AC O LHI M E NTO : E X P R E S S ÕE S S OCIA IS Q UE DE SA FI A M O N OS S O OL H A R N OV E M B RO 2 0 2 0
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É na ordem original de realidade constituída pelas relações sociais que se deve compreender a família humana.” Jacques Lacan
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Editorial Luciana Maria Peres Araujo
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eu comentário é sobre o contexto de abandono, problemas familiares, violações de direitos e negligências em que crianças e adolescentes passam e que, muitas vezes, acabam marginalizadas e de outra forma quando se faz efetivo o Estatuto da Criança e do Adolescente materializa-se os acolhimentos por instituições que passam a ter papel de reestruturação social e emocional para indivíduos infantojuvenil. Cito aqui dois documentos norteadores que podem auxiliar profissionais envolvidos no serviço de acolhimento de crianças e adolescentes que necessitam orientações básicas que lhes garantam auxílio nas ações e condutas que cercam esta realidade. A PIA - Plano Individual de Atendimento e a Cartilha - Acolhimento Ins-
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titucional de Crianças e Adolescentes são documentos de esferas do Ministério da Saúde e do Ministério Público Nacional que pautados pela Lei nº 8.069 (ECA) dispuseram os documentos acima citados como forma de operar o reordenamento dos serviços de acolhimento institucional para este público.
Introdução A preocupação com crianças e adolescentes tem ocupado cada vez mais lugar desde os debates iniciais sobre a necessidade de um Estatuto
Editora Luciana Maria Peres Araujo Comissão Editorial Amanda G. Lopes Menda Cíntia Ullmann de Andrade Gabriela Luciano Vera Guilherme
que fosse em uma direção diferente da proposta pelo Código de Menores (1979), instrumento muito mais de punição do que se promoção do bem-estar de crianças e adolescentes. É nesse espírito que vem o Estatuto da Criança e do Adolescente (1990). Apesar de ter conteúdo também no que diz respeito à penalização de crianças a partir de seus 12 anos, o estatuto traz uma preocupação com o seu melhor interesse e, entre os diversos pontos de promoção desse interesse integral, está o acolhimento institucional em casos definidos por lei de necessidade. Há situações em que crianças e
adolescentes não podem prosseguir no convívio familiar de seus lares, e o Estado se preocupou em oferecer alternativas para que essas pessoas continuassem se desenvolvendo em outros ambientes, regulados por lei, administrados por pessoas idôneas, e capazes de oferecer todos os instrumentos para que, ao chegarem aos 18 anos, pudessem ser capazes de viver suas vidas com escolaridade e maturidade devidas. Nosso trabalho tem por objeto exatamente essa proposta de acolhimento, buscando esclarecer os motivos que levam à utilização dessa alternativa, sua dinâmica ao longo do tempo de permanência das crianças e dos adolescentes nesse programa, suas possibilidades e dificuldades para ser implementado de forma integral, até o momento em que o jovem precisa se desligar do programa em função da sua maioridade civil. Trata-se assim, de um programa que, para além do bem-estar de cada acolhido, tem repercussões sociais importantes, sinalizadoras também de políticas públicas que precisam ser implementadas tanto no sentido educacional de uma sociedade que precisa ser educada para a atenção a vulneráveis quanto no sentido de uma melhor abordagem para a questão.
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NOME
Luana Figueira Silva PROFISSÃO
Psicóloga CRP 07/27105 EM QUE ÁREA DA PSICOLOGIA ATUA
Psicologia Jurídica e Social ONDE TRABALHA
Abrigo João Paulo II DESCRIÇÃO DO MINI CURRÍCULO
Psicóloga e Especialista em Práticas Forenses pela Faculdade de Desenvolvimento do Rio Grande do Sul (FADERGS) e Mestranda em Psicologia na Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)
Entrevista 1) Qual o papel do psicólogo em uma instituição de acolhimento? Luana Figueira Silva - No serviço de acolhimento institucional, o psicólogo atua como o profissional que fará o acompanhamento das questões de saúde física e mental da criança e do adolescente. Irá realizar a escuta qualificada com vistas a acolher os sentimentos, auxiliar no processo de adaptação ao novo contexto, bem como desenvolver intervenções que promovam bem-estar e saúde mental. O profissional também faz o acompanhamento da relação da criança/adolescente com os padrinhos afetivos e mantém contato com os outros profissionais da saúde. Além disso, o psicólogo atua em articulação com a rede socioassistencial, elaborando relatórios multiprofissional para auxiliar no processo de decisão judicial no que se refere ao planejamento de vida da criança e do adolescente institucionalizado, como possibilidade de retorno familiar, colocação em família substituta, entre outros.
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o serviço de acolhimento institucional, o psicólogo atua como o profissional que fará o acompanhamento das questões de saúde física e mental da criança e do adolescente. Irá realizar a escuta qualificada com vistas a acolher os sentimentos, auxiliar no processo de adaptação ao novo contexto, bem como desenvolver intervenções que promovam bem-estar e saúde mental. O profissional também faz o acompanhamento da relação da criança/adolescente com os padrinhos afetivos e mantém contato com os outros profissionais da saúde. Além disso, o psicólogo atua em articulação com a rede socioassistencial, elaborando relatórios multiprofissional para auxiliar no processo de decisão judicial no que se refere ao planejamento de vida da criança e do adolescente institucionalizado, como possibilidade de retorno familiar, colocação em família substituta, entre outros. Segundo Bento (2010), Além de promover o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários e de capacitar e instrumentalizar a equipe, o psicólogo que atua em acolhimento institucional deve se colocar na posição de mediador da criança com a instituição, com a família e também com o Poder Judiciário, uma vez que os abrigados têm como protagonistas de suas decisões os educadores, a equipe técnica e a Justiça. A mediação realizada pelo psicólogo é de grande relevância, pois este fará a inclusão, em seus relatos e relatórios, do desejo e da opinião dos acolhidos. Ou seja, o papel de mediador é primordial nesse contexto, aliar o conforto da criança ou adolescente, escutar sentimentos, acolher e ainda assim ser porta voz para a família e poderes envolvidos, é
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o mais importante. Outras habilidades vêm junto a esse contexto como a empatia, poder influenciador e principalmente acolhimento frente às adversidades. Trabalhar de forma interdisciplinar, e conhecer termos técnicos e leis vigentes como o ECA, também é importante. Assim como a entrevistada referiu, o acompanhamento de saúde física e mental do abrigado é o objetivo final desse trabalho. Furtando-se de técnicas e ferramentas que propiciem seu trabalho.
Referências Formato Documento Eletrônico(APA) Silva, Christie Dinon Lourenço da, Denardi, Raquel Cristina, Becker, Ana Paula Sesti, & Delvan, Josiane da Silva. (2015). A Psicologia nos serviços de acolhimento institucional e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. Pesquisas e Práticas Psicossociais, 10(1), 55-65. Recuperado em 17 de setembro de 2020, de http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_ arttext&pid=S1809-89082015000100005&lng=pt&tlng=pt
2) Quais os desafios enfrentados nesta área? Luana Figueira Silva - São muitos os desafios encontrados, as principais dificuldades existentes estão na intersecção entre os serviços da rede socioassistencial, o que inclui CRAS, CREAS, CAPS, UBS, entre outras, no que se refere a execução dos encaminhamentos realizados para acompanhamento das famílias, cumprimentos de prazos e realização de atendimentos de saúde mental. De forma geral, a dificuldade está associada a efetivação da política pública, que se fragmenta pela desorganização do sistema político.
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ara garantir um atendimento de qualidade às crianças e adolescentes acolhidos e às suas famílias, os serviços de acolhimento devem funcionar de maneira articulada com os demais serviços da rede socioassistencial local, conforme sugere o Manual de orientações Técnicas do Serviço de Acolhimento da criança e do adolescente. Tal articulação irá possibilitar a inserção dos usuários nos demais serviços, nos programas e ações que integram o Sistema Unico de Assistência Social (SUAS), que se fizerem necessários ao atendimento às demandas específicas de cada caso favorecendo a integração comunitária e social dos usuários. No entanto, nossa entrevistada, a psicóloga social Luana Ferreira, que tra-
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Luana Figueira Silva PROFISSÃO
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balha no Abrigo João Paulo II e, atua nas questões jurídicas do Abrigo, nos traz em seu relato uma realidade diferente. Ela ressalta que são muitos os desafios nessa área, onde traz que, as principais dificuldades existentes estão na intersecção entre os serviços da rede socioassistencial, o que inclui CRAS, CREAS, CAPS, UBS, entre outras, no que se refere a execução dos encaminhamentos realizados para acompanhamento das famílias, cumprimentos de prazos e realização de atendimentos de saúde mental. De forma geral, a dificuldade está associada a efetivação da política pública, que se fragmenta pela desorganização do sistema político.
go 4º do ECA (vida, saúde, educação, alimentação e outros) e diversos são os motivos que originam a execução desta medida de proteção, sendo os mais frequentes a negligência nas necessidades básicas (alimentação, higiene), violência física e sexual.
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3) De modo geral, quem são estas crianças e jovens acolhidos? Luana Figueira Silva - São crianças e adolescentes que tiveram seus direitos violados pela exposição a situações de risco no contexto familiar. Estes direitos estão descritos no arti-
nalisando a resposta da Psicóloga entrevistada Luana F. Silva e buscando artigos que destrinche mais sobre essa temática do perfil de crianças e jovens que precisam do acolhimento de instituições por um período ou até chegar a maioridade, trago abaixo alguns tópicos que colaboram para o entendimento desse tema. Conforme pesquisa realizada na cidade de São Paulo, a principal motivação para o abrigamento está na pobreza da família de origem da criança (NCA/PUC SP, 2002). Do total de 4 847 crianças e adolescentes abrigados, 67% tinham algum tipo de vínculo com a família biológica contra apenas 33% que não tinham família ou o paradeiro dela era desconhecido. Essa constatação é recorrente também em âmbito nacional. A pesquisa realizada pelo Instituto de Pesquisas Econômicas Aplicadas (Cabral, 2003) aponta que, do universo de 80 mil crianças e adolescentes, foram abrigados 24,2% por causa da pobreza, enquanto que 18,9% dos abrigamentos ocorreram por abandono, ausência ou perda do
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vínculo familiar. Para os profissionais dos abrigos ouvidos na pesquisa, a condição de extrema pobreza vivida pelas famílias desses adolescentes e crianças justifica ainda a dificuldade para a reinserção familiar, o que, por sua vez, favorece o prolongamento do tempo de permanência da criança no abrigo. De acordo com a pesquisa nacional do IPEA, verificou-se que o tempo de permanência das crianças na instituição chegava a dez anos. No contexto da cidade de São Paulo (NCA/PUC SP, 2002), constatou-se que esse tempo variava de dois a quatro anos. Conforme pesquisa de Weber e Gagno (1995), em abrigo na cidade de Curitiba, a maioria das crianças estava na instituição há mais de três anos, e algumas delas chegaram a permanecer abrigadas por 15 anos. Diante dessas constatações, fica evidente que, para algumas crianças e adolescentes, o abrigo caracteriza-se menos como espaço de passagem e mais como lugar de moradia, território de referência para o cotidiano de suas vidas e para a construção de suas identidades. Fazendo uma síntese breve do trecho retirado do artigo ‘’O momento da saída do abrigo por causa da maioridade: a voz dos adolescentes’’, destaco a importância do profissional da psicologia para trabalhar as questões psíquicas da criança e adolescente que passam por essas instituições.
4) Quais os aspectos jurídico-administrativas de um serviço de acolhimento? Luana Figueira Silva - O serviço de acolhimento institucional é uma medida de caráter excepcional e provisório previsto no ECA e é executado pela política de assistência social do município de Porto Alegre, fiscalizada pela Fundação de Assistência Social e Cidadania (FASC). O Poder Judiciário através da Vara da Infância e da Juventude determina a medida de proteção e se faz presente
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junto com a Promotoria de Justiça da Infância e da Juventude ao longo de todo o período de acolhimento institucional da criança/adolescente. A cada seis meses ocorrem as audiências concentradas em cada casa lar, que são as audiências realizadas para a discussão de cada caso, com a presença da equipe técnica da instituição, coordenação técnica e representantes judicias, para realização dos encaminhamentos necessários, bem como escuta de cada criança. Cabe salientar que existe uma juíza, uma promotora e uma defensora de referência para cada casa lar. A Promotoria da Infância também se faz presente através da realização de convênios com outras instituições, como centros de atendimento de psicoterapia e outros locais ou programas que sejam necessários para atender as necessidades psicossociais das crianças e adolescentes em acolhimento. Recentemente iniciou-se um projeto de mentoria para os adolescentes que estão com 17 anos, com o objetivo
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de auxiliá-los na colocação no mercado de trabalho. Os adolescentes mostraram-se felizes com a possibilidade de ter uma pessoa específica para auxiliar nesta questão de forma individual.
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Referências Moraes Martinez, Ana Laura, & Soares-Silva, Ana
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eplicando de forma de analisar a resposta da entrevista, e na busca por artigos que trouxessem como é feita o aspecto jurídico e administrativos, foi encontrada citações ao ECA como norte para essa questão. Foi apenas com a promulgação do Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) que crianças e adolescentes passaram a ser concebidos como sujeitos de direito, em peculiar condição de desenvolvimento. O encaminhamento para serviço de acolhimento passou a ser concebido como medida protetiva, de caráter excepcional e provisório (Art. 92, Art.101), voltado ao superior interesse da criança e do adolescente e aplicada nas situações previstas no Art. 98. O ECA assegurou, ainda, o direito de crianças e adolescentes à convivência familiar e comunitária,prioritariamente na família de origem e, excepcionalmente, na família substituta. As instituições estão se adaptando ás mudanças da sociedade, aproximando as crianças e adolescentes institucionalizados a comunidade através de políticas que tem como objetivo devolver após condições necessárias para a sociedade.
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Ainda que o ECA esteja atuando para que as instituições sigam esse processo de cuidado com a criança e adolescente ainda existe muito a se fazer, pois ainda existe locais que não tem estrutura ou não seguem as políticas da ECA na sua totalidade.
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Paula. (2008). O momento da saída do abrigo por causa da maioridade: a voz dos adolescentes. Psicologia em Revista, 14(2), 113-132. Recuperado em 27 de setembro de 2020, de http://pepsic.bvsalud.org/scielo. php?script=sci_arttext&pid=S167711682008000200008&lng=pt&tlng=pt.
5) Como funcionam as articulações com as políticas públicas com relação aos processos de acolhida, permanência e desligamento de crianças/adolescentes? Luana Figueira Silva - A medida de proteção é de competência exclusiva do Poder Judiciário que por meio do conselho tutelar recebe as notifica-
ções dos casos. A retirada da criança é feita pelo oficial de justiça até a instituição responsável, após emissão de mandado judicial. Existem diferentes modalidades de acolhimento institucional, sendo a porta de entrada do serviço uma casa de acolhimento (abrigo), onde existe uma equipe técnica, composta por psicóloga e assistente social, que irão investigar a situação familiar e avaliar inicialmente a possibilidade de retorno. Se constatada a necessidade de um acolhimento mais prolongado, a criança pode ser encaminhada para outra modalidade de atendimento (casa lar, família acolhedora). Ao longo do período de permanência na instituição, a criança é acompanhada por uma equipe técnica (assistente social e psicóloga) que busca conhecer a realidade da família e realizar os encaminhamentos necessários para os serviços de acompanhamento familiar, CRAS e CREAS. Estes serviços, devem organizar um plano de intervenção com o objetivo de diminuir a vulnerabilidade social das famílias
e trabalhar os aspectos necessários para o retorno da criança ao âmbito familiar. Inexistindo a possibilidade de retorno, considera-se a opinião da criança na busca por outro planejamento, como a inserção em família substituta ou permanência na instituição até a maioridade.
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á uma demanda gigantesca por diversas políticas públicas que solucionem a grande cepa de problemas sociais. Por outro lado, sabemos que os recursos não são infinitos. Desse modo, a gestão das políticas públicas depende fortemente, entre outras coisas, da capacidade técnica dos(as) servidores(as) públicos(as) e do orçamento público. O Juiz e o Promotor de Justiça da Infância e da Juventude exercem um papel importante no acolhimento familiar. O Promotor de Justiça é quem, com base em elementos reunidos pela Rede de Proteção, até mesmo pelo Conselho Tutelar, promove a ação que dá origem ao acolhimento de uma criança ou adolescente. Nenhuma criança ou adolescente pode estar em situação de acolhimento sem o devido processo judicial. Com base nas argumentações e provas apresentadas pelo Ministério Público, o Juiz defere ou não o afastamento da criança ou do adolescente de sua família natural ou extensa e determina o acolhimento. Caso a criança já esteja
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acolhida (por exemplo: foi encontrada sozinha na rua e o Conselho Tutelar promoveu o acolhimento), o Juiz avalia a necessidade de manter ou não o acolhimento, após a manifestação do Ministério Público. Cabe também ao Juiz e ao Promotor de Justiça a adoção de medidas para que a criança ou o adolescente permaneça o menor tempo possível em situação de acolhimento, já que este deve ser breve. Para isso servem as audiências concentradas, oportunidade em que são reunidas a Rede de Proteção e os familiares para discutir as alternativas para o desacolhimento. Por fim, é importante lembrar que não é papel do Ministério Público e nem do Poder Judiciário a execução do serviço de acolhimento familiar. Esse papel está reservado ao Poder Executivo e deve integrar as políticas públicas de atendimento à criança e adolescente do Município. Eventualmente, assim como ocorre com os acolhimentos institucionais, o serviço de acolhimento familiar pode ser desenvolvido por entidade de
atendimento não governamental, observadas as regras do art. 90 e seguintes do ECA. Nem mesmo selecionar e capacitar as famílias ou indicar por qual família a criança ou adolescente será acolhida são atribuições do Poder Judiciário ou do Ministério Público.
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Referências BRASIL. Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes. Brasília-DF: CONANDA, 1999. Disponível em: www.mds.gov.br. Plano Nacional de Promoção, Proteção e Defesa do Direito de Crianças e Adolescentes à Convivência Familiar e Comunitária. Brasília-DF: Conanda, 2006. p. 43. Disponível em: www.mds.gov.br.
6) Como se dá o processo de desligamento de crianças/adolescentes no serviço de acolhimento institucional? Luana Figueira Silva - O processo de desligamento ocorre conforme a organização de cada instituição, tendo em vista que ainda inexiste uma política pública que atue especificamente com o desligamento dos jovens por maioridade no munícipio de Porto Alegre. Na instituição em que trabalho, os adolescentes começam a ser inseridos no mercado de trabalho através de estágio e cursos profissionalizantes a partir dos 14 anos, conforme a legislação vigente. O valor recebido da bolsa fica em uma conta poupança a qual o jovem tem acesso através da autorização do responsável legal, e a equipe técnica trabalha com eles a conscientização da necessidade de economizar o valor, combinando retiradas mensais de R$50. Aos 17 anos, inicia-se um trabalho grupal, com reuniões sistemáticas para auxiliar na organização financeira e nos conhecimentos necessários para a vida de forma autônoma. A equipe técnica responsável também auxilia o jovem a procurar moradias para alugar com valores acessíveis, como repúblicas, por exemplo.
A fase de transição do adolescente é um momento delicado, como profissional que atua neste contexto, avalio que, existem profissionais capacitados e motivados a desenvolver projetos institucionais que promovam maior qualidade para este momento, mas algumas dificuldades são encontradas, como por exemplo, questões psicológicas dos adolescentes, é comum alguns estarem em um momento de negação muito forte e não conseguirem participar das intervenções realizadas, enquanto outros, lidam com a transição à nível da fantasia e possuem projetos pessoais difíceis de serem realizados no espaço de tempo que possuem. A educação financeira é um dos principais pontos a serem trabalhados, pois é a partir da tomada de consciência deste fator que os jovens podem elaborar planos mais coerentes com a realidade. Ao pensarmos em questões do desenvolvimento humano, aos 18 anos o cérebro está terminando de se desenvolver completamente e o jovem ainda não possui capacidade maturacional para assumir toda a responsabilidade que este momento impõe. As figuras de referência, muitas vezes, são ídolos de filmes e música, e os ideais a serem alcançados ainda fazem parte de um espectro de fantasias e desejos de uma vida diferente. Entretanto, a realidade deste público é a de ter que se responsabilizar por si quando ninguém nunca o fez, sem uma figura de referência estável fora do contexto de acolhimento, com a presença de muito medo e angústia, que tendem a ser ocultados por uma necessidade de mostrar-se forte frente a situação. O acompanhamento após a maioridade não existe formalmente, o que ocorre é que os profissionais que atuam no acolhimento, principalmente os educadores residentes, acabam por manter o contato e auxiliar da maneira que conseguem. Alguns jovens retornam para a família, com o desejo manifesto de auxiliar financeiramente enquanto que de modo inconsciente buscam a proteção e o afeto que não tiveram.
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COMISSÃO EDITORIAL - VERA
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xistem atualmente no Brasil quatro formas de acolhimento para crianças e adolescentes em funcionamento, de acordo com as Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes (2009), organizadas pelo CONANDA (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente). Cada um tem suas justificativas próprias. Vamos a elas? 1. Abrigo institucional: destinado a crianças e adolescentes afastados do convívio familiar por meio de medida protetiva, abandono, ou perda temporária do poder familiar dos pais ou responsáveis. 2. Casa lar: unidade residencial com
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adulto responsável ou unidade residente para crianças e adolescentes afastados do convívio familiar por meio de medida protetiva, abandono, ou perda temporária do poder familiar dos pais ou responsáveis. 3. Serviço de acolhimento em famílias acolhedoras: famílias se cadastram e são avaliadas por equipe interdisciplinar para que possam acolher crianças e adolescentes afastados do convívio familiar por meio de medida protetiva, abandono, ou perda temporária de poder familiar por parte dos pais ou responsáveis. 4. República: aplica-se a casos de jovens a partir de seus 18 anos em processo de desligamento da instituição de acolhimento sem o retorno para a família e sem meios para auto-sustentação. Pode ser utilizado até os jovens completarem 21 anos.
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Segundo nossos entrevistados Luana Figueira Silva (CRP 07/27105) e Rodrigo dos Santos Ramos (educador social CPCA e Osicon), inexiste uma política pública efetiva quanto ao desligamento de jovens de 18 anos das casas de acolhimento. Cada instituição tem suas próprias orientações a esse respeito, na ausência de uma diretriz nacional. Os jovens começam a se inserir no mercado de trabalho a partir de seus 14 anos de idade, sob regime de estágio ou através de cursos profissionalizantes, e têm sua remuneração investida em caderneta de poupança, tendo direito de retiradas mensais no valor de R$ 50,00. Aos 17 anos recebem orientações financeiras e começam a se preparar para a “vida adulta”. Começa, a partir daí, a procura por moradias com valor acessível. Não existe, segundo a psicóloga, um acompanhamento formal desses jovens após seus 18 anos. Alguns seguem tendo contato com educadores residentes de forma voluntária. Muitos retornam após a maioridade para suas famílias de origem, agora como fonte de renda, mão-de-obra para ajudar financeiramente o grupo familiar. Embora não tenha sido mencionado nas entrevistas, o serviço militar obrigatório aparece como alternativa para jovens do sexo masculino por se apresentar exatamente no período crítico de transição do acolhimento para a vida na rua. Importante ressaltarmos que nas cidades do interior essa rede de proteção enfrenta maiores dificuldades, seja pelo estigma que esses jovens enfrentam e pela repercussão do processo na sociedade como um todo, com dificuldades inclusive de garantir o anonimato dos envolvidos.
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ATO Relato da entrevista realizada com Rodrigo dos Santos Ramos, 37 anos, Educador Social que atualmente desenvolve trabalhos no CPCA - Centro de Promoção da Criança e do Adolescente e na OSICON - Associação Comunitária (Promoção e proteção de jovens vulneráveis) na cidade de Porto Alegre RS
Luciana Araujo: 04/09/20
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Resumo
Aqui você saberá um pouco mais sobre o serviço de acolhimento no Brasil e em alguns lugares do mundo.
“P
oderia ter apoio psicológico individualizado desde o momento da entrada da criança e do adolescente”, assim, com uma visão de preocupação e envolvimento com a criança e com o adolescente acolhido Rodrigo inicia o relato de como funciona os processos de acolhimento e de desligamento de crianças/adolescentes institucionalizados. Rodrigo entende que existe um esforço de toda a cadeia de profissionais e mecanismos para que a criança e o adolescente seja acolhido e posteriormente desligado das instituições porém, ainda existem dificuldades e deficiências nos serviços envolvidos, tais como: falta de profissionais/educadores que propiciem o desenvolvimento de relações afetivas e condições de fortalecimento de reintegração familiar, família substituta e o caminho das ações de autonomia e de disciplina que o futuro exigirá fora da instituição. Assim, com muita empatia e experiência de quem vive os momentos positivos e negativos de abrigos, Rodrigo complementa seu relato de que “o atendimento psicológico individualizado fortaleceria para além das questões psíquicas, vínculos e potencialização dos aspectos positivos importantes para crianças/adolescentes” que vivem nesta realidade advindas de negligências e violências do cenário sócio-cultural e ausência das políticas públicas. Com relação ao desligamento do jovem acolhido, Rodrigo diz que este ao completar 18 anos seguirá sua vida fora da instituição tendo ou não recursos (dinheiro, emprego, família, moradia, etc...). Que esta é a realidade das instituições públicas de acolhimento.
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USA https://hpi.georgetown.edu/mentalhealth/ Uruguay http://www.inau.gub.uy/familia/acogimiento-familiar/ download/6538/982/16 Japão https://www.toben.or.jp/know/iinkai/children Brasil https://www.fazendohistoria.org.br/servicos-deacolhimento-no-brasil Porto Alegre - RS http://www2.portoalegre.rs.gov.br/fasc/default.php?p_ secao=140 Porto Alegre e Região Metropolitana http://www.acolhida.org.br/quem-somos
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Leituras Famílias em vulnerabilidade social: é possível auxiliar sem invadir?
Psicologia Jurídica Professora Luciana Tisser
A presente coletânea reúne seis artigos, quatro dos quais elaborados pelos membros do Núcleo de Pesquisa e Intervenção Família e Infância (registrado como Diretório de Pesquisa no CNPq) da Faculdade de Psicologia da PUC Minas, e que refletem, além de suas experiências de intervenção clínica, a elaboração dos resultados da pesquisa O IMPACTO DAS MEDIDAS PROTETIVAS PREVISTAS PELO ESTATUTO DA CRIANÇA E DO ADOLESCENTE NOS SISTEMAS FAMILIARES - FAPEMIG – 2009-2011. https://www.editoracrv.com.br/?f=produto_detalhes&pid=3604
Projeto Gráfico e Diagramação Carlos Tiburski 3C arte design
Cada caso é um caso https://www.neca.org.br/wp-content/uploads/Livro5.pdf
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