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PEDRO SAMPAIO NUNES, EX-DIRECTOR DA COMISSÃO EUROPEIA DAS NOVAS TECNOLOGIAS DE ENERGIA E DAS ENERGIAS
PEDRO SAMPAIO NUNES,
EX-DIRECTOR DA COMISSÃO EUROPEIA DAS NOVAS TECNOLOGIAS DE ENERGIA E DAS ENERGIAS CONVENCIONAIS | EX-SECRETÁRIO DE ESTADO DA CIÊNCIA E INOVAÇÃO | CONSULTOR
PRECISAMOS URGENTEMENTE DE UMA NOVA POLÍTICA EUROPEIA DE ENERGIA
AComissão Europeia apresentou no passado dia 18 de maio a sua proposta REPowerEU, um plano que pretende reduzir rapidamente a dependência dos combustíveis fósseis russos e acelerar a transição ecológica. Nesta proposta a Comissão mostra infelizmente que nada aprendeu com a crise atual, e propõe na prática, substituir a nossa dependência da Rússia, por uma dependência mais total e mais irreversível da China. Salva-se o apelo a uma maior eficiência energética, onde cada unidade de energia no consumo, evita a produção de três unidades de energia primária na produção. De resto, estamos em pleno reino da fantasia e do politicamente correto, que nos trouxe até à atual tragédia. Com os preços mais altos de energia do Mundo, sejam em combustíveis líquidos, pela enorme punção fiscal a que são sujeitos, seja na eletricidade ou no gás natural, a Europa, gigante económico com pés energéticos de barro, tem que fazer algo de drástico e eficaz para alterar esta situação, que ameaça a sua competitividade industrial e o nível de vida dos seus cidadãos. Mas não seguramente o que consta da proposta da Comissão, em que esperemos que o bom senso do Parlamento e do Conselho Europeu, coloquem no bom caminho. Essa situação vem já de trás, não deriva da guerra da Ucrânia, mas foi muito agravada pelo conflito que estamos a assistir. A política europeia de energia formatou-se muito condicionada pela agenda climática, uma vez que a União pretendeu assumir um papel de liderança no combate climático, e sobretudo na chamada economia “verde” a que iria dar origem. No entanto, vejamos os factos: a União Europeia é responsável por 8 % das emissões globais de gases de efeitos de estufa. Há 20 anos era responsável por 14%. A China era responsável há 20 anos pelos mesmos 14% das emissões, hoje é responsável por 28%! Os Estados Unidos eram responsáveis por 24%, hoje são por 14%. Assim, a União Europeia desceu 6 pontos percentuais, mas à custa de ter hoje os custos mais elevados
de energia do Mundo, enquanto os Estados Unidos desceram 10 pontos e têm os preços mais baixos quer nos combustíveis líquidos (menos 40%), quer no gás natural (1/5 do valor europeu) e na eletricidade (cerca de metade do valor europeu). No mesmo período, a Europa aumentou a sua dependência energética de 56% para 60%, os Estados Unidos passaram a ser independentes e exportadores líquidos de energia a partir de 2020! Para piorar este panorama, aquele que é hoje o maior poluidor do globo, a China, domina largamente todas as tecnologias ditas “verdes”, com a maior potência instalada em fotovoltaica e eólica (204 GW de cada em 2018, mais do que toda a União Europeia e os Estados Unidos juntos), baterias e carros elétricos (mais do que a UE e os US juntos). Tem já 33 centrais nucleares e está a construir 21, destinadas no futuro a substituir as centrais a carvão. Tem planeadas e propostas mais 178! Quer isto dizer que apesar dos sacrifícios impostos à economia europeia, a liderança da “economia verde”, e das matérias-primas de que necessitam, está nas mãos dos que mais poluem. A abordagem ideológica e dogmática foi suplantada pela abordagem pragmática. A política voluntarista da “Energiewende” que inspirou e condicionou a política europeia de energia (e a nossa), revelou-se um enorme fracasso, tal como denunciava o “Economist” em 2015 e o Tribunal de Contas alemão no ano passado. 600 mil milhões de euros desperdiçados em subsídios, têm como resultado as emissões 6 vezes superiores às da França ou às da Suécia. Isto deve-se à intermitência e falta de densidade energética das energias renováveis, que não têm atualmente tecnologia eficaz para as resolver, e que esse fato empurrou o sistema elétrico alemão e europeu, para uma dependência crescente do gás natural russo e para os custos mais elevados do Mundo, à medida que a potência firme vai cedendo lugar a potência intermitente nos sistemas elétricos. Na realidade as centrais fotovoltaicas funcionam em Portugal apenas em média 20% das 8760 horas do ano em que é necessário manter as luzes acesas, e na Alemanha apenas metade disso. As eólicas cerca de 25% das horas do ano, em horas de produção equivalente. Funcionam de fato mais horas, mas com potência limitada, pelo que este é o máximo que se pode extrair de energia útil daquelas centrais. Portugal ainda dispõe de energia hídrica, o que dá mais 10% nos anos secos e 40% nos anos húmidos, e uma possibilidade de armazenar, com uma perda de 30% da energia usada, em bombagem hidráulica. Ora essas horas não se justapõem como seria o ideal, mas sobrepõem-se largamente. Pelo que no pior dos casos (o que vivemos o ano passado) temos 35% do tempo energia limpa, mas temos que fechar o restante das necessidades com gás natural e/ou importações. No melhor dos caos, poderíamos almejar ter 85% das necessidades anuais satisfeitas com renováveis, mas teríamos sempre que importar ou usar as centrais de ciclo combinado a gás natural cada vez mais caro para satisfazer o consumo. As tecnologias de armazenamento existentes apenas permitem deslocar a produção (com as perdas associadas), mas não acrescentam horas, e não existe ainda tecnologia competitiva para o fazer. O hidrogénio verde é uma fuga para a frente para tentar sair deste impasse e usá-lo como forma de armazenar os inevitáveis excedentes, quando se ultrapassa a “barreira do som” das percentagens críticas de injeção de energias intermitentes nos sistemas elétricos, que correspondem em termos gerais à potencia de consumo no vazio, porque criam necessariamente nas horas de produção plena excedentes. Ora o hidrogénio é uma molécula perigosa, de transporte e armazenagem complexa e de produção ainda muito cara, que exige mais energia para ser produzida do que aquela que vai proporcionar ao consumo. Estamos de novo no experimentalismo que nos conduzirá a mais elefantes brancos e mais ineficiências, enquanto os nossos concorrentes, beneficiando dos nossos erros, vão tomando conta, uma a uma, das tecnologias críticas para o nosso desenvolvimento futuro. E controlando as matérias-primas necessárias para as produzir. Mantendo os seus custos baixos e a sua estrutura produtiva competitiva. Tudo porque recusamos ideologicamente e sem base científica, duas tecnologias provadas, seguras e competitivas: A energia nuclear e a fracturação hidráulica (“fracking”). Como recusámos os biocombustíveis. Sendo que a energia nuclear é a única eficaz para satisfazer a base do diagrama (“baseload”), que conjugada com a eficiência energética e renováveis, poderá diminuir de forma drástica e rápida as emissões, aumentar a nossa segurança de abastecimento e diminuir os custos do sistema energético. Com um registo histórico de segurança muito superior a qualquer das outras formas de energia por unidade de energia produzida. Como mostram os exemplos da França, Suécia, Suíça e Finlândia, esses sim exemplos a copiar, e mostram pela negativa a Alemanha, a Dinamarca e Espanha, esses a evitar. Veremos como irão responder os responsáveis políticos a esta mudança necessária e urgente de rumo e de política. Se olham de frente os fatos, ou se se deixam de novo condicionar pelo politicamente correto, mas tecnicamente incorreto. l