GUINNESS – Jornada é a mais profunda ilustração humana na busca pelo sentido
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da vida. Basta verificar grandes histórias de jornadas – o Êxodo, a Odisséia, a Ilíada, Dom Quixote, O Peregrino... Todas elas têm em comum a busca por significados. Eu divido a jornada em quatro fases. A primeira é a do questionamento. É a busca consciente. A segunda fase é a das respostas, e eu considero que a fé cristã é a única crença a apresentar uma resposta adequada para essa busca. A terceira etapa é a das evidências. Já que as respostas nos dão sentido, queremos então saber o que é verdade. E, por fim, a última etapa da jornada é aquela que leva ao compromisso. A noção de jornada é a mais profunda ilustração de como as pessoas vêm e se encontram na fé cristã. Como foi a sua jornada pessoal? Meus pais eram missionários na China e eu nasci lá. Ainda criança, tive que deixá-los e seguir para a Inglaterra por causa dos comunistas. A minha própria jornada para a fé foi uma travessia intelectual. Comparei os argumentos de autores como Nietzsche, Jean Paul Sartre e Camus, os grandes ateus dos séculos 19 e 20, com os de grandes pensadores cristãos, como Dostoievsky, Chesterton e acima de todos C.S. Lewis. Ao final de minha busca, eu estava certo de que a fé cristã era de fato verdadeira. E a partir de quando sua vocação se cristalizou? Eu vim a Cristo em 1960. Na época, eu estava na universidade, em meio à ebulição da contracultura. Havia os filmes de Bergman e Fellini, assim como os protestos em Berkeley. Era difícil contextualizar isso tudo como cristão – mas foi aí que conheci Francis Schaeffer. Ele estava justamente empenhado em juntar os pontos, mostrando como não só a fé tinha sentido, mas a política, a arte, a filosofia... Ele me ajudou a entender que, se pensarmos de maneira cristã, ou seja, dentro de uma moldura bíblica, é possível entendermos os sinais de nosso tempo. O problema é que a maioria dos cristãos tem uma visão errada do que os cerca. Eles têm a teologia e a filosofia corretas, mas sua visão de mundo é estática – quando as Escrituras apresentam uma dimensão do tempo, da geração do agora. E um dos exemplos positivos que temos são os homens de Isacaar, cujas ações são relatadas no livro das Crônicas. Eles liam os sinais do tempo, para que Israel soubesse o que fazer. O senhor se considera um sucessor de Francis Schaeffer? Eu devo a Francis Schaeffer a visão e a paixão que me norteiam – e eu devoto muita seriedade àquilo que aprendi
com ele. Schaeffer levava Deus a sério, assim como levava as pessoas e a verdade a sério. Sim, eu devo a ele esse respeito, pelo exemplo que deixou. Mas em termos de conteúdo e de pensamento, eu não o sigo. Sou um cientista social, e meu mentor nas ciências sociais é Peter Berger, e não Francis Schaeffer. Por que alguns setores mais conservadores demonizam autores como Kierkegaard e Bonhoeffer? Será que não podemos aprender com eles? Claro que podemos. E esta é uma área em que Schaeffer exagerou um pouco e fez muito estrago. Ele atacava Soreen Kierkergaard ou Karl Barth por causa de algo particular na sua posição geral – e isso foi um erro. E aí ele dispensava todo o conteúdo do autor, o que é perigoso. Kierkergaard pode ter coisas que não concordamos, como o seu salto de fé, que é muito subjetivo. Mas devemos lembrar que ele atacava a religião seca e abstrata de seu tempo. A mesma coisa é verdade em Bonhoeffer, Barth e outros. A igreja nos seus primórdios, tinha uma pequena frase que dizia: “Toda a verdade é a verdade de Deus”. Então devemos ser os primeiros a reconhecer a verdade. É claro que se um irmão cristão estiver certo, como Kierkergaard, devemos rapidamente reconhecer seu lado certo, não focar sua fraqueza. Mas devemos fazê-lo com discernimento. E hoje o senhor ainda segue essa vocação em seu trabalho? O meu chamado é, de um lado, fazer com que o Evangelho tenha sentido para os que estão no mundo, ou seja, do lado de fora da Igreja. Por outro lado, quero fazer com que o mundo faça sentido para os que estão dentro das igrejas. Eu sou um apologista e um analista. Creio que vivemos um período crítico não só na história em geral, mas especificamente na história do cristianismo.
“O problema é que a maioria dos cristãos de hoje tem uma visão errada do que os cerca. Eles têm a teologia e a filosofia corretas, mas sua visão de mundo é estática” CRISTIANISMO HOJE | 57
ENTREVISTA
Recentemente, morreram Jerry Falwell e James Kennedy, dois ícones do evangelicalismo americano. Eles eram representantes da chamada direita cristã e incentivavam a participação política da Igreja. Essa escola ainda influencia os crentes dos Estados Unidos? Se você pegar os últimos 50 anos nos Estados Unidos, existem dois extremos que os evangélicos abraçaram. Um é o extremo privado – a fé, nesta concepção, é vista como algo extremamente pessoal, e, portanto, publicamente irrelevante. E isso foi o que aconteceu com a maioria dos cristãos americanos. Infelizmente, eles dormiram ao longo de toda a década de 1960, o período mais crucial da história do país no século 20. Quando acordaram, lá por meados da década seguinte, foram para o outro extremo: adotaram uma fé politizada e confiaram aos políticos mais do que eles podem fazer. Sob muitos aspectos, isso levou a fé cristã americana a se tornar serva do Partido Republicano. Qual é o perigo disso? Essa atitude da direita cristã, sua subserviência ao republicanismo, criou uma resistência contra a religião de uma maneira geral, e especificamente, em relação ao Evangelho. Agora, sob a presidência de George W. Bush, essa resistência chegou ao seu mais alto grau. As pessoas dizem assim: “Se Bush é religioso, eu não quero ser religioso”. E o fato é que aqueles que apoiaram Bush e ajudaram a elegê-lo – os evangélicos – agora estão pagando por esse erro. Eu argumentaria que o cristão deveria estar engajado politicamente, mas nunca abraçado e unido a um partido ou ideologia. O maior de todos os políticos evangélicos foi William Wilberforce, um conservador que, apesar disso, votou contra seu próprio partido quando concluiu que ele estava errado. Ele nunca foi um homem do partido; e antes de mais nada, era um homem de princípios, que agia de acordo com sua consciência cristã. Nos Estados Unidos, os cristãos têm que se libertar das algemas do Partido Republicano. Agora, seria igualmente horrível ir para o outro lado e fazer a mesma coisa em relação aos democratas. O que aconteceu com a sua igreja nos Estados Unidos? Nós rompemos com a Igreja Episcopal dos Estados Unidos e com seu mais extremado líder, o bispo
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John Shelby Spong. Ele não acredita em nenhum artigo do Credo Apostólico, mas ainda assim se mantém como líder da Igreja. E lá você vai ver heresia, apostasia e paganismo. A nossa igreja, com muita tristeza, se desligou da Igreja Episcopal – e acabamos nos unindo à Igreja Anglicana da Nigéria. Ora, são cerca de 20 milhões de anglicanos na Nigéria. Eles são evangélicos, são ortodoxos, pois crêem nas Escrituras. E eu sou um anglicano, mas um anglicano ortodoxo. Um anglicano evangélico. Evangélico e reformado, se você preferir. Madre Tereza de Calcutá, considerada por muitos católicos uma espécie de “santa” contemporânea, revelou em suas cartas, hoje transformadas em livro, suas dúvidas e angústias acerca da própria fé. O senhor também escreveu sobre isso. Qual é a natureza e o papel da dúvida na vida do cristão? Eu já escrevi sobre a dúvida porque muitas pessoas com quem conversava se sentiam culpadas por terem dúvidas. Elas pensavam que dúvida é a mesma coisa que descrença – e não é! No grego, no hebraico e em quase todas as línguas do mundo, dúvida significa algo como o meio do caminho entre a fé e a descrença. Fé significa estar convencido de algo; descrença é não acreditar absolutamente em algo. Ora, a dúvida é o meio de caminho. A dúvida, em si, não é descrença – mas precisa ser resolvida, porque poderá se transformar em descrença. Nos meus livros, tento apresentar as diferentes maneiras pelas quais temos dúvidas e o que fazer para resolvê-las. Praticamente todo mundo tem uma dúvida em algum momento da vida; o mais importante é tornar as pessoas libertas para que compartilhem suas dúvidas. Então, devemos ser honestos sobre isso e compreender que o mais importante é saber resolver as dúvidas e voltar a ter uma segurança plena de fé.
“Creio que vivemos um período crítico não só na história em geral, mas especificamente na história do cristianismo”
Uma de suas mensagens diz que a maior objeção para a fé cristã são os cristãos. Como assim? A coisa que faz com que os não-cristãos fiquem mais enojados com a nossa fé é a hipocrisia. É a atitude daquelas pessoas que dizem uma coisa e praticam outra. Neste sentido, a hipocrisia tem sido o grande obstáculo à fé. E ninguém teve uma posição mais contrária à hipocrisia do que Jesus – então, quando nós, que dizemos ser seguidores de Cristo, somos hipócritas, estamos traindo tudo aquilo que o Mestre nos chamou a ser. Erasmo, no tempo da Renascença, disse: “Se quisermos levar os turcos para Cristo, precisamos, antes de mais nada, sermos cristãos nós mesmos”. Hoje, ocorre a mesma coisa. Toda vez que um cristão não vive no padrão de Jesus, estamos vulneráveis à acusação de hipocrisia. No contexto atual, qual é o futuro que se vislumbra para as denominações protestantes como instituições? Há uma resistência às instituições hoje. No mundo globalizado, as nossas instituições – incluindo a família e a Igreja – estão claramente perdendo a força. Talleyrand, um político francês do século XIX, disse que, sem indivíduos, nada acontece; mas sem instituições, nada permanece. Hoje, muito se fala da fé dos sem-igreja, e isso acaba levando a uma espiritualidade muito ruim e contrária à Bíblia. Muitos cristãos, sobretudo os jovens, têm uma percepção equivocada daquilo que devem almejar. As pessoas dizem: “Posso adorar a Deus num campo de golfe da mesma maneira que na igreja”. Sem dúvida. Mas esse tipo de fé, além de não ter respaldo bíblico, não tem força – é como um cogumelo que cresce na madrugada e de manhã já desaparece. A Igreja é uma instituição da qual precisamos; porém, a Igreja institucionalizada está perdendo sua verdade. Nós precisamos de uma instituição com verdade, com vida. Precisamos, portanto, de uma reforma das instituições. Em sua opinião, os cristãos estão deixando um vácuo na sociedade? O problema não é bem esse. Não é que os cristãos não estejam aonde deveriam estar; o problema é que eles não são o que devem ser, exatamente onde estão. E precisamos de cristãos que saibam como aplicar o senhorio de Jesus e fazer a integração de sua fé em cada parte, em cada esfera da vida. A fé de cada um precisa ser integrar ao todo de sua vida. Os crentes devem viver de maneira cristã, devem trabalhar de maneira cristã. Quem é advogado e conhece Jesus deve exercer a advocacia de maneira cristã. Isso vale para qualquer um que professe fé no Salvador – o médico, o técnico da computação, o lixeiro. Só assim teremos chance de ser sal e luz e ganhar de volta a cultu-
“A Igreja é uma instituição da qual precisamos; porém, a Igreja institucionalizada está perdendo sua verdade”
ra. Infelizmente, o número de cristãos que pensam é uma minoria. Nas Escrituras, temos o mandamento de amar ao Senhor nosso Deus com todo o nosso entendimento. Mesmo assim, muitos cristãos simplesmente não pensam. Dessa forma, nunca conseguiremos ganhar o mundo moderno, a não ser que tenhamos uma geração que aprenda a pensar biblicamente e de maneira cristã. Em que dimensão a fé cristã contemporânea sofre influência pós-moderna? Esse pós-modernismo tem raízes em Nietzsche e outros pensadores tremendamente anticristãos. O que é mais chocante é que o pós-modernismo tem muita força entre os evangélicos na Inglaterra e nos Estados Unidos, bem como em outras partes do mundo – e, pelo que ouço falar, aqui no Brasil também. É irônico porque floresce na França nos anos 1960 quando não havia terreno para crescer na Alemanha do pós Guerra. Daí quando perde força na França, ela floresce nas universidades americanas – bem quando as universidades francesas já tinham abandonado essas idéias. Mas o que é mais terrível ainda, é que agora está florescendo entre os os cristãos em boa parte do mundo. E isso no exato momento em que essas idéias estão morrendo nas universidades americanas. Conhecemos o principio do mercado de investimentos: compra-se na baixa, vende-se na alta. Se você quer fazer lucro, jamais poderá comprar na alta e vender na baixa. Mas os evangélicos têm esse habito estúpido de abraçar as idéias bem quando elas estão moribundas. E são sempre as últimas pessoas acreditando nessas idéias passageiras. O pós-modernismo é profundamente antibíblico. É o grande perigo que ronda a fé cristã hoje. Qual o antídoto contra isso? O antídoto é um entendimento biblicamente pleno da verdade, da Palavra e do Espírito. E eu espero que o colapso do pós-modernismo crie um vácuo e que a fé cristã seja suficientemente forte – cultural, intelectual e teologicamente – para ocupar esse espaço e fazer a diferença. (Colaborou Volney Faustini)
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LIVROS E RESENHAS | Luciano Vergara
Discipulado visto por dentro
Chegou tarde
Eu, discípulo? – Respostas para os caminhantes
Carl Henry (organizador) 608 páginas Cultura Cristã, 2007
Márcio de Souza 64 páginas Aliança Produções, 2007
Um incentivo no início da carreira pode fazer diferença. E os jovens escritores devem ter espaço para se expressar. Ou como chegariam à maturidade? Márcio de Souza ousou se expressar; mas apostila talvez qualifique melhor a publicação desse líder iniciante e, ao que parece, apaixonado por discipulado. Arrazoados sobre os métodos de discipular podem interessar a quem quer implantar um método assim em sua comunidade, mas está inseguro ou enfrenta dificuldades pontuais; pois é a isso que Márcio se propõe. E – pode-se dizer – com certa propriedade. Afinal, ele está onde as coisas acontecem e suas observações podem ser dicas valiosas.
Base sólida A Igreja discipuladora Cláudio Marra 160 páginas Cultura Cristã, 2007.
Discipulado é também o tema de Cláudio Marra, porém discutindo metodologias dos pontos-de-vista histórico, teológico e pedagógico. O anel de doutor que ostenta explica o acervo de referências de pesquisa, relevante como fonte para outros autores, professores ou quem deseja implantar projetos com marco teórico bem ancorado. O forte sotaque presbiteriano não impede que outros grupos denominacionais se beneficiem do estudo – mas a produção editorial não resultou em algo nobre, no que tange à comercialização, a ponto de justificar o preço na página web da editora. Comparando-se com livros “luxuosos” de outras casas, sem os mesmos objetivos acadêmicos, a Cultura Cristã deveria ter uma política de preços mais adequada.
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Dicionário de ética cristã
Necessário e dicionário fazem uma rima rica – ainda mais, quando urge a necessidade de um arcabouço ético e moral na presente cultura evangélica brasileira. Sobretudo quando a sua explosão já ultrapassou o zênite do arco de assimilação, enquanto vertente de costumes. Somente uma nova índole – sólida e confiável – renovará o arremesso evangelístico, desenhando nova trajetória para além das atuais linhas, constantemente derruídas pela diluição do testemunho. E a primeira edição no Brasil, 34 anos atrasada e com sotaque norte-americano, não só descuida-se a ponto de incluir relatórios de 2001 na apresentação de 1973, como não rima solidez do conteúdo com fragilidade de roupagem.
Um Paulo sem verniz Virado do avesso Rogério Greco 180 páginas Nah Gash Editora, 2007
Dá gosto ter em mãos um produto bem acabado: boa arte da capa, boa composição. Enfim, um livro que vai bem na prateleira da loja ou na estante da sala. Dois méritos ainda são o fato de a autoria ser de um jurista brasileiro e, outro, de tratar-se de um romance ficcional de forte plausibilidade. O autor apoiou o romance na história bíblica do apóstolo Paulo, trazendo-o para um plano mais próximo do leitor. Assim, o personagem é visto menos de modo “envernizado” pelos séculos de tradição copista e mais como alguém em meio às vicissitudes de uma vida possível no primeiro século do cristianismo. Se a Nah Gash mantiver essa linha corajosa e inovadora, com a qualidade que apresentou em Virado do avesso, merecerá tanto prêmios quanto investimentos.
Conhecimento de causa A batalha final Corrie ten Boom 180 páginas Arte Editorial/Candeia, 2007
Poucos autores têm envergadura para versar acerca dos horrores da guerra, como fez Corrie ten Boom (1892-1983). A holandesa e sua família estiveram em prisões nazistas durante a Segunda guerra Mundial por terem abrigado em casa fugitivos judeus. Tornou-se célebre pela autoria de O refúgio secreto, que inspirou o filme homônimo, rodado em 1975 e dirigido por J.F. Collier. Autora de cerca de outros 30 livros publicados, em A batalha final Corrie trata da luta dos cristãos em tempos iminentes e decisivos, abordando as instruções, as vitórias possíveis, o serviço, a luta dos últimos tempos e a derrota das trevas. Ela carrega na temática da volta de Jesus para bem breve, enfatizando a necessidade de nos prepararmos para o encontro com o Senhor. Diante de uma testemunha do horror nazista, empalidece todo argumento contrário.
Devoção que atravessa séculos Vida de oração – Para quem deseja conhecer Deus na intimidade Teresa de Ávila (editado por James Houston) Coleção Clássicos da Espiritualidade Cristã 302 páginas Editora Palavra, 2007
Hoje é, talvez, impossível colocar-se na mesma perspectiva de Teresa de Ávila. A santa católica é, desde muito, popular entre místicos fervorosos. Há mais de quatro séculos, ela afeta a espiritualidade cristã, mas não é fácil isolá-la da idolatria e da obtusidade romanista do século 16. Reduzido
e modernizado para o presente, este já não é o livro de Teresa, e sim uma seleção do brilhantismo dessa figura magnética, cujas visões e experiências de fé deram carisma à personalidade persistente, mente arguta e espírito obstinado da “Doutora da Igreja”. Espiritualidade sem mística faz da fé a um código religioso, mas Teresa e seus valores ainda inflamam o senso de mistério na moderna cristandade.
Truculência de Estado Fuga da Coréia do Norte – Uma busca desesperada por alimento, amor e vida Paul Estabrooks 165 páginas Missão Portas Abertas, 2007
Quem lê Fuga da Coréia do Norte tem a impressão de enxergar, simultaneamente, o velho e o novo. Pode parecer mais um relato da guerra fria nos anos 1950, mas as circunstâncias são absolutamente atuais. Lê-lo é constatar o anacronismo do regime de Pyongyang, uma espécie de fóssil vivo dos velhos regimes marxistas autoritários. Não é uma leitura em busca de ilustração, e sim, de informação – uma denúncia em forma de narrativa, cujos personagens são reais, ainda que com nomes propositalmente mudados. Afinal, além de não tolerar críticas, a diferença ideológica ou a exibição das graves mazelas sociais do país, o governo vitalício de Kim Jong Il não admite a devoção a Jesus Cristo. Por isso mesmo, a nação asiática, uma das mais isoladas do mundo, aparece como campeã da perseguição religiosa. Fuga da Coréia do Norte é uma obra que mostra até que ponto se pode chegar na truculência de Estado e no culto à personalidade de autoridades. Lá, quem quiser pesar de modo diferente do oficial talvez não viva para continuar pensando – e a fé cristã tem seu mais alto preço no mundo de hoje. Luciano Vergara é jornalista, professor do Seminário Teológico Betel, no Rio de Janeiro, e pastor metodista.
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Púlpito digital
“O mundo é a minha paróquia!”, bradou John Wesley, no fim do século 18, com a plena consciência de que a missão da Igreja passa, necessariamente, pela porta dos templos e se completa para fora dos seus arraiais. Ou, para ser um pouco menos denominacional, basta lembrar das palavras de Jesus, convocando todos para serem suas testemunhas, em Jerusalém, Judéia, Samaria e até os confins da terra (Atos 1.8). O sociólogo canadense Marshall McLuhan teorizou, nos anos 1960, o surgimento da chamada “aldeia global” – e, menos de duas décadas depois, a internet ajudou a concretizar a idéia. Embora ainda estejamos longe de ser a comunidade utópica preconizada por McLuhan – seja pela exclusão digital, seja pela carência de tecnologia –, parece que as coisas estão mudando. Novas ferramentas da grande rede, como os sites de relacionamentos tipo Orkut e os blogs, têm contribuído para uma tribalização pós-moderna. É a paradoxal “volta da tradição oral”, necessária para o surgimento da aldeia imaginada por McLuhan. Tudo bem que os blogs podem suscitar intermináveis discussões éticas e filosóficas, já que são tribunas para todo tipo de assunto. Mas também têm se tornado um grande púlpito para a pregação das boas novas do Reino de Deus. Por isso, se você ou sua igreja não têm um, aqui vão algumas dicas para quem deseja iniciar-se: Escreva sobre algo que você conhece – Informação só é importante quanto se transforma em conhecimen-
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to. Fale sobre assuntos que você domina. Conteúdo é tudo! Defina bem o seu público – Quanto mais segmentado for o blog, melhor; afinal, você saberá qual a linguagem utilizar e as particularidades do seu leitor. Valorize a interação – Nunca deixe de responder a um visitante, por mais irrelevante que possa parecer o comentário. Nunca se esqueça de que existem mais de 80 milhões de blogs – e de que, dentre todos, seu foi o escolhido e motivou alguma reação. Atualização é fundamental – Torne a atualização do seu blog uma rotina. Se algum visitante em busca de novidades der de cara com a mesma informação, tenha certeza: você acaba de perdê-lo. Nunca fale em “miguxês” – “C naum sabi o q eh?” Trata-se dessa nova forma de “linguagem”, criada por adolescentes, indefectível em salas de bate-papo ou programas de mensagens instantâneas. Se você quer dar credibilidade ao seu blog, evite-a, a não ser que seja uma escolha deliberada para atingir esse tipo de público.
“Os blogs têm se tornado um grande púlpito para a pregação das boas novas do Reino de Deus”
Whaner Endo é publisher da W4 Editora e diretor executivo da Associação de Editores Cristãos (Asec). Formado em produção editorial, é mestrando em Comunicação Social e membro da World Association for Christian Communication (WACC). Contato: whaner@w4editora.com.br
Musuvathi J Ubendran
CH DIGITAL | Whaner Endo
ÚLTIMAS PALAVRAS Ziel Machado
A
Por que não se cala?
A pergunta do rei Juan Carlos de Espanha ao presidente ve- distinta a cada congregação em particular. Em seguida, nezuelano Hugo Chávez, na Cúpula Ibero-Americana rea- revela seu conhecimento de cada situação – elogia o que lizada no Chile, em novembro passado, já foi imortalizada deve ser elogiado e critica o que deve ser criticado; chano folclore político. O constrangimento daquela situação ma ao arrependimento e alerta para as conseqüências dos chamou minha atenção para a necessidade de se qualificar erros; adverte cada uma e termina com promessas. Fico a crítica quanto a seu conteúdo, sua forma, motivação e mo- me perguntando: o que nos quer comunicar o Senhor por mento. Quatro elementos que, quando não são tomados em meio desta estrutura? conta, podem desqualificar até mesmo uma crítica justa. Aproximadamente 60 anos após a morte e ressureição Fiquei pensando na forma como hoje se critica este seg- de Jesus, sua Igreja enfrentou uma crise cristológica. As comento da sociedade denominado Igreja Evangélica. Em munidades descritas no Apocalipse esqueceram aspectos muitos casos, as críticas públicas que se fazem a ela estão importantes de seu Senhor e se tornaram parecidas com impregnadas de uma visão ingênua o que se via no seu entorno social. sobre a ambigüidade dos projetos Por esta razão, o Senhor decide ene realizações humanas, como se a viar uma carta aos seus servos, e o “A alternativa à tarefa de fazer a distinção entre o faz por meio de seu servo João. Este, crítica inadequada trigo e o joio fosse algo fácil. Outras exilado na Ilha de Patmos, recebe a vezes, o esforço crítico está impregrevelação – e a partir dali, o Filho não é a ausência de nado de ressentimento, sem falar de Deus expressa suas impressões contestação, mas sim, em personalidades narcisistas, susobre diversas congregações, com portadas por grupos de narcisistas o conhecimento de quem “conhece sua qualificação em complementares que encarnam o suas obras”. Foram críticas mais que conteúdo, momento, espírito cruzadista moderno. legítimas, portanto. motivação e forma” A alternativa à crítica inadequaEm que contexto nascem as da não é a ausência de contestação, nossas críticas? Será que as mesmas sim, sua qualificação em contemas expressam toda a reverência údo, momento, motivação e forma. O Senhor Jesus nos deu devida àquele que “anda no meio da igreja e conhece as o exemplo. A forma como se dirige às sete igrejas da Ásia, suas obras’? Será que nossa crítica ao Corpo de Cristo hoje no Apocalipse, oferece-nos uma excelente perspectiva de pode ser vista como expressão de adoração ao Senhor da como reconhecer e afirmar o que é bom; ao mesmo tem- Igreja? Será que ela nasce de uma íntima relação com o po, indica o que deve ser corrigido. É bom lembrar que a Senhor ou apenas dos nossos limitados pontos de vista? descrição da situação de cada uma daquelas comunidades Como poderíamos depurar nossa crítica através do cocristãs, e a exposição de seus respectivos problemas, não nhecimento que só aquele que anda no meio de sua Igreja impediram o Senhor de chamá-las de “minhas igrejas”. dispõe? Talvez, enquanto não nos seja possível responder A literatura apocalíptica tem por finalidade colocar o de forma adequada a tais indagações diante do Senhor que momento presente à luz da perspectiva das realidades, também conhece nossas obras, o melhor seja considerar a ainda não vistas, do futuro, assim como de colocar o mo- pergunta do rei de Espanha: “Por que não se cala?” mento presente à luz das realidades, não vistas, do presente. Portanto, aquele que anda no meio de sua Igreja e Ziel Machado é historiador, pastor e secretário regional que conhece suas obras primeiro se apresenta de forma para a América Latina da IFES
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