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ANGELI ROSE

Angeli Rose é escritora, pesquisadora, carioca, geminiana, é cultivadora, delegué RJ, Ph.D. em Educação (UFRJ), Educadora para a Paz, terapeuta holística (UNIPAZ e CIT-RJ);recentemente foi agraciada com o título de Embaixadora da Paz pela OMDDH; é membro de diversas associações e academia; idealizadora e coordenadora do “Coletivo Mulheres Artistas”; colunista do Jornal Clarín Brasil (digital),entre diversas outras atividades que exerce, sempre no campo cultural. Autora, entre outros, de Biografia Não autorizada de uma Mulher pancada. angeliroseescritora@gmail.com

ESTANTE CULTIVE

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ANGELI ROSE

Estamos estreando a coluna “Estante Cultuve” com muita alegria. Quando recebi o convite de Valquíria Imperiano, presidente da Cultive Litteraturé, Art Solidarité

(Associação Cultive, Literatura, Arte e Solidariedade), já imaginava o desafio que viria pela frente. A Cultive, além de estar muito presente no cenário cultural internacional – sua sede é em Genebra -, tem o mérito de reunir artistas e ativistas culturais de grande talento e reconhecimento internacional, então, honrar essa função de colunista para a Revista Cultive só poderia exigir o melhor de mim. Decidimos trilhar um caminho que tanto vai ao encontro dos princípios que norteiam as atividades na Cultive, associação, como reafirma na revista o perfil construído com rigor e competência que na divulgação de valores estéticos e personalidades do campo cultural, englobando todas as linguagens. A partir disso, a coluna trará a cada edição uma resenha crítica de uma obra literária de um cultivador ou cultivadora e eventualmente entrevistas exclusivas concedidas à colunista, por ocasião de pesquisas ou eventos.

O gênero textual “resenha crítica” tem como objetivo principal apresentar uma obra artística, um 80 Revue Cultive - Genève evento (objeto apreciado) ou um acontecimento estético ou cultural de maneira resumida com apreciação técnica e autoral. e, no caso, preferencialmente, literária. É um convite à leitura. O termo crítica tem sua ligação mais íntima com a etimologia. Segundo o filósofo Emanuel Carneiro Leão (UFRJ) em Aprendendo a Pensar: "Etimologicamente, crítica provém do verbo grego krinein, cujo primeiro sentido é ‘separar para distinguir' o que há de característico e constitutivo. Essa separação distinta se exerce, remontando à ordem dos fundamentos constituintes e por isso elevando-se a uma ordem superior, à originária”.

Posto isso, apresentaremos o livro solo de Eluciana Íris, mineira, bacharel em Direito, nutricionista, escritora e, além de cultivadora, é Vice-presidente da Academia Mineira de Belas Artes (AMBA) e detentora de alguns prêmios literários, como o de Embaixadora da Paz pelo Núcleo de Letras e Artes de Buenos Aires e a Literarte, entre outros. Eluciana também é uma ativista cultural criativa, pois desenvolve um projeto semanal nas suas redes sociais chamado Chá & poesia com Elas [https:// youtu.be/sHE226HPyFI]. Vale conferir! Quanto ao livro, se intitula COMIDAS AFETIVAS & POEMAS. COMBINAÇÃO PERFEITA. Coleção Coletivo Literário. MG: Editora Ramos, 2020,87 pg. E pode ser adquirido com a autora, contatando-a em suas redes sociais. A obra apresenta prefácio, apresentação e dedicatória, agradecimentos e 4ª

capa. São chancelas importantes de leitores qualificados que dão a ver a relevância da obra e na voz inicial da autora destaco as dedicatórias à mãe e à sogra, in memoriam, Maria Dorcineia Almeida e Linnéa Carvalho, respectivamente. Por quê? Porque elas conferem a força da família mineira e o legado gastronômico domesticado tão conhecido como traço relevante da brasilidade. A cozinha mineira e a intimidade que ela traz nas conversas dos almoços de domingo.

“Você tem fome de quê?” Eu lhe perguntaria leitor, leitora, provocando uma reflexão antes de ler o livro da escritora e poeta Eluciana Íris, e logo de início me atreveria a resgatar de um lado a lembrança do rock brasileiro, Comida; e de outro, um título homônimo do médico Deepak Chopra de 2014. Então, a nossa autora mineira respondeu à legendária pergunta posta pelos Titãs na canção de modo elaborado que o “sumário” do volume sugere ao alternar uma receita com o título de um poema. Quanto ao livro de Chopra, vou deixar você curioso, curiosa, se ainda não o leu, mas posso adiantar que na linha de autoajuda, vale procurar por ele, porque o autor consegue aliar conquistas da ciência no campo nutricional e energético (Biovida e bioética) com os conhecimentos orientais sobre a leveza da vida e perspectivas existenciais.

Capa: Montanhas de Minas, Guto Paixão. Certamente, você poderá se perguntar o que isso tudo tem a ver com o livro em questão. Eu diria que primeiro para quem é leitor sabe que uma leitura puxa a outra; e para quem escreve é impossível não puxar da memória, porque “palavra puxa palavra”, já escrevia Machado de Assis sobre o jogo criativo que é a escrita autoral.

Se você tem fome de ler algo que o desperte para imagens inusitadas ou o coloque diante da possibilidade de aprender uma nova receita de gostosuras que podem lembrar a infância ou a reunião animada entre primos e amigas, por exemplo, começaria perguntando ao leitor ou à leitora, como se fizesse um convite à leitura da sabedoria das entrelinhas, a partir do jogo de alternância proposto no livro de Eluciana entre poesias e receitas culinárias.

A autora instiga o nosso apetite pela vida. De um lado, com sugestivos pratos tomados de um misto de memória familiar afetiva com a cultural (receitas de mãe, irmã e filha contam!); de outro, pela lucidez encantatória de sua saborosa poesia que se alia ao aroma das palavras bem escolhidas: “Umedeça o caminho suave, sem pressa”; sugere no poema Distante de Ti. A autora deixa entrever sua concepção de mundo, de poesia, de vida, mas caberá a cada um pelo caminho que desejar, aleatório ou não - se obedecer o sumário proposto - descobrir a dimensão holística como potência na literatura de Eluciana, entre 24 receitas de bom gosto e 32 poemas, com direito a poetas convidados para o desfrute da palavra em estado poético.

A certa altura da leitura, depois do pão de queijo da Kiki (sua mãe) poderiam presumir algo mais melancólico ou ameno, mas o que chega aos olhos leitores são imagens mais potentes de uma mulher que decidiu usar cabelos vermelhos e não está nem aí para a opinião púbica a ponto de ligar o foda-se. A expressão não choca é bem vinda ao contexto do poema intitulado com a expressão forte como um bom café forte que se toma ao cair da tarde. Talvez, se preparando para ver a Orquestra na roça, outra grata leitura ainda ligada à memória da mãe. Quanto às receitas, algumas são minuciosamente estruturadas com a inclusão de “ingredientes”; ”massa”; “modo de preparo” (da massa e do recheio); e “montagem”. São recursos que substituem perfeitamente um vídeo tão comum hoje nas redes sociais. Elementos da paisagem mineira, principalmente, interiorana, constituem a plasticidade conferida aos poemas, como “trem”, “roça”, um céu estrelado, um olhar pra cima, estendido à memória familiar, passarinhos, uma “praça”, “pequena igreja”, “pão de queijo”, certo cenário bucólico (“Venham descansar, abrigarem do sol debaixo dos meus olhos floridos”). Do sentimento de brasilidade plantado e desfrutado em Pau Brasil, sombras e flores, ao lado da tecnologia e aceleração do nosso tempo com a presença metonímica da “Harley Davidson”, por exemplo, em A fome e o Relógio. E ao final, quem se dispuser a conhecer a arte poética de estreia em solo de Eluciana Íris será brindado/a com uma prosa memorialística sobre sua cidade de nascença, Campo Belo e com a qual ainda mantém laços fortes, por palavra e por familiares que lá residem, em Cidade Montesa. Campo Belo. Minas Gerais. Assim, cabe trazer para a degustação linguística

algumas considerações daqueles que pensaram a literatura como alimento espiritual também: para o crítico literário Roland Barthes, o “sabor do saber” está na literatura; para o poeta também mineiro, de Itabira, Carlos Drummond, a leitura é uma fonte inesgotável de prazer; para Fernando Pessoa, ler é sonhar pela mão de outrem; já para Marcel Proust em "Sobre a leitura", a leitura está no limiar da vida espiritual. E como não poderia deixar de resgatar na memória da cultura universal, O Banquete de Platão com vários convivas (Fedro, Pausânias, o médico Erixímaco, o comediógrafo Aristófanes, o próprio anfitrião desse symposium, o poeta Agatão e Sócrates) a revelar a preciosa e perspicaz sapiência da sacerdotisa Diotima é possivelmente uma influência, consciente ou não, no belo dialógico diálogo entre Diotima e Sócrates que leva a refletir sobre o Amor, através do perfil de Eros que é traçado, no nível mais imediato de nossas sensibilidades e apetites, com ênfase no sexual, está presente de alguma maneira em Comidas Afetivas e poesia. O gênio, esse intermediário, que é o Amor, ou o “Daimond”, como os gregos o chamavam, é o mote para o pensamento reflexivo e filosófico, voEm o Caixeiro Viajante, por exemplo, Eluciana realiza um pouco desse apetite com a sensibilidade de poeta. Para degustação um fragmento do poema:

“Pudesse eu beijar sua boca na beira do lago. Sentir o cheiro das flores das laranjeiras. Mergulhar os pés quentes nas águas geladas da cachoeira. Suas mãos, delicadas toque de seda, fazer-me um afago (...) Fecho os olhos, ainda sinto a sua emoção que ardia ao me abraçar. Conto as estrelas, tento tocar e sentir o seu rosto.”

Então, como artista do seu tempo, Eluciana Iris conjuga alimento para o corpo com alimento para mente e espírito, sugerindo, através do seu livro, seu modo de ver a vida, a comida e a poesia.

Senhores, senhoras, a mesa está posta! Sivam-se, por favor, de sentidos e experiências, de leituras e gostosuras!

https://institut-cultive.com/eventos/projetos e-mail: antologia@institut-cultive.com

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